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10 DE FEVEREIRO DE 2021

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– Proteção dos idosos do vírus SARS-CoV-2 em lares de terceira idade (incluindo aqueles sem alvará) e punha

na agenda parlamentar, apesar do seu chumbo1, a brutal repercussão da pandemia nos idosos internados em

lares, tanto que hoje é sabido que estes constituem 26% das vítimas mortais por COVID-192.

Tal não pode deixar de conduzir-nos a uma reflexão profunda sobre a forma como as sociedades ocidentais

lidam com a velhice. Muitos idosos são colocados, pelo Estado e pelas famílias, no que designamos por lares,

casas de repouso e residências seniores, consoante o capital económico de cada pessoa ou família. Estimava-

se, antes da pandemia, que seriam cerca de 100 mil idosos, aqueles que em Portugal se encontravam nestas

instituições3, aos quais acrescem os cerca de 30 mil idosos colocados nos 3 mil lares ilegais sem alvará, segundo

estimativas da Associação de Lares e Casas de Repouso de Idosos4.

Na verdade, uma vez que muitas famílias não têm vagas nas misericórdias e instituições particulares de

solidariedade social (IPSS) e sentem dificuldades em pagar a mensalidade de um lar privado, vêm-se na

situação de tentar a solução que conseguem suportar financeiramente, colocando os seus idosos em lares

ilegais (a aguardar a alvará) ou mesmo clandestinos. Este último tipo de lar, não tendo alvará nem se

encontrando registado na carta social e na entidade reguladora, e não possuindo eventualmente as condições

necessárias para o seu funcionamento, não pode deixar, contudo, de estar sob o escrutínio do Estado,

nomeadamente sobre quem lá se encontra a viver ou a trabalhar5, sobretudo neste contexto de pandemia.

No ano transato, o Instituto da Segurança Social conduziu 1074 fiscalizações, que determinaram o

encerramento de 105 dessas estruturas, e 4139 visitas de acompanhamento a lares, legais e ilegais, tendo sido

identificados às autoridades de saúde para incluir no processo de vacinação cerca de 700 lares clandestinos,

segundo declarações da Ministra da Segurança Social6.Mas num universo de cerca de 30 mil idosos em cerca

de 3 mil lares clandestinos, segundo dados da Associação de Lares e Casas de Repouso de Idosos, tal parece

ser manifestamente insuficiente7.

Muitos dos utentes dos lares clandestinos não os escolheram e/ou as suas condições económicas não

permitiram outra opção viável, sendo por isso alheios ao processo de legalidade e ilegalidade (estando em

processo de obtenção de licenciamento ou não), pelo que é dever do Estado proteger estes cidadãos e cidadãs

em completa vulnerabilidade, fazendo cumprir o artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa, «o direito

à proteção da saúde» e «o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos

cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação».

Recentemente, dois estudos da DECO/Proteste sobre idosos em lares alertou para o tempo de espera por

vagas, o valor incomportável dos lares e a deterioração da qualidade de vida e da saúde, incluindo a saúde

mental dos idosos durante a pandemia, que, justamente, veio acelerar a sua degradação física e mental – os

idosos com graves condições de saúde passaram de 28% para 40% neste período8.

A pandemia veio, assim, expor as várias debilidades da nossa sociedade, dentre elas, o cuidado redobrado

que devemos aos nossos idosos e idosas. Face a esta situação, urge repensar o caminho até aqui adotado e

propor soluções concretas para repensar e reverter o modelo da institucionalização massiva de idosos, cabendo

ao Estado assegurar um processo de envelhecimento digno, reforçando igualmente os meios de apoio

domiciliário.

Neste sentido, a Assembleia da República, reunida em Plenário, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da

1 Discutido e votado em Plenário a 8 de abril de 2020, com os votos contra do PS, do PSD, do CH, abstenção do PCP, do CDS-PP e a favor do BE, do PAN, do PEV e do IL. 2 Segundo dados da DGS, do passado dia 4 de fevereiro, os idosos em lares corresponderam a 3750 das mortes desde o início da pandemia, sendo o número total de mortes de 14 354. https://rr.sapo.pt/2021/02/08/pais/covid-19-matou-3750-idosos-em-lares-desde-o-inicio-da-pandemia/noticia/225894/. 3 «No final de março (2019), o total de residências ativas rondava os 98 100 lugares, com uma capacidade média de 40 lugares por centro, sendo que 78% do número total de lugares (76 308) correspondia a entidades gestoras de centros não lucrativos, situando-se a capacidade das residências lucrativas em cerca de 21 800 lugares». In Jornal de Negócios (14 de junho de 2019). Outros dados: 165 mil utentes são apoiados nas 398 misericórdias; 800 mil utentes encontram-se em IPSS. InCorreio da Manhã (27 de março de 2020). 4 O presidente da Associação de Lares e Casas de Repouso de Idosos (ALI) estima em 3 mil as casas clandestinas, calculando uma média de dez idosos por casa. In entrevista à Sábado (15/12/2020). https://www.sabado.pt/vida/detalhe/temos-mais-de-tres-mil-lares-clandestinos. 5 Há muitos lares clandestinos pois o processo de licenciamento dos lares é muito difícil, havendo casos que levam cerca de 15 anos para o obter, num processo que começa pela licença de utilização camarária, para o qual a câmara tem de obter um parecer positivo da Segurança Social, do delegado de saúde e da proteção civil. Obtida a licença camarária, os lares têm ainda de pedir à Segurança Social a licença de funcionamento. Tal faz com que situações de ilegalidade e mesmo de clandestinidade se arrastem em desfavor dos mais idosos. In entrevista a João Ferreira de Almeida, Presidente da Associação de Lares e Casas de Repouso de Idosos (ALI), Sábado (15 de dezembro de 2020). https://www.sabado.pt/vida/detalhe/temos-mais-de-tres-mil-lares-clandestinos. 6 https://rr.sapo.pt/2020/12/21/pais/covid-19-vacinacao-prioritaria-nos-lares-ilegais-105-foram-encerrados-em-2020/noticia/219487/. 7 Cf. nota 4. 8 https://www.deco.proteste.pt/familia-consumo/orcamento-familiar/noticias/idosos-em-lares-perderam-vitalidade-durante-a-quarentena.

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