O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

II SÉRIE-A — NÚMERO 86

2

PROJETO DE LEI N.º 708/XIV/2.ª

PROTEÇÃO E VALORIZAÇÃO DO BARRANQUENHO

Exposição de motivos

Apesar de tradicionalmente afirmada a ideia de que o perfil linguístico de Portugal corresponde a uma

realidade homogénea e monolingue, os anos finais do século XX e o século XXI têm permitido reforçar a

evidência e a importância da valorização da diversidade linguística existente no território nacional. As iniciativas

locais de reconhecimento do património linguístico, enquanto traço identitário do património imaterial das

populações, que deve ser classificado e protegido, permitiram, ainda no cair do pano do século XX, reconhecer

a realidade da língua mirandesa, conferindo-lhe proteção legal e assegurando o desenvolvimento de políticas

públicas para a sua valorização e divulgação.

A realidade do Barranquenho e o incremento significativo da produção científica em torno da sua evolução e

caracterização evidenciam hoje com clareza mais uma realidade linguística singular em Portugal e, até, na

Península Ibérica, que pela sua subsistência até ao presente, deve merecer também uma intervenção normativa,

em linha, aliás, com os movimentos europeus e internacionais de proteção deste tipo de património imaterial

linguístico.

Quanto às suas origens, estima-se que nas suas raízes remotas o Barranquenho possa decorrer da

permanência, desde o período medieval, em torno do Castelo de Noudar, antiga sede de concelho, de população

proveniente de Castela, tendo a manutenção de contacto contínuo entre as terras de Barrancos e as populações

vizinhas espanholas contribuído para a permanência desta especificidade linguística, que a literatura científica

tem reconduzido tradicionalmente a um dialeto do português, a uma fala local ou, nalguns casos, a uma língua

mista.

Ainda que o desenvolvimento da investigação mais intensa em torno do barranquenho corresponda ao último

quartel do século XX e ao século XXI, um papel pioneiro deve ser reconhecido à obra de José Leite de

Vasconcelos que, já numa fase tardia da sua produção científica, deixou um trabalho de referência na sua

Filologia Barranquenha – Apontamentos para o seu estudo, publicado postumamente em 1955, a partir de

trabalho de campo realizado nas décadas de 30 e 40 do século XX.

Como o próprio refere em nota de prefácio, a experiência seria marcante e de enorme importância para os

seus estudos filológicos: «Visitar Barrancos foi para mim, durante longos anos, uma aspiração, um sonho. (…)

Que aprazíveis e úteis dias logrei em Barrancos! Como constantemente, com saudade, os evoco. E deveras me

lamento de haver deixado a minha visita para idade tão provecta. Em verdes anos maior proveito eu colheria,

por se estender ainda diante de mim dilatado campo de trabalho».

Apesar de já ter consagrado algumas passagens de trabalhos anteriores à fala de Barrancos

(designadamente na sua tese de doutoramento, o Equisse d’une Dialectologie Portugaise, editado em Paris em

1901), e, nesse texto, apenas a partir de notas de terceiros, é apenas com a sua deslocação ao território que

aprofunda a sua investigação. Como o próprio refere, «da antecâmara dos meus aposentos fiz, pois, centro de

estudos: e os meus hospedeiros principiaram a recrutar vítimas, que haviam de responder às minhas

perguntas».

Em missiva ao Ministro do Interior, Leite de Vasconcelos conclui pela identificação de um «curioso dialeto

popular usado no concelho de Barrancos; tem por base o falar do Baixo Alentejo, modificado pelo Estremenho-

Andaluz que lhe deu feição muito notável», referindo já na referia obra dedicado ao Barranquenho que o mesmo

«merece que se lhe dedique desvelada atenção, e não se deixe morrer sem que a sua gramática e léxico fiquem

devidamente investigados».

Mais recentemente, e no quadro de um movimento que convoca vários investigadores, merecem especial

referência os trabalhos de Maria Victoria Navas, professora da Universidade Complutense de Madrid, que a

partir da década de 90 do século XX tem avançado com uma proposta de revisão do estatuto e da tipologia até

aqui atribuída a esta variedade linguística mista, preferindo identificar no Barranquenho um língua de contacto

e minoritária, mais do que apenas um dialeto, uma fala fronteiriça ou uma fala raiana, como outros autores

tradicionalmente o qualificam.

Páginas Relacionadas
Página 0003:
1 DE MARÇO DE 2021 3 O caminho de alguma investigação científica mais recente refor
Pág.Página 3
Página 0004:
II SÉRIE-A — NÚMERO 86 4 cooficial minoritária, assente em medidas de
Pág.Página 4
Página 0005:
1 DE MARÇO DE 2021 5 Artigo 5.º Apoio científico e educativo É
Pág.Página 5