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8 DE MARÇO DE 2021

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1058/XIV/2.ª RECOMENDA AO GOVERNO QUE CUMPRA A RESOLUÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA N.º

62/2019 E ASSEGURE A ADOÇÃO DE UM CÓDIGO DE CONDUTA ADAPTADO À CONVENÇÃO DE ISTAMBUL, VISANDO UMA ADEQUADA COBERTURA NOTICIOSA DE CASOS DE VIOLÊNCIA

DOMÉSTICA E IMPEDIR UM EXPECTÁVEL EFEITO DE CONTÁGIO

O crime de violência doméstica é um dos fenómenos criminológicos com maior grau de incidência na sociedade portuguesa e corresponde a uma realidade transversal a todos os grupos sociais e faixas etárias. De acordo com o mais recente Relatório Anual de Segurança Interna, referente ao ano de 2019, este crime regista em todo o território nacional 29 498 ocorrências, o valor mais elevado desde 2010.

Este é um flagelo com graves e profundas repercussões no domínio pessoal, familiar, profissional e social das vítimas em causa, e deverá merecer um conjunto transversal e estruturado de medidas em diversos sectores. Os órgãos de comunicação social são um desses sectores, e, enquanto agentes de socialização, podem contribuir para a prevenção e o combate à violência contra as mulheres através de uma reponderação do tratamento dado a este fenómeno.

Nos últimos anos tem-se desenvolvido um trabalho de identificação da correlação entre os casos crescentes de perpetração do crime de violência doméstica com a forma como os meios de comunicação social têm vindo a difundir as notícias sobre o homicídio de mulheres em contexto de violência doméstica. Alguns estudos internacionais1 têm demonstrado que a desadequada cobertura noticiosa de casos de femicídio está associada a um aumento do número de mortes de mulheres vítimas de violência doméstica nos sete dias após a difusão das notícias, verificando-se um efeito de mimetização/contágio, que parece relacionar-se com a proliferação de mensagens assentes na impunidade dos agressores e nas falhas do sistema.

Na mesma linha, um recente estudo pela Entidade Reguladora da Comunicação Social2 (ERC) concluiu que existe «pouco investimento na problematização deste fenómeno social» e pouco «rigor informativo» na difusão de notícias, o que perpetua «estereótipos das relações de géneros na intimidade», identificando, também, uma diminuição do número de crimes nos dias imediatamente a seguir à difusão de notícias/reportagens sobre prevenção/intervenção no âmbito da violência doméstica.

Estes dados demonstram-nos, pois, que a abordagem mediática dos casos de femicídio deve ser feita com especial cautela e rigor, por forma a evitar-se que se crie junto das vítimas um sentimento de insegurança e de desproteção e, junto dos agressores, uma ideia de tolerância e legitimidade. Cientes desta realidade, alguns países da Europa, como Espanha, criaram um código de conduta que visa garantir a adequada cobertura noticiosa de casos de violência de género. Esta é uma medida perfeitamente alinhada com o disposto na Convenção de Istambul (nomeadamente no seu artigo 17.º), que exorta a comunicação social a definir «(…) diretrizes e regras de autorregulação para prevenir a violência contra as mulheres e reforçar o respeito pela sua dignidade». No nosso país abordagem similar a esta foi adotada no âmbito do Plano Nacional para a Prevenção do Suicídio e do Código Deontológico dos Jornalistas, alinhando-se com as recomendações da Organização Mundial de Saúde.

Em 2019, por proposta do PAN e seguindo aquelas que são as melhores práticas internacionais, a Assembleia da República aprovou a Resolução n.º 62/2019 que instava o Governo a promover junto dos órgãos de comunicação social, desejavelmente com o envolvimento da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, a elaboração e a adoção de um código de conduta adaptado à Convenção de Istambul, visando uma adequada cobertura noticiosa de casos de violência doméstica e impedir um expectável efeito de contágio. Apesar de a violência doméstica ser um flagelo no nosso país que exige medidas urgentes, volvidos mais de 2 anos da aprovação desta proposta do PAN, alinhada com aquelas que são as melhores práticas internacionais neste domínio, o nosso país continua sem ter um Código de Conduta adaptado à Convenção de Istambul.

Assim, face ao exposto e atendendo à importância deste tema, com a presente iniciativa o Grupo Parlamentar do PAN instar o Governo a que cumpra a Resolução da Assembleia da República n.º 62/2019 e promova junto dos órgãos de comunicação social e, desejavelmente com o envolvimento da Entidade

1 C. Vives-Cases, J. Torrubiano-Domínguez, C. Álvarez-Dardet (2009), «The effect of television news items on intimate partner violence murders», in European Journal of Public Health, Vol. 19, n.º 6. 2 ERC (2018), Representações da Violência Doméstica nos telejornais de horário nobre.

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