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II SÉRIE-A — NÚMERO 92

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acesso universal.

Em maio de 2020 vários líderes mundiais apelavam à partilha livre e gratuita do conhecimento e da

investigação que então estava a ser feita em relação à vacina, de forma a garantir um acesso universal e

equitativo. A Organização Mundial da Saúde, nomeadamente através do seu Secretário-Geral, Tedros Adhanom

Ghebreyesus, fez um apelo semelhante ao lançar uma Solidarity Call to Action onde se desafiava os países a

fazer da resposta à Covid-19 um bem público comum, nomeadamente através da partilha de conhecimento e

fazendo com que os resultados da investigação financiada com recursos públicos se tornassem acessíveis à

escala global. Portugal foi um dos países que subscreveu esta missiva.

Também a Organização das Nações Unidas (ONU) tem apelado para que a vacina contra a COVID-19 seja

um bem público acessível a todas as populações de todos os países, apelando à solidariedade e criticando as

tentações de cair no ‘nacionalismo da vacina’.

A verdade é que apesar de todos os apelos e apesar de as vacinas só terem sido possíveis através do

investimento público massivo em investigação e produção, as patentes estão nas mãos de indústrias privadas

que estão a estrangular a produção em prol de uma posição monopolista que garanta mais e mais lucros. As

vacinas, em vez de estarem a ser usadas para o bem público, estão a ser usadas para os acionistas da Pfizer,

da Moderna e de outras empresas terem uma generosa distribuição de dividendos nos anos de 2020 e de 2021.

Enquanto a Pfizer dizia esperar ganhar 15 mil milhões de dólares com a vacina contra a COVID-19 e a

Moderna anunciava, por sua vez, uma expectativa de ganhos na ordem dos 5 mil milhões, as entregas com que

estas e outras empresas farmacêuticas se tinham comprometido atrasavam-se a faziam atrasar os planos de

vacinação. Os contratos firmados com a União Europeia estão a ser consecutivamente incumpridos e a

AstraZeneca já disse que no segundo trimestre de 2021 só deverá entregar metade das vacinas com que se

tinha comprometido.

Resultado: as vacinas chegam a conta-gotas, os planos vacinais atrasam-se, a imunidade de grupo demorará

mais a ser atingida, as medidas restritivas para contenção de contágios têm de permanecer por mais tempo e,

talvez mais problemático ainda, permite-se uma maior janela temporal para que se produzam mutações do vírus

potencialmente mais perigosas e resistentes.

Em Portugal, por exemplo, previa-se a entrega de 4,4 milhões de doses até ao final do primeiro trimestre;

afinal deverá ser entregue cerca de metade desse valor. Em vez de termos mais de 2 milhões de pessoas

vacinadas, conseguiremos, se as farmacêuticas não continuarem a falhar, ter cerca de 1 milhão. Isso atrasará

todo o plano de vacinação, coisa que já foi admitida pelo próprio coordenador da task-force.

A verdade é que as patentes estão a estrangular a produção e a situação é mais dramática nos países mais

pobres do mundo.

Como dizia o Secretário-Geral das Nações Unidas num artigo publicado no final de fevereiro: «Apenas 10

países administraram mais de 75% de todas as vacinas COVID-19. Enquanto isso, mais de 130 países não

receberam uma única dose». Para além da desumanidade que esta desigualdade representa, espreita aqui um

perigo para todo o mundo. É que, como António Guterres avisou, «se permitirmos que o vírus se propague como

um fogo selvagem no Sul do globo, vai sofrer mutações constantes» e que «as novas variantes podem tornar-

se mais transmissíveis, mais mortíferas e, potencialmente, uma ameaça à eficácia das vacinas e diagnósticos

atuais» correndo o risco «que o vírus volte a assombrar também o Norte do globo.»

Perante o estrangulamento da produção e a escassez de vacinas na esmagadora maioria do país, a OMS

voltou a fazer um apelo contundente na última semana: suspendam-se as patentes das vacinas para que se

possa intensificar a sua produção e se possa garantir um acesso rápido e universal às mesmas.

Esse deve ser o caminho. A vacina deve ser um bem público e não uma mercadoria propriedade de umas

poucas empresas; a vacina deve ser de todos e para todos, até porque a sua investigação e produção foi

altamente financiada e subsidiada por dinheiro público; a pandemia combate-se com solidariedade entre países

e povos e não com o monopólio e açambarcamento.

O Governo português deve assumir, a nível internacional, a posição da solidariedade e da universalidade da

vacina, até se quer ser coerente com o apoio que já deu num passado recente ao apelo da OMS. Deve defender,

na União Europeia e nas várias instâncias internacionais, aquilo que é justamente defendido pela OMS e pela

ONU: o levantamento das patentes, a partilha livre e gratuita de todo o conhecimento e de todos os dados

resultantes da investigação sobre a vacina contra a COVID-19, a diversificação de locais de produção, a

massificação da produção e a distribuição mais rápida e célere da vacina por todos os países.

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