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II SÉRIE-A — NÚMERO 97

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punível noutras circunstâncias, por força do disposto no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto deixa de o ser.

De todo o modo, é de referir que nem o caráter estruturalmente completo de uma dada norma, nem a sua

unidade teleológica constituem obstáculos definitivos à identificação, a partir de segmentos ideais da mesma

ou de partes do respetivo enunciado linguístico, de outras normas autónomas de âmbito mais restrito –

operando-se, deste modo, um desdobramento da primitiva norma em (sub) normas de âmbito mais restrito –

sem que tal desvirtue ou ponha necessariamente em causa o sentido normativo fundamental da primeira.

Por exemplo, e confirmando isso mesmo, no caso vertente, facilmente se podem autonomizar quatro

normas, considerando a dupla alternativa «praticar ou ajudar» na antecipação da morte pedida por pessoa em

situação de sofrimento intolerável, com «lesão definitiva ou doença incurável e fatal». E em qualquer uma

delas subsiste a unidade teleológica da respetiva previsão, já que em todas continua a operar-se – e, o que se

afigura decisivo, a respeitar-se no seu núcleo essencial –, ainda que somente no âmbito de aplicação material

respetivo – que é necessariamente mais restrito – a mencionada redefinição da fronteira entre o ilícito e o lícito

operada pelo legislador.

Este pretendeu definir por via do Decreto n.º 109/XIV, e no exercício da sua liberdade de conformação, o

espaço máximo do lícito no quadro da ilicitude preexistente. Assim sendo, a referida segmentação normativa

seria possível, porque apenas estaria em causa a delimitação, naquele espaço máximo, de áreas de licitude

mais reduzidas para a antecipação da morte medicamente assistida não punível – somente a ajuda, e não

também a prática; ou somente no caso de doença incurável e fatal; e não também em caso de lesão definitiva

de gravidade extrema. Tratar-se-ia, assim, de diminuir, por razões de constitucionalidade, o espaço do lícito

criado pelo legislador dentro do ilícito já existente, e que o legislador quis manter; e não de o aumentar, como

porventura poderia resultar da supressão de outras condições. Uma tal operação de redução ou limitação seria

legítima, porquanto o Tribunal não estaria a desbravar novas fronteiras, substituindo-se ao legislador nessa

tarefa, mas tão-somente, no exercício do seu poder de controlo negativo, a limitar, por razões de legitimidade

constitucional, as escolhas já realizadas pelo próprio legislador.

12. Assim, no presente processo, admitindo-se que a pretensão do requerente aponta no sentido de que o

juízo a proferir se deva cingir às normas (segmentos normativos), isoladamente consideradas, do n.º 1 do

artigo 2.º do Decreto n.º 109/XIV enunciadas no requerimento – as normas constantes do n.º 1 do artigo 2.º, na

parte em que define antecipação da morte medicamente assistida não punível como a antecipação da morte

por decisão da própria pessoa, maior, em situação de sofrimento intolerável, e na parte em que integra no

conceito de antecipação da morte medicamente assistida não punível o (sub)critério lesão definitiva de

gravidade extrema de acordo com o consenso científico – considera-se, todavia, como decorre das

considerações feitas no número anterior, e, em especial, face à completude e ao sentido da norma jurídica em

causa, que a análise de tal pretensão carece de sentido se não for integrada no conjunto global e lógico dos

elementos da previsão da norma que, cumulativamente, determinam a não punibilidade da antecipação da

morte medicamente assistida por decisão da pessoa e a seu pedido.

Com efeito, resulta da estrutura da norma que os segmentos do n.º 1 do artigo 2.º autonomizados no

requerimento correspondem a dois elementos que, a par dos demais, constituem requisitos ou pressupostos

do parecer favorável a emitir pela CVA, na sequência de pareceres favoráveis sucessivos emitidos pelos

médicos intervenientes no procedimento (artigo 7.º, n.º 1), parecer esse que é condição necessária para se

passar à fase da concretização da decisão de antecipar a morte da pessoa que, com o seu pedido, deu início

ao procedimento clínico e legal que culmina na administração (ou autoadministração) dos fármacos letais

(artigos 2.º, n.º 3, 8.º, n.º 1, e 9.º, todos do Decreto n.º 109/XIV). Por ser assim, tais segmentos devem ser

entendidos lógica e teleologicamente como elementos objetivos (juntamente com outros não mencionados no

pedido) dos quais depende a exclusão da punição da prática ou ajuda, por profissional de saúde, à

antecipação da morte de alguém a seu pedido.

Deve entender-se, pois, que o objeto material do pedido enunciado pelo requerente não pode deixar de ser

recortado, para que verdadeiramente adquira sentido no quadro compreensivo em que se integra e justifica, na

sua conjugação com os demais elementos da previsão da norma.

Assim, a norma sindicada a título principal, tal como compreendida pelo Tribunal, é a que consta do artigo

2.º, n.º 1, do Decreto n.º 109/XIV, com todo o seu conteúdo prescritivo (designadamente aquele que lhe é

projetado a partir do número 3), enquanto norma completa, ao considerar antecipação da morte medicamente

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