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Terça-feira, 13 de abril de 2021 II Série-A — Número 114

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

S U M Á R I O

Projetos de Lei (n.os 708, 752, 771 e 792 a 796/XIV/2.ª):

N.º 708/XIV/2.ª (Proteção e valorização do barranquenho): — Pareceres da Comissão de Cultura e Comunicação e da Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.

N.º 752/XIV/2.ª (Altera o Decreto-Lei n.º 22-D/2021, de 22 de março, possibilitando a realização de exame de melhoria de

nota interna no ensino secundário): — Alteração do texto inicial do projeto de lei.

N.º 771/XIV/2.ª (Consagra a natureza pública dos crimes de violação, de coação sexual, de fraude sexual, de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência e de procriação

artificial não consentida e alarga os prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e do crime de mutilação genital feminina,

procedendo à alteração do Código Penal e do Código de Processo Penal): — Alteração do texto inicial do projeto de lei.

N.º 792/XIV/2.ª (PCP) — Altera a Lei da Defesa Nacional (segunda alteração à Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de

julho).

N.º 793/XIV/2.ª (PCP) — Altera a Lei Orgânica de Bases de Organização das Forças Armadas (segunda alteração à Lei Orgânica n.º 1-A/2009, de 7 de julho).

N.º 794/XIV/2.ª (BE) — Cria o programa férias desportivas e

culturais.

N.º 795/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira) — Altera o artigo 250.º do Código de Processo Penal, para uma abordagem na identificação de suspeitos que salvaguarde os direitos processuais e as liberdades

fundamentais das pessoas racializadas, limitando a discricionariedade policial baseada em estereótipos raciais: — Texto inicial do projeto de lei.

— Alteração do texto inicial do projeto de lei.

N.º 796/XIV/2.ª (CDS-PP) — Elimina proibições de estacionamento e pernoita em autocaravanas. Projetos de Resolução (n.os 1184, 1187 e 1194 a

1198/XIV/2.ª):

N.º 1184/XIV/2.ª (Recomenda ao Governo um investimento robusto na educação no âmbito de um plano de recuperação de aprendizagens e do desenvolvimento pessoal e social dos alunos):

— Alteração do texto inicial do projeto de resolução.

N.º 1187/XIV/2.ª (Deslocação do Presidente da República a Andorra): — Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas.

N.º 1194/XIV/2.ª (CDS-PP) — Implementação de medidas na área das doenças raras.

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N.º 1195/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a testagem massiva, recorrente e prioritária dos profissionais cuja atividade obrigue a contacto permanente com o público.

N.º 1196/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que proteja a serra de Carnaxide.

N.º 1197/XIV/2.ª (BE) — Pela inclusão de medidas para a

melhoria do estado de conservação da biodiversidade nos

planos de cogestão das áreas protegidas.

N.º 1198/XIV/2.ª (IL) — Recomenda ao Governo o cumprimento da legislação laboral na concessão dos Serviços de Imagiologia na Unidade Local de Saúde do Alto Minho.

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PROJETO DE LEI N.º 708/XIV/2.ª

(PROTEÇÃO E VALORIZAÇÃO DO BARRANQUENHO)

Pareceres da Comissão de Cultura e Comunicação e da Comissão de Educação, Ciência, Juventude

e Desporto e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer da Comissão de Cultura e Comunicação

ÍNDICE

PARTE I – Considerandos

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

PARTE III – Conclusões

PARTE IV – Anexos

1. Nota preliminar

O Projeto de Lei n.º 708/XIV/2.ª, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, visa reconhecer

e estabelecer medidas de proteção e valorização do Barranquenho.

A presente iniciativa foi apresentada por 47 Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, nos

termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do artigo 118.º do Regimento da

Assembleia da República (RAR), que consubstanciam o poder de iniciativa de lei. Trata-se de um poder dos

Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da CRP e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

RAR, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da CRP

e da alínea f) do artigo 8.º do RAR.

O projeto de lei deu entrada no dia 1 de março de 2021, foi admitido no dia 2 de março e baixou, na mesma

data, à Comissão de Cultura e Comunicação (12.ª). Foi anunciada na reunião plenária de 3 de março, tendo

sido nomeado como relator a deputada autora deste parecer.

Toma a forma de projeto de lei, dando cumprimento ao disposto no artigo 119.º do Regimento da Assembleia

da República (RAR), encontra-se redigida sob a forma de artigos, é precedida de uma exposição de motivos e,

em conformidade com o n.º 2 do artigo 7.º da Lei Formulário, tem uma designação que traduz sinteticamente o

seu objeto. A iniciativa prevê a sua data de entrada em vigor «no primeiro dia do mês seguinte à sua publicação»

(artigo 7.º), estando, assim, em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da Lei Formulário, que prevê

que os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência

verificar-se no próprio dia da publicação».

Do ponto de vista da sistemática, o Projeto de Lei n.º 708/XIV/2.ª (PS) forma um articulado composto por 7

preceitos normativos.

Com efeito, o artigo 1.º define que «a presente lei reconhece e estabelece medidas de proteção e valorização

do Barranquenho». O artigo 2.º define que a iniciativa «Estado Português reconhece o direito a cultivar e

promover o Barranquenho, enquanto património cultural imaterial, instrumento de comunicação e de reforço de

identidade da população de Barrancos».

O artigo 3.º reconhece o «direito à aprendizagem do Barranquenho, nos termos a regulamentar, em

articulação com a autarquia local e o agrupamento de escolas.» No artigo 4.º define-se que «as instituições

públicas localizadas ou sediadas no concelho de Barrancos podem emitir os seus documentos acompanhados

de uma versão em Barranquenho». No artigo 5.º é reconhecido «o direito a apoio científico e educativo, tendo

em vista a investigação, a formação de professores de Barranquenho, nos termos a regulamentar». No artigo

6.º é definido o prazo de regulamentação da lei no prazo de 180 dias e o artigo 7.º trata da entrada em vigor do

diploma que, em caso de aprovação, fixa a sua entrada em vigor no mês seguinte ao da sua publicação.

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2. Objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

Os autores da iniciativa apresentam a iniciativa com o objetivo de reconhecer e estabelecer medidas de

proteção e valorização do Barranquenho.

Na exposição de motivos da iniciativa os proponentes referem que «o Barranquenho, uma língua híbrida,

ainda que sem tradição escrita, única no mundo pelo seu carácter misto de português e espanhol, falado pelos

cerca de 1300 residentes e por todos os naturais do Concelho há vários séculos, constitui um lugar de encontro

de culturas peninsulares. Guarda um resquício da literatura oral peninsular e, provavelmente, o último vestígio

das origens da cultura musical procedente da zona nordeste portuguesa, entre muitas outras especificidades,

relacionadas com as tradições orais, musicais, culturais, costumes, culinária, artesanato, formas de fazer…».

Os autores da iniciativa consideram que a vitalidade que o Barranquenho evidencia não permite, contudo,

afastar todas as ameaças que pairam sobre a sua subsistência. Em primeiro lugar, e como resulta da abordagem

adotada pela UNESCO na avaliação da matéria, qualquer língua falada por menos de 5000 pessoas tende a

considerar-se ameaçada, pelo que a evolução dos atuais números de falantes do Barranquenho é um primeiro

motivo de preocupação.

A esta realidade acresce o facto de o envelhecimento dos falantes e o desaparecimento da geração mais

velha poderem traduzir-se na perda irreparável deste património linguístico inestimável.

Por último, o menor isolamento físico do território que o desenvolvimento da região e dos meios de

comunicação e transporte acarretou, bem como a presença intensa do Português como língua da administração,

da escola, dos meios de comunicação e das terras vizinhas, podem contribuir igualmente para um risco de

assimilação pela língua oficial.

Destarte, defendem que é fundamental e urgente preservar o Barranquenho, assegurando que são adotadas

medidas políticas concretas para a sua salvaguarda.

3. Enquadramento legal nacional e antecedentes

A Constituição1 consagra o Português como língua oficial (artigo 11.º), competindo ao Estado assegurar o

ensino e a valorização permanente, defender o uso e promover a difusão internacional da língua portuguesa

(artigo 9.º).

No âmbito das atribuições do Estado em matéria de ensino, incumbe-lhe proteger e valorizar a língua gestual

portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades,

e assegurar aos filhos dos emigrantes o ensino da língua portuguesa e o acesso à cultura portuguesa (artigo

74.º).

A proteção e valorização da língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso

à educação e da igualdade de oportunidades, teve como corolários a Lei n.º 89/99, de 5 de julho2, diploma que

define as condições de acesso, de exercício e regime de atividade dos intérpretes de língua gestual portuguesa,

e o Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho (versão consolidada)3, diploma que estabelece os princípios e as

normas que garantem a inclusão, enquanto processo que visa responder à diversidade das necessidades e

potencialidades de todos e de cada um dos alunos, através do aumento da participação nos processos de

aprendizagem e na vida da comunidade educativa.

O artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, prevê que as escolas de referência para a educação

e ensino bilingue constituem uma resposta educativa especializada com o objetivo de implementar o modelo de

educação bilingue, enquanto garante do acesso ao currículo nacional comum, assegurando, entre outros, o

desenvolvimento da língua gestual portuguesa como primeira língua.

Nesta sequência, merece também referência o Decreto-Lei n.º 16/2018, de 7 de março, diploma que cria o

grupo de recrutamento da Língua Gestual Portuguesa e aprova as condições de acesso dos docentes da Língua

Gestual Portuguesa ao concurso externo de seleção e recrutamento do pessoal docente.

1 https://www.parlamento.pt/Legislacao/Documents/constpt2005.pdf 2 Todas as referências legislativas nacionais nesta parte da nota técnica são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico,

salvo indicação em contrário. 3 Revogou o Decreto-Lei 3/2008, de 7 de janeiro (versão consolidada)

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Para além da língua portuguesa e da língua gestual portuguesa, que merecem tutela constitucional, em

Portugal existe outra língua oficial, a língua mirandesa.

Tal como referido na exposição de motivos da iniciativa legislativa em apreço, através da Lei n.º 7/99, de 29

de janeiro, foi reconhecido o direito a cultivar e promover a língua mirandesa, enquanto património cultural,

instrumento de comunicação e de reforço de identidade da terra de Miranda (artigo 2.º), designadamente o

direito da criança à aprendizagem do mirandês (artigo 3.º) e o direito a apoio científico e educativo, tendo em

vista a formação de professores de língua e cultura mirandesas (artigo 5.º).

Os artigos 3.º e 5.º da Lei n.º 7/99, de 29 de janeiro, preveem a necessidade de regulamentação, a qual

ocorreu por via do Despacho Normativo n.º 35/99, de 20 de julho, que faculta a aprendizagem do mirandês aos

alunos dos estabelecimentos dos ensinos básico e secundário do concelho de Miranda do Douro,

operacionalizando a forma de concretização dos direitos previstos naqueles dois artigos.

Paralelamente, a Lei n.º 7/99, de 29 de janeiro, prevê que as instituições públicas localizadas ou sediadas

no concelho de Miranda do Douro poderão emitir os seus documentos acompanhados de uma versão em língua

mirandesa (artigo 4.º).

Em maio de 2011, o minderico ou Piação dos Charales do Ninhou, língua falada na Vila de Minde desde o

século XVIII e que inicialmente funcionava como código conhecido apenas pelos fabricantes e comerciantes das

mantas de Minde, foi reconhecida internacionalmente pelo SIL International como uma língua individual,

autónoma e viva.

Em outubro de 2015, o minderico foi inserido no Registo da Memória do Mundo da UNESCO, um programa

para sensibilizar o público sobre a necessidade de preservar o património documental.

Importa também salientar a existência de outras duas línguas/dialetos em Portugal, que não detêm estatuto

semelhante às línguas portuguesa e mirandesa: o guadramilês, dialeto falado em Guadramil, e o riodonorês,

dialeto falado em Rio de Onor, ambas localidades do distrito de Bragança.

O articulado do projeto de lei em apreço é semelhante ao da Lei n.º 7/99, de 29 de janeiro, adaptando as

referências à língua mirandesa e ao concelho de Miranda do Douro ao barranquenho e ao concelho de

Barrancos.

4. Enquadramento internacional:

A nota técnica anexa ao presente relatório contém uma análise comparada bastante detalhada relativamente

ao regime vigente em Espanha, França e Itália, para além de se referir as orientações internacionais,

nomeadamente a Convenção para a Salvaguarda do Património Imaterial4 da UNESCO, aprovada a 17 de

outubro de 2003, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 28/2008, de 26 de março. É referida

também o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos5, que faz parte da Declaração Universal dos

Direitos Humanos, da ONU; bem como a Convenção sobre os Direitos da Criança6 da ONU, ratificada pelo

Decreto do Presidente da República n.º 49/90, de 12 de setembro, que estabelece, no n.º 1 do artigo 2.º e no

n.º 1 do artigo 29.º, o direito das crianças à língua, e a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do

Homem e das Liberdades Fundamentais7, do Conselho da Europa, ratificada pelo Decreto do Presidente da

República n.º 14/2006, de 21 de fevereiro, que, no seu artigo 14.º, proíbe a discriminação fundada na língua.

5. Iniciativas legislativas e petições pendentes e avaliação prévia de impacto de género

Relativamente a iniciativas pendentes verificou-se que, neste momento, sobre matéria idêntica ou conexa,

não se encontram iniciativas ou petições em tramitação. Também relativamente a antecedentes parlamentares

se confirmou que não foram apresentadas iniciativas legislativas ou petições sobre esta matéria.

Segundo a Avaliação Prévia de Impacto de Género anexa à iniciativa legislativa em questão, é possível

verificar que a iniciativa é neutra no impacto segundo os critérios definidos pelo formulário. Nesta fase do

4 Disponível no portal oficial www.dre.pt. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas nesta parte da nota técnica são feitas para o referido portal, salvo indicação em contrário. 5Disponível no sítio institucional do Ministério Público na Internet

(https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/documentos/instrumentos/pacto_internacional_sobre_os_direitos_civis_e_politicos.pdf). 6 Disponível no sítio institucional do Ministério Público na Internet (https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/documentos/instrumentos/convencao_sobre_direitos_da_crianca.pdf). 7 Disponível no sítio institucional do Ministério Público na Internet (https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/convention_por.pdf).

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processo legislativo a redação do projeto de lei não parece suscitar qualquer questão relacionada com a

linguagem discriminatória em relação ao género.

6. Consultas e contributos

De acordo com a nota técnica, é sugerida a consulta de várias entidades em sede de apreciação na

especialidade:

• Ministério da Cultura;

• Câmara Municipal de Barrancos;

• Academia das Ciências de Lisboa;

• OLP – Observatório da Língua Portuguesa;

• Associação Portuguesa de Escritores;

• CLUNL – Centro de Linguística da Universidade Nova de Lisboa – Faculdade de Ciências Sociais e

Humanas;

• CLUL – Centro de Linguística da Universidade de Lisboa – Faculdade de Letras da Universidade de

Lisboa;

• Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa;

• Camões – Instituto da Cooperação e da Língua PORTUGAL;

• SPA – Sociedade Portuguesa de Autores;

• Associação Portuguesa de Linguística;

• Faculdades de Letras das várias Universidades;

• Universidade Católica;

• Universidade de Évora;

• Departamentos de Língua Portuguesa;

• Associação Portuguesa de Editores e Livreiros.

PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTOR DO PARECER

A autora reserva a sua opinião para o debate da iniciativa.

PARTE III – CONCLUSÕES

A Comissão de Cultura e Comunicação, em reunião realizada no dia 13 de abril de 2021, aprova o seguinte

parecer:

O Projeto de Lei n.º 708/XIV/2.ª (PS) – «Proteção e valorização do Barranquenho» –, apresentado pelo Grupo

Parlamentar do PS, reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais para ser apreciado e votado em

Plenário da Assembleia da República, reservando os grupos parlamentares as suas posições e decorrente

sentido de voto para o debate.

PARTE IV – ANEXOS

1) Nota Técnica

Palácio de S. Bento, 13 de abril de 2021.

A Deputada Relatora, Alexandra Vieira — A Presidente da Comissão, Ana Paula Vitorino.

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Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PCP e do CDS-PP, na

reunião da Comissão de 13 de abril de 2021.

Parecer da Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto

ÍNDICE

PARTE I – Considerandos

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

PARTE III – Conclusões

PARTE IV – Anexos

PARTE I – CONSIDERANDOS

1.1. Nota introdutória

O Grupo Parlamentar do PS tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o Projeto de Lei

n.º 708/XIV/2.ª (PS) com o título «Proteção e valorização do Barranquenho».

A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ao abrigo e nos

termos do n.º 1 do artigo 167.º da CRP e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República

(RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto

na alínea b) do artigo 156.º da CRP e b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, bem como dos grupos

parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da CRP e da alínea f) do artigo 8.º do

RAR.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 1 de março de 2021. Foi admitido e baixou na generalidade à

Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto (8.ª), a 2 de março, por despacho do Sr. Presidente da

Assembleia da República.

1.2. Âmbito da Iniciativa

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista propõe com a presente iniciativa aprovar um conjunto de medidas

para a salvaguarda, proteção e valorização do Barranquenho.

1.3. Análise da Iniciativa

Este projeto de lei é composto por 7 artigos que estabelecem as medidas de proteção e valorização do

Barranquenho, sendo o 1.º artigo correspondente ao objeto, o 2.º artigo tem a epigrafe: Reconhecimento e

proteção do Barranquenho – e estipula que o Estado português reconhece o direito a cultivar e promover o

Barranquenho, enquanto património cultural imaterial, instrumento de comunicação e de reforço de identidade

da população de Barrancos.

Nos artigos 3.º, e 5.º é reconhecido o direito à aprendizagem do Barranquenho, bem como o direito a apoio

científico e educativo, tendo em vista a investigação, a formação de professores de Barranquenho, nos termos

a regulamentar.

No artigo 4.º é viabilizada a possibilidade das instituições públicas localizadas ou sediadas no concelho de

Barrancos poderem emitir os seus documentos acompanhados de uma versão em Barranquenho.

O artigo 6.º prevê que a regulamentação deve ocorrer num prazo de 180 dias a contar da sua entrada e o 7.º

define que a sua vigência será após o primeiro dia do segundo mês seguinte ao da sua publicação.

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1.3.1. Enquadramento jurídico nacional

Remete-se, no que tange à análise das matérias de enquadramento jurídico nacional e internacional, para o

detalhado trabalho vertido na nota técnica que acompanha o Parecer.

1.3.2. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Nas anteriores legislaturas também não foram apresentadas iniciativas legislativas ou petições sobre esta

matéria.

PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTOR DO PARECER

O signatário do presente relatório considera que a Língua é um elemento estruturante da cultura de um povo,

constituindo-se como um elemento identitário fundamental para a sua existência e afirmação no Mundo.

O Português é um magnífico exemplo disto mesmo, sendo historicamente uma língua que aproximou e

aproxima povos, constituindo-se como o grande fator de ligação entre os quase 300 milhões de cidadãos

lusófonos que existem no Mundo.

Porém, como nosso dinamismo histórico e a nossa capacidade de interação e miscigenação, a nossa Língua

foi capaz de se reinventar e de se misturar com outras, permitindo a muitos povos do universo da lusofonia criar

outras línguas e dialetos que são igualmente importantes fatores de afirmação cultural.

É assim que, apesar da homogeneidade cultural existente em Portugal, a verdade é que há especificidades

e caraterísticas próprias de povos e regiões que, também no território nacional, particularmente na zona da raia,

têm permitido desenvolver fórmulas de comunicação linguística próprias, configurando línguas ou dialetos mistos

ou de transição.

É o caso do barranquenho, do mirandês, do minderico ou do dialeto castrejo, estes últimos menos

conhecidos.

O estudo desta realidade linguística polifacetada há muito que envolve investigadores e instituições

académicas, num trabalho fortemente incentivado pelas investigações do grande etnólogo e filólogo Leite de

Vasconcelos, entre finais do séc. XIX e o início do séc. XX e, mais recentemente, pelas dinâmicas resultantes

do reconhecimento do mirandês como língua oficial pela Assembleia da República, através da Lei 7/99, em que

tive a honra de ter participado.

Leite de Vasconcelos foi muito claro quando afirmou que «não é o Português a única língua usada em

Portugal… fala-se aqui também o mirandês» ou «da convivência, a que se aludiu, de Hespanhóis com os

habitantes de Nóudar e de Barrancos adveio influência hespanhola no português, a qual muito concorreu para

a formação de um tipo especial de linguagem, designado na povoação por barranquenho, ou fala barranquenha,

ou fala à barranquenha».

Este riquíssimo universo linguístico deve continuar a ser assim merecedor da nossa maior atenção, enquanto

legisladores, sendo muito evidentes os já referidos resultados práticos da aprovação da Lei n.º 7/99, que

indiscutivelmente impulsionou uma intensa atividade investigatória e académica, que permitiu uma mais clara

afirmação do mirandês no planalto de Miranda do Douro e mesmo a nível internacional.

Daí a importância deste projeto de lei, que segue outras iniciativas políticas anteriores de vários quadrantes,

incluindo a minha área política, não podendo aqui esquecer os contributos do antigo Deputado por Beja, Mário

Simões.

Estou assim certo de que a aprovação de uma iniciativa legislativa que venha proteger e valorizar o

Barranquenho, com a formulação agora apresentada ou com outra, porventura mais aprofundada, será um sério

contributo para o enriquecimento da nossa cultura linguística.

Tal aprovação traduzir-se-á num inequívoco incentivo político às iniciativas em curso por parte da Câmara

Municipal de Barrancos e da Universidade de Évora tendentes ao desenvolvimento de um grande Programa de

Preservação, Estudo e Valorização do Património Linguístico e Cultural de Barrancos, incluindo a documentação

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do Barranquenho, a organização de uma convenção ortográfica, a elaboração de uma gramática e de um

dicionário e o início do seu ensino.

PARTE III – CONCLUSÕES

O Projeto de Lei n.º 708/XIV/2.ª (PS foi apresentada nos termos constitucionais, legais e regimentais

aplicáveis, encontrando-se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos para que seja apreciado e

votada em Plenário da Assembleia da República.

Palácio de S. Bento,31 de março de 2021.

O Deputado relator, José Cesário — O Presidente da Comissão, Firmino Marques.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CDS-PP, do PAN, e do IL,

na reunião da Comissão de 6 de abril de 2021.

PARTE IV – ANEXOS

Anexa-se nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 708/XIV/2.ª (PS)

Proteção e valorização do Barranquenho

Data de admissão: 02-03-2021

Comissão de Cultura e Comunicação (12.ª)

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

Elaborada por: Patrícia Pires e Luísa Colaço (DILP) — Isabel Pereira (DAPLEN) — Paula Faria (BIB) — Inês Cadete (DAC).

Data: 19-03-2021

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I. Análise da iniciativa

A iniciativa

A iniciativa é apresentada com o objetivo de reconhecer e estabelecer medidas de proteção e valorização do

Barranquenho.

Na exposição de motivos da iniciativa os proponentes referem que «o Barranquenho, uma língua híbrida,

ainda que sem tradição escrita, única no mundo pelo seu carácter misto de português e espanhol, falado pelos

cerca de 1300 residentes e por todos os naturais do Concelho há vários séculos, constitui um lugar de encontro

de culturas peninsulares. Guarda um resquício da literatura oral peninsular e, provavelmente, o último vestígio

das origens da cultura musical procedente da zona nordeste portuguesa, entre muitas outras especificidades,

relacionadas com as tradições orais, musicais, culturais, costumes, culinária, artesanato, formas de fazer…».

Os autores da iniciativa consideram que a vitalidade que o Barranquenho evidencia não permite, contudo,

afastar todas as ameaças que pairam sobre a sua subsistência. Em primeiro lugar, e como resulta da abordagem

adotada pela UNESCO na avaliação da matéria, qualquer língua falada por menos de 5000 pessoas tende a

considerar-se ameaçada, pelo que a evolução dos atuais números de falantes do Barranquenho é um primeiro

motivo de preocupação.

A esta realidade acresce o facto de o envelhecimento dos falantes e o desaparecimento da geração mais

velha poderem traduzir-se na perda irreparável deste património linguístico inestimável.

Por último, o menor isolamento físico do território que o desenvolvimento da região e dos meios de

comunicação e transporte acarretou, bem como a presença intensa do Português como língua da administração,

da escola, dos meios de comunicação e das terras vizinhas, podem contribuir igualmente para um risco de

assimilação pela língua oficial.

Destarte, defendem que é fundamental e urgente preservar o Barranquenho, assegurando que são adotadas

medidas políticas concretas para a sua salvaguarda.

• Enquadramento jurídico nacional

A Constituição1 consagra o Português como língua oficial (artigo 11.º), competindo ao Estado assegurar o

ensino e a valorização permanente, defender o uso e promover a difusão internacional da língua portuguesa

(artigo 9.º).

No âmbito das atribuições do Estado em matéria de ensino, incumbe-lhe proteger e valorizar a língua gestual

portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades,

e assegurar aos filhos dos emigrantes o ensino da língua portuguesa e o acesso à cultura portuguesa (artigo

74.º).

A proteção e valorização da língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso

à educação e da igualdade de oportunidades, teve como corolários a Lei n.º 89/99, de 5 de julho2, diploma que

define as condições de acesso, de exercício e regime de atividade dos intérpretes de língua gestual portuguesa,

e o Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho (versão consolidada)3, diploma que estabelece os princípios e as

normas que garantem a inclusão, enquanto processo que visa responder à diversidade das necessidades e

potencialidades de todos e de cada um dos alunos, através do aumento da participação nos processos de

aprendizagem e na vida da comunidade educativa.

O artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, prevê que as escolas de referência para a educação

e ensino bilingue constituem uma resposta educativa especializada com o objetivo de implementar o modelo de

educação bilingue, enquanto garante do acesso ao currículo nacional comum, assegurando, entre outros, o

desenvolvimento da língua gestual portuguesa como primeira língua.

1 https://www.parlamento.pt/Legislacao/Documents/constpt2005.pdf 2 Todas as referências legislativas nacionais nesta parte da nota técnica são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico,

salvo indicação em contrário. 3 Revogou o Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro (versão consolidada)

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Nesta sequência, merece também referência o Decreto-Lei n.º 16/2018, de 7 de março, diploma que cria o

grupo de recrutamento da Língua Gestual Portuguesa e aprova as condições de acesso dos docentes da Língua

Gestual Portuguesa ao concurso externo de seleção e recrutamento do pessoal docente.

Para além da língua portuguesa e da língua gestual portuguesa, que merecem tutela constitucional, em

Portugal existe outra língua oficial, a língua mirandesa.

Tal como referido na exposição de motivos da iniciativa legislativa em apreço, através da Lei n.º 7/99, de 29

de janeiro, foi reconhecido o direito a cultivar e promover a língua mirandesa, enquanto património cultural,

instrumento de comunicação e de reforço de identidade da terra de Miranda (artigo 2.º), designadamente o

direito da criança à aprendizagem do mirandês (artigo 3.º) e o direito a apoio científico e educativo, tendo em

vista a formação de professores de língua e cultura mirandesas (artigo 5.º).

Os artigos 3.º e 5.º da Lei n.º 7/99, de 29 de janeiro, preveem a necessidade de regulamentação, a qual

ocorreu por via do Despacho Normativo n.º 35/99, de 20 de julho, que faculta a aprendizagem do mirandês aos

alunos dos estabelecimentos dos ensinos básico e secundário do concelho de Miranda do Douro,

operacionalizando a forma de concretização dos direitos previstos naqueles dois artigos.

Paralelamente, a Lei n.º 7/99, de 29 de janeiro, prevê que as instituições públicas localizadas ou sediadas

no concelho de Miranda do Douro poderão emitir os seus documentos acompanhados de uma versão em língua

mirandesa (artigo 4.º).

Em maio de 2011, o minderico ou Piação dos Charales do Ninhou, língua falada na Vila de Minde desde o

século XVIII e que inicialmente funcionava como código conhecido apenas pelos fabricantes e comerciantes das

mantas de Minde, foi reconhecida internacionalmente pelo SIL International como uma língua individual,

autónoma e viva.

Em outubro de 2015, o minderico foi inserido no Registo da Memória do Mundo da UNESCO, um programa

para sensibilizar o público sobre a necessidade de preservar o património documental.

Importa também salientar a existência de outras duas línguas/dialetos em Portugal, que não detêm estatuto

semelhante às línguas portuguesa e mirandesa: o guadramilês, dialeto falado em Guadramil, e o riodonorês,

dialeto falado em Rio de Onor, ambas localidades do distrito de Bragança.

O articulado do projeto de lei em apreço é semelhante ao da Lei n.º 7/99, de 29 de janeiro, adaptando as

referências à língua mirandesa e ao concelho de Miranda do Douro ao barranquenho e ao concelho de

Barrancos.

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes

Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar (AP) verificou-se que, neste momento,

sobre matéria idêntica ou conexa, não se encontram iniciativas ou petições em tramitação.

• Antecedentes parlamentares

Nas anteriores legislaturas também não foram apresentadas iniciativas legislativas ou petições sobre esta

matéria.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS), ao abrigo e nos

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termos do n.º 1 do artigo 167.º daConstituição4 e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da

República(Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por

força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento,

bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição

e da alínea f) do artigo 8.º do Regimento.

A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do

Regimento, encontra-se redigida sob a forma de artigos, é precedida de uma breve exposição de motivos e tem

uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal, embora possa ser objeto de aperfeiçoamento

em caso de aprovação, dando assim cumprimento aos requisitos formais estabelecidos no n.º 1 do artigo 124.º

do Regimento.

Encontram-se igualmente respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo 120.º

do Regimento, uma vez que este projeto de lei define concretamente o sentido das modificações a introduzir na

ordem legislativa e parece não infringir princípios constitucionais, exceto quanto ao limite imposto pelo n.º 2 do

artigo 167.º da Constituição e n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, conhecido como lei-travão, que deve ser

salvaguardado no decurso do processo legislativo.

Com efeito, ao prever-se apoio educativo e científico para a formação de professores de modo a permitir o

ensino do Barraquenho, o que acarreta necessariamente um aumento de despesas e estando prevista a entrada

em vigor da iniciativa para o primeiro dia do segundo mês seguinte à sua publicação, poderá estar em causa o

princípio constitucional previsto no n.º 2 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 2 do artigo 120.º do Regimento

denominado como «lei-travão», mesmo que esteja prevista a regulamentação pelo Governo. Assim, e para

salvaguarda do cumprimento deste limite à apresentação de iniciativas, sugere-se que, em sede de apreciação

especialidade, se faça coincidir a sua entrada em vigor com a do Orçamento do Estado subsequente.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 1 de março de 2021. Foi admitido e baixou na generalidade à

Comissão de Cultura e Comunicação (12.ª) com conexão com à Comissão de Educação, Ciência, Juventude e

Desporto (8.ª) a 2 de março, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, tendo sido

ainda anunciado no dia 3 do mesmo mês.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

A lei formulário5 contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas

que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa.

O título do projeto de lei – «Proteção e valorizaçãodo Barranquenho» – traduz sinteticamente o seu objeto,

mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, embora, em caso de aprovação,

possa ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final.

Em caso de aprovação, a iniciativa em apreço revestirá a forma de lei, sendo objeto de publicação na 1.ª

série do Diário da República, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

A iniciativa prevê a sua data de entrada em vigor «no primeiro dia do mês seguinte à sua publicação» (artigo

7.º), estando, assim, em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que os

atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência

verificar-se no próprio dia da publicação».

Na presente fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não parece suscitar outras questões em face

da lei formulário.

• Regulamentação ou outras obrigações legais

A iniciativa prevê, no artigo 6.º, que o Governo proceda à sua regulamentação no prazo de 180 dias a contar

da sua entrada em vigor.

4 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República. 5 A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas.

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IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional

Países europeus

A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: Espanha,

França e Itália.

ESPANHA

A Constituição Espanhola6 estabelece, no n.º 1 do seu artigo 3.º, que «o castelhano é a língua espanhola

oficial do Estado» e que «todos os espanhóis têm o dever de a conhecer e o direito de a usar», e no n.º 2 do

mesmo artigo que «as outras línguas espanholas são também oficiais nas respetivas Comunidades Autónomas,

de acordo com os seus Estatutos». Acrescenta ainda o seu n.º 3, que «a riqueza das diferentes modalidades

linguísticas de Espanha é um património cultural que será objeto de especial respeito e proteção».

Salienta-se também o ponto 17 do n.º 1 do artigo 148.º da Constituição Espanhola, que determina que as

Comunidades Autónomas podem assumir competências de «promoção da cultura, da investigação e, se for

esse o caso, do ensino da língua da Comunidade Autónoma».

Assim, em Espanha, os estatutos das Comunidades Autónomas estabeleceram idiomas oficiais para os seus

respetivos territórios.

Na Catalunha e nas Ilhas Baleares, o catalão foi reconhecido como língua oficial a par do castelhano, pela

Lei 1/1998, de 7 de janeiro, de Política Linguística, verificando-se o mesmo relativamente ao aranês, através da

Lei 35/2010, de 1 de outubro, de Occitano, Aranês em Arão.

Na Comunidade Valenciana, foi a Lei 4/1983, de 23 de novembro, de uso e ensino do Valenciano, que

reconheceu o valenciano como língua oficial. O mesmo se verificou na Galiza para a língua galega, através da

Lei 3/1983, de 15 de junho, de normalização linguística, e no País Basco e em parte de Navarra para a língua

euskera, através da Lei 10/1982, de 24 de novembro, de normalização do uso do Euskera.

Em todos estes diplomas, para além do reconhecimento das línguas regionais como oficiais a par do

castelhano, é previsto o direito ao uso da língua, ao seu ensino e à sua utilização em documentos de instituições

públicas das Comunidades Autónomas.

Para além das línguas «co-oficiais» acima mencionadas, existem outras línguas faladas em território

espanhol que, até à data, não são oficiais. Exemplos destas línguas são o aragonês, falado no norte da província

de Huesca, e o asturleoniano falado nas Astúrias e em algumas partes das províncias de Zamora e León.

FRANÇA

A Constituição Francesa7, desde a alteração de 1992, prevê, no artigo 2.º, que «a língua da República é o

francês». O artigo 75.º-1, aditado em 2008, determina que «as línguas regionais pertencem ao património da

França». Na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 podemos encontrar o artigo 11.º, que

consagra o direito à liberdade de comunicação e expressão.

De acordo com o Relatório do Comité Consultivo para a Promoção das Línguas Regionais e da Pluralidade

Linguística Interna8 de 2013, do Ministério da Cultura, seis línguas regionais ainda são comummente utilizadas:

o alsaciano, o basco, o bretão, o catalão, o corso e o occitano. Além disso, existem várias línguas estrangeiras,

6 Diploma consolidado retirado do portal oficial www.boe.es. Todas as ligações eletrónicas e referências legislativas relativas a Espanha são feitas para o referido portal, salvo indicação em contrário. 7 Diploma consolidado retirado do portal oficial www.legifrance.gouv.fr.Todas as ligações eletrónicas e referências legislativas relativas a

França são feitas para o referido portal, salvo indicação em contrário. 8Diploma disponível no sítio institucional do Ministério da Cultura francês na Internet (https://www.culture.gouv.fr/Sites-thematiques/Langue-francaise-et-langues-de-France/Politiques-de-la-langue/Langues-de-France/Langues-regionales/Rapport-du-Comite-consultatif-pour-la-

promotion-des-langues-regionales-et-de-la-pluralite-linguistique-interne-2013).

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tais como o taitiano, o crioulo ou wallisien e o futunien. Apesar de estarem identificadas, não são oficialmente

reconhecidas.

Em 1992, o Conselho da Europa adotou a Carta Europeia das Línguas Regionais ou Minoritárias9, que visava

proteger e promover as línguas regionais. A França veio a assinar a Carta em 1999, no entanto, ainda não a

ratificou e só o francês tem estatuto de língua oficial. A ratificação é juridicamente vinculativa para o Estado

contratante, enquanto que a assinatura é um simples reconhecimento dos objetivos gerais da Carta.

Assinala-se a Lei n.º 94-665, de 4 de agosto de 1994, relativa ao uso da língua francesa, conhecida como

Lei Toubon, que reconhece a língua francesa como a língua obrigatória do ensino, do trabalho e dos serviços

públicos (artigo 1.º). O artigo 21.º estabelece que «as disposições da presente lei são aplicáveis sem prejuízo

das disposições legislativas e regulamentares relativas às línguas regionais da França e não excluem a sua

utilização».

Assinalamos ainda a Lei Deixonne, de 1951, agora revogada devido à sua incorporação no Código da

Educação, mais especificamente nos artigos L312-10 a L312-11-1 e D312-29 a D321-39, que permitiu o ensino

em França do basco, do bretão, do catalão e do occitano, seguindo-se outros, como o corso, o taitiano e o

alsaciano. Desde então, foram criados vários estabelecimentos bilingues com acordos para o ensino das línguas

regionais. Estas escolas não são oficialmente reconhecidas e são atualmente geridas por associações.

A título de exemplo, refira-se as competências que a Lei n.º 91-428, de 13 de maio de 1991, relativa ao

estatuto da coletividade territorial da Córsega, dava à assembleia para definir uma política de ensino da língua

e cultura da Córsega, e que passaram a constar do artigo L4422-36 do Código Geral das Coletividades

Territoriais.

As línguas regionais beneficiam assim de algum status a nível local, como a sua utilização em alguns media

locais (por exemplo, a emissora de rádio France Bleu) e nas sinalizações públicas e o seu ensino em algumas

escolas associativas, no entanto, não há reconhecimento jurídico das mesmas e nem da sua utilização como

línguas oficiais em textos administrativos, incluindo leis, decretos e sentenças judiciais, sendo o francês a língua

obrigatória e a única com estatuto oficial.

ITÁLIA

A Constituição da República Italiana10 estabelece, no seu artigo 6.º, a proteção das «minorias linguísticas».

É a Lei n.º 482/99, de 15 de dezembro, que implementa este artigo da Constituição, determinando no seu artigo

2.º a proteção da língua e da cultura daqueles que falam francês, franco-provençal, friulano, ladino, occitano e

sardo e ainda das respetivas línguas das populações imigrantes albanesa, catalã, germânica, grega, eslovena

e croata.

De acordo com o n.º 1 do artigo 3.º da Lei acima mencionada, «a delimitação do âmbito territorial e

submunicipal em que se aplicam as disposições para proteção das minorias linguísticas-históricas (…) é adotada

pelo «conselho provincial», após consulta aos municípios interessados, a pedido de, pelo menos, quinze por

cento dos cidadãos registados nos cadernos eleitorais e residentes nos próprios municípios, ou um terço dos

«conselheiros municipais» dos mesmos municípios». O n.º 3 do mesmo artigo determina que, quando as

minorias linguísticas se encontrarem distribuídas por diferentes territórios provinciais ou regionais, podem criar

órgãos próprios, passíveis de reconhecimento pelas autoridades locais. Assim sendo, e apesar do previsto no

n.º 3 acima mencionado, tratando-se de minorias linguístico-territoriais, as populações não beneficiam da mesma

proteção linguística se emigrarem para outra área territorial que não os municípios onde se encontra o respetivo

grupo linguístico.

A Lei n.º 482/99, de 15 de dezembro, prevê também o direito ao uso da língua, ao seu ensino (artigo 4.º) e à

sua utilização em documentos de instituições públicas dos respetivos municípios (artigos 7.º, 8.º e 9.º).

O Estado italiano não confere a mesma proteção a outras línguas regionais, nomeadamente as línguas

emiliano-romanhola, lígure, lombarda, napolitana, piemontesa, veneziana e siciliana. No entanto, algumas

destas línguas regionais beneficiam de medidas de proteção cultural na legislação regional, como por exemplo

9Diploma disponível no sítio institucional do Ministério Público na Internet (https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/carta_europeia_das_linguas_regionais_ou_minoritarias.pdf). 10 Diploma consolidado retirado do portal oficial www.normattiva.it. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a Itália são feitas para o referido portal, salvo indicação em contrário.

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o veneziano (Lei Regional n.º 8 de 13 de abril de 2007, de tutela, valorização e promoção do património

linguístico e cultural veneziano11), o piemontês (Lei Regional n.º 11 de 7 de abril de 2009, de tutela, valorização

e promoção do património linguístico do Piemonte12) e o lombardo (Lei Regional n.º 25 de 7 de outubro de 2016,

de políticas regionais em matéria cultural13).

Organizações internacionais

ONU/UNESCO

Vários documentos internacionais tratam de direitos linguísticos, cabendo-nos destacar, a Convenção para

a Salvaguarda do Património Imaterial14 da UNESCO, aprovada a 17 de outubro de 2003, ratificada pelo Decreto

do Presidente da República n.º 28/2008, de 26 de março. Segundo a Convenção, entende-se por «património

cultural imaterial as práticas, representações, expressões, conhecimentos e competências […] que as

comunidades, os grupos e, eventualmente, indivíduos reconhecem como fazendo parte do seu património

cultural». Esta disposição da Convenção manifesta-se, entre outros domínios, nas «tradições e expressões

orais, incluindo a língua como vetor do património cultural imaterial».

Assinalamos também o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos15, que faz parte da Declaração

Universal dos Direitos Humanos, da ONU, aprovado para ratificação pela Lei n.º 29/78, de 12 de junho, cujo

artigo 27.º estabelece que em «Estados em que existam minorias étnicas, religiosas ou linguísticas, as pessoas

pertencentes a tais minorias não devem ser privadas do direito [...] de empregar a sua própria língua».

Por fim, acrescentamos a Convenção sobre os Direitos da Criança16 da ONU, ratificada pelo Decreto do

Presidente da República n.º 49/90, de 12 de setembro, que estabelece, no n.º 1 do artigo 2.º e no n.º 1 do artigo

29.º, o direito das crianças à língua, e a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das

Liberdades Fundamentais17, do Conselho da Europa, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º

14/2006, de 21 de fevereiro, que, no seu artigo 14.º, proíbe a discriminação fundada na língua.

V. Consultas e contributos

Sugere‐se a consulta, em sede de apreciação na especialidade, das seguintes entidades:

• Ministério da Cultura;

• Câmara Municipal de Barrancos;

• Academia das Ciências de Lisboa;

• OLP – Observatório da Língua Portuguesa;

• Associação Portuguesa de Escritores;

• CLUNL – Centro de Linguística da Universidade Nova de Lisboa – Faculdade de Ciências Sociais e

Humanas;

• CLUL – Centro de Linguística da Universidade de Lisboa – Faculdade de Letras da Universidade de

Lisboa;

• Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa;

11 Diploma regional consolidado retirado do sítio na Internet do Boletim Oficial da Região de Veneto (https://bur.regione.veneto.it/BurvServices/Pubblica/HomeConsultazione.aspx). 12 Diploma regional consolidado retirado do sítio na Internet do Banco de dados regional do Piemonte – Arianna (http://arianna.consiglioregionale.piemonte.it/ariaint/TESTO?LAYOUT=PRESENTAZIONE&TIPODOC=LEGGI&LEGGE=11&LEGGEANNO=2009). 13 Diploma regional consolidado retirado do sítio na Internet do Banco de dados das leis regionais da Região da Lombardia – Normelombardia (http://normelombardia.consiglio.regione.lombardia.it/NormeLombardia/Accessibile/main.aspx?view=showpart&selnode=lr002016100700025&idparte=lr002016100700025). 14 Disponível no portal oficial www.dre.pt. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas nesta parte da nota técnica são feitas para o referido portal, salvo indicação em contrário. 15Disponível no sítio institucional do Ministério Público na Internet

(https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/documentos/instrumentos/pacto_internacional_sobre_os_direitos_civis_e_politicos.pdf). 16 Disponível no sítio institucional do Ministério Público na Internet (https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/documentos/instrumentos/convencao_sobre_direitos_da_crianca.pdf). 17 Disponível no sítio institucional do Ministério Público na Internet (https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/convention_por.pdf).

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• Camões – Instituto da Cooperação e da Língua PORTUGAL;

• SPA – Sociedade Portuguesa de Autores;

• Associação Portuguesa de Linguística;

• Faculdades de Letras das várias Universidades;

• Universidade Católica;

• Universidade de Évora;

• Departamentos de Língua Portuguesa;

• Associação Portuguesa de Editores e Livreiros.

Para o efeito, a Comissão deverá solicitar contributo escrito às referidas entidades.

Caso seja enviado, o respetivo contributo será disponibilizado no site da Assembleia da República, na página

eletrónica da iniciativa em apreço.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

A avaliação de impacto de género (AIG) que foi junta à iniciativa pelo grupo parlamentar proponente valora

como neutro o impacto com a sua aprovação, o que efetivamente se pode verificar após leitura do texto da

iniciativa.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso.

Nesta fase do processo legislativo a redação do projeto de lei não parece suscitar qualquer questão

relacionada com a linguagem discriminatória em relação ao género.

Enquadramento bibliográfico

CLEMENTS, Joseph Clancy; AMARAL, Patrícia; LUÍS, Ana R. – Spanish in contact with Portuguese: the case

of barranquenho. In The handbook of hispanic sociolinguistics [Em linha].[S.l.]: Blackwell Publishing, 2011,

p. 395-417. [Consult. 08 mar. 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=133556&img=20154&save=true>

ISBN 9781444393446

Resumo: O barranquenho é uma variedade linguística que existe, pelo menos, desde o início do século XIX,

falada em Barrancos por cerca de 1825 habitantes. Os autores iniciam o seu estudo com uma sucinta história

de Barrancos, passando, em seguida, à análise da emergência do barranquenho como variedade linguística.

Procede-se à análise das características definidoras do barranquenho: fonéticas, morfológicas, morfossintáticas

e lexicais, bem como à comparação com as características do português regional e com o espanhol. Verifica-se

que a identidade cultural do barranquenho não é inteiramente portuguesa, nem espanhola, mas sim um híbrido

das duas culturas, constituindo uma variedade linguística que reflete uma identidade cultural moldada por

desenvolvimentos sociopolíticos locais.

CORREIA, Victor Manuel Diogo – O barranquenho : urgência de uma política linguística? Revista de

Filología Románica [Em linha]. Madrid. Vol. 36, (2019), p. 169-178. [Consult. 08 mar. 2021]. Disponível em

WWW:

rue> ISSN 0212-999X.

Resumo: «No século XXI, o barranquenho enfrenta a ameaça da globalização e consequente processo de

Página 17

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17

nivelamento com o português. A reflexão sobre a realidade do barranquenho constitui-se como um fator decisivo

na definição de rumos de política linguística para esta variedade de contacto. No entanto, qualquer política deve

envolver a comunidade de falantes, o que implica a verificação in situ da existência de uma consciência

linguística e as suas tendências. Entre os tópicos que foram objeto de inquérito na comunidade, incluem-se

questões de adscrição, vitalidade, projeção no exterior, consciência da variação no próprio barranquenho e

motivação para a proteção e desenvolvimento da língua.»

NAVAS SÁNCHEZ-ÉLEZ, María Victoria – El barranquenho : un modelo de lenguas em contacto. Revista

de Filología Románica [Em linha]. Madrid. Vol. 9, (1992), p. 225-246. [Consult. 08 mar. 2021]. Disponível em

WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=133580&img=20176&save=true>

ISSN 0212-999X.

Resumo: Este trabalho baseou-se num total de 60 entrevistas levadas a cabo durante a permanência da

autora em Barrancos e tem em vista o conhecimento do dialeto que desde 1939 aguarda uma nova atenção. A

investigação aborda o estudo do barranquenho, tratando de explicar a variabilidade existente no dialeto inerente

a todo o sistema linguístico. A autora aborda a formação do dialeto barranquenho; situação geográfica e história

de Barrancos; emigrações para Espanha; isolamento; línguas faladas (português, barranquenho e espanhol),

influências linguísticas; descrição fonética, morfossintaxe, influências do castelhano, vocabulário, etc.

NAVAS SÁNCHEZ-ÉLEZ, María Victoria; GONÇALVES, Maria Filomena – Caracterização e problemas

atuais do barranquenho : contribuições para uma política de revitalização. Estudos de Linguística Galega [Em

linha]. Vol. 12 (2020), p. 179-199. [Consult. 08 mar. 2021]. Disponível em WWW:

>

Resumo: «Neste artigo analisa-se a situação atual ‒ resultado do contacto multissecular entre o português e

o espanhol ‒ de uma variedade linguística mista falada numa vila portuguesa do Alentejo: o barranquenho. O

objetivo deste trabalho é propor uma revisão do estatuto e da tipologia até agora atribuídos a esta variedade –

dialeto, fala fronteiriça ou raiana – que, em virtude das suas características, deveria ser tratada como uma língua

de contacto, minoritária, ameaçada e em perigo de extinção».

Com este estudo, os autores pretendem contribuir para o reconhecimento do barranquenho como língua, e,

ao mesmo tempo, chamar a atenção para a necessidade de uma política e planificação linguísticas que permitam

preservá-la, evitando o seu desaparecimento.

NAVAS SÁNCHEZ-ÉLEZ, María Victoria; GONÇALVES, Maria Filomena ; BARATA, Filipe Themudo – Notícia

sobre o barranquenho, língua ameaçada : processos de formalização e preservação. Estudis Romànics [Em

linha]. Barcelona. Vol. 43, (2021), p. 341-351. [Consult. 08 mar. 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=133578&img=20175&save=true>

ISSN 0211-8572.

Resumo: «O barranquenho, língua híbrida sem tradição escrita, falada desde há vários séculos, atualmente

por menos de 2000 pessoas, está em vias de desaparecimento devido à pressão demográfica e ao

envelhecimento da população, à influência do português, à padronização inerente à escolarização, ao maior

contacto das pessoas com o mundo exterior, à influência dos meios de comunicação e à consequente

homogeneização/uniformização que os processos de globalização implicam.»

De acordo com os autores, Barrancos possui um património linguístico inestimável, fruto de uma vivência

histórica única, que corre o risco de desaparecer, pelo que se torna urgente preservar esta língua que tem um

«evidente interesse regional, nacional, peninsular e internacional pois, não obstante dizer respeito aos

barranquenhos, não deixa de ser um património de todos os portugueses e, sem exagero, de todos os

peninsulares e europeus.»

VASCONCELOS, José Leite de – Filologia barranquenha: apontamentos para o seu estudo. Lisboa :

Imprensa Nacional, 1955. Cota: 10/55

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18

Resumo: Leite de Vasconcelos foi o primeiro linguista e filólogo a estudar o dialeto barranquenho. Na sua

obra: Filologia barranquenha: apontamentos para o seu estudo, começa por escrever sobre a influência

espanhola em Barrancos, onde nos fins do século XIX havia muitas profissões, tais como médico, mestre-escola,

coveiro, carpinteiro e tantas outras, que eram desempenhadas exclusivamente por espanhóis. Mesmo nos

nossos dias «rara será a família que não descenda de cepa espanhola ou não possua costela espanhola». Desta

influência decorre um tipo especial de linguagem: o barranquenho.

Nesta obra, o autor define a essência deste dialeto, utilizando os apontamentos reunidos durante a sua

presença na vila; analisa a influência linguística espanhola no falar de Barrancos e o caráter português do

barranquenho. Procede à transcrição fonética e ao estudo da gramática. Apresenta inúmeros exemplos deste

dialeto em textos populares, provérbios, cantigas, adivinhas, expressões barranquenhas ou «barranquenhadas»

e, por fim, um dicionário simplificado do barranquenho.

———

PROJETO DE LEI N.º 752/XIV/2.ª (1)

(ALTERA O DECRETO-LEI N.º 22-D/2021, DE 22 DE MARÇO, POSSIBILITANDO A REALIZAÇÃO DE

EXAME DE MELHORIA DE NOTA INTERNA NO ENSINO SECUNDÁRIO)

Exposição de motivos

O Decreto-Lei n.º 22-D/2021, de 22 de março, volta a estabelecer medidas excepcionais e temporárias na

área da educação, no âmbito da pandemia da doença COVID-19.

Tal como no ano transacto, o n.º 3 do artigo 3.º-C deste diploma vem impor que os alunos realizem exames

finais nacionais apenas nas disciplinas que elejam como provas de ingresso para efeitos de acesso ao ensino

superior, sendo ainda permitida a realização desses exames para melhoria de nota, relevando o seu resultado

apenas como classificação de prova de ingresso. Isto significa que todos os alunos que queiram realizar exames

nacionais com vista à melhoria da classificação final das suas disciplinas, na perspectiva da melhoria de nota

do ensino secundário, ficam impedidos de o fazer neste ano letivo.

A impossibilidade de realização de exames para melhoria de nota do ensino secundário tem tido a

contestação dos estudantes, visto que têm nesta a única forma de melhorar a sua média com vista ao ingresso

no curso superior que pretendem, tendo inclusive já se mobilizado e apresentado uma petição que permita a

sua realização.

A manter-se esta impossibilidade, estima-se que cerca de 19 000 jovens, que frequentam o 12.º ano ou que

já concluíram o secundário, serão afectados por não conseguirem aceder ao exame de melhoria para o qual

trabalharam desde o início do ano lectivo. Por exemplo, quem tiver concluído o ensino secundário, e quiser neste

ano candidatar-se novamente ao ensino superior para entrar num novo curso, ficará com a mesma média de

conclusão do secundário, situação que poderá ter consequências na construção de um projecto profissional,

revelando-se simultaneamente injusto e discriminatório.

Também, a Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior (CNAES) recomendou a 15 de fevereiro, que

fosse possível a realização dos exames utilizados para efeitos de melhoria de nota pelos estudantes.

Considerando a importância destes exames para os alunos e para os seus projectos de vida, defendemos

que deve ser assegurada a realização de exames de melhoria de nota no ensino secundário, pelo que propomos

uma alteração ao Decreto-Lei n.º 10-B/2021, de 4 de fevereiro, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 22-

D/2021, de 22 de março, com esse objetivo.

Assim, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o Deputado do

PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

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Artigo 1.º

Objeto

A presente Lei procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 10-B/2021, de 4 de fevereiro, alterado pelo

Decreto-Lei n.º 22-D/2021, de 22 de março, que estabelece medidas excepcionais e temporárias na área da

educação, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, para 2021.

Artigo 2.º

Decreto-Lei n.º 10-B/2021, de 4 de fevereiro

É alterado o artigo 3.º-C do Decreto-Lei n.º 10-B/2021, de 4 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 22-

D/2021, de 22 de março, que passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 3.º-C

[...]

1 – [...].

2 – [...].

3 – Os alunos realizam exames finais nacionais, apenas para efeitos de acesso ao ensino superior e nas

disciplinas que elejam como:

a) Provas de ingresso para efeitos de acesso ao ensino superior;

b) Provas para efeitos de melhoria de nota da classificação de prova de ingresso já realizadas;

c) Provas para efeitos de melhoria de nota da classificação final da disciplina.

4 – [...].

5 – [...].

6 – Para os casos da alínea c) do n.º 3 do presente artigo, a classificação final da disciplina é relevada, sendo

apenas considerada se a nova classificação for superior à anteriormente obtida, em:

a) 30%, nas disciplinas em que os alunos tenham tido aprovação à disciplina no ano lectivo de 2020/2021;

b) 100% nas disciplinas em que os alunos tenham tido aprovação à disciplina em anos letivos anteriores.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 13 de abril de 2021.

As Deputadas e o Deputado do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.

(1) O texto inicial foi substituído a pedido do autor da iniciativa a 13 de abril de 2021 [Vide DAR II Série-A n.º 102 (2021.03.23].

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PROJETO DE LEI N.º 771/XIV/2.ª (2)

(CONSAGRA A NATUREZA PÚBLICA DOS CRIMES DE VIOLAÇÃO, DE COAÇÃO SEXUAL, DE

FRAUDE SEXUAL, DE ABUSO SEXUAL DE PESSOA INCAPAZ DE RESISTÊNCIA E DE PROCRIAÇÃO

ARTIFICIAL NÃO CONSENTIDA E ALARGA OS PRAZOS DE PRESCRIÇÃO DE CRIMES CONTRA A

LIBERDADE E AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL DE MENORES E DO CRIME DE MUTILAÇÃO GENITAL

FEMININA, PROCEDENDO À ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL E DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL)

Exposição de motivos

Na XIII Legislatura, por via do Projeto de Lei n.º 1047/XIII/4.ª, apresentado pelo PAN, e de outros projetos de

âmbito similar, a Assembleia da República aprovou por unanimidade a Lei n.º 101/2019,de 6 de setembro, que

alterou o Código Penal por forma a assegurar que o enquadramento relativo aos crimes de coação sexual,

violação e abuso sexual de pessoa internada se encontra adaptada ao disposto na Convenção de Istambul,

assegurando-se a centralidade da falta de consentimento nestes tipos de crime.

Apesar deste inequívoco avanço, atualmente há aspetos da Convenção de Istambul que estão por

concretizar no ordenamento jurídico português, um dos quais se prende com a necessidade de se assegurar a

atribuição da natureza pública a todos os crimes contra a liberdade sexual, que integram a secção I do capítulo

V do Código Penal, algo que permitiria que o Ministério Público passasse a ter legitimidade para promover o

processo penal correspondente, independentemente de qualquer manifestação de vontade da vítima nesse

sentido.

A Convenção de Istambul prevê no seu artigo 55.º, n.º 1, que «as Partes deverão garantir que as

investigações das infrações previstas nos artigos 35.º, 36.º, 37.º, 38.º e 39.º da presente Convenção ou o

procedimento penal instaurado em relação a essas mesmas infrações não dependam totalmente da denúncia

ou da queixa apresentada pela vítima, se a infração tiver sido praticada no todo ou em parte no seu território, e

que o procedimento possa prosseguir ainda que a vítima retire a sua declaração ou queixa» e no seu artigo 18.º,

n.º 4, que «a prestação de serviços não deverá depender da vontade das vítimas de apresentar queixa ou de

testemunhar contra qualquer perpetrador». Particularmente, relativamente a este artigo 55.º, n.º 1, o Grupo de

Peritos em Ação contra a Violência contra Mulheres e Violência Doméstica (GREVIO), grupo de peritos

independentes responsável pelo controlo da aplicação da Convenção de Istambul, recomendou, no seu relatório

de avaliação de 20191, a alteração da legislação nacional, afirmando: «GREVIO urges the Portuguese authorities

to amend their legislation to make it conform with the rules regarding ex parte and ex officio prosecution set out

in Article 55, paragraph 1, of the Istanbul Convention, as regards in particular the offences of physical and sexual

violence».

Acresce que muitas vezes o constrangimento causado pelo crime na vítima, a dificuldade em integrar o

sucedido, o receio de ter de voltar a enfrentar o agressor, a exposição pública da sua intimidade perante as

autoridades públicas e policiais e o receio da lógica de revitimização associada ao processo levam a que, nestes

casos, a/o ofendida/o acabe por preferir o silêncio e a impunibilidade da/o agressor/a à denúncia do crime e

impulso do processo penal. Comprovativo desta realidade são as estatísticas referentes ao crime de violação,

que nos demonstram que existem verdadeiras cifras negras nesta matéria, com apenas 431 participações do

crime de violação em 20192 – valor manifestamente baixo, apesar de representar um aumento de 2,4% face a

2018. Atendendo à situação referida a consagração da natureza pública de todos os crimes contra a liberdade

sexual, ao retirar o impulso processual e toda a penosidade que lhe está associada do âmbito da vítima,

garantiria uma redução significativa das cifras negras associadas a estes crimes e daria, assim, um contributo

para a redução da ocorrência futura de muitos crimes desta natureza, quer pelo facto de, por um lado, a

comunidade ver reforçados os seus meios gerais de prevenção e sensibilização, quer, por outro lado, uma maior

dissuasão dos potenciais agressores relativamente a estes crimes. Sublinhe-se que a atribuição de natureza

pública a estes crimes não irá levar a condenações injustas, uma vez que na fase de inquérito e nas fases

1 GREVIO (2019), Baseline Evaluation Report Portugal, página 76. 2 Sistema de Segurança Interna (2020), Relatório anual de segurança interna – ano de 2019, página 13.

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subsequentes do processo o crime de violação será investigado de acordo com as regras gerais de imputação

penal e as garantias concedidas à defesa.

Importa, contudo, sublinhar que nos crimes contra a liberdade sexual, que integram a secção I do capítulo V

do Código Penal, é a liberdade sexual que se pretende tutelar, que, conforme afirma Paulo Pinto de

Albuquerque3, corresponde «à esfera mais íntima da personalidade», e que a consagração da natureza pública

destes crimes, ainda que de uma certa perspetiva reforce a proteção da vítima e possa contribuir para a redução

deste tipo de crimes, pode pôr em causa o bem jurídico tutelado nos casos em que a vítima fundamentadamente

não pretende fazer seguir o procedimento criminal. Relembre-se que o processo penal acarreta aspetos

negativos com forte impacto psicológico que não devem ser ignorados, dos quais se destaca a sujeição da vítima

a um penoso processo de revitimização, com a sujeição a exames médicos invasivos e inquirições que entram

na sua mais profunda intimidade, mas que são indispensáveis à investigação criminal. Assim, qualquer alteração

legal que atribua natureza pública aos crimes contra a liberdade sexual deverá evitar cair no erro de fazer

prevalecer obstinadamente o interesse comunitário na persecução penal sobre a vontade da vítima, levar em

conta em conta estes aspetos negativos associados ao procedimento criminal e prever, conforme defende a

Associação Portuguesa de Apoio à Vítima4 (APAV), uma válvula de escape através da qual se possa dar voz à

vítima e valorar a sua vontade.

Tendo em conta o anteriormente exposto e a necessidade de assegurar o pleno cumprimento da Convenção

de Istambul, com o presente projeto de lei, o PAN, como partido vinculado ao princípio da não-violência e que

assume a linha da frente da defesa dos direitos das mulheres, propõe que todos os crimes contra a liberdade

sexual, à exceção do crime de importunação sexual de pessoas maiores de idade, passem a ter a natureza

pública, prevendo-se, contudo, e em linha com o que defendeu a APAV, que nos procedimentos iniciados pelo

Ministério Público relativamente estes crimes contra pessoas maiores de idade a vítima possa, a todo o tempo,

requerer o arquivamento do processo e que tal requerimento só possa ser recusado pelo Ministério Público

quando, de forma fundamentada, se considere que o prosseguimento da ação penal é o mais adequado à defesa

do interesse da vítima e que o pedido se deveu a qualquer tipo de condicionamento por parte do arguido ou de

terceiro, caso em que deverá promover sempre a aplicação das medidas necessárias à sua proteção contra

eventuais retaliações ou coação.

Paralelamente com o presente projeto de lei o PAN pretende assegurar duas relevantes alterações

relativamente aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores.

Por um lado, propomos a eliminação da possibilidade de suspensão provisória do processo nestes crimes,

por via da revogação dos atuais n.os 4 e 5 do artigo 178.º do Código Penal, uma vez que a prática revela que no

âmbito destes crimes as crianças e jovens são frequentemente pressionadas a mudar o seu testemunho e que

as próprias famílias são desincentivadas pelos próprios profissionais e pelo Ministério Público a suspender o

processo. Diga-se que o condicionamento desta forma de resolução do conflito penal à necessidade de esta ser

a melhor via de defesa do interesse da vítima, prevista na Diretiva 1/2014 da Procuradoria-Geral da República,

na prática acaba por não funcionar, uma vez que na análise do interesse da vítima continua a prevalecer a

errada ideia de que estes crimes, quando não deixam marcas físicas, são pouco graves e de que a não sujeição

às adversidades do processo penal é sempre o melhor para a criança ou jovem – algo que nem sempre é

verdadeiro, uma vez que o processo penal, se for capaz de respeitar as medidas de proteção previstas na lei5,

e com o devido acompanhamento psicossocial poderá até ter um efeito catártico. Aliás, esta assunção de base

é reflexo de uma perspetiva não psicológica, mas jurídica, uma vez que estão amplamente descritos na literatura

cientifica os efeitos nefastos, emocionais, sociais e psicológicos deste tipo de incidentes nas vitimas.

Por outro lado, propomos a alteração dos prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e

autodeterminação sexual de menores e do crime de mutilação genital feminina, por forma a que se passe a

assegurar que quando o ofendido for menor de 14 anos o procedimento criminal nunca se extinga antes de o

ofendido perfazer 40 anos, e que quando o ofendido for maior de 14 anos passe a haver um prazo de prescrição

de 20 anos que nunca poderá, no entanto, ocorrer antes de o ofendido perfazer 35 anos. É importante notar que

estes crimes e o processo penal que lhe está associado são extremamente traumáticos para a vítima do ponto

de vista físico e psicológico, inclusive com sequelas e distúrbios psíquicos. Atendendo a isto, no âmbito Projeto

3 Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao Código Penal, 2.ª edição, Universidade Católica Editora, 2010, página 556. 4 APAV (2018), Contributo da APAV referente ao Projeto de Lei n.º 1047/XIII/4.ª (PAN), página 10. 5 Diga-se que, segundo a APAV, em média a criança só é ouvida mais de um ano após a denúncia, o que enfraquece substancialmente a

prova.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 114

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CARE – Rede de apoio especializado a crianças e jovens vítimas de violência sexual6, assinalou-se que o tempo

que passa entre a perpetração do crime e a sua revelação pode variar em função do impacto que o crime teve

na criança ou jovem, sendo que em 63,6% dos casos a revelação destes crimes acontece um ano ou mais

depois de o abuso ter acontecido, situação que pode acontecer por diversas razões, entre as quais se encontra,

por exemplo, a relação da vítima com o agressor, a não perceção dos factos como crime, a auto-culpabilização,

a falta ou insuficiência de provas, ou o síndrome da acomodação da criança vítima de abuso sexual. Desta

forma, é necessário abrir no nosso país o debate sobre o alargamento dos prazos de prescrição destes crimes

por forma a assegurar que a vítima se sente preparada, do ponto de vista emocional, para a revelação do crime

e para lidar com todos os aspetos relacionados com o seguimento do procedimento criminal.

Assim, com o presente projeto de lei o PAN pretende alterar o Código Penal e o Código de Processo Penal

por forma a assegurar a consagração da natureza pública dos crimes de violação, de coação sexual, de fraude

sexual, de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência e de procriação artificial não consentida, a eliminação

da possibilidade de suspensão provisória do processo no âmbito dos crimes contra a liberdade e

autodeterminação sexual de menores e a alargar os prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e

autodeterminação sexual de menores e do crime de mutilação genital feminina.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o

Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei aprova:

a) A quinquagésima terceira alteração do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de

setembro, alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de maio, pelos Decretos-Leis n.os 101-A/88, de 26 de março, 132/93,

de 23 de abril, e 48/95, de 15 de março, pelas Leis n.os 90/97, de 30 de julho, 65/98, de 2 de setembro, 7/2000,

de 27 de maio, 77/2001, de 13 de julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001, de 25 de agosto, e 108/2001,

de 28 de novembro, pelos Decretos-Leis n.os 323/2001, de 17 de dezembro, e 38/2003, de 8 de março, pelas

Leis n.os 52/2003, de 22 de agosto, e 100/2003, de 15 de 3 novembro, pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de

março, e pelas Leis n.os 11/2004, de 27 de março, 31/2004, de 22 de julho, 5/2006, de 23 de fevereiro, 16/2007,

de 17 de abril, 59/2007, de 4 de setembro, 61/2008, de 31 de outubro, 32/2010, de 2 de setembro, 40/2010, de

3 de setembro, 4/2011, de 16 de fevereiro, 56/2011, de 15 de novembro, 19/2013, de 21 de fevereiro, 60/2013,

de 23 de agosto, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, pelas Leis n.os 59/2014, de 26 de agosto, 69/2014,

de 29 de agosto, e 82/2014, de 30 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2015, de 8 de janeiro, e pelas Leis n.os

30/2015, de 22 de abril, 81/2015, de 3 de agosto, 83/2015, de 5 de agosto, 103/2015, de 24 de agosto, e

110/2015, de 26 de agosto, 39/2016, de 19 de dezembro, 8/2017, de 3 de março, 30/2017, de 30 de maio,

94/2017, de 23 de agosto, 16/2018, de 27 de março, 44/2018, de 9 de agosto, 101/2019 e 102/2019, ambas de

6 de setembro, 39/2020, de 18 de agosto, 40/2020, de 18 de agosto e 58/2020, de 31 de agosto;

b) E a trigésima sétima alteração ao Código de Processo Penal, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º

78/87, de 17 de fevereiro, alterado pelos Decretos -Leis n.os 387-E/87, de 29 de dezembro, e 212/89, de 30 de

junho, pela Lei n.º 57/91, de 13 de agosto, pelos Decretos -Leis n.os 423/91, de 30 de outubro, 343/93, de 1 de

outubro, e 317/95, de 28 de novembro, pelas Leis n.os 59/98, de 25 de agosto, 3/99, de 13 de janeiro, e 7/2000,

de 27 de maio, pelo Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de dezembro, pelas Leis n.os 30-E/2000, de 20 de

dezembro, e 52/2003, de 22 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro, pela Lei n.º 48/2007,

de 29 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, e pelas Leis n.os 52/2008, de 28 de agosto,

115/2009, de 12 de outubro, 26/2010, de 30 de agosto, 20/2013, de 21 de fevereiro, pela Lei Orgânica n.º 2/2014,

de 6 de agosto, e pelas Leis n.os 27/2015, de 14 de abril, 58/2015, de 23 de junho, 130/2015, de 4 de setembro,

1/2016, de 25 de fevereiro, 40-A/2016, de 22 de dezembro, 24/2017, de 24 de maio, 30/2017, de 30 de maio,

94/2017, de 23 de agosto, 114/2017, de 29 de dezembro, 1/2018, de 29 de janeiro, 49/2018, de 14 de agosto,

71/2018, de 31 de dezembro, 27/2019, de 28 de março, 33/2019, de 22 de maio, 101/2019, de 6 de setembro e

6 Projeto CARE (2017), Manual CARE – Apoio a crianças e jovens vítimas de violência sexual, páginas 53 e 54.

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39/2020, de 18 de agosto.

Artigo 2.º

Alteração ao Código Penal

São alterados os artigos 118.º e 178.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de

setembro, que passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 118.º

[...]

1 – [...]:

a) [...];

b) [...];

c) [...];

d) [...].

2 – [...].

3 – [...].

4 – [...].

5 – Nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, bem como no crime de mutilação

genital feminina sendo a vítima menor, o procedimento criminal:

a) Não se extingue, por efeito da prescrição, antes de o ofendido perfazer 40 anos, quando ofendido seja

menor de 14 anos;

b) Extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a sua prática tiverem decorrido 20 anos, não

podendo tal prescrição ocorrer antes de o ofendido perfazer 35 anos, quando ofendido seja maior de 14 anos.

Artigo 178.º

[...]

1 – O procedimento criminal pelo crime previsto no artigo 170.º depende de queixa, salvo se for praticado

contra menor ou deles resultar suicídio ou morte da vítima.

2 – Nos procedimentos iniciados pelo Ministério Público relativamente aos crimes previstos nos artigos 163.º

a 165.º, 167.º e 168.º e que não tenham sido praticados contra menor ou deles não tenha resultado suicídio ou

morte da vítima, a vítima pode, a todo o tempo, requerer o arquivamento do processo, só podendo o Ministério

Público rejeitar tal requerimento quando, de forma fundamentada, considere que o prosseguimento da ação

penal é o mais adequado à defesa do interesse da vítima e que o pedido se deveu a qualquer tipo de

condicionamento por parte do arguido ou de terceiro, caso em que deverá promover sempre a aplicação das

medidas necessárias à sua proteção contra eventuais retaliações ou coação.

3 – [...].

4 – (Revogado.)

5 – (Revogado.)»

Artigo 3.º

Norma revogatória

São revogados:

a) Os n.os 4 e 5, do artigo 178.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro,

na sua atual redação;

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b) Os n.os 8, do artigo 281.º, e 5, do artigo 282.º do Código de Processo Penal, aprovado em anexo ao

Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro, na sua atual redação.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 13 de abril de 2021.

As Deputadas e o Deputado do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.

(2) O texto inicial foi substituído a pedido do autor da iniciativa a 13 de abril de 2021 [Vide DAR II Série-A n.º 107 (2021.03.30].

———

PROJETO DE LEI N.º 792/XIV/2.ª

ALTERA A LEI DA DEFESA NACIONAL (SEGUNDA ALTERAÇÃO À LEI ORGÂNICA N.º 1-B/2009, DE

7 DE JULHO)

Exposição de motivos

No quadro da discussão de uma proposta de lei do Governo de alteração à Lei de Defesa Nacional, considera

o PCP ser oportuno apresentar um conjunto de propostas de alteração a esse diploma legal que incidam,

nomeadamente, sobre os poderes do Presidente da República enquanto Comandante Supremo das Forças

Armadas e os direitos dos militares na efetividade de serviço.

Assim, sendo o Presidente da República, por inerência, o Comandante Supremo das Forças Armadas, com

a competência para declarar a guerra, será um ato de coerência atribuir-lhe também o poder de autorizar o

emprego das Forças Armadas em missões contra agressões e ameaças transnacionais ou em operações

militares no exterior do território nacional.

Quanto à Assembleia da República, propõe-se o alargamento, de dois para quatro, da representação deste

órgão de soberania no Conselho Superior de Defesa Nacional, eliminando a exigência de eleição por maioria

de dois terços.

Em relação aos direitos dos militares na efetividade de serviço, as propostas do PCP visam, por um lado,

eliminar elementos de subjetividade e não mensuráveis como o conceito de «coesão» e, por outro, adequar as

regras gerais do exercício dos direitos ao quadro constitucional, nomeadamente no que, estritamente, diz

respeito ao «apartidarismo» das Forças Armadas e dos militares.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Alterações à Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de julho

Os artigos 10.º, 11.º, 13.º, 16.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 31.º e 32.º da Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de julho,

com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei Orgânica n.º 5/2014, de 29 de agosto, passam a ter a

seguinte redação:

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«Artigo 10.º

Comandante Supremo das Forças Armadas

1 – (…):

a) (…);

b) (…);

c) Autorizar, sob proposta do Governo, o emprego das Forças Armadas em missões que envolvam a

colaboração com as forças e os serviços de segurança contra agressões ou ameaças transnacionais;

d) Autorizar, sob proposta do Governo, o emprego das Forças Armadas, e de outras forças quando

integradas numa força militar, em operações militares no exterior do território nacional;

e) [Anterior alínea d)];

f) [Anterior alínea e)];

g) [Anterior alínea f)];

h) [Anterior alínea g)].

2 – A autorização para o emprego das Forças Armadas, e de outras forças quando integradas numa força

militar, em operações militares no exterior do território nacional é precedida de proposta fundamentada do

Primeiro-Ministro, a qual deve, designadamente, incluir:

a) (…);

b) (…);

c) (…);

d) (…).

Artigo 11.º

Assembleia da República

Sem prejuízo de outras competências que lhe sejam atribuídas pela Constituição ou pela lei, compete à

Assembleia da República, em matéria de defesa nacional:

a) (…);

b) (…);

c) (…);

d) (…);

e) (…);

f) (…);

g) (…);

h) (…);

i) (…);

j) (…);

k) [Atual alínea l)];

l) [Atual alínea m)];

m) [Atual alínea n)];

n) [Atual alínea o)];

o) [Atual alínea p)];

p) Apreciar a decisão do Governo de propor ao Presidente da República o envolvimento de contingentes ou

forças militares em operações militares no estrangeiro, que lhe é comunicada previamente, e acompanhar a

participação desses contingentes ou forças nas missões, nos termos fixados em lei própria;

q) Em caso de guerra, acompanhar a evolução da situação;

r) Eleger quatro Deputados para membros do Conselho Superior de Defesa Nacional pelo método da média

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26

mais alta de Hondt.

Artigo 13.º

Primeiro-ministro

1 – (…).

2 – (…):

a) (…);

b) (…);

c) (…);

d) Apresentar ao Presidente da República a proposta fundamentada do emprego das Forças Armadas, e de

outras forças quando integradas numa força militar, em operações militares no exterior do território nacional;

e) Propor ao Presidente da República o emprego das Forças Armadas em missões que envolvam a

colaboração com as forças e os serviços de segurança contra agressões ou ameaças transnacionais;

f) (…);

g) (…).

3 – (…).

Artigo 16.º

Conselho Superior de Defesa Nacional

1 – (…).

2 – (…).

3 – (…):

a) (…);

b) (…);

c) (…);

d) (…);

e) (…);

f) (…);

g) (…);

h) (…);

i) (…);

j) Quatro Deputados à Assembleia da República, eleitos nos termos da alínea s) do artigo 11.º.

Artigo 27.º

Regras gerais sobre o exercício de direitos

1 – No exercício dos seus direitos, os militares na efetividade de serviço estão sujeitos aos deveres

decorrentes do estatuto da condição militar.

2 – (…).

3 – (…).

Artigo 28.º

Liberdade de expressão

1 – Os militares na efetividade de serviço têm o direito de proferir declarações públicas sobre qualquer

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assunto, com a reserva própria do estatuto da condição militar, desde que aquelas não ponham em risco a

disciplina das Forças Armadas, nem o dever de isenção partidária dos seus membros.

2 – (…).

Artigo 29.º

Direito de reunião

1 – Os militares na efetividade de serviço podem participar em reuniões legalmente convocadas, desde que

trajem civilmente e não ostentem qualquer símbolo nacional ou das Forças Armadas.

2 – (…).

3 – O direito de reunião não pode ser exercido dentro das unidades e estabelecimentos militares, sem estar

devidamente autorizado, nem de modo que prejudique o serviço normalmente atribuído ao militar ou a

permanente disponibilidade deste para o seu cumprimento.

Artigo 30.º

Direito de manifestação

Os militares na efetividade de serviço podem participar em manifestações legalmente convocadas sem

natureza partidária, desde que estejam desarmados, trajem civilmente, não ostentem qualquer símbolo nacional

ou das Forças Armadas e desde que a sua participação não ponha em risco a disciplina das Forças Armadas.

Artigo 31.º

Liberdade de associação

1 – Os militares na efetividade de serviço têm o direito de constituir ou integrar associações sem natureza

partidária, nomeadamente associações profissionais.

2 – O exercício do direito de associação profissional dos militares é regulado por lei própria.

Artigo 32.º

Direito de petição coletiva

Os militares na efetividade de serviço têm o direito de promover ou apresentar petições coletivas dirigidas

aos órgãos de soberania ou a outras autoridades, desde que as mesmas não ponham em risco a disciplina das

Forças Armadas, nem o dever de isenção partidária dos seus membros.»

Artigo 2.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 12 de abril de 2021.

Os Deputados do PCP: António Filipe — João Oliveira — Paula Santos — Duarte Alves — Diana Ferreira —

Bruno Dias — Jerónimo de Sousa — Ana Mesquita — Alma Rivera — João Dias.

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PROJETO DE LEI N.º 793/XIV/2.ª

ALTERA A LEI ORGÂNICA DE BASES DE ORGANIZAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS (SEGUNDA

ALTERAÇÃO À LEI ORGÂNICA N.º 1-A/2009, DE 7 DE JULHO)

Exposição de motivos

No âmbito da discussão das alterações à Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas

(LOBOFA), propostas pelo Governo, com o objetivo de promover alterações na estrutura superior da instituição

militar, nomeadamente a concentração de poderes no Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, as

propostas que o PCP apresenta, através do presente projeto de lei, têm por objetivo restabelecer aspetos da

autonomia dos três ramos das Forças Armadas (FA), designadamente no processo de escolha e nomeação dos

militares para a respetiva estrutura superior.

As sucessivas alterações à LOBOFA não se traduziram na melhoria qualidade da administração, da

formação, do treino e do produto operacional, nem no reforço da solidariedade e da unidade de comando no

topo da hierarquia.

Por outro lado, o processo de concentração e governamentalização das FA, para o qual o PCP vem

chamando a atenção desde o final do século passado, tem contribuído para alimentar situações de dúvida,

nomeadamente na ascensão e progressão na carreira de oficial general e nos processos de nomeações para

as chefias.

As propostas agora apresentadas pelo PCP não representam um retrocesso. Pelo contrário, visam contribuir

para um quadro de estabilidade, na medida em que continua por fazer um debate aprofundado sobre as Forças

Armadas que o País precisa para cumprir a missão constitucional que lhes está cometida e cujos reflexos na

organização, no dispositivo e no sistema de forças deveriam ser concretizados num período de tempo

determinado e com o necessário investimento.

É no âmbito desse debate e de um processo rigoroso e transparente, que se deverão concretizar os

ajustamentos considerados necessários, desde logo na estrutura superior da instituição militar.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Alterações à Lei Orgânica n.º 1-A/2009, de 7 de julho

Os artigos 11.º, 17.º, 18.º e 24.º da Lei Orgânica n.º 1-A/2009, de 7 julho, com as alterações que lhe foram

introduzidas pela Lei Orgânica n.º 6/2014, de 1 de setembro, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 11.º

Competências do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas

1 – (…).

2 – Compete ainda ao Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, ouvido o Conselho de Chefes

de Estado-Maior:

a) (…);

b) (…);

c) (…);

d) (…);

e) (…);

f) (…);

g) (…);

h) (…);

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i) Nomear o Chefe do Estado-Maior do Comando Conjunto para as Operações Militares;

j) Propor ao Ministro da Defesa Nacional a nomeação e a exoneração dos comandantes dos comandos dos

Açores e da Madeira, dos diretores do Instituto de Estudos Superiores Militares e do Hospital das Forças

Armadas e do chefe do órgão de informações e segurança militares;

k) [Anterior alínea j)];

l) [Anterior alínea k)];

m) [Anterior alínea l)];

n) [Anterior alínea m)];

o) [Anterior alínea n)];

p) [Anterior alínea o)];

q) [Anterior alínea p)];

r) [Anterior alínea q)];

s) [Anterior alínea r)];

t) [Anterior alínea s)];

u) [Anterior alínea t)];

v) [Anterior alínea u)];

w) [Anterior alínea v)];

x) (…).

Artigo 17.º

Competências dos Chefes do Estado-Maior dos ramos

1 – Compete aos Chefes do Estado-Maior de cada ramo, sem prejuízo do disposto no artigo 11.º:

a) (…);

b) (…);

c) (…);

d) (…);

e) (…);

f) (…);

g) Nomear e exonerar os Vice-Chefes de Estado-Maior dos ramos, os Comandantes dos comandos de

componente, naval, terrestre e aérea e os Comandantes da Academia Militar, da Escola Naval e da Academia

da Força Aérea.

h) (…);

i) (…).

Artigo 18.º

Nomeação dos Chefes do Estado-Maior dos ramos

1 – Os Chefes de Estado-Maior dos ramos são nomeados e exonerados pelo Presidente da República, sob

proposta do Governo, a qual deve ser precedida da audição do Conselho Superior do respetivo ramo.

2 – O Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas pronuncia-se, através do Ministro da Defesa

Nacional, após audição do Conselho Superior do respetivo ramo.

3 – (…).

4 – (…).

Artigo 24.º

Nomeações

1 – (…).

2 – (…).

3 – (Revogado).

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4 – Compete ao Ministro da Defesa Nacional, sob proposta do Chefe do Estado-Maior-General das Forças

Armadas, ouvido o Conselho de Chefes de Estado-Maior, nomear e exonerar os titulares dos cargos seguintes:

a) (Revogada);

b) (…);

c) (…);

d) O Diretor do Instituto de Estudos Superiores Militares;

e) O Diretor do Hospital das Forças Armadas.

5 – As nomeações e exonerações referidas na alínea a) do n.º 3 devem ser confirmadas pelo Presidente da

República, sem o que não produzem quaisquer efeitos.

6 – (…).»

Artigo 2.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

Assembleia da República, 12 de abril de 2021.

Os Deputados do PCP: António Filipe — João Oliveira — Paula Santos — Duarte Alves — Diana Ferreira —

Bruno Dias — Jerónimo de Sousa — Ana Mesquita — Alma Rivera — João Dias.

———

PROJETO DE LEI N.º 794/XIV/2.ª

CRIA O PROGRAMA FÉRIAS DESPORTIVAS E CULTURAIS

Exposição de motivos

A crise pandémica da covid-19 resultou, até ao momento, em dois anos letivos atípicos, 2019/2020 e

2020/2021. Largos períodos de confinamento e de ensino não-presencial provocaram um agravamento das

desigualdades, perda de aprendizagens, atrasos no desenvolvimento, perda de competências emocionais,

sociais e físicas, degradação da saúde mental das crianças e jovens.

A par das medidas necessárias ao nível da recuperação de aprendizagens em contexto escolar, é importante

que as férias de verão de 2021 representem um momento de recuperação da interação segura entre pares, da

fruição da natureza e das atividades culturais e desportivas.

É responsabilidade do Estado prover, em condições de igualdade, as atividades de verão que farão a

diferença no desenvolvimento das crianças e jovens. A Constituição da República Portuguesa responsabiliza o

Estado por garantir a todas e a todos o seu direito à fruição e criação cultural (artigo 73.º, n.º 3) e o seu direito

de acesso à cultura física e ao desporto (artigo 79.º). Essa responsabilidade da democracia assume

características particulares no que se refere à proteção do desenvolvimento integral das crianças (artigo 69.º) e

à efetivação dos direitos sociais e culturais dos e das jovens (artigo 70.º).

A concretização dos direitos sociais das crianças e jovens ao nível da cultura, do desporto e do lazer está a

ser obstaculizada pelas desigualdades sociais e pela dimensão socioeconómica da crise pandémica. Se a

concretização destes direitos sociais e culturais deve ser uma preocupação constante da sociedade e do Estado,

no contexto atual é decisiva na vida das crianças e jovens.

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Perante o atual contexto, é premente a criação de um programa excecional e temporário de financiamento

de atividades lúdicas, desportivas e culturais para crianças e jovens durante a interrupção letiva do verão de

2021. Esse programa, nacional, universal e gratuito, deve ser financiado pelo Governo e implementado pelas

autarquias locais, em articulação com as associações culturais e desportivas. Através das autarquias locais é

possível fazer uma programação adaptada às populações e aos territórios. Correspondendo desta forma às

suas atribuições ao nível da ocupação dos tempos livres, do desporto e da cultura [alínea d) do n.º 2 do artigo

7.º e alíneas e) e f) do n.º 2 do artigo 23.º do Regime jurídico das autarquias locais, Lei n.º 75/2013, 12 de

setembro, na sua redação atual].

Este programa deve ser complementado por um Passe Jovem Cultura e Património, que assegura o acesso

gratuito a museus, monumentos, património e sítios arqueológicos.

Depois de longos períodos de confinamento, o regresso a atividades coletivas lúdicas, culturais e desportivas

acompanhadas é essencial para promover o desenvolvimento pessoal e social das crianças e jovens. Nenhuma

criança e nenhum jovem deve ficar privado das férias a que tem direito.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei determina a criação de um programa excecional e temporário de financiamento de atividades

lúdicas, desportivas e culturais para crianças e jovens durante a interrupção letiva do verão de 2021.

Artigo 2.º

Programa Férias Desportivas e Culturais

O Governo cria uma linha de financiamento das autarquias locais para o desenvolvimento de atividades de

verão para crianças e jovens nos termos do artigo seguinte.

Artigo 3.º

Programação Local das Atividades de Verão

1 – As autarquias locais organizam, em articulação com as associações culturais e desportivas, atividades

para crianças e jovens em idade escolar durante a interrupção letiva do verão de 2021.

2 – A programação local das atividades de verão inclui:

a) Prática desportiva;

b) Atividades de fruição e criação cultural;

c) Atividades lúdicas em contexto de natureza.

Artigo 4.º

Passe Jovem Cultura e Património

O Governo, em articulação com as autarquias locais, cria um Passe Jovem Cultura e Património que

assegura o acesso gratuito a museus, monumentos, património e sítios arqueológicos.

Artigo 5.º

Acesso Universal e Gratuito

O Programa de Férias Culturais e Desportivas e o Passe Jovem Cultura e Património previstos nos artigos

anteriores são de acesso gratuito e destinam-se a todas as crianças e jovens em idade escolar.

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Artigo 6.º

Regulamentação

O Governo procederá à regulamentação da presente lei no prazo de 30 dias a contar da entrada em vigor da

presente lei.

Artigo 7.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, 12 de abril de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — João Vasconcelos —

José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

———

PROJETO DE LEI N.º 795/XIV/2.ª

ALTERA O ARTIGO 250.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, PARA UMA ABORDAGEM NA

IDENTIFICAÇÃO DE SUSPEITOS QUE SALVAGUARDE OS DIREITOS PROCESSUAIS E AS

LIBERDADES FUNDAMENTAIS DAS PESSOAS RACIALIZADAS, LIMITANDO A DISCRICIONARIEDADE

POLICIAL BASEADA EM ESTEREÓTIPOS RACIAIS

(Texto inicial do projeto de lei)

Exposição de motivos

O n.º 1 do artigo 250.º do Código de Processo Penal estatui que: «Os órgãos de polícia criminal podem

proceder à identificação de qualquer pessoa encontrada em lugar público, aberto ao público ou sujeito a

vigilância policial, sempre que sobre ela recaiam fundadas suspeitas da prática de crimes, da pendência de

processo de extradição ou de expulsão, de que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território

nacional ou de haver contra si mandado de detenção.» O suspeito poderá proceder à sua identificação mediante

a apresentação de um dos documentos indicados nas alíneas do n.º 3 do supracitado artigo. Se tal não for

possível, poderá identificar-se mediante a apresentação «documento original, ou cópia autenticada, que

contenha o seu nome completo, a sua assinatura e a sua fotografia» (n.º 4), «comunicação com uma pessoa

que apresente os seus documentos de identificação» [alínea a) do n.º 5], «deslocação, acompanhado pelos

órgãos de polícia criminal, ao lugar onde se encontram os seus documentos de identificação» [alínea b) do n.º

5] e «reconhecimento da sua identidade por uma pessoa identificada nos termos do n.º 3 ou do n.º 4 que garanta

a veracidade dos dados pessoais indicados pelo identificando» [alínea c) do n.º 5]. Por fim, no n.º 6 do artigo

250.º lê-se que «Na impossibilidade de identificação nos termos do n.os 3, 4 e 5, os órgãos de polícia

criminalpodem conduzir o suspeito ao posto policial mais próximo e compeli-lo a permanecer ali pelo

tempo estritamente indispensável à identificação, em caso algum superior a seis horas, realizando, em

caso de necessidade, provas dactiloscópicas, fotográficas ou de natureza análoga e convidando o identificando

a indicar residência onde possa ser encontrado e receber comunicações».

Têm sido recorrentes os relatos da abordagem policial à população racializada tendo como base o presente

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artigo, baseada em estereótipos raciais e que remetem qualquer pessoa negra ou de minorias étnicas como a

população cigana, à condição de potencial suspeito. Sendo acompanhada, não raras vezes, por policiamento

repressivo e por revistas consideradas humilhantes por quem por elas passa e que restauram aquilo que é o

resultado de uma construção histórica colonial que configura a pessoa negra ou cigana como desordeira ou

criminosa.

No artigo 250.º do Código de Processo Penal, a questão da pertença étnico-racial de um indivíduo, e mais

concretamente a sua cor de pele, constitui um fator de identificação do suspeito dos crimes em questão,

nomeadamente no que diz respeito às «suspeitas (...) de que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no

território nacional (...).» Isto parte das conceções de identidade nacional e da conceção de cidadão nacional que

remete para fora do corpo nacional toda a diversidade e multiculturalidade que caracteriza Portugal e a

população portuguesa.

Segundo o advogado José Semedo Fernandes, esta é uma lei «que pinta o sujeito de negro», pois toda a

pessoa negra poderá ser abordada, parada, revistada e detida com base unicamente na sua cor de pele. O

advogado conta ainda que «quando era miúdo, um polícia parou-me à saída do bairro e perguntei porquê. Ele

disse: ‘um preto é sempre suspeito’»1. Mais tarde, já formado em Direito, José Semedo Fernandes

estabeleceu a conexão entre este episódio e o preceito contido no artigo 250.º do Código de Processo Penal.

Explicou que «Só depois de ler este artigo [250.º] fiz o paralelismo: o artigo dá a possibilidade de o agente parar

qualquer pessoa que seja negra e justificar com esse artigo, que nos coloca numa posição de fragilidade legal

(...).» Portanto, a lei, na forma como está elaborada, «acaba por ser ‘profundamente racista’. Isto porque ‘pinta

o suspeito de negro’ ao falar de alguém que ‘esteja irregularmente no território nacional’ ou tenha um processo

de expulsão administrativa. Ou seja, ‘empurra logo para os estrangeiros, associados aos negros’».2

O projeto COMBAT – O combate ao racismo em Portugal: uma análise de políticas públicas e

legislação, levado a cabo de junho de 2016 a abril de 2020, propôs-se a «colmatar um vazio que persiste ao

analisar o racismo em Portugal: o papel da legislação no combate à discriminação racial» e colocando «(...) no

centro do debate a relação entre Estado, direito e sociedade questionando, assim, os limites e possibilidades

das noções de ‘igualdade de tratamento’, de ‘discriminação’ e de ‘ódio racial’ que têm sido mobilizadas na

implementação da legislação e as suas consequências para uma compreensão (ou silenciamento) do contexto

histórico e da dimensão institucionalizada do racismo em Portugal».3 Através da análise de múltiplos processos

de contraordenação instaurados pela Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR) ao

abrigo da Lei n.º 134/99, de 28 de agosto e da Lei n.º 18/2004, de 11 de maio, que transpõe a Diretiva Europeia

de Igualdade Racial 2000/43/CE para a ordem jurídica nacional, entre 2006 e 2016, e findos até 20 de fevereiro

de 2020, nas áreas específicas da educação, habitação/vizinhança e forças de segurança, este estudo conclui

que «as denúncias de racismo relacionadas com as políticas de segurança urbana e a intervenção das forças

de segurança urbana e a intervenção das forças de segurança, incluindo a atitude negligente na investigação

de indícios de assédio e violência racista, têm sido constantes no contexto europeu».

A análise levada a cabo pelo supracitado instrumento de investigação aponta, essencialmente, «três

problemáticas: (i) como a legislação promove formas de intervenção policial sistemática e musculada em

determinados contextos urbanos e em relação às populações afrodescendentes, ciganas e migrantes; (ii) como

o sistema de justiça, as Inspeções [como é o caso da Inspeção-Geral da Administração Interna], e as forças de

segurança têm reproduzido representações institucionalizadas discriminatórias antinegras e anticiganas; (iii)

como são apuradas as queixas de racismo e, em particular, a injúria racial e o uso de substantivos e categorias

étnico-raciais». Concretamente, verificou-se «a existência de numerosos processos abertos por queixas

relacionadas com formas de abordagem e procedimentos das forças de segurança ao solicitar

identificação e na decisão de condução/detenção de suspeitos de prática de crime e, em particular,

quando acresce a suspeição de este ter penetrado ou permanecer irregularmente no território nacional.

Verificou-se um padrão de incumprimento do disposto no artigo 250.º do Código de Processo Penal em

relação aos diferentes mecanismos que o alegado suspeito pode acionar para identificar-se; as queixas

revelam que os alegados suspeitos são alvo de agressões e injúrias discriminatórias, muitas das vezes

1 Em «Quando era miúdo um polícia disse-me: um preto é sempre suspeito» | Racismo à Portuguesa | PÚBLICO (publico.pt) e em Joana

Gorjão Henriques, Racismo no País dos Brancos Costumes, Tinta da China, (2018), p. 43 e seguintes. 2 Joana Gorjão Henriques, ob. cit., p.44. 3 Silvia Rodríguez Maeso (coord.), Ana Rita Alves, Sara Fernandes e Inês Oliveira, Caderno de apresentação de resultados do pro jeto

COMBAT – «Direito, estado e sociedade: uma análise da legislação de combate ao racismo em Portugal», junho de 2020, p. 2.

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no interior dos veículos onde são conduzidos à esquadra. Note-se que nem sempre é possível ao

queixoso identificar o agente em causa, ou que o processo de identificação é obstruído pelos próprios

agentes».

Como declara Paulo PINTO DE ALBUQUERQUE4, «O poder de proceder a identificação de suspeito em

lugar público, aberto ao público ou sujeito a vigilância policial é um dos poderes cautelares do órgão de polícia

criminal. Pode ser exercido numa fase pré-processual, mas tem natureza processual, isto é, preordenada aos

fins do processo a instaurar ou já instaurando, perdendo-se, assim, a natureza estritamente preventiva da

medida (...)». No seu acórdão n.º 479/945, o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional a sujeição a

identificação policial de uma pessoa que não seja suspeita da prática de um crime, com base na invocação de

razões de «segurança interna». Na sua argumentação, expôs que: «O princípio da tipicidade legal impõe que

os atos de polícia, além de terem um fundamento legal, devem traduzir-se em procedimentos individualizados e

com conteúdo suficientemente definido na lei, seja qual for a sua natureza: quer sejam regulamentos gerais

emanados das autoridades de polícia, decisões concretas e particulares, medidas de coerção ou operações de

vigilância, todas as medidas de polícia estão sujeitas ao princípio da precedência da lei e da tipicidade legal. O

princípio da proibição do excesso, por seu turno, acarreta uma obrigatória subordinação das medidas de polícia

aos requisitos da necessidade, exigibilidade e proporcionalidade. Com ele reafirma-se enfaticamente o princípio

constitucional fundamental em matéria de atos públicos potencialmente lesivos de direitos fundamentais, em

termos de tais atos só deverem ir até onde seja imprescindível para assegurar o interesse público em causa,

sacrificando ao mínimo os direitos dos cidadãos». Ora, o artigo 250.º do Código de Processo Penal, ao atribuir

aos órgãos de polícia criminal a competência de proceder à identificação de qualquer pessoa, sempre que sobre

ela recaiam suspeitas «de que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional» acaba por

criar um espaço de elevada discricionariedade no que respeita à conduta policial, uma vez que a lei é omissa

quanto aos critérios a adotar para discernir se determinado indivíduo penetrou ou permanece irregularmente no

território nacional. Permanece a questão: quais são os parâmetros utilizados pelos órgãos de polícia criminal

para identificar se determinada pessoa entrou ou permanece irregularmente no território nacional? Quais são

as características de um estrangeiro?

Nesse sentido, o estudo em apreço conclui, portanto, que «a legislação – nomeadamente o artigo 250.º

do CPP –, [ao misturar critérios de natureza criminal com critérios de natureza contraordenacional],

permite que sejam criadas as condições para que, os cidadãos racializados, considerados como

potenciais suspeitos pratica de crimes, se encontrem numa situação especialmente vulnerável, e

sujeitos a práticas de assédio policial. Em menor medida, o mesmo se poderia dizer em relação a cidadãos

de nacionalidades do denominado leste da Europa (principalmente queixosos de nacionalidade ucraniana e

romena), ou do Brasil».6

É de realçar, igualmente, que a pessoa visada pela ordem de identificação deve ser um suspeito, isto é,

uma pessoa em relação à qual haja «fundadas suspeitas» da prática de uma infração criminal. Contudo, «a

permanência de cidadão estrangeiro em território português por período superior ao autorizado constitui

contraordenação»7, e não uma infração criminal. A redação atual do artigo 250.º do Código de Processo Penal

contribuiu, portanto, para a criação de uma confusão entre estes dois domínios, justificadamente distintos e que,

portanto, devem ser alvo de tratamentos diferenciados.

A violência policial é uma realidade frequente em Portugal, que urge ser combatida e eliminada. Segundo as

conclusões do Comité Europeu para a Prevenção da Tortura (CPT), que opera no âmbito do Conselho da

Europa, num relatório publicado a 13 de novembro de 2020, no seguimento da sua visita ad hoc a Portugal em

dezembro de 2019, «As autoridades portuguesas têm de reconhecer que os maus-tratos perpetrados por

agentes policiais são uma realidade, e não resultam apenas de ações de alguns agentes

transgressores». O relatório alerta que «não foi feito o suficiente para reconhecer e atacar o real e

persistente problema dos maus tratos pelas forças de segurança que existe em Portugal.»8 Já a chefe da

4 Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2.ª edição, p. 663 e seguintes. 5 Pode ser acedido em: Acórdão 479/94, 1994-08-24 - DRE. 6 Silvia Rodríguez Maeso (coord.), Ana Rita Alves, Sara Fernandes e Inês Oliveira, ob. cit., p. 46. 7 Como tal resulta da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, na sua redação atual (Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de estrangeiros de

território nacional). 8 O sumário executivo do relatório do CPT pode ser lido em: https://www.coe.int/en/web/cpt/portugal.

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delegação, Julia Kozma, em entrevista ao PÚBLICO9, observou que «existe tolerância zero em relação a estas

práticas, mas depois parece haver uma negação de que estes casos acontecem frequentemente» e sublinhou

que «Não se trata de um policial que, num ano, infringe a lei. Todos os anos que vimos a Portugal há alegações

de mais casos, e provas, e não há suficientemente consciência de que isto está no sistema e é preciso ser

atacado. Há relutância em levar alguém a ser punido.» É necessário relembrar que «A responsabilidade [das

autoridades] é aplicar a lei segundo parâmetros de direitos humanos, não chega citar a lei.»

Citando Barnor Hesse e Christine Bennett, «onde os estereótipos racistas, as suspeitas arbitrárias e o

policiamento agressivo se combinam consistentemente contra membros de uma comunidade particular,

o resultado é, invariavelmente, uma forma de assédio racial de estado».10

Portugal, na sua luta pela Igualdade e a Não-Discriminação tem a imperativa missão de proteger a dignidade

e os direitos de todas as pessoas que habitam o território e de todas as pessoas que a visitam, procurando

melhorar a sua legislação de forma a zelar pelos Direitos Humanos, constitucionalmente consagrados.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei altera o Código de Processo Penal, publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de

fevereiro, alterado pelos Decretos-Lei n.º 38-E/87, de 29 de dezembro, e 212/89, de 30 de junho, pela Lei n.º

57/91, de 13 de agosto, pelos Decretos-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro, 343/93, de 1 de outubro, e 317/95, de

28 de novembro, pelas Leis n.º 59/98, de 25 de agosto, 3/99, de 13 de janeiro, e 7/2000, de 27 de maio, pelo

Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de dezembro, pelas Leis n.os 30-E/2000, de 20 de dezembro, e 52/2003, de

22 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro, pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, pelo

Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, e pelas Leis n.os 52/2008, de 28 de agosto, 115/2009, de 12 de

outubro, 26/2010, de 30 de agosto, 20/2013, de 21 de fevereiro, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, e

pelas Leis n.º 27/2015, de 14 de abril, 58/2015, de 23 de junho, 130/2015, de 4 de setembro, 1/2016, de 25 de

fevereiro, 40-A/2016, de 22 de dezembro, 24/2017, de 24 de maio, 30/2017, de 30 de maio, 94/2017, de 23 de

agosto, 114/2017, de 29 de dezembro, 1/2018, de 29 de janeiro, 49/2018, de 14 de agosto, 71/2018, de 31 de

dezembro, 27/2019, de 28 de março, 33/2019, de 22 de maio, 101/2019, de 6 de setembro e 39/2020, de 18 de

agosto.

Artigo 2.º

Alteração ao Código de Processo Penal

É alterado o artigo 250.º do Código de Processo Penal, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 250.º

(…)

1 – Os órgãos de polícia criminal podem proceder à identificação de qualquer pessoa encontrada em lugar

público, aberto ao público ou sujeito a vigilância policial, sempre que sobre ela recaiam fundadas suspeitas da

prática de crimes, da pendência de processo de extradição ou de expulsão, de que tenha penetrado ou

permaneça irregularmente no território nacional ou de haver contra si mandado de detenção.

2 – (…).

3 – (…).

4 – (…).

5 – (…).

9 Pode ser acedida em:

https://www.publico.pt/2020/11/13/sociedade/noticia/conselho-europa-violencia-policial-frequente-portugal-pede-medidas-urgentes-1938969. 10 Barnor Hesse e Christine Bennett, Racial harassment and 1980s Waltham Forest, 1992, p.16, citado em Caderno de apresentação de

resultados do projeto COMBAT – «Direito, estado e sociedade: uma análise da legislação de combate ao racismo em Portugal», p. 9.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 114

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6 – (…).

7 – (…).

8 – (…).

9 – (…).

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 12 de abril de 2021.

A Deputada não inscrita, Joacine Katar Moreira.

(Texto alterado do projeto de lei)

Exposição de motivos

O n.º 1 do artigo 250.º do Código de Processo Penal estatui que: «Os órgãos de polícia criminal podem

proceder à identificação de qualquer pessoa encontrada em lugar público, aberto ao público ou sujeito a

vigilância policial, sempre que sobre ela recaiam fundadas suspeitas da prática de crimes, da pendência de

processo de extradição ou de expulsão, de que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território

nacional ou de haver contra si mandado de detenção.» O suspeito poderá proceder à sua identificação mediante

a apresentação de um dos documentos indicados nas alíneas do n.º 3 do supracitado artigo. Se tal não for

possível, poderá identificar-se mediante a apresentação «documento original, ou cópia autenticada, que

contenha o seu nome completo, a sua assinatura e a sua fotografia» (n.º 4), «comunicação com uma pessoa

que apresente os seus documentos de identificação» [alínea a) do n.º 5], «deslocação, acompanhado pelos

órgãos de polícia criminal, ao lugar onde se encontram os seus documentos de identificação» [alínea b) do n.º

5] e «reconhecimento da sua identidade por uma pessoa identificada nos termos do n.º 3 ou do n.º 4 que garanta

a veracidade dos dados pessoais indicados pelo identificando» [alínea c) do n.º 5]. Por fim, no n.º 6 do artigo

250.º lê-se que «Na impossibilidade de identificação nos termos dos n.os 3, 4 e 5, os órgãos de polícia

criminalpodem conduzir o suspeito ao posto policial mais próximo e compeli-lo a permanecer ali pelo

tempo estritamente indispensável à identificação, em caso algum superior a seis horas, realizando, em

caso de necessidade, provas dactiloscópicas, fotográficas ou de natureza análoga e convidando o identificando

a indicar residência onde possa ser encontrado e receber comunicações».

Têm sido recorrentes os relatos da abordagem policial à população racializada tendo como base o presente

artigo, baseada em estereótipos raciais e que remetem qualquer pessoa negra ou de minorias étnicas como a

população cigana, à condição de potencial suspeito. Sendo acompanhada, não raras vezes, por policiamento

repressivo e por revistas consideradas humilhantes por quem por elas passa e que restauram aquilo que é o

resultado de uma construção histórica colonial que configura a pessoa negra ou cigana como desordeira ou

criminosa.

No artigo 250.º do Código de Processo Penal, a questão da pertença étnico-racial de um indivíduo, e mais

concretamente a sua cor de pele, constitui um fator de identificação do suspeito dos crimes em questão,

nomeadamente no que diz respeito às «suspeitas (...) de que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no

território nacional (...).» Isto parte das conceções de identidade nacional e da conceção de cidadão nacional que

remete para fora do corpo nacional toda a diversidade e multiculturalidade que caracteriza Portugal e a

população portuguesa.

Segundo o advogado José Semedo Fernandes, esta é uma Lei «que pinta o sujeito de negro», pois toda a

pessoa negra poderá ser abordada, parada, revistada e detida com base unicamente na sua cor de pele. O

advogado conta ainda que «quando era miúdo, um polícia parou-me à saída do bairro e perguntei porquê. Ele

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13 DE ABRIL DE 2021

37

disse: ‘um preto é sempre suspeito’1. Mais tarde, já formado em Direito, José Semedo Fernandes estabeleceu

a conexão entre este episódio e o preceito contido no artigo 250.º do Código de Processo Penal. Explicou que

«Só depois de ler este artigo [250.º] fiz o paralelismo: o artigo dá a possibilidade de o agente parar qualquer

pessoa que seja negra e justificar com esse artigo, que nos coloca numa posição de fragilidade legal (...).»

Portanto, a lei, na forma como está elaborada, «acaba por ser ‘profundamente racista’. Isto porque ‘pinta o

suspeito de negro’ ao falar de alguém que ‘esteja irregularmente no território nacional’ ou tenha um processo de

expulsão administrativa. Ou seja, ‘empurra logo para os estrangeiros, associados aos negros’».2

O projeto COMBAT – O combate ao racismo em Portugal: uma análise de políticas públicas e

legislação, levado a cabo de junho de 2016 a abril de 2020, propôs-se a «colmatar um vazio que persiste ao

analisar o racismo em Portugal: o papel da legislação no combate à discriminação racial» e colocando «(...) no

centro do debate a relação entre Estado, direito e sociedade questionando, assim, os limites e possibilidades

das noções de ‘igualdade de tratamento’, de ‘discriminação’ e de ‘ódio racial’ que têm sido mobilizadas na

implementação da legislação e as suas consequências para uma compreensão (ou silenciamento) do contexto

histórico e da dimensão institucionalizada do racismo em Portugal».3 Através da análise de múltiplos processos

de contraordenação instaurados pela Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR) ao

abrigo da Lei n.º 134/99, de 28 de agosto e da Lei n.º 18/2004, de 11 de maio, que transpõe a Diretiva Europeia

de Igualdade Racial 2000/43/CE para a ordem jurídica nacional, entre 2006 e 2016, e findos até 20 de fevereiro

de 2020, nas áreas específicas da educação, habitação/vizinhança e forças de segurança, este estudo conclui

que «as denúncias de racismo relacionadas com as políticas de segurança urbana e a intervenção das forças

de segurança urbana e a intervenção das forças de segurança, incluindo a atitude negligente na investigação

de indícios de assédio e violência racista, têm sido constantes no contexto europeu».

A análise levada a cabo pelo supracitado instrumento de investigação aponta, essencialmente, «três

problemáticas: (i) como a legislação promove formas de intervenção policial sistemática e musculada em

determinados contextos urbanos e em relação às populações afrodescendentes, ciganas e migrantes; (ii) como

o sistema de justiça, as Inspeções [como é o caso da Inspeção-Geral da Administração Interna], e as forças de

segurança têm reproduzido representações institucionalizadas discriminatórias antinegras e anticiganas; (iii)

como são apuradas as queixas de racismo e, em particular, a injúria racial e o uso de substantivos e categorias

étnico-raciais». Concretamente, verificou-se «a existência de numerosos processos abertos por queixas

relacionadas com formas de abordagem e procedimentos das forças de segurança ao solicitar

identificação e na decisão de condução/detenção de suspeitos de prática de crime e, em particular,

quando acresce a suspeição de este ter penetrado ou permanecer irregularmente no território nacional.

Verificou-se um padrão de incumprimento do disposto no artigo 250.º do Código de Processo Penal em

relação aos diferentes mecanismos que o alegado suspeito pode acionar para identificar-se; as queixas

revelam que os alegados suspeitos são alvo de agressões e injúrias discriminatórias, muitas das vezes

no interior dos veículos onde são conduzidos à esquadra. Note-se que nem sempre é possível ao

queixoso identificar o agente em causa, ou que o processo de identificação é obstruído pelos próprios

agentes».

Como declara Paulo PINTO DE ALBUQUERQUE4, «O poder de proceder a identificação de suspeito em

lugar público, aberto ao público ou sujeito a vigilância policial é um dos poderes cautelares do órgão de polícia

criminal. Pode ser exercido numa fase pré-processual, mas tem natureza processual, isto é, preordenada aos

fins do processo a instaurar ou já instaurando, perdendo-se, assim, a natureza estritamente preventiva da

medida (...)». No seu acórdão n.º 479/945, o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional a sujeição a

identificação policial de uma pessoa que não seja suspeita da prática de um crime, com base na invocação de

razões de «segurança interna». Na sua argumentação, expôs que: «O princípio da tipicidade legal impõe que

os atos de polícia, além de terem um fundamento legal, devem traduzir-se em procedimentos individualizados e

com conteúdo suficientemente definido na lei, seja qual for a sua natureza: quer sejam regulamentos gerais

1 Em «Quando era miúdo um polícia disse-me: um preto é sempre suspeito» | Racismo à Portuguesa | PÚBLICO (publico.pt) e em Joana

Gorjão Henriques, Racismo no País dos Brancos Costumes, Tinta da China, (2018), p. 43 e seguintes. 2 Joana Gorjão Henriques, ob. cit., p.44. 3 Silvia Rodríguez Maeso (coord.), Ana Rita Alves, Sara Fernandes e Inês Oliveira, Caderno de apresentação de resultados do pro jeto

COMBAT – «Direito, estado e sociedade: uma análise da legislação de combate ao racismo em Portugal», junho de 2020, p. 2. 4 Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2.ª edição, p. 663 e seguintes. 5 Pode ser acedido em: Acórdão 479/94, 1994-08-24 - DRE.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 114

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emanados das autoridades de polícia, decisões concretas e particulares, medidas de coerção ou operações de

vigilância, todas as medidas de polícia estão sujeitas ao princípio da precedência da lei e da tipicidade legal. O

princípio da proibição do excesso, por seu turno, acarreta uma obrigatória subordinação das medidas de polícia

aos requisitos da necessidade, exigibilidade e proporcionalidade. Com ele reafirma-se enfaticamente o princípio

constitucional fundamental em matéria de atos públicos potencialmente lesivos de direitos fundamentais, em

termos de tais atos só deverem ir até onde seja imprescindível para assegurar o interesse público em causa,

sacrificando ao mínimo os direitos dos cidadãos». Ora, o artigo 250.º do Código de Processo Penal, ao atribuir

aos órgãos de polícia criminal a competência de proceder à identificação de qualquer pessoa, sempre que sobre

ela recaiam suspeitas «de que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional» acaba por

criar um espaço de elevada discricionariedade no que respeita à conduta policial, uma vez que a lei é omissa

quanto aos critérios a adotar para discernir se determinado indivíduo penetrou ou permanece irregularmente no

território nacional. Permanece a questão: quais são os parâmetros utilizados pelos órgãos de polícia criminal

para identificar se determinada pessoa entrou ou permanece irregularmente no território nacional? Quais são

as características de um estrangeiro?

Nesse sentido, o estudo em apreço conclui, portanto, que «a legislação – nomeadamente o artigo 250.º

do CPP –, [ao misturar critérios de natureza criminal com critérios de natureza contraordenacional],

permite que sejam criadas as condições para que, os cidadãos racializados, considerados como

potenciais suspeitos pratica de crimes, se encontrem numa situação especialmente vulnerável, e

sujeitos a práticas de assédio policial. Em menor medida, o mesmo se poderia dizer em relação a cidadãos

de nacionalidades do denominado leste da Europa (principalmente queixosos de nacionalidade ucraniana e

romena), ou do Brasil».6

É de realçar, igualmente, que a pessoa visada pela ordem de identificação deve ser um suspeito, isto é,

uma pessoa em relação à qual haja «fundadas suspeitas» da prática de uma infração criminal. Contudo, «a

permanência de cidadão estrangeiro em território português por período superior ao autorizado constitui

contraordenação»7, e não uma infração criminal. A redação atual do artigo 250.º do Código de Processo Penal

contribuiu, portanto, para a criação de uma confusão entre estes dois domínios, justificadamente distintos e que,

portanto, devem ser alvo de tratamentos diferenciados.

A violência policial é uma realidade frequente em Portugal, que urge ser combatida e eliminada. Segundo as

conclusões do Comité Europeu para a Prevenção da Tortura (CPT), que opera no âmbito do Conselho da

Europa, num relatório publicado a 13 de novembro de 2020, no seguimento da sua visita ad hoc a Portugal em

dezembro de 2019, «As autoridades portuguesas têm de reconhecer que os maus-tratos perpetrados por

agentes policiais são uma realidade, e não resultam apenas de ações de alguns agentes

transgressores». O relatório alerta que «não foi feito o suficiente para reconhecer e atacar o real e

persistente problema dos maus tratos pelas forças de segurança que existe em Portugal.»8 Já a chefe da

delegação, Julia Kozma, em entrevista ao PÚBLICO9, observou que «existe tolerância zero em relação a estas

práticas, mas depois parece haver uma negação de que estes casos acontecem frequentemente» e sublinhou

que «Não se trata de um policial que, num ano, infringe a lei. Todos os anos que vimos a Portugal há alegações

de mais casos, e provas, e não há suficientemente consciência de que isto está no sistema e é preciso ser

atacado. Há relutância em levar alguém a ser punido.» É necessário relembrar que «A responsabilidade [das

autoridades] é aplicar a lei segundo parâmetros de direitos humanos, não chega citar a lei.»

Citando Barnor Hesse e Christine Bennett, «onde os estereótipos racistas, as suspeitas arbitrárias e o

policiamento agressivo se combinam consistentemente contra membros de uma comunidade particular,

o resultado é, invariavelmente, uma forma de assédio racial de estado».10

Portugal, na sua luta pela Igualdade e a Não-Discriminação tem a imperativa missão de proteger a dignidade

e os direitos de todas as pessoas que habitam o território e de todas as pessoas que a visitam, procurando

melhorar a sua legislação de forma a zelar pelos Direitos Humanos, constitucionalmente consagrados.

6 Silvia Rodríguez Maeso (coord.), Ana Rita Alves, Sara Fernandes e Inês Oliveira, ob. cit., p. 46. 7 Como tal resulta da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, na sua redação atual (Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de estrangeiros de território nacional). 8 O sumário executivo do relatório do CPT pode ser lido em: https://www.coe.int/en/web/cpt/portugal. 9 Pode ser acedida em: https://www.publico.pt/2020/11/13/sociedade/noticia/conselho-europa-violencia-policial-frequente-portugal-pede-medidas-urgentes-1938969. 10 Barnor Hesse e Christine Bennett, Racial harassment and 1980s Waltham Forest, 1992, p.16, citado em Caderno de apresentação de resultados do projeto COMBAT – «Direito, estado e sociedade: uma análise da legislação de combate ao racismo em Portugal», p. 9.

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13 DE ABRIL DE 2021

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Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei altera o Código de Processo Penal, publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de

fevereiro, alterado pelos Decretos-Lei n.º 38-E/87, de 29 de dezembro, e 212/89, de 30 de junho, pela Lei n.º

57/91, de 13 de agosto, pelos Decretos-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro, 343/93, de 1 de outubro, e 317/95, de

28 de novembro, pelas Leis n.º 59/98, de 25 de agosto, 3/99, de 13 de janeiro, e 7/2000, de 27 de maio, pelo

Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de dezembro, pelas Leis n.º 30-E/2000, de 20 de dezembro, e 52/2003, de

22 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro, pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, pelo

Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, e pelas Leis n.º 52/2008, de 28 de agosto, 115/2009, de 12 de

outubro, 26/2010, de 30 de agosto, 20/2013, de 21 de fevereiro, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, e

pelas Leis n.os 27/2015, de 14 de abril, 58/2015, de 23 de junho, 130/2015, de 4 de setembro, 1/2016, de 25 de

fevereiro, 40-A/2016, de 22 de dezembro, 24/2017, de 24 de maio, 30/2017, de 30 de maio, 94/2017, de 23 de

agosto, 114/2017, de 29 de dezembro, 1/2018, de 29 de janeiro, 49/2018, de 14 de agosto, 71/2018, de 31 de

dezembro, 27/2019, de 28 de março, 33/2019, de 22 de maio, 101/2019, de 6 de setembro e 39/2020, de 18 de

agosto.

Artigo 2.º

Alteração ao Código de Processo Penal

É alterado o artigo 250.º do Código de Processo Penal, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 250.º

(…)

1 – Os órgãos de polícia criminal podem proceder à identificação de qualquer pessoa encontrada em lugar

público, aberto ao público ou sujeito a vigilância policial, sempre que sobre ela recaiam fundadas suspeitas da

prática de crimes, da pendência de processo de extradição ou de expulsão, ou de haver contra si mandado de

detenção.

2 – (…).

3 – (…).

4 – (…).

5 – (…).

6 – (…).

7 – (…).

8 – (…).

9 – (…).

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 12 de abril de 2021.

A Deputada não inscrita, Joacine Katar Moreira.

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PROJETO DE LEI N.º 796/XIV/2.ª

ELIMINA PROIBIÇÕES DE ESTACIONAMENTO E PERNOITA EM AUTOCARAVANAS

Exposição de motivos

A prática do autocaravanismo é uma forma alternativa de fazer férias em família, aproveitando a natureza e

a viagem para conhecer melhor o nosso Portugal e as suas gentes e para disfrutar das suas paisagens e

recantos. Muitos são os estrangeiros – holandeses, alemães, franceses – que utilizam esse meio para

percorrerem o nosso País, de Norte a Sul, cabendo também referir que é cada vez maior o número de

portugueses que também optam por essa solução de mobilidade turística.

Essa prática deve ser protegida e estimulada, carecendo apenas de ser levada a cabo com respeito pelo

meio ambiente e pelas zonas sensíveis do ponto de vista ambiental – as dunas, as falésias, as arribas, as

margens de rios e lagoas, por exemplo –, designadamente, as zonas integradas na Rede Natura 2000 e em

Zonas de Proteção Especial.

Não tem sido esta a realidade de há uns anos a esta parte, infelizmente, havendo relatos de desmandos

vários, com autocaravanas estacionadas em qualquer lugar, seja nas margens das águas interiores seja nas

praias, quando conseguem lá chegar. Quando não conseguem, fazem caravanismo selvagem em locais que

são de estacionamento para quem frequenta as praias.

Em muitos casos, com parques de campismo, áreas de serviço de autocaravanas e zonas de descarga de

autocaravanas a poucos quilómetros de distância.

A verdade é que o estacionamento abusivo de autocaravanas, para além do horário permitido e em locais

proibidos, acontece ao longo de todo o ano, principalmente na altura do Verão, o que terá ditado a aprovação e

publicação de dois diplomas:

⎯ Em 25 de maio de 2020, do Decreto-Lei n.º 24/2020, que regula o acesso, a ocupação e a utilização das

praias de banhos, cujo artigo 8.º, n.º 2, dispõe que «É interdita a permanência de autocaravanas ou similares

nos parques e zonas de estacionamento»;

⎯ Em 9 de dezembro de 2020, do Decreto-Lei n.º 102-B/2020, que alterou o Código da Estrada e legislação

complementar, e que aditou um artigo 50.º-A ao Código da Estrada, que proíbe o aparcamento (estacionamento

do veículo com ocupação de espaço superior ao seu perímetro) e a pernoita (permanência de autocaravana ou

similar no local de estacionamento, com ocupantes, entre as 21h00 de um dia e as 07h00 do dia seguinte).

Assim sendo, e desde janeiro de 2021, apenas é possível pernoitar no interior da autocaravana em locais

expressamente autorizados para o efeito. Fora desses locais, a pernoita está proibida, segundo as novas regras

do Código da Estrada, sob pena de coima de 60 a 300 euros, que passa para o dobro caso o aparcamento ou

a pernoita ocorram em Zona Natura 2000 ou área protegida.

Entende o CDS-PP que as restrições existentes relativamente às áreas protegidas não carecem de qualquer

ajustamento.

Já no que concerne à disciplina do estacionamento em geral, contudo, cremos ter sido criado um regime

excecional para as autocaravanas que parece ter pouca sustentação jurídica e, até, capaz de estar a roçar o

limiar da inconstitucionalidade.

No caso do Decreto-Lei n.º 24/2020, de 25 de maio, em particular, cremos até que o Governo está a legislar

numa matéria (a regulamentação do estacionamento) que é da competência das autarquias locais.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo

assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto e âmbito

A presente lei altera o regime legal do estacionamento e aparcamento de autocaravanas fora de áreas

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protegidas.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 24/2020, de 25 de maio

O artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 24/2020, de 25 de maio, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 8.º

(…)

1 – […].

2 – [Eliminado].

3 – Ao incumprimento do disposto no n.º 1 aplicam-se as coimas previstas nos regulamentos aplicáveis,

devendo a moldura da sanção ser sempre agravada para o dobro, sem prejuízo dos limites aplicáveis nos termos

gerais.

4 – […].»

Artigo 3.º

Alteração ao Código da Estrada

O artigo 50.º-A do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de maio, na sua redação

atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 50.º-A

Proibição de aparcamento de autocaravanas

1 – Sem prejuízo do disposto nos artigos 49.º e 50.º, é proibido o aparcamento de autocaravanas ou similares

fora dos locais expressamente autorizados para o efeito.

2 – Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se:

a) (…);

b) (…);

c) (Eliminado).

3 – […].»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de S. Bento, 13 de abril de 2021.

Os Deputados do CDS-PP: Telmo Correia — João Pinho de Almeida — Pedro Morais Soares — Cecília

Meireles — Ana Rita Bessa.

———

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II SÉRIE-A — NÚMERO 114

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1184/XIV/2.ª (3)

(RECOMENDA AO GOVERNO UM INVESTIMENTO ROBUSTO NA EDUCAÇÃO NO ÂMBITO DE UM

PLANO DE RECUPERAÇÃO DE APRENDIZAGENS E DO DESENVOLVIMENTO PESSOAL E SOCIAL

DOS ALUNOS)

Na primeira vaga, Portugal suspendeu as aulas presenciais a 16 de março e foi dos poucos países europeus

que manteve o ensino à distância até final do ano letivo, com exceção para a preparação de exames nacionais

para acesso ao Ensino Superior dos alunos do ensino secundário. Passado um ano, uma terceira vaga da

pandemia e um novo confinamento que atingiu as escolas, os nossos alunos foram dos que estiveram mais

tempo sem aulas presenciais.

Se a surpresa de uma pandemia inesperada justifica as dificuldades iniciais, as comunidades escolares e o

país assistiram com espanto à inação do Ministério da Educação na preparação do ano letivo 2020/21, deixando

às escolas a responsabilidade de elaborar os seus planos de contingência e estratégias de saúde pública sem

um reforço efetivo de recursos para assegurar, nomeadamente, a diminuição do número de alunos por turma, o

prolongamento dos horários das escolas e a recuperação das aprendizagens.

O estudo da OCDE em colaboração com a UNESCO, a UNICEF e o Banco Mundial, The state of school

education, one year into the COVID pandemic faz um retrato da situação em 30 países referente a 1 de fevereiro

de 2021. Portugal é identificado como um dos poucos países que não implementou medidas de fundo para

mitigar o impacto do encerramento das escolas na aprendizagem dos alunos. Ao contrário de Portugal, 86% dos

países incluídos no estudo já tinham avançado com medidas para o 5.º e 6.º anos de escolaridade, 75% já

tinham criado medidas para o 9.º ano e 73% para o ensino secundário. O Governo português apenas deu passos

no sentido de apurar o impacto do confinamento no ensino.

O preço a pagar pela suspensão do ensino presencial é demasiado alto. É por isso que o Bloco tem insistido

em propostas de preparação do ano letivo e nos esforços necessários para evitar fechar as escolas. O governo

ficou aquém. Nem todas as consequências serão irreversíveis, mas nada será como dantes. É desse princípio

que devemos partir. Os diagnósticos ainda são limitados e preliminares, mas os indícios são assustadores:

agravamento das desigualdades, perda de aprendizagens, atrasos no desenvolvimento, perda de competências,

degradação da saúde mental.

Segundo os resultados preliminares do estudo de diagnóstico promovido pelo IAVE, mais de 50% dos alunos

do 6.º e 9.º anos não conseguiram atingir os níveis esperados em três áreas: literacia matemática, literacia

científica, e literacia de leitura e informação. Os estudantes do 6.º ano são os mais afetados pelo ensino à

distância, enquanto os mais novos, do 3.º ano, tiveram mais facilidades em continuar a aprender em casa.

Um estudo realizado por uma equipa da Universidade de Coimbra, concluiu que a pandemia de COVID-19

teve «um significativo impacto negativo na saúde mental dos jovens portugueses, especialmente nos níveis de

depressão e de ansiedade».

Já o estudo promovido por uma equipa de investigadores da Nova School of Business and Economics alerta

para o aprofundamento das desigualdades sociais que se torna inevitável com o afastamento das crianças em

relação à escola, uma inevitabilidade quando 13% não têm a casa adequadamente aquecida e 9,2% não têm

luz suficiente no alojamento, enquanto 15,5% vive em alojamentos sobrelotados, 6,5% das crianças vivem numa

zona com crime, violência ou vandalismo e quase 13% em sítios com poluição, sujidade ou outros problemas

ambientais.

O reconhecimento dos profissionais da educação como linha da frente dos serviços essenciais foi um passo

importante no sentido certo, o regresso à escola presencial. Mas agora importa centrar esforços na recuperação

de competências sociais, emocionais e de aprendizagem perdidas desde o início da pandemia e, ao mesmo

tempo, planear o futuro da educação num cenário em que a pandemia não será erradicada de um momento

para outro.

O governo está ainda apostado em realizar um novo diagnóstico a partir das provas de aferição que já

estavam preparadas e reuniu um grupo multidisciplinar para apresentar recomendações.

Preparar a recuperação não é simplesmente planear a educação pós-pandemia, como parece ter sido desejo

do Governo no verão passado. Uma política de mínimos para enfrentar a crise máxima é, como vimos, um

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convite à inação. A outra vacina de que a escola pública precisa é o investimento.

O programa de recuperação que o País precisa tem de cumprir o desafio do Secretário-Geral da ONU e

aumentar substancialmente o investimento em educação. Tem de confiar nos professores e reforçar a escola

pública. Tem de chegar às aprendizagens, mas também à saúde mental e às competências emocionais, sociais

e físicas das crianças.

O próximo verão é essencial. Depois de um inverno de confinamento, a última coisa que as crianças precisam

é de passar o verão em casa ou em frente a um ecrã. Mais uma vez, é aqui que tudo se decide: as desigualdades

sociais podem ser agravadas ou contrariadas por políticas públicas.

O Governo deve reforçar a oferta de atividades lúdicas e desportivas durante as férias. Um programa nacional

para as férias de verão, financiado pelo Governo e impulsionado pelas autarquias em articulação com o

movimento associativo e as estruturas culturais e desportivas parte do reconhecimento de que o regresso a

atividades coletivas acompanhadas é essencial para mitigar o impacto do confinamento na saúde mental dos

jovens.

Essa aposta não dispensa, no entanto, o investimento em técnicos especializados nas escolas, numa ligação

estreita ao Programa Nacional para Saúde Mental, com reforço de profissionais e mais investimento na

educação inclusiva.

É preciso começar a atenuar o efeito da crise socioeconómica sobre os alunos e as suas famílias com um

reforço da Ação Social Escolar. Como revela o estudo «Crianças em Portugal e ensino a distância: um retrato»

(Nova SBE, Ambition Institute e ECARES) as condições socioeconómicas, as condições habitacionais e a

alimentação têm impacto no desempenho escolar e no agravamento dos problemas trazidos pelo ensino não-

presencial.

Para responder ao impacto da crise pandémica na educação, têm sido muitas as vozes que pedem

racionalização do currículo e flexibilização da avaliação. Esse tem sido também o alerta do Bloco de Esquerda:

é impossível que a escola faça o que tem a fazer se estiver focada numa impossível recuperação de programas

que já eram demasiado extensos antes da pandemia.

Não podemos ter uma escola a várias velocidades. Este é o tempo certo para começar uma revisão dos

currículos e dos programas que respeite o Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória e as

aprendizagens essenciais – que não são nem nunca podem ser confundidas com o primarismo conservador das

«disciplinas essenciais».

Este é também o tempo certo para levar a sério a proposta de redução do número de alunos por turma e

todas as medidas que promovam a personalização da educação, como os desdobramentos e as coadjuvações.

Se aceitamos o diagnóstico de que o impacto da pandemia é desigual, temos a obrigação de permitir que o

acompanhamento seja centrado nas necessidades de cada aluno.

Para cumprir este plano de recuperação, a Escola Pública precisa de mais profissionais. É necessário

reforçar de imediato o número de auxiliares nas escolas e contratar mais professores. As promessas de

rejuvenescimento e renovação do corpo docente feitas pelo Governo não têm passado de uma miragem. Para

o Partido Socialista parece que nunca é tempo para enfrentar este problema estrutural da escola pública.

Há 34 mil precários no sistema, há docentes que saíram do sistema. Se queremos um Programa de

Recuperação robusto, precisamos de todos. É preciso uma vinculação extraordinária de docentes e aprovar um

regime de incentivos a professores deslocados. Não se pode adiar o investimento de que as escolas tanto

precisam.

As escolas precisam de autonomia para identificar as necessidades e receber os recursos de que precisam,

sem as limitações de um regateio constante com o Ministério da Educação.

Todo este esforço impõe que o ano letivo comece logo no início de setembro. Esta antecipação do início das

aulas é essencial para que os alunos possam recuperar as aprendizagens em falta nos últimos anos letivos.

Seguindo o critério que foi aplicado a outros grupos profissionais de serviços essenciais, o acréscimo de trabalho

que a preparação do plano de recuperação e a antecipação do início do ano letivo representa deve dar lugar a

uma majoração de 50% sobre a remuneração correspondente a trabalho suplementar ou à possibilidade de

conversão desse trabalho suplementar em contabilização de tempo de serviço para efeitos de aposentação.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

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1 – Garanta que todas as Escolas têm autonomia e recursos para desenvolver os seus planos de

recuperação próprios, tendo em conta orientações nacionais, incluindo todos os docentes de que necessita,

reforçando os créditos horários atribuídos aos Agrupamentos de Escolas e Escolas não agrupadas para efeitos

de contratação inicial e o apoio aos professores deslocados;

2 – Promova a renovação e o rejuvenescimento do corpo docente para dar um novo impulso à Escola Pública

através de um concurso extraordinário de vinculação de professores;

3 – Inicie o próximo ano letivo logo no início de setembro, compensado o acréscimo de trabalho necessário

para preparação do plano de recuperação através de uma majoração de 50% sobre a remuneração

correspondente a trabalho suplementar ou através da possibilidade de conversão desse trabalho suplementar

em contabilização de tempo de serviço para efeitos de aposentação;

4 – Proceda à contratação imediata de auxiliares de acordo com as necessidades identificadas pelas

escolas;

5 – Proceda a uma adaptação curricular imediata, durante um período de transição até à conclusão da

revisão dos currículos, programas e manuais, reduzindo a dimensão da matéria a lecionar para centrar os

esforços na recuperação e consolidação das aprendizagens essenciais em cada ciclo de estudos, tendo em

conta o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória;

6 – Tome medidas para reduzir o impacto do confinamento na saúde mental e no desenvolvimento social e

psicológico das crianças e jovens, numa estreita ligação com o Plano Nacional para a Saúde Mental, e reforce

o investimento na Educação Inclusiva, contratando mais profissionais, ampliando recursos e expandindo as

unidades de apoio especializado;

7 – Crie um programa nacional de férias de verão, universal e gratuito, financiado pelo governo e

implementado pelas autarquias em articulação com as estruturas culturais e desportivas e o movimento

associativo;

8 – Reforce os apoios da Ação Social Escolar e reveja os critérios de acesso de forma a incluir mais

beneficiários, considerando as quebras de rendimentos mais abruptas motivadas pela crise socioeconómica e

alargando os apoios a mais escalões de rendimentos;

9 – Crie condições para um ensino mais personalizado, com a redução do número de alunos por turma, o

desdobramento de turmas, a coadjuvação em sala de aula e o desenvolvimento do trabalho interpares em

pequenos grupos de alunos.

Assembleia da República, 12 de abril de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Jorge Costa — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — João Vasconcelos —

José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

(3) O texto inicial foi substituído a pedido do autor da iniciativa a 12 de abril de 2021 [Vide DAR II Série-A n.º 111 (2021.04.07].

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1187/XIV/2.ª

(DESLOCAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA A ANDORRA)

Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas

A Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, nos termos constitucional e

regimentalmente aplicáveis, é favorável ao assentimento para ausência do território nacional, requerido por Sua

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Excelência o Presidente da República, tendo em vista a sua deslocação ao Principado de Andorra, nos dias 20

a 22 de abril de 2021, a fim de participar na XXVII Cimeira Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo.

Palácio de São Bento, 13 de abril de 2021.

O Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1194/XIV/2.ª

IMPLEMENTAÇÃO DE MEDIDAS NA ÁREA DAS DOENÇAS RARAS

De acordo com a Orphanet, o portal de referência para a informação sobre doenças raras e medicamentos

órfãos, «designam-se por doenças raras aquelas que afetam um pequeno número de pessoas quando

comparado com a população em geral e são levantadas questões especificas relativamente à sua raridade. Na

Europa, uma doença é considerada rara quando afeta 1 em 2.000 pessoas. Uma doença pode ser rara numa

região, mas comum noutra. (...)».

Atualmente, e segundo a mesmo fonte, são reconhecidas entre seis a sete mil doenças raras, mas todos os

dias surgem novas patologias com características raras, pelo que se torna complexo manter a informação

atualizada e, sobretudo, elaborar diagnósticos e prestar cuidados especializados e diferenciados aos portadores

destas doenças.

A Direção-Geral da Saúde (DGS) estima que «(...) existam entre 5 000 e 8 000 doenças raras diferentes,

afetando, no seu conjunto até 6% da população, o que extrapolando, significa que existirão até 600 000 pessoas

com estas patologias em Portugal. Acresce que, a maior parte destas pessoas sofre de doenças cuja prevalência

é inferior a 1 em 100 000 pessoas, ou seja, que afetam menos de 100 doentes no País. Porém, o peso social

das doenças raras atinge, para além dos doentes, os seus familiares e outros conviventes, especialmente

quando sofrem de doenças mais graves, incapacitantes ou difíceis de controlar. Conjugam-se, assim, fatores

desfavoráveis, como a raridade, a gravidade e a diversidade das doenças raras, que as tornam particularmente

pouco vulneráveis às intervenções do sector da saúde. Daí ter surgido a necessidade de serem lançadas

iniciativas específicas para o controlo destas doenças na comunidade. (...)»

Ainda relativamente às características e origens das doenças raras, refere a Orphanet que «enquanto a

maioria das doenças genéticas são raras, nem todas as doenças raras são causadas por alterações genéticas.

Existem por exemplo doenças infeciosas muito raras, bem como doenças autoimunes e cancros raros. Até ao

momento para muitas doenças raras, a causa permanece ainda desconhecida. As doenças raras são doenças

crónicas e progressivas graves, muitas vezes com risco de vida. Para muitas doenças raras, os sintomas podem

ser observados ao nascimento ou durante a infância (...). No entanto, mais de 50% das doenças raras

manifestam-se na idade adulta (...)».

Apesar disso, sabe-se que há uma grande percentagem que se manifesta precocemente, antes dos 2 anos

de idade. Importa, a este propósito, referir que as doenças raras serão responsáveis por cerca de 35% da

mortalidade em crianças com menos de 1 ano de idade. Sabe-se, também, que o diagnóstico e tratamento

atempados podem ser determinantes para um portador de uma doença rara.

Qualquer pessoa que se confronte com um diagnóstico de doença rara, seja como portador, seja na

qualidade de cuidador – mãe, pai, filho/a ou outro – deparar-se-á com um conjunto de questões para as quais

será difícil encontrar respostas. O portal da Orphanet, procura elencar e esclarecer algumas das dúvidas mais

recorrentes:

• «Quais são as consequências médicas e sociais da raridade destas doenças? O campo das doenças raras

sofre de um défice de conhecimentos médicos e científicos. Postas de parte durante muitos anos por médicos,

cientistas e políticos que não estavam conscientes das doenças raras e até muito recentemente não existiam

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programas políticos e de investigação científica no campo das doenças raras. Embora não haja um tratamento

específico para muitas delas, a existência de cuidados adequados pode melhorar a qualidade e a esperança de

vida dos doentes afetados e prolongar a sua esperança de vida.»

• «Os doentes afetados por estas doenças enfrentam dificuldades semelhantes na sua procura por um

diagnóstico, informação relevante e orientação adequada para profissionais qualificados. Questões específicas

são igualmente levantadas no acesso a cuidados de saúde de qualidade, apoio geral social e médico, ligação

efetiva entre os hospitais e centros de saúde, bem como na integração profissional e social e na independência.

As pessoas afetadas por doenças raras estão mais vulneráveis do ponto de vista psicológico, social, económico

e cultural. Estas dificuldades poderiam ser superadas pela existência de legislação adequada.»

• «Qual o progresso previsto para o diagnóstico e tratamento de doenças raras? Para todas as doenças raras,

a ciência consegue fornecer algumas respostas. Centenas de doenças raras podem agora ser diagnosticadas

através de um simples teste biológico. O conhecimento da história natural destas doenças é otimizado pela

criação de registos para algumas delas. Os investigadores estão cada vez mais a trabalhar através de redes, de

forma a partilharem os resultados da sua investigação e avançando mais eficientemente. São levantadas mais

esperanças com perspetivas oferecidas pelas legislações Europeia e nacionais (em muitos países Europeus)

no campo das doenças raras.»

Tal como noutras iniciativas legislativas apresentadas, o CDS-PP entende que uma sociedade só é

devidamente justa e solidária se incluir e considerar os cidadãos portadores de deficiência com a atenção que

merecem e se procurar desenvolver políticas globais e integradas que vão ao encontro dos seus direitos.

Entendemos que o mesmo se aplica, na íntegra, aos portadores de doenças raras.

O CDS-PP nunca abandonou os cidadãos com deficiência, procurando dar voz e defender aqueles que, pela

sua especial suscetibilidade, estão especialmente vulneráveis aos desafios quotidianos e ao desenvolvimento

integral da sua vida.

O mesmo temos vindo a fazer nos últimos treze anos relativamente às doenças raras, apresentando

iniciativas legislativas que pudessem trazer mais respostas a estas pessoas, mais qualidade de vida e mais

dignidade na doença. A título de exemplo, relembramos o Projeto de Resolução n.º 409/X, que apresentámos

em 2008, a recomendar ao Governo a criação do Cartão para Proteção Especial dos Portadores de Doença

Rara, aprovado por unanimidade, tendo dado origem à Resolução da Assembleia da República n.º 34/2009.

O CDS-PP orgulha-se que o Cartão da Pessoa com Doença Rara (CPDR) seja hoje uma realidade.

Orgulhamo-nos, também, que, através do Despacho n.º 2129-B/2015, de 26 de fevereiro, dos Gabinetes dos

Ministros da Saúde, da Educação e Ciência e da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, tenha sido

cumprido mais um compromisso do XIX Governo Constitucional, aprovando-se a Estratégia Integrada para as

Doenças Raras 2015-2020 tendo-se dado início, também, durante o Governo PSD/CDS-PP, ao processo de

identificação, aprovação e reconhecimento dos Centros de Referência Nacionais para Doenças Raras.

São passos muito importantes – determinantes – para estes doentes e para as suas famílias e cuidadores,

mas reconhecemos haver muito ainda por fazer.

A Estratégia Integrada para as Doenças Raras 2015-2020 é concretizada através de planos anuais de

operacionalização, publicados pela DGS (em fevereiro de 2016, fevereiro de 2017, março de 2018 e março de

2019). Estes planos são muito relevantes, pois permitem não só estabelecer as prioridades anuais, como

acompanhar a sua execução.

No entanto, estamos em abril de 2021 e não se conhece o plano anual para 2020 nem, tão pouco, os

Relatórios Intercalares sobre a Implementação da Estratégia Integrada para as Doenças Raras 2015-2020

relativos a 2019 e a 2020.

Não ignorando o tempo pandémico, o CDS-PP ainda assim considera ser preocupante este «abandono», até

porque, nas considerações finais do relatório intercalar anual relativo a 2018 – o último publicado – pode ler-se

que «(...) A ausência de orçamento específico alocado às atividades da Estratégia Integrada para as Doenças

Raras 2015-2020 e a impossibilidade de as entidades envolvidas poderem aceitar financiamento externo de

entidades privadas com fins lucrativos, é um dos maiores condicionantes da implementação dos planos anuais..»

Relativamente ao Cartão da Pessoa com Doença Rara, no Portal da Transparência do SNS só constam

dados relativos a 2016 e 2017. Fazendo uma pesquisa mais aprofundada, encontramos o Relatório Técnico

«Cartão da Pessoa com Doença Rara», do Departamento da Qualidade na Saúde, da DGS, onde se pode ler

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que «Em cumprimento da Norma da DGS n.º 01/2018, verificou-se que durante o ano 2019, foram emitidos 1065

Cartões de Pessoa com Doença Rara, podendo observar-se o registo de 411 doenças raras em 25 unidades de

consultas de especialidade médica.» Constata-se, também, que desde 2014 até 31 de dezembro de 2019 foram

«requisitados 7177 CPDR», mas que «Verifica-se uma ligeira diminuição do número de novos CPDR emitidos

em 2019 comparativamente ao ano 2018. Salienta-se que no ano 2017, a requisição do CPDR foi expandida a

todos os hospitais públicos e privados do Sistema de Saúde, bem como à RARISSIMAS, ficando cada instituição

responsável pela sua dinamização e implementação. (...) Quando se analisa a informação individualizada por

prestadores, observa-se que no ano 2019, os 1065 CPDR requisitados foram emitidos em 25 instituições, (...)

verificando-se que cerca de 85% dos CPDR foram requisitados por 5 instituições com Centros de Referência

para as seguintes áreas de doenças raras:

• Oncologia Pediátrica;

• Doenças Hereditárias do Metabolismo (incluindo as Doenças Lisossomais de Sobrecarga)

• Coagulopatias Congénitas;

• Fibrose Quística;

• Paramiloidose Familiar;

• Epilepsia Refratária;

• Onco-Oftalmologia;

Quando analisada a informação por doença, é possível constatar que no ano 2019 foram registadas 411

doenças raras nos novos cartões emitidos, correspondendo a 158 novas doenças codificadas.

A emissão de novo cartão pode, por vezes, estar associada à atualização do diagnóstico preliminar para um

diagnóstico mais preciso, correspondente a uma designação atualizada da doença rara, diferente da inicial.

As doenças raras com mais CPDR requisitados foram a Fenilcetonúria, Fibrose Quística e ainda Hemofilia A

grave e Hemofilia A ligeira (...)».

No entanto, este relatório – publicado em setembro de 2020 – é relativo a 2019. Ora, não se compreende por

que motivo em abril de 2021 ainda não estejam disponibilizados dados mais recentes. Mais ainda porque,

conforme é referido nas conclusões deste relatório «(...) Apesar dos hospitais com Centros de Referência para

doenças raras serem as instituições que maior número de CPDR emitem, existe a necessidade de continuar a

divulgar a existência deste instrumento em todas as consultas de especialidade, pois as doenças raras são

transversais a todo o país, a todas as faixas etárias e o acesso a cuidados de emergência ajustados à doença

rara pode ocorrer em qualquer serviço de urgência.

Para o ano de 2020, como forma de aumentar a utilidade e difusão do CPDR, mantêm-se propostos pela

DGS os seguintes desenvolvimentos a implementar pelos SPMS:

• Garantir que o CPDR, é visualizado nos sistemas de informação das urgências dos hospitais no momento

da triagem, com o objetivo de assegurar que, nas situações de urgência e/ou emergência, os profissionais de

saúde tenham acesso rápido à informação relevante da pessoa com doença rara, à especificidade da sua

situação clínica e aos cuidados clínicos a ter devido à raridade da sua doença;

• Integrar atualizações dos códigos Orpha, de forma automatizada, disponibilizadas pela Orphanet;

• Criação e disponibilização de um vídeo ilustrativo do processo de visualização (profissional de saúde e

utente) e requisição (médico hospitalar) do CPDR.

• Analisar internamente a possibilidade de disponibilizar o CPDR via Registo de Saúde Eletrónico.»

É, assim, determinante saber o ponto de situação, se estes objetivos foram desenvolvidos e até que ponto a

pandemia de COVID-19 afetou, também, o seu cumprimento.

O desenvolvimento do registo nacional de doenças raras é outra das áreas de preocupação.

Sabe-se que a falta de interoperabilidade entre as várias bases de dados, intra e inter unidades de saúde do

SNS, continua a ser um grande entrave. Uma vez que as doenças raras são, precisamente pela sua raridade,

de baixa prevalência, a partilha de dados entre hospitais, centros de referência e biobancos é determinante tanto

para o mapeamento geográfico das doenças, como para a investigação. Acresce que um registo nacional

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devidamente aplicado em Portugal é essencial para que possamos integrar eficazmente a rede europeia de

referência e o registo europeu de doenças raras.

No que diz respeito ao acesso a Cuidados Continuados Integrados para pessoas com doenças raras, a

informação que nos chega é que a Rede Nacional não tem resposta adequada nem suficiente e que é preciso

dotá-la de recursos humanos e materiais para que os portadores de doenças raras possam ter acesso a vagas

para institucionalização quando não houver alternativa garantindo-se, assim, a estes doentes os cuidados

adequados, ou o acesso a apoio domiciliário sempre que se justifique.

A maioria das doenças raras são tratadas com recurso a medicamentos órfãos. Conforme o CDS-PP tem

vindo a alertar, o acesso a estes medicamentos tem de ser agilizado e é preciso, também, tomar medidas que

assegurem a estes doentes o acesso a estes medicamentos no domicílio. Sendo certo que a pandemia de

COVID-19 veio acelerar o processo de dispensa e entrega de medicamentos em proximidade, há muitos doentes

que não conseguem que lhes seja facultado este acesso, continuando a ter de se deslocar (ou os seus

cuidadores), por vezes centenas de quilómetros, para poder levantar a medicação na farmácia hospitalar.

E tem de ser verdadeiramente incentivada, no nosso País, a investigação clínica e a inovação, também na

área das doenças raras.

Por fim, a Estratégia Integrada para as Doenças Raras, que terminou em 2020, estará a ser revista e

atualizada pela DGS, estabelecendo metas e objetivos até 2030, mas o CDS-PP considera determinante que

seja disponibilizada uma avaliação do que feito até 2020 e que seja realizado um debate público alargado sobre

a nova Estratégia para 2030.

Recordamos que se o diagnóstico de uma doença rara tem um impacto tremendo num adulto, numa criança

pode ser – atrevemo-nos a afirmar que é – ainda mais doloroso e difícil de aceitar, em particular para o seu

agregado familiar. Pais, irmãos, avós são confrontados com um choque e sofrimento inimagináveis, que se

agravam perante o desconhecido. Uma doença sobre a qual, por ser rara, pouco se sabe, poucos tratamentos

existirão e o prognóstico será, também, uma dúvida permanente nas vidas destas famílias. Aliado ao sofrimento,

o sentimento de impotência e a falta de respostas a diversos níveis crescem a cada dia que passa.

É dever do Estado atender a estas famílias e é obrigação do Parlamento dar-lhes voz e soluções,

promovendo iniciativas legislativas que despertem o Governo para a relevância e urgência destas matérias e

para a necessidade de agir rápida e eficazmente em defesa dos portadores de doenças raras.

Pelo exposto, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo

Parlamentar do CDS-PP abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de resolução:

A Assembleia da República recomenda ao Governo a implementação das seguintes medidas na área das

doenças raras que:

1 – Dote os atuais Centros de Referência dos meios humanos e tecnológicos para o cabal desempenho

das suas funções altamente diferenciadas, assegurando a divulgação pública e periódica dos seus índices de

qualidade assistencial.

2 – Proporcione maior apoio às atividades de investigação clínica e à divulgação científica do trabalho

destes Centros de Referência e crie incentivos à inclusão dos Centros de Referência para Doenças Raras em

ensaios clínicos devidamente autorizados pelo INFARMED, I.P.

3 – Fomente a articulação permanente entre os Centros de Referência para Doenças Raras e as redes de

referência europeias.

4 – Conclua o registo nacional de doenças raras, generalizando a sua aplicação.

5 – Modernize o Cartão da Pessoa com Doença Rara, aumente e agilize a sua atribuição a quem é elegível

e assegure o seu valor prático através da sua leitura em todas as unidades de saúde.

6 – Promova a emissão, pela Direção-Geral da Saúde, de Normas de Orientação Clínica destinadas

particularmente a cada doença rara.

7 – Disponibilize em todos os serviços hospitalares do Serviço Nacional de Saúde e em todos os centros

de saúde, informação organizada sobre os direitos sociais e sobre o apoio clínico disponíveis para os portadores

de doença rara e seus cuidadores, a facultar aquando da realização de tratamentos, de internamento e no

seguimento clínico destes doentes.

8 – Reforce a criação e ampla divulgação de media digitais que, em colaboração com as associações de

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doenças raras, visem esclarecer os cuidadores de portadores de doença rara, à luz do conhecimento científico

existente, sobre os padrões de evolução da doença, bem como o tipo de apoios de que poderão beneficiar.

9 – Reforce a contratualização com as instituições das Redes Nacional de Cuidados Continuados

Integrados e de Cuidados Paliativos, para internamento e/ou apoio domiciliário para portador de doença rara, e

para descanso do cuidador, de acordo com as possibilidades.

10 – Disponibilize informação detalhada e atualizada relativamente à avaliação da Estratégia Integrada para

as Doenças Raras 2015-2020 e promova um debate público alargado relativamente à nova Estratégia para

2030.

Palácio de São Bento, 12 de abril de 2021.

Os Deputados do CDS-PP: Ana Rita Bessa — Telmo Correia — Cecília Meireles — João Pinho de Almeida

— Pedro Morais Soares.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1195/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A TESTAGEM MASSIVA, RECORRENTE E PRIORITÁRIA DOS

PROFISSIONAIS CUJA ATIVIDADE OBRIGUE A CONTACTO PERMANENTE COM O PÚBLICO

Perante a evidência de que o ritmo de vacinação não supera o ritmo de propagação do vírus e que a

imunidade de grupo, a solução mais óbvia para travar a pandemia, está ainda longe de ser alcançada, é

consensual na comunidade científica de que a estratégia para desconfinar terá de passar pela testagem massiva

da população.

Manter o confinamento garantiria o controlo mais eficaz da pandemia, mas é uma solução irrealista,

considerando os danos socioeconómicos associados, alguns deles já irreparáveis fruto de dois períodos de

confinamento geral. É, por isso, necessário garantir que o desconfinamento é realizado com eficácia máxima,

de forma a não ser necessário voltar a travar a fundo a economia e a «encerrar» o País. Tal eficácia depende,

não só de um elevado número de testes, como do consequente rastreio em tempo útil (nas 24 horas seguintes)

de todos os contactos de alto, médio e baixo risco dos casos positivos, de forma a identificar toda a cadeia de

transmissão e isolá-la, impedindo a sua propagação.

Apesar de na mensagem política associada ao desconfinamento ter sido demonstrada sempre a consciência

da importância da testagem massiva, os números efetivos dos testes realizados não confirmam essa

consciência. Se, no pico da pandemia, Portugal chegou a realizar mais de 65 mil testes por dia, e foi sempre

dito que teria condições para testar mais, após o desconfinamento, entre o final de março e a primeira semana

de abril, o número de testes caiu a pique para entre 12 a 20 mil pessoas por dia, somando testes PCR e

antigénio.

A 10 de fevereiro, a ministra da Saúde anunciou a intenção de iniciar a testagem massiva da população e

dois dias depois a Direção Geral de Saúde (DGS) publicou uma atualização à norma 019/2020 que alarga a

testagem ao SARS-CoV-2 a todos os contactos, incluindo a realização de testes moleculares aos de baixo risco

«no momento da identificação» do contacto, o que permitiria dar seguimento aquela que tem sido sempre a

posição defendida pelo PSD: «é necessário testar, testar e isolar».

As mesmas indicações da DGS de fevereiro previam também a testagem em massa em determinados

«contextos ocupacionais de elevada exposição social», como por exemplo em fábricas e na construção civil1.

Dois meses depois, essa testagem massiva ainda não aconteceu, nem na comunidade geral nem em grupos

concretos identificados, tendo Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção

Civil e Obras Públicas (AICCOPN), chegado a classificar a testagem em massa na construção civil como «uma

1 https://covid19.min-saude.pt/direcao-geral-da-saude-atualiza-estrategia-nacional-de-testes/

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miragem»2.

No dia 6 de abril (último dia de que há registos comparáveis com os restantes países europeus a referir),

Portugal registava uma média dos últimos sete dias de 3.03 testes por cada mil habitantes, quando a Itália

registava 4.41 testes, a Bélgica, 4.25 testes por cada mil habitantes e o Reino Unido, no topo da lista, realizava

mais de 12.3 testes por cada mil habitantes por dia (apesar de estar a atingir a imunidade de grupo)3.

O Grupo Parlamentar do PSD considera que esta realidade, que será mascarada nos próximos dias pelos

números da testagem da comunidade educativa, traduz um relaxamento do Estado em relação a uma daquelas

que devem ser as suas duas grandes preocupações neste momento: testar (eficazmente) e vacinar.

De notar que o simples aumento do número de testes não representa um comportamento mais responsável

ou um maior combate à propagação do vírus. Se a ação posterior à identificação dos casos positivos não for

consequente e em tempo útil, os testes resultam inúteis. Contudo, números baixos de testagem traduzem

diretamente números baixos de casos identificados e, por isso, fraco controlo da propagação, o que compromete

gravemente a estratégia de desconfinamento em conformidade com a proteção da Saúde Pública.

Existem profissionais que, pela natureza das suas funções, estão sujeitos a um maior risco de contágio e,

naturalmente, de serem hospedeiros e transmissores do mesmo para terceiros. Este é o caso, para além dos

operadores de fábricas e trabalhadores da construção civil, dos operadores de supermercado ou de estações

de serviço, condutores de transportes públicos ou prestadores de serviços públicos presenciais que, durante a

pandemia, nunca pararam; como também é o caso dos trabalhadores de comércio, restauração, ginásios,

monumentos e todos as atividades que estão e vão ser reativadas nas diferentes fases de desconfinamento.

O Grupo Parlamentar do PSD, preocupado sobretudo com o cumprimento do objetivo máximo de prevenir a

propagação do vírus, considera que seria da maior relevância que sejam identificados os grupos prioritários a

testar e se proceda a um plano de testagem massiva e recorrente, de forma organizada e segura.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PSD

propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo:

1 – Proceda à testagem massiva prioritária de todos os profissionais não vacinados e cuja atividade os

obrigue a contacto permanente com o público, e que dê o eficaz seguimento aos casos positivos, identificando

e isolando, de forma a travar as suas cadeias de transmissão;

2 – Concretize um plano de testagem que preveja a recorrência periódica de testagem dos grupos

profissionais incluídos na previsão do número anterior.

Palácio de S. Bento, 12 de abril de 2021.

Os Deputados do PSD: Adão Silva — Ricardo Baptista Leite — António Maló de Abreu — Sandra Pereira —

Rui Cristina — Álvaro Almeida — Ana Miguel dos Santos — António Cunha — Artur Soveral Andrade — Bruno

Coimbra — Carlos Eduardo Reis — Cláudia Bento — Cristóvão Norte — Fernanda Velez — Helga Correia —

Hugo Patrício Oliveira — Mónica Quintela — Sara Madruga da Costa.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1196/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROTEJA A SERRA DE CARNAXIDE

A Serra de Carnaxide, localizada entre a serra de Sintra e o Parque Florestal de Monsanto, é uma importante

área natural da região de Lisboa e que se encontra ameaçada pela expansão urbana. Possui cerca de 600

2 https://www.msn.com/pt-pt/financas/casas/covid-19-testagem-em-massa-na-constru%C3%A7%C3%A3o-%C3%A9-uma-miragem-mas-

fiscaliza%C3%A7%C3%A3o-vai-apertar/ar-BB1fsyYT?li=BBoPRml 3 Fonte: Our World in Data - https://ourworldindata.org/coronavirus/country/portugal

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13 DE ABRIL DE 2021

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hectares e encontra-se na interceção dos municípios de Oeiras, Amadora e Sintra. A sua maior elevação atinge

os 211 metros, existindo outras colinas mais suaves, sendo uma formação geológica ainda integrante do

complexo vulcânico de Lisboa.

A área florestal merece destaque pela sua extensão e por integrar uma grande diversidade de espécies como

o Sobreiro (Quercus suber), o Zambujeiro (Olea europae), o Carvalho-cerquinho (Quercus faginea) e o Freixo

(Fraxinus angustifólia). Ao nível da flora, levantamentos efetuados identificaram a ocorrência de 237 espécies,

destacando-se a presença da Armeria pseudoarmeria, espécie endémica com estatuto de conservação

«Vulnerável». Em termos de fauna, destaca-se a importância desta área enquanto habitat de muitas espécies

de aves, com destaque para o Falcão-peregrino.

Outra grande riqueza deste território são os recursos hídricos subterrâneos, que serviram inclusivamente

para abastecer Lisboa através do aqueduto das Águas Livres. As nascentes que existiam na serra foram

captadas através de um ramal conhecido por aqueduto das Francesas, construído no subsolo com a extensão

de 4200 metros, trazendo a água por gravidade até à Buraca, onde se ligava ao aqueduto geral. Foi também

construído o aqueduto de Carnaxide, com 600 metros de comprimento, e que levava a água até povoado, junto

à igreja, servindo a população local. A construção destas duas estruturas iniciou-se meados do século XVIII e

são património da maior importância histórica e cultural. Ainda se conseguem percorrer ambas as galerias

subterrâneas e à superfície, na serra, são observáveis as mães de água e os respiradouros que permitiam a sua

ventilação. Os recursos hídricos continuam abundantes, mas dependem da capacidade de infiltração dos solos

e de se conseguir evitar a sua impermeabilização.

O aqueduto de Carnaxide encontra-se classificado enquanto Monumento de Interesse Público (Portaria n.º

119/2013, DR, 2.ª série, n.º 48, de 8-03-2013) e o aqueduto das Francesas está classificado como Monumento

Nacional (fazendo parte do aqueduto das Águas Livres, seus aferentes e correlacionados – Concelhos de

Lisboa, Amadora, Odivelas, Oeiras e Sintra – Decreto n.º 5/2002, DR, I Série-B. n.º 42, de 19-02-2002). Contudo,

já passaram cerca de 20 anos sobre esta classificação e a galeria das Francesas tem estado sujeita a grandes

pressões urbanísticas ao longo do seu traçado, carecendo de revisão e atualização.

A serra de Carnaxide enquanto área verde contribui também para a qualidade do ar e para a regulação da

temperatura, num contexto territorial cada vez mais urbanizado. A pressão imobiliária tem crescido em toda a

zona envolvente, ao abrigo dos próprios instrumentos de gestão territorial, como sejam os Planos Diretores

Municipais de Amadora, Oeiras e Sintra. No cimo da serra foram aprovadas grandes áreas de urbanização, com

destaque para os empreendimentos «Marconi Parque» e «Sky City», que irão provocar a fragmentação dos

habitats e impermeabilizar os solos, com impacto nas condições hidrológicas. Se nada for feito para travar as

intenções imobiliárias, em poucas décadas a serra de Carnaxide será destruída, perdendo-se as suas valências

ambientais e patrimoniais.

A preocupação com este território levou um grupo de cidadãos a criarem um movimento cívico pela

preservação da serra de Carnaxide. Apresentaram à Assembleia da República, a 15 de setembro de 2020, a

Petição n.º 140/XIV/2.ª Preservar a Serra de Carnaxide, com 5031 signatários, tendo baixado à Comissão de

Ambiente, Energia e Ordenamento do Território. A 10 de dezembro de 2020 os peticionários foram ouvidos em

audição. Diversas associações de defesa do ambiente de âmbito nacional mobilizaram-se também por esta

causa, procurando chamar a atenção para o problema e para a necessidade de se reverem os instrumentos de

planeamento em vigor.

A solução para a preservação da serra de Carnaxide passa pelo reconhecimento do seu valor ecológico e

patrimonial, com a consequente classificação legal.

Face do Decreto-Lei n.º 142/2008, de 24 de julho, que estabelece o regime jurídico da conservação da

natureza e da biodiversidade existem duas alternativas quanto ao âmbito de classificação: área protegida de

âmbito nacional que pode ser proposta pela autoridade nacional ou por quaisquer entidades públicas ou privadas

(Artigo 14.º) ou área protegida de âmbito regional ou local sob proposta de municípios e/ou associações de

municípios (Artigo 15.º).

Contudo, e considerando que tem havido dificuldades por parte destas autarquias em protegerem a serra de

Carnaxide, licenciando até projetos imobiliários que vão em sentido contrário e irão promover a sua degradação,

considera-se menos viável e efetivo este caminho de classificação de âmbito local ou regional. Faz mais sentido

ser a autoridade nacional, em concreto o Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, sob tutela

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do Ministério do Ambiente e Ação Climática, a desencadear a sua classificação legal. No entanto, se existirem

mudanças de posição e se as autarquias da Amadora, Oeiras e Sintra decidirem concertar posições para

proteção desta serra de Carnaxide, então fará sentido avançar numa lógica de área protegida de âmbito regional.

Em termos de estatuto de conservação, considera-se também que fará sentido avançar para a sua

classificação enquanto «Paisagem protegida», ao abrigo do artigo 19.º, que estipula:

1 – Entende-se por «paisagem protegida» uma área que contenha paisagens resultantes da interação

harmoniosa do ser humano e da natureza, e que evidenciem grande valor estético, ecológico ou cultural.

2 – A classificação de uma paisagem protegida visa a proteção dos valores naturais e culturais existentes,

realçando a identidade local, e a adoção de medidas compatíveis com os objetivos da sua classificação,

designadamente:

a) A conservação dos elementos da biodiversidade num contexto da valorização da paisagem;

b) A manutenção ou recuperação dos padrões da paisagem e dos processos ecológicos que lhe estão

subjacentes, promovendo as práticas tradicionais de uso do solo, os métodos de construção e as manifestações

sociais e culturais.

A serra de Carnaxide enquadra-se perfeitamente nesta categoria de área protegida, a sua paisagem resulta

de uma interação equilibrada entre o homem e os recursos naturais, sendo os dois aquedutos – Francesas e

Carnaxide – elementos históricos e culturais que demonstram as práticas tradicionais de captação e condução

de água. Estas construções do século XVIII são uma marca da paisagem, num espaço natural também cada

vez mais procurado para atividades de lazer, para observação de aves, para caminhadas em trilhos de grande

beleza, com o estuário do Tejo em pano de fundo.

Assim, vem o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, nos termos da Constituição e do Regimento

da Assembleia da República, recomendar ao Governo que:

1 – Promova a classificação da Serra de Carnaxide como área protegida de âmbito nacional ou regional, com

o estatuto de conservação de «Paisagem Protegida», devendo o ICNF desenvolver os procedimentos técnicos

subjacentes ao processo de classificação ou de apoio à concertação entre autarquias neste mesmo sentido.

2 – Implemente uma estratégia de corredores verdes para promover a conetividade ecológica entre a serra

de Carnaxide, a serra de Sintra, a serra da Carregueira e o Parque Florestal de Monsanto.

3 – Reveja e reforce o estatuto de proteção legal que incide sobre os aquedutos de Carnaxide e das

Francesas, de modo a evitar a sua destruição, devendo ser desenvolvidos esforços para a sua recuperação

efetiva.

4 – Aumente a fiscalização sobre a serra de Carnaxide para combater atividades que possam provocar danos

ambientais, considerando o descarte de resíduos urbanos e de resíduos de construção, a caça ilegal e a

circulação em veículos motorizados com impacto sobre os habitats.

Palácio de São Bento, 12 de abril de 2021.

Os Deputados do PSD: Luís Leite Ramos — Bruno Coimbra — Hugo Martins de Carvalho — Filipa Roseta

— Paulo Leitão — Nuno Miguel Carvalho — Hugo Patrício Oliveira — João Moura — Rui Cristina — António

Maló de Abreu — António Lima Costa — António Topa — João Gomes Marques — José Silvano — Emídio

Guerreiro — Pedro Pinto.

———

Página 53

13 DE ABRIL DE 2021

53

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1197/XIV/2.ª

PELA INCLUSÃO DE MEDIDAS PARA A MELHORIA DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO DA

BIODIVERSIDADE NOS PLANOS DE COGESTÃO DAS ÁREAS PROTEGIDAS

O processo de descentralização de competências incluiu a possibilidade de as autarquias assumirem

competências na gestão de áreas protegidas, até aqui geridas pelo Estado central. É conhecida a posição

contrária do Bloco de Esquerda sobre o processo de descentralização de competências e, em particular, também

em relação a estas áreas. A desresponsabilização do Estado central, a possibilidade de suborçamentação, a

permeabilidade aos interesses imobiliários e a gestão assente apenas em critérios locais são algumas das

preocupações em relação a este processo. O Bloco de Esquerda mantém a sua oposição ao processo de

descentralização.

Um projeto piloto de cogestão foi implementado em 2017 no Parque Natural do Tejo Internacional. Desde

então, o Ministério do Ambiente anunciou ser sua intenção alargar o modelo a todas as áreas protegidas do

país. Cinco áreas protegidas estão já em regime de cogestão. O Governo procedeu à descentralização da gestão

do Parque Natural da Serra de São Mamede (localizado nos municípios de Arronches, Castelo de Vide,

Portalegre e Marvão), da Reserva Natural das Dunas de São Jacinto (Aveiro), do Parque Natural do Alvão

(Mondim de Basto e Vila Real), do Parque Natural do Litoral Norte (Esposende) e do Parque Nacional da Peneda

Gerês (Arcos de Valdevez, Melgaço, Ponte da Barca, Terras de Bouro e Montalegre). Todas as comissões de

cogestão, entretanto formalizadas, são presididas, respetivamente, pelos presidentes das câmaras municipais

de Castelo de Vide, Aveiro, Mondim de Basto, Esposende e Arcos de Valdevez.

Os piores receios sobre o processo de cogestão das áreas protegidas foram confirmados com a publicação

pelo Governo da Portaria n.º 67/2021, de 17 de março, que «aprova o conjunto mínimo obrigatório de indicadores

de realização a integrar nos planos de cogestão das áreas protegidas». Com efeito, a portaria ignora qualquer

critério ou objetivo de conservação da natureza e apenas introduz objetivos de cariz turístico à cogestão das

áreas protegidas. O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta este projeto de resolução para garantir

a alteração da Portaria n.º 67/2021, de 17 de março, e assegurar a efetiva proteção ambiental e ecológica das

áreas protegidas.

A desproteção das áreas protegidas

A Rede Nacional de Áreas Protegidas (RNAP) abrange atualmente cerca de 793 mil hectares de área

terrestre e marinha (536 quilómetros quadrados), totalizando 9 por cento do território continental. São 47 áreas

protegidas, 32 das quais de âmbito nacional, 14 de âmbito regional ou local e uma área protegida privada. As

tipologias dividem-se em parque nacional (1), parques naturais (14), reservas naturais (12), paisagens

protegidas (13) e monumentos naturais (7). Além da RNAP, existem ainda as áreas designadas no âmbito da

Diretiva Habitats e da Diretiva Aves, que compõem a Rede Natura 2000, e as áreas classificadas ao abrigo de

compromissos internacionais, designadamente os Sítios Ramsar, as Reservas da Biosfera da UNESCO, entre

outras. Apesar da diversidade e número de áreas classificadas em Portugal, o país está ainda muito longe da

meta de proteger 30 por cento de áreas marinhas e costeiras sob jurisdição nacional até 2030, conforme consta

da Resolução do Conselho de Ministros n.º 143/2019, de 29 de agosto.

O aumento do número e extensão das áreas protegidas terrestres e marinhas no país reveste-se da maior

importância num contexto de crise climática e de perda acelerada de biodiversidade quer a nível nacional, quer

a nível global. Mas mais e maiores áreas protegidas, por si só, não basta. Muitas das nossas áreas protegidas

carecem de programas de execução dos seus programas especiais, bem como dos meios humanos, técnicos e

financeiros para os concretizar. A efetiva proteção, conservação e recuperação de ecossistemas, habitats e

espécies, nomeadamente os que integram as áreas protegidas, está muito longe de ser realidade no País.

O estado de conservação da biodiversidade em Portugal tem vindo a degradar-se. Apesar de a informação

ser escassa – dada a falta crónica de ações de monitorização e de estudos sobre os nossos sistemas ecológicos

–, Portugal é hoje o segundo país da Europa com mais espécies de mamíferos e plantas em perigo de extinção,

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II SÉRIE-A — NÚMERO 114

54

segundo a atualização de 2020 da Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza

(UICN). Na mesma linha, o último relatório da Agência Europeia do Ambiente sobre o estado dos habitats e

espécies da Rede Natura 2000 mostra que Portugal é o país da União Europeia com a maior percentagem de

habitats com estatuto de conservação desfavorável cuja tendência é de deterioração.

Neste panorama de grave perda de biodiversidade no país, o Governo publicou recentemente a Portaria n.º

67/2021. Entre os indicadores a calcular para «a monitorização do estado da arte da concretização da cogestão

das diferentes áreas protegidas» estão indicadores relevantes de educação e sensibilização ambiental, mas

também indicadores para medir a capacidade turística e a afluência a áreas protegidas como o número de portas

de entrada, infraestruturas de lazer e visitação, novas atividades e produtos, e projetos de inovação. Apesar de

não serem conhecidas medidas e ações estruturantes para a proteção, conservação, recuperação e

monitorização dos habitats e espécies da RNAP, o Governo inverte prioridades e decide promover o turismo e

a visitação nas áreas protegidas através dos planos de cogestão.

Com a recente Portaria n.º 67/2021, o Governo mostra entender a valorização dos habitats e espécies do

território continental não a partir da melhoria do estado de conservação da biodiversidade, mas através da

mercantilização desta, do aumento do seu valor económico e da sua atratividade turística, ainda que essa seja

uma estratégia condenada à partida, pelo seu curto prazo. Sem biodiversidade em bom estado de conservação

e em acelerada tendência de degradação, os visitantes nacionais e estrangeiros das áreas protegidas não terão

o que visitar.

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda considera urgente a melhoria do estado de conservação dos

ecossistemas, habitats e espécies do nosso território através do planeamento e da respetiva concretização de

medidas de proteção, conservação, recuperação e monitorização da biodiversidade. Recentemente, o Governo

aprovou, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 29/2021, de 22 de março, um pequeno conjunto

de projetos de restauro de habitats naturais que vai na direção certa para que a biodiversidade das nossas áreas

protegidas recupere. Mas esta é apenas uma ínfima fração do que é necessário fazer. Faltam os programas de

execução dos programas especiais de todas as áreas protegidas, bem como os respetivos meios humanos,

técnicos e financeiros para os concretizar. Falta ainda inverter prioridades e utilizar os planos de cogestão como

instrumentos que priorizam a conservação da biodiversidade, a educação e sensibilização ambiental e a

proximidade das cidadãs e cidadãos à natureza, ao invés de utilizá-los como mais um instrumento que fomenta

a monocultura do turismo no nosso País.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Altere o estipulado pela Portaria n.º 67/2021, de 17 de março, nomeadamente, definindo:

a) Como prioridade dos planos de cogestão das áreas protegidas o planeamento de ações de proteção,

conservação, recuperação e monitorização da biodiversidade;

b) Um conjunto mínimo obrigatório de indicadores de realização a integrar nos planos de cogestão das áreas

protegidas que permita comparar a situação do momento com a situação de referência anterior à execução de

medidas e ações previstas no âmbito da alínea anterior.

2 – Elabore e concretize, com caráter de urgência, os programas de execução dos programas especiais das

áreas protegidas, bem como os planos de gestão para todos os Sítios de Importância Comunitária da Rede

Natura 2000 em Portugal;

3 – Dote as entidades competentes em matéria de conservação da natureza e da biodiversidade de meios

humanos, técnicos e financeiros suficientes para levarem a cabo as ações de proteção, conservação,

recuperação e monitorização da biodiversidade necessárias para travar a degradação do estado de conservação

de habitats e espécies nas áreas protegidas do País.

Assembleia da República, 13 de abril de 2021.

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As Deputadas e os Deputados do BE: Nelson Peralta — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge

Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua —

João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro —

Maria Manuel Rola — Moisés Ferreira — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1198/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO O CUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO LABORAL NA CONCESSÃO DOS

SERVIÇOS DE IMAGIOLOGIA NA UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DO ALTO MINHO

Os Serviços de Imagiologia da Unidade Local de Saúde do Alto Minho (ULSAM, EPE) desempenham com

dedicação e esforço as atividades de saúde em todo o distrito de Viana do Castelo prestando um apoio essencial

a uma população de 200 mil habitantes com um rápido atendimento aos utentes que necessitem destas

especialidades.

Tais serviços encontram-se concessionados desde 2004 com o objetivo de obter ganhos notórios na

eficiência e na qualidade do serviço prestado com capacidade de resposta célere no atendimento aos utentes,

reparação e manutenção de equipamentos e disponibilização de meios humanos com qualificação e

especialidades.

Apesar de entendermos que a concessão de um serviço a privados é coerente numa situação hospitalar

desde que produza benefícios ao nível da gestão operacional e da estabilidade do cuidado aos utentes, várias

denúncias têm sido realizadas, muitas das quais são públicas nos órgãos de comunicação social, dando conta

da existência de casos de funcionários a desempenhar funções diárias de carácter efetivo com contratos de

prestação de serviços (falsos recibos verdes) e colaboradores que viram cessados os seus contratos de trabalho

para iniciar um novo contrato no dia seguinte, sendo que alguns que questionaram tal irregularidades foram

dispensados das suas atividades.

A Iniciativa Liberal entende que o Estado deve cumprir e fazer cumprir a lei nos contratos realizados com

entidades externas e ser um exemplo para a sociedade, nomeadamente a Lei n.º 63/2013 de 27 de agosto –

Instituição de mecanismos de combate à utilização indevida do contrato de prestação de serviços em relações

de trabalho subordinado – e o Código do Trabalho, nos seus artigos 143.º e 145.º.

O artigo 143.º impede, em caso de cessação de contrato de trabalho a termo por motivo não imputável ao

trabalhador, a nova admissão ou afetação do trabalhador através de contrato de trabalho a termo ou de trabalho

temporário cuja execução se concretize no mesmo posto de trabalho, ou ainda de contrato de prestação de

serviços para o mesmo objeto. O artigo 145.º estabelece que até 30 dias após a cessação do contrato, o

trabalhador tem, em igualdade de condições, preferência na celebração de contrato sem termo, sempre que o

empregador proceda a recrutamento externo para o exercício de funções idênticas àquelas para que foi

contratado.

Assim, tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento

da Assembleia da República, o Deputado único abaixo assinado da Iniciativa Liberal apresenta o seguinte projeto

de resolução:

Resolução

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera

recomendar ao Governo que garanta o:

1 – O cumprimento da Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto por parte da empresa que detém a concessão do

serviço de Imagiologia da ULSAM;

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2 – O cumprimento dos artigos n.º 143 e n.º 145 do Código do trabalho por parte da empresa que detém a

concessão do serviço de Imagiologia da ULSAM.

Palácio de São Bento, 13 de abril de 2021.

O Deputado do IL, João Cotrim de Figueiredo.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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