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Segunda-feira, 28 de junho de 2021 II Série-A — Número 159
XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)
S U M Á R I O
Decreto da Assembleia da República n.º 157/XIV: (a) N.º 157/XIV — Alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro, que aprova o regime geral da gestão de resíduos, o regime jurídico da deposição de resíduos em aterro e altera o regime da gestão de fluxos específicos de resíduos, transpondo as Diretivas (UE) 2018/849, 2018/850, 2018/851 e 2018/852. Projetos de Lei (n.os 888 a 890/XIV/2.ª): N.º 888/XIV/2.ª (CDS-PP) — Elimina da Lei n.º 27/2021, de 17 de maio (Carta Portuguesa de Direitos Humanos na era digital), a criação do conceito de desinformação e a previsão de apoios e incentivos estatais à atribuição de selos de
qualidade a órgãos de comunicação social. N.º 889/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Altera a lei que determina o fim dos abates de animais de companhia no sentido de a tornar mais transparente e efetiva. N.º 890/XIV/2.ª (IL) — Protege a liberdade de expressão online. Proposta de Lei n.º 103/XIV/2.ª (GOV): Altera a Lei da Organização do Sistema Judiciário e o regime aplicável à organização e funcionamento dos tribunais judiciais. (a) Publicado em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 888/XIV/2.ª
ELIMINA DA LEI N.º 27/2021, DE 17 DE MAIO (CARTA PORTUGUESA DE DIREITOS HUMANOS NA
ERA DIGITAL), A CRIAÇÃO DO CONCEITO DE DESINFORMAÇÃO E A PREVISÃO DE APOIOS E
INCENTIVOS ESTATAIS À ATRIBUIÇÃO DE SELOS DE QUALIDADE A ÓRGÃOS DE COMUNICAÇÃO
SOCIAL
Exposição de motivos
O artigo 6.º da Lei n.º 27/2021, de 17 de maio (Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital,
abreviadamente, Carta), consagra disposições legais com vista ao combate às fake news, determinando que o
Estado «assegura o cumprimento em Portugal do Plano Europeu de Ação contra a Desinformação», para
«proteger a sociedade contra pessoas singulares ou coletiva, de jure ou de facto, que produzam, reproduzam e
difundam narrativas» desse tipo.
O artigo 6.º prevê ainda que qualquer cidadão tem o direito a apresentar queixas à Entidade Reguladora para
a Comunicação Social (ERC) em caso de desinformação, podendo recorrer aos meios de ação previstos no
artigo 21.º da Carta, designadamente, a ação popular digital e o apoio estatal ao exercício pelos cidadãos dos
direitos de reclamação e recurso e de acesso a formas alternativas de resolução de litígios emergentes de
relações jurídicas no ciberespaço.
A aprovação desta norma, contudo, não foi isenta de dúvidas, de críticas fundamentadas – o Sindicato dos
Jornalistas solicitou à Provedora de Justiça e à Procurador-Geral da República pedido de declaração de
inconstitucionalidade desta norma – e de polémicas interpretativas perfeitamente desnecessárias e geradoras
de incerteza na aplicação da mesma.
Apesar de a proliferação de desinformação e falsas narrativas online – correntemente designadas por fake
news – ser um fenómeno potencialmente nocivo para a formação da opinião pública e que, no limite, pode
constituir uma ameaça à segurança interna e à democracia, não é compreensível nem aceitável que seja o
Estado a determinar o que é verdadeiro e o que não o é.
Exacerba mesmo as suas funções, na opinião dos signatários, o Estado que não se limita a «Garantir os
direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático» [artigo 9.º,
alínea b), da CRP], antes reclamando para si tarefas como a de fornecer um conceito de desinformação (artigo
6.º, n.º 2, da Carta), fornecendo exemplos vinculativos revestidos pela força da lei (artigo 6.º, n.º 3, da Carta) ou
como a de apoiar a criação de «estruturas de verificação de factos por órgãos de comunicação social
devidamente registados» e, principalmente, a de incentivar a «atribuição de selos de qualidade por entidades
fidedignas dotadas do estatuto de utilidade pública» (artigo 6.º, n.º 6, da Carta).
A União Europeia lançou, no início do ano de 2019, um sistema de alerta rápido para detetar notícias falsas
com vista a combater a manipulação do processo eleitoral, que constituiu o embrião do Plano Europeu de Ação
contra a Desinformação (abreviadamente, Plano) a que alude a Carta. O combate à manipulação do processo
eleitoral tinha em comum com o Plano a conexão de governos e especialistas através dos Estados-membros, a
criação de uma rede de verificadores de factos e equipas para identificar em tempo real campanhas organizadas.
O Plano foi aprovado, está em execução e ao Governo cabe assegurar o contributo do Estado português,
pelo que não é necessária a certificação legal dessa competência na Carta.
Também não consideramos avisada a criação de um conceito legal de desinformação, com exemplos
vinculativos – embora não exaustivos! –, que poderá eventualmente servir de base para a imposição de sanções.
No entender do CDS-PP, a abordagem destas matérias deve garantir o respeito e equilíbrio entre os
diferentes direitos e princípios fundamentais, como a liberdade de expressão, o pluralismo, a diversidade e a
fiabilidade da informação.
Por isso mesmo, consideramos que o Estado não deve poder intervir numa veste certificatória, separando os
bons dos maus meios de comunicação social, os sérios dos que o não são, praticando uma espécie de censura
que se distingue da que historicamente conhecemos por ser feita a posteriori, mas que dela se aproxima por
também estar a cargo do Estado.
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo
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assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto e âmbito
A presente lei altera a Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital, aprovada pela Lei n.º 27/2021,
de 17 de maio, eliminando a criação do conceito legal de desinformação e a referência a apoios estatais à
criação de estruturas de verificação de factos por órgãos de comunicação social e a incentivos à atribuição de
selos de qualidade a órgãos de comunicação social.
Artigo 2.º
Norma revogatória
É revogado o artigo 6.º da Lei n.º 27/2021, de 17 de maio.
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 25 de junho de 2021.
Os Deputados do CDS-PP: Telmo Correia — Cecília Meireles — Ana Rita Bessa — João Pinho de Almeida
— Pedro Morais Soares.
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PROJETO DE LEI N.º 889/XIV/2.ª
ALTERA A LEI QUE DETERMINA O FIM DOS ABATES DE ANIMAIS DE COMPANHIA NO SENTIDO DE
A TORNAR MAIS TRANSPARENTE E EFETIVA
Exposição de motivos
A Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, consubstancia um marco importante no que diz respeito à proteção dos
animais de companhia. Foi com esta lei que se determinou o fim do abate de animais saudáveis como forma de
controlo da sobrepopulação, passando a privilegiar-se uma política de prevenção, ou seja, a aposta nas
esterilizações e adoções. No entanto, parece-nos que esta carece ainda de alterações para se ajustar à
realidade que observamos nos dias de hoje.
Sabendo que a lei prevê a possibilidade, nos termos do artigo 3.º, no caso de os animais serem portadores
de zoonoses ou de doenças infectocontagiosas, de estes serem eutanasiados, consideramos haver falta de
informação quanto à prática da eutanásia pelos municípios.
Os animais detentores de zoonoses ou de doenças infectocontagiosas podendo ser, de forma geral,
considerados um perigo para a saúde pública, não o são em todos os casos. A identificação do tipo de zoonose
ou doença infectocontagiosa depende primeiro de rigorosos testes laboratoriais. Desconhece-se até então quais
os métodos utilizados para identificação nos CRO deste tipo de situações. Alguns tipos de zoonoses por regra
são identificados por via de teste rápido que não são 100% eficazes, podendo criar falsos positivos. Com o
evoluir da medicina veterinária, nos dias de hoje, determinadas zoonoses ou doenças infectocontagiosas são
completamente controladas e, por consequência, a lei não exige a eutanásia de animais pertencentes a cidadãos
particulares, ou a entidades sanitárias, a não ser por motivos de saúde pública.
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É fundamental existirem critérios rigorosos em todo o processo, para que não se proceda à eutanásia sem
comprovativo da gravidade da doença de que o animal possa comportar. Tenha-se por exemplo um canídeo
com leishmaniose (zoonose).
É fulcral em qualquer dos casos recorrer-se a análises laboratoriais, após a despistagem do teste rápido
acusar positivo ou duvidoso. No espaço de tempo em que se aguarda os resultados laboratoriais, deverá o
respetivo município proceder à publicidade do animal encontrado em paralelo como se procede com qualquer
outro animal, caso seja encontrado.
Após a receção das análises laboratoriais e se as mesmas acusarem positivo, deverá a entidade responsável
apurar o perigo para a saúde pública que este animal apresenta. Caso se trate de uma doença controlável e
sem perigo para a saúde pública terá o animal que ser publicitado nos meios disponibilizados online ou outros
que sejam mais adequados para efeitos de adoção. Caso se entenda que existe perigo iminente para a saúde
pública e justificável nos termos da lei, proceder-se-á à eutanásia.
Caso se entenda necessário proceder à eutanásia do animal, será necessário a autoridade responsável
proceder a um relatório referente à condição de saúde do animal, devendo os respetivos relatórios ser públicos,
ou seja, acessíveis aos cidadãos e autoridade sanitária, caso estes solicitem a sua consulta.
Pretende, ainda, a Lei n.º 27/ 2016, de 23 de agosto, e respetiva portaria, o incentivo à esterilização por vias
da eliminação da eutanásia. Não obstante, os termos desta lei têm sido interpretados de forma discricionária e
sem um esforço real por parte dos municípios de cumprir. Nomeadamente no que diz respeito ao número de
esterilizações devidas ou na criação de meios para tal.
Em 2019, Portugal procedeu ao abate de 2649 animais por zoonoses ou doenças infectocontagiosas, e em
2020 procedeu ao abate de 2281 animais. Estes números são significativos e sem qualquer comprovativo
laboratorial da doença e de perigo iminente para a saúde pública. Municípios como Torres Vedras, Ponte de
Lima, Paredes ou Coimbra, destacam-se dos restantes municípios no que diz respeito ao número de abates.
Sendo importante apurar por que razão naqueles municípios este número é tão díspar dos restantes.
Consideramos assim que apesar das recentes alterações que visam conferir maior proteção aos animais de
companhia e que demonstram uma mudança na forma como estes eram vistos pelo nosso ordenamento jurídico,
a verdade é que a legislação não sofreu ainda, na nossa opinião, as modificações que seriam necessárias para
acompanhar a evolução do pensamento nesta matéria.
Pelo que pretendemos clarificar o fim da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, promovendo uma maior
transparência na aplicação da lei.
Para além disso, o período transitório constante no artigo 5.º da lei já terminou em 2018. No entanto, nem
todos os municípios criaram as condições para proceder às esterilizações, ainda nem todos implementaram
programas de CED (captura-esterilização-devolução) e nem todos têm centro de recolha oficial ou páginas da
internet onde divulgam os animais recolhidos, pelo que consideramos que é altura de qualificar essas condutas
como contraordenação por forma a obter uma implementação efetiva da lei.
Note-se que a obrigatoriedade de ter centro de recolha oficial já data de 1925. No Decreto n.º 11242, de
1925, o artigo 3.º, dispunha que «Todas as câmaras municipais são obrigadas a construir e a manter, na sede
dos respetivos concelhos, um ou mais canis, segundo as necessidades, e as instalações anexas para postos de
vacinação.» Tendo essa obrigação vindo a ser, posteriormente, reiterada por vários diplomas legais. Segundo
o «Relatório sobre o levantamento dos centros de recolha oficial de animais e diagnóstico das necessidades»,
elaborado pela DGAV e DGAL em setembro de 2017, aos dias de hoje esta obrigação ainda não é cumprida por
todos os municípios, apesar dos apoios concedidos aos municípios via Orçamento do Estado para o efeito.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues
apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
O presente diploma procede à primeira alteração à Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, no sentido de a tornar
mais transparente, nomeadamente através da disponibilização aos cidadãos da informação relativa ao uso de
eutanásia.
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Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto
É alterado o artigo 3.º da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, o qual passará a ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º
(…)
1 – ................................................................................................................................................................... .
2 – ................................................................................................................................................................... .
3 – ................................................................................................................................................................... .
4 – ................................................................................................................................................................... .
5 – ................................................................................................................................................................... .
6 – ................................................................................................................................................................... .
7 – A decisão de proceder à eutanásia deve ser devidamente documentada, nos termos do artigo 3.º-A, e
devendo a referida informação ser pública a qualquer cidadão que solicite a sua consulta, autoridade sanitária
ou órgão de polícia criminal.
8 – (Anterior artigo n.º 7.)
9 – (Anterior artigo n.º 8.)
10 – (Anterior artigo n.º 9.)
11 – (Anterior artigo n.º 10.)»
Artigo 3.º
Aditamento à Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto
São aditados os artigos 3.º-A, 4.º-A e 4.º-B à Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, com a seguinte redação:
«Artigo 3.º-A
Justificação de decisão de eutanásia
1 – O médico veterinário deve socorrer-se de testes laboratoriais para efeitos de comprovação da doença
infectocontagiosa ou zoonose que o animal padeça.
2 – Caso o teste laboratorial acuse positivo, o médico veterinário municipal só pode proceder ao abate caso
esteja em causa situação de saúde pública grave.
3 – Caso o teste laboratorial acuse positivo e caso a doença infectocontagiosa ou zoonose seja controlada,
deverá o médico veterinário municipal divulgar o animal para adoção, nos mesmos termos que os restantes.
4 – Caso o teste laboratorial acuse positivo e o abate seja o único meio a proceder, deverá o médico
veterinário elaborar um relatório público com a informação do animal, nomeadamente caracterização do animal
e elementos identificativos; onde e em que dia foi encontrado; resultados de análises de laboratório; justificação
para a decisão de abate e indicação de razões públicas preponderantes.
5 – Caso a decisão de eutanásia se baseie em questões comportamentais, a decisão deve ser acompanhada
de parecer sobre o comportamento do animal e justificação da conclusão de perigosidade do mesmo.
Artigo 4.º-A
Contraordenações
O incumprimento do disposto na presente lei constitui contraordenação punível pelo ICNF, com coima cujo
montante mínimo é de € 500,00 e máximo de € 5000,00.
Artigo 4.º-B
Crime
A prática da eutanásia fora dos requisitos da lei consubstancia a prática de crime de maus tratos a animais,
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previsto e punido no artigo 387.º do Código Penal.»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor 90 dias após a sua publicação.
Palácio de São Bento, 28 de junho de 2021.
A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.
———
PROJETO DE LEI N.º 890/XIV/2.ª
PROTEGE A LIBERDADE DE EXPRESSÃO ONLINE
I
Introdução
A Carta Portuguesa dos Direitos Humanos na Era Digital foi publicada no passado dia 17 de maio.
A Iniciativa Liberal saúda a vontade de alargar os direitos e liberdades das pessoas aos meios digitais, tal
como descrito no primeiro artigo da Carta: «Todos os cidadãos e pessoas coletivas têm o direito à igualdade
de oportunidades de acesso, utilização, criação e partilha no Mundo Digital.»
O documento apresenta vários pontos positivos que reforçam Direitos, Liberdades e Garantias dos
indivíduos, como a garantia que o ciberespaço permaneça aberto à livre circulação das ideias e da informação,
o direito de livre acesso à Internet, o direito ao esquecimento (apagamento de dados pessoais) a redução e
eliminação das assimetrias regionais e locais em matéria de conectividade, o direito à proteção contra a
geolocalização abusiva, à comunicação usando criptografia e ao testamento digital, bem como alguns direitos
digitais face à Administração Pública.
O projeto aprovado tem pontos que afirmam a Internet como espaço de liberdade, sobretudo de liberdade de
expressão, livre de censura política.
II
O Problema
O documento, tal como aprovado na Assembleia da República e promulgado pelo Presidente da República,
e em desrespeito dos princípios liberais e democráticos que reclama defender, inclui uma disposição aberrante
que promove ativamente mecanismos censórios – o artigo 6.º relativo ao «Direito à proteção contra a
desinformação».
O artigo 6.º foi inspirado no Plano de Ação contra a Desinformação, um documento não vinculativo da União
Europeia que desenvolve recomendações para o combate ao novo fenómeno da conflitualidade digital entre
Estados, visando sobretudo campanhas de propaganda ideológica e política, promovidas por agentes
estrangeiros, para desestabilizar mecanismos democráticos da União Europeia e dos Estados-Membros.
Este tema é importante, mas é um tema de segurança nacional, da resiliência das instituições democráticas,
civis e sociais do País. Não é um tema de direitos, liberdades e garantias individuais e, portanto, por este motivo,
não deve constar de um documento que se debruça sobre direitos individuais. A constar, deveria sempre
salvaguardar os mais fundamentais direitos do cidadão, onde se inclui a liberdade de expressão.
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Contudo, o artigo 6.º afasta-se radicalmente das noções de segurança de Estado. Define desinformação de
forma laxa – «desinformação» passa a ser toda a informação que é falsa, possa ser falsa, ou possa ser
considerada falsa por alguma autoridade oficial.
O artigo 6.º abre o caminho para a censura sistematizada de conteúdos políticos legítimos, agride princípios
básicos da democracia liberal, e destrata direitos, liberdades e garantias reconhecidos pela nossa Constituição
a todos os indivíduos.
O artigo 6.º começa por proclamar que as pessoas têm um direito a não serem sujeitas a potenciais
falsidades, e imediatamente conclui que o Estado tem direito a montar um mecanismo de filtragem do que se
publica online.
O artigo 6.º confere a uma rede de verificadores licenciados, reconhecidos e autorizados pelo Estado, o poder
não sujeito a escrutínio democrático de julgar a veracidade dos conteúdos online, o que incluirá conteúdos
políticos.
Ora, o poder de definir o que é «verdade» em política; de colar carimbos de «falso» ou «errado» a opinião
política inconveniente, ou que não possa ser comprovadamente verdadeira; e de agir para suprimir discurso
político não conforme, ou mesmo de calar pessoas, constitui uma linha vermelha inaceitável.
O Estado não pode ter o poder de censurar. A censura digital não pertence a uma Carta Portuguesa dos
Direitos Humanos na Era Digital. Este projeto de lei retira do documento os mecanismos de censura política.
III
O Plano de Ação contra a Desinformação
O Plano de Ação contra a Desinformação foi apresentado a 5 de dezembro de 2018 pelo Alto Representante
da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, pelo Serviço Europeu para a Ação Externa
(SEAE), um dos braços diplomáticos da União Europeia.
Este documento foca-se em ações de sabotagem dos processos democráticos da União Europeia, na forma
de estratégias deliberadas, em larga escala, e sistemáticas de disseminação de desinformação. São
enumerados diversos episódios sobretudo relacionados com a Federação Russa.
Reconhecemos que determinados agentes externos têm interesse em guerrilha digital para influenciar a
opinião pública, minar a confiança nos processos políticos, e promover movimentos políticos extremistas.
Alguns destes agentes provêm de poderes externos pouco amigos da liberdade de expressão, e que fazem
uso das nossas sociedades abertas para impor a sua propaganda. Estes agentes tiram proveitos se a sua
desinformação for aceite pela população, mas ganham sobretudo se o poder político enveredar por um afã
censório, tolhendo a liberdade de expressão.
Cabe aos Estados, cooperando entre si, contrariar estas ameaças à ordem democrática liberal, reiterando a
sua adesão aos princípios dos direitos e liberdades individuais.
III
Uma transcrição infeliz
Contrariar «estratégias deliberadas, em larga escala, e sistemáticas de disseminação de desinformação» –
campanhas dissimuladas de propaganda subversiva contra os fundamentos democráticos liberais – é
responsabilidade dos organismos do Estado responsáveis pela segurança de estado. É importante que ameaças
reais sejam profissionalmente geridas pelos serviços de informação do Estado, exigindo-se desta polícia de
segurança o respeito escrupuloso dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Contudo, este enquadramento de política de segurança do estado perante ameaças externas está
integralmente suprimido da Carta Portuguesa dos Direitos Humanos.
Com o artigo 6.º, «desinformação» passa a incluir desafios ao poder político – narrativas que sejam
suscetíveis de causar prejuízo público na elaboração de políticas públicas. No limite, esta descrição inclui
oposição política a medidas do Governo ou a contestação de argumentos apresentados pelo Governo, mesmo
que falsos.
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O artigo 6.º parece tolerar erros de boa fé, sátiras e paródias, exceções também previstas no Plano de Ação
contra a Desinformação, onde se foi inspirar. Contudo, é escandaloso que o legislador tenha optado por não
incluir na Carta portuguesa, como inclui sobre a mesma matéria o Plano de Ação Contra a Desinformação, a
proteção ao discurso claramente partidário ou político.
Para cúmulo, ao centro do artigo 6.º está um novo sistema de policiamento contínuo, denúncia, auditoria e
descredibilização oficial de informação inconveniente. Para condenar alguma opinião incómoda, bastará que
contenha dados não integralmente verdadeiros – o que é frequente acontecer em todo o discurso político.
Quando a opinião for factualmente verdadeira, basta que se assemelhe a tendências políticas («campanhas de
desinformação») que convenham ser caladas.
Nunca o poder político gostou de ser questionado, sempre o poder político quis poder afastar críticas. A
democracia não pode ceder à censura.
IV
Enquadramento ideológico e político
A liberdade de expressão, sobretudo a liberdade de dizer ao poder político o que o poder político não quer
ouvir, e de consumir tal conteúdo crítico produzido por terceiros, é um direito de todo o indivíduo.
A liberdade de expressão não existe só para que possamos falar de assuntos corriqueiros; existe, sim, para
que qualquer um de nós possa denunciar perversões dos poderes instituídos. A liberdade de expressão é
condição necessária para uma cidadania informada e ativa. A liberdade de expressão é fundamental ao debate
político numa democracia saudável. A liberdade de expressão é a base de uma sociedade livre que consiga
resistir a tentativas de medidas autoritárias por parte do poder político.
O debate político, esse, faz-se não só de factualidades a preto-e-branco, mas também e sobretudo de
opiniões, ambiguidades e níveis de cinzento. No debate político prolifera informação que pode ser falsa, errada,
parcial, especulativa, manipuladora, persuasiva, polémica, subversiva, hiperbólica, metafórica, todo o tipo de
figuras de estilo, falácias lógicas e artifícios retóricos, verdades esticadas e mentiras por omissão, liberdade
criativa. A comunicação política e partidária depende frequentemente de narrativas subjetivas apresentadas
como verdades, factoides, meias-verdades seletivas, incorreções variadas. No fim do dia, muitos argumentos
políticos são matéria de princípios e valores, que por vezes são complementados com informação imperfeita.
Neste contexto, se é verdade que alguns argumentos maliciosos misturam mentiras no meio de verdades,
também é verdade que argumentos políticos muito pertinentes podem não ser factualmente robustos.
Nada disto deve ser avaliado literalmente e a subjetividade inerente à opinião não deve estar,
constantemente, sujeita a um crivo de objetividade definido por um terceiro. É um mau serviço à democracia
assinalar indiscriminadamente conteúdos políticos que possam não ser objetivos.
V
Censura
Em Portugal já atravessámos uma longa noite de ditadura, onde imperava a censura. Nunca mais.
A censura começa com promessas de zelosamente limpar o debate de falsidades, para proteger a população,
e acaba a rotular de intrujices inaceitáveis o que são desafios legítimos ao poder político.
Pela censura, primeiro abafam-se aspetos políticos incómodos, porque alguém usou uma inverdade ou não
usou factos oficiais. Depois, temas inteiros passam a ser tabu, porque podem ser inaceitavelmente subjetivos,
ou simplesmente diferentes da narrativa oficial. Por fim, extingue-se a própria atividade de escrutínio e crítica
porque pode ser antipatriótico questionar o poder.
É importante salientar que não será necessário que haja censura pura e dura, ou seja supressão direta de
discurso político discordante, e lápis azul nas redações físicas e digitais, para que estes mecanismos corroam
a vitalidade democrática do país. A mera existência de sistemas oficiais de verificação de factos imporá um
chilling effect, o conceito de «respeitinho», de tão má memória. A mera possibilidade de um conteúdo ou canal
poder levar «cartão amarelo» e poder sofrer consequências arbitrárias será suficiente para instaurar a
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autocensura, e impor comportamentos ordeiros.
Assim se controlam não só as publicações, mas também os pensamentos.
VI
Verificadores de factos
Sendo o Estado ele próprio um produtor de informação política, necessariamente subjetiva, e muitas vezes
pouco suportada em factos indubitavelmente provados, é parte interessada em qualquer poder de validação da
informação nos fóruns digitais. Não é legítimo que seja o Estado a definir quem são as entidades idóneas para
atestar a verdade em temas políticos que podem ser sensíveis aos próprios poderes políticos. São poderes que
não se admitem a um estado autoritário, e muito menos num estado democrático.
O Estado democrático não deve exercer qualquer censura. Nem deve subcontratar tal função, nem deve
tolerar que terceiros, supostamente independentes, exerçam tal poder sobre as pessoas e a comunidade.
Contudo o artigo 6.º vem autorizar explicitamente a criação de um cartel de estruturas de verificação de factos
por órgãos de comunicação social devidamente registados. E ainda a distribuição de selos de qualidade, por
parte de entidades fidedignas, a premiar a boa informação, o bom jornalismo, a boa argumentação, a boa
opinião.
Repetimos: não existe verificação «isenta» no discurso político. Mesmo em temas de natureza objetiva,
convém notar que no passado recente já houve vários casos em que entidades de verificação de factos se
enganaram, e outros casos em que estruturas diferentes deram resultados diferentes ao mesmo tópico em
análise, e, até, casos onde se verificou que toda a narrativa oficial era falsa.
No fim do dia, os próprios verificadores de conteúdos não poderão fugir muito às narrativas oficiais. No limite
estas entidades verificadoras terão de se basear em documentos oficiais, e em verdades oficiais, e adotar
narrativas oficiais. O debate político legítimo será reprimido.
VII
A perversão da Comunicação Social
Para cúmulo, a Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital pretende, absurdamente, controlar as
opiniões na internet usando um modelo de regulação de comunicação social.
Este entendimento está patente na concessão à Entidade Reguladora para a Comunicação Social dos
poderes para receber e apreciar queixas contra faltas de veracidade em conteúdos digitais.
É absolutamente ilegítimo que ideias políticas sejam policiadas pela Entidade Reguladora para a
Comunicação Social (ERC), coadjuvada por um cartel oficial de verificadores de factos, agraciados com o
estatuto de utilidade pública, e à mão de serem capturados pelo poder político.
Atribuir poderes censórios a entidades, sobretudo da área da Comunicação Social, é um péssimo serviço à
democracia.
A Comunicação Social já é o «quarto poder», responsável por reportar temas do interesse público. É
essencial manter a separação de poderes, assim como independência face ao poder político. A Comunicação
Social já é um sector influente e cobiçado, que opera demasiado próximo do Estado. Ao longo dos tempos tem
vindo a ser seduzida por ideologias, partidos, e interesses variados. A história recente do Portugal democrático
já deu provas abundantes tanto de relações confortáveis e mesmo simbióticas entre o poder político e a
comunicação social, assim como de relações adversariais que resultaram em afastamentos de vozes
incómodas.
A ERC e os órgãos de comunicação digital que comporão o cartel de verificadores de factos oficiais não
serão sujeitos a escrutínio democrático, e estarão no centro de um perigoso jogo político. Inevitavelmente,
aqueles poderes serão alvo de tentativa de captura e abuso. Assim acontecerá com quaisquer verificadores de
factos oficiais.
A vigilância democrática é uma atividade que deve ser independente do Estado, nunca controlada pelo
Estado. É especialmente perturbador que a Comunicação Social possa ter papel na supressão de informação
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política ou estar sujeita a estruturas oficiais que a impeçam de exercer a sua atividade com total Liberdade
editorial.
Assim se mina o escrutínio político democrático.
VII
Liberdade e responsabilidade, contra a Censura e contra a informação falsa
A informação falsa combate-se pela educação, pelo debate político, pela participação cívica, por uma
sociedade vigilante.
Para conteúdos polémicos, há o jornalismo, a opinião, o debate político, a sanção social. Para conteúdos
verdadeiramente problemáticos, há a Justiça.
A censura coloca a autoridade acima da liberdade individual. Numa democracia, as pessoas têm direito à
expressão. As pessoas têm direito a exprimirem as suas opiniões, mesmo que factualmente erradas. As pessoas
têm direito a consumir opiniões de terceiros, mesmo que factualmente erradas. As pessoas têm direito a saber
quem promove ideias, sobretudo se forem polémicas e factualmente erradas, para que possam ser
robustamente rebatidas, e fortalecidas as boas ideias. As pessoas têm o direito que o Estado não censure.
A solução para informação falsa é mais e melhor informação. Agilidade e escrutínio, em vez de legislação e
policiamento. Um mercado livre de ideias. Uma cultura de exigência e resiliência que reforce o sistema
democrático, em vez de leis que namoram a censura.
VIII
A proposta da IL
O artigo 6.º, tal como escrito e sem mais contexto, é uma disposição antidemocrática. Constitui uma afronta
inaceitável à liberdade de expressão. É indigna de promulgação seja pela Assembleia da República seja pelo
Presidente da República. O artigo deve ser liminarmente eliminado.
Reconhecemos a existência de guerra digital, referida no Plano de Ação contra a Desinformação, mas
propomos que oportunamente venha a ser sujeita a legislação própria. Nesta legislação, devem ser
salvaguardados os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Não pode ser possível confundir verdadeira desinformação de Estado com debate político legítimo. O país
não pode ceder a impulsos securitários, e erodir as instituições da democracia liberal, que é precisamente o que
pretendem poderes estrangeiros hostis.
É legítimo que entidades queiram desenvolver atividade de escrutínio político de opiniões de terceiros. Mas
deverá haver sempre separação entre o Estado e o livre mercado concorrencial de verificadores de factos. As
entidades que entenderem ser verificadores de factos não devem carecer de licenciamentos, devem poder ser
tão independentes quanto quiserem, e devem elas próprias sujeitarem-se ao escrutínio da sociedade civil e dos
seus pares.
IX
Conclusão
O artigo 6.º afigura-se como o primeiro passo para a criação de um «Ministério da Verdade» capaz de
controlar a opinião o que os cidadãos expressam na internet. Não pode passar.
A Internet tem de ser um espaço de liberdade. Devem ser replicadas nos meios digitais todas as limitações
ao poder do Estado, ou dos seus agentes, que garantam que o poder político não possa tolher a liberdade de
expressão, uma liberdade essencial para a saúde do sistema democrático.
A Censura não tem lugar dentro ou fora da Internet. O artigo 6.º deve ser revogado.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º
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1 do Regimento da Assembleia da República, o Deputado único do Iniciativa Liberal apresenta o seguinte projeto
de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei protege a liberdade de expressão online, procedendo, para tal, à alteração da Lei n.º 27/2021,
de 17 de maio.
Artigo 2.º
Norma revogatória
É revogado o artigo 6.º da Lei n.º 27/2021, de 17 de maio.
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 28 de junho de 2021.
O Deputado do IL, João Cotrim de Figueiredo.
———
PROPOSTA DE LEI N.º 103/XIV/2.ª
ALTERA A LEI DA ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA JUDICIÁRIO E O REGIME APLICÁVEL À
ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DOS TRIBUNAIS JUDICIAIS
Exposição de motivos
O XXII Governo Constitucional inscreveu no seu programa, entre os objetivos prioritários, o combate à
criminalidade económico-financeira, designadamente na sua vertente de criminalidade organizada, ciente de
que este fenómeno eleva os custos de contexto da economia e debilita as finanças do Estado, acentuando
desigualdades e erodindo os alicerces do Estado social, tudo desaguando na diminuição da confiança dos
cidadãos nas suas instituições.
A Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024, aprovada em anexo à Resolução do Conselho de Ministros
n.º 37/2021, de 6 de abril, prioriza a eficácia e eficiência dos mecanismos legais em matéria de repressão
daquele tipo de criminalidade, através da diminuição dos tempos de resposta do sistema judicial e da garantia
da efetiva punição dos agentes do crime.
Nesse âmbito, enfocou-se especialmente os chamados «megaprocessos», cuja delonga na tramitação é,
hoje, inaceitável, na medida em que, por um lado, torna ineficaz a reação criminal e, por outro, alimenta a
desconfiança dos cidadãos na justiça.
O Tribunal Central de Instrução Criminal é, por excelência, aquele que concentra os mais importantes
processos relevantes da criminalidade económico-financeira. A complexidade e sofisticação crescentes da
criminalidade económico-financeira, assim como a sua considerável dispersão territorial, determinam a
necessidade de reequacionar a organização judiciária em matéria de instrução criminal no município de Lisboa.
E esse movimento não pode deixar de considerar o elevado grau de especialização do Tribunal Central de
Instrução no combate àquele tipo de criminalidade. Por outro lado, a atual configuração deste tribunal tocante
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ao número de juízes que aí exercem funções é indutora de um imperfeito grau de aleatoriedade na distribuição
de processos e, por via disso, de uma indesejável personalização da justiça, o que não beneficia a adequada
perceção pública da objetividade da ação da justiça. Este contexto é agravado pela circunstância de os
processos que correm naquele tribunal adquirirem, em regra, um elevado patamar de mediatização.
Assim, respeitando a diferenciação e qualificação do Tribunal Central de Instrução Criminal e a sua
competência nacional, importa adotar medidas que permitam ultrapassar os constrangimentos acima
identificados. Neste contexto, a fusão, no Tribunal Central de Instrução Criminal, das competências nacionais
que, já são suas, com as competências próprias do juízo de instrução criminal de Lisboa, com o consequente
aumento do número de magistrados afetos ao primeiro, é a solução que surge como sendo a mais adequada a
garantir a racionalização de meios necessária ao combate mais qualificado à criminalidade económico-
financeira, mas também o reforço da confiança dos cidadãos no sistema de justiça.
Atenta a matéria, em sede de procedimento legislativo a decorrer na Assembleia da República, deve ser
ouvido o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o
Conselho Superior do Ministério Público, a Procuradoria-Geral da República, da Ordem dos Advogados, do
Conselho dos Oficiais de Justiça e da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, a Associação
Sindical dos Juízes Portugueses, o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, o Sindicato dos Oficiais de
Justiça e o Sindicato dos Funcionários Judiciais.
Assim:
Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da
República a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à:
a) Décima alteração à Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de
agosto, alterada pelas Leis n.os 40-A/2016, de 22 de dezembro, e 94/2017, de 23 de agosto, pela Lei Orgânica
n.º 4/2017, de 25 de agosto, pela Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, pelo Decreto-Lei n.º 110/2018, de 10 de
dezembro, e pelas Leis n.os 19/2019, de 19 de fevereiro, 27/2019, de 28 de março, 55/2019, de 5 de agosto, e
107/2019, de 9 de setembro;
b) Quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março, alterado pelo Decreto-Lei n.º 86/2016, de
27 de dezembro, pela Lei n.º 19/2019, de 19 de fevereiro, e pelo Decreto-Lei n.º 38/2019, de 9 de setembro, que
regulamenta a Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), e que estabelece o
regime aplicável à organização e funcionamento dos tribunais judiciais.
Artigo 2.º
Alteração à Lei da Organização do Sistema Judiciário
O artigo 120.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto,
na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 120.º
[…]
1 – ................................................................................................................................................................... .
2 – Cabe ainda a um tribunal central de instrução criminal:
a) A competência a que se refere o n.º 1 do artigo anterior, quando a atividade criminosa ocorrer no município
de Lisboa;
b) A competência relativamente aos crimes a que se refere o número anterior, quando a atividade criminosa
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ocorrer em comarcas diferentes dentro da área de competência do Tribunal da Relação de Lisboa.
3 – Sem prejuízo do disposto na alínea b) do número anterior, a competência dos juízos de instrução criminal
da sede dos Tribunais da Relação abrange a respetiva área de competência relativamente aos crimes a que se
refere o n.º 1, quando a atividade criminosa ocorrer em comarcas diferentes dentro da área de competência do
mesmo Tribunal da Relação.
4 – [Anterior n.º 3.]
5 – A competência a que se refere o n.º 1 do artigo anterior, quanto aos crimes estritamente militares, cabe
a um tribunal central de instrução criminal e à unidade orgânica de instrução criminal militar dos juízos de
instrução criminal do Porto, com jurisdição nas áreas indicadas no Código de Justiça Militar.
6 – [Anterior n.º 5.]»
Artigo 3.º
Extinção do Juízo de Instrução Criminal de Lisboa
É extinto o Juízo de Instrução Criminal de Lisboa.
Artigo 4.º
Juízes e oficiais de justiça
1 – Os juízes colocados no Juízo de Instrução Criminal de Lisboa à data da respetiva extinção consideram-
se colocados no Tribunal Central de Instrução Criminal.
2 – Os juízes a que se refere o número anterior e que reúnam os requisitos legalmente exigidos têm
preferência absoluta no primeiro movimento judicial que tenha lugar após a entrada em vigor da presente lei,
relativamente à totalidade dos juízos de instrução criminal.
3 – À data da respetiva extinção, os oficiais de justiça que exercem funções no Juízo de Instrução Criminal
de Lisboa passam a exercer funções no Tribunal Central de Instrução Criminal.
Artigo 5.º
Transição de processos
1 – Os processos que se encontrem pendentes no Juízo de Instrução Criminal de Lisboa, à data de entrada
em vigor da presente lei, transitam para o Tribunal Central de Instrução Criminal, mantendo-se na titularidade
dos juízes que neste tribunal sejam colocados nos termos do artigo anterior, sem que haja lugar à redistribuição
dos processos que lhes estejam atribuídos.
2 – Os processos que se encontrem pendentes no Tribunal Central de Instrução Criminal, à data de entrada
em vigor da presente lei, mantêm-se na titularidade dos juízes que naquela data se mostrem colocados nesse
tribunal, sem que haja lugar à redistribuição dos processos que lhes estejam atribuídos.
3 – Os aspetos não regulados nos números anteriores, designadamente as medidas tendentes ao equilíbrio
das pendências, a operar nas distribuições subsequentes à transição de processos, são objeto de deliberação,
consoante o caso, pelo Conselho Superior da Magistratura ou pelo Conselho Superior do Ministério Público.
Artigo 6.º
Execução
No âmbito das respetivas competências, o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior do
Ministério Público e a Direção-Geral da Administração da Justiça adotam as providências necessárias à
execução da presente lei.
Artigo 7.º
Alteração dos mapas anexos ao Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março
Os Mapas III e IV anexos ao Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março, na sua redação atual, são alterados
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com a redação constante do anexo à presente lei e da qual faz parte integrante.
Artigo 8.º
Norma revogatória
É revogada a alínea e) do n.º 1 do artigo 84.º do Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março, na sua redação
atual.
Artigo 9.º
Entrada em vigor
1 – A presente lei entra em vigor no dia 4 de janeiro de 2022.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, o artigo 6.º entra em vigor no dia seguinte ao da publicação
da presente lei.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 17 de junho de 2021.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa — A Ministra da Justiça, Francisca Eugénia da Silva Dias
Van Dunem — O Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro.
ANEXO
(a que se refere o artigo 7.º)
«ANEXO
[…]
MAPA III
[…]
.........................................................................................................................................................................
Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa
.........................................................................................................................................................................
Juízos de competência especializada
.........................................................................................................................................................................
Juízo local de pequena criminalidade de Lisboa.
Área de competência territorial: município de Lisboa.
Juízes: 5
Juízo de família e menores de Lisboa.
Área de competência territorial: município de Lisboa.
Juízes: 8
.........................................................................................................................................................................
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MAPA IV
Tribunais de competência territorial alargada
.........................................................................................................................................................................
Tribunal Central de Instrução Criminal
.........................................................................................................................................................................
Juízes: 9.
......................................................................................................................................................................... .»
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.