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Quarta-feira, 7 de julho de 2021 II Série-A — Número 164

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

S U M Á R I O

Projetos de Lei (n.os 836 e 905 a 908/XIV/2.ª): N.º 836/XIV/2.ª (Estabelece a proibição da importação ou venda de bens, serviços e recursos naturais provenientes de colonatos ilegais em territórios ocupados): — Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 905/XIV/2.ª (CH) — Procede a alterações aos artigos 12.º e 13.º, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto, que aprova a Lei de Segurança Interna. N.º 906/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Garante o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas em caso de assédio sexual. N.º 907/XIV/2.ª (BE) — Aprova a orgânica da Agência Portuguesa para a Migração e o Asilo, IP. N.º 908/XIV/2.ª (PSD) — Procede à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16 de outubro, que aprova a Lei Orgânica do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Proposta de Lei n.º 99/XIV/2.ª [Transpõe a Diretiva (UE) 2019/1, que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros competência para aplicarem a lei

de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado interno]: — Parecer da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, tendo como anexo uma declaração de voto apresentada pelo PS, e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. Projetos de Resolução (n.os 1226, 1358, 1376 e 1390 a 1401/XIV/2.ª): N.º 1226/XIV/2.ª (Recomenda ao Governo a monitorização da resposta económica e social ao ecossistema do vestuário, têxtil, calçado e moda no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência de Portugal e do Plano da Reindustrialização Europeia): — Informação da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação relativa à discussão do diploma ao abrigo do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República. N.º 1358/XIV/2.ª (Pela criação de uma campanha nacional de informação para o voto das pessoas migrantes nas eleições autárquicas): — Alteração do texto inicial do projeto de resolução. N.º 1376/XIV/2.ª (Deslocação do Presidente da República a Luanda):

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— Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas. N.º 1390/XIV/2.ª (CDS-PP) — Requalificação e reabilitação da Escola Secundária António Inácio da Cruz, em Grândola. N.º 1391/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo que proceda à desclassificação de todos os documentos militares datados até 1975. N.º 1392/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Recomenda ao Governo que proceda à ratificação da Convenção sobre violência e assédio no mundo do trabalho da Organização Internacional do Trabalho. N.º 1393/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Recomenda ao Governo que publique a lista atualizada das doenças profissionais que inclua as doenças resultantes da prática de assédio laboral. N.º 1394/XIV/2.ª (Comissão de Assuntos Europeus) — Apreciação do Relatório sobre «Portugal na União Europeia 2020».

N.º 1395/XIV/2.ª (BE) — Pela aplicação urgente de medidas para a despoluição e preservação do rio Paiva. N.º 1396/XIV/2.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a aceleração da vacinação contra a COVID-19. N.º 1397/XIV/2.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a contratação de trabalhadores da saúde para as unidades do SNS. N.º 1398/XIV/2.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a contratação dos enfermeiros recém-licenciados. N.º 1399/XIV/2.ª (CH) — Recomenda ao Governo que submeta a discussão e votação no Parlamento qualquer acordo de livre circulação ou mobilidade com a CPLP. N.º 1400/XIV/2.ª (PCP) — Recomenda a reversão do hospital de S. Paulo em Serpa para a gestão pública e a sua integração no Serviço Nacional de Saúde. N.º 1401/XIV/2.ª (PAR) — Deslocação do Presidente da República ao Brasil: — Texto do projeto de resolução e mensagem do Presidente da República.

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PROJETO DE LEI N.º 836/XIV/2.ª

(ESTABELECE A PROIBIÇÃO DA IMPORTAÇÃO OU VENDA DE BENS, SERVIÇOS E RECURSOS

NATURAIS PROVENIENTES DE COLONATOS ILEGAIS EM TERRITÓRIOS OCUPADOS)

Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas e nota técnica

elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião da Deputada autora do parecer

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexos

PARTE I – Considerandos

1 – Nota Introdutória

Ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República e da alínea b) do n.º 1 do

artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, as Deputadas e os Deputados do Grupo Parlamentar do

Bloco de Esquerda tomaram a iniciativa de apresentar, a 7 de maio de 2021, o Projeto de Lei n.º 836/XIV/2.ª

(BE), que «estabelece a proibição da importação ou venda de bens, serviços e recursos naturais provenientes

de colonatos ilegais em territórios ocupados».

Por despacho de sua Excelência, o Presidente da Assembleia da República, a iniciativa em apreço baixou à

Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, tendo sido designada como relatora a

deputada autora deste parecer.

2 – Âmbito, contexto e objetivos da iniciativa

O presente projeto de lei visa implementar um regime sancionatório de natureza penal, proibindo relações

comerciais com colonatos ilegalmente estabelecidos em «territórios ocupados» pelo Estado de Israel,

abrangendo cidadãos portugueses ou estrangeiros, desde que residentes em Portugal, bem como entidades

coletivas, independentemente da posse de personalidade jurídica própria.

Para o efeito, a iniciativa legislativa define como «Colono ilegal» um membro da população civil de uma

potência ocupante que estava ou está presente no território ocupado e cuja presença está a ser, ou foi, facilitada

direta ou indiretamente pela potência ocupante.

São definidos ainda os conceitos de «Território ocupado» um território que está ocupado segundo a definição

da Quarta Convenção de Genebra, e que foi: i) confirmado como tal numa decisão ou parecer consultivo do

Tribunal Internacional de Justiça; ii) confirmado como tal numa decisão do Tribunal Penal Internacional; iii)

confirmado como tal numa decisão de um tribunal internacional; iv) designado como tal para os fins desta Lei

num regulamento elaborado pelo governo, de acordo com o artigo 4.º e de «Potência ocupante» tem o mesmo

significado que na Quarta Convenção de Genebra, de 12 de agosto de 1949.

A aplicabilidade das medidas estabelecidas no diploma assenta num leque de definições intermediativas

concretamente previstas no artigo 2.º do projeto, aí relevando prima facie a Quarta Convenção de Genebra, no

que concerne ao entendimento dos conceitos de «potência ocupante» e de «território ocupado» e

derivadamente, de decisões jurisprudenciais internacionais integrativas desses mesmos conceitos.

Este projeto de lei define o âmbito territorial de aplicação da origem dos bens, serviços e recursos naturais

através da incumbência expressa ao Governo em publicar e de manter uma lista de todos os territórios

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considerados territórios ocupados.

O projeto de lei também define âmbito de aplicação pessoal: i) pessoas singulares possuidoras de cidadania

portuguesa ou residentes em Portugal; ii) pessoas coletivas, nos termos e para os efeitos do artigo 11.º do

Código Penal e iii) entidades sem personalidade jurídica cujas atividades sejam exercidas em Portugal.

A importação ou venda de bens, serviços e recursos naturais originários de colonatos ilegais em territórios

considerados ocupados pelo Direito Internacional tem respaldo criminal, nos termos deste projeto de lei, com

aplicação de pena de prisão até 5 anos, sendo a tentativa punível, apesar de não definir moldura penal.

Já o seu artigo 6.º vem prever um conjunto de (quatro) situações que, quando preenchidas, constituem

causas de exclusão da ilicitude relativamente ao crime tipificado no artigo 5.º, quando: i) o ato ou omissão (…)

foi cometido com o consentimento de uma entidade que é reconhecida pelo Estado como sendo a autoridade

legítima sobre esse território ocupado; ii) os bens ou serviços em questão não foram produzidos num território

ocupado por um colono ilegal; iii) os bens ou serviços em questão não foram produzidos por um colono ilegal

ou iv) os recursos naturais em questão não são originários de um território ocupado.

Em termos de enquadramento jurídico nacional, e de acordo com a nota técnica que acompanha esta

iniciativa legislativa, cumpre dizer:

O artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa (Constituição) enuncia as diversas fontes de direito

internacional que integram a ordem jurídica nacional, e, consequentemente, vigoram nesta:

− As normas e os princípios de direito internacional geral ou comum;

− As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas após a sua

publicação oficial;

− As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte;

− As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições no

desempenho das respetivas funções.

Por seu turno, vêm os n.os 1, 2, 3, e 7 do artigo 7.º da Constituição apresentar os fundamentos intrínsecos às

relações internacionais, extra União Europeia e países de língua portuguesa, tais como:

− Os princípios da independência nacional, do respeito dos direitos do homem, dos direitos dos povos, da

igualdade entre os Estados, da solução pacífica dos conflitos internacionais, da não ingerência nos

assuntos internos dos outros Estados e da cooperação com todos os outros povos para a emancipação

e o progresso da humanidade;

− A abolição do imperialismo, do colonialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e

exploração nas relações entre os povos, bem como o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a

dissolução dos blocos político-militares e o estabelecimento de um sistema de segurança coletiva, com

vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os

povos;

− O reconhecimento do direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem

como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão;

− A aceitação da jurisdição do Tribunal Penal Internacional, nas condições de complementaridade e demais

termos estabelecidos no Estatuto de Roma, com o propósito de uma justiça internacional que promova o

respeito pelos direitos da pessoa humana e dos povos.

Alguns dos instrumentos internacionais de direitos humanos que vinculam Portugal são:

−A Carta das Nações Unidas, publicada no Diário da República, Série I-A pelo Aviso n.º 66/91, de 22 de

maio de 1991,1 do Ministério dos Negócios Estrangeiros – Direção-Geral dos Negócios Político-

Económicos – trata-se do documento constitutivo desta organização internacional e no qual são

1 Disponível no sítio de internet do Diário da República Eletrónico. Todas as referências legislativas são feitas para este portal, salvo indicação em contrário.

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positivados os objetivos e princípios da atuação das Nações Unidas, assim como as funções e os poderes

adstritos aos seus diversos órgãos.

Os objetivos atribuídos às Nações Unidas, segundo o artigo 1.º da carta são:

1) Manter a paz e a segurança internacionais;

2) Desenvolver relações de amizade entre as nações baseadas no respeito do princípio da igualdade de

direitos e da autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz

universal;

3) Realizar a cooperação internacional;

4) Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns.

No artigo 2.º desta carta são enumerados os princípios inerentes à atuação das Nações Unidas e dos seus

membros, entre outros:

• A Organização é baseada no princípio da igualdade soberana de todos os seus membros;

• Os membros da Organização, a fim de assegurarem a todos em geral os direitos e vantagens resultantes

da sua qualidade de membros, deverão cumprir de boa fé as obrigações por eles assumidas em

conformidade com a presente carta;

• Os membros da Organização deverão resolver as suas controvérsias internacionais por meios pacíficos,

de modo a que a paz e a segurança internacionais, bem como a justiça, não sejam ameaçadas;

• Os membros deverão abster-se nas suas relações internacionais de recorrer à ameaça ou ao uso da força,

quer seja contra a integridade territorial ou a independência política de um Estado, quer seja de qualquer

outro modo incompatível com os objetivos das Nações Unidas.

−O Tribunal Internacional de Justiça constitui o principal órgão jurisdicional das Nações Unidas, tendo sido

criado pelo n.º 1 do artigo 7.º e pelos artigos 92.º a 96.º da Carta das Nações Unidas. A organização,

funcionamento, competências, processo, pareceres consultivos deste órgão é descrita no respetivo

Estatuto em anexo à Carta das Nações Unidas e faz parte integrante da mesma.

Para aceitar a jurisdição deste órgão, cada Estado-parte deve depositar a sua declaração2 junto do

Secretário-Geral das Nações Unidas. Portugal depositou, em 25 de fevereiro de 2005, tal documento3 a reafirmar

essa aceitação.

Conforme dispõe o n.º 1 do artigo 34.º do Estatuto do Tribunal, só os Estados podem ser partes nos litígios

perante este órgão jurisdicional.

De acordo com o n.º 1 do artigo 36.º e o n.º 1 do artigo 38.º do mesmo Estatuto, o seu âmbito de incumbências

abrange todas as questões que as partes lhe submetam, bem como todos os assuntos especialmente previstos

na Carta das Nações Unidas ou em tratados e convenções em vigor. As suas decisões são tomadas em

conformidade com o direito internacional como as convenções internacionais, gerais e especiais, expressamente

reconhecidas pelos Estados litigantes, o costume internacional; os princípios gerais de direito reconhecidos

pelas nações civilizadas, e as decisões judiciais e a doutrina dos publicistas mais qualificados das diferentes

nações como meio auxiliar para a determinação das regras de direito.

Note-se que a decisão do Tribunal apenas é obrigatória para as partes litigantes e para o caso em apreciação.

−A Declaração Universal de Direitos Humanos, adotada a 10 de dezembro de 1948 pela Assembleia Geral

das Nações Unidas através da Resolução 217 A (III)4. Esta corresponde a um dos instrumentos que viriam

a integrar a Carta das Nações Unidas, o texto oficial português foi publicado na 1.ª série do Diário da

República, de 9 de março de 1978.

2 Informação em https://www.icj-cij.org/en/declarations, consultada no dia 20-05-2021. 3 Disponível em https://www.icj-cij.org/en/declarations/pt, consultada no dia 20-05-2021. 4 Disponível em https://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/217(III), consultada no dia 20-05-2021.

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Num dos considerandos do preâmbulo deste documento é proclamado que «o reconhecimento da dignidade

inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento

da liberdade, da justiça e da paz no mundo».

Estabelece o artigo 16.º da Constituição que os direitos fundamentais consagrados no seu articulado não

excluem quaisquer outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional (n.º 1), e que os

preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de

harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (n.º 2).

−O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, ratificado pelo nosso país pelo Decreto do Presidente

da República n.º 2/2002, de 18 de janeiro, sendo o seu texto aprovado pela Resolução da Assembleia da

República n.º 3/2002, de 18 de janeiro; o artigo 124.º foi suprimido nos termos da Resolução da

Assembleia da República n.º 30/2017, de 20 de fevereiro, ratificada pelo Decreto do Presidente da

República n.º 20/2017, de 20 de fevereiro, e o artigo 8.º alterado pela Resolução da Assembleia da

República n.º 134/2021, de 4 de maio, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 45/2021, de

4 de maio.

O Tribunal Penal Internacional5, nos termos dos artigos 1.º, 4.º e 5.º do Estatuto de Roma, é uma instituição

permanente, com personalidade jurídica internacional e possui, igualmente, a capacidade jurídica necessária ao

desempenho das suas funções e à prossecução dos seus objetivos, sendo a sua jurisdição exercida sobre as

pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, de acordo com o referido

Estatuto, e é complementar das jurisdições penais nacionais. Consequentemente, o Tribunal tem competência

para julgar os crimes de genocídio (artigo 6.º), contra a humanidade (artigo 7.º), de guerra e de agressão (artigo

8.º).

−A IV Convenção de Genebra relativa à proteção das pessoas civis em tempo de guerra, de 12 de agosto

de 1949, é um dos tratados internacionais elaborados e adotados pela Organização das Nações Unidas,

tendo sido ratificada por Portugal pelo Decreto-Lei n.º 42991, de 26 de maio de 1960 (1.ª parte) e 2.ª parte

(nesta última parte é publicado o texto respeitante a este tratado, cfr. pág. 1238 e seguintes do Diário do

Governo).

Nos artigos 1.º, 2.º e 3.º deste tratado são materializadas as regras gerais que devem ser respeitadas em

todas as circunstâncias – em tempo de paz e em situação de guerra ou de conflito armado pelos Estados-Partes6

–, cuja finalidade é assegurar a proteção das pessoas que não tomem parte diretamente nas hostilidades e o

seu tratamento com humanidade, sem nenhuma distinção de carácter desfavorável baseada na raça, cor,

religião ou crença, sexo, nascimento ou fortuna, ou qualquer outro critério análogo, sendo ainda estabelecida a

recolha e o tratamento dos feridos e doentes.

São, ainda, proibidos, em qualquer ocasião e lugar, relativamente a estas pessoas, os seguintes atos:

a) As ofensas contra a vida e a integridade física, especialmente o homicídio sob todas as formas,

mutilações, tratamentos cruéis, torturas e suplícios;

b) A tomada de reféns;

c) As ofensas à dignidade das pessoas, especialmente os tratamentos humilhantes e degradantes;

d) As condenações proferidas e as execuções efetuadas sem prévio julgamento, realizado por um tribunal

regularmente constituído, que ofereça todas as garantias judiciais reconhecidas como indispensáveis pelos

povos civilizados.

Conforme estatuem o n.º 1 do artigo 7.º e os artigos 23.º a 54.º da Carta das Nações Unidas, o Conselho de

Segurança das Nações Unidas tem como funções assegurar a manutenção da paz e da segurança

internacionais. Um dos meios que este órgão tem ao seu dispor para o restabelecimento e manutenção da paz

e segurança internacionais é a Resolução. A situação de Israel e da Palestina foi abordada na Resolução 2334

(2016)7. No contexto deste documento, o Conselho de Segurança das Nações Unidas define várias medidas

5 Sítio oficial em https://www.icc-cpi.int/about, consultado no dia 20-05-2021, o seu lema é «This cause … is the cause of all humanity» (Esta causa … é a causa de toda a humanidade). 6 Lista acessível em https://ihl-databases.icrc.org/applic/ihl/ihl.nsf/vwTreatiesByCountry.xsp, consultada no dia 20-05-2021. 7 Consultada em https://undocs.org/S/RES/2334(2016), no dia 21-05-2021.

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que devem ser tomadas por Israel, como o respeito escrupuloso das suas obrigações e responsabilidades legais

vertidas na IV Convenção de Genebra relativa à Proteção de Pessoas Civis em Tempo de Guerra, de 12 de

agosto de 1949, e relembra a opinião consultiva8 do Tribunal Internacional de Justiça emitida no dia 9 de julho

de 2004 sobre as consequências legais da construção do muro nos territórios ocupados da Palestina.

No Capítulo IV9, em concreto o ponto C10, do relatório da 53.ª sessão da Comissão de Direito Internacional11,

este órgão recomenda à Assembleia Geral a adoção de uma resolução sobre a Responsabilidade dos Estados

por atos internacionalmente ilícitos e no ponto E apresenta o respetivo projeto, cujo texto final é aprovado em

anexo à Resolução da Assembleia-Geral A/RES/56/8312.

Segundo o artigo 2.º do anexo a esta resolução, existe um ato internacionalmente ilícito de um Estado quando

o seu comportamento, ação ou omissão:

− De acordo com as normas de direito internacional, lhe seja imputável; e

− Constitua uma violação de uma obrigação internacional a que se encontra vinculado.

No articulado desta resolução são, ainda, esclarecidos outros aspetos inerentes a esta temática como:

−A noção de violação de uma obrigação internacional (artigos 12.º a 15.º);

−A responsabilidade de um Estado relativamente a um ato de outro Estado (artigos 16.º a 19.º);

−As circunstâncias que excluem a ilicitude (artigos 20.º a 27.º);

−A responsabilidade internacional de um Estado: os princípios gerais (artigos 28 a 33); a reparação por

danos (artigos 34.º a 39.º); as violações graves das obrigações conforme as normas imperativas do direito

internacional geral (artigos 40.º e 41.º);

−A efetivação da responsabilidade internacional de um Estado (artigos 42.º a 54.º); e

−As disposições gerais (artigos 55.º a 59.º).

Relativamente às relações comerciais, a Constituição, no seu papel conformador do ordenamento jurídico,

identifica, desde logo, no seu artigo 80.º, os princípios fundamentais que devem estar presentes aquando do

estabelecimento da organização económico-social do país, em particular as alíneas a) e e):

−Subordinação do poder económico ao poder político democrático;

−Planeamento democrático do desenvolvimento económico e social.

Nas diversas alíneas insertas no artigo 81.º da Constituição são enunciadas as tarefas prioritárias atinentes

à esfera de competências do Estado na regulação económica e social do País que, entre outras, conforme as

alíneas g) e j) são:

− Desenvolver as relações económicas com todos os povos, salvaguardando sempre a independência

nacional e os interesses dos portugueses e da economia do País;

− Criar os instrumentos jurídicos e técnicos necessários ao planeamento democrático do desenvolvimento

económico e social.

Ainda no conjunto dos preceitos basilares da organização económica, o artigo 99.º da Constituição positiva

os objetivos da política comercial, um dos quais é o desenvolvimento e a diversificação das relações económicas

externas [alínea d)].

Presentemente, a par da integração do nosso país na União Europeia e, consequentemente, do mercado

interno existente no espaço comunitário e das suas quatro liberdades fundamentais (a livre circulação de

8 Disponível em https://www.icj-cij.org/public/files/case-related/131/131-20040709-ADV-01-00-BI.pdf (versão bilingue – Francês e Inglês), consultada no dia 21-05-2021. 9 Acessível em https://legal.un.org/ilc/reports/2001/english/chp4.pdf, consultado no dia 21-05-2021. 10 Pág. 25 do documento. 11 Sítio de internet oficial no endereço https://legal.un.org/ilc/, consultado no dia 21-05-2021. 12 Disponível em https://undocs.org/en/A/RES/56/83, consultada no dia 21-05-2021.

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mercadorias, das pessoas, dos serviços e dos capitais13), constata-se que as transações económicas de bens,

produtos e serviços, quer por importação ou exportação, assumem, cada vez mais, uma perspetiva internacional.

Importa referir a Lei n.º 97/2017, de 23 de agosto, que regula a aplicação e a execução de medidas restritivas

aprovadas pela Organização das Nações Unidas ou pela União Europeia e estabelece o regime sancionatório

aplicável à violação destas medidas.

Como prevê o artigo 2.º desta lei, uma medida restritiva é uma restrição temporária do exercício de um

determinado direito, através da imposição de uma proibição ou de uma obrigação, aprovada pela Organização

das Nações Unidas ou pela União Europeia e que visa a prossecução de pelo menos um dos seguintes objetivos:

a) A manutenção ou restabelecimento da paz e da segurança internacionais;

b) A proteção dos direitos humanos;

c) A democracia e o Estado de direito;

d) A preservação da soberania e da independência nacionais e de outros interesses fundamentais do

Estado;

e) A prevenção e repressão do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa.

Relativamente à execução das medidas restritivas relativas à importação e exportação de bens, em

conformidade com o determinado no n.º 1 do artigo 12.º da Lei n.º 97/2017, de 23 de agosto, aplicam-se os

regimes jurídicos destas atividades.

Cumpre ainda aludir à Convenção das Nações Unidas sobre Contratos para Venda Internacional de

Mercadorias elaborada pela Comissão das Nações Unidas sobre o Direito Comercial Internacional (CNUDCI)14,

agência especializada no seio da Organização Unidas, adotada em Viena, em 11 de abril de 1980, e ratificada

por Portugal através do Decreto n.º 5/2020, de 7 de agosto.

Este dispositivo preceitua sobre a formação dos contratos de compra e venda internacional, isto é, as

transações cujas partes têm os seus estabelecimentos em diferentes Estados, bem como identifica os direitos

e obrigações emergentes desse contrato para o vendedor e para o comprador.

Relativamente ao normativo penal, o Código Penal aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de

setembro, e revisto e publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, constitui o dispositivo-base

deste domínio jurídico que, através das suas normas, define os comportamentos humanos como contrários ao

direito e para os quais define a respetiva consequência jurídica (penas e medidas de segurança).

O artigo 11.º encontra-se inserido no Capítulo I – Pressupostos da punição do Título II – Do facto, e no seu

texto é prevista a responsabilidade criminal das pessoas singulares (n.º 1) e das pessoas coletivas e entidades

equiparadas (n.os 2 e 4 a 11).

Considerando a posição da União Europeia (UE) sobre os territórios ocupados por Israel desde junho de

1967, e o apelo geral dos Estados-Membros sobre a aplicação da legislação da União existente em matéria de

indicação da origem dos produtos, de forma a assegurar a transparência na informação fornecida aos

consumidores da UE, a Comissão publicou uma Nota interpretativa15 sobre a indicação da origem dos bens

provenientes dos territórios ocupados por Israel desde junho de 1967. Concretamente, este documento clarifica

qual a denominação que os produtos provenientes desses territórios devem ter, ao estipular, por exemplo que,

caso provenham de colonatos israelitas nos Montes Golã ou na Cisjordânia, não devem ter a indicação de

«produto de Israel» por estar incorreto ou ser enganador16, sugerindo a utilização da designação «produto dos

Montes Golã (colonato israelita)»17.

Neste contexto, o Parlamento Europeu questionou a Comissão Europeia18, em janeiro de 2019, sobre qual a

sua posição relativamente à proposta de lei da Irlanda, que proibia o país de transacionar bens e serviços a

partir de territórios ocupados por Israel, tendo a Comissão respondido19 que a UE rejeitava quaisquer tentativas

de isolamento de Israel e não apoiava os apelos para um boicote, reiterando, no entanto que, a UE não

reconhecia a soberania sobre os territórios ocupados por Israel desde junho de 1967, pelo que não os

13 Cfr. o n.º 2 do artigo 26.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) (versão consolidada), acessível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:12012E/TXT&from=PT, consultado no dia 19-05-2021. 14 Acessível em https://uncitral.un.org/, consultado no dia 19-05-2021. 15 https://eeas.europa.eu/delegations/israel/10130/interpretative-notice-indication-origin-goods-territories-occupied-israel-june-1967_en 16 Ponto 7 da Nota Interpretativa. 17 Ponto 10 da Nota Interpretativa. 18 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/P-8-2019-000081_EN.html 19 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/P-8-2019-000081-ASW_EN.html

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considerava parte do território de Israel, independentemente do seu estatuto legal ao abrigo do direito interno

israelita. Mencionou ainda as Conclusões do Conselho de Negócios Estrangeiros de 18 janeiro 2016 sobre este

tema nas quais se estipulou que a UE expressa o seu compromisso de assegurar que – em conformidade com

o direito internacional – todos os acordos entre o Estado de Israel e a UE terão de indicar inequívoca e

explicitamente a sua inaplicabilidade aos territórios ocupados por Israel em 1967. Não se trata de um boicote a

Israel, a que a UE se opõe firmemente20.

Um ano mais tarde, em janeiro de 2020, o Parlamento Europeu questiona uma vez mais a Comissão21 sobre

a sua posição referente à venda de produtos produzidos em colonatos israelitas ilegais nos territórios ocupados

e sobre a possibilidade de introduzir uma proibição de importação desses produtos, tendo a Comissão

respondido22 que, embora a UE se oponha ao boicote de Israel, distingue, nas suas negociações relevantes, o

território do Estado de Israel e os territórios ocupados por este desde 1967, destacando que os produtos

originários dos colonatos nestes territórios ocupados podem entrar na UE mas não se aplicavam, a tais produtos,

preferências ou outras medidas de facilitação do comércio ao abrigo da legislação ou acordos da UE. Referiu

ainda que o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia em 12 de novembro de 2019 no

Processo C-363/1823, confirmou que os produtos originários dos colonatos israelitas deviam ostentar uma

indicação de origem correta e não enganosa para o consumidor.

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

Sendo a opinião do autor de emissão facultativa, a Deputada autora do presente relatório exime-se, nesta

sede, de manifestar a sua opinião sobre a proposta em análise.

PARTE III – Conclusões

1 – O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda tomou a iniciativa de apresentar, a 7 de maio de 2021, o

Projeto de Lei n.º 836/XIV/2.ª (BE), que «estabelece a proibição da importação ou venda de bens, serviços e

recursos naturais provenientes de colonatos ilegais em territórios ocupados».

2 – O projeto de lei em análise tem por finalidade identificar os territórios considerados colonatos ilegais e

definir um quadro penal que vise impedir a importação ou venda de bens, serviços e recursos naturais originários

destes territórios.

3 – Nestes termos, a Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas é de parecer que o

Projeto de Lei n.º 836/XIV/2.ª (BE) está em condições de ser votado no Plenário da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 1 de julho de 2021.

A Deputada autora do relatório, Catarina Rocha Ferreira — O Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, na reunião da Comissão de 7 de julho de 2021.

Parte IV – Anexos

Nota técnica.

20 Vide nota de rodapé n.º 8. 21 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/E-9-2020-000007_EN.html 22 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/E-9-2020-000007-ASW_EN.html 23https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf;jsessionid=AA6A0A7C03EE6F752E9A1971BC78D13D?text=&docid=220534&pageIndex=0&doclang=PT&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=5822493

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Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 836/XIV/2.ª (BE)

Estabelece a proibição da importação ou venda de bens, serviços e recursos naturais provenientes

de colonatos ilegais em territórios ocupados

Data de admissão: 17 de maio de 2021.

Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas (em conexão com a Comissão de

Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Sandra Rolo e Belchior Lourenço (DILP); Rafael Silva (DAPLEN); Paula Faria (BIB); Gonçalo Sousa Pereira (CAE); e Raul Maia Oliveira (DAC). Data:

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

Desde o final da Segunda Guerra Mundial que o conflito israelo-árabe tem provocado enorme desgaste

político, social e económico para a comunidade internacional e em particular para os habitantes da região

geográfica em presença, inviabilizando um compromisso sério e duradouro para a paz baseado na interrupção

da lógica de violência entre as partes conflituantes. Os avanços conseguidos em 1993 com o Acordo de Oslo,

deixaram por resolver, entre outras questões, precisamente, a da política israelita de instalação de colonatos.

A partição de áreas de influência nos territórios palestinianos entre o Hamas, na Faixa de Gaza e a al-Fatah,

na Cisjordânia, com o correspondente e progressivo enfraquecimento da Autoridade Nacional Palestiniana,

trouxe, no período compreendido entre 2006 e 2014, sucessivas escaladas no conflito armado com Israel, num

incessante e violento processo de demarcação de espaços e fronteiras, pulverizando quaisquer capacidades ou

veleidades de entendimento. É neste contexto que a política de estabelecimento de colonatos, alimentada por

políticas de feição mais conservadora e nacionalista, tem vindo a fortalecer-se, fundamentalmente, como uma

medida estratégica de expansão e domínio territorial e securitário, por parte do Estado de Israel.1

Pese embora a condenação da política israelita de estabelecimento de colonatos em territórios da Cisjordânia

palestiniana e de Jerusalém oriental, por parte de diversas instâncias internacionais, como a Organização das

Nações Unidas e a própria União Europeia (EU), o facto é que, como afirmam os promotores desta iniciativa,

«(…) o comércio internacional (…) com territórios considerados ocupados pelo Direito Internacional, continua a

ser uma realidade imutável, efetivamente legitimando e fortalecendo económica e financeiramente a potência

ocupante». Apesar da clareza da posição da União, contrária à implantação de colonatos em territórios

1 Consultar, por todos, o artigo de imprensa disponível em: http://www.publico.pt/mundo/noticia/netanyahu-bate-recorde-de-construcao-nos-colonatos-em-territorios-ocupados-1581083.

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palestinianos ocupados, não só por serem ilegais como por inviabilizarem uma solução de paz, baseada na

coexistência de dois Estados, referem os promotores da presente iniciativa que «(…) os Estados-Membros da

EU, incluindo Portugal, continuam a tornar os colonatos israelitas financeiramente viáveis, (…) e que resultam

na exportação de produtos agrícolas e outros materiais (…)» que ali são produzidos.

Pretende-se, pois, com esta iniciativa, adotar «(…) medidas tornar tangíveis medidas que punam a ocupação

ilegal do Estado de Israel de territórios palestinianos (…)» e alinhar «(…) as políticas e relações comerciais de

Portugal com o Direito Internacional.»

Em particular, o presente projeto de lei visa implementar um regime sancionatório de natureza penal,

proibindo relações comerciais com colonatos ilegalmente estabelecidos em «territórios ocupados» pelo Estado

de Israel, abrangendo cidadãos portugueses ou estrangeiros, desde que residentes em Portugal, bem como

entidades coletivas, independentemente da posse de personalidade jurídica própria.

A aplicabilidade das medidas estabelecidas no diploma assenta num leque de definições intermediativas

concretamente previstas no artigo 2.º do projeto, aí relevando prima facie a Quarta Convenção de Genebra2, no

que concerne ao entendimento dos conceitos de «potência ocupante» e de «território ocupado» e

derivadamente, de decisões jurisprudenciais internacionais integrativas desses mesmos conceitos.

Nuclear nesta iniciativa, o artigo 5.º do projeto prevê a punição com pena de prisão até 5 anos, a compra ou

a venda de bens total ou parcialmente produzidos em «colonatos ilegais», a contratação de prestação de

serviços com origem nesses colonatos e ainda, a extração, por qualquer meio, de recursos de um território

ocupado ou das suas águas territoriais associadas.

Já o seu artigo 6.º vem prever um conjunto de (quatro) situações que, quando preenchidas, constituem

causas de exclusão da ilicitude relativamente ao crime tipificado no artigo 5.º.

• Enquadramento jurídico nacional

O artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa3 (Constituição) enuncia as diversas fontes de direito

internacional que integram a ordem jurídica nacional, e, consequentemente, vigoram nesta:

− As normas e os princípios de direito internacional geral ou comum;

− As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas após a sua

publicação oficial;

− As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte;

− As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições no

desempenho das respetivas funções.

Por seu turno, vêm os n.os 1, 2, 3, e 7 do artigo 7.º da Constituição apresentar os fundamentos intrínsecos às

relações internacionais, extra União Europeia e países de língua portuguesa, tais como:

− Os princípios da independência nacional, do respeito dos direitos do homem, dos direitos dos povos, da

igualdade entre os Estados, da solução pacífica dos conflitos internacionais, da não ingerência nos

assuntos internos dos outros Estados e da cooperação com todos os outros povos para a emancipação

e o progresso da humanidade;

− A abolição do imperialismo, do colonialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e

exploração nas relações entre os povos, bem como o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a

dissolução dos blocos político-militares e o estabelecimento de um sistema de segurança coletiva, com

vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os

povos;

− O reconhecimento do direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem

como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão;

− A aceitação da jurisdição do Tribunal Penal Internacional, nas condições de complementaridade e demais

2 Todas as quatro Convenções, ditas de Genebra, foram outorgadas a 12 de agosto de 1949; a Quarta, visou a proteção dos civis, inclusive em territórios ocupados. 3 Todas as referências à Constituição são feitas para o site da Assembleia da República.

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termos estabelecidos no Estatuto de Roma, com o propósito de uma justiça internacional que promova o

respeito pelos direitos da pessoa humana e dos povos.

Alguns dos instrumentos internacionais de direitos humanos que vinculam Portugal são:

−A Carta das Nações Unidas, publicada no Diário da República, Série I-A pelo Aviso n.º 66/91, de 22 de

maio de 19914 do Ministério dos Negócios Estrangeiros – Direção-Geral dos Negócios Político-

Económicos – trata-se do documento constitutivo desta organização internacional e no qual são

positivados os objetivos e princípios da atuação das Nações Unidas, assim como as funções e os poderes

adstritos aos seus diversos órgãos.

Os objetivos atribuídos às Nações Unidas, segundo o artigo 1.º da carta são:

1) Manter a paz e a segurança internacionais;

2) Desenvolver relações de amizade entre as nações baseadas no respeito do princípio da igualdade de

direitos e da autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz

universal;

3) Realizar a cooperação internacional;

4) Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns.

No artigo 2.º desta carta são enumerados os princípios inerentes à atuação das Nações Unidas e dos seus

membros, entre outros:

− A Organização é baseada no princípio da igualdade soberana de todos os seus membros;

− Os membros da Organização, a fim de assegurarem a todos em geral os direitos e vantagens resultantes

da sua qualidade de membros, deverão cumprir de boa fé as obrigações por eles assumidas em

conformidade com a presente carta;

− Os membros da Organização deverão resolver as suas controvérsias internacionais por meios pacíficos,

de modo a que a paz e a segurança internacionais, bem como a justiça, não sejam ameaçadas;

− Os membros deverão abster-se nas suas relações internacionais de recorrer à ameaça ou ao uso da força,

quer seja contra a integridade territorial ou a independência política de um Estado, quer seja de qualquer

outro modo incompatível com os objetivos das Nações Unidas.

O Tribunal Internacional de Justiça5 constitui o principal órgão jurisdicional das Nações Unidas, tendo sido

criado pelo n.º 1 do artigo 7.º e pelos artigos 92.º a 96.º da Carta das Nações Unidas. A organização,

funcionamento, competências, processo, pareceres consultivos deste órgão é descrita no respetivo Estatuto em

anexo à Carta das Nações Unidas e faz parte integrante da mesma.

Para aceitar a jurisdição deste órgão, cada Estado-parte deve depositar a sua declaração6 junto do

Secretário-Geral das Nações Unidas. Portugal depositou, em 25 de fevereiro de 2005, tal documento7 a reafirmar

essa aceitação.

Conforme dispõe o n.º 1 do artigo 34.º do Estatuto do Tribunal, só os Estados podem ser partes nos litígios

perante este órgão jurisdicional.

De acordo com o n.º 1 do artigo 36.º e o n.º 1 do artigo 38.º do mesmo Estatuto, o seu âmbito de incumbências

abrange todas as questões que as partes lhe submetam, bem como todos os assuntos especialmente previstos

na Carta das Nações Unidas ou em tratados e convenções em vigor. As suas decisões são tomadas em

conformidade com o direito internacional como as convenções internacionais, gerais e especiais, expressamente

reconhecidas pelos Estados litigantes, o costume internacional; os princípios gerais de direito reconhecidos

pelas nações civilizadas, e as decisões judiciais e a doutrina dos publicistas mais qualificados das diferentes

4 Disponível no sítio de internet do Diário da República Eletrónico. Todas as referências legislativas são feitas para este portal, salvo indicação em contrário. 5 Acessível em https://www.icj-cij.org/en/court, consultado no dia 20-05-2021. 6 Informação em https://www.icj-cij.org/en/declarations, consultada no dia 20-05-2021. 7 Disponível em https://www.icj-cij.org/en/declarations/pt, consultada no dia 20-05-2021.

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nações como meio auxiliar para a determinação das regras de direito.

Note-se que a decisão do Tribunal apenas é obrigatória para as partes litigantes e para o caso em apreciação.

−A Declaração Universal de Direitos Humanos, adotada a 10 de dezembro de 1948 pela Assembleia Geral

das Nações Unidas através da Resolução 217 A (III)8. Esta corresponde a um dos instrumentos que viriam

a integrar a Carta das Nações Unidas, o texto oficial português foi publicado na 1.ª série do Diário da

República, de 9 de março de 1978, por Aviso do Ministério dos Negócios Estrangeiros – Direção-Geral

dos Negócios Políticos.

Num dos considerandos do preâmbulo deste documento é proclamado que «o reconhecimento da dignidade

inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento

da liberdade, da justiça e da paz no mundo».

Estabelece o artigo 16.º da Constituição que os direitos fundamentais consagrados no seu articulado não

excluem quaisquer outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional (n.º 1), e que os

preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de

harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (n.º 2).

Sustentam Jorge Miranda e Rui Medeiros que «o n.º 2 pretende situar os direitos fundamentais num contexto

mais vasto e mais sólido que o da Constituição em sentido instrumental e impregná-los dos princípios e valores

da Declaração, como parte essencial da ideia de Direito à luz da qual todas as normas constitucionais – e, por

conseguinte, toda a ordem jurídica portuguesa – têm de ser pensadas e postas em prática.»9.

−O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, ratificado pelo nosso país pelo Decreto do Presidente

da República n.º 2/2002, de 18 de janeiro, sendo o seu texto aprovado pela Resolução da Assembleia da

República n.º 3/2002, de 18 de janeiro; o artigo 124.º foi suprimido nos termos da Resolução da

Assembleia da República n.º 30/2017, de 20 de fevereiro, ratificada pelo Decreto do Presidente da

República n.º 20/2017, de 20 de fevereiro, e o artigo 8.º alterado pela Resolução da Assembleia da

República n.º 134/2021, de 4 de maio, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 45/2021, de

4 de maio.

O Tribunal Penal Internacional10, nos termos dos artigos 1.º, 4.º e 5.º do Estatuto de Roma, é uma instituição

permanente, com personalidade jurídica internacional e possui, igualmente, a capacidade jurídica necessária ao

desempenho das suas funções e à prossecução dos seus objetivos, sendo a sua jurisdição exercida sobre as

pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, de acordo com o referido

Estatuto, e é complementar das jurisdições penais nacionais. Consequentemente, o Tribunal tem competência

para julgar os crimes de genocídio (artigo 6.º), contra a humanidade (artigo 7.º), de guerra e de agressão (artigo

8.º).

−A IV Convenção de Genebra relativa à proteção das pessoas civis em tempo de guerra, de 12 de agosto

de 1949, é um dos tratados internacionais elaborados e adotados pela Organização das Nações Unidas,

tendo sido ratificada por Portugal pelo Decreto-Lei n.º 42991, de 26 de maio de 1960 (1.ª parte) e 2.ª parte

(nesta última parte é publicado o texto respeitante a este tratado, cfr. pág. 1238 e seguintes do Diário do

Governo).

Nos artigos 1.º, 2.º e 3.º deste tratado são materializadas as regras gerais que devem ser respeitadas em

todas as circunstâncias – em tempo de paz e em situação de guerra ou de conflito armado pelos Estados-

Partes11 -, cuja finalidade é assegurar a proteção das pessoas que não tomem parte diretamente nas hostilidades

e o seu tratamento com humanidade, sem nenhuma distinção de carácter desfavorável baseada na raça, cor,

religião ou crença, sexo, nascimento ou fortuna, ou qualquer outro critério análogo, sendo ainda estabelecida a

recolha e o tratamento dos feridos e doentes.

8 Disponível em https://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/217(III), consultada no dia 20-05-2021. 9 In: MIRANDA, Jorge; MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada.Coimbra: Coimbra Editora, 2005. 3 tomos. ISBN 972-32-1308-7 (tomo I), pág. 140. 10 Sítio oficial em https://www.icc-cpi.int/about, consultado no dia 20-05-2021, o seu lema é «This cause … is the cause of all humanity» (Esta causa … é a causa de toda a humanidade). 11 Lista acessível em https://ihl-databases.icrc.org/applic/ihl/ihl.nsf/vwTreatiesByCountry.xsp, consultada no dia 20-05-2021.

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São, ainda, proibidos, em qualquer ocasião e lugar, relativamente a estas pessoas, os seguintes atos:

a) As ofensas contra a vida e a integridade física, especialmente o homicídio sob todas as formas,

mutilações, tratamentos cruéis, torturas e suplícios;

b) A tomada de reféns;

c) As ofensas à dignidade das pessoas, especialmente os tratamentos humilhantes e degradantes;

d) As condenações proferidas e as execuções efetuadas sem prévio julgamento, realizado por um tribunal

regularmente constituído, que ofereça todas as garantias judiciais reconhecidas como indispensáveis pelos

povos civilizados.

Conforme estatuem o n.º 1 do artigo 7.º e os artigos 23.º a 54.º da Carta das Nações Unidas, o Conselho de

Segurança das Nações Unidas tem como funções assegurar a manutenção da paz e da segurança

internacionais. Um dos meios que este órgão tem ao seu dispor para o restabelecimento e manutenção da paz

e segurança internacionais é a Resolução.

A situação de Israel e da Palestina foi abordada na Resolução 2334 (2016)12. No contexto deste documento,

o Conselho de Segurança das Nações Unidas define várias medidas que devem ser tomadas por Israel, como

o respeito escrupuloso das suas obrigações e responsabilidades legais vertidas na IV Convenção de Genebra

relativa à Proteção de Pessoas Civis em Tempo de Guerra, de 12 de agosto de 1949, e relembra a opinião

consultiva13 do Tribunal Internacional de Justiça emitida no dia 9 de julho de 2004 sobre as consequências legais

da construção do muro nos territórios ocupados da Palestina.

No Capítulo IV14, em concreto o ponto C15, do relatório da 53.ª sessão da Comissão de Direito Internacional16,

este órgão recomenda à Assembleia Geral a adoção de uma resolução sobre a Responsabilidade dos Estados

por atos internacionalmente ilícitos e no ponto E apresenta o respetivo projeto, cujo texto final é aprovado em

anexo à Resolução da Assembleia-Geral A/RES/56/8317.

Segundo o artigo 2.º do anexo a esta resolução, existe um ato internacionalmente ilícito de um Estado quando

o seu comportamento, ação ou omissão:

− De acordo com as normas de direito internacional, lhe seja imputável; e

− Constitua uma violação de uma obrigação internacional a que se encontra vinculado.

No articulado desta resolução são, ainda, esclarecidos outros aspetos inerentes a esta temática como:

−A noção de violação de uma obrigação internacional (artigos 12.º a 15.º);

−A responsabilidade de um Estado relativamente a um ato de outro Estado (artigos 16.º a 19.º);

−As circunstâncias que excluem a ilicitude (artigos 20.º a 27.º);

−A responsabilidade internacional de um Estado: os princípios gerais (artigos 28.º a 33.º); a reparação por

danos (artigos 34.º a 39.º); as violações graves das obrigações conforme as normas imperativas do direito

internacional geral (artigos 40.º e 41.º);

−A efetivação da responsabilidade internacional de um Estado (artigos 42.º a 54.º);e

−As disposições gerais (artigos 55.º a 59.º).

O comércio

«O comércio não é um fim em si mesmo. É um instrumento para beneficiar as pessoas.»18, ou melhor, as

12 Consultada em https://undocs.org/S/RES/2334(2016), no dia 21-05-2021. 13 Disponível em https://www.icj-cij.org/public/files/case-related/131/131-20040709-ADV-01-00-BI.pdf (versão bilingue – Francês e Inglês), consultada no dia 21-05-2021. 14 Acessível em https://legal.un.org/ilc/reports/2001/english/chp4.pdf, consultado no dia 21-05-2021. 15 Pág. 25 do documento. 16 Sítio de internet oficial no endereço https://legal.un.org/ilc/, consultado no dia 21-05-2021. 17 Disponível em https://undocs.org/en/A/RES/56/83, consultada no dia 21-05-2021. 18 In: Estratégia comercial e de investimento para a União Europeia, apresentada pela Comissão Europeia em 14 de outubro de 2015, com o título «Comércio para todos: Rumo a uma política mais responsável em matéria de comércio e de investimento», pág. 36, disponível em http://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2016/january/tradoc_154138.pdf, consultada no dia 19-05-2021.

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relações comerciais assumem uma natureza económica e social com consequências na vida dos cidadãos.

A Constituição, no seu papel conformador do ordenamento jurídico, identifica, desde logo, no seu artigo 80.º,

os princípios fundamentais que devem estar presentes aquando do estabelecimento da organização económico-

social do país, em particular as alíneas a) e e):

−Subordinação do poder económico ao poder político democrático, «(…) [alínea a)]. Esta norma reflete na

ordem económica fundamental o princípio geral do Estado de Direito Democrático afirmado como princípio

fundamental da República Portuguesa no artigo 2.º da Constituição. Esta alínea parte da verificação de

que, a par do poder político, existem outros ‘poderes’ de grande porte económico concentrado em

organizações de interesses de vária ordem, que, sendo legítimos, não podem, todavia, impedir a

realização da democracia económica e social a cargo do poder político democraticamente legitimado.»19.

−Planeamento democrático do desenvolvimento económico e social «(…) é um corolário do princípio da

subordinação do poder económico ao poder político democrático.»20 (itálicos dos autores).

Nas diversas alíneas insertas no artigo 81.º da Constituição são enunciadas as tarefas prioritárias atinentes

à esfera de competências do Estado na regulação económica e social do país que, entre outras, conforme as

alíneas g) e j) são:

− Desenvolver as relações económicas com todos os povos, salvaguardando sempre a independência

nacional e os interesses dos portugueses e da economia do país;

− Criar os instrumentos jurídicos e técnicos necessários ao planeamento democrático do desenvolvimento

económico e social.

Ainda no conjunto dos preceitos basilares da organização económica, o artigo 99.º da Constituição positiva

os objetivos da política comercial, um dos quais é o desenvolvimento e a diversificação das relações económicas

externas [alínea d)].

Nas palavras de António Menezes Cordeiro, «O Direito comercial é Direito privado. Trata-se de uma área

normativa dominada por vectores de igualdade e de liberdade: os diversos sujeitos apresentam-se sem poderes

de autoridade e podem, em princípio, desenvolver todas as actividades que a lei não proíba.»21.

Expressa, igualmente, o mesmo autor que, «Numa valoração teórica, o Direito comercial reporta-se a

relações interindividuais de nível profundo (…).

Em termos práticos, o Direito comercial é cultivado por privatistas, surge no prolongamento lógico de múltiplas

conceções civis e é aplicado em conjunto com os diversos institutos comuns.

Finalmente, em termos significativo-ideológicos, o Direito comercial, tal como o civil, dá corpo ao sentir

profundo da sociedade em que surja.»22.

A regulação jurídica das relações comerciais encontra-se dispersa por vários normativos, um dos quais é o

Código Comercial23, aprovado pela Carta de Lei de 28 de junho de 1888 publicada no Diário do Governo n.º

203, de 6 de setembro (texto consolidado) do qual, hodiernamente, somente algumas disposições estão em

vigor.

O artigo 2.º deste código apresenta a noção de atos de comércio como todos aqueles que se acharem

especialmente regulados neste Código e, além deles, todos os contratos e obrigações dos comerciantes que

não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário do próprio ato não resultar. Os artigos 463.º a 476.º

do mesmo código regulam a compra e venda.

A disciplina das relações comerciais é, ainda, complementada pelos artigos 874.º a 878.º, 879.º a 886.º, 887.º

a 891.º, 892.º a 904.º, 905.º a 912.º, 913.º a 922.º, 923.º a 926.º, 927.º a 933.º, 934.º a 936.º, 937.º a 938.º e

939.º, todas as normas do Código Civil, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de

1966 (texto consolidado).

19 In: MIRANDA, Jorge; MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada.Coimbra: Coimbra Editora, 2006. 3 tomos. ISBN 972-32-1308-7 (tomo II), pág. 12. 20 Idem, pág. 14. 21 In: CORDEIRO, António Menezes – Manual de Direito Comercial. Reimpressão da 2.ª edição de fevereiro de 2007 (revista, atualizada e aumentada). Coimbra: Edições Almedina, 2009. ISBN 978-972-40-3094-4, pág. 37. 22 Idem, pág. 38. 23 Acessível em https://db.datajuris.pt/pdfs/codigos/ccomercial.pdf, consultado no dia 22-05-2021.

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Presentemente, a par da integração do nosso país na União Europeia e, consequentemente, do mercado

interno existente no espaço comunitário e das suas quatro liberdades fundamentais (a livre circulação de

mercadorias, das pessoas, dos serviços e dos capitais24), constata-se que as transações económicas de bens,

produtos e serviços, quer por importação ou exportação, assumem, cada vez mais, uma perspetiva internacional.

Importa referir a Lei n.º 97/2017, de 23 de agosto, (texto consolidado) que regula a aplicação e a execução

de medidas restritivas aprovadas pela Organização das Nações Unidas ou pela União Europeia e estabelece o

regime sancionatório aplicável à violação destas medidas.

Como prevê o artigo 2.º desta lei, uma medida restritiva é uma restrição temporária do exercício de um

determinado direito, através da imposição de uma proibição ou de uma obrigação, aprovada pela Organização

das Nações Unidas ou pela União Europeia e que visa a prossecução de pelo menos um dos seguintes objetivos:

a) A manutenção ou restabelecimento da paz e da segurança internacionais;

b) A proteção dos direitos humanos;

c) A democracia e o Estado de direito;

d) A preservação da soberania e da independência nacionais e de outros interesses fundamentais do

Estado;

e) A prevenção e repressão do terrorismo e da proliferação de armas de destruição em massa.

Relativamente à execução das medidas restritivas relativas à importação e exportação de bens, em

conformidade com o determinado no n.º 1 do artigo 12.º da Lei n.º 97/2017, de 23 de agosto, aplicam-se os

regimes jurídicos destas atividades.

Cumpre ainda aludir à Convenção das Nações Unidas sobre Contratos para Venda Internacional de

Mercadorias elaborada pela Comissão das Nações Unidas sobre o Direito Comercial Internacional (CNUDCI)25,

agência especializada no seio da Organização Unidas, adotada em Viena, em 11 de abril de 1980, e ratificada

por Portugal através do Decreto n.º 5/2020, de 7 de agosto.

Este dispositivo preceitua sobre a formação dos contratos de compra e venda internacional, isto é, as

transações cujas partes têm os seus estabelecimentos em diferentes Estados, bem como identifica os direitos

e obrigações emergentes desse contrato para o vendedor e para o comprador.

As normas jurídico-penais

«(…), o Direito Penal tem um fim específico, o de garantir, contra os atentados mais graves, a paz social,

protegendo os bens jurídicos que a sociedade considera essenciais para a convivência social e desenvolvimento

individual e colectivo.»26.

Nestes termos, o Código Penal (texto consolidado) aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de

setembro, e revisto e publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, constitui o dispositivo-base

deste domínio jurídico que, através das suas normas, define os comportamentos humanos como contrários ao

direito e para os quais define a respetiva consequência jurídica (penas e medidas de segurança).

O artigo 11.º encontra-se inserido no Capítulo I – Pressupostos da punição do Título II – Do facto, e no seu

texto é prevista a responsabilidade criminal das pessoas singulares (n.º 1) e das pessoas coletivas e entidades

equiparadas (n.os 2 e 4 a 11).

II. Enquadramento parlamentar

Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Compulsados os registos disponíveis na AP, não existem pendentes quaisquer petições no presente âmbito.

24 Cfr. o n.º 2 do artigo 26.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) (versão consolidada), acessível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:12012E/TXT&from=PT, consultado no dia 19-05-2021. 25 Acessível em https://uncitral.un.org/, consultado no dia 19-05-2021. 26 In: SILVA, Germano Marques da – Direito Penal Português – Volume I, Introdução e Teoria da Lei Penal. 3.ª edição. Lisboa: Edições Verbo (Babel), 2010. ISBN 978-972-22-3012-4, pág. 238.

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Registam-se, porém, as seguintes iniciativas que se encontram pendentes de apreciação na especialidade:

Projeto de Resolução n.º 1316/XIV/2.ª (BE) – Recomenda ao Governo que classifique os colonatos israelitas

na Palestina como anexação.

Projeto de Resolução n.º 1317/XIV/2.ª (BE) – Recomenda ao Governo que reconheça o Estado da Palestina.

Projetos de Voto n.os:

569/XIV (PCP) – De condenação da repressão de Israel sobre a população palestiniana.

570/XIV (N insc. Joacine Katar Moreira) – De condenação pelos ataques das forças israelitas em Gaza e

contra a deslocação forçada do povo palestiniano residente no bairro de Sheikh Jarrah em Jerusalém Oriental.

571/XIV (BE) – De condenação pela crescente violência nos territórios ocupados palestinianos.

573/XIV (CDS-PP) – De condenação pela recente escalada de violência e confrontos em Jerusalém.

576/XIV (PSD) – De condenação contra o recrudescimento da violência entre israelitas e palestinianos.

579/XIV (PEV) – De condenação da repressão sobre a população da Palestina pelas autoridades israelitas.

598/XIV/2.ª (PS) – De condenação pelo escalar da violência no Território Palestiniano Ocupado e em Israel.

Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

Nas últimas sessões legislativas, muitas têm sido as iniciativas apresentadas pelos diferentes grupos

parlamentares acerca da temática genericamente contida no âmbito da política de colonatos promovida pelo

Estado de Israel, dando corpo, fundamentalmente, a diversos projetos de resolução e de votos. Selecionámos,

por ordem de antiguidade, os seguintes:

XI e XII SL:

Projeto de Resolução n.º 352/XI/2.ª (BE) – Recomenda ao Governo o reconhecimento do Estado da

Palestina.

Projeto de Resolução n.º 376/XI/2.ª (PCP) – Pelo Povo da Palestina.

Projeto de Resolução n.º 382/XI/2.ª (PEV) – Solidariedade com o Povo Palestiniano.

Projeto de Resolução n.º 389/XI/2.ª (PS) – Insta ao prosseguimento das negociações para a criação do

Estado da Palestina.

Projeto de Resolução n.º 1174/XII/4.ª (PEV) – Pelo reconhecimento do Estado da Palestina.

XIII SL:

Projetos de voto:

n.º 192/XIII/2.ª (PCP)

n.º 212/XIII/2.ª (BE)

n.º 215/XIII/2.ª (PCP)

n.º 219/XIII/2.ª (PS)

n.º 538/XIII//3.ª (PCP)

n.º 623/XIII/4.ª (PCP)

n.º 815/XIII/4.ª (BE)

XIV SL:

Projetos de voto:

n.º 54/XIV/1.ª (PCP)

n.º 166/XIV/1.ª (PCP)

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Considerando, em especial, a temática relacionada com a imposição de condicionamentos às relações

comerciais com empresas israelitas, sediadas ou não em colonatos judaicos, apenas identificámos os seguintes

projetos de resolução:27

Projeto de Resolução n.º 977/XII/3.ª (PCP) – Pelo respeito pelas normas e princípios do direito internacional

com o fim da parceria entre a EPAL e a empresa israelita MEKOROT.

Projeto de Resolução n.º 990/XII/3.ª (BE) – Recomenda ao Governo a não renovação do contrato entre a

EPAL e a MEKOROT (Empresa Nacional de Águas de Israel).

No concernente a projetos legislativos relacionados com a introdução de normas de natureza penal no

presente âmbito objetivo, a busca efetuada na AP não nos devolveu qualquer resultado.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE), ao abrigo e

nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da

República (Regimento),28 que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por

força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento,

bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição

e da alínea f) do artigo 8.º do Regimento.

Observa o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do Regimento e assume a forma de projeto de lei,

em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do Regimento.

A iniciativa encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o

seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos

no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Observa igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento,

uma vez que parece definir concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa29 e não

infringir a Constituição ou os princípios nela consignados, devendo ser salvaguardado, contudo, o princípio da

não retroatividade das leis penais, previsto no artigo 29.º da Constituição, dado que a segunda parte do artigo

7.º do projeto de lei prevê que a lei produza efeitos a partir da sua aprovação pela Assembleia da República.

A matéria sobre a qual versa o presente projeto de lei – «Definição dos crimes, penas (…) e respetivos

pressupostos» – enquadra-se, por força do disposto na alínea c) do artigo 165.º da Constituição, no âmbito da

reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 14 de maio de 2021. Foi admitido a 17 de maio, por despacho

de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, e anunciado em sessão plenária no dia seguinte. A 19 de

maio foi redistribuída à Comissão de Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas (2.ª),

em conexão com a Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação (6.ª), para apreciação na

generalidade.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

O título da presente iniciativa legislativa – «Estabelece a proibição da importação ou venda de bens, serviços

e recursos naturais provenientes de colonatos ilegais em territórios ocupados» – traduz sinteticamente o seu

27 Em concreto, o projeto do PCP acima identificado, acabaria por ser retirado em 11 de abril de 2014, ao passo que o segundo, do BE, caducou em 22 de outubro de 2015. 28 As ligações para a Constituição, o Regimento e a lei formulário são feitas para o portal oficial da Assembleia da República. 29 Sem prejuízo de uma análise mais detalhada no decurso do processo legislativo, a pena de prisão prevista no n.º 1 do artigo 5.º, para as pessoas coletivas e entidades sem personalidade jurídica referidas nas alíneas b) e c) do artigo 4.º do projeto de lei, parece compatível com o previsto no artigo 11.º (responsabilidade das pessoas singulares e coletivas) e n.º 1 do artigo 45.º (substituição da prisão por multa) do Código Penal.

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objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro,30

conhecida como lei formulário, embora possa ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na

especialidade ou em redação final. Com efeito, caso se pretenda tornar o título mais conciso, sugere-se que

seja analisada a possibilidade de o iniciar pelo substantivo, eliminando o verbo que o antecede, como

recomendam, sempre que possível, as regras de legística formal:

«Proibição da importação ou venda de bens, serviços e recursos naturais originários de colonatos ilegais em

territórios ocupados».

No que respeita ao articulado do projeto de lei, de assinalar que a expressão «potência ocupada» surge

definida na alínea b) do artigo 2.º, apesar de apenas ser utilizada na definição da alínea anterior, pelo que se

sugere a supressão desta definição.31 O n.º 2 do artigo do 5.º também nos parece prescindível, dado que,

segundo o disposto no n.º 1 do artigo 23.º do Código Penal, tentativa é punível se ao crime consumado

corresponder pena de prisão superior a três anos.

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com

o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro.

A iniciativa redação não contém uma norma a fixar a data de início de vigência, apesar da epígrafe do artigo

7.º («Entrada em vigor»), que prevê a produção de efeitos referida anteriormente. Assim, caso seja aprovada,

aplicar-se-á o disposto no n.º 2 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que, na falta de fixação do dia, os

diplomas «entram em vigor, em todo o território nacional e estrangeiro, no 5.º dia após a sua publicação». Tendo

em conta esta norma, a parte inicial do artigo 7.º parece desnecessária (quanto à parte final da norma, cfr. o

acima referido).

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei

formulário.

• Regulamentação ou outras obrigações legais

Nos termos do artigo 3.º, caberá ao Governo publicar, e manter atualizada, uma lista de todos os territórios

considerados territórios ocupados. Segundo o disposto na subalínea iv) da definição prevista na alínea e) do

artigo 2.º, tal será efetuado por regulamento governamental32 (cfr. n.º 3 do artigo 138.º do Código de

Procedimento Administrativo), podendo ainda ser especificado, no decurso do processo legislativo, qual o prazo

ou o membro do Governo competente para o efeito.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento no plano da União Europeia

O Tratado de Funcionamento da União Europeia33 (TFUE) no n.º 1 do artigo 3.º estipula que a União dispõe

de competência exclusiva nos seguintes domínios: (…) e) Política comercial comum. O n.º 2 do mesmo artigo

acrescenta que a União dispõe igualmente de competência exclusiva para celebrar acordos internacionais

quando tal celebração esteja prevista num ato legislativo da União, seja necessária para lhe dar a possibilidade

de exercer a sua competência interna, ou seja suscetível de afetar regras comuns ou de alterar o alcance das

mesmas.

O artigo 207.º do TFUE refere ainda que a política comercial comum assenta em princípios uniformes,

30 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho. 31 Não parece necessário transcrever o conceito, já previsto em convenção internacional da qual Portugal é signatário, apesar de, em alternativa, se poder acrescentar na alínea a), por exemplo, «uma potência ocupante, na aceção da Quarta Convenção de Genebra». 32 «(…) regulamento elaborado pelo governo, de acordo com o artigo 4.º». Esta remissão poderá ser corrigida, por parecer referente ao disposto no artigo 3.º do projeto de lei. 33 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=celex%3A12012E%2FTXT

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designadamente no que diz respeito às modificações pautais, à celebração de acordos pautais e comerciais

sobre comércio de mercadorias e serviços, e aos aspetos comerciais da propriedade intelectual, ao investimento

estrangeiro direto, à uniformização das medidas de liberalização, à política de exportação, bem como às medidas

de defesa comercial, tais como as medidas a tomar em caso de dumping e de subsídios. A política comercial

comum é conduzida de acordo com os princípios e objetivos da ação externa da União.

Em novembro de 1995, a União Europeia e Israel celebraram um Acordo de Associação34, que entrou em

vigor em junho de 2000, sendo esta a base jurídica das relações comerciais entre as duas partes. O objetivo

deste acordo foi o de proporcionar um quadro adequado para as relações políticas e reforçar o desempenho

económico, promovendo ao mesmo tempo a cooperação regional, com um diálogo regular sobre questões de

interesse comum e a cooperação económica entre a UE e Israel.

No âmbito da Política europeia de vizinhança35, com o intuito de promover a integração de Israel nas políticas

e programas europeus, foi adotado em 2005 o Plano de Ação UE-Israel36. Este plano baseia-se em valores

partilhados de democracia, respeito pelos direitos humanos, Estado de direito e liberdades fundamentais,

estando o mesmo em vigor até janeiro de 2022.

Como se referiu, Israel faz parte da Política Europeia de Vizinhança e, devido ao seu nível avançado de

desenvolvimento económico, recebe fundos do Instrumento Europeu de Vizinhança37 (ENI) que são

predominantemente utilizados para a implementação de projetos de geminação institucional. No entanto, todos

os programas de cooperação entre a União e Israel devem respeitar as Diretrizes sobre a elegibilidade das

entidades israelitas e das suas atividades nos territórios ocupados por Israel desde junho de 196738.

Com efeito, estas diretrizes estabelecem as condições em que a Comissão implementará os requisitos-chave

para a concessão de apoio da UE a entidades israelitas ou às suas atividades nos territórios ocupados por Israel

desde junho de 196739, de modo a assegurar o respeito das posições e compromissos da EU, nomeadamente,

sobre o não reconhecimento pela UE da soberania de Israel sobre os territórios ocupados (vide nota de rodapé

n.º 7).

De destacar que as conclusões do Conselho Europeu de janeiro de 201640 recordaram que a implantação

de colonatos é ilegal nos termos do direito internacional, constitui um obstáculo à paz e é suscetível de tornar

inviável uma solução baseada na coexistência de dois Estados, a UE reitera a sua forte oposição à política

israelita de colonatos e às medidas tomadas neste contexto, como a de construir uma barreira de separação

para além da linha de 1967, as demolições e confiscos – inclusive de projetos financiados pela UE –, as

expulsões, as deslocações forçadas, nomeadamente de beduínos, os postos avançados ilegais e as restrições

de circulação e de acesso.41

Considerando a posição da União sobre os territórios ocupados por Israel desde junho de 1967, e o apelo

geral dos Estados-Membros sobre a aplicação da legislação da União existente em matéria de indicação da

origem dos produtos, de forma a assegurar a transparência na informação fornecida aos consumidores da UE,

a Comissão publicou uma Nota interpretativa42 sobre a indicação da origem dos bens provenientes dos territórios

ocupados por Israel desde junho de 1967. Concretamente, este documento clarifica qual a denominação que os

produtos provenientes desses territórios devem ter, ao estipular, por exemplo que, caso provenham de colonatos

israelitas nos Montes Golã ou na Cisjordânia, não devem ter a indicação de «produto de Israel» por estar

incorreto ou ser enganador 43, sugerindo a utilização da designação «produto dos Montes Golã (colonato

israelita)»44.

34 https://ec.europa.eu/neighbourhood-enlargement/sites/default/files/association_agreement_israel-eu_2000.pdf 35 https://www.europarl.europa.eu/factsheets/pt/sheet/170/politica-europeia-de-vizinhanca 36 https://ec.europa.eu/neighbourhood-enlargement/sites/default/files/eu-israel_action_plan_2005.pdf 37 https://ec.europa.eu/regional_policy/pt/policy/what/glossary/e/european-neighbourhood-investment 38 https://ec.europa.eu/neighbourhood-enlargement/sites/default/files/guidelines_on_the_eligibility_of_israeli_entities_and_their_activities_in_the_territories_occupied_by_israel_since_june_1967.pdf 39 Nos termos do n.º 2 das Diretrizes, os territórios ocupados por Israel desde junho de 1967 compreendem os Montes Golã, a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental. 40 https://www.consilium.europa.eu/pt/press/press-releases/2016/01/18/fac-conclusions-mepp/ 41 Posição igualmente adotada nas Conclusões do Conselho dos Negócios Estrangeiros sobre o processo de paz no Médio Orientede 14 de maio de 2012 e 10 de dezembro de 2012. 42 https://eeas.europa.eu/delegations/israel/10130/interpretative-notice-indication-origin-goods-territories-occupied-israel-june-1967_en 43 Ponto 7 da Nota Interpretativa. 44 Ponto 10 da Nota Interpretativa.

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Neste contexto, o Parlamento Europeu questionou a Comissão Europeia45, em janeiro de 2019, sobre qual a

sua posição relativamente à proposta de Lei da Irlanda, que proibia o país de transacionar bens e serviços a

partir de territórios ocupados por Israel, tendo a Comissão respondido46 que a UE rejeitava quaisquer tentativas

de isolamento de Israel e não apoiava os apelos para um boicote, reiterando, no entanto que, a UE não

reconhecia a soberania sobre os territórios ocupados por Israel desde junho de 1967, pelo que não os

considerava parte do território de Israel, independentemente do seu estatuto legal ao abrigo do direito interno

israelita. Mencionou ainda as Conclusões do Conselho de Negócios Estrangeiros de 18 janeiro 2016 sobre este

tema nas quais se estipulou que a UE expressa o seu compromisso de assegurar que – em conformidade com

o direito internacional – todos os acordos entre o Estado de Israel e a UE terão de indicar inequívoca e

explicitamente a sua inaplicabilidade aos territórios ocupados por Israel em 1967. Não se trata de um boicote a

Israel, a que a UE se opõe firmemente47.

Um ano mais tarde, em janeiro de 2020, o Parlamento Europeu questiona uma vez mais a Comissão48 sobre

a sua posição referente à venda de produtos produzidos em colonatos israelitas ilegais nos territórios ocupados

e sobre a possibilidade de introduzir uma proibição de importação desses produtos, tendo a Comissão

respondido49 que, embora a UE se oponha ao boicote de Israel, distingue, nas suas negociações relevantes, o

território do Estado de Israel e os territórios ocupados por este desde 1967, destacando que os produtos

originários dos colonatos nestes territórios ocupados podem entrar na UE mas não se aplicavam, a tais produtos,

preferências ou outras medidas de facilitação do comércio ao abrigo da legislação ou acordos da UE. Referiu

ainda que o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia em 12 de novembro de 2019 no

Processo C-363/1850, confirmou que os produtos originários dos colonatos israelitas deviam ostentar uma

indicação de origem correta e não enganosa para o consumidor.

• Enquadramento internacional

Países europeus

A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados da União Europeia: Irlanda.

IRLANDA

O contexto legal atinente à matéria em apreço enquadra-se no âmbito da iniciativa legislativa de Control of

Economic Activity (Occupied Territories) Bill 201851, atualmente na fase de discussão em sede de comissão (Dáil

Éireann), visando dar efeito às obrigações do Estado decorrentes da Quarta Convenção de Genebra52 relativa

à Proteção de Pessoas Civis em Tempo de Guerra, de 12 de agosto de 1949, e ao abrigo do Direito Internacional

Humanitário. A presente iniciativa visa o propósito de constituição do crime para a prática de um indivíduo que

proceda à importação ou venda de bens ou serviços originários de um território ocupado ou da extração de

recursos de um território ocupado em determinadas circunstâncias. No quadro da iniciativa atualmente em

debate na House of the Oireachtas53, cumpre relevar a resposta54 do Vice-Presidente Mogherini, em nome da

Comissão Europeia, relativa ao processo legislativo desencadeado pelo diploma supracitado.

Esta proposta de alteração legislativa visa alterar o âmbito do enquadramento legal atualmente em vigor

45 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/P-8-2019-000081_EN.html 46 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/P-8-2019-000081-ASW_EN.html 47 Vide nota de rodapé n.º 8. 48 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/E-9-2020-000007_EN.html 49 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/E-9-2020-000007-ASW_EN.html 50https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf;jsessionid=AA6A0A7C03EE6F752E9A1971BC78D13D?text=&docid=220534&pageIndex=0&doclang=PT&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=5822493 51 Atualmente na fase de discussão em sede de comissão (Dáil Éireann). As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do House of the Oireachtas. [Consultado em 24 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://data.oireachtas.ie/ie/oireachtas/bill/2018/6/eng/initiated/b0618s.pdf >. 52 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Ministério Público. [Consultado em 24 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/documentos/instrumentos/convIVgenebra.pdf >. 53 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do House of the Oireachtas. [Consultado em 26 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://www.oireachtas.ie/ >. 54 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Comissão Europeia. [Consultado em 24 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/P-8-2019-000081-ASW_EN.html >.

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definido no quadro do Companies Act 201455, do International War Crimes Tribunal Act 199856 e do Customs

Act 201557, no qual se releva o disposto no seu n.º 1458 (Offences relating to improper importation or exportation

of good) da sua PART 359 (Offences, Penalties and Proceedings).

Organizações internacionais

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU)

A Organização das Nações Unidas (ONU)60 é um organismo constituído no quadro da Carta das Nações

Unidas61, documento no qual são positivados os objetivos e princípios da atuação das Nações Unidas, assim

como as funções e os poderes adstritos aos seus diversos órgãos, incluindo-se no seu âmbito a IV Convenção

de Genebra relativa à proteção das pessoas civis em tempo de guerra, de 12 de agosto de 1949 é um dos

tratados internacionais elaborados e adotados pela Organização das Nações Unidas ratificada por Portugal.

No quadro da ONU, importa fazer referência à Comissão das Nações Unidas sobre o Direito Comercial

Internacional (CNUDCI)62, uma agência especializada no seio desta organização que elaborou a Convenção

das Nações Unidas sobre Contratos para Venda Internacional de Mercadorias, adotada em Viena, em 11 de

abril de 1980. Este normativo regula a formação dos contratos de compra e venda internacional, ou melhor, as

partes envolvidas nessas transações têm os seus estabelecimentos em diferentes Estados, bem como identifica

os direitos e obrigações emergentes desse contrato para o vendedor e para o comprador.

A ONU, através do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos63, aprovou os UN

Guiding Principles on Business and Human Rigths: Implementing the United Nations ‘Protect, Respect and

Remedy’ Framework64, no âmbito da Resolução n.º 17/4, de 16 de junho de 201165 da Assembleia Geral das

Nações Unidas, onde são definidos um conjunto de diretrizes aplicáveis a Estados e Empresas, no sentido de

prevenir, abordar e remediar eventuais práticas de abusos de direitos humanos cometidos no âmbito de relações

comerciais e das atividades delas resultantes, assentando em três princípios (Protect, Respect and Remedy),

respetivamente:

• No dever dos Estados na proteção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais;

• No respeito por parte das empresas no quadro das suas responsabilidades sociais e do comprimento do

quadro legal vigente; e

• Na prossecução de comportamentos que permitam corrigir situações de abusos resultantes de atividades

económicas.

A aplicação destes princípios deverá levar em linha de conta, entre outros aspetos, aos riscos e as

necessidades de populações em situação de potencial vulnerabilidade (supporting business respect for human

55 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Office of the Attorney General. [Consultado em 24 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< http://www.irishstatutebook.ie/eli/2014/act/38/enacted/en/html >. 56 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Office of the Attorney General. [Consultado em 24 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< http://www.irishstatutebook.ie/eli/1998/act/40/enacted/en/html >. 57 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Office of the Attorney General. [Consultado em 24 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< http://www.irishstatutebook.ie/eli/2015/act/18/enacted/en/html >. 58 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Office of the Attorney General. [Consultado em 24 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< http://www.irishstatutebook.ie/eli/2015/act/18/section/14/enacted/en/html#sec14 >. 59 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Office of the Attorney General. [Consultado em 24 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< http://www.irishstatutebook.ie/eli/2015/act/18/section/14/enacted/en/html#part3 >. 60 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da ONU. [Consultado em 25 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://www.un.org/en >. 61 Publicada no Diário da República, Série I-A pelo Aviso n.º 66/91, de 22 de maio de 199161 do Ministério dos Negócios Estrangeiros – Direção-Geral dos Negócios Político-Económicos. As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da ONU. [Consultado em 26 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://www.un.org/en/about-us/un-charter>. 62 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da ONU. [Consultado em 26 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://uncitral.un.org/>. 63 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da ONU. [Consultado em 26 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://www.ohchr.org/EN/AboutUs/Pages/WhoWeAre.aspx >. 64 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da ONU. [Consultado em 25 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://www.ohchr.org/Documents/Publications/GuidingPrinciplesBusinessHR_EN.pdf >. 65 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da ONU. [Consultado em 25 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://undocs.org/en/A/HRC/RES/17/4>.

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rights in conflict-affected areas), assim como o facto das limitações da regulação das atividades extraterritoriais

de agentes económicos nacionais num quadro de respeito pelos direitos fundamentais (the corporate

responsability to respect human rights). Neste contexto, é ainda referido a necessidade de, alinhado com as

recomendações dos diversos tratados sobre direitos humanos, os Estados concorrerem para tomada de

medidas no sentido da prevenção de abusos por parte das empresas sob sua jurisdição, quer através de

instrumentos legais (state-based judicial mechanisms), quer através de mensagens coerentes e consistentes

quem se repercutem sobre a reputação do próprio Estado.

Ainda no quadro das Nações Unidas, importa também relevar o Tribunal Internacional de Justiça66, que no

seu The International Court of Justice Handbook67 identifica algumas decisões respeitantes a contenciosos

relacionados com a matéria em apreço, nomeadamente, a desenvolvimentos legais decorrentes da ocupação

de território como a Palestina, Mauritânia, Camboja, Namíbia e Costa Rica, entre outros.

V. Consultas e contributos

• Pareceres/contributos enviados pelo Governo, solicitados ou a solicitar ao mesmo

Embora estejamos perante matéria no âmbito dos Direitos, Liberdades e Garantias, contida na esfera de

reserva de competência legislativa da Assembleia da República, a especial natureza da temática e das medidas

projetadas, aconselham à recolha de contributos junto do Governo. Por um lado, por competir ao Ministério dos

Negócios Estrangeiros a condução da política externa portuguesa, com a qual a presente questão está

intimamente relacionada. Por outro lado, estando em causa a imposição de medidas de natureza penal, não

seria despiciendo colher contributos da parte do Ministério da Justiça.

• Consultas facultativas

Pela mesma ordem de razões acima expostas, estando em causa a adoção de medida de natureza penal,

sugere-se, ainda, a consulta tanto do Conselho Superior da Magistratura, como do Conselho Superior do

Ministério Público, através da emissão de correspetivos pareceres.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

O preenchimento, pelo proponente, da ficha de avaliação prévia de impacto de género (AIG) da presente

iniciativa, em cumprimento do disposto na Lei n.º 4/2018, de 9 de fevereiro, valora-a de forma neutra, portanto,

sem impacto assinalado no presente âmbito.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso.

Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta fase

do processo legislativo a redação do projeto de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a

linguagem discriminatória em relação ao género.

66 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Tribunal Internacional de Justiça. [Consultado em 25 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://www.icj-cij.org/en>. 67 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Tribunal Internacional de Justiça. [Consultado em 25 de maio 2021]. Disponível em WWW URL< https://www.icj-cij.org/public/files/publications/handbook-of-the-court-en.pdf>.

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• Impacto orçamental

Em face da informação disponível, não é possível determinar ou quantificar eventuais encargos resultantes

da aprovação da presente iniciativa, muito embora, em caso de aprovação, possam antever-se variações na

despesa e na receita, decorrentes da suspensão da importação ou exportação de bens, assim como da

aplicação fiscal dos tributos que seriam devidos, no caso da importação.

Releva, ainda, na presente análise, a aferição quanto ao âmbito temporal de aplicação do diploma, aspeto

que contende diretamente com o Orçamento do Estado em vigor e com a limitação concretamente prevista no

n.º 2 do artigo 167.º da Constituição da República.

VII. Enquadramento bibliográfico

AMNISTIA INTERNACIONAL — Think twice [Em linha]: can companies do business with Israeli

settlements in the Occupied Palestinian Territories while respecting human rights? London: Amnesty

International United Kingdom Section, 2019. [Consult. 19 maio 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134591&img=21652&save=true>

Resumo: Este relatório da Amnistia Internacional tem como objetivo fornecer às empresas que têm negócios

com os colonatos israelitas na Palestina um quadro legal que lhes permita tomar decisões de negócios alinhadas

com o direito internacional e os padrões internacionais e que cumpram as suas responsabilidades nesse

enquadramento. Cobre diversas questões relevantes em todos os setores da indústria e em todas as fases de

comércio e de investimento nesses assentamentos. Reflete uma tendência crescente de processos criminais e

civis contra empresas com base na sua suposta cumplicidade com graves violações dos direitos humanos,

incluindo crimes de guerra. Uma vez que os referidos assentamentos são ilegais face ao Direito internacional,

tanto as empresas como os governos devem abster-se de realizar negócios que contribuem para perpetuar uma

situação ilegal, numa clara violação dos direitos humanos.

DUBUISSON, François — The international obligations of the European Union and its Member States

with regard to economic relations with Israeli settlements [Em linha]. [Bruxelles: CNCD-11.11.11], 2014.

[Consult. 20 maio 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134612&img=21677&save=true>

Resumo: Neste estudo, o autor deixa claro que os assentamentos israelitas na Palestina são ilegais face ao

direito internacional e que os Estados devem cessar todas as relações económicas e comerciais com empresas

que detêm negócios nesses locais, impedindo que os seus produtos sejam vendidos em países da União

Europeia e abstendo-se de atividades que contribuem para a manutenção da situação atual. Parte do comércio

UE-Israel envolve mercadorias vendidas por entidades estabelecidas nos referidos assentamentos em territórios

palestinianos. O autor analisa as modalidades de aplicação da proibição de importação desses bens, tendo por

base o direito da UE e as normas da Organização Mundial do Comércio.

Sublinha que a obrigação de não ajudar as referidas empresas se aplica a atividades que, direta e

indiretamente, apoiam os colonatos. De acordo com o autor, o compromisso da UE com o direito internacional

será julgado pela sua resposta relativamente aos assentamentos manifestamente ilegais de Israel na Palestina,

servindo este estudo como diretriz para os Estados-Membros da UE saberem como agir relativamente a este

assunto.

HUMAN RIGHTS WATCH — Occupation, Inc. [Em linha]: how settlement businesses contribute to

Israel’s violations of Palestinian rights. [Washington]: Human Rights Watch, 2016. [Consult. 20 maio 2021].

Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134604&img=21670&save=true>

ISBN 978-1-6231-33146

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Resumo: Após a ocupação militar de Israel na Cisjordânia, em junho de 1967, o governo israelita iniciou o

estabelecimento de assentamentos nos territórios palestinianos ocupados, numa clara violação do direito

internacional. Desde o início, empresas privadas estiveram envolvidas nestas políticas, contribuindo e

beneficiando com elas. Este relatório detalha as maneiras pelas quais israelitas e empresas internacionais

ajudaram a construir, financiar, prestar serviços e estabelecer acordos de mercado com essas comunidades.

Em alguns casos, as próprias empresas são «colonizadores», atraídos pelos assentamentos, em parte devido

a rendas baixas, taxas de impostos favoráveis, subsídios do governo e acesso a trabalho palestiniano. Na

verdade, a pegada física da atividade empresarial israelita na Cisjordânia é superior à dos assentamentos

residenciais.

A Human Rights Watch não pretende um boicote dos consumidores relativamente aos produtos israelitas;

contudo, as referidas empresas devem cumprir as suas próprias responsabilidades relativamente à proteção

dos direitos humanos. Além disso, os consumidores devem ter informação sobre a origem dos produtos

importados para poder tomar decisões informadas. O relatório apresenta estudos de caso que demonstram

como as empresas que operam nestes assentamentos estão inextricavelmente ligadas a abusos cometidos.

LYNK, Michael — Situation of human rights in the Palestinian territories occupied since 1967 [Em linha].

[Geneva]: United Nations Human Rights Council, 2020. [Consult. 20 maio 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134602&img=21668&save=true>

Resumo: O presente relatório aborda uma série de questões pertinentes relativas à situação dos direitos

humanos na Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental e Gaza, com incidência especial na questão da

responsabilidade. Centra-se, essencialmente, em duas questões: análise das responsabilidades de prestação

de contas do Conselho de Segurança das Nações Unidas para garantir que as suas decisões e orientações

sobre a ocupação israelita de territórios palestinianos sejam obedecidas e, num segundo momento, avaliação

das responsabilidades das empresas privadas que operam ou que beneficiam, direta ou indiretamente, dos

assentamentos israelitas e da ocupação de territórios palestinianos. O relatório baseia-se principalmente em

informações fornecidas por vítimas, testemunhas, representantes da sociedade civil e agências das Nações

Unidas.

QUAKER COUNCIL FOR EUROPEAN AFFAIRS — EU Trade with Israeli Settlements. QPSW briefing paper

[Em linha]. (Aug. 2012), 64 p. [Consult. 19 maio 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134588&img=21640&save=true>

Resumo: Os assentamentos em terras palestinianas constituem áreas ocupadas, nas quais os israelitas

estabeleceram casas, comunidades e novas cidades. Apesar de reconhecer a sua ilegalidade, a União Europeia

continua a negociar com os territórios ocupados pelos israelitas na Palestina. Frutas e vegetais constituem a

principal parte das exportações destes assentamentos, mas também produzem alimentos processados, tais

como: vinho, flores, produtos de higiene e cosméticos, têxteis, produtos de plástico, produtos de metal e produtos

químicos. Esses bens, produzidos em terras ocupadas ilegalmente, são vendidos em toda a Europa, retornando

os lucros para os assentamentos ilegais. Na Europa, nos últimos anos, tem havido uma preocupação crescente

relativamente a estes vínculos económicos, que podem estar a agravar a situação criada pelos colonatos

israelitas.

Face a esta situação, são apresentadas recomendações à União Europeia no sentido de cessar todo o

comércio da UE com os assentamentos israelitas, incluindo serviços financeiros. Entre as recomendações

apresentadas, salienta-se a obrigatoriedade de indicação do local de origem em todas as mercadorias

importadas de Israel, nomeadamente naquelas que são originárias da Cisjordânia, devendo ser impostas multas

a quaisquer exportadores ou empresas que desrespeitem as regras relativas à origem dos produtos.

WAR ON WANT — Boycott, Divestment, Sanctions [Em linha]: winning justice for the Palestinian

people. London: War on Want, 2010. [Consult. 19 maio 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134589&img=21642&save=true>

Resumo: De acordo com o presente relatório, o povo palestiniano tem sofrido com a repressão, por parte de

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Israel, desde há mais de 60 anos. Governos em todo o mundo permitiram que Israel agisse com impunidade,

sancionando ativamente os atos israelitas com benefícios económicos e laços políticos mais estreitos. O

movimento Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) surgiu como resposta da sociedade civil palestiniana. A

ação do referido movimento é dirigida contra Israel para que este cumpra o direito internacional. Os boicotes

podem ser académicos, culturais, desportivos ou virados para os bens de consumo. No Reino Unido, o principal

alvo do boicote têm sido os bens de consumo produzidos em Israel, particularmente aqueles que são produzidos

nos colonatos na Cisjordânia.

Desinvestimento significa identificar corporações/empresas cúmplices com a ocupação dos territórios

palestinianos, garantindo que os fundos públicos não sejam investidos nessas empresas. Sanções são um

mecanismo para expressar desaprovação pelas ações de Israel. Campanhas atuais pedem a suspensão das

relações comerciais da União Europeia com Israel e um embargo a todos os negócios de armas entre Israel e o

Reino Unido. O referido movimento tem vindo a crescer, sendo agora apoiado por sindicatos, organizações

estudantis, grupos religiosos, escritores proeminentes e artistas de todo o mundo.

———

PROJETO DE LEI N.º 905/XIV/2.ª

PROCEDE A ALTERAÇÕES AOS ARTIGOS 12.º E 13.º, DA LEI N.º 53/2008, DE 29 DE AGOSTO, QUE

APROVA A LEI DE SEGURANÇA INTERNA

Exposição de motivos

Foi publicada há meses, no Diário da República n.º 72/2021, Série I de 2021-04-14, a Resolução do Conselho

de Ministros n.º 43/2021, que «Prevê a redefinição das atribuições do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras».

O Governo propõe agora, através da Proposta de Lei n.º 104/XIV/2.ª, uma reformulação das forças e serviços

de segurança que exercem atividade de segurança interna, no quadro da reafectação de competências do

Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

É importante começar por explicar que chamar «redefinição» ou «reformulação» a uma tentativa de extinção

é uma falácia que desrespeita todos os profissionais que ao longo destes mais de 30 anos deram o seu melhor

em prol não apenas desta instituição, mas sobretudo do nosso País e consequentemente da Europa em que

estamos integrados, e fazê-lo durante a presidência Portuguesa da União Europeia para mais num quadro de

pandemia como o que enfrentamos, é também desrespeitar todos os portugueses e uma tremenda

irresponsabilidade.

Esta proposta de lei que extingue o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e redistribui as suas atribuições por

cinco outras entidades: Polícia de Segurança Pública, Guarda Nacional Republicana, Polícia Judiciária, Rede

Nacional de Segurança Interna, Instituto dos Registos e Notariado prevê ainda a criação de uma nova entidade,

o Serviço de Estrangeiros e Asilo, a única entidade de segurança fronteiriça que tem a palavra «Asilo» no seu

nome.

Tudo isto por uma questão ideológica e mais do que tudo, para tentar ocultar os erros cometidos pelo

ministério e por quem tutela, não podemos permitir que um caso terrível defina todo um órgão e todos os seus

profissionais.

A Carreira de Investigação e Fiscalização do SEF, foi criada em 1990 e iniciou funções no aeroporto de

Lisboa, no dia 1 de agosto, de 1991, é um serviço de segurança funcional, que permitiu que cinco anos após o

exercício de funções do SEF nas fronteiras externas, e dois anos após Portugal ter ratificado a Convenção de

Aplicação do Acordo de Schengen, que o nosso País fosse integrado no primeiro grupo de países que a

aplicaram, facto que viabilizou a supressão dos controlos nas fronteiras internas dos estados signatários e a

criação de um espaço de livre circulação de pessoas, bem como a instauração do princípio de um controlo único

à entrada no território Schengen.

Deverá existir uma separação das funções policiais das funções administrativas, perceberíamos até, numa

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lógica economicista, que houvesse integração entre forças de segurança, o que não se compreende, porque de

facto não faz sentido é a criação de uma nova entidade que surge não se sabe bem de onde nem para quê.

Artigo 1.º

Objeto

O presente projeto de lei procede a alterações aos artigos 12.º e 13.º, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto,

que aprova a Lei de Segurança Interna.

Artigo 2.º

Os artigos 12.º e 13.º, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 12.º

Atribuições em matéria de segurança interna

1 – ................................................................................................................................................................... .

2 – ................................................................................................................................................................... :

a) ..................................................................................................................................................................... ;

b) ..................................................................................................................................................................... ;

c) ..................................................................................................................................................................... ;

d) ..................................................................................................................................................................... ;

e) ..................................................................................................................................................................... ;

f) ...................................................................................................................................................................... ;

g) Um Deputado representante de cada partido político com assento parlamentar, designados pela

Assembleia da República por indicação do respetivo Grupo ou Gabinete Parlamentar;

h) ..................................................................................................................................................................... ;

i) ...................................................................................................................................................................... ;

j) ...................................................................................................................................................................... ;

k) ..................................................................................................................................................................... ;

l) ...................................................................................................................................................................... ;

m) .................................................................................................................................................................... ;

n) ..................................................................................................................................................................... ;

o) ..................................................................................................................................................................... ;

Artigo 13.º

Competências do Conselho Superior de Segurança Interna

1 – ................................................................................................................................................................... .

2 – ................................................................................................................................................................... :

a) ..................................................................................................................................................................... ;

b) ..................................................................................................................................................................... ;

c) ..................................................................................................................................................................... ;

d) ..................................................................................................................................................................... ;

e) A definição das grandes linhas políticas de segurança europeia, propostas pelos órgãos

comunitários, após parecer preliminar do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).

3 – ................................................................................................................................................................... .»

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Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 6 de julho de 2021.

O Deputado do CH, André Ventura.

———

PROJETO DE LEI N.º 906/XIV/2.ª

GARANTE O CUMPRIMENTO DA CONVENÇÃO DE ISTAMBUL REFORÇANDO A PROTEÇÃO DAS

VÍTIMAS EM CASO DE ASSÉDIO SEXUAL

Exposição de motivos

Nos termos do artigo 40.º da Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência

contra as Mulheres e a Violência Doméstica, adotada em Istambul, com a epígrafe «Assédio sexual», «As Partes

deverão adoptar as medidas legislativas ou outras que se revelem necessárias para assegurar que qualquer

tipo de comportamento indesejado de natureza sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o intuito ou

o efeito de violar a dignidade de uma pessoa, em particular quando cria um ambiente intimidante, hostil,

degradante, humilhante ou ofensivo, seja passível de sanções penais ou outras sanções legais.»

Ora, a sociedade civil tem alertado para o facto de Portugal não estar a cumprir integralmente a Convenção

de Istambul, nomeadamente no que diz respeito à proteção das vítimas em caso de assédio sexual.

Assim, a dúvida que se coloca é a de saber se o cumprimento da norma acima citada depende da criação

de um tipo incriminador específico denominado de assédio sexual ou se basta que estas condutas já sejam

punidas, pelo ordenamento jurídico, através de outros tipos legais de crime ou sanções de outra natureza.

Importa recordar que, em 2015, a Assembleia da República debateu exatamente esta problemática, tendo

sido apresentadas essencialmente três posições.

Por um lado, aqueles que defendiam que não era necessário proceder a qualquer alteração legislativa, na

medida em que as condutas consagradas no artigo 40.º da Convenção de Istambul já estavam previstas noutras

normas do ordenamento jurídico português. Estariam aqui em causa, por exemplo, as normas relativas à

criminalização da coação sexual (163.º do Código Penal), violação (164.º do Código Penal) ou importunação

sexual (170.º do Código Penal), e, ainda, as normas previstas na legislação laboral.

Por outro lado, outros autores defendiam que a norma constante do artigo 40.º da Convenção de Istambul

obrigava à criminalização, de forma autónoma, do assédio sexual.

Finalmente, defendeu-se que o artigo 40.º da Convenção de Istambul, apesar de não obrigar à criação de

tipo autónomo incriminador para os casos de assédio sexual, implicava a realização de alterações legislativas

por forma a prever na nossa legislação todas as condutas abrangidas por aquela norma, o que à data não se

verificava.

Foi esta última posição que prevaleceu, e que motivou, nomeadamente, a alteração do artigo 170.º do Código

Penal, com a epígrafe «importunação sexual».

Assim, com a alteração introduzida pela Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto, o artigo 170.º passou a prever que

«Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de carácter exibicionista, formulando propostas de

teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com

pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.».

Ou seja, se tivermos em conta a redação em vigor deste artigo antes da aprovação desta lei, verificamos que

o legislador acrescentou, ao elenco das condutas mencionadas na norma, a formulação de propostas de teor

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sexual.

No entanto, ao estabelecer que apenas se encontram abrangidas as propostas de teor sexual, esta norma

não criminaliza todas as condutas que podem configurar situações de assédio sexual, nomeadamente o

denominado assédio de rua.

Como referem Pedro Caeiro e José Miguel Figueiredo1, «a lei é clara ao exigir a formulação de propostas.

Em consequência, não preenchem a factualidade típica as meras conversas de cariz sexual (…) porque não

implicam qualquer proposta, ainda que efectivamente importunem o receptor.»

Acrescentam que «pela mesma razão, o tipo não abarca palavras, gestos ou expressões faciais que, com ou

sem intuito de sedução, manifestem apreço ou admiração pelo destinatário da mensagem, em particular pelo

seu aspecto físico, ou muito simplesmente desejo sexual ou excitação sexual, de forma mais urbana ou grosseira

– aquilo que já mereceu a designação de ‘assédio sexual nas ruas’ – mas que não envolvem, em nenhum sentido

pensável, uma proposta.»

De notar que estes autores utilizam como exemplo de linguagem «mais urbana» expressões como «Acreditas

em amor à primeira vista ou tenho de passar por aqui outra vez?» ou «Ainda dizem que as flores não andam!»

e, como exemplo de linguagem «grosseira», expressões como «Belas pernas! A que horas abrem?» ou «Queria

que fosses uma pastilha elástica para te comer o dia todo».

Estes autores mencionam, ainda, que «há outro género de dichotes que aparecem formalmente como

propostas, mas que são apenas ‘propostas retóricas’, onde o suposto ‘proponente’ solicita ou se disponibiliza

para actos de natureza sexual sem qualquer expectativa razoável de aceitação pelo destinatário (como se

mostra pela linguagem colorida ou ofensiva utilizada), nem qualquer constrangimento do mesmo. Trata-se,

verdadeiramente, de provocações, obtendo o seu autor satisfação ou gratificação com a respectiva verbalização

e consequente reacção do(a) visado(a) (e, eventualmente, com o gáudio de outros circunstantes). Ora,

tampouco nestes casos pode seriamente afirmar-se que quem pede a outra pessoa que lhe ‘sopre na vela’, ou

se dispõe a fazer-lhe ‘um pijaminha de cuspe’ ou a ‘caiá-la de branco por dentro’, está a ‘formular propostas de

teor sexual’. Está, quando muito, a manifestar propósitos, mas não a formular propostas.»

Ora, facilmente se compreende que as expressões acima identificadas, que os autores identificam como

tendo linguagem «mais grosseira» ou que configuram «propostas retóricas» têm conteúdo sexual e são

verbalizadas com o intuito de intimidar, humilhar ou ofender outrem, sendo suscetíveis de atentar contra a sua

liberdade sexual.

Basta pensarmos, por exemplo, nos casos em que estas expressões são ditas a raparigas menores, o que

infelizmente acontece com frequência. É certo que o impacto da utilização de expressões de conteúdo sexual,

como os exemplos acima mencionados, é maior quando se trata de mulheres mais jovens ou adolescentes. E,

como é óbvio, em particular quando estão em causa mulheres mais jovens, o intuito daquele que profere

comentários de índole sexual é o de intimidar ou humilhar o outro, o que justifica porque é que estes

comportamentos são frequentemente cometidos contra raparigas, nomeadamente adolescentes, que têm uma

menor capacidade para lidar e/ou responder a estes comentários.

Depois, não se pode dizer que a utilização destas expressões não importuna o outro ou não condiciona a

sua liberdade sexual. Não podemos esquecer que as mulheres são as principais vítimas de situações de assédio

sexual e que muitas são sujeitas a comentários ou propostas de natureza sexual desde tenra idade. Por isso,

situações como esta são suscetíveis de provocar, nomeadamente, a perda de autoestima e transformar a forma

como se perceciona o outro, o que pode condicionar a criação de laços afetivos futuros e, desta forma, limitar a

sua liberdade sexual.

De facto, os estudos demonstram que o assédio tem impactos físicos e psicológicos que não podem ser

desvalorizados.

Veja-se, por exemplo, que no que diz respeito ao assédio sexual no trabalho, a Ordem dos Psicólogos2

considera que este cria perturbações significativas nas relações profissionais, interpessoais e familiares e tem

consequências para a saúde física e psicológica, que podem incluir, nomeadamente, stress, ansiedade, raiva,

irritação, humilhação e desespero; diminuição da autoestima e autoconfiança; dificuldade e perturbações de

1 CAEIRO, Pedro e FIGUEIREDO, José Miguel, «Ainda dizem que as leis não andam: reflexões sobre o crime de importunação sexual em Portugal e em Macau», 2016, que pode ser consultado em: https://www.researchgate.net/publication/339466676_Ainda_dizem_que_as_leis_nao_andam_reflexoes_sobre_o_crime_de_importunacao_sexual_em_Portugal_e_em_Macau 2 Assédio Sexual no trabalho | Ordem dos Psicólogos (ordemdospsicologos.pt)

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sono; problemas alimentares; depressão; consumo excessivo de álcool/drogas; diminuição da satisfação com a

vida e do bem-estar; diminuição da satisfação laboral e do rendimento e oportunidades profissionais e, ainda,

problemas físicos como problemas gastrointestinais, alterações cardiovasculares e problemas respiratórios.

Infelizmente, os estudos já realizados demonstram que os números do assédio sexual em Portugal são

expressivos e superiores aos que se verificam na média dos países europeus. De acordo com dados divulgados

pela CITE3, em 2015, o assédio sexual foi referido por 12,6% das pessoas inquiridas, dos quais 14,4% eram

mulheres e 8,6% homens.

Estes dados também demonstram que o assédio sexual no local de trabalho é com maior frequência da

autoria de homens e afeta mais frequentemente mulheres até porque, como bem menciona a CITE, «o mundo

do trabalho não está imune a uma ordem de género e uma ideologia de género que reproduz desigualdades

entre homens e mulheres.»4

De acordo com o Estudo «As mulheres em Portugal, hoje – Quem são, o que pensam e o que sentem», da

Fundação Francisco Manuel dos Santos, divulgado em 20195, 16% das mulheres inquiridas declararam ter sido

vítimas de assédio sexual, destacando-se as situações de «insinuações sexuais/Atenção sexual não desejada»

(piadas ou comentários ofensivos sobre o corpo/aspeto; olhares insinuantes ofensivos; propostas indesejadas

de carácter sexual, etc.) e «contacto físico não desejado» (tocar, apalpar, beijar, etc.).

Assim, dado que estas situações continuam a ocorrer com frequência, em particular no que diz respeito a

jovens adolescentes, consideramos fundamental que a legislação penal seja alterada por forma a abranger

condutas ainda não previstas que configuram situações de assédio sexual.

De facto, apesar de considerarmos que a alteração ao Código Penal feita em 2015, que incluiu no crime de

importunação sexual a formulação de propostas de teor sexual, foi um passo importante, entendemos que o

legislador deveria ter ido mais longe, criminalizando, igualmente, as situações em que são proferidas expressões

de cariz sexual, ainda que não consubstanciem propostas, garantindo assim que se encontram abrangidas pela

norma todas as situações de assédio de rua.

De notar que o artigo 40.º da Convenção de Istambul, estabelece que os Estados devem assegurar que

«qualquer tipo de comportamento indesejado de natureza sexual (…) seja passível de sanções penais ou outras

sanções legais.».

É verdade que se pode defender que as palavras proferidas com conteúdo sexual poderiam, preenchidos os

elementos típicos, ser enquadradas como crime de injúria, p. e p. nos termos do artigo 181.º do Código Penal.

Contudo, na nossa opinião, nestes casos, o bem jurídico a proteger não é a honra, como acontece no crime de

injúria, mas sim a liberdade sexual, pelo que devem ser expressamente previstas estas situações, para que não

exista dúvida, e enquadradas no capítulo referente aos crimes sexuais.

Face ao exposto, e com o objetivo de garantir o cumprimento do disposto no artigo 40.º da Convenção do

Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica,

propomos uma alteração ao artigo 170.º do Código Penal, com o intuito de criminalizar as situações em que são

proferidas palavras de índole sexual e punindo estas situações com uma pena de prisão até dois anos ou com

pena de multa.

Propomos, também, que a pena seja agravada caso o assédio ocorra em ambiente laboral, dado que a

ocorrência destas situações é muito significativa, como ficou demonstrado, e existe, na maior parte dos casos,

relações de subordinação/hierarquia, da qual o agressor se aproveita e que colocam a vítima numa situação de

maior vulnerabilidade.

Estas alterações permitirão, por um lado, combater o medo que as pessoas têm em fazer queixa,

particularmente quando estamos no âmbito das relações de trabalho, e a falta de confiança que têm na justiça

por duvidarem que tal as possa ajudar. Por outro lado, passam a mensagem que a sociedade não tolera este

tipo de comportamentos, incentivando uma mudança de atitudes, prevenindo a ocorrência de situações de

assédio e violência e promovendo a criação de uma sociedade igualitária.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

3 Guia para a elaboração do código de boa conduta para a prevenção e combate ao assédio no trabalho (cite.gov.pt) 4 Idem. 5 https://www.ffms.pt/FileDownload/b6eb24e5-3bf3-411d-9f35-b51a7ebed3e8/estudo-mulher-completo

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março,

na sua redação atual, reforçando a proteção das vítimas em caso de importunação sexual.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março

São alterados os artigos 170.º e 177.º do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, que aprova o Código Penal,

alterado pela Lei n.º 90/97, de 30 de julho, Lei n.º 65/98, de 2 de setembro, Lei n.º 7/2000, de 27 de maio, Lei

n.º 77/2001, de 13 de julho, Lei n.º 97/2001, de 25 de agosto, Lei n.º 98/2001, de 25 de agosto, Lei n.º 99/2001,

de 25 de agosto, Lei n.º 100/2001, de 25 de agosto, Lei n.º 108/2001, de 28 de novembro, Decreto-Lei n.º

323/2001, de 17 de dezembro, Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de março, Lei n.º 52/2003, de 22 de agosto, Lei n.º

100/2003, de 15 de novembro, Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, Lei n.º 11/2004, de 27 de março, Lei

n.º 31/2004, de 22 de julho, Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, Lei n.º 16/2007, de 17 de abril, Lei n.º 59/2007,

de 4 de setembro, Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, Lei n.º 40/2010, de 3 de setembro, Lei n.º 32/2010, de 2

de setembro, Lei n.º 4/2011, de 16 de fevereiro, Lei n.º 56/2011, de 15 de novembro, Lei n.º 19/2013, de 21 de

fevereiro, Lei n.º 60/2013, de 23 de agosto, Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, Lei n.º 59/2014, de 26 de

agosto, Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, Lei n.º 82/2014, de 30 de dezembro, Lei Orgânica n.º 1/2015, de 8 de

janeiro, Lei n.º 30/2015, de 22 de abril, Lei n.º 81/2015, de 3 de agosto, Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto, Lei n.º

103/2015, de 24 de agosto, Lei n.º 110/2015, de 26 de agosto, Lei n.º 39/2016, de 19 de dezembro, Lei n.º

8/2017, de 3 de março, Lei n.º 30/2017, de 30 de maio, Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto, Lei n.º 94/2017, de 23

de agosto, Lei n.º 16/2018, de 27 de março, Lei n.º 44/2018, de 9 de agosto, Lei n.º 101/2019, de 6 de setembro,

Lei n.º 102/2019, de 6 de setembro, Lei n.º 39/2020, de 18 de agosto, Lei n.º 40/2020, de 18 de agosto, e pela

Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto, os quais passam ter a seguinte redação:

«Artigo 170.º

[…]

Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de carácter exibicionista, proferindo palavras

ou formulando propostas de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual, é punido com pena

de prisão até 2anos ou com pena de multa até 240 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra

disposição legal.

Artigo 177.º

[…]

1 – ................................................................................................................................................................... :

a) ..................................................................................................................................................................... ;

b) ..................................................................................................................................................................... ;

c) ..................................................................................................................................................................... .

2 – ................................................................................................................................................................... .

3 – ................................................................................................................................................................... .

4 – As penas previstas nos artigos 163.º a 168.º e 170.º a 175.º, nos n.os 1 e 2 do artigo 176.º e no artigo

176.º-A são agravadas de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se o crime for cometido conjuntamente

por duas ou mais pessoas.

5 – ................................................................................................................................................................... .

6 – As penas previstas nos artigos 163.º a 165.º, 168.º, 170.º, 174.º, 175.º e no n.º 1 do artigo 176.º são

agravadas de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, quando os crimes forem praticados na presença ou

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contra vítima menor de 16 anos;

7 – As penas previstas nos artigos 163.º a 165.º, 168.º, 170.º e 175.º e no n.º 1 do artigo 176.º são agravadas

de metade, nos seus limites mínimo e máximo, se a vítima for menor de 14 anos.

8 – A pena prevista no artigo 170.º é agravada de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se o

crime for cometido em ambiente laboral.

9 – [Anterior n.º 8.]»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias a contar da sua publicação.

Palácio de São Bento, 7 de julho de 2021.

A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

———

PROJETO DE LEI N.º 907/XIV/2.ª

APROVA A ORGÂNICA DA AGÊNCIA PORTUGUESA PARA A MIGRAÇÃO E O ASILO, IP

Exposição de motivos

As/os cidadãs/ãos estrangeiras/os que escolheram Portugal para viver contribuem para a demografia, para

o desenvolvimento da economia, para a sustentabilidade do sistema da segurança social, bem como para a

riqueza e diversidade social e cultural do País.

Os dados do relatório sobre os Indicadores de Integração de Imigração referentes ao ano de 2019, publicado

pelo Observatório das Migrações (OM), demonstram de uma forma inequívoca o valor do contributo das pessoas

migrantes. Os estrangeiros representam 8,5% dos contribuintes e a sua contribuição para o sistema de

Segurança Social traduziu-se num saldo positivo de 884,4 milhões de euros. Este valor representa um aumento

de 35% em relação a 2018 e é o triplo do de 2013. No relatório pode ler-se «que a imigração é para Portugal

essencialmente ativa e contributiva, ajudando de forma inequívoca para contrabalançar as contas públicas da

segurança social, constituindo-se como uma dimensão importante do reforço e sustentabilidade do Estado social

em Portugal». Os imigrantes dão mais ao Estado do que dele recebem.

É de destacar também o contributo positivo dos imigrantes para a demografia, atenuando o envelhecimento

e o decréscimo da população residente. Em 2019, com o aumento significativo do número de entradas, que se

vem registando desde 2015, foi possível compensar as saídas e recuperar os valores positivos do saldo

migratório. Graças à entrada de mais 19 292 pessoas migrantes, Portugal ficou entre os oito Estados-membros

com o mais elevado saldo migratório. As mulheres de nacionalidade estrangeira foram responsáveis por 12,7%

do total dos nados-vivos em Portugal, importância relativa significativa quando a população estrangeira

representa apenas 5,7% do total da população residente no país, dando um importante contributo para o saldo

natural e para a mitigação do declínio populacional.

Embora o relatório assinale 2019 como o ano com mais imigrantes na História do País, Portugal continua a

ser um dos países com menos população migrante na Europa. Em 2019 residiam 590,348 mil estrangeiros,

representando 4,7% do total de residentes no país, o oitavo valor mais baixo da União Europeia.

Apesar da relevância dos contributos das pessoas migrantes e refugiadas, bem como do reconhecimento,

por parte do Governo, que Portugal precisa de mais imigração e de mais pessoas a trabalhar em Portugal, os

obstáculos à regularização dos imigrantes persistem. O Estado português tem falhado em garantir, aos cidadãos

e às cidadãs estrangeiros/as, a igualdade no acesso a direitos.

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Os atrasos crónicos do Serviço e Estrangeiros e Fronteiras (SEF) nas marcações para renovação ou

obtenção de autorização de residência têm sido denunciados pelas organizações representativas das pessoas

migrantes como um dos principais obstáculos colocados pelo Estado, que, ao manter milhares de cidadãos e

cidadãs estrangeiros/as em situações irregular, impossibilita o acesso a serviços públicos, a prestações sociais,

ao emprego com direitos, à habitação e ao reagrupamento familiar, entre outros direitos fundamentais.

No «Livro Branco sobre os direitos dos imigrantes e refugiados» que publicou em 2019, o Serviço Jesuíta

aos Refugiados (JRS) afirma que «a lei Portuguesa trata de forma desigual os imigrantes e que os tempos de

espera do SEF atingiram números inéditos». O documento refere ainda que nesse ano «houve prazos de

agendamento que demoraram quatro vezes mais do que é legalmente permitido».

Esta situação, que já era grave, tornou-se crítica com o surgimento da pandemia de COVID-19, tal como

denunciaram vinte associações numa Carta dirigida, em março de 2020, à Secretária de Estado para a

Integração e as Migrações.

Em resposta às reivindicações e denúncias das organizações representativas das pessoas migrantes e

refugiadas, o Governo emitiu o Despacho n.º 3863-B/2020, de 27 de março, e o Despacho n.º 4473-A/2021, de

30 de abril, que alarga o âmbito do anterior. Nestes diplomas estabelece-se que todas/os as/os cidadãs/ãos

estrangeiras/os com processos pendentes no SEF, à data da declaração do estado de emergência nacional e

até ao dia 30 de abril de 2021, ficam temporariamente com a sua situação regularizada, permitindo o acesso a

todos os serviços públicos, designadamente ao Serviço Nacional de Saúde, à proteção social, entre outros.

Esta medida, apesar dos avanços que representa, é curta. Por um lado, deixa muita gente de fora, como é o

caso das pessoas migrantes que ainda não tinham iniciado o seu processo de regularização no SEF e das que

estão em situação trabalho informal. Por outro, não corrige os problemas estruturais criados por décadas de

uma visão securitária da imigração, de atrasos crónicos, de discricionariedade e arbitrariedade nas decisões

que colocaram em pausa as vidas de milhares de pessoas que aspiram encontrar em Portugal melhores

condições de vida para si e para a sua família.

As notícias recentes ilustram o calvário burocrático que os imigrantes têm de passar para conseguir

regularizar a sua situação. Um artigo do jornal Público dá conta que o «SEF confirma que as vagas para a

concessão de autorizações de residência de trabalho estão totalmente preenchidas e que até junho de 2021

estão agendados cerca de 24 mil atendimentos para este assunto». Este Grupo Parlamentar tem recebido

denúncias de pessoas que estão há vários meses sem conseguir um agendamento do qual necessitam

desesperadamente para garantir o acesso a um emprego, ao reagrupamento familiar, a apoios sociais, entre

outros fins.

O Despacho n.º 1689-B/2021, de 12 de fevereiro, «determina que durante o estado de emergência os postos

de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras mantêm o atendimento presencial, mediante marcação,

destinado à prática de atos urgentes». Apesar de ser possível realizar agendamentos no SEF, os tempos de

espera encontram-se entre os 9 e os 12 meses. Estes prazos incompreensíveis aumentam o desespero e a

angústia das pessoas que esperam, algumas há anos, pelo agendamento. É mais um obstáculo burocrático

colocado pelo estado que não se sabe como ultrapassar.

A política de migração em Portugal baseia-se num modelo securitário e restritivo, assente em burocracia,

que faz coexistir na mesma instituição, uma Polícia de imigração, o controlo de fronteiras e o processamento de

documentação, a regulação dos fluxos migratórios e o combate ao tráfico de seres humanos. Esta opção

cristaliza a ideia de que os migrantes são uma ameaça, contra a qual os estados precisam de se proteger, e que

a imigração é um assunto de polícia.

As pessoas migrantes e requerentes de asilo que procuram Portugal em busca de uma vida melhor, como

tantas portuguesas e portugueses fizeram no passado e continuam a fazer no presente, não podem ser tratadas

como suspeitas ou mesmo criminosas até prova em contrário. A imigração não deve ser um assunto de polícia

e os direitos das pessoas migrantes têm de ser salvaguardados e protegidos.

A defesa de uma cidadania plena implica uma alteração profunda do paradigma da relação do estado com

as pessoas estrangeiras. Precisamos de uma política de acolhimento assente numa abordagem humanista, que

respeite os seus direitos e valorize a diversidade e o contributo que dão a Portugal. A sua consecução passa

pela separação orgânica entre as funções administrativas e as funções de investigação e fiscalização.

É necessário que o acolhimento de pessoas migrantes e requerentes de asilo caiba a um organismo

vocacionado para o efeito, com funcionárias/os com uma formação rigorosa, que assegure o mesmo respeito

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pelos direitos que é garantido às cidadãs e cidadãos nacionais. Um organismo administrativo que serve e acolhe

e não uma polícia que reprime.

Para tal, é fundamental garantir que em todas as etapas do processo de admissão de entrada, as pessoas

migrantes, requerentes de asilo e refugiadas tenham, sempre que necessitem, acesso a apoio jurídico

especializado, a intérpretes e mediadores com quem possam comunicar numa língua que dominem, ao apoio

de organizações não governamentais que atuem nesta área e a apoio consular.

Contrariamente a outros serviços públicos, o SEF gera significativas receitas próprias, sendo, em grande

medida, autossustentável. Com efeito, conforme referido no seu Relatório de Atividades de 2019, «as receitas

próprias resultantes da atividade direta do serviço representam 52,85% do financiamento», sendo considerada

«a fonte de financiamento mais representativa do orçamento do SEF». Estes valores são alcançados graças às

taxas e emolumentos pagos pelas pessoas estrangeiras que residem em Portugal. Os fundos comunitários

recebidos devido às pessoas migrantes representam 14,39% das receitas, pelo que 67,24% do orçamento do

SEF é garantido pelas pessoas migrantes.

Estes dados apoiam a necessidade de se criar uma estrutura vocacionada para o desempenho exclusivo das

funções administrativas, que tenha no centro da sua intervenção a defesa dos direitos das pessoas migrantes e

requerentes de asilo, que elimine a discricionariedade e a arbitrariedade e que confira a este processo as

garantias do Código de Procedimento Administrativo, nomeadamente em termos de transparência, prazos e

direito de recurso.

O presente projeto de lei visa a criação uma Agência para as Migrações e Asilo com a missão de melhorar

as condições do acolhimento das e dos migrantes e requerentes de asilo, desburocratizar e simplificar o acesso

à cidadania plena, assumindo o desempenho das funções administrativas que se encontram atualmente

atribuídas ao SEF.

Este organismo ficará sob a tutela da Presidência do Conselho de Ministros, que tutela a Secretaria de Estado

para a Integração e as Migrações, promovendo uma separação entre a segurança interna e as políticas de

imigração.

Pretende-se com este projeto criar condições para que os serviços de concessão e renovação de autorização

de residência ocorram nos locais onde são prestados os serviços públicos comuns aos restantes cidadãos e

cidadãs que vivem em Portugal, evitando a guetização das pessoas migrantes em serviços próprios. Os

processos de pedido de asilo, de proteção internacional e resultantes da recusa de entrada no território nacional

serão analisados por uma comissão na qual estão representadas especialistas, entidades responsáveis pela

política de imigração e asilo e representantes das organizações da sociedade civil.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Natureza

1 – A Agência Portuguesa para a Migração e o Asilo, IP, abreviadamente designado por APMA, IP, é um

instituto público integrado na administração indireta do Estado, dotado de autonomia administrativa.

2 – A APMA, IP, prossegue atribuições da Presidência do Conselho de Ministros.

Artigo 2.º

Jurisdição territorial e sede

1 – A APMA, IP, é um organismo central com jurisdição sobre todo o território nacional.

2 – A APMA, IP, tem sede em Lisboa.

Artigo 3.º

Missões e atribuições

1 – A APMA, IP, tem por missão executar e acompanhar as políticas relativas aos serviços de regularização

da entrada e permanência de cidadãos estrangeiros em território nacional, emitir pareceres sobre os pedidos de

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asilo e de instalação de refugiados, bem como estudar, promover, coordenar e executar as medidas e ações

relacionadas com as políticas migratórias e os movimentos migratórios.

2 – São atribuições da APMA, IP, no plano interno:

a) Emitir parecer relativamente a pedidos de vistos consulares;

b) Conceder em território nacional prorrogações de permanência, autorizações e renovações de residência;

c) Avaliar e emitir pareceres sobre processos de recusa de entrada ou saída de migrantes do território

nacional, sempre que os interessados apresentem recurso da decisão inicial;

d) Reconhecer e promover o direito ao reagrupamento familiar;

e) Manter a necessária colaboração com as entidades às quais compete a fiscalização do cumprimento da

lei reguladora do trabalho de estrangeiros;

f) Decidir sobre a aceitação da análise dos pedidos de asilo e refúgio e proceder à instrução dos processos

de concessão e de determinação do Estado responsável pela análise dos respetivos pedidos;

g) Analisar e dar parecer sobre os pedidos de concessão de estatutos de igualdade formulados pelos

cidadãos estrangeiros abrangidos por convenções internacionais;

h) Assegurar o cumprimento das atribuições previstas na legislação sobre a entrada, permanência e saída

de estrangeiros do território nacional.

3 – São atribuições da APMA, IP, no plano internacional:

a) Assegurar, por determinação do Governo, a representação do Estado Português a nível da União

Europeia no Comité Estratégico da Imigração, Fronteiras e Asilo, no Grupo de Alto Nível de Asilo e Migração,

no Grupo de Budapeste e noutras organizações internacionais, bem como participar nos grupos de trabalho que

versem matérias relacionadas com as atribuições da APMA, IP;

b) Assegurar a representação da APMA, IP, junto de postos consulares;

c) Assegurar os compromissos assumidos no âmbito da cooperação internacional nos termos legalmente

previstos;

d) Colaborar com os serviços similares estrangeiros, podendo estabelecer formas de cooperação.

4 – A APMA, IP, garante a formação contínua e específica dos seus funcionários em direitos humanos, direito

das migrações, direito de asilo e outras matérias relacionadas com as suas atribuições.

5 – A APMA, IP, promove formações específicas nas matérias de migrações, asilo e direitos humanos

dirigidas a serviços destinados à população estrangeira.

6 – A APMA, IP, promove sessões de esclarecimento e formação do público em geral nas matérias de

migrações, asilo e direitos humanos.

Artigo 4.º

Organização interna

1 – A organização interna da APMA, IP, é a prevista nos respetivos estatutos e regulamentos internos.

2 – São órgãos da APMA, IP:

a) O Conselho Diretivo;

b) O Comité para a Imigração, Asilo e Refúgio.

Artigo 5.º

Conselho Diretivo

1 – O Conselho Diretivo é composto por um presidente, por um vice-presidente e por um vogal.

2 – Sem prejuízo das competências conferidas por lei ou que nele sejam delegadas ou subdelegadas,

compete ao Conselho Diretivo orientar e coordenar superiormente a atividade da APMA, IP, e assegurar a

realização das suas atribuições.

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3 – Compete em especial ao Conselho Diretivo:

a) Representar a APMA, IP;

b) Definir e promover a política de qualidade, em especial dos processos organizativos;

c) Definir a política de gestão de recursos humanos e proceder à sua afetação aos diversos departamentos

da APMA, IP;

d) Assegurar a coordenação do processo de planeamento, controlo e avaliação dos resultados da atividade

da APMA, IP;

e) Ordenar inspeções que tiver por convenientes;

f) Aplicar coimas em processos de contraordenação;

g) Autorizar a credenciação de trabalhadores/as;

h) Exercer as demais competências que lhe sejam cometidas por lei, regulamento ou delegação.

4 – O presidente pode delegar no vice-presidente as competências previstas no número anterior.

Artigo 6.º

Comité para a Imigração, Asilo e Refúgio

1 – O Comité para a Imigração, Asilo e Refúgio é o órgão de consulta, apoio e participação na definição das

linhas gerais de atuação da APMA, IP, e nas tomadas de decisão do Conselho Diretivo em matéria de imigração

e asilo, emitindo pareceres sobre pedidos de asilo e instalação de refugiados, avaliando e emitindo pareceres

sobre os processos de recusa de entrada de imigrantes em território nacional e assegurando a representação

de departamentos governamentais e de organizações representativas da sociedade civil.

2 – O Comité para a Imigração, Asilo e Refúgio é composto por:

a) Um membro do Conselho Diretivo da APMA, IP, que preside;

b) Um representante a designar pelo membro do Governo responsável pela área da cidadania e da igualdade;

c) Um representante a designar pelo membro do Governo responsável pela área da justiça;

d) Um representante a designar pelo membro do Governo responsável pela área da administração interna;

e) Um representante a designar pelo membro do Governo responsável pela área do trabalho e assuntos

sociais;

f) Quatro representantes de organizações não governamentais, a designar nos termos do artigo 7.º;

g) Quatro elementos do grupo técnico-científico, a designar nos termos do artigo 8.º.

3 – Compete ao Comité para a Imigração, Asilo e Refúgio pronunciar-se sobre todos os assuntos que lhe

forem submetidos pelo membro do Governo responsável pela área das migrações ou pelo Conselho Diretivo da

APMA, IP.

4 – Sempre que for necessário, no âmbito de pedidos de asilo, obter avaliações de competências específicas

em relação à situação do país de origem, esta informação é prestada a pedido do Presidente a um agente ou

funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

5 – Compete ao Comité para as Migrações, Asilo e Refúgio aprovar o respetivo regulamento interno.

Artigo 7.º

Representantes das organizações não governamentais

1 – Integram o Comité para as Migrações, Asilo e Refúgio representantes de organizações não

governamentais, como tal reconhecidas nos termos da lei, cujo objeto estatutário se destine primordialmente à

defesa dos direitos das pessoas migrantes, refugiadas e requerentes de asilo, à defesa dos direitos humanos

ou ao combate ao racismo e xenofobia, e cujos objetivos se coadunem com os da APMA, IP.

2 – Encontram-se presentes no Comité para as Migrações, Asilo e Refúgio:

a) Um representante de organizações de imigrantes,

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b) Um representante de organizações de refugiados,

c) Um representante de organizações de defesa dos direitos humanos,

d) Um representante de organizações antirracistas.

3 – Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as entidades referidas no número anterior são

notificadas pela APMA, IP, para, no prazo de 30 dias, indicarem os respetivos representantes, efetivos e

suplentes.

4 – A designação dos representantes, efetivos e suplentes, é realizada por acordo entre as organizações não

governamentais, podendo estas estabelecer regras próprias de rotatividade na representação.

5 – A escolha dos representantes das organizações não governamentais tem por base os respetivos

estatutos e tem em conta a relevância e a continuidade das atividades desenvolvidas na promoção dos direitos

das pessoas migrantes, refugiadas e requerentes de asilo, dos valores da defesa dos direitos humanos, da

cidadania ou do combate ao racismo e xenofobia.

6 – O mandato dos representantes das organizações não governamentais corresponde ao período de 5 anos

e cessa com a tomada de posse dos novos membros.

7 – Aos representantes de organizações não governamentais, no exercício das suas funções, é atribuído

uma senha de presença para a participação nas reuniões do Comité, que será determinado por despacho do

membro do Governo com tutela sobre a APMA, IP.

Artigo 8.º

Grupo técnico-científico

1 – O Grupo técnico-científico é composto por quatro personalidades com reconhecida competência científica

nas áreas das migrações, asilo e refugiados.

2 – Os membros do grupo técnico-científico são nomeados pelo membro do Governo com tutela sobre a

APMA, IP.

3 – Aos membros do grupo técnico-científico, no exercício das suas funções, é atribuído uma senha de

presença para a participação nas reuniões da comissão, que será determinado por despacho do membro do

Governo com tutela sobre a APMA, IP.

Artigo 9.º

Serviços centrais e delegações regionais

1 – Para desenvolvimento das atividades inerentes aos seus objetivos e atribuições o APMA, IP, está

estruturado em serviços centrais, constituídos por unidades orgânicas nucleares e flexíveis, e em delegações

regionais, serviços descentralizados regulados em diploma próprio.

2 – Os Serviços Centrais compreendem:

a) Departamento de Migração;

b) Departamento de Asilo e Refugiados;

c) Departamento Jurídico;

d) Departamento de Estudos e Planeamento;

e) Departamento Administrativo e Financeiro;

f) Departamento de Apoio Técnico e Informático;

g) Departamento de Comunicação e Relações Externas.

3 – As Delegações Regionais compreendem serviços desconcentrados da APMA, IP.

4 – As áreas de jurisdição das Delegações Regionais coincidem com as Comissões de Coordenação e

Desenvolvimento Regional e articulam com os municípios que dela fazem parte.

5 – Compete às Delegações Regionais:

a) a análise e decisão de pedidos de autorização e renovação dos títulos de residência e prorrogações de

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38

vistos;

b) o encaminhamento, para o Departamento de Asilo e Refugiados dos serviços centrais, dos pedidos de

asilo e refúgio das suas áreas de jurisdição.

Artigo 10.º

Gabinete Municipal de Apoio ao Migrante

1 – As Delegações Regionais, em articulação com os municípios, criam os gabinetes municipais de apoio ao

migrante.

2 – Aos gabinetes municipais de apoio ao migrante compete:

a) a recolha de pedidos de autorização e renovação da residência, prorrogação de vistos e reagrupamento

familiar;

b) a recolha de documentação e dados biométricos;

c) a articulação com as delegações regionais.

3 – O atendimento do migrante ou do requerente de asilo é realizado de forma a garantir a sua privacidade

e confidencialidade.

Artigo 11.º

Elementos de identificação

Com vista ao estabelecimento ou confirmação da identidade de estrangeiros ou apátridas, a APMA, IP, pode

recorrer aos meios de identificação civil, incluindo a obtenção de fotografias e impressões digitais.

Artigo 12.º

Segredo profissional

1 – O pessoal da APMA, IP, é obrigado a guardar sigilo sobre todas as informações a que tiver acesso no

exercício das suas funções.

2 – A obrigação de sigilo a que se refere o número anterior não impede que os trabalhadores devam

comunicar prontamente às autoridades competentes factos indiciários da prática de qualquer crime.

Artigo 13.º

Receitas

1 – A APMA, IP, dispõe, para além das dotações atribuídas no Orçamento do Estado, das seguintes receitas

próprias:

a) As importâncias cobradas pela concessão de vistos, prorrogações de permanência, pela concessão e

renovação de autorizações de residência e títulos de residência nos termos da lei;

b) As taxas e emolumentos que por lei estiverem em vigor;

c) O produto da venda de impressos próprios da APMA, IP;

d) A percentagem do produto das coimas, de acordo com a lei vigente;

e) Quaisquer outras receitas que por lei lhe estejam ou venham a ser atribuídas.

2 – As receitas próprias referidas no número anterior são consignadas à realização de despesas da APMA,

IP, durante a execução do orçamento do ano a que respeitam, podendo os saldos não utilizados transitar para

o ano seguinte, nos termos previstos no decreto-lei de execução orçamental.

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Artigo 14.º

Despesas

Constituem despesas da APMA, IP, as que resultem de encargos decorrentes da prossecução das respetivas

atribuições.

Artigo 15.º

Estatutos

Os estatutos da APMA, IP, são aprovados por portaria no prazo de 60 dias contados da data de entrada em

vigor da presente lei.

Artigo 16.º

Atribuições em matéria policial

As atribuições do SEF em matéria de controlo de fronteiras e da investigação criminal, passam a ser

exercidas pelas forças e serviços de segurança nomeadamente a Guarda Nacional Republicana, pela Polícia

de Segurança Pública e pela Polícia Judiciária, nos termos a definir em diploma próprio.

Artigo 17.º

Norma Revogatória

São revogados:

a) o Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16 de outubro;

b) a alínea d) do n.º 2 do artigo 25.º da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto.

Artigo 18.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia 1 do mês imediato ao da sua publicação.

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: Beatriz Gomes Dias — José Manuel Pureza — Pedro Filipe Soares —

Jorge Costa — Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Isabel Pires —

Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria

Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

———

PROJETO DE LEI N.º 908/XIV/2.ª

PROCEDE À QUARTA ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 252/2000, DE 16 DE OUTUBRO, QUE

APROVA A LEI ORGÂNICA DO SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS

Exposição de motivos

A definição de um sistema lógico e coerente de articulação do funcionamento e coordenação da atividade

desenvolvida pelas diversas forças e serviços é um dos escopos fundamentais para garantir a indispensável

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manutenção da segurança interna, entendida como a atividade permanentemente desenvolvida pelo Estado

com vista a garantir o exercício dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o normal funcionamento

das instituições democráticas previstas na Constituição.

A conceção de tal sistema deve respeitar a especificidade institucional e a vocação funcional das diversas

forças e serviços que o integram, com vista a alcançar um emprego racional e eficaz dos meios disponíveis.

Foi através do Decreto-Lei n.º 440/86, de 31 de dezembro, que foi criado o Serviço de Estrangeiros e

Fronteiras, reestruturou-se o anterior Serviço de Estrangeiros e reiterou-se as atribuições deste novo organismo

no controlo documental da entrada e saída de cidadãos nacionais e estrangeiros nos postos de fronteira

terrestres, marítimos e aéreos, e atribuiu novas competências no domínio da política de imigração.

No quadro da política de segurança interna, o SEF tem atualmente por missão assegurar o controlo das

pessoas nas fronteiras, dos estrangeiros em território nacional, a prevenção e o combate à criminalidade

relacionada com a imigração ilegal e tráfico de seres humanos, gerir os documentos de viagem e de identificação

de estrangeiros e proceder à instrução dos processos de pedido de asilo, na salvaguarda da segurança interna

e dos direitos e liberdades individuais no contexto global da realidade migratória. Enquanto órgão de polícia

criminal, o SEF atua no processo, nos termos da lei processual penal, sob a direção e em dependência funcional

da autoridade judiciária competente, realizando as ações determinadas e os atos delegados pela referida

autoridade. Compete ainda ao SEF promover, coordenar e executar as medidas e ações relacionadas com estas

atividades e com os movimentos migratórios e, a nível internacional, garantir, por determinação do Governo, a

representação do Estado português, no desenvolvimento do Acervo de Schengen no âmbito da União Europeia,

no Comité Estratégico Imigração, Fronteiras e Asilo e no Grupo de Alto Nível de Asilo Migração, e noutras

organizações internacionais, bem como participar nos grupos de trabalho de cooperação policial que versem

matérias relacionadas com as suas atribuições.

Face à evolução dos fluxos migratórios e outros condicionalismos a que o Serviço de Estrangeiros e

Fronteiras teve de dar resposta, tornou-se manifesta a insuficiência de meios e as carências estruturais deste

organismo.

Em maio de 2019, o Ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, avançou que o Governo está «a

trabalhar intensamente» na preparação da nova lei orgânica do SEF, sendo «neste contexto que vai ser dada

uma nova dimensão à formação dos inspetores».

A separação orgânica entre funções policiais e funções administrativas é um desiderato essencial e

transversal a todas as forças e serviços de segurança. A importância da sua implementação é unânime, não

sendo compreensível, por isso, que seja aplicado isoladamente a uma concreta força ou serviço de segurança.

Essa intenção não deve, por isso, ser argumento para a extinção ou desclassificação como órgão de polícia

criminal de qualquer das forças e serviços de segurança nos quais se pretenda implementar essa separação

orgânica.

O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras detém e deve manter importantes funções de segurança. A separação

funcional entre estas funções e as de cariz administrativo é essencial à boa organização e funcionamento desta

como doutras forças, mas não deve ser argumento para a retirada das funções policiais ou inspetivas desta

importante unidade do Sistema de Segurança Interna. De tal modo são relevantes as funções policiais do SEF

que se considera que, ao invés da sua atomização, se deve propor o seu reforço institucional, mediante uma

alteração da classificação do SEF de serviço de segurança para força de segurança. Que é aquilo que tem sido,

independentemente da sua classificação formal, desde a data da sua criação.

A especialização, por contraponto e ao invés da concentração, de funções de autoridade soberana de

segurança é uma mais valia em si mesma e, sobretudo, uma saudável e necessária política de separação e

equilíbrio de poderes numa área tão sensível em matéria de direitos, liberdades e garantias.

Esta alteração na natureza do SEF visa afirmar este órgão de polícia criminal como força de segurança,

sujeitando-o concomitantemente aos deveres próprios das forças de segurança, que pressupõe

necessariamente não só a regulamentação autónoma das adequadas restrições ao exercício de direitos do

corpo especial, como uma separação clara aos níveis das atribuições orgânicas e funcionais entre as

responsabilidades de segurança e as de natureza administrativa.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PSD apresentam o seguinte projeto de lei:

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Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma procede à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16 de outubro, alterado pelos

Decretos-Leis n.os 290-A/2001, de 17 de novembro, 121/2008, de 11 de julho, e Decreto-lei n.º 240/2012, de 6

de novembro, que aprova a estrutura orgânica e as atribuições do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16 de outubro

Os artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis n.os 290-

A/2001, de 17 de novembro, 121/2008, de 11 de julho, e Decreto-Lei n.º 240/2012, de 6 de novembro, passam

a ter a seguinte redação:

«Artigo 1.º

Natureza

1 – O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, abreviadamente designado por SEF, é uma força de segurança,

organizada hierarquicamente na dependência do Ministro da Administração Interna, com autonomia

administrativa e que, no quadro da política de segurança interna, tem por objetivos fundamentais controlar a

circulação de pessoas nas fronteiras, a permanência e atividades de estrangeiros em território nacional, bem

como estudar, promover, coordenar e executar as medidas e ações relacionadas com aquelas atividades e com

os movimentos migratórios.

2 – ................................................................................................................................................................... .

Artigo 2.º

Atribuições

1 – O SEF prossegue as seguintes atribuições de natureza policial e de investigação criminal:

a) Vigiar e fiscalizar nos postos de fronteira, incluindo a zona internacional dos portos e aeroportos, a

circulação de pessoas, podendo impedir o desembarque de passageiros e tripulantes de embarcações e

aeronaves indocumentados ou em situação irregular;

b) Impedir o desembarque de passageiros e tripulantes de embarcações e aeronaves que provenham de

portos ou aeroportos de risco sob o aspeto sanitário, sem prévio assentimento das competentes autoridades

sanitárias;

c) Proceder ao controlo da circulação de pessoas nos postos de fronteira, impedindo a entrada ou saída do

território nacional de pessoas que não satisfaçam os requisitos legais exigíveis para o efeito;

d) Autorizar e verificar a entrada de pessoas a bordo de embarcações e aeronaves;

e) Controlar e fiscalizar a permanência e atividades dos estrangeiros em todo o território nacional;

f) Assegurar a realização de controlos móveis e de operações conjuntas com serviços ou forças de segurança

congéneres, nacionais e espanholas;

g) Proceder à investigação dos crimes de auxílio à imigração ilegal, bem como investigar outros com ele

conexos, sem prejuízo da competência de outras entidades;

h) Manter a necessária colaboração com as entidades às quais compete a fiscalização do cumprimento da

lei reguladora do trabalho de estrangeiros;

i) Instaurar, instruir e decidir os processos de expulsão administrativa de estrangeiros do território nacional e

dar execução às decisões de expulsão administrativas e judiciais, bem como acionar, instruir e decidir os

processos de readmissão e assegurar a sua execução;

j) Efetuar escoltas de cidadãos objeto de medidas de afastamento;

k) Assegurar a gestão e a comunicação de dados relativos à parte nacional do Sistema de Informação

Schengen (NSIS) e, sem prejuízo das competências de outras entidades, de outros sistemas de informação

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comuns aos Estados-Membros da União Europeia no âmbito do controlo da circulação de pessoas,

nomeadamente o Sistema de Informação de Vistos (VIS) e o Sistema de Informação Antecipada de Passageiros

(APIS), bem como os relativos ao sistema de informação do passaporte eletrónico português (SIPEP);

l) Cooperar com as representações diplomáticas e consulares de outros Estados, devidamente acreditadas

em Portugal, nomeadamente no repatriamento dos seus nacionais;

m) Assegurar o cumprimento das atribuições previstas na legislação sobre a entrada, permanência, saída e

afastamento de estrangeiros do território nacional;

n) Assegurar as relações de cooperação com todos os órgãos e serviços do Estado, nomeadamente com os

demais serviços e forças de segurança, bem como com organizações não-governamentais legalmente

reconhecidas;

o) Coordenar a cooperação entre as forças e serviços de segurança nacionais e de outros países em matéria

de circulação de pessoas, do controlo de estrangeiros e da investigação dos crimes de auxílio à imigração ilegal

e outros com eles conexos;

p) Assegurar o planeamento e a execução da assistência técnica necessária ao correto funcionamento dos

centros de cooperação policial e aduaneira (CCPA) em matéria de sistemas de informação, plataformas digitais

de trabalho e sistemas de comunicação;

2 – São atribuições do SEF em matéria de gestão documental, asilo e refugiados:

a) Conceder em território nacional vistos, prorrogações de permanência, autorizações de residência, bem

como documentos de viagem nos termos da lei;

b) Reconhecer o direito ao reagrupamento familiar;

c) Decidir sobre a aceitação da análise dos pedidos de asilo e proceder à instrução dos processos de

concessão, de determinação do Estado responsável pela análise dos respetivos pedidos e da transferência dos

candidatos entre os Estados-Membros da União Europeia;

d) Emitir parecer sobre os processos de concessão de nacionalidade portuguesa por naturalização;

e) Analisar e dar parecer sobre os pedidos de concessão de estatutos de igualdade formulados pelos

cidadãos estrangeiros abrangidos por convenções internacionais;

f) Emitir parecer relativamente a pedidos de vistos consulares.

g) Emitir o passaporte comum e o passaporte temporário português;

3 – São atribuições do SEF no plano internacional:

a) Assegurar, por determinação do Governo, a representação do Estado português a nível da União Europeia

no Comité Estratégico Imigração, Fronteiras e Asilo e no Grupo de Alto Nível de Asilo Migração, no Grupo de

Budapeste e noutras organizações internacionais, bem como participar nos grupos de trabalho de cooperação

policial que versem matérias relacionadas com as atribuições do SEF;

b) Garantir, por determinação do Governo, a representação do Estado Português no desenvolvimento do

Acervo de Schengen no âmbito da União Europeia;

c) Assegurar, através de oficiais de ligação, os compromissos assumidos no âmbito da cooperação

internacional nos termos legalmente previstos;

d) Colaborar com os serviços similares estrangeiros, podendo estabelecer formas de cooperação.»

Artigo 2.º

Regulamentação específica

O regime de exercício da liberdade sindical e os direitos de negociação coletiva e de participação do pessoal

do corpo especial do SEF serão objeto de diploma próprio, a aprovar no prazo de 60 dias contado da entrada

em vigor da presente lei.

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Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor após a sua publicação.

Palácio de São Bento, 7 de julho de 2021.

Os Deputados do PSD: Carlos Peixoto — André Coelho Lima — Mónica Quintela.

———

PROPOSTA DE LEI N.º 99/XIV/2.ª

[TRANSPÕE A DIRETIVA (UE) 2019/1, QUE VISA ATRIBUIR ÀS AUTORIDADES DA CONCORRÊNCIA

DOS ESTADOS-MEMBROS COMPETÊNCIA PARA APLICAREM A LEI DE FORMA MAIS EFICAZ E

GARANTIR O BOM FUNCIONAMENTO DO MERCADO INTERNO]

Parecer da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, tendo como anexo uma

declaração de voto do PS, e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.

Parecer

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexos

PARTE I – Considerandos

1 – Nota introdutória

O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 99/XIV/2.ª, que

«Transpõe a Diretiva (UE) 2019/1, que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros

competência para aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado interno».

A presente iniciativa legislativa deu entrada a 21 de maio de 2021, foi admitida e baixou à Comissão

Parlamentar de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação no dia 24 de maio, para a elaboração do

respetivo parecer, sendo designado relator o signatário.

2 – Objeto e motivação da iniciativa legislativa

2.1 – Objeto

Pretende a presente iniciativa proceder à transposição para o ordenamento jurídico interno da Diretiva (UE)

2019/1 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, a qual visa atribuir às autoridades

da concorrência dos Estados-Membros competência para aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom

funcionamento do mercado interno, promovendo alterações à Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, que aprova o regime

jurídico da concorrência, e ao Decreto-Lei n.º 125/2014, de 18 de agosto, que aprova os estatutos da Autoridade

da Concorrência.

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2.2 – Motivação

Pela leitura da exposição de motivos, constata-se que a proposta de lei em apreço visa como refere a nota

técnica, uma maior eficácia da aplicação do direito da concorrência, através da supressão de constrangimentos

na recolha de meios de prova ou na aplicação célere de sanções dissuasoras. Pretende-se assim conferir à

Autoridade da Concorrência (AdC) «competências de investigação e de decisão, designadamente, prevendo a

realização de diligências de busca e apreensão, de pedidos de esclarecimentos a trabalhadores de empresas

ou de associações de empresas, de buscas domiciliárias, de pedidos de informação e inquirições».

Procede-se igualmente, à «alteração do exercício dos poderes sancionatórios por parte da AdC,

determinando que a abertura de inquérito em processo contraordenacional dependa de um juízo que tem em

conta as prioridades da política da concorrência e a gravidade da eventual infração» sendo ainda «classificada

como contraordenação punível com coima a falta ou recusa de resposta, ou o fornecimento de resposta falsa,

inexata ou incompleta, no âmbito de diligências de inquirição e diligências de busca, exame, recolha e apreensão

realizadas».

A proposta de lei propõe-se assim reforçar as garantias de independência da AdC, determinando por um lado

que o Governo não pode dirigir instruções ou recomendações, nem emitir diretrizes acerca da sua atividade,

reforçando por outro lado o elenco de incompatibilidades e de impedimentos dos trabalhadores e dos titulares

de cargos de direção.

Pretende-se assim promover a nível organizacional «a estabilidade orçamental e a autonomia na gestão dos

recursos da entidade reguladora», procurando-se «dissuadir possíveis práticas anticoncorrenciais, incentivar o

processo competitivo empresarial, promover a eliminação de barreiras à entrada de empresas nos setores de

atividade e encorajar o empreendedorismo e a inovação».

3 – Enquadramento jurídico nacional

A Lei n.º 19/2012, de 8 de maio – que aprova o Regime Jurídico da Concorrência –, veio conformar-se com

a necessidade de cumprir medidas constantes do Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF),

adaptando-se ainda às alterações legislativas e jurisprudenciais da União Europeia em matérias de promoção e

defesa da concorrência, e refletindo a «experiência e o balanço da atividade desenvolvida no domínio da defesa

e promoção da concorrência, por parte da Autoridade da Concorrência e dos Tribunais de recurso competentes»,

aplicando-se a todas as atividades económicas exercidas, com carácter permanente ou ocasional, nos setores

privado, público e cooperativo.

Internamente, tal como refere a nota técnica elaborada pelos serviços, «a Autoridade da Concorrência-AdC

é a entidade que assegura o respeito pelas regras de promoção e defesa da concorrência, dispondo, para o

efeito, dos poderes sancionatórios, de supervisão e de regulamentação estabelecidos neste regime jurídico e

nos seus estatutos. Criada em 2003, pela Lei n.º 10/2003, de 18 de janeiro, rege-se atualmente pelo Decreto-

Lei n.º 125/2014, de 18 de agosto, que aprovou os estatutos da Autoridade da Concorrência, adaptando-os ao

regime estabelecido na lei-quadro das entidades reguladoras, aprovada pela Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto,

que aprova a lei-quadro das entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade

económica dos setores privado, público e cooperativo.»

Sendo a AdC uma pessoa coletiva de direito público, e enquanto entidade administrativa independente,

dotada de autonomia administrativa e financeira, de autonomia de gestão, de independência orgânica, funcional

e técnica, e de património próprio, cabe-lhe por missão, assegurar a aplicação das regras de promoção e defesa

da concorrência nos setores privado, público, cooperativo e social, no respeito pelo princípio da economia de

mercado e de livre concorrência, tendo em vista o funcionamento eficiente dos mercados, a afetação ótima dos

recursos e os interesses dos consumidores.

Destacam-se de entre as suas atribuições:

– velar pelo cumprimento das leis, regulamentos e decisões de direito nacional e da União Europeia

destinados a promover e a defender a concorrência;

– fomentar a adoção de práticas que promovam a concorrência e a generalização de uma cultura de

concorrência junto dos agentes económicos e do público em geral;

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– atribuir graus de prioridade no tratamento de questões que é chamada a analisar, nos termos previstos no

regime jurídico da concorrência;

– difundir, em especial junto dos agentes económicos, as orientações consideradas relevantes para a política

de concorrência; promover a investigação em matéria de promoção e defesa da concorrência, desenvolvendo

as iniciativas e estabelecendo os protocolos de associação ou de cooperação com entidades públicas ou

privadas que se revelarem adequados para esse efeito.

A nota técnica elenca ainda com alguma exaustão, um conjunto de outros diplomas aplicáveis em matéria

de enquadramento nacional desta atividade.

4 – Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar, verificou-se a existência de uma iniciativa referente

a matéria conexa a aguardar apreciação e votação na especialidade:

Projeto de Lei n.º 433/XIV/1.ª (PEV) – «Regime de nomeação e destituição dos membros do conselho de

administração das Entidades Administrativas Independentes com funções de regulação da atividade económica

dos setores privado, público e cooperativo (Segunda alteração à Lei n.º. 67/2013, de 28 de agosto).»

Da consulta realizada verifica-se a inexistência de quaisquer outras iniciativas legislativas ou petições de

matéria idêntica ou conexa.

5 – Apreciação dos requisitos formais

A iniciativa em apreço está em conformidade no geral com os requisitos regimentais e formais previstos no

Regimento, exceção para a circunstância de, apesar de o Regimento da Assembleia da República, – e ainda do

Decreto-Lei n.º 274/2009, de 2 de outubro, o prever –, não mencionar o Governo a realização de qualquer

audição nem juntar quaisquer estudos, documentos ou pareceres, conforme salienta a nota técnica que

acompanha o presente parecer.

Salienta ainda a nota técnica que, do ponto de vista da observação regimental das disposições

constitucionais – situação que analisa com algum pormenor e que aqui se reproduz sinteticamente:

«(…) parecem poder levantar-se algumas dúvidas, concretamente no que se refere às alterações

propostas aos artigos 18.º e 31.º da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, que aprova o novo regime jurídico da

concorrência (artigo 2.º da proposta de lei).

As reservas que aquelas normas parecem suscitar, (…) prendem-se com o n.º 4 do artigo 34.º da

Constituição, que dispõe ser proibida ‘toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas

telecomunicações e nos demais meios de comunicação,salvos os casos previstos na lei em matéria de

processo criminal’.

Com efeito, as alterações propostas às normas indicadas poderão colocar em causa a norma

constitucional citada, ao permitir à Autoridade da Concorrência, ‘no exercício de poderes sancionatórios’, a

ingerência na correspondência e outros meios de comunicação privada [alínea b) do n.º 1 do artigo 18.º],

permitindo a utilização desses elementos como meio de prova (n.º 2 do artigo 31.º).»

Atendendo a que numa primeira análise não foi possível afastar eventual hipótese de inconstitucionalidade,

oportunamente colocada pelos serviços de apoio na nota técnica elaborada, face à matéria em causa foi

entendido endereçar à comissão parlamentar especializada em assuntos desta natureza – Comissão

Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias –, um pedido parecer técnico, sobre

o qual recebeu esta Comissão nesta data, a indicação de que o mesmo não estará disponível em tempo útil

para ser considerado na elaboração do presente parecer, prevendo-se contudo a sua conclusão e apreciação

na 1.ª Comissão Parlamentar a tempo da discussão em Plenário agendada para dia 7 de julho.

Relativamente à designada lei formulário, a nota técnica refere e sugere apropriadamente, que o título da

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presente iniciativa legislativa possa ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na

especialidade ou em redação final, identificando de forma completa a diretiva:

«Transpõe a Diretiva (UE) 2019/1, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, que

visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros competência para aplicarem a lei de forma

mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado interno, e altera o regime jurídico da concorrência e os

estatutos da Autoridade da Concorrência.»

Efetivamente, a iniciativa – como bem refere a nota técnica – transpõe para o ordenamento jurídico nacional

a Diretiva (UE) 2019/1 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, e altera várias

normas da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, que aprova o regime jurídico da concorrência, e do Decreto-Lei n.º

125/2014, de 18 de agosto, que aprova os estatutos da Autoridade da Concorrência, conferindo cabimento à

sugestão dos serviços.

Em caso de aprovação, é prevista ainda a obrigatoriedade a cargo da Autoridade da Concorrência de

regulamentar a lei, no prazo de dois anos.

6 – Análise de direito comparado

A matéria subjacente à Diretiva (UE) 2019/1 que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-

Membros competência para aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado

interno, tem como objetivo:

– assegurar que as autoridades da concorrência dos Estados-Membros da UE dispõem das garantias de

independência, dos meios e das competências de execução e de aplicação de coimas necessários para

poderem lidar eficazmente com os acordos e práticas empresariais tendentes a restringir a concorrência

na sua jurisdição;

– aplicar-se especificamente quando são celebrados acordos anticoncorrenciais proibidos pelos artigos 101.º

(cartéis) e 102.º (abuso de posição dominante) do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

(TFUE), quer individualmente quer em paralelo com as leis nacionais da concorrência aplicáveis ao caso;

– prever um mecanismo de assistência mútua entre as autoridades da concorrência para assegurar que as

empresas não se furtam da aplicação de modo a garantir o bom funcionamento do mercado único

europeu;

A Diretiva 2019/1 está intimamente relacionada com o Regulamento (CE) n.º 1/2003 do Conselho, de 16 de

dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.º e 82.º do

Tratado, que visava estabelecer um regime que assegure a não distorção da concorrência no mercado comum.

Este regulamento atribuiu competências às autoridades nacionais da concorrência dos Estados-Membros da

UE para aplicarem, juntamente com a Comissão, as regras de concorrência da UE.

Da nota técnica da presente iniciativa anexa a este parecer, consta ainda a indicação de que a referida

Diretiva, datada de 2018 e cujo prazo de transposição terminou a 4 de fevereiro último, foi já transposta por 12

países, e ainda uma breve análise sobre a situação concreta da transposição na Alemanha, Espanha e França.

7 – Consultas efetuadas

Nos termos regimentais, foi solicitada a emissão de parecer à Comissão Nacional de Proteção de Dados

(CNPD), Procuradoria Geral da República, Ordem dos Advogados e ainda ao Tribunal da Concorrência,

Regulação e Supervisão.

Atendendo à matéria em causa, e seguindo sugestão incluída na nota técnica, entende-se conveniente

proceder a algumas consultas facultativas nos termos do n.º 3 do artigo 3.º da Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto,

concretamente da Autoridade da Concorrência-AdC e da Autoridade Nacional de Comunicações-ANACOM.

Os pareceres solicitados, assim que disponíveis estarão acessíveis no sítio eletrónico da Assembleia da

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República, na página da presente iniciativa, como é o caso do parecer da PGR, o único recebido à data e que

refere que «o conteúdo da proposta legislativa, não se enquadra em matéria de organização judiciária nem de

administração de justiça pelo que não caberá nas competências deste CSMP elaborar parecer sobre tal

matéria.»

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

O relator do presente parecer reserva a sua opinião para o debate em Plenário da iniciativa, a qual é, de

resto, de elaboração facultativa conforme o disposto no n.º 3 do artigo 137.º do RAR.

PARTE III – Conclusões

A Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação aprova o seguinte parecer:

1 – O Governo, no âmbito do poder de iniciativa, apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei

n.º 99/XIV/2.ª – «Transpõe a Diretiva (UE) 2019/1, que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-

Membros competência para aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado

interno»;

2 – A presente proposta de lei cumpre todos os requisitos constitucionais, legais e regimentais necessários,

exceto no que respeita às propostas de alteração aos artigos 18.º e 31.º da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, que

aprova o regime jurídico da concorrência (artigo 2.º da proposta de lei) e que poderá colidir com o n.º 4 do artigo

34.º da Constituição, que estatuí ser proibida «toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência,

nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de

processo criminal», caso em que subsiste a dúvida levantada pelos serviços, mas que poderá ser suprida no

decurso do processo legislativo.

3 – Na impossibilidade confirmada de dispor em tempo útil de parecer técnico solicitado à Comissão

Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que afaste a aquela possibilidade,

entende-se, no entanto, que, ainda que se venha a confirmar qualquer problema daquela natureza, poderá o

mesmo ser eliminado no âmbito do processo legislativo em curso.

4 – Nos termos regimentais aplicáveis, o presente parecer deverá ser remetido a Sua Excelência o

Presidente da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 25 de junho de 2021.

O Deputado autor do parecer, Jorge Paulo Oliveira — O Vice-Presidente da Comissão, Pedro Coimbra.

Nota: O parecer foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE e do PCP e a abstenção do PS, tendo-se

registado a ausência do CDS-PP, do PAN e do PEV, na reunião da Comissão de 7 de julho de 2021.

PARTE IV – Anexos

Declaração de voto, apresentada pelo PS.

Em conformidade com o cumprimento no artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, anexa-se

a nota técnica elaborada pelos serviços.

Declaração de voto apresentada pelo PS

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista abstém-se na votação do parecer referente à Proposta de Lei n.º

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/XIV/2.ª por não acompanhar as objeções relativas à constitucionalidade referidas no mesmo.

Nota Técnica

Proposta de Lei n.º 99/XIV/2.ª (GOV)

Título: Transpõe a Diretiva (UE) 2019/1, que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-

Membros competência para aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do

mercado interno

Data de admissão: 24 de maio de 2021.

Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação (6.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Luís Marques e Liliane Sanches da Silva (DAC), Lia Negrão (DAPLEN), Luísa Colaço e Filipa Paixão (DILP) e Paula Faria (BIB). Data: 8 de junho de 2021.

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

A presente iniciativa tem por finalidade proceder à transposição para o ordenamento jurídico nacional da

Diretiva (UE) 2019/11 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, que visa atribuir às

autoridades da concorrência dos Estados-Membros competência para aplicarem a lei de forma mais eficaz e

garantir o bom funcionamento do mercado interno, promovendo alterações àLei n.º 19/2012, de 8 de maio2, que

aprova o regime jurídico da concorrência, e ao Decreto-Lei n.º 125/2014, de 18 de agosto, que aprova os

estatutos da Autoridade da Concorrência.

Atendendo à exposição de motivos, constata-se que a proposta de lei em apreço pretende promover a

eficácia da aplicação do direito da concorrência, através da supressão de constrangimentos na recolha de meios

de prova ou na aplicação célere de sanções dissuasoras. Face ao exposto, atribui-se à Autoridade da

Concorrência (AdC) competências de investigação e de decisão, designadamente, prevendo a realização de

diligências de busca e apreensão, de pedidos de esclarecimentos a trabalhadores de empresas ou de

associações de empresas, de buscas domiciliárias, de pedidos de informação e inquirições. Igualmente, altera-

se o exercício dos poderes sancionatórios por parte da AdC, determinando que a abertura de inquérito em

1 Diploma consolidado retirado do portal oficial EUR-Lex. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas são feitas para o referido portal. 2 Diploma consolidado retirado do sítio na Internet do Diário da República Eletrónico. Todas as referências legislativas nesta parte da nota técnica são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico, salvo indicação em contrário.

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processo contraordenacional dependa de um juízo que tem em conta as prioridades da política da concorrência

e a gravidade da eventual infração. No âmbito das coimas e sanções pecuniárias compulsórias, considera-se

contraordenação punível com coima a falta ou recusa de resposta, ou o fornecimento de resposta falsa, inexata

ou incompleta, no âmbito de diligências de inquirição e diligências de busca, exame, recolha e apreensão

realizadas.

É referido que a proposta de lei visa reforçar as garantias de independência da AdC, determinando que o

Governo não pode dirigir instruções ou recomendações, nem emitir diretivas acerca da sua atividade, assim

como reforça o elenco de incompatibilidades e de impedimentos dos trabalhadores e dos titulares de cargos de

direção. A nível organizacional é promovida a estabilidade orçamental e a autonomia na gestão dos recursos da

entidade reguladora, de forma a que o seu funcionamento não seja financiado através do produto das coimas

aplicadas por infrações.

Com efeito, a iniciativa tem como fim dissuadir possíveis práticas anticoncorrenciais, incentivar o processo

competitivo empresarial, promover a eliminação de barreiras à entrada de empresas nos setores de atividade e

encorajar o empreendedorismo e a inovação.

• Enquadramento jurídico nacional

O Regime Jurídico da Concorrência, aprovado pela Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, veio reformular o regime

jurídico vigente até então, visando «cumprir medidas constantes do Programa de Assistência Económica e

Financeira (PAEF)»; responder «à evolução entretanto verificada na legislação e jurisprudência da União

Europeia em matérias de promoção e defesa da concorrência» e refletir «a experiência e o balanço da atividade

desenvolvida no domínio da defesa e promoção da concorrência, por parte da Autoridade da Concorrência e

dos Tribunais de recurso competentes3».

Nos termos do seu artigo 2.º, este regime jurídico «(…) é aplicável a todas as atividades económicas

exercidas, com caráter permanente ou ocasional, nos setores privado, público e cooperativo. Sob reserva das

obrigações internacionais do Estado português, a presente lei é aplicável à promoção e defesa da concorrência,

nomeadamente às práticas restritivas e às operações de concentração de empresas que ocorram em território

nacional ou que neste tenham ou possam ter efeitos».

Destaca-se, neste regime jurídico, o artigo 3.º, que contém a noção de empresa, todo o Capítulo II, relativo

às práticas restritivas da concorrência, e o Capítulo III, sobre as operações de concentração de empresas.

A AdC é a entidade que assegura o respeito pelas regras de promoção e defesa da concorrência, dispondo,

para o efeito, dos poderes sancionatórios, de supervisão e de regulamentação estabelecidos neste regime

jurídico e nos seus estatutos. Criada em 2003, pela Lei n.º 10/2003, de 18 de janeiro4, rege-se atualmente pelo

Decreto-Lei n.º 125/2014, de 18 de agosto5, que aprovou os estatutos da Autoridade da Concorrência,

adaptando-os ao regime estabelecido na lei-quadro das entidades reguladoras, aprovada pela Lei n.º 67/2013,

de 28 de agosto6, que aprova a lei-quadro das entidades administrativas independentes com funções de

regulação da atividade económica dos setores privado, público e cooperativo.

A AdC é uma pessoa coletiva de direito público, revestindo a natureza de entidade administrativa

independente, dotada de autonomia administrativa e financeira, de autonomia de gestão, de independência

orgânica, funcional e técnica, e de património próprio. Tem por missão assegurar a aplicação das regras de

promoção e defesa da concorrência nos setores privado, público, cooperativo e social, no respeito pelo princípio

da economia de mercado e de livre concorrência, tendo em vista o funcionamento eficiente dos mercados, a

afetação ótima dos recursos e os interesses dos consumidores, nos termos previstos na lei e nos seus estatutos

(artigo 1.º).

Das suas atribuições, destacam-se as seguintes: velar pelo cumprimento das leis, regulamentos e decisões

de direito nacional e da União Europeia destinados a promover e a defender a concorrência; fomentar a adoção

de práticas que promovam a concorrência e a generalização de uma cultura de concorrência junto dos agentes

económicos e do público em geral; atribuir graus de prioridade no tratamento de questões que é chamada a

3 Cfr. exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 45/12/1.ª (GOV), cujos trabalhos preparatórios podem ser consultados aqui. 4 Diploma revogado. 5 Retificada pela Declaração de Retificação n.º 40/2014, de 15 de setembro. 6 Texto consolidado.

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analisar, nos termos previstos no regime jurídico da concorrência; difundir, em especial junto dos agentes

económicos, as orientações consideradas relevantes para a política de concorrência; promover a investigação

em matéria de promoção e defesa da concorrência, desenvolvendo as iniciativas e estabelecendo os protocolos

de associação ou de cooperação com entidades públicas ou privadas que se revelarem adequados para esse

efeito (artigo 5.º).

Tendo em consideração o teor da presente proposta de lei, importa referir também um conjunto de diplomas

a ter em conta neste enquadramento nacional:

• O regime geral do ilícito de mera ordenação social, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de

outubro, que se aplica, subsidiariamente e com as devidas adaptações, aos processos de práticas restritivas da

concorrência;

• A Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, relativa ao direito a indemnização por infração ao direito da concorrência,

que estabelece as regras relativas a estes pedidos de indemnização e que é aplicável independentemente de a

referida infração já ter sido declarada por alguma autoridade de concorrência ou tribunal, nacional ou de qualquer

Estado-membro, pela Comissão ou pelo Tribunal de Justiça da União Europeia;

• O Decreto-Lei n.º 93/2017, de 1 de agosto7, que cria o serviço público de notificações eletrónicas

associado à morada única digital;

• A Lei n.º 37/2014, de 26 de junho8, que estabelece um sistema alternativo e voluntário de autenticação

dos cidadãos nos portais e sítios na Internet da Administração Pública denominado Chave Móvel Digital;

• O Decreto-Lei n.º 195/99, de 8 de junho9, que aprova o regime aplicável às cauções nos contratos de

fornecimento aos consumidores dos serviços públicos essenciais, cujo artigo 6.º-B determina que «Os

montantes relativos às cauções não reclamadas nos prazos e nos termos mencionados, que não tenham sido

restituídas aos consumidores, ao abrigo do artigo 6.º, revertem para um fundo a administrar pelo Instituto do

Consumidor, IP, destinado ao financiamento de mecanismos extrajudiciais de acesso à justiça pelos

consumidores e de projectos de âmbito nacional, regional ou local de promoção dos direitos dos consumidores

e a constituir nos termos a definir por portaria conjunta dos ministros responsáveis pelas áreas das finanças e

da defesa do consumidor.» Este Fundo para a Promoção dos Direitos dos Consumidores foi criado pela Portaria

n.º 1340/2008, de 26 de novembro10, e rege-se pelo seu regulamento, aprovado pelo Despacho n.º 1994/2012,

de 30 de janeiro de 2012, passando a reverter para ele parte do montante das coimas cobradas pela AdC, nos

termos propostos por esta iniciativa legislativa.

Relevam também o Código do Procedimento Administrativo, o Código de Processo nos Tribunais

Administrativos e a Lei da Organização do Sistema Judiciário, que no seu artigo 112.º consagra as competências

do Tribunal da Concorrência, da Regulação e da Supervisão.

Finalmente, dá-se conta da Plataforma de interoperabilidade da Administração Pública11, que aloja a

Plataforma de pagamentos da Administração Pública12, e o Portal de dados abertos da administração Pública,

que tem «como função agregar, referenciar e alojar dados abertos de diferentes organismos e setores da

Administração Pública, constituindo-se como o catálogo central de open data em Portugal».

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar (AP), constatou-se que só se encontra

7 Texto consolidado. 8 Idem. 9 Ibidem. 10 Alterada pela Portaria n.º 39/2012, de 3 de fevereiro. 11 Trata-se «de uma plataforma comum, orientada a serviços, com o objetivo de disponibilizar à Administração Pública, ferramentas para interligação entre sistemas. Permite a composição e disponibilização de serviços eletrónicos multicanal mais próximos das necessidades do cidadão e empresas, de uma forma ágil e com economia de escala. Promove a reutilização, a partilha e normalização de recursos.» 12 Conforme consta da página na Internet desta plataforma, «O serviço de Pagamentos da Administração Pública (PAP) é o sistema que permite a partir dos sistemas de cada organismo, disponibilizar nos seus sites e serviços digitais múltiplos métodos de pagamentos – DUC, VISA, Mastercard, Multibanco, MBWay e Paypal, entre outros, garantindo a gestão, controlo e monitorização dos recebimentos de forma integrada. Está especialmente vocacionada para a prestação de Serviços online por parte das entidades públicas».

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pendente, para apreciação e votação na especialidade, a seguinte iniciativa sobre matéria conexa:

➢ Projeto de Lei n.º 433/XIV/1.ª (PEV) – «Regime de nomeação e destituição dos membros do conselho de

administração das Entidades Administrativas Independentes com funções de regulação da atividade económica

dos setores privado, público e cooperativo (segunda alteração à Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto).»

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

Consultada a mesma base de dados, verificou-se que não foram apresentadas nesta Legislatura ou nas

últimas legislaturas iniciativas legislativas ou petições sobre a matéria.

III. Apreciação dos requisitos formais

A iniciativa em apreço é apresentada pelo Governo, no âmbito do seu poder de iniciativa e da sua

competência política, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 167.º e na alínea d) do n.º 1 do artigo

197.º da Constituição da República Portuguesa (Constituição) e no n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da

Assembleia da República (Regimento)13.

Assume a forma de proposta de lei, nos termos do n.º 2 do artigo 119.º do Regimento, encontra-se redigida

sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de

uma breve exposição de motivos, mostrando-se, assim, conforme com o disposto no n.º 1 do artigo 124.º do

Regimento. De igual modo, observa os requisitos formais relativos às propostas de lei, constantes do n.º 2 do

artigo 124.º do Regimento.

O n.º 3 do artigo 124.º do Regimento prevê que as propostas de lei devem ser acompanhadas dos estudos,

documentos e pareceres que as tenham fundamentado, bem como das tomadas de posição das entidades

ouvidas pelo Governo no âmbito do procedimento da respetiva aprovação. Em idêntico sentido, o Decreto-Lei

n.º 274/2009, de 2 de outubro, que regula o procedimento de consulta de entidades, públicas e privadas,

realizado pelo Governo, dispõe, no n.º 1 do artigo 6.º, que «os atos e diplomas aprovados pelo Governo cujos

projetos tenham sido objeto de consulta direta contêm, na parte final do respetivo preâmbulo ou da exposição

de motivos, referência às entidades consultadas e ao carácter obrigatório ou facultativo das mesmas». Dispõe

ainda, no n.º 2, que «no caso de propostas de lei, deve ser enviada cópia à Assembleia da República dos

pareceres ou contributos resultantes da consulta direta às entidades cuja consulta seja constitucional ou

legalmente obrigatória e que tenham sido emitidos no decurso do procedimento legislativo do Governo».

Não obstante, o Governo, na exposição de motivos, não menciona ter realizado qualquer audição, nem junta

quaisquer estudos, documentos ou pareceres que tenham fundamentado a apresentação da presente proposta

de lei.

A proposta de lei observa o limite à admissão das iniciativas estabelecido na alínea b) do n.º 1 do artigo 120.º

do RAR, definindo concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.

Já no que se refere ao disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 120.º do RAR – que determina a não admissão

de iniciativas que infrinjam a Constituição ou os princípios nela consignados – parecem poder levantar-se

algumas dúvidas, concretamente no que se refere às alterações propostas aos artigos 18.º e 31.º da Lei n.º

19/2012, de 8 de maio, que aprova o novo regime jurídico da concorrência (artigo 2.º da proposta de lei).

As reservas que aquelas normas parecem suscitar e que poderão ser analisadas com maior profundidade

em Comissão, prendem-se com o n.º 4 do artigo 34.º da Constituição, que dispõe ser proibida «toda a ingerência

das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação,

salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal» (destaque nosso).14

13 As ligações para a Constituição da República Portuguesa e para o Regimento da Assembleia da República são feitas para o portal oficial da Assembleia da República. 14 Na doutrina, têm sido analisadas as normas do anteprojeto, algumas das quais coincidentes com a proposta de lei agora apresentada V., por exemplo, PEDROSA, André Veloso, MENDES, Francisco Espregueira, GUIMARÃES, Rui Mesquita (em representação da TELLES Advogados) – O Controlo das Práticas Restritivas da Concorrência – Nothing Else Matters?. Revista de Concorrência e Regulação. Lisboa. Ano XI, N.º 42-43 (abril – setembro 2020), P. 87-115; MACHETE, Miguel Pena, XAVIER, Catarina Pinto, BELO,Beatriz (em representação da SLCM – Serra Lopes, Cortes Martins & Associados – Sociedade de Advogados, SP, RL), Direito da Concorrência: A Necessária Reforma

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Com efeito, as alterações propostas às normas indicadas poderão colocar em causa a norma constitucional

citada, ao permitir à AdC, «no exercício de poderes sancionatórios», a ingerência na correspondência e outros

meios de comunicação privada [alínea b) do n.º 1 do artigo 18.º]15, permitindo a utilização desses elementos

como meio de prova (n.º 2 do artigo 31.º)16.

As infrações sancionadas pelo regime jurídico da concorrência, em que as normas referidas se enquadram,

correspondem a ilícitos de mera ordenação social, sancionados com a aplicação de coima e aos quais está

associado um menor desvalor ético-jurídico relativamente ao que se verifica no direito criminal. Por outro lado,

o direito contraordenacional não assegura, ao infrator, as mesmas garantias de defesa que o direito penal

confere ao arguido17. Não sendo este enquadramento alterado pela iniciativa e fazendo a norma constitucional

expressa referência às exceções previstas na lei penal, consideramos ser de ponderar, em sede de apreciação

na especialidade, a harmonização da iniciativa com o referido n.º 4 do artigo 34.º da Constituição, sem prejuízo

dos princípios de direito da união europeia aplicáveis e do disposto no n.º 4 do artigo 8.º da Constituição.

A proposta de lei é subscrita pelo Primeiro-Ministro, pelo Ministro de Estado, da Economia e da Transição

Digital e pelo Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, mencionando ter sido aprovada em Conselho

de Ministros a 20 de maio de 2021, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 123.º do Regimento.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

O título da presente iniciativa legislativa – Transpõe a Diretiva (UE) 2019/1, que visa atribuir às autoridades

da concorrência dos Estados-Membros competência para aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom

funcionamento do mercado interno – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no

n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário18, embora, em caso de

aprovação, possa ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na especialidade ou em

redação final.

A iniciativa transpõe para o ordenamento jurídico nacional a Diretiva (UE) 2019/1 do Parlamento Europeu e

do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, e altera várias normas da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, que aprova

o regime jurídico da concorrência, e do Decreto-Lei n.º 125/2014, de 18 de agosto, que aprova os estatutos da

Autoridade da Concorrência.

Indica corretamente, no artigo 1.º, os números de ordem de alteração aos diplomas alterados, bem como as

suas alterações anteriores (n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário) e a diretiva transposta (n.º 4 do artigo 9.º da

por Força da Diretiva ECN+. Revista de Concorrência e Regulação. Lisboa. Ano XI, N.º 42-43 (abril – setembro 2020), P. 165-182; e ANASTÁCIO, Gonçalo, SAAVEDRA, Alberto – A Nova Lei da Concorrência Portuguesa – Notas Preliminares. Revista da Ordem dos Advogados. Lisboa. Ano 73 (janeiro – março 2013), P. 327-360. 15 Artigo 18.º, n.º 1, alínea b), na redação proposta pela iniciativa: «No exercício de poderes sancionatórios, a AdC, através dos seus órgãos ou trabalhadores pode, designadamente:(…) Proceder à busca, exame, recolha e apreensão ou cópia, sob qualquer forma, de informações ou dados, em qualquer formato, físico ou digital, designadamente, documentos, ficheiros, livros, registos ou mensagens de correio eletrónico ou de natureza semelhante, independentemente de parecerem não ter sido lidas ou de terem sido apagadas, qualquer que seja o suporte, estado ou local em que estejam armazenadas, nomeadamente num sistema informático ou noutro a que seja permitido o acesso legítimo a partir do primeiro, servidores, computadores portáteis, telemóveis, outros dispositivos móveis ou outros dispositivos não previamente identificados com precisão, acessíveis ao visado ou à pessoa sujeita a busca e relacionadas com o visado». (Destaque nosso) 16 Artigo 31.º, n.º 2, na redação proposta pela iniciativa: «Constituem meios de prova admissíveis, nos termos do disposto no artigo 167.º do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro, na sua redação atual, entre outros não expressamente proibidos, quaisquer documentos, declarações orais ou escritas, mensagens de correio eletrónico ou de natureza semelhante, independentemente de parecerem não terem sido lidas ou de terem sido apagadas, gravações, ficheiros e quaisquer outros objetos que contenham informações, independentemente do formato e do suporte em que tais informações se encontrem armazenadas.» (Destaque nosso) 17 Cfr., por exemplo, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 395/2014, processo n.º 683/13 (Relator: Conselheiro Fernando Ventura): «no ilícito de mera ordenação social, as sanções não têm a mesma carga de desvalor ético que as penas criminais, para além de que, para a punição, assumem particular relevo razões de pura utilidade e estratégia social» e também o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 180/2014, processo n.º 240/2013 (Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha): «(…) as diferenças existentes entre o ilícito de natureza criminal e o ilícito de mera ordenação social impede que se possa efetuar uma estrita transposição das normas e princípios constitucionais em matéria penal para o domínio do direito contraordenacional. Como começou por se afirmar no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 231/79, de 24 de julho, que introduziu o ilícito de mera ordenação social na ordem jurídica portuguesa, «hoje é pacífica a ideia de que entre os dois ramos de direito medeia uma autêntica diferença: não se trata apenas de uma diferença de quantidade ou puramente formal, mas de uma diferença de natureza. A contraordenação é um aliud que se diferencia qualitativamente do crime na medida em que o respetivo ilícito e as reações que lhe cabem não são diretamente fundamentáveis num plano ético-jurídico, não estando, portanto, sujeitas aos princípios e corolários do direito criminal […]. Está em causa um ordenamento sancionatório distinto do direito criminal.» 18 A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, e foi alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho.

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mesma lei), embora de forma abreviada.

A regra de legística formal refere que «o título de um ato de alteração deve referir o título do ato alterado».19

No seguimento destas considerações, sugere-se a seguinte redação, onde se inclui também a identificação

completa da diretiva:

Transpõe a Diretiva (UE) 2019/1 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018,

que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros competência para aplicarem a

lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado interno, e altera o regime jurídico

da concorrência e os estatutos da Autoridade da Concorrência

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, devendo ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o

disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

A previsão de início de vigência da iniciativa (30 dias após a sua publicação, de acordo com o artigo 10.º),

mostra-se conforme com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual os atos legislativos

«entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio

dia da publicação».

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não suscita outras questões em face da lei

formulário.

• Regulamentação ou outras obrigações legais

O artigo 6.º da iniciativa prevê a obrigação, a cargo da AdC, de regulamentar a lei, no prazo de dois anos

após a sua entrada em vigor, com vista a assegurar a concretização de: (i) novas linhas de orientação sobre a

instrução de processos relativos à aplicação de normas legais [alínea a)]; (ii) «novos termos do procedimento

relativo à tramitação para a obtenção de dispensa ou redução da coima» [alínea b)]; (iii) linhas de orientação

sobre cálculo de coimas [alínea c)]; (iv) termos do procedimento de transação [alínea d)]; e (v) Termos da

tramitação eletrónica de processos sancionatórios [alínea e)].

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento no plano da União Europeia

A matéria subjacente à Diretiva (UE) 2019/1 que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-

Membros competência para aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado

interno, tem como objetivo:

– assegurar que as autoridades da concorrência dos Estados-Membros da UE dispõem das garantias de

independência, dos meios e das competências de execução e de aplicação de coimas necessários para

poderem lidar eficazmente com os acordos e práticas empresariais tendentes a restringir a concorrência

na sua jurisdição;

– aplicar-se especificamente quando são celebrados acordos anticoncorrenciais proibidos pelos artigos 101.º

(cartéis) e 102.º (abuso de posição dominante) do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

(TFUE), quer individualmente quer em paralelo com as leis nacionais da concorrência aplicáveis ao caso;

– prever um mecanismo de assistência mútua entre as autoridades da concorrência para assegurar que as

empresas não se furtam da aplicação de modo a garantir o bom funcionamento do mercado único

europeu;

Este objetivos estão previstos no artigo 1.º do referido instrumento legal, segundo o qual o mesmo

19 Guia de Legística para a Elaboração de Atos Normativos. Lisboa: Divisão de Edições da Assembleia da República, maio de 2020. ISBN 978-972-556-712-8.

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«estabelece um conjunto de regras destinadas a assegurar que as autoridades nacionais da concorrência

dispõem das garantias de independência, dos meios e das competências de execução e de aplicação de coimas

necessários à aplicação eficaz dos artigos 101.º e 102.º do TFUE, de modo a que a concorrência no mercado

interno não seja falseada e a que os consumidores e as empresas não sejam prejudicados por leis e medidas

nacionais que impeçam as autoridades nacionais da concorrência de aplicarem as regras de forma eficaz».

O artigo 2.º, n.º 1 da Diretiva define como autoridade nacional de concorrência «uma autoridade designada

por um Estado-Membro nos termos do artigo 35.º do Regulamento (CE) n.º 1/2003, como responsável pela

aplicação dos artigos 101.º e 102.º do TFUE. Os Estados-Membros podem designar uma ou mais autoridades

administrativas (autoridade administrativa nacional da concorrência), bem como autoridades judiciais

(autoridade judicial nacional da concorrência)».

A diretiva é aplicável desde 3 de fevereiro de 2019 e o prazo de transposição pelos Estados-Membros para

a legislação nacional terminou a 4 de fevereiro de 2021.

Até 12 de dezembro de 2024, a Comissão Europeia deve apresentar ao Parlamento Europeu e ao Conselho

um relatório sobre a transposição e execução da diretiva.

No que concerne à proposta de lei ora em apreço, esta visa transpor para o ordenamento jurídico interno a

Diretiva (UE) 2019/1, tendo em vista a concretização dos seguintes objetivos:

– Independência das autoridades administrativas nacionais da concorrência na aplicação dos artigos 101.º e

102.º do TFUE no exercício das suas atribuições e competências, de forma imparcial (considerando (17)

e artigo 4.º);

– Independência funcional das autoridades administrativas e da sua imparcialidade, através da garantia de

que as coimas por elas aplicadas por infrações aos artigos 101.º e 102.º do TFUE não deverão ser

utilizadas para o seu próprio financiamento [considerando (17)];

– Competência das autoridades administrativas nacionais da concorrência para dar prioridade aos processos

relativos à aplicação dos artigos 101.º e 102.º do TFUE, para fazerem uma utilização efetiva dos seus

recursos e para se centrarem na prevenção e eliminação dos comportamentos anticoncorrenciais que

falseiam a concorrência no mercado interno [considerando (23) e artigo 4.º, n.º 5];

– Competência das autoridades administrativas nacionais da concorrência para aplicar mediante decisão no

âmbito de processos de aplicação próprios, como requerer que sejam aplicadas, no âmbito de processos

judiciais de natureza não penal, coimas efetivas, proporcionadas e dissuasoras às empresas e

associações de empresas que, dolosamente ou por negligência, cometam uma infração ao artigo 101.º

ou 102.º do TFUE (artigo 13.º);

– Estabelecimento do montante máximo das coimas aplicáveis [considerando (49) e artigo 15.º];

– Previsão de programas de clemência para cartéis secretos (artigo 17.º e seguintes);

– Foram também introduzidas alterações em algumas normas do regime dos recursos judiciais visando, por

um lado, a transposição da Diretiva (UE) 2019/1 e, por outro, suprir lacunas e aditar clarificações que

evitem a pendência judicial motivada estritamente por questões de natureza processual;

– Incentivo ao recurso a propostas de transação (artigo 2.º, n.º 1/ 17).

A Diretiva 2019/1 está intimamente relacionada com o Regulamento (CE) n.º 1/2003 do Conselho, de 16 de

dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.º e 82.º do

Tratado, que visava estabelecer um regime que assegure a não distorção da concorrência no mercado comum.

Este regulamento atribuiu competências às autoridades nacionais da concorrência dos Estados-Membros da

UE para aplicarem, juntamente com a Comissão, as regras de concorrência da UE.

• Enquadramento internacional

Países europeus

O prazo para transposição da Diretiva (UE) 2019/1, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de

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dezembro de 201820, que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros competência para

aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado interno, terminou no dia 4 de

fevereiro de 2021.

De acordo com a informação disponibilizada pela União Europeia21, até à data de elaboração da presente

nota técnica, esta Diretiva tinha sido transposta nos ordenamentos jurídicos dos seguintes países: Alemanha

(18.01.2021), Bulgária (25.02.2021), Croácia (16.04.2021), Dinamarca (15.02.2021), Espanha (27.04.2021),

França (02.12.2020), Holanda (vários diplomas, último dos quais em 17.02.2021), Hungria (vários diplomas,

último dos quais em 2020), Letónia (vários diplomas, último dos quais a 15.05.2019), Lituânia (vários diplomas,

último dos quais a 01.02.2021), Roménia (vários diplomas, último dos quais a 01.04.2021), e Suécia (vários

diplomas, último dos quais a 04.02.2021).

Apresenta-se abaixo informação relativamente aos seguintes Estados-Membros da União Europeia:

Alemanha, Espanha e França.

ALEMANHA

A Alemanha procedeu à transposição da Diretiva (UE) 2019/1 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11

de dezembro de 2018, através da Gesetz zur Änderung des Gesetzes gegen Wettbewerbsbeschränkungen für

ein fokussiertes, proaktives und digitales Wettbewerbsrecht 4.0 und anderer Bestimmungen (GWB-

Digitalisierungsgesetz)22, que introduziu alterações à Gesetz gegenWettbewerbsbeschränkungen23 (Lei sobre

as Restrições à Concorrência)24.

Este diploma introduz importantes alterações ao nível do alargamento das competências da

Wettbewerbsbehörde (Autoridade Nacional para a Concorrência), bem como ao nível do procedimento (§§ 19a

e 19). Para além disso, o conceito de abuso de posição dominante passou a integrar elementos específicos

relacionados com a internet e com o mercado digital, nomeadamente, proibindo que as empresas digitais deem

destaque às suas próprias marcas em detrimento de outras existentes no mercado com as mesmas

características (§ 19). O diploma introduz ainda alterações ao nível sancionatório, bem como no que respeita às

medidas provisórias a aplicar e ao acesso à informação (§ 18).

ESPANHA

Em Espanha, o Real Decreto-Ley 7/2021, de 27 de abril25, procedeu à transposição da Diretiva (UE) 2019/1

do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018.

Este diploma introduziu alterações à Ley 15/2007, de 3 de julio, de Defensa de la Competencia, as quais

vieram reforçar, entre outros, a necessidade de cooperação entre autoridades nacionais da concorrência e os

deveres de colaboração e informação, bem como introduzir novas regras quanto às inquirições, às competências

inspetivas e impositivas da Comisión Nacional de los Mercados y la Competencia, ao tratamento de informação

confidencial, ao procedimento e sua adequação ao conteúdo dos direitos fundamentais, às medidas provisórias

e às infrações e suas sanções.

Entre as alterações introduzidas na Ley 15/2007, de 3 de julio, destacam-se as seguintes:

1. Classificação dos acordos anti concorrenciais e das práticas de abuso de posição dominante como

infrações muito graves [artículo 62, apartado 4, a) e b), da Ley 15/2007, de 3 de julio];

2. Introdução de um procedimento específico de interrupção do prazo de prescrição [artículo 68, apartado 3,

da Ley 15/2007, de 3 de julio];

3. Alargamento dos deveres de informação e colaboração e dos poderes de fiscalização (artículos 39, 39bis

20 Diploma disponível no portal legislativo oficial da União Europeia, em EUR-LEX.EUROPA.EU 21 Informação disponível no portal legislativo da União Europeia, EUR-LEX.EUROPA.EU, no link https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/NIM/?uri=CELEX:32019L0001 22 Diploma disponível no portal WWW.BUNDESRAT.DE 23 Diploma consolidado disponível no portal WWW.GESETZE-IM-INTERNET.DE 24 Tradução para inglês do diploma disponível em https://www.gesetze-im-internet.de/englisch_gwb/, na versão atualizada até 12.07.2018, sendo que o diploma sofreu alterações posteriores, introduzidas pelo Art. 5 Abs. 3 G v. 9.3.2021 25 Diploma disponível no portal BOE.ES. Todas as referências legislativas em relação a Espanha deverão considerar-se remetidas para o referido portal, salvo indicação expressa em contrário.

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e 40, da Ley 15/2007, de 3 de julio); e

4. Revisão do montante das multas e das sanções pecuniárias periódicas (artículos 63 a 67, da Ley 15/2007,

de 3 de julio).

O Real Decreto-Ley 7/2021, de 27 de abril, introduziu igualmente alterações à Ley 3/2013, de 4 de junio, de

creación de la Comisión Nacional de los Mercados y la Competencia, reforçando as competências daquela

entidade.

É relevante destacar que, no preâmbulo do Real Decreto-Ley 7/2021, de 27 de abril, vem referida

«extraordinaria y urgente necesidad» de proceder à transposição da Diretiva (UE) 2019/1 do Parlamento

Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, tendo em conta que o período definido para tal havia

terminado a 4 de fevereiro de 2021, o que motivou a instauração de um processo de infração contra o Reino de

Espanha pela Comissão Europeia.

FRANÇA

O Article 37 da LOI n.º 2020-1508 du 3 décembre 2020 portant diverses dispositions d'adaptation au droit de

l'Union européenne en matière économique et financière26, autorizou o Governo a aprovar as medidas previstas

na Diretiva (UE) 2019/1 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018. A disposição

introduz alterações pontuais ao code de commerce, aditando, designadamente, uma nova previsão ao article L

420-2-1, em concreto, a proibição de grossistas importadores estabelecerem condições discriminatórias na

aquisição de produtos ou serviços relativamente aos quais tenham exclusividade, em relação a empresas nas

quais não detenham qualquer participação no capital.

A Ordonnance n.º 2021-649 du 26 mai 2021 relative à la transposition de la directive (UE) 2019/1 du

Parlement européen et du Conseil du 11 décembre 2018 visant à doter les autorités de concurrence des États

membres des moyens de mettre en œuvre plus efficacement les règles de concurrence et à garantir le bon

fonctionnement du marché intérieur, introduziu, por sua vez, novas alterações ao code de commerce.

Este diploma aditou o article L. 420-6-1, nos termos do qual os diretores, gerentes e outros funcionários de

uma empresa ou de um grupo de empresas que tenham praticado atos no âmbito de práticas anti concorrenciais

possam não ser penalizados se colaborarem ativamente com a Autorité de la concurrence, prestando as

informações necessárias ao apuramento dos factos.

O diploma estabeleceu ainda medidas de cooperação entre Estados (article L. 450-1), novas regras

procedimentais (article L. 450-4 e L. 464-8-2), bem como alterações em matéria de infrações e sancionatória

(articles L. 450-8, L. 450-9, L. 450-10 e L. 464-2), de prazo prescricional (articles 462-6 a 462-9) e procede a um

alargamento das competências da Autorité de la concurrence (articles L. 462-9-1 e L. 464-2).

A Ordonnance n° 2021-649 prevê ainda restrições no acesso e utilização de informação processual (articles

L. 464-10, L. 490-13 e L. 490-14).

V. Consultas e contributos

• Consultas obrigatórias

O Presidente da 6.ª Comissão promoveu, nos termos regimentais, a emissão de parecer pela Comissão

Nacional de Proteção de Dados (CNPD), pela Procuradoria Geral da República (PGR), pela Ordem dos

Advogados (AO) e pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão.

A PGR no seu parecer27 cumpre dizer que «(…) somos a informar que o conteúdo da proposta legislativa,

26 Diploma disponível no portal LEGIFRANCE.GOUV.FR. Todas as referências legislativas em relação a França deverão considerar-se remetidas para o referido portal, salvo indicação expressa em contrário. 27 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Assembleia da República. [Consultado em 14 de junho de 2021]. Disponível em WWW URL< https://app.parlamento.pt/webutils/docs/doc.pdf?path=6148523063446f764c324679626d56304c334e706447567a4c31684a566b786c5a793944543030764e6b4e46535539515343394562324e31625756756447397a5357357059326c6864476c3259554e7662576c7a633246764c7a41344e4749344f4756694c575a68595441744e446b304f4331684f4441794c5751324d445a6d4f44646b4d7a5a694d4335775a47593d&fich=084b88eb-faa0-4948-a802-d606f87d36b0.pdf&Inline=true >.

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não se enquadra em matéria de organização judiciária nem de administração de justiça pelo que não caberá

nas competências deste CSMP elaborar parecer sobre tal matéria.»

O parecer aqui citado, bem como restantes pareceres ou contributos que sejam recebidos serão

disponibilizados na página eletrónica da Assembleia da República, mais especificamente na página da presente

iniciativa.

• Consultas facultativas

Atendendo à matéria em causa, a 6.ª Comissão pode ainda, se assim o deliberar, solicitar os pareceres

escritos da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), do Tribunal de Contas (TC), da Ordem dos Revisores Oficiais

de Contas (OROC), da Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CRESAP), bem

como as entidades reguladoras constantes do n.º 3 do artigo 3.º da Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

De acordo com a informação constante na ficha de Avaliação Prévia de Impacto de Género (AIG)28, junta

pelo autor, considera-se que a iniciativa legislativa tem uma valoração neutra, dado que a maioria das categorias

e indicadores analisados, assumem essa valoração.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. A presente

iniciativa não suscita questões relacionadas com a utilização de linguagem discriminatória.

VII. Enquadramento bibliográfico

ANASTÁCIO, Gonçalo — Projeto de transposição da Diretiva ECN+. Revista de concorrência e regulação

[Em linha]. A. 12, n.º 44 (out./dez. 2020), p. 69-74. [Consult. 01 jun. 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=106748&img=19635&save=true>

ISSN1647-5801

Resumo: O referenciado texto incide sobre o projeto de transposição da Diretiva (UE) 2019/1/UE, de 11 de

dezembro de 2018, que visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros competência para

aplicarem a lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado interno (Diretiva ECN+). Refere

o papel da Autoridade Nacional da Concorrência na elaboração de uma proposta de diploma de transposição

apresentada ao atual Governo, que teve em consideração os contributos da delegação portuguesa da ICC –

Câmara de Comércio Internacional e das Empresas.

HENRIQUES, Miguel Gorjão; SAAVEDRA, Alberto — Directiva ECN+ e a nova era do direito da concorrência:

desafios e limites. Revista da Ordem dos Advogados [Em linha]. A. 80 (jan./jun. 2020), p. 219-256. [Consult.

01 jun. 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134817&img=21871&save=true>

28 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Assembleia da República. [Consultado em 8 de junho de 2021]. Disponível em: WWW URL< https://app.parlamento.pt/webutils/docs/doc.pdf?path=6148523063446f764c324679626d56304c334e706447567a4c31684a566b786c5a79394562324e31625756756447397a5357357059326c6864476c32595338344f47517a4f446c6c4d693032595745304c54526b593245744f4464684e4331694e474e6b4d5463794f4451785a6d59756347526d&fich=88d389e2-6aa4-4dca-87a4-b4cd172841ff.pdf&Inline=true>.

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ISSN 0870-8118

Resumo: Os autores debruçam-se sobre a transposição da Diretiva (UE) 2019/1, de 11 de dezembro de

2018, para o ordenamento jurídico nacional, que vai implicar uma revisão profunda da Lei n.º 19/2012, de 8 de

maio, que aprovou o regime jurídico da concorrência. A Diretiva tem uma dupla finalidade: atribuir às autoridades

da concorrência dos Estados-Membros competência para uma aplicação mais eficaz das normas de

concorrência da União Europeia (em particular, dos artigos. 101.º e 102.º do TFUE); e, assim, garantir o bom

funcionamento do mercado interno. Os autores focam-se na análise da referida Diretiva e nas vertentes da

«dimensão jusconcorrencial» da mesma.

MEUNIER, Sophie; MICKUS, Justinas — Sizing up the competition: explaining reform of European Union

competition policy in the COVID-19 era. Journal of European Integration [Em linha]. (Dec. 2020), p. 1077-

1094. [Consult. 31 maio 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=133805&img=20541&save=true>

ISSN0703-6337

Resumo: Garantir uma concorrência justa tem sido um pilar fundamental da política europeia. No entanto,

devido à pandemia de COVID-19, a política da UE desviou-se significativamente do seu percurso tradicional,

nomeadamente no que diz respeito à concessão de auxílios estatais e subsídios. Este artigo explora a mudança

e a continuidade no que se refere à política de concorrência europeia (ECP), pós-COVID-19, com base em três

fatores: 1) digitalização da economia global; 2) geopolitização da regulação da concorrência; 3) Brexit.

Os autores argumentam que a crise resultante da COVID-19 trouxe esses desafios pré-existentes para a

política de concorrência europeia, criando espaço para empreendedores, governos e instituições dos Estados-

Membros pressionarem no sentido de uma maior promoção e proteção da indústria europeia no mercado interno,

reforçando-se, ao mesmo tempo, a concorrência supranacional.

OCDE — OECD Competition Trends [Em linha]. [Paris]: OECD, 2020. [Consult. 31 maio 2021]. Disponível

na intranet da AR:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134789&img=21861&save=true>

Resumo: Nos últimos 50 anos, houve um crescimento notável na aplicação das leis da concorrência em todo

o mundo. Este relatório foi preparado pela Divisão de Concorrência da OCDE, com a finalidade de fornecer

informações atualizadas e acessíveis sobre as tendências da concorrência global, que podem ser usadas por

autoridades da concorrência e governos. O estudo inclui 58 indicadores que cobrem uma ampla gama de tópicos

relacionados com regimes jurídicos e atividades de fiscalização da concorrência. Divide-se em três partes: 1)

estatísticas gerais, análise de regimes e seus recursos; 2) tendências de aplicação, com foco na cartelização,

casos de abuso de posição dominante e análise de fusões; 3) uma secção «em foco» que analisa as sanções

aplicadas a cartéis.

UNIÃO EUROPEIA. Parlamento Europeu. EU competition policy [Em linha]: key to a fair single market.

Brussels: European Parliament, 2019 [Consult. 31 maio 2021]. Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134793&img=21859&save=true>

ISBN 978-92-846-5933-3

Resumo: A política de concorrência da União Europeia tem como objetivo salvaguardar o correto

funcionamento do mercado único. Essencialmente, garante que as empresas tenham a possibilidade de

competir em igualdade de condições nos mercados de todos os Estados-Membros. A política da concorrência

abrange um amplo leque de áreas: antitrust e cartéis, análise de fusões, auxílios estatais, liberalização de

mercados e cooperação internacional. Os desenvolvimentos recentes na política de concorrência incluem novas

regras que conferem poderes às autoridades nacionais da concorrência (ANC), para que procedam à aplicação

do direito da concorrência da UE de forma mais eficaz, no interesse da maximização do bem-estar dos cidadãos

e da competitividade da economia.

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A UE tem um dos sistemas de política de concorrência mais fortes do mundo, sendo que as regras também

se aplicam a empresas não pertencentes à UE, que operam no mercado único. Os novos desafios incluem a

reavaliação do papel da política de concorrência no desenho da indústria europeia e o tratamento de novas

questões decorrentes das especificidades da economia digital, como o papel dos dados, plataformas online e

fusões entre empresas estabelecidas e empresas em rápido crescimento, com potencial competitivo

significativo.

UNIÃO EUROPEIA. Tribunal de Contas Europeu — The Commission’s EU merger control and antitrust

proceedings [Em linha]: a need to scale up market oversight. Brussesl: ECA, 2020. [Consult. 01 jun. 2021].

Disponível em WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134807&img=21863&save=true>

Resumo: As regras da concorrência desempenham um papel significativo na economia da União Europeia,

garantindo que as empresas podem efetuar os seus negócios em condições equitativas de concorrência e

fornecer uma maior variedade de produtos e serviços aos consumidores a preços e condições competitivas. O

princípio da leal concorrência com igualdade de condições é crucial para o bom funcionamento do mercado

único da UE. A política de concorrência abrange todas as formas de práticas anticoncorrenciais das empresas;

os riscos para a concorrência decorrentes de fusões entre empresas e as atividades das autoridades públicas

dos Estados-Membros que possam distorcer a concorrência, tal como a concessão de auxílios estatais. A

Comissão assegura também que as autoridades nacionais da concorrência dos Estados-Membros aplicam as

regras de concorrência da UE de forma uniforme.

Nos últimos 10 anos, a aplicação das regras da concorrência na UE passou por mudanças significativas na

dinâmica do mercado e esteve no centro do interesse e do debate públicos. Este relatório resultou da primeira

auditoria realizada pelo Tribunal de Contas Europeu sobre o papel da Comissão como executora nas áreas de

fusões e antitrust. A auditoria teve como objetivo analisar a eficácia da Comissão na aplicação das regras de

concorrência da UE, nas áreas específicas do controlo da concorrência e das concentrações; na cooperação

com as autoridades nacionais da concorrência (ANC); na forma como conduziu as suas investigações; como

avaliou e comunicou a eficácia e qual o impacto do seu trabalho na concorrência e os benefícios daí resultantes

para os cidadãos no mercado único. São apresentadas recomendações que visam fortalecer a capacidade da

Comissão nas seguintes áreas: deteção de infrações; aumento da eficácia da fiscalização da concorrência;

melhoria do potencial da Rede Europeia da Concorrência e dos relatórios de desempenho.

WILS, Wouter P. J. — Independence of Competition Authorities: the example of the EU and its Member

States. World Competition [Em linha]. Vol. 42, n.º 2 (June 2019). 25 p. [Consult. 01 jun. 2021]. Disponível em

WWW:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134781&img=21822&save=true>

Resumo: No final de 2018, o Parlamento Europeu e o Conselho adotaram a Diretiva (UE) 2019/1, que, entre

outras matérias, contém disposições que garantem a independência das autoridades da concorrência dos

Estados-Membros da UE responsáveis pela aplicação das regras antitrust, juntamente com a Comissão

Europeia. No início de 2019, a Comissão Europeia mostrou a sua independência ao proibir a aquisição pela

Siemens do negócio de transporte ferroviário da Alstom, uma fusão publicamente apoiada pelos governos

alemão e francês. Este artigo fornece uma perspetiva geral das garantias de independência da legislação da

UE, focando-se na noção de independência e competências das autoridades da concorrência face aos

operadores económicos e interesses de negócio.

———

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1226/XIV/2.ª

(RECOMENDA AO GOVERNO A MONITORIZAÇÃO DA RESPOSTA ECONÓMICA E SOCIAL AO

ECOSSISTEMA DO VESTUÁRIO, TÊXTIL, CALÇADO E MODA NO ÂMBITO DO PLANO DE

RECUPERAÇÃO E RESILIÊNCIA DE PORTUGAL E DO PLANO DA REINDUSTRIALIZAÇÃO EUROPEIA)

Informação da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação relativa à discussão

do diploma ao abrigo do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República

1 – Vinte e quatro (24) Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista tomaram a iniciativa de

apresentar o Projeto de Resolução n.º 1226/XIV/2.ª (PS), ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 156.º

(Poderes dos Deputados) da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º (Poderes

dos Deputados) do Regimento da Assembleia da República (RAR).

2 – O Projeto de Resolução n.º 1226/XIV/2.ª (PS) deu entrada na Assembleia da República a 26 de abril de

2021, tendo sido admitido no mesmo dia, data em que baixou à Comissão de Economia, Inovação, Obras

Públicas e Habitação.

3 – O projeto de resolução em causa foi objeto de discussão na Comissão de Economia, Inovação e Obras

Públicas, em reunião de 30 de junho de 2021, tendo sido objeto de gravação áudio, a qual se encontra disponível

na página da iniciativa na Internet.

4 – A discussão do mencionado projeto de resolução ocorreu nos seguintes termos:

O Sr. Vice-Presidente da Comissão deu início à discussão do Projeto de Resolução n.º 1226/XIV/2.ª (PS),

tendo dado a palavra à Sr.ª Deputada Cristina Mendes da Silva (PS) para apresentação do mesmo.

A Sr.ª Deputada Cristina Mendes da Silva (PS) informou que a pretensão com a apresentação do projeto de

resolução em discussão se prendia com a situação que o país se encontra atualmente a viver e com as

oportunidades decorrentes do Plano de Recuperação e Resiliência para Portugal.

Referiu que o setor do vestuário e do calçado são de estrema importância para o país, porquanto significam

5% do PIB e representam 14% das exportações de bens, envolvendo cerca de 7000 empresas, 140 mil

trabalhadores diretos e estando 79% das empresas do setor localizadas na região norte do país.

Foi assinalado que o comércio do vestuário e do calçado cresceu muito na última década, tendo o vestuário

registado um crescimento de 48%, sendo o rendimento de exportações de 2,2 milhões de euros, em 2009, e de

3,2 milhões de euros, em 2019. Quanto ao setor do calçado, em 2017, as exportações representaram cerca de

2 mil milhões de euros, tendo isto sido possível devido ao dinamismo dos setores e à elevada competitividade

dos produtos e empresas.

Afirmou-se que 90% da exportação destes produtos é feita para países da União Europeia e só 10% para o

Canadá e para os Estados Unidos da América, o que significa que o mercado preferencial é o europeu.

O setor da moda é muitas vezes desvalorizado, apesar de ter pareceria com outros setores, como o do

turismo e de nele estarem envolvidos múltiplos profissionais que precisam e têm neste setor o seu emprego.

Estes são setores com mão de obra intensiva, em particular feminina, com uma grande necessidade de mão de

obra, pelo que as medidas de apoio à pandemia não se compadecem com este tipo de trabalhos, até porque os

trabalhadores não são facilmente substituídos em caso de doença, nem têm competências para serem

substituídos, uma vez que o setor funciona com cadeias de montagem, estando os trabalhadores especializados

numa parte especifica dessa linha de montagem.

Foi ainda referido que o setor está 20% abaixo da sua capacidade produtiva e que, em alguns casos, essa

redução chega aos 50%. Referiu-se ter havido uma mudança de paradigma no que diz respeito ao consumo, na

medida em que as pessoas optam por fazer compras online em vez de irem às lojas físicas, não só por receio

de irem aos espaços, mas também pelo facto de os espaços ainda terem os stocks dos anos anteriores.

Por fim, foi dito que as Empresas têm demonstrado dinamismo, sendo absolutamente necessário que a União

Europeia tenha em consideração estes dois setores, percebendo que, através do Plano de Recuperação e

Resiliência, deve ser feita a inovação das empresas. Por estes motivos, o Grupo Parlamentar do PS recomenda

o seguinte:

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(i) Uma avaliação e eventual reforço das medidas já preconizadas nos pactos setoriais para a

competitividade e internacionalização, de forma a salvaguardar uma total articulação com as oportunidades a

nível nacional, a nível da UE e internacionalmente; e

(ii) O reforço da preocupação para se manterem os postos de trabalho, com vista a capacitar e requalificar

os trabalhadores e trabalhadoras, a reorganização e inovação dos setores num alinhamento com os programas

de apoio e a encetar esforços para a participação ativa na reindustrialização da Europa.

De seguida, solicitou a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias (PCP) que informou pretender alertar para alguns

fatores relevantes na matéria em apreço.

Em primeiro lugar, referiu que o setor do calçado e do vestuário não são homogéneos, não se podendo tratar

as suas diferentes realidades do mesmo modo. Mais afirmou que o projeto de resolução ora em discussão não

referia a situação das micro e pequenas empresas destes setores, com a enorme vulnerabilidade e fragilidade

que estas sentem e sofrem. Assinalou que, em muitas destas empresas, os problemas advêm de uma altura

prévia à pandemia COVID-19, tendo-se tais dificuldades agravado a partir desse momento, pelo que fazia falta

uma abordagem do Estado e do Governo que conseguisse dar uma resposta direcionada a essa realidade.

Mais referiu que uma outra dificuldade particularmente sentida neste setor, e que os Deputados da Comissão

de Economia, na legislatura anterior puderam ter contacto direto, por iniciativa do GP PCP, é a de no setor têxtil

se recorrer frequentemente à subcontratação de grandes grupos económicos, muitas vezes estrangeiros, em

particular espanhóis, pelo que a exportação para a união europeia esconde, muitas vezes, a realidade

subjacente a este setor, com todas as implicações económicas daí decorrentes, com destaque para a

dependência e fragilidade das micro, pequenas e médias empresas nacionais.

Foi ainda assinalado que não é por um problema de qualificação e capacitação dos trabalhadores que estes

problemas existem no setor, mas antes devido à orientação e domínio do mercado por parte dos grandes grupos

económicos na subcontração e exploração às pequenas e médias empresas.

For fim, terminou dizendo que a proclamada «reindustrialização» da Europa não se pode traduzir na

desindustrialização de Portugal.

De seguida, não havendo mais inscrições, o Sr. Vice-Presidente da Comissão deu por encerrada a discussão

sobre o Projeto de Resolução n.º 1226/XIV/2.ª (PS), agradecendo os contributos dos intervenientes.

5 – Realizada a sua discussão, remete-se esta Informação a Sua Excelência, o Presidente da Assembleia

da República, nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República.

Assembleia da República, em 6 de julho de 2021.

O Vice-Presidente da Comissão, Pedro Coimbra.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1358/XIV/2.ª (*)

(PELA CRIAÇÃO DE UMA CAMPANHA NACIONAL DE INFORMAÇÃO PARA O VOTO DAS PESSOAS

MIGRANTES NAS ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS)

O direito ao voto marca, em termos históricos, o reconhecimento das/os cidadãs/ãos como sujeitos de direitos

e é a primeira expressão de cidadania e de participação no processo democrático. É uma importante ferramenta

para as/os cidadãs/ãos poderem atuar nas políticas que afetam diretamente as suas vidas e os seus locais de

residência.

O direito de eleger e de ser eleita/o é uma noção central das sociedades democráticas, encontrando

expressão em diversos instrumentos jurídicos internacionais, de que são exemplos o Pacto Internacional sobre

Direitos Civis e Políticos aprovado pelas Nações Unidas e a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

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Trata-se de um direito que desempenha ainda um papel central na definição da comunidade nacional,

revelando quem ela inclui e quem ela exclui. Nesse sentido, a expansão dos direitos políticos a um maior número

de pessoas que integram a comunidade nacional promove uma maior participação na democracia e nas

decisões políticas sobre os destinos da sociedade portuguesa.

A participação democrática de todas as pessoas que vivem em Portugal só se torna realmente abrangente e

representativa da comunidade nacional quando garante o acesso à informação e permite o pleno exercício dos

direitos políticos dos cidadãos e das cidadãs migrantes.

Segundo dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), em 2019 residiam em Portugal 590 348

cidadãs e cidadãos estrangeiros com título de residência válido, representando 5,7% do total de residentes do

país.

O Bloco de Esquerda defende que todas as pessoas estrangeiras, titulares de autorização de residência em

Portugal, devem ver reconhecida a sua capacidade eleitoral passiva e ativa, isto é, o direito a eleger e a ser

eleito/a, independentemente da existência ou não de acordos de reciprocidade com os países de origem.

Embora cientes de que a sua concretização implica uma revisão constitucional, consideramos que a sua

consecução é fundamental para o exercício de uma cidadania plena, e por isso continuaremos a defender esta

medida, que constava do programa com que nos apresentámos às eleições legislativas de 2019.

Enquanto essa alteração constitucional não se verifica, pugnaremos para que o direito de voto se alargue ao

maior número possível de pessoas migrantes residentes em Portugal.

À luz do atual quadro legal, são muitas as pessoas estrangeiras residentes em Portugal que estão privadas

do direito de voto. Acresce que, para aquelas às quais a lei reconhece esse direito, o recenseamento não é

automático, sendo necessário a inscrição junto da Administração Eleitoral.

O artigo 15.º da Constituição da República Portuguesa atribuí às pessoas estrangeiras residentes em

Portugal, em condições de reciprocidade, capacidade eleitoral ativa e passiva para as eleições dos titulares de

órgãos de autarquias locais. Consequentemente, os direitos políticos das pessoas estrangeiras estão limitados

a três situações: às/aos cidadãs/ãos de países de língua oficial portuguesa com residência legal há mais de dois

anos e em condições de reciprocidade, o que confere direitos políticos a nacionais do Brasil e Cabo Verde ao

fim de dois anos de residência para votar e ao fim de três para ser eleito em eleições locais; às/aos cidadãs/ãos

estrangeiras/os com residência legal em Portugal há mais de três anos desde que nacionais de países que, em

condições de reciprocidade, atribuam capacidade eleitoral ativa às/aos portuguesas/es neles residentes; às/aos

cidadãs/ãos dos Estados-Membros da União Europeia, quando de igual direito gozem legalmente as/os

cidadãs/ãos portuguesas/es no Estado de origem daquelas/es.

Assim, de acordo com a lei que regula a eleição de titulares dos órgãos das autarquias locais podem votar,

desde que inscritos/as no recenseamento no território nacional: os cidadãos e cidadãs brasileiros/as com

estatuto de igualdade de direitos políticos; os cidadãos e cidadãs nacionais dos Estados-Membros da União

Europeia (Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia, Dinamarca, Eslováquia, Eslovénia, Espanha,

Estónia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos,

Polónia, República Checa, Roménia e Suécia); cidadãos e cidadãs nacionais do Reino Unido com residência

em Portugal anterior ao “Brexit”; cidadãos e cidadãs do Brasil (sem estatuto de igualdade) e de Cabo Verde com

residência legal em Portugal há mais de dois anos; cidadãos e cidadãs da Argentina, Chile, Colômbia, Islândia,

Noruega, Nova Zelândia, Peru, Uruguai e Venezuela com residência legal em Portugal há mais de três anos.

As/os eleitoras/es estrangeiras/os representam ainda um universo bastante diminuto do total de

recenseadas/os do país. Os dados do Relatório Estatístico Anual de Indicadores de Integração de Imigrantes

em Portugal, publicado pelo Observatório das Migrações, revela que, em 2018, dos 64% das pessoas

estrangeiras residentes com direito de voto, apenas 12 em cada 100 estavam recenseadas, correspondendo a

0,3% do total de pessoas recenseadas no país nesse ano. O mesmo relatório permite concluir que em 2019 o

peso relativo das pessoas eleitoras estrangeiras por total de residentes sofreu uma redução face a 2018, estando

inscritas 27 628 pessoas no recenseamento eleitoral, o que corresponde a 0,25% do total de pessoas

recenseadas no território nacional.

Esta diminuta participação eleitoral deve-se a vários fatores. Desde logo, o recenseamento. Este processo é

automático para nacionais, mas requer inscrição para as pessoas com nacionalidade estrangeira. Este requisito

pode estar subjacente a este diminuto peso relativo das/os eleitoras/es estrangeiras/os, traduzindo não apenas

restrições de acesso a direitos políticos a pessoas estrangeiras residentes em Portugal, como também algum

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desconhecimento dos direitos políticos pelas pessoas migrantes que resulta na sua falta de inscrição.

Para além das restrições resultantes do quadro legal, têm sido reportadas várias situações em que as juntas

de freguesia fornecem, às pessoas estrangeiras que se pretendem recensear, informações erradas exigindo

«uma autorização do Ministério da Administração Interna» ou que tenham nacionalidade portuguesa para

procederem ao seu recenseamento.

A falta de informação ou a prestação de informações erradas às/aos cidadãs/ãos lesa os seus direitos e lesa

também a imagem das instituições democráticas.

Apesar do esforço desenvolvido por associações e coletivos que representam e apoiam as pessoas

migrantes, das campanhas por elas dinamizadas, muitas pessoas migrantes ainda desconhecem os seus

direitos de participação política.

Por outro lado, este esforço de informação e sensibilização não pode recair apenas nas organizações da

sociedade civil. O Estado tem a responsabilidade e os meios para ampliar o alcance destas ações de promoção

dos direitos políticos das pessoas estrangeiras residentes em Portugal e o dever de capacitar e fiscalizar a ação

das/os agentes da Administração Pública que prestam serviços às pessoas migrantes sobre este e outros

assuntos.

O Alto Comissariado para as Migrações (ACM), em parceria com a Comissão Nacional de Eleições, elaborou

um conjunto de materiais informativos sobre os direitos eleitorais e os requisitos para o recenseamento eleitoral

das pessoas migrantes residentes em Portugal, no âmbito das próximas eleições autárquicas.

Esta é, sem dúvida, uma iniciativa útil, mas o seu alcance é manifestamente insuficiente. É necessário adotar

uma estratégia mais proativa e abrangente, que se materialize na implementação de uma verdadeira campanha

nacional de informação e promoção dos direitos políticos das pessoas migrantes em Portugal, atendendo às

próximas eleições autárquicas. Uma campanha que conte com a colaboração das associações representativas

e de apoio às pessoas migrantes e que permita aumentar junto dessas comunidades o nível de conhecimento

sobre os seus direitos políticos e sobre o processo de recenseamento eleitoral, aproximando deste modo as/os

cidadãs/ãos migrantes e as instituições do Estado, sendo fundamental, neste campo, o papel das juntas de

freguesia.

O respeito pelas instituições políticas está intrinsecamente ligado ao direito dos cidadãos e das cidadãs

escolherem quem as/os representa e, por isso, devem ser tomadas todas as medidas necessárias para informá-

las/os dos meios e possibilidades que têm à sua disposição para exercer o seu direito de voto, bem como da

importância do mesmo.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende à Comissão Nacional de Eleições que:

1 – Promova uma campanha nacional de informação e promoção dos direitos políticos das pessoas

migrantes, para aumento da sua participação nas próximas eleições autárquicas.

2 – A referida campanha inclua a realização de sessões de formação das/os funcionárias/os do Estado, em

particular do poder local, sobre o direito de voto das pessoas migrantes e do respetivo processo de

recenseamento eleitoral.

3 – Promova o envolvimento das associações de pessoas migrantes e as organizações de base comunitária,

na implementação e divulgação da campanha.

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: Beatriz Gomes Dias — José Manuel Pureza — Pedro Filipe Soares —

Jorge Costa — Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Isabel Pires —

Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria

Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

(*) O texto inicial foi substituído a pedido do autor em 7 de julho de 2021 [Vide DAR II Série-A n.º 156 (2021-06-23)].

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1376/XIV/2.ª

(DESLOCAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA A LUANDA)

Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas

A Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, nos termos constitucional e

regimentalmente aplicáveis, é favorável ao assentimento para ausência do território nacional, requerido por Sua

Excelência o Presidente da República, para o período compreendido entre os dias 15 e 19 de julho do corrente

ano, tendo em vista a sua deslocação a Luanda, na República de Angola, onde participará na XIII Conferência

de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Estados de Língua Portuguesa, efetuando, ainda, escalas

na República Democrática de São Tomé e Príncipe e na República de Cabo Verde.

Palácio de São Bento, 7 de julho de 2021.

O Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, na reunião da Comissão de 7 de julho de 2021.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1390/XIV/2.ª

REQUALIFICAÇÃO E REABILITAÇÃO DA ESCOLA SECUNDÁRIA ANTÓNIO INÁCIO DA CRUZ, EM

GRÂNDOLA

Exposição de motivos

A Escola Secundária António Inácio da Cruz, em Grândola, está degradada e sem as condições devidas para

assegurar o desenvolvimento da atividade letiva com qualidade, pelo que requer uma intervenção urgente de

reabilitação e requalificação.

Este estabelecimento de ensino, inaugurado na década de 1960, tem uma rede de abastecimento de água

deteriorada, precisa de ver substituído todo o saneamento de esgotos e águas pluviais e de rever a rede e

potência elétricas.

O edifício, que continua a ter na sua construção tela zincada em fibrocimento – com sinais evidentes de

degradação –, tem problemas graves de impermeabilização. As instalações sanitárias precisam de ser

intervencionadas, e os espaços exteriores têm de ser reabilitados, criando passagens cobertas entre os blocas

d salas de aula.

Devido à total ausência de materiais isolantes nos pavimentos, paredes, vãos e coberturas, as salas de aula

não têm qualquer conforto térmico. É urgente substituir a caixilharia em madeira de vidro simples, assim como

os mecanismos de abertura e encerramento deteriorados das caixilharias.

O pavilhão desportivo está muito degradado e os balneários precisam de uma renovação profunda.

Para além de não ter refeitório, nem um espaço onde se sirvam refeições, a Escola Secundária António Inácio

da Cruz funciona com um bar com instalações bastante degradadas e equipamentos obsoletos.

O mobiliário desta escola do distrito de Setúbal está velho, nomeadamente mesas e cadeiras, e o software e

hardware do equipamento informático precisa de ser atualizado.

Nestes termos, e na convicção de que o atual Governo, em sede de Orçamento do Estado, garantirá a

consequente dotação orçamental, o Grupo Parlamentar do CDS-PP, ao abrigo das disposições constitucionais

e regimentais aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

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1 – Tome as medidas legislativas e administrativas necessárias para dar início ao processo de

requalificação e reabilitação da Escola Secundária António Inácio da Cruz, em Grândola.

2 – Proceda à imediata retirada das coberturas com fibrocimento.

3 – Partilhe com a escola e demais comunidade educativa o calendário das obras.

Palácio de São Bento, 1 de julho de 2021.

Os Deputados do CDS-PP: Ana Rita Bessa — Telmo Correia — Cecília Meireles — João Pinho de Almeida

— Pedro Morais Soares.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1391/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROCEDA À DESCLASSIFICAÇÃO DE TODOS OS DOCUMENTOS

MILITARES DATADOS ATÉ 1975

As Forças Armadas Portuguesas possuem nos seus Arquivos Históricos um importante acervo documental

que reflete uma parte significativa da história recente de Portugal. Em particular, os documentos militares

datados da Guerra Colonial de 1961-1974 representam uma coletânea de um período marcante do Estado Novo

e da sua natureza colonialista e imperialista.

No entanto, a vasta maioria deste acervo ainda se encontra classificada, impedindo o seu acesso integral ou

parcial a investigadores, jornalistas, académicos, estudantes e outros membros da sociedade civil que

frequentemente manifestam o desejo de consultarem aquela documentação aos ramos das Forças Armadas

Portuguesas.

Ora, tendo por base que o processo de consolidação democrática se faz através do aprofundamento da

transparência, do pleno acesso à informação, da publicidade da atividade dos órgãos do Estado, e do escrutínio

sobre a atuação política – fatores estes que, quando combinados com a evolução científico-tecnológica das

sociedades modernas, fundamentam ainda mais a necessidade de promover a desclassificação de documentos

outrora confidenciais – julga-se dispensável a negação do acesso a essas informações.

Mais, por serem documentos que incidem num período de tempo e num contexto político diametralmente

distintos do presente, onde os preceitos democráticos acima expostos estavam profundamente ausentes, e pelo

facto de não colocarem em risco ou dano a preservação da segurança interna e externa, bem como outros

interesses fundamentais do Estado, a sua desclassificação e consequente disponibilização constitui um

imperativo histórico.

Assim mesmo, para além de garantir uma maior fiabilidade da documentação da história nacional e

desintrincar os processos de investigação que vão sendo produzidos regularmente, avançar para a

desclassificação deste acervo não só permitiria perceber os factos por detrás da Guerra Colonial, mas também

repor a justiça para todas e todos aqueles que fizeram parte do contingente português e que foram afetados por

este evento, incluindo os 8831 mortos, 30 mil feridos, 4500 mutilados, 14 mil deficientes físicos, e os mais 100

mil diagnosticados com perturbação de stress pós-traumático, hoje com mais de 60 e 70 anos, arrancados

brutalmente às suas famílias e atirados à força para uma guerra colonial injusta e criminosa durante 13 anos,

provocando um sofrimento inaudito e milhares de mortos e mutilados de ambos os lados.

Por outro lado, esta iniciativa tem um propósito essencial de desmontar a história singular, a ficção contada

e recontada sobre esse período da história coletiva portuguesa, a qual tende a justificar a exploração, a barbárie,

a violência, a opressão e o genocídio dos povos dos países ocupados do continente africano, através de uma

narrativa de autorrepresentação benevolente da experiência ultramarina portuguesa e que subalterniza,

infantiliza e inferioriza as civilizações e populações de modo a legitimar aquela intervenção imperialista.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que proceda à desclassificação e

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respetiva organização de todos os documentos militares datados até 1975, particularmente aqueles que incidem

sobre o período histórico da Guerra Colonial de 1961-1974.

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: João Vasconcelos — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —

Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Isabel Pires —

Joana Mortágua — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria

Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1392/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROCEDA À RATIFICAÇÃO DA CONVENÇÃO SOBRE VIOLÊNCIA

E ASSÉDIO NO MUNDO DO TRABALHO DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO

Em 21 de junho de 2019, a 108.ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho adotou a primeira

Convenção sobre violência e assédio no mundo do trabalho1, e a respetiva recomendação.2

A Convenção (n.º 190) reconhece que a violência e o assédio no mundo do trabalho «podem constituir uma

violação ou abuso dos direitos humanos» e são «uma ameaça à igualdade de oportunidades». Destaca que a

violência e o assédio no mundo do trabalho afetam «a saúde psicológica, física e sexual, a dignidade e o

ambiente familiar e social», bem como «a qualidade dos serviços públicos e privados». Menciona, também, que

estas afetam «desproporcionalmente mulheres e meninas», podendo impedir que «as pessoas, particularmente

as mulheres, acedam, permaneçam e avancem no mercado de trabalho». Em consequência, reconhece que

«uma abordagem inclusiva, integrada e responsiva de género, que aborda causas e fatores de risco subjacentes,

incluindo estereótipos de género, múltiplas e intersectoriais formas de discriminação e relações de poder de

género desiguais, é essencial para acabar com a violência e o assédio no mundo do trabalho». Por fim, a

Convenção relembra aos Estados-membros que têm a responsabilidade de promover um «ambiente geral de

tolerância zero à violência e ao assédio».

A Convenção foi aprovada com 439 votos a favor, 7 contra e 30 abstenções e a recomendação que a

complementa com 397 votos a favor, 12 votos contra e 44 abstenções.

Ora, a Convenção sobre violência e assédio no mundo do trabalho entrou em vigor a 25 de junho de 2021,

dois anos após ter sido adotada pela Conferência Internacional do Trabalho da OIT. Contudo, até à data, apenas

seis países ratificaram a Convenção, a saber, Argentina, Equador, Fiji, Namíbia, Somália e Uruguai.3

Por isso, recentemente, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) lançou uma campanha global para

promover a ratificação e implementação da Convenção (N.º 190) sobre violência e assédio no local de trabalho.4

Esta visa explicar o que é a Convenção, as questões que cobre e como lidar com a violência e o assédio em

contexto laboral.

Em Portugal, a proteção legal do assédio no local de trabalho passou a figurar de forma autónoma na nossa

legislação com a aprovação da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, mas, ainda assim, quase limitada à sua vertente

sexual.

Atualmente, nos termos do artigo 29.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código

do Trabalho, é proibida a prática de assédio, constituindo este o «comportamento indesejado, nomeadamente

o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego,

trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a

1 Convention C190 – Violence and Harassment Convention, 2019 (No. 190) (ilo.org) 2 Recomendação R206 – Recomendação de Violência e Assédio, 2019 (n.º 206) (ilo.org) 3 Ratifications of ILO conventions: Ratifications by Convention 4 https://www.ilo.org/global/topics/violence-harassment/news/WCMS_793450/lang--en/index.htm

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sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.»

Sabemos que o assédio, moral ou sexual, pode causar danos na saúde do trabalhador, tanto ao nível físico

como psicológico.

De facto, o assédio moral é responsável por alterações cognitivas, a nível psicológico, psicossomático,

hormonal, no que respeita ao sistema nervoso, à tensão muscular e ao sono, podendo, inclusive, conduzir ao

suicídio. Ainda, verificam-se frequentemente depressões, síndromes de stress pós-traumático, fadiga crónica,

alergias, dependência de álcool e drogas, distúrbios cardíacos e endócrinos, entre outras lesões físicas e

psíquicas.5

No que diz respeito ao assédio sexual no trabalho, de acordo com a Ordem dos Psicólogos6, este cria

perturbações significativas nas relações profissionais, interpessoais e familiares e tem consequências para a

saúde física e psicológica, que podem incluir, nomeadamente, stress, ansiedade, raiva, irritação, humilhação e

desespero; diminuição da autoestima e autoconfiança; dificuldade e perturbações de sono; problemas

alimentares; depressão; consumo excessivo de álcool/drogas; diminuição da satisfação com a vida e do bem-

estar; diminuição da satisfação laboral e do rendimento e oportunidades profissionais e, ainda, problemas físicos

como problemas gastrointestinais, alterações cardiovasculares e problemas respiratórios.

Para além das implicações negativas para os trabalhadores, as situações de assédio têm ainda impacto nas

organizações, nomeadamente ao nível da diminuição de produtividade, aumento do absentismo e rotatividade

de trabalhadores, baixa moral da equipa e aumento dos conflitos, degradação do ambiente profissional e

decréscimo do desempenho financeiro da organização.7

Infelizmente, os estudos já realizados demonstram que os números do assédio moral e sexual em Portugal

são expressivos e superiores aos que se verificam na média dos países europeus. De acordo com dados

divulgados pela CITE8, em 2015, o assédio sexual foi referido por 12,6% das pessoas inquiridas, dos quais

14,4% eram mulheres e 8,6% homens e o assédio moral foi referido por 16,5% das pessoas inquiridas, sendo

16,7% mulheres e 15,9% homens.

Os dados também demonstram que, em Portugal, o assédio moral e sexual no local de trabalho é com maior

frequência da autoria de homens e afeta mais frequentemente mulheres até porque, como bem menciona a

CITE, «o mundo do trabalho não está imune a uma ordem de género e uma ideologia de género que reproduz

desigualdades entre homens e mulheres.»9

De acordo com o Estudo «As mulheres em Portugal, hoje – Quem são, o que pensam e o que sentem», da

Fundação Francisco Manuel dos Santos, divulgado em 201910, 35% das mulheres inquiridas declararam que,

pelo menos uma vez, foram vítimas de assédio moral no trabalho, tendo sido as situações mais frequentes as

de «perseguição profissional» (o trabalho é sistematicamente desvalorizado; de forma recorrente definiram-lhe

objetivos e prazos impossíveis de atingir, etc.) e a «intimidação» (sentir-se constantemente alvo de ameaças de

despedimento; ser sistematicamente alvo de situações limite com o objetivo de a levar ao descontrolo, etc.).

Ainda, 16% afirmaram ter sido vítimas de assédio sexual, destacando-se as situações de «insinuações

sexuais/Atenção sexual não desejada» (piadas ou comentários ofensivos sobre o corpo/aspeto; olhares

insinuantes ofensivos; propostas indesejadas de carácter sexual, etc.) «contacto físico não desejado» (tocar,

apalpar, beijar, etc.).

Infelizmente, sabemos também que o risco de violência e assédio é ainda mais elevado em tempos de crise,

tendo a crise pandémica provocada pela COVID-19 comprovado esta situação.

Por esse motivo, a OIT publicou um documento denominado «Convenção (n.º 190) da OIT sobre a eliminação

da violência e do assédio no mundo do trabalho (2019): 12 contribuições possíveis para a resposta à crise da

COVID-19 e recuperação da pandemia».11

Este documento destaca que «a crise da COVID-19 demonstrou que são necessárias ações e medidas em

diferentes áreas jurídica e política para combater eficazmente a violência e o assédio no mundo do trabalho»,

5 Neste sentido, cfr. Ana Cristina Ribeiro Costa, «O ressarcimento dos danos decorrentes do assédio moral ao abrigo dos regimes das contingências profissionais», publicado em Questões Laborais, Coimbra Editora, 1994. 6 Assédio Sexual no trabalho | Ordem dos Psicólogos (ordemdospsicologos.pt) 7 Idem. 8 Guia para a elaboração do código de boa conduta para a prevenção e combate ao assédio no trabalho (cite.gov.pt) 9 Idem. 10 https://www.ffms.pt/FileDownload/b6eb24e5-3bf3-411d-9f35-b51a7ebed3e8/estudo-mulher-completo 11 Convenção (N.º 190) da OIT sobre a eliminação da violência e do assédio no mundo do trabalho (2019): 12 contribuições possíveis para a resposta à crise da COVID-19 e recuperação da pandemia (ilo.org)

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na medida em que a COVID-19 intensificou «o estigma, a discriminação, a violência e o assédio de grupos

vulneráveis».

Acrescenta que «a COVID-19 exacerbou ainda mais os estereótipos de género e as masculinidades

violentas, conduzindo a um aumento do trabalho não remunerado de prestação de cuidados para as mulheres.

Esta situação, associada a uma maior insegurança financeira e desemprego, conduziu a um aumento da

violência e do assédio de género e, mais especificamente, da violência doméstica contra mulheres e raparigas».

No que diz respeito nomeadamente à violência doméstica, a OIT menciona que «o confinamento e o recolher

obrigatório impostos para combater a epidemia de COVID-19 forçam as pessoas a permanecerem em casa e,

sempre que possível, a trabalharem a partir de casa. Para muitas, a casa é agora o seu local de trabalho, o que

comporta riscos acrescidos de violência e assédio.».

Em consequência, conclui a OIT que «como a pandemia de COVID-19 veio evidenciar é fundamental ratificar

a Convenção (n.º 190) e incentivar a sua implementação conjuntamente com a Recomendação (n.º 206) para

um mundo do trabalho sem violência e assédio.».

Face ao exposto, atendendo a que Portugal não ratificou ainda a Convenção (n.º 190) sobre violência e

assédio da OIT, com o presente projeto de resolução recomendamos ao Governo que proceda à sua ratificação

e que adote as medidas necessárias à sua concretização, algo que consideramos particularmente importante

no contexto que vivemos.

De facto, temos vindo a assistir a uma maior atenção da sociedade civil para o tema e também a uma

crescente preocupação do legislador no sentido de prevenir estas situações e reforçar a proteção dos

trabalhadores caso estas ocorram. Por isso, consideramos que Portugal deve ratificar a Convenção n.º 190,

demonstrando que está verdadeiramente comprometido com a eliminação do assédio e da violência no mundo

do trabalho e na construção de locais de trabalho mais saudáveis.

Nestes termos, a Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, por

intermédio do presente projeto de resolução, recomenda ao Governo que:

• Ratifique a Convenção (n.º 190) sobre a eliminação da violência e do assédio no mundo do trabalho, da

Organização Internacional do Trabalho, e desenvolva as diligências necessárias para garantir a sua

implementação, em conjunto com a Recomendação n.º 206 que a complementa.

Palácio de São Bento, 7 de julho de 2021.

A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1393/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE PUBLIQUE A LISTA ATUALIZADA DAS DOENÇAS

PROFISSIONAIS QUE INCLUA AS DOENÇAS RESULTANTES DA PRÁTICA DE ASSÉDIO LABORAL

Em termos históricos, as primeiras leis e normas de segurança e saúde dos trabalhadores estavam

relacionadas com os perigos existentes no ambiente físico que podem incapacitar ou até mesmo causar a morte

destes.

Atualmente, a Organização Mundial de Saúde define um local de trabalho saudável como aquele em que

todos os membros da organização (empregadores, gestores e trabalhadores) cooperam com vista ao

melhoramento contínuo dos processos de proteção e promoção da saúde, da segurança e do bem-estar. Esta

definição demonstra como a compreensão de saúde ocupacional evoluiu de um foco quase exclusivo sobre o

ambiente físico de trabalho para a inclusão de fatores psicossociais e de práticas de saúde individual.1

1 1 Cfr. WHO (2010). Healthy workplaces: a model for action: for employers, workers, policymakers and practitioners

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7 DE JULHO DE 2021

69

Portugal enfrenta grandes desafios no que diz respeito à saúde psicológica e aos riscos psicossociais no

trabalho, que, para além dos elevados custos humanos, têm um impacto imensurável na sociedade e na

economia.

Os riscos psicossociais correspondem aos aspetos da organização e da gestão do trabalho, dos contextos

sociais e ambientais relativos ao trabalho que têm potenciais efeitos negativos do ponto de vista psicossocial,

nomeadamente os relacionados com as tarefas laborais (por exemplo, falta de autonomia e controlo sobre as

tarefas e a organização do trabalho), com a organização do trabalho (por exemplo, horários de trabalho

excessivos ou por turnos), com a estrutura da organização (por exemplo, falta de comunicação interna) e outros

fatores laborais (por exemplo, um ambiente laboral de conflito e a falta de apoio por parte dos supervisores e/ou

colegas).2

Estes traduzem-se num conjunto de consequências nefastas quer para os trabalhadores (sofrimento pessoal

e familiar; doenças físicas, como as dores musculares e articulares, dores de cabeça, problemas

cardiovasculares ou hipertensão; doenças mentais, como a depressão ou o burnout; perda de salário e gastos

de saúde adicionais) quer para o empregador, quer para as organizações (absentismo, presentismo, diminuição

da produtividade e da qualidade do trabalho, conflitos e degradação do clima de trabalho, necessidade de

substituir os trabalhadores, custos com despesas de saúde). A sociedade suporta igualmente custos com a

saúde e o impacto económico da diminuição da produtividade.3

Diversos documentos internacionais mencionam a necessidade de prevenir o surgimento de riscos

psicossociais e de promover a existência de locais de trabalho mais saudáveis.

A título de exemplo, a Convenção n.º 155 da OIT, sobre a segurança, a saúde dos trabalhadores e o ambiente

de trabalho, de 1981, menciona, no artigo 4.º que os Estados devem «definir, pôr em prática e reexaminar

periodicamente uma política nacional coerente em matéria de segurança, saúde dos trabalhadores e ambiente

de trabalho» que tem como objetivo «a prevenção dos acidentes e dos perigos para a saúde resultantes do

trabalho quer estejam relacionados com o trabalho quer ocorram durante o trabalho, reduzindo ao mínimo as

causas dos riscos inerentes ao ambiente de trabalho, na medida em que isso for razoável e praticamente

realizável.»

Ainda, ao nível do Direito Comunitário, importa mencionar a Directiva-Quadro n.º 89/391, de 12 de junho de

1989, relativa à aplicação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos

trabalhadores no trabalho que contém, nomeadamente, princípios gerais relativos à prevenção dos riscos

profissionais, à proteção da segurança e da saúde dos trabalhadores e à eliminação dos fatores de risco.

A Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, que define o regime jurídico da promoção da segurança e saúde no

trabalho, define «risco» como «a probabilidade de concretização do dano em função das condições de utilização,

exposição ou interacção do componente material do trabalho que apresente perigo», constituindo

«Componentes materiais do trabalho» o «local de trabalho, o ambiente de trabalho, as ferramentas, as

máquinas, equipamentos e materiais, as substâncias e agentes químicos, físicos e biológicos e os processos de

trabalho.». Ora, apesar desta lei mencionar os riscos psicossociais, não os inclui neste conceito, o que tem sido

criticado pela doutrina.

Por exemplo, Ana Cristina Ribeiro Costa, considera aquela definição «conservadora» por não abranger os

riscos psicossociais, já que «ao limitar o risco à probabilidade de concretização de um dano que resulte daquelas

componentes, está a excluir todos os danos que resultem de outros elementos que não aqueles, entre eles os

componentes que denominaríamos por ‘imateriais’.».4

Apesar disso, estabelece, no artigo 15.º, n.º 2 alínea f) que o empregador deve «assegurar, nos locais de

trabalho, que as exposições aos agentes químicos, físicos e biológicos e aos factores de risco psicossociais não

constituem risco para a segurança e saúde do trabalhador», bem como a «adaptação do trabalho ao homem,

especialmente no que se refere à concepção dos postos de trabalho, à escolha de equipamentos de trabalho e

aos métodos de trabalho e produção, com vista a, nomeadamente, atenuar o trabalho monótono e o trabalho

repetitivo e reduzir os riscos psicossociais.» que constitui uma concretização do disposto no artigo 127.º, n.º 1

alínea h) do Código do Trabalho.

2 Cfr. Enquadramento Legal da Saúde Ocupacional em Portugal – A Figura do Psicólogo do Trabalho, Ordem dos Psicólogos, 2018. 3 2 Cfr. Hoel, H., Sparks, K. & Cooper, C. L. (2001). The cost of violence/stress at work. University of Manchester Institute of Science and Technology. 4 Cfr. Costa, Ana Cristina Ribeiro, «Revisitando o assédio e o caminho para o seu enquadramento no regime dos acidentes de trabalho e doenças profissionais», Prontuário de Direito do Trabalho II, 2017.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 164

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Dentre estes riscos psicossociais é possível destacar o stresse ocupacional, o assédio (moral e sexual), a

violência no trabalho, a síndrome de burnout, a adição ao trabalho, a fadiga e carga mental, assim como o

trabalho emocional.

Em Portugal, a proteção legal do assédio no local de trabalho passou a figurar de forma autónoma na nossa

legislação com a aprovação da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto.

Atualmente, nos termos do artigo 29.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código

do Trabalho, é proibida a prática de assédio, constituindo este o «comportamento indesejado, nomeadamente

o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego,

trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a

sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.»

Sabemos que o assédio, moral ou sexual, pode causar danos na saúde do trabalhador, tanto ao nível físico

como psicológico.

De facto, o assédio moral é responsável por alterações cognitivas, a nível psicológico, psicossomático,

hormonal, no que respeita ao sistema nervoso, à tensão muscular e ao sono, podendo, inclusive, conduzir ao

suicídio. Ainda, verificam-se frequentemente depressões, síndromes de stress pós-traumático, fadiga crónica,

alergias, dependência de álcool e drogas, distúrbios cardíacos e endócrinos, entre outras lesões físicas e

psíquicas.5

Infelizmente, os estudos já realizados demonstram que os números do assédio moral e sexual em Portugal

são expressivos e superiores aos que se verificam na média dos países europeus. De acordo com dados

divulgados pela CITE6 , em 2015, o assédio sexual foi referido por 12,6% das pessoas inquiridas, dos quais

14,4% eram mulheres e 8,6% homens, enquanto na média dos países europeus estes valores se situavam nos

2% em 2010. Em relação ao assédio moral, este foi referido por 16,5% das pessoas inquiridas, sendo 16,7%

mulheres e 15,9% homens, enquanto que a média dos países europeus se situava nos 4,1%.

Ainda, de acordo com o Estudo «As mulheres em Portugal, hoje – Quem são, o que pensam e o que sentem»,

da Fundação Francisco Manuel dos Santos, divulgado em 20197, 35% das mulheres inquiridas declararam que,

pelo menos uma vez, foram vítimas de assédio moral no trabalho, tendo sido as situações mais frequentes as

de «perseguição profissional» (o trabalho é sistematicamente desvalorizado; de forma recorrente definiram-lhe

objetivos e prazos impossíveis de atingir, etc.) e a «intimidação» (sentir-se constantemente alvo de ameaças de

despedimento; ser sistematicamente alvo de situações limite com o objetivo de a levar ao descontrolo, etc.).

Ora, temos assistido a uma preocupação crescente do legislador nesta matéria, que se tem traduzido na

aprovação de medidas de reforço dos direitos dos trabalhadores em caso de assédio laboral.

A Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, veio introduzir importantes alterações, nomeadamente a salvaguarda

para os denunciantes e testemunhas de que não podem ser punidos disciplinarmente por terem contribuído para

o processo ou, ainda, a criação da obrigação de celebração de códigos de conduta.

Sobre a matéria em apreço, gostaríamos de destacar a alteração introduzida no artigo 283.º, n.os 8 e 9 do

Código do Trabalho que determina que «A responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de doenças

profissionais resultantes da prática de assédio é do empregador» e que «A responsabilidade pelo pagamento

da reparação dos danos emergentes de doença profissional prevista no número anterior é da segurança social,

nos termos legalmente previstos, ficando esta sub-rogada nos direitos do trabalhador, na medida dos

pagamentos efectuados, acrescidos de juros de mora vincendos.»

Ora, a doutrina e a jurisprudência vinham discutindo a possibilidade de qualificação dos danos decorrentes

do assédio como acidente de trabalho ou como doença profissional. Em 2017, o legislador, através da norma

acima citada, determinou que da situação de assédio podem resultar doenças profissionais.

No entanto, existe doutrina que entende que a formulação adotada não foi suficiente. A título de exemplo,

Ana Cristina Ribeiro Costa, destaca que o legislador não esclareceu «se as doenças serão tipificadas ou se

deverão enquadrar-se no conceito de doenças profissionais atípicas» e não excluiu que «do assédio também

5 Neste sentido, cfr. Ana Cristina Ribeiro Costa, «O ressarcimento dos danos decorrentes do assédio moral ao abrigo dos regimes das contingências profissionais», publicado em Questões Laborais, Coimbra Editora, 1994. 6 Cfr. Assédio sexual e moral no local de trabalho em Portugal, do Centro Interdisciplinar de Estudos de Género, CIEG. Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, ISCSP, Universidade de Lisboa e Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, CITE, 2016. 7 https://www.ffms.pt/FileDownload/b6eb24e5-3bf3-411d-9f35-b51a7ebed3e8/estudo-mulher-completo

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possam decorrer acidentes de trabalho».8

Depois, o artigo 6.º da Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, determinou que o Governo devia definir, em sede

de regulamentação própria, os termos de aplicação desta lei, na parte referente aos acidentes de trabalho e

doenças profissionais, no prazo de um mês a contar da data da sua publicação.

Contudo, o Governo não procedeu, ainda, à atualização da lista das doenças profissionais, fazendo constar

dela doenças decorrentes da prática de assédio como a depressão ou o burnout. Em consequência, apesar da

importância desta alteração, a mesma não produz ainda os efeitos pretendidos, dado que a não publicação

desta lista impede a concretização efetiva da lei.

Infelizmente, sabemos que o risco de violência e assédio é ainda mais elevado em tempos de crise, tendo a

crise pandémica provocada pela COVID-19 comprovado esta situação. Por isso, consideramos fundamental que

seja concluída rapidamente a regulamentação da Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, garantindo aos trabalhadores

afetados pelo assédio laboral o ressarcimento dos danos sofridos.

Nestes termos, a Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, por

intermédio do presente projeto de resolução, recomenda ao Governo que:

• Conclua o processo de regulamentação da Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, promovendo a atualização

da lista de doenças profissionais, que deve incluir as doenças resultantes da prática de assédio laboral,

garantindo ao trabalhador o ressarcimento pelos danos sofridos.

Palácio de São Bento, 7 de julho de 2021.

A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1394/XIV/2.ª

APRECIAÇÃO DO RELATÓRIO SOBRE «PORTUGAL NA UNIÃO EUROPEIA 2020»

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, e no âmbito da

apreciação da participação de Portugal no processo de construção da União Europeia, durante o ano de 2020,

o seguinte:

1 – Exprimir um juízo favorável sobre o conteúdo geral do Relatório do Governo, nos termos do n.º 4 do artigo

5.º da Lei n.º 43/2006, de 25 de agosto – Lei de acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da

República no âmbito do processo de construção da União Europeia, com as alterações introduzidas pela Lei n.º

21/2012, de 17 de maio, pela Lei n.º 18/2018, de 2 de maio, e pela Lei n.º 64/2020, de 2 de novembro, no âmbito

do processo de consulta e troca de informações entre o Governo e a Assembleia da República.

2 – Sublinhar que a apreciação deste Relatório traduz o empenho e o consenso existente entre as principais

forças políticas representadas na Assembleia da República, quanto à integração e à participação de Portugal na

União Europeia, sem prejuízo das divergências quanto às prioridades e orientações seguidas neste processo.

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

O Presidente da Comissão, Luís Capoulas Santos.

———

8 Cfr. Costa, Ana Cristina Ribeiro, «Revisitando o assédio e o caminho para o seu enquadramento no regime dos acidentes de trabalho e doenças profissionais», Prontuário de Direito do Trabalho II, 2017.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1395/XIV/2.ª

PELA APLICAÇÃO URGENTE DE MEDIDAS PARA A DESPOLUIÇÃO E PRESERVAÇÃO DO RIO

PAIVA

A emissão de descargas de efluentes poluentes persiste naquele que já foi considerado um dos rios mais

limpos da Europa – o rio Paiva. As suas águas, sobretudo no troço que atravessa o concelho de Castro Daire,

apresentam por vezes espumas em suspensão e tons acastanhados que emanam cheiros nauseabundos,

causando mal-estar à população que usufrui do curso de água e das suas margens. Além de afetaram a

qualidade de vida das populações locais, estes episódios de poluição provocam impactes negativos nos habitats

e nas espécies da fauna e flora aquática e ribeirinha. Tais impactes negativos são particularmente preocupantes

uma vez que a biodiversidade deste rio tem especial interesse para a conservação. O rio Paiva foi recentemente

classificado como Zona Especial de Conservação no âmbito da Rede Natura 2000.

A poluição no rio Paiva e afluentes pode alastrar-se por uma área considerável do território. Inserido na bacia

hidrográfica do rio Douro, a bacia do Paiva abrange 795 quilómetros quadrados, percorrendo aproximadamente

110 quilómetros, desde a serra de Leomil, no concelho de Moimenta da Beira, até Castelo de Paiva, onde

desagua no rio Douro. Afluem ao Paiva os rios Ardena, Côvo, Paivô, Mau, Frades, Sonso, Teixeira, Tenente e

Vidoeiro, tal como um conjunto de ribeiras e outros pequenos cursos de água. Apesar de correr quase sempre

por desfiladeiros, em troços do seu percurso podem ser encontradas praias fluviais, como as da Paradinha,

Areinho, Janarde, Meitriz, Vau e Espiunca. Os habitats, fauna e flora que ocorrem ao longo do seu percurso são

ricos e diversos, alguns dos quais estão protegidos ao abrigo da Diretiva Habitats.

O Bloco de Esquerda tem denunciado os recorrentes episódios de poluição no rio Paiva, associando-se às

populações locais e a associações de defesa do ambiente, como a SOS Rio Paiva, que reivindicam a

erradicação da poluição e a preservação daquele curso de água. Através das perguntas n.os 1579/XII/4.ª,

22/XIV/2.ª e 367/XIV/2.ª, o Bloco de Esquerda tem alertado para as fragilidades do tratamento de águas

residuais, sobretudo no concelho de Castro Daire, que poluem o rio Paiva. Apesar das denúncias e alertas, a

emissão de descargas poluentes continua, fruto de respostas insuficientes do Governo e das entidades

competentes em matéria de controlo, fiscalização e recuperação da qualidade ambiental do rio Paiva e afluentes.

Em resposta a uma pergunta do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, o Ministério do Ambiente e da

Ação Climática informou que as mais recentes ações de fiscalização, ocorridas em agosto de 2019, às ETAR

de Ponte Pedrinha, Arinho e Ouvida, todas sob a alçada da Câmara Municipal de Castro Daire, resultaram no

levantamento de cinco autos de notícia que deram origem a outros tantos processos de contraordenação por

incumprimento dos valores limite de emissão. A ETAR de Ponte Pedrinha continua em atividade, apesar de não

possuir título de utilização de recursos hídricos. Segundo o Governo, a sua desativação está condicionada à

entrada em exploração da nova ETAR de Castro Daire-Arinho, já construída, mas a aguardar a certificação das

instalações elétricas.

Existe, no entanto, um conjunto de ETAR, todas em Castro Daire, cujos títulos de utilização de recursos

hídricos já expiraram. São os casos das ETAR de Malhada (julho de 2019), Vale Abrigoso (setembro de 2019),

Mezio I (setembro de 2019), Custilhão (julho de 2019), Ouvida (novembro de 2018) e Arinho (novembro de

2018). Importa regularizar o funcionamento destas ETAR que descarregam no rio Paiva, apoiando as autarquias

locais para reabilitá-las. É também preciso avaliar a necessidade de requalificação e ampliação das redes

municipais de saneamento de águas residuais, de modo e recolhê-las e encaminhá-las corretamente para as

respetivas ETAR.

Também em resposta a uma pergunta do Bloco de Esquerda, o Governo revelou que a Inspeção-Geral da

Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) teve conhecimento de alegadas

descargas de efluentes pecuários no rio Paiva, no lugar de Mealha, freguesia de Canelas e Espiunca, em

Arouca. Face a esta e outras informações que dão conta de alegadas descargas ilegais provenientes de

explorações agropecuárias, importa averiguar se este tipo de descargas poluentes é recorrente. Para isso, é

necessário aumentar a frequência das ações de fiscalização às entidades agropecuárias da região, tal como as

ações de vigilância no rio Paiva e afluentes. Devem ser, por isso, reforçados os meios humanos, técnicos e

financeiros das entidades competentes em matéria de avaliação, inspeção e fiscalização ambiental. Acresce

ainda a necessidade de serem criadas equipas de guarda-rios para proteger os recursos hídricos e a

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biodiversidade do rio Paiva e afluentes.

As medidas e ações para despoluir e preservar o rio Paiva e afluentes devem ser articuladas num plano de

ação com uma perspetiva integrada e ecossistémica que responda à diversidade de problemas que afetam esta

bacia hidrográfica. O plano de ação deve ser desenvolvido pelas entidades competentes em matéria de gestão

dos recursos hídricos e conservação da natureza – a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e o Instituto da

Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), respetivamente –, em parceria com as autarquias locais,

instituições de ensino superior, associações de defesa do ambiente e movimentos de cidadãos e cidadãs que

desenvolvem ações na região.

A importância do rio Paiva para a preservação de habitats e espécies ficou reforçada com a sua recente

classificação como Zona Especial de Conservação (ZEC) pelo Decreto Regulamentar n.º 1/2020, de 16 de

março, no âmbito da Rede Natura 2000, ao abrigo da Diretiva Habitats. O rio Paiva assume particular relevância

por albergar espécies piscícolas endémicas e uma rara população de mexilhão-do-rio (Margaritifera

margaritifera). Destaca-se ainda a presença da toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus), da lontra (Lutra lutra) e

do lagarto-de-água (Lacerta schreiberi). Além de visarem a proteção e preservação destas e de outras espécies,

as orientações de gestão desta área classificada estão direcionadas para as populações de lobo-ibérico (Canis

lupus signatus) que ocorrem a sul do Douro.

No entanto, a ZEC do rio Paiva, classificada em março de 2020, carece ainda do respetivo plano de gestão

com as suas medidas e ações específicas. Segundo o artigo 5.º, do Decreto Regulamentar n.º 1/2020, de 16 de

março, o plano de gestão deve ser elaborado «em prazo não superior a dois anos após a classificação das

ZEC», prazo que corresponde a março de 2022. O Governo deve assegurar o cumprimento deste prazo, sob

pena de adiar a aplicação de medidas e ações fundamentais para a proteção e preservação da biodiversidade

do rio Paiva.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Disponibilize, com urgência, apoios às autarquias locais para reabilitação e correção do funcionamento

de estações de tratamento de águas residuais dos concelhos abrangidos pelo rio Paiva e afluentes, bem como

para requalificação e ampliação das redes municipais de saneamento de águas residuais;

2 – Reforce os meios humanos, técnicos e financeiros das entidades competentes em matéria de avaliação,

inspeção e fiscalização ambiental do rio Paiva e afluentes, para identificar e erradicar a emissão de descargas

ilegais de efluentes;

3 – Aumente a frequência e eficácia das ações de inspeção e fiscalização às entidades detentoras de título

de utilização de recursos hídricos do rio Paiva e afluentes, bem como às unidades industriais e explorações

agropecuárias da região;

4 – Desenvolva e aplique um plano de ação, com uma perspetiva integrada e ecossistémica, para a

despoluição e recuperação ambiental do rio Paiva e afluentes, das suas margens e respetivas galerias ripícolas,

em articulação com a Agência Portuguesa do Ambiente, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas,

as autarquias locais, instituições de ensino superior, associações de defesa do ambiente e movimentos de

cidadãos e cidadãs;

5 – Garanta o cumprimento do prazo de elaboração do Plano de Gestão da Zona Especial de Conservação

do Rio Paiva – que termina em março de 2022 –, onde devem constar as medidas e ações complementares de

conservação dos habitats e espécies desta área classificada, conforme disposto no Decreto Regulamentar n.º

1/2020, de 16 de março;

6 – Contrate uma equipa de guarda-rios para fiscalizar, vigiar e proteger os recursos hídricos e a

biodiversidade do rio Paiva e afluentes;

7 – Promova ações de sensibilização e comunicação ambiental junto das comunidades locais sobre a

importância da preservação do rio Paiva e afluentes.

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: Maria Manuel Rola — Nelson Peralta — Pedro Filipe Soares — Jorge

Costa — Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso —

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Isabel Pires — Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José

Moura Soeiro — Luís Monteiro — Moisés Ferreira — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1396/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A ACELERAÇÃO DA VACINAÇÃO CONTRA A COVID-19

Exposição de motivos

O processo de vacinação contra a COVID-19 não está a decorrer como seria necessário para que

rapidamente se assegure a proteção da saúde da população. A vacinação tem demonstrado uma taxa de

efetividade muito positiva, observada na redução da mortalidade, na redução de hospitalizações e na redução

da incidência nas faixas etárias com mais de 80 anos.

Na atual situação epidemiológica do País, com um novo recrudescimento de novos casos de infeção, que

começou por ser mais acentuado na região de Lisboa e Vale do Tejo, mas que se vai alastrando para o território

continental, a maior incidência é nas faixas etárias que ainda não foram vacinadas. Se a vacinação estivesse

mais avançada, estaríamos em melhores condições, neste momento, para controlar a epidemia.

Desde o início do processo de vacinação, este tem tido inúmeros constrangimentos que conduziram a atrasos

na implementação do Plano de Vacinação contra a COVID-19, devido à falta de vacinas. No primeiro trimestre

o País recebeu 2,3 milhões de vacinas quando estava previsto receber 4,5 milhões de vacinas, ou seja, menos

51%, sendo que no segundo trimestre a situação agravou-se tendo recebido 7,2 milhões de vacinas, quando

estava previsto receber 11 milhões de vacinas, isto é menos 65%. Isto significa que ao dia de hoje, se as

empresas farmacêuticas tivessem cumprido o que estava acordado praticamente toda a população estaria

vacinada.

Até 26 de junho de 2021 somente 3,3 milhões de pessoas (32%) tinham o esquema vacinal completo, e 5,3

milhões de pessoas (52%) têm uma dose da vacina.

Estima-se agora que se conseguirá alcançar 70% da população com uma dose da vacina entre 8 e 15 de

agosto. Porém é preciso considerar que é a vacinação completa que garante maior proteção e benefícios.

Os nossos centros de vacinação estão confrontados com dois problemas, por um lado a falta de vacinas, por

outro a carência de recursos humanos, na medida em que para além da falta de vacinas, é preciso assegurar a

capacidade dos centros de vacinação. Pretende-se administrar 140 mil vacinas por dia, mas isso exige o reforço

na contratação de enfermeiros. Dada a falta de enfermeiros nos centros de vacinação o Governo em vez de

assumir as suas responsabilidades e de proceder à sua contratação, procura empurrar o problema para as

autarquias, para que sejam estas a contratar os enfermeiros, o que para além de inaceitável é causador de

desigualdades.

Estão identificadas dificuldades que impedem que os trabalhadores se vacinem. Há empresas que estão a

descontar do salário o período correspondente ao despendido no processo de vacinação, o que constitui um

condicionamento impensável. Há muitos trabalhadores que devido aos baixos rendimentos, não têm condições

de prescindir de um dia de vencimento. Os trabalhadores com vínculos precários e sem estabilidade também

terão dificuldades em se ausentar do local de trabalho.

A vacinação da população, a par do rastreamento de contactos com rapidez e da testagem, tem mostrado

uma enorme eficácia na proteção da saúde dos cidadãos, portanto a aceleração da vacinação deve ser

considerada uma prioridade. Neste sentido o País não pode continuar amarrado aos acordos entre as empresas

farmacêuticas e a União Europeia, que já revelaram que não solução para a atual situação. Para aumentar a

disponibilidade de vacinas no País, aspeto determinante para acelerar a vacinação, o Governo tem desde já de

diversificar a compra de vacinas, reconhecidas pela Organização Mundial de Saúde. Os países que tomaram

essa opção, estão com taxas de vacinação bem superiores. Para reforçar a capacidade de vacinação é também

preciso reforçar a contratação de profissionais de saúde para os centros de vacinação e remover todos os

obstáculos que impedem os cidadãos de se vacinarem.

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Assim, tendo em consideração o acima exposto, e ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e

da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP

apresentam o seguinte projeto de resolução:

Resolução

Reconhecendo a eficácia da vacinação no controlo da epidemia da COVID-19, a Assembleia da República

recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do Artigo 166.º da Constituição, a adoção, com urgência, de

medidas para aceleração da vacinação, com o objetivo de proteger a saúde de toda a população,

nomeadamente:

1 – A diversificação da compra de vacinas, junto de países e/ou de empresas farmacêuticas que

desenvolveram vacinas contra a COVID-19, reconhecidas pela Organização Mundial de Saúde, no quadro da

sua opção soberana e que o procedimento com vista à autorização de introdução do mercado seja desenvolvido

pelo Infarmed, para permitir ao País que disponha de mais vacinas para a vacinação rápida de toda a população;

2 – O aumento da capacidade dos centros de vacinação, através do aumento do número de centros e da

contratação de trabalhadores da saúde, designadamente de enfermeiros;

3 – O reforço dos meios alocados à vacinação dos cidadãos no domicílio, que devido ao seu estado de saúde

não têm possibilidade de se deslocar aos centros de vacinação;

4 – A criação de todas as condições para que os trabalhadores adiram sem constrangimentos ao processo

de vacinação, sem perda de direitos e de rendimentos, removendo assim, os obstáculos que estão a impedir

muitos trabalhadores de se vacinarem, assegurando que o período que o trabalhador se ausenta do local de

trabalho para a vacinação é pago integralmente.

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

Os Deputados do PCP: Paula Santos — João Dias — Jerónimo de Sousa — João Oliveira — António Filipe

— Duarte Alves — Alma Rivera — Bruno Dias — Ana Mesquita — Diana Ferreira.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1397/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A CONTRATAÇÃO DE TRABALHADORES DA SAÚDE PARA AS

UNIDADES DO SNS

Exposição de motivos

Reforçar o Serviço Nacional de Saúde, dotá-lo de capacidade, exige a contratação de trabalhadores na área

da saúde, para assegurar o combate à epidemia e simultaneamente recuperar os atrasos na prestação de

cuidados de saúde.

O Governo procedeu à contratação de trabalhadores de saúde, mas sobretudo através da promoção de

vínculos precários. Dos trabalhadores contratados no âmbito das medidas excecionais de combate à epidemia,

para além de terem sido insuficientes, somente uma minoria conseguiu a integração na carreira.

Inicialmente o Governo começou por contratar os trabalhadores da saúde com contratos de quatro meses,

que poderiam ser prorrogados por mais quatro meses. Entretanto decidiu que quem perfizesse oito meses até

31 de março de 2021 seriam integrados na carreira com vínculo efetivo, deixando de fora os trabalhadores

contratados a partir de 1 de agosto de 2020. Em janeiro de 2021 o Governo autorizou a contratação de

trabalhadores da saúde, agora a termo incerto, isto é, podendo ser despedidos a qualquer momento.

Na semana passada foi publicado o Decreto-Lei n.º 54-B/2021, de 25 de junho, que autoriza a contratação

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de trabalhadores da saúde a termo incerto, até 31 de agosto, mas limitado aos trabalhadores que foram

contratados no passado ao abrigo das medidas excecionais de combate à COVID-19 com contrato a termo certo

ou incerto, impedindo a contratação de outros trabalhadores da saúde que são fundamentais dadas as

exigências que se colocam com o aumento de novos casos de infeção e a recuperação dos atrasos na prestação

de cuidados.

Deste modo o Governo não permite o aumento da capacidade de resposta do SNS, essencial para responder

à atual situação epidemiológica, quando estão já identificados atrasos na realização dos inquéritos

epidemiológicos e no rastreamento de contactos, quando é necessário aumentar a testagem e a capacidade

dos centros de vacinação, para vacinar mais rapidamente a população, acompanhar os doentes com COVID-19

no domicílio e os doentes internados e prosseguir a recuperação dos atrasos na prestação de cuidados de

saúde, que em bom rigor, até ao momento não se conseguiu. É indispensável assegurar o normal funcionamento

dos centros de saúde e dos hospitais, que voltam a sentir constrangimentos dada a necessidade de alocar mais

trabalhadores da saúde ao combate à epidemia.

Por outro lado, de acordo com os dados publicados no Portal da Transparência, em março de 2021, o

Ministério da Saúde tinha um total de 148 235 trabalhadores e em maio de 2021 tinha 147 646 trabalhadores da

saúde, isto é menos, em dois meses perderam-se 589 trabalhadores da saúde. Passado o período mais grave

da epidemia que foram vividos nos meses de janeiro e fevereiro, no momento de maior alívio, o Governo perdeu

a oportunidade e não tomou as medidas necessárias para assegurar que todos os trabalhadores contratados

permaneciam no SNS, trabalhadores esses que são necessários face à atual situação epidemiológica e serão

necessários no futuro para prestar os cuidados que ficaram por fazer.

Os trabalhadores da saúde estão exaustos, devido ao número elevado de horas extraordinárias e aos

elevados ritmos de trabalho. Não é possível alargar a resposta à custa dos mesmos trabalhadores. Portanto

qualquer ponderação de eventual impedimento de gozo de férias pelos trabalhadores da saúde é inaceitável.

A desvalorização profissional, social e remuneratória dos trabalhadores de saúde, a desvalorização das

carreiras, o desrespeito dos direitos tem levado à desmotivação e a que muitos trabalhadores da saúde optem

por abandonar o SNS.

Por isso, não se compreende que o Governo em vez de respeitar e garantir direitos, estabilidade, assegurar

a integração na carreira com vínculo efetivo, contratar os trabalhadores necessários, opte por um lado por limitar

essa mesma contratação sem tomar as medidas necessárias para pôr fim à precariedade e para garantir que

todos os trabalhadores da saúde estão integrados numa carreira com vínculo público efetivo. Deste modo o

Governo mais uma vez revela que está mais preocupado com o défice do que em garantir as condições de

trabalho aos trabalhadores da saúde e reforçar a capacidade do Serviço Nacional de Saúde.

A solução para o combate à epidemia não passa por novos confinamentos, mas sim, como o PCP sempre

afirmou, pelo reforço das equipas de saúde pública, pelo reforço da testagem e da vacinação, pelo reforço do

Serviço Nacional de Saúde para recuperar os cuidados atrasados e para assegurar todos os cuidados a que os

utentes têm direito, e para isto é condição essencial o reforço da contratação de trabalhadores da saúde, bem

como a garantia de todos os seus direitos e de carreiras dignas.

Assim, tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da

alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP

apresentam o seguinte projeto de resolução:

Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, que

adote as seguintes medidas:

1 – Proceda à conversão dos contratos de trabalho a termo resolutivo certo e incerto em contratos de trabalho

com vínculo efetivo a todos os trabalhadores da saúde, contratados no âmbito das medidas excecionais de

combate à epidemia da COVID-19, abrangendo aqueles cujo contrato, entretanto caducou e que já não se

encontram no Serviço Nacional de Saúde (SNS);

2 – Altere a norma do Decreto-Lei n.º 54-B/2021, de 25 de junho, que impede a contratação de trabalhadores

da saúde que não tenham sido previamente contratados com contrato de trabalho a termo resolutivo certo ou

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incerto, de molde a possibilitar as unidades de saúde de proceder à contratação dos trabalhadores da saúde

que são efetivamente necessários para combater a epidemia da COVID-19 e recuperar os atrasos na prestação

de cuidados ao nível dos cuidados de saúde primários e dos cuidados hospitalares;

3 – Proceda à integração dos trabalhadores da saúde com contratos de substituição, na carreira com contrato

de trabalho com vínculo efetivo, considerando que desempenham funções permanentes, na prestação de

cuidados de saúde aos utentes;

4 – Prorrogue a aplicação dos artigos 2.º a 7.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2021, de 2 de fevereiro, que que

estabelece mecanismos excecionais de gestão de profissionais de saúde para realização de atividade

assistencial, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, na sua redação atual.

5 – Garanta a autonomia das unidades do SNS na contratação de trabalhadores da saúde, dando

cumprimento à Lei n.º 87/2019, de 3 de setembro, dispensando-se a autorização do Ministério das Finanças.

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

Os Deputados do PCP: Paula Santos — João Dias — Jerónimo de Sousa — João Oliveira — António Filipe

— Duarte Alves — Alma Rivera — Bruno Dias — Ana Mesquita — Diana Ferreira.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1398/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A CONTRATAÇÃO DOS ENFERMEIROS RECÉM-LICENCIADOS

Exposição de motivos

A falta de trabalhadores da saúde no Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente de enfermeiros constitui

um sério constrangimento na prestação de cuidados de saúde aos utentes. Não é um problema de hoje, mas

sim o resultado das opções políticas de sucessivos Governos, que a realidade epidémica que vivemos veio

agravar.

Os enfermeiros são fundamentais nas unidades de saúde do Serviço Nacional de Saúde (SNS), ao nível dos

cuidados de saúde primários, dos cuidados hospitalares, dos cuidados continuados e paliativos, na saúde

mental, na reabilitação, na promoção de saúde e na prevenção da doença, entre outros.

Contudo, o Governo continua a não contratar enfermeiros em número adequado, nem a integrá-los numa

carreira com vínculo público efetivo, promovendo a precariedade de vínculos laborais. A precariedade e a

instabilidade, a ausência de uma perspetiva de desenvolvimento profissional no SNS, leva muitos enfermeiros

a optarem por desempenhar funções em unidades privadas ou mesmo fora do País, quando são necessários

nas unidades que integram o SNS. Mesmo em ano de epidemia, em 2020, 1320 enfermeiros solicitaram a

documentação para trabalhar no estrangeiro.

São necessários enfermeiros no SNS para prestar cuidados no âmbito do combate à epidemia, seja na

prestação de cuidados aos doentes COVID nos hospitais, ou nos atendimentos de doenças respiratórias (ADR),

na realização da testagem, na vacinação contra a COVID-19, nas equipas de saúde pública e no rastreamento

de contactos, seja na recuperação dos cuidados em atraso, no acompanhamento dos doentes crónicos, na

saúde infantil e na saúde materna, no acompanhamento a grávidas e no planeamento familiar, na vacinação no

âmbito do programa nacional de vacinação, na atividade cirúrgica, entre outros. Neste sentido é fundamental

que o Governo proceda efetivamente à contratação de enfermeiros, para que no âmbito das suas funções, o

SNS tenha capacidade de continuar a combater a epidemia da COVID-19 e de acompanhar todos os utentes e

doentes com outras doenças.

No final deste ano letivo, estima-se que concluam a licenciatura em enfermagem, cerca de 3000 enfermeiros.

São 3000 novos enfermeiros recém-licenciados que são necessários no SNS e que o Governo deve desde já

avançar com os procedimentos para a sua contratação e integração no SNS. Perante as carências existentes,

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não se pode voltar a perder a oportunidade de contratar estes jovens enfermeiros para reforçar a capacidade

de resposta do SNS.

Entendemos que é necessário contratar mais enfermeiros para o SNS, assim como é necessário a integração

de todos os enfermeiros com vínculos precários que desempenham funções no SNS. O PCP tem apresentado

diversas iniciativas legislativas no sentido da vinculação dos enfermeiros com vínculos precários, tal como

voltamos a apresentar um projeto de resolução nesse sentido.

Há grupos privados na área da saúde que aliciam estes jovens, turmas inteiras, para ingressar nas suas

unidades, ainda nem estes terminaram a licenciatura. Se houver uma oportunidade de exercer funções no SNS,

integrados numa carreira com vínculo público, com estabilidade, certamente muitos destes jovens farão essa

opção, por isso o Governo deve tomar as medidas, para contratar no imediato os enfermeiros recém-licenciados.

Assim, tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da

alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP

apresentam o seguinte projeto de resolução:

Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, que

proceda, com urgência, à contratação de todos os enfermeiros recém-licenciados através de procedimento

concursal de carácter excecional e simplificado, que permita a sua integração na carreira com contrato de

trabalho em funções públicas por tempo indeterminado e ao breve início de funções nas unidades de saúde do

Serviço Nacional de Saúde, de forma a reforçar a capacidade no combate à epidemia, designadamente nas

equipas de saúde pública e no rastreamento, na prestação de cuidados nos atendimentos de doenças

respiratórias, na testagem, na vacinação e na monitorização dos doentes com COVID-19 e na recuperação dos

atrasos na prestação de cuidados nos cuidados de saúde primários e nos cuidados hospitalares.

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

Os Deputados do PCP: Paula Santos — João Dias — Jerónimo de Sousa — João Oliveira — António Filipe

— Duarte Alves — Alma Rivera — Bruno Dias — Ana Mesquita — Diana Ferreira.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1399/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE SUBMETA A DISCUSSÃO E VOTAÇÃO NO PARLAMENTO

QUALQUER ACORDO DE LIVRE CIRCULAÇÃO OU MOBILIDADE COM A CPLP

Exposição de motivos

Angola, que iniciou este mês a presidência rotativa da CPLP, agendou oficialmente a cimeira da Comunidade

dos Países de Língua Portuguesa para 16 e 17 de julho, em Luanda, data simbólica visto que precisamente a

17 de julho se comemoram os 25 anos da CPLP.

Em final do ano passado, na XXV Reunião do Conselho de Ministros da Comunidade dos Países de Língua

Portuguesa foi prevista a finalização da discussão do projeto de acordo sobre a mobilidade na CPLP no primeiro

trimestre de 2021, com o intuito de poder vir a ser aprovado em Luanda, este mês de julho.

Aparentemente o Projeto de Acordo sobre a Mobilidade na CPLP está concluído e permitiu uma grande

convergência de posições e de avanços na formulação de medidas que pretendem agilizar a circulação entre

os países membros desta organização.

Independentemente das boas relações e benefícios de acordos externos sobre várias matérias, parece-nos

de bom senso que os portugueses, ou os seus representantes eleitos para este Parlamento, sejam consultados

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sobre tais matérias de tão grande relevância para a sociedade portuguesa e até europeia.

Segundo dados do Eurostat, referentes a 2020, Portugal tem 2.5 milhões de pobres, que é uma das mais

baixas taxas de produtividade da OCDE, no entanto aceita mais refugiados em percentagem que os países ricos

da Europa. Somos efetivamente o 4.º, imediatamente a seguir à Alemanha, França e Finlândia. Não será

pertinente que os portugueses sejam consultados antes da assinatura destes acordos, sobretudo já que não o

foram aquando da assinatura do Pacto Global para a Migração? É importante lembrar que na Bélgica, o primeiro-

ministro Charles Michel viu-se obrigado a apresentar a sua demissão na sequência de ter apoiado este Tratado

sem o levar a discussão interna.

Não deveriam também as autoridades europeias ser informadas e consultadas sobre este tipo de acordos?

Portugal é membro da CPLP, mas também o é da União Europeia e dado que este é um tema com implicações

não só no nosso país, acreditamos que tem que haver debate sobre este acordo em Portugal.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República,

reunida em sessão plenária, recomenda ao Governo que:

– Submeta a votação e discussão em Plenário quaisquer acordos que pretenda assinar, que impliquem a

entrada de imigrantes no País e consequentemente na Europa, nomeadamente o referido «Acordo sobre a

Mobilidade» na CPLP.

Assembleia da República, 5 de julho de 2021.

O Deputado do CH, André Ventura.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1400/XIV/2.ª

RECOMENDA A REVERSÃO DO HOSPITAL DE S. PAULO EM SERPA PARA A GESTÃO PÚBLICA E

A SUA INTEGRAÇÃO NO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE

Exposição de motivos

O Hospital de S. Paulo, em Serpa, foi entregue à Santa Casa da Misericórdia de Serpa em 2014. Ou seja, a

partir de 1 de janeiro de 2015, o hospital passou a ser gerido pela misericórdia ao abrigo de um contrato tripartido

estabelecido entre a referida entidade, a ARS Alentejo e a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (ULSBA).

A 14 de novembro de 2014 foi estabelecido um acordo de cooperação entre a Santa Casa da Misericórdia

de Serpa e o Estado, acordo esse que define um programa assistencial com base em três áreas – serviço de

urgência 24h/dia; consultas de várias especialidades e cirurgias de ambulatório.

Em outubro de 2017, a Santa Casa da Misericórdia de Serpa denunciou o referido acordo de gestão do

Hospital de São Paulo. O que veio gerar, então, uma divergência entre a Santa casa da Misericórdia de Serpa

e a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo e o próprio Ministério da Saúde que culminou na assinatura de

uma adenda ao acordo de cooperação.

Durante os anos de 2020 e 2021 foram vários os dias em que a administração do Hospital de São Paulo

decidiu, unilateralmente, pelo encerramento do serviço de urgência, sendo que no corrente mês de julho a escala

contempla à partida pelo menos 5 dias de encerramento. De recordar que também foi intensão da administração

da responsabilidade da Santa Casa da Misericórdia de Serpa que o serviço de urgência fosse alvo de alterações

no seu funcionamento, chegando mesmo a emitir um comunicado dando conta de que «no período

compreendido entre as 00h00 e as 08h00, o Serviço de Urgência funcionará mediante chamada, através da

utilização de uma campainha localizada no exterior do edifício». Justificando que esta «medida prende-se com

a extrema necessidade de afetação de recursos que, num período tão critico como o que estamos a passar, são

cada vez mais escassos.»

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É de salientar que no acordo de cooperação assinado entre a Misericórdia, ARS Alentejo e a Unidade Local

de Saúde do Baixo Alentejo, é determinado na alínea b) da sua cláusula VI que respeita aos Deveres da Santa

Casa da Misericórdia «b) Prestar cuidados de saúde de qualidade aos utentes, do Serviço Nacional de Saúde,

em tempo útil, nas melhores condições de atendimento, não estabelecendo qualquer tipo de discriminação.»

Também o ponto 1 da cláusula XIII «1) A Misericórdia deve dispor ao seu serviço de pessoal suficiente e dotado

de formação adequada para exercer, de forma continua e atempada, as atividades objeto do acordo.»

Santa Casa da Misericórdia de Serpa está claramente a violar os deveres a que está obrigada, revestindo-

se numa clara perda de qualidade do serviço prestado e redução do acesso aos cuidados de saúde a que a

população tem direito, mais ainda quando o país se depara com uma situação epidémica onde o caminho é o

de reforço das respostas em saúde e não a sua redução. num momento em que deveria estar a ser reforçada a

resposta do Serviço Nacional de Saúde mediante a contratação de profissionais em falta, de mais investimento

em equipamentos e meios materiais para prestar cuidados de saúde de qualidade, o que assistimos é

exatamente ao inverso.

Ainda relativamente ao acordo de cooperação, têm sido violados com gravidade diversas clausulas do

mesmo, nomeadamente as clausulas VI; XI e XIII entre muitos deveres que estão por apurar.

Só a gestão pública dos hospitais integrados no SNS cumpre os princípios constitucionais, nomeadamente,

a universalidade e a qualidade dos cuidados de saúde, independentemente das condições sociais e económicas

dos utentes. Neste sentido, o PCP propõe que Hospital de S. Paulo, em Serpa seja revertido para a gestão

pública, integrado na Unidade Local de saúde do Baixo Alentejo, assegurando o direito à saúde para os seus

utentes.

Nestes termos, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º

do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a

seguinte:

Resolução

Tendo presente a necessidade de assegurar e melhorar a resposta em saúde aos utentes do concelho de

Serpa e do distrito de Beja, a Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da

Constituição da República, recomendar ao Governo que adote as seguintes medidas no sentido de reverter para

a gestão pública o Hospital de São Paulo, em Serpa, integrando-o na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo

– EPE:

1 – Revogue o acordo de cooperação, celebrado entre a Administração Regional de Saúde do Alentejo, a

ULSBA e a Santa Casa da Misericórdia de Serpa, estabelecido ao abrigo do Decreto-Lei n.º 138/2013, de 9 de

outubro, celebrado com a União das Misericórdias Portuguesas;

2 – Integre o Hospital de São Paulo, em Serpa, na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE;

3 – Garanta os meios financeiros e os recursos humanos adequados ao correto funcionamento do hospital

de São Paulo;

4 – Reforce o Hospital de São Paulo, como unidade hospitalar complementar ao Hospital de Beja;

Assembleia da República, 7 de julho de 2021.

Os Deputados do PCP: João Dias — Paula Santos — João Oliveira — António Filipe — Jerónimo de Sousa

— Alma Rivera — Duarte Alves — Bruno Dias — Ana Mesquita — Diana Ferreira.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1401/XIV/2.ª

DESLOCAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA AO BRASIL

Texto do projeto de resolução

Sua Excelência o Presidente da República requereu, nos termos do n.º 1 do artigo 129.º e da alínea b) do

artigo 163.º da Constituição, o assentimento da Assembleia da República para se deslocar ao Brasil, entre os

dias 29 de julho e 3 de agosto, para estar presente na cerimónia de (re)inauguração do Museu da Língua

Portuguesa, em São Paulo.

Assim, apresento à Assembleia da República, nos termos regimentais, o seguinte projeto de resolução:

«A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 163.º e do n.º 5 do artigo 166.º da

Constituição, dar assentimento à deslocação de Sua Excelência o Presidente da República ao Brasil, entre os

dias 29 de julho e 3 de agosto, para estar presente na cerimónia de (re)inauguração do Museu da Língua

Portuguesa, em São Paulo.»

Palácio de São Bento, 7 de julho de 2021.

O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.

Mensagem do Presidente da República

Estando prevista a minha deslocação ao Brasil entre os dias 29 de julho e 3 de agosto próximo,

designadamente para estar presente na cerimónia de (re)inauguração do Museu da Língua Portuguesa em São

Paulo, venho requerer, nos termos dos artigos 129.º, n.º 1, e 163.º, alínea b), da Constituição, o assentimento

da Assembleia da República.

Lisboa, 7 de julho de 2021.

O Presidente da República,

(Marcelo Rebelo de Sousa)

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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