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Quarta-feira, 29 de setembro de 2021 II Série-A — Número 8

XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)

S U M Á R I O

Projetos de Lei (n.os 618, 851, 885, 886, 906, 909, 919 e 920/XIV/2.ª:

N.º 618/XIV/2.ª (Conta-corrente entre os contribuintes e o Estado): — Parecer da Comissão de Orçamento e Finanças e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 851/XIV/2.ª (Procede à implementação do modelo da igualdade e reforça a proteção das pessoas na prostituição): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 885/XIV/2.ª (Revogação da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, relativa ao regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 886/XIV/2.ª (Cessação de vigência do regime excecional de medidas de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça no âmbito da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, constante da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril): — Vide Projeto de Lei n.º 885/XIV/2.ª N.º 906/XIV/2.ª (Garante o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas em caso de assédio sexual):

— Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 909/XIV/2.ª (Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano): — Parecer da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 919/XIV/2.ª [Estabelece limites à publicidade dos jogos e apostas (décima sexta alteração ao Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro)]: — Parecer da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 920/XIV/2.ª [Revoga o «Cartão do Adepto», pela não discriminação e estigmatização de cidadãos em recintos desportivos (quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho)]: — Parecer da Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. Proposta de Lei n.º 107/XIV/2.ª (Altera os termos do exercício do mandato a meio tempo dos titulares das juntas de freguesia): — Parecer da Comissão de Administração Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder Local, tendo como anexo os pareceres da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da

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Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. Projetos de Resolução (n.os 1352, 1377, 1387 e 1395/XIV/2.ª e 1452 e 1457 e 1458/XIV/3.ª):

N.º 1352/XIV/2.ª (Promoção de um plano de proteção e despoluição do rio Paiva): — Texto final da Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território. N.º 1377/XIV/2.ª (Recomenda ao Governo medidas para defesa da sustentabilidade do rio Paiva e afluentes): — Vide Projeto de Resolução n.º 1352/XIV/2.ª N.º 1387/XIV/2.ª (Implementação de medidas para a monitorização, despoluição e valorização do rio Paiva e seus afluentes): — Vide Projeto de Resolução n.º 1352/XIV/2.ª N.º 1395/XIV/2.ª (Pela aplicação urgente de medidas para a despoluição e preservação do rio Paiva): — Vide Projeto de Resolução n.º 1352/XIV/2.ª N.º 1452/XIV/3.ª (Deslocação do Presidente da República às Canárias):

— Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas. N.º 1457/XIV/3.ª (PEV) — Medidas de prevenção e combate à exploração na prostituição. N.º 1458/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo português que alargue o prazo de consulta pública da Avaliação Ambiental do Programa de Prospeção e Pesquisa de Lítio. Propostas de Resolução (n.os 27 e 28/XIV/2.ª):

N.º 27/XIV/2.ª (Aprova, para ratificação, o Protocolo Adicional à Convenção do Conselho da Europa sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, aberto à assinatura em Estrasburgo, em 18 de dezembro de 1997): — Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas. N.º 28/XIV/2.ª (Aprova, para adesão, o Protocolo que altera o Protocolo Adicional à Convenção do Conselho da Europa sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, aberto à assinatura em Estrasburgo, em 22 de novembro de 2017): — Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas.

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PROJETO DE LEI N.º 618/XIV/2.ª

(CONTA-CORRENTE ENTRE OS CONTRIBUINTES E O ESTADO)

Parecer da Comissão de Orçamento e Finanças e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexos

PARTE I – Considerandos

1. Nota preliminar

O Grupo Parlamentar do CDS-PP tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o Projeto de

Lei n.º 618/XIV/2.ª – «Conta-corrente entre os Contribuintes e o Estado».

A iniciativa deu entrada na Assembleia da República no dia 6 de janeiro de 2021, tendo sido admitida no dia

8 de janeiro e baixado, na mesma data, à Comissão de Orçamento e Finanças (COF), comissão competente,

para elaboração do respetivo parecer. Em reunião da COF ocorrida a 13 de janeiro, foi o signatário nomeado

autor do parecer.

A discussão na generalidade do presente projeto de lei encontra-se agendada para a reunião plenária do dia

1 de outubro.

2. Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

Através do Projeto de Lei n.º 618/XIV/2.ª, os seus autores pretendem que seja criado um regime excecional

de extinção de prestações tributárias por compensação com créditos tributários e não tributários, por iniciativa

do contribuinte.

Consideram que, não obstante a criação de uma conta-corrente entre os contribuintes e o Estado deva «ser

exigível mesmo em situações de normalidade», a necessidade de melhorar a liquidez das empresas e as

disponibilidades das famílias devido aos efeitos da pandemia conduz à necessidade de criação de um regime

excecional «que vigore, pelo menos, até ao final de 2024, sem prejuízo de eventuais renovações».

O regime proposto prevê a compensação com créditos de natureza tributária (artigo 2.º) ou de natureza não

tributária (artigo 3.º), incluindo «créditos de qualquer natureza sobre o Sector Público Administrativo ou sobre o

Sector Empresarial do Estado, de que o contribuinte seja titular (…) desde que as dívidas do Estado indicadas

pelo contribuinte para compensação sejam certas, líquidas e exigíveis (…)».

A iniciativa prevê a possibilidade de deferimento tácito do pedido de compensação de créditos, decorridos os

prazos estabelecidos para decisão pela administração tributária (artigo 5.º).

A nota técnica em anexo, que integra o presente parecer, apresenta uma análise do enquadramento jurídico

nacional da iniciativa e de direito comparado, pelo que se remete para a sua consulta.

3. Conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e cumprimento da lei

formulário

A apresentação do presente projeto de lei foi efetuada nos termos e ao abrigo do disposto na alínea b) do

artigo 156.º e no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º, no n.º 1 do artigo 119.º

e no n.º 1 do artigo 123.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).

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A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do

RAR, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto

principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos no n.º 1

do artigo 124.º do RAR.

Refere a nota técnica dos serviços da AR que «o projeto de lei prevê a possibilidade de deferimento tácito

do pedido de compensação de créditos (n.º 2 do artigo 5.º), sem que haja necessariamente uma pronúncia da

administração tributária relativamente ao mérito da pretensão do contribuinte. Nesta medida, parece não ser de

excluir a possibilidade de se verificar, no ano económico em curso, uma diminuição das receitas previstas no

Orçamento do Estado, sem que haja uma correspondência efetiva com as despesas nele inscritas. Chama-se,

assim, a atenção para que o respeito pelo limite imposto pelo n.º 2 do artigo 167.º da Constituição e n.º 2 do

artigo 120.º do Regimento, conhecido como ‘lei-travão’, deve ser salvaguardado no decurso do processo

legislativo».

O projeto de lei cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e

republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho (lei formulário), ao apresentar um título que traduz sinteticamente

o seu objeto. Não obstante, a nota técnica dos serviços da AR sugere o seu «aperfeiçoamento formal» em sede

de apreciação na especialidade ou em redação final.

De acordo com o n.º 2 do artigo 2.º da lei formulário, dado que a iniciativa é omissa quanto à entrada em

vigor, a mesma ocorrerá no quinto dia após a sua publicação. O artigo 7.º do projeto de lei determina a sua

vigência temporária, «até ao final de 2024».

4. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre matéria conexa

Efetuada uma pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, não foram

encontradas iniciativas ou petições sobre esta matéria que se encontrem, atualmente, em apreciação.

5. Consultas e contributos

A nota técnica sugere que se pondere consultar o Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais, a

Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) e a Associação Fiscal Portuguesa (AFP).

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

O signatário do presente parecer exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a iniciativa

em apreço, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento,

reservando o seu grupo parlamentar a sua posição para o debate em Plenário.

PARTE III – Conclusões

A Comissão de Orçamento e Finanças é de parecer que o Projeto de Lei n.º 618/XIV/2.ª (CDS-PP) – «Conta-

corrente entre os Contribuintes e o Estado» reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido

e votado em Plenário, reservando os grupos parlamentares o seu sentido de voto para o debate.

Palácio de São Bento, 29 de setembro de 2021.

O Deputado autor do parecer, Nuno Miguel Carvalho — O Presidente da Comissão, Filipe Neto Brandão.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH, na reunião da

Comissão de 29 de setembro de 2021.

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PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 618/XIV/2.ª (CDS-PP)

Conta-corrente entre os contribuintes e o Estado

Data de admissão: 8 de janeiro de 2021.

Comissão de Orçamento e Finanças (5.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Nuno Amorim (DILP), Lia Negrão (DAPLEN), Paula Faria (Biblioteca) e Ângela Dionísio (DAC) Data: 26 de janeiro de 2021.

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

A iniciativa ora apresentada visa estabelecer um regime excecional de extinção de prestações tributárias por

compensação com créditos tributários e não tributários, por iniciativa do contribuinte, ou seja, a criação de uma

conta-corrente entre os contribuintes e o Estado, permitindo aos contribuintes o pagamento dos seus impostos

com os créditos que têm sobre o Estado, tenham ou não origem tributária.

Pretende-se ainda que este regime excecional vigore, pelo menos, até ao final de 2024, sem prejuízo de

eventuais renovações.

Da exposição de motivos, extraímos os seguintes fundamentos para a apresentação deste projeto de lei:

• Razões que se prendem com a justiça tributária e com o cumprimento de um «principio básico de um Estado

que se comporta como pessoa de bem – e não exige dívidas quando ele próprio é devedor e não está a

cumprir»;

• Espera-se que a medida contribua também para aumentar a liquidez na economia e os rendimentos das

famílias, questão particularmente importante no atual contexto de gravíssimas dificuldades financeiras

que resultam da desaceleração generalizada da atividade económica, em consequência da atual crise

pandémica.

Note-se que o nosso ordenamento jurídico já prevê mecanismos de compensação de dívidas fiscais,

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consagrados, essencialmente, no Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Adicionalmente, a

Portaria n.º 201-B/2017, de 30 de junho, veio regulamentar a compensação de dívidas tributárias com créditos

não tributários ao abrigo do artigo 90.º-A do CPPT, mas apenas nos casos em que o crédito tenha sido

reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, que sejam certos, exigíveis e líquidos, matéria que será

objeto de maior desenvolvimento no ponto seguinte desta nota técnica (NT).

Salienta-se, ainda, que se encontra em fase de apreciação na especialidade a Proposta de Lei n.º 43/XIV/1.ª,

a qual tem como objetivo a simplificação do procedimento tributário e o reforço das garantias dos contribuintes.

Destaca-se, em particular, uma norma que visa a criação de um mecanismo de conciliação entre a Autoridade

Tributária (AT) e os contribuintes no final da fase de inspeção, de modo a que os contribuintes possam

regularizar a sua situação tributária por acordo com a AT.

Refira-se, finalmente, as declarações do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF) que, no debate

parlamentar que antecedeu o quarto dia de votações na especialidade do Orçamento do Estado para 2021

(OE2021), a 25 de novembro de 2020, reconheceu que seria necessário fazer um esforço suplementar para se

implementar mais rapidamente a «conta-corrente».

• Enquadramento jurídico nacional

Constituição da República Portuguesa (Constituição) define, nos artigos 103.º e 104.º, os fins da tributação:

«O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma

repartição justa dos rendimentos e da riqueza» (n.º 1 do artigo 103.º); «o imposto sobre o rendimento pessoal

visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os

rendimentos do agregado familiar»; «a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu

rendimento real»; «a tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os cidadãos»; «a tributação

do consumo visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico

e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo» (artigo 104.º). No mesmo artigo 103.º, estatuem-se

os princípios da legalidade e da irretroatividade tributárias.

O direito fiscal importou o conceito de relação jurídica do direito civil1. As regras previstas na Lei Geral

Tributária (LGT) aprovada em anexo ao Decreto-Lei n.º 398/98, de 12 de dezembro, a relação jurídica tributária.

De acordo com o n.º 2 do artigo 3.º, os tributos compreendem os impostos, incluindo os aduaneiros e

especiais, e outras espécies tributárias criadas por lei, designadamente as taxas e demais contribuições

financeiras a favor de entidades públicas.

O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com

respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária, prevalecendo este principio sobre qualquer

legislação especial (n.os 2 e 3 do artigo 30.º).

A LGT prevê, no seu capítulo IV, as diversas formas de extinção da relação jurídica tributária. Assim, a relação

jurídica tributária extingue-se por pagamento da prestação tributária (artigos 40.º a 44.º), por caducidade do

direito de liquidação (artigos 45.º a 47.º), por prescrição da prestação (artigos 48.º e 49.º) e por garantia da

prestação tributária (artigos 50.º a 53.º).

As prestações tributárias são pagas em moeda corrente ou por cheque, através de débito em conta, por

transferência conta a conta e por vale postal ou por outros meios utilizados pelos serviços dos correios ou pelas

instituições de crédito que a lei expressamente autorize (n.º 1 do artigo 40.º)2, podendo ser efetuado em

prestações, mediamente requerimento do devedor (n.º 1 do artigo 42.º).

O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo

de quatro anos, quando a lei não fixar outro (n.º 1 do artigo 45.º).

As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos

impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação

única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos

impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso

em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente,

a exigibilidade do imposto ou o facto tributário (n.º 1 do artigo 48.º).

1 Cfr. Sanches, Saldanha, Manual de Direito Fiscal, 3.ª edição, Coimbra, Coimbra editora, p. 245. 2 O pagamento das dívidas tributárias pode ser realizado pelo próprio devedor ou por terceiro (n.º 1 do artigo 41.º).

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A cobrança das dívidas tributárias pode ocorrer sob as seguintes modalidades: Pagamento voluntário e

cobrança coerciva (artigo 78.º do CPPT).

Constitui pagamento voluntário de dívidas de impostos e demais prestações tributárias o efetuado dentro do

prazo estabelecido nas leis tributárias (n.º 1 do artigo 84.º). Findo o prazo estabelecido sem que o pagamento

tenha sido integralmente recebido, os serviços competentes extraem certidão de divida com base nos elementos

disponíveis, servindo de base à instauração de processo de execução fiscal (artigo 88.º).

O artigo 89.º prevê a possibilidade de compensar a dívida, por iniciativa da administração tributária, quando

o executado seja titular de créditos resultantes de reembolso, revisão oficiosa, reclamação ou impugnação

judicial de qualquer ato tributário. A compensação com créditos tributários pode ser igualmente efetuada a

pedido do contribuinte nos termos previstos no artigo 90.º

É igualmente possível a compensação com créditos de qualquer natureza sobre a administração direta do

Estado de que o contribuinte seja titular, por iniciativa deste, nas condições definidas no artigo 90.º-A. Para

regulamentar a compensação de dívidas tributárias com créditos não tributários ao abrigo do artigo 90.º-A do

CPPT nos casos em que o crédito tenha sido reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, foi

publicada a Portaria n.º 201-B/2017, de 30 de junho. Este procedimento é aplicável ao pagamento de dívidas

tributárias em fase de cobrança coerciva por compensação, por iniciativa do contribuinte, com créditos não

tributários sobre a administração central do Estado, reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado, que

sejam certos, exigíveis e líquidos. Para tal, o contribuinte pode requerer, por transmissão eletrónica de dados,

ao dirigente máximo da Administração Tributária o pagamento de dívidas tributárias por compensação, indicando

os elementos previstos no n.º 1 do artigo 3.º. O requerimento é acompanhado de translado de decisão judicial

transitada em julgado que comprove a natureza certa, exigível e líquida de crédito não tributário sobre a

administração central direta do Estado. O cumprimento dos requisitos formais é confirmado pela Administração

Tributária para aplicação da suspensão da execução prevista no n.º 5 do artigo 169.º do CPPT.

Com relevo para a apreciação da presente iniciativa cumpre mencionar o portal na Internet da AT, bem como

a página, da responsabilidade da mesma entidade, com legislação atualizada e consolidada dos códigos

tributários.

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Efetuada uma pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar (AP), não se

identificaram petições sobre esta matéria que se encontrem, atualmente, em apreciação.

Encontra-se, todavia, pendente uma iniciativa legislava sobre tema conexo, já anteriormente mencionada

nesta nota técnica: A Proposta de Lei n.º 43/XIV/1.ª – «Reforça as garantias dos contribuintes e a simplificação

processual».

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

Na presente Legislatura, bem como no final da anterior, sobre matéria conexa a esta iniciativa, foram

apresentadas as seguintes iniciativas, cuja apreciação se encontra já concluída:

• Projeto de Resolução n.º 548/XIV/1.ª (IL) – Pela transparência e equilíbrio na relação do Estado com o

contribuinte. Rejeitado na sessão plenária de 10/07/2020;

• Projeto de Lei n.º 465/XIV/1.ª (CDS-PP) – Aditamento ao Código de Procedimento e de Processo Tributário

introduzindo o processo de conciliação fiscal. Rejeitado na generalidade na sessão plenária de

10/07/2020;

• Projeto de Lei n.º 1102/XIII/4.ª (CDS-PP) – Cria, em complemento à Lei n.º 9/2019, de 1 de fevereiro, um

mecanismo de regularização oficiosa das declarações de IRS em decorrência de decisões judiciais que

impliquem devoluções aos contribuintes de prestações tributárias indevidamente cobradas. Iniciativa

caducada em 24/10/2019.

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Também no âmbito da apreciação na especialidade do Orçamento do Estado para 2021 – Proposta de Lei

n.º 61/XIV/2.ª (GOV) – foram apresentadas duas propostas de alteração (PA) sobre matéria conexa com a da

presente iniciativa:

– Proposta de aditamento n.º 905-C, da iniciativa do CDS-PP, que pretendia estabelecer um regime

excecional de extinção de prestações tributárias por compensação com créditos tributários e não tributários, e

que foi entretanto retirada;

– Proposta de aditamento n.º 243-C, da iniciativa do IL, que pretendia estabelecer uma norma de equilíbrio

contributivo, que foi rejeitada em Comissão.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do CDS-Partido Popular (CDS-PP), ao

abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º daConstituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da

Assembleia da República (RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos

Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo

4.º do RAR, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da

Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do RAR.

A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do

RAR, encontra-se redigida sob a forma de artigos, é precedida de uma breve exposição de motivos e tem uma

designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal, embora possa ser objeto de aperfeiçoamento em

caso de aprovação, dando assim cumprimento aos requisitos formais estabelecidos no n.º 1 do artigo 124.º do

RAR.

Observa igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR, uma

vez que define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa e parece não infringir

a Constituição ou os princípios nela consignados.

O projeto de lei prevê a possibilidade de deferimento tácito do pedido de compensação de créditos (n.º 2 do

artigo 5.º), sem que haja necessariamente uma pronúncia da administração tributária relativamente ao mérito

da pretensão do contribuinte. Nesta medida, parece não ser de excluir a possibilidade de se verificar, no ano

económico em curso, uma diminuição das receitas previstas no Orçamento do Estado, sem que haja uma

correspondência efetiva com as despesas nele inscritas.

Chama-se, assim, a atenção para que o respeito pelo limite imposto pelo n.º 2 do artigo 167.º da Constituição

e n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, conhecido como norma-travão, deve ser salvaguardado no decurso do

processo legislativo3.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 6 de janeiro de 2021. Foi admitido e baixou para discussão na

generalidade à Comissão de Orçamento e Finanças (5.ª) a 8 de janeiro de 2021, por despacho de S. Ex.ª o

Presidente da Assembleia da República, tendo sido, na mesma data, anunciado em sessão plenária.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, de ora em

diante designada como lei formulário, contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e

formulário dos diplomas que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa.

O título do projeto de lei – «Conta-corrente entre os Contribuintes e o Estado» – traduz sinteticamente o seu

objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, embora, em caso de

aprovação, possa ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na especialidade ou em

3 A verificar-se, a questão poderia ser contornada mediante a previsão de início de vigência da iniciativa com o Orçamento do Estado subsequente ao da sua aprovação.

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redação final.

Em caso de aprovação, a iniciativa em apreço revestirá a forma de lei, sendo objeto de publicação na 1.ª

série do Diário da República, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

A iniciativa é omissa relativamente à sua data de entrada em vigor, pelo que, nos termos do n.º 2 do artigo

2.º da lei formulário, entrará em vigor no quinto dia após a sua publicação4. O artigo 7.º da proposta de lei

determina a sua vigência temporária, até ao dia 31 de dezembro de 20245.

Na presente fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não parece suscitar outras questões em face

da lei formulário.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional

Países europeus

A legislação comparada é apresentada para o seguinte Estado-Membro da União Europeia: Espanha.

ESPANHA

Os princípios essenciais e a regulação das relações entre a Administração tributária e os contribuintes

encontram-se previstos na Ley 58/2003, de 17 de dezembro, Geral Tributaria.

De acordo com o artigo 71 do diploma, uma das formas previstas para extinção das relações jurídicas

tributárias é a compensação. As dívidas fiscais podem extinguir-se total ou parcialmente por compensação com

créditos reconhecidos por ato administrativo a favor do obrigado, nas condições regularmente estabelecidas. Os

contribuintes podem solicitar a compensação dos créditos e das dívidas tributárias de que sejam titulares

mediante um sistema de conta-corrente, nos termos regulares definidos.

A figura da conta corrente, regulada nos artigos 138 a 143 do Real Decreto1065/2007, de 27 de julio, por el

que se aprueba el Reglamento General de las actuaciones y los procedimentos de gestión e inspección tributaria

y de desarrollo de las normas comunes de los procedimentos de aplicación de los tributos, é um sistema de

«conta aberta» entre o contribuinte e administração na qual se anotam tanto os valores pendentes de devolução

como os pendentes de liquidação, compensando-se umas com as outras. Deste modo, as dividas extinguem-

se, facilitando o cumprimento das obrigações de pagamento de impostos.

Incluem-se no sistema de conta corrente tributário as dividas e os créditos provenientes dos seguintes

impostos:

• Imposto sobre o rendimento das pessoas singulares6;

• Imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas7;

• Imposto sobre o rendimento dos não residentes8; e

• Imposto sobre o valor acrescentado9.

Podem aceder ao sistema de conta corrente as pessoas singulares ou as entidades que exerçam atividades

empresariais ou profissionais e que cumpram os seguintes requisitos:

• Ter a obrigação de apresentação periódica de autoliquidações de IVA ou autoliquidações por retenções e

4 Contando-se este prazo «a partir do dia imediato ao da sua disponibilização no sítio da Internet gerido pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, S.A.» (www.dre.pt) – n.º 4 do artigo 2.º da citada lei. 5 Apesar de a norma determinar a sua vigência «até ao final de 2024», deve entender-se a referência como feita ao dia 31 de dezembro, sendo de considerar, aqui, as regras cíveis relativas ao cômputo do termo – cfr. a alínea a) do artigo 279.º do Código Civil: «Se o termo (…) for fixado no princípio, meio ou fim do ano, entende-se, respetivamente, o primeiro dia do ano, o dia 30 de junho e o dia 31 de dezembro». 6 Impuesto sobre la Renda de las Personas Físicas. 7 Impuesto sobre Sociedades. 8 Impuesto sobre la Renta de no Residentes cuando se trate de obligados tributarios que obtengan rentas mediante establecimiento permanente. 9 Impuesto sobre el Valor Añadido.

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10

pagamento dos referidos impostos;

• Ser credor da administração para devoluções contínuas;

• Serem titulares de créditos reconhecidos no exercício anterior equivalente a, no mínimo, 40 por cento das

dividas tributárias acumuladas no mesmo período;

• Estar em dia com as obrigações fiscais;

• Não ter sido aplicada qualquer sanção tributária nem qualquer condenação por crimes contra a Autoridade

Tributária; e

• Não ter renunciado ao sistema «conta-corrente» durante o ano civil ou o ano civil imediatamente anterior

ao exercício.

V. Consultas e contributos

• Consultas facultativas

Será de ponderar ouvir ou obter contributo escrito da AT, do SEAF e da Associação Fiscal Portuguesa (AFP).

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

O proponente juntou à proposta de lei a respetiva avaliação de impacto de género (AIG), De acordo com a

informação constante desse documento, considera-se que a iniciativa legislativa tem uma valoração neutra em

termos de impacto de género, dado que a totalidade das categorias e indicadores analisados, assumem a

valoração de «Neutro».

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso.

Nesta fase do processo legislativo a redação do projeto de lei não nos suscita qualquer questão relacionada

com a linguagem discriminatória em relação ao género.

• Impacto orçamental

Em sendo aprovada uma norma que prevê uma significativa agilização do processo da compensação10 de

créditos tributários e não tributários, é expectável, conforme já foi anteriormente referido, um impacto negativo

na arrecadação de receita fiscal, tanto mais que o prazo de regularização das dívidas do Estado aos

contribuintes é, em média, superior ao prazo médio exigido aos contribuintes para pagar as suas dividas fiscais.

Todavia, os dados disponíveis não permitem quantificar esse impacto.

• Outros impactos

Conforme se refere na exposição de motivos da iniciativa, a medida poderá contribuir para aumentar a

liquidez das famílias e das empresas, particularmente importante num contexto, como aquele que vivemos, de

acrescida debilidade económica e social. Notamos ainda que medidas desta natureza poderão potenciar a

adesão de mais empresas aos auxílios do Estado, fundamentais para a respetiva sobrevivência.

Em sentido inverso, pode-se sempre questionar se a agilização proposta nesta iniciativa é, ou não, excessiva,

viabilizando processos de compensação sem uma eficaz validação por parte da administração tributária, por

10 Prevista no n.º 3 do artigo 4.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 5.º (deferimento tácito)

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11

falta de tempo.

VII. Enquadramento bibliográfico

FERNANDES, Joana Rita da Cunha – A compensação de créditos tributários por iniciativa dos

particulares [Em linha]. Porto: [sn], 2013. (Tese de mestrado em direito fiscal). [Consult. 13 jan. 2021].

Disponível na Intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=132929&img=19029&save=true

Resumo: O presente trabalho corresponde à dissertação de mestrado em direito, na área de especialização

de direito fiscal, apresentada na Escola de Direito da Universidade Católica Portuguesa do Porto, e tem como

objetivo a análise do regime jurídico-tributário da compensação de créditos fiscais, mais propriamente, da

compensação por iniciativa dos particulares. «A compensação de créditos fiscais é a extinção de duas

obrigações fiscais, sendo o credor de uma delas devedor na outra, e o credor desta última, devedor da primeira».

Na presente tese, a autora pretende dar resposta a um conjunto de questões, apoiando-se em vários textos

acerca do instituto da compensação de créditos, quer ao nível do direito civil, quer ao nível do direito fiscal, a

saber: «o que é uma compensação de créditos?; quais são os seus requisitos?; quais são os seus efeitos?; o

legislador português prevê a compensação no direito fiscal?; se sim, qual é o regime que a ela se aplica?; quais

são os sujeitos que podem invocar a compensação de créditos fiscais?; qual é o procedimento a ser utilizado

para cada uma das formas que o legislador prevê?; em que fase de cobrança do imposto pode a administração

tributária invocar a compensação?; pode o contribuinte invocar a compensação de créditos com um crédito não

tributário ou, apenas o poderá fazer com créditos tributários como acontece com a administração fiscal?; se sim,

como o poderá fazer?; a possibilidade de compensar créditos tributários também existe nos ordenamentos

jurídicos espanhol e brasileiro?, se sim, qual o seu regime e procedimento?».

FIGUEIREDO, Pedro Nuno de Carvalho – Breves notas sobre a compensação de créditos no direito

tributário. Revista do Centro de Estudos Judiciários. Lisboa. ISSN 1645-829X. N.º 1 (1.º sem. 2013), p. 239-

268. Cota: RP-244.

Resumo: Neste artigo, o autor debruça-se sobre a figura da compensação no ordenamento jurídico-tributário

português. São abordados os seguintes aspetos: a compensação de créditos por iniciativa da administração

tributária; a solução legal para as questões controversas relativas ao âmbito e momento de concretização desta

compensação; os requisitos da compensação por iniciativa do contribuinte, relativa a créditos tributários e não

tributários; os meios de reação contra a compensação por iniciativa da administração tributária e de impugnação

da decisão de não compensação por iniciativa do contribuinte; a distinção entre ato material de compensação e

ato administrativo de compensação; a apreciação da legalidade da compensação com crédito de reembolso por

dívidas de um dos cônjuges. É ainda analisada a compensação de créditos das autarquias locais e a

conformação ao interesse público, bem como o direito ao recebimento de juros indemnizatórios por via da

anulação da compensação.

MORAIS, Rui Duarte – Manual de procedimento e processo tributário. Coimbra: Almedina, 2012. Cota:

12.06.6 – 65/2013.

Resumo: O autor aborda a questão do procedimento de compensação de créditos fiscais (p. 127 a 131 e 202

a 203), considerando que «é do interesse dos sujeitos passivos poderem, sistematicamente, extinguir as suas

obrigações tributárias por compensação (…), pois não se compreende que o Estado exija o pontual pagamento

dos seus créditos tributários e, simultaneamente, permaneça na condição de devedor em mora desse sujeito

passivo.» O autor considera que, embora a lei já preveja a compensação em termos substancialmente corretos,

estes são de difícil aplicação prática.

PLMJ Sociedade de Advogados – Compensação de dívidas fiscais com outros créditos do estado [Em

linha]. [S.l.]. ul. 2017. [Consult. 14 jan. 2021]. Disponível em:

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II SÉRIE-A — NÚMERO 8

12

https://www.plmj.com/xms/files/v1_antigos_anteriores_a_abr2019/newsletters/2017/julho/Compensacao_de

_dividas_fiscais_com_outros_creditos_do_Estado.pdf.

Resumo: Nesta nota informativa, a PLMJ dá conta da publicação da Portaria n.º 201-B/2017, de 30 de junho,

que estabelece as condições e procedimentos para a compensação de dívidas tributárias, objeto de processo

de execução fiscal, com créditos de natureza não tributária que o Estado tenha para com os contribuintes, por

iniciativa do contribuinte e nos casos em que o crédito tenha sido reconhecido por decisão judicial transitada em

julgado, concretizando assim a regulamentação prevista no n.º 7 do artigo 90.º-A do Código de Processo e

Procedimento Tributário. São elencados os pressupostos necessários para que o contribuinte possa acionar

este mecanismo.

———

PROJETO DE LEI N.º 851/XIV/2.ª

(PROCEDE À IMPLEMENTAÇÃO DO MODELO DA IGUALDADE E REFORÇA A PROTEÇÃO DAS

PESSOAS NA PROSTITUIÇÃO)

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica

elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

PARTE I – Considerandos

I. a) Nota introdutória

A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues, tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o

Projeto de Lei n.º 851/XIV/2.ª – Procede à implementação do modelo da igualdade e reforça a proteção das

pessoas na prostituição, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º, do n.º 1 do artigo 167.º e da

alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da alínea b) do n.º 1 do

artigo 4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), observando o disposto na

alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do Regimento.

O projeto de lei ora em análise deu entrada, em 21 de maio de 2021, tendo nessa mesma data sido admitido

e baixado, para discussão na generalidade, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e

Garantias, com conexão com a Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto, por despacho de S.

Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, tendo sido anunciado em sessão plenária no dia 26 de maio.

Do ponto de vista formal, conforme consta na nota técnica elaborada pelos serviços da Assembleia da

República, e uma vez que a iniciativa visa alterar o Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23

de setembro; a Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e

afastamento de estrangeiros do território nacional; e a Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, que estabelece o regime

de aplicação da educação sexual em meio escolar, e conforme ditam as regras de legística formal, o título da

iniciativa, se for aprovada, deverá ser: «Aplica o modelo da igualdade e reforça a proteção das pessoas na

prostituição, alterando o Código Penal e as Leis n.os 23/2007, de 4 de julho, e 60/2009, de 6 de agosto».

A iniciativa reúne os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º, no n.º 1 do artigo 120.º, no n.º 1 do

artigo 123.º e no artigo 124.º, todos do RAR, ainda não estando a sua discussão em Plenário agendada.

Em 26 de maio de 2021, a Comissão solicitou parecer escrito sobre esta iniciativa ao Conselho Superior da

Magistratura, ao Conselho Superior do Ministério Público, à Ordem dos Advogados, ao Alto Comissariado para

as Migrações e ao Observatório do Tráfico de Seres Humanos.

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13

I b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

A iniciativa sub judice visa alterar alguns aspetos do enquadramento legal da prostituição em Portugal, tendo

por base uma visão que assenta num modelo designado por modelo da igualdade ou abolicionista, por

contraposição a um modelo conhecido como modelo regulacionista. A este propósito, na exposição de motivos,

são mencionados vários países (Suécia, Noruega, Islândia, Israel, França e Irlanda) que, seguindo o referido

modelo da igualdade ou abolicionista, criminalizaram a compra de sexo, embora com distinções na tipificação e

na moldura penal a aplicar.

Tal como consta da nota técnica elaborada pelos serviços, a proponente cita diversos estudos e relatórios

que confluem na ideia de que a maior parte das pessoas em situação de prostituição são mulheres com

carências económicas associadas e que já sofreram algum tipo de violência ou experiência abusiva nas suas

vidas. Por esse motivo, subscreve o entendimento de que, na sua maioria, as situações de prostituição não

configuram verdadeiras expressões de liberdade, mas, ao invés, reportam-se a contextos condicionados pelas

circunstâncias, pelo que exigem a implementação de respostas que permitam a estas pessoas sair do sistema

da prostituição. A proponente evidencia também a ligação existente entre o tráfico de seres humanos e a

prostituição, referindo dados que revelam que a maior parte das mulheres que se prostituem na União Europeia

são mulheres migrantes.

Nestes termos, a proponente defende uma alteração legislativa assente nos seguintes vetores:

1 – Criminalização da compra de sexo, propondo para o efeito a alteração dos artigos 169.º e 175.º do

Código Penal, no sentido de prever a aplicação de pena de prisão até um ano, ou pena de multa, a «quem

solicitar, aceitar ou praticar ato sexual com pessoa na prostituição, em troca de contrapartida financeira ou

promessa desta, ou de benefício em espécie ou promessa de tal benefício», agravando-se a moldura penal a

aplicar se tais condutas forem praticadas com menor na prostituição, com a previsão de pena de prisão até três

anos ou pena de multa;

2 – Combate ao tráfico de seres humanos para exploração sexual, reforçando a proteção das pessoas

migrantes em situação de prostituição. Sobre este aspeto, o projeto de lei sub judice propõe a alteração dos

artigos 109.º, 111.º, 112.º e 115.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada,

permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional. As alterações propostas vão no sentido

de conceder autorização de residência a cidadãos estrangeiros que tenham sido vítimas de infrações penais

ligadas ao lenocínio, mesmo que tenham entrado ilegalmente no país e não preencham os requisitos para o

efeito da autorização. Prevê-se que essa autorização seja concedida, após prazo para reflexão, se o cidadão

colaborar com as autoridades na investigação do crime de lenocínio, por um lado, e, por outro, se demonstrar

empenho «no processo de saída do sistema da prostituição e na sua integração social e profissional». É também

proposto o alargamento do limite máximo do prazo de reflexão referido, que passa de 60 para 90 dias. A presente

iniciativa pretende ainda ver garantida, mesmo antes da concessão da autorização de residência, a subsistência

e o acesso a tratamento médico urgente e adequado da pessoa sinalizada como vítima do crime de lenocínio

que não disponha de recursos suficientes. Por último, quanto a esta matéria, é proposta a alteração da redação

do mencionado artigo 115.º, determinando-se que a autorização de residência pode, a todo o tempo, ser

cancelada se o portador reativar ativa e voluntariamente, por sua própria iniciativa, contactos com os presumíveis

autores do crime de lenocínio;

3 – Importância do tema do consentimento sexual nos programas de educação sexual implementados nas

escolas, propondo-se a alteração do artigo 2.º da Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, que estabelece o regime de

aplicação da educação sexual em meio escolar. A redação proposta adita uma nova alínea ao artigo,

consagrando que «o reconhecimento da indispensabilidade do consentimento para uma sexualidade vivida com

respeito e igualdade» deve constar no elenco das finalidades da educação sexual nas escolas.

4 – Reforço das respostas que permitam a saída da situação de prostituição. Neste ponto, o projeto de lei

em apreço (artigo 5.º) prevê o desenvolvimento pelo Governo de programas de saída do sistema da prostituição,

em articulação «com entidades governamentais, autarquias locais, organizações não governamentais e

associações, em particular associações de mulheres». Estes programas devem integrar componentes bastantes

diversificadas, desde o acompanhamento em termos médicos, ao auxílio nas necessidades básicas, como o

alojamento, até à promoção da integração e inserção social, com medidas de formação e apoio ao emprego.

Neste contexto, determina-se a criação no Orçamento do Estado de «um fundo destinado à implementação de

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programas de saída do sistema de prostituição», prevendo-se que reverta para este fundo o produto da aplicação

das penas de multa resultantes da condenação pela prática do crime de lenocínio e compra de sexo.

Cumpre igualmente referir que a presente iniciativa legislativa determina que o Governo remete à Assembleia

da República, anualmente, um relatório sobre a aplicação da lei que vier a ser aprovada. Este instrumento

destina-se a avaliar o impacto do diploma no combate ao tráfico de seres humanos para exploração sexual,

devendo integrar dados estatísticos sobre criminalização do referido tráfico, do lenocínio e da compra de sexo.

O relatório em causa deverá também incluir um «balanço da implementação dos programas de saída do sistema

da prostituição» e uma avaliação do «impacto da legislação ao nível da mudança de atitudes e

comportamentos».

O projeto de lei em apreço compõe-se de sete artigos preambulares: O primeiro definidor do respetivo objeto,

o segundo, terceiro e quarto contendo, respetivamente, alterações ao Código Penal, à Lei n.º 23/2007, de 4 de

julho, e à Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, o quinto consagrando o desenvolvimento de programas de saída do

sistema da prostituição, o sexto determinando que o Governo remete anualmente à Assembleia da República

um relatório sobre a aplicação da lei e o último fixando o início da vigência da lei que vier a ser aprovada.

I c) Enquadramento legal

• Enquadramento jurídico nacional

A Constituição da República Portuguesa (Constituição), refere no seu artigo 1.º, que «Portugal é uma

República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na

construção de uma sociedade livre, justa e solidária». Miranda e Canotilho (2018) referem a este propósito que

«(u)ma sociedade que respeita a dignidade da pessoa humana é aquela em que as pessoas são reconhecidas

como polos de liberdade, são tratadas com justiça e apoiadas com solidariedade».

O quadro legal aplicável à matéria em apreço, enquadrou-se em fases anteriores em diplomas como o

Decreto-Lei n.º 44579, de 19 de setembro de 1962, o Decreto-Lei n.º 474/76, de 16 de junho, a Resolução n.º

67/77, de 31 de março, a Resolução n.º 259/79, de 16 de agosto, a Lei n.º 3/84, de 24 de março, assim como a

Resolução da Assembleia da República n.º 51/98, de 15 de outubro, entre outros. A temática em apreço é

também abordada pelos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 144/2004, 196/2004, 303/04, 170/2006 e

396/07.

Para além do relevo para efeitos da matéria em apreço, enquadra-se também nas convenções ratificadas

por Portugal, das quais salientamos a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação

contra as Mulheres (Lei n.º 23/80, de 26 de julho), a Convenção para a Supressão do Tráfico de Pessoas e de

Exploração da Prostituição de Outrem (Resolução da Assembleia da República n.º 31/91, de 10 de outubro) e o

Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança Relativo à Venda de Crianças, Prostituição

Infantil e Pornografia Infantil (Resolução da Assembleia da República n.º 16/2003, de 5 de março) e a Convenção

do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica

(Resolução da Assembleia da República n.º 4/2013, de 21 de janeiro), instrumento no qual se exorta o Estado

português à adoção de políticas públicas conducentes à erradicação da violência contra as mulheres e violência

doméstica, o que se traduz em medidas específicas em várias dimensões, explanadas nos documentos de

política pública nacionais, donde se destaca a Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-

2030, Portugal+ Igual, aprovada através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018, de 21 de maio.

Já no quadro do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, para além da

deslocação dos crimes sexuais do capítulo relativo aos crimes contra valores e interesses da vida em sociedade

para o título dos crimes contra a liberdade sexual, cumpre aludir ao artigo 169.º (lenocínio), cuja redação inicial

referia que «quem, por meio de violência, ameaça grave, ardil ou manobra fraudulenta, levar outra pessoa à

prática em país estrangeiro da prostituição ou de atos sexuais de relevo, explorando a sua situação de abandono

ou de necessidade, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos». Esta redação foi posteriormente alterada pelo

artigo 2.º da Lei n.º 65/98, de 2 de setembro, pela Lei n.º 99/2001, de 25 de agosto, e pelo artigo 1.º da Lei n.º

59/2007, de 4 de setembro, donde decorre a redação atual, respetivamente:

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«Artigo 169.º

Lenocínio

1 – Quem, profissionalmente ou com intenção lucrativa, fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra

pessoa de prostituição é punido com pena de prisão de seis meses a cinco anos.

2 – Se o agente cometer o crime previsto no número anterior:

a) Por meio de violência ou ameaça grave;

b) Através de ardil ou manobra fraudulenta;

c) Com abuso de autoridade resultante de uma relação familiar, de tutela ou curatela, ou de dependência

hierárquica, económica ou de trabalho; ou

d) Aproveitando-se de incapacidade psíquica ou de situação de especial vulnerabilidade da vítima;

é punido com pena de prisão de um a oito anos.»

No âmbito dos crimes contra a autodeterminação sexual, o artigo 175.º (lenocínio de menores) do Código

Penal, cuja redação inicial referia que «quem, sendo maior, praticar atos homossexuais de relevo com menor

entre 14 e 16 anos, ou levar a que eles sejam por este praticados com outrem, é punido com pena de prisão até

2 anos ou com pena de multa até 240 dias». Esta redação foi posteriormente alterada pelo artigo 2.º da Lei n.º

65/98, de 2 de setembro, pelo artigo 1.º da Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro e pelo artigo 2.º da Lei n.º 103/2015,

de 24 de agosto, donde decorre a redação atual, respetivamente:

«Artigo 175.º

Lenocínio de menores

1 – Quem fomentar, favorecer ou facilitar o exercício da prostituição de menor ou aliciar menor para esse fim

é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

2 – Se o agente cometer o crime previsto no número anterior:

a) Por meio de violência ou ameaça grave;

b) Através de ardil ou manobra fraudulenta;

c) Com abuso de autoridade resultante de uma relação familiar, de tutela ou curatela, ou de dependência

hierárquica, económica ou de trabalho;

d) Atuando profissionalmente ou com intenção lucrativa; ou

e) Aproveitando-se de incapacidade psíquica ou de situação de especial vulnerabilidade da vítima;

é punido com pena de prisão de dois a dez anos.»

A iniciativa legislativa em apreço alude ainda ao disposto na Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que «aprova o

regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional»,

nomeadamente ao nível dos seguintes artigos:

• Artigo 109.º (autorização de residência), cuja redação inicial foi alterada pelo artigo 6.º da Lei n.º 29/2012,

de 8 de outubro;

• Artigo 111.º (prazo de reflexão), cuja redação inicial foi alterada pelo artigo 6.º da Lei n.º 29/2012, de 8 de

outubro;

• Artigo 112.º (direitos da vítima antes da concessão da autorização de residência), cuja redação inicial foi

alterada pelo artigo 2.º da Lei n.º 29/2012, de 8 de outubro; e

• Artigo 115.º (cancelamento da autorização de residência), cuja redação inicial foi alterada pelo artigo 6.º da

Lei n.º 29/2012, de 8 de outubro.

Os diplomas abordados referem ainda a Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, que «estabelece o regime de

aplicação da educação sexual em meio escolar», que identifica no seu artigo 2.º as finalidades da educação

sexual. Este diploma encontra-se regulamentado pela Portaria n.º 196-A/2010, de 9 de abril.

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De referir, ainda, que A Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, na sua publicação Tráfico de

mulheres em Portugal para fins de exploração sexual, 2008, resultante de uma pesquisa cientifica realizada pelo

Centro de Estudos Sociais e coordenada pelo Prof. Boaventura Sousa Santos, no âmbito do projeto CAIM, 2004,

financiado pela iniciativa comunitário EQUAL, apresenta um conjunto relevante de informações atinentes à

matéria em apreço, nomeadamente ao nível do desenvolvimento legal, dos instrumentos normativos relevantes

para a proteção das vítimas (onde se destaca Lei n.º 61/91, de 13 de agosto), da caracterização do fenómeno

de tráfico e prostituição e das respostas da sociedade civil às mulheres vítimas de tráfico sexual.

• Enquadramento no plano da União Europeia

A União funda-se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade,

do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a

minorias. Estes valores são comuns aos Estados-Membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a

não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres (artigo 2.º do

Tratado da União Europeia).

De acordo com o artigo 83.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia o Parlamento Europeu (PE) e

o Conselho podem estabelecer regras mínimas relativas à definição das infrações penais e das sanções em

domínios de criminalidade particularmente grave com dimensão transfronteiriça que resulte da natureza ou das

incidências dessas infrações, ou ainda da especial necessidade de as combater, assente em bases comuns.

Entre os domínios discriminados neste artigo, encontra-se, nomeadamente o tráfico de seres humanos e

exploração sexual de mulheres e crianças.

Na Resolução do Parlamento Europeu, de 26 de fevereiro de 2014, sobre a exploração sexual e a prostituição

e o seu impacto na igualdade dos géneros o Parlamento Europeu não só contextualiza o fenómeno, as causas

que potenciam a prostituição, os grupos mais vulneráveis bem como tece um conjunto de apelos e

recomendações aos Estados-Membros bem como à Comissão Europeia para abordar este problema e proteger

as vítimas.

Considera que uma forma de combater o tráfico de mulheres e raparigas menores para exploração sexual e

de promover a igualdade dos géneros é o modelo aplicado na Suécia, Islândia e Noruega (o chamado modelo

nórdico) e, atualmente, a ser analisado em vários países europeus, onde é a compra de serviços sexuais que

constitui um ato criminoso e não os serviços prestados pelas pessoas que se prostituem.

Acredita que considerar a prostituição como «trabalho sexual» legal, despenalizar a indústria do sexo em

geral e legalizar o lenocínio não constitui uma solução para proteger as mulheres e raparigas menores

vulneráveis da violência e da exploração, produzindo antes um efeito contrário, na medida em que as expõe a

um nível mais elevado de perigo de violência e promove, ao mesmo tempo, o crescimento dos mercados da

prostituição, o que, por sua vez, se traduz num maior número de casos de abuso de mulheres e raparigas

menores.

Nesta resolução o Parlamento Europeu reconhece também que a prostituição, a prostituição forçada e a

exploração sexual são questões de género e violações da dignidade humana, contrárias aos princípios dos

direitos humanos, entre os quais a igualdade de género e, por conseguinte, contrárias aos princípios da Carta

dos Direitos Fundamentais da União Europeia, incluindo o objetivo e o princípio de igualdade dos géneros.

A resolução refere ainda que o tráfico de pessoas, em particular de mulheres e crianças, para exploração

sexual tem aumentado a nível global, impulsionado pelo crescimento do crime organizado e respetivos lucros.

Assim a União Europeia (UE) tem vindo a desenvolver um quadro jurídico e político abrangente destinado a

fazer face a este fenómeno, nomeadamente através da Diretiva 2011/36/UE relativa à prevenção e luta contra

o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas e da estratégia da UE em matéria de luta contra o tráfico

de seres humanos 2021-2025, centrada na prevenção desta forma de criminalidade, na repressão dos

traficantes, bem como na proteção e no empoderamento das vítimas.

A Diretiva 2011/36/UE estabelece disposições mínimas comuns para determinar infrações no âmbito do

tráfico de seres humanos e punir os infratores, prevendo medidas para prevenir mais eficazmente este fenómeno

e reforçar a proteção das vítimas, incitando os Estados-Membros tomarem medidas para desencorajar a procura

que alimenta o tráfico; lançar campanhas de sensibilização e dar formação aos funcionários, permitindo-lhes

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identificar e lidar com as vítimas e potenciais vítimas de tráfico.

O artigo 2.º, n.º 1, da diretiva discrimina os atos intencionais que devem ser punidos pelos Estados-Membros

e o n.º 2 define a posição de vulnerabilidade como uma situação em que a pessoa não tem outra alternativa,

real ou aceitável, que não seja submeter-se ao abuso em causa.

Cumpre referir a Resolução do Parlamento Europeu, de 12 de maio de 2016, sobre a implementação da

Diretiva 2011/36/EU que exorta os Estados-Membros a aplicarem pesadas sanções penais aos crimes de tráfico

de seres humanos, escravatura moderna e exploração e a consideram crime a utilização ciente dos serviços de

vítimas de tráfico, nomeadamente para fins de prostituição, a exploração da prostituição de outrem ou outras

formas de exploração sexual.

A resolução apela a uma melhor implementação e monitorização do artigo 8.º da diretiva, de modo a garantir

que não sejam instaurados processos penais nem aplicadas penas ou sanções às vítimas de tráfico, incluindo

aqui as pessoas que são forçadas a prostituírem-se e convida os Estados-Membros a elaborarem estratégias

específicas para reduzir a procura do tráfico para fins de exploração sexual, instando a Comissão a examinar

mais aprofundadamente eventuais ligações entre a procura de serviços sexuais e o tráfico de seres humanos.

O Parlamento Europeu acredita de que a diminuição da procura pode ser alcançada por intermédio de

legislação que criminalize aqueles que compram os serviços sexuais das vítimas de tráfico de seres humanos e

insta os Estados-Membros a incluírem o casamento forçado como uma forma de tráfico de seres humanos se

contiver uma vertente de exploração da vítima. Acrescenta, ainda que o casamento forçado é muitas vezes o

objetivo final do tráfico. Exorta os Estados-Membros a preverem refúgios adequados para o acolhimento destas

vítimas e solicita à Comissão que reforce o intercâmbio de boas práticas neste domínio.

No relatório da Comissão ao PE e ao Conselho que avalia o impacto na prevenção do tráfico de seres

humanos do direito nacional em vigor que criminaliza a utilização de serviços que são objeto da exploração do

tráfico de seres humanos, em conformidade com o artigo 23.°, n.º 2, da Diretiva 2011/36/UE [COM(2016) 719

final] refere-se que um número limitado de Estados-Membros comunicou ter encomendado avaliações das

disposições legislativas na matéria ou estudos pertinentes. Reporta um relatório publicado em 2010 pela Suécia

sobre a proibição da compra de serviços sexuais, que entre as suas principais conclusões destacou que a

prostituição de rua foi reduzida para metade; que a Internet se converteu numa nova plataforma para a

prostituição; que a interdição da compra de serviços sexuais serviu para lutar contra a criminalidade organizada;

e que o apoio público à interdição aumentou. A Suécia prevê também um inquérito anti tráfico de seres humanos,

que avaliará a aplicação da disposição penal neste âmbito e examinará a forma como as autoridades com

funções coercivas investigam e tratam as questões de tráfico de seres humanos.

Menciona, também um estudo encomendado pela Finlândia, na sequência de um acórdão decisivo do

Supremo Tribunal «criminalização parcial» da compra de serviços sexuais a prostitutas por conta de outrem e

vítimas do tráfico de seres humanos que concluiu que o principal problema na aplicação da lei tem a ver com o

número muito reduzido de casos de abuso de vítimas do comércio sexual que são detetados, investigados,

julgados e punidos. O requisito da intenção dolosa para a criminalização parcial da compra de serviços sexuais

foi considerado problemático. Os autores do estudo propuseram a total criminalização da compra de serviços

sexuais.

No mais recente relatório sobre a aplicação da Diretiva 2011/36/UE – Resolução do Parlamento Europeu, de

10 de fevereiro de 2021, o Parlamento Europeu insta a Comissão, em cooperação com os Estados-Membros, a

analisar a forma como a procura de serviços sexuais estimula o tráfico de seres humanos. A Europol afirmou

que sendo a prostituição legal em alguns Estados-Membros torna mais fácil aos traficantes tirarem partido do

quadro jurídico e permite-lhes explorar crianças juntamente com vítimas adultas. Salienta ainda que é bastante

comum a utilização de empresas legais para encobrir as atividades de exploração. Conclui sublinhando que os

Estados-Membros têm a obrigação legal de desencorajar e reduzir a procura de todas as formas de exploração,

devendo constituir o objetivo principal dos esforços envidados em matéria de prevenção e de ação penal.

• Enquadramento internacional

No âmbito do dossier «Prostituição na Europa: Enquadramento internacional»1, elaborado pela Divisão de

1 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Assembleia da República (consultado em 1 de junho de 2021). Disponível

Página 18

II SÉRIE-A — NÚMERO 8

18

Informação Legislativa e Parlamentar (DILP), a pedido de um grupo parlamentar, onde se versa sobre a temática

da prostituição na sua vertente legal, é apresentado o contexto legal aplicável à matéria em apreço a 41 países

do espaço europeu, respetivamente, Albânia, Alemanha, Arménia, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia,

Dinamarca, Espanha, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Finlândia, França, Geórgia, Grécia, Holanda, Hungria,

Itália, Islândia, Kosovo, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Moldávia, Noruega, Polónia, Roménia, Sérvia,

Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido (Escócia, Inglaterra, Irlanda do Norte e País de Gales), República Checa e

Ucrânia.

ALEMANHA

O contexto legal atinente à matéria em apreço decorre do Gesetz zur Regelung der Rechtsverhältnisse der

Prostituierten (Prostitutionsgesetz – ProstG), de 20 de dezembro de 2001, diploma que a legaliza a prática da

prostituição, atento ao disposto nos artigos 185.º e 362.º do Código Civil (Bürgerliches Gesetzbuch).

A presente legislação verificou alterações decorrentes do Gesetz zum Schutz von in der Prostitution tätigen

Personen (Prostituiertenschutzgesetz – ProstSchG), de 21 de outubro de 2016, com o objetivo de promover a

melhoria da condição das pessoas na atividade de prostituição, nomeadamente ao nível de serviços de saúde,

de aconselhamento, apoio e da regulação da atividade de prostituição, regulação essa que incide também sobre

os estabelecimentos onde se desenvolvam a atividade da prostituição. Este diploma foi alterado pelo Gesetz zur

Verbesserung der strafrechtlichen Bekämpfung der Geldwäsche, de 9 de março de 2021, sendo o

acompanhamento dos efeitos da presente legislação, definidos nos termos do Prostitutions-Statistikverordnung

– ProstStatV, de 13 de junho de 2017.

O Bundesministerium für Familie, Senioren, Frauen und Jugend fornece um conjunto de informações diversas

relativas à aplicação do enquadramento legal em apreço.

FRANÇA

O contexto legal atinente à matéria em apreço decorre da Loi n.º 2016-444, du 23 avril visant à enforncer la

lutte contre le système prostitutionnel et à accompagner les personnes prostituées, relativo ao acompanhamento

de vítimas de prostituição. O diploma supracitado foi alterado posteriormente pela Loi n.º 2016-1917, du 29

décembre 2016. A Loi n.º 2016-444, du 23 avril, promove um conjunto de alterações a diversos diplomas, entre

os quais salientamos, respetivamente:

• O Code de l’action sociale et des families, onde destacamos as alterações respeitantes ao artigo L121-9

(no que se refere às garantias de proteção através dos denominados Centres d’hérgement et de

réinsertion social, constantes do artigo L345-1) e o artigo L451-1 (relativa à formação de profissionais que

atuem no âmbito de programas de saída do sistema de prostituição e a integração social e profissional de

vítimas de prostituição);

• Ao Code de l’entrée et du séjour des étrangers et du droit d’asile, nomeadamente no que concerne às

disposições aplicáveis a cidadãos estrangeiros beneficiários de medidas de proteção, constates do

Chapitre VI do Titre Ier do seu Livre II;

• Ao Code de procédure pénale, nomeadamente no que concerne às disposições constantes dos Titres XVII

e XIX;

• Ao Code de la construction et de l’habitation, nomeadamente no que concerne aos apoios ao nível de

habitação, atribuíveis às pessoas enquadradas nas alíneas g) e f) do artigo L441-1;

• Ao Code pénal, nomeadamente no que concerne às disposições aplicáveis na tipologia de atentados contra

a integridade da pessoa humana, constantes dos artigos 222-1 a 222-18-3, assim como das disposições

aplicáveis no seu article 225-22;

• Ao Code de la santé publique, nomeadamente no que concerne às disposições constantes do seu Titre

VIII, respeitante à matéria de redução de riscos relativos à prostituição; e

em https://ficheiros.parlamento.pt/DILP/Publicacoes/Temas/68.Prostituicao/68.pdf.

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• Ao Code du travail, nomeadamente no que concerne às disposições constantes do controlo de aplicação

da legislação do trabalho, enquadrado no quadro das competências inspetivas constantes do artigo

L8111-2.

A Loi n.º 2016-444, du 13 avril 2016 visa assim a prossecução de diversos objetivos, entre os quais a

promoção do reforço dos meios de combate ao tráfico de seres humanos para fins de exploração sexual, a

proteção das vítimas de prostituição e criação de uma possibilidade de saída do sistema da prostituição,

promovendo a integração social e profissional, para além de proceder à transposição parcial da Diretiva

2011/36/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011.

I d) Enquadramento parlamentar

Conforme consta na nota técnica da iniciativa em análise, verifica-se que, sobre a matéria em apreço, embora

em sentido divergente, se encontra pendente de apreciação em Plenário apenas a Petição n.º 18/XIV/2.ª –

«Legalização da Prostituição em Portugal e/ou Despenalização de Lenocínio», desde que este não seja por

coação.

Relativamente aos antecedentes parlamentares, verifica-se que sobre matéria idêntica ou conexa foram

apreciadas as seguintes iniciativas:

• Projeto de Resolução n.º 1019/XIII/2.ª (PEV) – «Combater o tráfico de seres humanos», que, em conjunto

com os Projetos de Resolução n.os 1292/XIII/3.ª (PSD) – «Recomenda ao Governo a elaboração e

implementação urgente de um novo Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico de Seres

Humanos» e 1333/XIII/3.ª (PAN) – «Recomenda ao Governo que proceda à célere elaboração e

implementação de um novo Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico de Seres Humanos»,

deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 77/2018, de 22 de março, que «Recomenda ao

Governo a elaboração e implementação urgente de um novo Plano Nacional de Prevenção e Combate ao

Tráfico de Seres Humanos;

• Petição n.º 276/XIII/2.ª – «Solicita a regulamentação da atividade de prostituição» –, cuja apreciação foi

concluída em 3 de outubro de 2018;

• Petição n.º 361/XIII/2.ª – «Solicita a legalização da prostituição em Portugal» –, cuja apreciação foi

concluída em 3 de outubro de 2018.

I e) Consultas e contributos

Em 2 de junho de 2021, a Comissão solicitou parecer escrito sobre esta iniciativa ao Conselho Superior da

Magistratura, ao Conselho Superior do Ministério Público e à Ordem dos Advogados.

Na presente data foram já recebidos os pareceres a que acima se alude, que se encontram disponíveis para

consulta na página da iniciativa2 na Internet.

O Conselho Superior do Ministério Público começa por referir que «o novo tipo penal que ora se pretende

introduzir visará tutelar a liberdade e a autodeterminação sexuais e, bem assim, na nossa interpretação, a

integridade psíquica, física e moral e, sobretudo, a própria dignidade humana». Acrescenta ainda que «resulta

que a prostituição está intimamente ligada ao tráfico de pessoas (para exploração sexual), em particular de

mulheres e crianças. Nesse sentido, a prostituição, em geral e na maioria dos casos, comportará situações de

evidente desigualdade – seja de género, seja económica ou, em geral, de oportunidades – bem como se poderá

traduzir, por definição e em potência, em ambiente incompatível com a dignidade e propiciador de situações de

violência». Há, porém, um reparo no douto parecer que merece particular atenção: «Assim, e embora na

incriminação do lenocínio, propriamente dito, esteja em causa a exploração económica de quem se prostitui, e

na compra de sexo (apenas) a troca monetária (ou em espécie), a verdade é que se trata (ainda) de

comportamento que, em última análise, é idóneo a fomentar o sistema de prostituição e a exploração económica

ao mesmo associada. O reconhecimento dos bens jurídicos tutelados e da sua dignidade, conforme se extrai do

2 Disponível em: Detalhe Iniciativa (parlamento.pt)

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citado aresto do Tribunal Constitucional, não significa que exista qualquer comando constitucional para que o

legislador ordinário incrimine este tipo de condutas, tratando-se de opção de política legislativa que, como vimos

e como revelam os estudos empíricos citados, terá como finalidade evitar ambiente propício à exploração.»

Por seu turno, a Ordem dos Advogados refere que os direitos e a saúde sexual e reprodutiva de todas as

mulheres devem ser respeitados, incluindo o direito ao seu corpo e à sua sexualidade, bem como o direito a ser

livre de qualquer tipo de coerção, discriminação e violência e que a prostituição é um problema de saúde, uma

vez que tem impactos negativos na saúde das pessoas que se prostituem, que apresentam uma maior

probabilidade de sofrer de traumas de saúde sexual, física e mental, de toxicodependência, alcoolismo e perda

de autoestima. Afirma-se ainda no douto Parecer que as pessoas que se prostituem são particularmente

vulneráveis a nível económico, social, físico, psicológico, emocional e familiar e que a exclusão social contribui

para uma maior vulnerabilidade das mulheres e raparigas menores desfavorecidas ao tráfico de seres humanos.

PARTE II – Opinião das relatoras

As relatoras signatárias do presente parecer reservam-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política

sobre o Projeto de Lei n.º 581/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) a qual é, de resto, de

«elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do RAR.

PARTE III – Conclusões

1 – A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues, tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República

o Projeto de Lei n.º 851/XIV/2.ª – «Procede à implementação do modelo da igualdade e reforça a proteção das

pessoas na prostituição».

2 – A iniciativa legislativa sub judice visa alterar alguns aspetos do enquadramento legal da prostituição em

Portugal.

3 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto

de Lei n.º 851/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues), reúne os requisitos regimentais e

constitucionais para ser discutido e votado em Plenário.

Palácio de São Bento, 27 de setembro de 2021.

As Deputadas relatoras: Elza Pais (PS) e Joana Sá Pereira (PS) — O Presidente da Comissão,Luís Marques

Guedes.

Nota: As parte I e III do parecer foram aprovadas por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH, na

reunião da Comissão de 29 de setembro de 2021.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 851/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues)

Procede à implementação do modelo da igualdade e reforça a proteção das pessoas na prostituição

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Data de admissão: 21 de maio de 2021.

Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Luís Silva (BIB), Belchior Lourenço (DILP), Sónia Milhano (DAPLEN), Ana Montanha e Vanessa Louro (DAC). Data: 2 de junho de 2021.

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

A presente iniciativa legislativa visa alterar alguns aspetos do enquadramento legal da prostituição em

Portugal, tendo por base uma visão que assenta num modelo designado por modelo da igualdade ou

abolicionista, por contraposição a um modelo conhecido como modelo regulacionista. A este propósito, na

exposição de motivos, são mencionados vários países (Suécia, Noruega, Islândia, Israel, França e Irlanda) que,

seguindo o referido modelo da igualdade, criminalizaram a compra de sexo, embora com distinções na tipificação

e na moldura penal a aplicar.

A proponente cita diversos estudos e relatórios que confluem na ideia de que a maior parte das pessoas em

situação de prostituição são mulheres com carências económicas associadas e que já sofreram algum tipo de

violência ou experiência abusiva nas suas vidas. Por esse motivo, subscreve o entendimento de que, na sua

maioria, as situações de prostituição não configuram verdadeiras expressões de liberdade, mas, ao invés,

reportam-se a contextos condicionados pelas circunstâncias, pelo que exigem a implementação de respostas

que permitam a estas pessoas sair do sistema da prostituição. A proponente evidencia também a ligação

existente entre o tráfico de seres humanos e a prostituição, referindo dados que revelam que a maior parte das

mulheres que se prostituem na União Europeia são mulheres migrantes.

Nestes termos, a proponente defende uma alteração legislativa assente nos seguintes vetores:

1 – Criminalização da compra de sexo, propondo para o efeito a alteração dos artigos 169.º1 e 175.º do

Código Penal, no sentido de prever a aplicação de pena de prisão até um ano, ou pena de multa, a «quem

solicitar, aceitar ou praticar ato sexual com pessoa na prostituição, em troca de contrapartida financeira ou

promessa desta, ou de benefício em espécie ou promessa de tal benefício», agravando-se a moldura penal a

aplicar se tais condutas forem praticadas com menor na prostituição, com a previsão de pena de prisão até três

anos ou pena de multa;

2 – Combate ao tráfico de seres humanos para exploração sexual, reforçando a proteção das pessoas

migrantes em situação de prostituição. Sobre este aspeto, o projeto de lei sub judice propõe a alteração dos

artigos 109.º, 111.º, 112.º e 115.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídicode entrada,

permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional. As alterações propostas vão no sentido

de conceder autorização de residência a cidadãos estrangeiros que tenham sido vítimas de infrações penais

1 Ligação para o artigo retirada do sítio na Internet do Diário da República Eletrónico (https://dre.pt/). Salvo indicação em contrário, todas as ligações para referências legislativas são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico.

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ligadas ao lenocínio, mesmo que tenham entrado ilegalmente no país e não preencham os requisitos para o

efeito da autorização. Prevê-se que essa autorização seja concedida, após prazo para reflexão, se o cidadão

colaborar com as autoridades na investigação do crime de lenocínio, por um lado, e, por outro, se demonstrar

empenho «no processo de saída do sistema da prostituição e na sua integração social e profissional». É também

proposto o alargamento do limite máximo do prazo de reflexão referido, que passa de 60 para 90 dias. A presente

iniciativa pretende ainda ver garantida, mesmo antes da concessão da autorização de residência, a subsistência

e o acesso a tratamento médico urgente e adequado da pessoa sinalizada como vítima do crime de lenocínio

que não disponha de recursos suficientes. Por último, quanto a esta matéria, é proposta a alteração da redação

do mencionado artigo 115.º, determinando-se que a autorização de residência pode, a todo o tempo, ser

cancelada se o portador reativar ativa e voluntariamente, por sua própria iniciativa, contactos com os presumíveis

autores do crime de lenocínio.

3 – Importância do tema do consentimento sexual nos programas de educação sexual implementados nas

escolas, propondo-se a alteração do artigo 2.º da Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, que estabelece o regime de

aplicação da educação sexual em meio escolar. A redação proposta adita uma nova alínea ao artigo,

consagrando que «o reconhecimento da indispensabilidade do consentimento para uma sexualidade vivida com

respeito e igualdade» deve constar no elenco das finalidades da educação sexual nas escolas.

4 – Reforço das respostas que permitam a saída da situação de prostituição. Neste ponto, o projeto de lei

em apreço (artigo 5.º) prevê o desenvolvimento pelo Governo de programas de saída do sistema da prostituição,

em articulação «com entidades governamentais, autarquias locais, organizações não governamentais e

associações, em particular associações de mulheres». Estes programas devem integrar componentes bastantes

diversificadas, desde o acompanhamento em termos médicos, ao auxílio nas necessidades básicas, como o

alojamento, até à promoção da integração e inserção social, com medidas de formação e apoio ao emprego.

Neste contexto, determina-se a criação no Orçamento do Estado de «um fundo destinado à implementação de

programas de saída do sistema de prostituição», prevendo-se que reverta para este fundo o produto da aplicação

das penas de multa resultantes da condenação pela prática do crime de lenocínio e compra de sexo.

Cumpre igualmente referir que a presente iniciativa legislativa determina que o Governo remete à Assembleia

da República, anualmente, um relatório sobre a aplicação da lei que vier a ser aprovada. Este instrumento

destina-se a avaliar o impacto do diploma no combate ao tráfico de seres humanos para exploração sexual,

devendo integrar dados estatísticos sobre criminalização do referido tráfico, do lenocínio e da compra de sexo.

O relatório em causa deverá também incluir um «balanço da implementação dos programas de saída do sistema

da prostituição» e uma avaliação do «impacto da legislação ao nível da mudança de atitudes e

comportamentos».

O projeto de lei em apreço compõe-se de sete artigos preambulares: O primeiro definidor do respetivo objeto,

o segundo, terceiro e quarto contendo, respetivamente, alterações ao Código Penal, à Lei n.º 23/2007, de 4 de

julho, e à Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, o quinto consagrando o desenvolvimento de programas de saída do

sistema da prostituição, o sexto determinando que o Governo remete anualmente à Assembleia da República

um relatório sobre a aplicação da lei e o último fixando o início da vigência da lei que vier a ser aprovada.

• Enquadramento jurídico nacional

A Constituição da República Portuguesa2 (Constituição), refere no seu artigo 1.º, que «Portugal é uma

República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na

construção de uma sociedade livre, justa e solidária». Miranda e Canotilho (2018)3 referem a este propósito que

«(u)ma sociedade que respeita a dignidade da pessoa humana é aquela em que as pessoas são reconhecidas

como polos de liberdade, são tratadas com justiça e apoiadas com solidariedade»4.

2 Todas as referências à Constituição são feitas para o site da Assembleia da República. 3 MIRANDA, Jorge; MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada. 2.ª ed. rev., atualizada e ampliada. Lisboa: Universidade Católica Editora, 2017-2020. ISBN 978-972-54-0541-3 (vol. 1), Págs. 61 e ss. 4 Numa alusão à prática de lenocínio, estes autores consideram que «a pessoa, sendo um fim em si mesmo, ‘não tem preço’, mas sim ‘dignidade’» (Constituição da República Portuguesa Anotada – Volume I; de Rui Medeiros e Jorge Miranda; Coimbra editora; Págs. 66 e ss), donde concluem pela não inconstitucionalidade da punição de lenocínio (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 144/2004) uma vez que «(…) numa ordem jurídica assente na dignidade da pessoa humana o legislador não está impedido de sancionar criminalmente as formas

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O quadro legal aplicável à matéria em apreço, enquadrou-se em fases anteriores em diplomas como o

Decreto-Lei n.º 44579, de 19 de setembro de 19625, o Decreto-Lei n.º 474/76, de 16 de junho6, a Resolução n.º

67/77, de 31 de março7, a Resolução n.º 259/79, de 16 de agosto8, a Lei n.º 3/84, de 24 de março9, assim como

a Resolução da Assembleia da República n.º 51/98, de 15 de outubro10, entre outros. A temática em apreço é

também abordada pelos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 144/2004, 196/2004, 303/04, 170/2006 e

396/07, para além do relevo para efeitos da matéria em apreço, das convenções ratificadas por Portugal, das

quais salientamos a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres11

(Lei n.º 23/80, de 26 de julho12), a Convenção para a Supressão do Tráfico de Pessoas e de Exploração da

Prostituição de Outrem (Resolução da Assembleia da República n.º 31/91, de 10 de outubro) e o Protocolo

Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança Relativo à Venda de Crianças, Prostituição Infantil e

Pornografia Infantil (Resolução da Assembleia da República n.º 16/2003, de 5 de março13) e a Convenção do

Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica

(Resolução da Assembleia da República n.º 4/2013, de 21 de janeiro), instrumento no qual se exorta o Estado

português à adoção de políticas públicas conducentes à erradicação da violência contra as mulheres e violência

doméstica, o que se traduz em medidas específicas em várias dimensões, explanadas nos documentos de

política pública nacionais, donde se destaca a Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-

2030, aprovada através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018, de 21 de maio14.

Já no quadro do Código Penal15, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março16, para além da

deslocação dos crimes sexuais do capítulo relativo aos crimes contra valores e interesses da vida em sociedade

para o título dos crimes contra a liberdade sexual, cumpre aludir ao artigo 169.º (lenocínio), cuja redação inicial

referia que «(q)uem, por meio de violência, ameaça grave, ardil ou manobra fraudulenta, levar outra pessoa à

prática em país estrangeiro da prostituição ou de atos sexuais de relevo, explorando a sua situação de abandono

ou de necessidade, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos». Esta redação foi posteriormente alterada pelo

artigo 2.º da Lei n.º 65/98, de 2 de setembro17, pela Lei n.º 99/2001, de 25 de agosto18 e pelo artigo 1.º da Lei

n.º 59/2007, de 4 de setembro19, donde decorre a redação atual, respetivamente:

de aproveitamento da vulnerabilidade de pessoas que sejam colocadas em situação de risco e/ou dependência global, como sucede (…) no lenocínio». Nestes termos, «(c)om a proibição do lenocínio pretende evitar-se que a exploração da intimidade de uma pessoa, e os inerentes riscos para a sua integridade pessoal, possam ser fonte de lucro para terceiros (…)». 5 «Proíbe o exercício da prostituição a partir de 1 de janeiro de 1963», revogado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro. 6 «Revoga o § 1.º do artigo 405.º (lenocínio) e altera a redação do § 1.º do artigo 461.º (crime de abertura de cartas ou papéis fechados) do Código Penal». 7 Constitui uma comissão, que funcionará junto do Ministério dos Assuntos Sociais, com vista à resolução do problema da prostituição. 8 Onde se releva a prostituição como reflexo de problemas como a dificuldade de emprego, habitação, transporte, insuficiências salariais, donde decorre o objetivo de criação de uma rede nacional de acolhimento que garanta a cobertura total do País nas ações de prevenção, apoio e resposta às situações de carência aguda devidamente comprovadas. 9 «Educação sexual e planeamento familiar». 10 Onde se recomenda ao governo a criação e implementação de programas especiais para grupos de risco enquadrando, neste conceito, as prostitutas. 11 Extensão ao território de Macau através do Aviso n.º 86/99, de 1 de julho. 12 Tendo posteriormente a sido ratificado o protocola opcional à referida Convenção, através da Resolução da Assembleia da República n.º 17/2002, de 8 de março. 13 «Aprova, para ratificação, o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança Relativo à Venda de Crianças, Prostituição Infantil e Pornografia Infantil, adotado em Nova Iorque em 25 de maio de 2000». 14 Ver a propósito Despacho n.º 8762/2018, de 14 de setembro. 15 Disponível no sítio de Internet do Diário da República Eletrónico. Todas as referências legislativas são feitas para este portal, salvo indicação em contrário. 16 Reviu o Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, que aprova o Código Penal, onde se releva os artigos n.os 215 (lenocínio) e 216.º (lenocínio agravado). 17 «Altera o Código penal», diploma alterado pelas Leis n.os 7/2000, de 27 de maio, 77/2001, de 13 de julho, 98/2001, de 25 de agosto, 99/2001, de 25 de agosto, 108/2001, de 28 de novembro, 10/2002, de 11 de fevereiro, e 52/2003, de 22 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, pelas Leis n.os 11/2004, de 27 de março, 31/2004, de 22 de julho, 5/2006, de 23 de fevereiro, 59/2007, de 4 de setembro, 19/2013, de 21 de fevereiro, 60/2013, de 23 de agosto, 59/2014, de 26 de agosto, 83/2015, de 5 de agosto, 103/2015, de 24 de agosto, e 16/2018, de 27 de março. 18 «Nona alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º 6/84, de 11 de maio, pelos Decretos-Leis n.os 132/93, de 23 de abril, e 48/95, de 15 de março, e pelas Leis n.os 65/98, de 2 de setembro, 7/2000, de 27 de maio, 77/2001, de 13 de julho, e 97/2001 e 98/2001, ambas de 25 agosto», diploma alterado pelas Leis n.os 59/2007, de 4 de setembro, 83/2015, de 5 de agosto, e 103/2015, de 24 de agosto. 19 «Vigésima terceira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro», diploma retificado pela Declaração de Retificação n.º 102/2007, de 31 de outubro, e alterado pelas Leis n.os 61/2008, de 31 de outubro, 17/2009, de 6 de maio, 32/2010, de 2 de setembro, 40/2010, de 3 de setembro, 56/2011, de 15 de novembro, 19/2013, de 21 de fevereiro, 60/2013, de 23 de agosto, 59/2014, de 26 de agosto, 30/2015, de 22 de abril, 83/2015, de 5 de agosto, 103/2015, de 24 de agosto, 39/2016, de 19 de dezembro, 8/2017, de 3 de março, 30/2017, de 30 de maio, 83/2017, de 18 de agosto, 94/2017, de 23 de agosto, 16/2018, de 27 de março, 44/2018, de 9 de agosto, 101/2019, de 6 de setembro, 102/2019, de 6 de setembro, 39/2020, de 18 de agosto, 40/2020, de 18 de agosto, e 58/2020, de 31 de agosto.

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«Artigo 169.º

Lenocínio

1 – Quem, profissionalmente ou com intenção lucrativa, fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra

pessoa de prostituição é punido com pena de prisão de seis meses a cinco anos.

2 – Se o agente cometer o crime previsto no número anterior:

a) Por meio de violência ou ameaça grave;

b) Através de ardil ou manobra fraudulenta;

c) Com abuso de autoridade resultante de uma relação familiar, de tutela ou curatela, ou de dependência

hierárquica, económica ou de trabalho; ou

d) Aproveitando-se de incapacidade psíquica ou de situação de especial vulnerabilidade da vítima;

é punido com pena de prisão de um a oito anos.»

No âmbito dos crimes contra a autodeterminação sexual, o artigo 175.º (Lenocínio de menores) do Código

Penal, cuja redação inicial referia que «(q)uem, sendo maior, praticar atos homossexuais de relevo com menor

entre 14 e 16 anos, ou levar a que eles sejam por este praticados com outrem, é punido com pena de prisão até

2 anos ou com pena de multa até 240 dias». Esta redação foi posteriormente alterada pelo artigo 2.º da Lei n.º

65/98, de 2 de setembro, pelo artigo 1.º da Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, e pelo artigo 2.º da Lei n.º

103/2015, de 24 de agosto, de onde decorre a redação atual, respetivamente:

«Artigo 175.º

Lenocínio de menores

1 – Quem fomentar, favorecer ou facilitar o exercício da prostituição de menor ou aliciar menor para esse fim

é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

2 – Se o agente cometer o crime previsto no número anterior:

a) Por meio de violência ou ameaça grave;

b) Através de ardil ou manobra fraudulenta;

c) Com abuso de autoridade resultante de uma relação familiar, de tutela ou curatela, ou de dependência

hierárquica, económica ou de trabalho;

d) Atuando profissionalmente ou com intenção lucrativa; ou

e) Aproveitando-se de incapacidade psíquica ou de situação de especial vulnerabilidade da vítima;

é punido com pena de prisão de dois a dez anos.»

A iniciativa legislativa em apreço alude ainda ao disposto na Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que «aprova o

regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional»,

nomeadamente ao nível dos seguintes artigos:

• Artigo 109.º (autorização de residência), cuja redação inicial foi alterada pelo artigo 6.º da Lei n.º 29/2012,

de 8 de outubro;

• Artigo 111.º (prazo de reflexão), cuja redação inicial foi alterada pelo artigo 6.º da Lei n.º 29/2012, de 8 de

outubro;

• Artigo 112.º (direitos da vítima antes da concessão da autorização de residência), cuja redação inicial foi

alterada pelo artigo 2.º da Lei n.º 29/2012, de 8 de outubro; e

• Artigo 115.º (cancelamento da autorização de residência), cuja redação inicial foi alterada pelo artigo 6.º da

Lei n.º 29/2012, de 8 de outubro.

Os diplomas abordados referem ainda a Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, que «estabelece o regime de

aplicação da educação sexual em meio escolar», que identifica no seu artigo 2.º as finalidades da educação

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sexual. Este diploma encontra-se regulamentado pela Portaria n.º 196-A/2010, de 9 de abril20.

A Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género21, na sua publicação «Tráfico de mulheres em Portugal

para fins de exploração sexual22» apresenta um conjunto relevante de informações atinentes à matéria em

apreço, nomeadamente ao nível do desenvolvimento legal, dos instrumentos normativos relevantes para a

proteção das vítimas (onde se destaca Lei n.º 61/91, de 13 de agosto23), da caracterização do fenómeno de

tráfico e prostituição e das respostas da sociedade civil às mulheres vítimas de tráfico sexual.

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verifica-se que, sobre a matéria em apreço,

embora em sentido divergente, se encontra pendente de apreciação em Plenário apenas a Petição n.º 18/XIV/2.ª 24 – «Legalização da Prostituição em Portugal e/ou Despenalização de Lenocínio», desde que este não seja por

coação.

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

Consultada a mesma AP, foram identificados sobre a matéria em apreço ou matéria conexa, os seguintes

antecedentes parlamentares:

– Projeto de Resolução n.º 1019/XIII/2.ª (PEV) – «Combater o tráfico de seres humanos», que, em conjunto

com os Projetos de Resolução n.os 1292/XIII/3.ª (PSD) – «Recomenda ao Governo a elaboração e

implementação urgente de um novo Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico de Seres Humanos» e

1333/XIII/3.ª (PAN) – «Recomenda ao Governo que proceda à célere elaboração e implementação de um novo

Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico de Seres Humanos», deu origem à Resolução da

Assembleia da República n.º 77/2018, de 22 de março, que «Recomenda ao Governo a elaboração e

implementação urgente de um novo Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico de Seres Humanos»;

– Petição n.º 276/XIII/2.ª – «Solicita a regulamentação da atividade de prostituição» –, cuja apreciação foi

concluída em 3 de outubro de 2018;

– Petição n.º 361/XIII/2.ª – «Solicita a legalização da prostituição em Portugal» –, cuja apreciação foi

concluída em 3 de outubro de 2018.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada pela Deputada não inscrita Cristina Rodrigues ao abrigo e nos

termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição25 e da alínea b) do n.º 1 do artigo

4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (Regimento), que consagram o poder

de iniciativa da lei.

Assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do Regimento,

encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto

principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, pelo que a iniciativa cumpre os requisitos formais

20 «Regulamenta a Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, que estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar». 21 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (consultado em 1 de junho de 2021). Disponível em https://www.cig.gov.pt/. 22 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (consultado em 1 de junho de 2021). Disponível em https://www.cig.gov.pt/siic/pdf/2014/estudotraficomulheresptfinsexploracaosexual.pdf. 23 «Garante proteção adequada às mulheres vítimas de violência». 24 Ligação para a petição retirada do sítio na Internet da Assembleia da República (https://www.parlamento.pt). Salvo indicação em contrário, todas as ligações para iniciativas pendentes ou antecedentes parlamentares são feitas para o sítio na Internet da Assembleia da República. 25 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República.

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previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Respeita igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento,

uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o

sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.

Assinala-se que o n.º 2 do artigo 167.º da Constituição impede a apresentação de iniciativas que envolvam,

no ano económico em curso, um aumento das despesas previstas no Orçamento do Estado (limite igualmente

previsto no n.º 2 do artigo 120.º do Regimento, designado por norma-travão). Ao prever, no artigo 5.º, um

conjunto de apoios e a criação no Orçamento do Estado de «um fundo destinado à implementação de programas

de saída do sistema de prostituição, com o objetivo de garantir a concretização dos apoios previstos», a iniciativa

parece poder implicar encargos orçamentais. Contudo, o limite imposto pela norma-travão foi acautelado pela

proponente, na medida em que o artigo 7.º do articulado difere a entrada em vigor do disposto no artigo 5.º para

o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.

Refira-se ainda que a matéria objeto da presente iniciativa se enquadra na alínea c) do n.º 1 do artigo 165.º

da Constituição, constituindo, assim, matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da

República.

O projeto de lei em apreciação deu entrada em 21 de maio de 2021, data em que foi admitido e em que, por

despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, baixou, para discussão na generalidade, à

Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª), com conexão com a Comissão

de Educação, Ciência, Juventude e Desporto (8.ª). Foi anunciado em reunião plenária no dia 26 de maio.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

A lei formulário26 estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos

diplomas que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa, pelo que deverá ser tida em conta

no decurso do processo da especialidade na Comissão e aquando da redação final.

Desde logo, cabe assinalar que o título do projeto de lei em apreciação – «Procede à implementação do

modelo da igualdade e reforça a proteção das pessoas na prostituição» – traduz sinteticamente o seu objeto,

mostrando-se em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da referida lei, embora, em caso de

aprovação, deva ser aperfeiçoado.

Com efeito, na redação do título deve ter-se em consideração que, como indicado no artigo 1.º do articulado,

a iniciativa altera:

➢ O Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro27;

➢ A Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e

afastamento de estrangeiros do território nacional; e

➢ A Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, que estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio

escolar.

Ora, as regras de legística formal recomendam que «o título de um ato de alteração deve identificar o diploma

alterado»28, por questões informativas e no sentido de tornar clara a matéria objeto do ato normativo. Assim, em

caso de aprovação da iniciativa, sugere-se a seguinte alteração ao título:

«Aplica o modelo da igualdade e reforça a proteção das pessoas na prostituição, alterando o Código Penal

e as Leis n.os 23/2007, de 4 de julho, e 60/2009, de 6 de agosto».

O n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário determina que «Os diplomas que alterem outros devem indicar o número

de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles diplomas que

26 A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas. 27 O Código Penal foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro. Embora o Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, lhe tenha introduzido uma profunda revisão, indica no seu artigo 1.º que «O Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, é revisto e publicado em anexo». 28 DUARTE, David (et al.) – Legistica: Perspectivas sobre a concepção e redacção de actos normativos. Coimbra: Almedina, 2002. P. 201.

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procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas».

A presente iniciativa identifica os diplomas que introduziram alterações ao Código Penal e à Lei n.º 23/2007,

de 4 de julho (a Lei n.º 60/2009, de 6 de agosto, ainda não sofreu qualquer modificação, consistindo a presente,

em caso de aprovação, na sua primeira alteração), dando deste modo cumprimento ao disposto na segunda

parte do n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário. Deverá ainda fazer menção ao número de ordem da alteração

introduzida às duas leis mencionadas, conforme determina a primeira parte da norma.

No que se refere ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, atendendo ao

elevado número de alterações sofridas e procurando manter uma redação simples e concisa, parece-nos mais

seguro e eficaz não elencar os diplomas que procederam a modificações anteriores nem o número de ordem da

alteração, por motivos de segurança jurídica. Apesar de tal exigência decorrer do referido n.º 1 do artigo 6.º, há

que ter em conta que a lei formulário foi aprovada e publicada num contexto de ausência de um Diário da

República Eletrónico, sendo que, neste momento, o mesmo é acessível universal e gratuitamente.

Cumpre ainda referir que as informações relativas ao número de ordem de alteração, assim como aos

diplomas alteradores devem ficar a constar, preferencialmente, no artigo relativo ao objeto.

Em caso de aprovação, a iniciativa em apreço revestirá a forma de lei, sendo objeto de publicação na 1.ª

série do Diário da República nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

No que respeita à entrada em vigor, o artigo 7.º do projeto de lei estabelece que a mesma ocorra no prazo

de 30 dias a contar da sua publicação (n.º 1), exceto no que se refere ao disposto no artigo 5.º, que deverá

entrar em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação (n.º 2), de forma a acautelar o

cumprimento do limite imposto pela norma-travão, conforme referido supra. Deste modo, mostra-se observado

o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que determina que: «Os atos legislativos e os outros atos de

conteúdo genérico entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início da vigência

verificar-se no próprio dia da publicação».

Na presente fase do processo legislativo a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em

face da lei formulário.

• Regulamentação ou outras obrigações legais

De acordo com o disposto no artigo 6.º da iniciativa, o Governo deverá apresentar ao Parlamento,

anualmente, um relatório sobre a aplicação da presente lei, o qual deverá incluir informação sobre o impacto da

legislação no combate ao tráfico de seres humanos para exploração sexual, dados estatísticos relativos à

criminalização do tráfico de seres humanos, do lenocínio e da compra de sexo, um balanço da implementação

dos programas de saída do sistema da prostituição e o impacto da legislação ao nível da mudança de atitudes

e comportamentos.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento no plano da União Europeia

A União funda-se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade,

do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a

minorias. Estes valores são comuns aos Estados-Membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a

não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres (artigo 2.º do

Tratado da União Europeia29).

De acordo com o artigo 83.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia30 o Parlamento Europeu (PE)

e o Conselho podem estabelecer regras mínimas relativas à definição das infrações penais e das sanções em

domínios de criminalidade particularmente grave com dimensão transfronteiriça que resulte da natureza ou das

incidências dessas infrações, ou ainda da especial necessidade de as combater, assente em bases comuns.

Entre os domínios discriminados neste artigo, encontra-se, nomeadamente o tráfico de seres humanos e

29 https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:9e8d52e1-2c70-11e6-b497-01aa75ed71a1.0019.01/DOC_2&format=PDF. 30 https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:9e8d52e1-2c70-11e6-b497-01aa75ed71a1.0019.01/DOC_3&format=PDF.

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exploração sexual de mulheres e crianças.

Na Resolução do PE, de 26 de fevereiro de 2014, sobre a exploração sexual e a prostituição e o seu impacto

na igualdade dos géneros31 o PE não só contextualiza o fenómeno, as causas que potenciam a prostituição, os

grupos mais vulneráveis bem como tece um conjunto de apelos e recomendações aos Estados-Membros bem

como à Comissão Europeia para abordar este problema e proteger as vítimas.

Considera que uma forma de combater o tráfico de mulheres e raparigas menores para exploração sexual e

de promover a igualdade dos géneros é o modelo aplicado na Suécia, Islândia e Noruega (o chamado modelo

nórdico) e, atualmente, a ser analisado em vários países europeus, onde é a compra de serviços sexuais que

constitui um ato criminoso e não os serviços prestados pelas pessoas que se prostituem.

Acredita que considerar a prostituição como «trabalho sexual» legal, despenalizar a indústria do sexo em

geral e legalizar o lenocínio não constitui uma solução para proteger as mulheres e raparigas menores

vulneráveis da violência e da exploração, produzindo antes um efeito contrário, na medida em que as expõe a

um nível mais elevado de perigo de violência e promove, ao mesmo tempo, o crescimento dos mercados da

prostituição, o que, por sua vez, se traduz num maior número de casos de abuso de mulheres e raparigas

menores.

Nesta resolução o PE reconhece também que a prostituição, a prostituição forçada e a exploração sexual

são questões de género e violações da dignidade humana, contrárias aos princípios dos direitos humanos, entre

os quais a igualdade de género e, por conseguinte, contrárias aos princípios da Carta dos Direitos Fundamentais

da União Europeia 32, incluindo o objetivo e o princípio de igualdade dos géneros33.

A resolução refere ainda que o tráfico de pessoas, em particular de mulheres e crianças, para exploração

sexual tem aumentado a nível global, impulsionado pelo crescimento do crime organizado e respetivos lucros.

Assim a União Europeia (UE) tem vindo a desenvolver um quadro jurídico e político abrangente destinado a

fazer face a este fenómeno, nomeadamente através da Diretiva 2011/36/UE relativa à prevenção e luta contra

o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas34 e da Estratégia da UE em matéria de luta contra o tráfico

de seres humanos 2021 – 202535, centrada na prevenção desta forma de criminalidade, na repressão dos

traficantes, bem como na proteção e no empoderamento das vítimas.

ADiretiva 2011/36/UE estabelece disposições mínimas comuns para determinar infrações no âmbito do

tráfico de seres humanos e punir os infratores, prevendo medidas para prevenir mais eficazmente este fenómeno

e reforçar a proteção das vítimas, incitando os Estados-Membros tomarem medidas para desencorajar a procura

que alimenta o tráfico; lançar campanhas de sensibilização e dar formação aos funcionários, permitindo-lhes

identificar e lidar com as vítimas e potenciais vítimas de tráfico.

O artigo 2.º, n.º 1, da diretiva discrimina os atos intencionais que devem ser punidos pelos Estados-Membros

e o n.º 2 define a posição de vulnerabilidade como uma situação em que a pessoa não tem outra alternativa,

real ou aceitável, que não seja submeter-se ao abuso em causa.

Cumpre referir a Resolução do PE, de 12 de maio de 2016, sobre a implementação da Diretiva 2011/36/UE36

que exorta os Estados-Membros a aplicarem pesadas sanções penais aos crimes de tráfico de seres humanos,

escravatura moderna e exploração e a consideram crime a utilização ciente dos serviços de vítimas de tráfico,

nomeadamente para fins de prostituição, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração

sexual.

A resolução apela a uma melhor implementação e monitorização do artigo 8.º da diretiva, de modo a garantir

que não sejam instaurados processos penais nem aplicadas penas ou sanções às vítimas de tráfico, incluindo

aqui as pessoas que são forçadas a prostituírem-se e convida os Estados-Membros a elaborarem estratégias

específicas para reduzir a procura do tráfico para fins de exploração sexual, instando a Comissão a examinar

mais aprofundadamente eventuais ligações entre a procura de serviços sexuais e o tráfico de seres humanos.

O Parlamento Europeu acredita de que a diminuição da procura pode ser alcançada por intermédio de

legislação que criminalize aqueles que compram os serviços sexuais das vítimas de tráfico de seres humanos e

31 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52014IP0162 32 https://www.europarl.europa.eu/charter/pdf/text_pt.pdf. 33 Ver também Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de março de 2015, sobre os progressos registados na União Europeia, em 2013, relativamente à igualdade de género disponível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52015IP0050 &qid=1622482833081. 34 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=celex%3A32011L0036. 35 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52021DC0171&qid=1619522320717. 36 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52016IP0227&qid=1622482833081.

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insta os Estados-Membros a incluírem o casamento forçado como uma forma de tráfico de seres humanos se

contiver uma vertente de exploração da vítima. Acrescenta, ainda que o casamento forçado é muitas vezes o

objetivo final do tráfico. Exorta os Estados-Membros a preverem refúgios adequados para o acolhimento destas

vítimas e solicita à Comissão que reforce o intercâmbio de boas práticas neste domínio.

No relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho que avalia o impacto na prevenção do

tráfico de seres humanos do direito nacional em vigor que criminaliza a utilização de serviços que são objeto da

exploração do tráfico de seres humanos, em conformidade com o artigo 23.°, n.° 2, da Diretiva 2011/36/UE

[COM(2016) 719 final]37 refere-se que um número limitado de Estados-Membros comunicou ter encomendado

avaliações das disposições legislativas na matéria ou estudos pertinentes. Reporta um relatório publicado em

2010 pela Suécia sobre a proibição da compra de serviços sexuais, que entre as suas principais conclusões

destacou que a prostituição de rua foi reduzida para metade; que a Internet se converteu numa nova plataforma

para a prostituição; que a interdição da compra de serviços sexuais serviu para lutar contra a criminalidade

organizada; e que o apoio público à interdição aumentou. A Suécia prevê também um inquérito anti tráfico de

seres humanos, que avaliará a aplicação da disposição penal neste âmbito e examinará a forma como as

autoridades com funções coercivas investigam e tratam as questões de tráfico de seres humanos.

Menciona, também um estudo encomendado pela Finlândia, na sequência de um acórdão decisivo do

Supremo Tribunal «criminalização parcial» da compra de serviços sexuais a prostitutas por conta de outrem e

vítimas do tráfico de seres humanos que concluiu que o principal problema na aplicação da lei tem a ver com o

número muito reduzido de casos de abuso de vítimas do comércio sexual que são detetados, investigados,

julgados e punidos. O requisito da intenção dolosa para a criminalização parcial da compra de serviços sexuais

foi considerado problemático. Os autores do estudo propuseram a total criminalização da compra de serviços

sexuais.

No mais recente Relatório sobre a Aplicação da Diretiva 2011/36/UE – Resolução do Parlamento Europeu,

de 10 de fevereiro de 202138 o PE insta a Comissão, em cooperação com os Estados-Membros, a analisar a

forma como a procura de serviços sexuais estimula o tráfico de seres humanos. A Europol afirmou que sendo a

prostituição legal em alguns Estados-Membros torna mais fácil aos traficantes tirarem partido do quadro jurídico

e permite-lhes explorar crianças juntamente com vítimas adultas. Salienta ainda que é bastante comum a

utilização de empresas legais para encobrir as atividades de exploração. Conclui sublinhando que os Estados-

Membros têm a obrigação legal de desencorajar e reduzir a procura de todas as formas de exploração, devendo

constituir o objetivo principal dos esforços envidados em matéria de prevenção e de ação penal.

• Enquadramento internacional

No âmbito do Dossier «Prostituição na Europa: enquadramento internacional39», elaborado pela Divisão de

Informação Legislativa e Parlamentar (DILP), a pedido de um grupo parlamentar, onde se versa sobre a temática

da prostituição na sua vertente legal, é apresentado o contexto legal aplicável à matéria em apreço a 41 países

do espaço europeu, respetivamente, Albânia, Alemanha, Arménia, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia,

Dinamarca, Espanha, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Finlândia, França, Geórgia, Grécia, Holanda, Hungria,

Itália, Islândia, Kosovo, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Moldávia, Noruega, Polónia, Roménia, Sérvia,

Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido (Escócia, Inglaterra, Irlanda do Norte e País de Gales), República Checa e

Ucrânia.

Países europeus

A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: Alemanha

e França.

37 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52016DC0719&qid=1622323325216. 38 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/A-9-2021-0011_PT.pdf. 39 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Assembleia da República. (Consultado em 1 de junho de 2021). Disponível em https://ficheiros.parlamento.pt/DILP/Publicacoes/Temas/68.Prostituicao/68.pdf.

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ALEMANHA

O contexto legal atinente à matéria em apreço decorre do Gesetz zur Regelung der Rechtsverhältnisse der

Prostituierten (Prostitutionsgesetz – ProstG)40, de 20 de dezembro de 2001, diploma que a legaliza a prática da

prostituição, atento ao disposto nos artigos 185.º e 362.º do Código Civil (Bürgerliches Gesetzbuch).

A presente legislação verificou alterações decorrentes do Gesetz zum Schutz von in der Prostitution tätigen

Personen (Prostituiertenschutzgesetz – ProstSchG), de 21 de outubro de 2016, com o objetivo de promover a

melhoria da condição das pessoas na atividade de prostituição, nomeadamente ao nível de serviços de saúde,

de aconselhamento, apoio e da regulação da atividade de prostituição, regulação essa que incide também sobre

os estabelecimentos onde se desenvolvam a atividade da prostituição. Este diploma foi alterado pelo Gesetz zur

Verbesserung der strafrechtlichen Bekämpfung der Geldwäsche41, de 9 de março de 2021, sendo o

acompanhamento dos efeitos da presente legislação, definidos nos termos do Prostitutions-Statistikverordnung

– ProstStatV, de 13 de junho de 2017.

O Bundesministerium für Familie, Senioren, Frauen und Jugend42 fornece um conjunto de informações

diversas43 relativas à aplicação do enquadramento legal em apreço.

FRANÇA

O contexto legal atinente à matéria em apreço decorre da Loi n.º 2016-444, du 23 avril44visant à enforncer

la lutte contre le système prostitutionnel et à accompagner les personnes prostituées, relativo ao

acompanhamento de vítimas de prostituição. O diploma supracitado foi alterado posteriormente pela Loi n.º

2016-1917, du 29 décembre 2016. A Loi n.º 2016-444, du 23 avril, promove um conjunto de alterações a diversos

diplomas, entre os quais salientamos, respetivamente:

• O Code de l’action sociale et des families, onde destacamos as alterações respeitantes ao artigo L121-9

(no que se refere às garantias de proteção através dos denominados Centres d’hérgement et de

réinsertion social45, constantes do artigo L345-1) e o artigo L451-1 (relativa à formação de profissionais

que atuem no âmbito de programas de saída do sistema de prostituição e a integração social e profissional

de vítimas de prostituição);

• Ao Code de l’entrée et du séjour des étrangers et du droit d’asile, nomeadamente no que concerne às

disposições aplicáveis a cidadãos estrangeiros beneficiários de medidas de proteção, constates do

Chapitre VI46 do Titre Ier do seu Livre II;

• Ao Code de procédure pénale47, nomeadamente no que concerne às disposições constantes dos Titres

XVII48 e XIX49;

• Ao Code de la construction et de l’habitation, nomeadamente no que concerne aos apoios ao nível de

40 Diplomas consolidados retirado do portal oficial www.gesetze-im-internet.de. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas referentes à Alemanha são feitas para o referido portal, salvo referência em contrário. 41 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Bundesgesetzblatt Online. (Consultado em 1 de junho de 2021). Disponível em https://www.bgbl.de/xaver/bgbl/start.xav?startbk=Bundesanzeiger_BGBl&start=//*[@attr_id=%27bgbl121s0327.pdf%27]#__ bgbl__%2F%2F*%5B%40attr_id%3D%27bgbl121s0327.pdf%27%5D__1622533519401. 42 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do governo alemão. (Consultado em 1 de junho de 2021). Disponível em WWW URL< https://www.bmfsfj.de/bmfsfj. 43 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do governo alemão. (Consultado em 1 de junho de 2021). Disponível em https://www.bmfsfj.de/bmfsfj/themen/gleichstellung/frauen-vor-gewalt-schuetzen/prostituiertenschutzgesetz/fragen-und-antworten-zum-prostituiertenschutzgesetz--117364. 44 Diplomas consolidados retirado do portal oficial legifrance.fr. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas referentes a França são feitas para o referido portal, salvo referência em contrário. 45 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do governo francês. (Consultado em 1 de junho de 2021). Disponível em https://www.cnle.gouv.fr/les-centres-d-hebergement-et-de.html. 46 «Dispositions applicables aux étrangers ayant déposé plainte pour certaines infractions, témoigné dans une procédure pénale ou bénéficiant de mesures de protection». 47 Ver a propósito a «Circulaire du 18 avril 2016de présentation des dispositions de droit pénal et de procédure pénale de la loi n° 2016-444 du 13 avril 2016 visant à renforcer la lutte contre le système prostitutionnel et à accompagner les personnes prostituées». 48 «De la poursuite, de l'instruction et du jugement des infractions en matière de traite des êtres humains, de proxénétisme ou de recours à la prostitution des mineurs». 49 «De la procédure applicable aux infractions de nature sexuelle et de la protection des mineurs victimes».

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habitação, atribuíveis às pessoas enquadradas nas alíneas g)50 e f)51 do artigo L441-1;

• Ao Code pénal, nomeadamente no que concerne às disposições aplicáveis na tipologia de atentados contra

a integridade da pessoa humana, constantes dos artigos 222-1 a 222-18-352, assim como das disposições

aplicáveis no seu article 225-22;

• Ao Code de la santé publique, nomeadamente no que concerne às disposições constantes do seu Titre

VIII53, respeitante à matéria de redução de riscos relativos à prostituição; e

• Ao Code du travail, nomeadamente no que concerne às disposições constantes do controlo de aplicação

da legislação do trabalho, enquadrado no quadro das competências inspetivas constantes do artigo

L8111-2.

A Loi n.º 2016-444, du 13 avril 2016, visa assim a prossecução de diversos objetivos, entre os quais a

promoção do reforço dos meios de combate ao tráfico de seres humanos para fins de exploração sexual, a

proteção das vítimas de prostituição e criação de uma possibilidade de saída do sistema da prostituição,

promovendo a integração social e profissional, para além de proceder à transposição parcial da Diretiva

2011/36/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 201154.

V. Consultas e contributos

• Consultas obrigatórias e facultativas

Em 26 de maio de 2021, a Comissão solicitou parecer escrito sobre esta iniciativa ao Conselho Superior da

Magistratura, ao Conselho Superior do Ministério Público, à Ordem dos Advogados, ao Alto Comissariado para

as Migrações e ao Observatório do Tráfico de Seres Humanos.

Todos os pareceres e contributos remetidos à Assembleia da República serão publicados na página da

iniciativa na Internet.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

O preenchimento, pelo proponente, da ficha de avaliação prévia de impacto de género da presente iniciativa,

em cumprimento do disposto na Lei n.º 4/2018, de 9 de fevereiro, devolve como resultado uma valoração neutra

do impacto de género.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. Sem

prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta fase do

processo legislativo, a presente iniciativa não nos suscita questões relacionadas com a utilização de linguagem

discriminatória.

50 «De personnes engagées dans le parcours de sortie de la prostitution et d'insertion sociale et professionnelle prévu à l'article L. 121-9 du code de l'action sociale et des familles». 51 «De personnes victimes de l'une des infractions de traite des êtres humains ou de proxénétisme prévues aux articles 225-4-1 à 225-4-6 et 225-5 à 225-10 du code pénal». 52 «Des atteintes volontaires à l'intégrité de la personne». Ver a propósito a «Décision 2018-761 QPC – 1er février 2019 – Association Médecins du monde et autres [Pénalisation des clients de personnes se livrant à la prostitution] – Conformité». 53 «Réduction des risques relatifs à la prostitution». 54 Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas, e que substitui a Decisão-Quadro 2002/629/JAI do Conselho.

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VII. Enquadramento bibliográfico

ALVES, Mafalda Cristina Leitão – O crime de lenocínio e o crime de tráfico de pessoas para fins de

exploração sexual no ordenamento jurídico português [Em linha]: Articulação de problemáticas. Coimbra:

[sn], 2017. [Consult. 28 maio 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134730&img=21756&save=true.

Resumo: «O estudo que iremos apresentar discorre sobre os seguintes crimes: lenocínio (artigo 169.º, n.º 1

e 2) e crime de tráfico de pessoas. Para a análise de qualquer conduta é importante uma primeira abordagem

(Parte I) acerca do conceito material e dos bens jurídicos jurídico-penais.

Na Parte II analisaremos o crime de lenocínio (simples e qualificado) em Portugal percorrendo o seu percurso

histórico e fazendo algumas considerações pertinentes sobre os elementos e características do mesmo. (…)

Posteriormente, na Parte III procederemos a análise do crime de tráfico de pessoas, em especial, para fins

de exploração sexual (resenha histórica, criação de legislação específicas e elementos e características)

Por fim, na Parte IV relacionaremos os vários crimes em análise entre si e estes com o fenómeno da

prostituição interligando, assim, o crime de tráfico de pessoas com a prostituição voluntária, a prostituição

voluntária mas em condições análogas à da exploração sexual e consequente concurso de crimes (lenocínio

qualificado e tráfico de pessoas para fins de exploração sexual) e, ainda, a descriminalização do lenocínio

simples e a regulamentação da prostituição em Portugal.»

BINDEL, Julie – The pimping of prostitution [Em linha]: Abolishing the sex work myth. London: Palgrave

Macmillan, 2017. [Consult. 28 maio 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134743&img=21766&save=true.

ISBN 978-1-137-55890-9

Resumo: Nesta obra a autora procura desconstruir aquilo que ela considera o mito do trabalho sexual.

Segundo ela, a prostituição é uma violação dos direitos humanos contra as mulheres e raparigas. No entanto,

nem todos compartilham desse entendimento. Estamos agora numa encruzilhada, com uma série de países ao

redor do mundo sob pressão para remover todas as leis relativas ao comércio sexual (incluindo aquelas que

regem proxenetismo e propriedade de bordéis), ou para criminalizar a compra de sexo (conhecido como modelo

nórdico). O debate polarizado sobre o comércio do sexo, levado a cabo nas universidades, nos meios de

comunicação social, nos círculos feministas e organizações de direitos humanos chegou a um ponto crítico que

vai implicar tomadas de decisões difíceis.

Neste percurso pela prostituição a autora analisa, entre outros, os seguintes tópicos: o movimento

abolicionista; os direitos dos trabalhadores do sexo; o comércio sexual; a legalização dos trabalhadores do sexo;

o papel do homem; e os direitos humanos.

ESTUDO diagnóstico sobre as mulheres no sistema de prostituição em Lisboa [Em linha]: Policy

paper. [S.l.]: Exitprostitution, 2021. [Consult. 28 maio 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134740&img=21762&save=true.

Resumo: «Este estudo-diagnóstico sobre as mulheres no sistema de prostituição em Lisboa, enquadra-se no

plano de atividades da Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, mais concretamente, no âmbito

do projeto EXIT II – Direitos Humanos das Mulheres a não serem prostituídas, que tem como objetivos: Combater

o sistema de prostituição; Defender os direitos humanos das mulheres, designadamente o direito fundamental

a não serem prostituídas; Contribuir para a mudança de atitudes e comportamentos face ao sistema da

prostituição; Contribuir para a elaboração de propostas de medidas e serviços de apoio à saída desse sistema.»

FERREIRA, Luísa Margarida Lopes – A prostituição em Portugal [Em linha]: Reflexão acerca de uma

possível solução de regulamentação no ordenamento jurídico português. Coimbra: [sn], 2018. [Consult. 28

maio 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134746&img=21767&save=true.

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33

Resumo: «O fenómeno da prostituição sempre existiu, mas nem sempre foi objeto do mesmo tratamento

jurídico, variando este no tempo e no espaço.

Iniciamos este estudo com uma referência aos diversos ‘modelos’ de regulamentação adotados no diversos

Estados, referindo sucintamente as suas caraterísticas essenciais.

Seguimos percorrendo as diversas soluções jurídicas adotadas em Portugal desde 1838 até à atualidade,

refletindo acerca das mesmas e procurando as vantagens atribuídas a cada modelo já adotado.

Discorremos, depois, sobre o quadro legislativo nacional, nomeadamente o artigo 169.º, n.º 1 do Código

Penal, a Constituição da República Portuguesa e a idoneidade da atividade da prostituição para ser objeto de

um contrato.»

Tendo em conta este tema, a autora desenvolve ainda os seguintes tópicos: a posição da Comissão dos

Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros; o conceito de prostituição; e a missão do estado tanto na criação

de condições de saída, como na criação de condições para quem pretende continuar a exercer a atividade da

prostituição.

A obra termina apresentando dados concretos relativos à população que se prostitui em Portugal, na

Alemanha, na Holanda, na Nova Zelândia, na Noruega e na Suécia e ao impacto da legalização no fluxo de

tráfico de seres humanos.

MATTHEWS, Roger – Prostitution, politics & policy [Em linha]. Oxford: Routledge-Cavendish, 2008.

[Consult. 28 maio 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134741&img=21764&save=true

ISBN 978-0-203-93087-8.

Resumo: Este livro faz uma análise da prostituição que é o culminar de 20 anos de pesquisa do seu autor.

Entre as posições radicais mais liberais que pretendem normalizar a prostituição, vendo-a como uma forma

legítima de trabalho, e as posições mais opostas a estas, que defendem que a prostituição envolve violência

contra as mulheres e pretendem a sua total eliminação, o autor procura apresentar um caminho que constituía

uma resposta teórica e política à prostituição, que seja tanto crítica como realista. Com este propósito vai

desenvolver ao longo da obra os seguintes tópicos: porque é que a prostituição se tornou um assunto?; mitos

associados à prostituição; vulnerabilidade e vitimização na prostituição; caminhos que levam à prostituição; sair

da prostituição; a política da prostituição; regulação da prostituição.

PORTUGAL. Assembleia da República. DILP – Prostituição na Europa [Em linha]: Enquadramento

internacional. Lisboa: Assembleia da República. DILP, 2019. [Consult. 28 maio 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=129331&img=14784&save=true.

Resumo: «O presente estudo, feito a pedido de um grupo parlamentar, versa sobre a temática da prostituição

na sua vertente legal e pretende dotar o leitor de uma visão global relativamente às diversas soluções jurídicas

utilizadas nos países da Europa (…).

As soluções na Europa encontram-se bastante divididas. Enquanto que apenas em 8 países a prostituição é

legal e está devidamente regulamentada, como na Alemanha, Áustria ou Holanda noutros existe um vazio legal

onde a prostituição não é nem punida nem está regulamentada como o caso da Espanha, Itália ou República

Checa. Por outro lado, existem igualmente países que proíbem a prostituição como a Croácia, a Moldávia ou a

Ucrânia. Por fim, os países de ‘modelo nórdico’, iniciado na Suécia em 1999, têm vindo a crescer na sua

incidência em países e este modelo já é aplicado em países como a França, Islândia, Noruega ou Suécia.»

QUESTIAUX, Lorraine – La prostitution dans l'union européenne: Chorique d'une abolition annoncée. Revue

de l'Union européenne. Paris. ISSN 0035-2616. N.º 594 (jan. 2016), p. 30-36. Cota: RE-33.

Resumo: Uma resolução do Parlamento Europeu, uma norma simples sem efeito vinculativo, prepara-se para

derrubar um sistema de pensamento, derrotar interesses económicos e acabar com aquilo que alguns gostam

de chamam de «a profissão mais velha do mundo»? Segundo o autor, a Resolução Honeyball, de 24 de fevereiro

de 2014, vai ter um grande impacto sobre as tradições liberais no direito da União que veem a prostituição como

uma simples atividade econômica. Não só o alcance interpretativo das resoluções, mas sobretudo a entrada em

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vigor da Carta dos Direitos Fundamentais, permite refletir sobre este resultado. Numa altura em que se coloca

a abolição da prostituição na maior parte dos países da União Europeia, este artigo interroga-se sobre a resposta

que é passível de vir a ser adotada pelo direito europeu, doravante garante da dignidade humana.

SANTOS, Boaventura de Sousa [et al.] – Tráfico de mulheres em Portugal para fins de exploração sexual

[Em linha]. Lisboa: Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2008. [Consult. 28 maio 2021].

Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=134744&img=21770&save=true.

Resumo: «O tráfico para fins de exploração sexual constitui uma das mais sérias violações dos direitos das

mulheres. Envolve sobretudo mulheres jovens que, na ilusão de se libertarem da situação de pobreza em que

se encontram, rumam a outras terras, outros países, outros continentes. Muitas são enganadas e vão ao

encontro de condições muito diferentes das que lhes foram descritas. Outras são aliciadas com promessas

fraudulentas de emprego. Todas são exploradas e veem a sua liberdade e dignidade pessoal ameaçadas. A

situação a que estas mulheres foram condenadas deve-nos levar a questionar a nossa cultura do social e a

refletir sobre o papel que todas e todos nós devemos exercer numa cidadania ativa, participativa e promotora

da dignidade humana.»

———

PROJETO DE LEI N.º 885/XIV/2.ª

(REVOGAÇÃO DA LEI N.º 9/2020, DE 10 DE ABRIL, RELATIVA AO REGIME EXCECIONAL DE

FLEXIBILIZAÇÃO DA EXECUÇÃO DAS PENAS E DAS MEDIDAS DE GRAÇA, NO ÂMBITO DA

PANDEMIA DA DOENÇA COVID-19)

PROJETO DE LEI N.º 886/XIV/2.ª

(CESSAÇÃO DE VIGÊNCIA DO REGIME EXCECIONAL DE MEDIDAS DE FLEXIBILIZAÇÃO DA

EXECUÇÃO DAS PENAS E DAS MEDIDAS DE GRAÇA NO ÂMBITO DA PREVENÇÃO, CONTENÇÃO,

MITIGAÇÃO E TRATAMENTO DA INFEÇÃO EPIDEMIOLÓGICA POR SARS-COV-2 E DA DOENÇA

COVID-19, CONSTANTE DA LEI N.º 9/2020, DE 10 DE ABRIL)

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica

elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

PARTE I – Considerandos

a) Nota introdutória

O Projeto de Lei n.º 885/XIV/2.ª – Revogação da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, relativa ao regime excecional

de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-

19 – apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD, e o Projeto de Lei n.º 886/XIV/2.ª – Cessação de vigência

do regime excecional de medidas de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça no âmbito

da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença

COVID-19, constante da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril – apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, deram

entrada na Assembleia da República em 23 de junho de 2021. Depois de admitidos, baixaram, para parecer, à

Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias em 24 de junho, por despacho de S.

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Ex.ª o Presidente da Assembleia da República.

Em 30 de junho de 2021 foram solicitados pareceres ao Conselho Superior do Ministério Publico, ao

Conselho Superior da Magistratura e à Ordem dos Advogados. À data da elaboração do presente parecer tinham

sido recebidos os pareceres emitidos pelos Conselhos referidos.

I. b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

Ambas as iniciativas em apreciação pretendem revogar a Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, que aprovou um

regime excecional de flexibilização e da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia

da COVID-19.

O Projeto de Lei n.º 886/XIV/2.ª, da iniciativa do Grupo Parlamentar do CDS-PP, define como objeto da

mesma a cessação da vigência daquele regime excecional, cessação essa a operar com a entrada em vigor da

lei que visa aprovar, salvaguardando a tramitação de processos em apreciação na data da sua entrada em vigor,

a qual ocorrerá no dia seguinte ao da sua publicação.

Começando por reconhecer que a Lei n.º 9/2021 «constituiu uma medida fundamental para deter a

propagação da doença num meio em que o distanciamento físico é impossível e onde convivem reclusos com

altos índices de infeções crónicas», o proponente considera que, com o processo de vacinação da população

prisional, «parece, pois, que deixou de haver fundamento para que o referido regime excecional continue em

vigor, não sendo intenção do CDS-PP permitir que o Governo utilize este regime excecional como forma de

controlo do excesso de população prisional».

O Projeto de Lei n.º 885/XIV/2.ª, da iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD, tem como objeto a revogação

da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, e estipula a entrada em vigor da lei que pretende ver aprovada a 1 de julho de

2021. Para fundamentar este projeto de lei, o proponente invoca «não haver registo de casos de COVID-19 nas

cadeias portuguesas, o que é de salutar, e de já nem sequer estarmos em estado de emergência devido à

pandemia». Não obstante, «os reclusos continuam a beneficiar da aplicação da Lei n.º 9/2020».

Invoca, ainda, «(…) notícias que dão conta que a pandemia já libertou mais de 2800 reclusos, sendo que, de

março a junho deste ano, terão sido libertados 119 presos com base nesta lei» o que, segundo o proponente

«bem demonstra que a verdadeira intenção do Governo, quando propôs esta lei, foi arranjar uma forma de

esvaziar as prisões portuguesas à boleia da pandemia», considerando que a estatística referente à população

prisional permite demonstrar «uma acentuada diminuição do número de reclusos após a entrada em vigor desta

lei».

Por último, refere, ainda, um projeto de resolução da sua autoria que recomenda ao Governo máxima

prioridade à vacinação contra a COVID-19 da população prisional, cuja conclusão se previa para 30 de junho

de 2021.

I. c) Enquadramento constitucional e legal

A Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, que aprovou um regime excecional de flexibilização da execução das penas

e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da COVID-19, resulta da Proposta de Lei n.º 23/XIV/1.ª

apresentada pelo Governo à Assembleia da República, no contexto da prevenção e combate à COVID-19.

Como refere a nota técnica elaborada a propósito dos projetos de lei em apreciação no presente parecer,

aquela proposta de lei «foi motivada, designadamente, pelas recomendações da Alta Comissária das Nações

Unidas para os Direitos Humanos e da Provedora de Justiça, no sentido da adoção de medidas orientadas para

a redução da população prisional».

Na respetiva exposição de motivos, o Governo, na qualidade de proponente, invoca «as especificidades do

meio prisional, quer no plano estrutural, quer considerando a elevada prevalência de problemas de saúde e o

envelhecimento da população que acolhe, aconselham que se acautele, ativa e estrategicamente, o surgimento

de focos de infeção nos estabelecimentos prisionais e se previna o risco do seu alastramento» e que as medidas

extraordinárias propostas «constituem a concretização de um dever de ajuda e de solidariedade para com as

pessoas condenadas, ínsito no princípio da socialidade ou da solidariedade que inequivocamente decorre da

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cláusula do Estado de direito.»

O regime aprovado pela Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, integra várias medidas orientadas para a diminuição

da população prisional, designadamente, um perdão parcial de penas de prisão; um regime especial de indulto

de penas; um regime extraordinário de licença de saída administrativa de reclusos condenados e a antecipação

extraordinária da colocação em liberdade condicional.

São estabelecidos critérios específicos relativamente a cada tipo de medida, que a nota técnica detalha.

Refira-se, entretanto, que em todas as medidas foram excluídos os condenados por crimes cometidos contra

membro das forças policiais e de segurança, das Forças Armadas e funcionários e guardas dos serviços

prisionais, no exercício das respetivas funções.

No que respeita à vigência da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril: Nos termos do seu artigo 10.º (na redação que

lhe foi conferida pela Lei n.º 16/2020, de 29 de maio), a Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, cessa a sua vigência «na

data a fixar em lei que declare o final do regime excecional de medidas de flexibilização da execução das penas

e das medidas de graça no âmbito da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica

por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19».

A nota técnica inclui a menção a diversa jurisprudência relativa ao regime instituído pela Lei n.º 9/2020, de

10 de abril.

Ainda segundo a mesma nota técnica, as iniciativas em apreciação foram apresentadas ao abrigo das

disposições constitucionais e legais que consagram o poder de iniciativa e observam o disposto na alínea a) do

n.º 1 do artigo 123.º, n.º 2 do artigo 119.º e n.º 1 do artigo 120.º do Regimento.

É, porém, suscitada a questão da entrada em vigor do Projeto de Lei n.º 885/XVI/2.ª, uma vez que a entrada

em vigor em 1 de julho de 2021 implicará a aplicação retroativa da revogação em causa, o que «pode

consubstanciar uma violação dos princípios da confiança e segurança jurídicas subjacentes ao Estado de direito

democrático, consagrado expressamente no artigo 2.º da Constituição (…)», considerando-se na citada nota

técnica que, nesta matéria, a iniciativa «não se encontra conforme com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei

formulário». Porém, também é ressalvado que o projeto de lei em causa «pode ser analisado e alterado no

decurso do processo legislativo, de modo a salvaguardar cabalmente» os princípios consignados na

Constituição.

À data da elaboração de presente parecer, encontram-se pendentes, sobre a matéria em apreço, o Projeto

de Resolução n.º 1360/XIV/2.ª (PSD) – Recomenda ao Governo que atribua a máxima prioridade à vacinação

contra a COVID-19 da população prisional, fixando como prazo-limite de conclusão desse processo a data de

30 de junho de 2021, e o Projeto de Lei n.º 397/XIV/1.ª (CH) – Pelo regresso imediato dos reclusos libertados

ao abrigo da Lei n.º 9/2020, regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça,

no âmbito da pandemia da doença COVID-19, aos estabelecimentos prisionais onde se encontravam a cumprir

pena privativa de liberdade.

Aguardam ainda apreciação as petições n.º 176/XIV/2.ª – Necessidade de reedição da Lei n.º 9/2020, de 10

de abril, e 177/XIV/2.ª – Aprovação de um perdão de penas generalizado e de uma amnistia para pequenos

delitos, as quais estão a ser tramitadas conjuntamente.

Em diversas legislaturas anteriores foram apresentadas iniciativas legislativas sobre matéria conexa com a

do projeto de lei em análise.

I. d) Consultas

Atendendo à matéria objeto da iniciativa foi promovida a consulta escrita, em 30 de junho de 2021, ao

Conselho Superior do Ministério Público, ao Conselho Superior da Magistratura e à Ordem dos Advogados. À

data da elaboração do presente parecer tinham sido recebidos os pareceres emitidos pelos Conselhos referidos.

Para o Conselho Superior do Ministério Publico «a decisão a tomar deverá basear-se em dados concretos

que permitam avaliar convenientemente o maior ou menor perigo que novas entradas nos estabelecimentos

prisionais possam representar para a população prisional e, nessa medida, se subsistem ou não razões

sanitárias e humanitárias que estiveram na base da referida lei». Entende, no entanto, que «do ponto de vista

dos direitos da população prisional», nada impede a cessação da vigência da lei, pelo que «parece ser de

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conferir concordância ao projeto de lei».

Quanto ao Conselho Superior da Magistratura, considera que a revogação «terá a vantagem de pôr termo a

um regime que tem potenciado, face às dúvidas interpretativas que suscita na sua aplicação, várias

controvérsias e inclusive diferenças no tratamento de entre condenados em posições materialmente idênticas».

Acrescenta este Conselho que «existindo equilíbrio entre o direito à segurança e da manutenção da ordem social

(…)» e o «direito à saúde e o dever de ajuda e de solidariedade para com as pessoas condenadas», tendo em

conta «a evolução positiva da pandemia» e o «processo de vacinação em curso», «forçoso é concluir que deixou

de haver fundamento para a manutenção do regime em causa».

PARTE II – Opinião do Deputado relator

A relatora signatária do presente relatório votou favoravelmente a proposta de Lei n.º 23/XIV de cuja

aprovação resultou a Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, por se rever nos argumentos apresentados pelo Governo

quanto à necessidade de aprovar medidas preventivas do surgimento de focos de infeção nos estabelecimentos

prisionais, fundada no dever de solidariedade que, quanto aos destinatários, não deve excluir ninguém, sob

pena de se colocar em crise um dos pilares do Estado de direito.

A relatora signatária do presente votou, ainda, favoravelmente, a alteração ao artigo 10.º da Lei n.º 9/2020,

por concordar com a solução adotada quanto à cessação da respetiva vigência. Fê-lo por entender que será o

Governo que, apoiado na informação científica e na discussão com especialistas, melhor poderá avaliar a

pertinência das decisões políticas implícitas na aplicação de medidas de combate à pandemia, à semelhança

do que tem acontecido com a aplicação ou alívio de restrições de diversa natureza.

Sendo verdade que, no presente, nos encontramos num momento muito favorável no que respeita à evolução

da situação pandémica e do processo de vacinação, também é certo que subsistem, ainda, motivos de

preocupação, designadamente face ao comportamento de variantes já em circulação, ao surgimento de novas

variantes e à duração da resposta da vacina à doença.

Importa, ainda, referir, que sendo verdade que Portugal tem uma taxa de encarceramento que deve convocar

a nossa reflexão, parece forçada a associação entre a necessidade de aliviar a pressão sobre os serviços

prisionais no contexto dramático da pandemia, e a resposta, também ela necessária à taxa de encarceramento.

Pela sua natureza, o problema que esta última configura jamais poderia ser resolvido com eficácia pelo recurso

a medidas extraordinárias, demandando antes uma reflexão profunda em torno das suas causas e a procura de

soluções que permitam introduzir no sistema a mudança que desejamos.

PARTE III – Conclusões

1 – O Projeto de Lei n.º 885/XIV/2.ª – Revogação da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, relativa ao regime

excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença

COVID-19 – apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD –, e o Projeto de Lei n.º 886/XIV/2.ª – Cessação de

vigência do regime excecional de medidas de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça no

âmbito da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da

doença COVID-19, constante da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril – apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS-

PP –, deram entrada na Assembleia da República em 23 de junho de 2021.

2 – Ambas as iniciativas pretendem revogar a Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, que aprovou um regime

excecional de flexibilização e da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da

COVID-19.

3 – A entrada em vigor do Projeto de Lei n.º 885/XVI/2.ª em 1 de julho de 2021 implicará a aplicação

retroativa da revogação em causa, o que poderá consubstanciar uma violação dos princípios da confiança e

segurança jurídicas.

4 – A questão referida no número anterior não obsta à análise da iniciativa, que pode ser alterada no decurso

do processo legislativo para salvaguarda dos princípios consignados na Constituição.

5 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que os Projetos

de Lei n.º 885/XIV/2.ª (apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD) e n.º 886/XIV/2.ª (apresentado pelo Grupo

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Parlamentar do CDS-PP) reúnem os requisitos constitucionais e regimentais para serem discutidos e votados

em Plenário.

Palácio de São Bento, 29 de setembro de 2020.

A Deputada relatora, Isabel Almeida Rodrigues — O Presidente da Comissão, Luís Marques Guedes

Nota: As parte I e III do parecer foram aprovadas por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PAN e

do CH, na reunião da Comissão de 29 de setembro de 2021.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do RAR.

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 885/XIV/2.ª (PSD)

Revogação da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, relativa ao regime excecional de flexibilização da execução

das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19

Data de admissão: 24 de junho de 2021.

Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª).

Projeto de Lei n.º 886/XIV/2.ª (CDS-PP)

Cessação de vigência do regime excecional de medidas de flexibilização da execução das penas e

das medidas de graça no âmbito da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção

epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, constante da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril

Data de admissão: 24 de junho de 2021.

Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Ana Cláudia Cruz (DAC), Helena Medeiros (BIB), Maria João Godinho e Luísa Colaço (DILP), Rafael Silva (DAPLEN). Data: 9 de julho de 2021.

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I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

As iniciativas legislativas sub judice visam revogar a Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, determinando a cessação

de vigência do regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça por esta

consagrado.

Constatam os proponentes de ambas as iniciativas que a Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, sendo de natureza

extraordinária e temporária, conforme aponta o Grupo Parlamentar do PSD, só cessará vigência na data a fixar

em lei que declare o final do regime excecional nela previsto.

Referem os proponentes que não se têm verificado casos de COVID-19 nos estabelecimentos prisionais

portugueses e que o estado de emergência já não está em vigor, discordando do facto de os reclusos

continuarem a beneficiar da aplicação da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, apontando que foram libertados mais de

2800 reclusos e opondo-se a que o Governo utilize este regime excecional como forma de controlo do excesso

de população prisional.

O Grupo Parlamentar do CDS-PP reconhece que esta constituiu uma medida fundamental para deter a

propagação da doença num meio em que o distanciamento físico é impossível e onde vivem reclusos com altos

índices de infeções e doenças crónicas (v.g. tuberculose, diabetes e HIV), porém, tal como o Grupo Parlamentar

do PSD quando alude ao Projeto de Resolução n.º 1360/XIV/2.ª (PSD) – Recomenda ao Governo que atribua a

máxima prioridade à vacinação contra a COVID-19 da população prisional, fixando como prazo-limite de

conclusão desse processo a data de 30 de junho de 2021, de que também é proponente, entende que deixou

de haver fundamento para que o referido regime excecional continue em vigor, nomeadamente, por estar a ser

empreendida a campanha de vacinação de reclusos, tendo a taskforce, em articulação com a Direção-Geral de

Reinserção e dos Serviços Prisionais, anunciado que a mesma seria concluída até ao final do mês de junho.

O Projeto de Lei n.º 885/XIV/2.ª (PSD) contém três artigos preambulares: o primeiro definidor do respetivo

objeto; o segundo contendo uma norma revogatória da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril e o último determinando o

início de vigência da lei a aprovar no dia 1 de julho de 2021.

Por sua vez, o Projeto de Lei n.º 886/XIV/2.ª (CDS-PP) contém quatro artigos preambulares: O primeiro

definidor do respetivo objeto; o segundo contendo uma norma sobre a aplicação da lei no tempo, que determina

a cessação de vigência da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril1; o terceiro contendo uma norma revogatória da Lei n.º

9/2020, de 10 de abril e o último determinando o início de vigência da lei a aprovar no dia seguinte ao da sua

publicação.

• Enquadramento jurídico nacional

A Lei n.º 9/2020, de 10 de abril2, aprovou um regime excecional de flexibilização da execução das penas e

das medidas de graça, no âmbito da pandemia da COVID-19. Teve origem na Proposta de Lei n.º 23/XIV3 e,

como pode ler-se na exposição de motivos da mesma, foi motivada, designadamente, pelas recomendações da

Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos4 e da Provedora de Justiça5, considerando o

proponente que «as especificidades do meio prisional, quer no plano estrutural, quer considerando a elevada

prevalência de problemas de saúde e o envelhecimento da população que acolhe, aconselham que se acautele,

ativa e estrategicamente, o surgimento de focos de infeção nos estabelecimentos prisionais e se previna o risco

do seu alastramento» e que as medidas extraordinárias propostas «constituem a concretização de um dever de

ajuda e de solidariedade para com as pessoas condenadas, ínsito no princípio da socialidade ou da

solidariedade que inequivocamente decorre da cláusula do Estado de direito».

1 Sugerindo-se que sistematicamente esta norma seja inserida a seguir. 2 Texto retirado do portal do Diário da República Eletrónico, para o qual são feitas todas as referências legislativas, salvo menção em contrário. 3 https://www.parlamento.pt/AtividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=44711. 4 Em mensagem de 25 de março, disponível em https://www.ohchr.org/EN/NewsEvents/Pages/DisplayNews.aspx?NewsID=25745&LangID =E, consultada em 02/07/2020. 5 Recomendação n.º 4/B/2020, de 26 de março, disponível em https://www.provedor-jus.pt/documentos/sistema-prisional-prevencao-do-contagio-sars-cov2-4-b-2020/, consultado em 02/07/2021.

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Em maio do mesmo ano, e com origem na Proposta de Lei n.º 30/XIV6, foi publicada a Lei n.º 16/2020, de 29

de maio, que alterou as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da COVID-19, procedendo

à quarta alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, à primeira alteração à Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, e à

décima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março. No que se refere à Lei n.º 9/2020,

alterou o respetivo artigo 10.º, relativo à cessação de vigência do regime excecional criado pela mesma,

remetendo-a para data a fixar em lei que declare o final do regime excecional de medidas de flexibilização da

execução das penas e das medidas de graça no âmbito da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da

infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da COVID-19, norma esta que foi incluída na discussão na

especialidade.

O regime aprovado pela Lei n.º 9/2020, de 10 de abril (texto consolidado), contém um conjunto de medidas

tendentes a diminuir a população prisional, que são: o perdão parcial de penas de prisão; o regime especial de

indulto de penas; o regime extraordinário de licença de saída administrativa de reclusos condenados; e a

antecipação extraordinária da colocação em liberdade condicional.

Relativamente a cada tipo de medida, a lei estabeleceu critérios específicos, abaixo detalhados, sendo que

se excluiu, em todos os casos, os condenados por crimes cometidos contra membro das forças policiais e de

segurança, das Forças Armadas e funcionários e guardas dos serviços prisionais, no exercício das respetivas

funções.

Assim, o perdão (artigo 2.º) é aplicável a penas de prisão de duração igual ou inferior a dois anos e aos

períodos remanescentes das penas de prisão mais longas se o tempo que faltar para o seu cumprimento integral

for igual ou inferior a dois anos e o recluso tiver cumprido pelo menos metade da pena. O perdão só pode ser

aplicado uma vez a cada recluso e reporta-se a condenações transitadas em julgado antes da entrada em vigor

desta lei. Estão excluídos desta possibilidade os reclusos que tenham sido condenados pela prática dos crimes

elencados nas alíneas a) a n) do n.º 3 do artigo 2.º, ainda que tenham sido também condenados pela prática de

outros crimes.

Idêntica exclusão é feita relativamente ao indulto excecional (regulado no artigo 3.º), que pode ser total ou

parcial, e se destina a reclusos com 65 ou mais anos de idade à data da entrada em vigor desta lei (que ocorreu

a 11 de abril), e sejam portadores de doença, física ou psíquica, ou de um grau de autonomia incompatível com

a normal permanência em meio prisional, no contexto da pandemia.

A licença de saída administrativa extraordinária (artigo 4.º) tem a duração de 45 dias (renovável) e aplica-se

a reclusos, mediante o seu consentimento, desde que cumulativamente se verifiquem os seguintes requisitos: o

preenchimento dos pressupostos e critérios gerais de concessão da licença de saída previstos no artigo 78.º do

Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (texto consolidado)7; o gozo prévio de pelo

menos uma licença de saída jurisdicional ao recluso que cumpre pena em regime aberto ou o gozo prévio de

duas saídas jurisdicionais ao recluso que cumpre pena em regime comum; e a inexistência de qualquer situação

de evasão, ausência ilegítima ou revogação da liberdade condicional nos 12 meses antecedentes. O período da

licença conta como tempo de execução da pena (exceto se a licença for revogada).

A antecipação extraordinária da colocação em liberdade condicional (artigo 5.º) pressupõe o gozo, com êxito,

de licença de saída administrativa extraordinária (ao abrigo deste regime criado pela Lei n.º 9/2020), e pode

corresponder a um período máximo de seis meses. Esta duração é equivalente ao período que o recluso

condenado tem de cumprir para atingir dois terços ou cinco sextos da pena, conforme se trate de pena de prisão

em medida inferior ou superior a seis anos.

Prevê-se ainda o reexame oficioso dos pressupostos da prisão preventiva independentemente do decurso

dos três meses referidos no artigo 213.º do Código de Processo Penal, sobretudo tratando-se de recluso com

65 ou mais anos de idade que seja portador de doença, física ou psíquica, ou de um grau de autonomia

incompatível com a normal permanência em meio prisional, no contexto da pandemia (artigo 7.º).

Esta lei terá suscitado, pelo menos numa fase inicial, algumas dúvidas de interpretação quanto a alguns

6 https://www.parlamento.pt/AtividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=44790. 7 Isto é, quando haja fundadas expectativas de que o recluso se comportará de modo socialmente responsável, sem cometer crimes e de que não se subtrairá à execução da pena ou medida privativa da liberdade, bem como compatibilidade da saída com a defesa da ordem e da paz social. Na concessão da licença, são ponderados a evolução da execução da pena ou medida privativa da liberdade; as necessidades de proteção da vítima; o ambiente social ou familiar em que o recluso se vai integrar; as circunstâncias do caso; e os antecedentes conhecidos da vida do recluso.

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aspetos, como resulta deste parecer8 do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República.

Também os tribunais têm sido a chamados a pronunciar-se a propósito do regime instituído por esta lei –

vejam-se, por exemplo:

– O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (Processo n.º 28/20.4YFLSB)9, em que se conclui,

designadamente, que «I – O preceituado no n.º 6 do artigo 2.º, da Lei n.º 9/2020, visando claramente prevenir o

alarme social decorrente da libertação de reclusos condenados pelos crimes que ali cataloga, não se reporta a

condenados em cumprimento de pena pelos crimes ali arrolados, apenas exigindo uma condenação pretérita

por um dos crimes ressalvados do perdão; II – O perdão concedido pela Lei n.º 9/2020 não opera ope legis,

antes requerendo uma decisão de aplicação que comporta uma margem de apreciação que verifique o

preenchimento dos requisitos e condições nela estabelecidos, decisão que, sendo favorável, necessariamente

resultará numa antecipação do termo do cumprimento da pena; III – No caso, tendo a referida decisão declarado

que o requerente não beneficia do perdão, dela não resultam quaisquer consequências de antecipação do termo

do cumprimento da pena de prisão em que o requerente se encontra submetido; (…)».

– O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra (Processo 175/20.2TXCBR-B.C19/12)10: «O perdão de

penas consagrado no artigo 2.º da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, só é concedido a reclusos, condenados por

sentença transitada em julgado em data anterior à da entrada em vigor daquele diploma legal, ficando,

consequentemente, excluídos da medida de graça referida os condenados que não tenham ingressado

fisicamente em estabelecimento prisional»;

– O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (Processo 1896/10.3TXCBR-AB-3)11, nos termos do qual «A

concessão do perdão, nos termos em que se encontra previsto no artigo 2.º da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril,

tem um propósito claro: o de evitar a propagação do contágio por COVID-19, através da libertação de reclusos

que, em atenção ao tempo de prisão já cumprido e/ou remanescente por cumprir e à natureza do crime ou

crimes por que hajam sido condenados, suscitem menores preocupações ao nível das razões de prevenção

geral e especial positiva e negativa.

Trata-se de uma medida de exceção que não contempla, nem interpretação extensiva, nem restritiva, nem

aplicação analógica, devendo ser interpretadas de acordo com o seu teor literal, sob pena de conduzir a

resultados metodologicamente incorretos e totalmente desvirtuados o pensamento legislativo e a razão de ser

da lei.

E por isso é que o perdão incide sobre a totalidade do tempo de prisão, seja o da pena única resultante de

cúmulo jurídico, seja o da soma material das penas, nos casos de cumprimento sucessivo e a sua aplicação é

excluída se alguma dessas condenações tiver sido proferida por algum dos crimes enumerados no n.º 6 do

artigo 2.º da Lei n.º 9/2020».

– O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (Processo n.º 259/18.7GLSNT.L1-3)12: «Do texto da Lei n.º

9/2020, de 10 abril (Regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça) resulta

tão-somente a possibilidade de aplicação de medidas dessa natureza (perdão parcial de penas; regime especial

de indulto de pena; licença de saída administrativa; antecipação extraordinária da colocação em liberdade

condicional) a reclusos em cumprimento de penas, à data da sua entrada em vigor;

A Lei n.º 9/20 aplica-se a pessoas definitivamente condenadas e que estivessem a cumprir pena de prisão

efetiva, em 11 de abril de 2020».

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verifica-se que se encontram pendentes, sobre

8 https://www.ministeriopublico.pt/sites/default/files/documentos/pdf/parecer_10-20.pdf, consultado em 02/07/2021. 9 http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/98f03b3a05fc4bf38025864000363e92, consultado em 02/07/2021. 10 http://www.gde.mj.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/8e8d4089a1d9866580258602003a7407?OpenDocument, consultado em 02/07/2021. 11 http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/73c1b14c11848e88802585f9003116d5?OpenDocument&Highlight=0, COVID, consultado a 02/07/2021. 12 http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/3ac581cda4b616428025860f00513aa6?OpenDocument, consultado em 02/07/2021.

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a matéria em apreço, o Projeto de Resolução n.º 1360/XIV/2.ª (PSD) – Recomenda ao Governo que atribua a

máxima prioridade à vacinação contra a COVID-19 da população prisional, fixando como prazo-limite de

conclusão desse processo a data de 30 de junho de 2021, e o Projeto de Lei n.º 397/XIV/1.ª (CH) – Pelo regresso

imediato dos reclusos libertados ao abrigo da Lei n.º 9/2020, de 10 abril, regime excecional de flexibilização da

execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, aos

estabelecimentos prisionais onde se encontravam a cumprir pena privativa de liberdade.

Aguardam ainda apreciação as Petições n.os 176/XIV/2.ª – Necessidade de reedição da Lei n.º 9/2020, de 10

de abril, e 177/XIV/2.ª – Aprovação de um perdão de penas generalizado e de uma amnistia para pequenos

delitos, as quais estão a ser tramitadas conjuntamente.

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

Consultada a base de dados da AP, verifica-se que, sobre a mesma matéria conexa, foram apreciadas, em

Legislaturas anteriores, bem como na anterior sessão da presente Legislatura, as seguintes iniciativas

legislativas:

➢ Proposta de Lei n.º 23/XIV/1.ª (GOV) – Estabelece um regime excecional de flexibilização da execução

das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia COVID-19, a qual deu origem à Lei n.º 9/2020,

de 10 abril, que aprovou o regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de

graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19;

➢ Proposta de Lei n.º 30/XIV/(GOV) – Altera as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia

da doença COVID-19, a qual deu origem à Lei n.º 16/2020, de 5 de maio, que altera as medidas

excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19, procedendo à quarta alteração

à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, à primeira alteração à Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, e à décima

segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março;

➢ Projeto de Lei n.º 667/VII/4.ª (PS, PSD, CDS-PP, PCP e PEV) – Perdão genérico e amnistia de pequenas

infrações, que deu origem à Lei n.º 29/1999, de 12 de maio.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

As iniciativas em apreço foram apresentadas pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata (PSD) e

pelo Grupo Parlamentar do CDS-Partido Popular (CDS-PP), ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da

Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (Regimento),13 que consagram

o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo

156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, bem como dos grupos parlamentares,

por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do

Regimento.

Observam o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do Regimento e assumem a forma de projeto de

lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do Regimento.

As iniciativas encontram-se redigidas sob a forma de artigos, têm uma designação que traduz sinteticamente

o seu objeto principal e são precedidas de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais

previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Observam igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento,

uma vez que definem concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa e parecem

não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados, relevantes para a sua admissibilidade, não

obstante o Projeto de Lei n.º 885/XIV/2.ª poder ser analisado e alterado no decurso do processo legislativo, de

modo a salvaguardar cabalmente esses princípios.

Com efeito, o artigo 3.º deste projeto de lei, ao definir o dia 1 de julho como data de entrada em vigor, neste

13 As ligações para a Constituição, o Regimento e a lei formulário são feitas para o portal oficial da Assembleia da República.

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momento já implica que a revogação do regime seja aplicada retroativamente. Tal pode consubstanciar uma

ofensa dos princípios da confiança e segurança jurídicas subjacentes ao princípio do Estado de direito

democrático, consagrado expressamente no artigo 2.º da Constituição, que implica a garantia de estabilidade

jurídica e de um mínimo de certeza e previsibilidade dos efeitos jurídicos dos atos dos poderes públicos,

protegendo-se, deste modo, as expectativas juridicamente criadas dos cidadãos.

Apesar de a retroatividade em causa poder não se enquadrar no elenco das proibições constitucionais de

retroatividade, nomeadamente, nos casos de determinadas leis penais (artigo 29.º da Constituição), leis

restritivas de direitos, liberdades e garantias (n.º 3 do artigo 18.º da Constituição) e leis fiscais (n.º 3 do artigo

103.º da Constituição), de acordo com o Prof. Gomes Canotilho, tal «não significa que o problema da

retroatividade das leis deva ser visualizado apenas com base em regras constitucionais. Uma lei retroativa pode

ser inconstitucional quando um princípio constitucional, positivamente plasmado e com suficiente densidade,

isso justifique»14. Dá ainda como exemplo, o princípio da segurança jurídica e da confiança dos cidadãos, o qual,

«na qualidade de princípio densificador do princípio do estado de direito serve de pressuposto material à

proibição da retroatividade das leis»15.

Também o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 93/84, afirma que, «contudo, se uma lei retroativa não é,

per se, inconstitucional, poderá sê-lo se a retroatividade implicar a violação de princípios e disposições

constitucionais autónomas». Estes princípios encontram-se concretizados em normas legais tais como o artigo

5.º do Código Civil e o n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro16, conhecida como lei formulário,

segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início

de vigência verificar-se no próprio dia da publicação».

Ambos os projetos de lei deram entrada a 23 de junho de 2021. Foram admitidos e baixaram para discussão

na generalidade à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª), por despacho

de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, no dia 24 de junho, data em que foram anunciados em

sessão plenária.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

O título do Projeto de Lei n.º 885/XIV/2.ª (PSD) – «Revogação da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, relativa ao

regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da

doença COVID-19» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo

7.º da lei formulário.

Este título, ao referir a revogação da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, encontra-se conforme a regra de legística

segundo a qual «as vicissitudes que afetem globalmente um ato normativo devem ser identificadas no título, o

que ocorre, por exemplo, em atos de suspensão ou em revogações expressas de todo um outro ato»17.

No que respeita ao início de vigência, o artigo 3.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor

ocorrerá no dia 1 de julho de 2021, pelo que, como foi referido anteriormente, não se encontra conforme com o

previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário.

Relativamente ao título do Projeto de Lei n.º 886/XIV/2.ª (PSD) – «Cessação de vigência do regime

excecional de medidas de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça no âmbito da

prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-

19, constante da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril» –, traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme

ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro18, conhecida como lei formulário, embora

possa ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na especialidade ou de redação final.

Nesse sentido, uma vez que o título está conforme a regra de legística segundo a qual «as vicissitudes que

14 CANOTILHO, J.J Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2018, P. 261. 15 CANOTILHO, J.J Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2018, P. 261. 16 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho. 17 DUARTE, David [et al.] – Legística: Perspectivas sobre a concepção e redacção de actos normativos. Coimbra: Almedina, 2002. P. 203. 18 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho.

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afetem globalmente um ato normativo devem ser identificadas no título, o que ocorre, por exemplo, em atos de

suspensão ou em revogações expressas de todo um outro ato»19, sugere-se apenas à comissão que tal possa

ser efetuado de uma forma mais expressa e citando o título original da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril:

«Revogação do regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no

âmbito da pandemia da doença COVID-19, aprovado pela Lei n.º 9/2020, de 10 de abril».

No que respeita ao articulado, o disposto no artigo 2.º do projeto de lei20, encontra-se redigido em

consonância com o disposto no artigo 10.º da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, na redação dada pela de 29 de

maio21, e ressalva, de forma genérica, que essa data de cessação ocorre «sem prejuízo da tramitação dos

processos em apreciação na data da sua entrada em vigor».

No que respeita ao início de vigência, o artigo 4.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor

ocorrerá no dia seguinte ao da sua publicação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do artigo

2.º da lei formulário, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em

caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação».

Em caso de aprovação estas iniciativas revestirão a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, a publicar na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º

2 do artigo 3.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro.

Nesta fase do processo legislativo, as iniciativas não nos suscitam outras questões no âmbito da lei

formulário.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional

Países europeus

A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: França e

Itália.

FRANÇA

A França decretou o estado de emergência sanitária, devido à pandemia de COVID-19, em 23 de março de

2020, através da Loi n.º 2020-290 du 23 mars 2020 d'urgence pour faire face à l'épidémie de COVID-1922, com

uma duração inicial de dois meses, tendo sido prorrogado até 10 de julho de 2020, inclusive.

No âmbito desta declaração do estado de emergência, foram apresentadas pela Ministra da Justiça, em 25

de março de 2020, quatro portarias, contendo medidas de exceção neste quadro, com a finalidade de simplificar

procedimentos, permitir a realização de audiências judiciais por videoconferência, à porta fechada, com juiz

único e prolongar os prazos de prescrição, entre outros.

Dessas portarias destaca-se a Ordonnance n.º 2020-303 du 25 mars 2020 portant adaptation de règles de

procédure pénale sur le fondement de la loi n.º 2020-290 du 23 mars 2020 d'urgence pour faire face à l'épidémie

de COVID-19, que define as regras de adaptação do processo penal consideradas indispensáveis para fazer

face às consequências da propagação da epidemia de COVID-19. Estas regras aplicam-se, nos termos do artigo

2 desta portaria, até um mês após a data em que termina o estado de emergência.

Importa para esta nota técnica as medidas que ajustam as condições para a execução do fim da pena de

19 DUARTE, David [et al.] – Legística: Perspectivas sobre a concepção e redacção de actos normativos. Coimbra: Almedina, 2002. P. 203. 20 «A vigência do regime excecional de medidas de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça no âmbito da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19 cessa na data da entrada em vigor da presente lei, sem prejuízo da tramitação dos processos em apreciação na data da sua entrada em vigor». 21 «A presente lei cessa a sua vigência na data a fixar em lei que declare o final do regime excecional de medidas de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça no âmbito da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19». 22 Diploma consolidado retirado do portal oficial legifrance.gouv.fr. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a França são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário.

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prisão, prevendo, em particular, a redução de dois meses na pena de prisão devido a circunstâncias excecionais

e a possibilidade de saída antecipada sob a forma de prisão domiciliária.

Nos termos do artigo 25, que vem derrogar o artigo 712-5 do Código de Processo Penal, as reduções de

pena e as autorizações de saída podem ser concedidas sem que a comissão de aplicação de penas seja ouvida,

desde que o Procurador da República emita parecer favorável. Na falta deste, o juiz de execução de penas pode

decidir, tendo recolhido o parecer dos membros da comissão de aplicação de penas, sob qualquer forma. A

libertação apenas poderá ocorrer se o condenado tiver uma residência e cumprir os requisitos para ser colocado

em liberdade condicional.

O artigo 27 prevê a possibilidade de o juiz de execução de penas reduzir em dois meses a pena, devido a

circunstâncias excecionais, durante a vigência do estado de emergência. Não podem beneficiar desta redução

de pena os condenados por crimes de terrorismo; por crime perpetrado sobre o seu cônjuge ou unido de facto,

nos termos do artigo 132-80 do Código Penal; que tenham participado numa ação coletiva, precedida ou

acompanhada de violência, contra as pessoas previstas no artigo R57-7-1 do Código de Processo Penal, ou

que coloque em risco a segurança do estabelecimento prisional; ou que tenham tido um comportamento que

coloque em perigo outros presos ou funcionários prisionais, tendo em atenção as regras imposta pelo contexto

sanitário ligado à epidemia de COVID-19.

Por decisão do Procurador da República, sob proposta do diretor dos serviços prisionais, qualquer pessoa

condenada a uma pena de prisão de duração igual ou inferior a cinco anos a quem falte cumprir dois meses ou

menos pode cumprir o restante em prisão domiciliária, com proibição de sair, salvo para deslocações justificadas

por imperativas necessidades familiares, profissionais ou de saúde. Podem ainda ser-lhe impostas as

obrigações acessórias previstas nos parágrafos 7.º a 14.º do artigo 132-45 do Código Penal, cuja violação

implica o regresso ao estabelecimento prisional.

Finalmente, no artigo 29 desta portaria prevê-se a aplicação, aos condenados a penas privativas da liberdade

aos quais falte cumprir um período igual ou inferior a seis meses, do artigo 747-1 do Código de Processo Penal,

que prevê a substituição da pena de prisão por prisão domiciliária com vigilância eletrónica, trabalho a favor da

comunidade ou multa.

Ainda em 2020, mediante o Décret n.º 2020-1257 du 14 octobre 2020 déclarant l'état d'urgence sanitaire,

tornou a ser declarado o estado de emergência, a partir do dia 17 de outubro, para que, devido à segunda vaga

da doença COVID-19, pudessem ser tomadas as medidas consideradas necessárias para fazer face aos riscos

sanitários em causa. Prorrogado até 16 de fevereiro de 2021 pela Loi n° 2020-1379 du 14 novembre 2020

autorisant la prorogation de l'état d'urgence sanitaire et portant diverses mesures de gestion de la crise sanitaire,

tornou a ser prorrogado até ao dia 1 de junho de 2021 pela Loi n° 2021-160 du 15 février 2021 prorogeant l'état

d'urgence sanitaire.

ITÁLIA

Em 22 fevereiro de 2020, o Governo italiano tomou as primeiras para fazer frente à emergência

epidemiológica de COVID-19. Com o desenvolvimento e evolução da situação pandémica, as medidas foram

sendo adaptadas às necessidades.

No âmbito dessas medidas, em 17 de março de 2020, o Governo italiano aprovou o decreto-legge 17 marzo

2020, n. 1823, Misure di potenziamento del Servizio sanitario nazionale e di sostegno economico per famiglie,

lavoratori e imprese connesse all'emergenza epidemiologica da COVID-19, que contém um vasto conjunto de

medidas para fazer face à situação criada pela pandemia de COVID-19.

De entre estas, destacam-se as que constam do artigo 123 deste diploma legal, relativas à execução de

penas. Em derrogação do disposto nos parágrafos 1, 2 e 4 do artigo 1 da legge 26 novembre 2010, n. 19924,

desde a data de entrada em vigor deste decreto (17 de março de 2020) até ao dia 30 de junho de 2020, a pena

de prisão passou a poder ser cumprida, se tal fosse requerido, no domicílio do condenado ou noutro lugar público

ou privado, de assistência ou acolhimento, se não fosse superior a 18 meses ou se constituísse parte residual

23 Diploma consolidado retirado do portal oficial normativa.it. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a Itália são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário. 24 Disposizioni relative all'esecuzione presso il domicilio delle pene detentive non superiori a diciotto mesi. O artigo 1.º prevê que podem cumprir pena no domicílio aqueles que sejam condenados a pena de prisão inferior a 18 meses ou aqueles que, tendo sido condenados a pena superior, tenham menos de 18 meses da pena por cumprir, especificando, no seu parágrafo 2, quem não pode usufruir desta medida.

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de uma pena maior. O mesmo artigo previa ainda um conjunto de exceções a esta regra, em razão do crime

pelo qual a pessoa tinha sido condenada ou por ter sofrido sanções disciplinares durante o cumprimento da

pena.

O juiz de execução de penas deveria adotar as diligências necessárias para a execução da pena no domicílio,

salvo se houvesse motivos graves que obstassem à tomada da medida.

Salvo se se tratasse de condenado menor de idade ou de condenado a pena de prisão não superior a 6

meses, era aplicado o controlo mediante meios eletrónicos ou outros instrumentos técnicos, para cuja aplicação

o condenado tinha de dar autorização. A aplicação desta medida devia iniciar-se pelos presos com

remanescente de pena a cumprir e se este fosse inferior a 30 dias, não seriam ativados os meios eletrónicos de

controlo.

Para os menores infratores internados em centros educativos, o serviço social de menores territorialmente

competente em relação ao local de residência, em conjunto com a equipa educacional do instituto,

providenciaria, no prazo de trinta dias a partir do recebimento da notificação da execução da medida em questão,

à elaboração de um programa educacional, a ser submetido ao magistrado competente para aprovação.

Finalmente, o artigo 124 do mesmo decreto-legge dispunha que, sem prejuízo do disposto no artigo 52 da

legge 26 de luglio 1975, n.º 354, e em derrogação do prazo máximo global referido no parágrafo 125 do mesmo

artigo, as licenças concedidas à pessoa condenada admitida no regime de semiliberdade podiam durar até 30

de junho de 2020.

Este decreto-lei foi convertido em lei através da legge 24 aprile 2020, n. 27, Conversione in legge, con

modificazioni, del decreto-legge 17 marzo 2020, n. 18, recante misure di potenziamento del Servizio sanitario

nazionale e di sostegno economico per famiglie, lavoratori e imprese connesse all'emergenza epidemiologica da

COVID-19. Proroga dei termini per l'adozione di decreti legislativi.

Na sequência de notícias como esta, que davam conta da colocação em prisão domiciliária de condenados

com ligação à máfia italiana ao abrigo do referido diploma, foi aprovado, na reunião do Conselho de Ministros

de 9 de maio de 2020, o decreto-legge 10 maggio 2020, n. 29, Misure urgenti in materia di detenzione domiciliare

o differimento dell'esecuzione della pena, nonché in materia di sostituzione della custodia cautelare in carcere

con la misura degli arresti domiciliari, per motivi connessi all'emergenza sanitaria da COVID-19, di persone

detenute o internate per delitti di criminalita' organizzata ((di tipo terroristico o mafioso)), o per delitti di

associazione a delinquere legati al traffico di sostanze stupefacenti o per delitti commessi avvalendosi delle

condizioni ((o al fine di agevolare l'associazione mafiosa o con finalita' di terrorismo)), nonche' di detenuti e

internati sottoposti al regime previsto dall'articolo 41-bis della legge 26 luglio 1975, n. 354, nonché, infine, in

materia di colloqui con i congiunti o con altre persone cui hanno diritto i condannati, gli internati e gli imputati.

Nos termos deste diploma, os condenados por crimes de associação criminosa, terrorismo, tráfico de

estupefacientes, relacionados com associação à máfia, ou previsto no artigo 41-bis da legge 26 luglio 1975, n.

354, eram colocados em prisão domiciliária ou beneficiavam do adiamento da pena por motivo relacionado com

a situação de emergência sanitária da COVID-19. O magistrado que adotou a medida, após obter parecer do

Procurador Distrital Anti-Máfia e do Procurador Nacional Anti-Máfia e Anti-Terrorismo avaliava a manutenção

dos motivos relacionados com a emergência sanitária no prazo de 15 dias após a data de adoção da medida e,

posteriormente, com periodicidade mensal. Esta avaliação seria realizada de imediato, caso a administração

prisional comunicasse a disponibilidade de estruturas prisionais adequadas às condições de saúde do preso em

causa. O despacho que revogava a prisão domiciliária era de execução imediata.

Este diploma foi revogado pelo n.º 3 do artigo 1 da Legge 25 giugno 2020, n. 70, Conversione in legge, con

modificazioni, del decreto-legge 30 aprile 2020, n. 28, recante misure urgenti per la funzionalita' dei sistemi di

intercettazioni di conversazioni e comunicazioni, ulteriori misure urgenti in materia di ordinamento penitenziario,

nonche' disposizioni integrative e di coordinamento in materia di giustizia civile, amministrativa e contabile e

misure urgenti per l'introduzione del sistema di allerta COVID-19. Esta mesma lei aditou ao decreto-legge 30

aprile 2020, n. 28, referido no seu título, os artigos 2-bis a 2-sexties que passaram a conter as normas sobre

detenção domiciliária e diferimento do cumprimento da pena devido à COVID-19.

25 Prevê que aos condenados que cumpram pena em regime de semiliberdade podem ser concedidas, a título de prémio, uma ou mais licenças cuja duração não pode ser superior a um total de 45 dias por ano.

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Outros países

Apresenta-se aqui a situação no Reino Unido.

REINO UNIDO

A política prisional no Reino Unido é descentralizada, sendo a responsabilidade pelas prisões na Inglaterra

e no País de Gales do Governo em Londres; na Irlanda do Norte, do Governo da Irlanda do Norte e na Escócia

do Governo escocês.

O Parlamento escocês aprovou o Coronavirus (Scotland) Act 202026, publicado a 6 de abril de 2020, que

prevê, na Part 8 do Schedule 4-Justice, a libertação antecipada de presos.

Nos termos do parágrafo 19, o Governo pode decidir a libertação antecipada de presos se essa medida se

revelar necessária e proporcional em relação aos efeitos que a COVID-19 pode ter numa prisão ou nas prisões

em geral, com o objetivo de proteger a segurança e ordem na prisão, bem como a saúde, segurança e bem-

estar dos reclusos e de quem lá trabalha. Não pode, no entanto, beneficiar desta medida, os condenados a

prisão perpétua, por crimes sexuais, por crimes violentos ou relacionados com terrorismo, os que são objeto de

processos ao abrigo da Lei da Extradição (Extradition Act 2003) ou aqueles em relação aos quais o responsável

pelo estabelecimento prisional considere que a respetiva libertação poderá representar um risco imediato para

alguém.

De acordo com o subparágrafo 7 desta norma, a libertação antecipada dos presos ao abrigo do Coronavirus

(Scotland) Act 2020 segue as regras previstas no parágrafo 1 do Prisoners and Criminal Proceedings (Scotland)

Act 1993, segundo o qual os reclusos com penas de curta duração (até quatro anos) podem ser libertados após

cumprimento de metade da pena e os condenados a penas de longa duração (mais de quatro anos) podem ser

libertados se tiverem cumprido dois terços da pena.

Compulsada a base de dados da legislação do Reino Unido, não foi possível encontrar outros diplomas que

prevejam a libertação de presos em virtude da crise sanitária provocada pela pandemia de COVID-19, apesar

de algumas declarações feitas em março de 2020, como é o caso de esta, da Ministra da Justiça da Irlanda do

Norte, ou esta, do Ministério da Justiça inglês.

V. Consultas e contributos

• Consultas obrigatórias e facultativas

Em 30 de junho de 2021, a Comissão solicitou parecer escrito sobre estas iniciativas ao Conselho Superior

do Ministério Publico, ao Conselho Superior da Magistratura e à Ordem dos Advogados.

Todos os pareceres e contributos remetidos à Assembleia da República serão publicados nas páginas das

iniciativas n.os 885/XIV/2.ª (PSD) e 886/XIV/2.ª (CDS-PP) na Internet.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

O preenchimento, pelos proponentes, das fichas de avaliação prévia de impacto de género das iniciativas

n.os 885/XIV/2.ª (PSD) e 886/XIV/2.ª (CDS-PP), em cumprimento do disposto na Lei n.º 4/2018, de 9 de fevereiro,

devolve como resultado uma valoração neutra do impacto de género.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

26 Diploma retirado do portal oficial legislation.gov.uk. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas ao Reino Unido são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário.

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que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso.

Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta fase

do processo legislativo a redação dos projetos de lei em apreço não nos suscita qualquer questão relacionada

com a linguagem discriminatória em relação ao género.

VII. Enquadramento bibliográfico

BRANDÃO, Nuno – A libertação de reclusos em tempos de COVID-19: Um primeiro olhar sobre a Lei n.º

9/2020, de 10/4. Julgar Online [Em linha]. (Abr. 2020). [Consult. 29 jun. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=135263&img=22437&save=true.

Resumo: O autor analisa neste artigo o Regime excecional de flexibilização da execução das penas e das

medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19 (Lei n.º 9/2020, de 10 de abril). Nuno Brandão

vai centrar a sua análise no perdão (artigo 2.º) e na licença de saída administrativa extraordinária (artigo 4.º). O

autor conclui que, em face da epidemia, a licença temporária com obrigação de permanência na habitação se

afigura uma boa solução. Apresenta, no entanto, algumas reservas relativamente ao perdão que, e cito: «o

mesmo já não se poderá dizer do perdão instituído no artigo 2.º, por nele se ter ido muito para além do que seria

necessário para proteger a vida e a saúde dos reclusos dele beneficiários, com sacrifício das finalidades da

punição por eles sofrida. Como há muito preveniu Figueiredo Dias, o exercício do direito de graça está longe de

constituir uma forma desejável e legítima de reduzir a população prisional. Advertência que não parece ter sido

tomada em devida conta na Lei n.º 9/2020, claramente (também) motivada por um propósito de súbita e

substancial diminuição da sobrelotação do sistema prisional português por via de uma amnistia imprópria.»

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Escritório Regional para a Europa – Preparedness, prevention and

control of COVID-19 in prisons and other places of detention [Em linha]: Interim guidance. Copenhagen: WHO

Regional Office for Europe, 2020. [Consult. 28 jun. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=130622&img=16067&save=true.

Resumo: Este guia da OMS é um documento orientador dos Estados sobre a COVID-19 e formas de controlo

da pandemia nas prisões.

Citando o texto da introdução «as prisões e outros locais de detenção são ambientes fechados onde as

pessoas (incluindo funcionários) habitam em proximidade. Todos os países têm a responsabilidade de aumentar

o seu nível de preparação, alerta e resposta na identificação, gestão e tratamento de novos casos de COVID-

19. Os países devem preparar-se para responder a diferentes cenários públicos de saúde, reconhecendo que

não existe uma abordagem única para gerir os casos e surtos do COVID-19».

O texto começa por identificar as características patogénicas, sinais e sintomas, bem como o tratamento do

COVID-19. É abordada a matéria dos planos de contingência, treino e educação e a abordagem a ter na

suspeição de casos de contaminação com a doença. São identificadas as medidas de prevenção e tratamento

médico para o staff e presos. O capítulo 14 é dedicado à gestão de casos (Case management) e aborda-se a

questão da saída de presos e formas de minimizar riscos na saúde pública.

PORTUGAL. Assembleia da República. Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar – Libertação de

reclusos no contexto da COVID-19 [Em linha]: Enquadramento internacional. Lisboa: Assembleia da República.

DILP, 2020. [Consult. 26 jun. 2021]. Disponível na Intranet da AR:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=130318&img=15602&save=true.

Resumo: «A presente síntese, feita a pedido de um Grupo Parlamentar, pretende recolher informação sobre

as principais medidas que estão a ser equacionadas ou aplicadas noutros países, quanto à possibilidade de

libertação de reclusos das prisões no contexto da COVID-19. Foram, assim, identificados para pesquisa os

seguintes países: Austrália, Alemanha, Espanha, Estados Unidos da América, França, Israel, Itália, Polónia e

Reino Unido. Apesar de não tendo sido possível obter informação oficial, devido à escassez de tempo para a

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preparação da resposta, optou-se por se apresentar algumas notícias que permitem perceber o quadro político

relativo à situação no Irão».

UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME – COVID-19 preparedness and responses in prisons

[Em linha]. [Viena]: UNODC, 2020. [Consult. 30 jun. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=130621&img=16066&save=true.

Resumo: Este documento orientador das Nações Unidas alerta para a necessidade imperiosa de se tomarem

medidas que estejam de acordo com Regras Mínimas Padrão das Nações Unidas para o Tratamento de

Prisioneiros (United Nations Minimum Standards for the Treatment of Prisoners), no âmbito da pandemia da

COVID-19. Segundo esta agência das Nações Unidas são necessárias medidas especiais de saúde pública

dentro das prisões para proteger as pessoas que estão dentro das prisões (e também as que estão fora que,

por contato, podem ser infetadas). Muito importante na resposta ao combate à pandemia é a redução de novas

admissões e a libertação de categorias selecionadas de presos.

———

PROJETO DE LEI N.º 906/XIV/2.ª

(GARANTE O CUMPRIMENTO DA CONVENÇÃO DE ISTAMBUL REFORÇANDO A PROTEÇÃO DAS

VÍTIMAS EM CASO DE ASSÉDIO SEXUAL)

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e nota técnica

elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

PARTE I – Considerandos

I. a) Nota introdutória

A Deputada Cristina Rodrigues (N insc.) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República, em 7

de julho de 2021, o Projeto de Lei n.º 906/XIV/2.ª – Garante o cumprimento da Convenção de Istambul

reforçando a proteção das vítimas em caso de assédio sexual.

Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º da Constituição

da República Portuguesa e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos

formais previstos no artigo 124.º desse mesmo Regimento.

Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, em 8 de julho de 2021, a iniciativa

vertente baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão do

respetivo parecer.

Em 15 de julho foram solicitados pareceres à Ordem dos Advogados, Conselho Superior da Magistratura e

Conselho Superior do Ministério Publico. À data da elaboração do presente relatório foram já recebidos todos

os pareceres.

I. b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

Com a presente iniciativa legislativa pretende-se proceder à alteração do artigo 170.º do Código Penal, «com

o intuito de criminalizar as situações em que são proferidas palavras de índole sexual e punindo estas situações

com uma pena de prisão até dois anos ou com pena de multa».

Propõe-se igualmente o agravamento da pena caso o assédio ocorra em ambiente laboral, dado que, de

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acordo com a proponente, «a ocorrência destas situações é muito significativa (…) e existe, na maior parte dos

casos, relações de subordinação/hierarquia, da qual o agressor se aproveita e que colocam a vítima numa

situação de maior vulnerabilidade».

A proponente justifica estas alterações no sentido de que estas permitirão «(…) combater o medo que as

pessoas têm em fazer queixa, particularmente quando estamos no âmbito das relações de trabalho, e a falta de

confiança que têm na justiça por duvidarem que tal as possa ajudar. Por outro lado, passam a mensagem que

a sociedade não tolera este tipo de comportamentos, incentivando uma mudança de atitudes, prevenindo a

ocorrência de situações de assédio e violência e promovendo a criação de uma sociedade igualitária».

Na exposição de motivos a proponente justifica o impulso legislativo com a necessidade de dar cumprimento

integral ao artigo 40.º da Convenção de Istambul1, respeitante ao «Assédio sexual», e que determina que «As

Partes deverão adotar as medidas legislativas ou outras que se revelem necessárias para assegurar que

qualquer tipo de comportamento indesejado de natureza sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o

intuito ou o efeito de violar a dignidade de uma pessoa, em particular quando cria um ambiente intimidante,

hostil, degradante, humilhante ou ofensivo, seja passível de sanções penais ou outras sanções legais».

Neste sentido, alega a Deputada Cristina Rodrigues que a atual redação do artigo 170.º do Código Penal,

respeitante ao crime de importunação sexual, não contempla todas as condutas que podem configurar situações

de assédio sexual, nomeadamente, não criminaliza «o denominado assédio de rua», como conversas, piropos

ou gestos, atos que, no seu entender, não se traduzindo em propostas de teor sexual – essas punidas pelo

artigo 170.º – têm cariz sexual e importunam os visados.

Na exposição de motivos são ainda referidos os dados divulgados pela Comissão para a Igualdade no

Trabalho e no Emprego – CITE, em 2015, em que o assédio sexual foi sinalizado por 12,6% das pessoas

inquiridas, dos quais 14,4% eram mulheres e 8,6% homens, e o estudo «As mulheres em Portugal, hoje – Quem

são, o que pensam e o que sentem», da Fundação Francisco Manuel dos Santos, de 2019, no qual 16% das

mulheres inquiridas declararam ter sido vítimas de assédio sexual.

Em concreto, a presente iniciativa propõe as seguintes alterações legislativas:

 Alteração do artigo 170.º (Importunação sexual) do Código Penal2, propondo, para o efeito, que o ato de

proferir palavras de teor sexual passe a integrar o respetivo tipo legal daquele crime e que a moldura

penal aplicável seja agravada, estabelecendo, designadamente, a previsão de punição com pena de

prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias;

 Alteração ao artigo 177.º (Agravação) do Código Penal3, no sentido possibilitar o agravamento das penas

previstas no artigo 170.º, quando o crime de importunação sexual for cometido:

1 Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica, adotada em Istambul, a 11 de maio de 2011 – Aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 4/2013, de 21 de janeiro. 2 Artigo 170.º – Importunação sexual Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de carácter exibicionista, formulando propostas de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal. 3 Artigo 177.º – Agravação 1 – As penas previstas nos artigos 163.º a 165.º e 167.º a 176.º são agravadas de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se a vítima: a) For ascendente, descendente, adotante, adotado, parente ou afim até ao segundo grau do agente; ou b) Se encontrar numa relação familiar, de coabitação, de tutela ou curatela, ou de dependência hierárquica, económica ou de trabalho do agente e o crime for praticado com aproveitamento desta relação. c) For pessoa particularmente vulnerável, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez. 2 – As agravações previstas no número anterior não são aplicáveis nos casos da alínea c) do n.º 2 do artigo 169.º e da alínea c) do n.º 2 do artigo 175.º 3 – As penas previstas nos artigos 163.º a 167.º e 171.º a 174.º são agravadas de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se o agente for portador de doença sexualmente transmissível. 4 – As penas previstas nos artigos 163.º a 168.º e 171.º a 175.º, nos n.os 1 e 2 do artigo 176.º e no artigo 176.º-A são agravadas de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se o crime for cometido conjuntamente por duas ou mais pessoas. 5 – As penas previstas nos artigos 163.º a 168.º e 171.º a 174.º são agravadas de metade, nos seus limites mínimo e máximo, se dos comportamentos aí descritos resultar gravidez, ofensa à integridade física grave, transmissão de agente patogénico que crie perigo para a vida, suicídio ou morte da vítima. 6 – As penas previstas nos artigos 163.º a 165.º, 168.º, 174.º, 175.º e no n.º 1 do artigo 176.º são agravadas de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, quando os crimes forem praticados na presença ou contra vítima menor de 16 anos; 7 – As penas previstas nos artigos 163.º a 165.º, 168.º e 175.º e no n.º 1 do artigo 176.º são agravadas de metade, nos seus limites mínimo e máximo, se a vítima for menor de 14 anos. 8 – Se no mesmo comportamento concorrerem mais do que uma das circunstâncias referidas nos números anteriores só é considerada para efeito de determinação da pena aplicável a que tiver efeito agravante mais forte, sendo a outra ou outras valoradas na medida da pena.

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– Conjuntamente por duas ou mais pessoas (alteração ao n.º 4 do artigo 177.º);

– Na presença ou contra vítima menor de 16 anos (alteração ao n.º 6 do artigo 177.º);

– Contra vítima menor de 14 anos (alteração ao n.º 7 do artigo 177.º); ou

– Em ambiente laboral (aditamento de um novo n.º 8 ao artigo 177.º).

Prevê-se a entrada em vigor do diploma 30 dias após a sua publicação.

I. c) Enquadramento legal

Os crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual encontram-se previstos no Capítulo V do Título

(Crimes contra as pessoas) da Parte Especial do Código Penal (CP), em duas secções diferentes, que

compreendem, respetivamente:

– Secção I – Os crimes de coação sexual (artigo 163.º), violação (artigo 164.º), abuso sexual de pessoa

incapaz de resistência (artigo 165.º), abuso sexual de pessoa internada (artigo 166.º), fraude sexual (artigo

167.º), procriação artificial não consentida (artigo 168.º), lenocínio (artigo 169.º) e importunação sexual (artigo

170.º);

– Secção II – Os crimes de abuso sexual de crianças (artigo 171.º), abuso sexual de menores dependentes

ou em situação particularmente vulnerável (artigo 172.º), atos sexuais com adolescentes (artigo 173.º), recurso

à prostituição de menores (artigo 174.º), lenocínio de menores (artigo 175.º), pornografia de menores (artigo

176.º), crime de aliciamento de menores para fins sexuais (artigo 176.º-A) e organização de viagens para fins

de turismo sexual com menores (artigo 176.º-B).

O referido Capítulo V compreende ainda uma Secção III, que contém disposições comuns aos crimes acima

referidos sobre agravação (artigo 177.º), queixa (artigo 178.º) e inibição do poder paternal e proibição do

exercício de funções (artigo 179.º).

É no artigo 170.º do Código Penal que se encontra criminalizada a «importunação sexual» de outra pessoa

através de três condutas típicas distintas: a prática perante ela de atos de caráter exibicionista, a formulação de

propostas de teor sexual e o constrangimento a contacto de natureza sexual.

O crime de importunação sexual previsto no artigo 170.º do CP é punido com pena de prisão até 1 ano ou

com pena de multa até 120 dias, que sobe para prisão até três anos se a vítima for menor de 14 anos (artigo

171.º, n.º 3, alínea a); se a vítima tiver entre os 14 e os 18 anos, este crime é punido com pena de prisão até um

ano (artigo 172.º, n.º 2).

Nos termos do n.º 1 do artigo 177.º, a pena é agravada de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se

a vítima: for ascendente, descendente, adotante, adotado, parente ou afim até ao segundo grau do agente; se

encontrar numa relação familiar, de coabitação, de tutela ou curatela, ou de dependência hierárquica, económica

ou de trabalho do agente e o crime for praticado com aproveitamento desta relação; ou se for pessoa

particularmente vulnerável, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez.

Conforme dispõe o artigo 178.º do Código Penal, o procedimento criminal depende de queixa, a não ser

quando a vítima seja menor ou dele resulte suicídio ou morte da vítima.

A redação atual do artigo 170.º resultou das alterações introduzidas ao Código Penal pela Lei n.º 59/2007,

de 4 de setembro, e pela Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto.

Foi através da Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto, que se deu cumprimento ao disposto na Convenção de

Istambul, designadamente, autonomizando o crime de mutilação genital feminina, criando os crimes de

perseguição e casamento forçado e alterando os crimes de violação, coação sexual e importunação sexual. A

alteração introduzida em 2015 à redação do artigo 170.º do Código Penal aditou ao tipo legal do crime a

expressão «formulando propostas de teor sexual».

Para um enquadramento legal e doutrinário mais exaustivo remete-se para a nota técnica elaborada pelos

serviços (em anexo).

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I. d) Antecedentes parlamentares

De acordo com a nota técnica (em anexo) encontram-se pendentes sobre a mesma matéria ou sobre matéria

conexa com a presente iniciativa legislativa – crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual –, as

seguintes iniciativas legislativas:

– Projeto de Lei n.º 852/XIV/2.ª (PAN) – Prevê o crime de assédio sexual, procedendo à quinquagésima

terceira alteração ao Código Penal e à décima oitava alteração ao Código do Trabalho;

– Projeto de Lei n.º 672/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) – Reforça a liberdade e

autodeterminação sexual criminalizando a divulgação não consentida de fotografias ou vídeos que contenham

nudez ou ato sexual;

– Projeto de Resolução n.º 1289/XIV/2.º (PAN) – Recomenda ao Governo a implementação de um código de

conduta nos locais de trabalho e programas de formação para a prevenção e combate ao assédio sexual.

Na atual Legislatura, em matéria de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, foram já

apreciadas as seguintes iniciativas legislativas:

– Projeto de Lei n.º 701/XIV/2.ª (IL) – Consagra os crimes de violação, de coação sexual e de abuso sexual

de pessoa incapaz de resistência como crimes públicos, rejeitado na sessão plenária de 2 de junho 2021;

– Projeto de Lei n.º 702/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) – Altera o Código Penal, atribuindo

a natureza de crime público aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, rejeitado na sessão

plenária de 15 de abril 2021;

– Projeto de Lei n.º 771/XIV/2.ª (PAN) – Consagra a natureza pública dos crimes de violação, de coação

sexual, de fraude sexual, de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência e de procriação artificial não

consentida e alarga os prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores

e do crime de mutilação genital feminina, procedendo à alteração do Código Penal e do Código de Processo

Penal, rejeitado na sessão plenária de 2 de junho 2021;

– Projeto de Lei n.º 772/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira) – Procede a uma alteração do

Código Penal, atribuindo a natureza de crime público aos crimes de coação sexual, violação e abuso sexual de

pessoa incapaz de resistência, garantindo a conformidade deste diploma com a Convenção do Conselho da

Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção de

Istambul), rejeitado na sessão plenária de 2 de junho 2021.

PARTE II – Opinião da relatora

A relatora signatária do presente relatório exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o

presente projeto de lei, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do

Regimento da Assembleia da República.

PARTE III – Conclusões

1 – A Deputada Cristina Rodrigues (N insc.) apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º

906/XIV/2.ª – «Garante o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas em caso

de assédio sexual».

2 – O presente projeto de lei propõe-se proceder à alteração do artigo 170.º do Código Penal no que respeita

ao crime de importunação sexual, propondo-se, para o efeito, que o ato de proferir palavras de teor sexual passe

a integrar o respetivo tipo legal daquele crime e que a respetiva moldura penal aplicável seja agravada.

3 – A iniciativa legislativa prevê igualmente uma proposta de alteração ao artigo 177.º do Código Penal,

possibilitando o agravamento das penas previstas no artigo 170.º, nomeadamente quando o crime de

importunação sexual for cometido em ambiente laboral.

4 – Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de

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parecer que o Projeto de Lei n.º 906/XIV/2.ª reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido

e votado em Plenário.

Palácio de São Bento, 29 de setembro de 2021.

A Deputada relatora, Emília Cerqueira — O Presidente da Comissão, Luís Marques Guedes.

Nota: As parte I e III do parecer foram aprovadas por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PAN e

do CH, na reunião da Comissão de 29 de setembro de 2021.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 906/XIV/2.ª (N insc. Cristina Rodrigues)

Garante o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas em caso de

assédio sexual

Data de admissão: 8 de julho de 2021.

Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Sónia Milhano (DAPLEN), Luís Silva(BIB), Maria João Godinho e Luísa Colaço (DILP), Ana Montanha e Vanessa Louro (DAC). Data: 10 de setembro de 2021.

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

O projeto de lei sub judice visa alterar o Código Penal no que respeita ao crime de importunação sexual, p.

e p. pelo artigo 170.º1, propondo, para o efeito, que o ato de proferir palavras de teor sexual passe a integrar o

1 Ligação para o artigo retirada do sítio na Internet do Diário da República Eletrónico (https://dre.pt/). Salvo indicação em contrário, todas as ligações para referências legislativas são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico.

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respetivo tipo legal daquele crime e que a moldura penal aplicável seja agravada, estabelecendo,

designadamente, a previsão de punição com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias2.

A presente iniciativa legislativa integra igualmente uma proposta de alteração ao artigo 177.º do Código

Penal, no sentido possibilitar o agravamento das penas previstas no artigo 170.º, quando o crime de

importunação sexual for cometido:

• Conjuntamente por duas ou mais pessoas (alteração ao n.º 4 do artigo 177.º);

• Na presença ou contra vítima menor de 16 anos (alteração ao n.º 6 do artigo 177.º);

• Contra vítima menor de 14 anos (alteração ao n.º 7 do artigo 177.º); ou

• Em ambiente laboral (aditamento de um novo n.º 8 ao artigo 177.º).

Justificando a sua pretensão, a proponente alega que o referido artigo 170.º não contempla todas as condutas

que podem configurar situações de assédio sexual, nomeadamente, não abrange «o denominado assédio de

rua», referindo-se a atos que, não se traduzindo em propostas de teor sexual, essas punidas pelo artigo, têm

cariz sexual e importunam os visados, como conversas, piropos ou gestos. Defende a proponente que a

criminalização de condutas desta natureza dará pleno cumprimento ao artigo 40.º da Convenção do Conselho

da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção

de Istambul), ratificada pelo Estado português, que, sob a epígrafe «Assédio sexual», determina que «as Partes

deverão adotar as medidas legislativas ou outras que se revelem necessárias para assegurar que qualquer tipo

de comportamento indesejado de natureza sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o intuito ou o

efeito de violar a dignidade de uma pessoa, em particular quando cria um ambiente intimidante, hostil,

degradante, humilhante ou ofensivo, seja passível de sanções penais ou outras sanções legais».

Na exposição de motivos, a proponente alerta para o impacto que assédio sexual pode gerar na vida das

vítimas, criando perturbações na sua saúde física e mental, bem como no desenvolvimento das suas relações

interpessoais, com especial enfoque nas consequências provocadas pelo assédio sexual ocorrido em contexto

laboral. Chama ainda a atenção para os «números expressivos» do assédio sexual em Portugal, aludindo a

estudos realizados pela Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE)3 e pela Fundação

Francisco Manuel dos Santos4, concluindo que a frequência com que este fenómeno ocorre e o impacto que

gera na vida das vítimas, determina a necessidade da alteração legislativa preconizada pelo presente projeto de

lei.

A iniciativa legislativa em apreço contém três artigos preambulares: o primeiro definidor do respetivo objeto,

o segundo alterando os artigos 170.º e 177.º do Código Penal e o último determinando o início de vigência da

lei que vier a ser aprovada.

• Enquadramento jurídico nacional

O crime de importunação sexual, previsto no artigo 170.º do Código Penal (CP)5, cuja alteração ora se

propõe, encontra-se inserido no Capítulo V do Título I (Crimes contra as pessoas) da Parte Especial do CP,

relativo aos crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual, que incluem:

– Na Secção I (crimes contra a liberdade sexual) – os crimes de coação sexual (artigo 163.º), violação (artigo

164.º), abuso sexual de pessoa incapaz de resistência (artigo 165.º), abuso sexual de pessoa internada (artigo

166.º), fraude sexual (artigo 167.º), procriação artificial não consentida (artigo 168.º), lenocínio (artigo 169.º) e o

já mencionado crime de importunação sexual (artigo 170.º);

– Na Secção II (crimes contra a autodeterminação sexual) – os crimes de abuso sexual de crianças (artigo

171.º), abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável (artigo 172.º), atos

2 Atualmente, o artigo 170.º prevê a aplicação de pena de prisão até 1 ano ou pena de multa até 120 dias. 3 «Guia para a elaboração do código de boa conduta para a prevenção e combate ao assédio no trabalho» disponível para consulta em: http://cieg.iscsp.ulisboa.pt/images/Guia_Cite.pdf. 4 «As mulheres em Portugal, hoje – Quem são, o que pensam e o que sentem» disponível para consulta em: https://www.ffms.pt/File Download/b6eb24e5-3bf3-411d-9f35-b51a7ebed3e8/estudo-mulher-completo. 5 Diploma consolidado (a partir do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março) retirado do sítio na Internet do Diário da República Eletrónico. Todas as referências legislativas são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico, salvo indicação em contrário.

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sexuais com adolescentes (artigo 173.º), recurso à prostituição de menores (artigo 174.º), lenocínio de menores

(artigo 175.º), pornografia de menores (artigo 176.º), crime de aliciamento de menores para fins sexuais (artigo

176.º-A) e organização de viagens para fins de turismo sexual com menores (artigo 176.º-B).

O referido Capítulo V compreende ainda uma Secção III, que contém disposições comuns aos crimes acima

referidos sobre agravação (artigo 177.º, cuja alteração também se propõe na iniciativa objeto da presente nota

técnica), queixa (artigo 178.º) e inibição do poder paternal e proibição do exercício de funções (artigo 179.º).

O artigo 170.º do Código Penal, na redação atualmente em vigor, criminaliza a «importunação sexual» de

outra pessoa através de três condutas típicas distintas: a prática perante ela de atos de caráter exibicionista, a

formulação de propostas de teor sexual e o constrangimento a contacto de natureza sexual.

Como se conclui no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães (Processo n.º 1700/17.1IPBBRG.G1) de

23 de novembro de 2020, este crime «visa proteger a liberdade sexual de outra pessoa, numa dupla dimensão:

negativa, significando genericamente a liberdade de não suportar condutas que agridam ou constranjam a esfera

sexual da pessoa, e positiva, como liberdade de interagir sexualmente sem restrições».

O crime de importunação sexual é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias,

que sobe para prisão até três anos se a vítima for menor de 14 anos [artigo 171.º, n.º 3, alínea a)]; se a vítima

tiver entre os 14 e os 18 anos, este crime é punido com pena de prisão até um ano (artigo 172.º, n.º 2).

Nos termos do n.º 1 do artigo 177.º, a pena é agravada de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se

a vítima: for ascendente, descendente, adotante, adotado, parente ou afim até ao segundo grau do agente; se

encontrar numa relação familiar, de coabitação, de tutela ou curatela, ou de dependência hierárquica, económica

ou de trabalho do agente e o crime for praticado com aproveitamento desta relação; ou se for pessoa

particularmente vulnerável, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez.

Conforme dispõe o artigo 178.º do Código Penal, o procedimento criminal depende de queixa, a não ser

quando a vítima seja menor ou dele resulte suicídio ou morte da vítima.

A redação atual do artigo 170.º resultou das alterações introduzidas ao Código Penal pela Lei n.º 59/2007,

de 4 de setembro6, e pela Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto.

A versão inicial do Código Penal (aprovada pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro7) não continha

qualquer disposição legal correspondente ao atual artigo 170.º 8, tendo o Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março,

introduzido o artigo 171.º, que, sob a epígrafe «Atos exibicionistas», previa que: «Quem importunar outra pessoa,

praticando perante ela atos de caráter exibicionista, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de

multa até 120 dias.». Com as alterações pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, alarga-se o âmbito deste crime,

acrescentando a expressão «ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual», que passa a constar do artigo

170.º como crime de «importunação sexual». Em 2015, este artigo adquire então a sua redação atual, com a

Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto, que aditou a expressão «formulando propostas de teor sexual».

A Lei n.º 83/2015 visou dar cumprimento ao disposto na Convenção de Istambul, autonomizando o crime de

mutilação genital feminina, criando os crimes de perseguição e casamento forçado e alterando os crimes de

violação, coação sexual e importunação sexual. A alteração introduzida a este último decorreu dos trabalhos em

especialidade, em que esteve em discussão, designadamente, a criminalização de forma autónoma do assédio

sexual9.

A doutrina tem vindo a discutir o que se entende por «propostas de teor sexual». Paulo Pinto de Albuquerque

refere que nesta expressão estão incluídas «palavras ou sons exprimidos e comunicados pelo agente, tais como

6 Retificada pela Declaração de Retificação n.º 102/2007, de 31 de outubro. 7 Retificado pela Declaração publicada no Diário da República n.º 279/1982, Série I de 1982/12/03, retificada pela Declaração publicada no Diário da República n.º 25/1983, 1.º Suplemento, Série I de 1983/01/31. 8 «Apenas se previa, no artigo 212.º, o crime de ‘exibicionismo e ultraje público ao pudor’ e, no artigo 213.º, o crime de ‘ultraje ao pudor de outrem’, comportamentos esses que vieram a ser descriminalizados com a Reforma do Código Penal de 1995, orientada no sentido de deixar de considerar os crimes sexuais como crimes ligados aos ‘sentimentos gerais de pudor e de moralidade sexual’. Com efeito, a revisão do Código Penal de 1995 alterou profundamente o enquadramento legal da criminalidade sexual, tendo subjacente o pressuposto de que só se pode considerar legítima a incriminação de condutas do foro sexual se e na medida em que atentem contra um específico bem jurídico eminentemente pessoal, sob pena de, não o fazendo, se estar perante um crime sem vítima. Os crimes sexuais deixaram, assim, de ser tidos como crimes contra os fundamentos ético-sociais da vida em sociedade, como acontecia com os crimes previstos nos artigos 201.º a 218.º da redação originária do Código Penal de 1982, para passarem a ser crimes contra as pessoas e, mais concretamente, contra a liberdade e autodeterminação sexual da vítima.» – cfr. Acórdão n.º 105/2013 (Processo n.º 716/12), do Tribunal Constitucional (disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20130105.html, e consultado a 04/08/2021), que não julgou inconstitucional a norma constante do artigo 170.º do Código Penal, na redação introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, na parte em que tipifica como crime a conduta de quem importunar outra pessoa, constrangendo-a a contacto de natureza sexual.9 Vide trabalhos preparatórios da Lei n.º 83/2015, no portal da Assembleia da República, em https://www.parlamento.pt/Atividade Parlamentar/Paginas/DetalheDiplomaAprovado.aspx?BID=18848, consultados a 04/08/2021.

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piadas, questões, considerações, exprimidas oralmente ou por escrito, bem como expressões ou comunicações

do agente que não envolvam palavras ou sons, como por exemplo, expressões faciais, movimentos com as

mãos ou símbolos»10.

Considera Clara Sottomayor que «O conceito de ‘propostas de teor sexual’ introduzido pela Lei n.º 83/2015,

no tipo legal de crime de importunação sexual (artigo 170.º do CP), deve ser interpretado à luz do conceito de

violência de género da Convenção de Istambul, abrangendo assim, não só convites sexuais não desejados,

como também palavras, comentários ou expressões humilhantes e degradantes sobre o corpo das mulheres e

que o ‘coisificam’ ou que se referem a atos sexuais desejados pelo assediador, ainda que seja usada linguagem

metafórica ou simbólica, mas cujo significado sexual é percetível pela generalidade das pessoas»11.

Refira-se também que o Grupo de Peritos para o Combate à Violência contra as Mulheres e à Violência

Doméstica (GREVIO) do Conselho da Europa, no seu relatório12 de avaliação da implementação por Portugal

das medidas preconizadas na Convenção de Istambul13, publicado em janeiro de 2019, considera que a redação

do artigo 170.º do Código Penal «é particularmente restritiva em comparação com o objetivo do artigo 40.º da

Convenção de Istambul, que é o de tornar passível de sanção legal ou criminal qualquer conduta verbal, não

verbal ou física de natureza sexual indesejada pela vítima, independentemente de se qualificar como um

comportamento «exibicionista» ou uma «proposta» sexual. A conduta verbal que constitui a ofensa pode

consistir em quaisquer palavras ou sons indesejados, como piadas, perguntas ou comentários, expressos ou

comunicados oralmente ou por escrito. A conduta não verbal, por outro lado, abrange qualquer expressão ou

comunicação por parte do perpetrador que não envolva palavras ou sons, por exemplo, expressões faciais,

movimentos das mãos ou símbolos. Tal como está, a formulação atual do Artigo 170.º do CP fica aquém do

objetivo do Artigo 40.º da Convenção de Istambul, que é o de capturar um padrão de comportamento cujos

elementos individuais, se considerados por si próprios, podem não necessariamente resultar numa sanção»

(tradução nossa). Nesse sentido, o GREVIO insta as autoridades portuguesas a rever a definição do crime de

importunação sexual previsto no artigo 170.º do Código Penal (que o relatório denomina crime de «sexual

harassment») com vista a alinhá-lo com os requisitos do artigo 40.º da Convenção de Istambul (pontos 174 e

175 do relatório).

No relatório Sombra14 preparado por um grupo de organizações não-governamentais com intervenção na

área refere-se que «No que diz respeito ao assédio sexual, os comportamentos previstos no artigo 40.º da

Convenção de Istambul, também não estão adequadamente incluídos na disposição legal e punição do crime

de importunação sexual no artigo 170.º do Código Penal Português, nem em qualquer outra regra normativa de

natureza criminal» e considera-se que «Várias investigações devem ser realizadas, nomeadamente no que diz

respeito», entre outros aspetos, ao ‘assédio sexual nas ruas’.

Finalmente, e atentas as alterações propostas ao n.º 8 do artigo 177.º do Código Penal, recorda-se que o

assédio está expressamente proibido, em ambiente laboral, constituindo contraordenação muito grave, nos

termos do artigo 29.º do Código do Trabalho (texto consolidado), aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de

fevereiro. Este artigo define assédio como «o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em facto

de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação

profissional, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe

criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador» (n.º 2), explicitando-se no n.º

3 que constitui assédio sexual «o comportamento indesejado de carácter sexual, sob forma verbal, não verbal

ou física, com o objetivo ou o efeito referido no número anterior».

10 ALBUQUERQUE, Paulo Sérgio Pinto de – Comentário do Código Penal: À luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Lisboa: Universidade Católica, 2015. 1661 p. ISBN 978-972-54-0489-8. 11 SOTTOMAYOR, Clara, O assédio sexual nas ruas e no trabalho: Uma questão de direitos humanosin AAVV, Combater a Violência de Género. Da Convenção de Istambul à Nova Legislação Penal, Universidade Católica Editora, Porto, 2016, disponível em https://clarasottomayor.com/pt/publicacoes, consultado em 04/08/2021. 12 Disponível no sítio na Internet da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género em http://cid.cig.gov.pt/Nyron/Library/Catalog /winlibimg.aspx?skey=984BE0F27D27460B9AC80FF7D4B07F1E&doc=96534&img=141212 (consultado em 30/07/2021). 13 Texto em língua portuguesa disponível no sítio na Internet do Conselho da Europa em https://rm.coe.int/168046253d (consultado em 30/07/2021). A Convenção de Istambul foi adotada em 2011 e entrou em vigor no dia 1 de agosto de 2014; Portugal foi o terceiro Estado-Membro do Conselho da Europa e o primeiro da União Europeia a ratificar esta Convenção, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 4/2013 e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 13/2013, ambos de 21 de janeiro. 14 Disponível no sítio na Internet da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género em https://www.cig.gov.pt/wp-content/uploads/ 2019/01/Relat%C3%B3rio-sombra.pdf (consultado em 30/07/2021).

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II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que, neste momento, se encontram

pendentes sobre a mesma matéria ou sobre matéria conexa, – crimes contra a liberdade e autodeterminação

sexual –, as seguintes iniciativas legislativas:

– Projeto de Lei n.º 852/XIV/2.ª (PAN) 15 – Prevê o crime de assédio sexual, procedendo à quinquagésima

terceira alteração ao Código Penal e à décima oitava alteração ao Código do Trabalho;

– Projeto de Lei n.º 672/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) – Reforça a liberdade e

autodeterminação sexual criminalizando a divulgação não consentida de fotografias ou vídeos que contenham

nudez ou ato sexual;

– Projeto de Resolução n.º 1289/XIV/2.º (PAN) – Recomenda ao Governo a implementação de um código de

conduta nos locais de trabalho e programas de formação para a prevenção e combate ao assédio sexual,

• Antecedentes parlamentares

Na atual Legislatura, em matéria de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, foram apreciadas

as seguintes iniciativas legislativas:

– Projeto de Lei n.º 701/XIV/2.ª (IL) – Consagra os crimes de violação, de coação sexual e de abuso sexual

de pessoa incapaz de resistência como crimes públicos, rejeitado na sessão plenária de 2 de junho 2021;

– Projeto de Lei n.º 702/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) – Altera o Código Penal, atribuindo

a natureza de crime público aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, rejeitado na sessão

plenária de 15 de abril 2021;

– Projeto de Lei n.º 771/XIV/2.ª (PAN) – Consagra a natureza pública dos crimes de violação, de coação

sexual, de fraude sexual, de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência e de procriação artificial não

consentida e alarga os prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores

e do crime de mutilação genital feminina, procedendo à alteração do Código Penal e do Código de Processo

Penal, rejeitado na sessão plenária de 2 de junho 2021;

– Projeto de Lei n.º 772/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira) – Procede a uma alteração do

Código Penal, atribuindo a natureza de crime público aos crimes de coação sexual, violação e abuso sexual de

pessoa incapaz de resistência, garantindo a conformidade deste diploma com a Convenção do Conselho da

Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção de

Istambul), rejeitado na sessão plenária de 2 de junho 2021.

Na XIII Legislatura, foram apreciadas sobre matéria conexa, as seguintes iniciativas legislativas:

– Projeto de Lei 1155/XIII/4.ª (PS) – Reformula os crimes de violação, coação sexual e abuso sexual de

pessoa inconsciente ou incapaz no Código Penal, ao abrigo do disposto na Convenção de Istambul, e alarga o

âmbito de aplicação da medida de coação de proibição de contacto aos crimes de ameaça, coação e

perseguição (stalking), e o Projeto de Lei n.º 1047/XIII/4.ª (PAN) – Altera o Código Penal, nomeadamente o

crime de violação, adaptando a legislação à Convenção de Istambul ratificada por Portugal, bem como os

Projetos de Lei n.os 1089/XIII/4.ª (PCP), 1105/XIII/4.ª (BE), 1111/XIII/4.ª (PAN), 1149/XIII/4.ª (PSD), e

1178/XIII/4.ª (CDS-PP), os quais deram origem à Lei n.º 101/2019, de 6 de setembro, Altera o Código Penal,

adequando os crimes de coação sexual, violação e abuso sexual de pessoa internada ao disposto na Convenção

de Istambul, e o Código de Processo Penal, em matéria de proibição e imposição de condutas;

– Projeto de Lei n.º 1058/XIII/4.ª (BE) – Procede à alteração dos crimes de violação e coação sexual no

15 Ligação para o Projeto de lei retirada do sítio na Internet da Assembleia da República (https://www.parlamento.pt/ ). Salvo indicação em contrário, todas as ligações para iniciativas pendentes ou antecedentes parlamentares são feitas para o sítio na Internet da Assembleia da República.

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Código Penal, em respeito pela Convenção de Istambul (quadragésima sétima alteração ao Código Penal),

tendo caducado em 24/10/2009;

Na Legislatura anterior foi igualmente apreciada a Petição n.º 20/XIII/1.ª (de Gabriel Simões Cardoso) –

Solicita que se proceda à criminalização do assédio sexual.

Da XII Legislatura, regista-se, sobre a matéria em apreço, o Projeto de Lei n.º 661/XII/4.ª (BE) – Cria o tipo

legal de assédio sexual no Código Penal, tendo dado origem, conjuntamente com outras iniciativas, à Lei n.º

83/2015, de 5 de agosto – Trigésima oitava alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82,

de 23 de setembro, autonomizando o crime de mutilação genital feminina, criando os crimes de perseguição e

casamento forçado e alterando os crimes de violação, coação sexual e importunação sexual, em cumprimento

do disposto na Convenção de Istambul.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada pela Deputada não inscrita Cristina Rodrigues, ao abrigo e nos

termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição16 e da alínea b) do n.º 1 do artigo

4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (Regimento), que consagram o poder

de iniciativa da lei.

Assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do Regimento,

encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto

principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, pelo que a iniciativa cumpre os requisitos formais

previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Respeita igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento,

uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o

sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.

Ao introduzir alterações ao Código Penal, a presente iniciativa incide sobre matéria enquadrável na alínea c)

do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, constituindo, assim, reserva relativa de competência legislativa da

Assembleia da República.

O projeto de lei em apreciação deu entrada em 7 de julho de 2021, foi admitido e, por despacho de S. Ex.ª o

Presidente da Assembleia da República, baixou, para discussão na generalidade, à Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª), em 8 de julho, data do seu anúncio em reunião plenária.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

A lei formulário17 estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos

diplomas que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa, pelo que deverá ser tida em conta

no decurso do processo da especialidade na Comissão e aquando da redação final.

Antes de mais, assinala-se que o título do projeto de lei em apreciação – «Garante o cumprimento da

Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas em caso de assédio sexual» – traduz sinteticamente

o seu objeto, mostrando-se em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da referida lei, embora, em

caso de aprovação, deva ser aperfeiçoado.

De facto, considerando que visa introduzir alterações ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82,

de 23 de setembro, o título do projeto de lei deve fazer menção a esse facto, tal como recomendam as regras

de legística formal, segundo as quais «o título de um ato de alteração deve identificar o diploma alterado»18, por

questões informativas e no sentido de tornar clara a matéria objeto do ato normativo.

16 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República. 17 A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas. 18 DUARTE, David [et al.] – Legistica: Perspectivas sobre a concepção e redacção de actos normativos. Coimbra: Almedina, 2002. P. 201.

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Consequentemente, em caso de aprovação, sugere-se o seguinte aperfeiçoamento do título da presente

iniciativa:

«Altera o Código Penal, reforçando a proteção das vítimas em caso de assédio sexual, em cumprimento da

Convenção de Istambul».

Refira-se ainda que, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário, «Os diplomas que alterem outros

devem indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar

aqueles diplomas que procederam a essas alterações (…)». No sentido de dar cumprimento a esta norma, o

artigo 2.º do projeto de lei elenca os diplomas que introduziram alterações anteriores ao Código Penal. Ora, há

que ter em conta que a lei formulário foi aprovada e publicada num contexto de ausência de um Diário da

República Eletrónico, sendo que, neste momento, o mesmo é acessível universal e gratuitamente. Em face do

exposto, atendendo ao elevado número de alterações sofridas pelo código em causa, por motivos de segurança

jurídica e tentando manter uma redação simples e concisa, parece-nos mais seguro e eficaz não indicar o elenco

de diplomas que procederam a modificações anteriores.

Em caso de aprovação, a iniciativa em apreço revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, sendo objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República nos termos da alínea c) do n.º 2 do

artigo 3.º da lei formulário.

No que respeita à entrada em vigor, o artigo 3.º do projeto de lei estabelece que a mesma deve ocorrer no

prazo de 30 dias a contar da sua publicação, observando o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que

determina que «Os atos legislativos e os outros atos de conteúdo genérico entram em vigor no dia neles fixado,

não podendo, em caso algum, o início da vigência verificar-se no próprio dia da publicação».

Na presente fase do processo legislativo a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em

face da lei formulário.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento no plano da União Europeia

Nos termos do disposto do artigo 2.º do Tratado da União Europeia19 (TUE), a União funda-se nos valores

do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do estado de direito e do respeito

pelos direitos do Homem. Dispõe ainda o artigo 3.º que a União tem por objetivo promover a paz, os seus valores

e o bem-estar dos seus povos. Também a Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia20, nomeadamente,

nos seus artigos 1.º, 3.º e 6.º, prevê a defesa da dignidade do ser humano, do direito à sua integridade, física

ou mental, bem como à sua liberdade, que abrange também a liberdade sexual.

Com base jurídica no artigo 83.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)21, o

Parlamento Europeu (PE) e o Conselho, por meio de diretivas adotadas de acordo com o processo legislativo

ordinário, podem estabelecer regras mínimas relativas à definição das infrações penais e das sanções em

domínios de criminalidade particularmente grave com dimensão transfronteiriça que resulte da natureza ou das

incidências dessas infrações, ou ainda da especial necessidade de as combater, assente em bases comuns.

Um passo importante em relação à prevenção e ao combate à violência contra as mulheres foi a assinatura,

em 2017, pela União Europeia (UE), da Convenção de Istambul de 201122, que, ainda que nem todos os seus

Estados-Membros a tenham ratificado23, deve ser lida como sinal de empenho da União na luta contra

manifestações de género contra mulheres, bem como caminho para dotar a União no seu espaço geográfico e

no mundo de instrumentos jurídicos de ação.

19 https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:9e8d52e1-2c70-11e6-b497-01aa75ed71a1.0019.01/DOC_2&format=PDF. 20 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:12016P/TXT&from=FR. 21 https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:9e8d52e1-2c70-11e6-b497-01aa75ed71a1.0019.01/DOC_3&format=PDF. 22 https://rm.coe.int/168046253d. 23 Desde agosto de 2021, foi assinado por todos os Estados-Membros da UE, e ratificado por 21 (Alemanha, Áustria, Bélgica, Croácia, Chipre, Dinamarca, Espanha, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polónia, Portugal, Roménia, Eslovénia e Suécia). Cumpre ainda salientar que em julho de 2020, o Governo polaco anunciou a sua intenção de se retirar da Convenção. Para uma informação mais detalhada do processo ver https://www.europarl.europa.eu/legislative-train/theme-area-of-justice-and-fundamental-rights/file-eu-accession-to-the-istanbul-convention.

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A Convenção de Istambul, traduz, assim, uma via de reconhecimento jurídico transnacional, quanto à

natureza da violência contra as mulheres, caraterizada como uma manifestação das relações de poder

historicamente desiguais entre mulheres e homens que levou à dominação e discriminação das mulheres

privando-as do seu pleno progresso. Por isso, e também reconhecendo que a natureza estrutural da violência

contra as mulheres é baseada no género, a Convenção aplica-se a todas as formas de violência contra as

mulheres, incluindo o assédio sexual.

A Convenção prevê diversas condutas especialmente gravosas, nomeadamente o artigo 40.º (assédio

sexual), a que alude a presente iniciativa. Nos termos do artigo 18.º, n.º 2, as Partes tomarão as medidas

legislativas ou outras necessárias, para assegurar a existência de mecanismos apropriados que permitam a

cooperação eficaz entre todas as instituições relevantes para a proteção e o apoio das vítimas e testemunhas

de todas as formas de violência cobertas pelo âmbito de aplicação da Convenção, nomeadamente, através de

recurso a serviços de apoio gerais e especializados indicados nos artigos 20.º e 22.º da Convenção e no n.º 4

prevêque «o fornecimento de serviços não deve depender da vontade das vítimas de apresentar queixa ou de

testemunhar contra qualquer autor de uma infração».

A Presidente Ursula von der Leyen estabeleceu como uma das seis prioridades da Comissão para 2019-

202424, a promoção do modo de vida europeu25 tendo em vista a proteção dos cidadãos europeus, a justiça e

os valores da UE, tendo como um dos seus domínios de intervenção os Direitos Fundamentais26 procurando

promover, designadamente, a igualdade entre homens e mulheres e luta contra a violência baseada no género27.

Na comunicação Uma União da Igualdade: Estratégia para a Igualdade de Género 2020-202528 a Comissão

estabelece objetivos estratégicos e as principais ações que visam a construção de uma Europa em que a

igualdade de género seja concretizada até 2025.

Segundo o estabelecido nesta Estratégia, a Convenção de Istambul é tida como referência para as normas

internacionais neste domínio, constituindo uma prioridade fundamental para a Comissão, afirmando que se a

adesão da UE à Convenção de Istambul continuasse bloqueada, a Comissão proporia, em 2021, medidas,

dentro dos limites da competência da UE, para alcançar os mesmos objetivos que aquela Convenção,

manifestando, em particular, a intenção de apresentar uma iniciativa com vista a alargar os domínios de

criminalidade em que a harmonização é possível, os denominados «eurocrimes», a formas específicas de

violência de género, nos termos do já mencionado artigo 83.º, n.º 1, do TFUE e propondo medidas adicionais

para prevenir e combater formas específicas de violência de género, incluindo o assédio sexual. A Estratégia

também determina um conjunto de medidas para combater o assédio sexual no âmbito laboral.

Cumpre também salientar que a Presidência portuguesa do Conselho da UE, organizou, em abril deste ano,

a Conferência de Alto Nível «10.º Aniversário da Assinatura da Convenção de Istambul. O estado da arte»,

fazendo um balanço desta década, na qual se analisaram os impactos da pandemia, refletiram-se as medidas

e ações necessárias para pôr fim a todas as formas de violência contra as mulheres e raparigas, nomeadamente,

a já mencionada nova Estratégia da UE para a Igualdade de Género 2020-2025.

O PE aprovou também diversas resoluções relativamente à matéria em apreço, nomeadamente:

– A Resolução do PE de 26 de outubro de 2017, sobre a luta contra o assédio sexual e os abusos sexuais

na UE29 que exortou o Conselho a adotar a cláusula «passerelle» e a identificar todas as formas de violência de

género como domínios de criminalidade ao abrigo do artigo 83.º, n.º 1 do TFUE 30 apelando à «Tolerância zero

e luta contra o assédio sexual e o abuso sexual na UE», condenando todas as formas de violência sexual e

física ou de assédio psicológico.

– A Resolução do PE, de 26 de novembro de 2020, sobre a situação dos direitos fundamentais na UE –

Relatório anual para os anos 2018-201931 na qual o PE refere que «a violência com base no género, em todas

as suas formas, incluindo assédio e violência no local de trabalho, em casa e em linha, constitui uma violação

24 https://ec.europa.eu/info/strategy/priorities-2019-2024_pt. 25 https://ec.europa.eu/info/strategy/priorities-2019-2024/promoting-our-european-way-life_pt. 26 https://ec.europa.eu/info/policies/justice-and-fundamental-rights_pt. 27 https://ec.europa.eu/info/policies/justice-and-fundamental-rights/gender-equality/gender-based-violence/ending-gender-based-violence_en. 28 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX:52020DC0152. 29 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=OJ:JOC_2018_346_R_0026&from=PT. 30 Ver parágrafo 12 da resolução. 31 https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/TA-9-2020-0328_PT.html.

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dos direitos fundamentais que afeta todos os níveis da sociedade (…) e representa um importante obstáculo à

igualdade entre homens e mulheres».

• Enquadramento internacional

A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha e França.

ESPANHA

A dignidade da pessoa, os direitos invioláveis que lhe são inerentes, o livre desenvolvimento da

personalidade, o respeito pela lei e pelos direitos dos outros são reconhecidos, no artigo 10 da Constituição32

espanhola, como fundamentos da ordem política e da paz social.

A Ley Orgánica 10/1995, de 23 de noviembre33, del Código Penal, integra o crime de assédio sexual nos

crimes contra a liberdade sexual, com um capítulo próprio, o Capítulo III, do Título VIII34 do Livro II (Crimes e

suas penas) do Código Penal.

O atentado contra a liberdade sexual de uma pessoa, mediante violência ou intimidação, é punido pelo artigo

178 com pena de prisão de um a cinco anos. No artigo 181 é punido o abuso sexual, com pena de prisão de um

a três anos ou pena de multa de 18 a 24 meses.

No sistema penal espanhol, o assédio sexual em meio laboral configura um tipo autónomo, previsto e punido

no artigo 184. Tipifica-se o crime de assédio sexual no âmbito de uma relação de trabalho, docente ou de

prestação de serviços, continuada ou habitual, punindo com uma pena de prisão de três a cinco meses ou multa

de 6 a 10 meses quem, no âmbito dessa relação, solicite favores de natureza sexual, para si ou um terceiro, e

com esse comportamento provocar à vítima numa situação objetiva gravemente intimidatória, hostil ou

humilhante (n.º 1).

A pena será agravada para prisão de cinco a sete meses e multa de 10 a 14 meses, se o autor tiver cometido

o facto prevalecendo-se de uma situação de superioridade laboral, docente ou hierárquica, ou com o anúncio

expresso ou tácito de causar à vítima um mal relacionado com as legítimas expectativas que aquela possa ter

no âmbito dessa relação (n.º 2 do artigo 184). Se a vítima for especialmente vulnerável, em função da idade,

doença ou outra situação, é aplicável igual pena agravada pela prática dos atos previstos no n.º 1 e é aplicável

uma pena de prisão de seis meses a um ano pelos atos previstos no n.º 2.

No caso de crime de assédio sexual, o procedimento depende de queixa do lesado, do seu representante

legal ou de iniciativa do Ministério Público. Quando a vítima for menor, portadora de deficiência que necessita

de proteção especial ou indefesa, basta uma denúncia do Ministério Público. Nestes crimes, o perdão do

ofendido ou do representante legal não extingue a ação penal nem a responsabilidade da mesma35.

O artigo 192 prevê também a aplicação da medida de liberdade vigiada, a cumprir depois de cumprida a pena

de prisão. Esta medida terá a duração de um a cinco anos, por o crime em causa ser considerado um crime

menos grave.

O Código Penal classifica os crimes em graves, menos graves ou leves consoante sejam punidos com uma

pena grave, menos grave ou leve (artigo 13). A classificação das penas consta do artigo 33, incluindo-se a pena

aplicável ao assédio sexual no âmbito de uma relação de trabalho, docente ou de prestação de serviços nas

penas menos graves.

As relações laborais são reguladas pelo Real Decreto Legislativo 2/2015, de 23 de octubre36, por el que se

32 Diploma consolidado retirado do portal oficial boe.es. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a Espanha são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário. 33 Texto consolidado. 34 O Título VIII engloba os Delitos contra la libertad e indemnidad sexuales. 35 É o seguinte o teor do artigo 191 do Código Penal: «Artículo 191 1. Para proceder por los delitos de agresiones, acoso o abusos sexuales, será precisa denuncia de la persona agraviada, de su representante legal o querella del Ministerio Fiscal, que actuará ponderando los legítimos intereses en presencia. Cuando la víctima sea menor de edad, persona con discapacidad necesitada de especial protección o una persona desvalida, bastará la denuncia del Ministerio Fiscal.2. En estos delitos el perdón del ofendido o del representante legal no extingue la acción penal ni la responsabilidad de esa clase.» 36 Texto consolidado.

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aprueba el texto refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores, que plasma, no seu artigo 4, os direitos

dos trabalhadores.

Considera como direitos básicos os direitos ao trabalho e à livre escolha da profissão, à sindicalização, à

negociação coletiva e à greve, o direito de reunião e o direito à informação e à participação na empresa.

Consagra ainda os seguintes direitos dos trabalhadores em relação ao trabalho: à ocupação efetiva; à

promoção e formação profissional; a não ser discriminado, direta ou indiretamente no acesso ao emprego e,

uma vez empregado, a não ser discriminado por razões de sexo, estado civil, idade dentro do respeito pela lei,

origem racial ou étnica, condição social, religião ou convicção religiosa, ideias políticas, orientação sexual,

pertença ou não a um sindicato, em razão da língua, e ainda por ser portador de uma incapacidade, desde que

apto a desempenhar as funções; à sua integridade física e a uma política adequada de prevenção dos riscos

laborais; ao respeito à sua intimidade e à consideração devida à sua dignidade, incluindo à proteção em relação

a assédio por razões de origem racial ou étnica, religião, incapacidade, idade ou orientação sexual, bem como

assédio sexual ou assédio em função do sexo; à perceção pontual da remuneração devida; ao exercício

individual das ações derivadas do seu contrato de trabalho, bem como todos os direitos que derivem

especificamente do seu contrato de trabalho.

O Real Decreto Legislativo 5/2000, de 4 de agosto, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley sobre

Infracciones y Sanciones en el Orden Social, prevê a punição do assédio sexual ou o assédio em função do

sexo no local de trabalho como uma infração social, se outra não lhe couber a título de sanção penal ou

administrativa.

O assédio sexual ou em função do sexo integra o elenco das infrações muito graves em matéria de relações

laborais, nos termos dos pontos 13 e 13bis do artigo 8 deste diploma.

Os critérios de graduação das sanções constam do artigo 39, podendo estas ser aplicadas nos seus graus

mínimos, médios e máximos, tendo em consideração a negligência e intencionalidade do infrator, a existência

de fraude ou conivência, o incumprimento de avisos prévios da Inspeção, o volume de negócios da empresa, o

número de trabalhadores ou beneficiários afetados, se aplicável, bem como os danos causados e o montante

da fraude.

As infrações muito graves, como as aplicáveis ao caso em apreço, são sancionadas com multa de 6251 a 25

000 euros, no seu grau mínimo, de 25 001 a 100 005 euros, no seu grau médio, e de 100 006 a 187 515 euros,

no seu grau máximo.

FRANÇA

O assédio sexual é punido, em França, pelo artigo L222-33 do Code Pénal37. Este consiste na imposição, a

uma pessoa, de forma repetida, de propostas e comportamento com conotação sexual ou sexista, seja atentando

à sua dignidade, devido ao seu carácter degradante ou humilhante, seja criando uma situação intimidante, hostil

ou ofensiva.

O tipo do crime é preenchido igualmente por qualquer forma de pressão grave, mesmo não repetida, com a

finalidade real ou aparente de obter um ato sexual, em benefício do autor dos factos ou de um terceiro.

Se chegar a haver contacto físico, pode ser preenchido o tipo do crime de agressão sexual, previsto e punido

nos termos do artigos L222-22 a L222-33-1 do Código Penal.

O assédio sexual é punido com pena de prisão de dois anos e multa de 30 000 euros, podendo ser agravada

para 3 anos de prisão 45 000 euros de multa se os factos forem praticados: Por uma pessoa que abuse da

autoridade que lhe conferem as funções que exerce; sobre um menor de 15 anos; sobre uma pessoa

particularmente vulnerável, devido a idade, doença, deficiência física ou psíquica ou estado de gravidez,

aparente ou do conhecimento do autor; sobre uma pessoa cuja vulnerabilidade ou dependência resultante de

precariedade económica ou social seja aparente ou conhecida do autor; por diversas pessoas agindo como

autores ou em cumplicidade; por meios eletrónicos; na presença de um menor; ou por um ascendente ou outra

pessoa que detenha autoridade de direito ou de facto sobre a vítima.

A proteção dos trabalhadores contra o assédio sexual no âmbito das relações laborais está prevista nos

37 Diploma consolidado retirado do portal oficial legifrance.gouv.fr. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a França são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário.

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artigos L1153-1 a L1153-6 do Code du Travail38.

No primeiro destes artigos determina-se que nenhum trabalhador deve ser submetido a atos que constituam

assédio sexual – propostas ou comportamentos repetidos, com conotação sexual, que sejam um atentado à sua

dignidade, devido ao seu carácter degradante ou humilhante, ou que criem uma situação intimidante, hostil ou

ofensiva – ou que a este sejam assimilados, por constituírem uma forma de pressão grave, mesmo não repetida,

com a finalidade real ou aparente de obter um ato de natureza sexual, seja em benefício do autor ou de terceiro.

O artigo L1153-2 proíbe qualquer discriminação de um trabalhador, estagiário ou candidato a um trabalho,

estágio ou formação por ter sido submetido ou recusar-se a submeter a uma situação de assédio sexual.

O Código do Trabalho impõe ainda ao empregador a adoção de medidas preventivas contra o assédio sexual

no local de trabalho, nomeadamente a divulgação do teor do artigo L222-33 do Código Penal.

Para além da sanção penal, o autor de assédio sexual é ainda punível disciplinarmente, nos termos do artigo

L1153-6 do Código do Trabalho.

Ainda sobre esta matéria, destacam-se três circulares: A Circulaire DGT 2012/14 du 12 novembre 2012

relative au harcèlement et à l’application de la loi n.º 2012-954 du 6 août 2012 relative au harcèlement sexuel,

do Ministério do Trabalho, do Emprego, da Formação Profissional e do Diálogo Social, a Circulaire n° SE1 2014-

1 du 4 mars 2014, relative à la lutte contre le harcèlement dans la fonction publique, do Ministério da Reforma

do Estado, da Descentralização e da Função Pública, e a Circulaire du 9 mars 2018 relative à la lutte contre les

violences sexuelles et sexistes dans la fonction publique, do Ministério da Ação e das Contas Públicas.

• Organizações internacionais

CONSELHO DA EUROPA

Em 11 de maio 2011, o Conselho da Europa adotou a Convenção para a Prevenção e o Combate à Violência

contra as Mulheres e a Violência Doméstica39 40, também denominada Convenção de Istambul, por ter sido

adotada naquela cidade. A implementação desta Convenção é monitorizada pelo Grupo de Peritos sobre o

Combate à Violência contra as Mulheres e à Violência Doméstica do Conselho da Europa, ou GREVIO, previsto

no artigo 66 desta Convenção.

No seu relatório de avaliação41 da implementação, por Portugal, das medidas adotadas na Convenção de

Istambul, publicado em janeiro de 2019, o GREVIO destacou o significativo empenho demonstrado pelas

autoridades portuguesas ao longo dos anos para combater a violência contra as mulheres bem como os esforços

para promover a igualdade entre mulheres e homens, focando especificamente o quadro legislativo construído

desde 2013, ano em que Portugal ratificou a Convenção de Istambul, para combater a violência contra as

mulheres.

São ainda identificadas algumas questões prioritárias que requerem medidas adicionais para que as

disposições da Convenção sejam cumpridas por Portugal, destacando-se a adoção de uma definição de

violência doméstica que inclua a noção de violência económica, tal como previsto no artigo 3b da Convenção; a

adequação do conceito de vítima ao conteúdo do artigo 3e da Convenção; e a adaptação da legislação nacional

ao disposto no artigo 55 da mesma, nomeadamente no que toca à não dependência de denúncia ou queixa da

vítima para a investigação ou processamento de infrações relacionadas com situações de violência física e

sexual.

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT)

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) adotou, em 21 de junho de 2019 a Convenção n.º 19042 43,

38 Texto consolidado. 39 Disponível em: https://rm.coe.int/168046253d. 40 A Convenção de Istambul foi aprovada, para ratificação, pela Resolução da Assembleia da República n.º 4/2013, de 21 de janeiro, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 13/2013, da mesma data. 41 Disponível em: https://rm.coe.int/grevio-reprt-on-portugal/168091f16f. 42 Versão em inglês disponível em: https://www.ilo.org/global/publications/meeting-reports/WCMS_721160/lang--en/index.htm. 43 Até ao momento, ainda não ratificada por Portugal.

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sobre a eliminação da violência e assédio no mundo do trabalho. Esta convenção reconhece «o direito de todos

a um mundo do trabalho livre de violência e assédio, incluindo o baseado em questões de género», que «a

violência e o assédio no mundo do trabalho podem constituir uma violação ou abuso dos direitos humanos e são

uma ameaça à igualdade de oportunidades, sendo inaceitáveis e incompatíveis com um trabalho decente», e

que são «incompatíveis com o desenvolvimento de empresas sustentáveis, com impacto negativo na

organização do trabalho e nas relações laborais»44.

Nos termos do seu artigo 2.º, esta convenção protege os trabalhadores e outras pessoas no mundo do

trabalho, independentemente da sua situação contratual, bem como estagiários, voluntários e candidatos a

emprego, e aqueles que exercem a autoridade, os deveres e as responsabilidades de um empregador,

aplicando-se a todos os setores, tanto públicos como privados. São abrangidas as situações de violência e

assédio que ocorrem no local de trabalho, onde o trabalhador é pago, descansa ou toma as suas refeições, bem

como instalações sanitárias e vestiários, durante viagens, eventos ou atividades sociais relacionadas com o

trabalho, através de comunicações relacionadas com o trabalho, nas acomodações fornecidas pelo empregador

e durante o caminho de e para o trabalho.

Em simultâneo com esta Convenção, foi adotada a Recomendação n.º 20645, sobre violência e assédio, que

contém as propostas destinadas aos membros da OIT, para concretização do parágrafo 2 do artigo 4.º da

Convenção.

A OIT tem uma página na Internet dedicada ao combate à violência e assédio sexual no local de trabalho.

Da informação aí disponível destaca-se um resumo46 sobre assédio sexual na indústria do entretenimento,

setor que é particularmente exposto a este tipo de fenómenos, no qual se analisam as tendências e padrões de

assédio sexual nesta indústria e é fornecida informação sobre a legislação de diversos países aplicável a esta

realidade, bem como outros meios para proteger os trabalhadores da indústria.

É de realçar também o projeto «Combating violence and harassment in the world of work & Equal

remuneration and career opportunities for men and women», numa parceria entre a OIT e França, iniciado em 1

de novembro de 2020 e que se prolonga até 31 de dezembro de 2024. Este projeto tem dois objetivos: Combater

a violência e o assédio no mundo do trabalho e reduzir as diferenças de género quanto a salários e evolução na

carreira.

V. Consultas e contributos

• Consultas obrigatórias e facultativas

Em 15 de julho de 2021, a Comissão promoveu a consulta escrita do Conselho Superior da Magistratura, do

Conselho Superior do Ministério Público e da Ordem dos Advogados.

Todos os pareceres e contributos remetidos à Assembleia da República serão publicados na página desta

iniciativa na Internet.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

O preenchimento, pelo proponente, da ficha de avaliação prévia de impacto de género da presente iniciativa,

em cumprimento do disposto na Lei n.º 4/2018, de 9 de fevereiro, devolve como resultado uma valoração neutra

do impacto de género.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

44 Tradução livre. 45 Versão em inglês. 46 Disponível em: https://www.ilo.org/actrav/info/pubs/WCMS_761947/lang--en/index.htm.

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que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. Sem

prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta fase do

processo legislativo, a presente iniciativa não nos suscita questões relacionadas com a utilização de linguagem

discriminatória.

VII. Enquadramento bibliográfico

ASSÉDIO sexual e moral no local de trabalho [Em linha]. 1.ª ed. Lisboa: Comissão para a Igualdade no

Trabalho e no Emprego, 2016. [Consult. 2 jun. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=124075&img=21879&save=true.

ISBN 978-972-8399-63-4.

Resumo: «A pesquisa teve como ponto de partida a comparação com os dados recolhidos num inquérito

pioneiro realizado em 1989 (Amâncio e Lima, 1994) sobre assédio sexual sobre mulheres. Considerando as

enormes transformações ocorridas nestes últimos 25 anos, constituiu-se também como objeto de investigação

em 2015 o assédio moral e alargou-se a inquirição aos homens, antes só referente às mulheres.»

O presente estudo foi desenvolvido pelo Centro Interdisciplinar de Estudos de Género, entre 2014 e 2016 e

aborda os seguintes tópicos: assédio sexual e moral: perspetiva histórica e conceptual; Portugal: assédio sexual

25 anos depois, o que mudou?; assédio sexual no local de trabalho; assédio moral; assédio sexual e moral em

perspetiva comparada; prevenir e intervir; assédio sexual e/ou moral na voz das pessoas alvo de assédio.

CAEIRO, Pedro; FIGUEIREDO, José Miguel – Ainda dizem que as leis não andam: Reflexões sobre o crime

de importunação sexual em Portugal e em Macau. In Um diálogo consistente [Em linha]: olhares recentes

sobre temas do direito português e de Macau. Macau: Associação de Estudos de Legislação e Jurisprudência

de Macau, 2016. [Consult. 7 set. 2021]. P. 160-207. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=135985&img=23623&save=true.

ISBN 978-99965-676-0-5.

Resumo: «Este estudo procura levar a cabo uma densificação jurídico-penal da importunação sexual,

interessada, em primeiro lugar, pela análise do ordenamento jurídico português. Começaremos por examinar a

evolução da norma contida no artigo 170.º do CP até à configuração que lhe foi dada em agosto de 2015,

privilegiando os tópicos do bem jurídico e da conduta típica (em particular no que diz respeito ao segmento que

passou a incriminar a ‘formulação de propostas de teor sexual’) no confronto com os princípios constitucionais

da legalidade e da necessidade e proporcionalidade da lei penal. Depois, procederemos à análise do

ordenamento jurídico de Macau, perscrutando aí lugares próximos ou distantes do ordenamento português no

que a este crime diz respeito, levando em conta o processo de revisão do Código Penal de Macau (CPM), em

matéria de crimes sexuais, atualmente em curso. Por fim, enunciaremos as conclusões que o estudo tenha

permitido firmar».

DIAS, Maria do Carmo Saraiva de Menezes da Silva – Notas substantivas sobre crimes contra a liberdade e

autodeterminação sexual. Revista do Ministério Público. Lisboa. ISSN 0870-6107. A. 34, n.º 136 (out.-dez.

2013), p. 59-97. Cota: RP-179.

Resumo: Neste artigo a autora analisa o tema dos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual. O

texto começa por tecer algumas considerações gerais sobre as características da vítima, as características do

agressor e a recolha de provas na investigação. De seguida apresenta algumas particularidades dos crimes

contra a liberdade e autodeterminação sexual, terminando com notas finais sobre o tema em análise.

Guia para a elaboração de código de boa conduta para a prevenção e combate ao assédio no trabalho

[Em linha]. Lisboa: Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, [2018]. [Consult. 7 set. 2021].

Disponível em:

Página 66

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https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=136011&img=23670&save=true.

Resumo: «O assédio sexual e o assédio moral no local de trabalho, enquanto formas de atentar contra a

dignidade das pessoas, não podem ser desvinculados de formas mais genéricas de desigualdade de acesso a

recursos, poderes e prestígio. Por um lado, o mundo do trabalho não está imune a uma ordem de género e uma

ideologia de género que reproduz desigualdades entre homens e mulheres. A vulnerabilidade às desigualdades

de género é um fator fundamental para a promoção das situações de assédio, porque permitem a desvalorização

simbólica e objetiva do lugar ocupado pelas mulheres. Por outro, a natureza hierárquica da organização do

mundo do trabalho potência situações de assédio moral e sexual, na medida em que determina acessos

desiguais a recursos, poderes, autoridade e prestígio (Torres etal, 2016).»

MANUAL de formação para prevenir e combater o assédio sexual e moral no local de trabalho [Em

linha]: trilhos para a tolerância zero. Lisboa: Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, 2016.

[Consult. 7 set. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=136010&img=23666&save=true.

ISBN 978-972-8399-66-5

Resumo: «Este instrumento formativo foi desenvolvido no âmbito do estudo Assédio Sexual e Moral no Local

de Trabalho em Portugal realizado pelo Centro Interdisciplinar de Estudos de Género, CIEG, entre 2014 e 2016

(…).

Assim, este produto formativo está fundamentado num profundo retrato do fenómeno do assédio sexual e

moral no local de trabalho em Portugal. Para fazer este retrato optou-se por cruzar metodologias extensivas e

intensivas. Por um lado, aplicou-se um inquérito por questionário a uma amostra representativa da população

ativa portuguesa (Portugal continental, excluindo o sector primário). Por outro, realizaram-se entrevistas

semiestruturadas a homens e mulheres vítimas de assédio moral e/ou sexual.»

REDINHA, Maria Regina Gomes – Assédio, uma noção binária?. InDireito do trabalho + crise [igual] crise

do direito do trabalho?: Atas do Congresso de Direito do Trabalho. Lisboa: Coimbra Editora, 2011. ISBN

978-972-32-1917-3. P. 265-273. Cota: 12.06.9 – 258/2011.

Resumo: Segundo a autora o ordenamento jurídico-laboral português contempla duas conceções distintas

de assédio que não têm repercussões totalmente coincidentes com o âmbito de aplicação subjetivo dos diplomas

legais de que provêm. O artigo analisa esta noção binária de assédio desenvolvendo os seguintes tópicos: A

noção de assédio no Código de Trabalho de 2003 e no Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas;

e a noção de assédio no Código de Trabalho de 2009.

SEQUEIRA, Alexandra Marques – Do assédio no local de trabalho: um caso de flirt legislativo?: Exercício de

aproximação ao enquadramento jurídico do fenómeno. Questões laborais. Coimbra. ISSN 0872-8267. A. 13,

n.º 28 (2006), p. 241-258. Cota: RP-577.

Resumo: O presente artigo analisa a questão do assédio sexual no local de trabalho. Este é um fenómeno

que, pelo menos ao nível específico do direito do trabalho, foi ignorado durante muito tempo. Segundo a autora,

as normas que reconhecem o referido fenómeno são fundamentais, uma vez que ao celebrar um contrato de

trabalho, o devedor da prestação transmite ao credor desta a disponibilidade da sua força de trabalho, numa

relação que origina, inevitavelmente, dependência. Do mesmo modo, o próprio objeto do contrato cria um

inevitável e variado conjunto de limitações à liberdade pessoal do trabalhador.

Depois de umas considerações iniciais, a autora aborda diferentes tipos de assédio sexual e moral,

terminando por abordar a questão do ónus da prova.

TUERKHEIMER, Deborah – Beyond #metoo. New York University Law Review [Em linha]. Vol. 94, n.º 5,

(nov. 2019), p. 1146-1208. [Consult. 2 jun. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=130145&img=15358&save=true.

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julho de 2021, o Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª – «Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano». No dia 12 de

julho de 2021 o Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª foi admitido e baixou para discussão na generalidade à Comissão

de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação.

A iniciativa é apresentada, no âmbito e termos do poder de iniciativa, consagrados no n.º 1 do artigo 167.º e

na alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), bem como no artigo 118.º e na

alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).

Nos termos do n.º 1 artigo 119.º do RAR, a iniciativa assume a forma de projeto de lei, encontra-se redigida

sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objetivo e é precedida de uma

exposição de motivos, cumprindo com os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.

Para cumprimento da lei formulário é sugerido na nota técnica o «aditamento de um novo artigo 1.º (Objeto)

com a referência aos diplomas alterados e respetivos números de ordem de alteração e leis que os alteraram,

com exceção do Código Civil» e em consequência é sugerida a renumeração dos restantes artigos. É também

referido na nota técnica que «do articulado não consta qualquer artigo sobre o início de vigência, a sua entrada

em vigor inicia-se em conformidade com o previsto no n.º 2 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual ‘Na

falta de fixação do dia, os diplomas referidos no número anterior entram em vigor, em todo o território nacional

e no estrangeiro, no quinto dia após a publicação’».

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa não suscita outras questões quanto ao cumprimento da lei

formulário.

• Análise do diploma

Objeto e motivação

A iniciativa apresentada pelo Grupo Parlamentar do PCP visa alterar a lei do arrendamento urbano, propondo

a alteração ao Código Civil, ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), ao Decreto-Lei n.º 160/2006,

de 8 de agosto, à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março e à Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril.

Segundo os proponentes as alterações legislativas introduzidas ao regime do arrendamento urbano na XIII

Legislatura não foram suficientes para erradicar os fatores de discricionariedade que consideram que se mantêm

em vigor. Fatores esses que consideram terem sido ainda agravados com a pandemia pois esta terá tornado

«ainda mais gritantes as diferenças entre os fracos recursos da imensa maioria dos inquilinos habitacionais – e

os grandes interesses ligados à financeirização do imobiliário».

Enquadramento legal e antecedentes

A nota técnica, que integra o presente parecer, apresenta uma pormenorizada análise ao enquadramento

legal do projeto de lei em causa pelo que se sugere a sua consulta.

Efetuada uma pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, verifica-se que

na XIV Legislatura, sobre a mesma matéria ou matéria conexa existira os seguintes antecedentes

parlamentares:

• Projeto de Lei n.º 488/XIV/1.ª (PCP) – «Alarga o regime extraordinário de proteção aos arrendatários até

31 de dezembro de 2021 e define o prazo para entrega de candidaturas para apoio financeiro do IHRU até 31

de dezembro de 2020», que deu origem à Lei n.º 58-A/2020, de 30 de setembro;

• Projeto de Lei n.º 483/XIV/1.ª (BE) – «Alarga o regime extraordinário de proteção dos arrendatários (quarta

alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março)», que deu origem à Lei n.º 58-A/2020, de 30 de setembro;

• Projeto de Lei n.º 387/XIV/1.ª (PCP) – «Estabelece um regime excecional no arrendamento habitacional e

não habitacional no caso de comprovada diminuição de rendimento», o qual foi rejeitado em sede de votação

na generalidade, no dia 21 de maio de 2021;

• Projeto de Lei n.º 368/XIV/1.ª (PS) – «Procede à terceira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março,

alterada pelas Leis n.os 4-A/2020 e 4-B/2020, ambas de 6 de abril, que aprova medidas excecionais e

temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da COVID-19»,

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que deu origem à Lei n.º 14/2020, de 9 de maio;

• Projeto de Lei n.º 272/XIV/1.ª (CH) – «Pela atribuição de um prazo de três meses de moratória nos

contratos de arrendamento habitacional e não habitacional», o qual foi rejeitado em sede de votação na

generalidade, no dia 2 de abril de 2020;

• Proposta de Lei n.º 47/XIV/1.ª (GOV) – «Autoriza o Governo a aprovar o regime jurídico de arrendamento

forçado», que deu origem à Lei n.º 68/2020, de 5 de novembro;

• Proposta de Lei n.º 32/XIV/1.ª (GOV) – «Altera o regime excecional para as situações de mora no

pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional,

no âmbito da pandemia COVID-19», que deu origem à Lei n.º 17/2020, de 29 de maio;

• Proposta de Lei n.º 21/XIV/1.ª (GOV) – «Estabelece um regime excecional para as situações de mora no

pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional,

no âmbito da pandemia COVID-19», que deu origem à Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril;

• Proposta de Lei n.º 18/XIV/1.ª (GOV) – «Estabelece um regime excecional e temporário de caducidade e

da oposição à renovação dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, atendendo à

pandemia da doença COVID-19», que deu origem à Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril;

• Projeto de Lei n.º 596/XIV/2.ª (BE) – «Alarga o regime extraordinário de proteção dos arrendatários (sétima

alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março)», que deu origem à Lei n.º 75-A/2020, de 30 de dezembro.

Regista-se ainda a existência da Petição n.º 186/XIV/2.ª (Margarida Costa Magalhães Almeida) – «Atual lei

de arrendamento – fazedora de sem-abrigo», com 27 assinaturas, a qual já se encontra concluída.

• Consultas e contributos

Nos termos regimentais foram promovidas as consultas à Associação nacional de Municípios Portugueses

(ANMP) e à Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE).

Até à data da elaboração deste parecer apenas foi recebido o parecer da ANMP que entendeu que a iniciativa

não reúne condições para a emissão de um parecer favorável. Segundo a ANMP «o presente projeto de lei, e

as propostas nele contidas, carecem de melhor reflexão e amadurecimento».

PARTE II – Opinião da Deputada autora do parecer

A signatária do presente parecer exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a iniciativa

em apreço, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do RAR,

reservando o seu Grupo Parlamentar a sua posição para o debate em Plenário.

PARTE III – Conclusões

A Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação é de parecer que o Projeto de Lei n.º

909/XIV/2.ª (PCP) – «Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano», reúne os requisitos constitucionais e

regimentais para ser discutido em Plenário, reservando os grupos parlamentares o seu sentido de voto para o

debate.

Palácio de São Bento, 15 de setembro de 2021.

A Deputada autora do parecer, Maria Begonha — O Vice-Presidente da Comissão, Pedro Coimbra.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CDS-PP e do PEV, na

reunião da Comissão de 15 de setembro de 2021.

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PARTE IV – Anexos

• Nota Técnica do Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª (PCP) – Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano.

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 909/XIV/2 (PCP)

Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano

Data de admissão: 12 de julho de 2021.

Comissão de Economia, Inovação e Obras Públicas (6.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Rita Nobre (DAC), Luís Martins (DAPLEN), Fernando Bento Ribeiro e Cristina Ferreira (DILP) e Luís Silva (BIB). Data: 13 de abril de 2021.

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

A presente iniciativa visa proceder à alteração do regime do arrendamento urbano, propondo, para o efeito,

a alteração de cinco diplomas legais sobre a matéria (Código Civil, Novo Regime do Arrendamento Urbano

(NRAU), Decreto-Lei n.º 160/2006, de 8 de agosto, Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, e Lei n.º 4-C/2020, de 6

de abril)1.

De acordo com os seus proponentes, a necessidade de alterar este regime prende-se com o facto a Lei n.º

31/2012, de 14 de agosto, continuar a ser fonte de preocupação e oposição, por dela resultarem inúmeros

«fatores de injustiça, arbitrariedade [e] conflitualidade».

Na exposição de motivos apresentada, os autores da iniciativa realçam que, não obstante terem sido

introduzidas alterações legislativas ao regime do arrendamento urbano durante a XIII Legislatura, determinados

fatores de discricionariedade permanecem em vigor, tendo estes sido, aliás, agravados pela pandemia de

COVID-19, a qual tornou «ainda mais gritantes as diferenças entre os fracos recursos da imensa maioria dos

inquilinos habitacionais – e os grandes interesses ligados à financeirização do imobiliário».

Por estes motivos, os proponentes consideram ser indispensável uma nova legislação do arrendamento

urbano, motivo pelo qual apresentam a iniciativa ora em análise.

Para uma melhor perceção das alterações apresentadas, foi elaborado um quadro comparativo, que consta

1 Diplomas retirados do sítio na Internet do Diário da República Eletrónico (https://dre.pt/). Todas as referências legislativas são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico, salvo indicação em contrário.

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em anexo à presente nota técnica e dela faz parte integrante.

• Enquadramento jurídico nacional

O direito à habitação está constitucionalmente consagrado no capítulo dos direitos e deveres sociais,

estatuindo para o efeito o artigo 65.º da Constituição que «Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma

habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a

privacidade familiar».

Para assegurar esse direito aos cidadãos, incumbe ao Estado (n.º 2 do referido artigo): «a) Programar e

executar uma política de habitação inserida em planos de ordenamento geral do território e apoiada em planos

de urbanização que garantam a existência de uma rede adequada de transportes e de equipamento social; b)

Promover, em colaboração com as regiões autónomas e com as autarquias locais, a construção de habitações

económicas e sociais; c) Estimular a construção privada, com subordinação ao interesse geral, e o acesso à

habitação própria ou arrendada; d) Incentivar e apoiar as iniciativas das comunidades locais e das populações,

tendentes a resolver os respetivos problemas habitacionais e a fomentar a criação de cooperativas de habitação

e a autoconstrução».

O Estado deve ainda adotar uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o

rendimento familiar e de acesso à habitação própria (n.º 3 do artigo 65.º).

A matéria objeto da presente iniciativa legislativa – Regime do Arrendamento Urbano – tem o seu

enquadramento legal disperso por vários diplomas, desde logo o Código Civil, no seu Capítulo IV – Locação –

do Título II «Dos contratos em especial» (artigos 1022.º a 1120.º).

Há a reter nomeadamente os casos de caducidade (artigo 1051.º), a antecipação de rendas (artigo 1076.º),

os tipos de contrato (artigo 1094.º), a renovação automática (artigo 1096.º), a oposição à renovação ou denúncia

pelo arrendatário (artigo 1098.º), e as denúncias para habitação e justificada (artigos 1102.º e 1103.º)

Diploma central é o «Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU)», que foi aprovado pela Lei n.º 6/2006,

de 27 de fevereiro, e sofreu, entretanto, as seguintes modificações:

1 – Declaração de Retificação n.º 24/2006, de 17 de abril;

2 – Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, que «procede à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano,

alterando o Código Civil, o Código de Processo Civil e a Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro»;

3 – Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro, que «revê o regime jurídico do arrendamento urbano, alterando o

Código Civil e procedendo à segunda alteração à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, à terceira alteração ao

Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto2, e à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 158/2006, de 8 de agosto3»;

4 – Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, que estabelece o «regime de reconhecimento e proteção de

estabelecimentos e entidades de interesse histórico e cultural ou social local (terceira alteração à Lei n.º 6/2006,

de 27 de fevereiro, que aprova o Novo Regime do Arrendamento Urbano, e quarta alteração ao Decreto-Lei n.º

157/2006, de 8 de agosto, que aprova o regime jurídico das obras em prédios arrendados)»;

5 – Lei n.º 43/2017, de 14 de junho, que «altera o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25

de novembro de 1966, procede à quarta alteração à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, que aprova o Novo

Regime do Arrendamento Urbano, e à quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto, que aprova

o regime jurídico das obras em prédios arrendados»;

6 – Lei n.º 12/2019, de 12 de fevereiro, que «proíbe e pune o assédio no arrendamento, procedendo à quinta

alteração ao Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro»;

7 – Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, que prevê «medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio

entre arrendatários e senhorios, a reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e a proteger

arrendatários em situação de especial fragilidade»;

8 – Declaração de Retificação n.º 7/2019, de 7 de março (retificação à Lei n.º 12/2019, de 12 de fevereiro);

9 – Declaração de Retificação n.º 11/2019, de 4 de abril (retificação à Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro);

10 – Lei n.º 2/2020, de 31 de março, que aprova o «Orçamento do Estado para 2020», alterando o artigo

2 Aprova o regime jurídico das obras em prédios arrendados. 3 Aprova os regimes de determinação do rendimento anual bruto corrigido e a atribuição do subsídio de renda.

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35.º da Lei n.º 6/20064, de 27 de fevereiro.

Um diploma considerado pelos proponentes da iniciativa é a Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro (Medidas

destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios, a reforçar a segurança e a

estabilidade do arrendamento urbano e a proteger arrendatários em situação de especial fragilidade),

nomeadamente a norma transitória do artigo 14.º, n.º 3; que prevê a repristinação do n.º 3 do artigo 1095.º5 e o

artigo 1104.º6do Código Civil na redação dada pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro.

Este diploma procedeu nomeadamente: à alteração ao Código Civil – artigos 1041.º, 1069.º, 1074.º, 1083.º,

1095.º, 1096.º, 1097.º, 1098.º, 1101.º, 1103.º, 1104.º e 1110.º; e à quinta alteração ao Novo Regime do

Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro.

É importante reter, visto ser alvo de proposta de alteração pelos proponentes da iniciativa, o diploma que

prevê o «Regime de celebração do contrato de arrendamento urbano», aprovado pelo Decreto-Lei n.º 160/2006,

de 8 de agosto.

De acordo com a exposição de motivos do diploma, «Tendo sido aprovado o Novo Regime do Arrendamento

Urbano (NRAU), pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, importa publicar os diplomas necessários à sua completa

aplicação. Entre esses encontra-se o decreto-lei que regula os elementos do contrato de arrendamento e os

requisitos a que obedece a sua celebração, previsto no n.º 2 do artigo 1070.º do Código Civil, na redação que

lhe foi dada pelo NRAU, o qual agora se publica».

O diploma sofreu uma modificação, tendo sido alterados os artigos 1.º a 3.º e republicado, pelo Decreto-Lei

n.º 266-C/2012, de 31 de Dezembro7.

No âmbito da pandemia da COVID-19 foi exigido ao Governo a aprovação de um conjunto de medidas

excecionais e temporárias com vista a prevenir a transmissão da infeção por SARS-CoV-2. No que concerne ao

arrendamento urbano há a citar, para além dos diplomas que a iniciativa em apreciação pretende alterar, por

exemplo o Decreto-Lei n.º 106-A/2020, de 30 de dezembro (Altera as medidas excecionais e temporárias

relativas à pandemia da doença COVID-19). Este diploma procede à quarta alteração à Lei n.º 4-C/2020, de 6

de abril (artigo 5.º – Apoio financeiro), e estabelece um regime excecional para as situações de mora no

pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional,

no âmbito da pandemia COVID-19. A este respeito, chama-se atenção para o Capítulo II da presente nota

técnica, no qual se abordam alguns dos antecedentes parlamentes

O artigo 8.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, outro dos diplomas legais que esta iniciativa propõe alterar,

estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo

coronavírus SARS-CoV-2 e da COVID-19. Nesta ligação8, para a base de dados da Procuradoria-Geral Distrital

de Lisboa do Ministério Público, pode consultar-se a versão atualizada da lei (após 11 alterações).

O seu artigo 8.º – Regime extraordinário e transitório de proteção dos arrendatários9 – é alvo de proposta de

alteração. Contém as alterações dos seguintes diplomas: Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril; Lei n.º 14/2020, de 9

de maio; Lei n.º 58-A/2020, de 30 de setembro; e Lei n.º 75-A/2020, de 30 de dezembro.

No âmbito das medidas extraordinárias de resposta à situação epidemiológica do novo coronavírus – COVID-

4 Ligação à base de dados da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa do Ministério Público que contém todas as versões do referido artigo: http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?artigo_id=691A0035&nid=691&tabela=leis&pagina=1&ficha=1&so_miolo=&nversao=#artigo, consultada em 09/09/2021. 5 «Artigo 1095.º Estipulação de prazo certo 1 – O prazo deve constar de cláusula inserida no contrato. 2 – O prazo referido no número anterior não pode, contudo, ser inferior a 5 nem superior a 30 anos, considerando-se automaticamente ampliado ou reduzido aos referidos limites mínimo e máximo quando, respetivamente, fique aquém do primeiro ou ultrapasse o segundo. 3 – O limite mínimo previsto no número anterior não se aplica aos contratos para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios, designadamente por motivos profissionais, de educação e formação ou turísticos, neles exarados». 6 «Artigo 1104.º Confirmação da denúncia No caso previsto na alínea c) do artigo 1101.º, a denúncia deve ser confirmada, sob pena de ineficácia, por comunicação com a antecedência máxima de 15 meses e mínima de um ano relativamente à data da sua efetivação». 7 Procede à adaptação à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, do Decreto-Lei n.º 158/2006, de 8 de agosto, que estabelece os regimes de determinação do rendimento anual bruto corrigido e de atribuição do subsídio de renda, e do Decreto-Lei n.º 160/2006, de 8 de agosto, que regula os elementos do contrato de arrendamento e os requisitos a que obedece a sua celebração. 8 http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=3268&tabela=leis&so_miolo=. 9http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?artigo_id=3268A0008&nid=3268&tabela=leis&pagina=1&ficha=1&so_miolo=&nversao=#artigo.

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19, a Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril (alterada pelas Leis n. os 17/2020, de 29 de maio, 45/2020, de 20 de agosto,

e Lei n.º 75-A/2020, de 30 de dezembro) também ela alvo de proposta de alteração por esta iniciativa, criou um

regime excecional para as situações de mora de arrendatários habitacionais no pagamento de rendas devidas

que, cumulativamente, tenham: Uma quebra de rendimentos superiores a 20% face aos rendimentos do mês

anterior ou do período homólogo do ano anterior (mesmo mês de 2019); e uma taxa de esforço com o pagamento

da renda que seja, ou se torne, superior a 35% dos rendimentos da família.

Nos termos da Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril, com as alterações operadas pela Lei n.º 17/2020, de 29 de

maio10, esse regime excecional aplica-se às rendas vencidas a partir do dia 1 de abril de 2020 até ao mês

seguinte ao final do estado de emergência, ou seja, até ao mês de junho de 2020, salvo no caso dos empréstimos

do IHRU11, que abrangem igualmente as rendas que se vençam entre o dia 1 de julho e o dia 1 de setembro de

2020.

O artigo 4.º da Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril, na sua redação atual, regula a «Mora do arrendatário

habitacional», nos seguintes termos: «Nas situações previstas no artigo anterior, o senhorio só tem direito à

resolução do contrato de arrendamento, por falta de pagamento das rendas vencidas nos meses em que vigore

o estado de emergência e no primeiro mês subsequente, se o arrendatário não efetuar o seu pagamento, no

prazo de 12 meses contados do termo desse período, em prestações mensais não inferiores a um duodécimo

do montante total, pagas juntamente com a renda de cada mês».

Ressalvamos a existência do «Balcão Nacional do Arrendamento», que tem competência exclusiva para a

tramitação do procedimento especial de despejo em todo o território nacional.

A Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, a que os proponentes se referem na exposição de motivos, aprovou

medidas destinadas a dinamizar o mercado de arrendamento urbano, alterando, nomeadamente, o regime

substantivo da locação e o regime transitório dos contratos de arrendamento celebrados antes da Lei n.º 6/2006,

de 27 de fevereiro, e criando um procedimento especial de despejo do local arrendado que permita a célere

recolocação daquele no mercado de arrendamento.

Para tornar o arrendamento um contrato mais seguro e com mecanismos que permitam reagir com eficácia

ao incumprimento, foi criado um procedimento especial que permite que a desocupação do imóvel seja realizada

de forma célere e eficaz no caso de incumprimento do contrato por parte do arrendatário.

Foi assim criado, pelo Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de janeiro, junto da Direção-Geral da Administração da

Justiça (DGAJ), o Balcão Nacional do Arrendamento (BNA), enquanto secretaria judicial com competência

exclusiva para a tramitação do procedimento especial de despejo em todo o território nacional.

Por fim, indicamos ainda existência de um «Portal da Habitação»12, com informação pertinente sobre a

matéria, contendo legislação e documentação.

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar (AP) sobre matéria idêntica ou conexa

constatou-se que se encontram pendentes, na XIV Legislatura, as seguintes iniciativas, nomeadamente:

(i) Projeto de Lei 4n.º 96/XIV/1.ª – «Altera o Código Civil, garantindo a não discriminação no acesso ao

arrendamento por quem detém animais de companhia», estando em fase de nova apreciação na comissão na

generalidade;

(ii) Projeto de Lei n.º 249/XIV/1.ª (BE) – «Estabelece a moratória aos processos de despejo decorrentes da

liberalização da Lei do Arrendamento Urbano até á construção de um robusto parque habitacional público»,

estando em fase de apreciação na generalidade;

(iii) Projeto de Lei n.º 171/XIV/1.ª (PCP) – «Cria um regime autónomo de arrendamento para as atividades

económicas, associativas e culturais», estando em fase de apreciação na generalidade;

10 Altera o regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional, no âmbito da pandemia COVID-19, procedendo à primeira alteração à Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril. 11 https://www.portaldahabitacao.pt/. 12 https://www.portaldahabitacao.pt/web/guest/legislacao_menu.

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(iv) Projeto de Lei n.º 157/XIV/1.ª (PCP) – «Alteração ao Regime do Arrendamento Apoiado para Habitação»,

estando em fase de apreciação na generalidade;

(v) Projeto de Lei n.º 69/XIV/1.ª (PCP) – «Prolonga os contratos de arrendamento para 10 anos, garantindo

maior estabilidade aos arrendatários, estando em fase de apreciação na generalidade»;

(vi) Projeto de Lei n.º 14/XIV/1.ª (PCP) – «Extingue o Balcão Nacional do Arrendamento e repõe o

procedimento especial de despejo por via judicial (sétima alteração à Lei n.º 6/2006, de 27 fevereiro, alterada

pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, pela Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro, pela Lei n.º 42/2017, de 14 de

junho, Lei n.º 43/2017, de 14 de junho, Lei n.º 12/2019, de 12 de fevereiro, e pela Lei n.º 13/2019, de 12 de

fevereiro – Novo Regime de Arrendamento Urbano), estando em fase de apreciação na generalidade»;

(vii) Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª (PCP) – «Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano, estando em fase

de apreciação na generalidade»;

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

Efetuada uma pesquisa à base de dados da AP constatou-se que, na XIV Legislatura, existiram, os seguintes

antecedentes parlamentares, sobre matéria idêntica ou conexa:

(i) Projeto de Lei n.º 488/XIV/1.ª (PCP) – «Alarga o regime extraordinário de proteção aos arrendatários até

31 de dezembro de 2021 e define o prazo para entrega de candidaturas para apoio financeiro do IHRU até 31

de dezembro de 2020», que deu origem à Lei n.º 58-A/2020, de 30 de setembro;

(ii) Projeto de Lei n.º 483/XIV/1.ª (BE) – «Alarga o regime extraordinário de proteção dos arrendatários

(quarta alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março)», que deu origem à Lei n.º 58-A/2020, de 30 de setembro;

(iii) Projeto de Lei n.º 387/XIV/1.ª (PCP) – «Estabelece um regime excecional no arrendamento habitacional

e não habitacional no caso de comprovada diminuição de rendimento», o qual foi rejeitado em sede de votação

na generalidade, no dia 21 de maio de 2021, com os votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP e do PAN e a

abstenção do IL;

(iv) Projeto de Lei n.º 368/XIV/1.ª (PS) – «Procede à terceira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março,

alterada pelas Leis n.os 4-A/2020 e 4-B/2020, ambas de 6 de abril, que aprova medidas excecionais e

temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença

COVID-19», que deu origem à Lei n.º 14/2020, de 9 de maio;

(v) Projeto de Lei n.º 272/XIV/1.ª (CH) – «Pela atribuição de um prazo de três meses de moratória nos

contratos de arrendamento habitacional e não habitacional», o qual foi rejeitado em sede de votação na

generalidade, no dia 2 de abril de 2020, com os votos contra do PS e do PSD e abstenções do BE, do PCP, do

CDS-PP, do PAN, do PEV, do IL e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

(vi) Proposta de Lei n.º 47/XIV/1.ª (GOV) – «Autoriza o Governo a aprovar o regime jurídico de arrendamento

forçado», que deu origem à Lei n.º 68/2020, de 5 de novembro;

(vii) Proposta de Lei n.º 32/XIV/1.ª (GOV) – «Altera o regime excecional para as situações de mora no

pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional,

no âmbito da pandemia COVID-19», que deu origem à Lei n.º 17/2020, de 29 de maio;

(viii) Proposta de Lei n.º 21/XIV/1.ª (GOV) – «Estabelece um regime excecional para as situações de mora

no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não

habitacional, no âmbito da pandemia COVID-19», que deu origem à Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril;

(ix) Proposta de Lei n.º 18/XIV/1.ª (GOV) – «Estabelece um regime excecional e temporário de caducidade

e da oposição à renovação dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, atendendo à

pandemia da doença COVID-19», que deu origem à Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril;

(x) Projeto de Lei n.º 596/XIV/2.ª (BE) – «Alarga o regime extraordinário de proteção dos arrendatários

(sétima alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março)», que deu origem à Lei n.º 75-A/2020, de 30 de dezembro.

Regista-se ainda a existência da petição n.º 186/XIV/2.ª (Margarida Costa Magalhães Almeida) – «Atual lei

de arrendamento – fazedora de sem-abrigo», com 27 assinaturas, a qual já se encontra concluída.

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III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada por Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista

Português (PCP), ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º daConstituição13 e do 119.º do Regimento da

Assembleia da República (Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos

Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e b) do n.º 1 do artigo 4.º e do

Regimento, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da

Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do Regimento.

Observa o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do Regimento, e assume a forma de projeto de lei,

em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do Regimento.

A iniciativa encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o

seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previsto

no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Observa, igualmente, os limites à admissão da iniciativa estabelecida no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento,

uma vez que define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa e parece não

infringir a Constituição ou os princípios nela consignados.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 11 de julho de 2021. Por despacho do Presidente da Assembleia

da República, foi admitido a 12 de julho, tendo baixado à Comissão de Economia, Inovação, Obras e Habitação

(6.ª) no mesmo dia.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

O título da presente iniciativa legislativa que «Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano» traduz

sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de

novembro, conhecida como lei formulário.

Segundo as regras de legística formal, nomeadamente do n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário, que estabelece

que «Os diplomas que alterem outros devem indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha

havido alterações anteriores, identificar aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que

incidam sobre outras normas», e considerando que a presente iniciativa legislativa visa introduzir alterações ao

Regime do Arrendamento Urbano, submete-se à consideração da comissão que, em sede de especialidade ou

de redação final, se pondere a adoção do título «Modifica o Regime do Arrendamento Urbano, alterando o

Código Civil, a Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, o Decreto-Lei n.º 160/2006, de 8 de agosto, a Lei n.º 1-A/2020,

de 19 de março, e a Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril)».

Submete-se, igualmente, à consideração da comissão, o aditamento de um novo artigo 1.º (objeto) com a

referência aos diplomas alterados e respetivos números de ordem de alteração e leis que os alteraram, com

exceção do Código Civil.

Na verdade, a lei formulário foi publicada num contexto diferente do atual, uma vez que hoje existe um diário

da república eletrónico, de acesso gratuito e universal, pelo que não se justifica, por uma questão de certeza e

segurança jurídica, colocar o número de ordem de alteração e respetivas alterações relativamente a diplomas

que já sofreram diversas alterações, como é o caso de códigos.

Em consequência, sugere-se a renumeraçãodos artigos seguintes do articulado da iniciativa.

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, devendo ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o

disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário. Considerando, ainda, que do articulado não consta

qualquer artigo sobre o início de vigência, a sua entrada em vigor inicia-se em conformidade com o previsto no

n.º 2 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual «Na falta de fixação do dia, os diplomas referidos no número

anterior entram em vigor, em todo o território nacional e no estrangeiro, no quinto dia após a publicação».

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei

formulário.

13 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República.

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IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional

Países europeus

A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: Espanha,

França e Irlanda.

ESPANHA

A Constituição14 espanhola reconhece, no seu artigo 47.º, o direito de todos os espanhóis a usufruir de uma

habitação digna e adequada.

Até metade da década de oitenta do século passado, o regime jurídico de arrendamento urbano

caracterizava-se por medidas orientadas a apoiar e proteger o inquilino, tanto quanto ao valor das rendas como

quanto à duração dos contratos. As leis de arrendamento urbano (LAU) de 1946, 1956 e, principalmente, a de

196415, eram muito rígidas no que se refere ao bloqueio dos arrendamentos, uma vez que, por um lado, as

rendas estavam praticamente congeladas, pois a sua atualização dependia de decisão governamental que nem

sempre era regular no tempo, e por outro lado, existia a transmissão forçada do contrato de arrendamento a

favor dos herdeiros do arrendatário.

Com a publicação do Real Decreto-Ley 2/1985, de 30 de abril de 1985, teve lugar uma mudança radical no

tratamento do regime do arrendamento urbano com a total liberalização tanto ao nível da duração do contrato

como ao nível da fixação do valor das rendas. A partir desta data passou a existir um mercado dual de

arrendamento urbano: o dos contratos celebrados antes do Real Decreto-Ley 2/1985, os chamados de «renda

antiga», com rendas baixas e sujeitos a transmissão forçada aos descendentes dos arrendatários e os contratos

celebrados após a publicação do Real Decreto-Ley 2/1985, com rendas altas e um elevado grau de rotatividade

ocupacional, como consequência da duração média anual dos contratos.

Para fazer face a essa distorção do mercado, que conduzia a prejuízos para os proprietários e arrendatários,

foi aprovada a Ley 29/1994, de 24 de novembro, de Arrendamientos Urbanos, a qual teve como principal objetivo

o estímulo do setor de arrendamento urbano através de uma regulação mais apertada que a prevista no Real

Decreto-Ley mas dando sempre prioridade à liberdade contratual entre as partes.

Foram as seguintes, ao tempo, as alterações fundamentais que se relacionam com a matéria da iniciativa

legislativa em análise:

• Estabelecimento de um prazo mínimo de duração do contrato, por forma a contribuir para uma estabilidade

das famílias, possibilitando-lhes uma alternativa real à aquisição de casa própria. Apesar de, no artigo 9.º,

se começar por prever a liberdade das partes na fixação do prazo do contrato, a seguir, submete-se o

mesmo a prorrogações obrigatórias anuais até atingir uma duração mínima de cinco anos, caso o prazo

acordado tenha sido inferior;

• Reconhecimento da existência de situações que exigem prazos inferiores de duração, circunscrita à

necessidade – conhecida à data da elaboração do contrato – de reaver o locado para habitação do próprio

proprietário (artigo 9.º);

• Introdução de um mecanismo de prorrogação tácita, decorrido o prazo definido inicialmente no contrato e

caso nenhuma das partes o tenha denunciado, por um novo prazo de 3 anos, renovado anualmente (artigo

10.º);

• A não renovação do contrato caso o proprietário prove necessitar do imóvel para sua habitação própria,

para familiares seus em primeiro grau, adoção, ou para o seu cônjuge em caso de divórcio ou anulação

do casamento.

14 Diploma consolidado retirado do portal oficial boe.es. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a Espanha são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário. 15 Ley 40/1964, de 11 de junio.

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A Ley 29/1994 foi objeto de diversas alterações16, sendo a mais importante a que ocorreu em 2013, pela Ley

4/2013, de 4 de junho, da qual se destaca:

• A duração inicial obrigatória dos contratos foi reduzida de 5 para 3 anos (artigo 9.º);

• A renovação contratual, após a passagem do prazo inicial mínimo de 3 anos, desceu de 3 para 1 ano (artigo

10.º);

• A possibilidade de desistência do arrendamento por parte do arrendatário, desde que decorridos 6 meses

do início do contrato e desde que notifique o senhorio com a antecedência mínima de um mês. A lei prevê

a possibilidade de as partes fixarem uma indemnização ao senhorio no valor de um mês de renda por

cada ano que fique por cumprir (artigo 11.º);

• A atualização das rendas ocorre segundo o convencionado por acordo entre as partes e, na ausência de

estipulação, estas atualizam-se por referência anual ao Índice de Garantia de Competitividade17 (artigos

17.º e 18.º);

• A possibilidade do proprietário de recuperar o fogo arrendado, desde que decorrido um ano após o início

do contrato e desde que o inquilino seja notificado com um mês antecedência, desde que a habitação se

destine a residência permanente sua ou de seus familiares em primeiro grau de consanguinidade ou por

adoção, ou para o seu cônjuge na sequência de separação judicial, divórcio ou nulidade matrimonial

(artigo 9.º, n.º 3);

• Em caso de venda da propriedade arrendada, o contrato só subsiste se estiver registado no Registo de

propriedade dos contratos de arrendamento urbano18 (disposição final 2.ª da Ley 4/2013, de 5 de junho).

Por fim refira-se que o contrato podia ser denunciado nas seguintes situações (artigo 27.º, n.º 2):

a) Falta de pagamento da renda;

b) Falta de pagamento da fiança;

c) Subarrendamento não autorizado;

d) Realização de obras não consentidas pelo proprietário;

d) Quando o arrendatário possua outra habitação permanente.

As medidas de flexibilização e de incentivo ao arrendamento aprovadas com a reforma de 2013 atingiram,

pelo menos parcialmente, seu objetivo. Dinamizaram e tornaram o mercado mais flexível, mas tiveram como

efeito colateral uma menor proteção do arrendatário. No sentido de facilitar o acesso à habitação através do

arrendamento urbano, o Governo espanhol aprovou, em março de 2019, uma nova reforma da lei do

arrendamento urbano (Ley 29/1994) através do Real Decreto-Ley 7/2019, de 1 de março, de medidas urgentes

en materia de vivienda y alquiler. As principais alterações introduzidas consistiram nas seguintes:

• Alteração do prazo de duração do contrato: Mantém-se o princípio de que a duração é acordada entre as

parte mas, enquanto até agora o senhorio podia impor uma duração mínima de três anos por meio de

prorrogações anuais, com a nova lei a duração mínima passa a ser de cinco anos, se o senhorio for uma

pessoa singular e, de sete anos, se for uma pessoa coletiva (artigo 9.º);

• Prorrogação do contrato: Desde a reforma de 2013 a extensão admitida era de um ano. A partir de agora

os contratos de arrendamento passam a poder ser estendidos por mais três anos (artigo 10.º);

• Em caso de alienação do imóvel arrendado, o novo proprietário sub-roga os direitos e obrigações do

vendedor (artigo 14.º).

FRANÇA

Em França, o regime do arrendamento urbano para habitação decorre da Loi n.º 86-1290, de 23 de dezembro

16 Ley 13/1996, de 30 de dezembro; Ley 50/1998, de 30 de dezembro; Ley 55/1999, de 29 de dezembro; Ley 1/2000, de 7 de janeiro; Ley 19/2009, de 23 de novembro; Ley 39/2010, 22 de dezembro; Ley 4/2013, de 4 de junho; Ley 2/2015, de 30 de março; Real Decreto-Ley 21/2018, de 14 de dezembroe Real Decreto-Ley 7/2019, de 1 de março. 17 https://www.ine.es/ss/Satellite?c=Page&cid=1259947704944&pagename=ProductosYServicios%2FPYSLayout&p=1254735893337&L=0. 18 Real Decreto 297/1996, de 23 de febrero, sobre inscripción en el Registro de la Propiedad de los Contratos de Arrendamientos Urbanos.

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de 198619, e da Loi n.º 89-462, de 6 julho de 1989, esta extensamente modificada20.

Existem alguns arrendamentos que ainda estão sujeitos ao regime da Loi n.º 48-1360, de 1 de setembro de

1948, e que abrange as habitações construídas antes de 1 de setembro de 1948 mas cujo campo de aplicação

se vem restringido progressivamente. São, genericamente, arrendamentos de rendas baixas, os quais se

caraterizam essencialmente por não terem de ser reduzidos a escrito e o seu conteúdo não estar regulamentado.

Não há prazo perentório de duração do contrato, admitindo-se a sua duração ilimitada. A revisão das rendas

está sujeita a um limite e deve respeitar os plafons regulamentares fixados anualmente segundo a categoria da

habitação.

O regime da lei de 1948 vai deixando de ser aplicado às habitações abandonadas ou àquelas cujos

beneficiários não exerçam o direito de transmissão do arrendamento.

Das modificações sofridas pela Loi n.º 89-462 destaca-se a que foi aprovada em 2015 com a Loi n.º 2015-

990, de 6 de agosto, também denominada lei Alur, e que teve como objetivo global o crescimento, a atividade e

a igualdade de oportunidades económicas.

A grande inovação que esta lei veio introduzir prende-se com o controle das rendas nas habitações

localizadas em determinadas zonas denominadas «zonas tensas», ou seja, com intensa procura e baixa oferta.

Confrontado perante o facto de cerca de 1/5 dos arrendatários despenderem cerca de 40% do seu

rendimento para a renda de casa, o Governo francês decidiu introduzir medidas legislativas de combate ao

aumento do preço dos arredamentos urbanos.

A lei Alur instituiu um contrato-tipo de arrendamento para fins habitacionais, o qual permitiu uma clarificação

das relações entre senhorios e inquilinos. Este contrato-tipo veio a ser definido pelo Décret n.º 2015-587, de 31

de maio.

Assim, o artigo 3 da Loi n.º 89-462, de 6 de julho, na redação que lhe foi dada pela lei Alur, lista os elementos

que devem constar do contrato de arrendamento, dos quais se destaca a forma escrita que reveste, a lista dos

equipamentos, o nome e o domicílio do senhorio, a duração do contrato e o montante a pagar e condições da

sua revisão, a área, o estado das instalações, as obras de beneficiação efetuadas após a saída do anterior

inquilino, e caso o fogo se insira numa das denominadas «zonas tensas», o montante da renda paga pelo

anterior arrendatário, o preço da renda de referência majorada aplicável na zona em que o fogo se insere e os

honorários dos agentes imobiliários cobrados ao arrendatário. No ato de assinatura do contrato de

arrendamento, o senhorio anexa um dossiê de diagnóstico técnico da fração a arrendar.

Este «contrato-tipo» só é aplicável aos contratos de arrendamento celebrados após 1 de agosto de 2015,

mas abrange todos os arredamentos submetidos ao regime da lei 89-462.

Este artigo foi ainda alterado pelas Lois n.º 2018-1021, de 23 novembro, e n.º 2019-1147, de 8 de novembro.

Segundo o artigo 10, o contrato de arrendamento a proprietários que sejam pessoas singulares tem a duração

de pelo menos três anos21, podendo ser convencionado outro prazo nunca inferior a um ano (artigo 11). Findo

o prazo inicial, o contrato pode ser prorrogado tacitamente ou renovado. Em caso de prorrogação tácita o prazo

da prorrogação é de três anos, em caso de renovação, o prazo desta é o prazo do contrato.

A renda é atualizada nos termos fixados pelas partes ou, em caso de omissão, no fim de cada ano do

contrato. O valor do aumento da renda não pode ultrapassar à variação do índice de referência dos

arrendamentos22 fixada pelo INSEE – Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Económicos.23

Os artigos 15 e 22 da Loi 89-462, conjugados com as disposições constantes das leis 86-1290, de 23

dezembro de 1986, 75-1351, de 31 dezembro de 1975 e 48-1360, de 1 setembro de 1948, consagram os

princípios, com as devidas exceções, com base nos quais o proprietário desencadeia os processos de resolução

do contrato de arrendamento. Esta pode ocorrer no final do prazo estipulado no contrato, em caso de não

pagamento das rendas, ou caso o senhorio precise da habitação para sua própria residência ou alguém da sua

família, para o vender ou por um motivo sério e legítimo.

A principal lei da habitação promulgada mais recentemente é a Loi 2018-1021, de 23 de novembro, também

19 Diploma consolidado retirado do portal oficial legifrance.gouv.fr. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a França são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário. 20 As alterações a que a Loi n.º 89-462, de 6 de julho foi sujeita podem ser consultadas aqui. 21 A lei prevê que no caso de os senhorios serem pessoas coletivas o prazo os contratos de arrendamento sejam de 6 anos, renováveis ou não, dependendo do estipulado pelas partes. 22 https://www.insee.fr/fr/metadonnees/source/indicateur/p1659/description. 23 https://www.insee.fr/fr/accueil.

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conhecida por Loi Élan, portant évolution du logement, de l'aménagement et du numérique. A lei Élan reflete a

«estratégia habitacional» do Governo e abrange áreas tão diversas como o ordenamento do território (operações

de revitalização territorial, urbanismo comercial), o planeamento urbano (autorizações de uso da terra), a

construção (recurso contra licenças de construção), a habitação social (conversão da habitação, arrendamento

de solidariedade), o respeito pelo meio ambiente (renovação energética, aquecimento, livro de manutenção), o

alojamento local (medidas de controlo de arrendamento mobiliado), o despejo por ocupações ilegais, o

condomínio, o combate à habitação indigna e a tecnologia digital (melhoria da cobertura pela implantação de

redes, arrendamento eletrónico).

Em relação ao setor habitacional, a lei Élan altera algumas disposições dispersas da Loi 89-462. Por exemplo,

harmoniza o conceito de habitabilidade para as situações de arrendamentos vários em quartos mobilados com

um só senhorio (artigo 141), põe fim à solidariedade para o pagamento de dívidas de renda em caso de violência

doméstica (artigo 136) e exclui a menção escrita à caução (artigo 134).

O artigo 24 da Loi 89-462 é novamente alterado para evitar despejos, incluindo a consideração de um

possível procedimento de sobre-endividamento (artigo 118 da lei Élan).

É criado um sistema experimental de controlo dos arrendamentos (artigos 139 e 140 da lei Élan) em especial

no que refere à supervisão nas «zonas tensas», impondo multas pesadas para os senhorios não cumpridores,

de 5000 Euros no caso de estes serem pessoas singulares e de 15 000 Euros em caso de pessoas coletivas.

Paralelamente incentiva a criação de observatórios de arrendamento, ( artigos 16 e 5, II, da Loi 89-462). Por fim,

o Governo é autorizado a definir um sistema de incentivo a ferramentas digitais para arrendamentos de

habitações vazias ou mobiladas, facilitando também a entrega desmaterializada dos documentos anexos ao

contrato de arrendamento (o chamado arrendamento digital) (artigo 128).

A lei cria um novo conceito de arrendamento de mobilidade (artigos 107 a 115) o qual consiste num contrato

de arrendamento de curta duração (prazo máximo de duração até 10 meses) de um apartamento mobilado ou

de segundas habitações cujo proprietário deseje recuperar fácil e rapidamente. A lei prevê que este contrato se

destine a determinadas categorias de inquilinos, como por exemplo estudantes, pessoas em formação, em

transferência profissional ou em trabalho temporário.

Importa ainda referir que as normas pelas quais se rege o regime do arrendamento para a habitação

decorrem não só dos diplomas supra mencionados, mas igualmente do Código Civil, do Código da Construção

e da Habitação, e do Código da Segurança Social. No portal do Service-Public-logement24 encontra-se, de forma

detalhada e completa, toda a informação respeitante a esta matéria.

IRLANDA

A principal legislação irlandesa sobre arrendamento urbano consiste no Residential Tenancies Act 200425, o

qual até à data foi objeto de diversas alterações.

Até 2004, a Irlanda possuía um mercado de arrendamento com regras substancialmente diferentes

consagradas no Landlord and Tenant Act 1967 a 1994.

Com a reforma de 2015, o Governo irlandês teve como objetivo travar o constante aumento das rendas para

fins habitacionais e aprovar um regime mais transparente nas relações entre senhorio e inquilino.

A renda é estabelecida através de negociação entre as partes mas o seu montante não pode ser acima do

definido pelos valores de mercado (artigo 19 e seguintes do Residential Tenancies Act 2004). O valor de

mercado vem definido no artigo 24 sendo que o Residential Tenancies Board (RTB)26publica a cada trimestre

o índex27 de referência dos valores das rendas praticados no mercado.

Com regime de 2004 a renda era atualizada a cada 12 meses mas a partir de 2015 essa atualização passou

a ter lugar só a cada 24 meses, a não ser que tenha havido acordo escrito entre as duas partes de outro prazo.

O prazo, por defeito, dos contratos de arrendamentos é de 4 anos, renováveis, sendo que o senhorio pode

livremente resolver o contrato, nos primeiros 6 meses da sua vigência, sem qualquer justificação. Passados

esses 6 meses, o senhorio só pode cancelar o contrato caso se verifique uma de três circunstâncias ou uma de

24 https://www.service-public.fr/particuliers/vosdroits/N19808. 25 Diploma consolidado retirado do portal oficial irishstatutebook.ie. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas à Irlanda são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário. 26 https://www.rtb.ie/. 27 https://www.rtb.ie/research/ar.

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três razões.

As circunstâncias que sustentam o cancelamento unilateral do contrato pelo senhorio são:

• Se o arrendatário não cumprir as suas obrigações legais e contratuais, máxime o não pagamento da renda

ou de outras despesas;

• Se a habitação se tornar muito pequena para as suas necessidades; ou,

• Se o proprietário pretende vender o imóvel, dispondo de 3 meses para tal.

As razões que fundamentam o cancelamento unilateral do contrato pelo senhorio são:

• Se precisar do imóvel para a sua habitação ou de um dos seus familiares imediatos;

• Se pretende fazer obras que obriguem a saída do inquilino;

• Se pretende alterar o fim a que se destina o imóvel, convertendo o arrendamento de habitacional em

comercial.

Os sítios da Internet Citizens’s Information28 e o Threshold29 contém informação mais detalhada sobre os

tipos de arredamento, os direitos e deveres dos proprietários e dos inquilinos, a questão das rendas e ainda uma

lista de modelos de documentos temáticos.

V. Consultas e contributos

• Consultas obrigatórias

O Vice-Presidente da 6.ª Comissão, Deputado Pedro Coimbra, promoveu, nos termos regimentais, a emissão

de parecer pela Associação Nacional de Municípios Portugueses30 (ANMP) e pela Associação Nacional de

Freguesias31 (ANAFRE).

A ANMP concluiu o seu parecer ao afirmar que «o presente projeto de lei, e as propostas nele contidas,

carecem de melhor reflexão e amadurecimento, não reunindo condições para a emissão de parecer favorável».

Tal conclusão resulta, designadamente, do facto de a ANMP considerar que «para que se possa justamente

avaliar os efeitos decorrentes das alterações legislativas introduzidas, desde o ano de 2017 até ao presente, em

matéria de arrendamento é necessário permitir o amadurecimento das medidas (…) podendo a antecipação de

medidas de ‘regime geral’ propiciar uma esfera de proteção excessiva que não equilibre adequadamente a

garantia do direito à habitação das famílias, por um lado, e, por outro, a necessária dinamização e ressurgimento

do mercado do arrendamento».

Até ao presente momento, a ANAFRE ainda não enviou o seu parecer, sendo que o mesmo será

disponibilizado na página da iniciativa logo que seja recebido.

• Consultas facultativas

Atendendo à matéria em causa a Comissão pode, se assim o deliberar, solicitar pareceres escritos ao

Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, IP32, bem como a associações de inquilinos e de proprietários.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

De acordo com a informação constante na ficha de Avaliação Prévia de Impacto de Género (AIG), junta pelo

28 https://www.citizensinformation.ie/en/housing/. 29 https://www.threshold.ie/. 30 Home – Portal Institucional (anmp.pt). 31 http://anafre.pt/home. 32 http://www.ihru.pt/.

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autor da iniciativa legislativa, considera-se que esta tem uma valoração neutra, dado que a totalidade das

categorias e indicadores analisados, assumem essa mesma valoração.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso.

Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta fase

do processo legislativo a redação do projeto de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a

linguagem discriminatória em relação ao género.

VII. Enquadramento bibliográfico

CASTELO, José – Arrendamento: Revisto e atualizado pela nova lei. 3.ª ed. Coimbra: Almedina, 2013.

109 p. ISBN 978-972-40-5089-8. Cota: 12.06.2 – 162/2013.

Resumo: «A legislação tem procurado revitalizar o mercado de arrendamento, através de alterações que

incidem particularmente na atualização dos valores das rendas e na celeridade dos despejos.

O arrendamento é um domínio vasto e complexo que assume importância singular em situação de crise

económica. Conhecer os direitos e obrigações dos inquilinos e senhorios é o objeto deste guia, dirigido aos não

juristas».

COLAÇO, Amadeu – Reforma do novo regime do arrendamento urbano: Guia prático. 4.ª ed. Coimbra:

Almedina, 2012. 349 p. Cota: 12.06.2 – 314/2012.

Resumo: «A Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, doravante designada por RNRAU, veio introduzir profundas

alterações no ‘Novo Regime do Arrendamento Urbano’, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, assim

como em diversas disposições, quer do Código Civil, quer do Código de Processo Civil. Tais alterações,

tendentes a dinamizar o mercado do arrendamento urbano, são de tal modo relevantes, que no entender do

autor consubstanciam uma verdadeira reforma do novo regime do arrendamento urbano. A presente obra tem

em vista responder a muitas das inúmeras questões de ordem prática que a RNRAU encerra. Neste contexto,

inclui um capítulo especialmente dedicado a formulários, os quais, sem prejuízo sempre da análise de cada caso

concreto, constituem linhas de orientação para as situações mais frequentes com que se depara o intérprete da

RNRAU. (…)» (nota ed.).

FIDALGO, Vítor Palmela – Estado atual do regime da transição para o Novo Regime do Arrendamento

Urbano (NRAU) e atualização das rendas. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Lisboa. ISSN 0870-3116. Vol. 60, n.º 1 (2019), p. 147-169. Cota: RP-226.

Resumo: «O presente estudo tem como objetivo estabelecer uma análise do estado atual do regime da

transição para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) e atualização das rendas, no que diz respeito

aos contratos de renda mesmo celebrados antes da vigência do Regime do Arrendamento Urbano (RAU) e aos

contratos não habitacionais celebrados antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de setembro.

dando especial enfoque às recentes alterações levadas a cabo pela Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro.»

FURTADO, Jorge Henrique Pinto – Comentário ao regime do arrendamento urbano. Coimbra: Almedina,

2019. 978 p. ISBN 978-972-40-8123-6. Cota: 12.06.2 – 495/2019.

Resumo: «O regime legal do arrendamento urbano vem sendo sucessivamente torturado com repetidas

alterações.

Sendo elas, embora, geralmente menores e de tendência, obrigam no entanto a uma cuidada atualização,

integração e análise, que se levam a cabo nesta obra, a qual não se queda pela mera enunciação passiva do

postulado legal, mas antes se alargou à respetiva apreciação crítica, essencial a um comentário, naturalmente

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pessoal.

Com recurso frequente ao direito comparado, à jurisprudência e à doutrina, intenta-se proporcionar aqui um

conhecimento aprofundado e fecundo do tema, concitando o leitor a formular, a cada passo, o seu próprio juízo

esclarecido, seja ele de concordância ou de discordância das ideias apresentadas.»

GOMES, Manuel Januário da Costa – A desvinculação ad nutum no contrato de arrendamento urbano na

reforma de 2012: Breves notas. In Estudos em homenagem ao Prof. Doutor José Lebre de Freitas. Coimbra:

Coimbra Editora, 2013. ISBN 978-972-32-2119-0. Vol. 1, p. 391-425. Cota: 12.06.2 – 65/2014.

Resumo: No presente artigo o autor tece algumas considerações sobre o contrato de arrendamento urbano

na reforma de 2012. Depois de uma breve introdução ao tema são desenvolvidos os seguintes tópicos:

considerações gerais sobre o regime de duração do contrato de arrendamento urbano; a (vera e própria)

denúncia do contrato de arrendamento urbano na reforma de 2012; as desvinculações discricionárias nos

contratos de arrendamento com prazo certo; a desvinculação unilateral ad nutum em arrendamentos para

habitação anteriores à Lei 6/2006; a desvinculação unilateral ad nutum em arrendamentos para fins não

habitacionais anteriores à Lei n.º 6/2006.

GOMES, Manuel Januário da Costa – Sobre a (vera e própria) denúncia do contrato de arrendamento:

Considerações gerais. O direito. Coimbra. ISSN 0873-4372. A. 143, n.º 1 (2011), p. 9-32. Cota: RP-270.

Resumo: O presente artigo faz uma análise da denúncia do contrato de arrendamento, quer por parte do

arrendatário quer por parte do senhorio. O autor começa por abordar a denúncia do contrato como modo

específico de cessação das relações contratuais duradoras por tempo indeterminado. De seguida, analisa a

denúncia do arrendatário, posterior e anterior ao NRAU, bem como a denúncia do senhorio, posterior e anterior

ao NRAU.

LEITÃO, Luís de Meneses – Arrendamento urbano. 10.ª ed. Coimbra: Almedina, 2020. 257 p. ISBN 978-

972-40-8945-4. Cota: 12.06.2 – 57/2021.

Resumo: «Como tem sido tradicional nas situações de crise, a pandemia COVID-19 determinou sucessivas

intervenções restritivas dos direitos dos proprietários, através de leis extravagantes, proclamadas como

excecionais e transitórias, mas cuja vigência tem vindo a ser sucessivamente prorrogada. Tornou-se, por isso,

necessário que nesta nova edição desta obra fossem examinados os regimes especiais estabelecidos para o

arrendamento em virtude da pandemia, em ordem a esclarecer as inúmeras dúvidas que o surgimento destas

medidas legislativas imponderadas têm feito surgir nos aplicadores do direito.»

MAGALHÃES, David – Algumas alterações do regime jurídico do arrendamento urbano (Leis n.os 12/2019 e

13/2019, de 12 de fevereiro): O recrudescer do vinculismo. Boletim da Faculdade de Direito. Coimbra. ISSN

0303-9773. Vol. 95, tomo 1 (2019), p. 563-613. Cota: RP-176.

Resumo: «Através das Leis n.os 12/2019 e 13/2019, ambas de 12 de fevereiro, foi novamente alterado o

regime jurídico do arrendamento urbano. Nada de novo numa érea em que as modificações legislativas se

sucedem ad nauseam. Esta intervenção tem, no entanto, uma marca que a destaca das ocorridas nas últimas

três décadas: O recrudescer do vinculismo que, embora com diferentes velocidades consoantes as etapas,

estava em retirada desde 1990. Invertendo a marcha, a maioria parlamentar que apoia o XXI Governo

Constitucional promoveu em vários aspetos o afastamento da autonomia privada e o dirigismo estatal. Os

motivos políticos desta mudança são demasiado evidentes para necessitarem de ser esmiuçados».

MORAIS, Fernando de Gravato – As novas regras transitórias na reforma do NRAU (Lei n.º 31/2012). Julgar.

Lisboa. ISSN 1646-6853. N.º 19 (jan.-abr. 2013), p. 13-36. Cota: RP-257.

Resumo: O presente artigo faz uma análise das regras transitórias que decorreram até ao Novo Regime de

Arrendamento Urbano. Depois de um breve enquadramento histórico o autor aborda as regras relativas ao

arrendamento habitacional: aplicação das regras novas independentemente do tipo de contrato do pretérito;

contratos habitacionais vinculísticos celebrados na vigência do RAU; contratos habitacionais de duração limitada

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Resumo: O movimento #MeToo deu início a um novo tipo de acusação de má conduta sexual, acusação esta

feita através de canais informais de comunicação. Uma análise funcional mostra que os relatórios não oficiais

podem promover fins importantes, contudo o surgimento de acusações informais deve ser uma preocupação

especial para os juristas e advogados, que geralmente partem de certas suposições sobre a primazia dos

sistemas formais de responsabilização. Estas premissas básicas precisam ser revistas caso, ao buscarem

satisfazer as metas que as nossas leis e instituições jurídicas não conseguem atingir, os canais informais de

divulgação de informações estejam a servir como substitutos para os mecanismos de responsabilidade

oficialmente sancionados que monopolizam a atenção dos meios de investigação académica. O recurso a

relatórios não oficiais são soluções alternativas legais imperfeitas, a sua prevalência significa que a lei de má

conduta sexual foi relegada a um estado relativo de imobilidade.

VIOLENCE and harassment in European workplaces [Em linha]: Causes, impacts and policies. Dublin:

European Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions, 2015. [Consult. 2 jun. 2021].

Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=120750&img=2076&save=true.

Resumo: A violência e o assédio são ataques à dignidade pessoal, ao direito a um tratamento igual e não

discriminatório e, muitas vezes, à saúde de uma pessoa. Os trabalhadores afetados por estes ataques pessoais

sentem-se inseguros em relação ao seu trabalho, ausentam-se com maior frequência e podem até ficar

impossibilitados de trabalhar, com os consequentes impactos na produtividade e nos custos corporativos e

públicos. Algumas pesquisas efetuadas a nível nacional apontam para um aumento continuado da violência e

assédio relatados. Certos países europeus, como os países escandinavos, têm políticas mais coordenadas e

estabilizadas para prevenir e combater a violência e o assédio. A consciência do tema a nível nacional, a sua

inclusão na legislação e o grau de envolvimento dos parceiros sociais nas políticas e intervenções definidas

contribuem para que este assunto seja eficazmente abordado.

Nota: Atendendo ao tema em causa, não é possível apresentar toda a bibliografia relevante disponível na

coleção da Biblioteca Passos Manuel, resumindo-se este contributo a alguns dos documentos mais recentes

nesta área. Para uma informação bibliográfica mais completa deverá ser consultado o catálogo da biblioteca.

———

PROJETO DE LEI N.º 909/XIV/2.ª

(ALTERAÇÃO AO REGIME DO ARRENDAMENTO URBANO)

Parecer da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação e nota técnica elaborada

pelos serviços de apoio

Parecer

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexos

PARTE I – Considerandos

• Nota Introdutória

Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) apresentou à Assembleia da República, a 11 de

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celebrados na vigência do RAU; contratos habitacionais (exclusivamente vinculísticos) celebrados antes da

vigência do RAU; aplicação das regras da transmissão por morte a alguns contratos do pretérito. Por último o

autor faz uma análise das regras relativas ao arrendamento não habitacional: aplicação das regras novas

independentemente do tipo de contrato do pretérito; contratos não habitacionais vinculísticos celebrados na

vigência do Decreto-Lei n.º 257/95; contratos não habitacionais de duração limitada celebrados na vigência do

Decreto-Lei n.º 257/95; contratos não habitacionais (exclusivamente vinculísticos) celebrados antes da vigência

do Decreto-Lei n.º 257/95; aplicação das regras da transmissão por morte a alguns contratos do pretérito.

PASSOS, Márcia – Guia do arrendamento em tempo de COVID-19: Regimes em, e após, estado de

emergência e reflexos futuros. Coimbra: Almedina, 2020. 320 p. ISBN 978-972-40-8593-7. Cota: 28.46 –

336/2020.

Resumo: «O regime do arrendamento urbano sofreu, de novo, perturbações, desta vez ocasionadas pela

situação epidemiológica do novo coronavírus – COVID-19, considerada pela Organização Mundial de Saúde,

em 30 de janeiro de 2020, como situação de emergência de saúde pública de âmbito internacional. Em 18 de

março de 2020, Portugal viu ser declarado o estado de emergência. Encerraram-se empresas, espaços públicos,

reinventaram-se formas de trabalhar e de viver e tudo isso teve enormes reflexos nas relações de arrendamento

habitacional, e não só. Num tempo invulgar, implementaram-se regras excecionais no regime do arrendamento

urbano. E, apesar das mesmas terem um período de vida limitado no tempo, não serão raros os casos em que

os reflexos se evidenciarão no futuro. Este breve guia tem, assim, um cariz histórico, resumindo aquelas que

são as regras que vigoram em Portugal neste período excecional e, por outro lado, um cariz orientador para a

reflexão que se impõe fazer, face às diversas questões que se colocam e colocarão, a curto e médio prazo, nas

relações de arrendamento.»

VALENTE, Edgar Alexandre Martins – Arrendamento urbano: Comentário às alterações legislativas

introduzidas ao regime vigente. Coimbra: Almedina 2019. 183 p. ISBN 978-972-40-7905-9. Cota: 12.06.2 –

275/2019.

Resumo: «O arrendamento urbano foi, recentemente, objeto de diversas alterações legislativas, com a

entrada em vigor de numerosa legislação avulsa, primeiramente com a Lei n.º 30/2018, de 16 de julho e, por

último, com a Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, mediadas por outros diplomas que, de igual forma, contendem

com a matéria em apreço, importando analisar as leis atualmente em vigor, tendo em vista a compreensão do

respetivo âmbito de aplicação das referidas alterações. Neste sentido, a obra em apreço reside na análise

exaustiva aos vários diplomas, alguns sob a forma de comentário aos preceitos alterados e outros através da

exposição geral do respetivo conteúdo e suas implicações em matéria de arrendamento urbano, a fim de auxiliar

o interprete na difícil tarefa de apreensão, compreensão e aplicação das normas vigentes, logrando-se a

utilização prática e intuitiva da presente obra, tanto pelo profissional forense como por qualquer outra pessoa

com interesse na matéria em questão.»

Nota: Atendendo ao tema em causa, não é possível apresentar toda a bibliografia relevante disponível na

coleção da Biblioteca Passos Manuel, resumindo-se este contributo a alguns dos documentos mais recentes

nesta área. Para uma informação bibliográfica mais completa deverá ser consultado o catálogo da biblioteca.

VIII. Anexo

Quadro comparativo entre as alterações propostas e as normas em vigor:

Código Civil (versão atual) Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

Artigo 1051.º (Casos de caducidade)

O contrato de locação caduca: 1 – (Atual corpo do artigo.)

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Código Civil (versão atual) Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

a) Findo o prazo estipulado ou estabelecido por lei; b) Verificando-se a condição a que as partes o subordinaram ou tornando-se certo que não pode verificar-se, conforme a condição seja resolutiva ou suspensiva; c) Quando cesse o direito ou findem os poderes legais de administração com base nos quais o contrato foi celebrado; d) Por morte do locatário ou, tratando-se de pessoa coletiva, pela extinção desta, salvo convenção escrita em contrário; e) Pela perda da coisa locada; f) Pela expropriação por utilidade pública, salvo quando a expropriação se compadeça com a subsistência do contrato; g) Pela cessação dos serviços que determinaram a entrega da coisa locada.

2 – No arrendamento urbano, o contrato não caduca pela verificação dos factos previstos na alínea c) do número anterior se o arrendatário, no prazo de seis meses após tomar conhecimento, comunicar ao senhorio por carta registada com aviso de receção, que pretende manter a sua posição contratual.

Artigo 1076.º (Antecipação de rendas)

1 – O pagamento da renda pode ser antecipado, havendo acordo escrito, por período não superior a três meses.

1 – O pagamento da renda pode ser antecipado por período não superior a três meses desde que a respetiva cláusula seja inserida no texto escrito do contrato assinado pelas partes.

2 – As partes podem caucionar, por qualquer das formas legalmente previstas, o cumprimento das obrigações respetivas.

2 – As partem podem caucionar, por qualquer das formas legalmente previstas, o cumprimento das obrigações respetivas, no limite máximo de uma renda.

3 – No caso da situação prevista do número anterior, a devolução tem de ocorrer até à data da desocupação e entrega do local e constar de documento escrito e assinado pelas partes.

Artigo 1081.º (Efeitos da cessação)

1 – A cessação do contrato torna imediatamente exigível, salvo se outro for o momento legalmente fixado ou acordado pelas partes, a desocupação do local e a sua entrega, com as reparações que incumbam ao arrendatário.

1 – […].

2 – Com antecedência não superior a três meses sobre a obrigação de desocupação do local, o senhorio pode exigir ao arrendatário a colocação de escritos, quando correspondam aos usos da terra.

2 – […].

3 – O arrendatário deve, em qualquer caso, mostrar o local a quem o pretender tomar de arrendamento durante os três meses anteriores à desocupação, em horário acordado com o senhorio.

3 – […].

4 – Na falta de acordo, o horário é, nos dias úteis, das 17 horas e 30 minutos às 19 horas e 30 minutos e, aos sábados e domingos, das 15 às 19 horas.

4 – Na falta de acordo, o horário é, nos dias úteis, das 18 horas às 19 horas e 30 minutos e, aos sábados das 17 horas às 18 horas e 30 minutos.

Artigo 1094.º (Tipos de contratos)

1 – O contrato de arrendamento urbano para habitação pode celebrar-se com prazo certo ou por duração indeterminada.

1 – […].

2 – No contrato com prazo certo pode convencionar-se que, após a primeira renovação, o arrendamento tenha duração indeterminada.

2 – […].

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Código Civil (versão atual) Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

3 – No silêncio das partes, o contrato considera-se celebrado por prazo certo, pelo período de cinco anos.

3 – No silêncio das partes, o contrato considera-se celebrado por prazo certo, pelo período inicial de cinco anos, e renovação automática no fim do prazo e por períodos mínimos de três anos se não for impedida a renovação por qualquer das partes nos termos dos artigos seguintes.

Artigo 1096.º (Renovação automática)

1 – Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior, sem prejuízo do disposto no número seguinte.

1 – O contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração, ou de três anos se este for inferior sem prejuízo do disposto no número seguinte.

2 – Salvo estipulação em contrário, não há lugar a renovação automática nos contratos previstos n.º 3 do artigo anterior.

2 – […].

3 – Qualquer das partes pode opor-se à renovação, nos termos dos artigos seguintes.

3 – […].

Artigo 1097.º (Oposição à renovação deduzida pelo senhorio)

1 – O senhorio pode impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao arrendatário com a antecedência mínima seguinte: a) 240 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis anos; b) 120 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis anos; c) 60 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis meses e inferior a um ano; d) Um terço do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, tratando-se de prazo inferior a seis meses.

1 – […].

2 – A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao termo do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação.

2 – […].

3 – A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data, sem prejuízo do disposto no número seguinte.

3 – […].

4 – Excetua-se do número anterior a necessidade de habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em 1.º grau, aplicando-se, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 1102.º e nos n.os 1, 5 e 9 do artigo 1103.º

4 – (Revogado.)

Artigo 1098.º (Oposição à renovação ou denúncia pelo arrendatário)

1 – O arrendatário pode impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao senhorio com a antecedência mínima seguinte: a) 120 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis anos; b) 90 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis anos; c) 60 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis meses e inferior a um ano; d) Um terço do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, tratando-se de prazo inferior a seis meses.

1 – […].

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Código Civil (versão atual) Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

2 – A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao termo do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação.

2 – […].

3 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, decorrido um terço do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, o arrendatário pode denunciá-lo a todo o tempo, mediante comunicação ao senhorio com a antecedência mínima seguinte: a) 120 dias do termo pretendido do contrato, se o prazo deste for igual ou superior a um ano;

3 – Sem prejuízo do número seguinte, decorrido um décimo do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, o arrendatário pode denunciá-lo a todo o tempo, mediante comunicação ao senhorio com a antecedência mínima seguinte: a) […];

b) 60 dias do termo pretendido do contrato, se o prazo deste for inferior a um ano.

b) […].

4 – Quando o senhorio impedir a renovação automática do contrato, nos termos do artigo anterior, o arrendatário pode denunciá-lo a todo o tempo, mediante comunicação ao senhorio com uma antecedência não inferior a 30 dias do termo pretendido do contrato.

4 – […].

5 – A denúncia do contrato, nos termos dos n.os 3 e 4, produz efeitos no final de um mês do calendário gregoriano, a contar da comunicação.

5 – […].

6 – A inobservância da antecedência prevista nos números anteriores não obsta à cessação do contrato, mas obriga ao pagamento das rendas correspondentes ao período de pré-aviso em falta, exceto se resultar de desemprego involuntário, incapacidade permanente para o trabalho ou morte do arrendatário ou de pessoa que com este viva em economia comum há mais de um ano.

6 – A inobservância da antecedência prevista nos números anteriores não obsta à cessação do contrato, mas obriga ao pagamento das rendas correspondentes ao período de pré-aviso em falta, exceto se resultar de desemprego involuntário, incapacidade permanente para o trabalho ou morte do arrendatário ou de pessoa com quem este viva em economia comum há mais de um ano ou da verificação de situação derivada do regime excecional de moratória no pagamento das rendas constante de diploma próprio.

Artigo 1102.º (Denúncia para habitação)

1 – O direito de denúncia para habitação do senhorio depende do pagamento do montante equivalente a um ano de renda e da verificação dos seguintes requisitos:

1 – O direito de denúncia para habitação do senhorio depende do pagamento do montante equivalente a dois anos e meio de renda e da verificação dos seguintes requisitos:

a) Ser o senhorio proprietário, comproprietário ou usufrutuário do prédio há mais de dois anos ou, independentemente deste prazo, se o tiver adquirido por sucessão; b) Não ter o senhorio, há mais de um ano, na área dos concelhos de Lisboa ou do Porto e seus limítrofes ou no respetivo concelho quanto ao resto do País casa própria que satisfaça as necessidades de habitação própria ou dos seus descendentes em 1.º grau.

a) Ser o senhorio proprietário, comproprietário ou usufrutuário do prédio há mais de cinco anos ou, independentemente deste prazo, se o tiver adquirido por sucessão; b) Não ter o senhorio, há mais de cinco anos, na área dos concelhos de Lisboa ou do Porto e seus limítrofes ou no respetivo concelho quanto resto do País, casa própria ou arrendada que satisfaça as necessidades de habitação própria ou dos seus descendentes em 1.º grau;

c) Não ter ainda usado esta faculdade.

2 – (Revogado.) 2 – […].

3 – O direito de denúncia para habitação do descendente está sujeito à verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 relativamente ao senhorio e do da alínea b) do mesmo número para o descendente.

3 – […].

4 – O senhorio que tiver diversos prédios arrendados só pode denunciar o contrato relativamente àquele que, satisfazendo as necessidades de habitação própria da família, esteja arrendado há menos tempo.

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Artigo 1103.º (Denúncia justificada)

1 – A denúncia pelo senhorio com qualquer dos fundamentos previstos nas alíneas a) e b) do artigo 1101.º é feita mediante comunicação ao arrendatário com antecedência não inferior a seis meses sobre a data pretendida para a desocupação e da qual conste de forma expressa, sob pena de ineficácia, o fundamento da denúncia.

1 – […].

2 – Quando a denúncia tiver o fundamento previsto na alínea b) do artigo 1101.º, a comunicação referida no número anterior é acompanhada, sob pena de ineficácia da denúncia, dos seguintes documentos:

2 – […]:

a) Comprovativo de que foi iniciado, junto da entidade competente, procedimento de controlo prévio da operação urbanística a efetuar no locado; e

a) […];

b) Termo de responsabilidade do técnico autor do projeto legalmente habilitado que ateste que a operação urbanística reúne os pressupostos legais de uma obra de demolição ou de uma obra de remodelação ou restauro profundos e as razões que obrigam à desocupação do locado.

b) […];

c) Comprovativo de que com o procedimento de controlo prévio da operação urbanística a efetuar no locado foi indicada a situação do arrendamento existente.

3 – A denúncia a que se refere o número anterior é confirmada, sob pena de ineficácia, mediante comunicação ao arrendatário, acompanhada dos seguintes documentos:

3 – […].

a) Alvará de licença de obras ou título da comunicação prévia;

b) Documento emitido pela câmara municipal, que ateste que a operação urbanística constitui, nos termos da lei, uma obra de demolição ou uma obra de remodelação ou restauro profundos para efeitos de aplicação do disposto na alínea b) do artigo 1101.º, quando tal não resulte do documento referido na alínea anterior.

4 – Na situação prevista no número anterior, a desocupação tem lugar no prazo de 60 dias contados da receção da confirmação, salvo se não se encontrar decorrido o prazo previsto no n.º 1, caso em que a desocupação tem lugar até ao termo do último dos prazos.

4 – […].

5 – O senhorio que haja invocado o fundamento referido na alínea a) do artigo 1101.º deve dar ao local a utilização invocada no prazo de três meses e por um período mínimo de dois anos.

5 – […].

6 – A invocação do disposto na alínea b) do artigo 1101.º obriga o senhorio, mediante acordo e em alternativa: a) Ao pagamento de uma indemnização correspondente a dois anos da renda, de valor não inferior a duas vezes o montante de 1/15 do valor patrimonial tributário do locado; b) A garantir o realojamento do arrendatário por período não inferior a três anos.

6 – […].

7 – Caso as partes não cheguem a acordo no prazo de 30 dias a contar da receção da comunicação prevista no n.º 1, aplica-se o disposto na alínea a) do número anterior.

7 – […].

8 – Metade da indemnização deve ser paga após a confirmação da denúncia e o restante no ato da entrega do locado, sob pena de ineficácia.

8 – […].

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Código Civil (versão atual) Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

9 – Salvo motivo não imputável ao senhorio, o não cumprimento do disposto no n.º 5, ou o não início da obra prevista na alínea b) do artigo 1101.º, no prazo de seis meses contados da desocupação do locado, obriga o senhorio ao pagamento de uma indemnização correspondente a 10 anos de renda.

9 – […].

10 – Da denúncia pelo senhorio não pode resultar uma duração total do contrato inferior a dois anos.

10 – […].

11 – A denúncia prevista na alínea b) do artigo 1101.º é objeto de legislação especial, sem prejuízo do disposto nos números anteriores.

11 – […].

NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano) (versão atual)

Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

Artigo 14.º-A (Título para pagamento de rendas, encargos ou despesas)

1 – O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário. 2 – O contrato de arrendamento, quando acompanhado da comunicação ao senhorio do valor em dívida, prevista no n.º 3 do artigo 22.º-C do regime jurídico das obras em prédios arrendados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de agosto, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente à compensação pela execução de obras pelo arrendatário em substituição do senhorio.

1 – O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário, salvo discordância das partes quanto aos valores. 2 – […].

Artigos 15.º, 15.º-A, 15.º-B, 15.º-C, 15.º-D, 15.º-E, 15.º-F, 15.º-G, 15.º-H, 15.º-I, 15.º-J, 15.º-K, 15.º-L, 15.º-M, 15.º-N, 15.º-O, 15.º-P, 15.º-Q, 15.º-R e 15.º-S

[…] (Revogado.)

Artigo 57.º (Transmissão por morte)

1 – O arrendamento para habitação não caduca por morte do primitivo arrendatário quando lhe sobreviva:

1 – O arrendamento para habitação não caduca por morte do primitivo arrendatário ou do cônjuge sobrevivo quando lhe tenha sido transmitido o direito ao arrendamento, se lhe sobreviver:

a) […]; b) […]; c) […]; d) […]; e) […]; f) […]. 2 – […]. 3 – […]. 4 – […]. 5 – […]. 6 – […].

a) […]; b) […]; c) […]; d) […]; e) […]; f) […]. 2 – […]. 3 – […]. 4 – […]. 5 – […]. 6 – […].

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NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano) (versão atual)

Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

(Aditamento) Artigo 14.º-B

Apoio e proteção nas situações do procedimento de despejo

1 – A notificação de procedimento de despejo deve conter informação concreta relativa aos serviços públicos a quem o arrendatário se possa dirigir caso não tenha alternativa de habitação. 2 – Os serviços de segurança social que acompanham o procedimento de despejo mantêm, até ao final do processo, ligação com o tribunal e com o agente de execução, com obrigatoriedade de elaboração de relatório sobre a situação social do arrendatário. 3 – Constitui motivo de suspensão excecional do processo de despejo a conclusão, no relatório previsto no número anterior, ada situação de fragilidade por falta de alternativa habitacional ou outra razão social imperiosa do arrendatário.

(Aditamento) Artigo 34.º-A

Novos contratos

Aos contratos habitacionais celebrados antes da vigência do RAU e que tenham transitado para o NRAU, cujo arrendatário, à data da entrada em vigor da presente lei, resida há mais de 20 anos no locado e tenha idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de deficiência igual ou superior a 60%, o senhorio apenas pode opor-se à renovação ou proceder à denúncia do contrato com o fundamento previsto na alínea b) do artigo 1101.º do Código Civil havendo lugar à atualização ordinária da renda, nos termos gerais.

Decreto-Lei n.º 160/2006 (Regime de celebração do contrato de arrendamento

urbano) (versão atual)

Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

Artigo 2.º (Conteúdo necessário)

Do contrato de arrendamento urbano deve constar: a) A identificação das partes, indicando os seus nomes, números de identificação civil e de identificação fiscal e, quando aplicável, naturalidade, data de nascimento e estado civil;

Do contrato de arrendamento urbano deve constar: a) […];

b) O domicílio ou a sede do senhorio; c) A identificação e localização do arrendado, ou da sua parte;

b) […]; c) […];

d) O fim habitacional ou não habitacional do contrato, indicando, quando para habitação não permanente, o motivo da transitoriedade;

d) […];

e) A existência da licença de utilização, o seu número, a data e a entidade emitente, ou a referência a não ser aquela exigível, nos termos do artigo 5.º;

e) […];

f) O quantitativo da renda; g) A data da celebração.

f) […]; g) […];

h) A natureza do direito do locador, sempre que o contrato seja celebrado com base num direito temporário ou em poderes de administração de bens alheios.

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Decreto-Lei n.º 160/2006 (Regime de celebração do contrato de arrendamento

urbano) (versão atual)

Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

Artigo 3.º (Conteúdo eventual)

1 – O contrato de arrendamento urbano deve mencionar, quando aplicável: a) A identificação dos locais de uso privativo do arrendatário, dos de uso comum a que ele tenha acesso e dos anexos que sejam arrendados com o objeto principal do contrato;

1 – O contrato de arrendamento urbano deve mencionar, quando aplicável: a) […];

b) A natureza do direito do locador, sempre que o contrato seja celebrado com base num direito temporário ou em poderes de administração de bens alheios;

b) (Revogado.)

c) O número de inscrição na matriz predial ou a declaração de o prédio se encontrar omisso;

c) […];

d) O regime da renda, ou da sua atualização; e) O prazo; f) A existência de regulamento da propriedade horizontal;

d) […]; e) […]; f) […];

g) O domicílio convencionado; h) Quaisquer outras cláusulas permitidas por lei e pretendidas pelas partes, diretamente ou por remissão para regulamento anexo.

g) […].

2 – Devem ser anexados ao contrato e assinados pelas partes os regulamentos a que se referem as alíneas f) e h) do número anterior e um documento onde se descreva o estado de conservação do local e suas dependências, bem como do prédio, aplicando-se, na sua falta ou em caso de omissão ou dúvida, o disposto no n.º 2 do artigo 1043.º do Código Civil.

2 – […].

3 – Para o efeito do disposto na alínea g) do n.º 1, o domicílio convencionado do arrendatário, ainda que não coincida com o endereço do imóvel arrendado, constitui o local para o qual lhe devem ser remetidas as comunicações e notificações relativas ao contrato de arrendamento.

3 – […].

Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março (versão atual)

Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

Artigo 8.º (Regime extraordinário e transitório de proteção dos arrendatários)

1 – Sem prejuízo do disposto no n.º 4, ficam suspensos até 30 de junho de 2021: a) A produção de efeitos das denúncias de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio;

1 — Sem prejuízo do disposto no n.º 4, ficam suspensos até 31 de dezembro de 2021: a) […];

b) A caducidade dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, salvo se o arrendatário não se opuser à cessação;

b) […];

c) A produção de efeitos da revogação, da oposição à renovação de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio;

c) […];

d) O prazo indicado no artigo 1053.º do Código Civil, se o término desse prazo ocorrer durante o período de tempo em que vigorarem as referidas medidas;

d) […];

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Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março (versão atual)

Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

e) A execução de hipoteca sobre imóvel que constitua habitação própria e permanente do executado.

e) […].

2 – O disposto no número anterior depende do regular pagamento da renda devida nesse mês, salvo se os arrendatários estiverem abrangidos pelo regime previsto nos artigos 8.º ou 8.º-B da Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril, na sua redação atual.

2 – […].

3 – O disposto no número anterior aplica-se às rendas devidas nos meses de outubro a dezembro de 2020 e de janeiro a junho de 2021.

3 – O disposto no número anterior aplica -se às rendas devidas nos meses de julho a dezembro de 2021.

4 – No caso de contrato de arrendamento para fins não habitacionais relativo a estabelecimentos que, por determinação legal ou administrativa da responsabilidade do Governo, tenham sido encerrados em março de 2020 e que ainda permaneçam encerrados a 1 de janeiro de 2021, a duração do respetivo contrato é prorrogada por período igual ao da duração da medida de encerramento, aplicando-se, durante o novo período de duração do contrato, a suspensão de efeitos prevista no n.º 1.

4 – […].

5 – A prorrogação prevista no número anterior conta-se desde o termo original do contrato e dela nunca pode resultar um novo período de duração do contrato cujo termo ocorra antes de decorridos seis meses após o levantamento da medida de encerramento e depende do efetivo pagamento das rendas que se vencerem a partir da data de reabertura do estabelecimento, salvo se tiverem efetuado o respetivo diferimento.

5 – […].

6 – A suspensão de efeitos prevista no n.º 1 e a prorrogação prevista no n.º 5 cessam se, a qualquer momento, o arrendatário manifestar ao senhorio que não pretende beneficiar das mesmas ou se o arrendatário se constituir em mora quanto ao pagamento da renda vencida a partir da data da reabertura do estabelecimento, salvo se tiverem efetuado o respetivo diferimento.

6 – […].

Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril (versão atual)

Projeto de Lei n.º 909/XIV/2.ª

Artigo 4.º (Mora do arrendatário habitacional)

Nas situações previstas no artigo anterior, o senhorio só tem direito à resolução do contrato de arrendamento, por falta de pagamento das rendas vencidas se o arrendatário, tendo diferido o pagamento da renda nos meses de abril a junho de 2020, não efetue o seu pagamento, no prazo de 12 meses contados do termo desse período, em prestações mensais não inferiores a um duodécimo do montante total, pagas juntamente com a renda de cada mês.

1 – Nas situações previstas no artigo anterior, o senhorio só tem direito à resolução do contrato de arrendamento, por falta de pagamento das rendas vencidas se o arrendatário, tendo diferido o pagamento da renda, não efetue o seu pagamento, no prazo de 24 meses contados do termo desse período, em prestações mensais não inferiores a um vigésimo do montante total, pagas juntamente com a renda de cada mês. 2 – O período de regularização da dívida tem início a 1 de janeiro de 2022 e termo a 31 de dezembro de 2023.

———

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PROJETO DE LEI N.º 919/XIV/2.ª

[ESTABELECE LIMITES À PUBLICIDADE DOS JOGOS E APOSTAS (DÉCIMA SEXTA ALTERAÇÃO

AO CÓDIGO DA PUBLICIDADE, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 330/90, DE 23 DE OUTUBRO)]

Parecer da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação e nota técnica elaborada

pelos serviços de apoio

Parecer

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer

Parte III – Conclusões

PARTE I – Considerandos

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (GP do BE) apresentou o Projeto de Lei n.º 919/XIV/2.ª,

«Estabelece limites à publicidade dos jogos e apostas (décima sexta alteração ao Código da Publicidade,

aprovado pelo Decreto Lei n.º 330/90, de 23 de outubro)», deu entrada a 29 de julho de 2021, foi admitido,

anunciado e baixou à Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação (6.ª Comissão) a 30 de

julho de 2021, por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, tendo sido anunciado na sessão

plenária do dia 9 de setembro.

A iniciativa é apresentada pelo GP do BE, nos termos dos artigos 167.º da Constituição da República

Portuguesa (doravante CRP) e 118.º do Regimento da Assembleia da República (doravante RAR), que

consubstanciam o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto na

alínea b) do artigo 156.º da CRP e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR, bem como dos grupos

parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da CRP e da alínea f) do artigo 8.º do

RAR.

É subscrita por 19 Deputados, respeitando os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º e nas

alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do RAR, relativamente às iniciativas em geral, bem como os previstos

no n.º 1 do artigo 123.º do referido diploma, quanto aos projetos de lei em particular. Respeita, ainda, os limites

da iniciativa impostos pelo RAR, por força do disposto nos n.os 1 e 3 do artigo 120.º

A iniciativa em apreço visa a modificação das matérias subjacentes à publicidade dos jogos e apostas,

através da alteração do artigo 21.º do Código da Publicidade.

Atendendo à respetiva exposição de motivos, a necessidade de alterar o Código de Publicidade prende-se

com a constatação de um crescente investimento em publicidade de jogos e apostas online, o que tem

alavancado as receitas e potenciado a faturação de valores recorde durante a pandemia.

Este comportamento foi acompanhado por um significativo acréscimo de número de jogadores, sendo que

63,6% dos novos jogadores apresentam-se na faixa etária inferior a 35 anos, o que comprova uma maior

incidência nas camadas mais jovens.

De acordo com os proponentes, esta realidade acarreta consigo diversas consequências nefastas,

designadamente através do seu impacto no aumento do jogo abusivo e patológico e na redução do rendimento

disponível dos jogadores, afetando com maior incidência as camadas da população mais vulneráveis.

O projeto de lei em apreço introduz alterações ao Código de Publicidade, nomeadamente a proibição de

publicidade a lotarias instantâneas, e a proibição de emissão de publicidade a jogos e apostas, entre as 7 horas

e as 22 horas e 30 minutos.

Confere, ainda, um reforço da proibição da publicidade a marca ou marcas de lotarias instantâneas nos locais

de quaisquer eventos em que participem menores.

Este projeto de lei é composto por três artigos, definindo o artigo 1.º o seu «Objeto», o artigo 2.º a «Alteração

ao Código da Publicidade», alteração ao artigo 21.º do Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei n.º

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330/90, e por fim, o artigo 3.º fixa a data de entrada em vigor do diploma, 30 dias após a aprovação do presente

diploma.

a) Antecedentes (iniciativas legislativas e petições)

Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar, verificou-se que, na presente Legislatura

foi apresentada, e aprovada, a seguinte iniciativa legislativa sobre matéria idêntica ou conexa:

– Projeto de Lei n.º 326/XIV/1.ª (PCP) – Determina limitações de acesso às plataformas de jogo online. Este

projeto de lei esteve na origem da Lei n.º 7/2020, de 10 de abril (Estabelece regimes excecionais e temporários

de resposta à epidemia SARS-CoV-2, e procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 26 de

março, e à quarta alteração à Lei n.º 27/2007, de 30 de julho).

Não se encontraram petições anteriores sobre a matéria em causa.

b) Iniciativas legislativas e petições sobre matéria conexa

Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar (AP), constatou-se que se encontram

pendentes, para apreciação e votação na generalidade, as seguintes iniciativas sobre matéria idêntica ou

conexa:

– Projeto de Lei n.º 343/XIV/1.ª (PCP) – Estabelece restrições à publicidade nos jogos e apostas (décima

quinta alteração ao Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro);

– Projeto de Lei n.º 480/XIV/1.ª (CDS-PP) – Combate ao jogo ilegal (sétima alteração ao Decreto-Lei n.º

66/2015 de 29 de abril, que aprova o regime jurídico dos jogos e apostas online).

c) Consultas obrigatórias e/ou facultativas

A DECO tomou a iniciativa de emitir parecer, segundo o qual, «congratula-se com a presente iniciativa (…)

revelando-se de manifesta importância para a proteção dos direitos e interesses dos consumidores, em

particular dos mais vulneráveis. Todavia, a nosso ver, as circunstâncias já conhecidas justificam uma

intervenção legislativa, porventura até, uma abordagem mais abrangente, que não apenas em sede de Código

da Publicidade, (…) como, entre outras, a adoção de medidas de sensibilização sobre os riscos associados, a

criação de mecanismos de autoexclusão».

Atendendo à matéria em causa, a 6.ª Comissão pode, se assim o deliberar, solicitar os pareceres escritos à

Direção-Geral do Consumidor (DGC), ao Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos (SRIJ), à Entidade

Reguladora para a Comunicação Social, à Comissão de Jogos do Instituto do Turismo de Portugal, IP, à Santa

Casa da Misericórdia de Lisboa, ao Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências

(SICAD), bem como de associações de defesa dos direitos dos consumidores.

d) Verificação do cumprimento da lei formulário

O projeto de lei inclui uma exposição de motivos e cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário

(Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho), uma vez que

tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto [disposição idêntica à da alínea b) do n.º 1 do artigo 124.º

do RAR], embora possa ser objeto de aperfeiçoamento em caso de aprovação.

Todavia, uma vez que, em caso de aprovação, o título poderá ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede

de apreciação na especialidade ou em redação final, sugere-se o seguinte título: «Limita a publicidade dos jogos

e apostas, alterando o Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro».

Através da consulta do Diário da República Eletrónico verificou-se que, em caso de aprovação, esta será a

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décima quinta alteração do Decreto Lei n.º 330/90, de 23 de outubro.

Encontra-se assim respeitado o n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário, «Os diplomas que alterem outros devem

indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar

aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas», sendo que no

artigo 1.º do projeto de lei são referidos o número de ordem de alteração e os diplomas que alteram o Decreto-

Lei n.º 330/90, de 23 de outubro, tornando-se dispensável colocar o número de ordem de alteração no título.

Porém, sublinha-se que a lei formulário foi aprovada e publicada num contexto anterior à existência do Diário

da República Eletrónico, atualmente acessível de forma gratuita e universal, pelo que, por motivos de segurança

jurídica e para tentar manter uma redação simples e concisa, parece mais seguro e eficaz não colocar o número

de ordem de alteração, assim como o elenco de diplomas que procederam a alterações, nos casos em que a

iniciativa incida sobre códigos, «leis» ou «regimes gerais», «regimes jurídicos» ou atos legislativos de estrutura

semelhante – neste caso, relativamente às alterações introduzidas a Código da Publicidade.

Em caso de aprovação, esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com

o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

No que respeita ao início de vigência, o projeto de lei estabelece, no seu artigo 4.º, que a sua entrada em

vigor ocorrerá «30 dias após a aprovação do presente diploma», o que parecer estar em conformidade com o

previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que os atos legislativos «entram em vigor no dia neles

fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação». No entanto,

sugere-se que a entrada em vigor seja alterada para «30 dias após a publicação», dada a incerteza de que a

publicação ocorrerá exatamente em 30 dias.

Na presente fase do processo legislativo a iniciativa em apreço não parece suscitar outras questões em face

da lei formulário.

e) Avaliação sobre impacto de género

O preenchimento, pelos proponentes, das fichas de avaliação prévia de impacto de género do Projeto de Lei

n.o 919/XIV/2.ª (BE), em cumprimento do disposto na Lei n.º 4/2018, de 9 de fevereiro, apresenta como resultado

uma valoração neutra do impacto de género.

f) Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. A presente

iniciativa não suscita questões relacionadas com a utilização de linguagem discriminatória

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

O autor do presente parecer reserva, nesta sede, a sua posição sobre o Projeto de Lei n.º 919/XIV/2.ª (BE),

que é de «elaboração facultativa», em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da

Assembleia da República.

PARTE III – Conclusões

A iniciativa em apreço é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (GP do BE), ao abrigo

e nos termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 1 do artigo 167.º da CRP e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º

e do artigo 118.º do RAR, que consagram o poder de iniciativa da lei.

A iniciativa encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o

seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, pelo que cumpre os requisitos formais

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previstos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.

Encontram-se igualmente respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo 120.º

do RAR, uma vez que este projeto de lei define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem

legislativa e parece não infringir princípios constitucionais.

Assim, nestes termos, a Comissão Parlamentar de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, é de

Parecer que o Projeto de Lei n.º 919/XIV/2.ª, «Estabelece limites à publicidade dos jogos e apostas (décima

sexta alteração ao Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro)», que deu

entrada a 29 de julho de 2021, e que baixou, para discussão na generalidade, à Comissão de Economia,

Inovação, Obras Públicas e Habitação (6.ª) a 30 de julho, por despacho do Presidente da Assembleia da

República, tendo sido anunciado na sessão plenária do dia 9 de setembro, cumpre os requisitos formais de

admissibilidade previstos na Constituição e no Regimento da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 24 de setembro de 2021.

O Deputado autor do parecer, Emídio Guerreiro — O Presidente da Comissão, António Topa.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CDS-PP e do PEV, na

reunião da Comissão de 29 de setembro de 2021.

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 919/XIV/2.ª (BE)

Estabelece limites à publicidade dos jogos e apostas (décima sexta alteração ao Código da

Publicidade, aprovado pelo Decreto Lei n.º 330/90, de 23 de outubro)

Data de admissão: 30 de julho de 2021.

Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação (6.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Luís Marques e Ana Montanha (DAC), Patrícia Pires (DAPLEN), Cristina Ferreira e Filipa Paixão (DILP) e Helena Medeiros (BIB). Data: 23 de setembro de 2021.

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

A iniciativa em análise visa estabelecer limites à publicidade dos jogos e apostas, através de alteração ao

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artigo 21.º do Código da Publicidade1.

Atendendo à respetiva exposição de motivos, os autores propõem restrições à publicidade, promoção e

patrocínio de jogos online, com vista a contrariar o seu crescimento, que aumentou significativamente durante a

pandemia, atingindo valores recorde de faturação e produzindo efeitos sociais adversos.

De acordo com os proponentes, esta realidade acarreta consigo diversas consequências nefastas,

designadamente através do seu impacto no aumento do jogo abusivo e patológico e na redução do rendimento

disponível dos jogadores, afetando com maior incidência as camadas da população mais vulneráveis.

Este comportamento foi acompanhado por um significativo acréscimo do número de jogadores, sendo que

63,6% dos novos jogadores apresentam-se na faixa etária inferior a 35 anos, o que comprova uma maior

incidência nas camadas mais jovens.

O projeto de lei em apreço introduz alterações ao Código de Publicidade, nomeadamente com a proibição

de publicidade a lotarias instantâneas, e a proibição de emissão de publicidade a jogos e apostas, entre as 7

horas e as 22 horas e 30 minutos.

Confere, ainda, um reforço da proibição de publicidade a marca ou marcas de lotarias instantâneas nos locais

de realização de quaisquer eventos em que participem menores.

Para efeitos de comparação entre o regime vigente e as alterações propostas pela iniciativa legislativa em

análise, disponibiliza-se o seguinte quadro comparativo (anexo 1).

• Enquadramento jurídico nacional

O n.º 1 do artigo 60.º da Constituição da República Portuguesa2 (Constituição) dispõe que «os consumidores

têm direito à qualidade dos bens e serviços consumidos, à formação e à informação, à proteção da saúde, da

segurança e dos seus interesses económicos, bem como à reparação de danos». O n.º 2 deste artigo ao proibir

«todas as formas de publicidade oculta, indireta ou dolosa» estabelece a articulação entre os direitos do

consumidor e a publicidade. Segundo J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira3, «sendo a publicidade um meio

potente de promover o consumo e influenciar o consumidor, compreende-se que a Constituição tenha

privilegiado o seu tratamento» e que «esta imbricação entre publicidade e direitos do consumidor pode justificar

restrições à publicidade quanto a certos destinatários (publicidade para menores) ou no seu objeto (restrição ou

proibição de bebidas alcoólicas, tabaco, medicamentos, jogos de fortuna ou de azar) e à sua quantidade

(limitação dos espaços publicitários na rádio e na televisão)».

A Lei de Defesa do Consumidor, aprovada pela Lei n.º 24/964, de 31 de julho, veio a consagrar explicitamente

o direito do consumidor à proteção da saúde na alínea b) do artigo 3.º. O artigo 5.º densificou este direito,

encontrando-se o Estado incumbindo do dever geral de proteção do consumidor, nos termos do artigo 1.º

A atual redação do artigo 21.º do Código da Publicidade, que diz respeito à publicidade dos jogos e apostas,

resulta da alteração ocorrida em 2015, pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 66/2015, 5 de 29 de abril, que aprovou,

no seu Anexo I, o Regime Jurídico dos Jogos e Apostas Online (RJO)6.

O RJO constitui a mais recente intervenção legislativa em matéria de jogos de fortuna ou azar.

Originariamente, a tradição portuguesa era a da proibição do jogo. O Código Civil de 1867 dispunha que o

contrato do jogo não era permitido como meio de aquisição e o Código Penal de 1886 criminalizava a atividade

de exploração de jogo, a profissão de jogador e o jogo ocasional. Esta situação veio a ser alterada pelo Decreto

n.º 14 643, de 3 de dezembro de 1927, que reconheceu que «o jogo era um facto contra o qual nada podiam as

disposições repressivas» e passou a definir as condições em que o jogo se podia desenvolver e quem o podia

praticar. Foram criadas zonas de jogo, que pretendiam assegurar as condições necessárias à respetiva prática

em ambiente controlado, com garantias de idoneidade e reduzindo ou anulando o interesse pelo jogo clandestino

e ilícito. O jogo passou assim de uma atividade proibida e não regulada para uma regulamentação onde se

1 Aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro. 2 Todas as referências à Constituição são feitas para o portal da Assembleia da República, salvo indicação em contrário. 3 CANOTILHO, J.J. Gomes; MOREIRA, Vital – Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª edição revista. Coimbra: Coimbra Editora, 2007, Vol. I, ISBN 978-972-32-1462-8, pág. 783. 4 Diploma retirado do sítio na Internet do Diário da República Eletrónico (DRE). Todas as referências legislativas são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico, salvo indicação em contrário. Trabalhos preparatórios. 5 (Aqui na versão consolidada) aprovada no uso da autorização legislativa pela Lei n.º 73/2014, de 2 de setembro, que teve origem na Proposta de Lei n.º 238/XII. 6 (versão consolidada).

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reconheceu que o direito de explorar jogos de fortuna ou azar estava reservado ao Estado. Em 1989 foi aprovada

uma nova lei do jogo através do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, o qual procedeu à sistematização

da regulação na matéria e, na sequência das sucessivas alterações de que foi objeto, ao controlo da difusão e

da prática desregulada do fenómeno.

A evolução tecnológica dos sistemas e dos equipamentos de jogo trouxe uma nova realidade não abrangida

pelo quadro normativo regulador dos jogos de fortuna ou azar que se revelava incapaz de dar resposta à

dimensão do jogo online, fator que esteve na origem da aprovação do Decreto-Lei n.º 66/2015, de 29 de abril.

Segundo se lê no preâmbulo do diploma «as soluções jurídicas e os princípios plasmados no RJO (…) visam

garantir a proteção dos menores e das pessoas mais vulneráveis, evitar a fraude e o branqueamento de capitais,

prevenir comportamentos criminosos em matéria de jogo online e salvaguardar a integridade do desporto,

prevenindo e combatendo a viciação de aposta e de resultados.» As funções de controlo, inspeção e regulação

da exploração e da prática do jogo e das apostas online foram cometidas ao Instituto do Turismo de Portugal,

IP7 através da Comissão de Jogos e ao seu Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos (artigo 40.º do Código

da Publicidade, na redação dada pela Lei n.º 30/2019, de 22 de junho8). No sítio do Serviço de Regulação e

Inspeção de Jogos (SRIJ)9 pode encontrar-se toda a regulamentação relativa aos jogos e apostas online.

A alteração efetuada em 2015 ao artigo 21.º do Código da Publicidade foi a primeira ocorrida desde 1990,

ou seja, desde a aprovação do Código, pelo que se transcrevem ambas as versões do artigo (Anexo 2):

Versão original (de 1990) Versão atual (de 2015)

Artigo 21.º Jogos de fortuna ou azar

1 – Não podem ser objeto de publicidade os jogos de fortuna ou azar enquanto objeto essencial da mensagem.

Artigo 21.º Jogos e apostas

1 – A publicidade de jogos e apostas deve ser efetuada de forma socialmente responsável, respeitando, nomeadamente, a proteção dos menores, bem como de outros grupos vulneráveis e de risco, privilegiando o aspeto lúdico da atividade dos jogos e apostas e não menosprezando os não jogadores, não apelando a aspetos que se prendam com a obtenção fácil de um ganho, não sugerindo sucesso, êxito social ou especiais aptidões por efeito do jogo, nem encorajando práticas excessivas de jogo ou aposta.

2 – Excetuam-se do disposto no número anterior os jogos promovidos pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.

2 – É expressamente proibida a publicidade de jogos e apostas que se dirija ou que utilize menores enquanto intervenientes na mensagem. 3 – É expressamente proibida a publicidade de jogos e apostas no interior de escolas ou outras infraestruturas destinadas à frequência de menores. 4 – É ainda expressamente proibida a publicidade de jogos e apostas a menos de 250 metros linha reta de escolas ou outras infraestruturas destinadas à frequência de menores. 5 – Nos locais onde decorram eventos destinados a menores ou nos quais estes participem enquanto intervenientes principais, bem como nas comunicações comerciais e na publicidade desses eventos, não devem existir menções, explícitas ou implícitas, a jogos e apostas. 6 – As concessionárias e ou as entidades exploradoras de jogos e apostas não podem ser associadas a qualquer referência ou menção publicitária à concessão de empréstimos. 7 – O disposto no n.º 4 não se aplica aos jogos sociais do Estado.

Relacionada com a matéria em apreço na presente iniciativa importa referir que, recentemente, a Lei n.º

7 http://www.turismodeportugal.pt/pt/Paginas/homepage.aspx. 8 Trabalhos preparatórios. 9 https://www.srij.turismodeportugal.pt/pt/.

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7/202010, de 10 de abril11, que estabelece regimes excecionais e temporários de resposta à epidemia SARS-

CoV-2, atendendo «ao acesso ilimitado e descontrolado aos canais de jogo online, espoletado pelo

confinamento imposto aos portugueses, (…) com agravamento de consequências emocionais e financeiras»12

veio determinar, na alínea b) do artigo 1.º, a limitação de acesso, parcial ou total, de acesso a plataformas de

jogos de azar online, até ao término do período relativo ao estado de emergência13, com vista à proteção dos

consumidores, em especial os mais vulneráveis, como menores, jovens adultos ou pessoas com adição ao jogo

(artigo 3.º).

O Código de Conduta da Autorregulação Publicitária em Matéria de Publicidade e outras formas de

comunicação comercial14 contém disposições atinentes à publicidade e outras formas de comunicação comercial

através dos meios interativos e/ou digitais assim como para a publicidade comportamental online ou OBA (online

behavioural advertising). Ainda no âmbito da autorregulação publicitária, o Instituto Civil da Autodisciplina da

Comunicação Comercial (ICAP)15 editou também um Guia de Boas Práticas de Comunicação de Marketing

Digital e Publicidade Comportamental Online16.

Refira-se, também, que a Associação Nacional dos Apostadores Online (ANAon)17 tem como uma das suas

missões e objetivos o alertar para o problema do jogo compulsivo.

No sítio da Internet do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD)18

podem ser consultadas as linhas de orientação técnica para a intervenção em comportamentos aditivos e

dependências sem substância relativas à perturbação do jogo19, assim como o Inquérito Nacional ao Consumo

de substâncias Psicoativas na População Geral 2016/1720, referido na exposição de motivos da iniciativa em

apreço.

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar (AP), constatou-se que se encontram

pendentes, para apreciação e votação na generalidade, as seguintes iniciativas sobre matéria idêntica ou

conexa:

– Projeto de Lei n.º 343/XIV/1.ª (PCP) – Estabelece restrições à publicidade nos jogos e apostas (décima

quinta alteração ao Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro).

– Projeto de Lei n.º 480/XIV/1.ª (CDS-PP) – Combate ao jogo ilegal (sétima alteração ao Decreto-Lei n.º

66/2015 de 29 de abril, que aprova o regime jurídico dos jogos e apostas online).

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

Na presente Legislatura foi apresentada, e aprovada, a seguinte iniciativa legislativa sobre matéria idêntica

ou conexa:

– Projeto de Lei n.º 326/XIV/1.ª (PCP) – Determina limitações de acesso às plataformas de jogo online. Este

projeto de lei esteve na origem da Lei n.º 7/2020, de 10 de abril (estabelece regimes excecionais e temporários

10 Trabalhos preparatórios. 11 (versão consolidada). 12 Exposição de motivos do Projeto de Lei n.º 326/XIV/1.ª (PAN), que lhe deu origem. 13 O estado de emergência foi decretado pelo Decreto do PR n.º 14-A/2020, de 18 de março e renovado pelos Decretos do Presidente da República n.º 17-A/2020, de 2 de abril, e n.º 20-A/2020, de 17 de abril. Teve início às 0:00 horas de 19 de março de 2020 e terminou às 23:59 horas de 2 de maio de 2020. 14 https://auto-regulacaopublicitaria.pt/wp-content/uploads/2018/01/Cod.-Conduta_ARP.pdf. 15 https://auto-regulacaopublicitaria.pt/. 16 https://auto-regulacaopublicitaria.pt/wp-content/uploads/2017/07/GUIA_VERSAO_FINAL.pdf. 17http://www.anao.pt/quem-somos/. 18http://www.sicad.pt/pt/Paginas/default.aspx. 19 http://www.sicad.pt/PT/Intervencao/DocumentosTecnicoNormativos/Paginas/detalhe.aspx?itemId=32&lista=SICAD_DOCUMENTOSNO RMATIVOS&bkUrl=BK/Intervencao/DocumentosTecnicoNormativos/. 20 http://www.sicad.pt/PT/EstatisticaInvestigacao/EstudosConcluidos/Paginas/detalhe.aspx?itemId=181&lista=SICAD_ESTUDOS&bkUrl=/B K/EstatisticaInvestigacao/EstudosConcluidos.

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de resposta à epidemia SARS-CoV-2, e procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 10-I/2020, de 26 de

março, e à quarta alteração à Lei n.º 27/2007, de 30 de julho).

Não se encontraram petições anteriores sobre a matéria ora em causa.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE), ao abrigo e

nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da

República21 (Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por

força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, bem como

dos Grupos Parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea

f) do artigo 8.º do Regimento.

A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do

Regimento. Encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu

objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos no

n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

São também respeitados os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do

Regimento, uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados – com a exceção

que se refere de seguida – e define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 29 de julho de 2021, data em que foi admitido e baixou para

discussão na generalidade à Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação (6.ª), por despacho

do Sr. Presidente da Assembleia da República, tendo sido anunciado na sessão plenária do dia 9 de setembro.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

A lei formulário22 contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas

que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa.

O título da presente iniciativa legislativa – «Estabelece limites à publicidade dos jogos e apostas (décima

sexta alteração ao Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro)» – traduz o

seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário.

Todavia, uma vez que, em caso de aprovação, o título poderá ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede

de apreciação na especialidade ou em redação final, sugere-se a seguinte alteração:

«Limita a publicidade a jogos e apostas, alterando o Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto Lei n.º

330/90, de 23 de outubro».

Através da consulta do Diário da República Eletrónico verificou-se que, em caso de aprovação, esta será a

décima quinta alteração do Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro.

Encontra-se assim respeitado o n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário, que prevê que, «Os diplomas que alterem

outros devem indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores,

identificar aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas». Uma

vez que no artigo 1.º do projeto de lei são referidos o número de ordem de alteração e as modificações anteriores

ao Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de outubro, torna-se dispensável colocar o número de ordem de alteração no

título.

Porém, sublinha-se que a lei formulário foi aprovada e publicada num contexto anterior à existência do Diário

da República Eletrónico, atualmente acessível de forma gratuita e universal, pelo que, por motivos de segurança

jurídica e para tentar manter uma redação simples e concisa, parece mais seguro e eficaz não colocar o número

21 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República. 22 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho.

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de ordem de alteração, assim como o elenco de diplomas que procederam a alterações, nos casos em que a

iniciativa incida sobre códigos, «leis» ou «regimes gerais», «regimes jurídicos» ou atos legislativos de estrutura

semelhante – neste caso, relativamente às alterações introduzidas a Código da Publicidade.

Em caso de aprovação, esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com

o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

No que respeita ao início de vigência, o projeto de lei estabelece, no seu artigo 4.º, que a sua entrada em

vigor ocorrerá «30 dias após a aprovação do presente diploma», o que parecer estar em conformidade com o

previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que os atos legislativos «entram em vigor no dia neles

fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação». No entanto,

sugere-se que a entrada em vigor seja alterada para «30 dias após a publicação», dada a incerteza de que a

publicação ocorrerá exatamente em 30 dias.

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em face

da lei formulário.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento no plano da União Europeia

O jogo e aposta, particularmente o jogo online, embora constituam uma preocupação das instituições

europeias, é uma matéria onde os Estados-Membros, individualmente, gozam de liberdade para restringir ou

limitar o acesso a todos ou a alguns tipos de serviços, com base em objetivos de interesse público que pretendam

salvaguardar em relação a essa atividade.

Neste sentido, a Diretiva Serviços (Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de

Dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno)23, exclui do seu âmbito de aplicação atividades de

jogo a dinheiro que impliquem uma aposta com valor monetário em jogos de fortuna ou azar, incluindo lotarias,

atividades de jogo em casinos e apostas [artigo 2.º, n.º 2, alínea h)]. Confirma-o também a Diretiva 2010/13/UE

do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa à coordenação de certas disposições legislativas,

regulamentares e administrativas dos Estados-Membros respeitantes à oferta de serviços de comunicação social

audiovisual24, de cujo âmbito de aplicação não fazem parte os jogos de fortuna em que é feita uma aposta em

dinheiro, incluindo lotarias, apostas e outras formas de jogos de azar, bem como os jogos online e os motores

de busca, mas não as emissões consagradas a jogos de azar ou de fortuna.

Contudo, a União Europeia (UE) não tem deixado a discussão em torno desta questão em vazio, e, assim,

tem havido um conjunto de iniciativas com o objetivo de estatuir uma regulamentação europeia do jogo,

aproximando e potenciando a cooperação legislativa entre os Estados-Membros.

Na Resolução de 10 de março de 2009, sobre a integridade dos jogos de apostas online [2008/2215(INI)], o

Parlamento Europeu (PE):

• Insta os Estados-Membros a cooperarem a nível da UE com vista à adoção de medidas contra qualquer

publicidade agressiva e promoção comercial por parte de operadores públicos ou privados de jogos de

apostas online, incluindo jogos de demonstração gratuitos, a fim de proteger, em particular, os jogadores

e os consumidores vulneráveis como as crianças e os jovens (parágrafo 22);

• Insta a Comissão a iniciar uma investigação sobre jogos de apostas online e sobre o risco de desenvolver

uma dependência do jogo, por exemplo no que respeita à forma como a publicidade influencia essa

dependência, à possibilidade de criar categorias comuns europeias de jogos, de acordo com o seu

potencial de criação de dependência, e a possíveis medidas de prevenção e de tratamento (parágrafo

28);

• Solicita à Comissão que examine, em particular, o papel da publicidade e da promoção comercial (incluindo

jogos de demonstração gratuitos online) na persuasão direta ou indireta de menores a participarem em

23 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1590285761230&uri=CELEX:32006L0123. 24 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1590285761230&uri=CELEX:32010L0013.

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jogos a dinheiro (parágrafo 29).

O Livro Verde sobre o jogo online no mercado interno [COM(2011) 128 final]25, lançou as bases do debate

da sua regulação, assente em pilares como a defesa dos consumidores, a proteção dos menores e de outros

grupos vulneráveis. Enumera as comunicações comerciais mais frequentemente usadas junto dos consumidores

finais e/ou distribuidores, as quais passam por publicidade televisiva, publicidade na imprensa escrita,

comunicações comerciais online, promoções de vendas, comercialização direta e contratos de patrocínio;

afirmando que a Comissão tem conhecimento de que, em muitos Estados-Membros, existem restrições a essas

comunicações comerciais, que vão desde a proibição até requisitos de conteúdo nos meios de comunicação

social que publicitam serviços de jogo online. Informa ainda que, do mesmo modo que as autoridades dos

Estados-Membros (e os operadores) procuram impedir que os menores tenham acesso a serviços de jogo

online, pretendem também controlar a comercialização e a promoção desses serviços, dando alguns exemplos

de restrições/normas que impõem que a promoção de tais serviços:

✓ Não seja dirigida a pessoas com idades inferiores ao limite nacional para participação;

✓ Não seja difundida (pela televisão ou pela rádio) nem comunicada durante programas específicos

destinados aos jovens nos canais generalistas, ou durante certos períodos anteriores ou posteriores a

tais programas;

✓ Não incluam nem mostrem uma pessoa que aparente uma idade inferior ao limite nacional para

participação;

✓ Não aliciem de outro modo crianças ou jovens, por exemplo, mediante associação com a cultura dos

jovens ou comunicada por uma celebridade (por exemplo, promoção de um operador de jogo online em

camisolas de equipas desportivas);

✓ Não seja afixada na proximidade de zonas frequentadas por crianças (por exemplo, espaços publicitários

na proximidade de escolas).

Refere ainda que atualmente os instrumentos utilizados nos Estados-Membros para tentar limitar a dimensão

excessiva do jogo compulsivo nos serviços online são os aplicados a todo o jogo, ou seja:

✓ Limites de idade; autolimitação (financeira e de tempo) e autoexclusão;

✓ Informação/avisos/autotestes (mais facilmente aplicados online do que fora de linha);

✓ Proibição da utilização de crédito; testes de realidade; obrigação de vigilância para os operadores online;

✓ Restrições impostas a determinadas formas de jogo ou de aposta, consideradas de maior risco (por

exemplo, jogos de casino ou, nas apostas desportivas, limitação das apostas apenas aos resultados

finais);

✓ Outros (por exemplo, limites na comunicação comercial – restrições à utilização de certos meios de

comunicação social, promoção de vendas e bónus de registo ou jogos de prática livre).

De destacar ainda a referência aos bilhetes de lotaria instantânea («raspadinha»), como aqueles que, no

universo dos vários tipos de jogo ou de aposta, estão entre aqueles que frequentemente, são considerados mais

suscetíveis de afetar grupos vulneráveis.

Na Resolução de 15 de novembro de 2011, sobre os jogos online no mercado interno [2011/2084(INI)]26o

PE, felicita a iniciativa da Comissão em lançar uma consulta pública, no âmbito do Livro Verde sobre o jogo

online, acreditando que permitirá uma «reflexão pragmática e realista sobre o futuro deste sector na Europa»;

defende que a criação de um «código de conduta pan-europeu» contribuiria para a garantia de um ambiente de

jogo responsável e um elevado nível de proteção para os jogadores, especialmente no caso de menores e de

outras pessoas vulneráveis bem como para a criação de um quadro de princípios e de regras que garantao

mesmo nível de proteção dos consumidores em toda a UE. Sublinha ainda a necessidade de alcançar soluções

pragmáticas relativamente à publicidade e ao patrocínio de manifestações desportivas de operadores de jogos

de azar online; e que devem ser adotados padrões comuns de publicidade que oferecem proteção suficiente

25 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1590285761230&uri=CELEX:52011DC0128. 26 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52011IP0492&qid=1631029273736.

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aos consumidores vulneráveis, mas ao mesmo tempo tornam possível o patrocínio de eventos internacionais.

Também cumpre fazer uma referência à Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de setembro de 2013,

sobre os jogos online no mercado interno [2012/2322(INI)]27 que:

✓ Exorta as associações europeias de operadores de jogo a desenvolverem e a adotarem códigos de

conduta de autorregulação;

✓ Insta os Estados-Membros e os operadores a promoverem o caráter responsável da publicidade relativa

aos jogos online;

✓ Saúda a iniciativa da Comissão de adotar uma recomendação sobre publicidade responsável relativa ao

jogo, solicitando que inclua normas mínimas comuns que ofereçam proteção suficiente aos consumidores

vulneráveis e recomendando que a publicidade seja responsável, contenha advertências claras sobre os

riscos da dependência do jogo e não seja nem excessiva nem exibida em conteúdos especificamente

destinados aos menores ou onde se verifique um risco maior de visar menores, tal como acontece,

nomeadamente, com a publicidade dos meios de comunicação social; apela a que a publicidade

socialmente responsável dos jogos online só seja autorizada para ofertas de jogo legais;

✓ Considera que nunca deve ser permitido fazer publicidade a serviços de jogos online através da

apresentação de probabilidades exageradas de ganho que deem a falsa impressão de que jogar constitui

uma estratégia razoável para melhorar as finanças pessoais;

✓ Considera que a publicidade deve incluir informação clara sobre as consequências do jogo compulsivo;

salienta que a definição de um formato não prejudicial para a publicidade, bem como de regras em matéria

da sua distribuição são determinantes para evitar o jogo aos menores de 18 anos e para combater o jogo

problemático e compulsivo;

✓ Exorta o grupo de peritos em serviços de jogo online e a Comissão a facilitarem o fluxo de dados entre as

entidades reguladoras dos Estados-Membros, a fim de partilharem as melhores práticas e informações.

A Comunicação da Comissão (COM/2012/0596 final)28 «Para um enquadramento europeu completo do jogo

online», o ponto 2.3.3., designado «Fomentar uma publicidade responsável», revela que a publicidade

responsável é imperativa para se assegurar que os cidadãos estão conscientes de que: 1) se aplicam restrições

de idade, 2) o jogo pode ser nocivo quando não é utilizado de modo responsável e 3) existem riscos que podem

ser de natureza financeira, social ou relacionados com a saúde. Nem todos os Estados-Membros da UE dispõem

de regulamentação publicitária específica para os serviços de jogo. Alguns Estados-Membros têm códigos de

conduta específicos. O setor do jogo e o setor publicitário empreenderam algumas ações de autorregulação.

Todos os cidadãos da UE devem ser suficientemente informados sobre as escolhas que operam, bem como

sobre os riscos associados ao jogo.

A Recomendação da Comissão de 14 de julho de 2014 sobre princípios com vista à proteção dos

consumidores e dos utilizadores de serviços de jogo online e à prevenção do acesso dos menores aos jogos de

azar online (2014/478/UE)29, refere existir um vasto leque de meios de comunicação social, que contribui para

que os grupos mais vulneráveis, como é o caso dos menores, sejam atraídos para o jogo pela ampla exposição

a estas comunicações comerciais, nomeadamente através da Internet, das aplicações móveis mas também

através das competições desportivas que assistem e que são patrocinadas por instâncias de jogo ou onde se

exibe publicidade centrada em atividades de jogo.

Por último cumpre ainda fazer referência ao trabalho, sobre este tema, desenvolvido pelo Tribunal de Justiça

da UE, em especial, sobre se e que restrições ou impedimentos à publicidade são, à luz do mercado interno,

admissíveis, em especial quando esses jogos ou apostas são, no caso concreto do Estado-Membro, explorados

em regime de monopólio. O critério que tem vindo a ser defendido pelo Tribunal e pelos advogados-gerais vai

no sentido dos Estados poderem limitar ou excluir a publicidade e, até, atribuir um seu exclusivo a uma

autoridade nacional (como referido pelo Acórdão do Tribunal de Justiça, de 8 de setembro de 2009)30, mas,

quando a admitam, a publicidade dos jogos de fortuna e azar, onde se incluem as apostas, deve, em primeiro

27 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52013IP0348&qid=1631029634665. 28 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX:52012DC0596. 29 https://www.srij.turismodeportugal.pt/fotos/editor2/estudos/oj_jol_2014_214_r_0012_pt_txt.pdf. 30 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1590285761230&uri=CELEX:62007CJ0042.

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lugar, ser moderada e manter-se nos limites do estritamente necessário para canalizar os consumidores para

as redes de jogos controladas e, em segundo lugar, a oferta de jogos pelo titular do monopólio deve estar sujeita

a um controlo estrito pelas autoridades públicas (sobre isso, com diferentes matizes, podem ver-se as

Conclusões do advogado-geral Mazák apresentadas em 20 de setembro de 201231; as Conclusões do

advogado-geral Mengozzi apresentadas em 4 de março de 201032).

• Enquadramento internacional

A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: Espanha e

França.

ESPANHA

A Ley 13/2011, de 27 de mayo, de regulación del juego33, regula a atividade do jogo no território espanhol,

com o fim de garantir a proteção da ordem pública, lutar contra a fraude, prevenir comportamentos aditivos,

proteger os direitos dos menores e salvaguardar os direitos dos participantes nos jogos, sem prejuízo do

regulamentado pelas comunidades autónomas.

O artículo 7-1 do diploma proíbe a publicidade, patrocínio ou promoção, sob qualquer forma, dos jogos de

sorte ou azar sempre que o seu autor para tal não tenha sido devidamente autorizado através do título

habilitante. Por turno, de acordo com o artículo 7-2, as condições relativas à publicidade autorizada e os seus

limites devem ser regulamentados especificamente e incluídos nos respetivos títulos habilitantes,

nomeadamente o que se refira a:

1 – Envio de comunicações publicitárias ou promocionais por correio eletrónico ou por qualquer outro meio

de comunicação eletrónico equivalente, o que apenas será possível se previamente autorizado pelo seu

destinatário;

2 – Inclusão de anúncios ou de outras modalidades publicitárias relativos a jogos nos meios de comunicação

ou noutros suportes publicitários;

3 – Patrocínio de acontecimentos desportivos que sejam objeto de apostas;

4 – Inserção de cartazes publicitários de atividades de jogo em locais nos quais se desenvolvam atividades

cujo resultado seja objeto de apostas ou loterias;

5 – Concursos televisivos e às obrigações de informação sobre os requisitos base do jogo;

6 – Quaisquer outras condições que se definam regulamentarmente.

Cabe à entidade que difunde a publicidade ou a promoção direta ou indireta dos jogos e dos seus operadores

verificar a existência de título habilitante que o autorize (artículo 7-3).

Cumpre ainda referir que, de acordo com o artículo 8 do diploma, as políticas referentes à atividade de jogo

responsável pressupõem a programação de ações preventivas, de sensibilização, de intervenção e de controlo,

bem como, a reparação de eventuais efeitos negativos. Relativamente a este último aspeto os operadores de

jogo deverão elaborar um plano de medidas mitigadoras dos possíveis efeitos prejudiciais passíveis de ser

produzidos pelo jogo nas pessoas, nas quais se deverá incluir a identificação dos grupos de risco, bem como a

prestação da informação necessária ao público no sentido da seleção consciente das atividades de jogo,

promovendo atitudes de jogo moderadas, não compulsivas e responsáveis.

Entre 3 de abril e 11 de junho de 2020 vigorou em Espanha um regime especial no que se refere à publicidade

e à promoção dos jogos de fortuna e azar de âmbito nacional, impondo restrições acrescidas com fundamento

no contexto de excecionalidade imposto pela pandemia COVID-19, e no sentido de evitar a intensificação do

consumo de jogos de azar e dos consequentes comportamentos de consumo compulsivo. Este regime foi

aprovado pelo Real Decreto-ley 11/2020, de 31 de marzo (articulo 37) e revogado pelo Real Decreto-ley 21/2020,

31 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1590285761230&uri=CELEX:62011CC0186. 32 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1590285761230&uri=CELEX:62007CC0316. 33 Diploma consolidado disponível no portal www.boe.es, para onde se deverão consideras remetidas todas as referências legislativas relativas a Espanha, salvo indicação expressa em contrário.

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de 9 de junio (Disposición derogatoria única. Derogación normativa)34.

A 4 de novembro de 2020 foi publicado o Real Decreto 958/2020, de 3 de noviembre, de comunicaciones

comerciales de las atividades de juego. Este diploma tem por objeto o desenvolvimento da Ley 13/2011, de 27

de mayo, e, para além de concretizar o regime da autorização prévia necessária ao autor da publicidade (artículo

6) e das políticas ativas de informação e de proteção dos utilizadores (Título II), prevê ainda o princípio do jogo

seguro. Assim, de acordo com o artículo 10-2 do diploma, são proibidas as comunicações comerciais que, entre

outros:

1 – Incitem a prática irrefletida ou compulsiva do jogo, ou apresentem a prática do jogo como uma atividade

atrativa ou estimulante;

2 – Ofereçam bens ou serviços aos utilizadores ou qualquer modalidade de crédito ou que remetam para

outros sítios que contenham ofertas de prestações de crédito rápidas e instantâneas;

3 – Sugiram que o jogo pode ser uma solução ou uma alternativa para problemas pessoais, educativos,

profissionais ou financeiros;

4 – Associem, vinculem ou relacionem as atividades de jogo a ideias ou comportamentos que expressem

êxito pessoal, familiar, social, desportivo ou profissional.

Em Espanha, a lotaria instantânea («raspadinha») é designada por tarjetas rasca y gana. Esta lotaria

comercializa-se em dois formatos: Físico e eletrónico. O principal jogo de raspadinha em Espanha é gerido pela

Organización Nacional de Ciegos Españoles (ONCE)35. Os jogos de raspadinha operados pela ONCE são

regulamentados pela Resolución de 20 de noviembre de 2017, da Secretaria de Estado de Servicios Sociales e

Igualdad, que regula a implementação, lançamento e finalização de diversos produtos de Lotaria Instantânea de

Boletos de la ONCE e publica em anexo o novo regulamento que rege este tipo de lotaria. Esta resolución obriga

à publicidade, no verso de cada boletim de jogo, de informações básicas acerca das normas aplicáveis

(nomeadamente a estrutura dos prémios, a referência de como aceder ao Regulamento completo, entre outros)

do regulamento, e à existência de um link que remeta para o regulamento no caso do formato eletrónico, a fim

de garantir os direitos de consumidores (artículo 20).

FRANÇA

A matéria da publicidade dos jogos de fortuna e azar vem prevista, em França, no Code de la sécurité

intérieure36. De facto, de acordo com o article D320-2 do diploma, qualquer comunicação comercial relativa a

um operador de jogos de fortuna e azar deve ser acompanhada por uma mensagem de alerta contra os riscos

associados ao jogo. Esta mensagem, que deve ser incluída em todos os meios publicitários ou promocionais,

contém, entre outros, o número do serviço público de assistência ao jogador gerido pela Agence Nationale de

Santé Publique. O diploma estabelece ainda requisitos específicos relacionados com o formato do meio

publicitário adotado. A título de exemplo, refira-se: A obrigatoriedade, nos meios audiovisuais, da manutenção

de um banner com a mensagem de alerta referida no article D320-2 durante o período de apresentação da

mensagem publicitária ou imediatamente a seguir à sua apresentação (article D320-3); a obrigatoriedade, nos

meios radiofónicos, da mensagem aqui em causa ser divulgada imediatamente após a publicidade (article D320-

4); ou a obrigatoriedade, no formato impresso, da mensagem referida no article D320-2 ser apresentada

horizontalmente e ocupando, pelo menos, 7% da superfície publicitária (article D320-6).

Acresce que, o article D-320-9 proíbe as comunicações comerciais promovidas por um operador de jogos de

fortuna e azar sempre que tais comunicações:

1 – Incentivarem o jogo excessivo, ou o banalizarem ou promoverem;

2 – Sugerirem que o jogo contribui para o sucesso social;

3 – Contiverem afirmações infundadas sobre as hipóteses que os jogadores têm de ganhar ou a expectativa

34 Diploma que veio a ser posteriormente revogado pela Ley 2/2021, de 29 de marzo. 35 Portal oficial da ONCE, disponível em https://www.once.es/. 36 Diploma disponível no portal www.legifrance.gouv.fr, para onde se deverão considerar remetidas todas as referências legislativas relativas a França, salvo indicação expressa em contrário.

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de ganho;

4 – Sugerirem que o jogo pode ser uma solução para dificuldades pessoais, profissionais, sociais ou

psicológicas;

5 – Apresentarem o jogo como uma alternativa ao trabalho remunerado.

É ainda proibido, nos termos do article D-320-10, nas comunicações comerciais relativas a jogos de fortuna

e azar:

1 – Qualquer encenação ou representação que inclua ou menores em situação de compra;

2 – Qualquer publicidade que incentive os menores a considerarem que os jogos de dinheiro e azar são

uma parte natural do seu lazer;

3 – Qualquer encenação que inclua personalidades ou personagens pertencentes ao mundo dos menores;

ou

4 – Qualquer publicidade dirigida a crianças ou adolescentes que se apresente particularmente atraente

para estes, nomeadamente através do uso elementos visuais, sonoros, verbais ou escritos.

A lotaria instantânea («raspadinha») designa-se em França por ticket de grattage e a sua regulamentação

vem prevista no Règlement général des jeux de loterie instantanée de La Française des jeux37. Contudo, este

diploma não inclui nenhuma disposição relativa à publicidade.

A 21 de julho de 2021 foi apresentada, na Assemblée Nationale, uma proposition de loi38, pela Deputada

Agnès Thill que visa, precisamente, a interdição da publicidade relativa aos jogos de fortuna e azar.

V. Consultas e contributos

• Consultas facultativas

A DECO-Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor tomou a iniciativa de emitir parecer39

«congratula-se com a presente iniciativa, (…) revelando-se de manifesta importância para a proteção dos

direitos e interesses dos consumidores, em particular dos mais vulneráveis. Todavia, a nosso ver, as

circunstâncias já conhecidas justificam uma intervenção legislativa, porventura até, uma abordagem mais

abrangente, que não apenas em sede de Código da Publicidade, (…) como, entre outras, a adoção de medidas

de sensibilização sobre os riscos associados, a criação de mecanismos de autoexclusão.»

Atendendo à matéria em causa, a 6.ª Comissão pode, se assim o deliberar, solicitar os pareceres escritos à

DGC, ao SRIJ, à Entidade Reguladora para a Comunicação Social, à comissão de jogos do Instituto do Turismo

de Portugal, IP, à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, ao SICAD, bem como de associações de defesa dos

direitos dos consumidores.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

De acordo com a informação constante da ficha de Avaliação Prévia de Impacto de Género (AIG)40, junta

37 Versão inicial, alterada pela Modification du règlement général des jeux de loterie instantanée de La Française des jeux. 38 Texto integral disponível no portal oficial da Assemblée Nationale, em www.assemblee-nationale.fr/. 39 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Assembleia da República (consultado em 14 de setembro de 2021). Disponível em https://app.parlamento.pt/webutils/docs/doc.pdf?path=6148523063446f764c324679626d56304c334e706447567a4c31684a 566b786c5a793944543030764e6b4e46535539515343394562324e31625756756447397a5357357059326c6864476c3259554e7662576c7a633246764c3246694e545132596d55354c5751794d324d744e444d314d7931694e3249794c544d354e7a59794e54417a4e546b31596935775a47593d&fich=ab546be9-d23c-4353-b7b2-39762503595b.pdf&Inline=true. 40 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Assembleia da República. [Consultado em 14 de setembro de 2021]. Disponível em: https://app.parlamento.pt/webutils/docs/doc.pdf?path=6148523063446f764c324679626d56304c334e706447567a4c31684 a566b786c5a79394562324e31625756756447397a5357357059326c6864476c325953396d59574a6d4d32457a595330335a6d5a694c5451775a6a4574595749794f4330795a5464695a54466d59574d7a597a55756347526d&fich=fabf3a3a-7ffb-40f1-ab28-2e7be1fac3c5.pdf&Inline

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pelo autor, considera-se que a iniciativa legislativa tem uma valoração neutra, dado que a maioria das categorias

e indicadores analisados, assumem essa valoração.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso. A presente

iniciativa não nos suscita questões relacionadas com a utilização de linguagem discriminatória.

VII. Enquadramento bibliográfico

CALADO, Vasco – Jogo, Internet e outros comportamentos aditivos [Online]: Dossier temático. Lisboa:

Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências, 2019. [Consult. 14 ago. 2021].

Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=130543&img=16029&save=true.

Resumo: Dossier temático, da responsabilidade do SICAD, constituído por um conjunto de textos de

diferentes autores que se dedicam ao estudo do jogo, jogo online e uso problemático da Internet. A crescente

preocupação relativa a estes comportamentos aditivos sem substâncias e suas consequências levaram à

elaboração deste dossier. Apresentam-se, assim, cinco textos com os seguintes temas:

– Dependência de videojogos: Uma realidade emergente;

– Projeto de investigação-ação #GeraçãoCordão: Avaliação e intervenção nas dependências online;

– Jogo e consumos de substâncias psicoativas em Portugal;

– Perturbação ou abuso de jogo? Navegação à vista nos limites do diagnóstico;

– Jogadores, parentes e dinheiro. Aproximação e experiência nas famílias anónimas da região de Lisboa.

CHÓLIZ MONTAÑÉS, Mariano; MARCOS MOLINER, Marta – Detección temprana y prevención de

adicciones tecnológicas en adolescentes [Online]. Madrid: Fundación MAPFRE, 2020. [Consult. 16 ago.

2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=133850&img=20551&save=true.

Resumo: Este estudo debruça-se sobre os comportamentos aditivos em relação às tecnologias da

informação e comunicação (TIC) entre os mais jovens. Os autores entendem que, resultado das suas

características estruturais e das condições de consumo no quotidiano, as TIC proporcionam condições que

estimulam o uso excessivo de jogos. Para os autores a tecnologia pode exacerbar vícios, como o transtorno do

jogo, por meio do jogo online, cujas variáveis estruturais e ambientais favorecem ainda mais o jogo e o vício

excessivos. Neste quadro analisam, em capítulo autónomo, os jogos de apostas (p. 44), cujos comportamentos

aditivos têm aumentado resultado da promoção destes jogos juntos dos adolescentes.

LAVADO, Elsa; CALADO, Vasco; FEIJÃO, Fernanda – Estudo sobre o consumo de álcool, tabaco, droga

e outros comportamentos aditivos e dependências [Online]: 2019. Lisboa: Serviço de Intervenção nos

Comportamentos Aditivos e nas Dependências, 2020. [Consult. 16 ago. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=135091&img=22148&save=true.

Resumo: «Este estudo sobre o consumo de álcool, tabaco, drogas e outros comportamentos aditivos

(ECATD-CAD) é um estudo transversal, realizado através de questionário (ESPAD) auto preenchido por alunos

em ambiente de sala de aula. Foi realizado pela primeira vez em 2003 e replicado a cada quatro anos (2007,

=true.

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29 DE SETEMBRO DE 2021

107

2011, 2015 e 2019). Em 2015, o estudo foi alargado a outros comportamentos aditivos (Internet e jogo). Pela

primeira vez, a presente edição (2019) contempla também as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira».

O relatório demonstra a subida contínua após 2015 do acesso ao jogo.

PORTUGAL. Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências – Linhas de

orientação técnica para intervenção em comportamentos aditivos e dependências sem substância

[Online]: A perturbação de jogo. Lisboa: SICAD, 2017. [Consult. 16 ago. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=130542&img=16028&save=true.

Resumo: Este documento do SICAD abrange o tema da dependência do jogo como uma patologia aditiva

sem recurso a substâncias. Pretende ser um «manual que procura uma síntese integradora do conhecimento

na área da (dependência do jogo) em termos da sua compreensibilidade e da inerente intervenção clínica e

psicossocial. Trata-se de um documento que (…) pode auxiliar de modo efetivo os interventores com pessoas

com [comportamentos aditivos e dependências] (…)». O documento analisa a dimensão do fenómeno em

Portugal e na Europa, estudando os seus aspetos neurobiológicos, neuro químicos e neuropsicológicos, e

tratamentos associados.

PORTUGAL. Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências – Relatório de

avaliação intermédia do Plano Nacional para a Redução dos Comportamentos Aditivos e das

Dependências [Online]: 2013-2020. Lisboa: SICAD, 2018. [Consult. 16 ago. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=135061&img=22125&save=true.

Resumo: O Plano Nacional para a Redução dos Comportamentos Aditivos e das Dependências (PNRCAD]

tem como ambição endereçar «importantes problemas de saúde pública relacionados com as substâncias

ilícitas, ou com o álcool; de forma inovadora prioriza a focalização no cidadão abrindo horizontes para a

abordagem de outros comportamentos aditivos e dependências com ou sem substâncias. As novas temáticas

afloradas são as NSP (novas substâncias psicoativas), o abuso de medicamentos e anabolizantes e o jogo». No

que respeita ao jogo de risco e patológico o relatório conclui que as metas propostas não foram atingidas, tendo-

se agravado a situação de comportamento aditivo, nomeadamente na população feminina.

Anexo 1

• Quadro comparativo

Código da Publicidade Projeto de Lei n.º 919/XIV/2.ª (BE)

Artigo 21.º Jogos e apostas

1 – A publicidade de jogos e apostas deve ser efetuada de forma socialmente responsável, respeitando, nomeadamente, a proteção dos menores, bem como de outros grupos vulneráveis e de risco, privilegiando o aspeto lúdico da atividade dos jogos e apostas e não menosprezando os não jogadores, não apelando a aspetos que se prendam com a obtenção fácil de um ganho, não sugerindo sucesso, êxito social ou especiais aptidões por efeito do jogo, nem encorajando práticas excessivas de jogo ou aposta.

Artigo 21.º Jogos e apostas

1 – […]

2 – É expressamente proibida a publicidade de jogos e apostas que se dirija ou que utilize menores enquanto intervenientes na mensagem.

2 – É expressamente proibida a publicidade a lotarias instantâneas.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 8

108

Código da Publicidade Projeto de Lei n.º 919/XIV/2.ª (BE)

3 – É expressamente proibida a publicidade de jogos e apostas no interior de escolas ou outras infraestruturas destinadas à frequência de menores.

3 – (Anterior n.º 2.)

4 – É ainda expressamente proibida a publicidade de jogos e apostas a menos de 250 metros em linha reta de escolas ou outras infraestruturas destinadas à frequência de menores.

4 – (Anterior n.º 3.)

5 – Nos locais onde decorram eventos destinados a menores ou nos quais estes participem enquanto intervenientes principais, bem como nas comunicações comerciais e na publicidade desses eventos, não devem existir menções, explícitas ou implícitas, a jogos e apostas.

5 – (Anterior n.º 4.)

6 – As concessionárias e ou as entidades exploradoras de jogos e apostas não podem ser associadas a qualquer referência ou menção publicitária à concessão de empréstimos.

6 – (Anterior n.º 5.)

7 – O disposto no n.º 4 não se aplica aos jogos sociais do Estado.

7 – (Anterior n.º 6.)

8 – É proibida a publicidade a jogos e apostas, entre as 7 horas e as 22 horas e 30 minutos, independentemente do suporte utilizado para a sua difusão.

9 – As comunicações comerciais e a publicidade de quaisquer eventos em que participem menores, designadamente atividades desportivas, culturais, recreativas ou outras, não devem exibir ou fazer qualquer menção, implícita ou explícita, a marca ou marcas de lotarias instantâneas.

10 – Nos locais onde decorram os eventos referidos no número anterior não podem ser exibidas ou de alguma forma publicadas marcas de lotarias instantâneas.

———

PROJETO DE LEI N.º 920/XIV/2.ª

[REVOGA O «CARTÃO DO ADEPTO», PELA NÃO DISCRIMINAÇÃO E ESTIGMATIZAÇÃO DE

CIDADÃOS EM RECINTOS DESPORTIVOS (QUARTA ALTERAÇÃO À LEI N.º 39/2009, DE 30 DE JULHO)]

Parecer da Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto e nota técnica elaborada pelos

serviços de apoio

Parecer

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexos

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29 DE SETEMBRO DE 2021

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PARTE I – Considerandos

1.1. Nota introdutória

O Deputado único do partido Iniciativa Liberal tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o

Projeto de Lei n.º 920/XIV/2.ª, com o título «Revoga o ‘Cartão do Adepto’, pela não discriminação e

estigmatização de cidadãos em recintos desportivos (quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho)».

A iniciativa em apreciação é apresentada ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da CRP e do n.º 1

do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei.

Trata-se de um poder dos Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da CRP e b) do n.º 1 do

artigo 4.º do Regimento, bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do

artigo 180.º da CRP e da alínea f) do artigo 8.º do RAR.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 6 de agosto de 2021. Foi admitido e baixou para discussão na

generalidade à Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto (8.ª), tendo sido anunciado na reunião

plenária do dia 14 de setembro.

1.2. Âmbito da Iniciativa

Esta iniciativa legislativa do Deputado único do partido Iniciativa Liberal (IL) visa a eliminação do denominado

«Cartão do Adepto», considerando que o mesmo é redundante e um fator de discriminação e estigmatização de

cidadãos em recintos desportivos. Entende o Deputado único do Iniciativa Liberal ser o Cartão do Cidadão o

único cartão de identificação necessário para, em conjunto com bilhete do jogo, aceder aos recintos desportivos.

• Análise da iniciativa

Com este projeto de lei é pretendido proceder-se à quarta alteração da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho1,

alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pelas Leis n.os 52/2013, de 25 de julho, e 113/2019,

de 11 de setembro.

De acordo com o explanado na exposição de motivos, o proponente invoca o histórico legislativo das medidas

de combate e prevenção da violência no desporto, desde 2004 até 2019, e pretende desse modo demonstrar

que tem existido uma insistência no combate e não na prevenção e um foco a jusante, ignorando soluções a

montante, nomeadamente na promoção do fair play nas camadas mais jovens, futuros atores do fenómeno

desportivo.

Argumenta que é necessário acabar com a exigência do cartão do adepto para aceder e permanecer nas

zonas com condições especiais de acesso e permanência de adeptos (doravante designadas por ZCEAP), nos

recintos onde se realizem espetáculos desportivos integrados nas competições desportivas de natureza

profissional ou de natureza não profissional considerados de risco elevado.

Considera ainda ser inaceitável haver registos obrigatórios que condicionem as liberdades de circulação,

associação e expressão na vida social, para além de redundantes. O IL opõe-se fortemente à obrigação de

alguém se registar numa base de dados do Estado para poder ter acesso a uma determinada zona de um recinto

desportivo ou poder aceder às zonas visitantes em recintos de outros clubes. Além disso, não entende como é

possível querer aplicar em Portugal uma medida que se mostrou totalmente ineficaz nos vários países europeus

em que foi aplicada nos últimos 15 anos.

A presente iniciativa tem 3 artigos, sendo o 1.º a definição do seu objeto, o 2.º a alteração à Lei n.º 39/2009,

de 30 de julho, e o 3.º a norma revogatória.

A iniciativa estabelece o reforço da igualdade de tratamento entre adeptos, para tal procedendo à quarta

alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pelas

Leis n.os 52/2013, de 25 de julho, e 113/2019, de 11 de setembro.

No artigo 2.º altera a redação do artigo 16-A da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, na sua redação atual,

eliminando da redação do seu número 2 a exigência da titularidade de um cartão de adepto para aceder ou

1 Versão consolidada, disponível no portal na Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa em http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado. php?tabela=leis&artigo_id=&nid=1326&nversao=&tabela=leis&so_miolo=.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 8

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permanecer a zona com condições especiais de acesso e permanência de adeptos, também é eliminado o n.º

3 do mesmo artigo.

Quanto ao artigo 3.º estipula a revogação da alínea r) do artigo 3.º, o n.º 3 do artigo 16.º-A e o n.º 2 do artigo

35.º da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, na sua redação atual.

1.3.1. Enquadramento jurídico nacional

A Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, «estabelece o regime jurídico da segurança e combate ao racismo, à

xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, ou atos com eles relacionados, de forma a possibilitar a

realização dos mesmos com segurança e de acordo com os princípios éticos inerentes à sua prática».

O n.º 1 do artigo 16.º-A do diploma obriga à criação de zonas com condições especiais de acesso e

permanência de adeptos (doravante designadas por ZCEAP), nos recintos onde se realizem espetáculos

desportivos integrados nas competições desportivas de natureza profissional ou de natureza não profissional

considerados de risco elevado. De acordo com a alínea q) do artigo 3.º, devem entender-se por ZCEAP, as

áreas específicas «do recinto desportivo integrado em competições desportivas de natureza profissional ou em

espetáculos desportivos integrados nas competições desportivas de natureza não profissional considerados de

risco elevado, onde é permitida a utilização de megafones e outros instrumentos produtores de ruídos, por

percussão mecânica e de sopro, desde que não amplificados com auxílio de fonte de energia externa, bem como

de bandeiras, faixas, tarjas e outros acessórios, de qualquer natureza e espécie, de dimensão superior a 1 m

por 1 m, passíveis de serem utilizados em coreografias de apoio aos clubes e sociedades desportivas». Por seu

lado, de acordo com o artigo 12.º, consideram-se de «risco elevado os espetáculos desportivos que forem

definidos como tal por despacho do presidente da APCVD (Autoridade para a Prevenção e o Combate à

Violência no Desporto), ouvida a força territorial competente e a respetiva federação desportiva ou, tratando-se

de uma competição desportiva de natureza profissional, a liga profissional» (n.º 1), considerando-se

«obrigatoriamente de risco elevado os espetáculos desportivos que sejam como tal declarados pelas

organizações internacionais, a nível europeu e mundial, das respetivas modalidades, com base em incidentes

ocasionados pelos adeptos de pelo menos uma das equipas» (n.º 2).

Neste seguimento, dispõe o artigo 16.º-A, n.º 2, que «o acesso e a permanência nas zonas com condições

especiais de acesso e permanência de adeptos, em cada espetáculo desportivo, são reservados apenas aos

adeptos detentores de título de ingresso válido e do cartão de acesso a zona com condições especiais de acesso

e permanência de adeptos.»

O cartão de acesso às ZCEAP é emitido pela Autoridade para a Prevenção e o Combate à Violência no

Desporto (APCVD)23, com as características e nos termos previstos em portaria do membro do Governo

responsável pela área do desporto [artigo 3.º, alínea r)].

A Portaria n.º 159/2020, de 26 de junho4, veio definir as normas aplicáveis à requisição, emissão,

funcionamento e utilização do cartão de acesso às ZCEAP, abreviadamente designado cartão do adepto, bem

como aprovar os respetivos modelos e características. De acordo com o artigo 3.º da referida portaria, o cartão

do adepto permite ao respetivo titular fazer prova da sua identificação para efeitos de acesso e permanência em

ZCEAP nos recintos onde se realizem espetáculos desportivos integrados em competições desportivas de

natureza profissional ou de natureza não profissional considerados de risco elevado, perante assistentes de

recinto desportivo, forças de segurança e outras entidades, públicas ou privadas, que tenham responsabilidades

em matéria de segurança no âmbito da realização de espetáculos desportivos.

Remete-se, no que tange à análise das matérias de enquadramento jurídico nacional mais aprofundado e

comparação internacional, para o detalhado trabalho vertido na nota técnica que acompanha o parecer.

2 Portal oficial da APCVD. 3 Entidade criada pelo Decreto Regulamentar n.º 10/2018, de 3 de outubro (diploma disponível no portal do Diário da República Eletrónico, em www.dre.pt), com a missão de prevenir e fiscalizar o cumprimento do regime jurídico previsto na Lei n.º 39/2009, de 30 de julho. 4 Diploma disponível no portal do Diário da República Eletrónico, em www.dre.pt, para onde se deverão doravante considerar remetidas todas as referências legislativas, salvo indicação expressa em contrário.

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1.3.2. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que, neste momento, com objeto

conexo com o do projeto de lei em análise, não existem iniciativas legislativas ou petições pendentes.

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

A consulta à AP devolve os seguintes antecedentes sobre matéria conexa:

N.º Título Data Autor Votação Publicação

XIII/4.ª – Proposta de Lei

153 Altera o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos.

2018/10/18 GOV

Aprovado A favor: PSD, PS, BE, CDS-PP, PAN e Paulo Trigo Pereira (N insc.) Abstenção: PCP e PEV

[DAR II Série-A n.º

8, 2018/10/04,

da 4.ª Sessão

Legislativa da XIII

Legislatura (pág. 126-

173)]

XIII/2.ª – Projeto de Lei

522

Procede à quarta alteração da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pela Lei n.º 52/2013, de 25 de julho, e à alteração da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio

2017/05/23 CDS-PP Esta iniciativa caducou em 2019/10/24

[DAR II Série-A n.º

114, 2017/05/23,

da 2.ª Sessão

Legislativa da XIII

Legislatura (pág. 5-8)]

521

Procede à quarta alteração da Lei n.º 39/2009, de 31 de agosto, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pela Lei n.º 52/2013, de 25 de julho, e à alteração do Regulamento das Condições Técnicas e de Segurança dos Estádios, anexo ao Decreto Regulamentar n.º 10/2001, de 7 de junho, no sentido de possibilitar a existência de sectores devidamente identificados em recintos desportivos nos quais se realizem competições desportivas nacionais de natureza profissional, que permitam aos espetadores permanecer na posição de pé durante todo o jogo

2017/05/23 CDS-PP Esta iniciativa caducou em 2019/10/24

[DAR II Série-A n.º

114, 2017/05/23,

da 2.ª Sessão

Legislativa da XIII

Legislatura (pág. 2-4)]

De realçar que:

• A Proposta de Lei n.º 153/XIII/4.ª (GOV) deu origem à Lei n.º 113/2019 – Estabelece o regime jurídico da

segurança e combate ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, alterando a Lei n.º

39/2009, de 30 de julho.

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

O signatário do presente relatório exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto

de Lei n.º 920/XIV/2.ª (IL) – Revoga o «Cartão do Adepto», pela não discriminação e estigmatização de cidadãos

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em recintos desportivos (quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho), reservando a posição do seu Grupo

Parlamentar para o debate em Plenário.

PARTE III – Conclusões

A Comissão, em sede de apreciação na especialidade da presente iniciativa legislativa deverá promover a

consulta das seguintes entidades:

• Secretário de Estado da Juventude e do Desporto;

• Instituto do Desporto de Portugal (IPDJ, IP);

• Federações desportivas;

• Ligas profissionais;

• Sociedades desportivas;

• Clubes desportivos;

• Associações dos vários desportos;

• Conselhos de arbitragem;

• Comité Olímpico de Portugal (COP);

• Comité Paralímpico de Portugal (CPP);

• Confederação do Desporto de Portugal;

• Forças de segurança;

• Grupos organizados de adeptos/claques;

• Associação dos Coordenadores de Segurança de Portugal;

• Associação Portuguesa de Defesa do Adepto;

• Procuradoria Geral da República (PGR);

• Conselho Superior do Ministério Público;

• Conselho Superior de Magistratura;

• Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD).

A Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto é de parecer que o Projeto de Lei n.º 920/XIV/2.ª

(IL) – Revoga o «Cartão do Adepto», pela não discriminação e estigmatização de cidadãos em recintos

desportivos (quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho), reúne os requisitos constitucionais e regimentais

para ser discutido e votado em Plenário.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do regimento da

Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 28 de setembro de 2021.

O Deputado relator, Emídio Guerreiro — O Presidente da Comissão, Firmino Marques.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado as ausências do PAN, do PEV e do IL,

na reunião da Comissão de 28 de setembro de 2021.

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29 DE SETEMBRO DE 2021

113

Nota Técnica

Projeto de Lei n.º 920/XIV/2.ª (IL)

Revoga o «Cartão do Adepto», pela não discriminação e estigmatização de cidadãos em recintos

desportivos (quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho)

Data de admissão: 6 de agosto de 2021.

Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto (8.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Enquadramento bibliográfico

Elaborada por: Filipa Paixão e Belchior Lourenço (DILP), Luís Martins (DAPLEN), Luís Silva (BIB), Elodie Rocha e Filipe Luís Xavier (DAC). Data: 17 de setembro de 2021.

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

Com a presente iniciativa visam o proponente proceder à quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho1,

alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pelas Leis n.os 52/2013, de 25 de julho, e 113/2019,

de 11 de setembro. Pretende-se, em concreto, a eliminação do denominado «Cartão do Adepto», considerando

ser este redundante e um fator de discriminação e estigmatização de cidadãos em recintos desportivos.

Entendem os proponentes ser o Cartão do Cidadão o único cartão de identificação necessário para, em conjunto

com bilhete do jogo, aceder aos recintos desportivos.

• Enquadramento jurídico nacional

A Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, «estabelece o regime jurídico da segurança e combate ao racismo, à

xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, ou atos com eles relacionados, de forma a possibilitar a

realização dos mesmos com segurança e de acordo com os princípios éticos inerentes à sua prática».

O n.º 1 do artigo 16.º-A do diploma obriga à criação de zonas com condições especiais de acesso e

permanência de adeptos (doravante designadas por ZCEAP), nos recintos onde se realizem espetáculos

desportivos integrados nas competições desportivas de natureza profissional ou de natureza não profissional

considerados de risco elevado. De acordo com a alínea q) do artigo 3.º, devem entender-se por ZCEAP, as

áreas específicas «do recinto desportivo integrado em competições desportivas de natureza profissional ou em

espetáculos desportivos integrados nas competições desportivas de natureza não profissional considerados de

risco elevado, onde é permitida a utilização de megafones e outros instrumentos produtores de ruídos, por

percussão mecânica e de sopro, desde que não amplificados com auxílio de fonte de energia externa, bem como

1 Versão consolidada, disponível no portal na Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa em http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado. php?tabela=leis&artigo_id=&nid=1326&nversao=&tabela=leis&so_miolo=.

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de bandeiras, faixas, tarjas e outros acessórios, de qualquer natureza e espécie, de dimensão superior a 1 m

por 1 m, passíveis de serem utilizados em coreografias de apoio aos clubes e sociedades desportivas». Por seu

lado, de acordo com o artigo 12.º, consideram-se de «risco elevado os espetáculos desportivos que forem

definidos como tal por despacho do presidente da APCVD (Autoridade para a Prevenção e o Combate à

Violência no Desporto), ouvida a força territorial competente e a respetiva federação desportiva ou, tratando-se

de uma competição desportiva de natureza profissional, a liga profissional» (n.º 1), considerando-se

«obrigatoriamente de risco elevado os espetáculos desportivos que sejam como tal declarados pelas

organizações internacionais, a nível europeu e mundial, das respetivas modalidades, com base em incidentes

ocasionados pelos adeptos de pelo menos uma das equipas» (n.º 2).

Neste seguimento, dispõe o artigo 16.º-A, n.º 2, que «o acesso e a permanência nas zonas com condições

especiais de acesso e permanência de adeptos, em cada espetáculo desportivo, são reservados apenas aos

adeptos detentores de título de ingresso válido e do cartão de acesso a zona com condições especiais de acesso

e permanência de adeptos».

O cartão de acesso às ZCEAP é emitido pela Autoridade para a Prevenção e o Combate à Violência no

Desporto (APCVD)23, com as características e nos termos previstos em portaria do membro do Governo

responsável pela área do desporto [artigo 3.º, alínea r)].

A Portaria n.º 159/2020, de 26 de junho4, veio definir as normas aplicáveis à requisição, emissão,

funcionamento e utilização do cartão de acesso às ZCEAP, abreviadamente designado «cartão do adepto», bem

como aprovar os respetivos modelos e características. De acordo com o artigo 3.º da referida Portaria, o cartão

do adepto permite ao respetivo titular fazer prova da sua identificação para efeitos de acesso e permanência em

ZCEAP nos recintos onde se realizem espetáculos desportivos integrados em competições desportivas de

natureza profissional ou de natureza não profissional considerados de risco elevado, perante assistentes de

recinto desportivo, forças de segurança e outras entidades, públicas ou privadas, que tenham responsabilidades

em matéria de segurança no âmbito da realização de espetáculos desportivos.

Refira-se ainda que, nos termos determinados pela portaria supra identificada:

1 – O cartão do adepto é um documento autêntico que contém os dados do seu titular estritamente

necessários e relevantes para o acesso e permanência em ZCEAP (artigo 8.º, n.º 1);

2 – É requerido em plataforma eletrónica, através de acesso disponível no sítio do portal «ePortugal», ou

em plataforma eletrónica que lhe venha a suceder (artigo 1.º do Anexo I);

3 – Para efeitos de emissão do cartão do adepto, são objeto de tratamento os seguintes dados pessoais: a)

nome completo; b) morada de residência e, no caso de ser diferente, morada de entrega do cartão do adepto;

c) tipo de documento de identificação e respetivo número; d) data de nascimento; e) fotografia do cartão de

cidadão ou fornecida pelo requerente; f) número de identificação fiscal; g) endereço eletrónico; h) número de

telefone; i) promotores de espetáculos desportivos que apoia; j) grupos organizados de adeptos em que se

encontre filiado, se for o caso; k) filiação, no caso de requerentes com idade igual ou superior a 16 anos e inferior

a 18 (artigos 3.º e 6.º do Anexo I);

4 – Os dados referidos no ponto anterior são objeto de partilha com os organizadores e promotores dos

espetáculos desportivos, para efeitos de dimensionamento e adequação das ZCEAP, de emissão e venda de

títulos de ingresso e de controlo de acessos (artigo 5.º do Anexo I);

5 – O cartão, por despacho do Presidente da APCVD5, tem um custo de 20 € a pagar no momento de

emissão e é válido por três anos, não existindo custos de renovação nas atualizações anuais, caso não se

alterem os elementos visíveis do cartão (artigos 7.º e 13.º do Anexo I);

6 – Cabe à entidade que emite e vende títulos de ingresso garantir que os adquirentes dos títulos de

ingresso são titulares de cartão do adepto válido e vedar a aquisição dos mesmos a titulares do cartão do adepto

para espetáculos desportivos que coincidam, cronologicamente, com períodos em que aqueles se encontrem

sujeitos a medidas de interdição (artigo 16.º-A, n.º 3, da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, e artigo 10.º do Anexo

2 Portal oficial da APCVD. 3 Entidade criada pelo Decreto Regulamentar n.º 10/2018, de 3 de outubro (diploma disponível no portal do Diário da República Eletrónico, em www.dre.pt), com a missão de prevenir e fiscalizar o cumprimento do regime jurídico previsto na Lei n.º 39/2009, de 30 de julho. 4 Diploma disponível no portal do Diário da República Eletrónico, em www.dre.pt, para onde se deverão doravante considerar remetidas todas as referências legislativas, salvo indicação expressa em contrário. 5 Despacho n.º 7468/2020, de 28 de julho, disponível no portal do Diário da República Eletrónico, em www.dre.pt.

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I);

7 – O cartão do adepto é pessoal e intransmissível (artigo 14.º).

Em fevereiro de 2021, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa julgou improcedente a procedimento

cautelar instaurado, entre outros, pela Associação Portuguesa de Defesa do Adepto, no qual se requereu a

suspensão de eficácia das normas constantes do Anexo I da Portaria n.º 159/2020, de 26 de junho. Essa decisão

veio a ser confirmada pelo Tribunal Central Administrativo Sul, em acórdão datado de 02/06/2021, referente ao

processo n.º 1996/20.1belsb6. De facto, este último tribunal acompanhou a decisão proferida pelo tribunal de 1.ª

instância, o qual entendeu, relativamente a cada uma das alegações apresentadas pelos requerentes, o

seguinte:

1. «(…) Os requerentes insurgem-se contra o facto de nos recintos onde se realizem espetáculos abrangidos

pelo artigo 16.º-A, os grupos organizados de adeptos apenas poderem aceder e permanecer nas zonas com

condições especiais de acesso e permanência de adeptos, bem como, contra a circunstância de tais zonas não

permitirem fisicamente a passagem dos espectadores para outras zonas e sectores do recinto desportivo,

suscitando a este respeito a inconstitucionalidade do regime jurídico nesses termos delineado, por violação dos

artigos 26.º, n.º 1, e 27.º, n.º 1, da CRP. Contudo, perscrutado tal quadro jurídico, acima traçado, e nesta análise

perfunctória que, necessariamente, tem de ser feita em sede cautelar, não se afigura que o mesmo padeça da

suscitada invalidade. Os requerentes configuram a violação dos invocados direitos com base numa alegada

restrição da sua liberdade de ação e atuação, que, no entanto, se afigura não existir, pelo menos na dimensão

constitucionalmente protegida. Com efeito, o adepto desloca-se, por opção individual, ao estádio e, também no

exercício da sua liberdade individual, escolhe o modo como pretende assistir ao jogo e, consequentemente, a

zona onde irá assistir (porquanto, e como nota a entidade requerida, o adepto, ainda que seja membro de um

GOA, pode livremente escolher o sítio do recinto onde pretende assistir ao evento, desde que cumpra os

requisitos de acesso e permanência fixados para as diferentes zonas do estádio), que se encontra previamente

delimitada, sendo que os invocados direitos à liberdade física e à liberdade de movimentos, previstos na

Constituição, salvaguardam o direito de o cidadão não ser detido, aprisionado, ou de qualquer modo confinado

a um determinado espaço contra a sua vontade, ou impedido de se movimentar. O que não sucede no caso em

apreço, sendo manifesto que não há qualquer confinamento forçado do adepto que voluntariamente decide ir

assistir a um espetáculo desportivo, sujeitando-se, naturalmente, às regras legalmente fixadas para o acesso e

permanência nos recintos desportivos, as quais, saliente-se, de acordo com as especificidades do tipo de

assistência, valem para todos os espectadores. Note-se que, como bem observa a entidade requerida, para

além de a delimitação física das zonas de assistência de adeptos num recinto desportivo estar plenamente

justificada por razões de organização do espaço e segurança, as diferentes zonas/secções do recinto desportivo

podem estar isoladas entre si, de maneira a evitar a aglomeração não controlada e mistura de adeptos de

equipas diferentes, bem como para evitar situações de sobrelotação de bancadas por via de migração de

espectadores. Acresce que, ao contrário do que alegam os requerentes, inexiste a aludida impossibilidade de o

adepto sair do espaço onde ingressou para o efeito, podendo aquele sair do recinto desportivo. Na verdade, a

existirem limites à liberdade geral de ação dos requerentes, neste âmbito, são os limites intrínsecos à ação dos

próprios titulares do direito que, livremente, optam (ou não) por ir assistir a um espetáculo desportivo,

designadamente, inseridos num grupo organizado de adeptos, deste modo submetendo-se às regras de

utilização e permanência no espaço em questão, cuja consagração legal e regulamentar visa de um modo geral

acautelar a segurança do próprio espaço e de todos os participantes no evento. (…)»

2. «(…) De igual modo, não se afigura, da análise sumária que se leva a cabo, que a implementação das

zonas com condições especiais de acesso previstas no artigo 16.º-A, cujo acesso vem regulamentado na

portaria posta em causa pelos requerentes, consubstancie uma qualquer violação do direito consagrado na

primeira parte do n.º 1 do artigo 37.º da CRP. (…) Considerando que a liberdade de expressão que os

requerentes invocam nos presentes autos se relaciona, como os próprios alegam, com a liberdade de

manifestarem o apoio ao seu clube, num recinto desportivo, de uma forma mais ruidosa e com recurso a lay-out

mais pesado, afigura-se adequada, necessária e proporcional, a restrição que possa resultar para esse direito

do regime ínsito no artigo 16.º-A da Lei n.º 39/2009. De facto, estando em causa a pretensa utilização de

6 Acórdão disponível no portal www.dgsi.pt.

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‘megafones e outros instrumentos produtores de ruídos, por percussão mecânica e de sopro, desde que não

amplificados com auxílio de fonte de energia externa, bem como de bandeiras, faixas, tarjas e outros acessórios,

de qualquer natureza e espécie, de dimensão superior a 1 m por 1 m, passíveis de serem utilizados em

coreografias de apoio aos clubes e sociedades desportivas’, num contexto grupal, afigura-se proporcional

restringir esse tipo de manifestação a uma zona delimitada do recinto desportivo, em todos os estádios das

competições profissionais e nos recintos que recebam jogos de risco elevado. Assim como, pela mesma razão,

não se nos afigura manifestamente desadequado ou desproporcional a restrição prevista no artigo 6.º, n.º 3, do

Anexo I da Portaria n.º 159/2020, no que respeita à idade mínima para acesso à ZCEAP aqui em causa (norma

à qual é feita referência pelos requerentes no articulado inicial, contudo, sem a formulação de uma concreta

consequência no plano jurídico) (…)».

3. «(…) O que vem dito permite, ainda, chegar a idêntica conclusão no que respeita à invocada violação do

direito de reunião constitucionalmente protegido (cfr. artigo 45.º, n.º 1, da CRP), que, à luz dos argumentos supra

enunciados, também se afigura inexistir. Donde daqui também resulta que, considerando o tipo de apoio ao

clube que os adeptos ora requerentes e respetivos associados pretendem realizar, afigura-se necessário,

adequado e proporcional restringir determinadas formas de manifestação a uma zona delimitada do recinto

desportivo, em todos os estádios das competições profissionais e nos recintos que recebam jogos de risco

elevado, a fim de salvaguardar a segurança de todos os participantes, que emana do disposto no artigo 27.º, n.º

1, da Constituição (…)».

4. «(…) Alegaram, ainda, os requerentes que a Portaria n.º 159/2020, ao assumir a disciplina da recolha,

tratamento e conservação dos dados pessoais para requisição do cartão de acesso, viola o disposto no n.º 4 do

artigo 35.º da lei fundamental. A respeito da problemática dos dados pessoais, invocaram, ainda, os requerentes

que a remissão para a portaria, operada pelo artigo 3.º, alínea r), da Lei n.º 39/2009, não apenas das

características técnicas do cartão de acesso às ZCEAP mas também dos ‘termos’ em que por meio dele se

processa esse acesso (nesses termos se incluindo as normas primárias sobre recolha e conservação de dados

pessoais ou sobre a onerosidade do cartão), viola o artigo 112.º, n.º 5, da Constituição, já que não pode o

regulamento ser habilitado a inovar ou, simplesmente, inovar relativamente à lei que visa regulamentar. Por

outro lado, e no que respeita à validade das normas previstas na portaria e respetivo anexo a propósito dos

dados pessoais do titular do cartão do adepto, dir-se-á, num juízo perfunctório, que a mesmas não inovam nem

colidem com o regime jurídico que visam regulamentar, contendo-se, antes, na habilitação legal constante da

alínea r) do artigo 3.º da Lei n.º 39/2009, porquanto, tal habilitação permite ao regulamento prever os termos em

que o cartão do adepto poderá ser emitido e utilizado, o que englobará a previsão regulamentar de aspetos

como os dados pessoais associados ao cartão (que naturalmente, terá de ter um titular, identificável) e respetivo

tratamento. O que vem dito, vale, igualmente, para aspetos relacionados com os encargos relativos à emissão

do cartão do adepto. (…) Assim, considerando os interesses prosseguidos pela autoridade responsável pelo

tratamento, não é manifesto ou evidente que os dados pessoais exigidos para a emissão do cartão não sejam

necessários para a finalidade para a qual foram recolhidos ou tratados. Pelo contrário, tendo em conta que o

cartão visa, por um lado, assegurar o registo e a identificação dos seus titulares para efeitos de dimensionamento

e gestão do acesso às ZCEAP e também para auxílio à verificação, em tempo útil, das decisões judiciais e

administrativas que impeçam determinadas pessoas de acederem aos recintos desportivos, então, afigura-se,

nesta análise perfunctória, que os dados previstos no artigo 3.º, n.º 1, do Anexo I da portaria serão os

necessários para a prossecução das finalidades para as quais se procede ao tratamento dos dados (…)».

5. «(…) Mais alegaram os requerentes que no caso dos autos ocorre a manifesta violação da liberdade de

associação, na sua vertente negativa, decorrente da obrigatoriedade de adesão a uma associação de adeptos

como requisito indispensável para a obtenção do cartão do adepto, o qual, por sua vez, é requisito indispensável

para o acesso e permanência no recinto desportivo por parte dos cidadãos que queiram exteriorizar o apoio ao

seu clube nos termos referidos – cfr. n.º 8 do artigo 16.º-A da Lei n.º 39/2009. Defenderam os requerentes, em

suma, que o cartão do adepto só será emitido a quem for membro de uma associação de adeptos, nos termos

do artigo 14.º, n.º 1 da Lei n.º 39/2009, o que viola, no seu entendimento, o disposto no artigo 46.º, n.º 3, da

CRP. (…) Em suma, não contemplando a Portaria n.º 159/2020, como requisito de acesso a uma ZCEAP, para

a qual está prevista a obtenção de um cartão do adepto, a obrigatoriedade de pertencer a uma associação de

adeptos, reconhecida ou não juridicamente, não se vê como provável a procedência da ação principal com

fundamento na violação do artigo 46.º, n.º 3, da CRP. Salientando-se, ainda, a este propósito, e precisamente

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devido ao facto de a portaria não regular as condições de acesso ao cartão do adepto nesses termos, que não

se vislumbra – nem os requerentes identificam, de resto – qual a norma regulamentar que o tribunal devesse

considerar ilegal com fundamento numa eventual inconstitucionalidade do artigo 14.º, n.º 1, da Lei n.º 39/2009

(pois o mesmo não é objeto de aplicação pelas normas da portaria, que nada regulamenta a propósito da

constituição ou atribuição de apoios a GOA). Face ao que, atento o exposto, se conclui, que não é provável a

procedência da ação principal, com fundamento nas ilegalidades invocadas (…)».

Cumpre ainda referir que, no Relatório de Análise da Violência associada ao Desporto (RAViD)7, de 16 de

dezembro de 2020, referente à época 2019/2020, elaborado em conjunto pela Polícia de Segurança Pública

(através do Ponto Nacional de Informações sobre Desporto – PNID8) e pela APCVD, concluiu-se o seguinte:

«a) Os adeptos visados são, na sua totalidade, do género masculino e, quanto à distribuição etária, 34% dos

adeptos têm entre 21 e 25 anos de idade, seguindo-se a faixa etária dos 26 aos 30 anos de idade, com 18%;

b) 56% dos adeptos sujeitos a medidas de interdição determinadas pela APCVD são membros de grupos

organizados de adeptos (GOA);

c) Os principais ilícitos contraordenacionais em que foram aplicadas as referidas medidas de interdição de

acesso são ‘a introdução ou utilização de substâncias ou engenhos explosivos, artigos de pirotecnia ou

fumígenos’ (54%) e ‘a prática de atos ou o incitamento à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos

espetáculos desportivos’ (40%);

d) A maioria das situações reporta-se à modalidade desportiva ‘Futebol’ (86%) e, em particular, à competição

‘1.ª Liga’, onde se contabilizam 56% do total de interdições aplicadas na modalidade ‘Futebol’.»

II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que, neste momento, não se

encontram pendentes quaisquer iniciativas legislativas ou petições sobre matéria idêntica ou conexa com a da

presente iniciativa.

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

A consulta à AP devolve os seguintes antecedentes sobre matéria conexa:

N.º Título Data Autor Votação Publicação

XIII/4.ª – Proposta de Lei

153 Altera o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos.

2018/10/18 GOV

Aprovado A favor: PSD, PS, BE, CDS-PP, PAN e Paulo Trigo Pereira (N insc.) Abstenção: PCP e

PEV

[DAR II Série-A n.º 8, 2018/10/04,

da 4.ª Sessão

Legislativa da XIII

Legislatura (pág. 126-

173)]

7 Documento disponível no portal oficial da APCVD, em https://www.apcvd.gov.pt/. 8 Entidade designada como ponto de contacto permanente para o intercâmbio de informações relativas ao fenómeno de violência associada ao desporto, e que se encontra sob a alçada da Polícia de Segurança Pública (cfr. artigo 3.º, n.º 3, alínea d), da Lei n.º 53/2007, de 31 de agosto, e artigo 3.º, alínea p), da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho).

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N.º Título Data Autor Votação Publicação

XIII/2.ª – Projeto de Lei

522

Procede à quarta alteração da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pela Lei n.º 52/2013, de 25 de julho, e à alteração da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio.

2017/05/23 CDS-PP Esta iniciativa caducou em 2019/10/24

[DAR II Série-A n.º

114, 2017/05/23,

da 2.ª Sessão

Legislativa da XIII

Legislatura (pág. 5-8)]

521

Procede à quarta alteração da Lei n.º 39/2009, de 31 de agosto, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pela Lei n.º 52/2013, de 25 de julho, e à alteração do Regulamento das Condições Técnicas e de Segurança dos Estádios, anexo ao Decreto Regulamentar n.º 10/2001, de 7 de junho, no sentido de possibilitar a existência de sectores devidamente identificados em recintos desportivos nos quais se realizem competições desportivas nacionais de natureza profissional, que permitam aos espetadores permanecer na posição de pé durante todo o jogo.

2017/05/23 CDS-PP Esta iniciativa caducou em 2019/10/24

[DAR II Série-A n.º

114, 2017/05/23,

da 2.ª Sessão

Legislativa da XIII

Legislatura (pág. 2-4)]

De realçar que:

• A Proposta de Lei n.º 153/XIII/4.ª (GOV) deu origem à Lei n.º 113/2019 – Estabelece o regime jurídico da

segurança e combate ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, alterando a Lei n.º

39/2009, de 30 de julho.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Deputado único representante do partido Iniciativa Liberal (IL),

ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º daConstituição da República Portuguesa (Constituição)9 e do

119.º do Regimento da Assembleia da República (Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-

se de um poder dos Deputados, por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e b) do n.º 1

do artigo 4.º e do Regimento.

Observa o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do Regimento, e assume a forma de projeto de lei,

em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do Regimento.

A iniciativa encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o

seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previsto

no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Observa, igualmente, os limites à admissão da iniciativa estabelecida no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento,

uma vez que define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa e parece não

infringir a Constituição ou os princípios nela consignados.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 5 de agosto de 2021. Por despacho do Presidente da

Assembleia da República, foi admitido a 6 de agosto, tendo baixado à Comissão de Educação, Ciência,

Juventude e Desporto no mesmo dia (8.ª) no mesmo dia. Foi anunciado na reunião da Comissão Permanente,

9 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República.

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em 9 de setembro.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

O título da presente iniciativa legislativa que «Revoga o ‘Cartão do Adepto’ pela não discriminação e

estigmatização de cidadãos em recintos desportivos (quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho)» traduz

sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de

novembro, conhecida como lei formulário.

Considerando que visa introduzir alterações à «Lei n.º 39/2009, de 30 de julho» o título do projeto de lei

menciona esse facto, em conformidade com as regras de legística formal, indicando, de igual modo, o número

de ordem da respetiva alteração (quarta alteração), confirmando-se, de facto, que a Lei n.º 39/2009, de 30 de

julho, foi alterada por três atos legislativos anteriores. Mostra-se, assim, observado o disposto no n.º 1 do artigo

6.º da lei formulário10, nos termos do qual «Os diplomas que alterem outros devem indicar o número de ordem

da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles diplomas que

procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas».

Todavia, do n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário parece não decorrer a necessidade de estas menções serem

feitas no título da iniciativa – e as mesmas constam no artigo 1.º da iniciativa – pelo que submete à consideração

da comissão que, em sede de especialidade ou de redação final, se pondere a adoção do título «Revoga o

‘Cartão do Adepto’ pela não discriminação e estigmatização de cidadãos em recintos desportivos, alterando a

Lei n.º 39/2009, de 30 de julho».

Considerando, ainda, que o disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 6.º da citada lei formulário, estabelece

que «se deve ainda proceder à republicação integral dos diplomas que revistam a forma de lei, em anexo,

sempre que existam mais de três alterações ao ato legislativo em vigor, salvo se se tratar de alterações a

Códigos», refira-se que da iniciativa legislativa em apreciação não consta qualquer projeto de republicação em

anexo.

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, devendo ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com o

disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário. Considerando, ainda, que do articulado não consta

qualquer artigo sobre o início de vigência, a sua entrada em vigor inicia-se em conformidade com o previsto no

n.º 2 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual «Na falta de fixação do dia, os diplomas referidos no número

anterior entram em vigor, em todo o território nacional e no estrangeiro, no quinto dia após a publicação».

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei

formulário.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento do tema no plano da União Europeia

Nos termos da alínea e) do artigo 6.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)11, a

União Europeia (UE) apenas dispõe de competência para desenvolver ações destinadas a apoiar, coordenar ou

completar a ação dos Estados-membros na área do desporto.

Em 2007, a Comissão Europeia publicou um Livro Branco sobre o desporto12 que reflete a preocupação da

União em prevenir e lutar contra a violência, a xenofobia e o racismo no desporto, através de incentivos à

utilização de programas específicos, assim como a organização de uma conferência de alto nível com as partes

interessadas para discutir medidas de prevenção e de luta contra a violência e o racismo nos eventos

desportivos. Pretende-se ainda instaurar um sistema de licenciamento de clubes para que todos sigam as

mesmas regras básicas incluindo disposições relativas à discriminação e à violência.

Na sua comunicação «Desenvolver a Dimensão Europeia do Desporto»13 14, a Comissão Europeia sublinha

10 A Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas. 11 https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:9e8d52e1-2c70-11e6-b497-01aa75ed71a1.0019.01/DOC_3&format=PDF. 12 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=celex:52007DC0391. 13 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX:52011DC0012&qid=1631094261663. 14 COM (2011)12 – Esta iniciativa foi escrutinada pela Comissão de Educação e Ciência e pela Comissão de Assuntos Europeus: https://

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a necessidade de adotar uma abordagem europeia para prevenir e combater a violência e a intolerância que

continuam a gerar problemas no desporto na Europa, incentivando o desenvolvimento e a implementação de

mecanismos e normas de segurança que abranjam um amplo leque de disciplinas desportivas. Além disso, a

Comissão reitera o seu empenho em apoiar a luta contra a intolerância no desporto e incentivo aos Estados-

Membros e a aplicarem plenamente a Decisão-Quadro 2008/913/JAI15 relativa à luta por via do direito penal

contra certas formas e manifestações de racismo e a xenofobia.

Em 2017, o Parlamento Europeu publicou uma resolução sobre uma abordagem integrada da política do

desporto16, onde lembra o problema da violência, do vandalismo e da discriminação nos eventos desportivos de

todos os níveis e modalidades, propondo a partilha de mais informações sobre a violência no desporto para o

resolver.

Ademais, em 2018, o Conselho publicou um conjunto de conclusões sobre a promoção dos valores comuns

da UE através do desporto17, onde convida os Estados-Membros a promover a luta contra o racismo e a

xenofobia, os estereótipos de género e a misoginia, todas as formas de discriminação e de violência nos estádios

e no desporto em geral. Convidam também o movimento desportivo a incentivar a realização de campanhas de

informação e de iniciativas destinadas aos espetadores e aos adeptos desportivos, para que estes promovam e

reafirmem os valores da UE, com vista a combater a violência nos estádios.

O quarto Plano de Trabalho da UE para o Desporto (2021-2024)18 destaca a importância da atividade física

e do investimento no desporto e procura também «reforçar a recuperação e a resiliência do setor do desporto

em situações de crise durante e na sequência da pandemia de COVID-19», assim como dar prioridade ao

desenvolvimento de competências e qualificações no desporto através do intercâmbio de boas práticas e da

aquisição de conhecimentos, a proteção da integridade e dos valores, as dimensões socioeconómica e

ambiental do desporto e a promoção da igualdade de género.

Desta forma, o Conselho incentiva as instituições da União a complementarem os esforços nacionais

canalizando apoio financeiro para o setor através dos programas e fundos disponíveis da UE, como o programa

Erasmus+19, o Corpo Europeu de Solidariedade20, os fundos da política de coesão e as iniciativas de

investimento de resposta ao coronavírus (CRII e CRII+). Além disso, o Conselho salienta a necessidade de

promover um diálogo entre os Estados-Membros e as partes interessadas pertinentes para debater estratégias,

a fim de permitir que as atividades desportivas recomecem de forma segura e, sempre que possível, coordenada

e prevenir futuras crises, reforçando a resiliência do setor do desporto da UE.

• Enquadramento internacional

Países europeus

A legislação comparada é apresentada para o seguinte Estado-Membro da União Europeia: Espanha.

ESPANHA

A Ley 10/1990, de 15 de octubre, del Deporte21 vem definir, conforme dispõe o n.º 1 do seu artículo 1, o

quadro legal aplicável ao desporto, atenta a distribuição de competências entre o Estado e as regiões autónomas

(à luz do disposto na alínea 29.ª do n.º 1 do artículo 149.º da Constitución Española). A Ley 10/1990, de 15 de

octubre, dispunha de normas referentes à prevenção da violência nos espetáculos desportivos, constante do

seu Título IX, enquadramento entretanto revogado com a publicação da Ley 19/2007, de 11 de julio, contra la

violencia, el racismo, la xenofobia y la intolerancia en el deporte. Este diploma define o enquadramento aplicável,

conforme é referido no seu articulo 1, para a manutenção da segurança e da ordem pública nos espetáculos

secure.ipex.eu/IPEXL-WEB/document/COM-2011-12-FIN/ptass. 15 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A32008F0913. 16 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1540287296856&uri=CELEX:52017IP0012. 17 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?qid=1540287555194&uri=CELEX:52018XG0608(03). 18 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=OJ:C:2020:419:FULL#C_2020419EN.01000101.doc. 19 https://ec.europa.eu/programmes/erasmus-plus/node_pt. 20 https://europa.eu/youth/solidarity/mission_pt. 21 Diplomas consolidados retirado do portal oficial boe.es. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas referentes a Espanha são feitas para o referido portal, salvo referência em contrário. Revogou a Ley 13/1980, de 31 de marzo, General de la Cultura Física y del Deporte.

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desportivos, assim como a determinação de um regime sancionatório contra os atos de violência, entre outros

preceitos.

O título preliminar prevê, no seu Capitulo II, as «obligaciones de las personas espectadoras y assistentes a

las competiciones y espectáculos desportivos», sendo que as condições de acesso aos recintos desportivos,

constantes do seu artículo 6, não apresentam nenhuma tipologia de identificação nos termos da presente

iniciativa legislativa. Em termos de matéria conexa, cumpre no entanto relevar a existência do denominado

«Libro de registro de atividades de seguidores», constante do artículo 9, que define a verificação de um registo,

no quadro da regulamentação em vigor, onde constam informações genéricas e identificativas sobre as

atividades das «peñas, asociaciones, agrupaciones o grupos de aficionados», que prestem o seu apoio às

entidades desportivas em questão. O referido registo deverá ser disponibilizado às autoridades respetivas, nos

termos do n.º 2 do referido artigo. A regulamentação deste instrumento encontra-se na Sección 3.ª22 do Capítulo

II do «Regulamento de Prevención de la Violencia, el Racismo, la Xenofobia y la Intolerencia en el Deporte», em

anexo ao Real Decreto 203/2010, de 26 de febrero23. O Regulamento, no n.º 5 do artículo 22, refere que «(…)

se inscribirán los aficionados o agrupaciones de aficionados que, pese a no mantener vínculos estables o

permanentes como los organizadores, hayan tomado parte en episodios violentos asociados al deporte».

Adicionalmente, quando face a medidas especiais aplicáveis em competições e/ou encontros específicos,

pode verificar-se a realização do registo de adeptos, sempre no respeito pela sua dignidade, pelos seus direitos

fundamentais e de acordo com o previsto na Ley Orgánica 4/2015, de 30 de marzo, e protección de la seguridad

ciudadana, assim como na Ley Orgánica 2/1986, de 13 de marzo, de Fuerzas y Cuerpos de Seguridad.

No âmbito da temática em apreço, releva-se também o papel da Comisión Nacional contra la Violencia en

los Espectáculos Deportivo24, sendo que o este organismo pode, nos termos do artículo 13 da Ley 19/2007, de

11 de julio, decidir pela implementação de medidas adicionais de segurança que possam incluir a implementação

de algumas tipologias de registos pessoais. Em paralelo, cumpre ainda relevar o regime sancionatório aplicável

a «personas espectadoras», constante do artículo 22 da Ley 19/2007, de 11 de julio, supracitada. A Ley 19/2007,

de 11 de julio encontra-se atualmente em processo de revisão25, tendo o procedimento de consulta pública26

ocorrido até 20 de julho de 2021.

Finalmente, cumpre fazer referência ao Observatorio Español del Racismo y la Xenofobia, nomeadamente

ao nível de produção de informações como os «Materiales Didácticos n.º 6 – Contra el Racismo y la Intolerancia

en el Fútbol: Recomendaciones Internacionales y Legislación».

Outros países

REINO UNIDO

Com o intuito de resolver os problemas do fenómeno de hooliganismo existente no Reino Unido

(especialmente os verificados na década de 80), da exclusão das competições europeias e as conclusões do

Hillsborough Stadium Disaster (Taylor Report)27, verificou-se uma alteração profunda das bases da segurança

no desporto, com especial incidência no futebol, através do Football (Offences) Act 199128, sendo relevante para

matéria em apreço as disposições constantes relativas à entrada não autorizada no recinto desportivo ( 4 –

Going onto the playing área)29.

22 «Actuaciones respecto del libro de registro de atividades de seguidores e información». 23 «Real Decreto 203/2010, de 26 de febrero, por el que se aprueba el Reglamento de prevención de la violencia, el racismo, la xenofobia y la intolerancia en el deporte». 24 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Governo de Espanha (consultado em 8 de setembro de 2021). Disponível em https://www.csd.gob.es/es/csd/organos-colegiados/comision-estatal-contra-la-violencia-el-racismo-la-xenofobia-y-la-intolera ncia-en-el-deporte. 25 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Governo de Espanha (consultado em 8 de setembro de 2021). Disponível em https://www.culturaydeporte.gob.es/dam/jcr:bc5c0b85-0cb9-4877-9f89-47dfaa6b63c4/anteproyecto-ley-deporte.pdf. 26 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Governo de Espanha (consultado em 8 de setembro de 2021). Disponível em https://www.culturaydeporte.gob.es/servicios-al-ciudadano/informacion-publica/audiencia-informacion-publica/cerrados/2021 /anteproyecto-ley-del-deporte.html. 27 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Governo do Reino Unido (consultado em 9 de setembro de 2021). Disponível em https://www.nationalarchives.gov.uk/documents/dec-16/Prem-19-3027.pdf. 28 Diplomas consolidados retirado do portal oficial legislation.gov.uk. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas referentes ao Reino Unido são feitas para o referido portal, salvo referência em contrário. 29 «It is an offence for a person at a designated football match to go onto the playing area, or any area adjacent to the playing area to which spectators are not generally admitted, without lawful authority or lawful excuse (which shall be for him to prove)».

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Para além da consideração do enquadramento legal aplicável aos crimes comuns contra as pessoas e contra

a ordem pública, previstos no Offences against the Person Act 1861, releva-se também o disposto no Public

Order Act 1986, cujos objetivos definidos no seu texto introdutório referiam a necessidade de definir o

ordenamento jurídico aplicável ao combate à violência nos eventos desportivos [enquadrando também neste

âmbito alterações ao Sporting Events (Control of Alcohol etc.) Act 1985], assim como Football (Offences) Act

1991.

Através do Football Spectators Act 1989, pretendeu-se aumentar o controlo da admissão de espectadores

aos eventos desportivos, aplicável na Inglaterra e no País de Gales, através de um sistema de inscrição e de

licença de admissão de espetadores, com vista à monitorização da aplicação de ordens judiciais donde

resultariam restrições a cidadãos condenados por determinados comportamentos, por forma a prevenir a

violência e a desordem. Neste quadro, verificou-se a criação da Sports Ground Safety Authority30, organismo

cujas atribuições31 incluem a emissão de licenças de equipamentos desportivos de futebol, assim como a

monitorização dos deveres de segurança e certificação dos equipamentos desportivos.

No âmbito do Football Spectators Act 1989, pode ainda ser aplicado o mecanismo de «Banning order»,

definido no article 14 do diploma supracitado. A polícia britânica possui uma unidade especial de policiamento

dos jogos de futebol denominada de United Kingdom Football Policing Unit (UKFPU)32, que trata de toda a

logística associada com a organização de jogos, incluindo o policiamento das áreas de acesso, escolta das

claques e policiamento dos parques de estacionamento adjacentes do local do evento desportivo. Esta unidade

integra a «Football Banning Orders Authority (FBOA)», entidade que gere os procedimentos relativos às

«Football Banning Orders» emitidas pelas instâncias judiciais da Inglaterra e da Escócia. Informações

adicionais33 sobre este mecanismo podem ser consultadas no Crown ProsecutionService (CPS)34.

Organismos Internacionais

CONSELHO DA EUROPA

No âmbito do projeto «ProS4+35» do Conselho da Europa, é possível a consulta do «Anual/season Report

2018 on violence, disorder and other prohibited activity36», relatório onde se referem o enquadramento legal e

boas práticas aplicadas37 enquadráveis na matéria em apreço para seguintes países, respetivamente: Albânia,

Bélgica, Bulgária, Chipre, Espanha, França, Hungria, Itália, Lituânia, Portugal, Sérvia e Turquia.

V. Consultas e contributos

• Consultas

Sugere-se a consulta, em sede de apreciação na especialidade, das seguintes entidades:

• Secretário de Estado da Juventude e do Desporto;

• Instituto do Desporto de Portugal (IPDJ, IP);

• Federações desportivas;

• Ligas profissionais;

30 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Sports Grounds Safety Authority (consultado em 3 de setembro de 2021). Disponível em https://sgsa.org.uk/about-the-sgsa/. 31 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet da Sports Grounds Safety Authority (consultado em 3 de setembro de 2021). Disponível em https://sgsa.org.uk/regulation/. 32 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Governo do Reino Unido (consultado em 9 de setembro de 2021). Disponível em https://www.gov.uk/government/groups/united-kingdom-football-policing-unit-ukfpu. 33 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Crown Prosecution Service (consultado em 9 de setembro de 2021). Disponível em https://www.cps.gov.uk/legal-guidance/football-related-offences-and-football-banning-orders. 34 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Crown Prosecution Service. (consultado em 9 de setembro de 2021). Disponível em https://www.cps.gov.uk/about-cps. 35 «Promoting and Strengthening the Council of Europe Standards to Safety, Security and Services at Football matches and other sport events». As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Conselho da Europa (consultado em 9 de setembro de 2021). Disponível em https://pjp-eu.coe.int/en/web/security-safety-sport. 36 As informações enunciadas foram retiradas do sítio na Internet do Conselho da Europa (consultado em 9 de setembro de 2021). Disponível em https://rm.coe.int/pros4-final-annualreport-publicv-2018/1680a18917. 37 «Section F. Legal framework and best practices».

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• Sociedades desportivas;

• Clubes desportivos;

• Associações dos vários desportos;

• Conselhos de arbitragem;

• Comité Olímpico de Portugal (COP);

• Comité Paralímpico de Portugal (CPP);

• Confederação do Desporto de Portugal;

• Forças de segurança;

• Grupos organizados de adeptos/claques;

• Associação dos Coordenadores de Segurança de Portugal;

• Associação Portuguesa de Defesa do Adepto;

• Procuradoria-Geral da República (PGR);

• Conselho Superior do Ministério Público;

• Conselho Superior de Magistratura;

• Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD).

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

Os proponentes juntaram ao projeto de lei a ficha de Avaliação de Impacto de Género (AIG),em cumprimento

do disposto na Lei n.º 4/2018, de 9 de fevereiro, concluindo que a iniciativa legislativa tem um impacto neutro.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso.

Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta fase

do processo legislativo a redação do projeto de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a

linguagem discriminatória em relação ao género.

VII. Enquadramento bibliográfico

BASTOS, Tiago Rodrigues; GONÇALVES, José Ricardo; CASTANHEIRA, Sérgio – A responsabilidade dos

clubes desportivos pelo comportamento dos seus adeptos: uma análise jurisprudencial. E-Pública [Em linha].

Vol. 8, n.º 1 (abr. 2021), p. 81-106. [Consult. 15 set. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=135639&img=22971&save=true.

ISSN 2183-184X.

Resumo: «A responsabilidade disciplinar das sociedades anónimas desportivas e dos clubes desportivos

pelo comportamento dos seus adeptos é subjetiva, pressupondo uma atuação culposa. Sobre os clubes e as

SAD incidem deveres in vigilando e in formando dos seus adeptos, com maior incidência dos grupos organizados

de adeptos (GOA). O TAD, o TCA Sul e do STA têm tido entendimentos divergentes sobre o ónus da prova,

mais concretamente sobre a possibilidade de recurso às presunções judiciais, naturais, para demonstrar o

(in)cumprimento dos referidos deveres que são legalmente impostos aos clubes. Em caso de comprovada

violação culposa devem ser sancionados os seus autores, neles podendo ser naturalmente incluídos os clubes

ou SAD culposamente inadimplentes, podendo ser adotadas formas mais eficazes e dissuasoras de

sancionamento, como sucede com os jogos à porta fechada ou interdição temporária de os autores poderem

entrar no estádio. As entidades federativas e os clubes ou SAD, com o apoio das forças policiais, devem

sensibilizar e formar, de modo pedagógico e eficaz, designadamente através dos mais variados e influentes

veículos comunicacionais à sua disposição, a população em geral, e os grupos organizados de adeptos em

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particular (claques), para o flagelo da violência no desporto, investindo numa abordagem preferencialmente

preventiva ao fenómeno em causa.»

GOMES, Gonçalo Rodrigues – A criminalização no domínio da violência no desporto na Lei n.º 52/2013:

algumas considerações. Desporto e direito. Coimbra. ISSN 1645-8206. A. 11, n.º 33 (maio/ago. 2014), p. 330-

353. Cota: RP-319.

Resumo: O presente artigo aborda o tema da violência no desporto tendo em conta a legislação portuguesa

sobre este assunto. Mais propriamente, está em causa uma análise da eficácia e amplitude dos diplomas

aprovados sobre este assunto. Segundo o autor, «a violência associada ao desporto, entendida neste artigo

como todas as manifestações violentas exógenas ao espetáculo desportivo de per si, é simultaneamente um

fenómeno atual e com a maturidade necessária a uma teia de considerações. Sendo esta realidade transversal

ao universo desportivo, não podemos deixar de nos centrar na modalidade que agrega a maioria dos

acontecimentos violentos, o futebol. Como problemática persistente ao longo dos anos, o legislador português,

acompanhado por uma prática comum nos restantes países europeus, procurou responder à proliferação de

manifestações violentas em espetáculos desportivos através da aprovação de diversos e sucessivos diplomas

legais, com diferente eficácia e amplitude.»

GOMES, Gonçalo Rodrigues – A violência associada ao desporto [Em linha]: da prevenção à repressão

penal. Lisboa: [s.n.], 2014. [Consult. 15 de set. 2021]. Dissertação de mestrado. Disponível na Intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=125688&img=10885&save=true.

Resumo: «Esta dissertação trata os problemas jurídicos relacionados com a violência associada ao desporto.

Partindo de uma análise histórica das ocorrências violentas, com pequenas referências sociológicas,

procuraremos retirar conclusões sobre a evolução do fenómeno. Uma breve referência de direito comparado

ajudar-nos-á a entender as medidas preconizadas pelo legislador português, procurando proceder a uma análise

crítica da legislação, quer repressiva, quer preventiva do fenómeno.»

PEREIRA, Rui Soares; CRAVEIRO, Inês Sítima – Sobre a responsabilidade civil dos clubes e das federações

por danos decorrentes de comportamentos praticados por espectadores em espetáculos desportivos. E-Pública

[Em linha]. Vol. 8, n.º 1 (abr. 2021), p. 49-80. [Consult. 15 set. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=135636&img=22969&save=true.

ISSN 2183-184X.

Resumo: «O presente artigo discute a questão da responsabilidade civil dos clubes e das federações por

danos decorrentes de comportamentos praticados por espectadores no contexto de espetáculos desportivos.

Sob o prisma das omissões, procura averiguar a imputação de responsabilidade a estas entidades por não

evitarem aqueles danos, à luz do Código Civil e da Lei n.º 39/2009.»

PORTELA, Gonçalo Bruno Diogo – O crime e o desporto [Em linha]: atividade desportiva violenta. Lisboa:

[s.n.], 2013. [Consult. 15 de set. 2021]. Dissertação de mestrado. Disponível na Intranet da AR:

http://catalogobib.parlamento.pt:81/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=125687&img=10884&save=true.

Resumo: O presente documento aborda o tema da violência no desporto, nomeadamente os

comportamentos criminalmente relevantes e com danos sociais consideráveis, praticados dentro dos complexos

desportivos e que raramente são levados ao controlo de uma entidade estadual, escapando os seus agentes à

punibilidade penal.

Tendo em conta a complexidade e abrangência do tema em análise o autor procurou limitar o seu estudo,

como o próprio diz: «às questões que, do meu ponto de vista, se afiguram mais controversas atendendo à

realidade portuguesa, procurando analisar a violência no fenómeno desportivo do ponto de vista dos

comportamentos criminalmente relevantes ocorridos nos recintos desportivos, no contexto das práticas

desportivas e como consequência do seu exercício. Deste modo, privilegiarei a análise às ofensas à integridade

física causadas em atletas por outros atletas, isto é, ofensas que ocorram sob a forma de heterolesão.»

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PORTUGAL. Assembleia da República. Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar – Violência no

desporto [Em linha]: Enquadramento nacional e Reino Unido. Lisboa: Assembleia da República. DILP, 2018.

[Consult. 15 de set. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=127854&img=13224&save=true.

Resumo: «O presente documento visa o enquadramento nacional legislativo da temática da violência no

desporto, com especial incidência no futebol, na perspetiva dos espetadores e de todo o espetáculo que lhe está

associado, feito a pedido da Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto.

Neste sentido foi solicitado um estudo sobre o enquadramento legal e procedimental dos espetáculos

desportivos no Reino Unido, país de grande tradição desportiva e futebolística e com conhecidos casos

passados de hooliganismo, que culminaram na exclusão de participação das equipas inglesas das competições

europeias de clubes, organizadas pela Union of European Football Association (UEFA).»

SALAMÉ-HARDY, Katia – Entre «jeu et enjeu», le sport dans un monde en mutation. Revue politique et

parlementaire. Paris. ISSN 0085-385X. A. 111, n.º especial (juin 2009), p. 103-203. Cota: RE-1.

Resumo: Neste artigo a autora analisa como a dimensão cada vez mais internacional, a forte mediatização,

a enorme financeirização, o marketing e o reinado do lucro provocaram a transformação de uma atividade de

prazer numa atividade financeira. Esta evolução que se foi operando no desporto deu origem a várias ligações

que se foram estabelecendo entre o desporto e outras áreas de atividade humana, nomeadamente, a política a

economia e os meios de comunicação social. Neste âmbito a autora mostra como o desporto se torna uma

caixa-de-ressonância política, que pode ser usado como arma política e como catalisador da violência. A autora

termina este artigo abordando as questões ética e educativa no desporto.

STRANG, Lucy [et al.] – Violent and Antisocial Behaviours at Football Events and Factors Associated

with these Behaviours [Em linha]: A rapid evidence assessment. Cambridge: RAND Europe, 2018. [Consult.

15 de set. 2021]. Disponível em:

https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=136109&img=23796&save=true.

Resumo: Este relatório observa os principais comportamentos antissociais e violentos que podem ser

testemunhados em eventos de futebol, como seja, abuso verbal, destruição de propriedade, atos de vandalismo

e agressão, constatando ao mesmo tempo que o futebol pode promover comportamentos e dinâmicas sociais

positivas. Neste âmbito, e de acordo com os próprios autores, é também importante reconhecer que as

definições de comportamento antissocial são, em certo grau, subjetivas e contextuais.

Nele são ainda apresentas as conclusões resultantes da revisão da bibliografia sobre os fatores que podem

conduzir a um comportamento violento e antissocial nos fãs de futebol.

———

PROPOSTA DE LEI N.º 107/XIV/2.ª

(ALTERA OS TERMOS DO EXERCÍCIO DO MANDATO A MEIO TEMPO DOS TITULARES DAS

JUNTAS DE FREGUESIA)

Parecer da Comissão de Administração Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e

Poder Local, tendo como anexo os pareceres da Associação Nacional de Municípios Portugueses

(ANMP) e da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) e nota técnica elaborada pelos serviços de

apoio

Parecer

Índice

Parte I – Considerandos

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Parte II – Pareceres da ANMP E ANAFRE

Parte III – Opinião do Deputado autor do parecer

Parte IV – Conclusões

Parte V – Anexos

PARTE I – Considerandos

A Proposta de Lei n.º 107/XIV/2.ª, do Governo, que «altera os termos do exercício do mandato a meio tempo

dos titulares das juntas de freguesia» deu entrada a 27 de julho de 2021.

Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República foi admitida e baixou para discussão na

generalidade à Comissão de Administração Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder

Local (13.ª) no mesmo dia. Foi anunciada na reunião da Comissão Permanente, em 9 de setembro.

Esta iniciativa legislativa visa proceder à sétima alteração à Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, alterada pelas

Leis n.os 5-A/2002, de 11 de janeiro, e 67/2007, de 31 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de

novembro, e pelas Leis n.os 75/2013, de 12 de setembro, 7-A/2016, de 30 de março, e 71/2018, de 31 dezembro.

Esta proposta de lei em apreciação tem como pretensão, segundo a fundamentação do autor da iniciativa,

«aprofundar a descentralização e a subsidiariedade no exercício de competências pelas autarquias locais» e

criar «condições para que todas as juntas de freguesia possam contar pelo menos com um membro eleito a

meio tempo», de acordo com os objetivos consagrados no Programa do XXII Governo Constitucional.

A regulamentação das funções a tempo inteiro e a meio tempo dos titulares da junta de freguesia consta do

artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro.

Nos termos do n.º 1 daquele artigo não é possível assegurar à universalidade das freguesias um membro

exercendo funções em permanência, a meio tempo, conforme o compromisso do Programa do XXII Governo

Constitucional. A sua redação, que se manteve sem alterações, é a seguinte: «Nas freguesias com o mínimo de

5000 eleitores e o máximo de 10 000 eleitores ou nas freguesias com mais de 3500 eleitores e 50 km2 de área,

o presidente da junta pode exercer o mandato em regime de meio tempo».

Para que os presidentes de juntas de freguesia possam exercer, por opção, os respetivos mandatos em

regime de tempo inteiro ou de meio tempo, com o pagamento suportado pelo Orçamento do Estado, terão de

ser ponderados o número de eleitores da freguesia e a área da freguesia (n.os 1 e 2 do artigo 27.º).

A presente iniciativa legislativa pretende modificar exatamente o referido artigo da lei que regula o exercício

de funções a tempo inteiro e a meio tempo, no âmbito do quadro de competências, assim como o regime jurídico

de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias.

Para o efeito, procede à alteração do n.º 1 do artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, aí passando

a constar que a presidência de freguesia pode ser exercida em regime de meio tempo, em todas as freguesias.

Elimina, dessa forma, os limites de número de eleitores e de área para o exercício do mandato em regime de

meio termo.

A revogação da alínea a) do n.º 3 do artigo 27.º, da mesma lei, garante que o exercício do mandato a meio

termo é sempre remunerado, independentemente do número de eleitores e o aditamento do número 8 ao artigo

27.º, estabelece os termos em que essa remuneração será realizada.

A presente proposta de lei é composta por quatro artigos: o primeiro identifica o seu objeto, o segundo altera

o artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, o terceiro procede à revogação da alínea a) do n.º 3 do já

mencionado artigo 27.º e o quarto artigo refere a sua entrada em vigor e produção de efeitos.

PARTE II – Pareceres da ANMP e ANAFRE

A Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) emitiu um parecer datado de 7 de setembro onde

diz que atendendo ao processo de descentralização em curso e ao princípio da subsidiariedade no exercício de

competências pelas autarquias locais, nada tem a opor à presente iniciativa, com a qual concorda. No entanto,

faz duas observações ao dizer «que a mesma não deve ser discutida e aprovada neste período eleitoral, uma

vez que no próximo dia 26 de setembro realizar-se-ão eleições para os órgãos das autarquias locais» e que

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127

«nesta importante matéria, a necessidade de uma alteração e atualização do Estatuto dos Eleitos Locais, de

forma a assegurar a dignificação e valorização do trabalho desenvolvido por todos os autarcas».

A Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) emitiu um parecer datado de 6 de setembro onde diz que

«é com agrado que recebe esta proposta de lei e manifesta concordância com tal». No entanto faz uma proposta

de alteração e apresenta-a como uma ressalva.

Chamam a atenção para o facto de que a presente proposta não pode colocar em causa o exercício de

funções a tempo inteiro ou meio tempo, desde que suportados pelo orçamento da junta de freguesia, cumprindo

o n.º 3 do artigo 27.º da Lei 169/99, de 18 de setembro.

Assim, propõe, como forma de diminuir eventuais desigualdades, que a alínea b) do n.º 3 do artigo 27.º

deixe de ter o limite mínimo de eleitores, ou seja, que passe a ter a seguinte redação:

«Nas freguesias até 10 000 eleitores, o presidente de junta pode exercer o mandato em regime de tempo

inteiro».

Dizem também que «Atendendo à importância da matéria em causa, e de forma a podermos integrar a

presente alteração no Orçamento do Estado de 2022, solicitamos que a presente proposta seja votada,

aprovada, promulgada e publicada a tempo do mesmo».

PARTE III – Opinião do Deputado autor do parecer

O signatário do presente relatório exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a presente

proposta de lei do Governo, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º

do Regimento, reservando para o seu grupo parlamentar qualquer tomada de posição.

PARTE IV – Conclusões

A iniciativa legislativa em análise foi apresentada pelo Governo, no âmbito do seu poder de iniciativa, nos

termos do n.º 1 do artigo 167.º e da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição e do artigo 119.º do

Regimento da Assembleia da República (Regimento). Reveste a forma de proposta de lei, nos termos do n.º 2

do artigo 119.º do Regimento.

É subscrita pelo Primeiro-Ministro e pela Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública,

conforme disposto no n.º 2 do artigo 123.º do Regimento e no n.º 2 do artigo 13.º da lei formulário, e ainda pelo

Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Foi aprovada em Conselho de Ministros a 22 de julho de

2021, ao abrigo da competência prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 200.º da Constituição.

Conforme expresso em nota técnica de apreciação à presente iniciativa legislativa (segue endereço em

Anexo – Parte V), esta proposta de lei cumpre os requisitos formais elencados no n.º 1 do artigo 124.º do

Regimento, uma vez que está redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente

o seu objeto principal e é precedida de uma exposição de motivos, cujos elementos são enumerados no n.º 2

da mesma disposição regimental.

Esta iniciativa legislativa define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa

e parece não infringir princípios constitucionais, respeitando assim os limites estabelecidos no n.º 1 do artigo

120.º do Regimento.

A matéria sobre a qual versa a presente proposta de lei enquadra-se, por força do disposto na alínea m) do

artigo 164.º da Constituição, no âmbito da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da

República.

O n.º 3 do artigo 124.º do Regimento prevê que as propostas de lei devem ser acompanhadas dos estudos,

documentos e pareceres que as tenham fundamentado. Em idêntico sentido, o Decreto-Lei n.º 274/2009, de 2

de outubro, que regula o procedimento de consulta de entidades, públicas e privadas, realizado pelo Governo,

dispõe, no n.º 1 do artigo 6.º, que «os atos e diplomas aprovados pelo Governo cujos projetos tenham sido

objeto de consulta direta contêm, na parte final do respetivo preâmbulo ou da exposição de motivos, referência

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II SÉRIE-A — NÚMERO 8

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às entidades consultadas e ao carácter obrigatório ou facultativo das mesmas».

Dispõe ainda, no n.º 2, que «no caso de propostas de lei, deve ser enviada cópia à Assembleia da República

dos pareceres ou contributos resultantes da consulta direta às entidades cuja consulta seja constitucional ou

legalmente obrigatória e que tenham sido emitidos no decurso do procedimento legislativo do Governo».

Todavia, a proposta de lei não vem acompanhada de quaisquer estudos, documentos que a tenham

fundamentado.

Na exposição de motivos é feita referência à necessidade de auscultar a ANMP e a ANAFRE através de

audição ou de envio de pareceres para a decorrência do processo legislativo a desenvolver em sede da

Assembleia da República.

Os pareceres emitidos por estes órgãos representativos do poder local, são objeto de observação na Parte

II do presente relatório e o seu endereço eletrónico consta de apresentação na Parte V (Anexos) deste mesmo

parecer.

Mais uma vez, em conformidade com o descrito na nota técnica, também apresentada na Parte V (Anexos)

deste parecer, são suscitadas algumas questões no âmbito da lei formulário. Assim, é dito que o título da

presente iniciativa legislativa – «Altera os termos do exercício do mandato a meio termo dos titulares dos titulares

das juntas de freguesia» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do

artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário, embora possa ser objeto de

aperfeiçoamento, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final, pelo que submete à ponderação

da comissão o seguinte título: «Modifica os termos do exercício do mandato a meio termo dos titulares dos

titulares das juntas de freguesia, alterando a Lei n.º 169/99, de 18 de setembro».

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com

o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro

A lei a que dá origem entra «em vigor no dia seguinte ao da sua publicação», conforme previsto no n.º 1 do

artigo 4.º do articulado e no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual os atos legislativos «entram em

vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da

publicação» e produz efeitos no dia 1 de janeiro de 2022, em conformidade com o disposto no n.º 2 do referido

artigo 4.º do articulado.

Todavia, visando uma maior clareza do articulado, propõe-se a autonomização da norma sobre a produção

de efeitos, constante do n.º 2 do artigo 4.º, criando para o efeito um novo artigo 4.º com a epigrafe «Produção

de efeitos», e renumerando, em consequência, o atual artigo 4.º como artigo 5.º, com a epígrafe «Entrada em

vigor» e corpo do atual n.º 1 do artigo 4.º

Face ao exposto, esta proposta de lei cumpre os requisitos formais elencados no Regimento da Assembleia

da República e consequentemente reúne condições para prosseguir o processo legislativo.

Palácio de São Bento, 25 de setembro de 2021.

O Deputado autor do parecer, José Maria Cardoso — O Presidente da Comissão, Fernando Ruas.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PCP, do CDS-PP e do

PAN, na reunião da Comissão de 29 de setembro de 2021.

PARTE IV – Anexos

Pareceres da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e da Associação Nacional de

Freguesias (ANAFRE) e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.

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Ass: Proposta de Lei n.º 107/XIV/2ª (GOV)- “Altera os termos do exercício do mandato

a meio tempo dos titulares das juntas de freguesia”

Parecer da ANMP

A presente iniciativa legislativa tem como objetivo permitir que todas as juntas de

freguesia tenham, pelo menos, um membro eleito a meio tempo.

Para o efeito, são eliminados os requisitos atualmente em vigor no n. º1 do artigo 27º

da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro (freguesias com o mínimo de 5 000 e máximo de 10 000

eleitores e com mais de 3 500 eleitores e 50km2 de área) para o exercício do cargo de

presidente de junta em regime de meio tempo, estabelecendo-se que em todas as

freguesias o presidente pode exercer o mandato em regime de meio tempo.

A presente alteração produzirá efeitos a 1 de janeiro de 2022.

Atendendo ao processo de descentralização em curso e ao princípio da subsidiariedade

no exercício de competências pelas autarquias locais, a ANMP nada tem a opor à

presente iniciativa, com a qual concorda. Entende-se, no entanto, que a mesma não

deve ser discutida e aprovada neste período eleitoral, uma vez que no próximo dia 26

de setembro realizar-se-ão eleições para os órgãos das autarquias locais.

A ANMP refere também, nesta importante matéria, a necessidade de uma alteração e

atualização do Estatuto dos Eleitos Locais, de forma a assegurar a dignificação e

valorização do trabalho desenvolvido por todos os autarcas.

ANMP, 7 de setembro de 2021

29 DE SETEMBRO DE 2021 ______________________________________________________________________________________________________

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ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE FREGUESIAS

Proposta de Lei n.º 107/XIX/GOV - Altera os termos do exercício do mandato a meio tempo dos titulares das juntas de freguesia

PARECER

Veio a (13ª) Comissão de Administração Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder Local, solicitar o Parecer da ANAFRE sobre a Proposta de Lei em título. É com agrado que a ANAFRE recebe esta Proposta de Lei que resulta de um compromisso assumido pelo Sr. Primeiro Ministro no Congresso da ANAFRE, em 2020, na cidade de Portimão, fruto da reivindicação da ANAFRE. Com a aprovação da presente Proposta de Lei verificamos que todas as Freguesias terão direito a um eleito a meio tempo, conjugando tal questão com o artigo 18.º da Lei 75/2013, de 12 de setembro. Chamamos a atenção para o facto de que a presente proposta não pode colocar em causa o exercício de funções a tempo inteiro ou meio tempo, desde que suportados pelo Orçamento da Junta de Freguesia, cumprindo o n.º 3 do artigo 27.º da Lei 169/99, de 18 de setembro. Propomos, ainda assim, como forma de diminuir eventuais desigualdades, que a al. b) do n.º 3 do artigo 27.º deixe de ter o limite mínimo de eleitores, ou seja, que passe a ter a seguinte redação: “Nas Freguesias até 10000 eleitores, o presidente de junta pode exercer o mandato em regime de tempo inteiro”. Como é lógico, tal alteração só é possível desde que cumpridas as regras orçamentais. Assim, cabe à ANAFRE dar parecer favorável à proposta apresentada, com a respetiva ressalva. Atendendo à importância da matéria em causa, e de forma a podermos integrar a presente alteração no Orçamento de Estado de 2022, solicitamos que a presente proposta seja votada, aprovada, promulgada e publicada a tempo do mesmo. Lisboa, 6 de setembro de 2021

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Nota Técnica

Proposta de Lei n.º 107/XIV/2.ª (GOV)

Altera os termos do exercício do mandato a meio tempo dos titulares das juntas de freguesia

Data de admissão: 27 de julho de 2021.

Comissão de Administração Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder Local (13.ª).

Índice

I. Análise da iniciativa

II. Enquadramento parlamentar

III. Apreciação dos requisitos formais

IV. Análise de direito comparado

V. Consultas e contributos

VI. Avaliação prévia de impacto

VII. Anexo

Elaborada por: Luís Martins (DAPLEN), Fernando Bento Ribeiro e Filipa Paixão (DILP) e Cátia Duarte (DAC) Susana Fazenda (DAC). Data: 7 de setembro de 2021.

I. Análise da iniciativa

• A iniciativa

A iniciativa legislativa em apreço visa proceder à sétima alteração à Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, que

estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos

municípios e das freguesias. Modifica, concretamente, o seu artigo 27.º, que regula o exercício de funções a

tempo inteiro e a meio tempo.

O autor da iniciativa refere pretender «aprofundar a descentralização e a subsidiariedade no exercício de

competências pelas autarquias locais» e criar «condições para que todas as juntas de freguesia possam contar

pelo menos com um membro eleito a meio tempo», objetivos consagrados no Programa do XXII Governo

Constitucional.

Para o efeito, procede à alteração do n.º 1 do artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, aí passando

a constar que a presidência de freguesia pode ser exercida em regime de meio tempo, em todas as freguesias.

Elimina, dessa forma, os limites de número de eleitores e de área para o exercício do mandato em regime de

meio termo.

A revogação da alínea a) do número 3 do artigo 27.º, da mesma lei, garante que o exercício do mandato a

meio termo é sempre remunerado, independentemente do número de eleitores e o aditamento do número 8 ao

artigo 27.º estabelece os termos em que essa remuneração será realizada.

A presente proposta de lei é composta por quatro artigos: o primeiro identifica o seu objeto, o segundo altera

o artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, o terceiro procede à revogação da alínea a) do n.º 3 do já

mencionado artigo 27.º e o quarto artigo refere-se à sua entrada em vigor e produção de efeitos.

Mencione-se ainda que, para efeitos de comparação entre o regime vigente e as alterações propostas pela

iniciativa em análise, disponibiliza-se, em anexo, um quadro comparativo.

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• Enquadramento jurídico nacional

A Constituição da República Portuguesa1 no seu artigo 235.º consagra a existência de autarquias locais. O

mesmo normativo reza que «As autarquias locais são pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos

representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas».

As autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas. Os órgãos representativos

da freguesia são a assembleia de freguesia e a junta de freguesia. A junta de freguesia é o órgão executivo

colegial da freguesia (Título VIII – Poder Local – artigos 236.º, 244.º e 246.º da Constituição).

O diploma que que estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento,

dos órgãos dos municípios e das freguesias é a Lei n.º 169/99, de 18 de setembro2, alterada pelas Leis n.os 5-

A/2002, de 11 de janeiro, e 67/2007, de 31 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro, e

pelas Leis n.os 75/2013, de 12 de setembro, 7-A/2016, de 30 de março, e 71/2018, de 31 dezembro.

A regulamentação das funções a tempo inteiro e a meio tempo dos titulares da junta de freguesia consta do

artigo 27.º da referida lei.

Nos termos do n.º 1 daquele artigo não é possível assegurar à universalidade das freguesias um membro

exercendo funções em permanência, a meio tempo, conforme o compromisso do Programa do XXII Governo

Constitucional. A sua redação, que se manteve sem alterações, é a seguinte: «Nas freguesias com o mínimo de

5000 eleitores e o máximo de 10 000 eleitores ou nas freguesias com mais de 3500 eleitores e 50 km2 de área,

o presidente da junta pode exercer o mandato em regime de meio tempo».

Para que os presidentes das juntas de freguesia possam exercer, por opção, os respetivos mandatos em

regime de tempo inteiro ou de meio tempo, com o pagamento suportado pelo Orçamento do Estado, terão de

ser ponderados o número de eleitores da freguesia e a área da freguesia (n.os 1 e 2 do artigo 27.º).

Regime de meio tempo:

– Freguesias com o mínimo de 5000 e o máximo de 10 000 eleitores;

– Freguesias com o mínimo de 3500 eleitores e 50 km2 de área.

Regime de tempo inteiro:

– Freguesias com mais de 10 000 eleitores;

– Freguesias com mais de 7000 eleitores e 100 km2.

Além disso, a lei prevê que, verificada a conformidade dos requisitos pela assembleia de freguesia, em função

do número de eleitores e de determinada percentagem sobre a receita, possam as juntas de freguesia ter

igualmente eleitos naquelas condições (n.º 3 do artigo 27.º):

Regime de meio tempo:

– Freguesias com o mínimo de 1000 eleitores, desde que o encargo anual com a respetiva remuneração não

ultrapasse 12% do valor total da receita constante da conta de gerência do ano anterior nem do valor inscrito no

orçamento em vigor.

Regime de tempo inteiro:

– Freguesias com mais de 1500 eleitores, desde que o encargo anual com a respetiva remuneração não

ultrapasse 12% do valor total da receita constante da conta de gerência do ano anterior nem do valor inscrito no

orçamento em vigor.

1 Texto disponível no portal da Assembleia da República, para o qual são feitas todas as referências à Constituição. 2 Diploma consolidado retirado do sítio na Internet do Diário da República Eletrónico. Todas as referências legislativas, com exceção da Constituição da República Portuguesa, são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico, salvo indicação em contrário.

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II. Enquadramento parlamentar

• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar sobre iniciativas e petições, não se

verificou a existência de qualquer iniciativa versando sobre matéria idêntica ou conexa.

• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)

Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar sobre iniciativas e petições, não se

verificou a existência de qualquer iniciativa que, na presente, ou em anteriores legislaturas, tenha versado sobre

matéria idêntica ou conexa.

III. Apreciação dos requisitos formais

• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais

A iniciativa legislativa em análise foi apresentada pelo Governo, no âmbito do seu poder de iniciativa, nos

termos do n.º 1 do artigo 167.º e da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição3 e do artigo 119.º do

Regimento da Assembleia da República (Regimento). Reveste a forma de proposta de lei, nos termos do n.º 2

do artigo 119.º do Regimento.

É subscrita pelo Primeiro-Ministro e pela Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública,

conforme disposto no n.º 2 do artigo 123.º do Regimento e no n.º 2 do artigo 13.º da lei formulário, e ainda pelo

Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Foi aprovada em Conselho de Ministros a 22 de julho de

2021, ao abrigo da competência prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 200.º da Constituição.

A presente iniciativa legislativa cumpre os requisitos formais elencados no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento,

uma vez que está redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto

principal e é precedida de uma exposição de motivos, cujos elementos são enumerados no n.º 2 da mesma

disposição regimental.

A presente iniciativa legislativa define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem

legislativa e parece não infringir princípios constitucionais, respeitando assim os limites estabelecidos no n.º 1

do artigo 120.º do Regimento.

A matéria sobre a qual versa a presente proposta de lei enquadra-se, por força do disposto na alínea m) do

artigo 164.º da Constituição, no âmbito da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da

República.

O n.º 3 do artigo 124.º do Regimento prevê que as propostas de lei devem ser acompanhadas dos estudos,

documentos e pareceres que as tenham fundamentado. Em idêntico sentido, o Decreto-Lei n.º 274/2009, de 2

de outubro, que regula o procedimento de consulta de entidades, públicas e privadas, realizado pelo Governo,

dispõe, no n.º 1 do artigo 6.º, que «os atos e diplomas aprovados pelo Governo cujos projetos tenham sido

objeto de consulta direta contêm, na parte final do respetivo preâmbulo ou da exposição de motivos, referência

às entidades consultadas e ao carácter obrigatório ou facultativo das mesmas».

Dispõe ainda, no n.º 2, que «no caso de propostas de lei, deve ser enviada cópia à Assembleia da República

dos pareceres ou contributos resultantes da consulta direta às entidades cuja consulta seja constitucional ou

legalmente obrigatória e que tenham sido emitidos no decurso do procedimento legislativo do Governo».

Todavia, a proposta de lei não vem acompanhada de quaisquer estudos, documentos ou pareceres que a

tenham fundamentado, referindo, porém, na exposição de motivos, que em sede do processo legislativo a

decorrer na Assembleia da República devem ser ouvidas a Associação Nacional de Municípios e a Associação

Nacional de Freguesias.

A proposta de lei em apreciação deu entrada a 27 de julho de 2021. Por despacho de S. Ex.ª o Presidente

da Assembleia da República foi admitida e baixou para discussão na generalidade à Comissão de Administração

3 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República.

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Pública, Modernização Administrativa, Descentralização e Poder Local (13.ª) no mesmo dia. Foi anunciada na

reunião da Comissão Permanente, em 9 de setembro.

• Verificação do cumprimento da lei formulário

O título da presente iniciativa legislativa – «Altera os termos do exercício do mandato a meio termo dos

titulares dos titulares das juntas de freguesia» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao

disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário, embora possa

ser objeto de aperfeiçoamento, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final, pelo que submete

à ponderação da comissão o seguinte título:

«Modifica os termos do exercício do mandato a meio termo dos titulares dos titulares das juntas de freguesia,

alterando a Lei n.º 169/99, de 18 de setembro».

Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da

Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com

o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro

A lei a que dá origem entra «em vigor no dia seguinte ao da sua publicação», conforme previsto no n.º 1 do

artigo 4.º do articulado e no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, segundo o qual os atos legislativos «entram em

vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da

publicação» e produz efeitos no dia 1 de janeiro de 2022, em conformidade com o disposto no n.º 2 do referido

artigo 4.º do articulado.

Todavia, visando uma maior clareza do articulado, propõe-se a autonomização da norma sobre a produção

de efeitos, constante do n.º 2 do artigo 4.º, criando para o efeito um novo artigo 4.º com a epigrafe «Produção

de efeitos», e renumerando, em consequência, o atual artigo 4.º como artigo 5.º, com a epígrafe «Entrada em

vigor» e corpo do atual n.º 1 do artigo 4.º

Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei

formulário.

IV. Análise de direito comparado

• Enquadramento internacional

Países europeus

Apresenta-se abaixo informação relativamente aos seguintes Estados membros da União Europeia: Espanha

e França.

ESPANHA

Espanha está territorialmente organizada em municípios, províncias e comunidades autónomas, os quais

gozam, de acordo com o artículo 137 da Constitución Española4, de autonomia na gestão dos seus respetivos

interesses. Gozam igualmente do estatuto de entidades locais as comarcas, as áreas metropolitanas e as

mancomunidades de municípios (associações de municípios criadas com o fim de executar uma obra ou prestar

um serviço em comum e que se insiram no âmbito das respetivas competências).

A lei base reguladora das entidades que integram a administração local espanhola é a Ley 7/1985, de 2 de

abril, Reguladora de las Bases de la Administración Local (LRBRL).

Os municípios constituem a base da organização territorial espanhola5, consubstanciando o meio mais

4 Diploma disponível no portal www.boe.es. Todas as referências legislativas referentes a Espanha deverão considerar-se remetidas para o referido portal, salvo indicação expressa em contrário. 5 Conforme referido no artículo 11 da LRBRL. Não se encontrou na organização territorial espanhola nenhuma entidade equivalente à junta

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imediato de participação dos cidadãos nos assuntos públicos. Atualmente totalizam 81176. Cada município

pertence a apenas uma província7.

De acordo com o artículo 140 da Constitución Española, os municípios gozam de personalidade jurídica

plena, e o seu governo e administração denominam-se por ayuntamentos. Quer isto dizer que, excetuando os

municípios que estejam sujeitos ao regime de conselho aberto, o ayuntamento é o órgão de governo e

administração dos municípios em Espanha8.

Os ajuntamentos são compostos por concejales, eleitos pelos munícipes por sufrágio universal, direto e

secreto a cada quatro anos. Cabe aos concejales eleger o alcalde, que é o representante máximo do município9.

O alcalde pode, por sua vez, nomear tenientes de alcalde, nos quais poderá delegar algumas das suas

competências.

São competências do alcalde:

1. Dirigir o governo e a administração municipal;

2. Representar o ayuntamento;

3. Convocar e presidir às sessões do Pleno10 ou de quaisquer outros órgãos municipais, nos termos

legalmente estabelecidos, e decidir no caso de empates através de voto de qualidade;

4. Dirigir, inspecionar e impulsionar os serviços e as obras municipais;

5. Ordenar éditos;

6. Desenvolver a gestão económica de acordo com o orçamento aprovado;

7. Aprovar a oferta de emprego público de acordo com o orçamento e o número de postos de trabalho

aprovados pelo Pleno, bem como as fases do respetivo procedimento;

8. Dirigir os recursos humanos;

9. Exercer funções de chefia da Policía Municipal;

10. Aprovar os instrumentos de planeamento urbanístico que não sejam da competência do Pleno, bem

como os instrumentos de gestão urbanística e os projetos de urbanização, e ainda, projetos de obras e de

prestação de serviços cuja contratação ou concessão caiam na sua competência;

11. Exercer funções de representação nas ações municipais e administrativas de defesa do ayuntamento

em matérias da sua competência ou, no caso de urgência, da competência do Pleno;

12. Propor ao Pleno a emissão de declarações do caráter lesivo de atos que caiam no âmbito de matérias

da competência da Alcaldía;

13. Em caso de catástrofe ou calamidade pública ou sério risco das mesmas, adotar as medidas que se

mostrem necessárias e adequadas, dando imediatamente conta das medidas adotadas ao Pleno;

14. Determinar sanções, nos termos legalmente previstos;

15. Emitir as licenças que sejam da sua competência;

16. Ordenar a publicação, a execução e assegurar o cumprimento dos contratos celebrados pelo

Ayuntamiento;

17. Exercer as demais competências previstas na lei.

O artículo 75-2 da LRBRL permite que os membros das Corporaciones locales (onde se incluem o alcalde e

os concejales) aufiram a retribuição correspondente ao trabalho efetivamente desenvolvido, quando se trate do

desempenho parcial de funções de presidência, vice-presidência, representação de delegação, ou da assunção

de outras responsabilidades que se mostrem necessárias. Cabe ao Pleno determinar os cargos que podem ser

objeto de trabalho a tempo parcial e as retribuições que lhes devem estar associadas, bem como o tempo de

trabalho mínimo necessário ao recebimento de tais retribuições.

de freguesia existente em Portugal. Contudo, as comunidades autónomas têm o poder de criar entidades locais de dimensão inferior ao município. 6 Conforme referido no portal oficial do Governo espanhol, em https://administracion.gob.es/pag_Home/espanaAdmon/comoSeOrganiza Estado/EntidadesLocales.html. 7 Conforme referido no artículo 12-2 da LRBRL. 8 Nos termos também previstos no artículo 19-1 da LRBRL. 9 Conforme se estabelece no artículo 19-2 da LRBRL e artículo 196 da Ley Orgánica 5/1985, de 19 de junio, del Régimen Electoral General 10 O Pleno é composto por todos os concejales – artículo 22-1 da LRBRL

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FRANÇA

De acordo com o article 72-1 da Constitution du 4 octobre 195811, as coletividades territoriais da República

francesa são os municípios (les communes), os departamentos, as regiões, as coletividades com estatuto

especial e as coletividades ultramarinas.

Nos termos do article 72-3 da Constitution e do article L1111-1 do Code général des collectivités territoriales

(CGCT), as comunidades são administradas livremente nas condições previstas na lei.

O município é a entidade administrativa básica, a menor subdivisão administrativa francesa, ou seja, a que

atua na menor circunscrição territorial.

Os municípios beneficiam de competência geral para gerir qualquer matéria de interesse municipal, atuando

ainda junto do Estado relativamente a matérias como o ordenamento do território, o desenvolvimento da saúde,

a promoção da igualdade entre géneros, a promoção do meio ambiente, entre outros (article L1111-2 do CGCT).

O article L1111-1-1 do CGCT dispõe que os representantes locais são os membros do conseil municipal, os

quais são eleitos por sufrágio universal, por um período de seis anos (Article L227 do Code électoral).

O maire é eleito igualmente por um período de seis anos, dentre e através de voto secreto dos membros do

conseil municipal, por maioria absoluta, podendo qualquer membro apresentar a sua candidatura ao cargo.

O maire tem, em França, uma dupla função: atua em nome do município mas atua igualmente em nome do

Estado relativamente a determinadas funções administrativas e judiciais.

No que se refere às funções administrativas e judiciais a executar em nome do Estado, o maire tem

competência para proceder à publicação de leis e regulamentos, à organização de eleições ou à certificação de

assinaturas, sendo-lhe atribuídas igualmente competências de polícia e de oficial público. A LOI n.º 2019-1461

du 27 décembre 2019 relative à l'engagement dans la vie locale et à la proximité de l'action publique, veio

fortalecer os poderes policiais do maire, permitindo-lhe impor sanções pecuniárias em caso de incumprimento

de normas urbanísticas.

Ao maire é permitido exercer, cumulativamente com as funções inerentes ao mandato de representante local,

outra atividade profissional remunerada. De acordo com o articleL2123-2 do CGCT, o maire tem direito a um

crédito de horas junto da sua entidade patronal, de modo a poder dispor do tempo necessário ao cumprimento

das suas responsabilidades enquanto eleito local. Tal crédito de horas varia consoante o número de habitantes

do município para o qual o maire tenha sido eleito. O empregador é obrigado a conceder ao maire o crédito de

horas a que este tenha direito, mas o tempo de ausência não é remunerado por este. Às funções de maire está

associado o princípio da gratuidade (article L2123-17); contudo, para além do direito ao reembolso das despesas

em que incorra pelo exercício das suas funções (article L2123-18), o maire tem ainda direito a receber uma

indemnização, paga pelo município, cujo valor varia em função do número de habitantes do município em

questão (articles L2123-20 e L2123-23).

V. Consultas e contributos

• Consultas obrigatórias

O Presidente da 13.ª Comissão promoveu, nos termos regimentais e legais, a emissão de parecer pela

Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e pela Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE).

A ANAFRE remeteu o seu parecer à 13.ª Comissão, o qual se encontra disponível na página eletrónica da

presente iniciativa12, nele mencionando serem a favor da proposta de lei apresentada e ressalvando dois pontos:

(i) a alteração da redação da alínea b) do n.º 3 do artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, e (ii) a

integração da presente alteração no Orçamento do Estado de 2022, solicitando que «a presente proposta seja

votada, aprovada, promulgada e publicada a tempo do mesmo».

A ANMP remeteu também o seu parecer à 13.ª Comissão, igualmente disponível na página eletrónica da

presente iniciativa, dele fazendo constar que nada têm a opor à presente iniciativa, propondo o seguinte: (i) que

11 Diploma disponível no portal www.legifrance.gouv.fr. Todas as referências legislativas referentes a França deverão considerar-se remetidas para o referido portal, salvo indicação expressa em contrário. 12 https://www.parlamento.pt/AtividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=121060.

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a iniciativa «não deve ser discutida e aprovada neste período eleitoral, uma vez que no próximo dia 26 de

setembro realizar-se-ão eleições para os órgãos das autarquias locais» e (ii) a «alteração e atualização do

Estatuto dos Eleitos Locais, de forma a assegurar a dignificação e valorização do trabalho desenvolvido por

todos os autarcas».

• Regiões autónomas

O Presidente da Assembleia da República promoveu, a 28 de julho de 2021, a audição dos órgãos de governo

próprios das regiões autónomas, através de emissão de parecer no prazo de 20 dias, nos termos do artigo 142.º

do Regimento da Assembleia da República, e para os efeitos do n.º 2 do artigo 229.º da Constituição.

Foram recebidos, até ao momento, os pareceres favoráveis do Governo Regional dos Açores, da Assembleia

Legislativa da Região Autónoma dos Açores e do Governo da Região Autónoma da Madeira. Estes pareceres

podem ser consultados, juntamente com outro que ainda possa ser enviado na página eletrónica da presente

iniciativa.

VI. Avaliação prévia de impacto

• Avaliação sobre impacto de género

De acordo com a informação constante na ficha de Avaliação Prévia de Impacto de Género (AIG), junta pelo

autor e disponível na página eletrónica da iniciativa, considera-se que a iniciativa legislativa tem uma valoração

neutra, dado que a totalidade das categorias e indicadores analisados, assumem essa valoração.

• Linguagem não discriminatória

Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre

que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso.

Sem prejuízo de uma análise mais detalhada, na apreciação na especialidade ou na redação final, nesta fase

do processo legislativo a redação da proposta de lei não nos suscita qualquer questão relacionada com a

linguagem discriminatória em relação ao género.

VII. Anexo

Lei n.º 169/99, de 18 de setembro13 Proposta de Lei n.º 107/XIV/2.ª (GOV)

Artigo 27.º Funções a tempo inteiro e a meio tempo

1 – Nas freguesias com o mínimo de 5000 e o máximo de 10 000 eleitores ou nas freguesias com mais de 3500 eleitores e de 50 km2 de área, o presidente da junta pode exercer o mandato em regime de meio tempo.

Artigo 27.º […]

1 – Em todas as juntas de freguesias o presidente pode exercer o mandato em regime de meio tempo.

2 – Nas freguesias com mais de 10 000 eleitores ou nas freguesias com mais de 7000 eleitores e de 100 km2 de área, o presidente da junta pode exercer o mandato em regime de tempo inteiro.

2 – […].

13 Diploma consultável no sítio na Internet da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, https://www.pgdlisboa.pt/.

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Lei n.º 169/99, de 18 de setembro13 Proposta de Lei n.º 107/XIV/2.ª (GOV)

3 – Desde que suportado pelo orçamento da freguesia, e sem que o encargo anual com a respetiva remuneração ultrapasse 12% do valor total geral da receita constante na conta de gerência do ano anterior, nem do valor inscrito no orçamento em vigor:

3 – […]:

a) Pode exercer o mandato em regime de meio tempo o presidente de junta nas freguesias com até 1500 eleitores;

a) [Revogada.];

b) Pode exercer o mandato em regime de tempo inteiro o presidente de junta nas freguesias com mais de 1500 eleitores e o máximo de 10 000;

b) […];

c) Pode ainda exercer o mandato em regime de tempo inteiro mais um vogal do órgão executivo das freguesias com mais de 10 000 eleitores e o máximo de 20 000 ou das freguesias com mais de 7000 eleitores e de 100 km2 de área;

c) […];

d) Podem ainda exercer o mandato em regime de tempo inteiro mais dois vogais do órgão executivo das freguesias com mais de 20 000 eleitores.

d) […].

5 – A possibilidade de exercício de funções a tempo inteiro habilita igualmente o exercício de funções apenas a meio tempo, nomeadamente nos casos em que tal seja necessário para assegurar o cumprimento dos limites com encargos anuais previstos no n.º 3.

5 – […].

6 – A possibilidade de exercício de funções a meio tempo nos termos do n.º 1, cujo pagamento de remunerações e encargos é assegurada pelo Orçamento do Estado, habilita igualmente o exercício de funções em regime de tempo inteiro desde que cumpridos os requisitos da alínea b) do n.º 3, caso em que a remuneração e encargos remanescentes são assegurados pelo orçamento próprio da freguesia.

6 – […].

7 – O número de eleitores relevante para efeitos dos números anteriores é o constante do recenseamento vigente na data das eleições gerais, imediatamente anteriores, para a assembleia de freguesia.

7 – […].

8 – O valor base da remuneração do presidente da junta de freguesia em regime de meio tempo é fixado em metade de cada escalão estabelecido nas alíneas do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 11/96, de 18 de abril, na sua redação atual.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1352/XIV/2.ª

(PROMOÇÃO DE UM PLANO DE PROTEÇÃO E DESPOLUIÇÃO DO RIO PAIVA)

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1377/XIV/2.ª

(RECOMENDA AO GOVERNO MEDIDAS PARA DEFESA DA SUSTENTABILIDADE DO RIO PAIVA E

AFLUENTES)

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1387/XIV/2.ª

(IMPLEMENTAÇÃO DE MEDIDAS PARA A MONITORIZAÇÃO, DESPOLUIÇÃO E VALORIZAÇÃO DO

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RIO PAIVA E SEUS AFLUENTES)

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1395/XIV/2.ª

(PELA APLICAÇÃO URGENTE DE MEDIDAS PARA A DESPOLUIÇÃO E PRESERVAÇÃO DO RIO

PAIVA)

Texto final da Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território

A Assembleia da República resolve, nos termos nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição,

recomendar ao Governo que tome as medidas urgentes necessárias à despoluição efetiva e total do rio Paiva,

nomeadamente:

1 – Tome as diligências necessárias, em conjunto com o município de Castro Daire, para assegurar a urgente

entrada em funcionamento a nova ETAR do Arinho, desativando a ETAR da Ponte Pedrinha, por não apresentar

condições necessárias para o tratamento dos efluentes;

3 – Disponibilize, com urgência, apoios às autarquias locais para reabilitação e correção do funcionamento

de estações de tratamento de águas residuais dos concelhos abrangidos pelo rio Paiva e afluentes, bem como

para requalificação e ampliação das redes municipais de saneamento de águas residuais, apoiando as

autarquias na melhoria e expansão da rede de saneamento, na construção e reabilitação de ETAR e na

consequente valorização ambiental, cultural e paisagística do rio Paiva e seus efluentes;

4 – Reforce os meios humanos, técnicos e financeiros das entidades competentes em matéria de avaliação,

inspeção e fiscalização ambiental do rio Paiva e afluentes, para identificar e erradicar a emissão de descargas

ilegais de efluentes;

5 – Contrate uma equipa de guarda-rios para fiscalizar, vigiar e proteger os recursos hídricos e a

biodiversidade do rio Paiva e afluentes;

6 – Reforce as ações de monitorização e fiscalização na bacia hidrográfica do rio Paiva e seus afluentes, de

forma a evitar e a dissuadir as descargas ilegais de águas residuais, intensificando ações de fiscalização e

vigilância de descargas poluentes e aumentando a frequência e eficácia das ações de inspeção e fiscalização

às entidades detentoras de título de utilização de recursos hídricos desse rio Paiva e afluentes, bem como às

unidades industriais e explorações agropecuárias da região;

7 – Determine a recolha regular de amostras, com vista ao controlo de eventuais ultrapassagens de valores

limite de emissão estabelecidos por lei;

8 – Disponibilize informação relativa a essas recolhas e respetivas análises, bem como informação relativa

ao plano de monitorização da qualidade da água do rio Paiva e afluentes, com reporte público, incluindo

informação sobre a origem das descargas poluentes, as ETAR em funcionamento em toda a bacia do Paiva e

seu estado de manutenção;

9 – Implemente medidas de prevenção e dissuasão de práticas ilícitas, através de campanhas de informação

junto das populações abrangidas pelo trajeto do rio, e afluentes, de modo geral, e empresas e instituições em

particular;

10 – Identifique todos os eventuais agentes poluidores desta linha de água, e afluentes, a verificação e/ou

revisão das condições de licenciamento e de laboração dos mesmos;

11 – Desenvolva e aplique um plano de ação, com uma perspetiva integrada e ecossistémica, para a

despoluição e recuperação ambiental do rio Paiva e afluentes, das suas margens e respetivas galerias ripícolas,

em articulação com a Agência Portuguesa do Ambiente, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas,

as autarquias locais, instituições de ensino superior, associações de defesa do ambiente e movimentos de

cidadãos e cidadãs;

12 – Garanta o cumprimento do prazo de elaboração do Plano de Gestão da Zona Especial de Conservação

do Rio Paiva – que termina em março de 2022 –, onde devem constar as medidas e ações complementares de

conservação dos habitats e espécies desta área classificada, conforme disposto no Decreto Regulamentar n.º

1/2020, de 16 de março;

13 – Desenvolva e implemente um plano de ação para a limpeza dos resíduos sólidos, nomeadamente de

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plásticos das suas margens, para a despoluição do rio Paiva e seus afluentes e para o controlo e combate à

proliferação de espécies invasoras, operacionalizando um plano de ação para limpeza desta linha de água e

dos seus afluentes;

14 – Impulsione um plano para a eliminação dos focos de poluição em articulação com todos os municípios

do vale do Paiva e organizações não governamentais;

15 – Proceda ao levantamento das barreiras artificiais construídas entre a nascente do rio Paiva e o concelho

de Castro Daire no sentido de avaliar o seu impacto, remover as barreiras construídas ilegalmente e proceder à

renaturalização do curso de água garantindo o respeito pelo caudal ecológico;

16 – Promova medidas e ações de sensibilização e comunicação ambiental junto das comunidades locais

dirigidas às empresas, à comunidade escolar e população em geral sobre a importância da preservação do rio

Paiva e afluentes, no sentido de evitar práticas que conduzam à poluição das águas através de descargas sem

o devido tratamento ou da deposição de resíduos sólidos, nomeadamente de resíduos de plástico nas margens

dos cursos de água.

Aprovada em 29 de setembro de 2021.

O Presidente da Comissão, José Maria Cardoso.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1452/XIV/3.ª

(DESLOCAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA ÀS CANÁRIAS)

Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas

A Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, nos termos constitucional e

regimentalmente aplicáveis, é favorável ao assentimento para ausência do território nacional, requerido por S.

Ex.ª o Presidente da República para os dias 6 e 7 de outubro do corrente ano, a fim de participar na reunião dos

Ministros da Justiça Ibero-Americanos que decorrerá nas ilhas Canárias, no Reino de Espanha.

Palácio de São Bento, 28 de setembro de 2021.

O Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1457/XIV/3.ª

MEDIDAS DE PREVENÇÃO E COMBATE À EXPLORAÇÃO NA PROSTITUIÇÃO

A Resolução da Assembleia da República n.º 47/2013, de 8 de março, relativa ao combate ao

empobrecimento e à agudização da pobreza entre as mulheres, prevê a criação de «um plano de combate à

exploração na prostituição, garantindo, nomeadamente, o acesso imediato das pessoas prostituídas a um

conjunto de apoios que lhes permitam a reinserção social e profissional, designadamente através de um acesso

privilegiado a mecanismos de proteção social (rendimento social de inserção, apoio à habitação, à saúde,

elevação da sua escolarização e acesso à formação profissional), bem como à garantia de acesso privilegiado

dos seus filhos aos equipamentos sociais».

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Após oito anos, pouco ou nada foi feito nesta matéria, sendo que a maioria das pessoas prostituídas

continuam sem alternativa e sem apoios e acompanhamento para que possam deixar o mundo da prostituição.

Na verdade, apesar de alguns avanços conquistados nos últimos anos, estamos ainda perante um retrocesso

civilizacional, sendo urgente valorizar o trabalho das mulheres e a dignidade da vida humana.

A prostituição é uma forma de exploração das pessoas, um atentado à dignidade humana e uma violação

dos direitos humanos. Importa esclarecer que a prostituição não é crime em Portugal, ou seja, a pessoa que se

prostitui não é criminalizada, mas sim quem explora a prostituição. Logo, quando se fala em legalização da

prostituição, na verdade, pretende-se a legalização do lenocínio.

Portugal rege-se pelo princípio do respeito pela dignidade humana, conforme consagra a Constituição da

República Portuguesa, e ratificou a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra

as Mulheres, que determina no artigo 6.º que «Os Estados Partes tomam todas as medidas apropriadas,

incluindo, disposições legislativas, para suprimir todas as formas de tráfico das mulheres e de exploração da

prostituição das mulheres», assim como a Convenção para a Supressão do Tráfico de Pessoas e de Exploração

da Prostituição de Outrem.

Como se sabe, a prostituição tem um incremento mais forte em contextos de crise, de degradação de

condições de vida, de agravamento das desigualdades e da pobreza, que acabam por ser fatores que empurram

as pessoas, maioritariamente mulheres que não têm formas de sobrevivência, para as redes de prostituição e,

muitas vezes, para a cadeia do tráfico de seres humanos, que acaba por lhe estar associado.

É inegável que a exploração na prostituição e o tráfico de seres humanos incluem diversas formas de

exploração e de violação dos direitos humanos, constituindo um atentado contra o corpo e a dignidade das

pessoas traficadas e prostituídas.

Ora, o flagelo da prostituição não se resolve punindo as pessoas que se prostituem, nem legalizando quem

as explora, mas exigindo medidas específicas e integradas de prevenção e combate às causas da prostituição

e de adequada proteção das pessoas prostituídas.

Saliente-se que o combate ao crime de tráfico de seres humanos não pode ser desligado das causas que

alimentam um negócio altamente lucrativo, que vive da exploração dos corpos das pessoas, tal como reforça o

Movimento Democrático de Mulheres, segundo o qual «São as mulheres e crianças as vítimas mais vulneráveis,

e em maior número, em consequência da pobreza, da desigualdade, da discriminação e da expansão do sistema

prostitucional. Na Europa, mais de 76% das vítimas de tráfico são mulheres, e pelo menos 15% são crianças;

as mulheres e crianças são 95% do total de pessoas traficadas para fins de prostituição; A forma mais comum

de tráfico de seres humanos é a exploração sexual (67%), seguida da exploração laboral (21%)».

Em pleno Século XXI estão presentes várias formas de exploração e há muitos seres humanos aprisionados

nas redes de tráfico sexual e de prostituição, ao mesmo tempo que são fomentadas correntes ideológicas e

políticas que pretendem a legalização da prostituição (leia-se do lenocínio), como uma mera atividade

económica. Isto significaria normalizar esta forma de exploração em vez de apoiar as pessoas prostituídas, seria

normalizar e aceitar que há um explorador e um explorado e uma profissionalização dessa situação.

Falar na legalização da prostituição é, no fundo, falar da legalização do lenocínio, insistindo na dicotomia

entre a prostituição forçada e a prostituição voluntária, sendo de salientar que a liberdade sexual nada tem a ver

com a prostituição, pois aqui trata-se de comprar um ato sexual, dentro de um sistema prostitucional que se

alimenta da exploração de seres humanos.

Sob o falso pretexto de legalização dos locais de prostituição para garantir a salubridade das pessoas

prostituídas, o Estado seria um parceiro conivente dos proxenetas e teria lucro com a exploração do corpo das

pessoas, em vez de se empenhar a combater as causas que levam à prostituição.

Face ao exposto, importa eliminar as causas que levam à prostituição, abolir esta forma de exploração e criar

um programa de políticas públicas de apoio às pessoas que desejam deixar a prostituição, apostando igualmente

numa vertente de pedagogia através da educação para a sexualidade nas escolas.

O Partido Ecologista «Os Verdes» tem lutado pelo fim de todas as formas de exploração e continuará a

aprofundar esta luta, reconhecendo na exploração da prostituição uma violação dos direitos humanos e

assumindo o compromisso de contribuir para a consciência social do que está em causa e para combater esta

grave forma de exploração e violência.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Partido Ecologista «Os Verdes»

apresentam o seguinte projeto de resolução.

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A Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1 – Tome as diligências necessárias com vista a assegurar os meios adequados para a implementação do

Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico de Seres Humanos e o devido funcionamento do

Observatório do Tráfico de Seres Humanos, assim como a efetiva criação do plano de combate à exploração na

prostituição.

2 – Combata firmemente a legalização do lenocínio, uma vez que se trata de uma violação de direitos

humanos fundamentais.

3 – Defenda a promoção de medidas de combate e prevenção da prostituição, através da garantia de

condições de vida dignas e da eliminação das causas económicas e sociais que empurram as pessoas para a

prostituição.

4 – Garanta o adequado apoio e proteção às pessoas que saem da prostituição, que as ajude a ter autonomia

e emancipação, que lhes permita a reinserção social, profissional e o acolhimento dos seus filhos, assim como

assistência a nível psicológico, social, médico e jurídico.

5 – Reforce o desenvolvimento de campanhas de sensibilização e de informação sobre o tráfico de seres

humanos, a prostituição e outras formas de exploração e de violência.

6 – Promova as diligências necessárias tendo em vista a criação das condições materiais e humanas para a

aplicação da educação sexual em meio escolar.

Palácio de São Bento, 28 de setembro de 2021.

Os Deputados do PEV: José Luís Ferreira — Mariana Silva.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1458/XIV/3.ª

RECOMENDA AO GOVERNO PORTUGUÊS QUE ALARGUE O PRAZO DE CONSULTA PÚBLICA DA

AVALIAÇÃO AMBIENTAL DO PROGRAMA DE PROSPEÇÃO E PESQUISA DE LÍTIO

A 28 de setembro de 2021 foi lançada a consulta pública do Relatório de Avaliação Ambiental Preliminar do

Programa de Prospeção e Pesquisa de Lítio das oito áreas potenciais para lançamento de procedimento

concursal para atribuição de direitos de prospeção e pesquisa de lítio, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 232/2007,

de 15 de junho, na sua redação atual. A referida consulta pública termina a 11 de novembro de 2021.

As áreas que serão propostas a concurso abrangem 27 municípios, designadamente: Fafe, Celorico de

Basto, Guimarães, Felgueiras, Amarante, Mondim de Basto, Almeida, Figueira de Castelo Rodrigo, Pinhel,

Trancoso, Mêda, Belmonte, Covilhã, Fundão, Guarda, Sabugal, Mangualde, Gouveia, Seia, Penalva do Castelo,

Fornos de Algodres, Celorico da Beira, Viseu, Satão, Nelas, Castelo Branco e Idanha-a-Nova.

As recentes eleições para os órgãos das autarquias locais determinam que neste momento se esteja a viver

uma transição de poder, uma vez que, ao abrigo do disposto no artigo 44.º, número 1, e no artigo 60.º, número

1, da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, a instalação das novas assembleias municipais e câmaras municipais

só deverão ocorrer até ao vigésimo dia posterior ao apuramento definitivo dos resultados eleitorais, ou seja,

previsivelmente até ao dia 20 de outubro de 2021. Acresce ainda referir que esta transição de poder é

especialmente complexa nos cinco municípios das áreas que serão propostas a concurso, onde se verificou

uma mudança de gestão autárquica (sendo que Mondim de Basto, Figueira de Castelo Rodrigo, Mêda e Nelas

passaram de uma gestão do PS para uma do PSD e a Guarda passou de uma gestão do PSD para uma de um

grupo de cidadãos eleitores).

Tendo em consideração que esta transição do poder autárquico deixará apenas 12 dias úteis de pronúncia

para os novos autarcas, o PAN defende o alargamento do prazo de consulta pública.

Adicionalmente, salienta-se que, apesar de o Governo ter escrito no programa que «o concurso abrangerá

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áreas previamente delimitadas que não englobarão áreas protegidas de âmbito nacional, as áreas classificadas

ao abrigo de instrumento de direito internacional e as áreas incluídas na Rede Natura 2000», a verdade é que

as áreas sujeitas agora as avaliações ambientais para lançamento de concurso incluem essas zonas sensíveis.

Com efeito, nas áreas de «Arga» e «Guarda-Mangualde E» definidas pelo Governo existem sobreposições

com zonas do Sistema Nacional de Áreas Classificadas. Adicionalmente, o Governo não excluiu das zonas que

pretende levar a concurso as «demais áreas classificadas ao abrigo de compromissos internacionais assumidos

pelo Estado português» nomeadamente as reservas da biosfera e os geoparques, tal como previsto no artigo

17.º do Decreto-Lei n.º 30/2021. Das oito áreas indicadas pelo Governo como potenciais para lançamento de

procedimento concursal para atribuição de direitos de prospeção e pesquisa de lítio, seis ocupam áreas

classificadas ao abrigo de compromissos internacionais assumidos pelo Estado português (Reserva da Biosfera

transfronteiriça da Meseta Ibérica, Reserva da Biosfera transfronteiriça Tejo-Tajo Internacional, Geoparque

NaturTejo da Meseta Meridional e Geoparque Serra da Estrela). De acordo com a avaliação efetuada, cerca de

28,5% do total da área afeta à prospeção e pesquisa encontra-se inserida no Sistema Nacional de Áreas

Classificadas ao abrigo do regime jurídico de conservação da natureza e da biodiversidade.

Desta forma, o PAN defende que o Governo exclua, efetivamente, em sede de concurso para a prospeção e

pesquisa de lítio, as áreas protegidas de âmbito nacional, as áreas classificadas ao abrigo de instrumento de

direito internacional e as áreas incluídas na Rede Natura 2000, consoante, aliás, o definiu em sede de programa.

Nestes termos, a Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, por

intermédio do presente projeto de resolução, recomenda ao Governo que:

1 – Alargue o prazo da consulta pública do Relatório de Avaliação Ambiental Preliminar do Programa de

Prospeção e Pesquisa de Lítio das oito áreas potenciais para lançamento de procedimento concursal para

atribuição de direitos de prospeção e pesquisa de lítio;

2 – Exclua, em sede de concurso para a prospeção e pesquisa de lítio, as áreas protegidas de âmbito

nacional, as áreas classificadas ao abrigo de instrumento de direito internacional e as áreas incluídas na Rede

Natura 2000.

Palácio de São Bento, 29 de setembro de 2021.

As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.

———

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 27/XIV/2.ª

(APROVA, PARA RATIFICAÇÃO, O PROTOCOLO ADICIONAL À CONVENÇÃO DO CONSELHO DA

EUROPA SOBRE A TRANSFERÊNCIA DE PESSOAS CONDENADAS, ABERTO À ASSINATURA EM

ESTRASBURGO, EM 18 DE DEZEMBRO DE 1997)

Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do Deputado autor do relatório

Parte III – Conclusões

PARTE I – Considerandos

1. Nota introdutória

Ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do

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artigo 198.º do Regimento da Assembleia da República, o Governo tomou a iniciativa de apresentar, a 6 de

setembro de 2021, a Proposta de Resolução n.º 27/XIV/2.ª, que «aprova, para ratificação, o Protocolo Adicional

à Convenção do Conselho da Europa sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, aberto à assinatura em

Estrasburgo, em 18 de dezembro de 1997».

Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, a iniciativa em apreço baixou à Comissão

de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, tendo sido designado como relator o Deputado autor

deste parecer.

2. Âmbito, contexto e objetivos da iniciativa

Portugal é parte na Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas, aprovada, para ratificação,

pela Resolução da Assembleia da República n.º 8/93, de 20 de abril, e ratificada pelo Decreto do Presidente da

República n.º 8/93, de 20 de abril.

O Protocolo Adicional à Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas, elaborado no

Conselho da Europa pela Comissão de Peritos sobre o Funcionamento das Convenções Europeias no Campo

Penal, sob autoridade do Comité Europeu para os Problemas Criminais, foi aberto à assinatura pelos Estados-

Membros do Conselho da Europa, em 18 de dezembro de 1997.

A cooperação judiciária internacional em matéria penal é fundamental nas relações entre os Estados,

permitindo às pessoas que tenham sido condenadas noutro Estado o cumprimento da sanção no seu Estado de

nacionalidade, contribuindo, por esta via, para a sua reinserção social.

O Protocolo Adicional à Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas tem por objeto facilitar

a aplicação da Convenção Relativa à Transferência das Pessoas Condenadas, suplementando a mesma

relativamente a aspetos específicos, aditando disposições aplicáveis a pessoas que fugiram do Estado da

condenação e a pessoas condenadas sujeitas a uma ordem de expulsão ou de deportação.

Com a ratificação do Protocolo Adicional à Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas,

Portugal atualiza na ordem jurídica interna as disposições adotadas pelo Conselho da Europa nesta matéria.

Nesta proposta de resolução, são formuladas reservas relativamente a (i) estrangeiros ou apátridas com

residência habitual no Estado requerido, em que Portugal reserva-se o direito de, enquanto Estado da

condenação, optar entre a aplicação do artigo 2.º ou a apresentação de pedido de extradição; (ii) será aplicada

a medida de privação de liberdade prevista no n.º 2 do artigo 2.º nos termos estabelecidos na Constituição da

República Portuguesa e legislação ordinária para detenção e prisão preventiva; (iii) se a idade ou o estado físico

ou mental da pessoa condenada o justificar, Portugal entende que a opinião, relativa à transferência,

mencionada no artigo 3.º, deve ser emitida pelo respetivo representante e (iv) que a vinculação da República

portuguesa não afasta os compromissos assumidos no âmbito da União Europeia e que determinem a aplicação

entre os respetivos Estados-Membros de normas que, embora especiais, não são incompatíveis com a

Convenção relativa à Transferência de Pessoas Condenadas nem com o Protocolo Adicional.

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

Sendo a opinião do autor de emissão facultativa, o Deputado autor do presente parecer exime-se, nesta

sede, de manifestar a sua opinião sobre a proposta em análise, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento

da Assembleia da República.

PARTE III – Conclusões

1 – O Governo tomou a iniciativa de apresentar, a 6 de setembro de 2021, a Proposta de Resolução n.º

27/XIV/2.ª, que «aprova, para ratificação, o Protocolo Adicional à Convenção do Conselho da Europa sobre a

Transferência de Pessoas Condenadas, aberto à assinatura em Estrasburgo, em 18 de dezembro de 1997».

2 – A proposta de resolução em análise tem por finalidade facilitar a aplicação da Convenção Relativa à

Transferência das Pessoas Condenadas, suplementando a mesma relativamente a aspetos específicos,

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aditando disposições aplicáveis a pessoas que fugiram do Estado da condenação e a pessoas condenadas

sujeitas a uma ordem de expulsão ou de deportação.

3 – Nestes termos, a Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas é de parecer que a

Proposta de Resolução n.º 27/XIV/2.ª está em condições de ser votada no Plenário da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 24 de setembro de 2021.

O Deputado autor do relatório, Paulo Neves — O Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PCP e do CDS-PP, na

reunião da Comissão de 28 de setembro de 2021.

———

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 28/XIV/2.ª

APROVA, PARA ADESÃO, O PROTOCOLO QUE ALTERA O PROTOCOLO ADICIONAL À

CONVENÇÃO DO CONSELHO DA EUROPA SOBRE A TRANSFERÊNCIA DE PESSOAS CONDENADAS,

ABERTO À ASSINATURA EM ESTRASBURGO, EM 22 DE NOVEMBRO DE 2017)

Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do Deputado autor do relatório

Parte III – Conclusões

PARTE I – Considerandos

1. Nota introdutória

Ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do

artigo 198.º do Regimento da Assembleia da República, o Governo tomou a iniciativa de apresentar, a 6 de

setembro de 2021, a Proposta de Resolução n.º 28/XIV/2.ª, que «aprova, para adesão, o Protocolo que altera o

Protocolo Adicional à Convenção do Conselho da Europa sobre a Transferência de Pessoas Condenadas,

aberto à assinatura em Estrasburgo, em 22 de novembro de 2017».

Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, a iniciativa em apreço baixou à Comissão

de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, tendo sido designado como relator o Deputado autor

deste parecer.

2. Âmbito, contexto e objetivos da iniciativa

Portugal é parte na Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas, aprovada para ratificação

pela Resolução da Assembleia da República n.º 8/93, de 20 de abril, e ratificada pelo Decreto do Presidente da

República n.º 8/93, de 20 de abril.

O Protocolo Adicional à Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas, elaborado no

Conselho da Europa pela Comissão de Peritos sobre o Funcionamento das Convenções Europeias no Campo

Penal, sob autoridade do Comité Europeu para os Problemas Criminais, foi aberto à assinatura pelos Estados-

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Membros do Conselho da Europa, em 18 de dezembro de 1997.

Em 2013, a Comissão de Peritos sobre o Funcionamento das Convenções Europeias no Campo Penal

realizou um estudo sobre a aplicação da Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas e do seu

Protocolo Adicional. Nas suas respostas, as partes comunicaram dificuldades na aplicação do referido protocolo

adicional e propostas de emendas, que foram consideradas numa sessão especial durante a sexagésima quinta

reunião plenária deste órgão.

Após esta reunião, foi proposto ao Comité Europeu para os Problemas Criminais alterar o protocolo adicional,

a fim de resolver certas dificuldades identificadas pelas partes.

O propósito do Protocolo que altera o Protocolo Adicional à Convenção Relativa à Transferência de Pessoas

Condenadas é o de fornecer normas aplicáveis à transferência da execução de sentença em dois casos: (i)

quando uma pessoa condenada tenha deixado o Estado da condenação e se encontre no Estado da sua

cidadania, tornando assim impossível ao Estado da condenação, na maior parte dos casos, executar a sentença

proferida; e (ii) quando a pessoa condenada se encontra sujeita a expulsão ou deportação após o cumprimento

da pena.

O Protocolo que altera o Protocolo Adicional à Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas

tem, assim, um alcance modificativo do protocolo adicional muito circunscrito, tendo, no entanto, plena

oportunidade a sua ratificação concomitante, a fim de permitir uma mais clara e coerente aplicação da

cooperação judiciária internacional nesta matéria, entre os Estados Parte.

Importa referir que o n.º 2 do artigo 3.º dispões que «após a abertura para assinatura deste protocolo e antes

de sua entrada em vigor, uma Parte da Convenção não poderá ratificar, aceitar, aprovar ou aderir ao protocolo

adicional, a menos que tenha simultaneamente ratificado, aceito ou aprovado este protocolo». Deste modo, terá

de se recorrer a adesão simultânea, já que resulta do próprio Protocolo que altera o Protocolo Adicional à

Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas.

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

Sendo a opinião do autor de emissão facultativa, o Deputado autor do presente parecer exime-se, nesta

sede, de manifestar a sua opinião sobre a proposta em análise, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento

da Assembleia da República.

PARTE III – Conclusões

1 – O Governo tomou a iniciativa de apresentar, a 6 de setembro de 2021, a Proposta de Resolução n.º

28/XIV/2.ª, que «Aprova, para adesão, o Protocolo que altera o Protocolo Adicional à Convenção do Conselho

da Europa sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, aberto à assinatura em Estrasburgo, em 22 de

novembro de 2017».

2 – A proposta de resolução em análise tem por finalidade permitir uma mais clara e coerente aplicação da

cooperação judiciária internacional nesta matéria, entre os Estados Parte da Convenção Relativa à

Transferência das Pessoas Condenadas.

3 – Nestes termos, a Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas é de parecer que a

Proposta de Resolução n.º 28/XIV/2.ª está em condições de ser votada no Plenário da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 24 de setembro de 2021.

O Deputado autor do relatório, Paulo Neves — O Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PCP e do CDS-PP, na

reunião da Comissão de 28 de setembro de 2021.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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