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Sexta-feira, 1 de outubro de 2021 II Série-A — Número 10

XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)

S U M Á R I O

Resoluções: (a) — Eleição de quatro juízes para o Tribunal Constitucional. — Deslocação do Presidente da República às Canárias.

Projetos de Lei (n.os 955 a 974/XIV/3.ª): N.º 955/XIV/3.ª (BE) — Repõe o valor do trabalhosuplementar e o descanso compensatório, aprofundando a

recuperação de rendimentos e contribuindo para a criação deemprego, procedendo no setor público e privado.N.º 956/XIV/3.ª (BE) — Alterações ao Regime Jurídico-

Laboral e Alargamento da Proteção Social dos Trabalhadorespor Turnos e Noturnos (vigésima primeira alteração aoCódigo do Trabalho).

N.º 957/XIV/3.ª (BE) — Consagra as 35 horas como períodonormal de trabalho no setor privado (vigésima primeiraalteração ao Código do Trabalho).

N.º 958/XIV/3.ª (BE) — Revoga as alterações ao Código doTrabalho introduzidas no período da troika que vieram facilitaros despedimentos e reduzir as compensações devidas aos

trabalhadores, procedendo à vigésima primeira alteração àLei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.N.º 959/XIV/3.ª (BE) — Reconhece o direito a 25 dias de

férias no setor privado (vigésima primeira alteração ao à Lein.º 7/2009, de 12 de fevereiro).

N.º 960/XIV/3.ª (BE) — Reforça a negociação coletiva, orespeito pela filiação sindical e repõe o princípio dotratamento mais favorável ao trabalhador (vigésima primeiraalteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º

7/2009, de 12 de fevereiro).N.º 961/XIV/3.ª (CH) — Agravamento das molduras penaisprivativas de liberdade para as condutas que configurem os

crimes de abuso sexual de crianças, abuso sexual demenores dependentes e atos sexuais com adolescentes.N.º 962/XIV/3.ª (CH) — Altera o código penal no seu artigo

164.º (violação) agravando as molduras penais aplicáveis aossujeitos que preencham os requisitos desta condutacriminosa, passando a considerar os crimes contra a

liberdade e autodeterminação sexual como crimes denatureza pública.N.º 963/XIV/3.ª (CDS-PP) — Programa de incentivo à criação

e flexibilização dos horários das creches.N.º 964/XIV/3.ª (PAN) — Estabelece o reforço e avaliação daimplementação e execução do Programa de Apoio à Redução

do Tarifário dos Transportes Públicos (PART) e do Programade Apoio à Densificação e Reforço da Oferta de TransportePúblico (PROTRANSP).

N.º 965/XIV/3.ª (BE) — Cria o Programa Rede de CrechesPúblicas.

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N.º 966/XIV/3.ª (BE) — Permite o acesso a um conjunto de

dados pessoais por parte de estudantes de medicina einvestigadores científicos, para fins académicos, de arquivode interesse público fins de investigação científica ou histórica

ou fins estatísticos (primeira alteração à Lei n.º 58/2019, de2021).N.º 967/XIV/3.ª (PAN) — Procede à prorrogação do prazo do

processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegale garante mecanismos de transparência neste processo,alterando a Lei n.º 91/95, de 2 de setembro.

N.º 968/XIV/3.ª (PAN) — Alarga os prazos de prescrição decrimes contra a liberdade e autodeterminação sexual demenores e do crime de mutilação genital feminina,

procedendo à quinquagésima quarta alteração do CódigoPenal.N.º 969/XIV/3.ª (PAN) — Consagra a terça-feira de carnaval

como feriado nacional obrigatório, procedendo à décimasétima alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lein.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

N.º 970/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —Determina a proibição das corridas de cães com finscompetitivos.

N.º 971/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —Altera o Código do Trabalho e a Lei Geral do Trabalho emFunções Públicas, reconhecendo o direito a 25 dias úteis deférias.

N.º 972/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —

Altera o Código do Trabalho, estabelecendo as 35 horassemanais como limite máximo do período normal de trabalho.N.º 973/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —

Altera o Código do Trabalho, determinando a obrigatoriedadede inclusão nos anúncios de emprego de aspetos relevantesda prestação de trabalho.

N.º 974/XIV/3.ª (PS) — Alteração à Lei n.º 2/3013, de 10 dejaneiro, e à Lei 53/2015, de 11 de junho, com vista ao reforçodo interesse público, da autonomia e independência da

regulação e promoção do acesso a atividades profissionais.

Projetos de Resolução (n.os 1460 e 1461/XIV/3.ª):

N.º 1460/XIV/3.ª (BE) — Pela proteção ambiental e social noPerímetro de Rega do Mira.N.º 1461/XIV/3.ª (PS) — Recomenda ao Governo que no

quadro da diplomacia do clima, promova as necessáriasdiligências para que a Organização das Nações Unidasreconheça o clima estável como Património Comum da

Humanidade.

Proposta de Resolução n.º 29/XIV/3.ª (GOV):

Aprova o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.

(a) Publicadas em Suplemento.

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PROJETO DE LEI N.º 955/XIV/3.ª

REPÕE O VALOR DO TRABALHO SUPLEMENTAR E O DESCANSO COMPENSATÓRIO,

APROFUNDANDO A RECUPERAÇÃO DE RENDIMENTOS E CONTRIBUINDO PARA A CRIAÇÃO DE

EMPREGO, PROCEDENDO NO SETOR PÚBLICO E PRIVADO

Exposição de motivos

Durante o período da troika, a desvalorização dos rendimentos de quem vive do seu trabalho fez-se por

múltiplas vias. Por via tributária (aumentos de impostos, alteração dos escalões do IRS, sobretaxa), pelas

alterações na proteção social (cortes nos apoios sociais, congelamento de pensões, alteração das regras do

subsídio de desemprego), por cortes salariais, pelo congelamento de carreiras e pela alteração da legislação

laboral. As alterações ao Código do Trabalho introduzidas pelo Governo PSD/CDS-PP (designadamente pela

Lei n.º 23/2012, de 25 de junho) traduziram-se na diminuição dos rendimentos dos trabalhadores, numa ofensiva

que teve uma especial repercussão no que toca às matérias relativas ao tempo de trabalho.

Esta desvalorização do trabalho pelas alterações da legislação laboral operou quer pelo aumento do tempo

de trabalho (com a eliminação de 4 feriados, de 3 dias de férias e do descanso compensatório), quer pela

redução do valor pago pelo trabalho realizado. Só por esta via, PSD e CDS, levaram a cabo uma transferência

de rendimentos do trabalho para o capital de cerca de 2,3 mil milhões de euros.

Uma das matérias em que estes cortes foram mais significativos, tendo, para além do mais, um efeito

negativo do ponto de vista da criação de emprego, foi o trabalho suplementar. Com efeito, por cada dia de

trabalho suplementar, o trabalhador tinha direito a 25% das horas em descanso compensatório. Com as

alterações introduzidas pelo PSD e pelo CDS em 2012, este descanso foi eliminado. Ou seja, se num ano um

trabalhador fizer 160 horas de trabalho suplementar, passou, desde 2012, a trabalhar mais 5 dias sem receber

nada por isso. Por outro lado, foi também reduzido o valor pago pelo trabalho realizado, com a diminuição para

metade da remuneração do trabalho suplementar: por cada hora de trabalho suplementar, o trabalhador passou

a receber, na primeira hora, um acréscimo de 25%, em vez de 50% e, nas horas seguintes, um acréscimo de

37,5%, em vez dos anteriores 75%. Por cada hora de trabalho suplementar em dia feriado, a majoração passou

a 50%, em vez de 100%. Também a majoração em caso de isenção de horário de trabalho foi diminuída para

metade.

Segundo dados oficiais do INE, há cerca de meio milhão de trabalhadores que realizam horas extraordinárias

no nosso País, numa média de 315 horas por ano. O corte para metade do seu valor tem assim um efeito duplo.

Por um lado, diminuiu os rendimentos destes trabalhadores. Por outro, o embaratecimento do trabalho

suplementar e a eliminação do descanso compensatório é uma medida contrária à criação de emprego e é um

incentivo ao preenchimento de postos de trabalho com horas extraordinárias. Ora, ao Estado incumbe, até por

imperativo constitucional, a promoção do pleno emprego e não políticas que inibam a distribuição do emprego

existente.

Em Portugal, contabilizam-se por ano cerca de 134 505 000 horas de trabalho suplementar. Ou seja, se

acaso todo o trabalho suplementar fosse transformado em postos de trabalho, isso corresponderia a 64 665

postos de trabalho. Contrariar o embaratecimento do trabalho suplementar é, pois, uma medida relevante para

incentivar a criação de emprego.

As recentes alterações introduzidas ao Código do Trabalho, designadamente as que resultaram da Lei n.º

93/2019, de 4 de setembro, não reverteram estas regras gravosas para os trabalhadores, regras estas que, à

data, foram inclusivamente encaradas como circunstanciais e transitórias, sendo certo que o único impacto foi

o de fragilizar a posição dos trabalhadores numa relação marcadamente desigual.

Assim, o objetivo do presente projeto de lei é repor o direito ao descanso compensatório por trabalho

suplementar, remunerar com justiça o trabalho extraordinário e desincentivar o abuso das horas extras e do

prolongamento de horários, expurgando o Código do Trabalho das medidas impostas durante o período da

intervenção da troika e do Governo das direitas relativas a estas matérias.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

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Artigo 1.º

Objeto e âmbito de aplicação

1 – A presente lei repõe o direito ao descanso compensatório por trabalho suplementar e os valores da

compensação pela prestação de trabalho suplementar, no âmbito das relações de trabalho abrangidas pelo

Código do Trabalho ou consagrados em instrumento de regulamentação coletiva.

2 – O presente diploma aplica-se, igualmente, ao regime do trabalho suplementar previsto na Lei n.º 35/2014,

de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, com as necessárias adaptações.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

Os artigos 229.º, 230.º e 268.º do Código do Trabalho, na versão dada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,

e alterado pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho,

47/2012, de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015,

de 14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de

agosto, 14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de

abril, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 229.º

[…]

1 – O trabalhador que presta trabalho suplementar em dia útil, em dia de descanso semanal complementar

ou em feriado tem direito a descanso compensatório remunerado, correspondente a 25% das horas de trabalho

suplementar realizadas, sem prejuízo do disposto no n.º 3.

2 – O descanso compensatório a que se refere o número anterior vence-se quando perfaça um número de

horas igual ao período normal de trabalho diário e deve ser gozado nos 90 dias seguintes.

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – O disposto nos n.os 1 e 2 pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que

estabeleça a compensação de trabalho suplementar mediante redução equivalente do tempo de trabalho,

pagamento em dinheiro ou ambas as modalidades.

7 – […].

Artigo 230.º

[…]

1 – […].

2 – O descanso compensatório de trabalho suplementar prestado em dia útil ou feriado, com exceção do

referido no n.º 3 do artigo anterior, pode ser substituído por prestação de trabalho remunerada com acréscimo

não inferior a 100%, mediante acordo entre empregador e trabalhador.

3 – Em microempresa ou pequena empresa, por motivo atendível relacionado com a organização do trabalho,

o descanso compensatório a que se refere o n.º 1 do artigo anterior, com ressalva do disposto no n.º 3 do mesmo

artigo, pode ser substituído por prestação de trabalho remunerada com um acréscimo não inferior a 100%.

4 – […].

5 – […].

Artigo 268.º

[…]

1 – […]:

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a) 50% pela primeira hora ou fração desta e 75% por hora ou fração subsequente, em dia útil;

b) 100% por cada hora ou fração, em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, ou em feriado.

2 – […].

3 – O disposto nos números anteriores pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de

trabalho nos termos do n.º 6 do artigo 229.º

4 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias após a sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa —

Mariana Mortágua — Alexandra Vieira— Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua

— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

———

PROJETO DE LEI N.º 956/XIV/3.ª

ALTERAÇÕES AO REGIME JURÍDICO-LABORAL E ALARGAMENTO DA PROTEÇÃO SOCIAL DOS

TRABALHADORES POR TURNOS E NOTURNOS (VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO

TRABALHO)

Exposição de motivos

O trabalho por turnos remete para um modo de organização do horário laboral no qual diferentes equipas

trabalham em sucessão durante um período alongado. Em alguns casos, os horários prolongam-se até 24 horas

por dia e 365 dias por ano, como em hospitais, aeroportos ou serviços de hotelaria. A extensão dos horários

também se verifica em alguns setores industriais, devido à continuidade do processo produtivo, tendo a sua

utilização vindo a ser cada vez mais comum também em grandes superfícies comerciais. De facto, nos últimos

anos, a Europa tem assistido a uma liberalização dos horários de trabalho, levando, por exemplo, à maioria dos

espaços comerciais a funcionar até mais tarde e a abrir ao domingo, estando mais de 20% dos trabalhadores

enquadrados por este regime. Este prolongamento dos horários não pode deixar de ser problematizado.

Em Portugal, o trabalho em regime noturno e por turnos abrange vastas áreas da produção, assegurando o

funcionamento de sectores fundamentais da sociedade. A produção, transporte e distribuição de energia, o

sistema de saúde, a distribuição de água e alimentos, as telecomunicações, a segurança (das pessoas, da

cadeia de logística e dos bens), os transportes públicos e de mercadorias e os espaços comerciais são alguns

exemplos de setores de atividade onde o trabalho noturno e por turnos assume uma expressão significativa. O

trabalho por turnos está a aumentar e é uma realidade cada vez mais presente nas organizações laborais,

abrangendo, no nosso País, mais de 750 mil pessoas, perto de 16% do total da população empregada. Entre

outras consequências sociais, ele comporta custos elevados na dinâmica social e familiar dos trabalhadores.

Em Portugal, a trivialização das autorizações para a laboração contínua têm permitido uma expansão muito

pouco criteriosa de regimes de trabalho que passam por horários cada vez mais alargados.

A 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde qualificou a emergência de saúde pública

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ocasionada pela COVID-19 como uma pandemia internacional, constituindo uma calamidade pública.

A crise pandémica é também uma crise económica e social que exige medidas capazes de assegurar às

famílias que o rendimento proveniente do seu trabalho é protegido, mas também capazes garantir que as

condições de trabalho – tantas vezes já tão precárias – não são alvo de abusos por parte da entidade

empregadora.

O tema do trabalho por turnos e noturno tem sido sucessivamente relegado para um momento posterior,

sem que nada de concreto aconteça para garantir melhores condições de trabalho e maior proteção social a

estes trabalhadores. A pandemia transformou estas relações laborais em alvos fáceis, permitindo a

implementação de períodos contínuos de trabalho à margem da lei. Isto porque, apesar de na Lei do

Orçamento do Estado para 2020 – por pressão do Bloco de Esquerda – ter ficado inscrita, no artigo 250.º, a

necessidade de realização de um estudo sobre o impacto do trabalho por turnos, tendo em vista o reforço da

proteção social destes trabalhadores até hoje – tanto quanto se sabe – esse estudo não existe e os

trabalhadores por turnos não viram nenhuma melhoria concreta acontecer.

Aliás, investigações de âmbito académico (nomeadamente da autoria de Isabel Soares da Silva1, da

Universidade do Minho) têm já demonstrado que o horário de trabalho por turnos, especialmente quando

envolve a realização de trabalho noturno e/ou períodos muito valorizados familiar e socialmente, pode

representar para o/a trabalhador/a dificuldades acrescidas do ponto de vista biológico, psicológico e/ou

familiar e social. Boa parte das dificuldades experienciadas resulta, por um lado, da necessidade de inversão

do ciclo sono-vigília (i.e., ter de dormir de dia e de trabalhar à noite) e, por outro, do desfasamento entre a

estruturação do tempo social e certos horários de trabalho, donde se salienta os períodos ao final do dia e

aos fins de semana. Embora os diferentes efeitos tendam a interrelacionar-se, podem ser agrupados em três

grandes dimensões: saúde (perturbações na saúde física e psicológica, incluindo perturbações nos ritmos

circadianos); efeitos sociais (interferência na vida familiar e social) e ocupacionais (em especial, as

perturbações circadianas do desempenho e a sua relação com a segurança ocupacional).

Diversos estudos científicos sobre a realidade do trabalho por turnos e o trabalho noturno têm dado um

contributo inestimável para um mais profundo conhecimento deste fenómeno e das suas consequências

humanas (designadamente, perturbações do sono, gastrointestinais, cardiovasculares, do humor, fadiga

crónica, problemas metabólicos, sociais e familiares, acidentes de trabalho por vezes mortais e catastróficos,

absentismo, diminuição da capacidade laboral e envelhecimento precoce). Por isso mesmo, esses estudos

têm vindo a interpelar os poderes públicos sobre a necessidade de uma maior regulação desta modalidade

de organização do trabalho. Apesar de as empresas garantirem que cumprem a lei, verifica-se, por exemplo,

que aspetos básicos da regulação do trabalho por turnos, como o intervalo de pelo menos 11 horas nas

mudanças entre os turnos, como recomendado na Diretiva Europeia 93/104/CE, não são, de facto,

respeitados. Assim, tem vindo a ser sugerido, nomeadamente pela equipa de Isabel Silva, que se intervenha

com vista a garantir: (i) a contratação de recursos humanos suficientes para impedir a sobrecarga horária;

(ii) a disponibilização de um serviço de cantina noturno para assegurar uma alimentação saudável; (iii) a

cedência de transporte, sobretudo em horários muito matinais; (iv) a autorização a realização de sestas

durante a noite sobretudo em horários noturnos longos, como acontece no Japão; (v) o envolvimento dos

trabalhadores na seleção dos turnos, apoiando-os aquando da «troca de horários»; e (vi) a aposta no

aconselhamento personalizado tendendo a aumentar o bem-estar destes funcionários.

A negociação e a contratação coletiva são um espaço privilegiado para regular estas matérias. Sucede

que as sucessivas revisões do Código do Trabalho em matéria de negociação e contratação coletiva,

nomeadamente pela imposição da sua caducidade, tiveram como efeito desequilibrar, a favor do patronato,

a legislação laboral, diminuir a capacidade de negociação dos sindicatos, reduzir a abrangência das

convenções e individualizar as relações laborais. No campo da organização do trabalho por turnos, noturno

e em folgas rotativas, este processo de individualização e precarização tem feito da entidade empregadora

o único determinante na relação laboral, proliferando situações de desfavorecimento do trabalhador. Por isso

mesmo, sem prejuízo da regulação de aspetos específicos que deve ser feita em cada setor e atendendo às

suas particularidades por instrumentos de regulação coletiva de trabalho, a lei geral tem o dever de definir

patamares mínimos para todos os trabalhadores.

1 Silva, I. S. (2012). Trabalho por turnos. In A. L. Neves & R. F. Costa (Coords.), Gestão de recursos humanos de A a Z, Lisboa: RH Editora, pp., 619-622.

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O Bloco de Esquerda, na anterior Legislatura, apresentou um projeto de lei sobre o trabalho por turnos, ao

qual se juntaram outros projetos, e foi criado, no âmbito da Comissão de Trabalho e da Segurança Social, um

grupo de trabalho para apreciar essas iniciativas. Foram realizadas, nesse âmbito, dezenas de audições a

diversas entidades, tendo sido de reconhecimento geral a necessidade de melhorar o enquadramento normativo

desta forma de organização do trabalho. Contudo, contrariamente aos sinais dados publicamente pelo PS, às

necessidades reconhecidas em várias das audições, as propostas da esquerda acabaram por ser todas

chumbadas.

Já nesta Legislatura, o número 1 do artigo 250.º da Lei do Orçamento do Estado para 2020 estabelecia que

«em 2020, o Governo apresenta um estudo sobre a extensão, as características e o impacto do trabalho por

turnos em Portugal, tendo em vista o reforço da proteção social destes trabalhadores». Quase dois anos depois

e uma crise pandémica instalada que trouxe a nu as debilidades já existentes do ponto vista social e laboral, o

referido estudo nunca foi dado a conhecer e a proteção social dos trabalhadores por turnos e em regime noturno

mantém-se inalterada. É urgente conferir dignidade ao trabalho desenvolvido pelos trabalhadores por turnos e

em regime noturno, combatendo a sua utilização indevida e conferindo proteção acrescida em virtude do

reconhecimento da penosidade do trabalho desenvolvido.

O presente projeto de lei visa dotar a lei de instrumentos que, assegurando os serviços e produções normais

das diferentes organizações, diminuam as consequências nefastas deste tipo de trabalho, nomeadamente na

saúde dos trabalhadores e trabalhadoras. Este projeto pretende, ainda, abrir espaço à negociação e à

contratação coletiva, em particular nos aspetos de complementaridade e adequação concreta às empresas. Os

seus aspetos essenciais são os seguintes:

1 – Clarificar os conceitos de trabalho por turnos, trabalho noturno e trabalhador noturno, e introduzir o

conceito de trabalhador por turnos, garantindo um enquadramento mais protetor dos trabalhadores.

2 – Definir regras sobre a organização por turnos que possibilitem uma menor perturbação dos ritmos

circadianos, uma acumulação de sono diminuída e uma maior sincronização com a vida social.

3 – Valorizar a participação dos trabalhadores e das suas estruturas representativas na definição dos turnos

e definir prazos mínimos para mudança de horário programado.

4 – Garantir um período mínimo de 24 horas de descanso na mudança de horário de turno e pelo menos dois

fins-de-semana de descanso em cada 6 semanas de trabalho por turnos, tendo em conta que o trabalho por

turnos afeta negativamente a vida familiar e empobrece as relações sociais e de amizade (75% dos

trabalhadores e trabalhadoras por turnos têm alterações na vida familiar e no relacionamento com os filhos e

lamentam a perda de amigos).

5 – Definir um máximo de 35 horas semanais de trabalho para quem trabalha por turnos ou é trabalhador

noturno.

6 – Alargar o acesso a exames médicos e a cuidados de saúde por parte dos trabalhadores por turnos e

trabalhadores noturnos e garantir que determinados grupos de trabalhadores são dispensados desta forma de

organização do trabalho.

7 – Consagrar o direito a mais um dia de férias por cada 2 anos de trabalho noturno ou por turnos.

8 – Definir o valor dos acréscimos retributivos pagos por trabalho por turnos e trabalho noturno (entre 25% a

30%).

9 – Conferir o direito à antecipação da idade legal de reforma sem penalizações, em 6 meses por cada ano

de trabalho por turnos ou noturno, considerando que o trabalho em regime noturno e em turnos é seguramente

o mais penoso e desgastante de todos os regimes de trabalho e que a idade e a antiguidade em trabalho noturno

constituem fatores fortemente agravantes, sendo o envelhecimento precoce uma das consequências dos

trabalhadores em regime de turnos.

10 – Tendo em conta os encargos resultantes do regime especial criado pelo presente diploma, propõe-se

que esses custos sejam suportados pelo acréscimo na contribuição das entidades patronais que utilizem estes

regimes de trabalho.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados e Deputadas do Bloco de Esquerda

apresentam o seguinte projeto de lei:

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Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma altera o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado

pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012,

de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de

14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de

agosto, 14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8

de abril, na parte relativa à organização do trabalho, em regime noturno e por turnos, e define para os

trabalhadores noturnos e por turnos a redução da idade da reforma, sem penalização.

Artigo 2.º

Âmbito de aplicação

1 – O disposto no presente diploma aplica-se aos trabalhadores a laborar em regime noturno e por turnos,

no âmbito das relações de trabalho abrangidas pelo Código do Trabalho ou consagrados em instrumento de

regulamentação coletiva.

2 – O presente diploma aplica-se, igualmente, com as necessárias adaptações, ao regime de trabalho por

turnos e noturno previsto na Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções

Públicas, com as posteriores alterações.

Artigo 3.º

Alterações ao Código do Trabalho

Os artigos 58.º, 74.º, 220.º, 221.º, 223.º, 224.º, 225.º, 238.º e 266.º do Código do Trabalho, aprovado pela

Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 58.º

[…]

1 – A trabalhadora grávida, puérpera ou lactante tem direito a ser dispensada de prestar trabalho em

horário de trabalho organizado de acordo com regime de adaptabilidade, de banco de horas, de horário

concentrado ou de trabalho por turnos.

2 – O direito referido no número anterior aplica-se a qualquer dos progenitores em caso de aleitação ou

para acompanhamento de filho ou outro dependente a cargo menor de 12 anos ou,

independentemente da idade, com deficiência ou com doença crónica, e ainda a trabalhador a quem

seja atribuído o estatuto de cuidador não principal de pessoa dependente nos termos da lei, quando

a prestação de trabalho nos regimes nele referidos afete a sua regularidade.

3 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 74.º

[…]

1 – Os menores, são dispensados de prestar trabalho em horário organizado de acordo com o regime de

adaptabilidade, banco de horas, horário concentrado, trabalho noturno ou por turnos, quando o mesmo

afetar a saúde ou segurança no trabalho.

2 – […].

3 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 220.º

[…]

1 – (Anterior corpo do artigo.)

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2 – Os turnos podem ser totais, ou parciais, consoante, respetivamente, o trabalho diário seja dividido em

três turnos ou dois turnos.

Artigo 221.º

[…]

1 – Devem ser organizados turnos de pessoal diferente sempre que, de forma continuada, o período de

funcionamento ultrapasse as 20 horas e se inicie antes das 7 horas.

2 – Os turnos devem, na medida do possível, ser organizados de acordo com os interesses e as preferências

manifestados pelos trabalhadores, mediante acordo com a comissão de trabalhadores ou, na ausência

desta, com os sindicatos em que os trabalhadores se encontrem filiados, de acordo com os artigos 425.º

e 426.º do Código do Trabalho.

3 – O empregador deve ter registo separado dos trabalhadores incluídos em cada turno e respetivos horários

de trabalho, que será enviado ao ministério que tutela o trabalho, à comissão de trabalhadores e aos

sindicatos que declarem ser filiados na respetiva entidade empregadora.

4 – A duração trabalho de cada turno é de 35 horas semanais, calculado numa média máxima de seis

semanas consecutivas de trabalho.

5 – A mudança do horário programado é comunicada com a antecedência mínima de 15 dias.

6 – Os turnos no regime de laboração contínua e dos trabalhadores que assegurem serviços que não possam

ser interrompidos devem ser organizados de modo que os trabalhadores de cada turno gozem, na mudança de

horário de turno, de pelo menos, 24 horas de descanso e lhes seja concedido pelo menos dois fins-de-semana

completos de descanso em cada seis semanas consecutivas sem prejuízo do período excedente de descanso

a que tenham direito.

7 – Aos trabalhadores por turnos não é aplicável o disposto nos artigos 203.º a 211.º, quanto à adaptabilidade

do horário de trabalho.

8 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto no presente artigo.

Artigo 223.º

[…]

1 – Considera-se trabalho noturno o prestado num período que compreenda o intervalo entre as 20 horas

de um dia e as 7 horas do dia seguinte.

2 – Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho podem estabelecer regimes mais favoráveis ao

trabalhador relativamente ao período de trabalho noturno, com observância do disposto no número anterior.

Artigo 224.º

[…]

1 – Considera-se trabalhador noturno o que presta, pelo menos, duas horas de trabalho normal noturno

em cada dia.

2 – O período normal de trabalho diário de trabalhador noturno não pode ser superior ao período normal

de trabalho de um trabalhador em horário diurno nem superior a 8 horas por dia.

3 – O período normal de trabalho diário de trabalhador noturno é de 35 horas calculado num período máximo

de referência de quatro semanas consecutivas de trabalho.

4 – Aos trabalhadores noturnos não se aplica o disposto nos artigos 203.º a 211.º, quanto à adaptabilidade

do horário de trabalho.

5 – Os trabalhadores noturnos cuja atividade implique riscos especiais ou uma tensão física ou mental

significativa não podem prestá-la por mais de sete horas e trinta minutos num período de vinte e quatro horas

em que executem trabalho noturno:

a) De natureza monótona, repetitiva, cadenciada ou isolada;

b) Em obra de construção, demolição, escavação, movimentação de terras, ou intervenção em túnel, ferrovia

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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ou rodovia sem interrupção de tráfego, ou com risco de queda de altura ou de soterramento;

c) Da indústria extrativa;

d) Da indústria química;

e) De fabrico, transporte ou utilização de explosivos e pirotecnia;

f) Que envolvam contacto com corrente elétrica de média ou alta tensão;

g) De produção ou transporte de gases comprimidos, liquefeitos ou dissolvidos ou com utilização

significativa dos mesmos;

h) Que, em função da avaliação dos riscos a ser efetuada pelo empregador, assumam particular

penosidade, perigosidade, insalubridade ou toxicidade.

6 – (Anterior n.º 5).

7 – O disposto nos números anteriores não é igualmente aplicável quando a prestação de trabalho

suplementar seja necessária para prevenir ou reparar prejuízo grave para a empresa ou para a sua

viabilidade devido a acidente ou a risco de acidente iminente.

8 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto nos n.os 2, 4 ou 5.

Artigo 225.º

[…]

1 – […].

2 – Para efeitos do número anterior, e ainda para a prevenção de doenças profissionais o empregador

deve garantir o acesso, sem qualquer custo para o trabalhador, a todas as consultas necessárias,

nomeadamente nas áreas gastrointestinal, do sono, cardiovascular, psicológica, cronobiológica, ortopédica

bem como a exames de rastreio de cancro da mama.

3 – (Anterior n.º 2).

4 – (Anterior n.º 3).

5 – (Anterior n.º 4).

6 – Sempre que indicação médica o exija, o empregador deve assegurar a trabalhador que sofra de

problema de saúde relacionado com a prestação de trabalho noturno a afetação a trabalho diurno que esteja

apto a desempenhar, mantendo o direito ao respetivo subsídio.

7 – (Anterior n.º 6).

8 – (Anterior n.º 7).

Artigo 238.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – O trabalhador noturno adquire, por cada dois anos como trabalhador noturno, o direito a um dia de

férias.

7 – O trabalhador por turnos adquire, por cada dois anos de trabalho como trabalhador por turnos, o direito

a um dia de férias.

8 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 1 a 7.

Artigo 266.º

[…]

1 – O trabalho noturno é pago com acréscimo de 30% relativamente ao pagamento de trabalho

equivalente prestado durante o dia.

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1 DE OUTUBRO DE 2021 11

2 – […]:

a) […];

b) […].

3 – […]:

a) […];

b) […];

c) […].

4 – […].»

Artigo 4.º

Aditamentos ao Código do Trabalho

São aditados os artigos 220.º-A, 222.º-A, 222.º-B e 266.º-A ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º

7/2009, de 12 de fevereiro, com a seguinte redação:

«Artigo 220.º-A

Noção de trabalhador por turnos

Considera-se trabalhador por turnos qualquer trabalhador cujo horário se enquadre no âmbito do trabalho

por turnos.

Artigo 222.º-A

Condições de laboração no regime de turnos

1 – O trabalho em regime de turnos pressupõe a audição das estruturas representativas dos trabalhadores,

Comissão de Higiene, Segurança e Saúde no Trabalho, e o parecer prévio da comissão de trabalhadores e o

acordo dos trabalhadores envolvidos, devendo o respetivo parecer acompanhar o pedido de aprovação do

respetivo ministério que tutela o trabalho.

2 – O início da prática do regime de turnos carece do prévio acordo informado e escrito do trabalhador, sendo

obrigatoriamente precedido de:

a) Informação quanto às consequências do trabalho por turnos para a saúde e bem-estar do trabalhador e

dos serviços de segurança e saúde disponibilizados pela entidade empregadora;

b) Informação das responsabilidades da entidade empregadora quanto às questões de ordem jurídico-

laborais relativas ao trabalho por turnos nomeadamente as constantes da presente lei.

3 – Os trabalhadores com mais de 55 anos de idade ou 30 anos, consecutivos ou intercalados, de trabalho

em regime de turnos podem solicitar a passagem ao regime de trabalho diurno, mantendo o direito ao acréscimo

retributivo contemplado nos n.os 1 e 2 do artigo 266.º-A.

4 – O regime previsto no artigo anterior é aplicável aos trabalhadores noturnos, em igualdade de

circunstâncias e em conformidade com o disposto no n.º 4 do artigo 266.º-A.

Artigo 222.º-B

Antecipação da idade de reforma

1 – O trabalho por turnos e noturno confere o direito à antecipação da idade de reforma na proporção da

contagem de seis meses por cada ano em trabalho de turnos e noturno e sem qualquer penalização.

2 – Para a antecipação da idade de reforma acresce ainda a contagem do tempo de trabalho suplementar

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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na proporção do referido no número anterior.

3 – O disposto nos números anteriores será regulamentado em legislação especial.

Artigo 266.º-A

Pagamento de trabalho por turnos e noturno

1 – O trabalho por turnos parcial é pago com acréscimo de 25%.

2 – O trabalho por turnos total é pago com acréscimo de 30%.

3 – O acréscimo referido nos números anteriores é pago também no subsídio de férias, de Natal, na

remuneração referente ao período de férias, em situação de baixa devido a acidente de trabalho ou em

períodos de mudança temporária para horário diurno a solicitação da empresa.

4 – O trabalho noturno prestado no período compreendido entre as 20 horas e as 7 horas é pago com

acréscimo de 30% relativamente ao pagamento de trabalho equivalente prestado durante o dia.

5 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.»

Artigo 5.º

Financiamento

1 – As regras de financiamento dos encargos resultantes do regime criado pelo presente diploma são

definidas em legislação especial.

2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior os encargos da aplicação deste regime são suportados

pelo acréscimo na contribuição das entidades empregadoras que recorram ao regime de turnos e trabalho

noturno.

Artigo 6.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa

— Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana

Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria

Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

———

PROJETO DE LEI N.º 957/XIV/3.ª

CONSAGRA AS 35 HORAS COMO PERÍODO NORMAL DE TRABALHO NO SETOR PRIVADO

(VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO)

Exposição de motivos

A redução do horário de trabalho é uma medida comprovadamente eficaz do ponto de vista económico e

justa do ponto de vista da distribuição do emprego existente. É, também, uma ferramenta para melhorar as

condições de trabalho, para permitir uma melhor conciliação entre as várias esferas da vida (libertando tempo

para atividades pessoais, familiares e associativas) e, se bem conduzida, para promover uma distribuição mais

igualitária do trabalho reprodutivo e doméstico, combatendo a desigualdade de género na distribuição do

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trabalho na esfera privada.

Em Portugal, trabalham-se horas a mais. De acordo com o Eurostat, os portugueses trabalham 41,3 horas

semanais (média de trabalho prestado a tempo inteiro), enquanto a média da União Europeia é de 40,4 horas.

Os portugueses trabalham mais uma hora por semana (54 minutos) do que a média dos parceiros da União

Europeia. Os países onde o horário de trabalho é mais curto são a Suécia (39,9 horas), França (39,4 horas),

Holanda (39 horas) e Itália (38,7 horas). Mas se isto é assim relativamente ao horário legal de trabalho, o número

real de horas semanais dedicadas ao trabalho é bem superior, tendo em conta todo o trabalho suplementar e

as horas extraordinárias não remuneradas, as várias formas de flexibilidade da organização do tempo de

trabalho, os períodos de deslocação entre a casa e o trabalho – alongados pela periferização geográfica dos

trabalhadores com salários mais baixos –, ou a invasão do tempo de descanso dos trabalhadores através de

dispositivos móveis e da exigência (ilegal) de uma conectividade permanente.

No período da troika, a orientação que predominou foi a de cortar rendimento e, simultaneamente, aumentar

o tempo de trabalho, particularmente o tempo de trabalho não pago. Isso aconteceu aumentando o horário de

trabalho na Administração Pública (um aumento entretanto revertido na anterior legislatura), estimulando pela

lei o trabalho suplementar através do seu embaratecimento (que permanece na lei), da eliminação de 3 dias de

férias no setor privado (corte que continua também a constar do Código do Trabalho) e do aumento anual da

idade de reforma, que prolonga o tempo de vida dedicado ao trabalho.

Como se sabe, e ficou comprovado no período austeritário, o alongamento de horários não se traduz em

acréscimos de produtividade. Pelo contrário, como vêm afirmando vários estudos, designadamente da OIT,

«horários de trabalho longos reduzem potencialmente a produtividade e a performance das empresas (…). Por

outras palavras, horas adicionais tendem a produzir efeitos decrescentes em termos de produtividade» (World

of Work 2014: Developing With Jobs, da responsabilidade da Organização Internacional do Trabalho),

Na Legislatura anterior foi possível, entre outras medidas, reverter cortes salariais, aumentar o salário mínimo

e repor as 35 horas na Administração Pública. Não se justifica, pois, que se continue a adiar a redução do horário

de trabalho para o conjunto dos trabalhadores.

A experiência portuguesa e internacional de outros processos de redução do horário de trabalho faculta-nos

o conhecimento suficiente para perceber como é que um processo deste tipo pode ser conduzido. Em Portugal,

a redução para as 40 horas, em 1996, permitiu a criação de 5% de emprego líquido no primeiro ano e 3% no

segundo. Em França, a aplicação das Leis Aubry (a primeira de 1998 e a segunda de 2000) que reduziram o

horário de trabalho paras as 35 horas, foi objeto, em 2014, de uma «Comissão de Inquérito sobre o impacto

societal, social, económico e financeiro da redução progressiva do tempo de trabalho», aprovada por

unanimidade e presidida por Thierry Benoit, Deputado UDI (partido de centro-direita). Desse relatório, constam

várias conclusões:

• «A redução do tempo de trabalho decidida pela lei de 1998 contribui para que a economia francesa criasse

mais empregos do que teria criado sem esta lei. O número de 350 mil é o mais comummente admitido»,

do total de 2 milhões de empregos criados entre 1997-2001;

• «Esta redução não coincidiu com uma degradação da competitividade do nosso País – nomeadamente

porque ela foi acompanhada de uma aceleração dos ganhos de produtividade. A França permanece assim

atrativa e localiza-se regularmente no trio dos países com mais investimento direto estrangeiro»;

• «A redução do tempo de trabalho, comparada com outras políticas públicas desenvolvidas para estimular

o emprego, nomeadamente aquelas que assentam na redução das quotizações sociais sem condições,

aparece como menos dispendiosa para as finanças públicas, tendo em conta o número de empregos que

permitiu criar»;

• A redução para as 35 horas «permitiu o relançamento e o dinamismo do diálogo social»;

• As Leis Aubry conduziram «a uma melhoria da articulação entre o tempo passado no trabalho e o tempo

consagrado a atividades pessoais, familiares e associativas».

O mesmo relatório identifica também os problemas da condução desse processo naquele país, com um

quarto dos ativos a relatarem uma degradação das condições de trabalho pela intensificação dos ritmos e com

empresas que reduziram recorreram à compressão de tempos acordados de pausas ou da transição entre

turnos, intensificando o trabalho e aumentando o sofrimento profissional, para dissimular a redução do tempo

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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de trabalho.

Há várias razões para que, em Portugal, se reduza o período normal de trabalho para as 35 horas nesta

Legislatura, garantindo que a essa redução não corresponde nenhuma redução de salário, nem de condições

de trabalho.

Uma outra razão que podemos acrescentar são os impactos e as respostas a que pandemia causada pela

COVID-19 obrigou no mundo do trabalho. Na sequência das restrições à mobilidade, operou-se uma transição

abrupta para o teletrabalho, sem mecanismos de preparação e de negociação coletiva. De realidade

relativamente residual, este passou a ter uma expressão massiva, comportando uma alteração em grande

escala na organização do trabalho. Uma das principais preocupações é a necessidade prever expressamente

um dever de desconexão por parte da entidade empregadora e que deve ser transversal ao Código do Trabalho

e não apenas em matéria de teletrabalho. Essa proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda está a ser

debatida em conexão com a regulação do teletrabalho. O teletrabalho reforça a necessidade de disciplinar o

respeito pelo horário de trabalho e os mecanismos de controlo (como aqui se propõe relativamente aos mapas

de horário e à intervenção da ACT), já que faz com que a prestação do trabalho como que «acompanhe» o

trabalhador onde quer que ele esteja, potenciando a ideia de uma conexão permanente, de uma escravização

pela hiperdisponibilidade para responder às solicitações do empregador, comprometendo a harmonia social,

familiar e o período de descanso.

Do ponto de vista económico, a redução do período normal de trabalho trata-se de uma medida coerente

com a lição dos últimos anos: É a recuperação de rendimentos e a melhoria das condições de trabalho que

permite estimular a economia e promover o crescimento. É também uma questão de justiça relativa, alargando

ao conjunto dos trabalhadores uma alteração que já foi concretizada na Administração Pública. Constitui, ainda,

um passo na direção certa do ponto de vista da organização da sociedade, porque liberta mais tempo para viver.

É, finalmente, uma medida essencial para combater o desemprego: um patamar de 6% de criação líquida de

emprego pela redução do período normal de trabalho significaria a criação em Portugal de mais de 230 mil

postos de trabalho.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei define as 35 horas de trabalho como limite máximo semanal dos períodos normais de trabalho,

procedendo à alteração do Código do Trabalho, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

São alterados os artigos 203.º, 210.º, 211.º e 224.º do Código do Trabalho aprovado em anexo à Lei n.º

7/2009, de 12 de fevereiro, alterado pela Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, pela Lei n.º 53/2011, de 14 de

outubro, pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, pela Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, pela Lei n.º 69/2013, de 30

de agosto, pela Lei n.º 27/2014, de 8 de maio, pela Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, pela Lei n.º 28/2015, de 14

de abril, pela Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, pela Lei n.º 8/2016, de 1 de abril, pela Lei n.º 28/2016, de 23

de agosto, pela Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, pela Lei n.º 14/2018, de 19 de março, pela Lei n.º 90/2019, de

4 de setembro, pela Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, e pela Lei n.º 18/2021, de 8 de abril, que passam a ter a

seguinte redação:

«Artigo 203.º

[…]

1 – O período normal de trabalho não pode exceder as 7 horas por dia e as 35 horas por semana.

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2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

Artigo 210.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […].

2 – Sempre que a entidade referida na alínea a) do número anterior prossiga atividade industrial, o período

normal de trabalho é de trinta e cinco horas por semana, na média do período de referência aplicável.

Artigo 211.º

[…]

1 – Sem prejuízo do disposto nos artigos 203.º a 210.º, a duração média do trabalho semanal, incluindo

trabalho suplementar, não pode ser superior a quarenta e duas horas, num período de referência estabelecido

em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que não ultrapasse 12 meses ou, na falta deste, num

período de referência de quatro meses, ou de seis meses nos casos previstos no n.º 2 do artigo 207.º

2 – […].

3 – […].

4 – […].

Artigo 224.º

[…]

1 – […].

2 – O período normal de trabalho diário de trabalhador noturno, não deve ser superior a sete horas diárias,

em média semanal, sem prejuízo do disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

3 – […].

4 – O trabalhador noturno não deve prestar mais de sete horas de trabalho num período de vinte e quatro

horas em que efetua trabalho noturno, em qualquer das seguintes atividades, que implicam riscos especiais ou

tensão física ou mental significativa:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […].

5 – […].

6 – […]:

a) […];

b) […].

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10 16

7 – […].»

Artigo 3.º

Salvaguarda de direitos

Da diminuição do tempo de trabalho não pode resultar a redução de remuneração nem a perda de quaisquer

direitos.

Artigo 4.º

Publicidade e dever de informação

1 – As entidades empregadoras ficam obrigadas a, no prazo de 6 meses após a publicação da presente lei,

definirem um plano de reorganização do tempo de trabalho e de contratação de efetivos de acordo com o

disposto no presente diploma.

2 – Do plano previsto no número anterior fará parte integrante um novo mapa de horários de trabalho e uma

calendarização do processo de recrutamento e seleção com vista a assegurar as contratações a efetuar em

consequência da redução do tempo de trabalho.

3 – O plano referido nos n.os 1 e 2 deve ser remetida à Direção-Geral do Emprego e das Relações de

Trabalho, à ACT e às estruturas representativas dos trabalhadores.

4 – Para efeitos do disposto no número anterior estabelece-se a meta de um mínimo de 6% de criação líquida

de emprego em relação ao número de efetivos abrangidos pela redução do horário de trabalho.

5 – O novo mapa de horários de trabalho constante do n.º 2 deve ser afixado em local bem visível com a

antecedência mínima de sete dias relativamente ao início da sua aplicação.

6 – É aplicável ao disposto no n.º 2 do presente artigo o n.º 3 do artigo 212.º do Código do Trabalho relativo

à consulta prévia da consulta da comissão de trabalhadores ou, na sua falta, as comissões intersindicais, as

comissões sindicais ou os delegados sindicais.

7 – Constitui contraordenação grave a falta de cumprimento do disposto no n.º 2 e no n.º 5.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

1 – O presente diploma entra em vigor 60 dias após a sua aprovação.

2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior as entidades empregadoras dispõem do período transitório

de um ano para adaptarem a organização do tempo de trabalho, o recrutamento e seleção de trabalhadores e

o início de funções dos trabalhadores admitidos na data de início da sua vigência com vista a dar cumprimento

ao previsto no presente diploma.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa —

Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua

— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

———

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PROJETO DE LEI N.º 958/XIV/3.ª

REVOGA AS ALTERAÇÕES AO CÓDIGO DO TRABALHO INTRODUZIDAS NO PERÍODO DA TROIKA

QUE VIERAM FACILITAR OS DESPEDIMENTOS E REDUZIR AS COMPENSAÇÕES DEVIDAS AOS

TRABALHADORES, PROCEDENDO À VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 7/2009, DE 12 DE

FEVEREIRO

Exposição de motivos

O poder de despedir, decorrência do poder diretivo da entidade empregadora, é uma das principais

manifestações da desigualdade que impera na relação laboral. A Constituição da República Portuguesa baliza

este poder da entidade empregadora, através do preceito constitucional da segurança no emprego, consagrado

no artigo 53.º, que proíbe os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.

A Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, que sucedeu às duas versões dos memorandos de entendimento da troika

de maio de 2011, introduziu alterações fundamentais ao Código do Trabalho com o objetivo de desequilibrar em

favor dos empregadores a regulação do trabalho, de precarizar e reduzir o custo do trabalho e de facilitar e

embaratecer o despedimento.

Por sua vez, a Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, foi ainda mais longe, aprofundando a tendência introduzida

pela Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, que diminuiu de 30 para 20 dias a base de cálculo das compensações

pela cessação dos contratos de trabalho para quase todas as modalidades de cessação, exceto os

despedimentos ilícitos. A partir de 1 de outubro de 2013, as compensações decorrentes da caducidade dos

contratos a termo e trabalho temporário, da denúncia, da revogação (acordo mútuo), da resolução do contrato

com justa causa pelo trabalhador e do despedimento, nas suas várias modalidades, passou a ter uma base de

cálculo das compensações de 20 dias para 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano de trabalho.

Não é demais recordar que, numa relação laboral, o trabalhador se encontra juridicamente subordinado ao

empregador e, na maior parte dos casos, economicamente dependente dos rendimentos do trabalho para

satisfazer as suas necessidades mais elementares (bem como as do respetivo agregado familiar). A fragilidade

do trabalhador despedido resulta, como é óbvio, exponencialmente acrescida e dela decorre a importância desta

compensação pecuniária ao trabalhador. Com efeito, um trabalhador que foi despedido, isto é, que perdeu

involuntariamente o seu emprego em virtude de uma decisão extintiva unilateral da entidade empregadora, é

um cidadão que perdeu o seu principal, por vezes único, meio de sustento. A diminuição do valor das

compensações agrava enormemente a fragilidade da situação em que este trabalhador se encontra. Ao

embaratecer os despedimentos, facilita também esse tipo de práticas por parte das empresas.

Desde março de 2020 que Portugal assiste a milhares de despedimentos e de cessações de contratos

precários. A crise pandémica que atravessamos é também uma crise económica e social que exige medidas

capazes de assegurar às famílias que o rendimento proveniente do seu trabalho – muitas das vezes o único que

assegura as necessidades do agregado – será protegido e o seu emprego garantido. A manutenção das

alterações legislativas introduzidas no período da troika – como o embaratecimento dos despedimentos – são o

paradoxo da proteção do emprego e da garantia de direitos aos trabalhadores.

Por isso mesmo, importa repor os valores devidos aos trabalhadores como compensação da cessação do

contrato de trabalho, valores esses que foram reduzidos para menos de metade, recuperando-se a fórmula de

cálculo adotada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e o objetivo fundamental da compensação: ressarcir o

trabalhador/a pelos danos resultantes da perda de emprego.

As recentes alterações introduzidas ao Código do Trabalho, designadamente as que resultaram da Lei n.º

93/2019, de 4 de setembro não reverteram estas regras gravosas para os trabalhadores, regras estas que, à

data, foram inclusivamente encaradas como circunstanciais e transitórias, sendo certo que o único impacto foi

o de fragilizar a posição dos trabalhadores numa relação marcadamente desigual.

Neste sentido, o Bloco de Esquerda apresenta o presente projeto de lei com o objetivo de intervir numa

matéria essencial que resultou das alterações legislativas realizadas no período da troika operando, assim, uma

repristinação do regime legal da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e repondo o valor da compensação em caso

de cessação por contrato de trabalho que não resulte de despedimento ilícito em um mês de retribuição base e

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diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à reposição dos 30 dias de retribuição base e diuturnidades, para efeitos de cálculo

da compensação por cessação de contrato de trabalho que não resulte de despedimento ilícito.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

O artigo 366.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e alterado pelas Leis

n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de 29 de

agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de abril,

120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto, 14/2018,

de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, 8 de abril, passa a ter a

seguinte redação:

«Artigo 366.º

[…]

1 – Em caso de despedimento coletivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a um mês

de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.

2 – Em caso de fração de ano, a compensação é calculada proporcionalmente.

3 – A compensação não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.

4 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 1 ou 2.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

1 – A presente Lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.

2 – Este regime é aplicável a todos os contratos cuja cessação ocorra após a entrada em vigor da presente

lei.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa —

Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua

— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso —; Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

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PROJETO DE LEI N.º 959/XIV/3.ª

RECONHECE O DIREITO A 25 DIAS DE FÉRIAS NO SETOR PRIVADO (VIGÉSIMA PRIMEIRA

ALTERAÇÃO AO À LEI N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO)

Exposição de motivos

O direito a férias está consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea d), da Constituição da República Portuguesa,

na sua dimensão de direito ao repouso e ao lazer, e nos artigos 237.º e seguintes do Código do Trabalho.

O desiderato do direito a férias, conforme aliás resulta da letra da lei, é o de proporcionar ao trabalhador a

recuperação física e psíquica, bem como condições de disponibilidade pessoal, integração na vida familiar e

participação social e cultural, pelo que, e de forma a cumprir esse objetivo fundamental, é um direito

irrenunciável.

O direito a férias adquire-se no momento da celebração do contrato e o trabalhador tem direito a um período

de férias retribuídas em cada ano civil. As férias vencem-se no dia 1 de janeiro de cada ano civil e reportam-se,

em regra, ao trabalho prestado no ano anterior.

Por força das alterações introduzidas ao Código do Trabalho de 2009 pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho,

o período de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis. Na versão do código de 2003, mantida pela Lei n.º

7/2009, de 12 de fevereiro, foi revogado o preceito que previa a majoração das férias em função da assiduidade.

O artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, estabelecia ainda a exclusão da majoração de dias de

férias previstas em instrumento de regulamentação coletiva. Esta norma foi declarada inconstitucional pelo

Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 602/2013, por violação do princípio da reserva constitucional de

contratação coletiva, bem como dos princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade. Assim sendo,

mantém-se a possibilidade de aplicação da referida majoração sempre que a mesma se aplique a trabalhadores

abrangidos por instrumento de regulamentação coletiva que a preveja.

Em suma, atualmente e independentemente da efetividade do serviço ou assiduidade e do momento em que

o trabalhador tenha sido contratado no dia 1 de janeiro do ano seguinte vencem-se 22 dias de férias.

Na Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, na linha do memorando de entendimento com a troika, a lógica

conservadora e ultrapassada era a de alongar os tempos de trabalho com vista a alcançar um aumento da

produtividade. É precisamente com esse espírito que se introduz a eliminação do regime de majoração do

período de férias em função da assiduidade do trabalhador, criado pelo código de 2003 e mantido na revisão de

2009 que firmavam uma estratégia, também ela pouco falaciosa, de combate ao absentismo. Assim, também

não podemos concordar com essa opção. Na redação do código de 2003 a duração do período de férias era

aumentada no caso de o trabalhador não ter faltado ou na eventualidade de ter apenas faltas justificadas, no

ano a que as férias se reportam, nos seguintes termos:

a) Três dias de férias até ao máximo de uma falta ou dois meios dias;

b) Dois dias de férias até ao máximo de duas faltas ou quatro meios dias;

c) Um dia de férias até ao máximo de três faltas ou seis meios dias.

Ora, esta redação deu origem a várias interpretações abusivas que se consubstanciavam na restrição do

acesso à majoração do direito a férias, por parte de trabalhadores e trabalhadoras mesmo quando estes se

limitavam a exercer os seus direitos. A título de exemplo, uma situação que foi denunciada por organizações

sindicais em que o exercício do direito de reunião no local de trabalho foi considerado pelas entidades

empregadoras, indevidamente, como falta.

Das recentes alterações introduzidas ao Código do Trabalho, designadamente as que resultaram da Lei n.º

93/2019, de 4 de setembro, não resultaram alterações nesta matéria.

Note-se que falamos de faltas justificadas, faltas essas que têm um regime próprio e cujos critérios estão

elencados no Código do Trabalho de forma clara, sendo que apenas são consideradas faltas justificadas aquelas

que sejam admitidas pela lei ou autorizadas pelo empregador e que, determinam, em várias situações, a

consequente perda de retribuição o que, naturalmente, penaliza o trabalhador. O regime das faltas injustificadas,

já de si gravoso, não releva para aqui, tanto mais que as faltas injustificadas podem consubstanciar justa causa

de despedimento, em virtude da violação do dever de assiduidade.

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Assim, a majoração, subordinada às faltas justificadas para efeitos da sua atribuição, implica aceitar que, por

exemplo, um trabalhador assíduo, que faltasse por motivo de falecimento do seu cônjuge, durante 5 dias,

conforme a lei prevê, fosse penalizado face a outro trabalhador que, felizmente, não se viu confrontado com

esta situação dramática.

Por outro lado, os estudos académicos e os dados estatísticos que têm vindo a ser divulgados nos últimos

anos comprovam que o maior absentismo laboral é feminino e tem na sua base a maternidade e o custo social

que representa para as mulheres, fortemente penalizadas no acesso ao trabalho, salarialmente e também por

soluções legislativas que desvalorizam esta realidade, atropelando o direito constitucional à família e à proteção

da paternidade e da maternidade.

A majoração das férias é uma opção errada que não serve os interesses dos trabalhadores, não garante

qualquer aumento da produtividade e apresenta-se como uma solução injusta e discriminatória.

A consagração dos 25 dias úteis de férias no setor privado, sem subordinação a quaisquer critérios, como o

da assiduidade, que tornem este direito disforme e discriminatório apresenta-se como uma solução de elementar

justiça. Trabalhadores restabelecidos física e psicologicamente, produzem mais e produzem melhor. É tempo

de abandonar paradigmas ultrapassados e modelos que assentam numa lógica de degradação das relações

laborais e que não são próprios de um País que se quer desenvolvido. O aumento do tempo de trabalho em

nada contribui para um mercado de trabalho que se pretende que ofereça condições laborais dignas no quadro

de uma economia competitiva e voltada para o futuro.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei visa reconhecer o direito a 25 dias úteis de férias.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

O artigo 238.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e alterado pelas Leis

n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de 29 de

agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de abril,

120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto, 14/2018,

de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de abril, passa a ter a

seguinte redação:

«Artigo 238.º

1 – O período anual de férias tem a duração mínima de 25 dias úteis.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no prazo de 30 dias após a sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

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As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa; —

Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua

— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro —Maria Manuel Rola —

Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

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PROJETO DE LEI N.º 960/XIV/3.ª

REFORÇA A NEGOCIAÇÃO COLETIVA, O RESPEITO PELA FILIAÇÃO SINDICAL E REPÕE O

PRINCÍPIO DO TRATAMENTO MAIS FAVORÁVEL AO TRABALHADOR (VIGÉSIMA PRIMEIRA

ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO, APROVADO PELA LEI N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO)

Exposição de motivos

O esvaziamento da contratação coletiva é um ataque à democracia. Sem negociação coletiva, os

trabalhadores são colocados numa relação de total fragilidade em relação aos empregadores. Ora, o atual

Código do Trabalho favorece escandalosamente a parte mais forte na relação laboral, nomeadamente no que à

contratação coletiva diz respeito.

Em 2011 havia mais de 1 milhão e 200 mil trabalhadores abrangidos por convenções coletivas de trabalho.

Em 2014, passaram a ser menos de 250 mil. Como foi possível? Entre outras coisas, porque a lei, ao contrário

do que sucedia no passado, permite que as convenções coletivas caduquem por decisão unilateral e que lhes

suceda o vazio. Esta instituição de um processo mais rápido e fácil para as entidades patronais determinarem a

caducidade das convenções coletivas, bem como as alterações feitas em 2012 às regras das portarias de

extensão, desequilibraram profundamente as relações laborais, instituíram uma dinâmica de chantagem nas

negociações, contribuíram para degradar o conteúdo das novas convenções e limitaram o número de

trabalhadores protegidos pela contratação coletiva.

Em 2008, havia 1 milhão 825 mil trabalhadores abrangidos pela contratação coletiva. Em 2014, passaram a

ser menos de 250 mil. Em 2019, o número subiu para 900 mil – uma melhoria importante, mas longe, ainda

assim, dos números anteriores à crise e às políticas de austeridade. Contudo, a proporção de contratos a prazo,

por exemplo, mantém-se no essencial. Além disso, apesar do aumento do número de convenções publicadas

em 2017 – cerca de 208 convenções coletivas com uma cobertura potencial superior a 820 mil trabalhadores –

o acréscimo mais significado verificou-se ao nível dos acordos de empresa, sendo certo que o volume de

trabalhadores abrangidos, segundo resulta dos dados da Direção-Geral de Emprego e das Relações de

Trabalho (DGERT) e do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS), está longe dos

cerca de dois milhões anuais que se chegou a atingir. Por outro lado, não está afastado o risco de uma

degradação dos conteúdos de convenções negociadas em condições de profundo desequilíbrio, além de que a

tendência de diminuição da cobertura de trabalhadores por convenções vigentes, com algumas oscilações,

merece preocupação, sobretudo atento o aumento da publicação de portarias de extensão, em particular em

2017.

Na ausência de contratação coletiva, os novos trabalhadores contratados posteriormente ficam abrangidos

pelo contrato individual de trabalho. Ora, nos termos do n.º 8 do artigo 501.º, após a caducidade e até à entrada

em vigor de outra convenção ou decisão arbitral, mantêm-se os efeitos acordados pelas partes ou, na sua falta,

os já produzidos pela convenção nos contratos individuais de trabalho em algumas matérias como a retribuição,

a duração do tempo de trabalho, a categoria profissional e respetiva definição. No entanto, a convenção coletiva

de trabalho não é constitucionalmente desenhada para ser funcionalizada em ordem a ser incorporada nos

contratos individuais.

É necessário tomar medidas urgentes tendentes ao reequilíbrio do Código do Trabalho que passam por

reinscrever o princípio do tratamento mais favorável na sua plenitude e pela revitalização da contratação coletiva.

O próprio Governo reconheceu, em sede de Comissão Permanente de Concertação Social, que a lei é tão

desequilibrada que propôs que se acordasse uma moratória para a utilização da figura da caducidade para evitar

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que fosse utilizada de forma abusiva pelas entidades patronais. Decorre da argumentação do Governo que

a consequência a tirar dessa proposta é que a lei não tem de ser apenas suspensa, mas alterada. No entanto,

as sucessivas iniciativas legislativas apresentadas pelo Bloco de Esquerda sobre o tema foram rejeitadas

pelo Governo com o apoio da direita.

Importa clarificar que este abuso não é apenas resultado de uma prática errada: é autorizado pela lei.

Com efeito, a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprovou o Código do Trabalho de 2009, já tinha

consubstanciado um retrocesso nos direitos laborais. As alterações introduzidas pela Lei n.º 23/2012, de 25

de junho, agudizaram violentamente esse processo. Um dos principais alvos deste ataque a direitos

fundamentais, consagrados na Constituição da República Portuguesa, foi justamente o direito à contratação

coletiva, plasmado no artigo 56.º. É de salientar que o Acórdão n.º 602/2013 do Tribunal Constitucional veio

declarar a inconstitucionalidade de várias normas da Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, por as considerar

violadoras daquele direito fundamental.

O decaimento do princípio da vigência da convenção até à sua substituição, bem como do princípio da

não ingerência do Estado e do poder político na autonomia coletiva e da contratação laboral assumiu uma

especial expressão com o regime transitório de sobrevigência e caducidade de convenção coletiva,

contemplado no artigo 10.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. O n.º 2 do artigo 10.º fez operar, à data da

sua entrada em vigor, ainda que de forma condicionada, isto é, verificados determinados factos, a caducidade

de convenções coletivas.

O memorando da troika e o acordo da Comissão Permanente de Concertação Social, que mereceu forte

oposição da CGTP, vieram acentuar a desigualdade própria das relações laborais, esvaziar o poder negocial

dos sindicatos e congelar a publicação de portarias de extensão, contribuindo para a individualização das

relações laborais. Posteriormente ao memorando, e sempre no mesmo sentido, foi apresentado um conjunto

de iniciativas legislativas: A Resolução Conselho de Ministros n.º 90/2012, de 31 de outubro; e a Resolução

Conselho de Ministros n.º 43/2014, de 27 de junho, e a Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto. Aquelas duas

resoluções, cujas consequências foram graves e cuja constitucionalidade era duvidosa, foram, entretanto,

revogadas no verão de 2017.

Por seu turno, a Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, veio estabelecer duas outras regras. Primeiro,

estabeleceu a caducidade, decorridos três anos (onde anteriormente eram cinco), da cláusula de convenção

que faça depender a cessação de vigência desta pela substituição por outro IRCT. No caso de denúncia,

estabeleceu a manutenção da convenção em regime de sobrevigência durante o período de negociação,

num mínimo de 12 meses. A interrupção da negociação por um período superior a 30 dias implica a

suspensão do prazo de sobrevigência. O período de negociação, com suspensão, não pode exceder os 18

meses. Segundo, determinou que a convenção coletiva, ou parte desta, pode ser suspensa temporariamente,

por acordo escrito entre as associações de empregadores e sindicais, na observância das seguintes

situações: crise empresarial por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras

ocorrências com impacto na atividade normal da empresa.

O resultado da conjugação destes instrumentos foi minar uma das traves mestras das relações de

trabalho: a confiança entre as partes. Consequentemente, assistiu-se à diminuição das atualizações das

convenções, à degradação do sistema de relações de trabalho e ao ataque direto aos sindicatos, a quem a

Constituição atribui o exclusivo direito de contratação coletiva.

As alterações sucessivas ao Código do Trabalho nos últimos anos colocaram em causa a dimensão

individual e coletiva dos direitos dos trabalhadores, configurando alterações paradigmáticas de sentido muito

negativo ao regime laboral em Portugal. Com efeito, reconduzir os direitos coletivos para a esfera individual,

ficcionando, de uma forma artificial e falaciosa, a paridade entre trabalhadores e empregadores opera uma

transfiguração que fragiliza ainda mais a posição do trabalhador que ocupa o lugar de parte mais débil no

seio da relação laboral.

O legislador português colocou, de facto, em crise o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador,

que se assume como um princípio essencial com vista a assegurar um maior equilíbrio no quadro das

relações laborais.

O princípio do tratamento mais favorável do trabalhador, enquanto forma de determinar a norma

concretamente aplicável, permite a escolha, de entre várias normas aptas a regular uma relação laboral,

daquela que fixe condições mais favoráveis ao trabalhador, ainda que se trate de uma norma de hierarquia

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inferior. Ora, este princípio tem sido delapidado em nome de uma alegada necessidade de flexibilização das

relações laborais, o que tem contribuído para uma fragilização das garantias dos trabalhadores.

Na nossa doutrina, o designado princípio do favor laboratoris tinha assento no artigo 13.º da Lei do Contrato

de Trabalho (LCT), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de novembro de 1969, conjugado com o artigo

6.º, n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei n.º 519-C1/79. Deste princípio decorria que, a menos que se estivesse perante

normas imperativas absolutas, isto é, de que resultasse uma proibição de derrogação por fonte inferior ou, no

caso de normas supletivas ou dispositivas, em que houvesse a permissão de afastamento independentemente

de maior ou menor favorabilidade, seria possível através de instrumento de regulamentação coletiva (com

exceção da portaria de condições de trabalho) estabelecer regime diferente do legal desde que mais favorável

ao trabalhador.

Este princípio, norteador da aplicação das normas laborais, é considerado como basilar no direito do trabalho,

sendo vital no reequilíbrio das posições dos sujeitos do contrato de trabalho, desenvolvendo-se como critério de

prevalência na aplicação de normas, tendo-se autonomizado como um «princípio de norma mínima», isto é,

como forma de garantir normas mínimas de tutela do trabalhador.

Nas palavras de Jorge Leite, a norma típica do ordenamento jus laboral era constituída «por uma regra

jurídica explícita impositiva e por uma regra jurídica implícita permissiva, vedando aquela qualquer redução dos

mínimos legalmente garantidos e facultando esta a fixação de melhores condições de trabalho…». Foi

exatamente essa norma que o Código do Trabalho, na Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, veio subverter,

ignorando a evolução do direito do trabalho ao longo do século XX, bem como a matriz constitucional que entre

nós consagra essa mesma evolução.

Com o Código do Trabalho de 2003, exceto no caso das normas imperativas, passou a vigorar a regra de

que os preceitos legais poderiam ser afastados por instrumentos de regulamentação coletiva quer em sentido

mais favorável, quer em sentido menos favorável ao trabalhador. Tal alteração, constante do artigo 4.º, n.º 1 do

CT, suscitou, na doutrina, muitas dúvidas quanto à sua constitucionalidade.

Ora, o n.º 3 da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, não recuperou o princípio do tratamento mais favorável e,

nesse sentido, em coerência, mudou-se a epígrafe para «Relações entre fontes de regulação». O n.º 3 do artigo

3.º limita-se a indicar, expressamente, um elenco de normas laborais semi-imperativas conforme já acontecia,

em relação a algumas delas, no código de 2003. Assim sendo, a necessidade de recuperar o princípio do

tratamento mais favorável, na aceção da revogada LCT, mantém-se.

Por último, o princípio da filiação, resultante da aceção do artigo 496.º do CT é uma projeção da autonomia

coletiva, em sede de contratação coletiva, ainda que a regra base da filiação comporte exceções ou distorções,

nomeadamente por via das portarias de extensão, mas também em resultado da aplicação do artigo 497.º do

CT. O artigo em apreço relativo à escolha da convenção aplicável determina que caso sejam aplicáveis, no

âmbito de uma empresa, uma ou mais convenções coletivas ou decisões arbitrais, o trabalhador que não seja

filiado em qualquer associação sindical pode escolher qual daqueles instrumentos lhe passe a ser aplicável

Esta norma revela-se, na prática, como uma norma antissindical, desincentivando a filiação sindical, ao

permitir a aplicação do regime de uma convenção coletiva quer a filiados quer a não filiados. Este desvirtuamento

do princípio da filiação deve ser expurgado do Código do Trabalho.

A crise sanitária provocada pela COVID-19 veio reforçar o que tem sido sucessivamente proposto e defendido

pelo Bloco de Esquerda, nas várias sessões legislativas, e que tem sido chumbado pelo Governo com o apoio

da direita: A urgência no reequilíbrio da lei do trabalho. A pandemia agudizou as relações de trabalho e, numa

relação de si já tão desigual, foi possível colocar os trabalhadores numa situação pior do que aquela em que se

encontravam, porque mais precários e com horários mais desfasados. Se o alargamento do período

experimental – ainda que parcialmente inconstitucional – contribuiu para esse efeito, o mesmo aconteceu com

a previsão da caducidade das convenções coletivas por decisão unilateral.

Equilibrar a lei do trabalho é uma condição fundamental de justiça social na própria resposta à crise e no tipo

de emprego e de País que nós queremos ter.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

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Artigo 1.º

Objeto

Altera o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado pela Lei n.º

105/2009, de 14 de setembro, pela Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho,

pela Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, pela Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, pela Lei n.º 27/2014, de 8 de

maio, pela Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, pela Lei n.º 28/2015, de 14 de abril, pela Lei n.º 120/2015, de 1

de setembro, pela Lei n.º 8/2016, de 1 de abril, pela Lei n.º 28/2016, de 23 de agosto, pela Lei n.º 73/2017,

de16 de agosto, Lei n.º 14/2018, de 19 de março, pela Lei n.º 90/2019, de 4 de setembro, pela Lei n.º 93/2019,

de 4 de setembro, e pela Lei n.º 18/2021, de 8 de abril, impedindo a caducidade das convenções coletivas e

procedendo à revogação da Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

Os artigos 3.º, 139.º, 476.º, 478.º, 482.º, 483.º, 486.º, 491.º a 493.º, 498.º a 502.º e 505.º do Código do

Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 3.º

[…]

As fontes de direito superiores prevalecem sobre fontes inferiores, salvo na parte em que estas, sem

oposição daquelas, estabeleçam tratamento mais favorável para o trabalhador.

Artigo 139.º

[…]

O regime do contrato de trabalho a termo resolutivo, constante da presente subsecção, pode ser afastado

por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho de sentido mais favorável ao trabalhador.

Artigo 476.º

[…]

1 – Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho não podem implicar para o trabalhador

tratamento menos favorável do que o estipulado por lei.

2 – As condições de trabalho fixadas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho só podem

ser substituídas por nova convenção coletiva de trabalho ou decisão arbitral com caráter globalmente mais

favorável reconhecido pelos seus subscritores.

3 – As disposições dos instrumentos de regulamentação coletiva só podem ser afastadas por contrato de

trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador.

Artigo 478.º

[…]

1 – Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho não podem:

a) Limitar o exercício dos direitos fundamentais constitucionalmente garantidos;

b) Contrariar as normas imperativas;

c) Incluir qualquer disposição que importe para os trabalhadores tratamento menos favorável do que o

estabelecido por lei;

d) Estabelecer regulamentação das atividades económicas, nomeadamente no tocante aos períodos de

funcionamento das empresas, ao regime fiscal e à formação dos preços e exercício da atividade de empresas

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de trabalho temporário, incluindo o contrato de utilização;

e) Conferir eficácia retroativa a qualquer das suas cláusulas, salvo tratando-se de cláusulas de natureza

pecuniária de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho negocial.

2 – […].

Artigo 482.º

[…]

1 – Sempre que numa empresa se verifique concorrência de instrumentos de regulamentação coletiva, serão

observados os seguintes critérios de prevalência:

a) Sendo um dos instrumentos concorrentes um acordo coletivo ou um acordo de empresa será esse o

aplicável;

b) Em todos os casos não contemplados na alínea a), prevalecerá o instrumento que for considerado, no seu

conjunto, mais favorável pelo sindicato representativo do maior número dos trabalhadores em relação aos quais

se verifica a concorrência desses instrumentos.

2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, o sindicato competente deverá comunicar por escrito

à entidade patronal interessada e à Autoridade para as Condições de Trabalho, no prazo de trinta dias a contar

da entrada em vigor do último dos instrumentos concorrentes, qual o que considera mais favorável.

3 – Caso a faculdade prevista no número anterior não seja exercida pelo sindicato respetivo no prazo

consignado, tal faculdade defere-se aos trabalhadores da empresa em relação aos quais se verifique

concorrência, que, no prazo de trinta dias, devem, por maioria, escolher o instrumento mais favorável.

4 – A declaração e a deliberação previstas no n.º 2 são irrevogáveis até ao termo da vigência do instrumento

por eles adotado.

5 – Na ausência de escolha, quer pelos sindicatos quer pelos trabalhadores, será aplicável o instrumento de

publicação mais recente.

6 – No caso de os instrumentos concorrentes terem sido publicados na mesma data, aplica-se o que regular

a principal atividade da empresa.

Artigo 483.º

[…]

1 – Sempre que existir concorrência entre instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho de natureza

não negocial, a portaria de extensão afasta a aplicação da portaria de condições de trabalho.

2 – Em caso de concorrência entre portarias de extensão, aplica-se o que contiver um tratamento mais

favorável ao trabalhador.

Artigo 486.º

[…]

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) (Revogado.)

3 – A proposta deve ser apresentada na data da denúncia da convenção em vigor, sob pena de esta não ter

validade.

4 – Das propostas, bem como da documentação que deve acompanhá-las, nomeadamente, a

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fundamentação económica, são enviadas cópias ao Ministério que tutela a área laboral.

Artigo 491.º

[…]

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […].

3 – (Revogado.)

4 – (Revogado.)

Artigo 492.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […].

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […].

h) (Revogado.)

3 – […].

4 – […].

Artigo 493.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – A pedido da comissão, pode participar nas reuniões, sem direito a voto, um representante do ministério

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que tutela a área laboral.

Artigo 498.º

[…]

1 – Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte

de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, o instrumento de regulamentação

coletiva de trabalho que vincula o transmitente é aplicável ao adquirente, salvo se, entretanto, outro instrumento

de regulamentação coletiva de trabalho negocial passar a aplicar-se ao adquirente.

2 – […].

Artigo 499.º

[…]

1 – A convenção coletiva vigora pelo prazo que delas constar expressamente.

2 – A convenção coletiva mantém-se em vigor enquanto não forem substituídas por outro instrumento de

regulamentação coletiva.

Artigo 500.º

[…]

1 – A convenção coletiva pode ser denunciada, no todo ou em parte, por qualquer das entidades que a

subscreveram, mediante comunicação escrita dirigida à outra parte, desde que seja acompanhada de uma

proposta negocial.

2 – As convenções coletivas não podem ser denunciadas antes de decorridos dez meses após a data da sua

entrada em vigor.

3 – A denúncia pode ser feita a todo o tempo quando:

a) As partes outorgantes acordem no princípio da celebração da convenção substitutiva, em caso de cessão

total ou parcial, de uma empresa ou estabelecimento;

b) As partes outorgantes acordem na negociação simultânea da redução da duração e da adaptação da

organização do tempo de trabalho.

Artigo 501.º

[…]

Decorrido o prazo de vigência, e desde que o preveja expressamente, a convenção renova-se

sucessivamente por iguais períodos.

Artigo 502.º

[…]

1 – A convenção coletiva apenas pode cessar mediante revogação por acordo das partes.

2 – Aplicam-se à revogação as regras referentes ao depósito e à publicação de convenção coletiva.

3 – A revogação prejudica os direitos decorrentes da convenção, salvo se na mesma forem expressamente

ressalvados pelas partes.

4 – O serviço competente do ministério responsável pela área laboral procede à publicação no Boletim do

Trabalho e Emprego de aviso sobre a data da cessação da vigência de convenção coletiva, nos termos do artigo

anterior.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

28

Artigo 505.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – A decisão arbitral produz os efeitos da convenção coletiva, vigora pelo prazo que dela constar

expressamente e mantêm-se em vigor enquanto não for substituída por outro instrumento de regulamentação

coletiva.

4 – […].»

Artigo 3.º

Norma revogatória

1 – São revogados os artigos 5.º, 10.º, 497.º, 501.º-A e 508.º a 513.º do Código do Trabalho, aprovado

pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

2 – São revogados a alínea c) do n.º 2, do artigo 486.º, os n.os 3 e 4 do artigo 491.º, a alínea h) do n.º 2

do artigo 492.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

3 – É revogada a Lei n.º 55/2014 de 25 de agosto.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.

Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa

— Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana

Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria

Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

———

PROJETO DE LEI N.º 961/XIV/3.ª

AGRAVAMENTO DAS MOLDURAS PENAIS PRIVATIVAS DE LIBERDADE PARA AS CONDUTAS QUE

CONFIGUREM OS CRIMES DE ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS, ABUSO SEXUAL DE MENORES

DEPENDENTES E ATOS SEXUAIS COM ADOLESCENTES

Exposição de motivos

O Estado de direito democrático, mormente pelos avanços iluministas progressivamente alcançados no

términus dos grandes conflitos armados, passou a assentar os seus valores identitários em princípios até então

grosseira e reiteradamente violados, os denominados direitos, liberdades e garantias, onde encontramos entre

outros, o direito à vida, à integridade física, à autodeterminação sexual, à liberdade e à segurança.

Na verdade, e ainda que a multidisciplinaridade dos tempos modernos apresente às sociedades atuais, aos

governantes e ao próprio Direito, uma vasta panóplia de novas condutas criminais que a todos exige uma

redobrada atenção a fenómenos outrora diminutos, não pode ainda assim o legislador negligenciar os princípios

supramencionados que ilustram os seus valores fundadores.

Fazê-lo é negligenciar, no seu âmago e equilíbrio, toda a unidade da ordem jurídica e inclusivamente o bem

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1 DE OUTUBRO DE 2021

29

jurídico da paz pública.

Nos últimos anos, não porque outrora não existissem, mas porque da sua existência se tinha

indubitavelmente menos conhecimento, acentuou-se a preocupação e a necessidade de reflexão sobre a

criminalidade exercida sobre crianças e menores, destacando-se dentro desta os crimes de natureza sexual.

Nesta matéria, muito acentuado tem sido o debate sobre a eficácia do quadro legislativo vigente em prevenir

e responder aos casos de abuso sexual de menores existentes, e evitar que os mesmos ou outros similares se

continuem a verificar um pouco por todo o mundo, debate a que Portugal não ficou, como de resto nunca poderia

ficar, indiferente.

Considera-se hoje inequívoco que, por muitos avanços que se tenham feito no combate à mesma, todas as

alterações que foram preceituadas para reforçar a tutela das crianças ou adolescentes vítimas de crimes

sexuais, bem como para reforçar a luta e o combate à pedofilia, continuam ainda muito aquém do necessário, o

que é facilmente comprovável pelos números avassaladores deste tipo de criminalidade que todos os anos são

conhecidos na União Europeia.

Desta forma, a pedofilia, transtorno que é sempre encarado num prisma patológico, e que por isso tem sido

preferencialmente enfrentado e combatido com programas assentes em pretensos planos de prevenção,

acompanhamento e recuperação do agente criminoso, olvida no entanto que por muito que os mesmos sejam

movidos pelas melhores intenções e crenças de recuperação médica e ressocialização social, os índices de

reincidência da conduta criminal em causa, muitas vezes pelo mesmo agente criminoso punido e julgado, são

absolutamente inaceitáveis.

Com este projeto de lei, vem o Chega, no cumprimento de uma das suas promessas eleitorais, defender a

agravação das molduras penais previstas para quem abuse sexualmente de crianças.

Não obstante a complexidade que se admite estar ligada a este fenómeno, o debate desta matéria deve

primeiramente procurar responder a uma interpelação legítima que se deve dirigir ao legislador sobre se as

soluções hoje existentes para estas condutas criminais, em grande medida assentes em penas privativas de

liberdade, muitas vezes de duração ridiculamente curta para a gravidade da conduta punida, serão suficientes

para sanar o dano causado à vítima, ressocializar o agente criminoso, e acautelar que não mais por si ou por

qualquer outro, a mesma volte a ser cometida, na mesma ou em vítima distinta.

As posições maioritárias parecem querer apontar a pedofilia como integrante de um domínio patológico,

corrente doutrinária que encontra até sustento pelas considerações do Código Internacional de Doenças, que

coloca a pedofilia na esfera das graves patologias, encarando-a como uma parafilia caracterizada pela

incapacidade do controlo do agente criminoso sob os seus impulsos sexuais compulsivos1.

Daqui resulta desde logo, que sendo encarada a pedofilia como uma doença, então, nesse caso, de entre as

três primordiais funções que estão sempre adstritas à punibilidade criminal, não se compreendem cumpridas as

funções de prevenção e de ressocialização, na medida em que a mera aplicação de penas privativas de

liberdade, como supra se mencionou na esmagadora maioria das vezes demasiado curta para a conduta em

causa, não garante as funções preventiva e ressocializante do agente criminoso.

Face à Constituição da República Portuguesa e ao quadro legal atualmente em vigor, o Chega entende que,

não obstante a necessidade imperiosa de realização da justiça e de prevenção – geral e especial – o horizonte

da reabilitação e da reinserção social dos criminosos tem de se manter sempre vivo e preponderante.

Ora, por todos os considerandos que acima viemos expondo, considera o Chega que já é hora de serem

tomadas as medidas necessárias, com a coragem que se deve exigir a quem governa, para que as nossas

crianças estejam de uma vez por todas protegidas do flagelo nocivo da criminalidade sexual contra elas dirigida.

O aumento das molduras penais aplicáveis não resolverá, por si só, os problemas da criminalidade sexual contra

menores. Mas é um passo dado no sentido de aumentar os níveis de eficácia na prevenção e punição deste

sombrio fenómeno que deixa marcas indeléveis e vitalícias nas suas vítimas e nos responsabiliza a todos pela

proteção das nossas crianças.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Chega, abaixo assinado,

apresenta o seguinte projeto de lei:

1 Ver neste sentido o CID, código internacional de doenças, publicado pela Organização Mundial de Saúde. Disponível em

http://www.who.int/classifications/icd/en/ (Acesso em 25 de novembro de 2019)

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à quinquagésima alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82,

de 23 de setembro, delimitando e integrando à codificação vigente o agravamento das penas de prisão previstas

para as condutas supramencionadas e as que configurem atos sexuais com adolescentes.

Artigo 2.º

Alterações ao Código Penal

Os artigos 171.º, 172.º e 173.º do Código Penal, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 171.º

Abuso sexual de crianças

1 – Quem praticar ato sexual de relevo com ou em menor de 14 anos, ou o levar a praticar com outra pessoa,

é punido com pena de prisão de dois a dez anos.

2 – Se o ato sexual de relevo consistir em cópula, coito anal, coito oral ou introdução vaginal ou anal de

partes do corpo ou objetos, o agente é punido com pena de prisão de cinco a doze anos.

3 – Quem:

a) Importunar menor de 14 anos, praticando ato previsto no artigo 170.º; ou

b) Atuar sobre menor de 14 anos, por meio de conversa, escrito, espetáculo ou objeto pornográficos;

c) Aliciar menor de 14 anos a assistir a abusos sexuais ou a atividades sexuais;

é punido com pena de prisão até cinco anos.

4 – Quem praticar os atos descritos no número anterior com intenção lucrativa é punido com pena de prisão

de dois a cinco anos.

5 – A tentativa é punível.

Artigo 172.º

Abuso sexual de menores dependentes

1 – Quem praticar ato descrito nos n.os 1 ou 2 do artigo anterior, relativamente a menor de 14 anos que lhe

tenha sido confiado para educação ou assistência, é punido com pena de prisão de dois a doze anos.

2 – Quem praticar ato descrito nas alíneas do n.º 6 do artigo anterior, relativamente a menor compreendido

no número anterior deste artigo e nas condições aí descritas, é punido com pena de prisão até oito anos.

3 – Quem praticar os atos descritos no número anterior com intenção lucrativa é punido com pena de prisão

até dez anos.

4 – A tentativa é punível.

Artigo 173.º

Atos sexuais com adolescentes

1 – Quem, sendo maior, praticar ato sexual de relevo com menor entre 14 e 16 anos, ou levar a que ele seja

praticado por este, com outrem, abusando da sua inexperiência, é punido com pena de prisão até três anos.

2 – Se o ato sexual de relevo consistir em cópula, coito oral, coito anal ou introdução vaginal ou anal de

partes do corpo ou objetos, o agente é punido com pena de prisão até cinco anos.

3 – A tentativa é punível.»

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Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

O Deputado do CH, Diogo Pacheco de Amorim.

———

PROJETO DE LEI N.º 962/XIV/3.ª

ALTERA O CÓDIGO PENAL NO SEU ARTIGO 164.º (VIOLAÇÃO) AGRAVANDO AS MOLDURAS

PENAIS APLICÁVEIS AOS SUJEITOS QUE PREENCHAM OS REQUISITOS DESTA CONDUTA

CRIMINOSA, PASSANDO A CONSIDERAR OS CRIMES CONTRA A LIBERDADE E

AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL COMO CRIMES DE NATUREZA PÚBLICA

Exposição de motivos

A criminalidade sexual não tem tido o devido tratamento jurídico-penal em Portugal, na nossa perspetiva.

Desde a proteção das vítimas à punição dos agressores, passando pela reparação da respetiva danosidade

social e individual do ilícito, regime repressivo dos crimes sexuais ainda tem um longo caminho para percorrer

no ordenamento jurídico português.

Segundo os dados disponíveis, os crimes de violação e abuso sexual de menores têm considerável

expressão entre 2013 e 2018, registando-se um aumento de cerca de 130% na sua ocorrência.

Há, no entanto, duas dimensões que merecem correção no curto prazo, atendendo ao seu impacto na vida

pública, à proteção das vítimas e à dissuasão da prática do crime: transformar o crime de violação em crime

público e alinhar, de forma mais equilibrada, as penas máximas possíveis para este tipo de crime com os

ordenamentos jurídicos mais próximos do nosso, nomeadamente Espanha e França.

São estes os principais objetivos deste projeto de lei, atendendo à necessidade de promover, com

considerável impacto social, mecanismos de dissuasão do crime e reforçar a proteção pública das vítimas.

Não se ignora, de forma alguma, as pertinentes e sérias questões em torno da natureza pública do crime de

violação colocada por eminentes penalistas e constitucionalistas. Assume particular importância o direito das

vítimas à reserva da sua vida privada e o impacto social que a participação na justiça pode ter nas suas vidas

pessoal e familiares. São aspetos que devem, naturalmente, ser tidos em conta.

É nosso entendimento que o bem jurídico protegido – a liberdade sexual – merece proteção reforçada no

ordenamento jurídico português, mesmo que tal possa comprimir, direta ou indiretamente, alguns direitos,

liberdades e garantias. Na verdade, o crime de violação não se estende apenas, em termos de impacto, sobre

a vítima, alargando efeitos devastadores (embora incomparáveis) à família da mesma, aos coletivos sociais

envolventes e à própria sociedade, onde provoca um significativo alarme social. São, por isso, diversos e

complexos, na sua relação, os bens jurídicos e interesses a defender pelo legislador, devendo naturalmente dar

primazia à proteção e defesa da própria vítima.

Com o presente projeto de lei, o Chega pretende não apenas transformar a natureza do crime de violação

em crime público, mas também reforçar os limites sancionatórios para a sua penalização, aumentando

consideravelmente as penas aplicáveis, em linha com outros ordenamentos jurídicos da União Europeia, como

o espanhol ou o francês. Em Espanha, por exemplo, a pena aplicável ao crime de violação é de seis a doze

anos, podendo chegar aos quinze anos em determinadas situações.

É evidente que um crime com a complexidade e a especificidade daquele que aqui é tratado não se combate

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apenas pela alteração jurídica da respetiva natureza penal ou com o aumento de penas, mas estas alterações

podem ser um sinal importante em termos da sua dissuasão e de acordo com as finalidades de proteção do bem

jurídico que, nos termos do n.º 1 do artigo 40.º do Código Penal, devem enformar a legislação penal.

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Código Penal, no seu artigo 164.º (violação) agravando as molduras

penais aplicáveis aos sujeitos que preencham os requisitos desta conduta criminosa e no seu artigo 178.º

atribuindo a natureza de crime público aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual.

Artigo 2.º

Alteração aos artigos 164.º e 178.º do Código Penal, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 164.º

Violação

1 – Quem, por meio de violência, ameaça grave, ou depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou

posto na impossibilidade de resistir, constranger outra pessoa:

a) A sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral; ou

b) A sofrer introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos;

é punido com pena de prisão de seis a doze anos.

2 – Quem, por meio não compreendido no número anterior, constranger outra pessoa:

a) A sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral; ou

b) A sofrer introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos;

é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos.

Artigo 178.º

Queixa

1 – (Revogado.)

2 – (Revogado.)

3 – (Revogado.)

4 – […].

5 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

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1 DE OUTUBRO DE 2021

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O Deputado do CH, Diogo Pacheco de Amorim.

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PROJETO DE LEI N.º 963/XIV/3.ª

PROGRAMA DE INCENTIVO À CRIAÇÃO E FLEXIBILIZAÇÃO DOS HORÁRIOS DAS CRECHES

Exposição de motivos

De acordo com os resultados preliminares dos Censos 2021, Portugal tem hoje menos 214 286 pessoas do

que em 2011.

No primeiro semestre deste ano, a natalidade atingiu o valor mais baixo dos últimos 30 anos (nasceram

apenas cerca de 37 000 bebés, o valor mais baixo desde 1989). Neste sentido, importa adotar políticas de

promoção da natalidade, nomeadamente no que respeita à oferta e às condições de funcionamento de creches

e jardins de infância, de forma a permitir às famílias uma melhor conciliação entre a vida profissional e a vida

familiar.

Por outro lado, a recente realidade pandémica veio reforçar a necessidade, defendida há muito pelo CDS,

de aprofundar a qualificação da rede de creches e estabelecimentos de ensino, adaptando o seu funcionamento

às novas realidades e necessidades das famílias, salvaguardando-se sempre o superior interesse da criança,

facilitando uma maior flexibilização dos horários das creches.

Neste sentido, o CDS entende ser preciso adequar os horários às necessidades efetivas e reais das famílias,

especialmente aos pais que trabalham aos fins-de-semana, por turnos ou em horário noturno.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do CDS-

PP abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à constituição de um programa de incentivo à criação e flexibilização dos horários das

creches.

Artigo 2.º

Adequação do modelo de financiamento das creches sem fins lucrativos

No âmbito do programa referido no artigo anterior, o Governo procede à adequação do modelo de

financiamento das creches sem fins lucrativos, de forma a incentivar o estabelecimento de horários flexíveis e

alargados, sempre que se verifique necessidade evidente das famílias em virtude dos horários de trabalho das

entidades empregadoras da comunidade.

Artigo 3.º

Promoção da constituição de Instituições Particulares de Solidariedade Social por iniciativa de

empresas

No âmbito do programa referido no artigo 1.º, o Governo procede à promoção da constituição de Instituições

Particulares de Solidariedade Social, sem finalidade lucrativa, por iniciativa de empresas, de modo a garantir o

acesso à celebração de acordos com a Segurança Social para financiar o funcionamento de creches que

pratiquem um horário flexível e adequado às necessidades dos seus funcionários.

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Artigo 4.º

Fomentação da celebração de acordos entre estabelecimentos de infância e entidades

empregadoras

No âmbito do programa referido no artigo 1.º, o Governo procede ao fomento da celebração de acordos entre

estabelecimentos de infância e entidades empregadoras, visando o estabelecimento de horários e outras

condições de acesso, de maneira a conceder mais alternativas aos pais, apoiando a dinâmica familiar.

Artigo 5.º

Regulamentação

No prazo de 90 dias, contados desde a entrada em vigor da presente lei, o Governo aprova os diplomas

necessários à efetivação do programa de incentivo à criação e flexibilização dos horários das creches.

Artigo 6.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

Os Deputados do CDS-PP: Telmo Correia — Pedro Morais Soares — Cecília Meireles — João Pinho de

Almeida — Ana Rita Bessa.

———

PROJETO DE LEI N.º 964/XIV/3.ª

ESTABELECE O REFORÇO E AVALIAÇÃO DA IMPLEMENTAÇÃO E EXECUÇÃO DO PROGRAMA DE

APOIO À REDUÇÃO DO TARIFÁRIO DOS TRANSPORTES PÚBLICOS (PART) E DO PROGRAMA DE

APOIO À DENSIFICAÇÃO E REFORÇO DA OFERTA DE TRANSPORTE PÚBLICO (PROTRANSP)

Exposição de motivos

O Roteiro de Neutralidade Carbónica para 2050, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º

107/2019, de 1 de julho, aponta como potencial de redução de emissões em 2030 neste setor, face a 2005,

entre 43 e 46% e afirma que «A descarbonização do setor dos transportes será alicerçada fundamentalmente

no reforço do papel do sistema de transporte público e na substituição dos atuais veículos a combustíveis

fósseis por uma frota essencialmente elétrica».

A necessidade e urgência na descarbonização do setor dos transportes tem como solução, em grande

medida, e conforme salientado no Roteiro de Neutralidade Carbónica para 2050, a aposta no aumento da

utilização dos transportes coletivos. O Programa de Apoio à Redução do Tarifário dos Transportes Públicos

(PART) e o Programa de Apoio à Densificação e Reforço da Oferta de Transporte Público (PROTRANSP)

pretendem, precisamente, atrair pessoas para o uso do transporte coletivo com abandono do transporte

particular.

O PART, ao permitir a redução do preço de utilização dos transportes coletivos, constitui um incentivo ao

seu uso. Contudo, o país necessita de tornar o uso de transportes coletivos mais atrativo, através do aumento

da oferta e melhoria da qualidade e intermodalidade dos mesmos, objetivo a que o PROTRANSP pretende

responder.

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Para que os objetivos de descarbonização do setor sejam efetivamente ambiciosos e alcançados já em 2030,

é fundamental, nesta fase, avaliar os resultados do PART e do PROTRANSP de forma a que se possa saber

como melhorar ambos os programas e alcançar os objetivos de reforço do uso de transportes coletivos e redução

do uso de transportes privados. A referida avaliação deve ponderar a evolução do uso de transportes coletivos

e de transportes privados, a correlação dessa evolução com os programas PART e PROTRANSP, bem como

os recursos financeiros afetos aos programas. Esta avaliação deve contemplar as políticas de intermobilidade

nomeadamente na conjugação dos transportes públicos, com a mobilidade ativa ou suave, assim como a

existência de parques dissuasores nas imediações dos transportes públicos.

Em função da avaliação efetuada, o Governo deverá propor, à Assembleia da República, a adoção de

medidas, devidamente fundamentadas, que permitam aumentar a eficácia dos programas PART e

PROTRANSP.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o Deputado do PAN apresentam

o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece o reforço e a avaliação da implementação e execução do Programa de Apoio à

Redução do Tarifário dos Transportes Públicos (PART) e do Programa de Apoio à Densificação e Reforço da

Oferta de Transporte Público (PROTRANSP).

Artigo 2.º

Avaliação do PART e do PROTRANSP

Num prazo de 9 meses após a entrada em vigor da presente lei, o Governo apresenta à Assembleia da

República um relatório elaborado por um grupo de trabalho, composto personalidades de reconhecido mérito no

domínio dos transportes, do ambiente e da economia, que avalie o PART e o PROTRANSP, ao nível da sua

eficácia, demonstrando, nomeadamente, a evolução do uso de transportes coletivos e de transportes privados,

a correlação dessa evolução com estes programas, bem como os recursos financeiros afetos aos programas e

respetivos indicadores de custo-eficácia.

Artigo 3.º

Medidas de reforço do PART e do PROTRANSP

Num prazo de 90 dias após a entrega do relatório referido no artigo anterior, o Governo propõe à Assembleia

da República a adoção de medidas, devidamente fundamentadas, para o reforço e aumento da eficácia do PART

e do PROTRANSP.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.

———

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PROJETO DE LEI N.º 965/XIV/3.ª

CRIA O PROGRAMA REDE DE CRECHES PÚBLICAS

Exposição de motivos

A educação e os cuidados da primeira infância são, cada vez mais, considerados uma base para a

educação e para a formação ao longo da vida.

O Parecer n.º 8/2008, do Conselho Nacional de Educação, sobre «A Educação das Crianças dos 0 aos

12 anos» salienta que «[a] educação dos 0 aos 6 anos é decisiva como pilar para o desenvolvimento

educativo das crianças e é fator de equidade». No mesmo sentido, o Seminário da «Educação das crianças

dos 0 aos 3 anos» (realizado no CNE em 18 de novembro de 2010) concluiu que «o direito à creche» é um

direito a ser reconhecido «enquanto serviço educativo» que tem «um valor intrínseco e pode contribuir para

o desenvolvimento das crianças» (CNE, 2011).

E a Recomendação n.º 3/2011 do CNE sobre «A educação dos 0 aos 3 anos» considera que a

concretização do direito das crianças à creche é «um fator de igualdade de oportunidades, de inclusão e

coesão social». O mesmo documento sustenta que a responsabilização primeira pela educação dos 0 aos 3

anos pertence às famílias, não devendo a frequência da creche ser obrigatória, mas devendo «ser universal,

de modo a que as famílias disponham de serviços de alta qualidade a quem entregar os seus filhos, serviços

esses que devem estar geograficamente próximos da respetiva residência ou local de trabalho» (2.ª

recomendação). E, no mesmo sentido, defende que «o Ministério da Educação deve assumir

progressivamente uma responsabilização pela tutela da educação da faixa etária dos 0-3» (3.ª

recomendação).

Conforme o Estado da Educação 2019 (CNE, 2020), o número de respostas sociais para a primeira

infância tem vindo a decrescer desde 2014 ao mesmo tempo que a procura de creche tem aumentado. A

falta de vagas e a escassa oferta pública fazem com que frequentemente seja mais caro ter uma criança na

creche do que um jovem numa universidade privada. Este quadro limita o acesso das famílias à creche e

ignora que a criança é um sujeito de direitos desde que nasce. O custo das creches relaciona-se com duas

opções de política: a) as creches não estão inseridas no sistema de ensino, mas na Segurança Social, pelo

que a oferta está essencialmente sob a gestão do setor privado e do setor social (IPSS); b) as creches são

vistas como assistência às famílias e não no quadro dos direitos da infância, o que contribui para

desresponsabilizar o Estado.

Esta falta de creches é reconhecida pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que, reportando-se

aos dados da Carta Social de 2019, salienta «uma insatisfatória cobertura média das respostas e

equipamentos sociais (…) para a 1.ª infância 48,4% (creches)» – uma cobertura insatisfatória que se faz

sentir de forma particularmente aguda nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. Por essa razão, o

PRR incluiu no seu 6.º Pilar «Políticas para a próxima geração, crianças e jovens, incluindo educação e

habilidade» o objetivo de «[a]umentar a capacidade de resposta em creche, fundamentalmente nos territórios

que ainda têm níveis de cobertura mais baixos».

A criação de um Programa Rede de Creches Públicas, a iniciar em 2022, permitirá responder a essa

debilidade social do país e concretizar o direito à creche como parte dos direitos constitucionais das crianças

ao desenvolvimento integral (artigo 69.º) e à Educação (artigo 73.º). Para além do levantamento das

necessidades e do reforço da oferta, esse programa terá como objetivo garantir a gratuitidade de frequência

de creche a todas as crianças.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei cria o Programa Rede de Creches Públicas.

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Artigo 2.º

Programa Rede de Creches Públicas

1 – O Programa Rede de Creches Públicas tem como objetivo promover o acesso à creche, assegurando

o direito das crianças à educação e ao seu desenvolvimento integral.

2 – Em 2022, o Governo procede ao alargamento da gratuitidade de frequência de creche a todas as

crianças que frequentem creche pública ou abrangida pelo sistema de cooperação e cujo agregado familiar

pertença ao 3.º escalão de rendimentos da comparticipação familiar.

3 – No primeiro semestre de 2022, o Governo inicia o levantamento das necessidades de resposta de

creches públicas e de educação pré-escolar, sendo apurado o número de vagas existentes na valência de

creche, as necessidades de recursos materiais, designadamente de meios e instalações, bem como dos

concursos ou bolsas de recrutamento com vista a suprir as necessidades de recursos humanos identificadas.

4 – A partir do segundo semestre de 2022, o Governo dá início a uma requalificação das creches já

existentes e à construção de novas creches em função do levantamento das necessidades, nos termos do

número anterior, de forma a garantir gradualmente o acesso universal e gratuito à creche para todas as

crianças dos zero aos três anos, independentemente do escalão de rendimento.

5 – A manutenção, qualificação e alargamento da oferta pública é acompanhada por uma equipa de

monitorização sob a tutela conjunta do Ministério da Educação e do Ministério do Trabalho e Segurança

Social.

Artigo 3.º

Inclusão da Rede de Creches no Sistema Educativo

1 – Em 2022, o Governo inicia um processo com vista à inclusão das creches no sistema educativo.

2 – O tempo de serviço dos educadores de infância afetos às creches é contabilizado para todos os

efeitos do Estatuto da Carreira Docente.

Artigo 4.º

Regulamentação

O Governo procede à regulamentação necessária da presente lei no prazo de dois meses a contar da sua

entrada em vigor.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeito a partir do Orçamento do

Estado subsequente.

Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — José Moura Soeiro — Pedro

Filipe Soares — Jorge Costa — Mariana Mortágua — Beatriz Gomes Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso

— Isabel Pires — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria

Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

———

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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PROJETO DE LEI N.º 966/XIV/3.ª

PERMITE O ACESSO A UM CONJUNTO DE DADOS PESSOAIS POR PARTE DE ESTUDANTES DE

MEDICINA E INVESTIGADORES CIENTÍFICOS, PARA FINS ACADÉMICOS, DE ARQUIVO DE INTERESSE

PÚBLICO FINS DE INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA OU HISTÓRICA OU FINS ESTATÍSTICOS (PRIMEIRA

ALTERAÇÃO À LEI N.º 58/2019, DE 2021)

Exposição de motivos

A pandemia do COVID-19 alertou o mundo para a necessidade imperiosa de apostar no conhecimento

enquanto garantia de desenvolvimento sustentável, robustez da nossa economia e, acima de tudo, viabilidade

da nossa existência e saúde enquanto seres humanos e comunidade.

O papel da comunidade científica ganhou uma nova centralidade no debate social. A corrida às vacinas que

vieram responder à crise da pandemia foi assunto diário e, também cá em Portugal, houve quem se tenha

organizado nos seus laboratórios, centros de investigação e hospitais universitários para dar uma resposta

humanitária e científica ao vírus. Para essa e outras tarefas futuras, é necessário ter acesso a um conjunto de

dados que as autoridades de saúde possuem, nomeadamente a Direção-Geral de Saúde (DGS), os Serviços

Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS) e a Administração Central do Sistema de Saúde, IP.

Se é verdade que a experiência da pandemia criou a possibilidade administrativa de acesso a alguns dados

por parte de vários laboratórios de investigação na área biomédica, relativamente ao fornecimento de grandes

dados e metadados para análise por cientistas de dados não se encontra ainda resolvido.

Ouvimos com atenção o Senhor Primeiro Ministro António Costa que, num dos debates parlamentares que

tiveram lugar durante o primeiro confinamento geral a que o país esteve sujeito, garantiu que seriam fornecidos

esses dados às instituições académicas e aos grupos das instituições da administração central que se

encontram a trabalhar o tema do ponto de vista científico. Independentemente dessa decisão ter conhecido

efeitos práticos no caso específico da pandemia da COVID-19, importa salientar a importância dessa prática

para merecer um tratamento mais duradouro no tempo e estrutural para o futuro da investigação científica em

Portugal.

A possibilidade deste alargamento na análise científica pode ser crucial na gestão de futuras crises de saúde

pública, desde a alocação de recursos, seleção da aplicação dos testes ou deteção precoce de doentes com

potencial de agravamento, entre outras matérias. A preocupação, que ganhou dimensão pública nos meses em

que enfrentamos a pandemia, como é exemplo um apelo publicado pelo jornal Público logo no início do

confinamento geral de março de 20201.

No mesmo sentido de alargar a possibilidade de acesso a dados para otimização de processos e

aprendizagens, uma das medidas que gera consenso entre as várias entidades envolvidas é a abertura dos

sistemas de informação de dados clínicos aos estudantes de medicina.

No final de 2020, a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa já havia tentado resolver esse

problema, quando deu entrada de um pedido de parecer à Comissão Nacional de Proteção de Dados (doravante

CNPD) sobre o protocolo entre aquela entidade, o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE, e os

Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS). O objetivo principal desse protocolo era uma

equivalência entre médicos e estudantes de medicina no que toca ao acesso ao software Sclínico.

Após essa tentativa, a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), através de uma comunicação

oficial, informou que apenas os profissionais inscritos na Ordem dos Médicos podem aceder ao software que

agrega os dados clínicos dos doentes internados e em consulta.2 Este impasse gerado após o conhecimento

dessa posição só poderá ser resolvido com uma clarificação legal que garanta, em primeira instância, o acesso

dos estudantes de medicina a estes sistemas de informação (software SClínico) e, em segunda instância,

mencione em que moldes é que esse acesso é permitido. Esse passo, se dado, representará uma efetiva

melhoria na formação médica em Portugal.

O presente projeto de lei do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta dois objetivos concretos:

1https://www.publico.pt/2020/03/26/ciencia/noticia/resposta-cientistas-continuam-apelar-acesso-imediato-dados-covid19-portugal-1909511 2https://www.publico.pt/2021/01/09/sociedade/noticia/cnpd-impede-acesso-estudantes-medicina-dados-clinicos-doentes-1945670

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• Em primeiro lugar, é necessário garantir o acesso a um conjunto de dados clínicos por parte da

comunidade científica e, para isso, propomos um regime de acesso a um conjunto de dados detidos pela Direção

Geral de Saúde, os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS) e a Administração Central do

Sistema de Saúde, IP., num modelo que garanta a sua encriptação e anonimato. Esta medida tem como fim

melhorar a investigação científica e aproximar as várias realidades da administração da saúde em Portugal com

os vários centros de produção de conhecimento científico que o país detém.

• Em segundo lugar, a fim de eliminar os obstáculos burocráticos que impedem os estudantes de Medicina

a acederem aos dados clínicos dos estudantes de medicina, propomos uma alteração Lei n.º 58/2019, de 8 de

agosto, que assegura a execução do Regulamento Geral de Proteção de Dados, de forma a permitir esse

acesso.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à primeira alteração à Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que assegura a execução do

Regulamento Geral de Proteção de Dados, permitindo o acesso a um conjunto de dados clínicos por parte de

estudantes de medicina e investigadores científicos.

Artigo 2.º

Âmbito de aplicação

São abrangidos pela presente lei:

a) Os estudantes de medicina a frequentar cursos de Medicina em hospitais universitários;

b) Os investigadores pertencentes a laboratórios e centros de investigação pertencentes ao perímetro legal

e administrativo das Instituições de ensino superior públicas.

Artigo 3.º

Alteração à Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto

São alterados os artigos 29.º e 31.º da Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 29.º

(…)

1 – ............................................................................................................................................................ .

2 – ............................................................................................................................................................ .

3 – (Novo) O acesso aos sistemas de informação que apoiam a prestação de cuidados e tratamentos de

saúde ou de serviços de diagnóstico por parte dos médicos é alargada aos estudantes de Medicina nos

estabelecimentos em que decorrer a sua formação.

4 – (Novo) Para efeitos do número anterior, é criado um perfil próprio para estudantes nas plataformas nos

quais são registados dados de saúde dos utentes, garantindo igual grau de segurança aplicável aos demais

perfis.

5 – (Novo) O acesso aos dados a que alude o n.º 2 é feito exclusivamente de forma eletrónica, salvo

impossibilidade técnica ou expressa indicação em contrário do titular dos dados, sendo vedada a sua divulgação

ou transmissão posterior.

6 – (Atual n.º 5.)

7 – (Atual n.º 6.)

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8 – (Atual n.º 7.)

Artigo 31.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – (Novo) – Para facilitação, efetivação e maior celeridade na obtenção de dados para fins de arquivo de

interesse público, fins de investigação científica ou histórica ou fins estatísticos, devem ser celebrados protocolos

entre as instituições de investigação científica e os organismos estatais responsáveis pela produção,

preservação e tratamento desses dados, nomeadamente a Direção Geral de Saúde (DGS), os Serviços

Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS) e a Administração Central do Sistema de Saúde, IP.

6 – (Novo) – Para o disposto no número anterior, o Governo regulamenta, num prazo de trinta dias após a

publicação da presente lei em Diário da República, o enquadramento legal desses protocolos e ainda uma lista

das instituições de investigação científica acreditadas para o efeito.

7 – (Atual n.º 5).»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação em Diário da República.

Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: Luís Monteiro — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa — Mariana

Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Isabel Pires —

Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro —

Maria Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.

———

PROJETO DE LEI N.º 967/XIV/3.ª

PROCEDE À PRORROGAÇÃO DO PRAZO DO PROCESSO DE RECONVERSÃO DAS ÁREAS

URBANAS DE GÉNESE ILEGAL E GARANTE MECANISMOS DE TRANSPARÊNCIA NESTE PROCESSO,

ALTERANDO A LEI N.º 91/95, DE 2 DE SETEMBRO

Exposição de motivos

As áreas urbanas de génese ilegal (AUGI) correspondem a aglomerados de construções que surgiram antes

do Decreto-Lei n.º 46 673, de 29 de novembro de 1965, em que a generalidade das construções foi erigida sem

licença, ou posteriormente sem a tenha sido obtida a necessária licença de loteamento.

A manutenção de áreas urbanas de génese ilegal é algo que não cumpre plenamente o direito à habitação

consagrado na Constituição da República Portuguesa e na Lei de Bases da Habitação, aprovada pela Lei n.º

83/2019, de 3 de setembro, pelo que urge tomar medidas para assegurar a sua reconversão. O enquadramento

legal desta reconversão consta da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, que, apesar de ter sido alterado ao longo

dos últimos anos, estabelece o regime excecional para a legalização das AUGI.

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De acordo com a versão atualmente em vigor da Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro, o prazo legal para o fim

da reconversão das áreas urbanas de génese ilegal terminou no passado dia 30 de junho de 2021. Tal situação

é especialmente preocupante quando é sabido que este processo está longe de estar concluído visto que, de

acordo com os dados do relatório da Direção-Geral do Território1, em janeiro de 2020, apesar de o universo

potencial de municípios do território continental abrangidos por este processo de reconversão ser de 278

municípios, apenas 14 municípios (5%) submeteram os levantamentos das AUGI (que totalizam 453

levantamentos).

Tendo em conta o claro atraso na execução do processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal

(também justificado pelo contexto de crise sanitária que estamos a viver) e tendo em vista a realização plena do

direito à habitação em Portugal, com a presente iniciativa o Grupo Parlamentar do PAN pretende assegurar a

prorrogação do prazo do processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal previsto na Lei n.º

83/2019, de 3 de setembro, de forma a permitir que as AUGI disponham de comissão de administração

validamente constituída até 31 de dezembro de 2023 e de título de reconversão até 30 de junho de 2026, e que

as câmaras municipais possam delimitar as AUGI até 31 de dezembro de 2023. Em nossa opinião esta

prorrogação assegurará uma maior articulação com o programa 1.º Direito cujo prazo termina em 2024.

Paralelamente procuram-se assegurar duas medidas adicionais. Por um lado, propõe o Grupo Parlamentar

do PAN que se assegure uma maior capacitação e esclarecimento dos municípios quanto ao processo de

reconversão urbanística das áreas urbanas de génese ilegal, por via da previsão da possibilidade dos membros

dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios poderem frequentar as ofertas formativas da Direção-Geral

do Território (algo que poderá dar o tão necessário impulso político que tem faltado neste processo), e da criação

de um gabinete de apoio aos processos de reconversão urbanística de áreas de génese ilegal, que garanta o

esclarecimento de dúvidas relativamente às disposições legais da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro. Por outro

lado, propõe o presente projeto de lei que se crie um mecanismo de transparência neste processo que envolva

a Assembleia da República na monitorização da execução do processo de reconversão, assegurada por via de

um relatório anual da Direção-Geral do Território, que apresente o estado de execução dos processos de

reconversão em curso e, sempre que necessário, de eventuais recomendações e medidas que possam

contribuir para a sua conclusão dentro do prazo previsto.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o

Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à prorrogação do prazo do processo de reconversão das áreas urbanas de génese

ilegal e garante mecanismos de transparência neste processo, procedendo para o efeito à sexta alteração à Lei

n.º 91/95, de 2 de setembro, que cria o processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal, alterada

pelas leis n.os 165/99, de 14 de setembro, 64/2003, de 23 de agosto, 10/2008, de 20 de fevereiro, 79/2013, de

26 de novembro, e 70/2015, de 16 de julho.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 91/95, de 2 de setembro

São alterados os artigos 56.º-A, 56.º-B e 57.º da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, na sua redação atual, que

passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 56.º-A

[…]

1 – […].

2 – Os municípios devem elaborar o levantamento das AUGI nos termos e condições publicitados pela

Direção-Geral do Território, no seu sítio da Internet, até 31 de janeiro de 2022, e devem comunicar esses

1 Direção-Geral do Território (2020), Relatório dos processos de reconversão das AUGI com o diagnóstico, página 8.

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levantamentos às entidades referidas no número anterior, no prazo de um ano a contar dessa publicitação.

3 – A Direção-Geral do Território publicita, ainda, no seu sítio da Internet, no prazo de 90 dias após o termo

do prazo para a comunicação dos levantamentos pelos municípios, um relatório com o diagnóstico dos

processos de reconversão das AUGI e define eventuais medidas que devam ser adotadas para a sua conclusão

e, sempre que possível, o cronograma para a sua execução.

Artigo 56.º-B

[…]

1 – A Direção-Geral do Território, em articulação com a Direção-Geral das Autarquias Locais, as comissões

de coordenação e desenvolvimento regional e a Associação Nacional de Municípios Portugueses, promove um

plano de formação, de frequência facultativa, para os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos

municípios e para os trabalhadores em funções públicas da administração central do Estado e das autarquias

locais, com vista a garantir a aplicação uniforme das disposições legais atinentes à reconversão urbanística de

áreas de génese ilegal.

2 – O plano de formação referido no número anterior visa capacitar a intervenção nos processos de

reconversão urbanística de áreas de génese ilegal, e, bem assim, promover a disseminação de boas práticas

para a resolução célere destes processos.

Artigo 57.º

[…]

1 – Para efeitos de aplicação da presente lei, devem as AUGI dispor de comissão de administração

validamente constituída até 31 de dezembro de 2023 e de título de reconversão até 30 de junho de 2026.

2 – A câmara municipal pode delimitar as AUGI, fixando como respetiva modalidade de reconversão a

iniciativa municipal sem o apoio da administração conjunta até 31 de dezembro de 2023.

3 – […].»

Artigo 3.º

Aditamento à Lei n.º 91/95, de 2 de setembro

São aditados os artigos 57.º-C e 57.º-D da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, na sua redação atual, que passa

a ter a seguinte redação:

«Artigo 57.º-B

Gabinete de apoio técnico

A Direção-Geral do Território, em articulação com a Direção-Geral das Autarquias Locais e as comissões de

coordenação e desenvolvimento regional, procede à criação de um gabinete de apoio aos processos de

reconversão urbanística de áreas de génese ilegal, que garanta o esclarecimento de dúvidas relativamente às

disposições legais do presente diploma.

Artigo 57.º-C

Monitorização dos processos de reconversão das AUGI

A Direção-Geral do Território apresenta anualmente à Assembleia da República, até ao dia 30 de março, o

relatório de monitorização dos processos de reconversão das AUGI, que preveja o estado de execução do

processo e, sempre que necessário, eventuais recomendações e medidas que possam contribuir para a sua

conclusão dentro do prazo previsto.»

Artigo 4.º

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Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e o deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.

———

PROJETO DE LEI N.º 968/XIV/3.ª

ALARGA OS PRAZOS DE PRESCRIÇÃO DE CRIMES CONTRA A LIBERDADE E

AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL DE MENORES E DO CRIME DE MUTILAÇÃO GENITAL FEMININA,

PROCEDENDO À QUINQUAGÉSIMA QUARTA ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL

Exposição de motivos

A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (Convention on the Rights of the Child1), de

20 de novembro de 1989, determina, no seu artigo 19, que os Estados-Membros devem aprovar as medidas

legislativas, administrativas, sociais e educativas necessárias a proteger a criança contra todas as formas de

violência física e mental, agressões ou abuso, negligência, maus tratos ou exploração, incluindo abuso sexual,

enquanto se mantenha ao cuidado de progenitores, tutores ou outras pessoas que tenham a criança a seu cargo,

cabendo, de acordo com o artigo 34 desta Convenção, aos Estados-Membros diligenciar no sentido de proteger

a criança contra todas as formas de exploração e abuso sexuais.

Também a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia dispõe, no n.º 1 do seu artigo 24.º, que as

crianças têm direito à proteção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar, sendo sempre aplicável o princípio

da inviolabilidade da dignidade do ser humano.

Foi adotada a Diretiva da UE sobre o Combate ao Abuso Sexual e à Exploração Sexual de Crianças e a

pornografia infantil2, em 2011, referindo que o abuso sexual e a exploração sexual de crianças constituem

violações graves dos direitos fundamentais, em especial do direito das crianças à proteção e aos cuidados

necessários ao seu bem-estar, tal como estabelecido na Convenção das Nações Unidas de 1989 sobre os

Direitos da Criança e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Esta Diretiva refere, no seu ponto 26, que «a investigação dos crimes e a dedução da acusação em processo

penal deverão ser facilitadas, tendo em conta não só as dificuldades que as crianças vítimas destes crimes

enfrentam para denunciar os abusos sexuais (…). Para que a investigação e a ação penal relativas aos crimes

referidos na presente diretiva possam ser bem-sucedidas, a sua promoção não deverá depender, em princípio,

de queixa ou acusação feita pela vítima ou pelo seu representante. Os prazos de prescrição da ação penal

deverão ser fixados de acordo com a legislação nacional».

É na sequência da obrigatoriedade acima descrita que o PAN trouxe este tema ao debate no início do

presente ano, com a apresentação do Projeto de Lei n.º 771/XIV/2.ª, e que, pela sua enorme importância, ora

reforça, na medida em que ainda não se deu cabal cumprimento à pretensão da Diretiva.

O constrangimento causado por este tipo de crimes na vítima, ao qual acresce a especial dificuldade em

integrar o sucedido, o receio de ter de voltar a enfrentar o agressor, a exposição pública da sua intimidade

perante as autoridades públicas e policiais e o receio da lógica de revitimização associada ao processo levam a

que, nestes casos, a/o ofendida/o acabe por preferir o silêncio e a impunibilidade da/o agressor/a à denúncia do

1 OHCHR – Convention on the Rights of the Child 2 Diretiva 2011/93/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de dezembro de 2011 relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração

sexual de crianças e a pornografia infantil, e que substitui a Decisão-Quadro 2004/68/JAI do Conselho.

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crime e impulso do processo penal.

Comprovativo desta realidade são os dados apresentados pela Associação Quebrar o Silêncio que nos refere

que os homens que em crianças ou jovens foram vítimas deste tipo de abuso apenas denunciam o crime e

procuram ajuda, no mínimo, 20 anos após o abuso, encontrando-se a maioria dos homens na casa dos 35-40

anos.

No atual quadro legal, muito embora a prescrição nunca ocorra antes de a vítima perfazer 23 anos, estes

crimes estão prescritos, em alguns casos, há décadas.

Acresce ainda o facto de a esta idade e dependendo da relação que a vítima tenha com o/a agressor/a,

por exemplo, sendo o/a agressor/a progenitor/a da vítima, poderá esta ainda ser dependente do/a primeiro/a.

Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e o processo penal que lhe está

associado são extremamente traumáticos para a vítima do ponto de vista físico e psicológico. Atendendo a

isto, no âmbito Projeto CARE – Rede de apoio especializado a crianças e jovens vítimas de violência sexual3,

assinalou-se que o tempo que passa entre a perpetração do crime e a sua revelação pode variar em função

do impacto que o crime teve na criança ou jovem, sendo que em 63,6% dos casos a revelação destes crimes

acontece um ano ou mais depois de o abuso ter acontecido, situação que pode acontecer por diversas

razões, entre as quais se encontra, por exemplo, a relação da vítima com o/a agressor/a, a não perceção

dos factos como crime, a autoculpabilização, a falta ou insuficiência de provas, ou o síndrome da

acomodação da criança vítima de abuso sexual.

A última alteração estrutural às regras de prescrição destes crimes ocorreu em 2007, sendo que volvidos

14 anos é mais do que urgente que se assegure um quadro legal capaz de proteger estas vítimas. É premente

que se assegure que a vítima se sente preparada, do ponto de vista emocional, para a revelação do crime e

para lidar com todos os aspetos relacionados com o seguimento do procedimento criminal.

O PAN propõe a alteração dos prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação

sexual de menores e do crime de mutilação genital feminina, de forma a que se passe a assegurar que

quando o/a ofendido/a for menor de 14 anos o procedimento criminal nunca se extinga antes de este/a

perfazer 40 anos, e que quando o/a ofendido/a for maior de 14 anos passe a haver um prazo de prescrição

de 20 anos que nunca poderá, no entanto, ocorrer antes de este/a perfazer 35 anos.

Esta proposta é apresentada com vista a colmatar o injustificado atraso que se verifica face a outros

países da União Europeia.

Em Espanha, quando a vítima é menor de 18 anos, o referido prazo prescricional só iniciará a sua

contagem a partir do momento em que a vítima perfaz 35 anos de idade.

Em França, nos termos do article 7 do Code de procédure pénale, a ação penal prescreve no prazo de

20 anos contado da data da prática do crime. Contudo, no caso de violação ou agressões sexuais contra

menores de 15 anos, o crime prescreve no prazo de 30 anos a contar da maioridade das vítimas (article 7 e

article 706-47 do Code de procédure pénale).

Em Itália, de acordo com o Art. 609-bis do Codice Penale, qualquer pessoa que, através de violência,

ameaças ou abuso de autoridade, forçar alguém a realizar ou a sofrer atos sexuais é punido com pena de

prisão de 6 a 12 anos, acrescendo que, nos termos do Art. 609-ter, a pena de prisão é agravada em um

terço, no caso de a vítima ser menor de 18 anos, sendo aumentada em metade se a vítima for menor de 14

anos e no dobro se a vítima for menor de 10 anos.

É urgente fazer face ao conhecido silêncio das vítimas e aos efeitos traumáticos destes crimes, permitindo,

com a redação que ora se propõe, diferenciar entre a altura da vida da criança em que o crime é praticado,

não esquecendo que esse é um facto com consequências potencialmente distintas, na medida em que se

verificam maiores implicações ao desenvolvimento da criança do ponto de vista físico e psicológico quando

um crime desta natureza é praticado em vítimas com diminuta idade.

Desta forma, é necessário abrir no nosso País o debate sério sobre o alargamento dos prazos de

prescrição destes crimes, como já previsto em outros países, de forma a assegurar que a vítima se sente

preparada, do ponto de vista emocional, para a revelação do crime e para lidar com todos os aspetos

relacionados com o seguimento do procedimento criminal.

Assim, com o presente projeto de lei o PAN pretende alterar o Código Penal de forma a alargar os prazos

3 Projeto CARE (2017), Manual CARE – Apoio a crianças e jovens vítimas de violência sexual, páginas 53 e 54.

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de prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e do crime de mutilação

genital feminina.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o

Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei aprova a quinquagésima quarta alteração do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º

400/82, de 23 de setembro, alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de maio, pelos Decretos-Leis n.os 101-A/88, de 26

de março, 132/93, de 23 de abril, e 48/95, de 15 de março, pelas Leis n.os 90/97, de 30 de julho, 65/98, de 2 de

setembro, 7/2000, de 27 de maio, 77/2001, de 13 de julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001, de 25 de

agosto, e 108/2001, de 28 de novembro, pelos Decretos-Leis n.os 323/2001, de 17 de dezembro, e 38/2003, de

8 de março, pelas Leis n.os 52/2003, de 22 de agosto, e 100/2003, de 15 de 3 novembro, pelo Decreto-Lei n.º

53/2004, de 18 de março, e pelas Leis n.os 11/2004, de 27 de março, 31/2004, de 22 de julho, 5/2006, de 23 de

fevereiro, 16/2007, de 17 de abril, 59/2007, de 4 de setembro, 61/2008, de 31 de outubro, 32/2010, de 2 de

setembro, 40/2010, de 3 de setembro, 4/2011, de 16 de fevereiro, 56/2011, de 15 de novembro, 19/2013, de 21

de fevereiro, 60/2013, de 23 de agosto, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, pelas Leis n.os 59/2014,

de 26 de agosto, 69/2014, de 29 de agosto, e 82/2014, de 30 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2015, de 8

de janeiro, e pelas Leis n.os 30/2015, de 22 de abril, 81/2015, de 3 de agosto, 83/2015, de 5 de agosto, 103/2015,

de 24 de agosto, e 110/2015, de 26 de agosto, 39/2016, de 19 de dezembro, 8/2017, de 3 de março, 30/2017,

de 30 de maio, 94/2017, de 23 de agosto, 16/2018, de 27 de março, 44/2018, de 9 de agosto, 101/2019 e

102/2019, ambas de 6 de setembro, 39/2020, de 18 de agosto, 40/2020, de 18 de agosto, 58/2020, de 31 de

agosto e 57/2021, de 16 de agosto.

Artigo 2.º

Alteração ao Código Penal

É alterado o artigo 118.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, que

passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 118.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – Nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, bem como no crime de mutilação

genital feminina sendo a vítima menor, o procedimento criminal:

a) não se extingue, por efeito da prescrição, antes de o ofendido perfazer 40 anos, quando ofendido seja

menor de 14 anos;

b) extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a sua prática tiverem decorrido 20 anos, não podendo

tal prescrição ocorrer antes de o ofendido perfazer 35 anos, quando ofendido seja maior de 14 anos.»

Artigo 3.º

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Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.

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PROJETO DE LEI N.º 969/XIV/3.ª

CONSAGRA A TERÇA-FEIRA DE CARNAVAL COMO FERIADO NACIONAL OBRIGATÓRIO,

PROCEDENDO À DÉCIMA SÉTIMA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO, APROVADO PELA LEI

N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO

Exposição de motivos

O carnaval é, em Portugal, uma época festiva de grande importância. Com origem no reinado de D. Afonso

III, ainda no Século XIII, a festa portuguesa é diferente daquela que ocorre em outros países que também

assinalam esta data, uma vez que é marcada pela preocupação em preservar ao máximo a identidade cultural

e a tradição associada a estas festividades.

O carnaval é festejado a nível nacional, com particular importância, nomeadamente, para as localidades de

Torres Vedras, Ovar, Estarreja, Mealhada, Madeira, Loulé, Loures e Sesimbra, que todos os anos aplicam largos

milhares de euros em despesas associados a estes festejos. De acordo com a imprensa, em 2013, os 15

principais corsos de carnaval representaram um investimento de 2,1 milhões de euros, menos do que o registado

em 2012 (2,5 milhões de euros), tendo sido o de Ovar o mais dispendioso, no valor de 450 mil euros. Pelo

carácter especialmente tradicional, destacam-se ainda o carnaval de Cabanas de Viriato e de Podence.

A festa e os desfiles do carnaval mexem com vários setores e dinamizam as economias locais. É preciso

construir os carros alegóricos, fazer fatos e acessórios e criar músicas, algo que leva a meses de trabalho das

comunidades. Além disso, os turistas nacionais e estrangeiros que vão assistir aos desfiles e participar nas

comemorações também geram receitas, através de estadias em hotéis ou pousadas, aquisição de bens no

comércio local e consumo de produtos na área da restauração.

A título de exemplo, de acordo com um estudo realizado pela Escola Superior de Turismo e Tecnologia do

Mar de Peniche, tendo por base uma estimativa de cerca de 350 mil visitantes, o carnaval de Torres Vedras

gera um retorno na ordem dos 9 milhões de euros para a economia local, durante os cinco dias e quatro noites

do evento. Este retorno de investimento só é possível se existirem visitantes que, ainda que possam ser locais,

regra geral são turistas, oriundos de vários pontos do País. Ora este potencial de dinamização económica nem

sempre é totalmente conseguido pelo facto de a terça-feira de carnaval não ser considerada como um feriado

obrigatório, mas apenas facultativo.

Apesar disso, salvo neste ano que ficou marcado pelas contingências da crise sanitária, tradicionalmente o

Governo, mediante despacho, tem concedido tolerância de ponto na terça-feira de carnaval aos trabalhadores

que exercem funções públicas nos serviços da administração direta do Estado, sejam eles centrais ou

desconcentrados, e nos institutos públicos, exatamente por considerar que existe em Portugal «uma tradição

consolidada de organização de festas neste período».

Mais, a não concessão de tolerância de ponto pelo XIX Governo Constitucional, de PSD/CDS-PP, foi uma

medida bastante contestada especialmente pelos municípios com maior tradição carnavalesca, que

argumentaram que a decisão iria penalizar as receitas com os festejos daquela altura do ano. Por este motivo,

a grande maioria dos municípios por sua iniciativa concederam, naqueles anos, tolerância de ponto aos seus

funcionários. A título de exemplo, em 2013, quase 200 autarquias concederam tolerância de ponto, existindo um

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aumento do número de municípios a conceder este benefício de 2014 para 2015.

Acresce ainda referir que embora para o setor privado este feriado seja facultativo, uma parte significativa

das empresas adicionam a terça-feira de carnaval à lista de feriados obrigatórios, por via de instrumentos de

regulamentação coletiva, como contratos coletivos e acordos de empresa.

O calendário escolar encontra-se também organizado no pressuposto que a terça-feira de carnaval é

considerada feriado, tanto que está previsto um período de férias para esta época. Por esse motivo, muitas

famílias aproveitam esta data para agendarem férias juntos, facto de grande importância tendo em consideração

que tal é árduo ao longo do ano pela difícil conciliação entre o calendário escolar e os períodos de férias dos

pais. Na sociedade moderna, os pais veem-se submetidos a um ritmo alucinante, trabalhando todo o dia, com

exigências profissionais cada vez maiores, deixando pouco tempo e disponibilidade para estarem com os filhos.

Por este motivo, numa época em que as famílias estão cada vez mais distanciadas, é preciso incentivar e criar

condições efetivas que permitam o aumento do número de períodos de lazer em família, sendo a época de

carnaval um ótimo período para tal.

De acordo com o Relatório da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE),

publicado em 7 de julho 2016, tendo como base o Inquérito Europeu às Forças do Trabalho, Portugal ocupa a

décima posição, numa lista composta por 38 países, com a maior carga horária laboral. Os trabalhadores

portugueses trabalham 1868 horas por ano, mais 102 horas que a média dos países da OCDE. Contudo, são

vários os estudos que indicam que à medida que aumentamos o número de horas de trabalho a produtividade

diminui, estando inclusive associado ao aumento de produtividade a existência de maiores períodos de

descanso e lazer, pelo que é preciso promover o aumento destes períodos, nomeadamente pelo aumento do

número de dias de férias e feriados.

Em conclusão, pelos motivos anteriormente enunciados, nomeadamente a necessidade de medidas que

garantam aos trabalhadores mais tempo para lazer, a premência de pôr fim a uma discriminação que se tem

verificado quanto aos trabalhadores do setor privado face aos do setor público e por forma a assegurar a

verificação nas economias locais dos impactos positivos associados a estas festividades, com a presente

iniciativa o Grupo Parlamentar do PAN pretende consagrar no Código do Trabalho a terça-feira de carnaval

como feriado obrigatório.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o

Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei consagra a terça-feira de carnaval como feriado nacional obrigatório, procedendo para o efeito

à décima sétima alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e alterado

pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de

29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de

abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto,

14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de abril.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

Os artigos 234.º e 235.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua

atual redação, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 234.º

[…]

1 – São feriados obrigatórios os dias 1 de janeiro, de terça-feira de carnaval, de Sexta-Feira Santa, de

Domingo de Páscoa, 25 de abril, 1 de maio, de Corpo de Deus, 10 de junho, 15 de agosto, 5 de outubro, 1 de

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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novembro, 1, 8 e 25 de dezembro.

2 – […].

3 – […].

Artigo 235.º

[…]

1 – Além dos feriados obrigatórios, pode ser observado a título de feriado, mediante instrumento de

regulamentação coletiva de trabalho ou contrato de trabalho, o feriado municipal da localidade.

2 – Em substituição do feriado municipal da localidade, pode ser observado outro dia em que acordem

empregador e trabalhador.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.

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PROJETO DE LEI N.º 970/XIV/3.ª

DETERMINA A PROIBIÇÃO DAS CORRIDAS DE CÃES COM FINS COMPETITIVOS

Exposição de motivos

A Declaração Universal dos Direitos dos Animais, redigida pela Liga Internacional dos Direitos do Animal, foi

proclamada em 15 de outubro de 1978 no seio da UNESCO. Trata-se de um documento que, embora com um

cariz não vinculativo, tem a importância de conter normas gerais de proteção do bem-estar animal, assentes

numa relação de coexistência harmónica entre os seres humanos e os animais e reconhece direitos aos animais,

nomeadamente o direito à vida e à alimentação, assim como a sua proteção de situações de maus-tratos e

tratamentos cruéis. Veja-se o artigo 1.º da Declaração que dispõe que «Todos os animais nascem iguais perante

a vida e têm os mesmos direitos à existência».

Apesar da antiguidade da referida Declaração sabemos que ainda há muito a fazer nesta matéria. É

importante destacar que o legislador tem percorrido um caminho importante no reforço das medidas de proteção

dos animais de companhia. Para além da Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, que marca a aprovação da designada

primeira lei de proteção de animais, em 2014, com a aprovação da Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, que altera

o Código Penal, o legislador criminalizou os maus-tratos a animais de companhia, alteração que reuniu um

consenso parlamentar alargado.

Mais tarde, com a alteração operada pela Lei n.º 8/2017, de 3 de março, foi aditado o artigo 201.º-B ao Código

Civil, com a epígrafe «animais» que prevê que «Os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto

de proteção jurídica em virtude da sua natureza.» Prevendo-se, ainda, no artigo 493.º-A do Código Civil, o direito

do detentor do animal de companhia a ser indemnizado em caso de lesão ou morte. Esta alteração veio pôr na

lei algo que já reunia um consenso na nossa sociedade e em vários países, ou seja, o reconhecimento de que

os animais são seres vivos sensíveis e a necessidade de prever medidas específicas de proteção destes contra

maus-tratos infligidos pelos seus detentores ou por terceiros.

Para além disso, era evidente que o Código Civil, ao não prever um tratamento autónomo dos animais não

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humanos, estava desatualizado face às alterações ocorridas em 2014 no âmbito jurídico-penal.

Todas estas alterações vão ao encontro do reconhecido na Declaração de Cambridge sobre a consciência

animal, proclamada em 2012 por um proeminente grupo internacional de especialistas das áreas de

neurociência cognitiva, neurofarmacologia, neurofisiologia, neuroanatomia e neurociência computacional, que

conclui que: «A ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo experimente estados afetivos.

Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos neuroanatômicos, neuroquímicos

e neurofisiológicos dos estados de consciência juntamente com a capacidade de exibir comportamentos

intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os humanos não são os únicos a possuir os

substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo todos os mamíferos e aves,

e muitas outras criaturas, incluindo os polvos, também possuem esses substratos neurológicos.»

Pelo que em 2017 se deu o importantíssimo passo de reconhecer legalmente que os animais se distinguem

das coisas, sendo sim, seres sensíveis e, por isso, suscetíveis de proteção. Note-se que o artigo do Código Civil

não faz qualquer distinção sobre se se refere meramente a animais de companhia, portanto, o seu âmbito

extravasa essa classificação.

Face a estas alterações legislativas importa agora completar o nosso ordenamento jurídico, passando a

prever situações específicas que não estavam antes previstas, harmonizando-as com este novo estatuto.

Carla Amado Gomes em «Desporto e Proteção de Animais por um Pacto de Não Agressão»1, faz uma análise

da legislação portuguesa aplicável aos animais, onde acaba por concluir, no que diz respeito à relação entre a

proteção dos animais e o desporto, que a Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, é ambígua. A autora refere que, por

exemplo, no seu artigo 1.º, é possível extrair um entendimento de que as práticas desportivas (com ou sem

componente de espetáculo) que impliquem sofrimento gratuito para os animais – leia-se: sofrimento que não

seja justificado por uma finalidade alimentícia ou científica humana, são já proibidas. No entanto, refere decisões

judiciais cuja interpretação demonstra que o julgador decidiu de forma diferente, deixando evidente a

necessidade de clarificação. A referida autora defende que a interpretação da Lei n.º 92/95 deve ser mais

consentânea com o contexto normativo global e com o sentimento de uma comunidade cada vez mais motivada

para uma reavaliação da relação entre o homem e os restantes componentes do ecossistema. Interpretação

com a qual concordamos, no entanto, havendo dúvida, cabe ao legislador clarificar e, é isso que se pretende

com o presente projeto.

Para chegar àquela conclusão, Carla Amado Gomes refere que «(…) um desporto que implique uma

utilização gratuita de um ser vivo, não sobrevive ao teste da necessidade, lido à luz do 'respeito pelos valores

do ambiente'. As tradições formam-se, perdem-se, recuperam-se, banem-se, como fenómenos

culturais/temporais que são. Os desportos/espetáculos, ainda que tradicionais, devem ser revistos de acordo

com as alterações de conceções sociais dominantes: não é despiciendo que atualmente não haja lutas de

gladiadores ou que as lutas de cães sejam proibidas (cfr. o Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro). Os

animais são companheiros do homem na aventura da vida e como tal e na sua condição de seres sensíveis,

devem ser resguardados de práticas que, desnecessariamente, lesem a sua integridade.»

Veja-se o exemplo, precisamente, da corrida de galgos. Podendo ser considerado uma um desporto (tradição

não é certamente), não cumpre os requisitos elencados por Carla Amado Gomes.

Tal como os subscritores da Iniciativa Legislativa de Cidadãos, que visa a «proibição da corrida de cães em

Portugal», referem, «Múltiplos estudos científicos, desenvolvidos, designadamente, pela American Society for

the Prevention of Cruelty to Animals (ASPCA), pela People for the Ethical Treatment of Animals (PETA), pela

Royal Society for the Prevention of Cruelty to Animals (RSPCA), pela Animals Australia, entre outras

organizações com atuação mundial, assim como investigadores na área do bem-estar animal, alertam para os

riscos que advêm da utilização de cães em corridas, tais como: excesso de criação de animais, podendo resultar

em abandono; instalações inadequadas para manutenção dos animais; ausência de enriquecimento ambiental

e falta de socialização com outros animais e humanos, resultando e, podendo resultar em problemas

comportamentais graves como compulsões, comportamentos repetitivos, apatia, latidos em excesso, ansiedade

de separação, entre outros; utilização de métodos de treino com recurso à força, ao excesso e à violência,

promovendo maus-tratos e esforço físico excessivo, muitas vezes resultando na morte do animal; altos índices

de taxas de mortalidade, baixos índices de esperança média de vida; utilização de isco vivo (recorrentemente

lebres), que resulta em mortes agónicas dos mesmos e em ferimentos nos cães; administração de substâncias

1 https://www.icjp.pt/sites/default/files/papers/cej-animais_revisto.pdf

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proibidas ou não registadas, promovendo o tráfico de estupefacientes; ferimentos e fraturas resultantes das

diversas práticas existentes antes e durante as corridas; tratamentos e atos médicos efetuados por indivíduos

sem formação médico-veterinária e cédula profissional, pondo em risco a vida do animal e em causa a ética e

deontologia profissional; importação e exportação de animais sem assegurar os requisitos de certificação

veterinária para o bem-estar e a sanidade animal, podendo colocar em risco a saúde pública através da

transmissão de zoonoses: raiva, leptospirose, dermatofitose, sarna sarcótica, borreliose, erliquiose, bordetella

bronchiseptica, vírus da parainfluenza canina, herpes vírus, parasitoses gastrointestinais, entre outras; apontam

ainda altos índices de taxas de mortalidade nestes animais e baixos índices de esperança média de vida.»

O presente projeto não visa impedir os cães de correrem livremente, em local apropriado, mas tão somente

aquelas corridas organizadas com fim competitivo, para as quais os animais têm um treino específico, que

envolvem um isco e que sabemos que colocam em causa o bem-estar dos animais envolvidos.

Face ao exposto, cremos que não é aceitável que o ordenamento jurídico português, que reconhece a

senciência dos animais; que prevê normas específicas de proteção destes, regulando, inclusive, o direito de

propriedade e obrigando o detentor a assegurar o bem-estar do animal; que criminaliza os maus-tratos contra

animais e que reconhece a dor associada à perda destes, permita que os animais sejam usados para práticas

que impliquem o seu sofrimento, como é o caso da corrida de cães.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei determina a proibição de corridas de cães com fins competitivos.

Artigo 2.º

Definição

«Corridas de Cães», para efeitos do presente diploma entende-se por «corridas de cães» todos os eventos

que envolvam a instigação à corrida, por via de isco vivo ou morto (recorrentemente lebres), ou mesmo sem

isco, de animais da família Canidae em pistas, amadoras ou profissionais, instalações, terrenos ou outros tipos

de espaço, públicos ou privados, com fins competitivos.

Artigo 3.º

Corridas de cães

1 – Quem promover, divulgar, vender ingressos, fornecer instalações, prestar auxílio material ou qualquer

outro serviço inerente à sua realização, treinar ou participar com cães em corridas é punido com pena de prisão

até 2 anos ou com pena de multa de multa até 200 dias.

2 – A tentativa é punível.

Artigo 4.º

Contraordenações

Constitui contraordenação punível, pelo Presidente do ICNF, com coima cujo montante mínimo é de (euro)

500 e máximo de (euro) 3740 ou (euro) quem assistir a corridas de cães.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.

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A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

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PROJETO DE LEI N.º 971/XIV/3.ª

ALTERA O CÓDIGO DO TRABALHO E A LEI GERAL DO TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS,

RECONHECENDO O DIREITO A 25 DIAS ÚTEIS DE FÉRIAS

Exposição de motivos

O direito a férias é um direito constitucionalmente protegido, previsto no artigo 59.º, n.º 1, alínea d), da

Constituição da República Portuguesa, que determina que «Todos os trabalhadores, sem distinção de idade,

sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito ao repouso

e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas».

Este direito está, igualmente, previsto nos artigos 238.º do Código do Trabalho e 126.º da Lei Geral do

Trabalho em Funções Públicas, que preveem que o período anual de férias tem a duração de 22 dias úteis.

Veja-se que o artigo 238.º, na redação inicial, previa que o trabalhador tinha direito a 22 dias úteis de férias,

os quais seriam aumentados no caso de o trabalhador não ter faltado ou ter apenas faltas justificadas no ano a

que as férias se reportam, nos seguintes termos: Três dias de férias, até uma falta ou dois meios dias; dois dias

de férias, até duas faltas ou quatro meios dias e um dia de férias, até três faltas ou seis meios dias. Esta

majoração foi revogada pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, mantendo-se apenas os 22 dias úteis de férias.

Ora, as férias visam proporcionar ao trabalhador a sua recuperação física e psíquica, permitindo uma maior

disponibilidade pessoal e incentivando a integração na vida familiar, bem como uma maior participação social e

cultural. Ajudam a diminuir o stress, aumentam os níveis de energia e permitem que o trabalhador possa

participar em atividades sociais, culturais e desportivas, algo que é difícil atendendo às longas jornadas de

trabalho.

Importa ter em conta que em Portugal o número de horas de trabalho registadas é superior ao da maioria

dos países da União Europeia.

A título de exemplo, de acordo com o relatório Working time in 2017-2018, do Eurofound1, Portugal está entre

os países com maior número de horas efetivamente trabalhadas, tendo-se registado uma média de 40,8 horas

em 2018, enquanto que a média da União Europeia se situava nas 40,2 horas.

Igualmente, segundo dados do Eurostat de 20192, Portugal está no topo dos países da União Europeia onde

se registam mais horas de trabalho semanais. Em 2018, a semana habitual de trabalho em Portugal foi de 39,5

horas, muito acima da média da União Europeia que se situava nas 37,1 horas e da dos países da Zona Euro

que se situava nas 36,5 horas.

Ora, as longas jornadas constituem um entrave à conciliação da vida pessoal e familiar com a vida

profissional. A isto acresce o facto de, frequentemente, os empregadores contactarem os trabalhadores fora do

horário de trabalho, interrompendo os seus períodos de descanso, o que torna esta conciliação ainda mais difícil.

Ao não conseguir fazer esta conciliação de forma equilibrada, o trabalhador acaba por descurar a sua vida

pessoal, pois sente que precisa de estar permanentemente disponível num mercado de trabalho altamente

competitivo. Em consequência, os tempos de lazer são cada vez menos e com melhor qualidade.

Esta situação tem reflexos na sua vida profissional, nomeadamente ao nível do absentismo e produtividade,

o que cria problemas às organizações laborais, quer pela sobrecarga dos colegas de trabalho presentes quer

pela potencial perda de clientes. Por isso, é fundamental garantir a existência de períodos de descanso e lazer

para aumentar o nível de satisfação dos trabalhadores, permitindo que estes sejam mais produtivos e exerçam

a sua atividade com maior segurança.

Importa, ainda, mencionar que ao nível da União Europeia, todos os Estados-Membros preveem um período

1 https://www.eurofound.europa.eu/publications/report/2019/working-time-in-2017-2018. 2 https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/portugal-no-topo-da-europa-em-horas-de-trabalho-510643#lg=1&slide=0.

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mínimo legal de férias anuais remuneradas que varia entre 20 e 25 dias. A Dinamarca, França, Luxemburgo,

Áustria e Suécia têm um mínimo de 25 dias e em Malta o período de férias corresponde a 24 dias3.

Ora, atendendo a que, conforme demonstrado pelos dados acima indicados do Eurostat e Eurofound, em

Portugal o número de horas efetivamente trabalhadas é superior ao da média dos países da União Europeia,

consideramos fundamental que sejam reforçados os períodos de descanso e lazer dos trabalhadores, medida

essencial para melhorar a conciliação da vida pessoal e familiar com a vida profissional.

Face ao exposto, com o presente projeto de lei, alteramos o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º

7/2009, de 12 de fevereiro, e a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de

20 de junho, consagrando o direito a 25 dias úteis de férias.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,

na sua redação atual e da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de

junho, na sua redação atual, consagrando o direito a 25 dias úteis de férias.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

É alterado o artigo 238.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado

pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de

29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de

abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto,

14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de abril, o

qual passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 238.º

[…]

1 – O período anual de férias tem a duração mínima de 25 dias úteis.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].»

Artigo 3.º

Alteração à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas

É alterado o artigo 126.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de

20 de junho, alterada pelas Leis n.os 82-B/2014, de 31 de dezembro, 84/2015, de 7 de agosto, 18/2016, de 20

de junho, 42/2016, de 28 de dezembro, 25/2017, de 30 de maio, 70/2017, de 14 de agosto, 73/2017, de 16 de

agosto, 49/2018, de 14 de agosto, 71/2018, de 31 de dezembro, 6/2019, de 14 de janeiro, 79/2019, de 2 de

setembro, 82/2019, de 2 de setembro, e 2/2020, de 31 de março, o qual passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 126.º

[…]

3 Cfr. Working time developments in the 21st century: Work duration and its regulation in the EU, do Eurofound

(https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef1573en.pdf) e Working time in 2017–2018, do Eurofound (https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef19030en.pdf).

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1 – […].

2 – O período anual de férias tem a duração de 25 dias úteis.

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no prazo de 60 dias a contar da sua aprovação.

Palácio de São Bento, 3 de outubro de 2021.

A Deputada não inscrita, Cristina Rodrigues.

———

PROJETO DE LEI N.º 972/XIV/3.ª

ALTERA O CÓDIGO DO TRABALHO, ESTABELECENDO AS 35 HORAS SEMANAIS COMO LIMITE

MÁXIMO DO PERÍODO NORMAL DE TRABALHO

Exposição de motivos

Em Portugal, nos termos do artigo 203.º do Código do Trabalho, o período normal de trabalho não pode

exceder 8 horas por dia e 40 horas por semana.

Ao nível da União Europeia, a generalidade dos países estabelece como período máximo semanal de

trabalho as 40 horas, com exceção da Bélgica com 38 horas e da França com 35 horas1.

No entanto, na prática, aquilo que se verifica é que o número de horas efetivamente trabalhadas é muito

maior em Portugal do que na maioria dos países da União Europeia.

A título de exemplo, de acordo com o relatório Working time in 2017-2018, do Eurofound2,Portugal está entre

os países com maior número de horas efetivamente trabalhadas, tendo-se registado uma média de 40,8 horas

em 2018, enquanto que a média da União Europeia se situava nas 40,2 horas.

Igualmente, segundo dados do Eurostat de 20193, Portugal está no topo dos países da União Europeia onde

se registam mais horas de trabalho semanais. Em 2018, a semana habitual de trabalho em Portugal foi de 39,5

horas, muito acima da média da União Europeia que se situava nas 37,1 horas e da dos países da Zona Euro

que se situava nas 36,5 horas.

Ainda, importa ter em conta que, no que diz respeito ao número médio de horas de trabalho semanais na

União Europeia, Portugal registou um aumento de 1,5 horas no período compreendido entre 2002 e 2014,

passando de 40,2 para 41,7 horas, como revela o relatório Working time developments in the 21st century: Work

duration and its regulation in the EU, do Eurofound4.

Assim, ainda que o limite máximo do período normal de trabalho seja idêntico ao dos restantes países

europeus, os dados demonstram que os portugueses trabalham mais horas, o que é consequência,

nomeadamente, do trabalho suplementar e dos mecanismos de desregulamentação do horário de trabalho

1 CfrWorking time in 2017–2018, publicado em 2019 pelo Eurofound, que pode ser consultado em https://www.eurofound.europa.eu/

publications/report/2019/working-time-in-2017-2018. 2 https://www.eurofound.europa.eu/publications/report/2019/working-time-in-2017-2018. 3 https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/portugal-no-topo-da-europa-em-horas-de-trabalho-510643#lg=1&slide=0. 4 https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef1573en.pdf.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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previstos na legislação laboral.

Apesar dos portugueses serem dos que mais horas trabalham, são, no entanto, dos que menos recebem,

sendo o salário mínimo nacional em Portugal inferior ao da generalidade dos países da Europa. Veja-se o caso

de Espanha com 1108 €; da Eslovénia com 1110 €; da França com 1555 €; da Alemanha com 1610 €; da Bélgica

com 1626 €; da Holanda com 1685 €; da Irlanda com 1724 €; do Reino Unido com 1903 € e o do Luxemburgo

com 2202 €, conforme resulta do relatório Minimum wages in 2021: Annual review, do Eurofound5.

Para além disto, apesar dos portugueses trabalharem mais horas do que na generalidade dos países da

Europa, tal não conduz necessariamente a uma maior produtividade, como demonstram os estudos já

realizados.

Eva Pereira e Guida Nogueira, no estudo Produtividade do trabalho em Portugal – Análise comparada ao

nível da empresa6, destacam que «Durante o período recente de recuperação económica, que se verificou

depois da crise de 2008, Portugal continuou a apresentar níveis de crescimento da produtividade do trabalho

comparativamente inferiores à generalidade dos países da União Europeia (UE). Como resultado, em 2017,

a produtividade do trabalho em Portugal correspondia a 76,6% da média da UE e 71,9% da Área Euro (a 4.ª

mais baixa deste grupo)».

De acordo com dados da Pordata, Portugal é o 8.º País da União Europeia com menor produtividade por

hora de trabalho7.

Ou seja, fazendo a ligação entre os níveis de produtividade e o número de horas trabalhadas,

nomeadamente os dados do Eurostat acima mencionados que revelam que Portugal tem uma carga horária

(39,5 horas por semana) acima da média da UE (37,1), conclui-se que os países da União Europeia que têm

maiores índices de produtividade são os que têm cargas horárias menos pesadas, o que demonstra que não

se consegue maior produtividade com mais horas de trabalho.

Pelo contrário, é fundamental garantir que o trabalhador goza do seu direito ao repouso e lazer, direito

constitucionalmente protegido e previsto igualmente no Código do Trabalho, para recuperação do seu

desgaste físico e psicológico, bem como para usufruir de atividades extralaborais, com família ou amigos.

Por isso, garantir a existência destes períodos é essencial para aumentar o nível de satisfação dos

trabalhadores, permitindo que estes sejam mais produtivos e exerçam a sua atividade com maior segurança.

Neste sentido, consideramos fundamental reduzir o horário de trabalho no sector privado para o limite

máximo das 35 horas semanais, à semelhança do que já foi feito para o sector público.

A Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, prevê no

seu artigo 105.º que o período normal de trabalho é de 7 horas por dia e 35 horas por semana, enquanto que

no sector privado o limite máximo são 8 horas por dia e 40 horas por semana.

Em consequência, se compararmos os diferentes períodos normais de trabalho existentes em Portugal

com o que se passa nos restantes países europeus, verificamos que, de acordo com dados do Eurofound,

Portugal é o que surge com maior diferença na comparação do horário normal do público e do privado, com

35 horas semanais no público e 39,4 horas no privado, não contabilizando estes dados o trabalho

suplementar8.

Face ao exposto, por considerarmos que não se justifica esta diferenciação entre o sector público e

privado e por entendermos que é fundamental reforçar os períodos de descanso e lazer dos trabalhadores,

propomos uma alteração ao Código do Trabalho, estabelecendo as 7 horas diárias e as 35 horas semanais

de trabalho como limite máximo do período normal de trabalho.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

5 https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef21015en.pdf. 6https://conselhoprodutividade.files.wordpress.com/2020/12/numero-11-produtividade-do-trabalho-em-portugal-analise-comparada-ao-nivel-da-empresa.pdf. 7 https://www.pordata.pt/Retratos/2020/Retrato+de+Portugal+na+Europa-87. 8 Cfr. Working time in 2017–2018, publicado em 2019 pelo Eurofound, que pode ser consultado em https://www.eurofound.europa.eu/ publications/report/2019/working-time-in-2017-2018.

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,

na sua redação atual, estabelecendo as 35 horas semanais de trabalho como limite máximo do período normal

de trabalho.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

São alterados os artigos 73.º, 203.º, 210.º, 211.º e 224.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009,

de 12 de fevereiro, alterado pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012,

de 25 de junho, 47/2012, de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de

agosto, 28/2015, de 14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto,

73/2017, de 16 de agosto, 14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e

18/2021, de 8 de abril, os quais passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 73.º

[…]

1 – O período normal de trabalho de menor não pode ser superior a sete horas em cada dia e a trinta e

cinco horas em cada semana.

2 – […].

3 – No caso de trabalhos leves efetuados por menor com idade inferior a 16 anos, o período normal de

trabalho não pode ser superior a seis horas em cada dia e trinta horas em cada semana.

4 – […].

Artigo 203.º

[…]

1 – O período normal de trabalho não pode exceder as sete horas por dia e as trinta e cinco horas por

semana.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

Artigo 210.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […].

2 – Sempre que a entidade referida na alínea a) do número anterior prossiga atividade industrial, o período

normal de trabalho não deve ultrapassar trinta e cinco horas por semana, na média do período de referência

aplicável.

Artigo 211.º

[…]

1 – Sem prejuízo do disposto nos artigos 203.º a 210.º, a duração média do trabalho semanal, incluindo

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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trabalho suplementar, não pode ser superior a quarenta e duas horas, num período de referência

estabelecido em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que não ultrapasse 12 meses ou, na

falta deste, num período de referência de quatro meses, ou de seis meses nos casos previstos no n.º 2 do

artigo 207.º

2 – […].

3 – […].

4 – […].

Artigo 224.º

[…]

1 – […].

2 – O período normal de trabalho diário de trabalhador noturno, quando vigora regime de adaptabilidade,

não deve ser superior a sete horas diárias, em média semanal, sem prejuízo do disposto em instrumento de

regulamentação coletiva de trabalho.

3 – […].

4 – O trabalhador noturno não deve prestar mais de sete horas de trabalho num período de vinte e quatro

horas em que efetua trabalho noturno, em qualquer das seguintes atividades, que implicam riscos especiais

ou tensão física ou mental significativa:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […].

5 – […].

6 – […]:

a) […];

b) […].

7 – […].»

Artigo 3.º

Garantia de direitos

Da redução do tempo de trabalho prevista neste diploma não pode resultar a redução do nível

remuneratório ou qualquer alteração desfavorável das condições de trabalho.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

1 – A presente lei entra em vigor no prazo de 60 dias a contar da sua aprovação.

2 – As entidades empregadoras dispõem do período transitório de seis meses para criarem as condições

necessárias para garantir o cumprimento do disposto no presente diploma.

Palácio de São Bento, 3 de outubro de 2021.

A Deputada não inscrita, Cristina Rodrigues.

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57

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PROJETO DE LEI N.º 973/XIV/3.ª

ALTERA O CÓDIGO DO TRABALHO, DETERMINANDO A OBRIGATORIEDADE DE INCLUSÃO NOS

ANÚNCIOS DE EMPREGO DE ASPETOS RELEVANTES DA PRESTAÇÃO DE TRABALHO

Exposição de motivos

Com o fomento das novas tecnologias, a internet passou a ser o mecanismo principal de divulgação de

anúncios de emprego pelas entidades empregadoras, existindo inclusive sites específicos para a sua publicação.

Contudo, quando consultamos os anúncios publicados, verificamos que, na maioria dos casos, as

informações elencadas são claramente insuficientes para o candidato a emprego decidir se pretende ou não

candidatar-se à vaga disponibilizada. Por exemplo, nem sempre é identificada a entidade empregadora, o local

de trabalho, o tipo de vínculo laboral ou o valor da retribuição.

Ora, estes elementos têm obviamente relevância para quem procura emprego. É normal que o candidato

queira saber onde irá prestar funções e se trabalhará sempre no mesmo local ou em locais diferentes porque

isso terá necessariamente impacto na sua dinâmica familiar.

É, ainda, relevante saber qual o vínculo contratual e, portanto, se será contratado a termo, por tempo

indeterminado ou a recibos verdes, isto porque para determinados candidatos pode ser fundamental que o

vínculo seja estável e outros podem querer prestar serviços para várias entidades, enquanto freelancer.

Depois, é comum encontrarmos anúncios em que é totalmente omissa a questão da remuneração ou que

incluem expressões vagas como «remuneração adequada à função». Constituindo a remuneração a

contrapartida pela prestação de trabalho, é relevante que o candidato conheça este valor para saber se tal

corresponde ou não às suas expectativas.

Importa mencionar que a inclusão destas informações é importante para o candidato, mas tem igualmente

relevância para o empregador. Imaginemos uma situação em que o anúncio não inclua todos àqueles elementos.

O candidato, que pode ter interesse na proposta tendo em conta as informações disponibilizadas, envia o seu

currículo que será depois apreciado pela empresa que colocou o anúncio. O candidato é chamado para

entrevista e é naquele momento que toma conhecimento de todas as informações relevantes para a contratação.

Suponhamos que o candidato não gosta das condições propostas, porque, por exemplo, o vínculo é precário ou

porque a remuneração é, na sua perspetiva, insuficiente e, por isso, recusa o emprego. Ora, se o candidato

tivesse tido conhecimento de todos os elementos essenciais à contratação inicialmente, porque o próprio

anúncio disponibilizava estas informações, nunca teria enviado currículo. A ausência de elementos vitais no

anúncio levou a que tanto o candidato como o potencial empregador perdessem tempo, ou seja, no caso do

candidato o tempo relacionado com a candidatura, deslocação para entrevista e a própria entrevista e, no caso

da empresa, o tempo gasto na análise da candidatura e entrevista com o candidato.

Não podemos esquecer que o candidato pode estar em situação de desemprego, inclusivamente pode já

não estar a receber subsídio, e pode ter que se deslocar para entrevistas, suportando os custos com a

deslocação, sem que depois tenha interesse em aceitar o emprego porque as condições propostas não

correspondem às suas expectativas.

Em suma, se garantirmos que os anúncios de emprego contêm todas as informações relevantes para a

contratação conseguiremos que as candidaturas sejam apenas realizadas por aqueles que têm efetivo interesse

nas condições apresentadas, o que ajuda as empresas no momento da seleção das pessoas a contratar.

Ora, o artigo 106.º do Código do Trabalho, com a epígrafe «dever de informação», determina que «O

empregador deve prestar ao trabalhador, pelo menos, as seguintes informações: A respetiva identificação,

nomeadamente, sendo sociedade, a existência de uma relação de coligação societária, de participações

recíprocas, de domínio ou de grupo, bem como a sede ou domicílio; o local de trabalho ou, não havendo um fixo

ou predominante, a indicação de que o trabalho é prestado em várias localizações; a categoria do trabalhador

ou a descrição sumária das funções correspondentes; a data de celebração do contrato e a do início dos seus

efeitos; a duração previsível do contrato, se este for celebrado a termo; a duração das férias ou o critério para a

sua determinação; os prazos de aviso prévio a observar pelo empregador e pelo trabalhador para a cessação

do contrato, ou o critério para a sua determinação; o valor e a periodicidade da retribuição; o período normal de

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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trabalho diário e semanal, especificando os casos em que é definido em termos médios; o número da apólice

de seguro de acidentes de trabalho e a identificação da entidade seguradora; o instrumento de regulamentação

coletiva de trabalho aplicável, se houver, bem como a identificação do fundo de compensação do trabalho ou

de mecanismo equivalente, bem como do fundo de garantia de compensação do trabalho, previstos em

legislação específica».

Por sua vez o artigo 107.º estabelece que esta informação deve ser prestada por escrito, considerando-se

cumprido este dever quando a informação em causa constar de contrato de trabalho reduzido a escrito ou de

contrato-promessa de contrato de trabalho.

Ou seja, o legislador considerou, e bem, que existe um mínimo de informações que devem ser prestadas ao

trabalhador antes da assinatura do contrato, por consubstanciarem aspetos relevantes na prestação de trabalho.

Ora, são exatamente estes elementos, ou seja, os elencados no artigo 106.º, que consideramos que devem

constar já do anúncio de emprego, contribuindo tal para o reforço da transparência e do direito dos candidatos

à informação. Anúncios mais completos e detalhados permitem não só atrair mais candidatos como garantem

que aqueles que concorrem têm verdadeiramente interesse em fazê-lo porque concordam com as condições

propostas, tendo por isso benefícios claros para o empregador e para os candidatos.

Face ao exposto, propomos uma alteração ao Código do Trabalho, determinado que os aspetos relevantes

na prestação de trabalho elencados no artigo 106.º devem constar do anúncio de emprego divulgado, por

qualquer meio, pela entidade empregadora.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,

na sua redação atual, definindo os elementos que devem constar nos anúncios de emprego, garantindo o reforço

do direito à informação dos candidatos.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

É alterado o artigo 106.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado

pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de

29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de

abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto,

14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de abril, o

qual passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 106.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

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h) […];

i) […];

j) […];

l) […];

m) […].

4 – […].

5 – Os anúncios de emprego divulgados, por qualquer meio, pelo empregador devem conter

obrigatoriamente as informações previstas no n.º 3 do presente artigo, com exceção do disposto nas

alíneas a), f), g), h), j) e m), salvo o disposto no artigo seguinte.

6 – A identificação do empregador e o valor certo ou estimado da retribuição deve ser indicado no

anúncio de emprego ou posteriormente ao candidato no contacto que precede a entrevista.

7 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto em qualquer alínea do n.º 3 e no n.º 5 do

presente artigo.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias a contar da sua aprovação.

Palácio de São Bento, 3 de setembro de 2021.

A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

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PROJETO DE LEI N.º 974/XIV/3.ª

ALTERAÇÃO À LEI N.º 2/2013, DE 10 DE JANEIRO, E À LEI 53/2015, DE 11 DE JUNHO, COM VISTA

AO REFORÇO DO INTERESSE PÚBLICO, DA AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DA REGULAÇÃO E

PROMOÇÃO DO ACESSO A ATIVIDADES PROFISSIONAIS

Exposição de motivos

Desde há muitos anos que a União Europeia alerta para a necessidade de os Estados-Membros identificarem

e eliminarem entraves no acesso a profissões reguladas, de forma a criar oportunidades de emprego e aumentar

o potencial de crescimento económico na Europa. Neste contexto, em 2017 a Comissão Europeia adotou uma

Comunicação relativa às recomendações para a reforma da regulação dos serviços profissionais [COM (2016)

820, de 10 de janeiro de 2017], onde identifica uma série de entraves resultantes da regulamentação dos

serviços profissionais pelos Estados-Membros, que não visam necessariamente a consecução de objetivos de

interesse geral ou, quando os visam, não são adequados, necessários ou proporcionais. Nesta Comunicação a

Comissão Europeia faz apelo a diversos estudos que demonstram que a redução de entraves pode aumentar a

produtividade e eficiência da economia, bem como o emprego. Assim, a Comissão faz várias recomendações

aos Estados-Membros, incluindo Portugal, no sentido de eliminaram restrições injustificadas e criarem um

quadro regulamentar que promova crescimento, inovação e emprego.

Também a Diretiva 2018/958, de 28 de junho de 2018, transposta para o ordenamento jurídico nacional pela

Lei n.º 2/2021, de 21 de janeiro, sobre o regime de acesso e exercício de profissões e atividades profissionais,

tem como objetivo assegurar que as regras nacionais de organização do acesso às profissões reguladas não

constituam um obstáculo injustificado ou desproporcionado ao exercício do direito fundamental à livre escolha

de uma atividade profissional.

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No âmbito do Semestre Europeu, a União Europeia considera que os esforços de Portugal para reduzir a

carga regulamentar das profissões reguladas, que tiveram tradução na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que

estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais,

foram travados ou mesmo revertidos pelos estatutos das diferentes ordens. Alertou, igualmente, para a falta de

resposta às recomendações da Comissão sobre a regulação dos serviços profissionais, bem como à análise da

OCDE de 2018 sobre a concorrência no domínio das profissões autorreguladas em Portugal, recomendando

expressamente a redução de restrições nas profissões altamente reguladas.

De entre as recomendações da OCDE a Portugal (Economic Outlook2019) consta a redução de barreiras

regulatórias nas profissões reguladas e, especificamente, a alteração de regras ao nível da supervisão do acesso

a estas profissões, que deve estar a cargo de um órgão independente. Já em 2018, a OCDE, em cooperação

com a Autoridade da Concorrência (AdC), realizou uma avaliação de impacto concorrencial da regulamentação

de uma série de profissões autorreguladas (advogados, solicitadores, agentes de execução, notários,

engenheiros, engenheiros técnicos, arquitetos, auditores, contabilistas certificados, despachantes oficiais,

economistas, farmacêuticos e nutricionistas). De entre as recomendações formuladas pela OCDE e AdC,

destacam-se a necessidade de separar a função regulatória da função representativa e de as mesmas serem

dotadas de um órgão de supervisão independente, de forma a contribuir para uma melhor regulação e criar

incentivos à inovação em prol dos consumidores. Uma outra recomendação, prende-se com a necessidade de,

nas sociedades profissionais, abrir o acesso a parcerias, propriedade e gestão de empresas profissionais a

indivíduos de outras profissões e permitir que empresas multidisciplinares atuem nos vários setores

profissionais, de forma a que diferentes modelos de negócios surjam no mercado e respondam à procura de

serviços multidisciplinares.

Tendo em consideração este contexto, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista realizou, entre março e

julho de 2020, audições com representantes das ordens profissionais, associações representativas dos

diferentes profissionais e associações de estudantes para analisar estas e outras recomendações.

O presente projeto de lei visa introduzir alterações ao regime jurídico das associações públicas profissionais,

cuja inestimável missão de regulação e representação oficial de amplos setores de atividade em nome do

interesse público deve ser reforçada através de medidas que garantam uma maior independência e isenção da

sua função regulatória e a eliminação de restrições não justificadas pelo interesse público. Por isso, é objetivo

deste diploma reforçar as competências regulatórias do órgão de supervisão das associações profissionais e

garantir a sua independência e isenção, densificando o regime jurídico em vigor que já prevê a obrigatoriedade

deste órgão independente. Por outro lado, tendo em consideração que uma das principais missões das

associações públicas profissionais é a defesa dos interesses gerais dos destinatários dos serviços, propõe-se

que o Provedor do cliente passe a ser obrigatório, ao mesmo tempo que se reforça os poderes de fiscalização

das associações. Para eliminar restrições injustificadas ao acesso às profissões reguladas, estabelecem-se

limites claros quanto aos estágios profissionais e eventuais cursos de formação e exames, que não devem incidir

sobre matérias já lecionadas e avaliadas pelas instituições de ensino superior, que estão sujeitas a processos

de avaliação e acreditação rigorosos, que envolvem as associações públicas profissionais.

Por fim, com o objetivo de dar pleno cumprimento ao artigo 25.º da Diretiva 2006/123/CE, relativa aos serviços

no mercado interno é proposta uma densificação das condições de constituição e funcionamento das sociedades

profissionais multidisciplinares, já previstas na lei em vigor, para que possam fornecer serviços multidisciplinares

e inovadores, com claros benefícios para os seus beneficiários.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados abaixo assinados

do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração:

a) Da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e

funcionamento das associações públicas profissionais;

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b) Da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e funcionamento das

sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 2/3013, de 10 de janeiro

Os artigos 3.º, 5.º, 8.º, 15.º, 16.º, 18.º, 20.º, 21.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 30.º, 46.º e 48.º da Lei n.º 2/2013, de

10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações

públicas profissionais, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 3.º

Constituição

1 – […].

2 – A constituição de novas associações públicas profissionais é sempre precedida dos seguintes

procedimentos:

a) […];

b) Audição das associações representativas da profissão e emissão de parecer de outras partes

interessadas, nomeadamente reguladores de serviços prestados pelas profissões em questão, Conselho

de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), Conselho Coordenador dos Institutos Superiores

Politécnicos (CCISP), associações científicas ou profissionais das áreas abrangidas, Autoridade da

Concorrência e representantes dos consumidores;

c) […].

3 – […].

Artigo 5.º

Atribuições

1 – São atribuições das associações publicas profissionais, nos termos da lei:

a) A representação e defesa dos interesses gerais da profissão, no respeito dos direitos e interesses

gerais dos destinatários dos serviços;

b) [Anterior alínea c)];

c) [Anterior alínea d)];

d) [Anterior alínea e)];

e) [Anterior alínea f)];

f) [Anterior alínea g)];

g) [Anterior alínea h)];

h) A fiscalização sobre a atuação dos seus membros no âmbito das suas funções, para efeitos de

exercício do poder disciplinar, podendo estabelecer protocolos com os competentes serviços de

fiscalização e inspeção do Estado;

i) […];

j) […];

k) […];

l) […];

m) […];

n) […];

2 – As associações públicas profissionais estão impedidas de exercer ou de participar em atividades de

natureza sindical ou que se relacionem com a regulação das relações económicas ou profissionais dos seus

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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

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membros, bem como exercer atividades de natureza comercial, sem prejuízo da comercialização de

artigos institucionais.

3 – As associações públicas profissionais não podem, por qualquer meio, seja ato ou regulamento,

estabelecer restrições à liberdade de acesso e de exercício da profissão, nem infringir as regras da

concorrência na prestação de serviços profissionais, nos termos do direito nacional e da União Europeia.

Artigo 8.º

Estatutos

1 – Os estatutos das associações públicas profissionais são aprovados por lei e devem regular, com os

limites definidos na presente lei:

a) […];

b) […];

c) Estágios profissionais ou outros, previstos em lei especial que sejam justificadamente necessários para o

acesso e exercício da profissão, apenas quando o estágio profissional não faça parte integrante do curso

conferente da necessária habilitação académica;

d) Número de períodos de inscrição por ano, nos casos em que esteja prevista a realização de estágio

profissional ou exame, devendo, pelo menos, haver um período de inscrição por ano.

e) […];

f) […]

g) […];

h) […] ;

i) […];

j) […];

k) […];

l) […];

m) […];

n) […];

o) […];

p) […];

q) Provedor dos destinatários dos serviços.

2 – Para os efeitos das alíneas c) e d) do número anterior, os estatutos estabelecem o regime do estágio de

acesso à profissão ou, sendo o caso, do período formativo correspondente, nomeadamente, quanto aos

seguintes aspetos:

a) Duração máxima do estágio, que não pode exceder os 12 meses, a contar da data de inscrição e incluindo

as fases eventuais de formação e de avaliação;

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […].

3 – A organização das fases eventuais de formação e de avaliação dos estágios profissionais referidos no

número anterior é da responsabilidade das associações públicas profissionais respetivas, sem prejuízo de a

lei definir o envolvimento de entidades públicas nos procedimentos de implementação ou de execução do

estágio profissional ou regimes de financiamento das entidades formadoras públicas e, sendo caso disso, o

envolvimento de entidades empregadoras públicas na realização dos estágios.

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1 DE OUTUBRO DE 2021

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4 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a definição das matérias a lecionar no período

formativo e, eventualmente, a avaliar em exame final deve garantir a não sobreposição com matérias ou

unidades curriculares que integram o curso conferente da necessária habilitação académica, devendo

as eventuais fases de formação ser também disponibilizadas na modalidade de ensino à distância com

taxas reduzidas.

5 – [Anterior n.º 4.]

6 – As taxas cobradas durante o estágio profissional ou eventual período de formação obedecem aos

critérios da adequação, necessidade e proporcionalidade.

7 – Os estágios profissionais são remunerados nos termos a definir nos estatutos das respetivas

associações públicas profissionais.

8 – A avaliação final do estágio é da responsabilidade de um júri independente, que deve integrar

personalidades de reconhecido mérito, que não sejam membros da associação pública profissional.

9 – Nos termos do disposto na alínea o) do número 1, as associações públicas profissionais não

podem recusar o reconhecimento de habilitações académicas e profissionais obtidas no estrangeiro que

estejam devidamente reconhecidas em Portugal ao abrigo da lei, do Direito da União Europeia ou de

convenção internacional.

Artigo 15.º

Órgãos

1 – […].

2 – Constituem órgãos obrigatórios das associações públicas profissionais:

a) […];

b) […];

c) Um órgão de supervisão, nos termos do artigo 15.º-A.

d) Um órgão disciplinar, eleito pela assembleia representativa, que exerce o poder disciplinar,

devendo integrar personalidades de reconhecido mérito que não sejam membros da associação pública

profissional.

e) [Anterior alínea d).]

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – A assembleia representativa é eleita por sufrágio universal, direto, secreto e periódico.

8 – […].

9 – […].

10 – O órgão de supervisão é independente no exercício das suas funções.

11 – […].

12 – […].

13 – As listas de candidatos aos órgãos eletivos das associações públicas profissionais devem

promover a igualdade entre homens e mulheres, assegurando que a proporção de pessoas de cada sexo

não seja inferior a 40%, salvo se no universo eleitoral existir uma percentagem de pessoas do sexo

menos representado inferior a 20%.

Artigo 16.º

Elegibilidade

1 – […].

2 – Os estatutos podem condicionar a elegibilidade para o cargo de membro dos órgãos com competências

executivas à verificação de um tempo mínimo de exercício da profissão, nunca superior a cinco anos, e para o

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cargo de presidente, de bastonário ou de membro dos órgãos com competência disciplinar e de supervisão,

nunca superior a 10 anos.

3 – […].

4 – Não são elegíveis para os órgãos das associações públicas profissionais os profissionais que

tenham desempenhado cargos em órgãos dos sindicatos do setor nos últimos quatro anos.

Artigo 18.º

Poder disciplinar

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – O exercício das funções disciplinares das associações públicas profissionais é definido nos respetivos

estatutos, competindo ao órgão disciplinar com recurso para o órgão de supervisão.

8 – […].

9 – Têm legitimidade para participar factos suscetíveis de constituir infração disciplinar ao órgão disciplinar

e para recorrer das decisões para o órgão de supervisão, designadamente:

a) […];

b) O provedor dos destinatários dos serviços;

c) […];

d) […];

Artigo 20.º

Provedor dos destinatários de serviços

1 – Sem prejuízo do estatuto do Provedor de Justiça, as associações públicas profissionais designam uma

personalidade independente com a função de defender os interesses dos destinatários dos serviços profissionais

prestados pelos membros daquelas.

2 – O provedor dos destinatários dos serviços é designado pelo Bastonário ou Presidente da

associação pública profissional de entre três candidatos propostos pela entidade pública responsável

pela defesa do consumidor e não pode ser destituído, salvo por falta grave no exercício das suas

funções.

3 – Sem prejuízo das demais competências previstas na lei ou nos estatutos, compete ao provedor analisar

as queixas apresentadas pelos destinatários dos serviços e fazer recomendações para a sua resolução, bem

como em geral para o aperfeiçoamento do desempenho da associação.

4 – O cargo de provedor é remunerado nos termos do estatuto ou do regulamento da associação

pública profissional.

5 – […].

Artigo 21.º

Referendo interno

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

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5 – Os referendos só são vinculativos se neles participar mais de metade dos membros da associação pública

profissional, salvo se a proposta submetida a referendo obtiver mais de 66% dos votos e a participação for

superior a 40%.

Artigo 24.º

Acesso e registo

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […]:

a) Verificação das capacidades profissionais pela sujeição a estágio profissional ou outro, previstos em lei

especial, nos termos e com os limites definidos na presente lei;

b) […];

c) Realização de exame final de estágio com o objetivo de avaliar os conhecimentos e as competências

necessárias para a prática de atos de confiança pública a realizar por um júri independente nos termos e

com os limites definidos na presente lei.

7 – […].

8 – […].

Artigo 25.º

Inscrição

1 – Têm direito a inscrever-se nas associações públicas profissionais todos os que preencham os requisitos

legais para o acesso à profissão e a desejem exercer, individualmente, em sociedade de profissionais ou em

sociedade multidisciplinar.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

Artigo 26.º

Exercício da profissão em geral

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – Os prestadores de serviços profissionais, incluindo as sociedades de profissionais, as sociedades

multidisciplinares ou outras formas de organização associativa de profissionais referidas no n.º 4 do artigo 37.º

e os demais empregadores ou subcontratantes de profissionais, ficam sujeitos aos requisitos constantes dos

n.os 1 e 2 do artigo 19.º e dos artigos 20.º e 22.º do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, e ainda, no que se

refere a serviços prestados por via eletrónica, ao disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de

janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 62/2009, de 10 de março, e pela Lei n.º 46/2012, de 29 de agosto.

5 – […].

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Artigo 27.º

Sociedades de profissionais e multidisciplinares

1 – Podem ser constituídas sociedades de profissionais que tenham por objeto principal o exercício de

profissões organizadas numa única associação pública profissional.

2 – Podem ainda ser constituídas sociedades multidisciplinares de profissionais para exercício de

profissões organizadas em associações públicas profissionais, juntamente com outras profissões

organizadas ou não em associações públicas profissionais, desde que:

a) A sociedade garanta a aplicação do regime de incompatibilidades e impedimentos aplicável, bem

como de prevenção de conflitos de interesses, devendo, na ausência de medidas que garantam a

inexistência de tais conflitos, a prestação de serviços ser recusada ou cessada.

b) Os responsáveis pela orientação e execução de funções de interesse público sejam profissionais

qualificados;

c) Seja garantida a independência técnica, a proteção de informação de clientes e a observância dos

deveres deontológicos aplicáveis a cada atividade profissional desenvolvida;

d) A sociedade seja dotada de um sistema interno de salvaguarda de sigilo profissional, sempre que

aplicável.

3 – As sociedades profissionais referidas nos números anteriores, constituídas em Portugal, podem ser

sociedades civis ou assumir qualquer forma jurídica admissível por lei para o exercício de atividades comerciais.

4 – Podem ser sócios, gerentes ou administradores das sociedades referidas no número anterior

pessoas que não possuam as qualificações profissionais exigidas para o exercício das profissões

organizadas na associação pública profissional respetiva, ficando vinculados aos deveres

deontológicos e de sigilo aplicáveis ao exercício das profissões abrangidas.

Artigo 29.º

Incompatibilidades e impedimentos

Os estatutos podem prever regras relativas incompatibilidades e impedimentos no exercício da profissão,

desde que respeitem o disposto na presente lei e se mostrem necessárias e proporcionais ao objetivo de

garantir a independência, imparcialidade e integridade da profissão e, caso se justifique, o segredo profissional,

e não possam ser substituídas por alternativas menos restritivas da liberdade profissional.

Artigo 30.º

Reserva de atividade

1 – Sem prejuízo do disposto na alínea b) do artigo 358.º do Código Penal, as atividades profissionais

associadas a cada profissão só lhe são reservadas quando tal resulte expressamente da lei, fundada em razões

imperiosas de interesse público constitucionalmente protegido, segundo critérios de adequação, necessidade e

proporcionalidade, com enumeração taxativa das atividadesreservadas.

2 – As associações públicas profissionais não podem, por qualquer meio, estabelecer atividades

reservadas.

3 – [Anterior n.º 2].

4 – [Anterior n.º 3].

Artigo 46.º

Controlo jurisdicional

1 – Os regulamentos e as decisões das associações públicas profissionais praticadas no exercício de

poderes públicos estão sujeitos ao contencioso administrativo, nos termos das leis do processo administrativo.

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2 – Têm legitimidade para impugnar a legalidade dos atos e regulamentos das associações públicas

profissionais:

a) […].

b) […].

c) […].

d) […].

e) O provedor dos destinatários dos serviços.

Artigo 48.º

Relatório anual e deveres de informação

1 – As associações públicas profissionais elaboram anualmente um relatório sobre o desempenho das suas

atribuições, em especial sobre o exercício do seu poder regulatório e do poder disciplinar, o qual deve ser

apresentado à Assembleia da República e ao Governo, até 31 de março de cada ano.

2 – […].

3 – […].»

Artigo 3.º

Aditamento à Lei n.º 2/3013, de 10 de janeiro

É aditado o artigo 15.º-A da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação,

organização e funcionamento das associações públicas profissionais, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 15.º-A

Órgão de Supervisão

1 – O órgão de supervisão é independente no exercício das suas funções, vela pela legalidade da atividade

exercida pelos órgãos da associação e exerce poderes de controlo, nomeadamente em matéria disciplinar e em

matéria de regulação do exercício da profissão.

2 – Sem prejuízo de outras estabelecidas por lei, são competências do órgão de supervisão:

a) O exercício das atribuições previstas na alínea c) do artigo 8.º, em especial a determinação das regras de

estágio, incluindo a avaliação final, bem como a fixação de qualquer taxa referente às condições de acesso à

inscrição na associação profissional;

b) O reconhecimento de habilitações e competências profissionais obtidas no estrangeiro;

c) O exercício de poderes de controlo em matéria disciplinar, mediante recurso das decisões do órgão

disciplinar;

d) A supervisão da legalidade e conformidade estatutária e regulamentar da atividade exercida pelos órgãos

da associação;

e) A pronúncia, em sede de consulta, sobre propostas de atos legislativos que fixem reservas de atos da

profissão.

3 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o órgão de supervisão é composto pelos seguintes

membros, eleitos por maioria de 2/3 da assembleia representativa:

a) Três representantes da profissão, inscritos na associação pública profissional;

b) Dois membros oriundos dos estabelecimentos de ensino superior que habilitem academicamente o acesso

à profissão organizada em associação pública profissional, não inscritos na associação profissional;

c) Uma personalidade de reconhecido mérito, não inscrita na associação pública profissional.

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4 – O Provedor dos destinatários dos serviços é, por inerência, membro de pleno direito do órgão de

supervisão, com direito de voto em todas as matérias, salvo em relação aos recursos de decisões disciplinares

por si interpostos.

5 – Os membros do órgão de supervisão elegem o Presidente de entre os membros não inscritos na

associação pública profissional.»

Artigo 4.º

Alteração à Lei n.º 53/2015, de 11 de junho

É alterado o artigo 7.º da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e

funcionamento das sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais, que

passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 7.º

Objeto social

1 – […].

2 – […].

3 – Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, podem ainda ser constituídas sociedades

multidisciplinares de profissionais para exercício de profissões organizadas em mais do que uma

associação pública profissional nos termos dos n.os 2 a 4 do artigo 27.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de

janeiro.»

Artigo 5.º

Norma revogatória

É revogado o n.º 1 do artigo 33.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, o n.º 2 do artigo 9.º e o artigo 55.º da

Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e funcionamento das sociedades

de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais.

Artigo 6.º

Norma transitória

1 – O regime previsto na presente lei aplica-se às associações públicas profissionais já criadas e em processo

de criação.

2 – As associações públicas profissionais já criadas devem adotar as medidas necessárias para o

cumprimento do disposto na presente lei.

3 – No prazo de 120 dias, o Governo apresenta uma proposta de lei de alteração dos estatutos das

associações públicas profissionais já criadas e demais legislação aplicável ao exercício da profissão, que os

adeque ao regime previsto na presente lei, devendo expressamente avaliar se os regimes de reserva de

atividade em vigor cumprem o disposto no artigo 30.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, na redação dada pela

presente lei.

4 – Para efeitos do disposto na parte final do número anterior, a Autoridade da Concorrência envia ao

Governo, no prazo de 60 dias após a entrada em vigor da presente lei, um relatório sobre o cumprimento dos

critérios estabelecidos no n.º 1 do artigo 30.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, bem como na Lei n.º 2/2021,

de 21 de janeiro, com uma recomendação quanto à manutenção, alteração ou revogação dos regimes de reserva

de atividade em vigor.

Artigo 7.º

Reexame

No prazo de três anos a contar da data de entrada em vigor da presente lei, a Autoridade da Concorrência

deve apresentar à Assembleia da República um relatório sobre a aplicação e eficácia da presente lei, podendo

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ser acompanhado de propostas adequadas.

Artigo 8.º

Entrada em vigor e produção de efeitos

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produz efeitos no prazo de 90 dias após

a sua publicação.

Palácio de São Bento, 3 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do PS: Ana Catarina Mendonça Mendes — Constança Urbano de Sousa —

Joana Sá Pereira — Rita Borges Madeira — Maria Begonha — Ascenso Simões — Carlos Pereira — Cláudia

Santos — Hortense Martins — Isabel Oneto — Luís Capoulas Santos — Miguel Matos — Paulo Porto — Eduardo

Barroco de Melo — Francisco Rocha — Filipe Pacheco — Lúcia Araújo Silva — Susana Amador — Ana Passos

— Sofia Araújo — Clarisse Campos — José Manuel Carpinteira — Cristina Sousa — Elza Pais — Joana Bento

— Fernando José — Palmira Maciel — Cristina Mendes da Silva — Jorge Gomes — Sílvia Torres — Norberto

Patinho — Nuno Fazenda — Maria da Graça Reis — Alexandra Tavares de Moura — Eurídice Pereira — Olavo

Câmara — José Rui Cruz — Pedro Sousa — João Azevedo Castro — Romualda Fernandes — Rosário Gambôa

— Martina Jesus — Francisco Pereira Oliveira — Vera Braz — Susana Correia — Lara Martinho.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1460/XIV/3.ª

PELA PROTEÇÃO AMBIENTAL E SOCIAL NO PERÍMETRO DE REGA DO MIRA

O Perímetro de Rega do Mira está localizado nos concelhos de Odemira e Aljezur e possui uma área

beneficiada de 12 000 hectares inseridos no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina

(PNSACV). Esta área destinada à agricultura de regadio ocupa cerca de 20 por cento da área total do parque

natural. Como tal, dada a magnitude considerável da área de agricultura na área protegida, as explorações

agrícolas deste aproveitamento hidroagrícola devem estar sujeitas a rigorosos critérios ambientais e

paisagísticos, com vista à minimização dos impactes negativos que as explorações provocam no solo, na água,

no ar e, consequentemente, nos habitats e nas populações de espécies, muitas delas ameaçadas. O Governo

deve pôr em prática os instrumentos que tem ao seu dispor para salvaguardar o superior interesse da proteção

e conservação da natureza, da biodiversidade e da paisagem do PNSACV. Mas não é isso que tem acontecido.

Em maio de 2017, uma avaliação da Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento

do Território (IGAMAOT) relativa ao cumprimento das normas aplicáveis às atividades agrícolas integradas no

Perímetro de Rega do Mira previstas no Plano de Ordenamento do PNSACV encontrou um vasto conjunto de

irregularidades e atropelos à gestão do parque natural. A IGAMAOT identificou zonas de agricultura intensiva

que ameaçam os valores naturais da área protegida – nomeadamente «habitats importantes e locais de

ocorrência de espécies muito raras» – reconheceu a degradação de massas de água superficiais e subterrâneas,

e alertou para o incumprimento de normas ambientais. A situação tem sido provocada pela proliferação de um

«mar de plástico» de estufas, túneis elevados e estufins para a produção de hortofrutícolas, que, segundo dados

do Ministério da Agricultura, já atinge cerca de 1600 hectares no Perímetro de Rega do Mira.

Face à gravidade das conclusões da avaliação da IGAMAOT e a crescente ameaça aos valores naturais do

PNSACV, o governo piorou a situação. Ao invés de fortalecer os instrumentos e as ações para a conservação

da natureza e da biodiversidade na área protegida, o governo criou, através da Resolução do Conselho de

Ministros n.º 179/2019, de 24 de outubro, um regime especial para o Perímetro de Rega do Mira que possibilita

a instalação do triplo da área impermeabilizada por estufas, túneis elevados e estufins, até um máximo de 4.800

hectares. Além disso, o diploma do governo normalizou os problemas sociais associados às explorações

agrícolas do Perímetro de Rega do Mira. Em vez de procurar soluções habitacionais dignas para os

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trabalhadores migrantes que vivem em contentores, o diploma do governo criou um regime especial feito à

medida dos promotores das explorações agrícolas, promovendo a atual situação guetizante, precária e indigna,

ao equiparar os contentores a «estruturas complementares à atividade agrícola», por um período de 10 anos. A

nova Resolução do Conselho de Ministros n.º 69/2021, de 4 de junho, que «adapta» o regime especial, vem

simplificar o procedimento para a instalação de contentores, agravando assim a existência de condições de

habitação indigna.

O grupo parlamentar do Bloco de Esquerda entende que as Resoluções do Conselho de Ministros n.º

179/2019 e 69/2021 devem ser revogadas. Defende também que deve ser impedida a instalação e ampliação

de áreas de explorações agrícolas no Perímetro de Rega do Mira impermeabilizadas por estufas, túneis

elevados, estufins e outras estruturas de plástico. A interdição da proliferação destas explorações agrícolas deve

vigorar até que estejam reunidas as condições adequadas para a proteção da natureza e da biodiversidade da

área protegida, e garantidas condições laborais e habitacionais dignas para quem vive e trabalha nas estufas

da região, conforme recomendado pelo Bloco de Esquerda nos Projetos de Resolução n.os 225/XIV/1.ª e

820/XIV/2.ª.

Outra situação que preocupa o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda diz respeito à gestão dos recursos

hídricos da área de influência do Perímetro de Rega do Mira. A água que beneficia o aproveitamento

hidroagrícola é captada na albufeira de Santa Clara, em Odemira, e gerida pela Associação de Beneficiários do

Mira (ABM), uma entidade privada dominada pelos grandes produtores agrícolas em estufas. Num contexto de

crescente escassez hídrica na região, a ABM foi autorizada pelo governo a ampliar a área elegível para rega

das suas explorações agrícolas em estufas, através do regime especial criado pela Resolução do Conselho de

Ministros n.º 179/2019.

Passados dois anos, em 2021, e perante a crescente escassez hídrica da albufeira de Santa Clara, a ABM

decidiu cortar a água aos pequenos produtores ditos «precários», alegando que estes dispõem de alternativas.

Mas esse não é o entendimento de centenas de utentes que por falta de abastecimento de água de que

usufruíram – e pagaram – durante décadas, veem hoje em risco os seus pequenos negócios de produção de

hortícolas e animais. Além disso, durante os meses de maio e junho, a ABM também não garantiu o necessário

caudal ecológico a jusante da albufeira. A situação provocou danos na fauna e flora ribeirinhas e impediu a

população local de usufruir do espelho de água garantido pela água da albufeira. Quando contactada pela Junta

de Freguesia de Santa Clara-a-Velha para a reposição do caudal ecológico, a ABM informou que poderia garantir

a recarga do espelho de água, entre 15 de junho e 15 de setembro, a troco de 13 738 euros, mais IVA.

A concessão da captação de água da albufeira de Santa Clara foi atribuída pela Direção-Geral de Agricultura

e Desenvolvimento Rural à ABM. A atribuição da concessão foi um erro do governo. O superior interesse público

de abastecimento de água às populações e aos seus pequenos negócios, bem como a manutenção e caudais

ecológicos, não está garantido pela gestão privada da ABM. Como tal, só a gestão pública, responsável, justa e

eficiente pode garantir que a água chega a quem dela mais precisa. Os donos das grandes explorações agrícolas

do Perímetro de Rega do Mira não são detentores dos recursos hídricos da região e não podem geri-los como

se fossem. A concessão da utilização da água da albufeira de Santa Clara deve ser revogada e devolvida à

esfera pública, conforme recomendado pelo Bloco de Esquerda no Projeto de Resolução n.º 1224/XIV/2.ª

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda considera que o crescente número e tamanho de explorações

agrícolas impermeabilizadas por estufas, túneis elevados, estufins e outras estruturas de plástico no Perímetro

de Rega do Mira lesa o ambiente, a paisagem, a biodiversidade e os recursos hídricos, contrariando o interesse

público. A gestão privada da utilização da água na região tem agravado os efeitos negativos da expansão

agrícola permitida pelo governo ao impedir o acesso dos pequenos produtores a um bem essencial e ao negar

caudais ecológicos no rio Mira. As crises ecológica e climática em curso e as projeções de escassez de água

em vastas áreas do território aumentam a urgência da aplicação de instrumentos que travem a expansão de

culturas em regime intensivo e superintensivo, e que protegem a natureza, a biodiversidade, os recursos naturais

e a vida das populações.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Impeça a instalação e ampliação de áreas de explorações agrícolas no Perímetro de Rega do Mira

impermeabilizadas por estufas, túneis elevados, estufins e outras estruturas de plástico, até que esteja

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salvaguardada a proteção da natureza, da biodiversidade, dos recursos hídricos e da saúde humana;

2 – Revogue a Resolução do Conselho de Ministros n.º 179/2019, de 24 de outubro, alterada pela Resolução

do Conselho de Ministros n.º 69/2021, de 4 de junho;

3 – Impossibilite o recurso a apoios públicos para aquisição de contentores e outras formas de alojamento

precário destinados à habitação de trabalhadores agrícolas;

4 – Reverta para a gestão pública a concessão da utilização dos recursos hídricos da área de influência do

Perímetro de Rega do Mira.

Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.

As Deputadas e os Deputados do BE: Maria Manuel Rola — Ricardo Vicente — Pedro Filipe Soares — Jorge

Costa — Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso —

Isabel Pires — Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José

Moura Soeiro — Luís Monteiro — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Catarina Martins.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1461/XIV/3.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE NO QUADRO DA DIPLOMACIA DO CLIMA, PROMOVA AS

NECESSÁRIAS DILIGÊNCIAS PARA QUE A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS RECONHEÇA O

CLIMA ESTÁVEL COMO PATRIMÓNIO COMUM DA HUMANIDADE

Exposição de motivos

As alterações climáticas são um dos temas mais debatidos da atualidade. E são, no universo das

preocupações ambientais, o que pode ter maiores e mais diversificados impactos. Muitos desses efeitos já são

evidentes. Dispomos hoje, do maior o conhecimento acumulado de sempre sobre os diferentes fatores que

influenciam o clima e as suas consequências que requerem, desde já, um grande esforço global de antecipação,

planeamento e de adoção de medidas de adaptação com o respetivo e vultuoso financiamento.

A concentração de dióxido de carbono na atmosfera tem vindo a aumentar significativamente, em resultado,

no que respeita às emissões antropogénicas, do consumo de energias de origem fóssil para corresponder aos

crescimentos económico e demográfico. As emissões de gases com efeito de estufa já aumentaram mais de

50% desde 1990 e continuam a crescer, apesar dos esforços de alguns países, como os Estados-Membros da

União Europeia. O aumento da temperatura média da superfície do planeta está a aproximar-se rapidamente

dos 1,5 ºC e, nalgumas regiões, está próximo dos 7 ºC.

O vapor de água, o dióxido de carbono e o metano são os principais gases com efeito de estufa presentes

na atmosfera e os mais preocupantes para os investigadores. O aumento da temperatura resultante da maior

evaporação e de maiores concentrações de vapor de água na atmosfera, bem como a aceleração do degelo ou

da libertação do metano acumulado nas regiões frias não podem surpreender e o efeito cumulativo destes

processos é inequívoco.

A média anual do crescimento da concentração de dióxido de carbono passou de 0,85 ppm na década de

60, para 1,5 ppm na década de 90 e 2,5 ppm na última década. A este ritmo, e sem contar com as contribuições

dos outros gases com efeito de estufa e múltiplos efeitos de retorno, a temperatura média à superfície da Terra

será muito superior à meta estabelecida no Acordo de Paris e ultrapassar-se-á o limite da irreversibilidade.

O relatório do Grupo de Trabalho I do IPCC, divulgado em agosto do presente ano, indica que a União

Europeia, ao estabelecer a meta coletiva da neutralidade carbónica em 2050 no regulamento «Lei Europeia do

Clima» assumiu a trajetória adequada para impedir um aumento da temperatura média da superfície terrestre

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superior a 1,5 ºC. Contudo, esta meta do Acordo de Paris não é atingível apenas com o esforço europeu; é

necessária a adesão de todos os países do mundo.

Apesar das expectativas criadas em relação à COP26 que se realizará em Glasgow, entre 30 de outubro e

13 de novembro de 2021, a grande maioria dos Estados parte da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre

as Alterações Climáticas ainda não apresentaram contribuições nacionalmente determinadas com metas

concretas de neutralidade carbónica ou de redução de emissões de gases com efeito de estufa até 2030. Por

outro lado, os países desenvolvidos ainda não conseguiram mobilizar o montante anual de 100 mil milhões de

dólares americanos para apoio aos países menos avançados, sendo cada vez mais consensual que o esforço

financeiro necessário para concretizar a transição ecológica em todo o mundo terá de provir de capitais públicos

e privados.

Efetivamente, e como tem alertado o Secretário-Geral das Nações Unidas, tudo indica que estamos perante

uma situação de emergência climática, na qual os efeitos dramáticos, que ocorrem com frequência crescente,

podem transformar-se em devastadores para toda a vida na Terra.

A Assembleia da República, através dos vários grupos parlamentares e das deputadas não inscritas,

encontra-se neste momento a trabalhar numa lei do clima. Para o efeito, foram auscultados muitos stakeholders

e recebidas múltiplas contribuições e recomendações da sociedade civil.

Entre as múltiplas recomendações recebidas, o Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento

Sustentável (CNADS) considera que «a regulação futura destas atividades deve ser garantida no quadro

internacional». E sugere que a noção de «Clima Estável como Património Comum da Humanidade» deve

constituir «o padrão de funcionamento estável do Sistema Climático reconhecido como um bem comum global

intangível, juridicamente indivisível, cujo bom estado de funcionamento é limitado e exaurível». Acrescenta ainda

o CNADS que «um Sistema Climático a funcionar dentro dos limites de variabilidade natural que foi observada

após a última glaciação é um património comum a toda a Humanidade e a todas as gerações». Trata-se de uma

visão realista a qual merece a concordância dos deputados subscritores.

Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo

Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República

Portuguesa recomendar ao Governo que, no quadro da diplomacia do Clima, promova diligências para que a

Organização das Nações Unidas reconheça o Clima Estável como Património Comum da Humanidade.

Palácio de São Bento, 29 de setembro de 2021.

Os Deputados do PS: Alexandre Quintanilha — Nuno Fazenda — Hugo Pires — Miguel Matos — João Miguel

Nicolau — Joana Bento — Raquel Ferreira — Fernando Paulo Ferreira — Filipe Pacheco — José Manuel

Carpinteira — Joana Lima — André Pinotes Batista — Luís Graça — Lúcia Araújo Silva — Alexandra Tavares

de Moura — Rosário Gambôa — João Azevedo — Francisco Pereira Oliveira — Joaquim Barreto — Lara

Martinho — Paulo Porto — Hortense Martins — Sofia Araújo — Cristina Mendes da Silva — Maria da Graça

Reis — Clarisse Campos — Marta Freitas — José Rui Cruz — Telma Guerreiro — Cristina Sousa — Elza Pais

— Rita Borges Madeira — Eurídice Pereira — Francisco Rocha — Jorge Gomes — Pedro Sousa — Susana

Amador — Vera Braz — Ana Passos — Anabela Rodrigues — Maria Joaquina Matos — Romualda Fernandes

— Palmira Maciel — Susana Correia — Martina Jesus — João Azevedo Castro — Sílvia Torres — Norberto

Patinho.

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1 DE OUTUBRO DE 2021 73

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 29/XIV/3.ª

APROVA O ACORDO SOBRE A MOBILIDADE ENTRE OS ESTADOS-MEMBROS DA COMUNIDADE

DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA

A República Portuguesa, a República de Angola, a República Federativa do Brasil, a República de Cabo

Verde, a República da Guiné-Bissau, a República da Guiné Equatorial, a República de Moçambique, a República

Democrática de São Tomé e Príncipe e a República Democrática de Timor-Leste assinaram o Acordo sobre a

Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), em Luanda,

em 17 de julho de 2021.

O Acordo vem permitir o estabelecimento de um quadro de cooperação em matéria de mobilidade dos

cidadãos dos Estados-Membros da CPLP e entre esses mesmos Estados, através de um sistema flexível e

variável que atende às particularidades relativas a cada Estado.

O referido Acordo representa um contributo para o reforço das relações de amizade e de cooperação entre

os Estados-Membros da CPLP.

Assim:

Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da

República a seguinte proposta de resolução:

Aprovar o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua

Portuguesa (CPLP), assinado em Luanda, em 17 de julho de 2021, cujo texto, na versão autenticada, na língua

portuguesa, se publica em anexo.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 30 de setembro de 2021.

O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa — Pel' O Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,

Ana Paula Baptista Grade Zacarias — O Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, José Duarte Piteira

Rica Silvestre Cordeiro.

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ACORDO SOBRE A MOBILIDADE ENTRE OS ESTADOS-MEMBROS DA COMUNIDADE DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA (CPLP)

Preâmbulo

Considerando que a mobilidade é um dos principais meios de fortalecimento dos vínculos entre pessoas que integram uma comunidade, e que, por isso, a mobilidade dos cidadãos nos territórios que a compõem deve ser tão livre quanto possível, exceto quando razões de interesse público imponham restrições razoáveis;

Recordando que a mobilidade no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa é uma aspiração antiga dos seus Estados-Membros, que vem sendo objeto de reiteradas menções nas Declarações de Chefes de Estado e de Governo da CPLP, desde a Declaração de Brasília de 2002 até à Declaração sobre Pessoas e Mobilidade, de Santa Maria, em 2018, cuja materialização, no presente Acordo, contribuirá de forma significativa para uma maior proximidade entre os cidadãos dos Estados-Membros da CPLP e para o incremento das relações de cooperação em todos os domínios, nomeadamente, social, cultural e económico;

Ressaltando que na Declaração sobre Pessoas e Mobilidade na CPLP, aprovada na Cimeira de Santa Maria, em 2018, os Chefes de Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa reafirmaram que "a mobilidade e a circulação no espaço da CPLP constituem um instrumento essencial para o aprofundamento da Comunidade e a progressiva construção de uma Cidadania dn CPLP";

Ressaltando ainda, que na Declaração sobre as Pessoas e a Mobilidade, os Chefes de Estado e de Governo dos Estados-Membros sublinharam a "premência da criação progressiva de condições que visem a facilitação da mobilidade entre os países que compõem a CPLP, tendo em atenção as especificidades de cada país, nos seus mais variados domínios, nomeadamente normativos, institucionais e de inserçiio regional, de sorte a garantir que as soluções adotadas sejam sólidas, seguras e factíveis";

Recordando que, através da Resolução de Mindelo sobre a Mobilidade na CPLP, de 2019, o Conselho de Ministros da CPLP renovou a determinação no sentido da criação de "um sistema flexível e variável que confira aos Estados-Membros um leque de soluções que lhes permitam assumir os compromissos decorrentes da mobilidade de uma forma gradual e progressiva, e com níveis diferenciados de integração, de modo a ajustarem os respetivos impactos às suas próprias especificidades internas, na sua dimensão política, social e administrativa";

Recordando que o nível mínimo de mobilidade que deve existir entre os cidadãos dos Estados­Membros da CPLP - circulação, com dispensa de visto, dos titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço - já se encontra traduzido nos instrumentos firmados entre os Estados-Membros;

Verificando que, para conferir maior substância ao ideário comunitário, a mobilidade no âmbito da CPLP deve ter como finalidade abranger, não apenas algumas categorias profissionais, mas todos os cidadãos dos Estados-Membros da CPLP, concorrendo assim para o fortalecimento da identidade comum da CPLP, nos termos indicados na Declaração de Santa Maria e na Resolução de Mindelo;

ANEXO

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Considerando que faz todo o sentido colocar à disposição dos Estados um conjunto de instrumentos de mobilidade, de sorte a que a escolha possa corresponder de forma mais ajustada possível aos interesses e particularidades próprias dos Estados, sem perda do conteúdo essencial da mobilidade;

Considerando ainda que o Acordo institucionaliza um sistema flexível e variável que permite aos Estados-Membros, a partir de uma base mínima obrigatória que consiste na livre circulação dos titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço, a escolha da categoria ou categorias de pessoas em função da profissão ou da área de atividade que exercem, bem assim a escolha do Estado ou Estados-Membros com os quais se querem vincular;

Ressaltando igualmente que o presente Acordo permite aos Estados-Membros, se tal se mostrar necessário, condicionar, num quadro de razoabilidade, a efetivação do acesso ao seu território ao preenchimento de certos requisitos que sejam essenciais para a salvaguarda do interesse público e dos fins para os quais foram estabelecidos;

E considerando, por fim, que o presente Acordo salvaguarda os compromissos internacionais dos Estados-Membros em matéria de mobilidade decorrentes dos Acordos de integração regional nos quais sejam Parte;

A República de Angola, a República Federativa do Brasil, a República de Cabo Verde, a República da Guiné-Bissau, a República da Guiné Equatorial, a República de Moçambique, a República Portuguesa, a República Democrática de São Tomé e Príncipe e a República Democrática de Timor­Leste, acordam o seguinte:

Capítulo I Disposições Gerais

Artigo 1. 0

Objeto O presente Acordo estabelece o quadro de cooperação em matéria de mobilidade dos cidadãos dos Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e entre esses mesmos Estados, através de um sistema flexível e variável que atende às particularidades relativas a cada Estado.

Artigo 2.º Âmbito de Aplicação

O presente Acordo aplica-se aos Estados-Membros da CPLP.

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Artigo 3. 0

Definições

Para os efeitos do presente Acordo, deve entender-se como: a) Mobilidade CPLP, a entrada de um cidadão de uma Parte no território de oub-a Parte;b) Estada de Curta Duração CPLP, a entrada e permanência de cidadão de uma Parte no

território de outra Parte, com dispensa de autorização administrativa prévia, por um curtoperíodo de tempo, nos termos da legislação interna da Parte de acolhimento;

c) Visto de Estada Temporária CPLP, a autorização administrativa concedida ao cidadão de umaParte para entrada e estada de duração superior às estadas de curta duração no território deoutra Parte e não superior a doze meses;

d) Visto de Residência CPLP, a autorização administrativa concedida ao cidadão de uma Partepara a entrada no território de outra Parte com a finalidade de, nesta Parte, requerer e obterAutorização de Residência CPLP;

e) Autorização de Residência CPLP, a autorização administrativa concedida ao cidadão de umaParte que lhe permite estabelecer residência no território da Parte emissora;

f) Instrumentos adicionais de parceria são acordos posteriores, estabelecidos entre duas ou maisPartes, para a concretização da mobilidade para além do mínimo que resulta do disposto naal. a) do n.º 2 do artigo 4.0 do presente Acordo.

Artigo 4.º Princípios Estruturantes

1. O Acordo confere às Partes um leque de soluções que lhes permite assumir compromissosdecorrentes da mobilidade de forma progressiva e com níveis diferenciados de integração, paraajustar os impactos do Acordo às suas próprias especificidades internas, na sua dimensão política,social e administrativa.

2. O Acordo é estruturado com base nos seguintes princípios:a) Isenção de vistos a favor dos titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de

serviço, para estadas de duração até 90 dias;b) Mobilidade de cidadãos de uma Parte, detentores de passaporte ordinário, no território das

demais Partes, sem prejuízo da aplicação do disposto no presente Acordo em matéria decredibilidade e autenticidade dos documentos, de acordo com o grau de compromissoassumido pelas Partes, no âmbito do princípio da flexibilidade variável;

c) Liberdade das Partes na escolha das modalidades de mobilidade, das categorias de pessoasabrangidas e das Partes com os quais estabelece parcerias para além do limite mínimo, emconformidade com o disposto nos artigos 6.º e 7.0 e os demais termos e condições previstos nopresente Acordo;

d) Salvaguarda dos compromissos internacionais das Partes em matéria de mobilidadedecorrentes dos Acordos regionais de integração nos quais sejam Partes.

Artigo 5. 0

Aplicação de regime mais favorável Da aplicação das disposições do presente Acordo não podem resultar limitações ao regime mais favorável previsto no Direito interno da Parte de acolhimento.

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Artigo 6. 0

Modalidades de Mobilidade CPLP A Mobilidade CPLP, entendida como o regime de entrada e permanência de cidadão de uma Parte no território de outra Parte, pode revestir as seguintes modalidades:

a) Estada de Curta Duração CPLP;b) Estada Temporária CPLP;c) Visto de Residência CPLP;d) Residência CPLP.

Artigo 7. 0

Categorias de Pessoas 1. A mobilidade CPLP, nos termos do artigo anterior, abrange:

a) Os titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço;b) Os titulares de passaportes ordinários.

2. Com vista à facilitação do incremento da mobilidade e ao seu ajustamento às realidades internasdas Partes, é-lhes permitido ainda, nos instrumentos adicionais de parceria, subdividir os titularesde passaportes ordinários em grupos, em função de atividades que exerçam ou da situação em quese encontrem, ou de qualquer outro critério relevante, nomeadamente:

a) Docentes de estabelecimentos de ensino superior; investigadores em centros deespecialidade reconhecidos; e técnicos altamente qualificados;

b) Docentes de estabelecimento de ensino não superior;c) Empresários, entendida a expressão como pessoas que exercem profissionalmente uma

atividade económica organizada para a produção e circulação de bens ou de serviços,através de um estabelecimento estável reconhecido na Parte da sua nacionalidade ou dasua residência habitual, com contabilidade instituída em conformidade com as prescriçõeslegais e administrativas e regularmente inscrito nessa condição no sistema tributário dessamesma Parte;

d) Agentes culturais, entendida a expressão como a categoria que abrange artistas,desportistas e representantes de órgãos da comunicação social, escritores, músicos,promotores e organizadores de eventos culturais e desportivos;

e) Estudantes no âmbito de programas de intercâmbio reconhecidos entre estabelecimentosde ensino da Parte da nacionalidade dos visitantes e os da Parte de acolhimento.

3. As Partes podem fazer escolhas per saltum nas categorias de pessoas referenciadas no númeroantecedente, ou escolher outras não referenciadas, em conformidade com os respetivos interessesnacionais.

Artigo 8. 0

Certificação A certificação das condições em que se apresentam as pessoas abrangidas pelas categorias referidas nas alíneas b), c), d) e e) do n.º 2 do artigo 7.0, bem como os procedimentos a serem adotados para o efeito, serão estabelecidos em instrumento adicional, aprovado pelas Partes.

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Artigo 9.º Segurança Documental

1. Incumbe às Partes a obrigação de assegurar, para além de qualquer dúvida razoável, averacidade das informações atestadas nos documentos que emitem e que relevem para efeitos damobilidade.

2. As Partes devem proceder à avaliação rigorosa das condições, designadamente de segurança,que cada Parte possui relativamente aos seus respetivos documentos de viagem e de identificaçãocivil.

3. As Partes obrigam-se, no âmbito do presente Acordo, a facultar reciprocamente espécimes oucópias dos seus respetivos documentos de viagem e de identificação civil, para efeitos de consultae exame.

Artigo 10.º Restrições de entrada e permanência

1. Sem prejuízo do disposto no presente Acordo, é permitido às Partes restringir a entrada oupermanência dos cidadãos da outra Parte no seu território por razões ligadas à necessidade desalvaguarda da ordem, segurança ou saúde pública.

2. É permitido às Partes restringir a entrada ou condicionar a permanência dos cidadãos da outraParte no seu território por fundadas suspeitas sobre a credibilidade e autenticidade dosdocumentos que atestam a qualidade exigida para a mobilidade, tal como determinado peloDireito interno dessa Parte.

Artigo 11.º Meios de subsistência

1. Às Partes de acolhimento é reservado o direito de exigir ao cidadão solicitante prova de meiosde subsistência suficientes, nos termos do seu Direito interno.

2. Em alternativa, a Parte de acolhimento poderá aceitar termo de responsabilidade, subscritopor cidadão nacional ou estrangeiro habilitado com título de residência.

3. As disposições deste artigo não se aplicam a titulares de passaportes diplomáticos, oficiais,especiais e de serviço.

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Artigo 12. 0

Compromisso de incremento 1. Com base nos princípios da flexibilidade e da variabilidade, as Partes assumem ocompromisso de criar as condições legais e institucionais que visem o incremento progressivo eordenado da mobilidade dos cidadãos das Partes, tendo em conta as especificidades de cada Parte.

2. As Partes podem assumir as suas obrigações de forma gradual e com ruveis diferenciados deintegração, por meio da adesão a uma ou mais modalidades de mobilidade ou da aceitação de urnaou mais categorias de pessoas, de modo a ajustá-las às suas especificidades internas.

3. Às Partes não é exigível o cumprimento de obrigações que se mostrarem incompatíveis com oscompromissos internacionais assumidos no quadro dos Acordos regionais de integração de quesejam igualmente Parte.

Capítulo II Estada de curta duração

Artigo 13.0

Estrutura e fins 1. A Estada de Curta Duração não depende de autorização administrativa prévia e destina-se atodos os cidadãos das Partes titulares de passaportes comuns ou ordinários e titulares depassaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço.

2. A duração da Estada de Curta Duração é regulada pela legislação interna da Parte deacolhimento, com ressalva do disposto na parte final da alínea a), do n.0 2 do artigo 4.0 do presenteAcordo.

3. O disposto na primeira parte do n.º 1 não impede as Partes de optar, se assim o consideraremnecessário, pela aplicação desta modalidade de forma gradual e progressiva, por ruveis ecategorias de pessoas nos termos do disposto no artigo 7.0•

Capítulo III Estadas temporárias

Artigo 14. 0

Estrutura e fins 1. A Estada Temporária depende de autorização administrativa prévia concedida pela Parte deacolhimento, na forma de Visto de Estada Temporária para cidadãos das Partes, por período nãosuperior a doze meses.

2. O Visto de Estada Temporária CPLP tem por destinatários os titulares de passaportesordinários.

3. É aplicável ao regime de Estada Temporária o disposto no n.0 2 do artigo 7.0•

4. O Visto de Estada Temporária CPLP permite múltiplas entradas, e a Estada pode serprorrogada por idênticos períodos, caso o Direito interno da Parte o permita.

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Artigo 15. 0

Prazos e cancelamento do Visto de Estada Temporária CPLP 1. O pedido de Visto de Estada Temporária CPLP deve ser decidido num prazo não superior a90 dias, contados da apresentação do pedido.

2. O Visto de Estada Temporária CPLP tem validade mínima de 90 dias, sem prejuízo de prazosmais alargados fixados por cada uma das Partes.

3. O Visto pode ser cancelado sempre que o seu titular deixar de reunir as condições previstaspara a sua concessão.

Artigo 16.º Aplicabilidade das regras gerais da mobilidade

No regime de Visto para as Estadas Temporárias de cidadãos das Partes são aplicáveis as regras gerais adotadas para a mobilidade no que respeita ao estabelecimento de condições especiais, designadamente quanto à certificação da condição requerida e à segurança documental, no respeito pelo direito interno de cada Parte.

Capítulo IV Visto de Residência CPLP e Residência CPLP

Artigo 17. 0

Estrutura e fins 1. Os cidadãos de uma Parte podem residir no território de outra Parte mediante umaautorização administrativa prévia, nas condições previstas no presente Acordo.

2. A autorização administrativa referida no número antecedente é emitida, numa primeira fase,por meio de Visto de Residência, o qual permite a entrada no território de outra Parte para fins deobtenção de Autorização de Residência da CPLP, título que confere ao requerente o direito aresidir no território dessa Parte, nos termos e com os efeitos previstos no presente Acordo.

Artigo 18. 0

Categorias

O Visto de Residência CPLP e a Autorização de Residência CPLP podem ser concedidos a todos os cidadãos de qualquer das Partes, nos termos e condições previstos no presente Acordo.

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Artigo 19.º Requisitos para a concessão e meios de prova

1. Podem ser concedidos Vistos de Residência e Autorização de Residência a cidadãos das Partesdesde que reúnam cumulativamente os seguintes requisitos:

a) Inexistência de medidas de interdição de entrada do requerente na Parte de acolhimento,tal como determinado pelo Direito interno deste; e,

b) Inexistência de indícios de ameaça por parte do requerente à ordem, segurança ou saúdepública da Parte de acolhimento, tal como determinado pelo Direito interno deste.

2. Cada uma das Partes define, nos termos da sua legislação, a documentação que deve serapresentada para efeitos de verificação do preenchimento dos requisitos definidos no númeroanterior.

3. É aplicável ao regime de Visto de Residência e Autorização de Residência o disposto no n.0 2do artigo 7.0.

Artigo 20.º Fins do Visto de Residência CPLP

O Visto de Residência CPLP permite ao seu titular a entrada no território da Parte emissora, com a finalidade de obtenção da Autorização de Residência CPLP.

Artigo 21.0

Prazos e cancelamento do Visto de Residência CPLP 1. O pedido de Visto de Residência CPLP deve ser decidido num prazo não superior a 60 dias,contados da apresentação do pedido, sem prejuízo de prazo mais favorável previsto no Direitointerno da Parte de acolhimento.

2. O Visto para fixação de Residência CPLP é válido por um período de 90 dias, sem prejuízo deprazo mais favorável previsto no Direito interno da Parte de acolhimento.

3. O Visto pode ser cancelado sempre que o seu titular deixe de reunir as condições previstaspara a sua concessão.

Artigo 22.º Autorização de Residência CPLP

1. A Autorização de Residência CPLP permite a residência no território da Parte emissora, com aduração inicial de um ano, renovável por períodos sucessivos de dois anos, sem prejuízo derenovações por período superior em conformidade com o Direito interno dessa Parte.

2. A Autorização de Residência CPLP pode ser cancelada se o seu titular deixe de reunir ascondições previstas para a concessão, ou caso seja dado como culpado de violação de normainterna da Parte de acolhimento que comine o cancelamento.

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Artigo 23.0

Prazos para o pedido e decisão da Autorização de Residência CPLP O pedido de Autorização de Residência para cidadãos das Partes é requerido no prazo máximo de 90 dias contados da primeira entrada do titular de Visto de Residência para cidadãos das Partes no território da Parte de acolhimento, e decidido no prazo de 60 dias, contados da data da apresentação do requerimento.

Artigo 24.º Taxas e Emolumentos

1. Os cidadãos das Partes, residentes em outras Partes, estão isentos do pagamento de taxas eemolumentos devidos na emissão e renovação de autorizações de residência, com exceção doscustos de emissão de documentos.

2. As taxas e emolumentos devidos nas demais autorizações administrativas para a MobilidadeCPLP, incluindo as suas prorrogações, são reguladas pelos instrumentos adicionais de parceria oupelo Direito Interno das Partes.

3. Em caso de cobrança de taxas e emolumentos, estes não podem ser superiores aos valoresestabelecidos para as autorizações administrativas ordinárias equiparáveis, emitidas a favor decidadãos dos Estados que não fazem parte do presente Acordo.

Artigo 25.º Efeitos da Autorização de Residência CPLP

Ao titular da Autorização de Residência CPLP são reconhecidos os mesmos direitos, liberdades e garantias que aos cidadãos da Parte de acolhimento e o gozo de igualdade de tratamento relativamente aos direitos económicos, sociais e culturais, em particular no que respeita ao acesso ao ensino, ao mercado de trabalho e a cuidados de saúde, com ressalva dos direitos que o Direito interno das Partes reserve aos seus cidadãos.

Artigo 26.º Período transitório

1. É permitido às Partes a opção por um período transitório de aplicação do regime deresidência, no qual pode ser exigido aos requerentes do Visto de Residência e Autorização deResidência da CPLP para cidadãos das Partes o comprovativo de um dos seguintes elementos:

a) Qualificação em áreas que o habilitem a exercer a curto prazo atividade profissional porconta própria ou por conta de outrem; ou,

b) Titularidade de projetos de empreendimento credíveis que assegurem a aquisição dosmeios de subsistência.

2. O período transitório referenciado no número antecedente tem a duração máxima de 5 anos,aplicando-se, findo este período, automaticamente o regime ordinário das condições de Visto deResidência para cidadãos das Partes, tal como definido no presente Acordo.

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Capítulo V Disposições Finais

Artigo 27.0

Regimes Complementares As matérias de tributação, regimes de segurança social, totalização de contribuições, totalização de períodos de seguro e exportações das prestações sociais, bem como de reconhecimento dos níveis de ensino e exercício de profissões reguladas, são tratadas em instrumentos específicos, ou, na ausência destes, pelo Direito interno da Parte de acolhimento.

Artigo 28.º Pontos Focais

Com o depósito do instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, as Partes comunicam ao Secretariado Executivo da CPLP o seu Ponto Focal com responsabilidade de acompanhamento da execução do presente Acordo.

Artigo 29.º Assinatura

O presente Acordo está aberto à assinatura dos Estados-Membros da CPLP.

Artigo 30.º Entrada em vigor

1. O presente Acordo entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte à data em que trêsEstados-Membros tenham depositado na sede da CPLP, junto ao seu Secretariado Executivo, osrespetivos instrumentos de ratificação, aceitação ou aprovação.

2. Para cada um dos Estados-Membros que vier a depositar posteriormente na sede da CPLP,junto ao Secretariado Executivo, o respetivo instrumento de ratificação, aceitação ou aprovaçãoque o vincule, o Acordo entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte à data do depósito.

3. O Secretariado Executivo, na qualidade de depositário do presente Acordo, notifica as demaisPartes das ratificações, aceitações ou aprovações ao Acordo.

Artigo 31.º Vigência

O presente Acordo permanece em vigor por tempo ilimitado.

Artigo 32.º Adesão

1. Podem aderir ao presente Acordo todos os Estados-Membros da CPLP mediante o depósitodo respetivo instrumento de adesão na Sede da CPLP junto do Secretariado Executivo da CPLP.

2. O presente Acordo entra em vigor, para os Estados-Membros que adiram ao mesmo, no

primeiro dia do mês seguinte à data do depósito do seu instrumento de adesão.

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Artigo 33.º Denúncia ou Retirada

1. Qualquer Parte pode deixar de ser Parte do presente Acordo mediante notificação escrita, dirigida ao depositário, da intenção de denunciar o Acordo ou retirar-se do mesmo, feita com antecedência mínima de doze meses.

2. A denúncia ou retirada não prejudica qualquer direito, obrigação ou situação jurídica dasPartes criados pelo cumprimento do presente Acordo em momento anterior à cessação da suavigência.

Artigo 34.0

Suspensão da aplicação 1. Qualquer das Partes pode suspender temporariamente a aplicação do presente Acordo, totalou parcialmente, por fundadas razões de ordem pública, saúde pública ou segurança nacional.

2. A suspensão da aplicação do presente Acordo, assim como o termo da suspensão, devem sernotificados ao Depositário, por escrito e por via diplomática e os seus efeitos produzem-se nomomento do recebimento da notificação.

3. Em casos excecionais justificados pela urgência, a suspensão produzirá efeito na data daemissão da notificação, que o deverá referir expressamente.

Artigo 35.º Resolução de Diferendos

Qualquer controvérsia relativa à interpretação ou aplicação do presente Acordo será solucionada através de negociação, por via diplomática, entre as Partes.

Artigo 36.º Revisão

1. Qualquer Parte pode apresentar, por escrito, propostas de emenda, enviando para efeitos de

revisão, ao Secretariado Executivo da CPLP, uma notificação contendo as propostas de emenda.

2. O Secretariado Executivo da CPLP regista as propostas de emenda recebidas nos termos donúmero anterior e, a pedido de duas ou mais Partes, através das suas autoridades competentes, outrês anos após a data da receção da primeira notificação, submete as propostas pendentes aoConselho de Minisb·os da CPLP para análise e aprovação.

3. Qualquer emenda aprovada pelo Conselho de Ministros da CPLP está sujeita a aprovação,ratificação ou aceitação pelas Partes.

4. As emendas entrarão em vigor nos termos do n.º 2 do artigo 32.0 do presente Acordo.

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Artigo 37.ºDepositário

O presente Acordo será depositado na Sede da CPLP junto do Secretariado Executivo.

Artigo 38. 0

Aplicação

1. A aplicação a cada uma das Partes das modalidades de cooperação previstas no artigo 6.0 dopresente Acordo depende sempre de consentimento, expresso por via diplomática.

2. Cada Parte comunicará ao depositário, por escrito e a qualquer momento, quais asmodalidades previstas no artigo 6.0, e categorias previstas no artigo 7.0 e os demais termos econdições previstos no presente Acordo que aceita lhe sejam aplicáveis e a Parte ou Partes com asquais se vincula na parceria.

Artigo 39.ºRegisto

Após a entrada em vigor do presente Acordo, o depositário submete-o para registo junto doSecretariado das Nações Unidas, nos termos do artigo 102.0 da Carta das Nações Unidas, devendonotificar as Partes da conclusão deste procedimento e indicar-lhes o número de registo atribuído.

éte António,Ministro das Relações Exteriores

Pela República de Cabo Verde �k-�-Ç-

Rui Alberto de Figu�!� Soares,Ministro dos Negócios Estrangeiros,Cooperação e Integração Regional

Luanda, 17 de julho de 2021

Carlos Alberto Fran o França,Ministro das Relações Exteriores

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0w _)�(�� Suzi C9 la Barbosa,Ministra de Estado, dos NegóciosEstrangeiros, da Cooperação Internacional edas Comunidades

1 DE OUTUBRO DE 2021 _____________________________________________________________________________________________________________

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Cópia certificada conforme o original depositado no Arquivo Diplomático.

Lisboa, 13 de Agosto de 2021Chefe de Divisão de Arquivo e BibliotecaMinistério dos Negócios Estrangeiros

Margarida LagesAssinado de forma digital por Margarida Lages Dados: 2021.08.13 11:30:27 +01'00'

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

II SÉRIE-A — NÚMERO 10 _____________________________________________________________________________________________________________

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