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Quarta-feira, 27 de outubro de 2021 II Série-A — Número 26
XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)
S U M Á R I O
Resoluções: (a)
— Recomenda ao Governo a conclusão urgente das obras de requalificação da Escola Secundária João de Barros, no concelho do Seixal. — Recomenda ao Governo que requalifique urgentemente a Escola Básica 2,3 Mário de Sá Carneiro, no concelho de Loures, e que divulgue o calendário de intervenções de remoção de fibras de amianto nos equipamentos escolares. — Recomenda ao Governo que retome, com urgência, a reabilitação da Escola Secundária da Sertã. — Recomenda ao Governo que cumpra a Resolução da Assembleia da República n.º 259/2018, de 9 de agosto, e requalifique urgentemente a Escola Secundária de Esmoriz, em Ovar. — Recomenda ao Governo que amplie e requalifique, com urgência, a Escola Secundária de Porto de Mós. — Recomenda ao Governo a requalificação da Escola Básica 2,3 Júlio Brandão, em Vila Nova de Famalicão. — Recomenda ao Governo que cumpra a Resolução da Assembleia da República n.º 257/2018, de 9 de agosto, e requalifique urgentemente a Escola Secundária da Póvoa de Lanhoso. — Recomenda ao Governo que requalifique urgentemente a Escola Secundária de Arganil.
— Recomenda ao Governo que requalifique, de imediato, a Escola Básica 2,3 e Secundária Pedro Ferreiro, de Ferreira do Zêzere. — Orçamento da Assembleia da República para 2022. Projetos de Lei (n.os 896/XIV/2.ª e 999 a 1003/XIV/3.ª):
N.º 896/XIV/2.ª (Protege o regime de exclusividade no mandato dos Deputados e Deputadas): — Parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio. N.º 999/XIV/3.ª (PAN) — Reconhece e regula a figura do animal comunitário, reduz o prazo de reclamação dos animais não identificados recolhidos nos CRO, e atribui ao Estado o encargo com os programas de esterilização de animais errantes ou comunitários, procedendo à primeira alteração à Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, à décima alteração ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 82/2019, de 27 de junho, e à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de dezembro. N.º 1000/XIV/3.ª (PAN) — Adequação do sistema de identificação dos equídeos, procedendo à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 123/2013, de 28 de agosto.
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N.º 1001/XIV/3.ª (PAN) — Alarga a tutela criminal a todos os animais vertebrados, procedendo à quinquagésima quarta alteração do Código Penal. N.º 1002/XIV/3.ª (PAN) — Alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril. N.º 1003/XIV/3.ª (PAN) — Procede à revogação do atual sistema de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente, procedendo à alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário. Projetos de Resolução (n.os 1463 e 1486 a 1494/XIV/3.ª):
N.º 1463/XIV/3.ª (Recomenda ao Governo que garanta o direito inalienável das crianças à presença de figura significativa das crianças nos momentos de transição dos contextos educativos): — Informação da Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto relativa à discussão do diploma ao abrigo do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República. N.º 1486/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a criação de fluxo de resíduos para fraldas e outros produtos de higiene descartáveis no âmbito no novo Regime Geral de Gestão de Resíduos, também e como parte integrante do Plano Estratégico de Resíduos Urbanos 2030. N.º 1487/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que proteja a zona do resort Costa Terra em Melides.
N.º 1488/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que proteja as espécies migradoras na bacia hidrográfica do Vouga. N.º 1489/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a promoção da redução de resíduos e o aumento da taxa de reciclagem. N.º 1490/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que garanta uma solução que assegure a transferência para o município de Carregal do Sal das verbas não cobertos pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e necessários para a conclusão do Projeto de Requalificação e Musealização da Casa do Passal. N.º 1491/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda a Criação do Dia Nacional das Acessibilidades. N.º 1492/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que assegure que as vagas de acesso ao 5.º e ao 7.º escalão em 2021 sejam idênticas ao número de docentes que integram as listas de acesso nestes dois escalões e que assegure uma solução que garanta a recuperação de todo o tempo de serviço dos docentes que estiveram em suspenso nas listas de vagas. N.º 1493/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a revisão dos Objetivos Específicos da PEPAC. N.º 1494/XIV/3.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a proteção do território do Perímetro de Rega do Mira (PRM) e do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina (PNSACV).
(a) Publicadas em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 896/XIV/2.ª
(PROTEGE O REGIME DE EXCLUSIVIDADE NO MANDATO DOS DEPUTADOS E DEPUTADAS)
Parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados e nota técnica elaborada pelos
serviços de apoio
Parecer
PARTE I – Considerandos
1.1. Nota introdutória
Os Deputados do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) tomaram a iniciativa de apresentar à
Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 896/XIV/2.ª – «Protege o regime de exclusividade no mandato dos
Deputados», tendo esta iniciativa dado entrada e sido admitida a 1 de julho de 2021.
Após ser anunciada, a iniciativa baixou para discussão na generalidade à Comissão de Transparência e
Estatuto dos Deputados (14.ª), em conexão com a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades
e Garantias (1.ª), por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, e foram anunciados na
sessão plenária de dia 1 de julho. A discussão na generalidade da presente iniciativa não se encontra ainda
agendada para sessão plenária. A Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados designou o Deputado
signatário do presente relatório como relator do parecer.
O projeto de lei deu entrada ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º, do n.º 1 do artigo
167.º e da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da alínea b) do
n.º 1 do artigo 4.º, da alínea f) do artigo 8.º e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
Verificando-se que reúne os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º, do n.º 1 do artigo 120.º, do n.º
1 do artigo 123.º e do artigo 124.º, todos do RAR.
1.2. Do objeto, conteúdo e motivação das iniciativas
O projeto de lei do BE indica como principal motivação da sua iniciativa a interpretação sufragada na
Comissão para a Transparência e Estatuto dos Deputados em parecer emitido em abril de 2021 quanto ao
regime de exclusividade dos Deputados à Assembleia da República, que segundo os proponentes da iniciativa
deturparia o sentido da lei ao admitir que o exercício de uma atividade económica não remunerada pudesse ser
compatível com o regime de exclusividade e com a consequente perceção de um abono mensal para despesas
de representação no montante de 10% do respetivo vencimento.
Entende o BE que o n.º 6 do artigo 16.º do Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos,
aprovado pela Lei n.º 4/85, de 9 de abril, visaria impedir o desempenho de atividades económicas em simultâneo
com o recebimento do abono específico pelo exercício das funções em regime de exclusividade, pelo que aquela
que entende ser a nova interpretação dada no recente parecer contraria o espírito da lei, passando a permitir
que, por exemplo, sócios-gerentes de empresas recebam o abono como se desempenhassem o mandato de
Deputado em exclusividade.
A exposição de motivos da iniciativa sustenta ainda que este entendimento surge reforçado pelo disposto na
Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, que aprova o Regime do Exercício de Funções por Titulares de Cargos Políticos
e Altos Cargos Públicos, dispõe no n.º 2 do seu artigo 6.º que «o exercício de funções em regime de
exclusividade é incompatível com quaisquer outras funções profissionais remuneradas ou não, bem como com
a integração em corpos sociais de quaisquer pessoas coletivas de fins lucrativos».
Nesse sentido, o Bloco de Esquerda introduz uma alteração ao n.º 2 do artigo 6.º da referida Lei n.º 52/2019,
de forma a deixar o inciso «remuneradas ou não» entre vírgulas (para o efeito aditando uma vírgula ao preceito)
e propõe uma nova redação para o n.º 6 do artigo 16.º do Estatuto Remuneratório introduzindo o inciso
«atividade» de forma a assegurar a leitura autónoma de cada uma das realidades a considerar incompatíveis
com o regime de exclusividade, passando a norma a referir que «os restantes Deputados não referidos nos
números anteriores têm direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 10/prct. do
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respetivo vencimento desde que declarem no registo de interesses que não exercem regularmente qualquer
atividade económica, atividade remunerada ou atividade de natureza liberal».
1.3. Enquadramento constitucional e legal
Quadro constitucional
A Constituição não disciplina detalhadamente o regime de exercício de funções parlamentares, remetendo o
essencial da disciplina jurídica para o plano legislativo. Efetivamente, como a Nota Técnica refere, o artigo 155.º
do texto constitucional assegura que devem ser garantidas «condições adequadas ao eficaz exercício» das
funções dos Deputados, enquanto o artigo 158.º, na respetiva alínea d) apenas prescreve que os Deputados
têm direito «aos subsídios que a lei prescrever», não desenvolvendo a matéria, nem fazendo depender os
mesmos de qualquer forma específica de exercício do mandato. Mesmo em sede de incompatibilidades (não
sendo essa a questão diretamente em causa), a Constituição limita-se no n.º 2 do artigo 154.º a remeter para a
lei a determinação das mesmas.
Evolução do quadro normativo aplicável à suspensão do mandato
Desde 1985 que a matéria em presença se encontra regulada no Estatuto Remuneratório dos Titulares de
Cargos Políticos (Lei n.º 4/85, de 9 de abril), no entanto, a redação do preceito que regula a matéria tem evoluído
ao longo dos anos:
• Nas versões iniciais dos preceitos relevantes, as despesas de representação apenas se encontravam
previstas para os vice-presidentes (20% do vencimento), presidentes dos Grupos Parlamentares e
agrupamentos parlamentares e secretários da mesa (15% do vencimento), vice-presidentes dos grupos
parlamentares e presidentes das comissões parlamentares permanentes (10% do vencimento) e era
condição para a sua perceção «desempenharem em regime de exclusividade o respetivo mandato»;
• Em 1987 (Lei n.º 16/87, de 1 de junho) foram acrescentados os vice-secretários da mesa aos Deputados
que poderiam perceber despesas de representação (no valor de 10% do vencimento), mantendo-se o
regime inalterado no restante;
• Em 1988 (Lei n.º 102/88, de 25 de agosto), os valores foram alterados (vice-presidentes passaram a 25%,
presidentes dos Grupos Parlamentares e secretários da mesa a 20%, e vice-presidentes dos Grupos
Parlamentares, presidentes de comissões parlamentares permanentes e vice-secretário da mesa
passaram a 15%) e deixou de se exigir um regime de exclusividade em relação a estes titulares de cargos
parlamentares, introduzindo-se a perceção de abono para despesas de representação para todos os
demais Deputados, estes na condição de desempenharem o respetivo mandato «em regime de dedicação
exclusiva»;
• Finalmente, em 2001 (Lei n.º 3/2001, de 21 de fevereiro), o regime para os demais Deputados perceberem
as despesas de representação voltou a mudar, passando a assentar na declaração no registo de
interesses «que não exercem regularmente qualquer atividade económica, remunerada ou de natureza
liberal».
Paralelamente, desde 1993, encontrava-se igualmente outra disposição sobre exclusividade na Lei n.º 64/93,
de 26 de agosto. Na sua versão originária, a referida lei determinava no n.º 1 do seu artigo 4.º que «os titulares
de cargos políticos exercem as suas funções em regime de exclusividade» concretizando no n.º 2 que a
titularidade desses cargos seria «incompatível com quaisquer outras funções profissionais, remuneradas ou não,
bem como com a integração em corpos sociais de empresas públicas ou privadas e demais pessoas coletivas,
exceto as que prossigam fins não lucrativos».
A Lei n.º 98/95, de 26 de agosto, contudo, excecionaria deste preceito estrito os Deputados, passando a
determinar a nova redação do n.º 1 do artigo 4.º que «os titulares dos cargos previstos nos artigos 1.º e 2.º
(cargos políticos e altos cargos públicos) exercem as suas funções em regime de exclusividade, sem prejuízo
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do disposto no Estatuto dos Deputados à Assembleia da República e do disposto no artigo 6.º quanto aos
autarcas a tempo parcial». A redação estabilizaria em 1998 (Lei n.º 12/98, de 24 de fevereiro), com a supressão
do inciso final relativo à expressão autarcas a tempo parcial e permaneceria em vigor nesses termos até à
revogação da referida lei pela Lei n.º 52/2019, de 31 de julho.
Como referido, no que respeita à matéria em análise, a Lei n.º 52/2019, determina que os titulares de cargos
políticos exercem as suas funções em regime de exclusividade, sem prejuízo do especialmente disposto na
presente lei e no Estatuto dos Deputados à Assembleia da República, mantendo a filosofia da Lei n.º 64/93 de
ressalvar o regime específico do Estatuto dos Deputados. Ainda que a norma sob análise se encontre plasmada
no estatuto remuneratório, tem-se considerado incluída no âmbito das normas estatutárias relativas aos
Deputados, algo que o próprio Estatuto dos Deputados passou a admitir expressamente em 2019 através da
alteração introduzida pela Lei n.º 60/2019, de 13 de agosto1.
Antecedentes de iniciativas legislativas recentes
Não se encontram iniciativas expressamente dirigidas à alteração do n.º 6 do artigo 16.º do estatuto
remuneratório, no sentido de alterar o conteúdo do regime de exclusividade, no entanto têm sido apresentadas
várias iniciativas propondo a consagração do regime de exclusividade como obrigatório para o exercício do
mandato dos Deputados à Assembleia da República, designadamente os Projetos de Lei n.os 153/XIII/1.ª,
768/XII/4.ª e 551/XII/3.ª, todos do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
Iniciativas pendentes
Consultada a base de dados Atividade Parlamentar (AP) não foram encontradas petições pendentes sobre
matéria idêntica ou conexa. No que respeita a iniciativas legislativas, em matéria de alterações ao regime de
exclusividade, não se encontra de momento pendente qualquer outro projeto ou proposta de lei.
1.4. Análise jurídica
Conforme resulta da leitura da nota técnica anexa ao presente parecer, a iniciativa cumpre as exigências
constitucionais e regimentais no plano formal quanto à sua apresentação, registando-se apenas algumas
sugestões para melhor adequação do seu sumário ao disposto na Lei n.º 74/98, de 11 de novembro (lei
formulário).
Não se identificam questões de constitucionalidade suscetíveis de determinar a rejeição da iniciativa com
esse fundamento, devendo, porém, sublinhar-se que na fase da especialidade, caso venha a ocorrer, se deve
prestar atenção ao regime de entrada em vigor, uma vez que a vigência imediata, como surge no projeto, pode
ser gerador de questões no plano da proteção da confiança.
Sendo certo que da perspetiva do proponente a sua iniciativa visa clarificar o regime aplicável em linha com
a interpretação que o proponente faz do regime de exclusividade, é igualmente verdadeiro que anteriores
tomadas de posição da Comissão da Transparência e das suas antecessoras Comissões ou Subcomissões de
Ética (na linha das quais se inserirá a mais recente interpretação, que motivou a presente iniciativa) terão
contribuído para estabilizar uma leitura do preceito, cuja alteração provocaria uma modificação efetiva nas
condições de exercício de mandatos em curso.
1 Os novos n.os 3 e 4 do artigo 1.º aditados nessa sede determinam que:
«3 – Além das normas constitucionais diretamente aplicáveis, o estatuto único dos Deputados é integrado pela presente lei, pelas demais disposições legais aplicáveis, pelas disposições do Regimento da Assembleia da República e pelas disposições regulamentares emitidas ao abrigo da lei». 4 – De acordo com o disposto no número anterior, aplicam-se aos Deputados as normas que lhes digam respeito da lei que define os direitos e deveres dos titulares de cargos políticos, da lei que define o estatuto remuneratório e da lei que define os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos».
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PARTE II – Opinião do Deputado relator
Sem prejuízo de uma tomada de posição mais desenvolvida e detalhada em sede de debate na generalidade
ou especialidade, importa, todavia, deixar duas ou três notas sobre a iniciativa em presença.
Em primeiro lugar, o signatário do parecer não adere à leitura dos proponentes quanto ao surgimento de uma
leitura inovadora (e deturpadora) do preceito objeto da principal alteração, o n.º 6 do artigo 16.º do estatuto
remuneratório. Tem havido um entendimento pacífico ao longo dos anos da sua aplicação pela Comissão da
Transparência ou das respetivas comissões que a antecederam na sua missão de avaliar os registos de
interesses, de que a situação do exercício não remunerado de funções ou atividades não colocaria em crise o
regime de perceção de despesas de representação, a que se alude coloquialmente como regime de
exclusividade.
Aliás, se alguma coisa a evolução legislativa do preceito (que surge descrita na secção respetiva do presente
parecer) evidencia é uma intenção legislativa clara de afastar o regime aplicável aos Deputados de fórmulas
estritas de exclusividade ou de dedicação exclusiva, optando o estatuto remuneratório pela fórmula sui generis
que temos vindo a analisar.
No mesmo sentido, aliás, a legislação genérica sobre exercício de cargos políticos (hoje a Lei n.º 52/2019,
de 31 de julho, no passado a Lei n.º 64/93, de 26 de agosto) ressalva regimes próprios neste domínio no que
concerne a Deputados e autarcas, remetendo a matéria para as normas estatutárias aplicáveis a cada categoria
de titular de cargo.
Assente este primeiro ponto, contudo, nada obsta a que a iniciativa do Bloco de Esquerda possa ser avaliada
pelos seus méritos próprios, ainda que possa partir de uma motivação equivocada – nada justifica que o
propósito que visa prosseguir não seja atendível apenas por essa discordância nos pressupostos de partida.
Nesse sentido, importaria avaliar o tema com alguma cautela acrescida, ponderando que modelo de dedicação
exclusiva ou de regime de exclusividade se pretende instituir.
O presente debate e a presente iniciativa nasceram a partir de uma preocupação com atividades económicas
e com a situação do sócio-gerente não remunerado, no entanto encontram-se situações de exercício de outras
funções profissionais que devem ser equacionadas e ponderadas para aferir se o resultado final é equilibrado e
não discriminatório. Vejamos, a título conclusivo, alguns exemplos da necessidade de maior ponderação e
harmonização:
• O Estatuto dos Deputados admite expressamente que possam ser exercidas de forma não remunerada
atividades como a investigação ou docência no ensino superior público, prevalecendo neste caso a
dimensão remuneratória (ou melhor, a dimensão não-remuneratória) como justificativo para se poder
manter a exclusividade;
• Tem-se entendido (havendo parecerística das comissões parlamentares permanentes que antecederam a
da transparência) que atividades de caráter pontual, ainda que remuneradas, não colidem com a
exclusividade. Neste caso, tem prevalecido aparentemente a dimensão da dedicação ao trabalho
parlamentar – sendo matéria que a iniciativa legislativa do BE não altera, mantendo a referência ao caráter
regular na norma revista;
• Finalmente, a perceção de senhas de presença em variados tipos de órgãos tem igualmente sido aceite
como conforme à exclusividade, potencialmente convocando quer a dimensão remuneratória, quer a
dimensão da dedicação (atento o caráter potencialmente pontual dessas funções).
PARTE III – Conclusões
1 – Os Deputados do BE apresentaram à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 896/XIV/2.ª –
Protege o regime de exclusividade no mandato dos Deputados.
2 – A presente iniciativa propõe-se alterar o n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, e o n.º 6
do artigo 16.º da Lei n.º 4/85, de 9 de abril, determinado que o exercício do mandato em regime de exclusividade
é incompatível com o exercício de qualquer atividade económica, remunerada ou não.
3 – Face ao exposto na presente análise relativamente ao cumprimento dos requisitos constitucionais,
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regimentais e legais da iniciativa, a Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados é de parecer que o
Projeto de Lei n.º 896/XIV/2.ª reúne os requisitos constitucionais e regimentais para serem discutidos e votados
em Plenário na generalidade.
Palácio de São Bento, 26 de outubro de 2021.
O Deputado relator, Pedro Delgado Alves — O Presidente da Comissão, Jorge Lacão.
Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PCP, na reunião da
Comissão de 26 de outubro de 2021.
PARTE IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada sobre o projeto de lei pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º
do RAR.
Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 896/XIV/2.ª (BE)
Protege o regime de exclusividade no mandato dos Deputados e Deputadas
Data de admissão: 1 de julho de 2021.
Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados (14.ª).
Índice
I. Análise das iniciativas
II. Enquadramento parlamentar
III. Apreciação dos requisitos formais
IV. Análise de direito comparado
V. Consultas e contributos
VI. Avaliação prévia de impacto
VII. Enquadramento bibliográfico
VIII. Anexo
Elaborada por: Cidalina Antunes (DAC), José Filipe de Sousa (DAPLEN), Cristina Ferreira, Filipa Paixão, Luísa Colaço e Sandra Rolo (DILP), e João Sanches (BIB). Data: 30 de setembro de 2021.
I. Análise das iniciativas
• A iniciativa
O projeto de lei em apreço é apresentado pelo proponente com o intuito de obviar a dúvidas interpretativas
sobre o regime de exclusividade no exercício do mandato de Deputado. Nesse sentido, discorda da interpretação
que resulta do parecer aprovado pela Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados (14.ª Comissão),
em 20 de abril de 2021, intitulado «Dúvidas sobre a conformidade legal da acumulação de funções com o regime
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de exclusividade.»
Em causa está a compatibilização de dois preceitos legais que versam sobre o regime de exclusividade
aplicável aos titulares de cargos políticos, mormente aos Deputados.
Os preceitos em causa, encontram-se previstos em dois diplomas distintos – o Regime Jurídico do Exercício
de Funções por Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos – Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, e o
Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos – Lei n.º 4/85, de 9 de abril. O primeiro foi alterado em
2019, tendo sido instituído um novo regime jurídico disciplinador do regime da exclusividade – entre outras
matérias -, enquanto o segundo diploma se mantém inalterado desde 2001.
Em concreto, os preceitos em causa nos referidos diplomas, são os seguintes:
– O n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, que dispõe: «O exercício de funções em regime de
exclusividade é incompatível com quaisquer outras funções profissionais remuneradas ou não, bem como com
a integração em corpos sociais de quaisquer pessoas coletivas de fins lucrativos»;
– O n.º 6 do artigo 16.º da Lei n.º 4/85, de 9 de abril – Estatuto Remuneratório dos Titulares de cargos Políticos
que dispõe: «Os restantes Deputados não referidos nos números anteriores têm direito a um abono mensal para
despesas de representação no montante de 10% do respetivo vencimento, desde que declarem no registo de
interesses que «não exercem regularmente qualquer atividade económica, remunerada ou de natureza liberal.»
Cotejando as duas normas verifica-se que é utilizada nas referidas normas diferente terminologia:
– Quaisquer funções profissionais vs. atividade económica regular;
– Quaisquer funções profissionais vs. atividade de natureza liberal regular;
remunerada ou não vs. remunerada
O proponente defende que a intenção do legislador era «impedir o desempenho de atividades económicas
em simultâneo com o recebimento do abono específico pelo exercício das funções em regime de exclusividade»
e que o referido parecer da 14.ª Comissão «reinterpreta a lei deturpando» na sua opinião «quer o disposto na
lei vigente, quer o espírito do legislador.»
Assim, o proponente pretende clarificar a norma do n.º 6 do artigo 16.º do estatuto remuneratório,
introduzindo-lhe o seguinte inciso: «desde que declarem no registo de interesses que não exercem regularmente
atividade económica, atividade remunerada ou atividade de natureza liberal»,
• Enquadramento jurídico nacional
O direito de participação na vida política encontra-se consagrado no n.º 1 do artigo 48.º da Constituição da
República Portuguesa2 (Constituição), que estabelece que «todos os cidadãos têm o direito de tomar parte na
vida política e na direção dos assuntos públicos do País, diretamente ou por intermédio de representantes
livremente eleitos».
O exercício da função de Deputado, previsto no artigo 155.º, estabelece no n.º 1 que «os Deputados exercem
livremente o seu mandato, sendo-lhes garantidas condições adequadas ao eficaz exercício das suas funções,
(…)». Por sua vez, a alínea d) do artigo 158.º, também da Constituição, dispõe que «Os Deputados gozam dos
subsídios que a lei prescrever».
Além do enquadramento constitucional, o exercício do mandato de Deputado encontra-se regulado em
legislação diversa, nomeadamente no Estatuto dos Deputados (versão consolidada) , aprovado pela Lei n.º 7/93,
de 1 de março3 4, na redação resultante das alterações introduzidas pelas Leis n.os 24/95, de 18 de agosto5,
2 Todas as referências à Constituição são feitas para o portal da Assembleia da República, salvo indicação em contrário. 3 Diploma retirado do sítio na Internet do Diário da República Eletrónico (DRE). Todas as referências legislativas são feitas para o portal oficial do Diário da República Eletrónico, salvo indicação em contrário. 4 Trabalhos preparatórios. 5 Trabalhos preparatórios.
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55/98, de 18 de agosto6, 8/99, de 10 de fevereiro7, 45/99, de 16 de junho8, 3/2001, de 23 de fevereiro9 10, 24/2003,
de 4 de julho11, 52-A/2005, de 10 de outubro12, 44/200613 e 45/200614, ambas de 25 de agosto, 43/2007, de 24
de agosto15, e 16/2009, de 1 de abril16, 44/2019, de 21 de junho17, e 60/2019, de 13 de agosto18.
Nos termos da alínea c), do n.º 2, do artigo 1.º da Lei n.º 4/85, de 9 de abril19, é também aplicável o Estatuto
remuneratório dos titulares de cargos políticos20 por ela aprovado, a qual se encontra alterada pelas Leis n.os
16/87, 1 de junho21, 102/88, de 25 de agosto22, 26/95, de 18 de agosto23, 3/2001, de 23 de fevereiro24, 52-A/2005,
de 10 de outubro25, e 44/2019, de 21 de junho26.
É ainda aplicável ao exercício do mandato do Deputado, por força do disposto da alínea d) do n.º 1 do artigo
2.º, o Regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos27, aprovado pela
Lei n.º 52/2019, de 31 de julho28, e alterado pela Lei n.º 69/2020, de 9 de novembro29.
Em matéria de regime de abonos importa também mencionar a Resolução da Assembleia da República n.º
113/2019, de 23 de julho, prevista no n.º 6 do artigo 16.º (subsídios) do Estatuto dos Deputados, e que
estabelece os princípios gerais de atribuição para apoio à atividade política dos Deputados.
Para efeitos da apreciação da presente iniciativa interessa reter o n.º 2 do artigo 19.º do Estatuto dos
Deputados que dispõe que «os Deputados têm direito a dispensa de todas as atividades profissionais, públicas
ou privadas, durante a legislatura». Esta redação corresponde às que já constavam nos anteriores estatutos30
aprovados na vigência da Constituição.
Todavia, a atribuição do abono para despesas de representação associado ao exercício em exclusividade
do mandato de Deputado deixou de constar no Estatuto dos Deputados em 1985 com a aprovação da Lei n.º
4/85, de 9 de abril, (tal como consta do n.º 6 do artigo 16.º relativo às remunerações dos Deputados).
É de notar, no entanto, a evolução do conceito do exercício em exclusividade do mandato de Deputado ao
longo da vigência da Lei n.º 4/85, de 9 de abril.
Assim, verifica-se que em 1988 deixou de se referir ao «desempenho em regime de exclusividade do
respetivo mandato», para se passar a referir ao «desempenho do respetivo mandato em regime de dedicação
exclusiva» e, em 2001, passou a constar o «não exercício regular de qualquer atividade económica, remunerada
ou de natureza liberal», como se demonstra nos quadros anexos à presente nota técnica.
Redação da Lei n.º 4/85, de 9 de abril, (versão inicial):
Artigo 16.º
(Remunerações dos Deputados)
1 – Os Deputados percebem mensalmente um vencimento correspondente a 50% do vencimento do
Presidente da República.
2 – Os vice-presidentes da Assembleia da República têm direito a um abono mensal para despesas de
6 Trabalhos preparatórios. 7 Trabalhos preparatórios. 8 Trabalhos preparatórios. 9 Retificada pela Declaração de Retificação n.º 9/2001, de 13 de março. 10 Trabalhos preparatórios. 11 Trabalhos preparatórios. 12 Trabalhos preparatórios. 13 Trabalhos preparatórios. 14 Trabalhos preparatórios. 15 Trabalhos preparatórios. 16 Trabalhos preparatórios. 17 Trabalhos preparatórios. 18 Trabalhos preparatórios. 19 Trabalhos preparatórios. 20 Versão consolidada. 21 Trabalhos preparatórios. 22 Trabalhos preparatórios. 23 Trabalhos preparatórios. 24 Trabalhos preparatórios. 25 Trabalhos preparatórios. 26 Trabalhos preparatórios. 27 Versão consolidada. 28 Trabalhos preparatórios. 29 Trabalhos preparatórios. 30 Cfr. n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 5/76, de 10 de setembro, e o n.º 2 do artigo 18.º da Lei n.º 3/85, de 13 de março.
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representação no montante de 20% do respetivo vencimento.
3 – Os presidentes dos Grupos Parlamentares e agrupamentos parlamentares e os secretários da Mesa
têm direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 15% do respetivo
vencimento.
4 – Os vice-presidentes dos Grupos Parlamentares que tenham um mínimo de 20 Deputados tem direito
a um abono para despesas de representação no montante de 10% do respetivo vencimento, havendo lugar
à atribuição de idêntico abono por cada vice-presidente correspondente a mais de 20 Deputados ou fração
superior a 10, até ao máximo de 4.
5 – Os presidentes das comissões parlamentares permanentes têm direito a um abono mensal para
despesas de representação no montante de 10% do respetivo vencimento.
6 – Os Deputados referidos nos n.os 2 a 5 só têm direito ao abono para despesas de representação se
desempenharem em regime de exclusividade o respetivo mandato.
Redação da Lei n.º 16/87, de 1 de junho (primeira alteração):
Artigo 16.º
(Remunerações dos Deputados)
1 – Os Deputados percebem mensalmente um vencimento correspondente a 50% do vencimento do
Presidente da República.
2 – Os vice-presidentes da Assembleia da República têm direito a um abono mensal para despesas de
representação no montante de 20% do respetivo vencimento.
3 – Os presidentes dos Grupos Parlamentares e agrupamentos parlamentares e os secretários da Mesa
têm direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 15% do respetivo
vencimento.
4 – Os vice-presidentes dos Grupos Parlamentares que tenham um mínimo de 20 Deputados tem direito
a um abono para despesas de representação no montante de 10% do respetivo vencimento, havendo lugar
à atribuição de idêntico abono por cada vice-presidente correspondente a mais de 20 Deputados ou fração
superior a 10, até ao máximo de 4.
5 – Os presidentes das Comissões Parlamentares Permanentes têm direito a um abono mensal para
despesas de representação no montante de 10% do respetivo vencimento.
6 – Os vice-secretários da Mesa têm direito a um abono mensal, para despesas de representação, no
montante de 10% do respetivo vencimento.
7 – Os Deputados referidos nos n.os 2 a 6 só têm direito ao abono para despesas de representação se
desempenharem em regime de exclusividade o respetivo mandato.
Redação da Lei n.º 102/88, de 25 de agosto (segunda alteração):
Artigo 16.º
(Remunerações dos Deputados)
1 – Os Deputados percebem mensalmente um vencimento correspondente a 50% do vencimento do
Presidente da República.
2 – Os vice-presidentes da Assembleia da República e os membros do Conselho de Administração têm
direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 25% do respetivo vencimento.
3 – Os presidentes dos Grupos Parlamentares e os secretários da Mesa têm direito a um abono mensal
para despesas de representação no montante de 20% do respetivo vencimento.
4 – Os vice-presidentes dos Grupos Parlamentares que tenham um mínimo de vinte Deputados têm
direito a um abono para despesas de representação no montante de 15% do respetivo vencimento, havendo
lugar à atribuição de idêntico abono por cada vice-presidente correspondente a mais de vinte Deputados ou
fração superior a dez.
5 – Os presidentes das Comissões Parlamentares Permanentes e os vice-secretários da Mesa têm
direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 15% do respetivo vencimento.
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6 – Os restantes Deputados não referidos nos números anteriores têm direito a um abono mensal para
despesas de representação no montante de 10% do respetivo vencimento, desde que desempenhem o
respetivo mandato em regime de dedicação exclusiva.
Redação da Lei n.º 3/2001, de 23 de fevereiro (terceira alteração e redação atual):
Artigo 16.º
(Remunerações dos Deputados)
1 – Os Deputados percebem mensalmente um vencimento correspondente a 50% do vencimento do
Presidente da República.
2 – Os vice-presidentes da Assembleia da República e os membros do Conselho de Administração têm
direito a um abono mensal para despesas de representação no montante de 25% do respetivo vencimento.
3 – Os presidentes dos Grupos Parlamentares e os secretários da Mesa têm direito a um abono mensal
para despesas de representação no montante de 20% do respetivo vencimento.
4 – Os vice-presidentes dos Grupos Parlamentares que tenham um mínimo de vinte Deputados têm
direito a um abono para despesas de representação no montante de 15% do respetivo vencimento, havendo
lugar à atribuição de idêntico abono por cada vice-presidente correspondente a mais de vinte Deputados ou
fração superior a dez.
5 – Os presidentes das comissões parlamentares permanentes e os vice-secretários da Mesa têm direito
a um abono mensal para despesas de representação no montante de 15% do respetivo vencimento.
6 – Os restantes Deputados não referidos nos números anteriores têm direito a um abono mensal para
despesas de representação no montante de 10% do respetivo vencimento, desde que declarem no registo
de interesses que não exercem regularmente qualquer atividade económica, remunerada ou de natureza
liberal.
Acresce ainda que a densificação do exercício em exclusividade do mandato de Deputado foi prevista no
artigo 6.º da Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, que aprovou o Regime do exercício de funções por titulares de
cargos políticos e altos cargos públicos, cuja redação evoluiu do artigo 4.º da Lei n.º 64/93, de 26 de agosto, já
revogada, relativa ao Regime de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos
cargos públicos.
II. Enquadramento parlamentar
• Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)
Sobre o regime da exclusividade no exercício do mandato de Deputado, inexistem iniciativas legislativas ou
petições pendentes.
• Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas e petições)
Consultada a base de dados da atividade parlamentar, nas duas Legislaturas anteriores, localizámos as
seguintes iniciativas legislativas, com objeto idêntico ao da iniciativa em apreço:
• Projeto de Lei n.º 153/XIII/1.ª (BE) – Altera o Estatuto dos Deputados tornando obrigatório o Regime de
Exclusividade dos Deputados à Assembleia da República, que foi aprovado, em votação final global,
em 7 de junho de 2019, tendo dado origem à Lei n.º 60/2019, de 13 de agosto – Décima terceira alteração
ao Estatuto dos Deputados, aprovado pela Lei n.º 7/93, de 1 de março;
• Projeto de Lei n.º 768/XII/4.ª (BE) – Altera o Estatuto dos Deputados tornando obrigatório o regime de
exclusividade dos Deputados à Assembleia da República, que foi rejeitado, na generalidade, em 12 de
março de 2015;
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• Projeto de Lei n.º 551/XII/3.ª (BE) – Altera o Estatuto dos Deputados tornando obrigatório o Regime de
Exclusividade dos Deputados à Assembleia da República, que foi rejeitado na generalidade em 17 de
abril de 2014.
Já quanto a antecedentes parlamentares de petições sobre a matéria, não existe registo.
III. Apreciação dos requisitos formais
• Conformidade com os requisitos constitucionais, regimentais e formais
A iniciativa em apreciação é apresentada pela pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE), ao abrigo
e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição31 e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia
da República (Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados,
por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, bem como dos Grupos Parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da
Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do Regimento.
A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do
Regimento, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu
objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais previstos no
n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.
Observa igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do Regimento,
uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define concretamente o
sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.
O projeto de lei em apreciação deu entrada a 30 de junho de 2021. Foi admitido e anunciado a 1 de julho e
baixou para discussão na generalidade à Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados (14.ª), em
conexão com a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª), por despacho de
S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República.
• Verificação do cumprimento da lei formulário
A lei formulário32 estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos
diplomas que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa, pelo que deverá ser tida em conta
no decurso do processo da especialidade na Comissão e aquando da redação final.
O título da presente iniciativa legislativa «Protege o regime de exclusividade no mandato dos Deputados e
Deputadas» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da
lei formulário, embora possa ser aperfeiçoado, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final.
De acordo com as regras de legística formal, «o título de um ato de alteração deve referir o título do ato
alterado»33.
Porém, não se deve incluir no título «a identificação dos atos anteriores, na medida em que» tal «poderia
conduzir a títulos muito extensos»34 e menos claros. Essas menções devem constar apenas no articulado da
iniciativa, conforme estatuído no n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário, como de resto sucede na presente iniciativa.
Embora a exigência da indicação do número de ordem de alteração e da identificação dos diplomas que
procederam a alterações anteriores decorra da lei formulário, deve ter-se em conta que a mesma foi aprovada
e publicada num contexto de ausência de um Diário da RepúblicaEletrónico, sendo que, neste momento, o
mesmo é acessível universal e gratuitamente.
Desta forma, e no respeito pelas regras de legística que têm sido seguidas nesta matéria sugere-se que,
caso a iniciativa seja aprovada, seja adotado o seguinte título na especialidade:
31 As ligações para a Constituição e para o Regimento são feitas para o portal oficial da Assembleia da República 32 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas. 33 DUARTE, David., (etal.) – Legística: Perspectivas sobre a concepção e redacção de actos normativos. Coimbra : Almedina, 2002. P. 201. 34 DUARTE, David., (etal.) – Legística: Perspectivas sobre a concepção e redacção de actos normativos. Coimbra : Almedina, 2002. P. 203.
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– Protege o regime de exclusividade no mandato dos Deputados, alterando as Leis n.os 4/85, de 9 de
abril, e 52/2019, de 31 de julho.
Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
No que respeita ao início de vigência, o artigo 4.º da iniciativa prevê que a mesma entra em vigor no dia
seguinte ao da sua publicação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei
formulário, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso
algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação».
Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em análise não nos suscita outras questões no âmbito da lei
formulário.
IV. Análise de direito comparado
• Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-Membros da União Europeia: Bélgica,
Espanha, França e Itália.
BÉLGICA
O artigo 49. da Constitution coordonnée35 (texto consolidado) refere que, ninguém pode ser membro das
duas Câmaras – Chambre des Représentants36 (Câmara dos Representantes) e Sénat37 (Senado).
Conforme estatui o artigo 50. da Constituição, o membro de uma das duas Câmaras nomeado pelo Rei na
qualidade de ministro e que aceite essa nomeação, suspende o seu mandato enquanto parlamentar voltando a
reassumi-lo quando cessar as funções de ministro. A lei regula as modalidades de substituição em cada uma
das Câmaras, in casu o artigo 1bis. da Loi du 6 Aôut 1931, établissant des incompatibilités et interdictions
concernant les Ministres et Ministres d'Etat, ainsi que les membres et anciens membres des Chambres
législatives (texto consolidado).
Quando um membro de uma das duas Câmaras é, segundo o artigo 51. da Constituição, nomeado pelo
governo federal para o desempenho de qualquer função assalariada que não a de ministro e que aceite tal
designação, cessa de imediato as suas funções e não as pode retomar até nova eleição.
O artigo 119. da Constituição reconhece que o mandato de membro do Parlamento de uma comunidade ou
região é incompatível com o de membro da Câmara dos Representantes e do Senado.
Relativamente às incompatibilidades e interdições dos membros da Câmara dos Representantes e do
Senado, estas encontram-se positivadas no articulado da Loi du 6 Aôut 1931 (texto consolidado).
O mandato de membro da Câmara dos Representantes ou o de Senador é, de acordo com o artigo 1. desta
lei, incompatível com as seguintes funções ou mandatos:
– Funcionário ou empregado assalariado do Estado;
– Ministro da Cultura remunerado pelo Estado;
– Consultor jurídico nas administrações públicas federais;
– Agente da entidade bancária do Estado;
– Comissário governamental nas sociedades anónimas;
– Governador de província, vice-governador, adjunto do governador, conselheiro e escrivão provincial;
35 Diploma consolidado retirado do portal oficial justel.be (legislação belga consolidada). Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas respeitantes à Bélgica são feitas para o referido portal, salvo indicação em contrário. 36 Em https://www.lachambre.be/, consultado no dia 09/07/2021. 37 Em https://www.senate.be/, consultado no dia 09/07/2021.
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– Comissário distrital;
– Titular em funções na ordem judiciária;
– Conselheiro de Estado, assessor da seção de legislação ou membro do gabinete de auditoria, do gabinete
de coordenação ou da secretaria do Conselho de Estado38;
– Juiz, relator ou escrivão do Tribunal Constitucional39;
– Membro do Tribunal de Contas40;
– Militar no serviço ativo com a exceção dos oficiais na reserva convocados na qualidade de soldados
milicianos;
– Membro do conselho de administração de uma empresa pública autónoma dependente do Estado.
Estes não podem demandar ou acompanhar qualquer ação litigiosa no interesse do Estado nem prestar
conselhos ou pareceres nestes casos, salvo gratuitamente.
Sem prejuízo de outras incompatibilidades constitucionais e legais, em conformidade com o preceituado no
artigo 1ter. da Loi du 6 Aôut 1931 conjugado com o § 1er. do artigo 67. da Constituição, os Senadores designados
pelo Parlamento da Região de Flandres ou grupo de língua holandesa do Parlamento da Região de Bruxelas-
Capital; pelo Parlamento da Comunidade Francesa; pelo Parlamento da Região de Valónia; pelo grupo de língua
francesa do Parlamento da Região de Bruxelas-Capital; pelo Parlamento da Comunidade Germanófona não
podem exercer ao mesmo tempo a função de presidente da câmara municipal, vereador ou presidente de um
centro público de assistência social.
Por seu turno, prevê o artigo 1quater. da mesma lei que o mandato de membro da Câmara dos
Representantes ou de Senador não pode ser acumulado com mais do que um mandato executivo remunerado.
São considerados como mandatos executivos remunerados:
– As funções de presidente da câmara municipal, vereador ou presidente de um centro público de assistência
social, independentemente dos rendimentos auferidos nesta qualidade;
– Todo o mandato exercido no seio de um organismo público ou privado como representante do Estado,
comunidade, região, província ou município, quando este mandato conferia mais poderes do que a mera
qualidade de membro de assembleia geral ou do conselho de administração desse organismo,
independentemente dos rendimentos obtidos nesta condição;
– Todo o mandato desempenhado num organismo público ou privado como representante do Estado,
comunidade, região, província ou município, desde que o rendimento mensal bruto tributável inerente a este
exercício seja, pelo menos, de 20 000 francos41. Este valor é objeto de atualização anual tendo em conta a
evolução do índice de preços no consumidor.
Como estabelece o artigo 1quinquies. da Loi du 6 Aôut 1931, o montante dos subsídios, salários ou senhas
de presença auferidas a título de retribuição das atividades exercidas pelo membro da Câmara dos
Representantes ou do Senado fora do âmbito do mandato parlamentar não pode exceder metade do valor do
subsídio parlamentar.
Para o cálculo deste valor são considerados os subsídios, salários ou senhas de presença decorrentes do
exercício de um mandato, função ou cargo público de ordem política ou das funções especiais no seio da
Câmara dos Representantes ou do Senado instituídas nos respetivos regimentos.
Relevam, igualmente, para este cômputo os valores recebidos, direta ou indiretamente, e a título de
subsídios, salários, ou senhas de presença pela participação no conselho de administração, consultivo ou comité
de direção:
– De entidades intermunicipais e interprovinciais;
38 Em http://www.raadvst-consetat.be/?page=about_organisation&lang=fr, consultado no dia 09/07/2021. 39 Em https://www.const-court.be/en/court/presentation/organization#, consultado no dia no dia 09/07/2021. 40 Em https://www.ccrek.be/FR/Presentation/Organisation.html, consultado no dia 09/07/2021. 41 Esta norma deve ser lida com o artigo 1.º do Regulamento (CE) n.º 2866/98 do Conselho, de 31 de dezembro (texto consolidado), que fixa irrevogavelmente as taxas de conversão entre o euro e as moedas dos Estados-Membros da União Europeia que adotaram o euro – 1 euro = 40,3399 francos belgas, acessível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:01998R2866-20150101&fro m=PT, consultado no dia 09/07/2021.
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– De pessoas coletivas sobre as quais uma ou mais autoridades públicas exercem, direta ou indiretamente,
uma influência dominante, nas seguintes formas:
• Celebrem com estas pessoas coletivas um contrato de gestão ou de administração;
• Designem, direta ou indiretamente, mais de metade dos membros do órgão de administração, gestão
ou direção da pessoa coletiva, ou que nomeiem uma ou mais pessoas para exercer a tutela sobre a
mesma;
• Possua, direta ou indiretamente, a maioria do capital subscrito;
• Detenha, direta ou indiretamente, a maioria dos votos intrínsecos às ações emitidas pela pessoa
coletiva.
– De pessoas coletivas nas quais, em sequência a uma decisão de uma autoridade pública, o membro da
Câmara dos Representantes ou do Senado integre o conselho de administração, conselho consultivo ou comité
de direção.
Quando o limite de acumulação financeira for ultrapassado, o montante do subsídio parlamentar é reduzido,
à exceção de quando o mandato de parlamentar (Câmara dos Representantes e do Senado) é exercido
cumulativamente com o mandato de presidente da câmara municipal, vereador ou de presidente de um conselho
de assistência social, nesta circunstância é nestes últimos cargos que o salário é reduzido.
Note-se que o limite de acumulação financeira não é aplicável aos presidentes da Câmara dos
Representantes e do Senado.
O limite de cumulação de mandatos ou cargos executivos remunerados (1) com o mandato parlamentar e da
acumulação financeira é reiterado no n.º 6. do Capítulo 1 do Statut du membre de la Chambre des
représentants42 (texto consolidado) sendo que, no início do mandato parlamentar, os membros eleitos
diretamente informam o presidente de todos os mandatos, funções ou cargos públicos de ordem política que
desempenham fora do mandato parlamentar e o valor bruto dos salários que recebem.
Se, durante o mandato, ocorrer alguma alteração quanto ao início ou fim dessas atividades ou do salário,
estes comunicam, de imediato, tais factos ao presidente da respetiva câmara.
Esta comunicação inclui, também, as informações relativas às instituições onde os mesmos exercem as
funções extraparlamentares e a apresentação dos comprovativos dos rendimentos emitidos por aquelas.
O cômputo do valor máximo tem como base um período de referência 12 meses.
Nos termos do artigo 161 do Règlement de la Chambre des représentants43 (texto consolidado), todosos
seus membros que exerceram os seus mandatos no ano civil precedente devem, antes do dia 1 de outubro de
cada ano, apresentar junto do Tribunal de Contas uma declaração na qual são elencados os mandatos, funções
dirigentes ou profissões, qualquer que seja a sua natureza, quer no setor público como no privado e indicar se
estas são remuneradas ou não.
O regime remuneratório dos membros da Câmara dos Representantes é desenvolvido nos n.os 1. a 3. e 5. do
capítulo 1 e no capítulo 2 do Statut du membre de la Chambre des représentants.
Conforme o disposto no artigo 89 do Règlement du Sénat de Belgique44 (texto consolidado), ao assumir o
mandato, cada membro do Senado comunica ao Presidente todas as informações pertinentes relativas aos
outros mandatos, funções e cargos públicos de ordem política que exerce para a aplicação do artigo 1quinquies.
da Loi du 6 Aôut 1931, isto é, o limite de acumulação financeira.
No sítio de internet do Senado são apresentadas várias frequently asked questions (FAQ)45 sobre os diversos
aspetos inerentes a este órgão como o seu papel, história, sobre as incompatibilidades, imunidades e
remunerações, dos procedimentos legislativos. A 5.1.3. esclarece como são remunerados os Senadores.
42 Acessível em https://www.lachambre.be/kvvcr/pdf_sections/depute/Statut_du_membre_de_la_Chambre_des_representants.pdf, pág. 6, consultado no dia 09/07/2021. 43 Em https://www.lachambre.be/kvvcr/pdf_sections/publications/reglement/reglementFR.pdf, consultado no dia 09/07/2021. 44 Em https://www.senate.be/doc/Reglement_2021_F.pdf, consultado no dia 09/07/2021. 45 Em https://www.senate.be/www/?MIval=/index_senate&MENUID=13000&LANG=fr, consultadas no dia 09/07/2021.
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ESPANHA
O n.º 1 do artigo 67 da Constitución Española46prescreve que ninguém pode ser, em simultâneo, membro
das duas Câmaras – Congreso de los Diputados47 (Congresso dos Deputados) e do Senado48 –, nem acumular
o mandato de Deputado com o lugar de membro de uma das assembleias das comunidades autónomas.
O n.º 1 do artigo 70 da Constituição enuncia alguns dos cargos, cujo exercício resulta na inelegibilidade e
incompatibilidade para o mandato dos Deputados e Senadores, remetendo, ainda, para a lei eleitoral a indicação
de outras causas de inelegibilidade e incompatibilidade.
Refere o n.º 2 do mesmo artigo que, a validade dos mandatos dos Deputados e Senadores é, nos termos da
lei eleitoral, sujeita a controlo judicial.
Vem a Ley Orgánica 5/1985, de 19 de junio, del Régimen Electoral General (texto consolidado) materializar
o regime de incompatibilidades e o regime de exercício do mandato dos Deputados e Senadores – em dedicação
absoluta -, na seguinte forma:
O artigo ciento coincuenta y cinco, concretamente os seus n.os 1 e 2 determinam que, as causas de
inelegibilidade dos Deputados e Senadores são também de incompatibilidade e identificam os vários cargos que
são incompatíveis com o exercício do mandato:
a) O Presidente da Comisión Nacional de los Mercados y la Competencia49;
b) Os membros do Conselho de Administração da Corporación de Radio Televisión Española50;
c) Os membros do Gabinete da Presidência do Governo51 ou dos ministros e dos secretários de Estado;
d) Os delegados do governo nas autoridades portuárias, confederações hidrográficas, sociedades
concessionárias de portagens;
e) Os presidentes dos conselhos de administração, conselheiros, administradores, diretores-gerais, gerentes
e cargos equiparados nas entidades públicas, monopólios estatais e empresas com participação, direta ou
indireta, maioritariamente pública, qualquer que seja a sua forma, e em caixas económicas de criação pública.
O n.º 4 do mesmo artigo estatui que, os Senadores designados pelas comunidades autónomas sejam ou
não, simultaneamente, membros das assembleias legislativas das mesmas:
a) Só podem desempenhar as atividades que lhes estão expressamente autorizadas pela Constituição e
nesta lei, independentemente do regime que lhes possa corresponder devido à sua nomeação pela comunidade
autónoma; e
b) Só podem receber a remuneração que lhes corresponda como Senadores, salvo se optarem
expressamente pela remuneração inerente ao cargo de Deputado da comunidade autónoma.
O artigo ciento cincuenta y seis estabelece que, os Deputados e Senadores só podem fazer parte dos órgãos
colegiais de direção ou conselhos de administração de organismos, entidades públicas ou empresas com
participação, direta ou indireta, maioritariamente pública até ao limite de dois órgãos, quando a sua eleição for
da competência do Congresso dos Deputados ou do Senado.
No entanto, só recebem as ajudas de custo ou subsídios a que tenham direito e que se encontram prescritos
no sistema remuneratório para a Administração Pública.
Os montantes acumulados e não recebidos são entregues diretamente ao Tesoro Público52 pelo organismo,
entidade ou empresa.
Conforme o disposto nos artigos ciento cincuenta y siete e ciento cincuenta y nueve, o mandato dos
46 Diploma consolidado retirado do portal oficial boe.es. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a Espanha são feitas para o referido portal. 47 Em https://www.congreso.es/home, consultado no dia 08/07/2021. 48 Em https://www.senado.es/, consultado no dia 08/07/2021. 49 Em https://www.cnmc.es/sobre-la-cnmc/que-es-la-cnmc#origen, consultado no dia 08/07/2021. 50 Em https://www.rtve.es/rtve/20190709/quienes-somos/937847.shtml, consultado no dia 08/07/2021. 51 Em https://transparencia.gob.es/transparencia/transparencia_Home/index/PublicidadActiva/OrganizacionYEmpleo/Funciones/Funciones-PG.html, consultado no dia 08/07/2021. 52 Em https://www.tesoro.es/, consultado no dia 08/07/2021.
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Deputados e Senadores é exercido em regime de dedicação absoluta, por conseguinte este é incompatível com
o desempenho, enquanto titular ou em substituição, de qualquer outro cargo, profissão ou atividade, pública –
órgãos constitucionais, Administrações Públicas, seus organismos e entidades públicas, empresas com
participação, direta ou indireta, maioritariamente pública – ou privada, por conta própria ou assalariada,
remunerada por vencimento, salário, ordenado, honorários ou qualquer outra forma.
Os Deputados e Senadores que tenham a qualidade de professores universitários podem colaborar, com a
universidade que se encontram vinculados, em atividades de docência ou de investigação de natureza
extraordinária, e que não afetem a direção e o controlo dos serviços. Por estas atividades apenas podem receber
os subsídios estabelecidos no Real Decreto 1086/1989, de 28 de agosto, sobre retribuciones del profesorado
universitario (texto consolidado).
Quanto ao elenco de atividades públicas e privadas, cujo desempenho é incompatível com o mandato de
Deputado e Senador, estas, de acordo com o n.º 2 do artigo ciento cincuenta y nueve da Ley Orgánica 5/1985,
de 19 de junio, são:
– As atividades de gestão, defesa, direção ou consultadoria junto de quaisquer órgãos ou empresas do setor
público estatal, autonómico ou local, a respeito de matérias que por estes devam ser resolvidas, e que afetem
diretamente a realização de algum serviço público ou que se destinem à obtenção de subsídios ou garantias
públicas;
– A atividade de empreiteiro ou garante de obras, serviços, fornecimentos, e em geral, quaisquer contratos
que sejam liquidados com recursos financeiros de organismos ou empresas do setor público estatal, autonómico
ou local ou o exercício de funções ou cargos de direção, representação, consultadoria ou prestação de serviços
em companhias ou empresas que se dediquem a tais atividades;
– O desempenho de funções ou cargos de direção, gestão, consultadoria ou prestação de serviços em
empresas ou sociedades que sejam arrendatárias ou administradoras de monopólios;
– A prestação de serviços de consultadoria ou qualquer outra tipologia de serviços, a título individual ou
coletivo, a favor de organismos ou empresas do setor público estatal, autonómico ou local;
– A participação superior a 10% adquirida, no todo ou em parte, após a eleição como Deputado ou Senador,
exceto quando esse facto ocorra por herança, em empresas ou sociedades que tenham contratos de obras,
serviços, fornecimentos ou, em geral, quaisquer outros que sejam suportados com fundos monetários de
organismos ou empresas do setor público estatal, autonómico ou local;
– As funções de presidente do conselho de administração, conselheiro, administrador, diretor-geral, gerente
ou cargos equiparados, bem como a prestação de serviços em entidades de crédito ou seguradoras ou em
qualquer sociedade ou entidade, cuja atividade seja fundamentalmente financeira e que apele publicamente à
poupança e ao crédito;
– Quaisquer outras atividades que, pela sua natureza, sejam incompatíveis com a dedicação e as obrigações
que reconhecidas aos Deputados e Senadores e instituídas nos Regimentos do Congresso dos Deputados e do
Senado.
Da proibição de exercício de atividades públicas e privadas, segundo o n.º 3 do mesmo artigo, excetuam-se,
as seguintes:
• A mera administração do património pessoal ou familiar, salvo a participação superior a 10% detida,
conjunta ou separadamente, pelo próprio, cônjuge ou pessoa com relação análoga e descendentes
menores em atividades empresariais ou profissionais de qualquer índole que tenham acordos,
concessões ou contratos com organismos ou empresas do setor público estatal, autonómico ou local;
• A produção ou criação literária, científica, artística ou técnica e as publicações decorrentes destas, sempre
que as mesmas não sejam desempenhadas através de cargo, profissão ou atividade pública ou privada
remunerada mediante vencimento, salário, honorários ou qualquer forma de retribuição;
• As atividades privadas distintas das identificadas no n.º 2 deste artigo são autorizadas pela respetiva
comissão de cada uma das Câmaras mediante prévia solicitação manifestada pelo interessado, sendo o
pedido e a autorização inscritas no registo de interesses instituído no artigo ciento sesenta desta mesma
lei.
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Determina o artigo ciento cincuenta y ocho da Ley Orgánica 5/1985, de 19 de junio que, sem prejuízo das
ajudas de custo e subsídios relativos aos cargos compatíveis, em circunstância alguma, os Deputados e
Senadores podem receber mais do que uma remuneração paga pelo orçamento dos órgãos constitucionais ou
das Administrações Públicas, seus organismos independentes, entidades públicas e empresas com
participação, direta ou indireta, maioritariamente pública ou optar pela perceção dos direitos retributivos
inerentes aos cargos incompatíveis.
Os Deputados e Senadores não podem, também, receber pensões de qualquer regime de segurança social
público e obrigatório, cujo pagamento é retomado automaticamente após o terminus do mandato.
Além das normas jurídicas supra referenciadas, o artigo 17 do Reglamento del Congreso de los Diputados
de 10 de febrero de 198253 (Regimento do Congresso dos Deputados) (texto consolidado) reconhece que, os
Deputados não podem invocar ou usar o seu estatuto de parlamentares para o exercício de atividade comercial,
industrial ou profissional.
O sistema remuneratório destes titulares de cargos políticos – Deputados e Senadores – é, em conformidade
com o n.º 4 do artigo 71 da Constituição, fixado pelas respetivas Câmaras.
Deste modo, os Deputados, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 8 do Regimento, auferem uma remuneração,
bem como ajudas de custo, abonos e subsídios por gastos que sejam indispensáveis para o cumprimento da
sua função.
O Congresso dos Deputados explana o regime remuneratório dos Deputados num documento54 datado de
14/04/2020, e apresenta no que respeita à atual Legislatura (XIV) duas decisões da Comissão do Estatuto dos
Deputados sobre as declarações de atividades55.
No que concerne aos direitos retributivos que assistem aos Senadores, estes compreendem, de acordo com
o n.º 1 do artigo 23 do Reglamento del Senado56 (Regimento do Senado) (texto consolidado), a remuneração,
ajudas de custo e subsídios por gastos necessários para o desempenho da sua função tal como estabelecido
no Orçamento do Senado. Estes pagamentos são irrenunciáveis.
O Senado também divulga informações quanto ao regime remuneratório57 e regime de incompatibilidades58
dos seus membros.
FRANÇA
Em França, não existe nenhuma disposição legal que imponha a exclusividade dos Députés de la Assemblée
Nationale no desempenho das suas funções. De facto, o Code électoral59, nos seus articles LO137 e seguintes,
limita-se a regular o regime jurídico das incompatibilidades aplicáveis aos parlamentares franceses.
Neste seguimento, no que diz respeito às incompatibilidades com outras atividades públicas, segundo os
articles LO137 a LO145 do code supra identificado, o mandato de Député não é passível de ser exercício
concomitantemente com os seguintes cargos ou funções:
• Sénateur;
• Deputado ao Parlamento Europeu;
• Membro do Conseil économique, social et environnemental;
• Exercício de magistrado ou outras funções jurisdicionais, de arbitragem ou de mediação;
• Maire (correspondente a presidente de câmara municipal), maire d'arrondissement, maire délégué e
d'adjoint au maire;
• Presidente ou vice-presidente de établissement public de coopération intercommunale;
• Presidente ou vice-presidente de conseil départemental;
53 Acessível em https://www.congreso.es/web/guest/cem/reglam, consultado no dia 08/07/2021. 54 Em https://www.congreso.es/webpublica/ficherosportal/regimen_economico_diputados.pd, consultado no dia 08/07/2021. 55 Disponíveis em https://www.congreso.es/web/guest/cem/dictamenes_actividades_xivleg, consultadas no dia 08/07/2021. 56 Em https://www.senado.es/web/conocersenado/normas/reglamentootrasnormassenado/detallesreglamentosenado/index.html#a56b1, consultado no dia 08/07/2021. 57 Em https://www.senado.es/web/composicionorganizacion/senadores/regimeneconomico/index.html, consultado no dia 08/07/2021. 58 Em https://www.senado.es/legis14/publicaciones/pdf/senado/bocg/BOCG_T_14_62.PDF#page=5, consultado no dia 08/07/2021. 59 Diploma consolidado disponível no portal legifrance.gouv.fr. Todas as referências legislativas referentes a França deverão considerar-se remetidas para o referido portal, salvo indicação expressa em contrário.
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• Presidente ou vice-presidente de conseil regional;
• Presidente ou vice-presidente de syndicat mixte;
• Presidente, membro do conseil exécutif ou presidente da assemblée da Córsega;
• Presidente ou vice-presidente das assembleias da Guiana Francesa ou da Martinica e presidente ou
membro do conseil exécutif da Martinica;
• Presidente, vice-presidente ou membro do governo, presidente ou vice-presidente do congrès e presidente
ou vice-presidente da assembléedeprovince da Nova Caledónia;
• Presidente, vice-presidente ou membro do governo e presidente ou vice-presidente da assemblée da
Polinésia Francesa;
• Presidente ou vice-presidente da assemblée territoriale das Ilhas Wallis e Futuna;
• Presidente ou vice-presidente do conseil territorial e membro do conseil exécutif de Saint-Barthélemy, de
Saint-Martin, de Saint-Pierre-et-Miquelon
• Presidente ou vice-presidente de órgão deliberativo de qualquer outra autoridade territorial criada por lei;
• Presidente da Assemblée des Français de l'étranger ou vice-presidente do conseil consulaire;
• Exercício de funções remuneradas a favor de um Estado estrangeiro ou de uma organização internacional;
• Exercício de funções públicas não eletivas;
• Presidente, diretor-geral, diretor-geral adjunto de empresas públicas ou entidades públicas;
• Membro do conselho de administração de empresas públicas ou entidades públicas, assim como exercício
de qualquer função no âmbito de uma autoridade administrativa independente.
De acordo com o articleLO141 do Code électoral, simultaneamente com o mandato de Député poderá ser
exercido um (e apenas um) dos seguintes cargos: Conseiller régional, conseiller à l'assemblée da Córsega,
conseiller départemental, conseiller de Paris, conseillerà l'assemblée da Guiana Francesa, de conseiller à
l'assemblée de Martinica ou de conseiller municipal (correspondente, neste último caso, a vereador de câmara
municipal). Para além do mais, nos termos do disposto nos articlesLO142 e LO144 do mesmo instrumento
jurídico, os Députés da Assemblée Nationale poderão também desempenhar atividades docentes, de ministros
de culto nos departamentos de Haut-Rhin, Bas-Rhin e Moselle e cumprir uma missão temporária não
remunerada que lhes tenha sido solicitada pelo governo.
No que concerne às incompatibilidades com atividades privadas, segundo o article LO146 do Code
mencionado supra, o mandato de Député não é passível de ser exercido conjuntamente com os cargos ou
funções de presidente do conselho de administração, presidente ou membro da direção, presidente do conselho
de supervisão, administrador delegado, diretor-geral, diretor-geral delegado ou gerente de:
• Sociedades comerciais ou respetivas sociedades detentoras da maioria do capital social ou do controlo
efetivo que gozam, sob a forma de garantias, de subsídios ou meios equivalentes, de vantagens
oferecidas pelo Estado ou por uma autoridade pública, exceto no caso em que essas vantagens resultem
da aplicação automática da legislação vigente;
• Instituições de crédito ou financeiras ou respetivas sociedades detentoras da maioria do capital social ou
do controlo efetivo;
• Sociedades comerciais ou respetivas sociedades detentoras da maioria do capital social ou do controlo
efetivo que sejam contrapartes em contratos públicos;
• Sociedades comerciais ou respetivas sociedades detentoras da maioria do capital social ou do controlo
efetivo de gestão de negócios imobiliários;
• Sociedades comerciais que gerem parcerias público-privadas (sociétés d'économie mixte);
• Sociedades comerciais que prestem consultoria às sociedades comerciais anteriormente descritas.
O article LO146-1 do mesmo diploma legal proíbe os Députés da Assemblée Nationale de iniciarem, após a
sua eleição, atividades de consultoria, bem como de continuarem a exercer tais atividades, caso apenas as
tenham iniciado nos doze meses anteriores à tomada de posse. Aos parlamentares franceses está igualmente
vedada a prestação de serviços de consultoria às sociedades comerciais referidas no parágrafo precedente,
assim como aos governos, empresas públicas, entidades administrativas ou qualquer outra estrutura pública
estrangeira.
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Segundo o article LO146-2 do Code électoral, os Députés não podem assumir o controlo de uma sociedade
comercial que tenha a consultoria como seu objeto social, não o podendo igualmente exercer caso essa
assunção tenha ocorrido nos doze meses anteriores à sua eleição. Por seu turno, o article LO146-3 daquele
mesmo code não permite que os parlamentares franceses exerçam a qualquer título atividades de lobbying.
Finalmente, de acordo com o article LO149 do diploma, os Députés da Assemblée Nationale, que sejam
simultaneamente advogados, não podem assumir o patrocínio forense, por si ou por interposta pessoa, de
processos que envolvam crimes contra a nação, o Estado, a paz pública ou matérias relativas à liberdade de
imprensa ou questões financeiras.
Não existindo a obrigação do exercício da atividade de Deputé em exclusivo, não existe igualmente uma
remuneração específica referente à exclusividade.
De facto, de acordo com as fichas sínteses disponibilizadas60 pela Assemblée Nationale, a remuneração dos
Deputés é composta por três componentes:
1 – A remuneração parlamentar de base, estabelecida por referência ao salário dos funcionários públicos
nas posições mais altas do estado;
2 – A remuneração de residência, correspondente a 3% do valor bruto mensal da remuneração base; e,
3 – A remuneração de funções, correspondente a 1/4 do valor bruto mensal da remuneração base.
A remuneração dos Deputados tem por fim assegurar a sua independência financeira e garantir a disposição
dos recursos humanos e materiais necessários ao desempenho do seu mandato.
Como nota final, cumpre ainda fazer uma breve referência ao regime aplicável nesta matéria aos Sénateurs,
ou seja, aos membros do Senat francês. As incompatibilidades da acumulação do cargo de Sénateur com outras
funções está intimamente ligado ao princípio constitucional da separação de poderes e da independência de
cada uma das duas assembleias, ou seja, a Assemblée Nationale e o Senat. Como tal, e conforme referido
supra, a primeira incompatibilidade a ter em conta é a que existe entre o exercício do mandato de Deputé e o
de Sénateur. Acresce que, de acordo com o Article LO297 do Code électoral, as incompatibilidades aplicáveis
aos Deputées aplicam-se igualmente aos sénateurs61.
ITÁLIA
A Constituição62 italiana estabelece, no seu artigo 65, que a lei regulamentará a questão das
incompatibilidades e inelegibilidades dos Deputados e Senadores.
No entanto, a própria Constituição enuncia algumas dessas incompatibilidades. Desde logo, entre o exercício
do cargo de Deputado e o de Senador, proibindo expressamente a candidatura simultânea às duas Câmaras
(2.º parágrafo do artigo 65); entre o de Presidente da República e qualquer outro cargo, logo, de Deputado ou
Senador (2.º parágrafo do artigo 84); entre o de parlamentar e o de membro do Conselho Superior de
Magistratura (último parágrafo do artigo 104); entre o de parlamentar e o de conselheiro ou assessor regional
(2.º parágrafo do artigo 122); ou entre o de parlamentar e o de juiz do Tribunal Constitucional (6.º parágrafo do
artigo 135).
A Legge 13 febbraio 1953, n. 60, Incompatibilitá parlamentari, vem dar cumprimento ao artigo 65 da
Constituição e é aplicável a ambas as Câmaras. Este diploma prevê a incompatibilidade entre o cargo de
parlamentar e cargos de nomeação governativa ou da administração central do Estado, cargos em associações
ou entidades que prestem serviços públicos ou que recebam apoios estatais, cargos em sociedades por ações
com exercício prevalente de atividade financeira. Ficam excluídos desta previsão os cargos em organizações
culturais, caritativas ou religiosas, bem como os exercidos em instituições de ensino superior na sequência de
uma eleição para os respetivos órgãos académicos.
Nos termos do artigo 1-bis desta lei, o cargo de Deputado, Senador ou de membro do governo é incompatível
60 Fiche de synthèse n°17 : La situation matérielle du député e Fiche de synthèse n°3 : La rémunération des députés, disponíveis no portal oficial da Assemblée Nationale. 61 Mais informações acerca do estatuto dos Senadores e dos deveres jurídicos aos quais estão vinculados, disponíveis no portal oficial do Sénat, em https://www.senat.fr/role/fiche/statut_senateur.html#c629448. 62 Diploma consolidado retirado do portal oficial normattiva.it. Todas as ligações eletrónicas a referências legislativas relativas a Itália são feitas para o referido portal oficial, salvo indicação em contrário.
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com o cargo de membro de um órgão legislativo ou executivo, nacional ou regional, em Estado estrangeiro.
Os Deputados não podem, também, prestar qualquer aconselhamento jurídico ou profissional a empresas
de caráter financeiro ou económico, nas suas relações ou disputas com o Estado.
A Corte Costituzionale, mediante sentença63 de 21 de outubro de 2011, declarou a ilegalidade dos artigos 1
a 4 desta lei, por não preverem a incompatibilidade entre o exercício simultâneo do cargo de Deputado e o de
presidente da câmara de uma autarquia com mais de 20 000 habitantes.
Existem ainda outras proibições da acumulação do mandato parlamentar com outros cargos previstas em
disposições específicas de várias leis.
Em particular, a Legge 27 marzo 2004, n. 78, Disposizioni concernenti i membri del Parlamento europeo eletti
in Italia, in attuazione della decisione 2002/772/CE, del Consiglio, aditou um artigo 5-bis à Legge 24 gennaio
1979, n. 18, Elezione dei membri del Parlamento europeo spettanti all'Italia, no qual se prevê a incompatibilidade
entre o cargo de Deputado ao Parlamento Europeu e o de Deputado ou Senador.
De igual modo, com o Decreto-Legge 13 agosto 2011, n. 138, Ulteriori misure urgenti per la stabilizzazione
finanziaria e per lo sviluppo, foi acrescentada às incompatibilidades já existentes a de exercício simultâneo do
cargo de Deputado ou Senador e de presidente de província ou da câmara de municípios com mais de 15 000
habitantes (artigo 13, n.º 3).
Caso um Deputado ou Senador se encontre, ou venha a encontrar-se no decurso do mandato, numa das
situações de incompatibilidade previstas, deve, dentro de prazos diversos consoante o tipo de incompatibilidade,
optar por um dos cargos.
V. Avaliação prévia de impacto
• Avaliação sobre impacto de género
O proponente juntou à iniciativa, a ficha de avaliação de impacto de género (AIG), dando assim cumprimentos
à Lei n.º 4/2018, de 9 de fevereiro, conforme deliberado na súmula n.º 67, de 20 de junho de 2018, da
Conferência de Líderes
• Linguagem não discriminatória
Na elaboração dos atos normativos a especificação de género deve ser minimizada recorrendo-se, sempre
que possível, a uma linguagem neutra ou inclusiva, mas sem colocar em causa a clareza do discurso.
O título da iniciativa utiliza a expressão «Deputados e Deputadas». Considerando que a adoção de vários
substantivos no título pode colocar em causa as respetivas concisão e clareza, e uma vez que os diplomas que
o presente projeto de lei visa alterar – e o próprio texto do projeto de lei – fazem referência a «Deputados», não
parece fazer sentido utilizar uma expressão diversa, por uma questão de coerência.
VI. Enquadramento bibliográfico
CONSELHO DA EUROPA. GRECO – Prévention de la corruption des parlementaires, des juges et des
procureurs [Em linha]: Rapport d’évaluation: Portugal. Strasbourg: Conseil de l’Europe, 2016 (Consult. 5
julho 2021). Disponível na Intranet da AR:
https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=119148&img=2060&save=true.
Resumo: O presente relatório aborda questões relacionadas com os princípios éticos, regras deontológicas
e conflitos de interesses; interdição ou limitação de algumas atividades; declarações de património, de
ordenados, de passivos e de interesses e faz uma avaliação da aplicação das regras em vigor e da sensibilização
para estas temáticas.
63 Disponível em: https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2011/10/26/011C0665/s1
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No que respeita aos Deputados, são apresentadas várias recomendações no sentido de garantir que os
prazos estabelecidos no Regimento da Assembleia da República para as diversas fases do processo legislativo
sejam respeitados; assegurar a igualdade de acesso a todas as partes interessadas (incluindo a sociedade civil)
nas várias fases do processo legislativo; adotar princípios e regras claras relativos à conduta dos Deputados
tornando esses princípios públicos e garantindo um mecanismo de acompanhamento eficaz para os aplicar;
sensibilizar os Deputados para esses princípios e normas de conduta, fornecendo orientação personalizada,
aconselhamento confidencial e formação em temas como: contatos apropriados com terceiros ou aceitação de
presentes, ofertas e benefícios, conflitos de interesse e prevenção da corrupção; proceder a uma avaliação
independente da eficácia do sistema de prevenção, declaração, determinação e sanção de conflitos de interesse
dos Deputados, dando especial atenção à adequação das incompatibilidades e impedimentos e aos seus efeitos
na prevenção e deteção de sinais de corrupção, tomando medidas corretivas apropriadas (fortalecendo e
aperfeiçoando regulamentos, reforçando o controlo e criando sanções dissuasivas); garantir que a declaração
de interesses privados dos Deputados é controlada de forma regular e rigorosa por um órgão imparcial; prever
sanções adequadas para violações menores de obrigação de declaração de património (como as declarações
incompletas e inexatas); tornar públicas e disponibilizar em linha as declarações de bens dos Deputados; garantir
que as declarações de todos os Deputados são objeto de verificação frequente em prazos razoáveis e que o
órgão de supervisão independente é dotado de recursos humanos suficientes por forma a facilitar uma
cooperação eficaz entre este organismo e os outros organismos públicos envolvidos no controlo de conflitos de
interesse dos Deputados.
PORTUGAL. Assembleia da República. Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar – Imunidades e
incompatibilidades parlamentares [Em linha]: Enquadramento internacional. Lisboa: DILP, 2016. (Consult.
5 jul. 2021). Disponível na Intranet da AR:
https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=127930&img=13256&save=true.
Resumo: O presente estudo comparado elaborado pela Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar
relativo às questões das imunidades e incompatibilidades dos Deputados, analisa sucintamente a situação
existente na Bélgica, Brasil, Espanha, França, Itália e Reino Unido, além da recolha da legislação mais relevante
sobre este assunto em cada um destes países. O estudo que abrange matérias distintas, embora
interrelacionadas, divide a análise por país e em duas partes: A primeira sobre imunidades e a segunda sobre
incompatibilidades.
SAMPAIO, Gustavo – Os facilitadores: Como a política e os negócios se entrecruzam nas sociedades
de advogados. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2014. 388 p. ISBN 978-989-626-607-3. Cota: 325/2014
Resumo: O autor apresenta uma investigação jornalística que revela as listas dos clientes das maiores
sociedades de advogados, as ligações entre políticos e empresas (desde o recrutamento de políticos ou ex-
políticos até aos cargos de administração em grandes empresas), as participações no âmbito da produção
legislativa ou da atividade reguladora, entre outros casos. Faz o retrato das ligações de interesses entre o poder
político, o mundo empresarial e as sociedades de advogados.
SAMPAIO, Gustavo – Porque falha Portugal? Lisboa: Manuscrito, 2016. 325 p. ISBN 978-989-8818-34-8.
Cota: 160/2016
Resumo: Esta obra aborda os pedidos de assistência financeira internacional que Portugal fez em apenas
40 anos de democracia, apontando para o «incumprimento sistemático das regras de contenção do défice
orçamental e da dívida pública, casos sucessivos de corrupção nas mais altas esferas política e económica,
ascensão recorrente de ex-governantes no meio empresarial». Destaca-se que o autor da obra prossegue com
o argumento que «o problema essencial está no mau funcionamento das instituições políticas e económicas» e
«procura diagnosticar os principais sintomas do problema, desde logo a captura do poder político pelo poder
económico e a imposição do denominado capitalismo de compadrio. De onde vieram e para onde foram logo a
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seguir, ao nível profissional, os governantes portugueses desde 1976, beneficiando ou não dos efeitos de
trampolim profissional, porta giratória e/ou benefício direto. Revelam-se neste livro 233 casos concretos de um
fenómeno sistemático, incluindo a mais recente vaga de recrutamento de ex-governantes. Mérito e competência
ou pagamento de favores, movimentação de influências e partilha de informação privilegiada? Mais: a tradição
do clientelismo partidário na atribuição de altos cargos diretivos; a proliferação de condecorações a políticos e
empresários ligados a casos de corrupção ou negócios ruinosos, sob uma lógica de autopromoção da casta; e
a consagração da mentira como instrumento político, gerando repulsa nos cidadãos que se afastam cada vez
mais das urnas de voto. As grandes causas da presente crise de credibilidade da classe política e,
consequentemente, do regime democrático».
———
PROJETO DE LEI N.º 999/XIV/3.ª
RECONHECE E REGULA A FIGURA DO ANIMAL COMUNITÁRIO, REDUZ O PRAZO DE
RECLAMAÇÃO DOS ANIMAIS NÃO IDENTIFICADOS RECOLHIDOS NOS CRO, E ATRIBUI AO ESTADO
O ENCARGO COM OS PROGRAMAS DE ESTERILIZAÇÃO DE ANIMAIS ERRANTES OU
COMUNITÁRIOS, PROCEDENDO À PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 27/2016, DE 23 DE AGOSTO, À
DÉCIMA ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 276/2001, DE 17 DE OUTUBRO, À SEGUNDA ALTERAÇÃO
AO DECRETO-LEI N.º 82/2019, DE 27 DE JUNHO, E À TERCEIRA ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º
314/2003, DE 17 DE DEZEMBRO
Exposição de motivos
A Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, veio inaugurar entre nós um novo paradigma de controlo e gestão da
população animal, abolindo a occisão (ou abate) de animais errantes como medida de recurso comum e
acolhendo estratégias efetivas e éticas como sejam o fomento da esterilização e a promoção de campanhas de
adoção de animais errantes e abandonados.
Para o efeito, o Estado assumiu o compromisso social de assegurar a concretização desses objetivos, em
colaboração com as autarquias locais, o movimento associativo e as organizações não-governamentais de
ambiente e de proteção animal, tal como estabelece o artigo 2.º da citada lei, sob a epígrafe «Deveres do
Estado».
Na verdade, é ao Estado e às autarquias locais que compete zelar pelo respeito e proteção dos animais em
estado de errância ou abandono e adotar as medidas adequadas a garantir um destino condigno aos mesmos,
em conformidade com o respetivo estatuto de seres sensíveis expressamente reconhecido pelo Código Civil.
Como é sabido, o edifício jurídico em vigor consagra aos chamados animais de companhia um regime
privilegiado face aos animais utilizados para outros fins, mercê da especial relação de proximidade afetiva e
emocional com os humanos, ao ponto de lhes reservar tutela penal exclusiva contra maus-tratos e morte dolosa
e injustificada, pese embora não acompanhemos esta opção do legislador, que no entender do PAN, deve
estender a proteção contra os maus-tratos e o abandono a todos os animais (pelo menos os animais sencientes,
da classe dos vertebrados).
Não obstante, é inegável a importância social que os animais de companhia, em particular os gatos e os
cães, representam nas sociedades modernas atuais, cultural e habitualmente considerados e tratados como
autênticos membros das famílias e das comunidades onde estão inseridos.
O exposto inclui necessariamente aqueles gatos e aqueles cães que, sem possuírem um detentor único e
definido, se fixam num território limitado do espaço público e aí permanecem integrados na comunidade local,
sendo mantidos e acarinhados por moradores e coletividades, como tal, estabelecendo uma relação de
dependência destes.
No caso específico dos gatos, a referida Lei n.º 27/2016, previu expressamente a concretização de
programas de captura, esterilização e devolução (CED) como forma de gestão da população de gatos em estado
de errância, dispondo, no seu artigo 4.º o seguinte:
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O Estado, por razões de saúde pública, assegura, por intermédio dos centros de recolha oficial de animais,
a captura, vacinação e esterilização dos animais errantes sempre que necessário, assim como a concretização
de programas de captura, esterilização e devolução (CED) para gatos.
Por sua vez, a Portaria n.º 146/2017, de 26 de abril, que regulamentou a citada lei, fixou as condições a que
devem obedecer os programas de esterilização de animais em estado de errância e os programas CED.
Concretamente no que respeita aos programas CED, dispôs, em consonância com as diretrizes
estabelecidas pela Lei n.º 27/2016, a possibilidade de a gestão dos mesmos ser atribuída a organizações de
proteção animal.
Para o efeito, a citada portaria estabeleceu no seu artigo 9.º um exigente caderno de encargos a cumprir pela
entidade gestora do programa CED (cfr. n.os 4 a 7), com o qual se concorda na generalidade.
Contudo, igualmente dispôs que as despesas relacionadas com a manutenção de colónias de gatos são da
responsabilidade da entidade promotora (cfr. n.º 8), ou seja, endossando, e mal, às organizações de proteção
animal gestoras das colónias a fatura com a alimentação e cuidados de saúde dos animais e, ainda, já que a
norma tem um amplo conteúdo, com os eventuais equipamentos necessários ao bem-estar dos animais,
nomeadamente, abrigos.
O que não se afigura legítimo, comportável ou sequer consentâneo com o espírito da lei, que claramente
atribui ao Estado o dever de assegurar a concretização dos programas CED para gatos, como tal obviamente
que deverá assegurar a manutenção dos animais incluídos nesses programas e, bem assim, o cumprimento do
dever de registo e identificação eletrónica.
Animais, esses que, se não estivessem integrados em colónias de rua controladas, estariam alojados em
centros de recolha oficiais (CRO), como tal, mantidos pelos municípios.
A citada disposição, para além de entrópica, constitui um sério obstáculo dissuasor da colaboração das
organizações de proteção animal, as quais, como é do conhecimento geral, enfrentam sempre grande aflição
financeira para prosseguir a sua benemérita e desinteressada ação de interesse público, para mais quando ao
longo dos anos se têm substituído ao Estado na prossecução do bem-estar animal.
Imputar-lhes, acrescendo à já difícil gestão das colónias que implica cuidados diários, os custos com a
alimentação e cuidados de saúde desses animais em estado de errância, fixados em colónias instaladas no
espaço público sob supervisão do município e que cabe ao Estado promover e assegurar, não se afigura
aceitável.
A colaboração por parte das organizações de proteção animal prevista pela citada Lei n.º 27/2016 não pode
exigir destas que ainda custeiem as despesas dessa generosa participação no cumprimento de deveres que
aquela lei inegavelmente atribui aos poderes públicos.
Por outro lado, a mesma Portaria n.º 146/2017 limitou-se a regular os programas CED exclusivamente
destinados a gatos inseridos em colónias.
Ora, o certo é que muitas vezes acontece que os gatos em estado de errância estão habituados à existência
solitária (que é, aliás, própria da sua natureza) e integrados, de forma estável e benéfica, em comunidades de
moradores, que os cuidam, não manifestando aptidão para a inserção numa colónia de gatos situada em local
diferente e sujeita a uma estrutura gregária.
A própria portaria citada reconhece expressamente essa eventualidade ao dispor que os gatos capturados
no âmbito dos programas CED deverão, antes de integrarem a colónia, ser entregues nos centros de recolha
oficial (CRO) para verificação da sua aptidão para o efeito [cfr. alínea d) do n.º 4 do artigo 9.º], caso contrário
terão que ser acolhidos nos CRO e encaminhados para adoção.
A solução legalmente prevista para as situações de gatos capturados que não sejam suscetíveis de integrar
colónias e que estejam inseridos em comunidades restritas e mantidas por estas, logo em situação satisfatória
e consolidada, não salvaguarda o interesse público da preservação do bem-estar desses animais nem das
próprias pessoas que integram os núcleos de moradores-cuidadores, os quais se veem privados da companhia
desses vizinhos de rua.
Muitas dessas pessoas não reúnem condições para alojar animais dentro de casa, ou encontram oposição
de algum coabitante, afeiçoando-se àqueles que cuidam na rua e nos quais muitas vezes encontram um
propósito de vida, situação muito comum entre as pessoas idosas e pessoas em situação de sem-abrigo, que
vivem na rua. Outras vezes são os próprios animais que não se adaptam ao cativeiro, habituados à liberdade
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de viver ao ar livre. Aliás, é a própria lei que dispõe como princípio básico para o bem-estar dos animais que
nenhum animal deve ser detido como animal de companhia se não se adaptar ao cativeiro (cfr. n.º 2 do artigo
7.º do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro).
E o mesmo se diga, aliás, de cães em estado de errância, muitas vezes vítimas de abandono, que encontram
acolhimento responsável numa comunidade de moradores e se habituam, de forma benigna, integrada e
controlada, a coabitar o espaço público, contribuindo também para a socialização, qualidade de vida das
pessoas, sentimento de pertença à comunidade e partilha de responsabilidades.
Encaminhar esses animais inseridos estavelmente em comunidades, doutrinariamente designados por
animais comunitários, para o cativeiro nos CRO e condená-los a um futuro incerto, com provável confinamento
permanente nesses alojamentos municipais, é claramente inadequado e até perverso, bem se sabendo que
muitos dos animais alojados nos CRO infelizmente não chegam a ser adotados.
Por outro lado, é um facto preocupante que, mercê da inoperância de décadas por parte dos poderes públicos
focados na prática continuada do abate como pretenso remédio para o controlo da população de cães e de gatos
e ausência de campanhas de esterilização animais expressivas por todo o território nacional, ainda enfrentamos
um grave problema de sobrepopulação destes animais relativamente ao número de lares que se disponibilizam
ou que reúnem condições para os acolher.
O fenómeno dos animais comunitários representa uma realidade sociológica relevante e respeitável, que se
pratica informalmente há décadas, e que, como tal, é justo que se reconheça juridicamente e regule, tanto mais
que alguns regulamentos municipais sobre o bem-estar animal, designadamente, o de Sintra, preveem já essa
figura, registando-se também casos de municípios que não avançam nos mesmos termos por dúvidas quanto à
margem de competência legal para o efeito.
Existem hoje evidências científicas de que o reconhecimento e a regulação dos animais comunitários
promove a responsabilidade social e o espírito de comunidade.
Designadamente, a prestigiada organização International Companion Animal Management Coalition (ICAM)
elaborou, em 2007, um manual de procedimentos operacionais que, para além de incluir estratégias de cuidados
dos animais comunitários, versa sobre a sustentabilidade dos programas de maneio desses animais através do
desenvolvimento da responsabilidade social local, do monitoramento e da avaliação constantes.
No mesmo sentido, segundo o Relatório Técnico n.º 931, de 2005, proferido pela Organização Mundial de
Saúde, quando as ações para o maneio das populações animais são controladas pelo sistema de participação
social, aumenta a consciência e o sentimento de guarda responsável na comunidade, o que contribui para a
construção de uma comunidade mais estruturada para prover cuidados de saúde aos animais e evitar o
abandono.
Ou seja, o reconhecimento jurídico do animal comunitário, obviamente sob requisitos legais adequados,
constitui uma resposta social complementar contra o abandono animal, promovendo igualmente a guarda
responsável dos animais, sob a ótica holística do bem-estar humano e animal e da qualidade de vida
comunitária.
Por outro lado, a imposição da identificação e vacinação desses animais representa uma forma eficaz de
prevenir e controlar zoonoses, que são também mais habituais em locais de intenso confinamento e grande
stresse como é inevitável nos canis e gatis, quer municipais, quer de associações de proteção animal.
Ainda, a presença de cães comunitários, obviamente dentro de certos limites e condicionalismos (que não
ponham em causa o bem-estar do próprio animal ou da população), é suscetível de proteger os moradores,
singulares e coletivos, da comunidade de atos ilícitos de terceiros e, bem assim, de evitar a formação de matilhas
com origem no agrupamento desregrado de animais abandonados. E a presença de gatos comunitários resulta
sempre numa forma natural de dissuasão de pequenos animais sinantrópicos nos meios urbanos tais como
roedores. Essa solução tem vindo a ser implementada, com grande êxito, nos países onde a sobrepopulação
de gatos e cães constitui um problema, nomeadamente, em vários estados brasileiros (São Paulo, Rio de
Janeiro, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, Espírito Santo), Chile, Argentina e Equador.
O próprio Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de dezembro, prevê, no n.º 4 do artigo 7.º, que as câmaras
municipais, no âmbito das suas competências, possam criar zonas ou locais próprios para a permanência e
circulação de cães e gatos, estabelecendo as condições em que esta se possa fazer sem meios de contenção,
quadro jurídico que acomoda, em traços gerais, a figura do animal comunitário.
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Em conformidade com o que vai exposto, torna-se igualmente necessário alterar e adequar o regime relativo
à identificação e registo desses animais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 82/2019, de 27 de junho.
Outrossim, é imperioso encontrar uma solução adequada para o problema das matilhas descontroladas de
cães sem detentor, a maioria dos quais vítimas de abandono, e cujo instinto de sobrevivência pode gerar
comportamentos agressivos ou indesejados para com pessoas e outros animais. Assim como, com o
consequente risco para o bem-estar dos próprios animais, sujeitos à fome, às intempéries, aos riscos de
atropelamento ou até maldade humana, pois não menos vezes são reportados casos de envenenamento de
animais das matilhas. São conhecidos frequentes casos de reclamações das populações por esse motivo,
muitas vezes acompanhadas de sentimentos de insegurança. A título de exemplo, citem-se os ataques a
rebanhos, amiúde atribuídos indevidamente ao lobo ibérico, designadamente, para efeitos indemnizatórios já
que compete ao Estado o ressarcimento por danos causados por essa espécie protegida.
Só nos três primeiros meses do ano e apenas no distrito de Castelo Branco, a GNR registou 14 ataques a
ovelhas e já em setembro de 2021, 48 ovelhas foram mortas quando pastavam nas margens do Mondego entre
tantos outros casos recentes , com o inerente prejuízo dos agricultores afetados.
A única via eticamente aceitável de acordo com os parâmetros que hoje nos regem como sociedade, é o
controlo efetivo dessas matilhas desde a sua formação, mediante alojamento provisório em parques próprios a
instalar nos municípios, para posterior encaminhamento para adoção ou outros fins, nomeadamente, para
programas de animais comunitários ou até guardadores de rebanhos.
Ainda, a experiência tem demonstrado que o prazo de 15 dias para eventual reclamação pelos detentores
dos animais capturados e acolhidos pelos CRO se mostra excessivo e desproporcionado, em particular nos
casos em que os animais não apresentem os sinais identificadores exigidos pelo n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-
Lei n.º 314/2013, de 17 de dezembro (coleira ou peitoral contendo o nome e morada ou telefone do detentor), e
ou não se encontrem registados em obediência ao disposto no Decreto-Lei n.º 82/2019, de 27 de junho, indício
de não terem detentor ou de este ter renunciado tácita ou deliberadamente à detenção.
Em tais situações, o prazo de cinco dias reputa-se suficiente, agilizando-se, assim, os procedimentos para
célere encaminhamento e destino dos animais, nomeadamente, para adoção.
Mostra-se, igualmente, necessário proceder à atualização de algumas normas contidas no Decreto-Lei n.º
314/2003, de 17 de dezembro, cujos cerca de 18 anos de vigência acusam desajustamento face ao regime atual,
nomeadamente, prevendo, ainda, que os animais errantes capturados pelas câmaras municipais possam ser
livremente sacrificados (cfr. n.º 5 do artigo 9.º).
Por fim, há que adequar a disciplina da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, ao regime instituído pelo Decreto-
Lei n.º 82/2019, de 27 de junho, que aprovou o Sistema de Informação de Animais de Companhia, o qual,
nomeadamente, prevê que as pessoas coletivas possam ser titulares de animais de companhia (cfr. n.º 5 do
artigo 9.º), contudo a lei citada só prevê a adoção de animais de companhia por pessoas individuais e instituições
zoófilas (cfr. n.º 2 do artigo 3.º), o que manifestamente é contraditório e afunila as possibilidades de adoção dos
animais alojados nos centros de recolha oficial.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, as Deputadas e o Deputado do Grupo Parlamentar do PAN apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei reconhece e regula o animal comunitário, reduz o prazo de reclamação dos animais não
identificados recolhidos nos centros de recolha oficiais (CRO), e atribui ao Estado o encargo com os programas
CED e de esterilização de animais errantes ou comunitários, procedendo à primeira alteração à Lei n.º 27/2016,
de 23 de agosto, à décima alteração ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, à segunda alteração ao
Decreto-Lei n.º 82/2019, de 27 de junho, e à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de dezembro.
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Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto
Os artigos 2.º, 3.º e 4.º da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 2.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – Os organismos da administração central do Estado responsáveis pela proteção, bem-estar e sanidade
animal, em colaboração com as autarquias locais, o movimento associativo e as organizações não-
governamentais de ambiente e de proteção animal, promovem campanhas de esterilização de animais errantes
e comunitários e de adoção de animais abandonados.
4 – […].
Artigo 3.º
[…]
1 – Os animais recolhidos pelos centros de recolha oficial de animais presumem-se abandonados e são
obrigatoriamente esterilizados e encaminhados para adoção, sem direito a indemnização dos detentores que
venham a identificar-se como tal após o decurso do prazo aplicável, caso não sejam reclamados pelos seus
detentores nos seguintes prazos, contados, de forma contínua, a partir da data da sua recolha:
a) 5 dias, se não for possível identificar o detentor através do registo previsto no Decreto-Lei n.º 82/2019, de
27 de junho, e ou dos sinais identificadores exigidos pelo n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 314/2013, de 17
de dezembro;
b) 15 dias, nos restantes casos.
2 – Findo o prazo de reclamação, os animais referidos no número anterior podem, sob parecer obrigatório
de médico veterinário ao serviço do município, ser cedidos gratuitamente pelas câmaras municipais ou centros
de recolha oficial de animais, quer a pessoas, individuais ou coletivas, ou, ainda, entidades públicas ou
organizações de socorro, resgate e salvamento, desde que, em qualquer caso, provem possuir condições
adequadas para o alojamento e maneio dos animais.
3 – Para efeitos do disposto nos números anteriores, as câmaras municipais e os centros de recolha oficial
de animais divulgam ao público, de forma adequada e regular, com atualização semanal, todos os animais
disponíveis para adoção, nomeadamente, entre outros, através de plataforma informática e em todos os locais
habituais de publicação de avisos e informação municipal.
4 – O abate ou occisão de animais em centros de recolha oficial de animais por motivos de sobrepopulação,
de sobrelotação, de incapacidade económica ou outra que impeça a normal detenção pelo seu detentor, é
proibido, exceto por razões que se prendam com o estado de saúde, nas circunstâncias referidas no n.º 6, ou
com o comportamento particularmente agressivo dos mesmos, desde que comprovadamente não seja possível
recuperar através do treinamento próprio e especializado.
5 – […].
6 – […].
7 – […].
8 – […].
9 – […].
10 – […].
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Artigo 4.º
[…]
1 – O Estado, por razões de saúde pública, assegura, por intermédio dos centros de recolha oficial de
animais, a captura, vacinação, identificação eletrónica e esterilização dos animais errantes, sempre que
necessário, assim como a concretização de programas de captura, esterilização e devolução (CED) para gatos
e de esterilização, vacinação e devolução de animais comunitários.
2 – Todos os programas referidos no número anterior, bem como a manutenção dos animais abrangidos,
concretamente a alimentação e os cuidados de saúde a prestar aos mesmos e os equipamentos necessários,
designadamente, abrigos, constituem encargo do Estado, por intermédio dos centros de recolha oficial de
animais.
3 – Os programas referidos no número um podem realizar-se por iniciativa das câmaras municipais ou
mediante proposta de particulares, singulares ou coletivos, a quem a câmara municipal atribua a gestão
respetiva, designadamente, de organização de proteção animal ou, no caso dos animais comunitários, de
pessoa, singular ou coletiva, ou de grupo de pessoas integradas numa comunidade local de moradores,
residenciais ou profissionais, comunidades escolares ou entidades públicas, sob supervisão da câmara
municipal.
4 – Para os efeitos previstos no disposto nos números anteriores, nomeadamente, a alimentação dos animais
de colónias ou comunitários, o Estado, através das câmaras municipais, das juntas de freguesia ou em parceria
com associações de proteção animal e ou grupos de voluntários, devem assegurar a existência de um programa
social de alimentação animal, como solução de recurso destinada aos cuidadores dos referidos animais a fim
de proverem à alimentação destes, bem como a pessoas que detenham animais e que se encontrem em
situação de carência ou de vulnerabilidade socioeconómica.»
Artigo 3.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro
Os artigos 2.º, 19.º, 20.º e 68.º do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, passam a ter a seguinte
redação:
«Artigo 2.º
[…]
1 – […]:
a) […].
b) […].
c) ‘Animal errante’ qualquer animal que seja encontrado na via pública ou outros lugares públicos fora do
controlo e guarda dos respetivos detentores ou relativamente ao qual existam fortes indícios de que foi
abandonado ou não tem detentor nem seja animal comunitário, e não esteja identificado;
d) […].
e) […].
f) […].
g) […].
h) […].
i) […].
j) […].
l) […].
m) […].
n) […].
o) […].
p) […].
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q) […].
r) […].
s) […].
t) […].
u) […].
v) […].
w) […].
x) […].
y) […].
z) […].
aa) […].
bb) […].
cc) […].
dd) […].
ee) […].
ff) «Animal comunitário» qualquer animal autorizado a permanecer em espaço e via públicos limitados, a que
o animal esteja habituado e onde esteja integrado, cuja guarda, alimentação e cuidados médico-veterinários são
assegurados por uma pessoa, singular ou coletiva, ou por um grupo de pessoas integradas numa comunidade
local de moradores, residenciais ou profissionais, comunidades escolares ou entidades públicas, sob supervisão
da câmara municipal.
gg) «Matilhas» grupos de cães formados espontaneamente, seja por força do abandono ou de terem nascido
já num contexto de matilha assilvestrada, que não disponham de detentor, que permaneçam e vagueiem em
espaço público, e que não estejam inseridos em programas de «animais comunitários».
2 – […].
3 – […].
4 – […].
Artigo 19.º
[…]
1 – Compete às câmaras municipais a recolha, a captura e o abate compulsivo de animais de companhia,
sempre que seja indispensável por razões de saúde pública e de segurança de pessoas e de outros animais, e
sem prejuízo do disposto no artigo 3.º da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto.
2 – As normas de boas práticas para a captura e abate de animais de companhia são divulgadas pela DGAV
aos médicos veterinários municipais, no prazo de 30 dias a contar da data de publicação do presente diploma.
3 – Aos animais recolhidos ou capturados nos termos do n.º 1 é aplicável o disposto nos artigos 3.º da Lei
n.º 27/2016, de 23 de agosto, e 9.º do Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de dezembro.
4 – [Revogado.]
5 – [Revogado.]
6 – Apenas um médico veterinário ou pessoa competente pode abater ou eutanasiar um animal de
companhia, de acordo com as normas referidas no n.º 2.
7 – As entidades policiais podem proceder ao abate imediato de animais sempre que estiverem em causa
medidas urgentes de segurança de pessoas e de outros animais e não haja possibilidade de recurso a outros
meios que não sacrifiquem a vida daqueles.
8 – […].
9 – [Revogado.]
10 – [Revogado.]
Artigo 20.º
Animal comunitário
1 – Como medida integrada na gestão da população de animais errantes, as câmaras municipais podem,
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sob parecer do médico veterinário municipal, autorizar a permanência de qualquer animal na via e no espaço
públicos, em locais devidamente delimitados a que o animal esteja habituado e onde esteja integrado.
2 – A autorização referida no número anterior é obtida mediante requerimento de pessoa, singular ou coletiva,
ou por um grupo de pessoas integradas numa comunidade local de moradores, residenciais ou profissionais,
comunidades escolares ou entidades públicas, onde o animal em causa esteja inserido, os quais se obrigam a
assegurar a guarda, alimentação e cuidados médico-veterinários do mesmo nos exatos termos e condições que
forem protocolados com a câmara municipal, e sob supervisão desta.
3 – Uma vez obtida a autorização, o animal deve ser submetido a esterilização e vacinação através do centro
de recolha oficial, posto o que será recolocado no espaço de origem onde será mantido.
4 – Os espaços utilizados para manutenção do animal comunitário deverão ser mantidos livres de resíduos
ou de restos de comida, devendo os comedouros ser recolhidos e o espaço limpo logo após a alimentação do
animal.
5 – Os cuidados médico-veterinários, designadamente, com a vacinação regular do animal, serão assumidos
pelo centro de recolha oficial.
6 – Sempre que a câmara municipal verifique que não são cumpridos os requisitos para a manutenção do
animal comunitário no local, poderá determinar medidas corretivas ou, sendo imprescindível, ordenar a
suspensão temporária, ou mesmo a cessação, do regime do animal comunitário, procedendo à recolha do animal
para o centro de recolha oficial a fim de ser encaminhado para adoção.
7 – Sem prejuízo do regime previsto para as colónias de gatos, a câmara municipal poderá autorizar a
presença de até três animais comunitários no mesmo espaço, desde que reunidas as condições para o efeito.
Artigo 68.º
[…]
1 – […]:
a) […].
b) […].
c) […].
d) […].
e) […].
f) […].
g) […].
h) […].
i) A violação do disposto no artigo 19.º;
j) […].
k) […].
l) […].
m) O maneio ou treino dos animais em desrespeito das condições fixadas no presente diploma;
n) A violação do disposto no artigo 20-A.º
2 – […]:
a) […].
b) […].
c) […].
d) […].
e) […].
f) […].
g)[…].
h) […].
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i) A violação do disposto no artigo 20-A.º quando se crie perigo para a vida ou integridade física de outrem
ou de animal.
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].».
Artigo 4.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 82/2019, de 27 de junho
Os artigos 11.º e 17.º do Decreto-Lei n.º 82/2019, de 27 de junho, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 11.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – Os animais que sejam recolhidos num centro de recolha oficial (CRO) e que não sejam reclamados pelos
seus proprietários devem ser registados no SIAC em nome do titular desse CRO, após o decurso do prazo
previsto no n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto.
6 – […].
7 – […].
8 – Os gatos que integrem colónias no âmbito dos programas CED e os animais de companhia comunitários
previstos no artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, devem ser registados em nome da
câmara municipal responsável pela respetiva supervisão.
Artigo 17.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – Estão igualmente isentos do pagamento da taxa os animais de companhia comunitários previstos no
artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro.
4 – A taxa referida no n.º 1 constitui receita do ICNF.
5 – Sem prejuízo do pagamento devido por outros atos médico-veterinários, não pode ser exigido outro
pagamento pelo mero registo do animal no SIAC.»
Artigo 5.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de dezembro
Os artigos 2.º, 7.º, 8.º e 9.º do Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de dezembro, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 2.º
[…]
[…]:
a) […].
b) […].
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c) […].
d) […].
e) […].
f) […].
g) […].
h) […].
i) […].
j) […].
l) […].
m) […].
n) ‘Cão ou gato errante’ aquele que seja encontrado na via pública ou outros lugares públicos fora do controlo
e guarda dos respetivos detentores ou relativamente ao qual existam fortes indícios de que foi abandonado ou
não tem detentor nem seja animal comunitário, e não esteja identificado;
o) […].
p) […].
q) ‘Cão ou gato comunitário’ aquele que for autorizado a permanecer em espaço e via públicos limitados, a
que o mesmo esteja habituado e onde esteja integrado, cuja guarda, alimentação e cuidados médico-veterinários
são assegurados por uma pessoa, singular ou coletiva, ou por um grupo de pessoas inseridas numa comunidade
local de moradores, residenciais ou profissionais, comunidades escolares ou entidades públicas, sob supervisão
da câmara municipal.
Artigo 7.º
[…]
1 – […].
2 – É proibida a presença na via ou lugar públicos de cães sem estarem acompanhados pelo detentor e sem
açaimo funcional, exceto se forem conduzidos à trela ou se se tratar de cão comunitário.
3 – […]
4 – As câmaras municipais, no âmbito das suas competências, devem criar zonas ou locais próprios para a
permanência e circulação de cães e gatos, estabelecendo as condições em que esta se pode fazer sem os
meios de contenção previstos neste artigo, designadamente, para lhes permitir a livre e adequada prática de
exercício físico, bem como para instalação de colónias de gatos no âmbito dos programas CED e de cães ou
gatos comunitários.
5 – Os cães e gatos comunitários deverão ostentar uma coleira indicando a sua qualidade de animal
comunitário e o contacto telefónico do CRO e de um dos cuidadores.
Artigo 8.º
Captura de cães e gatos errantes
1 – Compete às câmaras municipais, atuando dentro das suas atribuições nos domínios da defesa da saúde
pública e do meio ambiente, proceder, sendo necessário, à captura dos cães e gatos errantes encontrados na
via pública ou em quaisquer lugares públicos, utilizando o método de captura mais adequado a cada caso, em
conformidade com o previsto no artigo 5.º da Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, e no Decreto-Lei n.º 276/2001,
de 17 de outubro, e encaminhando-os para o centro de recolha oficial, sempre em observância das melhores
práticas de bem-estar animal, no que respeita à captura, maneio, transporte e posterior alojamento.
2 – […].
Artigo 9.º
[…]
1 – Os cães e gatos recolhidos no centro de recolha oficial, nos termos do disposto no artigo 3.º e do artigo
anterior, são obrigatoriamente submetidos a exame clínico pelo médico veterinário municipal, que elabora
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relatório e decide do seu ulterior destino, nos termos e condições previstos no artigo 3.º da Lei n.º 27/2016, de
23 de agosto.
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – Nos casos em que não tenham sido pagas as despesas e coimas referidas no n.º 2, sem prejuízo das
situações de vulnerabilidade social que, de forma comprovada, impeçam o pagamento, bem como quando não
estejam preenchidas as condições previstas no n.º 3, nem seja reclamada a entrega dos animais nos prazos
fixados, podem as câmaras municipais dispor dos animais, encaminhando-os para adoção, nos termos previstos
no artigo 3.º da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto.
6 – […].»
Artigo 6.º
Aditamento ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro
É aditado o artigo 20.º-A ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, com a seguinte redação:
«Artigo 20.º-A
Matilhas
1 – Sempre que se verifique necessidade de controlo de matilhas, as câmaras municipais devem criar
parques destinados ao controlo, manutenção e alojamento de matilhas, devendo os animais ser previamente
esterilizados.
2 – Os parques referidos no número 1 deverão ser instalados em terrenos ao ar livre, sendo a respetiva área
devidamente delimitada, dotada de abrigos e componentes naturais que permitam refúgio aos cães, e com a
extensão necessária à convivência dos diversos grupos sem perigo de ataque entre si.
3 – A eventual impossibilidade imediata de recolher e instalar os animais em parques de matilhas, não
prejudica a obrigação de promover a imediata esterilização daqueles, de forma a evitar o nascimento de mais
ninhadas e o aumento do número de animais que compõem a matilha.
4 – As câmaras municipais deverão assegurar os cuidados com a alimentação e saúde a prestar aos animais
alojados em parques de matilhas, e, bem assim, devendo promover a reabilitação desses animais através de
treinos adequados para posterior encaminhamento para adoção ou inserção em programas de animais
comunitários.»
Artigo 7.º
Normas regulamentares
O Governo deverá, no prazo de 30 dias, proceder à alteração da Portaria n.º 146/2017, de 26 de abril,
adequando-a às alterações ora introduzidas aos artigos 2.º, 3.º e 4.º da Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto.
Artigo 8.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no 1.º dia do mês imediatamente seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês Sousa Real — Nelson Silva.
———
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II SÉRIE-A — NÚMERO 26
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PROJETO DE LEI N.º 1000/XIV/3.ª
ADEQUAÇÃO DO SISTEMA DE IDENTIFICAÇÃO DOS EQUÍDEOS, PROCEDENDO À PRIMEIRA
ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 123/2013, DE 28 DE AGOSTO
O Decreto-Lei n.º 123/2013, de 28 de agosto, estabelece as regras que constituem o sistema de identificação
de equídeos nascidos ou introduzidos, em Portugal, assegurando a execução e garantindo o cumprimento no
ordenamento jurídico nacional, das obrigações decorrentes do Regulamento (CE) n.º 504/2008, da Comissão,
de 6 de junho de 2008, no que respeita aos métodos de identificação de equídeos.
Sucede que se tem vindo a verificar a necessidade de adequar o sistema de identificação dos equídeos à
realidade, reconhecendo a possibilidade de estes serem registados como animais de companhia nos casos em
que efetivamente o sejam, o que exige a competente alteração ao citado decreto-lei. Com efeito, a realidade do
registo deve espelhar a verdade material, sendo esse um princípio fundamental do direito registral. É este que
se deve adaptar às realidades legitimamente diversas e não o contrário. As organizações não governamentais
(ONG) ou associações de proteção animal que resgatam equídeos e os cidadãos ou cidadãs que os acolhem
veem-se amiúde confrontados com a impossibilidade prática de registar esses animais em conformidade com a
realidade, situação que urge ser clarificada. Sem esta adequação, estas entidades estão condicionadas a
declarar inverdades a fim de conseguir o registo, por deficiência lacunosa do atual regime jurídico, o que resulta
absurdo e inaceitável.
Por tudo o exposto, importa rever algumas disposições legais atinentes ao regime jurídico do registo de
equídeos.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do PAN apresentam o seguinte
projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei prevê a adequação do sistema de identificação dos equídeos prevendo a aptidão para a
companhia, procedendo à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 123/2013, de 28 de agosto.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 123/2013, de 28 de agosto
É alterado o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 123/2013, de 28 de agosto, o qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 4.º
Obrigação de identificação dos equídeos
Devem ser identificados nos termos Regulamento (CE) n.º 504/2008, da Comissão, de 6 de junho de 2008,
e do presente diploma, os equídeos, com ou sem fins comerciais, incluindo para companhia:
a) Nascidos na comunidade; ou
b) (…).»
Artigo 3.º
Aditamento ao Decreto-Lei n.º 123/2013, de 28 de agosto
É alterado o Anexo III do Decreto-lei n.º 123/2013, de 28 de agosto, o qual passa a ter a seguinte redação:
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«ANEXO III
(a que se refere o artigo 17.º)
Dados mínimos a constar na base de dados
1. (…)
2. (…)
3. (…)
4. (…)
5. (…)
6. (…)
7. (…)
8. (…)
9. (…)
10. (…)
11. (…)
12. (…)
13. (…)
14. Aptidão para companhia.
15. (Anterior número 14.)
16. (Anterior número 15.)
17. (Anterior número 16.)
18. (Anterior número 17.)»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês Sousa Real — Nelson Silva.
———
PROJETO DE LEI N.º 1001/XIV/3.ª
ALARGA A TUTELA CRIMINAL A TODOS OS ANIMAIS VERTEBRADOS, PROCEDENDO À
QUINQUAGÉSIMA QUARTA ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL
Exposição de motivos
A proteção animal é uma preocupação crescente da sociedade contemporânea, reveladora de uma maior
consciencialização no que respeita à capacidade de os seres percecionarem sensações e sentimentos de forma
consciente, bem como o sofrimento e dor.
A senciência dos animais é, hoje, indubitável e a sua capacidade de sofrimento, a sua sensibilidade à dor e
a sua capacidade de afeto estão na origem de uma profunda reflexão ética sobre a relação entre o ser humano
e os animais. Acontece, porém, que esta reflexão não pode ficar apenas no campo da ética e da moral, sendo
necessária e urgente a apresentação de medidas para um o seu correto enquadramento jurídico, em
consonância com os avanços científicos e sociais.
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A Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, representa um caminho muito importante na evolução do direito animal
em Portugal e um importante passo ao nível sancionatório, que teve como propósito resolver o que havia sido
deixado de fora da proteção penal existente, respondendo a necessidades prementes de prevenção geral, pois
apesar do caminho desbravado pela Lei de Proteção dos Animais, de 1995, com a proibição de condutas que
colocassem em causa o bem estar animal, a respetiva punição não se encontrava até então prevista.
Desta forma, aditou-se ao Código Penal um novo Título VI, designado «Dos crimes contra animais de
companhia». Este avanço no plano do direito penal, acompanhado da evolução ao nível do direito civil, revestiu
grande importância, mas não podemos deixar de considerar que ainda há um grande caminho a desenvolver no
plano legislativo e, consequentemente, no plano jurisprudencial. Um desses caminhos é, tal como se pretende
com a presente iniciativa, alargar a tutela criminal a todos os animais vertebrados.
Ora vejamos:
Quer o crime de maus-tratos previsto no artigo 387.º do Código Penal, quer o crime de abandono previsto no
artigo 388.º do mesmo diploma abrange apenas animais de companhia.
O legislador pretendeu densificar o conceito de «animais de companhia» com o disposto no artigo 389.º do
Código Penal, todavia grande parte das dúvidas legitimamente suscitadas não se mostram ainda dissipadas por
este normativo.
«A perspetiva adotada pelo legislador na qualificação como animais de companhia parte de uma visão
antropocêntrica, pelo que o que interessa para a qualificação do animal como sendo de companhia é a forma
como a pessoa que o detém o encara. Efetivamente, um bicho-da-seda, ou um aracnídeo, poderão ser
considerados animais de companhia desde que seja esse o papel que desempenham na vida dos seus donos»1.
Acontece, porém, que a senciência não se cinge aos animais regularmente considerados como animais de
companhia. E esse parece ser o amplo entendimento de uma sociedade mobilizada para a prevenção e combate
aos crimes cometidos contra animais.
Desde as alterações promovidas pela Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, que se tem assistido a um debate
em torno da interpretação e subsequente aplicação dos novos tipos de crime inscritos no nosso ordenamento
jurídico em virtude da entrada em vigor do referido diploma.
Refere a Ordem dos Advogados, em parecer elaborado e emitido aquando da discussão da temática dos
crimes contra animais de companhia, que são «sobejamente conhecidas as dificuldades, insuficiências e
deficiências mais alarmantes que os mesmos suscitam e que têm conduzido a resultados injustos, desde logo,
no arquivamento de grande parte dos inquéritos abertos na sequência da apresentação de denuncias por atos
de matar cometidos com dolo, por violência exercida contra animais, que não de companhia, ou situações de
abandono em que estão omissos indícios de perigo concreto para a integridade animal».
Menciona ainda, no mesmo parecer, a necessidade da extensão da tutela penal a outros seres sencientes
ao defender que «desde já louvamos a intenção de estender a tutela penal a outros animais, que não apenas
os de companhia, orientação que vai de encontro ao sentimento de justiça geral de proteger da violência
desnecessária e evitável os outros seres sencientes que connosco partilham o planeta (neste caso, o território
nacional)».
No parecer do Conselho Superior de Magistratura proferido no dia 2 de fevereiro de 2014, aquando da
apreciação dos projetos que despoletaram a criminalização dos maus-tratos e abandono de animais de
companhia, vislumbra-se opinião semelhante ao referir que «não vemos como os atos de crueldade injustificada
praticados sobre um qualquer animal que não caiba na assim tão apertada previsão da norma, fiquem fora da
sua esfera de proteção (…) por exemplo, não se compreende a razão de se considerar legítima a exclusão do
âmbito da proteção da norma, os casos de violência ou maus-tratos injustificados infligidos a um burro, a uma
vaca, a um cavalo ou a um veado, etc.».
Tal abrangência não só se reveste da mais fundamental justiça, como acompanharia os avanços científicos
concernentes às várias espécies animais, reconhecendo as respetivas necessidades etológicas e capacidades
físicas, sensoriais e cognitivas, como resolveria os problemas associados à aplicabilidade das normas previstas
no nosso Código Penal, e ainda acompanharia o caminho já traçado por outros Estados-Membros da União
Europeia.
1Crimes contra animais de companhia. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual, Artur Seguro Pereira, E-book, CEJ, abril de 2019.)
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Nomeadamente, a Alemanha prevê, desde 1972, no artigo 17.º da Lei de Proteção dos Animais, a tutela
penal de todos os animais vertebrados, protegendo-os da morte injustificada e dos maus-tratos. Na verdade,
existe hoje total consenso científico relativamente à especial qualidade senciente dessa classe de animais.
As apontadas evidências científicas tornam premente a alteração das premissas legais no âmbito da tutela
penal dos animais, ditando a eliminação do atual critério funcionalista e subjetivo, dificultador da interpretação e
aplicação das normas penais.
Em 2010, o código penal espanhol passou a punir qualquer violência injustificada que fosse perpetrada contra
«animais domésticos e amansados», sendo que em Julho de 2015 previu o aumento das molduras penais
previstas para estes crimes, bem como o alargamento das categorias de animais abrangidos, também aqueles
que são habitualmente domesticados. Acrescentou também a criminalização das condutas que impliquem
«exploração sexual» dos animais (designada por zoofilia) e previu sanções acessórias para os crimes referidos,
nomeadamente a inabilitação para a guarda de animais e inabilitação especial para o exercício de qualquer tipo
de profissão ou atividade comercial que envolva animais.
No preâmbulo da Lei Orgânica n.º 1/2015, que procedeu à citada alteração ao código penal espanhol,
justifica-se essa decisão de política criminal com o alarme social associado à violência contra os animais,
incluindo a exploração sexual.
Para além daquelas que são condutas manifestamente censuráveis em si mesmas que revestem os crimes
de maus-tratos e abandono de animais, as quais são um verdadeiro flagelo, não podemos deixar de referir a
estreita ligação entre os maus-tratos a animais e a violência entre seres humanos.
Immanuel Kant, nas suas conferências de ética, ministradas entre 1775 e 1780, referiu: «If he is not to stofle
his human feelings, he must practice kindness towards animals, for he who is cruel to animals becomes hard in
his dealings with men»2. Embora Kant não acreditasse que tivéssemos deveres diretos para com os animais,
ideia sobejamente ultrapassada na sociedade contemporânea, sustentava que os interesses humanos eram
suficientes para limitar o comportamento cruel para com todos os animais.
Nos últimos quarenta anos, esta ligação tem sido objeto de constantes investigações e estudos. Conexões
psicológicas, sociológicas e médicas foram feitas por uma variedade de investigadores, com o acumular de uma
quantidade considerável de evidências empíricas.
A título de exemplo, em Measuring Animal Cruelty and Case Histories, os investigadores Marie Louise
Petersen e David P. Farrington recolheram os seguintes dados empíricos3 (tradução livre):
● De 429 adultos internados em hospitais psiquiátricos, divididos por «agressivos» e «não agressivos»: 23%
mataram animais intencionalmente e 18% torturaram animais («agressivos») e 10% mataram e 5%
torturaram animais («não agressivos») (1979);
● De 152 homens divididos em «agressivos» e «não agressivos»: 25% dos criminosos agressivos relataram
5 ou mais atos de crueldade a animais, 6% dos não agressivos e nenhum dos não criminosos (1985);
● De 64 reclusos: 48% dos condenados por violação e 30% dos condenados por abuso sexual infantil
reportaram casos de crueldade contra animais (1986);
● De 28 homicidas sexuais: 36% cometeram atos de crueldade contra animais na infância e 46% na
adolescência (1988);
● De 117 reclusos, divididos em criminosos violentos e não violentos: 63% dos criminosos violentos
cometeram crueldade contra animais, contra 11% dos criminosos não violentos (1999);
● De 261 reclusos: 43% reportaram crueldade contra animais. Destes, 63% relataram que feriram ou mataram
animais e 55% abusaram de animais (2005).
Para além do exposto, a crueldade animal está fortemente implicada em casos de violência familiar e abuso
infantil em particular.
Estes dados, que ora utilizamos de forma meramente exemplificativa, são demonstrativos da clara ligação
que existe entre os maus-tratos a animais e violência entre humanos.
Com o exposto não se pretende reduzir a questão dos maus-tratos a animais a mero índice de alerta para
2 Immanuel Kant, Duties towards animals and spirits, em Lectures on ethics, trad. Louis Infield (Indianapolis and Cambridge: Hackett Publishing Company, 1963), p.240 3 The Link Between Animal Abuse and Human Violence, Andrew Linzey, inDoes Animal Abuse Really Benefit Us?, p.2-4.
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maus-tratos a humanos, mas essa ligação é fundamental para compreensão de toda a problemática sociológica
que lhe subjaz e para adoção dos necessários remédios de política legislativa e social.
A importância do combate aos casos de maus-tratos aos animais não pode permanecer apenas na esfera
da punitiva, mas também, e de forma essencial, na esfera da prevenção deste tipo de violência.
Legislar eficazmente contra atos de crueldade contra os animais pode prevenir a violência futura contra
vítimas humanas, uma vez que a crueldade contra os animais é muitas vezes o primeiro passo em direção à
violência contra os humanos, tendo em 2016, o FBI incluindo os maus-tratos a animais no elenco de
criminalidade grave4.
Considerando o que vai exposto, o PAN propõe-se alargar a tutela penal a todos os animais vertebrados,
com base nos tipos de crime já vigentes para os animais de companhia, corrigindo, assim, aquela que é uma
clamorosa e injustificada injustiça de tratamento entre animais que não sentem de forma diferente,
independentemente do objetivo da sua utilização.
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o
Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei alarga a todos os animais vertebrados a tutela criminal prevista contra os animais de
companhia, procedendo, para o efeito, à quinquagésima quarta alteração do Código Penal aprovado pelo
Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de maio, pelos Decretos-Leis n.os
101-A/88, de 26 de março, 132/93, de 23 de abril, e 48/95, de 15 de março, pelas Leis n.os 90/97, de 30 de julho,
65/98, de 2 de setembro, 7/2000, de 27 de maio, 77/2001, de 13 de julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001,
de 25 de agosto, e 108/2001, de 28 de novembro, pelos Decretos-Leis n.os 323/2001, de 17 de dezembro, e
38/2003, de 8 de março, pelas Leis n.os 52/2003, de 22 de agosto, e 100/2003, de 15 de novembro, pelo Decreto-
Lei n.º 53/2004, de 18 de março, pelas Leis n.os 11/2004, de 27 de março, 31/2004, de 22 de julho, 5/2006, de
23 de fevereiro, 16/2007, de 17 de abril, 59/2007, de 4 de setembro, 61/2008, de 31 de outubro, 32/2010, de 2
de setembro, 40/2010, de 3 de setembro, 4/2011, de 16 de fevereiro, 56/2011, de 15 de novembro, 19/2013, de
21 de fevereiro, e 60/2013, de 23 de agosto, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, pelas Leis n.os
59/2014, de 26 de agosto, 69/2014, de 29 de agosto, e 82/2014, de 30 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º
1/2015, de 8 de janeiro, e pelas Leis n.os 30/2015, de 22 de abril, 81/2015, de 3 de agosto, 83/2015, de 5 de
agosto, 103/2015, de 24 de agosto, 110/2015, de 26 de agosto, 39/2016, de 19 de dezembro, 8/2017, de 3 de
março, 30/2017, de 30 de maio, 94/2017, de 23 de agosto, 16/2018, de 27 de março, 44/2018, de 9 de agosto,
101/2019 e 102/2019, ambas de 6 de setembro, 39/2020, de 18 de agosto, 40/2020, de 18 de agosto, 58/2020,
de 31 de agosto, e 57/2021, de 16 de agosto.
Artigo 2.º
Alteração ao Código Penal
São alterados os artigos 111.º, 387.º, 388.º, 388.º-A e 390.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
400/82, de 23 de setembro, que passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 111.º
Animais, instrumentos, produtos ou vantagens pertencentes a terceiro
1 – Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a perda não tem lugar se os animais, instrumentos,
produtos ou vantagens não pertencerem, à data do facto, a nenhum dos detentores, agentes ou beneficiários,
ou não lhes pertencerem no momento em que a perda foi decretada.
2 – Ainda que os animais, instrumentos, produtos ou vantagens pertençam a terceiro, é decretada a perda
4 https://leb.fbi.gov/articles/featured-articles/the-link-between-animal-cruelty-and-human-violence.
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quando:
a) O seu titular tiver concorrido, de forma censurável, para a sua lesão, utilização ou produção, ou do facto
tiver retirado benefícios;
b) Os animais, instrumentos, produtos ou vantagens forem, por qualquer título, adquiridos após a prática do
facto, conhecendo ou devendo conhecer o adquirente a sua proveniência; ou
c) Os animais, instrumentos, produtos ou vantagens, ou o valor a estes correspondente, tiverem, por qualquer
título, sido transferidos para o terceiro para evitar a perda decretada nos termos dos artigos 109.º, 109.º-A e
110.º, sendo ou devendo tal finalidade ser por ele conhecida.
3 – (…).
4 – (…).
Artigo 387.º
Morte e maus-tratos de animal
1 – Quem, sem motivo legítimo, matar um animal é punido com pena de prisão de 6 meses a 2 anos ou com
pena de multa de 60 a 240 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
2 – (…).
3 – Quem, sem motivo legítimo, infligir dor, sofrimento ou quaisquer outros maus-tratos físicos a um animal
é punido com pena de prisão de 6 meses a 1 ano ou com pena de multa de 60 a 120 dias.
4 – (…).
5 – (…):
a) (…);
b) (…);
c) (…).
Artigo 388.º
Abandono de animais
1 – Quem, tendo o dever de guardar, vigiar ou assistir animal, o abandonar, pondo desse modo em perigo a
sua alimentação e a prestação de cuidados que lhe são devidos, é punido com pena de prisão até seis meses
ou com pena de multa até 60 dias.
2 – (…).
Artigo 388.º-A
Penas acessórias
1 – Consoante a gravidade do ilícito e a culpa do agente, podem ser aplicadas, cumulativamente com as
penas previstas para os crimes referidos nos artigos 387.º e 388.º, as seguintes penas acessórias:
a) Privação do direito de detenção de animais pelo período máximo de 6 anos;
b) Privação do direito de participar em feiras, mercados, exposições ou concursos relacionados com animais;
c) Encerramento de estabelecimento relacionado com animais cujo funcionamento esteja sujeito a
autorização ou licença administrativa;
d) Suspensão de permissões administrativas, incluindo autorizações, licenças e alvarás, relacionadas com
animais.
2 – (…).
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Artigo 389.º
Conceito de animal
Para efeitos do disposto no presente título, entende-se por animal qualquer animal vertebrado.»
Artigo 3.º
Aditamento ao Código Penal
É aditado o artigo 109.º-A ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, com
a seguinte redação:
«Artigo 109.º-A
Perda de animais que sejam vítimas de crimes
São declarados perdidos a favor do Estado os animais que sejam vítimas de crimes quando, pelas
circunstâncias do caso, se mostrar comprometida, em definitivo, a convivência entre o animal e o seu detentor,
agente do crime, ou quando exista fundado risco da prática de factos semelhantes aos que motivaram a
condenação.»
Artigo 4.º
Alterações à organização sistemática do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro
É alterada a epígrafe do Capítulo IX da Secção IV do Título III do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro
da de «Perda de instrumentos, produtos e vantagens» para «Perda de animais, instrumentos, produtos e
vantagens», contendo os artigos 109.º a 112.º-A.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
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PROJETO DE LEI N.º 1002/XIV/3.ª
ALTERAÇÃO DO ESTATUTO DA CARREIRA DOS EDUCADORES DE INFÂNCIA E DOS
PROFESSORES DOS ENSINOS BÁSICO E SECUNDÁRIO, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 139-
A/90, DE 28 DE ABRIL
Exposição de motivos
O Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, determina no seu artigo 54.º os critérios relativos à
aquisição de outras habilitações por docentes profissionalizados com licenciatura.
Vem o mesmo, na sua atual redação, determinar que «a aquisição por docentes profissionalizados,
integrados na carreira, do grau académico de mestre em domínio diretamente relacionado com a área científica
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que lecionem ou em ciências da educação confere direito à redução de um ano no tempo de serviço legalmente
exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde que, em qualquer caso, na avaliação do desempenho
docente lhes tenha sido sempre atribuída menção qualitativa igual ou superior a Bom» e que «a aquisição por
docentes profissionalizados, integrados na carreira, do grau académico de doutor em domínio diretamente
relacionado com a área científica que lecionem ou em ciências da educação confere direito à redução de dois
anos no tempo de serviço legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde que, em qualquer
caso, na avaliação do desempenho docente lhes tenha sido sempre atribuída menção qualitativa igual ou
superior a Bom».
Das alterações introduzidas dá-se nota que as mesmas versam sobre o tipo de bonificação atribuída em cada
caso. Assim, e até à publicação da Portaria n.º 344/2008, de 30 de abril, os mestrados e doutoramentos eram
considerados na integração na carreira.
A portaria em causa veio regulamentar o processo de reconhecimento dos ciclos de estudos conducentes
aos graus de mestre e doutor e dos próprios graus académicos obtidos por docentes profissionalizados,
procedendo a uma nova interpretação do artigo 54.º, ou seja, passados quase 20 anos da vigência deste artigo,
veio o Governo de então proceder à alteração do mesmo introduzindo uma interpretação diferente da que
vigorava até ao momento.
Assim, após a publicação da Portaria n.º 344/2008, de 30 de abril, considera-se que, para efeitos de
progressão na carreira, o disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 54.º do estatuto da carreira docente, na sua atual
redação, apenas se aplica «aos docentes profissionalizados que tenham obtido o grau de mestre ou de doutor
a que se refere o artigo anterior em data posterior à sua integração na carreira».
Ora, tal situação significa que os docentes que pretenderam reforçar as suas competências ao longo da vida
não veem o seu esforço reconhecido aquando da sua integração no quadro. Não se afigura, por isso, igualitário
o princípio de bonificar um docente integrado na carreira como consequência da realização de
mestrado/doutoramento e não bonificar outro docente que tendo o mesmo mestrado/doutoramento é
discriminado porque o realizou enquanto contratado profissionalizado.
Considerando a realidade portuguesa onde os docentes são confrontados com longos anos de espera até à
sua integração na carreira, considera-se que esta distinção de critérios não se enquadra naquilo que se deseja
de um Estado que promova a igualdade entre pares e que contraria a intenção e a valorização do exercício da
função de docente.
Poderá ser assumido como injustificável dizer ao docente que, trabalhando ao longo de 15 anos ou mais,
ininterruptamente, e que por iniciativa própria procede à valorização profissional e por conseguinte suporta
igualmente um esforço financeiro, o Estado não lhe reconhece esse mesmo esforço, mais, que o discrimina em
relação ao seu par.
As reivindicações da classe docente são antigas e mais do que justificadas por força de um contínuo
desinvestimento na atratividade da profissão que resulta numa classe docente envelhecida, e para a qual os
jovens não se sentem atraídos em investir por todas as especificidades que lhe estão inerentes, ora por
congelamento de carreiras, ora por concursos que colocam os professores a muitos quilómetros da sua
residência, uma vida instável para aqueles e aquelas que representam uma classe de profissionais essenciais
numa das bases fundamental da nossa sociedade: A educação.
Não podemos, nem devemos, continuar a exigir um conjunto de deveres, sem reconhecer os direitos que lhe
são inerentes e sem proceder à justa valorização da carreira do docente. Para a sua valorização, importa corrigir
as injustiças verificadas, face ao papel fundamental que a classe docente tem no nosso País.
Assim, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o Deputado do
PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à décima quinta alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos
Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, e alterado
pelos Decretos-Leis n.os 105/97, de 29 de abril, 1/98, de 2 de janeiro, 35/2003, de 27 de fevereiro, 121/2005, de
26 de julho, 229/2005, de 29 de dezembro, 224/2006, de 13 de novembro, 15/2007, de 19 de janeiro, 35/2007,
de 15 de fevereiro, 270/2009, de 30 de setembro, 75/2010, de 23 de junho, 41/2012, de 21 de fevereiro, e
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146/2013, de 22 de outubro, e pelas Leis n.os 80/2013, de 28 de novembro, 12/2016, de 28 de abril, e 16/2016,
de 17 de junho.
Artigo 2.º
Alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos
Básico e Secundário
É alterado o artigo 54.º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos
Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, na sua redação atual, que passa
a ter a seguinte redação:
«Artigo 54.º
[…]
1 – A titularidade do grau de mestre em domínio diretamente relacionado com a área científica que lecionem
ou em ciências da educação por docentes profissionalizados integrados na carreira, aquando dessa integração
ou obtida em data posterior à integração na carreira, confere o direito à redução de um ano no tempo de serviço
legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde que, em qualquer caso, na respetiva avaliação
de desempenho lhes tenha sido sempre atribuída menção qualitativa igual ou superior a Bom.
2 – A titularidade do grau de doutor em domínio diretamente relacionado com a área científica que lecionem
ou em ciências da educação por docentes profissionalizados integrados na carreira, aquando dessa integração
ou obtida em data posterior à integração na carreira, confere o direito à redução de dois anos no tempo de
serviço legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde que, em qualquer caso, na respetiva
avaliação de desempenho lhes tenha sido sempre atribuída menção qualitativa igual ou superior a Bom.
3 – […].
4 – […].»
Artigo 3.º
Norma revogatória
Com a entrada em vigor da presente lei é revogado o artigo 2.º da Portaria n.º 344/2008, de 30 de abril.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real —Nelson Silva.
———
PROJETO DE LEI N.º 1003/XIV/3.ª
PROCEDE À REVOGAÇÃO DO ATUAL SISTEMA DE ACESSO AOS 5.º E 7.º ESCALÕES DA
CARREIRA DOCENTE, PROCEDENDO À ALTERAÇÃO DO ESTATUTO DA CARREIRA DOS
EDUCADORES DE INFÂNCIA E DOS PROFESSORES DOS ENSINOS BÁSICO E SECUNDÁRIO
O Decreto-Lei n.º 75/2010, de 23 de junho, introduziu pela primeira vez um mecanismo de vagas para o
acesso aos 5.º e 7.º escalões, referindo no seu artigo 37.º que a progressão aos 3.º, 5.º e 7.º escalões depende,
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entre outros requisitos, da observação de aulas (no caso da progressão aos 3.º e 5.º escalões) e da obtenção
de vaga (no caso da progressão aos 5.º e 7.º escalões). A possibilidade de progressão para estes escalões
pode ocorrer sem o requisito relativo à existência de vagas, mediante a obtenção das menções de excelente e
muito bom nos 4.º e 6.º escalões.
A avaliação dos professores, como de quaisquer outros setores profissionais, é fundamental na
monitorização da qualidade e melhoria dos processos de trabalho, nomeadamente através da observação de
aulas e formação contínua. Contudo, o sistema de avaliação de docentes carece obrigatoriamente de isenção,
terminando numa estratégia que procura a rotatividade das melhores classificações entre os colegas. Com a
necessidade de obtenção de uma nota de mérito (Muito Bom ou Excelente) para acesso direto a estes escalões,
o que acontece frequentemente é que não é o mérito que é reconhecido, mas uma deturpação do sistema que
tenta atribuir as melhores classificações em função de quem possa precisar para poder superar a barreira
provocada pela existência de vagas para progressão.
Por ser um sistema de avaliação que se encontra preso a limitações financeiras e coloca anualmente em
desigualdade os docentes, este sistema acarreta injustiças na avaliação, impedindo que os profissionais se
sintam reconhecidos pelo trabalho que desenvolvem, além de os aprisionar num nível de valorização salarial do
qual é difícil saírem, gerando conflitos organizacionais, insatisfação laboral e perda efetiva de direitos na carreira.
A aplicação deste mecanismo que começou em 2018, com a publicação da Portaria n.º 29/2018, de 23 de
janeiro, é único na Administração Pública, configurando um sistema de carreira horizontal. Através dele, em
2020, 673 docentes ficaram fora do acesso ao 5.º escalão e 1348 docentes fora do acesso ao 7.º escalão, num
total de 2021 docentes que ficam a aguardar vaga no ano seguinte.
Docentes que lidam diariamente com um número de alunos muito superior ao que seria desejável para que
se conseguisse chegar a todos/as. Que enfrentam diariamente condições de trabalho precárias, nomeadamente
com colocações distantes de casa e da família. Que se confrontam com o risco de burnout sendo uma das
classes profissionais que mais recorre a serviços de saúde mental.
A escola pública, à semelhança do Serviço Nacional de Saúde, demonstrou nesta crise sanitária, o seu
enorme valor, competência e espírito de missão. O reforço da escola pública tem que assentar, antes de mais,
na valorização dos seus recursos humanos, garantindo que as pessoas têm o justo reconhecimento salarial, a
progressão de carreiras, e as condições de trabalho mais adequadas.
A qualidade da escola pública faz-se com melhores estruturas, mas essencialmente com valorização das
pessoas. Não é digno, não é justo, não é politicamente aceitável que se continuem a exigir sacrifícios pessoais
e familiares dos docentes, que se empurrem estes profissionais para outras áreas de trabalho, e se desbarate
a educação desta forma.
O elevador social que a educação deve ser, é um elevador que parou para os docentes, que à custa da
profissão que decidiram abraçar, se veem impossibilitados de progredir na carreira; não porque não tenham
mérito, mas porque o sistema de avaliação e de vagas que foi criado, teve como único intuito, impedir a sua
progressão.
Associada a esta situação, por consequência da crise sanitária resultante da COVID-19, foram alterados os
procedimentos da avaliação de desempenho dos docentes, reduzindo-se os prazos para a observação de aulas,
num quadro de condições não habituais, que poderá ter condicionado estes processos de avaliação, situação
particularmente gravosa para os docentes posicionados nos 4.º e 6.º escalões, sujeitos a regime de vagas, e
que por efeito destas alterações, poderão ter avaliações prejudicadas em ano de progressão de carreira.
Pela injustiça reiterada contra estes profissionais, pela missão que abraçaram, pelo serviço público que
prestam, pelo reconhecimento do seu esforço diário agravado na crise social e sanitária que vivemos, e pela
difícil tarefa que tem pela frente nos próximos anos, de recuperação dos indicadores de sucesso e bem estar
dos estudantes, é urgente que sejam corrigidos os erros cometidos contra os docentes pela própria tutela,
anulando o mecanismo de vagas de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente, que o Grupo Parlamentar
do PAN propõe revogar com o presente projeto de lei.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o
Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei assegura a revogação do atual sistema de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente,
procedendo para o efeito à décima quinta alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos
Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, e alterado
pelos Decretos-Leis n.os 105/97, de 29 de abril, 1/98, de 2 de janeiro, 35/2003, de 27 de fevereiro, 121/2005, de
26 de julho, 229/2005, de 29 de dezembro, 224/2006, de 13 de novembro, 15/2007, de 19 de janeiro, 35/2007,
de 15 de fevereiro, 270/2009, de 30 de setembro, 75/2010, de 23 de junho, 41/2012, de 21 de fevereiro, e
146/2013, de 22 de outubro, e pelas Leis n.os 80/2013, de 28 de novembro, 12/2016, de 28 de abril, e 16/2016,
de 17 de junho.
Artigo 2.º
Norma revogatória
É revogada a alínea b), do n.º 3, do artigo 37.º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos
Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, na sua
atual redação.
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Palácio de São Bento, 28 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1463/XIV/3.ª
(RECOMENDA AO GOVERNO QUE GARANTA O DIREITO INALIENÁVEL DAS CRIANÇAS À
PRESENÇA DE FIGURA SIGNIFICATIVA DAS CRIANÇAS NOS MOMENTOS DE TRANSIÇÃO DOS
CONTEXTOS EDUCATIVOS)
Informação da Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto relativa à discussão do
diploma ao abrigo do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da república
Ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa (Poderes dos
Deputados) e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República (Poderes dos
Deputados), foram apresentadas as seguintes iniciativas:
• Projeto de Resolução n.º 1463/XIV/3.ª (PAN) – Recomenda ao Governo que garanta o direito inalienável
das crianças à presença de figura significativa das crianças nos momentos de transição dos contextos
educativos.
A discussão da iniciativa acima identificada ocorreu na reunião da Comissão de 19 de outubro de 2021.
A Deputada Bebiana Cunha (PAN), no âmbito da apresentação da iniciativa, começou por referir que a
mesma visa alertar para a realidade das creches, em relação ao facto de a criança não poder ser acompanhada
por uma figura significativa da mesma, conforme resulta das regras estabelecidas pela Direção-Geral de Saúde
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(DGS), defendendo que esta situação foi aceitável no ano passado, atenta a situação pandémica, mas já não o
é este ano. Considerou ainda que a Assembleia da República deve posicionar-se a favor da criança, tão jovem,
poder ser acompanhada, sem pôr em causa as condições sanitárias, pelo que o projeto de resolução desafia o
Parlamento a tomar posição sobre a matéria, o que implica a revisão da norma da DGS.
O Deputado Tiago Estevão Martins (PS) manifestou reticências em relação a pedir-se à DGS a revisão e
alteração das normas e orientações existentes.
• A Deputada Ana Mesquita (PCP) mencionou que o PAN apresentou no passado o Projeto de Resolução
n.º 608/XIV/1.ª (PAN) – Recomenda ao Governo que garanta o acompanhamento das crianças que ingressam
pela primeira vez no pré-escolar ou no 1.º ciclo, em relação ao qual o PCP votou a favor, mas tinha um texto
diferente. Referiu depois que o PCP não quer pôr em causa as normas da DGS e que embora considerem
importante a presença de uma figura significativa das crianças, nomeadamente nas transições de ciclo, vão
ponderar a forma como vão votar.
Não se tendo registado outras intervenções, a Deputada Bebiana Cunha (PAN), a terminar, reiterou que falta
a presença de uma figura significativa e realçou a sua importância para a saúde mental das crianças e das
respetivas famílias, defendendo que entendem ser importante solicitar à DGS a alteração das normas existentes.
Realizada a discussão, cuja gravação áudio será disponibilizada no projeto de resolução referido, remete-se
esta Informação a S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, para agendamento da votação das
iniciativas na reunião plenária, nos termos do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República.
Palácio de São Bento, em 19 de outubro de 2021.
O Presidente da Comissão, Firmino Marques.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1486/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A CRIAÇÃO DE FLUXO DE RESÍDUOS PARA FRALDAS E OUTROS
PRODUTOS DE HIGIENE DESCARTÁVEIS NO ÂMBITO NO NOVO REGIME GERAL DE GESTÃO DE
RESÍDUOS, TAMBÉM E COMO PARTE INTEGRANTE DO PLANO ESTRATÉGICO DE RESÍDUOS
URBANOS 2030
Em Portugal, não existe reciclagem para as fraldas e outros produtos de higiene descartáveis que, segundo
os dados da Quercus, as fraldas descartáveis em 2010 representavam já 5% dos resíduos sólidos urbanos.
No relatório anual de resíduos urbanos (RARU) de 20191 é possível constatar que os têxteis sanitários
correspondem a 7,76% de todos os resíduos urbanos (RU) em Portugal continental.
Além de cada fralda demorar cerca de 500 anos a decompor-se, os microplásticos presentes na sua
composição têm sérios impactos no ambiente mas também na saúde humana, por via dos disruptores
endócrinos químicos, considerados pela OMS causadores vários problemas relacionados com a desregulação
hormonal.
No que se refere às fraldas descartáveis usadas, estes resíduos de origem predominantemente urbana e
produzidos hoje em dia em larga escala, assumem, face às suas características de utilização, um fator
significativo que determina que seja refletida a decisão quanto ao seu destino final. Efetivamente, o atual destino
dado a estes resíduos é a sua eliminação, quer em aterro quer por incineração, pelo que um potencial
encaminhamento para reciclagem implicaria o estabelecimento de regras e de fatores a considerar numa gestão
específica.
Decorrente da necessidade de se promover a definição da melhor opção na gestão destes resíduos, a
Agência Portuguesa do Ambiente diligenciou, em 2009, em parceria com uma entidade externa, o
1 https://apambiente.pt/sites/default/files/_Residuos/Producao_Gest%C3%A3o_Residuos/Dados%20RU/RARU%202019.pdf.
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desenvolvimento de um estudo de sustentabilidade técnica, ambiental e económico-financeira, que permitisse
avaliar da sua potencialidade como fluxo de resíduos. Com a concretização deste estudo foram identificados
vários cenários de modelos de gestão, com o objetivo de definir uma estratégia para este fluxo emergente.
Para uma eficiente gestão de resíduos urbanos é fundamental uma redução da produção dos próprios
resíduos e incentivar o envolvimento de todos na economia circular, quebrando a lógica do descartável e de
todos os impactos que tem no nosso planeta e na proteção da biodiversidade.
Nestes termos, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o
Deputado do PAN abaixo assinados propõem que a Assembleia da República recomende ao Governo que, por
intermédio do Ministério do Ambiente e da Ação Climática:
1) Crie um fluxo de resíduos para fraldas e outros produtos de higiene descartáveis no âmbito no novo
Regime Geral de Gestão de Resíduos, também e como parte integrante do Plano Estratégico de Resíduos
Urbanos 2030.
2) Promova a produção e utilização de produtos de higiene reutilizáveis, assim como a produção e redução
de produtos de higiene descartáveis.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1487/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROTEJA A ZONA DO RESORT COSTA TERRA EM MELIDES
Exposição de motivos
O projeto do resort Costa Terra, situado no litoral alentejano, junto a Melides, foi adquirido pela norte-
americana Discovery Land Company em 2019. O projeto abrange cerca de 200 hectares e quatro quilómetros
de frente de costa e prevê um campo de golfe, vários hotéis e moradias. Localiza-se em área protegida, sítio de
interesse comunitário e REN.
Relativamente ao loteamento, foi emitida em 2005, uma declaração de impacte ambiental (DIA) favorável
condicionada, designadamente «ao reconhecimento por despacho conjunto do Ministro do Ambiente, do
Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e do ministro competente em razão da matéria, da
ausência de soluções alternativas e da sua necessidade por razões imperativas de reconhecido interesse
público, incluindo de natureza social ou económica, ao abrigo do disposto no n.º 10 do artigo 10.º do Decreto-
Lei n.º 140/99, de 24 de abril, alterado pelo Decreto-Lei n.º 49/2005, de 24 de fevereiro». O Despacho Conjunto
n.º 165/2006 foi publicado em 2006 e determina que:
«1 – É reconhecida a ausência de soluções alternativas e a existência de razões imperativas de interesse
público, incluindo de natureza social e económica, para a realização do projeto designado ‘Loteamento da Costa
Terra’, localizado no concelho de Grândola, freguesia de Melides.
2 – É reconhecida a ausência de soluções alternativas e a existência de razões imperativas de interesse
público, incluindo de natureza social e económica, para a realização do projeto designado ‘Campo de golfe da
Costa Terra’, localizado no concelho de Grândola, freguesia de Melides».
A DIA apresenta 97 medidas de mitigação e 3 medidas de compensação.
Relativamente ao campo de golf foi emitida DIA, pela CCDR Alentejo, em março de 2012, também favorável
condicionada. A DIA incluiu 20 condicionantes e 73 medidas de mitigação, com validade até 2014.
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Em 2008, a Comissão Europeia abriu um processo de infração contra Portugal pelo incumprimento da
legislação ambiental europeia, considerando haver «graves deficiências» nos estudos dos empreendimentos
turísticos Costa Terra, Herdade do Pinheirinho e Herdade da Comporta, todos localizados em zonas protegidas
do Alentejo.
Em suma, estamos perante um projeto com estudos de impacte ambiental que remontam há mais de uma
década, numa zona protegida, sítio de interesse comunitário, cuja validade das DIA é questionável, tanto mais
com a evolução que tem ocorrido nas espécies em vias de extinção, bem como no conhecimento científico dos
impactos das alterações climáticas ao nível da subida do nível do mar e da escassez hídrica. Num projeto cujas
DIA foram alvo de infração pela Comissão Europeia, a única justificação encontrada pelo Governo da altura foi
declarar «a ausência de soluções alternativas e a existência de razões imperativas de interesse público,
incluindo de natureza social e económica».
O verdadeiro interesse público para a zona não reside nos interesses económicos, mas sim em preservar
aqueles ecossistemas, já ameaçados pela subida do nível do mar e pela escassez hídrica, num País que,
reconhecidamente, não tem tido capacidade de conservar a natureza e as espécies, sendo o quarto país
europeu com mais espécies em vias de extinção.
Assim, face ao exposto, o PAN defende que o Governo deve procurar todos os meios ao seu dispor para
garantir que o empreendimento turístico Costa Terra não é executado e, ao mesmo tempo, garantir a
preservação ecológica da zona em questão.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais
aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que desenvolva todos os esforços
para que o empreendimento turístico Costa Terra não seja executado e que garanta a preservação ecológica da
zona em questão.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1488/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROTEJA AS ESPÉCIES MIGRADORAS NA BACIA
HIDROGRÁFICA DO VOUGA
Exposição de motivos
Foi emitida uma licença de utilização dos recursos hídricos por parte da Agência Portuguesa do Ambiente
(APA), em que se prevê a construção de uma ponte-açude na zona de estuário do rio Vouga, em plena Zona de
Proteção Especial da ria de Aveiro e sítios classificados no âmbito da Rede Natura 2000. Esta obra, cujo
promotor é a Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro, padece de graves problemas, quer ao nível do
projeto propriamente dito, quer no que diz respeito a todas as etapas procedimentais que culminaram na
aprovação do licenciamento ambiental em fevereiro de 2021.
Em termos ambientais, este projeto é desastroso para as espécies de peixes migradores, onde se incluem
populações em risco como a lampreia marinha (estatuto de ameaça: «Vulnerável») e o sável, a truta marisca e
a enguia, todas elas classificadas como «Criticamente em perigo» em território português. A infraestrutura, tal
como se encontra atualmente projetada, impede a passagem destes peixes, que à exceção da enguia, se
reproduzem exclusivamente em água doce, comprometendo a viabilidade destas populações na bacia
hidrográfica do Vouga. Para além disso, é expectável que os impactos negativos deste projeto se estendam a
outras redes hidrográficas da região Centro, designadamente o Mondego, uma vez que as populações destes
peixes estão interligadas durante a fase marinha do seu ciclo de vida.
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A própria licença emitida pela APA considera que a construção deste açude «poderá introduzir impactes
severos e irreversíveis sobre a fauna piscícola», não se compreendendo a ausência de medidas de mitigação
prévias à execução de uma obra com um orçamento superior a 10 milhões de euros.
Numa altura em que a União Europeia estabeleceu na sua Estratégia para a Biodiversidade 2030, o objetivo
de restaurar pelo menos 25 000 Km de rios livres de obstáculos na Europa, através da remoção de barreiras e
recuperação de zonas de inundação, este projeto caminha no sentido oposto, estando em clara contradição com
o Pacto Verde Europeu.
A própria Comissão Europeia financia projetos de conservação e restauro ecológico na bacia hidrográfica do
Vouga, como é o caso do projeto LIFE Águeda, cujo objetivo principal é a eliminação de obstáculos para os
peixes migradores nos rios da região. Ora, a construção da ponte-açude no rio Novo do Príncipe coloca em
causa os objetivos deste projeto, também ele de vários milhões de euros, tendo efeitos diametralmente opostos
aos que se deseja atingir para a conservação da natureza na área de intervenção.
Para além dos impactes ambientais negativos já mencionados, todo o procedimento administrativo deste
projeto apresenta falhas graves, começando pela repescagem de uma declaração de impacte ambiental de
outubro de 2003 para a requalificação da pista de remo de Aveiro, um propósito totalmente distinto daquilo que
hoje se apresenta para esta infraestrutura.
Para além disso, há 20 anos (data do estudo de impacte ambiental) não existiam sequer os atuais sítios
classificados da Rede Natura 2000 nem o aproveitamento hidroelétrico de Ribeiradio-Ermida, o qual provocou
alterações significativas nas dinâmicas existentes na bacia hidrográfica do Vouga. Tratando-se de um projeto
infraestruturante para a região, este deveria carecer de consulta pública e estar integrado no processo de
avaliação de impacte ambiental do Sistema de Defesa Primário do Baixo Vouga Lagunar, dada a interligação
entre ambos projetos. Urge portanto, reverter a licença de utilização de recursos hídricos emitida pela APA e
realizar uma avaliação de impacte ambiental que tenha em linha de conta a nova realidade da bacia hidrográfica
do Vouga, e que preconize a construção de uma passagem para peixes, de forma a mitigar os impactes
negativos desta obra. Adicionalmente, deverá também ocorrer um processo de participação democrática e
consulta pública para garantir o desenvolvimento sustentável e harmonioso desta região rica em valores
naturais.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais
aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
Realize uma avaliação de impacte ambiental atual para o projeto de construção do açude do Baixo Vouga
Lagunar.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1489/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A PROMOÇÃO DA REDUÇÃO DE RESÍDUOS E O AUMENTO DA TAXA
DE RECICLAGEM
Exposição de motivos
As metas definidas na Diretiva Europeia 2008/98/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de
novembro de 2008, sobre resíduos, foram vertidas no Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos (PERSU
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2020), aprovado pela Portaria n.º 187-A/2014, publicada em Diário da República (I Série) n.º 179, de 17 de
setembro. Consistem, sinteticamente, em 2020 ser atingida uma redução da produção de resíduos de 10%, face
a 2012; em 2020 haver uma deposição máxima de resíduos biodegradáveis em aterro de 35% e, em 2020, se
atingir um nível de reciclagem mínimo de 50%, meta que não foi cumprida.
Adicionalmente, a Diretiva (UE) 2018/852 é aplicável desde 4 de julho de 2018 e deve ser transposta para a
legislação dos países da UE até 5 de julho de 2020, vindo introduzir metas ainda mais exigentes.
A Diretiva (UE) 2018/852, que altera a Diretiva 94/62/CE, prevê medidas para:
● Prevenir a produção de resíduos de embalagens, e
● Promover a reutilização, a reciclagem e as outras formas de valorização dos resíduos de embalagens em
vez da sua eliminação final, a fim de contribuir para a transição para uma economia circular.
A diretiva abrange todas as embalagens colocadas no mercado europeu e todos os resíduos de embalagens,
sejam eles utilizados ou produzidos a nível da indústria, do comércio, de escritórios, lojas ou serviços, a nível
doméstico ou a qualquer outro nível e independentemente do material utilizado.
Os países da UE devem tomar medidas tais como programas nacionais, incentivos através de regimes de
responsabilidade alargada do produtor e outros instrumentos económicos, a fim de prevenir a produção de
resíduos de embalagens e minimizar o impacte ambiental das mesmas. Deverão assim incentivar o aumento
das embalagens reutilizáveis colocadas no mercado e de sistemas de reutilização que não comprometam a
segurança alimentar, podendo incluir sistemas de consignação, metas, incentivos económicos e uma
percentagem mínima de embalagens reutilizáveis colocadas no mercado para cada tipo de embalagem, entre
outras medidas.
Os países da UE devem ainda tomar as medidas necessárias para cumprir as metas de reciclagem até 31
de dezembro de 2025 e que exigem a reciclagem de pelo menos 65%, em peso, de todas as embalagens.
As metas de reciclagem para cada material são:
● 50% do plástico,
● 25% da madeira,
● 70% dos metais ferrosos,
● 50% do alumínio,
● 70% do vidro, e
● 75% do papel e cartão.
Até 31 de dezembro de 2030, devem ser reciclados pelo menos 70% das embalagens. Tal inclui:
● 55% do plástico,
● 30% da madeira,
● 80% dos metais ferrosos,
● 60% do alumínio,
● 75% do vidro e
● 85% do papel e cartão.
Adicionalmente, ainda no âmbito da Diretiva (UE) 2018/852, os países da UE devem assegurar que as
embalagens colocadas no mercado cumprem os requisitos essenciais constantes do Anexo II da diretiva:
● Limitar ao máximo o peso e o volume da embalagem para manter níveis de segurança, higiene e aceitação
adequados para o consumidor;
● Reduzir ao máximo a presença de substâncias ou matérias perigosas no material da embalagem e em
qualquer dos seus componentes;
● Projetar embalagens reutilizáveis ou valorizáveis.
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Desta forma, é crucial introduzir incentivos para um efetivo ecodesign na produção de embalagens, sem
prejuízo dos requisitos já definidos ao nível da legislação europeia, designadamente nas normas NP EN 13428:
2005, «Embalagem – Requisitos específicos para o fabrico e composição – Prevenção por redução na fonte»,
e a EN 13429:2004, «Packaging – Reuse». O PAN defende assim a promoção do ecodesign das embalagens
primárias e a minimização da utilização das embalagens secundárias e terciárias.
Com efeito, os grandes desafios para o aumento do nível de recuperação de embalagens passam pela
redução da sua produção, pelo acréscimo da recuperação seletiva das mesmas e pelo aumento da
reciclabilidade dos materiais.
Assim, para além da promoção do ecodesign das embalagens e da redução da utilização de embalagens
secundárias e terciárias, o PAN considera urgente uma aposta na revisão das especificações técnicas dos
resíduos de embalagens provenientes de recolha seletiva, de forma a aumentar o quantitativo de materiais
passíveis de reciclagem, no âmbito do sistema integrado de embalagens e resíduos de embalagens (SIGRE),
cuja última revisão ocorreu em 2009, estando em vigor as constantes nos Despachos n.º 15370/2008 e n.º
21894-A/2009.
As especificações técnicas, na prática, definem quais dos materiais recolhidos seletivamente, através dos
ecopontos, poderão ser aceites para efeitos de encaminhamento para reciclagem. Tendo em consideração a
evolução ocorrida na indústria da reciclagem na última década, é urgente proceder à redefinição das
especificações técnicas dos resíduos de embalagens provenientes de recolha seletiva para reciclar, no âmbito
do Sistema Integrado de Embalagens e Resíduos de Embalagens (SIGRE).
De acordo com o relatório anual de resíduos urbanos publicado pela Agência Portuguesa do Ambiente para
o ano de 2018, foram separadas cerca de 564 mil toneladas de materiais passíveis de reciclagem, tendo sido
retomadas para efeitos de reciclagem apenas 355 mil toneladas1. Significa isto que apenas 63% dos materiais
separados foram efetivamente reciclados. Exemplos de embalagens que pagam o «Ponto Verde» e que são
separadas para os ecopontos mas que, na prática, por não cumprirem as «especificações técnicas», são
considerados refugos e depositados em aterro ou incinerados, são as embalagens de iogurtes, quando do ponto
de vista da indústria da reciclagem poderiam ser recicladas, bem como os pacotes das batatas fritas,
embalagens de papel/cartão com teor de humidade superior a 10% e embalagens de PEAD (plástico) que
contenham mais de 1% de papel, entre outros.
Importa, por isso, alterar as especificações técnicas, de forma a aumentar também a taxa de reciclabilidade.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais
aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Desenvolva as ações necessárias a que as embalagens privilegiem as melhores práticas de design
ecológico, dando prioridade à utilização de materiais recicláveis, monomateriais, reutilizáveis, utilizando o
mínimo de recursos exigíveis para garantir a qualidade e segurança do produto embalado.
2 – Até ao final de 2022, efetue a revisão das especificações técnicas do Sistema Integrado de Gestão de
Resíduos de Embalagens, tendo por objetivo um acréscimo de, pelo menos, 50% das embalagens aceites para
fins de reciclagem.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês Sousa Real — Nelson Silva.
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1 https://www.pontoverde.pt/assets/docs_publicacoes/Relatorio%20Atividades%20de%202018%20da%20SPV%20-%20Resumo%20.pdf
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1490/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE GARANTA UMA SOLUÇÃO QUE ASSEGURE A TRANSFERÊNCIA
PARA O MUNICÍPIO DE CARREGAL DO SAL DAS VERBAS NÃO COBERTOS PELO FUNDO EUROPEU
DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL E NECESSÁRIOS PARA A CONCLUSÃO DO PROJETO DE
REQUALIFICAÇÃO E MUSEALIZAÇÃO DA CASA DO PASSAL
Exposição de motivos
Há 81 anos, Aristides de Sousa Mendes, desobedecendo de forma corajosa às ordens expressas de Salazar
e fazendo prevalecer valores éticos e morais superiores, passou vistos para Portugal a todos aqueles que lhos
requereram, salvando assim mais de 30 mil vidas do terror da guerra e do jugo nazi. De entre todos aqueles que
foram salvos por Aristides de Sousa Mendes encontravam-se cerca de 10 mil judeus, assim como importantes
personalidades como, por exemplo, Otto von Habsburg, a Grã-Duquesa Charlotte do Luxemburgo, Charles
Oulmont, Robert Montgomery, Salvador Dali e diversos ministros do governo belga no exílio.
Este ato heróico de Aristides de Sousa Mendes valeu-lhe um processo disciplinar, a expulsão do corpo
diplomático, a proibição do exercício da advocacia e a inexistência de qualquer tipo de vencimento. Na miséria,
Aristides contou apenas com uma pensão simbólica da comunidade israelita em Portugal, morrendo sozinho e
indigente a 3 de abril de 1954, no Hospital da Ordem Terceira.
Após a sua morte vários foram os reconhecimentos e honrarias que lhe foram atribuídos a título póstumo em
Portugal e no estrangeiro. Nos anos de 1960, o Yad Vashem, em Israel, prestou-lhe homenagem através da
atribuição do título de «Justo entre as nações» e da plantação de vinte árvores em sua memória no parque Yaar
Mayishuy. Em 1987 o Presidente da República Mário Soares atribuiu-lhe o grau de Oficial da Ordem da
Liberdade, pedindo publicamente à sua família desculpas «em nome do Portugal democrático, pela injustiça e
sofrimento causados». Posteriormente, o mesmo Presidente da República viria a atribuir-lhe a Grã-Cruz da
Ordem Militar de Nosso Senhor Jesus Cristo e, mais recentemente, o Presidente da República Marcelo Rebelo
de Sousa elevou-o ao grau de titular da Grã-Cruz da Ordem da Liberdade. Refira-se que, em 1987, a Assembleia
da República aprovou por unanimidade a sua reintegração na carreira diplomática, a título póstumo, que foi feita
no grau de ministro plenipotenciário de 2.ª classe – embaixador.
No passado dia 19 de outubro de 2021, na sequência da Resolução da Assembleia da República n.º 47/2020,
o País decidiu dar a Aristides de Sousa Mendes a maior homenagem nacional concedendo-lhe honras de
Panteão Nacional, como forma de perpetuar a sua memória «enquanto homem que desafiou a ideologia fascista,
evocando o seu exemplo na defesa dos valores da liberdade e dignidade da pessoa humana».
Apesar da importância de Aristides de Sousa Mendes para a história de Portugal e desta tão recente e
importante homenagem nacional, chegamos a 2021 sem que a requalificação e musealização da Casa do
Passal, histórica casa de Aristides de Sousa Mendes em Cabanas de Viriato, no concelho de Carregal do Sal,
esteja assegurada. No entender do Grupo Parlamentar do PAN, só com a conclusão deste processo se
assegurará o pleno reconhecimento nacional do ato de consciência de Aristides de Sousa Mendes.
A Casa do Passal, construída no Século XIX e que durante a II Guerra Mundial acolheu alguns refugiados
judeus, foi propriedade da família Sousa Mendes até aos anos de 1950, momento a partir do qual não mais foi
habitada e entrou em declínio e abandono ficando em estado de ruína. Em 2001, a Casa do Passal foi adquirida
pela Fundação Aristides de Sousa Mendes, com o intuito de aí se erigir uma casa-museu, a sede da fundação,
um centro de exposições, uma biblioteca e um arquivo.
Nos últimos anos, vários foram os passos dados no sentido de se conseguir a requalificação e musealização
da Casa do Passal. Em 2011, devido à sua relevância arquitetónica e cultural, a Casa do Passal foi classificada
como monumento nacional, através do Decreto n.º 16/2011, de 25 de maio.
Em 2013, iniciou-se o processo de requalificação e musealização da Casa do Passal, que à data estava em
ruína. Nesse ano, celebrou-se um contrato de comodato, que cedeu a Casa do Passal pelo prazo de dez anos
à Direção-Regional de Cultura do Centro que, com o apoio dos fundos europeus do programa do Quadro de
Referência Estratégico Nacional (QREN), levou a cabo a substituição da cobertura, reforço e estabilização
estrutural do edifício.
A segunda fase deste processo foi assumida pelo município de Carregal do Sal, enquanto dono da obra, com
financiamento do programa Centro 2020, visando assegurar a organização do espaço da quinta da Casa do
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Passal, a colmatação dos arranjos exteriores próximos da casa e uma intervenção de continuidade do que já se
encontra executado. Tendo em conta os custos deste processo, no âmbito da Orçamento do Estado de 2022,
aprovado pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março, ficou prevista a transferência de uma verba até 300 mil euros nos
termos do projeto de requalificação e musealização da Casa do Passal e a acordar entre o Ministério da Cultura,
via Direção-Regional de Cultura do Centro, a Câmara Municipal de Carregal do Sal e a Fundação Aristides de
Sousa Mendes.
Apesar do exposto, chegamos ao final de 2021 e relativamente à Casa do Passal, verificamos que, apesar
das promessas do anterior Governo de tudo fazer para que a casa abrisse ao público como museu em 2018,
não só a segunda fase de intervenção ainda não se iniciou, como também verificamos que, segundo relatos da
comunicação social local, algumas das remodelações de preservação mínima realizadas na primeira fase de
intervenção já começam a mostrar os primeiros sinais de degradação e de necessidade de pequenas
intervenções.
No dia 18 de maio deste ano, foi publicado no Diário da República o concurso público para a recuperação e
musealização da Casa do Passal, com um valor de 1 173 420 euros. No entanto, este valor foi considerado
demasiado baixo pelos eventuais interessados, pelo que não atraiu concorrentes e o concurso acabou por ficar
deserto. A este concurso sucedeu-se um segundo, cujos preços foram ajustados para 1 568 800 euros e que
acabou também por ficar deserto. Segundo informações divulgadas na comunicação social, a Câmara Municipal
de Carregal do Sal irá lançar um concurso por ajuste direto com o valor de 1 568 800 euros, que se conseguir
dar origem à escolha de uma empresa poderá levar à abertura da Casa do Passal como museu no ano de 2023.
Contudo, de acordo com os dados disponibilizados pela Câmara Municipal de Carregal do Sal, existem ainda
um conjunto de despesas adicionais que terão de ser contratadas pelo município de Carregal do Sal para
assegurar a musealização da Casa do Passal e que estão fora do procedimento em curso. Em causa estão
despesas com a conceção geral gráfica da exposição no valor de 15 375 euros, com investigação e coordenação
no valor de 30 750 euros, com conteúdos gráficos e audiovisuais no valor de 30 750 euros, com design de
comunicação integrado no valor 9 532,50 euros e com arranjos exteriores no valor de 360 400 euros. Estas
despesas fazem com que o custo total do projeto de reabilitação e musealização da Casa do Passal, a suportar
pelo município de Carregal do Sal, se cifre nos 2 015 607,50 de euros, sendo que a comparticipação total do
Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional para o projeto é de apenas 1 041 643,45 euros. Tal significa que
existem 1 041 643,45 euros que terão de ser totalmente suportados pelo município de Carregal do Sal, o que
para além de sobrecarregar o respetivo orçamento municipal com um projeto de âmbito nacional, poderá gerar
novos atrasos adicionais à conclusão do projeto.
A estes custos acresce referir que, no âmbito do programa valorizar e da linha de apoio à valorização turística
do interior, será desenvolvido o programa à descoberta de Carregal do Sal que terá uma ciclovia/ecovia dedicada
a Aristides de Sousa Mendes, que valorizará grandemente a Casa do Passal e Cabanas de Viriato com uma
visão que concilia a história, o contacto com a natureza e valorização do ato de consciência de Aristides de
Sousa Mendes. Este projeto implicará um investimento da parte do município de Carregal do Sal na ordem dos
827 160,41 euros, que, a juntar aos anteriormente suportados, onerará ainda mais o orçamento do município de
Carregal do Sal.
Atendendo a que este se trata de um projeto que visa garantir a concretização de um gesto de pura justiça
histórica – que, em primeira linha, cabe ao nível do poder estadual – e que tem uma dimensão nacional e um
elevado potencial de dinamização económica da região Centro, com a presente iniciativa o Grupo Parlamentar
do PAN pretende assegurar que o Governo, em articulação com a Fundação Aristides de Sousa Mendes,
garanta uma solução que assegure a transferência para o município de Carregal do Sal dos 1 041 643,45 euros
não cobertos pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e necessários para a conclusão do projeto de
requalificação e musealização da Casa do Passal. Paralelamente, propomos também que o Governo assegure
o financiamento de pelo menos 500 000 euros do programa à descoberta de Carregal do Sal por forma a
assegurar a conclusão atempada da ciclovia/ecovia dedicada a Aristides de Sousa Mendes.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais
aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que, através dos Ministérios da
Coesão Territorial, da Cultura, dos Negócios Estrangeiros e da Economia e em articulação com a Fundação
Aristides de Sousa Mendes, garanta uma solução que assegure a transferência para o município de Carregal
do Sal:
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1 – Dos 1 041 643,45 euros não cobertos pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e necessários
para a conclusão do projeto de requalificação e musealização da Casa do Passal;
2 – E dos 500 000 euros não cobertos pela linha de apoio à valorização turística do interior e necessários à
construção da ciclovia/ecovia dedicada a Aristides de Sousa Mendes.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1491/XIV/3.ª
RECOMENDA A CRIAÇÃO DO DIA NACIONAL DAS ACESSIBILIDADES
A Associação Salvador atua na área da deficiência motora e foi fundada por Salvador Mendes de Almeida
em 2003. Tem como missão promover a inclusão das pessoas com deficiência motora na sociedade e melhorar
a sua qualidade de vida, potenciando os seus talentos e sensibilizando para a igualdade de oportunidades.
Em 2019, esta associação criou o Dia das Acessibilidades, um dia dedicado à sensibilização nesta área. Em
duas edições, conseguiu envolver mais de 20 000 pessoas – crianças e jovens de todo o País, empresas,
arquitetos, câmaras municipais, entre outros. Através da Petição n.º 211/XIV/2.ª – Criação do Dia Nacional das
Acessibilidades – e que reuniu 2091 assinaturas são explanados os seguintes objetivos:
1 – Demonstrar que a falta de acessibilidades é um dos principais fatores de exclusão social das pessoas
com deficiência motora e que a mudança é urgente;
2 – Colocar todas as escolas do País a dedicar um dia à sensibilização das crianças e jovens sobre a temática
da deficiência e acessibilidade;
3 – Incentivar as autarquias e as restantes entidades envolvidas com temas de acessibilidade, a trabalharem
de forma efetiva nesta área e a criarem iniciativas de sensibilização da comunidade para mudança de
mentalidades;
4 – Destacar o trabalho realizado na área das acessibilidades para que sirva de exemplo a nível nacional.
O ordenamento jurídico português proíbe quaisquer práticas discriminatórias no âmbito das acessibilidades,
contudo é comumente sabido que um dos maiores fatores de exclusão social são as barreiras, arquitetónicas
ou outras, que impedem a pessoa com deficiência de desenvolver a sua vida pessoal e profissional.
Paralelamente, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência consagra, além das diretrizes
para mais e melhor acessibilidades, no artigo 8.º, relativo à sensibilização, que:
1 – Os Estados partes comprometem-se a adotar medidas imediatas, efetivas e apropriadas para:
a) Sensibilizar a sociedade, incluindo a nível familiar, relativamente às pessoas com deficiência e fomentar o
respeito pelos seus direitos e dignidade;
b) Combater estereótipos, preconceitos e práticas prejudiciais em relação às pessoas com deficiência,
incluindo as que se baseiam no sexo e na idade, em todas as áreas da vida;
c) Promover a sensibilização para com as capacidades e contribuições das pessoas com deficiência.
2 – As medidas para este fim incluem:
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a) O início e a prossecução efetiva de campanhas de sensibilização pública eficazes concebidas para:
i) Estimular a recetividade em relação aos direitos das pessoas com deficiência;
ii) Promover perceções positivas e maior consciencialização social para com as pessoas com deficiência;
iii) Promover o reconhecimento das aptidões, méritos e competências das pessoas com deficiência e dos
seus contributos para o local e mercado de trabalho.
b) Promover, a todos os níveis do sistema educativo, incluindo em todas as crianças desde tenra idade, uma
atitude de respeito pelos direitos das pessoas com deficiência;
c) Encorajar todos os órgãos de comunicação social a descreverem as pessoas com deficiência de forma
consistente com o objetivo da presente convenção;
d) Promover programas de formação em matéria de sensibilização relativamente às pessoas com deficiência
e os seus direitos.
Por sua vez, a Estratégia Nacional para a Inclusão das Pessoas com Deficiência (ENIPD) 2021-2025
consagra, nos diferentes eixos, vários objetivos a concretizar, dos quais se destaca uma maior promoção, pleno
acesso e igual gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais no campo político, económico,
social, cultural e civil, por todas as pessoas com deficiência. Igualmente, reconhece que o «acesso desigual a
recursos económicos, sociais e culturais é um fator de exclusão social, que restringe a participação social, limita
e empobrece o seu conhecimento e as oportunidades e o usufruto dos seus plenos direitos».
Um relatório da Comissão para a Promoção das Acessibilidades de 30 de janeiro de 2020 assinala alguns
dos pontos críticos no que diz respeito às barreiras arquitetónicas, desde logo:
1 – Em 42% do edificado regista-se a inexistência de lugares de estacionamento reservados a pessoas com
mobilidade condicionada (42%) e, quando existem, 55% revela falta de adequada sinalização;
2 – A altura inadequada dos balcões e guichés de atendimento nos edifícios com atendimento ao público
apresenta um valor de 36%;
3 – Em 15% do edificado com atendimento ao público não existem balcões e guichés de atendimento;
4 – 40% do edificado apresenta um desnível inadequado das rampas no edificado relativamente ao requisito
sobre a inclinação máxima de 6%. 50% apresentam uma inclinação máxima de 8%;
5 – A inexistência ou inadequação de instalação sanitária adequada a pessoas com mobilidade
condicionada nos edifícios com atendimento ao público em 41% do edificado.
O Estado deve, assim, através das ferramentas disponíveis, compensar e atenuar as limitações de atividade
e restrições de participação decorrentes da deficiência, potenciando a funcionalidade, exponenciando a
participação, promovendo a inclusão e aumentando a qualidade de vida das pessoas.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais
aplicáveis, propõe que a Assembleia da República resolva instituir o dia 20 de outubro como o Dia Nacional das
Acessibilidades.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1492/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE ASSEGURE QUE AS VAGAS DE ACESSO AO 5.º E AO 7.º
ESCALÃO EM 2021 SEJAM IDÊNTICAS AO NÚMERO DE DOCENTES QUE INTEGRAM AS LISTAS DE
ACESSO NESTES DOIS ESCALÕES E QUE ASSEGURE UMA SOLUÇÃO QUE GARANTA A
RECUPERAÇÃO DE TODO O TEMPO DE SERVIÇO DOS DOCENTES QUE ESTIVERAM EM SUSPENSO
NAS LISTAS DE VAGAS
O Decreto-Lei n.º 75/2010, de 23 de junho, introduziu pela primeira vez um mecanismo de vagas para o
acesso aos 5.º e 7.º escalões, referindo no seu artigo 37.º que a progressão aos 3.º, 5.º e 7.º escalões depende,
entre outros requisitos, da observação de aulas (no caso da progressão aos 3.º e 5.º escalões) e da obtenção
de vaga (no caso da progressão aos 5.º e 7.º escalões). A possibilidade de progressão para estes escalões
pode ocorrer sem o requisito relativo à existência de vagas, mediante a obtenção das menções de Excelente e
Muito Bom nos 4.º e 6.º escalões.
A avaliação dos professores, como de quaisquer outros setores profissionais, é fundamental na
monitorização da qualidade e melhoria dos processos de trabalho, nomeadamente através da observação de
aulas e formação contínua. Contudo, o sistema de avaliação de docentes carece obrigatoriamente de isenção,
terminando numa estratégia que procura a rotatividade das melhores classificações entre os colegas. Com a
necessidade de obtenção de uma nota de mérito (Muito Bom ou Excelente) para acesso direto a estes escalões,
o que acontece frequentemente é que não é o mérito que é reconhecido, mas uma deturpação do sistema que
tenta atribuir as melhores classificações em função de quem possa precisar para poder superar a barreira
provocada pela existência de vagas para progressão.
Por ser um sistema de avaliação que se encontra preso a limitações financeiras e coloca anualmente em
desigualdade os docentes, este sistema acarreta injustiças na avaliação, impedindo que os profissionais se
sintam reconhecidos pelo trabalho que desenvolvem, além de os aprisionar num nível de valorização salarial do
qual é difícil saírem, gerando conflitos organizacionais, insatisfação laboral e perda efetiva de direitos na carreira.
A aplicação deste mecanismo que começou em 2018, com a publicação da Portaria n.º 29/2018, de 23 de
janeiro, é único na Administração Pública, configurando um sistema de carreira horizontal. Através dele, em
2020, 673 docentes ficaram fora do acesso ao 5.º escalão e 1348 docentes fora do acesso ao 7.º escalão, num
total de 2021 docentes que ficam a aguardar vaga no ano seguinte.
Falamos de docentes que lidam diariamente com um número de alunos muito superior ao que seria desejável
para que se conseguisse chegar a todos/as; que enfrentam diariamente condições de trabalho precárias,
nomeadamente com colocações distantes de casa e da família; que se confrontam com o risco de burnout sendo
uma das classes profissionais que mais recorre a serviços de saúde mental.
A escola pública, à semelhança do Serviço Nacional de Saúde, demonstrou nesta crise sanitária o seu
enorme valor, competência e espírito de missão. O reforço da escola pública tem de assentar, antes de mais,
na valorização dos seus recursos humanos, garantindo que as pessoas têm o justo reconhecimento salarial, a
progressão de carreiras e as condições de trabalho mais adequadas.
A qualidade da escola pública faz-se com melhores estruturas, mas essencialmente com valorização das
pessoas. Não é digno, não é justo, não é politicamente aceitável que se continuem a exigir sacrifícios pessoais
e familiares dos docentes, que se empurrem estes profissionais para outras áreas de trabalho e que se desbarate
a educação desta forma.
O elevador social que a educação deve ser é um elevador que parou para os docentes, que à custa da
profissão que decidiram abraçar, se veem impossibilitados de progredir na carreira, não porque não tenham
mérito, mas porque o sistema de avaliação e de vagas que foi criado teve como único intuito impedir a sua
progressão.
Associada a esta situação, por consequência da crise sanitária resultante da COVID-19, foram alterados os
procedimentos da avaliação de desempenho dos docentes, reduzindo-se os prazos para a observação de aulas,
num quadro de condições não habituais que poderá ter condicionado estes processos de avaliação, situação
particularmente gravosa para os docentes posicionados nos 4.º e 6.º escalões, sujeitos a regime de vagas, e
que por efeito destas alterações poderão ter avaliações prejudicadas em ano de progressão de carreira.
Pela injustiça reiterada contra estes profissionais, pela missão que abraçaram, pelo serviço público que
prestam, pelo reconhecimento do seu esforço diário agravado na crise social e sanitária que vivemos e pela
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difícil tarefa que tem pela frente nos próximos anos, de recuperação dos indicadores de sucesso e bem-estar
dos estudantes, é urgente que sejam corrigidos os erros cometidos contra os docentes pela própria tutela,
anulando o mecanismo de vagas de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais
aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Assegure que as vagas de acesso ao 5.º e ao 7.º escalão em 2021 sejam idênticas ao número de
docentes que integram as listas de acesso nestes dois escalões;
2 – Em articulação com as organizações representativas dos docentes, assegure uma solução que revogue
a alínea b) do n.º 3 do artigo 37.º do estatuto da carreira docente, assim como todos os artigos que lhe estão
associados, e que garanta a recuperação de todo o tempo de serviço dos docentes que estiveram em suspenso
nas listas de vagas, para efeitos da contagem do seu tempo de serviço na carreira docente.
Palácio de São Bento, 28 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1493/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A REVISÃO DOS OBJETIVOS ESPECÍFICOS DA PEPAC
Exposição de motivos
O processo de elaboração e discussão do PEPAC – Plano Estratégico da Política Agrícola Comum para
Portugal tem decorrido com inúmeras queixas de organizações não-governamentais e da própria comunidade
científica sobre a falta de transparência, envolvimento, debate e abertura para acolher os contributos de
especialistas e das organizações de defesa do ambiente.
O processo ficou marcado pela demissão de seis peritos da comissão de acompanhamento devido aos
atrasos na elaboração do plano e por sentirem que os seus contributos não foram tidos em consideração.
Também as organizações não governamentais de ambiente têm apontado diversas críticas ao plano e ao
processo de consulta pública, nomeadamente no que diz respeito a diversas insuficiências, em particular nas
componentes referentes aos Objetivos Específicos 4, 5 e 6 (respetivamente, clima, recursos naturais e
biodiversidade), considerando que a questão só pode ser resolvida com uma profunda revisão destes pontos
através de um processo de consulta que seja verdadeiramente inclusivo e participativo.
Os próximos anos de política agrícola comum serão determinantes para atenuar os efeitos da catástrofe
climática que já se está a manifestar em várias zonas do planeta e que, segundo a comunidade científica, terá
especial impacto no nosso País.
Por isso, os objetivos referentes à adaptação às alterações climáticas, atenuação dos seus efeitos, energia
sustentável, a par de uma gestão eficiente de recursos naturais como a água, os solos e o ar e a proteção da
biodiversidade, melhoria dos serviços ligados aos ecossistemas e preservação dos habitats e das paisagens
assumem uma importância vital e devem estar acima de quaisquer tipo de interesses que não sejam a
salvaguarda do bem estar das populações e do equilíbrio natural do planeta.
Nestes termos, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o
Deputado do PAN abaixo assinados propõem que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Proceda a uma revisão profunda dos Objetivos Específicos 4, 5 e 6 (clima, recursos naturais e
biodiversidade) da PEPAC, em função dos contributos das ONGA, comunidade científica e peritos do conselho
de acompanhamento;
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2 – Promova um processo de consulta pública verdadeiramente transparente e abrangente no sentido de
contribuir para uma agricultura mais sustentável.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1494/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A PROTEÇÃO DO TERRITÓRIO DO PERÍMETRO DE REGA DO MIRA
(PRM) E DO PARQUE NATURAL DO SUDOESTE ALENTEJANO E COSTA VICENTINA (PNSACV)
Exposição de motivos
Um pouco por todo o Alentejo, em resultado das áreas de cultivo intensivo e superintensivo e dos efeitos das
alterações climáticas, verifica-se uma verdadeira degradação da paisagem, do ecossistema, da biodiversidade
e do tecido social, bem como o comprometimento da quantidade e qualidade de recursos hídricos disponíveis
como é o caso da reserva de água da barragem de Santa Clara.
Desta forma, a par de saber que ações de fiscalização têm sido realizadas pela administração pública e se o
Governo irá apresentar um plano de atuação concertado com vista a dar uma resposta estruturada aos diferentes
problemas que assolam a região, importa, em primeira linha, travar, de forma tempestiva e imediata, o progresso
desregrado de qualquer instalação e exploração agrícola na zona do PNSACV, conforme proposto no Projeto
Lei n.º 835/XIV/2.ª (PAN)1.
Foi neste contexto de completo descontrole que o movimento de cidadãos Juntos pelo Sudoeste (JPS)
decidiu levar formalmente uma queixa à Comissão Europeia (CE) por negligência do Estado português
relativamente ao citado «caos» que se vive no PNSACV, território que engloba também o Perímetro de Rega do
Mira (PRM).
Segundo o movimento, está em causa uma agricultura que consome «recursos naturais que são de todos
nós, nomeadamente a água, que vem escasseando seriamente desde 2013, e arrasando habitats e valores
naturais que na realidade devemos às futuras gerações».
A Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT), na
sequência de Processo Inspetivo NUI/AA/CN/000001/16.7.AOT, no seu Relatório Final n.º I/02006/AOT/17, com
o objetivo de avaliar o cumprimento das normas aplicáveis às atividades agrícolas integradas no PRM previstas
no Plano de Ordenamento do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina (doravante
POPNSACV), pode ler-se que o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) «não dispõe de dados
que permitam conhecer, de modo completo e atualizado, as atividades agrícolas exercidas no PNSACV, em
particular na AIE (Área de Intervenção Específica) PRM, e correspondente área ocupada, bem como a sua
evolução. Tal circunstância encontra-se necessariamente relacionada com o facto de a instalação de
explorações agrícolas na AIE PRM não estar dependente de parecer prévio do ICNF, nem a instalação da
atividade agrícola (intensiva) ser sujeita a licenciamento, encontrando-se a informação sobre o uso do solo na
AIE PRM dispersa entre a ABM (Associação de Beneficiários do Mira) e a DGADR (Direção-Geral de Agricultura
e Desenvolvimento Rural)».
O referido relatório refere taxativamente que não se mostra assegurado o cumprimento dos
condicionamentos à ocupação para a execução de estufas, estufins, túneis elevados ou abrigos para culturas
protegidas em sede de controlo prévio à instalação da atividade agrícola.
O POPNSACV encontra-se em sobreposição parcial com o aproveitamento hidroagrícola do Mira, situação
que gera incompatibilidades legais coincidentes com o incumprimento generalizado do POPNSACV que coloca
1 DetalheIniciativa (parlamento.pt)
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em risco os valores ambientais que o próprio plano de ordenamento prevê proteger, acarretando igualmente a
violação das obrigações do Estado português decorrentes da classificação do parque em Zona Especial de
Conservação, enquadrada na Rede Natura 2000, constituindo uma situação urgente a resolver.
Assim, para permitir uma maior segurança jurídica, controle dos danos e impactes ambientais até então
ocorridos por via da progressão descontrolada da agricultura intensiva no Sudoeste Alentejano, e com o objetivo
de preservar os valores naturais existentes, importa promover as necessárias diligências para o integral
cumprimento do regime da avaliação de incidências ambientais (RN2000), do regime jurídico da avaliação de
impacte ambiental e do POPNSACV, bem como a análise dos reais e cumulativos na biodiversidade, nos solos
e nos recursos hídricos e tecido social das explorações agrícolas do PRM, bem como nos valores ecológicos e
paisagísticos do PNSACV.
A harmonização entre a conservação da natureza e respeito pelos recursos naturais e a atividade agrícola
mostra-se impossível de alcançar se se mantiver o atual padrão que aposta numa agricultura que retira o máximo
do solo no menor período de tempo, desrespeitando os seus ciclos naturais e descurando os impactes
ambientais que este modo de produção provoca nos solos, água, ar, habitats, em toda a biodiversidade e ainda
em todos aqueles que à agricultura intensiva ou superintensiva estão ligados diretamente por via do seu trabalho
e, indiretamente, por via das externalidades negativas que a todos impactam.
A atividade agrícola requer uma urgente mudança de paradigma, sendo necessária a transição do modo
intensivo de produção para uma agricultura regenerativa e que, ao invés de destruir os processos ecológicos,
estabelece com eles uma relação de respeito pela sua riqueza e biodiversidade.
Para além da Rede Natura, supramencionada, o território deveria encontrar-se, desde já, protegido pelo
regime jurídico da avaliação de impacte ambiental, bem como da lei de bases da política do ambiente, sujeitas,
estas últimas, a um princípio de integração e transversalidade.
Por isso, em primeira linha, para a proteção do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina,
bastaria o cumprimento do previsto no regime da avaliação de incidências ambientais (RN2000) e regime jurídico
da avaliação de impacte ambiental.
Acresce ainda que a gestão dos recursos hídricos da área do perímetro de rega é gerida por uma entidade
privada, a Associação de Beneficiários do Mira (ABM), dominada pelos grandes produtores agrícolas em estufas.
Em face e em resposta à conhecida escassez de água, recurso natural de todos e para todos, que se vem
agravando seriamente desde 2013, até pelos efeitos das alterações climáticas que se farão sentir cada vez mais,
e arrasando habitats e valores naturais que na realidade devemos às futuras gerações, que a ABM, organismo
responsável por gerir a albufeira, decidiu unilateralmente, cortar a água a pequenos produtores que há muito se
abasteciam no canal de rega ligado à albufeira da barragem de Santa Clara, que, ainda antes do início do verão,
já se encontra a menos de metade da sua capacidade.
Não obstante a escassez de água na zona, agudizada pelos padrões de consumo insustentáveis de uma
agricultura intensiva e superintensiva e pelos efeitos das alterações climáticas, parece, no entanto, não faltar
água para abastecer o «mar de estufas» que tem crescido no litoral alentejano.
Com os efeitos das alterações climáticas, e, consequentemente, com anos com cada vez menor precipitação
e uma agricultura intensiva que consome grande parte da água da barragem em apreço, é necessário reverter
o que se passa na região para que a água atualmente disponível não chegue também para os pequenos
agricultores e produtores que deveriam ser incentivados.
Importa ainda reverter a monopolização dos recursos hídricos utilizados para os consumos impraticáveis da
agricultura intensiva e que se desenvolva e implemente, com carácter de urgência, um plano de ação de
transição ecológica da área agrícola do PRM.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PAN propõe que
a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Promova as necessárias diligências para o cumprimento do regime da avaliação de incidências
ambientais (RN2000), do regime jurídico da avaliação de impacte ambiental e do Plano de Ordenamento do
Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina (POPNSACV), aprovado pela Resolução de Conselho
de Ministros (RCM) n.º 11-B/2011, de 4 de fevereiro, e à sua atualização de acordo com o disposto no Decreto-
Lei n.º 80/2015, de 14 de maio, pelas explorações agrícolas desenvolvidas no território em apreço;
2 – Realize um estudo onde constem os efeitos cumulativos na biodiversidade, nos solos e nos recursos
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hídricos e tecido social das explorações agrícolas do Perímetro de Rega do Mira, bem como nos valores
ecológicos e paisagísticos do PNSACV;
3 – Promova e diligencie a concessão pública da utilização dos recursos hídricos da área de influência do
Perímetro de Rega do Mira;
4 – Desenvolva e implemente um plano de ação de transição ecológica da área agrícola do Perímetro de
Rega do Mira.
Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.