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Terça-feira, 29 de março de 2022 II Série-A — Número 1

XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)

S U M Á R I O

Resolução: (a)

Constituição de uma comissão eventual de verificação de poderes dos Deputados eleitos. Projetos de Regimento (n.os 1 a 3/XV/1.ª):

N.º 1/XV/1.ª (BE) — Repõe a realização de debates quinzenais, reforçando o escrutínio parlamentar ao governo (primeira alteração ao Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto). N.º 2/XV/1.ª (IL) — Regresso dos debates quinzenais com o Primeiro-Ministro na Assembleia da República (primeira alteração ao Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto). N.º 3/XV/1.ª (PAN) — Repõe os debates quinzenais, assegura mais transparência no funcionamento da Assembleia República e garante mais direitos Deputados Únicos Representantes de um Partido, procedendo à primeira alteração ao Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto. Projetos de Lei (n.os 1 a 9/XV/1.ª):

N.º 1/XV/1.ª (PCP) — Reforça os direitos dos trabalhadores no regime de trabalho noturno e por turnos. N.º 2/XV/1.ª (PCP) — Repõe os valores de pagamento do trabalho suplementar, para todos os trabalhadores (décima

nona alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do Trabalho e décima primeira alteração à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas). N.º 3/XV/1.ª (PCP) — Repõe o princípio do tratamento mais favorável do trabalhador, elimina a caducidade da contratação coletiva e regula a sucessão de convenções coletivas de trabalho (décima nona alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro). N.º 4/XV/1.ª (BE) — Elimina os vistos gold (oitava alteração ao regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional). N.º 5/XV/1.ª (BE) — Regula as condições em que a morte medicamente assistida não é punível e altera o Código Penal. N.º 6/XV/1.ª (PAN) — Alarga a tutela criminal dos animais, procedendo à quinquagésima sexta alteração do Código Penal. N.º 7/XV/1.ª (CH) — Aumenta o valor relativo ao complemento especial de pensão dos antigos combatentes. N.º 8/XV/1.ª (PAN) — Alarga os prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e do crime de mutilação genital feminina, procedendo à alteração do Código Penal. N.º 9/XV/1.ª (PAN) — Estabelece a remuneração obrigatória dos estágios profissionais para o acesso ao exercício da

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profissão, procedendo à primeira alteração da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, e dos estatutos de diversas associações públicas profissionais. Projetos de Resolução (n.os 1 a 7/XV/1.ª):

N.º 1/XV/1.ª (PS, PSD, CH, IL, PCP e BE) — Constituição de uma comissão eventual de verificação de poderes dos Deputados eleitos. N.º 2/XI/1.ª (PCP) — Aumento do salário mínimo nacional. N.º 3/XV/1.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a reposição, criação e valorização das carreiras na Administração Pública e a revogação do SIADAP. N.º 4/XV/1.ª (PCP) — Pela urgente negociação da tabela remuneratória única da Administração Pública tendo em vista assegurar a sua proporcionalidade.

N.º 5/XV/1.ª (L) — Recomenda ao Governo a criação do Programa 3C – Casa, conforto e clima – para combater a pobreza energética e o desconforto térmico no País, de forma sustentável e comportável, contribuindo para a luta contra as alterações climáticas. N.º 6/XV/1.ª (L) — Declarando Vladimir Putin responsável por crimes de guerra e instando as autoridades nacionais a participarem do esforço internacional de investigação, acusação, condenação e punição de todos os crimes de guerra na Ucrânia. N.º 7/XV/1.ª (PAN) — Adaptação do Plano Nacional da Água às alterações climáticas, como medida de combate à seca. (a) Publicada em Suplemento.

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PROJETO DE REGIMENTO N.º 1/XV/1.ª

REPÕE A REALIZAÇÃO DE DEBATES QUINZENAIS, REFORÇANDO O ESCRUTÍNIO PARLAMENTAR

AO GOVERNO (PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO REGIMENTO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA N.º 1/2020,

DE 31 DE AGOSTO)

Exposição de motivos

As possibilidades de escrutínio e fiscalização do governo pela Assembleia da República foram reduzidas com

a entrada em vigor do Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto. Este novo

Regimento, que substituiu a vigência do Regimento da Assembleia da República n.º 1/2007, de 20 de agosto,

que foi aprovado com os votos das bancadas do PS e PSD e, entre outros, eliminaram os debates quinzenais

com o primeiro-ministro.

O período em que o novo Regimento esteve em vigor mostrou como a decisão de acabar com os debates

quinzenais foi errada. Num momento do desenvolvimento dos sistemas democráticos em que exista um maior

clamor por transparência e fiscalização, a decisão foi em contraciclo com esta pretensão popular. E se o erro já

era visível e notório no período em que estávamos perante um Governo minoritário, isso ainda é absolutamente

incontornável num período em que o País terá um Governo com apoio maioritário na Assembleia da República.

É conhecida a tentação autocrática dos governos maioritários. Num contexto em que essa maioria de apoio

ao Governo pode condicionar a fiscalização realizada pela Assembleia da República e em que o Presidente da

República também fica com menor capacidade de ação face à condução governativa, é inquestionável o valor

democrático do reforço das possibilidades de escrutínio a realizar pela Assembleia da República. Foi, aliás, esse

o pensamento que levou à introdução dos debates quinzenais com o primeiro-ministro, ponto alto da fiscalização

parlamentar da ação governativa. E, certamente não alheio a esta pretensão democrática, já foi demonstrada a

abertura para a realização destes debates pelo atual Primeiro-Ministro. A presente iniciativa permitirá revelar se

essa disponibilidade para o debate é verdadeira.

No momento em que se inicia uma nova legislatura, que previsivelmente será das mais longas do período

democrático conduzidas por um governo com maioria absoluta, é imprescindível repor a realização dos debates

quinzenais na Assembleia da República com a presença do primeiro-ministro. É esse o objetivo desta iniciativa.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de regimento:

Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma procede à primeira alteração do Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de

31 de agosto.

Artigo 2.º

Alteração ao Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto

Os artigos 224.º e 225.º do Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto, passam a

ter a seguinte redação:

«Artigo 224.º

Debate com o primeiro-ministro

1 – O primeiro-ministro comparece quinzenalmente perante o Plenário para uma sessão de perguntas dos

Deputados, em data fixada pelo Presidente da Assembleia, ouvidos o governo e a Conferência de Líderes.

2 – A sessão de perguntas desenvolve-se em dois formatos alternados:

a) No primeiro, o debate é aberto por uma intervenção inicial do primeiro-ministro, por um período não

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superior a 10 minutos, a que se segue a fase de perguntas dos Deputados desenvolvida numa única volta;

b) No segundo, o debate inicia-se com a fase de perguntas dos Deputados desenvolvida numa única volta.

3 – Cada grupo parlamentar dispõe de um tempo global para efetuar as suas perguntas, podendo utilizá-lo

de uma só vez ou por diversas vezes.

4 – Cada pergunta é seguida, de imediato, pela resposta do primeiro-ministro.

5 – O primeiro-ministro dispõe de um tempo global para as respostas igual ao de cada um dos grupos

parlamentares que o questiona.

6 – No formato referido na alínea a) do n.º 2, os grupos parlamentares não representados no governo

intervêm por ordem decrescente da sua representatividade, a que se seguem os grupos parlamentares

representados no governo por ordem crescente de representatividade.

7 – No formato referido na alínea b) do n.º 2, os grupos parlamentares intervêm por ordem decrescente da

sua representatividade, sendo, porém, concedida prioridade de acordo com a grelha constante em anexo.

8 – No formato referido na alínea b) do n.º 2, o primeiro-ministro pode solicitar a um dos ministros presentes

que complete ou responda a determinada pergunta.

9 – Os tempos globais dos debates e a sua distribuição constam das grelhas de tempos em anexo.

10 – O governo, no formato referido na alínea a) do n.º 2, e os grupos parlamentares, no formato referido na

alínea b) do n.º 2, comunicam à Assembleia da República e ao Governo, respetivamente, com a antecedência

de vinte e quatro horas, os temas das suas intervenções.

Artigo 225.º

Debate com os ministros

1 – Cada ministro deve comparecer perante o Plenário pelo menos uma vez por sessão legislativa, para uma

sessão de perguntas dos Deputados.

2 – O debate incide sobre todas as matérias constantes das áreas tuteladas pelo ministro, que, para o efeito,

poderá fazer -se acompanhar da sua equipa ministerial.

3 – O Presidente da Assembleia fixa, com um mês de antecedência, as datas para a realização dos debates

referidos no número anterior, ouvidos o governo e a Conferência de Líderes.

4 – O debate tem a duração máxima de 120 minutos, cabendo à Conferência de Líderes fixar a distribuição

das perguntas de acordo com a representatividade de cada grupo parlamentar.

5 – Cada pergunta tem a duração máxima de dois minutos, sendo, de imediato, seguida pela resposta do

ministro, em tempo igual, havendo direito a réplica com a duração máxima de um minuto.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins — Joana

Mortágua — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE REGIMENTO N.º 2/XV/1.ª

REGRESSO DOS DEBATES QUINZENAIS COM O PRIMEIRO-MINISTRO NA ASSEMBLEIA DA

REPÚBLICA (PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO REGIMENTO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA N.º 1/2020, DE

31 DE AGOSTO)

Em 1996, num período de governação do Partido Socialista liderado por António Guterres, consensualizou-

se o modelo de debate mensal com o primeiro-ministro. Mais tarde, em 2007, com a revisão do Regimento da

Assembleia da República, um novo modelo de debates quinzenais foi consensualizado na Comissão de

Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tendo sido um dos últimos pontos acertados no

grupo de trabalho coordenado pelo Deputado socialista António José Seguro. O novo modelo consistia em

debates quinzenais com o primeiro-ministro em dois formatos alternados, sendo um iniciado por uma intervenção

do primeiro-ministro e outro iniciado por perguntas dos partidos.

Ao longo dos anos, depois de colocado o modelo em prática, surgiram várias críticas aos debates quinzenais.

Alguns consideraram que o Plenário do debate se tornou numa tarde de perguntas e respostas rápidas, com

pouco escrutínio efetivo, mas muito mediatismo. Muitas vezes o ambiente tornou-se também demasiado

crispado, sendo recorrente as vezes que o primeiro-ministro não respondia às perguntas dos partidos, ora por

não querer, ora por não ser a pessoa mais indicada para responder. Também eram recorrentes as queixas de

quem estava no governo de que o primeiro-ministro despendia praticamente dois dias de trabalho, um a preparar

o debate e outro no próprio debate, com este modelo.

Face a estas críticas, as quais efetivamente merecem atenção, o Partido Socialista e o Partido Social

Democrata decidiram, em 2020, que o melhor seria acabar com os debates quinzenais, tendo o bloco central

aprovado contra todos os restantes partidos um novo modelo: Debates mensais com o Governo, alternados

entre primeiro-ministro e um ministro setorial. Na prática, o primeiro-ministro só está de dois em dois meses a

prestar contas na Assembleia da República.

O que o bloco central fez foi retroceder mais de 20 anos no que toca ao escrutínio parlamentar do governo.

De debates mensais, Portugal passou para debates quinzenais e passou na prática, infelizmente, para debates

bimestrais com o primeiro-ministro. Com os recentes resultados das eleições legislativas de janeiro de 2022, os

quais culminaram numa maioria absoluta do Partido Socialista, a falta de escrutínio parlamentar ao primeiro-

ministro tornou-se ainda mais gravosa. Tal facto foi até reconhecido em parte pelo próprio Partido Socialista, o

qual, depois do Iniciativa Liberal ter proposto publicamente o regresso dos debates quinzenais dias após as

eleições, admitiu estar disponível para dialogar e encontrar um modelo alternativo ao atual.

No presente do projeto de regimento, o Grupo Parlamentar do Iniciativa Liberal propõe o regresso dos

debates quinzenais com o primeiro-ministro, com pequenas alterações ao modelo que constava na anterior

versão do Regimento da Assembleia da República.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do

IL abaixo assinado apresenta o seguinte projeto de regimento:

Artigo 1.º

Objeto

O presente Regimento estabelece os debates quinzenais com o primeiro-ministro, para tal procedendo à

primeira alteração ao Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto.

Artigo 2.º

Alteração ao Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto

Os artigos 224.º e 225.º do Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto, passa a ter

a seguinte redação:

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«Artigo 224.º

Debate com o primeiro‐ministro

1 – O Primeiro‐Ministro comparece quinzenalmente perante o Plenário para uma sessão de perguntas dos

Deputados, em data fixada pelo Presidente da Assembleia, ouvidos o governo e a Conferência de Líderes.

2 – A sessão de perguntas desenvolve‐se em dois formatos alternados:

a) No primeiro, o debate é aberto por uma intervenção inicial do Primeiro‐Ministro, por um período não

superior a 10 minutos, a que se segue a fase de perguntas dos Deputados desenvolvida numa única volta;

b) No segundo, o debate inicia‐se com a fase de perguntas dos Deputados desenvolvida numa única volta.

3 – Cada partido com representação parlamentar dispõe de um tempo global para efetuar as suas perguntas,

podendo utilizá‐lo de uma só vez ou por diversas vezes.

4 – Cada pergunta é seguida, de imediato, pela resposta do primeiro‐ministro.

5 – O primeiro‐ministro dispõe de um tempo global para as respostas igual ao de cada um dos partidos com

representação parlamentar que o questiona.

6 – No formato referido na alínea a) do n.º 2, os partidos não representados no governo intervêm por ordem

decrescente da sua representatividade, a que se seguem os partidos representados no governo por ordem

crescente de representatividade.

7 – No formato referido na alínea b) do n.º 2, os partidos com representação parlamentar intervêm por ordem

decrescente da sua representatividade, sendo, porém, concedida prioridade alternadamente a diferentes

partidos na primeira pergunta de acordo com a grelha aprovada no início da legislatura, nos termos do n.º 9.

8 – O primeiro-ministro é responsável pelas respostas às perguntas formuladas, mas pode solicitar a um dos

membros do governo presentes que complete ou responda a determinada pergunta.

9 – Os tempos globais dos debates e a ordem de colocação de perguntas constam das grelhas de tempos

aprovadas no início da legislatura, atendendo à representatividade de cada partido.

Artigo 225.º

Debate com os ministros

1 – Cada ministro deve comparecer perante o Plenário pelo menos uma vez por sessão legislativa, para uma

sessão de perguntas dos Deputados.

2 – O debate incide sobre todas as matérias constantes das áreas tuteladas pelo ministro, que, para o efeito,

poderá fazer‐se acompanhar da sua equipa ministerial.

3 – O Presidente da Assembleia fixa, com um mês de antecedência, as datas para a realização dos debates

referidos no número anterior, ouvidos o governo e a Conferência de Líderes.

4 – Cada partido com representação parlamentar dispõe de um tempo global para efetuar as suas perguntas,

podendo utilizá‐lo de uma só vez ou por diversas vezes.

5 – Cada pergunta é seguida, de imediato, pela resposta do ministro.

6 – O ministro dispõe de um tempo global para as respostas igual ao de cada um dos partidos com

representação parlamentar que o questiona.

7 – Os partidos com representação parlamentar intervêm por ordem decrescente da sua representatividade,

sendo, porém, concedida prioridade alternadamente a diferentes partidos na primeira pergunta de acordo com

a grelha aprovada no início da legislatura, nos termos do número seguinte.

8 – Os tempos globais dos debates e a ordem de colocação de perguntas constam das grelhas de tempos

aprovadas no início da legislatura, atendendo à representatividade de cada partido.»

Artigo 3.º

Disposição transitória

A Conferência de Líderes aprova até 15 dias após a publicação do presente Regimento as grelhas de tempos

previstas no Regimento.

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Artigo 4.º

Entrada em vigor

O presente Regimento entra em vigor 20 dias após a sua publicação.

Palácio de São Bento, 29 de março de 2022.

Os Deputados do IL: Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos Guimarães Pinto — Joana Cordeiro — João

Cotrim Figueiredo — Patrícia Gilvaz — Rodrigo Saraiva — Rui Rocha.

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PROJETOS DE REGIMENTO N.º 3/XV/1.ª

REPÕE OS DEBATES QUINZENAIS, ASSEGURA MAIS TRANSPARÊNCIA NO FUNCIONAMENTO DA

ASSEMBLEIA REPÚBLICA E GARANTE MAIS DIREITOS DEPUTADOS ÚNICOS REPRESENTANTES DE

UM PARTIDO, PROCEDENDO À PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO REGIMENTO DA ASSEMBLEIA DA

REPÚBLICA N.º 1/2020, DE 31 DE AGOSTO

Exposição de motivos

O regimento da Assembleia da República é um instrumento jurídico, que constitui um dos pilares

fundamentais da nossa democracia. E é-o, não só porque, conforme afirma Michela Manetti1, é a expressão do

poder deste órgão de soberania se autorregular, correspondendo à disciplina jurídica da prática parlamentar

reconhecida e aceite por todas as forças políticas e pelos membros que a integram; mas também porque,

conforme sublinha Jorge Miranda2, é o instrumento que, concretizando com completa autonomia as regras do

jogo democrático, garante a liberdade de ação dos Deputados e dos grupos parlamentares, realiza o princípio

representativo e manifesta o poder deste órgão de soberania perante os demais órgãos do Estado.

Pela sua importância, o Regimento da Assembleia da República deverá consagrar soluções jurídicas

permanentes e estáveis que, garantindo um funcionamento democrático e plural deste órgão de soberania,

evitem que, a cada nova legislatura, tenha de haver a abertura de exceções à letra do Regimento com

pronunciamentos da Conferência de Líderes caso-a-caso, conforme tem ocorrido nas últimas legislaturas.

Contudo, e não obstante o exposto, a Assembleia da República tem de ser capaz de verificar se as suas

disposições regimentais têm adesão à realidade ou se carecem de revisão.

Na opinião do PAN, apesar de o atual regimento estar em vigor a apenas há 1 ano e meio, há um conjunto

de disposições que carecem de uma revisão para assegurar que este instrumento jurídico tem uma maior adesão

à realidade e se encontra em conformidade com um conjunto de legislação recentemente aprovada. Em

concreto, o atual Regimento enquadra e regula os grupos parlamentares de amizade com parlamentos de outros

países. No entanto, nada dispõe sobre o que sucede no caso de esses países praticarem um ato de agressão

contra outro Estado, como o que está a ser praticado pela Rússia relativamente à Ucrânia. Outro caso liga-se

ao disposto no artigo 27.º da Lei de Bases do Clima, aprovada recentemente pela Lei n.º 98/2021, de 31 de

dezembro, que exige que no âmbito dos processos legislativos exista uma avaliação de impacte legislativo

climático, disponível no momento da apreciação das iniciativas legislativas, contudo, o regimento nada

concretiza relativamente a este concreto aspeto desta lei no âmbito da regulação do processo legislativo.

Por isso mesmo, o PAN entende que o início da XV Legislatura deverá levar a uma alteração cirúrgica do

Regimento que o adeque à realidade existente, designadamente ao contexto de maioria absoluta resultante das

1 Michela Manetti, La Legittimazione del Diritto Parlamentare, Dott. A. Giurrfè Editore, 1990, pp 3 e 10. 2 Jorge Miranda, Direito Constitucional, III, AAFDL, 2001, pp. 203 a 206, e Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo II, Coimbra Editora, 2006, página 595.

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últimas eleições para a Assembleia da República. Assim, com o presente projeto de regimento, o PAN propõe

cinco níveis de alterações.

Em primeiro lugar, queremos assegurar que, num contexto de maioria absoluta, a Assembleia da República

vê reforçada as funções de controlo político e de escrutínio da ação governativa, que são funções primordiais

dos parlamentos. Desta forma, entre outras medidas propomos a reposição dos debates quinzenais com o

primeiro-ministro, uma figura introduzida, também num contexto de maioria absoluta, por proposta do PS no

Regimento da Assembleia da República n.º 1/2007, de 20 de agosto, e extinta na última legislatura por acordo

do PS e do PSD, o que representou um retrocesso para a nossa democracia.

Conforme explica António José Seguro3, a reforma que introduziu este modelo de debate, em 2007, procurou

assegurar uma maior centralidade do Parlamento no debate político e permitir um maior controlo sobre a ação

política do governo. O referido autor lembra que a institucionalização dos debates com o primeiro-ministro na

nossa democracia demorou duas décadas e meia, surgindo com as sessões de perguntas ao primeiro-ministro

(que, até 2007, exigiam o conhecimento prévio das perguntas dos deputados), sendo antes disso de destacar

os debates de urgência (introduzidos em 1993) e a prática dos debates sem regularidade definida iniciados, em

1995, durante o Governo de António Guterres. Com a reintrodução da figura dos debates quinzenais o PAN

pretende que o Parlamento seja não só o centro do debate político, mas também que o governo e o primeiro-

ministro sejam sujeitos a um escrutínio regular para que a maioria absoluta não se transforme em poder absoluto.

Em segundo lugar, queremos prosseguir o rumo de reforço dos direitos dos Deputados únicos representantes

de um partido, iniciado na XIII Legislatura, uma vez que as últimas eleições para a Assembleia da República

demonstraram que esta realidade veio para ficar, pelo que não se compadece com soluções excecionais

casuísticas, e que, de uma vez por todas, deverá ser objeto de um tratamento equilibrado e não-discriminatório

no âmbito do Regimento da Assembleia da República. Procura-se, assim, impedir que uma parte significativa

do eleitorado não seja silenciada nos trabalhos parlamentares e evitar a situação que vem ocorrendo desde a

XIII Legislatura, em que os direitos destes Deputados ficam dependentes da benevolência da Conferência de

Líderes e dos grupos parlamentares.

Conforme afirma Maria Lúcia Amaral4, «os partidos políticos são associações livres de cidadãos que se

constituem não apenas para identificar, agregar e apresentar ao público as grandes alternativas existentes

quanto ao modo de condução da vida coletiva mas, mais do que isso, para dar cumprimento a essas mesmas

alternativas através da assunção da titularidade dos órgãos de poder». Ora, sendo certo que um princípio de

representatividade pode trazer a atribuição de mais direitos aos grupos parlamentares e, dentro destes, aos

grupos parlamentares de maiores dimensões, não menos certo é que os Deputados únicos representantes de

um partido têm de dispor de mecanismos de ação parlamentar que lhe permitam assumir a plena titularidade do

seu cargo e dar cumprimento à alternativa que representam no hemiciclo. Tal não está neste momento

assegurado, quando, por exemplo, um Deputado único não pode agendar uma sua iniciativa legislativa sem que

seja por via de um agendamento potestativo ou de um agendamento por arrastamento a iniciativas dos grupos

parlamentares.

Por esse motivo, neste âmbito, destacamos como principal alteração a consagração do direito dos Deputados

únicos representantes de um partido de procederem ao agendamento comum de pelo menos seis iniciativas por

sessão legislativa, fazendo-se assim uma analogia com o número de declarações políticas passíveis de serem

feitas por sessão legislativa (que propomos que passe das cinco para seis), previsto no artigo 71.º, n.º 2. A

solução proposta consagra em regimento a decisão tomada pela Conferência de Líderes na XIII Legislatura

relativamente ao Deputado único representante do PAN5 – que reconheceu o direito de agendamento comum

de três iniciativas por sessão legislativa (número de declarações políticas passíveis de serem feitas à época).

Desta forma, assegura-se um meio termo equilibrado e com um precedente sólido, entre uma situação em que

os Deputados únicos representantes de um partido podem propor dois agendamentos potestativos por

legislatura (de caráter mais solene) e a situação em que o seu direito de agendamento fica à mercê da

benevolência dos grupos parlamentares ao invés do atual silenciamento de forças políticas diretamente eleitas

à Assembleia da República e de um enfraquecimento do direito de oposição.

3 António José Seguro, A reforma do Parlamento português: O controlo político do governo, Quetzal, 2016, páginas 77 a 79. 4 Maria Lúcia Amaral, A forma da República, Coimbra Editora, 2005, página 274. 5 Cfr. Súmula n.º 9 da Conferência de Líderes, da XIII Legislatura.

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Importará ainda sublinhar que, conforme afirmam Gomes Canotilho e Vital Moreira6, «na medida (…) em que

o Governo tenha apoio maioritário permanente na Assembleia da República, a sua capacidade de determinar a

ordem de trabalhos desta é praticamente ilimitada, podendo conduzir a uma sistemática preterição das

prioridades regimentais a favor das suas propostas ou dos assuntos que lhe interessem». Assim, num contexto

de maioria absoluta como o que caracteriza a atual composição da Assembleia da República, a atribuição aos

Deputados únicos de um direito potestativo de proceder a um certo número de agendamentos comuns por

sessão legislativa poderá, pois, ser uma forma de prevenir ou mitigar este risco de um poder absoluto do governo

ou do partido maioritário na definição da agenda dos trabalhos parlamentares.

Também se propõe que seja reconhecido aos Deputados únicos representantes de um partido o direito de

integrarem formalmente a conferência de líderes, de forma a assegurar que podem ter uma participação na

definição dos aspetos estruturais da vida e funcionamento da Assembleia da República, bem como o direito a

proferir declarações de voto orais.

Em terceiro lugar, propõe-se uma maior transparência dos trabalhos das comissões parlamentares, por via

da consagração de uma restrição dos casos em que poderá haver reuniões de comissões parlamentares à porta

fechada, exigindo complementarmente obrigações extra de publicidade das deliberações tomadas. Com a

presente proposta, o PAN vem defender, de forma clara, que a regra deve ser sempre a do caráter público das

reuniões das comissões, uma vez que só assim se credibiliza a política e dá aos cidadãos as condições mínimas

necessárias para nela confiarem. Propomos que as reuniões à porta fechada só possam ocorrer em casos muito

excecionais em que o tratamento de matérias que, nos termos do regime legal aplicável, estejam sujeitas a um

dever de sigilo.

Em quarto lugar, propõe-se duas clarificações das regras regimentais referentes aos grupos parlamentares

de amizade, de forma a dar mais ênfase à necessidade de estes grupos apenas poderem ocorrer em casos em

que exista o pleno respeito pelos direitos humanos, os valores democráticos e a paz. Por um lado, propõe-se

que se consagre em Regimento a disposição que atualmente consta do artigo 2.º, n.º 3 da Resolução da

Assembleia da República n.º 6/2003, de 24 de janeiro, na sua redação atual. Tal consagração, não prejudicando

o princípio da reciprocidade e as suas exceções consagradas na referida resolução, visa tão-somente enfatizar

a necessidade de a Assembleia da República respeitar o requisito referente à exigência de que estes laços de

amizade só devam ser estabelecidos com parlamentos plurais livremente eleitos. A presente disposição procura

consciencializar a Assembleia da República, e cada um dos seus Deputados, para a necessidade de a

Assembleia da República, como órgão de soberania de Portugal, um Estado democrático de direito, pautar as

suas relações internacionais de natureza institucional pelo respeito pela democracia pluralista e pelos direitos

fundamentais. Algo que, todavia, nem sempre tem sido garantido ao longo dos últimos anos.

Por outro lado, propõe-se que o Presidente da Assembleia da República passe a poder determinar por

despacho a suspensão do funcionamento de um grupo parlamentar de amizade existente se se verificar uma

deterioração das relações diplomáticas de Portugal com o país em causa, designadamente devido a violações

graves de direitos humanos ou ao planeamento, preparação ou execução de um ato de agressão contra outro

Estado. Esta é uma solução que ganha especial importância e atualidade num contexto em que se verifica uma

invasão da Ucrânia pela Rússia e em que continuou a existir um grupo parlamentar de amizade com a Rússia.

Finalmente, em quinto lugar, o PAN propõe um conjunto de alterações tendentes a assegurar a modernização

do Regimento e do funcionamento da Assembleia da República Por um lado, cumprindo um dos compromissos

que assumimos no nosso programa eleitoral e o disposto no artigo 27.º da Lei de Bases do Clima, aprovada

pela Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro, defendemos que, a par da avaliação de impacto de género, passe a

exigir-se, também, uma avaliação prévia de impacto climático para todas as iniciativas legislativas que dão

entrada na Assembleia da República. Tal alteração traz uma consciencialização dos partidos e dos Deputados

para o estado de emergência climática que vivemos e para a necessidade de ação para assegurar o seu eficaz

combate, impondo-lhes que haja uma eventual avaliação prévia dos impactes ambientais positivos ou negativos.

Naturalmente que, atendendo ao escasso tempo existente para a discussão das alterações ao Regimento e à

complexidade associada à elaboração do seu regime jurídico, propomos que, caso esta alteração regimental

seja aprovada, só produza efeitos com a entrada em vigor do respetivo regime jurídico.

Por outro lado, propomos que as intervenções de chefes de Estado estrangeiros ou de líderes de

6 J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II, 4.ª ed., Coimbra Editora, 2010, páginas 387 e 388.

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organizações internacionais de que Portugal faça parte no âmbito das sessões solenes de boas-vindas, para

além de poderem ocorrer sob a forma presencial, possam também ocorrer por videoconferência. A recente

participação do Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, por via de videoconferência, em sessões solenes

à distância em diversos parlamentos do mundo, demonstra a necessidade de se adaptar este tipo de sessões

aos avanços tecnológicos existentes.

Nestes termos, a abaixo assinada Deputada única do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e

regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projeto de regimento:

Artigo 1.º

Objeto

O presente Regimento procede à primeira alteração ao Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020,

de 31 de agosto.

Artigo 2.º

Alteração ao Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto

São alterados os artigos 20.º, 43.º, 63.º, 71.º, 74.º, 76.º, 110.º, 131.º, 151.º, 155.º, 211.º, 224.º e 225.º do

Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto, na sua redação atual, que passam a ter a

seguinte redação:

«Artigo 20.º

[…]

1 – O Presidente da Assembleia da República reúne-se com os presidentes dos grupos parlamentares, ou

seus substitutos, e com os Deputados únicos representantes de um partido, para apreciar os assuntos previstos

na alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º e outros previstos no Regimento, sempre que o entender necessário para o

regular funcionamento da Assembleia.

2 – […].

3 – Os votos dos representantes dos grupos parlamentares e dos Deputados únicos representantes de um

partido na Conferência de Líderes reproduzem a sua representatividade na Assembleia da República.

4 – […].

Artigo 43.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – Não podem existir grupos parlamentares de amizade relativos a países com os quais Portugal não

mantenha relações diplomáticas ou que não tenham parlamentos plurais livremente eleitos.

4 – Mediante prévia auscultação das Comissões dos Negócios Estrangeiros e dos Assuntos Europeus, o

Presidente da Assembleia da República pode, oficiosamente ou na sequência de requerimento dos deputados,

determinar por despacho a suspensão do funcionamento de um grupo parlamentar de amizade existente caso

algum dos requisitos mencionados no número anterior se deixe de verificar ou se se verificar uma deterioração

das relações diplomáticas de Portugal com o país em causa, designadamente devido a violações graves de

direitos humanos ou ao planeamento, preparação ou execução de um ato de agressão contra outro Estado.

Artigo 63.º

[…]

1 – [Anterior corpo do artigo].

2 – Os Deputados únicos representantes de um partido têm o direito ao agendamento comum de seis

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iniciativas por sessão legislativa.

Artigo 71.º

[…]

1 – […].

2 – Cada Deputado único representante de um partido tem direito a produzir seis declarações políticas por

sessão legislativa e cada Deputado não inscrito tem direito a produzir duas declarações políticas por sessão

legislativa.

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – Os Deputados únicos representantes de um partido dispõem de um minuto para solicitar esclarecimentos

aos oradores e estes de igual tempo para dar explicações.

Artigo 74.º

[…]

1 – Os grupos parlamentares, os Deputados únicos representantes de um partido e o governo podem

requerer fundamentadamente ao Presidente da Assembleia da República a realização de debates de atualidade.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – […].

Artigo 76.º

[…]

1 – […].

2 – Podem ainda realizar-se sessões solenes evocativas de outros eventos ou da memória de

personalidades, por iniciativa do Presidente da Assembleia da República, bem como sessões solenes de boas-

vindas a chefes de Estado estrangeiros ou a líderes de organizações internacionais de que Portugal faça parte,

com faculdade de uso da palavra, presencialmente ou através de videoconferência, por estes convidados.

3 – […].

Artigo 110.º

[…]

1 – […].

2 – As comissões parlamentares só podem, excecionalmente e mediante deliberação fundamentada tomada

em reunião pública, reunir à porta fechada, quando o caráter reservado das matérias a tratar o justifique.

3 – Considera-se que existem matérias de caráter reservado sempre que esteja em causa o tratamento de

matérias que, nos termos do regime legal aplicável, estejam sujeitas, nomeadamente, a segredo de Estado, a

segredo de justiça ou a sigilo por tratarem de dados genéticos, biométricos ou relativos à saúde de pessoas.

4 – Das reuniões das comissões referidas no n.º 2 é lavrada e publicada uma ata, da qual devem constar o

sumário dos assuntos tratados de forma reservada, as posições dos Deputados e dos grupos parlamentares, o

resultado das votações, com discriminação dos sentidos de voto e das respetivas declarações de voto individuais

ou coletivas, a deliberação final e os elementos que a fundamentem.

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Artigo 131.º

[…]

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […];

i) O relatório da avaliação de impacto climático, elaborado nos termos do disposto no artigo 27.º da Lei de

Bases do Clima, aprovada pela Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro, e do respetivo regime jurídico.

j) [Anterior alínea i)].

3 – […].

4 – […].

Artigo 151.º

[…]

1 – […].

2 – A deliberação prevista no número anterior depende de requerimento de, pelo menos, dez Deputados, de

um Deputado único representante de um partido ou de um grupo parlamentar.

3 – […].

Artigo 155.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – Em cada reunião plenária os Deputados únicos representantes de um partido têm o direito a produzir

uma declaração de voto oral por tempo não superior a um minuto, que poderá versar sobre uma votação final

global ou o conjunto de várias votações finais globais ocorridas nessa reunião.

Artigo 211.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – Concluído o debate e a votação na especialidade, cada Deputado único representante de um partido e

cada grupo parlamentar, por ordem crescente de representatividade, e o governo, que encerra, têm direito a

efetuar declarações que antecedem a votação final global.

6 – […].

7 – […].

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Artigo 224.º

Debate com o primeiro-ministro

1 – O primeiro-ministro comparece quinzenalmente perante o Plenário para uma sessão de perguntas dos

Deputados, em data fixada pelo Presidente da Assembleia, ouvidos o governo e a Conferência de Líderes.

2 – A sessão de perguntas desenvolve-se em dois formatos alternados:

a) No primeiro, o debate é aberto por uma intervenção inicial do primeiro-ministro, por um período não

superior a dez minutos, a que se segue a fase de perguntas dos Deputados desenvolvida numa única volta;

b) No segundo, o debate inicia-se com a fase de perguntas dos Deputados desenvolvida numa única volta.

3 – Cada grupo parlamentar e Deputado único representante de um partido dispõe de um tempo global para

efetuar as suas perguntas, podendo utilizá-lo de uma só vez ou por diversas vezes.

4 – Cada pergunta é seguida, de imediato, pela resposta do primeiro-ministro.

5 – O primeiro-ministro dispõe de um tempo global para as respostas igual ao de cada um dos partidos que

o questiona.

6 – No formato referido na alínea a) do n.º 2, os partidos não representados no Governo intervêm por ordem

decrescente da sua representatividade, a que se seguem os grupos parlamentares representados no governo

por ordem crescente de representatividade.

7 – No formato referido na alínea b) do n.º 2, os partidos intervêm por ordem decrescente da sua

representatividade, sendo, porém, concedida prioridade de acordo com a grelha aprovada no início da

legislatura.

8 – No formato referido na alínea b) do n.º 2, o primeiro-ministro pode solicitar a um dos ministros presentes

que complete ou responda a determinada pergunta.

9 – Os tempos globais dos debates e a sua distribuição constam das grelhas de tempos aprovadas no início

da legislatura.

10 – O Governo, no formato referido na alínea a) do n.º 2, e os grupos parlamentares, no formato referido na

alínea b) do n.º 2, comunicam à Assembleia da República e ao governo, respetivamente, com a antecedência

de vinte e quatro horas, os temas das suas intervenções.

Artigo 225.º

Debate com os ministros

1 – Cada ministro deve comparecer perante o Plenário pelo menos uma vez por sessão legislativa, para uma

sessão de perguntas dos Deputados.

2 – O debate incide sobre todas as matérias constantes das áreas tuteladas pelo ministro, que, para o efeito,

poderá fazer-se acompanhar da sua equipa ministerial.

3 – O Presidente da Assembleia fixa, com um mês de antecedência, as datas para a realização dos debates

referidos no número anterior, ouvidos o governo e a Conferência de Líderes.

4 – O debate tem a duração máxima de cento e vinte minutos, cabendo à Conferência de Líderes fixar a

distribuição das perguntas de acordo com a representatividade de cada partido.

5 – Cada pergunta tem a duração máxima de dois minutos, sendo, de imediato, seguida pela resposta do

ministro, em tempo igual, havendo direito a réplica com a duração máxima de um minuto.»

Artigo 3.º

Norma revogatória

É revogado o número 3, do artigo 59.º do Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de

agosto, na sua atual redação.

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Artigo 4.º

Entrada em vigor e produção de efeitos

1 – A presente alteração entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a alteração ao artigo 131.º do Regimento da Assembleia

da República n.º 1/2020, de 31 de agosto, só produz efeitos com a entrada em vigor do regime jurídico da

avaliação de impacte ambiental.

Palácio de São Bento, 29 de março de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE LEI N.º 1/XV/1.ª

REFORÇA OS DIREITOS DOS TRABALHADORES NO REGIME DE TRABALHO NOTURNO E POR TURNOS

O horário de trabalho, a sua fixação e cumprimento, o respeito pelos tempos de descanso, as respetivas

condições de pagamento e de compensação, e a sua articulação com a vida pessoal e familiar, são matérias

que assumem uma enorme atualidade. Nos dias de hoje, estas matérias são alvo de ataque por parte do

patronato e justificam a mais firme e corajosa luta e reivindicação dos trabalhadores.

Em 1866, a Associação Internacional dos Trabalhadores apresentou a reivindicação universal dos três 8x8x8

– oito horas de trabalho diário, oito para lazer, convívio familiar e cultura, oito para dormir e descansar – que

esteve na base da criação de uma jornada de trabalho que constituiu o marco histórico de uma sociedade mais

justa e socialmente saudável.

A este avanço civilizacional, o capital foi resistindo e respondendo com instrumentos ardilosos para tornear

e afastar a lei, transformando todo o período normal de trabalho em tempo de trabalho efetivo, eliminando

pausas, inventando as mais diversas «flexibilizações» e aumentando por esta via a intensidade e ritmos de

trabalho.

Depois do percurso histórico de lutas que conquistaram as 8 horas diárias de trabalho e 40 horas semanais

em cinco dias, os trabalhadores enfrentam desde há vários anos o desafio de resistir à regressão de direitos.

Sob a capa da urgência na melhoria da competitividade que nunca passará por aí, sucessivas alterações à

legislação laboral resultaram sempre em degradação dos direitos dos trabalhadores, corporizando novos

conceitos, que apenas recuperam velhas ideias de desumanização do trabalho (adaptabilidades, bancos de

horas, entre outros).

É incontestável que o trabalho diurno é o trabalho adequado ao ser humano, e que o trabalho noturno, de

uma maneira geral, é causa de graves danos. Porque o organismo funciona em estado de desativação,

investigações científicas mostraram já que o trabalho noturno exige um esforço suplementar; que o sono em

estado de reativação diurna é um sono mais curto (cerca de 2 ou 3 horas a menos do que o sono de noite) e de

uma qualidade menor; e que o trabalho noturno provoca perturbações de sono, vigílias frequentes. e outras

perturbações neuro-psíquicas, irritabilidade, agressividade, esgotamentos, astenia, tendências depressivas.

Um estudo realizado na Dinamarca junto de 7000 mulheres, e publicitado pela Associação de Luta contra o

Cancro e pelos sindicatos, revela que o risco de desenvolver um cancro no seio é cerca de 50% mais elevado

nas mulheres com idades compreendidas entre os 30 e os 54 anos tendo trabalhado de noite pelo menos metade

do ano, do que nas mulheres da mesma idade trabalhando durante o dia; e que nas mulheres tendo trabalhado

de noite durante 6 anos, o risco sobe para 70%.

Tais investigações científicas vieram dar razão aos que contestaram a diretiva da União Europeia e a

Convenção da OIT, que, em nome da igualdade, impuseram o levantamento na indústria da proibição do trabalho

noturno das mulheres.

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O princípio e a lei devem, pois, partir da afirmação da excecionalidade do trabalho noturno.

O conceito de trabalho noturno deve ser clarificado, fixando esse período das 20h às 7h do dia seguinte; bem

como deve estabelecer-se, relativamente ao trabalho noturno, que ainda mais nesse caso não deve ser praticada

a adaptabilidade dos horários de trabalho. A média deve ser apenas semanal para as atividades que não

envolvam especial penosidade.

Na organização do trabalho por turnos, importa fixar algumas regras que impeçam abusos na aplicação do

sistema de turnos 3x8; estabelecer para este sistema a redução semanal do horário de trabalho. Nos casos de

dias de descanso rotativos, importa estabelecer a periodicidade no seu gozo ao sábado e domingo, estabelecer

ciclos curtos para a equipa noturna e criar para os trabalhadores noturnos mais um intervalo de descanso, além

do já consagrado, no período de especial sonolência.

Sem prejuízo da reposição das condições de pagamento das indemnizações por despedimentos, garantindo

condições mais favoráveis aos trabalhadores, propõe-se que, no imediato, o subsídio de turno seja contabilizado

para efeitos do cálculo de compensação por despedimento.

Uma atenção especial deve ser dada às normas que garantam a saúde e a segurança dos trabalhadores,

determinando-se exames necessários, com uma periodicidade de seis meses. Por tudo o que foi acima citado,

para além das regras especiais que protegem os menores e a maternidade, impõem-se exames e garantias

especiais para as mulheres, nomeadamente através do rastreio do cancro da mama.

Com este projeto de lei, o PCP reconhece as características penosas específicas deste regime de trabalho

e propõe medidas de limitação, salvaguarda e reparação dos seus efeitos:

• Limitação do trabalho noturno e por turnos às situações que sejam, técnica e socialmente justificadas,

desde que sejam garantidas condições de segurança, de proteção da saúde, de garantia de proteção da

maternidade e paternidade, de infraestruturas e serviços sociais compatíveis com este tipo de horários de

trabalho e sejam fixadas por negociação e contratação coletiva subsídios e compensações adequadas aos

trabalhadores abrangidos;

• Clarificação do conceito de trabalho noturno retomando a sua fixação com início às 20h e até às 7h; não

aplicação de mecanismos de desregulamentação do horário de trabalho relativamente ao horário de trabalho

noturno e por turnos;

• Limitar o recurso ao sistema de turnos 3x8 e estabelecer mesmo para este sistema a redução semanal

do horário de trabalho;

• Estabelecer periodicidade no gozo dos dias de descanso rotativos mesmo ao sábado e domingo;

• Obrigatoriedade de realização de exames médicos necessários, cuja periodicidade dever ser de seis

meses;

• Estabelecimento do valor mínimo de subsídio de turno;

• Reconhecimento do direito a uma antecipação da idade de reforma para o regime de trabalho por turnos,

devido ao desgaste e penosidade deste tipo de prestação de trabalho.

• Reconhecimento do direito a uma bonificação no cálculo da pensão de reforma com um acréscimo à taxa

global de formação em mais 0,2% por cada ano de trabalho em regime de turnos ou noturno.

• Aumento da taxa social única a pagar pelas entidades patronais que recorram ao trabalho por turnos ou

noturno.

• Reconhecimento do direito a sair do regime de turnos, passando para o horário diurno, após trabalhar 20

anos neste regime ou quando o trabalhador tiver 55 anos de idade, sem perda do subsídio que usufrui à data,

sem prejuízo das condições mais favoráveis consagradas nos instrumentos de regulamentação coletiva de

trabalho.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei altera o regime de organização dos tempos de trabalho, em regime de trabalho noturno e por

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turnos, define a retribuição relativa ao trabalho por turnos e facilita a idade da reforma para os trabalhadores em

regime de trabalho por turnos, procedendo à décima nona alteração do Código do Trabalho aprovado pela Lei

n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e altera o artigo 161.º n.º 2 da Lei de Trabalho em Funções Públicas, aprovada

pela Lei n.º 34/2014, de 20 de junho.

Artigo 2.º

Âmbito de aplicação

1 – O disposto na presente lei, aplica-se aos trabalhadores em regime de trabalho noturno e por turnos, no

âmbito das relações laborais contempladas pelo Código do Trabalho e instrumentos de regulamentação coletiva

de trabalho.

2 – A presente lei aplica-se, com as necessárias adaptações, ao regime de trabalho noturno e por turnos

previsto na Lei de Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, e posteriores

alterações, salvo se a sua previsão for mais favorável ao trabalhador.

Artigo 3.º

Alterações ao Código do Trabalho

Os artigos 58.º, 74.º, 220.º, 221.º, 222.º, 223.º, 225.º, 238.º e 366.º do Código do Trabalho, aprovado pela

Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 58.º

[…]

1 – A trabalhadora grávida, puérpere ou lactante tem direito a ser dispensada de prestar trabalho em horário

de trabalho organizado de acordo com regime de adaptabilidade, de banco de horas, de horário concentrado ou

detrabalho por turnos, até dois anos após o parto e/ou enquanto a trabalhadora estiver a amamentar.

2 – […].

3 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 74.º

[…]

1 – Os menores são dispensados de prestar trabalho em horário organizado de acordo com o regime de

adaptabilidade, banco de horas, horário concentrado, trabalho noturno ou por turnos.

2 – […].

3 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 220.º

[…]

1 – […].

2 – [Novo] O trabalho por turnos só pode ser prestado, nos casos devidamente justificados e

fundamentados, nomeadamente, nos casos em que o trabalho, pela sua natureza, não possa sofrer

interrupções ou se torne indispensável para prevenir ou reparar prejuízos graves para a empresa ou para

a sua viabilidade.

3 – [Novo] O trabalhador não pode ser obrigado a prestar trabalho por turnos, sem antes ter dado o

seu acordo por escrito.

4 – [Novo] A entidade patronal que organize um regime de trabalho por turnos deve ter um registo de

onde conste a justificação daquele regime e um registo separado dos trabalhadores incluídos em cada

turno.

5 – [Novo] Cabe à entidade patronal a prova da necessidade da organização do trabalho por turnos.

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6 – [Novo] Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 2, 3 e 4 deste artigo.

Artigo 221.º

[…]

1 – Devem ser organizados turnos de pessoal diferente sempre que o período de funcionamento ultrapasse

os limites máximos do período normal de trabalho.

2 – Os turnos, incluindo os regimes de escalas rotativas, devem ser organizados de acordo com os

interesses e as preferências manifestados pelos trabalhadores, ouvidos os representantes eleitos pelos

trabalhadores para a área da segurança e saúde no trabalho e mediante parecer obrigatório da comissão

de trabalhadores, nos termos do disposto nos artigos 425.º e 426.º do Código do Trabalho ou, na falta

desta, às associações sindicais representativas dos trabalhadores.

3 – [Novo] Aos trabalhadores em regime de trabalho por turnos devem ser formalmente, prestadas

informações sobre:

a) O regime de trabalho por turnos e suas consequências para a saúde do trabalhador;

b) Os Serviços de Segurança e Saúde existentes na empresa e seu funcionamento;

c) Informação jurídico-legal do regime do trabalho por turnos.

4 –A duração de trabalho de cada turno não pode ultrapassar 6 horas de trabalho diário e deve ser

interrompido para pausa e/ou refeição por um período mínimo de 30 minutos, de modo que o trabalhador

não preste mais de 4 horas consecutivas de trabalho, salvo se for aplicável regime mais favorável ao

trabalhador previsto em Instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

5 – [Novo] O intervalo para pausa e/ou refeição, previsto no número anterior, é considerado como

prestação efetiva de trabalho.

6 – [Novo] Aos trabalhadores em regime de trabalho por turnos não é aplicável horário organizado de

acordo com qualquer regime de adaptabilidade, banco de horas e horário concentrado.

7 – [Novo] A organização dos turnos deve ser comunicada e afixada no início de cada ano civil.

8 – [Anterior n.º 4].

9 – Os turnos no regime de laboração contínua e os de trabalhadores que asseguram serviços que não

podem ser interrompidos, nomeadamente nas situações a que se referem as alíneas d) e e) do n.º 2 do artigo

207.º, devem ser organizados de modo que os trabalhadores de cada turno gozem, pelo menos, um dia de

descanso em cada período de quatro dias, e um sábado e domingo completos em cada período de quatro

semanas, sem prejuízo do período excedente de descanso a que tenham direito.

10 – [Novo] A cada período de 5 anos em trabalho por turnos, o trabalhador pode optar por trabalho

em regime de horário diurno fixo por período igual sem perda do subsídio de turno.

11 – [Novo] O trabalhador em regime de trabalho por turnos, após trabalhar 20 anos neste regime ou

atingindo os 55 anos de idade, pode optar por um regime de trabalho em horário fixo diurno, sem perda

do subsídio de turno constante do artigo 266.º-A e, sem prejuízo das condições mais favoráveis

consagradas nos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.

12 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 222.º

[…]

1 – […].

2 – [Novo] O trabalhador que presta trabalho por turnos deve ser previamente submetido a um exame

médico que determine a sua aptidão física e psíquica para o trabalho em regime de turnos.

3 – [Novo] O empregador deve promover, com a periodicidade de seis meses, a realização de exames

de saúde adequados para avaliar, com regularidade, a aptidãoo física e psíquica do trabalhador para o

exercício do trabalho por turnos, bem como a repercussão destes e das condições em que são

prestados.

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4 – A entidade patronal deve assegurar que os meios de proteção e prevenção em matéria de segurança e

saúde dos trabalhadores por turnos sejam equivalentes aos aplicáveis aos restantes trabalhadores, adequados

ao trabalho por turnos, e se encontrem disponíveis a qualquer momento.

5 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 223.º

[…]

1 – […].

2 – O período de trabalho noturno pode ser determinado, no sentido mais favorável ao trabalhador, por

instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, com observância do disposto no número anterior,

considerando-se como tal, na falta daquela determinação, o compreendido entre as 20 horas de um dia e as 7

horas do dia seguinte.

Artigo 225.º

[…]

1 – A entidade patronal deve assegurar exames de saúde gratuitos e sigilosos ao trabalhador em regime de

trabalho noturno, com a periodicidade de 6 meses, destinados a avaliar a aptidão física e psíquica do

trabalhador para o exercício do trabalho noturno, bem como a repercussão deste e das condições em

que é prestado.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 238.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – [Novo] O trabalhador em regime de trabalho noturno ou por turnos adquire um dia de férias

suplementar, por cada três anos de trabalho noturno ou por turnos.

5 – […].

6 – […].

Artigo 366.º

[…]

1 – Em caso de despedimento coletivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a um mês

de retribuição, incluindo o subsídio de turno e diuturnidades por cada ano completo ou fração de

antiguidade.

2 – [Revogado].

3 – […].

4 – [Revogado].

5 – [Revogado].

6 – [Revogado].

7 – [Novo] Em caso de fração de ano, a compensação é calculada proporcionalmente.

8 – [Novo] A compensação não pode ser inferior a três meses de retribuição base, incluindo o subsídio

de turno e diuturnidades.

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9 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto no presente artigo»

Artigo 4.º

Alteração à Lei de Trabalho em Funções Públicas

O n.º 2 do artigo 161.º da Lei de Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de

junho, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 161.º

[…]

1 – O trabalho por turnos é pago, com acréscimo remuneratório relativamente ao pagamento de trabalho

prestado em regime de horário fixo, sem prejuízo de condições mais favoráveis previstas em instrumento de

regulamentação coletiva de trabalho aplicável.

2 – Ao acréscimo referido no número anterior, aplica-se o disposto no artigo 266.º-A do Código do Trabalho.»

Artigo 5.º

Aditamento ao Código do Trabalho

São aditados ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua redação atual,

os artigos 266.º-A e 266.º-B com a seguinte redação:

«Artigo 266.º-A

Pagamento de trabalho por turnos

1 – O trabalho por turnos é pago, no mínimo, com acréscimo de 25% relativamente ao pagamento de trabalho

prestado em regime de horário fixo, sem prejuízo de condições mais favoráveis previstas em instrumento de

regulamentação coletiva de trabalho aplicável.

2 – O pagamento do acréscimo de trabalho por turnos é acumulável com o pagamento do acréscimo por

trabalho noturno, sempre que o turno implique trabalho noturno, nos termos do artigo 223.º do Código do

Trabalho.

3 – O pagamento do acréscimo de trabalho por turnos ou noturno não afasta o pagamento da remuneração

devida por trabalho suplementar.

4 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto no n.º 1.

Artigo 266.º-B

Antecipação da idade da reforma

1 – O trabalhador em regime de turnos, tem direito a um regime específico de reforma antecipada a definir

em legislação especial.

2 – O regime previsto no número anterior deve prever:

a) A redução da idade de reforma e bonificação no cálculo da pensão de reforma com um acréscimo à taxa

global de formação em mais 0,2% por cada ano de prestação de trabalho em regime de trabalho por turnos;

b) A adaptação das disposições relativas à base de incidência da taxa social única, a pagar em contribuições

para a segurança social pelas entidades patronais, aumentando o seu valor proporcionalmente aos custos

acrescidos para a segurança social resultantes do previsto na alínea anterior, devendo ser incluído no seu

cálculo e apuramento a retribuição relativa ao trabalho por turnos.»

Artigo 6.º

Entrada em vigor

1 – A presente lei entra em vigor no dia imediato à sua publicação.

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2 – As disposições da presente lei que impliquem o aumento da despesa do Estado, entram em vigor com o

Orçamento do Estado posterior à sua publicação.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — Paula Santos — Bruno Dias — Alma Rivera — Jerónimo de Sousa

— João Dias.

———

PROJETO DE LEI N.º 2/XV/1.ª

REPÕE OS VALORES DE PAGAMENTO DO TRABALHO SUPLEMENTAR, PARA TODOS OS TRABALHADORES (DÉCIMA NONA ALTERAÇÃO À LEI N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO, QUE

APROVA O CÓDIGO DO TRABALHO E DÉCIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 35/2014, DE 20 DE JUNHO, QUE APROVA A LEI GERAL DO TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS)

Exposição de motivos

A degradação geral das condições de vida da maioria dos portugueses foi resultado da política de exploração

que promoveu baixos salários e pensões, cortes nos seus montantes, desemprego, eliminação de apoios sociais

– abono de família, complemento solidário para idosos, rendimento social de inserção – e criou uma situação

social dramática.

Nesta estratégia, as alterações às leis laborais promovidas por sucessivos governos, e de forma

particularmente grave pelo Governo PSD/CDS-PP entre 2011 e 2015 representaram um retrocesso civilizacional

profundo e a aposta num caminho de desvalorização do trabalho e de ataque a direitos fundamentais dos

trabalhadores.

A revisão do Código do Trabalho em 2012 promovida pelo Governo PSD/CDS-PP representou a imposição

do trabalho forçado e gratuito com a eliminação de feriados, redução de dias de férias e corte de dias de

descanso obrigatório, extorquindo milhões de euros aos trabalhadores, promovendo a eliminação de mais de 90

mil postos de trabalho e extinguindo feriados que são símbolos de independência nacional e soberania popular.

Visou a diminuição de salários, designadamente com o corte para metade no pagamento do trabalho em dias

de descanso, feriados e horas extraordinárias; apontou para o agravamento e generalização do banco de horas,

prolongando o horário de trabalho e pondo em causa a articulação entre a vida profissional e a vida pessoal e

familiar.

Promoveu o aumento da precariedade designadamente com a facilitação do contrato de trabalho de muito

curta duração e a eliminação de obrigações de informação à ACT facilitando a arbitrariedade.

Promoveu os despedimentos, em confronto com a proibição constitucional de despedimento sem justa causa,

admitindo o despedimento por inadaptação sem causa objetiva de mudança no posto de trabalho, a par da

redução do valor das indemnizações.

Constituiu um forte ataque à contratação coletiva invocando uma falsa descentralização e procurando impor

a eliminação de cláusulas de instrumentos de regulação coletiva de trabalho acordados entre associações

sindicais e associações patronais.

O corte de 50% no pagamento do trabalho suplementar, do trabalho em dia feriado ou em dia de descanso

semanal foi aplicado a todos os trabalhadores até 2015, sendo que desde então, apenas as situações

abrangidas pela contratação coletiva garantem o pagamento sem redução. No entanto, várias empresas têm

incumprido a lei e negado o pagamento do trabalho suplementar, em dia de descanso semanal ou em dia feriado

sem redução de 50% do seu valor.

Assim, mantém-se ainda o corte no pagamento para todos os trabalhadores não abrangidos pela contratação

coletiva, pelo que é de elementar justiça assegurar a sua aplicação a todos. Tal significaria a reposição do

pagamento do trabalho extraordinário com um acréscimo de 50% na primeira hora e de 75% nas horas

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29 DE MARÇO DE 2022

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seguintes; e a reposição do direito a descanso compensatório correspondente a igual período das horas

trabalhadas ou a um acréscimo de 100% no salário no caso de trabalho em dia feriado.

Com o presente projeto de lei, o PCP propõe a reposição dos montantes e regras de cálculo do pagamento

do trabalho extraordinário, trabalho suplementar e em dia feriado.

O PCP considera que só uma legislação de trabalho que retome a sua natureza de proteção da parte mais

débil é compatível com uma perspetiva progressista e com o desenvolvimento económico e social.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei visa a reposição do pagamento do trabalho suplementar para 50% da retribuição na primeira

hora, 75% nas horas e frações subsequentes e para 100% no caso de ser prestado em dia descanso semanal,

obrigatório ou complementar, ou em dia feriado, para todos os trabalhadores.

Artigo 2.º

Alteração ao anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho

Os artigos 229.º, 268.º e 269.º do anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do

Trabalho, alterada pela Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, Lei n.º 23/2012,

de 25 de junho, Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, Lei n.º 27/2014, de 8 de

maio, Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, Lei n.º 28/2015, de 14 de abril, Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, Lei

n.º 8/2016, de 1 de abril, Lei n.º 28/2016, de 23 de agosto, Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, Lei n.º 14/2018, de

19 de março, Lei n.º 90/2019, de 4 de setembro e Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, passam a ter a seguinte

redação:

«Artigo 229.º

(…)

1 – O trabalhador que presta trabalho suplementar em dia útil ou em dia de descanso semanal

complementar tem direito a descanso compensatório remunerado, correspondente a 25% das horas de

trabalho suplementar realizadas, sem prejuízo do disposto no n.º 3.

2 – O descanso compensatório a que se refere o número anterior vence-se quando perfaça um número

de horas igual ao período normal de trabalho diário.

3 – (…).

4 – (…).

5 – O descanso compensatório é marcado por escolha do trabalhador, salvo quando esta marcação

possa prejudicar de forma determinante a organização do trabalho por parte da entidade patronal, caso

em que deve ser marcado por acordo entre as partes.

6 – O disposto nos n.os 1 e 2 pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de

trabalho que disponha no sentido mais favorável aos trabalhadores.

7 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto nos n.os 1, 3 ou 4.

Artigo 268.º

(…)

1 – (…):

a) 50% pela primeira hora ou fração desta e 75% por hora ou fração subsequente, em dia útil;

b) 100% por cada hora ou fração, em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar ou em feriado.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 1

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2 – (…).

3 – O disposto nos números anteriores pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de

trabalho que disponha no sentido mais favorável aos trabalhadores.

4 – (…).

Artigo 269.º

(…)

1 – (…).

2 – O trabalhador que presta trabalho normal em dia feriado em empresa não obrigada a suspender o

funcionamento nesse dia tem direito a descanso compensatório de igual duração ou acréscimo de 100% da

retribuição correspondente.

3 – O trabalhador que presta trabalho em dia feriado tem ainda direito a descanso compensatório

remunerado, a gozar nos três dias úteis seguintes, devendo ser marcado por acordo entre trabalhador e

empregador.»

Artigo 3.º

Alteração à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas

Os artigos 162.º e 165.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções

Públicas, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, pela Lei n.º 84/2015, de 7

de agosto, pela Lei n.º 18/2016, de 20 de Junho, pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, pela Lei n.º 25/2017,

de 30 de maio, pela Lei n.º 70/2017, de 14 de agosto, pela Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, Lei n.º 49/2018, de

14 de agosto, Lei n.º Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro e Lei n.º

79/2019, de 2 de setembro, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 162.º

(…)

1 – (…):

a) 50% da remuneração, na primeira hora ou fração desta;

b) 75% da remuneração, nas horas ou frações subsequentes.

2 – O trabalho suplementar prestado em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, e em dia

feriado, confere ao trabalhador o direito a um acréscimo de 100% da remuneração por cada hora de trabalho

efetuado ou descanso compensatório de duração igual.

3 – (…).

4 – (…).

5 – (…).

6 – (…).

7 – (…).

Artigo 165.º

(…)

1 – (…).

2 – O trabalhador que realiza a prestação em órgão ou serviço legalmente dispensado de suspender o

trabalho em dia feriado obrigatório tem direito a descanso compensatório com duração de igual duração e

acréscimo de 100% da retribuição correspondente, cabendo a escolha ao trabalhador, na ausência de

acordo entre as partes.»

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Artigo 4.º

Entrada em vigor

1 – A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

2 – O disposto no artigo 3.º apenas produz efeitos a partir da entrada em vigor do Orçamento do Estado

posterior à sua publicação.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — Paula Santos — Alma Rivera — Bruno Dias — Jerónimo de Sousa

— João Dias.

———

PROJETO DE LEI N.º 3/XV/1.ª

REPÕE O PRINCÍPIO DO TRATAMENTO MAIS FAVORÁVEL DO TRABALHADOR, ELIMINA A CADUCIDADE DA CONTRATAÇÃO COLETIVA E REGULA A SUCESSÃO DE CONVENÇÕES

COLETIVAS DE TRABALHO (DÉCIMA NONA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO, APROVADO PELA LEI N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO)

Exposição de motivos

Desde 2003 que o PCP tem vindo a suscitar na Assembleia da República a discussão dos direitos inscritos

na contratação coletiva e o próprio direito de contratação coletiva, com o objetivo de acabar com a caducidade

dos contratos coletivos e repor o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador.

Estas normas gravosas foram introduzidas pelo Governo PSD/CDS-PP em 2003, pioradas pelo Governo PS

de maioria absoluta em 2009, agravadas pelo Governo PSD/CDS-PP em 2012, agravamento que foi mantido

pelo Governo minoritário do PS até à presente data, sempre com o apoio do PSD e do CDS-PP.

É inaceitável que se tenha introduzido a norma da caducidade das convenções coletivas e se tenha permitido

o estabelecimento de condições laborais piores que as previstas na lei pondo em causa o princípio do tratamento

mais favorável ao trabalhador.

A caducidade dos instrumentos de regulação coletiva significa a possibilidade dada às associações patronais

de, recusando-se a negociar, fazerem caducar os contratos coletivos de trabalho pondo em causa os direitos

que estes consagram. Foi-lhes dada a possibilidade de fazerem chantagem sobre os trabalhadores e os seus

sindicatos, colocando-os perante a falsa alternativa entre a caducidade ou o acordo para a redução de direitos.

Foi afirmado que estas normas iriam dinamizar a contratação coletiva, mas a realidade é o contrário: menos

contratos, menos trabalhadores envolvidos. Passaram 19 anos e nunca mais a contratação coletiva atingiu os

níveis existentes antes destas normas gravosas do Código do Trabalho terem sido impostas.

Foi publicada a declaração de caducidade de dezenas de convenções coletivas, mas as consequências

nefastas não ficaram por aí porque em contratos negociados e publicados foram condicionados e amputados

direitos. E o problema não ficou lá atrás no tempo, todos os anos se repete a chantagem das associações

patronais.

Hoje persistem tentativas patronais para impor a eliminação de feriados municipais, o corte de pausas

essenciais à saúde dos trabalhadores, a redução a um quarto do pagamento do trabalho extraordinário em dias

feriados e de folga, o corte para metade do valor do pagamento do trabalho noturno, a fixação generalizada da

desregulação dos horários, ou o corte no subsídio de apoio aos filhos que há muito existe no sector têxtil.

A última alteração ao Código do Trabalho juntou à causa de caducidade a possibilidade da mesma se verificar

aquando da extinção de uma associação sindical ou de uma associação patronal outorgante de uma convenção

coletiva, excetuando-se os casos em que a extinção de associação patronal ou de associação sindical seja

voluntária e com o intuito de fazer caducar a convenção coletiva.

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Consequentemente, sempre que se não prove que o intuito da dissolução da associação patronal foi a

extinção da convenção coletiva, haverá caducidade desta.

Como forma de salvaguardar os direitos dos trabalhadores, defende o PCP que é dever do Estado promover

e garantir o direito de contratação coletiva reconhecido às associações sindicais e às associações patronais

sendo que a caducidade da contratação coletiva deve ocorrer unicamente por acordo das partes que a outorgam.

Para além disto, a referida alteração ao Código do Trabalho deixou fixado o presente envenenado da

arbitragem obrigatória, mas os direitos dos trabalhadores não podem ficar sujeitos à discricionariedade da

decisão de colégios arbitrais. A solução exige o fim da caducidade, a garantia de que um contrato só seja

substituído por outro contrato livremente negociado. É isso que o PCP propõe com esta iniciativa legislativa.

A luta reivindicativa, organizada a partir dos locais de trabalho, está na origem da contratação coletiva.

Sobretudo depois da Revolução de Abril, representou um sinal de progresso nas relações laborais, mas também

de aprofundamento da democracia participativa. A contratação coletiva tem um papel estruturante na regulação

do trabalho, é um instrumento de consagração de direitos conquistados com a luta e simultaneamente condição

para o desenvolvimento e progresso do País.

O direito de negociação e contratação coletiva é reconhecido aos trabalhadores na Constituição e integra o

elenco de direitos fundamentais consagrados em convenções internacionais.

Os direitos dos trabalhadores, a valorização do trabalho e dos trabalhadores, representam uma dimensão

essencial para o desenvolvimento e o futuro do País. Se há lição que se tira dos últimos anos é a de que a

defesa, reposição e conquista de direitos, indispensável para a melhoria das condições de vida dos

trabalhadores e do povo constitui ao mesmo tempo um fator decisivo para o crescimento económico e a criação

de emprego.

Se há lição que se pode tirar é que a política de agravamento da exploração e empobrecimento, de cortes

de salários, de pensões e de outros direitos sociais foi, não só uma política de injustiça social, mas também de

recessão, desemprego e afundamento do País. Urge por isso, a rejeição total desse caminho e a revogação

dessas medidas. Pelos direitos dos trabalhadores, para distribuir a riqueza criada de forma mais justa, mas

também para criar mais emprego, para estimular o desenvolvimento económico é preciso revogar as normas

gravosas da legislação laboral.

Por isso mesmo, neste projeto de lei o PCP propõe a reposição do princípio do tratamento mais favorável do

trabalhador e a eliminação da caducidade dos contratos coletivos de trabalho.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à décima nona alteração ao Código do Trabalho, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009,

de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho, na redação atual.

Artigo 2.º

Alteração ao anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro

Os artigos 3.º, 500.º, 502.º do Código do Trabalho, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,

na redação atual, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 3.º

(…)

1 – Aos contratos de trabalho aplicam-se:

a) As normas legais sobre regulamentação de trabalho;

b) Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho;

c) Os usos laborais que não contrariem a lei e os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho;

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d) O princípio da boa-fé.

2 – As fontes de direito superiores prevalecem sempre sobre as fontes de direito inferiores, salvo na parte

em que estas estabeleçam tratamento mais favorável para o trabalhador.

3 – As normas legais sobre regulamentação de trabalho podem ser afastadas por instrumento de

regulamentação coletiva de trabalho, quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador,

salvo quando delas resultar o contrário.

4 – As normas legais sobre regulamentação de trabalho só podem ser afastadas por contrato individual de

trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador, se delas não resultar o contrário.

5 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho não podem ser afastadas por portaria de condições

de trabalho.

6 – As normas dos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho só podem ser afastadas por contrato

de trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador.

Artigo 500.º

Denúncia de convenção coletiva

1 – Qualquer das partes pode denunciar a convenção coletiva com efeitos no termo de cada período de

vigência, mediante comunicação dirigida à outra parte, acompanhada da respetiva proposta negocial.

2 – A convenção coletiva mantém-se em vigor até ser substituída por outro instrumento de regulamentação

coletiva de trabalho.

Artigo 502.º

Cessação da vigência de convenção coletiva

1 – A convenção coletiva apenas pode cessar:

a) Mediante revogação por acordo das partes;

b) Pela entrada em vigor de convenção coletiva que a substitua.

2 – [Revogado].

3 – [Revogado].

4 – Aplicam-se à revogação as regras referentes ao depósito e à publicação de convenção coletiva.

5 – A revogação não prejudica os direitos decorrentes da convenção, continuando o respetivo regime a

aplicar-se aos contratos individuais de trabalho anteriormente celebrados e às respetivas renovações.

6 – [Revogado].

7 – [Revogado].

8 – [Revogado].»

Artigo 3.º

Norma revogatória

São revogados os artigos 5.º e 10.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do

Trabalho, e os artigos 447.º n.º 9, 456.º n.º 3, 497.º, 501.º, 501.º-A, os n.os 2, 3, 6, 7 e 8 do artigo 502.º, n.º 2 do

artigo 512.º e artigo 513.º do Código do Trabalho, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na

sua redação atual.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

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Assembleia da República, 29 de março de 2022.

Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — Paula Santos — Alma Rivera — Bruno Dias — Jerónimo de Sousa

— João Dias.

———

PROJETO DE LEI N.º 4/XIV/1.ª

DETERMINA A ELABORAÇÃO PELO GOVERNO DE RELATÓRIO ANUAL SOBRE AS ASSIMETRIAS

REGIONAIS EM PORTUGAL, PRÉVIA À APRESENTAÇÃO DO OE, COM VISTA À SUA APRESENTAÇÃO

À ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

Exposição de motivos

A Lei n.º 29/2012, de 9 de agosto, introduziu a figura da «autorização de residência para atividade de

investimento» (vulgo, visto gold)no Regime Jurídico de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de

Estrangeiros do Território Nacional.

Desde a sua criação, este instituto tem estado associado a práticas de corrupção, tráfico de influências,

peculato e branqueamento de capitais, e a outros ilícitos fiscais e criminais. A esse conhecimento, acresce a

informação pública que mostra como os vistos gold têm sido usados por oligarcas para fugir a obrigações

internacionais, incluindo a sanções económicas. Essa realidade é bem visível no processo das sanções

impostos à Federação Russa e a um destacado grupo de oligarcas próximos de Putin em consequência da

bárbara agressão russa à Ucrânia.

Na sequência da invasão da Ucrânia pela Rússia, o Reino Unido já anunciou que irá acabar com o seu

modelo de vistos gold, cujo enquadramento é similar ao praticado em Portugal. Mais recentemente, a própria

Comissão Europeia, seguindo os alertas de diversas entidades e do Parlamento Europeu, recomendou aos

Estados o fim destes regimes. Sabendo como anteriores governantes portugueses chegaram a ir à Rússia

promover a venda de vistos gold, mesmo após a anexação da Crimeia pela Rússia, é imperioso acabar com

este instituto também em Portugal.

O Bloco de Esquerda há muito que denuncia que os vistos gold são um fator que em muito contribui para a

proliferação da criminalidade económica. Esta é, aliás, uma ideia que cada vez ganha mais força não só em

Portugal como também na Europa. É significativo que, no quadro desse debate, a noção de que estamos diante

de «um esquema de importação da corrupção e da criminalidade organizada para a União Europeia», como foi

referido pela ex-Eurodeputada Ana Gomes, tenha sido amplamente perfilhada. É pois, convicção do Bloco de

Esquerda que, se queremos combater a corrupção e o crime económico, a aprovação deste projeto de lei nos

coloca mais perto desse objetivo.

Anunciados como mecanismo de apoio ao investimento estrangeiro criador de emprego em Portugal, os

vistos gold mostraram ser, na prática, um autêntico fiasco na criação de postos de trabalho. Efetivamente, uma

avaliação objetiva dos resultados dos vistos gold em termos de natureza do investimento a eles associado

mostra que contribuem para uma especulação imobiliária de alta intensidade e ajudam a criar, também por essa

via, problemas estruturais na forma como concebemos a organização das cidades. Mais do que um imóvel, está

em causa a compra de uma de uma autorização de residência, pouco importa que o valor do imóvel. Os fins

justificam os meios. E a especulação imobiliária assim alimentada, sendo um efeito colateral desta perversão,

não tem limites à vista.

Por outro lado ainda, o deliberado benefício injustificado em termos de celeridade, simplicidade e

desburocratização para milionários contrasta flagrantemente com o tratamento reservado a imigrantes que aqui

vivem, que aqui trabalham, que descontam para a segurança social e que pagam impostos, a quem o Estado

condena a um enorme calvário burocrático para a respetiva regularização, onde a incerteza, a espera, o

adiamento e a burocracia são tão desesperantes como fragilizadores dos direitos. Os vistos gold são, pois, fonte

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de uma discriminação inaceitável entre cidadãos de primeira – a quem tudo é facilitado por força da posse de

bens materiais, sem cuidar sequer da respetiva origem e natureza – e cidadãos de segunda – pessoas que

trazem consigo apenas a sua força de trabalho e a quem a lei e a prática administrativa impõem sucessivos

obstáculos e restrições à entrada e permanência no nosso País. Esta distinção de direitos e obrigações que

discrimina positivamente quem tem dinheiro e discrimina negativamente quem não o tem não é própria de um

Estado de direito democrático, efetivamente respeitador dos direitos humanos.

O Bloco de Esquerda tem apresentado inúmeras propostas para melhorar o Regime Jurídico de Entrada,

Permanência, Saída e Afastamento de Estrangeiros do Território Nacional, na perspetiva de um respeito não

discriminatório pelos direitos humanos de todas as pessoas. O fim do instituto dos vistos gold terminará com

algo que favorece a criminalidade económica, porá fim a uma das principais causas da especulação imobiliária

e acabará com um privilégio injustificado que atira uns para um pesadelo burocrático, enquanto estende a

passadeira vermelha a outros.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei revoga a autorização de residência para atividade de investimento, da Lei n.º 23/2007, de 4 de

julho, que aprova o Regime Jurídico de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de Estrangeiros do

Território Nacional, alterada pela Lei n.º 29/2012, de 9 de agosto, pela Lei n.º 56/2015, de 23 de junho, pela Lei

n.º 63/2015, de 30 de junho, pela Lei n.º 59/2017, de 31 de julho, pela Lei n.º 102/2017, de 28 de agosto, pela

Lei n.º 26/2018, de 5 de julho, pela Lei n.º 28/2019, de 29 de Março e pelo Decreto-Lei n.º 14/2021, de 12 de

fevereiro.

Artigo 2.º

Norma revogatória

São revogadas a alínea d), do n.º 1, do artigo 3.º, o artigo 90.º-A e a alínea r), do n.º 1, do artigo 122.º da Lei

n.º 23/2007, de 4 de julho, com as posteriores alterações.

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins — Joana

Mortágua — José Moura Soeiro.

———

PROJETO DE LEI N.º 5/XV/1.ª

REGULA AS CONDIÇÕES EM QUE A MORTE MEDICAMENTE ASSISTIDA NÃO É PUNÍVEL E

ALTERA O CÓDIGO PENAL

Exposição de motivos

O processo legislativo para regular as condições em que a morte medicamente assistida não é punível já é

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II SÉRIE-A — NÚMERO 1

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longo. Iniciado por um grande debate público (que teve vários aprofundamentos ao longo do tempo, no

Parlamento e na sociedade portuguesa), congregou em diversos momentos uma maioria de Deputadas e

Deputados na Assembleia da República. Esse é um processo rico e tornou claro que não é aceitável, à luz de

um princípio geral de tolerância e da articulação constitucional entre direito à vida, direito à autodeterminação

pessoal e direito ao livre desenvolvimento da personalidade, negar o direito de, dentro de um quadro legal

rigorosamente delimitado, se ver atendido o pedido para antecipação da morte sem que tal gere a penalização

dos profissionais de saúde que, fieis ao comando de acompanhar os seus pacientes até ao fim, ajudem à

satisfação de um tal pedido.

Esse processo legislativo ficou perto da conclusão na XIV Legislatura, mas o veto político do Presidente da

República Marcelo Rebelo de Sousa impediu esse objetivo. O texto jurídico que resultou do processo de

especialidade dos Projetos de Lei n.os 4/XIV/1.ª (BE), 67/XIV/1.ª (PAN), 104/XIV/1.ª (PS), 168/XIV/1.ª (PEV) e

195/XIV1.ª (IL), e que culminou com o Decreto da Assembleia da República 199/XIV é, pois, a base substancial

da presente iniciativa. As pequeníssimas alterações que a esse texto são feitas decorrem da superação das

objeções colocadas no veto presidencial de 29 de novembro de 2021. Na verdade, só formalmente se inicia um

processo legislativo com esta iniciativa pois a sua substância advém totalmente do percurso, debate e diálogo

realizado na XIV Legislatura. Contudo, para eliminar qualquer indeterminação jurídica que poderia advir de,

numa nova legislatura, se proceder à superação de um veto presidencial que transita de uma legislatura anterior,

é apresentada esta iniciativa legislativa.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei regula as condições especiais em que aantecipação da morte medicamente assistidanão é

punível e altera o Código Penal.

Artigo 2.º

Definições

Para efeitos da presente lei, considera-se:

a) Morte medicamente assistida: morte que ocorre por decisão da própria pessoa, em exercício do seu direito

fundamental à autodeterminação e livre desenvolvimento da personalidade, quando praticada ou ajudada por

profissionais de saúde;

b) Suicídio medicamente assistido: autoadministração de fármacos letais pelo próprio doente, sob supervisão

médica;

c) Eutanásia: administração de fármacos letais, pelo médico ou profissional de saúde devidamente habilitado

para o efeito;

d) Doença grave e incurável: doença que ameaça a vida, em fase avançada e progressiva, incurável e

irreversível, que origina sofrimento de grande intensidade;

e) Lesão definitiva de gravidade extrema: Lesão grave, definitiva e amplamente incapacitante que coloca a

pessoa em situação de dependência de terceiro ou de apoio tecnológico para a realização das atividades

elementares da vida diária, existindo certeza ou probabilidade muito elevada de que tais limitações venham a

persistir no tempo sem possibilidade de cura ou de melhoria significativa;

f) Sofrimento: Sofrimento físico, psicológico e espiritual, decorrente de doença grave e incurável ou de lesão

definitiva de gravidade extrema, com grande intensidade, persistente, continuado ou permanente e considerado

intolerável pela própria pessoa;

g) Médico orientador, médico indicado pelo doente que tem a seu cargo coordenar toda a informação e

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assistência ao doente, sendo o interlocutor principal do mesmo durante todo o processo assistencial, sem

prejuízo de outras obrigações que possam caber a outros profissionais;

h) Médico especialista, médico especialista na patologia que afeta o doente e que não pertence à mesma

equipa do médico orientador.

Artigo 3.º

Antecipação da morte medicamente assistida não punível

1 – Para efeitos da presente lei, considera-se morte medicamente assistida não punível a que ocorre por

decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de

sofrimento intolerável, com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e incurável, quando

praticada ou ajudada por profissionais de saúde.

2 – Para efeitos da presente lei, consideram-se legítimos apenas os pedidos de morte medicamente assistida

apresentados por cidadãos nacionais ou legalmente residentes em território nacional.

3 – A morte medicamente assistida ocorre em conformidade com a vontade e a decisão da própria pessoa,

que se encontre numa das seguintes situações:

a) Lesão definitiva de gravidade extrema;

b) Doença grave e incurável.

4 – A morte medicamente assistida pode ocorrer por:

a) Suicídio medicamente assistido;

b) Eutanásia.

5 – O pedido subjacente à decisão prevista no n.º 1 obedece a procedimento clínico e legal, de acordo com

o disposto na presente lei.

6 – O pedido pode ser livremente revogado a qualquer momento, nos termos do artigo 12.º

CAPÍTULO II

Procedimento

Artigo 4.º

Abertura do procedimento clínico

1 – O pedido de abertura do procedimento clínico de antecipação da morte é efetuado por pessoa que

preenche os requisitos previstos no artigo anterior, doravante designada por doente, em documento escrito,

datado e assinado pelo próprio, ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, a ser

integrado em registo clínico especial (RCE) criado para o efeito.

2 – O pedido é dirigido ao médico escolhido pelo doente como médico orientador.

3 – O médico orientador deve obrigatoriamente aceder ao historial clínico do doente e assumi-lo como

elemento essencial do seu parecer, emitido nos termos do artigo 5.º.

4 – Não são admitidos os pedidos de doentes sujeitos a processo judicial para aplicação do regime do maior

acompanhado, enquanto o mesmo se encontrar pendente, sendo o procedimento de antecipação da morte

imediatamente suspenso quando o processo judicial for instaurado posteriormente à apresentação do pedido e

enquanto o mesmo decorra, independentemente da fase em que o procedimento de antecipação da morte se

encontre.

5 – Ao doente é sempre garantido, querendo, o acesso a cuidados paliativos.

Artigo 5.º

Parecer do médico orientador

1 – O médico orientador emite parecer fundamentado sobre se o doente cumpre todos os requisitos referidos

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no artigo 3.º e presta-lhe toda a informação e esclarecimento sobre a situação clínica que o afeta, os tratamentos

aplicáveis, viáveis e disponíveis, designadamente na área dos cuidados paliativos, e o respetivo prognóstico,

após o que verifica se o doente mantém e reitera a sua vontade, devendo a decisão do doente ser registada por

escrito, datada e assinada.

2 – A informação e o parecer prestados pelo médico e a declaração do doente, assinados por ambos,

integram o RCE.

3 – Se o parecer do médico orientador não for favorável à antecipação da morte do doente, o procedimento

em curso é cancelado e dado por encerrado e o doente é informado dessa decisão e dos seus fundamentos

pelo médico orientador, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do

artigo 4.º.

Artigo 6.º

Confirmação por médico especialista

1 – Após o parecer favorável do médico orientador, este procede à consulta de outro médico, especialista na

patologia que afeta o doente, cujo parecer confirma ou não que estão reunidas as condições referidas no artigo

anterior, o diagnóstico e prognóstico da situação clínica e a natureza grave e incurável da doença ou a condição

definitiva e de gravidade extrema da lesão.

2 – o parecer fundamentado do médico especialista é emitido por escrito, datado e assinado por ele e integra

o RCE.

3 – Se o parecer do médico especialista não for favorável à antecipação da morte do doente, o procedimento

em curso é cancelado e dado por encerrado e o doente é informado dessa decisão e dos seus fundamentos

pelo médico orientador, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do

artigo 4.º.

4 – No caso de parecer favorável do médico especialista, o médico orientador informa o doente do conteúdo

daquele parecer, após o que verifica novamente se o doente mantém e reitera a sua vontade, devendo a decisão

do doente ser registada por escrito, datada e assinada pelo próprio ou pela pessoa por si designada nos termos

do n.º 2 do artigo 11.º, e, juntamente com o parecer ou pareceres alternativos emitidos pelo médico ou médicos

especialistas, integrar o RCE.

5 – Caso o doente padeça de mais do que uma lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e

incurável, o médico orientador decide qual a especialidade médica a consultar.

Artigo 7.º

Confirmação por médico especialista em psiquiatria

1 – É obrigatório o parecer de um médico especialista em psiquiatria, sempre que ocorra uma das seguintes

situações:

a) O médico orientador e ou o médico especialista tenham dúvidas sobre a capacidade da pessoa para

solicitar a antecipação da morte revelando uma vontade séria, livre e esclarecida;

b) O médico orientador e ou o médico especialista admitam que a pessoa seja portadora de perturbação

psíquica ou condição médica que afete a sua capacidade de tomar decisões.

2 – Se o médico especialista em psiquiatria confirmar qualquer uma das situações referidas no número

anterior, o procedimento em curso é cancelado, sendo o doente informado dessa decisão e dos seus

fundamentos, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do artigo 4.º.

3 – O parecer do médico especialista em psiquiatria é emitido por escrito, datado e assinado pelo próprio e

integra o RCE.

4 – A avaliação necessária para a elaboração do parecer referido no n.º 1 envolve, sempre que a condição

específica do doente assim o exija, a colaboração de um especialista em psicologia clínica.

5 – No caso de parecer favorável do médico especialista em psiquiatria, este, acompanhado do médico

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orientador, deve informar o doente do conteúdo daquele parecer, após o que verifica novamente se o doente

mantém e reitera a sua vontade, devendo a decisão consciente e expressa deste ser registada em documento

escrito, datado e assinado pelo próprio ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, o

qual integra o RCE.

Artigo 8.º

Parecer da Comissão de Verificação e Avaliação

1 – Nos casos em que se apresentem os pareceres favoráveis nos termos dos artigos anteriores,

reconfirmada a vontade do doente, o médico orientador remete cópia do RCE para a Comissão de Verificação

e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Antecipação da Morte (CVA), prevista no artigo 24.º, solicitando

parecer sobre o cumprimento dos requisitos e das fases anteriores do procedimento, que é elaborado no prazo

máximo de 5 dias úteis.

2 – Quando a CVA tiver dúvidas sobre se estão reunidas as condições previstas na presente lei para a prática

da morte medicamente assistida, deveconvocar os médicos envolvidos no procedimento para prestar

declarações, podendo ainda solicitar a remessa de documentos adicionais que considere necessários.

3 – Em caso de parecer desfavorável da CVA, o procedimento em curso é cancelado, podendo ser reiniciado

com novo pedido de abertura, nos termos do artigo 4.º

4 – No caso de parecer favorável da CVA, o médico orientador deve informar o doente do conteúdo daquele

parecer, após o que verifica novamente se este mantém e reitera a sua vontade, devendo a sua decisão

consciente e expressa ser registada em documento escrito, datado e assinado pelo próprio ou pela pessoa por

si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, o qual integra o RCE.

Artigo 9.º

Concretização da decisão do doente

1 – Mediante parecer favorável da CVA, o médico orientador, de acordo com a vontade do doente, combina

o dia, hora, local e método a utilizar para a antecipação da morte.

2 – O médico orientador informa e esclarece o doente sobre os métodos disponíveis para praticar a

antecipação da morte, designadamente a autoadministração de fármacos letais pelo próprio doente ou a

administração pelo médico ou profissional de saúde devidamente habilitado para o efeito mas sob supervisão

médica, sendo a decisão da responsabilidade exclusiva do doente.

3 – A decisão referida no número anterior deve ser consignada por escrito, datada e assinada pelo doente,

ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, e integrada no RCE, sem prejuízo do disposto

no n.º 6 do artigo 3.º

4 – Após a consignação da decisão, o médico orientador remete cópia do RCE respetivo para a Inspeção-

Geral das Atividades em Saúde (IGAS), que pode acompanhar presencialmente o procedimento de

concretização da decisão do doente.

5 – No caso de o doente ficar inconsciente antes da data marcada para a antecipação da morte, o

procedimento é interrompido e não se realiza, salvo se o doente recuperar a consciência e mantiver a sua

decisão.

Artigo 10.º

Administração dos fármacos letais

1 – Além do médico orientador e outro profissional de saúde, obrigatoriamente presentes aquando da

administração dos fármacos letais, podem estar presentes outros profissionais de saúde por indicação do

médico orientador, assim como pessoas indicadas pelo doente, desde que o médico orientador considere que

existem condições clínicas e de conforto adequadas.

2 – Imediatamente antes de se iniciar a administração ou autoadministração dos fármacos letais, o médico

orientador deve confirmar se o doente mantém a vontade de antecipar a sua morte, na presença de uma ou

mais testemunhas, devidamente identificadas no RCE.

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3 – Caso o doente não confirme expressamente a sua vontade de antecipar a morte, nomeadamente se

manifestar qualquer dúvida, o procedimento em curso é cancelado e dado por encerrado, o que é inscrito em

documento escrito, datado e assinado pelo médico orientador, integrando o RCE, podendo o procedimento ser

reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do artigo 4.º

4 – No caso previsto no número anterior, deve ser entregue ao doente o respetivo RCE, devendo uma cópia

ser anexada ao seu processo clínico e outra enviada para a CVA com o respetivo Relatório Final do médico

orientador, nos termos do artigo 17.º

Artigo 11.º

Decisão pessoal e indelegável

1 – A decisão do doente em qualquer fase do procedimento clínico de antecipação da morte é estritamente

pessoal e indelegável.

2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, caso o doente que solicita a antecipação da morte não

saiba ou esteja impossibilitado fisicamente de escrever e assinar, pode, em todas as fases do procedimento em

que seja requerido, fazer-se substituir por pessoa da sua confiança, por si designada apenas para esse efeito,

aplicando-se as regras do reconhecimento de assinatura a rogo na presença de profissional legalmente

competente, devendo a assinatura ser efetuada na presença do médico orientador, com referência expressa a

essa circunstância, e na presença de uma ou mais testemunhas.

3 – A pessoa designada pelo doente para o substituir nos termos do número anterior não pode vir a obter

benefício direto ou indireto da morte do doente, nomeadamente vantagem patrimonial, nem ter interesse

sucessório.

Artigo 12.º

Revogação

1 – A revogação do pedido de antecipar a morte cancela o procedimento clínico em curso, devendo a decisão

ser inscrita no RCE pelo médico orientador.

2 – Mediante a revogação do pedido é entregue ao doente o respetivo RCE, devendo ser anexada uma cópia

ao seu processo clínico com o relatório final do médico orientador.

Artigo 13.º

Locais autorizados

1 – A escolha do local para a prática da morte medicamente assistida cabe ao doente.

2 – O ato de antecipação da morte pode ser praticado nos estabelecimentos de saúde do Serviço Nacional

de Saúde e dos setores privado e social que estejam devidamente licenciados e autorizados para a prática de

cuidados de saúde, disponham de internamento e de local adequado e com acesso reservado.

3 – Caso a escolha do doente recaia sobre local diferente dos referidos no número anterior, deve o médico

orientador certificar que o mesmo dispõe de condições clínicas e de conforto adequadas para o efeito.

Artigo 14.º

Acompanhamento

Além do médico orientador e de outros profissionais de saúde envolvidos no ato de antecipação da morte,

podem estar presentes, também para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 10.º, as pessoas indicadas pelo

doente.

Artigo 15.º

Verificação da morte e certificação do óbito

A verificação da morte e a certificação do óbito obedecem à legislação em vigor, devendo as respetivas

cópias ser arquivadas no RCE.

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Artigo 16.º

Registo Clínico Especial

1 – O RCE inicia-se com o pedido de antecipação da morte redigido pelo doente, ou pela pessoa por si

designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, e dele devem constar, entre outros, os seguintes elementos:

a) Todas as informações clínicas relativas ao procedimento em curso;

b) Os pareceres e relatórios apresentados pelos médicos e outros profissionais de saúde intervenientes no

processo;

c) O parecer da CVA;

d) As decisões do doente sobre a continuação do procedimento ou a revogação do pedido;

e) A decisão do doente sobre o método de antecipação da morte;

f) Todas as demais ocorrências consideradas relevantes.

2 – Concluído o procedimento ou cancelado por revogação do pedido do doente, decisão médica ou seguindo

parecer da CVA, o RCE é anexado ao relatório final, devendo ser anexada uma cópia ao processo clínico do

doente.

3 – O médico orientador é responsável pelo RCE, nele integrando os documentos a que se refere o n.º 1.

4 –O doente tem acesso ao RCE sempre que o solicite ao médico orientador.

5 – O modelo de RCE é estabelecido em regulamentação a aprovar pelo governo.

Artigo 17.º

Relatório final

1 – O médico orientador elabora, no prazo de 15 dias após a morte, o respetivo relatório final, ao qual é

anexado o RCE, que remete à CVA e à IGAS.

2 – A obrigação de apresentação do relatório final mantém-se nos casos em que o procedimento é encerrado

sem que tenha ocorrido a antecipação da morte do doente, seja por revogação do doente seja por decisão

médica ou parecer desfavorável da CVA.

3 – Do relatório final devem constar, entre outros, os seguintes elementos:

a) A identificação do doente e dos médicos e outros profissionais intervenientes no processo, incluindo os

que praticaram ou ajudaram à antecipação da morte, e das pessoas consultadas durante o procedimento;

b) Os elementos que confirmam o cumprimento dos requisitos exigidos pela presente lei para a antecipação

da morte;

c) A informação sobre o estado clínico, nomeadamente sobre o diagnóstico e prognóstico, com explicitação

da natureza grave e incurável da doença ou da condição definitiva e de gravidade extrema da lesão e das

características e intensidade previsível do sofrimento;

d) O método e os fármacos letais utilizados;

e) Data, hora e local onde se praticou a antecipação da morte e a identificação dos presentes;

f) Os fundamentos do encerramento do procedimento.

4 – O modelo de relatório final é estabelecido em regulamentação a aprovar pelo Governo.

CAPÍTULO III

Direitos e deveres dos profissionais de saúde

Artigo 18.º

Profissionais de saúde habilitados

1 – Os profissionais de saúde inscritos na Ordem dos Médicos e também os inscritos na Ordem dos

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Enfermeiros podem praticar ou ajudar ao ato de antecipação da morte, excluindo-se aqueles que possam vir a

obter qualquer benefício direto ou indireto da morte do doente, nomeadamente vantagem patrimonial.

2 – Para efeitos da prossecução do ato de antecipação da morte, os profissionais de saúde referidos no

número anterior devemverificar previamente a existência de prescrição dos fármacos necessários, efetuada nos

termos legais aplicáveis.

3 – Aos profissionais de saúde envolvidos no procedimento de antecipação da morte é disponibilizado,

sempre que solicitado, apoio psicológico.

Artigo 19.º

Deveres dos profissionais de saúde

No decurso do procedimento clínico de antecipação da morte, os médicos e outros profissionais de saúde

que nele intervêm devem respeitar os seguintes deveres:

a) Informar o doente de forma objetiva, compreensível, rigorosa, completa e verdadeira sobre o diagnóstico,

tratamentos aplicáveis, viáveis e disponíveis, resultados previsíveis, prognóstico e esperança de vida da sua

condição clínica;

b) Informar o doente sobre o seu direito de revogar a qualquer momento a sua decisão de antecipar a morte;

c) Informar o doente sobre os métodos de administração ou autoadministração dos fármacos letais para que

aquele possa escolher e decidir de forma esclarecida e consciente;

d) Assegurar que a decisão do doente é livre, esclarecida e informada;

e) Auscultar com periodicidade e frequência a vontade do doente;

f) Dialogar com os profissionais de saúde que prestam cuidados ao doente e, se autorizado pelo mesmo,

com os seus familiares e amigos;

g) Falar com o procurador de cuidados de saúde, no caso de ter sido nomeado e se para tal for autorizado

pelo doente;

h) Assegurar as condições para que o doente possa contactar as pessoas com quem o pretenda fazer;

i) Assegurar o acompanhamento psicológico do doente.

Artigo 20.º

Sigilo profissional e confidencialidade da informação

1 – Todos os profissionais que, direta ou indiretamente, participam no procedimento de antecipação da morte

estão obrigados a observar sigilo profissional relativamente a todos os atos, factos ou informações de que

tenham conhecimento no exercício das suas funções nesse âmbito, respeitando a confidencialidade da

informação a que tenham tido acesso, de acordo com a legislação em vigor.

2 – O acesso, proteção e tratamento da informação relacionada com o procedimento de antecipação da

morte processam-se de acordo com a legislação em vigor.

Artigo 21.º

Objeção de consciência

1 – Nenhum profissional de saúde pode ser obrigado a praticar ou ajudar ao ato de antecipação da morte de

um doente se, por motivos clínicos, éticos ou de qualquer outra natureza, entender não o dever fazer, sendo

assegurado o direito à objeção de consciência a todos os que o invoquem.

2 – A recusa do profissional deve ser comunicada ao doente num prazo não superior a 24 horas e deve

especificar a natureza das razões que a motivam, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.

3 – A objeção de consciência é manifestada em documento assinado pelo objetor, dirigido ao responsável

do estabelecimento de saúde onde o doente está a ser assistido e o objetor presta serviço, se for o caso, e com

cópia à respetiva ordem profissional.

4 – A objeção de consciência é válida e aplica-se em todos os estabelecimentos de saúde e locais de trabalho

onde o objetor exerça a sua profissão.

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5 – A objeção de consciência pode ser invocada a todo o tempo e não carece de fundamentação.

Artigo 22.º

Responsabilidade disciplinar

Os profissionais de saúde não podem ser sujeitos a responsabilidade disciplinar pela sua participação no

procedimento clínico de antecipação da morte, conquanto cumpram todas as condições e deveres estabelecidos

na presente lei.

CAPÍTULO IV

Fiscalização e avaliação

Artigo 23.º

Fiscalização

1 – Compete à IGAS a fiscalização dos procedimentos clínicos de antecipação de morte nos termos da

presente lei.

2 – Em caso de incumprimento da presente lei, a IGAS pode, fundamentadamente, determinar a suspensão

ou o cancelamento de procedimento em curso.

Artigo 24.º

Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Antecipação da Morte

Para cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 8.º e avaliação da aplicação da presente lei, é criada a

Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Antecipação da Morte (CVA).

Artigo 25.º

Composição e funcionamento da Comissão

1 – A CVA é composta por cinco personalidades de reconhecido mérito que garantam especial qualificação

nas áreas de conhecimento relacionadas com a aplicação da presente lei, designadas da seguinte forma:

a) Um jurista indicado pelo Conselho Superior da Magistratura;

b) Um jurista indicado pelo Conselho Superior do Ministério Público;

c) Um médico indicado pela Ordem dos Médicos;

d) Um enfermeiro indicado pela Ordem dos Enfermeiros;

e) Um especialista em bioética indicado pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.

2 – Não podem integrar a CVA os profissionais de saúde, referidos nas alíneas c) e d) do número anterior,

que tenham manifestado objeção de consciência nos termos do artigo 21.º

3 – O mandato dos membros da CVA é de cinco anos, renovável por um único período.

4 – A CVA elabora e aprova o seu regulamento interno e elege, de entre os seus membros, um presidente.

5 – A CVA funciona no âmbito da Assembleia da República, que assegura os encargos com o seu

funcionamento e o apoio técnico e administrativo necessários.

6 – Os membros da CVA não são remunerados pelo exercício das suas funções, tendo direito a senhas de

presença por cada reunião em que participam de montante a definir por despacho do Presidente da Assembleia

da República e, bem assim, a ajudas de custo e a requisições de transporte nos termos da lei geral.

Artigo 26.º

Verificação

1 – A CVA avalia a conformidade do procedimento clínico de antecipação da morte, através de parecer prévio,

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nos termos do artigo 8.º, e através de relatório de avaliação, nos termos do número seguinte.

2 – Uma vez recebido o relatório final do processo de antecipação da morte, que inclui o respetivo RCE, a

CVA examina o seu conteúdo e avalia, no prazo de cinco dias após essa receção, os termos em que as

condições e procedimentos estabelecidos na presente lei foram cumpridos.

3 – Nos casos em que a deliberação prevista no número anterior seja de desconformidade com os requisitos

estabelecidos pela presente lei, a CVA remete o relatório ao Ministério Público para os devidos efeitos e às

respetivas ordens dos profissionais envolvidos para efeitos de eventual processo disciplinar.

Artigo 27.º

Avaliação

1 – A CVA apresenta, anualmente, à Assembleia da República, um relatório de avaliação da aplicação da

presente lei, com informação estatística detalhada sobre todos os elementos relevantes dos processos de

antecipação da morte e que pode conter recomendações.

2 –Para elaboração do relatório são avaliados, com garantia de anonimato e confidencialidade, os relatórios

finais e respetivos RCE remetidos à CVA pelos médicos orientadores, que devem prestar todos os

esclarecimentos adicionais que esta lhes solicite.

3 – A IGAS presta à CVA as informações solicitadas sobre os procedimentos de fiscalização realizados

relativamente ao cumprimento da presente lei.

CAPÍTULO V

Alteração legislativa

Artigo 28.º

Alteração ao Código Penal

Os artigos 134.º, 135.º e 139.º do Código Penal passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 134.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – A conduta não é punível quando realizada no cumprimento das condições estabelecidas na Lei n.º

xx/aaaa.

Artigo 135.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – A conduta não é punível quando realizada no cumprimento das condições estabelecidas na Lei n.º

xx/aaaa.

Artigo 139.º

[…]

1 – [Atual corpo do artigo].

2 – Não é punido o médico ou enfermeiro que, não incitando nem fazendo propaganda, apenas preste

informação, a pedido expresso de outra pessoa, sobre o suicídio medicamente assistido, de acordo com o n.º 3

do artigo 135.º».

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CAPÍTULO VI

Disposições finais e transitórias

Artigo 29.º

Seguro de vida

1 – Para efeitos do contrato de seguro de vida, a antecipação da morte não é fator de exclusão.

2 – Os profissionais de saúde que participam, a qualquer título, no procedimento clínico de antecipação da

morte de uma pessoa segura perdem o direito a quaisquer prestações contratualizadas.

3 – Para efeitos de definição de causa de morte da pessoa segura, deve constar da certidão de óbito a

antecipação da morte.

4 – Uma vez iniciado o procedimento clínico de antecipação da morte, a pessoa segura não pode proceder

à alteração das cláusulas de designação dos beneficiários.

Artigo 30.º

Sítio da Internet

A Direção-Geral da Saúde disponibiliza, no seu sítio da Internet, uma área destinada a informação sobre a

realização da antecipação da morte medicamente assistida não punível, com os seguintes campos:

a) Informação sobre o procedimento clínico de antecipação da morte;

b) Formulários e documentos normalizados;

c) Legislação aplicável.

Artigo 31.º

Regulamentação

O Governo aprova, no prazo máximo de 90 dias após a publicação da presente lei, a respetiva

regulamentação.

Artigo 32.º

Disposição transitória

Nos dois primeiros anos de vigência da presente lei, a CVA apresenta semestralmente à Assembleia da

República o relatório de avaliação a que se refere o n.º 1 do artigo 27.º

Artigo 33.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 30 dias após a publicação da respetiva regulamentação.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins — Joana

Mortágua — José Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 6/XV/1.ª

ALARGA A TUTELA CRIMINAL DOS ANIMAIS, PROCEDENDO À QUINQUAGÉSIMA SEXTA

ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL

Exposição de motivos

A proteção animal é uma preocupação crescente da sociedade contemporânea, reveladora de uma maior

consciencialização no que respeita à capacidade de os seres percecionarem sensações e sentimentos de forma

consciente, bem como o sofrimento e dor.

Desde 1995 que a Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, aprovou o regime de proteção dos animais,

estabelecendo, designadamente, a proibição de «todas as violências injustificadas contra animais,

considerando-se como tais os atos consistentes em, sem necessidade, se infligir a morte, o sofrimento cruel e

prolongado ou graves lesões a um animal». Esta lei foi posteriormente alterada pela Lei n.º 19/2002, de 31 de

julho , pela Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, pela Lei n.º 39/2020, de 18 de agosto e pela Lei n.º 6/2022, de 7

de janeiro.

Apesar de na sua versão inicial o diploma remeter, no então artigo 9.º, para lei especial o regime

sancionatório, só volvidos 26 anos, com a Lei n.º 6/2022, de 7 de janeiro, foi introduzido um quadro

contraordenacional no diploma.

A sensibilidade dos animais («sentient beings») é hoje indubitável e a sua capacidade de sofrimento, a sua

sensibilidade à dor e a sua capacidade de afeto estão na origem de uma profunda reflexão ética e jurídica sobre

a relação entre o ser humano e os animais.

Em 2012 um grupo de renomados neurocientistas proclamaram a Declaração de Cambridge sobre a

Consciência dos Animais1:

«Nós declaramos o seguinte: ‘A ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo

experimente estados afetivos. Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos

neuroanatómicos, neuroquímicos e neurofisiológicos de estados de consciência juntamente com a capacidade

de exibir comportamentos intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os humanos não

são os únicos a possuir os substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo

todos os mamíferos e as aves, e muitas outras criaturas, incluindo polvos, também possuem esses substratos

neurológicos’» (sublinhado nosso).

Acontece, porém, que esta reflexão não pode permanecer apenas no campo da ética e da moral, sendo

necessária e urgente a apresentação de medidas para o seu correto enquadramento jurídico, em consonância

com os avanços científicos e sociais.

Neste mesmo sentido, destacamos as palavras do ilustre Professor Menezes Cordeiro, de que «há um fundo

ético-humanista que se estende a toda a forma de vida, particularmente à sensível. O ser humano sabe que o

animal pode sofrer; sabe fazê-lo sofrer; sabe evitar fazê-lo. A sabedoria dá-lhe responsabilidade. Nada disso o

deixará indiferente – ou teremos uma anomalia, em termos sociais e culturais, dado o paralelismo com todos os

valores humanos»2 (sublinhado nosso).

O artigo 13.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)3, na redação introduzida pelo

Tratado de Lisboa, veio reconhecer um dever de proteção por parte dos Estados-Membros aos animais,

enquanto seres «sensíveis», embora sujeitos a harmonização4:

«Na definição e aplicação das políticas da União nos domínios da agricultura, da pesca, dos transportes, do

mercado interno, da investigação e desenvolvimento tecnológico e do espaço, a União e os Estados-Membros

terão plenamente em conta as exigências em matéria de bem-estar dos animais, enquanto seres sensíveis,

respeitando simultaneamente as disposições legislativas e administrativas e os costumes dos Estados-

1 The Cambridge Declaration on Consciousness – 7 de Julho de 2012. 2 António Menezes Cordeiro, in Tratado de Direito Civil, III, Parte Geral, Coisas, Almedina, 2013, pág. 276. 3 Disponível em http://europa.eu/pol/pdf/consolidated-treaties_pt.pdf. 4 Com antecedentes no Protocolo n.º 13 do Tratado de Amesterdão (1997).

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Membros, nomeadamente em matéria de ritos religiosos, tradições culturais e património regional»5 (sublinhado

nosso).

A Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, representa um caminho muito importante na evolução do direito animal

em Portugal e um importante passo ao nível sancionatório, que teve como propósito resolver o que havia sido

deixado de fora da proteção penal existente, respondendo a necessidades prementes de prevenção geral.

Desta forma, aditou-se ao Código Penal um novo Título VI, designado «Dos Crimes contra Animais de

Companhia».

Este avanço no plano do direito penal, acompanhado da evolução ao nível do direito civil, revestiu-se de

grande importância, sendo que não podemos deixar de considerar que ainda há um grande caminho a

desenvolver no plano legislativo e, consequentemente, no plano jurisprudencial, assim como na própria

aplicação da lei já existente.

Um desses caminhos é, tal como se pretende com a presente iniciativa, alargar a tutela criminal que

atualmente é restrita aos chamados animais de companhia. Neste momento, quer o crime de maus-tratos

previsto no artigo 387.º do Código Penal, quer o crime de abandono previsto no artigo 388.º do mesmo diploma,

abrangem apenas animais de companhia.

O legislador pretendeu densificar o conceito de «animais de companhia» com o disposto no artigo 389.º do

Código Penal, todavia, grande parte das dúvidas legitimamente suscitadas não se mostram ainda dissipadas

por este normativo.

«A perspetiva adotada pelo legislador na qualificação como animais de companhia parte de uma visão

antropocêntrica, pelo que o que interessa para a qualificação do animal como sendo de companhia é a forma

como a pessoa que o detém o encara. Efetivamente, um bicho-da-seda, ou um aracnídeo, poderão ser

considerados animais de companhia desde que seja esse o papel que desempenham na vida dos seus donos».6

Desde as alterações promovidas pela Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, que se tem assistido a um debate

em torno da interpretação e subsequente aplicação dos novos tipos de crime inscritos no nosso ordenamento

jurídico em virtude da entrada em vigor do referido diploma.

Refere a Ordem dos Advogados, em parecer elaborado e emitido aquando da discussão da temática dos

crimes contra animais de companhia, que são «sobejamente conhecidas as dificuldades, insuficiências e

deficiências mais alarmantes que os mesmos suscitam e que têm conduzido a resultados injustos, desde logo,

no arquivamento de grande parte dos inquéritos abertos na sequência da apresentação de denúncias por atos

de matar cometidos com dolo, por violência exercida contra animais, que não de companhia, ou situações de

abandono em que estão omissos indícios de perigo concreto para a integridade animal».

Menciona ainda, no mesmo parecer, a necessidade da extensão da tutela penal a outros seres sencientes

ao defender que «desde já louvamos a intenção de estender a tutela penal a outros animais, que não apenas

os de companhia, orientação que vai ao encontro do sentimento de justiça geral de proteger da violência

desnecessária e evitável os outros seres sencientes que connosco partilham o planeta (neste caso, o território

nacional)».

Também no Parecer do Conselho Superior de Magistratura, proferido no dia 2 de fevereiro de 2014, aquando

da apreciação dos projetos que espoletaram a criminalização dos maus tratos e abandono de animais de

companhia, vislumbra-se opinião semelhante ao ser referido que «não vemos como os atos de crueldade

injustificada, praticados sobre um qualquer animal que não caiba na assim tão apertada previsão da norma,

fiquem fora da sua esfera de proteção (…) por exemplo, não se compreende a razão de se considerar legítima

a exclusão do âmbito da proteção da norma, os casos de violência ou maus tratos injustificados infligidos a um

burro, a uma vaca, a um cavalo ou a um veado, etc.».

Para além daquelas que são condutas manifestamente censuráveis em si mesmas relativas a maus-tratos e

abandono de animais, as quais são um verdadeiro flagelo, não podemos deixar de referir a estreita ligação entre

os maus-tratos a animais e a violência entre seres humanos.

Nos últimos quarenta anos, esta ligação tem sido objeto de constantes investigações e estudos. Conexões

psicológicas, sociológicas e médicas foram feitas por uma variedade de investigadores, com o acumular de uma

quantidade considerável de evidências empíricas.

5 Jornal Oficial da União Europeia, C 115/47, de 09/05/2008. 6 Crimes contra Animais de Companhia. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual, Artur Seguro Pereira, e-book, CEJ, Abril de 2019 (http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/penal/eb_Crime_Animais.pdf).

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Desta forma, este alargamento da tutela penal não só se reveste da mais fundamental justiça, como

acompanharia o caminho já traçado por outros Estados-Membros da União Europeia.

Nomeadamente, a Alemanha prevê, desde 1972, no artigo 17.º da Lei de Proteção dos Animais, a tutela

penal de todos os animais vertebrados, protegendo-os da morte injustificada e dos maus-tratos. Na verdade,

existe hoje total consenso científico relativamente à especial qualidade senciente dessa classe de animais.

Em 2010, o Código Penal espanhol passou a punir qualquer violência injustificada que fosse perpetrada

contra «animais de estimação, domésticos e amansados», sendo que em julho de 2015 previu o aumento das

molduras penais previstas para estes crimes, bem como o alargamento das categorias de animais abrangidos

também àqueles que são habitualmente domesticados, como os animais que vivam temporária ou

permanentemente sob o controlo humano ou qualquer animal que não viva em estado selvagem. Acrescentou

também a criminalização das condutas que impliquem «exploração sexual» dos animais (designada por zoofilia)

e previu sanções acessórias para os crimes referidos, nomeadamente a inabilitação para a guarda de animais

e inabilitação especial para o exercício de qualquer tipo de profissão ou atividade comercial que envolva animais.

No preâmbulo da Lei Orgânica 1/2015, que procedeu à citada alteração ao Código Penal espanhol, justifica-

se essa decisão de política criminal com o alarme social associado à violência contra os animais.

Em França, o artigo 521-123 do CodePénal pune os abusos graves ou os atos de crueldade praticados

contra os animais domésticos, domesticados ou em cativeiro com uma pena de prisão de dois anos e uma pena

de multa de 30 000 €. As pessoas singulares condenadas pela prática de crimes ao abrigo deste artigo ficam

proibidas, de forma permanente ou não, de ter um animal e do exercício, por um período máximo de cinco anos,

da atividade profissional ou social que tenha sido usada para cometer o crime.

O legislador francês, prevê ainda penas no Code Rural et de la Pêche Maritime, em relação aos maus tratos

contra animais verificados no contexto da execução de atividades agrícolas ou de pescas, tais como: A marcação

dos carneiros com alcatrão; a destruição de colónias de abelhas por sufocamento para recolha do mel ou da

cera; a guarda em cativeiro de animais selvagens e de privá-los em simultâneo de alimentação e de cuidados

de saúde; a guarda de animais domésticos sem qualquer abrigo; o transporte de animais em violação das

normas legalmente aplicáveis ou o abate de animais fora do matadouro (artigos R215-1 a R215-10).

O Código Penal italiano, em vigor por via do Regio Decreto 19 ottobre 1930, n.º 1398, desde de 2013, que

introduziu um TítuloIX-Bis denominado «Dos delitos contra o sentimento pelos animais» (Dei delitti contro il

sentimento per gli animali), punindo-se: O abate por crueldade ou sem necessidade de animais com pena de

prisão de quatro meses a dois anos (cfr. artigo 544-bis); os maus-tratos, a tortura e a sujeição a trabalhos

esforçados ou insuportáveis a animais com pena de prisão de três a dezoito meses e pena de multa de 3000 €

a 15 000 € (cfr. artigo 544-ter); os espetáculos e as manifestações com sevícias ou tortura para o animal com

pena de prisão de quatro meses a dois anos e com pena de multa de 3000 € a 15 000 € (cfr. artigo 544-quater);

a proibição de realização de combates e de competições não autorizadas que possam colocar em perigo a

integridade física de animais com pena de prisão de um a três anos e pena de multa de 50 000 € a 160 000 €

podendo ser agravada em 1/3 em circunstâncias excecionais (cfr. artigo 544-quinquies).

No Reino Unido desde 1911 que vigora o Protection of Animals Act, que previa já uma pena máxima de 6

meses de trabalhos forçados com uma multa e que a crueldade contra animais é, atualmente crime, tendo as

penas sido agravadas para 5 anos desde 29 de junho de 2021, através do Animal Welfare (Sentencing and

Recognition of Sentience) Draft Bill.

Os avanços na proteção dos animais verificam-se também para além das fronteiras da União Europeia. Nos

Estados Unidos da América, apesar de todos os estados terem leis que criminalizam a crueldade animal, com o

«Preventing Animal Cruelty and Torture Act (PACT» prevê-se que atos de crueldade contra «mamíferos não

humanos, pássaros, répteis ou anfíbios vivos» se subsumem a um crime federal.

Prevenir e punir tal crueldade foi considerado um imperativo de bem-estar animal e de saúde pública. Cada

vez mais é reconhecido que a crueldade animal é um crime grave e um precursor para outros crimes violentos.

Desde 2016, que o FBI alterou a categorização dos crimes contra animais, que passaram a ser tipificados como

«crimes contra a sociedade», a par dos crimes violentos contra pessoas, como os homicídios, acreditando que

dessa forma será mais fácil identificar os fatores de risco e atuar na prevenção da violência.

Em Portugal, desde 2017, por força da Lei n.º 8 ,de 3 de março, que alterou o Código Civil, que aos animais

é reconhecido um estatuto jurídico próprio (em geral, não limitado aos animais de companhia como a tutela

penal conferida pela Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto), dissociando-os do regime das coisas e reconhecendo

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que «os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto de proteção jurídica em virtude da sua

natureza» (vide artigo 201.º-B do Código Civil).

Reconheceu igualmente o legislador, que o direito de propriedade deve assegurar ao animal «o seu bem-

estar e respeitar as características de cada espécie e observar, no exercício dos seus direitos, as disposições

especiais relativas à criação, reprodução, detenção e proteção dos animais e à salvaguarda de espécies em

risco, sempre que exigíveis» (n.º 1 do artigo 1305.º-A do Código Civil).

Dispõe o n.º 2 do artigo 1305.º-A do Código Civil que assegurar o bem-estar animal deve compreender

«garantia de acesso a água e alimentação de acordo com as necessidades da espécie em questão»[alínea a)]

bem como «a garantia de acesso a cuidados médico-veterinários sempre que justificado, incluindo as medidas

profiláticas, de identificação e de vacinação previstas na lei» [alínea b)].

Pela primeira vez, o direito de propriedade foi ainda limitado, em razão de um bem jurídico prevalecente – o

bem-estar animal – tendo o legislador determinado no n.º 3 do artigo 1305.º-A do Código Civil que «o direito de

propriedade de um animal não abrange a possibilidade de, sem motivo legítimo, infligir dor, sofrimento ou

quaisquer outros maus-tratos que resultem em sofrimento injustificado, abandono ou morte».

Contudo, apesar do estatuto jurídico e das inúmeras denúncias de maus-tratos e abandono que são feitas,

no que respeita à proteção penal dos animais, o nosso Código Penal não acompanhou ainda a evolução feita

no direito penal de outros países, o repto da sociedade civil que clama por esta alteração legislativa, bem como

a doutrina e própria jurisprudência.

Desde os tribunais de primeira instância aos tribunais superiores que existe o reconhecimento de que

independentemente da finalidade com que os animais são detidos, devem ser sujeitos a uma existência digna7.

Pode ler-se no Acórdão da Relação do Porto, de 19 de fevereiro de 2015, referente ao processo

1813/12.6TBPNF.P1 que «constitui um dado civilizacional adquirido nas sociedade europeias modernas o

respeito pelos direitos dos animais. A aceitação de que os animais são seres vivos carecidos de atenção,

cuidados e proteção do homem, e não coisas de que o homem possa dispor a seu bel-prazer, designadamente

sujeitando-os a maus tratos ou a atos cruéis, tem implícito o reconhecimento das vantagens da relação do

homem com os animais de companhia, tanto para o homem como para os animais, e subjacente a necessidade

de um mínimo de tutela jurídica dessa relação, de que são exemplo a punição criminal dos maus tratos a animais

e controle administrativo das condições em que esses animais são detidos. Por conseguinte, a relação do

homem com os seus animais de companhia possui hoje já um relevo à face da ordem jurídica que não pode ser

desprezado»8.

É nossa convicção que atualmente já existe no nosso país amplo consenso em torno das soluções jurídico-

criminais adotadas por outros ordenamentos jurídicos afins, como é o caso do país vizinho.

O exposto torna premente a necessidade de alteração das premissas legais no âmbito da tutela penal dos

animais, ditando a eliminação do atual critério funcionalista e subjetivo, dificultador da interpretação e da

aplicação das normas penais e até do fundamento constitucional destas, conforme tem sido alertado por ilustres

penalistas como a Professora Doutora Teresa Quintela de Brito, já ouvida sobre esse assunto em sede de

comissão parlamentar.

Neste sentido e nas palavras da filósofa norte-americana Martha Nussbaum «os animais não humanos são

capazes de uma existência condigna. É difícil precisar o que a frase pode significar, mas é relativamente claro

o que não significa (…) O facto de os humanos actuarem de uma forma que nega essa existência condigna

aparenta ser uma questão de justiça, e uma questão urgente»9.

Considerando o que vai exposto, o PAN propõe-se alargar a tutela penal dos animais, com base no modelo

espanhol vigente, corrigindo, assim, aquela que é uma clamorosa injustiça de tratamento entre animais que não

sentem de forma diferente, independentemente do objetivo da sua utilização, pelo menos daqueles mais

vulneráveis, que estão à mercê da ação humana.

Por fim, entendemos que, face ao regime da propriedade de animais, tal como se encontra hoje configurado

pelo artigo 1305.º-A do Código Civil, importa diferenciar a propriedade de coisas inanimadas da propriedade de

animais, no âmbito da tutela penal do património, concretamente no que respeita ao crime de dano e na

consequente tipologia do crime, diferenciando e submetendo à necessidade de queixa ou acusação particular

7 O Direito dos animais – Jornal Universitário do Porto. 8 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto. 9 Martha Nussbaum, Frontiers of Justice, 2007.

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apenas os crimes cujo objeto da ação seja uma coisa.

Nestes termos, a abaixo assinada Deputada única representante do partido Pessoas-Animais-Natureza, ao

abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei alarga a outros animais a tutela criminal prevista contra os animais de companhia, procedendo,

para o efeito, à quinquagésima sexta alteração do Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de

setembro.

Artigo 2.º

Alteração ao Código Penal

São alterados os artigos 111.º, 207, 212.º, 213.º, 387.º, 388º, 388.º-A e 390.º do Código Penal, aprovado pelo

Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, que passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 111.º

Animais, instrumentos, produtos ou vantagens pertencentes a terceiro

1 – Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a perda não tem lugar se os animais, instrumentos,

produtos ou vantagens não pertencerem, à data do facto, a nenhum dos agentes ou beneficiários, ou não lhes

pertencerem no momento em que a perda foi decretada.

2 – Ainda que os animais, instrumentos, produtos ou vantagens pertençam a terceiro, é decretada a perda

quando:

a) O seu titular tiver concorrido, de forma censurável, para o seu maltrato ou a sua lesão, utilização ou

produção, ou do facto tiver retirado benefícios;

b) Os animais, instrumentos, produtos ou vantagens forem, por qualquer título, adquiridos após a prática do

facto, conhecendo ou devendo conhecer o adquirente a sua proveniência; ou

c) Os animais, instrumentos, produtos ou vantagens, ou o valor a estes correspondente, tiverem, por qualquer

título, sido transferidos para o terceiro para evitar a perda decretada nos termos dos artigos 109.º, 109.º-A e

110.º, sendo ou devendo tal finalidade ser por ele conhecida.

3 – […].

4 – […].

Artigo 207.º

[…]

1 – […]:

a) […]; ou

b) A coisa furtada ou ilegitimamente apropriada for de valor diminuto e destinada a utilização imediata e

indispensável à satisfação de uma necessidade do agente ou de outra pessoa mencionada na alínea a).

2 – No caso do artigo 203.º, o procedimento criminal depende de acusação particular quando a conduta

ocorrer em estabelecimento comercial, durante o período de abertura ao público, relativamente à subtração de

coisas móveis de valor diminuto e desde que tenha havido recuperação imediata destas, salvo quando cometida

por duas ou mais pessoas.

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Artigo 212.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – O procedimento criminal depende de queixa se o objeto da ação for uma coisa.

4 – É correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 206.º e 207.º se o objeto da ação for uma coisa.

Artigo 213.º

[…]

1 – […].

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […]:

[…]

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

[…]

3 – É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 204.º e 2 e 3 do artigo 206.º e na

alínea a) do n.º 1 do artigo 207.º se o objeto da ação for uma coisa.

4 – […].

Artigo 387.º

Morte e maus-tratos de animal

1 – Quem, sem motivo legítimo, matar um animal é punido com pena de prisão de 6 meses a 2 anos ou com

pena de multa de 60 a 240 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.

2 – […].

3 – Quem, sem motivo legítimo, infligir dor, sofrimento ou quaisquer outros maus-tratos físicos a um animal

é punido com pena de prisão de 6 meses a 1 ano ou com pena de multa de 60 a 120 dias.

4 – […].

5 – […]:

a) […];

b) […];

c) […].

Artigo 388.º

Abandono de animais

1 – Quem, tendo o dever de guardar, vigiar ou assistir animal, o abandonar, pondo desse modo em perigo a

sua alimentação e a prestação de cuidados que lhe são devidos, é punido com pena de prisão até seis meses

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ou com pena de multa até 60 dias.

2 – […].

Artigo 388.º-A

Penas acessórias

1 – Consoante a gravidade do ilícito e a culpa do agente, podem ser aplicadas, cumulativamente com as

penas previstas para os crimes referidos nos artigos 387.º e 388.º, as seguintes penas acessórias:

a) Privação do direito de detenção de animais pelo período máximo de 6 anos;

b) Privação do direito de participar em feiras, mercados, exposições ou concursos relacionados com animais;

c) Encerramento de estabelecimento relacionado com animais cujo funcionamento esteja sujeito a

autorização ou licença administrativa;

d) Suspensão de permissões administrativas, incluindo autorizações, licenças e alvarás, relacionadas com

animais.

2 – […].

Artigo 389.º

Conceito de animal

1 – Para efeitos do disposto no presente título entende-se por animal:

a) Um animal doméstico ou amansado;

b) Um animal dos que habitualmente sejam domesticados;

c) Um animal que, temporária ou permanentemente, se encontre sob controlo humano; ou

d) Qualquer animal que não viva em estado selvagem, ou que vivendo em estado de liberdade, não se

encontre protegido por norma especial.

2 – O disposto no número anterior não se aplica à utilização de animais nos termos e para os fins legais,

designadamente:

a) Fins agrícolas, pecuários, agroindustriais ou de pesca, aquacultura e transformação de pescado;

b) Espetáculos comerciais;

c) Atividades cinegéticas;

d) Atividades culturais e desportivas;

e) Atos médico-veterinários;

f) Investigação científica;

g) Salvaguarda da saúde pública;

h) Exercício da liberdade religiosa.

i) Outros fins legalmente previstos.

3 – [Revogado].»

Artigo 3.º

Aditamento ao Código Penal

É aditado o artigo 109.º-A ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, com

a seguinte redação:

«Artigo 109.º-A

Perda de animais que sejam vítimas de crimes

São declarados perdidos a favor do Estado os animais que sejam vítimas de crimes quando, pelas

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circunstâncias do caso, se mostrar comprometida, em definitivo, a convivência entre o animal e o seu detentor,

agente do crime, ou quando exista fundado risco da prática de factos semelhantes aos que motivaram a

condenação.

Artigo 4.º

Alterações à organização sistemática do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro

É alterada a epígrafe do Capítulo IX da Secção IV do Título III do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro

da de «Perda de instrumentos, produtos e vantagens» para «Perda de animais, instrumentos, produtos e

vantagens», contendo os artigos 109.º a 112.º-A.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 29 de março de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE LEI N.º 7/XV/1.ª

AUMENTA O VALOR RELATIVO AO COMPLEMENTO ESPECIAL DE PENSÃO DOS ANTIGOS

COMBATENTES

Exposição de motivos

No ano de 2020, depois de décadas a reivindicar um estatuto próprio, foi finalmente aprovado o Estatuto do

Antigo Combatente. Esta lei, para além de determinar um importante conjunto de medidas de apoio aos Antigos

Combatentes e às suas famílias, é especialmente importante pelo justo (apesar de tardio) reconhecimento pelo

Estado português dos serviços prestados pelos militares a Portugal.

Mais concretamente, o Estatuto determina o enquadramento jurídico que é aplicável a estas pessoas, para

além de integrar instrumentos de apoio económico e social e informar sobre as formas para obtenção dos apoios

previstos. Com a aprovação deste Estatuto foi, nomeadamente, criado o cartão do Antigo Combatente, foi

simbolicamente definido o dia 11 de Novembro como o dia do Antigo Combatente, determinado o conjunto de

direitos e benefícios que os ex-militares podem usufruir, instituído o balcão único da defesa, a rede nacional de

apoio, o centro de recurso de stress em contexto familiar, entre outras coisas. Para além do reconhecimento

pelo trabalho desenvolvido em prol do País, pretende-se assegurar o envelhecimento digno e acompanhado

destas pessoas, pois são conhecidas as dificuldades que muitos passam aos dias de hoje, seja ao nível físico

como mental, para além de dificuldades económicas e sociais, existindo casos de Antigos Combatentes em

situação de sem-abrigo.

De facto, a aprovação deste Estatuto foi importante, no entanto, o Chega considera que o complemento

especial de pensão, na forma que é atualmente calculado resulta num valor que é muito reduzido face às

dificuldades que muitos dos ex-militares e as suas famílias passam.

Segundo a Lei n.º 46/2020, de 20 de agosto (lei que aprova o Estatuto do Antigo Combatente), o

complemento especial de pensão, corresponde a uma prestação pecuniária cujo montante corresponde a 7%

do valor da pensão social por cada ano de prestação de serviço militar ou o duodécimo daquele valor por cada

mês de serviço.

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Podem beneficiar deste complemento os Antigos Combatentes pensionistas do regime de solidariedade do

sistema de segurança social (bem como as viúvas, pensionistas de sobrevivências destas pensões), que

recebam uma pensão rural ou uma pensão social e que cumulativamente: Recebam pensão social de invalidez

ou social de velhice da segurança social, do regime especial das atividades agrícolas e do transitório rural;

tenham certificado, a seu pedido, o tempo de serviço militar em condições de dificuldade ou perigo. Este

complemento é pago uma vez por ano, no mês de outubro, correspondendo às 14 mensalidades a que o

beneficiário tem direito1.

Não basta dizer que se reconhece o sacrifício destes militares bem como a coragem e lealdade com que

combateram em vários teatros operacionais, o Chega considera que é preciso traduzir esse reconhecimento em

apoios efetivos e adequados.

Veja-se o exemplo francês. Esta matéria está contemplada no Code des pensions militaires d'invalidité et des

victimes de guerre onde são determinados os requisitos para ser considerado antigo combatente bem como o

direito à atribuição de vários títulos, cartões e apoios. A pensão de combatente não se confunde com a pensão

de reforma e consubstancia uma forma de reconhecimento pelos serviços prestados, tendo o valor de 751,40 €

pagos semestralmente, até à morte do seu beneficiário. Para além disso esta pensão pode ser acumulada com

outras pensões, é isenta de impostos e não conta como rendimento.

Podemos assim concluir que o regime francês é muito mais vantajoso para os Antigos Combatentes do que

aquele que o Estado português atualmente assegura. Desta forma o Chega, tal como mencionado no programa

eleitoral do partido, «(…) honrará os Antigos Combatentes do Ultramar e familiares diretos através de medidas

concretas que respondam às suas reivindicações como forma de agradecimento e da mais elementar justiça a

quem ofereceu a vida em defesa da pátria.», pelo que propõe um valor mínimo de 300 € para o complemento

especial de pensão, assim como seja possível a acumulação de benefícios, algo que é atualmente

impossibilitado pela Lei n.º 9/2002, de 11 de fevereiro.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, o Grupo Parlamentar do Chega apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei aumenta o valor relativo ao Complemento Especial de Pensão dos Antigos Combatentes.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 9/2002, de 11 de fevereiro

É alterado o artigo 6.º da Lei n.º 9/2002, de 11 de fevereiro, alterada pela Lei n.º 46/2020, de 20 de agosto,

que aprovou o Estatuto do Antigo Combatente, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 6.º

[…]

Aos beneficiários do regime de solidariedade do sistema de segurança social é atribuído um complemento

especial de 300 € por mês, independentemente do tempo de serviço prestado.

Artigo 3.º

Alteração à Lei n.º 3/2009, de 13 de janeiro

São alterados os artigos 5.º e 9.º da alteração à Lei n.º 3/2009, de 13 de janeiro, que regula os efeitos jurídicos

dos períodos de prestação de serviço militar de antigos combatentes para efeitos de atribuição dos benefícios

previstos nas Leis n.º 9/2002, de 11 de fevereiro, e 21/2004, de 5 de junho, os quais passam a ter a seguinte

redação:

1 Informação disponível em https://www.defesa.gov.pt/pt/adefesaeeu/ac/eac.

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«Artigo 5.º

[…]

1 – O complemento especial de pensão previsto no artigo 6.º da Lei n.º 9/2002, de 11 de Fevereiro, atribuído

aos pensionistas dos regimes do subsistema de solidariedade é uma prestação pecuniária no montante de 300

€ por mês independentemente do tempo de serviço.

2 – […].

Artigo 9.º

[…]

1 – [Revogado].

2 – […].»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Palácio de São Bento, 29 de março de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias

— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

———

PROJETO DE LEI N.º 8/XV/1.ª

ALARGA OS PRAZOS DE PRESCRIÇÃO DE CRIMES CONTRA A LIBERDADE E

AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL DE MENORES E DO CRIME DE MUTILAÇÃO GENITAL FEMININA,

PROCEDENDO À ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL

Exposição de motivos

A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (Convention on the Rights of the Child1), de

20 de novembro de 1989, determina, no seu artigo 19, que os Estados-Membros devem aprovar as medidas

legislativas, administrativas, sociais e educativas necessárias a proteger a criança contra todas as formas de

violência física e mental, agressões ou abuso, negligência, maus tratos ou exploração, incluindo abuso sexual,

enquanto se mantenha ao cuidado de progenitores, tutores ou outras pessoas que tenham a criança a seu cargo,

cabendo, de acordo com o artigo 34 desta Convenção, aos Estados-Membros diligenciar no sentido de proteger

a criança contra todas as formas de exploração e abuso sexuais.

Também a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia dispõe, no n.º 1 do seu artigo 24.º, que as

crianças têm direito à proteção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar, sendo sempre aplicável o princípio

da inviolabilidade da dignidade do ser humano.

Em 2011 foi adotada a Diretiva da União Europeia sobre o Combate ao Abuso Sexual e à Exploração Sexual

1 OHCHR – Convention on the Rights of the Child.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 1

48

de Crianças e a pornografia infantil2, referindo que o abuso sexual e a exploração sexual de crianças constituem

violações graves dos direitos fundamentais, em especial do direito das crianças à proteção e aos cuidados

necessários ao seu bem-estar, tal como estabelecido na Convenção das Nações Unidas de 1989 sobre os

Direitos da Criança e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Esta Diretiva refere, no seu ponto 26, que «a investigação dos crimes e a dedução da acusação em processo

penal deverão ser facilitadas, tendo em conta (…) as dificuldades que as crianças vítimas destes crimes

enfrentam para denunciar os abusos sexuais (…). Para que a investigação e a ação penal relativas aos crimes

referidos na presente diretiva possam ser bem sucedidas, a sua promoção não deverá depender, em princípio,

de queixa ou acusação feita pela vítima ou pelo seu representante. Os prazos de prescrição da ação penal

deverão ser fixados de acordo com a legislação nacional».

É na sequência da obrigatoriedade acima descrita que o Pessoas-Animais-Natureza trouxe este tema ao

debate no início do ano de 2021, com a apresentação do Projeto de Lei n.º 771/XIV/2.ª, e que, pela sua enorme

importância e na medida em que ainda não se deu cabal cumprimento à pretensão da diretiva, reforçou com a

apresentação do Projeto de Lei n.º 968/XIV/3.ª que se viu aprovado na generalidade.

Contudo, face à dissolução da Assembleia da República ocorrida em dezembro de 2021, foi prejudicado o

processo legislativo em curso, sendo, desta forma, necessário corroborar a iniciativa anteriormente apresentada

de forma que seja, desta feita, possível que corra os seus termos.

Isto porque sabemos que o constrangimento causado por este tipo de crimes na vítima, ao qual acresce a

especial dificuldade em integrar o sucedido, o receio de voltar a enfrentar o agressor, a exposição pública da

sua intimidade perante as autoridades públicas e policiais e o receio da revitimização associada a todo o

processo levam a que, nestes casos, a/o ofendida/o acabe por preferir o silêncio e a impunibilidade da/o

agressor/a à denúncia do crime e impulso do processo penal que se mostra muitas vezes moroso e desgastante.

Comprovativo desta realidade são os dados apresentados pela associação Quebrar o Silêncio que nos refere

que os homens que em crianças ou jovens foram vítimas deste tipo de abuso apenas denunciam o crime e

procuram ajuda, no mínimo, 20 anos após o abuso, encontrando-se a maioria dos homens na casa dos 35-40

anos quando, finalmente, sentem que reúnem as condições para o fazer.

No atual quadro legal, muito embora a prescrição nunca ocorra antes de a vítima perfazer 23 anos de idade,

estes crimes estão prescritos, em alguns casos, há décadas.

Acresce ainda o facto de a esta idade e dependendo da relação que a vítima tenha com o/a agressor/a,

sendo, por hipótese, o/a agressor/a progenitor/a da vítima, poderá esta última ainda ser dependente do/a

primeiro/a.

Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e o processo penal que lhe está

associado são extremamente traumáticos para a vítima do ponto de vista físico e psicológico. Atendendo a isto,

no âmbito Projeto CARE – rede de apoio especializado a crianças e jovens vítimas de violência sexual3,

assinalou-se que o tempo que passa entre a perpetração do crime e a sua revelação pode variar em função do

impacto que o crime teve na criança ou jovem, sendo que em 63,6% dos casos a revelação destes crimes

acontece um ano ou mais depois de o abuso ter acontecido, situação que pode acontecer por diversas razões,

entre as quais se encontra, por exemplo, a relação da vítima com o/a agressor/a, a não percepção dos factos

como crime, a auto-culpabilização, a falta ou insuficiência de provas, ou o síndrome da acomodação da criança

vítima de abuso sexual.

A última alteração estrutural às regras de prescrição destes crimes ocorreu em 2007, sendo que volvidos 15

anos é mais do que urgente que se assegure um quadro legal capaz de proteger estas vítimas. É premente que

se assegure que a vítima se sente preparada, do ponto de vista emocional, para a revelação do crime e para

lidar com todos os aspetos relacionados com o seguimento do procedimento criminal.

O Pessoas-Animais-Natureza propõe a alteração dos prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e

autodeterminação sexual de menores e do crime de mutilação genital feminina, de forma a que se passe a

assegurar que quando o/a ofendido/a for menor de 14 anos o procedimento criminal nunca se extinga antes de

este/a perfazer 40 anos, e que quando o/a ofendido/a for maior de 14 anos passe a haver um prazo de prescrição

de 20 anos que nunca poderá, no entanto, ocorrer antes de este/a perfazer 35 anos.

2 Diretiva 2011/93/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Dezembro de 2011, relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil, e que substitui a Decisão-Quadro 2004/68/JAI do Conselho. 3 Projeto CARE (2017), Manual CARE – Apoio a crianças e jovens vítimas de violência sexual, pág. 53 e 54.

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49

Esta proposta é apresentada com vista a colmatar o injustificado atraso que se verifica face a outros países

da União Europeia.

Em Espanha, quando a vítima é menor de 18 anos, o referido prazo prescricional só iniciará a sua contagem

a partir do momento em que a vítima perfaz 35 anos de idade.

Em França, nos termos do article 7 do Code de procédure pénale, a ação penal prescreve no prazo de 20

anos contado da data da prática do crime. Contudo, no caso de violação ou agressões sexuais contra menores

de 15 anos, o crime prescreve no prazo de 30 anos a contar da maioridade das vítimas (article 7 e article 706-

47 do Code de procédure pénale).

Em Itália, de acordo com o articolo 609-bis do Codice Penale, qualquer pessoa que, através de violência,

ameaças ou abuso de autoridade, forçar alguém a realizar ou a sofrer atos sexuais é punido com pena de prisão

de 6 a 12 anos, acrescendo que, nos termos do articolo 609-ter, a pena de prisão é agravada em um terço, no

caso de a vítima ser menor de 18 anos, sendo aumentada em metade se a vítima for menor de 14 anos e no

dobro se a vítima for menor de 10 anos.

É urgente fazer face ao conhecido silêncio das vítimas e aos efeitos traumáticos destes crimes, permitindo,

com a redação que ora se propõe, diferenciar entre a altura da vida da criança em que o crime é praticado, não

esquecendo que esse é um facto com consequências potencialmente distintas, na medida em que se verificam

maiores implicações ao desenvolvimento da criança do ponto de vista físico e psicológico quando um crime

desta natureza é praticado em vítimas com diminuta idade.

Desta forma, é necessário abrir no nosso País o debate sério sobre o alargamento dos prazos de prescrição

destes crimes, como já previsto em outros países, de forma a assegurar que a vítima se sente preparada, do

ponto de vista emocional, para a revelação do crime e para lidar com todos os aspetos relacionados com o

seguimento do procedimento criminal.

Assim, com o presente projeto de lei o PAN pretende alterar o Código Penal de forma a alargar os prazos de

prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e do crime de mutilação genital

feminina.

Nestes termos, a abaixo assinada Deputada única do partido Pessoas-Animais-Natureza, ao abrigo das

disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei aprova a quinquagésima sexta alteração do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º

400/82, de 23 de setembro.

Artigo 2.º

Alteração ao Código Penal

É alterado o artigo 118.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, que

passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 118.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […].

2 – […].

3 – […].

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50

4 – […].

5 – Nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, bem como no crime de mutilação

genital feminina sendo a vítima menor, o procedimento criminal:

a) Não se extingue, por efeito da prescrição, antes de o ofendido perfazer 40 anos, quando ofendido seja

menor de 14 anos;

b) Extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a sua prática tiverem decorrido 20 anos, não podendo

tal prescrição ocorrer antes de o ofendido perfazer 35 anos, quando ofendido seja maior de 14 anos.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE LEI N.º 9/XV/1.ª

ESTABELECE A REMUNERAÇÃO OBRIGATÓRIA DOS ESTÁGIOS PROFISSIONAIS PARA O

ACESSO AO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO, PROCEDENDO À PRIMEIRA ALTERAÇÃO DA LEI N.º 2/2013,

DE 10 DE JANEIRO, E DOS ESTATUTOS DE DIVERSAS ASSOCIAÇÕES PÚBLICAS PROFISSIONAIS

Exposição de motivos

Em Portugal, após anos de estudos no ensino superior, milhares de jovens são obrigados a frequentar

estágios profissionais para poderem aceder à profissão para a qual adquiriram qualificação durante os seus

estudos superiores. Esta é a realidade que ocorre quanto aos jovens que pretendem ser advogados, arquitetos,

contabilistas certificados, despachantes oficiais, economistas, engenheiros, notários, nutricionistas, psicólogos,

revisores oficiais de contas, enfermeiros, solicitadores e agentes de execução.

Os estatutos das ordens destas profissões não estabelecem a obrigatoriedade de remuneração destes

estágios, o que significa que o direito de remuneração acaba, muitas vezes, por ser uma cortesia da entidade

de acolhimento do estagiário. A maioria destas ordens profissionais também acaba por impor aos estagiários

taxas de inscrição de valores desproporcionais e algumas delas exigem também ao estagiário a subscrição de

certos seguros.

Todo este enquadramento, associado aos custos que têm de suportar com o transporte, alimentação,

inscrição no estágio, seguros e habitação, acaba por gerar a situação injusta de milhares de jovens licenciados

terem de, na prática, pagar para entrar no mercado de trabalho e pagar para trabalhar, comprometendo a sua

independência – uma vez que têm de se manter na dependência da sua família.

Este é igualmente um fator de desigualdade social, dado que, geralmente, são os jovens provenientes de

classes mais altas que têm condições para aceitar estágios neste tipo de condições, e que não promove a

coesão territorial, uma vez que, tendencialmente, as entidades de acolhimento do estagiário que melhores

condições têm para assegurar a remuneração dos estagiários localizam-se no litoral e em especial nas áreas

metropolitanas de Lisboa e do Porto.

A injustiça deste quadro legal é particularmente visível ao nível dos advogados e tem levado a

posicionamentos públicos no sentido da defesa do direito de remuneração no âmbito dos estágios profissionais

de acesso à profissão.

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Em 2016, a antiga Bastonária da Ordem dos Advogados, Elina Fraga, afirmava que apenas 10% dos 4000

inscritos nos estágios da Ordem eram remunerados, defendendo, por isso, uma solução que garantisse a

respetiva remuneração1. De acordo com uma notícia publicada no sítio da Internet da Ordem dos Advogados

em 2021, o atual Bastonário da Ordem dos Advogados, Luís Menezes Leitão, é também favorável a uma

alteração que garanta a remuneração dos estágios profissionais, reconhecendo «a importância da existência de

estágios remunerados, que poderiam ocorrer através de um sistema de bolsas do Instituto de Emprego e

Formação Profissional»2.

Face ao exposto e procurando pôr fim a esta realidade injusta, com o presente projeto de lei, o PAN propõe

uma alteração da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, e dos estatutos das diversas ordens profissionais que exigem

estágios profissionais para o acesso à profissão, mas que não garantem a obrigatoriedade da sua remuneração,

de forma a garantir o fim dos estágios não remunerados, através da exigência de remuneração obrigatória

variável consoante o estudante tenha licenciatura (1,65 x IAS) ou mestrado (1,75 x IAS), e do pagamento de

subsídio de refeição equivalente ao dos trabalhadores da função pública.

Tendo em vista a maior salvaguarda dos direitos dos estagiários, propomos também que sempre que os

estatutos das associações públicas profissionais exijam obrigatoriamente seguro de acidentes pessoais ou

seguro de responsabilidade civil profissional, que os encargos de tal subscrição corram por conta da entidade

de acolhimento e não, como até aqui, por conta do estagiário.

Finalmente e com o objetivo de assegurar a necessidade de adaptar esta medida à realidade do mercado e

de evitar que a mesma possa ter como consequência a rejeição de estágios por parte das entidades de

acolhimento, propõe-se também que, no prazo de 60 dias após a publicação desta lei, o Governo proceda à

alteração da Portaria n.º 206/2020, de 27 de agosto. Pretende-se com esta alteração assegurar a criação de um

regime especial aplicável aos estágios profissionais para o acesso e o exercício da profissão no âmbito da

medida de estágios ATIVAR.PT, que garanta o financiamento destes estágios pelo Instituto do Emprego e

Formação Profissional (IEFP).

O conteúdo da presente iniciativa corresponde no essencial ao apresentado pelo PAN no Projeto de Lei n.º

989/XIV/3.ª, que foi aprovado com os votos a favor do PAN, do PS, de quatro Deputados do PSD, do BE, do CH

e do IL, e a abstenção do PSD, do PCP, do CDS-PP e do PEV, não tendo visto o seu processo legislativo

concluído em virtude da dissolução da Assembleia da República.

Nestes termos, a abaixo assinada Deputada única do PAN, ao abrigo das disposições constitucionais e

regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece a remuneração obrigatória dos estágios profissionais para o acesso ao exercício

da profissão, procedendo:

a) À primeira alteração da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação,

organização e funcionamento das associações públicas profissionais;

b) À segunda alteração ao Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 9 de

setembro, e alterado pela Lei n.º 23/2020, de 6 de julho;

c) À segunda alteração ao Estatuto da Ordem dos Arquitetos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/98, de 3 de

julho, e alterado pela Lei n.º 113/2015, de 28 de agosto;

d) À terceira alteração ao Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º

452/99, de 5 de novembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 310/2009, de 26 de outubro, e Lei n.º 139/2015, de 7

de setembro;

e) À quarta alteração ao Estatuto da Ordem dos Despachantes Oficiais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 173/98,

de 26 de junho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 73/2001, de 26 de fevereiro, e 228/2007, de 11 de junho, e

pela Lei n.º 112/2015, de 27 de agosto;

f) À segunda alteração ao Estatuto da Ordem dos Economistas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 174/98 de 27

1 Declarações disponíveis em: https://www.dn.pt/portugal/advogados-vao-passar-a-ter-estagios-financiados-pelo-estado-5051324.htm. 2 Notícia disponível em: https://portal.oa.pt/comunicacao/imprensa/2021/02/22/faculdade-ordem-e-firmas/.

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de junho, e alterado pela Lei n.º 101/2015, de 20 de agosto;

g) À segunda alteração ao Estatuto da Ordem dos Engenheiros, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 119/92, de 30

de junho, e alterado pela Lei n.º 123/2015, de 2 de setembro;

h) À quinta alteração ao Estatuto da Ordem dos Notários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 26/2004, de 4 de

fevereiro e alterada pela Lei n.º 51/2004, de 29 de outubro, Decreto-Lei n.º 15/2011, de 25 de janeiro, Lei n.º

155/2015, de 15 de setembro e Decreto-Lei n.º 145/2019, de 23 de setembro.

i) À segunda alteração ao Estatuto da Ordem dos Nutricionistas, aprovado pela Lei n.º 51/2010, de 14 de

dezembro e alterado pela Lei n.º 126/2015 de 3 de setembro;

j) À terceira alteração ao Estatuto da Ordem dos Psicólogos Portugueses, aprovado pela Lei n.º 57/2008, de

4 de setembro, e alterado pelas Leis n.os 27/2012, de 31 de julho, e 138/2015, de 7 de setembro;

k) À primeira alteração ao Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, aprovado pela Lei n.º

140/2015, de 7 de setembro;

i) À primeira alteração ao Estatuto da Ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução, aprovado pela Lei

n.º 154/2015, de 14 de setembro;

m) À terceira alteração ao Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 104/98, de 21

de abril, alterado pelas Leis n.os 111/2009, de 16 de setembro, e 156/2015, de 16 de setembro.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro

O artigo 8.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 8.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […];

i) […];

j) […];

k) […];

l) […];

m) […];

n) […];

o) […];

p) […].

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […].

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53

3 – […].

4 – […].

5 – As tabelas de enquadramento das taxas cobradas durante o estágio profissional ou eventual período de

formação obedecem aos critérios da adequação, necessidade e proporcionalidade, e preveem isenções de

pagamento para os estagiários que demonstrem que beneficiaram de bolsa de estudo nos anos de frequência

do curso de licenciatura.

6 – Sem prejuízo do disposto nos estatutos das associações públicas profissionais, os estágios profissionais

são remunerados, tendo o estagiário o direito:

a) A remuneração, com o valor mínimo de:

i) 1,65 x IAS, no caso de o estagiário ser detentor de uma qualificação de nível 6 do Quadro Nacional de

Qualificações;

ii) 1,75 x IAS, no caso de o estagiário ser detentor de uma qualificação de nível 7 do Quadro Nacional de

Qualificações.

b) A subsídio de refeição de valor idêntico ao fixado para a generalidade dos trabalhadores que exercem

funções públicas; e

c) Sempre que os estatutos das associações públicas profissionais exijam obrigatoriamente seguro de

acidentes pessoais ou seguro de responsabilidade civil profissional, a que os encargos de tal subscrição corram

por conta da entidade de acolhimento.»

Artigo 3.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Advogados

Os artigos 195.º e 196.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 9 de

setembro, na sua atual redação, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 195.º

[…]

1 – […].

2 – O estágio é remunerado nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, e tem início, pelo

menos, uma vez em cada ano civil, em data a fixar pelo conselho geral, e a duração máxima de 18 meses,

contados da data de inscrição até à realização da prova referida no n.º 6.

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – […].

8 – […].

9 – […].

Artigo 196.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […].

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54

2 – […].

3 – […].

4 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […].

5 – No momento da inscrição, o estagiário deve apresentar comprovativo de subscrição, contratada pelo seu

patrono, da apólice de seguro de grupo disponibilizada pela Ordem dos Advogados, ou de outra, relativa a:

a) Seguro de acidentes pessoais, que cubra os riscos que possam ocorrer durante e por causa do estágio;

b) Seguro de responsabilidade civil profissional, que cubra, durante a realização do estágio e enquanto a

respetiva inscrição se mantiver ativa, os riscos inerentes ao desempenho das tarefas que enquanto advogado

estagiário lhe forem atribuídas, conforme o estabelecido na apólice respetiva, renovando-o sempre que

necessário até à sua conclusão.»

Artigo 4.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Arquitetos

O artigo 8.º do Estatuto da Ordem dos Arquitetos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/98, de 3 de julho, na

sua atual redação, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 8.º

[…]

1 – […].

2 – O estágio profissional tem a duração de 12 meses, é promovido pela Ordem, é obrigatoriamente

remunerado nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, e prestado sob acolhimento e a

supervisão de um orientador.

3 – […].

4 – […].

5 – […]:

a) […];

b) […].

6 – […]:

a) […];

b) […];

c) […].

7 – […].

8 – Durante o período do estágio, a entidade de acolhimento assegura o pagamento de remuneração ao

estagiário e contrata um seguro para cobertura de acidentes pessoais em benefício do estagiário.

9 – […].

10 – […].

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11 – […].»

Artigo 5.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados

Os artigos 25.º, 29.º e 30.º do Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados, aprovado pelo Decreto-Lei

n.º 452/99, de 5 de novembro, na sua atual redação, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 25.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […]:

a) […];

b) […].

4 – […].

5 – […].

6 – A celebração e manutenção de seguro de acidentes pessoais e de seguro de responsabilidade civil

profissional não é obrigatória durante o estágio profissional, sendo o respetivo custo, em caso de subscrição,

suportado pelo patrono.

Artigo 29.º

[…]

[…]:

a) Ao acompanhamento profissional adequado pelo patrono para o exercício das suas funções e à respetiva

remuneração nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro;

b) […];

c) […].

Artigo 30.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […].

2 – […]:

a) Facultar ao membro estagiário o acesso ao local de realização do estágio e assegurar-lhe o pagamento

de remuneração nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro;

b) […];

c) […].»

Artigo 6.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Despachantes Oficiais

O artigo 61.º do Estatuto da Ordem dos Despachantes Oficiais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 173/98, de 26

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de junho, na sua atual redação, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 61.º

[…]

1 – Anualmente é realizado um estágio obrigatório de acesso à profissão para os candidatos inscritos que

sejam titulares da habilitação académica legalmente exigida para o respetivo exercício profissional, sendo

remunerado nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro.

2 – […].

3 – Compete à Ordem disponibilizar um seguro de acidentes pessoais durante a vigência do estágio de

formação, sendo o respetivo custo suportado pela entidade de acolhimento.

4 – […].»

Artigo 7.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Economistas

O artigo 15.º do Estatuto da Ordem dos Economistas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 174/98 de 27 de junho,

na sua atual redação, passa a ter a seguinte redação:

Artigo 15.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) Compete ao patrono o pagamento de remuneração nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de

janeiro, e a realização de um relatório de estágio e acompanhar, tutelar e avaliar a atividade profissional exercida

pelo estagiário;

e) […];

f) […];

g) O estagiário está dispensado de realizar seguro de responsabilidade civil profissional, sendo o respetivo

custo, em caso de subscrição, suportado pelo seu patrono;

h) […].

2 – […]:

a) […]; ou

b) […].

3 – […].

4 – […]:

a) […];

b) […];

c) […].

5 – […].

6 – […].

7 – […].»

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Artigo 8.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Engenheiros

Os artigos 20.º, 24.º e 25.º do Estatuto da Ordem dos Engenheiros, aprovado pelo Lei n.º 123/2015, de 2 de

setembro, na sua atual redação, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 20.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – Os membros estagiários inscrevem-se no colégio de especialidade correspondente ao seu curso e têm

direito a remuneração nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro.

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – […].

8 – […].

9 – […].

Artigo 24.º

[…]

A subscrição de seguro de responsabilidade civil profissional pelo engenheiro estagiário não é obrigatória,

sendo o respetivo custo, em caso de subscrição, suportado pela entidade de acolhimento.

Artigo 25.º

[…]

O estagiário está dispensado de realizar seguro de acidentes pessoais, nos casos em que o estágio

profissional orientado decorra no âmbito de um contrato de trabalho, sendo o respetivo custo suportado pela

entidade de acolhimento.»

Artigo 9.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Notários

Os artigos 27.º e 27.º-D do Estatuto da Ordem dos Notários, aprovado pelo Lei n.º Decreto-Lei n.º 26/2004,

de 4 de fevereiro, na sua atual redação, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 27.º

[…]

1 – O estágio é obrigatoriamente remunerado nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro,

tem a duração máxima de 18 meses e é realizado sob orientação de notário com, pelo menos, cinco anos de

exercício de funções notariais, livremente escolhido pelo estagiário ou designado pela Ordem dos Notários.

2 – […].

3 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

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II SÉRIE-A — NÚMERO 1

58

e) […].

4 – […].

Artigo 27.º-D

[…]

No momento da inscrição, o estagiário deve apresentar comprovativo de subscrição da apólice de seguro,

contratado pelo patrono, relativo a:

a) […];

b) […].»

Artigo 10.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Nutricionistas

Os artigos 64.º e 68.º do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas, aprovada pela Lei n.º 51/2010, de 14 de

dezembro, na sua atual redação, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 64.º

[…]

1 – […].

2 – O estágio profissional é remunerado nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, e tem

uma duração de seis meses, nos termos do regulamento de estágio da Ordem.

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

Artigo 68.º

[…]

Durante o estágio profissional, o membro estagiário da Ordem deve beneficiar de seguro de acidentes

pessoais e de seguro profissional, a contratar pela entidade recetora.»

Artigo 11.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Psicólogos Portugueses

O artigo 55.º do Estatuto da Ordem dos Psicólogos Portugueses, aprovado pela Lei n.º 57/2008, de 4 de

setembro, na sua atual redação, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 55.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – O estágio profissional é remunerado nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, e tem a

duração de 12 meses a contar da data de inscrição.

4 – […].

5 – […].

6 – […].

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7 – […].

8 – […].

9 – […].

10 – […].

11 – Durante o estágio profissional, o estagiário deve beneficiar de seguro de acidentes pessoais e de seguro

profissional, a contratar pela entidade recetora.»

Artigo 12.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas

Os artigos 157.º e 159.º do Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, aprovado pela Lei n.º

140/2015, de 7 de setembro, na sua atual redação, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 157.º

Início, duração e remuneração do estágio

1 – […].

2 – O estágio é remunerado nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, e tem a duração de,

pelo menos, três anos, com o mínimo de 700 horas anuais, decorrendo pelo menos dois terços do tempo junto

de um patrono, que seja um revisor oficial de contas ou uma sociedade de revisores oficiais de contas.

3 – […].

4 – […].

5 – […].

Artigo 159.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – No momento da inscrição, o estagiário deve apresentar comprovativo de subscrição, contratada pelo seu

patrono, da apólice de seguro de acidentes pessoais consentâneo com a atividade que desenvolve.

7 – […].

8 – […].»

Artigo 13.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução

Os artigos 133.º e 135.º do Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, aprovado pela

Lei n.º 154/2015, de 14 de setembro, na sua atual redação, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 133.º

Direitos e deveres dos patronos

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […]:

a) […];

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b) O pagamento de remuneração nos termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro;

c) [Anterior alínea b)];

d) [Anterior alínea c)];

e) [Anterior alínea d)].

5 – […].

6 – […].

Artigo 135.º

[…]

No momento da inscrição, o estagiário deve apresentar comprovativo de subscrição da apólice de seguro

contratada pelo seu patrono, relativa a:

a) […];

b) […].»

Artigo 13.º

Alteração ao Estatuto da Ordem dos Enfermeiros

O artigo 7.º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 104/98, de 21 de

abril, na sua atual redação, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 7.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […].

2 – […]:

a) […];

b) […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – O estágio profissional de adaptação, enquanto medida de compensação, é regido pela Lei n.º 9/2009, de

4 de março, alterada pelas Leis n.os 41/2012, de 28 de agosto, e 25/2014, de 2 de maio, e remunerado nos

termos do disposto na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro.

8 – […].»

Artigo 15.º

Regulamentação

No prazo de 60 dias, após a publicação da presente Lei, o Governo procede à alteração da Portaria n.º

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206/2020, de 27 de agosto, de forma a assegurar a criação de um regime especial aplicável aos estágios

profissionais para o acesso e exercício da profissão no âmbito da medida de estágios ATIVAR.PT.

Artigo 16.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 90 após a respetiva publicação.

Palácio de São Bento, 29 de março de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1/XV/1.ª

CONSTITUIÇÃO DE UMA COMISSÃO EVENTUAL DE VERIFICAÇÃO DE PODERES DOS DEPUTADOS

ELEITOS

Aos 29 dias do mês de março de 2022, os Deputados eleitos à XV Legislatura da Assembleia da República

deliberam constituir uma Comissão Eventual de Verificação de Poderes dos Deputados Eleitos conforme relação

constante da ata de apuramento geral, da Comissão Nacional de Eleições, a qual se manterá em funcionamento

até que se constitua a comissão competente em razão desta matéria.

A Comissão Eventual será constituída pelos seguintes Deputados:

Nove membros designados pelo Partido Socialista:

– Carlos Pereira;

– Filipe Neto Brandão;

– Francisco Rocha;

– Hugo Pires;

– Isabel Rodrigues;

– Jamila Madeira

– Maria Antónia Almeida Santos;

– Maria da Luz Rosinha;

– Pedro Delgado Alves.

Quatro membros designados pelo Partido Social Democrata:

– André Coelho Lima;

– Catarina Rocha Ferreira;

– Duarte Pacheco;

– Mónica Quintela.

Um membro designado pelo partido Chega:

– Bruno Nunes.

Um membro designado pelo partido Iniciativa Liberal:

– Patrícia Gilvaz.

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Um membro designado pelo Partido Comunista Português:

– Alma Rivera.

Um membro designado pelo Bloco de Esquerda:

– Pedro Filipe Soares.

Cabe a esta Comissão eleger a respetiva Mesa e, em concomitância, designar um relator.

É seu objeto a elaboração de um relatório a submeter à votação e aprovação do Plenário, contendo a

declaração de verificação dos poderes dos Deputados eleitos e, bem assim, as pertinentes substituições dos

Deputados eleitos (derivadas ou do exercício de cargos que determinem a suspensão do respetivo mandato, ou

a requerimento dos próprios) pelos candidatos não eleitos dos respetivos partidos que se sigam na ordem de

precedências, nos respetivos círculos e listas.

Do relatório devem constar ainda os demais factos com incidência na respetiva verificação de poderes.

O relatório conclui por um parecer formal, a submeter à votação e aprovação do Plenário.

Palácio de São Bento, 29 de março de 2022.

Os Deputados proponentes: Pedro Delgado Alves (PS) — Adão Silva (PSD) — Bruno Nunes (CH) — Rodrigo

Saraiva (IL) — Paula Santos (PCP) — Pedro Filipe Soares (BE).

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 2/XV/1ª

AUMENTO DO SALÁRIO MÍNIMO NACIONAL

Exposição de motivos

A evolução da distribuição da riqueza em Portugal continua a ser demonstrativa de uma profunda injustiça

social. As assimetrias existentes na acumulação de riqueza não só não se esbatem, como confirmam que uma

pequena percentagem das famílias portuguesas detém mais de metade da riqueza, enquanto a esmagadora

maioria dos portugueses ficam com uma pequena fatia dessa riqueza.

O Inquérito à Situação Financeira das Famílias de 2020, realizado entre outubro de 2020 e fevereiro de 2021,

considerou os dados relativos à situação epidémica vivida, tendo concluído que o seu impacto na situação

financeira e no rendimento das famílias foi maior nas famílias que dependiam do rendimento do trabalho do que

no período anterior a esta.

O Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, realizado em 2020 pelo INE sobre rendimentos do ano

anterior, indica que 16,2% das pessoas estavam em risco de pobreza em 2019.

A taxa de risco de pobreza correspondia, em 2019, à proporção de trabalhadores com rendimentos líquidos

inferiores a 6480 euros anuais, ou seja, 540 euros por mês (com salário mínimo nacional de 600 euros). Quer

isto dizer que o seu rendimento mensal não é suficiente para as despesas básicas familiares, sendo inegável

que os baixos salários e em particular o valor do salário mínimo nacional (SMN) constitui uma das principais

causas de pobreza.

Estes dados demonstram a injustiça na distribuição da riqueza e o processo de concentração da riqueza

promovida por sucessivos governos, e evidenciam as consequências desastrosas de décadas da política de

direita, em particular no emprego, na produção nacional, nos serviços públicos e nas funções sociais do Estado,

na dependência externa e nas limitações à soberania nacional.

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Para inverter este processo de injustiça, pobreza e agravamento da exploração é determinante valorizar o

SMN. Ao longo dos anos, o SMN tem sido profundamente desvalorizado por sucessivos governos, com

atualizações abaixo do aumento dos rendimentos médios e do índice de preços ao consumidor. Bastaria que

tivesse acompanhado a evolução deste último critério para que tivesse atingido em 2005 os 500 euros. Aliás, se

o SMN tivesse sido atualizado todos os anos, considerando a inflação e o aumento da produtividade, o seu valor

seria hoje muito superior.

Em janeiro de 2021 o SMN foi fixado em 665 euros, e só em janeiro de 2022 foi fixado em 705 euros, aumento

esse que sendo claramente insuficiente para a reposição do poder de compra e para enfrentar o custo de vida

é inseparável da luta dos trabalhadores que o PCP valoriza.

Impõe-se por isso a necessidade de avançar para um aumento geral dos salários, incluindo o salário mínimo

nacional para 850 euros.

Em Portugal, o SMN é a remuneração de referência para centenas de milhares de trabalhadores. Segundo

os dados do boletim estatístico de Janeiro de 20221, no segundo trimestre, a população com emprego

correspondia a 4 878 100 trabalhadores, sendo que, consultando este mesmo documento, os seus dados

indicam que, em abril de 2019, 25,6% auferiam o salário mínimo nacional, o que correspondia a mais de 1 milhão

e 200 mil trabalhadores.

Esta realidade prova que os baixos salários continuam a ser uma opção política e uma realidade

predominante no País, configurando uma das causas das enormes e gritantes desigualdades sociais.

É uma emergência nacional o aumento geral dos salários e, em particular o salário mínimo nacional, para

fazer crescer a economia e o emprego, para aumentar as contribuições para a segurança social, para aumentar

o poder de compra perdido e agravado pela inflação que provoca uma subida acentuada dos preços, sobretudo

dos bens de consumo, para assegurar o regresso de tantos jovens forçados a emigrar pelo agravamento das

condições de vida e pela política de direita do Governo PSD/CDS-PP.

É uma emergência nacional o aumento geral dos salários e, particularmente o salário mínimo nacional, para

assegurar o direito aos jovens a ter filhos, a constituir família, para assegurar mais justiça na distribuição dos

rendimentos.

Os argumentos invocados para não aumentar o salário mínimo nacional prendem-se com a falsa ideia do

peso das remunerações na estrutura de custos das empresas e no seu suposto efeito negativo para a

competitividade. Na verdade, as remunerações têm um peso muito inferior a um conjunto de outros custos,

designadamente com a energia, combustíveis, crédito ou seguros. Convém, aliás, referir que este conjunto de

custos estão sujeitos à estratégia de lucro máximo de um conjunto de empresas e sectores que, depois de

privatizadas passaram a penalizar fortemente a economia nacional.

A criação e consagração do direito a um salário mínimo nacional foi uma das importantes conquistas da

Revolução de Abril e do regime democrático. À data, representou uma melhoria muito expressiva nas condições

vida dos trabalhadores, no entanto, não acompanhou o aumento do custo de vida e tem sido ao longo das

décadas profundamente desvalorizado com atualizações abaixo do aumento dos rendimentos médios e do

índice de preços ao consumidor, e viu até o seu valor congelado entre 2011 e 2014.

Não se combate a pobreza, incluindo a pobreza infantil, sem assumir a necessária valorização dos salários

e o aumento do salário mínimo nacional de forma significativa.

Não se pode ter pensões mais elevadas no futuro sem aumentar os salários no presente, nomeadamente o

salário mínimo nacional.

Não se dinamiza a economia sem assumir que são os salários dos trabalhadores que influenciam o consumo,

a procura e a dinamização do mercado interno.

Não se defende a emancipação dos jovens sem assumir que, para que estes possam sair de casa dos pais

e concretizar projetos de vida, é fundamental que tenham vínculos estáveis e salários que lhes garantam

condições para construir, de forma autónoma, o seu caminho.

Não se combate a emigração de trabalhadores qualificados nem se fixam trabalhadores na Administração

Pública sem valorizar os salários, as carreiras e as profissões.

Não se pode falar de sustentabilidade da segurança social sem assumir que o aumento dos salários é

determinante para esse objetivo.

1 Boletim Estatístico do Gabinete de Estratégia e Planeamento – Ministério do Trabalho Solidariedade e Segurança Social, janeiro de 2022, páginas 7 e 14.

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Não há país desenvolvido sem trabalhadores valorizados. Para o PCP o aumento do salário mínimo nacional

é imperioso, por razões de justiça social e de uma mais justa distribuição da riqueza, mas também por razões

de carácter económico, uma vez que assume especial importância no aumento do poder de compra, na

dinamização da economia e do mercado interno.

O PCP tem-se batido pelo aumento do salário mínimo nacional para 850 euros e reapresenta agora essa

proposta, sem prejuízo de durante o ano de 2022 se fixar um valor de 800 euros, tal como foi já anteriormente

admitido.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a

seguinte:

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição recomendar ao

Governo que aumente o salário mínimo nacional para os 850 euros.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

Os Deputados do PCP: Jerónimo de Sousa — Paula Santos — Diana Ferreira — Alma Rivera — Bruno Dias

— João Dias.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 3/XV/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A REPOSIÇÃO, CRIAÇÃO E VALORIZAÇÃO DAS CARREIRAS NA

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E A REVOGAÇÃO DO SIADAP

Exposição de motivos

Com a aprovação da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, estabeleceram-se os regimes de vinculação, de

carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções publicas. Este diploma, aprovado por PS,

PSD e CDS-PP, representou um dos maiores ataques aos direitos dos trabalhadores da Administração Pública,

visando uma profunda e estratégica desvalorização das carreiras dos trabalhadores.

O então maioritário Governo PS impôs uma profunda alteração e reconfiguração nas relações laborais entre

os trabalhadores e o Estado. Destaque para substituição do vínculo público de nomeação pelo contrato de

trabalho por tempo indeterminado; substituição do quadro de pessoal pelo mapa de pessoal; generalização da

precariedade e instabilidade em vez de vínculos estáveis; alargamento das causas de despedimento; criação

de uma tabela única para as remunerações; destruição das carreiras profissionais, vigorando e proliferando a

polivalência de funções.

A destruição das carreiras da Administração Pública, criando três carreiras generalistas (técnico superior,

assistente técnico e assistente operacional), teve como objetivo por um lado, limitar a progressão na carreira e

as promoções, passando estas a depender da obtenção de dez pontos por via do sistema de avaliação, o que

para a maioria dos trabalhadores da Administração Pública significa dez anos para progredir; e por outro, pôr

fim à especialização e especificidade de funções, colocando em causa a qualidade de serviço público.

Passados cerca de 15 anos sobre a aprovação desta lei, a realidade de todos os dias revela que o PCP tinha

razão quando afirmou que estava em curso um profundo ataque aos direitos dos trabalhadores.

A reposição e criação de novas carreiras na Administração Pública, de acordo com as especificadas de cada

função em concreto é da mais elementar justiça, na perspetiva da valorização das carreiras profissionais dos

trabalhadores e da melhoria do serviço público que é prestado às populações.

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Os trabalhadores da Administração Pública continuam, hoje, a lutar pela reposição e pela criação de novas

carreiras.

A desvalorização das carreiras dos trabalhadores da Administração Pública não está desligada de uma tabela

remuneratória única que não tem sido revista nem revalorizada nem de um sistema de avaliação que não

promove o desenvolvimento profissional e coloca severas limitações à progressão nas carreiras. Desde a sua

criação que o PCP se opôs ao SIADAP, afirmando que «a avaliação do desempenho tem que ser justa e deve

ter como objetivo melhorar cada vez mais os serviços» que são prestados pelos trabalhadores da Administração

Pública às populações. Mais afirmámos, então, que esta «não pode nem deve servir para condicionar, dificultar,

impedir ou instrumentalizar a promoção e a progressão da carreira dos trabalhadores da Administração Pública».

Mas é exatamente isso que o SIADAP significa – travão nas progressões e desvalorização dos trabalhadores

e dos serviços públicos.

O SIADAP tem, desde a sua primeira versão, um claro objetivo economicista posto em prática através do

sistema de quotas que apenas serve para impedir a progressão dos trabalhadores, conduzindo a que mais de

75% dos trabalhadores que ingressem agora na Administração Pública apenas têm a possibilidade de atingir o

primeiro terço dos níveis de vencimento propostos, mantendo o absurdo sistema de quotas para as

classificações mais elevadas, com o objetivo de limitar a progressão na carreira dos trabalhadores.

A progressão na carreira só é obrigatória após a obtenção de dez pontos na avaliação, mas ao serem

limitadas (com as quotas) as classificações mais elevadas, mesmo que haja mais trabalhadores a merecerem

esta classificação, ela não se verifica, ficando a grande maioria dos trabalhadores estagnados, com legítimas

pretensões de progressão na carreira goradas e criando-se inaceitáveis injustiças na Administração Pública.

O sistema de quotas não permite uma verdadeira avaliação porque impõe artificialmente um limite à avaliação

e apenas visa condicionar a promoção e progressão nas carreiras.

Também este é um elemento que afasta trabalhadores, nomeadamente jovens e trabalhadores mais

qualificados, da Administração Pública – uma vez que não têm perspetiva de construção de uma carreira que

os valorize.

Este Sistema de Avaliação do Desempenho dos Trabalhadores da Administração Pública apareceu, em

2007, pelas mãos de um Governo do PS de maioria absoluta. E apareceu não para, de uma forma construtiva,

melhorar os serviços e a qualificação dos trabalhadores. O seu verdadeiro objetivo foi (e ainda é) através da

avaliação, impedir a progressão na carreira, facilitar despedimentos e até mesmo fundamentar o encerramento

de serviços.

A reposição, alteração e criação de novas carreiras na Administração Pública, bem como a construção de

um sistema de avaliação justo, transparente, formativo e potenciador das progressões nas carreiras é matéria

de âmbito da negociação coletiva entre as organizações representativas dos trabalhadores e o governo. Esta

matéria deve envolver profundamente os trabalhadores e as suas organizações representativas, num processo

sério e eficaz e que tenha como objetivo valorizar os trabalhadores e os serviços públicos, e não o contrário.

Pelo exposto, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a

seguinte:

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República,

recomendar ao Governo que durante o ano de 2022:

1. Desenvolva e concretize os processos de negociação coletiva com as organizações representativas dos

trabalhadores, com vista à reposição, valorização e criação de novas carreiras profissionais, tendo em

consideração, em cada uma das carreiras, o seu enquadramento e as especificidades das funções

desempenhadas, definindo concretos descritivos funcionais e as concretas funções exercidas, assegurando a

valorização das carreiras, a progressão e a consequente tradução remuneratória.

2. Revogue o atual sistema de avaliação de desempenho (SIADAP), incluindo os sistemas específicos nele

baseados, substituindo-o por um sistema de avaliação sem quotas, formativo, transparente, equitativo e justo,

que valorize realmente os trabalhadores, potenciando a progressão profissional nas suas carreiras, negociando-

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II SÉRIE-A — NÚMERO 1

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o devidamente com as organizações representativas dos trabalhadores.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — Paula Santos — Bruno Dias — Alma Rivera — Jerónimo de

Sousa— João Dias.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 4/XV/1.ª

PELA URGENTE NEGOCIAÇÃO DA TABELA REMUNERATÓRIA ÚNICA DA ADMINISTRAÇÃO

PÚBLICA TENDO EM VISTA ASSEGURAR A SUA PROPORCIONALIDADE

Exposição de motivos

Os trabalhadores da Administração Pública têm sido continuadamente penalizados nas suas remunerações

e condições de trabalho.

Nos últimos 13 anos ocorreram duas atualizações remuneratórias – uma de 0,3% e a mais recente de 0,9%,

que não atinge sequer os valores da inflação. Em 13 anos, o subsídio de refeição subiu 50 cêntimos. Estes

elementos traduzem uma forte desvalorização e significativa perda de poder de compra dos trabalhadores da

Administração Pública que continua sem ser reposto.

Acresce o facto de, a cada aumento do SMN, os índices remuneratórios mais baixos serem absorvidos por

esse aumento, não existindo um reposicionamento e valorização salarial dos trabalhadores nessas posições, o

que significa que largas dezenas de milhares de trabalhadores da Administração Pública recebem o salário

mínimo nacional mesmo trabalhando há 15, 20, 25 anos na Administração pública.

Esta situação tem que ser rapidamente invertida, sendo necessário implementar medidas de efetiva

valorização dos trabalhadores da Administração Pública, dos seus salários, das suas carreiras e profissões.

Esta realidade afasta trabalhadores da Administração Pública quando o caminho que se exige é o do reforço

dos serviços públicos, nomeadamente nas funções sociais do Estado.

Importa lembrar que no Orçamento do Estado para 2018, por ação, intervenção e proposta do PCP, se

reconheceu o descongelamento das carreiras e progressões para todos os trabalhadores da Administração

Pública (pondo assim fim a mais de 9 anos em que as mesmas não tiveram qualquer tipo de progressão), dando-

se passos na concretização desse direito, incluindo com a valorização remuneratória, ainda que faseada, dos

trabalhadores cuja progressão depende do regime de avaliação em vigor.

Mais tarde, com o Decreto-Lei n.º 29/2019, de 20 de fevereiro, o Governo promoveu a atualização da base

remuneratória da Administração Pública para o valor de 635,07 €, considerando que este valor corresponde à

4.ª posição remuneratória. Tal entendimento levou a que os primeiros quatro níveis da TRU auferissem a mesma

remuneração, mantendo apenas formalmente as três primeiras posições remuneratórias.

Esta alteração da base remuneratória, para além de claramente insuficiente, veio destruir a proporcionalidade

inicial da TRU à qual o Governo estaria vinculado nos termos do n.º 3 do artigo 147.º da Lei n.º 35/2014, de 20

de junho. Com o Decreto-Lei n.º 10-B/2020, de 20 de março, o Governo promoveu o aumento da base

remuneratória única no valor de 10 € para as remunerações enquadradas entre os 635,07 € e os 683,13 €, assim

como um aumento generalizado das remunerações em 0,3%.

O último diploma publicado, o Decreto-Lei n.º 109-A/2021, de 7 de dezembro, que atualiza as remunerações

da Administração Pública e aumenta a respetiva base remuneratória, mantém as quatro primeiras posições da

TRU com referência ao salário mínimo nacional e determina uma atualização de 0,9%, que é claramente

insuficiente e fica muito aquém daquilo que seria devido a estes trabalhadores após mais de uma década de

congelamentos. Na verdade, vem adensar os problemas já verificados da falta de progressividade da TRU,

continuando por resolver o pouco distanciamento entre o valor da base remuneratória e o valor de admissão na

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carreira de assistente técnico e diminui o distanciamento e proporcionalidade entre os níveis remuneratórios e

as várias categorias e carreiras.

As questões remuneratórias dos trabalhadores da Administração Pública demonstram a justeza da

necessidade de revisão da tabela remuneratória única, a par de uma valorização da carreiras e profissões, e da

necessidade de um processo negocial na Administração Pública tendo em vista a reposição, criação e

valorização das carreiras destes trabalhadores, como o PCP já por diversas propôs.

Pelo exposto, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a

seguinte:

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República,

recomendar ao Governo que promova, de forma urgente, um processo negocial com as organizações sindicais

representativas dos trabalhadores da Administração Pública, por forma a efetuar a revisão da tabela

remuneratória única, assegurando a sua proporcionalidade.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — Paula Santos — Alma Rivera — Bruno Dias — Jerónimo de Sousa

— João Dias.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 5/XV/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A CRIAÇÃO DO PROGRAMA 3C – CASA, CONFORTO E CLIMA – PARA

COMBATER A POBREZA ENERGÉTICA E O DESCONFORTO TÉRMICO NO PAÍS, DE FORMA

SUSTENTÁVEL E COMPORTÁVEL, CONTRIBUINDO PARA A LUTA CONTRA AS ALTERAÇÕES

CLIMÁTICAS

Uma das características mais reconhecidas de Portugal é o seu clima temperado. Apesar disso, muitos dos

nossos concidadãos passam frio no inverno e calor no verão tanto dentro de suas casas como nos seus locais

de trabalho. Portugal é um dos países da União Europeia onde este problema afeta mais pessoas e com maior

gravidade. Mesmo tendo em conta a evolução positiva dos últimos anos, Portugal continua a ser um dos países

onde mais pessoas declaram não ter condições financeiras para aquecer as suas casas adequadamente:

segundo o Eurostat, em 2020 17,5% dos portugueses encontrava-se ainda nesta situação, enquanto a

estimativa para média da população dos países da União Europeia que se encontra na mesma situação é de

apenas 8,2%, menos de metade.

Entre as características da construção em Portugal que contribuem para este problema conta-se a grande

prevalência de casas mal isoladas, o que aumenta a dificuldade de aquecimento das casas no inverno e o seu

arrefecimento no verão, ficando as famílias muito mais expostas às variações das temperaturas e das condições

climatéricas em geral, condição essa que tem um impacto agravado no contexto de emergência ecológica e

climática que vivemos.

Para a União Europeia, o aquecimento das casas constitui um indicador básico para aferir o bem-estar geral

das famílias, sendo que, na maioria das habitações existentes nos Estados-Membros da UE existem

equipamentos de aquecimento central, enquanto em Portugal, em 2012, o número de habitações com este tipo

de aquecimento era apenas de 13,3%.

Existem várias causas para estes índices tão elevados de pobreza energética no nosso País. Em primeiro

lugar, os baixos rendimentos auferidos pela maioria das famílias no nosso País têm uma óbvia relação direta

com a escolha de não equipar habitações com mecanismos eficazes de aquecimento das casas no inverno, já

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que estes equipamentos são caros, em particular se tivermos em conta o poder de compra da família mediana

em Portugal. Mas a qualidade das políticas públicas nesta matéria é também um dos fatores a ter em conta num

diagnóstico a este problema – bem como nas possíveis soluções para ele. Relembre-se, a esse propósito, o

facto de apenas em 1990 ter sido publicada a primeira legislação que regulamenta as condições térmicas dos

edifícios, o que faz com que a maioria do edificado existente no nosso País tenha sido construído antes destas

normas entrarem em vigor e, portanto, tenha, regra geral, pior isolamento e menos eficiência energética que

edifícios construídos noutros países da União Europeia, onde este tipo de legislação existe, em muitos casos,

desde as décadas de 50 e 60 do século passado.

São muitas as consequências da pobreza energética que assola as habitações e locais de trabalho em

Portugal e afetam mais domínios da vida quotidiana dos portugueses do que aqueles que possa parecer à

primeira vista. O impacto da pobreza energética faz-se sentir de forma muito clara e quantificável no Serviço

Nacional de Saúde. A exposição prolongada ao frio faz com que exista uma maior vulnerabilidade a doenças

sazonais que levam os portugueses a procurar cuidados hospitalares em maior número e com maior frequência.

No extremo, a pobreza energética mata. Em 2018 o INSA (Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge) detetou

397 mortes atribuíveis a baixas temperaturas. A tentar aquecer as suas casas recorrendo a métodos não

convencionais e não seguros, como grelhadores de sardinhas, já perderam a vida pelo menos seis pessoas este

ano em Portugal. Estes são alguns dos números que se conhecem mas a pobreza energética já fez muitas mais

vítimas invisíveis em Portugal. Há aqui uma tragédia recorrente e silenciosa, longe de uma adequada

consciencialização pública, que urge corrigir e por fim erradicar.

A pobreza energética afeta também a produtividade do País. Locais de trabalho indevidamente isolados e

sem condições de conforto térmico resultam em menor capacidade produtiva dos seus trabalhadores já que

estes ficam sujeitos a todas as consequências de saúde negativas provocadas tanto pelo frio como pelo calor

em excesso, resultando, potencialmente, em menos dias de trabalho prestados por ano.

Por tudo isto, o Livre considera que é urgente reduzir ao máximo a pobreza energética e o desconforto

térmico dentro das nossas casas e locais de trabalho.

Em 2020 e 2021, o Fundo Ambiental disponibilizou 9,5 milhões de euros no âmbito do programa de apoio

«Edifícios mais Sustentáveis», lançado no quadro das medidas de dinamização económica previstas pelo

Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) na sequência dos impactos pandemia causada pela

COVID-19. Estes apoios previam taxas de financiamento de 70% do investimento. O interesse da sociedade

portuguesa neste tipo de apoio ficou evidente através do elevado número de candidaturas recebidas. De junho

de 2021 até ao momento, foram também já disponibilizados 60 milhões de euros para apoiar o investimento em

medidas de eficiência energética em edifícios residenciais, no contexto da segunda fase do programa referido,

desta vez mobilizados através da Componente 13 do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), com taxas de

financiamento de 85%.

No âmbito da mesma Componente 13, um montante de 26 milhões de euros, aos quais se somaram 5,98

milhões de euros do Fundo Ambiental, foram alocados ao programa «Vale Eficiência», com o objetivo de

entregar 100 mil «vales eficiência» a famílias economicamente vulneráveis até 2025.

O PRR oferece uma oportunidade única para fazer este investimento no bem-estar, na qualidade de vida, no

conforto, na saúde e na produtividade dos portugueses, ajudando no combate às alterações climáticas em

simultâneo.

No PRR estão ainda previstos outros 240 milhões de euros para investimentos desta natureza, em edifícios

residenciais. Adicionalmente, o excedente do PRR que o Governo espera vir a receber, decorrente do novo

cálculo das subvenções a atribuir a cada Estado-Membro, está estimado em cerca de 1500 milhões de euros,

um valor que, no entender do Livre, deveria maioritariamente ser alocado ao apoio a disponibilizar para o

investimento das famílias portuguesas em todas as tipologias já previstas no programa de apoio «Edifícios mais

Sustentáveis», nomeadamente para a instalação de janelas eficientes, isolamento térmico, sistemas de

aquecimento e/ou arrefecimento, painéis fotovoltaicos, equipamentos que permitam aumentar a eficiência

hídrica, e incorporação de biomateriais, materiais reciclados, soluções de base natural, fachadas e coberturas

verdes e soluções de arquitetura bioclimática.

As taxas de apoio oferecidas até ao momento – 70% e 85% – permitiram mobilizar um número considerável

de candidaturas, apresentadas por dezenas de milhares de cidadãos. Contudo, o Livre tem consciência de que

o investimento pessoal em 15% ou 30% do valor é o suficiente para inviabilizar a candidatura de muitos outros

cidadãos – frequentemente daqueles que mais necessitam desse apoio e de mais conforto térmico. Os «vales

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eficiência» não serão também, em muitos casos, suficientes para cobrir as necessidades de investimento de

muitas famílias economicamente vulneráveis.

O Livre entende que é possível ir muito mais longe e criar um incentivo adicional à melhoria do conforto

térmico nas nossas casas e locais de trabalho. É possível subsidiar todas estas operações em mais do que o

valor do seu custo, através dos fundos do PRR e de um crédito fiscal, numa proporção de 100% para os primeiros

e 10% para o segundo, criando assim um incentivo adicional para dinamizar um setor económico e que os

cidadãos se mobilizem na melhoria do nosso conforto térmico coletivo, bem como no combate às alterações

climáticas, já que esta transição permitirá baixar a fatura da energia em geral e recorrer a fontes de energia

menos poluentes em particular.

Chamamos a este o programa 3C – Casa, conforto e clima. A sua criação permitirá combater a pobreza

energética, aliviar a pressão sobre o SNS, modernizar substancialmente o nosso edificado e configura mais um

contributo para o combate às alterações climáticas. O programa 3C — casa, conforto e clima – é também

relevante para um quarto C, o da carteira, ou seja, da comportabilidade financeira para os portugueses pois,

pela sua abrangência, tem também o potencial de diminuir os custos na fatura energética dos domicílios e das

empresas, e também de reduzir substancialmente a carga burocrática existente neste tipo de apoios. Ao ser

aberto a qualquer pessoa, família ou empresa e subsidiado na sua totalidade, a grande maioria dos

constrangimentos burocráticos cai por terra.

Para além da redução da carga burocrática, é fundamental assegurar que as candidaturas que irão beneficiar

os mais economicamente vulneráveis, venham de facto a existir. Para tal, o apoio técnico necessário e proativo

para mobilizar essas candidaturas deverá ser disponibilizado.

Numa altura em que vivemos uma crise energética aguda em simultâneo com a emergência ecológica que

temos de enfrentar, o Livre entende que este é o momento certo para avançar com medidas abrangentes, de

longo-prazo, que ajudem os nossos concidadãos e o planeta.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre propõe à Assembleia

da República que, através do presente projeto de resolução, delibere recomendar ao Governo que:

1 – Utilize o remanescente a disponibilizar através da Componente 13 do PRR, bem como o excedente do

novo cálculo das subvenções do PRR para criar o programa 3C – casa, conforto e clima – uma nova fase para

o programa de apoio «Edifícios mais Sustentáveis», através da qual sejam financiados em 100% todos os

investimentos aprovados, até aos 100 000 euros.

2 – Estude a criação de um crédito fiscal a atribuir a todos os aderentes ao programa de 10% do valor

despendido.

3 – Implemente, através da otimização do e-Balcão, um serviço de preparação de candidaturas ao programa

de apoio «Edifícios mais Sustentáveis» que antecipe necessidades identificadas junto de cidadãos

economicamente vulneráveis, não mobilizados à partida por iniciativa própria.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 6/XV/1.ª

DECLARANDO VLADIMIR PUTIN RESPONSÁVEL POR CRIMES DE GUERRA E INSTANDO AS

AUTORIDADES NACIONAIS A PARTICIPAREM DO ESFORÇO INTERNACIONAL DE INVESTIGAÇÃO,

ACUSAÇÃO, CONDENAÇÃO E PUNIÇÃO DE TODOS OS CRIMES DE GUERRA NA UCRÂNIA

No passado dia 24 de fevereiro, a Federação Russa – sob o comando do seu presidente, Vladimir Putin –

invadiu a Ucrânia. Desde então sucedem-se os bombardeamentos e destruição de várias cidades, vilas e aldeias

ucranianas e violentos combates militares que têm atingido sistematicamente alvos civis, tendo como

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consequência a perda de milhares de vidas humanas. Segundo a ONU, mais de 10 milhões de pessoas viram-

se obrigadas a sair das suas casas, 3,77 milhões das quais abandonaram mesmo a Ucrânia e são agora

refugiadas noutros países.

A Ucrânia tem as suas fronteiras internacionalmente reconhecidas e a Rússia, enquanto signatária da Carta

da ONU, estava comprometida a não lançar ações agressivas, sem provocação, e a cumprir com as condições

mínimas exigíveis para evitar o conflito. A invasão da Ucrânia pela Rússia é, à luz do direito internacional,

ilegítima e ilegal.

O mundo tem assistido ao perpetrar de crimes de guerra – designação genérica que por convenção pode

incluir crimes contra a humanidade, atos de genocídio, violações dos direitos humanos e outras violações

criminais do direito internacional – cometidos no território da Ucrânia pelas forças armadas da Federação Russa

e seus aliados, às ordens do Presidente da Federação Russa, Vladimir Putin.

Perante este cenário de violência extrema e de sucessivos crimes contra a humanidade perpetrados em

território ucraniano a mando de Putin, a comunidade internacional tem de agir e Portugal deve passar de um

mero discurso de condenação para uma ação concreta no plano legal que faça com que estes crimes não fiquem

impunes.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre propõe que a

Assembleia da República resolva:

1 – Condenar a invasão militar da Ucrânia pela Rússia;

2 – Exprimir a sua solidariedade com o povo da Ucrânia;

3 – Saudar a oposição cidadã que, na Rússia, se manifesta em favor da paz e na firme condenação às ações

e práticas autoritárias deste regime da Federação Russa;

4 – Declarar Vladimir Putin, presidente da Federação Russa, como responsável principal pelos crimes de

guerra cometidos no território da Ucrânia na sequência da invasão lançada a 24 de fevereiro de 2022.

E ainda:

5 – Instar as autoridades nacionais a que apoiem os esforços de investigação de todos os crimes de guerra

perpetrados no quadro desta invasão, por forças militares regulares, paramilitares ou milícias, de qualquer das

partes em conflito;

6 – Indicar ao Governo português que se junte aos esforços da comunidade internacional para que sejam

iniciados os devidos procedimentos perante o Tribunal Penal Internacional, de forma que Vladimir Putin e outros

altos responsáveis russos sejam julgados por:

a) Crimes de guerra;

b) Crimes contra a humanidade;

c) Atos de genocídio;

d) Violações dos direitos humanos;

e) Outras violações criminais do direito internacional que tenham cometido ou venham a cometer no território

da Ucrânia.

Assembleia da República, 29 de março de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

———

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 7/XV/1.ª

ADAPTAÇÃO DO PLANO NACIONAL DA ÁGUA ÀS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS, COMO MEDIDA DE

COMBATE À SECA

Exposição de motivos

A crise sanitária, bem como a recente crise energética, vieram demonstrar que precisamos tornar mais

sustentável a nossa relação com os recursos naturais do planeta diminuindo a exposição a riscos de saúde e a

custos económicos que põem em causa a nossa segurança e o nosso desenvolvimento.

Desde a assinatura do Acordo de Paris em 2015, com todos os compromissos aí assumidos, a concentração

de gases com efeito de estufa aumentou de 402 partes por milhão para 417 partes por milhão. A partir das 430

partes por milhão, de acordo com a comunidade científica, iremos ter um aumento médio da temperatura global

de 2 graus celsius e o ponto de não retorno a partir do qual o planeta entra num novo estado climático, um

estado que, de acordo com os cientistas, irá provocar redução da precipitação e aumento dos períodos de seca,

desertificação, subida do nível do mar, com a submersão de zonas costeiras, fenómenos climáticos extremos,

como inundações e furacões e disseminação de doenças. Estas alterações vão provocar uma extinção em

massa das atuais formas de vida, incluindo da espécie humana. Perante este cenário, os cientistas estimam que

cerca de 88% da população mundial não sobreviverá.

De acordo ainda com estas estimativas, Portugal será um dos países europeus mais afetados pelas

alterações climáticas, que se vão manifestar no nosso País através de fatores como a disseminação de doenças

e eventos climáticos extremos, como furacões, secas, incêndios florestais, subida do nível do mar, escassez de

água potável ou desertificação de extensos territórios. Dizem-nos os cientistas que abaixo do paralelo 40, que

em Portugal fica na Figueira da Foz, os territórios serão inabitáveis.

O fenómeno das alterações climáticas é agravado por uma gestão insustentável dos recursos naturais, em

particular a água, cuja gestão é fundamental para garantir a nossa sobrevivência. A qualidade dos solos, as

florestas e a biodiversidade em geral, dependem da forma como formos capazes de gerir este recurso natural,

tendo em conta a ligação existente entre os ecossistemas terrestres.

Significa isso, que Portugal tem não só de acompanhar os esforços internacionais de redução de emissões

poluentes, como de adotar todas as medidas com vista a preparar-se para minimizar os impactos das alterações

climáticas no nosso território e na nossa população e tem de o fazer o quanto antes, de uma forma eficaz e

transparente e economicamente responsável e sustentável.

Nos últimos anos tem sido feito um grande investimento na realização de estudos, planos e estratégias para

combater o problema da seca e da escassez de água em Portugal, mas temos visto poucos ou nenhuns

resultados desse investimento, ao mesmo tempo que vemos um agravar dos efeitos da seca no nosso território.

No entender do PAN é necessário e urgente colocar em prática todo o conhecimento obtido, orientando o

investimento público no sentido de contribuir para uma melhor gestão da água em função dos desafios

ambientais atuais e da realidade que temos pela frente.

Um planeamento cego à nova realidade climática é um planeamento que não protege a população e o

território e que utiliza mal os recursos financeiros disponíveis. Antes de se planear seja o que for, o Estado

necessita de conhecer a realidade do que vai planear, através da elaboração de um atlas de risco das alterações

climáticas a nível nacional, regional e local, tal como proposto na Lei do Clima apresentada pelo PAN.

Os recursos hídricos e o acesso à água potável constituem um dos maiores desafios que o País terá de

enfrentar, com consequências ao nível da precipitação e da seca extrema, consoante, aliás, concluiu o último

relatório do IPCC e se poderá visualizar na figura infra. Para além do impacto da escassez de água nas

populações, ecossistemas e atividades económicas sabemos que o acesso à água, em cenário de escassez,

tem constituído, historicamente, uma das maiores fontes de tensão e conflitos entre Estados.

A redução da disponibilidade de água potável em território nacional será muito significativa e implica uma

avaliação urgente do que poderá ser o uso da água e de que forma poderemos contrariar este processo.

Veja-se aliás, que esta não é apenas uma realidade distante, mas já do presente, como nos exemplificam

situações como a escassez de água na zona da Rega do Mira ou o grave problema que se antevê por força da

ocupação do parque natural da Costa Vicentina com estufas e atividade agrícola intensiva ou superintensiva ou

o progressivo aumento da agricultura intensiva no Alentejo, em particular do olival intensivo, que, de acordo com

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investigadores da Universidade de Évora, vem pôr em causa a sustentabilidade e equidade no acesso à água,

recurso precioso numa região em que é tão escassa.

É, assim, fundamental e urgente a revisão do Plano Nacional da Água, que, entre outros:

● Identifique que tipos de culturas agrícolas serão compatíveis com a disponibilidade hídrica projetada para

os próximos 50 anos;

● Identifique zonas ameaçadas com escassez de água para uso humano para os próximos 50 anos;

● Identifique riscos de nulidade de tratados internacionais que contenham regimes de exceção com

referência à precipitação histórica, como, por exemplo, a Convenção de Albufeira;

● Determine restrições ao uso da água para determinadas atividades económicas sempre que tal não seja

compatível com a disponibilidade hídrica;

● Consagre fontes alternativas de obtenção de água potável e de retenção de recursos hídricos no solo;

● Determine a implementação de planos de uso eficiente da água.

Paralelamente e porque entendemos que os municípios poderão ter um papel fundamental na concretização

do referido plano, propomos que possam existir também planos municipais de adaptação às alterações

climáticas para o setor da água – cuja elaboração compete às câmaras municipais e a aprovação às assembleias

municipais.

Nesse sentido é fundamental garantir que quer o Governo, quer as autarquias locais, implementam os

respetivos planos setoriais, designadamente o plano nacional de ação de adaptação às alterações climáticas

para o setor da água, previstos na Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, aprovada pela

Resolução do Conselho de Ministros n.º 24/2010, de 1 de abril, sustentada nos primeiros estudos sobre esta

matéria em Portugal (projetos SIAM I e SIAM II), a qual foi posteriormente revista pela Resolução do Conselho

de Ministros n.º 56/2015, de 30 de julho, que aprovou a Estratégia Nacional para Adaptação às Alterações

Climáticas 2020 (ENAAC 2020), passando a ser norteada por três objetivos principais: Melhorar o nível de

conhecimento sobre as alterações climáticas; implementar medidas de adaptação, e promover a integração da

adaptação em políticas sectoriais.

Para mais, quando o próprio Programa de Ação para a Adaptação às Alterações Climáticas, aprovado pela

Resolução do Conselho de Ministros n.º 130/201, identifica as nove linhas de ação estabelecidas visam a

redução dos principais impactos e vulnerabilidades do território, onde se inclui o aumento da frequência e da

intensidade de períodos de seca e de escassez de água; a redução da precipitação anual, o aumento da sua

variabilidade e a consequente alteração do regime de escoamento reduzirá os caudais dos rios, e afetará

igualmente a recarga dos aquíferos, podendo, inclusivamente, secar as nascentes de rios importantes na

Península Ibérica por períodos de tempo mais ou menos longos. Estas alterações poderão ser acompanhadas

por problemas ao nível da qualidade da água, intensificação de eventos de seca e maior pressão para a

desertificação, promovendo a perda de biodiversidade associada à alteração da estrutura e dinâmica dos

ecossistemas. Esta redução na precipitação afetará igualmente a recarga dos aquíferos, potenciando a

degradação da qualidade dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos; a perda de caudais e capacidade

de escoamento de águas em rios como o rio Douro e o rio Tejo, com valores incompatíveis com a

sustentabilidade ecológica desta linha de água estruturante do território nacional, entre outros fenómenos

relacionados com a água e os recursos hídricos.

Assim, a Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, por intermédio do

presente projeto de resolução recomenda ao Governo que:

Proceda à revisão do Plano Nacional da Água (Decreto-Lei n.º 76/2016, de 9 de novembro), tendo como

prioridade a mitigação dos efeitos das alterações climáticas, assegurando nomeadamente:

a) A identificação de zonas ameaçadas pela escassez de água para uso humano para os próximos 50 anos;

b) A identificação dos tipos de cultura agrícola compatíveis com a disponibilidade hídrica projetada para os

próximos 50 anos;

c) A realização de um levantamento dos diplomas nacionais e convenções internacionais que prevejam

regimes de exceção que tenham a precipitação histórica como referência e a previsão de recomendações

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tendentes a assegurar a sua compatibilização com os objetivos de adaptação às alterações climáticas;

d) A determinação de restrições ao uso da água para determinadas atividades económicas sempre que tal

não seja compatível com a disponibilidade hídrica;

e) A previsão de fontes alternativas de obtenção de água potável e de retenção de recursos hídricos no solo;

e,

f) A garantia de implementação de planos de uso eficiente da água.

Palácio de São Bento, 29 de março de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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