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Sexta-feira, 20 de maio de 2022 II Série-A — Número 29

XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)

S U M Á R I O

Projetos de Lei (n.os 77 e 80 a 97/XV/1.ª): N.º 77/XV/1.ª (Pela consagração do dia 25 de novembro como feriado nacional obrigatório): — Alteração do texto inicial do projeto de lei. N.º 80/XV/1.ª (PAN) — Procede à revogação do atual sistema de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente, procedendo à alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário. N.º 81/XV/1.ª (PAN) — Alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril. N.º 82/XV/1.ª (PAN) — Torna obrigatória a tomada de declarações para memória futura a pedido da vítima ou do Ministério Público. N.º 83/XV/1.ª (PAN) — Regula as condições em que a morte medicamente assistida não é punível e procede à alteração do Código Penal. N.º 84/XV/1.ª (BE) — Repõe a obrigatoriedade de avaliação de impacte ambiental à instalação de centros

electroprodutores a partir de fontes renováveis e alarga as medidas de envolvimento e proteção das comunidades locais (alteração ao Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril). N.º 85/XV/1.ª (L) — Inclui a exposição, nos exemplos do que constituem maus-tratos psíquicos, no âmbito do crime de violência doméstica e consagra a frequência de programas específicos de educação parental na lista de penas acessórias. N.º 86/XV/1.ª (PAN) — Corrige a legislação que concretiza a Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024 e aprofunda as garantias de proteção dos denunciantes. N.º 87/XV/1.ª (PAN) — Adota medidas de otimização do desempenho dos tribunais superiores da jurisdição administrativa e fiscal, alterando o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais. N.º 88/XV/1.ª (PAN) — Elimina a discriminação de género nos critérios de compensação associada às atividades específicas dos médicos. N.º 89/XV/1.ª (PAN) — Reforça os direitos dos utilizadores finais de serviços de comunicações eletrónicas.

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N.º 90/XV/1.ª (L) — Consagra o dever de as instituições contratarem os doutorados com categoria de auxiliar, ou a ela superior, quando se verifique o termo do contrato. N.º 91/XV/1.ª (BE) — Estabelece o complemento vitalício de pensão e a pensão mínima de dignidade aos antigos combatentes. N.º 92/XV/1.ª (BE) — Criação do crime de exposição de menor a violência doméstica (quinquagésima quinta alteração ao Código Penal). N.º 93/XV/1.ª (BE) — Programa extraordinário de vinculação dos docentes. N.º 94/XV/1.ª (CH) — Criação do Estatuto do Arguido Colaborador e agravamento das penas aplicáveis aos crimes de corrupção previstos no Código Penal. N.º 95/XV/1.ª (CH) — Realização obrigatória de um

referendo sobre a despenalização da morte medicamente assistida. N.º 96/XV/1.ª (IL) — Dispensa da tentativa de conciliação nos processos de divórcio sem consentimento do outro cônjuge nos casos de condenação por crime de violência doméstica (alteração ao Código Civil e ao Código do Processo Civil). N.º 97/XV/1.ª (IL) — Assegura a nomeação de patrono às vítimas especialmente vulneráveis (alteração ao Estatuto da Vítima e à Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, que altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais). Projeto de Resolução n.º 62/XV/1.ª (CH): Realização de um referendo sobre a despenalização da morte medicamente assistida.

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PROJETO DE LEI N.º 77/XV/1.ª (*)

(PELA CONSAGRAÇÃO DO DIA 25 DE NOVEMBRO COMO FERIADO NACIONAL OBRIGATÓRIO)

Exposição de motivos

No seguimento do dia 25 de Abril de 1974, sob influência exercida pelo Partido Comunista Português e da

extrema-esquerda junto dos oficiais que lideravam o Movimento das Forças Armadas, Portugal esteve prestes

a ver vingar o primeiro passo que visava colocar o nosso País sob a tutela de um regime totalitário à imagem

da então existente e hoje já defunta União Soviética.

Prova disso mesmo, entre outros episódios bem elucidativos da agenda política que por estes dias se

movia em Portugal, foi a visita de dez dias do então líder do COPCON, Capitão Otelo Saraiva de Carvalho, a

Cuba, onde acompanhado do Capitão Marques Júnior, procuraram estreitar ligações entre a mencionada

ditadura e a nossa pátria. Visita esta que não inocentemente foi solicitada pelo Partido Comunista Português e

apoiada pelo comunismo internacional.

No desejo de que igual regime fosse instaurado no nosso País, seguir-se-ia em segundo lugar a

ilegalização dos partidos de Direita no dia 28 de setembro de 1974, e depois a prisão ou exílio dos of iciais não

alinhados com a extrema-esquerda, juntamente com a nacionalização da banca. A concretizarem-se estas

pretensões, a 25 de novembro de 1975, atingir-se-ia o objetivo da tomada total de poder pelas forças de

extrema esquerda comunista.

Período conturbado da nossa política, ficam igualmente registados os incidentes vividos a 11 de novembro,

verificados no seguimento de uma manifestação dos trabalhadores da construção civil, através do cerco à

Assembleia Constituinte e a 20 de novembro a autossuspensão do VI Governo provisório pela ausência total

de condições que assegurassem o normal exercício da governação.

Daqui resultaria, a 21 de novembro, a destituição de Otelo Saraiva de Carvalho do comando que detinha

sob sua alçada, desmoronando-se a matriz ditatorial que se preparava para tomar as rédeas do poder.

De uma isenta e factual análise da História, bem como de uma observação isenta e politicamente séria das

vivências da época que a todos se exige, é inegável que os três primeiros passos foram dados. Felizmente,

falhou o quarto e último, graças à intervenção pronta e eficaz do Regimento de Comandos da Amadora, então

sob o Comando do Coronel Jaime Neves, pelo que à sua ação decisiva devemos todos nós a liberdade e o

regime democrático de que hoje podemos usufruir.

Sem a sua coragem e determinação seríamos hoje, seguramente, uma Cuba, uma Coreia do Norte ou uma

Venezuela.

Para o Chega, que aliás já na Legislatura passada, com estes mesmos fundamentos, defendeu a

instauração da comemoração solene do 25 de Novembro, é imperativo que se faça justiça ao dia e a todos

quantos neste dia impediram que Portugal, tendo saído de uma ditadura, entrasse definitivamente noutra.

Passados quase cinco décadas sobre o processo revolucionário, importa clarificar que a liberdade não tem

donos nem tutores, pertencendo a todos quantos de uma maneira ou de outra contribuíram para que Portugal

se tenha transformado num País livre, ainda que essa mesma liberdade outrora alcançada pareço de novo

hoje ameaçada por comportamentos e práticas enraizadas num regime que teima em se afundar numa letargia

incompreensível, sendo dela manifestação bem clara, a teimosia em continuar a não querer dar ao 25 de

Novembro a importância que claramente teve e continua a ter.

Nesse mesmo sentido, sinal inequívoco de uma mudança de paradigma no que a esta matéria diz respeito,

passa por consagrar o dia 25 de Novembro como feriado nacional obrigatório, consagração que sendo

aprovada representa a mais honesta e legítima homenagem ao Regimento de Comandos da Amadora bem

como a todos aqueles que a 25 de Novembro de 1975, direta ou indiretamente contribuíram para que hoje

possamos festejar o dia em que a liberdade, de facto, e após muitas dezenas de anos, nos foi finalmente

devolvida.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Chega apresenta o

seguinte projeto de lei:

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração ao Código do Trabalho, consagrando o dia 25 de Novembro como

feriado nacional obrigatório.

Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

É alterado o artigo 234.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com as

alterações introduzidas pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de

25 de junho, 47/2012, de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de

agosto, 28/2015, de 14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto,

73/2017, de 16 de agosto, 14/2018, de 29 de março, 90/2019, de 4 de setembro e 93/2019, de 4 de setembro,

93/2019, de 4 de setembro, 18/2021, de 8 de abril, Lei n.º 83/2021, de 6 de dezembro e 1/2022, de 3 de

Janeiro, o qual passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 234.º

Feriados obrigatórios

1 – São feriados obrigatórios os dias 1 de janeiro; Terça-Feira de Carnaval; Sexta-Feira Santa; Domingo de

Páscoa; 25 de Abril; 1 de Maio; Corpo de Deus (festa móvel); 10 de Junho; 15 de agosto; 5 de Outubro; 1 e 25

de Novembro; 1, 8 e 25 de dezembro.

2 – […].

3 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo —

Gabriel Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto —

Rita Matias — Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

(*) O texto inicial foi publicado no DAR II Série-A n.º 28 (2022.05.19) e foi alterado a pedido do autor em 20 de maio de 2022.

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PROJETO DE LEI N.º 80/XV/1.ª

PROCEDE À REVOGAÇÃO DO ATUAL SISTEMA DE ACESSO AOS 5.º E 7.º ESCALÕES DA

CARREIRA DOCENTE, PROCEDENDO À ALTERAÇÃO DO ESTATUTO DA CARREIRA DOS

EDUCADORES DE INFÂNCIA E DOS PROFESSORES DOS ENSINOS BÁSICO E SECUNDÁRIO

Exposição de motivos

O Decreto-Lei n.º 75/2010, de 23 de junho, introduziu pela primeira vez um mecanismo de vagas para o

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acesso aos 5.º e 7.º escalões, referindo no seu artigo 37.º que a progressão aos 3.º, 5.º e 7.º escalões

depende, entre outros requisitos, da observação de aulas (no caso da progressão aos 3.º e 5.º escalões) e da

obtenção de vaga (no caso da progressão aos 5.º e 7.º escalões). A possibilidade de progressão para estes

escalões pode ocorrer sem o requisito relativo à existência de vagas, mediante a obtenção das menções de

excelente e muito bom nos 4.º e 6.º escalões.

A avaliação dos professores, como de quaisquer outros setores profissionais, é fundamental na

monitorização da qualidade e melhoria dos processos de trabalho, nomeadamente através da observação de

aulas e formação contínua. Contudo, o sistema de avaliação de docentes carece obrigatoriamente de isenção,

terminando numa estratégia que procura a rotatividade das melhores classificações entre os colegas. Com a

necessidade de obtenção de uma nota de mérito (Muito Bom ou Excelente) para acesso direto a estes

escalões, o que acontece frequentemente é que não é o mérito que é reconhecido, mas uma deturpação do

sistema que tenta atribuir as melhores classificações em função de quem possa precisar para poder superar a

barreira provocada pela existência de vagas para progressão.

Por ser um sistema de avaliação que se encontra preso a limitações financeiras e coloca anualmente em

desigualdade os docentes, este sistema acarreta injustiças na avaliação, impedindo que os profissionais se

sintam reconhecidos pelo trabalho que desenvolvem, além de os aprisionar num nível de valorização salarial

do qual é difícil saírem, gerando conflitos organizacionais, insatisfação laboral e perda efetiva de direitos na

carreira.

A aplicação deste mecanismo que começou em 2018, com a publicação da Portaria n.º 29/2018, de 23 de

janeiro, é único na Administração Pública, configurando um sistema de carreira horizontal. Através dele, em

2020, 673 docentes ficaram fora do acesso ao 5.º escalão e 1348 docentes fora do acesso ao 7.º escalão,

num total de 2021 docentes que ficam a aguardar vaga no ano seguinte.

Docentes que lidam diariamente com um número de alunos muito superior ao que seria desejável para que

se conseguisse chegar a todos/as; que enfrentam diariamente condições de trabalho precárias,

nomeadamente com colocações distantes de casa e da família; e que se confrontam com o risco de burnout

sendo uma das classes profissionais que mais recorre a serviços de saúde mental.

A escola pública, à semelhança do Serviço Nacional de Saúde, demonstrou nesta crise sanitária, o seu

enorme valor, competência e espírito de missão. O reforço da escola pública tem de assentar, antes de mais,

na valorização dos seus recursos humanos, garantindo que as pessoas têm o justo reconhecimento salarial, a

progressão de carreiras, e as condições de trabalho mais adequadas.

A qualidade da escola pública faz-se com melhores estruturas, mas essencialmente com valorização das

pessoas. Não é digno, não é justo, não é politicamente aceitável que se continuem a exigir sacrifícios pessoais

e familiares dos docentes, que se empurrem estes profissionais para outras áreas de trabalho e se desbarate

a educação desta forma.

O elevador social que a educação deve ser é um elevador que parou para os docentes, que, à custa da

profissão que decidiram abraçar, se veem impossibilitados de progredir na carreira; não porque não tenham

mérito, mas porque o sistema de avaliação e de vagas que foi criado, teve como único intuito, impedir a sua

progressão.

Associada a esta situação, por consequência da crise sanitária resultante da COVID-19, foram alterados os

procedimentos da Avaliação de Desempenho dos Docentes, reduzindo-se os prazos para a observação de

aulas, num quadro de condições não habituais, que poderá ter condicionado estes processos de avaliação,

situação particularmente gravosa para os docentes posicionados nos 4.º e 6.º escalões, sujeitos a regime de

vagas, e que, por efeito destas alterações, poderão ter avaliações prejudicadas em ano de progressão de

carreira.

Pela injustiça reiterada contra estes profissionais, pela missão que abraçaram, pelo serviço público que

prestam, pelo reconhecimento do seu esforço diário agravado na crise social e sanitária que vivemos, e pela

difícil tarefa que tem pela frente nos próximos anos, de recuperação dos indicadores de sucesso e bem estar

dos estudantes, é urgente que sejam corrigidos os erros cometidos contra os docentes pela própria tutela,

anulando o mecanismo de vagas de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente, que o PAN propõe

revogar com o presente projeto de lei.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei assegura a revogação do atual sistema de acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente,

procedendo para o efeito à décima quinta alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos

Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, e

alterado pelos Decretos-Leis n.os 105/97, de 29 de abril, 1/98, de 2 de janeiro, 35/2003, de 27 de fevereiro,

121/2005, de 26 de julho, 229/2005, de 29 de dezembro, 224/2006, de 13 de novembro, 15/2007, de 19 de

janeiro, 35/2007, de 15 de fevereiro, 270/2009, de 30 de setembro, 75/2010, de 23 de junho, 41/2012, de 21

de fevereiro, e 146/2013, de 22 de outubro, e pelas Leis n.os 80/2013, de 28 de novembro, 12/2016, de 28 de

abril, e 16/2016, de 17 de junho.

Artigo 2.º

Norma revogatória

É revogada a alínea b), do n.º 3, do artigo 37.º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos

Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, na sua

atual redação.

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor na data de entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua

publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

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PROJETO DE LEI N.º 81/XV/1.ª

ALTERAÇÃO DO ESTATUTO DA CARREIRA DOS EDUCADORES DE INFÂNCIA E DOS

PROFESSORES DOS ENSINOS BÁSICO E SECUNDÁRIO APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 139-

A/90, DE 28 DE ABRIL

Exposição de motivos

O Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário,

aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, determina no seu artigo 54.º os critérios relativos à

aquisição de outras habilitações por docentes profissionalizados com licenciatura.

Vem o mesmo, na sua atual redação, determinar que «a aquisição por docentes profissionalizados,

integrados na carreira, do grau académico de mestre em domínio diretamente relacionado com a área

científica que lecionem ou em Ciências da Educação confere direito à redução de um ano no tempo de serviço

legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde que, em qualquer caso, na avaliação do

desempenho docente lhes tenha sido sempre atribuída menção qualitativa igual ou superior a Bom» e que «a

aquisição por docentes profissionalizados, integrados na carreira, do grau académico de doutor em domínio

diretamente relacionado com a área científica que lecionem ou em Ciências da Educação confere direito à

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redução de dois anos no tempo de serviço legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde

que, em qualquer caso, na avaliação do desempenho docente lhes tenha sido sempre atribuída menção

qualitativa igual ou superior a Bom.»

Das alterações introduzidas dá-se nota que as mesmas versam sobre o tipo de bonificação atribuída em

cada caso. Assim, e até à publicação da Portaria n.º 344/2008, de 30 de abril, os mestrados e doutoramentos

eram considerados na integração na carreira.

A portaria em causa veio regulamentar o processo de reconhecimento dos ciclos de estudos conducentes

aos graus de mestre e doutor e dos próprios graus académicos obtidos por docentes profissionalizados,

procedendo a uma nova interpretação do artigo 54.º, ou seja, passados quase 20 anos da vigência deste

artigo, veio o Governo de então proceder à alteração do mesmo introduzindo uma interpretação diferente da

que vigorava até ao momento.

Assim, após a publicação da Portaria n.º 344/2008, de 30 de abril, considera-se que, para efeitos de

progressão na carreira, o disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 54.º do Estatuto Carreira Docente, na sua atual

redação, apenas se aplica «aos docentes profissionalizados que tenham obtido o grau de mestre ou de doutor

a que se refere o artigo anterior em data posterior à sua integração na carreira.»

Ora, tal situação significa que os docentes que pretenderam reforçar as suas competências ao longo da

vida não veem o seu esforço reconhecido aquando da sua integração no quadro. Não se afigura, por isso,

igualitário o princípio de bonificar um docente integrado na carreira como consequência da realização de

mestrado/doutoramento e não bonificar outro docente que tendo o mesmo mestrado/doutoramento é

discriminado porque o realizou enquanto contratado profissionalizado.

Considerando a realidade portuguesa onde os docentes são confrontados com longos anos de espera até

à sua integração na carreira, considera-se que esta distinção de critérios não se enquadra naquilo que se

deseja de um Estado que promova a igualdade entre pares e que contraria a intenção e a valorização do

exercício da função de docente.

Poderá ser assumido como injustificável dizer ao docente que, trabalhando ao longo de 15 anos ou mais,

ininterruptamente, e que por iniciativa própria procede à valorização profissional e por conseguinte suporta

igualmente um esforço financeiro, o Estado não lhe reconhece esse mesmo esforço, mais, que o discrimina

em relação ao seu par.

As reivindicações da classe docente são antigas e mais do que justificadas por força de um contínuo

desinvestimento na atratividade da profissão que resulta numa classe docente envelhecida, e para a qual os

jovens não se sentem atraídos em investir por todas as especificidades que lhe estão inerentes, ora por

congelamento de carreiras, ora por concursos que colocam os professores a muitos quilómetros da sua

residência, uma vida instável para aqueles e aquelas que representam uma classe de profissionais essenciais

numa das bases fundamental da nossa sociedade: a educação.

Não podemos, nem devemos, continuar a exigir um conjunto de deveres, sem reconhecer os direitos que

lhe são inerentes e sem proceder à justa valorização da carreira do docente. Para a sua valorização, importa

corrigir as injustiças verificadas, face ao papel fundamental que a classe docente tem no nosso País.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à décima quinta alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos

Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, e

alterado pelos Decretos-Leis n.os 105/97, de 29 de abril, 1/98, de 2 de janeiro, 35/2003, de 27 de fevereiro,

121/2005, de 26 de julho, 229/2005, de 29 de dezembro, 224/2006, de 13 de novembro, 15/2007, de 19 de

janeiro, 35/2007, de 15 de fevereiro, 270/2009, de 30 de setembro, 75/2010, de 23 de junho, 41/2012, de 21

de fevereiro, e 146/2013, de 22 de outubro, e pelas Leis n.os 80/2013, de 28 de novembro, 12/2016, de 28 de

abril, e 16/2016, de 17 de junho.

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Artigo 2.º

Alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos

Básico e Secundário

É alterado o artigo 54.º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos

Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, na sua redação atual, que passa

a ter a seguinte redação:

«Artigo 54.º

[…]

1 – A titularidade do grau de mestre em domínio diretamente relacionado com a área científica que

lecionem ou em Ciências da Educação por docentes profissionalizados integrados na carreira, aquando dessa

integração ou obtida em data posterior à integração na carreira, confere o direito à redução de um ano no

tempo de serviço legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde que, em qualquer caso, na

respetiva avaliação de desempenho lhes tenha sido sempre atribuída menção qualitativa igual ou superior a

Bom.

2 – A titularidade do grau de doutor em domínio diretamente relacionado com a área científica que

lecionem ou em Ciências da Educação por docentes profissionalizados integrados na carreira, aquando dessa

integração ou obtida em data posterior à integração na carreira, confere o direito à redução de dois anos no

tempo de serviço legalmente exigido para a progressão ao escalão seguinte, desde que, em qualquer caso, na

respetiva avaliação de desempenho lhes tenha sido sempre atribuída menção qualitativa igual ou superior a

Bom.

3 – […].

4 – […].»

Artigo 3.º

Norma revogatória

Com a entrada em vigor da presente lei é revogado o artigo 2.º da Portaria n.º 344/2008, de 30 de abril, na

sua redação atual.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor na data de entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua

publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

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PROJETO DE LEI N.º 82/XV/1.ª

TORNA OBRIGATÓRIA A TOMADA DE DECLARAÇÕES PARA MEMÓRIA FUTURA A PEDIDO DA

VÍTIMA OU DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Exposição de motivos

O crime de violência doméstica, tipificado no artigo 152.º do Código Penal, consubstancia um dos

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fenómenos criminológicos com maior grau de incidência na sociedade portuguesa, correspondendo a uma

realidade transversal a todos os grupos sociais e faixas etárias.

De acordo com o Relatório Anual de Segurança Interna de 2020, «a violência doméstica contra cônjuge ou

análogo, passou a ser o tipo de crime mais verificado, determinante da aplicação de penas e de medidas não

privativas (8623)»1.

De acordo com o Observatório de Mulheres Assassinadas, «entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 2020

foram 35 mulheres assassinadas, tendo sido 19 vítimas de femicídio em contexto de relações de intimidade e

16 mulheres assassinadas noutros contextos (…). No que diz respeito às tentativas, contabilizaram-se em

2020, 57 tentativas assassinato, sendo destas 50 tentativas de femicídios nas relações de intimidade e 7

tentativas de assassinato de mulheres noutros contextos»2.

Estamos perante um crime com gravosas e profundas repercussões nos planos pessoal, familiar,

profissional e social das vítimas em causa, conjuntura que é merecedora das devidas e adequadas respostas.

A gravidade do crime em análise, e considerando todo o supra exposto, encerra um problema de recolha e

produção de prova. Para uma efetiva produção dessa prova, afigura-se como fundamental atender às

declarações das vítimas, que quanto mais célere for a sua recolha, mais fidedignas e pormenorizadas podem

ser essenciais no desenrolar do respetivo processo crime.

Nos crimes de violência doméstica, não existe uma obrigatoriedade para tomada de declarações para

memória futura como existe, por exemplo, no caso dos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual

de menor – obrigatoriedade que decorre do artigo 271.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.

Em parecer da Procuradoria-Geral da República demonstra a importância que a recolha de declarações

para memória futura representa para a descoberta da verdade dos factos, referindo que «necessariamente,

além das situações objetivas a que alude o artigo 271.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, designadamente

'em caso de doença grave ou de deslocação para o estrangeiro', terá de ser ponderado o interesse da vítima,

que se encontra fragilizada, sendo este instituto da tomada de declarações para memória futura um dos

mecanismos para evitar a repetição de audição da vítima e protegê-la do perigo de revitimização. Por outro

lado, importa acautelar a genuinidade do depoimento, em tempo útil, pois é do conhecimento comum que este

tipo de crimes são de investigação, por vezes, complexa e demorada, sendo na maior parte dos casos as

vítimas os testemunhos essenciais para a descoberta da verdade dos factos.»

Uma vez que o partido do Pessoas-Animais-Natureza subscreve integralmente o entendimento da

Procuradoria-Geral da República, apresenta o presente projeto de lei com vista a tornar obrigatória a tomada

de declarações para memória futura a pedido da vítima ou do Ministério Público.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à décima alteração à Lei n.º 112/2009 de 16 de setembro, que estabelece o regime

jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica, à proteção e à assistência das suas vítimas e revoga a

Lei n.º 107/99, de 3 de agosto, e o Decreto-Lei n.º 323/2000, de 19 de dezembro, com vista a reforçar os

direitos das vítimas e tornar obrigatória a tomada de declarações para memória futura a pedido da vítima ou do

Ministério Público.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 112/2009 de 16 de setembro

É alterado o artigo 33.º da Lei n.º 112/2009 de 16 de setembro, o qual passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 33.º

[…]

1 – O juiz, a requerimento da vítima ou do Ministério Público, procede sempre à inquirição daquela no

1 ficheiro.aspx (portugal.gov.pt) 2 UMAR – União de Mulheres Alternativa e Resposta – Observatório de Mulheres Assassinadas Dados 2020 (umarfeminismos.org)

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decurso do inquérito, a fim de que o depoimento possa, se necessário, ser tomado em conta no julgamento.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE LEI N.º 83/XV/1.ª

REGULA AS CONDIÇÕES EM QUE A MORTE MEDICAMENTE ASSISTIDA NÃO É PUNÍVEL E

PROCEDE À ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL

A evolução da ciência e da medicina permite, nos dias de hoje, prolongar a vida para além daquilo que

seria imaginável, contribuindo para um aumento da esperança média de vida. De acordo com um Relatório

recente da Organização Mundial de Saúde (OMS), Portugal surge com uma esperança média de vida de 81,1

anos, valor e com tendência para crescer.

Apesar dos inúmeros avanços da medicina, existem, porém, ainda muitas doenças ou lesões que

permanecem sem cura. Ainda que seja inevitável, parece existir na nossa sociedade um certo receio em

discutir questões relacionadas com o fim de vida, tema este cuja complexidade e diferentes sensibilidades se

reconhece.

A existência de alta tecnologia na medicina moderna, por possibilitar o aumento do número de anos de

vida, coloca novos desafios, como a necessidade de estabelecimento de critérios para uma boa prática clínica

numa fase final da vida, de prestação de todos os cuidados médicos que se afigurem necessários e a também

a discussão em torno da questão da morte medicamente assistida, em face da das contraposições entre a

quantidade e a qualidade de vida.

A discussão em torno do tema da morte medicamente assistida teve início na Assembleia da República na

XIII Legislatura. A entrada da Petição n.º 103/XIII/1.ª, que solicitava a despenalização da morte assistida, deu

início a um debate intenso no Parlamento, tendo sido, por conseguinte, criado um Grupo de Trabalho para o

efeito. A discussão deste tema nos moldes em que se realizou foi de extrema importância, porque, apesar da

complexidade e profundidade do mesmo, foi possível, especialmente em sede de Grupo de Trabalho, debater

o tema com seriedade, discutir argumentos e retirar conclusões. A este debate seguiram-se muitos outros,

impulsionados por organizações da sociedade civil, contribuindo para um maior esclarecimento dos cidadãos

sobre o tema e permitindo-lhe formar a sua opinião de forma consciente.

O PAN sempre mostrou interesse em discutir o tema, facto que constava já do seu programa eleitoral às

eleições legislativas de 2015 e motivo pelo qual pugnou pela criação de um Grupo de Trabalho que permitisse

o debate na Assembleia da República, no qual teve uma participação ativa. Na XIII Legislatura, apresentámos

assim uma iniciativa que visava a despenalização da morte medicamente assistida, a qual foi rejeitada.

Na XIV Legislatura, com o mesmo intuito, apresentámos o Projeto de Lei n.º 67/XIV/1.ª que foi aprovado na

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generalidade e, após amplo debate e trabalho na especialidade, deu origem a um texto conjunto que agregava

iniciativas de diversos partidos. Texto esse que veio a ser aprovado por ampla maioria, com os votos a favor

do PS, do BE, do PAN, do PEV, do IL e de 14 Deputados do PSD, a abstenção de 2 Deputados do PS e de 2

Deputados do PSD e o voto contra.

Após esta aprovação, o Decreto pela Assembleia da República, foi sujeito, a pedido do Sr. Presidente da

República, a fiscalização preventiva da constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional. Após a apreciação do

mesmo, veio o Tribunal Constitucional, por via do Acórdão n.º 123/2021, declarar inconstitucionais algumas

das respetivas normas, dando, posteriormente, origem a um veto nos termos do artigo 279.º, n.º 1, da

Constituição. Na sequência de um trabalho conjunto de diversas forças políticas, a 5 de novembro de 2022, a

Assembleia da República aprovou uma proposta de alteração a este Decreto com os votos a favor do PS, do

BE, do PAN, do PEV, do IL e de 13 Deputados do PSD, a abstenção de 2 Deputados do PS e de 3 Deputados

do PSD e o voto contra de 7 Deputados do PS, 62 Deputados do PSD, do PCP, do CDS-PP e do CH.

Contudo, apesar de ter obtido uma maioria expressiva, este decreto foi novamente vetado pelo Sr. Presidente

da República.

Por sermos favoráveis à autodeterminação, e no respeito pela autonomia e liberdade, por entendermos que

esta matéria já foi profundamente discutida na anterior legislatura e por existir nesta nova legislatura uma

maioria política favorável à consagração da não-punibilidade da morte medicamente assistida, decidimos

trazer novamente este tema a debate. Acreditamos que esta representa a vontade maioritária da sociedade.

Vontade expressamente demonstrada num estudo da Eurosondagem que revelou que 67,4% da população

defende a legalização da morte medicamente assistida. Por outro lado, é importante recordar um recente

estudo elaborado em colaboração com a secção regional do norte da Ordem dos Médicos, realizado com base

na resposta de 1200 médicos, segundo o qual a maioria dos médicos considera que a eutanásia deveria ser

legalizada em Portugal, tendo inclusive alguns médicos admitido que já praticaram eutanásia ou suicídio

assistido.

Passaremos, então, a apresentar os argumentos e motivos justificativos do presente projeto de lei.

Numa breve definição de morte medicamente assistida, configuramos a mesma como o ato de antecipar a

morte que ocorre por decisão da própria pessoa, em exercício do seu direito fundamental à autodeterminação

e livre desenvolvimento da personalidade, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde, quando

não existem quaisquer perspetivas de cura. A morte medicamente assistida pode concretizar-se de duas

formas: eutanásia, quando o fármaco letal é administrado por um médico, e suicídio medicamente assistido,

quando é o próprio doente a autoadministrar o fármaco letal, sob a orientação e supervisão de um médico.

Consideramos que desta definição resulta claramente qual o objetivo do recurso à morte medicamente

assistida. A motivação não será certamente matar alguém, mas sim permitir a morte medicamente assistida

como meio para acabar com a situação de sofrimento irreversível em que alguém se encontra. Acreditamos

que a intenção de qualquer doente que pretenda recorrer à morte medicamente assistida, tal como a de

qualquer médico que a pratique, é unicamente à vontade em acabar com o sofrimento em que se encontra, no

caso de um paciente que esteja numa situação clínica relativamente à qual não se vislumbra qualquer

esperança de melhoria. Assim, sabendo aqueles doentes qual o seu destino, aquilo que no fundo estão a

escolher, quando formulam um pedido de morte medicamente assistida, é entre duas formas de morrer, isto é,

entre uma morte digna e uma morte decorrente da doença, a qual acabará por ocorrer em situação de

sofrimento. Conforme defende Pedro Galvão, filósofo e professor na Universidade de Lisboa, «a morte é um

mal comparativo. Não é que estar morto seja intrinsecamente mau (ou bom): a morte, quando é um mal para

quem morre, é má por comparação com aquilo que exclui [um futuro com valor]. Acontece que, por vezes, a

alternativa à morte não é um futuro valioso. Aquilo que a morte exclui nem sempre é globalmente bom».

Ora, em causa não está qualquer opção entre a morte e a vida, até porque nos casos em apreço esta

última já não tem a configuração que as pessoas consideram que deveria ter. A configuração da vida, numa

perspetiva meramente biológica, deixa de fora uma conceção baseada numa fruição plena, de constante

construção, como resultado da nossa experiência, das nossas escolhas e das nossas convicções. Não

encaramos a vida apenas como algo inato, mas como algo mutável que se transforma ao longo dos anos em

virtude do nosso percurso e das nossas crenças.

É inquestionável o direito à vida de qualquer pessoa e o direito a viver de forma condigna. Viver é um

direito, mas não uma obrigação. Mas quando a vontade de recorrer à morte medicamente assistida é

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manifesta e inequívoca, pelas razões já amplamente expendidas, não devemos prolongar a vida a todo o

custo, particularmente se esses custos acarretam para a pessoa uma dor e um sofrimento intoleráveis.

A este propósito citamos o artigo «suicídio medicamente ajudado e eutanásia em unidades de cuidados

intensivos: um diálogo sobre questões éticas centrais», publicado pelo Critical Care Medicine, segundo o qual

os médicos podem optar por não iniciar ou suspender terapêuticas de suporte vital, mesmo que daí resulte que

os doentes morram mais cedo do que, de outro modo, morreriam. Tendo por base a perspetiva médica, refere

ainda o artigo que os médicos estão «obrigados a tratar o sofrimento físico, mesmo que haja uma hipótese de

que essa intervenção, para aliviar a dor, possa encurtar a vida. Se aceitarmos que a vida não precisa de ser

prolongada a todo o custo e que a vida pode mesmo ser encurtada (seja involuntariamente seja

passivamente), no interesse do seu conforto, então aceitamos implicitamente que o valor da vida não é

infinito».

Como escreve o médico de Gastrenterologia que tem se tem debruçado sobre o tema da morte

medicamente assistida, Gilberto Couto, citando Rachels e Dworkin, a nossa vida biológica (enquanto

organismos) não tem, para nós, o mesmo valor da nossa vida biográfica (enquanto pessoas). Pelo mesmo

motivo, Miguel Real, autor de o «Manifesto em defesa de uma morte livre», apela a que vejamos a vida numa

perspetiva de qualidade e não apenas de quantidade.

Posições como as acima referidas invocam o princípio da dignidade da pessoa humana. Conforme ensina

José Gomes Canotilho, jurista e professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, a

dignidade da pessoa é da pessoa concreta, na sua vida real e quotidiana, não é de um ser ideal e abstrato. É

a pessoa, tal como existe, que a ordem jurídica considera irredutível e insubstituível e cujos direitos

fundamentais a Constituição da República Portuguesa (CRP) enuncia e protege.

Como refere Luísa Neto, professora de direito constitucional, quando alguém formula um pedido de morte

medicamente assistida está no fundo a dizer: quero viver e morrer de outra maneira, sempre por referência ao

valor da vida e por respeito à vida. A opção de morrer nestes termos implica não tanto o de escolher morrer,

mas mais o de como morrer. O direito a morrer dignamente implica então apenas falar do direito a que não nos

impeçam de aceitar com dignidade e responsabilidade a chegada iminente da morte, bem como o direito a que

respeitem o nosso direito a viver de tal maneira que possamos preparar-nos para assumir tal morte.

Aqui este princípio aparece ligado ao conceito de autonomia e liberdade individual. Um indivíduo

competente e autónomo é livre e responsável pelas suas escolhas. Conforme defendido por John Stuart Mill,

ser-se responsável pelas próprias escolhas em vida significa também ser-se livre de poder escolher quando e

como morrer.

Neste sentido, subscrevemos o que foi dito pelo constitucionalista Jorge Reis Novais na sua audição na

Assembleia da República no Grupo de Trabalho criado para discutir esta matéria. Aquando da sua reflexão

sobre o que é o princípio da dignidade da pessoa humana, concluiu que «se nós consideramos que as

decisões que a pessoa toma nos domínios vitais da existência humana, o Estado deve proteger a pessoa de

interferências de outros e de imposições de outros, ou seja, deve ser reconhecida a cada pessoa que seja

competente para formar uma vontade o poder de conformar a sua vida de acordo com as suas próprias

conceções; naquelas áreas mais íntimas, naquelas áreas mais vitais da sua existência, não deve ser o Estado

a impor uma conceção do mundo, de como deve levar a sua vida. Deve ser a pessoa a definir isso».

A verdade é que, cada vez mais, a prática médica tem sido caracterizada pela autonomia e liberdade do

paciente. Atualmente, a defesa de um modelo paternalista para a atuação médica já não existe. A ideia da

autodeterminação veio alterar substancialmente o sentido do ato médico. O paciente deixou de ser um sujeito

meramente passivo na relação médico/doente, para passar a ser um sujeito detentor de direitos que, em

conjunto com o médico, decide o percurso da sua vida.

Neste sentido, porque estamos numa relação paritária, o médico deve informar o paciente do seu estado

de saúde, discutir com ele as opções de tratamento disponíveis e ter em conta a sua vontade sobre o destino

a dar à sua vida. Em suma, nas palavras de Luísa Neto «tratar bem não é apenas atuar segundo as regras

técnicas da profissão, mas também considerar o doente como um centro de decisão respeitável.»

Não se defende aqui que a vontade do paciente seja absoluta, isto é, que o médico execute sempre o

pedido pelo doente, nos exatos termos em que tal é pedido. Aquilo que se defende é que a vontade do

paciente seja tida em conta, em todos os momentos, nomeadamente em relação à questão do fim de vida.

Ora, as decisões sobre a morte e, em especial, sobre o modo em que esta ocorre, são de extrema

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importância. Assim, quando uma pessoa, de forma consciente e esclarecida, define as condições que quer

para a sua morte, tal vontade deve ser valorada e não liminarmente ignorada, como ocorre atualmente.

A este propósito sufragamos a posição de Jorge Reis Novais, transmitida no Grupo de Trabalho já

mencionado, que inclusive defendeu que a situação atual, de não atender à vontade da pessoa, é

inconstitucional. Tendo defendido, a propósito da apreciação da margem do legislador para intervir nesta

matéria, a existência de um mínimo e de um máximo, dando a Constituição grande margem de manobra ao

legislador desde que respeitados estes limites, argumentou no seguinte sentido: «uma situação de proibição

total de atender à vontade da pessoa, que é aquela que existe hoje, que essa situação é proibida pela

Constituição, ou seja, tenderia a dizer que a situação atual é inconstitucional. Isto é, quando penaliza em todas

e quaisquer circunstâncias, não poderia fazê-lo. Não poderia fazê-lo porque a Constituição de Estado de

Direito, uma Constituição apoiada na dignidade da pessoa humana, tem de reconhecer a vontade da pessoa

decidir para as questões mais decisivas e mais íntimas da sua vida, onde eu incluo também as decisões, em

alguma medida, sobre as condições da sua própria morte. Na medida em que a lei atual não dá a mínima

possibilidade, portanto é uma proibição total e absoluta, a meu ver tenderia a considerar que este limite está

ultrapassado, ou seja, este limite constitucional de atender, em alguma medida, à autonomia da pessoa não

está a ser respeitado».

Para além da posição assumida por Jorge Reis Novais, vários outros constitucionalistas defendem que

uma lei que permita a eutanásia ou o suicídio medicamente assistido não é inconstitucional, nomeadamente

Luísa Neto, Teresa Beleza e Faria Costa.

A discussão sobre uma eventual inconstitucionalidade resulta de poder estar em causa uma violação do

artigo 24.º da CRP. Ora, tal interpretação apenas é possível se se entender que aquele artigo, ao estabelecer

que a «vida humana é inviolável», interdita qualquer violação do direito à vida, independentemente do tipo de

agressão em causa.

Todavia, ainda que se diga que a vida humana é inviolável ou que o direito à vida é um direito absoluto, tal

consideração, do ponto de vista estritamente jurídico, não é verdadeira. A admissibilidade de situações como a

possibilidade de matar em legítima defesa demonstram tal facto. O direito à vida, ainda que tendencialmente

absoluto, não tem, atualmente, a configuração de um direito absoluto.

Facilmente se compreende que aquilo que deve ser garantido pelo Estado é que a pessoa que toma a

decisão é competente para o fazer e que o faz de forma livre, isto é, sem qualquer coação ou interferência de

terceiros. O Estado deve assim criar mecanismos que permitam aferir se a vontade manifestada por

determinada pessoa corresponde à sua vontade real, ou seja, se a pessoa está lúcida e consciente.

Todavia, tem sido defendido que a despenalização da morte medicamente assistida introduzirá a ideia de

que há vidas que são dignas de serem vividas e outras indignas de serem vividas. Não compreendemos este

argumento. Todas as vidas são dignas, independentemente do seu grau de autonomia ou de dependência,

independentemente de se tratar de alguém interdito por anomalia psíquica ou com plena consciência. A única

coisa que difere são as obrigações do Estado, porquanto o mesmo tem o dever de aferir se a pessoa está em

condições de formular a sua vontade, de forma consciente e lúcida, uma vez que, caso não esteja, o acesso à

morte medicamente assistida não é possível.

Outros argumentos têm sido apresentados contra a despenalização da morte medicamente assistida, em

especial a existência de cuidados paliativos e o argumento da «encosta escorregadia ou rampa deslizante».

No entanto, o PAN entende que a despenalização da morte medicamente assistida não exclui nem conflitua

com os cuidados paliativos, nem tão pouco se pode confundir com o direito de acesso aos mesmos. Estes

são, aliás, de enorme importância, devendo, por isso, ser valorizados e continuamente reforçados. Mas a

verdade é que os cuidados paliativos não eliminam por completo o sofrimento em todos os doentes, nem

impedem por inteiro a degradação física e psicológica dos casos considerados para efeitos do objetivo da

presente lei, porque nem todo o sofrimento é, infelizmente, tratável. Para além disto, os efeitos associados a

estes tratamentos, nomeadamente náuseas e alterações de consciência, podem comprometer a autonomia e

a qualidade de vida dos pacientes.

É verdade que ainda há muito a fazer para a melhoria da qualidade e da acessibilidade dos cuidados

paliativos em Portugal. No entanto, isso não significa que apenas se possa permitir a morte medicamente

assistida quando tivermos melhores cuidados paliativos, até porque não é isso que está em causa. A vontade

destes doentes deve ser respeitada e o Estado deve ter uma resposta alternativa para aqueles que sofrem.

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Sendo inequívoco que mesmo num contexto de recurso à morte medicamente assistida os cuidados paliativos

devem ser prestados, tal como devem ser todos os demais direitos do doente assegurados.

Mais, não entramos em discussões alarmistas relacionadas com o argumento da «rampa deslizante», nos

termos do qual a aprovação da morte medicamente assistida abriria caminho para aprovação de formas de

eutanásia involuntária. A morte assistida destina-se a doentes conscientes, lúcidos e cuja vontade foi

manifestamente expressa, motivo pelo qual esta é sempre a pedido do paciente.

Desde que se assegure o cumprimento desta regra, não cremos que existirão abusos. Ainda assim, a

possibilidade de existência de eventuais abusos não pode impedir o legislador de legislar sobre determinadas

matérias. Tais riscos obrigarão outrossim o legislador a ser mais cauteloso, devendo estabelecer mecanismos

claros e exigentes de fiscalização e fazer um acompanhamento constante da aplicação da lei, de forma a fazer

os ajustes que sejam necessários. Como bem escreve Gilberto Couto, «o respeito pela autonomia e liberdade

de um doente, assumido na permissão da morte assistida, não deve ser posto em causa pela incapacidade do

Estado em fazer o seu papel, que é impedir os abusos».

Este argumento da «rampa deslizante» tem sido, porém, utilizado para descrever a experiência da morte

medicamente assistida nos países que a despenalizaram. No entanto, olhando para a prática, tal argumento é

desprovido de sentido ou factualidade. Em termos de Direito Comparado, o número de mortes por eutanásia

ou suicídio assistido não são alarmantes, como se tem defendido.

De acordo com a avaliação de 2016 dos sistemas de saúde, a Holanda é o país com melhor classificação

no ranking internacional, numa avaliação de 35 países europeus. Olhando para a avaliação de outros países

que despenalizaram a morte medicamente assistida, veremos que a Suíça se encontra no 2.º lugar, a Bélgica

no 4.º lugar e o Luxemburgo no 6.º lugar. Tal comprova que os países que a despenalizaram são países

evoluídos, que prestam bons cuidados de saúde, nomeadamente a nível dos cuidados paliativos, e oferecem

aos seus pacientes todas as alternativas possíveis. Neste sentido, Portugal, que se encontra no 14.º lugar do

ranking, deve olhar para estes países como exemplos a seguir.

A respeito da diferença entre eutanásia ativa e eutanásia passiva, a justiça canadiana defendeu que desde

que o doente tenha dado indicação de que pretende a morte medicamente assistida e que «possa dar o seu

consentimento informado, não interessa se a assistência do médico é passiva ou ativa, porque a dignidade e a

autonomia do doente são quem manda, em qualquer dos casos».

Assim, para além dos casos de suspensão de tratamento, é permitido aos médicos, por exemplo,

administrar morfina a um doente para aliviar a sua dor, ainda que, de tal ato, possa resultar a morte. Esta

possibilidade, conhecida por teoria do duplo efeito, demonstra que a diferença entre a «morte permitida» e a

«morte não permitida» não é assim tão vincada. De acordo com esta teoria, basta que o médico diga que agiu

com a intenção de aliviar o sofrimento, para que esta morte seja considerada permitida. Contudo, será

possível discernir efetivamente qual a intenção do médico? Conseguiremos afirmar seguramente que a

intenção do médico é aliviar a dor e não antecipar a morte? Entendemos que não. A intenção do médico nem

sempre é fácil definir. Por este motivo, ainda que reconheçamos a diferença entre as duas atitudes,

certamente que esta não é suficientemente grande que justifique a proibição de uma e a permissão de outra,

isto é, que proíba a eutanásia ativa e admita a eutanásia passiva.

Em Portugal, vários foram os avanços no sentido de reconhecer aos pacientes uma maior autonomia. É

hoje aceite que o doente recuse a administração de determinado tratamento, ainda que de tal recusa resulte a

morte. Importantes contributos nesta matéria foram dados pela Lei n.º 25/2012, de 16 de julho, que estabelece

o regime das diretivas antecipadas de vontade, em matéria de cuidados de saúde, designadamente sobre a

forma de testamento vital, e que permite a nomeação de procurador de cuidados de saúde. Enquanto

importante instrumento de reconhecimento da autonomia do doente, esta figura veio prever a possibilidade de

qualquer cidadão maior de idade – desde que não se encontre interdito ou inabilitado por anomalia psíquica e

que se encontre capaz de dar o seu consentimento consciente, livre e esclarecido – poder subscrever um

«documento unilateral e livremente revogável a qualquer momento pelo próprio», no qual «manifesta

antecipadamente a sua vontade consciente, livre e esclarecida, no que concerne aos cuidados de saúde que

deseja receber, ou não deseja receber, no caso de, por qualquer razão, se encontrar incapaz de expressar a

sua vontade pessoal e autonomamente».

Não obstante os passos importantes que têm sido dados, em Portugal não é ainda permitida a morte

medicamente assistida. É nosso parecer que tal, por não ser permitido em qualquer circunstância, limita

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excessivamente a autonomia e a liberdade individuais. Pretendemos então, com o presente projeto, proceder

à regulamentação da morte medicamente assistida em Portugal, tanto na vertente de eutanásia como de

suicídio medicamente assistido, de forma a admiti-la, verificadas determinadas circunstâncias.

Assim, o paciente tem de ser portador de uma doença ou lesão incurável, causadora de sofrimento físico

ou psicológico intenso, persistente e não debelado ou atenuado para níveis suportáveis e aceites pelo doente

ou estar em situação clínica de incapacidade ou dependência absoluta ou definitiva. Precisa de ser

competente e estar consciente e lúcido quando formula o seu pedido e quando o reitera, devendo tal pedido

ser reiterado ao longo de todo o processo. Para além disso, o pedido deve ser apresentado pelo próprio, por

escrito, de forma livre e voluntária, após um processo de adequada informação prestada pelo médico e de livre

reflexão, não motivado ou influenciado por qualquer pressão ou coação exterior. Desta forma, entendemos

que devem estar excluídos do seu âmbito de aplicação os menores, as pessoas interditas ou inabilitadas por

anomalia psíquica, bem como aquelas que padeçam de uma doença do foro mental. Para além disso, aquele

que formula o pedido deverá ter nacionalidade portuguesa ou residir legalmente em Portugal.

Na sequência da formulação do pedido, este deverá ser analisado por uma equipa multidisciplinar,

composta por médicos a quem o paciente faz o pedido, médico especialista na patologia do paciente e por um

médico psiquiatra. O procedimento é exigente e para que o pedido seja aceite é necessário o parecer

favorável dos três médicos envolvidos no processo.

Para além disso, pretende-se criar a Comissão de Verificação e Avaliação. Esta exerce essencialmente

uma função de fiscalização e de controlo, competindo-lhe emitir parecer prévio sobre o cumprimento dos

requisitos legais e, posteriormente, receber e analisar os processos de morte medicamente assistida

praticados, para aferir do cumprimento da legislação. Para além disso, exerce importantes competências ao

nível do acompanhamento da aplicação da lei, emissão de pareceres sobre a matéria e elaboração de

relatórios sobre a sua atividade, podendo ainda formular recomendações à Assembleia da República ou ao

Governo.

Cremos que o presente projeto, por prever elevados mecanismos de controlo, quer seja pela

obrigatoriedade de parecer favorável de diversos médicos, quer seja pela criação de uma Comissão que

analisará, em momento prévio e após a morte, o cumprimento dos requisitos legais, evitará situações de

abuso, por possuir um elevado grau de escrutínio e de monitorização.

Pela exclusão de doentes com problemas mentais, pela exigência de consulta de médicos de diferentes

áreas, pela obrigatoriedade de um pedido reiterado e por apenas admitir o acesso à morte medicamente

assistida aos doentes com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença incurável, causadora de

sofrimento físico ou psicológico intenso, persistente e não debelado ou atenuado para níveis suportáveis e

aceites pelo doente ou a doentes em situação clínica de incapacidade ou dependência absoluta ou definitiva,

e, ainda assim, nestes casos, obrigar o médico a discutir com o paciente outras possibilidades terapêuticas

ainda disponíveis, assim como as possibilidades oferecidas pelos cuidados paliativos e as suas consequências

e impactos na vida do paciente, o presente projeto de lei tem em vista garantir que o pedido de morte

medicamente assistida não é uma precipitação e que resulta efetivamente da vontade do paciente.

Importa ainda acrescentar que a morte medicamente assistida é pedida pelo doente e não sugerida pelo

médico. Neste sentido, a publicidade a uma lei que possibilite a morte medicamente assistida deverá ser

mínima, bastando que o doente tenha conhecimento da lei e que o médico só fale desta possibilidade quando

diretamente interpelado pelo doente para tal. Mais, o presente projeto não obriga ninguém a formular um

pedido de morte medicamente assistida, nem ninguém deverá ser submetido a ela contra a sua vontade,

destinando-se apenas àqueles que o pedirem, sendo unilateralmente e a todo o tempo passível a revogação

do pedido.

Face ao exposto, vemos a despenalização e regulamentação em Portugal da morte medicamente assistida

como uma expressão concreta dos direitos individuais à autonomia e à liberdade de convicção e de

consciência. Assim, e ainda que os direitos individuais no domínio da autodeterminação da pessoa doente

tenham vindo a ser progressivamente reconhecidos – nomeadamente o reforço do consentimento informado,

do direito de aceitação ou a recusa de tratamento, da condenação da obstinação terapêutica e das diretivas

antecipadas de vontade –, vemos a possibilidade de acesso à morte medicamente assistida como mais um

passo importante e necessário no reconhecimento daqueles direitos.

Nestes termos, a abaixo assinada Deputada única representante do partido do PAN, ao abrigo das

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disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projeto de lei:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei regula as condições especiais em que aantecipação da morte medicamente assistidanão é

punível e altera o Código Penal.

Artigo 2.º

Definições

Para efeitos da presente lei, considera-se:

a) Morte medicamente assistida, morte que ocorre por decisão da própria pessoa, em exercício do seu

direito fundamental à autodeterminação e livre desenvolvimento da personalidade, quando praticada ou

ajudada por profissionais de saúde;

b) Suicídio medicamente assistido, autoadministração de fármacos letais pelo próprio doente, sob

supervisão médica;

c) Eutanásia, administração de fármacos letais, pelo médico ou profissional de saúde devidamente

habilitado para o efeito;

d) Doença grave ou incurável, doença grave que ameace a vida, em fase avançada e progressiva,

incurável e irreversível, que origina sofrimento de grande intensidade;

e) Lesão definitiva de gravidade extrema, lesão grave, definitiva e amplamente incapacitante que coloca a

pessoa em situação de dependência de terceiro ou de apoio tecnológico para a realização das atividades

elementares da vida diária, existindo certeza ou probabilidade muito elevada de que tais limitações venham a

persistir no tempo sem possibilidade de cura ou de melhoria significativa;

f) Sofrimento, sofrimento físico, psicológico e espiritual, decorrente de doença grave ou incurável ou de

lesão definitiva de gravidade extrema, com grande intensidade, persistente, continuado ou permanente e

considerado intolerável pela própria pessoa;

g) Médico orientador, médico indicado pelo doente que tem a seu cargo coordenar toda a informação e

assistência ao doente, sendo o interlocutor principal do mesmo durante todo o processo assistencial, sem

prejuízo de outras obrigações que possam caber a outros profissionais;

h) Médico especialista, médico especialista na patologia que afeta o doente e que não pertence à mesma

equipa do médico orientador.

Artigo 3.º

Antecipação da morte medicamente assistida não punível

1 – Para efeitos da presente lei, considera-se morte medicamente assistida não punível a que ocorre por

decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de

sofrimento intolerável, com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença incurável, quando praticada ou

ajudada por profissionais de saúde.

2 – Para efeitos da presente lei, consideram-se legítimos apenas os pedidos de morte medicamente

assistida apresentados por cidadãos nacionais ou legalmente residentes em território nacional.

3 – A morte medicamente assistida ocorre em conformidade com a vontade e a decisão da própria pessoa,

que se encontre numa das seguintes situações:

a) Lesão definitiva de gravidade extrema;

b) Doença grave ou incurável.

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4 – A morte medicamente assistida pode ocorrer por:

a) Suicídio medicamente assistido;

b) Eutanásia.

5 – O pedido subjacente à decisão prevista no n.º 1 obedece a procedimento clínico e legal, de acordo com

o disposto na presente lei.

6 – O pedido pode ser livremente revogado a qualquer momento, nos termos do artigo 12.º

CAPÍTULO II

Procedimento

Artigo 4.º

Abertura do procedimento clínico

1 – O pedido de abertura do procedimento clínico de antecipação da morte é efetuado por pessoa que

preenche os requisitos previstos no artigo anterior, doravante designada por doente, em documento escrito,

datado e assinado pelo próprio, ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, a ser

integrado em Registo Clínico Especial (RCE) criado para o efeito.

2 – O pedido é dirigido ao médico escolhido pelo doente como médico orientador.

3 – O médico orientador deve obrigatoriamente aceder ao historial clínico do doente e assumi-lo como

elemento essencial do seu parecer, emitido nos termos do artigo 5.º

4 – Não são admitidos os pedidos de doentes sujeitos a processo judicial para aplicação do regime do

maior acompanhado, enquanto o mesmo se encontrar pendente, sendo o procedimento de antecipação da

morte imediatamente suspenso quando o processo judicial for instaurado posteriormente à apresentação do

pedido e enquanto o mesmo decorra, independentemente da fase em que o procedimento de antecipação da

morte se encontre.

5 – Ao doente é sempre garantido, querendo, o acesso a cuidados paliativos.

Artigo 5.º

Parecer do médico orientador

1 – O médico orientador emite parecer fundamentado sobre se o doente cumpre todos os requisitos

referidos no artigo 3.º e presta-lhe toda a informação e esclarecimento sobre a situação clínica que o afeta, os

tratamentos aplicáveis, viáveis e disponíveis, designadamente na área dos cuidados paliativos, e o respetivo

prognóstico, após o que verifica se o doente mantém e reitera a sua vontade, devendo a decisão do doente

ser registada por escrito, datada e assinada.

2 – A informação e o parecer prestados pelo médico e a declaração do doente, assinados por ambos,

integram o RCE.

3 – Se o parecer do médico orientador não for favorável à antecipação da morte do doente, o procedimento

em curso é cancelado e dado por encerrado e o doente é informado dessa decisão e dos seus fundamentos

pelo médico orientador, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do

artigo 4.º

Artigo 6.º

Confirmação por médico especialista

1 – Após o parecer favorável do médico orientador, este procede à consulta de outro médico, especialista

na patologia que afeta o doente, cujo parecer confirma ou não que estão reunidas as condições referidas no

artigo anterior, o diagnóstico e prognóstico da situação clínica e a natureza incurável da doença ou a condição

definitiva da lesão.

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2 – O parecer fundamentado do médico especialista é emitido por escrito, datado e assinado por ele e

integra o RCE.

3 – Se o parecer do médico especialista não for favorável à antecipação da morte do doente, o

procedimento em curso é cancelado e dado por encerrado e o doente é informado dessa decisão e dos seus

fundamentos pelo médico orientador, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura,

nos termos do artigo 4.º

4 – No caso de parecer favorável do médico especialista, o médico orientador informa o doente do

conteúdo daquele parecer, após o que verifica novamente se o doente mantém e reitera a sua vontade,

devendo a decisão do doente ser registada por escrito, datada e assinada pelo próprio ou pela pessoa por si

designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, e, juntamente com o parecer ou pareceres alternativos emitidos

pelo médico ou médicos especialistas, integrar o RCE.

5 – Caso o doente padeça de mais do que uma lesão definitiva ou doença incurável, o médico orientador

decide qual a especialidade médica a consultar.

Artigo 7.º

Confirmação por médico especialista em psiquiatria

1 – É obrigatório o parecer de um médico especialista em psiquiatria, sempre que ocorra uma das

seguintes situações:

a) O médico orientador e ou o médico especialista tenham dúvidas sobre a capacidade da pessoa para

solicitar a antecipação da morte revelando uma vontade séria, livre e esclarecida;

b) O médico orientador e ou o médico especialista admitam que a pessoa seja portadora de perturbação

psíquica ou condição médica que afete a sua capacidade de tomar decisões.

2 – Se o médico especialista em psiquiatria confirmar qualquer uma das situações referidas no número

anterior, o procedimento em curso é cancelado, sendo o doente informado dessa decisão e dos seus

fundamentos, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do artigo 4.º

3 – O parecer do médico especialista em psiquiatria é emitido por escrito, datado e assinado pelo próprio e

integra o RCE.

4 – A avaliação necessária para a elaboração do parecer referido no n.º 1 envolve, sempre que a condição

específica do doente assim o exija, a colaboração de um especialista em psicologia clínica.

5 – No caso de parecer favorável do médico especialista em psiquiatria, este, acompanhado do médico

orientador, deve informar o doente do conteúdo daquele parecer, após o que verifica novamente se o doente

mantém e reitera a sua vontade, devendo a decisão consciente e expressa deste ser registada em documento

escrito, datado e assinado pelo próprio ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, o

qual integra o RCE.

Artigo 8.º

Parecer da Comissão de Verificação e Avaliação

1 – Nos casos em que se apresentem os pareceres favoráveis nos termos dos artigos anteriores,

reconfirmada a vontade do doente, o médico orientador remete cópia do RCE para a Comissão de Verificação

e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Antecipação da Morte (CVA), prevista no artigo 24.º, solicitando

parecer sobre o cumprimento dos requisitos e das fases anteriores do procedimento, que é elaborado no prazo

máximo de 5 dias úteis.

2 – Quando a CVA tiver dúvidas sobre se estão reunidas as condições previstas na presente lei para a

prática da morte medicamente assistida, deveconvocar os médicos envolvidos no procedimento para prestar

declarações, podendo ainda solicitar a remessa de documentos adicionais que considere necessários.

3 – Em caso de parecer desfavorável da CVA, o procedimento em curso é cancelado, podendo ser

reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do artigo 4.º

4 – No caso de parecer favorável da CVA, o médico orientador deve informar o doente do conteúdo

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daquele parecer, após o que verifica novamente se este mantém e reitera a sua vontade, devendo a sua

decisão consciente e expressa ser registada em documento escrito, datado e assinado pelo próprio ou pela

pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, o qual integra o RCE.

Artigo 9.º

Concretização da decisão do doente

1 – Mediante parecer favorável da CVA, o médico orientador, de acordo com a vontade do doente, combina

o dia, hora, local e método a utilizar para a antecipação da morte.

2 – O médico orientador informa e esclarece o doente sobre os métodos disponíveis para praticar a

antecipação da morte, designadamente a autoadministração de fármacos letais pelo próprio doente ou a

administração pelo médico ou profissional de saúde devidamente habilitado para o efeito mas sob supervisão

médica, sendo a decisão da responsabilidade exclusiva do doente.

3 – A decisão referida no número anterior deve ser consignada por escrito, datada e assinada pelo doente,

ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, e integrada no RCE, sem prejuízo do

disposto no n.º 6 do artigo 3.º

4 – Após a consignação da decisão, o médico orientador remete cópia do RCE respetivo para a Inspeção-

Geral das Atividades em Saúde (IGAS), que pode acompanhar presencialmente o procedimento de

concretização da decisão do doente.

5 – No caso de o doente ficar inconsciente antes da data marcada para a antecipação da morte, o

procedimento é interrompido e não se realiza, salvo se o doente recuperar a consciência e mantiver a sua

decisão.

Artigo 10.º

Administração dos fármacos letais

1 – Além do médico orientador e outro profissional de saúde, obrigatoriamente presentes aquando da

administração dos fármacos letais, podem estar presentes outros profissionais de saúde por indicação do

médico orientador, assim como pessoas indicadas pelo doente, desde que o médico orientador considere que

existem condições clínicas e de conforto adequadas.

2 – Imediatamente antes de se iniciar a administração ou autoadministração dos fármacos letais, o médico

orientador deve confirmar se o doente mantém a vontade de antecipar a sua morte, na presença de uma ou

mais testemunhas, devidamente identificadas no RCE.

3 – Caso o doente não confirme expressamente a sua vontade de antecipar a morte, nomeadamente se

manifestar qualquer dúvida, o procedimento em curso é cancelado e dado por encerrado, o que é inscrito em

documento escrito, datado e assinado pelo médico orientador, integrando o RCE, podendo o procedimento ser

reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do artigo 4.º

4 – No caso previsto no número anterior, deve ser entregue ao doente o respetivo RCE, devendo uma

cópia ser anexada ao seu processo clínico e outra enviada para a CVA com o respetivo Relatório Final do

médico orientador, nos termos do artigo 17.º

Artigo 11.º

Decisão pessoal e indelegável

1 – A decisão do doente em qualquer fase do procedimento clínico de antecipação da morte é estritamente

pessoal e indelegável.

2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, caso o doente que solicita a antecipação da morte não

saiba ou esteja impossibilitado fisicamente de escrever e assinar, pode, em todas as fases do procedimento

em que seja requerido, fazer-se substituir por pessoa da sua confiança, por si designada apenas para esse

efeito, aplicando-se as regras do reconhecimento de assinatura a rogo na presença de profissional legalmente

competente, devendo a assinatura ser efetuada na presença do médico orientador, com referência expressa a

essa circunstância, e na presença de uma ou mais testemunhas.

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3 – A pessoa designada pelo doente para o substituir nos termos do número anterior não pode vir a obter

benefício direto ou indireto da morte do doente, nomeadamente vantagem patrimonial, nem ter interesse

sucessório.

Artigo 12.º

Revogação

1 – A revogação do pedido de antecipar a morte cancela o procedimento clínico em curso, devendo a

decisão ser inscrita no RCE pelo médico orientador.

2 – Mediante a revogação do pedido é entregue ao doente o respetivo RCE, devendo ser anexada uma

cópia ao seu processo clínico com o Relatório Final do médico orientador.

Artigo 13.º

Locais autorizados

1 – A escolha do local para a prática da morte medicamente assistida cabe ao doente.

2 – O ato de antecipação da morte pode ser praticado nos estabelecimentos de saúde do Serviço Nacional

de Saúde e dos setores privado e social que estejam devidamente licenciados e autorizados para a prática de

cuidados de saúde, disponham de internamento e de local adequado e com acesso reservado.

3 – Caso a escolha do doente recaia sobre local diferente dos referidos no número anterior, deve o médico

orientador certificar que o mesmo dispõe de condições clínicas e de conforto adequadas para o efeito.

Artigo 14.º

Acompanhamento

Além do médico orientador e de outros profissionais de saúde envolvidos no ato de antecipação da morte,

podem estar presentes, também para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 10.º, as pessoas indicadas pelo

doente.

Artigo 15.º

Verificação da morte e certificação do óbito

A verificação da morte e a certificação do óbito obedecem à legislação em vigor, devendo as respetivas

cópias ser arquivadas no RCE.

Artigo 16.º

Registo Clínico Especial

1 – O RCE inicia-se com o pedido de antecipação da morte redigido pelo doente, ou pela pessoa por si

designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, e dele devem constar, entre outros, os seguintes elementos:

a) Todas as informações clínicas relativas ao procedimento em curso;

b) Os pareceres e relatórios apresentados pelos médicos e outros profissionais de saúde intervenientes no

processo;

c) O parecer da CVA;

d) As decisões do doente sobre a continuação do procedimento ou a revogação do pedido;

e) A decisão do doente sobre o método de antecipação da morte;

f) Todas as demais ocorrências consideradas relevantes.

2 – Concluído o procedimento ou cancelado por revogação do pedido do doente, decisão médica ou

seguindo parecer da CVA, o RCE é anexado ao Relatório Final, devendo ser anexada uma cópia ao processo

clínico do doente.

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3 – O médico orientador é responsável pelo RCE, nele integrando os documentos a que se refere o n.º 1.

4 – O doente tem acesso ao RCE sempre que o solicite ao médico orientador.

5 – O modelo de RCE é estabelecido em regulamentação a aprovar pelo Governo.

Artigo 17.º

Relatório Final

1 – O médico orientador elabora, no prazo de 15 dias após a morte, o respetivo Relatório Final, ao qual é

anexado o RCE, que remete à CVA e à IGAS.

2 – A obrigação de apresentação do Relatório Final mantém-se nos casos em que o procedimento é

encerrado sem que tenha ocorrido a antecipação da morte do doente, seja por revogação do doente seja por

decisão médica ou parecer desfavorável da CVA.

3 – Do Relatório Final devem constar, entre outros, os seguintes elementos:

a) A identificação do doente e dos médicos e outros profissionais intervenientes no processo, incluindo os

que praticaram ou ajudaram à antecipação da morte, e das pessoas consultadas durante o procedimento;

b) Os elementos que confirmam o cumprimento dos requisitos exigidos pela presente lei para a

antecipação da morte;

c) A informação sobre o estado clínico, nomeadamente sobre o diagnóstico e prognóstico, com explicitação

da natureza incurável da doença ou da condição definitiva da lesão e das características e intensidade

previsível do sofrimento;

d) O método e os fármacos letais utilizados;

e) Data, hora e local onde se praticou a antecipação da morte e a identificação dos presentes;

f) Os fundamentos do encerramento do procedimento.

4 – O modelo de Relatório Final é estabelecido em regulamentação a aprovar pelo Governo.

CAPÍTULO III

Direitos e deveres dos profissionais de saúde

Artigo 18.º

Profissionais de saúde habilitados

1 – Os profissionais de saúde inscritos na Ordem dos Médicos e também os inscritos na Ordem dos

Enfermeiros podem praticar ou ajudar ao ato de antecipação da morte, excluindo-se aqueles que possam vir a

obter qualquer benefício direto ou indireto da morte do doente, nomeadamente vantagem patrimonial.

2 – Para efeitos da prossecução do ato de antecipação da morte, os profissionais de saúde referidos no

número anterior devemverificar previamente a existência de prescrição dos fármacos necessários, efetuada

nos termos legais aplicáveis.

3 – Aos profissionais de saúde envolvidos no procedimento de antecipação da morte é disponibilizado,

sempre que solicitado, apoio psicológico.

Artigo 19.º

Deveres dos profissionais de saúde

No decurso do procedimento clínico de antecipação da morte, os médicos e outros profissionais de saúde

que nele intervêm devem respeitar os seguintes deveres:

a) Informar o doente de forma objetiva, compreensível, rigorosa, completa e verdadeira sobre o

diagnóstico, tratamentos aplicáveis, viáveis e disponíveis, resultados previsíveis, prognóstico e esperança de

vida da sua condição clínica;

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b) Informar o doente sobre o seu direito de revogar a qualquer momento a sua decisão de antecipar a

morte;

c) Informar o doente sobre os métodos de administração ou autoadministração dos fármacos letais para

que aquele possa escolher e decidir de forma esclarecida e consciente;

d) Assegurar que a decisão do doente é livre, esclarecida e informada;

e) Auscultar com periodicidade e frequência a vontade do doente;

f) Dialogar com os profissionais de saúde que prestam cuidados ao doente e, se autorizado pelo mesmo,

com os seus familiares e amigos;

g) Falar com o procurador de cuidados de saúde, no caso de ter sido nomeado e se para tal for autorizado

pelo doente;

h) Assegurar as condições para que o doente possa contactar as pessoas com quem o pretenda fazer;

i) Assegurar o acompanhamento psicológico do doente.

Artigo 20.º

Sigilo profissional e confidencialidade da informação

1 – Todos os profissionais que, direta ou indiretamente, participam no procedimento de antecipação da

morte estão obrigados a observar sigilo profissional relativamente a todos os atos, factos ou informações de

que tenham conhecimento no exercício das suas funções nesse âmbito, respeitando a confidencialidade da

informação a que tenham tido acesso, de acordo com a legislação em vigor.

2 – O acesso, proteção e tratamento da informação relacionada com o procedimento de antecipação da

morte processam-se de acordo com a legislação em vigor.

Artigo 21.º

Objeção de consciência

1 – Nenhum profissional de saúde pode ser obrigado a praticar ou ajudar ao ato de antecipação da morte

de um doente se, por motivos clínicos, éticos ou de qualquer outra natureza, entender não o dever fazer,

sendo assegurado o direito à objeção de consciência a todos os que o invoquem.

2 – A recusa do profissional deve ser comunicada ao doente num prazo não superior a 24 horas e deve

especificar a natureza das razões que a motivam, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.

3 – A objeção de consciência é manifestada em documento assinado pelo objetor, dirigido ao responsável

do estabelecimento de saúde onde o doente está a ser assistido e o objetor presta serviço, se for o caso, e

com cópia à respetiva ordem profissional.

4 – A objeção de consciência é válida e aplica-se em todos os estabelecimentos de saúde e locais de

trabalho onde o objetor exerça a sua profissão.

5 – A objeção de consciência pode ser invocada a todo o tempo e não carece de fundamentação.

Artigo 22.º

Responsabilidade disciplinar

Os profissionais de saúde não podem ser sujeitos a responsabilidade disciplinar pela sua participação no

procedimento clínico de antecipação da morte, conquanto cumpram todas as condições e deveres legalmente

estabelecidos, nomeadamente previstos na presente lei.

CAPÍTULO IV

Fiscalização e avaliação

Artigo 23.º

Fiscalização

1 – Compete à IGAS a fiscalização dos procedimentos clínicos de antecipação de morte nos termos da

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presente lei.

2 – Em caso de incumprimento da presente lei, a IGAS pode, fundamentadamente, determinar a

suspensão ou o cancelamento de procedimento em curso.

Artigo 24.º

Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Antecipação da Morte

Para cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 8.º e avaliação da aplicação da presente lei, é criada a

Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Antecipação da Morte (CVA).

Artigo 25.º

Composição e funcionamento da Comissão

1 – A CVA é composta por cinco personalidades de reconhecido mérito que garantam especial qualificação

nas áreas de conhecimento relacionadas com a aplicação da presente lei, designadas da seguinte forma:

a) Um jurista indicado pelo Conselho Superior da Magistratura;

b) Um jurista indicado pelo Conselho Superior do Ministério Público;

c) Um médico indicado pela Ordem dos Médicos;

d) Um enfermeiro indicado pela Ordem dos Enfermeiros;

e) Um especialista em bioética indicado pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.

2 – Não podem integrar a CVA os profissionais de saúde, referidos nas alíneas c) e d) do número anterior,

que tenham manifestado objeção de consciência nos termos do artigo 21.º

3 – O mandato dos membros da CVA é de cinco anos, renovável por um único período.

4 – A CVA elabora e aprova o seu regulamento interno e elege, de entre os seus membros, um presidente.

5 – A CVA funciona no âmbito da Assembleia da República, que assegura os encargos com o seu

funcionamento e o apoio técnico e administrativo necessários.

6 – Os membros da CVA não são remunerados pelo exercício das suas funções, tendo direito a senhas de

presença por cada reunião em que participam de montante a definir por despacho do Presidente da

Assembleia da República e, bem assim, a ajudas de custo e a requisições de transporte nos termos da lei

geral.

Artigo 26.º

Verificação

1 – A CVA avalia a conformidade do procedimento clínico de antecipação da morte, através de parecer

prévio, nos termos do artigo 8.º, e através de relatório de avaliação, nos termos do número seguinte.

2 – Uma vez recebido o Relatório Final do processo de antecipação da morte, que inclui o respetivo RCE, a

CVA examina o seu conteúdo e avalia, no prazo de cinco dias após essa receção, os termos em que as

condições e procedimentos estabelecidos na presente lei foram cumpridos.

3 – Nos casos em que a deliberação prevista no número anterior seja de desconformidade com os

requisitos estabelecidos pela presente lei, a CVA remete o relatório ao Ministério Público para os devidos

efeitos e às respetivas ordens dos profissionais envolvidos para efeitos de eventual processo disciplinar.

Artigo 27.º

Avaliação

1 – A CVA apresenta, anualmente, à Assembleia da República, um relatório de avaliação da aplicação da

presente lei, com informação estatística detalhada sobre todos os elementos relevantes dos processos de

antecipação da morte e que pode conter recomendações.

2 – Para elaboração do relatório são avaliados, com garantia de anonimato e confidencialidade, os

relatórios finais e respetivos RCE remetidos à CVA pelos médicos orientadores, que devem prestar todos os

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esclarecimentos adicionais que esta lhes solicite.

3 – A IGAS presta à CVA as informações solicitadas sobre os procedimentos de fiscalização realizados

relativamente ao cumprimento da presente lei.

CAPÍTULO V

Alteração legislativa

Artigo 28.º

Alteração ao Código Penal

Os artigos 134.º, 135.º e 139.º do Código Penal passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 134.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – A conduta não é punível quando realizada no cumprimento das condições estabelecidas na Lei n.º

__/____.

Artigo 135.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – A conduta não é punível quando realizada no cumprimento das condições estabelecidas na Lei n.º

__/_____.

Artigo 139.º

[…]

1 – (Atual corpo do artigo.)

2 – Não é punido o médico ou enfermeiro que, não incitando nem fazendo propaganda, apenas preste

informação, a pedido expresso de outra pessoa, sobre o suicídio medicamente assistido, de acordo com o n.º

3 do artigo 135.º»

CAPÍTULO VI

Disposições finais e transitórias

Artigo 29.º

Seguro de vida

1 – Para efeitos do contrato de seguro de vida, a antecipação da morte não é fator de exclusão.

2 – Os profissionais de saúde que participam, a qualquer título, no procedimento clínico de antecipação da

morte de uma pessoa segura perdem o direito a quaisquer prestações contratualizadas.

3 – Para efeitos de definição de causa de morte da pessoa segura, deve constar da certidão de óbito a

antecipação da morte.

4 – Uma vez iniciado o procedimento clínico de antecipação da morte, a pessoa segura não pode proceder

à alteração das cláusulas de designação dos beneficiários.

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Artigo 30.º

Sítio da Internet

A Direção-Geral da Saúde disponibiliza, no seu sítio da Internet, uma área destinada a informação sobre a

realização da antecipação da morte medicamente assistida não punível, com os seguintes campos:

a) Informação sobre o procedimento clínico de antecipação da morte;

b) Formulários e documentos normalizados;

c) Legislação aplicável.

Artigo 31.º

Regulamentação

O Governo aprova, no prazo máximo de 90 dias após a publicação da presente lei, a respetiva

regulamentação.

Artigo 32.º

Disposição transitória

Nos dois primeiros anos de vigência da presente lei, a CVA apresenta semestralmente à Assembleia da

República o relatório de avaliação a que se refere o n.º 1 do artigo 27.º

Artigo 33.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 30 dias após a publicação da respetiva regulamentação.

Assembleia da República, 19 de maio de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE LEI N.º 84/XV/1.ª

REPÕE A OBRIGATORIEDADE DE AVALIAÇÃO DE IMPACTE AMBIENTAL À INSTALAÇÃO DE

CENTROS ELECTROPRODUTORES A PARTIR DE FONTES RENOVÁVEIS E ALARGA AS MEDIDAS DE

ENVOLVIMENTO E PROTEÇÃO DAS COMUNIDADES LOCAIS (ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 30-

A/2022, DE 18 DE ABRIL)

Exposição de motivos

A produção de energia a partir de fontes renováveis é um elemento ventral na resposta à crise climática e é

também uma garantia de soberania e segurança energética. Combinado com outras políticas pode ser um

importante componente no combate à pobreza energética e à resistência dos preços da energia perante crises

e situações de vida como a que se vive atualmente.

As várias fontes de produção energética têm impactos ambientais, diversificados e de diferente gravidade.

Também nos casos da energia renovável é essencial conhecer os seus impactos, implementar medidas de

minimização e ordenar o território e proceder à instalação dos centros electroprodutores de forma a mitigar os

seus efeitos negativos.

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Para o sucesso da resposta climática é fulcral que as suas medidas vão ao encontro das necessidades das

populações e tenha o seu apoio. É também uma questão de justiça climática e social. Atualmente, a instalação

de megas parques solares tem causado alguma apreensão e mesmo protestos por parte das populações. O

abate massivo de veados e gamos na herdade da Torre Bela é um exemplo elucidativo dos problemas que

devem ser evitados na instalação de centros electroprodutores a partir de energias renováveis.

A 18 de abril, o Governo publicou o Decreto-Lei n.º 30-A/2022 que retira a obrigatoriedade de efetuar uma

avaliação de impacte ambiental para os centros electroprodutores renováveis. Como refere a referida

legislação na sua exposição de motivos: «o presente decreto-lei vem adequar a avaliação caso a caso

referente à submissão dos projetos de centros eletroprodutores, determinando que fora das áreas sensíveis a

pronúncia da autoridade de avaliação de impacte ambiental (AIA), até agora sempre obrigatória, apenas

ocorrerá a pedido da entidade licenciadora quando haja indícios de que o projeto é suscetível de provocar

impactes significativos no ambiente».

Na realidade, apenas se tem conhecimento sustentado de que o centro electroprodutor pode apresentar

impactes significativos no ambiente através dos resultados de uma avaliação de impacte ambiental. Acresce

que é também através da AIA que se podem verificar potenciais impactos e formas de os minimizar.

O Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril, inicialmente previa um «distanciamento mínimo de 1 km em

redor dos aglomerados rurais e do solo urbano exceto nos casos em que o solo urbano seja destinado à

instalação de atividade económica». No entanto, a 26 de abril, foi publicada a Declaração de Retificação n.º

14-A/2022 que corrige essa distância para 0,1 km. Notoriamente, 100 metros é uma distância bastante

reduzida para evitar eventuais impactos na qualidade de vida dos cidadãos.

O Decreto-lei define um conjunto positivo de medidas para envolvimento das comunidades locais, mas

apenas nos casos de centros eletroprodutores de fontes de energia renováveis e de UPAC com potência

instalada igual ou superior a 20 MW ou, no caso de centro eletroprodutor de fonte primária eólica com pelo

menos 10 torres. A importância e os benefícios do envolvimento das comunidades são demasiado importantes

para ficarem reduzidos a projetos acima do atualmente definido.

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta o presente projeto de lei no para repor a

obrigatoriedade da avaliação de impacte ambiental para a instalação de centros electroprodutores a partir de

energias renováveis. Aumenta ainda a distância destes centros electroprodutores para os aglomerados rurais

e de solo urbano (exceto para atividade económica). Por fim, alarga os projetos de envolvimento das

comunidades locais a mais centros electroprodutores, no caso garantindo esses projetos para centros

eletroprodutores de fontes de energia renováveis e de UPAC com potência instalada igual ou superior a 10

MW (e não a 20 MW) ou, no caso de centro eletroprodutor de fonte primária eólica com pelo menos 5 (e não a

10) torres.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei altera o Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril, no sentido de repor a obrigatoriedade de

avaliação de impacte ambiental à instalação de centros electroprodutores a partir de fontes renováveis e

alarga as medidas de envolvimento e proteção das comunidades locais.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril

São alterados os artigos 2.º, 5.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril:

«Artigo 2.º

[…]

1 – No caso de projetos de instalação de centros eletroprodutores de fontes de energia renováveis,

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instalações de armazenamento, de UPAC, as respetivas linhas de ligação à RESP, bem como os projetos de

produção de hidrogénio por eletrólise a partir da água, não localizados em áreas sensíveis e abaixo dos

limiares estabelecidos no anexo II ao Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, na sua redação atual, a

entidade licenciadora, para efeitos de apreciação prévia e decisão de sujeição a avaliação de impacte

ambiental (AIA), solicita o parecer prévio à autoridade de AIA, nos termos do n.º 3 do artigo 3.º do referido

decreto-lei.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

Artigo 5.º

[…]

A instalação de centros eletroprodutores de fontes de energia renováveis e de UPAC obedece às regras

técnicas aplicáveis e observa as seguintes determinações:

a) […];

b) […];

c) […];

d) Distanciamento mínimo de 250 metros em redor dos aglomerados rurais e do solo urbano exceto nos

casos em que o solo urbano seja destinado à instalação de atividade económica;

e) […].

Artigo 6.º

[…]

1 – O procedimento de controlo prévio para a instalação de centros eletroprodutores de fontes de energia

renováveis e de UPAC com potência instalada igual ou superior a 10 MW ou, no caso de centro eletroprodutor

de fonte primária eólica com pelo menos 5 torres, é instruído com uma proposta de projetos de envolvimento

das comunidades locais.

2 – […].

3 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, 19 de maio de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins —

Joana Mortágua — José Moura Soeiro.

———

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II SÉRIE-A — NÚMERO 29

28

PROJETO DE LEI N.º 85/XV/1.ª

INCLUI A EXPOSIÇÃO, NOS EXEMPLOS DO QUE CONSTITUEM MAUS-TRATOS PSÍQUICOS, NO

ÂMBITO DO CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E CONSAGRA A FREQUÊNCIA DE PROGRAMAS

ESPECÍFICOS DE EDUCAÇÃO PARENTAL NA LISTA DE PENAS ACESSÓRIAS

Exposição de motivos

O crime de violência doméstica, verdadeiro flagelo na sociedade portuguesa, é um crime profundamente

complexo e que se refrata em diversas esferas: além das vítimas diretas gera as que são expostas a ela.

O artigo 152.º do Código Penal, que define o crime de violência doméstica, tem sofrido reformas diversas,

que vêm aditando as circunstâncias em que ele se verifica bem como as categorias de pessoas que merecem

especial tutela.

Pese embora a natureza exemplificativa das condutas que o consubstanciam, a reforma ora proposta visa,

de um lado, incluir de forma expressa a exposição das categorias de pessoas elencadas no n.º 1 a maus

tratos físicos e psíquicos, como modalidade de mau trato psíquico, pelo que integrador do crime de violência

doméstica; de outro aperfeiçoar a redação da alínea a) do n.º 2, no sentido de especificar que a agravação ali

prevista resulta da circunstância de os atos descritos no número 1 serem praticados na presença de menor,

vítima especialmente vulnerável que ao Estado incumbe especialmente proteger.

A parte inicial da norma, na redação atual – «No caso previsto no número anterior, se o agente: a) Praticar

o facto contra menor (…)» – julga-se consumida senão pela alínea e), pela alínea d) do n.º 1. Já nos casos em

que com o menor não existe a relação de parentalidade descrita na alínea e) ou a coabitação exigida na alínea

d), mas uma relação que implique que aquele esteja colocado à guarda, responsabilidade da direção ou a

trabalhar ao serviço do agente, e lhe sejam infligidos maus tratos físicos ou psíquicos, o crime é o de maus

tratos e está previsto no artigo 152.º-A.

Finalmente, no que tange às penas acessórias previstas no n.º 4 do artigo 152.º, crê-se plenamente

justificado incluir a possibilidade de o agressor frequentar programas específicos de educação parental,

quando o crime seja infligido a certas categorias de pessoas ou sejam perpetrados perante elas: descendentes

do próprio ou das pessoas descritas no n.º 1; eventualmente menores que com ele coabitem, dependendo da

natureza da relação.

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à quinquagésima sexta alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º

400/82, de 23 de setembro, e alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de maio; pelos Decretos-Leis n.º 101-A/88, de

26 de março, n.º 132/93, de 23 de abril, e n.º 48/95, de 15 de março; pelas Leis n.º 90/97, de 30 de julho, n.º

65/98, de 2 de setembro, n.º 7/2000, de 27 de maio, n.º 77/2001, de 13 de julho, n.º 97/2001, n.º 98/2001, n.º

99/2001 e n.º 100/2001, de 25 de agosto, n.º 108/2001, de 28 de novembro; pelos Decretos-Leis n.os

323/2001, de 17 de dezembro, e n.º 38/2003, de 8 de março; pelas Leis n.º 52/2003, de 22 de agosto, e n.º

100/2003, de 15 de novembro; pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março; pelas Leis n.º 11/2004, de 27 de

março, n.º 31/2004, de 22 de julho, n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, n.º 16/2007, de 17 de abril, n.º 59/2007, de

4 de setembro, n.º 61/2008, de 31 de outubro, n.º 32/2010, de 2 de setembro, n.º 40/2010, de 3 de setembro,

n.º 4/2011, de 16 de fevereiro, n.º 56/2011, de 15 de novembro, n.º 19/2013, de 21 de fevereiro, n.º 60/2013,

de 23 de agosto; pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto; pelas Leis n.º 59/2014, de 26 de agosto, n.º

69/2014, de 29 de agosto, n.º 82/2014, de 30 de dezembro; pela Lei Orgânica n.º 1/2015, de 8 de janeiro;

pelas Leis n.º 30/2015, de 22 de abril, n.º 81/2015, de 3 de agosto, n.º 83/2015, de 5 de agosto, n.º 103/2015,

de 24 de agosto, n.º 110/2015, de 26 de agosto, n.º 39/2016, de 19 de dezembro, n.º 8/2017, de 3 de março,

n.º 30/2017, de 30 de maio, n.º 94/2017, de 23 de agosto, n.º 16/2018, de 27 de março, n.º 44/2018, de 9 de

agosto, n.º 101/2019 e n.º 102/2019, ambas de 6 de setembro, n.º 39/2020 e n.º 40/2020, ambas de 18 de

agosto, n.º 58/2020, de 31 de agosto, n.º 57/2021, de 16 de agosto, n.º 79/2021, de 24 de novembro e n.º

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94/2021, de 21 de dezembro.

Artigo 2.º

Alteração ao Código Penal

O artigo 152.º do Código Penal passa a ter a seguinte redação:

Artigo 152.º

[…]

1 – Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais,

privações da liberdade, ofensas sexuais, ou a eles expuser, ou impedir o acesso ou fruição aos recursos

económicos e patrimoniais próprios ou comuns:

(…).

2 – No caso previsto nonúmeroanterior, se o agente:

a) Praticar o facto na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima; ou

(…).

4 – Nos casos previstos nos números anteriores, incluindo aqueles em que couber pena mais grave por

força de outra disposição legal, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto

com a vítima e de proibição de uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação

de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica e de educação parental.

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

———

PROJETO DE LEI N.º 86/XV/1.ª

CORRIGE A LEGISLAÇÃO QUE CONCRETIZA A ESTRATÉGIA NACIONAL ANTICORRUPÇÃO 2020-

2024 E APROFUNDA AS GARANTIAS DE PROTEÇÃO DOS DENUNCIANTES

Exposição de motivos

No final da XIV Legislatura a Assembleia da República, em vésperas da sua dissolução, aprovou, por larga

maioria, um conjunto de Leis que deram cumprimento ao disposto na Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-

2024. Por um lado, a Lei n.º 94/2021, de 21 dezembro, alterou o Código do Processo Penal, de forma a

designadamente prever, nos artigos 24.º, 30.º e 264.º, que o Tribunal ou Ministério Público (na fase de

inquérito) possam decidir sobre a conexão ou separação de processo em certas situações e, deste modo,

assegurar uma maior eficácia, ou a supressão de uma lacuna que existia relativamente às pessoas coletivas –

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30

em que se aplicavam as regras aplicáveis aos arguidos individuais, adaptadas à realidade das mesmas, ou

legislação diversa. Por outro lado, na sequência do Projeto de Lei n.º 879/XIV/2.ª, apresentado pelo PAN, e de

outras iniciativas, por via da Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro, aprovou-se o novo regime geral de proteção

de denunciantes de infrações, que, entre outras coisas, consagrava a obrigação de criação de canais de

denúncia interna e externa e um conjunto de importantes garantias aos denunciantes de infrações, como a

proteção contra atos de retaliação.

Apesar dos avanços inequívocos dados, a falta de tempo ditada pela dissolução da Assembleia da

República, levou a que existissem nestes diplomas soluções que se revelaram problemáticas nuns casos e

insuficientes noutros.

A Lei n.º 94/2021, de 21 dezembro, levantou um conjunto de problemas, que foram apontados pelas

associações representativas das magistraturas, pela Ordem dos Advogados e pelo Conselho Superior da

Magistratura. Uma das críticas mais prementes referiu-se ao regime dos impedimentos do juiz, previsto no

novo artigo 40.º do Código do Processo Penal, que, segundo diversas opiniões poderia pôr em causa a

celeridade da justiça com diversos constrangimentos ao funcionamento dos tribunais, por via da multiplicação

exponencial de substituição de juízes e adiamentos de diligências e de um conjunto de dúvidas no âmbito dos

processos pendentes sobre quem deveria ser o juiz. Estas alterações permitem também contornar o princípio

do juiz natural, por via de intervenções inócuas do juiz interveniente na fase de inquérito a fim de o afastar de

fases processuais posteriores.

Por seu turno, o novo regime geral de proteção de denunciantes de infrações ficou aquém do que um

combate à corrupção poderia exigir. Por um lado, consagrou-se no artigo 2.º um âmbito de aplicação que

apenas abrange as violações de atos ou omissões contrárias ao direito da União Europeia e os crimes

previstos no n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, deixa de fora um conjunto de outras

violações de legislação nacional que não resulta de fonte europeia, algo que frustra por completo os objetivos

de proteção que estiveram na origem desta lei. De resto, durante a discussão das diversas propostas

apresentadas, o Conselho Superior do Ministério Público defendeu a reformulação da alínea a), do n.º 1, do

artigo 1.º, e a necessidade de esta alínea abranger todos os instrumentos normativos nacionais e

comunitários.

Por outro lado, apesar de se terem consagrado mecanismos que garantem que a denúncia não poderá ser

fundamento de responsabilidade disciplinar, civil, contraordenacional ou criminal do denunciante, não garante

qualquer limitação das strategic lawsuit against public participation (SLAPP). O Manifesto «Em Defesa dos

Ativistas Ambientais», dinamizado pela CPADA e pela Protejo e subscrito por 28 organizações, apelou à

consagração deste tipo de limitações, defendendo que as mesmas protegem o direito de participação na vida

pública e põem fim a uma das retaliações mais penosas que se vêm impondo aos denunciantes

(especialmente no domínio ambientais).

Com a presente iniciativa o PAN pretende assegurar não só que as alterações legislativas aprovadas no

final do ano de 2021 não têm efeitos contrários aos pretendidos, mas também que se procede à discussão de

propostas que aprofundam a proteção dos denunciantes e que, devido ao fim de legislatura, não foram objeto

de discussão aprofundada pela Assembleia da República.

Assim, esta iniciativa prevê um conjunto de quatro grandes propostas que têm o objetivo de corrigir a

legislação que concretiza a Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024 e de aprofundar as garantias de

proteção dos denunciantes.

A primeira prende-se com a necessidade de corrigir os erros e lapsos previstos na Lei n.º 94/2021, de 21

dezembro, em linha com as recomendações apresentadas pelas associações representativas das

magistraturas, pela Ordem dos Advogados e pelo Conselho Superior da Magistratura, das quais se destaca a

redução substancial das situações de impedimento do juiz por participação em processo, impedindo-se a

intervenção do juiz em julgamento, recurso ou pedido de revisão, relativos a processo em que tiver aplicado

medida de coação que proíba ou imponha condutas, a obrigação de permanência na habitação ou a prisão

preventiva, ou que tenha presidido a debate instrutório.

A segunda visa assegurar o alargamento do âmbito de aplicação do regime geral de proteção de

denunciantes de infrações, nos termos recomendados pelo Conselho Superior do Ministério Público, em

setembro de 2021. Na opinião do PAN, os denunciantes correm elevados riscos devido à divulgação de

infrações, pelo que não se afigura minimamente razoável que se lhes exija que consigam identificar se a

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denúncia que apresentam cabe no âmbito do direito da União Europeia ou se está estritamente no âmbito do

direito nacional – caso em que não daria acesso à proteção conferida desta lei. Desta forma, consagra-se um

conceito amplo de denúncia que, para além de abarcar qualquer violação de direito da União Europeia, passa

a incluir também a violação de normas nacionais, inclusivamente em matéria penal e contraordenacional,

solução que acolhe a redação proposta pelo Conselho Superior do Ministério Público e que é próxima à que foi

adotada na transposição da diretiva pela Dinamarca, Letónia, Lituânia, Malta e Suécia.

A terceira visa garantir a previsão de um conceito amplo de denunciante que inclua pessoas que não estão

ligados profissionalmente à entidade denunciada. Este conceito amplo, para além de ser recomendado pelas

Organizações Não-Governamentais, nomeadamente a Transparência Internacional1, e pelo Parlamento

Europeu2, é também uma exigência que consta da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, a que

Portugal está vinculado e que determina, no seu artigo 33.º, que os países devem ponderar medidas que

assegurem a proteção de pessoas que denunciem junto das autoridades competentes, independentemente da

relação laboral. A consagração deste conceito amplo é importante, porque os cidadãos sem vínculo laboral

podem, por circunstâncias diversas, ter acesso a informação de relevante interesse público e, sem a proteção

legal adequada, podem ser sujeitos a retaliações por parte da entidade denunciada – algo bem patente, por

exemplo, nos casos de denúncias de poluição do rio Tejo ou de denúncia de irregularidades no que respeita

ao transporte de animais vivos.

A quarta e última proposta pretende consagrar um mecanismo anti-SLAPP, que proteja o denunciante

contra retaliações no âmbito judicial. Esta proposta assegura a concretização no nosso ordenamento jurídico

das recomendações da OCDE3 e do The Bond Anti-Corruption Group4 nesta matéria e de uma solução similar

à que existe na Austrália, em 30 estados dos Estados Unidos da América e em algumas províncias do

Canadá, onde se aprovou Legislação anti-SLAPP. Esta solução dá ainda resposta às preocupações expressas

pelo Parlamento Europeu, que, em 25 de novembro de 2020, aprovou uma resolução5 em que, expressando a

sua condenação ao recurso às ações SLAPP «para silenciar ou intimidar jornalistas e órgãos de jornalismo de

investigação e criar um clima de medo em torno da comunicação de determinados temas», apelou ao

estabelecimento de normas mínimas contra o recurso a SLAPP nos países da União Europeia. A proposta do

PAN limita as ações sob a forma de SLAPP (ação intimidatória), ao reconhecer a qualquer pessoa, objeto de

proteção por este Estatuto, o direito de invocar a denúncia para requerer potestativamente a declaração de

improcedência das ações (tenham elas o objeto que tiverem) e ao prever, em linha com o permitido pelo

considerando 97 da Diretiva (UE) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de

2019, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União, a improcedência das

ações contra essas pessoas quando o autor da ação não conseguir provar que a pessoa contra quem intentou

ação não cumpre as condições de proteção previstas no Estatuto do Denunciante e que a referida ação não

está ligada de forma direta ou indireta à denúncia ou à divulgação pública. Prevê-se ainda que a entidade que

fizer uso de ações sob a forma de SLAPP tenham, por um lado, de pagar uma multa, reembolsar as despesas

a que tenha obrigado a parte contrária (nomeadamente os honorários) e a indemnizar os prejuízos sofridos

pela parte contrária como consequência direta ou indireta da ação, e que, por outro lado, tenha de pagar uma

coima que poderá ir até aos 250 mil euros.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede:

a) À quadragésima primeira alteração ao Código de Processo Penal (CCP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º

1 Transparência Internacional (2019), Directiva Europeia de Proteção de Denunciantes: Análise e Recomendações. 2 Resolução do Parlamento Europeu, de 24 de Outubro de 2017, sobre as medidas legítimas para proteger os denunciantes que agem no interesse público ao divulgarem informações confidenciais de empresas e organismos públicos (2016/2224(INI)). 3 OCDE (2010), OCDE Anti-Corruption Action Plan, página 10. 4 OCDE (2019), OECD Working Group on Bribery – Public Comments: Review of the 2009 Anti-Bribery Recommendation página 53. 5 Resolução do Parlamento Europeu, de 25 de novembro de 2020, sobre o reforço da liberdade dos meios de comunicação social: proteção dos jornalistas na Europa, discursos de ódio, desinformação e papel das plataformas [2020/2009 (INI)].

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78/87, de 17 de fevereiro, na sua redação atual;

b) À nona alteração à Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, na sua redação atual, que estabelece medidas de

combate à criminalidade organizada e económico-financeira.

c) À primeira alteração à Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro, que estabelece o regime geral de proteção

de denunciantes de infrações, transpondo a Diretiva (UE) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho,

de 23 de outubro de 2019, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União.

Artigo 2.º

Alteração ao Código de Processo Penal

Os artigos 40.º, 57.º, 196.º, 311.º-B, 418.º, 419.º, 425.º, 429.º e 435.º do CCP, passam a ter a seguinte

redação:

«Artigo 40.º

[…]

1 – […]:

a) Aplicado medida de coação prevista nos artigos 200.º a 202.º;

b) Presidido a debate instrutório;

c) […];

d) […];

e) […].

2 – […].

3 – […].

Artigo 57.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – A pessoa coletiva ou entidade equiparada pode ser constituída arguida.

5 – A pessoa coletiva é representada por quem legal ou estatutariamente a deva representar e a entidade

que careça de personalidade jurídica é representada pela pessoa que aja como diretor, gerente ou

administrador e, na sua falta, por pessoa escolhida pela maioria dos associados.

6 – […].

7 – […].

8 – […].

9 – […].

Artigo 196.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – No caso de pessoa coletiva ou entidade equiparada, o termo deve conter a sua identificação social, a

sede ou local de funcionamento da administração e o seu representante designado nos termos dos n.os 4 a 8

do artigo 57.º

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5 – […].

6 – […].

7 – […].

8 – […].

Artigo 311.º-B

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – Ao rol de testemunhas é aplicável o disposto na alínea e) do n.º 3 e nos n.os 7 e 8 do artigo 283.º

Artigo 418.º

[…]

1 – Concluído o exame preliminar, o processo, acompanhado do projeto de acórdão se for caso disso, vai

a visto do presidente e dos juízes-adjuntos e depois à conferência, na primeira sessão que tiver lugar.

2 – […].

Artigo 419.º

[…]

1 – Na conferência intervêm o presidente da secção, o relator e dois juízes-adjuntos.

2 – A discussão é dirigida pelo presidente, que, porém, só vota, para desempatar, quando não puder

formar-se maioria com os votos do relator e dos juízes-adjuntos.

3 – […].

Artigo 425.º

[…]

1 – Concluída a deliberação e votação, é elaborado acórdão pelo relator ou, se este tiver ficado vencido,

pelo primeiro adjunto que tiver feito vencimento.

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – […].

Artigo 429.º

[…]

1 – Na audiência intervêm o presidente da secção, o relator e dois juízes-adjuntos.

2 – […].

Artigo 435.º

[…]

Na audiência o tribunal é constituído pelo presidente da secção, pelo relator e por dois juízes-adjuntos.»

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Artigo 3.º

Alteração à Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro

O artigo 1.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 1.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […];

i) […];

j) […];

l) […];

m) Contrafação, uso e aquisição de cartões ou outros dispositivos de pagamento contrafeitos e respetivos

atos preparatórios, aquisição de cartões ou outros dispositivos de pagamento obtidos mediante crime

informático, dano relativo a programas ou outros dados informáticos e sabotagem informática, nos termos dos

artigos 3.º-A, 3.º-B, 3.º-C, 3.º-D, 3.º-E, 4.º e 5.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, e ainda o acesso

ilegítimo a sistema informático, se tiver produzido um dos resultados previstos nas alíneas a) e b) do n.º 5 do

artigo 6.º daquela lei, for realizado com recurso a um dos instrumentos referidos no n.º 2 do mesmo artigo, ou

integrar uma das condutas aí tipificadas;

n) […];

o) Contrafação de moeda e de títulos equiparados a moeda;

p) […];

q) […];

r) […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].»

Artigo 4.º

Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro

Os artigos 2.º, 5.º, 24.º e 27.º da Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro, na sua redação atual, passam a ter a

seguinte redação:

«Artigo 2.º

[…]

1 – […]:

a) A conduta que viole normas nacionais ou do direito da união europeia, inclusivamente em matéria penal

e contraordenacional, relativas aos domínios de:

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i. […];

ii. […];

iii. […];

iv. […];

v. […];

vi. […];

vii. […];

viii. […];

ix. […];

x. […].

b) […];

c) […];

d) […]; e

e) […].

2 – […].

Artigo 5.º

[…]

1 – A pessoa singular que, dentro ou fora de uma organização e independentemente de qualquer relação

laboral, denuncie ou divulgue publicamente uma infração nos termos estabelecidos no capítulo II, é

considerada denunciante.

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […].

3 – […].

Artigo 24.º

Responsabilidade do denunciante e medidas de proteção contra retaliações no âmbito judicial

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – No âmbito de processos judiciais, nomeadamente por difamação, violação de direitos de autor, violação

do sigilo, violação das regras de proteção de dados, divulgação de segredos comerciais ou que tenham por

objeto pedidos de indemnização por violação de obrigações contratuais, não pode ser imputado ao

denunciante que denuncie ou divulgue publicamente uma infração de acordo com os requisitos impostos pela

presente lei qualquer tipo de responsabilidade em resultado dessa denúncia ou divulgação pública, gozando

essas pessoas do direito de invocar tal denúncia ou divulgação pública para requerer a declaração de

improcedência das ações.

6 – Independentemente do objeto do processo judicial, a pessoa que iniciou o processo contra denunciante

que denuncie ou divulgue publicamente uma infração de acordo com os requisitos impostos pela presente lei,

sob pena de improcedência da ação, provar que a pessoa a quem pretende imputar responsabilidades não

cumpre as condições de proteção previstas na presente lei e que a referida ação não está ligada de forma

direta ou indireta à denúncia ou à divulgação pública.

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7 – O disposto no presente artigo aplica-se com as devidas adaptações a qualquer das pessoas referidas

no artigo 6.º

8 – A violação do disposto no presente artigo obriga as pessoas singulares e coletivas:

a) ao pagamento de uma multa;

b) ao reembolso das despesas a que tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos

mandatários ou técnicos;

c) à indemnização dos prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência direta ou indireta da

violação.

9 – Em tudo o que não esteja previsto relativamente à concretização do disposto nos n.os 5 e 6, aplica-se o

disposto relativamente à litigância de má-fé no Código de Processo Civil.

Artigo 27.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) A instauração de processos contra as pessoas a que se refere o artigo 5.º que se venham a provar ser

vexatórios ou violadores do disposto no artigo 24.º

2 – […].

3 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […];

i) […];

j) […];

k) […];

l) […];

m) […];

n) […];

o) […];

p) […];

q) […];

r) […];

s) […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].»

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Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE LEI N.º 87/XV/1.ª

ADOTA MEDIDAS DE OTIMIZAÇÃO DO DESEMPENHO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES DA

JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA E FISCAL, ALTERANDO O ESTATUTO DOS TRIBUNAIS

ADMINISTRATIVOS E FISCAIS

Exposição de motivos

Se é verdade que, segundo a Comissão Europeia1, Portugal é o 8.º país da União Europeia que tem um

menor tempo médio de conclusão de casos cíveis e comerciais em todas as instâncias. Não menos verdade é

o facto de, segundo os mesmos dados, o tempo estimado necessário para dirimir na primeira instância os

litígios no âmbito da justiça administrativa e tributária é de 846 dias, o que coloca Portugal no topo do ranking

da União Europeia. A estes dados acrescem um conjunto de casos mediáticos, por exemplo, no âmbito dos

crimes económicos, que demoram mais de uma década a terem um desfecho final.

Este estado da justiça no nosso país leva a que estudos de 20202 nos digam que Portugal se destaca na

União Europeia por ser um país em que o grau de confiança no sistema legal é particularmente baixo (4 numa

escala de zero a dez), estando no mesmo patamar que a Polónia e só sendo superado pela Eslovénia e por

Espanha. Estes défices estruturais no funcionamento do sistema de justiça para além de porem em causa a

tutela dos direitos dos cidadãos, representam ainda um custo acrescido para a atividade empresarial, que,

inevitavelmente, penaliza a competitividade da economia do nosso país.

A justiça administrativa é um dos focos que levanta mais preocupações e que mais carece de medidas que

garantam as condições necessárias para o seu funcionamento eficiente.

Sem prejuízo da necessidade da tomada de medidas estruturais nesse sentido que exigem uma maior

reflexão, com a presente iniciativa o PAN pretende concretizar no Estatuto dos Tribunais Administrativos e

Fiscais duas propostas tendentes a assegurar a otimização do desempenho dos tribunais superiores da

jurisdição administrativa e fiscal apresentadas, em fevereiro de 2022, constantes no relatório intercalar do

Grupo de Trabalho para a Justiça Administrativa e Fiscal.

Assim, por um lado, propomos que se assegure uma maior especialização nos tribunais centrais

administrativos, por via do aditamento de uma nova norma (n.º 3) ao artigo 32.º do Estatuto dos Tribunais

Administrativos e Fiscais, no sentido de assegurar que, por deliberação do Conselho Superior dos Tribunais

Administrativos e Fiscais, sejam criadas nos Tribunais Centrais Administrativos subsecções especializadas em

função da matéria. Esta parece-nos ser a forma de assegurar uma resposta não só ao congestionamento da

justiça administrativa, mas, principalmente, à sua crescente complexificação, nomeadamente nas áreas da

contratação pública ou do direito do desporto. Respostas como esta que ora se propõe têm-se revelado eficaz

noutros países da União Europeia e nos tribunais administrativos de primeira instância.

Por outro lado, propomos o alargamento do prazo de validade dos concursos de acesso à carreira de juiz

1 Comissão Europeia, The 2021 EU justice Scoreboard, União Europeia, 2021. 2 Pedro Adão e Silva e Luís Eloy, «Balanço ambivalente para um sistema que não consegue conquistar a confiança dos cidadãos», inValorizar as Políticas Públicas, IPPC-ISCTE, 2020, página 84.

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do supremo tribunal administrativo e dos tribunais centrais administrativos, por via de uma alteração do n.º 7

do artigo 66.º e do n.º 6 do artigo 69.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, no sentido de se

prever que os concursos de acesso, respetivamente, ao cargo de juiz do Supremo Tribunal Administrativo e

dos Tribunais Centrais Administrativos, têm a validade de dois anos, prorrogável por seis meses. Esta

alteração revela-se necessária porque, atualmente, prevê-se que os concursos de acesso à carreira de juiz do

Supremo Tribunal Administrativo e dos Tribunais Centrais Administrativos, respetivamente, têm a validade de

um ano, prorrogável até seis meses, prazo que se afigura exíguo em face da complexidade e da duração do

processo de avaliação curricular dos candidatos a estes tribunais superiores.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à décima terceira alteração ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais,

aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, alterada pelas Leis n.os 4-A/2003, de 19 de fevereiro, 107-

D/2003, de 31 de dezembro, 1/2008, de 14 de janeiro, 2/2008, de 14 de janeiro, 26/2008, de 27 de junho,

52/2008, de 28 de agosto, e 59/2008, de 11 de setembro, pelo Decreto-Lei n.º 166/2009, de 31 de julho, e

pelas Leis n.os 55-A/2010, de 31 de dezembro, e 20/2012, de 14 de maio, pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de

2 de outubro, e Lei n.º 114/2019, de 12 de setembro.

Artigo 2.º

Alteração ao Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais

Os artigos 32.º, 66.º e 67.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, na sua redação atual,

passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 32.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – Por deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais podem ser criadas nos

Tribunais Centrais Administrativos subsecções especializadas em função da matéria.

Artigo 66.º

[…]

1 – […].

2 – […].

2 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – O concurso é aberto para cada uma das secções e tem a validade de dois anos, prorrogável até seis

meses.

Artigo 67.º

[…]

1 – […].

1 – […].

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2 – […].

3 – […].

5 – […].

6 – O concurso é aberto para cada uma das secções e tem a validade de dois anos, prorrogável até seis

meses.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE LEI N.º 88/XV/1.ª

ELIMINA A DISCRIMINAÇÃO DE GÉNERO NOS CRITÉRIOS DE COMPENSAÇÃO ASSOCIADA ÀS

ATIVIDADES ESPECÍFICAS DOS MÉDICOS

Exposição de motivos

O Grupo de Trabalho criado para a revisão do modelo de organização e funcionamento das Unidades de

Saúde Familiar (doravante USF) apresentou, mas decidiu, entretanto, e face a toda a contestação, retirar os

indicadores de Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) e doenças sexualmente transmissíveis (DST) da

avaliação de desempenho dos profissionais.

O Grupo Técnico entendeu retirar dos indicadores «Ausência de IVG» e «Ausência de ITS» da proposta de

revisão dos critérios para atribuição de Unidades Ponderadas às Atividades Específicas (AE) dos profissionais

inseridos em USF de Modelo B, por reconhecer que os indicadores em causa são «suscetíveis de leituras

indesejáveis», conforme refere o próprio grupo técnico.

Será discutida nova proposta de revisão dos critérios dentro de 30 dias.

São vários os receios por parte dos representantes dos médicos e dos enfermeiros e da sociedade civil,

nomeadamente que os indicadores poderiam levar a más práticas médicas e de enfermagem, como seja na

área da interrupção voluntária da gravidez, em última análise o receio de poder existir algum tipo de pressão

do profissional sobre a utente para que não realizasse o ato.

A ideia que o grupo de trabalho referiu ter por base seria a de um bom planeamento familiar e não o

contrário. Ou seja, o entendimento seria de que a realização de uma IVG seria resultado de um planeamento

familiar falhado. Tal não corresponde à realidade e é profundamente discriminatório, na medida em que, de

alguma forma, limita o direito de escolha das mulheres.

A Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF) defendeu que a Interrupção Voluntária da

Gravidez (IVG) e as infeções sexualmente transmissíveis nas mulheres devem ser retirados dos indicadores

de avaliação de desempenho dos profissionais.

A Ministra da Saúde negou qualquer intenção de penalizar profissionais de saúde que tenham assistido

mulheres que optem pela IVG e garantiu que não está em causa a opção da mulher. Acontece, porém, que

estas medidas têm um cunho ideológico e moral que não é útil nem desejável em nenhum contexto,

especialmente no contexto da saúde.

Segundo diversos relatórios da Direção-Geral da Saúde, o número de interrupções de gravidez tem vindo

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sucessivamente a decrescer, e desde 2011 não houve qualquer registo de morte de mulher por IVG.

Desta forma, e por não ser aceitável qualquer tipo de discriminação de género, o Pessoas-Animais-

Natureza pretende com o presente projeto de lei eliminar o ónus que existe sobre a mulher no regime jurídico

da organização e funcionamento das USF.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de agosto, que estabelece

o regime jurídico da organização e funcionamento das unidades de saúde familiar (USF) e o regime de

incentivos a atribuir a todos os elementos que as constituem, bem como a remuneração a atribuir aos

elementos que integram as USF de modelo B, de forma a eliminar a discriminação de género nos critérios de

compensação associada às atividades específicas dos médicos.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de agosto

O artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de agosto, com as alterações introduzidas pelo Decreto-

Lei n.º 73/2017, de 21 de junho, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 29.º

[…]

1 – […]:

a) A vigilância, em planeamento familiar, de pessoas em idade fértil, por ano – uma unidade;

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […].

2 – […].

3 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

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PROJETO DE LEI N.º 89/XV/1.ª

REFORÇA OS DIREITOS DOS UTILIZADORES FINAIS DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÕES

ELETRÓNICAS

Exposição de motivos

A defesa dos direitos dos consumidores de serviços essenciais tem sido uma preocupação do PAN nos

últimos anos. Um dos exemplos dessa preocupação foi a proposta do PAN no sentido de assegurar o fim do

valor acrescentado nas chamadas para linhas de apoio ao cliente, que foi aprovada e consagrada no

Orçamento do Estado para 2021 (Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro).

O processo de discussão da Lei das Comunicações Eletrónicas, que transporá para a ordem jurídica

nacional a Diretiva 98/84/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de novembro de 1998, a Diretiva

2002/77/CE, da Comissão, de 16 de setembro de 2002, e a Diretiva (UE) 2018/1972, do Parlamento Europeu

e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, abre a oportunidade para se assegurar um reforço significativo

dos direitos dos utilizadores finais de serviços de comunicações eletrónicas.

Desta forma, com a presente iniciativa, o PAN pretende introduzir um conjunto de seis novos direitos dos

consumidores/utilizadores de serviços de comunicações eletrónicas, que visam estabelecer uma relação

contratual baseada na confiança e no equilíbrio de posições entre as partes.

Em primeiro lugar, queremos que a fatura mensal do consumidor passe a conter não só a discriminação

dos serviços prestados e dos preços correspondentes, mas também a informação sobre a duração

remanescente do período de fidelização, sobre o valor associado à denúncia antecipada do contrato por

iniciativa do utilizador final e sobre a existência da tarifa social de fornecimento de serviços de acesso à

Internet em banda larga (uma medida que, pela fraca adesão que tem tido, carece de uma maior divulgação).

Defendemos também que a fatura mensal referente ao mês de janeiro divulgue informações sobre os

melhores preços aos utilizadores finais praticados pela empresa no âmbito dos serviços contratados, de forma

que o consumidor possa optar por mudar de pacote de serviços se considerar que alguma das ofertas

disponíveis lhe é mais vantajosa.

Em segundo lugar, propomos que, sempre que os limites contratados forem atingidos ou haja a subscrição

de qualquer serviço adicional, a empresa tenha sempre de enviar uma mensagem de alerta ao utilizador final e

que seja impedida de cobrar aos consumidores quaisquer serviços ou funcionalidades a eles associadas sem

que estes tenham dado o seu consentimento expresso para o efeito. Desta forma, procura-se travar um

conjunto de práticas abusivas que têm imposto custos injustificados aos consumidores. Relembre-se que nos

números 5 e 6, do artigo 102.º do Código Europeu das Comunicações Eletrónicas, aprovado pela Diretiva (UE)

2018/1972, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, vai-se até mais longe do que

aqui propomos e prevê-se a possibilidade de os Estados-Membros obrigarem os fornecedores a prestarem

informações suplementares sobre o nível de consumo e de proibirem a utilização do serviço em caso de

superação de um limite financeiro ou de volume.

Em terceiro lugar, a consagração do direito de acesso neutral à Internet, com todas as suas

funcionalidades, nos termos previstos no Regulamento (UE) 2015/2120 do Parlamento Europeu e do

Conselho, de 25 de novembro de 2015, assegurando nesta sede a limitação de práticas de zero-rating

abusivo. A limitação das práticas de zero-rating assume crucial importância tendo em conta que prejudicam o

consumidor e a livre concorrência, constituindo ainda uma ameaça a uma Internet livre e neutra. Tal limitação

é especialmente necessária no nosso país, uma vez que as operadoras têm disponibilizado aos consumidores

pacotes de dados artificialmente baixos, de modo a incentivar a adesão a pacotes de zero-rating.

Em quarto lugar, reconhece-se um conjunto de direitos aos consumidores com deficiência, com destaque

para o direito de acesso a linhas de Apoio ao Cliente em Língua Gestual Portuguesa e de acesso às

informações contratuais em termos equivalentes aos disponibilizados à maioria dos consumidores (o que

significará, entre outros, o direito de acesso aos contratos e outras informações contratuais em braille).

Em quinto lugar, caso ocorra uma situação de indisponibilidade do serviço, prevê-se um direito dos

consumidores, que reconhece que sempre que, por motivo não imputável ao consumidor, os serviços

comunicações eletrónicas, que tenham sido por este contratados, se mantiverem indisponíveis por um período

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superior a 24 horas, consecutivas ou acumuladas por período de faturação, a empresa que oferece os

serviços tem de, independentemente de pedido do utilizador final nesse sentido, proceder ao crédito do valor

equivalente ao preço que seria por este devido pela prestação do serviço durante o período em que o mesmo

permaneceu indisponível. A consagração deste direito foi defendida pela ANACOM e é importante porque,

estando nós a falar de serviços essenciais, a sua indisponibilidade pode trazer graves constrangimentos e

danos aos consumidores – que pretendemos ressarcir com a consagração deste direito.

Em sexto e último lugar, propõe-se a consagração de um direito relativo aos consumidores em situação de

desemprego ou emigração, que lhes assegura que não lhes será exigido o pagamento de quaisquer encargos

relacionados com o incumprimento do período de fidelização. Pela gravidade destas situações, é de elementar

justiça que se permita aos consumidores resolver sem custos o contrato, de uma forma automática e sem

estar dependente da bondade discricionária das empresas prestadoras de serviços de comunicações, para

exercerem um direito que lhe é reconhecido como seu pelo artigo 437.º do Código Civil.

Nestes termos, a abaixo assinada Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, ao abrigo das disposições

constitucionais e regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede ao reforço dos direitos dos utilizadores finais de serviços de comunicações

eletrónicas.

Artigo 2.º

Âmbito de aplicação

A presente lei aplica-se às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas

acessíveis ao público e que se encontram sujeitas ao regime de autorização geral, incluindo aquelas que

prestam serviços de comunicações interpessoais com base em números e excluindo as empresas que

prestam serviços de comunicações interpessoais independentes do número.

Artigo 3.º

Direito à transparência das faturas mensais

1 – O utilizador final, nos termos da presente lei e em função dos serviços de comunicações eletrónicas em

causa, tem o direito a receber, sem encargos, faturas mensais não detalhadas, que deverão incluir

obrigatoriamente os seguintes elementos:

a) Discriminação dos serviços prestados e dos preços correspondentes;

b) Duração remanescente do período de fidelização e indicação do valor associado à denúncia antecipada

do contrato por iniciativa do utilizador final;

c) informação sobre a existência da tarifa social de fornecimento de serviços de acesso à Internet em

banda larga e a sua aplicação aos consumidores com baixos rendimentos ou com necessidades sociais

especiais, quando aplicável.

2 – A fatura mensal referente ao mês de janeiro deverá assegurar a divulgação de informações sobre os

melhores preços aos utilizadores finais praticados pela empresa quanto aos serviços contratados.

Artigo 4.º

Direito à informação em caso de ultrapassagem de limites contratados

As empresas mencionadas no artigo 2.º deverão enviar uma mensagem de alerta ao utilizador final antes

dos limites contratados serem atingidos ou de ser subscrito qualquer serviço adicional, estando impedidas de

cobrar aos consumidores quaisquer serviços ou funcionalidades a eles associadas sem que estes tenham

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dado o seu consentimento expresso para o efeito e não podendo este consentimento resultar de opções

estabelecidas por defeito que tivessem de ser recusadas para evitar essa cobrança.

Artigo 5.º

Direito de acesso neutral à Internet

1 – Todos têm o direito de acesso neutral à Internet, com todas as suas funcionalidades, nos termos

previstos no Regulamento (UE) 2015/2120 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de

2015.

2 – São designadamente contrárias ao disposto no número anterior as ofertas de zero-rating, se

cumulativamente:

a) levarem a tratamento não-equitativo e discriminatório do tráfego e não garantirem o funcionamento

contínuo do ecossistema da Internet como motor de inovação; e

b) produzirem efeitos significativos nos direitos dos consumidores, designadamente se trazem uma

redução significativa na escolha do consumidor, ou nos provedores de serviços, designadamente se existe um

efeito na gama de aplicações que estes podem fornecer ou se são significativamente desencorajados de

entrar no mercado.

Artigo 6.º

Direitos dos utilizadores finais com deficiência

No prazo de 60 dias após a entrada em vigor da presente lei, a Autoridade Nacional de Comunicações,

após consulta a utilizadores finais com deficiência, diretamente ou por intermédio das suas associações

representativas, define os requisitos a impor às empresas que oferecem serviços de comunicações eletrónicas

acessíveis ao público, de forma a garantir que os utilizadores finais com deficiência:

a) Têm acesso a serviços de comunicações eletrónicas, incluindo às respetivas informações contratuais,

em termos equivalentes aos disponibilizados à maioria dos utilizadores finais;

b) Têm acesso a linhas de Apoio ao Cliente em Língua Gestual Portuguesa, quando se justifique;

c) Têm direito a que qualquer desconto por motivo de deficiência seja calculado com base no preço mais

baixo entre o preço em vigor na oferta comercial do operador nesse momento ou preço que o utilizador paga

pela oferta de que já usufruía antes do pedido de desconto; e

d) Beneficiam da escolha de empresas e serviços disponíveis para a maioria dos utilizadores finais.

Artigo 7.º

Direitos dos utilizadores finais na situação de indisponibilidade do serviço

1 – Sempre que, por motivo não imputável ao utilizador final, qualquer dos serviços de comunicações

eletrónicas acessíveis ao público, com exceção dos serviços de comunicações interpessoais independentes

de números e serviços de transmissão utilizados para a prestação de serviços máquina a máquina, que

tenham sido por este contratados, se mantiverem indisponíveis por um período superior a 24 horas,

consecutivas ou acumuladas por período de faturação, a empresa que oferece os serviços deve,

independentemente de pedido do utilizador final nesse sentido, procede ao crédito do valor equivalente ao

preço que seria por este devido pela prestação do serviço durante o período em que o mesmo permaneceu

indisponível.

2 – O período de 24 horas a que se refere o número anterior é contado a partir do momento em que a

situação de indisponibilidade seja do conhecimento da empresa.

3 – A empresa que oferece os serviços de comunicações eletrónicas abrangidos pelo n.º 1 deve

reembolsar o utilizador final pelos custos em que este tenha incorrido com a participação da indisponibilidade

de serviço que não lhe seja imputável.

4 – A dedução ou o reembolso a que o utilizador final tenha direito, nos termos dos n.os 1 e 3, são

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efetuados por crédito na fatura seguinte a emitir pela empresa ou por crédito no saldo do utilizador final, no

caso de serviços pré-pagos, ou, tendo terminado a relação contratual entre as partes sem que tenha sido

processado esse crédito, através de reembolso por qualquer meio direto, designadamente transferência

bancária ou envio de cheque, no prazo de 30 dias após a data da cessação do contrato.

5 – A indisponibilidade dos serviços a que se refere o n.º 1 que, depois de reportada à empresa, se

prolongue por um período superior a 15 dias confere ao utilizador final o direito de resolver o contrato sem

qualquer custo.

Artigo 8.º

Direitos na situação de desemprego ou emigração do titular do contrato

1 – Em situações de emigração ou de desemprego do consumidor titular do contrato devidamente

comprovadas, a empresa que oferece serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público, com

exceção dos serviços de comunicações interpessoais independentes de números e dos serviços de

transmissão utilizados para a prestação de serviços máquina a máquina, não lhe pode exigir o pagamento de

quaisquer encargos relacionados com o incumprimento do período de fidelização.

2 – A Autoridade Nacional de Comunicações pode determinar quais os elementos comprovativos que

podem ser exigidos pelas empresas que oferecem serviços aos consumidores para efeitos do disposto no

número anterior.

Artigo 9.º

Regime sancionatório

1 – A fiscalização do cumprimento do disposto na presente lei é da competência da Autoridade Nacional de

Comunicações, que em caso de incumprimento por uma empresa deve notificá-la desse facto e dar-lhe a

possibilidade de se pronunciar num prazo não inferior a 10 dias.

2 – Após ter procedido à audiência nos termos do número anterior, a Autoridade Nacional de

Comunicações, atendendo a gravidade do incumprimento, à existência de ofertas alternativas e à posição de

mercado do infrator, pode:

a) Ordenar ao operador ou prestador de serviços a adoção de medidas destinadas a corrigir o

incumprimento;

b) Aplicar sanções pecuniárias compulsórias, nos termos previstos na Lei das Comunicações Eletrónicas;

c) Emitir ordens de cessação ou de adiamento da prestação de serviços, cuja disponibilização seja

suscetível de violar o presente artigo, a vigorar enquanto não forem adotadas medidas destinadas a corrigir o

incumprimento.

5 – Qualquer cidadão pode, nos termos do disposto da Lei n.º 27/2021, de 17 de maio, exercer o direito de

ação popular digital contra quem infrinja o disposto na presente lei.

Artigo 10.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

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PROJETO DE LEI N.º 90/XV/1.ª

CONSAGRA O DEVER DE AS INSTITUIÇÕES CONTRATAREM OS DOUTORADOS COM CATEGORIA

DE AUXILIAR, OU A ELA SUPERIOR, QUANDO SE VERIFIQUE O TERMO DO CONTRATO

Exposição de motivos

O objeto do Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de junho, na sua redação atual, enunciado no artigo 1.º, é

audacioso e inspirador no que descreve ser o objetivo do regime jurídico que consagra: estimular o emprego

científico e tecnológico em todas as áreas do conhecimento; promover o rejuvenescimento das instituições que

integram o Sistema Científico e Tecnológico Nacional; valorizar as atividades de investigação científica, de

desenvolvimento tecnológico e de gestão e comunicação de ciência e tecnologia nessas instituições. A leitura

do preâmbulo faz crer num admirável mundo novo assente em condições de estabilidade e previsibilidade para

os doutorados, na promoção de segurança e justiça no trabalho, que todavia, paradoxalmente, assenta em

contratos a termo, certo ou incerto, com duração máxima de seis anos.

Tal circunstância é naturalmente precária para qualquer doutorado, sendo que tal precariedade se agrava

em razão da senioridade. Não só: contratos de duração limitada representam perdas para as instituições: de

saber especializado, de experiência, de conhecimento organizacional. E para as pessoas representam,

quantas vezes, vidas adiadas, apoucamento pessoal e familiar, com refrações diversas no que tange à saúde

física e mental, à natalidade, à participação cívica e democrática. Para o País, representa ainda insatisfação e

quantas vezes a partida para outras geografias.

Com a presente alteração visa-se garantir que os doutorados com categoria superior à de doutorado júnior,

i.e.., com categoria de doutorado auxiliar ou superior, uma vez terminado o contrato (sempre) a termo a que se

refere o artigo 6.º do diploma, sejam contratados por tempo indeterminado pela entidade que é parte no

contrato findo. Realça-se que estes profissionais já passaram por rigorosos processos de recrutamento, pelo

que a sua contratação já resulta de rigorosa seleção. Realça-se, igualmente, que as entidades apenas têm o

dever de os contratar após um período de seis anos em que beneficiaram de financiamento para o seu

trabalho.

A presente alteração contribui para diminuir a precarização e a incerteza do trabalho científico destas

pessoas, que não são as mais jovens e que são as mais qualificadas e experientes, efetivamente estimulando

a criação de emprego científico e a integração dos doutorados nas carreiras ou de docente ou de investigação

científica.

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de agosto, que aprova um

regime de contratação de doutorados destinado a estimular o emprego científico e tecnológico em todas as

áreas do conhecimento, a promover o rejuvenescimento das instituições que integram o Sistema Científico e

Tecnológico Nacional (SCTN), bem como a valorizar as atividades de investigação científica, de

desenvolvimento tecnológico, de gestão e de comunicação de ciência e tecnologia nessas instituições. Ter

excelência depende de a promover e proteger.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de agosto

É alterado o n.º 1 do artigo 2.º e o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de agosto, na sua redação

atual, que passa a ter a seguinte redação:

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«Artigo 2.º

[…]

1 – O regime aprovado pelo presente decreto-lei aplica-se à contratação a termo resolutivo de doutorados

para o exercício de atividades de investigação científica, de desenvolvimento tecnológico, de gestão e de

comunicação de ciência e tecnologia em instituições do SCTN, bem como à contratação, por tempo

indeterminado, dos doutorados com categoria de auxiliar ou a esta superior, quando verificado o termo

daqueles, tendo em vista o desenvolvimento estratégico das mesmas e o reforço do investimento em ciência

e tecnologia.

Artigo 6.º

[…]

1 – […]:

[…]

[NOVO] c) Contrato de trabalho por tempo indeterminado, nos termos da LTFP, ou nos termos do Código

do Trabalho, consoante as entidades estejam sujeitas ao regime de direito público ou ao regime de direito

privado.

[…]

[NOVO] 4 – As entidades a que se refere o artigo 3.º ficam obrigadas a celebrar contrato por tempo

indeterminado com os doutorados com a categoria de auxiliar ou a ela superior, para categoria da carreira de

investigação científica ou da carreira de docente do ensino superior, de acordo com as funções

desempenhadas pelo contratado doutorado, findo o período referido na alínea a) ou na alínea b) do n.º 1,

consoante seja o caso.

[renumeração do n.º 4 e do n.º 5]

6 – Ainstituição, em função do seu interesse estratégico, procede à abertura de procedimento concursal

para categoria da carreira de investigação científica ou da carreira de docente do ensino superior, de acordo

com as funções desempenhadas pelo contratado doutorado, até seis meses antes do termo do prazo de seis

anos referido no n.º 2.

7 – Independentemente do prazo a que alude o n.º 4 e o número anterior, as instituições podem, a todo o

tempo, proceder à abertura de procedimento concursal nos termos legais.

[renumeração do n.º 7]

8 – Sem o prejuízo do disposto nos números anteriores o Governo compromete-se no prazo de seis meses

a abrir um debate público com as instituições e na Assembleia da República no sentido de rever o sistema

atual de emprego científico, incluindo o RJIES e os estatutos da carreira de investigação científica e da

carreira de docência universitária.»

Artigo 3.º

Aplicação no tempo

O artigo 6.º, n.º 4, é aplicável aos contratos outorgados na sequência de recrutamentos iniciados após a

sua entrada em vigor.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

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Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

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PROJETO DE LEI N.º 91/XV/1.ª

ESTABELECE O COMPLEMENTO VITALÍCIO DE PENSÃO E A PENSÃO MÍNIMA DE DIGNIDADE AOS

ANTIGOS COMBATENTES

Exposição de motivos

A maioria dos antigos combatentes, hoje com mais de 60 e 70 anos, foram arrancados às suas famílias e

às suas terras pelo regime fascista para uma guerra colonial e injusta. Foi-lhes provocado um imenso

sofrimento, com milhares de mortos e mutilados dos dois lados. Subsistem ainda milhares de ex-militares que

regressaram com graves sequelas e doenças. Grande parte destes cidadãos vive com reformas miseráveis

que nada dignificam a sociedade. O Estado e sociedade deve-lhes fazer justiça e prestar o devido

reconhecimento, solidariedade e providenciar os meios dignos e suficientes de subsistência e vida. É uma

dívida do país democrático para com estes cidadãos.

Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta o presente projeto de lei para

valorizar as pensões dos antigos combatentes, estabelecendo um complemento vitalício de pensão de 50

euros e ainda uma pensão mínima de dignidade igualada ao salário mínimo nacional.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece o complemento vitalício de pensão e a pensão mínima para os antigos

combatentes.

Artigo 2.º

Complemento vitalício

É atribuído um complemento vitalício de pensão, no montante de 50 euros mensais, aos antigos

combatentes beneficiários do complemento especial de pensão ou do acréscimo vitalício de pensão

constantes das Leis n.º 9/2002, de 11 de fevereiro, e 3/2009, de 13 de janeiro.

Artigo 3.º

Pensão mínima

1 – Os ex-militares aos quais se aplica o estatuto de antigos combatentes e que sejam beneficiários da

Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, cujas pensões sejam inferiores ao salário mínimo

nacional, terão as suas pensões recalculadas até atingirem aquele valor.

2 – O recálculo das pensões indicado no número anterior será feito faseadamente, nos termos seguintes:

a) Um ano após a entrada em vigor da presente lei deve corresponder a 80% do salário mínimo nacional;

b) Por cada um dos anos seguintes deve ter um aumento de 5% até atingir o valor do salário mínimo

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nacional.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a publicação do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —

Catarina Martins — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 92/XV/1.ª

CRIAÇÃO DO CRIME DE EXPOSIÇÃO DE MENOR A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA (QUINQUAGÉSIMA

QUINTA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO PENAL)

Exposição de motivos

A consistência dos números anuais da violência doméstica e dos femicídios em Portugal, revela bem como

a violência contra as mulheres, e especialmente a violência nas relações de conjugalidade ou intimidade, se

manifesta como um problema estrutural na nossa sociedade que persiste como uma das mais pungentes

violações dos Direitos Humanos.

O crime de violência doméstica, mantém-se como o crime contra as pessoas que mais mata em Portugal.

As centenas de vítimas de femicídios, as milhares de mulheres sujeitas à violência no seio de relações de

intimidade e as milhares de crianças órfãs e vítimas da exposição a este tipo de violência por vezes durante

todo o seu crescimento, merecem todos os esforços para alterar esta realidade e para garantir a sua proteção.

O Bloco de Esquerda tem procurado contribuir para o combate a este tipo de violência e de crime desde

que chegou ao Parlamento. O primeiro projeto de lei que apresentou enquanto Grupo Parlamentar, há mais de

vinte anos, foi precisamente a mudança da natureza do crime de violência doméstica para crime público. A

juntar a esta proposta, muitas outras se seguiram. Todas elas partiram da análise concreta da realidade e de

quem sabe que a justiça não é um sistema fechado em si mesmo, mas que deve servir um propósito social

claro e inscrito na Constituição da República Portuguesa.

Retomamos este combate com a presente iniciativa legislativa que procura garantir que todas as vítimas do

crime de violência doméstica são devidamente reconhecidas e objeto de especial proteção pelo Estado. Não

podemos compactuar com um status quo que reconhece a existência de vítimas esquecidas da violência em

contexto familiar, mas não garante, de forma clara, a sua consagração enquanto vítima autónoma e a sua

devida tutela jurídico-penal.

Reconhece-se na Legislatura anterior avanços tímidos na lei que não conseguiram porém assegurar que as

crianças sejam efetivamente consideradas vítimas da exposição à violência doméstica. A introdução de uma

nova alínea no n.º 1 do artigo 152 do Código Penal especifica entre as possíveis vítimas do crime de violência

doméstica os menores descendentes ainda que sem coabitação. Contudo, o que se pretende cumprir, no

estrito respeito pela Convenção de Istambul é que as crianças sejam consideradas vítimas de violência

doméstica, designadamente enquanto testemunhas da violência doméstica e não somente, como se

depreende da lei atual, quando são o alvo direto dos diferentes tipos de violência que compõem o crime de

violência doméstica.

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Está amplamente provado e é consensualmente aceita na comunidade científica nacional e internacional,

que a violência doméstica imprime um enorme sofrimento às crianças que a vivenciem ou testemunhem

mesmo que os atos de violência não lhe sejam diretamente dirigidos. Viver em contexto de violência acarreta

consequências devastadoras para o seu pleno e harmonioso desenvolvimento, afetando a sua saúde e bem-

estar, potenciando comportamentos de desajustamento familiar e social, problemas de foro emocional e

cognitivo e implicações negativas no seu rendimento escolar e na sua capacidade de integração social.

Relevamos a argumentação expressa no parecer do Conselho Superior do Ministério Público a propósito

do processo de discussão da Proposta de Lei n.º 28/XIV/1.ª da anterior legislatura quando afirma que o

reconhecimento expresso das crianças enquanto vítimas do crime de violência doméstica quando vivenciam

esse contexto no seu seio familiar ou quando se constituem testemunhas presenciais desses atos de violência

«cumpre a Lei Fundamental que determina ao Estado Português a consagração do direito das crianças à

proteção da sociedade e do Estado com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as

formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e

nas demais instituições» (artigo 69.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa). Acrescenta que cumpre

igualmente a Convenção sobre os Direitos da Criança quando determina que «os Estados Partes tomam todas

as medidas legislativas, administrativas, sociais e educativas adequadas à proteção das crianças contra todas

as formas de violência física ou mental, dano ou sevícia, abandono ou tratamento negligente, maus tratos ou

exploração incluindo a violência sexual, enquanto se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles, dos

representantes legais ou de qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada.» E por fim, que cumpre a

Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a

Violência Doméstica (Convenção de Istambul), quando reconhece que «as crianças são vítimas de violência

doméstica, designadamente como testemunhas de violência na família (artigo 26.º)».

Recuperamos também a ideia expressa no referido parecer, de que importa proceder a alterações no

âmbito do artigo 152.º do Código Penal, que «permitam a integração no novo tipo objetivo do crime de

violência doméstica das condutas que impliquem as crianças que vivenciam o contexto de violência doméstica

ou o testemunhem.»

Acredita este Grupo Parlamentar que existe consenso sobre a necessidade de garantir proteção efetiva a

estas crianças, razão pela qual apresenta esta iniciativa propondo a autonomização do valor jurídico que deve

ser atribuído ao bem-estar e ao desenvolvimento saudável das crianças através da criação de um novo tipo

legal do crime de exposição do menor a violência doméstica.

A conduta objetiva passa a consistir «na exposição do menor à prática dos factos constitutivos do crime de

violência doméstica e que sejam adequados a prejudicar o seu desenvolvimento».

Esta é uma alteração importante que contribuirá de forma decisiva para que todas as vítimas tenham uma

resposta adequada respeitando-se as imposições que decorrem de diplomas como a Constituição da

República Portuguesa, a Convenção sobre os Direitos da Criança e a Convenção de Istambul garantindo que

nenhuma vítima de violência doméstica é vítima esquecida.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à quinquagésima quinta alteração ao Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º

400/82, de 23 de setembro, reforçando a proteção jurídico-penal das crianças e jovens através da criação do

crime de exposição do menor a violência doméstica.

Artigo 2.º

Alteração ao Código Penal

É aditado o artigo 152.º-C ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro,

alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de maio, pelos Decretos-Leis n.os 101-A/88, de 26 de março, 132/93, de 23 de

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abril, e 48/95, de 15 de março, pelas Leis n.os 90/97, de 30 de julho, 65/98, de 2 de setembro, 7/2000, de 27 de

maio, 77/2001, de 13 de julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001, de 25 de agosto, e 108/2001, de 28 de

novembro, pelos Decretos-Leis n.os 323/2001, de 17 de dezembro, e 38/2003, de 8 de março, pelas Leis n.os

52/2003, de 22 de agosto, e 100/2003, de 15 de novembro, pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, e

pelas Leis n.os 11/2004, de 27 de março, 31/2004, de 22 de julho, 16/2007, de 17 de abril, 59/2007, de 4 de

setembro, 61/2008, de 31 de outubro, 32/2010, de 2 de setembro, 40/2010, de 3 de setembro, 4/2011, de 16

de fevereiro, 56/2011, de 15 de novembro, 19/2013, de 21 de fevereiro, 60/2013, de 23 de agosto, pela Lei

Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, pelas Leis n.os 59/2014, de 26 de agosto, 69/2014, de 29 de agosto, e

82/2014, de 30 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2015, de 8 de janeiro, e pelas Leis n.os 30/2015, de 22 de

abril, 81/2015, de 3 de agosto, 83/2015, de 5 de agosto, 103/2015, de 24 de agosto, 110/2015, de 26 de

agosto, 39/2016, de 19 de dezembro, 8/2017, de 3 de março, 30/2017 de 30 de maio, 83/2017, de 18 de

agosto, 94/2017, de 23 de agosto, 16/2018, de 27 de março, 44/2018, de 9 de agosto, 102/2019, de 6 de

setembro, 101/2019, de 6 de setembro, 39/2020, de 18 agosto, 40/2020, de 18 de agosto, 58/2020, de 31 de

agosto, 57/2021, de 16 de agosto, 79/2021, de 24 de novembro, 94/2021, de 21 de dezembro, o qual passa a

ter a seguinte redação:

«Artigo 152.º-C

Exposição de menor a violência doméstica

1 – Quem expuser menor, de modo reiterado ou não, e de forma a prejudicar o seu bem-estar ou

desenvolvimento saudável, a situação de violência doméstica, definida nos termos do artigo 152.º, é punido

com pena de prisão de dois a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição

legal.

2 – Caso o crime seja praticado por quem tenha para com o menor um especial dever de guarda ou

assistência, é punido com pena de prisão de três a seis anos, se pena mais grave lhe não couber por força de

outra disposição legal.

3 – Podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com o menor e de

proibição de uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de frequência de

programas específicos de prevenção da violência doméstica e de parentalidade positiva.

4 – Quem for condenado por crime previsto neste artigo pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua

conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do exercício das responsabilidades parentais, da

tutela ou da curatela por um período de 1 a 10 anos.

5 – É correspondentemente aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 103.º, caso em

que a decisão de extinção da inibição apenas produz plenos efeitos após a regulação do exercício das

responsabilidades parentais pelo Tribunal de Família e Menores.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente Lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —

Catarina Martins — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 93/XV/1.ª

PROGRAMA EXTRAORDINÁRIO DE VINCULAÇÃO DOS DOCENTES

Exposição de motivos

Todos os anos a falta de professores na escola pública faz-se sentir com mais força e mais cedo. Este é

um problema com causas identificadas: a combinação do envelhecimento, da precariedade e da

desvalorização da carreira docente.

No final do segundo período de 2021/22 eram 30 mil alunos sem professor a pelo menos uma disciplina. E

no próximo ano já serão cerca de 110 mil na mesma situação, conforme um estudo realizado pela antiga

diretora da Direção-Geral de Estatísticas da Educação. A lista de disciplinas com falta de professores é cada

vez maior: Português, Matemática, Biologia e Geologia, Física e Química, História, Geografia, Inglês, Filosofia

e Informática. Só este ano, até ao mês de maio, serão 861 professores reformados e não há quem os

substitua.

À desvalorização sistemática da carreira docente corresponde a diminuição do número de estudantes

interessados nos cursos que formam para o ensino. De acordo com a OCDE, Portugal é dos países em que

menos jovens dizem querer vir a ser professores e professoras.

Para cativar mais jovens para a docência é preciso começar por valorizar os profissionais atuais e

conseguir que muitos dos que abandonaram a profissão sintam o apelo para regressar. Sem vinculação à

carreira, os docentes precários não só vivem na incerteza e sem progressão como frequentemente ficam

sujeitos às flutuações salariais que resultam dos horários incompletos. Esta desvalorização da carreira

docente é uma injustiça para com as professoras, os professores e educadores de infância e causa grandes

prejuízos à escola pública.

Acresce que, a cada ano que passa, o relatório do Conselho Nacional de Educação vem alertar para o

envelhecimento do corpo docente e para a perspetiva de uma aposentação abrupta de uma grande parte dos

docentes. No seminário «Faltam Professores! E Agora?», organizado pelo Conselho Nacional de Educação no

passado dia 18 de maio de 2022, o coordenador do estudo da NOVA SBE pedido pelo Ministério da Educação

sublinhou que cerca de 40% dos 120 mil professores que estavam a dar aulas em 2018/19 previsivelmente

estarão reformados até ao ano letivo de 2030/31.

O respeito pelo direito a uma carreira digna e o interesse na estabilidade do corpo docente exigem que se

tomem medidas que vão além do previsto pela «norma-travão», cujo efeito, como se tem visto, é muito

limitado.

A criação de um programa extraordinário de vinculação dos docentes com três ou mais anos de serviço,

devidamente negociado com as estruturas sindicais, é, portanto, um instrumento necessário para o reforço da

escola pública e para o combate à precariedade no Estado.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei cria um programa extraordinário de vinculação de docentes da escola pública com 3 ou mais

anos de serviço.

Artigo 2.º

Programa Extraordinário de Vinculação dos Docentes

1 – O Programa Extraordinário de Vinculação dos Docentes consiste num conjunto de concursos externos

destinados à vinculação extraordinária de docentes com três ou mais anos de serviço nos termos previstos

pelos artigos 23.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, na sua atual redação.

2 – O Programa Extraordinário de Vinculação de Professores não prejudica a aplicação do artigo 42.º do

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Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, na sua redação atual.

Artigo 3.º

Abertura de Procedimentos Concursais para a Vinculação Extraordinária de docentes

Durante o ano de 2022, o Governo inicia a abertura de procedimentos concursais para a vinculação dos

docentes com três ou mais anos de serviço, independentemente do grupo de recrutamento, que nos quatro

anos anteriores tenham completado 365 dias ou mais de serviço nos estabelecimentos de educação pré-

escolar e dos ensinos básico e secundário na dependência do Ministério da Educação.

Artigo 4.º

Regulamentação

O Governo, mediante negociação com as estruturas sindicais, procederá à regulamentação da presente lei

nomeadamente no que diz respeito ao calendário do programa de vinculação extraordinária.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeito a partir do Orçamento do

Estado subsequente.

Assembleia da República, 20 de maio de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —

Catarina Martins — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 94/XV/1.ª

CRIAÇÃO DO ESTATUTO DO ARGUIDO COLABORADOR E AGRAVAMENTO DAS PENAS

APLICÁVEIS AOS CRIMES DE CORRUPÇÃO PREVISTOS NO CÓDIGO PENAL

Exposição de motivos

O combate à corrupção e à criminalidade altamente organizada constitui um dos maiores desafios da

justiça portuguesa que, por obstáculos de vária ordem que não tem sabido ultrapassar, está mais

desacreditada e com dificuldade em ser efetiva.

Da inexistência de recursos humanos e técnicos que assegurem uma investigação criminal capaz, à

ausência de instrumentos que permitam a prova dos factos que constituem a incriminação, de forma fácil e

segura, tudo tem servido de pretexto para a falta de eficácia neste combate, que a cada dia que passa corrói

mais e mais a nossa sociedade e lesa diariamente o interesse público.

A isto acresce o facto – não menos importante – de este tipo criminalidade ser cada vez mais complexa,

não só pelas redes de proteção em que se move, mas também pelos diferentes meios que estão à sua

disposição, pelo que também são cada vez mais exigentes os meios necessários para a combater.

Em março de 2021, o Governo aprovou a Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024, tendo apresentado

um conjunto de iniciativas legislativas baseadas nesta Estratégia de cuja discussão na Assembleia da

República viria a resultar a Lei n.º 94/2021, de 21 de dezembro.

O Estatuto do Arguido Colaborador é uma ferramenta, entre outras, que pode ajudar nesta batalha e que

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urge criar em Portugal, no âmbito da temática do Direito Premial: com efeito, a concessão de um tratamento

penal menos severo – nomeadamente com a atenuação especial da pena, com a dispensa de pena ou com a

suspensão provisória do processo – tem já inscrição em institutos vigentes na ordem jurídica nacional,

designadamente quanto ao crime de corrupção mas, igualmente, quanto se trate de corrupção, por exemplo,

de titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, de corrupção de agentes desportivos ou de

corrupção no comércio internacional.

O Direito Premial consiste num conjunto de medidas através das quais os cidadãos que sejam arguidos em

processos, designadamente nos casos de corrupção, e que se disponham a colaborar com a justiça, possam,

sem deixar de ser alvos de censura penal, ver essa censura ser atenuada, premiando a sua colaboração com

a justiça: dá-se-lhes a possibilidade de, ao colaborar de modo decisivo na atividade probatória, receberem um

tratamento penal menos severo, nomeadamente com uma atenuação especial ou mesmo dispensa de pena.

O benefício premial pressupõe que a colaboração a ser prestada pelo arguido às autoridades tem de

conduzir à recolha de provas decisivas ou à produção ou obtenção de provas decisivas na descoberta de

outros responsáveis pelo crime: o arguido tem de prestar elementos objetivos relevantes, no sentido de

constituírem, por si ou em conjugação com outros elementos, o que significa que o auxílio tem de ser útil à

investigação, na medida em que conduza à descoberta de outros agentes do crime.

Por isso, a criação do Estatuto do Arguido Colaborador é importante, pois a melhor forma de vencer o muro

da corrupção e as teias complexas que ela própria elabora é contando com a colaboração de algum dos

arguidos, que se disponha a auxiliar na descoberta da verdade. Mas é também importante porque as normas

em que se consubstancia não prejudicam aqueloutras que, dentro de cada regime punitivo especial,

estabelecem formas de concessão de um tratamento penal menos severo em razão dessa colaboração efetiva

para a descoberta da verdade – constituindo, portanto, um auxílio à obtenção de prova que pode ser aplicado

em concomitância com outros regimes premiais.

Por outro lado, é um facto que Portugal tem sentido, nos últimos anos, um verdadeiro clima de impunidade

em matéria de corrupção, tráfico de influências e criminalidade económica em geral.

Tanto assim é, que esta é uma realidade que não se verifica apenas entre os titulares de cargos políticos,

mas no exercício de funções públicas em geral, tornando-se as suspeitas de corrupção e compadrios no

aparelho de Estado cada vez mais densas e consumindo a capacidade de autonomia dos poderes públicos e a

confiança dos cidadãos nos mesmos.

É evidente que são várias e complexas as razões que conduziram à materialização deste clima, não

apenas de natureza jurídico-penal, mas também de natureza político-sociológica e psicossocial. De qualquer

maneira, é hoje notório que o aparelho de justiça quer e está motivado para fazer mais no âmbito da luta

contra a corrupção, estando limitada pelas brandas penas e pelas ineficazes sanções acessórias previstas na

legislação aplicável.

O aumento das penas não garante, por si só, a diminuição do número de crimes ou a sua gravidade. Não

resolve, per si, todos os problemas associados ao fenómeno dilacerante da corrupção em Portugal. No

entanto, conforme demonstram variados estudos, pode ser um fator dissuasor e preventivo importante,

relevando enquanto elemento preventivo.

Na verdade, mesmo no quadro da União Europeia, as penas aplicáveis em Portugal à criminalidade

económica e aos crimes contra a autonomia do Estado são extraordinariamente brandas, o que pode

representar um incentivo desnecessário e incompreensível ao cometimento deste tipo de crimes em território

português.

É isso mesmo que esta iniciativa visa desincentivar.

Pelo exposto, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo

Parlamentar do Chega abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

1 – A presente lei tem por objetivo a criação do estatuto do arguido colaborador (Estatuto), enquanto meio

especial de obtenção de prova em processo penal.

2 – A presente lei visa ainda proceder ao agravamento das molduras penais aplicáveis aos crimes de

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corrupção, ativa e passiva, previstos no Código Penal.

Artigo 2.º

Âmbito pessoal

1 – É considerado arguido colaborador, para os efeitos da presente lei, a pessoa que:

a) Abandonar voluntariamente a atividade criminosa concretamente imputada, afastar ou fizer diminuir

consideravelmente o perigo por ela provocado ou impedir que o resultado que a lei quer evitar se verifique;

b) Até ao encerramento da audiência de julgamento em primeira instância, auxiliar concretamente na

obtenção ou produção de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis.

2 – Pode ainda beneficiar do disposto na presente lei o agente que tiver denunciado o crime até 30 dias

após a prática do ato, e sempre antes da instauração do procedimento criminal, desde que voluntariamente

restitua a vantagem ilícita ou o respetivo valor.

Artigo 3.º

Âmbito material

1 – A presente lei é aplicável quando estiver em causa a prática dos seguintes crimes:

a) Terrorismo, organizações terroristas, terrorismo internacional e financiamento do terrorismo;

b) Corrupção ativa e passiva, incluindo a praticada nos setores público e privado e no comércio

internacional, bem como na atividade desportiva;

c) Tráfico de influência;

d) Participação económica em negócio;

e) Branqueamento de capitais;

f) Recebimento indevido de vantagem;

g) Tráfico de estupefacientes, nos termos dos artigos 21.º a 23.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de

janeiro;

h) Tráfico de armas;

i) Associação criminosa.

2 – Excecionalmente, sempre que o superior interesse de realização da Justiça o justifique, estando em

causa crime que deva ser julgado pelo tribunal coletivo ou pelo júri, a colaboração do arguido pode ser

acordada para crimes não contemplados no número anterior.

Artigo 4.º

Formalização

1 – A colaboração incide sobre factos de que o arguido possua conhecimento direto e que constituam

objeto da prova.

2 – Os termos em que se processa a colaboração do arguido devem ser formalizados no decurso da fase

de inquérito, por termo exarado nos autos em diligência presidida pelo juiz de instrução, ou em documento

assinado pelo arguido e pela autoridade judiciária competente e homologado por aquele.

3 – Do acordo de colaboração devem constar obrigatoriamente as contrapartidas premiais dessa

colaboração, no que respeita à determinação da medida da pena, dispensa ou isenção dela e formas de

execução da mesma.

4 – Constituem direitos do arguido colaborador:

a) A assistência por advogado, em qualquer intervenção que tenha no processo;

b) A ocultação da sua identidade, exceto para os investigadores, até à dedução de acusação;

c) Beneficiar das medidas para a proteção de testemunhas em processo penal, com as devidas

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adaptações;

d) A não ajuramentação.

Artigo 5.º

Formação da convicção

A convicção do julgador, em caso de condenação, não pode assentar exclusivamente na prova obtida por

colaboração de coarguido.

Artigo 6.º

Segredo de justiça

Os processos em que exista o acordo de colaboração previsto no artigo 4.º são obrigatoriamente sujeitos a

segredo de justiça.

Artigo 7.º

Efeitos sobre a pena

1 – Os benefícios premiais que podem ser concedidos ao arguido colaborador são os seguintes:

a) Atenuação especial da pena, em qualquer dos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 1.º,

quando não simultâneos;

b) Dispensa de pena, quando ocorram em simultâneo.

2 – O agente pode ser isento de pena, no caso previsto no n.º 3 do artigo 1.º

3 – O disposto no presente Estatuto não prejudica a aplicação dos benefícios premiais previstos em

legislação penal especial.

Artigo 8.º

Alteração ao Código de Processo Penal

Os artigos 133.º, 268.º e 271.º do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17

de fevereiro, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 133.º

[…]

1 – […].

2 – Excetuam-se do disposto na alínea a) do número anterior os arguidos que tenham celebrado acordo de

colaboração, ao abrigo da legislação respetiva.

3 – Em caso de separação de processos, os arguidos de um mesmo crime ou de um crime conexo, mesmo

que já condenados por sentença transitada em julgado, só podem depor como testemunhas se nisso

expressamente consentirem ou se a tal estiverem obrigados por acordo de colaboração.

Artigo 268.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

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c) […];

d) […];

e) […];

f) Exarar nos autos, ou homologar, acordo de colaboração com arguido, nos termos da legislação

respetiva;

g) [Anterior alínea f)].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

Artigo 271.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – O disposto no número anterior é correspondentemente aplicável a declarações do assistente e das

partes civis, de peritos e de consultores técnicos, de arguidos com acordo de colaboração e a acareações.

8 – […].»

Artigo 8.º

Alteração ao Código Penal

Os artigos 373.º e 374.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, na sua

redação atual, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 373.º

[…]

1 – O funcionário que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou

aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para a prática

de um qualquer ato ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou

aceitação, é punido com pena de prisão de cinco a dezasseis anos.

2 – Se o ato ou omissão não forem contrários aos deveres do cargo e a vantagem não lhe for devida, o

agente é punido com pena de prisão de dois a oito anos.

3 – Sempre que, nos termos do n.º 1, o agente seja condenado a uma pena superior a cinco anos de

prisão, fica impedido de exercer quaisquer cargos públicos durante dez anos.

Artigo 374.º

[…]

1 – Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a

funcionário, ou a terceiro por indicação ou com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não

patrimonial com o fim indicado no n.º 1 do artigo 373.º, é punido com pena de prisão de dois a dez anos.

2 – Se o fim for o indicado no n.º 2 do artigo 373.º, o agente é punido com pena de prisão até cinco anos

ou com pena de multa até 360 dias.

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57

3 – A tentativa é punível.»

Artigo 9.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias a contar da sua publicação.

Palácio de São Bento, 20 de maio de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo —

Gabriel Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto —

Rita Matias — Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

———

PROJETO DE LEI N.º 95/XV/1.ª

REALIZAÇÃO OBRIGATÓRIA DE UM REFERENDO SOBRE A DESPENALIZAÇÃO DA MORTE

MEDICAMENTE ASSISTIDA

Exposição de motivos

A Constituição da República Portuguesa estabelece, nos artigos 24.º e 25.º, que a vida humana e a

integridade moral e física das pessoas são invioláveis. A garantia do direito à vida, aliás, é o pressuposto e a

condição por excelência de realização de todos os restantes direitos fundamentais.

Não obstante, ainda a legislatura mal começou e já o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista deram

entrada ao Projeto de Lei n.º 5/XV e ao Projeto de Lei n.º 74/XV, respetivamente, ambos visando regular as

condições em que a morte medicamente assistida não é punível criminalmente e, em coerência, despenalizar

as referidas condutas, previstas e declaradas puníveis pelos artigos 134.º e 135.º do Código Penal.

O Chega não quer um Estado que mate, antes, um que cuide, nem um Serviço Nacional de Saúde em que

se tolere a ideia de que há vidas que valem a pena ser vividas e outras não, que há vidas que podem ser

abreviadas e sofrimentos que podem ser terminados, em vez de aliviados, tratados, mitigados.

Por outro lado, este tipo de alteração ao status quo jurídico, que os mencionados preceitos constitucionais

têm por função assegurar, não pode ser empreendida de ânimo leve: ela é uma questão de relevante interesse

nacional, para efeitos do disposto no artigo 115.º, n.º 3 da CRP, não pode ficar confinada aos corredores da

Assembleia da República, ela deve ser aberta à participação de toda a sociedade, ela deve ser devolvida ao

Povo.

Além disso, um processo legislativo que envolva o sacrifício do fundamental direito à vida e as

circunstâncias em que o Estado vai realizar esse sacrifício, não pode ser concluído sem que se ouçam

algumas entidades cuja função é a de aconselhar o Estado, em matérias tão ominosas.

Pelo exposto, os Deputados do Chega abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

1 – A presente lei estabelece a obrigação de consulta direta aos cidadãos eleitores quando esteja em

causa a produção de legislação sobre os requisitos e condições de que depende a morte medicamente

assistida ou a ajuda ao suicídio.

2 – A presente lei determina igualmente a sujeição a parecer obrigatório do Conselho Nacional de Saúde

das iniciativas legislativas a que se refere o número anterior, precedido de audição das entidades competentes

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em razão da matéria.

Artigo 2.º

Consulta obrigatória

1 – O ato legislativo que tenha, como efeito necessário, a despenalização da morte medicamente assistida

ou da ajuda ao suicídio, não produz efeito sem que a maioria dos cidadãos eleitores se tenham pronunciado

favoravelmente em consulta direta de alcance nacional.

2 – A consulta aos cidadãos eleitores tem lugar nas condições e nos termos previstos na lei orgânica que

aprova o regime do referendo.

Artigo 3.º

Parecer obrigatório

É aditado um artigo 18.º-A à Lei de Bases da Saúde, aprovada e publicada em anexo à Lei n.º 95/2019, de

4 de setembro, com a seguinte redação:

«Artigo 18.º-A

Legislação sobre morte medicamente assistida e ajuda ao suicídio

1 – A discussão e posterior votação dos princípios e sistema de qualquer iniciativa legislativa que tenha,

como efeito necessário, a despenalização da morte medicamente assistida ou da ajuda ao suicídio, é

precedida de parecer do Conselho Nacional de Saúde.

2 – Para o efeito da emissão do parecer referido no número anterior, o Conselho Nacional de Saúde

procede à auscultação das entidades competentes em razão da matéria, designadamente, das seguintes:

a) Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida;

b) Ordem dos Médicos;

c) Ordem dos Enfermeiros.»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 20 de maio de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo —

Gabriel Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto —

Rita Matias — Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

———

PROJETO DE LEI N.º 96/XV/1.ª

DISPENSA DA TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO NOS PROCESSOS DE DIVÓRCIO SEM

CONSENTIMENTO DO OUTRO CÔNJUGE NOS CASOS DE CONDENAÇÃO POR CRIME DE VIOLÊNCIA

DOMÉSTICA (ALTERAÇÃO AO CÓDIGO CIVIL E AO CÓDIGO DO PROCESSO CIVIL)

A violência doméstica é um crime com milhares de vítimas em Portugal que envolve, na sua essência, uma

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assimetria de poder entre o agressor e a vítima, concretizada não só na violência física, mas também

psicológica, económica ou sexual. É um flagelo que, apesar de muitas tentativas, tem sido particularmente

difícil de eliminar da sociedade portuguesa.

No sentido de empenhar os melhores esforços legislativos na prevenção e no combate a esta realidade, é

pertinente adotar-se uma abordagem transversal a todo o ordenamento jurídico português, analisando

criticamente não só o regime penal e processual penal em vigor, mas também todos os outros regimes que

possam ter relação com a matéria. Procurando corresponder a essa necessidade, é redigido o presente

projeto de lei.

A tentativa de conciliação, obrigatória no âmbito do processo especial de divórcio e separação sem

consentimento do outro cônjuge, prevista no artigo 1779.º, n.º 1 do Código Civil, e no artigo 931.º do Código de

Processo Civil, merece especial atenção. Esta diligência apenas pode ser dispensada por motivos objetivos,

tendo em conta nomeadamente a ausência do réu em parte incerta, e após o tribunal ter realizado as

diligências previstas no artigo 236.º do Código de Processo Civil.

A previsão da obrigatoriedade de realização da tentativa de conciliação é fruto da ideia de que o divórcio

litigioso é a última linha, que apenas deve ser acionada em último caso. Esta é uma manifestação clara do

pendor conciliatório da lei, que entende que o tribunal deve promover a estabilidade do casamento para

impedir a consumação do divórcio.

Ainda que se compreenda que a dissolução do casamento é realidade que deve ser devidamente

ponderada, não se considera que o tribunal, como órgão de soberania que exerce o poder jurisdicional, deva

submeter as partes a uma tentativa de conciliação, quando uma delas já manifestou o propósito de se

desvincular do casamento, nos casos em que tenha havido condenação de cônjuge pelo crime de violência

doméstica. A circunstância de um crime desta natureza ter sido julgado e provado por sentença transitada em

julgado é fator suficientemente grave para que a vítima, que desencadeou uma ação de divórcio sem

consentimento do outro cônjuge, não tenha que passar por uma tentativa de conciliação que, em última

análise, poderá acarretar ainda mais sofrimento psicológico.

Neste caso em concreto, tendo em conta não só o flagelo que é o crime de violência doméstica, mas

também o facto de este ser praticado também na constância do casamento, não se justifica que a lei civil e a

lei processual civil não tenham em consideração a prática deste crime como constituindo fundamento bastante

para a criação de uma exceção à obrigatoriedade da realização da tentativa de conciliação.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º

1 do Regimento da Assembleia da República, os Deputados do Iniciativa Liberal apresentam o seguinte

projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à:

a) Alteração ao Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966, na sua

redação atual;

b) Alteração ao Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, na sua redação

atual.

Artigo 2.º

Alteração ao Código Civil

O artigo 1779.º do Código Civil, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 1779.º

Tentativa de conciliação; conversão do divórcio sem consentimento de um dos cônjuges em divórcio por

mútuo consentimento

1 – […].

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2 – Nos casos em que um dos cônjuges tenha sido condenado pela prática de crime de violência

doméstica, por sentença transitada em julgado, contra o cônjuge requerente do divórcio, tem este a

faculdade de prescindir da tentativa de conciliação.

3 – [Anterior n.º 2.]»

Artigo 3.º

Alteração ao Código de Processo Civil

O artigo 931.º do Código de Processo Civil, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 931.º

Tentativa de conciliação

1 – […].

2 – Nos casos em que o réu tenha sido condenado pela prática de crime de violência doméstica, por

sentença transitada em julgado, contra o autor, este é dispensado da tentativa de conciliação,

mediante requerimento.

3 – Aquando da notificação prevista nos termos do n.º 1, o juiz adverte o autor da faculdade prevista

no número anterior.

4 – [Anterior n.º 2.]

5 – [Anterior n.º 3.]

6 – [Anterior n.º 4.]

7 – [Anterior n.º 5.]

8 – [Anterior n.º 6.]

9 – [Anterior n.º 7.]»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 20 de maio de 2022.

Os Deputados do IL: Patrícia Gilvaz — Rui Rocha — Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos Guimarães

Pinto — Joana Cordeiro — João Cotrim Figueiredo — Rodrigo Saraiva.

———

PROJETO DE LEI N.º 97/XV/1.ª

ASSEGURA A NOMEAÇÃO DE PATRONO ÀS VÍTIMAS ESPECIALMENTE VULNERÁVEIS

(ALTERAÇÃO AO ESTATUTO DA VÍTIMA E À LEI N.º 34/2004, DE 29 DE JULHO, QUE ALTERA O

REGIME DE ACESSO AO DIREITO E AOS TRIBUNAIS)

O ordenamento jurídico penal português tem incorporado e alargado, ao longo dos últimos anos, o conceito

de vítima. Para tal, revelou-se essencial a Lei n.º 130/2015, de 4 de setembro, que consagrou, primariamente,

o Estatuto da Vítima, concedendo a estas uma série de direitos e prevendo uma série de princípios e

prerrogativas, tendo, igualmente, aditado o artigo 67.º-A ao Código de Processo Penal fazendo assim com

que, indubitavelmente, a vítima seja um verdadeiro sujeito processual.

Ora, este mesmo Estatuto da Vítima entendeu que existem vítimas cuja vulnerabilidade carece de um

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tratamento e enquadramento legal próprio, tendo para tal criado, concomitantemente, o Estatuto de Vítima

Especialmente Vulnerável, dirigido nomeadamente a vítimas cuja fragilidade resulte da sua idade, do seu

estado de saúde ou de deficiência, bem como do facto de o tipo, o grau e a duração da vitimização haver

resultado em lesões com consequências graves no seu equilíbrio psicológico ou nas condições da sua

integração social.

O conceito de Vítima Especialmente Vulnerável inclui vítimas como as de violência doméstica, crime com

milhares de vítimas em Portugal que envolve, na sua essência, uma assimetria de poder entre o agressor e a

vítima, concretizada não só na violência física, mas também psicológica, económica ou sexual. É um flagelo

que, apesar das múltiplas tentativas, tem sido particularmente difícil de eliminar da sociedade portuguesa.

O crime de violência doméstica é provavelmente o crime que mais comumente associamos à especial

vulnerabilidade da vítima. No entanto, os traços e as características acima descritos são igualmente

transversais a outros tipos de crime, cujas vítimas se consideram também merecedoras de uma tutela

específica, que lhes garanta o melhor acompanhamento, preferencialmente em todas as etapas do processo

penal.

Com o presente projeto de lei, pretende-se que a Vítima, aquando da sua qualificação como Especialmente

Vulnerável, tenha ao seu dispor aconselhamento jurídico imediato, na nossa ótica essencial para o cabal

esclarecimento dos seus direitos e para o acompanhamento completo, integral e transversal nas diversas

etapas processuais. Nestes termos, a vítima terá assim um papel reforçado como parte ativa e colaborante

com a justiça, uma vez que serão reduzidos os fenómenos de vitimização secundária que, não raras vezes,

impedem a apresentação de queixa e dificultam a participação ativa da vítima no processo penal.

De notar que, em abstrato, a alteração agora proposta já foi sindicada pelo Ministério Público, pela Ordem

dos Advogados e pela Associação Portuguesa de Apoio À Vítima, tendo estas três entidades acordado quanto

ao mérito, relevância, necessidade de a lei permitir a concessão de patrono, através de escalas de prevenção,

às Vítimas Especialmente Vulneráveis.

A alteração legislativa agora proposta garante ainda que, arguido e vítima gozam das mesmas

prerrogativas de assistência legal, essencial para que se garanta um processo justo e equitativo para todos os

sujeitos processuais.

Procurando corresponder a essa necessidade, é apresentado o presente projeto de lei.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º

1 do Regimento da Assembleia da República, os Deputados do Iniciativa Liberal apresentam o seguinte

projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei confere o direito à nomeação de patrono em escalas de prevenção para as vítimas

especialmente vulneráveis, para tal procedendo:

a) À primeira alteração ao Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei n.º 130/2015, de 4 de setembro; e

b) À quinta alteração à Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, que altera o regime de acesso ao direito e aos

tribunais, alterada pelas Leis n.os 47/2007, de 28 de agosto, 40/2018, de 8 de agosto e 2/2020, de 31 de

março.

Artigo 2.º

Alteração ao Estatuto da Vítima

Os artigos 11.º e 21.º do Estatuto da Vítima, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 11.º

[…]

1 – […]:

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II SÉRIE-A — NÚMERO 29

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a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) Em que medida e em que condições tem acesso a:

i) […];

ii) Apoio judiciário, sendo que no caso de se tratar de vítima especialmente vulnerável tem direito a

que seja nomeado de forma imediata um patrono; ou

iii) […].

g) […];

h) […];

i) […];

j) […];

k) […];

l) […];

m) […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].

7 – […].

8 – […].

9 – […].

10 – […].

11 – […].

Artigo 21.º

[…]

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) Nomeação imediata de patrono, se manifestar tal intenção.»

Artigo 3.º

Alteração à Lei n.º 34/2004, de 29 de julho

O artigo 41.º do Regime de Acesso ao Direito e aos Tribunais, na sua redação atual, passa a ter a seguinte

redação:

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«Artigo 41.º

[…]

1 – […].

2 – No momento de atribuição do estatuto de vítima especialmente vulnerável, esta é informada de

que pode requerer a nomeação de patrono, que lhe será concedido de imediato, conforme disposto no

artigo 20.º da Lei n.º 130/2015, de 4 de setembro, que aprova o Estatuto da Vítima, e nos mesmos

termos que ao arguido, conforme previsto no artigo 39.º do presente diploma.

3 – No âmbito das nomeações a vítimas especialmente vulneráveis há lugar a pagamento de

honorários, nos mesmos termos da nomeação ao arguido de defensor.

4 – [Anterior n.º 2.]

5 – [Anterior n.º 3.]

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação em Diário da República.

Palácio de São Bento, 20 de maio de 2022.

Os Deputados do IL: Patrícia Gilvaz — Rui Rocha — Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos Guimarães

Pinto — Joana Cordeiro — João Cotrim Figueiredo — Rodrigo Saraiva.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 62/XV/1.ª

REALIZAÇÃO DE UM REFERENDO SOBRE A DESPENALIZAÇÃO DA MORTE MEDICAMENTE

ASSISTIDA

Exposição de motivos

Deu entrada na Assembleia da República, logo nos primeiros dias da legislatura, o Projeto de Lei n.º 5/XV,

do Bloco de Esquerda, que «Regula as condições em que a morte medicamente assistida não é punível e

altera o Código Penal», ao qual se seguiu, muito recentemente, o Projeto de Lei n.º 74/XV, do Partido

Socialista, cujo título é rigorosamente igual ao daquele.

Ainda os ecos da discussão da legislatura anterior não se esfumaram e já os dois principais animadores do

debate sobre a eutanásia – é disto que falamos – fizeram questão de marcar presença.

A Constituição da República Portuguesa estabelece, nos artigos 24.º e 25.º, que a vida humana e a

integridade moral e física das pessoas são invioláveis. A garantia do direito à vida, aliás, é o pressuposto e a

condição por excelência de realização de todos os restantes direitos fundamentais.

Propõem os autores das iniciativas acima referidas a legalização da eutanásia em seres humanos e da

ajuda ao suicídio – eufemisticamente designada por «morte medicamente assistida» –, com o intuito de alterar

a lei penal no sentido da despenalização das referidas condutas, previstas e declaradas puníveis pelos artigos

134.º e 135.º do Código Penal.

Admitir que uma alteração legislativa deste teor ganhe forma, independentemente de quais forem os

pressupostos e requisitos que estão consignados naquelas iniciativas, é o equivalente a dizer aos cidadãos

que a proteção, que o Estado e o ordenamento jurídico que o sustenta concedem à vida humana, lhes pode

ser retirada pelos deputados à Assembleia da República, desde que a maioria de que dispõem, ou que

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II SÉRIE-A — NÚMERO 29

64

conseguem concitar, o permita.

Não só em Portugal a eutanásia é crime: é-o também num conjunto de outros ordenamentos jurídico,

nomeadamente europeus.

O Código Penal alemão prevê a eutanásia ativa como crime próprio, punindo-o, no artigo 216.º, com pena

de prisão de 6 meses a 5 anos. É requisito para o preenchimento deste tipo legal de crime que a vítima haja

formulado pedido expresso e sério para ser morta, pois, caso o pedido não exista, o autor do crime pode ser

acusado de cometer homicídio simples, previsto e punido pelo artigo 212.º. A tentativa é punível.

O Código Penal austríaco também trata a eutanásia como um crime próprio distinto do homicídio simples –

artigo 77.º , com a epígrafe «Homicídio a pedido», segundo o qual quem matar alguém, a seu pedido sério e

urgente, é punido com prisão de 6 meses a 5 anos. A pena a aplicar é reduzida, portanto, quando comparada

com a do homicídio simples. Também o artigo 78.º pune o incitamento ou a ajuda ao suicídio com a mesma

pena do homicídio a pedido – no caso de suicídio assistido relativamente a doente terminal, quem pratica a

ação final acaba por ser o próprio doente, limitando-se o agente do crime a prestar-lhe ajuda.

No ordenamento jurídico cipriota, não há disposições legais específicas sobre a eutanásia e o suicídio

assistido, que são tratados como crimes de, respetivamente, homicídio e ajuda ao suicídio (artigos 203.º e

seguintes e 218.º do Código Penal). Mas existe uma lei sobre direitos dos doentes, datada de 2005, que prevê

que o paciente tem o direito a ser aliviado da dor e do sofrimento, na medida dos conhecimentos científicos

disponíveis e de acordo com os respetivos regulamentos ético-profissionais em vigor, dentro dos limites legais

e com observância dos adequados procedimentos. Mas outra norma dessa mesma lei prevê que o paciente

tem o direito a cuidados de saúde e ao respeito da sua dignidade na fase final da sua vida, dentro dos limites

da lei e dos procedimentos legítimos.

Quanto à possibilidade de eutanásia ou a morte assistida, apenas três ordenamentos jurídicos a admitem

abertamente na União Europeia: concretamente, os Países Baixos, a Bélgica e o Luxemburgo1. E admitem-na

sem que seja requisito que o doente sofra de doença fatal ou em fase terminal, ao contrário do que sucede,

por exemplo, com os ordenamentos jurídicos do Canadá, da Colômbia e de alguns estados federados dos

Estados Unidos da América que despenalizam o suicídio assistido.

A lei belga permite a eutanásia infantil a menores de qualquer idade.

Nos Países Baixos, até há bem pouco tempo, discutia-se a possibilidade de eutanásia por exaustão vital2.

Essa mensagem não é a que o Chega quer transmitir aos seus concidadãos, porque entende que esse

caminho não corresponde, bem pelo contrário, aos princípios pelos quais orienta a sua ação política.

Uma tal alteração do status quo jurídico, por outro lado, não pode senão ser considerada uma questão de

relevante interesse nacional, para efeitos do disposto no artigo 115.º, n.º 3, da CRP. É uma decisão que não

pode ser tomada apenas nos corredores da Assembleia da República: ela deve ser aberta à participação de

toda a sociedade, ela deve ser devolvida ao povo.

O Chega não quer um Estado que mate, antes, um que cuide.

O Chega quer um Estado para o qual a vida humana tem igual valor em todas as circunstâncias e por isso

merece proteção em todas elas: não compreendemos nem aceitamos que circunstâncias indesejadas como a

doença, a deficiência ou o sofrimento humano, seja físico ou existencial, retirem valor ao ser humano.

O Chega não aceita nem tolera a ideia de que há vidas que valem a pena ser vividas e outras não.

Pelo exposto, os Deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos e para os efeitos do artigo 115.º e da alínea j) do artigo

161.º da Constituição da República Portuguesa e do n.º 6 do artigo 20.º da Lei Orgânica do Regime do

Referendo, apresentar ao Presidente da República a proposta de realização de um referendo em que os

cidadãos eleitores recenseados no território nacional e os residentes no estrangeiro regularmente recenseados

sejam chamados a pronunciar-se sobre a pergunta seguinte:

1 Se alargarmos a visão aos membros do Conselho da Europa, encontramos ainda a Suíça, que permite uma forma mitigada de suicídio assistido, ao passo que a maioria dos Estados-membros deste órgão limitam-se a permitir recusas de tratamento e outros (como Portugal) permitem as diretivas antecipadas de vontade sob a forma de testamento vital. 2 É um novo conceito de eutanásia, aplicável a idosos saudáveis a partir dos 75 anos, que sentem a sua vida completa e não pretendem continuar – é uma forma de garantir a liberdade de decidir sobre o final da vida.

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«Concorda que a morte medicamente assistida de uma pessoa, a seu pedido, ou a ajuda ao suicídio,

devem continuar a ser punidas pela lei penal?»

Palácio de São Bento, 20 de maio de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo —

Gabriel Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto —

Rita Matias — Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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