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14 DE JUNHO DE 2022

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sobrepõe aos estados, o Tratado da Carta da Energia inverte o ónus dos custos associados à transição

energética: em vez de serem as indústrias poluidoras a compensar os cidadãos pelos riscos que lhes impõem,

são os cidadãos a terem de compensar estas indústrias por lhes exigirem um modelo de negócio compatível

com a preservação do planeta. Nos Países Baixos duas empresas multinacionais estão a exigir indemnizações

a rondar os mil milhões de euros devido a uma lei que as impede de utilizar carvão na produção da energia

elétrica a partir de 2030. Este exemplo não é caso único: em Espanha o Governo confronta-se com dezenas

de queixas por procurar combater a pobreza energética tornando a eletricidade mais acessível. De facto,

nenhum tratado internacional é responsável por tantos casos ISDS como o Tratado da Carta da Energia.

A Comissão Europeia, mandatada pelos Estados-Membros da União Europeia (UE), tem procurado

modernizar este acordo, mas as suas propostas são simultaneamente excessivamente tímidas e

excessivamente ambiciosas. Excessivamente tímidas pois, mesmo se integralmente aceites, continuariam a

proteger um volume de emissões até ao ano 2050 correspondente ao triplo do volume compatível com o alvo

de 1,5º inscrito no acordo de Paris, em vez do atual quíntuplo desse volume. Excessivamente ambiciosas

porque, dada a arquitetura do TCE, a necessidade de unanimidade entre os seus membros para efetuar

alterações deste calibre, e as resistências que têm sido publicamente demonstradas, é pouco credível que

venham a ser acolhidas de forma integral ou sequer substancial. Na realidade, estas negociações têm

decorrido desde 2019 sem ter dado quaisquer frutos. Ao longo deste período as emissões permaneceram

acima dos alvos estipulados e a transição energética foi sendo adiada, enquanto por outro lado o TCE foi

alargando o número de membros, prevendo-se que continue a alargar nos próximos anos, tornando a cláusula

de caducidade mais pesada e perigosa.

Deve acrescentar-se que um estudo recentemente conduzido pela Professora Christina Eckes e pelo Dr.

Laurens Ankersmit, da Universidade de Amesterdão, analisou em detalhe a compatibilidade jurídica entre o

TCE e a legislação da UE, concluindo que nenhum grau de «modernização» tornará este tratado de

investimento compatível com a legislação da UE. Recorde-se que o texto do TCE é explícito na subordinação

estrutural da proteção ambiental à proteção do investimento, e as propostas de modernização não colocam

isso em causa.

Finalmente, parece começar a existir algum consenso político no Parlamento Europeu a respeito da

necessidade de abandonar este acordo. Para que os países da UE procedam a um abandono coletivo, é

agora necessário que os estados tomem medidas decisivas nesse sentido. Representantes do Governo

francês, do Governo espanhol, do Governo luxemburguês, e outros, num total de sete Estados-Membros da

UE, expressaram preocupações graves em relação ao TCE. Portugal, país depositário do TCE, tem obrigação

de ter uma posição de liderança no combate às consequências perversas deste acordo, sobretudo perante a

manifesta impossibilidade de melhorar as condições nele presentes.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre propõe à

Assembleia da República que, através do presente projeto de resolução, delibere recomendar ao Governo

que:

1. Se posicione favoravelmente a uma denúncia coletiva do Tratado da Carta da Energia em sede de

Conselho Europeu e nas formações relevantes do Conselho da União Europeia;

2. Caso se revele impossível avançar para uma denúncia coletiva do Tratado da Carta de Energia, solicite

as necessárias consultas jurídicas para a consideração de uma denúncia unilateral do acordo.

Assembleia da República, 14 de junho de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

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