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II SÉRIE-A — NÚMERO 150

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das costas.

Igualmente chocante foi tudo aquilo a que assistimos no angustiante cerco de Mariupol, onde durante dois

meses, três semanas e dois dias toda uma comunidade foi trucidada física e psicologicamente. Confirma-se que

mais de 6 mil civis morreram (segundo as autoridades ucranianas o número ascendeu a 21 mil), acrescentando-

se 30 mil deportados para a Rússia, além do óbito de 10 mil soldados, repartidos pelos beligerantes.

Na floresta de Izium, nas proximidades de Kharkiv, foram descobertas valas comuns com corpos de 17

soldados ucranianos e pelo menos outras 443 sepulturas improvisadas, na sua maioria civis.

Em setembro, uma Comissão Independente promovida pelo Conselho dos Direitos Humanos da ONU,

chefiada pelo juiz norueguês Erik Mose, apresentou um relatório onde afirmou ter encontrado provas de crimes

de guerra, execuções, tortura e violações por parte das forças russas. Segundo o documento, os crimes

«incluem a detenção prévia das vítimas, sinais visíveis de execução nos corpos, mãos atadas atrás das costas,

tiros na cabeça e gargantas cortadas.» Ainda segundo esta comissão, foram cometidos crimes de abuso sexual

a mulheres e crianças, com o pormenor soez de, em alguns casos, os familiares terem sido obrigados a assistir.

Relembremos também que a Rússia tem atacado permanentemente infraestruturas civis e de fornecimento

de energia, procurando atirar o povo ucraniano à lenta morte pelo frio, pela fome e pela sede.

Não estamos, portanto, a falar de circunstâncias regulares, mesmo tratando-se de um contexto de guerra,

cabendo a Portugal o imperativo moral de assumir uma posição inequívoca.

As quatro Convenções de Genebra e o Protocolo Adicional I, de que a Ucrânia e a Federação da Rússia são

Estados Partes, estabelecem que as violações graves do Direito Internacional Humanitário, juntamente com os

incumprimentos graves, constituem crimes de guerra; que qualquer pessoa que ordene ou cometa tais atos ou

que ajude e seja cúmplice é responsável por tais crimes.

Portugal tem a oportunidade de estar do lado certo da História apoiando o processo de constituição de um

tribunal penal especial para os crimes perpetrados neste conflito, tal como defendido pela presidente da

Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e pelo Alto Representante para os Assuntos Exteriores e Política de

Segurança dos 27, Josep Borrell, que propuseram a constituição deste tribunal em colaboração com o Tribunal

Penal Internacional (TPI) e envolvendo as Nações Unidas.

Em 4 de março de 2022, o Conselho de Direitos Humanos da ONU votou a criação da Comissão de Inquérito

Internacional Independente sobre a Ucrânia, com um mandato para investigar violações dos Direitos Humanos

e do Direito Internacional Humanitário no contexto da invasão russa da Ucrânia em 2022.

É verdade que, em novembro de 2016, a Rússia retirou a sua assinatura do Estatuto de Roma e a Ucrânia

não é um Estado Parte no Estatuto de Roma, mas exerceu duas vezes as suas prerrogativas de aceitar a

jurisdição do TPI relativamente a alegados crimes ocorridos no seu território, nos termos do artigo 12.º, n.º 3, do

Estatuto de Roma. Apesar do TPI não ter jurisdição sobre o crime de agressão nesta situação, uma vez que

nem a Ucrânia nem a Federação da Rússia ratificaram o Estatuto de Roma e as suas alterações relacionadas

com o crime de agressão, esta lacuna pode – e deve – ser colmatada através da criação de um tribunal

internacional especial, incumbido de investigar e julgar os eventuais crimes cometidos na guerra da Ucrânia.

A criação de tribunais internacionais especiais não é inédita. Sucedeu, por exemplo, após a Segunda Guerra

Mundial, com os Tribunais de Nuremberga e Tóquio, e, mais tarde, com os Tribunais para a ex-Jugoslávia e

para o Ruanda. Claro que, após a criação de um tribunal permanente, como o TPI, seria desejável que a criação

de Tribunais «ad hoc» deixasse de ser necessária. Mas pode justificar-se pelas limitações ainda existentes à

jurisdição deste tribunal, com acontece no caso atual.

Assim, relevando o acima referido e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o

Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata vem propor que a Assembleia da República recomende ao

Governo que:

1. Manifeste o seu total apoio à investigação iniciada pelo Procurador do TPI sobre os alegados crimes de

guerra e crimes contra a humanidade cometidos na Ucrânia, ao trabalho da Comissão de Inquérito do

Alto‑Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e aos esforços de organizações da sociedade

civil independentes para recolher e preservar provas de crimes de guerra; sublinhando a importância de um

trabalho e um avanço rápidos para obter as provas necessárias para a investigação e a perseguição de todos

os responsáveis pela autorização, prática e ocultação de crimes de guerra e outras violações dos direitos

humanos e do direito internacional humanitário; considerando de importância crucial uma ação rápida no sentido

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