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15 DE FEVEREIRO DE 2023

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 484/XV/1.ª

CRIA UM GRUPO DE TRABALHO COM VISTA À REVISÃO E ALTERAÇÃO DA LEGISLAÇÃO

APLICÁVEL AOS CRIMES SEXUAIS

Exposição de motivos

A Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica tornou

públicas, esta segunda-feira, dia 13 de fevereiro, as conclusões do trabalho realizado em 2022, concretamente

do estudo dos abusos sexuais de crianças por membros e/ou colaboradores da Igreja, entre os anos 1950 e

2022, com vista a «um melhor conhecimento do passado e adequada ação preventiva e de intervenção

futura»1.

Na apresentação dos dados sobre os abusos sexuais cometidos na Igreja Católica, a Comissão

Independente revelou alguns depoimentos que chegaram ao organismo sobre os abusos sexuais ocorridos no

seio da Igreja Católica portuguesa, de situações extremamente traumáticas e dolorosas e que, em muitos

casos, ocorreram há décadas.

De entre os 512 testemunhos validados recebidos ao longo do ano, relativos a 4815 vítimas, a comissão

enviou para o Ministério Público 25 casos que serão alvo de uma investigação judicial.

Contudo, tal como referiu a Presidente do Instituto de Apoio à Criança, Dr.ª Dulce Rocha2, estas comissões

são essenciais, na medida em que trazem um enorme conhecimento, mas ressalva que «a comissão tem

muito poucos poderes», porque «comunica ao Ministério Público e a maior parte dos casos estão prescritos e

o processo é arquivado, ou até nem se constitui processo».

E esta é uma das primeiras dificuldades que nos deparamos para se atingirem condenações. Uma vez que

os crimes de abuso sexual contra menor prescrevem ao fim de 15 anos e os crimes de ato sexual com

adolescente prescrevem após 10 anos, muitos destes casos podem estar prescritos antes da vítima se sentir

preparada, do ponto de vista emocional, para a revelação do crime e para lidar com todos os aspetos

relacionados com o seguimento do procedimento criminal.

Por outro lado, outra dificuldade prende-se com o facto de nos casos de abusos sexuais contra menores

entre os 14 e os 18 anos, o direito de queixa só poder ser exercido até a vítima completar os 23 anos. Apesar

de tal não acontecer com os crimes sexuais contra crianças menores de 14 anos, que são sempre públicos,

esta não deixa de ser uma limitação que deverá ser analisada.

Também as molduras penais para estes crimes merecem revisão, nomeadamente no eventual

agravamento pelo menos nos limites máximos, uma vez que podem ver-se estas penas constantemente

suspensas.

O constrangimento causado por este tipo de crimes na vítima, ao qual acresce a especial dificuldade em

integrar o sucedido, o receio de ter de voltar a enfrentar o agressor, a exposição pública da sua intimidade

perante as autoridades públicas e policiais e o receio da lógica de revitimização associada ao processo levam

a que, nestes casos, o ofendido acabe por preferir o silêncio e a impunibilidade do agressor à denúncia do

crime e impulso do processo penal.

Comprovativo desta realidade são, para além dos agora conhecidos relativamente ao caso concreto da

Igreja Católica portuguesa, os dados apresentados pela Associação Quebrar o Silêncio, que nos refere que os

homens que em crianças ou jovens foram vítimas deste tipo de abuso apenas denunciam o crime e procuram

ajuda, no mínimo, 20 anos após o abuso, encontrando-se a maioria dos homens na casa dos 35-40 anos

quando se encontra capacitado para o fazer.

No atual quadro legal, muito embora a prescrição nunca ocorra antes de a vítima perfazer 23 anos, estes

crimes estão prescritos, em alguns casos, há décadas.

É importante notar que estes crimes e o processo penal que lhe está associado são extremamente

traumáticos para a vítima, do ponto de vista físico e psicológico, inclusive com sequelas e distúrbios psíquicos.

Atendendo a isto, no âmbito projeto CARE – Rede de apoio especializado a crianças e jovens vítimas de

violência sexual, assinalou-se que o tempo que passa entre a perpetração do crime e a sua revelação pode

variar em função do impacto que o crime teve na criança ou jovem, sendo que em 63,6 % dos casos a

1 MicrosoftWord – Relatório final (1)_sumario.docx. 2 Dulce Rocha: «Prescrição de crimes de abuso sexual devia ser de 30 anos» – Renascença.

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