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18 DE OUTUBRO DE 2023

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Salvo o devido respeito, não se afigura que este argumento seja assim tão evidente.

É que, na pendência de um processo de revisão ordinária, pode haver uma razão de urgência que justifique

um processo extraordinário mais rápido sobre uma ou mais matérias delimitadas.

A revisão extraordinária é exatamente uma «válvula de escape» do sistema, permitindo-se a realização de

uma revisão constitucional quando se conclua pela necessidade ou conveniência em iniciar um procedimento

de revisão antes de decorridos cinco anos sobre a data da publicação da última revisão constitucional,

exigindo-se para isso uma maioria especialmente qualificada de quatro quintos dos Deputados em efetividade

de funções3.

Ou seja, a revisão constitucional extraordinária é especialmente vocacionada para a resolução mais célere

de questões constitucionais delimitadas que circunstâncias concretas exijam.

É por isso que Jorge Miranda e Rui Medeiros admitem que haja lugar a uma revisão extraordinária mesmo

que já tenham passado cinco anos sobre a última revisão ordinária (e, portanto, pudesse haver lugar a um

processo ordinário), desde que «haja uma necessidade imperiosa de alterar uma matéria especifica regulada

na Constituição sem que se pretenda concomitantemente abrir um debate mais alargado em torno de outras

alterações da Constituição». Caso contrário, se não se admitir uma revisão extraordinária para isto, então,

teria de se abrir uma revisão ordinária para resolver o tal caso concreto, obstando a uma outra revisão (mais

geral) nos próximos cinco anos4.

Deste excurso retira-se que a revisão extraordinária tem um objeto diferente da revisão ordinária, dirigindo-

se precisamente à resolução célere de problemas constitucionais concretos, desde que se verifique que tal é

necessário e urgente.

Acresce que, em rigor, nenhuma disposição constitucional impede expressamente a possibilidade de

abertura de um processo de revisão extraordinária estando em curso um processo de revisão constitucional

ordinária. Isso não corresponde nem a um limite temporal nem a um limite circunstancial de revisão

constitucional (cfr. os artigos 284.º e 289.º da CRP).

Pode apresentar-se uma outra objeção, que se prende com a garantia da unidade da revisão

constitucional, contudo esta regra opera dentro do mesmo processo e não no âmbito de um processo

autónomo.

Note-se que esta conclusão é de natureza orgânico-formal e não material, o que significa que a pré-

existência de um processo ordinário de revisão não retira por si só à AR o poder de assumir poderes de

revisão extraordinária.

Coisa diferente é saber quais as circunstâncias materiais concretas que justificam a assunção de tais

poderes, mas isso, salvo melhor opinião, é uma ponderação de natureza substancial que compete aos

Deputados e que estes só podem deliberar por uma maioria qualificada de quatro quintos dos Deputados em

efetividade de funções.

É verdade que, no caso vertente, a situação que justifica o projeto do PAN já existia à data em que foi

iniciado o processo ordinário de revisão constitucional (tanto assim que vários projetos preveem alterações à

Constituição nesse sentido), mas isso não impede a AR de fazer uma ponderação sobre a eventual

agudização do problema, por exemplo, devido à apresentação do pedido de fiscalização com força obrigatória

geral, apresentado obrigatoriamente pelo Ministério Público.

A assunção de poderes extraordinários de revisão deve ser circunscrita ao problema constitucional que se

pretende resolver e essa delimitação deve constar da resolução que assume tais poderes.

Neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira defendem que a «Constituição não estabelece a exigência

de que a assunção de poderes de revisão deva indicar as matérias sobre as quais há-de incidir a revisão; mas

a razão de ser da revisão constitucional extraordinária assim o parece exigir, pois não é lógico considerar

inadiável e imprescindível uma revisão constitucional sem uma definição das matérias carecidas dela»5.

Em sentido contrário, Jorge Miranda e Rui Medeiros entendem que não há fundamento constitucional para

sustentar esta delimitação do âmbito material das revisões extraordinárias. Além de faltar base literal,

consideram que a revisão extraordinária é «um ato livre no fim»6.E continuam: «Em conformidade, a simples

3V. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, op. cit., pág. 782. 4Cfr. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, op. cit., pág. 784. 5V. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa anotada, volume II, 4.ª Edição, Coimbra, 2010, pág. 997. 6 Cfr. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, op. cit., pág. 783.

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