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11 | II Série B - Número: 051 | 27 de Novembro de 2010

(i) Em sede do preâmbulo e articulado do Decreto-Lei n.º 111/2010 o legislador expende um conjunto de argumentos, que, quando não são subterfúgios, são claramente abusivos ou mesmo falsos:

a) O Governo liberaliza, porque os horários «abrangem actualmente um número reduzido de estabelecimentos», porque dos «estabelecimentos com uma área de venda superior a 2000 m2 ou estabelecimentos integrados num grupo que dispõe, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 30 000m2» «apenas 5% dos estabelecimentos do ramo alimentar e 7,7% dos estabelecimentos do ramo não alimentar se encontram abrangidos pelos horários impostos às grandes superfícies comerciais».
Conclui, de forma admirável o legislador: «Estes dados permitem concluir que os actuais horários das grandes superfícies comerciais (…) distorcem a concorrência em prejuízo d o funcionamento do mercado e dos consumidores»! O Governo deveria começar por explicar a razão de, actualmente, os estabelecimentos abrangidos pela limitação nas tardes de domingos e feriados, com excepções, serem um universo reduzido. Explicar, por exemplo, porque razão o poder político foi cúmplice da ilegalidade ao longo destes últimos anos, permitindo que grandes superfícies, licenciadas com 1998 m2, usassem o subterfúgio legal de uma área de vendas inferior aos 2000m2 para abrirem aos sábados e domingos todo o dia! Explicar porque razão o Secretário de Estado do Comércio homologou, por despacho de 1 de Março de 2010, o Parecer n.º 33/2009, de 22 de Março, da PGR, de esclarecimento da definição de «grandes superfícies comerciais», que «legalizou» a abertura nas tardes de domingos e feriados a mais 86 grandes superfícies comerciais! Mas mais grave é o subterfúgio da utilização da fórmula percentual para subestimar o impacto dos 177 estabelecimentos ainda obrigados a encerrar nas tardes de domingo e feriados. Porque o Governo não desconhece que os impactos, no caso em apreço, não resultam da maior ou menor percentagem do número de estabelecimentos, mas do que esses estabelecimentos representam em termos de facturação/volume de vendas no mercado de retalho! É assim que os 74 hipers, sendo 5% dos estabelecimentos do ramo alimentar, tiveram, em 2009, 26% da facturação (Índice Nielsen Alimentar) e as dezenas de milhar de lojas do comércio tradicional 12% de um volume global de facturação de 12 868 milhões de euros! Depois é notável como o Governo, dos dados referidos — 5% (74 lojas) dos estabelecimentos do ramo alimentar e 7,7% (103) do ramo não alimentar encerrados nas tardes de domingos e feriados — tira a conclusão de que «os actuais horários distorcem a concorrência! Porquê? Mistério que só o Governo saberá explicar. Mistério tanto maior quando se sabe que os grandes grupos de distribuição, proprietários desses 5% de estabelecimentos, são também os proprietários de centenas de estabelecimentos dos formatos supers e discounts, abertos nas tardes de domingos e feriados, respectivamente, em 2009, com 44% e 18% da facturação! Terá o Governo pedido um parecer à Autoridade de Concorrência na avaliação dessa distorção da concorrência? b) Outro argumento é a tese de que os actuais horários «se encontram dissociados das necessidades e interesses locais», «distorcem a concorrência em prejuízo (…) dos consumidores », o que o decreto-lei vai corrigir! Quem e como foram avaliadas as «necessidades e os interesses locais»? Com as autarquias locais? Com as associações do comércio tradicional e de proximidade? Teve o Governo em conta a constatação de que a instalação das unidades (todos os formatos!) dos grupos da grande distribuição se traduzir, em geral, no empobrecimento e desestruturação das redes económicas regionais e locais, com redução da procura de bens produzidos local ou regionalmente? O que foi admitido no relatório elaborado pelo anterior governo sobre a execução da Lei n.º 12/2004, na avaliação dos «impactos intersectoriais» da instalação daquelas unidades, licenciadas ao abrigo dessa lei? Sobre a velha tese dos «interesses dos consumidores», se não se confundir a manifestação desses interesses com a petição montada pela APED — a associação dos interesses dos grandes grupos da distribuição — , o Governo podia esclarecer como formulou tal conclusão e assim a configurou no decreto-lei em reunião do Conselho de Ministros, sem que as entidades do Conselho Nacional de Consumo tivessem tempo para se pronunciar? Ou o Governo já conhecia as suas opiniões? Justifica também o Governo com a necessidade de «adaptar os horários das grandes superfícies comerciais aos hábitos de consumo entretanto adquiridos pela população portuguesa». Mas se há outras lojas de retalho abertas, incluindo da grande distribuição, qual a necessidade de abrir mais? E então, porque não «adaptar os horários» de outros serviços, incluindo serviços públicos, a esses hábitos de consumo?

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