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II SÉRIE-B — NÚMERO 28

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60 – Também Martins da Fonseca desenvolve a noção de domicílio, à luz do artigo 34.º da Constituição da

República Portuguesa, recordando que está em causa «o direito à intimidade, a preservação da esfera da

liberdade individual e familiar, em resumo, a «paz da casa» (Cfr. Conceito de domicílio, face ao artigo 34.º da

Constituição da República, in Revista do Ministério Público, n.º 45, 1991, pp. 45-64, p. 60).

61 – Costa Andrade reforça esta mesma linha: «o domicílio é, com efeito, todo o espaço fisicamente

circunscrito e delimitado (fechado) onde, por mais ou menos tempo, a(s) pessoa(s) se entrincheira(m) ou se

refugia(m) para realizar a sua vida privada, imune(s) às perturbações, ruídos ou olhares indesejados do

ambiente, resguardadas da indiscrição e devassa arbitrárias» (Sobre o acórdão, Manuel da Costa Andrade,

«Domicílio, Intimidade e Constituição», in Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 138, Nov-Dez de 2008,

n.º 3953, p. 111, Col. 2).

62 – A consagração constitucional da inviolabilidade do domicílio pretende proteger não só a intimidade

pessoal, como a segurança, a estabilidade e o sossego. Protege-se «ao mesmo tempo (…) o âmbito espacial

que constitui a morada» e também «o direito à intimidade pessoal» (Cfr. José Ramón Alvarez Rodriguez, «Del

Allanamiento de Morada, Domicilio de Personas Jurídicas y Estabelecimientos Abiertos al Público», in Ciencia

Policial – Revista Técnica de la Dirección General de la Policia, n.º 87, p. 70).

63 – Maia Gonçalves realça também esta mesma opinião, vincando que domicílio é «qualquer lugar que sirva

para habitação, portanto numa barraca de campismo, num velho autocarro, num barco, etc., desde que estejam

a ser utilizados para esse efeito» (Código Penal Português Anotado, 1984, p. 295).

64 – Nesta mesma linha de raciocínio, o Supremo Tribunal Espanhol abrange, no espectro de domicílio, todo

o lugar onde haja «a clara vontade do seu titular excluir o espaço e a atividade nele desenvolvida do

conhecimento e intromissões de terceiros» (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Espanhol n.º 484/2004, de 16 de

Abril, consultado em http://www.poderjudicial.es).

65 – Indo, de resto, ao encontro do pensamento expresso pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

(Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, de 24 de novembro de 1986, caso Guillow v. Reino

Unido, consultado em http://echr.coe.int/echr/en/hudoc)

66 – Mas esta proteção do domicílio é similar ao longo de todo o dia?

67 – Não.

68 – A Constituição da República Portuguesa estabelece um especial cuidado na proteção «durante a noite»

(n.º 3, do artigo 34.º da CRP).

69 – O legislador ordinário materializa esta ideia, consubstanciando um horário onde as buscas domiciliárias

só podem ser realizadas em situações de criminalidade violenta ou grave: «entre as 21 e as 7 horas» (n.º 2, do

artigo 177.º, do Código de Processo Penal).

70 – Vale a pena recordar que ao Regime Geral das Contraordenações, que rege o Código da Estrada, se

aplicam, subsidiariamente, as regras do Código Penal e do Processo Penal.

71 – Havendo (como deve haver) grandes restrições na intromissão do domicílio, quando o que está em

causa é a produção de prova criminal, fará algum sentido que se permita a perturbação da vida privada a

qualquer hora para dissipar um eventual ilícito contraordenacional?

72 – Este assunto pode, a uma vista menos informada, parecer lateral. Mas é importantíssimo neste ponto:

as autoridades policiais, para aferirem a existência de um ilícito contraordenacional terão forçosamente que

importunar o descanso – às duas, três ou quatro da madrugada – para se certificarem da presença ou não de

pessoas na autocaravana.

73 – Não foi por descuido ou mero acaso que o legislador, no ano de 2007, acrescentou a frase «ou

perturbação da vida privada», à epígrafe do artigo 190.º do Código Penal, criminalizado essa mesma

perturbação.

74 – E não foi por mero acaso que o fez na norma relativa à violação do domicílio.

75 – Fê-lo para dar expressão a esta ideia de proteção da reserva da vida privada e familiar.

76 – O crime não se consubstancia apenas com a entrada física.

77 – A perturbação da vida privada, da pessoa recolhida no seu domicílio, também se traduz na violação

deste.

78 – Ao estabelecer como elemento constitutivo do tipo para a infração, que a autocaravana esteja ocupada

no período noturno, o legislador está a impelir as autoridades policiais a perturbar a vida privada para verificar

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