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II SÉRIE-C — NÚMERO 4

De qualquer forma, as «praxes administrativas» (Rogério Soares) ou «jurisprudência burocrática» (Freitas do Amaral) não assumem o conteúdo de uma vinculação jurídica, trata-se de mera conveniência prática para a solução de um problema.

Na Lei n.° 1/73 estamos em presença de uma chamada «discricionariedade de decisão» (Entscheidungsermessen) acompanhada de alguns «conceitos indeterminados» de valor diverso na previsão da norma (os casos de «empresa» e de «empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional»). Valor diverso porque o conceito de empresa, como vimos, pode ser reconduzido aos chamados «conceitos classificatórios», situações individualizáveis como constitutivas de uma classe, isto é, uma soma de acontecimentos substancialmente idênticos (Rogério Soares). Por seu lado, o conceito de empreendimento ou projecto de manifesto interesse para a economia nacional assume a natureza de um conceito indeterminado em sentido estrito, onde poderá existir lugar para uma «margem de apreciação» por parte da Administração (Bachof-Beurteilungsspielraum) ou mesmo uma «prerrogativa de avaliação» a cargo da Administração (Einscheetzungspraerogative).

De qualquer forma, cada vez é mais maioritária a corrente doutrinária que, com base no princípio da separação de poderes, vê no poder discricionário um campo de reserva da Administração, não o subtraindo ao direito, mas sim à sua plena judicialidade (Vieira de Andrade).

Isto vale por dizer que não pode a Administração, com base em abstractas invocações do princípio da igualdade, autovincular-se de acordo com praxes administrativas ou directivas de comportamento. Entre nós, como na França, por exemplo, sempre se considerou que, quando a lei atribui à Administração um poder discricionário, impõe que a sua utilização não seja predeterminada, antes pressuponha uma análise casuística de subsunção do direito a cada caso concreto. Será, por isso, ilegal uma autovinculação da Administração, porque significa a não utilização do poder discricionário pretendido pela lei (Sérvulo Correia).

Do exposto se retira que, ao ser atribuído à Administração o poder discricionário de conceder ou não o aval do Estado verificados certos pressupostos, deixados também pela lei à apreciação da Administração, não pode esta deixar de examinar cada caso concreto, rejeitando a discricionariedade querida por lei, com base na invocação de pretensos precedentes administrativos que a não podem vincular com a mesma força da lei. Principalmente quando, como vimos, o princípio da igualdade adoptado pela nossa Constituição exige uma igualdade material e não apenas formal; exigindo discriminações quando as situações sejam diferentes.

Em conclusão, não se pode retirar deste argumento, da força conformativa para a Administração dos princípios da igualdade e da imparcialidade, razões para incluir a UGT no conceito de empresa próprio da Lei n.° 1/73, nem sequer como entidade a ela equiparável.

Pelo que temos de concluir que o despacho n.° 112/97--XIII do Ministro das Finanças, que concedeu o aval do Estado à UGT, viola a base i da Lei n.° 1/73.

b) Conformidade com a base n da Lei n.81/73

1 — Os requisitos para a concessão do aval do Estado constantes da base n, que aqui agora interessa analisar, restringem-se aos constantes do seu n.° 1, tal como a questão foi colocada pela resolução que criou a presente

Comissão [n.° 2, alínea b)). Além de que tivemos já oportunidade de nos referirmos ao seu n.° 2, tendo visto que a UGT nele se não enquadrava.

No n.° 1 da base n da Lei n.° 1/73 exige-se que o aval apenas seja prestado a financiamentos de empreendimentos ou projectos reconhecidos de manifesto interesse para a economia nacional, ou em que o Estado tenha participação, além de que se deve assegurar a imprescindibilidade do aval para o financiamento.

2 — O projecto em causa consubstancia-se nas acções de formação profissional levadas a cabo pela UGT até finais de 1996. Entendeu o Ministro das Finanças, no despacho n° 122/97-XIII em exame, que tais acções de formação profissional «permitiram aumentar a qualificação profissional dos trabalhadores e propiciaram novas oportunidades de emprego para milhares de formandos, contribuindo desta forma para a redução do desemprego». Considerou, assim, tais acções de «manifesto interesse para a economia nacional», até porque, referiu, os objectivos atingidos com essas acções constituem interesses constitucionalmente protegidos [artigo 58.°, n.° 2, alínea a)], sendo tarefas do Estado.

Todavia, há aqui a referir, como nota distintiva, que as acções de formação profissional já haviam cessado na altura da concessão do aval, tratando-se, por isso, de garantir o financiamento destinado ao pagamento de dívidas ocasionadas pela promoção dessas acções, e não destinado a empreendimento a iniciar. Generosamente, contudo, uma vez que não se encontra na Lei n.° 1/73 nenhuma limitação quanto ao momento de efectivação do empreendimento, será admissível considerar que podem ser subsumidos na base n empreendimentos pretéritos e ou futuros.

3 — Refrescando argumentos utilizados na parte final da questão anterior, diremos que estamos aqui em presença de um conceito indeterminado em sentido estrito onde se admite uma margem de apreciação ou mesmo uma prerrogativa de avaliação à Administração. O conceito em exame vai exigir da Administração um determinado juízo de prognose, isto é, um raciocínio através do qual se avalia a capacidade para uma actividade futura (Sérvulo Correia) no caso de empreendimentos ainda não iniciados, ou uw» mero juízo de valoração da situação pretérita à previsão normativa.

No caso em exame podíamos aceitar a tese de Ule de que não deve ser recusada a solução dada pela Administração enquanto for defensável que eia cai no quadro legal. O que nos parece possível de aceitar ser aqui o caso.

4 — Quanto às restantes questões constantes do n.° I da baseii da Lei n.° 1/73 diremos que não se aplica o segmento da previsão da norma relativa à participação estatal no empreendimento, pois tal participação não se verifica in casu, a não ser que se tenha por verificado pela atribuição da parte nacional óo Fundo Social Europeu (FSE).

5 — No que se refere à imprescindibilidade do aval, tudo leva a concluir que sem ele a CGD não tinha financiado a UGT. Como afirmou o Dr. João Salgueiro, na audição à- Comissão, a CGD sempre exigiria utwa garantia suficiente como condição necessária para a realização do empréstimo. Ora, foi face à inexistência de património livre que a UGT solicitou o aval ao Esiado. A este respeito refira-se, ainda, que o Ministro das Finanças declarou na Comissão de Inquérito ter confirmado ^unto da CGD (do seu presidente) da imprescindibilidade do aval