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Sexta-feira, 17 de Novembro de 2000 II Série-C - GOP-OE - Número 6

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO

Reunião de 16 de Novembro de 2000

S U M Á R I O


A Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite) abriu a reunião às 10 horas.
Em continuação do debate, na especialidade, das propostas de lei n.os 47/VIII - Grandes Opções do Plano Nacional para 2001 e 48/VIII - Orçamento do Estado para 2001, usaram da palavra, sobre o orçamento do Ministério da Juventude e Desporto, além do Sr. Ministro (Armando Vara) e do Sr. Secretário de Estado da Juventude (Miguel Fontes), os Srs. Deputados Hermínio Loureiro (PSD), Bernardino Soares (PCP), Dinis Costa (PS), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Manuel Moreira (PSD), Margarida Botelho (PCP), Laurentino Dias (PS), António Pinho (CDS-PP), Carlos Marta (PSD) e José Alberto Fateixa (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública, usaram da palavra, além do Sr. Ministro (Alberto Martins) e do Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa (Alexandre Rosa), os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira (PS), Arménio Santos (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Luís Marques Guedes (PSD) e Rodeia Machado (PCP).
Sobre o orçamento do Ministério da Economia, intervieram, além do Sr. Ministro (Mário Cristina de Sousa) e dos Srs. Secretários de Estado Adjunto do Ministro da Economia (Vítor Santos), Adjunto e do Orçamento (Fernando Pacheco), das Pequenas e Médias Empresas, do Comércio e dos Serviços (Ângelo Rosário de Sousa) e do Turismo (Vítor Neto), os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira (PS), António Pires de Lima (CDS-PP), Hugo Velosa (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Manuel Moreira (PSD), Cândido Capela (PCP) e Machado Rodrigues (PSD).
Sobre o Ministério da Administração Interna, usaram da palavra, além do Sr. Ministro (Nuno Severiano Teixeira), os Srs. Deputados Rodeia Machado (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Francisco Torres (PS), Miguel Macedo (PSD), Joaquim Matias (PCP), António Dias Baptista (PS), Manuel Moreira, Fernando Costa e Guilherme Silva (PSD), Maria Celeste Correia e Menezes Rodrigues (PS).
Acerca do orçamento do Ministério da Justiça, usaram da palavra, além do Sr. Ministro (António Costa) e dos Srs. Secretários de Estado Adjunto (Eduardo Cabrita) e da Justiça (Diogo Machado), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Joaquim Sarmento (PS), António Pires de Lima (CDS-PP), Guilherme Silva (PSD), Narana Coissoró (CDS-PP) e Manuel Moreira (PSD).
A Sr.ª Presidente encerrou a reunião eram 00 horas e 15 minutos.

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A Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas.

Srs. Deputados, vamos dar início à discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Juventude e do Desporto. O Sr. Ministro da Juventude e do Desporto já fez uma exposição genérica sobre o orçamento do seu Ministério em sede de Comissão de Juventude e Desporto, pelo que vamos simplesmente registar as questões que os Srs. Deputados queiram colocar-lhe.
Começo por dar a palavra ao Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, a primeira questão que quero colocar em relação ao orçamento do Ministério da Juventude e do Desporto é a de saber se o Sr. Ministro tem condições para poder afirmar aqui hoje que, com este orçamento, o Sr. Ministro e o seu Ministério vão cumprir todos os compromissos assumidos, a tempo e horas, com o movimento associativo, ou seja, se este orçamento dá a garantia de que não vão existir mais atrasos, de que as federações não vão ter mais razões de queixa acerca do incumprimento dos contratos-programa por parte do Governo, enfim, se este orçamento garante o cumprimento dos protocolos que V. Ex.ª não assinou, mas que assumiu em nome do Governo.
Gostava também de perguntar-lhe, Sr. Ministro, se, entre a discussão em sede de Comissão de Juventude e Desporto e a discussão, agora, em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano, já pensou em algo para a preparação dos Jogos Olímpicos de 2008.
O Sr. Ministro, na Comissão de Juventude e Desporto, disse-nos que tinha verbas inscritas para a preparação dos Jogos Olímpicos de 2004 e o PSD sugeriu-lhe a preparação, desde já, das Olimpíadas de 2008, pelo que gostaria de saber se é ou não intenção do seu Ministério preparar as Olimpíadas de 2008. É que se for só para as de 2004, tal como está previsto, vamos, com certeza, em 2004, estar novamente aqui a falar de resultados menos positivos e de um menor empenhamento.
Gostava também de dizer-lhe, Sr. Ministro - já agora, aproveitando esta oportunidade -, que fiquei satisfeito por ver que o Sr. Ministro, na primeira oportunidade que teve, depois da discussão do orçamento na Comissão de Juventude e Desporto, falou com alguma ambição em termos de política desportiva.
É que o Sr. Ministro demonstrou algum espanto quando o PSD lhe falou na ambição desportiva para 2012 e 2016, mas o Sr. Ministro, na primeira oportunidade pública que teve logo a seguir a essa discussão, falou sobre essa matéria, referindo que o Governo estava a conversar com algumas câmaras municipais, apesar de, julgo, o Sr. Ministro só ter falado na Câmara Municipal de Lisboa.
A este propósito, aproveito para dizer-lhe que valia a pena não haver aqui um critério de excepção: é que, quando se prepara uma candidatura a umas Olimpíadas, não se deve falar só com a Câmara Municipal de Lisboa, mas com todos os autarcas. Sei que a candidatura tem de ser de uma cidade, mas penso que aqui está a haver algum benefício de Lisboa relativamente às outras cidades, que não me parece bem.
Depois, Sr. Ministro, gostava de saber quais são, no orçamento, as verbas disponíveis para o apoio a eventos internacionais. O Euro 2004 é para onde este orçamento prevê uma grande parte da sua verba destinada à organização de eventos internacionais. Porém, ainda recentemente, tive oportunidade de falar com um presidente de uma federação que está a organizar um campeonato do mundo em Portugal, que quer que seja realizado em Portugal, mas que ainda não tinha recebido, até à data, nenhum apoio, nenhum sinal, por parte do Governo. Refiro-me concretamente à Federação Portuguesa de Andebol, mas não fico só pelo andebol, porque também o hóquei em patins está a preparar um campeonato do mundo para 2003 e, até ao momento, que eu saiba, o Governo ainda não deu qualquer sinal positivo para a realização desses eventos internacionais.
Portanto, Sr. Ministro, quero dizer-lhe que esta política de apoio aos eventos internacionais não pode esgotar-se no Euro 2004.
Sr. Ministro, quero também perguntar-lhe se já tem alguma ideia que nos possa aqui adiantar hoje sobre a forma como o Governo vai dar o apoio à criação de melhores instalações desportivas. Ficou vago, em sede de Comissão de Juventude e Desporto, este apoio do Governo: as candidaturas vão ser feitas pelos clubes, pelo movimento associativo, pelas câmaras municipais ou pelas associações de municípios? Como vão ser as regras? Como é que isso vai ser feito?
Há ainda uma outra questão, que se prende com o apoio à formação e ao reconhecimento dos dirigentes desportivos. O Sr. Ministro tem referido que é preciso apoiar, é preciso reforçar o apoio. Porém, pergunto-lhe: como está a pensar fazer isso, se reduz as verbas no orçamento? Ou seja, se há uma redução de verbas no orçamento para esta matéria, como é que o Sr. Ministro estimula o bom desempenho, como é que faz formação? Como é que vai resolver esse problema?
Uma outra questão prende-se com as verbas inscritas para o Euro 2004. Gostava de saber se o Sr. Ministro já está em condições de informar a Assembleia da República sobre como vai ser a questão das acessibilidades.
O Sr. Ministro, na Comissão de Juventude e Desporto, disse-me que o seu Ministério estava a fazer um trabalho final para saber aquilo que correspondia a acessibilidades devidas ao Euro 2004 e o que não eram acessibilidades respeitantes ao Euro 2004. Julgo que, como o Sr. Ministro disse que, se calhar, naquele próprio dia, esse trabalho final estaria concluído, o Sr. Ministro estará hoje, com certeza, em condições de informar a Assembleia da República sobre quais são os montantes para as acessibilidades do Euro 2004, em termos de orçamento.
E, já agora, porque estamos a falar de verbas e de orçamento, gostaria também de saber quais são as verbas disponíveis para o parqueamento tendo em vista o Euro 2004. Temos visto e lido muita contra-informação e algumas entidades promotoras adiantam-se ao Sr. Ministro... Bem sei que, com certeza, a responsabilidade não é sua, mas nós continuamos à espera de uma explicação - e ela tem de ser dada por si, Sr. Ministro - sobre como vai ser o financiamento dos parques de estacionamento.
Uma última questão prende-se e vem na sequência da discussão que tivemos em sede de Comissão de Juventude e Desporto, onde o Sr. Ministro manifestou alguma preocupação - senti isso, mas posso estar enganado - pelo mau momento que atravessa o desporto na escola.

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Aliás, o Sr. Ministro já prometeu apresentar na Assembleia da República, durante o próximo trimestre, um programa de desenvolvimento da actividade desportiva.
Assim, gostava de saber, com este orçamento que tem para o desporto, o que está a pensar fazer em termos de desporto na escola. Está a pensar em tutelar o desporto na escola? Está a pensar em fomentar, em incentivar… Bem sei que essa é, com certeza, a sua vontade, porque nós não conseguimos ter uma efectiva política desportiva, se estas duas situações estiverem separadas.
Portanto, sabendo eu a vontade que tem de fazer algo mais do que aquilo que tem feito até agora - porque, Sr. Ministro, julgo que o senhor tem sido uma "caixa registadora", ou seja, o senhor só tem assumido os compromissos de outros seus antecessores e, neste momento, só anda a pagar (e sinto alguma incomodidade da sua parte, porque o senhor, tendo também tido experiência nos bombeiros, pois teve essa tutela no anterior Governo, anda a "apagar incêndios", ou seja, o senhor anda a resolver os problemas pontuais do movimento associativo, o que, com certeza, é algo incómodo para si) -, gostaria de saber como é que o Sr. Ministro pensa resolver este problema.
Nesta primeira fase, eram estas as minhas perguntas. Se tiver mais alguma dúvida, farei outras perguntas.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Juventude e do Desporto.

O Sr. Ministro da Juventude e do Desporto (Armando Vara): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hermínio Loureiro, vou procurar responder, tão rápido quanto possível, a todas as questões que me colocou.
Em primeiro lugar, quero dizer-lhe que, do nosso ponto de vista, o orçamento ajudará a garantir todos os compromissos assumidos, não tenho disso a menor dúvida. Se tivermos em conta que só o IND vai gerir um orçamento na ordem dos 18 milhões de contos para o próximo ano, talvez isso seja suficiente para dar conta da dimensão dos meios de que dispomos para o futuro. Eles são, no que tem a ver com o IND, sensivelmente iguais aos do ano em curso…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - São menos 100 000 contos!

O Orador: - Se tivermos em conta que o Desporto passa a estar integrado, juntamente com a Juventude, num único Ministério, portanto, com capacidades até, desse ponto de vista, de fazer uma gestão dos recursos que estão afectos ao Ministério de maneira relativamente diferente, nós temos uma margem de manobra que vai permitir-nos, ao longo do ano, fazer a gestão do orçamento, como o fazem a generalidade dos ministérios, fazendo transferências de um lado para o outro, se for necessário, e reforçando ou diminuindo cada um dos programas em função da sua execução.
Portanto, não tenho qualquer preocupação especial de carácter orçamental. Sei também que a decisão de constituir o Ministério implica agora que tenhamos um espaço para a própria construção do Ministério - portanto, o ano de 2001 será também um ano da construção do Ministério. E, com um conjunto de decisões já tomadas, vamos ainda, durante o ano de 2001, aumentar os meios do Ministério.
Dou-lhe um exemplo muito importante para a área do desporto, que tem a ver com o facto de haver alguns programas dispersos por vários ministérios que, ao longo do ano, com os instrumentos jurídicos necessários para isso, vão concentrar-se no Ministério da Juventude e do Desporto: um deles, já decidido, tem a ver com um programa que hoje ainda corre, tem corrido sempre, no Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território e que passará para o Ministério da Juventude e do Desporto, o que implicará que cerca de 1,5 a 2 milhões de contos de um programa de apoio à construção de equipamentos desportivos passe também para o Ministério, o que nos permitirá uma gestão mais integrada - e espero também que, por essa via, mais racional - dos recursos de que dispomos.
Portanto, não tenho qualquer preocupação. Naturalmente, toda a gente gostava de ter mais meios - isso resulta da vida e das necessidades que "batem à porta" do Ministério -, mas estou seguro que vamos conseguir fazer uma gestão que honre os compromissos e que, além disso, não se fique apenas pelo honrar dos compromissos assumidos.
De facto, nós queremos lançar um conjunto de programas e verá que vai ter algumas surpresas. Até posso referir-lhe já uma, que, a nosso ver, é bastante importante: queremos lançar um programa de modernização da generalidade dos clubes desportivos e associações recreativas e de juventude e estamos a trabalhar numa parceria com o Ministério da Ciência e da Tecnologia com o objectivo de, durante o próximo ano, iniciarmos um grande projecto de modernização na área da informação e das novas tecnologias.
Assim, esperamos que as cerca de mais de 10 000 associações com estas características que existem no País, possam, já no próximo ano, pelo menos em um terço delas, entre 3000 ou mais, vir a ter acesso a esse programa, possa ser-lhes fornecido equipamento informático, o software respectivo e formação às pessoas dessas associações que vão funcionar com o sistema informático, tendo como contrapartida da parte dessas associações a ligação à Internet, para que, em todo o País, possa também desenvolver-se a nossa ideia de que Portugal será um país mais desenvolvido e mais capaz se, em todas as partes do território e em todos os sectores de actividade, a aposta na Internet for uma aposta certa.
Isso vai ser feito em parceria com o Ministério da Ciência e da Tecnologia, vamos ter para isso verbas do fundo comunitário e, portanto, isso vai acrescentar também ao que aqui está.
Podia dar-lhe exemplos de outros programas, mas, a seu tempo, teremos condições para falar sobre eles.
Depois, o Sr. Deputado falou nos Jogos Olímpicos, na ambição demonstrada para 2012 e que essa ambição teria sido resultado das preocupações e da ambição demonstrada pelo PSD. Ó Sr. Deputado, não tinha eu ainda falado com ninguém do PSD sobre esta matéria e, em Sidney onde tive de me deslocar, logo três ou quatro dias depois de ter tomado posse, em representação de Portugal a acompanhar a nossa delegação aos Jogos Olímpicos, tive logo a noção de que se tratava de uma área em que era preciso pensar e também tive logo a noção de que o dossier é de tal responsabilidade que não dá para "fazer um número"... Pensar numa candidatura de Portugal aos Jogos Olímpicos não é um número - quer dizer aquilo que vulgarmente se designa por "fazer um número" -, é algo

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de muito sério, com muita responsabilidade para o País, que exige que se pense, que se fale, que se saiba a opinião dos protagonistas.
Portanto, o que estamos a fazer nesta fase é exactamente isso e espero que, muito brevemente, em colaboração com as estruturas do mundo do desporto, que também têm a ver com essa matéria, possamos tomar decisões que envolvam o movimento desportivo, as autarquias, o País.
O Sr. Deputado disse que só tenho falado com a Câmara Municipal de Lisboa; não é verdade, Sr. Deputado, não tenho falado apenas com a Câmara Municipal de Lisboa. A minha preocupação nessa matéria é falar com o País, porque se houver uma candidatura, essa candidatura terá de ser do País, devendo ser, embora, como se sabe, apresentada por uma cidade.
Quanto aos eventos internacionais, vamos continuar a seguir a estratégia que vinha de trás, lançada pelos meus antecessores, de transformar Portugal num palco de grandes acontecimentos internacionais na área do desporto. E digo na área do desporto, porque é a que a nós mais compete, mas esse objectivo tem também a ver com outras áreas, e, para isso, estamos a desenvolver esforços e a apoiar candidaturas.
Numa próxima oportunidade, vou trazer-lhe a relação dos eventos internacionais que vão realizar-se em Portugal entre 2000 - enfim, 2000 está quase no fim e já se realizaram alguns, mas ainda há um, muito importante, que vai realizar-se no final deste mês e nos primeiros dias de Dezembro, que é o Tennis Masters Cup - e 2004 e o Sr. Deputado vai ficar impressionado com o número de eventos internacionais, que, nesse período, estão previstos para Portugal, nomeadamente campeonatos europeus e mundiais das mais diversas modalidades vão ter aqui palco e isso representa um investimento impressionante por parte do Governo.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - E do movimento associativo, em primeiro lugar!

O Orador: - Sim, também do movimento associativo, mas acrescento-lhe: não quero saber se é em primeiro ou em segundo lugar; o que posso dizer-lhe é que, se não houvesse Governo por detrás desses eventos, não havia movimento associativo capaz de, só por si, realizá-los em Portugal.
Para mim, o que é importante é que eles se realizem cá e que ajudem a promover o País. Nós estamos cá, na retaguarda, para os ajudar, para ajudar o movimento associativo a ser capaz. Se os louros vão para o Governo ou para o movimento associativo, isso não me preocupa; o que me interessa é que os louros vêm para Portugal e se determinados eventos se realizarem cá, Portugal ganha com isso.
Por exemplo, no caso do Tennis Masters Cup, foi a iniciativa privada que tomou a seu cargo a candidatura a uma iniciativa destas e o Governo fez o que lhe competia, que foi garantir à empresa que trouxe para cá o evento, quando se candidatou, que, se, porventura, fosse ganha essa candidatura, teria a cobertura indispensável, desde logo financeira, para que isso acontecesse. E estamos a falar de muitas centenas de milhar de contos só para esse evento, o que, no conjunto, ultrapassa, em muito, 1 milhão de contos. Portanto, não há qualquer problema em relação aos meios.
Por outro lado, vamos também inovar um pouco nessa matéria. Acho que o Ministério da Economia deve estar associado ao Ministério da Juventude e do Desporto, na promoção e no apoio a esse tipo de eventos, pelo que já tive uma conversa com o Sr. Ministro da Economia, no sentido de, entre o IND e o ICEP haver colaboração, porque tudo isto tem muito a ver com a imagem de Portugal no mundo e promove um conjunto de novas oportunidades para as empresas portuguesas, que é útil ter em conta.
Portanto, também nesta área, vamos passar a olhar para este dossier não apenas na sua componente desportiva mas também na sua componente económica e financeira, procurando parcerias, mesmo ao nível dos diversos departamentos do Governo, para que as candidaturas tenham sucesso. E, felizmente, estão a ter, porque, de facto, os nossos dirigentes federativos, também por esta via, também ao terem condições para se candidatar à realização de eventos, vão ganhando um protagonismo internacional qualitativamente diferente. Aí, não há, pois, qualquer problema.
Porém, se há um outro ou outro dirigente federativo, como o Sr. Deputado referiu, que diz nada saber, a única coisa que posso dizer-lhe é que se, em vez de terem falado consigo, tivessem falado comigo, se calhar, já sabiam de mais alguma coisa. É que, de facto, não tenho conhecimento de nenhum caso de candidatura internacional em que tenham pedido apoio ao Governo e possam dizer que de nada sabem… E eu, como sabe, ainda estou há pouco tempo nesta função, mas uma das minhas primeiras preocupações foi esta: garantir a todos que uma candidatura internacional para qualquer modalidade, desde que seja consistente, tem o apoio do Governo, tem o apoio do País, porque isso é importante para Portugal.
Portanto, fico muito admirado e a única coisa que me ocorre é dizer que, se, em vez de terem falado consigo, esses dirigentes federativos tivessem falado comigo, já saberiam alguma coisa. Nada mais posso acrescentar, porque os problemas que havia já foram resolvidos e relembro que havia algumas dificuldades em relação ao atletismo, resultantes de vultosos investimentos que é preciso fazer nas estruturas necessárias para o evento, mas isso está resolvido - aliás, hoje mesmo, ou amanhã (não tenho a certeza, porque, enfim, não tenho a agenda toda na cabeça), vão ser acertados os últimos pormenores em relação ao mundial de pista coberta, portanto não vejo que aí haja qualquer problema.
No que respeita ao apoio a infra-estruturas, quem concorre concorre, podem concorrer as associações de municípios, os municípios e as associações privadas - aqui não há qualquer problema em relação a isso -, quer ao Quadro Comunitário de Apoio quer aos apoios que o Governo tem em termos de PIDDAC.
Depois, perguntou-me o Sr. Deputado, como é que vão ser as acessibilidades. As acessibilidades, vão ser como eu já havia dito na altura em que falámos neste assunto: há um plafond definido para as acessibilidades que tem como limite a verba de 12 milhões de contos. Na altura em que falámos - penso que foi na discussão, na generalidade - não tínhamos ainda um ponto da situação completo sobre o dossier, porque as câmaras apresentaram candidaturas da ordem dos 40 milhões de contos para esse programa.
Entretanto, foi feita uma separação, digamos assim, do que é que compete a cada autarquia e precisou-se, a cada

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uma das autarquias, os contornos da resolução do Conselho de Ministros, que tem a ver apenas, como na altura também referi, com as obras em espaço de jurisdição municipal.
Assim, neste sentido, já estão programadas várias reuniões com os clubes e com as câmaras e posso adiantar-lhe, desde já, as seguintes: amanhã haverá uma reunião entre o Ministério da Juventude e do Desporto, o Ministério do Equipamento Social, a Câmara Municipal de Lisboa e o Sporting Clube de Portugal, para acertar o dossier Sporting; na segunda-feira, de manhã, teremos reuniões no Porto, com a Câmara Municipal do Porto, o Futebol Clube do Porto e o Boavista Futebol Clube; na segunda-feira, à tarde, teremos reuniões com a Câmara Municipal de Braga e com a Câmara Municipal de Guimarães para acertar, em cada um dos casos, o dossier relativo a cada um desses clubes e câmaras; e assim sucessivamente.
Portanto, provavelmente, o dossier Sporting ficará fechado na sexta-feira, os outros que mencionei ficarão fechados na segunda-feira, e espero que os relativos às restantes câmaras e clubes sejam fechados ao longo da próxima semana. Porquê? Porque depois de termos definido o que é que entra no espírito da resolução e aquilo que já é, naturalmente, responsabilidade do Estado, ainda há algumas áreas que não estão suficientemente explicitadas e isto faz parte daquele trabalho que é preciso que a administração central, as câmaras e os clubes façam para que as coisas corram bem.
Logo que o dossier esteja fechado vamos trazê-lo, aqui, e explicar, convenientemente e com toda a clareza, aos Srs. Deputados, quais foram as responsabilidades que o Estado assumiu em relação a essa matéria.
Por conseguinte, não há qualquer atraso, não há qualquer problema, tudo tem corrido bem; há apenas acertos a fazer, porque a administração central, no que tem a ver com a parte das estradas, pensa que algumas das obras que foram propostas carecem de uma ou outra especificação. Por isso, vamos fazer essa especificação e, provavelmente, no período de uma ou duas semanas, no máximo, estaremos, aqui, convosco para vos dar toda a informação.
Tive, aliás, oportunidade de falar com o presidente da comissão que acompanha o dossier Euro 2004 e pareceu-nos bem, e ele a mim também, que deixássemos passar a fase de discussão do orçamento, para logo a seguir podermos tratar da matéria relativa ao Euro 2004 mais aprofundadamente.
Em relação à questão do estacionamento, ela não está ainda decidida, porque não há uma pressa muito grande em relação a isso.
Nós já temos os montantes e já sabemos o que pode implicar cada uma das decisões que tomarmos sobre isso. Neste momento, já tenho em meu poder um dossier que diz quais são as responsabilidades que teremos de assumir em função das decisões que tomarmos; diz-nos que se optarmos pela solução a as responsabilidades são x; se optarmos pela solução b as responsabilidades são y. Mas não havendo ainda uma decisão, porque estou a procurar trabalhá-la com as câmaras e com os clubes envolvidos, também poderemos falar mais, em especial, sobre isso depois.
Apenas para terminar, queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que não tenho qualquer pretensão de tutelar o desporto escolar; a única pretensão que tenho nesta área é a de criar condições para que tenhamos uma coordenação eficaz entre aquilo que me parece ser o triângulo-chave do problema, isto é temos de ser capazes de criar uma coordenação entre o desporto escolar, as autarquias e o movimento federado que dote o sistema de eficácia.
Penso que aí existem alguns problemas que temos de resolver e estamos a procurar uma solução para isso no âmbito do tal plano de médio e longo prazo de que lhe falei, que inclui diversas possibilidades de desenvolvimento e que a seu tempo também espero trazer aqui.
Portanto, não há qualquer pretensão de tutela, nem qualquer incomodidade da minha parte por ter procurado que este primeiro período do meu mandato fosse um período de honrar compromissos. Penso que isso é essencial. Quem "chega" tem de honrar os compromissos que foram assumidos pela pessoa que "saiu", o que acontece não apenas em relação à mudança de ministros mas também em relação à mudança de governos, mesmo quando saídos de eleições.
Há orientações, há decisões que não podem ser alteradas apenas porque há uma mudança de governo ou de ministro; os compromissos são do Estado e têm de ser honrados pelos seus diversos protagonistas.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, se for para fazer outra intervenção não lha posso dar.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Não é para uma intervenção, Sr.ª Presidente.
Se me desse licença, gostaria de levantar apenas uma questão sobre uma pergunta concreta que fiz ao Sr. Ministro da Juventude e do Desporto, à qual ele não respondeu, talvez por esquecimento, e que se prende com o apoio à organização de eventos internacionais.
Perguntei-lhe concretamente sobre as Federações Portuguesas de Andebol e de Hóquei em Patins, mas o Sr. Ministro respondeu-me, de uma forma vaga, dizendo que apoia todos os eventos internacionais e lembro que estamos a falar de candidaturas que têm de ser feitas agora.
Sei que o Sr. Ministro lê os jornais, porque, de vez em quando, diz que teve conhecimento de algo através dos jornais, e como também já é público o descontentamento destas duas federações relativamente ao apoio do Governo, gostaria de saber se nos pode adiantar alguma coisa sobre este assunto e penso que só não o fez por esquecimento.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Juventude e do Desporto, para responder.

O Sr. Ministro da Juventude e do Desporto: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hermínio Loureiro, não foi por esquecimento que não falei nesse assunto; não conheço esses problemas e não tenho de ter conhecimento deles pelos jornais.
Se as pessoas em questão tivessem falado comigo em vez de falarem com o Sr. Deputado, nós já teríamos resolvido os problemas.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Eles não falaram comigo; eu leio os jornais!

O Orador: - Não tenho conhecimento de qualquer tipo de problema.

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Não sei se está tudo bem, mas se não está comuniquem-me os problemas e procurarei resolvê-los! Pelo jornal é que não…!

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Soares, tem a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, devo dizer que a resposta que o Sr. Ministro acabou de dar, nos deixa, em algumas questões, com uma preocupação ainda maior do que a que tínhamos em relação à influência que o investimento no Euro 2004 terá no restante investimento desportivo.
Desde logo porque o Sr. Ministro, quando respondeu à pergunta sobre se estão assegurados os meios para honrar os compromissos que o Governo assumiu em relação ao Euro 2004, fez referência aos cerca de 18 milhões de contos do IND - de facto, é uma verba inferior à que estava inscrita no ano passado e tem um decréscimo real se tivermos em conta em inflação.
A primeira referência que o Sr. Ministro fez para garantir que há dinheiro para os investimentos no Euro 2004 é o orçamento do IND, do que se depreende que podem estar em risco outros compromissos e outras missões que o dinheiro do IND tem de assegurar, os quais, pelos vistos, não estarão tão assegurados quanto isso.
Depois, a segunda resposta que o Sr. Ministro deu a essa preocupação dos Deputados do PSD foi a seguinte: como o Ministério, agora, é da Juventude e do Desporto, o Governo tem toda a liberdade para transferir dinheiro dos vários organismos deste Ministério, por isso pode assegurar os investimentos que forem necessários para o Euro 2004.
Isto leva-me a ter uma preocupação ainda maior: será que, por exemplo, o investimento que está previsto para a área da juventude também estará disponível, se o Governo assim entender, para acudir às necessidades do Euro 2004? Esta é uma pergunta óbvia, tendo em conta a resposta que o Sr. Ministro deu!
O Sr. Ministro disse que, porque foi constituído o Ministério da Juventude e do Desporto, o Governo tem uma maior possibilidade e flexibilidade para utilizar todos os recursos deste Ministério e fazer as transferências que forem necessárias. Quero saber quais são as transferências que o Governo admite nesta matéria.
Numa sua intervenção pública, o Sr. Ministro garantiu que, nos próximos seis anos, serão investidos 100 milhões de contos no desporto.
Procurei o investimento previsto para o desporto, para o ano 2001, e constatei que é de 9 milhões de contos; é esse o montante que está previsto, grosso modo, para o IND. Portanto, pergunto-lhe se podemos esperar um crescimento muito grande desta verba, nos próximos cinco anos, de forma a chegarmos aos tais 100 milhões de contos. Ou então, gostava que o Sr. Ministro explicasse como é que compõe este número, porque me parece que, aqui, há qualquer coisa que não está a bater certo, mas admito que até seja por falta de informação da nossa parte.
Outra questão que também não foi respondida quando fizemos a discussão, na generalidade, é a seguinte: quanto dinheiro vai ser utilizado, concreta e definitivamente - pelo menos no orçamento para 2001 -, pelo Governo no investimento para o Euro 2004 e de onde vai sair esse dinheiro? De facto, o Sr. Ministro não respondeu concretamente a esta questão, aquando da última reunião que tivemos na Comissão de Juventude e Desporto.
Resumindo, nós queremos que nos responda ao seguinte: de onde vai sair o dinheiro para os parques de estacionamento? Vai haver uma linha de crédito bonificado? Quem vai pagar e quando os encargos com essas bonificações? Vai haver uma linha de crédito sem qualquer tipo de juros, como alguns presidentes de clubes referiram? E de onde vai sair o dinheiro para todos os outros investimentos que têm vindo a ser referidos no âmbito do Euro 2004?
Fazemos estas perguntas, porque é preciso que a Assembleia da República tenha um conhecimento rigoroso e completo de tudo quanto o Governo já assumiu ou vai assumir em relação a esta matéria, uma vez que só assim podemos avaliar a aplicação dos dinheiros públicos no investimento do Euro 2004. O Governo não pode negar à Assembleia esta informação e não pode impedir que tenhamos uma avaliação mais completa e real do que é o investimento público no Euro 2004.
A outra questão que quero colocar tem ainda a ver com a diminuição das verbas de funcionamento e de investimento do IND.
Sabendo nós que as verbas de funcionamento do IND diminuem e que uma parte delas tem a ver com os contratos-programa e com o financiamento das federações desportivas, será que o apoio às federações está garantido ou os apoios dos anos transactos vão ser repetidos?
Faço-lhe esta pergunta, porque a verba que está inscrita, tendo em conta o apoio às federações, diminuiu este ano em relação à do ano passado: era de 5,884 milhões de contos, em 2000, e, para o ano de 2001, segundo a proposta do Governo, será de 5,134 milhões de contos.
Uma vez que já ouvimos tantas queixas e dificuldades - as quais julgo não serem todas mentira, embora algumas delas venham nos jornais - sobre a falta de financiamento e a falta de financiamento atempado, mesmo em relação aos contratos-programa já assinados, quanto mais às necessidades que estão para além deste contratos, pergunto-lhe se não devemos ficar preocupados com esta diminuição da verba para as federações desportivas que são quem, no fundamental, como o Sr. Ministro sabe, assegura a prática desportiva no nosso país, a qual está muito aquém daquilo que seria desejável junto da nossa população, mas que, desta forma, não vê garantido um futuro mais radioso, digamos assim.
Gostava ainda de lhe fazer uma pergunta que não é do seu tempo como Ministro desta pasta, mas é uma questão que tem sido colocada aquando da discussão de outros orçamentos do Estado, portanto também a quero colocar aqui. A pergunta tem que ver com a dependência, muitas vezes invocada, embora pense que tecnicamente a questão não pode ser posta nestes termos, que as verbas para as federações terão relativamente à eventual realização de determinadas receitas das apostas mútuas.
Noutros orçamentos esta dependência foi-nos apresentada nos seguintes termos: o dinheiro para as federações desportivas será concretizado se forem concretizadas as receitas previstas das apostas mútuas, o que, para além da exiguidade das verbas, é uma situação preocupante, uma vez que elas são incertas e podem até, durante o ano, ter variações que não acompanhem as necessidades e os compromissos assumidos com as federações.

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Portanto, queria perguntar ao Sr. Ministro da Juventude e do Desporto se, em 2001, há esta dependência e se ela não põe em causa quer os compromissos assumidos quer a concretização das exíguas verbas para o apoio às federações desportivas.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Juventude e do Desporto.

O Sr. Ministro da Juventude e do Desporto: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, gostava de começar por responder à parte final da sua intervenção, para lhe dizer que, do nosso ponto de vista (e nós é que vamos ter de responder pela execução do orçamento e também perante as necessidades do movimento associativo e as insuficiências, ou não), repito, não vejo motivos para a existência de preocupação em termos orçamentais.
O que referi, e que tanto o preocupou, sobre as transferências entre programas ou entre departamentos resulta da prática normal e da necessidade que, ao longo do ano, há sempre de adequar as dotações financeiras de cada programa ao seu próprio desenvolvimento.
Portanto, essa é uma questão que o Sr. Deputado pode levantar, aqui, no exercício normal do direito de oposição e do direito de, aqui, trazer também algumas preocupações, mas não é mais do que isso, porque o que vamos fazer é o que sempre se fez e nem seria razoável que fosse de outra forma.
Então, se um programa, por qualquer razão, não se desenvolver a tempo, por exemplo, uma obra que se lança em Janeiro e que, por qualquer razão, se atrasa, por tantas razões que todos sabemos (às vezes há atrasos no visto prévio, outras vezes na consignação, ou há outro problema qualquer ao longo da construção), que levam, por hipótese, a que no final do ano a verba que estava inscrita para essa obra só se tenha executado em 10%. Ora, quando isto acontece, o que é que qualquer Governo, qualquer Câmara Municipal, qualquer junta de freguesia ou qualquer empresa fazem? Agarram nessa verba e procuram aplicá-la onde ela faz falta no ano financeiro em causa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas o Sr. Ministro parece que já está a contar com isso!

O Orador: - Com certeza! Mas eu não sou idiota! Não hei-de contar com isso? Eu tenho 5 anos de experiência no Governo e sei muito bem como é que essas coisas se fazem!
O Sr. Deputado não tem essa experiência, portanto percebo bem que, aqui, venha colocar essa questão! Agora, quem está habituado a gerir dossiers desta natureza sabe que tem de fazer transferências e vai fazê-las!
Sabe também por que é que para nós é muito importante - e o Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território também compreendeu isso - que o dossier de apoio à construção de equipamentos desportivos, que está no Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, venha para o Ministério da Juventude e do Desporto? Porque acrescenta entre 1,5 a 2 milhões de contos a um dossier de características semelhantes.
Também quero dizer que a gestão conjunta desse dossier nos permite ter uma racionalidade diferente, correspondendo, de alguma forma, a uma reorganização dos serviços do Estado e a alguma reforma nesta matéria. Não vejo que daí haja problema e não é nossa intenção fazer transferências do IPJ para o IND, ou coisas assim.
Agora, vamos procurar, isso garanto-lhe, executar tão próximo quanto possível dos 100% o orçamento que temos, porque se não o fizéssemos o Sr. Deputado no próximo ano estaria, aqui, a dizer que não fomos capazes de executar o orçamento, uma vez que sobrou, por hipótese, dinheiro no sector b que deveríamos ter transferido para o sector c, mas não o fizemos, portanto não o gerimos bem. É nessa perspectiva que falo. Não há razão para ter preocupações, porque vamos procurar honrar todos os investimentos.
O Sr. Deputado disse que gostava de saber de onde vêm os 100 milhões de contos de que falei. Se leu bem as declarações - que fiz numa conferência da Universidade Técnica de Lisboa sobre economia e desporto - falei num investimento próximo dos 100 milhões de contos, mas não falei num investimento do Governo desse valor... Não sei como é que isso apareceu escrito.
Na altura, e até inserido na lógica de candidatura aos jogos olímpicos, disse, e é minha convicção, que nós, mantendo-se o nível de investimento que está a fazer-se, hoje, no sector desportivo, estaremos em condições para nos candidatarmos à realização dos jogos olímpicos em 2012, sem grande esforço adicional. Expliquei porquê, referindo, por exemplo, que nos próximos seis anos o investimento feito no desporto, em Portugal, rondará os 100 milhões de contos.
Eu disse ainda que o investimento do Quadro Comunitário de Apoio será de cerca de 45 milhões de contos; o investimento da componente nacional será de cerca de 15 milhões de contos; o que, juntamente com o esforço que as autarquias, os clubes e as empresas estão a fazer nesta matéria, lança para cerca de 100 milhões de contos o investimento feito, em Portugal, na área do desporto.
Aliás, devo dizer-lhe uma coisa, que, para mim, começa a ser evidente: o facto de a generalidade das autarquias, em Portugal, terem, hoje, o conjunto de infra-estruturas básicas (água, saneamento e caminhos) quase resolvido faz com que elas próprias estejam, agora, a investir em equipamentos, designadamente desportivos, um volume financeiro muito maior, o que quer dizer também que muitas autarquias começam a compreender que a componente desporto pode estabelecer a diferença entre um concelho e outro.
Foi ainda perguntado de onde vai sair o dinheiro para o Euro 2004, mas eu pensei que essa questão já estivesse esclarecida, pois já tivemos oportunidade de falarmos sobre ela.
Preocupa-me que, sempre que no Parlamento se fala no Euro 2004, se procure dar a ideia de que não há controlo orçamental ou que há um qualquer resvalar financeiro relativamente a esta matéria, o que não é uma posição boa nem para o próprio dossier, nem para a imagem que damos de nós próprios, nem para o País, na medida em que estamos sempre a criar a ideia de que o Estado, quando se envolve num determinado dossier, não é capaz de ser rigoroso na forma como gere os dinheiros públicos.
Em primeiro lugar, gostava de dizer-lhe que não há qualquer resvalar financeiro; uma coisa são os meios que o Estado vai envolver na renovação e construção de estádios, outra coisa são as obras que cada clube ou cada câmara municipal quer fazer.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas eu não me referi a isso!

O Orador: - Já vou à sua questão, Sr. Deputado!
Parece-me útil dizer isto porque a ideia que sempre fica é a de que há um descontrolo, o que não é verdade. Não há descontrolo algum, isto é, as verbas que os clubes vão receber para a construção e renovação dos estádios são as previstas nos protocolos e respeitam os termos de referência previstos. Há um dossier relativo às acessibilidades que está também balizado e, seguramente, haverá um terceiro dossier relacionado com o estacionamento que será também balizado com base nos mesmos termos de referência com que se chegou ao valor dos estádios.
Portanto, não há resvalar algum relativamente a esta matéria. Se o clube a ou b decidiu ir mais longe fico muito satisfeito, aliás, penso que todos deveríamos ficar satisfeitos, porque isso quer dizer que encontraram meios para fazer investimentos ainda mais vultosos em relação às infra-estruturas.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Eu fico satisfeito e preocupado!

O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado, mas, da nossa parte, não há preocupação em relação a isso, porque partimos sempre do princípio que estamos a trabalhar com pessoas de bem, que vão honrar os compromissos, como o Governo espera honrar os seus.
O dinheiro para o Euro 2004 vem, uma parte, dos fundos comunitários e, outra parte, do Orçamento do Estado. Não há qualquer problema em relação a isso! Como o Sr. Deputado sabe, o dinheiro para tudo o que tem a ver com acessibilidades não sai das verbas orçamentadas no Ministério da Juventude e do Desporto mas, sim, do orçamento do Ministério do Equipamento Social.
Neste momento, não há ainda uma decisão sobre o aspecto do estacionamento porque não temos completamente resolvida a questão financeira com ele relacionada. Porém, não qualquer pressa especial em relação a essa matéria; resolveremos esse problema quando tivermos condições para o fazer.
Poderia dizer-lhe que vamos resolver este problema daqui a um mês criando condições para que a Sociedade Euro 2004, S.A. vá à banca pedir um empréstimo que será pago a médio prazo, e estaria tudo bem; mas não é isso o que queremos fazer! Se tivermos de o fazer, fá-lo-emos, mas não é isso o que queremos fazer!
Repito: o dossier estacionamento não está ainda completamente definido porque não é uma urgência, não é preciso ser decidido já. Por outro lado, neste momento, não temos ainda condições para saber de onde vêm os meios financeiros necessários para esse apoio.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dinis Costa.

O Sr. Dinis Costa (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Juventude e do Desporto, Sr. Secretário de Estado da Juventude, em primeiro lugar, queria saudar o facto de ser a primeira vez que, nesta Assembleia, se discute autonomamente as políticas de juventude, no que diz respeito ao Orçamento do Estado, em sede de reunião conjunta das Comissões de Juventude e Desporto e de Economia, Finanças e Plano.
Nesta primeira fase, queria colocar algumas questões relativas concretamente à área da juventude porque, por um lado, o Sr. Ministro já respondeu genericamente às questões atendentes ao desporto e porque, por outro lado, se trata de uma discussão que também tem a ver com juventude, pelo que gostaria de colocar o ênfase possível nessas questões.
Para além disso, também me parece evidente que, nesta altura, os níveis de preocupação relativa ao desporto estão claramente sanados, sendo previsível que o PSD e os restantes partidos estejam na disposição de alterar o seu sentido de voto relativamente ao Orçamento do Estado na especialidade.
Gostaria, então, de colocar algumas questões ao Sr. Ministro, ou ao Sr. Secretário de Estado da Juventude, caso entenda dever ser ele a responder-me, relacionadas com o apoio ao associativismo no que diz respeito ao reforço e ao aumento dos subsídios ordinários e extraordinários às associações de estudantes.
Neste Orçamento do Estado fica claro que o apoio ao associativismo continua a merecer uma atenção muito especial, inclusivamente, há um reforço desse apoio. Porém, gostaria que o Sr. Secretário de Estado se pronunciasse com algum detalhe sobre o aspecto concreto dos subsídios ordinários e extraordinários, porque algumas associações, designadamente na área do ensino superior, têm manifestado algumas preocupações, embora, provavelmente, algumas delas sem justificação.
Gostaria que esclarecesse também o mais pormenorizadamente possível o que é o Espaço Juventude e o que vão significar, em termos de visibilidade do mesmo, as verbas que lhe estão afectas.
Em relação à Agência Nacional para a Promoção do Voluntariado, gostaria que desse conta dos resultados e da importância que esse programa tem tido, bem como do significado prático do reforço da verba prevista.
Finalmente, gostaria que abordasse também o programa Integração Social de Jovens em Risco. Temos tido notícias alarmantes quanto ao número de jovens portugueses em situações de risco, pelo que gostaria que abordasse este aspecto e que explicasse a razão de, neste plano, haver aparentemente uma diminuição da verba.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude (Miguel Fontes): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Dinis Costa, muito obrigado pelas questões que colocou. De forma breve, gostaria de dar-lhe os esclarecimentos devidos às respostas que solicitou.
Como o Sr. Deputado pode constatar neste Orçamento do Estado o apoio ao associativismo tem um crescimento, seguindo a tradição deste Governo e do seu antecessor, de reforço constante e permanente do apoio ao associativismo juvenil.
O Governo, desde a primeira hora, assumiu como linha de orientação na política de juventude que uma das suas traves-mestras passava precisamente por ajudar o associativismo juvenil a crescer e a ter condições de afirmar-se na sociedade portuguesa, pois entende, convictamente, que estamos a falar de um instrumento privilegiadíssimo para a promoção da educação cívica dos

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jovens e para o convite a uma intervenção mais forte, com isso reforçando a nossa cidadania. Nesse sentido, as verbas têm aumentado e, no Orçamento do Estado para o próximo ano, voltarão a aumentar consideravelmente.
No que diz respeito às associações de estudantes do ensino superior, as verbas previstas têm a ver exclusivamente com o seguinte: a Lei n.º 33/87, de 11 de Julho, aprovada por esta Câmara, fixou uma fórmula de apoio às associações de estudantes do ensino superior, a qual entra em linha de conta com dois indicadores, sendo um deles o do salário mínimo nacional e o outro o do número de alunos inscritos em cada ano, em cada uma das instituições.
Ora, é da conjugação destes dois indicadores, através de uma fórmula que a lei consagrou, que se define o valor para apoiar cada associação do ensino superior - e é isso o que tem acontecido -, correspondendo isto ao subsídio ordinário. Portanto, limitamo-nos a prever, em cada ano, o que entendemos ser a verba necessária para cumprir o que decorre da Lei n.º 33/87.
No que diz respeito aos subsídios extraordinários, trata-se de uma modalidade de apoio que configura a possibilidade de uma verba estar dividida, durante o ano, em quatro períodos, cada um deles com uma previsão de 15 000 contos, totalizando 60 000 contos, de modo a que as associações possam ter um momento de se candidatarem a projectos específicos. Os termos dos apoios a que as associações concorrem são definidos por despacho do Secretário de Estado da Juventude, que define os respectivos critérios e requisitos, tratando-se de um processo que tem sido particularmente pacífico.
Aliás, se o Governo tem, nesta área, uma herança a deixar é precisamente a da total pacificação no relacionamento com o mundo associativo: onde antes havia discricionaridade, hoje há rigor; onde antes havia alguma dificuldade e tensão, sem se perceber muito bem qual era o papel do Estado e o papel da sociedade civil, hoje há uma total clareza sobre as funções que competem a cada uma das partes. Portanto, trata-se de um domínio em que o Governo se sente muitíssimo tranquilo e satisfeito com o trabalho já realizado.
Quanto ao Espaço Juventude, basicamente, trata-se de um novo programa relacionado com o facto de estarmos a iniciar um novo quadro comunitário de apoio. Infelizmente, no II Quadro Comunitário de Apoio, a única medida relacionada com juventude dizia respeito às pousadas de juventude, ao turismo juvenil, não tendo sido contemplada mais nenhuma medida. Felizmente, apanhámos o processo do III Quadro Comunitário de Apoio a tempo e, assim, abriram-se novas janelas de oportunidade neste domínio.
Não havendo um programa operacional vertical de juventude, há, porém, nos diferentes programas operacionais do III Quadro Comunitário de Apoio, várias janelas de oportunidade que permitem a diferentes actores e agentes candidatarem-se com projectos que tenham a ver com a área da juventude, nomeadamente no âmbito dos equipamentos e das infra-estruturas.
Neste âmbito, o objectivo não é ser o Estado, a Administração Central, a promover um programa de edificação de espaços municipais de juventude, por exemplo, aliás, tal não faria sentido quando hoje discutimos tudo o que tem a ver precisamente com os níveis de responsabilidade e transferimos um conjunto de meios e de competências para as autarquias noutros domínios, isto é, estaríamos a agir ao arrepio desta situação, mas o objectivo é permitir que as autarquias, se assim entenderem, possam vir a apostar em equipamentos vocacionados para a juventude; algumas já os possuem, outras não, pelo que têm agora forma de ver essas possibilidades financiadas.
Vamos dar um apoio que sirva como estímulo para que esses equipamentos possam surgir, criando um programa que ajudará, na sua componente nacional, a comparticipar as verbas que autarquias ou outras entidades possam necessitar para usar devidamente esse valor posto à sua disposição.
Quanto à questão do voluntariado juvenil, como o Sr. Deputado sabe, temos desenvolvido muito trabalho neste âmbito, porque entendemos que outra das áreas essenciais do Programa do Governo prende-se com a ajuda à estruturação do tecido social, o que necessita do contributo, nomeadamente, do voluntariado. Por outro lado, julgamos ser nossa obrigação estimular a juventude portuguesa a ter uma atitude cívica de participação, designadamente, ao nível do voluntariado juvenil - aliás, no próximo ano, há uma razão acrescida para que tal aconteça, porque, como sabe, é o Ano Internacional dos Voluntários.
Portanto, estamos a trabalhar para que o próximo ano represente um salto qualitativo muito grande, nomeadamente, permitindo que aqueles, e são muitos, que hoje têm vontade de abraçar projectos de voluntariado, sobretudo jovens, e, por outro lado, as instituições e as associações, ou seja, todos os que necessitam do contributo desse voluntários, possam conhecer-se e apresentar-se.
Entendemos que o papel do Governo não é interferir na esfera da sociedade civil nem ter qualquer atitude paternalista relativamente aos jovens mas tão-só, o que já é muito, criar os meios que permitirão aproximar a oferta da procura de forma a reforçar o voluntariado.
A última questão colocada pelo Sr. Deputado Dinis Costa relaciona-se com a integração social de jovens em risco. Quero dizer-lhe que o Governo está a ultimar um programa altamente ambicioso e inovador neste domínio, que se chamará Programa Escolhas, o qual resultará da acção conjunta e concertada de diferentes ministérios, obviamente, do Ministério da Juventude e do Desporto mas também dos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade, da Justiça, da Educação e da Administração Interna, para referir só os que têm uma responsabilidade essencial.
Trata-se de um programa que vai actuar em diferentes domínios ao nível, nomeadamente, da integração social dos jovens que se encontram em situação de maior risco, de maior fragilidade e de maior vulnerabilidade, prevenindo, desse modo, os fenómenos de delinquência juvenil que lhe estão associados e contribuindo para algo que é uma aposta permanente no Governo do PS, ou seja, o apoio a todos os instrumentos que visem uma efectiva igualdade de oportunidades entre os jovens.
Não olhamos para estes jovens como pequenos criminosos mas, sim, como jovens que, se cumprirem e tiverem práticas de delinquência, devem ser responsabilizados, por isso estamos a fazer tudo para que, em Janeiro do próximo ano, a Lei Tutelar Educativa, já aprovada, seja efectivamente cumprida, o que o Governo se compromete a concretizar. Responsabilizar estes jovens está muito bem, mas tal não pode significar, como, por vezes, alguns insinuam, que sejam tratados sem se

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perceber que são precisamente jovens menores, devendo o nosso esforço ser centrado na sua integração social.
Portanto, vamos colaborar com esse programa e vamos continuar os instrumentos que já este ano tínhamos a esse nível, nomeadamente o programa Clube Bus, de que o Sr. Deputado já ouviu falar na Comissão de Juventude e Desporto. Este programa tem a ver, mais uma vez, com uma forma inovadora e criativa de dotar os meios socialmente mais complicados de espaços de sociabilidade junto dos jovens de modo a que tenham outras oportunidades e perspectivas no seu quotidiano, permitindo-lhes, efectivamente, uma plena inserção na sociedade portuguesa.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, uma das medidas que V. Ex.ª já apresentou e de que falámos no debate na generalidade foi a da revisão do financiamento das federações desportivas, tendo sido apresentado o Plano Estratégico de Desenvolvimento para o Desporto em 2001.
Uma das questões que gostava de colocar e de tentar perceber mais aprofundadamente prende-se com os critérios que vão estar por trás da revisão do modelo de financiamento das federações desportivas.
Como o Sr. Ministro sabe, neste momento, uma das maiores preocupações de muitas federações tem a ver com o facto de pensarem que as verbas destinadas ao desporto em Portugal são canalizadas para a realização de grandes eventos, por exemplo, o Euro 2004, esquecendo-se uma prática importantíssima para o desporto e para todos os portugueses, que passa, muitas vezes, pelo desporto federado e pelos apoios que as federações concedem ao desenvolvimento do desporto.
Por isso mesmo, é fundamental que esta Câmara perceba que critérios vão estar por trás da revisão do financiamento das federações desportivas - aliás, trata-se de um tema que preocupa muito várias federações, pelo que, este ano, exactamente nesta sede, fazia sentido que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre isso.
Sr. Ministro, há um aspecto que tem sido muito falado, embora V. Ex.ª, em resposta a uma pergunta similar, tenha referido que se trata de uma questão que não tem grande importância e que vai ser resolvida no futuro. Confesso que considero que é em sede de debate orçamental, na especialidade, que a Câmara e, penso, até o País, têm de perceber algo essencial acerca das verbas que vão para o Euro 2004.
A primeira questão que quero focar relaciona-se com os centros de estágio que têm de ser criados ou, muitos deles, recuperados ou remodelados para dar apoio a um conjunto de selecções no Euro 2004.
Gostava de perceber, porque da leitura do Orçamento do Estado isso não é simples nem fácil, que critérios vão ordenar o financiamento destes centros de estágio, isto é, se o financiamento destes centros de estágio vai partir do financiamento estatal de 25% ou de outro financiamento. Para além disso, gostaria de saber que espécie de apoios e verbas vão ser dirigidas para a construção dos centros de estágio.
Por outro lado, no que se refere às infra-estruturas dos estádios, quer aos parques de estacionamento, quer aos acessos interiores dos estádios incluídos no projecto do Euro 2004, gostaria de saber, uma vez que o Sr. Ministro, há pouco, não foi muito claro e me parece importante clarificar este ponto, se essas verbas partem do financiamento estatal dos 25% ou se são outro estilo de verbas.
Portanto, considero muito importante percebermos de onde vêm ao certo as verbas previstas para a construção dos parques de estacionamento e dos acessos interiores do estádios - não dos acessos exteriores -, porque me parece indispensável que esse financiamento seja clarificado de uma vez por todas.
Um terceiro ponto que me parece muito importante, constante das Grandes Opções do Plano, é sobre uma nova parceria - aliás, o Sr. Ministro já anunciou que, no primeiro semestre do próximo ano, vai apresentar um estudo mais fundamentado sobre esta matéria. Trata-se, pois, de uma nova parceria que tem de ser feita no sector da educação e das autarquias locais com vista a uma melhor gestão dos equipamentos desportivos, dizendo-se que é preciso definir os critérios de apoio no âmbito do QCA III.
Uma das coisas que me parece muito importante na definição dos critérios de apoio é percebermos se as verbas do QCA III vão ser destinadas apenas à gestão e utilização desses equipamentos desportivos ou se um dos critérios vai ser o da canalização das mesmas, por exemplo, para a construção de pavilhões desportivos nas escolas, assim fomentando o desporto escolar, nomeadamente através de intercâmbios com as autarquias locais e até com a sociedade civil.
Uma quarta questão, também muito breve, é a de que uma das áreas que é muito falada, e bem, no que respeita à medicina desportiva, é, por um lado, a questão dos controlos de doping, o que me parece importante, e, por outro, a questão do controlo que é feito relativamente às condições de saúde dos praticantes dos vários desportos - aliás, a este respeito, já dirigi um requerimento à então Secretaria de Estado do Desporto, agora Ministério da Juventude e do Desporto.
É que uma das alterações que o Ministério da Saúde fez quanto a esta área foi entender que os exames médicos a que são submetidos os praticantes de desporto têm de ser feitos por médicos especializados em medicina desportiva.
Ora, sendo certo que, em Portugal, existem menos de 60 médicos com esta especialidade e havendo cerca de 300 000 praticantes de desporto no nosso país, pergunto como é possível que os referidos 60 médicos possam fazer relatórios médicos sobre tão elevado número de atletas.
De facto, é um problema complicado, já que os centros de medicina desportiva de cada uma das áreas em que o País está dividido não conseguem responder às necessidades, pelo que têm de recorrer aos serviços dos referidos médicos especializados em medicina desportiva, sendo certo, repito, que não creio que os cerca de 60 profissionais existentes em Portugal possam atender um universo superior a 300 000 atletas.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Juventude e do Desporto.

O Sr. Ministro da Juventude e do Desporto: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, a primeira questão que colocou teve a ver com os critérios de atribuição de verbas ao movimento associativo, tendo o Sr. Deputado transmitido a ideia de que uma parte muito

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grande do dinheiro é destinada ao financiamento dos eventos desportivos de nível internacional que se realizam em Portugal, designadamente o Euro 2004.
Gostava de dizer-lhe - e também é o que tenho procurado transmitir à generalidade dos agentes desportivos com quem tenho falado - que tem de desaparecer a ideia de que o Euro 2004 vai prejudicar as restantes modalidades desportivas ou o sector desportivo não ligado ao futebol. Trata-se de uma ideia que vem do passado e que se acentuou a propósito do Euro 2004 pelo facto de algumas pessoas com acesso aos media, aquelas que vulgarmente se designam por "líderes de opinião", terem, desde logo, manifestado algumas reservas em relação à organização do Euro 2004 em Portugal, inclusive tendo usado o argumento de que tal organização iria obrigar a canalizar para este evento um conjunto de meios tão vultuosos que, seguramente, o resto das actividades desportivas iria sair prejudicado.
Ora, isso não é verdade e a realização, em Portugal, de um evento como o Euro 2004 vai beneficiar o desporto em geral, desde logo, porque induz uma modernização de um conjunto de infra-estruturas desportivas que, em condições normais, apenas seria feita num prazo de 20 ou 25 anos.
Na verdade, vamos acelerar a modernização das infra-estruturas desportivas de uma forma extraordinariamente significativa. Atrás disso, pela própria força que o evento gera, vai também produzir-se uma enorme modernização em tudo o que tem a ver com o dossier desportivo, desde logo, em termos de gestão de importância económica, de desenvolvimento para o País no que tem a ver com as acessibilidades gerais e as específicas dos estádios.
A isto tudo posso acrescentar algo que, para mim, está claro: não há diminuição de verbas para as outras modalidades desportivas. Pelo contrário, nos próximos anos, haverá um aumento de verbas. Espero ainda que, no conjunto de decisões em que estamos a trabalhar a propósito dos critérios de financiamento das federações, possamos introduzir um pouco de justiça, o que significa, também, uma diferenciação qualitativa entre o que espero venha a ser o futuro e o que tem sido o passado, não apenas o passado próximo mas o mais longínquo.
Não podemos tratar em pé de igualdade coisas que são desiguais, pois tal seria uma enorme injustiça. Ora, os critérios que hoje existem vão um pouco nesse sentido e porque, nomeadamente este ano, houve um problema de aprovação do orçamento.
É que, como sabe, o Orçamento do Estado para 2000 entrou em vigor um pouco tarde o que fez com que praticamente não tenha havido qualquer alteração de critérios em relação ao passado. Na verdade, o critério seguido foi o de receber orçamentos dos vários sectores e, como não foi possível cobrir a totalidade, atribuiu-se x por cento a cada um dos sectores e, portanto, todos foram tratados em pé de igualdade.
Ora, penso que isto não é possível e que, por muito que nos custe, não podemos tratar de igual forma uma federação que tem 120 000 ou 130 000 praticantes e uma outra que tem 18 000 ou 20 000 praticantes, que é o que acontece hoje em dia. Aliás, muitos dos problemas do próprio movimento associativo ao nível de superestrutura resultam do facto de se pensar que é possível atribuir o mesmo peso a instituições com peso qualitativamente diferente.
Por outro lado, espero discutir convosco, com toda a abertura, o conjunto de critérios que vamos implementar e, desde logo, há um que me parece indispensável. É que se temos o sonho de organizar uns Jogos Olímpicos em Portugal, é evidente que as designadas "modalidades olímpicas", se não todas pelo menos as que têm mais tradição no nosso país, têm de ter um tratamento diferente em relação às outras.
Mais adiante, o Sr. Deputado falou na questão dos centros de estágio. O QCA III permite que a generalidade do País possa candidatar-se à construção de infra-estruturas desportivas consideradas básicas. Por exemplo, tenho recebido vários presidentes de câmaras, acompanhados de representantes de clubes desportivos, que querem que as suas cidades também sejam consideradas zonas de apoio ao Euro 2004, ou seja, querem melhorar os respectivos estádios, construir novos pavilhões, desenvolver os espaços desportivos que já possuem e procuram assim candidatar-se à atribuição de verbas. Ora, tudo isso já está definido em termos de critérios de candidatura ao QCA III.
Como referi na resposta anterior, pode haver candidaturas por parte do Estado ou da sociedade civil para desenvolver o tipo de infra-estruturas desportivas que se entender. Depois, estas são apoiadas por dinheiros públicos em função do que são as prioridades definidas nos regulamentos do QCA.
Pela nossa parte, vamos procurar que a componente específica do desporto no QCA III possa ser dirigida a determinados tipos de equipamentos, por forma a que, em 2006, quando o QCA estiver completamente executado, possamos ter um país relativamente diferente. Por exemplo, no âmbito do QCA e dos meios de apoio a equipamentos desportivos, vamos privilegiar a construção de piscinas cobertas - e já o referi várias vezes -, pela própria característica do equipamento e porque o mesmo propicia a prática desportiva por parte de todos os escalões etários.
Gostaríamos que, no final da vigência do III QCA, existisse, pelo menos, uma piscina coberta em cada concelho do País e que o número de pavilhões duplicasse. Isto nada tem a ver com centros de estágio… Quer dizer, não precisamos de ter um centro de estágio em cada concelho para termos condições de haver equipas de diversas modalidades desportivas a fazerem estágio no nosso país. Felizmente, já começamos a ser um destino bastante procurado para a prática de estágios por parte de equipas estrangeiras, mas os centros de estágio dos diversos clubes de que ouvimos falar são da iniciativa e da responsabilidade dos próprios - aliás, que eu tenha conhecimento, nem sequer foi feito qualquer pedido de apoio ao Estado em relação a esses centros de estágio.
Em seguida, o Sr. Deputado perguntou de onde vêm as verbas para a construção dos acessos, nomeadamente os acessos interiores. Respondo-lhe que, se compreendi bem o que o Sr. Deputado quis dizer quando se referiu a acessos interiores, tal faz parte do projecto de construção de cada estádio e, portanto, está incluído no valor que os clubes orçamentaram para a obra e o Estado vai apoiar 25% desse valor, tendo em conta os valores de referência. As verbas que têm a ver com outro tipo de acessos provêm dos orçamentos do Ministério do Equipamento Social.
Perguntou-me, ainda, quais as verbas do QCA destinadas à construção de pavilhões escolares. Devo dizer-lhe que, no que tem a ver com a verba específica para o desporto, não está previsto apoio aos pavilhões escolares, pois tal é financiado pelo Ministério da Educação que tem para isso um programa específico.

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Desde logo, acabou a construção de novas escolas sem pavilhões, decisão que foi tomada já há alguns anos e está a ser executada e, como sabem, há também um plano de acção do Ministério da Educação no sentido de dotar de pavilhões as escolas que ainda não os têm. Mas, repito, tal investimento é da responsabilidade do Ministério da Educação.
Quanto à questão dos médicos especializados em medicina desportiva, na próxima terça-feira, vamos dar posse, na sede da Ordem dos Médicos, à comissão resultante de uma lei que a Assembleia aprovou sobre a questão da medicina desportiva.
Portanto, espero que, a partir daí, possamos ter condições para resolver a questão num período de três anos, tempo que a Ordem dos Médicos considera possível para alterar qualitativamente a situação da medicina desportiva. Espero que, após a constituição daquela comissão, possam ser credenciados como médicos de medicina desportiva todos os que têm condições para tal, e não apenas os 60 que o Sr. Deputado referiu, e ainda, que, numa fase subsequente, possa encontrar-se uma solução de características diferentes para a formação desses médicos.
Penso que esta decisão vai ao encontro do que foi a vontade dos próprios Srs. Deputados que se envolveram na aprovação daquela lei que referi. Depois, faremos com que um decreto, também já publicado e que versava sobre a mesma matéria, se adeqúe ao que foi a decisão da Assembleia da República em relação a esta matéria, porque parece-me que as coisas são o que são e se a Assembleia legislou sobre a matéria, temos o dever de implementar as estruturas que foram criadas.
Portanto, se tudo correr bem, a partir de terça-feira, a comissão estará constituída e empossada e passará pela mesma a responsabilidade pela creditação dos médicos que estejam em condições de serem considerados especialistas em medicina desportiva e, também, pelo encontrar de soluções definitivas em relação ao problema.

A Sr.ª Presidente: - Muito obrigada, Sr. Ministro.
Srs. Deputados, vamos iniciar a segunda ronda de questões e peço-vos que sejam tão breves quanto possível, na medida em que apenas dispomos de mais 15 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, vou reportar-me a dois municípios do distrito do Porto, começando pelo de Valongo, que é um concelho bastante carenciado em infra-estruturas desportivas, apesar de a actual câmara municipal ter feito um esforço no sentido de criar algumas, mas, de facto, a mesma tem limitações orçamentais que não lhe permitem ir mais além.
Sr. Ministro, há duas freguesias no município de Valongo, concretamente as freguesias de Campo e de Sobrado, que não têm um único pavilhão desportivo. Trata-se de uma das carências mais sentidas pela população local, em particular pela juventude, e porque sei que a câmara municipal já oficiou ao Sr. Ministro, gostava de saber qual a disponibilidade de inscrição em PIDDAC de verbas para que, no próximo ano, o município possa avançar com a construção de um pavilhão desportivo em cada uma das duas referidas freguesias.
Passando ao município de Vila Nova de Gaia, sei que, desde que assumiu a actual pasta, o Sr. Ministro ainda não teve oportunidade de visitar o concelho, mas estou certo que, logo que lhe seja possível, o fará a convite da câmara municipal.
Vila Nova de Gaia é um município que está numa fase de grande desenvolvimento e modernização, havendo, finalmente, uma política desportiva coerente e perspectivada a médio e longo prazo.
Vila Nova de Gaia é dos concelhos do País com maior movimento associativo, particularmente no campo desportivo, já que temos uma vintena de clubes federados, para além de mais alguns não federados, e um conjunto de outras instituições de carácter desportivo, que, acima de tudo, têm procurado proporcionar o desporto a todas as gerações mas, em particular, à juventude.
Esta câmara municipal herdou até alguns projectos da anterior, mas foi a actual que se determinou a avançar com base em recursos próprios, encontrando até algumas soluções de engenharia financeira para construir, por exemplo, o complexo desportivo do parque da cidade, infra-estrutura esta que se pretende que seja de grande qualidade para receber competições internacionais e até para poder dar apoio ao Euro 2004, e um outro grande complexo desportivo de igual nível, situado na freguesia de Pedroso, mais para sul do concelho.
Para além dos citados, também têm sido construídos outros equipamentos, desde pavilhões polidesportivos em praticamente todas as freguesias, como piscinas, etc.
É certo que, em Gaia, vai ter lugar a construção dos centros de estágio do Futebol Clube do Porto, numa zona que estava um tanto ou quanto desertificada e estou certo que isso vai impulsionar a criação de uma nova centralidade dentro de Vila Nova de Gaia. Isso é positivo para o município no seu conjunto e, em particular, para aquela zona do concelho, mas, de facto, não tem havido comparticipações correspondentes a esse forte investimento na área desportiva.
Sei que, quando o Sr. Ministro José Sócrates tutelava esta área no anterior governo, visitou Vila Nova de Gaia e penso que ficou impressionado com o que viu em termos de construção de infra-estruturas desportivas, tendo-se disponibilizado para ajudar, na medida do possível, pelo que pergunto ao Sr. Ministro se também está aberto a tal.
É que, no fundo, não se trata de infra-estruturas que apenas vão servir Vila Nova de Gaia, mas servirão também a região e até o próprio País, a fim de poder receber competições de nível internacional no âmbito das várias modalidades.
Em Vila Nova de Gaia também há desporto náutico, atendendo a se situa junto dessa grande "auto-estrada" que é o rio Douro. Ora, existe um clube, o Centro Náutico de Crestuma, a que a câmara municipal já cedeu um terreno para a construção de instalações condignas para a prática de desportos náuticos. Devo dizer que é um clube relativamente recente, que não tem sequer uma vintena de anos, mas cujos membros já têm ganho grandes competições internacionais, e necessita instalações novas porque as actuais são muitíssimo precárias, pelo que gostaria de avançar com a construção de um edifício para localizar a respectiva sede. Assim, gostaria de saber da disponibilidade do Sr. Ministro para comparticipar nesta obra.
Por último: já anteriormente coloquei ao Sr. Secretário de Estado da Juventude uma questão acerca das pousadas de juventude, mas o Sr. Secretário de Estado deu-me a resposta "tradicional" que foi a de dizer que estão

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sensibilizados para a construção de pousadas de juventude a qual tem de obedecer a critérios de localização, e que, em princípio, deve haver, pelo menos, uma por distrito.
Mas a verdade é que Vila Nova de Gaia tem uma já velha pretensão a uma pousada de juventude, havendo mesmo um local para a respectiva construção, determinado há cerca de 20 anos, numa freguesia limítrofe, S. Félix da Marinha. Esse terreno está completamente abandonado e está destinado à construção da pousada de juventude que serviria a região, embora admita que, hoje, se calhar, essa já não seja a opção da tutela.
Portanto, já anteriormente falei sobre isso com o Sr. Ministro que me deu uma resposta que não foi positiva. No entanto, não deixo de suscitar a questão pois é minha responsabilidade, enquanto Deputado, corresponder às aspirações dos meus concidadãos da região de Vila Nova de Gaia que aqui represento.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, em relação às questões da juventude, mantém-se uma dificuldade que já tivemos no debate na generalidade que é a seguinte: continuarmos a ter pouca informação e diferente da dos anos passados desde 1995.
É que esta não só é a primeira vez em que o orçamento para a juventude não é apresentado por programas, logo no debate na generalidade, como o documento que hoje nos foi entregue inclui, pela primeira vez, as verbas consignadas em PIDDAC, o que dificulta muito aos grupos parlamentares conseguirem fazer uma avaliação precisa deste orçamento.
De qualquer forma, e ao contrário do que foi dito na discussão na generalidade, continua a ser muito importante para o PCP perceber se o orçamento do IPJ e da Secretaria de Estado da Juventude é, fundamentalmente, para o apoio directo ao associativismo juvenil ou se é para os programas e, pelas nossas contas, continua a ser - e muito - para os programas.
Aliás, pelas nossas contas volta a subir muito o apoio para os programas que vinha descendo desde 1998. De resto, muito do apoio directo, como já referimos, está direccionado para o associativismo juvenil mais institucionalizado, isto é, para o CNJ, para as federações nacionais e regionais, para a cooperação internacional - penso que sobrará pouco -, mas a questão que coloco ao Sr. Secretário de Estado da Juventude é a de saber o que restara, nomeadamente para o associativismo juvenil mais informal.
Uma outra questão que gostaria de focar prende-se com a falta das taxas de execução dos programas, o que gera alguma perplexidade. Por exemplo: que execução está prevista da verba para as associações de estudantes, quer para o ensino superior, para o ensino secundário, por regiões, etc.?
Refere-se, por outro lado, a promoção de estilos de vida saudáveis, ao contrário do ano passado, que identificava exactamente quais eram os programas, e a minha questão é exactamente esta: isto inclui o programa formar saúde? São os vários programas que existem na área da sexualidade? Que programas são? E estas dúvidas aplicam-se também à informação aos jovens, que no ano passado nos foi apresentado com os programas Observatório, a Rede Nacional de Informação, o Portal da Juventude, etc..
Para terminar, gostaria ainda de colocar uma questão que se prende com o Livro Branco da Juventude. Gostaríamos de saber se ainda há algum processo a complementar tendo em vista a constituição deste Livro que não se refere.
Em relação ao PIDDAC, gostaria também de colocar as seguintes questões: em relação à Agência para a Promoção do Voluntariado prevê-se uma verba de cerca de 130 000 contos até 2003 e para a Integração de Jovens em Risco, prevê-se uma verba de 460 000 contos, pelo que gostaríamos de saber em que é que vão ser aplicadas estas quantias.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, vou ser muito breve tanto mais que serão muitas as questões a que terá de responder, sobretudo pela intervenção circunstanciada do Deputado Manuel Moreira sobre Vila Nova de Gaia e Valongo.
Sr. Ministro, já agora lembro-lhe que o Sr. Ministro tem um convite para ir a Fafe, logo após a sua tomada de posse, que é um concelho muito mais carenciado que Vila Nova de Gaia.
Sr. Ministro, em primeiro lugar, folgo muito, enquanto Deputado do PS, pelo facto de o desporto, desde a tomada de posse da V. Ex.ª, ter, finalmente, um papel de primeira grandeza, o que significa que foi boa a medida da criação do Ministério do Desporto e da Juventude, o que significa que as expectativas são altas relativamente à actuação do Ministro deste sector tão importante em termos sociais no nosso país.
As minhas questões têm alguma incidência orçamental e são as seguintes: no Orçamento fixa-se uma verba ligeiramente superior ao ano passado para modernização dos serviços, quer no que respeita ao IND, quer no que respeita ao CEFD.
Lemos, entretanto, algumas declarações de V. Ex.ª no sentido de proceder a algum reajustamento ou alteração do modelo de funcionamento desse Instituto Nacional do Desporto, descentralizando - por aquilo que pareceu das suas declarações - algumas das suas competências ou dando a uma componente mais próxima da realidade local ou distrital, suponho, mais competências e mais capacidade de intervenção e retirando um pouco do napoleónico que este próprio Instituto tem na forma como desenvolve o seu trabalho sediado em Lisboa.
Por isso, gostaria de perguntar a V. Ex.ª se as verbas que nos aparecem no Orçamento e que têm a ver com a modernização destes serviços têm em vista a aplicação de uma nova política e de uma nova filosofia de funcionamento desse Instituto.
Quanto à segunda questão vou abordá-la de forma muito resumida, porque este tema já foi respondido, várias vezes, por V. Ex.ª: refiro-me ao Euro 2004, e não apenas no que tem a ver apenas com este Ministério mas também com os outros envolvidos.
Ouvi e li declarações de V. Ex.ª, quando questionado a propósito da eventualidade do chumbo do Orçamento do Estado, que é, apesar de tudo, uma eventualidade, pois a votação final será no fim deste mês e veremos qual é a disponibilidade dos grupos parlamentares para votarem favoravelmente este Orçamento, e pareceu-me interessante a forma positiva como V. Ex.ª reagiu a essa eventualidade ou a forma positiva como reagiu aos problemas,

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eventualmente, decorrentes para o Euro 2004 da não aprovação do Orçamento, pelo que gostaria de pedir a V. Ex.ª que desse à Câmara um esclarecimento claro sobre isso.
Ou seja, no fundo, gostaria que me respondesse ao seguinte: das palavras que disse sobre esta matéria, entendi que não o preocupa um eventual chumbo do Orçamento quanto ao êxito do Euro 2004 ou quanto às questões financeiras do Euro 2004.
Portanto, o Sr. Ministro tem essa preocupação, mas, não obstante, continua a considerar que haveria condições para que o processo decorresse com normalidade e para que o Euro 2004 tivesse o êxito que todos, ao menos por palavras, queremos, pois todos temos uma convicção comum: a de queremos que o Euro 2004 seja um êxito em Portugal.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Pinho.

O Sr. António Pinho (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, gostaria de colocar duas breves questões, estando a primeira delas relacionada com a juventude, porque quando falamos de promover a integração social de jovens em risco, eu lembro-me que, de facto, tivemos um ano grave nesse campo, nomeadamente na delinquência juvenil, todavia verificamos uma diminuição de 3% das verbas atribuídas a este objectivo específico.
Assim, no PIDDAC houve uma diminuição de 36%, que talvez me tenha escapado, mas gostava de ouvir aqui uma explicação, pois quando falamos tanto em atacar as causas, em actuar nas causas e não apenas tentar remediar penso que a solução passa também por aqui.
Em relação aos factores de risco, aos riscos da juventude, há aqui duas ou três questões que não foram referidas, como, por exemplo, a questão do suicídio juvenil e quem trabalha com os jovens nas escolas sabe que há questões dramáticas, que esta é uma questão que existe e que, por vezes, o jovem ou a criança até não tem bem a noção do que quer dizer "vou matar-me", "não ando aqui a fazer nada", esse tipo de expressões que todos nós, ou pelo menos aqueles que têm contactos com jovens em idade escolar, sabemos que, muitas vezes, surgem.
Uma outra questão, por exemplo, tem a ver com o problema da anorexia, que já aqui foi referido recentemente na Assembleia e que também não está contemplada no PIDDAC, e há, ainda, a questão do trabalho infantil que poderá sair do âmbito da juventude, é certo, mas há um acompanhamento que também me parece necessário e essencial, porque, ao fim e ao cabo, trata-se de comprometer a própria juventude.
É óbvio que o trabalho infantil tem de ser atacado, as crianças não podem trabalhar, mas depois qual é o acompanhamento que se dá quando sabemos que não é uma opção delas trabalhar?
Em relação, à área do desporto, em sede de discussão do Orçamento do Estado, na generalidade, foi focada a questão do desporto para deficientes e dos jogos paraolímpicos. Todavia, é necessário que os resultados dos jogos paraolímpicos não sirvam apenas para nos congratularmos na altura, não sirvam apenas para fazer uns votos simpáticos, mas sirvam, sim, para nos chamar a atenção para a realidade desta vertente do desporto que tem uma função muito mais de integração do que de competição.
De facto, o que é que ouvimos no nosso dia-a-dia? É que os prémios de 1997 relativamente aos atletas do desporto para deficientes foram pagos em Maio e Junho deste ano, ficando ainda a faltar os anos de 1998, 1999 e 2000.
É verdade que o Orçamento anterior foi aprovado tardiamente, mas os Orçamentos de 1997, 1998 e 1999 já deveriam ter contemplado essas verbas. O que é que dizem os atletas que estiveram presentes? É que das Olimpíadas de 1996 para as de 2000, não houve qualquer evolução, que continuam exactamente com as mesmas condições e, Sr. Ministro, hoje de manhã, por coincidência, ouvi na RTP, falar um atleta, condecorado com medalha de ouro, que disse que a partir de 1996 passou a ter um subsídio de 30 000$ e em 1997 passou para 29 000$… Ora, isto é um pormenor, mas foi o que ouvi hoje de manhã.
Quanto à questão dos prémios se o atleta vencer uma medalha de ouro, ganha o prémio de 100% relativamente a essa medalha de ouro, a segunda medalha já só vale 50%, se, eventualmente, conseguir uma terceira medalha já só vale 25%… Bom, isto motivou até o comentário do locutor que disse "se os senhores ganharem quatro ou cinco medalhas ainda acabam é a pagar pela medalha que ganharam".
Ainda, outra questão que foi falada - e eu penso que isto não é da competência do Ministério do Desporto e da Juventude, mas penso que também tem interesse em pressionar nesse sentido - foi a das queixas apresentadas relativamente à cobertura feita pelos órgãos de comunicação social. Se em relação aos órgãos de comunicação social, privados, digamos assim, o Ministério nada poderá fazer a não ser sensibilizar, já em relação à RTP a questão torna-se muito mais grave, porque se trata de um serviço público e daí a Federação mostrar o seu desagrado pelo facto de a RTP não ter estado presente em Sidney para a cobertura dos jogos paraolímpicos.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Marta Gonçalves.

O Sr. Carlos Marta Gonçalves (PSD): - Sr. Ministro, o senhor disse que há orientações e decisões que não podem ser alteradas só porque muda o ministro ou só porque muda o governo.
Assim, a primeira pergunta que quero colocar-lhe tem precisamente a ver com isto e é a seguinte: foi criada, pelo anterior governo, a Comissão Desporto Século XXI que fez o levantamento das infra-estruturas desportivas necessárias a efectuar no País e a programação da construção dessas infra-estruturas dentro do III Quadro Comunitário de Apoio.
A pergunta concreta que gostaria de colocar-lhe é saber se a actual equipa ministerial vai ou não cumprir este programa de construção de equipamento e de infra-estruturas desportivas que não se destinam, exclusivamente, à modernidade do futebol, mas, sim, a um conjunto vastíssimo de modalidades e equipamentos desportivos por todo o País.
Uma segunda pergunta tem a ver com uma questão também relacionada com o III Quadro Comunitário de Apoio e com a possibilidade de as diferentes entidades poderem ou não candidatarem-se nas diferentes CCR e se essa candidatura depende ou não da homologação do Ministro da tutela.

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Terceira questão, também relacionada com equipamentos desportivos e com a interligação com o desporto escolar, é a seguinte: como o Sr. Ministro disse existe um programa que é completamente desenvolvido pelo Ministério da Educação e existe um programa que é, eventualmente, tutelado, na sua grande parte, pelo Ministério do Desporto e da Juventude que tem a ver com a construção de infra-estruturas desportivas nas escolas.
Pensamos, e o Sr. Ministro também poderá estar de acordo com esta questão, que é necessário haver uma grande interligação entre o que se faz na escola e o que se faz na sociedade desportiva fora da escola.
Sabemos que, neste momento, o Ministério da Educação não constrói na generalidade das escolas portuguesas, ao contrário daquilo que aqui foi dito, pavilhões desportivos; constrói é ginásios,…

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - O que é bem diferente!

O Orador: - … ginásios esses que não dão para a prática das diferentes modalidades desportivas nem para a competição.
Por isso, gostaria de saber até que ponto o Ministro do Desporto e da Juventude vai ter intervenção nesta matéria de forma a que essas infra-estruturas, que estejam a ser construídas pelo Ministério da Educação, possam estar interligadas com o Ministério do Desporto e da Juventude e também com as respectivas câmaras municipais, por forma a construir infra-estruturas desportivas que possam corresponder às necessidades desportivas locais.
Necessariamente que isto tem também a ver com o tal programa a médio e longo prazo que se pretende ou que se vai levar a efeito nos próximos tempos e que vai apresentar-se em conjunto com o movimento associativo.
Uma outra questão tem a ver com as estruturas e os serviços do desporto relacionadas com o Instituto Nacional do Desporto. De facto, esta é uma decisão que já não vai ser mantida pela actual equipa ministerial, segundo as declarações do Sr. Ministro, mas aqui, neste caso particular, é de dar razão à oposição e, em particular, ao Partido Social-Democrata, que, na anterior legislatura, teve o cuidado de referir que as alterações produzidas pelo Governo socialista eram alterações más, erradas e que não correspondiam à realidade.
E ainda bem que o Sr. Ministro tem intenção de fazer estas alterações, pelo que gostaria de saber quais são as suas intenções e, sobretudo, saber se as respectivas estruturas distritais do Instituto Nacional do Desporto vão ter competências apenas financeiras ou vão também passar a promover e a ter um papel importante na realização de actividades desportivas, porque isto tem a ver com a política nacional, que está a ser seguida pelo Governo do Partido Socialista, e é uma grande alteração em termos de política desportiva.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de terminar.

O Orador: - Sr.ª Presidente, pretendo colocar só mais duas questões.
Gostaria, também, de perguntar ao Sr. Ministro se o Tennis Masters Cup vai ser apoiado e qual vai ser o apoio financeiro que o Estado vai dar a esta realização.
Ainda relativamente ao complexo desportivo de Lamego, gostaria de saber o que é que o Sr. Ministro pensa sobre esta matéria.
Finalmente, uma pergunta também muito directa acerca de uma decisão da anterior equipa ministerial que foi a da criação de um centro de alto rendimento no Porto, pelo que gostaria de saber se o actual ministro vai ou não cumprir esta promessa.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Alberto Fateixa.

O Sr. José Alberto Fateixa (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, gostaria de colocar apenas duas questões, mas previamente gostaria de tecer alguns comentários.
Em primeiro lugar, não tenho dúvida que o Grupo Parlamentar do PSD rejeitaria os orçamentos e as políticas que o PSD quando foi governo levou à prática durante 10 anos. De facto, o conjunto de críticas que são suscitadas levam-me, decididamente, a tirar esta conclusão e se olharmos para o investimento que os governos do PSD realizaram no movimento associativo, no mínimo, estranhamos e achamos curioso estas preocupações que o PSD levanta aqui.
Por exemplo, recordando o ano de 1995 o apoio às federações foi de 3,5 milhões de contos e o que é proposto agora são 5,7 milhões de contos, pelo que eu diria que se não estamos onde gostaríamos de estar, estamos, de certeza, no bom caminho.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Num oásis, num oásis!…

O Orador: - As minhas questões têm a ver com os jogos olímpicos de Atenas, isto porque, quando o PSD foi governo, não houve apoio durante todo o ciclo olímpico, portanto pergunto-lhe se relativamente aos jogos olímpicos de Atenas, à semelhança do que aconteceu para os jogos de Sidney, se vai ou não haver apoio relativamente a todo o ciclo olímpico.
Outra questão tem a ver com infra-estruturas, pois, pela primeira vez, existe um programa de apoio ao desenvolvimento das infra-estruturas desportivas no âmbito da Comunidade Europeia. Este programa está totalmente regionalizado o que me parece ser um sinal da preocupação de cobrir todo o País de igual modo, pelo que pergunto se considera que, ao nível do desporto, há condições para cumprir o que está orçamentado em 2001.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Ministro, eu própria estou inscrita para colocar uma questão ao Sr. Ministro, o que passo a fazer.
A minha questão tem a ver com a resposta do Sr. Ministro ao Sr. Deputado Bernardino Soares. Se entendi bem - admito que não tenha entendido - o Sr. Ministro disse que não é idiota e, portanto, que gere as folgas orçamentais de um programa da juventude a favor do desporto, ou vice-versa, em função das disponibilidades. Pareceu-me que o Sr. Ministro disse isto.
Ora, quero dizer ao Sr. Ministro que o senhor só pode fazer isso se a Assembleia o autorizar, isto é, vindo à Assembleia pedir autorização para tal, pois julgo que é evidente que não pode fazer essas transferências em circunstância alguma.

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O Sr. Ministro da Juventude e do Desporto: - Sr.ª Presidente, peço desculpa, mas tal pode ser feito em algumas circunstâncias.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Ministro, é isso que vamos ter de esclarecer, isto é, quais são as circunstâncias em que o Sr. Ministro considera que pode fazer essas transferências.
A Assembleia não se limita a autorizar a realização de despesas por parte dos Ministérios, mas fá-lo de acordo com determinados objectivos. Como a classificação funcional entre as verbas atribuídas à juventude e as atribuídas ao desporto não pode ser rigorosamente a mesma - nem pensar nisso! - essa transferência só é possível, constitucionalmente (já não é sequer um problema da lei mas, sim, da Constituição), se a Assembleia a autorizar.
Ora, a área do desporto e a da juventude só têm alguma ligação se elas forem absolutamente iguais. Se não forem, e não podem ser, pois não podem ter a mesma classificação funcional, sendo errado que a tenham, essa transferência é possível, evidentemente, desde que o Sr. Ministro venha à Assembleia pedir essa autorização.
Sr. Ministro, devo dizer que irei verificar, porque não o fiz e só agora o poderei fazer, de acordo com o que o Sr. Ministro disse, se os serviços colocaram todas as rubricas do seu Ministério na mesma classificação funcional. É que, se o fizeram, vão necessariamente ter de o alterar! A Assembleia não pode autorizar semelhante classificação!
Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Juventude e do Desporto.

O Sr. Ministro da Juventude e do Desporto: - Sr.ª Presidente, o Sr. Secretário de Estado da Juventude dará início às respostas.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude: - Sr.ª Presidente, responderei muito rapidamente às questões que me foram directamente colocadas.
Começando pela Sr.ª Deputada Margarida Botelho, quanto à questão que colocou e, que, aliás, já tinha colocado em sede de Comissão, relativamente ao modo de ajudarmos, este ano, os Srs. Deputados nesta discussão, lembro que aquilo que apresentamos - e compreenda que o diga assim - é apenas uma simpatia nossa para com os Srs. Deputados, para facilitar a discussão, mas a informação que os Srs. Deputados têm é a oficial.
Pensava que o facto de essa apresentação ter mudado de um ano para o outro já tinha ficado esclarecido, quando dissemos que o facto de ter sido criado o Ministério da Juventude e do Desporto, o que é acontece pela primeira vez, nos obrigou a uma lógica de apresentação das verbas em função do critério do Ministério e não prevalecendo aqui qualquer rotina ou tradição.
Mas devo dizer-lhe que tem toda a mesma informação que tinha nos anos anteriores. Porventura, a única que não terá é a de que, no passado, chegávamos ao ponto de fazermos a apresentação detalhada do orçamento do Instituto Português da Juventude, porque estava em causa só a Secretaria de Estado da Juventude. Este ano, pela apresentação que se entendeu fazer, não se verificou essa necessidade.
Quanto à questão, aliás sempre recorrente no seu grupo parlamentar, do associativismo versus programas, não é verdadeira a conclusão que tira. O apoio ao associativismo sobe 9,3% este ano e o dos programas sobe 3,9%. Como tal, o aumento do apoio ao associativismo é muito superior ao dos programas.
Mas, Sr.ª Deputada, permita que lhe diga que, mesmo sobre isso, temos uma divergência: é que os senhores tendem a reduzir a política de juventude a uma política de transferências de verbas para apoiar as associações juvenis e nós somos mais ambiciosos, entendendo que a política de juventude, tendo essa responsabilidade, tendo esse pilar de apoiar e estimular o associativismo juvenil, não se confina ao apoio ao associativismo juvenil.
Por isso, pensava que o seu grupo parlamentar ficaria muito satisfeito ao ver que, de ano para ano, alargamos o leque de intervenções na área da juventude, conseguimos mobilizar novos programas, criar novas parcerias, fazendo aquele que é o papel de uma área horizontal por definição como é a da juventude num qualquer governo: criar condições para trabalhar de forma articulada com outros ministérios.
É que, como é óbvio e como a Sr.ª Deputada tão bem sabe, política de juventude é tudo aquilo que tem a ver com todos os domínios da acção governativa. Por isso, é natural que, de um ano para o outro, haja o reforço de novos programas. Esse é um bom sinal, pois significa que o Governo está a trabalhar, e bem.
Quanto à questão do livro branco, embora não seja matéria orçamental, posso dizer-lhe que o livro branco é um processo da iniciativa da Comissão Europeia, apresentado em Novembro de 1999. Foram realizadas consultas para a elaboração desse livro branco, tanto aos próprios jovens, como a académicos e a peritos, sendo que outros fóruns institucionais serão consultados para se pronunciarem.
Durante a Presidência portuguesa, houve encontros internacionais de jovens para se pronunciarem sobre aquilo que entendem dever ser esse livro branco e, durante a Presidência francesa, houve já um grande encontro internacional de jovens em Paris. Portugal tem colaborado de forma muito activa, mas trata-se de um processo de uma instituição comunitária, a Comissão, prevendo-se que esse processo esteja concluído apenas durante a Presidência belga, sendo que, durante a Presidência sueca haverá, porventura, um primeiro draft nessa matéria.
Mas, se assim o desejarem terei todo o gosto em esclarecer os Srs. Deputados, em sede de Comissão parlamentar, sobre este processo e colher os contributos para a elaboração desse livro branco, o que me parece muito útil, contributos esses que teria todo o gosto em fazer chegar a este processo.
Relativamente à questão do associativismo informal, as verbas continuam previstas. Sr.ª Deputada, lembro que o Programa Iniciativa, que volta a crescer, não se destinando exclusivamente a apoiar o associativismo informal, pois destina-se também a apoiar instituições, que, trabalhando com jovens, não são instituições juvenis, continua a ter a sua verba reforçada. É, pois, por essa via que temos apoiado o associativismo informal.
Mas, e gostaria de sublinhar este aspecto sem me alongar, tal apoio não é feito apenas de forma financeira. Ou seja, quando falamos de associativismo informal é bom que tenhamos a noção de que estamos a falar de grupos de jovens que se juntam por uma razão muito pontual, que a seguir pode ter continuidade ou não, os quais têm uma relação muito tranquila com os serviços desconcentrados do Instituto Português da Juventude.

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Sr.ª Deputada, permita que aproveite este momento para dizer que, se há instituição pública em Portugal que funciona bem, é o Instituto Português da Juventude. Todo e qualquer jovem, seja para efeitos individuais, como ir buscar informação, seja para participar num projecto, vê sempre a sua pretensão atendida e esclarecida. Deste ponto de vista, é, pois, uma instituição particularmente exemplar, como tal o apoio aos jovens existe de forma muito clara.
Sr. Deputado António Pinho, começo por dizer, no tocante às questões da integração social de jovens em risco (questão que, aliás, também foi colocada pela Sr.ª Deputada Margarida Botelho), que a diminuição que os senhores identificam é só, e tão-só, em sede de PIDDAC; na outra, não há diminuição, mas, pelo contrário, aumento da verba.
Já há pouco expliquei que, encontrando-se o Governo a preparar um programa interministerial particularmente ambicioso, em que o nosso Ministério terá um papel muito activo, é no quadro desse programa que muito deste trabalho será feito. Mas devo dizer que estamos permanentemente a fazer esse trabalho de prevenção e de integração social - aliás, isto prende-se com a questão do suicídio, da anorexia e todas as outras que queira colocar, na medida em que fizermos programas que contribuam, de forma clara, para a integração social dos jovens.
Sendo que estamos a promover um programa de ocupação de tempos livres e não o delimitamos apenas aos jovens mais favorecidos, o que é que estamos a fazer que não seja contribuir para a integração social dos jovens, incluindo os jovens em risco? De facto, quando apostamos no voluntariado, nos programas de mobilidade e de ocupação dos tempos livres, estamos, obviamente a prevenir situações como a que referiu.
O Sr. Deputado estará de acordo em que seria, no mínimo, estranho que montássemos a este nível (que não ao nível de uma intervenção de saúde pública, pois aí já deslocalizamos a questão para uma dimensão mais clínica), ou seja, do ponto de vista de uma intervenção comunitária, um qualquer programa em que o objectivo fosse o de dizer: "Jovens, não se suicidem!". Quer dizer, como é que monta um programa assim?… Temos é de ter programas que, motivando os jovens, envolvendo-os, convidando-os à participação cívica, retirem do seu espectro mental qualquer situação de frustração tal e tão grave nas suas vidas que os levem a equacionar essa situação.
Como tal, não estou a ver em como é que possa haver um programa especificamente dirigido para combater um fenómeno que todos conhecemos e que merece, obviamente, toda a atenção do Governo, como sei que a merece por parte dos Srs. Deputados.
Digo-lhe o mesmo em relação às questões da anorexia e lembro-lhe que temos um programa de promoção de estilos de vida saudáveis.
Há pouco, a Sr.ª Deputada Margarida Botelho perguntava se é a sexualidade, se é apenas o formar em saúde. Só posso responder-lhe que é tudo isto. A questão da sexualidade leva a fatia maior, pois é a parte mais prioritária, precisamente aquela onde há menos respostas noutras dimensões institucionais, pelo que assumimos aí um papel mais forte, mas temos programas, nomeadamente formativos, de sensibilização, que englobam esses aspectos, como, por exemplo, os distúrbios alimentares ou outras questões que se prendem com a saúde pública dos jovens e dos adolescentes.
Sobre esta matéria, gostaria de dizer que tive, ainda recentemente, o gosto de ouvir aqui, nesta mesma Câmara, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista propor a elaboração de um livro verde sobre essas questões, dizendo que esta é uma matéria nova, emergente na sociedade portuguesa, que tem a ver com muitas dimensões e que se deveriam chamar os especialistas a este debate. Quero, desde já, dizer, da parte do Governo, que estamos inteiramente ao dispor da Assembleia da República para participarmos nesse trabalho com os Srs. Deputados.
A última questão tem a ver com o trabalho infantil. Estamos a trabalhar em conjunto com o Ministério do Trabalho e da Solidariedade a diferentes níveis. Volto a chamar a atenção dos Srs. Deputados no sentido, que compreenderão, de que a área da juventude é, de facto, muito horizontal, pelo que fazemos um esforço muito grande para acompanhar todas as dimensões da política de juventude em colaboração com outros ministérios.
Assim, fazemos parte da Comissão Nacional de Protecção das Crianças e Jovens em Risco, da Comissão Interministerial para o Emprego e do Grupo de Trabalho Interministerial para o Combate ao Trabalho Infantil, ao nível do qual acabámos de lançar, no passado mês de Outubro, um programa dirigido às associações juvenis (porque os programas também de dirigem às associações juvenis), convidando-as a apresentar projectos de proximidade, nas suas comunidades locais (destina-se, pois, sobretudo às associações de âmbito local), de prevenção do trabalho infantil. Trata-se de um programa que está, neste momento, em fase de recepção de candidaturas.
Também aí temos dado um contributo - aliás, como o Sr. Deputado sabe -, uma vez que, este fenómeno, felizmente, desde que o Governo o assumiu, não o escondeu e quis combatê-lo, tem estado a regredir na sociedade portuguesa.

A Sr.ª Presidente: - Tem, agora, a palavra o Sr. Ministro da Juventude e do Desporto.

O Sr. Ministro da Juventude e do Desporto: - Sr.ª Presidente, vou procurar ser tão breve quanto possível, embora o conjunto de questões que me foram colocadas não me facilite a vida, pois são muitas e eu gostaria de responder a todas.
Começo pela questão levantada pela Sr.ª Presidente, que tem a ver com as formas de organização e de execução orçamental.
Quero dizer-lhe que não está no nosso espírito fazer algo que a lei não nos permita fazer. Se não for possível fazer mudanças, não é e não se fazem! Mas vamos aproveitar uma margem de manobra existente na gestão das verbas inscritas no PIDDAC e também, por exemplo, no que tem a ver com algo que considero indispensável e que resultará numa vantagem, que é o desenvolvimento de actividades comuns aos dois principais institutos públicos que dependem do Ministério: o Instituto Nacional do Desporto e o Instituto Português da Juventude.
Há um conjunto de programas que têm a ver com juventude e desporto que serão desenvolvidos em parcerias, tal como já aconteceu no passado, nada impedindo que façamos incidir uma parte maior do encargo num ou no outro, em função da evolução orçamental de cada um deles, ou seja, em função das disponibilidades de cada um deles, sem que isso tenha qualquer tipo de implicação legal.
Trata-se de fazer uma gestão tão eficaz e racional quanto possível dos recursos que temos ao nosso dispor.

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Naturalmente, se quisermos ir além disso, teremos de pedir autorização à Assembleia, facto de que temos plena consciência, não havendo qualquer dúvida quanto ao mesmo. Talvez eu me tenha explicado mal, mas não há qualquer intenção, nem tal seria possível de ir mais longe do que o que a lei permite.
O Sr. Deputado Manuel Moreira perguntou, em síntese, se o Governo está aberto a parcerias, ao que eu respondo dizendo que sim. Aliás, apetecia-me perguntar-lhe se o Sr. Deputado também está aberto a criar condições para que aquilo que permite a nossa abertura durante o ano 2001 seja aprovado! Mas, enfim, esse é um assunto que abordaremos a seguir!
A propósito da velha aspiração da pousada de juventude no concelho de Gaia, gostaria de dizer ao Sr. Deputado que o meu concelho - Vinhais - também tem uma velha aspiração a uma pousada de juventude, que, como o Sr. Deputado compreenderá, eu gostaria muito de ver concretizada durante o período em que tenho responsabilidades nesta matéria. Não sei se tal será possível, mas garanto-lhe que a aspiração do meu concelho é, seguramente, tão ou mais velha do que a do seu!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Acredito mais na realização dessa do que na do meu concelho!

O Orador: - Sr. Deputado, refiro isto apenas para lhe dar conta das dificuldades em ter critérios que sejam perceptíveis.
A Sr.ª Deputada Margarida Botelho voltou a referir a questão da informação e da dificuldade em comparar a informação. Devo dizer que a compreendo, mas, no próximo ano, não teremos, seguramente, essa dificuldade, porque, tendo a estruturação do Orçamento de ser diferente por causa da criação de um novo Ministério, faz sentido que agora comecemos a olhar para as verbas em função dessa realidade.
Respondendo agora a uma das questões colocadas pelo Sr. Deputado Laurentino Dias, creio responder também a algumas das questões levantadas pelo Sr. Deputado Carlos Marta, direi que vamos introduzir algumas alterações na estrutura do Instituto Nacional do Desporto, que têm, em princípio, uma lógica de modernização e de desconcentração, porque sempre considerei que todas as decisões, que foram tomadas no passado no sentido de concentrar nas sedes das comissões de coordenação regional o know-how, a competência e os meios, foram más para o País, nomeadamente para o interior, pois promoveram desertificação e fuga de quadros.
A um suposto movimento de desconcentração de Lisboa para o resto do País sucedeu-se, nas regiões, um movimento de concentração em cada uma das sedes das comissões de coordenação regional, o que se revelou mau. Aliás, estou inteiramente de acordo com o Sr. Deputado quando refere que as alterações na estrutura do IND foram más - sei que se referia às "nossas", às mais recentes -, mas devo dizer-lhe que o que foi feito no passado, nesta matéria, teve grande gravidade e consequências na distribuição dos recursos no País.
Como tal, vamos alterar essa situação, introduzindo a lógica do distrito, pois é isso que faz sentido, e desconcentrando para as delegações distritais, tanto quanto for possível, em termos de competências e de meios. Vamos ver até onde podemos ir nesta matéria.
Todavia, alerto já para o facto de que o próximo ano não será um ano de "vacas gordas" na desconcentração de meios para as delegações distritais, mas começaremos com alguma coisa e vamos procurar que isso corresponda a uma vontade efectiva de desconcentração de competências e de meios do Governo para o nível distrital.
A segunda questão que o Sr. Deputado colocou tem a ver com o Euro 2004. Como tive oportunidade de dizer, tenho plena consciência de que, se o Orçamento do Estado não fosse aprovado, teríamos de encontrar soluções para que o dossier não parasse - penso que isso está fora de causa. Agora, não há a menor dúvida de que a não aprovação do Orçamento em nada facilitaria a vida e criaria dificuldades adicionais, não só em relação a este dossier como em relação a outros.
Penso que é evidente para todos que a não aprovação do Orçamento do Estado traduz-se em dificuldades para o País, que terá de ultrapassá-las, se for caso disso, obviamente. Esse também é um custo da democracia, pelo que, se o Parlamento assim decidisse, teríamos de encontrar soluções alternativas. Mas não me venham dizer que facilitava, pois não facilitava!
Quanto à questão dos jogos paraolímpicos colocada pelo Sr. Deputado do PP, não quero entrar aqui em pormenores sobre o dossier nem contribuir para nada que não seja prestigiar essa causa e criar condições para que ela se desenvolva cada vez mais, porque ela insere-se naquilo que pensamos dever ser o desporto em Portugal e dever ser um programa de governo nessa matéria.
Mas repito uma expressão que já utilizei há pouco, isto é, não podemos tratar igualmente os desiguais, pois tal é uma grande injustiça. Na verdade, a ideia de que o desporto paraolímpico deve ter um tratamento igual ao olímpico não faz sentido. Não é igual, pelo que não pode ter o mesmo tratamento de igualdade!
Termino este dossier dizendo o seguinte: Portugal tem um dos melhores sistemas do mundo de apoio aos atletas paraolímpicos e é também a isso que se deve a nossa excelente prestação olímpica.
Estamos disponíveis - e já o fizemos com o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade - para rever alguns aspectos, melhorando o que for possível, mas não estamos disponíveis para tratar igualmente o que não é igual; esta é que é a questão!
Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado Carlos Marta Gonçalves sobre o plano para o século XXI, devo dizer que queremos continuar a desenvolvê-lo. Porém, há um "pequeno" problema: é que uma das bases do sucesso desse plano assentava nas autarquias e na sua capacidade para induzirem investimentos na área do desporto. É que, como já referi, quando falamos em investimento no sector na ordem dos 100 milhões de contos não estamos a dizer que é apenas o poder central que vai investir, há um conjunto de agentes que vai contribuir para isso.
O que acontece é que - e tenho tido uma dificuldade e por isso temos estado a falar com as câmaras municipais -, por força da criação de um programa específico para a área do desporto, as câmaras entendem que tudo o que é equipamento desportivo do seu concelho deve ser candidatado a esse programa mas a lógica do plano para o século XXI não era essa.
Na verdade, a lógica era a seguinte: o que se previa era que uma área de intervenção específica no desporto no âmbito do QCA fosse complementar ao investimento das próprias câmaras, integrando projectos seus na outra medida, permitindo às câmaras ir buscar dinheiro ao fundo

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comunitário. Se continuar a lógica que as câmaras estão a desenvolver neste momento, afunila-se o investimento em vez de este ser ampliado, e é este o problema que estamos a procurar resolver.
É que como há um plano, um programa ou uma medida para o desporto, as câmaras querem incluir aí outras despesas, como, por exemplo, para a ETAR, para o caminho, para a ponte e isso não pode ser, porque o programa para o desporto destina-se a questões mais específicas e não a questões de âmbito geral, que deverão continuar a ser desenvolvidas com base noutros programas.
Quanto à questão da homologação, é evidente que tem de haver homologação do Ministro. Na medida em há comparticipação de verbas nacionais que saem do orçamento do Ministério tem de haver homologação do Ministro. Era o que faltava se não houvesse! Há verbas que envolvem uma parcela de recursos nacionais que vêm do orçamento do Ministério de que sou responsável e por isso têm de ser homologadas pelo respectivo Ministro.

O Sr. Carlos Marta Gonçalves (PSD): - Mas não é essa a questão, é o critério político!

O Orador: - Para mim, é evidente que tem de haver um critério político na decisão final, mas o critério político não quer dizer que seja um critério partidário. Na medida em que eu, com as câmaras, com as comissões próprias, homologo um conjunto de investimentos, por exemplo dirigidos para piscinas, estou a definir uma política em relação a essa matéria. Mas uma coisa é o critério político de política desportiva e outra coisa é o critério partidário.
Quanto à relação entre o Ministério da Educação e o Ministério da Juventude e do Desporto, devo dizer que a nossa preocupação é de articulação de políticas e, se possível, de investimentos, mas não vamos intervir em nada que tenha a ver com a escola, por razões que o Sr. Deputado Hermínio Loureiro facilmente compreende.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Mas se estiver a ser mal feito!

O Orador: - O Sr. Deputado dizia que agora nas escolas nós não construímos instalações desportivas mas, sim, ginásios. Mas, como sabe, nos 10 anos anteriores nem ginásios se construíram. Aliás, o número de escolas que foram construídas sem qualquer instalação desportiva é disso demonstrativa.
Na verdade, há hoje um esforço notável no sentido de não construir escolas sem equipamentos desportivos, seja ginásio, pavilhão ou o que lhe queira chamar.
Em segundo lugar, é importante a decisão de, tão rapidamente quanto possível, dotar as escolas que não tinham de um mínimo de equipamentos desportivos. Penso que isto é estruturante e espero que o continuemos a fazer.
Já dei algumas informações quanto à alteração de estruturas na área da administração pública desportiva.
Quanto à questão do Tennis Masters Cup, o Estado apoiou a realização desta iniciativa na lógica de promoção externa do País. Trata-se de um evento que vai fazer com que, durante os dias em que se realiza, o nosso país tenha uma visibilidade internacional invejável, designadamente nas televisões. Vão estar os oito melhores jogadores do mundo a disputar o título de primeiro e, portanto, a meu ver, faz todo o sentido que, na lógica de promoção do País, se possa apoiar uma empresa que se dispõe a fazer uma coisa destas em Portugal, porque os ganhos que daí advêm para a promoção de Portugal são imensos e, se calhar, muito mais rentáveis do que outro tipo de promoções e de projectos que estão em desenvolvimento.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - E qual a verba? Quanto?

O Orador: - Não tenho o montante exacto porque a promoção não é apoiada pelo Ministério da Juventude e do Desporto e por isso não disponho de todos os elementos, mas posso procurar saber e fornecê-los porque nada há a esconder em relação a essa matéria. De qualquer forma, esse apoio não passou por nós.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - É que os requerimentos demoram tanto tempo a ter resposta…

O Orador: - Por nós passa outro tipo de apoio que tem a ver, por exemplo, com a parceria com o Cartão Jovem ou apoios na promoção do ténis enquanto modalidade em Portugal, apoios esses que passam pela Federação Portuguesa de Ténis e não por outras entidades. Portanto, nada há a esconder.
Como já disse, porque houve um início de parceria entre a área do desporto e a área da promoção externa, gostaria que ela pudesse desenvolver-se muito mais, porque o Tennis Masters Cup é importante para Portugal, sendo um dos eventos para mediáticos do mundo, como o Euro 2004 e outros que estão previstos para Portugal.
O Sr. Deputado José Alberto Fateixa colocou a questão dos apoios ao ciclo olímpico. Quanto a esta questão poderíamos já ter um feito um "número público" - se me permitem a expressão - no sentido de dizer: "vamos aumentar em x o apoio do Estado para os quatro anos", mas penso que isso não era sério e, no entanto, há muitas pessoas a pressionar-nos nesse sentido.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Tem de ser para oito ano, não pode se para quatro!

O Orador: - Não estava a responder à sua questão, porque já o fiz. Estava a responder à questão do Sr. Deputado José Alberto Fateixa, por isso não façamos confusão.
Como eu dizia, podíamos ter dito que aumentaríamos em x %, passando de 2,6 milhões para 3 ou 4 milhões, que é o que algumas pessoas da área do desporto, que até estiveram envolvidas neste dossier, querem ouvir do Governo. Isto é, muitas das pessoas que estão envolvidas no dossier fazem uma pressão na opinião pública para que o Governo decida rapidamente o tipo de apoios que vai dar. Mas, por muito que planeemos a nível de um prazo maior, não podemos ignorar o ciclo olímpico, sendo que as coisas têm de correr em paralelo.
Todavia, para mim, resulta evidente que a nossa prestação paraolímpica foi das melhores de sempre e sei que os Srs. Deputados estão de acordo com esse aspecto, aliás até votaram um voto de congratulação na Assembleia da República sobre essa matéria.

Vozes do PSD: - Leu o voto?

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O Orador: - É também evidente que, a nossos olhos, não é suficiente e que os apoios dados pelo Estado geraram expectativas maiores. Por isso, temos de avaliar se foi ou não correcto, porque os meios envolvidos foram muito grandes e não aparece ninguém - porque não seria razoável - a dizer que o Estado, no seu conjunto, não me refiro apenas ao Governo, não se envolveu a sério no apoio à sua delegação olímpica.
E, portanto, o que é que faz sentido agora? É termos alguma avaliação do que é que falhou ou não, pelo menos até ao final do ano, e a partir daí emendar. É que é muito simples convidarmos os responsáveis do comité olímpico e as federações para fazer um contrato em que aumentamos em 5, 10 ou 20% o apoio, só que isso depois não resulta em nada. Por isso temos de ser um pouco rigorosos na avaliação que se vai fazer disso.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, penso que, genericamente, respondi a todas as questões que me foram colocadas.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Ministro, não havendo mais pedidos de esclarecimento, resta-me agradecer a sua presença nesta Comissão bem como a do Sr. Secretário de Estado.
Gostaria de referir que vamos continuar com o debate do Orçamento, na especialidade, relativo ao Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública.

Pausa.

Estamos, então, em condições de passar à discussão do orçamento, na especialidade, do Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública.
Tem a palavra o Sr. Ministro do Estado e da Administração Pública.

O Sr. Ministro do Estado e da Administração Pública (Alberto Martins): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, se me permitem, gostaria de usar a palavra para fazer uma breve intervenção introdutória, colocando duas questões que têm sido, em alguma medida, objecto de debate público nos últimos dias e que se centram sobretudo em duas matérias, uma das quais, aliás, foi aludida no debate, na generalidade, do Orçamento do Estado e tem a ver com a questão dos activos da administração pública, e a outra relaciona-se com os institutos públicos.
Relativamente ao emprego na administração pública, o que tem sido dito pelo Governo, e que reitero e preciso, é que há uma estimativa - que, a curto prazo, deixará de ser estimativa, dado que o último recenseamento foi feito em 1996 e está em marcha um recenseamento que termina a sua fase de recolha na administração pública em final deste ano e que, no primeiro trimestre, terá já um tratamento pormenorizado quanto aos activos da administração pública -, que presumimos não ser grosseira mas com um grau muito grande aproximação, de que, nos próximos 10 anos, dos cerca de 650 000 funcionários da administração pública, central, regional e local, haverá, por limite de idade, um afastamento de cerca de 40% dos seus efectivos.
Tem sido dito que esta é uma oportunidade para que, a administração pública, quer nos seus recrutamentos, quer na sua formação, quer nos procedimentos de escalonamentos de carreiras, possa promover uma modernização da administração pública, dos seus agentes e membros. Neste sentido, não há qualquer ideia quantitativa quanto a uma redução dos membros da administração pública, sendo certo que, com a redução de 40% dos funcionários, que deixam de prestar serviço à administração pública, há esta possibilidade.
Por outro lado, quanto ao problema dos activos da administração pública, deve dizer-se que Portugal tem um número próximo daquele que existe noutros países; não temos funcionários públicos a mais, o que poderemos verificar é que há, nalguma medida, uma inversão na pirâmide da administração pública, com um número excessivo na administração central e um número relativamente descompensado nas administrações locais e temos de resolver esta questão com a ideia de que as necessidades da administração pública não são quantificáveis, porque elas surgem em função dos direitos sociais que o Estado tem vindo a atribuir e que é preciso preencher.
Quando se defende uma polícia de proximidade e são votadas medidas legislativas no sentido de se reforçar essa ideia isso implica um aumento dos trabalhadores da função pública; quando se vota o alargamento do ensino pré-escolar isso implica um aumento dos trabalhadores da função pública.
Por outro lado, haverá, naturalmente, serviços onde a redução será efectiva, com o recurso a novas tecnologias, a novos instrumentos de formação e até a uma melhor e maior racionalização da administração pública, que é o que pretendemos e que corresponde a um conjunto de reformas que estão a ser empreendidas.
Gostaria de referir uma segunda questão que tem a ver com os institutos públicos, que, como sabem, são um instrumento de agilização da máquina do Estado.
Foi criado um grupo de trabalho para fazer uma aferição precisa sobre onde se justifica a criação de institutos, qual o estatuto que devem ter e quais as medidas a tomar para, eventualmente, corrigir situações que merecem ser corrigidas. O grupo de trabalho está a cumprir as suas funções, admitimos que o trabalho possa ser ultimado num prazo relativamente curto, que será, de uma forma indicativa, até ao fim do mês de Novembro, ainda que se admita que este prazo possa ter alguma dilação.
O relatório desse grupo de trabalho, presidido pelo Prof. Vital Moreira, será difundido e permitir-nos-á ter acesso um conjunto de sugestões, que pedimos que o grupo de trabalho apresentasse, que vão ser objecto de debate por parte do Governo, as quais não deixarei de trazer à Assembleia, relativamente a medidas programáticas legislativas que sejam necessárias.
A questão concreta que se prende com a matéria dos institutos públicos tem a ver com uma alusão feita pela Sr.ª Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, não nessa qualidade mas enquanto Deputada do PSD, relativamente ao Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública.
Em função do que foi dito, gostaria de precisar que não há três novos institutos no Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública. Havia, e continua a haver, três institutos públicos. A Secretaria de Estado passou a Ministério e nesta passagem até "emagreceu" organizativamente em relação a ela. Os institutos públicos que existiam eram o Instituto Nacional da Administração, criado em 1992, no governo do Prof. Cavaco Silva, que é a escola superior da administração pública; o Instituto de Gestão das Lojas do Cidadão, que continua a existir

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(qualquer destes institutos terá ajustamentos em termos de modernização); e o Instituto de Gestão da Base de Dados dos Recursos Humanos da Administração Pública, que continua a existir, sendo a ele que cabe o recenseamento da função pública, a cujo prazo de conclusão já aludi, que vai ser substituído pelo Instituto de Inovação da Administração do Estado, e acabará, quando este instituto for criado, o Secretariado para a Modernização Administrativa. Isto é, mantêm-se três institutos e até acaba uma direcção-geral com a alteração relativa ao instituto de que falei.
Eram estes os dados preliminares e esta informação que queria dar aos Srs. Deputados.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Presidente da 1.º Comissão, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado e Srs. Deputados…

O Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública: - Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, permita-me que o interrompa para reparar a minha gaffe protocolar ao não me ter dirigido ao Sr. Presidente da 1.ª Comissão, Dr. Jorge Lacão.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Ministro, foi importante ter esclarecido este aspecto que, em circunstâncias que não vale a pena caracterizar nesta altura, foi abordado no encerramento do debate na generalidade.
Vou colocar três questões ao Sr. Ministro, que têm alguma ligação com a parte financeira - aliás, estamos a debater o Orçamento -, havendo, é certo, colegas muito mais qualificados do que eu para se pronunciarem quanto às questões políticas da Reforma do Estado e da Administração Pública.
As três questões da área financeira - não está cá o representante do Ministério das Finanças, mas isso não será grave - prendem-se com o seguinte: em relação a uma linha fundamental do governo e do Ministério de que V. Ex.ª é responsável, há uma estratégia de desconcentração da Administração Pública.
Ora bem, relativamente a essa estratégia, prevista no Programa do Governo e reafirmada várias vezes por V. Ex.ª, nomeadamente num debate parlamentar ocorrido em Janeiro último, quero perguntar-lhe até que ponto o Sr. Ministro está convencido de que essa desconcentração, num prazo que, pelo que tem sido referido pelo Sr. Ministro e pelo que tem sido analisado por alguns de nós, será de uma meia dúzia de anos, entre 5 e 10 anos, independentemente de qual seja o governo, embora preferindo, obviamente, que fosse não digo este governo mas um governo parecido com este…

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Talvez um bocadinho melhor!

O Orador: - Se é que é possível.

Risos do PSD.

É difícil. E melhor do que este Ministro é quase impossível. Penso eu de que…

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, se desse governo fizesse parte o Sr. Deputado, convenhamos que era bem melhor!

Risos do PSD.

O Orador: - Essa é a apreciação de V. Ex.ª. Apesar das origens republicanas e laicas na sua genealogia, em termos de antepassados, V. Ex.ª, lamentavelmente, situa-se no centro-direita… De qualquer maneira, agradeço a sua gentileza. Digo centro-direita, pois falo do nosso ponto de vista. V. Ex.ª situar-se-á, do seu ponto de vista, onde entender.
Mas voltemos à questão da desconcentração. Poderá haver algum medo de que, numa primeira fase, alguns aspectos ligados à desconcentração possam ter alguns custos de formação, de reconversão, de criação de umas estruturas e de extinção de outras, mas a prazo, esse tal prazo de 5 a 10 anos, como é que o Sr. Ministro entende que esse efeito de desconcentração da Administração, com uma maior aproximação da Administração aos interesses das populações, poderá traduzir-se em termos de custos nesta estratégia orçamental? Será correcta a ideia de que essa desconcentração a prazo poderá trazer uma redução global nos custos de administrações?
Sabemos que este Governo, contrariamente ao que tem sido dito, não tem aumentado os custos das administrações, não segundo a perspectiva do Governo mas segundo, por exemplo, a análise que a OCDE publicou. O que tem aumentado, sim, são as despesas técnica e contabilisticamente correntes, o que é bem diferente, porque englobam despesas correntes de transferências, compra e investimento. Os custos das administrações não aumentaram nos quatro primeiros anos deste governo, nos que já têm contas efectivamente apuradas, contrariamente a outros governos que, para evitar maior polémica, neste momento, não vou referir.
Portanto, Sr. Ministro, a pergunta é: será que essa desconcentração a prazo, de meia dúzia de anos, poderá traduzir-se numa redução global, embora julgue que nunca será demasiado significativa, dos custos da Administração Pública?
Segunda questão: há cerca de um ano, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 2000, foi anunciado, não pelo Sr. Ministro mas pelo seu colega das Finanças, na altura também da Economia, que se poderia caminhar para um Orçamento de base zero. A opção feita não foi essa - e, em meu entender, bem! -, pois não há condições para um orçamento desse tipo, nem sei se alguma vez houve.
Lembro-me que, uma vez, o Dr. João Salgueiro - meu particular amigo de há muitos anos e um antigo Deputado do PSD que, do meu ponto vista, faz aqui alguma falta -, quando era ministro das Finanças anunciou também a sua grande preocupação em caminhar para os orçamentos de base zero. Isto passou-se, ainda eu era jovem, algures à volta do ano 1980/1981 e também não se conseguiu - uns não conseguiram, outros não quiseram.
Ora, a opção do Governo foi a de avançar no sentido gradual do ABB, do Orçamento baseado em actividades. Não sei se o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado querem dizer alguma coisa sobre esta opção, no seguinte sentido: na minha interpretação, esse Orçamento baseado em actividades - tanto quanto eu sei, apenas terá começado pelo Ministério das Finanças, estendendo-se ao

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da Agricultura, havendo a perspectiva de se alargar a outros ministérios -, do ponto de vista das Finanças, tem como objectivo permitir uma análise mais precisa e concreta, também a partir de indicadores de ordem física, analisar a produtividade da Administração Pública e a correspondência entre os objectivos de cada serviço, os recursos utilizados, os custos financeiros e outros que, depois, no final do ano, se traduzem.
Portanto, a minha questão para o Sr. Ministro, não do ponto de vista financeiro mas do ponto de vista da perspectiva da reforma do Estado e da Administração Pública, é a seguinte: será que nesse Orçamento de base zero, que este ano é um primeiro avanço e, julgo, no próximo ano, para o Orçamento para 2002, irá estender-se a outros ministérios, poderá haver algum contributo positivo para a reforma da Administração Pública, no sentido de identificar melhor o que se destina para cada serviço, o que gasta cada serviço, o que emprega cada serviço, evidenciando alguma analogia com o que foi em muitas empresas a passagem de uma contabilidade geral para uma contabilidade analítica, com as diferenças óbvias próprias do funcionamento da Administração Pública? Com esta segunda pergunta, no fundo, solicito o ponto de vista do Sr. Ministro, em termos de reforma do Estado e da Administração Pública, sobre se o facto de podermos identificar financeiramente com mais rigor o que cada serviço faz, a que é que corresponde e quais os seus objectivos, pode, realmente, ajudar neste processo global de reforma do Estado e da Administração Pública.
A terceira e última questão - não sei se será para o Sr. Ministro, se para o Sr. Secretário de Estado (o Sr. Ministro dirá) - tem a ver com o seguinte: na minha interpretação e da leitura de alguns comentadores, como certamente todos os Deputados já fizeram, pareceu-me que um ou outro comentador ainda não terá entendido completamente que houve uma alteração na afectação das remunerações neste Orçamento.
Assim, a minha questão é a seguinte: o caminho para integrar, em cada ministério, o que corresponde à subida de custos relativa a promoções, mudanças de categorias previsíveis, alterações no Ministério - deixando para a dotação provisional o que, de facto, não é completamente previsível na altura da elaboração do Orçamento, mas pode ser estimável, que é a negociação, depois da decisão do Governo, quanto aos aumentos das remunerações -, é um caminho que esta equipa do Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública pensa que poderá facilitar a clarificação das negociações ou, pelo contrário, será que introduz algum factor de perturbação no conjunto das negociações?
Passo a explicar: quando se negoceia x% de aumentos para a Administração Pública, sabemos que este x% se traduz sempre num x+y. Ora bem, se, à partida, esse y, cada vez com mais rigor, se for integrando em cada ministério, o Governo no seu conjunto, o Parlamento, a opinião pública, os eleitores, não serão surpreendidos porque o que se negociou foi x, mas o x é +y. Se o y já vier integrado, sob a responsabilidade de cada ministério e devidamente acompanhado pelo das Finanças e pelo da Administração Pública, ficará, aparentemente, mais claro e transparente o quadro da negociação. Porque os outros números, de inflação, etc., também com a diferença de 1/1000, 0,1%, são mais ou menos aceitáveis e circulam, havendo pequenas evoluções.
Portanto, a minha dúvida é esta: o Sr. Ministro (dirijo a pergunta ao Sr. Ministro, mas poderá ser o Sr. Secretário de Estado a responder, conforme entender) considera que uma evolução deste tipo facilita esse quadro de negociações? Ou, pelo contrário, considera que nada facilitará ou, na pior hipótese, ainda prejudicará o quadro das negociações?
Sr. Ministro, há pouco esqueci-me de o saudar e, sem menosprezo pelo Sr. Secretário de Estado, que é um excelente governante, temos na nossa frente um dos grandes parlamentares do PS que já estiveram nesta Câmara a participar num governo, que, aliás, é dirigido por um excelente parlamentar.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, muito obrigado pelas suas palavras e pela sua gentileza amiga - os amigos são generosos!
Permita-me que responda à primeira questão e deixe as outras duas para o Sr. Secretário de Estado fazer o favor de responder.
A primeira questão que o Sr. Deputado coloca é a da descentralização territorial da Administração do Estado ou a descentralização tout court, se quisermos.
A questão da descentralização é um grande objectivo do Governo, está ínsito no Programa de Governo. A descentralização e a desconcentração são duas matérias que vão a par e, sendo vencida, por referendo, a ideia da regionalização, corresponde a um objectivo deste Governo cumprir a descentralização territorial e a desconcentração do Estado.
Neste sentido, está em curso - e outros responsáveis do Governo estarão em melhores condições para o precisar - a descentralização de competências, poderes e funções para as autarquias locais. O próprio III Quadro Comunitário de Apoio, que certamente já terá sido aqui tratado ou irá sê-lo pela Sr.ª Ministra do Planeamento, é já um exercício de desconcentração significativo e, no que diz respeito aos modelos orgânicos, é um dos objectivo do Programa do Governo criar uma entidade regional, com funções de participação nas políticas públicas, que será oportunamente presente, para deliberação, não só ao Conselho de Ministros mas também será trazida a público, nos termos em que o próprio Conselho entender mais adequado.
Nesse sentido, creio que é seguramente preciso a ideia que o Sr. Deputado inclui implicitamente na sua pergunta, que é a nova qualidade da Administração Pública, da Administração do Estado, que irá surgir com a desconcentração.
Como tive oportunidade de dizer - e os números a que estou a referir-me são números precisos de 1996 e, como já disse, está em curso, na sua fase de ultimação, o novo recenseamento da Administração Pública - a administração central e a administração local ocupam cerca de 33% dos funcionários da Administração Pública, no distrito de Lisboa. O que significa que temos uma administração centralizada e concentrada extremamente significativa e julgo que toda uma lógica - e esse é um dos objectivos - de requalificação da Administração Pública passa pela sua descentralização, pela sua desconcentração, o que necessariamente irá trazer um conjunto de funções de proximidade, uma formação de proximidade e uma adequação em termos de proximidade que naturalmente vai gerar uma melhor qualidade na Administração Pública.

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O esforço que estamos a fazer, e que temos já em trânsito com experiências singulares, ao nível da prestação de serviços na Administração Pública dá-nos nota dessa ideia, ou seja, uma Administração de proximidade em termos de prestação de serviços pode ser muito mais eficaz.
Creio - e não é demais repeti-lo - que as Lojas do Cidadão, que constituem um instrumento de prestação de serviços ao cidadão, hoje já sediadas em Lisboa e no Porto e prevendo-se a inauguração, no próximo dia 4 de Dezembro, de uma outra, em Aveiro, e, a 20 de Dezembro, de uma outra em Viseu, constituem zonas de excelência, na prestação dos serviços de qualidade da Administração, entre outras razões, precisamente por uma formação localizada e pela proximidade da prestação de serviços.
Portanto, toda uma lógica de reforma da Administração e de nova qualidade da Administração, em nosso entender, passa por uma desconcentração da Administração. E, quer as Lojas do Cidadão, quer os Postos de Atendimento ao Cidadão, são exemplos singulares e de excelência de que tudo o que seja desconcentrar representa, por um lado, nova qualidade, proximidade, melhores prestações de serviços e implica, por outro, necessariamente, uma nova formação dos quadros da Administração Pública.
Por isso, a questão que o Sr. Deputado coloca pode articular-se com a anterior, no sentido de que esta "janela" de oportunidade dos 40% dos funcionários públicos, que vão ser substituídos por limite de idade, é uma "janela" de oportunidade de grande importância, porque permite uma nova formação, uma requalificação na base de conhecimento em novas tecnologias, formação em função das necessidades de prestação dos serviços que são cada vez mais exigentes, o que vai implicar um novo sentido e novas regras e um novo sistema de recrutamento ao nível da administração central e, necessariamente, ao nível da administração local, ou seja, da Administração como um todo. Portanto, a primeira questão que o Sr. Deputado colocou é um objectivo do Programa do Governo.
Quanto aos calendários, o Governo, oportunamente, dará conta dos mesmos.
Em termos de qualidade da Administração Pública, a descentralização e a desconcentração são instrumentos de proximidade e de qualificação, e temos algumas experiências significativas de que assim é.
Sr.ª Presidente, se me permite, agora passarei a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa.

A Sr.ª Presidente: - Com certeza, Sr. Ministro.
Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa (Alexandre Rosa): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira colocou duas questões que, do meu ponto de vista, são importantes, são elementos fundamentais, são elementos-chave, para todo este processo de reforma da Administração Pública, nomeadamente de reforma ao nível da análise dos custos de funcionamento da nossa Administração Pública.
Penso que um dos grandes problemas que temos pela frente, quando falamos de reforma da Administração Pública, tem que ver com a necessidade de se conseguirem três desideratos fundamentais: o primeiro tem que ver com a promoção da qualidade dos serviços que prestamos aos cidadãos e com a qualidade dos serviços da nossa Administração Pública; o segundo tem que ver com a necessidade inquestionável de promover aumentos significativos da produtividade dos serviços da Administração Pública; o terceiro, relacionado com os dois primeiros, tem que ver com o fundamental e necessário combate ao desperdício na nossa Administração Pública. É um desafio que temos pela frente! É um desafio que todas as empresas têm pela frente! É um desafio que a nossa Administração Pública tem que agarrar também de frente!
Neste sentido, o Orçamento baseado em actividades, o ABB, é um instrumento, a nosso ver, fundamental para se conseguir ir dando passos importantes na análise de todas as condições de funcionamento da Administração, no sentido de aumentar a sua produtividade e combater o desperdício.
O exercício que foi feito este ano, em sede de Orçamento, foi o de começar a apontar esta nova orientação para a elaboração dos orçamentos dos serviços. É um desafio que temos pela frente e que o Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública, em articulação com o Ministério das Finanças, está empenhado em desenvolver e em alargar cada vez mais a um maior número de serviços.
Temos noção de que estas questões, que são complexas para a máquina administrativa que temos, não se conseguem resolver carregando num botão, não se conseguem resolver de um momento para o outro. Há que ter uma perspectiva de aproximação progressiva com este objectivo estratégico de promover a execução e elaboração de Orçamentos baseados nesta metodologia de trabalho.
Gostava, no entanto, de dizer que temos em vias de conclusão uma proposta legislativa relativa ao lançamento daquilo a que chamamos "sistema de autonomias controladas de gestão", que pretendemos desenvolver de forma experimental com base na contratualização entre os serviços e o Governo para a promoção de processos de modernização e de qualidade desses serviços, que têm fundamentalmente como objectivo encontrar condições de maior autonomia de gestão desses serviços, a que corresponderá, naturalmente, maior responsabilidade pela gestão dos meios que lhes são disponibilizados. A abordagem orçamental para esses serviços que entrarem nesse sistema de autonomias controladas de gestão será necessariamente uma abordagem na metodologia do ABB, sob pena de, no fim do contrato que esses serviços estabelecerão com o Governo, não sermos capazes, sequer, de controlar os efeitos que esse processo de aprofundamento das autonomias tiver na melhoria da sua qualidade, no aumento da sua produtividade e no combate ao desperdício.
Em resumo, a abordagem ABB é estratégica não só do ponto de vista financeiro mas também como elemento propulsor da melhoria e da qualidade da nossa Administração Pública.
A segunda questão que coloca tem que ver com a desagregação e a afectação, à partida, dos valores orçamentais destinados a cobrir o movimento de promoções e de progressões na carreira dos funcionários públicos, deixando para a dotação provisional do Ministério das Finanças as verbas necessárias ao aumento salarial anual. Eu diria que esta forma de abordagem é boa, não confunde as questões.
Claro que esta evolução que se tem vindo a fazer facilita não só o processo negocial com os sindicatos mas também

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o melhor entendimento sobre aquilo de que estamos a falar quando falamos de aumentos salariais. Porque não é correcto, do nosso ponto de vista, quando falamos de aumentos salariais, estarmos permanentemente a confundir as diferentes dimensões que compõem a massa salarial.
No entanto, em termos de despesa pública, não podemos deixar de ter em conta que a massa salarial e a sua evolução são determinadas por um conjunto de factores e, como é natural, os efeitos volume contam para a massa salarial, os efeitos das promoções e das progressões contam para a massa salarial, da mesma forma que contam para a massa salarial os valores fixados para o aumento salarial anual.
Há diferentes factores que contribuem para a determinação da massa salarial e estes não podem ser escamoteados, dizendo nós que o esforço financeiro do Estado para o pagamento dos salários é apenas aquele que decorre da taxa de aumento anual, porque o esforço financeiro do Estado, ou seja, o esforço financeiro dos impostos dos contribuintes portugueses tem efeitos muito maiores do que aqueles que decorrem directamente do aumento anual salarial.
Em resumo, diria também que esta forma de afectação, à partida, dos valores orçamentais é correcta porque é clarificadora, mas não nos pode fazer esquecer que a massa salarial resulta de um conjunto de factores e não apenas da questão do aumento salarial anual.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): - Sr.ª Presidente, queria colocar duas questões ao Sr. Ministro, a primeira das quais está relacionada com a modernização da Administração Pública e a segunda com as questões salariais ou sociais do sector.
O Sr. Ministro sentiu-se na necessidade de interpretar e de dar uma explicação prévia a algumas declarações públicas que têm surgido nos últimos dias. Ora, o Sr. Ministro reconhecerá que estas declarações são oriundas do próprio Governo, porque ainda recentemente o Sr. Ministro Jorge Coelho deu uma interpretação à reforma administrativa, que, de algum modo, vai na linha do que o Sr. Ministro aqui referiu. Ou seja, disse o Sr. Ministro Jorge Coelho que se devia aproveitar a passagem à aposentação nos próximos 10 anos de cerca de 40% dos actuais efectivos do funcionalismo público para introduzir a necessária renovação e requalificação dos profissionais. No entanto, ontem, foi um ministro do mesmo Governo, o Sr. Ministro Pina Moura, quem veio dizer exactamente o contrário do que havia sido dito pelo Ministro Jorge Coelho. Disse o Sr. Ministro Pina Moura que se iria aproveitar esta renovação dos quadros da função pública para reduzir de forma significativa os seus efectivos.
Há, portanto, pelo menos em termos da opinião pública, duas linhas que são avançadas pelos mais altos responsáveis do Governo e que revelam uma confusão. Como tal, seria bom, até para a própria imagem do Governo, que o Executivo se entendesse primeiro "dentro de casa" e que só depois viesse publicamente dizer o que é que pensa sobre cada uma das questões em apreço. Somos, portanto, de parecer que, independentemente de percebermos bem a explicação dada no início desta reunião pelo Sr. Ministro, talvez fosse preferível para o Governo optar por uma estratégia diferente. Isto porque estamos em presença de uma reforma da Administração Pública que não respeita a este ou a àquele sector, a este ou àquele governo. É, de resto, um processo que, pelos vistos, não se pode concretizar de repente, já que não se pode, de uma penada, concretizar um processo que é inevitavelmente lento, que tem as suas fases, que mexe com todo o País e que, por isso, devia ser mais amplamente participado.
Como tal, pergunto ao Sr. Ministro se, de facto, não seria mais razoável que o Governo elaborasse um núcleo de princípios enquadradores dessa política de reforma da administração do Estado, apresentando esse documento ou essa proposta de diploma na Assembleia da República para ser debatida e participada pelos grupos parlamentares, por um lado, não deixando, por outro, de ser discutida e debatida pelos parceiros sociais. Não entendo, Sr. Ministro, como é possível um Governo que se diz de diálogo, que se diz defensor da concertação social, que tem sempre grande abertura para discutir e debater, aceitando as participações dos cidadãos e das instituições, avançar com um processo desta natureza, em que os sindicatos e os demais parceiros sociais são postos à margem. Não percebemos que política de diálogo é esta, não percebemos qual é o papel do Conselho Permanente de Concertação Social e não percebemos qual o papel dos sindicatos do sector num processo que, do nosso ponto de vista, devia merecer a intervenção, a participação ou a opinião responsável e construtiva de todos esses agentes. Isto para já não falar do caso concreto do Parlamento e dos grupos parlamentares.
Este processo, na nossa opinião, devia ser o mais amplamente participado, envolvendo as forças políticas e os sindicatos, e isso, lamentavelmente, não está a ser feito, até porque, como já disse, parece que é o próprio Governo que não sabe muito bem o que quer, já que o Sr. Ministro Jorge Coelho e o Sr. Ministro Alberto Martins dizem uma coisa e o Sr. Ministro Pina Moura diz outra coisa signficativamente diferente.
Gostava, portanto, de ouvir a opinião do Sr. Ministro sobre este assunto.
Gostaria de saber se o Sr. Ministro considera que a reforma da Administração Pública passa também pela valorização dos seus recursos humanos actuais. Isto porque não basta que uma percentagem de pessoas passe à aposentação para, depois, se recrutarem outras pessoas com outros perfis profissionais e outras capacidades profissionais. Também é preciso encontrar uma resposta para os cerca de 650 000 profissionais que estão actualmente na Administração Pública. O Sr. Ministro crê que os recursos disponíveis no Orçamento para a formação profissional são suficientes para introduzir essa mais-valia no domínio da formação profissional e no domínio da valorização dos recursos humanos actuais da Administração Pública? O Sr. Ministro crê que esses recursos são suficientes para responder a esse objectivo da melhoria das condições dos serviços a prestar aos cidadãos pela actual Administração Pública?
Passando à questão salarial, começaria por agradecer ao Sr. Secretário de Estado que, na resposta que deu ao Deputado Hasse Ferreira, fez o favor de tentar descodificar o que está por trás da proposta do Orçamento e da estratégia negocial do Governo com os sindicatos para os salários do próximo ano.
Sr. Ministro, nós percebemos que, depois da forma como as coisas correram no presente ano, não vai ser fácil ao

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Governo sair bem de todo este processo. Para o ano 2000, o Governo tinha prometido a melhoria dos salários, em geral, e, em especial, dos salários da Administração Pública. Por isso, aplicou unilateralmente um aumento de 2,5%, no pressuposto de que a inflação se situaria nos 2%. Todavia, como V. Ex.ª sabe, a inflação, em 31 de Dezembro, situar-se-á, muito provavelmente, nos 2,9% ou nos 3%, havendo, portanto, uma derrapagem de cerca de 50% em relação ao previsto, o que não abona nada quanto à fiabilidade das ideias e parâmetros que o Governo apresentou nos anos anteriores e que apresenta para o próximo ano.
No entanto, se o Governo continua a afirmar que os salários do próximo ano vão ter uma actualização que vai acautelar o poder de compra dos funcionários públicos, é evidente que tem de dar um aumento superior ao valor da "inflação razoável". Ora, o valor da "inflação razoável" para o próximo ano não vai ser de 2,7% ou de 2,8%, como o Governo diz, mas, sim, de 3,2% ou de 3,5%.

Vozes do PS: - Eh!

O Orador: - É evidente que o Partido Socialista parece estar incomodado, mas nós gostaríamos de estar errados, porque acreditamos que a inflação não favorece nada nem ninguém. Nós gostaríamos de continuar a conviver com uma inflação baixa, mas os números estão aí a desmentir o optimismo e ao autismo socialista e a dar razão às nossas dúvidas e às nossas críticas. O Partido Socialista e o Governo continuarão, portanto, a defender a sua tese, enquanto nós continuamos com as nossas opiniões, que são sustentadas em factos e em realidades e não em hipóteses irrealistas.
Nós constatamos, portanto, que o Governo, para acautelar esse poder de compra dos funcionários públicos, não pode deixar de considerar essa inflação realista para o próximo ano. Pergunto como é que o Governo compatibiliza esta actualização salarial de, pelo menos, 3,2% - que será, provavelmente, o valor da inflação no próximo ano e que, portanto, o leva a ter de propor aumentos superiores a esse valor para melhorar os salários - com a promessa feita pelo Sr. Primeiro-Ministro, segundo a qual iria compensar os trabalhadores da Administração Pública pela desvio de inflação que ocorresse neste ano de 2000. Lembro que o desvio existe, já que os senhores previram que a taxa de inflação no corrente ano seria de 2% e ela ficará nos 2,9% ou 3%. O Governo tem de ter, portanto, uma massa salarial para o próximo ano claramente superior àquela que tem vindo a anunciar.
Por outro lado, o Governo tem dito que as disponibilidades do Orçamento são suficientes para responder a esses compromissos. No entanto, Sr. Ministro, o Orçamento do ano passado previa um aumento de receitas de 9% e o Orçamento deste ano apenas prevê um aumento de 5,7%. Não percebo como é que o Governo consegue, com menos recursos, responder a exigências salariais mais elevadas, porque temos de ter em conta que não se trata apenas de actualizar os salários mas também de dar satisfação à promessa feita aqui pelo Sr. Primeiro-Ministro, dizendo que compensaria os trabalhadores da Administração Pública em cerca de 0,9% ou mesmo de 1%.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública.

O Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Arménio Santos, começaria por responder à primeira questão que colocou, que é importante, sobre as reformas da Administração.
Precisando a dúvida que o Sr. Deputado suscitou, posso dizer-lhe que não há qualquer falta de sintonia entre o que dizem os diversos membros do Governo. O que temos dito é que, com esta previsão - e falo em previsão porque está constituído um grupo de trabalho para aferir, com todo o rigor, qual é esse número - de 40% de funcionários ou membros da Administração Pública que, por atingirem o limite de idade, deixam, numa lógica de preenchimento do mesmo número, essa Administração Pública, está aberta a possibilidade (que devemos aproveitar) de requalificar a Administração Pública em termos de recrutamento e de formação. Isto, naturalmente, sem prejuízo da formação dos trabalhadores da Administração Pública que existe hoje e para a qual o Governo tem meios, nomeadamente do próprio Orçamento do Estado e dos fundos estruturais. De qualquer modo, sobre este tema da formação, será o Sr. Secretário de Estado a responder.
Em relação à falta de sintonia que o Sr. Deputado enunciou, saliento que o que tem sido dito é que há uma oportunidade que será preenchida.
No que respeita aos activos da Administração Pública e à sua previsão, como tive oportunidade de dizer no início, está a ser ultimado o recenseamento geral da Administração Pública para termos um número preciso e nítido. Depois de constituída essa base de dados, ela será actualizável a todo o tempo, de forma a que possamos saber o que é que temos na Administração Pública. Isto não obstante termos alguns números indicativos que os Srs. Deputados conhecem e que dizem que 48% da Administração Pública estão sediados no sector da educação, enquanto que cerca de 24% estão na saúde. Há aqui, portanto, zonas muito densas e fortes e é por isso que, sem uma real avaliação das necessidades e uma rigorosa atribuição das políticas de gestão provisional, não é possível dizer se temos ou não Administração Pública a mais ou a menos. Evidentemente, empiricamente qualquer um de nós poderia dizer que há serviços que, pela sua rentabilidade, aparentam ter gente a mais, como há necessidades que, certamente, irão aumentar em função das próprias obrigações de intervenção do Estado ao nível da segurança, da saúde e do ensino. Eu próprio tive a oportunidade de dar alguns exemplos, referindo que a ideia da polícia de proximidade e do reforço da segurança ou que a ideia do pré-escolar alteram uma lógica que seja simplista e quantitativa. Não há lógicas quantitativas para a Administração Pública, mas há lógicas de qualidade.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Com o recenseamento da Administração Pública, com algumas medidas que iremos tomar em termos de reforma da Administração Pública e correspondendo ao repto do Sr. Deputado, o que poderei dizer é que o Governo está disponível e interessado não só em discutir com os sindicatos - porque isso, em alguns destes domínios, é legalmente obrigatório - mas também em discutir com a Assembleia da República e em promover debates sobre a questão da Administração Pública e o recrutamento da mesma. Há algumas questões que são suficientemente importantes, porque são de regime, para serem partilhadas

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e por isso confesso que, quando me falam da reforma da Administração Pública, costumo dizer, a brincar, que há reformas das administrações públicas. Quero com isto dizer que há uma Administração Pública, mas que, para além da divisão jurídica que todos, juristas ou não, acabamos por fazer entre a administração central, regional e local, há várias administrações sectoriais. Há a administração da saúde, da justiça, da educação, da solidariedade social, etc. Todos estes são espaços específicos que têm identidades próprias e, portanto, a questão da reforma da Administração Pública acaba sempre por ser, na realidade, um conjunto de reformas das administrações públicas.
Facilmente identifico um conjunto de medidas específicas que constituem processos que, inevitavelmente, constituem uma reforma da Administração Pública. Em primeiro lugar, temos de reformar o recrutamento na Administração Pública, tanto dos quadros superiores, como dos funcionários públicos, que não são quadros superiores. Temos de aferir isso e temos de fazer uma avaliação.
Depois, temos de aferir a formação que é feita na Administração Pública e, com esta "janela" da oportunidade, há uma formação que é inevitável, que é a formação na sociedade da informação e do conhecimento, mas não só. Estas serão técnicas ao serviço de grandes objectivos de racionalização daquela que é a maior empresa portuguesa, que, como sabemos, é a Administração Pública, pela qualidade da qual passa, em grande medida, o desenvolvimento.
Temos ainda de discutir os modelos orgânicos da Administração Pública e, pela minha parte, já foram tomadas algumas medidas no sentido de discutir a questão dos institutos públicos e do procedimento administrativo em termos da deliberação. Está criada uma comissão para rever o Código do Procedimento Administrativo, não à luz de uma pura evolução e revisão jurídica mas à luz de novas necessidades de informatização na Administração Pública.
É preciso ver a coerência dos modelos orgânicos da Administração Pública e isso será feito. É preciso também ver a questão da Administração Pública em termos da simplificação administrativa e, como tive oportunidade de anunciar, já foram dados alguns passos nesse sentido com as Lojas do Cidadão, os Postos de Atendimento ao Cidadão (PAC), o Infocid e tudo o que é inovação tecnológica na Administração Pública, que acabam por ser caminhos inexoráveis nesta reforma horizontal e transversal.
É preciso também equacionar de novo a questão do mérito na Administração Pública, já que os senhores sabem tão bem como eu o que é a avaliação na Administração Pública. Essa é também uma reforma que vai ser feita, ao mesmo tempo que iremos regular a questão da gestão pública, razão pela qual alguns destes processos estão já encaminhados, enquanto outros estão em trânsito.
O debate público veio à superfície na sequência de uma resolução que está a ser ultimada em Conselho de Ministros e que, juntamente com o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa, tive a oportunidade de, nas reuniões da negociação colectiva, dar conta aos sindicatos, revelando quais eram os princípios dessa resolução quanto ao emprego público.
Como já referi, este diploma está a ser ultimado, será uma resolução, portanto não tem carácter normativo, mas político, isto é, trata-se de uma opção política que vai obrigar a um conjunto de medidas legislativas.
Ora, o que referi ao sindicato foram os princípios da resolução quanto ao emprego público. Esses princípios eram: racionalização da evolução dos efectivos na Administração Pública através da contenção do seu crescimento, relacionando o fluxo de entradas com o fluxo de saídas; criação de reservas de recrutamento nas carreiras gerais da Administração Pública; reforço das disciplinas de contratação de pessoal a termo certo; melhoria da operacionalidade do sistema de mobilidade de forma a que aproveite de modo mais eficaz os recursos já existentes na Administração, com a dinamização do recrutamento centralizado e a criação de uma bolsa de emprego na Administração Pública.
Trata-se, portanto, de um conjunto de medidas de inovação quanto ao recrutamento na Administração Pública que eu gostaria de acompanhar com outras medidas de carácter geral e em relação às quais há, da nossa parte, disponibilidade, interesse e empenho em vir discuti-las à Assembleia da República. É fundamental que a Assembleia da República, por intermédio dos diversos grupos partidários e com a representatividade política que tem, acompanhe o Governo numa reforma que é essencial e que é composta por um conjunto de várias reformas.
Portanto, esta é a minha resposta à primeira questão que o Sr. Deputado Arménio Santos colocou.
Quanto às outras questões, o Sr. Secretário de Estado tentará responder, se a Sr.ª Presidente o permitir.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Arménio Santos, permita-me, antes de mais, dizer-lhe que subscrevo inteiramente a preocupação manifestada por V. Ex.ª no que se refere à necessidade de um forte investimento na formação e na requalificação dos activos da Administração Pública.
Devo, aliás, dizer que esta é uma preocupação do Governo, exactamente porque neste processo de transformação da nossa Administração Pública e de substituição dos efectivos não temos a ideia de fazer passar todo o processo por uma política de dispensa de pessoas por força da sua maior ou menor desadequação às necessidades das administrações modernas, como sucede na nossa Administração.
Naturalmente que importa investir fortemente na formação dos activos, porque os que saem fazem-no por razões exclusivas do seu limite de idade e os que ficam têm que ser treinados e formados para que possam resolver melhor e prestar melhor o serviço que lhes cabe.
Diria, pois, que há três linhas estratégicas para a formação profissional dos trabalhadores da Administração Pública.
A primeira área de intervenção fundamental é a função estratégica para a direcção e para a liderança - uma questão que, às vezes, nos esquecemos de abordar quando falamos de formação, mas que é um assunto decisivo. Ou seja, enquanto não conseguirmos ter dirigentes da Administração Pública com capacidade de liderança e com projectos de empreendimento, dificilmente poderemos ter uma Administração Pública melhor, pelo que a intervenção da formação a esse nível é para nós uma questão estratégica.
A segunda dimensão da intervenção é a formação contínua, quer para a qualificação quer para a reconversão profissional dos activos. A formação inicial é, pois,

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importante para quem vem de novo para a Administração Pública porque, por mais formação que traga, quer da escola secundária quer universitária, precisa sempre de uma interface de formação para poder desempenhar bem as suas funções.
Em termos de uma resposta directa à sua questão quanto à existência ou não de recursos no Orçamento para dar sequência a esta preocupação e dinâmica - que, como disse, subscrevemos -, dir-lhe-ia que existem os recursos que pensamos adequados para esse fim. Designadamente, em termos de administração central, temos disponíveis para o período de vigência do III Quadro Comunitário de Apoio, isto é, entre 2000/2006, 10 milhões de contos para esta área de intervenção. Esta verba destina-se à administração central, já que a administração local tem verbas bastante maiores, porque tem afectos cerca de 40 milhões de contos para a formação dos cerca de cento e poucos mil funcionários que possui a todos os níveis nas diferentes câmaras. Aliás, devo dizer que, ainda hoje, o Conselho de Ministros aprovou o Programa FORAL para a formação autárquica com vista a canalizar, orientada e estrategicamente, esta disponibilidade financeira da ordem dos 40 milhões de contos.
Contudo, as verbas disponíveis para a formação não se resumem a estes dois instrumentos financeiros, dado que noutros sectores, como a saúde e a educação, há também programas de intervenção sectorial que também prevêem investimentos na formação. O PRODEP, por exemplo, ao nível da educação, é um instrumento de formação do subsector "educação" que está também vocacionado para essa área com verbas, do nosso ponto de vista, significativas.
No entanto, permita-me que lhe diga, a questão às vezes não é de dinheiro mas, sim, de orientação da formação e de encaminhamento estratégico das disponibilidades financeiras que temos.
Deste modo, gostaríamos de aceitar e promover um desafio no sentido de decididamente orientarmos os recursos financeiros para aquilo que é necessário, ou seja, para colocar a procura no comando da estratégia de formação e não a oferta, como, por vezes, acontece. Por vezes, a formação é condicionada pela oferta dos promotores de formação, sendo que nem sempre corresponde às necessidades mais reais dos processos de mudança e de modernização dos serviços públicos.
Esta é, pois, a grande questão que se nos coloca: investir na formação orientada para os processos de mudança e de modernização dos serviços públicos.
Uma nota final relativa à questão dos salários. Naturalmente que o Sr. Deputado tem o direito de discordar dos cenários macroeconómicos que o Governo apresenta a esta Assembleia no que toca à inflação. O Governo apresenta uma taxa de inflação para o próximo ano situada entre os 2,7% e 2,9%. Quanto a esta questão, quero dizer-lhe que discordar é um direito que nos assiste a todos, mas, obviamente, o cenário macroeconómico com que o Governo está a trabalhar é de 2,7% a 2,9% e não vamos, por força da discussão dos salários para a função pública, alterar o cenário macroeconómico que o Governo tem como bom. Por isso, parece-me que sobre essa matéria pouco haverá a acrescentar.
Assim, entendemos que os valores inscritos no Orçamento são suficientes para acomodar a revisão salarial para o ano 2001 e não impossibilitar o normal desenvolvimento das carreiras dos trabalhadores da Administração Pública em termos da progressão nos escalões e de promoções dentro das respectivas carreiras.
Contudo, quero alertar e relembrar esta Comissão para o facto de o Sr. Ministro das Finanças aqui ter dito, em resposta a uma questão levantada pelo Partido Comunista Português, que se sossegasse o Partido Comunista Português a inclusão de um adicional de 20 milhões de contos na dotação provisional do Ministério das Finanças afecta a esta questão o Governo estaria disponível para aceitar essa "almofada", para maior tranquilidade dos Sr. Deputados, embora o Governo pense que não será necessário recorrer a esse valor. No entanto, se isso tranquiliza o Parlamento, o Governo já disse, pela voz do Sr. Ministro das Finanças, que estaria disponível para aceitar esse reforço de 20 milhões de contos na dotação provisional.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro, apraz-me registar que o tabu já caiu, porque agora o Governo, o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado já podem falar com os sindicatos sobre actualizações salariais.
Mas, para além de tudo aquilo que acerca do assunto já referimos do ponto de vista político, nomeadamente através da apreciação que então colocámos, e para além da questão política global em que considerei ser absolutamente inaceitável o Governo não iniciar o processo de negociação salarial enquanto não houvesse a aprovação do Orçamento do Estado, não consigo resistir a referir que ainda por cima essa acção directa recaía sobre um membro do Governo - no caso, o Sr. Ministro. O que me faz lembrar um jovem estudante que, há uns 31 anos, em Coimbra, quis falar numa determinada cerimónia pública e a resposta que lhe deram foi: "Fala depois". Foi isso que o Sr. Ministro utilizou com os sindicatos. Ou seja, falamos, mas depois!…

O Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública: - Olhe que não!

O Orador: - Mas, caído que está o tabu sobre a questão da negociação salarial, gostaria de colocar algumas questões sobre este problema.
Começaria pela parte referida pelo Sr. Secretário de Estado quanto à abertura do Sr. Ministro das Finanças à inclusão de mais 20 milhões de contos no Orçamento do Estado.
Sr. Secretário de Estado, como na altura também tive oportunidade de dizer ao Sr. Ministro das Finanças, o meu problema não é de sossego para ter uma "almofada". Eu não quero "almofadas". O que eu quero é que as verbas inscritas no Orçamento sejam para distribuir pelos trabalhadores da função pública. Não é para ficarem na "almofada", para o Governo se encostar na "almofada" e ficar lá com aquela reserva, que depois não vai utilizar.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Esta é a questão central!
Mas agora iremos analisar mais a fundo a questão que se prende com a previsão da inflação.

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Não quero ser um pessimista, porque quando aponto para uma previsão de inflação de 3% no próximo ano, tenho consciência de que estou a ser optimista - aliás, basta recordar a intervenção do Sr. Ministro das Finanças a dizer que, no próximo ano, as tensões inflacionistas vão ser muito maiores do que as deste ano devido a factores diversos. Portanto, repito, quando aponto para 3% - é um número redondo -, tenho consciência de que estou a ser optimista.
Temos, pois, de partir deste princípio: se, numa perspectiva optimista, podemos prever uma inflação de 3%, se, no ano 2000, a negociação salarial com os trabalhadores da função pública foi feita com base numa previsão de inflação de 2%, se essa inflação, em vez de ser de 2%, é de 2,8%, se o Governo negociou de boa fé (e eu quero admitir que o fez), com base numa previsão de inflação de 2%, e ela passou a 2,8%, o mínimo exigível é que o Governo agora compense os trabalhadores da função pública por essa diferença de 0,8%.
Se, em 2001, o Governo compensar os trabalhadores da função pública em 0,8% e se lhe juntarmos a inflação prevista, numa perspectiva optimista, de 3%, dá 3,8%.
Ora, as verbas de que o Governo dispõe neste momento no Orçamento para aumentos salariais são de 70 ou 71 milhões de contos - porque uma é de 50 e tal milhões de contos e a outra é de 20 e tal milhões de contos -, o que dá, no máximo, aumentos salariais de 3,6%. Se aceitarmos a tese da compensação do ano 2000, que, julgo, é o mínimo exigível, isto significa que, à partida, o Governo está a prever aumentos salariais reais negativos para a função pública. Os economistas utilizam estas expressões. Como é que alguma coisa negativa pode ser aumento? Isto é uma redução dos salários reais em, pelo menos, 0,2%, para que não haja confusões.
É neste sentido que propomos que sejam atribuídos em termos de dotação provisional, para afectação exclusiva a aumentos salariais no ano 2001, mais 28 milhões de contos. Porquê 28 milhões de contos? Porque corresponde a um aumento da ordem dos 1,4%. O que, com os 3,6% que estão já no Orçamento, dará 5%. Tal significa, na perspectiva optimista de inflação de 3% para o ano 2001, que o aumento de salário real efectivo para 2001 para os trabalhadores da função pública nunca ultrapassará o 1,2%.
Esta é a questão central. Sobre isto não podemos divagar e a isto não podemos fugir, porque se o Governo mantiver a posição que neste momento tem, com as verbas que neste momento tem no Orçamento, isto significa que vai haver congelamento de salários reais em 2001, depois de ter havido no ano de 2000 decréscimo dos salários reais dos trabalhadores da função pública.
Ora, esta situação não é aceitável, porque não podem ser os trabalhadores da função pública a pagar com os seus salários, por exemplo, o congelamento do preço dos combustíveis, tal como não podem ser eles a pagar a isenção de mais-valias obtidas pela Petrocontrol.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Os trabalhadores da função pública não podem pagar com os seus salários as coisas que o Governo faz, e que eventualmente não deveria fazer, sendo que, no caso concreto da Petrocontrol, não tenho qualquer dúvida de que não deveria ter feito.

Protestos do PS.

A segunda questão, Sr. Ministro, tem a ver com o problema da actualização das pensões degradadas dos reformados e dos pensionistas da Administração Pública.
Em Maio deste ano, nesta Assembleia, em Plenário, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que apoia o Governo, chumbou um projecto de lei apresentado pelo PCP, porque garantiu que o Governo iria resolver o problema. No entanto, até agora, nada temos na Assembleia da República, vindo do Governo, para resolver essa questão. Isto é, não existe qualquer proposta de lei nesse sentido.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Aliás, foram divulgadas publicamente as linhas orientadoras de uma proposta que não responde a questões centrais, que foram os compromissos assumidos pela bancada do Partido Socialista, designadamente, para além da actualização extraordinária que é necessário fazer, a indexação das pensões aos salários dos trabalhadores no activo.
A questão que coloco, Sr. Ministro, é a seguinte: quando é que vamos ter algo para que a Assembleia da República se possa debruçar sobre essa matéria. E temos nós o nosso projecto de lei à espera da tal proposta do Governo, para podermos discutir em conjunto.
Passo à última questão, Sr.ª Presidente e Sr. Ministro, que tem a ver com o problema da reforma da Administração Pública. Não vou entrar na matéria substantiva, mas gostaria de levantar uma questão que se traduz numa dúvida, diria mesmo que se trata de uma dúvida existencial. Só que não é sobre mim mas sobre a orgânica do Governo. Esta questão foi suscitada publicamente pelo Sr. Ministro das Finanças e a dúvida que tenho, e que gostaria de ver esclarecida, é se essa matéria da reforma da Administração Pública está na tutela do Ministério das Finanças ou se está na tutela do Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não está em lado nenhum!

O Orador: - Julgo que vale a pena clarificar esta questão, para não haver confusões em termos futuros sobre com quem temos de discutir essas matérias, se é com o Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública, se é com o Sr. Ministro das Finanças.
Termino, manifestando uma concordância com V. Ex.ª, Sr. Ministro. De facto, a reforma da Administração Pública é constituída por um conjunto de várias reformas…

O Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública: - Exactamente!

O Orador: - … e talvez a mais prioritária seja a que V. Ex.ª há pouco referiu, que é a reforma do recrutamento na Administração Pública. Isto porque estávamos convencidos de que há três ou quatro anos atrás tínhamos avançado na reforma do recrutamento na Administração Pública e, afinal, estamos a ver que aquilo que foi aprovado na altura, ou seja, as leis que foram publicadas não estão a ser cumpridas, continuando a existir a lamentável situação de recrutamentos na Administração Pública que nada têm a ver com os critérios objectivos que, como todos referiram

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nas suas intervenções, devem presidir a esse mesmo recrutamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública.

O Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, agradeço muito as suas palavras e a lembrança do tal tabu com 31 anos, que é já um tempo um pouco longo. Em todo o caso, V. Ex.ª também se lembra. Portanto, a longitude do tempo é repartido por ambos!
Devo dizer que não tem razão! E não tem razão porque eu não disse - isso seria um mau exemplo - "falam depois". O que eu disse foi o seguinte… Aliás, o Sr. Deputado conhece bem a lei da negociação colectiva - porque a mesma foi votada favoravelmente pelo Partido Socialista, pelo Partido Comunista Português e por Os Verdes, em 1998 - e sabe que se trata de uma lei da negociação geral anual, que pode iniciar-se a 1 de Setembro e que termina aquando da votação final global do Orçamento do Estado. Ou seja, tem uma tempestividade que a associa à votação final global do Orçamento do Estado.
Ora, esta lei tem um conjunto de itens - penso que são cerca de 12 - para a negociação. Isto é, a negociação incide sobre vencimentos, pensões, prestações de acção social, extinção das relações de emprego, regime geral, duração do trabalho, férias, exercício dos direitos colectivos, condições de higiene, aperfeiçoamento profissional, disciplina, mobilidade, recrutamento e classificação de serviço.
O que foi dito aos sindicatos foi: "vamos discutir tudo isto que integra a negociação colectiva, mas a parte salarial, dado que estamos na iminência, por declarações públicas gerais, de que o Orçamento não passe, fica para termos uma aferição no dia 8 e, nessa altura, imediatamente apresentaremos uma proposta". E foi isto que foi feito.
Aliás, dissemos mais: "para que a negociação final não seja prejudicada por esta dificuldade do Governo de estar na iminência de, pela primeira vez, ter um Orçamento do Estado reprovado ou sem votação, garantimos, de qualquer forma, que as negociações terminarão antes de fins de Novembro". Isto é, dissemos aos sindicatos que aquele período em que não estávamos em condições de apresentar uma proposta não os prejudicaria, porque o final das negociações - que é, digamos, o momento essencial -, esse, terminará ao mesmo tempo.
Portanto, a situação foi cautelar, de prudência, de rigor e não de fugir. Teve apenas este objectivo!
Por outro lado, quanto à questão dos aumentos salariais e dos aumentos da função pública, devo dizer que, na última negociação colectiva, não conseguimos, nesta matéria, como noutras em geral, estabelecer qualquer acordo com as centrais sindicais e com as representações sindicais da Administração Pública e por isso não houve acordo. No entanto, unilateralmente, e assumindo as responsabilidades políticas daí decorrentes, propusemos um aumento de 2,5% para toda a função pública, com um aumento mínimo de 3000$, que abrangeu entre 140 000 a 150 000 funcionários. Ora, este aumento significou, em termos percentuais, valores que vão entre 2,5% a 5,2%, sendo que 25% dos funcionários públicos tiveram aumentos superiores a 2,5%.
O que o Sr. Primeiro-Ministro disse e o compromisso que assumiu foi o de que, se houvesse perda do poder de compra, ela seria reposta na proposta que iríamos apresentar. Portanto, se a taxa de inflação este ano for fixada em 2,7%, naturalmente que, em relação ao valor que apresentámos de 2,5%, haverá um diferencial de 0,2%; se a taxa de inflação for de 2,8%, esse diferencial será de 0,3%. Logo se fará essa aferição.
Na proposta do Governo, o ponto de partida foi um aumento de 3%, daí termos apresentado uma proposta de aumento de 3,2%, que poderá ser até, no caso, como sabe, de 3,3%. Portanto, foi esta a base que apresentámos.
Agora, naturalmente - o Sr. Deputado também não pretende isso, nenhum de nós teria essa pretensão estulta -, a questão da negociação salarial tem um espaço e uma instância próprios para se fazer, e não é, como sabe, porque votou a lei, que é uma lei da Assembleia da República, que queremos cumprir escrupulosamente… Aliás, eu cumpri-a desde o primeiro momento das negociações, porque na lei não diz que o Governo tem que apresentar uma proposta sobre esta matéria, tem é de negociar e discutir estas matérias, e a prioridade foi aquela que era possível para nós. Até usei uma expressão vinda, talvez, da culinária ou das artes domésticas, quando disse: "temos de 'saber as linhas com que nos cozemos', é por isso que queremos apresentar a proposta salarial". O Sr. Deputado não entendeu isso, viu aqui reserva mental, que não existiu, e até pôs o jovem a fazer coisas que ele, certamente, nunca fará na vida.

A Sr.ª Presidente: - Também para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa: - Sr.ª Presidente, é apenas para prestar um esclarecimento em relação à questão levantada sobre a actualização das pensões degradadas.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, há uma recomendação desta Assembleia, sob proposta do Partido Socialista, para que o Governo apresente uma proposta de lei, visando a resolução do problema das pensões fixadas até 30 de Setembro de 1989, porque é desta matéria que estamos a falar, porque se entende que o novo sistema retributivo teve um efeito na estrutura das remunerações da Administração Pública que afectou - entendemos, hoje, todos em geral, mas, na altura, nem todos entendemos a mesma coisa - os valores das aposentações das pessoas aposentadas antes da entrada em vigor do novo sistema retributivo.
O sentido da orientação da recomendação desta Assembleia não é, na nossa leitura e no nosso entendimento, o sentido que o Sr. Deputado Octávio Teixeira lhe quer atribuir. Nada está escrito na recomendação da Assembleia da República que aponte para a indexação das pensões aos salários do activo.
Sei que é essa a proposta do Partido Comunista Português, do Bloco de Esquerda, do PSD, todos os partidos defendem, efectivamente, o esquema da indexação das pensões aos salários do activo, mas o que o Estatuto da Aposentação diz é que as pensões são anualmente actualizadas de acordo com os aumentos salariais do activo. Ou seja, se os salários do activo foram aumentados este ano 2,5%, as pensões também foram aumentadas 2,5%.

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No entanto, o Estatuto da Aposentação não prevê que, quando se opera uma revalorização ou uma reclassificação de uma qualquer carreira, as pessoas que já não estão no activo tenham de ser indexadas. Não prevê, por exemplo, que, se uma pessoa pertencente à carreira de engenheiro, que hoje tem uma determinada estrutura salarial, vir essa carreira revalorizada daqui a 10 anos por força da valorização dessa actividade profissional, os engenheiros aposentados tenham de ser reclassificados como se estivessem no activo.
Portanto, eu diria que, em relação a este problema da indexação das pensões aos vencimentos do activo, não encontrarão na proposta do Governo nada que aponte nesse sentido, não só porque não é essa a recomendação da Assembleia da República mas também porque o Governo discorda dessa matéria. E alertava para o perigo em que podemos estar a colocar-nos se defendermos matérias dessa natureza, porque, então, se calhar, temos de repensar todo o sistema das pensões, nomeadamente do regime geral da segurança social, que, como sabem, não tem qualquer mecanismo de indexação à mudança da estrutura laboral e da estrutura das profissões no activo. Portanto, esta questão, do nosso ponto de vista, é séria e complicada.
Portanto, a proposta do Governo vai no sentido daquela proposta que foi divulgada pelos diferentes grupos parlamentares, que já negociámos com os sindicatos, estando o processo de negociação já concluído.
Posso dizer aqui, hoje, que a proposta de lei vai ser agendada num dos próximos Conselhos de Ministros para ser aprovada e remetida a esta Assembleia, mas com esta garantia de que as pensões serão revistas com efeitos a partir de 1 de Janeiro do ano 2001.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Com efeitos a partir de quando?

O Orador: - De 1 de Janeiro de 2001! O compromisso que há, e que, aliás, sempre houve desde a discussão das diferentes propostas, é que teria efeitos em 2001, e esses efeitos produzir-se-ão em 2001 com a proposta que o Governo aqui vai apresentar, que, naturalmente, é uma proposta diferente da do Partido Comunista Português.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública, em primeiro lugar, quero cumprimentá-lo e dizer-lhe que apreciamos o bom senso que vai pondo nas coisas que vai dizendo, mesmo falando depois e, portanto, dando respostas posteriores a essas questões essenciais, como disse o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Não quero fazer-lhe a maldade de voltar a trazer aqui a questão dos aumentos, porque essa questão essencial já foi suficientemente discutida, seja em termos de salários, seja em termos de pensões, não quero ir por aí, e também não quero fazer uma outra maldade, que é entrar na discussão de fundo, porque temos tempo para isso e acho que não é nem o tempo nem a hora, porque estamos muito em cima das "artes culinárias", designadamente das do almoço, e, portanto, talvez não seja a melhor hora para isso, de saber até que ponto é que este Orçamento do Estado e as suas circunstâncias acabaram de derrotar todos os seus grandes objectivos, designadamente em termos de reforma do sistema político.
Esta era uma pergunta que faria muito sentido, porque, de facto, em relação a todas as propostas que tinha, seja em termos de reforma da lei eleitoral para a Assembleia da República, seja mesmo em termos de reforma da lei eleitoral para as autarquias locais, penso que a primeira grande conclusão a tirar é a de que foram completamente derrotadas pelas circunstâncias e pela forma como este Orçamento foi aprovado.
Portanto, este seria, certamente, um tema de grande discussão e de grande preocupação, como é evidente, porque tudo aquilo que foi dito até hoje e todas as propostas que o Governo apresentou nesta matéria, se dúvidas existissem, acabaram de ser derrotadas pelas circunstâncias estranhas em que este Orçamento é aprovado.
Deixando este tema, poderia passar para um segundo, a lei dos partidos, e perguntar-lhe por que razão, sendo esta uma matéria que tem estado, e estará brevemente, na actualidade política, também não tem qualquer referência quer nas Grandes Opções do Plano quer no relatório do Orçamento do Estado, e faria todo o sentido que aí estivesse mencionada, uma vez que se faz referência à reforma das várias leis eleitorais.
Deixando esta dúvida para discussão posterior, irei passar a algumas questões concretas, que lhe são mais simpáticas ou, se quiser, onde estaremos mais facilmente de acordo, porque todas lhe são simpáticas, como é evidente, como sejam, a modernização administrativa e, designadamente, a questão das Lojas do Cidadão, que o Sr. Ministro já referiu hoje várias vezes.
Na análise que fizemos, verificámos que a maior parte das Lojas do Cidadão que estão previstas agora, por exemplo, para Coimbra, para Aveiro, para Leiria, para Setúbal e a segunda para Lisboa, já estavam previstas no Orçamento do Estado para 2000 e continuam previstas para 2001. Portanto, a primeira questão é óbvia: por que é que estas Lojas não surgiram ainda em 2000? Concretamente, o que vai ser executado em 2001? O Sr. Ministro tem prazos e calendarização para a execução quer das Lojas do Cidadão quer dos Postos de Atendimento ao Cidadão?
Por outro lado, gostaria de saber se o surgimento dessas mesmas Lojas contempla ou não o encerramento de outros serviços, ou seja, se há ou não uma relação directa entre o surgimento destas Lojas e destes Postos de Atendimento e o encerramento de outros serviços, como poderia ser decorrência normal.
A terceira pergunta concreta é esta: em termos de contratualização com entidades privadas, que é também uma aposta do seu Ministério, pelo que sabemos, o que é que está feito? Existe algum estudo em que essa entrega contratualizada se baseie? Se existe, pode esse estudo ser dado a conhecer à Assembleia da República?
Em termos de desconcentração, recentemente o Governo referiu como uma questão importante, ainda que, depois, tenhamos também, obviamente, uma delegação em Lisboa, a transferência da sede do Instituto de Medicina Legal para Coimbra. Pergunto-lhe se mais alguma coisa desse tipo e nesse modelo está previsto.
O meu partido, em tempos, chegou a defender a transferência de outras instituições, incluindo o próprio Tribunal Constitucional - e, nesse caso, era para Coimbra -, tendo apresentado um projecto de lei nesse

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sentido, que, enfim, poderá não ser o tema central hoje em dia. Mas está prevista ou não a transferência de algumas instituições fundamentais para outras cidades, numa lógica de desconcentração e de valorização dessas mesmas cidades?
Quero ainda perguntar-lhe quando é que o recenseamento em relação à função pública, opção fundamental para tudo o que se venha a fazer a seguir, estará efectivamente concluído, porque me parece essencial para qualquer reforma, pois há sempre questões de fundo que são antecedentes das reformas que se vão fazer. Efectivamente, esse recenseamento devia estar concluído há muito tempo e também devia ser do conhecimento do Governo e da própria Assembleia há muito tempo.
Isto tem a ver com uma última questão que quero deixar, que é a de que o Sr. Ministro terá sempre de falar depois. Porquê? Porque o recenseamento não está concluído, havendo opções fundamentais que decorrem dele que não podemos tomar, e porque, até hoje, no que respeita modelo, quer o Sr. Ministro quer o Sr. Secretário de Estado usaram palavras que, penso, são caras a toda a Assembleia e a todas as bancadas, sem excepção, tanto aos que foram a favor como aos que foram contra a regionalização, como "descentralização" e "desconcentração" (com uma posição ou outra, todos encaramos com simpatia essas palavras), mas não conseguimos saber qual é o modelo exacto. Quer dizer, estamos a discutir antes uma coisa para a qual não sabemos qual é exactamente o modelo para que o Governo aponta.
Ainda há pouco tempo, participei num debate com inúmeros responsáveis de vários partidos, como o Sr. Presidente da Assembleia Municipal de Lisboa, creio que o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira também esteve presente num dos painéis dessa discussão sobre o modelo de evolução da administração local, designadamente, e o estudo não é conhecido, pelo menos eu não o conheço, não sei se o Sr. Ministro o conhece, não sei se tem já conclusões sobre esse estudo e não sei o que quer fazer com ele.
Nós temos dito, ainda que de uma forma embrionária, com os dados de que dispomos, que, em qualquer reforma, seja a nível da desconcentração, seja a nível da descentralização - esta mais difícil, como é evidente, porque ela só pode ser feita para entidades eleitas democraticamente, designadamente para os municípios -, sobretudo, a nível da desconcentração, que nos parece fundamental valorizar os distritos. Ora, nós não sabemos se essa é uma opção, se vai ser feita e em que termos que vai ser feita.
Por exemplo, um dos temas que estava em discussão no debate em que participei era a situação das assembleias distritais. Acredita o Sr. Ministro que tenho falado com colegas meus, autarcas, e alguns até autarcas do poder, que não sabiam que existiam vereadores, que não sabiam que existia uma assembleia distrital?!

Vozes do PS: - Eram do CDS-PP!

O Orador: - Não eram do CDS, estejam descansados. Mas podiam ser do CDS!
Quer dizer, ficou aí um organismo perdido no meio das múltiplas reformas, que não tinham qualquer contacto com ela. De facto, ficou aí um organismo perdido, cujas funções não são conhecidas, cuja utilidade não é conhecida, que faz umas obras de recolha de dados, de estudo e de não sei quê, que tem funcionários que recebem mal porque quem tem de lhes pagar são as câmaras municipais, e elas, muitas vezes, já se esqueceram das assembleias distritais, que não têm qualquer lógica no "edifício" actual e que, portanto, ficaram completamente perdidas.
Isto só para demonstrar que não temos uma ideia de fundo. Temos nostálgicos da regionalização e, depois, não temos uma ideia de fundo sobre qual é o modelo exacto de descentralização e de desconcentração, o que permite que haja essas entidades perdidas.
Não me vou alongar mais, Sr. Ministro.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública.

O Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, agradeço as suas perguntas, mas, evidentemente, estaria fora de hipótese eu pensar qualquer maldade da sua parte. Acho que o Sr. Deputado seria absolutamente incapaz disso e, portanto, não precisava de fazer essa enunciação prévia.
Relativamente às questões que colocou, e não obstante a sua falta de pertinência orçamental, creio que vale a pena dar-lhes a seguinte resposta: não podemos confundir as realidades com desejos. A lei eleitoral para as autarquias locais ou a lei eleitoral para a Assembleia da República estão incluídas no Programa do Governo e os seus calendários são fixados pelo Governo quando tomar a iniciativa de apresentar esses diplomas. Um deles já está na Assembleia da República e, no que se refere ao outro, o trabalho já está elaborado. Portanto, oportunamente, o Governo aferirá da oportunidade da sua apresentação.
Compreendo que o Sr. Deputado gostasse que essa matéria tivesse sido, em absoluto, afastada, mas não, está no Programa do Governo.
Quanto a outras questões da reforma do sistema político, gostaria de lhe lembrar que há duas que estão cumpridas. As próximas eleições do Presidente da República vão fazer-se já no quadro das duas leis fundamentais que a Assembleia aprovou: uma, é a lei que define o universo eleitoral, o direito de voto dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro; outra, é a lei para o financiamento das campanhas eleitorais, que vai também já ter tradução, e foi votada por todos nós na Assembleia, aliás, pelos Srs. Deputados - desculpem-me este "nós", que é um "nós" afectivo -, na sequência de iniciativas políticas em termos de reforma política.
Quanto à descentralização em geral, e deixando a questão das Lojas do Cidadão para o Sr. Secretário de Estado responder, devo dizer que já há algumas medidas concretas, como teve oportunidade de dizer, relativamente às competências das autarquias, ao próprio Quadro Comunitário de Apoio em termos de desconcentração, e o Governo, em termos do seu Programa de Governo, organizará a oportunidade política de apresentação das suas propostas num quadro que a si próprio definiu, uma vez que criou uma comissão para elaborar um conjunto de estudos e de trabalhos, a qual está a desenvolver normalmente o seu trabalho e apresentará as suas propostas logo que o termine. Julgo que, em Janeiro, apresentará as suas propostas e o Governo, depois, aferirá os próprios relatórios de trabalho dessa comissão e adoptará as medidas e iniciativas legislativas que decorrerem dele.

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Trata-se, como sabe, de uma comissão interministerial e, portanto, nessa altura, traremos à Assembleia, se essa for a opção do Governo, as medidas que decorrem do trabalho, aliás, muito profícuo, dessa comissão.
Peço agora à Sr.ª Presidente que permita ao Sr. Secretário de Estado completar as minhas respostas.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, de forma muito rápida, quanto às Lojas do Cidadão, gostava de dizer o seguinte: se o Sr. Deputado Telmo Correia tiver o cuidado de olhar para o Orçamento do Estado para 2000, verificará que, deste conjunto de Lojas do Cidadão, quase todas estavam lá, com excepção da de Braga, que é uma loja nova, mas também verificará que as verbas inscritas em PIDDAC para estas Lojas eram, pela sua dimensão, tipicamente de arranque, destinavam-se a introduzir em PIDDAC um projecto para se começar a trabalhar nele, uma vez aprovado.
As coisas passam-se assim, como é comum, em muitos projectos, nomeadamente quando aqui se discute o PIDDAC, em que se mete uma pequena verba para sinalizar para, depois, o projecto ter continuidade. É assim que normalmente se faz.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Por isso é que a pergunta faz sentido!

O Orador: - Claro! Mas eu explico-lhe rapidamente em que situação estamos relativamente a essas Lojas.
As Lojas do Cidadão em Aveiro e em Viseu, duas Lojas que estavam incluídas no Orçamento do Estado para 2000, vão abrir as suas portas, respectivamente, no dia 4 de Dezembro e no dia 20 de Dezembro, ou seja, até ao fim do ano 2000 estas duas Lojas vão entrar em funcionamento. Portanto, temos mais duas Lojas até ao fim do ano 2000.
Relativamente às restantes que aparecem identificadas no PIDDAC para o ano 2001 e que, com excepção da de Braga, já vinham do PIDDAC de 2000, dou esta informação: relativamente à Loja do Cidadão em Setúbal, temos neste momento em ultimação o processo negocial para as instalações que vamos arrendar para o efeito. Já há a devida avaliação da Direcção-Geral do Património e estamos agora em fase de negociação final com o proprietário para que se possa fazer o arrendamento dessas instalações.
Em situação idêntica está a de Braga. Estamos a proceder à negociação final do contrato de arrendamento para instalações também já identificadas como adequadas para este projecto.
Relativamente à de Coimbra, temos em vista um edifício para a respectiva instalação, edifício que está a ser negociado para se poder depois avançar com as obras de adaptação.
Relativamente à de Leiria, não temos ainda instalações, porque se lançou um anúncio para recebimento de oferta de instalações disponíveis na cidade de Leiria e apenas recebemos uma resposta que consideramos desadequada, pelo que continuaremos, em articulação com a Câmara Municipal de Leiria e com o Governador Civil de Leiria, a procurar instalações para a Loja do Cidadão de Leiria.
Relativamente a Lisboa, estamos, neste momento, em fase de ultimação do processo de escolha da localização da segunda Loja do Cidadão.
Em suma, dir-lhe-ia que, no ano 2001 - se olhar para o PIDDAC, poderá retirar essa conclusão -, será possível lançar todas estas Lojas, não querendo com isto dizer que todas abrirão em 2001, mas todas vão ter o seu processo de lançamento em 2001, e, quando chegarmos ao fim do ano 2001, concluiremos que umas estarão abertas, outras em fase de obra e outras em fase de início do processo. De qualquer forma, ao longo do ano, todos estes projectos serão desenvolvidos.
Mais: face ao estado de desenvolvimento de cada um dos projectos, poderemos dizer com segurança que as Lojas do Cidadão em Setúbal, Coimbra e Braga (e gostaríamos que, em Lisboa, também isso foi possível para a segunda Loja do Cidadão) abrirão ao público no ano 2001.
Relativamente aos Postos de Atendimento ao Cidadão, está prevista a abertura de mais nove, a juntar aos dois que já abriram. Mas há uma coisa nova em matéria de Postos de Atendimento ao Cidadão, recentemente aprovada por resolução do Conselho de Ministros: é que a estratégia para este novo produto é a sua disseminação pelo País, em ligação com a rede de Lojas do Cidadão, ou seja, fazer evoluir Postos de Atendimento ao Cidadão em forma de cogumelo à volta de cada uma das Lojas do Cidadão para que se possa fazer a dispersão desta oferta de serviços às zonas e localidades onde não é preciso nem adequado lançar Lojas do Cidadão. Isto significa que a ideia estratégica é a de dotar todo o País de Postos de Atendimento ao Cidadão, instrumentos bastante menos consumidores de investimento mas que levam às pessoas os benefícios da Loja do Cidadão.
Finalmente, em relação aos efeitos que as Lojas do Cidadão têm no encerramento de serviços públicos, naturalmente que essa é uma questão que nos preocupa e faz sentido olhar para as Lojas do Cidadão como elemento de racionalização da oferta dos serviços públicos ao nível das diferentes zonas do País. Quando falamos de grandes cidades, como Lisboa, Porto, Setúbal, Coimbra, etc., pensamos que não vamos ter ainda a oportunidade de assistir ao encerramento de serviços por via do aparecimento das Lojas do Cidadão porque se trata, nestes grandes aglomerados, de aumentar a oferta daquilo que está instalado. Obviamente que com um maior alargamento de Lojas do Cidadão e uma entrada em cidades de menor dimensão, o problema do encerramento dos serviços vai colocar-se e um dos objectivos é que, através da Loja do Cidadão, se possam introduzir elementos de racionalização.
Dou-lhe um pequeno exemplo, que não tem grande relevância - não queria aqui alardeá-lo como um elemento de propaganda: mesmo em Aveiro, o facto de haver uma Loja do Cidadão a partir do dia 4 de Dezembro, levou a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, que tem um posto de atendimento fora da Repartição de Finanças, a reafectar e a reduzir o número de pessoas que estão nesse posto porque vai abrir mais um posto de atendimento para os impostos. Portanto, são mecanismos deste tipo, de racionalização, que as Lojas também permitem e que queremos desenvolver.
Tenho de confessar que o problema do encerramento de serviços, ou da racionalização do seu funcionamento, se surgirão de forma mais visível nas cidades de menor dimensão e talvez não tanto nas cidades de grande

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dimensão, como são aquelas onde as Lojas, neste momento, estão a ser edificadas.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, penso que já todos os grupos parlamentares fizeram as suas intervenções e o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado deram as respostas.
Neste momento, vou dar a palavra aos Srs. Deputados que se inscreveram, mas com limitação de tempo, que será de 3 minutos por cada intervenção, e peço também ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado que sejam muito concisos nas respostas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, registo que, na sua intervenção inicial, tentou lavar aqui a atitude inaceitável e malcriada do Ministro de Estado, Jaime Gama, aquando do debate na generalidade. Sei que, como lhe é próprio, o Sr. Ministro tentou fazê-lo de uma forma elegante mas, com toda a franqueza, não sei se lhe ficou bem. O que sei é que o Sr. Ministro não conseguiu explicar nada!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Essa primeira expressão inicial era a sua assinatura, não era?

O Orador: - Sr.ª Presidente, eu não sei se estamos em diálogo!

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, dado o adiantado da hora, agradecia que fosse conciso e directo à pergunta ao Sr. Ministro, sem nenhum tipo de considerações. Se tem alguma questão a colocar ao Sr. Ministro a que ele possa responder, agradeço que a coloque. Quanto a outro tipo de considerações, agradecia que não as fizesse.

O Orador: - Sr.ª Presidente, continuando o que estava a dizer, acho que o Sr. Ministro não conseguiu explicar porque razão, no Orçamento do Estado, não se consegue encontrar nada relativamente à existência do novo instituto que o Governo, na sua Lei Orgânica, recentemente aprovada, vai lançar no ano 2001. De resto, o relatório do Orçamento do Estado é claro quando refere, inclusivamente, que o Ministério da Reforma do Estado tem apenas dois serviços autónomos - estou a ler, é a única coisa que cá vem!
Muitas das questões que eu queria colocar já o foram pelo Sr. Deputado Telmo Correia e as explicações que o Governo podia dar já foram dadas; contudo, queria perguntar ao Sr. Ministro se é ou não verdade que o Governo, a propósito da estruturação territorial da Administração, pretende repescar a ideia desastrada dos comissários regionais, agora sob a forma de sub-secretários regionais, conforme foi noticiado na comunicação social.
Outra questão que peço ao Sr. Ministro que, de uma forma mais conclusiva, nos explique refere-se ao problema da eventual contratualização ou não, já existente durante o ano 2000, como foi promessa do Orçamento do Estado para o ano 2000, com entidades fora da Administração de serviços próprios da Administração. Porque, Sr. Ministro, não vale a pena falarmos em necessidade de redução de funcionários na Administração Pública enquanto não houver uma identificação clara de quais são as áreas de onde o Estado pode retirar-se, em termos de prestação de serviços aos cidadãos; e essa identificação clara passa também, obviamente, pelas experiências de contratualização própria com serviços fora da Administração.
Não me alongo mais porque não tenho tempo, mas pedia-lhe, Sr. Ministro, que tentasse adiantar alguma coisa sobre esta matéria.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, duas ou três questões muito breves que têm a ver com os institutos públicos e com aquilo que o Sr. Ministro já aqui nos trouxe, dizendo que o crescimento exponencial dos institutos públicos visava, na opinião do Governo, aligeirar procedimentos da Administração Pública e, nalguns casos, isso não aconteceu.
Cito, como exemplo, a questão do Instituto da Aviação Civil, em que 80% do pessoal, na altura, do serviço da Aviação Civil era pessoal técnico e 20% administrativo, com apenas 18 dirigentes. Com a criação do Instituto, passou para 70% o pessoal administrativo, 30% o pessoal técnico e os dirigentes cresceram de 18 para 59. Há, nesta matéria, uma situação complicadíssima. No Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, que o Governo trouxe à Assembleia - e o PCP votou contra - os contratos, hoje em dia, são contratos "à peça", são contratos com base na lei geral, são contratos na Administração Pública… Enfim, uma miscelânea que não se compreende porque em secretárias ao lado umas das outras estão vários técnicos a vencerem de forma totalmente diferenciada, o que não é admissível.
Quando o Sr. Ministro nos diz que há um grupo de trabalho a estudar esta situação e que haverá uma discussão pública sobre esta matéria, o problema é qual o entrosamento que é feito com os sindicatos, porque os sindicatos conhecem perfeitamente o que é a Administração Pública, a reforma da Administração Pública ou das várias administrações públicas (estou de acordo com o Sr. Ministro quando diz isso), conhecem essa situação. Qual é a participação e o envolvimento dos sindicatos nisso?
Por outro lado, foi criado um forum da Administração Pública, em que havia vários intervenientes, desde sindicatos a, nomeadamente, representantes de várias instituições - Associação Nacional de Municípios Portugueses, por exemplo - mas que não funciona, tanto quanto tenho conhecimento. Esse forum devia funcionar para fazer alguma aferição, mas não funciona. Gostava que me dissesse alguma coisa sobre isso.
Por último, há uma situação em que estamos de acordo - e o meu camarada Octávio Teixeira já falou sobre isso -, que é o recrutamento na Administração Pública. Nós julgávamos que, com a integração, em 1996, dos funcionários que estavam a recibo verde, o problema estaria resolvido. Mas não. Há um contraditório entre aquilo que é a declaração política do Governo e a sua prática, porque, nestes últimos anos, têm entrado na Administração Pública, em situação precária, muitos trabalhadores. Esta é uma situação clara e objectiva que tem de ser resolvida, de uma vez por todas, com clareza.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública.

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O Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública: - Sr.ª Presidente, serei telegráfico, correspondendo à sugestão da Sr.ª Presidente.
Sr. Deputado Rodeia Machado, quanto à questão dos institutos públicos, a realidade não é conhecida, os sindicatos não a conhecem, mas está a ser feito um levantamento exaustivo, rigoroso. O objectivo deste grupo de trabalho é a identificação da pertinência da criação dos institutos públicos, a identificação das áreas ou funções que devem ficar reservadas a directores-gerais, a definição de regras aplicáveis aos institutos públicos e a elaboração de um conjunto de programas, de propostas, de iniciativas legislativas. A identificação desta situação vai ser feita pela primeira vez na existência do Estado democrático.
Portanto, rigorosamente, a realidade não é conhecida e devo dizer-lhe que não é conhecida nem por mim. Em função da informação que vou recebendo é que vou tendo uma informação mais ou menos precisa do que existe, e essa informação tem vindo a ser aprofundada, uma vez que não havia um levantamento rigoroso.
A questão dos institutos públicos não nasceu com este Governo mas há muito e, em si, a ideia do instituto público é uma ideia positiva de agilização da Administração Pública. Do que se trata é da sua adequação, racionalidade, métodos de gestão e objectivos que prossegue. Mas o grupo de trabalho está a funcionar e, se tivermos um pouco de paciência, o trabalho será apresentado a curto prazo.
Há ainda uma questão que o Sr. Deputado Rodeia Machado colocou e que o Sr. Secretário de Estado fará o favor de responder.
O Sr. Deputado Luís Marques Guedes colocou três questões, penso eu.
Quanto à questão da comissão e às propostas do Governo relativamente a essa matéria, devo dizer a comissão elaborou um trabalho que será oportunamente ponderado pelo Governo relativamente às soluções. Portanto, não há qualquer assunção pública ou até reservada do Governo relativamente a esta matéria - há relatórios, há estudos. Eu vi a notícia a que o Sr. Deputado fez referência, mas não há qualquer opção política neste momento relativamente aos trabalhos da comissão. Devo dizer que ainda não pude acompanhá-los com toda a minúcia, embora conheça os trabalhos no geral.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A notícia é verdadeira!

O Orador: - Eu não me pronuncio sobre as notícias que vão saindo acerca de grupos de trabalhos que estão em fase de elaboração do seu trabalho. Não pode haver notícias que sejam precisas quanto a relatórios avulsos de grupos de trabalho que não tenham a sindicação política, já que é para isso que os grupos de trabalho são constituídos. Além do mais, tendo em conta a fase do próprio grupo de trabalho e da própria elaboração dos relatórios que, um pouco por todo o lado, temos visto na comunicação social. Aquilo que há, e que é um compromisso do Governo, é a criação de uma entidade intermédia a nível regional, mas essa está no Programa do Governo e foi sufragada na Assembleia da República.
Segundo, a questão do instituto. Como já tive oportunidade de explicitar no início desta nossa reunião, houve uma alteração de uma Secretaria de Estado que passou a Ministério e que tinha três institutos, e mantém-nos. Em dois deles, há pequenas alterações. No caso do INA, que é um instituto de 1992; no caso do Instituto das Lojas do Cidadão, que é um instituto de há dois ou três anos; e no caso do Instituto da Gestão de Base de Dados, que penso substituir pelo Instituto de Inovação da Administração do Estado, extinguindo o Instituto da Gestão de Base de Dados e o Secretariado da Modernização Administrativa. Passo assim de uma Secretaria de Estado a um Ministério emagrecendo organicamente o próprio Ministério comparado com a Secretaria de Estado.
Relativamente à questão específica que o Sr. Deputado colocou, mais específica ainda, o que é dito no Orçamento está bem dito. Não fala no instituto, nem tinha de falar, porque a Lei Orgânica do Ministério, no seu artigo final, o 20.º - era o último e, por isso, eventualmente, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes não o leu! - diz o seguinte:…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Li, li!

O Orador: - … "1 - O património dos serviços a extinguir, incluindo activos e passivos e, bem assim, os direitos e obrigações em que se encontram constituídos, transferem-se, por força do disposto no presente diploma, em termos a estabelecer por despacho do Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública, para os serviços que passam a deter atribuições e competências análogas.
2 - Aos serviços e organismos que sucedem aos agora extintos ficam consignadas as verbas orçamentais que a estes estão destinadas pelo Orçamento do Estado no presente ano económico". Isto é, aquilo que era atribuído ao Instituto da Gestão de Base de Dados e ao Secretariado da Modernização Administrativa passa para esse instituto. Não há qualquer alargamento, nem aprofundamento, nem reforço de verba, uma vez que há este trânsito.
Se a Sr.ª Presidente me permite, passo a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa para complementar a resposta.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa: - Sr.ª Presidente, de forma muito rápida, porque o tempo já é pouco, vou fazer apenas uma nota relativa à questão colocada pelo Sr. Deputado Rodeia Machado, acerca do trabalho precário na Administração Pública.
Penso que valeria a pena se conseguíssemos entender-nos sobre os vários números. Hoje, fiquei alarmado porque vi num jornal alguém dizer que me tinha sido atribuído o reconhecimento de que havia 40 000 trabalhadores precários na Administração Pública. É um número que não existe em lado nenhum, nunca ninguém conseguiu fazer essa contagem. Gostaria de dar esta informação ao Parlamento. Os dados de que dispomos, em termos daquilo que é legalmente informado pelos diferentes serviços da Administração Pública ao Ministério da Reforma do Estado, apontam para que a situação em 31 de Julho de 2000, em matéria de contratações a termo certo na Administração Pública, ronda as 13 000 pessoas, das quais cerca de 7000 ou 8000 são da administração central e o resto da administração local. Refiro isto para termos também a ideia de que este problema do recurso às contratações a termo, legalmente utilizado, não é um problema apenas da

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administração central mas também da administração local. Aliás, a tendência na administração local é de crescimento e a da administração central é de decréscimo.
A questão que aqui se nos coloca é a de que, por vezes, nos assusta a ideia da contratação a termo certo; mas o contrato a termo certo não é nenhum crime - está consagrado na lei.
Quanto à questão que se coloca acerca dos contratos a termo certo, dir-lhe-ia que onde eles existem mais (e vale a pena falarmos claro) é fundamentalmente em dois sectores da administração central: saúde e educação, sendo que, por exemplo, na educação muitos dos contratos a termo certo que existem são por recurso a figuras que a lei prevê de substituição temporária de pessoas. Se um auxiliar de acção educativa adoece, se uma auxiliar de acção educativa está de licença de parto, etc., é possível, é desejável e é necessário substituir. Portanto, não se trata de termos uma situação descontrolada de recurso aos contratos a termo certo mas de uma situação controlada e legal. Penso que não corremos o risco de herdar uma situação descontrolada e pouco clara sobre a prestação de trabalho na Administração Pública por parte de pessoas sem nenhum estatuto devidamente enquadrado, porque é dos contratos a termo certo que estamos a falar. Naturalmente que não vale introduzir nestas questões figuras como as avenças, que são normais - é necessário e a lei também prevê o recurso a avenças - ou recorrer à aquisição de serviços - também é normal e de lei, é sempre possível fazer aquisição de serviços, mas isto não é trabalho desenvolvido do ponto de vista hierárquico, enquadrado. São figuras diferentes.
Também não vale misturar nisto as pessoas que desempenham actividades em alguns serviços da Administração Pública enquanto estagiários ou destinatários de programas de formação profissional, que têm nos serviços públicos o espaço de treino profissional.
Se contarmos tudo isto e se contarmos também nestas matérias, por exemplo, o esforço feito pela Administração, nomeadamente a local, no desenvolvimento dos programas ocupacionais, os quais, muitas vezes, por exemplo, nas juntas de freguesia, são uma forma de socorrer pessoas que, estando numa situação de desemprego a sério, são, no entanto, úteis para tratar dos jardins das aldeias, se misturarmos tudo isto nos contratos precários da Administração Pública, estamos a confundir várias coisas e não vale a pena.
O nosso número de contratos a termo certo é aquele que lhe disse e qualquer outro é algo de fantasmagórico.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, terminámos a discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública. Agradeço a presença do Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública e do Sr. Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa.
Srs. Deputados, vamos interromper agora os nossos trabalhos e retomá-los às 15 horas.

Eram 14 horas e 20 minutos.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados, vamos dar início à discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Economia.
O Sr. Ministro da Economia já fez uma exposição genérica sobre o orçamento do seu Ministério aquando da apresentação do orçamento em sede de Comissão, pelo que vamos simplesmente registar as questões que os Srs. Deputados queiram colocar ao Sr. Ministro.
Começo por dar a palavra ao Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, as questões que quero colocar ao Sr. Ministro têm a ver com o seguinte: em primeiro lugar, apesar da evolução bastante positiva da economia portuguesa, em boa parte por influência do Governo nestes últimos cinco anos, há alguns aspectos que podem suscitar alguma preocupação, mas que podem ser ultrapassados, tentando transformar o que poderão ser algumas ameaças em oportunidades.
Um dos aspectos centrais, que se reflecte em vários domínios, nomeadamente na balança de pagamentos, tem a ver com as dificuldades de algumas empresas portuguesas no contexto do que se tem chamado a globalização, o "desarmamento" alfandegário, o "desarmamento" aduaneiro e, designadamente, todo o processo de integração da economia portuguesa na economia europeia e, de um modo geral, na economia mundial.
Assim, em termos das medidas propostas neste orçamento, conjugadas, nomeadamente, com o Plano Operacional da Economia (POE), gostaria que o Sr. Ministro valorasse - e esta é a minha questão concreta - de que forma considera que este orçamento é, de facto, um instrumento adequado para ajudar a aumentar a competitividade de muitas empresas portuguesas que ainda têm problemas sérios nessa área.
Uma segunda questão relacionada com esta é a seguinte: o Governo português - e isso ficou claro, no plano europeu, na Cimeira de Lisboa, em Santa Maria da Feira - deu uma importância muito grande à utilização das tecnologias da informação, em várias áreas, designadamente - e essa é a que, neste momento, mais nos interessa -, na actividade empresarial. Portanto, gostaria de saber até que ponto o Sr. Ministro considera que este orçamento é, de facto, um instrumento que pode ajudar ao desenvolvimento das empresas portuguesas no que respeita a essa utilização das tecnologias da informação e, de um modo geral, à penetração, à utilização e ao avanço das empresas portuguesas nas áreas do que se tem chamado de a nova economia.
São estas as duas questões essenciais que coloco.
Depois, há dois aspectos mais sectoriais, um dos quais tem a ver com o seguinte: há alguma preocupação, em algumas regiões e um pouco em todo o País, sobre o futuro da indústria automóvel, em Portugal. Alguns pensaram, há alguns anos, que a indústria automóvel podia desempenhar, em Portugal, um papel motor similar ao que alguns sectores tradicionais tinham desempenhado anos antes. Há declarações de antigos ministros, não digo da Economia, mas, por exemplo, da Indústria e Energia, nesse sentido - talvez um pouco excessivas, mas percebemos o entusiasmo da altura. Hoje, surgem problemas ligados à indústria automóvel, quer quanto a reconversão de empresas quer,

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de vez em quando, quanto às dificuldades sentidas por algumas empresas em adaptar-se a qualquer mudança na área fiscal ou na área da competição empresarial, ao mesmo tempo que aparecem e se fala de novos projectos. Assim, pergunto-lhe, Sr. Ministro, se pode avançar alguma explicação sobre a questão de como este orçamento, e segundo a estratégia económica que este Governo e o Sr. Ministro propugnam, vê a posição do sector automóvel. Como é que, durante o período em que este orçamento vai actuar, algumas preocupações e algumas esperanças existentes no sector automóvel poderão evoluir este ano?
A quarta questão tem a ver com o seguinte: ao longo dos anos, temos tido uma preocupação séria e algumas esperanças, confirmações e concretizações no sector têxtil. O têxtil, como sabemos, está localizado em várias regiões, com posições diferentes. Hoje, há empresas têxteis claramente competitivas no plano mundial, sendo até consideradas como uma ameaça por algumas empresas de outros países, como a Itália, a Bélgica e a França, mas também ainda há alguns problemas relativamente sérios no têxtil. Dado o peso que o sector do têxtil tem na economia portuguesa, como é que o Sr. Ministro valora a utilização deste orçamento e das políticas do Governo durante o próximo ano, no avanço do processo de reconversão da indústria têxtil?
São estas as minhas quatro perguntas.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia (Mário Cristina de Sousa): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, antes de mais, quando falamos neste orçamento, penso que, em relação ao tipo de questões que me colocou, vamos falar sobretudo do Plano Operacional da Economia e do contributo que este orçamento dá para esse Plano como contrapartida do QCA III.
Neste pressuposto, penso que, antes de mais, este tema das dificuldades de algumas empresas portuguesas de integração na economia mundial tem claramente a ver com competitividade e com necessidade de aumentar exportações. E esse é um tema em relação ao qual o POE dispõe de várias medidas, quer dirigidas à melhoria de produtividade das empresas e, por consequência, à sua possibilidade de competir melhor, quer dirigidas inclusivamente a apoios à internacionalização.
Tive oportunidade de, na apresentação do orçamento em Comissão - mas retomo aqui o tema -, tentar ser bastante claro sobre o que considero que, em termos de internacionalização, deve ser apoiado, hoje em dia, pelas políticas públicas.
Penso que passámos o momento de apoiar as empresas no puro e simples investimento no estrangeiro e penso que devemos apoiá-las, neste momento, em duas perspectivas, ou seja, para além da promoção da imagem de Portugal e dos produtos portugueses, em termos mais gerais, devemos apoiá-las em dois aspectos: um deles é a possível necessidade de deslocalização da produção. É sabido que estamos numa situação de pleno emprego ou próxima do pleno emprego, mas, em vários sectores industriais, tenho ouvido frequentes queixas sobre a dificuldade em encontrar mão-de-obra. Por isso, podemos ter de apoiar alguma deslocalização industrial do segmento de produção. Podemos igualmente apoiar algumas operações de comercialização no exterior, ou seja, de colocação de postos avançados para comercialização no exterior. Portanto, este é outro aspecto em que o POE poderá apoiar as empresas portuguesas nesse esforço de reganharem posição competitiva no mercado internacional.
Quanto às tecnologias de informação, também recordo que pus alguma ênfase na importância que atribuo à necessidade de o POE estar preparado para apoiar as empresas portuguesas, particularmente as PME, no acesso à economia digital. Penso que, nos próximos anos, vamos assistir a uma divulgação acelerada do comércio electrónico. Provavelmente, ele vai ter um incidência inicial muito maior sobre as transacções entre empresas, embora, obviamente, ao mesmo tempo, também se vá assistir à relação empresa/consumidor - no entanto, a minha percepção pessoal, resultante de alguma experiência anterior nesta matéria, é a de que o desenvolvimento mais rápido vai ocorrer no comércio entre empresas. E nesta perspectiva, o POE tem uma medida claramente adequada a apoiar as empresas a integrarem-se nos processos de compra e venda electrónica, que estão a desenvolver-se neste momento e dos quais elas necessitam de não ser excluídas, sob pena de perderem posição e competitividade.
Quanto ao futuro da indústria automóvel, o que posso dizer-lhe, neste momento, é que temos uma indústria de componentes bastante importante. Esta indústria de componentes já tem hoje uma dimensão que não depende exclusivamente da existência de grandes fabricantes em Portugal, pois ela própria já é exportadora e já é capaz inclusivamente de operações de deslocalização, acompanhando clientes para fora do País. Mas é evidente que seria importante para o futuro conseguir a presença em Portugal de novos fabricantes. Ora, o Ministério da Economia, designadamente através do ICEP, está a desenvolver esforços nesse sentido. É sabido que, recentemente, estivemos muito próximos de uma conclusão favorável, que, entretanto, ficou suspensa, com um grupo alemão. Existe um outro grupo alemão que, neste momento, está à procura de um sítio para instalar uma nova fábrica e nós já apresentámos uma candidatura. Portanto, todos os esforços estão a ser feitos no sentido de garantir novas candidaturas, novos investimentos.
Gostaria, porém, de acentuar que, neste momento, a procura de novos investimentos, estrangeiros, em geral, e, no sector automóvel, em particular, está pensada, sobretudo, na óptica de investimentos que tragam uma forte componente tecnológica e modernizante. Portanto, não se trata apenas de investimentos que contribuam para uma absorção de enormes volumes de mão-de-obra; é prioritário investimentos que tragam uma componente de modernização e de inovação tecnológica, que seja internalizada na economia portuguesa.
Quanto à questão sobre a indústria têxtil, passo a palavra, com a autorização da Sr.ª Presidente, ao Sr. Secretário de Estado Adjunto, para falar sobre esse tema.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia (Vítor Santos): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, quanto à questão formulada sobre o sector têxtil, diria que o diagnóstico que fazemos relativamente ao sector têxtil é aquele que fazemos relativamente à grande maioria dos chamados sectores tradicionais. Portanto, a nossa política relativamente ao

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sector têxtil estende-se e alarga-se a outros sectores de actividade, como é o caso, só para dar alguns exemplos, do calçado, do mobiliário, dos moldes, etc.
Deste ponto de vista, além da área regulamentar, o nosso principal instrumento de actuação é POE. E, deste ponto de vista, muito sinteticamente, os principais vectores de actuação são os seguintes: por um lado, uma focalização na extensão da cadeia de valor. É sabido que, hoje em dia, uma das características da nossa indústria é uma excessiva concentração na produção, na fabricação e na transformação. Tal significa que as nossas empresas industriais começam muito tarde na cadeia de valor e acabam muito cedo. Portanto, é necessário que cheguem cada vez mais cedo e que saiam cada vez mais tarde da cadeia de valor. O que é que quero dizer com isto? Quero dizer que, a montante da produção, a montante da transformação, há que focalizar e concentrar a atenção na concepção do produto, na inovação, e, a jusante da produção, no marketing, na distribuição e na comercialização.
Uma outra questão tem a ver com uma aposta muito forte numa mudança de atitudes ao nível da formulação de estratégias empresariais. É necessário passar de uma focalização na competitividade de preço e adoptar, ao nível da formulação das estratégias empresariais, um instrumento mais alargado, mais horizontal, de vectores de actuação em termos estratégicos. Estou a pensar nos chamados novos factores dinâmicos da competitividade, que passam pela adopção de estratégias de diferenciação do produto, com uma aposta muito clara na qualidade, na inovação, nas alterações dos métodos de gestão e de organização, na adopção de processos tecnológicos e de práticas que sejam menos penalizantes da qualidade ambiental.
Um outro vector bastante importante e que está considerado no POE é a formação. Quando se fala da qualificação de recursos humanos, da formação, hoje em dia, pensamos que a questão essencial não é tanto, apenas e sobretudo criar emprego ou apostar na compatibilização entre a oferta de qualificações que é oferecida, que é fornecida pelo sistema formal de ensino, e as necessidades do mercado de trabalho, é preciso ir muito mais longe e é necessário continuar a apostar - e reforçar e consolidar essa estratégia - numa política de ensino e de formação que agilize e prepare as pessoas para a mudança.
Um outro factor essencial, que é generalizável quer ao sector têxtil quer ao calçado quer aos restantes sectores tradicionais, é a cooperação. A cooperação interempresarial é uma forma de ganhar massa crítica, de ganhar dimensão; é necessário termos pequenas e médias empresas, no sector têxtil e nos outros sectores, com uma dimensão semelhante às empresas congéneres à escala europeia.
A utilização mais intensiva das novas tecnologias de informação é uma outra questão essencial, já aqui referenciada pelo Sr. Ministro.
Finalmente, o acesso ao financiamento é um vector essencial do POE, na sua medida 3.4. Não assumimos que haja por parte do sistema financeiro uma discriminação negativa das PME; a ideia é desenvolver instrumentos de actuação que permitam que pequenas e médias empresas inovadoras e com visão estratégica tenham um acesso ao financiamento semelhante ao das empresas de grande dimensão.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Pires de Lima.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, nós estivemos a ler e a estudar com alguma atenção aquilo que é proposto ao nível do orçamento do Ministério da Economia e, mais uma vez, ficámos um pouco surpreendidos por, nesta proposta de orçamento e no conjunto de políticas sectoriais que estão apontadas, haver uma total vacuidade naquilo que diz respeito a objectivos concretos.
Este orçamento do Ministério da Economia tem três ou quatro páginas e não aponta um único objectivo quantificado, concreto. De facto, não há um único número neste orçamento, a não ser os vários números dos gastos do próprio orçamento. No que diz respeito às políticas, não há um único objectivo concretizado.
Ora, é relativamente fácil, hoje em dia, estarmos de acordo sobre diagnósticos gerais, sobre aquilo que são os males da economia nacional. É fácil e mais ou menos consensual dizermos que temos fortes problemas de competitividade e um gap brutal de produtividade face àquilo que é a média europeia e até face ao nosso vizinho espanhol. Só que, depois, a grande diferença tem de ser feita não no diagnóstico mas, no que diz respeito a um governo e a um ministério, na ambição, no arrojo e na definição de um conjunto de objectivos quantificados e calendarizados, que sejam um compromisso perante a nação, perante os portugueses, de forma a que, no final desta Legislatura, possamos avaliar em que medida o País evoluiu de acordo com os objectivos que foram definidos ou em que medida não evoluiu coisa alguma.
Neste momento, em Portugal, estamos perante um desafio concreto que necessita de uma resposta por parte do Governo e, nomeadamente, penso, por parte do Ministro da Economia.
Portugal há quatro ou cinco anos, estava apenas a uma geração - quase que ao alcance da mão dos nossos filhos, diria - de poder atingir aquilo que é o nível médio da riqueza, o nível médio de vida europeu.
De acordo com aquilo que tem sido a evolução nos últimos anos, nomeadamente nos anos de 1999 e 2000, este diferencial face à Europa passou de uma geração para três, no melhor dos casos. Isto é, no melhor dos casos, provavelmente, nem os meus netos - e sou um Deputado relativamente novo - poderão alcançar este objectivo, de viver tão bem como vivem, pelo menos do ponto de vista económico, os outros países europeus.
A economia portuguesa está claramente em desaceleração e este ano vai crescer menos do que a média europeia. Salvo erro, só a Dinamarca cresce este ano menos do que Portugal em todo o espaço da comunidade.
Portanto, uma primeira questão para a qual gostaria de ouvir um compromisso claro por parte do Governo e, em concreto, por parte do Sr. Ministro, é esta: qual é o tempo? É uma geração? São três gerações? Qual é o tempo objectivo apontado pelo Sr. Ministro para que Portugal, do ponto de vista económico - é disto que estamos a falar -, possa atingir a média europeia?
Relativamente ao conjunto de propostas sectoriais que, aqui, são apresentadas, é dado um peso considerável (enfim, em termos verbais, um pouco vago) à importância da inovação, da diferenciação e das novas tecnologias na dinamização do tecido empresarial, industrial, económico e comercial português. Mas, apesar de o Sr. Ministro já ter respondido ao Deputado Joel Hasse Ferreira a estes dois temas, creio que neste orçamento são totalmente desvalorizados, pelo menos no texto que nos chegou, os

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papéis do investimento externo e da internacionalização das empresas portuguesas.
Também aqui, apesar de estar de acordo com aquilo que o Sr. Ministro acabou de dizer ao Deputado Joel Hasse Ferreira, isto é, que o investimento externo deve estar centralizado, ou deve ser atraído, nomeadamente nos sectores de alta tecnologia por forma a poderem servir de motor de disseminação de novas tecnologias e até de novas culturas de gestão no ambiente económico português, estranho que não haja qualquer referência neste texto ao papel do investimento externo. Somos confrontados com um desafio claro: em Portugal, o investimento externo cresceu até 1997, ano em que atingiu, salvo erro, cerca de 500 milhões de contos, e desceu abruptamente em 1998 e em 1999 para cerca de 100 milhões de contos. Em 1999, houve um investimento externo, em termos reais, pior do que o que tivemos nos anos de 1985 e 1986 e constatamos que neste orçamento não é estabelecida qualquer prioridade à captação de investimento externo, e, mais uma vez, não vem definido qualquer objectivo de captação de investimento externo para o ano 2001.
Portanto, penso que seria importante perceber qual é o objectivo que o Governo tem para o ano 2001, em termos quantitativos, para a captação de investimento externo dentro dos critérios, com os quais estou de acordo, explicitados pelo Sr. Ministro.
No que respeita à internacionalização, entendemos que o Sr. Ministro, relativamente até ao seu antecessor, tem vindo a desvalorizar a importância da internacionalização para as empresas portuguesas. Enfim, na resposta que deu ao Deputado Joel Hasse Ferreira referiu-se a este tema, mas penso que é absolutamente fundamental encorajar e criar os mecanismos para que as empresas portuguesas, nomeadamente as que têm uma escala razoável e que já atingiram um patamar de competitividade aceitável, se internacionalizem e possam ganhar escala e competir num mercado mais global do que o mero mercado português.
Aliás, ainda no outro dia assisti a declarações de responsáveis de uma empresa de que o senhor já foi presidente, a EDP, os quais manifestavam essa prioridade para a própria EDP. Pelo que vinha escrito nos jornais, e quero acreditar que seja verdade, a EDP fazia depender essa vontade de internacionalização em grande parte do apoio que pudesse receber do Estado para esse esforço de internacionalização. Isto é normal! Somos um País pequeno, vivemos numa economia muito centralizada durante muitos e muitos anos, e, portanto, é absolutamente razoável que as empresas portuguesas que têm possibilidade de se internacionalizar precisem de apoios muito concretos, os quais, manifestamente, hoje em dia, não existem. O FIEP e o RETEX, que são os instrumentos que conheço de apoio à internacionalização dentro do esquema do Programa Operacional da Economia, não são suficientes para "alavancar" qualquer projecto de internacionalização de uma média ou grande empresa, em Portugal.
Portanto, nesta matéria, também gostaria de saber que tónica, que importância, é que o Sr. Ministro vai dar à internacionalização das empresas e como é que está a pensar prever esquemas mais agressivos que permitam às empresas portuguesas abraçar projectos de internacionalização claros.
Finalmente, quero falar de um quarto tema que tem a ver com a reforma fiscal. Bem sei que a reforma fiscal é um tema da dependência do Ministério das Finanças; mas ou temos Ministro da Economia ou não temos.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Agora existe, antes é que não havia!

O Orador: - Não é possível conceber uma reforma fiscal passando ao lado de um aspecto fundamental da reforma fiscal, que é a competitividade das empresas.
Portanto, devo já dizer-lhe, Sr. Ministro, que não aceito que à minha pergunta seja dada uma resposta do tipo "isso é responsabilidade do Ministério das Finanças".
Ora, a reforma fiscal, que está em cima da mesa e que está implícita neste orçamento, diz praticamente nada, diz zero relativamente àquilo que é a competitividade das empresas, que é, aliás, um tema que o Sr. Ministro (já o ouvi referir em alguns discursos) considera fulcral em termos de Ministério da Economia.
Não está prevista, pelo menos para este ano, para este orçamento - é disto que estou a falar -, qualquer diminuição da carga fiscal sobre as empresas, nem para as grandes, nem para as médias, nem para as pequenas e médias empresas. Não estão previstos esquemas, benefícios, por aquilo que temos conhecimento, que de alguma forma funcionem como incentivos ao aumento da produtividade das empresas, ao aumento da inovação ou até à internacionalização das empresas.
Dado que a reforma fiscal é, provavelmente, o melhor instrumento que existe neste momento, em termos de política económica, para poder provocar um choque fiscal que reforce a competitividade das empresas em Portugal, quero saber qual é a opinião do Sr. Ministro quanto a esta ausência de medidas no Orçamento do Estado para 2001.
São estas as quatro questões para as quais peço a sua atenção.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Pires de Lima, antes de mais, quanto à sua referência à ausência absoluta de indicação de objectivos, penso que, no mínimo, há um ponto do relatório do Orçamento do Estado para 2001, o ponto IV.8, que vai da página 178 até…

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Não, a página 178 é a da agricultura! É da…

O Orador: - Peço desculpa, então é porque esta é uma edição diferente.
Estou a referir-me ao sítio onde começa o Ministério da Economia, onde vêm os objectivos, as medidas de política de carácter horizontal e medidas política de carácter sectorial. Portanto, penso que…

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr. Ministro, eu não digo que não hajam objectivos genéricos e vagos, eles estão aqui apontados. Mas onde é que eles estão quantificados? Onde é que eles estão calendarizados? Não há um único número! Não conheço qualquer objectivo que o seja sem que haja um número que se pretenda atingir, sem que haja um estágio que se pretenda atingir!

O Orador: - Enfim, dada a natureza deste documento, não sei se seria aqui que deveria existir esse grau de detalhe, porque, naturalmente, muito do que aqui está é vertido e reflectido nas medidas que irão ser usadas no

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Programa Operacional da Economia face a projectos concretos.
Portanto, vejo com alguma dificuldade uma quantificação como a que pretende. É, enfim, uma questão de conceito. Aceito a sua posição, mas penso que, num documento desta natureza, se indicam os caminhos, já que é, depois, no terreno, perante os projectos concretos, que doseamos os incentivos à sua realização, através da utilização das várias medidas do Programa Operacional da Economia.
Agora, deixe-me falar um pouco sobre os temas do investimento externo, por um lado, e da internacionalização, por outro.
Verifico que concorda com a minha perspectiva sobre o investimento externo, que não é pacífica, pois poder-se-ia dizer que qualquer investimento externo seria bom; isto talvez fosse verdade num ambiente de desemprego acentuado, mas hoje não é, porque podemos ser selectivos. Assim, podemos, e devemos, privilegiar investimentos que tragam renovação, inovação e melhoria tecnológica ao tecido empresarial português e que, depois, induzam essa modernização, inclusive através de fornecedores - aliás, penso que o caso da indústria automóvel é um bom exemplo disto.
Agora, é uma coisa muito complicada fixar, nos investimentos externos de alguma dimensão, objectivos e esperar uma uniformidade de captação ao longo do tempo. É utópico, sejamos claros. Isto é, vamos assistir, inevitavelmente, como já assistimos no passado e vamos continuar a assistir, a descontinuidades e picos, se estamos a falar, repito, de grandes investimentos, porque, se estamos a falar de pequenos e médios investimentos, eles serão uma corrente mais ou menos contínua. Mas aqueles que realmente fazem a diferença ou vêm ou não; se vêm temos um pico, se não vêm não o temos. E temos de ser realistas quanto a isto.
Estamos, neste momento, como eu disse, a discutir hipóteses no sector automóvel, e vamos, enfim, falar claramente. Ora, se o Grupo Volkswagen decidir avançar com a fábrica da Sodia há uma descontinuidade, se não decidir não há; se outras hipóteses, que existem no horizonte, avançarem, há um pico, senão não há.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Mas estamos a falar de um nível muito baixo!

O Orador: - Estamos a falar de grandes investimentos estruturantes, e não há maneira de termos uma distribuição uniforme ao longo do tempo.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr. Ministro, desculpe, já agora só quero fazer um pequeno comentário.
Estou de acordo consigo relativamente aos grandes projectos. É evidente que esses grandes projectos não surgem todos os anos, e, portanto, no ano em que surgem provocam descontinuidades importantes nessa matéria - nisso posso estar de acordo consigo.
Agora, há um nível mínimo de investimento externo que é absolutamente necessário para fomentar todo esse clima de inovação, de tecnologia, de disseminação de uma cultura e de um ambiente empresarial mais dinâmico. E aquilo que verificamos é que, nos últimos anos, Portugal atingiu um nível de investimento externo idêntico ao atingido nos anos de 1985/86, em termos reais: 100 milhões de contos corresponde ao nível de investimento externo que tínhamos em 1985/86. E esse investimento, essa plataforma normal de investimento externo deve estar assente num sistema, nomeadamente no sistema fiscal, competitivo, que foi outra questão que lhe coloquei.
Por conseguinte, relativamente aos grandes projectos, aceito a resposta que o Sr. Ministro me está a dar, mas, naquilo que são os investimentos normais, naqueles que garantem um mínimo de competitividade, o que se está a verificar é que Portugal não é competitivo, não tem um sistema competitivo, não tem mão-de-obra qualificada e não tem um sistema fiscal competitivo para atrair esse investimento.

O Orador: - Sr. Deputado, o que acaba de dizer pode levar-nos já para a questão seguinte, que é a da reforma fiscal.
É certo que o facto de estarmos numa situação de pleno emprego é um óbice, é verdade, mas há uma outra questão que tem de ser tida em conta: em relação à Europa comunitária, há, neste momento, uma concorrência muito forte em termos de destino do investimento, que é a da Europa de Leste, como sabe. Isto é um facto.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Devo dizer-lhe que a entidade que, em Portugal, se ocupa disto, que é o ICEP, está totalmente atenta a isso e está a fazer os melhores esforços, mas é evidente que, quando a concorrência aumenta, temos de viver com esse facto.
Portanto, temos de fazer alguns esforços, como é evidente; temos de reforçar esforços. E posso dizer-lhe que, neste momento, por exemplo, há uma situação (já estava criada, apenas encontrei a situação) em que o ICEP conseguiu estabelecer um sistema extremamente atraente de ser o único interlocutor, o único guichet, com quem o investidor estrangeiro fala para resolver todos os temas, quer sejam eles fiscais, ambientais ou de licenças. Tudo passa pelo ICEP, e, neste aspecto, tem-se feito, e vai-se continuar a fazer, um grande esforço.
Posso garantir-lhe que me empenharei profundamente empenhado em fazê-lo e dizer-lhe que, quando sair daqui, vou ter uma reunião no ICEP para discutir exactamente o tema "investimento estrangeiro". É uma mera coincidência, como é evidente, mas digo-lhe que estamos fortemente empenhados nisso, mas temos de viver com a concorrência que temos, e esta é inelutável.
Quanto ao tema da competitividade fiscal, penso que uma das coisas para a qual a presente reforma fiscal aponta é para a tendência de descida da tributação sobre o rendimento das empresas, e isto, quanto a mim, é a questão-chave.
Portanto, a competitividade fiscal começa sobretudo na tributação do rendimento das empresas, porque, quanto a mim, é aquela que melhor incentiva o empresário, uma vez que as medidas fiscais específicas ad hoc podem serem incentivadoras mas também são distorcedoras de decisões. E, como tenho alguma experiência pessoal disto, posso dizer-lhe que muitas vezes tomam decisões baseadas em incentivos existentes e que, se calhar, não têm uma grande racionalidade económica mas, sim, uma racionalidade fiscal e uma racionalidade da linha final.
Portanto, neste sentido, e na medida em que a presente reforma fiscal tende para uma redução progressiva da taxa de IRC, para mim, esse é o grande incentivo. E prefiro este incentivo, de longe, a incentivos parcelares e orientados.

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Por exemplo, considero este incentivo muito mais importante do que o da tributação das mais-valias, porque, apesar de beneficiar determinado tipo de operações, não beneficia aquilo que, para mim (e já levo 30 anos disto), realmente define o que uma empresa é capaz de fazer ou não, que é a bottom line, a linha do fim, o resultado final, e é sobre este que o empresário tem de medir se é ou não maltratado em temos fiscais.
Esta é minha leitura, e, por isso, neste sentido, daqui para a frente farei todos os esforços para que a reforma fiscal prossiga no sentido de aliviar a tributação sobre o lucro líquido.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Mas concorda em que este ano não há uma diminuição!

O Orador: - Não quero garantir, mas, tanto quanto me recordo, já há uma diminuição.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - A taxa baixou de 34% para 32%, no ano passado, e agora acabou; nada está previsto neste Orçamento.

O Orador: - Espero que venha a ser prevista nos próximos Orçamentos, porque penso que é muito importante. Acho muito importante sobretudo a filosofia subjacente a esta reforma, que é a de evitar escapatórias que, sendo úteis para alguns empresários, não o são para todos e, pelo contrário, a de ser mais equitativo nas zonas onde se atingem todos. Esta é uma filosofia que defenderei, sem qualquer dificuldade, perante o Sr. Ministro das Finanças.
Isto quer dizer que, efectivamente, quanto mais nos movermos nessa direcção mais competitivos seremos com o investimento estrangeiro, embora, repito, seja preciso não esquecer que estamos a enfrentar uma competição dura, porque todos os ex-países do Leste, hoje, estão ansiosos, e em alguns aspectos têm vantagens competitivas sobre Portugal, uma vez que têm situações de desemprego, mão-de-obra qualificada e por vezes estão mais próximos das casas-mãe - temos o caso da Alemanha versus um país de Leste. E, portanto, é uma concorrência difícil que temos de enfrentar, mas não vamos assustar-nos com isto! Temos a consciência disto, mas não vamos assustar-nos! Vamos fazer um esforço!

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - E em relação à internacionalização?

O Orador: - A internacionalização é um tema sobre o qual tenho particular satisfação em falar, porque fui protagonista de dois processos de internacionalização de empresas portuguesas, o da Cimpor e o da EDP.
Agora, o que me parece é que houve um momento, talvez importante, na história recente deste País, em que Portugal passou a ser um investidor líquido no exterior. Isto deu-nos alguma maioridade, algum respeito do mundo dos negócios e a possibilidade de ter, em Portugal, empresas com alguma escala. Apesar de tudo, não nos iludamos, porque, hoje em dia, o conceito de "escala", na Europa e no mundo, muda todos os dias; quando fazemos rankings de empresas, verificamos que, de repente, há duas que se juntam e o ranking fica todo trocado. De qualquer forma, penso que isto permitiu, efectivamente, ter empresas importantes.
A questão que se coloca é a seguinte: em que medida é que devem as políticas públicas envolver-se neste processo? Ou seja, se o processo, em si, é saudável, em que medida, em que ponto e em que momento é que as políticas públicas - e quando falo de políticas públicas refiro-me quer às políticas de incentivo directo quer às de benefício fiscal, por exemplo - deverão envolver-se, quando, na realidade e em muitos casos, o que está em causa é o facto de as empresas o fazerem por entenderem dever fazê-lo no quadro da sua estratégia empresarial? Não é preciso o Estado empurrá-las, nem ajudá-las, elas fazem-no, porque entendem que, numa perspectiva ou imediata, em alguns casos, ou de médio ou longo prazo, essa será a resposta para os seus accionistas verem, a prazo, um crescimento de resultados.
Foi neste sentido que, há pouco, seleccionei dois temas que me pareceram muito mais críticos para aquilo que é, apesar de tudo, a grande base da indústria portuguesa, que é, não nos iludamos, constituída por pequenas e médias empresas, algumas cada vez menos pequenas - e ainda bem! -, mas elas ainda são a base. E é em relação a estas empresas que admito que haja processos para elas complexos, onde as políticas públicas, quer pela via do apoio directo quer pela via de medidas de carácter de apoio até diplomático, por exemplo, podem ajudar a processos de deslocalização industrial - e não estou a falar de questões teóricas, pois, neste momento, há empresas que estão a considerar seriamente hipóteses deste tipo, exactamente porque estão a enfrentar o limite em termos de mão-de-obra disponível. E, deste modo, entendem que podem ter uma alternativa de deslocalizar o processo produtivo, continuando a controlar, de Portugal, todo o processo de colocação no mercado de destino. Posso dar um exemplo: imaginem uma indústria de calçado, com a fabricação em Cabo Verde e a continuar a exportar para o mercado europeu.
Portanto, continua a reter-se uma parte importante da margem do negócio em Portugal, mas, apesar de tudo, conseguiu ganhar-se competitividade. Isto porque, se se combinar um bom treino de mão-de-obra, o valor dos salários do outro país e a capacidade de colocação no mercado europeu que já existe, estamos, obviamente, perante uma combinação que tem tudo para ser ganhadora. Num cenário destes, penso que as políticas públicas podem dar uma ajuda.
Um outro cenário, como eu disse há pouco, e já há experiências, é apoiar as empresas portuguesas, designadamente através de movimentos de tipo associativo, a colocarem em mercados-alvo postos avançados, armazéns, operações comerciais que permitam atingir mais facilmente esses mercados. Por exemplo, hoje - e aqui o problema é colocado ao contrário -, os mercados de Leste começam a ser muito atractivos para a indústria portuguesa em determinados sectores, mas, muitas vezes, a distância aconselha a que se esteja lá, pelo menos, no segmento final do processo produtivo, ou seja, no segmento comercial.
É esta a distinção que eu queria fazer. É esta a posição que defendo, e, francamente, não tenho notícia de que a EDP esteja à espera que o Estado lhe dê algum apoio. Não está! O Estado poder-lhe-á dar algum apoio na perspectiva de accionista e de estar de acordo com uma determinada estratégia, apesar de o Estado já não ser, como sabe, o accionista maioritário da EDP, mas é, de qualquer forma, um accionista importante, e, sendo assim, é natural que a EDP, se quiser fazer uma operação de aquisição no Brasil,

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queira que o seu maior accionista, embora não maioritário, lhe dê um conforto, lhe diga uma palavra. Mas duvido que esteja à espera de fundos para isso.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Penedos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, atendendo a que estamos em sede de discussão na especialidade, vou colocar, de forma muito breve, uma questão concreta relacionada com o orçamento do Ministério da Economia.
Em 1998, foi celebrado um protocolo entre o Governo da República, assinado pelo então Ministro da Economia, e o governo da Região Autónoma da Madeira relacionado com a questão das tarifas eléctricas a praticar pela Empresa de Electricidade da Madeira. Esta questão também se colocava em relação à Região Autónoma dos Açores, a qual seguiu um determinado caminho.
No que respeita à Região Autónoma da Madeira, o Ministro da Economia de então e o presidente do governo regional assinaram um protocolo que termina a sua vigência agora, no ano 2000. Ora, a pergunta que quero colocar tem precisamente a ver com o facto de esse protocolo estar a cessar a sua vigência agora e de o Orçamento do Estado, nesta matéria, não ter qualquer quantia específica, expressa, para resolver o problema das tarifas de energia a praticar na Região Autónoma da Madeira.
O Governo da República e o governo regional, de acordo com o princípio da coesão, entre outros, têm como objectivo que as tarifas sejam idênticas em todo o País, com o que estamos todos de acordo, mas a verdade é que este protocolo, em termos de eficácia prática, não atingiu os seus objectivos. Tal sucedeu porque, segundo os números que tenho em meu poder, nos anos de 1999 e 2000, as verbas necessárias, que estavam previstas e orçamentadas, para conseguir essa igualização tarifária nunca foram transferidas para a Empresa de Electricidade da Madeira no sentido de se conseguir esse objectivo do Governo da República e do governo da Região Autónoma da Madeira.
Estamos a falar de verbas e de diferenças razoáveis: em 1999, estava prevista a transferência de cerca de 2 milhões de contos, mas foram transferidos somente 617 000 contos; em 2000, estava prevista a transferência de 2,5 milhões de contos, mas, até agora, só foram transferidos cerca de 600 000 contos. Portanto, há verbas em atraso em relação aos anos que referi.
Ora, a questão que se coloca é a seguinte: face a esta situação de cessação da vigência do protocolo neste ano, seria razoável que o Orçamento do Estado, na sua previsão, no seu articulado, nas transferências de verbas, concretamente no artigo 5.º, n.º 44, em vez de dizer que vai haver uma transferência de verba para resolver este problema não dizendo qual é, quantificasse essa mesma verba. Ou seja, o que vai acontecer a partir de 2001? O Ministério da Economia prevê alguma verba para resolver este problema? É que as populações da Região Autónoma da Madeira têm este problema concreto: pagam efectivamente mais pela energia eléctrica do que a população do resto do País.
Portanto, as minhas perguntas concretas são as seguintes: para além desta norma genérica, o Ministério da Economia prevê alguma verba em concreto? Prevê fazer alguma coisa de diferente para resolver este problema? O que é que está previsto, em termos orçamentais, para resolver este problema?

O Sr. Presidente (José Penedos): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr. Presidente, estando presente o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, eu propunha que fosse ele a dar, pelo menos, uma primeira explicação sobre esta questão, caso esteja de acordo.

O Sr. Presidente (José Penedos): - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento para responder.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Fernando Pacheco): - Sr. Presidente, respondendo à questão concreta colocada pelo Sr. Deputado Hugo Velosa, eu diria que há uma razão específica para se seguir o modelo constante do Orçamento do Estado, o qual, aliás, corresponde a uma alteração quanto ao modelo que começou a ser seguido. Inicialmente, esta transferência era inscrita em PIDDAC, mas, depois, optou-se por fazer a mobilização das verbas através de dotação provisional, aliás, penso que o Sr. Deputado esteve envolvido na discussão que ocorreu nessa altura. Isto porque, se, em PIDDAC, existisse um programa a prever essa transferência, o que acontecia é que, pela própria lógica da Lei de Finanças das Regiões Autónomas, o valor do PIDDAC a transferir para a Região na comparticipação de programas na Região deveria reduzir nesse montante, por haver uma questão de capitação que, depois, prejudicaria. No fundo, o grande problema que se colocou no segundo ano de vigência do protocolo foi o de encontrar uma forma para se fazer esta transferência sem prejudicar a Região, ou seja, sem estarmos a dar este dinheiro com uma mão e a tirar com a outra, por essa transferência.
Os valores de que tenho conhecimento, relativamente a 1999, não são os que o Sr. Deputado referiu. Pelo que sei, mas poderei verificar este aspecto, no ano de 1999, a transferência foi significativamente superior ao montante mencionado pelo Sr. Deputado, penso que foi mais do que 1 milhão de contos, não sei exactamente quanto; estou a falar de memória, mas, como posso estar enganado, irei verificar.
No entanto, isto deve-se também a uma outra questão. Quando o protocolo foi firmado, ele tinha em anexo a razão de ser do mesmo, que era a seguinte: haveria uma transferência para compensar as condições relacionadas com o facto de se tratar de sistemas com uma dimensão reduzida, que não permitem economias de escalas, como acontece com sistemas maiores. No caso dos Açores, esta situação foi agravada por outra condição: a grande dispersão por um conjunto ilhas; na Madeira este problema não era tão delicado, mas também existia.
Uma contrapartida desse protocolo era a realização de ganhos de eficiência; ou seja, o que se avaliou foi o custo-padrão da produção de energia eléctrica nas regiões autónomas, atendendo às características específicas dos seus sistemas de produção e de distribuição. Portanto,

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determinou-se qual era o custo-padrão, aferindo-se a compensação pelo valor da diferença desse custo-padrão no pressuposto de que haveria um determinado conjunto de ganhos de eficiência, os quais, também segundo a informação de que disponho, não estão a ser realizados de acordo com o que se antecipava quando os protocolos foram feitos. Por isso, tanto quanto ao caso da Madeira como ao caso dos Açores - era essa a minha experiência de Secretário de Estado da Indústria e Energia, mas também de depois disso -, tem havido reuniões em que estas questões têm sido regularmente abordadas.
As transferências nunca foram realizadas por inteiro também porque se pensa que os ganhos de eficiência não estão realizados de acordo com os valores que se pensaria. Isto significa que tem de proceder-se a uma etapa no momento de finalização do protocolo relacionada com a avaliação real desses ganhos de eficiência, ou seja, com a avaliação de como evoluíram os custos-padrão nas duas Regiões, comparando-os com a evolução dos custos-padrão no continente. E isto tem a ver com o facto de o protocolo estar limitado temporalmente ao ano 2000.
Respondendo à questão concreta que o Sr. Deputado Hugo Velosa colocou, parece-me - e é esta a maneira como o problema está equacionado - que a transferência deverá continuar a processar-se através da dotação provisional, por isso é que não há a inscrição no PIDDAC, e que permitiria, enfim, responder à questão que está a colocar; e que, em 2001, não havendo ainda novo protocolo, deverá trabalhar-se em valores da ordem de grandeza do último protocolo, mas, como eu já disse, este assunto ainda não foi discutido com os Secretários Regionais das duas Regiões, pelo que estamos aqui a antecipar esta questão.
Portanto, não deixará de fazer-se as transferências por não haver um protocolo celebrado para o ano 2001, elas continuarão a fazer-se na continuação daquilo que foi a base de trabalho até aqui. É, no entanto, de esperar que haja rapidamente novo protocolo que permita continuar a existir uma base legal para a sustentação destas transferências, que serão feitas a partir da dotação provisional pela razão que já apontei e que tem a ver com a Lei de Financiamento das Regiões Autónomas.

O Sr. Presidente (José Penedos): - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, em sede de especialidade, o nosso negócio são números, pois estamos a discutir o Orçamento, mas começo por colocar uma questão de ordem geral.
É suposto o Ministério da Economia e, em particular, o seu responsável máximo, o Sr. Ministro, ter a seu cargo a tutela e a responsabilidade estratégica sobre as empresas públicas ou as empresas com capitais públicos e, neste contexto, procurar dar corpo às orientações do Governo ou às orientações de defesa do interesse nacional. Aliás, o relatório do Orçamento do Estado para 2001 afirma que uma das alegadas preocupações do Governo…

Pausa.

Sr. Presidente, peço desculpa, mas, tendo em conta as não sei quantas "reuniões" que há aqui, é difícil…

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Está muito sensível!

O Orador: - Estou, sim!
Como eu estava a dizer, o relatório do Orçamento do Estado para 2001 afirma a necessidade de manter em mãos nacionais centros de decisão de sectores e empresas estratégicas. Neste quadro, a minha pergunta concreta é a seguinte: que medidas, que estratégia, pensa o Governo adoptar para, no caso da Galp e do acordo de participação e de privatização com os italianos da Eni, garantir que este sector energético se mantenha em mãos portuguesas?
Trata-se de uma questão que tem vindo a ser discutida recentemente; há até sugestões, pelo que vi hoje na imprensa, de Deputados do partido que apoia o Governo no sentido de procurar que o Executivo intervenha junto da Iberdrola para que a empresa e o sector público português recuperem alguma da capacidade de intervenção perdida, vendendo a participação da Iberdrola a empresas portuguesas (enfim, já estamos na fase "tapa buracos"). É evidente que o Ministério da Economia e o Sr. Ministro não podem dissociar-se desta situação e têm, seguramente, uma opinião.
Assim sendo, gostaria de saber o que o Ministro em concreto pensa sobre esta matéria, o que tenciona fazer, que estratégias e medidas pensa executar.
Falo nesta empresa em concreto, mas poderia falar em outras sob outras tutelas, como, por exemplo, do caso TAP/Swissair, empresa que, se se confirmarem as notícias vindas a público nas últimas 24 horas, poderá sofrer, nos próximos dias, problemas ainda mais complexos, relacionados com a venda da participação da Swissair a outras companhias. Mas, para já, é neste sector, no sector público português, que eu gostaria de ver a questão esclarecida.
Segunda questão, falou-se aqui muito na internacionalização da economia, e eu já tive oportunidade de referenciar, em sede de discussão do Orçamento do Estado na generalidade, que há uma mudança de estratégia deste Ministro em relação ao anterior: este Ministro afirma reorientar o processo de internacionalização para as pequenas e médias empresas, enquanto que o anterior Ministro preferia orientá-lo para os grandes grupos económicos nacionais, tipo Sonae. Mas, Sr. Ministro, se procura reorientar o apoio à internacionalização das empresas portuguesas para o segmento das pequenas e médias empresas, que são as que mais necessidade têm desse apoio, como é evidente, isso faz-se com meios, com dinheiro, seja ao nível directo do apoio às empresas seja ao nível da promoção dos produtos e serviços para ganhar quotas de mercado.
Ora, o que verificamos olhando para o orçamento e para as verbas dele constantes? Verificamos que, em matéria de promoção comercial de produtos e serviços, as verbas disponíveis no Ministério da Economia descem, de 2000 para 2001, 14,3%; em matéria de marketing internacional dos produtos e serviços portugueses, as verbas disponíveis descem, de 2000 para 2001, 54%; em matéria de apoio directo à internacionalização das empresas, as verbas disponíveis descem 60%.
Assim sendo, como é que o Sr. Ministro compatibiliza a sua estratégia de reorientar a internacionalização para o segmento das pequenas e médias empresas, que são as que de facto mais precisam do estímulo do Governo - e neste ponto estou de acordo consigo -, com esta diminuição enorme de verbas destinadas a atingir esse objectivo? Para além do mais, como é sabido, temos vindo a perder sucessivamente quotas de mercado em várias áreas.

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O terceiro conjunto de questões tem a ver com a área do comércio.
Primeira questão: não entendo como é que, numa área que o Governo diz privilegiar, que é o apoio ao comércio tradicional e a sua modernização, o programa específico Apoio ao Comércio Tradicional aparece com uma quebra de 40% nas verbas. Poder-se-á dizer que temos o POE (Programa Operacional da Economia), com vários subprogramas, mas há um programa específico no PIDDAC com uma redução de 40%!
A segunda questão que quero levantar no âmbito do comércio, a qual, em vários momentos, já foi alvo de debate na Assembleia da República com o anterior responsável pela Secretaria de Estado e, na discussão do Orçamento do Estado na generalidade, com este Ministério, tem a ver com o PROCOM e com a garantia, que o Governo deve dar, de cumprir os compromissos assumidos, designadamente, na área dos projectos de urbanismo comercial.
Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, num requerimento a que o Governo me respondeu há pouco tempo, há cerca de três meses, afirmava-se que, no âmbito do II Quadro Comunitário de Apoio, foram aprovadas 3540 candidaturas empresariais com um incentivo estimado em 31,4 milhões de contos, em números redondos. Porém, olhando para as verbas que o Governo indica em relação a esta área, à Intervenção Operacional Comércio e Serviços, PROCOM, parte de urbanismo, a verba total de incentivos ao comércio ronda os 21,9 milhões de contos. Isto é, entre o valor do incentivo que o Governo diz ter aprovado no II Quadro Comunitário de Apoio para as 3540 candidaturas, 31,4 milhões de contos, e as verbas que no conjunto da programação financeira do II Quadro Comunitário de Apoio o Governo indica em sede de Orçamento do Estado, 21,9 milhões de contos, há uma diferença de quase 10 milhões de contos. Como é que isto se explica? Aonde é que o Governo vai buscar este diferencial?
Mas, Sr. Secretário de Estado, vamos fazer uma leitura mais fina das verbas, para a qual eu gostaria de ter respostas concretas.
Para dar-lhe um exemplo concreto e não estarmos a falar em abstracto, vou referir-me ao distrito por que fui eleito Deputado e que, por isso, conheço melhor. O Governo informou-me, a certa altura, relativamente aos compromissos para o financiamento dos projectos já entregues e aprovados em sede do II Quadro Comunitário de Apoio, que o valor global a ser pago era de 458 030 contos. Porém, Sr. Secretário de Estado ou Sr. Ministro, uma vez que não sei quem vai responder, ao que sei, pouco ou nada destas verbas foram pagas.
Para mais, analisando o PIDDAC ao nível do II Quadro Comunitário de Apoio - não estou a falar no Programa Operacional da Economia, nem no III Quadro Comunitário de Apoio, ao abrigo do qual quem não foi contemplado no anterior terá de reapresentar os projectos, e esta é outra discussão que se levanta, tanto a este nível como ao nível do RIME (Regime de Incentivos às Microempresa), etc. -, a verba que aparece disponibilizada, por exemplo, para o meu distrito, nesta matéria, não é, nem de longe nem de perto, os 458 000 contos de compromissos já assumidos pelo Governo no âmbito do II Quadro Comunitário de Apoio e de incentivos a fundo perdido mas, pura e simplesmente, 33 500 contos. Há aqui um diferencial enorme que eu gostaria que o Governo explicasse como vai ser coberto para dar resposta às candidaturas empresariais.
Acontece, Sr. Ministro, que os empresários, as pequenas e médias empresas, as microempresas que se candidataram ao PROCOM tiveram prazos a cumprir: apresentaram os projectos, projectos esses que foram aprovados, fizeram as obras e apresentaram os pagamentos. Ou seja, os investimentos foram feitos há meses, e há meses que aguardam o respectivo pagamento, apesar de já terem contratos assinados! Como não gosto de falar em abstracto, devo dizer que, ontem e hoje, tomei a iniciativa de, neste caso concreto, fazer um rastreio de amostragem junto de alguns dos empresários e cheguei à conclusão de que 8 dos mais de 60 empresários envolvidos neste processo apresentaram, há cerca de seis meses, as despesas comprovadas e assinaram contratos. E, só para esses oito empresários, a verba de incentivos que falta receber ronda os 74 600 contos. Ora, o que está no orçamento não dá sequer para cobrir este valor, quanto mais o resto! Pergunto: como é que o Governo vai resolver esta "embrulhada", uma vez que, aparentemente, não existem verbas disponíveis, e, mais uma vez, poderá haver aqui uma enorme frustração de um processo de apelo à modernização do comércio que não encontrou concretização nas verbas?
Por outro lado, muitos dos projectos que foram apresentados ao abrigo do PROCOM, do RIME, etc., no âmbito do II Quadro Comunitário de Apoio, e não encontraram enquadramento, alegadamente por esgotamento de verbas, terão agora de ser reorganizados e reapresentados, com novos gastos na sua elaboração, ao abrigo do III Quadro Comunitário de Apoio. Pergunto: o que se passa? Por que razão estes projectos não passam automaticamente para o III Quadro Comunitário de Apoio?
Passemos a uma outra área, à área do turismo, sobre a qual costumo dizer, há alguns anos a esta parte, que há um mar de rosas…

Risos.

Se calhar, é por isso que o Sr. Secretário de Estado é o único membro da equipa do Governo que transita do governo anterior, se não estou a falhar…

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Não, não!

O Orador: - Há outro, peço desculpa!
Mas parece-me haver um grande consenso criado à volta das políticas para o turismo, muito por intervenção dos operadores no sector, das regiões de turismo, etc. Contudo, é preciso que este consenso se traduza em medidas práticas nos planos financeiro e legislativo, tanto mais que este é um sector que tem a importância que tem; é um sector que teve de receitas, salvo erro, 1400 milhões de contos em 2000; temos 12 milhões de turistas e há, de facto, um boom neste sector que é preciso acarinhar, apoiar e desenvolver no País.
Porém, fiquei um pouco surpreendido com o novo "discurso" que li nos textos que nos foram apresentados, na medida em que eles apontam uma formulação - a qual pode, eventualmente, não ter efeitos práticos, mas eu temo que tenha - que, no fundo, se traduz no seguinte: trata-se de consolidar os grandes centros turísticos, os de maior dimensão, em Portugal. Em resumo, é isto que está no relatório, o que significa que se pretende orientar os esforços e meios financeiros para Lisboa, Algarve e Madeira, esquecendo-se de uma questão que, até há pouco

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tempo, estava no discurso, pelo menos no do Sr. Secretário de Estado, que é a necessidade de diversificar a oferta, diversificar os nossos próprios destinos internos e os próprios produtos e serviços que temos para oferecer.
Portanto, deste texto decorre, ou pode decorrer, a discriminação, a marginalização e uma menor priorização do turismo rural, do turismo cultural e do desenvolvimento de outros pólos de atracção turística dentro do sector, para nos continuarmos a concentrar no Algarve, em Lisboa e na Madeira, isto é, no "produto sol e praia", o que, naturalmente, como destino turístico, teremos de continuar a ter de privilegiar e apoiar, mas que, como é óbvio, terá de ser acompanhado de apoios, de mecanismos e de medidas para uma maior diversificação.
Em segundo lugar, no debate que aqui travámos sobre o Orçamento do Estado para 2000, previa-se a publicação de dois instrumentos legislativos, que continua adiada e que podem ser muito importantes para o novo impulso no sector: a lei de bases e a nova lei-quadro das regiões de turismo. Pergunto: quando é que essa legislação está em condições de vir a público e ser debatida, se for caso disso - e penso que será -, na Assembleia da República?
Por último, e esta é uma questão muito concreta, no sector do turismo existem programas específicos de valorização turística de certas regiões na base de propostas e de programas que foram apresentados - estou a falar, por exemplo, de São Mamede e de Évora, que têm reservas próprias no PIDDAC para programas específicos de valorização. Ora, sei que também foi apresentado por uma outra região de turismo - a Região de Turismo Planície Dourada - um programa de promoção e valorização turística da sua respectiva área (já quantificado), mas não vejo dotação orçamental para este fim. Gostava de ter uma explicação do Governo no sentido de saber por que é que esse programa não avança.

O Sr. Presidente (José Penedos): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr. Presidente, se estiver de acordo, responderei às duas primeiras questões e pedirei aos Srs. Secretários de Estado para responderem às restantes.
Em relação ao tema Galp, sobre o qual já tive oportunidade de me pronunciar por mais do que uma vez, muito sinteticamente, gostaria de dizer o seguinte: pessoalmente, estou de acordo e não enjeitaria o objectivo de manter a empresa em mãos portuguesas, mas os Srs. Deputados sabem perfeitamente que, no quadro da União Europeia, este não é um objectivo que eu possa expressar em termos políticos, porque estas não são, como sabem, as regras do jogo, e temos de ter isto muito claro.
Dito isto, o problema não se coloca neste momento mas, sim, quando se chegar ao momento de decidir a fase seguinte: a privatização da empresa, designadamente a sua colocação em Bolsa. E, nesse momento, inclusivamente, terão de tomar-se decisões quanto a ter ou não uma golden share, ou seja o que for. Portanto, neste momento penso que é prematuro estar a pronunciar-me sobre o que fazer ou não a propósito deste tema. Aliás, como disse, a questão das golden shares está, neste momento, "debaixo de fogo" da Comissão, e, portanto, é um tema complexo, mas gostaria de acentuar que este não é um tema de risco imediato.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço desculpa, Sr. Ministro, mas, como sabe, as dificuldades que hoje se sentem nessa área decorrem de responsabilidade directa do Governo, uma vez que permitiu o aumento da participação dos italianos, no capital da empresa, de 15% para 33,4% - ou para 33,2% -, contra aquela que era a perspectiva inicial. Portanto, o Governo tem uma clara responsabilidade neste processo, da qual não pode demitir-se!

O Orador: - Sr. Deputado, dessa responsabilidade não resultou até agora, que eu saiba, que a Galp seja controlada pela Eni!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E o acordo parassocial?!

O Orador: - Não resultou até agora. O que estou a dizer, Sr. Deputado, é que o problema, se existe, colocar-se-á num determinado momento que não é este, e, portanto, penso que não vale a pena estarmos aqui a especular já sobre o que acontecerá ou não daqui a dois anos, porque entretanto muita coisa pode acontecer.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Podemos perder a empresa e o sector!

O Orador: - Não comento mais.
Quanto ao segundo ponto, o relativo ao problema dos fundos ou da disponibilidade de meios, deixe-me, primeiro, corrigir a leitura que faz, que, a meu ver, não é correcta, ao dizer que apresento uma reorientação relativamente ao meu antecessor.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É um louvor!

O Orador: - Não, não! Provavelmente, estaremos a dizer a mesma coisa, mas de maneira diferente! Ou seja, não digo isto apenas para tornar claro o que, suponho, já é claro neste momento: é que, contrariamente à "lenda" que se tentou montar no início, de que eu teria uma "guerra" com o meu antecessor, não existe qualquer "guerra", antes pelo contrário! Mais: em relação à leitura que faço do que se passou antes - e faço uma leitura activa, no sentido de que fui protagonista de um processo de internacionalização, sendo o anterior Ministro da Economia o representante do accionista junto da empresa -, posso dizer-lhe que houve, da parte do Governo (e bem, na minha opinião), um apoio político e um apoio de accionista. Nunca houve qualquer apoio monetário. Sei porque estive envolvido em processos de internacionalização de duas empresas em que o Estado tinha posição dominante ou forte, como são os casos da Cimpor e da EDP, e, em nenhum dos casos, as empresas foram buscar quaisquer fundos, fizeram-no a partir do seu próprio balanço e por entenderem, como referi há pouco, que essa seria uma boa estratégia. Portanto, tiveram foi o conforto político e não qualquer apoio.
Do que estou agora a falar é na óptica de usar os dinheiros públicos, que é uma óptica muito mais séria, no sentido de que temos de pensar muito bem onde aplicamos os dinheiros públicos - e refiro-me, designadamente, ao POE, quer na vertente fundos comunitários quer na vertente complemento fundos nacionais -, e é nesta perspectiva que entendo que, neste momento, estes fundos, a serem aplicados na internacionalização, devem ser usados para aqueles fins específicos sobre os quais, aliás, penso que estamos de acordo.

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Creio ter tornado claro que há aqui uma distinção entre o apoio político e apoio accionista e o apoio com fundos, o que é diferente, porque é muito mais responsabilizante, já que envolve o uso de meios públicos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Ministro, a Sonae recebeu apoios com fundos para o desenvolvimento de superfícies comerciais e de distribuição no Brasil. Foram 10 milhões, Sr. Ministro!

O Orador: - Sr. Deputado, não posso comentar, porque não conheço. Mas terá sido em relação a um sistema de incentivos que, entretanto, já caducou, já não está em vigor.

Risos dos Deputados do CDS-PP, António Pires de Lima, e do PSD, Hugo Velosa e Vieira de Castro.

De qualquer forma, em relação ao apoio à internacionalização, que é amplo no sentido de que não inclui apenas os aspectos específicos que mencionei mas também a imagem de Portugal no exterior, a promoção dos produtos portugueses, etc., que pertencem, fundamentalmente, ao ICEP, como se sabe, há de facto uma redução significativa nas verbas, mas ela será compensada, este ano, pela candidatura do ICEP, que está em curso, a verbas do POE especificamente desenhadas para este ponto. Portanto, as verbas vão aparecer, vão ser complementadas; ou seja, essa queda será, na realidade, compensada pelo recurso a verbas do POE. Esta situação não está espelhada no orçamento, talvez seja um problema de apresentação dos números. No entanto, gostaria de esclarecer o Sr. Deputado de que - e, como deve calcular, este é um tema que me preocupa particularmente, porque é da responsabilidade directa e específica do Ministro, já que o ICEP depende directamente de mim - este é um tema sobre o qual já estamos a trabalhar, e, em breve, o ICEP apresentará candidaturas ao POE para poder prosseguir os programas de apoio à internacionalização em sentido amplo, isto é, de promoção da economia portuguesa no exterior, quer quanto à indústria quer quanto ao turismo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O ICEP tem menos 37% neste orçamento!

O Orador: - Desculpe, mas não é comparável, porque este ano vão entrar verbas que não existiam no ano passado. Posso garantir-lhe que não estou aqui a usar qualquer subterfúgio. É mesmo assim!
De qualquer forma, peço aos Srs. Secretários de Estado das Pequenas e Médias Empresas, do Comércio e dos Serviços e do Turismo que respondam às restantes questões colocadas pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente (José Penedos): - Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado das Pequenas e Médias Empresas, do Comércio e dos Serviços.

O Sr. Secretário de Estado das Pequenas e Médias Empresas, do Comércio e dos Serviços (Ângelo Rosário de Sousa): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, em relação às questões que nos colocou, começo por referir que o PROCOM não diz respeito apenas ao urbanismo comercial, é um programa de apoio à modernização do comércio onde, de facto, o urbanismo comercial representa uma fatia significativa e, porventura, a mais emblemática de todo o programa. Em todo o caso, quero referir-me de uma forma geral ao PROCOM, para sermos precisos e objectivos no que toca aos números e aos orçamentos que se apresentam.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho referiu-se, mais concretamente, a alguns números constantes da resposta aos requerimentos que formulou, ainda este ano, ao ex-Secretário de Estado do Comércio e Serviços, ao Governo, e que, de facto, se referem ao urbanismo comercial e não à totalidade do PROCOM. Esta é, portanto, a primeira observação.
Volto a reafirmar o que já dissemos em sede de discussão na generalidade: relativamente ao PROCOM, incluindo obviamente todos os projectos do urbanismo comercial, reafirmamos a nossa responsabilidade e o nosso dever de fazer duas coisas: primeiro, solver, obviamente, todos os compromissos já assumidos pelo Estado, ou seja, os projectos homologados e contratados sem qualquer condicionante. Portanto, isto aplica-se a todo o conjunto de projectos que deram entrada no âmbito do PROCOM e que foram homologados, aprovados e contratados como tal - trata-se de uma situação irreversível. Neste momento, as candidaturas já estão todas contratadas, a generalidade dos projectos, a larga maioria, foram concluídos até 31 de Outubro e o que estamos a fazer é, de facto, solver todos esses compromissos.
Assim, os 458 030 contos referentes à totalidade dos projectos do distrito de Évora, qualquer que seja a sua situação, todos eles constam da nossa agenda de compromissos e todos eles serão pagos e satisfeitos com base nas verbas inscritas no orçamento, e, caso as verbas venham a revelar-se insuficientes, concretamente no âmbito do PROCOM e do urbanismo comercial, encontraremos formas de as reforçar por forma, volto a afirmar, a cumprir, rigorosa e escrupulosamente, os compromissos assumidos nessa matéria; assim os empresários também apresentem e cumpram com as suas obrigações de executar os projectos de acordo com os critérios e com os timing previstos. Ou seja, quando falamos de 458 030 contos de projectos de urbanismo comercial aprovados no distrito de Évora não quer dizer - nem ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, com certeza, quis dizer - que, qualquer que seja o grau de desempenho e de concretização deste tipo de projectos por parte das empresas, tenhamos de pagar os 458 030 contos.
No mesmo requerimento, aliás…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Secretário de Estado, não foi nada disso que me responderam!
Sr. Secretário Estado, fiz-lhe perguntas muito concretas. Primeiro, no conjunto dos projectos, só no âmbito do urbanismo comercial do País, o Governo situava esse valor em 31,4 milhões de contos (incentivo estimado). No PIDDAC, o que aparece como valor global de programação financeira total para todo o PROCOM, a pagar, é 21,9 milhões de contos.
No que toca concretamente ao distrito de Évora, o que os senhores dizem é que, no âmbito do II Quadro Comunitário de Apoio, irão ser pagos - o Sr. Secretário de Estado não sabe se irão ser pagos - 458 000 contos. No orçamento que aqui apresentam, a verba prevista é apenas de 33 500 contos! Ora, só os oito projectos que aguardam pagamento, já com recibos, contratos feitos e assinaturas de ambos os lados, envolvem 74 700 contos. Onde é que se vai buscar este dinheiro? Tem de estar orçamentado!

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O Orador: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, volto a reafirmar aquilo que disse, ou seja, que os 458 030 contos, relativamente aos projectos aprovados no âmbito do QCA II, serão pagos na justa medida em que forem concretizados e apresentados os dossiers pelas empresas promotoras, o que, aliás, já sucedeu na sua generalidade, ainda que não na sua totalidade - até 31 de Outubro, conforme lhe competia. Vamos apurar esse valor, e temos meios orçamentais para o cobrir, independentemente da distribuição regional do PIDDAC; e nesta matéria de incentivos temos sempre alguma dificuldade em definir, logo à partida, o valor, uma vez que não trabalhamos com orçamentados regionalizados em matéria do programa do comércio.
Mas deixe-me referir aqui uma outra questão relativamente aos compromissos assumidos. Os projectos homologados, aprovados e contratado serão satisfeitos com base no Orçamento do Estado para 2001 e, quanto aos que transitaram para o QCA III, na mesma resposta dada ao requerimento formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho dizia-se: "No âmbito do QCA III serão analisadas 72 candidaturas, correspondentes a um investimento de 1,3 milhões de contos". Pois bem, Sr. Deputado, neste momento foram apurados, por acaso, não 72 mas 74 projectos, e, por acaso, após a análise efectuada pelos serviços, o valor de investimento não foi de 1,3 milhões mas de 971 000 contos. E todos estes projectos já estão aprovados no âmbito do POE, dando sequência cabal, aliás, àquele que foi o compromisso assumido no âmbito deste requerimento.
Relativamente à questão da transição para o QCA III, a última pergunta colocada pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho, o que se disse é que os projectos que não foram objecto de decisão, que não foram homologados e contratados, obviamente, iriam transitar para o QCA III. Mas o que foi possível fazer-se, foi o seguinte: nas medidas em que os critérios e os dados adicionais necessários não eram significativos, não se pediram novas candidaturas. Assim sucedeu com perto de 3500 projectos que, no âmbito do urbanismo comercial, já se encontram aprovados no POE - Programa Operacional da Economia, relativamente aos quais não foram pedidos novos elementos adicionais. Agora, depois de estarem aprovados e homologados, obviamente, que, na altura da contratação, houve que pedir a actualização de alguns elementos.
Relativamente a outros sistemas, cujos critérios se afastavam ligeiramente mais daquilo que era exigido no anterior QCA, pediu-se dados adicionais, e não foi uma reformulação de candidatura, nem houve, julgo eu, lugar a grandes despesas adicionais na preparação dos projectos. Assim foi na questão da transição de alguns sistemas que anteriormente integravam o PROCOM, como era o caso do SAMEC, e dos projectos especiais para o POE. Ou seja, não foram pedidas novas candidaturas, foram pedidos dados mais actualizados e alguns dados complementares, que no quadro regulamentar anterior não eram exigidos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas, então, por que é que não pagam os contratos que já estão entregues há meses, com despesas comprovadas? Esta é que é a questão!

O Orador: - Peço-lhe desculpa, Sr. Deputado, por não ter respondido a essa questão.
O que se passa, neste momento, é que as empresas tiveram um prazo, até 31 de Outubro, para concluir os seus investimentos, preparar os seus dossiers e entregá-los. Devo dizer que a generalidade das empresas candidatas ao PROCOM, nomeadamente ao urbanismo, cumpriram esse prazo e que também nos foram colocadas algumas questões e dificuldades relativamente a alguns casos concretos, mas nada foi possível fazer-se.
Relativamente aos projectos, o Sr. Deputado não pode, com base numa situação que pode ser concreta e relativa a cerca de dezenas de candidaturas, generalizar esta situação para uma medida que tem 3500 projectos aprovados. Ou seja, conforme já disse no debate, na generalidade, não lhe vou dizer que não haja casos de projectos inicialmente apresentados já há seis meses, mas também importa aqui referir que a apresentação inicial não quer dizer tudo, porque muitas vezes os dossiers não vêm nem completos nem fundamentados, e, muitas vezes, há que pedir esclarecimentos por forma a concluírem-se os dossiers. De facto, temos um sistema que, na opinião de alguns, é demasiado rigoroso e exigente, mas, nesta fase, não podemos prescindir disto.
Há muitas questões concretas, como, por exemplo, a dos elevados pagamentos apenas em dinheiro, que nos colocam, como é óbvio, a necessidade de voltar a pedir a confirmação desses valores, por forma a fazê-lo por outros meios.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa agora! Então e os contratos entregues, aprovados e assinados por ambas as partes?!

O Orador: - Sr. Deputado, o contrato assinado por ambas as partes não dá o direito de utilização do incentivo, aquilo que dá esse direito é o empresário cumprir, de acordo com os timing que estão estabelecidos, o investimento, realizá-lo e financiá-lo da forma como está previsto. Só depois disto é que ele terá direito ao incentivo; e, como é óbvio, só depois disto é que o Estado tem a obrigação e o dever de lhe pagar.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Que discurso tão diferente do da campanha eleitoral que fizeram no ano passado! Na altura, eram só facilidades; agora são só dificuldades!

Neste momento, a Sr.ª Presidente, Manuela Ferreira Leite, reassumiu a presidência.

A Sr.ª Presidente: - Para completar a resposta do Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.

O Sr. Secretário de Estado do Turismo (Vítor Neto): - Sr.ª Presidente, começo por agradecer as palavras simpáticas do Sr. Deputado Lino de Carvalho em relação à evolução do turismo e também por o tranquilizar acerca da política do Governo, que não mudou, não só porque é o mesmo Secretário de Estado mas, sobretudo, porque é o mesmo Governo e as grandes vertentes da sua política não estão alteradas.
Quanto ao bom momento que o turismo atravessa - e eu não falaria de boom, porque pode levar à criação de ilusões ou à ideia de que estamos interessados apenas num crescimento quantitativo do nosso turismo, e não é esta a realidade -, de facto, nos últimos anos, temos vindo a crescer quantitativamente, tem aumentado o número de turistas. Desde 1997, até hoje, os turistas aumentaram em

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cerca de 2 milhões, o que representa cerca de 24% de crescimento, mas, em termos de receitas, no mesmo período, crescemos 45%. Ora, este é o dado que interessa aqui relevar.
Por outro lado, em 2000, a projecção que fazemos para o final do ano é de um crescimento na ordem dos 3%, 3,5%, em termos quantitativos, e dos 10%, 12%, em termos de receitas.
Gostaria de sublinhar, porque, a meu ver, isto tem importância, apesar de se falar muito poucas vezes dos problemas do turismo, que estes nossos resultados acontecem num momento de turbulência turística na área do mediterrâneo. Este ano, houve grandes alterações na área do mediterrâneo, com uma recuperação muito forte da Turquia, do Egipto e da zona balcânica, com fortes resultados também em Itália e França, e, neste contexto, Portugal continuou a crescer. A Espanha não vai ter este ano o crescimento que esperava, e está com resultados, acumulados a Setembro, inferiores aos dos portugueses.
Portanto, isto dá-nos alguma garantia de que estamos a trilhar o caminho certo, de que de facto já estamos a correr numa pista própria e de que o nosso turismo consegue responder às turbulências, às dificuldades e às alterações que surgem na área do mediterrâneo. Porém, isto não nos deve levar a falar de boom mas, sim, de um crescimento sustentado, consolidado, que é positivo e que temos de procurar manter nos próximos anos; mas para isso temos de trabalhar muito em termos de melhoria dos nossos produtos, da nossa oferta e qualidade da mesma.
Sr. Deputado, no que toca à outra questão que levantou, gostaria de o tranquilizar, porque, de facto, consolidar centros turísticos de maior dimensão é uma formulação um pouco tecnocrática, podemos dizer assim, e que pode levar a interpretações erróneas e fora do seu contexto.
A linha estratégica do Governo para o turismo assenta em dois vectores fundamentais: por um lado, continuar a apoiar, e fortemente, as zonas e as regiões onde o nosso turismo é mais forte - creio que ninguém perdoaria ao Governo se não o fizesse.
O Sr. Deputado falou de 1400 milhões de contos de receitas, posso dizer-lhe que, este ano, prevemos 1600 milhões de contos de receitas cambiais no nosso turismo, o que é extraordinariamente importante para a nossa Balança de Pagamentos. Por isso ninguém perdoaria ao Governo se este não apoiasse os grandes centros turísticos de maior dimensão, que representam 70%, 80%, 85% do nosso turismo, e é onde precisamente se geram essas receitas.
Portanto, esse é um vector de que não iremos abdicar, e penso que qualquer economista, qualquer estratega de marketing não perdoaria se abandonássemos pontos de força da nossa intervenção económica.
Por outro lado, gostaria de dizer que o outro vector, que não é menos importante do que este, em que assenta a nossa política é apoiar a diversificação da nossa oferta turística, não só em termos de produtos mas em termos de oferta e de regiões, porque pensamos que isto é importante, não só numa perspectiva do turismo mas também numa perspectiva mais vasta de desenvolvimento local e regional e de atenuação das assimetrias; ou seja, levar a que o turismo possa ser uma actividade praticada em todo o País e que traga benefícios para as populações.
Isto está a ser feito, e, de facto, toda a nossa política, inclusivamente em fundos comunitários, assenta nesta perspectiva. Hoje, no POE, as medidas para o turismo são de uma abertura total e privilegiam de uma forma muito grande as novas iniciativas para as novas regiões, os novos produtos e a intervenção estratégica na área do turismo. Portanto, estamos totalmente vocacionados para apoiar tudo o que vá nessa direcção.
Assim, gostaria de tranquilizar o Sr. Deputado dizendo que não há alteração, pelo contrário, há uma acentuação deste nosso vector de intervenção.
O Sr. Deputado colocou questões sobre a lei-quadro das regiões de turismo e a lei de bases. Ora, penso que as propostas do PIDDAC não são feitas através de nós, mas directamente para o Ministério do Planeamento. Não posso dar-lhe uma resposta específica sobre isto, mas vou informar-me, vou ver o que se passa. Sei que algumas foram acolhidas, outras não; é, portanto, uma matéria sobre a qual me irei informar melhor.
Sobre a lei-quadro das regiões de turismo, gostaria de dizer ao Sr. Deputado que já está a decorrer, numa fase avançada, o diálogo com as regiões de turismo. Posso adiantar que no dia 5 de Dezembro vai haver uma reunião para uma primeira discussão sobre um texto de proposta, que já foi elaborado, para a lei-quadro das regiões de turismo, e penso que, no decurso do próximo ano, iremos chegar a um consenso, por forma a resolver este problema.
Quanto à lei de bases, esta é uma lei de enquadramento global, é um edifício para fechar todo o quadro legal da área do turismo. É um documento político, que também está a ser elaborado, e eu gostaria que até ao final desta Sessão Legislativa este problema ficasse resolvido. No entanto, gostaria de sublinhar o seguinte: todo o quadro legislativo, naquilo que diz respeito a investimentos na área do turismo, está completo. "Estar completo" não quer dizer que seja perfeito, não quer dizer que não possa ser susceptível de aperfeiçoamentos, mas ele está feito e hoje nenhum investidor, nenhuma empresa, pode dizer que é por falta de enquadramento legal que não intervém na área do turismo.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Srs. Secretários de Estado: Sou Deputado eleito pelo círculo eleitoral do Porto, vivo num dos grandes municípios deste País, Vila Nova de Gaia, que tem, para quem o conhece bem, grandes potencialidades no plano industrial, comercial e turístico.
A actual câmara municipal está, finalmente, a realizar um projecto de desenvolvimento e modernização daquele grande município, correspondendo, no fundo, às aspirações de várias gerações, para o tornar num concelho de qualidade, o qual também carece de um ordenamento industrial. Assim, há alguns anos a esta parte lançou-se um certame para tentar divulgar as potencialidades do concelho nos planos social, comercial e turístico, chamado Gaiamostra, que normalmente utilizava um pavilhão de cais, situado em Vila Nova de Gaia, cedido pela APDL, através do protocolo celebrado entre a câmara municipal e a APDL. Este pavilhão do cais está, neste momento, a ser demolido, atendendo a que vai haver um projecto de requalificação de toda aquela zona ribeirinha, e, por isso, este certame, Gaiamostra, já este ano teve de se deslocar para um pavilhão sem um mínimo de condições, porque é apenas um pavilhão desportivo que a câmara tentou adaptar, o melhor que pôde e soube, para não interromper essa exposição das potencialidades do concelho. Ora, é objectivo desta câmara municipal, em sintonia estratégica com a associação comercial e social de Vila Nova de Gaia,

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construir de raiz um parque empresarial digno deste nome num concelho com aquela dimensão e potencialidades. Mas, para isso, precisam, naturalmente, do apoio, do incentivo, da comparticipação do Estado e, porque não?, também dos fundos comunitários, para que esse projecto possa, desde já, ser pensado e realizado a curto prazo.
É também intenção da câmara que, para além deste certame de carácter genérico, geral, possa haver, ao longo do ano, outros certames, outras exposições mais sectoriais das diversas potencialidades do concelho.
Sr. Ministro, eu gostaria de saber da disponibilidade do Governo para encarar e apoiar, na medida do possível, naturalmente, este objectivo, que, a meu ver, é importante não só para o município onde ele vai ser sediado mas para a própria região onde está inserido. Apesar de sabermos que no encontramos ao lado da cidade do Porto ou de Matosinhos, onde se realiza a EXPONOR, onde realmente se realizam as grandes feiras internacionais e nacionais, é, a meu ver, importante que haja este parque empresarial de Vila Nova de Gaia, com um pavilhão de exposições que seja digno desse nome, e é por isto que eu gostaria de sensibilizar o Governo e de saber se da parte dele há disponibilidade e abertura para poder vir a apoiar este objectivo.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cândido Capela.

O Sr. Cândido Capela (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, Srs. Secretários de Estado: Começo por referir que sou Deputado eleito pelo círculo eleitoral de Braga, sendo a minha região, mais concretamente, a do Vale de Ave.
Ora, como ouvi aqui falar da modernização da indústria portuguesa e em particular da indústria têxtil e do vestuário, gostaria de ver esclarecida uma questão. Sabe-se que a propósito de alguns dos programas de modernização da indústria têxtil e do vestuário houve investimento, e muito investimento bom, que levou à modernização tecnológica, mas houve também muito investimento tecnológico que não representou qualquer mais-valia, qualquer ganho, para a modernização do nosso tecido empresarial nesta área. Aliás, há relatórios da comunidade a este respeito que, no mínimo, levantam dúvidas, que gostaria de ver esclarecidas, no sentido de que parte dos fundos do esforço nacional e comunitário não foi devidamente aproveitado, devidamente canalizado e, se calhar, alguns dos resultados estão hoje à vista.
Dito isto, pergunto: no futuro, como pensa o Ministério da Economia acompanhar os novos investimentos, como pensa avaliar, no concreto, a aplicação dos dinheiros públicos?
Em relação à modernização, uma outra área que tem merecido apoio foi a do ambiente. Houve empresários que fizeram esforços no sentido de, dotando-se de meios próprios, projectarem e construírem ETAR e outros que, podendo-o fazer, optaram pela adesão a processos intercomunitários. Mas há uma fatia muito importante de outros empresários que, podendo fazer a adesão a processos intercomunitários, podendo construir as ETAR, tendo-se comprometido, inclusivamente, em prazo e em obra, nestas execuções, não o fizeram.
Pergunto: como é que o Ministério pensa evitar que junto dos empresários haja descrédito - e já não falo de uma velha questão, que está pendente com o Ministério do Ambiente, sobre a concorrência desleal que, alegadamente, alguns empresários admitem nesta matéria? Como pensa o Ministério resolver o problema daqueles que, tendo-se esforçado, tendo investido, têm agora vizinhos que, rigorosamente, não só nada fazem como continuam a operar de uma forma impune?

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Pequenas e Médias Empresas, do Comércio e dos Serviços.

O Sr. Secretário de Estado das Pequenas e Médias Empresas, do Comércio e dos Serviços: - Srs. Deputados, sobre a questão relativa ao município de Gaia, devo dizer que, no âmbito do QCA III, temos acordado na organização entre os diversos programas o seguinte: em matéria de apoio a este tipo de iniciativas, que, obviamente, valorizam sempre as actividades produtivas no sentido de as divulgar e de melhorar o conhecimento que os mercados dispõem das actividades económicas, quaisquer que elas sejam, o acordo que há a nível de organização do QCA III é o de que as infra-estruturas que envolvam construção de infra-estruturas físicas deverão, preferencialmente, ser canalizadas para programas operacionais regionais, neste caso do Programa Operacional da Região Norte, obviamente, isto no pressuposto de este tipo de infra-estruturas se inserir num plano geral de desenvolvimento, não só local mas também regional, e de contribuir para um melhor ordenamento, sobretudo do próprio município.
Em relação ao POE, o que podem e devem esperar os empresários organizados nas suas associações é que possam vir a ter, de facto, apoio para a realização das próprias iniciativas, quer de natureza mais tradicional, organizando, por exemplo, não só mostras, feiras, certames mas também divulgando a sua capacidade e a sua competitividade através de novos meios, como, por exemplo, de bases de dados, de relatórios digitais. O que eu diria é que a infra-estrutura, a avaliação do apoio, deverá ser canalizada para o programa operacional regional e que os conteúdos, esses sim, é que poderão e deverão ser submetidos à medida 3.3 do Programa Operacional da Economia.
No que diz respeito à indústria têxtil, o meu colega já se referiu de forma genérica, mas apenas pretendo dizer que, relativamente à avaliação daquilo que foi feito nos últimos anos, mais particularmente no âmbito do QCA II, grosso modo nos últimos cinco anos, os resultados é que contam. E de facto, em 1994/95, o que se discutia de uma forma recorrente era se a indústria têxtil teria ou não futuro - e muita gente dizia que, em Portugal, não tinha qualquer futuro. O que se discutia eram medidas de emergência, de apoio à criação de emprego na Região do Ave. Hoje, o que de facto se discute são os novos caminhos para manter no futuro a competitividade que se gerou até agora numa região que está muito perto do pleno emprego, se não abaixo da taxa de desemprego.
Não quero com isto dizer que esteja tudo resolvido, mas os 270 milhões de contos dinamizados só no âmbito do Programa IMIT hão-de traduzir-se necessariamente numa melhoria da competitividade do sector. Como é óbvio, os investimentos, designadamente através de programas comunitários, não constituem seguro de vida para ninguém, mas mostram uma disponibilidade muito grande em termos de modernização e de algum reposicionamento da indústria têxtil, que, neste momento, já é visível no sector algodoeiro do Vale do Ave, por exemplo.

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Conforme também já foi aqui afirmado, a indústria têxtil tem vários subsectores, várias fileiras, e o que se passa é que a indústria têxtil do Vale do Ave se está reposicionar em sectores menos expostos à concorrência internacional, nomeadamente dos países de mão-de-obra barata, reposicionando-se em segmentos que podem gerar maior valor acrescentado. É o caso do enorme investimento que vem sendo feito na área dos acabamentos, onde, neste momento, se ganha ou perde dinheiro, se ganha ou se perde competitividade, e não em sectores de produção indiferenciada, como a fiação, mais a montante.
O Sr. Deputado também referiu os enormes investimentos feitos na área do ambiente e devo dizer que concordo inteiramente com a preocupação com que terminou a sua intervenção. O que é que vamos fazer relativamente aos empresários que não modernizaram, que não investiram na área do ambiente? Estamos disponíveis para uma acção de fiscalização generalizada a este tipo de comportamentos, mas para tirar daí as suas consequências. Ou seja, entendemos que os que arriscam, que modernizam, que investem, não podem ser penalizados. Penalizadas devem ser as empresas que não acompanham não só as oportunidades como também, em muitos casos, as suas obrigações legais.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Machado Rodrigues.

O Sr. Machado Rodrigues (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, vou procurar ser breve. Tenho duas perguntas para formular, sendo uma de âmbito nacional mas com grande incidência regional.
Há uma grande empresa portuguesa, a EDP, que se propõe fazer um grande investimento no distrito de Bragança consubstanciado na barragem do Baixo Sabor. O sítio e as disposições para o avanço e para a avaliação desse empreendimento foram analisados, tendo depois havido alguns percalços, nomeadamente ligados a questões ambientais, que levaram a uma dilação - julgo que é nesta situação que se encontra neste momento.
Gostaria de referir, pois penso que é justo fazê-lo, que formulei, em tempo oportuno, um requerimento ao Governo sobre essa questão, ao qual o Ministério da Economia respondeu impecavelmente. Nesse requerimento, eu perguntava se havia alteração dos pressupostos, quer do ponto de vista da baía energética, quer do ponto de vista da conveniência em termos do que se passava no mercado e no preço dos combustíveis, quer do ponto de vista da limitação das emissões e do cumprimento das regulamentações da Comunidade, quer do ponto de vista da reserva estratégica de água absolutamente indispensável para a produção das barragens a jusante da do Baixo Sabor, quer do ponto de vista da regularização do caudal do Douro.
A tudo o Ministério da Economia respondeu dizendo que se algo aconteceu aos pressupostos que existiam foi que hoje ainda são mais evidentes e têm valor de forma ainda mais incisiva.
Infelizmente, de outro Ministério recebi uma resposta não detalhada, pondo a questão em termos de estar a ser estudada outra alternativa.
Devo dizer que a minha conclusão, em termos práticos - e digo isto aqui porque, obviamente, a decisão de avançar pertence ao Governo -, relativamente ao estudo da alternativa, é a de que se façam as duas que é possível fazer e que se avance mais depressa com a que estiver mais avançada.
Como se trata de um investimento de carácter extremamente estruturante para o distrito pelo qual fui eleito para esta Assembleia, quero deixar aqui esta questão ao Sr. Ministro da Economia, que com certeza está sensibilizado para a matéria por a conhecer de outra sede, para, no fundo, as necessidades de desenvolvimento do País não serem travadas por considerações ou situações que não são mais do que conjunturais.
A outra questão que quero colocar é de âmbito global. Tenho para mim, e suponho que estamos todos de acordo quanto a isso, que, nesta altura, um aspecto essencial para a economia portuguesa é o crescimento do investimento estrangeiro - o Sr. Secretário de Estado parece não estar muito de acordo comigo, mas eu penso assim. Nesta época de globalização, esse aspecto é essencial, sendo que outra vertente muito importante é a preparação das nossas empresas para elas, directamente, ou como subcontratantes, se integrarem nessas economias globalizadas.
Mas, no tocante à importância decisiva do investimento estrangeiro e no seguimento de uma questão que aqui coloquei ao Sr. Ministro das Finanças e aos membros do seu Ministério, gostaria que o Sr. Ministro comentasse o grau de receio que tem relativamente a políticas fiscais porventura menos realistas e à respectiva influência na atractabilidade do investimento estrangeiro.
Tendo em conta que o mercado de capitais é um instrumento essencial para a problemática economia, quero também chamar a atenção para o facto de o mercado de capitais português ser um jovem em crise de crescimento, com todas as delicadezas de um adolescente. Gostaria que o Sr. Ministro comentasse as implicações e riscos que possam advir da adopção de eventuais políticas fiscais para economia portuguesa.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.

O Sr. Ministro da Economia: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Machado Rodrigues, começando pelo Baixo Sabor, tenho de lhe confessar, muito honestamente, que a última vez que me debrucei sobre este tema foi durante a minha actividade anterior, como certamente imaginará. E também tenho de lhe confessar que, desde que estou no Governo, o dossier não me apareceu. No entanto, vou pedir ao Sr. Secretário de Estado Adjunto, que acompanhou este tema de perto, e continua a acompanhar visto que tem a tutela da Direcção-Geral da Energia, que comente essa questão.
Antes disso, aproveito para responder à segunda questão, começando por fazer uma distinção importante. Penso que, quando o Sr. Deputado fala de crescimento do investimento estratégico, está a pensar em investimento directo estrangeiro, ou seja, investimento directo em projectos industriais ou de outra natureza.
Na verdade, se não houver procura externa, a bolsa portuguesa não existe. Aliás, este é um problema que, a médio e a longo prazo, terá de ter um caminho diferente. Como sabe, hoje em dia começa a discutir-se a fusão de bolsas, porque esta questão cada vez é mais complicada, isto é, mesmo países com uma dimensão superior à nossa começam a ter problemas em terem a sua bolsa nacional, ou bolsas, como muitas vezes acontece.
Falando daquela é a principal preocupação do Ministério da Economia, que é o investimento directo estrangeiro, já há pouco, em resposta a uma questão, tive oportunidade

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de dizer que a fiscalidade é claramente um elemento importante numa decisão de investimento, mas não me parece que a recente reforma fiscal tenha criado algum problema nessa matéria. Como já disse há pouco, penso que é importante para o futuro que pelo menos a componente tributação do IRC venha a ser cada vez mais melhorada. Aliás, penso que, na discussão do Orçamento na generalidade, o Sr. Ministro das Finanças deixou claro ser essa a intenção do Governo, isto é, a de ir evoluindo para uma tributação sobre o IRC cada vez mais favorável.
Entendo que esta é uma medida muito importante. É óbvio que o investidor estrangeiro, quando avalia várias alternativas de localização, analisa um pacote de factores. O factor fiscal é, obviamente, muito importante, mas há outros. Como tal, não se pode dizer que um investimento é ou não feito exclusivamente por causa do factor fiscal. Contudo, partilho a sua preocupação em relação a essa matéria.
Estou convencido de que, tal como foi prometido publicamente e como já se começou a fazer, se fará um esforço no sentido de ir reduzindo a tributação sobre o IRC, que me parece ser a peça mais importante de tudo isto. Há pouco, chamei a atenção para o seguinte: embora um grande investimento estrangeiro possa ser tratado em regime contratual e possa ter alguns benefícios específicos, penso que o que realmente conta para o empresário é saber como é que o lucro é tributado, pois esse é, afinal, o grande aferidor da competitividade de um país.
Dito isto, peço ao Sr. Secretário de Estado que comente o tema da barragem do Baixo Sabor, que, pessoalmente, também considero muito interessante.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Machado Rodrigues, não podemos estar mais de acordo com a sua perspectiva relativamente ao Baixo Sabor. Na verdade, um objectivo essencial deste Governo, em matéria de política energética, é o de criar condições para o desenvolvimento de novos processos no âmbito das chamadas energias renováveis.
Como sabe, está definido um programa a médio e longo prazo em relação às grandes hídricas e, complementarmente, pela via dos apoios comunitários e no contexto do Programa Operacional da Economia, estão definidos apoios à eficiência energética, à utilização racional da energia e à promoção de novas formas de energia, como é o caso das mini-hídricas, das energias eólicas, da energia solar, etc.
Começo, pois, por dizer que partilhamos da sua preocupação e, sobretudo, dos objectivos que aqui enunciou, no sentido de aumentar, de forma progressiva e gradual, o peso proveniente das novas formas de energia, das energias renováveis, na oferta de energia.
Quanto à situação concreta do Sabor, o ponto da situação é o seguinte: como sabe, foi feito pelo Sr. Secretário de Estado do Ambiente um despacho a dar orientações no sentido de ser desenvolvido um estudo de impacte ambiental visando essencialmente determinar o interesse público deste projecto.
Em função desse despacho, está a ser desenvolvido pela EDP o estudo de impacte ambiental e, na sequência dos resultados desse estudo, que esperamos que sejam positivos, isto é, que conduzam ao desenvolvimento e à execução do projecto, será cometida à REN a análise económica e financeira do projecto. Se for caso disso, o projecto será desenvolvido, como esperamos, de resto, até porque tal corresponde às orientações da política energética do Governo.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, terminámos a audição do Sr. Ministro da Economia.
Tenho duas informações a dar aos Srs. Deputados. Em primeiro lugar, quero lembrar que, por volta das 18 horas, teremos a audição do Sr. Ministro da Administração Interna.
Em segundo lugar, informo os Srs. Deputados de que as propostas de alteração ao Orçamento que os diferentes grupos parlamentares queiram entregar na Comissão de Economia, Finanças e Plano deverão dar entrada na Mesa até amanhã, de modo a termos possibilidade de as organizar para as votações.
Agradeço, pois, a todos os grupos parlamentares que tomem em atenção que deverão entregar as propostas de alteração até amanhã.
Srs. Deputados, vamos interromper os trabalhos.

Eram 17 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 17 horas e 35 minutos.

Vamos, então, dar início à audição do Sr. Ministro da Administração Interna, cuja presença desde já agradeço.
Começo por dar a palavra ao Sr. Ministro para fazer uma breve exposição sobre aspectos que considere de interesse para esta Comissão. Depois, os Srs. Deputados pedirão os esclarecimentos que entenderem.
Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Nuno Severiano Teixeira): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito rapidamente, referir-me-ei aos aspectos, que apresentei de forma mais detalhada à 1.ª Comissão, referentes ao orçamento do Ministério da Administração Interna atendendo a três questões fundamentais: os valores globais dos montantes em causa, as áreas funcionais a que serão afectados e os objectivos que se procuram com esses montantes.
No respeitante aos valores globais, o orçamento do MAI para 2001 é de 266 milhões de contos, o que significa um crescimento de 21 milhões de contos e uma taxa de crescimento na ordem dos 8,5% relativamente ao ano passado. O PIDDAC é de 10,3 milhões de contos, o que representa mais 2,7 milhões de contos do que no ano passado. Estes números dão, de certa maneira, o sinal da importância que o Governo atribui a esta área da segurança interna.
Sem mais pormenores - depois estarei, naturalmente, à disposição para os esclarecimentos que entenderem -, passarei às áreas funcionais a que se dirigem estes montantes globais e que poderíamos, muito sinteticamente, dizer que são quatro: a segurança interna, a segurança rodoviária, a protecção e o socorro (incluem-se aqui a prevenção e o combate aos fogos florestais e a protecção civil) e as outras áreas do Ministério, onde se inclui, por exemplo, a administração eleitoral.
No que respeita à segurança dos cidadãos, é preciso dizer que, dos 266 milhões de contos do orçamento, 214

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são para esta área. Ou seja, se há um sinal de importância dado ao nível do Governo à segurança interna com esse aumento, há, no interior do orçamento do Ministério da Administração Interna, uma clara e significativa afectação de verbas à segurança e, portanto, o sinal político de que é essa a prioridade.
Destas verbas, o mais relevante será referir que as dotações da GNR, da PSP e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras sofrem aumentos relativamente significativos. A PSP terá mais 7,6 milhões de contos, o que significa uma taxa de crescimento de 8,9%; a GNR terá 8 milhões de contos, o que representa uma taxa de 7,8%; o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras terá 870 000 contos, ou seja, a sua dotação tem um crescimento significativo, de 13,8%, o que decorre da nova lei orgânica que entrou em vigor.
Também no que respeita ao PIDDAC, a segurança é a parte mais importante, sendo-lhe atribuídos 9,1 milhões de contos, cerca de 88% do valor global, o que, em números muito gerais, se dirige fundamentalmente a três áreas: são 5 milhões de contos para as infra-estruturas (ou seja, esquadras e postos); são 2,6 milhões de contos para os sistemas de comunicação, a informatização e o equipamento; é 1 milhão de contos para um programa novo, o programa das polícias municipais, e há ainda uma verba da ordem dos 160 000 contos dirigida ao SEF, para terminar o Projecto Passaporte Seguro.
Quais são os objectivos? Os objectivos fundamentais são de natureza quantitativa, naturalmente, com o aumento e reforço destas dotações, mas não só, ou seja, são também de melhoramento qualitativo, o que passa, desde logo, por uma definição clara dos objectivos.
Muito sinteticamente, esses objectivos são os seguintes: na segurança interna, mais polícia na rua e polícia mais próxima dos cidadãos; melhor equipamento para as forças de segurança, quer ao nível das infra-estruturas, ou seja, esquadras e postos, o interface entre os cidadãos e as forças de segurança, quer ao nível das comunicações (a este nível, recordo o plano integrado de comunicações de emergência) e também o melhoramento dos equipamentos, das frotas, do armamento, etc.; finalmente, uma motivação para o trabalho operacional, ou seja, o factor humano como elemento fundamental, quer financeiro, quer não financeiro, ao nível das carreiras e de outros apoios, que são fundamentais.
O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, para além dos seus objectivos tradicionais, tem agora, com a nova lei relativa aos estrangeiros, responsabilidades acrescidas no que diz respeito ao combate, à angariação, à exploração de mão-de-obra ilegal e ao projecto do passaporte seguro.
A segunda área é a da segurança rodoviária. Trata-se de uma verba de 10,8 milhões de contos, mais 300 000 contos do que no ano passado, tratando-se de um crescimento de 3%. Relativamente a esta questão gostaria de deixar uma nota: é que todas as receitas geradas no sector vão ser afectas à Direcção-Geral de Viação, pelo que ficam nessa mesma área. Poderemos referir os seguintes objectivos: melhorar a fiscalização, como aliás tem vindo a ser feito, e o exemplo disto mesmo é esta última operação que está em curso, operação em larga escala e selectiva; melhorar a segurança nas estradas - obviamente que esta não é uma função exclusiva do Ministério da Administração Interna, tendo de ser integrado no quadro do PISER (Plano Integrado de Segurança Rodoviária) -, com a detecção dos "pontos negros" da sinistralidade e o melhoramento da sinalização.
Serão igualmente implementadas medidas que tendem a melhorar o parque automóvel como a medida relativa aos veículos em fim de vida e, depois, há medidas de educação que têm a ver com o civismo de quem conduz, sendo também uma área a considerar.
Para o sistema de prevenção e combate aos fogos florestais e protecção civil há uma dotação de 16,7 milhões de contos, mais 600 000 contos do que no ano passado. Os objectivos fundamentais nesta área são o melhoramento dos meios humanos: a formação na Escola Nacional de Bombeiros e, como elemento importante, a complementaridade daquilo que tem sido a base dos bombeiros, o voluntariado (que é a matriz fundamental dos bombeiros), com piquetes de intervenção permanente. Outros objectivos são a melhoria da rede de comunicação integrada, podendo os bombeiros vir a beneficiar desta rede que está a ser trabalhada para as outras forças, a melhoria do equipamento e uma aposta importante na prevenção e na simulação, particularmente ao nível dos sismos.
No ano passado, houve um aumento muito significativo das dotações, que teve a ver com a implementação do processo de informatização do recenseamento eleitoral, o qual se mantém nos mesmos níveis, com o objectivo de completar o processo de informatização e de agilizar o processo eleitoral.
Para terminar, devo dizer que o orçamento do Ministério da Administração Interna sobe globalmente e sobe sectorialmente em todos os sectores, como sinal claro da importância política que o Governo dá a este sector e sinal da importância e da prioridade que o Ministério da Administração Interna dá à área da segurança.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, tendo em conta a área das forças de segurança passo a colocar uma pergunta ao Sr. Ministro que tem a ver com o seguinte: como V. Ex.ª sabe, foi aprovada pela Assembleia da República uma lei relativa ao subsídio de turno e piquete para as forças de segurança. Quando o Sr. Secretário de Estado aqui foi interrogado sobre essa matéria disse que não iriam pagar subsídio de turno e de piquete porque para tal eram necessários 13 milhões de contos, montante que não existia. No entanto, agora, o Sr. Ministro diz que vai pagar subsídio de turno e de piquete e que tem, para o efeito, inscritos no Orçamento 1,5 milhões de contos. Portanto, há uma discrepância entre o que foi dito no ano passado, pelo Sr. Secretário de Estado, e o que é dito no presente, pelo Sr. Ministro, pelo que gostaria de aclarar esta matéria, isto é, saber se vai ou não ser pago o subsídio de turno e piquete às forças de segurança. Esta é a primeira questão.
A segunda questão também está relacionada com a segurança, tendo a ver com os bombeiros de todo o País.
Sr. Ministro, devo dizer que estou de acordo com os princípios enunciados nas Grandes Opções do Plano, mas não me parece que "bata certo a bota com a perdigota" em termos de objectivos económicos para fazer face ao que aí se refere.
Nas Grandes Opções do Plano estabelece-se que há que melhorar os níveis de coordenação operacional entre o SNPC (Serviço Nacional de Protecção Civil) e o SNB (Serviço Nacional de Bombeiros) e nós estamos de acordo com isto. Mas é preciso ver como é feita a coordenação,

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pelo que peço a V. Ex.ª que nos esclareça sobre o que está a ser feito nesse sentido.
No parágrafo seguinte das Grandes Opções do Plano estabelece-se o seguinte: "(…)no sentido de manter e de reforçar o regime de apoio às associações de bombeiros, no que respeita à edificação dos quartéis o Governo aprovou um regulamento de candidatura às comparticipações do Estado para Associações Humanitárias de Bombeiros Voluntários (…)", mas no PIDDAC não há subvenção para os quartéis de bombeiros. Por isso pergunto: onde é que está o dinheiro para a construção de quartéis?
Há outro ponto que se refere aos serviços de protecção civil concelhios e aos planos de emergência. Tanto quanto se sabe, os serviços de protecção civil concelhio estão em andamento, não estão ainda todos feitos e muito menos desenvolvidos estão os planos de emergências. No ano passado pressionámos o Governo sobre esta matéria e propusemos uma ajuda concreta para os planos de emergência da parte do Ministério às autarquias locais, já que muitas delas não tinham pessoal em condições para fazer os planos de emergência. Estes, como o Sr. Ministro sabe, são essenciais numa definição de protecção civil, mas na altura não estavam feitos. Gostaria de saber o que é que foi feito nesse sentido, o que é que evoluiu e em que ponto da situação nos encontramos quanto a esta matéria.
Gostaria ainda de colocar uma questão relativa ao reforço dos meios aéreos para o combate a fogos florestais. Sabemos que, este ano, os fogos florestais foram um imenso flagelo. Está a agora a fazer-se um rescaldo (permitam-me a expressão) sobre esta matéria, mediante um estudo sobre o que aconteceu com o objectivo de se saber quais foram as deficiências efectivas no combate aos incêndios florestais. VV. Ex.as dizem que reforçam os meios aéreos, mas reforçar esses meios significaria, na prática, haver mais dinheiro no Orçamento. A rubrica relativa aos fogos florestais consta do Orçamento e se não estão verbas inscritas V. Ex.ª dir-me-á onde está o dinheiro.
No ano passado a verba para o combate a fogos florestais era de 3,308 milhões de contos, a verba para este ano é de 3,008 milhões de contos, cerca de 300 000 contos menos. Como é que se reforça o combate, havendo menos dinheiro no Orçamento?
Há uma situação clara e objectiva, que é a seguinte: o Governo ainda não pagou à maioria das associações de bombeiros voluntários os subsídios relativos a fogos florestais do ano 2000 e alguns de 1999 ainda estão em dívida. Portanto, indirectamente são as associações de bombeiros que estão a financiar o sistema e não o contrário, como deveria ser. Esta é a segunda questão.
A terceira questão tem a ver com a área da prevenção dos fogos florestais.
É equacionada uma série de questões, mas há uma que é essencial na prevenção, que é a do ordenamento florestal, e essa não tem só a ver com o vosso ministério, tem a ver, essencialmente, com o Ministério da Agricultura.
A lei relativa ao ordenamento florestal não está a ser cumprida, não estão a ser implementados vários incentivos nos planos, nomeadamente no plano florestal, os quais estavam propostos na própria lei, para reflorestação e para o ordenamento da floresta e, portanto, a montante não se faz a prevenção que é necessário fazer.
VV. Ex.as referem ainda um ponto essencial que fizeram, mas, em meu entender, com alguma inexactidão. Coloco o problema neste sentido: os guardas a quem foram entregues telemóveis para, numa primeira acção, poderem ser o primeiro foco de localização de incêndios, não tiveram uma prevenção como devia ser. Primeiro porque não sabiam trabalhar com os telemóveis, já que ninguém lhes ensinou e, em segundo lugar, muitos dos telemóveis foram distribuídos (e posso citar algumas zonas) em zonas onde não funcionava a respectiva rede.
Portanto, para um trabalho perfeito é necessário equacionar devidamente as questões, esperando que, de futuro, as coisas possam melhorar.
Há ainda uma outra questão que gostaria que V. Ex.ª explicasse. O Sr. Ministro disse que neste Orçamento se regista um aumento de carácter administrativo das verbas para o Serviço Nacional de Bombeiros de 1,3 milhões de contos para 1,8 milhões de contos, mas, este ano, a transferência do Estado para o Orçamento diminuiu. O Orçamento para 2000 foi de 7,717 milhões de contos e este ano é de 7,2 milhões de contos, portanto menos meio milhão de contos. Juntando este número com a verba para a prevenção dos fogos florestais, que é de menos 300 000 contos, percebe-se onde é que o dinheiro não está, mas noutras áreas ainda haverá menos.
O Governo assumiu um compromisso que, até hoje, ainda não foi cumprido, ou, se sim, foi de forma muito ligeira. Este compromisso tem a ver com o Estatuto Social do Bombeiro. Como VV. Ex.as sabem, num universo de cerca de 30 000 bombeiros voluntários (há números discrepantes entre 33 000 e 36 000), há 430 associações de bombeiros voluntários e a quantia de 23 000 contos concedida a título de comparticipação governamental para o Estatuto Social do Bombeiro é, em nosso entender, insignificante, quando sabemos perfeitamente que se extrapolarmos dos números relativos aos bombeiros voluntários para os números referentes aos bombeiros profissionais, o Governo teria de colocar à disposição entre 120 e 130 milhões de contos. Como só existem 116 milhões de contos estamos muito longe desse número.
Portanto, é necessário financiar, de uma forma fundamental, o voluntariado, dando-lhe algumas condições. O Estatuto Social do Bombeiro é, por excelência, em nosso entender, um meio de dinamizar a acção de atrair para os bombeiros mais voluntários. Não há uma crise muito profunda em relação a essa matéria, mas há uma preocupação quanto ao voluntariado, daí que seja preciso dar condições exactamente para atrair pessoas para os bombeiros. E se o Governo quer ter na protecção civil de socorro uma entidade denominada "bombeiros voluntários" há que lhe dar condições para isso, não sendo com 23 000 contos de apoio ao Estatuto Social do Bombeiro que o consegue fazer. Portanto, gostaria de saber qual é a disposição do Governo para criar incentivos para os bombeiros voluntários de forma a estarem disponíveis (há muitos que o estão) para defenderem a população portuguesa.
Uma última questão tem a ver com o apoio às associações em concreto. É evidente que as verbas do Totoloto e do Totobola são insuficientes para financiar indirectamente as associações. É um "bolo" extremamente pequeno, pelo que seria necessário que o Governo disponibilizasse mais meios para as associações.
Já falámos da questão dos quartéis, desaparecendo do PIDDAC essa situação, mas, para além disso, também há as pequenas obras de conservação e de manutenção que é necessário fazer, a todo o tempo, nos quartéis de bombeiros.

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Gostaria que o Sr. Secretário de Estado me pudesse esclarecer sobre este assunto.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - O Sr. Deputado coloca um conjunto de questões que se dividem em duas partes fundamentais. Uma primeira sobre problemas relativos aos bombeiros e protecção civil e uma segunda relativa às forças de segurança, em particular ao subsídio de turno e de piquete.
Se me permite, começo pelo fim, dizendo que concordo com o que o Sr. Deputado disse relativamente à matriz fundamental dos bombeiros, que é o voluntariado, e, por isso, desse ponto de vista, não temos qualquer desacordo. De facto, o voluntariado é a identidade dos bombeiros, mas também sabemos que nas sociedades de hoje, com os riscos e a vida dos dias de hoje, muitas vezes é difícil que o voluntariado por si só supra as necessidades existentes. Pelo que tenho colhido da vontade dos bombeiros, há um grande desejo de que o voluntariado seja complementado com piquetes de intervenção permanente, que possam, de uma forma constante, imediata e eficaz, responder a essas situações. Portanto, não vejo na posição que assumimos um menor apoio à questão do voluntariado, até porque este cumpre não só funções de natureza social mas também de natureza cívica, que julgo serem muito importantes. A questão de complementar o voluntariado com a existência de piquete prende-se com a necessidade da existência de eficácia.
Relativamente à questão dos quartéis de bombeiros, há uma dotação do PIDDAC da ordem dos 500 000 contos (constantes da página 95, se a memória me não falha) para este tipo de obras. Mas mais do que isso, o que há também é uma tentativa (que já direi qual é) de procurar envolver não só o Governo mas também outras entidades, nomeadamente as autarquias, no financiamento deste tipo de obras, ao nível dos terrenos, por exemplo. Portanto, isto para dizer que do PIDDAC não desapareceu completamente essa dotação, existindo meio milhão de contos para satisfazer esse tipo de necessidade.
Quanto aos meios aéreos, trata-se de uma questão muito séria, que o Governo está a estudar e a encarar. Não temos qualquer dúvida acerca da necessidade de investir nessa área, mas não há, neste momento, uma decisão sobre a sua modalidade. Há um estudo em curso sobre qual deverá ser a fórmula mais adequada para ter esses meios aéreos e, como sabem, há várias hipóteses, desde o aluguer à compra, mas não há uma decisão tomada, embora o Governo esteja preocupado com essa matéria.
No que diz respeito àquela que me pareceu ser a questão central, a da arquitectura da relação entre o Serviço Nacional de Bombeiros e o Serviço Nacional de Protecção Civil e os elementos de coordenação, tem havido algum desequilíbrio ou, por vezes, uma tentativa de articulação menos equilibrada. Gostaria de dizer que, do ponto de vista do Governo, há neste sistema, que chamaria de protecção e socorro (permita-me a introdução deste conceito), dois pilares fortes: o Serviço Nacional de Bombeiros e a Protecção Civil, estando em pé de igualdade e desenvolvendo-se mecanismos de coordenação em torno dos mesmos.
Portanto, essa é a arquitectura que gostaríamos de desenvolver.
Para além disto - e esta questão entronca noutra de que lhe falei -, há o interesse e a intenção de envolver, para além destes dois pilares, as autarquias, as associações, um conjunto de entidades, que podem, devem e é absolutamente fundamental que se associem a este sistema.
Em relação à questão do subsídio de turno e de piquete, é verdade que foi feita, neste mesmo local, a declaração referida pelo Sr. Deputado. Mas também já tive ocasião, em comissão - e volto a fazê-lo aqui com muito gosto -, de esclarecer essa questão.
O primeiro aspecto é o seguinte: vai haver subsídio de turno e de piquete e, portanto, desde o momento em que cheguei ao Ministério que me empenhei - e disse-o aqui desde o início do meu mandato - para que este subsídio pudesse ser posto em prática. Havia duas condições para o pôr em prática: uma de natureza regulamentar, outra de natureza orçamental. No que toca à regulamentação da lei, posso dizer que, neste momento, está em fase bastante adiantada um projecto de regulamento de subsídio de turno e de piquete, e que, em breve, quando estiver na sua fase ultimada, será apresentado às associações e à Direcção Nacional de Polícia para, dentro deste diálogo, chegar à formulação final. Mas, repito, do ponto de vista da regulamentação, está numa fase adiantada.
Em segundo lugar, em relação à questão orçamental, o Sr. Deputado conhece tão bem ou melhor do que eu o clima de contenção deste orçamento e, portanto, a verba que não existia na dotação do ano passado e que passa a existir na de este ano é um sinal de esforço do Governo no sentido de querer pôr em prática este subsídio de turno e de piquete.
Respondendo à questão colocada pelo Sr. Deputado de saber como é que encaramos este subsídio, devo dizer que o encaramos como um estímulo, como um incentivo ao trabalho operacional em zonas e em horas de maior dificuldade. Temos de ter em conta que os números que apareceram equiparavam, de uma forma automática, os subsídios da função pública dos subsídios na polícia, mas são trabalhos de natureza diferente; a polícia, por natureza, tem um trabalho por turno e por piquete e, portanto, não penso que deva ser equivalente e confundida a função pública com a polícia.
Trata-se de mais um subsídio, de mais um suplemento que deve funcionar como incentivo ao trabalho operacional em condições de dificuldade.
Portanto, este é o entendimento que temos, neste momento, e é o compromisso que aqui deixamos sobre o qual, aliás, já falámos com as associações.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr. Ministro, confesso-lhe que, apesar de esta discussão não ser propriamente nova, pois já tivemos ocasião de discutir este assunto em Plenário e em sede de comissão, não queria deixar de voltar a um outro aspecto que me parece importante.
Começo precisamente por esse aspecto, não sem deixar de fazer referência a uma história que me parece perfeitamente rocambolesca - seria bom que o Sr. Ministro, inclusivamente, tivesse ocasião de a esclarecer - e que ontem tive oportunidade de ler num jornal de dimensão nacional. A ser verdade, trata-se de um "caso de investigação" e de um verdadeiro "caso de polícia". A

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história, que até é difícil de acompanhar, é esta: por um erro de informática, o PIDDAC que o Sr. Ministro nos apresentou e que aqui traz a esta Assembleia e a esta Comissão não é o seu PIDDAC, mas o PIDDAC do Ministro anterior. É esta a história que vem publicada e é isto que vem dito.
Devo dizer-lhe, em primeiro lugar, que me parece uma coisa estranhíssima e de grande preocupação para nós. Apesar de, de facto, esperarmos alguma mudança, mesmo não sendo todas as que gostaríamos de ver, esperávamos que o PIDDAC correspondesse a essa mudança e a essas novas preocupações. Mas se este ainda é o PIDDAC do Ministro Gomes…, então, a ser assim, tanto pior, porque é sinal de que nem a pouca mudança que nós esperaríamos irá de facto acontecer.
Apesar de achar esta história rocambolesca (tudo isto vem contado no jornal - erro, troca de versões do PIDDAC, etc, e toda a história descrita, que me dispenso de reproduzir), pensei que ela poderia conter alguma verdade, porque, de facto, a versão do PIDDAC que está aqui não parece corresponder às opções do Sr. Ministro.
Este PIDDAC parece não corresponder às suas opções, Sr. Ministro. Peço imensa desculpa por lho dizer, mas a sua resposta à pergunta do Sr. Deputado Rodeia Machado não é suficiente nem esclarecedora para mim, e, logo para começar, na questão do subsídio de turno e de piquete. Não vale, pois, a pena ficarmos agarrados à declaração do Sr. Secretário de Estado sobre os 13 milhões de contos. Já percebemos que houve falta de coordenação, não entre ministérios, mas, neste caso, dentro do mesmo Ministério, dado que um diz uma coisa, outro diz outra. Vamos esquecer isso.
Mas eu agarro-me à sua declaração, Sr. Ministro, de que, para este ano, estariam orçamentados 3 milhões de contos, correspondendo a 1,5 milhões para cada uma das forças, para pagamento do subsídio de turno e de piquete. Portanto, sinceramente, não vejo que esta verba possa estar aqui contemplada, nem que esteja assegurado que possa estar. É que, se analisarmos os vários aumentos, constatamos que há aumentos com subsídios vários: temos os aumentos de pessoal que são feitos em relação às várias forças e, designadamente no caso da GNR, temos o aumento global de 3,8%, se fizermos as contas com a inflação e com a evolução normal das carreiras. Portanto, onde é que estão os 1,5 milhões para o subsídio de turno e de piquete? Sinceramente, não o encontro. Se o Sr. Ministro me puder ajudar, aqui ou noutras circunstâncias, a perceber e a garantir que essa verba cá está, eu ficaria muito mais descansado.
É que suspeito que esse montante não esteja previsto neste PIDDAC, parecendo-me que a sua declaração foi uma mera declaração de intenções, tratando-se de uma promessa que, a ser assim, não será cumprida.
Sr. Ministro, ainda há pouco estava a ouvi-lo e, vai-me desculpar, fez-me lembrar uma outra afirmação produzida há uns tempos atrás. O Sr. Ministro parecia que estava a dizer: "vai haver subsídio de turno e de piquete, só não sei é quando"...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Está a referir-se ao Dr. Durão Barroso? Olhe que está a romper a "putativa AD"!

O Orador: - Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, estou a tentar discutir, com alguma serenidade e com alguma seriedade, questões que me parecem muito importantes para o País em matéria de administração interna e de segurança dos cidadãos. Só isso!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não há ninguém mais sereno do que eu neste momento!

O Orador: - E pedia-lhe que, neste momento, me ajudasse a evitar a chicana política que me parece perfeitamente desnecessária para este tipo de debate.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Por si, eu evitava a chicana…

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, usará da palavra quando eu lha der.
Sr. Deputado Telmo Correia, faça favor de continuar.

O Orador: - Para concluir esta matéria, direi, pois, que a verba ou está neste PIDDAC, ou não está, e, se estiver, pergunto qual é o seu valor.
O Sr. Ministro diz, inclusivamente, que tem um projecto e uma proposta a ser ultimada em relação a esta matéria. Bem, já conheço a proposta da Associação dos Profissionais de Polícia... Não sei se é a mesma do Governo, se tem colaboração do Governo...
A Associação dos Profissionais de Polícia já distribuiu uma proposta na qual estão calculados montantes para o subsídio de turno e de piquete. Fala em, no caso de suplemento, entre 15% a 25%, consoante o trabalho por turnos seja parcial ou em permanência e, quanto ao suplemento de piquete, entre 5,9% e 7,4%, consoante o dia em que esse trabalho é prestado. Pergunto, pois, se esta é ou não a proposta do Governo. Se não for, pergunto, então, qual é a proposta do Governo e qual é o montante exacto dessas mesmas verbas de subsídio de turno e de piquete. Para nós é essencial e fundamental saber se a verba está prevista e, quer esteja quer não esteja, qual é o seu montante exacto.
Sr. Ministro, ainda quanto ao PIDDAC, tendo como questão subjacente saber se este é ou não o seu, creio que, em sede de comissão, falou de inúmeras obras que estariam a ser feitas. Inclusivamente, terá falado em 50 esquadras, mas não encontrei neste texto essa correspondência e, sobretudo, não encontro verba para obras de um conjunto vastíssimo de esquadras.
Há um número enorme de esquadras, de que lhe falei em comissão - e o Sr. Ministro conhece a lista -, que estão em condições de péssimo funcionamento, completamente degradadas e cuja recuperação não está ainda prevista, tais como: Areosa, S. João de Deus, Afurada, Pinheiro Manso e Campanhã, no Porto; Olivais, Benfica, Calvário, Moscavide, Praça da Alegria, João Crisóstomo, Reboleira, Queluz, Boa Vista, em Lisboa.
Em termos de esquadras, lembro-lhe ainda o que se passa no concelho de Almada, onde o poder local tem chamado a atenção para o facto de existirem compromissos do Governo nesta matéria, havendo um acordo entre o próprio Governo e a Câmara Municipal de Almada que previa a construção, naquele concelho, de instalações para a PSP em Laranjeiro, Feijó, Costa da Caparica, na zona do Plano Integrado de Almada e para a GNR em Charneca/Sobreda. Existem, inclusivamente, tanto quanto sei, compromissos do Governo no sentido de lançar as obras das esquadras da PSP, de lançar o concurso do quartel da GNR, de fazer o projecto da esquadra da Costa da Caparica e de lançar o concurso

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da esquadra do Plano Integrado de Almada, tudo entre 2000 e 2001. Efectivamente, nas propostas agora aqui apresentadas não se encontram verbas para a realização dessas mesmas instalações, o que me leva outra vez a pensar não ser do Sr. Ministro esta iniciativa, nem ser do Sr. Ministro a autoria desta mesma iniciativa.
Cabe ainda lembrar que as obras nas esquadras de que estou agora a falar tinham sido objecto de decisão do Governo em 1996, 1998 e 1999, não tendo, até à data, sido executadas. Mas, para além do caso do concelho de Almada, a mesma questão poderia ser levantada, por exemplo, em relação a Vila Franca de Xira, onde também o poder local alerta para esta situação, ou, em Sintra, onde o problema, se não for igual, será muito semelhante.
A minha terceira questão refere-se à situação actual na GNR. É certo que se regista um aumento de verbas - o Sr. Ministro ainda há pouco referiu o reforço de verbas e o respectivo montante global -, mas não é menos verdade que, sistematicamente, recebemos notícias de uma situação dramática na GNR em termos de verbas, como tem sido referido pelos responsáveis da própria força e sistematicamente repetido na comunicação social. Pergunto-lhe, pois, Sr. Ministro, se considera que este aumento de verbas que agora aqui anunciou será suficiente, tendo em conta situações tais como (a serem verdadeiras) as de clínicas que se recusam a prestar serviços de saúde aos militares, de fornecedores de água e de luz com cartas a ameaçar cortar o respectivo fornecimento, de falta de verbas para imprimir os manuais dos recrutas, de falta de verbas para a manutenção dos veículos e, inclusivamente, as relacionadas com problemas com o próprio fardamento. Em relação a estes casos, soma-se um dívida global de cerca de 10 milhões de contos aos prestadores de serviços de saúde aos membros da Guarda Nacional Republicana, o que é particularmente preocupante.
Num dado momento, foi anunciado pelo Governo um reforço de 2 milhões de contos. Ora, não sei - e essa é uma pergunta que também lhe faço - se foi ou não feito esse reforço e, se foi, em que medida é que ele poderá ter minorado esta situação.
Sr. Ministro, numa segunda ronda de perguntas, pretendo colocar-lhe questões sobre outras matérias já aqui afloradas, mas, sem sair da área da segurança, coloco-lhe ainda duas questões muito breves.
Recentemente, alguns de nós tivemos ocasião de participar num debate sobre a situação das forças de segurança e sobre problemas, inclusive ao nível psicológico, dos membros dessas mesmas forças de segurança. Houve até uma rádio que promoveu um debate sobre essa mesma matéria, puxando para tema o facto de que um número muito elevado de agentes de segurança, designadamente ao nível da PSP, cometeriam suicídio. Este assunto foi discutido durante uma manhã interna, como o Sr. Ministro poderá saber ou, pelo menos, ter ouvido contar.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Eu participei nesse debate!

O Orador: - Também intervim, mas como, posteriormente, estive aqui a fazer perguntas a um colega seu não acompanhei o debate todo, pelo que nem sequer sabia que o Sr. Ministro tinha participado.
Tendo-se, pois, discutido muito esta necessidade de apoio psicológico, pergunto-lhe se existe verba suficiente para instalações de apoio psicológico e segundo que modelo é que ele irá ser organizado, uma vez que as forças têm reclamado que esse apoio seja feito por comando e o que nós sabemos é da constituição de uma unidade para fazer esse apoio e, depois, diversificá-lo. Deste modo, pergunto-lhe, Sr. Ministro, se considera ou não que esse apoio deva ser feito por comando e se considera ou não que haverá capacidade orçamental para esse apoio poder ser assim feito.
Uma última questão, mais pormenorizada e mais concreta, que lhe coloco tem a ver com o destacamento da Brigada Fiscal da GNR de Bragança, que foi extinto em 11 de Setembro, transferindo-se para Vila Real. Considerando que Bragança será, eventualmente, o distrito do País com a linha de fronteira mais extensa, parece-nos que seria o local indicado para manter este tipo de destacamento. Por isso pergunto-lhe: porque é que este destacamento foi extinto e porque é que foi transferido para Vila Real?
Por agora não me alongo mais, creio já ter falado durante muito tempo. Embora houvesse muitas outras questões a colocar, como, infelizmente, o tempo não nos permite fazê-lo, guardarei para uma eventual segunda ronda questões sobre outras matérias.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado Telmo Correia, sobre algumas questões que me colocou já tínhamos tido oportunidade de conversar. Se me permite, respondo-lhe começando pelo final da sua intervenção.
Como o Sr. Deputado sabe, lembro que fica em Bragança o grupo operacional que marca a presença no território e que desempenha as funções necessárias ao nível da fronteira. Portanto, não há um abandono por parte da Guarda Nacional Republicana relativamente a essa área do País. Faz-se, digamos, a deslocação para Vila Real, mas há a permanência em Bragança naquilo que é a função fundamental, operacional, da Guarda Nacional Republicana.
Em relação ao apoio psicológico, tive o gosto de o ouvir no debate que referiu. Desde o momento que tomei conhecimento deste problema, que me foi posto por ambas as associações, foi encetado um diálogo com a Direcção Nacional da Polícia de Segurança Pública, no sentido de se fazer face ao problema. Neste momento, entre o Ministério e a Direcção Nacional da Polícia de Segurança Pública, corre um estudo no sentido de saber qual a melhor forma de dar resposta a esta situação. É que, como o Sr. Deputado Telmo Correia diz, pode ter vários modelos, ou um modelo concentrado ou um modelo desconcentrado.
Não posso dizer-lhe neste momento, porque não tenho o resultado do estudo em elaboração sobre esta matéria, qual deve ser a fórmula. No entanto, do que não tenho dúvida é que é preciso pôr em prática esses gabinetes de apoio psicológico na Polícia de Segurança Pública para fazer face a este tipo de problemas. Portanto, uma vez que esse estudo esteja concluído, poderemos tomar uma decisão sobre qual o modelo adoptar.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Quando?

O Orador: - Sr. Deputado, neste momento não poderei precisar, mas dentro de algum tempo, até ao final do ano, poderei seguramente responder-lhe, pois é um assunto que está em estudo entre a PSP e o Governo.

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Quanto à GNR, e relativamente à falta de verbas que mencionou relacionadas com a saúde, trata-se, de facto, de um problema que não é de resolução fácil. As outras questões que colocou respeitam a problemas que têm vindo a ser aflorados, mas que, na realidade, não conhecemos. Ou seja, quando foi necessário pagar-se gasóleo, ele foi pago; quando foi necessário pagar-se água e luz, também foram pagas, não tendo sido cortadas. Portanto, estas são questões que têm vindo a ser afloradas, mas sempre resolvidas.
Mas, de facto, o problema da saúde preocupa o Ministério! O sistema de saúde das forças de segurança serve cerca de 230 mil utentes e tem um volume de despesa da ordem dos 23 milhões de contos e que, se for comparado com outros, nomeadamente, por exemplo, com o dos ramos das forças militares, é inferior em termos de despesa per capita. Mas, enfim, "com o mal dos outros, posso eu bem", não é essa a questão. A questão é que há, de facto, um problema, que tem a ver com a dívida que, neste momento, é da ordem dos 10 milhões de contos. Foi feito um pedido ao Ministério das Finanças no sentido de se obter uma dotação que pudesse fazer face a esta dívida e, embora não tenhamos ainda uma resposta, há empenhamento do Ministério da Administração Interna junto do Ministério das Finanças para se fazer face a essa situação.
Também vale a pena dizer que não se trata apenas de uma questão quantitativa. Há medidas, quer ao nível da lei orgânica das forças quer ao nível de medidas concretas, no sentido de criar maior responsabilização na gestão deste serviço de saúde de maneira a poder minorar e responsabilizar este tipo de situações.
Quanto à questão que colocou sobre as esquadras, poderíamos estar aqui a discutir esquadra a esquadra... Aquilo que posso dizer-lhe é que, neste momento, há um total de 42 obras feitas relativamente a esquadras, entre remodelações e obras novas. Podemos estar aqui a discutir uma a uma, mas o número global parece-me importante e parece-me significativo, sobretudo se o compararmos com situações anteriores.
Quanto ao subsídio de turno e de piquete, como é óbvio, Sr. Deputado, a proposta do Governo não é igual à proposta da Associação dos Profissionais de Polícia, embora o Governo, no que diz respeito à formulação da sua proposta, oiça as associações, e, em particular, aquela que referiu. Portanto, em relação aos montantes para fazer face ao subsídio de turno e de piquete, o Sr. Deputado sabe qual é o valor. Eu gostaria que fosse mais, mas não pode ser. Ele consta da rubrica das remunerações certas e permanentes do Orçamento. Está incluído o valor de 1,5 milhões de contos, acrescendo àquilo que era a situação anterior sem o montante de subsídio de turno e de piquete. Portanto, o Sr. Deputado Telmo Correia pergunta-me, quando é que vai haver…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Permite-me interrompê-lo?

O Orador: - Com certeza!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - O Sr. Ministro fala de 1,5 ou de 3 milhões?

O Orador: - São 3 milhões para as duas forças, sendo 1,5 milhões para a PSP e outros 1,5 milhões para a GNR.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E o Sr. Ministro considera suficiente o montante que está nas despesas fixas para fazer face a esse acréscimo de subsídio?

O Orador: - Claro!
Em relação à questão inicial que o Sr. Deputado Telmo Correia colocou, não sei se não iremos estar aqui a discutir politicamente - o que é um erro - ou o que é um mero problema de natureza técnica, que tem a ver com o sistema informático de gestão de um plano de obras. Isso em nada altera, rigorosamente, aquilo que é o PIDDAC, não tem a ver com a discussão do Mapa XI, que é o que importa. Ora, como é natural, o que digo com muita clareza é que, relativamente à execução dessas obras, haverá da parte do Governo toda a transparência. Portanto, toda a informação que os Srs. Deputados entenderem pedir será disponibilizada. Isso, sem qualquer dúvida.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, apresento-lhes as boas-vindas a esta Comissão por parte do Grupo Parlamentar do PS. Começo por dizer que nos congratulamos com a preocupação, sem alarmismos, que tem havido com o problema da segurança e também, especialmente, com a humanização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras a que temos assistido nos últimos tempos. Parece-nos essencial que o País dê essa imagem a si próprio e aos seus residentes.
Sr. Ministro, antes de passarmos a assuntos mais centrais do Ministério, e que colegas meus apresentarão a seguir, quero colocar-lhe duas questões bastante precisas que têm a ver com o Regulamento Geral do Ruído, que em breve estará em vigor, com alguns problemas em matéria de viação e de afectação da GNR à prevenção dos atentados ambientais.
Julgava que o Regulamento Geral do Ruído iria resolver uma série de problemas. No entanto, tenho acompanhado a situação e tenho falado com agentes da PSP e da GNR que me transmitiram o seguinte problema: antes de termos uma lei mais bem feita, o próprio agente da polícia podia, de acordo com a razoabilidade, interpelar o cidadão que estivesse a perturbar a ordem pública com ruído ou outra coisa qualquer e agir discricionariamente, persuadindo-o a não o fazer. Hoje em dia, porque há parâmetros precisos que vão estar em vigor com o Regulamento Geral do Ruído e porque a polícia não está equipada com os aparelhos necessários, nem tem, muitas vezes, a capacidade técnica e a formação para os utilizar, criou-se um problema para as próprias forças de segurança, que não sabem como actuar. Isto porque, embora exista uma lei, essas forças de segurança não têm os meios necessários, não têm formação técnica e têm, muitas vezes, dificuldade em fazer as medições, porque os ruídos são difusos. De facto, pode haver aqui um acompanhamento por parte do Ministério para evitar que a lei não constitua um vazio em termos de implementação e para que se possa obviar a estes problemas já suscitados pelos próprios agentes de autoridade.
Em matéria de viação, queria perguntar ao Sr. Ministro, até porque isso já foi objecto de um requerimento que fizemos em tempos, se poderá haver limitações a alguns veículos que, neste momento, são bastante perigosos para a circulação dos outros. Refiro-me a veículos com umas armações de ferro ou de metal à frente, chamadas "protecção anti-canguru", que são totalmente desfasadas para cidades como Lisboa e que têm sido, obviamente, causadoras de maior gravidade nos acidentes em que estão

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envolvidos. Nesse sentido, há uma série de países que têm legislação que limitam este tipo de armações, para evitar que haja uma despadronização dos veículos e que, quando de acidentes, todos esses acidentes não padronizados possam ferir mortalmente as pessoas.
O mesmo acontece com uma série de veículos que entraram agora na normalidade da circulação rodoviária portuguesa e que não estavam definidos anteriormente, porque pertenciam à categoria de tractores. Estou a pensar, por exemplo, nas motos-quatro, que aproveitaram a necessidade de cumprimento de uma lei do mercado interno, mas sobre as quais pode haver legislação específica quanto à segurança na sua utilização. Pode haver mesmo, no que diz respeito a esses veículos ou a quaisquer outros, alguma legislação especificamente dirigida ao limite de velocidade, visto que se estes veículos são, muitas vezes, utilizados como veículos de trabalho, deveriam confinar-se também ao limite de velocidade para esse tipo de veículos.
Ainda em matéria de viação, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, há hoje uma profusão de papelinhos que são colocados nos vidros das viaturas. Temos o imposto de selo, o seguro e a prova de inspecção, pelo que, como vemos, o número de dísticos colocados no vidro vai crescendo e, se neste momento são três, poderão vir a ser mais. Por outro lado, as pessoas acabam por se esquecer dos dísticos dos anos anteriores e, por isso, qualquer dia temos os vidros dos automóveis cheios de papéis colados. Tenho reparado que noutros países se tem evoluído para formas de identificação na chapa de matrícula, por exemplo, libertando os vidros dos automóveis desse tipo de selos ou de dísticos. Como tal, pergunto se o Ministério e a Direcção-Geral de Viação não pensam numa modernização desse sistema para obviar a essa trapalhada que vai prejudicando a visão dos automobilistas.
Temos seguido o empenhamento do Ministério numa maior fiscalização ambiental por parte das forças da autoridade, nomeadamente da GNR e da PSP, e este empenhamento parece-nos muito importante, já que é um sinal da política do Governo noutras áreas. Pergunto, portanto, até porque há elementos que permitem ajudar o Ministério nesta matéria - estou a pensar no Programa Operacional da Economia e no QCA III -, se não será possível ir buscar verbas a programas específicos para haver um maior controlo nesta matéria por parte da GNR e da PSP. Pergunto mesmo se não será possível levar estas forças, enquanto dependentes da tutela do Ministério, a utilizar veículos de transporte menos poluentes. Em concreto, estou a pensar naqueles transportes urbanos que fazem os serviços normais de estafeta, área na qual o próprio Ministério pode ter um papel muito importante, dando o exemplo.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado, V. Ex.ª colocou um conjunto de questões que se prendem, sobretudo, com a área da segurança rodoviária e com a área ambiental.
Em relação ao problema da fiscalização em matéria ambiental, estamos a dar os primeiríssimos passos. No entanto, há um projecto que tem problemas de natureza vária, o primeiro dos quais é de natureza financeira, porque é um projecto caro, que é o da eventual criação de uma brigada ambiental. Digo "eventual" porque isto não saiu do estudo e do pensamento sobre a possibilidade da sua existência e, portanto, trata-se de algo que está a dar os seus primeiros passos.
Percebo o incómodo que provocam estes papelinhos no lado direito dos pára-brisas dos automóveis, mas não está neste momento prevista qualquer alteração que possa trazer para a matrícula dos carros esse tipo de informação e, portanto, nessa área não haverá, neste momento, qualquer novidade de monta. De todo o modo, é uma sugestão interessante.
Para responder à sua questão relativa ao Regulamento Geral do Ruído, posso dizer-lhe que já há passos dados ao nível do que pode vir a ser o controlo e a fiscalização desse Regulamento. Aí há algum equipamento para a PSP e para a GNR e, naturalmente, alguma formação dos agentes para a utilização desse tipo de equipamento de controlo de ruído.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, há um conjunto de questões que gostaria de referir, mas como algumas já lhe foram colocadas e por si respondidas, não vou protelar esta matéria nem repetir os assuntos. De qualquer forma, sobram duas ou três que quero colocar, mesmo depois da ida do Sr. Ministro à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, altura em que apresentou o orçamento para o seu Ministério e em que obtivemos algumas respostas para as questões que na altura foram colocadas.
O primeiro grupo de questões que queria colocar está relacionado com a participação do Ministério da Administração Interna na questão da protecção da floresta com aquilo que, no âmbito do Ministério da Administração Interna, se pretendeu e pretende fazer para o futuro próximo. Esta é uma matéria que já foi referida por um Deputado do Partido Comunista, mas sempre gostaria de lembrar que estamos a falar de um sector extraordinariamente importante em Portugal, já que cerca de 200 000 portugueses trabalham directa ou indirectamente no sector das florestas, sendo cerca de 3,4 milhões de hectares do nosso território ocupado por estas e representando os produtos directa ou indirectamente delas derivados qualquer coisa como 2,5% do Produto Interno Bruto. Estamos a falar de um recurso que, do ponto de vista ambiental, é extraordinariamente importante mas que tem um impacto económico e social não menos relevante e importante no nosso país. Em relação a esta matéria, não vale a pena dizer que, ao longo dos anos - e saliento que não estou a falar só dos últimos anos -, têm sido conhecidas as dificuldades de concretizar uma política de prevenção e de combate eficaz aos fogos florestais.
A este propósito, convém dizer que este ano o Governo foi particularmente mal sucedido neste domínio. No ano de 1999, arderam cerca de 43 000 ha de floresta em Portugal, enquanto as contas que estão mais ou menos feitas para o ano de 2000 apontam para uma área de 60 000 ha ardidos. Mais de 24 000 incêndios foram registados, segundo as contas provisórias de que dispomos, pelo que houve um retrocesso significativo durante o ano 2000 neste domínio do combate aos fogos florestais e da prevenção dos fogos florestais. Este facto não deixa de ser preocupante, tendo

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em conta que o Ministério da Administração Interna, sobretudo nos últimos dois anos, apostou fortemente nesta política, procurando não só reduzir as situações que propiciem fogos florestais como também atacar mais cedo esse tipo de situações para diminuir a área ardida. Ora, aquilo que se verificou foi precisamente o contrário.
Tanto quanto sei, o Ministério da Administração Interna tem responsabilidades partilhadas com o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas neste domínio. Foi anunciado no ano passado que, durante os próximos cinco anos, iriam ser constituídas, à razão de 100 por ano, equipas de sapadores florestais cujos custos operacionais seriam partilhados pelo Ministério da Agricultura e pelo Ministério da Administração Interna. Tanto quanto entendi na altura em que foi apresentado este programa, o Ministério da Agricultura apetrecharia estas equipas e o Ministério da Administração Interna ficaria responsável pelo pagamento destes salários. Recordo que falavam de 100 equipas por ano! Quais são os resultados desta política e desta acção que o Governo quis concretizar? Em 1999, em vez de 100 equipas, constituiu 33! No ano 2000, a informação que tenho é a de que, em vez de mais 100 equipas, o Governo constituiu 32! Estamos, portanto, com uma capacidade de realização neste domínio proporcionalmente idêntica ao aumento dos fogos e ao aumento da área ardida que se verificou este ano em relação ao ano anterior, para já não falar nos anos anteriores a 1998.
Mas há mais. Para o ano 2001, o Ministério da Agricultura inscreveu 500 000 contos para estas equipas. Ora, sendo esta uma verba que já estava inscrita no ano passado - era exactamente idêntica - e só se tendo constituído 32 equipas, como é que o Ministério da Administração Interna entende, naquilo que lhe diz directamente respeito (que, tanto quanto sei, tem a ver com o pagamento destas pessoas), que vai conseguir concretizar o objectivo de fazer mais 100 equipas no ano 2001? Isto porque a verba que o Ministério da Administração Interna tem prevista para este fim não me parece suficiente para encarreirar de vez este programa, que pode ser muito importante no domínio da prevenção.
Ainda em relação a esta matéria, Sr. Ministro, queria colocar algumas questões sobre os centros florestais e sobre a Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais (CNEFF). Julgo que a estrutura que foi criada continua com muitas dificuldades, para não dizer outra coisa, de concretização no terreno. São conhecidos vários distritos onde não funcionam estas estruturas, são apontadas várias queixas de articulação entre a comissão nacional e estes centros, que, supostamente, deviam estar no terreno a coordenar este tipo de questões. Ora, a verdade é que não são apenas um, dois ou três os distritos em que estas dificuldades são referidas como importantes obstáculos para o sucesso da política que tem em vista, em primeira linha, a preservação da floresta, mas também uma inversão dos números que nos últimos anos temos constatado no domínio dos incêndios e de todo esse tipo de sinistros.
Passando para outro domínio, queria reportar-me à segurança rodoviária. Já tive oportunidade de lhe colocar um conjunto de questões na reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tendo-lhe então referido que, por muito boas intenções que o Sr. Ministro ou qualquer outra pessoa que esteja no seu lugar tenha, não vale a pena pensarmos em inflexão séria dos problemas da segurança rodoviária - que são também gravíssimos a todos os níveis -, se não encararmos uma política rigorosa de segurança rodoviária. É claro que o Plano Integrado de Segurança Rodoviária (PISER), a Tolerância Zero e o abate de carros são muito importantes, mas, como já tive oportunidade de dizer, isto não chega, porque há um conjunto de questões que não estão directamente relacionadas com o Ministério da Administração Interna mas que se repercutem nos resultados que este Ministério vem apresentar sobre questões de segurança rodoviária e que não estão equacionados. Continuamos a retalhar este tipo de questões, acabando hoje com o Imposto Automóvel (IA) mais favorável para os jipes para amanhã aumentar não sei o quê e para, depois, andarmos para trás com outro tipo de medidas.
Anuncia-se agora, por exemplo, uma medida que aplaudo, pelos vistos da iniciativa de Deputados socialistas, de haver uma diminuição do imposto aplicável aos carros ecológicos. Pergunto, portanto, por que é que em Portugal não se pondera a situação dos carros mais seguros e, por via dessa segurança acrescida, não se dá a alguns modelos um benefício fiscal que possa traduzir-se em maior segurança para os utentes desses automóveis. Há várias medidas neste domínio que não estão, do meu ponto de vista, a ser encaradas de uma forma global.
O Sr. Ministro, no Orçamento e na definição da política em relação a esta matéria, diz que vai continuar o programa Tolerância Zero. Julgo que, muito embora se tenham mostrado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias alguns números sobre este programa relativos a este ano e apesar de esses números não serem catastroficamente piores do que aqueles que se verificaram no ano passado - diz o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna que até são relativamente melhores -, há uma coisa com a qual todos estamos de acordo: é que os resultados da Tolerância Zero estão aquém das expectativas do próprio Governo. As declarações proferidas pelo antecessor do Sr. Ministro e pelo Sr. Secretário de Estado na altura em que foi lançado este programa eram mais optimistas em relação aos resultados que se conseguiram concretizar. Ora, o problema que se põe em relação a este programa não é um problema de sermos a favor ou contra ele, mas é um problema que nos obriga a avaliar com muito rigor se um programa deste género, que, pela sua própria natureza, tem um âmbito de aplicação muito limitado, é suficiente para atingirmos os objectivos que pretendíamos e, sobretudo, se no contexto da educação que é preciso fazer para todos os automobilistas e utentes da via pública, este tipo de programa ajuda a construir essa tal educação cívica que propicia melhores resultados de segurança rodoviária. Esta era uma questão que queria deixar ao Sr. Ministro.
A terceira questão está relacionada com algo que o Sr. Deputado Telmo Correia já referiu, ou seja, com aquela questão que veio ontem nos jornais, perguntando se o PIDDAC é ou não o verdadeiro PIDDAC do Ministério da Administração Interna. Esse tipo de questão não é muito relevante, porque, seja ou não este o PIDDAC do Sr. Ministro da Administração Interna, o Sr. Ministro está aqui a responder por ele e a defendê-lo e, portanto, dir-lhe-ei que, se não for este o seu PIDDAC, a penalização é maior e é para si. Estas não são, portanto, dores que deva tomar para mim.

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Em relação ao PIDDAC, é, no entanto, verdade que o Sr. Ministro tem dito que há quarenta e tal esquadras que estão em recuperação e que o programa de recuperação de esquadras tem sofrido uma aceleração ao longo dos últimos anos - e é verdade que há um crescimento nesse tipo de recuperação de estruturas policiais e da GNR -, mas também é verdade que os objectivos ambiciosos que foram inscritos em PIDDAC nos últimos anos em relação a um conjunto de estruturas das forças de segurança estão muito longe de estar minimamente cumpridos. Já para não falar naqueles casos citados pelo Deputado Telmo Correia, dou-lhe, de cor, dois casos que se verificam no meu distrito e que conheço pessoalmente. Em primeiro lugar, devo dizer que o quartel da GNR de Amares está pelo menos há cinco anos em PIDDAC e tem umas instalações que o Sr. Ministro bem podia visitar, se tivesse oportunidade. Mas há mais. O quartel da GNR de Cabeceiras de Basto é um verdadeiro susto e é absolutamente inapropriado para os agentes que prestam lá serviço. É intolerável pensar que há agentes da GNR que trabalham naquelas condições e naquelas circunstâncias.
Portanto, Sr. Ministro, em relação a este domínio há ainda muito para fazer. Mas há, independentemente de reconhecer que há uma aceleração de obras, uma responsabilidade política do Governo neste sector, que é esta: é que foi o Governo que abriu as rubricas no PIDDAC para a melhoria e a construção de muitos destes postos da GNR e da PSP e o que é verdade é que não o tem concretizado. Por exemplo, há um quartel da GNR que está há quatro ou cinco anos no PIDDAC com 1000 contos e não ata nem desata. Isto com a agravante de a câmara municipal, correspondendo ao apelo feito há pouco pelo Sr. Ministro, ter cedido já definitivamente um terreno para se fazer esse quartel. Como este caso há mais, Sr. Ministro, há muitos mais.
Como tal, o que eu queria saber era se o Governo, em relação ao que estava e está no PIDDAC - independentemente de este ser o seu PIDDAC ou não, Sr. Ministro -, tem ou não a intenção de concretizar um conjunto de projectos que estão há dois, três ou quarto anos inscritos e que, como disse, não atam nem desatam.
Finalmente, Sr. Ministro, queria fazer-lhe uma pergunta que me deixou muito curioso. No meio destas verbas todas que aumentam no Ministério da Administração Interna, já tive oportunidade de lhe dizer que durante algum tempo, de uma forma responsável, o PSD teve uma expectativa positiva em relação ao Partido Socialista na área da administração interna, mas agora, no limite - e quero que o Sr. Ministro aceite isto como uma atenção especial em relação a V. Ex.ª -, só conseguimos estar cépticos em relação à mesma matéria e ao Governo.
De facto, convenhamos que a folha de serviços do Governo socialista na área da Administração Interna não tem sido particularmente brilhante ao longo dos últimos cinco anos. O Sr. Ministro tem algumas provas dadas, não directamente neste sector mas em sectores relativamente conexos, temos conhecimento da sua capacidade, e por isso, no limite, vamos conceder-lhe um cepticismo e ver se o Sr. Ministro consegue inverter a desgraça que tem sido este domínio, nos últimos anos.
Quero também dizer-lhe que, como o Sr. Ministro já compreendeu, não se trata apenas de um problema de dinheiro para a resolução de muitas questões na área da administração interna. Isto porque no ano passado houve um aumento de orçamento para o Ministério da Administração Interna e os resultados pioraram. Aliás, há dois anos também houve aumento de verbas para a segurança interna e os resultados não foram melhores, o mesmo tendo sucedido há três anos. Portanto, está visto, até estatisticamente, que esta política do Partido Socialista de aumento das verbas para resolver os problemas não funciona. E se alguma vez em Portugal houve sentimento de insegurança - o que, aliás, teve a ver com uma das bandeiras eleitorais do Partido Socialista em 1995 -, nunca se registou tanto como neste ano e no ano passado. Portanto, julgo que não vale e pena debatermos esta matéria.
Contudo, há uma verba que me impressiona. É a verba de 50 000 contos a mais para o SIS. Devo dizer-lhe, Sr. Ministro, que com as últimas turbulências que tiveram lugar neste sector, não sei se o SIS ainda existe, verdadeiramente,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Como não existe, devia ser mais barato!

O Orador: - … mas como este relatório é relativamente parco quanto ao destino concreto desses 50 000 contos para o SIS, ficar-lhe-ia muito grato se o Sr. Ministro, sem quebra de sigilo - porque esta Casa está amaldiçoada em relação a esta matéria -, nos pudesse dizer para que é que vão servir estes 50 000 contos. Não sei se o SIS lhe fica agradecido, mas eu fico.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, agradeço, em primeiro lugar, o "cepticismo" que manifestou, e que, devo dizer, me conforta.
Em relação às várias questões que o Sr. Deputado coloca - e são pelo menos cinco -, tentaria responder-lhe brevemente.
Em relação à última questão, devo dizer-lhe que a reserva que ela merece explica a forma parca como consta do relatório. Quanto ao aumento, é o mesmo devido a dois aspectos fundamentais: em primeiro lugar, diz respeito ao aumento global de 2,5% que se verifica em relação aos serviços restantes nestas áreas funcionais; em segundo lugar, também deve dizer-se que está para ser apresentada a nova Lei Orgânica do SIS, em breve, que também merecerá alguma evolução do próprio serviço.
Quanto à questão relativa à segurança rodoviária, lembro que já em sede de Comissão conversámos sobre este aspecto e que, obviamente, partilhamos as mesmas preocupações. Gostaria apenas de dizer, relativamente à questão que colocou da carga fiscal sobre veículos que tivessem maior segurança, que este assunto fez parte de uma diligência do Ministério da Administração Interna junto do Ministério das Finanças para que fosse incluída quando da reforma do Imposto Automóvel. Portanto, essa preocupação existe no Ministério da Administração Interna.
No que diz respeito aos números da segurança rodoviária, partilhamos a ideia da importância que tem a educação e o civismo nesta matéria. No entanto, é um facto que os números da sinistralidade são elevados. Como é evidente, gostaríamos que fossem "zero", mas não são. Aliás, dificilmente serão, mesmo com todos os meios afectos a essa situação. Contudo, há um aspecto que, apesar de tudo, vale a pena salientar: é que os números relativos da sinistralidade rodoviária - embora não sejam

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aqueles que nos confortam - têm vindo a decrescer em número de acidentes, em número de mortes e em número de feridos graves, portanto, em número de vítimas. O que quer dizer, relativamente à sinistralidade homóloga, que este ano tivemos menos 46 mortos, menos 649 feridos graves, ou seja, menos 695 vítimas. Isto significa que, apesar de tudo, há alguma evolução que, embora não seja a que gostaríamos, não é de todo negativa.
Quanto à questão dos fogos florestais, trata-se de uma questão que continua a ser, simultaneamente, do âmbito do Ministério da Administração Interna e do Ministério da Agricultura. Ora, isto significa que há conversações e cooperação entre estes dois Ministérios no sentido da resolução deste problema, tendo, aliás, havido um aumento - não tão grande quanto gostaríamos - do número de equipas de sapadores florestais.
No entanto, como o Sr. Deputado há pouco referiu, e muito bem, nem tudo se resolve com dinheiro. E há alguns mecanismos que podem ser ensaiados no sentido de potenciar o dinheiro que existe, quer no Ministério da Agricultura quer no Ministério da Administração Interna, para a colaboração estreita entre estes dois ministérios e outras entidades que estamos a apontar, ou seja, aos 3 milhões de contos que há no Ministério da Administração Interna mais aos 500 000 contos que há no Ministério da Agricultura poderem associar-se outras entidades que tenham como objectivo potenciar estas verbas com verbas comunitárias.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Peço desculpa por interromper, Sr. Ministro, mas, já agora, gostaria de colocar uma questão, uma vez que para o ano não sei se teremos esta discussão em sede da Comissão de Economia Finanças e Plano.
O Sr. Ministro está a querer dizer que abandona aquele objectivo das 100 equipas por ano, que foi, aliás, uma das bandeiras do Ministro Fernando Gomes?

O Orador: - Sr. Deputado, o objectivo não se abandona, vou tentar consegui-lo!
Finalmente, em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado relativamente ao PIDDAC e aos quartéis devo dizer que aqueles dois quartéis a que o Sr. Deputado se referiu constam no PIDDAC. Aliás, já tivemos este debate em sede de Comissão e é evidente que há uma dispersão no PIDDAC, sendo também óbvio que esta questão não pode ser resolvida de um dia para o outro, como de resto o Sr. Deputado sabe melhor do que eu.
O que lhe posso dizer é que, desde o momento em que cheguei ao Ministério (disse-o no outro dia em sede de Comissão e volto a repetir agora), o que tentei fazer foi procurar realizar um conjunto de obras que fossem consideradas prioritárias, usando critérios objectivos relativamente à sua prioritização.
Ora, essas prioridades são: fazer quartéis onde não há; fazer mais quartéis onde esses quartéis existam, mas onde já não chegam para os efectivos que albergam, e melhorar as instalações. Quanto a este ponto, já conversei com o Sr. Secretário de Estado que tutela esta área no sentido de podermos fazer um plano integrado de instalações policiais a um prazo mais longo, de três anos, de modo a que se possa planear claramente este tipo de obras.
Esta é a ideia que temos neste momento e é de acordo com este conceito que gostaríamos de vir a orientar as verbas do PIDDAC.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, como é natural, a maior parte das questões foi já debatida, mas permita-me sublinhar alguns pormenores.
Começaria exactamente pelos quartéis dos bombeiros que, segundo a previsão de outro ministério, passarão a ser competência dos municípios. Se me permite aditar algo às suas palavras, Sr. Ministro, quero dizer-lhe que os municípios nunca deixaram de comparticipar nos quartéis de bombeiros, quer através de terrenos quer através dos complementos da comparticipação.
Como o Sr. Ministro sabe, a portaria define parâmetros muito apertados para a construção dos quartéis de bombeiros, sendo um facto que no PIDDAC deste ano não aparece no mapa XI uma verba para quartéis de bombeiros. Calculo que a verba a que o Sr. Ministro se referiu seja a que se encontra designada por "transferências de capital para administrações privadas", no montante de 440 000 contos.
Ora, segundo as normas da portaria, isto significa que serão quatro quartéis de bombeiros ou, então, se houver obras em curso, no máximo, cinco ou seis quartéis.
Pergunto: por que razão estas verbas não aparecem no PIDDAC regionalizado? Não acredito que se o Ministério vai fazer quatro a seis quartéis de bombeiros não saiba com rigor quais são.
Mais: a minha preocupação é maior porque, em 1999, ano de eleições, houve um compromisso assumido com uma associação de bombeiros de um protocolo em que participavam o Ministério, a câmara municipal e os bombeiros. Nessa altura, o Sr. Ministro respondeu a um requerimento meu dizendo que a partir de então poderiam lançar o concurso para a obra, tendo, aliás, dado a mesma resposta a essa associação. Só que, procurando no Mapa XI e no PIDDAC regionalizado, não vi a verba. Ora, conjugando esta situação com a intenção de transferir para os municípios esta competência, mais preocupado fico.
Ou seja, se de facto um dos quartéis é esse, então que se faça uma alteração com a desagregação da verba e acrescente-se esse quartel na discussão em sede de especialidade. Penso que é o mais correcto para que fiquemos tranquilos.
Relativamente aos quartéis das forças de segurança, também apreciei as palavras do Sr. Ministro no sentido de serem criadas mais instalações com vista a desenvolver um policiamento de proximidade.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, agradeço-lhe que abrevie.

O Orador: - Vou acelerar, Sr.ª Presidente.
Devo dizer que concordo perfeitamente com esse plano a médio prazo. Algumas obras já foram referidas, mas eu poderia referir outras ainda mais graves.
Por exemplo, em 1999 - ano de eleições -, havia obras que constavam no PIDDAC, sendo uma delas o posto da GNR de Santo António. O que sucede é que me foi respondido este ano pelo Ministério, através de um requerimento, que essa localidade não teria um posto da GNR porque Santo António estava no plano... Mas isto já esteve em PIDDAC e, nestas circunstâncias, os municípios procuram terrenos, adquirem e disponibilizam terrenos e combinam equipamentos com as forças de segurança. Mas, depois de

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tudo isto, a obra deixa de constar no PIDDAC, não se sabe quando é que ela vai existir, ou então mantêm-se com aqueles valores residuais. Penso que se trata de uma situação que deve ser clarificada para bem das autarquias e para bem do funcionamento quer da PSP quer da GNR.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dias Baptista.

O Sr. Dias Baptista (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, grande parte das questões que tinha para colocar foram já colocadas e respondidas pelo Sr. Ministro. De qualquer forma, restam-me ainda algumas.
A primeira relaciona-se com o seguinte: o Sr. Ministro apresentou-nos o orçamento do seu Ministério, realçando o crescimento que este apresenta, o que me parece importante. Trata-se de um crescimento de 21 milhões de contos, representando um crescimento de 8,5%, o que é manifestamente significativo uma vez que demonstra preocupação com uma cultura de segurança que este Governo tem procurado implementar. A primeira nota que gostaria, pois, de realçar é exactamente esta preocupação do Governo com uma cultura de segurança.
Gostaria que o Sr. Ministro procurasse explicitar, para além do que já fez na sua intervenção inicial, um pouco mais sobre esta matéria, designadamente sobre os dois grandes objectivos referidos: mais polícia e polícia mais perto.
Se bem percebo, este "mais polícia" prende-se com a continuidade de uma política que tem vindo a ser posta em prática. Isto é, entre 1996 e 2000, podemos constatar um crescimento de 4100 efectivos nas forças da PSP e da GNR, o que é significativo. É de tal forma significativo que neste momento a relação agente de segurança/cidadãos é quase de 1/200, em Portugal, que é excelente em termos europeus. Este factor deve, pois, ser registado e realçado.
Gostaria de perguntar a V. Ex.ª se esta política de apostar na continuação do crescimento das forças de segurança vai manter-se em 2001 e, a manter-se, qual a previsão de aumento dos efectivos para 2001.
A segunda questão, dentro dos mesmos objectivos, relaciona-se com o "mais perto". O "mais perto", certamente, engloba-se na noção correctíssima de policiamento de proximidade. Também aqui, para além das 42 novas esquadras que o Sr. Ministro nos referenciou, que estão em obras ou em execução final, gostaria de sublinhar um outro número tremendamente significativo que se relaciona com o PIDDAC: partimos de 5,5 milhões de contos em 1995 para 10,3 milhões em 2001, o que é um salto tremendo em termos de PIDDAC, que é tanto mais tremendo se nos procurarmos ater apenas em relação a 2000. É que em relação a 2000 temos um crescimento de 2,7 milhões de contos, o que representa um saldo no montante disponível de 35%.
Entendemos que este reforço de 35%, em sede de PIDDAC, é algo de importante que deve ser registado. Nessa medida, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro quais vão ser as grandes apostas, ou seja, onde vai V. Ex.ª representar este aumento significativo.
Por outro lado, gostaria também de perguntar o seguinte: o Sr. Ministro referiu na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que um dos seus objectivos é o de apresentar até ao final da legislatura uma proposta de lei relativa ao regime das forças de segurança. Aquilo que pretendo saber é se a intenção é a de apresentar esta lei em 2001 ou se a sua preparação terá lugar em 2001 com vista a ser apresentada em 2002.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, Vila Nova de Gaia, que o Sr. Ministro, com certeza, já teve oportunidade de conhecer, é dos maiores municípios do País em termos de população (tem 300 000 habitantes) e em termos de área. E Vila Nova de Gaia tem problemas graves em termos de criminalidade, de consumo e tráfico de droga, apesar do esforço que a Câmara Municipal tem feito em conjunto com os governos para atenuar esta situação.
Nesse sentido, vai fazer dois anos em Dezembro próximo que foi disponibilizado um conjunto de terrenos para que o Governo pudesse avançar com a construção de um conjunto de instalações, nomeadamente para a GNR, porque esta força de segurança está, de facto, muitíssimo mal instalada. Acontece, porém, que nada se verificou até ao momento.
Há poucas semanas, tive a oportunidade de interpelar o Governo, numa sessão de perguntas, colocando estas questões, tendo o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna feito o favor de me responder de uma forma positiva. Mas se volto a esta questão em sede de discussão do Orçamento do Estado na especialidade é porque verifico que aquilo que ele nos manifestou (a mim em particular, o que agradeço) não está materializado no Orçamento do Estado, nomeadamente no PIDDAC. Isto é, não consta do Orçamento o objectivo de, no próximo ano, se avançar em relação à construção de alguns quartéis da GNR, como me disse, para que estes possam ser concluídos até ao final do ano de 2001 ou, o mais tardar, no início de 2002.
Como, ciclicamente, tenho recebido este tipo de resposta dos vários titulares da pasta da Administração Interna, não só de Ministros como também de Secretários de Estado, e nada avançou, naturalmente que estou céptico em acreditar que seja desta vez que tal objectivo será levado a cabo. Apesar de tudo, continuo a pensar - sou um homem de esperança - que possa ser desta vez.
Não é com 1000 contos - como disse o Sr. Secretário da Administração Interna - que se pode construir no próximo ano os quartéis da GNR de Arcozelo e de Canidelo. Além disso, refiro que também não vi inscrita a verba para a construção de raiz do quartel de Valadares, apesar de este ter sido recentemente instalado, provisoriamente, em instalações que a Câmara cedeu e que foram adaptadas para o efeito - mantendo-se, contudo, o objectivo de ter um quartel construído de raiz na freguesia e vila de Valadares.
Também verifico que não se encontra prevista uma verba condigna para se avançar com a remodelação da esquadra central da PSP em Vila Nova de Gaia - todos os anos se incluem 1000 contos, às vezes um pouco mais, e nunca se consegue avançar. Como mais uma vez se assinala apenas com 1000 contos, quer dizer que não é para avançar no próximo ano!
Quero também chamar a atenção do Sr. Ministro de que foi, finalmente, criado, há ano e meio, o Comando de Destacamento Territorial da GNR, em Vila Nova de Gaia, que, naturalmente, veio dar satisfação a uma das pretensões velhíssimas desta cidade, só que foi colocado num quartel da GNR no limite do concelho, em Lever, e, efectivamente,

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ainda não tem instalações próprias, as quais, a meu ver, devem ficar situadas no centro do município, designadamente na freguesia de Pedrouços.
Por outro lado, como estão instalados provisoriamente, há ano e meio, no quartel da GNR de Lever, e mal instalados, não podem, penso eu, exercer condignamente as suas funções enquanto estiverem nesta situação. Penso, portanto, que se justificava também inscrever, desde já, esta obra, para que pudesse avançar no próximo ano.
Para concluir, quero também chamar a atenção do Sr. Ministro para o seguinte: a GNR foi levada para uma outra freguesia e vila, que é Canelas, aí foi instalada na sede da junta de freguesia, depois de esta sofrer obras de adaptação, e para isso foi preciso que a junta de freguesia passasse a funcionar na sede de uma colectividade. Essas instalações provisórias foram inauguradas pelo seu antecessor há cerca de meio ano.
Ora, a câmara municipal já comprou um edifício, há vários meses, para aí ser instalada definitivamente a GNR, mas o processo não avançou e também não vejo no orçamento qualquer verba inscrita para adaptar esse edifício a instalações definitivas da GNR, para que a junta de freguesia possa regressar à sua sede própria e aí possa exercer condignamente o seu mandato autárquico.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que conclua.

O Orador: - Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Quero também perguntar-lhe, Sr. Ministro, o seguinte: em Gaia, temos várias corporações de bombeiros voluntários, sendo que a mais recente, que tem já alguns anos, é a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Crestuma, que ainda não tem um quartel para poder funcionar, está em instalações muito precárias; no entanto, sei que já apresentaram um projecto há mais de 1 ano. Gostava de saber, Sr. Ministro, se vão encarar seriamente esta situação, porque também nada vejo inscrito no Orçamento do Estado a construção do quartel dos Bombeiros Voluntários de Crestuma, em Vila Nova de Gaia.
Sr. Ministro, a minha última pergunta tem a ver com as polícias municipais. Elas já foram criadas em vários concelhos do meu próprio distrito, o do Porto, designadamente na cidade de Vila Nova de Gaia e, por isso, pergunto-lhe quando é que elas vão ser efectivamente instaladas e começar a funcionar, porque também serão muito úteis para poder dar maior tranquilidade à população de Vila Nova de Gaia e dos outros concelhos do distrito do Porto.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, não quero voltar atrás e repetir a discussão que aqui tivemos…

A Sr.ª Presidente: - Então, não volte, Sr. Deputado!

Risos.

O Orador: - … mas apenas e só deixar-lhe uma nota de encerramento dessa mesma discussão, que é muito rápida: é que, de acordo com números que, entretanto, estive a tentar apurar, ficou por esclarecer em que termos é que o aumento dos ditos cujos subsídios é feito. Ou seja, se não são os valores das associações, como o Sr. Ministro me disse, como é que o Sr. Ministro chegou a esse 1,5 milhões para cada uma das forças? Realmente, isso foi perguntado por mim e por outros Srs. Deputados mas ninguém, até agora, percebeu qual é a fórmula mágica e o cálculo extraordinário e fantástico que permite chegar a esse 1,5 milhões.
Quero dizer-lhe também que, entretanto, estive aqui a procurar fazer umas contas e, designadamente no caso da GNR, esse 1,5 milhões não está lá, Sr. Ministro, porque as verbas globais de aumento das despesas de pessoal são 3,7 milhões de contos, passando de 96 milhões de contos para 99,7 milhões de contos, com uma variação de 3,8; se formos às remunerações certas, o aumento aí é de 1,2 milhões, com uma variação de 1,5%, e, portanto, o 1,5 milhões de que o Sr. Ministro fala, não pode estar, de maneira alguma, nas remunerações certas, a não ser que haja aí também um fundo falso qualquer, que eu não consigo perceber, sinceramente.
A pergunta que lhe quero fazer, e vou ser muito breve para poupar algum tempo, porque, de alguma forma, ela já foi feita por outros Srs. Deputados, ao longo desta ronda, e, como eu disse, não tem a ver com segurança interna mas, sim, com a prevenção e combate aos fogos florestais, é a seguinte: temos, de facto, um aumento significativo de verbas no combate aos incêndios e aos fogos florestais, só que me parece que esse aumento de verbas não corresponde a um aumento de resultados, porque, em 2001, temos 91 000 ha de área ardida e, de 1996 a 2000, temos 438 000 ha de área ardida, o que corresponde a uma média anual de cerca de 100 000 ha de área ardida. Houve, portanto, um aumento significativo e anual de reforço de verbas para combate sendo que a média daquilo que ardeu continua a ser exactamente a mesma.
Sr. Ministro, talvez valesse a pena ser um pouco mais claro na sua leitura destes resultados e na sua leitura dos caminhos que têm estado a ser seguidos, porque, efectivamente, aumentamos agora mais 600 000 contos em relação a 2000, temos vindo sempre a aumentar, mas o resultado parece não ser muito diferente.
Será por isso que o Sr. Ministro tira a conclusão de que, se calhar, não vale a pena as tais 100 brigadas? De resto, o compromisso das 100 brigadas vem de há três anos. Lembro-lhe que, em 1999, foram criadas 33 brigadas, em 2000 foram criadas 31 e percebemos da sua afirmação de que, no ano de 2001, haverá um recuo em relação à criação destas brigadas.
A outra pergunta, que também já foi feita, mas acabei por ficar sem perceber - e com isto termino, Sr. Ministro -, é se os pastores têm ou não telefonado. Sinceramente não percebi, assim como não sei que avaliação é que faz desses mesmos telefonemas.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem apalavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Joaquim Matias, V. Ex.ª colocou uma questão relativa aos quartéis de bombeiros e ao facto de as obras não estarem inscritas. Devo dizer-lhe que essas obras não são da responsabilidade do Governo, são obras das associações de bombeiros ou das autarquias.
Agora, em relação àquela questão concreta que me colocou, ou seja, a do quartel dos bombeiros do Barreiro,

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apraz-me dizer-lhe que já foi para Diário da República e, portanto, esse será um dos quartéis que vai ser feito. A informação que tenho neste momento é essa.

O Sr. Joaquim Matias (PCP). - E de onde sai a verba? É desses 400 000 contos?

O Orador: - Exactamente!
O Sr. Secretário de Estado acaba de me informar que o posto de Santo António da Charneca também será construído.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Mas também não está no PIDDAC!

O Orador: - Em relação às questões que me foram colocadas pelo Sr. Deputado Dias Baptista, quero dizer muito claramente o seguinte: em relação ao aumento de efectivos, tem havido, de facto, um aumento, que tem sido sustentado, e a previsão é que essa tendência se continue a verificar no ano de 2001. Em 2000, o total de efectivos era da ordem dos 46 332 e a previsão é que passe para 46 871, no ano de 2001.
Em relação à polícia de proximidade, designadamente à questão das polícias municipais, porque penso que era a isso que se queria referir, quero dizer-lhe que o programa está em marcha, os primeiros 100 formandos já estão na escola e a previsão é que, durante o próximo ano, venham a ser formados mais cerca de 400 polícias. Portanto, digamos que a linha está traçada, haverá um aumento sustentado dos efectivos e uma filosofia de policiamento de proximidade.
Relativamente à questão que me colocou sobre o PIDDAC, eu, de uma maneira muito geral, disse inicialmente os programas fundamentais a que nos comprometemos no PIDDAC: há um programa novo, que, naturalmente, é o das polícias municipais, que têm 1 milhão de contos; há o reforço de outros programas que já vêm de trás, com 5 milhões de contos para instalações e 2,6 milhões de contos para o equipamento (e aqui talvez valha a pena explicitar que há cerca de 450 000 contos para as comunicações de emergência), há 2 milhões de contos para meios operacionais, e quando estamos a falar de meios operacionais, estamos também a falar da frota, pois há o projecto claro de ir renovando a frota, como, aliás, tem vindo a ser feito, que passa pelo abate das viaturas que tenham mais de 10 anos ou mais de 400 000 km, e há também cerca de 150 000 contos para a informatização dos serviços.
Naturalmente que há aqui também o plano das lanchas, sendo que duas já estão entregues e uma terceira irá ser entregue ainda até ao final deste ano. Durante o próximo ano, seguir-se-á a entrega de mais um conjunto de lanchas ao ritmo de uma em cada dois meses.
Sobre a questão que me coloca o Sr. Deputado Telmo Correia, em relação aos fogos florestais, devo dizer que, naturalmente, as áreas são o que são. Porém, julgo que aqui há duas apostas fundamentais: a primeira é de natureza quantitativa, não pode ser outra, continuando a investir-se no combate aos fogos; mas há uma outra linha, e é essa que julgo que é muito importante, que é a da prevenção. É na prevenção que teremos de apostar, não só no sentido de prevenir os incêndios mas também de os combater na sua fase inicial. Aí é que julgo que deve ser feito um investimento bastante grande.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Mas as brigadas também serviam para isso!

O Orador: - Exactamente! Mas eu gostava de dissipar qualquer mal entendido relativamente à minha posição sobre as brigadas: sou a favor, quero que elas continuem e quero aumentá-las. Não quero que fique qualquer dúvida sobre essa situação!
Relativamente à regulamentação do subsídio de turno e de piquete, não posso dar-lhe neste momento os valores pela simples razão de que não tenho o documento na sua fase final e não o tenho porque ele precisa de ser conversado quer com a Direcção Nacional da Polícia de Segurança Pública quer com as associações, o que ainda não aconteceu. Portanto, digamos que todo o enquadramento legal dará a explicação dessa questão.
Mas, antes disso e logo que o tenha, tenho muito gosto em conversar com o Sr. Deputado e dar-lhe toda a informação relativamente a essa matéria.
Julgo que saltei - e peço desculpa - as questões o Sr. Deputado Manuel Moreira.
Sr. Deputado, quero dizer-lhe o seguinte, com muita clareza, relativamente às questões que me põe: no plano das instalações policiais a médio prazo, digamos que o Ministério da Administração Interna está a trabalhar de acordo com aqueles critérios que enunciei aqui inicialmente, ou seja, fazer, em primeiro lugar, onde não existe; em segundo lugar, fazer onde as instalações não são suficientes e, em terceiro lugar, fazer os melhoramentos.
Estas esquadras e estes postos que referiu, no centro de Gaia, em Canidelo, em Arcozelo e em Custóias, fazem parte das prioridades do Ministério. Portanto, quero dizer-lhe isso com muito clareza.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - E o Comando de Destacamento Territorial da GNR?

O Orador: - A obra do Comando de Destacamento Territorial da GNR é diferente daquelas, porque aquelas fazem parte da prioridade e digamos que sobre esse assunto não há qualquer dúvida. Agora, em relação a esta, devo dizer-lhe que se trata de uma obra de monta, de uma obra grande e de uma obra que exige não só maior volume mas também um estudo mais aprofundado.
Quanto aos bombeiros de Crestuma, Sr. Deputado, a resposta já lhe foi dada.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Costa.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, deixe-me pôr-lhe duas questões, uma genérica e uma muito concreta.
Sobre a sinistralidade, Sr. Ministro, dir-lhe-ei que é muito frequente, nomeadamente em auto-estradas concessionadas, encontrarem-se todo o tipo de animais, nomeadamente de raça canina. Inclusivamente, há uma semana, um desses animais provocou um grave acidente perto de Óbidos, no qual morreram cinco pessoas, entre os quais bombeiros, além de se encontrarem várias pessoas gravemente feridas, e parece que ninguém é culpado de nada.
Quando é que as polícias começam a pedir responsabilidades às proprietárias de auto-estradas, às concessionárias, pela falta de vedação nessas vias,

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permitindo a sua invasão por todo o tipo de animais, com as maiores e as mais graves consequências, como aconteceu neste caso concreto?
Já agora, Sr. Ministro, é do conhecimento das seguradoras, das polícias e da Junta Autónoma de Estradas ou dos novos institutos, que há pontos perigosos no País. Quando é que se toma a iniciativa de resolver, com soluções técnicas, esses pontos considerados negros ou perigosos, porque o problema não se resolve com mais polícias?
Creio que as seguradoras deviam ser partes interessadas nas soluções técnicas, na medida em que também, para além do País, têm os maiores prejuízos. Com estes acidentes, não deixam também as companhias seguradoras de ser partes interessadas na solução deste tipo de problemas.
Deixo-lhe estas duas considerações, mas chamo-lhe a atenção, de uma forma especial, para a perigosidade causada pela invasão por animais nas auto-estradas, muito concretamente na A8, Lisboa/Leiria, onde isso se passa frequentemente, para já não falar do péssimo estado do piso, que nenhuma polícia pode resolver.
Creio que o Ministério e as polícias deviam ter a coragem de chamar a atenção do Ministério do Equipamento Social e dessas entidades para a perigosidade objectiva dessa estrada - e são muitos os acidentes que resultaram da perigosidade objectiva - e até pedir-lhes responsabilidades.
Depois destas duas questões genéricas, quero colocar-lhe também duas questões concretas, muito rapidamente.
O Sr. Ministro está há pouco tempo à frente do Ministério da Administração Interna, mas quero chamar-lhe a atenção para uma esquadra que só por milagre ainda não caiu. Recomendo ao Sr. Ministro que reforce as verbas para os agentes da PSP das Caldas da Rainha para, além de capas para não se molharem nos dias em que chove, terem protecção especial, porque em breve vai cair-lhes o telhado da esquadra em cima.
O que é grave é que, há 12 anos, desde o Sr. Ministro Eurico de Melo, que não se fazem obras, porque se fala na nova obra; há cinco anos que a esquadra tem verbas em PIDDAC, e, para surpresa de todos, a verba substancial que havia, em 2001 desaparece e aparece apenas uma verba simbólica de 1000 contos.
Sr. Ministro, não acredito que aquele edifício - e julgo que era importante que o Sr. Ministro, ou quem de direito, fosse verificar - dure mais um ano, mais um Inverno, e muito menos dois, atendendo à programação das obras.
Creio que o Ministério nunca terá um mínimo de autoridade moral para responsabilizar quem quer que seja, e muito menos o município, por não contribuir para a transferência das instalações da PSP, ainda que provisoriamente, porque, de facto, acho que há uma grave irresponsabilidade da parte de alguém. Há cinco anos que há verbas em PIDDAC e há cinco anos que nem sequer existe projecto para a obra. Tudo quanto sei, ainda não se passou do estudo prévio.
E mais: o município ofereceu o terreno ou parte do terreno; o município dispunha-se a fazer o projecto; o município dispunha-se a contribuir para as obras, mas o Ministério preferiu chamar a si - e muito bem - a responsabilidade do projecto e da obra.
Portanto, o Sr. Ministro e o País estão sujeitos a uma grave vergonha, que é o edifício ruir, pondo em risco centenas de agentes. Aliás, não são centenas, a esquadra devia ter uma centena de agentes, porque a esquadra em causa devia ter 115 agentes no seu quadro mas tem apenas 75 agentes. Mas esta é outra questão.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que termine.

O Orador: - Sr. Ministro, chama-lhe a atenção para essa grave situação.
A segunda questão tem a ver com os bombeiros. Sr. Ministro, o seu antecessor, Dias Loureiro, prometeu publicamente aos Bombeiros Voluntários das Caldas da Rainha a comparticipação para a construção de um tanque de aprendizagem, porque os bombeiros também só têm a ganhar com a aprendizagem da natação.
O seu antecessor Alberto Costa voltou a prometê-lo e os Bombeiros Voluntários das Caldas da Rainha lançaram a obra; o Sr. Secretário de Estado José Augusto Carvalho, bem recentemente, prometeu uma verba de 40 000 contos. Dentro de pouco tempo, essa obra estará concluída e não estará paga e, por certo, não se pode pedir responsabilidades aos bombeiros, que acreditaram na Administração Pública, que acreditaram nos governos do PSD, que acreditaram nos Ministros do PS, que acreditaram nos Deputados do PS e no Governador Civil de Leiria, que acreditaram iam ter uma comparticipação. Mas o que é certo é que, neste PIDDAC, não há qualquer verba para esse fim. Creio que o Sr. Ministro estará lá brevemente, na homenagem aos bombeiros e ao seu Comandante, que ultrapassa os 30 anos de serviço, e espero que, até lá, o Sr. Ministro leve este assunto estudado para que a classe política não passe pela vergonha de ter prometido aos soldados da paz uma coisa e, entretanto, ninguém cumpriu essa promessa.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Presidente da 1.ª Comissão, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Penso que este orçamento não é ainda, no âmbito da Administração Interna, o orçamento de V. Ex.ª - porventura, V. Ex.ª teve de aceitar um orçamento já preparado pelo seu antecessor. Eu esperava que este orçamento marcasse, no âmbito da Administração Interna, alguma diferença e uma perspectiva de política neste sector que, do meu ponto de vista e da minha leitura, este orçamento e o PIDDAC não asseguram.
Gostava de lhe colocar algumas questões concretas, sendo que a primeira tem a ver com a intervenção da PSP e da GNR no âmbito da investigação criminal.
Como V. Ex.ª sabe - e esta é uma questão, do meu ponto de vista, essencial - há, no âmbito das acções que visam o combate à criminalidade e, consequentemente, visam garantir maior segurança, um circuito que passa, desde a prevenção e de uma presença o mais notória possível dos agentes de segurança na rua, também pela conclusão o mais rapidamente possível dos processos judiciais que conduzam à responsabilização, ao julgamento e à penalização a tempo dos autores dos crimes.
Nessa perspectiva, como sabe, viabilizámos aqui a Lei da Organização da Investigação Criminal, que definiu novas competências para a GNR e para a PSP, e há uma disposição transitória que visava permitir à PSP que se apetrechasse, em termos de quadros, para assumir em

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plenitude essas competências, designadamente nas áreas de Lisboa, Setúbal e creio que Faro também.
Se não me falha a memória, este regime transitório cessa no início de Janeiro - não tenho a certeza de quando será, mas é no próximo ano, não tenho a lei presente neste momento -, pelo que queria saber se estas forças, particularmente a PSP, se apetrecharam, do ponto de vista dos elementos e dos meios a afectar a esta área, para dar resposta a essa competência, que, de outra forma, será um presente envenenado às forças de segurança, que passarão a ser também responsabilizadas pelos males da justiça - pelos males da segurança por um lado e pelos males da justiça por outro, pela sua morosidade, pela sua ineficiência, pela ineficácia da investigação.
Queria saber, portanto, se, designadamente em sede do orçamento, estão previstos os meios para completar esse quadro e qual a previsão relativamente ao efectivo funcionamentos desses novos meios, sem sacrifício, obviamente, de agentes que devem estar no terreno, sem aumentar o número daqueles que estão afectos a tarefas administrativas.
Outra questão tem a ver com a segurança rodoviária. Portugal é dos países europeus com maior sinistralidade - estamos à frente nesta estatística, ao contrário dos índices de desenvolvimento, em que estamos a ficar cada vez mais para trás -, pelo que me parece que o aumento previsto de 300 000 contos nesta área é perfeitamente ridículo para dar uma resposta, porque me parece que devia haver uma mobilização nacional para esta questão. É uma questão cada vez mais preocupante e o número de pessoas (jovens, por exemplo9 que ficam afectadas pela gravidade da extensão dos acidentes rodoviários cresce em Portugal.
A experiência da Tolerância Zero parece ter sido um fracasso, pelo menos de harmonia com especialistas na matéria, e queria saber quais são as prioridades do Governo, por via do orçamento, nesta questão.
Uma outra questão tem a ver com as polícias municipais. Como V. Ex.ª sabe, o que está previsto, em termos da comparticipação do Governo nos custos em contratos-programa a celebrar com os municípios que vêm implementando as polícias municipais, não cobre, efectivamente, os custos integrais que os municípios passam a ter com estas novas competências e com esta nova estrutura. Parece-me que esta força complementar pode, designadamente a nível de cada autarquia, retirar encargos que hoje são da PSP, deixando a PSP para acções de prevenção e acções mais especializadas em termos de segurança, e que este contributo que as polícias municipais podem dar pode ser importante mas, para isso, era preciso que as câmaras municipais tivessem os meios financeiros. Queria saber se o Governo está disposto a alterar o quadro actual, em que comparticipa nesta matérias.
Ainda uma questão que tem a ver com um problema que tem sido aqui recorrentemente colocado: vejo aqui uma entrevista do Sr. Presidente da Associação Sócio-Profissional da PSP ao 24 Horas, em que faz um grande elogio aos governos socialistas, referindo que conta com uma informação muito completa por parte do Governo nas questões que dizem respeito à PSP, e eu não quero crer que V. Ex.ª deu à Associação Sócio-Profissional a informação do montante que o Governo vai fixar para os subsídios de turno e de piquete e que V. Ex.ª não essa informação ao Parlamento! Não quero crer que isso possa acontecer!
Finalmente, uma questão de âmbito regional: estou extremamente preocupado com o que acontece relativamente às estruturas em matéria de segurança na Região Autónoma da Madeira. Há, neste PIDDAC, coisas absolutamente incríveis e inadmissíveis! Designadamente para esquadras da PSP no Caniçal, no Caniço e em Porto Santo, que tinham verbas em PIDDAC anteriores que nunca foram efectivamente utilizadas mas estavam previstas, para uma situação em que estão em zero! Estão em zero!
Por exemplo, em relação a uma das esquadras, a de S. Vicente, da Brigada Fiscal do Funchal, que tinha uma verba de 89 000 contos prevista para ser executada em 1999, estranhamente, não foi executado nada e agora temos aqui uma previsão de 10 000 contos que é perfeitamente insuficiente para concretizar as obras de instalação de que carece com uma premência enorme a Brigada Fiscal da GNR do Funchal.
Agora, ao contrário, verifica-se que há estas descidas, este deslizar de verbas. No PIDDAC de 2000 previam-se verbas para 2001 e agora usa-se o esquema de continuar a deslizar para 2002, continuando a inscrever-se verbas de 1000, 10 000, 5000 contos, etc.
Por outro lado, indo à mesma área em relação aos Açores, vêem-se valores altamente elevados para estruturas semelhantes. Tenho uma leitura sobre isto: há realmente uma diferença global no PIDDAC de cerca de 4 milhões de contos a mais para os Açores e eu estou a pensar que há qualquer mão no Governo que, porventura, fez diluir esta situação e a responsabilidade desta situação para os Ministros independentes, para sacudir um pouco "a água do capote". V. Ex.ª é capaz de ter sido aqui levado a esta discriminação, pois, por aquilo que conheço da sua personalidade, sei que não aceitaria se não tivesse sido efectivamente enganado. E é também aqui que se encontra uma das fatias relevantes para essa diferença intolerável, para essa discriminação inadmissível entre o PIDDAC global para a Região Autónoma da Madeira e para a Região Autónoma dos Açores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, congratulando-me com a atribuição da dotação de 214 milhões de contos para a segurança dos cidadãos, porque a segurança é uma dimensão da liberdade e do Estado de direito, queria perguntar, concretamente, ao Sr. Ministro o seguinte: quais são as grandes apostas do Ministério no que diz respeito ao combate às redes de imigração ilegal e de exploração de mão-de-obra imigrante, e se entende que há uma tradução satisfatória no orçamento para a implementação de medidas nesta área. Vejo que há algumas medidas e vou citar só duas: há um novo sistema de emissão automatizada de autorizações de residência, há um incremento da celeridade de tratamento administrativo dos processos pendentes nos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras, que é um problema real que os cidadãos estrangeiros sentem no seu dia-a-dia, e era a esta área que eu queria que o Sr. Ministro se referisse.
Por último, Sr. Ministro, não resisto a dar-lhe os parabéns: o Sr. Ministro tomou posse do cargo há mais de 60 dias e ainda não foi alvo de nenhuma campanha! É obra!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Menezes Rodrigues.

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O Sr. Menezes Rodrigues (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado: Efectivamente, as alterações profundas dos comportamentos da nossa sociedade obrigam, seguramente, à mobilização de recursos importantes para a segurança dos cidadãos. A propósito disso mesmo, há uma freguesia que me merece particular preocupação, a freguesia de Camarate, no concelho de Loures, que tem 30 000 habitantes, com uma população residente de diferentes origens, muita dela em vias de integração e de inserção na nossa comunidade, que tem um terreno disponibilizado há mais de 10 anos, com projecto feito, e onde só falta fazer o quartel da PSP. Gostaria de saber se o Sr. Ministro também coloca esta esquadra, que me parece de grande relevância, nas suas prioridades.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr.ª Presidente, começaria pela primeira questão que me foi colocada, relativamente às auto-estradas e à circulação dos animais nas auto-estradas.
Naturalmente que as polícias, e, em particular, neste caso, a Brigada de Trânsito da GNR, podem, devem e estão a fazer uma fiscalização sobre isso, mas, relativamente a esta matéria, como é óbvio, isso é de uma aleatoriedade total e se alguém terá de ocupar-se desta matéria penso eu que serão os tribunais e não propriamente a GNR e a PSP.
Em relação à Esquadra de Caldas das Rainha, tomei boa nota do que me disse. É a primeira vez que oiço falar disso, tal como da questão dos bombeiros. Tomarei boa nota do que me está a dizer e irei ver o que se passa com essas situações.
Relativamente à questão da sinistralidade rodoviária e dos chamados "pontos negros", os pontos perigosos, naturalmente que não é ao Ministério da Administração Interna, em primeiro lugar, que isso cabe, há todo um conjunto de entidades que intervêm nessa matéria e entre elas uma, que referiu, a Associação Portuguesa de Seguros, que tem presença institucional no Conselho de Segurança Interna e, nessa sede, tem feito exprimir as suas opiniões e os seus interesses.
Quanto às questões que me coloca o Sr. Deputado Guilherme Silva, gostaria que ficasse claro que, do meu ponto de vista, não há nenhum favorecimento em relação a nenhuma região do País. Portanto, esse assunto, para mim, não tem qualquer fundamento, no que diz respeito aos critérios que pareceu considerar discriminatórios.
Já agora, se o Sr. Deputado me permite, julgo que o Comando do Funchal não pode queixar-se, e ainda bem, quanto a quartel mais caro, melhor e mais bem equipado, enquanto obra! Neste caso, é uma discriminação positiva!
Relativamente às polícias municipais, isso é algo que tem a ver com os contratos-programa e com a sua negociação: os que estão feitos e estão a ser executados, estão nessa base e é nessa base que, este ano, iremos trabalhar.
Quanto às autarquias, o que me parece que tem acontecido é que a forma como têm sido postas as coisas, a celeridade do processo, levou a que algumas autarquias não tivessem imediatamente capacidade de resposta; mas há já neste momento várias candidaturas, julgo que são 28, se a memória me não falha, pelo que o processo poderá continuar.
Quanto à questão da Lei da Investigação Criminal, é de facto uma questão importante porque, tal como o Sr. Deputado disse, e muito bem, traz para a área da PSP e da GNR competências que não tinham, numa área que absolutamente fundamental como é a do combate à sinistralidade.
Sobre isso, gostava de dizer ao Sr. Deputado, com muita clareza, que reuniu já, se a memória me não falha, por três vezes o Conselho Coordenador de Organização de Investigação Criminal, que decorre dessa lei, e os trabalhos têm sido muito céleres. Há três áreas que têm sido privilegiadas e parecem-me ser três áreas fundamentais: em primeiro lugar, a constituição de um sistema integrado de informação criminal, coisa que não é fácil, como o Sr. Deputado sabe tão bem ou melhor do que eu, e neste momento a situação é de relativo avanço no que diz respeito a um consenso sobre a fórmula técnica que isso deverá ter e neste momento está-se a trabalhar simultaneamente na possibilidade da compatibilização técnica dos sistemas e na forma de co-gestão desses sistemas entre as várias forças.
Em segundo lugar, já foi criado, e está apresentado ao Conselho, um plano de cooperação operacional no sentido de poder coordenar as várias forças.
Finalmente, em relação à questão concreta que o Sr. Deputado me colocava, o calendário de transição das competências entre a PSP e a Polícia Judiciária está traçado e acordado. Como sabe, ele referia-se a Lisboa, Porto, Setúbal e Faro, porque envolvia meios e, sobretudo, formação que exige algum tempo; esse calendário foi acordado entre as forças e posso dizer-lhe, neste momento, que, até Junho do ano 2001, essa transição será feita nas cidades de Setúbal e de Faro, e até Dezembro de 2001, essa transição será feita em Lisboa e no Porto, cobrindo, portanto, todo o território.
A questão que é colocada pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia, relativamente ao SEF, é indiscutivelmente uma questão de extraordinária importância. Esta área do SEF tem, neste momento, uma incidência particular porque há nova lei orgânica, e essa nova lei orgânica está orientada para novas tarefas que decorrem da lei de estrangeiros, chamada assim vulgarmente.
Em termos fundamentais, o que é que esta lei traz de acréscimo em relação àquilo que eram as competências tradicionais do SEF? Primeiro, há uma fórmula de agilização dos processos relativamente aos requerimentos dos vistos. Segundo, há, relativamente a uma questão fundamental, que era a dos estrangeiros que tinham entrado sem visto em Portugal mas que permaneciam em território nacional, a criação de uma figura, que é a da autorização de permanência, que permite regularizar a sua situação desde que preencham um conjunto de condições, que têm a ver com a sua situação criminal, de residência, etc., e que passam pela existência de um contrato de trabalho.
Foram acauteladas algumas situações de natureza humanitária relativamente a essa lei, nomeadamente no que diz respeito ao agrupamento de famílias e deve dizer-se também que esta lei tem uma outra componente, que é tão ou mais importante do que esta, e nisso tem influência sobre o SEF, que é a do combate à angariação de mão-de-obra ilegal, ou seja, redes de tráfico de mão-de-obra ilegal, e combate também ao emprego de mão-de-obra ilegal, com moldura penal para a angariação e com moldura contra-ordenacional, com coimas que vão, de acordo com critérios que têm a ver com a dimensão das empresas, entre outros, desde 300 contos até 4900 contos.

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O SEF tem, portanto, uma tarefa muito importante, neste momento, e a esta tarefa tem de ser dada resposta pela nova lei orgânica que entrou agora em vigor. Ora, o aumento de quase 14% da dotação orçamental do SEF destina-se a fazer face a estas situações.
Finalmente, quanto à última questão colocada pelo Sr. Deputado Menezes Rodrigues, quero dizer-lhe que Camarate corresponde àqueles critérios que enunciei, no que diz respeito às prioridades das esquadras.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, é que o Sr. Ministro esqueceu-se de uma questão.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, estando feitos os cálculos globais para os subsídios de turno e de piquete, o Sr. Ministro não respondeu à pergunta sobre qual é o valor desses subsídios individualmente considerados.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, em primeiro lugar, ninguém tem informação que não venha aqui a esta Câmara.
Agora, relativamente aos montantes, eles, neste momento, ainda não estão determinados.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Como é que é possível?!

O Orador: - Isso foi o que já expliquei ao Sr. Deputado Telmo Correia. Essa regulamentação está a ser feita, terá de ser negociada, terá de ser acordada com a direcção da PSP e, naturalmente, terão de ser ouvidas as associações. Portanto, logo que haja essa informação, disponho-me, desde já, a transmitir-lha com toda a clareza.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim da discussão do orçamento do Ministério da Administração Interna. Agradeço-lhes, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, a vossa presença.
Srs. Deputados, interrompemos, agora, os nossos trabalhos, que serão retomados às 21 horas e 30 minutos. Mais uma vez, solicito a todas as bancadas parlamentares que entreguem as propostas de alteração ao Orçamento até amanhã.
Srs. Deputados, está suspensa a reunião.

Eram 19 horas e 45 minutos.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos reiniciar a reunião.

Eram 22 horas.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão do orçamento do Ministério da Justiça.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (António Costa): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito sinteticamente, quero chamar a atenção para as principais áreas de investimento no orçamento do Ministério da Justiça, que é um orçamento que, relativamente à dotação inicial de 2000, apresenta uma variação de 15,5%.
É um orçamento que mantém, no essencial, o perfil do que vinha do ano anterior, ou seja, um fortíssimo investimento ainda na área dos serviços prisionais, que continua a preencher praticamente metade do PIDDAC do Ministério da Justiça, tendo sido possível manter também o nível de investimento na Polícia Judiciária, estabilizado na casa dos 3 milhões de contos, sendo que, mantendo o plafond de investimento na Polícia Judiciária, vai ser já possível diversificar as áreas de investimento, visto que, como se recordam, no ano passado, dos 3,1 milhões de contos afectos à Polícia Judiciária, mais de metade estava afecto à obra da directoria do Porto, que, este ano, já tem uma verba bastante reduzida, porque já está em funcionamento.
Há também uma verba que cresce de um modo significativo, que diz respeito, no orçamento da Secretaria-Geral do Ministério, às obras relativas a tribunais, e, depois, há um crescimento muito grande no que diz respeito à informatização, não só dos tribunais mas também do sistema de registos e notariado, que, tendo tido um crescimento, de 1999 para 2000, de 2,8 milhões de contos para 5,2 milhões de contos, tem agora uma nova subida para 7 milhões de contos.
Por fim, chamo também a atenção para o crescimento do investimento em dois subsistemas importantes, um, o da medicina legal, mas, sobretudo, o do Instituto de Reinserção Social, com dotações compatíveis com a entrada em vigor, no dia 1 de Janeiro, da nova Lei Tutelar Educativa.
No que diz respeito ao PIDDAC, o aumento de investimento do Instituto de Reinserção Social é de 118%, o que é, de facto, um crescimento muito significativo, não obstante os montantes, em termos absolutos, de investimento no Instituto ainda não terem atingido os números que entendemos necessários para qualificar o sistema do Instituto de Reinserção Social.
Como introdução, diria apenas isto.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Ministro e a sua equipa e dizer que os meus camaradas responsáveis por esta área, devido à mudança do debate do orçamento deste Ministério de ontem para hoje, não podem, de todo em todo, cá estar. Porém, há duas questões que gostaria de colocar.
A primeira tem a ver exactamente com um dos aspectos referidos pelo Sr. Ministro, que é a manutenção do "plafonamento" do investimento na Polícia Judiciária. Reconhecendo que o Ministério da Justiça é, este ano, um dos ministérios privilegiados no orçamento e na boa vontade do Sr. Ministro das Finanças,…

O Sr. Ministro da Justiça: - Não exagere!

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O Orador: - … quero colocar-lhe uma questão relativa à Polícia Judiciária, área essa onde, porventura, esse privilégio não se faz sentir.
Todos sabemos que há um enorme défice de pessoal e de recursos humanos na Polícia Judiciária, o que está a provocar sérios atrasos na investigação criminal, designadamente em grandes processos, na realização de perícias, etc., e pode levar à prescrição de muitos processos importantes. Porém, não vemos, no orçamento, as medidas financeiras suficientes, que permitam alavancar uma política que, pelo menos, a curto ou médio prazo, conduza a um reforço substancial dos meios humanos, em particular, para dar resposta a esta questão. Gostava, pois, de ouvir o Sr. Ministro sobre este aspecto.
A segundo questão é de ordem regional e, no ano passado, já a coloquei ao Sr. Ministro. O Sr. Ministro referiu que tem uma verba substancial na Secretaria-Geral do Ministério para tribunais, mas a verdade é que, no que toca ao meu círculo eleitoral, que é Évora, a questão do novo tribunal continua parada. E tenho para mim a convicção de que as rendas que o seu Ministério está a pagar pelo aluguer das várias instalações onde os vários tribunais estão a funcionar, em condições que não são obviamente as melhores, bem pelo contrário, já permitiriam resolver o arranque da construção de um novo tribunal.
Penso que, do ponto de vista da racionalização dos gastos e da criação de condições dignas para o funcionamento dos tribunais em Évora, se justifica, cada vez mais, que o Ministério tome a decisão de avançar com as medidas necessárias que permitam viabilizar a construção do novo tribunal. Até porque há uma questão adicional ao funcionamento da máquina judicial: é que o próprio funcionamento dos tribunais em pleno centro histórico está a provocar problemas urbanísticos complicados, que não são menores e, embora esta seja uma questão lateral, é uma questão que, para a cidade, tem relevância.
São estas as duas questões que lhe coloco, Sr. Ministro.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, peço que, depois, o Sr. Secretário de Estado Adjunto complete a resposta relativamente a Évora.
Quanto à questão sobre a Polícia Judiciária, Sr. Deputado Lino de Carvalho, é verdade que a Polícia Judiciária tem muitas vagas no quadro. Houve, quer em 1999, quer em 2000, descongelamentos importantes, que se cifraram no nível máximo da capacidade de formação do próprio Instituto de Ciências Criminais e, em 2001, voltaremos a ter um descongelamento que atinge a capacidade máxima de formação do Instituto. Aliás, estão inscritas verbas em PIDDAC que visam, designadamente, alargar a capacidade de formação do Instituto.
De qualquer modo, como sabe, foi publicada ontem a nova Lei Orgânica da Polícia Judiciária, que há mais de 10 anos se aguardava e que contém um programa importante de revalorização das diferentes carreiras e de reestruturação orgânica da Polícia Judiciária, com alguns aspectos que são naturalmente impopulares, mas que derivam da Lei de Organização da Investigação Criminal, da nova repartição de competências entre a Polícia Judiciária, a PSP e a GNR, permitindo, portanto, uma gestão mais eficaz dos recursos humanos que existem, de forma a aumentar a capacidade de resposta da Polícia Judiciária.
Tem sido, felizmente, possível, dentro das limitações existentes na Polícia Judiciária, obter medidas de gestão que traduziram ganhos de eficácia. Recorde-se que, há um ano, um dos problemas muito graves com que estávamos confrontados era o do nível excessivo de pendências acumuladas no Laboratório de Polícia Científica - em Janeiro deste ano, estavam 21 000 processos, entre Lisboa e Porto, pendentes de exame no Laboratório de Polícia Científica. Ora, com o conjunto de medidas de gestão que foi possível à Direcção da Polícia Judiciária implementar, temos, neste momento, o número de pendências já reduzido de 21 000 para 11 000. É evidente que não chegámos ainda ao paraíso, admitindo que, algum dia, alguém possa chegar ao paraíso, mas há um caminho que está a ser percorrido e que terá de continuar a sê-lo, relativamente à Polícia Judiciária.
Agora, o desenvolvimento dos meios tecnológicos na Polícia Judiciária é um investimento essencial, porque, hoje, o trabalho de uma polícia, como a Polícia Judiciária, requer uma grande capacidade laboratorial, um bom sistema integrado de informações, um bom sistema automatizado de impressões digitais e um bom sistema de telecomunicações, pelo que esse investimento é crucial para aumentar a capacidade de resposta da Polícia Judiciária, que, admitamos, tem dado motivos de orgulho ao País e que não creio tenha contribuído para os problemas que referiu quanto ao atraso no andamento de processos.
Relativamente à questão sobre Évora, antes de o Sr. Secretário de Estado lhe responder mais concretamente, quero dizer-lhe o seguinte: devemos ter a noção de que, dos 1,7 milhões de processos existentes nos tribunais portugueses, 80% estão em Lisboa, no Porto e em mais 11 comarcas à volta de Lisboa e do Porto - estes 80% não são sequer do conjunto das duas áreas metropolitanas. Portanto, quando se fala da chamada "crise da justiça", devemos ter a noção de onde essa crise da justiça se situa.
Não discuto a necessidade de intervenções e de investimentos em várias zonas do País, onde a justiça tem de estar, porque a justiça deve estar próxima dos cidadãos, mas devemos ter a noção de que, nesta fase, tem de haver um critério de investimento muito selectivo, concentrando os investimentos nas zonas que efectivamente constituem factores de bloqueio efectivo ao funcionamento do sistema de justiça. E, infelizmente, tenho verificado que, em termos de instalações, Lisboa e Porto são duas das comarcas mais desfavorecidas do País. Isto é objectivamente verdade! Indo aos tribunais de Lisboa ou aos do Porto, vê-se as péssimas condições em que as pessoas que lá trabalham prestam o seu serviço. Ora, penso que não podemos deixar de ter a noção deste estado de coisas na selecção que fazemos dos investimentos.

A Sr.ª Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, para completar a resposta.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Eduardo Cabrita): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, completando, relativamente a Évora, a informação dada pelo Sr. Ministro, direi que Évora, não constituindo, no quadro da pendência acumulada, uma comarca numa situação particularmente grave - e, isto, segundo dados correspondentes já ao final de Setembro, isto é, após os processos entrados, no final das férias judiciais -, Évora, dizia, mantém uma tendência de

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significativa recuperação, até da pendência acumulada, mesmo apenas com os dois juízos cíveis a funcionar. Como sabe, há um terceiro juízo cível, previsto e criado por lei, mas não instalado, e, mesmo assim, temos, este ano, um número de cerca de 500 processos findos, até Setembro, superior ao daqueles que entraram, o que significa que não só não há uma situação grave de pendência como há até uma tendência de recuperação com os meios actuais.
O arrendamento a que se referiu tem fundamentalmente a ver, julgo, com o local em que foi instalado, em 1999, o DIAP. Julgo que é fundamentalmente a essa instalação que se refere. De qualquer modo, está o Ministério da Justiça em condições de, no ano de 2001, logo que definido o terreno, proceder à abertura imediata do concurso para o projecto de construção do novo tribunal de Évora.
Diria que, aqui, a consciência daquilo que é uma prioridade local - e reafirmo, agora, a disponibilidade que afirmei, há um ano, numa reunião deste tipo que aqui tivemos, isto é, temos condições, temos definida a área bruta de construção necessária - deve ser considerada quer pelo Governo quer pelas autoridades locais.
E é isto o que fazemos relativamente à generalidade das autarquias do País, que mobilizam meios e manifestam o seu empenho, designadamente disponibilizando terrenos para a instalação dos tribunais. Por isso, está, neste momento, em fase final de selecção, entre as 17 empresas concorrentes, a adjudicação do tribunal de Almada, com base em terreno cedido pela câmara municipal; por isso, foi já possível definir o terreno do novo tribunal de Palmela, um terreno cedido pela câmara municipal, e, relativamente a Évora, não tem havido disponibilidade da câmara municipal para a cedência de terreno. Aquilo que tem sido afirmado é a indicação de terrenos, aliás, considerados como tecnicamente não desejáveis,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Fora do centro histórico!

O Orador: - … e, de qualquer modo, sempre com a indicação de que é para aquisição e não para cedência para a construção do tribunal.
Portanto, há aqui um equilíbrio de prioridades. Não há uma situação de pendência grave; há, de qualquer modo, disponibilidade, chegando-se a entendimento sobre o terreno, para lançar o projecto do novo tribunal de Évora.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, dentro de uma política de ressocialização do delinquente, tem vindo o Ministério da Justiça - em meu entender, bem e de forma correcta - a implementar medidas, a montante e a jusante, que possam fazer um enquadramento de recuperação do delinquente, de forma a que ele seja ressocializado.
Julgo que o homem tem uma componente humana multifacetada e, muitas vezes, é necessário relevar a sua componente de recuperação para a sociedade. Assim, o PIDDAC financeiro releva aqui uma verba de 960 000 000$, quase 1 milhão de contos, para o Instituto de Reinserção Social. Está, pois, em curso a reforma do sistema de reinserção social, em que se prevê a afectação de 1,2 milhões de contos para a implementação de um novo regime tutelar educativo para menores, no âmbito do programa de prevenção da delinquência juvenil. Gostaria que o Sr. Ministro nos fizesse uma referência, por mais sucinta que seja, às medidas que foram ou vão ser tomadas nesta reforma do sistema de reinserção social.
Também na cobertura financeira do PIDDAC para o Ministério da Justiça atinge um relevo essencial a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais. De que forma é que estes 12,6 milhões de contos vão ser afectos? Ou seja, que medidas o Ministério prevê para consubstanciar, em termos de execução orçamental, no âmbito do PIDDAC para o Ministério da Justiça, esta verba canalizada e prevista no orçamento para a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais?
Outra verba que gostaria de ver esclarecida tem a ver com a Direcção-Geral da Administração Extra-Judicial. O Sr. Ministro tem-se preocupado - e tem-no feito de uma forma entusiástica e competente - em criar meios extrajudiciais de prevenção e de composição de conflitos e para isso foi criada a Direcção-Geral da Administração Extra-Judicial. Gostaria também que o Sr. Ministro nos desse alguns elementos que pudessem levar-nos a concluir que esta direcção-geral já está a dar, ou irá dar, os seus frutos, de forma a combater-se a morosidade processual.
Finalmente, quero registar com agrado a existência de um Programa Integrado de Modernização e de Informatização dos Registos e Notariado, que acarretará um custo de 2 milhões de contos, e a este respeito gostaria de ouvir do Sr. Ministro um balanço do que já foi feito, ou do que está a ser feito, no âmbito deste programa.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, depois, peço ao Sr. Secretário de Estado da Justiça que me ajude a complementar as duas últimas respostas.
Relativamente ao Instituto de Reinserção Social, anunciámos, no debate do Programa do Governo, que gostaríamos de conseguir fazer com esse instituto, nesta Legislatura, um esforço semelhante ao que foi possível realizar já na legislatura anterior com os serviços prisionais. E consideramos que seria bom, agora que a situação nos serviços prisionais começa a estar mais controlada - dos 57% que tínhamos de sobrelotação temos oscilado, ao longo deste ano, entre os 13 e os 16%, sendo que agora estamos nos 16% -, começar a investir também no futuro e a intervir no tratamento destes jovens de forma a prevenir que, no futuro, eles se tornem "clientes" dos serviços prisionais.
Foi possível, num trabalho intenso com o Ministério do Trabalho e da Solidariedade, chegar a acordo para o início da vigência da Lei Tutelar Educativa já no próximo dia 1 de Janeiro, passando, portanto, para o Ministério do Trabalho e da Solidariedade um conjunto de equipamentos, que vão acolher os jovens e as crianças em risco, que estavam a cargo do IRS e que passarão a estar a cargo deste Ministério, podendo o IRS concentrar os seus esforços nos colégios que passarão a estar em regime fechado, semifechado ou semi-aberto.
Neste momento, estão já a decorrer obras de forma a que, no início do ano, um conjunto de colégios possa ter condições para acolhimento em regime fechado, sendo nossa intenção que mais dois colégios possam acolher crianças em regime fechado até ao final do ano.
Por outro lado, na reforma da Lei Orgânica do Ministério da Justiça, houve uma clarificação das funções

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do IRS e dos serviços prisionais, de modo que o trabalho de reinserção social dentro do sistema prisional deixa de ser exercido pelo IRS e passa a ser exercido pela Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, o que é uma forma de o IRS passar a ter maior capacidade de trabalho na função específica que lhe está consagrada.
Foi ainda possível proceder já ao descongelamento - aliás, está em fase de conclusão o concurso - para a contratação de 275 técnicos e monitores para o Instituto de Reinserção Social. E estamos a falar 275 novas pessoas que irão começar a trabalhar num serviço que dispõe de 700 técnicos e monitores. Portanto, trata-se de um reforço muito significativo, que vai ser possível concluir até ao final do ano, de modo a que no dia 1 de Janeiro tudo possa arrancar, não digo bem mas, pelo menos, com condições mínimas de sucesso no desenvolvimento deste programa.
Quanto aos serviços prisionais, no essencial, o que temos no PIDDAC deste ano é a continuação das grandes obras que foram lançadas no ano passado e, por outro lado, a prossecução do programa de recuperação dos diferentes estabelecimentos prisionais.
Como terão visto, ontem o Sr. Primeiro-Ministro teve a oportunidade de inaugurar a Casa das Mães, em Tires, uma nova unidade que criou mais 70 lugares no Estabelecimento Prisional de Tires exclusivamente dedicados a reclusas que têm junto de si filhos com menos de 3 anos. Muito brevemente, no princípio do próximo ano, será inaugurada a Casa da Criança, para acolhimento, extramuros, das crianças com mais de 3 anos que, nos termos da lei, já não podem estar dentro do estabelecimento prisional.
Infelizmente, uma das realidades que temos hoje no sistema prisional é a de as reclusas não terem a quem confiar os filhos fora do sistema prisional. Muitas vezes - e isso não é raro, sobretudo nas zonas metropolitanas - há famílias inteiras reclusas por associação a crimes de tráfico de droga e, portanto, não podemos pôr as crianças, pura e simplesmente, na rua, nem podemos tê-las dentro da prisão, pois isso violaria a lei e seria, obviamente, desumanizador.
Assim, num programa conjunto com a Câmara Municipal de Cascais e com uma instituição particular de solidariedade social, a Associação Champagnard, foi possível criar uma casa junto ao estabelecimento prisional, mas fora dele, para acolher as crianças com mais de 3 anos que não tenham condições para estar longe dos pais e num ambiente familiar normal.
Relativamente à Direcção-Geral da Administração Extra-Judicial e aos Registos e Notariados diria duas coisas breves, pedindo ao Sr. Secretário de Estado que completasse.
A Direcção-Geral da Administração Extra-Judicial não se destina a ser um organismo pesado, que se caracterize por um grande dispêndio de dinheiro. O que nós pretendemos é uma nova direcção-geral que seja ágil, leve, que funcione essencialmente como um organismo que estimule o desenvolvimento de meios alternativos em regime de parceria. Portanto, a dotação orçamental que lhe é atribuída, de cerca de 300 000 contos, destina-se, basicamente, a permitir iniciar as suas funções, a começar a desenvolver o seu trabalho de parceria junto da sociedade civil.
Relativamente ao Programa de Informatização dos Registos e Notariado, estabelecemos como meta para a conclusão do processo de informatização integral o dia 31 de Dezembro de 2002. Ao longo deste ano, foi elaborado um conjunto de trabalhos importantes, tais como os trabalhos de auditoria de sistemas, realizados pela Price Waterhouse Coopers e pela Andersen Consulting, uma aos registos e outra ao sistema de notariado, e a definição dos programas, tendo sido calendarizado e orçamentado o programa de informatização quer do sistema de registos quer do sistema de notariado, que está a ser já executado pela Direcção-Geral dos Registos e Notariados e pelo Instituto das Tecnologias da Informação na Justiça.
Aliás - e esta é uma componente importante -, há candidatura a verbas comunitárias para financiamento deste programa, que, creio eu, tem 2 milhões de contos inscritos este ano mas que orça, na sua totalidade, em cerca de 7 milhões de contos, nos exercícios de 2001 e 2002.
O Sr. Secretário de Estado da Justiça, que tutela a DGAEJ e o instituto da Direcção-Geral dos Registos e Notariados poderá, se a Sr.ª Presidente o permitir, completar a informação.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça (Diogo Machado): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Completando diria que, quanto aos registos e notariado, o chamado primeiro pacote de reforma do notariado, que entrou em vigor no dia 1 de Maio passado, teve como significado imediato fazer desaparecer do sistema 1/4 do número total de actos notarias praticados no ano de 1999, que corresponde, essencialmente, a esse universo imenso de 2,3 milhões de fotocópias certificadas, que simplesmente foram inutilizadas e cujo resultado útil tem sido surpreendentemente positivo.
Até Agosto, as indicações que tínhamos no sistema eram as de que já tinham desaparecido efectivamente, até então, no decurso de um par de meses, 1,35 milhões de fotocópias, por comparação com os mesmos meses do ano anterior, o que significa a crescente consciência, por parte dos cidadãos, da desnecessidade desse exercício burocrático para instrução de procedimentos administrativos.
Aliás, os números que vamos conhecendo mostram não só o sucesso da iniciativa mas também que, ao contrário do que alguns profetas da desgraça então anunciavam, o caos, a insegurança e a incerteza, devem, no limite, ter sido citados por carta registada com aviso de recepção, porque ainda não apareceram.
Com esse pacote do notariado, que teve, além do mais - dizemos nós -, a virtude de ser um sinal de que a mudança estava a chegar e era possível, significou também que, ao mesmo tempo, fomos fazendo, por assim dizer, um trabalho de casa não imediatamente visível, procurando que, no final de Outubro passado, pudéssemos dispor de um conjunto de vários outros instrumentos naquilo que é a verdadeira reforma dos registos e notariado.
O Sr. Ministro referiu as duas auditorias aos sistemas, à gestão e aos procedimentos, que vão servir, além do mais, para a fase de análise funcional no trabalho de arquitectura, concepção, realização, produção, instalação, desenvolvimento, actualização e assistência técnica dos programas informativos - são sete - que vão animar a rede informática do Ministério da Justiça, a que vão estar ligados todos os cartórios notariais e todas as conservatórias de registo até 31 de Dezembro de 2002.
Além do mais, é preciso também investir na formação dos oficiais de registo e notariado, dos Srs. Conservadores e dos Srs. Notários e garantir que, tal como hoje já sucede nos novos tribunais e começa a suceder nos tribunais onde

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a informatização está a chegar, cada posto de trabalho já se conceba dotado de um terminal de computador, de uma impressora e da consequente ligação à rede informática do Ministério da Justiça.
No final de Outubro, passámos também a dispor daquilo a que chamaríamos o plano de expansão da rede de cartórios notariais e do plano de reinstalação do conjunto dos serviços do registo e notariado, porque, além do mais, mudar tudo isto também há-de significar mudar as condições de trabalho das pessoas e as condições de acolhimento dos cidadãos nesses serviços públicos, que, entendemos nós, ainda têm de continuar a ser olhados como tal. Estimamos que em 2003 eles estejam completamente reconfigurados, de tal modo que a lógica de instrução dos actos notarias e a lógica de instrução dos actos de registo, que hoje impendem como um ónus sobre os cidadãos e as empresas, passará, nessa altura, a impender exclusivamente sobre a própria Administração Pública, o que quer dizer que quem quiser praticar um acto notarial, por via da compaginação dos sete programas de informatização, vai poder simplesmente apresentar-se perante o oficial público competente e dizer que pretende praticar esse acto, pelo ele fará o favor e cumprirá a obrigação de recolher, por via informática e pela ligação em rede, o conjunto de informações que, como sabem, hoje impendem como obrigação o cidadão recolher previa e preambularmente à prática de um acto notarial.
É sobretudo isso o que justifica que se pense num investimento global da ordem dos 7 milhões de contos. Poderá ser um pouco mais, poderá talvez ser um pouco menos, mas o que há é a garantia de que este dinheiro existirá. E digo que poderá ser um pouco menos porque a parcela importante corresponde à chamada rede informática e admitimos nós que seja possível, entretanto, dispor de soluções tecnologicamente mais avançadas, sem fios - só para não usar a expressão original inglesa wireless -, e de, portanto, por aí haver uma economia efectiva nesse investimento global.
Portanto, a ideia é a de, dado o sinal de mudança, mostrada a sua realidade, feito o trabalho de casa, começar, como começou em Novembro, um período de 26 meses de investimento nos registos e notariado, que corresponderá, dizemos nós, a recuperar em 26 meses o que em 26 anos, provavelmente, se deixou por fazer, porque, de 1974 para cá, a realidade subjacente mudou radicalmente. Aparecemos todos como cidadãos, depois aparecemos como agentes económicos e os registos e notariado, concordarão, essencialmente, não mudaram quase nada.
No que à Direcção-Geral da Administração Extra-Judicial se refere, completando o que o Sr. Ministro da Justiça avançou, ela tem como atribuições o acesso ao direito, ou seja, aquilo que amanhã mesmo, aqui, na Assembleia - correspondendo a uma iniciativa do Partido Comunista -, começará também a tomar a nossa atenção e que é a criação dos julgados de paz, o que, achamos nós, deve ser olhado como uma câmara parajudiciária, não necessariamente como a nova primeira instância que simplesmente estimule maior procura judiciária mas como uma oferta judiciária diferente, com outra natureza, que queira dizer acessibilidade, economia, celeridade e, se calhar, justiça participada, e também os chamados meios alternativos de prevenção e de justa composição dos litígios.
Isto significa que a Direcção-Geral da Administração Extra-Judicial está concebida para permitir ao Ministério da Justiça uma fórmula para ensaiar uma intervenção a montante do sistema tradicional; isto significa que, além do mais, é um instrumento orgânico que poderá, porventura, permitir uma intervenção diversificadora sobre a procura da tutela judiciária; isto significa que o Ministério da Justiça procura, por esta via, começar a não actuar apenas reactivamente mas actuar mais perto da origem dos litígios e com vantagens para todos os que neles, porventura, estejam envolvidos, podendo justacompô-los, designadamente com recurso à equidade por contraposição com a lógica de aplicação da lei positiva, que o sistema tradicional significa.
Uma outra função primordial da Direcção-Geral da Administração Extra-Judicial é a do acesso ao direito, na sua tripla vertente, que corresponde ao desenho do n.º 2 do artigo 20.º da Constituição e que é o de garantir que há informação jurídica, consulta jurídica e patrocínio judiciário já dentro dos tribunais.
Desse ponto de vista, há uma dotação em PIDDAC de 50 000 contos, da qual uma parcela substancial corresponde ao início da construção de um centro de informações aos cidadãos, a que estes poderão - admitimos nós -, a prazo, aceder, por via telefónica ou através das ligações modernas que o arsenal tecnológico de hoje permite, e saber, por exemplo, o que é que têm de fazer para alcançar o patrocínio judiciário se não tiverem capacidade económica para custear a lide.
Desse ponto de vista, ontem, o Sr. Ministro da Justiça foi, informalmente, avançando aos grupos parlamentares aquilo que corresponde à proposta de lei, que está em ultimação no processo legislativo dentro do Governo, sobre a requalificação e dignificação do apoio judiciário. É o resultado de um trabalho de empenhada negociação e de esforço comum com a Ordem dos Advogados e com a Câmara dos Solicitadores, para, diríamos nós, se gastamos muito dinheiro, pelo menos gastar melhor o dinheiro que até agora vínhamos gastando, isto é, de uma vez por todas termina-se com a ligação necessária entre a formação dos advogados e o patrocínio oficioso, garantindo que por via do suprimento da necessidade económica dos cidadãos não se lhes faz a assistência técnica em tribunal por advogados estagiários - que fora do contexto do patrocínio judiciário não teriam, normalmente, competência para essas causas - e que este passa a ser assegurado por advogados titulados.
Portanto, esta corresponde a outra competência essencial da Direcção-Geral da Administração Extra-Judicial e é tudo isto que justifica que ela tenha de orçamento 300 000 contos, algo mais do que o conjunto dos outros novos pequenos serviços que resultam da reforma orgânica do Ministério da Justiça.
Lembraria, a propósito do apoio judiciário, que quando dizemos que é preciso gastar melhor pelo menos o mesmo, estamos a falar de quantias da ordem dos 3,5 milhões de contos, que é quanto vimos gastando, e vínhamos todos gastando colectivamente, muitas vezes para aquela ficção de se levantar um estagiário, pedir justiça e limitar-se a oferecer o mérito dos autos, garantindo, por essa via, que a nossa consciência, se calhar menos bem, ficava consolada com essa espécie de irónica ficção de que se lhes dava condições de igualdade perante os tribunais.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado António Pires de Lima.

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O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado: Aconteceu à bancada do CDS-PP um pouco aquilo que aconteceu também à bancada do Partido Comunista, ou seja, fomos driblados com essas movimentações do Sr. Ministro,…

O Sr. Ministro da Justiça: - Essa agora!… Eu estive cá ontem!…

O Orador: - …e apesar de manifestamente não ser um especialista na área da Justiça - é caso para se dizer que é "filho de peixe mas não sabe nadar" -, vou tentar fazer eco de algumas das preocupações que me foram transmitidas pelos meus colegas relativamente ao Orçamento e àquilo que está previsto serem as prioridades na área da justiça.
Uma das nossas preocupação, para a qual gostaríamos de ter alguma clarificação ou esclarecimento por parte do Sr. Ministro ou do Sr. Secretário de Estado, tem a ver com o ritmo de informatização dos serviços, nomeadamente dos tribunais e dos serviços prisionais.
Há um esforço - reconhecido - por parte do Governo, nos últimos tempos, de trabalhar no sentido de informatizar os serviços de justiça. Nós estamos perfeitamente de acordo com esta necessidade, mas ficamos na dúvida relativamente ao objectivo prático, concreto, para o ano 2001, ou seja, com este esforço que tem vindo a acumular-se e que está previsto no Orçamento do Estado para 2001, o que é que se atingirá, no final do ano 2001, no que respeita não só à informatização dos tribunais e das secretarias mas também a outros métodos, tais como a gravação de audiências. Em que benefícios práticos irá reflectir-se todo o investimento que está a ser proposto pelo Ministério de Justiça e que se vem acumulando ao longo dos anos?
Outra dúvida que temos relativamente à informatização tem a ver com o sistema prisional. Nós vemos alguma contradição entre os números apresentados no Orçamento e no PIDDAC, nomeadamente para o sistema de informatização prisional, conhecido por SIP, salvo erro, e o que foi apontado há dois anos, em 1998, pelo anterior Ministro da Justiça, Dr. José Vera Jardim, que, na altura, referia ser seu objectivo, até ao final do ano 2000, ter o SIP a funcionar, o que permitiria, entre outras coisas, a introdução do cartão do recluso, a possibilidade de utilização de porta-moedas multibanco e o acesso a serviços telefónicos. E isto, segundo as palavras do ministro da altura, implicava num investimento de 1,6 milhões de contos até ao ano 2000. Era esse o montante necessário para que o sistema estivesse totalmente implementado no início de 2001.
Ora, aquilo que verificamos é que na proposta de Orçamento que nos fizeram chegar está prevista uma verba de 1,5 milhões de contos, mas distribuída por uma série de anos, mesmo depois do ano 2003 - para este ano, salvo erro, está prevista uma verba de 200 000 contos -, e queríamos perceber se o SIP já está realmente implementado, o que não nos parece, dado que os seus resultados e os seus benefícios não são visíveis, e em que medida é que isto passou a constituir, nesta era da informatização, uma segunda prioridade para o novo Ministro da Justiça.
Uma outra preocupação, que partilhamos totalmente, é a intervenção que está prevista no sistema de justiça no sentido de recuperar as pendências acumuladas nos serviços de justiça. Uma das queixas, feita por muita gente, é a falta de juízes para fazer face a todas as pendências existentes, sabendo nós que são conhecidos casos de juízes com 1400/1500 processos pendentes, que manifestamente não podem gerir.
Há quem diga que existe uma carência, a nível de magistrados, de cerca de 100 juízes, em Portugal. Queria saber se é essa a opinião do Sr. Ministro e também em que medida está contemplado neste Orçamento, que prevê um aumento da despesa, em termos práticos, de 9%, o suprimento de parte destes 100 juízes durante o ano de 2001.
Finalmente, queria pôr-lhe uma questão mais técnica, que tem a ver com uma eventual suborçamentação do orçamento geral da justiça. O tema é o seguinte: temos um orçamento da justiça que contempla uma despesa de 212 milhões de contos - salvo erro, não chega a 1% do PIB -, o que parece ser manifestamente pouco quando comparado com os orçamentos para os serviços de justiça noutros países europeus.
Também está mais ou menos implícito no nosso sistema de justiça que uma boa parte dos seus serviços são financiados por aquilo que se designa por Cofre Geral dos Tribunais, constituído pelas receitas obtidas pelos tribunais dos utilizadores da justiça. No entanto, disto já houve queixas de grandes empresas. Lembro, por exemplo, que a Sonae se recusou a pagar as despesas que lhe competiam pelos serviços que estava a utilizar no tribunal, do que lhe foi dado provimento a nível europeu. Tanto quanto sabemos, foi declarada ilegal esta subafectação de receitas, de "facturas", aos utilizadores da justiça directamente nos tribunais, que compensam a falta de verbas no orçamento geral da justiça.
Sr. Ministro, queria saber se confirma este facto e se está previsto no Orçamento para 2001 a correcção desta situação, dado que o próprio Tribunal Europeu já se pronunciou pela sua ilegalidade.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, faz parte das funções da oposição criticar o Governo, mas desta vez o Sr. Deputado António Pires de Lima não teve razão, porque a equipa do Ministério da Justiça está cá, praticamente, desde a hora que estava estabelecida. Chegou um bocadinho mais tarde, mas só isso, porque era hoje que devia cá estar.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, foi só um pequeno aparte, para tentar justificar o facto de não ser especialista em justiça.

Risos.

Agora já cá está o Sr. Prof. Narana Coissoró, mas a verdade é que esta audiência estava prevista, no plano inicial, para hoje, às 18 horas e 30 minutos.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Pires de Lima, a confusão é um bocado maior, porque nós estivemos cá ontem, às 18 horas e 30 minutos. Portanto, viemos com 27 horas de avanço, porque, pelo mapa que nos foi dado, devíamos ter estado

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cá ontem. Só que ontem a reunião foi remarcada para hoje, às 21 horas e 30 minutos.
Sr. Deputado, quanto à questão da informatização, o programa global de informatização do sistema de justiça assenta na construção de uma rede dedicada do Ministério da Justiça que, quando estiver integralmente concluída, será a maior rede informática existente no País e ligará todos os tribunais entre si, todos os tribunais a todo o sistema de registo e notariado, a todos os estabelecimentos prisionais, a todos os colégios do IRS, enfim, a todas as unidades do sistema de justiça.
Neste momento, a rede já está instalada em grande parte deste sistema, está integralmente instalada relativamente às unidades da Polícia Judiciária e relativamente aos estabelecimentos prisionais. Portanto, as verbas que encontra agora aqui para os serviços prisionais já não são para o desenvolvimento de rede mas, sim, para o desenvolvimento de aplicações, o que, obviamente, é a parte menos custosa do investimento.
Para que o sistema funcione, há duas áreas que são estratégicas, quer para o funcionamento do sistema entre si, quer, sobretudo, para a prestação de serviços ao cidadão: a informatização dos tribunais e a informatização dos registos e notariados.
Assim, foram essas as duas áreas que considerámos prioritárias, tendo definido como prioridade concluir integralmente, até ao final de 2001, a informatização dos tribunais. Perguntou-me a respectiva taxa e eu informo-o que o nosso objectivo é atingir uma taxa de 100%, a funcionar em 31 de Dezembro de 2001. E a funcionar significa não só a instalação das redes como a instalação das aplicações próprias de gestão de cada um dos processos.
Neste momento, temos já definido o calendário da instalação das redes, o que conduzirá a que tenhamos a última rede instalada em Setembro de 2001, ou seja, com tempo suficiente para proceder, até 31 de Dezembro desse ano, à instalação da aplicação e à formação do pessoal nesse tribunal.
Mas já estamos, neste momento, a instalar aplicações em tribunais! Temos já cerca de 30 tribunais com as aplicações de gestão do processo civil instaladas e em funcionamento desde o passado dia 15 de Setembro e, conforme as redes vão sendo instaladas, nós vamos instalando as aplicações e dando a formação ao pessoal. Portanto, é um processo que vai estar permanentemente em movimento, com um cronograma que está definido até 31 de Dezembro de 2001.
De qualquer forma, há alguns aspectos desse sistema de informatização que vão ser antecipados. No próximo dia 1 de Janeiro, teremos já todos os tribunais com o correio electrónico a funcionar e com capacidade para poderem receber as peças processuais por correio electrónico, desde que elas sejam enviadas por esse meio, e vamos ter em funcionamento no dia 1 de Janeiro - posso agora confirmá-lo com bastante alívio, porque essa foi uma aposta muito arriscada que estabelecemos -, integralmente em todos os tribunais, o sistema de vídeo-conferência.
Este sistema funcionará da seguinte forma: nas comarcas de Lisboa e Porto haverá um equipamento em cada sala de audiência e mais um equipamento fora das salas de audiência, para que a testemunha, quando residir em Lisboa e estiver a responder para outro sítio, possa depor sem ter de perturbar o funcionamento das sala de audiências; nas outras comarcas, teremos um equipamento por cada duas salas de audiência, mais um equipamento fora da sala de audiência para depoimentos. É isto que temos de ter este sistema em funcionamento no dia 1 de Janeiro, porque é condição de entrada em vigor do Código do Processo Civil.
Temos, depois, como prioritária a área de registos e notariado, que é o sistema mais completo, porque por um lado são mais processos e, por outro lado, estão mais dispersos. Aqui, o nosso objectivo é concluir a taxa de 100% em 31 de Dezembro de 2002.
Neste momento, estão também a ser desenvolvidas as diferentes aplicações. No que diz respeito ao registo predial, temos já sete instaladas e estamos a certificar e a expandir a aplicação que já tínhamos em funcionamento. E quanto ao registo e notariado isto é fundamental, porque isso vai permitir ganhos de produtividade nos registos e no notariado e de qualidade da prestação de serviços ao cidadão e às empresas, que é um contributo decisivo para melhorar as condições de competitividade da nossa economia.
Portanto, quanto à informatização, os planos estão todos definidos e já em execução, quer nos tribunais quer nos registos e notariado, com duas metas muito ambiciosas: 31 de Dezembro de 2001 e 31 de Dezembro de 2002.
Devo dizer-lhe que o receio que todos tínhamos era o da formação do pessoal, porque, obviamente, não basta ter lá as máquinas e as aplicações, é preciso também ter pessoas que com elas trabalhem. O que temos constado, com grande satisfação, é que nas secretarias dos tribunais, naquelas 30 onde já estão instaladas as novas aplicações de gestão do processo civil, as pessoas têm todas demonstrado não só uma grande capacidade de apreensão mas, sobretudo, uma grande vontade de apreensão. Felizmente, é uma aplicação muito amigável para o utilizador e as pessoas sentem a utilidade objectiva do seu funcionamento para a própria qualidade do trabalho que desenvolvem. Temos tido situações de pessoas que têm ficado para além das horas de trabalho, nos fins-de-semana, nos feriados, a trabalhar e a treinar nas novas aplicações, para apreensão do sistema.
Agora, é preciso ter a noção de que há uma ilusão que convém não termos: não é possível, num sistema com a dimensão e com a complexidade do da justiça, introduzir um processo de informatização sem que, necessariamente, num primeiro momento, não haja problemas. Portanto, é uma aposta que tem de ser feita, mas, como tudo, dói e, portanto, vai haver problemas. Temos de ter consciência disso e é preciso que a tenhamos já, neste momento, para que, quando os problemas surgirem, não entremos todos numa enorme frustração e não dizermos que, afinal, mais valia não termos feito a informatização. Não, este é um processo normal de informatização, que tem num momento inicial, e para isso temos de estar todos preparados.
Quanto à questão da falta de magistrados, é verdade e devo dizer-lhe que se há coisa que me dá alguma satisfação é, ao fim de um ano, toda a gente reconhecer que faltam magistrados em Portugal. É que, há um ano, o discurso ainda era o de que havia magistrados a mais e apareciam umas contas de comparação entre o número de juízes, por habitante, em Portugal e o número de juízes, por habitante, nos mais diferentes países europeus.
Felizmente, as pessoas perceberam que este não é o bom critério de avaliação das necessidades de magistrados. O critério que releva é saber o número de juízes por processo: a Holanda tem 16 milhões de habitantes e entram menos de 300 000 processos por ano em tribunal; nós, com menos

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seis milhões de pessoas, temos mais de 700 000 processos a entrar anualmente em tribunal. É uma questão de cultura da sociedade e nós, que temos orgulho e prazer em ser portugueses, temos de ter a noção que isso tem custos diferentes de ser holandês.
Ora, o Governo, a Assembleia da República e o Conselho Superior da Magistratura adoptaram um conjunto de medidas, que foram ao limite, creio eu, do que era constitucional, política e orçamentalmente possível, para criar condições para atacar a carência de magistrados.
A Assembleia aprovou, por proposta do Governo, uma lei que habilita o Conselho Superior da Magistratura com três novos instrumentos de gestão dos quadros de magistrados. Por um lado, havia como proposta, no programa eleitoral do PSD, a possibilidade de mobilização de magistrados jubilados para regresso ao serviço, a possibilidade de encurtar o estágio de formação dos auditores de justiça, ou seja, quem está a fazer o curso para a magistratura, e, em terceiro lugar, a possibilidade da abertura de um concurso extraordinário de recrutamento, por um período temporário de quatro anos, para o exercício das funções de juiz de direito de entre licenciados em direito. O Governo propôs, a Assembleia aprovou e o Conselho Superior da Magistratura já deitou mão a estes três instrumentos.
No que diz respeito à mobilização de magistrados jubilados, não houve uma adesão muito significativa. Aliás, houve uma perturbação aqui introduzida por uma lamentável interpretação de um serviço do Ministério das Finanças, que fez uma interpretação humilhante para os Srs. Magistrados e que, felizmente, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento em boa hora revogou. Mas, como é evidente, quando se cometem humilhações, isso paga-se e, portanto, isso teve o efeito de desincentivar a disponibilidade que muitos magistrados jubilados tinham para voltar ao serviço e colaborar empenhadamente na resolução dos problemas da justiça.
Depois, o Conselho Superior da Magistratura já utilizou uma vez o mecanismo de encurtamento do estágio e, portanto, houve um conjunto de magistrados que puderam entrar ao serviço dos tribunais, creio que Maio, em resultado desse encurtamento do período de estágio. Esta é uma medida que não é boa porque, como é evidente, o desejável é que todos possam concluir a sua formação no prazo normal, mas, infelizmente, no estado de carência em que nos encontramos, muitas vezes temos de recorrer a soluções que não são as ideais, as boas, mas que são as necessárias.
O Conselho Superior da Magistratura abriu, a semana passada, um concurso extraordinário para recrutamento de licenciados em direito para um conjunto de vagas. Foi-nos pedido um número superior a 90 e o Governo fixou o número de vagas em 100. Está neste momento a decorrer - creio que o prazo de candidatura termina no próximo dia 28 - a candidatura para recrutamento, pelo período temporário de quatro anos, de 100 magistrados, que vão ser colocados, sobretudo, no exercício de funções, como juízes auxiliares, nos tribunais cujos magistrados tenham uma capitação de processos superior a 1500.
Esperemos todos que o concurso tenha sucesso, mas há uma coisa que também temos de dizer: nós não podemos ter magistrados a qualquer preço!… Não podemos!… Portanto, o regulamento do concurso e o recrutamento dos candidatos pelo Conselho Superior da Magistratura têm de revestir-se de grande exigência, porque recrutar um magistrado não é o mesmo que recrutar qualquer servidor do Estado. Portanto, temos de ter preocupação, temos de tentar resolver o problema, mas não podemos fazê-lo a qualquer preço.
Agora, é minha profunda convicção de que, para um combate eficaz às pendências acumuladas, tínhamos de conseguir preencher estes 100 lugares, por forma a obtermos quer um reforço da bolsa de juízes quer a possibilidade de colocar juízes auxiliares em todos os tribunais que têm mais de 1500 processos acumulados por cada juiz.
As verbas para o pagamento destes magistrados estão inscritas, não no Orçamento do Estado mas, porque são pagas por receitas dos cofres gerais dos tribunais, no orçamento do Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial do Ministério da Justiça.
Por outro lado, também temos inscrita dotação para contratar assessores, em número que estimamos entre 100 a 108, para os magistrados nos tribunais de 1.ª instância.
Relativamente a esta matéria, temos um problema, que colocámos ao Conselho Superior da Magistratura e que teremos de partilhar com a Assembleia da República, visto que, em nosso entender - e a experiência demonstrou-o -, a lei que vigora para os assessores não satisfaz os objectivos que tinha em vista. No fundo, trata-se de uma lei de aproveitamento de quem não acede ao Centro de Estudos Judiciários, é uma lei que, no fundo, visa ocupar provisoriamente aqueles que, verdadeiramente, desejam ser magistrados. É por isso que a maioria dos primeiros 50 assessores que entraram em funções, e que já tive o prazer de empossar no exercício das minhas funções, apresentou-se ao novo concurso para ingresso no Centro de Estudos Judiciários e, hoje, estão a frequentar o curso de auditor.
Como disse, abordámos o Conselho Superior da Magistratura, tendo colocado a questão de haver duas modalidades alternativas de recrutamento de assessores, uma, estrutural, que significa resolver um problema em dois.
Como sabe, hoje, com o novo regime de admissão ao Centro de Estudos Judiciários, só pode candidatar-se a este quem tenha concluído a respectiva licenciatura há mais de dois anos. A experiência tem demonstrado que tal parece não ser uma boa solução, porque muita gente não tem condições para estar dois anos a aguardar o início de uma função remunerada, acabando por encaminhar-se para outro tipo de actividade e, depois, já não está disponível para a magistratura. Portanto, uma das propostas que apresentámos ao Conselho Superior da Magistratura foi no sentido de se considerar o exercício de funções de assessor como um período vestibular do acesso à magistratura. Assim, as pessoas que acabassem o respectivo curso podiam ingressar como assessores, cargo que exerceriam durante dois anos, e, depois, se tivessem uma boa avaliação do seu desempenho, podiam ser admitidas ao Centro de Estudos Judiciários, o qual frequentariam, após o que poderiam ingressar na magistratura. Isto tinha a vantagem de evitar a "fuga" das pessoas para outras actividades no período que medeia entre a conclusão da licenciatura e a sua admissão ao CEJ (Centro de Estudos Judiciários), sem sacrifício do objectivo, que estava correcto, de que os magistrados saiam do CEJ já com uma idade biológica em que, teoricamente, têm maturidade mais adequada às funções da judicatura.
Propusemos, ainda, um outro modelo, radicalmente diferente mas que preenche um dos objectivos que é o recrutamento de assessores. Trata-se de não haver qualquer período vestibular para os assessores, mas, antes,

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permitir aos juízes de 1.ª instância que preencham determinadas condições, isto é, que estejam em tribunais onde o movimento processual o justifique, que contratem directamente um assessor, que terá um vínculo precário, na base da confiança pessoal do magistrado.
Este último modelo tem inconvenientes e tem vantagens. Por um lado, tem todos os inconvenientes que decorrem da informalidade, por outro, tem todas as vantagens que resultam da relação de confiança. Na verdade, é o magistrado que contrata quem consigo trabalha e, portanto, é o magistrado que é responsável pelo trabalho que desenvolve, pelo que selecciona quem entende e pretende que trabalhe consigo.
São, pois, estes os dois modelos sobre os quais pedimos ao Conselho Superior da Magistratura que se pronunciasse. A informação que temos é a de que, na sua próxima reunião, que creio que se realiza no dia 21, o Conselho pronunciar-se-á sobre esta questão dos assessores.
Mais adiante, colocou-me uma questão sobre a suborçamentação, sobre o problema das receitas do Ministério da Justiça e sobre a comparação entre os investimentos do Ministério da Justiça de Portugal e o de outros países. Comecemos pela comparação que estabeleceu.
É verdade que, tal como Espanha, Portugal é dos países europeus que menos investe da sua riqueza no sistema de justiça. Segundo tenho ouvido dizer o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, a média comunitária de investimento na justiça é 4,6% do PIB, enquanto, no Orçamento do Estado português, essa média é menos de um quarto daquela percentagem.
Depois, há um problema de fundo com o financiamento do sistema de justiça, que, aliás, nos levou a solicitar ao Sr. Prof. Sousa Franco um estudo sobre um modelo alternativo de financiamento do sistema de justiça.
Historicamente, o sistema de justiça tem funcionado através de financiamento por receitas próprias dos cofres gerais dos tribunais mas, sobretudo, provenientes do cofre de conservadores e notários. Creio que não deve haver muitos ministérios com uma taxa de cobertura da respectiva despesa em receitas próprias superior a 50%, mas o Ministério da Justiça tem-na. Essa cobertura significa que o cidadão paga o serviço de justiça.
Ora, há um conjunto de empresas, basicamente do mesmo grupo empresarial, que, ao longo dos anos, foi impugnando junto do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias a liquidação de emolumentos notariais e registrais, com base numa directiva sobre reunião de capitais que proibia a imposição pelo Estado de pagamento de quantias desproporcionadas relativamente ao custo do serviço. Portugal perdeu o primeiro processo, em Setembro de 1999, relativamente a uma antiga tabela que já não está em vigor; voltou a perder este ano, relativamente a uma nova tabela que tinha imposto um valor máximo de cobrança de receitas de registo e notariado, tabela essa que voltou a ser considerada desproporcionada.
Há um aspecto mais preocupante que é o facto de, com base nesta decisão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, os tribunais tributários e o Supremo Tribunal Administrativo terem inovado a sua jurisprudência. Efectivamente, têm vindo a proceder a anulações de taxas emolumentares de notariado e de registo, mesmo fora do âmbito da directiva sobre reunião de capitais, com a consideração de que, sendo tais taxas desproporcionadas em relação ao valor do custo do serviço, têm uma natureza fiscal e, portanto, careceriam de aprovação parlamentar.
Este é um cenário que, obviamente, exige que se repense o financiamento do sistema de justiça, porque isto significa que, a prazo, ou a Constituição é alterada, ou a Assembleia da República aprova, por lei, o que tem sido aprovado, ao longo de décadas, por portarias do Ministério da Justiça, ou, então, tem de se encontrar uma outra forma de financiamento do sistema de justiça, que, necessariamente, não passará por receitas próprias mas pelo recurso directo ao Orçamento do Estado. Significa isto que é preciso ter em conta que, neste cenário, o Orçamento do Estado teria de consignar ao sistema de justiça uma verba acima de 100 milhões de contos.
Trata-se de um processo muito complicado e, como disse, o Professor Sousa Franco está a estudar um modelo de financiamento que terá de existir, sendo que nunca poderíamos recusar-nos a executar os julgados. Mas põe-se um problema muito complexo quanto à execução destes julgados, que, aliás, nos levou a solicitar um conjunto de pareceres jurídicos, porque se a execução do julgado se traduz simplesmente na devolução da quantia cobrada, o acto fica gratuito, mas ninguém nos disse nem resulta do acórdão do Tribunal de Justiça que o acto deva ser gratuito. O que diz o Tribunal de Justiça é que não podemos cobrar mais do que o custo do serviço prestado, mas o problema é o de saber como é que, por um lado, se estabelece o custo do serviço, o que implica um aturado trabalho de fixação do mesmo, e, sobretudo, como é que, mesmo que hoje se criasse uma tabela que vigorasse para o futuro, se aplicava esta a um acto que foi praticado há 10 anos, que é a data em que foi interposto o recurso.
Portanto, o problema é muito complexo quanto à execução dos julgados, mas o mais complexo é criarmos um novo modelo de financiamento do sistema de justiça.
Basicamente, é isto que tinha a responder sobre a matéria.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, fez uma curta intervenção inicial que, praticamente, resumiu-se a dizer que há um aumento de 118% nas verbas para a justiça…

O Sr. Ministro da Justiça: - Não, não! Do Instituto de Reinserção Social!

O Orador: - Ah! É para o IRS?! Eu estava a ver onde é que o Sr. Ministro tinha ido arranjar um tão amplo aumento de verbas…! Ia mesmo pedir-lhe que pormenorizasse tão pródiga distribuição de verbas!
De qualquer forma, e começando exactamente pelo Instituto de Resinserção Social (IRS), queria colocar-lhe uma questão.
Todos temos a noção de que há algum divórcio em áreas sensíveis dos tribunais relativamente às pontes que devem estabelecer-se com o Instituto de Resinserção Social. Há a velha problemática das penas de prisão sucedâneas, designadamente o trabalho a favor da comunidade. Insistimos muito - e, eventualmente, é uma realidade - em que, comparando com os restantes países da União Europeia, há uma insistência excessiva por parte dos nossos juízes relativamente à aplicação da pena de

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prisão, havendo, designadamente um elevado número de presos preventivos. No entanto, a verdade é que, de uma forma geral, os magistrados não são habilitados com meios para aplicação daquelas medidas.
A sensação que tenho é a de que o Instituto de Resinserção Social deveria ter uma presença mais próxima, pelo menos, dos tribunais criminais em termos de poder coadjuvar os magistrados nesta procura de soluções. Sabemos que há soluções pontais, que há protocolos celebrados com algumas entidades - câmaras municipais, etc. -, mas que, de uma forma geral, se mostram insuficientes para dar resposta ao problema. Aliás, várias vezes tenho ouvido magistrados dizerem que se deparam com a situação concreta de, eventualmente, até poder aplicar-se uma pena daquele tipo, mas a verdade é que não têm à mão uma saída para poderem concretizá-la.
Ora, sinto que era exigível que, pelo mesmo junto daqueles tribunais que citei, o Instituto de Reinserção Social tivesse uma presença à semelhança da do Ministério Público e de outros órgãos que integram o próprio tribunal. Assim, espero que este reforço de verbas agora previsto possa contemplar esta questão.
V. Ex.ª referiu que estão a ser dados passos no sentido de implementar os colégios de menores, remodelando alguns, reinstalando outros, em termos de se executar a lei tutelar educativa.
Confesso que me parece ainda insuficiente o que se está a programar no Orçamento do Estado relativamente a essa matéria, face àquilo a que temos assistido em termos de aumento da delinquência juvenil e em termos de situações reveladoras da incapacidade do sistema judicial em dar resposta a essa problemática e perante o compasso de espera, que tem sido excessivo, na implementação da lei tutelar educativa, um tempo, por falta de regulamentação da mesma, outro tempo, agora, por falta de instalações e meios adequados.
De qualquer forma, quero registar o aumento que se verifica nalguns sectores do orçamento para a justiça como um benefício relativamente a uma tendência que o Ministério da Justiça, particularmente o Ministro, tem revelado nos últimos tempos.
Refiro-me à ideia de que a celeridade da justiça vai resolver-se com a eliminação de garantias - leia-se, nalguns casos, com simplificações de carácter processual. Espero que o reforço que é dado agora, em sede de Orçamento, em termos financeiros, permita a V. Ex.ª refrear esse ímpeto e dotar efectivamente as estruturas judiciais de meios humanos e de equipamentos, pois esses, sim, é que são uma das grandes razões - nalguns casos, a escassez, noutros, a insuficiência - que não permite dar as respostas mais prontas à justiça. Aliás, nalguns casos, V. Ex.ª já o reconheceu, designadamente no que diz respeito à falta de magistrados.
Espero, pois, que haja soluções que venham complementar e atenuar a forma como V. Ex.ª tem procurado resolver a questão da celeridade através das alterações processuais que são conhecidas, algumas das quais irão ser tratadas em sede da 1.ª Comissão, em virtude do pedido de apreciação parlamentar apresentado pelo PSD relativamente à reforma do Processo Civil.
Há pouco, o Sr. Secretário de Estado referiu-se aos julgados de paz. Também neste caso, penso que, se porventura houver tempo, esse assunto será tratado na reunião de amanhã da 1.ª Comissão.
Não obstante, gostaria de ficar desde já com uma ideia sobre o que pensa o Governo, por um lado, relativamente à distribuição, em termos geográficos, dos julgados de paz e, por outro lado, o que pensa relativamente ao desempenho dos juízes que preencherão estes julgados de paz.
V. Ex.ª já referiu que tem havido alguns avanços e algumas soluções - e, efectivamente, temos de reconhecer que assim é - que permitiram fazer reverter o caminho por que se ia enveredando na área prisional em Portugal. Mas não deixo de ficar preocupado e de pensar que não estão assim tão resolvidos os problemas a ponto de se justificar uma diminuição de verbas em sede de PIDDAC, sendo que, para 1999, estavam previstos 33 milhões de contos, para 2000, estavam previstos 11 milhões de contos e agora, para 2001,…

O Sr. Ministro da Justiça: - Há aí um equívoco! É que não é em 1999, mas até 1999! É o acumulado dos cinco anos anteriores.

O Orador: - Desculpe, mas pensei que estes valores se referiam à execução do ano de 1999!

O Sr. Ministro da Justiça: - Não, não!

O Orador: - Então, é o somatório dos anos anteriores.

O Sr. Ministro da Justiça: - Exactamente!

O Orador: - De qualquer forma, há um aumento muito pouco significativo do investimento na área dos serviços prisionais face às carências que este sector ainda tem.
Finalmente, vou colocar-lhe uma questão que tem a ver com instalações na área da justiça na Região Autónoma da Madeira.
Verifico com espanto que as verbas inscritas no PIDDAC para 2001 para, designadamente, o Tribunal Judicial de Santa Cruz, o Tribunal Judicial de São Vicente e as instalações da Inspecção da Polícia Judiciária do Funchal, com carências que são reconhecidas e conhecidas do Ministério há muitos anos, são perfeitamente insignificantes, não darão para construir nem uma parede de qualquer destes tribunais. Estão previstos 5000 contos para o Tribunal Judicial de Santa Cruz, 5000 contos para o Tribunal Judicial de São Vicente e o grosso da coluna está previsto para os anos seguintes, 275 000 contos, num caso, e 275 000 contos, noutro.
Se formos ver o PIDDAC do ano passado, o que é que verificamos? Verificamos que estas verbas de 5000 contos estavam inscritas para o ano 2000 e o grosso da coluna estava previsto para os anos seguintes. Isto é, VV. Ex.as vão deslizando os valores mais significativos para os anos seguintes, o que significa que, no futuro próximo, não vão concretizar estas estruturas da justiça.
Porém, curiosamente, como, aliás, dei conta quando falei das instalações na área da segurança interna, verifico que, no que diz respeito aos Açores, acontece exactamente o contrário.

Risos do Ministro da Justiça.

É verdade! Falei nas verbas previstas para os tribunais da Região Autónoma da Madeira, assim como para o Colégio de Menores, cuja situação se arrasta há imensos

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anos e em que estão inscritos 25 000 contos, que, obviamente, não permitirão a conclusão da construção desse Colégio no ano 2001, e verifico que, em relação aos Açores, em equipamentos similares, VV. Ex.as têm inscritas verbas significativas. É o caso do Estabelecimento Prisional de Angra do Heroísmo, em que estão previstos 410 000 contos; é o caso do Tribunal Judicial de Santa Cruz das Flores, em que estão previstos 200 000 contos; é o caso dos tribunais de Ponta Delgada, em que estão previstos 120 000 contos. São verbas da ordem dos 200 000 contos.
Ora, eu começo a somar estas parcelas e a perceber porque é que a Região Autónoma dos Açores tem no PIDDAC mais 4 milhões de contos do que tem a Região Autónoma da Madeira. Não compreendo esta discriminação,…

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - … na medida em que as carências nestas áreas são equivalentes. Não percebo porque é que se vão arrastando as infra-estruturas da justiça na Região Autónoma da Madeira, não percebo porque se faz esta discriminação. Não gostaria de pensar que tem por base uma questão de ordem político-partidária face aos governos que, neste momento, estão em cada uma das Regiões Autónomas.
A verdade é que tudo tem de ter uma explicação e VV. Ex.as, porventura, poderão ter outra mais convincente e que ultrapasse esta minha inquietante desconfiança.
Sr. Ministro, são estas questões que gostava de ver esclarecidas.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Não é fácil de explicar!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, se não se importa, vou responder de forma breve a duas questões que colocou e, posteriormente, o Sr. Secretário de Estado Adjunto responderá, também de forma breve, a uma outra questão.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto vai responder, em pormenor, aos diversos investimentos em curso na Região Autónoma da Madeira. Contudo, como um dos exemplos que invocou foi o do Estabelecimento Prisional de Angra do Heroísmo e depois ouvi dizer que as necessidades da Madeira eram similares, permitia-me recordar que, graças, designadamente, ao esforço de V. Ex.ª, o único estabelecimento prisional que foi construído durante aqueles 10 anos, que me escuso de dizer quais foram, foi precisamente o Estabelecimento Prisional do Funchal…! Foi o único construído durante aqueles 10 anos…! Como sabe, tem, felizmente, capacidade sobrante para, num esforço de solidariedade, poder acolher reclusos exteriores à Região Autónoma da Madeira e é um caso exemplar de que, infelizmente, o esforço realizado durante esses 10 anos na Região Autónoma da Madeira não permitiu satisfazer todas as necessidades dos Açores.
Quanto aos meios, Sr. Deputado Guilherme Silva, há um ano tínhamos 1000 vagas no quadro de oficiais de justiça, durante o ano 2000 entraram ao serviço como oficiais de justiça 1300 pessoas e em Janeiro entrará o número de funcionários necessário para preencher as últimas 80 vagas que ainda existem nos quadros. Os mecanismos legais estão criados para haver um reforço de magistrados e para a colocação de assessores nos tribunais.
Para além disso, foi lançado, e está a avançar ao ritmo a que há pouco pude concretizar, o processo de informatização dos tribunais. Disseram-me aqui que nem no final do próximo ano a videoconferência funcionaria. Afinal, estará a funcionar a partir de Janeiro. Portanto, há mais meios.
Agora, o Sr. Deputado não pode ter a ilusão, como ninguém pode ter, de que o sistema de justiça, como qualquer outro sistema, se baste simplesmente com mais meios, mais meios e mais meios. Não é possível! O Sr. Deputado sabe bem como é que os números têm evoluído. Há, hoje, quatro vezes mais processos executivos do que havia há cinco anos, há, hoje, três vezes mais processos declarativos do que havia há cinco anos. O Sr. Deputado sabe que não é possível, no mesmo período de tempo, triplicar ou quadriplicar os meios. Se o Governo apresentasse um Orçamento que triplicasse ou quadriplicasse o orçamento do Ministério da Justiça, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite teria uma síncope imediata pelo despesismo que isto representava.
Portanto, temos de ir introduzindo reformas. Já ouviu falar de reformas estruturais? Reformas estruturais significa introduzir instrumentos que melhorem a eficiência e a produtividade do sistema sem implicar um aumento desnecessário da despesa. Portanto, temos de simplificar os mecanismos processuais.
Os Srs. Deputados clamam contra o novo sistema de citações. Gostaria que me dissessem quantos funcionários é que era necessário recrutar para procederem à citação pessoal num sistema que tem 1,7 milhões de processos. São 700 000 novos processos por ano. Repito: quantos funcionários é que teríamos de recrutar para fazerem 700 000 citações pessoais por ano? Isto não é possível! O Sr. Deputado sabe que isto não é possível! Portanto, não aceito essa contraposição entre celeridade e garantias.
Digo-lhe mais: é minha convicção, e estou convencido de que é a convicção dos portugueses, de que, sem celeridade, não há garantias e de que a celeridade é ela própria uma garantia que as pessoas querem ver satisfeita. É, aliás, uma garantia, que, como sabe, está inscrita na Constituição, está inscrita na Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Então, nós andamos há anos a ser condenados no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem por morosidade da administração da justiça e a acusação que agora me fazem é a de que eu quero que a justiça ande depressa? Não me elogiem muito, porque, às tantas, começo a ficar popular.

Risos do PS.

O que as pessoas querem, garanto-lhe, é que a justiça seja célere.
E mais: nós temos que romper com um ciclo vicioso, porque a justiça funciona mal, porque tem um excesso de processos no circuito, mas uma das razões porque tem este excesso é porque funciona mal, porque se generalizou a convicção na sociedade de que a justiça não é eficaz.
Portanto, não é uma dissuasão do incumprimento, tornou-se uma oportunidade para o incumprimento e as pessoas que sabem que têm a obrigação de pagar dizem: "se isso vai para tribunal, deixa andar que durante uns anos ninguém me incomoda". Ora, a generalização desta ideia contribui para "entupir" dia após dia os tribunais.

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Portanto, temos de fazer um grande esforço para demonstrar ganhos de eficácia que credibilizem o funcionamento do sistema de justiça. Temos de ter penhoras que funcionem, temos de acabar com esta bandalheira, desculpará a expressão, que é a de, dia após dia, os julgamentos serem sistematicamente adiados, porque as pessoas faltam, porque os réus se recusam a receber as cartas registadas com aviso de recepção. Isto descredibiliza o sistema, só agrava o funcionamento do sistema.
Portanto, não me assusta com o discurso de que eu quero acabar com as garantias. O Sr. Deputado não só sabe que eu não quero acabar com as garantias como sabe que não haverá garantias efectivas se a justiça não for célere. É isso que as pessoas sentem e exigem. As pessoas estão fartas desta ideia de que isto pode andar assim.
Devo dizer-lhe que me custa muito ver responsáveis políticos e profissionais da justiça embrenhados na teorização dos diferentes passos das normas processuais como se vivêssemos no princípio do século XX com uma sociedade paroquial onde ninguém ia a tribunal, onde ninguém andava no giro económico e, portanto, podia viver ao ritmo da aldeia em que o oficial de justiça andava de porta em porta notificando as pessoas. Esse mundo acabou.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Toda a gente sabe isso!

O Orador: - Então, se toda a gente sabe isso, temos de retirar daí as necessárias ilações.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Eduardo Cabrita): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, completando a resposta prestada pelo Sr. Ministro da Justiça, quero dizer que, relativamente à área do Instituto de Reinserção Social e às nossas preocupações de realização de investimentos na Região Autónoma da Madeira, fico embevecido com a circunstância de, apesar de o crescimento de investimento no Instituto de Reinserção Social ter sido de, apenas, 118%, o Sr. Deputado Guilherme Silva nos apoiar no sentido de que é necessário mobilizar meios adicionais para esta área de intervenção.
Relativamente ao orçamento de funcionamento, o Instituto de Reinserção Social tem um crescimento de 25% em relação ao orçamento de 2000 e tem mais 1,150 milhões de contos atribuídos no quadro da resolução do Conselho de Ministros, aprovada em Julho passado, exactamente para permitir a contratação já aqui referida, cujo processo de selecção está a decorrer, de 200 monitores e de 75 técnicos integrados no programa visando a entrada em vigor da lei tutelar educativa.
Portanto, não só haverá uma mobilização de técnicos e de monitores, que permitirá, relativamente às áreas em que vai funcionar o regime fechado, ter pessoal em número adequado às exigências daí resultantes, mas também estão a ser feitos um pouco por todo o País investimentos nos novos colégios, que terão regime fechado já dentro de um mês e meio, em Coimbra, em Caxias, no Mondego, perto da Guarda e, ao longo do ano 2001, no Colégio de Santo António, no Porto, e no Colégio de Vila Fernando, perto de Elvas.
Mas esta intervenção é também reforçada com aquilo que era uma possibilidade legal abstracta desde 1982, e que foi sendo sucessivamente esquecida, que é a possibilidade de, face aos níveis de encarceramento de que dispomos e que são dos mais elevados no quadro da União Europeia e, por outro lado, face às respostas clássicas a alguns tipos de criminalidade, tais como a multa, a pena suspensa ou a prisão, haver condições legais efectivas para a aplicação das penas de trabalho a favor da comunidade, o que nunca existiu até 1997.
O que nos tem distinguido é que, ao longo deste ano, pelo País fora tem sido dada prioridade política à criação de uma rede que envolve protocolos com autarquias locais, instituições particulares de solidariedade social, associações cívicas, associações económicas, dando prioridade aos grandes círculos judiciais, dando prioridade às comarcas das capitais de distrito, o que me permitiu estar há duas semanas na Guarda, na semana passada em Leiria, em Viana do Castelo e em Guimarães e, na próxima semana, estarei na Câmara Municipal de Vila Real e também em Bragança, dando visibilidade àquilo que é um trabalho de criação de uma rede de responsabilidade solidária, de cidadania, de empenhamento na mudança do paradigma de aplicação de medidas penais e, mais, de envolvimento da comunidade na política de prevenção criminal.
Hoje em dia, temos uma rede que envolve protocolos com cerca de 600 entidades por este País fora e iremos, ao longo deste ano, preencher essa malha em todos os círculos judiciais onde tal ainda não foi realizado, celebrando protocolos com um quadro de entidades significativo e que permite, de facto, alargar aquilo que são experiências extremamente positivas, como as que já se passam em Braga, em Matosinhos e em algumas ilhas dos Açores, em que é aplicado um número significativo de penas de trabalho a favor da comunidade. Certamente que teremos uma rede ampla que permite aos magistrados, querendo aplicar uma pena deste tipo, ter imediatamente à sua disposição um técnico do IRS e, sobretudo, um conjunto significativo de entidades, a começar pelas autarquias locais e a continuar nas misericórdias, nos hospitais, nas associações de bombeiros voluntários, disponíveis para receber os condenados a prestar penas de trabalho a favor da comunidade.

O Sr. Ministro da Justiça: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao nível de investimento verificado na Madeira, foi, finalmente, possível concluir um processo que se arrastava há mais de 10 anos, que foi o de encontrar uma localização na Região Autónoma da Madeira, no concelho de Santa Cruz, freguesia do Santo da Serra, para a instalação de um centro educativo. A aquisição desse espaço implicou um investimento de 97 000 contos feito este ano e a realização da despesa foi autorizada, o que permitirá, a partir de agora, iniciar as adaptações da instalação aí existente, de modo a que, até final de 2001, estejamos em condições de dar início à instalação desse centro educativo, acabando com uma situação lastimável, que é a circunstância de os jovens oriundos da Região Autónoma da Madeira terem de cumprir medidas de internamento em centros educativos no continente. O Sr. Deputado não me acompanhou quando me desloquei à freguesia do Santo da Serra, apesar de eu o ter convidado, mas terei todo o gosto em ir consigo visitar o colégio quando ele começar a funcionar.
Mas, para além de eu ter ido à freguesia do Santo da Serra no final de Outubro, quando tive a alegria de voltar

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a visitar a Região Autónoma da Madeira, tive a oportunidade de, juntamente com o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz, constatar o bom trabalho de cooperação, com base num protocolo celebrado entre o Ministério da Justiça e a Câmara Municipal de Santa Cruz, que permitiu recuperar o Tribunal Judicial de Santa Cruz, que passou a ter novos gabinetes, uma nova sala de audiências nas actuais instalações e que tem, hoje, condições de dignidade de funcionamento.
Porém, isto não afasta a necessidade de um novo tribunal e exactamente por isso, também no final de Outubro, tive a alegria de voltar da Madeira com a indicação de um terreno que me foi disponibilizado pelo Sr. Presidente da Câmara e que permitirá aí a instalação do tribunal, pelo que está, neste momento, a ser estudada a adequação desse terreno.
Quanto ao Tribunal Judicial de São Vicente, estamos um pouco mais adiantados. Chegámos já a acordo sobre o terreno e teremos condições de lançar o concurso para projecto. Lá para o fim do ano, se tudo correr bem, lançaremos o concurso para a construção. Teremos, assim, dois novos tribunais e um colégio.
Finalmente, foi com muita alegria que inaugurei, no Estabelecimento Prisional do Funchal, porque a capacidade do Estabelecimento é superior às necessidades permitindo aí um esforço de solidariedade nacional, uma experiência educativa única no País, que é uma creche/jardim de infância para 50 crianças, a qual se destina não só aos filhos das reclusas mas também às crianças da comunidade que frequentam a mesma creche que os filhos destas.
Estive lá com o Sr. Secretário Regional de Educação, que assinou um protocolo com o Ministério da Justiça, que construiu um jardim de infância, sendo que a Secretaria Regional de Educação cede o pessoal educativo, os educadores e os auxiliares de educação. Este é um bom exemplo de cooperação, como, aliás, foi reconhecido pelo Governo Regional da Madeira.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça (Diogo Machado): - Sr.ª Presidente, prometo ser breve, embora esse não seja necessariamente um hábito e uma virtude dos juristas, que tendem a ser palavrosos!

A Sr.ª Presidente: - Já percebi, Sr. Secretário de Estado!

Risos.

O Orador: - Aliás, penso que a economia cada vez tem uma função mais importante a desempenhar neste mundo da justiça e que a abertura de uma janela por onde passam, de vez em quando, umas corrente de ar, só nos faz bem!
Sr.ª Presidente, preciso só de uns instantes para explicar ao Sr. Deputado Guilherme Silva o por que é difícil responder ou corresponder ao desafio que nos colocou, o de antecipar um debate, que talvez possamos iniciar daqui a 12 horas, e, sobretudo, de inverter a iniciativa que entendemos deve ser, como sempre foi, desde a primeira hora, da Assembleia da República, e para dar duas ou três ideias sobre os julgados de paz, para tentarmos, pelo menos, acabar em harmonia, como sugere o último dos vocábulos.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Secretário de Estado, pensei que amanhã se iria realizar um colóquio sobre os julgados de paz, onde esse assunto seria tratado. Mas faça favor de continuar.

O Orador: - Sr.ª Presidente, dito isto, ou seja, que não é possível responder ao desafio, também não me parece razoável inverter por completo a ordem natural em que esta questão deve ser examinada.
Um dos Srs. Deputados introduziu o tema dos julgados de paz, fazendo duas perguntas: a da distribuição geográfica dos julgados de paz e a do preenchimento dos lugares, imagino eu, buscando vislumbrar o que o Governo porventura entende sobre quem devem ser as pessoas a servir nesses tribunais e quais os seus requisitos habilitacionais. Eu diria que estas talvez devam ser as últimas duas perguntas a serem formuladas - é só um entendimento, obviamente.
A propósito de antecipações, o que faria sentido, seria, talvez, em primeiro lugar, o Governo ter o acto de humildade de acompanhar e secundar a iniciativa parlamentar do Partido Comunista Português e de, tal como pedimos licença, estar sempre com os trabalhos, enquanto a Assembleia e a Comissão assim o entenderem, dando a sua opinião, quando pedida.
A propósito dos julgados de paz, podemos ensaiar, designadamente, aquilo que é um desafio colectivo: em lugar de estarmos, como vamos estando e procurando não estar tanto, no Ministério da Justiça, a olhar para trás, podermos começar a olhar para a frente. E olhar para a frente quer dizer começar a pensar e a perscrutar o que deve ser o sistema de justiça em 2010, em 2015 ou em 2020, em vez de estarmos, no ano 2000, a acudir a problemas da justiça que têm, provavelmente, pelo menos uma década.
Desse ponto de vista, só temos, diria eu, como certezas, as que são negativas, do que não podemos definitivamente fazer. Não podemos incorrer no risco de sermos destinatários da única regra sociológica conhecida - remeto para o monumental e magnífico estudo do Professor Boaventura de Sousa Santos e do Centro de Estados Sociais de Coimbra -, que é a de mais oferta de tutela judiciária suscita mais procura de tutela judiciária. E isto quer dizer o seguinte: não podemos pensar mais o mesmo, temos de pensar diferente. E, pensando diferente, temos de, diria eu, imaginar uma câmara parajudiciária que seja muito mais um lugar de paz, de reconciliação e de justa composição do que um lugar de guerra, de batalha e de acerto final em função da aplicação da lei positiva na frieza da interpretação jurídica, que contempla uma lógica inexorável de vencido e de vencedor.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Secretário de Estado, peço-lhe muita desculpa, até porque não tenho o costume de tirar a palavra, que, de resto, lha vou voltar a dar, mas só quero chamar a sua atenção para o facto de estarmos na Comissão de Economia, Finanças e Plano a discutir o Orçamento, e não na 1.ª Comissão, a discutir problemas da justiça, que, aliás, considero interessantes.
De qualquer forma, se os Srs. Deputados entenderem que deve continuar-se essa discussão, não lhe retiro a palavra.
Faça favor de prosseguir.

O Orador: - Sr.ª Presidente, procurando a reconciliação, pois o espírito é de paz, digo apenas o seguinte: tal como

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foi afirmado, em devido tempo, pelo Sr. Ministro da Justiça, o Governo acautelou, pelo lado da questão orçamental, um exercício de instalação de um certo número (dois, três) de julgados de paz, por hipótese um de perfil eminentemente urbano e outro de perfil eminentemente rural, os quais, a partir do acerto da lei que se faça no quadro da Assembleia, instalaremos a benefício de verificação, por exemplo, no decurso do ano de 2001. Do ponto de vista orçamental, trazendo a questão dos julgados de paz ao âmbito desta Comissão, é o que se me oferece dizer.

A Sr.ª Presidente: - Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado da Justiça, e peço-lhe mais uma vez desculpa pela minha observação.
Srs. Deputados, peço-vos que sejam muito breves nas intervenções que se seguem. De resto, penso que já todos colocaram ao Sr. Ministro da Justiça e aos Srs. Secretários de Estados as questões que queriam ver esclarecidas, pelo que lhes peço brevidade, o que também peço aos Srs. Membros do Governo, nas respostas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, serei mesmo muito breve. O que quero perguntar tem a ver com a resposta à segunda questão que coloquei, sobre o Tribunal Judicial de Évora. Como a resposta do Sr. Secretário de Estado não se compagina com a verdade histórica, só pedi para intervir outra vez para que fique registada em acta a verdade do que se passa nesta matéria.
Sr. Secretário de Estado, esta matéria arrasta-se desde Setembro de 1991, desde o ofício n.º 8944, de 17 de Setembro de 1991, trocado entre os poderes locais, a autarquia, e o Ministério da Justiça. De então para cá, o Ministério da Justiça alterou sucessivamente a sua posição: ora queria um conjunto de lotes; ora queria menos lotes; ora queria mais área; ora queria menos área.
Ao longo deste anos todos, foram-se sucedendo ofícios, para cá e para lá (tenho aqui os números de todos os ofícios), e foram-se alterando os preços, os valores, as áreas, etc. Até que, já no tempo do Governo do Partido Socialista, se chegou a um primeiro acordo.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Um passo em frente!

O Orador: - Exactamente.
Esse acordo era no sentido de estabelecer o Palácio da Justiça na zona de expansão da cidade, numa área nobre, numa área de serviços, onde se está a estabelecer a universidade, os serviços de segurança social, etc., para desbloquear o centro histórico.
Chegou-se a acordo quanto aos lotes e quanto aos valores, os quais a autarquia disponibilizava com um preço muito abaixo do preço de mercado, aliás no quadro de uma avaliação efectuada pela Direcção-Geral do Património.
Na verdade, nos sucessivos relatórios apresentados pelo Ministério à Assembleia da República em sede de Orçamento nunca se fala em condições, diz-se só que a partir de 1998 (e o deste ano repete o que já constava do de 1998), por limitações urbanísticas, não houve acordo com a câmara municipal. As questões são de ordem urbanística e não de valores. A verdade é que o terreno estava situado e definido na zona a que tem de obedecer, no quadro do plano urbanização e expansão da cidade.
De tal modo é assim que, no último ofício enviado pelo Ministério da Justiça, em Abril de 1997, o Ministério agradece a colaboração prestada pela câmara municipal e refere que vai reequacionar a questão em termos da área que necessita para a implantação.
Durante todos estes anos, a câmara municipal teve os lotes guardados para o Ministério da Justiça. Como o Ministério da Justiça não desbloqueou a situação, os lotes acabaram por ser, na mesma, vendidos ao Estado para instalação da Direcção Regional do Ambiente, com base no preço acordado e definido pela Direcção-Geral do Património.
Assim, só não foi executado o que estava estabelecido porque o Ministério da Justiça não quis, e, pelos vistos, o que o Ministério da Justiça não quis, quis o Ministério do Ambiente.
Agora, o Ministério da Justiça não pode pensar que as autarquias deste País fazem a oferta urbanística a todos os serviços do Governo, porque não há terreno que chegue nem meios financeiros suficientes!
Mas o acordo estava em cima da mesa, os valores estavam acordados, de tal modo que acabou por ser o Ministério do Ambiente a considerar que seria um bom negócio adquirir o terreno que esteve, durante anos e anos, guardado para o novo Palácio da Justiça.
Os votos que faço são os de que o Ministério da Justiça defina claramente o que quer e como quer e que reabra os contactos para se encontrar uma solução, que, sobretudo, resolva os problemas das condições de trabalho neste sector, em Évora.
Em vez de o Governo resolver este problema, o que é que fez? Arrendou um edifício. E sabe quanto está a pagar por mês? Está a pagar 4000 contos, no centro histórico. Em dois anos, teria pago o terreno!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Justiça, começo por pedir desculpa por ter chegado tarde, mas fui representar o nosso Presidente, que está a caminho de Timor, e não podia faltar a esta missão. Foi por esta razão que não pude chegar aqui a horas.
Sr. Ministro, V. Ex.ª ainda acredita na triologia de acabar com a falta de magistrados - magistrados jubilados, encurtamento do estágio e recrutamento de juízes ad-hoc? Porque efectivamente…

Risos do Deputado do PSD Hugo Velosa.

Vamos pôr as cartas na mesa: V. Ex.ª viu que esta solução não deu nem dá resultado! Não é por causa da história que V. Ex.ª trouxe, que é triste e lamentável, a de o Ministério das Finanças não ter pago a tempo as ajudas de custo e não sei mais o quê, e de o Sr. Magistrado perder dinheiro em vez de o ganhar… Não é por causa disso que a solução falhou! Faz parte da nossa cultura! Houve algum entusiasmo, mas um magistrado jubilado, que já saiu da carreira, não está para voltar a tratar daqueles problemas, não havendo incentivos culturais ou outros que o atraiam para esta função.
Quanto às questões do encurtamento dos estágios e dos juízes ad-hoc, já coloquei este problema por várias vezes. Pensei, e V. Ex.ª também deve ter pensado, que, a vingar, esta solução dará cabo do Centro de Estudos Judiciários! V. Ex.ª veio aqui dizer, e com razão, que o concurso tem de ser muito exigente. Veja o tempo que

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passou desde o entusiasmo que V. Ex.ª punha nesta solução e o momento em que vão entrar os primeiros juízes ad-hoc - talvez esta expressão não esteja certa, mas penso que me compreende - através do concurso. Veja o tempo que passou e como é que eles vão entrar!
Este não é um problema novo, mas vamos partir do princípio de que eles são excelentes juízes. Este é um acto do Estado de negação de todo o trabalho do Centro de Estudos Judiciários! Qualquer um de nós se vai perguntar por que é que vamos perder tempo com o Centro de Estudos Judiciários, se esta é a maneira mais rápida e expedita de recrutar juízes! Se um juiz pode julgar - e bem! -, sendo admitido só através de um concurso, não precisando de respeitar critérios de idade ou estar dois anos à espera ou encurtar o que quer que seja, andar num curso de pós-graduação, aturar os mestres, os professores, fazer aquelas sentenças enormes de 400 páginas que se fazem no Centro de Estudos Judiciários… Tudo isto desaparece se chegarmos à conclusão de que esta maneira expedita de recrutar os juízes, através de um concurso - e excelentes juízes, como V. Ex.ª diz, porque o concurso vai ser exigente, pois queremos bons juízes e o povo tem de acreditar que a justiça é feita por juízes competentes -, rebenta com a própria teoria do Centro de Estudos Judiciários.
Sei que não é este o momento para tratar disto, mas é só para lhe dizer que o dinheiro que se gasta, ou se gasta bem no Centro de Estudos Judiciários, ou se gasta bem com os juízes ad-hoc. Agora, as duas coisas ao mesmo tempo são contraditórias e, pelo menos, no meu raciocínio, uma prejudica a outra. Ou o Centro de Estudos Judiciários é bom e é aí que se formam os juízes, ou o concurso é bom e não precisamos do Centro de Estudos Judiciários! V. Ex.ª depois me dirá.
Passo agora ao problema dos assessores. Isto de dizer que vão para assessores os que ficaram de fora é o facilitismo, Sr. Ministro! Quer dizer, para o rebotalho, o saldo, os que não puderam entrar para o Centro de Estudos Judiciários, arranja-se maneira de irem trabalhar!

O Sr. Ministro da Justiça: - É o que existe! Eu quero acabar com isso!

O Orador: - Então acabe; acabe já e não fale mais nisso!
Outra coisa, dizer que os juízes trazem os seus chefes de gabinete, os seus secretariozinhos, a que chama assessores, é "amiguismo", é "clientelismo", é proteccionismo, é o filho do amigo que lá vai, é o cunhado que lá vai - o "cunhado" no sentido de cunha e de cunhado propriamente dito!

Risos.

V. Ex.ª sabe isso! Isto de o assessor ser trazido pelo juiz, o "juiz cunhado"…

Risos.

Nem vale a pena falar nisto, pois estamos a tratar de coisas sérias!
O quarto aspecto que quero referir tem a ver com os tais 15 000 processos. De um lado, V. Ex.ª quer o problema de 15 000 processos - e sei que V. Ex.ª talvez concorde comigo, pois, no fundo, V. Ex.ª é a favor da contingentação de processos… Vamos a isso! Façamos "voos de águia"! Por que é que estamos a dar "saltinhos de frango"? Não vale a pena! V. Ex.ª não vai fazer "voos de águia"; V. Ex.ª está a dar "saltinhos de frango"! Acabe lá com esta brincadeira de 15 000 processos, vamos lá à contingentação e acabou-se o problema! É ou não é? Façamos de conta que estamos numa entrevista do Jô Soares e diga: é ou não é?
O quinto problema que quero referir é o da celeridade. Eu já disse várias vezes que este é um problema fundamental, que nenhum de nós tem capacidade ou vontade… e também não depende… Se eu fosse Ministro da Justiça não sei se saberia como o resolver! É o tal problema organizacional. É a própria gestão dos juízes, a forma como os juízes têm de se organizar, têm de ter uma vontade de produzir, e, por mais que o processo civil seja facilitado, se um juiz tem hábitos antigos, não vamos a parte alguma!
Então, como é que se muda a cultura de um juiz? Se um juiz está possuído de uma cultura de prazos que são indicativos, se um juiz tem hábitos antigos, não é a celeridade do processo civil ou do processo penal que dá um certo ímpeto, que "empurra" um bocadinho mais, digamos assim, mas o que, verdadeiramente, é necessário é que o juiz incorpore em si a ideia de que aquelas reformas processuais representam apenas a melhoria do aparelho e não a própria vontade dele! Ora, se um juiz trabalha à antiga, se a Sr.ª Dr.ª Juíza não dispensa o seu lanche das 17 às 18 horas e diz: "esperem aí um bocadinho que eu…"

Risos.

Não façam essas caras! Posso dar exemplos! Eles dizem muitas vezes: "vou dar o despacho daqui a pouco, vou pensar…". Vou tomar um café e vejo lá a juíza a comer uma torrada! Mas disse que ia pensar no despacho…!
O primeiro bloqueio da celeridade que Boaventura de Sousa Santos, no seu relatório do observatório, coloca logo à cabeça não são as normas processuais - estas ajudam, ajudam e muito! - mas a própria cultura dos juízes! E o que tem feito o Ministério da Justiça para obrigarem os juízes a mudar a sua cultura? Não são as inspecções, não são as classificações que são dadas, não são as boas sentenças que produzem, agora bastante reduzidas! É preciso arranjar alguma coisa para se sair dos bloqueios pessoais, bloqueios organizacionais, da própria justiça. Vamos todos pensar nisso, mas gostaria de saber se V. Ex.ª está com vontade de fazer isso ou se vai simplificar mais as formalidades, que, muitas vezes, prejudicam os processos, o que resolve de algum modo os problemas, mas não resolve todos, porque a barreira fundamental é o facto de os juízes continuarem com velhos modos de decidir, apesar de se lhes dar novos aparelhos que eles não sabem aproveitar.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira, e espero que Gaia não tenha muitos problemas por resolver.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr.ª Presidente, vou começar por Valongo.
Sr. Ministro da Justiça e Srs. Secretários de Estado, começo por focar a questão do município de Valongo, que, como sabem, tem tribunal judicial desde há cinco anos, desde 1995, a funcionar transitoriamente num edifício de

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habitação encontrado pela câmara municipal em cooperação com o Ministério.
Acontece, porém, que este facto tem conduzido a problemas graves em termos dos próprios profissionais que aí, diariamente, desempenham funções em péssimas condições e dos próprios utentes reclamam constantemente das condições existentes. Como tal, justifica-se que se possa avançar, com urgência, para a construção de um edifício feito de raiz para o tribunal judicial de Valongo. E, neste sentido, a Câmara Municipal de Valongo já disponibilizou ao Ministério, na nova centralidade de Valongo, um terreno para o efeito.
Verifico que o Governo já inscreveu uma verba de 5000 contos, que, para já, considero simbólica, a qual, penso, não dá sequer para fazer o projecto - não só penso como tenho a certeza.

Vozes do PSD: - Isso é só para a primeira pedra!

O Orador: - E verifico que, pela projecção do PIDDAC para os próximos anos, teremos um novo tribunal daqui a quatro ou cinco anos. Digo isto, porque vejo que os investimentos plurianuais vão até 2003 e que, depois, se diz em "anos seguintes" mais 0,5 milhão de contos, etc. Por isso não sei se serão três, quatro ou cinco anos.
Ora, o que peço ao Ministro e ao Sr. Secretário de Estado que encarem seriamente a possibilidade de reforçar no PIDDAC esta verba para 2001, porque este seria um sinal de que o projecto poderia ser elaborado e aprovado e até aberto concurso, que é o que se impõe, no próximo ano, 2001. É neste sentido que apelo ao Sr. Ministro que se reforce esta verba, com este objectivo.
Sobre Vila Nova de Gaia gostaria de referir uma questão que se prende com a remodelação do Colégio Corpus Christi. Fico satisfeito por constatar que constam verbas para este efeito, mas só há 2000 contos para 2001, o que também me parece uma verba francamente irrisória, ainda que para os anos subsequentes estejam já inscritos valores mais significativos. Porém, gostaria que a obra pudesse avançar mais rapidamente, e para isso também teríamos de reforçar esta verba, com o que ficaríamos todos satisfeitos, em particular os responsáveis do colégio e do município de Vila Nova de Gaia.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, vou responder a três questões muito concretas e deixo para o Sr. Ministro da Justiça a resposta ao conjunto de preocupações suscitadas, em boa hora, pelo Sr. Deputado Narana Coissoró.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, relativamente a Évora, em 1997, existia uma obrigação legal por parte da câmara municipal de ceder terrenos para a instalação do tribunal. No entanto, na Legislatura anterior, a maioria que foi possível formar nesta Câmara alterou essa disposição, pelo que, hoje, não existe essa obrigação. Portanto, o Sr. Deputado confirmou inteiramente a minha intervenção inicial, porque, de facto, no conjunto de correspondência trocada, de que o Sr. Deputado tem cópia, falta o ofício da Câmara Municipal de Évora a ceder terreno,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não falta! Ele está aqui!

O Orador: - … como a generalidade das câmaras municipais continuam a fazer, para que, adequadamente, seja instalado o tribunal. Assim, neste quadro, há uma gestão em função das prioridades.
Se a Câmara Municipal de Évora tivesse cedido o terreno graciosamente…,

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa agora!

O Orador: - …como fez a Câmara Municipal de Almada, o concurso já teria sido lançado e estaria à beira da adjudicação.
Em 1997, a câmara municipal tinha a obrigação legal de ceder terreno, mas, nessa altura, em vez de o fazer, tentou negociar alienações de terrenos. Hoje, já não existe essa obrigação legal, e também não existe esse terreno que tinha sido disponibilizado, porque, como disse, foi alienado para outros fins,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Foi alienado ao Estado, ao Ministério do Ambiente!

O Orador: - … ainda que a uma entidade pública.
Disponibilize-se a Câmara Municipal de Évora em ceder um terreno adequado, na zona de expansão, para o lançamento do tribunal e Évora terá concurso para projecto do tribunal este ano.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é chantagem!

O Orador: - Não é chantagem…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é chantagem! Então, agora as câmaras municipais têm de ser promotoras?!

O Orador: - O Sr. Presidente da Câmara Municipal de Évora fale com o Sr.ª Presidente da Câmara Municipal de Almada e pode ser que…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Deixe lá Almada!

O Orador: - Estou a dar-lhe um bom exemplo.
Passando para a questão de Valongo, de facto a Câmara Municipal de Valongo disponibilizou o terreno para a construção do tribunal, tal como a generalidade das câmaras municipais existentes por esse País fora, como a de Almada. E, portanto, neste momento, estamos apenas à espera de indicações que têm a ver com o plano de pormenor da área em que o tribunal vai ser implantado para lançar o concurso. É o único requisito técnico que estamos neste momento a aguardar que nos seja fornecido pela Câmara Municipal de Valongo, após o que estaremos em condições de lançar o concurso para o projecto.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Estamos numa fase de troca de elementos técnicos, que tem a ver com as limitações e com as caracterizações urbanísticas no plano de pormenor da área de implantação.
Relativamente ao Colégio Corpus Christi, tive oportunidade de o visitar há alguns meses, acompanhado pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, altura em que apreciámos o que seria possível realizar, e chegámos a acordo

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que o local nobre em que o colégio está instalado merecia ser destinado a outra função, que não a um colégio de menores. Assim, o Sr. Presidente da Câmara Municipal Vila Nova de Gaia ficou de analisar a possibilidade de indicar uma qualquer outra área do município de Vila Nova de Gaia que permita a construção de um colégio que venha a substituir o Colégio Corpus Christi.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, vou responder às duas questões colocadas pelo Sr. Deputado Narana Coissoró.
Todos estamos de acordo em que faltam magistrados;

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Está bem, e daí?!

O Orador: - … todos sabemos que o Centro de Estudos Judiciários tem feito um excelente trabalho, mas tem uma capacidade limitada de formação de magistrados por ano. Não é possível aumentar a capacidade de formação do Centro de Estudos Judiciários, que todos os anos tem recebido o número máximo que pode receber de auditores. O que propusemos à Assembleia, que aceitou, foi um conjunto de três mecanismos para a resolução temporária dos problemas.
Se o Sr. Deputado me pergunta se acredito no recurso aos magistrados jubilados eu digo-lhe aqui o que disse na Assembleia da República aquando da discussão do Programa do Governo. No estado de crise em que nos encontramos, não é pelo facto de a proposta ser do PSD que a vou recusar, penso que tenho o dever de a consagrar na lei. E continuo a dizer o mesmo: cada magistrado jubilado que se disponibilizar a regressar ao activo e a trabalhar é bem-vindo.
Não sei se o Sr. Deputado sabe que, em Espanha, acabam de alterar a idade de jubilação dos magistrados para os manter, no activo, de modo a procurar responder a um problema exactamente idêntico ao que temos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - (Por não ter falado para o microfone, não foi possível transcrever as palavras do orador).

O Orador: - Não! Têm estado claramente a adoptar a mesma solução. Portanto, não é uma questão de crença mas, sim, de termos um instrumento que sempre que for utilizado é bom, e que pressupõe necessariamente, como constava, aliás, do espírito da própria proposta do PSD, a disponibilidade das pessoas, a qual existe ou não, pois esta não se decreta.
Agora, um concurso extraordinário não é alternativa ao CEJ mas, sim, complementar. O CEJ forma magistrados; o concurso recruta pessoas que temporariamente irão exercer funções de juiz de Direito. É esta a função do concurso. Qual é a vantagem disto? É a de podermos ter, para além dos número de magistrados que o CEJ formará este ano, mais 100 juízes, desejavelmente, que, durante os próximos quatro anos, poderão estar ao serviço.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Está a falar de coisas diferentes!

O Orador: - A solução temporária tem, além do mais, uma vantagem: se os magistrados são contratados para combater pendências acumuladas, com a eliminação das pendências, a sua necessidade desaparece, e, portanto, deste modo ficaríamos com os quadros inflacionados relativamente às necessidades. O facto de ser um recrutamento temporário tem a vantagem de termos os quadros ajustados temporariamente à satisfação de uma necessidade que é temporária.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Está a falar de coisas diferentes!

O Orador: - Em relação à questão cultural, devo dizer que não tenho dúvidas. O Sr. Deputado falou da necessidade de uma mudança cultural dos juízes, eu não digo que seja só dos juízes. Há uma necessidade de mudança cultural da comunidade judiciária, de todos os intervenientes na comunidade judiciária; porém, as mudanças culturais não se decretam.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - V. Ex.ª decreta através de decretos-leis!

O Orador: - As mudanças culturais constroem-se, e, como sabe, com a reforma da Lei Orgânica do Ministério da Justiça criámos um conjunto de organismos, designadamente o Gabinete de Auditoria e Modernização, para o qual convidámos para o dirigir, e que felizmente aceitou, uma pessoa que creio que conhece, o Professor João Bilhim,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … que é um especialista em gestão de administração pública e que veio trabalhar na área da auditoria e modernização do sistema de justiça, porque é fundamental munirmo-nos de novos instrumentos de acção dentro do sistema que ajudem à mudança cultural. Como sabe, na reforma do contencioso administrativo, fizemos uma experiência pioneira, quer nacional quer, tanto quanto sei, internacionalmente, que foi o recurso a uma empresa de consultoria, organização e métodos para fazer uma auditoria ao funcionamento dos tribunais administrativos. Este trabalho, que foi hoje apresentado publicamente, contém um conjunto de soluções de organização e funcionamento dos tribunais para aumentar a sua eficiência.
O Sr. Deputado pergunta-me se sou a favor ou contra a contingentação. Em abstracto, sou a favor. Mas como é que fazemos a contingentação hoje com o estado em que os tribunais se encontram e com o número de processos acumulados que existem.
O Conselho Superior da Magistratura entende como um número adequado uma média de 700 processos por magistrado. Ora, se o concurso correr bem e houver encurtamento no estágio, vamos ter juízes auxiliares para os tribunais, onde há uma capitação superior a 1500 processos. Assim, se neste momento ainda não tenho meios para responder a capitações de 1500 processos, como é que quer que eu estabeleça uma capitação de 700 processos. Não posso! Não há meios para isso!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Amanhã falamos!

O Orador: - Podemos falar amanhã.
Portanto, o combate à morosidade tem de ser um cocktail de medidas, que requer não só mais meios,

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melhor administração, a criação de meios alternativos para a resolução de litígios mas também a simplificação processual. Temos de obter ganhos por via da simplificação processual, sem sacrificar as garantias. Com certeza!
Agora, todos sabemos que há, nos códigos, um conjunto de mecanismos que podem ser simplificados sem sacrifício das garantias e com ganhos de eficiência no funcionamento do sistema. É este o trabalho que temos de prosseguir.

A Sr.ª Presidente: - Terminadas as inscrições, agradeço ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, não posso deixar passar esta oportunidade sem fazer um protesto veemente ao modo e aos termos usados na intervenção do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado quer transferir para os órgãos do poder local responsabilidades, que não são suas, nem do ponto de vista legal nem do ponto de financeiro.
A seguir-se o critério apontado pelo Sr. Secretário de Estado para o Ministério da Justiça, por que razão é que não o segue para o Ministério da Saúde, para o Ministério da Cultura, para todos os serviços do Estado que têm necessidade de se implantar nos diversos municípios deste país? Os municípios não são empreiteiros de terrenos, não são promotores, não têm terreno, têm de o adquirir para o ceder; portanto, têm de pagar.
Aliás, Sr. Secretário de Estado, eu também tenho comigo o ofício da câmara municipal e o último do Ministério da Justiça. E o que o Ministério da Justiça disse, na altura, Sr. Secretário de Estado - tome boa nota -, foi que, como a localização daquele terreno não lhe interessava, iria lançar um concurso público de ideias, para, depois, fazer uma proposta. Onde está o concurso público de ideias? Onde está a nova proposta? Por que é que o terreno serve, e foi pago pelo Estado, para o Ministério do Ambiente e não serve para o Ministério da Justiça, para este pagar?

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, a Câmara Municipal de Évora terá de escolher se opta por considerar prioritária, ou não, a cedência de terreno para um tribunal, ou se esta não é uma prioridade, se a prioridade é outra, designadamente a que apontou, a alienação de terrenos a entidades públicas ou privadas. É uma opção legítima, cabe ao Ministério da Justiça gerir os recursos à sua disposição num quadro de gestão de prioridades.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por finda a reunião e agradeço a presença do Sr. Ministro da Justiça e dos Srs. Secretários de Estado.
A próxima reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano terá lugar amanhã, às 9 horas e 30 minutos, com a presença do Ministério do Planeamento.

Eram 00 horas e 15 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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