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Terça-feira, 13 de Novembro de 2001 II Série-C - GOP-OE - Número 1

VIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2001-2002)

COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO

Reunião de 12 de Novembro de 2001

S U M Á R I O


Pelas 10 horas e 25 minutos, a Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite) abriu o debate, na especialidade, das propostas de lei n.os 104/VIII - Grandes Opções do Plano para 2002 e 105/VIII - Orçamento do Estado para 2002.
Usaram da palavra, sobre o orçamento do Ministério das Finanças, além do Sr. Ministro (Guilherme d'Oliveira Martins) e dos Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Fiscais (Rogério Ferreira), do Tesouro e das Finanças (Rudolfo Lavrador) e do Orçamento (Rui Coimbra), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Maria Celeste Cardona (CDS-PP), Hugo Velosa (PSD), Fernando Serrasqueiro (PS), Francisco Louçã (BE), Menezes Rodrigues (PS) e Patinha Antão (PSD).
Sobre o orçamento do Ministério da Cultura, usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro (Augusto Santos Silva) e dos Srs. Secretários de Estado da Comunicação Social (Arons de Carvalho) e da Cultura (Conde Rodrigues), os Srs. Deputados Luísa Mesquita (PCP), Fernando Seara (PSD), Isabel Pires de Lima (PS), António Filipe (PCP), Machado Rodrigues (PSD), Narana Coissoró (CDS-PP), António Reis (PS), Lino de Carvalho (PCP), Luiz Fagundes Duarte (PS), António Abelha (PSD), José Alberto Fateixa (PS), Guilherme Silva (PSD), Natalina Tavares de Moura (PS) e Rosado Fernandes (CDS-PP).
Sobre o orçamento do Ministério da Educação, usaram da palavra, além do Sr. Ministro (Júlio Pedrosa) e dos Srs. Secretários de Estado da Administração Educativa (Domingos Fernandes) e do Ensino Superior (Pedro Lourtie), os Srs. Deputados David Justino (PSD), Rosalina Martins (PS), Luísa Mesquita (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Rosado Fernandes (CDS-PP), Manuel Moreira (PSD), Natalina Tavares de Moura (PS), Margarida Botelho (PCP), José Cesário (PSD), Luiz Fagundes Duarte (PS), Agostinho Lopes (PCP), António Abelha (PSD) e Maria Santos (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Ciência e da Tecnologia, usaram da palavra, além do Sr. Ministro (Mariano Gago), os Srs. Deputados José Carlos Lavrador (PS), David Justino (PSD), Rosado Fernandes (CDS-PP), Margarida Botelho (PCP) e Natalina Tavares de Moura (PS).
A Sr.ª Presidente encerrou a reunião eram 20 horas e 55 minutos.

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A Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Começo por cumprimentar o Sr. Ministro das Finanças e os Srs. Secretários de Estado aqui presentes.
Srs. Deputados, se não se importam, vamos estabelecer algumas regras para os nossos trabalhos.
Em primeiro lugar, os Srs. Assessores dos diferentes grupos parlamentares não devem estar sentados nas primeiras filas, no lugar dos Srs. Deputados, pelo que, para dar apoio aos diferentes grupos parlamentares, os Srs. Assessores devem ficam sentados noutras filas; em segundo lugar, vamos começar por fazer uma ronda de pedidos de esclarecimento por todas as bancadas e só depois o Sr. Ministro das Finanças responderá, pois parece-me que devemos dispensar o Sr. Ministro de fazer uma intervenção inicial, uma vez que a discussão na generalidade já foi feita em Plenário e, também, na Comissão de Economia, Finanças e Plano e agora estamos em sede de debate na especialidade; por último, mais uma vez, gostaria de fazer o apelo aos Srs. Deputados para que nos cingíssemos à discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2002.
É, pois, nessa conformidade que vou dar a palavra aos Srs. Deputados que queiram inscrever-se.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Tal como a Sr.ª Presidente referiu, já formulámos as nossas observações e críticas em sede de discussão na generalidade e, portanto, vamos ater-nos a questões de esclarecimento, de especialidade, de alguns dos problemas existentes, que não todos - senão, se calhar, ficávamos aqui todo o dia!
Sr. Ministro das Finanças, a primeira questão que gostaria de colocar-lhe tem a ver com as grandes rubricas da despesa. Quando foi por mim interpelado em reunião desta Comissão, em sede de discussão na generalidade, em relação às despesas com o pessoal, o Sr. Ministro, de algum modo, confirmou os cálculos a que nós tínhamos chegado mas afirmou que, apesar de tudo - não sei se o afirmou o Sr. Ministro se o Sr. Secretário de Estado do Orçamento - , tinham margem de manobra, uma vez que iriam reduzir, em particular, os abonos variáveis, o que lhes permitiria obter a tal margem de manobra para as remunerações certas e permanentes. Penso que este foi um dos argumentos que aqui avançaram.
Essa é uma verdade, Sr. Ministro, porque se olharmos para os chamados "abonos variáveis" que estão orçamentados para 2002, verificamos que eles diminuem cerca de 20% em relação ao orçamentado para 2001; ou até, se quisermos fazer a comparação com a execução previsível (se esta seguir o mesmo padrão dos anos anteriores), podemos falar de um valor de cerca 30%. particularmente visível nas horas extraordinárias, nas ajudas de custo, enfim nos chamados "outros abonos".
Esta questão, Sr. Ministro, por um lado confirma os valores que nós avançámos, em sede de discussão na generalidade, quanto à dotação global, já incluindo a dotação provisional para as despesas com pessoal, que não vai além dos 3% e que, deduzidos os valores que nós referimos ligados às responsabilidades do Estado perante a Caixa Geral de Aposentações, a ADSE, as reestruturações, as promoções, deixa uma margem de 1,5% ou pouco mais para os aumentos nominais. Ou seja, mesmo com estas diminuições dos abonos variáveis, a margem não será muito diferente, nem muito maior: poderá atingir 1,9% ou outro valor semelhante.
Só que esta questão levanta uma outra, essa sim, central da minha interpelação. Como o Sr. Ministro sabe, estamos em Novembro e, neste momento, muitos serviços do Ministério das Finanças apresentam dificuldades em despesas mínimas, elementares, designadamente falta-lhes dinheiro para a gasolina, têm ajudas de custo que não são pagas, etc. Tal significa, por exemplo, que desde o dia 8 de Outubro os inspectores tributários não saem do serviço! E não saem do serviço desde que tal envolva esses encargos, nomeadamente encargos com deslocações, ajudas de custo, utilização do carro próprio, porque, depois, não lhes pagam as despesas a que têm direito.
Ora, tal situação coloca-nos o seguinte problema: ao fazer esta redução enorme nos abonos variáveis, num quadro em que a reorganização de serviços ainda não está completamente feita, dificultando as condições de mobilidade dos funcionários, designadamente de uma área tão particular como é o caso da Inspecção Tributária, pergunto como é que o Governo vai pôr os serviços a funcionar para o ano e como é que prevê arrecadar receita fiscal, designadamente no combate à fraude e evasão fiscais, quando os próprios meios financeiros que estão despendidos, necessariamente, vão agravar a situação hoje existente.
Portanto, este é um conjunto de perguntas que lhe formulo, tendo em conta que os demais elementos já tinham sido confirmados aquando da apresentação do Orçamento na generalidade.
Outra questão, Sr. Ministro, tem a ver com a afectação das dotações provisionais. Já verificámos, em sede de discussão na generalidade, que a dotação provisional de despesas correntes está toda afectada, tanto quanto parece, às despesas com pessoal, situando-se nos 249,4 milhões de euros.
Ora, o esclarecimento que queríamos obter prende-se com a afectação da dotação provisional para as despesas de capital - que, aparentemente, até têm o mesmo montante das despesas correntes. Na verdade, a dotação provisional para as despesas de capital, tanto quanto pudemos detectar, está afecta, por um lado, à aquisição de bens de capital e, por outro lado, a transferências para outros sectores, que não públicos, e envolve qualquer coisa como 154,6 milhões de euros.
A pergunta muito concreta que lhe formulo é esta: que outros sectores são estes (que não Administração Pública) que vão beneficiar de uma afectação deste valor na dotação provisional das despesas de capital?
Em relação aos códigos fiscais, também queria deixar-lhe duas ou três notas. Não vou entrar na discussão da suspensão das novas condições de tributação ou de não tributação de mais-valias este ano (e em 2003 logo se verá!), porque essa é uma discussão que já travámos. Portanto,

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vou ater-me a alguns aspectos em relação aos quais gostava de obter alguns esclarecimentos, mesmo no quadro das opções - das quais discordamos - assumidas pelo Governo.
Os rendimentos de acções e de movimentos com derivados passam a ser englobados, o que, para nós, até é positivo, mas a sua tributação é reduzida em 50% e, mesmo no âmbito das opções assumidas pelo Governo, elas passam a ser tributadas por uma mesma taxa, a taxa global.
É sabido, Sr. Ministro, que a doutrina fiscal, e bem, procura fazer uma diferenciação na tributação das taxas sobre as mais-valias em sede de IRS, exactamente para penalizar mais os movimentos de curto prazo, os movimentos especulativos de capitais, e poder dar alguma estabilidade aos movimentos de longo prazo. Era isso que se procurava fazer na reforma fiscal, com uma diferenciação de taxa de aplicação nessa matéria.
O Governo, mesmo se aceitarmos a promessa de que, para 2003, vai repor a tributação em 50%, fá-lo "a metade" e com uma taxa idêntica, o que favorece os movimentos especulativos de curto ou curtíssimo prazo e, assim sendo, nós também gostávamos de saber qual a razão desta opção por parte do Governo.
Um outro aspecto que gostaria de questionar - como pode constatar, estou a ater-me a aspectos de detalhe mas importantes - tem a ver com a dedução à colecta relativa à dupla tributação económica dos lucros distribuídos. Estes lucros eram tributados a 100% e tinham direito à dedução à colecta pela dupla tributação económica e, agora, o Governo aponta uma outra tributação em que, em vez de fazer o englobamento na tributação do rendimento de acções, por exemplo, em IRS, a 100% com crédito imposto, acaba por englobá-los a 50%, ou seja, a metade!
Feito um breve exercício, esta alteração provoca a seguinte situação: com a nova fórmula que o Governo aponta são agravados todos os rendimentos até à taxa 40% do IRS e os mais altos rendimentos são desagravados. Ora, esta situação não me parece ter muita lógica, por isso também gostávamos de conhecer a razão da opção do Governo por esta solução, ou seja por uma forma nova de tributação em IRS, através da conjugação de vários artigos do Orçamento (artigos 78.º, 40.º-A, etc.), que acaba por fazer com que a nova fórmula só favoreça os rendimentos que são tributados a uma taxa de IRS acima dos 40%, em comparação com a situação que a reforma fiscal propunha. Porquê, Sr. Ministro? Qual é a justificação para o fazer?
Em relação ao regime simplificado, Sr. Ministro, há alterações que, aliás, consideramos positivas e vão ao encontro de questões que nós próprios e os sectores envolvidos temos levantado quanto à clarificação de algumas normas de aplicação do regime simplificado.
Todavia, Sr. Ministro, há um aspecto central que está por resolver e ao qual o Orçamento não dá resposta. Refiro-me, concretamente, à publicação dos coeficientes de base técnica e científica para cada sector de actividade que a reforma fiscal propunha. Sem a publicação desses coeficientes de base técnico-económica diferenciados para cada actividade, esta melhoria, esta clarificação dos procedimentos quanto ao regime simplificado, acaba por perder muita da sua eficácia e da sua operacionalidade.
Portanto, o reequilíbrio de algumas injustiças que estavam a ser cometidas e que agora se propõe clarificar no âmbito das propostas de alteração para o regime simplificado ficam, na prática, bastante condicionadas pela ausência da publicação destes coeficientes. A questão que coloco é esta, Sr. Ministro: para quando se prevê essa publicação?
Quanto ao IRC, Sr. Ministro, formulo-lhe perguntas muito curtas e muito simples. Qual a razão por que o Governo alarga ao activo incorpóreo as condições de isenção de tributação quando as mais-valias são reinvestidas? Como se sabe, a alteração que é introduzida limita-se a uma palavra, mas essa palavra altera profundamente esse quadro e aponta para uma solução - salvo erro é o artigo 45.º - que é incompreensível.
Assim, a partir de agora, para efeitos de determinação de lucro tributável, posso vender património imobilizado, vender máquinas e apostar na Bolsa com as mais-valias daí conseguidas que isso é considerado reinvestimento para efeitos dos benefícios da tributação. Porquê, Sr. Ministro?
Mais: posso vender acções e voltar a reinvestir na Bolsa e continuo a ter esses benefícios! Qual é a razão? Qual é o critério? Sabemos que existe um critério, que são as pressões dos grupos económicos e financeiros, mas, já agora, gostava de saber quais são os critérios técnicos. Isto é, os critérios políticos já conhecemos quais são: favorecer, em muito, a tributação, o sistema financeiro das grandes holdings, mas, já agora, gostaria que o Governo nos explicasse qual o motivo, no plano técnico, que justifica considerar esta alteração que nem sequer existia nos códigos anteriores. Esta é, de facto, uma melhoria, para um certo lado - é claro! - em relação aos códigos anteriores.
Ainda por cima, acontece que este tratamento favorável é alargado às mais-valias financeiras, de acordo com as alterações do n.º 4 do artigo 45.º, e nós gostávamos também de saber porquê, pois esta situação ainda agrava mais o processo das mais-valias exclusivamente financeiras.
Sr. Ministro, a outra questão que também temos dificuldade em compreender tem a ver com a retroactividade da aplicação do código, que aparece em vários lados, principalmente quando essa retroactividade é favorável aos grandes grupos financeiros e económicos, mas sobretudo a retroactividade prevista nas alterações ao n.º 8 do artigo 30.º do Código do IRC, em que o saldo líquido das mais-valias, ou seja, a diferença entre as mais-valias e as menos-valias, realizadas antes de 1 de Janeiro de 1991, pode ser incluído na base tributável de qualquer exercício anterior por metade do seu valor e sem exigência de reinvestimento. Ora, isto é aquilo a que podemos chamar um "bolo aos pobres"!

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Ou aos ricos!

O Orador: - Ou aos ricos, como diz aqui o Deputado Francisco Louçã com mais propriedade.
Aqui são os pobres que pagam a crise, não são os ricos! Porquê? Tanto mais que as novas alterações da reforma fiscal davam um prazo larguíssimo - cerca de 10 anos, salvo erro - para que essa tributação fosse concretizada. Era um prazo extremamente equilibrado e moderado.

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Ora, o que vai acontecer é que aquilo que se estima que são os tais 600 milhões de contos de mais-valias que andarão por aí (segundo as estimativas), o que, a ser tributado à nova taxa de 30% de IRC, mesmo considerando a sua divisão em vários anos, levaria a um encaixe do Estado de qualquer coisa como 180 milhões de contos, passam agora a ser incluídos no resultado de qualquer exercício anterior - de preferência num em que tenha tido prejuízo a SGPS em causa, para assim "ficar tudo em casa" e nada se tributar.
Sr. Ministro, isto é um verdadeiro escândalo, principalmente no momento em que, como se verifica, as restrições e as alterações orçamentais favorecem uns, neste caso os detentores de capital, em detrimento de outros, os detentores de trabalho, como acabámos de verificar.
Há aqui uma questão, que não é técnica, para a qual o Sr. Ministro, porventura, terá explicações, e que tem que ver com a redução dos requisitos, em sede de off-shore, do comprovativo de não residente. Como sabe, as próprias SGPS são dispensadas da apresentação desse comprovativo, sendo suficiente qualquer meio de prova, situação esta que entendemos.
Por um lado, o Governo procura "apertar a malha" em determinados movimentos, como é o caso do sector imobiliário - e também não entendemos por que é que fica só pelo sector imobiliário -, mas, por outro, alivia as condições de comprovação de certificação da qualidade de não residente e ao fazê-lo, e não me digam que é por questões técnicas ou por desburocratização (a desburocratização aqui tem uma palavra, que é: facilitar a vida àqueles que utilizam o off-shore), acaba por criar uma "malha" larga por onde o aperto que se faz, aparentemente por um lado, ficando esvaziado por outro. Ora, esta situação é algo que também temos dificuldade em compreender.
Sr. Ministro, em sede de alteração do Código de Processo Tributário, o Governo pede autorização legislativa para fazer aquilo a que chama: rever o regime de prestação de garantias. Há quem afirme que isso se destina a facilitar ainda mais a vida à administração tributária perante o contribuinte - e lembro que quando este reclama a administração tributária tem um ano para responder e, por vezes, nem responde nesse - em detrimento dos direitos dos contribuintes. É isso? O que é que significa este pedido de autorização legislativa para rever o regime de prestação de garantias e alargar os casos em que essa prestação possa ser dispensada pela administração fiscal?
Gostaria ainda de colocar uma outra questão - e pergunto-lhe a si porque se perguntar ao Secretário de Estado do Turismo ele vai dizer-me que é com as Finanças - que tem que ver com a transferência do antigo IVA turístico para as regiões e outros órgãos locais de turismo.
O Orçamento tem um critério bom ou mau - para nós, é mau porque o valor previsto para inflação está abaixo da realidade - que é o de as transferências serem actualizadas em função da taxa de inflação oficial que o Governo prevê e que é de cerca de 2,75%.
No que toca às transferências para as regiões e outros órgãos locais de turismo, a transferência fica a zero, isto é, não há a aplicação deste critério, apesar de ter havido um crescendo da actividade turística e das receitas turísticas no ano passado. Então, por que é que se segue para todas as entidades o critério da transferência, aplicando a taxa de inflação, e não se segue o mesmo critério para este caso?
Já agora, que estamos nesta sede de actividades turísticas, gostaria de colocar-lhe uma questão (que segundo o Ministério da Economia é da responsabilidade do Ministério das Finanças) que tem que ver com a chamada dedutibilidade do IVA em despesas profissionais de alimentação e de alojamento. Já agora, lembro que foi criado um grupo de trabalho para resolver esta questão, grupo esse que nunca chegou a tomar posse, a funcionar - aliás, o prazo para apresentar propostas era, salvo erro, até finais de Setembro, para dar tempo útil para que viesse incorporado no Orçamento - ou a reunir, porque o Ministério das Finanças nunca indicou os seus representantes.
Mas, como estava a dizer, como sabe, as entidades do sector, com o aumento dessa dedutibilidade, até à semelhança do que acontece em Espanha e na medida em que se considera a Espanha e Portugal mercado interno único para efeitos de actividade turística, não percebem que haja tributações diferenciadas. Nós sabemos, Sr. Ministro, e não temos dúvidas em reconhecer, que esse problema tem de ser encarado com o necessário controlo fiscal para evitar abusos e soluções de evasão. Aliás, o próprio despacho conjunto do Ministério das Finanças e do Ministério da Economia reconhece a razão da necessidade de resolver este problema e de permitir a dedutibilidade do IVA em despesas profissionais e tem particular expressão na actividade turística que não é tão pequena como isso. Porquê, Sr. Ministro?
Como pensamos apresentar, tanto para esta questão como para a anterior, propostas de alteração, tendo em conta que a anterior é para repor um critério que o Governo segue em todos os artigos - menos neste - e que esta é para concretizar o que o Governo reconhece como justo no próprio despacho de criação do grupo de trabalho, pergunto: por que é que não se avançou e o que é que o Governo tem a dizer sobre esta matéria?

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças, gostaria de colocar umas questões de natureza mais específica e mais própria, sem prejuízo de procurar enquadrá-las numa ou duas questões de índole mais geral.
Sr. Ministro, tenho ouvido variadíssimas vezes V. Ex.ª fazer uma afirmação - quer no Plenário quer nas intervenções públicas que vai fazendo em torno deste Orçamento - que me tem perturbado, pelo que gostaria que o Sr. Ministro das Finanças me dissesse, um pouco melhor, o que é que quer dizer porque, sinceramente, não percebo.
O Sr. Ministro das Finanças tem vindo a dizer que, com a apresentação deste Orçamento, não foi abandonado nenhum princípio aprovado e consagrado no âmbito da reforma fiscal, aprovada em 2000, referindo-se V. Ex.ª ao princípio que entendo ser o de englobamento de todo o conjunto de rendimentos auferidos pelos respectivos sujeitos passivos e, depois, veremos que o conjunto de soluções aqui encontradas, nomeadamente na área das mais-valias, pecam por serem insuficientes do ponto de vista

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do Partido Popular, mas, em todo o caso, parecem ser um pouco contraditórias com essa afirmação.
Sr. Ministro das Finanças, o que é que o senhor quer dizer quando afirma que não abandona o princípio quando, na prática, faz a aplicação da lei que - se não quiser utilizar outro termo - distorce o princípio? Não percebo e apenas o entendo à luz de alguma incapacidade (se V. Ex.ª me permite) de assumir o conjunto das soluções que, do ponto de vista do CDS-PP, deveriam até ser mais arrojadas, pois, como sabe, defendemos que essas medidas não deveriam sequer ter sido aprovadas no âmbito da reforma fiscal, porque o que estava em causa era a criação de condições de competitividade para a nossa economia.
Julgamos, portanto, que avanços e recuos não conduzem a lado nenhum, ou melhor: conduzem à incerteza, à imprevisibilidade e, às vezes até, à incapacidade de os agentes económicos e as famílias fazerem, com todo o direito e legitimamente, a gestão das suas disponibilidades.
A "talho de foice", Sr. Ministro das Finanças, e como julgo que nesta matéria vigora muito a técnica do palpite, que eu não partilho inteiramente, gostaria de saber se o Sr. Ministro tem algum número, algum valor, algum indicador relativamente às consequências negativas que, porventura, teriam ocorrido com a aprovação desta legislação específica, no âmbito da reforma fiscal, nomeadamente em termos de falta de investimento e de canalização de investimento para outras áreas, eventualmente mais atractivas, no mercado comunitário. É, pois, esta a primeira questão que queria colocar-lhe.
Outra questão prende-se com algo de que até já falei no Plenário e tem a ver com o seguinte: o sindicato dos trabalhadores dos impostos tem vindo, reiteradamente, a dizer que não tem condições, porque elas lhe não são dadas, para ter, por um lado, uma ideia exacta e rigorosa, e, por outro, para fazer uma aplicação rigorosa da legislação fiscal entretanto aprovada. Julgo que uma das queixas que tem vindo a ser apresentada por aquele sindicato é a da falta de meios.
Já tive ocasião de perguntar aqui se a administração tributária tinha, de facto, sido dotada dos meios financeiros que haviam sido estimados para o efeito e fiquei com a ideia de que essas verbas iriam ser canalizadas, mas ainda ontem ou anteontem os trabalhadores dos impostos, através dos respectivos sindicatos, vieram, de novo, dizer publicamente que não têm condições, porque lhes faltam meios de formação, meios financeiros e um conhecimento mais aprofundado destas matérias para fazer a aplicação da legislação fiscal.
Portanto, Sr. Ministro das Finanças, gostaria muito de saber, porque julgo que a eficiência na arrecadação passa (não direi exclusivamente, porque não me atrevo a dizer tal) pela qualidade e pela própria eficiência dos serviços. Como tal, é muito importante, para nós, saber em que termos e qual é o ponto da situação de facto, no que respeita à máquina da administração fiscal que procede à arrecadação dos impostos.
Há ainda mais duas pequenas questões ligadas a esta que gostaria muito de colocar ao Sr. Ministro das Finanças e que, mais uma vez, têm a ver com aquilo que eu considero não dever ser feito, que é a aplicação de índices e critérios pela táctica do palpite.
Sr. Ministro das Finanças, como sabe, foi aprovada, no âmbito da reforma fiscal, a possibilidade de a administração fiscal fazer um controlo muito apurado, tanto quanto era dito pelos respectivos responsáveis e pelos apoiantes dessa medida, de todas as transacções efectuadas com os cartões de crédito.
Gostaria, pois, de saber se já dispõe de dados objectivos e quantificados quanto ao tipo de controlo feito através desse sistema e quais são os resultados alcançados com esse controlo (que presumo ser em resmas de papel, mas admito estar enganada, pois não domino as técnicas da informática) das operações feitas com cartões de crédito, o que - relembro o Sr. Ministro - nos foi dito, na altura, constituir uma verdadeira medida moralizada de combate à fraude e à evasão.
Ora, neste momento, V. Ex.ª já tem, com certeza, dados concretos sobre esta matéria e, porventura, até já terá feito correcções às matérias colectáveis com base no controlo entretanto feito.
A segunda pergunta nesta área prende-se com o seguinte: como V. Ex.ª recordará, também foi aprovado um regime de acesso às contas bancárias dos contribuintes e dos sujeitos passivos mais flexível, com menos burocracia e muito mais justo e equilibrado - pelo menos foi assim que nos foi apresentado.
Também gostaria de saber qual é, neste momento, o ponto da situação dos processos que teriam sido levantados e o resultado a que tal conduziu, porque ainda há bem pouco tempo li numa revista que V. Ex.ª divulgou que tinham procedido a uma acção de fiscalização de que teria resultado (o jornal não era muito explícito, pelo que até aproveito para perguntar a V. Ex.ª se estes dados estão correctos) a cobrança de mais 347 milhões de contos, sendo que depois esse valor foi corrigido para cerca de 150 milhões de contos, de modo que fiquei sem saber se se tratava de impostos ou de correcções à matéria colectável que ainda estavam em processo de apreciação e de reclamação.
Assim, gostaria de obter de V. Ex.ª a especificação desses valores, bem como que nos dissesse se alguns deles e essas acções de fiscalização têm a ver, como é possível que tenham, com a maior facilidade de acesso à informação bancária e, assim sendo, gostaria também de saber quais foram esses casos e que finalidades objectivas e de combate à fraude é que se alcançaram com as novas regras.
Não posso deixar de dizer (aliás, julgo que já o disse publicamente), que, no outro dia, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, o Sr. Dr. Rui Coimbra, disse numa publicação, se não foi mal transcrito, algo que continuo a considerar razoável, ou seja: disse que não podiam ser feitas comparações com o ano 2001, isto é, com o ano que está em execução, porque teria sido um ano de autêntica desgraça justamente por haver uma fuga maciça ao fisco.
Sr. Ministro das Finanças, gostaria de saber o seguinte: se isto é assim, como é que é possível compatibilizar a grande canalização de recursos e de meios financeiros e humanos para o tal combate à fraude e à evasão e depois chegar-se à conclusão de que esse combate não funcionou? Pergunto também quantos mais anos teremos de combater arduamente, e, já agora, com que meios, porventura mais adequados, porque os que têm vindo a ser consagrados não têm, alcançado o objectivo, se assim for e se assim tiver ocorrido.

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Tenho ainda mais três ou quatro questões a que gostaria que V. Ex.ª me respondesse, se puder, duas das quais partilho com o Sr. Deputado Lino de Carvalho: a da dedutibilidade do IVA profissional e outra no que respeita à prestação de garantias.
Recordo a V. Ex.ª que foi por pressão e por proposta do CDS-PP que as garantias bancárias, findo um ano, em termos de reclamação, e findos dois anos, em termos de impugnação, podem e devem ser levantadas, podendo e devendo o contribuinte que ali colocou o seu dinheiro ou está a pagar ao banco juros para ali ter a garantia bancária ser por isso indemnizado. Como tal, se possível, também gostaria de ver explicado o alcance desta medida, justamente porque considero que ela é moralizadora das relações entre a administração fiscal e os contribuintes.
Sr. Ministro das Finanças, tenho mais duas questões muito simples, tendo a primeira a ver com o novo regime consagrado no artigo 28.º, n.º 4, que procede à revisão do artigo 3.º, relativo aos rendimentos da categoria B, em que se alarga o conceito, em termos de incidência, das mais-valias. Por mais voltas que tenha dado, lendo e relendo este preceito, não consegui perceber que tipo de rendimentos estão aqui em causa e como tal, gostaria que nos desse uma ideia mais precisa de quais são rendimentos visados neste preceito, uma vez que se alarga o âmbito da respectiva incidência.
Há ainda uma outra matéria que tem a ver com o reinvestimento na aquisição de habitação. O Sr. Ministro das Finanças sabe que se levantaram alguns problemas relativamente ao anterior modelo, em que administração fiscal tinha uma doutrina interna que, a meu ver, violava manifestamente quer a letra quer o espírito da lei. Agora esse regime foi alterado, passando a ser isento de tributação o valor da realização e não já o valor da alienação feita na primeira casa que depois é reinvestido na segunda.
Gostaria de saber se esta é a concretização da tal doutrina circulatória ou se, porventura, este novo regime beneficia um pouco mais quem, apesar de tudo, com muitos sacrifícios, procura ter casa própria, pese embora ainda continuar a pagar sisa e não se vislumbrar quando é que essa sujeição ao imposto mais estúpido do mundo vai terminar!
Tenho ainda uma pergunta muito específica e própria, que tem a ver com a alteração feita no âmbito deste Orçamento ao regime da dedutibilidade dos encargos para efeitos fiscais. Reporto-me ao artigo 33.º do Código do IRC, que estipulava que 50% da totalidade das despesas de representação com viaturas ligeiras não eram dedutíveis, sendo que agora se eliminou esse preceito, passando a incluir-se à taxa de tributação autónoma 20% (artigo 73.º). É muito simples, Sr. Ministro das Finanças: isto significa que este conjunto de despesas passa a ser totalmente dedutível, havendo depois tributação à taxa autónoma de 20%.
Finalmente, Sr. Ministro das Finanças, veio hoje a público uma proposta, aparentemente formulada pelo grupo parlamentar do PS, para revisão do regime da tributação das provisões para riscos gerais de crédito, matéria que, como V. Ex.ª sabe, também nós contestámos no âmbito da reforma fiscal.
Gostaria de saber se há propostas nesse sentido ou, mesmo não havendo, se VV. Ex.as têm a ideia ou partilham a convicção de que este regime deve ser modificado, tendo em vista, sobretudo, o fortalecimento do nosso sector financeiro, que é, neste momento preciso, na nossa economia, aquilo que, a nosso ver, é mais importante preservar.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado, gostaria de começar por fazer alguns breves comentários e de colocar algumas questões concretas nesta discussão em sede de especialidade do Orçamento do Estado para 2002.
Começando pelo articulado, o artigo 57.º da proposta de lei prevê, na sua alínea l), uma autorização ao Governo para o cumprimento de obrigações assumidas, até 30 de Setembro de 2001, pelos organismos dotados de autonomia administrativa e financeira integrados no Serviço Nacional de Saúde até ao limite de 444 milhões de euros.
O PSD já levantou esta questão, volta a levantá-la, e gostaria de saber, em sede de especialidade, não só qual é a opinião do Governo, mas também qual é a sua disponibilidade para reconhecer que com este preceito violam-se normas essenciais, quer da Constituição da República Portuguesa, quer da lei do enquadramento orçamental. Ou seja, a previsão desta regularização das obrigações assumidas pelo Serviço Nacional de Saúde até 30 de Setembro de 2001, contraria claramente o princípio da anualidade do Orçamento do Estado expresso na Constituição, que refere que o Orçamento é anual, por ano civil, e na lei do enquadramento orçamental.
Ora, ao prever esta regularização até 30 de Setembro de 2001, este princípio da anualidade está a ser violado, pelo que gostaria de saber qual é a opinião do Governo sobre esta questão e, se entender que não há nenhum desrespeito da legalidade, qual é o fundamento desta autorização constante do artigo 57.º.
Em relação aos impostos em concreto, gostaria de levantar algumas questões específicas. Quanto ao IRS, há uma questão, já debatida na discussão na generalidade, sobre a qual gostaria confrontar o Governo em sede de especialidade, que é a seguinte: genericamente, a proposta do Governo procede à actualização de escalões do IRS à taxa de inflação prevista pelo Governo para 2002 de 2,75% - aliás, esta actualização processa-se não só no IRS, mas também em relação a outros impostos, tratando-se, pois, de uma actualização prevista com base na taxa de inflação.
Ora, parece que acabou de sair um novo estudo sobre a economia europeia que aponta para a continuação, no ano 2002, da recessão económica que tem vindo a verificar-se.
Assim, se, em 2002, se voltar, efectivamente, a repetir a situação deste último ano e também dos anos anteriores, mas agora, por maioria de razão face à situação económica portuguesa, europeia e mundial - e nos anos anteriores, o Governo não tem acertado nas previsões, que são, em regra, largamente ultrapassadas, nomeadamente no que diz respeito à taxa de inflação - há quem preveja, ao contrário do Governo, que a taxa de inflação não será de 2,75%, valor apontado na proposta de lei do Orçamento, mas, sim, uma taxa superior ao nível por exemplo dos 3,5%.

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Ora, a acontecer isto, ou seja, se se verificar essa inflação (e tudo leva querer que sim), os trabalhadores por conta de outrem, que representam uma taxa elevadíssima ao nível da arrecadação de receitas de IRS em cada ano orçamental, vão pagar mais impostos.
Perante isto a pergunta que faço - e nunca é demais fazê-la, face ao erro de previsões que tem acontecido, nomeadamente na receita fiscal, em 2001, mas também nos anos anteriores - é se o Governo aceita alterar esta situação em sede de especialidade ou se mantém este princípio e, a mantê-lo, fica, desde já, claro que o nosso entendimento é o de que vai haver um aumento de impostos para os trabalhadores por conta de outrem, como, aliás, é óbvio.
Em relação ao IRC, o Governo anunciou, e isso conta da proposta de lei, que vai verificar-se uma descida da taxa do imposto de 32% para 30%, havendo outras medidas avulsas que estão previstas em sede de IRC. Nós entendemos que o Governo não foi tão longe como deveria ter ido para melhorar a competitividade da economia, das empresas e para haver um estímulo ao investimento. Mas, enfim, é esta a previsão que o Governo faz e o que está previsto no Orçamento é que se baixe a taxa de 32% para 30%.
De qualquer modo, numa conjuntura económica internacional, que todos reconhecem, de incerteza, prevendo-se inclusivamente, para economias como a norte-americana, que a situação económica piore (e a situação económica desses países anda próxima da recessão), não se justificaria que o Governo apresentasse medidas mais ousadas em sede de IRC para melhorar a competitividade das empresas e para melhorar a produtividade?
Sei que o Governo tem um calendário para reduzir essas taxas para os anos seguintes, mas, em nossa opinião, isso já deveria estar vertido na proposta de lei do Orçamento do Estado para 2002.
Relativamente aos benefícios fiscais às empresas localizadas em regiões desfavorecidas do interior, que foram aprovados pela Lei n.º 171/99, de 18 de Setembro - que é uma lei da iniciativa do PSD -, gostaria de colocar duas questões ao Governo, sendo a primeira a seguinte: quando é que o Governo vai publicar a portaria regulamentadora que fixa os critérios e que procede à delimitação das áreas territoriais beneficiárias? Como o Governo bem sabe, é fundamental que isso aconteça para que a lei tenha viabilidade prática e entre em vigor.
A segunda pergunta é a seguinte: de acordo com a lei do Orçamento do Estado para 2001, que já está publicada, a portaria devia ter sido publicada no prazo de 60 dias, ou seja, até ao final de Fevereiro de 2001, para produzir efeitos já em 2001. Ora, perante este quadro, não existindo a portaria, não tendo entrado em vigor essa matéria, gostaríamos de saber qual é a posição do Governo sobre esta matéria.
No que diz respeito ao imposto sobre os produtos petrolíferos, no relatório que acompanha a proposta de lei do Orçamento do Estado, o Governo estima que o preço do petróleo continue a descer nos mercados internacionais, devendo situar-se abaixo do patamar dos 25 dólares por barril.
Por outro lado, o Governo também admite que a cotação do euro relativamente ao dólar não se afaste dos níveis actuais, isto é dos 92 cêntimos, pelo que há um enquadramento favorável à descida dos preços dos combustíveis para os consumidores, conforme o Governo aqui já assumiu na discussão do Orçamento na generalidade.
No entanto, a receita estimada para o imposto sobre produtos petrolíferos cresce 8,8% relativamente à estimativa de execução de 2001, sendo esta 40 milhões de contos inferior à previsão inicial do Orçamento para 2001, havendo, portanto, um decréscimo de 8%.
A pergunta que se põe é a seguinte: estará o Governo em condições de garantir que os preços dos combustíveis descerão já no início de 2002? E quanto? Ou, pelo contrário, não pode fazê-lo enquanto não estiver saldada a conhecida dívida às petrolíferas originada por uma política dos preços dos combustíveis, assumida nos anos anteriores por este Governo, a qual contou com a oposição do PSD?
Ora, perante uma conjuntura de baixa dos preços do petróleo nos mercados internacionais, será que o Governo está a acautelar a necessidade de continuar a fazer os pagamentos às petrolíferas para liquidação da dívida contraída sem que os preços finais de venda do gasóleo e do petróleo sejam alterados?
Ainda no que respeita ao imposto sobre produtos petrolíferos, a proposta de lei do Orçamento do Estado inclui uma autorização legislativa para que o Governo estabeleça um regime diferenciado das taxas de imposto sobre produtos petrolíferos para o gasóleo quando utilizado por veículos pesados e veículos automóveis ligeiros destinados ao serviço de aluguer com condutor, táxis, letra A e letra T.
Ora, esta autorização legislativa, que consta deste Orçamento, já constava do Orçamento para 2001, portanto, trata-se de uma repetição da autorização legislativa, pelo que ocorre perguntar o que é que o Governo pretende fazer nesta matéria. Como a autorização legislativa não foi concretizada, apesar de constar do Orçamento para 2001, o Governo, ao fazer com que ela conste novamente no Orçamento para 2002, pretende concretizá-la?
Em matéria de despesa com pessoal, gostaria de colocar a seguinte questão: tem sido entendido que é claro que o crescimento da despesa com o pessoal de 3,7%, previsto no Orçamento para 2002, relativamente à estimativa de execução de 2001, não vai ser suficiente para conter ou acomodar os aumentos salariais da função pública, que devem estar, pelo menos, ao nível da inflação prevista.
Portanto, gostaria de saber se o Governo está a contar com a dotação provisional no Ministério das Finanças para financiar esses aumentos salariais. E se está a pensar utilizar - e esta a pergunta concreta que deixo -, qual será a percentagem? É que a dotação provisional do Ministério das Finanças tem um determinado valor, tem um plafond de 100 milhões de contos, portanto, pergunto: destes 100 milhões de contos, quanto é que vai ser utilizado para as actualizações salariais?
Aliás, no que se refere à dotação provisional inscrita no Capítulo 60 do Ministério das Finanças, no que diz respeito às Despesas Excepcionais, verifica-se que os 100 milhões de contos orçamentados para 2002 representam uma diminuição de cerca de 15% em relação ao Orçamento para 2001. Na eventualidade de parte significativa desta dotação vir a ser utilizada para as despesas com o pessoal, não haverá - sendo esta é uma suposição lógica - uma efectiva

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diminuição salarial? Será o remanescente suficiente para fazer face a verdadeiras despesas imprevistas que possam surgir ao longo de 2002, já que é normalmente utilizado como dotação provisional para outro tipo de despesas que surjam?
Em relação às privatizações, de acordo com o Orçamento, estão estimados cerca de 30 milhões de contos de receitas de privatizações. O Ministério das Finanças inscreve no orçamento do Fundo de Regularização da Dívida Pública cerca de 76,3 milhões de contos para aumentos de capital de empresas públicas e de 50,8 milhões de contos para amortização da dívida pública. O Governo já sabe e pode dizer-nos quais são as empresas públicas onde serão aplicadas as receitas das privatizações para a realização dos aumentos de capital? É que eu gostaria de ver concretizada a intenção do Governo em relação a determinadas empresas públicas.
Gostaria ainda de colocar mais duas questões. Não consta nenhuma verba no Orçamento do Estado que tenha que ver com medidas concretas para o combate à fraude e evasão fiscais. O Governo fala em eficiência fiscal, anuncia uma série de medidas para o combate à fraude e evasão fiscais, mas não vemos no Orçamento do Estado qualquer verba concreta (aliás, esta questão já foi colocada anteriormente) para pôr a administração fiscal a funcionar em termos de aumentar a capacidade do Governo quanto à arrecadação da receita fiscal.
O PSD tem dito que é necessário fazer uma auditoria ao funcionamento da administração fiscal, é uma insistência que faz, mas a verdade é que a administração fiscal, como é reconhecido por todos, não tem meios, os quais deviam estar vertidos no Orçamento do Estado, para, em termos efectivos e práticos, aumentar a eficiência quanto à capacidade de arrecadação dos impostos e das receitas fiscais. Aliás, é pública a existência de algum mal-estar nomeadamente a nível dos funcionários da administração fiscal, porque esta é uma realidade e ninguém pode negá-la.
Gostaria de saber, em termos de sede de fiscalidade, o que é que consta no Orçamento em concreto para, por exemplo, completar a informatização dos serviços. O que é que consta, em concreto, para aumentar a eficiência da administração fiscal e para conseguir um maior combate à fraude e evasão fiscais, que se reflectirá no aumento da receita fiscal? Por exemplo, está previsto um reforço da articulação entre os diferentes organismos com funções inspectivas? Sabemos que a função inspectiva da administração fiscal e do Governo em relação à matéria das receitas dos impostos é fundamental, mas não vemos vertidas no Orçamento normas e verbas que correspondam a uma maior eficiência da administração fiscal.
Uma última questão tem que ver com as regiões autónomas. O Orçamento do Estado prevê para as duas regiões autónomas, dos Açores e da Madeira, um aumento da capacidade de endividamento em 6 milhões de contos, tendo as duas regiões autónomas a mesma capacidade de endividamento, independentemente de alguma crítica que possa fazer-se, fora deste âmbito, quanto àquilo que consideramos ser uma discriminação existente no PIDDAC para cada uma das regiões, mas isso já é habitual.
Haverá explicações, e, normalmente o Governo tem-nas, para que a Região Autónoma dos Açores tenha mais verbas no âmbito do PIDDAC e, portanto, no âmbito dos investimentos do Estado nas regiões autónomas, havendo, de facto, alguma diferença sempre a mais para a Região Autónoma dos Açores.
Mas, como eu disse, teremos que aceitar as explicações que o Governo dará para o próximo ano, como já deu no ano passado em relação a este ano, mas quanto à capacidade de endividamento ter-se-á de colocar a questão.
O Sr. Ministro e a sua equipa do Ministério das Finanças têm conhecimento dos problemas das duas regiões autónomas quanto à capacidade de endividamento, sendo que esta é fundamental para que as regiões autónomas possam cumprir compromissos financeiros, inclusivamente dívidas, que já existem, e obras que estão a ser feitas. Aliás, tanto quanto sei, o aumento da capacidade de endividamento era uma "reivindicação" das duas regiões autónomas, que entendiam, e entendem, que os 6 milhões de contos de aumento de capacidade de endividamento são insuficientes.
Assim, deixo-lhe esta questão: qual é o critério concreto do Ministério das Finanças para fixar em 6 milhões de contos a capacidade de endividamento das duas regiões autónomas? E faço-lhe esta pergunta, porque, ao utilizarmos vários critérios, verificamos como se processa o aumento da capacidade de endividamento em relação ao País em geral e, se tivermos em linha de conta o critério, por exemplo, da capitação da população, chegamos à conclusão que, efectivamente, esse aumento da capacidade de endividamento é muito superior para o País em geral, por comparação com o das regiões autónomas, daí a minha primeira pergunta, procurando saber qual é o critério concreto.
A segunda pergunta é a seguinte: nós aqui não podemos esconder (até no âmbito daquilo que dispõe a lei das finanças das regiões autónomas, independentemente das suas alterações, conforme proposta que, tanto quanto sei, já deu entrada no Parlamento) que o Orçamento do Estado tem de conter todas as verbas que são transferidas para as regiões autónomas. Ou seja: ou no âmbito da lei das finanças das regiões autónomas há transferências que têm de constar do Orçamento do Estado ou no âmbito do PIDDAC, para os investimentos que são feitos nas regiões autónomas, o facto é que essas verbas têm de constar do Orçamento. Portanto, tem de haver uma enorme transparência no Orçamento do Estado em relação a todas as verbas que são transferidas.
Nós não podemos esconder que, tanto quanto sabemos (e é isto que eu peço ao Ministério das Finanças que me confirmasse) estava prevista, não no âmbito do aumento da capacidade de endividamento, mas num outro âmbito, uma outra transferência para a Região Autónoma dos Açores no montante de 6 milhões de contos.
Portanto, a pergunta que deixo ao Sr. Ministro é a seguinte: se isto é verdade, como é que isto vai acontecer no âmbito do Orçamento do Estado, porque eu não acredito que seja fora do âmbito do Orçamento do Estado? Mas pergunto: se, efectivamente, isto está a acontecer, em que âmbito é que isto pode acontecer?
Independentemente da resposta do Ministério das Finanças, que eu espero que seja a de que não existe qualquer tipo de outra transferência que discrimine as duas regiões autónomas, quero deixar, desde já, a V. Ex.ª o comentário de que, efectivamente, a acontecer uma situação destas será a primeira vez, desde que há transferências de

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verbas para as regiões autónomas, a haver diferença de tratamento em relação a essas transferências.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Secretários de Estado: Eu regressaria à questão do endividamento, porque gostaria de ouvir, da parte do Sr. Ministro, qual é a sua visão sobre a questão do endividamento.
É que, sabendo nós que está a ser feito um grande esforço, ao nível do subsector do Estado, para conter o nível de endividamento, e sabendo também (e aí gostaria até que pudesse dar-me mais elementos) o que se pretende com a autorização legislativa para conter o endividamento das autarquias, gostaria que o Sr. Ministro me dissesse como é que isto tudo joga com a questão, agora levantada pelo Deputado Hugo Velosa, de, relativamente às regiões autónomas, apontarmos para valores mais elevados.
Dá-me a ideia de que temos de definir uma estratégia, relativamente ao endividamento global de todos os sectores. Portanto, gostaria que o Sr. Ministro nos desse conta do que é que se pretende relativamente ao endividamento, já que aí é expressa a autorização legislativa para o endividamento dos municípios, e de que forma é que isto se articula com o endividamento das regiões autónomas.
Depois, passo às questões de natureza fiscal sobre as quais gostaria de ouvir a posição do Governo, referindo, desde já, que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista pretende introduzir algumas alterações: uma, já aqui foi focada (e, neste momento, talvez não nos pareça ser muito justificável), tem a ver com a questão da incorporação em regime de mais-valias, da sua aplicação em termos de incorpóreo.
Assim gostaria de saber, por parte do Governo, qual é a sua perspectiva, neste momento, relativamente a essa introdução, dado que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tal como já anunciámos, pretende restringir esse normativo e não fazer incluir o imobilizado corpóreo no alargamento da possibilidade de aplicação em termos de reinvestimento.
Mas também ao nível da retroactividade do reporte entre as mais-valias e as menos-valias, gostaríamos de limitar essa retroactividade, saber a sua opinião, Sr. Ministro, relativamente a esta questão e perguntar qual a justificação para passar de dois para cinco anos o período de alargamento do reporte.
Ainda dentro da área fiscal, já há algum tempo dizemos que o normativo da reforma fiscal, que fazia depender o englobamento em função do tempo de permanência (fazendo variar esse englobamento de 75% a 30%) em que, tecnicamente, numa situação, tal qual a que vigora agora, as menos-valias são mais frequentes que as mais-valias, isso provoca desequilíbrios e alguma injustiça fiscal. Aliás, temos dado como exemplo os casos de um lote que produza uma mais-valia de 100 e um outro lote que produza, no mesmo dia e para o mesmo contribuinte, uma menos-valia de 200, o que significaria uma menos-valia global de 100, poder ser tributado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é a sua opinião!

O Orador: - Sr. Deputado, eu estou a pôr a questão, na minha perspectiva.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Está enganado!

O Orador: - Está bem, nós errámos muito, mas o PCP também anda a ler as alterações de uma forma abusiva.
Aliás, terá até, porventura, resposta a algumas das questões que já pôs, para ver que a leitura não é a do PCP que, por ser desconfiado relativamente a tudo, às vezes até lê o que lá não está.

A Sr.ª Presidente: - Ó Sr. Deputado, agradecia que tentássemos deixar as respostas para a equipa das Finanças e não começássemos já a dar respostas…

O Orador: - Sr.ª Presidente, eu fui interrompido pelo Sr. Deputado do PCP.

A Sr.ª Presidente: - Não se deixe interromper, Sr. Deputado!

O Orador: - Mas a questão que coloco é a seguinte: dado que a percentagem do englobamento é não só para as mais-valias mas também para as menos-valias, é para o saldo, pergunto se esta situação pode existir e podendo, como eu entendo que existe, é que ao englobar uma menos-valia ela tem de ser ponderada em função da percentagem de menos-valia, pelo que gostaria de saber como é que a alteração introduzida foi a do englobamento neutro de 50% e digo neutro porque, na minha perspectiva, isto não tem implicações nem nas mais-valias nem nas menos-valias, porque ao ser aplicada a taxa de 50%, não tem desequilíbrios de 70% a 30% e, portanto, não provoca estas distorções que podem acontecer.
Ora, gostaria que me fosse dito porque razão esta medida só se aplica em 2003? Não podia ser feito a meio de 2002? Já sabemos que, tecnicamente, o problema de 1 de Janeiro tinha acumulação da parte de alteração do software dos bancos para o euro e para este novo aplicativo, mas podia ser, repito, a meio do ano. Portanto, esta era uma questão que eu gostaria de ver resolvida.
Uma outra questão é a de saber o porquê da alteração do critério do FIFO, em termos de custeio das mais-valias, para o critério do custeio médio.
Gostaria, ainda, de, muito sinteticamente, elogiar, digamos, a questão de as SGPS poderem, neste momento, ser equiparadas a uma empresa de outra formulação jurídica qualquer, dado que já não se justificaria criar SGPS só para a questão do planeamento fiscal, dado que hoje, com esta alteração que me parece significativa, todas as empresas têm sobre esta matéria um tratamento idêntico.
Gostaria também de colocar uma outra questão que é a de saber se é possível dizerem-me quantas famílias podem vir a beneficiar do regime de famílias com mais de três filhos, de acordo com o normativo que foi introduzido, no sentido de beneficiar as famílias numerosas.
Por último, talvez para auxiliar alguma resposta, quero dizer que não tenho conhecimento que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista esteja a pensar em qualquer alteração às previsões de riscos gerais, que foram consideradas em termos da última reforma fiscal, mesmo com o período transitório até 2003.

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Portanto, desconheço o que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista pretenda sobre essa matéria fazer alguma alteração, ou, pelo menos, não é do meu conhecimento, hoje, que exista qualquer iniciativa nesse sentido - aliás, suponho que essa matéria não está em discussão, neste momento.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças: Eu não tenho bem a certeza se nós fazemos um grande serviço ao esclarecimento do debate, ou se, em contrapartida, fazemos um grande serviço ao Sr. Ministro, ao conjugar questões - tantas, tão variadas e de ordens tão diferentes -, porque isso acaba por favorecer sempre uma resposta que, nos limites do tempo, será sempre muito breve relativamente a matérias tão complexas e tão diferentes.

A Sr.ª Presidente: - Deixe-me só interrompê-lo, Sr. Deputado, lembrando-lhe que estamos em Comissão e aqui não há limites de tempo.
Por isso, se o Sr. Ministro não responder categoricamente às questões que forem levantadas, qualquer Sr. Deputado poderá reincidir.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Bem sei, mas há um limite que são as 24 horas do dia, pelo menos! Não é assim?

A Sr.ª Presidente: - Também não, porque poderíamos prolongar esta sessão para um outro momento.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem. Penso que é uma resposta prometedora.
De qualquer modo, queria colocar-lhe dois tipos de questões, Sr. Ministro, e muito brevemente, porque, em função das questões que já lhe foram colocadas, creio que se suscitará um debate de outra qualidade.
Em primeiro lugar, uma observação e uma questão: eu registo, e penso não ser enviesado nisto, que a equipa ministerial tomou uma atitude muito diferente no debate que tivemos na preparação da generalidade, nesta Comissão, e no Plenário, no que toca a um aspecto fundamental, que é o da cenarização da evolução da economia.
As respostas que os senhores deram, no debate aqui, na Comissão, foram na sequência dos documentos que estão apresentados, por exemplo, sobre as Grandes Opções do Plano, muito na linha de recusar uma visão recessiva; ao passo que no Plenário foi notório que tanto a intervenção do Ministro das Finanças como a intervenção do Primeiro-Ministro foram muito acentuadamente no sentido de aceitar que estamos, pelo menos, num contexto recessivo em algumas das principais economias do mundo e, provavelmente, (creio que reproduzo com algum rigor), também no espaço europeu.
Lembro que no debate na Comissão tinha dito, não sei se foi o Sr. Ministro ou se foi o Sr. Secretário de Estado, que uma das razões para prever o dinamismo das exportações portuguesas era fazer um modelo simples, com o cálculo ponderado das taxas de crescimento previstas pelos nossos principais parceiros comerciais.
Ora, parece-me mais do que óbvio, hoje, que os principais indicadores disponíveis, tanto a nível nacional como a nível internacional, sublinham que esses parceiros comerciais estão em retracção.
Assim, o que lhe quero perguntar é se, depois das afirmações que foram feitas no Plenário pelo Ministro das Finanças e pelo Primeiro-Ministro, não se lhe sugerem alterações de estratégia quanto à política orçamental, nomeadamente alterações quanto ao cenário macroeconómico que o Governo apresentou. Sabemos que apareceram cenários que pecam por exagero - o Bank of America, por exemplo, previa um crescimento de 0,3% da economia portuguesa para o ano de 2002, o que me parece francamente exagerado -, mas é certo que o Banco Mundial prevê para a economia da zona euro um crescimento de 1%, o que atiraria, forçosamente, para níveis muito inferiores o cenário macroeconómico que o Governo tem vindo a defender. Gostaria, pois, que me fizesse um comentário sobre esta matéria.
Sobre algumas outras matérias, fico a aguardar a resposta a algumas perguntas concretas da Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona e do Sr. Deputado Lino de Carvalho. Em particular, quero apenas sublinhar três questões, e não mais do que isso, porque elas já foram colocadas.
Em primeiro lugar, houve ou terá havido ou estaremos a ter em 2001 ganhos de eficiência em alguns impostos. Pelas projecções disponíveis e pelos dados até final de Setembro, parece ser o caso do IRS. Pela minha parte, entendo que seria muito importante que tivéssemos informação detalhada sobre o que significa este crescimento do IRS, isto é se tal crescimento é em termos de novos contribuintes, se é em termos de eficiência fiscal, se é em termos de instrumentos de controlo. Este problema foi colocado e quero reforçá-lo, porque me parece que dá uma indicação muito importante para as projecções possíveis no próximo ano.
No entanto, em sentido exactamente contrário, gostava de saber o que se passa a nível do IRC. O Sr. Ministro deu-nos aqui, na Comissão, em sede de debate na generalidade, informações no sentido de que, segundo os dados disponíveis até final de Setembro, havia uma queda de 9,6% no IRC, mas a sua equipa tem vindo a dizer que, neste último trimestre, se espera uma atenuação desta evolução. Assim, gostava que nos explicasse porquê, qual o sentido desta evolução - e já temos mais um mês e meio de informação -, o que é que se espera e quais são as razões para isso.
Por outro lado, gostava também que comentasse a questão das provisões para riscos gerais e da tributação sobre provisões.
O Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro já fez uma intervenção sobre isso e quero, naturalmente, dar-lhe razão. No entanto, parece-me que a forma florentina que utilizou é muito preocupante, porque, ao garantir-nos que hoje não tem conhecimento desta matéria, está, certamente, a ser sincero mas não é aquilo que gostaríamos de ouvir, ou seja que "se isso aparecer, eu estou contra, bater-me-ei contra essa proposta". Pela minha parte, preferiria uma declaração de vontade mais do que uma constatação do facto provisório. Toda a nossa vida é feita de mudança e já sabemos o que são estes debates do Orçamento.

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Enfim, é uma afirmação política que registo como tal, mas ficaria mais contente se tivesse um segundo registo no sentido de que o Governo, hoje, também não tem conhecimento dessa matéria e ainda mais contente ficaria se o Governo nos dissesse que, se vier a ter conhecimento disso, se oporá.
Ainda sobre a questão dos cartões de crédito, li, na imprensa, que o Sr. Ministro tinha feito a declaração categórica de que iria colocar inspectores tributários à porta dos restaurantes. Parece-me um pouco preocupante ver entrar o Ministro de faca e garfo no restaurante a perguntar, realmente, pelos recibos que foram passados e não sei se seria um sintoma de grande ganho de rigor na intervenção da administração tributária. Enfim, não é necessariamente garantido que seja o melhor instrumento.
No entanto, foi, de facto, aqui lembrado um dos instrumentos possíveis - e não cobre todas as condições -, que é a obrigação que as instituições gestoras dos cartões de crédito têm de prestar toda a informação pertinente ao Ministério das Finanças. Quero saber se isso é considerado insatisfatório e daí esta expedição retaliatória possível sobre os restaurantes ou se, pelo contrário, há alguma indicação que nós não tenhamos e que justifique medidas novas.
Uma outra questão que quero colocar-lhe, Sr. Ministro, tem a ver com esta alteração que propôs em relação a um dos impostos especiais sobre o tabaco, a qual tem sido justificada, em ambientes informais, com uma necessidade de fazer aumentar a receita, por via de fazer aumentar a venda dos charutos e cigarrilhas. Quero, pois, perguntar-lhe, muito directamente, preto no branco, se é mesmo assim, se essa é a razão para esta proposta de redução da taxa especial sobre charutos e cigarrilhas. É mesmo para fazer aumentar o consumo desse tabaco?
Finalmente, registo, e já o fiz publicamente, um aspecto positivo neste Orçamento, que é a medida que impossibilita ou dificulta a utilização de empresas off-shore para a compra de habitação, como agentes do contrato de compra de habitação.
Quero, no entanto, perguntar-lhe por que razão é que esta medida não é extensível a todos os bens de consumo duradouro, ou seja, todos aqueles que não têm a ver propriamente com a aplicação de poupanças de não residentes, pois aqui, pelo contrário, trata-se de uma estratégia para poder comprar mais barato uma casa. Mas, se é esse o objectivo do Governo, como parece ser, e é um objectivo louvável, por que é que isto não se estende ou será que o Governo está disponível para estender esta medida a todos os bens de consumo duradouros, que, pela mesma razão, são embaratecidos com uma estratégia de planeamento fiscal desse tipo.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que já todos os partidos políticos intervieram nesta primeira ronda de questões, vou dar a palavra ao Sr. Ministro das Finanças ou aos Srs. Secretários de Estado, conforme o Sr. Ministro entender, para responder às questões que foram suscitadas.

O Sr. Ministro das Finanças (Guilherme d'Oliveira Martins): - Muito obrigado, Sr.ª Presidente.
Antes de mais, quero, naturalmente, agradecer todas as questões que foram colocadas e parece-me que, de facto, as essenciais estão colocadas nas dúvidas e nos problemas que ressaltaram das várias intervenções.
Em primeiro lugar, gostaria de vos dizer algo que me parece importante relativamente ao método. O Governo e a equipa do Ministério das Finanças estão totalmente disponíveis para desenvolver com a Assembleia da República e, em particular, com esta Comissão um trabalho permanente de acompanhamento não só da execução do Orçamento mas também do contexto conjuntural em que este Orçamento para 2002 irá ser posto em prática.
Numa conjuntura de incerteza, como aquela que temos e que prevemos para o ano de 2002, parece-me que este é o melhor método e o mais adequado. Nesse sentido, a Comissão poderá, certamente, reflectir sobre a melhor maneira de o fazermos, mas julgo que, antes de mais, a possibilidade de termos reuniões periódicas de análise e de acompanhamento do Orçamento e da consolidação das finanças públicas é, naturalmente, uma sugestão importante. Pensamos que há aqui um trabalho a fazer entre o Parlamento e o Governo para o qual o Governo tem toda a disponibilidade, aliás, mais do que disponibilidade considera que se trata de um trabalho indispensável.
Em segundo lugar, no debate na generalidade, a Sr.ª Presidente da Comissão, na sua qualidade de líder parlamentar do Partido Social-Democrata, perguntou, e eu respondi-lhe, mas parece-me que é indispensável responder, de novo, no início desta fase do debate do Orçamento do Estado para 2002, de onde partíamos, tendo suscitado, designadamente, a questão do Orçamento rectificativo.
Ora, devo dizer, com muita clareza, porque esse ponto é extraordinariamente importante, uma vez que é o ponto de onde partimos, é a base para a discussão deste Orçamento do Estado, que os pressupostos e os elementos relativos à previsão de execução orçamental para 2001 são aqueles que constam do relatório da proposta de lei. E manda a verdade que se diga aqui - isso tem de ficar muito claramente afirmado - que a necessidade de Orçamento rectificativo deve-se, fundamentalmente, não a qualquer rompimento do tecto da despesa mas, isso sim, à adopção de uma maior flexibilidade relativamente ao défice orçamental. O défice orçamental que estava subjacente ao Orçamento que foi aqui aprovado e depois alterado para 2001 era um défice de 1,1%. Nós entendemos, para não sacrificar o investimento público e para não sacrificar a despesa social, executar o Orçamento sem nos atermos ao limite estrito do 1,1%, face à evolução da conjuntura, face ao abrandamento da economia. É por isso que, ao apresentarmos uma previsão de execução do Orçamento com 1,7% de défice na execução de 2001, se torna necessário que este Parlamento se pronuncie sobre a questão da alteração daí decorrente.
Recordo que no Orçamento rectificativo, que foi aprovado em 29 de Junho passado, o pressuposto continuava a ser o défice de 1,1% e, naturalmente, também o limite da dívida pública inerente a esse pressuposto. Este aspecto é, pois, importante: não alteramos os pressupostos de execução orçamental que constam do relatório da proposta de lei e, portanto, o valor que aí vem indicado, de 1,7% de défice na execução do Orçamento, é aquele para que, em princípio, continuamos a apontar.
Outro aspecto importante, porque é geral, tem a ver com a questão pertinente que o Sr. Deputado Francisco Louçã

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colocou relativamente à cenarização. Disse o Sr. Deputado Francisco Louçã que terá sido diferente a tónica que lhe pareceu resultar do nosso discurso na Comissão e no Plenário.
Sr. Deputado Francisco Louçã, naturalmente, é verdade que a prudência determina que nós analisemos, momento a momento, a evolução da conjuntura. E recordo aqui a afirmação produzida no discurso do Sr. Deputado João Cravinho, relativamente ao contexto dos cenários e à necessidade de analisarmos e vermos o cenário em estreita com a própria opinião pública e com a própria confiança dos agentes económicos.
Não há, neste momento, razões para alterarmos o cenário macroeconómico que está subjacente ao Orçamento do Estado, o que não significa, porém, que não seja necessário continuarmos a ser muito prudentes, não cometendo quaisquer excessos de optimismo em relação ao cenário macroeconómico.
Na semana passada, há exactamente oito dias, realizou-se a reunião do Conselho ECOFIN e houve duas conclusões que os ministros das finanças adoptaram nessa reunião. Em primeiro lugar, a de dizer que as consequências de 11 de Setembro passado são mais fundas e, porventura, mais duradouras do que inicialmente estava previsto. Em segundo lugar, também se concluiu que os fundamentos das economias europeias apontam para que, a médio prazo, haja boas perspectivas na superação da actual fase de abrandamento. É por isso que tenho dito e reafirmado, como fiz no Plenário, que não se pode esperar de mim, da equipa das Finanças e do Governo qualquer cenário idílico relativamente à evolução da economia. No entanto, também não se pode esperar de nós o alimentar de qualquer cenário de crise.
O Sr. Deputado Hugo Velosa usou a expressão "recessão para Portugal". Ora bem, Sr. Deputado, essa expressão não é correcta, uma vez que não há nenhum elemento que, relativamente à conjuntura portuguesa, nos leve a considerar estarmos em conjuntura recessiva.
Os dados claros e inequívocos a que nos podemos ater são os seguintes: antes de mais, os dados do crescimento em relação aos dois primeiros trimestres do ano, período em que se verificou um crescimento em relação ao período homólogo do ano anterior e em relação ao período anterior. Havia, de facto, essa dúvida relativamente ao primeiro trimestre, como o Sr. Deputado Hugo Velosa se recorda, mas essa dúvida desvaneceu-se.
Por outro lado, temos já um outro elemento, que é o indicador coincidente do Banco de Portugal relativamente ao terceiro trimestre, que aponta para um ligeiríssimo abrandamento relativamente ao período anterior mas sempre num nível de crescimento que é, neste momento, superior às previsões para os outros países europeus. Estes são os dados objectivos e não podemos retirar conclusões em que, na ânsia de termos um cenário menos optimista, já estamos, pura e simplesmente, a rasurar a própria realidade. Isso, de facto, não deve acontecer.
Nesse sentido, Sr. Deputado Francisco Louçã - e comecei por esta questão por ser relativa ao enquadramento geral -, devo dizer que é esta uma razão que me leva a propor ao Parlamento e à Comissão um acompanhamento muito especial, tanto no que se refere ao enquadramento como, simultaneamente, no que respeita à execução. Repito: os números que temos continuam a apontar para os limites que estão na nossa previsão, mas é evidente que não podemos ser imprudentes a ponto de dizer que a realidade vai evoluir num sentido mais positivo ou num sentido menos positivo. Não me parece, portanto, que seja possível termos aqui qualquer visão idílica relativamente à realidade.
Passarei, agora, às questões mais específicas, respondendo de forma relativamente telegráfica e remetendo muitas delas directamente para os Srs. Secretários de Estado, antes de mais para o Sr. Secretário de Estado do Orçamento e para o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e, depois, para o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, caso lhe seja dirigida alguma questão.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho referiu-se à questão da despesa, às margens de manobra, às despesas certas e permanentes e às despesas com o pessoal, recordando bem que, de facto, invocámos aqui - e repetimo-lo - a redução dos abonos variáveis. Eu disse, no entanto, que a margem de manobra é mais ampla do que isso, uma vez que envolve tudo o que diz respeito à contratação de pessoal e também um acompanhamento muito estrito e especial relativamente a esse ponto. Nós, neste particular, temos a preocupação, por um lado, de corresponder aos desafios concretos - as obrigações, os deveres e as responsabilidades -, mas, simultaneamente, devemos fazer incidir uma muito maior disciplina orçamental na execução do Orçamento.
Todavia, o Sr. Deputado referiu um caso concreto, que também foi, aliás, aludido por vários outros Srs. Deputados, em particular pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona. Diz respeito este caso aos serviços tributários, à Direcção-Geral dos Impostos, e, em particular, às acções de inspecção e às acções de combate à fraude e à evasão fiscais.
Posso dizer-lhes, Srs. Deputados, que esta é uma das nossas preocupações fundamentais. Há medidas que já foram tomadas, designadamente em relação à afectação de meios do próprio Fundo de Estabilização Tributária, e, por outro lado, há acções concretas que entendemos dever levar a cabo, uma vez que temos consciência de que a eficiência fiscal depende, em medida muito significativa, do empenhamento e, simultaneamente, da retribuição justa dos trabalhadores dos impostos. É uma questão que estamos a acompanhar pari passu, é uma questão fundamental e ela vale, naturalmente, para os trabalhadores dos impostos, na medida em que estamos a falar do combate à fraude e à evasão fiscais, mas, naturalmente, reporta-se também a um acompanhamento muito estrito que estamos a fazer da despesa, para que as responsabilidades e obrigações sejam cumpridas.
O Sr. Deputado Hugo Velosa referiu que não havia verbas orçamentadas relativamente ao combate à fraude e à evasão fiscais, mas no PIDDAC há verbas orçamentadas para o combate à fraude e à evasão fiscais e eu reafirmo aqui o que já disse. Chegámos, como sabe, a 78% de informatização do sistema da administração fiscal e iremos atingir os 100% no ano 2002; é esse, pelo menos, o empenhamento que temos.
Relativamente à afectação da dotação provisional, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento completará a minha resposta, dando esclarecimentos adicionais, mas, no que respeita aos códigos fiscais, gostaria, em primeiro lugar, de dizer que algumas das considerações que o Sr. Deputado Lino de Carvalho produziu na discussão em Plenário do

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Orçamento, na generalidade - considerações que repetiu aqui -, partem de alguns pressupostos que não estão inteiramente correctos, como o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais terá oportunidade de justificar.
Em primeiro lugar, pode estar certo que a nossa ideia não é, de modo algum, a de favorecer ou apoiar quaisquer movimentos especulativos ou quaisquer movimentos de curto prazo. Falou o Sr. Deputado na tributação das mais-valias e estas são, como sabe, um elemento simbólico extraordinariamente importante, mas, relativamente ao conjunto das receitas efectivamente cobradas, uma realidade infelizmente pouco relevante.
A verdade é que se tem falado nos tais 600 milhões de contos que andarão por aí, mas o certo é que vivemos num espaço de fronteiras abertas, como sabe, e eu gostaria bem, como calculam, em nome de todos os contribuintes e da eficiência fiscal, de ter possibilidades de tributar uma parte significativa desse valor. Todavia, como também sabem, este valor é mais mítico do que real, pela razão exacta que estou a invocar, bastando, aliás, percebermos qual é a configuração dos diferentes sistemas fiscais europeus, sem ser necessário, sequer, ir para os off-shore. Como o Sr. Deputado sabe, basta utilizar alguns sistemas fiscais extraordinariamente favoráveis no domínio da tributação de capitais, como é o caso do Luxemburgo.
Como o Sr. Deputado bem sabe, o Luxemburgo é um país e um espaço fiscal onde há uma forte e densa presença portuguesa - recordo-lhe que 1/3 da população activa é constituído por portugueses. Isto para lhe dar conta de que este movimento é muitas vezes natural e justificado por esta circunstância.
Reportando-me à concretização ou à aplicação das mais-valias de que estamos a falar, começo por dizer que no ano 2001, quer por virtude da conjuntura económica, quer por virtude das dificuldades técnicas, a tributação do imposto, em termos de colecta, era praticamente igual a 0, facto que não se vai repetir, como o Sr. Deputado sabe, uma vez que a aplicação das medidas que adoptámos levará já à percepção de receita fiscal que, de outro modo, seria extraordinariamente difícil.
Gostaria, aliás, de dar também nota de que, em relação às situações que referiu, designadamente no que diz respeito ao regime simplificado, saudou as alterações positivas e questionou quanto à publicação dos coeficientes de base técnico-científica.
Trata-se de um tema extraordinariamente importante, como sabe. Aliás, é tão importante quanto difícil, para sermos inteiramente claros. O Sr. Deputado sabe bem que não tenho os critérios dos coeficientes de base técnico-científica aqui, no bolso, o que de resto seria bom, uma vez que a sua existência e aplicação são elementos centrais para uma maior eficiência fiscal.
No entanto, quero que saiba, Sr. Deputado, que estamos a trabalhar não apenas na criação e adopção desses coeficientes, mas também na adopção de instrumentos que nos permitam antecipar o efeito dos mesmos. Não é preciso que estejam completos, mas é necessário começar por tê-los, para termos uma atitude inteiramente realista relativamente a esta questão. Caso contrário, arriscamo-nos a ter de estar à espera dos coeficientes técnico-científicos, uma vez que eles são de facto difíceis e os técnicos e os cientistas não se põem facilmente de acordo relativamente a eles, porque a ciência e a técnica fiscal são de facto extraordinariamente complexas (e a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona sabe-o bem). Assim, quero apenas dizer-lhe, Sr. Deputado, que o seu interesse é, neste ponto, o nosso interesse e o nosso empenhamento.
Quanto ao IRC, o Sr. Deputado referiu a questão do alargamento do activo incorpóreo da tributação.
No que diz respeito a este tema, devo dizer-lhe que o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro já referiu que em relação ao imobilizado incorpóreo das mais-valias estamos totalmente disponíveis e, mais do que disponíveis, pensamos que é correcta a proposta, o sentido e o alcance da sugestão que foi aqui feita pelo Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Incorpóreo ou corpóreo?

O Orador: - Incorpóreo, Sr. Deputado.
A proposta concreta que o Sr. Deputado…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas por que é que fizeram esta proposta aqui?

O Orador: - Como?…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Basta repor o que estava!

O Orador: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais irá dar-lhe a explicação a essa questão.
De qualquer modo, e antes disso, quero sublinhar que já referi no Plenário, em resposta à intervenção do Sr. Deputado João Cravinho, que entendemos ser plenamente correcta a adopção da solução que ele aqui defendeu e que foi preconizada pelo Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
Mas para não estarmos a protelar este tema, e se a Sr.ª Presidente o permitir, solicito ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Ficais que esclareça o Sr. Deputado Lino de Carvalho quanto à questão suscitada.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Ficais (Rogério Ferreira): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, o que está aqui em causa, única e exclusivamente, são razões de normalização e de harmonização do regime.
Dado que o regime do IRS para as mais-valias prevê um englobamento a 50 % quer para as mais-valias imobiliárias, como se previa já anteriormente, quer para as mais-valias mobiliárias, tal como se prevê, e dado que no IRC se estabeleceu também a regra dos 50%, entendemos que, estando em causa as mais-valias, o tratamento deveria ser idêntico.
Contudo, não pelas razões que o Sr. Deputado indicou mas por razões de fiscalização, admitimos que se justifica a exclusão do activo incorpóreo do regime previsto no artigo 45.º do Código do IRC.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Que era o que estava!

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O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Com certeza, Sr. Deputado! É isso mesmo. Portanto, estamos inteiramente de acordo neste ponto, dentro dos pressupostos que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais acabou de mencionar.
Gostaria ainda de referir que remeto para o Sr. Secretário de Estado a resposta a outras questões que colocou, designadamente em relação à suposta retroactividade.
No que diz respeito à também suposta redução dos requisitos para o comprovativo de não residente em off-shore, a meu ver, a leitura que o Sr. Deputado faz continua a ser a menos correcta. Isto porque não é, de facto, nosso objectivo facilitar ou dar um sinal contraditório relativamente quanto ao que pretendemos para as off-shore.
Quanto a esta questão, Sr. Deputado, quero voltar a dizer-lhe que o que fizemos começou, claramente, muito antes do dia 11 de Setembro. Designadamente, o despacho que fiz nesta matéria, bem como as medidas que começaram a ser tomadas nesta área, são de data anterior, sendo que o dia 11 de Setembro deu maior actualidade a este tema.
A nossa única preocupação, neste aspecto, diz respeito aos imigrantes, razão pela qual entendemos apontar para uma maior desburocratização, neste particular. No entanto, gostaria de sublinhar que a preocupação do Sr. Deputado no que diz respeito a uma exigência redobrada em relação aos off-shore é uma preocupação que também temos.
Quanto à questão das garantias no Código de Processo Tributário, a autorização que aqui consta reporta-se exclusivamente ao processo judicial. Contudo, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais terá também oportunidade de falar sobre este assunto.
No que diz respeito à actividade turística e à dedutibilidade do IVA relativo a despesas profissionais e de alojamento, o Sr. Deputado Lino de Carvalho sabe por certo que neste momento estão em fase adiantada os trabalhos relativos à elaboração de uma directiva comunitária nesta matéria. Por isso, temos de ter uma extraordinária preocupação na articulação das situações, para não estarmos a definir em Portugal soluções que, porventura, venham ser infirmadas pela directiva a que me referi.
Portanto, esta é uma questão que nos preocupa, e tanto nos preocupa que foi previsto um grupo de trabalho. O facto de esse grupo de trabalho não ter sido ainda activado deve-se exclusivamente à circunstância de ter-se acelerado o trabalho europeu nesta matéria e ainda ao facto de não queremos, obviamente, estar a perder tempo. Naturalmente que poderíamos pôr o grupo de trabalho em funcionamento e as pessoas a discutir, mas obviamente, porque essas pessoas são conhecedoras desta realidade, elas perguntariam, antes de mais, qual o ponto da situação em relação à directiva. Esta é a razão fundamental, Sr. Deputado.
Passando à questão do critério da taxa de inflação em relação às transferências, quero dizer-lhe o seguinte: na elaboração do Orçamento, entendemos que, face às situações que existem no tocante à cobrança de receita e à indispensabilidade de acordo com o princípio da unidade de caixa, deveríamos salvaguardar ao máximo as previsões cautelosas que fazemos relativamente à cobrança de receitas. Daí que tenhamos procedido como procedemos.
Trata-se, pois, de uma medida cautelar, para garantir que a cobrança de receita global não seja aqui posta em causa. De qualquer modo, Sr. Deputado, registamos a sua preocupação.
A Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona colocou uma questão sobre o princípio do englobamento e sobre os princípios fundamentais - que, digo e repito, não foram abandonados - relativos às medidas fiscais, tendo em conta o que foi aprovado em 2000.
Sr.ª Deputada, a questão fundamental é exactamente esta: o princípio do englobamento decorre da Constituição. Naturalmente que tem as dificuldades conhecidas, mas este princípio está plenamente claro. Tem-se dito muitas vezes que se suspendeu o regime das mais-valias relativamente ao IRS, mas, em bom rigor, aquilo que fizemos foi a adopção das medidas técnicas indispensáveis para podermos aplicar os princípios fundamentais que decorrem, quer da Constituição, quer da lei. E foi por isso que afirmei que a tributação das mais-valias sem discriminação é um princípio para cumprir e para respeitar.
Assim, como já referi na resposta ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, em 2001, por virtude da própria evolução da conjuntura mas também pelos problemas técnicos que as medidas envolviam, não houve qualquer cobrança desta receita no tocante ao IRS.
Portanto, neste momento, estamos num ponto em que não pudemos, por várias razões, cobrar a receita inerente, tendo sido criado um vazio, porque não cobrámos a receita relativamente ao novo nem cobrámos a receita em relação ao antigo, porque o antigo já não estava em vigor. Esta é que é a questão fundamental que está em causa.
Portanto, quando se referiu à questão da retroactividade, quero dizer-lhe que não estamos perante uma situação em que se ponha a questão da retroactividade. O que estamos aqui a fazer é cumprir o princípio de que, se há rendimento, tem de haver cobrança de imposto. Este é um princípio fundamental, não havendo, portanto, aqui, uma verdadeira retroactividade, uma vez que estamos apenas, em nome da eficiência fiscal, a garantir que quem teve rendimento pague o respectivo imposto.
De outra maneira, isto é, se chegássemos ao dia 31 de Dezembro e não tivéssemos os instrumentos indispensáveis para a diferenciação de taxas e regimes, naturalmente que ficaríamos numa situação em que, por um vazio técnico-legal, não iríamos cobrá-lo.
Pergunta a Sr.ª Deputada - e é uma pergunta extraordinariamente pertinente - qual a consequência, relativamente aos movimentos de capitais, das medidas que foram adoptadas em 2000, em particular, nas mais-valias.
Em relação a este aspecto, limito-me a recordar aquilo que o Sr. Deputado João Cravinho lembrou na intervenção que fez no debate na generalidade, citando o relatório da CMVM em relação a este assunto particular.
O relatório da CMVM diz-nos que não é possível estabelecermos uma relação de causa-efeito entre as medidas adoptadas em 2000, a evolução da nossa bolsa e, simultaneamente, os movimentos de capitais.
Esta situação, Sr.ª Deputada, é muito difícil e, no domínio das considerações que cada um faz sobre a evolução, podemos tirar todas as conclusões e todas as consequências. Mas julgo que o bom e o correcto, neste momento, é olharmos para a frente e, se houve fuga de capitais e quebra

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de receita, garantirmos, sobretudo, condições positivas de confiança para os capitais que saíram poderem regressar e para, simultaneamente, restabelecermos essas condições de confiança. É esse o trabalho. Não podemos refazer a história, não podemos estar aqui a dizer se a CMVM tem ou não razão, mas a verdade é que, olhando para a frente, temos de criar condições para que Portugal seja um espaço de estabilidade e de certeza relativamente à evolução e à confiança económicas.
Nesse particular, Sr.ª Deputada - e sei que este princípio lhe é caro, como julgo que é caro a todo este Parlamento e a todos os Srs. Deputados -, precisamos, de uma vez por todas, de criar condições, através de consensos duráveis no Parlamento, para termos um sistema fiscal simples, compreensivo e eficaz. Esta é que é a questão fundamental. E naturalmente que, para termos um sistema simples, compreensivo e eficaz, precisamos também de condições de estabilidade que nos permitam aplicar um sistema fiscal, aplicar os impostos, ter cobrança de receita real e autêntica, ligando sempre dois princípios, o da competitividade e o da justiça fiscal. Estes dois princípios têm de estar permanentemente ligados. Não faz sentido olhar apenas à competitividade fiscal sem olhar à justiça, como não faz, naturalmente, sentido preocupar-nos apenas com o princípio da justiça, sem nos preocuparmos com o princípio da eficácia ou da eficiência. Afinal, quando falamos de finanças públicas, estamos sempre a falar da eficiência e da equidade, que vão a par.
Relativamente às medidas de controlo, referiu vários exemplos, como os cartões de crédito e o acesso mais flexível às contas bancárias. Já agora, reporto-me a duas pequenas questões que foram suscitadas pelo Sr. Deputado Francisco Louçã: uma tem a ver com o IVA na restauração e outra com os célebres charutos e cigarrilhas.
Tenho estado em silêncio, como Conrado, relativamente aos charutos e às cigarrilhas porque tenho achado graça à insistência do Sr. Deputado Francisco Louçã. Verá como é fácil a resposta que tenho para lhe dar.
Mas comecemos, naturalmente, pelo IVA da restauração, ligando-o às medidas de controlo e de fiscalização.
Srs. Deputados, as medidas concretas que estão previstas fazem parte dos programas de fiscalização da administração tributária, queremos pô-las em prática e queremos também ter resultados, porque ainda não os temos relativamente a este tipo de acções, e relacionaria isto com os tais critérios técnicos e científicos, porque umas coisas têm tudo a ver com as outras, como bem sabemos.
Portanto, relativamente à restauração, Sr. Deputado, não quero, naturalmente, que, agora, por trás de cada consumidor esteja um agente fiscalizador da administração fiscal.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Até porque isso era mau para a digestão do almoço!

O Orador: - Não é mau, não, Sr. Deputado!
O Sr. Deputado Lino de Carvalho, concordará comigo, e com certeza que o Sr. Deputado Francisco Louçã também, que há, infelizmente, o hábito de o cidadão contribuinte, esquecendo que está a ser prejudicado com isso, não solicitar, como é seu direito, os recibos relativamente àquilo que pagou.
Naturalmente que não esquecemos o que é que se passa noutros países, designadamente em Espanha ou em França, mas certamente que a alguns dos Srs. Deputados, à saída dos restaurantes, foi perguntado - certamente que isso aconteceu, porque é normal - sobre se tinham ou não o recibo, e isto é extraordinariamente importante em razão do funcionamento do IVA, em razão do sistema do IVA, que exige, naturalmente, para que a cobrança da receita seja feita, que todos os que estão na "corrente" cumpram e solicitem o cumprimento das obrigações fiscais.
O Sr. Deputado Francisco Louçã, que julgo não ser fumador - eu também não o sou -, certamente que verificará, se se der a esse cuidado, que uma parte significativa dos charutos e das cigarrilhas que são vendidos em Portugal não pagam os impostos, uma vez que eles são adquiridos noutros países onde o imposto tem um valor inferior, designadamente em Espanha. Verificará, aliás, que a maior parte dos charutos e cigarrilhas que, neste momento, são consumidos em Portugal são de proveniência espanhola e de proveniência ilegal, razão pela qual se tornava indispensável combater a fraude e a evasão neste particular e, sobretudo, garantir que deixemos de estar a consumir charutos e cigarrilhas de outros países, ainda por cima ilegalmente, e cumpramos as nossas obrigações. Aqui, a única razão, Sr. Deputado, é…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Mas são espanhóis ou são ilegais?! É que se são trazidos de Espanha não há qualquer ilegalidade! É o mercado comum!

O Orador: - Não, Sr. Deputado! Como o imposto que é percebido em Espanha é menor, naturalmente que eles são ilegais, uma vez que, em bom rigor, a sua tributação reporta-se à taxa praticada em Espanha e não a à taxa praticada em Portugal.
Nesse sentido, Sr. Deputado, é melhor termos a mesma taxa e é melhor, naturalmente, favorecermos aí a transparência do mercado. É apenas isto, e não é para incentivar…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - A minha suspeita é verdadeira!

O Orador: - Como?!

O Sr. Francisco Louçã (BE): - A minha suspeita é verdadeira!

O Orador: - Sr. Deputado, não é, portanto, para incentivar nem o fumo do charuto nem da cigarrilha, é apenas para garantir que não haja estes movimentos excêntricos relativamente a este comércio.
Mas, voltando às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, há uma questão importante - as outras questões serão respondidas, depois, pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais - que tem a ver com a tributação de provisões.
Para ser franco, fiquei surpreendido com esta notícia de que haveria uma proposta de alteração relativa à tributação de provisões de riscos gerais de crédito. Devo dizer que não há. Não tenho conhecimento disso e o Governo também não a tem no seu "cardápio" de propostas a serem submetidas aqui ao Parlamento. Alguém falou nisto,

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com certeza, mas não julgo que seja matéria que se torne indispensável.
Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, como sabe, relativamente a esta matéria, há uma distinção muito importante entre as provisões gerais, que têm um regime que deve ser aquele que está em vigor, e as provisões específicas, e naturalmente que a grande questão está aqui. Percebe-se que o regime seja diferente, uma vez que a própria "saúde" e a transparência no funcionamento das instituições financeiras depende desta ligação. Julgo, no entanto, que não deve haver uma rigidez relativamente a estas fronteiras, deve haver, sim, clareza relativamente ao que é provisão geral e o que é provisão específica. E se a provisão é específica, definindo-se, naturalmente, qual é a sua finalidade, obviamente que deve obedecer a um regime diverso.
Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais responderá, depois, às outras questões que colocou.
Sr. Deputado Hugo Velosa, relativamente à questão do artigo 57.º, alínea l), e ao Serviço Nacional de Saúde, devo dizer que, uma vez que há muito tempo estudo estas questões, e até escrevi muito sobre elas, tive a preocupação de ver, designadamente quanto ao sentido e ao alcance da própria anualidade, se haveria aqui qualquer entorse. Aliás, a Sr.ª Presidente, Manuela Ferreira Leite, suscitou-me esta questão em Plenário, disse mesmo que apelava, enfim, à minha experiência nesta matéria jurídico-financeira.
Mas vendo bem, Sr. Deputado Hugo Velosa, em bom rigor, e não invocando já o precedente - porque, de facto, houve um precedente, e um precedente mais amplo no caso do Orçamento do Estado para 1999 -, para ser muito claro, tenho dificuldade em ver que haja aqui entorse ao princípio da anualidade, apenas por uma razão, Sr. Deputado: é que, para efeitos de défice orçamental e de despesa, a verdade é que esta regularização não envolve aumento ou agravamento das necessidades de financiamento traduzidas em défice. É esta a razão pela qual tenho dificuldade em considerar que haja uma violação do princípio da anualidade, é um princípio apenas de regularização. Não havia violação em 1999 e não há, a meu ver, violação em 2002.
Mas naturalmente que estou aberto e disponível para ouvir os vossos argumentos, sendo que, neste momento, eles seriam relevantes se houvesse, de facto, diferença em regularizar aqui ou em regularizar noutro ano. Verdadeiramente, esta despesa é despesa já realizada. E, mais, é despesa já contabilizada em termos dos critérios europeus. Esta é que é a questão fundamental.
Quanto ao IRS, já respondi a algumas das questões que referiu.
V. Ex.ª invocou aqui uma previsão de inflação para 2002 muito diferente daquela que fazemos. No entanto, permito-me dizer-lhe que basta ver os últimos números e a tendência clara de evolução dos preços para verificar que o ano 2002 vai apresentar valores muito próximos dos limites inferiores da nossa previsão, basta olhar os números que já hoje existem, se não houver, naturalmente, alterações significativas no que se refere às circunstâncias.
Relativamente ao IRC, o Sr. Deputado referiu que os 30% eram ainda insuficientes e que era necessário ir mais além. Sr. Deputado Hugo Velosa, não sei se tem consciência da quebra de receita fiscal pela adopção da taxa de 28% ou 29% no ano 2002. Estamos no "fio da navalha", como bem sabe, Sr. Deputado, e se há algumas medidas cujo desagravamento de taxa podem envolver aumento de receita, em virtude da própria eficiência, neste caso a redução envolverá sempre uma quebra significativa de receita fiscal. Os números estão apurados, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais recordá-los-á aqui, mas, verdadeiramente, esse é que é o nosso problema, problema que também tem a ver com outra circunstância: as medidas relativamente ao interior, já adoptadas (a portaria que aqui invocou já está assinada), vão, já de si, envolver significativamente, para um número muito importante de contribuintes, desagravamentos extremamente significativos. Esta é que é a questão que não pode, obviamente, deixar de ser referida.
Relativamente ao ISP, perguntou-me, em primeiro lugar, como é que é isto do crescimento da receita e também como é vai ser com os preços da gasolina, designadamente no próximo ano.
Sr. Deputado Hugo Velosa, em primeiro lugar, o princípio da estabilidade de preços, que nós adoptámos, levou a que assumíssemos compromissos com as petrolíferas. Esses compromissos estão praticamente saldados e essa é a razão pela qual podemos prever um aumento tão significativo, mas prudente, da receita em ISP no ano 2002.
Com a recente evolução de preços do petróleo, ainda acima dos 20 dólares por barril - e, como sabe, a previsão, neste momento, é a de que, a partir da próxima semana, teremos os preços um pouco acima de 22 -, a verdade é que, ao saldarmos os encargos relativamente às petrolíferas, criam-se condições para termos mais receita relativamente ao ISP e criam-se também condições para cumprir aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro já referiu e que é, face à evolução dos preços internacionais do petróleo, adoptarmos no início do ano, quanto à gasolina, a medida que for então adequada, tendo em conta, repito, o preço internacional do petróleo nessa altura.
Relativamente às privatizações, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças falará sobre isso, designadamente em relação à questão da aplicação do Fundo Regularização da Dívida Pública.
Quanto à autorização legislativa sobre os veículos, naturalmente que a nossa preocupação é a da pertinência dessa autorização em 2002. Isto tem a ver com o que estou também a dizer quanto à consequência de podermos, a partir de 1 de Janeiro de 2002, ter um novo regime relativamente aos preços dos produtos petrolíferos, repito, em particular para a gasolina, mas também para o gasóleo é necessário que dele tiremos as devidas consequências para que tenhamos um sistema coerente.
Quanto às regiões autónomas, relativamente à capacidade de endividamento, os 6 milhões de contos que prevemos, quer para a Região Autónoma dos Açores, quer para a Região Autónoma da Madeira, correspondem, afinal, à necessidade de cumprirmos os nossos compromissos, designadamente em termos de défice do sector público administrativo. E se prevemos 6 milhões de contos para as duas regiões autónomas, a verdade é que, como sabe, prevemos um endividamento líquido zero para as autarquias locais.
Naturalmente que o ano 2002 é um ano extraordinariamente importante em relação ao cumprimento pelo sector

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público administrativo dos compromissos que assumimos, vamos ter já em 2002 de apresentar elementos periódicos relativamente à execução dos orçamentos e, neste particular, não podemos deixar de fazer funcionar um sistema que é este: as limitações que são feitas para a administração central, para o Estado, têm, obviamente, de ser seguidas solidariamente pelos outros subsectores. Julgo que este é um princípio que não oferecerá dúvida. Percebo que isto envolva dificuldades mas, como princípio, não envolverá dúvidas.
Colocou-me também uma outra questão, sobre se haveria um tratamento discriminatório relativamente à Região Autónoma dos Açores. Quanto ao endividamento, ele não é discriminatório, envolverá o mesmo limite quer para os Açores quer para a Madeira. Mas está a referir uma outra questão, que, neste momento, estamos a estudar e que, naturalmente, com toda a transparência, queremos assumir.
Sr. Deputado, não haverá aqui…

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Por isso é que eu fiz a pergunta!

O Orador: - Sr. Deputado, com certeza! Eu não fujo às perguntas!
É uma questão que tem a ver com as recentes calamidades, em particular no Faial, nos Açores, e há um problema concreto relativamente às calamidades nos Açores que estamos a estudar neste momento. Mas, Sr. Deputado Hugo Velosa, pode estar certo de que a solução que encontrarmos não vai ser para tentarmos fugir àquilo que são as competências do próprio Parlamento.
Como perceberá, Sr. Deputado, numa região como os Açores, que tem calamidades periódicas, infelizmente, naturalmente que não poderíamos - nem poderia eu, Sr. Deputado! - deixar de estudar e considerar essa questão que está posta. Mas não será fugindo ao Parlamento, certamente, que adoptaremos o que quer que seja. É um princípio, é um princípio de solidariedade que aqui não pode deixar de ser lembrado. Aliás, informalmente, há pouco dias, falava sobre isto com o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, que exprimia a sua preocupação face a este caso concreto, que era um caso diferente do de um endividamento geral.
Portanto, nem os Srs. Deputados das regiões autónomas nem eu próprio estaríamos bem connosco próprios se não assumíssemos com clareza a distinção das coisas, designadamente a resposta às populações que foram atingidas severamente pelas calamidades, no caso dos Açores.
Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, a primeira questão que colocou tem que ver com a definição clara dos limites relativos aos endividamento. Naturalmente que, neste particular, a preocupação que temos é a de uma definição clara dos compromissos que assumidos e por isso comecei por dizer que é indispensável que, com toda a informação disponível, o Governo e o Parlamento, nestas matérias, possam trabalhar mais em conjunto e mais articuladamente.
Remeto para o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais a resposta relativa às questões fiscais.
Quanto ao número de famílias que poderão beneficiar do regime de mais de três filhos, trata-se de 65 000 famílias. É o número que temos, mas o Sr. Secretário de Estado completará as questões.
Sr. Deputado Francisco Louçã, já respondi relativamente à cenarização e também em relação aos ganhos de eficiência em 2001, designadamente em relação ao IRS.
Sr. Deputado, os ganhos da eficiência registados em 2001, designadamente nos últimos meses, correspondem, a nosso ver, a duas circunstâncas: uma é o facto de o IRS se reportar, em parte, a rendimentos do ano 2000 e, em parte, do 2001, como sabe, e ao facto de haver, na nossa perspectiva, resultados já positivos na própria preocupação que temos tido de acompanhar a execução e a cobrança de receitas.
Pergunta-me por que razão é que, à eficácia do IRS, corresponde uma menor eficácia relativamente ao IRC. Há um conjunto de medidas que foram adoptadas ao longo do tempo, designadamente em relação ao efeito dos pagamentos por conta; este efeito dos pagamentos por conta, que foi, como sabe, alterado em 2000, teve o seu pleno efeito em 2001 e essa é uma das razões que leva a esta quebra de receita.
Pergunta-me se, então, nos dois meses que ainda faltam, é possível recuperar alguma coisa. Devo dizer que é difícil estarmos a dizê-lo exactamente, mas temos essa expectativa, uma expectativa legítima. No entanto, julgamos que só a partir do dia 1 de Janeiro de 2002 será possível obtermos ganhos de eficiência maiores relativamente também ao IRC.
Estamos a acompanhar com muito cuidado a execução do IRC em 2001 e por isso apenas lhe posso dizer e reafirmar aquilo que temos dito: esperamos que os últimos meses possam dar algum sinal positivo também relativamente ao IRC.
Quanto às previsões de riscos gerais, já lhe respondi: não está no nosso horizonte, não temos ideia de fazer essa alteração do regime.
No que se refere ao off-shore, última questão que pôs, perguntou porque não estender o regime que prevemos para a habitação a outros bens duradouros. A nossa preocupação, Sr. Deputado, é justamente a de podermos alargar ao máximo o regime que permita combater a fraude e a evasão através de off-shore, mas percebe por que razão, no caso da habitação, é mais fácil, uma vez que estamos perante bens sujeitos a registo, o que torna as coisas mais fáceis, e eu diria que, relativamente a outros bens duradouros, aqueles sujeitos a registo, também pode vir a haver um regime semelhante.
Peço agora ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para responder às restantes questões colocadas.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, julgo que maior parte das questões já foram respondidas pelo Sr. Ministro, mas, não obstante e percorrendo as questões que foram sendo colocadas pelos Srs. Deputados, eu salientaria, telegraficamente, o seguinte: relativamente à observação do Sr. Deputado Lino, de que, segundo a sua opinião, este regime de tributação das mais-valias, com englobamento a 50% nas pessoas singulares, vai penalizar as mais-valias de longo prazo, digo-lhe, se me permite, que a observação está enviesada, na medida em que o regime é exactamente igual, quer as mais-valias sejam especulativas quer não o sejam, de acordo com a expressão que utilizou.
A razão para o regime ser idêntico resulta do facto de o englobamento a uma taxa única, a 50% - que é a taxa

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média relativamente às taxas que existiam nos termos da Lei n.º 30-G/2000 -, ser o único que permite, com alguma facilidade, o novo sistema da retenção na fonte, através dos intermediários financeiros.
Além disso, na actual conjuntura, faz sentido promover a liquidez do mercado e, sendo assim, faz sentido que esta diferenciação não exista.
Por outro lado, temos outros instrumentos de poupança a longo prazo, como é o caso dos PPR, dos PPA, etc., onde se justifica - nestes, sim - esta diferenciação.
Por último, diria que o próprio mercado penaliza as mais-valias especulativas, designadamente através de comissões cobradas pelos intermediários financeiros.
Portanto, há várias razões que justificam um regime de tributação com englobamento a 50%, nomeadamente a simplicidade e a eficácia do próprio sistema.
Para terminar, digo-lhe também, relativamente à observação que fez, que julgo que essa diferenciação, a ser feita, não deve sê-lo no âmbito das respectivas taxas. Julgo que o regime instituído, através da isenção de base, tem virtualidades…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Nem sequer o puseram em prática!

O Orador: - … que permitem nessa sede, eventualmente até em sede de Estatuto dos Benefícios Fiscais, estabelecer essa distinção.
Quanto à questão da dupla tributação económica, que tem que ver com a substituição do método de crédito de imposto pelo método da isenção, não vejo como possam ser agravados os mais altos rendimentos relativamente a rendimentos mais baixos, dado que o método de crédito de imposto impunha que o respectivo crédito de imposto fosse acrescentado ao rendimento líquido global do sujeito passivo.
De qualquer forma, a orientação política não é essa e, portanto, agradeço demonstração da parte do Sr. Deputado Lino de Carvalho caso haja alguma falha técnica, que, obviamente, será rectificada.
Relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado sobre o n.º 8 do artigo 30.º do Código do IRC e a exigência do reinvestimento, quero dizer-lhe que não houve qualquer alteração relativamente ao regime transitório anterior, que constava da Lei n.º 30-G/2000. Esse regime é integralmente mantido, o que se acrescenta é uma norma, é uma alternativa, é um direito que é dado ao contribuinte de poder antecipar a tributação para um momento que não o da venda.
Primeira nota: é um direito que acresce ao regime transitório que já existia, pelo que não há qualquer alteração relativamente ao regime anterior.
Segunda nota: o que não se exige é, antecipando a tributação, o reinvestimento subsequente dos valores de realização dos activos que concretizaram o reinvestimento, ou seja, o reinvestimento também é integralmente mantido.
Se porventura há algum lapso de expressão, ou técnico, na redacção, também estamos abertos, obviamente, para o corrigir. Portanto, o reinvestimento continua a ser exigido.
Quanto à questão que colocou sobre aquilo que designa por off-shore da Madeira e que eu designaria por Zona Franca da Madeira, gostava de chamar a sua atenção para o facto de que as normas são meramente interpretativas ou simplificadoras e desburocratizantes do regime fiscal da Zona Franca da Madeira, muito especialmente para o disposto na proposta de alteração do artigo 33.º, n.º 21, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, em que, como vê, são excluídas do âmbito institucional da Zona Franca da Madeira as comissões decorrentes de actividade de intermediação. Portanto, digamos, o sentido da norma é exactamente aquele pelo qual se tem batido, no âmbito da mesma.
No que respeita à alteração do Código de Procedimento e de Processo Tributário, tenho visto que há alguns erros de interpretação; já vi um primeiro erro de interpretação num artigo do jornal Expresso, salvo erro na última semana, e um segundo no jornal Público de hoje.
Note-se que a alteração se destina a rever o regime de prestação de garantias no âmbito judicial, ou seja, no âmbito do processo judicial e não no âmbito do procedimento administrativo. Portanto, há que saber fazer a respectiva distinção.
É evidente que essas normas necessitam de alguns aperfeiçoamentos técnicos, que, obviamente, carecem de uma autorização legislativa dada pela Assembleia da República. Saliento, por exemplo e designadamente, o facto de a norma se referir ao trânsito em julgado, quando, na minha opinião, se deveria referir à mera decisão em primeira instância, como, aliás, parece decorrer de uma interpretação correctiva adequada do respectivo preceito.
Julgo que estão respondidas, por mim ou pelo Sr. Ministro, todas as questões do Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Relativamente às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, julgo que ainda faltará responder à de saber se a administração fiscal foi dotada dos meios financeiros necessários, designadamente no que respeita à formação e a conhecimentos mais aprofundados, dada a queixa do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos que referiu.
Posso fazer chegar à Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona dados sobre a formação que tem vindo a ser feita desde a existência do Instituto de Formação Tributária. De facto, a formação cresceu substancialmente desde que este instituto existe e, portanto, poderei fazer chegar à Sr.ª Deputada, com todo o gosto, os dados relativos ao aumento da formação que este instituto consubstanciou desde a sua existência.
No que concerne à questão das garantias, ela já foi respondida no âmbito da resposta dada ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Colocou-me ainda uma questão sobre o artigo 28.º, n.º 4, nomeadamente sobre qual o seu alcance e quais os rendimentos que aqui estão em causa, admito que, relativamente a este artigo, também possa ser corrigida alguma questão técnica que seja menos perceptível.
Seja como for, a alteração proposta pretende atrair para a categoria B não apenas as mais-valias tal como são qualificadas em sede de IRC mas também outros rendimentos, como mais-valias, nos termos do artigo 10.º do Código do IRS, e que se referem aos activos afectos ao exercício de uma actividade profissional ou empresarial.
Esta alteração justifica-se por duas razões: em primeiro lugar, porque parece não fazer sentido que rendimentos

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obtidos no âmbito de actividades profissionais e empresarias estejam sujeitos às regras especiais de englobamento das mais-valias, designadamente à regra dos 50%; em segundo lugar, porque desta forma contribui-se para uma maior neutralidade no tratamento fiscal entre quem exerce uma actividade empresarial a título individual ou de forma societária. É esta a intenção.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Já percebi!

O Orador: - Passo a responder à questão do regime do reinvestimento nos imóveis, sobre ter passado a ser o valor de realização e não o de alienação. De facto, alterou-se para o valor de realização, a que se acrescentou "deduzido do valor de amortização do empréstimo". Aqui, o sentido de valor de realização é igual ao do valor de alienação, mas se for necessário alterar a expressão, por razões técnicas, admito que também se altere.
Quanto à questão que colocou sobre o artigo 33.º e o porquê da existência de tributação autónoma, devo dizer que isso se passa, naturalmente, por razões de neutralidade e harmonização entre os regimes dos Códigos do IRS e do IRC, que passou a ser exactamente o mesmo para as despesas de representação e para as despesas com viaturas ligeiras de passageiros.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Tributa-se autonomamente?

O Orador: - Exactamente, tributa-se autonomamente, como já se tributava em sede de IRC. Isso faz-se por razões de normalização e de simplificação.
Julgo que respondi a todas as questões colocadas pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.
No que respeita à questão do Sr. Deputado Hugo Velosa, que falta responder, sobre as medidas concretas contra a fraude e evasão ficais, gostava apenas de salientar que o plano de actividades da fiscalização foi apresentado no final de Outubro ao Sr. Ministro e que este inclui, por solicitação expressa do Sr. Ministro, um critério de fiscalização muito particular.
Em primeiro lugar, tem em consideração o novo regime simplificado. Obviamente que o regime simplificado, por si só, permite uma deslocalização da fiscalização para as empresas com contabilidade organizada, mas o Sr. Ministro acrescentou o seguinte critério: as empresas com contabilidade organizada, quer em sede de IRS quer em sede de IRC, que apresentem lucros inferiores a 50% daqueles que se aplicariam caso estivessem sujeitos aos coeficientes do regime simplificado, serão, como critério, obrigatoriamente sujeitas a fiscalização.
É evidente que há outras medidas previstas no plano de actividades, designadamente a nível de programas informáticos, que permitirão seguir os processos desde o momento das correcções até ao momento do trânsito em julgado das respectivas decisões.
Das questões colocadas pelo Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, a relativa ao incorpóreo já foi respondida aquando da resposta dada ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Relativamente à questão do retroactividade do reporte de dois para cinco anos, o Sr. Deputado também já teve oportunidade de indicar que não terá efeitos retroactivos, conforme proposto pelo grupo parlamentar, a 1 de Janeiro de 2001.
Quanto à questão que me colocou de o englobamento provocar injustiças nos diferentes períodos e de saber se seria tecnicamente possível instituir o novo regime dos 50% a partir de 1 de Janeiro de 2001, digo-lhe que, de facto, isso não é tecnicamente possível.
Dou um exemplo muito concreto - que, aliás, já foi aqui chamado à colação pelo Sr. Deputado Afonso Candal - que tem que ver com o seguinte: suponham que, num determinado ano, há uma mais-valia decorrente da alienação de uma determinação acção no valor de 100 positivo, sendo que essa acção foi adquirida há menos de um ano. Portanto, o englobamento será de 75 dessa mais-valia de 100.
Se, porventura, existir uma menos-valia decorrente de uma alienação de uma acção detida há mais 5 anos, suponham que no valor de 200, o saldo negativo é de 100, mas a mais-valia existe em 15. Ou seja, vai haver uma tributação de uma menos-valia e, portanto, viola-se aqui o princípio da capacidade contributiva. Por isso, o regime dos 50% torna-se necessário para obviar a este tipo de situações.
Por outro lado, não seria viável aplicar o regime dos 50% a partir de 1 de Janeiro de 2002 por uma razão muito simples: é que as menos-valias eram consideradas a partir de 1 de Janeiro de 2001 em 75% e não em 50%, de modo que tem de aguardar-se um ano, que é precisamente o ano da introdução do euro e também do regime de retenção na fonte, que agora é previsto para efeitos de cobrança efectiva das mais-valias das pessoas singulares.
Por último, porquê a alteração do critério FIFO (first in, first out) para o critério de custeio médio? Porque é o critério mais adequado à implementação do mecanismo de retenção na fonte agora previsto.
No que respeita às questões colocadas pelo Sr. Deputado Francisco Louçã, julgo que o Sr. Ministro já respondeu a todas elas.
Sr.ª Presidente, é tudo o que tinha para explicar aos Srs. Deputados.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças (Rodolfo Lavrador): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em relação à questão muito concreta colocada pelo Sr. Deputado Hugo Velosa, direi que, pela própria natureza das coisas e pela própria incerteza do que é a vida empresarial não há nenhuma razão para este ano termos uma resposta diferente daquela que aconteceu nos outros anos. Como é evidente, o conhecimento das empresas concretas que poderão ou não vir a ser objecto de um aumento de capital dependerá da própria execução orçamental.
Em todo o caso, gostaria de focar dois pontos. Em primeiro lugar, como é evidente, o valor determinado foi tecnicamente fixado, com o rigor habitual, por parte da Direcção-Geral do Tesouro, não havendo nenhuma razão para pensar que, em termos globais, não será um valor suficiente para as necessidades que possam vir a existir.
Em segundo lugar - e este é o aspecto que me parece mais importante -, estando nós a falar de receitas que à face da Constituição e da lei têm uma afectação com alguns constrangimentos, podemos assegurar que faremos uma aplicação rigorosa desses constrangimentos. Portanto,

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as aplicações que fizermos serão no sector produtivo, mesmo quando feitas através da forma de aumentos de capital. Neste aspecto seremos totalmente rigorosos.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Coimbra): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, gostaria de deixar duas ou três notas. De alguma forma, o comentário quanto à Despesa acabou por centrar-se nas despesas com pessoal, tendo o Sr. Deputado Lino de Carvalho tocado no ponto, ou seja, referiu que existe uma margem muito maior do que aquela que parece, nomeadamente porque há uma estimativa da nossa parte e orçamentámos um decréscimo nos abonos variáveis, sendo a questão essencial o porquê.
Como se sabe, essa despesa depende fundamentalmente do efeito volume e não do efeito preço. Isto quer dizer que se argumentamos, por outro lado, que há uma contenção muito grande na parte do efeito volume, temos de saber que é como consequência dessa contenção que se consegue conter também os abonos variáveis e eventuais, nomeadamente as horas extraordinárias. Portanto, essa despesa está mais ligada ao efeito volume do que a qualquer tipo de efeito preço, nomeadamente de negociação salarial.
Portanto, por um lado, justifica-se, como é óbvio, um crescimento muito menor, um crescimento zero, ou até menos, dessa despesa. A pergunta é o segundo passo, ou seja, porquê menos 20% (não é tanto, mas não está muito longe deste valor). Tenho alguma esperança que possamos chegar a esse valor mas orçamentámos menos 15%.
O argumento que posso mencionar é que foram dadas instruções muito específicas aos serviços, quando estavam no processo de orçamentação, no sentido de se concentrarem no essencial e de fazerem bem as contas. É que sabemos - e o Sr. Deputado também o sabe, com certeza - como muitas horas extraordinárias são pagas! De alguma forma, tenta resolver-se nesta sede uma série de outros problemas. Ora, entendemos que esta não é a sede para resolver outro tipo de problemas. Portanto, se temos problemas com carreiras, isso resolve-se noutra sede, não em sede de horas extraordinárias! Assim, com estas instruções dadas ao nível do processo de orçamentação, é natural que apareça um valor negativo no crescimento.
A segunda questão colocada pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho refere-se à dotação provisional. O Sr. Deputado quer saber onde está e onde vai ser aplicada a dotação provisional. Ó Sr. Deputado, se eu soubesse não lhe chamava provisional, orçamentava-a exactamente no sítio e no Ministério devido! Infelizmente, a dotação provisional, pela sua natureza, corresponde exactamente àquilo que não sei onde vou gastar; se soubesse estava resolvido o problema e, obviamente, a dotação provisional desaparecia por definição, deixava de ser provisional!
Já agora, uso o mesmo tipo de argumentação para o Sr. Deputado Hugo Velosa…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Secretário de Estado, peço desculpa por interrompê-lo, mas gostaria de referir-me ainda a esta questão.
A dotação provisional está dividida em duas partes, as despesas correntes e as de capital, sendo que uma e outra, aparentemente, têm valores iguais (249,4 milhões de euros).
Deixando as despesas correntes, porque estão todas afectas a despesas com pessoal, vemos que as despesas de capital, de 249,4 milhões de euros, estão afectas a dois factores: aquisição de bens de capital (94,8 milhões de euros) - é fácil, basta comparar os vários mapas do Orçamento - e transferências para outros sectores que não públicos (154,6 milhões de euros). A soma destas duas parcelas dá 249,4 milhões de euros.
A minha pergunta muito concreta é a seguinte: o que significa transferência para outros sectores não públicos? Que outros sectores não públicos são esses que vão receber uma transferência de 154,6 milhões de euros das dotações provisionais em sede de capital?

O Orador: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, mais uma vez, dou-lhe a mesma resposta, apenas com uma leve nuance. Não se trata de outros sectores não públicos mas, sim, de outras administrações públicas, simplesmente não é Estado, nesse sentido. Mas se se chegar à conclusão - daí a virtualidade da dotação provisional -, ao longo da execução, que a dotação serve mais para aquisição de bens e serviços do que para as transferências de que falou, como sabe, esses ajustamentos podem ser feitos.
Nesta fase, fez-se uma distribuição da dotação provisional entre rubricas da Despesa, não entre Ministérios ou sectores onde se saiba desde já que a dotação provisional vai ser aplicada. Se o soubesse, incluiria essa verba no plafond desse Ministério! Se eu estivesse a responder-lhe onde iria ser aplicada a dotação provisional, o Sr. Deputado Lino de Carvalho dir-me-ia para tirar essa verba da dotação provisional e inclui-la nos Ministérios, e aí teria de dar-lhe razão. Como não é esse o caso, não vou dar-lhe razão.
O Sr. Deputado Hugo Velosa perguntou também, e na mesma sequência - aliás, gostaria de frisar a harmonia na questão da dotação provisional -, quanto vou utilizar, pois dá ideia que a dotação não chega. Realmente, imagino que a forma como está a colocar a questão faz apelo a uma negociação salarial de tal forma elevada que não tenho dotação provisional para o que me pede.
Como sabe, sempre defendemos uma moderação salarial e é exactamente com os valores da dotação provisional de que fala, esses 100 milhões de euros, que haverá uma negociação salarial com moderação.
Penso que mais nenhuma questão foi colocada sobre a Despesa, mas gostaria de fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Francisco Louçã, relativa ao cenário macroeconómico.
Sr. Deputado, a questão que colocou quando falou das exportações como função do crescimento económico esperado para os outros países é realmente muito pertinente. Ou seja, se por qualquer razão os crescimentos económicos dos países que temos em consideração e que, obviamente, são os nossos principais parceiros comerciais, forem sucessivamente revistos em baixa, faria sentido ter uma menor taxa de crescimento das exportações e, em consequência, uma menor taxa de crescimento do produto.
Mas o curioso é que o Sr. Deputado não sabe exactamente - mas terei o maior prazer em enviar-lhe esses dados - os valores que estavam por detrás da nossa estimativa,

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ou seja, que tipo de crescimento económico para os nossos principais parceiros comerciais levámos em consideração para chegar àquele valor da taxa de crescimento das exportações e, então, comparar agora com o novo. É que pode ser que seja o mesmo, pode ser que já tenhamos antecipado estas revisões em baixa, porque fizemos este Orçamento há um mês, não foi assim há tanto tempo.
O Sr. Deputado, usando o argumento das exportações, obriga-me a usar o argumento do consumo! Então o Banco Central Europeu faz uma descida fundamental de 50 pontos base na taxa de juro e não devemos ajustar também o consumo e o investimento?! Será que se compensam? Penso que, nesta fase, o melhor é deixarmos estar o cenário como está, com aquele argumento que já referimos - aliás, o Sr. Ministro também já o mencionou várias vezes - de que, com certeza, estaremos dispostos, à medida que o tempo vai avançando, para fazer todas as revisões do cenário macroeconómico quando se julgar conveniente; neste momento não o é, com certeza! Aliás, como prova, por que não pegamos, não no Bank of America, que o Sr. Deputado quis usar como argumento, mas, sim, por exemplo, nas consultoras que têm referido que o crescimento será de 2,5% para o ano de 2001 e de 2,5% para 2002? Como sabe, também não fomos por aí! E como o Sr. Deputado sabe, pois é tão macroeconomista como eu, o Bank of America não é referência para nada!…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Foi o que eu disse!

A Sr.ª Presidente: - Depois da primeira ronda de perguntas dos partidos, tenho mais três inscrições para pedir esclarecimentos.
Uma vez que as grandes questões já foram levantadas pelas diferentes bancadas, peço aos Srs. Deputados que sejam sintéticos, pois, provavelmente, pedem a palavra apenas para esclarecer alguns pontos que não ficaram claros com as intervenções agora feitas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Menezes Rodrigues.

O Sr. Menezes Rodrigues (PS): - Sr.ª Presidente, não pretendo exactamente esclarecer pontos que não ficaram claros mas, sim, formular novas questões, o que farei muito rapidamente.
Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, o imposto de selo incide em algumas realidades em que causa perturbação, quer do ponto de vista da competitividade quer do ponto de vista da concorrência, e isto é verdade particularmente no crédito. A alteração proposta ao artigo 4.º do Código do Imposto do Selo melhora francamente a incidência e os intervenientes abrangidos, particularmente as instituições de crédito sediadas no exterior mas com filiais em Portugal. Todavia, parece ter escapado algo que, francamente, temos alguma dificuldade em controlar, que são as instituições que podem operar em Portugal em operações transfronteiriças onde não há lugar à tributação.
Não tenho condições para avaliar o montante, mas sei que em época de mercado único pode atingir dimensões preocupantes. Esta é uma das minhas preocupações, pelo que gostaria de obter um comentário.
A segunda questão que quero colocar tem que ver com a anunciada activação do artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais. Haverá sempre uma conjuntura melhor para activar esta regra, contudo, considerando que há uma quantidade de agentes económicos, de empresas de pequena e média dimensão, e até algumas de grande dimensão, que aderiram ao Plano Mateus, se essas empresas não estiverem em condições de poder ajustar… É verdade que esta é uma medida perfeitamente necessária, dada a endémica debilidade da capitalização das nossas empresas, mas fico com a seguinte preocupação: se, porventura, aproveitarem o balanço para se deixarem liquidar haverá, de facto, uma quebra substancial no Plano Mateus.
Assim, a minha pergunta é no sentido de saber se ao Ministério das Finanças interessaria esta conjuntura a partir de 1 de Janeiro para activar este preceito legal.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, gostava de fazer um comentário ou um pedido de esclarecimento adicional relativamente a algumas das respostas dadas.
A primeira questão é de ordem geral. O Sr. Ministro, nas respostas que deu, fez uma afirmação que porventura é esclarecedora das razões de fundo que levam à suspensão e à alteração de alguns aspectos da reforma fiscal aqui aprovada, designadamente em sede de mais-valias.
O Sr. Ministro referiu que era necessário restabelecer a confiança no mercado de capitais e que eram precisos consensos duráveis. Mas consensos duráveis com quem, Sr. Ministro?! O Sr. Ministro, em sede de tributação fiscal, quer que haja um consenso que englobe toda a gente, quer quanto à tributação do capital quer quanto à tributação do trabalho? São perspectivas legítimas, mas temos aqui vários partidos porque há vários interesses na sociedade que não podem estabelecer consensos.
Se há matéria em que o consenso é quase impossível é na tributação.
Então por que é que, ao fim de pouco tempo de se ter estabelecido nesta Assembleia um determinado consenso, para utilizar a explicação do Sr. Ministro, de alteração aos códigos dos impostos sobre os rendimentos, essas alterações, mesmo sem terem sido postas em prática e testadas, foram alteradas, Sr. Ministro?
A tese é a de que já não se pagava nada. Pois não, não se pagava! Foi por isso que se procurou fazer, tributando, para se começar a pagar! O que aconteceu foi que o Governo, perante as pressões de um dos sectores que se considerou prejudicado, o de movimento de capitais, decidiu recuar. Essa é que é a questão, Sr. Ministro!
Como dizem os observadores e os protagonistas dos mercados de capitais, um dos problemas que afecta a confiança no mercado de capitais, para usar a expressão do Sr. Ministro, é exactamente a instabilidade dos regimes fiscais. Se calhar não são tanto as taxas, é a instabilidade dos regimes fiscais, isto é, o facto de em nenhum momento se perceber qual é a linha de rumo estratégica que o Governo quer dar à tributação, porque as alterações que agora pretende introduzir vão, aliás, para além de outras alterações que porventura tenham sido introduzidas nos códigos de imposto sobre os rendimentos noutros países, designadamente na própria Espanha, que apenas introduziu uma alteração, aliás significativa, no sentido da diminuição,

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para 18% da dedução em mais-valias em sede de imobilizado incorpóreo. Mais nada!
Nós fomos muito mais além! As alterações ainda não foram introduzidas na prática, ainda não se testou a sua eficácia, e o Governo, em vez de assumir uma posição firme, de dizer "vamos tributá-las porque Portugal é o único país onde a tributação do capital se faz nestas condições"…
Aliás, o Sr. Deputado João Cravinho - depois de ele o ter já hoje trazido à colação, Sr. Ministro, eu também o trago - deu aqui alguns exemplos do desequilíbrio entre a tributação do capital em Portugal e a tributação do trabalho. Portanto, as alterações introduzidas nos códigos procuraram, minimamente, fazer algum reequilíbrio neste desequilíbrio - passe a expressão - e esta filosofia, esta preocupação, é posta claramente em causa nas modificações propostas. É o mesmo que leva o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, sem ainda sequer ter testado a aplicação das alterações introduzidas em sede de tributação das acções em IRS, a dizer "não, eu acho que assim está mal e, portanto, é preciso criar uma taxa única". A taxa única foi agora introduzida, mas por que é que não se testou o processo anterior?
Portanto, Sr. Ministro, não vale a pena estarmos com rodeios, estas alterações técnicas têm um significado! O Governo tomou a opção de, em vez de assumir uma posição firme em relação às pressões que o mercado de capitais fez perante as alterações ao Código, ceder naquilo que eram elementos nucleares, que tendiam a promover algum reequilíbrio na justiça tributária em Portugal. Essa é a questão que vale a pena ter presente. E no próximo Orçamento vamos ter outras alterações e outras alterações, e são estas alterações significativas - não são pormenores de correcções, são alterações de estratégia, de reflexão - sobre a tributação em sede de imposto sobre o rendimento, que prejudicam a tal confiança dos mercados de capitais com os quais os senhores estão tão preocupados.
Sr. Ministro, é evidente que o mercado de circulação de movimentos de capitais é hoje um processo de fronteiras abertas, mas é por isso que se torna necessário fazer esse controlo. Por exemplo, como essa era uma questão que nos preocupava, como o Sr. Ministro sabe, num dos pontos do memorando que entregámos ao Governo - aqueles célebres 19 pontos que já discutimos na generalidade - dissemos que havia a necessidade de publicar, até à apresentação do Orçamento do Estado, a legislação complementar à reforma fiscal, designadamente no que se refere às regras de comunicação à administração fiscal dos movimentos transfronteiriços de transacções não comerciais. Isto é, os senhores, em vez de procurarem melhorar o sistema fiscal, no controlo e na informação, em relação aos movimentos de capitais no quadro da globalização, preferem deixar de tributar aquilo que, justamente, devia começar a ser tributado. É, de facto, uma clara opção política do Governo.
Quanto às previsões, tomei boa nota de que o Governo e o Partido Socialista não têm conhecimento de nenhuma alteração dos "riscos gerais". Esperemos que não surja nenhuma alteração para a previsão dos "riscos específicos" em relação ao sistema financeiro.
Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o senhor diz que sobre erros técnicos a exigência de reinvestimento se mantém em relação aos efeitos retroactivos da tributação das mais-valias, dos tais 600 milhões de contos de que para aí se fala. Então o Sr. Secretário de Estado não leu o que escreveu, porque o n.º 8 do artigo 30.º, salvo erro, relativo às alterações ao Código do IRC é claro e diz que a parte da diferença positiva, portanto, o saldo líquido, das mais-valias, criando um novo direito, como o Sr. Secretário de Estado diz, alterou a situação existente e esse novo direito é só isto: pode, por opção de um sujeito passivo, ser antecipadamente incluído na base tributável de qualquer exercício anterior ao da alienação do activo. Estamos a falar das mais-valias realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001, por metade do seu valor, nos termos previstos nos códigos, sem exigência de reinvestimento. Está aqui escrito, Sr. Secretário de Estado. Não é com exigência de reinvestimento, como o Sr. Secretário de Estado respondeu, é sem exigência de reinvestimento. Ora, o que está no Código actualmente é que essa diferença pode ser reportada em 10 anos, mas desde que tenham tido o reinvestimento.
Portanto, há uma alteração profunda e significativa, não só em relação à retroactividade dos exercícios onde a entidade em causa tenha esse tipo de prejuízos - fica resolvido -, sem exigência de reinvestimento. Portanto, não é aquilo que o Sr. Secretário de Estado disse.
Quanto aos off-shores, o Sr. Ministro disse que fez alterações em sede dos imigrantes. Então, por que é que há alterações em relação às SGPS, em sede de IRC? Por que é que às SGPS se alarga o conceito de isenção de tributação em sede de off-shores, onde deram lucros às mais-valias? Aí não tem a ver com os imigrantes!… Por que é que em relação às SGPS se afirma, claramente, que elas estão dispensadas de apresentar qualquer certificação da qualidade de não residente das entidades com quem opera? Está cá escrito! Sr. Ministro, não é uma questão de imigrantes, como disse.
Sr. Ministro, suspeito que, em relação ao preço da gasolina, vamos ter um filme idêntico ao de há dois anos. O Sr. Ministro já falou um pouco de forma diferente do Sr. Primeiro-Ministro, que disse que, a partir de Janeiro, o preço ia baixar, tendo o Sr. Ministro dito que a situação vai ser revista em função das alterações que houver.

O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Não!

O Orador: - Eu só estou a dizer, Sr. Ministro, que há uma diferença entre o discurso voluntarista, para agradar a quem está a ver os debates televisivos e à opinião pública, de que o preço da gasolina vai baixar - e, ao ouvi-lo, o Sr. Ministro deve ter ficado como anteriormente o ministro Pina Moura ficou, ou seja, um pouco aflito - e o seu, dizendo que se o barril da gasolina não descer para os 22 dólares já não dá para baixar o preço.

O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, fique descansado que se houver dúvida interpretativa o que vale é a declaração do Sr. Primeiro-Ministro.

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O Orador: - Muito bem.
Quanto às despesas com pessoal, há pouca volta a dar. Se não há efeito de volume, porque, entretanto, o Governo não faz novas admissões, e há uma parte do pessoal da Administração Pública que, por efeitos de reforma, dela saem, aquilo que é diminuído em remunerações é aumentado em encargos do Estado em sede de Caixa Geral de Aposentações e de pagamento de pensões de reforma. Portanto, no resultado global não haverá grande diferenciação, porque há uma parte desse efeito de volume que passa das remunerações certas para a Caixa Geral de Aposentações. Assim, em matéria de encargos do Estado, a questão não será, em termos globais, substancialmente diferente.
Quando os senhores diminuem os "abonos variáveis" em questões sensíveis, que são hoje base para o funcionamento dos serviços - por exemplo, não pagar um subsídio de inspecção tributária, que continua em regulamentação -, há um conjunto de encargos correntes, do dia-a-dia, de que os serviços precisam absolutamente para poderem movimentar-se, sobretudo em sede de inspecção tributária, designadamente agora, se for colocar um inspector à porta de cada restaurante. Se os senhores diminuem esse volume, é evidente que isso vai depois ter consequências na capacidade de os serviços intervirem em sede de controlo, de fiscalização, de inspecção e de arrecadação de receita para o Estado.
Portanto, é bom fazer uma reflexão sobre as consequências desta vossa engenharia para conter as despesas com pessoal num certo nível, que acaba por se traduzir, apesar de tudo, no aumento de "remanescentes e permanentes" não muito diferente daquele cerca de 1,5% de que falámos em sede de generalidade. Logo, a questão dos aumentos de remunerações propostos para a Administração Pública, de que o Governo tem margem de manobra, continua, no plano político, a ser a mesma, isto é, está muito inferior ao que deveria ser para repor o poder de compra e para dar resposta à própria taxa de inflação.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr.ª Presidente, prometo ser mais contido no tempo que o Sr. Deputado Lino de Carvalho, que cumprimento pela importância das questões que levantou…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa agora!
Se a Sr.ª Presidente quiser pode criticar-me, mas o Sr. Deputado trate das perguntas que quiser!

O Orador: - Sr. Deputado, não se tratou de uma crítica, mas sim de uma nota de humor. Mas eu retiro-a, Sr. Deputado. De qualquer modo, mantenho de pé a promessa que fiz.
Sr. Ministro, começo por me referir à explicação que deu sobre o conteúdo do artigo 57.º, que, confesso, me suscitou alguma perplexidade.
Se entendi bem, V. Ex.ª disse que a inscrição da despesa "Cumprimento de Obrigações Assumidas até 30 de Setembro de 2001 por Organismos do Serviço Nacional de Saúde", no montante de cerca de 88 milhões de contos, se deve à circunstância de estas despesas já estarem contabilizadas em contabilidade nacional. Portanto, estes compromissos teriam já sido reflectidos nos mapas que nos são fornecidos relativamente à evolução do défice em contabilidade nacional.
Ora, sobre essa sua afirmação, Sr. Ministro, e prevalecendo-me do conteúdo do artigo 34.º da Lei de Enquadramento Orçamental, que diz, no n.º 1, alínea e), que a proposta de lei de Orçamento do Estado deverá apresentar "memória descritiva das razões que justificam as diferenças entre os valores apurados, na óptica da contabilidade pública e na óptica da contabilidade nacional", gostaria de lhe dizer, com toda a vénia e respeito, que não fiquei convencido com a explicação dada pelo Sr. Ministro da Saúde Saúde, em sede de debate na generalidade - e eu próprio tive, então, ocasião de lhe perguntar se os elementos que nos facultava, nomeadamente sobre o défice de exercício do anos de 1999 a 2001, inclusive, estariam ou não reflectidos na informação sobre o défice previsto para 2002. Por isso, pergunto-lhe agora, Sr. Ministro das Finanças, se é entendimento de V. Ex.ª que toda a informação que deve ser prestada sobre a área da saúde, no debate da especialidade, está contida nessa informação ou deve ser objecto de esclarecimento adicional, já que é também obrigação prevista na Lei de Enquadramento Orçamental, no seu artigo 22.º, cuja epígrafe é "Equilíbrio", que "O orçamento de cada serviço ou fundo autónomo é elaborado, aprovado e executado por forma a apresentar saldo global nulo ou positivo".
Não restam dúvidas, salvo melhor opinião, de que esta é uma obrigação ao nível da contabilidade pública, de acordo com os n.os 2 e 3 deste mesmo artigo.
Neste sentido, Sr. Ministro, pergunto-lhe se poderemos esperar, no âmbito, inclusive, do espírito de colaboração com esta Comissão, que V. Ex.ª nos forneça elementos adicionais sobre o detalhe da passagem de valores da contabilidade nacional à contabilidade pública, focando, sobretudo, estes pontos que acabei de referir.
No que diz respeito a outras matérias que foram objecto de explicação por parte da equipa governamental, gostaria de sublinhar o que Sr. Ministro disse quanto à previsão cautelosa dos valores do IVA para o próximo ano, a propósito da transferência do IVA para regiões de turismo. Constatamos que essa transferência, quando comparada com a do ano passado, é exactamente igual, isto é, não há qualquer acréscimo em termos nominais. Vou repetir, Sr. Ministro: V. Ex.ª tem uma previsão cautelosa quanto ao IVA, que é a de um crescimento da ordem dos 7,5%. Gostava de obter alguma explicação adicional em relação a isso, porque me parece poder haver aqui, eventualmente, alguma inconsistência.
Existe na proposta um pedido de autorização legislativa, sobre o qual também gostava de ter uma explicação adicional. Esse pedido reporta-se à alteração dos limites de endividamento das autarquias. Trata-se de uma matéria que está tratada no artigo 17.º da proposta, que, no n.º 2, diz o seguinte: "Fica o Governo autorizado, ouvida a Associação Nacional de Municípios Portugueses, a legislar no sentido de limitar o acréscimo de endividamento líquido dos municípios, por forma a garantir o cumprimento dos objectivos do Governo em matéria de défices estabelecidos no Orçamento do Estado para 2002".

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Sr. Ministro, com a devida vénia, julgo que a inscrição deste pedido de autorização legislativa tem um efeito perverso imediato, que é o de todas as autarquias, em termos generalizados, terem aqui um incentivo para aumentarem o mais possível o seu nível de endividamento já este ano, e também durante o próximo ano, enquanto esta autorização legislativa não ficar consagrada na prática. Ora, considerando que um processo de construção de autorização legislativa leva vários meses, este incentivo perverso pode derrotar, inclusive, o espírito da inscrição desta iniciativa por parte do Governo.
Neste sentido, gostava de lhe perguntar, Sr. Ministro, se nos pode informar, para além desta preocupação, algo sobre o conteúdo desta autorização, já que, em termos quantitativos, o que o Governo pretende fazer em matéria de limitação do acréscimo de endividamento é muito relevante para podermos saber qual é o impacto prático dessa medida.
Quanto a matérias que não estão tratadas no Orçamento, gostaríamos de saber se o Governo tem disponibilidade para encarar a introdução de medidas que nos parecem ser omissões importantes. Gostava de perguntar, relativamente às medidas no âmbito da evasão e fraude fiscais, se o Governo pensa introduzir alguma alteração ao regime actual de reporte de prejuízos. Isto porque todos os fiscalistas comentam, com grande preocupação, a circunstância de existirem abusos vertidos no stock actual de reporte de prejuízos, que atinge valores gigantescos (penso que posso utilizar esta expressão), decorrentes, pressupostamente, de situações de evasão ou fraude fiscais anteriores. Se o regime não for mudado, significa que há um deferimento tácito dessas situações anteriores, pelo que parecerá útil que haja alguma medida no sentido de prevenir abusos nesta matéria.
Por outro lado, em matéria de incentivos específicos, nomeadamente à actividade económica, tendo em vista a dificuldade crescente da situação, pergunto se o Governo está disponível para, finalmente, contemplar um incentivo fiscal às sociedades de capital de risco, reiteradamente apontadas como um veículo fundamental da modernização; um regime que fosse, por exemplo, semelhante ao regime espanhol, que, na prática, permite que todas as aplicações das sociedades de capital de risco que tenham a ver, exactamente, com a sua actividade beneficiem de uma isenção em IRC, isto é, de um pagamento em IRC da ordem de 1% (se a memória não me falha), depois de essas aplicações serem realizadas pelas sociedades no período que vai do 3.º ao 12.º ano correspondente a essas aplicações.
Pergunto também - porque não ouvi, ainda, a explicação - qual é a opinião do Ministério das Finanças quanto à iniciativa legal do Governo, elaborada pelo Ministério da Justiça, relativamente à alteração do artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais. Essa alteração eliminou uma suspensão que havia de aplicação mandatória de uma circunstância: a de que, quando o capital próprio de uma sociedade se torna inferior a metade do capital social, desencadeia-se um mecanismo automático - de resto, o próprio Código, como V. Ex.ª muito melhor do que eu sabe, obriga, nomeadamente os administradores, a executar essa acção - no sentido de, de imediato, restabelecer, pela via de operações harmónio ou outras, o reequilíbrio em matéria de capitais alheios, entre capitais próprios e capitais de crédito.
Gostava, pois, de saber, qual é a opinião do Ministério das Finanças e, sobretudo, qual é o impacto previsível que esta medida poderá ter, nomeadamente no sector empresarial do Estado, em que se reconhece a existência de muitas empresas em relação às quais, aparentemente, esta alteração se aplica de imediato.
Por último, sobre matéria fiscal, gostava de me referir a duas questões técnicas pontuais, mas que me parecem de grande importância. A primeira tem a ver com o facto de ter sido consagrada, na alteração da Lei n.º 30-G/2000, uma suspensão da tributação em sede de sisa quando há transferências de imóveis intergrupos, que estavam sujeitos ao regime do lucro consolidado. Salvo melhor opinião, a eliminação desta possibilidade e a tributação, na prática, desta circunstância parece dificultar operações de flexibilidade, de reajustamento imobiliário e de restruturação financeira que colocam os nossos grupos económicos em desvantagem competitiva de ordem fiscal injustificada.
Finalmente, quanto ao regime de preços de transferência, é entendimento pessoal e de muitos fiscalistas que o regime consagrado pela Lei n.º 30-G/2000, se vai no bom sentido, é, porventura, excessivo do ponto de vista da criação de obrigações burocráticas muito pesadas, para além de outras matérias, que dificultam também a competitividade na atracção do investimento, nomeadamente do investimento estrangeiro para Portugal. Penso que está em preparação uma portaria clarificadora dos regimes de aplicação. Gostaria de saber se o Governo está disponível para uma revisão do enquadramento normativo legal, já que subsiste esta preocupação - que tem sido expressa, inclusive, pela generalidade dos agentes económicos - quanto à excessiva carga burocrática que, porventura, nem deveria estar nesse conteúdo legal.

A Sr.ª Presidente: - Não havendo mais inscrições, tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr.ª Presidente, sucintamente, vou começar por responder ao Sr. Deputado Lino de Carvalho. A primeira questão colocada pelo Sr. Deputado Menezes Rodrigues será respondida pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, relativamente às preocupações que aqui exprimiu, devo dizer-lhe que as alterações introduzidas no sistema fiscal há cerca de um ano, ultrapassaram, felizmente, em dimensão, a questão em que o Sr. Deputado agora se centra exclusivamente, que é a de uma parte do regime das mais-valias.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Que é nuclear!

O Orador: - Sr. Deputado, sejamos rigorosos, vendo qual o mais importante núcleo das alterações que foram aqui aprovadas em Dezembro de 2000. E o mais importante núcleo das alterações que foram aqui introduzidas tem a ver, em primeiro lugar, com o desagravamento de rendimentos dos trabalhadores por conta de outrem; tem a ver com a adopção dos regimes simplificados, que no ano 2002, como sabe, entrarão em velocidade de cruzeiro; tem a ver com a adopção de novos critérios que permitem e induzem o combate à fraude e à evasão, o qual é, naturalmente,

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indispensável para termos mais eficiência fiscal. Isto corresponde aos tais mais de 95% - muito mais de 95% - das alterações que foram aqui aprovadas em Dezembro de 2000.
O Sr. Deputado centra-se na questão das mais-valias. Dir-lhe-ei que há momentos e momentos para tomarmos determinadas medidas. Para mal dos nossos pecados, fui o primeiro a citar aqui o relatório da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, que diz que não há uma relação de causa/efeito entre a reforma fiscal e o que se passou nas bolsas. A verdade é que tivemos, não só em Portugal, mas na conjuntura internacional, uma situação geradora de menos-valias e não de mais-valias.
Sr. Deputado, estas são as circunstâncias, estes são os factos. Por isso é que, neste aspecto, não podemos "pôr a cabeça na areia", temos de ser muito claros.
Por certo, o Sr. Deputado recordar-se-á, mas vou lembrá-lo de qual foi a grande reivindicação relativamente ao nosso regime de mais-valias: era tirar as sociedades gestoras de participações sociais desse regime e tratá-las de forma discriminada. O Sr. Deputado lembrar-se-á de que eu disse aqui que não haveria qualquer regime discriminatório em relação às sociedades gestoras de participações sociais. E cumprimos, porque entendemos que essa é a solução correcta. E o Sr. Deputado sabe muito bem que há razões, até em termos do Direito Comparado, que poderiam levar a que suscitássemos essa questão, mas não suscitámos, porque entendemos que, no domínio dos princípios, ela não era correcta. Portanto, sejamos perfeitamente claros e transparentes.
Também já disse aqui que, do nosso lado, existe toda a abertura e toda a disponibilidade para encontrar um regime equilibrado que nos permita, de facto, corresponder positivamente àquilo que são as exigências, as circunstâncias do próprio mercado.
Sr. Deputado, felizmente que os princípios fundamentais das mudanças fiscais são princípios que estão plenamente de pé. Perguntar-me-á: mas, e os consensos duráveis? Temos um consenso durável relativamente a mais de 95% das alterações fiscais que aqui aprovámos no ano 2000, e que estão adquiridas, Sr. Deputado. Isso é um bem. Estão adquiridas, porque não vê, neste momento, neste Parlamento, esses aspectos da reforma fiscal, que são extraordinariamente relevantes, serem postos em causa. Isso é importante. Trata-se de consensos duráveis relativamente àquilo que funciona, àquilo que deve funcionar cada vez melhor.
Mas, Sr. Deputado, mal ou bem, não vou discutir agora se quem tem razão sobre esta matéria é o relatório da CMVM, se são as considerações das mais diferentes individualidades. O que me interessa é olhar para o futuro e encontrar soluções que nos permitam, designadamente nesta conjuntura de incerteza, fazer regressar a Portugal capitais, que, de uma forma legal, regular e séria, possam contribuir para o desenvolvimento do País e para a criação de emprego. Esta é que é a questão fundamental, Sr. Deputado.
Sr. Deputado Patinha Antão, não iria regressar à questão do artigo 57.º e da anualidade, sobre a qual falará o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, se bem que, se ainda há dúvidas técnicas nesse particular, naturalmente, nós próprios seremos os primeiros a manifestar abertura para a correcção dessas mesmas dúvidas.
No entanto, Sr. Deputado, não poderá acusar-nos de falta de transparência porque, neste ponto, estamos a dizer exactamente o que pretendemos e é preciso ver qual é a melhor maneira de o fazermos. Essa é que é a questão fundamental e esse é um princípio bom que devemos prosseguir.
Passo, agora, a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento para continuar a responder às questões.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Deputado, permita-me uma nota em relação à informação que pediu.
Tenho ideia - mas posso não estar certo - que nunca se deu tanta informação como este ano. Preocupámo-nos muito em perceber que tipo de mapas haveríamos de elaborar porque, como sabe, todos os anos se fazem novos mapas sobre a saúde. Aliás, tivemos a ajuda da bancada do PCP, que pôs à nossa disposição os mapas relativos aos últimos três ou quatro anos e o que fizemos foi elaborar não só os mesmos como mais ainda.
Permita-me, pois, que torne a utilizar a resposta dada pelo Sr. Primeiro-Ministro quando essa questão foi colocada: toda a informação que costuma ser transmitida em anos anteriores sê-lo-á também este ano.
Assim, peço-vos que nos solicitem as informações que consideram em falta, embora diga desde já que nada falta, antes pelo contrário. Aliás, para além de uma série de explicações que foram dadas pela primeira vez este ano, através das quais se explicita claramente a passagem de contabilidade pública para nacional, foram apresentados, em contabilidade pública e em contabilidade nacional, os mapas específicos relativos ao SNS, para além dos referentes a todo o sector público administrativo.
O Sr. Deputado certamente saberá que a maneira mais fácil de fazermos a passagem do défice do SNS de contabilidade pública para nacional é pegarmos no défice em contabilidade pública e subtrairmos o saldo de gerência que transita para o ano seguinte, bem como os recebimentos de anos anteriores. São exactamente essas duas parcelas que estão em causa quando se compara os mapas do SNS que estamos habituados a ver, e que não são imediatamente em contabilidade pública porque, como sabe e também referiu, em contabilidade pública, pelo menos ao nível da orçamentação, é suposto que o saldo seja maior ou igual a zero - daí o artigo 22.º e a sua aplicação este ano, mais uma vez.
Portanto, peço-lhe que não hesite em solicitar-nos todos os mapas e todos os elementos relativos a contas do SNS que é costume serem entregues à Assembleia da República.
Passo à questão da autorização legislativa e do artigo 17.º, em relação ao endividamento dos municípios.
Em primeiro lugar, pensamos que não terá esse efeito que disse que poderia ter, exactamente porque fazemos isto com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP). Portanto, a "conversa" sobre este artigo foi feita com a ANMP e é nesse processo que estamos. Mas não podemos "ser presos por ter cão e presos por não ter", não podemos fazer o que sempre se pediu, que era estabelecer limites para nosso controlo - e não que se ache que a despesa é muita ou pouca - e que, no momento em que a medida é lançada, se venha dizer "afinal,

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não, porque têm estes efeitos perversos". Dessa forma é que a medida nunca sairia.
As consequências da medida estão plasmadas no mapa que faz o resumo do sector público administrativo. Como vê, o défice que lá consta para a administração regional e local não é mais do que a possibilidade do aumento do endividamento das regiões autónomas. Significa isto que, em relação aos municípios, o que lá está é um zero.
Portanto, esta é, exactamente, a forma como queremos aplicar esta autorização legislativa, mas fazendo-o, não por imposição e, sim, pedindo à Assembleia que nos deixe fazer isto em concertação com a ANMP.

O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Passo, agora, a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Muito rapidamente, volto à questão das mais-valias, suscitada pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Com certeza que o Sr. Deputado não quereria a existência de três regimes diferentes - o anterior a 1 de Janeiro de 20001, um outro em 2001 e ainda um outro a partir de 1 de Janeiro de 2002 ou de 2003.
Por outro lado, julgo que, constantemente, se está a confundir a parte com o todo. Quer dizer, a reforma fiscal tem na sua base o regime simplificado, a derrogação do sigilo bancário, a tributação de manifestações de riqueza e não este regime das mais-valias das pessoas singulares, única e exclusivamente, o qual, por outro lado, se mantém, integralmente, a partir de 1 de Janeiro de 2003. A este respeito repito que, por razões exclusivamente técnicas, não é possível implementar o regime de retenção na fonte a partir de 1 de Janeiro de 2002, a não ser que fizéssemos como fez o PSD no Orçamento do Estado para 1993, isto é, que se frustrassem as legítimas expectativas dos agentes económicos, coisa que também não pretenderemos fazer.
A segunda pergunta dizia respeito à questão do controlo e às portarias.
Respondo-lhe, repetindo o que já aqui foi dito: as portarias estão a ser elaboradas no Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, designadamente as portarias referentes a preços de transferência e a imputação de custos e proveitos. Trata-se de portarias que implicam algumas dificuldades técnicas que irão ser ultrapassadas.
Quanto à sua terceira pergunta, respondo-lhe que quando o n.º 8 se refere a "qualquer exercício anterior", é, obviamente, a qualquer exercício anterior, mas posterior a 1 de Janeiro de 2002. Chega-se lá por interpretação meramente jurídica, mas, se for preciso, pode-se esclarecer. É uma redundância, mas esclarecer-se-á com certeza.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E sem exigência de investimento!

O Orador: - É sem exigência de novo reinvestimento nos activos em que o investimento foi efectuado. O grupo parlamentar terá oportunidade de esclarecer definitivamente esta questão. Não há qualquer dúvida sobre isso, como já aqui foi dito.
Passo à pergunta que fez em quarto lugar e que era relativa às SGPS e à pretensa dispensa da prova da qualidade de não residente.
Devo dizer que esta questão refere-se, exclusivamente, a operações activas. Ou seja, na prática, refere-se a operações que se realizam com os membros do grupo, operando-se a nível do próprio grupo. Portanto, é fácil aferir a qualidade de residente ou não das empresas com que se relacionam as SGPS. É evidente que estas estão, ainda, sujeitas a poderes de supervisão.
Isto justifica, portanto, não a não comprovação da qualidade de não residente mas a prova nos termos gerais. É, pois, isso que está aqui em causa.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não é nada disso que lá está escrito!

O Orador: - Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado Patinha Antão relativamente à previsão do IVA de 7,5%, apenas quero lembrar, muito sumariamente, que, basicamente, há quatro razões que explicam esta previsão.
Chamo a atenção que, entre Junho e Outubro, o IVA cresceu 9,963% contra 0,6%, entre Janeiro e Maio. A tendência é claramente ascendente e mesmo com o crescimento de 0,6% nos primeiros cinco meses, pode afirmar-se que, para este ano, o crescimento previsível é de 5,5%.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Ouviremos todos a explicação de V. Ex.ª, mas gostaria de precisar o que perguntei.
Face a essa previsão de 7,5% feita pelo Governo, por que é que a transferência para as regiões, ao abrigo do chamado "IVA turístico", tem um crescimento de 0%?

O Orador: - Porque mais não foi solicitado. É exclusivamente essa a razão.
Quanto à questão do reporte de prejuízos, concordo em absoluto com o que indicou. De facto, a norma deverá ser revista. No entanto, chamo a atenção que a mesma já tem algumas virtualidades que poderão ser aproveitadas, designadamente em sede de situações administrativas. Eu próprio tenho emitido despachos em que interpreto, digamos mais restritivamente, a norma que se refere ao reporte de prejuízos, mas é óbvio que a mesma carece de alguns aperfeiçoamentos.
Quanto à questão que colocou relativamente ao incentivo fiscal para o capital de risco que vem previsto no regime espanhol, quero chamar a atenção que as sociedades de capital de risco já beneficiam da isenção dos dividendos prevista no artigo 46.º, independentemente da percentagem de participação no capital e do período de detenção dos activos, e beneficiam, ainda, do regime de reinvestimento previsto no artigo 45.º. Ou seja, os lucros não são tributados e as mais-valias das partes de capital são tributadas apenas em 50%. Portanto, estas sociedades já beneficiam de um regime especial, mas, obviamente, devemos estar atentos ao regime espanhol e, se houver necessidade, poder-se-á estudar e ponderar, em termos de

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competitividade fiscal, se será ou não necessária alguma alteração.
Passo à questão que colocou a respeito das operações efectuadas no âmbito de grupos sujeitos ao lucro consolidado.
O anterior regime de tributação do lucro consolidado pressupunha a eliminação fiscal das operações de compra e venda entre empresas de um grupo, pelo que, na altura, justificava-se uma isenção de sisa por uma questão de mera coerência e de neutralidade do regime.
No regime actual, estas operações têm relevância fiscal e, consequentemente, não se justifica a isenção. Isto não impede, obviamente, que se dentro do grupo vierem a realizar-se operações de concentração, designadamente fusões, não possa ser aplicável o regime que decorre do Decreto-Lei n.º 404/90, à semelhança do que existe para a generalidade das empresas.
Quanto à questão dos preços de transferência e à disponibilidade para alterar o excesso de burocracia, admito que possam vir a ser introduzidos alguns aperfeiçoamentos. No entanto, penso que, talvez mais importante do que esses aperfeiçoamentos, justifica-se a publicação da portaria sobre preços de transferência que, como já disse, está a ser elaborada pelo meu Gabinete.
Passo ao Sr. Deputado Menezes Rodrigues, a quem peço desculpa por não ter começado por lhe responder e que colocou uma questão quanto ao imposto de selo.
A alteração ao artigo 4.º tem a ver com o critério de territorialidade no âmbito do imposto de selo. Portanto, trata-se de um esclarecimento que se pretendeu dar em sede de proposta de lei do Orçamento. Mas, obviamente, poderemos discutir ainda se se justifica ou não alguma alteração do ponto de vista técnico.

O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Passo a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças: - Muito rapidamente, vou debruçar-me sobre a questão que foi colocada, não só pelo Sr. Deputado Menezes Rodrigues como pelo Sr. Deputado Patinha Antão, relativamente ao artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais e ao respectivo impacto sobre o sector empresarial do Estado.
Antes de mais, devo dizer ao Sr. Deputado Patinha Antão que, como é evidente, o Ministério das Finanças está de acordo com o Ministério da Justiça, como penso que o Sr. Deputado também estará, em que é importante para a economia portuguesa evitar esta utilização instrumental de sociedades com prejuízos para outras finalidades que não são, seguramente, a produtividade e o desenvolvimento económico. Portanto, nesse domínio, é evidente que tem a nossa concordância.
Para responder à questão que colocou acerca do impacto sobre o sector empresarial do Estado, direi que, juridicamente, a questão é complexa. Estamos a estudá-la conjuntamente com o Ministério da Justiça, nomeadamente quanto à compatibilidade da rácio e do preceito, pela circunstância de não podermos esquecer que a responsabilidade do Estado é genérica, não se esgota, como acontece em relação a outros sócios de outras sociedades, com o mero capital social das empresas.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, dou por terminada esta audição, agradecendo ao Sr. Ministro das Finanças e ao Srs. Secretários de Estado toda a colaboração que nos deram.
Srs. Deputados, reiniciaremos os trabalhos às 15 horas com a audição do Sr. Ministro da Cultura.

Eram 13 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados, vamos reiniciar os trabalhos.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Começo por apresentar os meus cumprimentos ao Sr. Ministro da Cultura e aos Srs. Secretários de Estado, agradecendo, desde já, a vossa presença.
Srs. Deputados, reafirmo aquilo que já disse de manhã, no início da audição do Sr. Ministro das Finanças, e que consiste no seguinte: estamos a proceder a uma discussão na especialidade e, como tal, o Sr. Ministro dispensa-se de fazer qualquer tipo de apresentação do orçamento do respectivo Ministério, dado já o ter feito aquando da apresentação do Orçamento do Estado, na generalidade.
Hoje têm lugar três audições muito longas, pelo que peço que nos cinjamos aos temas de natureza orçamental e que não tentemos divergir para assuntos de natureza política.
Começo por dar a palavra aos Srs. Deputados que quiserem intervir ou colocar questões ao Sr. Ministro. No final da primeira ronda de perguntas de cada um dos partidos, o Sr. Ministro seleccionará as questões, já que em relação a este Ministério estão em questão dois temas um tanto diversos, que são os relativos à comunicação social e à cultura. Não vou fazer distinção em relação às perguntas; ela far-se-á, com certeza, relativamente às respostas, pelo que faremos, então, a divisão das questões que forem colocadas.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Cultura, Srs. Secretários de Estado: Há um conjunto de questões que, aquando da apresentação, na generalidade, do orçamento deste Ministério, já foram colocadas, mas às quais o Sr. Ministro não respondeu. Apostando que estamos em discussão de especialidade, vamos tentar transferir para esta sede algumas delas, que, de algum modo, são estruturantes do orçamento. Talvez colocando as questões na especialidade, em sede de Comissão, o Sr. Ministro acabe por lhes dar resposta.
A questão de fundo prende-se com o decréscimo de verbas neste Orçamento. Trata-se de um decréscimo de cerca de 6%, que, para além da resposta simplista da contenção, o Sr. Ministro não explica, o que é muito pouco para percebermos quais são os efeitos deste decréscimo no orçamento da Cultura. Continuamos sem ter taxas de execução, o que, de algum modo, não nos permite, sequer, avaliar, ainda, da gravidade que poderá ter este decréscimo. Não temos taxas de execução do PIDDAC, não temos taxas de execução do Programa Operacional de Cultura, não temos quaisquer taxas de execução que nos permitam avaliar

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da gravidade deste decréscimo de 6%. É fundamental sabermos como é que estamos em termos de execução de 2001, no que tem que ver com o PIDDAC, para sabermos, então, dos reflexos deste decréscimo de 6%.
Como se encontra presente o Sr. Secretário de Estado da Cultura, até há muito pouco tempo responsável pelo Programa Operacional de Cultura, naturalmente que também nesta matéria poderemos ter algumas informações que nos permitam saber até que ponto é que as verbas dos fundos comunitários, concretamente o Programa Operacional de Cultura (dúvidas que já levantámos aqui há um ano), foram ou não efectivamente aproveitadas ou se, também em termos de taxa de execução do Programa Operacional da Cultura, ficámos aquém das nossas possibilidades, por, por exemplo, ausência de projectos. Aquilo que nos chega é exactamente isso, isto é, que por ausência de projectos não foram capazes de aproveitar as verbas do Programa Operacional de Cultura.
Esse Programa continua a ser um sustentáculo fundamental para o orçamento de 2002, mas se já não o aproveitámos em 2001 naturalmente que as razões que levaram ao não aproveitamento dessas verbas este ano serão exactamente as mesmas razões que justificam o não aproveitamento para o próximo ano. Era, pois, importante sabermos como é que estamos relativamente a essa mesma taxa de execução.
E no que tem que ver com as taxas de execução, gostariamos de saber como é que estão aquelas que eram as apostas em termos de um conjunto muito lato de programas para o ano 2001. Estou a lembrar-me da recuperação dos espaços dos cine-teatros e dos teatros e das bibliotecas, para só referir dois exemplos, que eram cruciais no ano transacto. Se olharmos para o orçamento, fundamentalmente para o texto escrito, aquilo que vemos é que as recuperações concluídas são uma insignificância, para não dizer que praticamente não existem. Em relação à recuperação dos cine-teatros, relativamente ao ano 2001, diz-se que se concluiu uma reparação e que o resto concluir-se-á - estranhamente - agora, em Novembro/Dezembro. Não se sabendo, portanto, exactamente quais são, também era importante que o Sr. Ministro nos desse a noção exacta de quantos cine-teatros é que foram recuperados em 2001 e quais se prevêem recuperar em 2002, dado que em relação a estes recintos de espectáculos havia um conjunto muito lato de projectos.
Dizia, há um ano, o Sr. Ministro da Cultura - não o Sr. Ministro, mas o Ministro de então - que se estes programas não se cumprissem não seria por responsabilidade da tutela, mas por responsabilidade do poder local, pelo não aparecimento de candidaturas. Ora, esta é, também, uma questão em relação à qual valeria a pena termos notícia. Se o número das recuperações existentes é de tal maneira diminuto, urge perguntar: a tutela é responsável? As verbas estiveram disponíveis? Foram as candidaturas que não apareceram em termos das regiões e em termos dos concelhos ou, se as candidaturas apareceram, não houve condições para as fazer funcionar?
Passo a referir-me a uma outra verba, extremamente importante, porque ela se prende com uma área ignorada durante dezenas de anos no nosso País, que é a recuperação do nosso património, da sua inventariação e da sua recuperação. Durante muitos anos, considerou-se que os instrumentos legislativos eram insuficientes e que agora, com a aprovação da Lei de Bases do Património, teríamos, de algum modo, criado condições para que esse património pudesse ser recuperado.
A verdade é que a regulamentação dessa Lei continua por fazer, e neste momento, olhando para as Grandes Opções do Plano, a informação que há é que ela será regulamentada para o ano 2002 - naturalmente que isto será desde já, também, um obstáculo à concretização daquilo que seriam as medidas da própria Lei de Bases do Património.
A questão que lhe coloco, Sr. Ministro, é a seguinte: como é que se chegou às verbas que estão previstas para o IPPAR? Na verdade, olhamos para o programa de acções que o Sr. Ministro nos fez chegar e a noção com que ficamos é que há uma verba global para o IPPAR e depois, na página 32 ou 33, aparece um conjunto de exemplos - de mosteiros, de monumentos -, sem que seja visível alguma estratégia, alguma planificação e algum eixo prioritário que o tenha determinado.
Ora, é extremamente importante saber porquê aqueles e porque não outros ou se aqueles não são mais do que meros exemplos e qual é a estratégia do Ministério da Cultura para a recuperação, de facto, do nosso património classificado.
Naturalmente que poderia apontar muitos mais exemplos, mas dou-lhe só um, que, de algum modo, é caricato: distrito de Santarém e capital do distrito. A cidade de Santarém é, supostamente, candidata a património mundial, com bandeira do Partido Socialista há cerca de 12 anos e com o apoio do Governo do Partido Socialista fundamentalmente a partir de 1995, e tem aquele que é, talvez, um dos monumentos mais importantes do nosso país em termos do gótico, que é o Mosteiro de São Francisco. Este Mosteiro está em recuperação desde 1960, sujeito a algumas interrupções (a última é já do "reinado" do Partido Socialista e não se sabe muito bem quando recomeçará).
Ora, havendo as verbas, que sabemos existirem, para o IPPAR, porque não reiniciar uma recuperação iniciada há 30 anos e que, neste momento, corre dois riscos: o de, pura e simplesmente, nunca mais ser recuperado, porque o estado de degradação é de tal maneira grande que não pode ser recuperado, ou o de aquilo que já foi recuperado há 30 anos correr o risco de se degradar, porque a recuperação ficou incompleta?
Este exemplo poderia ser multiplicado por muitos outros exemplos, mas demonstra não parecer haver, por parte do Ministério da Cultura, por parte da tutela, um programa de operações que tenha em vista a recuperação do nosso património classificado e que transforme em prioridade aquilo que é de facto prioridade, consignando-lhe, simultaneamente, as verbas respectivas.
O Sr. Ministro poder-me-á dizer que a autarquia não deu conhecimento ou que a tutela não conhece que o Convento de São Francisco sofre estas vicissitudes, de qualquer modo esta é a realidade.
Uma outra questão prende-se com a política de subsídios ou de apoios - eu sei que o Sr. Ministro prefere que se refira "apoios" e não "subsídios", por isso transfigurei o signo linguístico, pelo que vamos aos "apoios": como é que estamos de apoios ao teatro e à dança.

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Todos os anos, sem excepção nos últimos anos, recebemos aqui as companhias teatrais de norte a sul do País, lamentando-se por se substituírem, de algum modo, àquilo que deveria ser uma actividade da própria tutela, isto é, por a Constituição da República Portuguesa - e volto ao texto constitucional! -, não ser cumprida naquilo que são responsabilidades do Governo nesta matéria e serem estas companhias, muitas vezes a expensas próprias, quando não têm apoios, a fazerem aquilo que o Estado não faz.
A verdade é que os apoios ou não chegam, ou chegam tardiamente, ou são dados um pouco em nome de, suposta e casuisticamente, projectos anuais, o que, de algum modo, deixa muitas vezes sem saída uma companhia, uma vez que o seu trabalho é planificado atempadamente, de uma forma às vezes plurianual, e assim contam com subsídios casuísticos que, muitas vezes, resultam do desconhecimento total, por parte da tutela, daquele que é o seu trabalho.
Todos nós, Deputados, temos, na Assembleia da República, processos que demonstram à evidência que muitos apoios são dados sem conhecimento mínimo do trabalho realizado, o que permite que as actas que resultaram dos apoios dados a estas companhias teatrais sejam muitas vezes exactamente iguais e muitas vezes, até, pouco verdadeiras, porque sendo um texto-tipo acaba por não responder à realidade daquele que é o trabalho realizado por cada uma destas companhias de teatro.
Ora, a não existência de uma lei de bases do teatro, que pelos vistos também não é uma estratégia e uma prioridade da própria tutela, leva a que, naturalmente, no próximo ano, possamos confrontar-nos com o mesmo exercício com que nos confrontámos no ano transacto, que é a presença, nesta Casa, de dezenas e dezenas de companhias em procura de resposta aos apoios que, casuísticamente e sem critérios (que se conheçam), o Ministério irá dar novamente.
Uma outra questão, Sr. Ministro (até pelas poucas informações que o próprio orçamento traz), prende-se com o Teatro D. Maria II. Pelo que sei, o Sr. Ministro considera que já se poupou algum dinheiro, porque não houve que fazer rescisões de contratos, mas foram feitos despedimentos. Pelo menos, esta é a informação que nos chegou da discussão na generalidade.
Também ficámos a saber que acabou com a companhia residente: já não temos companhia residente e, naturalmente, os gastos com o Teatro D. Maria II estão reduzidos. A questão que coloco é muito simples: quanto à recuperação e remodelação do Teatro, já que ele não tinha condições para funcionar (havia problemas que punham em causa, inclusivamente, a segurança dos espectadores e dos actores), gostava de saber se ele está agora em condições e se, definitivamente, não iremos ter uma companhia residente mas, sim, dois ou três actores e, depois, de harmonia com a peça que, entretanto, for representada no D. Maria II, de forma precária e casuística, se resolverão algumas representações naquele Teatro, que era a aposta, desde a época liberal, numa responsabilidade do Estado. Ou seja, o Estado responsabilizar-se pelo teatro como medida pedagógica para a construção do discurso crítico, não junto do povo português mas, fundamentalmente, junto das escolas, em particular na parte final dos ensinos básico e secundário, em que, como o Sr. Ministro sabe, havia um papel importante de natureza pedagógico-didáctica realizado junto desta vertente do ensino no nosso país.
Para já, é tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Peço aos Srs. Deputados um certo poder de concisão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Seara.

O Sr. Fernando Seara (PSD): - Sr.ª Presidente, tentarei ser conciso, preciso e também incisivo.
Começo por cumprimentar o Sr. Ministro da Cultura e os Srs. Secretários de Estado aqui presentes.
Não vou repetir algumas das perguntas que a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita suscitou e que já tínhamos deixado em aberto aquando da apresentação do orçamento em Comissão. Pedia, portanto, ao Sr. Ministro que também as fizesse minhas.
Vou colocar três questões concretas, respeitantes ao sector da comunicação social, em particular à RTP e ao ICAM.
Primeira questão: em que termos é que o Sr. Ministro entende ser possível concretizar todo o modelo de serviço público com a verba atribuída no Orçamento do Estado para a RTP, tendo em conta o plano de actividades aprovado pelo Conselho de Administração e que foi objecto de parecer positivo por parte do Conselho de Opinião, em relação ao ano de 2002? E queria fazer-lhe a pergunta, Sr. Ministro, muito objectivamente - e vamos assumir que o papel da fiscalização política e do debate político implica também conhecermos aqui opções.
É evidente que nós pressentimos que, neste preciso momento, o modelo da RTP é triplo(estamos a falar do canal generalista): informação, desporto - hóquei em patins no prime time… E não vou aqui citar entrevistas do Ministro Augusto Santos Silva nem do Secretário de Estado Arons de Carvalho sobre essa matéria, até para não os perturbar. Sei que é legítimo mudar de opinião, mas mudar de opinião muito rapidamente é estranho! Também não vou suscitar aqui certas interrogações e interpelações de alguns Deputados da maioria que gostaria de ver aqui a apresentar propostas em relação aos 25 milhões de contos, propostas que suscitaram em sede da 1.ª Comissão - está aqui presente o seu presidente, portanto não me deixa mentir. Como não os vejo, perderam-se, com certeza, no caminho…
Nesta matéria, pergunto como é possível compreender uma estratégia em relação ao mesmo Conselho de Administração e a orientações políticas consagradas pela tutela, inclusive, Sr. Ministro, com a contratação de empresas de consultadoria internacional que dão pareceres totalmente contraditórios no âmbito do mesmo Conselho de Administração, com o que agora nós vimos, sentimos e pressentimos. Como é que é possível? Que gestão é esta? Que lógica de orientação estratégica é esta?
Esta situação é tão perturbante quanto a segunda questão: o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social poderá explicar-nos o que é que acontece com a questão respeitante aos 15,5 milhões de contos atribuídos à RTP? Na verdade, aquilo que o ex-Secretário de Estado Manuel Baganha e o ex-Ministro das Finanças Pina

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Moura suscitaram, aqueles 15,5 milhões de contos entrados via Portugal Global, SGPS, destinaram-se a tapar um buraco financeiro? Destinaram-se a uma operação de engenharia fiscal entre Estado, SGPS Portugal Global e RTP? É importante saber se assim foi até pelo rigor das contas, para sabermos, na verdade, a curto prazo, qual é o défice real da RTP.
Terceira questão, Sr. Ministro: como é que se vai compatibilizar todo o seu projecto ao nível das Grandes Opções do Plano, designadamente o reforço da produção audiovisual independente, com a situação financeira do principal operador público de televisão? Em que termos? Com que lógica? É possível concretizar as intenções das GOP com as verbas disponíveis no Orçamento, inclusive ao nível da contratualização com os operadores privados? Já não vamos falar aqui na verba de meio milhão de contos, atribuída e contratualizada pelo anterior Ministro da Cultura e nunca efectivada.
Sr. Secretário de Estado Arons de Carvalho, peço desculpa, mas estamos a citar o anterior Ministro da Cultura. Não estamos a citar mal, não estamos a descontextualizar, porque todos nós ouvimos. Está escrito e foi dito em on! E há aqui um conjunto de Deputados, de todas as bancadas, que ouviu.
É esta matéria que importa concretizar. É verdade? Como é que é possível? Em que termos é possível? Não se percebe como é que, no âmbito da concepção da revisão do contrato de concessão de serviço público, isto pode ser possível! Pedia ao Sr. Ministro, ao responsável político, para, se possível, me esclarecer e, fundamentalmente, acautelar os meus receios mais pessimistas.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima.

A Sr.ª Isabel Pires de Lima (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, da análise deste orçamento parecem decorrer dois factos: por um lado, estamos perante um orçamento que, ao nível da despesa, não é um orçamento de continuidade, na medida em que constatamos uma contenção de despesas de funcionamento na ordem dos 11,3% (menos do que em 2001) e, por outro lado, estamos perante um orçamento que significa um aumento de investimento dirigido para a área do património - quase 41% do orçamento dirige-se para o património arquitectónico, museológico e arqueológico, sendo atribuída uma parcela de quase 20% ao IPPAR.
Ora, num cenário de contenção deste tipo - vou restringir-me a questões, de facto, orçamentais -, por que é que há um aumento por áreas nos organismos de produção artística do Estado? Por exemplo, a Orquestra Nacional do Porto beneficia de um aumento de 2,6% e de um acréscimo, ao nível do PIDDAC, na ordem dos 30%; a Companhia Nacional de Bailado tem um acréscimo de 8,2%, etc. Portanto, a questão que coloco é esta: por que é que, entre 2001 e 2002, há flutuações distintas consoante os organismos? Por exemplo, ao nível do Teatro Nacional de S. Carlos há uma diminuição de 3,4% e ao nível do Teatro Nacional D. Maria II uma diminuição de 3,9%.
No fundo, o que significam estas flutuações e, na sequência delas, o que significa um peso de cerca de 15% do orçamento para os teatros nacionais, designadamente para a Companhia Nacional de Bailado e para a Orquestra Nacional do Porto? Aliás, o domínio dos teatros nacionais é o segundo mais favorecido pelo orçamento do Ministério da Cultura.
Uma outra questão, que, no fundo, vem na sequência de algumas perguntas formuladas pela minha colega Luísa Mesquita, prende-se com o seguinte: uma das "bandeiras" do Partido Socialista na área da cultura situou-se nas redes de equipamentos sociais públicos em parceria com as autarquias. Portanto, também nós gostaríamos de saber que significado tem o orçamento de 2002 no ritmo de construção destas redes ou, se quiser, também nós gostaríamos que nos fossem facultadas algumas explicações quanto ao orçamento na sua distribuição a esse nível, dado que não nos foram facultados dados concretos.
Finalmente, queria fazer um pequeno comentário, que não é propriamente uma questão. Gostava de saudar o facto de haver, num orçamento deste tipo, uma dotação orçamental para 2002 no Instituto Português do Livro e das Bibliotecas que o coloca entre os organismos com maior crescimento absoluto do orçamento. Basta dizer que para o Instituto Português do Livro e das Bibliotecas se prevê um aumento de 1,3 milhões de euros, aumento que é determinado, em parte, pela dotação em PIDDAC, que sobe substancialmente no caso deste Instituto. É apenas uma saudação quanto a esta questão.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr.ª Presidente, a minha pergunta diz respeito à área da comunicação social e será muito sintética, na medida em que, de alguma forma, já foi formulada pelo Sr. Deputado Fernando Seara. Em todo o caso, iria concretizar um aspecto.
Já muito foi dito, quer no debate na generalidade quer em sede de especialidade, sobre o problema da RTP neste Orçamento do Estado. Isto é, existe uma vasta colecção de entrevistas dadas por vários membros do Governo - quer pelo actual Ministro das Finanças, ao tempo em que era responsável pela área da comunicação social, quer pelo próprio Secretário de Estado da Comunicação Social - no sentido de que a reestruturação financeira que o Governo pretendia empreender relativamente à RTP implicaria uma indemnização compensatória da ordem dos 25 milhões de contos para o ano 2002. Isto foi dito e redito, o Governo assumiu-o por diversas vezes, a RTP funcionou nessa base e o próprio Conselho de Administração apresentou-se nesta Assembleia,tendo esse compromisso como pressuposto para a sua actuação no ano de 2002 e considerando esses 25 milhões de contos indispensáveis para que a reestruturação financeira pudesse ser levada a cabo.
A reestruturação financeira da RTP é um compromisso assumido nas Grandes Opções do Plano para 2002; há inclusivamente um ponto, no capítulo relativo à comunicação social, onde se refere a criação das condições indispensáveis à reestruturação financeira da RTP através da racionalização dos seus custos e da garantia em conformidade com o direito comunitário dos recursos aptos à sustentação do serviço público televisivo. É isto que consta das Grandes Opções do Plano.

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No entanto, o que é certo é que esses 25 milhões de contos não estão previstos e aquilo que o Governo assume relativamente à RTP, para 2002, na proposta de lei do Orçamento do Estado é uma indemnização compensatória da ordem dos 18 milhões de contos, o que significa que relativamente àquilo que o Governo assumiu e afirmou faltam 7 milhões de contos.
Esta questão foi amplamente abordada durante o debate na generalidade na 1.ª Comissão e houve, da parte de Deputados de todas as bancadas parlamentares, a convicção de que das duas uma: ou esta verba era alterada e o Governo cumpria aquilo que assumiu relativamente à RTP ou, então, no ano 2002 ficaremos numa situação em que o serviço público de televisão em vez de viver "vegeta" e não tem condições para que a reestruturação financeira que se impunha possa ser levada a cabo. Aliás, foi inclusivamente aventada na 1.ª Comissão a hipótese de, na especialidade, esta questão ser alterada e ser feita - permita-me o termo - a reposição das verbas que estavam previstas e que não estão propostas.
A questão muito concreta que quero colocar é esta: qual é a disponibilidade do Governo para, em sede de especialidade, alterar a proposta de lei do Orçamento do Estado por forma a que a RTP possa dispor da prometida indemnização compensatória de 25 milhões de contos?

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Machado Rodrigues.

O Sr. Machado Rodrigues (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, vou fazer três perguntas directamente relacionadas com a especialidade do Orçamento, nomeadamente com o PIDDAC do Ministério da Cultura.
A primeira tem que ver com os projectos ligados ao programa do Parque Arqueológico do Vale do Côa. Noto que os investimentos previstos no PIDDAC, e tendo este programa dois projectos, concentram 9 milhões de contos no projecto do museu do Parque Arqueológico do Vale do Côa.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, 9 milhões de euros, não contos.

O Orador: - Peço desculpa, o total do projecto são 47 milhões 554 mil euros. Para 2002, estão previstos 1,4 milhões de contos e, em 2001, foram gastos 400 000 contos. É o que dá nas minhas contas, com os euros que estão no programa. Suponho que os meus números estão certos.
Em contrapartida, o projecto do Parque Arqueológico do Vale do Côa é um projecto com um valor global de 2,5 milhões de contos, dos quais já estão gastos 1,5 milhões de contos. Gostaria, pois, que o Sr. Ministro fizesse o favor de esclarecer - e posso aceitar que, parcialmente, seja ignorância minha - como é que estes dois projectos se interpenetram, como é que se ligam.
Tenho ainda uma pergunta muito directa para lhe fazer: o projecto essencial que se vê por estes números, e que agora está concentrado no museu do Parque Arqueológico do Vale do Côa, era compatível com a construção da barragem de Foz Côa?
A outra questão que tenho para lhe colocar diz respeito ao Programa de Recuperação das Aldeias Históricas de Portugal. Penso que este é um programa muitíssimo importante e que, ligado a uma boa promoção de turismo, nomeadamente do interior do País - e agora, pelo menos nos discursos, está toda a gente muito preocupada com o interior do País... Mas vejo que o Programa,no seu total, tem 500 000 contos atribuídos, dos quais 450 000 já estão gastos. Pergunto: uma vez que não há outras verbas programadas, o Programa de Recuperação das Aldeias Históricas de Portugal está abandonado?
A última questão refere-se ao projecto de rede de teatros municipais, que prevê uma verba de 350 000 contos por ano durante cinco anos. Em termos de programação financeira, é aproximadamente este valor que está no PIDDAC. Pensando que este é um projecto muito importante, com incidência, provavelmente, em vários sítios do País, mas introduzindo uma questão de interesse directo, dada a minha condição de Deputado eleito pelo círculo eleitoral do distrito de Bragança, pergunto: o protocolo, que julgo que existe, entre o Ministério da Cultura e a Câmara Municipal de Bragança para a construção do teatro municipal em Bragança está incluído neste programa e neste projecto? Caso a resposta seja afirmativa, quais os montantes? É que esta verba que aqui consta é completamente díspar da que penso ser necessária para fazer a obra.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, a pergunta que gostaria de colocar é também sobre comunicação social, concretamente sobre a RTP.
Não há dúvida - e ainda não foi rebatido pelo Partido Socialista - que há uma enorme desconformidade entre aquilo que o Governo quer da RTP e aquilo que o Governo dá à RTP. Da última vez que aqui esteve na Comissão, o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social foi posto perante o problema de como fazer um serviço público e de fazer renascer o espírito que sempre dominou, teoricamente, a RTP - mas que nunca se conseguiu fazer -, ou seja, de não ser uma concorrente de televisão privada, e, ao mesmo tempo, ter de concorrer por causa das audiências e da publicidade, isto é, libertá-la dos "freios" que geralmente travam a sua prestação de serviço público, porque tem de concorrer com televisões que não prestam serviço público, proporcionando-lhe os meios.
O Sr. Secretário de Estado, tanto quanto me lembro, numa das sessões em que estávamos a discutir o Orçamento, disse que tinha de seguir as regras da contenção. Parecia, pela sua maneira de dizer, que, embora não concordasse com essa situação, era solidário com o Governo e tinha de seguir as regras da contenção e, portanto, não lhe competia, numa Comissão, dizer aquilo que ia na sua alma, mas sim o que ia na "alma" do Governo.
Temos de desfazer estes mitos e saber se o Sr. Secretário de Estado e o Sr. Ministro, que é recém chegado a este sector, entendem que é com contenções forçadas de outros ramos que podem fazer da RTP o serviço público que deve ser. Para ser um serviço público, a RTP precisa de dinheiro; por outro lado, dar dinheiro à RTP para disputar as audiências, a publicidade, os programas

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generalistas, as telenovelas brasileiras, portuguesas ou o que quer que seja, é uma lógica absolutamente contrária ao que se pretende.
Ora, não é o novo director de informação, por mais competente e "milagreiro" que seja, que pode modificar a própria natureza das coisas. Ou o dinheiro é mal gasto numa televisão que não encontra um rumo para se afirmar com uma filosofia, uma dinâmica e uma orientação diferente, ou é bem gasto e não há dinheiro que pague se ela for uma televisão - que não um aparelho ideológico do Estado - diferente da privada e que saiba conquistar o mercado por outras vias que não seja a concorrência na publicidade e na chamada lógica das audiências.
Aquilo que neste momento se verifica é que o Governo não dá qualquer orientação à RTP para quebrar a lógica das privadas, e, por outro lado, trata-a como uma emissora pobre, na medida em que diminui substancialmente a sua indemnização compensatória de modo a que ela não possa ser também um serviço público. Com este dinheiro que lhe dá, ela não pode quebrar a lógica de concorrente de estações privadas; se der dinheiro a mais tem de se lhe exigir coisas que não se vêem no Orçamento nem nas Grandes Opções do Plano.Ou seja, dá a clara impressão de que, perante estas verbas, se fazem coisas contra vontade. Nunca ouvi o Sr. Ministro falar sobre estes assuntos, devo dizer a verdade, e, portanto, não posso criticá-lo nem elogiá-lo. Vamos lá ver se ouvimos qualquer coisa da sua boca sobre este assunto.
Todavia, temos ouvido, e bastante, o Secretário de Estado, que foi aqui nosso colega, como Deputado da oposição aos governos do PSD. Ele tem uma formação teórica sólida sobre estes problemas e, pelo menos, tem uma ideia teórica do que deve e do que não deve ser um serviço público de televisão. Contudo, vê-se sempre- e ele há-de desculpar-me que o diga - muito constrangido quando se trata da RTP. Dá a impressão de que alguma coisa não lhe corre bem no seu íntimo e que ele gostaria que a RTP fosse outra coisa que não é a filosofia geral do Governo.
Não estou a querer dizer que ele não concorda com o Governo ou que está a fazer fretes ao Governo, mas sou um admirador do Sr. Secretário de Estado como um teórico, um académico de comunicação social e sempre tive uma reserva muito grande quanto àquilo que ele faz na RTP como governante e aquilo que sempre o ouvi dizer aqui, nesta Assembleia, como um homem que pensava sobre o que deveria ser a RTP.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - "Bem prega Frei Tomás…!"

O Orador: - Temos, de novo, este problema, de haver um Secretário de Estado que é peregrino numa área, que se sente deslocado numa área e que se vê obrigado a defendê-la. Gostaria de saber se o Secretário de Estado está satisfeito com este corte de verbas, com a verba prevista, com aquilo que se diz nas Grandes Opções do Plano e com aquilo que se quer gastar. Mesmo que diga que concorda com o Governo, não fico de mal consigo, porque quando V. Ex.ª voltar à oposição, dentro de breve tempo, há-de voltar às suas ideias!

Risos.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Reis.

O Sr. António Reis (PS): - Sr.ª Presidente, o Sr. Ministro da Cultura terá, com certeza, tal como nós, no Grupo Parlamentar do Partido Socialista, registado com muito agrado o consenso generalizado nesta Câmara por parte de todas as bancadas, quanto à insuficiência da indemnização compensatória prevista no Orçamento para 2002 em relação ao serviço público de televisão.
De facto, esta é uma novidade política que temos de registar, na medida em que, há 1, 2, 3 anos atrás, este Parlamento dividia-se num bloco de esquerda e num bloco de direita com posições diametralmente opostas quanto ao esforço que o Estado efectuava em relação ao serviço público de televisão. Daquele lado, dizia-se que era demais; deste lado, dizia-se que era preciso ainda mais esforço.

Vozes do PS: - Exacto!

O Orador: - Desta vez, parece haver um consenso no sentido de que finalmente se entende que o Estado deve financiar de forma mais forte o serviço público de televisão. Quem, como eu, sempre se bateu por esse reforço de financiamento, sente-se bastante confortado com este súbito consenso que aqui se gerou.
É certo que houve uma discrepância óbvia entre o que estava prometido, em declarações de vários responsáveis políticos, como indemnização compensatória para o ano 2002 em relação à RTP e aquilo que nos aparece na proposta de lei do Orçamento do Estado. Pessoalmente, penso que esse recuo do Governo não tem lógica política e não se percebe como é que através disso se conseguiria contentar qualquer das outras bancadas da oposição. A prova está feita: não tem lógica económica, porque está a enfraquecer um dos três pilares em que assentava a reestruturação financeira do serviço público de televisão. Assim, só lhe posso reconhecer uma lógica ética, moral. Ou seja, o Governo entendeu que o serviço público de televisão não poderia alhear-se do esforço generalizado de contenção da despesa pública em que está empenhado; o serviço público de televisão tem, de alguma maneira, de manifestar também a sua solidariedade para com os outros sectores da Administração Pública e não se furtar a esse esforço colectivo de redução da despesa pública. Salva-se a lógica ética, enfraquece-se ou, melhor, não se respeita a lógica económica e política.
Em todo o caso, como há pouco eu dizia, este era um dos três pilares em que assentava a reestruturação financeira do serviço público de televisão, pois os outros dois são o saneamento do passivo e a redução das despesas, nomeadamente com pessoal, já que não é previsível um aumento de receitas, uma vez que a única fonte de receitas é, praticamente, a publicidade - e se conseguirmos que as receitas de publicidade, em 2002, se mantenham ao mesmo nível das de 2001, creio que já temos muita sorte!
A questão que quero colocar ao Sr. Ministro é a seguinte: o Governo está em condições de assegurar a esta Câmara

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que, em 2002, iniciar-se-á, com efeito, um sério esforço de saneamento do passivo financeiro da RTP? Segunda questão: que orientações procurará dar à empresa no sentido de uma efectiva compressão de custos, porventura não apenas com o pessoal?

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Dado que terminámos a primeira ronda de pedidos de esclarecimento, vou dar a palavra ao Sr. Ministro da Cultura ou aos Srs. Secretários de Estado, conforme entender, para responder a estas questões.

O Sr. Ministro da Cultura (Augusto Santos Silva): - Posso ser eu o primeiro, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Sendo assim, tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Cultura: - Sr.ª Presidente, começo por agradecer aos Srs. Deputados as perguntas feitas e por dizer que, por uma questão de lógica, talvez deva arrumar as respostas em dois grandes blocos, um relativo à comunicação social e o outro aos restantes sectores sob tutela do Ministério da Cultura.
Assim, começo pelo sector da comunicação social. Contudo, antes, gostaria de fazer, se me permitem, duas precisões factuais que me parecem importantes no sentido do esclarecimento recíproco de posições.
A primeira precisão tem a ver com as observações iniciais da Sr.ª Deputada Luísa Mesquita relativas às condições em que se desenrolou a discussão, na generalidade, da proposta de lei do Orçamento, na parte relativa ao Ministério da Cultura. Por responsabilidades que não podem ser imputadas ao Governo nem aos Srs. Deputados, que decorrem apenas do facto de a discussão anterior ter sido viva e de se ter prolongado, o debate, que estava previsto para as 11 horas e 30 minutos, iniciou-se às 13 horas e 10 minutos e teve de terminar às 14 horas e 15 minutos por razões de Estado, por eu ter um compromisso com o Sr. Ministro Coordenador do Governo de Transição de Timor-Leste, às 14 horas e 30 minutos. Foi esta a única razão pela qual não respondi a algumas das questões colocadas, e, nessa altura, acertámos que, justamente, todas as questões que não tinham podido ser respondidas transitariam para esta reunião. Não se tratou de eu não querer responder mas, sim, de organização dos trabalhos.
A segunda precisão que gostaria de fazer tem a ver com a intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró e é a seguinte: esta não é a primeira vez que falo na Assembleia da República sobre a RTP. Tive ocasião de falar sobre a RTP, pela primeira vez, quando participei numa reunião da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, em princípios de Setembro, altura em que fui chamado à Comissão para expor as orientações políticas gerais do Ministério da Cultura com a nova equipa, e, pela segunda vez, aquando da discussão, na generalidade, do orçamento da cultura. Aliás, foi o facto de toda a equipa participar numa discussão global…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - E o problema das compensações!

O Orador: - Sim, também falei sobre essa questão.
Tenho, evidentemente, todo o gosto em me pronunciar sobre as questões aqui trazidas, mas queria apenas fazer estas duas precisões factuais.
Em relação às questões colocadas, e antes de passar a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social, gostaria de dizer, em primeiro lugar, que o hóquei em patins não foi transmitido num canal generalista, pelo que não pode ser usado como exemplo de contradição…

A Sr.ª Presidente: - Foi na RTP1, Sr. Ministro!

O Orador: - Na RTP1? Bom, nesse caso, tem toda a razão, Sr. Deputado! Não vejo hóquei em patins,…

A Sr.ª Presidente: - Faz mal! Deveria ver!

O Orador: - … por culpa minha! Aliás, a Sr.ª Presidente chama-me atenção para a importância de ver hóquei em patins!

A Sr.ª Presidente: - Exactamente!

O Orador: - Muito bem, penitencio-me pelo erro vendo os próximos campeonatos do princípio ao fim!
Voltando ao que eu estava a dizer, em primeiro lugar, para nos situarmos, não há, em 2002, por comparação com 2001, uma redução do montante da indemnização compensatória paga pelo Estado à RTP; pelo contrário, há um aumento, embora ligeiríssimo. Mas não há uma redução da indemnização compensatória paga pelo Estado em 2001 comparativamente com o valor orçamentado e que será pago em 2002. O que há, isso sim, é a impossibilidade de, em 2002, nos aproximarmos a 100% do valor de referência, que, na sequência de trabalhos entre o Conselho de Administração da RTP e o Estado, como accionista da empresa, se pôde determinar, que é de cerca de 25 milhões de contos, como valor-padrão, valor desejável para a indemnização compensatória do Estado, nos termos do actual contrato de serviço público.
Esse processo de convergência será muito lento em 2002, visto que se fica a 7 milhões de contos daquele valor, facto que tem, evidentemente, repercussões sobre o andamento do programa de reestruturação financeira da RTP e a adequação do plano de actividades, apresentado pelo Conselho de Administração e validado pelo Conselho de Opinião, e as disponibilidades orçamentais. Há, portanto, um trabalho, que o Conselho de Administração fará, de readequação desse plano de actividades à disponibilidade orçamental que, do lado do Estado, através da indemnização compensatória, foi possível encontrar.
Esta é a posição, a proposta do Governo, e, portanto, a posição de todos os seus membros - não há uma alma do Ministro e uma alma do Governo -, e é a posição veiculada na proposta de orçamento apresentada a esta Câmara.
A razão fundamental para esta nossa posição, que já foi recordada pelo Sr. Deputado António Reis, é a de que, num contexto de contenção do crescimento da despesa pública, pensamos (e eu penso com particular ênfase) que não faria sentido isentar a RTP de um esforço que estamos a pedir em muitos outros domínios e em muitas outras áreas do serviço público em Portugal.

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Isto só torna mais agudos e necessários, para o que haverá todo o empenho do Governo, os avanços no trabalho nas outras duas dimensões, que têm a ver com as questões financeiras, em torno da RTP. Refiro-me ao processo de saneamento do passivo, já hoje recordado pelo Sr. Deputado António Reis, no qual há um trabalho intenso entre os dois Ministérios envolvidos e o Conselho de Administração da RTP de que esperamos obter resultados a breve prazo, não esquecendo a complexidade técnica da questão e o processo de contenção de custos, de racionalização dos custos e de ganhos de eficiência na empresa que o actual Conselho de Administração tem conduzido desde o início do seu mandato com o total apoio do Governo.
As orientações são claras neste processo: a racionalização e os ganhos de eficiência devem fazer-se sem, evidentemente, pôr em causa os direitos dos trabalhadores da empresa, com a moderação e o equilíbrio necessários e sem exageros, que seriam indevidos, quando se trate de processos de racionalização de custos de pessoal, e também procurando obter ganhos de eficiência, quer do ponto de vista da organização da empresa, quer do ponto de vista da forma como ela presta o seu serviço e, portanto, como se organiza enquanto operador televisivo. Mas isto sem que esse processo de racionalização de custos signifique o incumprimento das obrigações fundamentais da empresa, seja do ponto de vista da prestação do serviço público, seja, por exemplo, do ponto de vista do apoio ao desenvolvimento do audiovisual português e dos conteúdos em português.
Neste processo, como em muitos outros de contenção do crescimento da despesa, o objectivo, a orientação essencial é, não pondo em causa nenhuma linha fundamental de actuação, adiar o que for possível adiar e conter o que for possível conter, comprimindo, pois, os custos, a começar, evidentemente, pelos menos incontornáveis. Este é um esforço em que a empresa está empenhada e julgo que o actual Conselho de Administração já tem dado suficientes exemplos desse empenhamento.
Quanto à terceira questão colocada pelo Sr. Deputado Fernando Seara, no que respeita ao apoio à produção audiovisual independentemente, gostaria, em primeiro lugar, de dizer que, na execução orçamental de 2001, a produção audiovisual independente beneficia de um concurso relativo às disponibilidades de verba consignadas para 2001. O concurso obedece a um regulamento, cuja portaria foi publicada nos princípios do mês de Outubro, e o valor desse concurso, que está iminente, é de 1 milhão de contos. Este valor resulta justamente da operação proposta no orçamento para 2001, que tem a ver com 0,5 milhão de contos provenientes do orçamento do Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia (ICAM) mais 0,5 milhão de contos provenientes do orçamento do Instituto da Comunicação Social. Não é, portanto, verdade que haja 0,5 milhão de contos por alocar em 2001. O que é verdade é que, em 2001, a produção audiovisual independente em Portugal beneficiará do apoio do Estado no montante de 1,5 milhões de contos, resultante do facto de ter havido um atraso no concurso do ano passado, que acabou por completar-se apenas este ano, em Agosto passado, no valor de 0,5 milhão de contos, e de estar iminente o lançamento de um segundo concurso no valor de 1 milhão de contos.
É, aliás, a mesma preocupação que norteia a proposta de orçamento para 2002 no que diz respeito aos apoios canalizados pelo Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia, o qual, contudo (e antecipo uma pergunta provável), é um dos organismos que tem redução efectiva de verba para 2002.
Trata-se de, mais uma vez num contexto de rigor orçamental acrescido, prever a verba que julgamos necessária em função de dois factos: o primeiro é o de que o ICAM terminará a execução do orçamento deste ano com saldo e o segundo é o de que termina com saldo mesmo num contexto em que há atrasos no pagamento das receitas da taxa que incide sobre a publicidade por parte de dois operadores televisivos, que, contudo, já tiveram ocasião de nos garantir que regularizarão, a breve prazo, a situação.
O Sr. Deputado Narana Coissoró colocou três questões relativas à comunicação social, mas penso que já respondi a duas delas. Contudo, sobre o modo como entendemos o serviço público de televisão, penso que importa considerar o seguinte: primeiro, a RTP, como empresa concessionária do serviço público de televisão, presta um serviço contratualizado, de acordo com o respectivo contrato de concessão, e a lógica deste contrato é que se possa assegurar uma programação dirigida para o grande público no canal generalista, que possa assegurar uma programação de matriz, ao mesmo tempo complementar e alternativa, na RTP2 e um conjunto de serviços que os operadores comerciais, legitimamente, não têm de assegurar no contexto da lei e do quadro portugueses, desde os serviços em cooperação, a RTP Internacional e a RTP África, os serviços regionais de informação, os canais regionais e outros serviços conexos. E é este contrato que baliza a actuação da RTP, a qual, julgo, tem cumprido e cumpre cada vez melhor essas obrigações.
Em relação às questões colocadas sobre a comunicação social, em termos gerais, era isto que eu gostaria de dizer e, se a Sr.ª Presidente der licença, remeto para o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social os aprofundamentos necessários.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social.

O Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social (Arons de Carvalho): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, antes de responder mais directamente a uma das perguntas feitas pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, gostaria de responder a uma questão colocada pelo Sr. Deputado Fernando Seara, que tem a ver com a atribuição de uma verba de 15 milhões de contos à RTP.
A explicação é muito simples: desde 1992 - sublinho esta data, que me parece ser importante para o Sr. Deputado Fernando Seara - que a RTP não pagava IVA e a administração fiscal, em finais de 1997, chamou a sua atenção para esse efeito. Depois de se apurar a verba em falta, convencionou-se que, dadas as dificuldades conhecidas por parte da empresa, ela seria atribuída sob a forma de dotação de capital. Porquê à Portugal Global e não à RTP? Porque uma razão simples, porque, neste momento, o accionista da RTP é a Portugal Global, e foi por isto que essa verba foi canalizada através da Portugal Global e não foi atribuída directamente à Radiotelevisão Portuguesa.

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Sr. Deputado Narana Coissoró, é claro que não é fácil responder a perguntas sobre estados de alma. De qualquer forma, posso dizer que, mais do que satisfeito ou insatisfeito, estou permanentemente insatisfeito; porém, não encaro essa permanente insatisfação como uma forma de resignação mas, sim, como uma forma de determinação.
É evidente que, em relação ao passado e mesmo ao presente da RTP, sempre poderei dizer que é questionável alguns aspectos da qualidade da programação da RTP1, como foi aqui referido, mas, de qualquer forma, creio que a RTP, em vários aspectos, deu saltos qualitativos muito importantes nos últimos anos. Tem, hoje, um contrato de concessão que segue fielmente o modelo europeu e que é mesmo elogiada na União Europeia; tem um canal 2, a RTP2, que é hoje um paradigma de qualidade na sua programação; tem uma informação muito mais isenta do que aquela que existia há seis anos; fez a RTP África; fez a informação regionalizada; tem legendagem para deficientes auditivos. Ou seja, a RTP tem um conjunto vasto de serviços que não tinha no passado, que foram sendo feitos paulatinamente nos últimos anos e que dão um sinal claro de progresso e de qualidade na prestação do serviço público de televisão.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Faça favor de prosseguir, Sr. Ministro da Cultura.

O Sr. Ministro da Cultura: - Sr.ª Presidente, passarei às questões relativas aos outros sectores tutelados pelo Ministério da Cultura e seguirei, se me permitem, a ordem das questões colocadas.
A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita fez-me uma pergunta sobre as taxas de execução do PIDDAC e do Programa Operacional da Cultura (POC), e tenho todo o gosto em lhe transmitir os dados disponíveis, que são os seguintes: no contexto do PIDDAC, portanto, no contexto do Capítulo 50 do Orçamento do Estado para 2001, a estimativa com que trabalhamos, hoje, aproxima-se de uma execução de 100%, em Dezembro. Dito isto com mais rigor, a estimativa que os serviços fazem em princípios de Novembro de 2001 aponta para uma taxa de execução na ordem dos 95% em finais do ano de 2001. Portanto, estamos, em números redondos, a trabalhar na execução do PIDDAC, tendo por referência o conjunto da verba atribuída, no Capítulo 50 do Orçamento do Estado, ao Ministério da Cultura.
O Programa Operacional da Cultura, como os Srs. Deputados sabem, teve os seus primeiros projectos aprovados na reunião da Unidade de Gestão de 19 de Outubro de 2000 e, como consequência natural, não há praticamente execução financeira reportada ao ano de 2000, por manifesta impossibilidades física e prática. No entanto, posso dizer que, neste momento, o Programa Operacional da Cultura está em plena velocidade de cruzeiro. Não há, portanto, qualquer receio de que haja problemas na execução do POC decorrentes da ausência de projectos.
Só para dar uma ideia - reforçando, aliás, informações que, com todo o gosto, já tive ocasião de prestar aquando da discussão do orçamento na generalidade -, usando agora dados referentes a 31 de Outubro passado, devo dizer que, no âmbito do Programa Operacional da Cultura, já foram aprovados 113 projectos, dos quais 111 já se encontram homologados; e, destes 111 projectos homologados, 64 referem-se a organismos do próprio Ministério da Cultura e 47 são ou de autarquias, que são 19, ou de outras entidades públicas - e aqui gostaria de realçar o facto de 20 destes projectos homologados serem de iniciativa de entidades privadas de fins não lucrativos. Isto responde a uma das orientações fundamentais na execução do POC, que é justamente a de o manter aberto não só ao próprio Ministério da Cultura como a outras entidades públicas, às autarquias locais e a entidades privadas de fins não lucrativos.
O valor dos projectos aprovados é de cerca de 25 milhões de contos, o que representam 17 milhões de contos de FEDER, o que quer dizer 37% da dotação global do POC.
Portanto, em aprovações, passamos um terço do valor do Programa Operacional da Cultura para o período de sete anos, 2000/2006.
No que diz respeito à execução, o ritmo é naturalmente mais lento do que o das aprovações. Considerando o valor programado para 2000/2001, a despesa executada, validade e certificada pelo gestor do Programa representa, hoje, 5 milhões de contos. Isto é, aproximamo-nos de um quarto do valor programado para 2000/2001, e a nossa estimativa é a de chegarmos ao fim do ano com uma execução acumulada da ordem de pouco mais de 7 milhões de contos, o que significa mais ou menos o valor da dotação programada para 2000. O que quer isto dizer? Quer dizer que, partindo de um primeiro ano em que, naturalmente, pelas razões que indiquei, não houve execução financeira, estamos a recuperar sistematicamente, e temos uma carteira de projectos e de aprovações que garante que, montado o sistema de realização do POC, essa recuperação se faça ao longo da duração do dito Programa.
Quanto aos esclarecimentos pedidos pela Sr.ª Deputada sobre os programas específicos, nomeadamente o de bibliotecas, remeto-os para o Sr. Secretário de Estado da Cultura, que tem a tutela directa nesta área.
Em relação à rede de cine-teatros, gostaria de recordar que trabalhamos com duas redes, uma tem a prioridade máxima do ponto de vista da estratégia do Ministério da Cultura, que é o programa de dotação de todas as capitais de distrito que não tenham ainda cine-teatros ou teatros recuperados com um teatro ou cine-teatro recuperado. Neste programa, todas as autarquias interessadas viram celebrados os respectivos protocolos, que estabelecem as condições de comparticipação do Ministério da Cultura e as condições de candidatura ao Programa Operacional da Cultura. E, de acordo com o ritmo que decorre da relação entre o Ministério da Cultura e as autarquias, mas onde a iniciativa das autarquias é determinante, há obras que estão a decorrer, há obras que estão praticamente a finalizar (exemplo disso é Aveiro), há obras que estão a decorrer (temos como exemplos Beja e Braga) e há obras que estão em fase de projecto (como, por exemplo, Guarda, porque Viseu é exemplo de equipamento).
As obras a decorrer estão a ser acompanhadas quer do ponto de vista técnico quer dos ponto de vista das candidaturas devidas ao Programa Operacional da Cultura.
Gostaria de recordar que os termos da Medida 2.1 do Programa Operacional da Cultura, e são os termos da negociação

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com a Comissão Europeia, determinam que o indicador físico de cumprimento do Programa será o apoio a 10 equipamentos de salas de espectáculos, ao abrigo dessa medida, e estamos em condições de cumprir esse indicador físico.
Ao mesmo tempo, temos a rede de teatros municipais, nos quais estão implicadas autarquias que não são sedes de distrito, onde também há obras concluídas e em fase de conclusão - e, assim o entender, terei todo o gosto em fazer chegar à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, assim como aos Deputados que a desejarem, a lista nominal quer dos projectos cujas obras estão a decorrer, quer dos projectos que estão concluídos, quer ainda dos projectos que se encontram em fase de apreciação. Aliás, se me permite, aproveito para responder já a uma das questões colocadas pelo Sr. Deputado Machado Rodrigues e que incide especificamente sobre o cine-teatro de Bragança.
Sr. Deputado Machado Rodrigues, segundo a indicação que tenho, as obras iniciam-se neste 2.º semestre, estão devidamente protocoladas e, nos termos deste protocolo, a Câmara Municipal de Bragança já apresentou candidatura ao Programa Operacional da Cultura, a qual está em análise, sendo certo que a Câmara Municipal de Bragança já superou um impedimento à prossecução do projecto que tinha sido a não validação, por parte do Tribunal de Contas, da primeira proposta de adjudicação. Mas este problema está resolvido; portanto, as coisas estão a decorrer com normalidade.
No que diz respeito às questões do património, a Lei de Bases do Património Cultural foi publicada no início de Setembro de 2001, entrou em vigor dois meses depois da sua publicação, isto é, no início de Novembro, e o Governo tem um ano, a partir da data da sua entrada em vigor, para regulamentar a lei e tenciona, naturalmente, cumprir esse prazo. Portanto, não há qualquer atraso na regulamentação da Lei de Bases do Património Cultural.
Mas a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita tem toda a razão em dizer que a Lei de Bases do Património Cultural abre novas perspectivas, dá novos instrumentos de garantia quer no que diz respeito à preservação quer no que diz respeito à conservação e à valorização do nosso património.
O IPPAR tem ele próprio um programa, o programa integrado no património, que obedece a uma estratégia clara e está claramente expresso numa publicação do Ministério da Cultura, que se chama justamente Património - Balanço e Perspectivas [2000-2006], publicação essa que foi apresentada em meados do ano passado e constitui o guia de orientação, o quadro onde se inscrevem e se justificam todos os projectos e obras que o IPPAR tem em realização ou previstos, designadamente, no horizonte 2006.
Por razões que se compreendem e, em relação às quais, julgo, todos estaremos de acordo, esse programa de intervenção estratégica sobre o património, do IPPAR, é balizado cronologicamente de modo a coincidir com o próprio III Quadro Comunitário de Apoio, visto aí haver um instrumento supletivo muito importante, supletivo ao Orçamento do Estado e em particular ao PIDDAC, para sustentar os esforços que é necessário desenvolver para recuperar, conservar e valorizar o nosso património.
No que diz respeito às questões relativas aos apoios às artes do espectáculo, devo dizer que os governos apoiados pelo Partido Socialista, por estarem muito conscientes do facto de uma simples anualidade das decisões sobre apoios colocar dificuldades a uma parte das estruturas de criação, designadamente às mais consolidadas e que naturalmente trabalham numa base plurianual, tomaram a iniciativa de reforçar os programas de financiamento plurianual às estruturas de criação, com particular incidência na área do teatro, mas não só. Isto explica que no ano passado, em 2000, tenham sido lançados e concretizados concursos de financiamento plurianual por 2 ou 4 anos e também que já esta equipa, já este ano, em Julho e Agosto, tenha prorrogado os protocolos de financiamento plurianual, o que, a não ser feito, tendo em conta que se esgotavam em 2001, colocavam a questão de haver um possível hiato, que não queremos evidentemente, e por isso os prorrogamos, no financiamento para 2002.
Os actuais concursos desenvolvem-se, como a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita sabe, por obediência a um regulamento, que se esgota neste próprio ano e que foi concebido e gizado como um quadro de transição, e, portanto, em 2002 haverá novos regulamentos, novos quadros de financiamento; e asseguro-lhes que a preocupação de garantir bases plurianuais de financiamento para as estruturas de criação será na preparação e na decisão sobre esses novos quadros de financiamento.
Quanto à última questão colocada pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, sobre o Teatro Nacional D. Maria II, devo dizer que ninguém foi despedido, foram, sim, celebradas rescisões amigáveis de contrato. São inteiramente justas as considerações que a Sr.ª Deputada fez sobre a função de um teatro nacional, e, se me permite, terei todo o gosto em enviar cópia do discurso que eu próprio fiz, no Teatro Nacional D. Maria II, sobre a missão do teatro nacional, aquando da posse do vogal da Comissão de Gestão com responsabilidades de direcção artística no teatro.
No que toca à questão que tão legitimamente a preocupa, devo dizer-lhe que, em função das obras, já realizadas, de remodelação no interior do teatro, o teatro está em condições de proceder, com toda a segurança, à sua abertura ao público e de fazer o que lhe compete fazer; e, a partir do próximo dia 8 de Dezembro, haverá certamente actividades no Teatro Nacional D. Maria II.
Já respondi às questões colocadas pelo Sr. Deputado Fernando Seara.
A Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima, a quem tenho todo o gosto em responder, colocou a questão sobre a evolução dos orçamentos dos organismos de produção artística para 2002. Em geral, há, de facto, um reforço, que se faz sentir seja no PIDDAC seja em relação a cada um deles, nas estimativas sobre receitas próprias, e penso que as variações entre os serviços são relativamente fáceis de explicar, são coerentes, a saber: há dois organismos que vêem o seu orçamento de funcionamento diminuir, um deles é o Teatro Nacional de São Carlos, este pela simples razão de, em 2001, não precisar de recorrer ao Teatro Camões - portanto, a verba para pagar o aluguer do Teatro Camões, que é cerca de 400 000 contos, que este ano reforçava o orçamento do Teatro Nacional de São Carlos, não faz sentido constar no orçamento para 2002.
Já no que diz respeito ao Teatro Nacional D. Maria II, a diminuição nas despesas de funcionamento tem a ver com o facto de, no orçamento de funcionamento deste ano, uma

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parte considerável ter sido usada para o pagamento das indemnizações devidas com as rescisões. Como, em 2002, não ocorrem rescisões,…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Já não há!

O Orador: - … há esta folga, que é usada para reforçar quer as despesas de produção quer, naturalmente, orçamentos de outros organismos.
No quadro da Orquestra Nacional do Porto, as verbas de funcionamento mantêm-se, mas há um reforço no PIDDAC.
No caso da Companhia Nacional de Bailado há uma estimativa de reforço muito importante das receitas próprias, que tem a ver justamente com uma política agressiva, no bom sentido, de obtenção de patrocínios e mecenato e de receitas de bilheteira por parte da Companhia.
No que diz respeito ao Teatro Nacional de São João, a diminuição nas receitas próprias, aí prevista, tem apenas a ver com o facto de 2002 não ser ano do Festival PONTI e de não fazer sentido repetir-se, em 2002, a verba que, através da Sociedade Porto 2001, S. A., foi canalizada este ano para o Teatro Nacional de São João.
Remeto para o Sr. Secretário de Estado da Cultura as questões relativas ao ritmo de construção das redes, e passo às perguntas feitas pelo Sr. Deputado Machado Rodrigues, a quem ainda não tive oportunidade de responder.
No que diz respeito ao Programa de Recuperação de Aldeias Históricas de Portugal, trata-se de um programa conjunto do Ministério do Planeamento e do Ministério da Cultura, e nas propostas das Grandes Opções do Plano para o Ministério da Cultura estão indicadas as formas de colaboração por parte do IPPAR nesse programa. Portanto, peço ao Sr. Deputado que não entenda a verba inscrita em PIDDAC do Ministério da Cultura como sendo a verba do programa, visto que há mais duas verbas: a do próprio Ministério do Planeamento e, que é a principal fonte de financiamento deste programa, o eixo próprio, o eixo pertinente dos programas regionais desconcentrados, seja do centro, seja do Alentejo.
Relativamente às questões do Parque Arqueológico do Vale do Côa, não sei se haverá alguma gralha, concedo que possa haver, no mapa facultado aos Srs. Deputados, mas devo dizer que, naturalmente, os números do PIDDAC estão muito longe daqueles que apresentou. No conjunto, o Instituto Português de Arqueologia tem inscrito em PIDDAC 11 milhões de euros, falando em termos gerais, e, desses 11 milhões de euros, 7 milhões de euros são destinados ao projecto do Museu do Vale do Côa e 1 milhão de euros ao Parque Arqueológico do Vale do Côa. Isto é,…

O Sr. Machado Rodrigues (PSD): - Isso é no ano 2002.
Quando mencionei os 9 milhões de contos, referia-me ao conjunto do programa, e julgo que é o que interessa. Ou seja, o que interessa é saber quanto é o projecto, na sua totalidade, e como está dividido. Os 9 milhões de contos, que mencionei, são os 47 milhões de euros, que estão aqui, e que correspondem ao conjunto do projecto.
Peço desculpa por o interromper, Sr. Ministro, mas é apenas para esclarecer que não me referia à verba de 2002, mas, sim, à concepção global, de como é que aquilo vai ser tratado, em termos de Museu do Vale do Côa versus Parque Arqueológico do Vale do Côa.
Peço desculpa, mais uma vez, por ter interrompido para dar este esclarecimento.

O Orador: - Muito obrigado! Assim está tudo esclarecido!
Posso, então, considerar a questão essencial que o Sr. Deputado colocou. De facto, o museu é o projecto-âncora não só do Parque Arqueológico do Vale do Côa como da acção de intervenção de base territorial do Côa; é um projecto que tem muitas possibilidades, designadamente, do ponto de vista de concretizar a função do Parque e da utilização cultural e turística desse património mundial, que são as gravuras rupestres, a arte rupestre do Côa, como um verdadeiro motor de desenvolvimento local. Logo, a importância do projecto é justamente essa, a de também servir de âncora ao Projecto de Desenvolvimento Integrado, local, para além de cumprir a nossa obrigação de salvaguardar e valorizar o património mundial, que são as gravuras rupestres do Vale do Côa.
E, em relação à pergunta que colocou, a minha resposta é tão simples como foi o enunciado da sua pergunta: justamente, a eventual construção de uma barragem no Côa inviabilizaria este projecto.
As outras questões relativas à comunicação social serão respondidas, se a Sr.ª Presidente o permitir, pelo Sr. Secretário de Estado da Cultura, no que diz respeito às bibliotecas, museus e arquivos.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.

O Sr. Secretário de Estado da Cultura (Conde Rodrigues): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, é objectivo do Governo, como tem sido até agora, desenvolver redes de cultura assentes em equipamentos no território, que, no fundo, simbolizem também uma perspectiva descentralizadora e de absorção ou de fixação de públicos em todo o território. E esse objectivo tem sido prosseguido paulatinamente, no caso das bibliotecas, com um ritmo de construção e de abertura de novas bibliotecas, o que fez com que, ainda há cerca de duas semanas, tivéssemos inaugurado a biblioteca n.º 101.
Por outro lado, também na passada semana, assinámos mais seis contratos-programa com bibliotecas, e, como se pode ver pelo orçamento destinado ao ano de 2002, a verba inscrita no Instituto Português do Livro e das Bibliotecas (IPLB) para a construção das bibliotecas aumenta, o que, pelo mapa do PIDDAC, pode dar um investimento em 46 bibliotecas durante o ano de 2002.
Portanto, o ritmo tem sido crescente e, como se sabe, é um ritmo que também não é controlável pelo Ministério da Cultura, porque este disponibiliza 50% do financiamento para a construção das bibliotecas, mas o ritmo de construção depende dos investimentos dos próprios municípios, porque são eles que não só apresentam a candidatura como também lançam o concurso e fazem a gestão da respectiva obra. Portanto, o ritmo de construção das bibliotecas depende da bondade do município, sendo o Governo, neste caso, um parceiro financeiro e de acompanhamento técnico e logístico e, depois, mais tarde, também um parceiro na constituição do conteúdo da própria biblioteca.

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Mas saliento também a própria rede dos arquivos, esta mais recente, iniciada em 1998, no âmbito da qual ainda há pouco tempo - há pouco mais de três semanas - o Ministério da Cultura assinou contratos-programa com mais 27 municípios para a realização de arquivos históricos municipais. Isto acontece a um ritmo que, também neste caso, depende não só dessa parceria mas ainda de candidaturas, de projectos e de uma execução física dos próprios municípios. E, como foi referido na altura, pelos municípios que assinaram contratos-programa, trata-se de um ritmo que os satisfaz, uma vez que agora, face ao ano de 2002, mantemos, como também se pode ver, um conjunto de municípios que será beneficiado por essa mesma rede.
No entanto, o Ministério da Cultura não ficou e não pode, naturalmente, estar satisfeito apenas com isto, pelo que tentou também levar este conceito de rede aos próprios museus. E, neste sentido, gostaria de dizer que, no próximo dia 19, vamos assinar 36 protocolos com museus, que não são museus do Ministério mas de outras entidades públicas, nomeadamente de autarquias, bem como de entidades privadas, para, precisamente, atribuir os primeiros apoios ao abrigo da Rede Portuguesa de Museus. Trata-se, pois, de um financiamento que também terá continuidade em 2002, e que é o primeiro passo para a concretização deste projecto lançado este ano, embora formalmente constituído no ano 2000, e que se traduzirá, no território, num símbolo de qualidade para os museus portugueses e, portanto, também num investimento crescente, por parte do Governo, em parceria com outros agentes.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Lino de Carvalho para pedir esclarecimentos, quero pedir-vos que, uma vez que estamos a caminho das 17 horas, façam perguntas muito directas e muito concisas, de forma a que também se verifiquem respostas correspondentes.
Tem a palavra, Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito obrigado, Sr.ª Presidente, vou tentar respeitar a sua orientação.
Sr. Ministro da Cultura, vou colocar-lhe duas questões, uma das quais está ligada à estratégia do seu Ministério para o futuro dos centros regionais das artes do espectáculo. Como sabe, isto estava inscrito no programa do anterior Governo, foi criado um primeiro centro regional das artes do espectáculo, como projecto-piloto, em Évora, ao qual se seguiu um outro em Viseu, no quadro de um processo de descentralização integrada das artes do espectáculo.
A primeira grande filosofia, digamos, que enformou a criação desses centros foi a de que eles funcionariam como entidades públicas financiadas totalmente pelo Governo, no quadro da ideia de uma descentralização integrada das várias artes do espectáculo. Numa fase posterior, esta orientação mudou, embora sempre dentro do Governo apoiado pelo Partido Socialista, no sentido de que houvesse parcerias entre os centros e outras entidades locais, designadamente as autarquias. Apesar de se tratar de uma alteração à filosofia inicial e ao contexto em que os primeiros dois centros, e únicos até agora, foram lançados, eles aceitaram-na. O Centro Regional das Artes do Espectáculo de Viseu fez um protocolo com a Câmara Municipal de Viseu e o Centro Regional das Artes do Espectáculo do Alentejo formalizou um protocolo que demorou um pouco mais tempo, porque envolvia mais autarquias mas que estava pronto, salvo erro, em 2000, para poder ser assinado e, portanto, haver, a partir daí, um financiamento que, como o Sr. Ministro acabou de referir em relação às questões das artes do espectáculo, não representasse meramente um subsídio anual mas plurianual e pudesse dar alguma sustentação e algum planeamento a esta actividade e a estas instituições.
Sucede, Sr. Ministro, que, no caso do Centro Regional das Artes do Espectáculo de Viseu, o protocolo termina no final deste ano, no caso do de Évora, o protocolo não chegou a ser assinado, com o Sr. Ministro Sasportes, apesar de estar pronto para assinar, porque, à última hora, o Sr. Ministro entendeu não o assinar por razões que nos escapam, pelo que estamos perante uma situação de alguma instabilidade e de alguma indefinição quanto a esta questão.
No PIDDAC está inscrita uma verba global para o ano de 2002 de €748 000, que estão divididos, segundo me parece, em duas partes, uma parte para Évora, outra parte para Viseu; mas, em relação a 2001, a verba que está inscrita, de execução prevista, que é de cerca de €450 000, não sei onde foi gasta, porque, em Évora, não foi gasta, nada foi entregue a Évora. Porventura, foi tudo entregue a Viseu.
Portanto, a primeira questão que se coloca é a seguinte: do ponto de vista geral, de filosofia geral, gostaríamos de saber se o Governo vai continuar a assumir os seus compromissos em relação aos centros regionais das artes do espectáculo, se isto ainda é um elemento da filosofia de descentralização do actual Ministério e se vai continuar a garantir os compromissos assumidos e, eventualmente, outros que se venham a assumir. E, neste contexto, gostávamos também de saber por que é que não se liquidam em 2001 as despesas que, entretanto, um dos centros fez, concretamente o Centro Regional das Artes do Espectáculo de Évora (CRAE), que está, neste momento, a viver do orçamento do Centro Dramático que vive ao pé dele, e qual é a perspectiva para o futuro deste CRAE, uma vez que a única verba inscrita é para 2002 e a ideia é termos um projecto plurianual.
Como sabe, Sr. Ministro, no que toca a esta questão, há um pedido de entrevista do CRAE do Alentejo com o Sr. Ministro, que, salvo erro, era para ser realizada hoje ou amanhã - como vê, estamos todos bem informados -, e era importante que, de facto, esta questão fosse esclarecida aos próprios, independentemente daquilo que tem a ver com o Orçamento e com as verbas inscritas no PIDDAC, uma vez que não ultrapassam o ano de 2002. Esta questão não pode viver nesta indecisão, como, aliás, o Sr. Ministro referiu em relação a outras questões gerais.
Portanto, em relação a isto, aquilo que nos interessa saber é o pagamento dos encargos de 2001 e o futuro para estes centros, e, no caso concreto do de Évora, para quando a assinatura de um protocolo plurianual que sustente o seu funcionamento, de acordo com os princípios gerais que estão aprovados.
A segunda questão tem a ver com um problema que não é pequeno, que é o da Biblioteca Pública e do Arquivo Distrital de Évora. Como sabe, Sr. Ministro, há uma questão específica neste domínio, que foge ao "pronto-a-vestir"

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normal das bibliotecas de leitura pública e popular, uma vez que em Évora se integram os elementos da leitura popular, da leitura pública, e da biblioteca clássica. Por isso mesmo, a Biblioteca Pública de Évora é uma biblioteca que, conjuntamente com mais duas ou três ou talvez meia dúzia, no País, tem um patamar de classificação directamente ligado ao Ministério da Cultura e ao Instituto Português do Livro e da Leitura. Também por isso, na altura do Ministro Carrilho, e confirmada posteriormente pelo Ministro Sasportes, foi encontrada uma solução específica de construção de uma nova estrutura de biblioteca pública em Évora, até no novo espaço nobre da cidade, uma vez que a situação actual é insustentável, a qual pudesse conjugar as valências tradicionais da biblioteca de leitura pública e da biblioteca erudita, se quisermos dizer assim, num quadro em que, naturalmente, a autarquia suportaria a parte que lhe competiria suportar se estivesse no esquema tradicional de biblioteca de leitura popular e o Governo suportaria a parte que lhe competiria suportar, sem diminuição das valências de biblioteca e do nível de biblioteca nacional.
Sucede que, neste momento, com tantas alterações ministeriais - e estamos num país em que cada ministro e cada equipa nova que inicia funções, mesmo sendo do mesmo Governo, parece ser de um governo novo, fazendo, às vezes, oposição ao ministro anterior ou esquecendo compromissos assumidos, apesar de se tratar do mesmo Governo -, ainda não sei qual é a reflexão do Sr. Ministro sobre esta matéria. A verdade é que isto se arrasta desde o Ministro Carrilho, com o Ministro Sasportes tivemos de reconstruir todo o dossier - espero que, com o Sr. Ministro Santos Silva, isso não seja necessário -, pelo que se torna importante que o Sr. Ministro dê aqui uma resposta quanto à estratégia do Ministério nesta matéria, uma vez que ainda não estão inscritas no orçamento as verbas para esse efeito. Sei que este processo, neste momento, a confirmar-se o acordo feito com o Ministro Sasportes, depende ainda de um problema de reordenamento do espaço urbano, onde isso vai ser visto em acordo com o IPPAR, mas a verdade é que ainda não ouvimos a opinião do Sr. Ministro sobre este compromisso geral. E, tanto nós como os directamente interessados, que, segundo me parece, têm "penduradas" várias entrevistas pedidas ao Sr. Ministro em relação a esta matéria, gostaríamos de a ouvir.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Sr.ª Presidente, vou fazer uma pergunta muito rápida, mas, em primeiro lugar, quero cumprimentar os Srs. Presidentes das Comissões, o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado.
Uma das medidas incluídas nas GOP para o sector da cultura tem por objectivo proteger e valorizar o património. É mesmo a primeira medida a implementar em 2002 e, neste domínio, é dada prioridade à regulamentação da Lei de Bases do Património, que já foi aqui referida e foi aprovada por esta Casa. Uma parte substancial dos encargos previstos pela nova Lei de Bases do Património tem a ver, sobretudo, com o património arquitectónico, através do IPPAR. Vemos que, de 2001 para 2002, o orçamento do Ministério da Cultura para este sector tem uma variação negativa de (-)8,4 pontos percentuais, com reflexos, sobretudo, no PIDDAC. Ou seja, para um acréscimo previsto, e obrigatório por lei, de encargos, até porque está também em discussão, neste momento, embora não tenha efeitos neste orçamento, a lei dos benefícios fiscais para os detentores de património cultural, a qual já terá implicações noutro orçamento, verifica-se uma considerável diminuição de verbas, mesmo tendo em conta que o IPPAR tem, em termos de orçamento do Ministério da Cultura e em termos de PIDDAC, a parte de leão dessas verbas. Só que estamos a falar de muito património espalhado por este País.
Assim, a pergunta que faço é muito simples e, de certa forma, mazinha. Pergunto ao Sr. Ministro como vai V. Ex.ª acudir a esta disparidade entre objectivos e verbas afectadas para estes objectivos, mesmo tendo em conta, repito, que o IPPAR é o organismo cujo sector é mais contemplado. É que esta redução vai obrigar o Ministério, obviamente, a fazer opções e, por isso, gostaria de saber como é que o problema vai ser resolvido, uma vez que a lei obriga, claramente, a que determinados bens do nosso património sejam urgentemente protegidos.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Abelha.

O Sr. António Abelha (PSD): - Sr.ª Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, começo por cumprimentar V. Ex.ª, os Srs. Presidentes das Comissões de Educação, Ciência e Cultura e de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o Sr. Ministro da Cultura e os Srs. Secretários de Estado.
O Sr. Ministro já terá inferido que não vou falar dos números que têm sido abordados por diversos colegas da minha bancada e por elementos das outras bancadas parlamentares e que, por certo, vou restringir-me muito mais ao distrito pelo qual sou eleito, o distrito de Vila Real, e a uma questão que não esgota todos os problemas culturais daquele distrito, mas que está na ordem do dia e que esta Casa, e muito bem, colocou na ordem do dia há já alguns anos atrás. Trata-se, como o Sr. Ministro sabe, do Museu do Douro.
Afirma o Governo, nas Grandes Opções do Plano para 2002, que, entre outros, os objectivos da política cultural são os de proteger e valorizar o património, descentralizar e apoiar o dinamismo dos agentes culturais e aproveitar as oportunidades que, em termos de bens culturais, favoreçam a novidade, o contacto e a abertura ao exterior. Ora, nem era preciso ser Deputado eleito pelo círculo de Vila Real - ainda por cima nascido na região do Douro, no Pinhão, como sucede comigo - para, ao ler estas referências à novidade, ao contacto e à abertura ao exterior e ao aproveitamento dos bens culturais, ver que a estratégia definida pelo Governo "assenta como uma luva" ao Museu do Douro.
Todavia, Sr. Ministro, das intenções aos actos vai uma grande distância e, por isso, constato que, quer em termos do orçamento, quer mesmo nas Grandes Opções do Plano, o Museu do Douro é tratado de forma menor ou inexistente.
Sr. Ministro, tendo a lei que cria o Museu do Douro sido aprovada por unanimidade nesta Câmara, o que fez e o que faz o seu Ministério pela sua implantação? Até agora,

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pouco ou nada! Não tendo sido V. Ex.ª o único Ministro da Cultura dos últimos anos, compreenderá que diga que assistimos a uma política errática de hesitações, que se contenta em escrever como grande objectivo para a criação do Museu do Douro a realização de uma exposição programática na Régua, integrada no processo de implantação do Museu do Douro. Pergunto, muito directamente, Sr. Ministro: esta é uma medida enquadrada numa estratégia global ou trata-se de mais uma manobra de diversão, de "pára-arranca" ou de "faz de conta"?
Por outro lado, se for possível, diga-nos, com clareza, qual o ponto de situação do Museu do Douro, em que ponto se encontra a sua reestruturação, que todos sabemos ser polinuclear e, por isso, mais complexa, e como se articula a relação entre a sede - provavelmente em Peso da Régua - e o outro acervo importante que existe na Real Companhia Velha e na Real Vinícola, em Gaia.
Cumprindo o apelo da Sr.ª Presidente, termino dizendo que urge preservar a memória de um povo e do seu trabalho - o povo duriense, labutando nos árduos socalcos do Douro, o povo que João de Araújo Correia e Miguel Torga tão bem cantaram.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Alberto Fateixa.

O Sr. José Alberto Fateixa (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Cultura, far-lhe-ei uma pergunta muito rápida e muito directa, relacionada com as questões do património.
Parece-me que a experiência de trabalho conjunto realizado entre o Ministério da Cultura e o Ministério do Planeamento ao nível das aldeias históricas da Beira foi uma experiência assinalável e positiva. Penso que, também em consequência dessa experiência, foi apresentado um programa de intervenções relativo ao Alentejo, mais concretamente relativo a intervenções a castelos do Alentejo e suas zonas envolventes. Olhando mais directamente para o orçamento do Ministério da Cultura, reparo que não está expressa essa intervenção relativa aos castelos do Alentejo, pelo que pergunto se essa intervenção e esse programa, que, tenho a certeza, serão executados durante a vigência deste Quadro Comunitário e que envolvem o Ministério da Cultura e do Planeamento, serão uma realidade no ano 2002.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Cultura e Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social, a questão que vos quero colocar respeita ainda à RTP, porque foi anunciada, com pompa e circunstância, a nomeação do Dr. João Carlos Silva para Presidente da RTP como sendo a escolha que iria pôr termo ao descalabro financeiro daquela empresa. De certo modo, justificava-se esta escolha pela sua preparação técnica, com prejuízo, obviamente, da independência, dada a sua excessiva conotação partidária. Infelizmente, perdeu-se a isenção, que estava comprometida à partida, mas não se ganhou na eficiência de gestão que se esperava e que era também prometida.
Digo isto porque os números são elucidativos. Assim, temos em 2000 um défice da ordem dos 34,7 milhões de contos, contra 25 milhões de contos em 1999 e mais 25 milhões de contos em 1998. Como tal, não há dúvida nenhuma de que se regista um agravamento, tendo, de 1999 para 2000, as dívidas de longo prazo passado para o dobro, ou seja, de 52 milhões de contos para 104 milhões de contos. O financiamento de serviços externos, por sua vez, passou de 31 milhões de contos para 39 milhões de contos e, enfim, tudo isto se agravou. Como tal, gostaria que me fosse explicado o que o Governo pensa fazer para inverter esta situação. Tanto mais que este agravamento de custos tem sido, infelizmente, acompanhado de uma degradação do serviço público e de uma quebra de audiências, pelo que não há um índice que possa ser compensado por este descalabro.
Ainda há pouco foi feita uma operação em relação à qual temos de ser claros, porque foi, obviamente, uma operação que pretende "furar" as exigências de transparência que se deve ter na relação financeira do Estado com a televisão pública. Esta via de fazer um aumento de capital de 15,5 milhões de contos da Portugal Global, para esta entregar essa quantia à televisão, por forma a esta poder pagar o IVA em atraso e tirar parte substantiva de 0,5 milhão de contos para as remunerações da administração, é algo que me parece totalmente anómalo e reprovável.
O Sr. Secretário de Estado, há pouco, referia, sempre com aquela lembrança do cavaquismo, que isto vem de 1992. Disse que há aqui consequências da dívida de 1992, mas o que não disse é que nessa altura discutia-se se este IVA era ou não devido, reclamando a televisão o seu não pagamento, e que só em 1 de Junho de 1996 é que o então Ministro das Finanças Sousa Franco determinou, esclarecendo, que o IVA era devido e que tinha de ser pago. Apesar deste esclarecimento e desta definição, a verdade, já não tendo nada a ver com o cavaquismo, é que de 1996 a 2000 continuou a não se pagar o IVA. Ora, este acumulado não é, portanto, apenas de 1992 a 1996 - altura em que se compreendia o não pagamento, porque estava em discussão - mas também de 1997 a 2000, altura em que já não havia discussão. Na verdade, isto acontece com muita frequência com este Governo, havendo um ministro que diz que se paga e outro que afirma que não paga, razão pela qual a incoerência é reinante. A realidade, porém, é que se deixou acumular esta questão.
Isto gera, para além disso, um fenómeno engraçado, porque, como se sabe, este IVA é, em linguagem técnica, processado por dentro, ou seja, está já inserido nos valores da compensação, e a televisão arrecadou, recebeu e não entregou ao Estado, como devia, numa atitude que, do ponto de vista jurídico-criminal, configura abuso de confiança. Por sua vez, o Estado, por esta engenharia financeira do aumento de capital da Portugal Global, voltou a entregar aquilo que a televisão já tinha recebido para aquele pagamento. Ou seja, a televisão recebe duas vezes! Mas era preciso que estes números não aparecessem nos resultados, aumentando o agravamento deste descalabro, e daí esta solução.
Curiosamente, ao abrigo de parte desta verba, dos tais 500 000 contos, faz-se uma actualização dos vencimentos da administração da RTP. Há, de facto, coisas curiosas! Não vou, obviamente, comentar ou referir os valores dessas remunerações, que são bastante elevados, mas vou

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referir um processamento que me parece totalmente inaceitável.
Nós temos um despacho do Presidente da Portugal Global a fixar o aumento de vencimentos, que data de 15 de Novembro; temos, por outro lado, a homologação ou a concordância com esses aumentos da comissão de vencimentos, que data de 24 de Novembro de 2000; por fim, temos esta coisa extraordinária: o cheque de pagamento destes aumentos, que são criados num despacho de 15 de Novembro e homologados a 24 de Novembro, datar de 7 de Novembro! Antes mesmo de tudo isto estar regularizado, a excelentíssima administração pagou-se antecipadamente. De facto, se a administração fosse tão eficiente a gerir a televisão como é a gerir os seus vencimentos, teríamos uma gestão excelente!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não se esqueça que a renda da casa é paga até ao dia 8!

O Orador: - É lamentável que a gestão dos dinheiros públicos seja feita desta maneira e que a televisão dê este espectáculo e este exemplo na forma da sua gestão.
O que pergunto ao Sr. Ministro é o seguinte: a televisão vai tornar transparentes estes números, vão os seus resultados reflectir mais estes 15,5 milhões de contos que, efectivamente, recebe, ou vai manter esta engenharia financeira de ocultação destes valores? O que é que será feito para o futuro em matéria do IVA? Vai deixar outra vez atrasar e acumular para, pela segunda vez, receber essa quantia, através de engenharia financeira? Que promessas e orientações tem o Governo e a administração da RTP em termos de nos dar a garantia de que este agravamento de custos vai ser alterado, revertendo-se o caminho que temos seguido ao longo destes anos em matéria de televisão? Será que vai ser necessário arranjar um "Rangel" para o pelouro financeiro, como se arranjou para a programação, embora, segundo me parece, este vá tornar mais cara a televisão?! Se não houver um outro "Rangel ao contrário", penso que tudo isto, neste domínio, vai piorar.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natalina Tavares de Moura.

A Sr.ª Natalina Tavares de Moura (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Cultura, de há três anos a esta parte, venho fazendo apelos sucessivos aos seus diferentes antecessores, e sempre com êxito! Espero, igualmente, ter êxito desta vez.
Sr. Ministro, não vi contemplado no PIDDAC regionalizado por Lisboa a continuidade do arranjo da Igreja da Madre de Deus. Com o Ministro Manuel Maria Carrilho, consegui o arranjo da talha e dos telhados, trabalho que continuou a ser executado com o Ministro José Sasportes. Porém, àquele belíssimo edifício de estilo manuelino, de que há apenas três, incluindo este, exemplos no mundo, falta, Sr. Ministro, o arranjo do exterior. Ora, como não consigo perceber, pelos documentos, se se trata ou não de uma obra de continuidade, gostaria que fosse dada uma atenção muito especial ao exterior daquele edifício, que merece igualmente ser tratado.
Ainda na área do património cultural edificado e da arte sacra, peço-lhe, Sr. Ministro, uma atenção muito especial para a Igreja de Santa Engrácia, na Calçada dos Barbadinhos - não estou a referir-me ao Panteão Nacional, porque este está bem conservado mas à Igreja de Santa Engrácia -, que é de estilo barroco e que precisa urgentemente de um arranjo, para não ser destruída. Além disto, se um dia for possível, gostaria que o Sr. Ministro se deslocasse a esta igreja para verificar que há ali algo de estranho para todos nós, que é o facto de haver uma estalagem, segundo aquilo que nos dizem ser, no espaço imediatamente contígua à igreja.
Sr. Ministro, chamo a atenção de V. Ex.ª para estas duas igrejas, que não vejo entre as seis igrejas contempladas no PIDDAC.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, dou a palavra ao Sr. Ministro da Cultura ou aos Srs. Secretários de Estado, conforme entender.
Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Cultura: - Sr.ª Presidente, em boa ordem, começo pelos centros regionais das artes do espectáculo, em relação aos quais foram colocadas duas questões, uma de orientação geral e, outra, específica, que tem a ver com os dois centros existentes em Viseu e em Évora.
Em relação à primeira, devo dizer que a orientação geral é aquela que o Governo tem seguido com esta modulação que eu gostaria de considerar.
O projecto de centros regionais das artes do espectáculo, designadamente no seu primeiro enunciado de objectivos claramente descritos como a possibilidade de estruturas públicas de apoio ao desenvolvimento das artes do espectáculo de dimensão regional, estava tipicamente relacionado com um outro objectivo essencial do Programa do XIII Governo, o da regionalização.
Evidentemente, o facto de a regionalização administrativa não ter avançado, por decisão do eleitorado, através de referendo, obriga a reequacionar a natureza dos centros regionais.
A orientação actual é aquela que, muito bem, enunciou, isto é, considerar as estruturas onde, primeiro, se possa verificar uma parceria estruturada entre o Ministério da Cultura, as autarquias locais e as estruturas de criação independentes e, segundo, se possa potenciar o próprio financiamento e apoio público a estruturas independentes, através da prestação - por essas estruturas ou pelos centros que elas dinamizam - de outras actividades de serviço público, em termos de formação, gestão de equipamentos públicos ou outras actividades conexas, que permitam justamente alargar a actividade própria das estruturas de criação a outras actividades de serviço público, como o desenvolvimento das artes do espectáculo - em particular no teatro -, regionalmente sediadas.
É esta a lógica! Não é, portanto, uma lógica de disseminação da constituição, por exclusiva iniciativa ou sob exclusiva responsabilidade do poder central, de estruturas públicas, no sentido de estruturas estatais disseminadas numa base distrital ou regional, cumprindo funções atribuídas aos institutos públicos de apoio às artes do espectáculo, mas, sim, de disseminação progressiva de combinações enraizadas localmente entre autarquias e estruturas independentes de criação que permitam não só sustentar o apoio a essas estruturas como assegurar a gestão e o funcionamento das redes de teatros e cine-teatros - ou

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seja, os equipamentos públicos localmente disponíveis -, constituindo, assim, parcerias público/privado, no sentido em que nas parcerias públicas há uma ligação entre o Ministério da Cultura e as câmaras municipais e em que essa mesma ligação se potencia com o trabalho com as estruturas independentes, sobretudo com as de natureza associativa, cooperativa ou outra ligada ao que, tecnicamente, chamamos de "terceiro sector" ou "economia social".
Em resultado desta orientação, o que fizemos foi propor ao Centro Regional das Artes do Espectáculo de Viseu a prorrogação do protocolo, cuja vigência terminava em fins de 2001. Para quê?! Para que o financiamento de apoio a esse centro regional seja garantido para o ano 2002. que é o ano em que, havendo novos concursos, haverá também, nesses concursos, modalidades próprias para o desenvolvimento de estruturas do tipo dos centros regionais.
No que diz respeito ao Centro Regional das Artes do Espectáculo de Évora, a lógica é a mesma. No entanto, o processo está mais atrasado, visto que ainda não foi possível terminar o trabalho técnico com o centro regional. Como muito bem o Sr. Deputado recordou, já é a segunda vez que é adiada a entrevista que tinha marcada comigo, e eu tenho de vir à Assembleia, naturalmente… Mas posso dizer-lhe que o processo está em curso, encontrando-se justamente na fase de desenho de uma solução para o Centro Regional das Artes do Espectáculo de Évora que seja consonante com esta orientação geral que referi e homóloga à solução encontrada para o Centro Regional das Artes do Espectáculo de Viseu.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Dá-me licença, Sr. Ministro?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço desculpa por o interromper, Sr. Ministro, mas, em todo o caso, há compromissos que estão assumidos. Portanto, há encargos a que o Estado se obrigou perante as estruturas que, entretanto, foram desenvolvendo as suas actividades em função desses compromissos. Estou a recordar-me, no caso específico de Évora, dos encargos assumidos durante 2001, ano em curso, para além, enfim, da assinatura do protocolo que permitirá o avanço para o futuro, no quadro geral que o Sr. Ministro agora enunciou.
Estes compromissos têm de ser respeitados, obviamente, pelo Estado, como pessoa de bem, para além do futuro.

O Orador: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, a regra de ouro da actuação do Ministério da Cultura, como acontece em todos os departamentos governamentais, é a de honrar os compromissos escritos. Portanto, esta regra será também aqui aplicada.
As condições em que isso se pode fazer, com quem e de acordo com que procedimentos, é sobre isto que estamos a trabalhar, em conjunção com a própria estrutura.
Quanto à Biblioteca Pública de Évora, a resposta ser-lhe-á dada pelo Sr. Secretário de Estado da Cultura, que é quem tem a tutela das bibliotecas.
No que diz respeito à questão colocada pelo Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte, com a mesma clareza com que colocou a questão, digo que sabemos quais são as responsabilidades acrescidas que resultam para o Governo e para administração do património. O Governo não ignora as responsabilidades acrescidas que resultam da própria aprovação da Lei de Bases do Património Cultural, e é, por isso que o Sr. Deputado, se fizer as contas de adição, já que tem os valores das parcelas, notará que a área do património tem um aumento global de cerca de 6% em relação às verbas previstas na dotação inicial do orçamento para 2001, havendo, portanto, um aumento superior em relação à estimativa de execução do orçamento de 2001.
O que acontece é que, por uma questão de equilíbrio e de dimensão dos institutos em causa, bem como dos seus próprios programas de investimento, a nossa aposta, em matéria de PIDDAC e de fundos comunitários para 2002, tem como prioridade essencial o Instituto Português dos Museus (IPM), a Rede Nacional de Museus e o Instituo Português de Arqueologia, o que não significa que o IPPAR não disponha dos 40 milhões de euros - se não me falha a memória -, para continuar a realizar o seu trabalho em 2002.
Portanto, a resposta global à pergunta global - de como é que se explica que, sendo tão importante, do ponto de vista da definição dos objectivos políticos por parte do Governo, a defesa e a valorização do património, haja diminuição nas verbas do IPPAR - é a de que há um aumento das verbas no que diz respeito à grande área do património, o que, aliás, significará 41% do orçamento global do Ministério da Cultura para 2002.
Passando à questão colocada pelo Sr. Deputado José Alberto Fateixa, devo dizer que o programa de recuperação, valorização e animação de castelos e fortalezas tem, do ponto de vista da intervenção do IIPAR e do Ministério da Cultura, seis intervenções em curso e que terminarão no fim de 2003, respectivamente nos Castelos de Belmonte, Marialva e Figueira de Castelo Rodrigo, Elvas, Évora Monte e Avis, que o investimento, em 2001, foi cerca de 300 000 contos e que já foram concluídas intervenções em quatro destes recintos, sendo o investimento global do programa na ordem de 1,5 milhões de contos.
Portanto, o programa está em curso. E o facto de ele não aparecer tão explícito na proposta de orçamento do Ministério da Cultura resulta apenas do facto de, tal como acontece com o Programa Recuperação de Aldeias Históricas de Portugal, a principal fonte de financiamento ser o programa regional desconcentrado.
A resposta à questão colocada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva será dada pelo Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social.
Sr.ª Deputada Natalina Tavares de Moura, quanto aos pedidos que fez, posso dizer que serão naturalmente tidos na devida conta e nos termos correctos, isto é, mediante informação técnica dos serviços do IPPAR. Terei todo o gosto em solicitar ao IPPAR a informação que me pede para ter em conta não só de como essas intervenções, cuja necessidade não discuto, aparecem no planeamento estratégico do IPPAR mas também as medidas que têm de ser levadas a cabo para corrigir eventuais planeamentos, caso eles não estejam contemplados.
A questão colocada pelo Sr. Deputado António Abelha irá ser respondida pelo Sr. Secretário de Estado da Cultura,

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que é quem conduz pessoalmente o processo do Museu do Douro.
Assim, se a Sr.ª Presidente permitir, o Sr. Secretário de Estado da Cultura e o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social irão responder às questões colocadas pelos Srs. Deputados.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado da Cultura.

O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, de facto, a Biblioteca Pública de Évora tem características especiais, depende, inclusivamente, do Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, ao contrário do que acontece com as outras, e tem sido vontade do Instituto melhorar a actual biblioteca, daí que, como se pode verificar pelo PIDDAC, haja uma verba inscrita nesse sentido. Mas o que está em causa, em relação à Biblioteca Pública de Évora, é a construção de uma biblioteca com qualidade que possa integrar a Rede Nacional de Leitura Pública e ao mesmo tempo continuar a prestar a valência de biblioteca erudita, como faz neste momento.
Houve várias conversas, vários encontros - assisti a um em Maio, com o Sr. Presidente da Câmara Municipal -, e de facto ficou por resolver uma questão que é fundamental para nós: a da localização da própria biblioteca.
Isto porque o município de Évora apresentou uma proposta de intervenção urbana no terreiro, no chamado Largo do Rossio, em Évora, que não estava sequer ao nível de um anteprojecto, isto é, havia apenas um conjunto de desenhos, que, na reunião havida em Maio, ficaram de ser convertidos em anteprojecto, o qual ficou de ser apresentado ao próprio IPPAR para parecer, uma vez que ficava na zona de protecção da zona histórica de Évora, que, como sabe, é património mundial e, por isso, está sujeito a classificação.
Portanto, neste momento, aguardamos a resolução desse problema, mantendo o Governo a mesma posição, uma vez que houve consenso quanto à concretização da biblioteca e, ao mesmo tempo, quanto à concretização do arquivo distrital, que é também uma questão pendente. Com a abertura, em Fevereiro, do novo arquivo distrital de Aveiro, fica-nos apenas o arquivo distrital de Évora para requalificar, e, portanto, será também objecto dessa intervenção.
É verdade também, como há pouco foi referido, que, em relação ao Centro Regional das Artes do Espectáculo do Alentejo, estava agendada para hoje uma reunião com o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Évora, que teve de ser passada para sexta-feira,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Évora está com azar!

O Orador: - … precisamente porque esta reunião convosco estava marcada para sexta-feira e foi antecipada para hoje.
Portanto, fica assente a posição do Governo e, na próxima sexta-feira, com certeza que será isso que terei ocasião de reafirmar ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Évora.
Em relação ao Museu do Douro, cuja lei de criação foi aprovada por esta Assembleia em 1997, demos passos significativos este ano. Porquê? Precisamente porque foi constituída a equipa para acompanhar a concretização do museu e porque foi também inscrita no PIDDAC para 2002 uma verba significativa que, em conjunto com a verba para o projecto Coimbra 2003, totaliza qualquer coisa como 8,1 milhões de euros. Por outro lado, ainda mais importante para concretizar este projecto, foram aprovados três projectos do Programa Operacional da Cultura com o valor de 251 000 contos, a concretizar em 2001, 2002 e 2003, projectos fundamentais para a concretização do museu. O primeiro é o projecto integrado de acção cultural do Douro, o segundo é o projecto Viver e Saber Tecnologias Tradicionais da Região do Douro e o terceiro é o do inventário e arquivo histórico do próprio Douro. A concretização destes projectos dará conteúdo ao próprio museu.
Estamos, neste momento, a trabalhar com a Direcção-Geral do Património para proceder à aquisição de um edifício na Régua, onde será construída a futura sede do Museu do Douro, tendo havido já a cedência, por parte do Instituto do Vinho do Porto, de instalações para a realização da exposição em 2003.
Portanto, foram dados passos significativos para a concretização deste importante projecto, e tanto é importante que "vem à cabeça" da lista dos projectos que temos para realizar em 2001 e também em 2002.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado da Cultura, em geral, os senhores, quando pensam num arquivo, pensam logo em betão. Por isso, quero perguntar-lhe se trataram interiormente o Arquivo Distrital de Évora, uma vez que ele estava completamente abandonado, nem sequer tinha um ficheiro ordenado, e a biblioteca tinha fichas que já datavam do velho Cunha Rivara.
Antes de passarem aquilo para o edifício novo, não seria bom pensarem nos exemplares raros que lá estão? É que um arquivo não é só betão, é, sobretudo, o que lá está dentro. Mas aqui, em geral, pensa-se só no betão. Gostava que se pronunciasse sobre isto.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.

O Sr. Secretário de Estado da Cultura: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rosado Fernandes, das verbas inscritas no PIDDAC do Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo consta uma parcela que se destina ao tratamento dos arquivos, à sua inventariação, no caso de ela não ocorrer, e também já a preparação da própria digitalização.
Agora, o Ministério da Cultura tem 18 arquivos distritais, tem o arquivo nacional e tem também, no caso de Évora, esse aspecto em acompanhamento. A verba que aparece no PIDDAC do Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo referente à Biblioteca Pública e ao Arquivo Distrital de Évora é uma verba que se destina a tentar minorar esse problema. Quanto à construção não está aqui, porque está subjacente a esta definição com a própria Câmara Municipal, que terá lugar no futuro.

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A Sr.ª Presidente: - Tem, agora, a palavra o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social.

O Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social: - Sr.ª Presidente, quero dizer, com toda a cordialidade, ao Sr. Deputado Guilherme Silva que não é fácil discutir com rigor temas com base em textos jornalísticos, eles próprios muito pouco rigorosos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas eu não citei qualquer texto jornalístico, Sr. Secretário de Estado!

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que evitem o diálogo.

O Orador: - Peço desculpa, mas não citou outra coisa que não um texto jornalístico!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não citei qualquer texto jornalístico!

O Orador: - Não se baseou noutra coisa, Sr. Deputado!
Em relação à questão das dotações de capital, devo dizer que não são, obviamente, processos menos transparentes, uma vez que, como toda a gente sabe, o Governo, nos últimos anos, por via de restrições orçamentais que já foram amplamente debatidas, financiou menos a RTP do que aquilo que o contrato de concessão previa.
Por outro lado, a dotação de capital não é invulgar. Essa forma de financiamento da televisão pública em Portugal não começou com este Governo, começou com o governo do PSD em 1993, em 1994 e em 1995, e, portanto, não é um processo de menor transparência, como toda a gente sabe.
Finalmente, em relação à questão da comissão de vencimentos, tudo seria, de facto, errado se não tivesse havido previamente uma deliberação das tutelas e não tivesse havido uma indicação da tutela para que esses vencimentos fossem, desde logo, postos à disposição das pessoas.

A Sr.ª Presidente: - Não havendo mais pedidos de palavra, dou por encerrada a discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Cultura.
Srs. Deputados, vamos aguardar alguns momentos até que dê entrada a equipa do Ministério da Educação, a fim de iniciarmos a discussão do orçamento do Ministério.

Pausa.

Sr. Ministro da Educação, Srs. Secretários de Estado, antes de mais, quero agradecer a vossa presença.
Vamos iniciar a discussão do orçamento do Ministério da Educação e vamos fazê-lo dentro do esquema que temos estado a seguir. Como o Sr. Ministro teve oportunidade de fazer uma exposição sobre matéria de natureza genérica quando, na Comissão, discutimos, na generalidade, o orçamento do Ministério, e como estamos numa discussão na especialidade, começo por dar a palavra aos Srs. Deputados, um por cada grupo parlamentar, para colocarem questões e, depois, o Sr. Ministro responderá.
Penso que não preciso de pedir novamente aos Srs. Deputados que se limitem às questões orçamentais na especialidade, o que significa - e peço desculpa de o dizer - que não são necessárias grandes intervenções nem grandes discursos, para ver se tornamos esta reunião eficaz, pedido, aliás, que faço também ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado.
Tem a palavra o Sr. Deputado David Justino.

O Sr. David Justino (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Educação, Srs. Secretários de Estado, quero, em primeiro lugar, apresentar os meus cumprimentos.
No que se refere à discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Educação, tenho para vos colocar três perguntas.
A primeira tem a ver com a análise que se pode fazer relativamente à concretização e, depois, às propostas de expansão da rede do pré-escolar. Podemos dizer que, de acordo com as últimas estatísticas que foram apresentadas, a rede pública dos jardins de infância apresenta uma distribuição das suas capacidades que eu gostaria de salientar, tendo até em atenção que um dos objectivos que o Sr. Ministro teve oportunidade de enunciar aquando da discussão, na generalidade, na Comissão foi o da preocupação na racionalização da rede escolar.
Não obstante alguns estabelecimentos serem novos, portanto, terem começado a funcionar recentemente, surpreende-me que tenham sido autorizado o seu funcionamento quando se sabe que, em alguns locais, não iriam ter o número de alunos suficiente. E chegamos a uma situação em que, neste momento, cerca de 11% ou 12% dos estabelecimentos da rede pública do ensino pré-escolar têm menos de 10 alunos.
A primeira pergunta que lhe faço é esta: qual é a posição do Ministério face ao futuro deste número de estabelecimentos, que, obviamente, têm um custo por aluno elevadíssimo, como é perfeitamente natural.
A segunda pergunta que desejaria colocar-lhe, dado que a análise dos dados do orçamento também nos permite tirar algumas conclusões não só em relação às despesas de funcionamento mas também relativamente aos investimentos, tem a ver com o seguinte: a taxa de cobertura projectada já para o próximo ano anda à volta dos 73% a 75%. Gostaria de saber, face à distribuição dos investimentos previstos para o pré-escolar, como é que se vai resolver o problema das duas mais baixas taxas de cobertura distritais, ou seja, o caso do distrito do Porto, em que a taxa de cobertura do pré-escolar é de 59%, e do distrito de Setúbal, em que essa mesma taxa de cobertura é de 57%, portanto, muito longe da média nacional, sendo certo que estes são também os distritos mais populosos.
Estará aqui, eventualmente, a razão por que me parece, face ao primeiro dado, que houve alguma falha no planeamento dos investimentos a fazer, nomeadamente construindo estabelecimentos onde eles eram menos necessários e não fazendo esse investimento onde eles eram mais necessários.
Portanto, queria saber até que ponto é que as propostas apresentadas quer no PIDDAC quer nas despesas de funcionamento poderão ou não colmatar esta distorção relativamente aos dados que forneci.
Por último, ainda no que diz respeito à educação pré-escolar, sabemos que, neste momento, pelo menos no corrente ano lectivo, a rede pública engloba qualquer coisa como 106 000 alunos e a rede privada 118 000, portanto,

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a rede privada ainda é superior à rede pública, mas, depois, se formos fazer o confronto dos custos, concluiremos que os custos na rede pública são praticamente duplos dos custos na rede privada.
Em relação a este dado, gostava de saber o que o Ministério pensa fazer em relação à gestão da rede pública do pré-escolar, dado que também tem sobre si a preocupação de contenção nas despesas, tendo em atenção também que, se confrontarmos os dados do ano passado, o crescimento da rede pública não foi significativo, ou seja, de 1999 para 2000, passou-se de 105 000 para 106 000 alunos, portanto um aumento de pouco mais de 1000 alunos, enquanto que a rede privada passou de 113 000 para 118 000 alunos. Ou seja, nos últimos anos, a taxa de crescimento da rede privada continua a ser superior à da rede pública.
Sabendo, também, que o tipo de serviço que a rede pública da pré-primária está a prestar (e já tive oportunidade de falar sobre isso) é um serviço relativamente insuficiente - abrir as escolas às 9 horas da manhã e fechá-las às 15 horas e 30 minutos não há-de ser um bom serviço -, gostaria de saber, tendo em atenção que isso também representa custos adicionais, se isso está ou não está contemplado no orçamento do Ministério.
Passando para o ensino superior, nomeadamente para um distrito que o Sr. Ministro conhece bem, o de Aveiro, aquilo que se diz é que havia um entendimento (e gostaria que o Sr. Ministro pudesse confirmar) de que a Universidade de Aveiro iria adquirir, por cerca de 1,5 milhões de contos, o Estádio Mário Duarte, na cidade de Aveiro. Gostaria de saber com que verbas vai ser feita a aquisição desse estádio por cerca de 1,5 milhões de contos. Isto porque tive oportunidade de ver as várias rubricas do PIDDAC e, tirando uma que lá está, que são Infra-estruturas, não creio que seja possível enquadrar. Assim, gostava de saber, em primeiro lugar, se vai ser feita a aquisição; em segundo lugar, como é que vai ser feita; e, em terceiro lugar, se está ou não está contemplada neste orçamento.
Por último, ainda relativamente ao ensino superior, gostaria que pudessem explicar-me quais os critérios para uma verba que atinge os cerca de 3,25 milhões de euros para a avaliação do ensino superior. Estamos a falar de qualquer coisa como 650 000 contos, só para o próximo ano, para a avaliação do ensino superior. Na verdade, não estou a ver que resultados, vistos da primeira fase, possam justificar uma verba tão elevada, nomeadamente quando o grosso dessa verba está na chamada "avaliação externa". Portanto, se pudessem explicar-me e justificar esta verba, eu agradecia.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosalina Martins.

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, tenho também três ou quatro questões para colocar. Vou, desde já, saltar uma questão do pré-escolar, que se prende com um tema que o colega que me antecedeu já abordou e que tem a ver com a questão do crescimento do pré-escolar e com esta dualidade entre o público e o privado. Centrar-me-ei na questão do 1.º ciclo, sem voltar a falar aqui nas Grande Opções do Plano nem a fazer toda a discussão que já travámos na generalidade, na Comissão.
O 1.º ciclo foi definido como prioridade neste ano lectivo e nós sabemos quais são os constrangimentos do 1.º ciclo, sobretudo nas zonas do interior onde a recessão demográfica tem vindo a aumentar sistematicamente.
Para além de todas as questões que têm a ver com racionalização, com mobilização de recursos e, talvez, também com introdução de mais factores de qualidade, gostava de recolocar uma questão que foi colocada aquando da discussão na generalidade mas que, penso, não ficou suficientemente esclarecida: a dos agrupamentos. Na reunião que tivemos, aquando da discussão na generalidade, foi levantada esta questão dos agrupamentos e foi dito que alguns agrupamentos não tinham orçamento de funcionamento. Tentei indagar na minha região se havia situações de agrupamentos que estivessem sem orçamentos e constatei que, efectivamente, quer no distrito de Viana do Castelo, quer em três ou quatro casos que consegui referenciar no distrito de Braga, há agrupamentos que iniciaram o ano lectivo sem qualquer tipo de financiamento e aqueles que funcionam ou são as câmaras municipais que estão a adiantar o dinheiro ou, outros, têm funcionado com a boa vontade de alguns.
Porque estamos aqui num debate na especialidade e porque eu, que não sou economista, não consigo desagregar esta verba do orçamento do funcionamento do ensino básico, gostaria de saber como é que se vai ultrapassar esta situação, se esta situação depende, única e exclusivamente, do mau funcionamento de uma direcção regional ou se, efectivamente, é preciso reorientar esta linha de actuação do Ministério da Educação.
Uma outra questão, também muito concreta, que eu gostaria de colocar tem a ver com as escolas profissionais. No passado fim-de-semana, ao ler um longo artigo que tinha a ver com o acompanhamento de um dia do actual Ministro das Finanças, olhei para umas notas de rodapé, em que havia um discurso na primeira pessoa de que retirei uma frase que dizia o seguinte: "Mas a política é acção, por isso sinto um grande orgulho em ter contribuído, no Ministério da Educação, para o lançamento da rede de educação pré-escolar…" - todos nós estamos muito orgulhosos disso e temos consciência de que esse trabalho continua a ser feito - "… e para a consolidação das escolas profissionais."
Ao olhar para este orçamento relativo às escolas profissionais, a minha preocupação não é tanto com as acções de formação profissional que estão no terreno para este ano mas para o futuro.
Dado que, nas Grandes Opções do Plano, nós definimos que, até 2006, é objectivo do Governo do Partido Socialista - aliás, isso também decorre do Programa do Governo - ter cerca de 40% dos alunos em vias profissionalizantes ou direccionadas para a vida activa e sendo, neste momento, o subsistema das escolas profissionais aquele que garante este percurso, dado que a revisão curricular do ensino secundário só vai iniciar-se no próximo ano lectivo, portanto só daqui a três anos é que colocará no mercado os primeiros jovens oriundos dos cursos tecnológicos, penso que deverá haver, nas escolas profissionais, esta perspectiva de crescimento. A questão que coloco é: para o ano lectivo de 2002/2003, que está consagrado neste Orçamento do Estado, qual é a perspectiva relativamente ao ensino profissional?

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Uma terceira questão refere-se ao ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro. Penso que, se não me enganei nos números (eu não sou especialista a manusear números), o factor de crescimento que nos aparece neste capítulo é de 3,6%.
Sabendo nós que existem duas redes - a rede oficial, sobretudo circunscrita aos países da União Europeia e da África do Sul, e a rede particular e cooperativa, mais nos Estados Unidos da América, Canadá, Austrália, Venezuela - e, ainda, as secções internacionais e que tem havido um aumento progressivo do número de professores colocados e do número de alunos que estão no sistema, gostaria de colocar uma questão muito concreta que tem a ver com a formação de professores.
No final da passada sessão legislativa, realizou-se um encontro e uma das grandes lacunas sentidas pelos participantes tinha a ver exactamente com a formação dos professores que estão neste momento no estrangeiro, sobretudo porque se referia à necessidade de fazer uma abordagem do Português não só como língua materna mas também como língua estrangeira, muitas vezes inserido em contextos multiculturais, em contextos multilingues, bilingues, etc. Concretamente, neste Orçamento do Estado, qual é a fatia que está reservada à formação destes professores, dado tratar-se de um aspecto muito importante e que também se prende com um projecto de resolução da Assembleia da República?
Quanto ao ensino superior, e para terminar, uma última questão: nós sabemos que, após a segunda fase de colocações, cerca de 8000 vagas não foram preenchidas, o que, logicamente, nos leva a deduzir que o orçamento do ensino superior vai abranger menos alunos do que aqueles que, inicialmente, estavam previstos. Pergunto se, relativamente à acção social escolar no ensino superior, que tem sido uma aposta e uma bandeira do Partido Socialista, todos os alunos carenciados, face a este orçamento, vão ter direito às bolsas de estudo respectivas.
Sr.ª Presidente, por motivos de ordem pessoal, vou ter de apanhar um avião às 20 horas, pelo que vou ausentar-me. De qualquer forma, as respostas não são só para mim, são também para o meu grupo parlamentar. Portanto, Sr. Ministro da Educação e Srs. Secretários de Estado, se eu me ausentar entretanto, o meu grupo parlamentar tomará a devida nota das respostas que forem dadas às minhas questões.

A Sr.ª Presidente: - Sr.ª Deputada, até me assustou com essa ideia de às 20 horas ainda não ter a resposta, uma vez que ainda são 17 horas e 45 minutos!

Risos.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, a primeira questão prende-se com o financiamento para o ensino superior. Nós recebemos a Comissão Permanente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas há cerca de uma semana e, para além das questões que já tinham sido levantadas aquando da discussão na generalidade, concretamente pelos Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, hoje possuímos outros dados, extremamente gravosos, naquilo que tem a ver com o financiamento do ensino superior e que, na nossa perspectiva e - agora não só - subscrita também pelos Srs. Reitores (pelo menos, os que integraram a Comissão Permanente e que estiveram na Assembleia da República, a propósito do financiamento do ensino superior), põe em causa o financiamento das universidades para o próximo ano lectivo. Dito de uma outra forma, os Srs. Reitores consideraram que estamos no limiar da sobrevivência, que não deve haver qualquer tipo de movimentação, que a água está pela boca e, se mexerem, morrerão afogados! Eles, as faculdades e os respectivos alunos!

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): - Ficou pelo queixo!

Risos.

A Oradora: - Tive a noção de que o Sr. Presidente da Comissão Permanente tinha levantado um pouco mais o dedo e que chegava mesmo à boca!
Os dados que temos não são, de facto, muito simpáticos, não dão muito para rir. Nós estamos a falar de um subsistema que é fundamental ao País! Ou entendemos, discursivamente, que a educação é estratégia fundamental ao desenvolvimento do País e que o ensino superior é a aposta necessária à formação de quadros qualificados ou isto não passa das GOP, não passa dos programas do Governo e, quando é preciso consignar as verbas, em termos de orçamento, não as temos e, portanto, não entendemos que a educação é importante e que o subsistema do ensino superior é fundamental ao nosso desenvolvimento. É por isso que essas questões não dão tanto para rir como, à primeira vista, pode parecer!
A questão que coloco já, Sr. Ministro, é esta: temos o orçamento de funcionamento com um aumento de 9% e, depois, o investimento do Plano com um aumento de 16,9%. Ora, talvez fosse bom traduzirmos estes aumentos. E a tradução destes aumento significa que, no investimento, no ano transacto, tivemos um decréscimo de quase 14%, mais precisamente 13,7%. Se agora aumentarmos 16,9%, descobriremos que, relativamente ao investimento do Plano de 1999 e de 2000, ficamos muito aquém das nossas necessidades. Portanto, o aumento só é plausível e credível se falarmos do decréscimo de 13,7% no ano transacto e, então, perceberemos que aumento é este! Se tivermos em atenção a inflação prevista, que rondará, na melhor das hipóteses, os 4%, veremos que não há, efectivamente, nenhum aumento no investimento.
Passemos agora ao orçamento de funcionamento: um aumento de 9%. Se tivermos em atenção que nestes 9% estão 7% das propinas, se também tivermos em atenção a inflação, veremos qual é o aumento do orçamento de funcionamento em termos do ensino superior.
Dizem os Srs. Reitores, depois de alguma insistência, que as propinas - ainda não vimos o actual Sr. Ministro dizer isto, mas, naturalmente, na resposta o dirá! - vão exclusivamente ter como objectivo o aumento da qualidade no ensino superior. Aquilo que foi dito à Comissão foi que, com excepção do primeiro ano em que uma fatia das propinas foi aplicada na qualidade, nunca mais, até hoje e também para o próximo ano, as propinas servirão para o aumento da qualidade mas exclusivamente para fazer funcionar as universidades naquilo que tem que ver com o

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pagamento da água, da luz e dos vencimentos dos docentes.
Sr. Ministro, também relativamente ao orçamento padrão e ao financiamento - possuímos, inclusivamente, uns gráficos extremamente interessantes, que foram fornecidos à Comissão de Educação, Ciência e Cultura -, desde 1996 até ao ano 2002, tendo em atenção o Orçamento do Estado, aquilo que se conclui é que, depois de uma lei de financiamento em que se contratualizou uma forma relativamente à qual o Governo assumiu responsabilidades e as universidades também, as universidades cumpriram, mas o Governo não.
Mas mais grave do que não ter cumprido foi ter-se afastado todos os anos da convergência para o orçamento padrão e ter apostado na divergência. O que leva a uma situação perfeitamente caricata, vivida já nos últimos anos, e perfeitamente clara para o ano de 2002, que é a de o orçamento previsto para o Ministério da Educação ser exclusivamente para fazer funcionar, no limiar da sobrevivência, as universidades do nosso país.
Eu bem sei que estas questões dizem muito ao actual Ministro, anterior reitor e presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), e também que lhe trouxeram muitas preocupações, inclusivamente no ano passado, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 2001. Sei que é sensível a estas questões e por isso mesmo estou a colocar-lhas, tendo a certeza de que irá explicar-nos o que se passa com todas estas matérias.
Mas, continuando, se acrescentarmos, ainda, que a cativação dos 5% foi transformada em corte e que a fuga ao orçamento padrão ronda os 10%, temos, na prática, um corte de 15% nas universidades. Isto também permite entender a situação de perfeita agonia com que se confrontam as universidades do nosso país.
Embora estejamos a discutir matéria orçamental, parece-me importante termos sabido, na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, que a Comissão Permanente - e, penso, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas - considera que as propinas não são o caminho certo para a resolução dos problemas do ensino superior e que a lei do financiamento em vigor, aprovada, nesta Casa, por alguns grupos parlamentares em 1997, não é a resposta que o ensino superior deseja em termos de financiamento. É bom sabermos que agora são os estudantes, os reitores e alguns grupos parlamentares que consideram que esta não é a lei que serve o ensino superior!
Mas vamos a outros itens do orçamento.
Gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se um acréscimo de 3,1% no ensino básico e secundário corresponde - considerando, mais uma vez, que a inflação rondará os 4% -, ou pode minimamente corresponder, não só ao funcionamento do ensino básico e secundário… Porque aquilo que a Sr.ª Deputada Rosalina Martins referiu há pouco, e que é extremamente importante, não se verifica só no distrito pelo qual a Sr.ª Deputada foi eleita; de norte a sul do País a grande maioria dos agrupamentos não tem financiamento. O 1.º ciclo do ensino básico não tem orçamento, portanto a situação não é pontual, não se verifica num ou noutro distrito, é assim de norte a sul do País.
Mas pergunto: um acréscimo de 3,1% no ensino básico e secundário, considerando a inflação, consegue responder ao funcionamento dos agrupamentos, ao funcionamento do ensino básico e secundário e ao início, mesmo que seja devagarinho, muito devagarinho, da reforma curricular, tendo em atenção todas aquelas novidades que a reforma curricular trazia?! E estou a lembrar-me do ensino das línguas estrangeiras no 1.º ciclo do ensino básico e de todas aquelas novidades da reforma curricular, nomeadamente a nível tecnológico, etc.
Uma outra questão prende-se com o ensino da língua portuguesa no estrangeiro. A questão que quero colocar não é a de saber se o aumento que está previsto chega, porque não tenho dúvida nenhuma de que não chega. É referido um aumento de 3,6%, aumento, esse, que nem sequer considera a inflação que está prevista. Portanto, não responde sequer à continuidade do funcionamento, neste momento.
Porém - questão que considero importante -, foi aprovado, nesta Casa, por unanimidade, um texto que, no seu articulado, recomenda ao Governo a criação de um programa de expansão e qualificação do ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro, que passe por um investimento financeiro maior para vencer a grave situação de carência existente.
A esta recomendação a tutela respondeu com um investimento menor, porque um aumento de 3,6% não é um investimento maior, comparativamente com o ano de 2001 e tendo em conta a inflação!
Deixando de fora as medidas na área da comunicação social, da RTP Internacional, solicita-se, também, nesse texto, o apoio e incentivo às várias formas de cursos existentes, a elaboração de manuais escolares e de outro material pedagógico-didáctico, a elaboração de programas de acção de formação de professores, a colocação por concurso dos coordenadores do ensino português, etc.
Sr. Ministro, pergunto como é que com um aumento de 3,6% se pode responder minimamente a todos estes itens. Ou o Ministério seleccionou algum e tem uma outra verba prevista num outro item, que não este? Porque este aumento não chega para responder a estas questões e ao conteúdo do texto aprovado, por unanimidade, nesta Casa.
Uma outra questão prende-se com o ensino pré-escolar. Sr. Ministro, não vou repetir as questões colocadas pelo PS e pelo PSD, mas há uma questão de fundo que se prende com as responsabilidades enviadas para as autarquias e as contrapartidas financeiras.
Quando assistimos, neste Orçamento, no que respeita aos investimentos do Plano, a uma quebra de 55,5%, o que isto significa é que, definitivamente, e de uma forma perfeitamente clara, o Governo se desresponsabiliza na área do pré-escolar. Aquilo que era uma aposta do Governo do Partido Socialista, que era o Programa de Desenvolvimento e Expansão da Educação Pré-Escolar, está exclusivamente nas mãos das autarquias.
Mas mais: até agora, tem havido um conjunto de protocolos que delimitam a área de actuação das autarquias e da tutela - o Governo. O que este decréscimo de 55,5% quer dizer é que os protocolos acabaram. Portanto, não vão ser assinados mais protocolos com autarquias, para responder fundamentalmente às necessidades sentidas em áreas complicadas de grande densidade populacional, como as do Porto, de Braga, de Setúbal e de Lisboa, onde as falhas são maiores e a cobertura é menor. Ou, então, há algum protocolo especial assinado com estas autarquias responsabilizando-as, na sua totalidade, pela expansão e

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pelo desenvolvimento do ensino pré-escolar ou, então, ela deixou de ser uma paixão do Governo…!
Finalmente, Sr. Ministro, uma última questão sobre o ensino particular e cooperativo.
Em todos os Orçamentos do Estado, temos vindo a chamar a atenção para aquilo que tem sido, e é - porque agora os dados já são conhecido através do Diário da República, portanto nem sequer estão escondidos -, cortes orçamentais pedidos às escolas públicas, e que, na prática, conseguem pôr em causa (e é isto que fazem exclusivamente) a qualidade do ensino público ministrado nas nossas escolas do ensino básico e secundário e para aquilo que tem sido um acréscimo efectivo e claro no ensino particular.
Nós temos uma listagem - provavelmente, como nós a recebemos também a receberam os restantes grupos parlamentares - onde consta um conjunto de colégios na zona Centro que recebem apoios do Governo, e grandes apoios do Governo, que continuaram a recebê-los durante o ano 2001, que vão recebê-los durante o ano de 2002 (e é isto que eu queria saber, Sr. Ministro) e que não cumprem aquilo a que estão obrigados por lei. Ou seja, há colégios e externatos que são financiados pelo dinheiro de todos nós e que se dão ao luxo de recusar as matrículas a alguns alunos, porque estes têm problemas de aprendizagem; há colégios e externatos que recebem financiamentos públicos e que se dão ao luxo de estarem colocados a 4 km de escolas públicas, as quais têm capacidade para receber os alunos que estão nesses colégios mas que estão a ficar sem alunos porque eles vão para esses colégios; ou, então, há algumas autarquias que recusam, em nome dos apoios que o Governo dá aos colégios, o transporte de alguns alunos para alguns estabelecimentos de ensino públicos, justificando a existência de um colégio privado na área em que existe a escola pública.
Sr. Ministro, terei todo o prazer em fazer chegar esta listagem dos colégios, que tenho em meu poder, mas também sei que tudo isto foi enviado ao Governo e a outras instituições, inclusivamente aos tribunais.
A questão que coloco é esta: estes colégios na zona Centro continuam a receber os apoios para o ano 2002, mesmo não cumprindo os requisitos, mesmo não cumprindo a legislação em vigor, mesmo estando a pôr em causa a qualidade do ensino das nossas escolas públicas, mesmo estando a provocar horários zeros, às dezenas, na região Centro, bem como descidas muito grandes em termos do número de alunos em muitas escolas públicas da região Centro?

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Isabel Castro, chamo a atenção para o facto de estar presente entre nós uma delegação da Assembleia Parlamentar da UEO. Para eles, peço a vossa saudação.

Aplauso gerais, de pé.

Tem a palavra a Sr. Deputada Isabel Castro.

A Sr. Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, não vou falar sobre algumas das questões que nos preocupam, porque já foram colocadas por outros colegas, designadamente as questões do ensino da língua portuguesa no estrangeiro e do ensino superior.
Vou falar de um sector que tem sido sistematicamente esquecido, porventura porque é um dos sectores mais fragilizados e em relação ao qual é óbvio que a constatação do problema e a sua valorização no discurso nada tem que ver, na prática, com a asfixia de meios para corresponder àquilo que são deveres constitucionalmente assumidos pelo Estado, que decorrem de responsabilidades da lei de bases do ensino e que, aliás, foram mais recentemente assumidos, no plano internacional, pelo Estado português na Declaração de Salamanca sobre Princípios, Política e Prática em Educação Especial: refiro-me ao ensino especial.
Sr. Ministro, é em relação ao ensino especial que me parece particularmente chocante a situação que se vive este ano. Particularmente no ano passado, o ensino especial já foi objecto de uma primeira intervenção numa perspectiva claramente economicista, ou seja, não considerando que há uma responsabilidade de dar satisfação às necessidades educativas especiais das crianças (estamos a falar de um grupo amplo, isto é, das crianças deficientes e, mais do que isso, das crianças com necessidades educativas especiais). Ora, particularmente numa área metropolitana como a de Lisboa, o Sr. Ministro tem, com certeza, a noção do que isto significa em termos de amplitude do problema e da gravidade de não haver uma resposta para o mesmo.
A questão, para nós, coloca-se não só porque no início do ano lectivo se verificou que, estranhamente, não foi solicitado às escolas, como é usual, que fizessem o levantamento das suas necessidades para este ano lectivo como também porque, alertado o Ministério para esse facto, não foram tomadas medidas especiais. Portanto, não estão a ser colocados, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 105/97, os professores treinados e pagos pelo Estado para saber lidar com crianças deficientes e para trabalhar nesta área. Pelo contrário, como forma de rentabilização - para usar a expressão do Governo, não a nossa -, pega-se em professores do ensino regular, que são, no fundo, como aconteceu há alguns anos para o ensino superior, os "turboprofessores". Trata-se, assim, de professores a quem é atribuído um grande número de escolas e que, como se percebe, não vão conseguir satisfazer as exigências destes meninos, que têm direito a uma resposta educativa.
Estas crianças, ao serem excluídas - porque isto é uma forma de exclusão do sistema -, virão a ser a prazo cidadãos jovens e adultos sem possibilidade de se integrarem normalmente na vida da comunidade.
Portanto, Sr. Ministro, é perante esta situação em concreto, que significa, por exemplo, que na Grande Lisboa tenhamos 26 professores para 49 escolas, sendo que estes professores têm de fazer a "ronda" por várias escolas diariamente, situação esta ainda não referida por nenhum dos colegas, que gostaria que nos dissesse como vai ultrapassar este problema.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Educação, interessou-me bastante a discussão sobre as Grandes Opções do Plano, sendo que não tive dúvidas em afirmar nessa altura que Portugal nunca

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dispôs de tanto dinheiro para a educação. Portanto, se educação não há é porque o dinheiro é mal gerido. É mal gerido, por exemplo, a começar pelas universidades, quando todos nós sabemos os milhares de contos que se gastam nas chamadas reuniões de júri para doutoramentos, concursos e agregações, coisas que podiam fazer-se por fax.

O Sr. David Justino (PSD): - Por fax?!

O Orador: - Por fax, com certeza! Se me incumbirem de fazer uma prova, certamente que não preciso de estar na presença do reitor da universidade para dizer que a faço! Passam a vida a passear entre universidades! Em parte nenhuma do mundo isto se faz! Era o que faltava!
Como reitor sempre me chocou a quantidade de viagens que tinha de fazer, e que deixei de fazer - recusava-me a fazê-las - porque considero que se trata de um dispêndio no erário público absolutamente desnecessário. Se houvesse um caso "bicudo", por exemplo, de insultos, de rivalidades, de "canibalismo universitário", então, sim, era necessária a nossa presença.
Cada qual pensa como quer, mas de qualquer maneira penso que os universitários estão habituados a gastar muito dinheiro, embora ganhem modestamente. Portanto, este é o exemplo de uma situação em que podia poupar-se alguma coisa.
No que diz respeito ao dinheiro à disposição do ensino, penso que o mesmo seria suficiente caso houvesse medidas que obrigassem as escolas a administrar bem, porque seriam avaliadas.
Como é evidente, falar num orçamento na especialidade sem ter um balanço para saber qual foi o resultado do orçamento anterior não convence nenhum accionista. Em qualquer empresa seria assim, mas aqui somos forçados a falar de aumentos e de diminuições da taxa de inflação sem saber se, por exemplo, em certos sectores aquilo que se conseguiu no ano transacto foi 90%, 80% ou 70%.
Quero insistir na questão do ensino básico, visto que o meu colega David Justino já referiu o ensino pré-escolar, que considero extremamente importante, embora há 20 anos não soubesse sequer o que isso era nem o considerasse muito importante, porque nunca o tive - não consideramos importante aquilo que nunca tivemos e nunca conhecemos - e não era especialista em ciências da educação, felizmente, pois nesse caso a educação ainda estaria pior.
Recebi várias cartas de escolas do 1.º ciclo de diversos pontos do País em que criancinhas me perguntavam se no século XXI ainda terão os manuais tão complicados que os obrigam a decorar e se ainda terão de passar o frio que passam nas escolas. Outro dia - não sei se na Comissão de Educação, Ciência e Cultura -, alguém disse que Portugal era um país com um clima temperado e que, portanto, o aquecimento nas escolas não era necessário. Penso que foi um Deputado açoreano quem disse isto….

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Eu?!

Risos.

O Orador: - Estava a lembrar-me de quem tinha dito aquilo porque, de facto, os açoreanos não têm frio, pois têm uma amplitude térmica relativamente pequena!
Portanto, como eu estava a dizer, recebi cartas de crianças a perguntar se ainda continuarão a passar frio nas escolas. Será o estado actual financeiro do orçamento dedicado ao ensino básico suficiente?
Bem sei que a resposta ao problema que enunciei é "Isso é competência da autarquia!". Até admito que seja competência da autarquia, mas tem de haver um entendimento, porque até sou a favor da descentralização nas decisões, mas a descentralização nunca se deu - aliás, outro dia falei na sua "capoeira das musas" - era assim que Calímaco chamava ao museu de Alexandria -, na 5 de Outubro.
Portanto, Sr. Ministro, gostaria de saber se vão ser tomadas algumas medidas efectivas no sentido de as crianças terem, pelo menos, alguma qualidade de vida, que se reflectirá, certamente, na escola e na qualidade de aprendizagem. E já não digo na qualidade de ensino, porque há professores que não são recuperáveis. Aliás, este é outro aspecto que seria aqui de frisar.
Outro dia, na reunião do Conselho de Reitores, o Presidente, o Reitor da Universidade do Algarve, disse-nos com uma certa graça que Portugal precisava de engenheiros e de menos humanidades. Eu, que sou da área de humanidades, sou capaz de concordar com ele, porque sempre defendi que um país onde se estuda sobretudo Direito está necessariamente condenado a ser um país conflitual. Não há dúvida nenhuma que no dia em que os advogados não tiverem assuntos para resolver em tribunal o País desfaz-se. Portanto, desde os bacharéis de Direito do século XIX até hoje, a profissão preferida de um País conflituoso e conflitual (diz-se de brandos costumes mas não é; têm medo de levar na cabeça, mas brandos não são!) é o conflito.
Estive a ver as estatísticas e julgo que este livro que tenho em meu poder, embora me tivesse chegado bastante tarde às mãos, elucida sobre certos números no ensino. Na parte de ciências há uma predominância grande de inscrições, há mais pessoas na ciência do que nas humanidades e nas artes. Portanto, não sei onde o Presidente do Conselho de Reitores foi buscar aquela ideia, muito embora considere que se Portugal tivesse mais tecnologia não perdia nada.
Sr. Ministro, como tive ocasião de lhe dizer aquando do debate das Grandes Opções do Plano, de que nos serve alta tecnologia se não temos tecnologia média? De que nos servem os altos quadros saídos da universidade, que em geral têm uma preparação teórica "manualista" extremamente aplicada, se, por exemplo, em relação aos alunos de Agronomia, que têm três anos de alta matemática e vêem fitopatologia em slides, quando chegam ao campo, não sabem distinguir qualquer erva daninha da aveia selvagem, o chamado balanco?
No que diz respeito ao ensino tecnológico em geral, estive a informar-me, pois outro dia os Professores Nóvoa e Vítor Crespo insistiram comigo em como o ensino profissional estava a desaparecer nos países europeus, o que não é verdade, e posso dizer que os alemães, os franceses, os austríacos continuam com este tipo de ensino, aliás, estes últimos até têm aulas aos sábados.
Sr. Ministro, pergunto-lhe o seguinte: será suficiente o ensino tecnológico incidir só nos três últimos anos, que depois poderão dar acesso, evidentemente, ao ensino superior (para mim isso nem é objecto de discussão)? Para

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certas profissões, por exemplo, as que envolvam dedos (o violino começa-se a aprender aos seis anos. Mas não se trata da aprendizagem de violino, antes de mecânica, de certas profissões mais especializadas), não seria conveniente começar-se mais cedo? Em países desenvolvidos este ensino começa no 7.º ano, ou seja, temos os quatro anos da antiga primária, mais dois anos do ensino básico e no 7.º ano já haveria início de profissionalização, ou melhor, de ensino com aplicação prática (não lhe chamemos profissionalização).
Ainda não vejo isto em Portugal, ainda não há dinheiro para o fazer, além disso a mente portuguesa ainda não se conformou com este cenário. De facto, não vai ser fácil pensarmos nesta hipótese, só quando chegarmos a um atraso ainda mais considerável do que aquele que hoje já nos caracteriza e nos torna bastante conhecidos no campo internacional as pessoas acordarão para a necessidade de começar a preparar os nossos rapazes e as nossas raparigas para profissões para que tenham vocação.
No que diz respeito ao ensino superior, sempre considerei o ensino politécnico uma asneira, aliás, sempre o disse. Nunca considerei que resolvesse o que quer que fosse; a universidade teria podido perfeitamente resolver, criando vários tipos de cursos, aquilo que o instituto politécnico está a fazer. Só que o instituto politécnico teve depois o azar de ter congregado à sua volta pessoas de carreira medíocre e como similia similibus congregantur, naturalmente que foram buscar outros medíocres. E como diz Boileau em Arte Poética, un sot a toujours un plus sot qui l' admire, ou seja, um pateta tem sempre um mais pateta que o admira.
Sr. Ministro, considero que muito mais importante do que o dinheiro, que chega, é a forma como ele vai ser administrado. Sr. Ministro, pergunto se está disposto a mandar avaliar e a publicar, como já fez, as avaliações, embora o meu querido colega António Braga, que está com um ar todo prazenteiro, me tivesse dado uma "pancadinha" quando eu pedi a publicação!… Mas, enfim, são coisas que esquecemos.

O Sr. António Braga (PS): - Isso não é verdade!

O Orador: - De maneira que gostaria de saber se o Sr. Ministro está disposto a avaliar a sério a forma como os dinheiros são geridos e a arranjar forma de esses dinheiros poderem dar mais proveito, por exemplo, no ensino superior, admitindo também que os alunos que lá estão há 10 anos não merecem continuar a ocupar o lugar de outros, que tanto necessitam de ter um ensino superior.

A Sr.ª Presidente: - Estou a ver que tenho de dar razão à Sr.ª Deputada Rosalina Martins!
Tem a palavra o Sr. Ministro da Educação, para responder.

O Sr. Ministro da Educação (Júlio Pedrosa): - Sr.ª Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Educação, Cultura e Ciência, Sr.as e Srs. Deputados: Vou seguir a ordem das intervenções e procurar não deixar nenhuma pergunta sem resposta, algumas delas com a contribuição do Srs. Secretários de Estado.
Sr. Deputado David Justino, no que diz respeito à concretização da expansão da rede pré-escolar, à preocupação que tem em relação às necessidades da sua racionalização e a essa nota de existirem situações em que o número de alunos claramente aponta num sentido inverso àquele que temos defendido, diria o seguinte: creio que há uma necessidade de racionalização urgente do pré-escolar articulado com o 1.º ciclo do ensino básico e com a política de agrupamentos. A intervenção que temos prevista em relação à qualificação, nomeadamente do 1.º ciclo, onde este problema tem uma dimensão muito significativa, como todos sabemos - aliás, esta questão já foi discutida num encontro com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, porque, como sabemos, em relação, nomeadamente, aos investimentos, é matéria da sua responsabilidade - passa pela criação de um quadro de referência para a rede do pré-escolar, do 1.º ciclo e, também, dos 2.º e 3.º ciclos, quadro esse que corresponda a uma racionalização não só em termos da existência de escolas com um número de alunos ajustado ao bom funcionamento das escolas e dos jardins de infância mas também pela necessidade de se criarem equipamentos e condições para que tenhamos os professores qualificados para o que hoje é exigido numa educação básica e do 1.º ciclo de qualidade. Isto é, condições para terem, além do currículo nuclear, educação musical, educação física, etc.
Portanto, o que temos inscrito como resposta a este problema, que está identificado, é associar-lhe a racionalização e, sobretudo, o desenvolvimento nas zonas onde há ainda um grande espaço para o incremento de uma política para a rede articulada com a racionalização do 1.º ciclo e com a formação de agrupamentos verticais, de preferência, que ajudem também a criar equipamentos que dêem uma resposta completa do ponto de vista pedagógico, não apenas dos recursos físicos mas também dos recursos humanos.
Quanto à questão que levantou sobre o desenvolvimento da rede, direi que, no distrito do Porto, já se assistiu a um desenvolvimento acelerado da rede, pois, no ano passado, foram construídas cerca de 60 escolas, mas temos de reconhecer que o mesmo não aconteceu no distrito de Setúbal, sobretudo. Estamos a trabalhar com a Associação Nacional de Municípios Portugueses - fizemos já algum percurso nesse trabalho -, tendo em vista a criação de uma outra dinâmica para responder a este problema, nomeadamente nos distritos onde há um atraso em relação ao objectivo.
Quanto ao volume de investimentos inscritos, aproveito para corrigir e responder não só ao Sr. Deputado David Justino, que teve uma intervenção no dia 8, mas também à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, já que há uma leitura que pode ser errónea do número que aqui está, quando comparam o Orçamento inicial, de 2001, com o Orçamento de 2002, uma vez que em 2001 está inscrita a verba de investimento que depois foi transferida para as autarquias e agora não está. Se usarmos os mesmos termos de referência, a verba inscrita em 2001 é de cerca de 6,5 milhões de contos e a verba inscrita em 2002, usando a mesma referência, é de 6,8 milhões de contos.
Como sabem, é óbvio que a maior parte desta verba é de investimento, cuja responsabilidade de utilização compete às autarquias, mas o Ministério da Educação tem presente a necessidade de ter um trabalho mais próximo para

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que este programa tenha o enquadramento que há pouco referi, ou seja, de resposta aos problemas que a rede tem hoje.
Quanto aos custos da rede pública e à natureza da oferta da rede pública, ao horário de funcionamento e à adequação do funcionamento do jardim de infância às necessidades das famílias, essas são preocupações que estão no centro deste trabalho de articulação próxima com as autarquias. Aliás, as reuniões que já tivemos apontam no sentido de podermos desenhar um quadro de referência para o funcionamento da rede pública que vá no sentido de responder a estas preocupações e creio que temos condições para actuar no sentido de que essa resposta seja ajustada.
No que respeita à contratualização do funcionamento da rede privada com as estruturas IPSS, Mutualidades, Misericórdias, ela está feita e vai continuar nos mesmos termos. A discussão que estamos a ter com as autarquias tem também presente preocupações de definição daquilo que deve ser o quadro de referência para o seu funcionamento e os custos racionalizados do apoio a esse funcionamento.
Como sabe, uma parte destas responsabilidades é das autarquias, outra parte é do Ministério da Educação e o quadro de discussão de transferência de competências para as autarquias, que está a ser desenvolvido, dará a resposta adequada a este problema.
Relativamente ao ensino superior, foi feita uma pergunta muito concreta sobre a Universidade de Aveiro e a aquisição do Estádio Mário Duarte. Sr. Deputado, é natural que não esteja inscrito, porque, quando a Universidade de Aveiro propôs, para o ano 2001, esta aquisição, por verbas do Orçamento do Estado, foi recusada. Creio que, na altura própria, a Universidade de Aveiro terá de tomar, em relação a esta matéria, a sua própria decisão, mas, neste momento, desconheço o quadro de desenvolvimento desse processo. Sei apenas que, na altura em que a questão foi posta nos termos em que o Sr. Deputado a pôs, de custos estimados de 1,5 milhões de contos, a proposta de aquisição do Estádio Mário Duarte por verbas do Orçamento do Estado foi recusada pelo Governo, que tinha então como ministro da Educação o Dr. Augusto Santos Silva.
Portanto, esta é a minha resposta a esta pergunta concreta. Na verdade, não sei qual é o desenvolvimento que a própria Universidade pretende dar a esse problema neste momento preciso.

O Sr. David Justino (PSD): - Quer dizer que este Orçamento não contempla essa verba?!

O Orador: - Em verba de PIDDAC, não está contemplada.
Relativamente à questão de avaliação do ensino superior, na verdade este segundo ciclo de avaliação do ensino superior procura dar uma resposta que tenha em conta a experiência do primeiro ciclo. Este segundo ciclo tem um calendário extremamente rigoroso, já foi cumprida a primeira fase nos exactos termos em que foi planeada, está a decorrer a segunda fase, que prevê o cumprimento do calendário considerado, e o orçamento que está contemplado inclui os recursos necessários para que a avaliação externa de todo o sistema - público, privado, politécnico e universitário - tenha o financiamento que foi orçamentado para este ano. Os resultados, creio, iremos começar a vê-los muito brevemente, porque, em reunião havida com o Sr. Presidente do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior, ficou estabelecida a metodologia para disponibilizar os resultados dessa avaliação a muito curto prazo, desde que tenhamos disponível o relatório de avaliação dos dois subsistemas, público e privado universitário, público e privado politécnico. Como houve um pequeno atraso por parte de um dos subsistemas, isso conduziu a que não tenhamos ainda os primeiros resultados. No entanto, tenho já notícia que esse problema está resolvido e que, a muito curto prazo, iremos ter os resultados deste primeiro trabalho.
A Sr.ª Deputada Rosalina Martins falou no 1.º ciclo, prioridades, problemas em zonas, agrupamentos e orçamento de funcionamento dos agrupamentos.
Sr.ª Deputada, é verdade que o 1.º ciclo está inscrito como uma grande prioridade, tanto no sentido da sua qualificação como no da criação de condições que nos permitam ter escolas de 1.º ciclo completas, não apenas do ponto de vista da sua estrutura de funcionamento mas também com um número de alunos que as tornem pedagogicamente ajustadas a um ensino de 1.º ciclo de grande qualidade e que tenham uma resposta dos professores qualificados de que necessitam. E, certamente, o desenvolvimento dos agrupamentos irá contribuir para este tipo de objectivo.
Peço agora ao Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa que dê uma resposta precisa à questão do financiamento dos agrupamentos, para que não misturemos essa questão com a seguinte.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa (Domingos Fernandes): - Sr.ª Deputada, Srs. Deputados, o financiamento dos agrupamentos deve ser entendido da seguinte forma: nós, Ministério da Educação, naturalmente que financiamos as escolas dos 2.º e 3.º ciclos que estão inseridas em agrupamentos verticais. Portanto, estas recebem financiamento para o funcionamento e para outro tipo de actividades, nomeadamente para as reuniões que têm lugar no âmbito do mesmo agrupamento, ou seja, reuniões de professores dos vários ciclos.
No que diz respeito ao 1.º ciclo, de facto, essa competência é das autarquias, como sabe, e, no âmbito daquilo que o Sr. Ministro já referiu, a transferência de competências para as autarquias é uma das matérias que está a ser analisada e aprofundada.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Educação: - Quanto às escolas profissionais e ao objectivo dos 40% dos alunos em vias profissionalizantes, é verdade que temos, hoje, uma oferta relativamente diversificada de formação profissionalizante ou vocacional pelas escolas profissionais, que tiveram este ano um financiamento de cerca de 30 milhões de contos, segundo os últimos números de que disponho por via do PRODEP, num planeamento que dá sustentabilidade ao funcionamento da rede que tem vindo a ser financiada, há uma oferta através dos centros de formação profissional

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do Ministério do Trabalho e da Solidariedade, com o qual estamos a desenvolver um trabalho muito activo no sentido de termos uma articulação não só da rede mas também do trabalho que é feito em cada um destes subsistemas, e está em preparação o lançamento da revisão curricular do ensino secundário, através da qual se pretende, de uma forma muito clara, dar muito maior expressão às formações tecnológicas e artísticas.
A nossa convicção é a de que, fazendo este exercício, como estamos a fazer, de uma forma bastante articulada, a rede que contempla estas três ofertas permite chegar a este objectivo ou, mesmo, ultrapassá-lo, dentro do quadro de referência estabelecido pelo Governo.
O ensino de português no estrangeiro - preocupação que me foi colocada por vários Sr.as e Srs. Deputados - tem, naturalmente, uma presença no Programa do Governo e está contemplado em sede de Orçamento.
Temos bem presente a resolução aprovada em sede de Comissão de Educação, Ciência e Cultura, vamos, com certeza, responder àquilo que são os objectivos que estão aí estabelecidos para esta área de intervenção e estamos a desenvolver, com o Ministério dos Negócios Estrangeiros, um trabalho muito intenso de cooperação, no sentido de optimizarmos o uso do recurso dos dois Ministérios nesta área, seja através de uma cooperação mais estreita com o Instituto Camões, seja através de uma cooperação com a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas.
O Orçamento que temos e o programa que está estabelecido procuram responder, certamente, àquilo que é a resolução aprovada em sede de Comissão de Educação, Ciência e Cultura e aos objectivos que o Governo tem inscrito para esta área importante de intervenção. Pensando não apenas nas comunidades de emigrantes ou de luso-descendentes mas também nos países que pretendem ter a língua portuguesa como língua nacional, que é o caso de Timor, os países africanos de língua portuguesa, onde se está a fazer um esforço crescente de envio de professores e de desenvolvimento de outras áreas de cooperação, e os países que manifestam interesse em incluir o Português nos seus currículos nacionais. Parece-nos que essa é uma linha de desenvolvimento que deve ter cada vez mais a nossa atenção e investimento de recursos.
Se a Sr.ª Presidente me der licença, peço ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior que responda à questão colocada quanto às vagas e à acção social escolar no ensino superior, porque poderá, com mais precisão, dar a resposta.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior (Pedro Lourtie): - Sr.ª Presidente, é um facto que se verifica, no final da segunda fase do concurso nacional, cerca de 8000 vagas não preenchidas e que este número de vagas tem vindo a aumentar. É uma tendência que se tem verificado ao longo dos últimos anos e este ano, pela primeira vez, verificou-se que o número de candidatos ao ensino superior público é inferir ao número de vagas.
No entanto, o facto de o número de candidatos ter diminuído não significa que já este ano haja uma diminuição do número de alunos no ensino superior público. Devo dizer que estamos, neste momento, a rever um pouco em baixa a previsão de novos alunos, de alunos inscritos pela primeira vez no ensino superior, relativamente às previsões que tínhamos feito em Junho. Estamos a rever com uma baixa de cerca de menos 4000 alunos inscritos pela primeira vez em relação ao que tínhamos previsto em Junho. Isso significa que o crescimento do número de alunos no ensino superior público vai ser inferior ao que tínhamos previsto inicialmente.
Não deixa de haver, no entanto, um crescimento, porque há cursos que foram lançados e que ainda estão numa fase de "enchimento" (como costumamos dizer), visto que há anos que ainda não estão preenchidos. Portanto, não há ainda uma diminuição do número de alunos.
Em relação à acção social escolar, de facto, há um aumento das verbas, onde temos de considerar não apenas a verba que está inscrita especificamente no serviço da acção social mas também a verba inscrita nas dotações comuns da acção social escolar, que é relevante. O que significa que, no fundo, temos sempre alguma imprevisibilidade, relativamente ao número de estudantes que têm direito à bolsa, de acordo com os regulamentos.
Todos os alunos carenciados, de acordo com a definição que está no regulamento de bolsas, quer do ensino público quer do ensino privado, em que as bases de determinação de quem são os alunos carenciados é a mesma, terão direito a bolsa no próximo ano. Aliás, já se verificou este ano e já se verificou em 2000, ano em que, pela primeira vez, todos os alunos do ensino particular e cooperativo que estavam dentro do critério de aluno carenciado tiveram direito a bolsa. Este programa de criação de bolsas para o ensino particular e cooperativo foi lançado em 1996, previa-se completar em 2001, mas conseguiu-se completar em 2000. Portanto, para o próximo ano, está prevista a verba necessária para atribuir bolsas a todos os estudantes carenciados.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Ainda em relação ao ensino superior, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita colocou questões nas quais mostrou preocupações com o financiamento e, em particular, com a interpretação que fez da posição da Comissão Permanente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.
Na verdade, também ouvi algumas declarações públicas do Sr. Presidente do Conselho de Reitores em relação a essa matéria, defendendo que as universidades estavam em condições de funcionar, quer no presente ano lectivo quer no próximo, sem problemas do tipo daqueles que a Sr.ª Deputada considerou que existem.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Ministro, não é uma questão de interpretação. Essas declarações não foram feitas numa audiência a um grupo parlamentar mas na Comissão de Educação, Ciência e Cultura. E os Srs. Reitores que estiveram presentes nessa reunião não disseram o que o Sr. Ministro acabou de dizer. Disseram

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exactamente o contrário. O que levou, inclusivamente, a que os Deputados presentes tivessem confrontado os Srs. Reitores com as declarações que haviam sido feitas, e que tinham vindo na comunicação social, no encontro realizado com o Sr. Ministro. Pelos vistos, alteraram a sua posição.

O Orador: - Sr.ª Deputada, a opinião que nos foi expressa pelos Srs. Reitores, através do Conselho de Reitores, quer em Plenário quer em Comissão Permanente, foi a de que o orçamento para 2002, que tem, realmente, um aumento de 4,3% no orçamento de funcionamento, que tem inscrito, em PIDDAC, um orçamento para apetrechamento, renovações de laboratórios e outro tipo de condições necessárias para a qualidade no ensino, tem uma verba que corresponde a cerca de 1,25% do orçamento. Portanto, o orçamento global para gerar condições de funcionamento nas universidades é de cerca de 5,5%, quando o crescimento do número de alunos será, porventura, inferior a 2%.
Também quanto ao crescimento em investimentos, quer nas universidades quer nos politécnicos, houve, da parte do respectivos representantes, do Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos e do Conselho de Reitores, a indicação de que correspondia àquilo que era o programa de investimentos que estavam em condições de desenvolver no próximo ano. Isso foi o que resultou do nosso trabalho com ambos os Conselhos.
As propinas e o seu uso variam muito de universidade para universidade, Sr.ª Deputada, e creio que isso pode ser escrutinado olhando para o orçamento detalhado de cada universidade e vai ser tornado mais claro à medida que forem publicados os relatórios de auditoria a que as universidades estão obrigadas, depois da publicação da lei do financiamento. Portanto, teremos oportunidade de ver que este tipo de análise não é aplicado a todas as universidades e será, com certeza, um excelente exercício começarmos a interrogar-nos sobre por que é que há situações tão diferenciadas entre as universidades.
Vamos fazer um trabalho muito aprofundado com cada uma das universidades para, neste novo contexto de decréscimo no número de alunos e de termos um modelo de financiamento indexado ao número de alunos e nas condições, que prevemos sejam as dos próximos anos, de este panorama não se alterar, construirmos um modelo de financiamento e de afectação de recursos que responda à situação actual e futura de funcionamento das universidades, que não o modelo que foi pensado numa altura em que se previa, e se confirmou, que existiria um crescimento continuado do número de alunos.
Vamos, com certeza, ter um quadro de referência diferente e vamos ter, com os representantes das instituições universitárias e politécnicas, um trabalho a fazer para saber qual é a fórmula de funcionamento a ser adoptada. Porque - sabe, com certeza - que a fórmula que está a ser adoptada não foi, em nenhuma altura, considerada como a fórmula que responda à lei de financiamento. Ela tem vindo continuamente a ser usada, mas não houve nunca nenhum exercício no sentido de saber qual é a fórmula que corresponde àquilo que a lei de financiamento prevê. Vamos, com certeza, fazer esse trabalho, agora com as universidades, para responder ao momento actual e, sobretudo, ao momento futuro da vida das instituições.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior: - Sr.ª Presidente, vou apenas responder à questão que foi levantada pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, relativamente ao crescimento do PIDDAC entre 2000 e 2002, porque estamos a discutir o Orçamento para 2002.
É preciso referir que, no Orçamento para 2000, estava prevista uma reserva de convergência de 8% e que, no Orçamento para 2002, não há esta reserva de convergência. Portanto, a comparação não é linear. O que posso dizer é que há, de facto, um crescimento do PIDDAC durante o próximo ano.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, levantou, a seguir, uma questão, no sentido de saber se o orçamento para o ensino básico e secundário chega, ou não, para aquilo que é preciso fazer.
Sr.ª Deputada, aquilo que foi orçamentado foi-o na convicção de que vamos realizar os objectivos que temos de realizar, não sem estarmos a fazer um esforço de racionalização do uso dos recursos que temos disponíveis. Certamente que estão já a ser tomadas medidas, as quais estão a dar resultados naquilo que é a economia de recursos que é possível hoje fazer, a partir do facto, que é conhecido, de o número de alunos no básico e no secundário ter estado a decrescer de uma forma sistemática, nos últimos três anos, e isso ter já repercussões que conseguimos incorporar numa racionalização do uso do Orçamento.
Creio que já respondi às questões relativas ao ensino do Português no estrangeiros e, também, à preocupação com os menos de 55% no pré-escolar, uma preocupação permanente, embora já tenha esclarecido a Sr.ª Deputada em sede de Comissão de Educação, Ciência e Cultura.
Em relação ao que se passa ensino particular e cooperativo, está a ser feito um trabalho rigoroso de inspecção e tem estado a ser feito, nas direcções regionais de educação, um trabalho de adequação daquilo que é o contrato actual às novas condições. No entanto, todos somos responsáveis e sabemos que não se pode passar de um contrato que foi negociado em certas condições para preencher uma lacuna do sistema público, para uma situação que crie problemas que não são aceitáveis, certamente. Portanto, estamos a gerir esse problema com grande sentido de responsabilidade e vamos continuar na linha que já tem vindo a ser desenvolvida nas direcções regionais para o corrigir com o tempo que for necessário, de forma a não criar situações insustentáveis.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, quanto ao ensino especial, se há coisa que não podemos aceitar é qualquer acusação no sentido de que conduzimos a política e a acção nesta área numa perspectiva economicista. Pode criticar a forma de atacar o problema e a metodologia que foi adoptada. Pode criticar o facto de termos acreditado que os concursos seriam a forma transparente de responder a este problema e de haver professores especializados que não concorrem.

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No entanto, quando os números são aqueles que existem - e o número de professores a actuar na área do ensino especial para crianças com dificuldades educativas especiais aumentou da maneira que aumentou -, creio que, com certeza, não vê aqui uma preocupação em diminuir os recursos a alocar a esta importantíssima área, em relação à qual o Governo tem as mesmas preocupações, o mesmo sentido de responsabilidade que a Sr.ª Deputada expressou.
O total de professores colocados, em 2000/2001, nesta área não é inferior ao dos que foram colocados no ano anterior e, nas direcções regionais de educação, existe ainda uma reserva para poder acudir a qualquer situação que seja identificada como carenciando de resposta.
Já está em curso, quase a ser terminado, um trabalho de preparação de actuação nesta área para o próximo ano lectivo que leva em linha de conta tudo o que foi a experiência colhida durante este ano.
Gostaria de sublinhar perante todos os Srs. Deputados que consideramos esta uma área decisiva de intervenção para conseguirmos ter uma escola democrática, inclusiva, e dar às crianças e aos jovens deste país resposta às questões reais.
Portanto, em relação a esta área, não teremos qualquer preocupação que possa ser apelidada de economicista.
O Sr. Deputado Rosado Fernandes colocou questões que, fundamentalmente, têm a ver com uma maior preocupação na utilização dos recursos públicos, sobretudo no ensino superior.
A este propósito, já referi a questão das auditorias obrigatórias. Vamos dar grande atenção a esse aspecto, mas também vamos acrescentar à avaliação dos cursos e da investigação um programa de avaliação institucional para, de uma forma mais aprofundada, verificarmos como é que o modelo de governação e gestão das universidades se ajusta ao que hoje lhes é pedido.
Com certeza faremos um esforço adicional para aumentar o acesso nas áreas de Ciência e de Engenharia porque, infelizmente, não estamos a ter suficientes candidatos nestas áreas para responder às necessidades do País. Portanto, face aos números que o Sr. Deputado tem perante si, verifica-se que não há propriamente um excesso de candidatos nessas áreas, pelo que temos de continuar a fazer um esforço.
Tal esforço vai aumentar também através da política que implementámos no sentido de aumentar as formações tecnológicas pós-secundárias. Constituirá uma via para que alunos que, porventura, não seguiriam estudos superiores, possam dispor de uma forma diferente de aprofundar mais a respectiva formação profissional, possam entrar na vida activa e se, mais tarde, quiserem continuar os estudos superiores, poderão fazê-lo depois de tomarem opções mais definitivas.
Portanto, a aposta na valorização do ensino profissional far-se-á quer pela revisão curricular do ensino secundário, quer pela significativa ampliação das formações tecnológicas pós-secundárias, por forma a permitir aumentar o reconhecimento social e tornar mais visível a importância desta área de formação.

A Sr.ª Presidente: - Muito obrigada, Sr. Ministro.
Srs. Deputados, temos um sério problema. É que há nove inscrições e, como é sabido, ainda temos a audição de um outro ministério.
Assim, creio que os Srs. Deputados aceitarão de bom grado que a Mesa determine uma restrição ao tempo de que cada Sr. Deputado disporá para colocar as respectivas questões.
Tentaremos, pois, que cada orador não utilize mais do que 3 minutos, que é o tempo de que normalmente dispomos em Plenário quando pretendemos questionar um membro do Governo.
Passamos, então, a uma segunda ronda de perguntas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, queria abordar algumas questões relacionadas com o distrito do Porto, concretamente com o concelho de Marco de Canavezes, no qual está contemplada a construção de uma segunda escola secundária, o que é uma necessidade premente para satisfazer a população escolar deste concelho. Só que a verba de 24 940 euros inscrita em PIDDAC é simbólica, o que nos diz que, efectivamente, tal construção não será iniciada no próximo ano.
Ora, naturalmente, nós consideramos que é muito urgente a construção desta escola. Daí eu desejar saber da disponibilidade do Governo para reforçar esta verba a fim de que a construção da escola possa ser iniciada no próximo ano.
De igual modo, parece-nos uma necessidade o investimento na escola profissional de arqueologia de Marco de Canavezes, mas a verba que vem inscrita em PIDDAC é igualmente bastante simbólica.
No que diz respeito ao município de Penafiel, estranho imenso que duas escolas cuja construção estava prevista em PIDDAC para 2001 tenham desaparecido completamente. Refiro-me concretamente às escolas EB 2,3 de Penafiel norte e de Penafiel sul, cuja construção, apesar de ter estado inscrita em PIDDAC para 2001 com verbas simbólicas de 1000 contos para cada uma, nem sequer consta do PIDDAC para 2002. Gostaria de saber qual a razão, uma vez que ambas as escolas continuam a ser uma necessidade muitíssimo importante para o município de Penafiel.
De igual modo, justifica-se que este concelho venha a ter uma segunda escola secundária para servir a população escolar a sul do concelho, já que a existente actualmente no concelho não é suficiente para dar uma resposta satisfatória.
No que diz respeito a Vila Nova de Gaia, a construção da escola EB 2,3 de Serzedo tem vindo a ser inscrita em PIDDAC, nos últimos anos, com verbas simbólicas e todos os anos "desliza" para o ano seguinte. Assim, continua a tentar iludir-se as populações e os autarcas que têm lutado denodadamente pela construção desta escola e, mais uma vez, a verba inscrita em PIDDAC para 2002 é de 24 940 euros, o que corresponde à verba de 5000 contos que já estava inscrita para 2001.
Ora, Sr. Ministro, é inaceitável que a construção desta escola continue a ser constantemente adiada e nós não podemos continuar a iludir as populações e os respectivos autarcas.
Em relação à Escola Secundária de António Sérgio, a antiga escola industrial e comercial, considero que é muito

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importante a sua reabilitação. Ora, está contemplado em PIDDAC o antigo liceu, a que hoje chamamos Escola Secundária Almeida Garrett, pelo que pergunto por que razão não sucede o mesmo com aquela outra escola que tem mais de um século de existência e cuja beneficiação se justifica realmente.
O último município que abordarei é o de Valongo. As Escolas EB 2,3 de Campo e de Sobrado não têm pavilhão desportivo e ambas as freguesias nem sequer dispõem de qualquer tipo de equipamento desportivo deste género. Justifica-se, pois, que estas escolas disponham de equipamentos desportivos, não só para servir a população escolar como também a população em geral.
Nesse sentido, a câmara municipal tem tentado procurado sensibilizar o Ministério da Educação e também o Ministério da Juventude e do Desporto para, em parceria com o Instituto Nacional do Desporto, tentar construir tais equipamentos desportivos contíguos às escolas para assim poder servir os estudantes e a população em geral. Devo dizer que já há projectos aprovados para o efeito, pelo que gostaria que o Governo contemplasse em PIDDAC a construção dos equipamentos desportivos para estas duas escolas de Campo e de Sobrado.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natalina Tavares de Moura.

A Sr.ª Natalina Tavares de Moura (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, nas GOP, na 3.ª Opção, na parte que se refere ao ensino superior, consta que "Encontra-se em fase de análise, após parecer dos parceiros sociais, a regulamentação da Lei de Ordenamento e Organização do Ensino Superior (…)".
A pergunta muito concreta que lhe coloco, Sr. Ministro, é a de saber se esta revisão vai ou não ter em conta a Declaração de Bolonha que, como sabemos, questiona e equaciona a mobilidade, a empregabilidade e a competitividade. Sabemos que a referida Declaração tem estado em discussão, mas não conhecemos nenhum texto escrito acerca da mesma.
Eu própria, recorrendo à Internet, consegui aceder a um texto do Sr. Secretário de Estado Pedro Lourtie, o qual me ajudou a encontrar o fio condutor acerca desta Declaração de Bolonha e do que a mesma pode vir a pôr em questão. Pelo que me foi dado ler, embora não tenha consultado todos os portais, põe-se em questão todo o edifício legislativo do ensino superior, e não só.
Assim, gostaria de saber o que está a ser feito neste sentido e queria, ainda, fazer uma sugestão.
Como disse, tendo andado a navegar na Internet, acabei por encontrar tudo o que queria, mas penso que não é fácil este trabalho, pelo que creio que seria bom distribuir pelos estabelecimentos de ensino uma brochura contendo o trabalho já feito. É que creio que tem havido uma grande discussão sobre esta matéria a nível de topo, mas a maioria académica - professores, quadros superiores do Ministério da Educação e alunos - não tem conhecimento desta Declaração que é de grande importância para nós.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, tentarei ser escrupulosa no cumprimento do tempo de que disponho, no entanto, não posso deixar passar uma afirmação feita pelo Sr. Ministro em relação ao CRUP (Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas).
O CRUP prestou as informações que prestou ao plenário da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, portanto não o fez numa audiência privada com o Partido Comunista Português, por isso, todos os grupos parlamentares ouviram o mesmo que nós próprios.
O problema da utilização quase integral das verbas das propinas para as verbas de funcionamento não é o problema de uma, duas ou três faculdades; é um problema geral.
Já que falou nas verbas para investigação, aproveito para informá-lo, relativamente às que vêm especificadas em PIDDAC, quer para o ensino universitário quer para o politécnico, que foi informado pelo Conselho de Reitores que aquelas verbas eram usadas integralmente para ajudar ao pagamento das despesas de funcionamento. É, pois, esta a realidade que temos.
Uma outra questão prende-se com o aumento ou diminuição do número de alunos. A realidade é que, este ano, o número de alunos ainda aumenta mas o dinheiro para as bolsas aumenta apenas 1%. Assim, peço-lhe que quantifique o aumento de alunos no ensino superior público e privado neste ano lectivo e, tendo em conta o aumento de 1% nas bolsas, pergunto-lhe se prevê que o que acontecerá é a diminuição do valor médio da bolsa de estudos, valor que não permite o sustento de um aluno do ensino superior.
Passo a uma questão concreta relativamente à Faculdade de Ciências da Nutrição da Universidade do Porto.
Penso que todos os presentes conhecem a situação em que se encontra esta Faculdade, que é provisória há já 25 anos. Devo dizer que, de entre as várias escolas provisórias, básicas e secundárias, que já vi, as condições desta Faculdade, atendendo à tal dignidade que se quer atribuir ao ensino superior, situam-se muitos furos abaixo das de algumas escolas básicas e secundárias. Não há laboratórios; não há computadores; os estudantes que necessitam de trabalhar em laboratório têm de espalhar-se por três universidades da cidade do Porto, etc. Acresce que, percorrendo as 26 rubricas de PIDDAC para a Universidade do Porto, verifica-se que nada está destinado a esta Faculdade, que é provisória já desde há 25 anos. Pergunto, pois, como é que isto é possível.
Queria questioná-lo, também, acerca da desagregação de algumas verbas relacionadas com a acção social escolar e com o investimento na mesma.
A primeira questão tem a ver com o Instituto Politécnico de Bragança que tem 5500 estudantes dos quais apenas 5% são do concelho de Bragança e metade dos quais pediu a concessão de uma bolsa de estudos no ano passado. Estamos, pois, perante um quadro de estudantes com características socioeconómicas muito particulares.
Assim, gostaria de saber o que está previsto em termos de desagregação de verbas, uma vez que há uma série de necessidades neste Instituto, nomeadamente em relação a residências, etc.
Uma outra questão prende-se com o Instituto Politécnico de Portalegre. Em Outubro, em requerimento dirigido ao

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Ministério da Educação, tinha informado que do que havia necessidade era de uma residência e de uma cantina, orçadas em 350 000 contos e 140 000 contos respectivamente. Ora, como a verba orçamentada em PIDDAC é 130 000 contos, pergunto-lhe o que é que não foi contemplado: a residência ou a cantina?
Uma questão relacionada com a Universidade do Porto: 12 000 estudantes, no Campo Alegre, continuam sem cantina.
Por último, uma questão relacionada com o ensino especial e a acção social escolar no âmbito do mesmo, sobre que, aliás, já o tinha questionado em sede de discussão na generalidade, e que se prende com a diminuição das respectivas verbas. O total de verbas orçamentadas em PIDDAC para 2001 era 1,33 milhões de euros, enquanto, para 2002, o total é 1,25 milhões de euros. O que se passa? Há menos crianças a necessitar destes apoios? Mudaram-se os critérios?
Faço estas perguntas porque, recentemente, recebemos uma informação - e isto prende-se com a questão que a Sr.ª Deputada Isabel Castro em relação aos "turbo" professores do ensino especial que, além de terem bastantes escolas a seu cargo, também foram informados, nomeadamente, no distrito, do qual recebemos informação, que, embora devessem receber os tais 63$/Km das deslocações por transporte privado, passariam a receber como se fossem de transporte público, que é qualquer coisa como 24$/Km.
Ora, se for aqui que vamos conter a despesa do Estado, não me parece bem.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, António Braga.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, vamos ser extremamente rápidos.
Não vou perguntar ao Sr. Ministro se o orçamento que tem é suficiente, porque nesta altura do ano chega sempre e falta sempre no final do ano; vamos, sobretudo, procurar averiguar exactamente o que V. Ex.ª se propõe fazer em duas ou três áreas, fazendo-o de uma forma muito telegráfica.
Assim, voltemos à questão dos agrupamentos: a criação dos agrupamentos tem objectivos muito claros no sentido da optimização dos recursos; e eu dir-lhe-ia que deveria ter sido uma reforma crucial para a valorização, nomeadamente, do 1.º ciclo do ensino básico.
Agora, o que está a passar-se, na prática, infelizmente, não é nada disto; na prática, o Ministério da Educação está a dar orientações aos conselhos executivos, por exemplo, para reduzir de uma forma drástica os complementos pedagógicos; a introdução, por exemplo, de línguas estrangeiras, no primeiro ciclo do ensino básico, quando os agrupamentos são verticais; a introdução da educação física, da educação musical. Ora, o que eu gostaria de saber é até onde é que nós vamos a esse nível? Vamos ou não assumir os agrupamentos de uma forma abrangente? Vamos colocar em pé de igualdade todos os ciclos do ensino básico, ou vamos deixar estar tudo como está?
Por outro lado, Sr. Ministro, o Ministério da Educação, até ao momento, constituiu 231 agrupamentos horizontais e 268 agrupamentos verticais. Falamos de 58,4% do total de escolas, sendo que o Ministério propõe-se atingir os 100% em 2004. Nós sabemos perfeitamente quanto custa cada agrupamento, ou seja cada agrupamento significa três pessoas no conselho executivo, pelo menos dois funcionários administrativos e, pelo menos, um auxiliar de educação, vulgo "contínuo", na respectiva estrutura.
Assim, eu gostava de saber: se for mantido este ritmo de criação de agrupamentos, sem orientações precisas, onde é que vamos parar? Onde é que V. Ex.ª tem orçamento? Qual é a verba prevista neste orçamento, para contemplar, no ano de 2002, todo o aumento da estrutura que isto implica? Note-se que estamos a falar, essencialmente, de estrutura administrativa.
A segunda questão refere-se ao ensino do português no estrangeiro. Ora, de uma forma muito breve e muito directa, eu gostava de saber se V. Ex.ª, isto é, se a actual equipa do Ministério da Educação, se propõe tratar as comunidades portuguesas fora da Europa, à excepção da África do Sul, fundamentalmente os Estados Unidos, a Venezuela, a Austrália, o Canadá, nos termos em que têm sido tratados, ou seja, sem praticamente qualquer investimento.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa, Domingos Fernandes, esteve nomeado para coordenador do ensino de português nos Estados Unidos, lugar que não chegou a exercer, e sabe, presumo eu, quais são as implicações desta falta de investimento neste domínio. Portanto, a questão muito directa é a seguinte: vamos manter o ritmo de não investimento em todas estas comunidades ou vai haver uma alteração radical deste estado de coisas?
Aliás, na sequência de uma polémica, travada na última reunião da Comissão, e que envolveu, nomeadamente, o Presidente, o Sr. Deputado António Braga, deixe-me dizer-lhe que relativamente à distribuição, por exemplo, de dicionários de português e de bandeiras nacionais, pelas nossas comunidades, os números que nos foram fornecidos pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros são perfeitamente hilariantes. Assim, até 30 de Junho de 2001 foram distribuídos quatro mapas de Portugal e, a nível de dicionários de português distribuídos, o seu total em 2000, por exemplo, foi de 18. Ora estamos a falar de 4,5 milhões de portugueses no estrangeiro!
Para terminar, Sr. Ministro, gostaria de colocar-lhe, ainda, outra questão, formulada muito rapidamente, que é a seguinte: quando é que V. Ex.ª dá meios para a Universidade de Aveiro criar a respectiva unidade orgânica em Viseu?

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Fernando Serrasqueiro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Srs. Presidentes das Comissões, Sr. Ministro da Educação, Srs. Secretários de Estado: A minha questão tem que ver com o PIDDAC e com os Açores, por isso vou ser muito breve.

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Ao comparar o orçamento do PIDDAC, afecto aos Açores, nos anos de 2001 e 2002 verificamos que se passa de um total de 4,905 milhões de euros, em 2001, para 2,127 milhões de euros, em 2002; ou seja, se não me enganei nas conta (porque tive de fazer a conversão de moeda), há uma redução para menos de metade, na passagem de um ano para o outro, no que diz respeito ao PIDDAC para os Açores.
É verdade que a taxa de execução, prevista para 2001, dá um valor que é ainda inferior, em quase metade, à dotação inicial proposta para 2002. Isto é, houve uma dotação inicial de quase 5 milhões de euros em 2001, há uma dotação inicial de cerca de 2 milhões de euros, ou pouco mais, para 2002 e há uma previsão de execução em 2001, na ordem de um milhão de euros, aproximadamente, pelo que estamos a decrescer.
Entretanto, verifico que a acção para a construção do pólo da Universidade dos Açores, em Angra do Heroísmo, desapareceu do PIDDAC de 2002, quando a obra mal começou! Ou melhor: a obra foi iniciada, havia uma acção no PIDDAC de 2001 e, tanto quanto sei, agora a obra está parada.
Posto isto, gostaria de saber o seguinte: como é que o Ministério da Educação vai explicar (pois suponho que terá obviamente razões para isso), esta redução tão drástica, tão violenta, dos valores do PIDDAC para a Região Autónoma dos Açores? E como é que explica a não construção do pólo da Universidade dos Açores em Angra do Heroísmo, que está no início?
Pergunto isto por saber que existem problemas que têm que ver com orçamentos de obra, com autorização de despesas, com autorização desses orçamentos. Trata-se pois de uma questão, relativamente à qual, eu, como Deputado eleito pelos Açores e do partido que apoia o Governo, fico um bocado inquieto, uma vez que, nos organismos do governo central, ainda não perceberam que construir um edifício nos Açores fica forçosamente mais caro do que construí-lo em Lisboa.
Sei que, na anterior equipa do ministério, havia algumas discussões a esse respeito, designadamente, a não aceitação do orçamento de obra pelo então Sr. Secretário de Estado; agora, espero que este assunto se resolva de modo a que eu possa, não só vê-lo no PIDDAC de 2002, como ainda dar a resposta às pessoas que me perguntam o que se passa e qual o porquê de aquela obra ainda não ter avançado.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, Sr. Secretário de Estado: É conhecido que o distrito de Braga é um distrito com uma enorme pujança demográfica, pois é um distrito muito jovem, sendo até das regiões mais jovens da Europa. Mas é também um distrito com problemas evidentes, ao nível da juventude: elevados níveis de trabalho infantil; elevados níveis de desistência escolar; e outras questões.
Na verdade, isto coloca o problema da necessidade de uma grande atenção à escola e ao ensino e a uma escola de qualidade. Do meu ponto de vista, o orçamento para a educação, previsto para o distrito, não responde a estas questões ao nível do ensino pré-escolar, nomeadamente em termos de construção de pavilhões gimnodesportivos para as escolas secundárias.
Gostaria, aliás, de perguntar-lhe se o Governo e o Sr. Ministro vão cumprir a promessa do anterior Ministro no sentido de, até 2006, cada escola secundária ter um pavilhão gimnodesportivo.
Coloco-lhe, ainda, duas ou três questões mais concretas: quanto à Universidade do Minho, não fico descansado ao ver as verbas de funcionamento disponíveis para a Universidade do Minho, bem como a outras promessas do Governo relativamente a esta Universidade. Esta é uma verba do Ministério da Cultura que leva a que a Biblioteca Pública de Braga, de leitura, esteja pronta há mais de dois anos e continue sem equipamento para poder funcionar.
Mas relativamente aos investimentos do PIDDAC para o presente ano de 2002, o que se verifica é o seguinte: aquilo que o Orçamento para 2001 previa, para o desenvolvimento dos projectos em curso, para a construção de um conjunto de pólos, e aquilo que temos previsto para 2002 corresponde a uma redução de cerca de 2,5 milhões de contos, sendo que a redução mais significativa é, exactamente, a dos pólos de ciências de saúde que, pela leitura que faço, têm uma redução de 2 milhões de contos.
É evidente que temos um problema neste PIDDAC, já existente, aliás, no PIDDAC anterior: é que o Governo do Partido Socialista inaugurou uma forma de apresentar os PIDDAC sem dar conta da execução dos projectos anteriores, portanto não sei qual é verdadeiro significado destes valores. Por isso, pergunto-lhe: são os projectos que se atrasaram, no presente ano, decorrendo daí a impossibilidade de esses investimentos se realizarem em 2002? Há alterações de projectos? O que é que se passa, em particular, no pólo de ciências da saúde, cujos cursos de medicina, como é sabido, foram abertos este ano?
Uma outra questão que pretendo colocar tem que ver com a Escola de Enfermagem Calouste Gulbenkian de Braga. Esta escola tem vindo a prestar serviços relevantes na formação de enfermeiros, de que estamos tão carenciados, mas tem um claro problema de falta de espaço e de falta de meios. No PIDDAC para 2002 estão previstos 27 400 contos, pelo que pergunto: este valor corresponde às solicitações feitas para o aluguer de novas instalações? E mais: então, onde estão as verbas para equipar os laboratórios que são necessários?
Como, para mim, isto é estranho, coloco-lhe mais esta questão: estando em curso a criação de um pólo para ciências de saúde na Universidade do Minho, por que razão a Escola Superior de Enfermagem de Calouste Gulbenkian de Braga não tem a possibilidade de vir a ter instalações anexas ou incluídas na construção deste pólo? Que perspectiva tem o Governo, relativamente a instalações suficientes e definitivas para a Escola Superior de Enfermagem de Calouste Gulbenkian de Braga?
No que diz respeito à região de Terras de Basto, e sempre direi que é uma região perdida entre o Minho e Trás-os-Montes, que tem dois concelhos minhotos e dois transmontanos, o facto é que "o amor declarado" do Governo pelo interior e pelas zonas rurais não parece chegar à região de Terras de Basto...!
E digo isto porque continuamos com a Escola Profissional Agrícola de Fermil de Basto, com a mesma verba que dá para o anteprojecto sem se avançar, relativamente

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ao desenvolvimento desta escola, que continua com pavilhões pré-fabricados, sem pavilhões gimnodesportivos, sem uma vedação.
Ora, isto é tanto mais grave quanto o concelho de Celorico de Basto tem a verba - notável! - de investimento no PIDDAC, global, de 33 000 contos, depois de, no ano passado, ter tido 32 000 contos.
Pergunto-lhe, também, se é ou não intenção do Governo, avançar com uma escola secundária oficial em Cabeceiras de Basto? Este é outro concelho desta região, que, penso, será dos únicos concelhos deste País que não tem uma escola secundária oficial.
Finalmente, e quanto ao ensino secundário no concelho de Guimarães, devo dizer que este o concelho é daqueles com um crescimento populacional muito acelerado, em que os cálculos feitos apontam para a necessidade, a curto e médio prazo, de, pelo menos, quatro novas escolas secundárias - aliás, os dados revelam que até já há um conjunto de escolas que está superlotado neste momento.
Do balanço que é feito, uma dessas escolas, vem apontada no PIDDAC, é a Escola Secundária Básica 2,3 de Abação. Mas faltam, pelo menos, mais três: uma para área de Sande, outra para a área de Nespereira/Santiago e outra, ainda, para a área de Mesão Frio/Costa. Estas escolas são fundamentais, sendo que uma delas é importante para acabar com o que ainda resta do ensino mediatizado, ou seja com as heranças do ensino pela TV, visando responder em termos de aproximação da escola da residência dos alunos, em particular para resolver problemas evidentes de sobrelotação de um conjunto de escolas de Braga.
Finalmente, uma questão muito concreta sobre o ensino privado. A minha camarada Luísa Mesquita já aqui referiu o problema da clareza na atribuição de subsídios e apoios ao ensino privado secundário. Penso que há critérios objectivos na atribuição desses apoios e, portanto, quando uma escola, um colégio privado, não tem direito a esse subsídio deve ser por não responder a esses critérios objectivos.
A pergunta que formulo ao Sr. Ministro é esta: tem ou não essa escola - estou a referir-me ao caso de um colégio privado de uma ordem religiosa no concelho de Barcelos - direito a uma resposta objectiva, esclarecendo exactamente por que é que não recebe apoios da parte do Ministério da Educação e, naquele caso, da Direcção Regional de Educação do Norte? É que isso não foi feito.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Abelha.

O Sr. António Abelha (PSD): - Sr. Presidente, os meus cumprimentos ao Sr. Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, ao Sr. Ministro da Educação e à respectiva equipa.
Começaria por corroborar as palavras dos dois Deputados que me precederam, nomeadamente no que respeita à mão certeira do Governo para discriminar negativamente as regiões periféricas e o interior.
No PIDDAC para 2002, no distrito de Vila Real, há uma quebra de 27,5% em relação ao PIDDAC de 2001. Aí se comprova, realmente, o notável interesse do Partido Socialista pelo interior e pelo mundo rural...! Mas sobre o PIDDAC nem vou falar porque, para mim - é a modesta opinião de quem só sabe ler, porque sabe ler português, e não é economista -, trata-se de um documento mais próximo da ficção do que da realidade.
O Sr. Presidente Fernando Serrasqueiro sabe que um documento emanado seja da Assembleia da República, seja do Governo, deve ser rigoroso, honesto, honrado, assim como as relações entre nós, entre os cidadãos e entre as instituições. E o PIDDAC não é um documento que honra quem o elabora: de ano para ano, inscrevem-se nele obras e verbas que se repetem até ao infinito e, mais à frente, darei dois ou três exemplos concretos do que estou a dizer.
Voltando ao distrito de Vila Real, pelo qual sou eleito, queria referir ao Sr. Ministro a minha preocupação face a duas obras, uma das quais, se não for um lamentável lapso do Governo ou da tipografia onde o orçamento foi impresso, não me fará retirar uma única palavra ao que aqui vou proferir e que é de alguma dureza, sinceramente.
Passo a explicitar: há dois estabelecimentos de ensino que o Governo se comprometeu a construir no concelho de Chaves, a EB 2,3 e, obviamente, o Pólo da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, que funciona em condições, direi, "menos aceitáveis" num edifício normalíssimo de habitação.
Sr. Ministro, repare neste exemplo da escola EB 2,3 de Chaves. Em 2000, no PIDDAC - o tal documento que se queria sério, honesto, rigoroso e onde deveria constar não só o que foi inscrito como o que foi executado, o que não é feito há muito tempo -, estava inscrita a verba de 380 000 contos; para 2001 a "soma astronómica" de 1000 contos e para 2002, tendo em vista, porventura, a sua conclusão, estão inscritos zero escudos. É verdade!
Agora, passo a ler-lhe as palavras proferidas pela Sr. Secretária de Estado da Educação, há um anos atrás, em resposta a uma pergunta que formulei. Dizia, então, a Sr.ª Secretária de Estado: "Gostaria de responder ao Sr. Deputado António Abelha relativamente à Escola EB 2,3 de Chaves, porque quanto a essa tenho dados. O Sr. Deputado tem razão, já que, de facto, está prevista a quantia que referiu,…" - 1000 contos - "… ainda que a verba possa ser, eventualmente, aumentada." - vê-se! - "Estão previstos 345 000 contos para 2002…" - zero! - "…e 150 000 contos para 2003, dando por finalizada a escola nessa altura". Fim de citação, embora aqui e ali com alguns comentários meus.
Ora, Sr. Ministro, que prova mais concludente do que esta para confirmar a falta de cumprimento de palavra por parte do Governo socialista para as gentes de Chaves?! O Partido Socialista abandonou, de maneira absoluta, este projecto de relevante interesse para Chaves e para as suas populações? Sim ou não?
Segundo ponto, bem concreto e bem necessário ao desenvolvimento do interior, à correcção das assimetrias, à coesão nacional (e a todas essas palavras que se vão gastando, a elas próprias, de tanto serem repetidas): que dizer do sempre assinado, protocolado, concursado e propagandeado, mas nunca visto, Pólo de Chaves da UTAD? Neste caso, a posição do Governo atinge foros de má fé e não isenta de responsabilidades o executivo camarário local, por coincidência do Partido Socialista, que tem demonstrado uma total inércia, falta de poder reivindicativo e de empenhamento do Governo central. Não é só por uma questão partidária, e justifico: em meia dúzia de dias foram

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recolhidas milhares de assinaturas de cidadãos de todos os partidos, embora a iniciativa tenha partido de um companheiro do Partido Social-Democrata. Mas, como dizia, foram recolhidas milhares de assinaturas indistintamente, de cidadãos de todos os partidos.
Seria longa, Sr. Ministro, a enumeração das sucessivas verbas inscritas, desde 1998 até 2002, pelo executivo socialista para a construção do Pólo de Chaves da UTAD. Resumidamente, indicamos alguns números: de 1998 a 2001, inscreveu-se uma verba total de 675 000 contos; verba e obra e obra executada: zero! De 1999 a 2002, a verba total inscrita…

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Sr. Deputado, agradecia que sintetizasse a sua intervenção.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
De 1999 a 2002, a verba total inscrita foi de 1,6 milhões de contos; verba executada: zero escudos. Em 2001, a verba prevista é de 710 000 contos, quando foi inscrita, realmente, uma verba de 130 000 contos; em 2001 previa-se, para 2002, 310 500 contos. E qual foi a verba inscrita este ano? 259 000 contos. É preciso algum descaramento! É que para os anos 2003 e 2004 prevêem-se as verbas de 925 000 contos e de 650 000 contos.
Assistimos, pois, a uma reprise inqualificável de um "filme" que nunca chegou a ser realizado mas cujo guião se repete desde 1998.
Sr. Ministro, ainda sobre a UTAD, sabe V. Ex.ª o resultado do concurso, que teve direito a ampla cobertura mediática, aquando da sua abertura em Chaves, no dia 8 de Julho, e cujas propostas foram abertas em Setembro? Sabe, por conseguinte, o cronograma da empresa vencedora? Prevê sabê-lo a curto prazo? Se sabe o resultado, ou quando o souber, poderá dizer que a verba inscrita no PIDDAC dá para começar, de forma decisiva, a construção do Pólo da UTAD?
Sr. Ministro, espero que a resposta que entender dar não se fique, como no ano passado, por um lacónico "não era V. Ex.ª o responsável pela educação"...! É, pois, necessário ultrapassar os obstáculos técnicos: já há projecto, já há concurso, por isso creio que estamos no bom caminho. Ou seja, quando sabemos que o projecto está elaborado, o concurso aberto, faltando unicamente a vontade política a este Governo de encarar com seriedade a construção do Pólo de Chaves da UTAD, com tudo o que de positivo implica para este concelho a sua concretização, pelo que apenas desejamos que o Governo cumpra a palavra dada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Educação, vou colocar-lhe uma questão no domínio da educação e ensino artístico.
Na sequência das conclusões do grupo interministerial de 1996 e da comissão que se constituiu posteriormente - é evidente que não pretendo falar a respeito da formação de formadores, tendo em conta que as escolas superiores de educação têm competências no domínio da formação e na área da psicopedagogia das expressões artísticas, nem no domínio do ensino artístico nas escolas superiores de ensino artístico, nem no domínio das escolas profissionais -, o que gostaria de saber é se se mantém o interface cultura e educação nesta matéria, no que diz respeito à educação estética geral dos cidadãos, dado que não vi referência alguma a esta questão, nem dotação orçamental.
Portanto, a minha pergunta é se se mantém esse grupo interministerial, se se mantém esse interface cultura e educação numa perspectiva não da formação de formadores, não da formação de profissionais mas, fundamentalmente, numa perspectiva mais globalizante, mais integradora da formação dos cidadãos numa visão de educação estética.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, permita-me que retorne a um tema anterior porque, porventura, pode ser antipático adjectivar as políticas mas, se nos circunscrevermos aos factos, a verdade é que, na educação especial, o ano lectivo começou sem que fosse feito o levantamento das necessidades das escolas.
A verdade é que há uma redução do número de vagas, o que significa que há um aumento de ratio, de número de crianças por professor; a verdade, goste-se ou não, é que há um conjunto de crianças que não tem uma resposta adequada, porque ninguém acredita que crianças deficientes ou meninos com necessidades educativas especiais possam ter uma resposta pedagógica com o mínimo de qualidade quando os professores têm de se desdobrar, num verdadeiro engenho de fazer a cobertura de muitas escolas.
Em suma, Sr. Ministro, quer goste quer não goste, a realidade concreta mostra-nos uma degradação da qualidade e da resposta pedagógica a que todas as crianças têm direito e que fica afectada. A realidade, goste-se ou não, é que este trabalho vai ser feito com uma mão-de-obra mais barata, pois já se viu que há diferenças em relação ao pagamento dos professores que vão desdobrar-se para cobrir muitas escolas - aliás, poderei enviar ao Ministério a lista dos jardins de infância, das escolas, em Algés, na Parede e em todo o distrito de Lisboa, cujos concelhos são fortemente penalizados. Portanto, esta é uma realidade em relação à qual a resposta do Sr. Ministro não é clara.
Existem mais dois aspectos em relação aos quais gostaria que o Sr. Ministro fosse mais preciso e que têm a ver com uma pergunta formulada sobre os cortes nos apoios sociais ao ensino especial. Por um lado, não vejo razão para o facto de os manuais em Braile continuarem a chegar atrasados às escolas todos os anos e, por outro lado, por que razão as escolas, espaço escolar e equipamentos, não estão ainda adaptados para receber todo o tipo de crianças, independentemente de terem ou não dificuldades na sua mobilidade.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Terminadas as inscrições, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação para responder às questões que lhe foram colocadas.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, quanto às primeiras perguntas, que foram formuladas pelo Sr. Deputado Manuel Moreira (depois pedirei ao

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Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa para dar respostas mais precisas), em relação àquela que é a política do Governo para o desenvolvimento do parque escolar, devo dizer que temos duas preocupações fundamentais: uma, é a de que se responda prioritariamente às situações de escolas que estão instaladas em pré-fabricados ou em situações precárias; a outra, respeita às escolas em clara situação de sobredotação. Neste momento, não tenho os elementos, mas pedirei ao Sr. Secretário de Estado para verificar se os tem e se em relação aos casos concretos que referiu há alguma razão para haver algum atraso no planeamento feito.
No entanto, em relação a esta matéria e a outras perguntas que foram feitas sobre o ensino secundário, gostaria de dizer que estamos a ultimar um trabalho de preparação de um estudo de referência para a rede do ensino secundário que tenha em conta a revisão curricular que vai ocorrer a partir do próximo ano.
Admito que pode existir uma ou outra situação relativa às escolas secundárias cuja programação pode estar, eventualmente, alterada com vista a que a rede de oferta de ensino secundário surja definida com mais clareza, tendo já em conta a programação da revisão curricular que incluirá, como o Sr. Deputado sabe, uma diversificação de áreas, quer de formação geral quer de formação tecnológica, que exigem uma apreciação final muito cuidada dessa oferta.
Em relação à Sr.ª Deputada Natalina Tavares de Moura e à matéria relativa à Declaração de Bolonha, ao trabalho feito e à sua divulgação, gostaria de dizer que se iniciou já a divulgação do documento para debate, quer nas escolas quer com os Conselhos de Reitores dos Institutos Politécnicos e da APESP e esperamos que uma vez distribuído possamos iniciar um trabalho sistemático de debate a partir desse instrumento, que passará depois a uma segunda fase de elaboração de um documento que tenha em conta este debate público.
Tomo boa nota do interesse que a Sr.ª Deputada vê em que se prepare uma brochura dos documentos importantes que têm sido disponibilizados, pelo menos na Internet têm estado disponíveis ao longo deste tempo, mas admito que haja muitas pessoas nas instituições de ensino superior que gostarão de ter outro tipo de documentos e poderemos, certamente, considerá-lo.
Os resultados deste debate sobre a Declaração de Bolonha podem ter algumas implicações sobre a regulamentação da lei do ordenamento e, eventualmente, sobre outros enquadramentos legislativos em acção no ensino superior - tomaremos isso em conta -, mas não pensamos alterar aquilo que já anunciámos, que é retomar a regulamentação da lei do ordenamento com base nos resultados da discussão pública que já teve lugar tendo em conta este outro contributo da Declaração de Bolonha e da Declaração de Praga.
Em relação às questões relativas à acção social escolar postas pela Sr.ª Deputada Margarida Botelho, pedirei ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior para responder.
Respondi às várias questões que são postas sobre investimentos para instalações de ensino superior e gostaria de dar duas notas. A primeira, é de que o planeamento dos investimentos nas várias instituições, e sobretudo a sua concretização, tem uma grande dose de responsabilidade das próprias instituições. Há vários casos de inscrições feitas em sede de PIDDAC ou até de FEDER que, depois, não foram concretizadas pelas instituições em investimentos efectivos.
Ora, a primeira prioridade da acção do Sr. Secretário de Estado, bem como da sua equipa, foi discutir com todas as instituições de ensino superior o seu programa de investimentos, o estado em que estava em 2001 e aquilo que era uma programação realista para 2002.
Assim, foram considerados em PIDDAC os investimentos que as instituições entendiam estar em condições de concretizar em 2002. Isso responde ao pólo de Chaves, que é um caso desses, em que está inscrito o que foi considerado como necessário nesta discussão com a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, está considerado o que foi dito em relação à Universidade do Minho e o que foi dito em relação à Universidade dos Açores.
É evidente que, por vezes, instalações provisórias que se mantêm ao longo de tantos anos são merecedoras de uma interrogação, que é a de saber por que é que as instituições planearam o seu investimento daquela forma. Ora, isso acontece em variadíssimos casos, havendo políticas muito diferenciadas de planeamento do investimento pelas próprias instituições, pelo que faz sentido vermos qual foi o resultado desse planeamento diversificado nas diferentes instituições.
Não vou voltar a esta questão dos investimentos no ensino superior, porque esta será a resposta que terei a dar. Como já referi, os investimentos previstos para o próximo ano foram discutidos profunda e detalhadamente entre a Secretaria de Estado e as próprias instituições.
Quantos aos agrupamentos, peço ao Sr. Secretário de Estado que dê a resposta, porque eu vou fazer a roda completa sobre o que me parece que poderei responder.
Em relação ao ensino português no estrangeiro, como referi, estamos a planear uma resposta detalhada a cada um dos pontos que constam da resolução apresentada, nomeadamente em relação à distribuição de bandeiras e de dicionários pelo Ministério da Educação.
Como anunciei há pouco, iniciámos com o Ministério dos Negócios Estrangeiros um trabalho de articulação relativamente ao que deve ser feito de modo a que este programa responda às necessidades identificadas e acreditamos que há capacidade de resposta muito maior em consequência desta articulação entre os dois Ministérios.
Relativamente à unidade orgânica de Viseu da Universidade de Aveiro, já se iniciou algum trabalho entre a Secretaria de Estado e a Universidade para ver, no contexto actual, qual é o desenvolvimento que deve ter esse programa.
Sr. Deputado Agostinho Lopes, em relação ao ritmo de construção de pavilhões de escolas, estamos a desenvolver o programa de instalações definitivas de escolas e de bibliotecas, de escolas com laboratórios e de escolas com pavilhões. Fizemos uma amostragem, a qual inclui a Direcção Regional de Educação do Norte, que aponta para os seguintes indicadores: escolas com instalações definitivas, estamos a cerca de 90% do objectivo final; escolas com bibliotecas, estamos a cerca de 90% do objectivo final; escolas com laboratórios, estamos com cerca de 81%; escolas com pavilhões, estamos com cerca de 86%.
Vamos, com certeza, continuar este programa para cumprir os objectivos que temos estabelecido e os indicadores

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que temos é que, porventura, em relação aos pavilhões, vamos atingir o objectivo antes daquilo que estava programado e como o programa vai continuar admitimos conseguir antecipar o cumprimento desse objectivo.
Gostaria também de dizer que vamos discutir com a Universidade do Minho e com a escola de enfermagem formas de articulação dos dois projectos que têm também a preocupação que o Sr. Deputado tem de, tão cedo quanto possível, dotarmos a escola de enfermagem de condições para o seu trabalho.
Em relação às escolas secundárias e às preocupações com outras regiões, creio que já dei a resposta que me era possível dar neste momento, mas o Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa completá-la-á.
O trabalho com o ensino privado tem aquele sentido que há pouco apresentei. Há contratos que estão actuais e que estamos a procurar ajustar à situação actual devido à diminuição do número de alunos. Se existem situações como esta que referiu, faz todo o sentido ver a justeza delas com a respectiva Direcção Regional de Educação e tomarei a respectiva nota da preocupação que o Sr. Deputado expressou.
Sr. Deputado António Abelha, temos uma grande atenção em relação à questão das escolas em zona periféricas e estamos a criar uma rede de escolas básicas e secundárias para todo o território nacional, independentemente do sítio onde estejam as comunidades que necessitam de uma escola. Com certeza que fará justiça ao Governo se olhar para a rede de escolas que tem vindo a ser construída, quer em zonas do interior, do litoral, quer ainda nos centros das cidades ou da periferia. Com certeza que ainda não terminámos a execução da programação feita e existirão, porventura, situações que o Sr. Deputado gostaria de ver concretizadas e que ainda não foram.
Tomo nota desta preocupação com a Escola EB 2, 3 de Chaves, cuja resposta detalhada não conheço, mas se o Sr. Secretário de Estado tiver resposta, com certeza que ele a acrescentará à minha.
Sr.ª Deputada Maria Santos, devo dizer-lhe que vamos dar uma atenção muito grande às questões da educação artística. Estamos a retomar o trabalho com o Ministério da Cultura e inserimos as questões do ensino artístico também na preocupação da revisão curricular do ensino secundário e do ensino básico, sendo que não as separamos desses dois programas, assim como não separamos também aspectos específicos como esse do sistema educativo. Todavia, parece-me que temos de dar um salto quantitativo e qualitativo muito significativo na oferta de ensino artístico quer no ensino básico quer no ensino secundário.
Em relação às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, pedirei ao Sr. Secretário de Estado que responda em detalhe às suas preocupações, nomeadamente em relação à ratio e aos números. Fizemos uma distinção muito clara entre aquilo que são apoios a crianças com necessidades educativas especiais e aquilo que são apoios a crianças que precisam de algum tipo de apoio educativo e que deve ser incluído no projecto-escola porque, em princípio, não são crianças com necessidades de apoios educativos permanentes.
Quanto aos números relativos à educação especial, pode ver que o número que consta do relatório que foi apresentado sobre os professores destacados para as crianças com necessidades educativas especiais para o próximo ano é de 5695, enquanto que no ano passado foi de 5580. Repito, refiro-me a crianças com necessidades educativas especiais e permanentes no sentido de serem portadoras de deficiência e estamos a fazer uma separação muito cuidada entre este grupo de crianças e outras crianças que precisam de outro tipo de apoios.
Certamente que quando estes números são misturados o resultado é diferente, mas peço ao Sr. Secretário de Estado que acrescente o que entender sobre este assunto, nomeadamente sobre o atraso na distribuição de manuais em Braile. No entanto, vou tomar nota dessa referência e, caso isso aconteça, isso deve ser corrigido.
Em relação aos espaços escolares adaptados, todos os espaços novos são construídos com esta preocupação e as Direcções Regionais de Educação têm uma orientação para que o façam nas escolas em que seja necessário responder a esta necessidade.
Agora, se a Sr.ª Presidente, me permite, passarei a palavra ao Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior: - Tentando ser sintético, em relação às questões da acção social escolar, se compararmos as verbas que estão previstas para 2002 com as verbas disponíveis em 2001, e que foram reforçadas especificamente para a acção social escolar no sentido de conseguir atribuir bolsas a todos os estudantes, de forma a que não houvesse falta de verbas para a atribuição de bolsas, verifica-se que há um crescimento, de 2001 para 2002, de cerca de 4,6%.
As dotações comuns para a acção social escolar crescem, de 2001 para 2002, o que significa que, no total, temos um crescimento de cerca de 6%, quando o crescimento do número de alunos no ensino público rondará os 3,5% - aliás, neste momento, estamos a rever estes números em baixa, como eu disse há pouco, tanto que no ensino privado não se prevê um crescimento do número de alunos.
Nesse sentido, o Orçamento para 2002 permite, de facto, dar resposta às necessidades da acção social escolar.
Queria ainda fazer referência a duas questões a que o Sr. Ministro já respondeu. Quanto ao plano de investimentos nas diferentes instituições, gostaria de dizer que foram feitas reuniões com todas as universidades, todos os politécnicos, todas as escolas não integradas. Foram feitas 49 reuniões com as diferentes instituições para identificação das prioridades e das condições em que cada empreendimento estava, no sentido de se poder avançar. O PIDDAC foi todo trabalhado com as próprias instituições, respondendo às suas prioridades.
Em relação à questão levantada pelo Deputado Luiz Fagundes Duarte, sobre os custos acrescidos da Região Autónoma dos Açores, devo dizer que esse acréscimo é um facto. Aliás, ainda na semana passada despachei um processo com custo acrescido para a Região Autónoma dos Açores, pelo que isso é reconhecido.
Quanto à questão levantada pelo Deputado Agostinho Lopes, sobre a Escola Calouste Gulbenkian de Braga, referindo que não sabia se a verba de investimento prevista era para aluguer do edifício, devo dizer que não é para aluguer do edifício mas, sim, para equipamento do edifício que foi alugado.

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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - E a verba para as instalações?

O Orador: - Isso faz parte do orçamento de funcionamento e é uma questão que está, neste momento, a ser trabalhada com a própria escola.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: - Sr. Presidente, gostaria de começar por responder ao Sr. Deputado José Cesário, para lhe dizer que, no que respeita aos agrupamentos, o Governo tem uma política muito clara, tendo em vista a integração do maior número de escolas possível em agrupamentos, mas é evidente que não ignoramos que as autarquias têm nesse processo um papel relevante. De facto, temos de articular com as autarquias o desenvolvimento desse processo e temos de encontrar formas de apoiar melhor os alunos do 1.º ciclo, precisamente através deste processo de agrupamento.
Posso dizer-lhe que no processo que estamos a desenvolver com as autarquias, e que já referi anteriormente, por parte do Ministério da Educação temos os meios alocados para suportar o alargamento dos agrupamentos, tendo naturalmente em conta a realidade, que contamos que seja efectiva, da cooperação das autarquias neste processo, como, aliás, já acontece com muitas autarquias, como sabe, nomeadamente algumas do seu distrito, que ainda recentemente visitei.
No que respeita à Sr.ª Deputada Isabel Castro, devo dizer que, de facto, o levantamento foi feito pelas direcções regionais e julgo que tem havido bastante confusão ou falta de esclarecimento sobre esta matéria, mas eu procuro, mais uma vez, contribuir para esse esclarecimento.
No ano passado, os professores que apoiaram meninos e meninas com necessidades educativas especiais foram colocados indistintamente, ao abrigo do Despacho Conjunto n.º 105/97, de 1 de Julho, e do Decreto-Lei n.º 35/88, de 4 de Fevereiro. Estamos num processo de clarificação, ou seja, não podemos considerar todos os meninos na categoria daqueles que têm necessidades verdadeiramente especiais (se me permite que sublinhe este facto), porque temos de caminhar para uma situação em que todos os recursos humanos que tenhamos sejam afectados a esses meninos e meninas que têm, de facto, necessidades desse tipo.
Em relação ao número de professores, devo dizer que não colocámos menos professores este ano; o que aconteceu foi que, ao abrigo do Despacho Conjunto n.º 105/97, foram colocados apenas professores para meninos com necessidades educativas especiais, portanto, não para todos os meninos, e foi ao abrigo do Decreto-Lei n.º 35/88 que colocámos os outros professores.
Como tal, no que toca ao Despacho n.º 105/97, não se pode comparar a situação do ano passado com a deste ano, porque, no ano passado, foram colocados, ao abrigo deste despacho, professores indistintamente para todo o tipo de meninos e, este ano, tal não aconteceu.
De facto, é lamentável que continuemos a ouvir que há aqui uma medida economicista, porque isso não é verdade! Mais: volto a referir que todas as direcções regionais têm uma bolsa de professores que pode ser ainda utilizada nesta altura, se nos forem indicados os casos. Aliás, a Sr.ª Deputada referiu um exemplo dizendo que havia um professor para muitas escolas, mas, se me permite, devo dizer-lhe que o exemplo que deu não é muito feliz, pois disse que são 26 professores para 49 escolas e isso nem duas escolas dá para cada professor!
Só para terminar este ponto, devo dizer que temos, nesta matéria, uma grande preocupação e sentimos de uma forma muito especial aquilo que acabamos de ouvir. É que a ratio para necessidades educativas especiais é de um professor para 7,7 alunos, sendo que para outros meninos que precisam de apoios educativos, que é uma coisa diferente, é de um para 14,7.
Gostaria também de referir que a regulamentação dos Decretos-Leis n.os 6/2001 e 7/2001, ambos de 18 de Janeiro, que organizam o currículos do ensino básico e secundário, respectivamente, vai ser feita integrando um conjunto de legislação dispersa, de modo a que, de uma vez por todas, se identifique o que são necessidades educativas especiais e o que é um professor de necessidades educativas especiais, para que esta situação caminhe para uma clarificação e um apoio melhor e de mais qualidade aos jovens.
Quero ainda referir o seguinte: as direcções regionais estão a planear e a trabalhar atentamente porque, como sabe, temos muitos professores que foram preparados, e subsidiados, pelo Ministério da Educação para serem professores de necessidades educativas especiais e que, lamentavelmente, depois de subirem dois, ou três, ou quatro escalões na carreira, não concorrem - a Sr.ª Dr.ª Isabel Castro deve saber disso.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Pois sei, como sei das irregularidades!

O Orador: - Como tal, vamos trabalhar com esses professores nesse sentido. É que o País nunca teve os recursos necessários nessa matéria, mas tem feito um esforço muito significativo para que eles existam. Agora, temos de trabalhar com esses professores e esperamos que os Srs. Deputados também nos possam dar uma contribuição para que esses professores possam estar onde gostaríamos que eles estivessem.
Sr. Deputado António Abelha, quanto à questão da Escola Básica 2/3 de Chaves, a informação que temos é a de que há ali um problema de disponibilização de um terreno. Aliás, isso aplica-se também noutras situações, isto é, por vezes, o Ministério da Educação não consegue adquirir um terreno numa localização adequada. É que uma escola não se pode implantar em qualquer sítio!
Mas a informação que temos sobre a situação em apreço é a de que há uma dificuldade com o terreno, sendo que o terreno disponibilizado não é considerado pelos técnicos da Direcção Regional de Educação do Norte como o mais adequado para a localização daquela escola. Como tal, logo que o terreno seja disponibilizado, a Direcção Regional de Educação do Norte procederá com certeza à construção da escola. É esta a informação de que disponho.

O Sr. António Abelha (PSD): - Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

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O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Abelha (PSD): - O Sr. Secretário de Estado, por acaso, não sabe em que freguesia é que se situa o tal terreno que não reúne condições?

O Orador: - Não faço ideia!

O Sr. António Abelha (PSD): - É que me parece que esse problema já está ultrapassado. Inicialmente, era na freguesia da Madalena e, depois, passou para a de Santa Cruz/Trindade.

O Orador: - Não tenho informação com esse detalhe, Sr. Deputado.
Finalmente, Sr. Deputado Manuel Moreira, o que lhe posso dizer é que temos prioridades na construção das escolas, como deve imaginar. A degradação das escolas é uma prioridade principal, depois há a sobrelotação e, finalmente, as escolas que não têm pavilhões.
O Sr. Deputado falou muito rapidamente e não tive tempo de anotar todas as escolas a que se referiu, mas posso dizer-lhe que a Escola Secundária de Alfena, em Valongo, foi criada, tal como a EB 2/3 n.º 2, em Valongo, e a de Vila Nova de Gaia, em Gervide. Além disso, a Secundária de Carvalhos está em substituição e a de Almeida Garrett tem em curso um processo de ampliação e temos prevista, em Marco de Canaveses, a escola EB 2/3 n.º 2; a de Alpendurada têm ainda problemas de terrenos, isto é, os terrenos ainda não foram disponibilizados ou não foi possível adquiri-los. Não sei se referi todas as escolas que o Sr. Deputado mencionou, mas é esta a informação de que disponho.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura António Braga.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado, mas tem de ser muito breve.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar, queria dizer que o facto de eu há pouco ter falado rapidamente se deveu à circunstância de a Sr.ª Presidente ter inaugurado, para a segunda ronda de perguntas, a limitação de tempo em 3 minutos. Ora, como eu tinha de abordar três concelhos e nove questões…

O Sr. Presidente (António Braga): - Sr. Deputado, não vai agora gastar mais 3 minutos!

O Orador: - Não, não vou, Sr. Presidente, apesar de há pouco não terem sido respeitados os 3 minutos, tendo havido colegas que falaram durante muitíssimo mais tempo.
O que eu queria dizer ao Sr. Secretário de Estado é que isso que acabou de dizer já eu sei, pois consta do PIDDAC regionalizado, sendo que eu o questionei em relação às outras que aí não aparecem. Penafiel tinha duas escolas, Penafiel Norte e Penafiel Sul, que desapareceram e não se percebe porquê, dado que são necessárias e que há necessidade de uma nova escola secundária para servir a zona sul do concelho, que também não está contemplada.
Disse também que era preciso reforçar verbas em relação à escola secundária de Alpendurada no concelho de Marco de Canaveses e à Escola Profissional de Arqueologia de Marco de Canaveses e também referi a escola de Serzedo, em Vila Nova de Gaia, que continua a ser adiada, a deslizar ano após ano no PIDDAC, quando se trata de uma necessidade premente.

O Sr. Presidente (António Braga): - Sr. Deputado, dei-lhe a palavra para fazer precisar algumas questões e não para uma nova intervenção.

O Orador: - Sr. Presidente, estou a precisar, porque, pelos vistos, o Sr. Secretário de Estado não "apanhou" nada do que eu disse e referiu-me aquilo que eu já sabia, o que está no Orçamento do Estado e no PIDDAC. Vai desculpar-me, mas a culpa não é minha, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente (António Braga): - Muito bem, Sr. Deputado, mas peço-lhe que conclua.

O Orador: - Está contemplada a beneficiação da Escola Almeida Garrett, que é o antigo liceu, mas também se justifica, há muito tempo, a beneficiação da Escola António Sérgio, no concelho de Vila Nova de Gaia.
Quanto aos pavilhões das escolas, não falei das escolas de Valongo que estão contempladas, falei sim em relação a dois pavilhões que já deviam existir há muito nas escolas EB 2/3 de Campo e Sobrado.

O Sr. Presidente (António Braga): - A Sr.ª Deputada Margarida Botelho também queria fazer uma precisão, pelo que tem a palavra.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr. Presidente, queria fazer duas precisões em relação a duas questões que coloquei e a que o Governo não deu resposta. Uma é relativa à diminuição da verba da acção social escolar para o ensino especial, que de facto diminui, sendo importante perceber porquê. A segunda tem a ver com o pagamento das deslocações dos professores da acção social escolar, pois, como referi, em alguns distritos está a acontecer que, em vez de lhes pagarem a verba de deslocação de serviço em viatura própria, pagam-lhes como se fossem em transportes públicos, mas usando eles o seu próprio carro.

O Sr. Presidente (António Braga): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Botelho, quanto à questão relativa à verba da acção social escolar para a educação especial, não prevemos nenhuma diminuição nesse tipo de esforço. Aquilo que indicamos como acção social escolar no ensino não superior aumenta 10,2%.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - O ensino especial diminui!

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O Orador: - Repare que o ensino especial é também ensino não superior. Este aspecto tem, pois, que ver com um conjunto de documentos que têm as duas componentes.
Qual era a outra questão que tinha levantado?

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr. Ministro, há um distrito do nosso país (pelo menos um, o de Santarém) onde os professores do ensino especial que têm de dar apoio às tais mais do que uma escola se deslocam no seu carro particular e, em vez de lhes pagarem o quilómetro a cerca de 60$ escudos, pagam-lhes a 20$!

O Orador: - Sr.ª Deputada, não conheço essa situação, pelo que terei de ver o que é que se passa.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Fernando Serrasqueiro.

O Sr. Presidente: - Suponho que estão respondidas as questões colocadas…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, eu só queria lamentar o facto de não ter tido resposta para as minhas questões!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, referi-lhe os critérios que utilizamos na construção de escolas e são esses critérios que a Direcção Regional de Educação do Norte vai prosseguir. Aliás, poderia dar-lhe aqui números elucidativos acerca do plano de construções que foi concretizado nos últimos cinco anos, nomeadamente na Direcção Regional de Educação do Norte, e vamos prosseguir com essa política. Como tal, não vou agora discutir aqui consigo o caso da escola A e da escola B!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Secretário de Estado, o Governo é o mesmo! Sei que a equipa do Ministério da Educação…

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Sr. Deputado, agora já não pode usar da palavra!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Mas o Sr. Secretário de Estado admitiu a interrupção!

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Sr. Deputado, V. Ex.ª já fez a pergunta, o Governo já respondeu e não vamos abrir uma nova ronda de perguntas!
Agradeço ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado a sua presença e vamos iniciar, já de seguida, o debate do Orçamento, na especialidade, do Ministério da Ciência e da Tecnologia.

Pausa.

Temos entre nós a equipa do Ministério da Ciência e Tecnologia e, para iniciar a primeira ronda de perguntas dos diferentes grupos parlamentares, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lavrador.

O Sr. Carlos Lavrador (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados, vou fazer uma breve apreciação seguida de uma pergunta, também bastante curta.
É realmente confortante constatar que, ao longo destes seis anos, o Ministério da Ciência e Tecnologia vem desenvolvendo uma política consistente e sustentada, quer nos objectivos que pretende atingir, quer nos financiamentos que, para esta finalidade, vão sendo disponibilizados na componente nacional e na comunitária.
Não deixam, pois, de nos satisfazer alguns indicadores, nomeadamente o que nos permite concluir que Portugal é, hoje, o terceiro País que mais cresce em termos de investigação e desenvolvimento, logo atrás da Finlândia e à frente da Dinamarca e da Espanha.
Poder-nos-ão dizer que teria que ser assim, uma vez que o atraso estrutural de Portugal a isso obrigava. Teria que ser, mas podia não ser, como não o foi durante muitos anos. E, portanto, de alguma maneira, temos de nos sentir satisfeitos com isto.
O outro indicador que nos dá alguma satisfação é o crescimento em termos, por exemplo, de publicações científicas, em que ocupamos, neste momento, os primeiros lugares. Também aqui havia um enorme défice, mas isto significa que a cultura científica e o hábito de produzir se estão paulatinamente a instalar no País.
O terceiro indicador é o facto de, no Programa Ciência Viva, o número de projectos ter passado de 200, em 1997, para cerca de 9000, em 2000, o que nos parece verdadeiramente notável e sintomático, por um lado, do alcance e sucesso deste programa e, por outro, da aquisição de novos hábitos culturais no âmbito da investigação científica, da curiosidade intelectual e da produção.
Temos tido, ao longo destes anos, uma política sustentada e com rosto, uma política que sabemos qual é e cujo rosto é o Sr. Ministro, que, com constância, tem ocupado este cargo.
Continua a verificar-se um conjunto de preocupações que também apraz registar, nomeadamente no âmbito da investigação científica, o reforço dos investimentos em ciência e tecnologia, de acordo com prioridades que foram definidas em 1995. Portanto, continua a haver uma actuação coerente com um projecto a médio prazo então definido.
Uma outra componente que nos apraz registar é a continuação da preocupação em fazer uma avaliação permanente do que está feito e em corrigir aquilo que está mal e também em fazer uma avaliação sobre a funcionalidade e a rentabilidade das instituições.
Portugal ganhou, também, nestes anos, uma visibilidade internacional e um protagonismo que nunca até aqui tinha tido, o que penso que também é motivo de satisfação.
No âmbito da sociedade de informação - e lembro que Portugal, aquando da sua presidência, contribuiu para uma consciencialização da problemática em causa a nível da União Europeia -, Portugal também está a desenvolver um conjunto de projectos, nomeadamente o Portugal Digital e a Iniciativa Internet, em especial nas escolas, sendo que

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também aqui os números são elucidativos. Em 1999, tínhamos 220 escolas do 1.º Ciclo com Internet instalada, neste momento temos cerca de 8094. Estamos, neste momento, a alargar essa actuação aos níveis seguintes, isto é, do 5.º ao 12.º ano de escolaridade, tentando criar uma rede que transcenda as escolas e que una, em rede, escolas, bibliotecas, museus, centros de formação de vários tipos, etc.
Gostaria de colocar uma questão, não sem primeiro referir que, em termos orçamentais, é, na nossa opinião, impressionante o crescimento dos meios postos à disposição da ciência, tecnologia e da sociedade de informação. Assim, em 1995, falando ainda em escudos, a dotação orçamental foi de 23,5 milhões de contos, situando-se, neste momento, em números redondos, em 78 milhões de contos. Isto significa um crescimento de 18% relativamente ao ano anterior, em que o valor foi de 66,5 milhões de contos. Portanto, sistematicamente e de modo sustentado, continua a haver uma implementação e um incremento dos meios disponíveis no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Há que referir que, deste enorme esforço que se traduz no Orçamento para este ano, a componente nacional teve um acréscimo de cerca de 50%.
Para terminar e antes de colocar a questão que pretendo, gostaria de dizer que esse crescimento se aplica sobretudo ao investimento, dado que na componente Funcionamento houve até um ligeiro decréscimo nas verbas que se pretende disponibilizar para essa finalidade.
A questão que quero colocar ao Sr. Ministro tem que ver exactamente com a Internet nas escolas e no sistema mais vasto a que me referi há pouco. Gostaria que me fizesse o ponto da situação relativamente ao que se passa entre o 5.º e o 12.º ano de escolaridade, sendo que se pressupõe que, até ao fim do ano, quase 100% das escolas do 1.º Ciclo estejam ligadas, em rede, através da Internet.
Gostaria que fizesse um ponto da situação e que dissesse também não quando é que o processo mais geral estará terminado, porque se trata de um processo aberto, que nunca estará terminado, mas quando é que atingirá a sua velocidade de cruzeiro.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem a palavra o Sr. Deputado David Justino.

O Sr. David Justino (PSD): - Sr. Presidente, devo dizer que estou numa posição relativamente difícil, porque, ao contrário do Orçamento do Estado, que penso que é deplorável, confesso que considero que o orçamento da Ciência e Tecnologia até é um bom orçamento.
Em segundo lugar, a situação também é difícil porque, mais do que uma vez, já tive oportunidade de enunciar alguns pontos em relação aos quais poderá haver desacordo, ou pelo menos trata-se de concepções relativamente diferentes. Ora, o orçamento que estamos a discutir decorre de uma determinada política, a qual não vou discutir agora, já que aquilo que temos de discutir é precisamente o orçamento, mas reconheço que, relativamente àquilo que se passou no ano anterior - talvez seja pelo facto de, ao contrário de outros ministérios, o Ministério da Ciência e Tecnologia manter o mesmo responsável ao longo de seis anos, enquanto que, por exemplo, o Ministério da Educação já vai em quatro ministros e por isso é um bocado difícil, já que cada vez que vem um novo Ministro temos, obviamente, que repetir o discurso -, não posso repetir o discurso, porque o Ministro é o mesmo e, portanto, se o faço, fico sem argumentos.
Por último, penso que as perguntas e os pedidos de esclarecimento que fiz logo na discussão do Orçamento na generalidade foram respondidos, independentemente das conclusões que se possam tirar. Por isso, devo dizer que esgotei a imaginação para lhe colocar perguntas e não vou inventar perguntas só pelo facto de ter que ocupar tempo.
Obrigada pela sua atenção e fico-me por aqui.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Está a ver, Sr. Ministro Mariano Gago, nem tudo é tão mau assim, mesmo num pelouro tão complicado como é o da Ciência e Tecnologia!
Completando a conversa que tive consigo no início, eu, que faço humanidades e agricultura, gostaria muito que a investigação agrícola fosse também coordenada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Não tenho dúvida nenhuma de que quanto mais cabeças há a mandar em sectores que, no fundo, têm grande interligação, pior é o resultado.
Penso que as pescas estão dependentes de si. Li no PIDDAC a referência a um programa relativo à "ciência e tecnologia do mar"...

O Sr. Ministro da Ciência de Tecnologia (Mariano Gago): - Não, não estão!

O Orador: - Então, é só "ciência e tecnologia do mar".
Tenho notado que há uma grande descoordenação entre os cientistas e julgo até que, nalguns casos, os cientistas fazem a investigação de que mais gostam, o que naturalmente é a pior definição da ciência no sentido de esta criar desenvolvimento para um país.
Volto àquela minha proposta, que levantou alguns protestos por parte de alguns zoilos, quanto à Academia das Ciências, considerada uma entidade mumificada, e que de certa maneira o é, no sentido de ver se na verba consagrada à Academia se podia, ou não, melhorar os recursos para custear a permanência de um grupo de lexicólogos, que poderiam ser escolhidos por uma comissão formada pelos sábios aqui da nossa terra, no sentido de se conseguir ter um dicionário que abrangesse o português desde a Idade Média até aos nossos dias.
Como se sabe, os dois volumes publicados pela Verbo só abrangem o português desde Garrett até aos nossos dias e ficamos um pouco com "fome" no sentido de termos um dicionário que abrangesse não só a língua portuguesa desde os cancioneiros até aos nossos dias mas que, inclusive, fosse todos os anos completado com os neologismos que entram para a língua e com os termos técnicos que têm que ser adaptados para a língua.
Temos deixado isso ao livre arbítrio dos diversos sectores tecnológicos e daí os economistas nos terem impingido a palavra "implementar", daí o dizer-se "não realizei que tu eras burro" em vez de "não me dei conta que tu eras burro". Os franceses também caíram nessa…
A Academia das Ciências tem o problema de ter ciências e letras ao mesmo tempo, ao passo que a Academia espanhola ou a francesa só têm letras, o que cria uma maior facilidade.

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Portanto, é só este o pedido que faço ao Sr. Ministro, na medida em que quem dá dinheiro pode, depois, avaliar e dizer que o trabalho foi mal feito, mas não admito é que um País como o nosso não tenha um dicionário decente, que cubra todas as virtualidades da língua portuguesa, porque isso faz falta aos estudantes, aos professores, aos Deputados, aos Ministros, e, assim, não teríamos muitas pessoas por aí a dizer "eu fui de encontro à tua opinião", o que de facto significa exactamente o contrário daquilo que seria necessário.
Por outro lado, e fico-me por aqui, porque tenho a mesma opinião que o meu colega David Justino, não sei se o Sr. Ministro está a par das intrigas universitárias, embora eu pense que deva estar. De qualquer maneira, digo-lhe que, pelas últimas informações que tenho tido, o Instituto de Meteorologia "tem-se fechado em copas" sempre que se pretende que ele dê informações aos homens da biofísica da Faculdade de Ciências. Pelo menos, eram estas as queixas que me chegavam no tempo em que eu me dava com eles, ou seja, que se fecharam, que "fizeram uma quinta" - enfim, no fundo, agora, é necessário ter uma casa no Alentejo para se ser bom português e também é necessário ter uma quinta científica para se ser um bom cientista.
Mas, Sr. Ministro, chamava a sua atenção para isto, porque, naturalmente, julgo que o Instituto de Meteorologia ganharia também com uma troca de impressões com os seus colegas da Faculdade de Ciências, que são colegas deles, embora, como se sabe, não haja pior inimigo do professor do que o próprio colega. De qualquer maneira, a situação existente era essa mesmo!
Por outro lado, voltava a insistir, pois não sei como é que tem coordenado isto nem como é que tem marcado os parâmetros, para que, de facto, se estudassem a sério as energias alternativas, em Portugal.
Neste momento, a União Europeia, pela primeira vez, começou a descobrir que o lobby dos homens do petróleo nem sempre queria o bem da União - ou, então, e espero que não seja, porque não pagam já suficiente, mas penso que isso não será verdade. De qualquer modo, já começaram a pensar, novamente, em fazer o bio-etanol e, naturalmente, já começaram a fazer o biodiesel. Ora, isso poderia fazer reavivar muitas superfícies de cereais, de beterraba e de outros produtos agrícolas que foram abandonadas e que teriam como fim fazer um combustível do qual, como o Prof. Mariano Gago sabe, resulta para os americanos o chamado corn gluten feed, que excedeu as expectativas da indústria americana porque é pago a preço de ouro na Europa e entra sempre por Roterdão, sendo um dos produtos que tem levado ao grande desenvolvimento da indústria porcina na Holanda, porque em redor de Roterdão há uma série de criações de porcos.
Desculpem-me descer tão baixo, mas a verdade é que eu não vivo só de Homero e de Virgílio e julgo que a ciência poderia contribuir, e muito, para que esses aspectos pudessem ser estudados e melhorados em Portugal, tal como as energias alternativas e outros aspectos que, naturalmente, conhece tão bem ou melhor que eu.

Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.ª Presidente da Comissão, Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Sr. Margarida Botelho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia, em relação ao Orçamento do Estado do Ministério da Ciência e Tecnologia, a preocupação maior que nós temos, de facto, é em relação à estratégia usada, ou seja, é um facto que há verbas para este Ministério que não descem tanto como descem as de outros Ministérios, mas a realidade é que grande parte do orçamento do Ministério da Ciência e Tecnologia se destina a divulgação científica, o que nos parece ser um objectivo louvável, mas não se destina à investigação e desenvolvimento, o que, em nossa opinião, deveria ser um investimento estratégico que o nosso País deveria fazer.
Se nós "desmontarmos" o Orçamento do Estado nesta perspectiva, a realidade que temos é um pouco diferente da que nos quis fazer passar o Sr. Deputado do Partido Socialista.
Em primeiro lugar, porque se retirarmos ao orçamento do Ministério da Ciência e Tecnologia o Programa Operacional Sociedade da Informação, o Programa Ciência Viva e a Cooperação Internacional, chegamos à verba 35,6 milhões de contos, muito longe da "gloriosa verba" que nos querem fazer passar. Ou seja, desde 1999, esta verba aumentou cerca de 17,5%, mas se descontarmos aqui cerca de 12% das sucessivas inflações e se contarmos com os cerca de mais 5200 trabalhadores que entretanto foram admitidos, vemos que não há propriamente muito crescimento neste orçamento.
Mas se retirarmos, ainda, a estes 35,6 milhões de contos o dinheiro das bolsas de estudo (e não podemos considerar que todos os doutorandos e mestrandos contribuem para a investigação e desenvolvimento como os organismos internacionais a definem), chegamos à soma de 21 milhões de contos. Ou seja, comparando com 1999, em que estavam orçamentados 19,6 milhões de contos, há aqui uma evolução muito pequena, que, para nós, é praticamente estagnação.
Em oposição, os programas da sociedade da informação passaram de 0,1 milhões de contos, em 1998, para 21,6 milhões de contos, em 2002. Assim, Sr. Ministro, pergunto-lhe: onde é que se discutiu esta estratégia? E faço-lhe esta pergunta uma vez que os organismos que devem ser ouvidos para discutir as estratégias na área da ciência da investigação e do desenvolvimento não foram escutados. Como o Sr. Ministro bem sabe, esses organismos reúnem muito pouco.
Também lhe queria renovar algumas questões que eu já tinha colocado no debate na generalidade e que foram respondidas de uma forma muito pouco concreta.
Assim, gostaria de lhe perguntar que verbas existem para as linhas de apoio à inserção profissional dos investigadores doutorados, em Portugal ou no estrangeiro, que foram anunciadas pelo Ministério da Ciência e Tecnologia?
A segunda pergunta é quantos recrutamentos foram feitos para a carreira de investigação nos laboratórios do Estado desde que o Ministério da Ciência anunciou a nova forma de contratação? A resposta que o Sr. Ministro deu a esta pergunta, no debate na generalidade, ou seja, que se via caso a caso, quando o argumento para não se abrir o concurso fosse falta de verba, não é exactamente o que

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quero saber, o que quero saber é quantos foram os recrutamentos feitos.
Finalmente, gostaria de saber qual é o aumento da verba, presumindo eu que há um aumento, para os laboratórios nacionais do Estado

A Sr.ª Presidente: - Como só tenho mais uma inscrição, vou dar a palavra à Sr.ª Deputada Natalina Tavares de Moura.

A Sr.ª Natalina Tavares de Moura (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, hoje, "estou naquela" do "insiste, insiste", como na educação física! E vou insistir mais!
Sr. Ministro, eu vou insistir uma vez mais, pela terceira vez, no sentido de o Sr. Ministro, com este dinheiro que tem (de facto, trata-se de um crescimento significativo, de 50%, em termos de investimento, que não vem a zeros, como a Sr.ª Deputada Margarida Botelho quer fazer crer com a sua intervenção), tentar que os cegos e amblíopes deste País tenham direito ao livro com apoio digital.
Percebo que é necessário harmonizar alguns conflitos entre editores e livreiros, mas não percebo por que é que não se conseguiu, até hoje, fazer com que esta bolsa de portugueses, tão necessitados quanto eu noutras matérias, não teve ainda direito a este livro digitalizado. O Braille já foi, o suporte áudio também e agora não se percebe, Sr. Ministro. Com este dinheiro, deve haver algum que possa ser deslocado para esta bolsa de portugueses.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem agora a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, tentarei ser breve, como aconselha a hora já avançada, relativamente às várias questões que me foram colocadas, tentando condensar o mais possível.
Sr.ª Deputada Margarida Botelho, considero extraordinário dizer que o orçamento do Ministério da Ciência e da Tecnologia não desce tanto como o dos outros Ministérios, na medida em que sobe 17,8% e, em investimento, sobe 22,3%. Portanto, do ponto de vista da ciência, não consigo compreender a pertinência do "não descer tanto". Mas é verdade que há descidas negativas que se chamam subidas.
A Sr.ª Deputada pergunta onde se discutiu esta estratégia. Bem, em primeiro lugar, na Assembleia da República, porque o Programa do Governo corresponde, exactamente, à estratégia que tem vindo a ser seguida e as Grandes Opções do Plano correspondem exactamente, todos os anos, àquilo que tem vindo a ser seguido, com pequenas correcções. É verdade que também foi discutido, longamente, durante mais de um ano, com praticamente todas as organizações do sector, quando foi preciso elaborar o programa de desenvolvimento regional nesta área e o Quadro Comunitário de Apoio, que neste momento está em debate.
Portanto, aqui não há qualquer estratégia oculta. É uma estratégia perfeitamente assumida, apresentada e sucessivamente discutida no Parlamento. Podemos discutir se ela é ou não é boa, mas que ela é discutida e que é conhecida, é!
Por outro lado, Sr.ª Deputada Margarida Botelho, confesso que não consigo segui-la quando faz o exercício da subtracção sucessiva. Se retirarmos tudo o que, nas tecnologias, diz respeito às tecnologias de informação; se retirarmos tudo o que nos recursos humanos diz respeito à formação de doutorados ou ao recrutamento de pós-doc; se retirarmos toda a divulgação científica; se retirarmos a cooperação internacional em ciência e tecnologia, ou seja, a investigação feita em cooperação internacional, e se, em cima disso, retirássemos também os projectos de investigação, suponho que ficaria mesmo zero! E teríamos feito o exercício não da subtracção mas da decomposição das partes.
Eu gostaria de deixar à Sr.ª Presidente da Comissão números que ainda não tinha quando tivemos a discussão na Comissão de Educação, Ciência e Cultura e que nessa altura anunciei que tentaria trazer aqui, quanto ao Orçamento de Ciência e Tecnologia do Estado para 2002, portanto, da totalidade dos programas e dos Ministérios. São obviamente números provisórios, mas apresento-os e deixo-os aqui, pedindo à Sr.ª Presidente da Comissão que os distribua. Poderão ocorrer correcções menores, mas imagino que as pequenas correcções menores que se façam em nada alteram, significativamente, o que aqui está.
Os critérios utilizados neste orçamento de Ciência e Tecnologia são os da OCDE e do Eurostat, na definição do que é Ciência e Tecnologia e do que é Investigação e Desenvolvimento, não foram inventados por nós.
Ora, segundo estes critérios em 1995, o Orçamento de Ciência e Tecnologia do Estado representava 1,46% do Orçamento do Estado. Este número, 1,46%, em 1995, sobe para 1,56%, em 1996; para 1,68%, em 1997; para 1,85%, em 1998; para 2,24%, em 1999; para 2,37%, em 2000; para 2,37%, em 2001, e para 2,55% em 2002. Estou a falar sempre de orçamentos iniciais e esta é a evolução.
Quando comparado com o produto interno bruto, o Orçamento de Ciência e Tecnologia do Estado passa de 0,45 do PIB, em 1995, para 0,69%, em 2002, e julgo que não vale a pena acrescentar mais nada.
A descrição detalhada, por organismos, por programas e por Ministérios, poder-se-á encontrar neste mesmo documento, que, apesar de provisório, julgo que dá uma informação mais vasta do que a do simples Ministério da Ciência e Tecnologia e gostaria de deixar esta informação.
Na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, a Sr.ª Deputada Margarida Botelho também me perguntou sobre a admissão de pessoal, quer nos laboratórios do Estado, quer noutras instituições.
Gostaria de lhe dizer que a informação prestada pelas direcções dos laboratórios do Estado para o período de 1997-2001 refere que os doutorados admitidos, com nomeação definitiva, foram 95, dos quais 84 na base da carreira de investigador auxiliar, sendo que a totalidade dos doutorados admitidos nos laboratórios do Estado é da ordem dos 143. Atenho-me, no entanto, ao primeiro número como número mais fiável em matéria de nomeações definitivas.
Também gostaria de lhe dizer o que se passa em matéria de recrutamento em termos de pós-doutoramentos. Os pós-doutoramentos são, em todos os países desenvolvidos, uma forma essencial de início de carreira após o doutoramento, praticamente em todas as áreas científicas. Neste momento, o número apurado de bolsas pós-doc em curso é de cerca de 597, das quais 419 atribuídas directamente

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pelo Ministério e cerca de 180 pelas próprias instituições científicas. Este número representa uma evolução muito significativa relativamente ao passado, sendo que há uma percentagem importante, de cerca de duas centenas, de pessoas de nacionalidade estrangeira que, em concursos públicos, concorrem a estas bolsas e estão cá. Também temos, obviamente, uma maioria de cidadãos nacionais nas nossas instituições ou ainda, alguns deles, em formação em instituições estrangeiras.
A descrição detalhada das verbas para os laboratórios do Estado encontra-se, obviamente, no orçamento do Ministério da Ciência e Tecnologia.
A Sr.ª Deputada Natalina Tavares de Moura fez-me uma pergunta sobre os cegos e amblíopes e sobre o livro digital. É uma questão importante, que já tive ocasião de discutir, em comissão, designadamente porque não está definitivamente resolvida no quadro europeu. Trata-se de uma questão que, marginalmente, diz respeito ao Ministério da Ciência e Tecnologia, na medida em que diz respeito à política do livro, e pelo facto de utilizar tecnologias digitais não deixa de ser política do livro.
A minha opinião pessoal nesta matéria, que é uma matéria muito controversa na União Europeia, é a de que é indispensável conseguir criar a situação que, hoje, já está criada, por exemplo, em algumas bibliotecas nacionais mas que não é suficiente para chegar à população com necessidades especiais, designadamente os cegos e os amblíopes. O primeiro passo é, obviamente, o de que a generalidade da população, sobretudo os cidadãos com necessidades especiais, tenham acesso às tecnologias de informação. Este passo está a ser dado também pelo meu Ministério e, aí, com um programa especial de acesso dos cidadãos considerados especiais à sociedade da informação. No entanto, não deixarei de tomar nota desta questão, como já lhe disse, e de tentar discuti-la com o meu colega do Ministério da Cultura.
O Sr. Deputado Rosado Fernandes perguntou-me sobre a investigação agrícola e sobre as pescas e devo dizer-lhe que o Ministério da Ciência e Tecnologia tem uma função de coordenação geral, não tem a tutela directa nem do IPIMAR nem do Instituto Nacional de Investigação Agrária. Tem, de facto, e teve, uma intervenção importante, nestes últimos anos, no que diz respeito à orientação de alguns programas e ao reforço de algumas capacidades quer no IPIMAR, quer no Instituto Nacional de Investigação Agrária.
Podemos discutir se esta é a melhor solução, mas o que tentámos fazer, nesta matéria, foi reforçar a capacidade científica nesta área, concentrar essa capacidade científica em objectivos que, obviamente, discutidos com as tutelas e com os próprios laboratórios, se nos afiguravam estratégicos para o País.
E gostava de deixar claro o seguinte, que é, obviamente, discutível: entendo que é indispensável que uma política científica tenha duas componentes centrais, uma de garantia da liberdade académica - a qual tem de ser assegurada, e o preço dessa garantia é a exigência de qualidade dessa liberdade académica, medida nos termos normais da comunidade científica - e uma de definição de programas orientados nos organismos públicos ou sob contrato com o Estado. É entre esses dois vectores que tem de haver um equilíbrio. Sei que existem, nalguns países, políticas mais dirigistas ou que, em determinados momentos, acentuam mais um dos pilares e políticas que acentuam mais o outro pilar. Pela minha parte, entendo que, no estado actual de crescimento e de desenvolvimento da ciência e das instituições científicas em Portugal, temos, imperativamente, de garantir ambos os pilares.
Porém, longe de mim defender que em instituições que foram criadas para fazer investigação para políticas públicas o essencial seja a liberdade académica. Claro que não é assim! Pode haver uma pequena margem de investigação estratégica livre nessas instituições, mas será uma pequeníssima margem. Reciprocamente, em instituições universitárias, não faria qualquer espécie de sentido que 90% da investigação fosse investigação orientada, tem de ser, exactamente, investigação de exploração de oportunidades, de acordo com a agenda científica das áreas. Parece-me difícil discutir, em abstracto, o equilíbrio entre estas duas tendências, pelo que terá de ser discutido caso a caso, no concreto.
No entanto, Sr. Deputado, também lhe devo dizer, com toda a franqueza, que não me coíbo de, quando há um problema ou uma oportunidade, fazer tudo o que está no meu poder para convencer a liberdade académica a seguir um determinado caminho, sem obstar a essa mesma liberdade académica.
Quando foi descoberto, num projecto de investigação, o nemátodo no pinheiro em Portugal, obviamente, o Ministério da Ciência e Tecnologia e o Ministério da Agricultura fizeram tudo o que estava no seu poder para "casar" os esforços da universidade e do laboratório do Estado na resolução do problema. E o problema foi resolvido! Poderia dar muitos mais exemplos desta natureza.
O Sr. Deputado colocou a questão dos recursos de lexicologia em Portugal, designadamente na Academia das Ciências de Lisboa. Dei uma resposta positiva e repito-a. Repito que o Dicionário de Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa foi, no que diz respeito às verbas de investimento, pago integralmente pela Fundação Gulbenkian, não por falta de oferta de financiamento do Ministério da Ciência e Tecnologia - não! - mas, simplesmente, por decisão dos seus autores e da Academia das Ciências de Lisboa. Essa oferta de apoio à lexicologia na Academia das Ciências de Lisboa está feita, está feita ao Professor Malaca Casteleiro, está feita à direcção da Academia das Ciências, no respeito, no estrito respeito, das regras de avaliação científica do financiamento público de qualquer instituição de investigação. A proposta já está feita, está garantida e aqui a repito.
Quanto às informações que me dá sobre as restrições antigas que existiam e a opacidade de fornecimento de dados do Instituto de Meteorologia a instituições de investigação, espero que esteja resolvida e agradeço que, se assim não for, me informem. A informação que tenho é a de que o problema está resolvido mas, se não estiver, agradeço que me informem. No entanto, repito, parece-me que a situação está ultrapassada e é da consciência da direcção do Instituto de Meteorologia.
Gostaria de lhe poder fornecer elementos que também recolhi sobre o esforço que existe, neste momento, de apoio ao desenvolvimento das energias alternativas, no essencial sob a égide do Ministério da Economia. Trouxe os elementos para fornecer, porque essa pergunta também já foi feita em Comissão.

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Agradeço os comentários do Sr. Deputado David Justino. Quanto ao Sr. Deputado José Carlos Lavrador, cujos comentários também agradeço, colocou-me uma questão sobre o ponto da situação da Internet nas escolas e quando se atingirá a velocidade de cruzeiro.
Sr. Deputado, os números que tenho, embora entenda que não são apenas os números que nos interessam, pois eles são apenas a base do problema - e devo dizer que acompanho este assunto, como deve compreender, praticamente, semanalmente -, apontam que, hoje, o número de escolas ligadas à Internet é de 10 158, das quais 8400 são do 1.º ciclo, 1754 são do 5.º ao 12.º ano (públicas e privadas), 181 centros de formação de professores, 312 bibliotecas, 32 museus, 97 associações e 70 outras entidades sem fins lucrativos.
Está neste momento a completar-se, e esperamos completá-la integralmente até ao final deste ano, a rede nacional de ensino, a rede nacional das instituições das escolas - e haverá sempre alterações dessa rede, porque haverá sempre escolas que se criam e escolas que se fecham e novas necessidades -, cuja dimensão e suporte são evolutivos, na medida em que ela se suporta numa rede nacional que foi criada e tem sido desenvolvida e onde houve fortíssimos investimentos para a ciência. Essa rede tem, hoje, uma largura de banda muitíssimo superior à que tinha há três ou quatro anos atrás, quer de ligações internacionais, quer de ligações nacionais, e, por outro lado, tem o suporte técnico da rede académica nacional.
Portanto, do ponto de vista do suporte técnico ao desenvolvimento da rede de conectividade das escolas, não creio que haja problemas. Aliás, temos visto que, em relação às escolas que já foram ligadas há mais tempo e que têm, neste momento, exigências de tráfego muito superiores às que tinham há três anos atrás, a estratégia que foi desenvolvida foi a de criação de redes locais nas escolas e de aumentar a sua capacidade à medida das suas necessidades, porque a pior coisa que poderia acontecer era dar capacidade que não fosse utilizada, e julgo que está provado que essa estratégia tem aguentado bem e pode aguentar ainda durante muitos anos.
A questão fundamental, a partir de agora, é aprender com a experiência dos últimos três anos, sobretudo nas escolas do 5.º ao 12.º ano, que já estão ligadas há mais de três anos e onde há hoje uma experiência muito rica e muito diversificada.
A posição do Ministério da Ciência nesta matéria tem sido a seguinte: em primeiro lugar, defender e garantir a conectividade não comercial da totalidade do sistema de ensino, de investigação e as associações culturais em Portugal; conseguir criar condições negociais com as operadoras de telecomunicações para que cada um dos utentes não tenha de gerir uma negociação para a qual estaria, necessariamente, muito fragilizado e garantir, em contrapartida, que se trata de uma rede sem fins lucrativos; garantir, simultaneamente, as alianças e a evolução da política europeia que nos permitam garantir conectividade internacional a preços acessíveis e em condições técnicas acessíveis. Foi isto que se conseguiu.
Do ponto de vista da estratégia relativamente a conteúdos, o Ministério da Ciência e Tecnologia tomou a posição de encorajar o mais possível, em parte com o Ministério da Educação, no que diz respeito aos programas do Ministério da Educação, em parte no que diz respeito à sua própria política científica, não só a criação de conteúdos mas também o desenvolvimento de projectos, designadamente de projectos de relação entre as instituições científicas e as escolas.
Portanto, não consideramos a Internet nem como uma questão separada nem como uma questão técnica. O que me parece essencial é que as pessoas, nas mais variadas áreas das ciências, nas escolas, possam utilizar a Internet para contactar com quem sabe mais de ciência, com bancos de dados de ciências, com os cientistas, em projectos.
Houve uma questão pioneira que entendemos ser nossa obrigação desencadear, na área da política para a sociedade da informação, pelo carácter exemplar que poderia ter, que foi o desenvolvimento de capacidades de escrita na Internet. As capacidades de escrita exigem ainda algum know-how específico, mas exigiam mais há três anos do que hoje - o software não é tão transparente como todos gostaríamos -, uma vez que não é a mesma coisa escrever um jornal escolar à máquina e passá-lo a copiógrafo e escrevê-lo em computador.
Obviamente, é mais fácil fazê-lo em computador, mas é preciso saber alguma coisa. Esse trabalho foi desenvolvido essencialmente a pretexto da participação portuguesa na feira internacional de Hanôver, envolveu umas largas centenas de escolas portuguesas e o resultado, aliás, foi publicado na Internet.
Quanto aos passos seguintes e à pergunta precisa que me fez, procurando saber quando é que isto entra em "velocidade de cruzeiro", tenho de lhe dizer que se a "velocidade de cruzeiro" significar cruzarmos os braços, dizendo que não temos nada a ver com a rede, penso que não chegaremos a esse ponto. Para nós, a "velocidade de cruzeiro" será ter uma actividade crescente, mas ter a rede constituída, o que acontecerá no final deste ano.
Perguntar-me-á: "E a seguir a isso, como é que se fará a articulação dessa rede com os municípios, com as autoridades académicas, com os sistemas de formação de professores, etc.?". Pois bem, estão postas no terreno as condições para esse desenvolvimento, que, em grande parte, se está a fazer. Dou-lhe um exemplo, pedindo desculpa por vos demorar mais um pouco com isto. A ligação das escolas do 1.º ciclo foi feita através de um protocolo com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, em que uma pequena percentagem do investimento é dos municípios mas em que a maioria, designadamente a totalidade do tráfego, é garantido pelo orçamento do Ministério da Ciência e da Tecnologia. Neste momento, contudo, muitíssimos municípios - e eu assisti a vários exemplos concretos - têm rotinas de participação de professores, dos vereadores responsáveis e de técnicos responsáveis pelo pelouro da educação para assegurar a troca de experiências entre professores dos diferentes graus de ensino no uso da rede. Cada vez mais a rede material ou virtual da Internet serve para apoiar a rede real das pessoas na troca de experiências sobre o que realmente conta, que é a maneira como ensinam, como se aprende, como se gere a escola, etc.
Creio que, por outro lado, a apropriação da Internet pelos estudantes criou, obviamente, um desafio às escolas, aos professores e aos pais. Mas esse desafio é bom, porque aumenta a capacidade de escrita, obriga a que se discutam os conteúdos, interessantes ou não, e, em última análise, obriga a que se faça educação. É a contribuição

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que, na nossa esfera de capacidades, entendemos dar nesta matéria para o desenvolvimento da educação em Portugal, tal como estamos a fazer na área da divulgação científica e do desenvolvimento da ciência.
Para que não fiquem dúvidas, gostava ainda de deixar claro que considero, e estou seguro que a Sr.ª Deputada me acompanha, que as relações entre a ciência e o cidadão, designadamente nas escolas, e que a promoção da cultura científica das pessoas não está separada das actividades de base para a criação de condições de investigação em Portugal. Se Portugal tem hoje muitos jovens que querem fazer ciência e que vão para cursos de natureza científica, é também porque existe uma sensibilização geral para a ciência, ao contrário do que acontece com grande parte dos países europeus, que, segundo dizem, se debatem com problemas gravíssimos de falta de vocações na área da ciência e da tecnologia. Se Portugal tem hoje uma posição exemplar no que respeita à participação de mulheres na ciência, é também porque, como ensinam os livros, a participação em actividades de natureza científica de rapazes e raparigas muito novos se amplificou muito neste momento, o que não cria esta ideia de que as ciências são para uns e não para outros. Creio que neste caminho há, obviamente, muito para fazer, pelo que nunca me ouvirão dizer que está tudo feito ou que a situação portuguesa é óptima - não é! De facto, a situação portuguesa é de enorme atraso estrutural, já que a comunidade científica que temos hoje em Portugal é, no seu essencial, na sua parte produtiva, extremamente nova em relação aos padrões internacionais, faltando-lhe um conjunto de gerações que a história portuguesa não produziu como devia ter feito, numa altura em que não havia liberdade ou investimento nesse sector.
Estamos com elevadíssimas taxas de crescimento em relação a todos os outros países, e ainda bem, porque tal significa que estamos em convergência real com o resto da Europa. É verdade! Essa convergência real não é partilhada com a generalidade dos países que estão mais abaixo nessa "cauda", mas é partilhada com alguns dos países de maior desenvolvimento, como a Finlândia ou a Irlanda, por exemplo. Contudo, tenho consciência de que tal não chega e tenho consciência de que, com este ritmo de crescimento, atingiremos em cinco, seis anos os níveis médios de capacidade científica humana em Portugal. Todavia, porque faltam todas as gerações para trás, não é só com este ritmo de crescimento que atingiremos a penetração da ciência e tecnologia em todo o tecido social económico, já que esta exige, obviamente, muito mais pessoas do que as que temos e pessoas com muito mais experiência, facto para o qual precisaremos de mais alguns anos.
Terminaria dizendo que o crescimento da investigação e desenvolvimento das empresas é, naturalmente, um dos pontos críticos desta problemática. Na semana passada tiveram lugar as Jornadas da Inovação, na Exponor, no Porto, e aí houve ocasião de mostrar resultados, ou seja, de mostrar o que tinha acontecido com os projectos de investigação feitos em consórcio, isto é, financiados por concurso, pelo Ministério, e executados por empresas, que os lideraram, e por universidades. Tivemos, portanto, ocasião de ver quais eram os resultados desses projectos, que, em boa verdade, já não são resultados, mas, sim, nalguns casos, protótipos, produtos de mercado ou processos comercializados. É preciso não esquecer, no entanto, que, obviamente, alguns deles sentem enormes dificuldades para chegar ao mercado internacional, para ultrapassar as empresas do mercado ibérico, etc.
De facto, o segundo texto que gostaria de deixar à Sr.ª Presidente, pedindo-lhe o favor de o distribuir aos Srs. Deputados, é o catálogo desses projectos que são resultados, porque considero que este é um elemento de avaliação pública na área da investigação empresarial, permitindo-nos aferir aquilo que está a ser feito, aquilo que de bom se fez, aquilo que de menos bom se conseguiu, mas, em suma, aquilo que o País está a progredir nesta matéria.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr.ª Presidente, eu não quero atrasar mais os nossos trabalhos, mas coloquei uma questão a que o Sr. Ministro se esqueceu de responder e que era relativa às verbas que existem para as linhas de apoio à inserção profissional dos investigadores.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia.

O Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia: - Por estranho que lhe pareça, Sr.ª Deputada, eu dei-lhe essa resposta na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, mas volto a repetir-lha aqui.
No documento que lhe distribuí, a rubrica orçamental que se refere a este assunto é aquela que fala da formação e da inserção. Por sua vez, a verba que lá está é, muito simplesmente, aquela que for necessária, porque, ao contrário do que possa imaginar, as verbas necessárias para a inserção são, neste momento, escassíssimas e reduzidíssimas quando comparadas com as verbas de formação. É que estamos a falar de 400 ou 500 pós-doc em Portugal, dos quais 200 ou 300 são estrangeiros, mas estamos a falar de 5000 bolseiros no total, o que quer dizer que estamos a falar de, pelo menos, 4000 bolseiros de doutoramento. Tal significa que estamos longíssimo de atingir qualquer patamar financeiro no que respeita à inserção, ou seja, para pôr isto "preto no branco", nenhum doutorado de qualidade será recusado por razões financeiras pelo nosso sistema científico.

A Sr.ª Presidente: - Não havendo mais pedidos de esclarecimento, agradeço ao Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia a sua colaboração com a nossa Comissão.
Lembro aos Srs. Deputados que recomeçaremos os nossos trabalhos amanhã, às 10 horas, para discutir, na especialidade, o orçamento do Ministério do Planeamento.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 20 horas e 55 minutos.

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