O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Terça-feira, 23 de Fevereiro de 2010 II Série-OE — Número 7

XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)

COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS

Reunião de 22 de Fevereiro de 2010

SUMÁRIO O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto) declarou aberta a reunião às 9 horas e 42 minutos.
Prosseguiu o debate, na especialidade, da proposta de lei n.º 9/XI (1.ª) — Orçamento do Estado para 2010, tendo a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território (Dulce Pássaro) apresentado o orçamento do seu Ministério.
O Sr. Deputado Miranda Calha (PS), na qualidade de Presidente da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, a propósito da intempérie que assolou a Região Autónoma da Madeira, solidarizou-se com os habitantes daquele território e manifestou pesar pelas vítimas, tendo a Comissão guardado 1 minuto de silêncio.
Seguidamente, a Sr.ª Ministra respondeu às questões que lhe foram colocadas pelos Srs. Deputados José Eduardo Martins (PSD), Renato Sampaio e João Sequeira (PS), Artur Rêgo (CDS-PP), Rita Calvário (BE), Miguel Tiago (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), António Cabeleira (PSD), Glória Araújo (PS), Paula Santos (PCP), Fernando Marques (PSD), Jorge Manuel Gonçalves (PS), Agostinho Lopes (PCP), Luísa Roseira e António Leitão Amaro (PSD), Jamila Madeira (PS) e Antonieta Guerreiro, Maria Conceição Pereira e Paulo Cavaleiro (PSD).
Sobre o orçamento do Ministério da Educação, a Sr.ª Ministra (Isabel Alçada) e os Srs. Secretários de Estado

Página 2

2 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Adjunto e da Educação (Alexandre Ventura) e da Educação (João Trocado da Mata) responderam às questões que foram colocadas pelos Srs. Deputados Amadeu Soares Albergaria (PSD), Bravo Nico (PS), Michael Seufert (CDSPP), Ana Drago (BE), Miguel Tiago (PCP) — que também exerceu a figura regimental do protesto —, João Prata (PSD), Rosalina Martins (PS), Rita Rato (PCP), Margarida Almeida (PSD), Maria Luísa Santos (PS), Agostinho Lopes (PCP), Vânia Jesus (PSD), Odete João (PS), Bruno Dias (PCP), Raquel Coelho (PSD), Paulo Barradas (PS), Antonieta Guerreiro (PSD), Teresa Venda (PS), Paulo Cavaleiro (PSD), João Sequeira (PS) e Emídio Guerreiro (PSD).
Sobre o orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, o Sr. Ministro (Mariano Gago) deu resposta a questões que foram colocadas pelos Srs. Deputados José Ferreira Gomes (PSD), Bravo Nico (PS), Michael Seufert (CDS-PP), José Moura Soeiro (BE), Miguel Tiago (PCP), Pedro Saraiva (PSD), Teresa Damásio (PS), Rita Rato (PCP), Emídio Guerreiro (PSD), Sofia Cabral (PS), Vânia Jesus (PSD), Agostinho Lopes (PCP), Nuno Miguel Araújo (PS), Bruno Dias (PCP), Carla Rodrigues (PSD) e Manuela Melo (PS).
O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte) encerrou a reunião eram 22 horas e 30 minutos.

Página 3

3 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 9 horas e 42 minutos.

Quero começar por cumprimentar a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território, o Sr.
Presidente e os Deputados da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, os Deputados da Comissão de Orçamento e Finanças e agradecer-lhes a sua presença.
Vamos dar início a esta audição, de discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, conforme previsto no artigo 211.º do Regimento.
Para tal, vamos seguir a grelha de tempos acordada, que prevê uma intervenção inicial da Sr.ª Ministra, até 20 minutos, seguindo-se uma primeira ronda com intervenções e perguntas até 8 minutos, uma segunda ronda com perguntas até 5 minutos e uma conclusão.
Sem mais, passo a palavra à Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território para proferir a sua intervenção inicial.
Faça favor, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território (Dulce Pássaro): — Muito obrigada, Sr.
Presidente, e bom dia a todos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma breve apresentação da proposta de orçamento do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território para o ano de 2010, procurando sistematizar alguma informação para que, depois, possamos debater, com mais eficácia, o documento.
A despesa consolidada inscrita no Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território (que passarei a designar por MAOT) é de 706,3 milhões de euros e está distribuída por funcionamento e por PIDDAC (Programa de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central) — investimento, portanto.
A despesa de funcionamento é de 431,4 milhões de euros; a despesa de PIDDAC é de 283 milhões de euros. Refiro que representa 10% do PIDDAC global do Orçamento do Estado e tem um incremento de 12,5 milhões de euros face ao Orçamento do Estado de 2009.
As fontes de financiamento para a componente de funcionamento são as seguintes: receitas gerais, 108 milhões de euros, e outras fontes, designadamente receitas próprias, no valor de 323,4 milhões de euros.
Penso que é sabido que, nessas receitas próprias, se incluem a taxa dos recursos hídricos (TRH), a taxa de gestão de resíduos (TGR), portanto, as taxas da ERSAR, a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos, IP (ERSAR, IP), enfim, várias receitas próprias. Em suma, como referi, o funcionamento tem um total de 431,4 milhões de euros.
Relativamente ao PIDDAC, as fontes de financiamento são as seguintes: 87 milhões de euros de receitas gerais e também há receitas próprias. Refiro, a título de exemplo, as dotações do Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu, que é um fundo EFTA e, obviamente, como já referi, as taxas atrás mencionadas de gestão de resíduos e de recursos hídricos também alimentam esta componente. Depois, temos o financiamento comunitário, no valor de 101,9 milhões de euros.
A componente PIDDAC investimento, do MAOT, está estruturada nas medidas de programa descritas no Mapa XV do Orçamento do Estado. Como mais relevantes em termos de quantitativos, destaco a Medida 030 — Habitação e Serviços Colectivos — Habitação, que tem inscrita uma verba de 112 milhões de euros, essencialmente, mas não só, gerida pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, IP (IHRU) e outra medida, também com relevância em termos quantitativos, que é a Medida 033 — Habitação e Serviços Colectivos-Protecção do Meio Ambiente e Conservação da Natureza, que tem uma verba de 97,7 milhões de euros. A primeira medida representa cerca de 40% do PIDDAC do MAOT e a segunda medida cerca de 35%.
Nesta Medida 033, de Protecção do Meio Ambiente e Conservação da Natureza, estão inscritos, essencialmente, os investimentos do Instituto da Água (INAG), do Instituto da Conservação do Ambiente e Biodiversidade (ICNB), das administrações das regiões hidrográficas (ARH).
Gostaria, já agora, de dizer o seguinte: o aumento do PIDDAC tem essencialmente a ver não com as dotações directas (que, como sabem, diminuíram) do Orçamento do Estado, directas, mas com o aumento de financiamento comunitário, que passa de 95,3 milhões de euros para 101,9 milhões de euros e com o facto de

Página 4

4 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

a componente de reabilitação do parque habitacional do IHRU, que anteriormente estava inscrita em funcionamento, ter passado para o PIDDAC.
Dito isto, farei uma breve passagem pelas prioridades políticas.
A proposta de orçamento, como não podia deixar de ser, tem em conta o Programa de Governo e as respectivas prioridades. Como prioridades, aponto as seguintes: a gestão do litoral; a conservação da natureza; a política de cidades e habitação; a gestão de resíduos; a gestão dos recursos hídricos; o abastecimento de água e saneamento de águas residuais (que eu inscrevo como prioridade, embora não tenha expressão no Orçamento do Estado); e a temática das alterações climáticas, essencialmente através das dotações para o Fundo Português de Carbono.
Detalhando um pouco o caso do litoral, temos inscritos 43,7 milhões de euros. Como sabem, o litoral tem um plano de acção aprovado para o período de 2007-2013 (Plano de Acção para o Litoral 2007-2013), que está, aliás, em fase de revisão e prevê acções prioritárias em dois grandes grupos: prevenção de risco potencial para as pessoas e bens e valorização das áreas costeiras.
O investimento a efectuar nesta área do litoral será mais elevado do que estes 43,7 milhões de euros, uma vez que diversas autarquias também levarão a efeito importantes investimentos no âmbito da execução dos planos de ordenamento da orla costeira (POOC). As sociedades Polis, que também não têm aqui visibilidade, realizarão obras importantes no âmbito dos seus planos estratégicos. E as próprias ARH executarão obras, nomeadamente recorrendo ao Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos, que tem dotação para acudir a algumas realizações no litoral.
O litoral, como sabem, carece permanentemente de intervenção, seja em situações estabilizadas — há intervenções que estão previstas e devidamente alocadas aos vários serviços — seja em intervenções de emergência, como este ano bem tem mostrado.
A propósito, ainda, do litoral, penso que os Srs. Deputados têm a noção de que, no ano 2010 continuarão em execução as quatro intervenções Polis Litoral, como referi, cujos valores de investimento não têm tradução no Orçamento do Estado, uma vez que as entidades promotoras são as sociedades mistas Estado-autarquias.
Para essas sociedades Polis prevê-se, para 2010, um investimento total de 53,1 milhões de euros, distribuídos pelo Polis Litoral Norte, pelo Polis Ria de Aveiro, pelo Polis Litoral Sudoeste e pelo Polis Ria Formosa.
Passarei, agora, a abordar outra área importante de prioridade, a conservação da natureza, referindo, já agora, que muitos dos investimentos que são feitos no litoral incidem na conservação da natureza, como é facilmente compreensível.
Para além destas iniciativas para a conservação da natureza, está previsto um valor de 9,8 milhões de euros de investimento, tendo inicialmente a ver com a consolidação do Plano de Acção para a conservação do Lince Ibérico e para outras acções com vista à protecção de espécies protegidas ou ameaçadas. Está também previsto proceder ao alargamento da Rede de Áreas Marinhas Protegidas, concretizando a extensão da Rede Natura 2000 ao meio marinho, a promoção de novas áreas locais, regionais e privadas, e a sua integração na Rede Nacional de Áreas Protegidas e a continuação de investimentos na prevenção de fogos florestais e da recuperação de zonas ardidas.
Por outro lado, as áreas protegidas serão dotadas de mais meios de vigilância e de primeira intervenção.
Evidentemente, não posso deixar de salientar que inscrevemos também uma acção específica sob o «chapéu» do Ano Internacional da Biodiversidade que este ano se celebra. O Ministério considera prioritário acompanhar todas as suas realizações a nível internacional, e com reflexo também a nível nacional.
Relativamente à política de cidades e habitação, temos inscrita uma verba de 262,9 milhões de euros.
Nesta vertente, eu diria que a componente mais representativa tem a ver com o crédito a conceder pelo IHRU para realojamento e reabilitação das edificações do ex-IGAPHE — Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado. Por outro lado, além de todo esse parque habitacional do ex-IGAPHE, que carece de reabilitação, e para além do financiamento à habitação social, portanto, com rendas controladas, há que destacar o apoio à iniciativa Bairros Críticos, com a qual penso que também estão familiarizados. Em concreto, trata-se do Vale da Amoreira, do Lagarteiro e da Cova da Moura, nos quais têm sido desenvolvidas diversas iniciativas tendentes à sua recuperação, iniciativas concretas de recuperação de património habitacional mas também de recuperação e regeneração de áreas públicas e de investimento em iniciativas diversas no domínio do social e do cultural para ancorar as populações daquelas regiões e permitir a sua integração.

Página 5

5 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Ainda a propósito da política de cidades e habitação, refiro que, adicionalmente a estes montantes que estão inscritos no orçamento do MAOT, também estão aprovados no QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional) cerca de 800 milhões de euros para os POLIS XXI até 2013. Essas verbas destinar-seão, essencialmente, ao estabelecimento de parcerias para a regeneração urbana, redes urbanas, competitividade e inovação. Enfim, há toda uma política no âmbito das cidades e habitação que tem de ter uma expressão muito significativa em termos do orçamento do MAOT.
Relativamente aos resíduos, apesar de a verba inscrita no orçamento do MAOT não ser muito expressiva — é de apenas 1,4 milhões de euros —, importa referir que, complementarmente, vão ser seguidas e dinamizadas acções diversas, quer pela APA (Autoridade Nacional de Resíduos) quer pelas comissões de coordenação regional, que são as autoridades regionais de resíduos.
Portanto, estes importantes organismos do Ministério do Ambiente têm um vasto conjunto de tarefas a desenvolver no sentido de uma consolidação adequada da política de gestão de resíduos em estreita articulação com as políticas comunitárias, das quais destaco as seguintes: a execução da estratégia para os CDR; a promoção da utilização do composto derivado de resíduos urbanos; a promoção de concursos para a atribuição de verbas da taxa de gestão de resíduos para projectos de gestão de resíduos; a operacionalização do mercado organizado de resíduos; a continuação da correcção de situações ilícitas na gestão de resíduos e a erradicação de depósitos ilegais de veículos em fim de vida; e a prossecução do Plano de Prevenção de Resíduos Urbanos.
Enfim, para além destas tarefas desenvolvidas por estes organismos, refiro que a política de gestão de resíduos no nosso país é também muito assegurada e concretizada pelos sistemas de gestão de resíduos, dos quais dou destaque aos sistemas que são maioritariamente detidos pela Empresa Geral de Fomento, que têm inscrita uma verba para investimento de 136 milhões de euros para este ano, bem como pelos outros sistemas de titularidade municipal, relativamente aos quais não disponho de números, mas que estão no terreno a fazer obras complementares tendentes à implementação das políticas de gestão de resíduos no nosso país, e ainda, como é óbvio, os privados, que são fundamentais.
Como sabem, se há sector no nosso país que muito tem contado com a participação do sector privado é a área da gestão dos resíduos os urbanos e não urbanos.
Relativamente aos recursos hídricos, temos inscrita uma verba de 52,5 milhões de euros, essencialmente para a execução dos Planos de Gestão de Região Hidrográfica que as ARH estão a desenvolver, designadamente: protecção e valorização dos recursos hídricos, projectos de controlo de cheias e secas, projectos de prevenção de riscos, planos de gestão de estuários, continuação da implementação do Programa Nacional de Barragens, a adopção de um conjunto de medidas que está rotinizado para a segurança das barragens, para o reforço da rede de monitorização ecológica, da qualidade ecológica das águas.
Portanto, continuam a ser variadas as iniciativas que cabem neste grande «chapéu» dos recursos hídricos.
Já agora, embora não seja um projecto que se inscreva apenas sob o grande item dos recursos hídricos, gostava de fazer referência ao projecto do Arco Ribeirinho Sul, que apesar de não ter expressão no Orçamento do Estado é um projecto importante que terá repercussões positivas na gestão dos recursos hídricos da zona sul do estuário do Tejo e, obviamente, também em termos de ordenamento do território, de requalificação urbana e ambiental.
Sobre o abastecimento de água e saneamento, como sabem, embora continuando a ser uma área de prioridade política do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, ela não tem grande expressão, mas, naturalmente, há sempre necessidade de acompanhamento da implementação destas políticas: há organismos especialmente vocacionados para o acompanhamento destas políticas de água e saneamento.
Refiro-me, por exemplo, ao AER ou à SARC, que têm um papel fundamental em termos da consolidação deste sector.
Destacaria que este sector, em termos de investimento, está essencialmente ligado aos investimentos do Grupo AP (Águas de Portugal), e estão previstos investimentos de cerca de 394 milhões de euros neste domínio.
Finalmente, sobre a temática das alterações climáticas, como também é sabido, está inscrita no orçamento do MAOT uma verba de 53,1 milhões de euros para o Fundo Português de Carbono, que se destina, tal como já tivemos oportunidade de referir em sessões anteriores, à aquisição de créditos de reduções de emissões, investimentos noutros fundos de carbono e apoio a projectos domésticos para a redução de emissões.

Página 6

6 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Também é sabido que o Orçamento do Estado para 2010 aprofunda a reforma fiscal ambiental, que foi iniciada com a reforma do imposto automóvel, numa lógica de neutralidade fiscal, continuando — como, aliás, deve ser — a desonerar os produtos e serviços relevantes para a eficiência energética, para as energias renováveis, para o ambiente em geral, e onerando as actividades e produtos que são ambientalmente insustentáveis, poluentes ou ineficientes.
Informo também que no ano de 2010 será operacionalizada a utilização do Fundo de Intervenção Ambiental.
Dito isto, estou à disposição dos Srs. Deputados para responder às questões que me queiram colocar.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Antes de prosseguir, e dado que estão mais Deputados presentes, não quero deixar de recordar que esta é a primeira reunião da Comissão de Orçamento e Finanças — penso que é mesmo a primeira reunião que tem lugar na Assembleia da República — depois dos acontecimentos trágicos que se verificaram na Região Autónoma da Madeira, que chocaram e consternaram a todos.
A esse propósito, o Sr. Presidente da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Deputado Miranda Calha, irá usar da palavra.

O Sr. Miranda Calha (PS): — Srs. Deputados, precisamente na sequência das palavras do Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, desejaria propor aos Deputados aqui reunidos, quer da Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local quer da Comissão de Orçamento e Finanças, que pudéssemos manifestar, em função dos graves acontecimentos que tiveram lugar na Região Autónoma da Madeira, em primeiro lugar, a nossa solidariedade para com as populações da Região Autónoma da Madeira e naturalmente, também, para com os órgãos institucionais da Região, quer o Governo Regional quer a Assembleia Legislativa.
Em segundo lugar, desejava apresentar o nosso pesar e as nossas condolências aos familiares de todos aqueles que foram vítimas destes acontecimentos, que, de facto, assumiram uma gravidade ímpar na Região Autónoma da Madeira.
Queria, por isso, não só formular este voto e estas considerações em nome da Comissão de Ambiente e da Comissão de Orçamento e Finanças, como propor 1 minuto de silêncio pelos trágicos acontecimentos e, em especial, pelas vítimas.

A Comissão guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

O Sr. Presidente: — Iremos, agora, prosseguir com o debate. Nesta primeira ronda de perguntas, seguindo a regra da rotatividade, primeiro usará da palavra o PSD, que dispõe de 8 minutos para o efeito.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, queria, antes de mais, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, agradecer-vos a iniciativa que acabam de ter e à qual nos associamos com muita dor e luto, e sobre a qual as palavras não acrescentam verdadeiramente nada.
Muito obrigado pela vossa iniciativa.
Sr. Ministra, muito obrigado pelas suas longas explicações. Não quero deixar de me pronunciar e de a questionar sobre várias das matérias que enunciou, mas queria fazer, antes de mais, uma pequena introdução ao que de mais importante nos convoca para uma discussão do sector do ambiente no Orçamento do Estado de um ano tão especial como é o de 2010.
Portugal recebeu de chofre uma crise internacional, porque estava bastante menos preparado do que outros, que gerou no País uma taxa de desemprego superior a 10%. Estamos com um endividamento que todos consideram para lá de record, muitíssimo preocupante para o futuro das nossas contas públicas, com uma actividade económica estagnada e um Governo que «grita» por Santa Bárbara depois da tempestade! Ora, em relação à execução do QREN, esse volume brutal de ajudas estruturais de quase 4% do PIB que a União Europeia nos faculta há quase 20 anos para prosseguirmos o objectivo da convergência, que sempre falhámos, disse-nos o Ministro da Economia no debate do Orçamento do Estado (sem sequer acertar nos

Página 7

7 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

números que o seu próprio Ministério disponibiliza online) que boa parte da incapacidade de execução do Quadro de Referência Estratégico Nacional vem da incapacidade de as empresas terem liquidez para acompanhar a contrapartida nacional na execução do QREN.
Ora, com tanta discussão que tivemos no passado recente sobre investimento público e sobre a utilidade, a reprodutibilidade e o efeito na economia do investimento público, a primeira coisa que, em nome do PSD, lhe dizemos esta manhã, Sr.ª Ministra, é que gostaríamos de ver mais investimento público na área do ambiente e menos investimento público não reprodutivo em várias outras áreas do Orçamento do Estado. Nessa medida, temos pena que algumas destas prioridades não sejam verdadeiras prioridades.
De facto, a crise parece sempre melhorar os indicadores ambientais: quando as empresas não produzem, há menos resíduos para tratar; quando as empresas não produzem, há menos emissões de carbono. E a verdade é que todos os indicadores positivos do ambiente nos últimos tempos vêm, infelizmente, menos de alguma acção pró-activa que tenha mudado o que quer que seja e mais, isso sim, da estagnação económica.
Contudo, não deixamos de, com o ambiente, gerar emprego, emprego para o futuro, e desenvolver em Portugal uma actividade empresarial e industrial de futuro e daquele século XXI da inovação em que queremos estar.
Ora, o que nos preocupa — e essa é a primeira grande nota sobre este orçamento para o ambiente — é que, numa altura em que as empresas não dão trabalho ao sector do ambiente instalado, num País que tem tantos e tão graves passivos ambientais, não se vê aqui um esforço de investimento público para que o sector continue a ser pujante e sustentável na actividade económica.
Quando se tem um País com tanto passivo ambiental na área dos resíduos e onde se estimulou a instalação de tanta capacidade de tratamento, tem-se 1,4 milhões de euros para a política de resíduos, considerando-se isto uma prioridade!» Sr.ª Ministra, desculpará, mas 1,4 milhões de euros revela que isto não é prioridade coisa nenhuma! Esta é a nossa primeira preocupação, eventualmente mais dirigida ao Primeiro-Ministro e ao Ministro de Estado e das Finanças do que à Sr.ª Ministra do Ambiente, mas não deixamos de querer ouvir a sua opinião sobre isto. Este não é um orçamento de investimento público nesta área, que é reprodutiva, que gera emprego e capacidade de inovação nas empresas portuguesas e até capacidade de exportação.
A segunda nota de carácter geral tem que ver com a muito certeira entrevista que a Sr.ª Ministra deu em Dezembro, em que disse que o seu mandato tem de ser essencialmente de concretização do que foi aprovado.
Se eu tivesse menos uns anos ou se fosse do Partido Ecologista «Os Verdes» — com todo o respeito, claro está — hoje não teria resistido à tentação de lhe trazer todo o papel que o seu antecessor produziu.
Poria aqui, em cima da mesa, uma pilha de volumes, o que não deixaria que a Sr.ª Ministra me visse, apesar de eu não ser muito baixo, de milhares, milhares e milhares de páginas. É que o seu antecessor foi verdadeiramente o Gutenberg do ambiente: escreveu, imprimiu, imprimiu, imprimiu, imprimiu, imprimiu» Mas todas as estratégias, diz-nos agora V. Ex.ª, é a Sr.ª Ministra que vai executar.
Sr.ª Ministra, por muito que estimemos — e estimamos — um grande acréscimo de capacidade com a sua entrada no Ministério, não é possível executar a partir de agora, depois de quatro anos a pensar, num ano só, a Estratégia Nacional para os Efluentes Agro-Pecuários e Agro-Industriais (ENEAPAI), a estratégia do litoral, o Plano Estratégico de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas Residuais (PEAASAR), o Plano Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos (PERSU), a estratégia disto, daquilo e daqueloutro. Porque, basicamente, a maior parte destas coisas, como a sua intervenção acabou de reconhecer e como o próprio orçamento reconhece, são apenas e só papel.
Ora, quatro anos a planear foi um bocadinho demais, e não queremos cometer a injustiça de esperar que tudo execute de uma vez, mas a Sr.ª Ministra falou — e entro agora apor aí — em três ou quatro áreas prioritárias na política do Ministério para este ano. Sobre essas três ou quatro áreas prioritárias há algumas delas sobre as quais não podemos deixar de conversar. A primeira delas refere-se ao litoral.
Sr.ª Ministra, entendamo-nos: não há — não sejamos maniqueístas, é uma tentação de todos os ministros do ambiente — ministro do ambiente, há mais de 15 anos, que tome posse e que não tenha como prioridade o litoral. Sr.ª Ministra, essa é que é essa! O Primeiro-Ministro deste e do anterior Governos, quando era ministro do ambiente — como estamos recordados, pelo menos os mais veteranos da Casa —, fez uma quantidade de capas simpáticas no Expresso

Página 8

8 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

a dizer que ia ordenar o litoral, criar a agência do litoral, impedir a construção nas zonas de risco, demolir o que havia para demolir. Sr.ª Ministra, não vai repetir-nos mais do mesmo! Só acreditamos que o litoral é prioridade política se fizer o favor de detalhar um bocadinho mais o que vai acontecer, para lá da execução ou da revisão de alguns planos de ordenamento da orla costeira (POOC). É que, nos últimos quatro anos, tudo aquilo que há para dizer sobre o litoral — e em alturas de catástrofe há sempre uns profetas da véspera que têm sempre muita coisa para dizer — está previsto, planeado e pensado fazer há muito tempo, mas pura e simplesmente não acontece.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, dispõe de 1 minuto.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
E não acontece porque, entre outras coisas, estão aqui previstos 43,7 milhões de euros. Ora, sabendo que o seu antecessor, só a pôr areia na Costa da Caparica, gastou 15 milhões de euros, manifestamente a Sr.ª Ministra não vai dizer-nos que este valor é adequado àquilo que o País precisa.
Dos resíduos já falei e não vou falar muito mais. Neste minuto de que disponho vou aproveitar para me centrar no tema da água, voltando ao tema do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN).
Tal como a Sr.ª Ministra anunciou, e sabemos que está fora do orçamento, este é, porventura, o maior desafio de mobilização de recursos do Programa Operacional Valorização do Território, constituído pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) e pelo Fundo de Coesão, portanto, apenas de iniciativa pública — não venham aqui culpar os empresários de ele não estar executado —, a meias entre o Ministério das Obras Públicas e o Ministério do Ambiente. Ora, o Ministério do Ambiente pura e simplesmente não executou a sua parte até hoje, Sr.ª Ministra, e essa é a realidade. A Águas de Portugal não tem estado a cumprir o seu papel.
O PEAASAR prevê, essencialmente, um modelo de verticalização dos sistemas. Na teoria, independentemente da titularidade do investimento — sobre a qual divergiremos, com certeza — e da maneira como ele deve ser conduzido, a verticalização dos sistemas, por aquilo que induz de economia de escala e de racionalidade da gestão, não é em si, porventura, má ideia, mas é uma ideia não concretizada, Sr.ª Ministra.
Portanto, quando falamos, para o ano, de um investimento de 394 milhões de euros estamos, mais uma vez, a admitir uma execução paupérrima do Quadro de Referência Estratégico Nacional nesta matéria.
As perguntas que lhe coloco são estas, Sr.ª Ministra: que sistemas vão avançar? O que é que a Águas de Portugal vai fazer em 2010? Que novos sistemas de gestão de água vai criar? Destes 394 milhões de euros, quanto é do QREN e quanto é de contrapartida nacional da Águas de Portugal, recorrendo, naturalmente, aos empréstimos do Banco Europeu de Investimentos (BEI), como de costume? O que é que, de facto, vai acontecer neste sector de infra-estruturação básico essencial que não está cumprido?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, não posso deixar de fazer também um comentário ou outro antes de procurar responder às questões que colocou.
É certo que a crise, do ponto de vista ambiental, pelo menos nalgumas áreas, contribuiu para melhorar os indicadores: produzem-se menos resíduos, há menos emissões. Tem havido melhorias significativas nestes indicadores, claramente comprováveis, mesmo antes da crise, portanto, há uma estratégia de melhoria que tem vindo a consolidar-se.
Relativamente à questão dos passivos ambientais — e pensando que está a referir-se, por exemplo, a minas, que têm passivos acumulados, ou a zonas industriais abandonadas —, estão previstos variadíssimos investimentos neste âmbito. Para esses investimentos estamos a contar com verbas do Programa Operacional Valorização do Território e receitas próprias, provenientes do orçamento mas essencialmente ligadas ao fundo de gestão de resíduos, ao Fundo de Intervenção Ambiental. Assim, esses instrumentos vão permitir-nos assegurar a contrapartida nacional de um conjunto de iniciativas inscritas no POVT (Programa Operacional

Página 9

9 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Valorização do Território) para recuperação de passivos ambientais, que têm a ver, por exemplo, com a tentativa de, finalmente, acabar com aquela situação de Alcanena.
Quando comecei a trabalhar na área do ambiente já se falava de Alcanena. Primeiro, era Alcanena relacionada com rejeições de águas residuais; mais tarde, começou a ser Alcanena relacionada também com rejeição dos resíduos dos curtumes; e, depois, recuperação das próprias zonas onde inadequadamente todas essas rejeições foram sendo depositadas. Aliás, tenho a dizer que foi com alguma surpresa que, quando estávamos a preparar a nossa proposta de orçamento, me dei conta que esta é uma área que está em vias de finalização, tendo eu pensado que era uma matéria já ultrapassada.
Portanto, temos inscritos um projecto para a reabilitação da célula de lamas não estabilizadas da ETAR de Alcanena; um projecto para a recuperação da área mineira de Aljustrel; projectos de execução e estudos de incidências ambientais em 20 áreas mineiras com componente de radioactividade; projectos das envolventes à escombreira da Barragem Velha e à Zona Industrial da Urgeiriça; um projecto para a recuperação ambiental da área mineira da Senhora das Fontes e da velha mina do Lousal, no Alentejo.
Para além disso, estão previstas, como também não pode deixar de ser, acções de monitorização e de controlo periódico, porque assim tem de ser, e de tratamento de efluentes; estão previstas várias acções para a recuperação do passivo ambiental dos territórios da Quimiparque, que é um grande desafio, como sabem; e também um conjunto de acções para a recuperação do passivo ambiental dos territórios da ex-Siderurgia Nacional.
Estes projectos têm bastante representação, pois estamos a falar de 13,3 milhões de euros de investimentos, dos quais 9,3 milhões de euros serão comparticipados. Portanto, têm alguma expressão.
Relativamente à questão das áreas prioritárias, e no que respeita em concreto ao litoral, o Sr. Deputado manifestou interesse em conhecer mais em detalhe o que está previsto.
Na área do litoral posso referir alguns casos, mas não vou elencar tudo, procurando salientar os projectos que me parecem mais relevantes, sendo que a relevância, por vezes, não mede pelo montante de investimento, nem pouco mais ou menos.
Por exemplo, quanto ao litoral algarvio, como sabem, os últimos acontecimentos têm-nos dado nota de que é premente investir-se na recuperação do litoral do Algarve. Penso que este ano, que com tantas intempéries, infelizmente, nos tem castigado, também teve, se calhar, o mérito de sensibilizar as pessoas. Algumas delas, legitimamente, vêem defraudadas as suas expectativas, mas percebem que é necessário proceder a algumas requalificações, a algumas demolições. Ainda ontem, a Sr.ª Secretária de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades se deslocou ao Algarve precisamente para tomar contacto com a realidade, tendo-me dado nota de que as autoridades, os representantes dos moradores, a sociedade civil em geral estão sensibilizados para a necessidade de todas aquelas acções de demolição e a consequente renaturalização daquelas ilhas barreiras, daqueles cordões dunares se efectuarem rapidamente. Temos aqui inscrita uma verba de cerca de 2,5 milhões de euros.
Gostaria de destacar também a alimentação das praias do Forte Novo e do Garrão. Por exemplo, sendo esta iniciativa importante porque tem uma expressão de 10 milhões de euros, também é importante, no fundo, porque contribui para alimentar aquela praia.
Gostaria de salientar também, na zona do Alentejo, um conjunto de acções de reabilitação e valorização do Portinho da Arrábida e a requalificação da Lagoa de Melides. Seguidamente, na zona da Administração da Região Hidrográfica do Tejo (ARH Tejo) temos variadíssimas iniciativas, vários projectos: na praia de São Julião, em Mafra; na praia do Magoito, em Sintra; na praia de Porto Dinheiro. Temos ainda inscrito o projecto de estabilização da arriba da praia da Ilha da Berlenga, em Peniche, e a requalificação das praias da Consolação e da Consolação Norte.
Desta longa lista estou a salientar aquilo que me parece que tem tido mais visibilidade.
Estou a gastar muito tempo, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Resta-lhe 1 minuto, Sr.ª Ministra. Mas haverá com certeza ocasião, nas respostas seguintes, para voltar a esses temas.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Quero referir que, por exemplo, o INAG tem inscrita uma verba — e, como sabe, o INAG é o organismo com mais acções inscritas — de 23 milhões de

Página 10

10 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

euros em acções, no litoral, de combate à erosão, de requalificação de arribas, de renaturalização de dunas, de melhoria de apoios de praia. É uma longa lista de projectos, claramente identificados.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que abrevie, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — É que acabei por não responder à questão da água» Fica para mais tarde.

O Sr. Presidente: — Terá com certeza ocasião, nas respostas seguintes, de voltar a esse tema, Sr.ª Ministra.
Tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, gostaria que esta primeira intervenção do Partido Socialista fosse dividida em duas partes, a minha e a do Deputado João Sequeira.
Sr.ª Ministra, a elaboração deste Orçamento do Estado, na área do Ambiente, é de uma grande dificuldade.
Dada a conjuntura internacional, a crise económica, percebemos que, sendo este, como é, um Orçamento do Estado de rigor para todos os ministérios, o orçamento do Ministério do Ambiente também tenha exigido um grande rigor por parte da Sr.ª Ministra. Mas, sendo, à partida, de rigor, também deve ser mais eficaz na sua concretização.
Por isso, percebemos bem — e realçamo-lo — o rigor na elaboração deste orçamento, que leva a que haja prioridades muito bem definidas, de entre as quais salientamos a questão do litoral e a conservação da natureza.
Sabemos que as políticas ambientais de primeira geração ainda não estão concretizadas em Portugal, sendo necessário mais investimento, nomeadamente na área dos resíduos. Daí a necessidade de haver aqui também da parte do Ministério — e há — uma aposta forte no sentido da concretização de um conjunto de políticas, fundamentais para o ambiente.
Mas temos consciência de que este não é um Ministério, pura e simplesmente, do Ambiente. De facto, a política ambiental é uma política transversal a todos os ministérios, cabendo também a todos eles definir alguma política ambiental nas suas prioridades.
De qualquer maneira, fundamentalmente, as questões ambientais e do ordenamento do território associadas neste Ministério levam a que percebamos facilmente que, na elaboração deste orçamento, há uma grande preocupação não só nas questões ambientais, com as alterações climáticas, a conservação da natureza e a biodiversidade, mas também na valorização do território (e isso é fundamental), com a política do litoral e a política de cidades. E isso são motivos que realçamos, na medida em que eles contribuem, nomeadamente a requalificação e a regeneração urbana, de uma forma decisiva, para a economia, para o investimento no próprio desenvolvimento económico, assim como para a criação de emprego e, consequentemente, para a saída da própria crise.
Por isso, Sr.ª Ministra, temos aqui um orçamento que, apesar de tudo, com todos estes constrangimentos, regista um aumento no PIDDAC na ordem dos 4%, tendo a própria conservação da natureza, que é sempre uma área pobre de qualquer ministro e de qualquer governo, neste Ministério, uma prioridade, com um aumento de cerca de 8%, nas políticas de conservação da natureza, que são muito importantes para que o nosso território fique bem valorizado.
Assim, Sr.ª Ministra, sendo este um orçamento que tem variadíssimas componentes, gostaria que a Sr.ª Ministra detalhasse melhor algumas áreas que, para nós, são importantes, tais como a conservação da natureza, as políticas do litoral em todas as suas vertentes e, nas políticas ambientais da primeira geração, a questão dos resíduos e a questão do abastecimento e tratamento de águas residuais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Sequeira.

O Sr. João Sequeira (PS): — Srs. Presidentes das Comissões de Orçamento e Finanças e do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território, Sr.
Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Orçamento do Estado para 2010, no cumprimento do

Página 11

11 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Programa do Governo, no que diz respeito ao ordenamento do território e à política das cidades, apresenta como prioridades a aposta na reabilitação urbana, a renovação da política de habitação, uma nova lei dos solos, a melhoria dos sistemas de informação e planeamento territorial, a execução de uma política das cidades e a implementação da Estratégia Nacional para a Gestão Integrada da Zona Costeira.
Estes são os seis vectores fundamentais da política governativa para o ordenamento do território e a política das cidades, corporizados no Orçamento do Estado para 2010.
No sistema de planeamento, para além da preparação de uma nova lei dos solos, como acabei de referir, prevê-se, para 2010, a elaboração das orientações estratégicas de âmbito nacional e regional para a delimitação da REN e a conclusão dos planos regionais de ordenamento do território.
No domínio da informação territorial, geográfica e cadastral, salienta-se a consolidação do processo de cobertura cadastral do País, a instalação do Observatório do Ordenamento do Território e do Urbanismo, a consolidação do Sistema Nacional de Informação Geográfica (SNIG) e a continuação da implementação do Sistema Nacional de Informação Territorial (SNIT).
Na política das cidades, o Orçamento do Estado para 2010 estabelece como prioridade acelerar a execução das operações da Política de Cidades POLIS XXI, já aprovadas no âmbito do QREN e que somam mais de 800 milhões de euros.
Este orçamento apresenta ainda como marca política fundamental uma aposta estratégica clara e de importante tradução no investimento governamental, na política do litoral e na reabilitação urbana e política de habitação.
A reabilitação urbana assume, quanto a nós, uma importância estratégica fundamental no contexto das políticas de habitação, de cidades e de desenvolvimento e competitividade do nosso território.
Para 2010, está previsto o arranque do Programa de Apoio à Reabilitação Urbana 2010-2015, que tem como meta multiplicar por cinco a média anual de fogos reabilitados com o apoio do Estado, procurando também estimular por essa via a economia e o emprego.
Prevê-se a operacionalização de fundos de investimento urbano, que serão um instrumento essencial de financiamento das operações de reabilitação urbana, previstos no novo Regime Jurídico de Reabilitação Urbana.
Na política de habitação, prevê-se a aprovação do Plano Estratégico da Habitação, que apresenta duas linhas de actuação: a reabilitação do património habitacional degradado e o desenvolvimento do arrendamento urbano.
Quanto à tão falada política do litoral, o substancial crescimento da dotação orçamental do Ministério, afecta a investimentos no litoral, reflecte a prioridade política da consideração do litoral como uma das áreas de intervenção fundamentais do Governo, através do desenvolvimento de uma política integrada e da implementação de Planos de Ordenamento da Orla Costeira.
Sr.ª Ministra, o Orçamento do Estado para 2010, no domínio do ordenamento do território e da política das cidades, corporiza prioridades políticas claras e soluções objectivas para os problemas do País. Nessas apostas estratégicas, assumem particular importância orçamental a política do litoral e a reabilitação urbana e política de habitação. Assim, e perante a importância política e estratégica destas apostas, gostaríamos de saber mais detalhadamente quais as medidas e investimentos que o Governo pretende levar a cabo nestas áreas.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, as questões que agora me foram colocadas dão-me também a oportunidade de procurar aduzir alguns elementos de resposta ao Sr. Deputado José Eduardo Martins quando abordar o tema «águas e resíduos».
Vou, no entanto, começar pelo reforço da política de conservação da natureza, detalhando o seguinte: as pessoas que acompanham estas matérias do ambiente há mais tempo sabem que era tradicional surgir um comentário e uma crítica dizendo que a conservação da natureza nunca era suficientemente dotada.
Ora, nos últimos anos, vem-se verificando um crescimento, uma clara aposta, no sentido de dotar o ICNB e toda a política de conservação da natureza de meios, a fim de melhorar a sua intervenção.

Página 12

12 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O ICNB?! E consegue dizer isso sem se rir, Sr.ª Ministra?

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sobre isto, e para comprovar aquilo que acabo de referir, quero referir o seguinte: se considerarmos o orçamento de funcionamento e o PIDDAC, as dotações postas à disposição do ICNB representarão, para 2010, 12,9%, ou seja, praticamente 13% do total do orçamento do MAOT, quando, por exemplo, em 2003 e 2004, representava apenas 5,4% e 5,8%, respectivamente. Se isto não ç um indicador de melhoria»! Enfim» Gostava que me explicassem porquê.
Ora, em concreto, na área da política de conservação da natureza, o ICNB, como referi, tem inscrito, para investimento, um total de quase 10 milhões de euros — isto, para investimento, pois a globalidade do orçamento é superior a 20 milhões de euros.
Esses 10 milhões de euros em investimento dinamizarão, em concreto, o seguinte: a modernização dos sistemas de informação interna. É que, como sabem, o ICNB é um organismo muito descentralizado, com uma vasta cobertura do território, com muita necessidade de intervenção, pelo que é fundamental que tenha sólidos e eficazes instrumentos de informação interna.
À parte isso, há um projecto específico relacionado com o Ano Internacional da Biodiversidade, para a recuperação, gestão e monitorização da biodiversidade.
Está prevista a melhoria das condições de visitação e valorização das infra-estruturas de turismo da natureza, para o que estão inscritos 2 milhões de euros; e a conservação e a valorização de espécies e habitats em sítios classificados, para cujo fim está inscrita uma verba de 1,6 milhões de euros. Estas não são questões menores, porque todos nós sabemos que um dos objectivos do Ano Internacional da Biodiversidade é levar a biodiversidade ao quotidiano do cidadão, porque só assim o cidadão se sentirá parte desse processo e estará disponível para contribuir para essa preservação, modificando comportamentos, fazendo, se calhar, por vezes, cedências na sua comodidade. Portanto, esta é uma questão que reputamos de extrema importância.
À parte isso, temos também previsto um conjunto de acções que não são de somenos importância, de prevenção e mitigação de fogos florestais, bem como inevitavelmente a recuperação das zonas ardidas.
Há também algumas verbas inscritas para a melhoria de instalações das próprias estruturas do ICNB.
Assim sendo, há claramente uma aposta na melhoria das condições de funcionamento do ICNB. Está inscrita a compra de veículos, porque há zonas, áreas protegidas que, como é do conhecimento público, têm muita escassez de meios materiais, precisando de veículos para executar as suas tarefas, pelo que isso também está inscrito.
Assim como também necessitamos de alguns reforços em recursos humanos. Mas, como há uma grande contenção no que respeita à contratação de novos recursos, algumas das necessidades têm de ser supridas através de prestações de serviços. Portanto, encomendamos tarefas, fazemos outsourcing, dinamizamos o sector privado, as universidades. O fundamental é cumprirmos os nossos objectivos de preservação da natureza.
Portanto, considero que, fazendo uma análise da trajectória das dotações em PIDDAC e em funcionamento para a área da conservação da natureza, o nosso país tem feito um percurso bastante estruturado no sentido de consolidar e valorizar a conservação da natureza e a preservação da biodiversidade.
O PIDDAC geral do Ministério cresce e o orçamento diminui um pouco, mas também não é grave, pois vivem-se tempos de contenção. De qualquer das formas, conseguimos, em termos de funcionamento, ter a dita contenção que o País todo tem de ter mas no que toca a investimento, num contexto difícil, conseguimos crescer.
Gostaria ainda de abordar a questão das políticas de águas e de resíduos. Estou a referir-me ao abastecimento de água e à drenagem e tratamento de águas residuais. Evidentemente, o PEAASAR tem metas que estão atrasadas. Como é minha obrigação, estou a assumir, perante os Srs. Deputados, o que deve ser dito. Como sabem, o nosso país tem uma história de sucesso a nível internacional. Somos considerados um caso de exemplo pelas mudanças que o nosso país, num relativo curto espaço de tempo, tem conseguido implementar no que respeita à melhoria da qualidade dos serviços de águas e gestão de resíduos urbanos. Penso que isso é algo de que nos devemos orgulhar e que não deve ser utilizado como arma de arremesso, porque é uma matéria relativamente à qual todos — porque todos contribuímos —

Página 13

13 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

podemos estar satisfeitos, sem que isso signifique que ficamos a olhar encantados para a nossa obra sem a completarmos. Estamos cá para a completar.
No que diz respeito ao sector da água, tem havido dificuldades efectivas nas condições que permitem concretizar as verbas que estavam dotadas no QREN para o sector das águas que é maioritariamente gerido pela Águas de Portugal. Isso resulta da dificuldade que tem havido na estruturação das parecerias públicopúblicas e na dita verticalização que está prevista no PEAASAR e tem claras vantagens. Simplesmente, as negociações para tornar possível essa verticalização não têm sido fáceis. E porquê? Eu já tive oportunidade de o referir na Comissão quando se discutiu o Programa do Governo. Porque temos algumas regiões do País que vão ter serviços de águas a preços elevados se não houver nenhum mecanismo de perequação. Esses preços são elevados porque têm ineficiências intrínsecas àquelas regiões.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, muito bom dia.
Lido o programa do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território inserido no Programa do Governo, vemos que o Ministério do Ambiente tem grandes ambições. Propõe-se intervir numa série de áreas no ambiente, no ordenamento do território, áreas que vão desde os recursos hídricos ao saneamento, à conservação da natureza, à reabilitação urbana, à renovação da política de habitação, à implementação da estratégia nacional de gestão integrada da zona costeira, etc.
Gostaria, pois, de chamar a atenção para o seguinte facto: perante este programa tão vasto e estas ambições tão alargadas, o Ministério do Ambiente apresenta um orçamento que representa 0,3% do Orçamento do Estado e, inclusivamente, representa -1,2% do que o de 2009. Sr.ª Ministra, com este dinheiro, como pretende implementar todas estas políticas e executar todo este programa que se propõe? Tendo em atenção que, já em 2009, o Orçamento do Estado tinha uma previsão do orçamento para o ambiente de 715 milhões de euros e, de acordo com os dados que me foram fornecidos, teve uma execução de 314,5 milhões de euros, ou seja, sendo a verba curta e muito pequena, para não dizer insignificante, no todo do que é o Orçamento do Estado, mesmo assim, em 2009, o Ministério do Ambiente conseguiu executar menos de 50% dessa verba. Pergunto se foi por ter inserido no programa coisas demais que nunca esperou nem pensava sequer a vir concretizar, e então o estar ou não aqui é o mesmo ou se foi por ineficiência dos serviços. Onde estão esses cerca de 400 milhões que não foram executados? Passando esta parte da perseguição mais genérica, gostaria de falar de questões mais concretas em relação a cada uma das áreas.
Relativamente ao ambiente e ao ordenamento costeiro, podemos falar das políticas concretas disto, daquilo, deste ponto, de recuperação desta zona, de intervenção naquela zona, de gestão do litoral etc.
Porém, o que se passa em Portugal há muitos anos, para não dizer desde sempre, é que toda a situação do ordenamento costeiro envolve dezenas e dezenas de entidades. Qualquer estratégia que tenha em vista o reordenamento e gestão do litoral passa primariamente por algo que não vejo aqui neste programa, Sr.ª Ministra: concentrar numa única entidade gestora do território todas as competências de ordenamento e de gestão do litoral. Não vejo isso no programa e gostaria de saber se a Sr.ª Ministra e o Governo entendem que essa é, ou não, uma prioridade e se é essa ou não a razão pela qual não há qualquer referência à criação dessa entidade e ao acabar com esta «pulverização» de centros decisores que levam não só ao atraso das decisões que têm de ser tomadas e que são urgentes como também a uma ineficiência enorme na gestão do território.
Por outro lado, e no que respeita aos parques e reservas naturais, a Sr.ª Ministra referiu há pouco na sua intervenção que é importante levar a biodiversidade a cada cidadão «para que este possa interagir, modificar comportamentos e fazer cedências no seu conforto quando necessário», ou seja, compreender o ambiente e a biodiversidade. Sr.ª Ministra, não vejo nenhuma palavra no Programa do Governo nem no programa do Ministério do Ambiente relativamente a uma questão que já quis levantar quando este assunto foi debatido em comissão, tendo-me sido, na altura, retirada a palavra. Há muitos anos foram constituídas e criadas zonas de reserva da natureza, parques naturais sem consulta efectiva e real dos residentes nessas áreas. Daí para cá esses residentes têm sido muito pouco tidos ou achados na gestão e conservação dessas zonas. São praticamente excluídos.

Página 14

14 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Ministra diz que há que levar a biodiversidade ao cidadão para este interagir e modificar comportamentos. Perante esta sua afirmação, o Governo vai modificar comportamentos e levar as pessoas a serem parte nos processos de gestão dos territórios onde eles moram e de terrenos de que o Estado, com a melhor das intenções, há 10, 15, 20 anos, se apropriou, se assenhoreou, tomando conta deles e não deixando que as pessoas sejam parte na gestão dos seus próprios terrenos? Vou dar-lhe um exemplo que roça o caricato. Há cerca de um ou dois anos, a entidade gestora do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina criou um regulamento em que mais de quatro ou cinco pessoas juntas precisavam de ter autorização por ser considerado um ajuntamento e por poderem destruir o revestimento vegetal. Sr.ª Ministra, tem de se pôr cobro a este tipo de situações ridículas. Fazer uma gestão integrada passa por falar com as pessoas. Esta é outra questão que lhe queria colocar.
Por outro lado, e ainda em relação aos parques, não obstante as intenções anunciadas de reforço de vigilância, de reforço dos meios de combate aos fogos, de prevenção, etc., o que se passa é que, numa área em que metade do orçamento não foi executado, temos uma situação concreta em que não há meios nem humanos nem materiais para, minimamente, gerir, proteger e preservar o que já existe. Dou-lhe os exemplos do Parque Natural do Douro Internacional e do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, onde não há pessoal suficiente no terreno para fazer as acções de vigilância. Inclusivamente, segundo o que veio a público, não há verbas para eles se deslocarem dentro do Parque e irem às diversas zonas que precisam de vigiar e proteger.
Sr.ª Ministra, deixando a parte do ordenamento do território para a segunda ronda, gostaria ainda de lhe colocar uma questão. A Sr.ª Ministra referiu que, no sector dos resíduos, somos um exemplo internacional. É verdade, Sr.ª Ministra, e ninguém o nega. Conseguimos avanços significativos em períodos de tempo relativamente curtos. No entanto, o que se está a verificar neste momento é que há duas grandes preocupações no sector empresarial da reciclagem. A primeira é que as empresas desse sector se queixam que estão numa situação de falência à vista, como já aconteceu noutros países da Europa, porque as empresas produtoras ou geradoras do lixo reciclável estão a exportá-lo para países fora da Comunidade Europeia, deixando o sector de reciclagem português sem matéria-prima para trabalhar.
A segunda preocupação tem a ver com a coordenação com outros ministérios. O Ministério está ciente — já fiz esta pergunta ao Ministério e não obtive resposta — de que existem diferenças quanto às normas de homologação exigidas para determinados plásticos recicláveis e para determinadas áreas industriais que são diferentes das de outros países, nomeadamente de Espanha? É que isso impede as empresas portuguesas de reciclagem de produzirem tubo e material em PVC para a indústria da construção civil nacional, por exemplo, e as empresas de construção civil, nomeadamente nas grandes empreitadas do Estado, estão a importar esse mesmo tubo de Espanha porque lá as normas de reciclagem não têm essas exigências.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, também não posso deixar de fazer o seguinte comentário: obviamente, tivemos, em 2009, uma execução fraca em termos de QREN, tendo em conta que podíamos ter chegado ao limite de 100%. Porquê? Como podem imaginar, é uma matéria de grande preocupação e que tem sido objecto de um diagnóstico interno. Ora, isso deveu-se essencialmente às dificuldades na aprovação das candidaturas, mas também à execução menos boa ligada ao ciclo urbano da água.
O modelo institucional que foi definido no PEAASAR, como há pouco referi, por um lado, não foi fácil de concretizar e, por outro, para os casos em que até se conseguiu concretizar parcerias, também surgiram algumas dificuldades relacionadas com a celeridade nas expropriações, na obtenção das declarações de utilidade pública, porque, como sabem, não se pode deixar de passar por estes projectos, sobretudo os de abastecimento e de drenagem de água (estender canos e instalar, muitas das vezes, infra-estruturas de tratamento em áreas cobertas por figuras de ordenamento), e estamos a agilizar-nos no sentido de as aprovações serem mais céleres.
Relativamente ao QREN, só posso dizer isto. Temos o diagnóstico feito no sentido de melhorarmos e de recuperarmos rapidamente.

Página 15

15 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

No que diz respeito ao litoral, ás várias entidades que existem» Não existem tantas assim, Sr. Deputado.
Existe o INAG (Instituto Nacional da Água) e as ARH (Administração da Região Hidrográfica). A gestão de proximidade é importante.
Há realmente intervenções onde é importante o INAG intervir, porque, como autoridade nacional da água, tem a perspectiva de conjunto, tem o know-how acumulado, quer queiramos quer não. É uma instituição centenária que tem conhecimento e, portanto, tem um papel a desempenhar. As ARH são um novo modelo organizativo que também tem claras vantagens, porque permite a tal gestão de proximidade junto das autarquias, inclusivamente a possibilidade de delegarem competências em algumas áreas nas próprias autarquias para melhor fazerem a gestão dos recursos hídricos. Depois, complementarmente a estes organismos do Estado, temos também — já mais na vertente que o Sr. Deputado referiu — as Sociedades Polis que, estas sim, tem agilidade superior em termos de gestão e integram as várias componentes e, portanto, também são uma área que tem estado a resultar bem.
Já agora, não posso deixar de dizer que o PIDDAC do nosso Ministério é 10% do PIDDAC do Governo! Não é assim tão pouco! Acho que tem expressão! Na minha perspectiva, é uma área que tem expressão! Relativamente à questão da biodiversidade e aos comentários que o Sr. Deputado fez, gostava de dizer que, em qualquer parte do mundo em que estão implementadas políticas de preservação da biodiversidade, nunca ficam todos satisfeitos. É um facto. Então, qual é a linha a seguir? Não precisamos ser inovadores, e, de certa forma, vamos fazendo benchmarking com outros países que, antes de Portugal, foram desenvolvendo estas políticas. Procuramos, através do diálogo, envolvendo as pessoas e as associações e estabelecendo parcerias, implementar uma política de conservação da natureza que se quer ajustada, adequada e sustentável e que venha, progressivamente, a ser integrada. Sei que é verdadeira a situação que foi referida e que, como esta, há outras. É verdade, mas são situações pouco desejáveis. Por isso é que estamos a rever os planos de ordenamento e a procurar erradicar de vez esse tipo de situações. De alguma forma, nas várias intervenções que temos, procuramos, se quiser, extirpar essas posições, que, às vezes, foram definidas numa lógica centralista — não foi intencional, mas o resultado é mau. Por isso, o Sr. Secretário de Estado está sempre a dar indicações ao ICNB (Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade) no sentido de as revisões dos planos terem em conta precisamente essas fracturas que existem com alguns residentes.
No entanto, também não posso deixar de dizer uma coisa: não nos esqueçamos que os parques naturais em concreto, que foram no início muito contestados, começam a ser entendidos como activos significativos, pelo menos em partes com expressão no nosso país, porque as pessoas percebem que têm restrições para todas as suas iniciativas, mas, depois, têm mais-valias. Ainda no outro dia, fui a um parque natural, que já existe há cerca de 30 anos, e fiquei feliz por verificar que a sociedade civil que estava representada no evento a que fui estava satisfeita, porque já não tinham casas aberrantes e feitas de qualquer maneira, não havia excesso de áreas construídas, entre outras coisas. Portanto, estamos a fazer o caminho.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isso também depende do parque!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — É verdade.
Rapidamente, porque já me falta pouco tempo, vou falar sobre a questão dos resíduos e da reciclagem, duas questões importantes que o Sr. Deputado levantou.
Sr. Deputado, é um facto que a reciclagem de materiais já não é de agora. Há muito, e estive muito directamente envolvida com estes assuntos, que várias empresas nossas vêem fugir materiais recolhidos selectivamente para reciclar para países que têm fraquíssimas exigências ambientais, que exploram pessoal e que têm custos de produção muito mais baixos, mercê destas péssimas práticas. É um facto! E este é um assunto muito debatido em Bruxelas, relativamente ao qual todos nos vamos procurando defender. É claro que a legislação diz que esses materiais não podem ir para esses países, se eles não tiverem» Como sabe, nós, e os países do mundo com preocupações nesta matéria, temos de conjugar, e às vezes esta é a dificuldade, várias políticas, tais como políticas de livre trânsito, de concorrência, com políticas de ambiente e até políticas de direitos humanos, quando estamos a falar das pessoas que são exploradas. Ora bem, o que é que acontece? A legislação comunitária e todos grupos temáticos específicos têm sempre em conta que os Estados não devem permitir a exportação. É uma luta de todos os dias! É uma luta e nós estamos do lado desses industriais que clamam. Estamos do lado deles para os defender! É o que posso dizer.

Página 16

16 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

De qualquer das formas e para finalizar, a reciclagem no nosso país também tem tido, felizmente, um bom percurso de melhoria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Calvário.

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, em primeiro lugar, quero apresentar, em nome do Bloco de Esquerda, um voto de pesar às vítimas da intempérie da Região Autónoma da Madeira. De facto, é uma situação muito grave e este tipo de intempéries — não só intensas chuvadas, mas também ondas de calor, incêndios e outras — tendem a tornar-se cada vez mais intensas e frequentes devido ao fenómeno das alterações climáticas. Isto mostra como é urgente avançarmos com uma estratégia nacional para as alterações climáticas. Por isso, pergunto, Sr.ª Ministra: para quando prevê a aprovação desta estratégia nacional que já esteve sujeita a consulta pública? Mas, mais do que uma estratégia nacional, também são preciso medidas concretas e mecanismos de financiamento para a adaptação às alterações do clima. E aquilo que vemos neste Orçamento do Estado, nomeadamente em PIDDAC, é que apenas existe uma verba muito reduzida, pouco mais de 50 000 euros, para uma medida que se chama «estratégias territoriais para a adaptação às alterações climáticas». É a única coisa que podemos encontrar neste Orçamento do Estado sobre esta matéria. Assim, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, se considera suficiente e que mais poderá ser feito para efectivar, de facto, a adaptação dos territórios ao crescimento da frequência e intensidade deste tipo de intempéries.
Sobre o orçamento em concreto, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista diz-nos que ele é de rigor. No entanto, de rigor vejo muito pouco, porque há uma discrepância de valores acentuada entre o que nos é apresentado no Relatório do Orçamento do Estado e na nota explicativa do Ministério do Ambiente. No Relatório a despesa consolidada situa-se na ordem dos 476 milhões de euros; na nota explicativa esta verba sobe para 706,3 milhões de euros. Quero perceber o porquê desta discrepância de valores.
Aliás, na nota explicativa há outros valores que não batem certo: nas despesas de funcionamento, primeiro fala-se em 423 milhões de euros e, depois, em 432 milhões de euros e também, em termos da despesa para o litoral, os valores que aqui são apresentados não batem certo uns com os outros. Qual é o rigor deste orçamento, quando nos apresentam estes valores? Isto mostra, de facto, que o Ministério está preocupado em apresentar contas certas e ser rigoroso na sua execução, uma vez que foi o ministério que, no ano anterior, em 2009, apresentou menor taxa de execução de todo o Governo, na ordem dos 44%?! Passo à prioridade que é apresentada pelo Governo nas políticas de habitação e reabilitação urbana. Falase muito desta prioridade, no entanto, se formos olhar mais em concreto para os valores que nos são apresentados, fica muito aquém do esperado. Em primeiro lugar, o orçamento para o IHRU decresce relativamente ao orçamento para 2009 na ordem dos 59%, o que é um valor significativo. Se considerarmos que a taxa de execução do IHRU em 2009 foi uma das mais baixas dos serviços e fundos autónomos, percebemos que, de facto, aqui há pouca prioridade.
Ao nível da reabilitação urbana, também a verba inscrita em PIDDAC anda na ordem do 7 milhões de euros e este valor parece-nos bastante insuficiente perante a realidade do parque habitacional em Portugal. Assim, gostaríamos de saber para quando a aprovação do Plano Estratégico de Habitação, que estabelece um diagnóstico muito concreto sobre esta matéria? Esta foi uma promessa do anterior governo; ou seja, o Plano deveria ter sido aprovado no final de 2008, mas, depois, foi adiado até ao Verão de 2009. O que é que, até agora, ainda não vimos a sua aprovação.
Este Plano Estratégico diz-nos que existem milhares de casas a necessitar de reabilitação urbana, mais em concreto 1,6 milhões de casas a precisar de pequenas e médias obras e cerca de 326 000 que estão muito degradadas. Portanto, é preciso um forte investimento público para proceder à requalificação destas casas e também para as colocar disponíveis no mercado de arrendamento de forma a combater as casas que estão devolutas e que estão expectantes no mercado, o que faz aumentar o preço das habitações e obriga também as pessoas a endividarem-se à banca. Sabemos que somos dos países com um menor mercado de arrendamento, temos optado muito pela aquisição de casa própria, o que tem provocado um endividamento muito sério das famílias aos bancos.
O Governo, no Relatório do Orçamento do Estado, fala num Programa de Apoio à Reabilitação Urbana para 2010-2015, no entanto, não vimos qualquer tradução orçamental, nem ao nível de PIDDAC nem ao da

Página 17

17 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

proposta de lei. Não há nada que concretize este Programa de Apoio. Se este Programa de Apoio é para ser concretizado através dos fundos imobiliários, que estão assentes no sistema financeiro, ficamos preocupados porque o sistema financeiro já mostrou bem o que vale nestas áreas e sabemos como a especulação bolsista não protege as pessoas mas, sim, os lucros da banca.
O Bloco de Esquerda tem uma proposta e uma alternativa muito concreta e irá apresentá-la neste próximo Orçamento do Estado. Iremos propor um plano para a reabilitação urbana que estabelece uma meta até 2015 para a reabilitação de 200 000 fogos, centrado em investimento público que será recuperado de forma responsável, criando uma bolsa de habitação para arrendamento, permitindo que estas casas entrem no mercado de arrendamento a preços acessíveis e, portanto, conjugando aqui uma política de reabilitação, de acesso às casas e também da criação de emprego. Prevemos, com este programa, a criação directa de 60 000 postos de trabalho. Esperemos que haja responsabilidade da parte do Governo e dos restantes grupos parlamentares para podermos avançar com esta proposta.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, informo-a de que já só dispõe de 1 minuto.

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Ainda sobre habitação, gostaria de saber qual é a dotação orçamental para os apoios ao arrendamento jovem, mais em concreto ao Programa Porta 65.
Sabemos que os critérios de acesso a este Programa irão ser alterados. Julgo que ainda não foi publicado o decreto-lei que concretiza as alterações estabelecidas em Conselho de Ministros, mas gostaria de saber qual é a dotação orçamental efectiva para o apoio ao arrendamento jovem. Isto porque sabemos que, com a criação do Porta 65, houve uma redução efectiva nos apoios aos jovens quanto ao acesso ao arrendamento.
Anteriormente, entre 2004 e 2006, o programa do incentivo ao arrendamento jovem disponibilizou uma média de 62 milhões de euros/ano ao apoio ao arrendamento jovem. Verificamos que, nos anos seguintes e com criação do Porta 65, estes valores foram muito reduzidos. Por exemplo, em 2009, o apoio foi de 6,5 milhões de euros. Portanto, houve uma redução substancial.
Em PIDDAC, a verba para apoio social, na medida habitação, é de 4,3 milhões de euros. Face aos valores dos anos anteriores, esta verba parece-nos muito reduzida, até porque o apoio social não é só a Porta 65 mas outro tipo de medidas. No entanto, gostaria que a Sr.ª Ministra nos dissesse qual é a verba que está disponível para este programa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, a estratégia de adaptação às alterações climáticas, como sabe, foi discutida, já houve reunião de Secretários de Estado, e está para breve a sua aprovação; portanto, já está na fase final.
Sr.ª Deputada, quanto à estratégia de adaptação às alterações climáticas e à sua expressão no PIDDAC, devo dizer que ela não existe porque a adaptação é feita, no fundo, por vários actores. Vamo-nos adaptando às alterações climáticas através das políticas adequadas de ordenamento, de requalificação do litoral, etc. Por exemplo, quando investimos num abastecimento de água de forma, eu diria, sustentável, prevê-se, inclusivamente, a identificação de fontes para situações de catástrofe, de cheia ou de seca. Hoje, os nossos sistemas de gestão de água para abastecimento elaboram planos de segurança para, precisamente, fazerem face a essas situações. A autoridade nacional competente para a qualidade de água para consumo humano tem dinamizado, apesar de ainda não ser um imperativo comunitário, a elaboração destes planos.
As acções de prevenção de incêndios e de cheias e a regularização de cursos de água são obras tendentes a garantir uma resposta relativamente às alterações climáticas.
Por isso, não temos uma verba única aglutinada. Poderemos fazer no futuro o exercício de aglutinar todas as acções que poderão ser enquadráveis nesta medida.
A Sr.ª Deputada disse que, relativamente à verba de funcionamento, ela aparece ao longo do orçamento com valores diferentes. Num sítio aparece como sendo 431,4 milhões de euros e, noutro, com um valor menor.
O valor menor é o valor consolidado, foram retiradas as transferências entre serviços para não haver duplicação. Aliás, quando estava a fazer a análise e a preparação também verifiquei isso.

Página 18

18 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Deputada refere o decréscimo no IHRU. Como a Sr.ª Deputada sabe, no orçamento do IHRU há verbas para a concessão de crédito à habitação apoiada e à reabilitação da habitação. Então, o que é que acontece? Verificou-se que havia dotações que não tiveram por várias razões, que também estamos a diagnosticar, procura suficiente. Então, diminuímos a dotação, tornando a estimativa mais realista à concessão de crédito à habitação. Como sabe, esta é apenas uma das vias para a concessão de crédito à habitação, pois é necessário que haja outras fontes (aquela não é a única) e houve dificuldades em os actores reunirem as outras fontes de financiamento.
Esta é uma área fundamental da política do Ministério e, naturalmente, todos os contributos que possam ser dados no sentido da política que estamos a desenvolver serão bem-vindos, e, portanto, à partida, estamos disponíveis para discutir esta questão.
Relativamente ao Porta 65, está inscrita uma verba de 20 milhões de euros no Capítulo 60 do Ministério das Finanças. Entretanto, com as alterações feitas ao Porta 65, aumentámos o universo de possíveis destinatários. Eventualmente, em alguns casos poderá haver reduções da comparticipação, mas haverá um maior número de destinatários.
O Porta 65 não é apoio social, quero destacar isto.

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Eu sei!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — O Porta 65 é apoio à autonomização dos jovens. Para as pessoas com problemas sociais há outras áreas de política do IHRU destinadas a subsidiar rendas sociais, algumas até com transferências do Ministério das Finanças, mas não é o caso do Porta 65.
Penso que abordei todas as questões que me foram colocadas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território, Sr. Secretário de Estado, antes de mais, uma palavra para associar a bancada do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português às palavras e ao minuto de silêncio que fizemos no início desta reunião. Importa, agora, mais do que a nossa solidariedade, fazer tudo para que quer as estruturas quer as pessoas, particularmente as pessoas, não fiquem com as mazelas deixadas por estes episódios e para salvaguardar os direitos de essas pessoas serem ressarcidas no caso de uma catástrofe natural.
Sr.ª Ministra, peço-lhe, uma vez mais (este é um apelo recorrente da minha parte), que, por momentos, deixe a sua «pele» de técnica do Ministério e façamos uma discussão mais política, tendo em conta que, sobre os números pouco nos será possível aprofundar, até porque os próprios documentos que nos forneceu são, diria, mais do que vagos, pois em alguns casos estão errados. Portanto, sobre estes números pouco poderemos aprofundar e discutir, até porque eles reflectirão muito pouco daquela que será a intervenção deste Ministério. Assim, tentaremos fazer aqui uma discussão mais em torno daquelas que serão as verdadeiras acções e intervenções concretas do Ministério. E é um facto, que a Sr.ª Ministra tentou descrever de uma forma bastante curiosa, aliás, talvez até da forma inversa à da realidade, através do investimento no ambiente, nomeadamente na conservação da natureza, que o ambiente vai tendo cada vez menos peso para este Governo. Se fizermos as contas ao governo anterior e entendo este como sendo de continuidade, a verdade é esta.
Estamos em 2010, o ano internacional da biodiversidade, se olharmos, por exemplo, para o mais emblemático dos institutos do seu Ministério, o ICNB (Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade), e fizermos as contas ao orçamento de 2009 e não à estimativa da execução, como habilmente os ministérios vão fazendo para nos tentarem iludir dos verdadeiros cortes orçamentais, a verdade é que há um decréscimo de 5% no orçamento. Se a taxa de execução se repetir, estamos a falar de um corte muito significativo na verba disponível para o ICNB. A Sr.ª Ministra diz-nos que há um aumento, se não estou em erro, mas isso não é verdade, porque, se compararmos os números com o orçamento, verificamos rapidamente que não é verdade.

Página 19

19 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O grave, Sr.ª Ministra, não é só a existência de um corte no financiamento do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade. O grave é que ele esteja já à beira da total inoperância.
Neste momento (tal como já foi referido por outros parlamentares), temos áreas protegidas, com as quais, segundo a Sr.ª Ministra, as populações estão muito contentes. Sr.ª Ministra, isto não é verdade em todos os casos, o que é pena. Não temos a mínima dúvida de que a Sr.ª Ministra também tem como objectivo fazer com que as populações vivam felizes nas áreas protegidas. Infelizmente, não é sempre assim.
A verdade é que as populações sentem-se cada vez mais lesadas pelos parques naturais, porque estes não retribuem a exigência que fazem às populações, em grande parte porque este Governo tem vindo a castigar, a punir as populações. É curioso que não se possa, por exemplo, apanhar um raminho de salsa um parque natural, mas já se pode construir um campo de golfe, com piscinas, com casas de luxo» É curioso! É uma dualidade de critérios, no mínimo, curiosa! É engraçado que não se possa apanhar um caranguejo em Tróia, mas pode fazer-se um casino e uma marina mesmo ao lado! São as curiosidades, no mínimo, preocupantes.
Sr.ª Ministra, isto também está relacionado com o facto de o Estado estar cada vez menos presente no território.
Neste momento, não temos vigilantes da natureza, os guarda-rios desapareceram. Temos áreas protegidas inteiras, com quilómetros e quilómetros quadrados de extensão, sem um único vigilante da natureza. Ora, Sr.ª Ministra, diga-me o que é que é protegido nesta área? O que é que é protegido num espaço em que, supostamente, existe um conjunto de valores a proteger, mas onde não há uma única pessoa para os proteger? Sr.ª Ministra, sobre o ICNB, pergunto se está previsto, finalmente, a atribuição dos uniformes aos vigilantes da natureza, que os esperam desde 2005, e este Inverno nem sequer receberam a farda de Inverno. Está previsto algum investimento nas viaturas, que, como a Sr.ª Ministra acabou de referir, estão decrépitas, muitas delas não saem das garagens, porque não há sequer dinheiro para a manutenção? Há, finalmente, a previsão de abertura de concurso para novos vigilantes da natureza? Sr.ª Ministra, não podemos continuar a fazer um discurso redondo da biodiversidade, da protecção da natureza, das áreas protegidas e, depois, permitir que o corpo central, que tem o papel de fiscalizar e de intervir no território, continue a desaparecer.
Não temos praticamente vigilantes da natureza. Há, ou não, previsão para a abertura de um concurso? Há, ou não, previsão para a revisão do estatuto profissional desta carreira, adaptando-a, aliás, à nova legislação? Sr.ª Ministra, passo para as taxas de recursos hídricos. Pergunto: qual vai ser a estratégia do Governo para os próximos quatro anos, no que toca à Águas de Portugal? Tenciona alienar mais empresas da holding? Tenciona, de alguma forma, privatizar capital da própria holding? Ainda, no âmbito da água, quanto às taxas de recursos hídricos, verificamos, neste orçamento, que as ARH obtêm, em muitos dos casos, o dobro daquilo que obtiveram no ano passado em receita própria e julgamos nós, da análise que fazemos no Grupo Parlamentar do PCP, porque o Relatório do Orçamento do Estado não o diz, que isto se deve essencialmente à cobrança da taxa de recursos hídricos que este Governo em má hora veio impor às pessoas. E todos nós já a pagamos, certamente, nas nossas facturas de água, aliás, naquele bonito conceito, que a Sr.ª Ministra também subscreve de cruz, do utilizador-pagador. Já agora pergunto à Sr.ª Ministra: quem é o recebedor? Se há um pagador, temos de saber quem é o recebedor. Enquanto eu vir que, no meu município, há sempre alguém que «abocanha» os lucros e não investe na rede como deveria, pergunto e perguntarei sempre quem é o recebedor.
Sobre a taxa de recursos hídricos, pergunto-lhe: qual é a afectação para essas verbas? Estamos a falar de muitos milhões de euros. Sabemos que o Ministério e o Governo perdoaram à EDP grande parte da dívida.
Não sabemos à luz de que lei o fez, mas sabemos que cobrou à EDP uns simpáticos 50 milhões de euros para explorar as barragens portuguesas durante 50 anos. É um valor muito simpático.

O Sr. Presidente: — Tem 1 minuto, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Agradeço a nota.
Como estava a dizer, cobrou uns simpáticos 50 milhões de euros à EDP. Não conhecemos à luz de que lei o fez, porque o regime económico-financeiro da taxa de recursos hídricos não prevê qualquer valor desta

Página 20

20 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

ordem mas, sim, um valor muito maior. Portanto, houve um desconto para a EDP, só é pena que não haja para todos os outros sectores de actividade.
Mas o mais importante, e é isto que vou perguntar, é saber para onde irá o dinheiro que o Estado ou as ARH estão a arrecadar, por via do esforço dos cidadãos portugueses, da taxa de recursos hídricos. Como sabe, em relação a esta taxa, o PCP apresentou um projecto de lei para a sua revogação, tendo em conta que a consideramos, inclusivamente, um novo imposto, porque ela, na prática, onera todos os portugueses, uma vez que, como a Sr.ª Ministra sabe, julgo que, técnica e politicamente, assumimos a água como um recurso essencial.
Termino, perguntando à Sr.ª Ministra se o Polis que está previsto e que é anunciado no Relatório do Orçamento do Estado para os rios — Polis Rios, se não estou em erro — é uma intervenção daquelas em que vamos pôr tudo muito bonitinho onde as pessoas passam, com uns arranjos, uns bancos de jardim e umas vedações feitas em madeira, ou é uma operação estrutural nos rios e na rede hidrográfica nacional.

O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Podemos fazer intervenções onde os rios cruzam as populações, podemos fazer marginais muito bonitas, mas, Sr.ª Ministra, o fundamental é cuidar dos rios portugueses, e, neste momento, nem guarda-rios temos.
Portanto, é muito estranho que com o dinheiro que está no Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos se consiga fazer o trabalho hercúleo que é necessário fazer, limpeza, regularização, desassoreamento e despoluição dos rios portugueses.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território para responder.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, já vi que não gosta muito do meu estilo técnico, mas cada um é como é! É a vida!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não! Não é não gostar! Estamos na política!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Tudo bem! Mas o que é que quer?! Eu tenho trinta e tal anos de tçcnica» É assim. Não ç mau! Deixe lá! Vou procurar responder às suas questões.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado diz que o ambiente tem cada vez menos peso na política geral. Eu não acho.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas essa é uma opinião técnica!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — É uma opinião política. E explico-lhe porquê. Não acho que tenha cada vez menos peso, porque a política de ambiente não se pode medir apenas pelo orçamento do Ministério do Ambiente. Aliás, desejavelmente, a política de ambiente deve ser, e é, transversal e temos evidências — e cada vez vai ser mais assim — de que as várias áreas da governação têm integradas preocupações de natureza ambiental.
Deveríamos analisar o Orçamento nesta óptica, e este é um exercício que penso promover internamente.
Quando verificamos, por exemplo, que na recuperação de edifícios públicos e nas remodelações energéticas são feitos diagnósticos sobre a eficiência energética, que se tem em conta, quando se fazem obras, precisamente a capacidade energética dos edifícios, que se integra um conjunto de medidas tendentes a promover a recolha de resíduos nos edifícios públicos e privados — enfim, poderíamos continuar por aqui fora, mas não vou detalhar mais —, podemos concluir que há, cada vez mais, preocupações de natureza ambiental nas várias áreas da governação. E, como digo, deveremos ter cada vez mais estas preocupações.
Relativamente ao ICNB, o Sr. Deputado referiu que, nas áreas protegidas, as pessoas não estão contentes.
Há umas que estão, outras que não estão! Realmente, o nosso objectivo é contribuir para que, se possível,

Página 21

21 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

não direi todas, porque, se calhar, nunca é possível contentarmos todas, mas o máximo de pessoas estejam contentes. Agora, também me parece excessivo dizer que não se pode apanhar salsa numa área protegida.
Obviamente que não é o caso.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Olhe que é!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — É óbvio que há um conjunto de práticas, acções de natureza silvícola, de cultura não intensiva e de cultivo de propriedades privadas com culturas tradicionais, que são permitidas. Tudo isto é permitido, sem prejuízo, como referi há pouco, de poder haver uma ou outra situação que carece de modificação, o que já está em curso.
Pergunta-me, depois, se estão previstos os uniformes. Estão.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Cinco anos depois!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Está bem! Mais vale tarde do que nunca! Pergunta-me também se está prevista a compra de viaturas. No PIDDAC do ICNB está prevista uma verba de 406 300 euros para aquisição de viaturas — Programa 015, Medida 033, Projecto 07.07.4, se quiser ver.
Portanto, essa compra está prevista e elas são necessárias. É um facto que são super necessárias.
Também está prevista a revisão da carreira e a abertura do concurso para os vigilantes, num quadro, refiro mais uma vez, de grande contenção. Também há instrumentos disponíveis que vamos ter de utilizar, como, por exemplo, o pacote de estágios para a Administração Pública. Vamos também alocar algumas dessas pessoas à área da conservação da natureza.
Passando, agora, à Águas de Portugal, quero dizer que ela não é para privatizar.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — A Águas de Portugal é uma empresa absolutamente estratégica para o nosso país. O recurso água é absolutamente estratégico para a soberania de um país. Portanto, a Águas de Portugal não é para privatizar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — E as outras empresas?!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — A Águas de Portugal e as empresas onde ela tem participação e relacionadas, portanto, com o»

Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado terá ocasião de voltar a essa matéria na 2.ª ronda.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sobre a taxa de recursos hídricos, gostaria de dizer que é, efectivamente, uma clara aplicação do princípio do utilizador-pagador, que tem dado excelentes resultados em todos os países da Europa. É um instrumento fundamental, é um instrumento justo, na medida em que quem utiliza paga por essa utilização, e tem, inclusivamente, um carácter de moralização de práticas inadequadas.
O Sr. Deputado quer saber qual é a afectação.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quero saber quem recebe!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — O que está previsto na legislação é que 50% da taxa seja para o Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos, 10% para o orçamento do INAG e 40% para as ARH. Tanto a verba que vai para o Fundo como a parte das verbas que vão para o INAG e para as

Página 22

22 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

ARH também são usadas para investimento. No caso das ARH e do INAG, uma parte da verba é para funcionamento e a outra parte é para investimento, o que também reforça as rubricas de investimento. O Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos financia um conjunto de iniciativas importantes, que estão, aliás, inscritas no orçamento. Portanto, o Fundo recolhe e utiliza as verbas com esse objectivo.
Para finalizar, passo ao Polis Rios. Sr. Deputado, o Polis Rios é um conceito que está em definição.

Risos do BE, do PCP e de Os Verdes.

Posso dizer que até já houve sugestões no sentido de se mudar o nome, de, em vez de Polis Rios, chamarse outra coisa, mas isto não é o mais relevante.
O que se pretende com o conceito Polis Rios é uma intervenção estrutural nos rios, que tem como objectivo não apenas, como referiu, operações de embelezamento mas também operações de regularização de leitos, de limpeza, de regeneração das galerias ripícolas e de investimento em zonas de fruição. Portanto, é um investimento estrutural, não é apenas um investimento de embelezamento, como referiu.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, cumprimento a equipa dos Ministérios das Finanças e do Ambiente e do Ordenamento do Território.
Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território, recordo-me que, no início do mandato anterior, o seu antecessor, o então Ministro Francisco Nunes Correia, veio à Assembleia da República apresentar o orçamento para o Ministério do Ambiente e todos nós criticámos muito o corte brutal a que tinha sido sujeito este Ministério, em termos de atribuição de verbas.
Nessa altura, o então Sr. Ministro disse, para descansar o Parlamento, que não nos preocupássemos, porque aquele orçamento tinha uma grande diferença em relação aos anteriores: os anteriores não eram executados e aquele e os seguintes eram para executar! Portanto, aquele era um orçamento de rigor e de seriedade e, a partir dali, tudo seria diferente: o que estava prometido, em termos orçamentais, era aquilo que seria executado. Não foi preciso muito tempo para se perceber que, afinal, não era nada assim e que tudo continuava exactamente como nos orçamentos anteriores.
Ó Sr.ª Ministra, chegar a um Orçamento do Estado de um ano e perceber que, no ano anterior, nem metade foi executado é quase deplorável e é muito grave! E mais grave ainda é que nem no Relatório, nem no Orçamento por acções, nem em lado algum venha explicado «tintim por tintim» à Assembleia da República a que se devem estes fraquíssimos níveis de execução. Julgo que a Assembleia da República merece uma explicação concreta e específica em relação a esses fraquíssimos níveis de execução.
Depois, também nos preocupa muito a cada vez maior falta de transparência deste Orçamento do Estado e até do PIDDAC em particular, porque o PIDDAC é um plano de investimentos. Ó Sr.ª Ministra, quem quiser comparar este PIDDAC com o do ano passado, tem dias de dores de cabeça — eu tive-os e, se calhar, outros Deputados também os tiveram —, porque aquilo é quase incomparável.
Parece que, cada vez mais, estamos a tentar que ninguém perceba o Orçamento do Estado. Ora, eu julgo que o objectivo do Governo deveria ser exactamente o contrário, se não tem vergonha daquilo que propõe, porque, se tem vergonha daquilo que propõe, de facto, o objectivo deve ser que ninguém o perceba.
Chegamos ao orçamento por acções, ou seja, à nota explicativa que o Ministério do Ambiente apresentou à Assembleia da República e ela não bate certo com o Relatório do Orçamento do Estado, porque fala numa despesa consolidada de 760 milhões de euros e o Relatório do Orçamento do Estado fala de uma despesa consolidada de 476 milhões de euros. A Sr.ª Ministra diz: «Ah! É que nós aqui incluímos o PIDDAC!» E, então, aqui não está uma parte do PIDDAC já incluída?! Aquilo que o Ministério do Ambiente apresentou à Assembleia da República o ano passado batia mais certo com o Relatório do Orçamento do Estado do que este ano apresentou em nota explicativa à Assembleia República.
Por mais somas que façamos, parece que as coisas nunca batem certo. E é este exercício de clareza que peço ao Ministério do Ambiente, para que possamos perceber. Entretanto, começámos todos a discutir muitos

Página 23

23 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

números, mas não estamos todos a falar da mesma coisa. Mas, mesmo não estando todos a falar da mesma coisa, Sr.ª Ministra, acho muito pouco sério que o Ministério do Ambiente chegue à Assembleia da República com estes níveis de execução em relação ao ano passado — como já vimos, menos de metade! — e, depois, ainda tenha a suprema «lata» (não tenho outro nome para designar isto) de dizer que o Ministério do Ambiente registou um crescimento de 51,5%! Ao menos a Sr.ª Ministra não tire esta conclusão, porque acho que isto é «gozar» definitivamente com a realidade a que o País está sujeito ao nível da intervenção do Ministério do Ambiente. Se o Ministério apresenta estes níveis de execução em relação ao ano passado, não tire esta conclusão, Sr.ª Ministra, explique antes por que é que não executou tudo o que estava para executar. Não pode é retirar a conclusão de que este ano apresenta um crescimento de 51,5%! Não pode! Isto não é sério! Ainda sobre o peso do Ministério do Ambiente no Orçamento, a Sr.ª Ministra pode não gostar, mas o certo é que, no ano passado, o Relatório dizia-nos que o Ministério do Ambiente pesava 0,9% na Administração Central e 0,4% no PIB e, este ano, o Relatório diz-nos que pesa 0,8% na Administração Central e 0,3% no PIB. Ora, se isto não é menos peso do Ministério do Ambiente, o que é que é menos peso, Sr.ª Ministra?! Faço, portanto, exactamente a mesma afirmação que a Sr.ª Ministra fez há pouco. Se isto não é menos peso, explique-nos lá o que é isto! Em suma, Sr.ª Ministra, temos de nos confrontar com a realidade concreta e o que o Ministério do Ambiente precisa de fazer é uma opção política e, depois, assumir e dar a cara por essa opção política. É tão simples quanto isto! Não pode é fazer uma opção política e depois tentar disfarçar, dizendo aos portugueses: «Não é esta a opção política que estamos a fazer»! Não! No que diz respeito há falta de clareza» O Ministçrio do Ambiente apresenta-nos um documento explicativo, onde se diz que o Ministério definiu sete prioridades. Ora, se contarmos as prioridades, contamos nove. Depois, reparámos que o litoral está repetido duas vezes, com os 43,7 milhões de euros. Mas, afinal, restam outras» Depois, a Sr.ª Ministra não quer falar da integração da gestão ambiental nas políticas sectoriais» Olhe, Sr.ª Ministra, este documento quase que é para pôr de lado, porque não explica nada, só confunde.
Se é este o objectivo do Ministério do Ambiente, então não vale a pena.
No que diz respeito à questão do litoral, o Sr. Deputado José Eduardo Martins disse há bocado, e bem, que poderíamos pegar num orçamento do Ministério do Ambiente de há não sei quantos anos e verificaríamos que as prioridades são sempre as mesmas. Sabe qual é o problema, Sr.ª Ministra? O problema não é as prioridades serem sempre as mesmas, o grande problema é o facto de os problemas estruturais serem sempre os mesmos e mais graves de ano para ano.
Antes de mais, quero deixar aqui, em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, uma palavra de pesar e de grande solidariedade para com a Região Autónoma da Madeira. Mas, Sr.ª Ministra, isto custa tanto, a mim e ao Partido Ecologista «Os Verdes» (e dizemos isto tantas vezes, Sr.ª Ministra!), porque andamos sempre à espera dos dramas, para, depois, nos virmos solidarizar. Com certeza, temos de o fazer! É evidente! Mas, depois, vimos chorar sobre o que aconteceu! Não pode ser! Temos de ter medidas de prevenção! E a Região Autónoma da Madeira é um exemplo disto.
Volto ao todo do nosso litoral. Sr.ª Ministra, o que se anda a fazer é a estragar consecutivamente o nosso litoral, a não agir em tempo útil, e, depois, claro, os dramas continuam sempre a acontecer. Este Verão aconteceu mais um, na Costa da Caparica. Ainda há pouco dito, e bem, que foram gastos 15 milhões de euros (ou, pelo menos, prometidos 15 milhões de euros), e, agora, o Governo vem prometer 43 milhões de euros?! Isto dá para quê?! Eu não quero discutir números com a Sr.ª Ministra.

O Sr. Presidente: — Tem 1 minuto, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Peço desculpa, Sr. Presidente. Vou terminar e deixo o resto das questões para a segunda ronda.
Não quero discutir números, Sr.ª Ministra, porque já percebi que isso de discutir números não leva a grande coisa. Quero é perceber exactamente o seguinte: do que está previsto para o litoral, o que é que vamos ter efectivamente? O que é que vai resultar exactamente daqui? Como a Sr.ª Ministra sabe, está previsto um programa nacional de barragens com elevado potencial hidroeléctrico que não estudou os seus efeitos sobre o litoral. E a Sr.ª Ministra sabe disto. Não está

Página 24

24 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

preocupada com isto?! Não foram estudados os seus efeitos sobre a qualidade da água. Mas agora, voltando ao litoral, pergunto: que implicações concretas vão resultar daqui no que toca à fragilização do nosso litoral? Isto não está estudado e a Sr.ª Ministra não pode «pôr a mão no lume» à conta disto!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, faça favor de concluir.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente, com mais um aspecto, porque as outras questões que tenho para colocar vão ficar para a segunda ronda, que é o Ano Internacional da Biodiversidade.
Sr.ª Ministra, aparece aqui como uma das prioridades do Ministério do Ambiente a criação de mais áreas protegidas. Com certeza, mas para criar áreas protegidas e para elas funcionarem nos exactos termos em que funcionam as actuais áreas protegidas, pergunto se valerá a pena. Pergunto se valerá a pena, porque ter áreas protegidas sem vigilância, áreas que não têm vigilantes da natureza, é contribuir para a fragilização destas áreas protegidas. O Ministério do Ambiente não tem a hombridade de dizer que este ano vai resolver definitivamente este problema?

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada.
Antes de dar a palavra à Sr.ª Ministra para responder, informo os Srs. Deputados das Comissões de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local e de Orçamento e Finanças que temos a honra de ter entre nós, a assistir a esta sessão, o Sr. Presidente do Parlamento da Moldávia, para quem peço uma saudação.

Aplausos.

Para responder, tem, então, a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, também irei fazer alguns comentários relativamente à sua intervenção.
O primeiro tem a ver com a questão da execução do PIDDAC do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território no ano passado. É importante, já agora, dar nota do seguinte: em 2009, a execução do PIDDAC foi de 82% e em funcionamento foi 100%. Onde correu mal foi na rubrica relativa aos fundos comunitários, onde a execução foi só de 26%. Obviamente que, depois, média feita, atendendo ao volume fundos, a execução global foi prejudicada.
A Sr.ª Deputada diz que o PIDDAC deste ano não é comparável com o PIDDAC do ano passado. O PIDDAC deste ano, Sr.ª Deputada, não tem de ser comparável.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Essa agora!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Nós temos novos projectos! Por que é que tem de ser comparável?! O PIDDAC deste ano tem uma série de projectos novos que foram diagnosticados como necessários. Portanto, vai desculpar-me mas essa observação não colhe.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Então e os projectos que deveriam continuar?!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — A Sr.ª Deputada também deu nota de que as verbas globais inscritas no Relatório do Orçamento do Estado e no documento que disponibilizámos não coincidem. Efectivamente, Sr.ª Deputada, os montantes que estão no Relatório do Orçamento do Estado não incluem os activos e os passivos financeiros, nomeadamente o IHRU (Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana). A abordagem é diferente e, portanto, os números não são coincidentes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É fantástico!

Página 25

25 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — A abordagem é diferente, e, portanto, os números não são coincidentes. Mas é uma clarificação que fica feita. É uma abordagem diferente. Não é necessariamente nem melhor nem pior, é diferente! Sr.ª Deputada, vou contrariar a sua afirmação de que o MAOT tem pouco peso. Na minha perspectiva, o peso do MAOT ou de qualquer outro Ministério não se avalia apenas com base nas inscrições feitas no Orçamento do Estado.
Já tive oportunidade de referir que há outras áreas da política do ambiente que não têm expressão no Orçamento do Estado, designadamente a área gerida pela Águas de Portugal, a área das sociedades Polis, que também são geridas com o contributo da Parque Expo. Todas elas são intervenções com expressão. E quando falo na Águas de Portugal, estou obviamente a incluir a parte da política de resíduos urbanos e de outros fluxos específicos. Por conseguinte, não podemos avaliar a intervenção e o peso da política do Ambiente exclusivamente com base no peso do orçamento do Ministério do Ambiente no Orçamento do Estado.
Relativamente à questão do Ano Internacional da Biodiversidade, já aqui foi referido que vai ser feita uma clara aposta no reforço dos vigilantes. Não vamos ter os vigilantes todos de que precisamos, mas vamos fazer uma aposta no sentido de priorizar dentro das regras que temos de cumprir e que a Sr.ª Deputada conhece muito bem. Temos um conjunto de restrições, no contexto actual da nossa integração na União Europeia, na fase em que estamos, que tem aspectos positivos e negativos, mas não é isto que estamos aqui a discutir.
O que posso dizer-lhe, Sr.ª Deputada, é que, nestes constrangimentos, vamos dar prioridade à área da conservação da natureza. É isto o que posso dizer-lhe. E vamos fazê-lo abrindo mais vagas do que para outras áreas. Eu sei os pedidos que tenho, Sr.ª Deputada.
Já agora, é importante que se tenha a noção de que as políticas do ambiente no nosso país são relativamente recentes. Desde que trabalho, como técnica, no Ministério do Ambiente, no desenvolvimento de várias funções, sempre assisti à situação de escassez de recursos humanos para as políticas que precisávamos de implementar.
A verdade é que no nosso país o Ministério do Ambiente começou a crescer em contraciclo com todas as outras iniciativas tendentes a diminuir o peso do sector põblico, o peso»

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Estamos a fazer esse balanço. Como sabe, o «óptimo é inimigo do bom»! Fazemos o nosso melhor e estamos a priorizar as áreas, porque temos todo o interesse, obviamente, em que as políticas de conservação da natureza e de preservação da biodiversidade progridam.
No que se refere ao plano nacional de barragens, vou voltar à Assembleia da República, a pedido dos Srs. Deputados, para debater esta questão em detalhe. Mas também quero dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que, relativamente ao essencial das barragens, elas são desenvolvidas»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É do litoral que estou a falar!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Eu sei, mas, repare, antes de haver o plano nacional de barragens o Douro já tem hoje barragens que permitem que os sedimentos sejam transportados»

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras da oradora).

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Então, não vamos falar agora daquilo» Quero dizer, falemos de outro tipo de impactos que as barragens podem ter e que estão a ser objecto de avaliação rigorosa. Então, não falemos hoje na implementação do plano nacional de barragens versus litoral.

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Página 26

26 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente: — Haverá ocasião de voltarmos a este tema, se a Sr.ª Deputada assim o quiser.
Srs. Deputados, vamos dar início à segunda ronda de questões, onde cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos, mas acresce a possibilidade de, no final, cada Deputado poder usar da palavra por mais 2 minutos.
Foi esta a grelha acordada na Comissão de Orçamento e Finanças e que tem sido aplicada nestas reuniões.
Em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado António Cabeleira, dispondo, para o efeito, de 5 minutos.

O Sr. António Cabeleira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território, o documento que elaborou para apresentação do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território no debate do Orçamento do Estado para 2010 é extremamente telegráfico, o que se lamenta.
Definiu a Sr.ª Ministra como as três principais prioridades políticas: o litoral, a conservação da natureza e a política de cidades e habitação.
As políticas para o litoral têm sido um fracasso. Como já foi aqui referido pelo Sr. Deputado José Eduardo Martins, ao longo destes anos somam-se insucessos.
Um terço da costa portuguesa está a ser destruída pela erosão. Segundo um relatório da Comissão Europeia, Portugal ocupa o 4.º lugar dos 18 países da União Europeia com maior erosão, facto que não é nada animador.
Sr.ª Ministra, não se percebendo no documento entregue pelo Ministério quais são as medidas de política em concreto, pergunto: que políticas vão ser adoptadas, que planos vão ser revistos, para uma adequada protecção do litoral e para que Portugal deixe de ser o quarto país da União Europeia com mais problemas de erosão e se resolvam, de uma vez, os problemas estruturais, pois vamos somando sucessos e não insucessos? Nas políticas para a conservação da natureza é dado particular enfoque ao facto de o ano de 2010 ser o Ano Internacional da Biodiversidade, mas, Sr.ª Ministra, não se percebe quais as medidas concretas.
Referiu já, neste debate, que vamos acompanhar aquilo que se irá fazer a nível internacional. Parece-nos pouco para que se perceba quais são, de facto, as prioridades do Governo em relação a esta matéria da biodiversidade.
Sr.ª Ministra, também falo aqui no problema dos vigilantes, porque são manifestamente insuficientes.
Quando o Ministério tem de se dotar de recursos humanos, tem de estabelecer prioridades e, se calhar, é muito importante estabelecer como prioridade-base o recrutamento de vigilantes da natureza, porque aquilo em que se tem reparado é que, por falta de vigilantes, aumentam os fogos florestais, os actos de vandalismo, a deposição de resíduos, as actividades furtivas, etc. Portanto, Sr.ª Ministra, esperemos que tome medidas concretas quanto aos vigilantes da natureza.
Sr.ª Ministra, como sabe, está instalada uma profunda indignação na população residente nas áreas protegidas, com a imposição, através da Portaria n.º 1245/2009, do pagamento de taxas adicionais pelo desenvolvimento das mais diversas actividades da sua vida quotidiana. É sabido que as actividades agrícolas, silvícolas e agropecuárias tradicionais são o garante da manutenção do equilíbrio paisagístico e da biodiversidade. A já referida Portaria e, em particular, a tabela de taxas anexa suscitou, no seu curto período de vigência, dúvidas, equívocos e múltiplas reacções não só quanto ao âmbito de aplicação mas também quanto à sujeição de determinados actos e actividades ao pagamento das referidas taxas.
A aplicação de taxas, pela emissão obrigatória de parecer pelo Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, sobre os projectos ou pedidos de autorização, apresentados pela população residente nas áreas protegidas, para o desenvolvimento das mais elementares actividades, como a agricultura, a pecuária, a silvopastorícia, a floresta, etc., implica um tratamento desigual inaceitável das populações residentes nas áreas protegidas. É completamente incompreensível que as populações residentes nas áreas protegidas sejam discriminadas negativamente com a obrigatoriedade de pagamento de taxas adicionais — trata-se de um ónus intolerável para quem vive e trabalha numa área protegida.
Tendo a Sr.ª Ministra do Ambiente reconhecido que algumas das disposições da Portaria são passíveis de ser melhoradas, com vista a potenciar a sua maior inteligibilidade, pergunto á Sr.ª Ministra»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem 1 minuto.

Página 27

27 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. António Cabeleira (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Pergunto, Sr.ª Ministra: vai rever, de facto, a referida Portaria e introduzir o princípio de que as populações residentes não pagam taxas e de que as outras taxas recolhidas nas áreas protegidas são obrigatoriamente investidas no melhoramento das ditas áreas protegidas? Passo à política de cidades e habitação.
A reabilitação urbana, para ser eficaz, deverá constituir-se como uma abordagem integrada que dê resposta ao carácter multidisciplinar dos problemas em presença em cada área, sem esquecer os equipamentos, o apoio ao desenvolvimento social, o desenvolvimento económico e as questões ambientais.
Importa, para futuro, evitar a degradação pontual das edificações, corrigindo os factores que têm prejudicado a conservação regular dos edifícios e criando condições para que a vida urbana se processe normalmente.
É, pois, urgente criar instrumentos adequados à supervisão pública da conservação das edificações, actualizar o cadastro, aperfeiçoar o Regime do Arrendamento Urbano, alargar a todo o território os instrumentos criados pelo Regime Jurídico da Reabilitação Urbana, aperfeiçoar os instrumentos de intervenção coerciva, criar instrumentos fiscais e de financiamento público para potenciar as iniciativas de reabilitação urbana, criar mecanismos de perequação e de afectação de parte das mais-valias, agilizar o processo de planeamento das áreas de reabilitação urbana, onde os planos de pormenor se configuram inadequados,»

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. António Cabeleira (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, importa agilizar o processo de planeamento das áreas de reabilitação urbana, onde os planos de pormenor se configuram inadequados, dada a sua complexidade, instituindo a figura do plano de salvaguarda, conjugado com um programa de acção.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Glória Araújo.

A Sr.ª Glória Araújo (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Ambiente, começo por uma afirmação do meu colega, Sr. Deputado Miguel Tiago: estamos aqui para discutir política e não para fazer considerações demasiado técnicas que não nos permitam alcançar a visão política que se pretende deste tipo de reuniões. E, neste sentido, gostaria de sublinhar algo que é público e notório mas que, infelizmente, não se tem percebido, ao longo desta reunião.
O anterior Governo foi, de facto, o Governo que colocou o ambiente no fulcro da política económica em Portugal. Efectivamente, foi com este Governo e a partir da acção política deste Governo que o ambiente passou a ser uma questão estratégica económica.
Hoje em dia, Portugal tem uma economia «verde» de volume considerável, temos rankings, a nível europeu, que demonstram bem isto mesmo, temos orgulho no trabalho que foi feito, temos uma visão estratégica económica centrada no ambiente.
Portanto, para sairmos um bocadinho da contabilidade e falarmos um pouco de economia, até para darmos o enquadramento da expressão real do ambiente nas políticas e opções do Governo, e não aquele que emana apenas deste orçamento, em concreto, do Ministério do Ambiente, que é manifestamente muito reduzido em relação ao que é, hoje em dia, falar de ambiente em Portugal (e sabemos que a dotação orçamental que está prevista para o Ministério do Ambiente não reflecte, nem de perto nem de longe, o investimento do Governo em políticas sustentáveis de ambiente), quero lembrar, de passagem, que tivemos um investimento nas energias renováveis, nas eólicas, no plano nacional de barragens, que, apesar de tudo e com todos os defeitos que possa ter, ç uma opção económica para a energia que convçm ao ambiente,»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isso de convir ao ambiente»!

A Sr.ª Glória Araújo (PS): — Convirá, certamente, mais do que outras que eram possíveis.

Página 28

28 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Refira-se, ainda, o carro eléctrico, a própria certificação energética dos edifícios e todas as consequências de acréscimo de valor em tudo o que possa ser reabilitação urbana, e o próprio parque escolar, já que estamos a construir escolas amigas do ambiente.
Portanto, diria que todo o impacto que o facto de o Governo ter assumido o ambiente como fulcral na sua política económica está a causar em todas as áreas, em todas as indústrias e em todos os sectores deste País, é, de facto, histórico e notável, e este é, realmente, o Governo que centrou a nossa economia no ambiente.
Desta forma, como não poderia deixar de ser, a mais-valia que o Ministério do Ambiente ganhou, na minha opinião, pelo menos, em relação àquilo que acontecia no passado, foi o facto de se ter colocado na coordenação de todo este projecto de um governo. É, pois, um parceiro estratégico, é um parceiro que, a cada momento, auxilia e impulsiona o Governo a avançar nesta opção clara por uma economia moderna.
Inevitavelmente, quando falamos, por exemplo, em alterações climáticas — e, já agora, gostaria de perguntar à Sr.ª Ministra ou, talvez, ao Sr. Secretário de Estado, pois não sei quem terá os números em concreto, como está Portugal, em termos de emissões de CO2, e como está a nossa perspectiva de cumprirmos Quioto —,»

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem 1 minuto.

A Sr.ª Glória Araújo (PS): — Obrigada, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, quando falamos em alterações climáticas, também temos de pensar, apesar de a quantificação ser bastante difícil, pelo menos de uma forma mais estrita, no que significou, em termos de ambiente, toda esta opção que o nosso Governo fez em matéria de políticas e de economia que se possa chamar «verde». E, de facto, hoje em dia, em todos os ministérios e em todos os sectores, temos não apenas uma boa vontade, um tanto ou quanto kitsch, na demonstração daquela que é a intenção de respeitar o ambiente, mas, sim, opções estratégicas, em todas as áreas e em todas as indústrias, orientadas para uma economia «verde».
Considerando aquilo que se passou em Copenhaga, considerando aquilo que é do nosso conhecimento geral sobre o estado da economia e das finanças, a nível global, como é que a Sr.ª Ministra, parceira estratégica de todo um Governo que está empenhado numa economia neste sentido, perspectiva a continuação do investimento e da acção deste Governo no que toca, por exemplo, à reforma fiscal, que tão bem lembrou, que se iniciou na passada Legislatura e agora se implementa.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

A Sr.ª Glória Araújo (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Como é que a Sr.ª Ministra vê a prossecução das políticas do Governo para o ambiente, no actual contexto da conjuntura económica global.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Ambiente, agora, vamos falar de ordenamento do território.
A Sr.ª Ministra anuncia no programa que irá seguir uma política de reabilitação urbana e de ordenamento do território, uma política das cidades, etc., mas aquilo que temos, da anterior Legislatura, é uma política de reabilitação urbana que, atendendo ao número de prédios reabilitados, pode considerar-se ter sido um falhanço, no âmbito nacional.
Tivemos uma política de incentivo ao arrendamento que, novamente, atendendo ao número de pessoas que a ele recorreram, se afigura ter sido desajustada da realidade do mercado.
Anuncia, agora, para esta Legislatura, que irá ser submetido à discussão pública um documento relativo à nova lei dos solos, que será o documento-base a partir do qual se irá, efectivamente, re-regulamentar o uso dos solos em Portugal.

Página 29

29 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A questão que coloco, desde já, muito directa e concretamente, é esta: em termos de peso político, qual é o peso que o Ministério do Ambiente tem no Governo? É que qualquer política de ordenamento do território, em Portugal, terá de passar, necessariamente, pela integração de uma nova lei dos solos, como aqui é anunciado, mas também pela alteração de todo o paradigma do desenvolvimento urbano a que se tem assistido, em Portugal, nos últimos 10, 15 ou 20 anos. Portanto, para o Ministério do Ambiente implementar, de forma efectiva, uma política de fundo de ordenamento do território, terá de o fazer transversalmente e de forma cruzada com outros ministérios.
Dou-lhe um exemplo concreto: para além de medidas esparsas e dispersas, de pequenos incentivos aqui e ali, não se pode implementar uma política de fundo de reordenamento urbano, ou seja, de recuperação dos centros das cidades, trazendo, novamente, as pessoas para os centros das cidades e acabando com o caos urbanístico, que é a constante e sistemática emissão de novas licenças de construção para a transformação de solos em solos urbanos e habitáveis, concorrentemente com a desertificação dos centros das cidades, sem se mexer, por exemplo, na Lei das Finanças Locais, sem se mexer neste paradigma que representa o grosso das receitas das autarquias, por via dos IMI (imposto municipal sobre imóveis) e dos IMT (imposto municipal sobre transacções). Enquanto isto não for mexido, não podemos ter autarquias colaborantes com o Governo central, numa política efectiva, concreta, realística e de efeitos plenos de recuperação dos centros urbanos das cidades, de reutilização dos solos para os fins para que deveriam ser utilizados, o que, no fundo, também tem a ver com uma política ambiental consistente e de fundo que passe pela não deslocalização das pessoas dos centros das cidades e de perto dos locais de trabalho, pondo-as a morar a quilómetros, só porque tal é conveniente à autarquia, já que aumenta as suas receitas, só porque tal é conveniente ao promotor imobiliário, porque lhe dá muito mais dinheiro construir de novo do que recuperar no centro das cidades, e tal é conveniente, paralelamente e, se calhar, acima de tudo, a um sistema financeiro, a um sistema bancário que vai buscar mais-valias tremendas a todo este sistema, já que faz um empréstimo ao construtor, faz um empréstimo a quem vai comprar, etc.
Mas isto passa ainda por outra questão, Sr.ª Ministra. O paradigma do desenvolvimento também tem a ver com o lançamento de uma política do Governo, de incentivo à aquisição de habitação fictícia, a qual veio causar o endividamento de milhares e milhares de famílias portuguesas e contribuir para uma menor mobilidade social, quando, principalmente em tempo de crise, é preciso aumentar essa mobilidade para corresponder à falta de emprego em determinadas zonas. Se houvesse uma política séria de arrendamento e não uma política de incentivo à compra de habitação própria, a maioria das famílias portuguesas teria mobilidade para mudar de zona à procura de um novo paradigma de trabalho, de emprego.
Com a política que se seguiu durante estes últimos 15 a 20 anos, amarrou-se as pessoas, com a «âncora» da compra de casa, do empréstimo e da hipoteca, a uma zona, impedindo-as de se movimentarem e de irem à procura de uma melhor vida noutro local onde pudesse haver emprego.
A pergunta que lhe deixo, apesar de ter muitas mais para lhe fazer, mas o tempo é escasso, é a seguinte: vamos com esta equipa, com este Governo, ter o compromisso político sério de olhar para as questões a fundo e desenvolver uma política séria de reordenamento dos solos, de recuperação dos centros urbanos e alterar completamente o paradigma — a meu ver, errado, e está provado que é errado — de desenvolvimento urbanístico que tem existido nos últimos 15 a 20 anos?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Calvário.

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar, queria recolocar duas perguntas a que a Sr.ª Ministra não respondeu. A saber: para quando a aprovação do Plano Estratégico da Habitação e em que consiste o Programa de Apoio à Reabilitação Urbana para 2010-2015, que aparece no Relatório do Orçamento do Estado, porque não vemos qualquer tradução concreta a nível do orçamento, nomeadamente em termos de medidas fiscais, entre outras? Em segundo lugar, queria referir a política de conservação da natureza. O Ano Internacional da Biodiversidade é 2010 e a Ministra diz que, neste ano, será dada prioridade à política de conservação; no entanto, aquilo a que assistimos é a uma redução das verbas do ICNB, comparativamente ao orçamento de 2009, na ordem dos 4,4%. E, quando conhecemos, ao longo dos últimos anos, a desorçamentação deste

Página 30

30 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Instituto, o que prejudica cada vez mais a sua capacidade técnica e operacional de estar no terreno a executar a política de conservação da natureza, parece-nos muito estranho que haja uma redução de verbas, ao mesmo tempo que surge o discurso da prioridade nesta política.
Depois, vem a Ministra dizer-nos que este Instituto deverá recorrer à prestação de serviços, ao outsourcing, a estágios profissionais, nomeadamente a nível dos vigilantes da natureza, quando este corpo de vigilantes extremamente importante para aplicar a política de conservação da natureza tem tido, ao longo dos últimos anos, condições de trabalho muito deficitárias e quadros profissionais com vínculos precários que em nada dignificam este corpo profissional e que prejudicam muito a aplicação de uma política de conservação da natureza séria e responsável.
Portanto, se é este o caminho, o de continuar a precariedade, recorrer a prestações de serviço exteriores e não dignificar estes profissionais, de facto, não percebemos a prioridade que o Ministério diz que dá a esta política.
Relativamente aos vigilantes da natureza, há muitos parques naturais que continuam sem ter os quadros de pessoal preenchidos. Inclusive, no Parque Natural do Douro Internacional, neste momento, não existe qualquer vigilante da natureza. Gostaria de perguntar à Sr.ª Ministra se vai preencher os quadros de pessoal não só neste Parque mas em todas as áreas protegidas, de quantos novos recrutamentos estamos a falar e como é que isso se traduz em termos orçamentais, uma vez que não está previsto nas despesas com pessoal o recrutamento de novas pessoas.
No que respeita à água e aos recursos hídricos, muito nos espanta que haja em torno desta matéria um discurso, e vou citar, de «continuidade com uma política de criação de valores» e de «considerar a água como eixo motor para uma estratégia de crescimento económico». Julgo que estas palavras dizem tudo: consideram a água e os recursos hídricos como uma mercadoria, como um bem transaccionável e não como um bem público essencial para consumo humano e para a manutenção e a sustentabilidade dos ecossistemas e da biodiversidade. Creio que estas palavras mostram a forma como o Governo entende a água e os recursos naturais. De facto, considera-os como mercadorias. Aliás, isto está muito patente em toda a política que o Governo tem seguido nesta área, nomeadamente na área do abastecimento e do saneamento em que, apesar de dizer que considera o sector das águas estratégico, tem seguido uma política de concessões e parcerias público-privadas, que entrega a gestão aos privados numa lógica de negócio e de lucro que não é consentânea com a protecção destes recursos e com a responsabilidade social que deve existir na prestação destes serviços.
No que respeita aos recursos hídricos, parece que o Ministério ainda não sabe muito bem o que é o Polis Rios. Ainda é um conceito em definição, o que muito me espanta. Mas queria saber, mesmo sendo um conceito em definição, qual será a sua articulação com os planos de gestão de bacia hidrográfica, porque esses, sim, definem quais devem ser as intervenções de recuperação, manutenção e valorização dos recursos hídricos, conhecer qual é a verba associada ao Polis Rios neste orçamento e se este programa, uma vez que terá mecanismos de financiamento associados, irá contribuir para que Portugal, esperemos, em 2015 cumpra os objectivos ambientais estabelecidos na Directiva-Quadro da Água, um compromisso que Portugal assumiu.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Srs. Presidentes da Comissão de Orçamento e Finanças e de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território, Sr.a e Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, a primeira questão que queria colocar, apesar de já ter sido hoje aqui abordada, prende-se com o Polis da orla costeira. Porque entendo que há questões que ainda não foram completamente esclarecidas, queria colocá-las à Sr.ª Ministra.
Os planos de ordenamento da orla costeira estão aprovados. Pergunto: para quando a sua implementação e, dessa implementação, que projectos se prevê avançarem em 2010? A última informação que nos foi dada relativa ao «Orçamento por acções» refere que o orçamento para o litoral é de cerca de 43,7 milhões de euros, verba que consideramos manifestamente insuficiente para a execução destes importantes planos de ordenamento ao nível do litoral.
Queria referir o Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos, que também já hoje foi aqui abordado, que retém as verbas das taxas de recursos hídricos pagas por todos nós. No Relatório do Orçamento do Estado,

Página 31

31 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

ele é referido para os Polis Rio e também se indica que é possível recorrer a este Fundo para a execução de obras no âmbito do litoral. Este Fundo tem cerca de 17 milhões de euros e parece que é a salvação para todos estes investimentos que são necessários. Peço-lhe que esclareça esta questão, porque este Fundo não dará para todos estes investimentos e é necessário, efectivamente, conhecermos aquilo que irá avançar em 2010.
Um outro aspecto que queria abordar prende-se com o orçamento privativo das comissões de coordenação e desenvolvimento regional (CCDR). Ultimamente, às CCDR tem sido retirado um conjunto de meios que lhes permitia desenvolverem as suas funções, o que coloca grandes dificuldades no desempenho das suas responsabilidades e tem reflexos negativos a este nível, nomeadamente nos municípios naquilo que tem a ver com o acompanhamento das revisões dos planos directores municipais, dos planos de urbanização e dos planos de pormenor.
Esta diminuição do investimento — aliás, desinvestimento que é visto em todo o orçamento do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território — vai, naturalmente, criar grandes dificuldades à continuação do trabalho ao nível do ordenamento do território.
A terceira questão que quero colocar tem a ver com o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana. Em 2009, em termos de orçamento foi executado cerca de 30% daquilo que estava orçamentado, tendo ficado do muito aquém das necessidades e dos objectivos políticos quando foi referido que a reabilitação urbana e o realojamento eram uma prioridade. Mas a verdade é que só 30% desse orçamento foi executado. E em 2010, pasme-se, não há nenhum aumento deste orçamento, como é referido no Relatório; antes pelo contrário, ele tem uma diminuição de cerca de 60% face ao orçamentado em 2009.
Atendendo aos níveis de execução, nomeadamente aos do ano passado, temos uma previsão de futuro pouco animadora. E se, em 2010, os níveis de execução forem os mesmos do que em 2009, a reabilitação e o realojamento, mais uma vez, sendo colocados como uma prioridade pelo Ministério do Ambiente, ficarão muito aquém daquilo que é necessário.
Um outro assunto prende-se com o projecto Arco Ribeirinho Sul, relativamente ao qual queria colocar-lhe três questões muito concretas. Este projecto veio reflectido como prioridade em 2009, surge novamente em 2010 e, entretanto, foram publicados os estatutos da sociedade que irá gerir todo o projecto.
As questões muito concretas são as seguintes: qual o calendário, o cronograma previsto para a concretização deste projecto? Qual a dotação financeira associada ao projecto e o seu reflexo em termos de Orçamento do Estado para 2010? Para quando a constituição das sociedades executoras locais, que ainda não foram constituídas?

O Sr. Presidente: — Dispõe de 1 minuto, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Obrigada, Sr. Presidente.
No seu órgão executivo, prevêem-se dois elementos executivos e um elemento não executivo e os municípios não têm a possibilidade de ter um desses elementos executivos. Queria perguntar-lhe a razão de ser dessa situação.
A última questão prende-se com o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida. Passados quatro anos da aplicação deste Plano, qual é a avaliação que o Governo faz da sua aplicação? Qual foi a melhoria das condições de vida das populações locais com a aplicação deste Plano? Quais são os impactos nas comunidades, nomeadamente nas comunidades marinhas, com as fortes restrições para a actividade piscatória artesanal existentes no Parque Marinho Luiz Saldanha? Pretendia ainda saber se, na revisão deste Plano, o Governo está ou não disponível para proceder a alterações nas imposições que são prejudiciais para as populações locais e para os pescadores.
Consideramos que a aplicação deste Plano teve efeitos bastante negativos para a comunidade local, nomeadamente para os pescadores, e o que queríamos saber é se a avaliação da sua aplicação está em debate público, se nele estão envolvidas entidades representativas de pescadores e os municípios e se, efectivamente, se vai proceder a alterações para minimizar os efeitos nefastos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

Página 32

32 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território, na resposta que me deu na primeira ronda fez afirmações gravíssimas e acho que elas têm que ser denunciadas.
Em primeiro lugar, relativamente à clareza ou à disparidade de números entre o Relatório do Orçamento do Estado, que é o documento oficial entregue na Assembleia da República, e a nota explicativa que o Ministério deu, a Sr.ª Ministra veio justificar dizendo que aqui não estava incluído o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana. Está cá! Portanto, essa não é a razão! Gostava de perceber, de facto, os números que o Ministério apresenta.
Mas, depois, manda afirmações para o ar que ainda por cima não correspondem à verdade! A Sr.ª Ministra diz que o PIDDAC não é para comparar com o do ano passado?! Ó Sr.ª Ministra, tenha respeito pelo trabalho dos Deputados! Então, não é para comparar? Não temos projectos plurianuais? Não precisamos perceber se continuam lá, se desistiram deles? Perguntou o que significa estar ou não em PIDDAC. Então, os PIDDAC não são para comparar? Até são para comparar com os PIDDAC de outros anos! É evidente que são para comparar! Não podemos dizer «vamos esquecer tudo o que ficou do passado e vamos fazer uma coisa nova este ano»! Se fosse essa a questão, o Ministério do Ambiente não tinha — mal! — determinado no Relatório que as suas verbas sobem 51%, o que ainda por cima não corresponde à verdade. Portanto, as conclusões não podem ser retiradas conforme nos apetece, Sr.ª Ministra.
Olhe, como Deputada, gostava de perceber o orçamento do Ministério do Ambiente. É esse o apelo que faço, e não estou a conseguir perceber porque a Sr.ª Ministra não está a esclarecer.
A Sr.ª Ministra tem razão quando refere que vamos discutir o programa nacional de barragens noutra altura, mas dizer-me para não culparmos o programa nacional de barragens pela situação em que está o nosso litoral, claro que não o fazemos porque ele ainda não existe. Mas o que se passa é que ele vai agravar o problema do nosso litoral. É essa a chamada de atenção que queremos fazer, e os senhores não estudaram isso! Sabe por que é que não estudaram? Porque não convém estudar porque os resultados seriam maus! Mas falaremos sobre isto noutra sessão.
Em relação aos vigilantes da natureza, a afirmação que a Sr.ª Ministra faz é muito geral. Gostávamos de perceber o que vai isto resultar na prática. Ou seja, daquilo que está orçamentado, com as necessidades reais de alargar o corpo de vigilantes da natureza» O Parque Nacional do Douro Internacional não tem vigilantes da natureza. Isto é perfeitamente inconcebível!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Tem «zero»!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E quanto ao Parque Natural da Arrábida, o número de vigilantes da natureza é claramente insuficiente! E não vamos falar de outros» Ou seja, face às necessidades prementes no País de vigilantes da natureza, o que vai resultar no final do ano 2010? É isso que gostávamos de perceber! E não venha dizer que temos muitas dificuldades, que isto não é como queríamos, mas que vamos fazer um grande esforço. Pois, mas pergunto: o que vai resultar, na prática? Qual é o objectivo, a meta do Ministério do Ambiente? O Polis Rios é uma outra questão que eu tinha para colocar, mas já outros Srs. Deputados o fizeram. Já percebemos que ainda está, no âmbito do conceito, em definição. Se a Sr.ª Ministra quiser mandar à Assembleia da República o leque de hipóteses, nós também podemos dar um contributo relativamente ao nome. Porém, não é o nome que interessa mas saber o que é isto, qual é o objectivo, o que vai resultar durante o ano de 2010. É isto que precisamos saber, é isto que queremos saber e não os nomes ou as nomenclaturas que são dadas às coisas.
A Sr.ª Ministra disse — e muito bem — que o Ministério do Ambiente deveria ser um ministério transversal.
Quero saber a opinião da Sr.ª Ministra sobre as deduções à colecta relativamente à aquisição de equipamentos para energias renováveis. Os Verdes continuam a afirmar que este apoio decresce no cômputo geral. É verdade que há um item novo importante: o valor das obras que se façam na nossa casa em termos de isolamento para maior eficiência energética pode ser deduzido à colecta. Isto é importante, mas o que é dito no Orçamento do Estado?

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, dispõe de 1 minuto.

Página 33

33 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou já terminar, Sr. Presidente.
É dito que isto só pode ser aplicado de quatro em quatro anos.
Ora bem, imaginemos que eu sou uma pessoa que ganha o salário médio nacional — que a Sr.ª Ministra sabe que não é nada elevado —, tenho filhos, tenho uma casa com, imaginemos, seis janelas. Eu não consigo, com o meu orçamento, isolar tudo num ano. Então, vou dar prioridade ao quarto dos meus filhos e vou aplicar janelas duplas nesse quarto. O que diz o Governo? Diz: «Pois bem, se não pode, azar. Pudesse! Porque agora põe as janelas no quarto dos miúdos e deduz o valor à colecta, mas para o ano já não põe janelas porque só pode deduzir de quatro em quatro anos». Isto não é justo! Quem pode faz tudo; quem não pode tem um benefício muito menor. Portanto, não é justo, Sr.ª Ministra.
Eu já fiz a pergunta ao Sr. Ministro das Finanças, mas eu gostava de ouvir a resposta da Sr.ª Ministra do Ambiente, que, à partida, terá outras preocupações mais directas nesta área em relação a toda a população portuguesa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Marques.

O Sr. Fernando Marques (PSD): — Srs. Presidentes da Comissão de Economia e Finanças e da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, antes de colocar uma questão muito concreta ainda sobre os sistemas multimunicipais de abastecimento de água, permita-me, Sr.ª Ministra, uma nota para a felicitar pela humildade com que vem a esta Câmara — pena que outros colegas seus do Governo não tenham essa mesma humildade! — reconhecer aquilo que é óbvio e tantas vezes aqui tem sido dito. As palavras não são minhas, eu registei-as, são suas: o PEAASAR está atrasado, tem havido dificuldades na implementação do QREN, as coisas não têm corrido bem.
Bom, isto só prova que o PSD, afinal, tinha razão quando há umas semanas apresentou um projecto de resolução que tinha, precisamente, um conjunto de recomendações ao Governo no sentido de agilizar e acelerar a execução do QREN, porque temos três anos perdidos durante os quais, obviamente, muita coisa podia estar já decidida, relativamente ao PEAASAR e a outras questões relacionadas com o QREN.
Mas vamos ainda às questões do ciclo urbano da água. Parece-me que era necessário o Governo explicitar melhor as suas posições sobre esta questão. O abastecimento de água e tratamento de águas residuais é apontado como uma das prioridades no documento que nos foi entregue, mas, ao ler o relatório sectorial do Orçamento do Estado, vemos que muito pouca coisa se diz acerca dos investimentos e dos abastecimentos de água.
Como é evidente, vai-me dizer que se remete para a Águas de Portugal, que é a Águas de Portugal que vai fazer os investimentos, mas eu penso que quem tem de definir a política é o Governo e nós devemos ser informados dessa perspectiva do Governo nesta matéria dos sistemas de abastecimento de água.
Portanto, a questão que coloco muito concretamente é esta: verticalização dos sistemas, sim ou não? A determinada altura, ainda havia dúvidas sobre se deveriam ser criados novos sistemas multimunicipais para os abastecimentos de água em baixa ou se deveriam ser os actuais sistemas a integrar e a verticalizar o sistema de abastecimento de água em baixa. Se sim, vai haver dinheiro suficiente no QREN para financiar todos os investimentos previstos? Dado que a maior parte dos municípios assinaram protocolos de intenção — foi feito um levantamento nacional dos investimentos necessários —, pergunto, Sr.ª Ministra: há ou não dinheiro para todos estes investimentos, necessários para atingir os objectivos do PEAASAR? Pequenos sistemas autónomos e municípios que não aderiram a estes sistemas têm ou não possibilidade de ser financiados no QREN? Por último, ainda, refiro a questão das tarifas que a Sr.ª Ministra abordou muito levemente. Naturalmente, há sistemas multimunicipais em que os estudos de sustentabilidade apontam para tarifas incomportáveis para a população. Pergunto se elas vão ou não ser harmonizadas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Manuel Gonçalves.

Página 34

34 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Jorge Manuel Gonçalves (PS): — Srs. Presidentes da Comissão de Economia e Finanças e da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Srs. Membros do Governo, começo por elogiar a afirmação da Sr.ª Ministra de que uma opção prioritária para o ano de 2010 é a intervenção sobre a requalificação do litoral.
Sendo Deputado eleito pelo distrito de Leiria, quero também congratular-me com as afirmações que aqui fez sobre a intervenção da praia do Carreiro do Mosteiro, na Berlenga, e da praia da Consolação e da Consolação Norte.
Sabemos que vivemos um período de crise orçamental, sabemos que há dificuldades em atender e responder a todos os problemas que o País tem. Outros, com certeza, como aqui já manifestaram, têm a «receita» para que ninguém pague nada, para que os assuntos sejam todos resolvidos, para que não haja problemas de ordem orçamental. É uma «receita» que muitos países comprariam, mas até hoje ninguém comprou essa «receita» e, como tal, não a vi aplicada em lado nenhum, e todos os países se confrontam com problemas de ordem ambiental.
Outra questão: face à crise financeira em 2009, o Governo tomou a iniciativa de ter um programa para a renovação da frota automóvel para substituição de veículos em fim de vida. Trata-se, pois, de uma medida tomada para apoiar a economia, mas que também teve reflexos na área ambiental. Essa medida está contemplada no Orçamento do Estado, com uma dotação orçamental que vem do Ministério das Finanças.
Pergunto: mesmo com algumas limitações neste domínio, até porque o País tem de começar a fazer uma caminhada no sentido de reduzir o seu défice orçamental, qual é a opinião da Sr.ª Ministra relativamente a uma medida com uma matriz importante também do ponto de vista ambiental, mas com uma dotação orçamental fora do seu Ministério? Qual é a avaliação que a Sr.ª Ministra faz da continuidade deste programa para melhoria do ambiente em Portugal?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, começaria por cumprimentar os Srs. Membros do Governo.
Sr.ª Ministra, a revisão do Parque Nacional da Peneda-Soajo-Gerês seria, certamente, uma oportunidade para reconciliar o Parque com as suas gentes. Por isso, pergunto se está disponível para suspender o processo em curso e iniciar novo processo, com base na Resolução do Conselho de Ministros n.º 134/95, de 11 de Novembro, consagrando o estatuto das populações locais, a defesa dos direitos conforme os usos e costumes e garantindo contrapartidas para compensar impedimentos de actividades económicas.
Julgo que não deve haver dificuldade em ter em conta estas questões que levanto, dado o apoio de um Deputado do Partido Socialista à manifestação de mais de 2000 pessoas, habitantes do Parque, que se realizou no passado mês de Janeiro, em Braga.
A Sr.ª Ministra falou sobre a defesa do litoral. No PIDDAC, estão previstos 43,7 milhões de euros.
Pergunto: que projectos e que dotações estão previstos para a defesa da erosão no Parque Natural do Litoral Norte, concretamente, nas praias das freguesias de São Bartolomeu do Mar, Marinhas, Esposende e Apúlia, que tão gravemente estão a ser atingidas, ficando sem praias? Relativamente ao problema de ambiente e de empresas, Sr.ª Ministra, refiro o seguinte: um dia destes a Agência Portuguesa do Ambiente validou o aumento da taxa da Sociedade Ponto Verde em 36,5%, valor médio. Isto corresponde a uma situação absolutamente incompatível com a competitividade de uma parte significativa de empresas portuguesas. Pergunto se a Sr.ª Ministra está a pensar em rever este valor, que se associa a outras taxas de recursos hídricos e outros, como a Sr.ª Ministra sabe.
Uma outra questão diz respeito ao facto de as oficinas de automóvel estarem há muito obrigadas, e bem, à inscrição no SIRAPA — Sistema Integrado de Registo da Agência Portuguesa do Ambiente, portanto, ao pagamento de custos por esse facto e até, e bem, ao pagamento de coimas, quando não cumpram.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que abrevie ou que termine.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Vou abreviar, Sr. Presidente.

Página 35

35 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Pergunto, Sr.ª Ministra, quando é que se impõem as mesmas regras às grandes superfícies, aos grupos de distribuição que vendem produtos e, depois, não fazem a recolha de resíduos.
Finalmente, Sr.ª Ministra, pedia-lhe uma informação sobre a concretização da reabilitação de bairros do exIGAPHE, que também consta do PIDDAC, no concelho de Guimarães, dado não haver dados suficientes nos documentos que nos forneceu.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Roseira.

A Sr.ª Luísa Roseira (PSD): — Srs. Presidentes da Comissão de Economia e Finanças e da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, a pergunta que quero fazer muito sinteticamente à Sr.ª Ministra tem a ver com os resíduos e o peso que os mesmos têm, dentro das prioridades que a Sr.ª Ministra estabeleceu no orçamento do Ministério do Ambiente.
Uma vez que considerou, desde o início, nas entrevistas que publicitou, que esta era das matérias que mais a preocupavam, pergunto-lhe se entende que o valor atribuído a esta rubrica dos resíduos é suficiente para combater, quando, designadamente, o último estudo da Comissão Europeia, que foi publicado este mês, entende que a verba é insuficiente para atacarmos este problema.
Uma outra questão é de regozijo por parte do PSD pelo facto de o Governo ter aderido à nossa causa da fiscalização e do combate às infracções ambientais. É com grande regozijo, mais uma vez o digo, que nós verificamos que têm essa intenção na vossa política.
Também sob a forma de crítica construtiva, gostaria de dizer à Sr.ª Ministra que este tipo de acções não se fazem com políticas reactivas de voo picado em acções hipermediatizadas e acções-espectáculo. Uma fiscalização eficaz é aquela que não é anunciada. Como sabe, se anunciarmos as fiscalizações, vamos pôr sobreaviso e alertar os prevaricadores que, nesse sentido, vão ficar muito mais dispersos e atentos para esconder situações ilícitas. Foi o que não aconteceu com a anterior operação que efectuou, a megaoperação.
Mas, como nós sabemos que este Governo não vive sem anúncios, temos que resignar-nos a esse fim! Porque pelos dados, que nos forneceu, do Orçamento do Estado, não vi, quanto à fiscalização, que houvesse recurso a meios humanos, pergunto com que meios pretende aumentar a fiscalização no terreno e com que meios pretende aumentar a fiscalização quer na instrução quer na conclusão dos processos de contra-ordenação. Faço esta pergunta, uma vez que sabemos que grande parte é arquivado e que, por outro lado, quando há recursos por parte de privados, os mesmos são considerados improcedentes, por falta de fundamentação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Leitão Amaro.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Srs. Presidentes da Comissão de Economia e Finanças e da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Srs. Membros do Governo, muito rapidamente, queria fazer-lhe uma pergunta sobre a habitação jovem.
Sem querer deixar de lhe fazer uma outra pergunta, sobre que outras políticas, para além do programa Porta 65, pensa o Governo criar, sendo que a realidade é a ausência total de políticas, especificamente sobre o programa Porta 65 (arrendamento jovem), gostava de agradecer e saudar a Sr.ª Ministra pelas alterações propostas, recentemente aprovadas em Conselho de Ministros, e que são, na verdade, um acto de contrição, dando razão a todos aqueles que, como o PSD, desde há muito, acusavam este programa de ser claramente insuficiente e injusto, deixando de lado muitos milhares de jovens que perderam o apoio com a política e com o programa Porta 65.
A Sr.ª Ministra vem aqui dizer, hoje, que o Orçamento do Estado para 2010 contempla um apoio de 20 milhões de euros. Gostava, desde logo, de lhe perguntar quanto é que foi, afinal, em 2009? Houve declarações em que disseram 16,5 milhões de euros; o site, do Governo, Portal da Juventude diz 6,5 milhões de euros. De qualquer forma, qualquer destes valores está tanto, tanto abaixo dos 65 milhões que o anterior programa teve em 2007 que pergunto que esperança é que se pode pôr neste programa, que convicção tem o Governo neste programa, como é capaz o Governo de falar em aumento do número de jovens comparticipados se, no máximo (se for executado), ficamos a um terço!

Página 36

36 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Sr. Ministra, rapidamente, gostaria de colocar mais duas ou três questões que não estão resolvidas.
O programa Porta 65, hoje, deixa de fora um grupo de jovens muito significativo, e não só enquanto política social. Com certeza, neste momento, poderia fazer sentido dar-lhe um cunho também social, designadamente o de não abandonar aqueles jovens que perdem o emprego nesta fase. Estará o Governo disposto a que o Porta 65 abranja os estudantes deslocados, os jovens com os estágios que o Governo promete e cujo enquadramento neste programa é muito difícil e, finalmente, os jovens de rendimentos mais baixos?

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que abrevie, Sr. Deputado.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.
Está o Governo disposto a rever a taxa de esforço, a rever os limites de comparticipação e outras regras sobre o funcionamento, designadamente as relativas ao período de duração? Sr.ª Ministra, está ou não disposto o Governo a levar a sério, finalmente, o programa de apoio ao arrendamento jovem?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.

A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, antes de mais, gostaria de frisar uma temática que já muito aqui foi referida e sublinhada — as intervenções no litoral. Estas intervenções são cruciais e de ter em conta, sobretudo numa perspectiva de equilíbrio dos ecossistemas com todos: com a fauna, a flora, mas também com pessoas e actividades económicas. Este é, pois, um ponto absolutamente crucial, sobretudo nas intervenções no litoral, como é o caso, por exemplo, da intervenção no quadro do Polis da ria Formosa.
Gostaria, por isso, de sublinhar que neste contexto, em termos europeus, algumas cartas foram dadas.
Aliás, tive a honra de também ser relatora do Relatório Turismo litoral, que previa precisamente essa interligação entre o litoral e o interior e a responsabilidade colectiva que a preservação do litoral europeu deveria ter numa lógica europeia, que hoje não existe, mas que foi aprovada e aceite pela Comissão Europeia e que era importante que, agora, visse a luz do dia em termos de legislação e de apoio financeiro.
Neste sentido, gostava de pedir à Sr.ª Ministra intervenções nesse sentido para que esta mensagem, esta linha tão difícil de conseguir visse agora, também, e dado que Portugal é um país com a expressão de costa por todos conhecida, um apoio suplementar nessa matéria.
Por outro lado, gostaria de sublinhar a questão da reabilitação urbana. Esta é uma peça crucial que já aqui foi frisada pela Sr.ª Ministra, que vem vertida neste orçamento e que visa a certificação e a qualificação energética do património edificado e de todas as habitações, além de que é muito importante neste contexto de crise: é um apoio económico muito direccionado à reconversão de empresas de construção civil que, como sabemos, vivem momentos difíceis.
Considero que este é, pois, um elemento muito importante para a ligação entre o ambiente e a economia num país como Portugal.
Nessa lógica de respeito ambiental, gostaria de pedir à Sr.ª Ministra que nos clarificasse também como Portugal pretende (de uma maneira que julgo absolutamente pioneira) levar à prática a operacionalização da questão dos veículos eléctricos e de que forma os cidadãos poderão aceder, de uma maneira expedita e eficaz, a esta hipótese.
Para terminar, de forma muito telegráfica, gostaria de falar de uma problemática muito clara. Refiro-me ao apoio à rolha de cortiça e ao ataque que está a viver por todo o mundo.
Há uma iniciativa europeia a desenrolar-se que se prende com a aplicação do rótulo ambiental, ou ecológico, ou biológico, simplesmente e só quando exista rolha de cortiça. Gostaria de saber de que forma poderá ajudar uma actividade económica tão importante para o seu País.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Antonieta Guerreiro.

A Sr.ª Antonieta Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, muito bem-vinda.

Página 37

37 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Na última vez que cá esteve, a Sr.ª Ministra avançou com três pilares que, como tirei algumas notas na altura, passo a rever: para o combate à erosão seriam atribuídos 230 milhões de euros; para a qualificação da orla costeira 83 milhões de euros; para a recuperação do litoral 550 milhões de euros.
Da leitura que consegui fazer do PIDDAC e do Orçamento, e segundo o que a Sr.ª Ministra aqui disse, consigo detectar projectos de investimento, em sede do Orçamento, de 38 milhões de euros (e não de 43,7 milhões de euros) e, no PIDDAC, de 92 milhões de euros. Portanto, isto dá 130 milhões de euros, o que significa que há uma diferença de 100 milhões em relação ao que a Sr.ª Ministra disse inicialmente.
Ora, gostaria de começar por perceber o que cabe em cada um destes três pilares a que se referiu — erosão, qualificação da orla costeira e litoral. Isto é: de todos os projectos de investimento que existem, tanto no Orçamento como no PIDDAC, o que cabe em cada um deles? Como se faz esta divisão e, sobretudo, quem define as prioridades? Nós temos o INAG, as ARH, as CCDR, o Ministçrio» Quem ç que, realmente, define as prioridades para a orla costeira e para o ordenamento do território? Como é que tudo isto se processa? Por outro lado, coloco a questão dos POOC. Dos vários POOC que existem e vão ser revistos, há um que não vai ser revisto — a Sr.ª Ministra já o disse — e que carece urgentemente de revisão, que é o POOC de Burgau/Vilamoura, porque há aspectos que não estão a funcionar e que estão a ser ultrapassados.
Relativamente ao Algarve, o único investimento do PIDDAC que existe é em areia para a praia. Sr.ª Ministra, ficamos muito contentes porque, realmente, há praias que precisam de areia, mas há muito mais praia para além da areia! Gostava de ouvir a Sr.ª Ministra sobre este tema.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira.

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, a questão que aqui trago hoje é muito concreta e versa a Lagoa de Óbidos.
Como V. Ex.ª sabe, a Lagoa de Óbidos é a maior lagoa salgada que temos em Portugal continental e, por isso, é uma referência não só ambiental mas também com um forte impacto na economia da região — e, com certeza, de Portugal —, desde logo, para a economia dos pescadores que dela vivem e suas famílias. Isto, para além de se revestir de importância turística para muitos investimentos que estão a ser feitos na região Oeste, muitos deles apoiados pelo Governo.
Ora, provavelmente V. Ex.ª saberá que, neste momento, estamos a sofrer uma situação de emergência graças à incúria. É que, ainda em Dezembro, os Deputados do PSD convidaram o Sr. Presidente do INAG para uma visita à Lagoa de Óbidos, mas este não mostrou qualquer pressa na resolução dos problemas.
Embora os autarcas de Caldas da Rainha, de Óbidos e das freguesias lhe tenham apresentado várias propostas, nenhuma delas lhe pareceu aceitável, independentemente das sugestões que no momento lhe foram entregues.
Acontece que, neste momento, estamos a viver uma situação que pode ser de grave desastre ambiental.
Como V. Ex.ª sabe, há grave risco de o emissor submarino poder ser destruído. Está a ser feita uma intervenção nessa matéria com a colocação de sacos, mas ainda na passada semana os sacos foram arrastados e o emissor submarino ficou à vista. Ontem, estive junto a esse local e continuamos a ver o emissor submarino à vista.
Por outro lado, a praia da Foz de Arelho desapareceu, praticamente. Entretanto, foi construído o esporão para que se comece a fazer a concentração de areia.
Muito concretamente, pergunto: Sr.ª Ministra, pensa ou não deslocar-se lá, uma vez que já foi convidada pelo Sr. Presidente da Câmara, em Janeiro, para uma reunião de trabalho com o LNEC (Laboratório Nacional de Engenharia Civil)? Ontem, a Sr.ª Secretária de Estado deslocou-se — e muito bem — à Fuzeta para ver o problema da destruição e eu pergunto quando pensa a Sr.ª Ministra deslocar-se à Lagoa de Óbidos para fazer uma reunião de trabalho com o LNEC, com o INAG e com as várias entidades para que se tomem as resoluções necessárias e adequadas. Aliás, também o Sr. Presidente da Junta, em carta de 17 de Fevereiro, lhe enviou o mesmo pedido.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Cavaleiro.

Página 38

38 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Paulo Cavaleiro (PSD): — Srs. Presidentes da Comissão de Economia e Finanças e da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, Srs. Membros do Governo, a minha questão é sobre o desenvolvimento sustentado e vai no sentido de reforçar a lógica de que, muitas vezes, se as políticas fossem feitas de baixo para cima, os resultados poderiam ser muito melhores a vários níveis, pois o desenvolvimento sustentado é muito abrangente. Pena é que se use muito esta palavra, algo recente no discurso, mas muito pouco praticada em termos de acções concretas. Nas Grandes Opções do Plano até faz parte do título, mas depois não se vêem medidas! A Agenda 21 Local, como sabe, é um processo de participação pública orientado para a sustentabilidade local, com origem na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992. Na Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável, aprovada em 2007, assume-se o seu papel como elemento determinante para garantir o empenho dos cidadãos e o sucesso dos processos de desenvolvimento sustentável.
Em Portugal, cerca de 140 instituições, autarquias, juntas de freguesia afirmam ter um processo de Agenda 21 Local em curso; contudo, é assumido que os resultados destes processos ficaram muito aquém do desejado, tendo falhado, nomeadamente: a sua continuidade no tempo, a produção de resultados concretos e a própria monitorização sistemática dos resultados.
A principal causa reside na falta dos indispensáveis apoios financeiros e técnicos por parte do Governo central. Esta foi, também, a conclusão do primeiro GLOCAL, encontro de Agendas 21. Não se percebe por que apoiámos, no passado, as duas primeiras fases do processo — a fase de sensibilização e a fase de diagnóstico e plano de acção — e continuámos a não ter apoios para a terceira fase, a da implementação, monitorização e revisão, que é a mais importante! A título de exemplo, na região Norte, foi assumido pela CCDRN o objectivo de implementar a Agenda 21 Local em 80% dos municípios até 2010, mas nem sequer metade deste objectivo foi atingido. É que, apesar de ser uma das tipologias de projectos previstas no Programa Operacional Regional do Norte 2007/2013, nenhum concurso foi lançado para apoiar estes processos. E, mais grave ainda, o manual de pré-regulamentação para a Agenda 21 Local, editado pela Agência Portuguesa do Ambiente, em finais de 2008, veio tentar transformar este processo num mero processo de certificação.
Conforme assumido pelo Programa do Governo, existe um alheamento crescente dos cidadãos em relação aos mecanismos tradicionais de participação democrática, sendo assumido que é necessário encontrar novas formas de participação, mais directas e permanentes»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que formule a questão.

O Sr. Paulo Cavaleiro (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.
Como dizia, é necessário encontrar novas formas de participação do cidadão, mais directas e permanentes, na formação das decisões públicas.
Estando o tempo de que disponho a terminar, formulo-lhe a seguinte pergunta concreta: onde está, neste orçamento, o investimento do Governo na implementação das Agendas 21 Locais, nomeadamente garantindo as condições necessárias à continuidade dos processos em curso, não defraudando assim milhares de pessoas e instituições envolvidas e respeitando os compromissos internacionais? Como não tive resposta da primeira vez que coloquei esta questão, espero tê-la agora, no debate do orçamento.

O Sr. Presidente: — Para responder, conjuntamente, a todas as questões que lhe foram colocadas, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, vamos ver se consigo rentabilizar as respostas das minhas seis páginas de anotações.
Em primeiro lugar, sobre a observação que foi feita, de que a política do litoral é um fracasso, que, de entre 18 países, Portugal é o quarto com maior erosão e que, portanto, não temos uma política, gostaria de dizer que temos uma política, que é pública. No livro Litoral 2007-2013, estão elencadas, no final, todas as intervenções, designadamente, estão identificados o local, o tipo de intervenção, a entidade responsável e a

Página 39

39 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

descrição da intervenção. Portanto, penso que seria útil consultarem este documento porque, a partir dele» Eu não digo que o documento refere tudo ao pormenor (por exemplo, a verba que está inscrita por organismo), mas identifica o organismo coordenador da intervenção, porque a maior parte das intervenções incluem a participação de mais do que um organismo, designadamente INAG, ARH, nalguns casos câmaras municipais, sociedades Polis. Recomendo, por isso, a sua leitura.
Já agora, gostaria de acrescentar que nunca se investiu tanto no litoral como nos últimos anos e com um crescimento acentuado em 2010.
A este propósito, salientava o seguinte: em 2007, por exemplo, foram inscritos em orçamento, para o litoral, 8,2 milhões de euros; em 2008, já foram inscritos 35,7 milhões de euros; em 2009, 38 milhões de euros; e, em 2010, estão inscritos 43 milhões de euros, repartidos pelo orçamento do INAG e das ARH. Porém, saliento que estão também previstos para investimento no litoral mais 53 milhões de euros nas sociedades Polis.
Portanto, para 2010, estão previstos 100 milhões de euros para o litoral, enquanto no ano passado estavam previstos só 38 milhões de euros e, em 2005, estavam previstos menos de 12,5 milhões de euros.
Creio, com toda a sinceridade, que está comprovado que está a ser feito um claro investimento, há, pois, uma política bem estruturada.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isso não passa de números!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Não, não! Passa.
Já agora, queria dizer que, para mim, foi muito confortável encontrar uma política estruturada, porque um plano é um primeiro documento que permite o desenvolvimento de uma política. Portanto, é a este plano que estamos a dar cumprimento e eu recomendo os Srs. Deputados a sua consulta, porque ficarão certamente tranquilos no que respeita a algumas das questões levantadas.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Tranquilos?!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Quanto à conservação da natureza, volto a referir que, no que respeita ao Ano Internacional da Biodiversidade, temos previsto reforço de vigilantes.
Gostava também de salientar que 2007 foi o primeiro ano em que o ICNB não precisou de dotação provisional, isto é, conseguiu pagar a todos os fornecedores e, questão que não é de somenos importância, conseguiu reunir os requisitos administrativos para poder abrir concursos, porque, como sabem, se não há dotação, se não há verbas, não se pode abrir concursos, o que é importante.
Relativamente à questão das taxas, realmente, suspendi a portaria, que necessitava de ser reequacionada e, a curto prazo, ela será novamente publicada. Direi que continuará a haver taxas, mas as taxas foram recentradas e procuraram, essencialmente, não penalizar as pessoas, os particulares que viviam, vivem, cultivam e desenvolvem a sua actividade nos parques. Os utilizadores, com carácter de negócio, que utilizam os parques têm, naturalmente, que contribuir para a gestão dos parques, porque os parques são uma maisvalia e um activo que esses próprios operadores comerciais vão, de certa forma, também utilizar.
Sobre a questão do cadastro, queria referir que temos inscrita em PIDDAC uma verba significativa para participar no projecto de elaboração do cadastro, desde já para sete municípios, envolvendo a participação da Autoridade Florestal Nacional, e teremos de investir bastante mais em anos subsequentes, pois essa é uma necessidade do nosso País.
Sobre a questão de o ambiente ter ou não pouca relevância no nosso País, claro que eu concordo em absoluto quando se diz que o ambiente passou a estar na política económica, e não só. Aliás, eu ainda sou do tempo em que era ambiente versus política económica, em que se entendia que o desenvolvimento estava contra o ambiente. Hoje, não é assim. Hoje, o desenvolvimento, concretamente o desenvolvimento económico, tem um cariz marcadamente ambiental, estão em parceria. Temos a estratégia para as renováveis, para as eólicas, o projecto do carro eléctrico, a certificação energética dos edifícios. Enfim, muito tem sido feito.
Já agora, relativamente ao cumprimento das metas de Quioto, não nos esqueçamos — não posso deixar de dizer isto — que, em 2005, Portugal estava 23 pontos percentuais acima da meta de Quioto e no ano de

Página 40

40 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

2008 está abaixo 6 pontos percentuais. Portanto, isto conseguiu-se de alguma maneira. É um aspecto que convém não menorizar.
Relativamente à reforma fiscal ambiental, quero dizer que essa reforma é imparável, correcta e adequada.
Nós temos que desonerar os produtos, bens e serviços que são amigos do ambiente e, pelo contrário, penalizar os bens e serviços que têm incidências claramente negativas na preservação ambiental.
Uma questão levantada pelo Sr. Deputado Artur Rêgo tem a ver com a lei dos solos. Ora, sobre a lei dos solos, quando vim à Comissão, já tive oportunidade de dizer o seguinte: estamos absolutamente cientes de que a lei dos solos só será possível se houver um grande espaço de consenso com todas as forças políticas, com os representantes da sociedade civil, com as autarquias. É óbvio que sim. Aquilo a que eu me comprometi foi a começarmos este ano a desenvolver toda a reflexão que vai ser necessária para o País vir a ter uma lei dos solos que — estou inteiramente de acordo e, se calhar, aqui ninguém está em desacordo — é absolutamente fundamental para o desenvolvimento adequado do nosso País. Sabemos que temos de envolver os organismos do Estado das várias áreas, como, por exemplo, a da justiça, as autarquias, mas, para além de documentos técnicos, vamos ter que fazer todo um caminho, vamos ter de ponderar, de recolher tendências. É isso que nos propomos fazer. Eu não disse que vamos ter no ano de 2010 uma lei dos solos, até porque se dissesse isso era pura irrealidade. Vamos, sim, iniciar o processo envolvendo todos e ainda bem que esta Câmara está disponível para apoiar esta iniciativa.
Concordamos por inteiro que é necessário incentivar a política de arrendamento, em detrimento da política de compra, que tem as desvantagens que foram referidas em termos da própria mobilidade.
Sobre o Plano Estratégico da Habitação, dá-me nota a Sr.ª Secretária de Estado que esse Plano está prestes a ser terminado e vamos tê-lo no 1.º semestre deste ano, portanto não falta muito, pois já estamos quase no fim do 1.º trimestre.
Quero ainda dizer que estamos a desenvolver um plano de reabilitação, porque — e o que vou dizer também não é nenhuma novidade, resulta, sim, de uma reflexão de todas as pessoas que se preocupam com as questões de política de ambiente e de qualidade de vida das pessoas — temos de investir na reabilitação dos centros urbanos e, em alguns casos, esta reabilitação pode ser dinamizada por grupos económicos com poder, com capacidade, mas também pelos particulares que têm a sua casinha e que precisam de melhorá-la, em vez de perspectivarem comprar mais um apartamento fora de Lisboa, do Porto, de Coimbra, enfim das áreas urbanas.
Portanto, o nosso plano de reabilitação está em desenvolvimento e, evidentemente, na minha perspectiva e numa avaliação honesta, dificilmente terá expressão e obra no ano de 2010 ou, quando muito, no final de 2010. Mas já estamos a desenvolvê-lo.
Relativamente à conservação da natureza, foi referido que não houve aumento de verbas para o ICNB.
Mas tenho aqui comigo uma nota que evidencia o contrário. A verdade é que, no ano de 2009, o ICNB teve uma verba, soma de funcionamento e PIDDAC, de 20,860 milhões de euros, em 2008 essa verba foi de 19,255 milhões de euros e, em 2010, é 21,574 milhões de euros. Portanto, tem estado a crescer.

Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.

Posso dizer que, em termos de PIDDAC, a verba está a crescer desde 2007. Em 2008, foi de 4,8 milhões de euros; em 2009, de 5,4 milhões de euros; e, em 2010, tem igual verba.
Em termos de funcionamento, temos: em 2009, 15,45 milhões de euros e, em 2010, 16,164 milhões de euros. Isto é comprovável e esta tabela consta dos documentos.
Relativamente ao sector do abastecimento de água, águas residuais, ciclo urbano, foi referido que a preocupação tem sido a de fazer concessões a privados. Ora, não tem sido essa a preocupação; simplesmente, também não há razão por que não recorrer às concessões a privados.
A questão é a seguinte: a legislação permite-o e, a exemplo do que se passa noutros países do espaço da União Europeia, o que interessa é termos bons serviços. E termos bons serviços é termos serviços de qualidade ao mais baixo preço. Foi entendido em 1993, quando foi feita uma reestruturação do modelo institucional para a gestão do ciclo urbano da água no nosso País — e esse conceito não foi mudado e eu, pessoalmente, acho que foi uma via bem conseguida! — que a água é um bem público mas a sua gestão pode ser privada,»

Página 41

41 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É como os bancos!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — » desde que fortemente regulada. Por isso, foi decidido pelo executivo anterior o reforço dos poderes de intervenção do regulador de águas e resíduos.
Portanto, o IRAR (Instituto Regulador de Águas e Resíduos), que agora é a ERSAR, alargou o seu âmbito de intervenção a todo o tipo de entidades gestoras. As concessões eram cobertas desde 1993, as concessões a privados e as concessões públicas, porque temos essas duas figuras, mas veio a perceber-se com o funcionamento do sector que, por uma questão de equidade, de defesa dos interesses do cidadão, a própria prestação deste serviço por entidades públicas de titularidade municipal ou de titularidade estatal careciam também de intervenção regulatória. Assim, foi alargado o âmbito de intervenção da ERSAR e, simultaneamente, aprofundada essa intervenção, que é bem mais rigorosa do que era — aliás, a exemplo do que se pratica noutras partes do mundo.
Sobre a questão dos Polis Rios, já tive oportunidade de dizer que os Polis Rios vão ser intervenções estruturantes e vão ser articulados, como não pode deixar de ser, com os planos de gestão de bacia hidrográfica que estão em desenvolvimento. E não há-de ser só com os planos de gestão de bacia hidrográfica mas também com outros instrumentos de planeamento.
Sobre a Sociedade Arco Ribeirinho Sul, está previsto o seu período de acção até 2028. Estão em constituição os órgãos sociais — aliás, o modelo foi definido no anterior executivo. Recentemente, foi indicado o presidente da sociedade gestora, estão a ser definidas as outras duas pessoas que integram o conselho de administração e já estão indicados os nomes para alguns dos outros órgãos sociais.
Como sabem, há uma dotação do Orçamento do Estado para o arranque dessa sociedade. Essa sociedade ficará localizada na margem sul, porque a sua área de intervenção também se desenvolve lá. E já tive oportunidade de falar com os três presidentes de câmara das áreas que são abrangidas, que me disseram estar satisfeitos com o andamento que o projecto está a ter. E obviamente que, com o arranque da sociedademãe, da sociedade gestora, de imediato, serão criadas as condições para as sociedades — e também temos todo o interesse nisso. Portanto, isto é mais um ponto de situação do que propriamente outra coisa.
Foi perguntado qual é a avaliação que se faz do Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida.
Posso dizer que é positiva. Graças à regulação da parte marinha do Parque, houve, comprovadamente, e monitorizada, uma recuperação dos recursos pesqueiros. Teve custos — pois teve! —, mas os recursos pesqueiros recuperaram, com claras mais-valias para o ambiente e também para a actividade económica, porque também se não houver regeneração dos recursos e recuperação, um belo dia, além da biodiversidade, acaba-se também a fonte de rendimento.
A questão suscitada sobre o ciclo urbano da água e a possibilidade de concretizar o PEAASAR prende-se um pouco com o que referi sobre a intervenção da ERSAR e sobre a questão da verticalização.
Quero dizer que a ERSAR é um instrumento de política importante, sendo um organismo que tem distanciamento do poder político — já agora, é bom que se saiba que, por estatuto, só tem tutela (e tem uma tutela mitigada) e não tem superintendência. De facto, trata-se de um organismo que deve ter uma postura de equidade de posições relativamente aos utilizadores, às câmaras e ao cidadão, e às entidades gestoras.
Mas o know-how acumulado na ERSAR permite contribuir para que se vão ultrapassando dificuldades relacionadas com a concretização da estratégia definida no PEAASAR. Porquê? Porque, em concreto, o grande nó górdio em todo este processo são as questões tarifárias. E as questões tarifárias resultam muito da circunstância, que também já tive oportunidade de referir e que os Srs. Deputados sabem, de, infelizmente, as zonas interiores, com menos pessoas e com rendimentos mais baixos, serem aquelas que, para terem água de qualidade nas suas torneiras, têm custos mais elevados. Portanto, está em estudo uma possibilidade de se contribuir para a solução deste problema, sem que, obviamente, a outra via para a solução deixe de passar por algo que já está definido, que é uma discriminação positiva nas comparticipações comunitárias. Mas quando são desenvolvidos os modelos que permitem o cálculo da tarifa com base numa metodologia harmonizada e se chega a valores que são difíceis de acomodar pelos munícipes de algumas regiões, os respectivos autarcas, que primeiro se vincularam à constituição de algumas parcerias para a verticalização do sector, depois não avançam tanto assim.

Página 42

42 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

De qualquer forma, também quero dizer — e foi feita uma pergunta sobre o QREN — que, apesar de as candidaturas inscritas para este eixo para o QREN serem superiores às dotações do QREN, estamos convencidos de que o que vai ser passível de execução é acomodável. Como sabem, o QREN, agora, é gerido noutro ministério, em termos da sua gestão macro, mas nós, Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, somos utilizadores do QREN e o que foi combinado foi que, se conseguirmos executar as dotações, será possível renegociar reforços de verbas. Assim nós façamos o caminho!» E quando digo «nós«, quero dizer todos os intervenientes envolvidos.
Perguntaram se os sistemas autónomos podem ir ao QREN. Podem, desde que sejam sistemas que evidenciem, no âmbito das candidaturas, sustentabilidade na gestão, capacidade de gestão.
Sobre a questão dos veículos em fim de vida e a questão da renovação da frota, considero que, com base nos dados disponíveis, em Portugal, tivemos uma abordagem muito correcta no que respeita à questão da frota automóvel nacional. Tivemos uma renovação muito significativa, o que foi motivado, por um lado, pela fiscalidade em termos de imposto automóvel e, por outro, pelos próprios incentivos ao abate de veículos usados. Os resultados têm sido muito bons, muito se reciclou. Aliás, para terem uma noção, posso dizer-vos que, entre 2005 e 2009, no caso dos veículos em fim de vida, se registou um aumento da reciclagem de 1150%. Tem, pois, havido uma adesão muito grande. É claro que as concessionárias também perceberam que havia ali um espaço de oportunidade e potenciaram os incentivos do Estado. O que é certo e verdade é que temos, hoje, um parque automóvel mais seguro. É que a questão da renovação do parque automóvel, quando foi pensada, não foi apenas por razões ambientais mas também por razões de segurança rodoviária, das pessoas. Portanto, é uma medida relativamente à qual só posso fazer uma avaliação muito positiva.
Relativamente à questão do Parque Nacional da Peneda-Gerês, Sr. Deputado, não está previsto suspender o plano (de ordenamento); está previsto, sim, acolhermos todas as sugestões que estão a ser feitas, discutirmos, analisarmos e vermos o que vamos fazer. O que queremos é que o instrumento seja o mais consensual possível. Com isto, não estou a dizer que vai agradar a toda a gente, os consensos são, como todos sabemos, uma ponderação de interesses. Mas estamos disponíveis para discutir tudo aquilo que, no âmbito do processo de consulta, nos chegar. Discutir e ver aquilo que é passível de compatibilizar em termos do cumprimento de legislação e de preservação de valores e de interesses das pessoas. É que esse, às vezes, também é o grande drama: o problema é que nós temos legislação — que, por acaso, até é de origem comunitária, mas podia não ser — em vigor, temos valores a preservar e, depois, isso acaba por ter, às vezes, os seus custos para as pessoas. E o desafio está em conseguirmos encontrar o ponto e integrar os contributos que efectivamente permitem melhorar a situação e diminuir a conflitualidade.
Quanto à questão que suscitou sobre o Valor Ponto Verde (VPV) que a APA (Agência Portuguesa do Ambiente) aprovou, gostava de salientar que a incidência no consumidor é vestigial.

Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.

Sr. Deputado, fizemos um estudo de qual era a incidência do aumento do Valor Ponto Verde num cabaz de compras de 19 € — e são 2 cêntimos, Sr. Deputado! Portanto, o que acontece aqui é o seguinte: a meu ver, foi, se calhar, pouco prudente a opção de, anteriormente, durante dois ou três anos, as quantidades de material para reciclagem terem crescido. Nós, portugueses, estamos a aderir à deposição selectiva; nós também temos uma directiva comunitária para cumprir; nós temos aumentado claramente as nossas metas de reciclagem. Só que, como todos sabem, aqui e em qualquer parte do mundo, a reciclagem, per si, não é sustentável, ela precisa ser subsidiada, e a solução que se encontrou foi ela ser subsidiada por quem utiliza a embalagem. Ora, como os quantitativos estão a aumentar, foi necessário aumentar o Valor Ponto Verde.
O Sr. Deputado Agostinho Lopes referiu também a questão do SIRAPA. Sr. Deputado, obviamente que todos os produtores de resíduos têm de estar no SIRAPA. O SIRAPA é um instrumento fundamental para termos informação que nos permita conhecer a situação da gestão de resíduos no nosso País, fazer os diagnósticos necessários, definir estratégias. Em suma, é básico, todos têm de aderir ao SIRAPA.
O PSD referiu, sobre a questão dos resíduos, que a fiscalização não se faz com acções mediatizadas.
Também concordo. Só que a mediatização tem aspectos positivos quando está em causa uma vasta série de operadores, porque, como bem sabem, as operações de fiscalização só são possíveis por amostragem.

Página 43

43 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Portanto, foi deliberadamente que nós mediatizámos. É que nós conseguimos uma clara melhoria de situações com o anúncio da operação, porque ninguém sabe quem vai ser inspeccionado. E nós temos evidência da quantidade de operadores que repuseram as suas situações, na expectativa de que poderiam ser inspeccionados, e ter as consequências de estarem a ter práticas inadequadas. Portanto, foi deliberadamente e com a intenção não de fazer publicidade mas de pôr todos os operadores de gestão de resíduos a fazer o que lhes compete.
Não sei, Sr. Presidente, se ainda terei tempo»

O Sr. Presidente: — Ainda dispõe de tempo. Não se preocupe, Sr.ª Ministra, que avisarei quando lhe restar 1 minuto.
Faça favor de prosseguir.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sobre a questão da habitação jovem, quero dizer o seguinte: em termos da habitação jovem, mais uma vez, o Porta 65, como referi, tem um objectivo determinado. O tal programa que o Sr. Deputado referiu ter existido em anos anteriores era pouco selectivo nos apoios, apoiando os jovens que precisavam e os que não precisavam (esta é que é a verdade).
E vamos lá ver uma coisa: não é só porque se é jovem que se tem de ser apoiado. Devemos apoiar os jovens, mas o País tem de ser rigoroso na gestão dos seus recursos. Portanto, o que foi entendido fazer foi uma revisão do plano na óptica de, neste caso concreto, criar condições para a autonomização dos jovens. Volto a dizer: este plano não tem como objectivo apoiar o jovem porque é jovem, nem apoiar as situações de fragilidade social (a fragilidade social está prevista noutras áreas). Tem como objectivo, sim, apoiar a autonomização dos jovens que têm condições de autonomização e, esses sim, que precisam de um apoio no início das suas vidas. Por isso foi alargado e, das candidaturas apresentadas que reúnem as condições, o Sr.
Secretário de Estado não me deu nota de que algumas tenham sido recusadas por falta de dotação mas, sim, por as mesmas não preencherem os requisitos por, em alguns casos, Sr. Deputado, carecerem de ajuste. Daí — por carecerem de ajuste, por haver injustiças — termos feito essa alteração. Mas nunca as candidaturas foram recusadas por falta de dotação.
Sobre a habitação jovem, era isto que queria dizer.
A Sr.ª Deputada Antonieta Guerreiro suscitou a questão do Algarve e disse que o combate à erosão se faz só com areia. Nem pouco mais ou menos, Sr.ª Deputada! Estão previstas para o Algarve importantes acções, como o Polis Litoral Ria Formosa. De facto, está elencado um conjunto de acções de intervenção precisamente na região do Algarve, que não vamos estar agora a detalhar, mas sobre o qual, se a Sr.ª Deputada quiser e tiver interesse, lhe será facultada informação junto da Secretaria de Estado.
Agora, também não me parece muito preciso dizer que o único investimento que existe para o Algarve é areia para a praia, uma vez que estão em curso obras de muito maior monta, a saber: estão previstas demolições, requalificações, reposições de cordões dunares, renaturalização, etc. Enfim, está prevista muita coisa.
Sobre a questão da Lagoa de Óbidos, gostaria de dizer que essa questão é, obviamente, seguida com a máxima seriedade no Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território. Agora, o que já deu para perceber — e, por acaso, não foi só na Lagoa de Óbidos — foi o seguinte: no litoral, não podemos ter acções avulsas sem suporte técnico-científico e, por isso, o LNEC tem estado envolvido nestas acções, pois não nos sentimos confortáveis a fazer intervenções que possam ser prejudiciais.
Estão inscritos 16 milhões de euros, que correspondem ao total da intervenção prevista para a Lagoa de Óbidos. Já houve uma avaliação de impacte ambiental para a grande dragagem destinada à construção do muro-guia. Simplesmente, combinei com o Sr. Presidente da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, no início de Janeiro, que, mercê da situação — porque discutimos o assunto com o LNEC e foi-nos dito que era possível fazê-lo —, não vamos esperar pela construção do muro-guia. Vamos fazer a grande dragagem depois da época balnear. O que vamos fazer antes da época balnear — e rapidamente, já em Abril — é a dragagem mais pequena, que vai permitir que aquela região tenha praia na época balnear porque também é legítimo que queiram tê-la.

Página 44

44 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Portanto, não vamos falar de caso por caso. O que posso dizer relativamente a este assunto é que têm o meu comprometimento, que o assunto está a ser acompanhado de muito perto. O INAG (Instituto da Água IP) tem feito muito trabalho.
Não posso, de forma alguma corroborar essa opinião porque noto que há um grande envolvimento, há locação de verbas, há adaptação de estratégias de médio prazo, que foram passadas para estratégias de médio prazo.
Temos tido um ano dificílimo, designadamente com a questão do emissário. Colocámos esporões no imediato, que não estavam previstos, e protegemos como deve ser o emissário com sacos. Mas o mar tem estado muito forte e são precisos mais sacos.
A verdade é que já toda a gente se permite fazer sugestões! Eu, que sou engenheira, não me permito fazer sugestões, mas toda a gente se permite fazer sugestões sobre o tipo de intervenções que devem ser feitas, o que ç algo um pouco estranho» Sr.ª Deputada, o assunto está a ser acompanhado directamente pelo meu Gabinete.
Relativamente às questões da implementação da Agenda XXI local, há uma verba inscrita para contribuir e para ajudar alguns municípios — não me recordo de quantos — à implementação da referida Agenda.
Já corri aqui as minhas notas e penso que já esgotei todas as questões.

O Sr. Presidente: — Passamos agora à conclusão deste debate, com uma terceira ronda de 3 minutos para cada grupo parlamentar para concluírem ou formularem uma última questão.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Leitão Amaro.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, penso que a frase certa para comentar este Orçamento e o desempenho é: só é possível reforçar caso se mereça.
Ora, ficou por explicar aqui o porquê da baixíssima execução do Orçamento do Estado para 2009. Ficou por esclarecer o porquê do corte extraordinário, no sentido da sua dimensão, do Orçamento do Estado para 2009 para o Orçamento do Estado para 2010. E não se diga que é porque o Ministério perdeu a área do desenvolvimento regional, porque isso implicaria um aumento equivalente no Ministério da Economia. Ora, isso não aconteceu e o Ministério da Economia perde também no seu orçamento.
Sr.ª Ministra, ficou por explicar estas incoerências e esta falta de rigor nos documentos associados ao orçamento. É uma trapalhada que não ajuda à credibilização do Ministério e à sua força na mesa das negociações orçamentais.
Ficou também por explicar o que o Ministério vai fazer para melhorar o fraco desempenho e a fraca execução e aumentar o rigor ao nível da Águas de Portugal.
Sr.ª Ministra, a resposta que deu relativamente à possibilidade de os municípios e concessionários privados utilizarem o QREN não é satisfatória, porque invocou um nível de discricionariedade que não é compatível nem semelhante nos outros casos.
Ficou também por explicar o acompanhamento orçamental que o Ministério vai fazer à actuação do Fundo Português de Carbono. Não são claras a racionalidade, a prontidão, a agilidade da actuação do Fundo Português de Carbono para assegurar que os investimentos no cumprimento de Quioto, eventualmente até por compra de créditos, são rápidos, adequados e aos melhores preços de mercado. Esta foi uma pergunta que ficou por responder na nossa última audição e vou deixá-la aqui novamente.
Não há rigor nem clareza ao nível da preparação e da clarificação das opções orçamentais. Há níveis baixíssimos de execução. Falámos do litoral e a Sr.ª Ministra deu-nos com mais um livro. Se utilizássemos de novo a figura que o meu colega utilizou há pouco era mais um para a pilha! Portanto, há falta de rigor, há falta de clarificação e de assunção das quedas, há falta de execução. Sr.ª Ministra, perante isto, por mais que queiramos que o Ministério do Ambiente se torne uma prioridade, desde logo, transversal e numa prioridade orçamental, parece que o Ministério do Ambiente não está a fazer o que deve para merecer esse lugar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

Página 45

45 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, deste debate, na Comissão do Orçamento, constata-se facilmente que, em primeiro lugar, a política de ambiente não deixa de ser uma preocupação e uma prioridade deste Governo, quer ao nível da política do ambiente, quer ao nível da política do ordenamento do território e, fundamentalmente, da requalificação.
Este Ministério tem no seu orçamento a valorização das políticas que contribuem também para o desenvolvimento económico e para a criação de emprego, que são as prioridades do Governo. Ficou aqui bem demonstrado que o Ministério do Ambiente é um parceiro no desenvolvimento da nossa economia.
Por outro lado, muitas das questões que aqui foram levantadas são laterais à discussão da política do Orçamento. E temos de reconhecer que a Sr.ª Ministra respondeu com alguma clareza e até com algum pormenor a questões que aqui foram colocadas.
Ora, isso demonstra que o Ministério do Ambiente tem hoje uma política e uma prioridade para o País e sabe quais são essas prioridades e qual é o caminho. Por muito que custe a alguns, por muito que tentem desvalorizar os planos estratégicos, não existe política sem planos ou, pelo menos, um diagnóstico e um plano para atacar essa política. Ora, foi isso que o Governo fez e está a fazer. E ainda faz algo que considero muito importante: não deitou fora as políticas que vinham a ser seguidas quer pelo governo anterior quer, até, pelo governo de direita do PSD e do CDS. Também aproveitou as políticas positivas. Também reconhecemos que o que eles deixaram é muito pouco, mas, o que nos deixaram, aproveitámos.

Risos do PSD.

Aliás, só me lembro mesmo da única coisa que nos deixaram: os CIRVER (Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos). Basta verificar que, em três anos, tiveram tantos ministros do Ambiente que já lhe perdi a conta! Até houve alguns ministros do Ambiente que nem chegaram sequer a vir à Comissão do Ambiente, porque as suas passagens no Ministério eram tão fugazes que era difícil terem uma política do ambiente. Se não tinham uma política para o Ministçrio» Atç houve ministros que confundiam a REN (Rede Eléctrica Nacional) com a REN (Reserva Ecológica Nacional).
Portanto, Sr.ª Ministra, penso que este debate demonstra bem que estamos no caminho certo relativamente às políticas do ambiente, em sintonia com a política prioritária do Governo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, ao Deputado Renato Sampaio, com toda a simpatia que me merece, só lhe posso recomendar que visite o meu oftalmologista, porque eu vejo melhor do que ele.
Quer ver como vejo melhor? Vou dizer-lhe o que vejo. Vejo que o Governo que está a apresentar o Orçamento do Estado é um Governo eleito pelos portugueses, teve uma maioria e, portanto, merece governar.
Tem o seu Programa, está aqui a debatê-lo e a discuti-lo. Podemos concordar ou discordar, mas é o Programa do Governo que foi eleito. Haveria outras medidas que eu gostaria de ver incluídas, mas não é o meu Programa e só tenho de debater o que aqui está na mesa. Nessa medida, já tenho muito mais visão, julgo, do que o Deputado Renato Sampaio.
Gostaria de fazer aqui uma recomendação ao Governo, que é uma constatação de facto. Infelizmente, em Portugal, «cada cabeça sua sentença». Esse é o hábito e são os usos deste País. Isto para dizer que, normalmente, quando acaba uma legislatura e é nomeado novo governo há novas orientações políticas porque falta, ou tem faltado, o tal plano de fundo estratégico de desenvolvimento e, portanto, as políticas vão mudando ao sabor dos governos.
Nomeadamente no que respeita à lei dos solos anunciada, era importantíssimo que o Governo não se limitasse a lançar este ano a discussão, como foi anunciado, mas tivesse a preocupação de acelerar e tentar concluir para, nesta Legislatura, termos uma lei dos solos em vigor. Isto antes que a Legislatura acabe, entre outra equipa ministerial e se mude de ideias ou se recomece o processo do princípio e são mais quatro anos perdidos a somar aos 10, 15 ou 20 que já lá vão. Essa era a primeira recomendação que o CDS queria fazer, dada a importância da questão.

Página 46

46 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A outra recomendação que gostaríamos de fazer — e é uma questão que nos preocupa face àquilo que foi aqui constatado e admitido pelo Ministério — tem a ver com a questão da execução do Orçamento. Não basta elencar medidas a tomar, não basta orçamentar verbas para depois dar corpo a essas medidas, é preciso executar. Ora, como foi aqui reconhecido, há áreas em que, na anterior Legislatura, a execução ficou abaixo dos 50%, o que quer dizer que algo ficou por fazer. Das duas, uma: ou ficou algo por fazer e devia ter sido feito porque foi anunciado como medida, ou, então, nunca houve intenção de fazer, o que é má fé política — não será o caso.
Assim, a recomendação que o CDS gostaria de deixar aqui ao Governo é que procure não só executar as políticas como executar as verbas orçamentalmente adjudicadas para essas políticas para, daqui a quatro anos ou no fim da Legislatura, podermos estar aqui a ver «zero» verbas sobrantes.
Queria ainda colocar algumas questões concretas. Ainda não foi aqui referido mas, em primeiro lugar, gostaria de felicitar o Governo e esta equipa por uma medida anunciada que ninguém referiu, ou seja, a intenção de criar um seguro de renda. Penso que esta será uma medida importante no incentivo à política do arrendamento, alterando o paradigma existente.

O Sr. Presidente: — Terá de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Vou já concluir, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, em que se vai concretizar esse seguro de renda? É um seguro de renda dirigido ao inquilino ou ao senhorio e com que características? Relativamente aos projectos PIN (Potencial Interesse Nacional), gostaria de saber qual a situação desses projectos nas áreas de protecção da natureza e de reserva e porquê a diferença de tratamento entre os grandes grupos que apresentam projectos PIN e os residentes locais, a quem nem sequer é autorizado construir uma casa nos seus terrenos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Calvário.

A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Sr. Presidente, Srs. Ministra, o Orçamento do Estado para 2010 peca pela falta de transparência e de rigor. Aliás, os dados apresentados pelo Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território tornam isso muito evidente.
Este é um Orçamento que faz contenção no investimento público e na própria função pública, nos serviços dos vários ministérios.
Mas, no Orçamento nos apresenta, ao mesmo tempo que faz isto, em nome do rigor e da contenção orçamental, assiste-se ao desperdício dos dinheiros públicos. A prova disso é que este Orçamento faz o corte de 85 milhões de euros nos gastos com pessoal, ao mesmo tempo que prevê gastar, em 2010, cerca de 8000 milhões de euros no tal outsourcing e na contratação da prestação de serviços. Ou seja, vai gastar, neste campo, mais 1000 milhões de euros do que a verba orçamentada para 2009. Aliás, só em estudos, pareceres e consultadorias, gasta mais 21 milhões de euros do que no ano passado.
O Ministério do Ambiente surge aqui como o Ministério mais gastador ao nível destes pareceres e consultadorias, com uma verba de cerca de 47 milhões de euros. Gostaria que a Sr.ª Ministra nos desse explicações sobre este facto, porque, pelos vistos, não confia nos serviços do próprio Ministério, não pretende investir em técnicos qualificados e no reforço destes serviços para fazerem o que lhes compete e prefere recorrer ao outsourcing e à prestação de serviços, o que é um desperdício absoluto para o Orçamento do Estado.
Queria também colocar uma outra questão, que tem a ver com o projecto do bairro crítico no Vale da Amendoeira, um bairro muito complicada e com questões de precariedade social muito graves. A Sr.ª Ministra, em visita ao bairro, no fim-de-semana, anunciou um investimento público de 8 milhões de euros. No entanto, verificamos, em termos de PIDDAC, uma verba inscrita na ordem dos 3,7 milhões de euros, sendo sobretudo suportada por fundos comunitários. Gostaria de perguntar à Sr.ª Ministra onde se vão buscar as verbas para proceder à requalificação urgente deste bairro e responder a muitas das necessidades sociais que aí se vivem, ainda mais numa situação de crise social profunda, de pobreza e de fome. É preciso dar uma resposta urgente à necessidade destas pessoas.

Página 47

47 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, parece que fez aqui o esforço — e louvamo-lo — de tentar responder a algumas das perguntas, muito embora tenha sido um esforço absolutamente improdutivo. Vou deixar-lhe algumas perguntas que são, de facto, repetidas, porque julgamos importante obter as respostas.
A Sr.ª Ministra pode considerar que não é importante, mas continuamos a entender que aqui, em Comissão, quem determina o que é ou não importante, independentemente da sua formação técnica (que não cabe à Sr.ª Ministra julgar), continuam a ser os Deputados. Portanto, Sr.ª Ministra, vou colocar algumas questões novas e outras que já foram colocadas, para as quais apelo que, de facto, responda.
No que se refere às taxas do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, sabemos que o Governo suspendeu, para revisão, o decreto-lei que estabelecia um conjunto de taxas cobradas por actividades realizadas em áreas protegidas. No entanto, quando fez essa suspensão, deu uma nota que consideramos bastante negativa, dizendo que estava disponível para rever os valores mas não o princípio. O que lhe queremos perguntar é se vai continuar a entender que uma pessoa, porque vive numa área protegida, tem de pagar por actos administrativos e a pessoa que é sua vizinha e mora do outro lado da estrada, pelo que não mora numa área protegida, não tem.
Esta é uma das questões que colocamos: o que pensa em relação a estas taxas? Vai apenas mudar o valor, criar uns valores mais simpáticos, mas vai manter a ideia de que as pessoas devem ser castigadas e punidas por morarem numa área protegida? Outra pergunta tem a ver com a Rede Natura 2000, Sr.ª Ministra. Esta é uma pergunta persistente da parte do PCP — tal como o Sr. Secretário de Estado Humberto Rosa lhe dirá —, porque a consideramos deveras importante. Quando é que temos uma cartografia actualizada e pormenorizada da Rede Natura 2000? Não podemos continuar a referir-nos à Rede Natura 2000 como a Sr.ª Ministra fez num conjunto de respostas que nos tentou dar: «foi alguém que perguntou», «está para aí», «vimos aqui no livro», etc.
Sr.ª Ministra, a Rede Natura 2000 não pode continuar a «estar para aí». Precisamos saber onde está a Rede Natura 2000 para, depois, quando aparecem aqueles empreendimentos tipo Freeport ou outros, sabermos se estavam ou não em Rede Natura 2000. Ao dizer que «está para aí», nunca se sabe ao certo onde está a Rede Natura 2000.
Portanto, precisamos saber quando é que o Governo tenciona ter pronta a cartografia da Rede Natura 2000. E não diga, novamente, como fez o seu antecessor, que nos testou a paciência ao limite, que está na Internet. Já procurámos toda a Internet e não existe cartografia da Rede Natura 2000 numa escala de 1 para 25 000 na Internet, como a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado bem devem saber.
Por outro lado, Sr.ª Ministra, se na água é preciso aumentar as tarifas por causa do princípio do utilizador/pagador, uma vez mais lhe pergunto quem é o recebedor. Sr.ª Ministra, entregar essa fatia de pagamentos a empresas privadas não justifica de todo o princípio do utilizador/pagador.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Peço-lhe, Sr.ª Ministra, que nos diga onde estão os estudos que indicam a recuperação da biodiversidade no Parque Marinho Luiz Saldanha, incluído no Parque Natural da Arrábida.
Por último, Sr.ª Ministra, quanto ao litoral, não vale a pena dizer-nos que está no livro. E, mesmo que estivesse, a Sr.ª Ministra tem obrigação de nos responder. O que é que vai fazer, em concreto, em 2010, com os 43,7 milhões de euros para os programas do litoral?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, não leve a mal o que vou dizer, porque não tem nada a ver com questões pessoais mas com questões políticas.

Página 48

48 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Sr.ª Ministra, não estamos aqui a discutir os apontamentos que os Srs. Secretários de Estado vão passando à Sr.ª Ministra nem, eventualmente, os apontamentos que a Sr.ª Ministra trouxe do Ministério do Ambiente, porque, se estamos, gostava de ter uma cópia desses apontamentos.
Os números de que estamos aqui a falar não batem certo com o documento que temos. E, como é evidente, é o documento que temos que vai ser aprovado na Assembleia da República.
Sr.ª Ministra, sabemos que os números têm sempre leituras muito diferentes. Comparamos, creio que justamente, o que estava previsto no Orçamento do Estado para 2009 com o que está previsto no Orçamento do Estado para 2010, porque esse foi o compromisso político assumido pelo Governo. É sempre a mesma coisa de ano para ano, não vale a pena inventar muito mais! O Governo, como não gosta, faz uma comparação do que prevê para 2010 com o que foi executado em 2009, que é sempre muito mais baixo. Por isso, dizemos que as verbas para o ICNB baixam e o Ministério do Ambiente diz que sobem. São leituras políticas que fazemos dos números. No entanto, se os número não estão certos, se cada número que a Sr.ª Ministra refere não é o que está nos nossos quadros, o que é que estamos aqui a discutir? Afinal, o que é que vai acontecer no ano de 2010? Relativamente aos números apresentados pela Sr.ª Ministra, convinha ser um pouco mais explícita, porque, senão, vamos sair daqui com recomendações de leitura mas sem perceber exactamente o que é que vai acontecer.
Dos 43,7 milhões de euros previstos para o litoral, quais são as acções concretas, ou seja, o que é que vai resultar concretamente da aplicação dessa verba? Precisamos saber isso, tal é o estado caótico do nosso litoral e de áreas tão fragilizadas no nosso litoral. Temos de perceber o que vai resultar destes 43,7 milhões de euros, porque são claramente insuficientes para as necessidades do nosso litoral. Ao que é que se vai dar, efectivamente, prioridade? Por outro lado, já percebi que a Sr.ª Ministra não respondeu a uma série de perguntas que fiz. Foi uma opção política. Mas quero fazer mais uma relativamente ao Fundo Português de Carbono.
A Sr.ª Ministra do Ambiente concorda que o Orçamento do Estado determine que o Fundo Português de Carbono sirva exclusivamente para gastar lá fora e não para medidas internas? Concorda com essa lógica? Gostava de perceber isso. Vamos apresentar, como é evidente, uma alteração ao Orçamento do Estado, porque discordamos profundamente desse princípio, mas gostava de saber se a Sr.ª Ministra concorda com ele.
Ainda sobre o litoral, saímos daqui com a recomendação de leitura do Plano de Acção para o Litoral 20072013. O nível de execução do Plano de Acção para o Litoral 2007-2013, Sr.ª Ministra, em 2009, não chegava aos 10%, ou seja, quando estávamos a metade do tempo a execução não chegava aos 10%. Ora, vamos com uma grande recomendação de leitura e podemos relê-lo pela terceira vez, mas queremos saber o seu estado de execução e como é que ele vai ficar no ano de 2010.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território.

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Sr. Presidente, primeiro que tudo, gostava de dizer uma coisa como apreciação global. Tem tudo corrido muito mal, mas uma entidade independente fez há pouco tempo uma avaliação ambiental a 167 países e Portugal ficou no 19.º lugar.
Portanto, não é muito mau.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Deve ter ido às pedreiras da Arrábida! Qual é a entidade?

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Deve ter sido!» Mas é uma entidade independente e quando os números são desconfortáveis, não gostamos deles! E também vi na imprensa que, numa avaliação entre 50 países desenvolvidos, Portugal ficou no 12.º lugar. Ou seja, relativamente à política de ambiente, parece-me que as coisas não têm corrido assim tão mal.
Quanto ao que foi referido de os municípios poderem ou não concorrer ao QREN, gostava de clarificar que, de acordo com os regulamentos, os municípios podem concorrer ao QREN desde que seja com sistemas em

Página 49

49 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

alta e desde que sejam 11 sistemas integrados. Os privados não podem concorrer ao QREN. Não referi que os privados podiam.
Por outro lado, foi referido que, no litoral, as coisas têm corrido muito mal, mas volto a dizer o que já disse.
Em 2005, no litoral, investiram-se 12,5 milhões de euros; este ano está previsto investir 100 milhões de euros; e, desde os 12,5 milhões de euros até agora, temos estado sempre a crescer. Portanto, quem é que considera o litoral importante? Relativamente à questão levantada da criação do seguro de renda, vamos criá-lo mas não o temos ainda completamente definido. Estamos a pensar que a via correcta poderá ser no sentido de associar o seguro de renda a uma bolsa de casas para arrendar. Ou seja, estamos a pensar seguir esta via, que também já se pratica noutros países. Consideramos que será algo que poderá incrementar o mercado de arrendamento, com todas as vantagens que encontramos para o mesmo.
Quanto à questão que levantou a Sr.ª Deputada Rita Calvário, o Ministério do Ambiente tem inscrita uma verba com expressão para outsourcing, contratação de serviços e estudos. Tem, sim senhora, e há várias razões que o explicam, como o facto de as variadíssimas intervenções que são necessárias, a começar pelo litoral, requererem estudos técnicos aprofundados e requererem especialidades.
Já agora, aproveito para vos dizer que, ainda esta semana, tive oportunidade de ir à adjudicação de uma obra — para a qual não tive mérito nenhum, visto que foram os que estiveram antes de mim que decidiram —, que foi a escada de peixe no rio Mondego, em Coimbra, e na apresentação que foi feita fiquei encantada (é este o termo!) com a quantidade de estudos que foram realizados sobre a questão do ciclo de vida das espécies em causa, as teses de doutoramento que foram desenvolvidas, o aumento de saber que resultou de uma iniciativa daquelas.
Portanto, na área do ambiente, todas as pessoas sabem que precisamos de estudos, de projectos, que não podemos fazer as coisas de qualquer maneira e, portanto, mobilizam-se as universidades, o sector privado, todo o País. Mesmo que não vivêssemos em contenção de recrutamento dos recursos, era pouco adequado, como forma de gestão, estarmos a ter, nos quadros dos organismos, pessoas para dar respostas a todas estas especificidades. Portanto, o outsourcing, a compra de serviços técnico-científicos, é absolutamente necessário para a área da governação no domínio do ambiente.
Depois, quanto à questão que colocou sobre o Vale da Amoreira, está previsto um investimento de 8 milhões de euros que não é todo para este ano, é para este ano e para os anos subsequentes.
Já agora, além dos 8 milhões de euros, está previsto mais investimento, que, por acaso, tem outra origem.
No âmbito do mecanismo financeiro do espaço económico europeu estão previstos mais 4 milhões de euros, além dos 8 milhões cujos contratos de financiamento ali foram assinados.
Dirá a Sr.ª Deputada: «Mas por que é que só se realizam este ano 3,7 milhões?» Porque também é preciso desenvolver os projectos.
Temos estado a dar todo apoio a essas iniciativas que tinham sido gizadas no governo anterior e a que temos dado continuidade porque, como também foi dito, são boas, são adequadas e não há que haver mudança.
Relativamente à questão levantada pelo Sr. Deputado Miguel Tiago, quanto às taxas do ICNB e à portaria que suspendi, volto a dizer que é para manter o princípio de o ICNB ter de prestar serviços, designadamente de apreciação de projectos, de emissão de pareceres e de licenças, e esses serviços, como princípio geral, é para serem pagos, porque são os utilizadores desses serviços que os devem pagar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — São as pessoas que vivem lá!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Deixe-me avançar.
Porque se vamos utilizar o Orçamento do Estado para redistribuir e, se a recolha de receitas é feita sem ter em conta as utilizações e depois redistribuímos, estamos a criar situações de injustiça.
Portanto, é mais justo utilizar o sistema segundo o qual quem utiliza paga pelos serviços.
Porém, não confundamos as coisas. Os habitantes daquelas regiões, além de terem várias isenções previstas — e aí concordo —, não têm de ser penalizados pela circunstância de viverem num parque. Como tal, a revisão que fizemos tem em conta essas situações e aligeira ou isenta, conforme aquilo que nos pareceu, dentro de uma lógica de equidade.

Página 50

50 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Relativamente á cartografia da REDE Natura 2000, »

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não me diga que está na Net!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — » este ano há um projecto no àmbito do PIDDAC, que ç o 6913, para se fazer a cartografia da Rede Natura. Surpresas!»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Atç que enfim!» O seu antecessor dizia que estava feita há anos!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Estava feita à escala 1/1000, mas vamos amos fazê-la a outra escala! Finalmente, quanto à questão do litoral referida pela Sr.ª Deputada, em relação à qual os números não coincidiam, disse que temos inscritos, para intervenções no litoral, 43,7 milhões de euros e, complementarmente, estão previstos investimentos de 53,1 milhões de euros nos POLIS do litoral, autarquias e com fundos das Administrações das Regiões Hidrográficas (ARH).
Portanto, volto a referir que se trata de um investimento de 100 milhões de euros na globalidade, mas, como é óbvio, com expressão no Orçamento do Estado, são só 43,7 milhões de euros.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas em que projectos?!

A Sr.ª Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território: — Enfim, não vou estar aqui a dizer-lhe tudo» Só para finalizar, relativamente ao Fundo Português de Carbono, este é um instrumento complementar para o cumprimento de Quioto, utilizado apenas, como todos sabemos, como tampão para acomodar algumas situações que não foi possível resolver com a implementação de medidas concretas. Mas, atenção: concordamos perfeitamente que ele seja gasto também — embora não só — a comprar activos lá fora, a comprar créditos de emissão, isto é, os 23 milhões de euros.
Esses créditos de emissão vão ser utilizados para desenvolvimento limpo noutros países. Qual é o problema? As alterações climáticas são um problema global, não são um problema de Portugal. Portanto, a lógica, a filosofia é investirmos a nível global. É que os disparates que os outros fazem caem-nos aqui, mas os que fazemos caem nos outros sítios.
Portanto, desde quando faz sentido, numa temática como esta, termos uma intervenção focalizada? O que eu queria dizer era que investimentos em desenvolvimento limpo noutros países, sim.
Os 30,1 milhões de euros também vão ser investidos em activos e em projectos internamente e, portanto, têm uma componente mais interna do que externa.
Penso que consegui abordar o essencial das questões que me colocaram.

O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao fim desta audição. Quero agradecer a presença dos Srs. Deputados e dos Srs. Membros do Governo da área do ambiente e do Sr. Presidente da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local.
Retomamos os nossos trabalhos às 14 horas e 30 minutos, com a audição da Sr.ª Ministra da Educação.
Está encerrada a reunião.

Eram 14 horas e 4 minutos.

Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro reaberta a reunião.

Eram 14 horas 55 minutos.

Começo por cumprimentar e agradecer a presença do Sr. Presidente e dos Srs. Deputados da Comissão da Educação, dos Srs. Deputados da Comissão de Orçamento e Finanças, a Sr.ª Ministra da Educação e os Srs. Secretários de Estado nesta audição.

Página 51

51 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Trata-se de uma audição, que está prevista no artigo 211.º do Regimento, para discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Educação, em que seguiremos a grelha de tempos acordados na Comissão. Em primeiro lugar, a Sr.ª Ministra fará uma exposição, com uma duração máxima de 20 minutos, seguindo-se-lhe uma primeira ronda, com perguntas e respostas individualizadas, com o tempo máximo de 8 minutos, e, depois, uma segunda ronda de perguntas com resposta conjunta.
Apenas por uma questão de informação, avisarei quem estiver no uso da palavra quando faltar 1 minuto para esgotar o seu tempo.
Passo, agora, a palavra à Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação (Isabel Alçada): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de começar por saudar-vos a todos.
Na apresentação do orçamento do Ministério da Educação aqui, na Comissão, quero recordar-vos as cinco grandes prioridades do Governo nesta matéria da educação.
Em primeiro lugar, a concretização da universalização da educação pré-escolar e do ensino secundário de 12 anos, alargando, assim, as oportunidades de qualificação para jovens e também a qualificação dos adultos.
Para além do alargamento destas oportunidades de qualificação e da frequência do sistema educativo, queremos, naturalmente, aprofundar a qualidade da oferta educativa, a qualidade da aprendizagem dos alunos, reforçando a competência e as condições de funcionamento das escolas e os recursos, no quadro da autonomia da intervenção em educação, portanto, do reforço autonomia das escolas.
Para tal, sentimos que é indispensável valorizar a profissão docente, o relacionamento com as famílias e o relacionamento com os órgãos de proximidade dos cidadãos, com as autarquias e com as instituições das autarquias que trabalham nesta área da educação.
Trouxe-vos alguns dados, só para sistematizar alguns indicadores referentes ao orçamento e ao seu contexto, que passo a referir.
Quanto à estrutura do orçamento do Ministério da Educação, os Srs. Deputados conhecem-na. Nas três rubricas principais, verificamos, desde logo, que as despesas com pessoal têm um grande peso no nosso orçamento, representando, este ano, 72,3%; despesas correntes, que são, maioritariamente, as despesas dos estabelecimentos de ensino, dos serviços do Ministério, centrais e regionais, e as transferências, que representam 23%, e as despesas de capital e investimento representam 4,7%.
Verificamos, desde logo, comparando com 2009, que o peso das despesas de capital e investimento é maior. Na verdade, isto deve-se ao facto de, no ano passado, como estão bem recordados, ter havido uma iniciativa, que se chamou Iniciativa Investimento e Emprego, que teve um valor da ordem dos 300 milhões de euros. Portanto, as despesas de capital de 2009 e de 2010 não são muito diferentes, estas últimas até crescem um pouco.
O orçamento do Ministério da Educação representa 12,2% do Orçamento do Estado e 4,3% do PIB.
Em relação às prioridades, gostava de chamar a atenção para o facto de o investimento no pré-escolar — prioridade que enunciei — ter um aumento estimado de 7,4%, o investimento no secundário profissional um aumento de 28,5% e o investimento para a formação dos adultos um aumento de 37,2%.
Mas, para além do orçamento do Ministério da Educação, temos de ter em consideração que existe mais investimento em educação que não está no nosso orçamento.
Temos, desde logo, na expansão da rede do pré-escolar, 52,5 milhões de euros, que são dos orçamentos das autarquias e dos parceiros do Ministério da Educação.
No que respeita à construção e requalificação dos centros escolares, temos aqui 880,8 milhões de euros, que é também dos orçamentos das autarquias. O Ministério da Educação tem uma grande intervenção nesta área, no que respeita à definição da rede educativa e das condições dos estabelecimentos de ensino, mas o investimento é autárquico, com o apoio do QREN.
Na requalificação das escolas básicas 2,3 há, para além do que está orçamentado no Ministério da Educação, 72 milhões de euros.
Na oferta profissionalizante nas escolas privadas, as próprias escolas, recorrendo também a financiamento comunitário, investem 247 milhões de euros.
Portanto, o total, como vemos aqui, para além do Orçamento do Estado, é de 1,261 milhões de euros.

Página 52

52 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Quanto à Iniciativa Novas Oportunidades, que tem a ver com a formação dos jovens, podemos verificar o seguinte: o anúncio do alargamento para 12 anos da escolaridade obrigatória, associada a uma oferta de cursos, que têm tido, verdadeiramente, um bom acolhimento e aos quais os potenciais interessados atribuem um valor para si próprios e para as suas vidas, e também as bolsas de estudo que são asseguradas pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, levou a um acréscimo, já este ano, da ordem dos 23 000 jovens a frequentar o ensino secundário em relação àquilo que acontecia no ano passado.
Os Centros de Novas Oportunidades também têm crescido — agora sentimos que já estamos numa fase de estabilização — e respondem inteiramente às necessidades.
O plano tecnológico da educação, como já tenho tido a oportunidade de referir, representa aqui o valor da equidade, o acesso universal ao uso das novas tecnologias e à utilização das novas linguagens para obter informação, para estudar, para produzir informação, no quadro de uma interacção entre adulto — educador e professor — e crianças que estão em situação de aprendizagem dentro da sala de aula, porque só dentro da sala de aula é que asseguramos que todos têm, de facto, o apoio do adulto. Mas isso também acontece fora da sala de aula, porque, como sabem, no 1.º ciclo, todas as crianças recebem computadores pessoais, que também podem também utilizar em casa para o seu próprio desenvolvimento e para uma utilização individual.
Como podem ver, todos os concursos foram concursos públicos internacionais. Isto representa um esforço considerável da parte do Ministério da Educação para assegurar este financiamento e para assegurar que todos os concursos correm no quadro de dificuldades que conhecem de preparação e de adjudicação de concursos. Temos apenas três concursos por completar, estamos ainda na fase de análise de propostas, e o da e.escolinha, para distribuir o computador este ano aos meninos do 1.º ano de escolaridade, está a aguardar propostas. Isto representa um investimento plurianual da ordem dos 314 milhões.
A expansão da rede pré-escolar é realizada pelas autarquias, mas no caso das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto é o Ministério que está a investir, uma vez que já não é possível recorrer a fundos comunitários. Temos nestas Áreas Metropolitanas 181 projectos aprovados, que correspondem a 431 novas salas e a um investimento total de 70 milhões de euros e representam um aumento da capacidade de 10 355 crianças.
Quanto ao programa de requalificação da rede do 1.º ciclo e da educação pré-escolar, porque, como sabem, os centros escolares têm 1.º ciclo, pré-escolar e alguns também o 2.º ciclo, que é um projecto que acompanhamos e todas as propostas são aprovadas pelo Ministério da Educação, foram analisados e aprovados pelo Ministério da Educação 892 centros escolares. Destes temos 515 candidaturas aprovadas no QREN, 158 já concluídos, 257 em obra e 100 em projecto. Isto representa um investimento das autarquias — não é do Ministério da Educação — de 889 milhões de euros.
Quanto às escolas básicas 2,3, temos 76 escolas em requalificação, estando concluídas 9, em obra 25 e em projecto ou concurso 42, o que representa um investimento de 302 milhões de euros, investimento esse que também é plurianual.
No que diz respeito à requalificação das escolas secundárias, como sabem, ela foi entregue a uma empresa especialmente constituída para o efeito — a empresa Parque Escolar —, que tem tido uma taxa de sucesso muito elevada. Está prevista uma requalificação de 335 escolas, estando concluídas ou em fase de conclusão 105 escolas, em projecto 100 escolas e em fase de identificação130 escolas, o que representa, nas 205 escolas que já estão concluídas, em obra ou em projecto, um investimento total da ordem dos 2,45 milhões de euros.
Como sabem, este Programa e, nomeadamente, a intervenção na área da requalificação das escolas foi considerado prioritário no quadro das medidas de combate à crise e ao desemprego. Por isso, permitam-me que vos informe também sobre o número de empresas e de empregos que têm estado ligados a estes vários programas.
Nos centros escolares temos 4120 empresas a trabalhar nos vários domínios, desde empreiteiros, projectistas, fiscalização, empresas de fornecimento de equipamentos, de mobiliário, etc., o que representa sensivelmente 20 600 novos empregos criados; nas escolas básicas 2,3 temos 760 empresas a trabalhar, o que representa 3040 empregos criados; e nas escolas secundárias temos 2500 empresas envolvidas, que, no pico alto, significam 30 000 empregos criados. Ora, isto representa um total de mais de 6000 empresas abrangidas e de mais de 53 000 de postos de trabalho que estão a ser gerados ou mantidos pelo facto de haver este enorme investimento na requalificação das nossas escolas.

Página 53

53 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Ficar-me-ei por aqui, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Vamos agora passar à 1.ª ronda de questões. Seguindo a regra da rotatividade, tem a palavra, em primeiro lugar, o PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar esta intervenção dirigindo uma palavra de apreço e de incentivo a todos os autarcas, em particular a todos os presidentes de câmara e a todos os vereadores e vereadoras da educação, sem excepção, da esquerda à direita, passando pelos independentes, porque são eles que, no terreno, muito para além das competências que lhes estão atribuídas em matéria de educação, substituem um Ministério tantas vezes distante e ausente, um Ministério sempre pronto a decretar e a propagandear novas medidas e a deixar que a responsabilidade da sua concretização fique para um poder local que diz ouvir, mas não ouve, que diz financiar, mas não financia verdadeiramente.
Sabe bem o Ministério que os autarcas, olhando todos os dias para os alunos, para os pais, para os professores, para a comunidade educativa, lá acabarão por resolver os problemas, mesmo que isso seja à custa dos seus já magros orçamentos.
Sr.ª Ministra, o PSD concorda com os investimentos feitos nas escolas secundárias. O PSD concorda que a melhoria nos estabelecimentos de ensino é um investimento de proximidade, com impactos mais visíveis para as populações servidas por essas infra-estruturas, e que estes investimentos poderiam ter um impacto muito forte e imediato na criação de emprego e no estímulo à actividade económica. Poderiam, Sr.ª Ministra, mas o problema é que a Parque Escolar está a concentrar o volume de obras em meia dúzia de grupos económicos, inviabilizando o investimento público de proximidade.
O PSD entende que é fundamental permitir o acesso das pequenas e médias empresas aos concursos de investimentos públicos de proximidade, acabando com a sua aglomeração em termos que limitam o acesso a empresas de certas dimensões.
Sr.ª Ministra, a empresa Parque Escolar tem por objecto o planeamento, gestão de desenvolvimento e execução do programa de modernização da rede pública de escolas secundárias.
Um dos objectivos deste programa, como a Sr.ª Ministra bem sabe, é criar um novo modelo de gestão das instalações, garantindo uma optimização de recursos instalados e uma correcta gestão da conservação e manutenção dos edifícios após a intervenção.
No cumprimento deste objectivo, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, qual a intenção do Ministério ao transferir o património das escolas secundárias públicas para a empresa Parque Escolar? É que se durante a preparação e o lançamento das obras, as escolas, mais do que chamadas a participar, foram chamadas para serem informadas das decisões, como vai ser o modelo de gestão da Parque Escolar? As escolas participarão? Qual o papel da comunidade educativa? Como vai ser feita esta participação? Sr.ª Ministra, gostaria de falar-lhe agora do Programa Nacional de Requalificação das Escolas Básicas.
Este programa visa dotar as escolas de melhores condições de funcionamento, modernizando as instalações e os equipamentos escolares, tendo em vista assegurar uma melhor adequação às exigências pedagógicas e à diversificação das ofertas de educação e formação.
Ao nível da Parque Escolar das EB 2,3, também existem muitas escolas degradadas, com falta de aquecimento, com coberturas de fibrocimento, sem planos de manutenção, com falta de laboratórios, com falta de polivalentes, escolas sobrelotadas. E este programa de requalificação das escolas básicas é um programa tímido, cujo objectivo não assumido é transferido para os municípios — uma vez mais, um conjunto de problemas que competiria ao Ministério resolver atempada e efectivamente. Mas, incapaz de resolver os enormes problemas com as infra-estruturas das EB 2,3, o Ministério endossou os problemas para as autarquias.
Sr.ª Ministra, de acordo com o Programa Nacional de Requalificação das Escolas Básicas, as 76 escolas seleccionadas foram-no de acordo com o seu estado de degradação. Gostaria de saber quais foram os critérios para aferir esse estado de degradação.

Página 54

54 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, se, num município onde exista uma EB 2,3 degradada e a câmara municipal entenda não ter condições para assinar um acordo de colaboração para a remodelação da escola, o Ministério assume a realização da obra? O Ministério transferiu para cerca de 90 municípios novas competências em matéria de educação, assinando com cada autarquia um contrato de execução. Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, se o Governo tem acompanhado a execução destes contratos e qual é a intenção do Governo para com a maioria dos municípios que ainda não aceitaram as novas competências.
O Governo sempre afirmou que esta transferência de competências seria acompanhada das verbas adequadas. A maioria dos municípios afirma que esta transferência não vem acompanhada do envelope financeiro suficiente e que serão os orçamentos municipais a assumir mais encargos. Pergunto-lhe se considera adequada a verba de 20 000 € por EB 2,3, independentemente da dimensão da escola e da sua especificidade, para efeitos de manutenção e apetrechamento.
Na hipótese de ser sua vontade continuar a transferência de competências para as autarquias, está o Ministério da Educação disponível para aceitar que seja feita uma avaliação, por entidade independente, das obras necessárias nas escolas básicas antes de estas serem entregues aos municípios, para que possamos todos saber quais são os investimentos necessários para adequar todas as escolas à legislação vigente? Pode a Sr.ª Ministra dizer-nos a que fundos ou a que programa, nomeadamente do Quadro de Referência Estratégico Nacional, pode uma autarquia que já tenha sob sua gestão o parque escolar do 2.º e 3.º ciclos, ou que venha a tê-lo, candidatar-se para ampliar ou remodelar uma escola básica do 2.º e do 3.º ciclo? Sr.ª Ministra, com a construção dos centros educativos, os municípios portugueses estão a dar o maior contributo das últimas décadas para a modernização do parque escolar do pré e do 1.º ciclo. Reconheça-se ao Governo a prioridade que deu ao 1.º ciclo, permitindo aos municípios o acesso a fundos comunitários sem os quais o processo de remodelação e construção destes centros educativos aconteceria, certamente, a um ritmo muito mais lento. Mérito às câmaras municipais que têm sabido aproveitar bem esses fundos, sem esquecer que boa parte das despesas são pagas directamente pelos seus orçamentos — os terrenos, os projectos, a componente nacional.
Sr.ª Ministra, neste momento, se não todos, a esmagadora maioria dos municípios portugueses têm as suas cartas educativas homologadas pelo Ministério da Educação. Na maioria destas cartas estão contabilizados os investimentos necessários para que, em cada concelho, se reduzam as assimetrias na rede de escolas do pré e do 1.º ciclo. O Ministério terá dados aproximados do investimento necessário para recuperar e ordenar toda a rede escolar do 1.º ciclo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, dispõe de 1 minuto.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Dou-lhe o exemplo da Área Metropolitana do Porto, onde o investimento total para cumprir todas as construções e remodelações previstas nas 16 cartas educativas representa um valor superior a 250 milhões de euros. Estão acordados cerca de 120 milhões de euros de comparticipação de verbas do QREN. As prioridades definidas pelos 16 municípios foram exclusivamente o fim dos desdobramentos e a remoção de todos os contentores que existem na Área Metropolitana do Porto afectos à educação. Ficarão por financiar, pelo menos nesta fase, todos os outros investimentos previstos nas cartas educativas e que são, seguramente, muito importantes.
Pergunto-lhe ainda o seguinte: se o objectivo do Governo é o de reduzir as assimetrias das redes de escolas, a Sr.ª Ministra considera a hipótese de todos os investimentos previstos nas cartas educativas nacionais poderem vir a ser financiados por verbas do QREN? Por último, pergunto se a Sr.ª Ministra nos garante que todos os projectos apresentados pelas autarquias que tenham o parecer favorável do GEPE (Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação) vão ter financiamento disponível no âmbito do QREN.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra para responder, Sr.ª Ministra.

Página 55

55 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria, muito obrigada pelas questões que me colocou.
Antes de mais, gostaria de dar-vos o testemunho da minha visita a escolas ao longo de décadas. Durante décadas, entrei nas escolas do nosso país com a sensação de que, se não fossem as pessoas, não percebia como é que se poderia trabalhar num ambiente tão degradado. Realmente, os profissionais são capazes de alterar as circunstâncias e criar um ambiente mesmo onde as condições mínimas não existem.
Na anterior legislatura, lançou-se um programa que é absolutamente pioneiro e que permite abrir um caminho seguro para podermos encarar a questão da reabilitação da rede escolar como nunca foi feito no nosso país. Gostava de sublinhar isto, porque quando as coisas acontecem, e graças à iniciativa política, achamos que é um dado adquirido. Neste caso, é um dado adquirido graças a decisões que foram estruturantes, encerrando um passado em que não se olhava para o parque escolar e para a situação e condições das escolas e passando a considerar-se que os edifícios e a rede escolar deviam ser perspectivadas para a época em que se vive e estudadas de forma a que o futuro pudesse entrar na escola portuguesa.
Neste quadro, houve uma iniciativa que a todos os títulos me parece muito importante, que foi a constituição da empresa Parque Escolar.
Se lermos com atenção todos os documentos que existem produzidos pela empresa Parque Escolar, nomeadamente os relatórios de contas, os balanços, o código de ética, o código de relacionamento com os professores, os alunos, aquilo a que hoje se chama os stakeholders, o relacionamento com os familiares dos alunos, verificamos que há toda uma serie de princípios que estão predefinidos e que são seguidos.
A empresa Parque Escolar tem vindo a fazer um trabalho muito exigente com soluções que nunca se tinham ensaiado no nosso país.
No Orçamento deste ano temos uma transferência de 50 milhões de euros para a empresa Parque Escolar, que é uma empresa pública EPE, não é uma sociedade por acções, não é uma empresa aberta. Poderia ser uma sociedade por acções de que o Estado fosse maioritário, mas não é. É uma empresa pública totalmente detida pelo Ministério da Educação e pelo Ministério das Finanças. Portanto, é uma empresa pública.
Em relação à questão que colocou da transferência do património para o parque escolar, sabemos que precisamos de competência técnica para que esta actividade seja adequadamente exercida. Hoje, manter um edifício com as condições que estamos a oferecer às nossas escolas, neste momento, como um serviço público — é claro, oferecer, neste sentido, porque é um dever colocarmos as nossas escolas nesta época em que vivemos —, isto é, a manutenção dos equipamentos e do edifício não pode ser feita de uma forma amadorística nem por quem não tem competência específica para o efeito.
Neste sentido, temos um quadro de profissionais que estão aptos a assegurar a actividade de forma a garantir a qualidade requerida por um investimento que é avultado, como sabem, e que temos que assegurar que é sustentável. Por isso, a transferência do património para o parque escolar é uma medida de gestão inovadora, e nós assumimos plenamente que isto trará um benefício público muito importante.
Em relação à ligação às escolas, posso dizer-vos que todo o trabalho, mesmo o trabalho de projecto, foi feito com a colaboração das escolas, das direcções das escolas, do corpo docente das escolas. Há uma ligação entre os utilizadores/donos de obra, digamos assim, e os projectistas, que permite que as soluções estejam a ser muitíssimo bem acolhidas.
Em relação às questões das EB 2,3 e às escolas do 1.º ciclo, se o Sr. Presidente me permite, passo a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Educação para responder.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado da Educação, tem a palavra.

O Sr. Secretário de Estado da Educação (João Trocado da Mata): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, penso que as questões relacionadas com o 2.º e o 3.º ciclos, com o ensino básico ou o 1.º ciclo, estão, de certo modo, relacionadas com a transferência de competências para os municípios.
Como sabem, o Ministério da Educação iniciou o processo de transferência de competências para os municípios seguindo o princípio de que os municípios, por questões de proximidade, estariam em melhores condições de prestar o serviço educativo e aquilo que foi transferido, no essencial, são competências que residiam nos serviços centrais e regionais. Nesse processo foram assinados 113 contratos de execução e

Página 56

56 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

lembro que, quando não foi possível chegar a acordo com os municípios — no caso das escolas EB 2,3 —, essas escolas não foram transferidas. Portanto, gostaria de frisar este ponto.
Estamos, desde Dezembro, em articulação estreita com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, a analisar, discutir e aprofundar este modelo de transferência de competências para os municípios e esperamos que até ao final de Março do corrente ano todas as questões que têm vindo a ser levantadas neste quadro estejam resolvidas.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Caros Colegas, o Orçamento do Estado pode ser duas coisas: pode ser um exercício contabilístico de duas colunas principais — receitas e despesas —, mas também pode ser aquilo que ele permite construir, aquilo que ele permite edificar e, no que respeita à educação, aquilo que ele permite que as pessoas aprendam. E é nesta base, diria, mais pedagógica e axiológica deste Orçamento de Estado para o Ministério da Educação que eu irei fundamentar a minha intervenção e posterior questão.
Eu talvez classificasse este Orçamento como sendo um orçamento inclusivo, talvez o orçamento mais inclusivo de sempre do Ministério da Educação, um orçamento de vanguarda, que vai para dentro da sala de aula e que se coloca na secretária ao lado do aluno para que lhe possa criar as melhores condições para que ele aprenda, e também um orçamento que vai para o interior das famílias, permitindo que as famílias possam ter as condições necessárias para que os seus jovens e também os seus mais seniores tenham condições para poderem aprender.
Este orçamento, e começarei pela parte inclusiva, é um orçamento que, hoje, no ano de 2010, vai consolidar mais cerca de 1,1 milhões de portugueses dentro da escola. E vou repetir, porque acho que isto é muito importante: no ano de 2010 vamos ter, relativamente ao ano de 2005, mais cerca de 1,1 milhões de portugueses dentro das escolas que fazem parte do serviço público de educação em Portugal.
Este é um número absolutamente histórico e é um ganho enorme em igualdade de oportunidades para todos os portugueses. Nós temos — e acabámos de ver isso — mais cerca de 10 000 crianças no ensino préescolar, mais cerca de 23 000 a 24 000 jovens no ensino secundário, mais cerca de um milhão de adultos que regressaram à escola, aos percursos de aprendizagem e de qualificação, mas também aos percursos de certificação das respectivas competências e conhecimentos. E iremos ter, neste ano, daqui para a frente, um novo contingente de jovens do ensino secundário que irão engrossar, de forma crescente, a fileira de jovens que frequentam o ensino superior.
Estamos, pois, Sr.ª Ministra, perante um orçamento que não pode apenas ser lido como contabilidade; é um orçamento que mete mais estas pessoas todas dentro da escola e que cria uma nova oportunidade para o nosso país, uma vez que esta oportunidade, que se dá a mais cerca de 1,1 milhões de pessoas, é também uma oportunidade que se dá ao nosso país.
E, ao colocar estas pessoas dentro da escola pública, não se pensa apenas em colocá-las lá, porque também se pensa, e principalmente, em dar-lhes as melhores condições para que possam aí realizar a sua qualificação com o máximo de qualidade. Por isso é que eu acho que este é um orçamento de vanguarda, de modernidade e que vai para dentro da sala de aula; é um orçamento dentro da sala de aula que se senta à secretária com o aluno.
Não irei falar da rede de bibliotecas escolares, que sei que é um tema que lhe diz particularmente respeito, que é uma enorme obra de promoção de literacia e de cidadania, que está hoje dentro de todas as escolas do nosso país, mas gostaria de referir a existência desta enorme oportunidade, desta enorme ferramenta disponível para todas as crianças do 1.º ciclo: a possibilidade de todas as crianças do 1.º ciclo terem à sua disposição um computador pessoal, o que faz de Portugal um caso ímpar e o que coloca Portugal no cimo do ranking de oportunidades de formação ao nível do 1.º ciclo do ensino básico com recurso à tecnologia de informação e comunicação nas salas de aula equipadas para poderem receber essas crianças e para poderem receber essa mesma tecnologia.
Temos, Sr.ª Ministra, um outro momento histórico que acabou de referir e que não posso deixar de reforçar e relevar: estamos perante o maior movimento de requalificação do parque escolar da história de Portugal, mas também estamos perante o maior movimento de requalificação do parque escolar hoje em marcha em

Página 57

57 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

todo o mundo. Não há outro país, em parte alguma deste mundo, em que 1300 escolas estejam, em simultâneo, a ser construídas ou completamente renovadas.
Não há escala comparável àquela que, neste momento, existe em Portugal e eu acho que isto é também histórico e não é apenas uma obra de construção civil; é talvez a maior obra de construção de igualdade de oportunidades e de justiça social que esta Democracia já fez nos últimos 30 anos.
Por último, queria referir-lhe que este é um orçamento de justiça social e também um orçamento de promoção das condições básicas para a igualdade de todos os cidadãos no exercício do direito à educação.
O orçamento relativo ao apoio social escolar é o mais consolidado de sempre e aquele que abrange o maior universo de famílias e de indivíduos de que há memória. Isto cria um factor novo na nossa educação em Portugal que é o de criar as condições de igualdade para que todos os jovens e adultos que tenham essa necessidade e que sintam esse impulso de se qualificarem tenham reunidas as condições económicas e financeiras para que possam exercer esse seu direito em condições exactamente iguais àqueles que, não tendo a sua situação económica e financeira, já o faziam anteriormente.
Recapitulando, este é um orçamento para mais de 1,3 milhões de portugueses, que está dentro de 1300 escolas a renová-las ou a construí-las de forma radical; é um orçamento que abrange, hoje, cerca de 1 milhão de famílias e de jovens aos quais é dada, através do apoio social escolar, uma nova oportunidade.
Diria, Sr.ª Ministra, se me permite uma certa metáfora, que este é um orçamento centrado no aluno, centrado nas pessoas que aprendem, centrado naqueles que estão a fazer a sua qualificação, sabendo que, estando a fazer a sua qualificação, estão a preparar-se para dar um contributo qualificado ao desenvolvimento do nosso país.
Penso que estamos talvez, neste momento, na Comissão de Orçamento e Finanças e, particularmente, juntando a Comissão de Educação, na essência mais crítica do desenvolvimento de Portugal, que é a educação e a qualificação das pessoas.
Sendo esta a «coluna vertebral» deste orçamento para a educação as duas questões que lhe deixo são as seguintes: como pensa a Sr.ª Ministra promover a qualificação, a formação contínua dos professores e que importância lhe atribui, neste momento, no sentido de que esse braço crítico de todo esse projecto possa estar à altura de todo o investimento que está a ser feito em todas as outras dimensões que acabei de referir.
Por último, pergunto-lhe qual é a grande prioridade do Ministério da Educação para o próximo ano lectivo 2010/2011, que, como todos sabemos, se inicia em Setembro próximo. Qual é o grande desígnio que temos?

O Sr. Presidente: — Para responder às questões que foram colocadas, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Muito obrigada, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, agradeço muito as suas palavras e sua primeira frase sobre a base pedagógica e axiológica.
Na verdade, nós regemo-nos por princípios que têm uma componente técnica e pedagógica, e por valores que decorrem do nosso projecto político e que pretendem promover a igualdade de oportunidades e uma maior equidade e justiça social na prática, em cada momento, na escola, dentro da vivência das escolas e dentro da vivência da sala de aula.
Por isso fiquei muito sensibilizada pelo facto de o Sr. Deputado referir esta preocupação, porque, na verdade, temos, de trazer para dentro da sala de aula todos os reflexos de todo o esforço que é feito pelo Ministério da Educação, pelas pessoas que colaboram com o Ministério da Educação, pelas autarquias, pelos profissionais de educação que trabalham nas autarquias. E porque não temos uma visão dicotómica, ou seja, não vemos para um lado o Ministério da Educação, para o outro lado as autarquias; nós vemos a nossa colaboração com as autarquias como uma colaboração crescente, como uma parceria em que as competências de quem é mais competente se colocam na linha da frente para servir aqueles que são os beneficiários da educação — os alunos, as famílias, os docentes — e não temos aqui concorrência nem rivalidades, sendo que estamos numa situação em que os recursos que temos à nossa disposição, no nosso orçamento, são transferidos para as autarquias, quando e no caso de serem melhor utilizados e executados pelas autarquias, ou ficam para serem executados pelo Ministério da Educação quando as autarquias manifestam, ainda — porque sentimos que é ainda, porque entendemos que é possível e é desejável ir mais

Página 58

58 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

longe neste relacionamento de transferência de poder para as autarquias —, que não estão preparadas para executar os projectos que temos em conjunto.
Gostava de vos dizer que é nesta parceria, em todo este investimento e em todo este acréscimo do número de alunos, neste benefício, em particular, no pré-escolar, que todos os estudos demonstram e a nossa experiência directa também, como é essencial o investimento no pré-escolar para alargar as oportunidades e para, muito cedo na vida, estimular o desenvolvimento e dar melhores condições às crianças e, sobretudo, àquelas cujas famílias não têm tantas possibilidades de criar um ambiente tão estimulante como o que queremos para todas as crianças portuguesas.
A nossa linha, Srs. Deputados, é todos sem excepção, criando situações de favorecimento particular àqueles que, pela sua inserção, pelo contexto em que vivem, seja regional, seja local, seja a família, não têm tantas possibilidades, tantas oportunidades como os outros, e nós temos de estar atentos, todos, e trabalhar neste quadro.
Em relação às questões que o Sr. Deputado colocou vou começar por responder à da prioridade para 2010/2011 — e, depois, peço ao Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação para responder à questão da formação contínua dos portugueses —, onde a nossa grande aposta é na qualidade. Mas dir-me-ão imediatamente: isso é um conceito vago. Em que é que se operacionaliza? Dir-vos-ei que será nas metas de aprendizagem e nos ajustamentos dos currículos para que todos os alunos, em cada ano de escolaridade, todas as famílias e todos os docentes tenham mais nítidas quais são as aprendizagens e as competências que é desejável e indispensável assegurar a cada etapa do percurso educativo.
Com base nessa definição de metas e ajustamentos de currículos, que permitam assegurar aquilo que é nuclear no trabalho educativo, temos de investir no alargamento de competências e na melhoria da forma como se avaliam os resultados. Os resultados devem ser progressivamente mais satisfatórios; temos de, na forma como a aprendizagem é avaliada, verificar progressos. Neste campo, como noutros, é muito importante fazermos um balanço entre o investimento e o resultado.
Investimos recursos, investimos esforços, investimos formação, investimos todo um conjunto de conhecimentos que fomos acumulando ao longo do tempo e investimos competência técnica.
Precisamos que esse investimento se traduza numa aprendizagem efectiva por parte dos nossos alunos e num desenvolvimento que lhes permita beneficiar melhor de todos os recursos que a escola oferece e vir a desempenhar na nossa sociedade um papel que abra perspectivas para que o nosso país, com as gerações do presente e do futuro, se encaminhe para o progresso e para a melhoria das condições de vida de todos nós. É esta a grande prioridade: metas de aprendizagem bem definidas. E sentimos que é, se quiserem, uma semente a partir da qual poderemos colher muitos frutos.
Peço, agora, a palavra para o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação. Chamo apenas a sua atenção para o tempo de que dispõe.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação (Alexandre Ventura): — Sr. Presidente, vou ser breve.
Srs. Deputados, gostaríamos de partilhar convosco, a propósito da formação contínua, as acções em que estamos envolvidos neste momento e as acções que pretendemos desenvolver no curto e no médio prazos.
Fundamentalmente, estamos a trabalhar num processo de revisão do regime jurídico da formação contínua, em articulação com o Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua e outros interlocutores. Estamos, naturalmente, a desenvolver este trabalho no sentido de melhor enquadrar a acção desenvolvida pelos centros de formação das associações de escolas. Pretendemos, sobretudo, uma articulação ainda mais harmoniosa entre a vertente das necessidades de formação identificadas pelas escolas e pelos docentes e as ofertas de formação por parte das associações de escolas, instituições do ensino superior e outras entidades.
Neste momento, estamos envolvidos, para além disso, em três grandes programas de formação contínua e especializada: um primeiro programa no domínio da avaliação, sobretudo do desempenho docente; um segundo programa no domínio da capacitação das direcções das nossas escolas; e um terceiro programa para capacitar ainda mais e melhor os responsáveis pelos serviços de administração escolar das nossas escolas.

Página 59

59 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O nosso objectivo fundamental é centrar a formação contínua nas genuínas necessidades das escolas e dos docentes. Pretendemos reforçar esse carácter instrumental da formação contínua como um elemento que influencie positivamente o trabalho desenvolvido pelos docentes nas suas interacções com os alunos, capacitando ainda mais os professores portugueses e proporcionando melhores aprendizagens para os alunos.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, a minha primeira palavra é dirigida ao Deputado José Manuel Rodrigues, que é o coordenador do CDS nesta Comissão, que não está aqui, hoje, connosco porque ficou na Madeira a tratar — nas palavras dele — já da reconstrução, depois da tragédia que se abateu por lá.
Do Grupo Parlamentar do CDS-PP vai um grande abraço para a Madeira, para ele e para os seus.
Sr.ª Ministra, ouvindo o Governo e o Partido Socialista falar aqui, parece que a «coluna vertebral» do Ministério da Educação é apenas a reconstrução física da escola e acabamos por esquecer uma série de matérias importantes com incidência orçamental, portanto com lugar neste debate, tais como o desenvolvimento escolar, a qualidade da formação, a valorização da escola, a avaliação dos docentes e dos discentes.
Gostaria de começar por notar uma série de recuos deste Ministério, e alguns são bastante positivos, em relação às políticas seguidas no governo anterior: acaba — e bem! — a divisão da carreira docente; a avaliação dos professores está «assim, assim»; a prova de recuperação dos alunos é facultativa escola a escola. Enfim, é um verdadeiro Ministério marcha atrás, o que nestas matérias não deixa de ser positivo.
No entanto, isso tudo leva a que haja também uma grande confusão normativa, porque as leis que regulam a divisão da carreira, a avaliação dos professores e as provas de recuperação continuam em vigor. Portanto, há ainda professores titulares e não-titulares; a avaliação continua em vigor — aliás, vai ainda produzindo efeitos enquanto falamos; e não se percebe muito bem como se faz chegar a informação de que terminarão as provas de recuperação quando acabaram as faltas injustificadas com o novo estatuto do aluno.
A primeira pergunta que lhe deixo (parece-nos importante, porque vai regular o funcionamento do Ministério ao longo deste ano lectivo e do que se iniciará proximamente) é quando é que V. Ex.ª, o seu Ministério, vai produzir os diplomas para suportar as intenções que têm vindo a ser anunciadas nas negociações que têm feito com os sindicatos.
Parece-nos um tema da máxima importância, uma vez que, por exemplo, em matéria de avaliação os professores contratados continuam a ter de ser avaliados e os que estão a subir de escalão também, como sabe. E o que acontece, agora, é que chegam às escolas circulares das direcções regionais para que estas façam uma espécie de apreciação intercalar desses docentes. Portanto, há uma confusão entre aquilo que está em vigor e aquilo que se quer suspender, o que leva a que, de facto, continuemos a pensar que teria sido melhor suspender este processo, como o CDS pediu, sendo que o PSD e o PS entenderam não o fazer.
Sabemos também agora que a prova de recuperação dos alunos, no caso de excesso de faltas, é retirada ou pelo menos passa a ser facultativa de escola para escola, não se percebendo essa dualidade de critérios e como é que se garante a unicidade da avaliação dos alunos. E o que é mau, o que verdadeiramente choca é que a prova de recuperação não é retirada por motivos pedagógicos, ou seja, por ser infeliz no que conta a educar os estudantes e os alunos, para que estes tenham uma cultura de rigor, de trabalho, de assiduidade, mas, sim, para que se retire carga burocrática aos docentes, o que é de todo em todo lamentável.
Mas a pergunta que lhe deixo é se vai mexer ou não no estatuto do aluno. De facto, parece-nos bem que termine a prova de recuperação, mas parece-nos igualmente bem que seja reintroduzido um critério de assiduidade, porque o que está neste momento na lei é que o professor vai fazendo provas até que consiga finalmente avaliar o aluno que faltou às aulas. Ora, a assiduidade nas aulas é em si um bem que importa, do ponto de vista do CDS, proteger.
Uma outra pergunta que lhe deixo é acerca de um parceiro que é muito esquecido pelo Ministério e que é muito importante na educação no nosso país, que são as escolas privadas.
Como sabe, temos chamado à atenção — já chamámos à atenção do Ministro de Estado e das Finanças e do Ministério da Educação — para o facto de as escolas privadas terem uma penalização muito grande nos

Página 60

60 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

descontos dos professores para a segurança social; descontam cerca de 25%, o que é mais do que qualquer outro sector — mesmo o sector privado, por exemplo, é superior à banca.
Neste Orçamento reduz-se 0,5 pontos percentuais — para 24,5%. Parece-lhe bem? O Ministério da Educação acha que um parceiro destes, que muitas vezes garante a liberdade de escolha das pessoas ou colmata falhas em áreas geográficas em que o Ministério não garante da educação, deverá continuar a ser penalizado desta forma ou está disposto também a lutar junto do seu colega das Finanças para que essa taxa possa baixar? Por fim, já aqui se falou da transferência de competências para as autarquias, e V. Ex.ª disse que está convencida de que vão continuar a transferir mais competências para municípios, porque está convencida, e nós também, de que esse caminho é positivo.
Também nos parece que esse é um caminho positivo, mas gostaria de chamar a sua atenção para o seguinte: o rácio auxiliar/estudante muitas vezes não se coaduna com a realidade das escolas. Esse rácio, enfim, é universal, não tem em conta as especificidades de cada escola, é igual para escolas com muitos e com poucos edifícios, é igual para escolas com muitas e com poucas turmas e, sobretudo, quando comparamos com o rácio de não-docentes por aluno que encontramos no ensino privado, vê-se verdadeiramente onde está o problema.
No ensino público, temos um funcionário para cada 26 alunos, no privado, temos 1 para cada 12. É certo que os privados oferecem muitos mais serviços — e bem! — do que o serviço público de educação, mas também nos parece que para que esta transferência de competências possa verdadeiramente funcionar o Ministério tem de reconhecer que é preciso contratar mais funcionários para cada escola do que aquilo que está neste momento a autorizar.
Sr.ª Ministra, a minha pergunta final é sobre se vai ou não aumentar estes rácios para melhorar o sucesso deste programa. E deixo-a, como tem sido nosso apanágio, com muito tempo para responder, uma vez que não esgotei o nosso tempo.

Entretanto, assumiu a presidência o Presidente da Comissão de Educação e Ciência, Luiz Fagundes Duarte.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação, para responder.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, só vou responder sobre o ponto da prova, depois pedirei a palavra para o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Educação, para falar sobre as questões do Estatuto da Carreira Docente e da legislação.
Em relação à prova de recuperação dos alunos e ao estatuto do aluno, temos estado a estudar o assunto, porque o Estatuto do Aluno não deve ser modificado só num ponto. Se referimos a questão da prova foi porque, como essa prova se aplicava aos alunos que por algum motivo faltavam para verificar se tinham adquirido conhecimento, e o facto de ela existir e, embora estivesse explicitamente dito na lei que deveria ser escrita, era muitas vezes motivo para a elaboração de provas escritas por parte dos professores, o que afectava também o trabalho dos professores, nós, contra uma regra que achamos que devemos manter, falámos apenas num ponto antes de apresentar o conjunto das medidas referentes à mudança do estatuto do aluno.
Sr. Deputado, gostava de dizer que não se trata de recuar em nenhum dos aspectos que referiu, pelo seguinte: para já, posso dizer que quando é um recuo não é positivo; um recuo verifica-se quando as pessoas sentem de estão mal, portanto voltam atrás. Neste caso, não é um recuo, é uma avaliação da situação que leva a que haja uma alteração das medidas que estavam em vigor.
Naturalmente, isso acontece na educação. A mudança na educação é desejável, há até uma máxima em educação que é a seguinte: um sistema educativo que não muda está, por definição, a piorar. E isto porquê? Porque a sociedade muda, as circunstâncias das escolas mudam, a avaliação das medidas aconselha mudanças. E tudo isto implica que os responsáveis políticos e os técnicos reconheçam que é necessário haver mudança. Foram essas as mudanças que introduzimos. Sentimos que foram avanços.

Página 61

61 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Em relação ao estatuto do professor e à publicação dos documentos, peço a palavra para o Sr. Secretário de Estado, que tem acompanhado as negociações e que vos pode dar uma informação muito completa e circunstancial.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Agora, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, então, vamos partilhar convosco um ponto de situação relativamente a esta matéria das negociações sindicais.
Como sabem, desenvolvemos negociações com as organizações sindicais. Decorrente dessa negociação, foi assinado um acordo de princípios e estamos, neste momento, na fase de transferir para documentos normativos esse mesmo acordo de princípios.
Esse processo já foi desenvolvido pelo Ministério da Educação. Temos estado reunidos com as organizações sindicais — a última reunião que tivemos foi na passada sexta-feira, e voltaremos a reunir na próxima quarta-feira.
Já remetemos às organizações sindicais três propostas de documentos normativos: um decreto-lei para o Estatuto da Carreira Docente, uma portaria e um despacho. Temos preparado também o decreto regulamentar respeitante à matéria da avaliação do desempenho docente.
As organizações sindicais, na passada sexta-feira, apresentaram as respectivas posições quanto às propostas do Ministério de Educação. Na próxima quarta-feira, prevemos concluir as matérias respeitantes ao Estatuto da Carreira Docente, para que depois se inicie o percurso legislativo normal.
Quanto à questão levantada sobre a avaliação dos professores contratados, como sabem, estamos a desenvolver todas as acções no sentido de, tão depressa quanto possível, dispormos dos documentos normativos relativos ao Estatuto da Carreira Docente e à avaliação do desempenho docente.
No entretanto, os docentes (alguns docentes) necessitam de ser avaliados — é exactamente o caso dos professores contratados. Se estes professores não forem avaliados, o que lhes acontece é que, no próximo ano, não poderão ser contratados novamente. Portanto, presumo que estejamos em harmonia relativamente a esse aspecto. Convém, de todo em todo, salvaguardar o direito ou, pelo menos, a possibilidade de os professores actualmente contratados terem, no próximo ano lectivo, de ser novamente contratados. É esse o objectivo que nos leva, neste lapso temporal e até termos novo enquadramento normativo para a avaliação do desempenho, a desenvolver a avaliação dos docentes contratados.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Paulo Mota Pinto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago, pelo Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, Srs. Secretários de Estado, creio que não vale a pena fabricar falsos equívocos nem apostar em que, repetidos várias vezes, eles possam tornar-se verdade.
Nesta Câmara, apesar das diferenças ideológicas e políticas óbvias, penso que a Sr.ª Ministra e os Srs.
Secretários de Estado não encontrarão, aqui assim, uma única voz contra a ideia de requalificação do nosso parque escolar. E, portanto, não vale a pena fazer um discurso, quando discutimos a questão da Parque Escolar, EPE, e dizer-nos que «quem não é pela Parque Escolar, EPE, é contra a requalificação das escolas»»! É uma abordagem absolutamente demagógica e que em nada favorece a clarificação do debate.
O problema está na forma como o Governo encontrou uma maneira, um artifício de fazer a requalificação do parque escolar, em particular, das nossas escolas secundárias.
Creio que o que a Sr.ª Ministra aqui disse é particularmente preocupante e perigoso.
A Sr.ª Ministra fez-nos aqui uma abordagem de defesa da Parque Escolar, EPE, do modelo de entidade pública empresarial, e disse-nos que poderia ser uma sociedade por acções, em que o Estado tivesse a maioria do capital ou (não o referiu, mas quase dá vontade de perguntar) uma empresa em que o Estado tivesse uma golden share sobre o parque educativo das escolas secundárias.

Página 62

62 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Ora, o que faz sentido perguntar é o seguinte: porque é que, para qualificar aquilo que era um património edificado escolar que necessitava — e todos o sabíamos — de uma requalificação a breve prazo, o Governo entendeu que era adequado criar uma entidade pública empresarial? Esta é que é a questão. E porque é que o Governo entende que é necessário passar para essa empresa, para além das verbas necessárias para executar as obras, o património de escolas secundárias deste país que vão ser requalificadas? E quando a Sr.ª Ministra nos diz que até poderia ser uma sociedade por acções, ficamos a perceber exactamente o terreno que estamos a discutir: é se, a prazo — não estou a dizer que seja a Sr.ª Ministra, mas um outro governo que venha —, se venha a entender que é útil às finanças do País privatizar parte do património do parque educativo e do parque escolar que existe em Portugal. E isto não é compreensível!! Sr.ª Ministra, aquilo sobre o que temos de questioná-lo é o seguinte: passados dois anos de existência da Parque Escolar, temos uma empresa pública que tem sete escolas; não se percebe exactamente porque é que tem estas sete escolas e não tem outras ou porque é que as tem. Se ela é património público, se, até hoje, o parque escolar foi gerido pelo Ministério da Educação; se quem está à frente da Parque Escolar não vem de uma experiência de gestão escolar, vem antes da Refer, da REN, de outro tipo de infra-estruturas públicas, que nada têm a ver com a Parque Escolar, que nada têm a ver com o edificado das escolas, não se compreende por que é que foi criada esta empresa e por que é que ela pode ter acesso a património público.
E esta é a questão central.
Segunda questão: a da forma como a contratação pública tem vindo a ser feita para a recuperação do edificado das escolas secundárias.
Devo dizer-lhe que esta é uma matéria complicada porque a Parque Escolar não torna o acesso a esta informação muito fácil, nem as bases de dados criadas pelo Governo tornam o acesso a esta informação fácil.
Mas eu gostava que pudéssemos perceber a quem é que estão a ser adjudicadas, por ajuste directo, as empreitadas de requalificação das escolas secundárias.
Na fase zero das obras que foram adjudicadas, a Teixeira Duarte teve 37%, e isto significa o valor de 31 126 000 €; a Edifer ficou com 21%, e isto significa 10 milhões de euros; a Mota Engil ficou 12%, e significa cerca de 5 milhões de euros; e a HCI-Construções ficou com 30%, ou seja, com 16 milhões.
Por sua vez, na fase um, a Mota Engil ficou 33%, ou seja, digamos que, para simplificar, por todo e por junto, a Mota Engil, em todo este processo de reconstrução do parque escolar, já ficou com 117 milhões de euros de negócio na requalificação do parque escolar.
Gostávamos de perceber porque é que, na fase zero e na fase um, o bolo da requalificação fica na mesa de quatro empresas de construção civil, tal como gostávamos de perceber porque é que os ajustes directos, na área da planificação e dos projectos, também têm sucessivamente sido encomendados, convidados os mesmos arquitectos e os mesmos gabinetes de projectistas. O arquitecto Carlos Prata teve 11 escolas, Camilo Cortesão, oito, Bak Gordon, seis» Ou seja, aquilo que foi um modelo de intervenção e de requalificação que, deixe-me dizer-lhe, Sr.ª Ministra, ao contrário de outros países, nomeadamente o Reino Unido que teve um programa extremamente interessante de requalificação das escolas, que é o Building Schools for the Future, em que teve um debate público sobre o que deveria ser o projecto de requalificação do seu edificado escolar, em Portugal, nada disso tivemos. Temos aqui é uma empresa pública que fica com a propriedade das escolas e que faz um conjunto de negócios, por ajuste directo ou candidatura com prévia qualificação, sem que se perceba porquê.
Portanto, considero que esta era, provavelmente, a questão que a Sr.ª Ministra nos devia explicar, porque a Sr.ª Ministra apresenta-nos aqui 30 000 empregos criados e nós gostávamos de saber de onde é que tirou estes números. Quem é que lhe deu esta informação? Os projectistas, as empresas assinaram compromissos, assumiram compromissos no sentido de criar estes empregos? Ou esta é a mesma — enfim, eu não queria dizer» —, propaganda que foi feita no exacto momento em que foi lançado o programa e agora apenas se confirma, dizendo «prometemos mais 30 000 empregos, aqui estão os 30 000 empregos!» Mas de onde é que vem esta informação? Pergunto para que possamos saber»! Penso que era muito útil que a Sr.ª Ministra nos pudesse aqui dizer porquê uma EPE, porque é que ela vai ficar com o património das escolas públicas secundárias, se vai ser privatizado, e que raio de modelo de contratação por ajuste directo é este que vai sempre calhar aos mesmos. Esta, penso eu, é uma das questões centrais.

Página 63

63 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, falta 1 minuto para concluir o seu tempo.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Obrigada, Sr. Presidente.
Eu queria, muito brevemente, discutir com a Sr.ª Ministra algumas escolhas orçamentais que a aqui nos trouxe e que me parecem relativamente discutíveis.
Olhando para as áreas de despesa do Ministério da Educação do orçamento inicial de 2009 e do orçamento inicial de 2010, há alguns dados que saltam aos olhos.
Veja que na acção social escolar, o que foi executado foi menos do que estava previsto no orçamento de 2009; nos complementos educativos, o que foi executado é menos do que estava previsto, inicialmente, no orçamento de 2009; na educação especial, também é menos do estava inicialmente previsto.
Curiosamente, no ensino particular e cooperativo, foi executado mais do que estava previsto no orçamento inicial; ou seja, em acção social, educação especial, complementos educativos, executámos menos do que prevíamos; no ensino particular e cooperativo, executámos mais do que prevíamos no orçamento. E o que é que acontece, agora? Agora, num ano de constrangimento orçamental, é exactamente o ensino particular e cooperativo que tem uma dotação orçamental significativa e que cresce, o que, aliás, é assumido pela Sr.ª Ministra.
Por fim, também muito rapidamente e só para se perceber se entendi correctamente as palavras do Sr.
Secretário de Estado, refiro o seguinte: o Sr. Secretário de Estado disse-nos que os contratados, para voltarem a ser contratados para o ano, têm de ser avaliados. Isto significa que o Sr. Secretário de Estado vai manter uma avaliação que o próprio Governo entendeu que era uma avaliação que não tinha tido os critérios e a objectividade necessários ou vai criar — não sei se em Março ou Abril deste ano — um modelo de avaliação dos contratados, portanto, já a meio do ano? Devo dizer que isto na minha cabeça não ficou completamente claro.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, muito obrigada pelas suas questões.
Gostava de, mais uma vez, incentivar os Srs. Deputados a visitarem as escolas que já estão feitas.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas não é isso que está em causa!

A Sr.ª Ministra da Educação: — É porque estamos aqui a falar de uma realidade que existe, que foi feita e que está visível e em que as pessoas podem não só verificar a qualidade daquilo que está feito, como também a qualidade do serviço que aquele equipamento oferece à educação.
Em relação ao ponto sobre o modelo que foi utilizado pela Parque Escolar para as escolas secundárias, gostava de vos lembrar que, naturalmente, foi feito com base num projecto que existia em Inglaterra e que a Sr.ª Deputada Ana Drago citou; só que, no nosso país, o projecto foi assumido de uma forma mais plena e foi desenvolvido de uma forma mais massiva, mas a base de inspiração deste projecto foi, precisamente, o projecto inglês.
Gostava ainda de referir que há um relatório de avaliação, que está disponível também na Internet, de uma avaliação realizada por peritos da OCDE que referem, como uma prática a seguir internacionalmente, o modelo de gestão, seguido pela empresa Parque Escolar e elogiam abertamente o nosso país pelo facto de ter seguido, de uma forma consistente, aquele modelo e ter os resultados que têm vindo a ser obtidos.
Não se trata aqui de um modelo de gestão escolar, Sr.ª Deputada; trata-se, sim, de um modelo de gestão de um património de edifícios que carecem, para serem requalificados e para serem mantidos em condições, para serem edifícios do século XXI — com todo o apetrechamento tecnológico que queremos que as nossas escolas hoje tenham, com a diversidade de oferta educativa que decorre da existência de cursos profissionais em praticamente todas as escolas —, de equipas competentes do ponto de vista técnico e que devem ser concentradas em unidades orgânicas, empresas que, nesse caso, é uma empresa pública — eu referi o facto de ser uma empresa pública — e o património dessa empresa pública é um património público.

Página 64

64 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Só para vos dar dois ou três exemplos de, exactamente, uma opção que é radicalmente inversa àquilo que, às vezes, as pessoas podem pensar ou que é sugerido pela análise, quer-vos falar, por exemplo, na Escola Secundária Machado de Castro. A Escola Secundária Machado de Castro, aqui perto, em Lisboa, não estava utilizada, era uma escola que estava vazia. Ora bem, a empresa Parque Escolar EPE reabilitou esta escola e, neste momento, ela está com uma utilização plena escolar, é a escola de hotelaria.
Outro exemplo, a Escola Secundária Marquês de Pombal; outro, ainda, a Escola Secundária D. João de Castro.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Aquela que os senhores queriam fechar!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Lembram-se de, há alguns anos, tantas notícias sobre a possibilidade de se alienar a escola D. João de Castro? Neste momento, esta escola está recuperada e a ser utilizada como escola.
Está longe da intenção do Ministério da Educação alienar o património público que são as escolas portuguesas. Posso afirmá-lo aqui, nesta Assembleia: o Ministério da Educação não irá alienar o património público constituído pelas escolas portuguesas! Em relação aos concursos da Parque Escolar, gostava de dizer que, como sabem, apenas 5% de todo o trabalho da Parque Escolar foi acordado por contrato directo com gabinetes de arquitectura. Os gabinetes de arquitectura envolvem vários arquitectos e, neste momento, temos 102 gabinetes de arquitectura. O facto de ser um contrato directo decorreu de uma problemática, neste caso, da contratação de arquitectos que é específica, porque para elaborar um programa de arquitectura era necessário um arquitecto.
Na verdade, para criar as condições para se abrir um concurso é preciso um trabalho técnico com as direcções das escolas, trabalho esse que carece de profissionais de arquitectura.
Neste momento, para alargar ao máximo» Nós compreendemos que há 20 000 arquitectos no nosso país e que estes devem, dentro do possível, ser convidados a participar neste trabalho. O concurso público é de realização difícil neste caso, porque é necessária a elaboração de um caderno que requer, para isso mesmo, arquitectos. E, como devem compreender, ser elaborado previamente por um arquitecto e, depois, entregue a outro é complicado! Mas, neste caso, a empresa Parque Escolar está a estudar e, aliás, já fez um acordo com a Europan, que é uma organização internacional, para se poder incentivar a participação de mais arquitectos, nomeadamente arquitectos que estão em início de carreira, e criar condições, com o apoio da Europan, para que possam fazer-se, também, concursos na área da arquitectura.
No caso das outras adjudicações, foram feitos concursos públicos, com pré-qualificação e com júri, e a empresa à qual foi adjudicado o trabalho foi a que, no quadro do concurso, apresentou melhores condições e, naturalmente, foi seleccionada de acordo com os parâmetros que estavam consignados nas regras do concurso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Sr. Presidente, uso da palavra apenas para prestar um esclarecimento que foi pedido.
Previsivelmente, haverá um novo enquadramento normativo para a avaliação do desempenho (calculamos nós) por volta de Abril ou Maio. Os docentes contratados, para que possam vir a ser contratados no próximo ano lectivo, têm de participar num processo de avaliação do respectivo desempenho e, portanto, se aguardássemos pela existência de um novo enquadramento normativo para a avaliação do desempenho, o lapso temporal remanescente seria manifestamente insuficiente para desenvolver essa avaliação de desempenho.
Por último, gostaríamos de frisar que o objectivo do Ministério da Educação com esta medida, que não é mais do que o respeito pelo enquadramento normativo ainda em vigor, é garantir exactamente a esses docentes contratados a possibilidade de virem a ser contratados novamente, no próximo ano lectivo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

Página 65

65 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, ainda bem que a Sr.ª Ministra teve oportunidade de vir cá hoje, outra vez — como é, aliás, natural que aconteça —, porque da primeira vez que aqui esteve, aquando da discussão na generalidade, de facto, ficámos sem nada saber do Orçamento do Estado.
Vamos ver se hoje conseguimos saber alguma coisa.
O Grupo Parlamentar do PCP tem vindo a colocar, desde 2007, estas questões relativas à criação da empresa Parque Escolar, EPE, porque ela levantou-nos muitas dúvidas desde o início, ainda antes da opacidade da forma de contratação e de todas estas dúvidas que têm surgido e que, julgo, são legítimas — a Sr.ª Ministra deve reconhecer que assim é —, porque enquanto não tivermos acesso a todos os dados, todas as dúvidas são legítimas.
Com a criação da Parque Escolar, o Governo conseguiu utilizar um expediente que não é novo: o de criar empresas para se desresponsabilizar das suas funções sociais; cria uma empresa e depois diz que essa responsabilidade é dela! Também já vimos criações de outras EPE que redundaram, depois, em SA e que servem, afinal de contas, como o primeiro degrau para a privatização — é o caso, por exemplo, da Estradas de Portugal.
Certamente, existirão muitos interesses privados que aguardam pacientemente a sua «fatia» do sistema educativo, a sua valiosíssima «fatia» do sistema educativo. Outros já a têm! Aqueles que andam a construir e conseguem, por ajuste directo, um conjunto de obras muito significativo, aqueles que já conseguem explorar as cantinas, os bares, os refeitórios, a vigilància, as papelarias» Todos esses já conseguem tirar o seu quinhão, e o Governo prepara-se para entregar ainda mais! A primeira questão que devemos colocar, Sr.ª Ministra, é a de saber por que razão chegámos a este ponto: desde há 30 anos que existem escolas provisórias em Portugal! Não estamos a criticar, como é óbvio — nunca o faríamos —, a urgente e necessária intervenção no parque escolar, para a qual o próprio Grupo Parlamentar do PCP tem alertado ao longo dos tempos. Até lhe digo, Sr.ª Ministra, que, no anterior governo, o PCP chegou a visitar escolas decadentes, decrépitas, nas quais foi mal recebido por orientação do seu Ministério — porque não era bom mostrar aquelas escolas.
Felizmente, estamos a intervir nessas escolas, mas a questão que se coloca é esta: os fins justificam todos os meios? Podemos obviar à transparência pública para fazer obras só porque elas são urgentes? Se é assim, então o Governo encontrou a fórmula mágica! Deixa tudo chegar a um estado de insustentabilidade total e, depois, inventa mecanismos completamente opacos para resolver o problema e argumentar que «o problema era tão grande que tivemos de contornar todas as regras»! Sr.ª Ministra, se a Parque Escolar, EPE, a empresa que o anterior governo criou para gerir o parque escolar, não precisa de expedientes excepcionais, então para que foi criado o regime excepcional de contratação pública? Com efeito, foi criado um regime de contratação e compras públicas e, logo a seguir, um regime excepcional. Ora, se a Parque Escolar, EPE, faz tudo de forma tão expedita e tão transparente, para que foi preciso esse regime excepcional? A Sr.ª Ministra também nos disse aqui que a Parque Escolar era composta por um conjunto de especialistas. Portanto, para não deixar aos amadores, a essas pessoas que trabalham no Ministério da Educação, a esses funcionários das direcções regionais e aos órgãos de gestão da escola a gestão do parque escolar, a Sr.ª Ministra foi buscar pessoas entendidas na matéria, entendidas na alienação do património do Estado e na gestão imobiliária dos terrenos do Estado — e a REFER entrou pelo parque escolar a dentro» Portanto, aí estão os «especialistas» em gestão de património escolar»! E tambçm vieram os representantes das empresas»! Queria que a Sr.ª Ministra me dissesse, pelo menos, o que é que isto lhe parece: um alto funcionário de uma empresa de construção civil sai da sua empresa, lampeiro, entra no Conselho de Administração da Parque Escolar e contratualiza obras no valor de 35 milhões de euros com a empresa de onde acabou de sair.
Acha que isto é natural? É normal? É transparente, Sr.ª Ministra?!

Vozes do PCP: — Isto é uma vergonha!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isto faz parte, não é? Temos de fazer qualquer coisa nas escolas e, portanto, qualquer coisa serve» Mas há um mínimo, Sr.ª Ministra! Gostava de saber o que a Sr.ª Ministra tem a dizer sobre esta situação.

Página 66

66 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Já agora, aproveito para falar-lhe um pouco da Escola Secundária D. João de Castro, questão que a Sr.ª Ministra não acompanhou, certamente, e cujo dossier terá agora estudado. Deixe-me dizer-lhe, Sr.ª Ministra, que o PCP propôs aqui, nesta Assembleia, um projecto de resolução para que esta escola se mantivesse no âmbito público, mas o PS rejeitou esse projecto de resolução porque, na altura, pensava que podia alienar aquela Escola — e não pôde aliená-la por vários factores.

Protestos da Deputada do PS Manuela Melo.

A Sr.ª Ministra conhece um deles, o da afectação do terreno para fins educativos.
Portanto, não puderam fazê-lo, mas não exija ao PCP desculpas por ter defendido a manutenção daquele espaço no património público.

Protestos da Deputada do PS Manuela Melo.

A Sr.ª Deputada Manuela Melo está a tentar boicotar activamente a minha intervenção, pelo que pedia ao Sr. Presidente»

Protestos da Deputada do PS Manuela Melo.

Se a Sr.ª Deputada me quiser chamar mentiroso, chama-me lá fora e a gente logo vê» É para podermos baixar o nível da discussão!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputados, peço-lhes que se criem condições para que quem está no uso da palavra possa prosseguir a sua intervenção.
Srs. Deputados, tenho por hábito permitir os apartes desde que não impeçam a continuação da intervenção.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E desde que não sejam ofensivos!

O Sr. Presidente: — Faça favor de continuar, Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, apenas gostava de ler duas ou três passagens do estatuto da Parque Escolar.
«À Parque Escolar compete: conceber, desenvolver e gerir»« — agora, pasme-se! — «» as unidades de negócio destinadas a potenciar receitas da exploração das escolas secundárias e a valorizar o património afecto ao Ministério da Educação».
Mais: «A Parque Escolar pode exercer quaisquer outras actividades, complementares ou subsidiárias do seu objectivo principal, bem como explorar outros ramos de actividade comercial ou industrial dele acessórios para a realização do seu objecto». E a Parque Escolar pode ainda «constituir ou participar noutras empresas ou sociedades».
Talvez este princípio de trazer os quadros das grandes construtoras para dentro da Parque Escolar seja já o princípio destas suas competências» Sobre a Parque Escolar só me resta fazer uma pergunta: como é que a Sr.ª Ministra aceita que a gestão do parque escolar, do património material mais importante do seu Ministério seja gerido sem escrutínio público? As pessoas votaram no Governo, não no Conselho de Administração da Parque Escolar, e querem saber o que vai ser feito na escola tal, no ano x, e não querem que a Ministra lhes responda: «Não sei, isso é com uma empresa, porque nós criámos uma empresa para o fazer».
Sr.ª Ministra, duas õltimas questões no pouquíssimo tempo que me resta»

O Sr. Presidente: — Dispõe de apenas mais 1 minuto, Sr. Deputado.

Página 67

67 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O seu Ministério permitiu, passivamente, que 177 milhões de euros da acção social escolar fossem para pagar computadores, certamente úteis, mas desenquadrados dos planos curriculares, como reconhecerá. De facto, não havia planificação para a utilização do Magalhães, mas havia para os manuais escolares, um dos materiais essenciais para a conclusão com sucesso do processo educativo — não sendo exclusivos, são importantes. Ora, para esses, a Sr.ª Ministra não tinha os 60 milhões disponíveis para, através da acção social, garantir a gratuitidade, mas lá se desencantaram 177 milhões de euros, «desviadinhos» da acção social escolar para pagar um computador que ninguém sabia ainda para o que servia — aliás, ainda hoje, sobram-nos sérias dúvidas.
A pergunta que lhe faço é se, com a verba que está prevista — de 40 milhões de euros —, tenciona garantir, finalmente, a gratuitidade total para toda a escolaridade obrigatória dos manuais escolares, tendo em conta que eles são um elemento estrutural da gratuitidade do ensino. Não é possível dizer que a escola é gratuita se as famílias tiverem de continuar a despender mais de 200 00 € no início de cada ano lectivo para pagar os manuais escolares.
Termino, perguntando: qual é a estratégia orçamental para fazer frente à situação gravíssima que se vive no que toca aos funcionários não docentes, nomeadamente nas escolas secundárias. Neste momento, temos mais de 6000 pessoas nas escolas a prestar serviço de funcionário, de auxiliar de acção educativa através de contratos.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, gostava de chamar a atenção para um ponto que me parece óbvio, mas às vezes, o mais óbvio não surge tão claro como isso.
Se o Ministçrio da Educação se quisesse desresponsabilizar, não estava aqui a responder ás questões,»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não ç verdade! Tinha de vir na mesma»

A Sr.ª Ministra da Educação: — » não estava aqui a responder plenamente e a explicar, com toda a abertura, esta forma de trabalhar, recorrendo a uma empresa para assegurar funções que, no quadro do Ministério, implicavam a constituição de uma unidade. Podia ser de outra maneira, mas esta não só foi criada à semelhança do que tem acontecido noutros casos e noutros países, como tem provado bons resultados.
Vou apenas referir algumas vantagens do modelo: em primeiro lugar, um modelo como este permite mais iniciativa; em segundo lugar, indicadores de realização muito mais claros;»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Nem por isso!

A Sr.ª Ministra da Educação: — » em terceiro lugar, uma gestão totalmente virada para os resultados; em quarto lugar, uma gestão colegial muito mais rica de competências tçcnicas;»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Onde?

A Sr.ª Ministra da Educação: — » em quinto lugar, a publicação de balanço e contas com um fiscal õnico, com auditorias do Tribunal de Contas, muito mais avaliável, com um código de bom governo e um código de ética. Provavelmente, não conhecem o que é o código do bom governo, mas é um instrumento muito importante hoje para aferir exactamente os princípios segundo os quais as organizações se regem.
Por fim, a realização prova que foi uma opção devidamente ponderada e que tem dado resultados como nunca antes no nosso País aconteceu.
Quanto ao regime excepcional de contratação, quero dizer-vos que o mesmo não decorreu nem da natureza da actividade nem da natureza da organização Parque Escolar, EPE, decorreu, sim, da situação do nosso País, da situação de crise, que exigia medidas que fossem executadas a curto prazo,»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Temos de dar uma ajudinha à Parque Escolar!

Página 68

68 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Ministra da Educação: — » que exigia que o lançamento das obras fosse o mais rapidamente possível accionado para a criação de emprego, Srs. Deputados.
A questão decorreu de uma política mais global de necessidade de criação de emprego. Daí precisamente o recurso a um financiamento excepcional que foi colocado ao serviço da empresa Parque Escolar EPE.
Quanto às empresas, volto a dizer, como há pouco já o disse, que elas foram seleccionadas no quadro de concursos e que foram estabelecidas regras para esses concursos, estando todo o procedimento divulgado.
Gostava que me fizessem chegar, se assim o entenderem — aliás, tem sido muito comum aos Srs. Deputados colocarem questões sobre a política e a acção do Ministério da Educação —, questões específicas sobre qualquer escola, sobre qualquer docente. Envidaremos todos os esforços para responder circunstanciadamente a cada questão que colocarem, porque tudo o que respeita à forma como a empresa está gerida, aos seus balanços e contas, aos seus relatórios de avaliação técnica e de avaliação financeira está publicamente colocado no site da empresa Parque Escolar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não está, não, Sr.ª Ministra!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Peço agora a palavra para o Sr. Secretário de Estado da Educação, para responder à questão sobre a acção social escolar.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, começo por dizer que o orçamento da acção social escolar cresce 6,3%.
No que respeita à transferência da verba da rubrica da acção social escolar, lembro que o Decreto-Lei n.º 55/2009, de 2 de Março, que estabeleceu o regime jurídico aplicável à atribuição e ao funcionamento dos apoios no âmbito da acção social escolar, definiu, no seu artigo 40.º, que, no quadro do programa de acesso aos computadores pessoais e ao serviço de Internet de banda larga, os alunos dos ensinos básico e secundário integrados em escalões de apoio beneficiam de condições especiais.
A razão pela qual temos esta formulação visa, no essencial, garantir igualdade de oportunidades. Não podemos fazer o discurso da igualdade de oportunidades, o discurso sobre os computadores, sobre a Internet, sobre as tecnologias da informação e da comunicação como sendo fundamentais para trabalhar, para estudar, para viver no século em que vivemos e, depois, questionar o princípio de distribuição de computadores por todos os alunos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Então e sobre os manuais? Onde está a resposta?

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — É, portanto, uma medida de igualdade de oportunidades.

O Sr. Presidente: — Terminamos, assim, a primeira ronda de questões, que teve resposta individualizada.
Passamos, agora, à segunda ronda, em que cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos, podendo acrescer 2 minutos por cada Deputado que se inscreva. A resposta será conjunta, em tempo igual ao das perguntas.
Começamos pelo Grupo Parlamentar do PSD. Tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, quero só dar a indicação de que os 5 minutos serão preenchidos com a intervenção do Sr. Deputado João Prata. Entretanto, farei chegar à mesa o conjunto de Deputados que querem colocar questões de 2 minutos.

O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Deputado.
Então, tem a palavra o Sr. Deputado João Prata.

O Sr. João Prata (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação e Srs. Secretários de Estado, sejam bem-vindos.

Página 69

69 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

É fundamental que na educação, cada vez mais, e depois de quatro anos de gestão socialista das políticas educativas, duas palavras estejam presentes: autenticidade e credibilidade.
O que temos visto nestes últimos meses é uma certa colagem às políticas anteriores, que muito de nefasto tiveram exactamente para a autenticidade e para a credibilidade da educação junto dos seus principais interessados, que são os portugueses, os pais e, naturalmente, os professores e os alunos.
Quando se refere que os sistemas educativos têm de mudar, a primeira questão prende-se com o estatuto do aluno, assunto já aqui focado.
O Estatuto do Aluno foi aprovado em lei em 2002 e, depois, houve um outro, aprovado em 2008. Estamos em 2010 e, como se percebe claramente, não se trata de uma mudança mas apenas de perceber que foi um grave erro aquilo que o PS fez em 2008 com a aprovação do estatuto.
O Estatuto do Aluno quer-se um documento simples, claro e concreto, em que há direitos dos alunos, sim, mas há também deveres dos alunos. Os alunos estão na escola para procurar respeitar as indicações e viver num bom clima democrático, mas fundamentalmente estão na escola para procurarem ser melhores cidadãos e para que as gerações futuras, como foi dito e muito bem, possam servir melhor o seu País.
O que se pergunta, e que ainda não foi respondido, é o seguinte: quais são as principais linhas de orientação que o Ministério da Educação postula para as alterações do estatuto do aluno? A segunda questão, Sr.ª Ministra e Srs. Secretários de Estado, tem a ver com os contratos de autonomia.
Em 2007, também por linha política anterior, surge esta experiência, que aqui registo tratar-se de uma experiência razoavelmente positiva do ponto de vista do enquadramento legal, pois na prática não sabemos, e é isso que se pergunta aqui. Que estudos tem, neste momento, o Ministério sobre o desenvolvimento dos contratos de autonomia? Há opiniões de conselhos de escolas, de alguns presidentes de conselhos directivos ou de directores de estabelecimento de ensino que assinaram esses contratos de autonomia? O que se pergunta é o seguinte: o que é que este Governo pensa fazer em relação à política dos contratos de autonomia? Porque, em termos de Orçamento do Estado, não há expressão orçamental, não consigo descobri-la. Sendo uma linha política do anterior governo que este Governo diz querer continuar — pelo menos não ouvi dizer que não queria fazê-lo —, quero perguntar o que pensa fazer, quais são as linhas de orientação que tem para este mandato e, particularmente, qual é a expressão orçamental.
A Assembleia da República, seguramente, tal como eu e os meus colegas Deputados, gostaria de saber o que está a ser feito e como está a decorrer essa experiência, para se poder aferir e dar outro desenvolvimento.
A terceira questão tem a ver com o programa de avaliação das escolas. A Inspecção-Geral da Educação desenvolve um programa de avaliação das escolas centrada, primeiro, na avaliação interna e, depois, na avaliação externa por uma equipa da Inspecção-Geral da Educação. Também não verifico, no Orçamento do Estado, a expressão orçamental disso.
Fala-se muito na avaliação dos Srs. Professores, até se chega ao ponto politicamente errado — porque é mais um sinal errado que se dá à sociedade portuguesa, no sentido de quase afrontar os professores de uma forma mais polida — de referir que é importante mudar o Estatuto do Aluno para não sobrecarregar os professores com mais um trabalho, o da prova de recuperação. É a expressão máxima de cinismo político utilizar-se isso dessa forma.
Deste modo, eu diria que a avaliação das escolas é importante, tal como é importante a avaliação dos professores e dos alunos, mas, realmente, a avaliação da organização, daquele elo mais fraco da cadeia, do sistema educativo, que são as escolas» Gostaria de questionar este Governo, este Ministçrio, no sentido de saber qual é a orientação desta equipa governativa em relação ao processo de auto-avaliação e de avaliação externa das escolas. É a de seguir o modelo que está? Produzir resultados em função daquilo que já foi feito? No Orçamento não consegui perceber muito bem o que se pretende.
Por último, em relação aos 12 anos de escolaridade, também aqui as mudanças são muito rápidas.
Seguramente, a Sr.ª Ministra e os Srs. Secretários de Estado estão recordados de que, em 2002, esta Assembleia da República ou o governo então vigente, de coligação entre o PSD e o CDS-PP, propôs uma lei de bases do sistema educativo em que se pressupunha já a existência de 12 anos de escolaridade obrigatória.
Depois, como a Sr.ª Ministra sabe, essa lei foi vetada pelo então Presidente da República, e só passados sete anos, em 2009, o governo do PS fez dos 12 anos de escolaridade grande meta eleitoral ou grande motivo de campanha eleitoral.

Página 70

70 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Não estamos contra isso, por princípio o PSD também é favor — aliás, propusemo-lo na lei de bases do sistema educativo em 2002. O que aqui se questiona, bem assim como dizia o Sr. Secretário de Estado quanto á acção social escolar, ç um aspecto. Relato um exemplo, para se perceber bem»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que abrevie a sua intervenção, pois já excedeu o tempo de que dispunha.

O Sr. João Prata (PSD): — Em relação à acção social escolar, gostava de contar um pequeno episódio.
Ainda outro dia, em contacto com os eleitores, pude perceber que um agregado familiar com dois alunos a estudar no ensino secundário, o pai e a mãe a auferirem o ordenado mínimo, teve de fazer um acordo com a livraria, durante quatro meses, para ter acessos aos livros escolares, porque não tiveram dinheiro para os pagar, nem com os apoios sociais escolares.
É nesse sentido que pergunto, Sr. Secretário de Estado, dando sequência àquilo que eu estava referindo, o que é que se pensa fazer para que realmente este assunto seja implementado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosalina Martins, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra e Srs. Secretários de Estado, os meus cumprimentos.
Quero fazer uma pequena nota prévia. Eu não tinha previsto falar sobre a Parque Escolar, mas como este foi um tema transversal a todas as intervenções durante a primeira ronda, gostaria de recolocar aqui uma questão. Afinal, o que é que se passa com a Parque Escolar? A Sr.ª Ministra já referiu que existe um relatório da OCDE onde esta experiência é avaliada de uma forma muito positiva e, neste momento, a Parque Escolar está a construir e a requalificar escolas. Está a fazê-lo bem ou mal?

Risos do BE e do PCP.

É notório que está a fazê-lo muito bem. E como está a fazê-lo muito bem, parece que isso é preocupação geral de todos os partidos da oposição.

Protestos da Deputada do BE Ana Drago.

Nomeadamente, a Sr.ª Deputada Ana Drago falou 9 minutos da Parque Escolar, e só no resto do tempo falou sobre as restantes políticas educativas.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Porque dou importância ao que diz a Sr.ª Ministra!

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): — Vou recentrar as questões.
Como nota de rodapé, e depois dos exemplos que a Sr.ª Deputada deu relativamente à adjudicação de escolas, eu, por exemplo, posso dar-lhe outro. Na minha escola, quem fez o projecto foi um arquitecto que até é professor da própria escola! Veja como há disparidades!»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Grande critério! Está na lei!

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): — As grande empresas que a Sr.ª Deputada referiu»! Como o orçamento é um instrumento para executar políticas, tendo o PS já aqui referido que este é um orçamento inclusivo, um orçamento de vanguarda, um orçamento que está também ao serviço as famílias, vou recentrar efectivamente a nossa questão no Orçamento do Estado.
O PS já aqui foi acusado de estar a dar sequência a políticas de continuidade. Nunca se pretendeu nem fazer roturas, nem fazer grandes reformas. A continuidade é extremamente importante de forma a podermos assegurar, tal como a Sr.ª Ministra referiu, uma mudança tranquila.

Página 71

71 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Efectivamente, na questão da educação temos um triângulo, em que em cada um dos vértices temos entidades diferentes: por um lado, temos o Estado; por outro lado, as escolas; e, por outro lado, aquilo que designamos de comunidade escolar.
Ao Estado cabe a afectação de recursos e garantir orientações gerais; às escolas cabe a gestão desses mesmos recursos e a prestação do serviço público que é a educação; à comunidade educativa — autarquias, pais e instituições da sociedade civil — cabe acompanhar a concretização das políticas educativas.
Enquanto ouvi a intervenção do Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria imaginei-me num outro país. É porque, efectivamente, as autarquias são parceiros privilegiados neste processo educativo, e muito antes do início da requalificação do parque escolar já muitas, no que diz respeito ao 1.º ciclo, tinham iniciado esse processo.
Portanto, as autarquias assumem a educação como um dos seus objectivos prioritários.

O Sr. Presidente: — Resta-lhe 1 minuto, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, não resisto a deixar-lhe aqui uma nota sobre a discussão de uma proposta de lei de Orçamento do Estado ocorrida, nesta mesma Sala, no dia 24 de Outubro de 2003, em que o Ministro da Educação, que o Sr. Deputado sabe exactamente quem era, referia como objectivos os seguintes: reordenamento da rede do 1.º ciclo; profissionalização da gestão das escolas; combate ao abandono escolar; alargamento da escolaridade obrigatória para o 12.º ano; grande tónica na contratualização com as autarquias; novo ensino básico e novo ensino secundário.
No entanto, há aqui esta grande diferença: os senhores tinham um compromisso e não o concretizaram; nós assumimos o compromisso e concretizámo-lo. Esta é a grande diferença entre as políticas levadas a cabo.
Para terminar, Sr. Presidente, quero dirigir uma pergunta muito concreta à Sr.ª Ministra, que tem a ver com a questão da subida da dotação no privado.
A Sr.ª Deputada Ana Drago entendeu não ver aí também a grande expansão que teve o ensino artístico. A minha pergunta muito concreta, Sr.ª Ministra, vai no sentido de saber qual é o objectivo de progressão do ensino artístico para o próximo ano lectivo, que é exactamente o ano ao qual se destina este orçamento.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero recuperar da minha intervenção de há pouco duas questões que ficaram por responder (e às quais agradecia que a Sr.ª Ministra pudesse agora responder) e que têm a ver com o caso das taxas sociais pagas pelas escolas particulares.
Gostaria de saber se a Sr.ª Ministra acha ou não que deve fazer um esforço junto do seu colega das Finanças para que essas taxas possam ser baixadas e o sistema educativo possa contar com o contributo dos docentes do privado de uma forma mais equilibrada. Gostaria ainda de saber se a Sr.ª Ministra vai querer mexer — e acho que esta é uma questão fundamental e que tem sido aqui suscitada por várias bancadas — nos rácios dos funcionários não docentes, quando faz a transferência de competências para as autarquias, ou se vai continuar a insistir nesses rácios e esperar que as autarquias cedam naquilo que se lhes manifesta, com o que concordamos, insuficiente para a gestão das escolas.
Vou colocar-lhe mais duas ou três questões, às quais espero que tenha tempo para responder. Uma delas tem a ver com o número de docentes que temos no sistema, neste momento. Verifica-se que existem cerca de 10 000 docentes a menos do que há três anos, quando, ao mesmo tempo, aumentou o número de alunos.
Assim, quero perguntar-lhe se o facto de estar a aumentar o número de alunos por docente tem a ver com a diminuição do número de alunos do ensino especial, que, infelizmente, saíram do sistema, assim como os seus professores.
Uma outra questão é no sentido de saber se é possível o Ministério aferir, dentro da massa salarial, o que está destinado a docentes e funcionários nas escolas e o que está destinado à máquina do Ministério e às direcções regionais. Sendo certo que não gostaríamos de ver aí confundido o número daqueles docentes que são pedidos às escolas e que, estando tecnicamente ainda no âmbito das escolas, estão a prestar funções junto da administração central ou da administração regional de educação.

Página 72

72 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Sr.ª Ministra, já falei aqui do ensino especial e quero dizer-lhe que é com agrado que verificamos haver um aumento de dotação para este sector da educação. Gostaríamos, no entanto, de relembrar que a aplicação da lei retirou do sistema, no anterior ano lectivo, cerca de 21 000 alunos com necessidades educativas especiais.
Isto pode ser bom ou mau, mas gostaríamos de saber a sua opinião em relação à CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde). A Sr.ª Ministra acha que a CIF é suficiente, como único instrumento de avaliação, para aferir aqueles que têm necessidades educativas especiais, ou pode haver aqui um avanço, e não um recuo, em relação aos critérios, que permita que este universo seja mais abrangente? Quero ainda retomar a questão do parque escolar, mas numa perspectiva diferente daquela que tem sido aqui abordada, numa perspectiva que me parece importante e que tem a ver com o gabinete de gestão financeira do seu Ministério, o qual tem perdido uma série de competências (e naturalmente bem, porque são passadas para a Parque Escolar), mas que, no ano passado, tinha um orçamento de cerca de 143 milhões de euros e que, agora, tem uma estimativa de despesa de cerca de 580 milhões de euros. Isto, ao mesmo tempo que houve uma perda de competências para a Parque Escolar e, ao mesmo tempo que, para este ano, vai orçamentar-se mais do aquilo que foi orçamentado no ano passado, cerca de 197 milhões de euros.
No meio de tudo isto, não percebemos de onde veio tanta necessidade orçamental para o gabinete de gestão financeira e gostaríamos que nos esclarecesse isso, uma vez que, apesar de haver a passagem de competências para a Parque Escolar, ainda aumenta o orçamentado para este ano.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, muito provavelmente, vou dar uma grande novidade à Sr.ª Deputada Rosalina Martins e, já agora, informar também a Sr.ª Ministra da Educação: quem fez o Código dos Contratos Põblicos foi nada mais nada menos do que o governo de» Josç Sócrates! Ou seja, o governo que a Sr.ª Deputada apoiou, como Deputada, na anterior Legislatura, o governo liderado pelo mesmo PrimeiroMinistro que a Sr.ª Ministra da Educação tem neste momento. Portanto, quem fez as regras da contratação pública foi nem mais nem menos do que o PS, que, no momento seguinte, suspendeu as mesmas regras que tinha feito. E a estranheza é: porquê? Por uma questão de tempo, de dificuldade em agilizar os concursos públicos para responder às solicitações? Não! Se formos analisar o Código dos Contratos Públicos, veremos que ele tem vários procedimentos que permitem exactamente agilizar os concursos públicos. E porque é que há concursos públicos? Por duas razões fundamentais: primeiro, por interesse público, ou seja, é o concurso público que assegura que o Estado é confrontado com várias propostas e que escolhe a que é melhor para o interesse público; segundo, por uma questão, que neste País é muito necessária, de transparência, para que não haja administradores de empresas de construção civil que, quando entram para empresas públicas EPE, adjudicam às suas empresas obras no valor de vários milhões de euros. É para isso que servem os concursos públicos: interesse público e transparência.
Ora, a Sr.ª Ministra fala-nos aqui de um código de ética da Parque Escolar, EPE, escrito e tornado público no seu site. Pois o código de ética desta mesma empresa tem permitido que a Parque Escolar vá seccionando as encomendas que vai fazendo, exactamente para fugir de quê? Desta coisa extraordinária chamada concurso público.
Portanto, estamos a falar de um programa de requalificação de escolas que está a ser levado a cabo com procedimentos muitíssimo obscuros e suspeitos — é disto que estamos a falar! Quero agora abordar, muito brevemente, algumas questões já aqui referidas pelos membros do Governo.
Disse-nos o Sr. Secretário de Estado que os professores contratados vão ser contratados na base de avaliações, do modelo de avaliação Simplex, que o próprio Governo entendeu que não era sustentável nem credível. Ou seja, tivemos escolas que fizeram procedimentos de avaliação, outras que entenderam que todos os professores contratados deveriam ser classificados com Bom… Isto é, vamos ter pessoas a concorrer para os mesmos lugares que foram sujeitas a critérios de avalização díspares, permitidos por um modelo de avaliação que ainda está em vigor, que a bancada do PS não permitiu que venha a ser transformado.
Por outro lado, a Sr.ª Deputada Rosalina Martins falou-nos das escolas de ensino artístico. Só que eu não estava a falar-lhe das escolas de ensino artístico mas, sim, dos contratos de associação. No ano passado, para 55 000 crianças, tínhamos orçamentados 230 000 €; agora, para 53 000 crianças, temos orçamentados

Página 73

73 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

235 000 €. Ou seja: mais alunos, menos dotação; menos alunos, mais dotação. Há algo aqui que não se compreende.
Como não se compreende, dado o discurso de igualdade de oportunidades deste Governo, que, no âmbito da educação pré-escolar, no apoio social à criança, esteja orçamentado, este ano, menos de metade do que estava, no ano passado. Não percebemos exactamente o que aconteceu. No ano passado, estavam orçamentados 807 000 € e, agora, estão 320 000 €. O apoio social, pura e simplesmente, deixou de ser importante? É ou não uma prioridade do Governo? O mesmo se passa com o alargamento da rede de educação pré-escolar, que, no ano passado, tinha orçamentados 9 milhões de euros e agora tem orçamentados 6,4 milhões de euros. Gostava de perceber exactamente estes números. É que estes são os números do Ministério da Educação e os que a Sr.ª Ministra nos trouxe são da responsabilidade dos municípios e das IPSS.

O Sr. Presidente: — Resta-lhe 1 minuto, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Uma outra questão tem a ver com o seguinte: no que toca à educação especial, os investimentos do plano desapareceram da programação orçamental apresentada para o ano de 2010. Em 2009, estavam previstos 6 milhões de euros e, agora, temos um orçamento de funcionamento, mas nada temos em termos de investimentos do plano. Era bom que a Sr.ª Ministra nos explicasse isto.
Quero ainda referir uma questão que já aqui foi colocada. Uma das questões que mais temos discutido, no âmbito dos apoios da acção social escolar, é o acesso aos manuais escolares. Na anterior Legislatura, o governo disse aqui, pela voz de um Deputado que já não pertence à bancada do Partido Socialista, que iria implementar um programa experimental de distribuição gratuita de manuais escolares, no sentido de que ele fosse testado para se criar uma bolsa universal de empréstimo de manuais escolares. Isto nunca aconteceu, nem viu a luz do dia, por mais que esperássemos. Por isso, o Bloco de Esquerda vai propor neste orçamento esse mesmo programa experimental, de criação de bolsas de empréstimos de manuais escolares nas escolas.
Como vamos propor, no que toca às bolsas de estudo de frequência do secundário, que o critério do sucesso escolar, bem como o critério dos 18 anos, seja eliminado, para que tenha verdadeiramente apoio quem mais necessita na prossecução dos estudos do secundário.
Por fim, porque vale a pena tomar medidas inovadoras que não têm grandes custos orçamentais,»

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que abrevie, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — » e porque uma das queixas fundamentais dos professores, nos õltimos anos, tem sido o excesso de tarefas burocráticas e administrativas, o Bloco de Esquerda vai propor, para este Orçamento do Estado, um programa de desburocratização daquilo que são as funções docentes. É uma medida de fácil execução pelo Ministério da Educação, com o pessoal especializado que tem, pelo que queremos saber qual é a disponibilidade da Sr.ª Ministra para esta proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, cumprimentar a Sr.ª Ministra e os restantes membros do Governo.
A primeira questão que gostaria de colocar tem a ver com o ensino especial. De acordo com números do Ministério da Educação, no ano de 2007/2008, 16 000 alunos (mais concretamente, 15 986) terão sido afastados das escolas públicas de educação especial. De acordo com dados revelados no dia 7 de Junho de 2008 pelo mesmo Ministério, num encontro temático sobre a educação especial, o número de alunos nas escolas públicas apoiados pelas necessidades educativas era de cerca de 49 877. No ano seguinte, de acordo com dados do mesmo Ministério, esse número era de apenas 33 891. O que permite concluir, de forma clara, que 21 000 alunos deixaram de ser abrangidos, pela alteração instituída pelo Decreto-Lei n.º 3/2008.
Ora, de acordo com o orçamento por acções, na pág. 8, é revelado um aumento de 7%. O que gostaríamos de perceber, Sr.ª Ministra, é em que se concretiza este aumento de 7%. É na melhoria das condições materiais e humanas das escolas e de recepção destes alunos? É na resposta do Governo às necessidades

Página 74

74 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

das famílias, das escolas e aos anseios do PCP, relativamente aos meios humanos necessários à concretização da escola inclusiva? É que, Sr.ª Ministra, depois da aplicação deste decreto-lei, tivemos oportunidade de visitar inúmeras escolas que recebem alunos com necessidades educativas especiais e, de facto, achámos desumano haver uma auxiliar da acção educativa que, para além do plano de contingência da gripe A e o acompanhamento a um corredor de salas de aula, ainda tivesse de acompanhar os alunos com necessidades educativas especiais que, naquele caso, eram 12 alunos com diferentes graus de deficiência. Portanto, achamos que há que alterar esta política de concretização da escola pública e revogar este decreto.
Por isso mesmo, o PCP apresentou, hoje, um projecto de lei que visa alterar profundamente o ensino especial. E entendemos, a par da bancada do CDS-PP, que hoje aqui trouxe preocupações, que talvez encontremos uma forma de viabilizar este nosso projecto, que certamente irá concretizar, de uma forma muito mais democrática, o ensino especial na escola pública, que terá sempre de passar por uma escola inclusiva.
De facto, estamos muito preocupados, pelo que a questão concreta que lhe coloco é esta: o aumento de 7%, relativamente ao ensino especial, tem um reflexo a que nível? Ainda sobre a questão da educação, nomeadamente a educação para a saúde e a educação sexual, na pág. 22 deste orçamento por acções, referem-se verbas tendo em conta a concretização da lei. A lei continua por regulamentar e, de facto, o prazo já foi ultrapassado há muito. A Sr.ª Ministra já veio dizer que o diploma está pronto para breve. Acontece que já estamos a meio do segundo período e a educação sexual nas escolas continua por aplicar. No n.º 2 do artigo 14.º da respectiva lei, diz-se que «Os gabinetes de informação e apoio ao aluno devem estar em funcionamento em todos os agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas até ao início do ano lectivo de 2010-2011», pelo que a pergunta que lhe coloco é se, na página 22 do orçamento por acções, a verba que vem destinada se concretizará na criação dos gabinetes e na formação dos professores. Se não, em que é que se concretiza essa verba, na realidade? Ainda sobre a acção social escolar e o reforço das famílias carenciadas, na página 20 do orçamento por acções, há uma referência a residências para estudantes. Gostaria de saber que residências são estas, em que distritos se encontram e qual o número de estudantes abrangidos por estas residências — refiro-me a estudantes do ensino secundário.
Sr.ª Ministra, já tive oportunidade de lhe colocar esta questão»

O Sr. Presidente: — Tem 1 minuto, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.
Como disse, já tive oportunidade de lhe colocar esta pergunta, que tem a ver com a bolsa de estudo de 84,09 € para um rendimento agregado dos pais de 209 €. Quer dizer, acho que isto ç, no mínimo, um desastre, um desastre humano, que consiste em haver um rendimento agregado dos pais que o Ministério considera como um ponto de partida para a atribuição de uma bolsa, que são 209 €. Gostava que a Sr.ª Ministra me pudesse também clarificar esta questão.
Por fim, e muito rapidamente, refiro o seguinte: no dia 4 de Fevereiro, ocorreu uma luta dos estudantes do ensino secundário. Foi divulgada nas escolas uma circular do Ministério da Educação, nomeadamente do Gabinete de Coordenação de Segurança Escolar, que sugeria — digo «sugeria» com uma linguagem manifestamente irónica — aos chefes de equipa de zona que nomeassem duas equipas escaladas para o turno das 21 horas às 4 horas da manhã do dia 3 para o dia 4 de Fevereiro e uma equipa que entrasse de serviço às 5 horas da manhã — hora em que também será antecipado o início do serviço —, que deveria fazer o turno das 7 horas até às 13 horas. Isto, de forma a estarem de serviço duas equipas à hora de abertura das escolas com vista a fazer face a qualquer situação anómala.
Gostaria que, se possível, a Sr.ª Ministra me definisse o que é uma situação anómala e se, de facto, uma luta democrática dos estudantes do ensino secundário e do ensino básico requer tantas medidas de segurança.

O Sr. Presidente: — Nos termos da nossa grelha de tempos, há um conjunto de inscrições para perguntas de 2 minutos por Deputado, em relação às quais vou seguir a regra da rotatividade.
Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Almeida.

Página 75

75 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Margarida Almeida (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, o assunto que me traz aqui volta a ser, novamente, o estatuto da carreira docente dos professores dos ensinos básico e secundário.
Nos últimos dias, foi enviado aos sindicatos o projecto de alteração, onde se nota, realmente, um recuo em relação ao acordo realizado no dia 8 de Janeiro deste mesmo ano, na medida em que não estipula a compensação anual de 0,5 pontos à classificação dos professores avaliados com Bom que não progridam para os 5.º e 7.º escalões por falta de vagas, não garante as percentagens mínimas de vagas anuais no acesso aos 5.º e 7.º escalões que, segundo o acordo de 8 de Janeiro, são de 50% e 33% dos candidatos, respectivamente.
Outro incumprimento prende-se com o acesso àqueles dois escalões. O «triste» do acordo indica que os professores avaliados com Muito Bom e Excelente progridem automaticamente, independentemente da existência de vagas. Porém, o projecto de revisão apresentado pelo Ministério da Educação estipula que são necessárias duas classificações consecutivas de Excelente, ou de Muito Bom e Excelente, independentemente da ordem. Segundo uma fonte sindical, é intenção do Ministério da Educação dar tradução legal a estas matérias por portarias ou por despacho.
Sr.ª Ministra, as alterações ao estatuto da carreira docente, ao nível da avaliação e da progressão da carreira dos professores, deve constar de decreto-lei e não estar subjacente a portaria ou despacho do Ministério, porque uma coisa é ser vinculado por um decreto-lei e vincula o Governo e outra coisa é ser vinculado por uma portaria e, então aqui, vincula o Ministério da Educação. Em que é que isto se pode traduzir em sede de orçamento? Tendo em conta o acordo assinado — ou que virá a ser assinado — pelo Ministério da Educação e pelos sindicatos sobre a progressão na carreira docente e a ter início já neste ano lectivo, onde estão consagrados, em sede de Orçamento do Estado para 2010, os encargos com a progressão na carreira dos professores, e se, em sede de orçamento, o Ministçrio diz que o aumento das despesas de pessoal»

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem que concluir.

A Sr.ª Margarida Almeida (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, os professores precisam de saber como é que se vai proceder à progressão na carreira e, efectivamente, qual é o valor afecto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luísa Santos.

A Sr.ª Maria Luísa Santos (PS): — Sr. Presidente, Srs. Presidentes de Comissão, Sr.ª Ministra, Srs.
Secretários de Estado, a questão que vou colocar prende-se com as condições de realização das aulas de educação física.
A educação física é uma área disciplinar obrigatória do currículo dos alunos e para a sua efectiva leccionação são necessários não só espaços específicos cobertos e de exterior, bem como material didáctico adequado a todas as matérias de ensino. Estes espaços e este material são também utilizados nas actividades do desporto escolar.
O Ministério da Educação tem vindo a realizar um grande investimento na recuperação e na requalificação das escolas, no sentido de melhorar as condições de funcionamento das mesmas e não ficaram de parte, naturalmente, as instalações desportivas, sobretudo as instalações de exterior. Mas continuam a existir, em algumas escolas mais antigas, ou ainda não intervencionadas, ginásios, balneários e espaços exteriores, que deixaram de estar adequados à realidade actual e à aplicação dos programas nacionais.
Em primeiro lugar, gostaria de saber se o Ministério da Educação pretende intervir na requalificação destes espaços, ou, melhor ainda, se está prevista a sua substituição por novas instalações.
A minha segunda questão consiste em saber se nos projectos das escolas novas ou a construir estão previstos os necessários espaços para a educação física e o desporto escolar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

Página 76

76 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, aproveito para cumprimentar a Sr.ª Ministra e os Srs.
Secretários de Estado.
Sr.ª Ministra, na preparação deste Orçamento do Estado, tive encontros com várias câmaras municipais do distrito de Braga e em várias delas foi referido o enorme atraso na transferência para as autarquias de verbas para transportes e refeições — algumas tinham dívidas de transferências de cerca de quase um milhão de euros em 2009.
Começo por perguntar-lhe, Sr.ª Ministra, se está previsto no Orçamento do Estado para 2010 regularizar essas dívidas e passar o Estado — o Ministério da Educação, logicamente — a pagar atempadamente estas transferências que, como é claro, causam grandes preocupações e problemas a estas autarquias.
Uma segunda questão tem a ver com problemas de sobrelotação — felizmente que ainda há sobrelotação, pois é sinal que ainda há muitos alunos — no Vale do Ave e no Vale do Cávado.
Além dos concelhos que assinaram protocolos de transferência, existem outros que não assinaram, continuando com a necessidade de novas escolas EB 2,3 e de escolas secundárias. Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, onde posso colher a informação do que está em curso em 2010 relativamente à resposta a estes problemas.
Finalmente, Sr.ª Ministra, durante toda a Legislatura anterior — para não mencionar outras legislaturas ainda mais para trás — foi sendo colocado o problema, como uma necessidade absoluta, de uma nova escola profissional pública no Vale do Ave. Até hoje, esta escola continua por construir. Pergunto-lhe se é no âmbito do Orçamento do Estado para 2010 que essa construção vai ser iniciada.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Jesus.

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Presidentes de Comissão, Srs. Secretários de Estado, Sr.ª Ministra da Educação, Sr.as e Srs. Deputados, a Sr.ª Ministra falou, na sua intervenção, nas novas tecnologias como ferramenta cada vez mais usual e de aprendizagem nas escolas. Já foi dito aqui, por colegas Deputados, que é importante e fundamental que sejam vistas como um complemento aos manuais escolares.
Acrescento ainda, relativamente às novas tecnologias, que o seu acesso tem que ser universal, porque notícias do início deste ano informavam da exclusão das regiões autónomas do concurso internacional de aquisição de 250 000 computadores portáteis Magalhães por parte do Governo da República. Acho que um concurso internacional para aquisição de computadores portáteis por parte do Estado português, que, aliás, vem no seguimento das irregularidades apontadas pela União Europeia no processo de adjudicação, sem concurso público, da primeira vaga de portáteis, não devia enformar desta grave lacuna, excluindo as regiões autónomas numa área tão sensível e carente de solidariedade, como é a educação, em especial ao nível do ensino básico.
Sr.ª Ministra, até agora não houve qualquer esclarecimento, por parte do Ministério da Educação, sobre tão estranha exclusão. O próprio Governo da Região Autónoma da Madeira colocou a questão, através da Secretaria Regional de Educação, à Secretaria de Estado das Obras Públicas e Telecomunicações, ao Sr.
Secretário Adjunto da Educação, ao Ministério da Educação, e até ao momento não obteve qualquer resposta.
Também permanece ainda sem resposta o requerimento feito pelos Deputados eleitos pelo círculo eleitoral da Madeira.
Por isso, aproveitando a presença de VV. Ex.as, gostaríamos de saber quais os motivos da não inclusão das regiões autónomas neste programa, que no passado incluiu todo o País, e se vão ou não manter-se os pressupostos referentes ao programa e.escolinha no que se refere aos alunos da Madeira no corrente ano lectivo e nos seguintes, para que o Governo Regional possa saber, com a devida antecedência.
Sr.ª Ministra, o mínimo que pode fazer é esclarecer-nos e dar uma resposta sobre esta matéria e, particularmente, informar todos os madeirenses.
Sr. Presidente, termino dizendo que, nesta matéria, o certo é que o Sr. Primeiro-Ministro, na deslocação que fez, por escassas horas, na anterior Legislatura, à Região Autónoma da Madeira, distribuiu alguns Magalhães e deixou a promessa de novas remessas mais significativas, estando a acontecer exactamente o contrário.

Página 77

77 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete João.

A Sr.ª Odete João (PS): — Sr. Presidente, Srs. Presidentes de Comissão, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, o ano de 2010 é um ano de contenção e de enormes dificuldades. No entanto, o orçamento do Ministério da Educação aumenta. Esta é a realidade, contrariamente àquilo que disse o Bloco de Esquerda, em que uma acção diminuía, uma rubrica diminuía e, no final, significaria que não estávamos a discutir o Orçamento do Estado, mas uma aritmética demagógica, em que todas as parcelas diminuem e a soma aumenta. Creio que esta é uma nova área de estudo da matemática.
Penso que o Orçamento do Estado tem servido como instrumento para criar um conjunto de condições que beneficiam as escolas e os alunos. Independentemente das obras que estão em todas as áreas de ensino — pré-escolar, 1.º ciclo, 2.º e 3.os ciclos, ensino secundário —, há um investimento claro nos alunos, nomeadamente na acção social escolar. A indexação que foi feita à declaração de IRS, permitiu aumentar significativamente o número de jovens e de alunos que beneficiaram da acção social escolar. Esta é uma realidade, assim como a possibilidade de termos nas escolas um conjunto de equipamentos que transportam a escola para o futuro, nomeadamente tudo aquilo que se faz ao nível do plano tecnológico, sendo a distribuição de computadores aos alunos uma possibilidade que não devemos descartar, pois permite a todas as crianças terem acesso a meios e a recursos de que anteriormente não dispunham. Isto é transformar a escola e os alunos num novo paradigma de formação e de educação.
É nesta área que gostaria de colocar uma questão. Sabemos que os equipamentos são fundamentais, mas a produção de conteúdos para trabalhar com esses equipamentos não é despicienda. Assim, gostaria de saber se o Ministério da Educação pensa ter algumas iniciativas nesta área de produção de conteúdos para usar com as tecnologias de informação e comunicação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, pela parte do PCP, queria voltar a uma questão que tem sido também aqui colocada sobre o programa de acesso a computadores portáteis e à banda larga.
Este programa é destinado ao 1.º ciclo do ensino básico — o famoso e.escolinha — e também ao 3.º ciclo do ensino básico e ao secundário, citando o artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 55/2009 que o Sr. Secretário de Estado referiu há pouco.
O orçamento da acção social escolar parece já não prever a verba para esse programa. Para 2010, há uma verba no PIDDAC do Ministério de 12,5 milhões de euros, a somar a 8,2 milhões de euros de fundos comunitários, mas essa verba é só para o 1.º ciclo, ou seja, para o e.escolinha. Portanto, a questão muito concreta que lhe peço que esclareça é a de saber, então, qual é a fonte de financiamento para o 3.º ciclo e para o secundário e onde é que está no Orçamento, porque não a temos encontrado. Por outro lado, gostaria também de saber como é que se pode enquadrar esta dimensão de mais de 10 para um, ou seja, um décimo, nas verbas em causa entre 2009 e 2010, visto que em 2009 foram transferidos 178 milhões de euros e agora estão previstos no PIDDAC do Ministério 12,5 milhões de euros, mesmo que se somem os 8,2 milhões de euros de fundos comunitários.
Sobre o que já foi pago pelo Ministério, nomeadamente pela acção social escolar, falta esclarecer alguma coisa de muito importante. Sr.ª Ministra, a resposta do seu gabinete à nossa pergunta refere 177,8 milhões de euros transferidos para a Fundação para as Comunicações Móveis, mas não respondeu às questões centrais que colocámos na altura. Gostava de saber para que é que este dinheiro serviu para pagar: se serviu para pagar só os Magalhães; se serviu para pagar os computadores para o 3.º ciclo; se há outras contas a pagar; se há aqui acertos de contas com a Fundação para as Comunicações Móveis, como na altura surgiu de declarações de membros do Governo; e se há ainda dívidas a pagar, tal como os operadores privados na altura e ultimamente têm vindo a invocar.
Termino com uma questão muito importante que tem a ver com a relevância pedagógica e curricular da utilização destes computadores, porque não vale a pena estar a somar tecnologia e máquinas para as salas

Página 78

78 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

de aula ou para as casas das pessoas se depois não existe, do ponto de vista curricular e pedagógico, a plena integração e utilização para tirar partido dessa oportunidade que é colocada.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Termino, Sr. Presidente, com esta ideia: as tecnologias, como temos dito muitas vezes, não são boas nem más, depende da utilização que lhes damos. No entanto, temos vindo a assistir a uma oportunidade em muitos aspectos perdida do ponto de vista pedagógico e curricular, porque os professores não têm tido acesso à utilização plena e à integração nas aulas e no processo de ensino e aprendizagem.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Raquel Coelho.

A Sr.ª Raquel Coelho (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, as bancadas do CDS, do PCP e do BE já aqui levantaram questões relativamente ao ensino especial.
Incidirei novamente nestas questões, escusando-me de mencionar os números dramáticos relativamente ao decréscimo de frequência de alunos do ensino especial. No entanto, este decréscimo é sintomático com a aplicação da Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF): em 2008, tínhamos cerca de 50 000 alunos a frequentar o ensino especial; o balanço mais recente refere, em números redondos, 33 000 alunos; e, com base na aplicação da CIF, as projecções apontam-nos para cerca de 23 000 alunos com necessidades educativas especiais, descida que se pode continuar a verificar.
Há muitos alunos — cerca de 12% das crianças por indicação médica — que, sofrendo de dislexia, evidenciando alterações comportamentais, deficiências de comunicação ou na linguagem, não estão abrangidas pelas medidas contempladas com crianças com necessidades educativas especiais, porque a aplicação da fórmula da CIF é muito confusa e deixou de ser um meio para se transformar num fim.
Por outro lado, os professores e os agrupamentos têm-se vindo a queixar — como se pode ver pelas notícias que no fim-de-semana e hoje vieram a público sobre os números dramáticos do ensino especial — da falta de professores no ensino especial, da falta de especialização, da falta de apoios nos auxiliares de acção educativa, da falta de terapeutas, da falta de psicólogos, etc. É toda uma situação dramática.
Sr.ª Ministra, o número de alunos com necessidades educativas especiais diminuiu, mas os alunos não desapareceram, seguramente continuam no nosso sistema de ensino. O que pretende V. Ex.ª fazer no que concerne à aplicação desta lei, cuja eficácia parece estar em causa concretamente na aplicação da CIF? Pretende V. Ex.ª aumentar o número de docentes com formação especializada, de técnicos de acção social escolar e de psicólogos? E como é que, no âmbito da transferência de competências para o município, pretende colmatar as lacunas e as dificuldades da Portaria n.º 1049-A/2008, que tanto condiciona o trabalho dos municípios? Sr.ª Ministra, os jovens cresceram com as histórias que V. Ex.ª escreveu como uma excelente escritora.
Face à história e como Ministra, permita que os jovens deficientes possam crescer com outro paradigma no ensino especial.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Barradas.

O Sr. Paulo Barradas (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, um dos aspectos mais marcantes da reforma do sistema de ensino prende-se com os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP), que, como é sabido, conheceram a partir de 2006 um decisivo e novo impulso.
As escolas TEIP trabalham e tratam problemas particulares de forma particular e contextos diferentes de uma forma diferente também. Hoje, já na terceira fase, as escolas TEIP podem, através dos seus contratosprograma, contar com o reforço de recursos humanos, com o reforço de tempo de trabalho destinado a disciplinas nucleares, apostam na diversificação da oferta formativa para jovens e para adultos, na valorização do diálogo com as famílias e ainda na melhoria das condições de segurança nas escolas. Tudo isto ao serviço de uma maior assiduidade e também de melhores resultados escolares.

Página 79

79 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Recentemente foi conhecido o relatório da Inspecção-Geral da Educação e, embora os resultados aí identificados não possam ser considerados como definitivos porque dizem respeito a uma etapa de um percurso, queremos salientar a iniciativa desta avaliação que deve ser contínua, porque indica, de facto, a prioridade que este Ministério dá a esta reforma ao ponto de a monitorizar desta forma permanente e particular com o intuito de melhorar as suas funcionalidades.
Sr.ª Ministra, na terceira fase, que está concluída, da implementação das escolas TEIP atingiu-se o objectivo a que o Ministério se tinha proposto de criar, na diversidade do território nacional, 100 escolas deste género. Alcançado este objectivo — e é esta a pergunta que deixo a V. Ex.ª —, entende a Sr.ª Ministra e o seu Ministério que está atingido o número suficiente adaptado às necessidades do território português ou pensa, em contrapartida, o Ministério alargar ainda mais esta rede das escolas TEIP?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Antonieta Guerreiro.

A Sr.ª Antonieta Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, quero falar-lhe sobre as bibliotecas escolares que, ao contrário do que o Sr. Deputado Bravo Nico disse, estão longe de ser o paraíso.
Gostaria de começar pelas págs. 8 e 11 do PIDDAC onde não está discriminada a verba para as bibliotecas escolares, à semelhança do que aconteceu em 2008. O nome está lá, mas não está a verba. Este ano, o valor orçamentado para a Rede de Bibliotecas Escolares e para o Plano Nacional de Leitura, em termos de orçamento para funcionamento, ascende aos 8,4 milhões de euros. Nos dois anos imediatamente anteriores a dotação inicial era de 5,735 milhões de euros em 2009 e de 3,710 milhões de euros em 2008. A Sr.ª Ministra vai dizer que este ano o valor é superior. O problema é que, ao contrário dos anos anteriores, este ano é uma verba conjunta: Plano Nacional de Leitura e Rede de Bibliotecas Escolares.
Começo por lhe perguntar por que é que temos orçamento para funcionamento e não temos orçamento para construção. Dá um pouco a ideia de que está tudo a funcionar como aconteceu em Aljezur há umas semanas atrás, em que foram entregues 2500 € á escola para rechear uma sala de aula com umas estantes e uns livros, uma parte do dinheiro veio da escola interactiva e outra parte do Plano Nacional de Leitura. Mas não existe investimento efectivo na Rede de Bibliotecas Escolares ou, pelo menos, não existe em todo o território nacional, visto que não existe no interior algarvio como não existe noutras partes do País. No caso concreto de Aljezur, aqueles alunos têm de percorrer 40 km ou 25 km para ir a uma escola ou para ir a uma biblioteca municipal ou a outra biblioteca escolar.
Portanto, há efectivamente falta de financiamento nesta área. Aljezur, muito concretamente, é dos poucos municípios do Algarve onde há um crescimento percentual de população e todos os anos aquela escola em particular aumenta o número de salas de aula. Tem de encontrar sempre maneira de arranjar mais uma sala de aula. Mas posso falar-lhe de outros casos, como o de uma escola em Olhão onde a biblioteca escolar está fechada por falta de funcionários: a funcionária da biblioteca não está na biblioteca, porque tem de ir para a portaria, visto que não há funcionários para estar na portaria.
Portanto, há uma falta de investimento sério em equipamentos e em funcionários. Gostava que a Sr.ª Ministra nos falasse um pouco sobre isto e ponderasse bem o Plano Nacional de Leitura e a Rede de Bibliotecas Escolares, porque estão longe de ser o paraíso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, na Declaração dos Direitos da Criança podemos ler que a humanidade deve à criança o melhor que pode dar. Também na nossa sociedade, sobretudo para as crianças com necessidades especiais, devemos dar o melhor. É neste enquadramento que o novo Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância, que foi aprovado em 2009, reconhece, no seu preâmbulo, objectivos claros, dos quais destaco, por um lado, o de assegurar a todos o direito à participação e à inclusão social como prioridade política do Governo que valoriza a qualidade da democracia e dos seus valores de coesão social e, por outro lado, compromete-se a garantir uma resposta uniforme no território nacional de forma a assegurar a universalidade do acesso aos serviços de intervenção precoce.

Página 80

80 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O novo Sistema confirma a importância que, para o sucesso da intervenção junto das crianças com estas necessidades desde os zero aos seis anos, tem o papel da família e o papel de equipas interdisciplinares, onde se reconhece a participação do Ministério da Educação, da Segurança Social e da Saúde.
Concretamente no que respeita à educação, define aquele diploma que constituiu prioridade política contemplar, no âmbito da intervenção precoce na infância, a criação de agrupamentos escolares de referência para a intervenção precoce.
Considerando que neste relatório do Orçamento do Estado para 2010 não se fala muito desta valência, que é, de facto, um compromisso que resulta do ano de 2009, gostaria que a Sr.ª Ministra nos pudesse dar mais alguma informação se o Ministério da Educação já constituiu a rede dos agrupamentos que vão trabalhar na intervenção precoce e quais os meios que, neste enquadramento, em termos de equipas pluridisciplinares, já estão hoje distribuídos pelo território.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Cavaleiro.

O Sr. Paulo Cavaleiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, sobre a questão das obras nas escolas e do parque escolar, queria colocar uma questão muito rápida.
Como é óbvio, não criticamos o objecto. É importante fazer obras nas escolas, como sabemos. Já existiram outros programas. É verdade que este programa podia ter sido mais abrangente e diferente, mas não havia tempo, eleitoralmente falando, para preparar as coisas dessa maneira.
Depois das críticas que ouviu aqui hoje — imagino o desconforto que lhe devem causar algumas delas —, é verdade que o que está feito está feito. A pressão eleitoralista e a desculpa da crise já não colhem.
Consegue garantir que vai mudar o que até a si a deixa desconfortável nesta matéria? Devo dizer que, relativamente à questão que lhe colocaram sobre os arquitectos, o exemplo que deu não me pareceu ser o melhor e penso que poder-se-ia fazer de outra maneira. Dou-lhe um exemplo concreto: considera necessário juntar no mesmo concurso um conjunto de escolas que nada têm a ver umas com as outras, impedindo, assim, que empresas mais pequenas possam concorrer? É destas questões que falamos e que podemos melhorar a partir de agora. Ficamos à espera que tenha em atenção todas estas questões que colocamos e que possa mudar e melhorar, porque as obras são importantes, são para fazer, e todos concordamos com elas. Mas, se calhar, é preciso que as coisas se façam de outra maneira.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Sequeira.

O Sr. João Sequeira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, a generalização da prática desportiva, em particular nos mais jovens, é uma prioridade política do Governo, assumida no Programa do Governo e no Orçamento do Estado para 2010.
No que concerne ao Ministério da Educação, assumem particular importância o desporto escolar e a introdução da actividade física como actividade de enriquecimento curricular no 1.º ciclo do ensino básico.
Assim, tendo em conta a importância destes dois programas para a necessidade, por todos reconhecida, de generalização da prática desportiva e o considerável investimento previsto no Orçamento do Estado para 2010, gostaríamos de saber, Sr.ª Ministra, qual tem sido a evolução no número de alunos envolvidos tanto no desporto escolar como na actividade física, no âmbito das actividades de enriquecimento curricular no 1.º ciclo do ensino básico.

O Sr. Presidente: — Para responder conjuntamente, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação. Lembro que, se necessitar, pode acrescentar ao tempo que ainda dispõe 2 minutos por pergunta.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, se permitir, gostaria que fosse o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação a responder às questões colocadas.

O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.

Página 81

81 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Sr. Presidente, antes de mais, quanto à questão do Estatuto da Carreira Docente, quero afirmar que não há qualquer tipo de recuo relativamente àquele que foi o acordo de princípios assinado entre o Ministério da Educação e as organizações sindicais. Aquilo que existe, como já tivemos oportunidade de esclarecer, mas reforçamos, é, pura e simplesmente, uma questão de técnica legislativa que levou a que o Ministério da Educação tivesse optado efectivamente por vários instrumentos: decreto-lei, decreto-regulamentar, portaria e despacho. Queremos assegurar, nesta Câmara, que todas as características do acordo de princípios estão já vertidas nos documentos normativos. O Ministério da Educação honra integralmente os compromissos assumidos para com as organizações sindicais através do acordo de princípios — nem outra coisa seria de imaginar.
Quanto ao Estatuto do Aluno, devo dizer, de uma forma muito clara, que aquilo que foi comunicado é apenas uma das características deste Estatuto. O Ministério da Educação está a trabalhar nesta matéria.
Contamos, durante o mês de Março, divulgar a proposta do Ministério da Educação a este propósito. O nosso objectivo é, tendo em conta a experiência neste domínio e a manifestação das posições dos diversos parceiros do Ministério da Educação, proceder aos ajustamentos, às melhorias necessárias neste mesmo Estatuto do Aluno.
Queremos deixar muito claro que, de maneira alguma, o facto de ter sido comunicada esta característica inerente à alteração do Estatuto do Aluno significa qualquer tipo de cinismo político. O Ministério da Educação respeita os professores. O Ministério da Educação conta com os professores. O Ministério da Educação não existiria se não existissem os professores e os alunos. Qualquer interpretação que aponte no sentido de cinismo político está completamente ao arrepio da intenção do Ministério da Educação.
Sobre esta matéria, enquadra-se, como é natural e compreensível, a intenção de o Ministério da Educação, que, aliás, já hoje foi corroborada por diversos Srs. Deputados nesta Câmara, diminuir a carga burocrática e administrativa que impende sobre os docentes nas escolas. O Ministério da Educação está a desenvolver as iniciativas tendentes a diminuir essa carga burocrática e a libertar efectivamente os docentes para que se consagrem ainda mais às suas tarefas pedagógicas, didácticas, científicas, de formação e de auto-formação.
Sobre a avaliação das escolas, a Inspecção-Geral da Educação, contando, também, como sabem, com a colaboração de docentes do ensino superior, está a desenvolver o programa de avaliação externa das escolas.
Quero deixar a informação de que o investimento neste programa mantém-se. É uma aposta decisiva e decidida do Ministçrio da Educação. Em 2009, estavam inscritos 325 000 € para este programa e, para 2010, estão inscritos 360 000 € no orçamento da Inspecção-Geral de Educação para continuar com o investimento neste programa de avaliação externa das escolas, mas que também tem um papel dinamizador da autoavaliação dos estabelecimentos de ensino.
Não se pretende orientar, pretende-se apoiar as escolas no desenvolvimento dos seus instrumentos, processos e programas de auto-avaliação.
Quero ainda dizer, a este propósito, que, até ao final de 2010, serão avaliadas mais 200 escolas, no âmbito deste programa, e que, previsivelmente, até Fevereiro/Março de 2011, serão avaliadas as remanescentes escolas do nosso sistema educativo, sejam elas escolas singulares ou agrupadas, no total das 1149 unidades orgânicas que integram o nosso sistema educativo.
Portanto, esta é uma aposta clara do Ministério da Educação.
Quero também partilhar convosco que, relativamente a este programa, estão a ser recolhidas, de forma paulatina, todas as informações que permitam melhorar o programa quando terminar o 1.º ciclo da avaliação.
É intenção do Ministério da Educação introduzir os ajustamentos e as melhorias que se verifiquem necessários neste programa para que ele melhor corresponda às intenções da melhoria da qualidade do desempenho das nossas escolas e de atingir os melhores resultados por parte dos nossos alunos. Neste âmbito, o Ministério da Educação está a trabalhar conjuntamente com o Conselho Nacional de Educação, com as escolas que já foram avaliadas e com os avaliadores externos que participam, conjuntamente com inspectores da Inspecção-Geral da Educação, neste mesmo programa.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr. Presidente, começo pelos contratos de autonomia.

Página 82

82 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Como é do vosso conhecimento, o Ministério da Educação celebrou 22 contratos de autonomia em 2007 e estamos, neste momento, a proceder à avaliação. Já começámos a reunir com os directores das escolas com quem celebramos contratos de autonomia, e as decisões que venham a ser tomadas nesta matéria dependem obviamente do estudo, da avaliação e da discussão das questões relacionadas com a autonomia.
Quanto às questões relacionadas com a transferência de competências e com os atrasos no pagamento, como vos disse, temos vindo a reunir com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP). Na última reunião, que aconteceu na semana passada, foi-nos transmitido pela ANMP que, nesta matéria, a transferência era exemplar.
Portanto, tenho alguma dificuldade em perceber a questão e temo que esteja a ser tomada a parte pelo todo.
Passo ao Plano Tecnológico e à ênfase na tecnologia. Lembro que, durante 20 anos, o Ministério da Educação investiu em conteúdos e em formação. Pena é que, quando os docentes chegavam à escola, não houvesse tecnologia para poderem aplicar os conhecimentos entretanto adquiridos. O que é que foi feito em matéria de plano tecnológico da educação? Foi reforçada, a partir de um estudo de diagnóstico, a infraestrutura tecnológica das escolas. Falo em particular das redes de área local e da ligação das escolas à Internet. Ora, isto mais não é do que ligar a escola à Internet e fazer com que em todas as salas de aula haja acesso à Internet e que este seja em banda larga, de alta velocidade. É este o objectivo para que o professor, a partir da sala de aula, possa ter acesso a conteúdos, muitos deles disponíveis na Internet.
Foram também reforçados os instrumentos de apoio aos processos de ensino e de aprendizagem. Refirome a computadores, a quadros interactivos e a videoprojectores. Mais uma vez, onde é que é colocada a tónica? A tónica é colocada na sala de aula. É preciso que o professor, a partir da sala de aula, possa ter acesso a toda a informação disponível.
Mas o plano tecnológico não diz respeito só ao eixo tecnologia, tem também o eixo conteúdos e o eixo formação, no qual se encontra o programa de formação e certificação de professores em tecnologias da informação e da comunicação.
A ênfase colocada na tecnologia não decorre da assunção, por parte do Ministério da Educação, de que a tecnologia é uma espécie de panaceia universal, uma espécie de remédio para todos os males, mas é fundamental para criar condições no sentido de modernizar os processos de ensino e de aprendizagem, para garantir que os professores trabalhem em rede, para ser possível, a partir da sala de aula, aceder a conteúdos e, sobretudo, é necessária para garantir igualdade de oportunidades.
Já vos disse que temos de ser consequentes com o discurso que fazemos sobre a igualdade de oportunidades. Se é consensual que as tecnologias de informação e da comunicação são fundamentais para trabalhar e estudar na nossa sociedade, é necessário sermos consequentes nesta matéria.
Portanto, é fundamental criar condições de igualdade nas nossas escolas. Esta é a condição necessária, mas sabemos que não é a condição suficiente.
O segundo desafio que se coloca às escolas é justamente o de garantir usos de qualidade por parte dos alunos, garantir que todos os alunos tenham acessos de qualidade, porque senão o que acontece é que os capitais desiguais de origem desses mesmos alunos sejam reproduzidos na escola. Aliás, a sociologia francesa tem, sobre esta matéria, um conjunto alargado de estudos.
Portanto, o que se está a pretende fazer é justamente conciliar igualdade de oportunidades no que respeita ao plano tecnológico da educação.
Chamo a vossa atenção para alguns dos projectos que recaem no eixo conteúdos. Foi lançado o Portal das Escolas e o que se fez, sem qualquer investimento, foi inventariar e recensear tudo o que são recursos educativos digitais, que tinham sido adquiridos pelo Estado e por outras entidades ao longo de décadas. Foi feita a inventariação, a referenciação de acordo com os critérios internacionais, e esses recursos educativos digitais foram disponibilizados no Portal das Escolas. Os professores têm acesso a estes recursos a partir da área reservada, e, portanto, podem utilizá-los na sala de aula.
Chamo também a vossa atenção para outras aplicações que muito fazem em matéria pedagógica: o caminho das letras e os livros digitais, que tenho visto a serem utilizados por muitos professores na sala de aula.

Página 83

83 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Portanto, não há aqui qualquer determinismo tecnológico no que respeita ao plano tecnológico. O plano foi desenhado a partir de um estudo que identificou as fragilidades das nossas escolas em matéria de modernização tecnológica do ensino.
Passo às questões sobre o ensino particular e cooperativo. O crescimento que temos no orçamento é de 2% (comparando o orçamento executado em 2009 com o orçamento previsto para o corrente ano) e é feito, sobretudo, à custa da expansão da rede de escolas com quem o Ministério da Educação celebrou contratos de patrocínio. É uma medida de igualdade de oportunidades, mais uma vez, a garantir que os alunos do ensino público regular possam ter acesso a escolas de ensino artístico especializado, em particular a aulas de música, num regime articulado. E este crescimento decorre do facto de estarmos a apoiar mais 4000 alunos e mais 9 escolas.
Quanto à questão do acesso das regiões autónomas ao Programa e.escola, tenho ouvido declarações públicas dos responsáveis regionais e não encontro reflectidas nessas declarações as vossas preocupações.
Como sabem, a gestão do apetrechamento do parque escolar é da competência das regiões autónomas no quadro da sua autonomia e aquilo que o Ministério da Educação fez foi reunir com os dirigentes das regiões autónomas, com os secretários regionais quer dos Açores quer da Madeira, no sentido de se encontrar uma solução, e colocámo-nos ao dispor das regiões autónomas, para a execução deste programa. As declarações que ouvi da Secretária Regional dos Açores iam no sentido de afirmar que estava a ser feito um estudo sobre o impacto da iniciativa e-escolinha naquela região autónoma para a tomada de decisão, e acho de todo compreensível haver um estudo prévio antes da tomada de decisão política.
Penso que eram estas as questões»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não, não! Havia mais!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, vou começar por responder à questão das despesas com pessoal do Ministério da Educação. Temos 5231 milhões de euros para docentes e não docentes das escolas, o que corresponde a um número de 152 600 docentes e de 47 000 não docentes, e para os serviços centrais e regionais do Ministério da Educação 89,4 milhões de euros, o que corresponde a cerca de 2700 funcionários dos serviços regionais, a 999 funcionários das direcções regionais e a 596 funcionários do Gabinete Coordenador da Segurança Escolar, que não estão adstritos a escolas mas que aí se deslocam em caso de necessidade, para assegurar uma melhor segurança. Depois, se quiser, poderei dar-lhe outros exemplos.
Quanto à questão que me colocou em relação às taxas sociais, como sabe, isso depende de um conjunto de questões que têm a ver com o Código Contributivo. Ora, o Código Contributivo não foi aprovado, tinha um equilíbrio próprio, e, neste momento, essa questão não depende do Ministério da Educação. Portanto, teremos de aguardar que ela seja resolvida em sede própria.
Vou passar, de seguida — e peço desculpa por este saltar de resposta —, às redes das bibliotecas escolares e também aos livros escolares.
Em relação à rede de bibliotecas escolares — como podem imaginar, sou muito sensível a esta questão, tanto mais que era a área de actividade em que anteriormente me situava —, até 2009, foi possível completar a rede de bibliotecas escolares dos 2.º e 3.º ciclos e do ensino secundário e, neste mesmo quadro, também se assegurou o serviço de bibliotecas a todos os agrupamentos escolares. Naturalmente que, no caso do 1.º ciclo, a situação que a Sr.ª Deputada aqui referiu, ainda há necessidade de ir mais longe, porque a existência de uma biblioteca adequada, de um pólo de biblioteca, digamos assim, associada à biblioteca sede na escola de 1.º ciclo é desejável e temos de avançar mais neste campo; e, neste sentido, podem verificar que está prevista a biblioteca em todos os centros escolares. Nas escolas que já existem na rede pública temos estado a melhorar a situação das bibliotecas escolares e este ano está, de facto, prevista uma verba de 1,6 milhões de euros para melhorar a situação das bibliotecas escolares e um outro financiamento de mais de oito milhões de euros para bibliotecas escolares e para o Plano Nacional de Leitura.
Gostava de ligar um pouco a questão do Plano Nacional de Leitura ao livro escolar. Durante muito tempo, no nosso país, havia a ideia de que o livro dentro da sala de aula era apenas o livro escolar. Hoje, temos um conceito muito alargado sobre os recursos que devem ser usados na sala de aula, para habituarmos as

Página 84

84 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

crianças a terem contacto com os livros e a lerem livros diversificados, desde poesia, a prosa, a drama, etc., e não apenas o livro escolar. Como sabem, noutros países isto já é assim, há uma espécie de biblioteca que serve a turma e nessa biblioteca enquadram-se o livro escolar e os livros de alargamento de horizontes que as crianças devem ler na sala de aula.
Uma prática que consideramos indispensável para que, exactamente, se alargue a possibilidade de todas as crianças terem uma leitura efectiva de livros diversificados, é a existência nas escolas de conjuntos de livros adequados a cada nível educativo. Para isto, no quadro do Plano Nacional de Leitura, as bibliotecas escolares escolhem conjuntos de livros, que são adequados a cada nível educativo, desde o pré-escolar a todo o sistema educativo. Para quê? Para que os docentes possam requisitar, para leitura na sala de aula, conjuntos de livros adequados e também recomendar que as crianças levem livros para casa, para uma leitura individual e trabalhos de pesquisa.
Portanto, há toda uma dinâmica de leitura, e, quando digo dinâmica de leitura, incluo, naturalmente, os livros científicos.
Neste quadro, também se insere a questão da utilização dos computadores para a leitura na sala de aula e na biblioteca escolar para a pesquisa de informação, de forma a que se alarguem os horizontes neste campo.
Este ano está prevista também uma verba na acção social escolar de aproximadamente 45 milhões de euros para livros escolares. É este o investimento que vamos fazer e que corresponde»

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras da oradora).

A Sr.ª Ministra da Educação: — Ainda não estou a falar disso, estou a falar dos escalões A e B do apoio às famílias no quadro da acção social escolar. É isto que está previsto.
Passo ao tema necessidades educativas especiais. Quero dizer-vos que achamos que esta é uma questão muito importante. Na verdade, no que respeita à salvaguarda dos direitos das crianças e das famílias, precisamos absolutamente de continuar o trabalho de apoio às crianças com necessidades educativas especiais.
Como mencionaram — e bem! —, houve uma alteração. Neste momento, temos um instrumento de identificação das necessidades que tem sido usado pelas escolas e que está em avaliação. O primeiro relatório que temos é favorável, mas vamos continuar a fazer uma avaliação da utilização deste instrumento, que, numa primeira análise, nos parece benéfico e que corresponde a uma necessidade de tornar mais clara a identificação das questões que requerem uma intervenção no quadro da educação especial.
Mas há casos, como a Sr.ª Deputada disse, que não são suficientemente claros, e consideramos que deve ser absolutamente clarificada a forma como esse instrumento é utilizado e aplicado e também a forma como são utilizados outros instrumentos de apoio às crianças que, não tendo necessidades educativas especiais, precisam de apoio educativo devido a dificuldades de aprendizagem.
Posso dizer-vos que, pelos indicadores de que dispomos, temos, neste momento, 4779 docentes do grupo de recrutamento de educação especial e vários instrumentos»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quantos são especializados?!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Temos 700 auxiliares de acção educativa abrangidos por formação; 292 unidades de apoio especializado a alunos com multideficiência; 1289 técnicos, terapeutas ocupacionais, da fala, fisioterapeutas e formadores em língua portuguesa gestual; em manuais escolares e livros de leitura em Braille estão já adaptados 18 000, em formato ampliado 1458, em formato digital e áudio analógico 1100, em formato Daisy 54 e em relevo 9000. Estes livros estão inseridos nas recomendações do Plano Nacional de Leitura, para que as crianças com este tipo de necessidades possam ser devidamente atendidas.
Neste momento, temos no orçamento da educação especial 228 milhões de euros, que correspondem a 33 893 alunos atendidos.
Na verdade, sentimos que precisamos de continuar o trabalho neste domínio, de forma a que as crianças com estas necessidades sejam, de facto, atendidas. Tem de haver uma monitorização continuada, para que o nosso país possa responder, de uma forma cabal, a estas questões.

Página 85

85 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Em relação aos agrupamentos e escolas que estão inseridas nos TEIP» TEIP são, como sabem, territórios educativos de intervenção prioritária, com os quais se pretende dar uma resposta educativa mais eficaz e adequada quando se verifica que há dificuldades de aprendizagem, quando os resultados não correspondem àquilo que é desejável, em territórios com vários tipos de carências que estão devidamente identificadas e que requerem uma atenção especial da parte do Estado e do Ministério da Educação, para que, realmente, existam melhores condições.
Neste momento, como o Sr. Deputado referiu, temos 104 territórios identificados, que correspondem a 135 998 alunos e, neste momento, estão a trabalhar 15 607 docentes. Definiu-se uma forma de recrutamento de docentes mais facilitada para poder acorrer às necessidades. Sabemos que tem havido vantagens, mas também temos detectado alguns inconvenientes.
Claro que a nossa perspectiva era a de que o nosso país não precisasse destes TEIP, porque os territórios identificados correspondem a uma necessidade. Neste quadro, o relatório da Inspecção-Geral do Ensino verificou que houve uma certa controversa sobre a forma como os TEIP estavam avaliados. Os TEIP correspondem a uma necessidade, não a um ponto de chegada. Os resultados de aprendizagem não são, de maneira alguma, os resultados que achamos que o nosso país deve apresentar. Temos de identificar a realidade, temos de identificar os problemas, e aqui trata-se da identificação de um problema específico para podermos mobilizar recursos mais adequados e responder com um esforço mais bem desenhado para as necessidades.
No que respeita ao desporto escolar, outra questão aqui colocada, tem havido, ao longo dos anos, um conjunto acrescido de projectos. Há uma estimativa para 2009/2010, que ainda não está fechada, de 1378 projectos, que correspondem a várias modalidades desportivas (mais ou menos 50 modalidades), abrangendo 120 000 alunos e 8900 docentes. Posso dizer-vos que sentimos que é muito importante continuarmos a investir nesta área, porque é também uma forma de assegurar que a escola responde a interesses da população discente.
Muitas vezes as pessoas imaginam que, para crianças com dificuldades específicas numa determinada área de natureza académica, a resposta é mais horas dessa disciplina. No entanto, sem descurar a necessidade de apoio nessas áreas, em particular de um apoio mais individualizado quando há dificuldades em determinadas áreas, como o português, uma língua estrangeira, a matemática, sabe-se que se for dada abertura para actividades de outra natureza às crianças e jovens que possam não ter tanta apetência e tantos resultados (e, como sabem, a apetência decorre do resultado), se forem abertas mais possibilidades para as crianças e jovens alargarem os seus interesses nas áreas desportivas, isto, em muitos casos, reverte a favor de um acréscimo de resultados académicos.
Temos o gosto de anunciar que este ano a equipa de desporto escolar do Ministério da Educação vai organizar um campeonato mundial de andebol escolar, a decorrer em Braga, Fafe e Guimarães, entre 19 e 27 de Março, e onde vão participar 26 países. Vamos dar muito apoio a esta iniciativa, tal como à gala de desporto escolar e a todas as iniciativas que nos parecem muito importantes e potenciadoras do desenvolvimento educativo.
Relativamente à questão da transferência de verbas para transportes, gostaria de lembrar que esta não é matéria da competência do Ministério da Educação. De qualquer forma, estamos atentos a esta questão. São verbas dos orçamentos de outros Ministérios, mas têm de ser tomadas em consideração, porque é importante que as autarquias disponham de verbas para o pagamento de refeições e de transportes escolares, por forma a poderem cumprir cabalmente a sua missão no quadro da educação. É nesta perspectiva de articulação que queremos trabalhar.
Gostaria ainda de falar da questão da saúde escolar e da educação sexual. A formação para a educação sexual está a finalizar. Como sabem, estas coisas demoram, porque é preciso um conjunto de consultas, mas estamos a ultimar este ponto, sendo que há 160 professores que já tiveram formação por parte dos gabinetes de saúde. Vamos, portanto, continuar a investir na formação de docentes e na disponibilização de instrumentos de trabalho na área da educação para a saúde e, no âmbito deste quadro, na educação sexual.
Há pouco, quando falei do desporto escolar, não referi que as instalações desportivas são muito importantes. No quadro da definição das condições adequadas para os centros escolares, o Ministério da Educação tem referido sempre a necessidade de campos de jogos cobertos para as instalações desportivas.
O Ministério tem vindo a aumentar o equipamento neste campo. Naturalmente que gostaríamos que todas as

Página 86

86 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

escolas o tivessem, mas, como sabem, não podemos fazer tudo instantaneamente, por isso, tem havido um progresso reconhecido. No entanto, continuamos a querer que, quando se inaugurem novas escolas, estas possam ter as suas instalações desportivas.

O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr.ª Ministra.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Já acabou?!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à 3.ª ronda de perguntas, na qual cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos, havendo 10 minutos para resposta por parte da Sr.ª Ministra.
Em primeiro lugar, em nome do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, nesta fase já bastante adiantada do debate, utilizando a expressão do Sr. Secretário de Estado, começo por dizer que tomamos nota, e bem, da imensa simpatia e preocupação que esta equipa ministerial demonstra relativamente a um conjunto de problemas.
Ficámos a perceber que é preciso melhorar o Estatuto do Aluno, mas não ficámos a saber em que áreas e como é que isto se vai fazer.
Também ficámos a saber que os contratos de autonomia são muito importantes, mas estão em avaliação desde 2008, porque já no orçamento de 2008, ou seja, um ano depois dos primeiros contratos, ouvimos dizer (os senhores não estavam no governo, mas o Primeiro-Ministro é o mesmo) «estamos em avaliação». Por isso, continuamos sem saber se, de facto, esta aposta, que é decisiva, na autonomia das escolas vai, ou não, passar a ser uma coisa experimental.
Tomamos nota de que vão cumprir tudo o que está previsto no acordo de princípios com as estruturas sindicais — e hoje fiz uma pergunta que já tinha feito à Sr.ª Ministra quando do debate na generalidade que na altura ficou sem resposta e que hoje ficou mais uma vez sem resposta —, mas, mais uma vez, ficámos sem conhecer a expressão orçamental das medidas, ou seja, das alterações ao Estatuto, quer em 2010 quer nos anos vindouros.
Tomamos nota da grande preocupação e da esperança que o desporto escolar seja uma realidade, mas ficámos sem saber como e onde é que se vão fazer os investimentos. Vamos, ou não, fazer os pavilhões que faltam? Onde os vamos fazer e quanto dinheiro é que vamos transferir para fazer isto? Tomamos ainda nota da grande preocupação e empenho quanto à formação dos docentes, e eu gostava de saber quanto foi gasto em 2009 na formação dirigida aos docentes no que diz respeito à TLEBS (Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário) e ao Acordo Ortográfico, medidas que estão suspensas e que não vão ter eficácia no próximo ano lectivo. Por isso, seria importante percebermos que o dinheiro é gasto e que, ao menos, tem alguma repercussão.

O Sr. Presidente: — Tem 1 minuto, Sr. Deputado.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
No minuto final, relativamente à questão das obras, do betão, que foi largamente discutida e que é uma matéria que está desorçamentada, não consta sequer do orçamento, e respondendo a alguns aspectos que aqui foram mencionados pelo Partido Socialista, devo dizer que há um programa, que é dirigido ao 1.º ciclo, que está alicerçado em candidaturas ao QREN e há um conjunto de candidaturas aprovadas e outras que não estão aprovadas. A questão é muito simples, Sr.ª Ministra: o que é vai acontecer às escolas que não ficaram incluídas no QREN? O mesmo se aplica às escolas do secundário relativamente à Parque Escolar.
Em terceiro lugar, e mais importante que tudo isto, é o «parente pobre», que são as escolas do 2.º e 3.º ciclos, relativamente às quais os senhores vêm aqui dizer que temos 76 projectos, quando estamos a falar de um universo muito maior.
Volto a fazer a pergunta que ficou sem resposta, Sr.ª Ministra: a que é que uma câmara municipal se pode candidatar para ir buscar dinheiro para recuperar uma escola do 2.º ou 3.º ciclos do seu concelho? Aonde? A lado nenhum! Isto não está previsto no QREN, não está previsto a lado nenhum! Por isso, seria importante que

Página 87

87 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

dissesse qual é o mecanismo, porque senão estas escolas são de facto o «parente pobre», uma vez que o Ministério não quer investir nelas e não dá, sequer, a possibilidade aos municípios, que são parceiros decisivos»

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Sr.ª Deputada, o PSD é um partido do poder local há muitos anos e muito antes de os governos pensarem fazer fosse o que fosse já o poder local de todos os partidos defendia e investia nas escolas.

O Sr. Presidente: — Agradeço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Concluo, Sr. Presidente, dizendo que é importante percebermos onde é que, de facto, os municípios podem dar uma resposta às escolas do 2.º e 3.º ciclos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, na parte final desta discussão do orçamento do Ministério da Educação para 2010, verificamos que poderíamos ter falado bastante mais de matérias estruturantes da educação, da aprendizagem (de jovens e adultos), mas, infelizmente, durante grande parte deste debate, devido à postura da oposição, não passámos de um orçamento que, eu diria, não andou muito para lá das questões das obras de construção civil, um orçamento de areia, cimento, tijolos, de empresas de construção. Penso que perdemos bastante tempo nestes aspectos e que não acrescentámos grande coisa.
Nesta parte final do debate, permito-me referir que, em todos estes exercícios orçamentais, há sempre dois caminhos possíveis e um deles é partirmos da tesouraria, da contabilidade e das disponibilidades existentes, para se estruturar um plano de actividades e um projecto. Mas, neste tipo de exercício orçamental, não deixamos de ter qualquer coisa que não é mais do que uma espécie de «pré-fabricado contabilístico», que, muitas vezes, não tem qualquer ligação à realidade, que não responde a necessidades das pessoas, que não aproveita as potencialidades existentes e que não alavanca Portugal. Penso que assistimos nestes últimos anos, e este é mais um elemento deste novo pensamento, a uma nova metodologia e a um novo circuito de construção orçamental. Pensámos nas grandes finalidades estratégicas para Portugal, naquilo que é verdadeiramente estruturante para o desenvolvimento social, humano, económico e cultural do nosso país, e foi com base nestes «faróis», nestas grandes finalidades, que começámos a estruturar o nosso projecto educativo e, consequentemente, a estruturar de forma diferente o orçamento para a educação.
Começámos no plano de actividades e passámos para o orçamento, e esta é a forma correcta de construirmos as nossas propostas orçamentais. E é exactamente este o exemplo do orçamento que temos hoje perante nós. Eu diria que este orçamento não está apenas localizado no interior da sala de aula mas é um orçamento com «alma», porque nele estão perfeitamente vincados o destino que queremos dar ao nosso país, o tal rumo que queremos imprimir ao nosso sistema educativo. Está também muito clara a coluna vertebral dos princípios e dos valores que são a matriz programática e eleitoral que os portugueses sufragaram há apenas seis meses e está inscrita neste orçamento a preocupação com as pessoas, com a qualidade da aprendizagem e com o apoio social àqueles que têm menos condições para frequentar o sistema educativo.
Resumindo e concluindo, Sr.ª Ministra, está aqui um orçamento que é um bom instrumento para potenciar um bom serviço público aos portugueses, e o nosso grupo parlamentar aqui estará para dar todo o apoio para a sua boa concretização.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

Página 88

88 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Ufa, Sr. Presidente! Estavam aqui ainda a ecoar as palavras do Deputado Bravo Nico.

Risos.

Estou aqui ainda a sentir a «alma» do orçamento e sinto quase que um peso no coração, que essa «alma» me provoca.

Risos.

Ainda assim encontro fôlego para algumas perguntas muito rápidas, Sr.ª Ministra, sendo a primeira em relação ao gabinete de gestão financeira.
Recordo que, no ano passado, esse gabinete obteve uma redução no orçamento, que, na altura, foi justificada com a passagem de competências para a Parque Escolar — e bem, pareceu-nos. Entretanto, esse gabinete executou quase cinco vezes mais do que tinha sido orçamentado e agora sobe no orçamento outra vez. Se na altura foi essa a explicação, gostaríamos de conhecer a explicação para esta nova subida no orçamento.
Passo a um tema que também tem sido prometido e preparado. Temos ouvido nesta Câmara que estão a ser criadas equipas multidisciplinares nos agrupamentos para servir as escolas. Não sei se esse processo está, ou não, em andamento e em que ponto está. Se a Sr.ª Ministra conseguisse gastar 1 minuto com esta questão, agradeço-lhe.
Finalmente, em relação à educação pré-escolar e à contratualização ou aos protocolos com as IPSS para fornecimento destes serviços, gostaria de saber se existem algumas metas para o número de utentes a abranger este ano e nos próximos anos e como é que estão a proceder, relativamente a estes protocolos e a estas contratualizações, para esse serviço, que nos parece da máxima importância.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, devo dizer que as perguntas que coloquei na minha anterior intervenção não deveriam ser interessantes, porque não obtive qualquer resposta por parte de nenhum dos responsáveis do Ministério da Educação. No entanto, sou suficientemente teimosa para as repetir e por isso acho que vale a pena voltar a questionar a equipa deste Ministério.
Devo dizer — e este é um pequeno aparte para o Sr. Deputado Bravo Nico — que prometi a mim própria que não ia ceder à tentação de responder à sua provocação, mas é muitíssimo curioso que o Sr. Deputado, que acusou aqui tantas vezes a oposição de falar apenas de outras coisas que não da reabilitação das escolas secundárias, agora, que falamos, fique tão triste»! Ora, aqui está o debate que queremos fazer e as respostas que o Governo deu» O Sr. Secretário de Estado falou-nos aqui da sociologia francesa e de como ela nos mostra que as diferenças no capital económico têm consequências nas desigualdades do capital escolar, do capital cultural.
Por isso mesmo, coloquei a questão, na minha anterior intervenção, sobre se o Governo estaria disposto a anular o critério do sucesso escolar para atribuição das bolsas de estudo que estão a ser dadas aos alunos que frequentam o ensino secundário. Pergunto isto, porque sabemos que os estudantes que necessitam destas bolsas de estudo são os que têm mais dificuldade no sucesso escolar e por isso é que é necessário anular esta condição, pelo que volto a repetir esta mesma questão.
E recoloco a questão do acesso aos manuais escolares, porque podemos falar muito sobre o investimento tecnológico nas escolas, mas a verdade é que a compra dos manuais escolares continua a ser, para cada família de classe média, um encargo anual brutal, que aumenta na razão directa do número de filhos. Por isso, eu coloquei a questão de saber se estaria ou não o Governo disponível para apoiar uma proposta, que o Bloco de Esquerda vai fazer em sede de Orçamento, no sentido de ser criado um sistema de bolsas de empréstimo experimental que possa testar até que ponto as escolas e o Ministério podem comprar os manuais escolares e eles passarem de uns anos para os outros para os diferentes estudantes, o que não só permite poupar na

Página 89

89 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

despesa das famílias como também ensinar os estudantes a respeitar os livros e a frequentar bibliotecas no uso do livro e não na sua destruição.
Não vou discutir aspectos orçamentais. Por exemplo, não vou questionar a verba inscrita para prémios, condecorações e ofertas, que é de 2,6 milhões de euros, não vou perguntar para que serve esta verba, mas gostava de repetir o raciocínio que há pouco tentei aqui fazer. É incompreensível que tenhamos tido menores execuções do que o previsto em 2009, nas verbas iniciais, no que toca à acção social escolar, complementos educativos e educação especial, ou seja, investimos menos do que o que estava previsto inicialmente, enquanto no ensino particular e cooperativo investimos mais do que o que estava previsto inicialmente. O Sr.
Secretário de Estado disse-nos que isso tinha a ver com os contratos de patrocínio que foram feitos no âmbito das escolas de música e artísticas.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Não consigo compreender como é que para termos mais nove escolas nestes contratos de patrocínio, temos um acréscimo orçamental de 15 milhões de euros, ou seja, para mais 3700 alunos vamos gastar mais 15 milhões de euros, o que dá uma verba de 4000 €/aluno que tem acesso ás escolas artísticas, o que significa que em cada mês este aluno vai custar 450 €. Ora, com estes 450 € não era possível criar educação artística no âmbito da escola pública com os professores que lá temos? Esta é a pergunta que se coloca.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Srs. Presidentes da Comissão de Orçamento e Finanças e da Educação, Sr.ª Ministra e Srs. Secretários de Estado, ficaram algumas perguntas do Grupo Parlamentar do PCP por responder e deixo o apelo para que, nesta última ronda, fizessem um esforço para responder a essas perguntas, nomeadamente as que foram colocadas pelos meus camaradas Bruno Dias e Agostinho Lopes, porque, Sr.ª Ministra, em última instância, quem assina os contratos com as autarquias é o seu Ministério.
Portanto, julgamos que, no mínimo, seria de bom-tom que este Ministério justificasse por que é que o Estado central deve mais de 900 000 € em transportes e refeições, e isso só no distrito que foi referido. É que o Sr. Deputado Bravo Nico não pode, cada vez que aqui falamos de educação, vir falar encarecidamente das refeições escolares» Aliás, pasmo por hoje não trazer aqui esse discurso» Talvez porque a Sr.ª Ministra não tenha como justificar o atraso nas verbas! De qualquer forma, não podemos estar sempre a insistir na tecla, para apelar ao coração dos portugueses, das refeições escolares, como diz o Sr. Deputado Bravo Nico, das «refeições quentes nas escolas«, e, depois, o dinheiro não chegar ás autarquias» Portanto, apelo para que fizessem um esforço para responder a estas questões.
Também registo que a Sr.ª Ministra não respondeu a uma pergunta muito pertinente que lhe foi colocada pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, mas não estranhamos, porque essa pergunta referia-se à construção e recuperação de espaços desportivos. Na verdade, a resposta que o PCP obteve quando fez a mesma pergunta foi a seguinte: isso já nada tem a ver connosco, porque isso agora é com a Parque Escolar.
Registamos que a Sr.ª Ministra responde com a mesma moeda ao PCP e ao PS, embora a este com mais diplomacia.
Sr.ª Ministra, gostava que respondesse a uma questão que coloquei, porque julgo que é determinante na qualidade do sistema educativo e do serviço prestado, e que se prende com o empobrecimento dos recursos humanos na educação.
Sr.ª Ministra, referi-lhe os 6000 contratados por via de contratos de emprego-inserção, ou tarefeiros, que prestam serviço, objectivamente de auxiliar de acção educativa, na escola pública. E, Sr.ª Ministra, nós não podemos continuar a ter escolas que não abrem os portões, porque não têm funcionários, que não têm vigilância, porque não têm funcionários, que não conseguem cuidar dos meninos que têm necessidades educativas especiais ao mesmo tempo que vigiam um corredor e que têm de assegurar o plano de contingência para uma doença, como foi o caso da gripe A, ao mesmo tempo que se assiste a uma desvalorização brutal deste trabalho, que é muito valioso nas escolas.

Página 90

90 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Este é um dos problemas com que, actualmente, as escolas mais se cruzam, que é a falta de meios humanos para cumprir o seu papel — e refiro-me, essencialmente, aos auxiliares de acção educativa. E o que é mais grave é que este Ministério estimula que se vá buscar para suprir essas necessidades os contratados de emprego-inserção, que podem ficar nas escolas, como a Sr.ª Ministra bem sabe, apenas um ano, ou seja, um contratado de emprego-inserção é uma pessoa que desaparece dos números do desemprego, que vai ganhar muito mal, como a Sr.ª Ministra também sabe, e que só pode ficar na escola um ano. Ou seja, ao fim de um ano em que aprendeu mais ou menos a sua tarefa tem de ir embora, porque estes contratos empregoinserção não permitem a renovação.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Termino dizendo que um estudo encomendado pela Autoridade Nacional das Comunicações refere que mais de 80% das pessoas que usufruíram dos programas e.escola e e.escolinha já tinham computador.
A Sr.ª Ministra está disponível para utilizar 177 milhões de euros da acção social escolar para pagar computadores a quem já tem, mas não tem dinheiro suficiente para pagar os manuais escolares, que são um elemento estruturante do sistema educativo a todos os que frequentam a escolaridade obrigatória.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr. Presidente, começo pela acção social escolar para dizer que o valor previsto no orçamento inicial para 2009 era de 204 milhões de euros e o executado foi de 176 milhões de euros.
O que justifica esta situação? Como sabe, com a entrada em vigor, em 2009, do Decreto-Lei n.º 55/2009, foi alterada a definição dos escalões de rendimento e os escalões da acção social escolar passaram a ser definidos pelos escalões do abono de família e, na altura da orçamentação, o Gabinete de Gestão Financeira do Ministério da Educação sobrestimou este valor — não tem mais nenhuma razão. Não se conhecia qual era a implicação e o impacto da alteração da definição dos escalões e, portanto, o valor foi sobrestimado. Aliás, como vê para este ano, o valor é de 187 milhões de euros, o que, como já disse, representa um acréscimo de 6,3%.
Quanto aos contratos de patrocínio, a questão é muito clara: o Despacho n.º 17932/2008 definiu a fórmula de financiamento dos contratos de patrocínio e, portanto, o que temos aqui é a aplicação desta fórmula de financiamento ao acréscimo do número de alunos. A questão é simples e transparente.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Está a despolitizar a questão!

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Não me parece que possa ser feita uma leitura centrada exclusivamente no custo por aluno, porque não estamos a levar em linha de conta outros custos, como a questão dos instrumentos de música e o seu reforço.
Quanto à política do betão, o que temos é um processo, do meu ponto de vista, ímpar e sem precedentes no que respeita à construção e à requalificação da rede escolar, que vai desde o pré-escolar ao ensino secundário.
No que respeita à educação pré-escolar, vamos ter um acréscimo de cerca de 10 000 salas, sendo que nos centros escolares temos já 515 candidaturas aprovadas pelos PO regionais, e lembro que essas candidaturas foram analisadas pelo Ministério da Educação no quadro do planeamento da rede escolar, através de um trabalho desenvolvido de perto com as autarquias.
No que respeita às EB 2, 3, estamos a falar das escolas que foram objecto de contrato de execução. Aquilo que posso dizer é que para as candidaturas para a requalificação das escolas EB 2,3 há uma linha no Programa Operacional Valorização do Território (POVT) que permite esse financiamento — aliás, temos escolas que estão a ser financiadas ao abrigo dessa mesma linha de financiamento.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

Página 91

91 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, vou responder à questão que se prende com o Gabinete de Gestão Financeira dizendo que, em 2009, houve um acréscimo de verba da ordem dos 300 milhões de euros referentes ao programa de investimento para a crise — estes 300 milhões de euros foram colocados no orçamento do Gabinete de Gestão Financeira do Ministério da Educação. Em relação a 2010, o valor é superior. Portanto, se se retirar estes 300 milhões de euros, o valor é superior ao orçamento inicial. A transferência para a Parque Escolar é de 50 milhões de euros e no orçamento de 2009 era de 16,5 milhões de euros, e a restante verba do orçamento do Gabinete de Gestão Financeira corresponde às transferências para as IPSS e é de 125 milhões de euros.
Em relação às bolsas de estudo, na verdade, não estamos muito abertos à possibilidade de dar bolsas de estudo a pessoas que não tenham resultados escolares. É preciso investir na qualidade, é preciso investir na forma como se propiciam as condições para as pessoas estudarem, mas os alunos precisam de apresentar resultados. Naturalmente que estamos abertos a todas as formas de trabalho que garantam equidade e apoio aos alunos e às famílias, mas temos que premiar os resultados ou, melhor, não facilitar. Nós somos absolutamente contra uma política de facilitismo em que está a desperdiçar-se recursos. Por exemplo, investir na formação de docentes para o Acordo Ortográfico sentimos que não é indispensável. É necessário, sim, uma sensibilização, é necessário facultar recursos para que as pessoas possam assumir as novidades decorrentes do Acordo Ortográfico, mas investir em acções de formação, em programa de formação neste campo seria um desperdício com o qual não estamos dispostos a fazer. Na situação em que o nosso País vive, na verdade, não seria muito facilmente compreendido pela população e não nos parece adequado.
A finalizar, gostava de salientar que achamos importante investir na qualidade. Sabemos que os recursos humanos são importantes, que é importante recorrer a docentes e a funcionários habilitados. Precisamos de funcionários que estejam nas escolas, naturalmente, conhecemos muito bem e do lado de dentro o que se passa nas escolas e sabemos como os funcionários são indispensáveis para que tudo corra da melhor forma.
Há pouco, foi colocada uma questão sobre os funcionários que estão ligados à segurança. Quando há manifestações de estudantes, recorremos a esses funcionários precisamente para assegurar que tudo se passe dentro do quadro da legalidade. Não se considere que existe alguma limitação ao exercício dos direitos dos cidadãos, sejam estudantes, professores ou outros profissionais, trata-se apenas de antecipar e garantir que tudo se passa nas melhores condições.
Em relação à qualidade, que sentimos que temos o dever de procurar para o nosso País e para a nossa educação, como há pouco referi, estamos muito empenhados em definir o currículo de modo a que todos — pais, crianças e docentes — saibam quais são as metas em cada momento.
Embora não tenha sido aqui devidamente salientada, devo dizer que estamos também muito empenhados na questão da educação para a cidadania, no âmbito da qual se inscrevem várias formações importantes.
A gestão e a organização das escolas têm que ser aperfeiçoadas, também com clareza de referenciais para a gestão das escolas — e aí, sim, sentimos que é indispensável investir na formação das direcções e de todos os quadros que trabalham nas escolas. É preciso pensar que há referenciais que devem criar o quadro, mas reforçar a autonomia na acção. Temos confiança de que é num quadro de definição de referenciais e de reforço da autonomia, que passa pelos contratos com as escolas, de reforço da intervenção das autarquias e de reforço da participação das famílias que podemos estruturar uma educação mais adequada para os diferentes grupos, para as diferentes regiões, para os diferentes níveis educativos.
É, de facto, importante que haja uma conjugação de esforços e uma forma de assegurar que a definição que é feita ao nível local nas escolas, as melhores soluções para cada circunstância, é respeitada e encorajada.
Mas, para que isso se possa fazer, precisamos de mais instrumentos. Precisamos de mais instrumentos de monitorização, de instrumentos técnicos que as equipas educativas possam usar para fazerem um balanço entre os recursos de que dispõem e os resultados que obtêm.
Também aqui foram focados apoios diversificados. Os programas de formação de professores irão continuar, como o Programa Nacional de Ensino do Português (PNEP), o Plano de Acção para a Matemática, os programas na área das ciências e, sobretudo, o que pretendemos é melhorar os resultados das escolas, melhorar os resultados da aprendizagem para que os recursos postos ao serviço da educação e que estão consignados neste orçamento possam verdadeiramente servir o nosso País.

Página 92

92 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, concluímos assim a apreciação do orçamento do Ministério da Educação»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, para uma interpelação à mesa a fim de, de alguma forma, deixar nota de um protesto.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, chamo a atenção para o facto de a interpelação à mesa ter a ver com a condução dos trabalhos.
Pede a palavra para um protesto ou para uma interpelação à mesa?

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado. Dispõe de 2 minutos.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, intervenho para que fique claro que registamos com desagrado, como é óbvio, que o Governo tenha optado por não responder a um conjunto de perguntas que o PCP lhe dirigiu precisamente sobre questões de âmbito estritamente orçamental.
A Sr.ª Ministra não hesitou em fazer considerações de âmbito geral e em trazer aqui a sua tese sobre a política genérica do seu Governo, mas, quando foi confrontada com questões orçamentais, não conseguiu responder ou optou por não o fazer.
Deixamos esta nota: houve três questões centrais que o PCP entendeu colocar que não mereceram resposta, a saber: sobre transferências para as autarquias para transportes e refeições, a Sr.ª Ministra não respondeu; sobre as transferências e a origem das fontes de financiamento para o Programa e.escola, a Sr.ª Ministra não respondeu; tal como não respondeu às questões que foram colocadas, inclusive sobre as suspeitas de promiscuidade que existem entre o Conselho de Administração da Parque Escolar e as obras que adjudica. Não respondeu, por exemplo, como é possível que, no âmbito de dezenas de milhares de arquitectos em Portugal — a própria Ministra disse-o —, 40 projectos, que correspondem, se não estou em erro, a 20% dos projectos adjudicados pela Parque Escolar, tenham ficado nas mãos de cinco ateliers de arquitectura.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, posso assegurar ao Parlamento que todo o trabalho feito pelo Ministério e pela empresa que depende do Ministério foi realizado no quadro da lei. Não houve nenhuma infracção; foi e é tudo realizado com total transparência.
No que respeita às respostas relativas às transferências para as autarquias, elas foram devidamente dadas. Todas as questões de carácter orçamental que tiveram a amabilidade de colocar foram, do nosso ponto de vista, respondidas.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, chegados ao fim desta audição, quero agradecer a presença da Sr.ª Ministra de Educação e dos Srs. Secretários de Estado.
A reunião prosseguirá depois de um intervalo de 5 minutos, com a audição do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Srs. Deputados, está interrompida a reunião.

Eram 17 horas e 32 minutos.

Página 93

93 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Srs. Deputados, está aberta a reunião.

Eram 18 horas 50 minutos.

Começo por cumprimentar e agradecer a presença do Sr. Presidente e dos Srs. Deputados da Comissão de Educação e Ciência, dos Srs. Deputados da Comissão de Orçamento e Finanças, do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e o Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Vamos proceder à audição do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para discutir o orçamento, na especialidade, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES), nos termos do artigo 211.º, n.º 2, do Regimento da Assembleia da República.
Para este efeito, seguiremos uma grelha de tempos, que foi acordada na Comissão de Orçamento e Finanças, que prevê uma intervenção inicial do Sr. Ministro, até 20 minutos; seguidamente, haverá uma primeira ronda, com perguntas de 8 minutos e resposta individualizada, e uma segunda ronda, com perguntas de 5 minutos, podendo ser também feitas perguntas de Deputados, até 2 minutos, com resposta conjunta, seguindo-se uma conclusão do debate.
Sem mais, sendo este o programa, digamos assim, para esta audição, passo a palavra ao Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago): — Srs. Presidentes da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Educação e Ciência, Sr.as e Srs. Deputados, esforçarme-ei por cumprir o tempo regimental, mas pedia que me alertassem se houver alguma ultrapassagem.
A proposta de Orçamento do Estado para 2010 nas áreas do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, que está aqui em discussão, não podia, a nosso ver, ser mais clara. São claras as nossas prioridades.
Com esta proposta de orçamento, visamos, em primeiro lugar, contribuir para enfrentar as necessidades de crescimento económico e social do País com mais conhecimento e mais inovação, com mais cultura científica e tecnológica e com mais formação.
A proposta de orçamento aponta não apenas para o reforço persistente das capacidades científicas e tecnológicas do País como, muito especialmente, assenta numa estratégia decidida de promoção de níveis mais elevados de educação superior na sociedade portuguesa.
É neste contexto que esta proposta consagra e reflecte orçamentalmente o Contrato de Confiança recentemente fixado entre o Governo e todas as instituições públicas de ensino superior. Esse Contrato, como sabem, visa o desenvolvimento do sistema binário, o reforço das instituições, a diversidade das áreas de formação, a qualificação crescente do corpo docente, o reforço do sucesso escolar, da cooperação internacional e da abertura à sociedade, mas muito em especial a rápida expansão dos níveis de qualificação superiores da população.
A proposta de orçamento consagra ainda, como é visível, a consolidação da dinâmica de crescimento da Ciência e Tecnologia (C&T) em Portugal, visando assegurar sustentabilidade ao desenvolvimento das capacidades científicas nacionais e da sociedade da informação.
Passo à questão do Contrato de Confiança com o Ensino Superior.
O Governo, como sabem, firmou com o sistema de ensino superior um Contrato de Confiança como instrumento de desenvolvimento do ensino superior em Portugal. Em particular, visa-se a formação de mais 100 000 activos nos próximos quatro anos, de um processo exigente de definição de indicadores e objectivos por cada instituição e de avaliação anual dos resultados atingidos. É de um modelo social renovado para o ensino superior que falamos aqui. Queremos instituições capazes de se concentrarem não apenas na formação de jovens estudantes mas, muito mais do que até agora, na formação superior de adultos activos à procura do seu primeiro diploma superior ou, ainda, da formação contínua necessária à sua actualização cultural e científica ou reconversão profissional e validada por um grau superior. Queremos, portanto, um ensino superior aberto à sociedade.
Defendemos uma agenda educativa para os jovens estudantes do ensino superior que neles suscite a vontade de acção fora das paredes das instituições, em actividades comunitárias que promovam a vontade de

Página 94

94 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

aprender da sociedade e a atracção de adultos experientes para o estudo, no quadro de um ensino superior renovado e socialmente mais aberto e mais exigente.
O Contrato de Confiança lançado no âmbito da preparação do Orçamento do Estado acrescenta cerca de 100 milhões de euros e estabilidade plurianual às disponibilidades orçamentais para funcionamento das instituições públicas de ensino superior, vai estimular o rápido crescimento da oferta de cursos de especialização tecnológica, de vagas em regime pós-laboral, de mestrados de índole profissional e outras pósgraduações, assim como a expansão do ensino à distância.
É nestes termos que o programa especial para o desenvolvimento do ensino superior, lançado no âmbito do Orçamento do Estado para 2010, representa, em nosso entender, um modelo inovador a nível internacional, pois define uma contratualização de objectivos e de recursos acrescidos à escala nacional, garantindo a autonomia de cada instituição e suscitando, no sistema de ensino superior, uma responsabilidade colectiva em torno de objectivos nacionais.
Tive ocasião de, na semana passada, apresentar ao Conselho Europeu da Educação, em ponto especial da agenda, o novo modelo que o Contrato de Confiança com o Ensino Superior, realizado em Portugal, pode representar para a concretização de objectivos europeus de qualificação. Pude verificar o interesse suscitado e o valor potencial deste modelo noutras situações.
No âmbito da concretização deste Contrato, como sabem, serão elaborados programas de desenvolvimento por todas as instituições de ensino superior público, que incluirão necessariamente indicadores específicos correspondentes aos objectivos nacionais e que deverão demonstrar a forma como cada instituição se compromete a contribuir para a sua concretização.
Ainda no âmbito do ensino superior, a proposta de Orçamento do Estado para 2010 consagra especialmente o desenvolvimento da acção social escolar.
Hoje, o Estado já apoia com bolsas de estudo mais de 21% do total dos estudantes do ensino superior. O aumento da dotação orçamental para a acção social do ensino superior em 2010 concentra-se num esforço adicional de 16 milhões de euros na dotação disponível para bolsas de estudo, estando, aliás, em curso, com a colaboração do conjunto dos serviços de acção social das instituições, a revisão dos procedimentos e regulamentos, de forma a que o sistema possa continuar a responder, com maior justiça, rapidez e eficiência, às necessidades dos estudantes mais carenciados.
Reuni recentemente, a meu pedido, com todos os responsáveis de universidades e politécnicos públicos, que se fizeram acompanhar pelos dirigentes dos seus serviços de acção social. Com o seu acordo, decidimos adoptar um modelo de contratualização plurianual da atribuição de bolsas de estudos por todo o período do ciclo de estudos, garantir regras técnicas comuns a todo o País, prazos limitados de resposta aos pedidos de bolsa, de renovação ou de alteração, estando já disponíveis e operacionais os meios técnicos e organizativos que permitem simplificar drasticamente a apresentação de documentos comprovativos pelo estudante e, por conseguinte, reduzir o tempo de apreciação e de resposta. Este modelo, desenvolvido em conjunto com todas as instituições, estará em aplicação já no início do próximo ano lectivo.
A responsabilidade na apreciação das candidaturas a bolsas de estudo, recordo, é da responsabilidade de cada instituição. São as instituições de ensino superior que aplicam a lei e atribuem as bolsas, não o Ministério. Face a atrasos excessivos e, naturalmente, inaceitáveis no interesse dos estudantes, procurámos ajudar as próprias instituições a superar as razões desses atrasos.
Por isso, desenvolvemos e criámos uma plataforma que permite dispensar documentos e aos serviços aceder à informação relevante disponível noutros serviços públicos, designadamente segurança social e finanças. O encurtamento drástico de prazos de resposta pode, assim, ser regulamentado com a colaboração e empenho das instituições de ensino superior.
Posso garantir-vos, por outro lado, que da parte do Ministério não houve, não há nem haverá quaisquer atrasos na transferência das verbas justificadas pelas universidades e politécnicos para pagamento de bolsas de estudo por si atribuídas.
Mais: a qualquer momento a lei e os regulamentos prevêem a atribuição de auxílios de emergência pelas próprias instituições e pelos seus serviços de acção social, sem qualquer intervenção da tutela. O recurso das decisões desses serviços cabe apenas aos reitores e presidentes das instituições. Estou certo de que esses tudo farão para resolver os problemas reais que lhes sejam levados à consideração.

Página 95

95 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Sem prejuízo de outras medidas já discutidas com as instituições de ensino superior, gostaria de vos comunicar, desde já, que prevemos, para lá de outros reforços que conhecem, reforçar também as condições de apoio, hoje previstas, para estudantes bolseiros que tenham necessidade de se deslocar por força da frequência de estágios. Esse reforço decorre da crescente mobilidade a este nível, que se verifica, e do seu impacto diferenciado segundo os recursos dos próprios estudantes.
A prioridade ao desenvolvimento do ensino superior consagrada neste orçamento inclui, pois, como uma das suas principais componentes, a prioridade ao sistema de apoio social aos estudantes mais carenciados, sempre no sentido da maior equidade e selectividade dos apoios concedidos e do estímulo ao alargamento da base social do sistema de ensino superior.
Gostaria de vos falar, agora, da renovação do Compromisso com a Ciência e o Desenvolvimento Tecnológico, consagrada neste orçamento.
Como saberão, em Portugal, a despesa pública e privada em Investigação e Desenvolvimento (I&D) atingiu o nível de 1,51% do PIB, em 2008 — último dado disponível —, e o número de investigadores — 7,2 por cada 1000 activos — situou-se já acima da média da União Europeia.
Mais importante, ainda, a dinâmica de crescimento, produção científica, entrosamento entre universidades e empresas, relevância e reconhecimento internacionais é, hoje, um dos principais activos para o futuro do País. O Orçamento do Estado para 2010 estimula o reforço e consolidação desta dinâmica de crescimento.
Reforça-se, assim, o funcionamento do sistema de avaliação internacional de programas, projectos e instituições científicas, financiados com recurso a fundos públicos, sistema, esse, que é o principal garante da qualidade dos nossos investimentos em ciência.
Assim, serão reforçados os sistemas de recurso e desenvolvido, já a partir deste ano, um verdadeiro sistema de avaliação de alto nível do conjunto das avaliações da Fundação para a Ciência e Tecnologia, como instrumento de promoção da qualidade crescente dessas avaliações. A Fundação Europeia para a Ciência será a instituição-garante deste sistema de avaliação científica de alto nível.
No quadro das orientações estratégicas para esta Legislatura, serão preparados, em 2010, programas mobilizadores de Ciência e Tecnologia, com base em redes temáticas de investigação, designadamente no quadro das parcerias internacionais já existentes e outras, de identificação de oportunidades induzidas pelas próprias capacidades científicas já desenvolvidas e em estudos e acções de prospectiva científica e tecnológica.
Será conferida prioridade à preparação de um programa dinamizador para as ciências e tecnologias do mar, focado nas áreas de maior oportunidade científica e impacto económico — biotecnologia, recursos vivos, orla costeira, geologia, energia e clima — e, numa primeira fase, na actividade científica em mar profundo, especialmente centrada nos Açores.
O sistema de apoio fiscal à Investigação e Desenvolvimento, denominado SIFIDE, que foi reintroduzido em 2005 — e, como sabem, esse sistema tinha um período de vigência até ao final do ano de 2010, portanto, será revisto para 2011 —, será revisto no quadro da análise que emerge a nível internacional. Desde já, e como anunciado no Programa do Governo, que aqui é cumprido, as despesas com a contratação de doutorados pelas empresas são fortemente apoiadas no quadro desta proposta de lei do Orçamento do Estado para 2010.
Hoje mesmo, reunimos, em colaboração com a COTEC, com cerca de 100 empresas especialmente activas em Investigação e Desenvolvimento, em Portugal. Todas deixaram claro o valor do SIFIDE (Sistema de Incentivos Fiscais à I&D Empresarial) e a pertinência do reforço proposto neste orçamento.
Serão ainda, em 2010, estimulados os mecanismos para o acompanhamento do investimento privado em Investigação e Desenvolvimento em associação a grandes investimentos públicos no quadro dos mecanismos legais já criados pelo Governo para afectação obrigatória de uma fracção do investimento a Investigação e Desenvolvimento, a realizar pelas empresas adjudicantes em território nacional.
No contexto das infra-estruturas científicas, serão desenvolvidas acções de formação de novas gerações de técnicos. Será estimulada, durante este ano, a reabilitação de segurança de laboratórios, o desenvolvimento de edifícios sustentáveis capazes de responder às novas exigências técnicas, energéticas e ambientais — em alguns casos, algumas dessas obras já começaram —, bem como a reorganização de instituições de investigação e a criação de consórcios de I&D.

Página 96

96 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Gostaria de vos referir, também, as questões ligadas às condições de trabalho dos investigadores, que serão reforçadas no âmbito deste Orçamento, na sequência das recomendações europeias, de que Portugal foi, aliás, um dos principais promotores na União Europeia, e das medidas previstas no Programa do Governo.
As recomendações, quer do Conselho Europeu de Competitividade, quer do Comité Económico e Social da União Europeia recentes, que emergiram, muito especialmente, do esforço conjunto de Portugal e do Luxemburgo, acompanham de perto as medidas já tomadas em Portugal ou as previstas no Programa do Governo.
Importa, a este respeito, informar a Assembleia da República que, dentro de dias, se realizará um Conselho Europeu de ministros dos assuntos sociais, no qual, por iniciativa do Conselho de Investigação, sob proposta de Portugal e do Luxemburgo, pela primeira vez se analisarão as medidas a tomar à escala europeia em matérias relativas às condições sociais dos investigadores, designadamente a portabilidade de pensões.
Gostaria igualmente de informar todos os Deputados que, na sequência do diálogo continuado com as associações de bolseiros e de investigadores, a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) vai proceder às modificações tornadas necessárias nos regulamentos de bolsas de investigação no sentido de melhor proteger as condições de trabalho dos investigadores em formação, especialmente no âmbito de outras instituições de cujos regulamentos de bolsas a FCT é, em última análise, garante.
Gostaria de vos sublinhar, também, que será desenvolvido, em 2010, o programa Ciência Global, já lançado com enorme resposta (e a criação do Centro UNESCO para a formação avançada em ciências no espaço da CPLP), como programa inovador de formação avançada em Portugal de investigadores de países em desenvolvimento da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa).
Gostaria de terminar, Sr.as e Srs. deputados, com uma palavra sobre a catástrofe que atingiu a região da Madeira este fim-de-semana. Quero exprimir a minha profunda consternação e pesar pelo que se passou.
Estive constantemente em contacto com a Universidade da Madeira, onde, felizmente, não se apuraram até agora danos humanos ou materiais significativos, e informam-me os seus responsáveis que as aulas reabrem na próxima quarta-feira. Mas sabemos de familiares de estudantes mortalmente atingidos. A todos exprimimos a nossa tristeza e solidariedade.
O Instituto de Meteorologia pôde prever a possibilidade de uma situação de precipitação grave e emitir para as autoridades de protecção civil um alerta amarelo, depois vermelho. Detectou ainda o valor potencial, em situações idênticas, da instalação de um radar meteorológico cujas medidas permitissem precisar ainda melhor a intensidade esperada do fenómeno meteorológico e antecipar, talvez em duas ou três horas, o alerta emitido. Desde já, está o Instituto de Meteorologia a trabalhar para a instalação desse tipo de equipamento (anunciada, aliás, há poucas semanas) onde seja útil, sem prejuízo da avaliação de métodos alternativos ou complementares com recurso à análise atempada de dados de satélite.
Contudo, é claro que a integração atempada de factores de risco de forma exigente em situações de urgência se impõe cada vez mais, designadamente no que respeita a riscos naturais. Importa nesta análise atender às condições locais, ao modo de ordenamento e de construção, ao modelo de ocupação do território e de actividade humana.
A actividade científica pode hoje contribuir de forma útil para a tomada de decisão em matéria de prevenção, mitigação e gestão da resposta a riscos naturais graves, quando devidamente desenvolvida e integrada.
Temos vindo a preparar há bastante tempo, com acompanhamento internacional, um consórcio de instituições de referência nacional nesta matéria, o Consórcio RISCOS.
O programa de actividade do Consórcio RISCOS, que integra quatro laboratórios de Estado (LNEC, IM, IH, LNEG), oito universidades, dezenas de centros e institutos de investigação e empresas, foi já submetido, em versão revista, à FCT e avaliado positivamente. No quadro da proposta de Orçamento do Estado para 2010 estaremos em condições de o constituir e formalizar, dotando o País de um instrumento de investigação e coordenação de recursos científicos cuja necessidade é manifesta e para cujo funcionamento dispomos hoje, finalmente, em várias áreas — da vulcanologia e sismologia à meteorologia, entre outras —, das competências necessárias e do acesso às redes internacionais relevantes.
O esforço de formação avançada em matéria de gestão de riscos públicos, domínio novo na formação universitária em Portugal, é ainda uma das actividades que temos vindo a procurar desenvolver, especialmente no quadro de parcerias internacionais especializadas.

Página 97

97 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Esperamos prosseguir, no quadro deste Orçamento, este esforço de formação e investigação nas instituições de ensino superior, integrando as redes de formação que, à escala europeia e internacional, nos esforçamos por ajudar a criar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado.

O Sr. Presidente: — Vamos dar início ao debate, com a primeira ronda de questões, dando a palavra, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado José Ferreira Gomes, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. José Ferreira Gomes (PSD): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr.
Presidente da Comissão de Educação e Ciência, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr.
Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos numa conjuntura especialmente difícil, em que uma das poucas vias de esperança é a melhor qualificação dos portugueses, é o reforço da criação e da transmissão de saber que só o ensino superior poderá potenciar.
Para o Governo, já temos uma população universitária superior à média europeia (35% dos jovens de 20 anos) e o número de investigadores já terá também ultrapassado a média europeia (com 7,2 por cada 1000 activos). A crer nesta visão optimista, não teríamos razões para preocupações e o Sr. Ministro das Finanças poderia atç descansar um pouco» Mesmo assim, o grande vector estratégico do Governo para esta Legislatura é ainda o número de estudantes. No entanto, mais importante do que aumentar o número de estudantes, sugiro, será fazer um grande esforço para melhorar a eficácia do ensino superior. Mas, nesta área, o grande feito da legislatura anterior foi a eliminação da avaliação que existia para vivermos, ainda hoje — cinco longos anos depois! —, com uma Agência de Avaliação e Acreditação em instalação.
Proponho que discutamos a forma como este Orçamento do Estado contribui para este grande objectivo da qualidade.
A minha intervenção vai incidir sobre cinco questões principais, que proponho sucessivamente.
A primeira delas é o chamado Contrato de Confiança, a que o Sr. Ministro acabou de referir-se longamente.
Ora, faz hoje oito dias, V. Ex.ª esteve no Conselho Europeu de Educação, em Bruxelas, e fez distribuir em Lisboa uma nota de imprensa onde anunciava que o Contrato de Confiança «é reconhecido como um modelo inovador de contratualização de objectivos».
É sabido que a percentagem do PIB atribuída pelo Orçamento do Estado ao ensino superior, em Portugal, é modesta e que, em despesa por estudante, estamos abaixo dos nossos parceiros imediatos. O estrangulamento financeiro a que as instituições foram forçadas nos últimos anos levou-as ao limite e, face à iminente rotura financeira da maioria das universidades e politécnicos, um reforço de 8% no orçamento é, certamente, bem-vindo, ainda que venha compensar apenas parte dos 11% retirados nos anos mais recentes para a Caixa Geral de Aposentações.
Mas vejamos em que consiste este modelo inovador de contratualização: todas as instituições recebem (pelo menos, em princípio) o mesmo aumento percentual; os objectivos estão agora a ser «acordados», depois de definido o financiamento; e aumenta o número de estudantes, o único objectivo apontado. Um modelo inovador, de facto!» O que estão a fazer os nossos parceiros mais imediatos? Como o Sr. Ministro bem sabe, a maioria dos países europeus tem introduzido grandes reformas voltadas mais para a qualidade do que para a quantidade.
Aqui na vizinha Espanha, está em curso a iniciativa dos Campus de Excelência Internacional, sendo de salientar que a decisão foi tomada por um painel internacional. E o resultado foi muito selectivo: quatro ou cinco projectos vencedores, mais outros tantos numa espécie de segunda liga.
Em Portugal, preferimos uma negociação directa, para simplesmente apontar objectivos numéricos quanto ao número de estudantes a admitir ou a graduar. O efeito deste número de estudantes é que o financiamento público por estudante vai baixar ainda mais. Será que isso vai acontecer sem perda de qualidade? Será que ainda há «gorduras» a eliminar nas instituições? Notemos que os famosos saldos já foram gastos! O pior é que não se vislumbra como irão ser avaliados os efeitos negativos destes contratos já que escaparão ao que se poderá esperar da Agência de Avaliação e de Acreditação. Mas também não parecem ser estas as preocupações do Governo.
A segunda questão tem a ver com as universidades-fundação.

Página 98

98 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Como vimos atrás, vários países estão a introduzir mecanismos de diferenciação do ensino superior. Que papel se espera entre nós das universidades-fundação? Será que temos aqui o gérmen das futuras superuniversidades portuguesas ou será um acto puro de desorçamentação? Isto depois de termos passado aqui três horas a discutir a desorçamentação feita no ensino secundário com a criação da empresa Parque Escolar A terceira questão prende-se com o Processo de Bolonha.
Que vai o Governo fazer acerca do Processo de Bolonha? Será que depois de uma introdução apressada, mal preparada e não acompanhada, o Ministério vai avaliar os efeitos da reforma ou fechar-se-á no cómodo distanciamento, protegido pela cortina da autonomia e de uma Agência de Acreditação ainda incipiente? Será que o financiamento dos 2.o ciclos se manterá ou teremos áreas como a física e a filosofia reservadas para estudantes ricos, de acordo com a interpretação mais estrita da lei actual? A quarta questão prende-se com o investimento público em investigação e desenvolvimento (I&D).
Na área da ciência, sabemos que, apesar do esforço apreciável dos últimos decénios, estamos ainda na cauda da Europa. Olhando para o Orçamento do Estado para 2010 e para as Grandes Opções do Plano, apesar do que o Sr. Ministro disse há pouco, fica a impressão de que teremos atingido o limite do esforço expectável, o que implicará a manutenção deste lugar na cauda do mundo desenvolvido.
Será que o Sr. Ministro tem uma visão mais optimista destes documentos e poderá apontar o meu erro de leitura? A quinta questão: os atrasos proverbiais da Fundação para a Ciência e Tecnologia.
Não posso passar em claro sobre estes atrasos nem deixar de perguntar-me se isso não será o resultado de a Fundação (ou o Ministério) ter uma «boca maior que a barriga», para usar uma linguagem popular. Será que a Fundação tem meios à medida dos compromissos assumidos? Pergunto isto porque sei da preocupação do Presidente da Fundação com a previsibilidade dos concursos e o respeito pelos prazos estipulados — contudo, isso parece muito difícil.
Espero que o Sr. Ministro possa responder a estas questões muito claras.
Primeiro, sobre o contrato de confiança, depois de 5 anos de folga a toda a avaliação, para quando a qualidade das aprendizagens? Segundo, as universidades-fundação serão o gérmen das super-universidades portuguesas ou uma simples manobra de diversão? Terceiro, em relação ao Processo de Bolonha, para quando a avaliação dos resultados e a normalização da regra de financiamento do 2.º ciclo? Quarto, em investimento público em I&D, teremos atingido o limite ou podemos esperar duplicar ainda o financiamento público para nos situarmos na média europeia? Quinto, quanto aos atrasos na FCT, para quando um financiamento previsível?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Ferreira Gomes, devo dizer que fiquei um pouco surpreendido com a sua intervenção, certamente motivada por boas intenções mas que me pareceu singularmente afastada de grande parte dos problemas reais que existem no nosso desenvolvimento científico — perdoe-me este à vontade com que lhe respondo.
Em primeiro lugar, há um elemento de desconfiança que deveria ser de imediato levantado do seu espírito.
Contrapor qualidade a número de estudantes é algo que me parece não fazer qualquer sentido. Precisamos de mais qualidade e de mais estudantes.
Por que é que precisamos de mais estudantes? Quando olhamos apenas para o número dos estudantes jovens que frequentam o ensino superior, o típico indicador dos estudantes que hoje têm 20 anos, dos quais 35% ou 36% frequentam o ensino superior em Portugal, devemos sentir colectivamente — e espero que o Sr. Deputado também sinta — um grande regozijo, pois é uma situação muitíssimo melhor do que aquela que vivíamos há 10 ou 15 anos.
Com o atraso que se verificava, com o peso que em Portugal tem o défice de qualificações, designadamente das famílias desses estudantes, é extraordinário que estas décadas pós 25 de Abril tenham permitido uma inversão de rumo e uma correcção muito significativa neste sentido.

Página 99

99 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Este progresso tem vindo a acentuar-se com os anos, pelo que o facto de estarmos hoje em níveis parecidos com os da OCDE neste domínio coloca-nos com o mesmo problema que têm todos os outros países que também estão a aumentar este número. Chegámos a esta média, mas os outros também chegaram a essa média e estão a aumentar. Portanto, aqui o nosso problema passou a ser o igual ao dos outros, deixámos de ser um País anormal nesta matéria.
Porém, quando olhamos para as faixas etárias onde o peso do passado é mais relevante, designadamente aquelas que incluem a população activa, verificamos quanto é o caminho que ainda temos de percorrer. Por exemplo, quanto à meta europeia para a percentagem de diplomados, dou-lhe apenas um número, aquele que foi utilizado, depois de um longo debate, como objectivo para a Europa para 2020. Percentagem de diplomados na faixa etária dos 25 anos aos 34 anos: em Portugal, estamos em cerca de 20%; a União Europeia está em cerca de 30%; o objectivo é 40%.
Dir-me-á que chegaremos lá apenas deixando passar o tempo. Pois, com certeza, mas nessa altura, provavelmente, a meta também já se deslocou. Ou seja, quando olhamos em detalhe as parcelas que compõem esta meta e as estratégias que a ela induzem, verificamos que a questão fundamental do sucesso escolar nos ensinos básico e secundário pesa, e é a única que pode permitir o aumento da percentagem de estudantes que, terminando o ensino secundário, concorre e entra no ensino superior. Chegámos a um nível que é perfeitamente aceitável em termos europeus, mas temos de continuar.
O problema hoje particularmente grave — e isso justifica, respondendo à sua questão, a ênfase dada a este modelo de Contrato de Confiança — é que, quando nos comparamos com países que têm muito mais diplomados na sua população activa, verificamos que eles também têm muito mais pessoas na sua população activa a frequentar o ensino superior do que nós. Ou seja, quem até teria menos necessidade, tem mais estudantes a frequentar o ensino superior. Este, o problema da relação do ensino superior com faixas etárias e profissionais mais elevadas do que a população jovem que termina o ensino secundário, é um dos principais problemas do ensino superior português.
Ora, um dos nossos objectivos é exactamente neste âmbito. Não me vai fazer dizer que é apenas este o objectivo, porque temos o objectivo da qualificação do corpo docente, da produção científica, da relação com as actividades económicas ou da relação com o desenvolvimento regional. Tudo isto são objectivos, mas se, além disso, uma mudança é crítica nos próximos anos — crítica do ponto de vista da economia, da reconversão profissional, da cultura geral da população — é a de uma frequência muito maior de pessoas adultas activas no ensino superior.
O desejável seria termos, dentro de poucos anos, um ensino superior em que um grande número de instituições tivesse, lado a lado, estudantes com 18, 19 e 20 anos e adultos activos com 30, 40 e mais anos, que dele obtivessem graus em vários níveis para obter, como disse na minha intervenção inicial, quer a primeira a qualificação ao nível do ensino superior quer a sua reconversão.
Temos cerca de meio milhão de diplomados do ensino superior, com licenciaturas, que saíram há mais de 10 anos do ensino superior, da escola. A percentagem desses 500 000 diplomados que frequentam alguma forma de ensino superior é mínima, em Portugal, quando comparada com a de outros países. Ora, sabemos o impacto decisivo, a importância enorme que tem, para a reconversão profissional, para a superação de dificuldades de desemprego em períodos de reconversão de empresas, o ensino superior intervir neste mundo.
O Sr. Deputado, com certeza, estará de acordo comigo em erigir como elemento fundamental, que exige uma mudança de paradigma dentro da atitude do ensino superior e, diria mesmo, da própria juventude estudantil, a atracção e a fixação no ensino superior de activos.
Sr. Presidente, ainda me resta algum tempo?

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, dispõe cerca de 1 minuto e meio. Eu avisá-lo-ei quando faltar 1 minuto para terminar o seu tempo. Terá ocasião para terminar, em resposta a outras questões.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Com certeza, Sr. Presidente.
Há uma parte da sua intervenção que achei ser uma brincadeira, porque o Sr. Deputado sabe que fiz toda a minha vida profissional como cientista, como físico. A certa altura disse que a física ia ser reservada para

Página 100

100 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

estudantes ricos. Não quero viver nesse país! Não sei que país é esse que está a enumerar, mas com certeza não é o meu e espero que não seja o seu.
A outra questão que levanta, e que convinha deixar muito clara, é a da avaliação.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, dispõe de 1 minuto.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado, a ladainha de que a Comissão Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES) interrompeu as suas actividades, que agora foi criada a comissão de avaliação e deixámos de ter avaliação, é objectivamente pouco correcta.
O Sr. Deputado sabe perfeitamente que a Comissão não tinha qualquer competência em matéria de acreditação de cursos, que as suas avaliações nunca recomendaram fechar nenhum curso e que foram completamente inúteis para alterar a situação de muitos cursos que manifestamente não deviam existir. Pelo contrário, durante estes anos e pela primeira vez, tivemos avaliação de instituições feita sistematicamente — mais de 10 por ano — por painéis que não eram designados pelas próprias instituições, que eram independentes das instituições. Alterámos a lei ao fim de uma longa batalha política, em particular neste Parlamento, de maneira a ter acreditação de cursos estritamente condicionada à avaliação externa. Tivemos de modificar a lei, tivemos de criar uma agência própria, etc. Esse processo está, neste momento, em curso, segundo os prazos e os critérios fixados na lei e que são independentes do Governo.
Todos gostaríamos que isto tivesse sido feito há 10 anos, e eu também, Sr. Deputado. Devo dizer-lhe que fiz parte dessa batalha, em particular neste Parlamento, quando estava no Conselho Nacional de Educação, e nessa altura perdi. Perdemos, portanto, muitos anos nessa matéria, mas espero que os recuperemos agora.
Posso garantir-lhe que é nossa inteira prioridade, neste momento, fazer com que a questão da qualidade no ensino e na investigação esteja presente, cada vez mais, na política para o desenvolvimento do ensino superior em Portugal.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, haverá, com certeza, ocasião, em resposta a outras perguntas, de voltar a estes temas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, há um aparente paradoxo no qual a nossa oposição, particularmente mais à direita, cai sempre, que é o paradoxo — aliás, é mais um erro, não é bem um paradoxo, é um erro de percepção — de pensar que é preciso ter menos para se ter melhor.
O principal indicador de qualidade do nosso sistema de ensino superior e do nosso sistema científico é exactamente a quantidade. Foi precisamente neste primordial indicador da quantidade de pessoas que acediam ao ensino superior, da quantidade de pessoas que acediam ao sistema científico e da quantidade de instituições que fazem parte dessa mesma rede de ensino superior e de investigação científica, devido a esse diminuto número, a essa densidade mínima de pessoas e de instituições, que esteve a nossa principal fragilidade durante décadas.
Portanto, não é preciso reduzir para sermos melhor, pelo contrário, temos de ter mais pessoas, mais instituições, mais investigação, mais conhecimento e mais empresas para podermos começar a ser melhores.
Penso que laborámos durante muitos anos nesta percepção errada da realidade.
Sr. Ministro, no que se refere às questões que tenho a colocar-lhe, vou concentrar a minha preocupação na tecnologia, naquela letra do meio da sigla do Ministério que tutela, o MCTES. Irei, talvez, privilegiar o «T», mas não poderia deixar de fazer antes uma breve passagem pelas outras letras que constituem a sigla.
Penso que temos estado a assistir, nos últimos anos — com uma breve interrupção quando o PSD e o CDS governaram o nosso país —, a uma grande mudança tectónica de orientação de finalidades e de objectivos de toda a rede científica e de formação superior em Portugal. Definiram-se rumos, definiram-se trajectórias muito claras, que tinham como grande finalidade o desenvolvimento humano, social e económico do nosso País e, principalmente, aumentar a capacidade de Portugal produzir mais riqueza através da construção da sua principal matéria-prima, que é o conhecimento.

Página 101

101 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Penso que é aqui que assenta toda esta mudança tectónica de rumo a que assistimos desde que o Governo do PS tem Mariano Gago como Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Penso que o orçamento para 2010 é mais uma evidência bem clara desta consolidação de rumo face à que é, talvez, a principal finalidade deste Orçamento do Estado, ou seja, promover o desenvolvimento do nosso País.
Assistimos, de facto, ao nível da produção do conhecimento e ao nível da rede científica, a uma aposta que tem dado os seus frutos, que tem dado os seus indicadores, já aqui referidos pelo Sr. Ministro, concentrando no orçamento específico para a ciência um volume com percentagem cada vez maior relativamente ao PIB, como também já aqui foi mencionado, o que faz com que Portugal, hoje, se aproxime muito rapidamente dos níveis médios dos países da União Europeia ou da OCDE. Mas tem tido um outro efeito também muito importante, que é o efeito de contágio de investimento em ciência, em inovação e em tecnologia, o qual aumentou também de forma muito significativa noutros ministérios e também em muitas das principais empresas do nosso País.
Portanto, não só aumentou de forma clara o orçamento de ciência e tecnologia naquilo que ao Governo diz respeito, no ministério que tem essa tutela, como aumentou também, de forma muito clara e significativa, este esforço de investimento na inovação e na tecnologia em todas as áreas de governação do nosso País e em toda a actividade económica. Os indicadores estão aí e vou dispensar-me de os recordar porque são conhecidos de todos.
Não basta, porém, produzir conhecimento, não basta produzir saber para que o nosso País possa desenvolver-se e para que a riqueza possa ser gerada e distribuída de forma mais solidária. É fundamental, como o Sr. Ministro também já referiu aqui, outra grande preocupação: tornar esse conhecimento acessível à generalidade da população portuguesa.
Isto é extraordinariamente importante e é aqui que radica o tal erro de percepção da nossa oposição. É fundamental termos cada vez mais pessoas e mais pessoas no activo acedendo a este pensamento científico para que essas pessoas possam transportar essa matéria-prima essencial para a fileira da economia e assim poderem gerar mais riqueza e uma outra capacidade produtiva do nosso País.
Talvez este orçamento fique marcado por aquilo que o Sr. Ministro já referiu, o Contrato de Confiança com o Ensino Superior, subscrito por todas as instituições do ensino superior e pelo Governo, que revela um compromisso claro de toda a rede de formação superior do nosso País para com o futuro do nosso País.
Há uma aposta clara na disponibilização da formação avançada para aquele que é o cluster decisivo e crítico nas próximas duas ou três décadas para o desenvolvimento de Portugal, que é o dos adultos que estão no activo e que continuarão no activo durante cerca de mais duas ou três décadas. São estas pessoas que permanecerão até aos 65 anos no activo que têm absoluta necessidade de qualificação para que possam dar ainda um contributo muito qualificado e qualificante para o desenvolvimento de Portugal.
Mas é também um compromisso muito importante por parte das instituições de ensino superior para com os cidadãos portugueses que não faziam parte do seu universo de recrutamento. E as instituições de ensino superior português, hoje mais do que nunca, respondendo a um impulso político do Governo, estão disponíveis, sensíveis e completamente empenhadas em proporcionar à população adulta portuguesa uma oportunidade de qualificação não apenas para a sua formação inicial mas para a sua formação ao longo da vida.
Por último, temos a dimensão que privilegio nesta minha primeira intervenção e que tem a ver com a fileira científica desde a génese do conhecimento até à utilização desse mesmo conhecimento. Penso que é clara, hoje, a aposta decisiva na produção científica, na qualificação dos cidadãos portugueses, na qualificação das instituições de ensino superior, das instituições científicas, e é cada vez mais clara a aposta na transferência deste conhecimento, desta inovação, desta tecnologia para a fileira económica, que é onde ela pode produzir a riqueza que tanta falta nos faz para que possamos distribuí-la de uma forma solidária e aumentar os nossos níveis de desenvolvimento económico e social.

O Sr. Presidente: — Resta-lhe 1 minuto, Sr. Deputados.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Ora, era aqui que gostaria de centrar a minha preocupação e de solicitar ao Sr. Ministro que nos falasse um pouco desta letra «T», de Tecnologia, de transferência de tecnologia e de transferência da inovação, de

Página 102

102 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

transferência do conhecimento, do papel cada vez mais decisivo das empresas nos incentivos ao acolhimento deste conhecimento, à participação das próprias empresas na rede científica nacional, ao emprego científico em empresas que tanto dele carecem, à participação nas parcerias entre empresas e centros de investigação e à promoção destes consórcios com empresas e destas capacidades transversais e multidisciplinares, para termos, na mesma fileira, a produção, a qualificação e a transferência do conhecimento.
Por último, gostaria que nos falasse sobre a definição das grandes linhas estratégicas de investigação para o futuro do País (e acabou de referir uma, ao nível dos oceanos, extraordinariamente importante para o nosso património e o nosso território), concentrando aí parte significativa do esforço nacional e dos dinheiros dos contribuintes.
Agradecia que o Sr. Ministro se pronunciasse acerca desta matéria.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, esta questão da apropriação económica dos resultados da investigação científica é uma questão que nos preocupa a todos, que preocupa este Parlamento desde há muitos anos — pelo menos, desde a elaboração da primeira lei sobre a investigação científica, num momento, aliás, em que essa preocupação não encontrava por parte das capacidades existentes no País a possibilidade de ser respondida na esmagadora maioria das áreas. Na verdade, em muitas das áreas, não existia massa crítica nem recursos institucionais que permitissem responder a muitos dos problemas existentes.
Devo dizer-vos que eu próprio fui confrontado em muito da minha vida profissional, há 10, 20 anos, com tentativas sistemáticas de entregar contratos internacionais de investigação em empresas portuguesas sem encontrar essa capacidade no nosso País e, em alguns casos, sem encontrar sequer a capacidade científica capaz de liderar esses processos ou de os acompanhar.
Hoje, felizmente, essa situação está muito ultrapassada, o que não quer dizer que não haja ainda, em inúmeras áreas, carências gigantescas. O que temos é uma acumulação de conhecimento, de competências e de recursos que é extremamente recente e estamos em competição com países em que essa acumulação se deu durante muitíssimos anos, em que todas as gerações existem nas empresas, nos institutos de transferência, na transferência de tecnologia, na actividade académica, gerações essas que faltam em muitas áreas, em Portugal, como alguns dos presentes que são do domínio bem sabem.
O que temos hoje — talvez possa acrescentá-lo — é uma matriz de articulação entre as universidades, as empresas e os institutos de interface fortemente assente em redes institucionais que estão a consolidar-se e que curiosamente estão a consolidar-se, pela primeira vez, em algumas áreas, à escala nacional.
O que era normal acontecer, na época primitiva desta relação, era a relação entre uma instituição (aliás, normalmente era uma pessoa ou um departamento de uma instituição universitária) e uma empresa ou um conjunto de empresas.
O facto de hoje começarmos a ter parcerias à escala nacional que envolvem quase todas as instituições competentes num domínio com o conjunto das empresas que trabalham nessa matéria é uma realidade nova, que está fortemente ligada à criação de estudos de pós-graduação em parceria internacional ou que está fortemente ligada a grandes investimentos públicos.
Quando me pergunta — e temos estado a trabalhar nessa matéria — o que, neste momento, existe, para lá do programa simbólico que indiquei, da prioridade, aliás, de procurar muito rapidamente ocupar o território na investigação em mar profundo, sobretudo no domínio biotecnológico e no domínio da pesquisa mineral, pelo impacto potencial, gigantesco, que o estudo do mar profundo na zona dos Açores pode ter para Portugal e pela competição muito importante que neste momento vamos ter de travar com outros interesses de outros países, posso dizer-lhe que, hoje, existe muito trabalho desenvolvido nas áreas da energia, dos transportes, da biotecnologia e, naturalmente, na área das tecnologias da informação, sendo, no entanto, esta última uma área onde esse desenvolvimento começou muito antes do de todas as outras.
Este sector das tecnologias da informação vai, aliás, ser fortemente potenciado durante este ano e o próximo pela aposta europeia nos elementos a que se convencionou chamar «Internet do futuro» ou «Internet das coisas», que tem neste momento muitas empresas e institutos de investigação envolvidos em Portugal e

Página 103

103 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

vai ser objecto de grandes investimentos públicos europeus, tendo nós certamente ocasião de participar num esforço europeu nesta matéria.
Gostaria de aproveitar o tempo de que ainda disponho para responder a uma questão que está ligada a esta, colocada há pouco pelo Sr. Deputado Ferreira Gomes e à qual não tive tempo para responder, que é a questão das médias.
Esta é uma questão particularmente crítica quando vista de uma forma superficial. No entanto, hoje, estamos completamente convencidos de que para um país pequeno como Portugal, com 10 milhões de habitantes e uma dimensão semelhante ou um pouco superior à da Suécia ou da Suíça, a questão das médias se coloca de uma forma completamente diferente quando nos comparamos com países como a Espanha, a Alemanha, a França ou o Reino Unido. Porquê? Porque as médias não definem as massas críticas necessárias para conseguir resolver problemas em tempo útil, para termos um número de pessoas, as capacidades instaladas entre empresas e instituições académicas que permitam, de facto, entrar na competição em algum domínio.
Por isso, verificamos que, neste momento, os países mais desenvolvidos da Europa, da nossa dimensão, em matéria de recursos humanos, por exemplo, não têm as médias europeias; as médias deles são as mais elevadas do mundo, são as médias do Japão ou dos Estados Unidos, pois têm o dobro da média europeia em número de investigadores por milhares de activos. Se tivermos de definir uma meta realista, do ponto de vista económico, para o número de investigadores por milhares de activos, em Portugal, diria que essa meta é o dobro da média europeia — abaixo de 10/1000 activos não devemos nunca parar, e estamos em 7.
É claro que a média europeia está abaixo dos 6. Mas a média europeia, na Alemanha, significa que existem regiões/núcleos na Alemanha onde temos 15 e outros onde temos muito abaixo de 6. Mas «com o mal dos outros, podemos nós bem», sobretudo em países muito grandes.
O que importa é não esmorecermos nesta matéria e não nos fixarmos na média europeia.
Julgo que era este o esclarecimento que queria e dou-lho com todo o gosto. Julgo que estamos completamente de acordo nesta matéria: é indispensável termos metas muitíssimo mais exigentes e é isso que estamos a fazer. É por isso que a aposta na formação e no emprego científico e na atracção não apenas de talentos nacionais mas também de talentos de outros países para Portugal tem de continuar e de se reforçar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Começo por cumprimentar os dois Presidentes de Comissões aqui presentes, o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado e os Srs. Deputados.
Antes de me debruçar sobre algumas questões importantes, quero apenas referir que é uma pena que, no orçamento, as dotações de investimento não se encontrem desagregadas, como acontecia noutros orçamentos. Recordo que, em 2007, podíamos desagregar as dotações para as instituições de ensino superior e os respectivos serviços da acção social e que, no ano passado e neste ano, deixou de haver esses mapas, sendo difícil avaliar e apurar a verdadeira organização das verbas. Assim sendo, julgo que seria importante, para uma melhor leitura destes documentos, que voltássemos a essa forma de elaborar o orçamento.
Antes de mais, quero saudar o que aqui ouvimos, ou seja, a proposta do Sr. Ministro de criar um sistema plurianual de bolsas para todo o ciclo de estudos, acompanhando, portanto, o estudante ao longo de todo esse ciclo, medida que me parece positiva e que o CDS saúda, bem como o apoio aos deslocados no caso dos estágios curriculares, matéria em discussão na Comissão de Educação.
Sr. Ministro, julgo que as nossas questões vão incidir muito no Contrato de Confiança, porque, como não estivemos presentes nas negociações deste documento e apenas tivemos acesso ao mesmo, muitas vezes não sabemos o que está por detrás de algumas das medidas que se enunciam. Vamos, pois, colocar-lhe algumas questões que não são explícitas neste documento.
Uma dessas questões, que já lhe coloquei aqui anteriormente mas que gostaria de voltar a colocar-lhe, tem a ver com a acção social e com o reforço dos 16 milhões de euros, bem como com o aumento de cerca de 10% nas bolsas.
A pergunta que lhe faço é se esse aumento de 16 milhões de euros se destina apenas ao universo de bolseiros tal como o conhecemos hoje, ou se o Sr. Ministro vai também mexer na lei das bolsas para alargar o

Página 104

104 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

universo de bolseiros e contribuir com esses 16 milhões de euros para colmatar o aumento do número de bolsas que daí poderá advir.
Gostaria ainda de saber se está interessado ou não em mexer nos escalões das bolsas, que, como sabe, é uma razão muitas vezes invocada de criação de injustiças, como todos os sistemas por escalões, sendo que da parte dos estudantes existira interesse em que ou houvesse mais escalões ou o sistema fosse linear, porque, como sabe, a pequena diferença de rendimento não teria aí tão grande diferença na posterior atribuição da verba.
Na sua última presença nesta Casa, o Sr. Ministro, a propósito da questão do atraso no pagamento das bolsas, referiu que o Ministério sempre tinha pago todas as transferências, conforme tinha sido pedido. A verdade é que o Sr. Administrador dos Serviços da Acção Social de Coimbra referiu que nem sempre conseguiu ter da parte da direcção-geral todas as transferências de que necessitava. Assim sendo, perguntolhe se sabe mais alguma coisa acerca disso. Tenho aqui algures os números, mas agora não os encontro.
Ainda acerca do Contrato de Confiança e dos 100 milhões de euros de aumento de dotação para as instituições, agora que vai estabelecer os contratos com as instituições, gostaríamos de saber em que lógica vai estabelecê-los.
É que no Contrato de Confiança fala-se de mais vagas, de mais formados, licenciados e doutorados, e de um aumento do sucesso escolar, mas tudo isto de uma forma muito vaga. O que queremos saber é como vai contratualizar, por exemplo, o aumento do sucesso escolar por parte das instituições. É verdade que há muitas maneiras de fazê-lo, mas aqui o que importa é não introduzir incentivos a que haja laxismo.
Portanto, é importante encontrar maneiras de o fazer, em consonância, provavelmente, com a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior ou com outras formas de controlo. Mas gostava de lhe perguntar directamente se vai definir metas de sucesso escolar ou se vai definir, por exemplo, taxas de escolarização de cada uma das instituições face ao número de vagas.
Também gostávamos de saber quais os critérios que o Ministério vai utilizar para abrir novas vagas nos cursos que já existem. Quais os cursos que vai escolher e em que áreas é que quer aumentar? Vai seguir algum critério objectivo para o fazer? Vai fazê-lo de forma equilibrada entre o ensino universitário e politécnico? Creio que o Sr. Ministro também é a favor do sistema binário, assim como o CDS. Portanto, quais vão ser as maneiras de manter a diferenciação, que nos parece importante, entre as duas formas de ensino superior, sobretudo relativamente a este aumento de vagas? Vai fazê-lo de uma forma equilibrada? A reorganização da rede do ensino superior é uma matéria que também nos merece a máxima importância e o máximo cuidado. Sabemos que muitas vezes, quando falamos de instituições do ensino superior e de unidades de investigação, falamos também de massa crítica e de um número de docentes e de discentes que em conjunto possam contribuir para um clima de trabalho científico positivo.
A questão que gostaria de lhe colocar é a seguinte: a rede vai ser reorganizada de uma forma planeada da parte do Ministério ou vai ser deixada para a sua própria reorganização com base nos critérios da agência de acreditação? Vai abrir e fechar cursos com um critério de uma futura reorganização da rede e vai fazer esse controlo através das vagas? É porque o Ministério tem essa «faca na mão»» Através do controlo que exerce sobre as vagas, vai proceder a cortes com vista à reorganização da rede do ensino superior? Relativamente aos 16 milhões de euros, vai aumentar o universo de bolseiros ou não? Qual vai ser a lógica dos contratos que vai estabelecer agora com as instituições, uma a uma? Como vai contratualizar a questão do sucesso escolar e das vagas e a questão do universitário e do politécnico, tendo em conta a reorganização da rede do ensino superior? Quanto à acção social, vai dotar de mais meios os apoios indirectos da acção social? É porque temos visto que os administradores dos SASU (Serviços de Acção Social da Universidade) e dos vários sistemas de acção social se têm vindo a queixar relativamente ao investimento nas cantinas, nas residências, etc.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, muito obrigado pelas suas questões, que são muitas. Vou tentar responder.

Página 105

105 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Relativamente à primeira questão que levantou acerca dos mapas de investimento, julgava que eles estavam na própria proposta de lei do Orçamento do Estado, mas temos todo o gosto em fornecer-lhe esses elementos. O erro deve ser meu, portanto não há qualquer problema.
Registo aqui com agrado o facto de ter considerado positiva esta questão da plurianualização das bolsas por ciclos de estudo da acção social e do apoio a deslocados nos estágios.
Gostaria de começar por responder à questão que me colocou sobre a acção social e depois passo à questão do contrato de confiança, que é provavelmente aquele em que terei de demorar um pouco mais de tempo.
Quanto à acção social, o nosso objectivo é simples: é fazer com que os estudantes mais carenciados, progressivamente ano após ano, que comecem a aceder ao ensino superior tenham condições. Ou seja: o nosso objectivo não é fazer com que a acção social cubra estudantes com rendimentos mais elevados, mas, sim, fazer com que ela esteja em condições de acolher mais estudantes, designadamente estudantes de grupos sociais que antes não acediam ao ensino superior e que agora acedem e têm de encontrar condições de apoio. Portanto, é sempre um sistema de selectividade.
Se me perguntar se ç intenção do Ministçrio propor um alargamento dos rendimentos a partir dos quais» Não! O objectivo do Ministério é o de que se houver mais estudantes no ensino superior nos possamos concentrar aí. Tudo o resto» Sim, foi isso que foi discutido com os responsáveis das instituições politécnicas e universitárias. Devo dizerlhe que reuni com todos os reitores e com todos os presidentes do politécnico, que se fizeram acompanhar pelos dirigentes dos serviços de acção social, mas que fique claro que quem é responsável pelas instituições e pela acção social são os reitores e os presidentes dos politécnicos. Aliás, são eles que nomeiam os administradores, são eles que respondem pelos actos dos administradores, o direito de recurso é deles. Ora, esta assunção por parte dos dirigentes máximos das universidades e dos politécnicos, também do domínio da acção social, é um fenómeno novo que queremos politicamente encorajar, porque nos parece essencial para a política do ensino superior e para o próprio desenvolvimento das instituições.
As questões que foram colocadas e muito discutidas nessa reunião vão ser objecto de proposta das instituições. A diluição dos escalões ou a criação de um algoritmo que permita diluir fronteiras entre escalões não é nada de essencial. Antes pelo contrário, há que encontrar soluções que permitam simplificar, dado que, por vezes, os detalhes complicam imenso a atribuição das bolsas sem qualquer vantagem prática.
Relativamente à questão dos Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra, eu gostaria de lhe dizer que essa questão foi levantada na reunião pelo Reitor da Universidade de Coimbra. Foi formalmente desmentida por todas as outras instituições e pela Direcção-Geral de Ensino Superior. No caso em questão, tanto quanto consegui apurar, os Serviços de Acção Social tinham apresentado um pedido que não podia ser aceite pela Direcção-Geral de Ensino Superior que não era conforme com as regras legais. Foi pedido que se corrigisse, foi corrigido e foi transferido.
Como devem imaginar, se temos o dinheiro no Ministério é para o transferir para todas as instituições.
Mais: no ano passado verificou-se que — e no ano passado houve um reforço do orçamento em matéria de acção social a meio do ano — as bolsas da acção social, sendo um direito dos estudantes, e não estando condicionadas por plafonds orçamentais, caso se verifique a necessidade de serem reforçadas a qualquer momento irão sê-lo com verbas do Ministério ou com verbas da dotação provisional do Ministério das Finanças. Trata-se de um direito dos estudantes no quadro da lei do regulamento em vigor.
Agora passo à questão do contrato de confiança. Gostaria de deixar claro o seguinte: o modelo que foi adoptado no contrato de confiança é, em primeiro lugar, um contrato de confiança genérico com objectivos claros para o conjunto do sistema universitário e politécnico.
No Ministério não nos vamos entreter a negociar contratos, um a um, com cada uma das instituições.
Acreditamos que as instituições são responsáveis, e serão responsáveis em matéria de avaliação depois, por apresentarem, cada uma delas, programas de desenvolvimento que colectivamente respondem ao contrato de confiança. Há uma responsabilidade colectiva das instituições que não eliminamos.
O primeiro programa de desenvolvimento que foi formalmente presente ao Ministério, no qual apus apenas «visto», e é público, foi o da Universidade do Minho. Este programa vai muito além dos objectivos que estão no Contrato de Confiança. São objectivos de desenvolvimento da própria universidade, que define as suas metas e os seus objectivos. Alguns dos quais coincidem com os do Contrato de Confiança e respondem pela

Página 106

106 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Universidade do Minho para a sua quota-parte do cumprimento daquelas metas em matéria de formação de activos, em matéria de formação pós-graduada, etc.
Se me perguntar como se espera, por exemplo, que o ensino universitário e o ensino politécnico respondam diferenciadamente, responderei que certamente se espera que os cursos de especialização tecnológica sejam oferecidos pelo politécnico, mas espera-se que a atracção para a universidade dos diplomados, designadamente para mestrados, seja feita preferencialmente pelas universidades. Na maioria dos casos está a sê-lo. Espera-se que ambos, quer as universidades quer os politécnicos — embora dependa da região onde estão inseridos —, ofereçam mais vagas em regime pós-laboral nos seus cursos e possam adaptar os seus cursos ao regime pós-laboral. Espera-se que emirjam agora consórcios para oferta de ensino à distância, que naturalmente têm de responder não às capacidades da instituição mas à procura por parte da população activa portuguesa. Sabemos que em certas áreas essa procura não encontra hoje oferta em ensino assistido parcialmente à distância e em ensino presencial.
Quando falamos do sucesso escolar, os indicadores que temos vindo a utilizar para medir a posteriori o sucesso escolar são os indicadores da OCDE. Longe de nós qualquer ideia de fixar qualquer meta de sucesso escolar de instituição em instituição! É a instituição que a deve fixar. Não fixámos sequer essa meta à escala nacional por causa das consequências perversas que a fixação de metas desta natureza poderia induzir.
Esperamos que o sucesso escolar melhore porque aguardamos que haja consequências positivas com a reorganização das instituições e com a melhoria da qualificação do corpo docente das instituições, que é visível. É nesses vectores que esperamos que a questão se coloque.
Quanto à reorganização da rede e às vagas, o Sr. Deputado tem toda a razão. Esse é um dos instrumentos e esperamos que a primeira acreditação, ou não, dos cursos nos venha dar a primeira matriz sobre a qual é possível fazer um esforço de reorganização da rede. Não é a agência de acreditação que vai fazer a reorganização da rede, mas ela vai dizer o que deve continuar e o que não deve. Sobre essa base é possível fazer um trabalho conjunto com as instituições para a reorganização da rede.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostava de começar por cumprimentá-lo e, antes de entrar propriamente na discussão do Orçamento do Estado, gostaria de o felicitar e de lhe colocar uma questão muito concreta.
Gostaria de o felicitar porque na última reunião que tivemos coloquei-lhe directamente a questão da discriminação de estrangeiros na atribuição das bolsas da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Esta fundação estava a pedir aos investigadores estrangeiros documentos excepcionais que não pedia aos cidadãos nacionais. O Sr. Ministro não quis responder a essa pergunta, dizendo que tínhamos bolsas generosas. Felizmente, a FCT recuou na sequência de queixas de vários investigadores estrangeiros que estavam a ser discriminados pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia e, portanto, o Governo também recuou naquela que tinha sido uma prática discriminatória.
Fico contente que o Governo tenha recuado, que a FCT tenha começado a dar bolsas a estes estudantes e que, portanto, tenha revisto aquilo que tinha dito sobre as bolsas destes estudantes. Também fico contente por termos participado dessa denúncia e queria felicitá-lo por esse recuo.
Gostava também de lhe falar de um caso de que já lhe falei. Na última reunião que tivemos, falei-lhe do caso do Estádio Universitário de Lisboa. No Estádio Universitário de Lisboa havia cerca de 100 trabalhadores que estavam a trabalhar a «recibo verde». Em 2009, houve várias denúncias de trabalhadores que estavam a trabalhar nos ginásios, a dar aulas de natação, a assegurar que o Estádio Universitário de Lisboa funcionasse.
Houve, em 2009, várias denúncias. Esses trabalhadores estavam a trabalhar para o Estado a falsos «recibos verdes». O Estado estava a cometer uma ilegalidade para com estes trabalhadores.
Quando o confrontei com essa questão, o Sr. Ministro disse: «Não tenho nada a ver com isso.» De facto, em 2009, e mediante essas denúncias, o Estádio Universitário de Lisboa resolveu propor a criação de uma empresa, cujos escritórios funcionam no próprio Estádio Universitário de Lisboa, que contratou esses mesmos 100 trabalhadores para fazerem as mesmas funções nas piscinas, nos ginásios do Estádio Universitário, instituição pública, com subordinação, horário e integração em equipa. O Sr. Ministro resolveu descartar essa

Página 107

107 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

responsabilidade do Estádio Universitário de Lisboa e passar a contratação com os mesmos falsos «recibos verdes» para uma empresa que tem instalações no próprio Estádio Universitário!» Evidentemente, isso permite ao Governo dizer: «Não, nós não temos nada a ver com isso. Há uma empresa (Fuga à Rotina) que por acaso contratou os mesmos trabalhadores para as mesmas funções, com os mesmos falsos ‘recibos verdes’, mas já não sou eu que os contrato«.
Na última reunião o Sr. Ministro disse-me que tomava nota dessa denúncia. Queria perguntar-lhe se já fez essa denúncia à Autoridade para as Condições de Trabalho. É porque o Programa do seu Governo, na página 61, diz que pretende combater os falsos «recibos verdes» e que pretendia erradicá-los da função pública.
Como é que se erradicam os falsos «recibos verdes» da função pública? Não é celebrando contratos com os trabalhadores que estão a trabalhar como os do Estádio Universitário de Lisboa. Não. É criando empresas que vão manter essa ilegalidade.
Por isso, eu gostava de lhe entregar, para essa denúncia, vários documentos distribuídos aos trabalhadores pelo Estádio Universitário de Lisboa.
Primeiro documento: «Tarefas a realizar diariamente por todos os professores: entrada, verificar aviso e convocatórias, passar cartão no torniquete (»)« Cartão de quê? Do Estádio Universitário de Lisboa! Ou seja: falsos —recibos verdes«, quando estão a trabalhar para uma empresa, fuga á rotina! Passam o cartão no torniquete, logo, são trabalhadores independentes, certamente! Têm horário, mas são trabalhadores independentes» Lê-se no documento que «a pontualidade é fundamental». Sr. Ministro, um trabalhador que passa o cartão no torniquete, um cartão do Estádio Universitário de Lisboa, que tem instruções de que a pontualidade é fundamental, que tem horários a cumprir, que está lá todos os dias, que dá aulas, que está integrado numa equipa, tem de ter um contrato de trabalho para a instituição com quem trabalha, neste caso o Estádio Universitário de Lisboa!» Tenho comigo os cartões destes trabalhadores que eles passam no torniquete»! Vou entregar-lhe também o documento que define as competências destes trabalhadores do Estádio Universitário de Lisboa: «Elaboração e planificação anual do trabalho a realizar; elaboração do planeamento mensal específico de cada actividade; preenchimento e entrega trimestral ao coordenador da ficha de caracterização de classe (»)« — fala-se em coordenador, o que significa que estas pessoas estão integradas numa equipa e que é trabalho subordinado» O documento tambçm refere «participação activa nas reuniões mensais», ou seja, estas pessoas têm reuniões mensais com uma equipa e por isso têm direito a um contrato de trabalho. No entanto, o Sr. Ministro «lavou as mãos» e pôs uma empresa a contratá-los a falsos «recibos verdes». Espero que pelo menos tenha a decência de fazer a denúncia que aqui disse que ia fazer!» Tenho aqui também várias circulares, como a de avaliação de desempenho que refere a pontualidade e a assiduidade que vale 40% na avaliação de desempenho destes trabalhadores. Sr. Ministro, um trabalhador que é avaliado numa instituição pública — Estádio Universitário de Lisboa — pela sua assiduidade não é um trabalhador independente, mas estes 100 trabalhadores estão a falso recibo verde.
Vou fazer-lhe chegar, depois, estes documentos.
Dito isto, queria passar à discussão propriamente do Orçamento do Estado.
O Sr. Ministro, na sua intervenção, brindou-nos com um exercício de retórica que certamente todos apreciamos. Gostava de o confrontar com alguns números concretos.
O financiamento público por estudante este ano baixa em relação aos anos anteriores. Na verdade, no Orçamento do Estado para o ensino superior, o valor de 100 milhões de euros anunciado pelo Sr. Ministro é superior em relação ao ano passado, mas volta aos níveis de 2005 com tudo o que mudou: existem mais estudantes e são feitas mais exigências às universidades. Portanto, queria começar por assinalar que este Orçamento do Estado é basicamente o reconhecimento da política de estrangulamento financeiro que o Sr.
Ministro levou a cabo nos últimos anos. É o reconhecimento que as universidades estavam de tal modo estranguladas que, para poderem respirar, tinham de ter mais dinheiro. É, creio, pouco ambicioso voltar aos níveis de 2005 em termos de financiamento.
Eu gostava também de falar-lhe de um tema muito concreto que é a acção social escolar. O Sr. Ministro esteve cá no debate com o Primeiro-Ministro quando foi interpelado pelo Bloco de Esquerda e por outras bancadas sobre as bolsas de acção social. Começou por negar a responsabilidade do Governo nessa matéria: «Não tenho nenhuma responsabilidade!» As instituições atrasam-se, porque não funcionam!» Não tenho nada a ver com o assunto!«» Sr. Ministro, deixe-me notar que a política de acção social deste Governo, além

Página 108

108 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

de ter produzido os atrasos que são notícia frequente — semanalmente há um artigo na imprensa que relata mais uma história de atrasos de meses no pagamento das bolsas —, tem promovido também os empréstimos como forma de complemento de acção social. Sabemos que há hoje 11 000 estudantes que estão a recorrer a empréstimos, que estão endividados e que vão acabar o seu curso endividados.

O Sr. Presidente: — Tem 1 minuto, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro vem hoje dizer-nos que prevê um aumento de bolseiros — é evidente, a crise social exige que se faça essa previsão —, mas que não vai alargar os critérios de atribuição de bolsas e, sobretudo, que não vai aumentar os meios humanos e técnicos dos serviços de acção social, quando os serviços de acção social — também reuni com eles, Sr. Ministro! — nos dizem coisas diferentes do que o Sr. Ministro aqui disse, ou seja, que os atrasos se devem a não terem pessoal suficiente para analisar os processos. Estamos a falar de quatro técnicos para analisar 9000 processos no Instituto Politécnico de Coimbra! Estamos a falar de dois técnicos no Porto! Os serviços de acção social estão estrangulados ao ponto de não terem os meios técnicos que permitem dar uma resposta atempada, e os meios técnicos devem estar previstos no Orçamento do Estado. E o que é que este Orçamento do Estado diz? Diz que esses meios não vão aumentar. O Sr. Ministro não prevê aumento para o funcionamento dos serviços de acção social ou prevê um aumento residual»! Vou dar-lhe exemplos concretos: em Lisboa, a Universidade de Lisboa tem a mesma verba que o ano passado, quando vai haver mais bolseiros e quando era preciso mais meios para analisar os processos; em Coimbra, os Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra têm menos 200 000 euros para o seu funcionamento. Como é que vão dar respostas mais céleres? Como é que vão ter mais capacidade de analisar os processos? O Politécnico do Algarve vai ficar igual, tem a mesma verba.
O Sr. Ministro prevê o aumento do universo de bolseiros, mesmo não alterando as regras que permitiriam que pessoas que estão excluídas dos actuais critérios fossem incluídas, mas não dá meios humanos aos serviços de acção social, ou seja, com mais bolseiros e com menos meios nalguns casos ou meios iguais noutros, estes serviços vão ter mais dificuldade em analisar estes processos e isso significa, no concreto, mais atrasos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, uma vez que excedeu já o seu tempo.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro vem falar-nos dos seus projectos de futuro. Aguardaremos por esses projectos, mas este Orçamento tenderá a piorar a capacidade de resposta destes serviços.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Moura Soeiro, agradeço as questões que me colocou, questões verdadeiramente interessantes e que valeria a pena discutir, mas que estão de tal maneira soterradas numa retórica agressiva que torna difícil a resposta ponderada, que vou repetir relativamente à intervenção anterior.
O Sr. Deputado — e bem — chamou a atenção de que poderia estar a existir alguma discriminação de estrangeiros em bolsas num centro de investigação, num caso concreto. Fui ver. Havia um recurso. Esse recurso estava em análise e não tinha sido decidido. Não tive qualquer intervenção na decisão por parte da Fundação para a Ciência e a Tecnologia sobre esse recurso. Quem analisou o recurso entendeu que os estudantes tinham razão. Foi feito.
Expliquei-lhe, na altura, que o regulamento de bolsas em Portugal é relativamente a estrangeiros, quando comparado com os outros países da União Europeia, nalguns casos mais generoso e noutros casos igual. Em Portugal, nos concursos de bolsas de doutoramento para todos os domínios científicos esse concurso é reservado, em primeiro lugar, aos residentes em Portugal e não como noutros países em que é reservado aos cidadãos residentes» Não estamos a dar bolsas de doutoramento para todo o mundo, para qualquer cidadão de qualquer parte do mundo. Contudo, o regulamento em Portugal é particularmente generoso ao admitir uma

Página 109

109 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

excepção, que é quando a instituição de investigação entende que é do seu interesse a presença daquele candidato a bolsa de doutoramento, coisa que não acontece na maioria dos países europeus. Pelo contrário, por razões de política científica, desde há vários anos que mantemos completamente aberto, ao contrário do que acontece na maioria dos outros países europeus, as bolsas de pós-doutoramento. Para quê? Para pormos em competição todos e para atrairmos para Portugal os melhores a esse nível.
Relativamente à segunda questão dos —recibos verdes«, segundo o Sr. Deputado falsos «recibos verdes« no Estádio Universitário de Lisboa, recebi a sua denúncia por escrito numa afirmação e depois aqui e disse-lhe o que ia fazer, como era natural. Não sou uma instância de inspecção. Dá-me essa informação, não me compete a mim avaliar se ela é correcta ou incorrecta, mas às autoridades competentes. Portanto, fiz o que tinha dito que fazia,»

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Já fez!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — » ou seja, transmitir toda a informação que tinha disponível, designadamente a sua intervenção, ao Ministério do Trabalho com pedido de intervenção.
Considero um pouco estranho que o Sr. Deputado não resista a dizer depois esta frase bombástica: «Espero que o Sr. Ministro tenha a decência de fazer o que disse que ia fazer!» Não lhe fica bem, Sr. Deputado.
Por outro lado, o Sr. Deputado diz que foi, de facto, aumentado o financiamento público para o ensino superior em Portugal — certo —, mas que o financiamento por estudante não está a aumentar. Bem, o financiamento por estudante é todo o financiamento por estudante, porque as instituições de ensino superior não recebem só a dotação directa para funcionamento. A totalidade dos orçamentos das instituições de ensino superior, designadamente as verbas de investigação e todas as outras verbas a que têm acesso, tem aumentado muito e tem aumentado, portanto, o financiamento por estudante, em Portugal. Portanto, o financiamento das instituições só em parte é que é o financiamento dado à cabeça, de base, para o funcionamento das instituições.
O Sr. Deputado tem uma questão ideológica com os emprçstimos», e eu gostava de o convencer, se não aqui, na vida. Muitos estudantes, já há muito tempo, contraem empréstimos em instituições bancárias em condições leoninas. O que este sistema veio fazer, de facto, foi dar a esses estudantes, designadamente a muitos dos que já tinham emprçstimos,»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E a outros»!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — » condições de poderem ter acesso a crédito sem garantias, coisa que não existia em Portugal antes, e em condições particularmente favoráveis. É estranho que, do ponto de vista ideológico, quem se pretende de esquerda seja contra uma garantia dada aos estudantes sem terem património, sem terem fiador, a condições de juros muitíssimo mais baixos do que os do mercado. É extraordinário que se defenda que isso não devia existir, quando o sistema de acção social em Portugal continua a funcionar e não é substituído — todos os dados e estudos, neste momento, o mostram — pelo sistema de empréstimos.
Por último, Sr. Deputado, vou responder-lhe às questões dos serviços de acção social. Como deve imaginar, estive reunido com os responsáveis das instituições e os responsáveis dos serviços que também me informaram dos telefonemas que estavam a receber, designadamente do seu partido político, e dos pedidos que lhes estavam a ser feitos. Ora, a verdade é que a questão dos meios dos serviços de acção social para a apreciação das candidaturas não foi, em lado nenhum, levantada nessas reuniões. Antes pelo contrário, a questão que esteve em causa foi sempre a da simplificação dos processos na apreciação dos pedidos. E essa questão hoje tem condições para ser resolvida, designadamente através da plataforma de interoperabilidade que permite aos serviços de acção social dispensar declarações por escrito e dispensar documentos que sejam entregues pelos próprios estudantes.
As instituições — as universidades e os institutos politécnicos — têm naturalmente uma responsabilidade global nesta matéria. E não me vai convencer de que uma grande universidade está tolhida pelo facto de ter mais quatro ou mais três funcionários num dos seus serviços, no qual, em última análise, quem é responsável é o reitor ou o presidente do politécnico que tem todas as condições para afectar recursos a esses serviços.

Página 110

110 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, sempre que fazemos estas discussões, a do Orçamento do Estado ou outras, permanece uma frontal contradição, que é obviamente ideológica.
O Sr. Ministro aparentemente demoniza as diferenças ideológicas; nós encaramo-las com toda a naturalidade! O Sr. Ministro preconiza e aplica uma política neoliberal, que visa, no essencial, a desresponsabilização do Estado perante o ensino superior. O PCP não a subscreverá nunca e dessa contradição partimos para esta discussão, que nasce, à partida, com um certo antagonismo, como é natural.
Não esperamos que use a diferença ideológica para justificar tudo, porque consideramos que, ainda assim, a justiça, ou pelo menos a preocupação com a justiça, deve prevalecer.
Esta diferença ideológica faz com que, da parte deste Ministério, se continue a praticar uma opção política — e julgamos que esta é uma nota importante que deve ficar da discussão do Orçamento do Estado — de desinvestimento no ensino superior.
Não é uma questão de constrangimento orçamental ou de contenção orçamental. Aliás, o Sr. Ministro sabe, tal como todos nós, que o investimento e o financiamento do ensino superior é, em última instância, um investimento a médio prazo.
Portanto, há uma opção política! Aliás, basta ver a dimensão dos valores a que nos estamos a referir e compará-los com outros, por exemplo com os das despesas da administração directa do Estado. Se para pôr fim ao pagamento de propinas por todos os estudantes do nosso sistema de ensino superior bastaria um investimento na ordem dos 350 milhões de euros anuais, ficamos a saber a dimensão do investimento que seria necessário para garantir a gratuitidade.
Portanto, é claramente uma opção da qual partimos para fazer a discussão.
Sr. Ministro, mesmo no quadro desta política de desinvestimento, de diminuição do peso do Estado no financiamento do ensino superior e da obtenção da receita — que o Sr. Ministro chama de receita privada e de receita própria das instituições e que nós preferimos chamar de propina, porque é o seu nome real — há ainda assim uma nota preocupante: é que o Sr. Ministro, desde 2005, veio a estrangular sucessivamente as instituições de ensino superior, enquanto não as tinha de rastos, ao ponto de lhes poder impor a sua política e a sua concepção para o ensino superior. Ou seja: obrigou-as a aumentar as propinas, a converter o conhecimento que deveriam difundir e produzir em mercadoria, os «cursos sanduíche«, e por aí fora»- chegámos a este ponto! — e, com isso, trouxe as instituições até um ponto quase de ruptura, ao qual não chegaram porque o Sr. Ministro, generosamente, «abria a bolsa» sempre que conseguia das instituições aquilo que delas exigia» Ora, deixo-lhe uma primeira pergunta: se este contrato de confiança é tão bom porque é que não o assumiu desde 2005? Porque é que não o assumiu desde 2006? É porque depois de, em 2005, as instituições terem levado os cortes orçamentais que levaram o Sr. Ministro percebeu certamente que havia necessidade de investir em 2006. E, se não percebeu, o PCP, por exemplo, logo em 2006, propôs a reposição nas instituições de um conjunto de verbas que o Sr. Ministro Mariano Gago lhes havia retirado ou, melhor, o seu Governo! Sucessivamente, até ao ano passado, até 2009, o PCP propôs persistentemente a reposição da verba no mínimo daquilo que o Governo havia retirado por via da necessidade do aumento das contribuições para a Caixa Geral de Aposentações.
Ora, se, afinal, vem agora anunciar a todo o País que há um contrato de confiança que, curiosamente, vai salvar o ensino superior da estagnação a que o próprio Ministério o tinha votado, qualquer dia chegamos ao ponto em que o Governo tira as reformas aos idosos e, depois, quando as der, vem dizer que são uma regalia» Sr. Ministro, pergunto-lhe porque é que não reconheceu a necessidade de fazer investimentos antes de ter feito com que as instituições ficassem quase sem opções, nomeadamente no que toca à gestão do seu pessoal — e isto com efeitos particularmente intensos no quadro do ensino superior politécnico, como sabe, sujeito a elevada precariedade.

Página 111

111 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Da leitura do Orçamento do Estado e dos diversos documentos que o Governo nos forneceu, surge-nos uma dúvida. Da leitura do relatório que acompanha o Orçamento do Estado deste ano, ficamos a saber que, para as universidades e os politécnicos, mais os seus serviços de acção social — porque no Relatório, como sabe, este dois dados vêm em conjunto —, temos 1562 milhões de euros e, em 2009, tínhamos, para a mesma rubrica, 1718 milhões de euros, o que dá ainda uma diferença da ordem dos 150 milhões de euros.
Quando fazemos as contas, retirando a acção social, verificamos que, em relação à estimativa, existe um crescimento, o tal que o Sr. Ministro refere como sendo de 100 mil euros, mas, na verdade, em relação ao orçamentado há uma diminuição.
Pergunto ao Sr. Ministro como é que está em condições de garantir-nos que a taxa de execução vai ser este ano superior à taxa de execução do ano anterior.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exacto!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Imaginemos a seguinte situação: se taxa de execução é igual em 2010 e em 2009, estamos a falar de uma retirada de quase 300 milhões de euros do orçamento. Claro que o Sr. Ministro dirá: «Está a esquecer-se de que temos de retirar as fundações». Mas, então, pergunto-lhe: onde é que pomos as fundações!

Risos do PCP.

É uma pergunta sincera», porque não sei por que vias estão a ser financiadas as instituições que optaram pelo regime fundacional, porque o Sr. Ministro diz que não estão aqui, mas também não diz onde estão, pelo que gostaria de saber.
Mesmo retirando as fundações — 169 milhões de euros —, ainda assim fica um corte significativo, isto em relação ao que é executado.
Sr. Ministro, passando a outras questões mais relacionadas com a ciência, dizia o Sr. Ministro há poucos anos que os consórcios seriam um dos eixos fundamentais do desenvolvimento tecnológico. Apresentou-nos o Física-N e um conjunto muito amplo de consórcios, pelo que gostaria de saber o que é que lhes aconteceu, em que pé está cada um deles e qual é a expressão que eles adquirem no seu orçamento.
Pergunto ainda se tem pensada uma solução para os contratos ciência de 2007 e 2008, no caso os que lhes vierem a seguir, e se pensa continuar com este regime de alguma instabilidade no quadro da carreira da investigação.
O Sr. Ministro valoriza muito — julgamos que, pelo menos, retoricamente o faz bem — a carreira do investigador e, curiosamente, despreza sempre a carreira técnica, sendo este um dado a que não deixamos de dar algum relevo»! É engraçado que o Sr. Ministro não hesite em valorizar o número de investigadores por milhar de habitante em Portugal — que, de facto, tem crescido —, mas nunca refira o número de técnicos por investigador.
Como sabe — e saberá bem melhor do que eu» —, esse é um factor determinante da capacidade e do potencial científico nas instituições, porque, se tivermos um conjunto muito grande de investigadores, mas se eles tiverem de fazer um trabalho técnico, desde calibrar máquinas até fazer o trabalho administrativo, a produtividade não será certamente a mesma.
Portanto, gostaria também que se pronunciasse sobre o rácio técnico/investigador e sobre qual é a previsão para o seu crescimento.
Termino com esta nota: na última reunião que tivemos, o Sr. Ministro dizia-nos que o Instituto Tecnológico e Nuclear (ITN) tinha 1 milhão de saldo a transitar. Sr. Ministro, lamento que tenha utilizado um golpe de desonestidade intelectual dessa natureza. O Sr. Ministro sabe que a verba a que se referia dizia respeito a receita consignada e, portanto, não estava, nem poderia estar, disponível para fazer face aos projectos que mencionei.
Lamentamos que seja preciso recorrer a este tipo de artimanha ou de artifício para justificar a ruptura financeira em que se encontram as instituições!

Página 112

112 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, penso que não vale a pena perdermos tempo com a primeira parte da sua intervenção. Como deve imaginar não posso estar de acordo consigo quando diz que o Estado se desresponsabiliza e desinveste no ensino superior, »

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É um dado objectivo!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — » quando o dado objectivo ç precisamente oposto: o Estado está precisamente neste Orçamento do Estado a aumentar a dotação dos contribuintes para o ensino superior.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Acabei de mostrar-lhe o contrário!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Parece-me que, mesmo com diferenças ideológicas tão acentuadas, com um partido tão conservador como o de V. Ex.ª, é difícil não ver os factos.

Protestos do PSD e do PCP.

Por outro lado, há uma retórica de estrangulamento que me parece um bocadinho «assassina» e do foro criminal. Coloca de rastos e depois estrangula, mas, logo a seguir, passa para o comçrcio» E diz que os cursos são mercadoria e fala de umas sanduíches, não sei de que quê, não sei qual o seu conduto»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — As instituições que tutela, Sr. Ministro!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Tomáramos nós que existissem muitos «cursos sanduíches», como o Sr. Deputado diz com esse ar assustado, o que significaria que o estudante tinha uma parte de estágio profissional no interior do curso, sendo isso particularmente positivo.
O Sr. Deputado fala-me também — já me esforcei por explicar muitas vezes — que as propinas representam, hoje, cerca de 12% a 15% (consoante os anos, mas são desta ordem de grandeza») do orçamento das instituições do ensino superior.
Portanto, é difícil imaginar ser verdade o que diz o Sr. Deputado no sentido de constituírem o essencial das receitas próprias.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — 80% da receita própria!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não constituem o essencial das receitas próprias das instituições, são uma parte.
Por outro lado, pergunta porque ç que não fiz o contrato de confiança antes»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Digamos que não tinha confiança»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — O Sr. Deputado sabe bem que a reforma do sistema do ensino superior se fez na última legislatura. Fez-se uma reforma na governação, no regime de abertura das instituições do ensino superior a novos públicos e a novos estudantes, e, hoje, pela primeira vez, estamos verdadeiramente em condições de fazer este contrato de confiança, que, aliás, constava do Programa de Governo. Foi a votos, Sr. Deputado, não foi uma invenção pós-eleitoral, foi qualquer coisa que estava no programa eleitoral e, depois, no Programa de Governo.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Então, porque é que fez?

Página 113

113 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Portanto, o que estamos a fazer é a cumprir aquilo que anunciámos ao eleitorado nesta matéria.
O Sr. Deputado pergunta onde é que, na lógica orçamental, estão as universidades-fundações. Estão na rubrica relativa à transferência do Orçamento do Estado. Onde tecnicamente não podem estar é nas receitas que recebem para lá do Orçamento do Estado e na despesa que fazem.
Isto é, a transferência do Orçamento do Estado para todas as instituições está em todos os mapas, quer as universidades sejam fundações quer o não sejam e, como sabe, elas são financiadas de acordo com as mesmas regras.
Portanto, a transferência do Estado para as instituições aparece nos mapas da despesa do Estado relativamente às instituições.
Porém, quando, nos mapas do orçamento, registamos aquilo que nos orçamentos privativos de todas as instituições são as receitas ou as despesas estimada para lá da que está no Orçamento, esse é o orçamento privativo da instituição, deixou de fazer parte do Orçamento do Estado.
Portanto, para comparar um ano com outro, é preciso que a receita própria seja abatida do ano anterior nessas instituições. Não é a receita do Orçamento do Estado, porque esta lá, a única diferença é simplesmente esta. Porém, a diferença é bastante grande, porque uma destas instituições é a maior universidade do País, com receitas próprias da ordem dos 100 milhões de euros.
Portanto, é evidente que temos um volume que tem de ser comparável. Ou se fazia um inquérito específico, que não está no Orçamento do Estado, junto de todas estas instituições, para ver quanto é que está nos seus orçamentos privativos, e inscrevíamos aqui, mas tecnicamente estaria incorrecto — conhecemos esses números, são públicos, nada há de esquisito nisto —, ou, então, para efeitos de comparação, abatíamos do ano anterior. Foi isto que foi feito.
Os consórcios, designadamente os que foram avaliados positivamente, estão à espera da execução deste Orçamento do Estado para poderem ser lançados e financiados.
De todos os que foram submetidos, houve quatro consórcios que foram avaliados positivamente nesta fase, com alterações relativamente às suas propostas e com sugestões de modificação significativa relativamente à programação que faziam.
Foi o consórcio Riscos, de que já falei, o consórcio Oceanus, o Espaço e o Física-N. Relativamente a este houve propostas de alteração muito significativas quanto ao indicado pelos proponentes.
Segue-se, agora, com a aprovação do Orçamento do Estado, a negociação final entre a Fundação para a Ciência e a Tecnologia, IP, e os proponentes deste consórcios, à luz das recomendações que foram feitas pelos avaliadores relativamente a todos eles.
Na minha intervenção, chamei a atenção para que daria imediata prioridade ao estabelecimento do consórcio Riscos por razões óbvias e também porque, à luz da avaliação, é um dos consórcios com maior amadurecimento no número e na integração das competências das instituições. Como devem imaginar, não foi fácil o trabalho de juntar, ao longo de dois anos, quatro dos grandes laboratórios do Estado, muitas universidades e dezenas de centros de investigação e de empresas na constituição deste consórcio, cuja importância para o País é tão importante.
Por último, gostaria de comentar a questão dos técnicos. Certamente que lhe passou uma das afirmações que fiz na minha intervenção inicial sobre esta matéria. Temos consciência de que uma nova geração de técnicos em várias áreas de apoio à actividade de investigação é necessária e o esforço passa, em primeiro lugar, por uma renovação da formação desses técnicos. Hoje, os técnicos de apoio à investigação não são a geração de técnicos que constituíam carreiras próprias há 20 ou 30 anos. Posso dar-lhe exemplos da minha experiência profissional em muitas áreas.
Hoje em dia, em primeiro lugar, a actividade de investigação requer técnicos que não estejam estritamente e toda a sua vida naquelas instituições, requer técnicos que tragam para as instituições de investigação em particular a experiência de outras actividades e da actividade industrial e que, depois, levem a nova experiência para essas instituições. A área onde está mais amadurecida a renovação dos técnicos na actividade de investigação, é, certamente, na área das tecnologias de informação e comunicação. Sabemos hoje a importância que tem a presença de técnicos nessas instituições académicas ou instituições de interface.

Página 114

114 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Estamos, naturalmente, de acordo com o objectivo de reforçar e de requalificar os técnicos de investigação, mas que fique absolutamente claro que a prioridade, nestes anos, tinha de ser o reforço da qualidade de investigação, medida pelos investigadores e por aquilo que os investigadores eram capazes de fazer. Este era o elemento central, porque é em função dos programas de investigação que se define a actividade técnica indispensável de apoio à actividade dos cientistas.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Passamos, agora, à 2.ª ronda de perguntas, em que cada grupo parlamentar tem direito a 5 minutos, existindo já inscrições de alguns Srs. Deputados para perguntas de 2 minutos.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, quero, antes de mais, citando V. Ex.ª, dizer que se, por um lado, ao ouvir algumas das intervenções que fizemos, pensou que estávamos a falar de um País diferente, eu, aquando da sua intervenção inicial, pensei que estava a ouvir o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior da Suécia, da Suíça ou da Holanda, também só para citar países que referiu. Felizmente que, depois, ao longo das rondas, acabou, afinal, por reconhecer que nem tudo irá assim tão bem em matéria de ciência, tecnologia e ensino superior.
Mas, como não quero fugir à ordem do dia, tenho cinco perguntas muito concretas para lhe colocar, todas elas centradas no Orçamento do Estado.
A primeira tem a ver com uma questão que também já lhe foi colocada pelo PCP, mas que eu volto a colocar: neste gráfico que lhe mostro podem ver-se os dados oficiais apresentados pelo Ministério das Finanças, que, no fundo, mostram que, em 2009, aprovámos — e, portanto, acho que o Sr. Ministro deve uma explicação a esta Casa — um orçamento para o seu ministério de 2696 milhões de euros e o Sr. Ministro só executou 2175 milhões de euros. Ora, se a ciência é tão importante e o ensino superior também, ficava-lhe bem explicar porque é que houve 521 milhões de euros que ficaram por executar.
Esta questão remete-nos para uma outra, que é a de saber se o orçamento para 2010 é verdadeiramente um orçamento maior ou menor — em termos nominais, é inferior — e qual é taxa de execução que se compromete alcançar para 2010. Estamos aqui a trabalhar sobre valores fictícios e, um ano depois, quando confrontamos a realidade com o planeado, há discrepâncias brutais.
Portanto, se planeou que precisava de 2696 milhões de euros e se teve a conivência desta Assembleia para aprovar o seu orçamento, explique-nos porque é que, afinal de contas, 521 milhões de euros ficaram por executar e qual é o compromisso que assume aqui, em matéria de execução, para 2010, porque é a execução que, verdadeiramente, faz falta.
Gostava agora de me centrar um pouco mais em torno do que é, dentro do orçamento, a realidade das instituições de ensino superior. Em termos nominais, podem ver neste gráfico — e estou a ser generoso — a trajectória ao longo dos vários anos que já leva em funções. Mas, quando converto esta realidade, que bate no fundo em 2007, com o que são, depois, as compensações de Caixa Geral de Depósitos, de aumentos de encargos e de aumento de contribuições para a Caixa Geral de Aposentações, o retrato é um bocadinho diferente — e, como digo, estou a ser generoso com o valor máximo que posso incluir em transferências para instituições do ensino superior em 2010 —, a curva é bastante diferente, é uma curva que eu diria séria enquanto base de discussão, porque, em termos reais, desce a pique até 2008. E, tomando como base de referência o valor de 2005, nós, em 2008, estávamos a viver com 77% e, agora, há aqui um retomar, que se queda nos 90%.
Portanto, o que lhe pergunto, Sr. Ministro, é se tem outros dados para desmentir os que aqui apresento — e são dados que não tentei contorcer, são dados objectivos, é a análise mais fria que posso fazer desta realidade —, se subscreve o que está aqui ou se tem outra realidade para nos apresentar relativamente ao que está a colocar em cima da mesa.
Com isto, quero também sossegar o Sr. Deputado Bravo Nico: quando a OCDE tiver cá as estatísticas com 2007 e 2008, terei todo o prazer também em lhas mostrar. E não vão ser muito favoráveis relativamente a Portugal.
Portanto, pergunto-lhe: é isto ou não? Sente-se confortável? Qual é a lógica de cortar, cortar, cortar, para, depois, abrir uns «furos» no «cinto» que colocou nas instituições de ensino superior? Francamente, não

Página 115

115 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

percebo esta lógica de ter aqui quase umas oscilações, que não sei se são para continuar ou não, com um período que poderíamos calcular se fosse mais ou menos uma sinusóide. Até é intrigante perceber este paradigma de financiamento.
Já agora, em matéria do contrato de confiança, deixe-me dizer que é um bocadinho sui generis. Eu diria que se tenho um amigo, com o qual trabalho há 10 anos, espero já ter criado a confiança suficiente para não acordar um dia e dizer-lhe «vamos assinar um contrato de confiança.» Portanto, em termos de baptismo, há uma coisa que me interroga sempre um bocadinho que é perceber como é que alguém que eu já conheço há tanto tempo — o Sr. Ministro desempenha estas funções há muito tempo —, de repente, sente necessidade, por iluminação divina, de assinar a confiança.
Mas, se queremos ser sérios, já que há um contrato, peço-lhe também para olhar para o que está na nota de rodapé. O Sr. Ministro sabe tão bem como eu que não são 100 milhões de euros, são 88 milhões. Em abono da verdade, está na nota de rodapé que há 12 milhões para a ADSE que são retirados aos 100 milhões.
É uma falácia — e aqui, na oposição, estamos até a ir atrás dessa onda —, porque, em termos líquidos, são 88 milhões de euros, para quem ler atentamente o contrato de confiança. Portanto, já que estamos a falar em confiança, se calhar, era melhor»

O Sr. Presidente: — Falta 1 minuto para terminar o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — » falarmos todos dos 88 milhões de euros e não dos 100 milhões de euros.
Uma última questão no tempo que me resta: porque as questões de ensino superior não se resolvem num único ano, há um outro mapa que também consta do Orçamento do Estado para 2010 que me preocupou.
Agora, cada ministério tem um programa. Embora exista incapacidade da parte dos ministérios de gerir verdadeiramente programas, que não deviam estar interligados com ministérios, e dando isso de barato, agora cada ministério tem um programa.
Ora, o programa plurianual que lhe diz respeito apresenta, não apenas no OE mas na totalidade de recursos a afectar à ciência, tecnologia e ensino superior, cerca de 4000 milhões de euros em 2010, mas, depois, quando vamos ver, a plurianualidade para 2011 e para 2012 é preocupante, é alarmante. Estou em crer que se trata apenas de um erro técnico, não sei se seu se do Ministério das Finanças, mas o certo é que está lá. Portanto, quem olhar para o que se perspectiva para 2011 e 2012, não pode deixar de ficar tremendamente preocupado com o que pode ser o desinvestimento puro.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Termino, Sr. Presidente, com uma última questão, pedindo-lhe, Sr. Ministro, que comente novamente estes dados da OCDE (já que gosta tanto da OCDE): este indicador que lhe mostro é o indicador de financiamento por aluno no ensino superior, em relação ao qual já lhe pedi que comentasse qual pensa que deve ser o futuro de Portugal, em que a nossa posição, como pode ver, não é a da média da União Europeia nem a dos países da OCDE.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Damásio.

A Sr.ª Teresa Damásio (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, convém lembrar nesta Câmara que foi com o Partido Socialista que assinámos a Estratégia de Lisboa, que, verdadeiramente, internacionalizámos a nossa investigação e que foi na anterior Legislatura que, com o Processo de Bolonha, tornámos competitivo e internacionalizámos o nosso ensino superior.
O artigo 165.º do Tratado de Lisboa diz que a União Europeia contribuirá para o desenvolvimento de uma educação de qualidade, incentivando a cooperação entre os Estados-membros e que a acção da União tem por objectivo desenvolver a dimensão europeia da educação (n.º 2).
No relatório do Orçamento do Estado, o Sr. Ministro atribui ao ensino superior um papel muito importante na consolidação das políticas europeias, pois considera-o como um instrumento privilegiado de cooperação internacional, e dá igualmente um destaque particular à lusofonia e à cooperação nos domínios da

Página 116

116 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

investigação com os países membros da CPLP. Diz igualmente que, para concretizar essa internacionalização, irá ampliar o número de bolsas Erasmus e o número de participação de estudantes, professores e funcionários das instituições do ensino superior nos programas europeus de mobilidade.
Pergunto-lhe se, com isto, pretende cumprir o previsto no n.º 2 do artigo 165.º do Tratado de Lisboa e como é que será feita essa ampliação da atribuição de bolsas de mobilidade, se, com isso, o nosso Governo pretende aumentar a nossa competitividade em termos europeus e também em termos transeuropeus e como é que se pode incentivar as instituições de ensino superior na expansão dos contratos de cooperação internacional.
Recordo que, neste domínio, seria extremamente relevante — e penso que isso está nos horizontes deste Orçamento do Estado — o incentivo e a cooperação das nossas embaixadas, através da diplomacia económica e nos domínios da educação e da investigação, na colaboração com as instituições de ensino superior, facilitando a informação acerca de feiras do ensino superior que se realizam regularmente em várias áreas geográficas do globo, disponibilizando apoio institucional e logístico.
É conhecido de todos o interesse que há no continente asiático, no Médio Oriente e no Magreb pela língua e culturas portuguesas. Há muitas feiras de recrutamento nesses países e seria muito importante para as instituições de ensino superior portuguesas terem oportunidade de estarem presentes, poderem apresentar os seus projectos educativos, e, assim, aumentarem o recrutamento por parte das instituições respectivas, mas também, naturalmente, do ponto de vista nacional, dos alunos internacionais.
Como sabemos, é isso que, na actualidade, fazem muitas instituições de ensino superior europeias, nomeadamente do Reino Unido, da Alemanha, da Espanha, do Benelux e dos países escandinavos.
O Sr. Ministro fala-nos, igualmente, em renovar o compromisso com a ciência e com o desenvolvimento tecnológico. De facto, em 2008, a despesa pública atingiu um nível histórico, assim como o número de investigadores, que foi de 7,2 por cada 1000 activos, quando, em 1998, era de 3 por cada 1000 activos.
A percentagem de graduação na faixa etária relevante com o título de doutor era de 1% em 2000 e passou, em 2006, para 3,3%, a maior da OCDE. E congratulamo-nos, a este título, com a alteração ao incentivo fiscal à contratação de doutorados pelas empresas.
A produção de patentes é o indicador de excelência e incontornável da medida do impacto económico do aparelho científico e tecnológico. A média na Europa, no que respeita a este indicador, é 95 patentes/ano por milhão de habitantes (OCDE, EUROSTAT, Thomson Reuters).
Sabemos que há patentes de investigadores portugueses registadas noutros países. O que poderemos fazer para aumentar o registo dessas patentes em Portugal? Considera o Sr. Ministro que a inclusão da produção de patentes e das actividades empresariais nos factores de promoção na carreira docente do ensino superior e dos investigadores seria relevante, bem como o aumento da produção do financiamento público da investigação no sector privado? Ou ainda a concentração de instituições públicas de investigação em grandes centros a articular com as grandes empresas?

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que abrevie, pois já esgotou o tempo.

A Sr.ª Teresa Damásio (PS): — Por último, gostava de lhe perguntar de que forma é que o Programa Ciência Global para a CPLP contribuirá. Estou certa de que é isto que está na mente do Sr. Ministro para brain gain e não para brain drain.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, passo a colocar-lhe algumas questões.
Gostaria de voltar a uma questão que levantei há pouco acerca das dotações para a acção social indirecta, nomeadamente o investimento em infra-estruturas nos serviços de acção social, tais como cantinas e alojamentos, relativamente às quais não encontramos verbas consignadas no PIDDAC. Não sei se estão previstas noutros números do Orçamento do Estado que não estejamos a ver. Parece-nos que estes são investimentos que por vezes são esquecidos, porque lembramo-nos das bolsas da acção social directa e

Página 117

117 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

esquecemo-nos desta forma de fazer acção social, que é muito importante para o bem-estar dos nossos estudantes.
Gostaria também de lhe falar dos bolseiros de investigação e dos valores das suas bolsas, que, como sabe, Sr. Ministro, não têm sofrido actualizações ao longo dos anos, creio que desde 2002. Estamos a falar de pessoas que recebem bolsas para preencher necessidades que seriam normalmente supridas por contrato, porque a verdade é que estão a prestar serviços. Estamos a falar de pessoas que, muitas vezes, estão a ser usadas como funcionários de investigação ao abrigo de bolsas. Em todo o caso, seja como for, e independentemente das condições (não vale a pena entrarmos agora por aí), a verdade é que as bolsas para investigação não têm sido actualizadas desde 2002, voltando a não estar prevista qualquer actualização.
Em relação ao contrato de confiança, gostaria de lhe perguntar, Sr. Ministro, se vamos entrar por um caminho em que os politécnicos se vão especializar nos CET (cursos de especialização tecnológica), deixando para as universidades as pós-graduações e os mestrados — os doutoramentos já lá estão —, ou se vão equilibrar as vagas. Esta é uma pergunta que lhe fiz há pouco, mas agradecia que o Sr. Ministro pudesse voltar a referir-se a ela.
Gostaria, entretanto, de salientar que o aumento de vagas em cursos paralelos no ensino universitário leva à perda de candidatos para o politécnico. O Ministério não deverá esquecer-se deste aspecto na avaliação que vai fazer.
Por fim, gostaria de voltar a uma questão de que falámos na última vez que o Sr. Ministro aqui esteve e que tem a ver com a agência de acreditação. Creio que o Sr. Ministro disse, na altura, que queria ter os cursos todos acreditados até ao final de 2011.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — É a vontade da lei!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Com certeza, nem é a sua vontade, é a vontade da lei. Mas estamos a falar de cerca de 4000 cursos, grosso modo, para serem avaliados em (vamos ser benévolos) dois anos, o que se traduz numa média de talvez seis cursos por dia. A minha pergunta é se o Sr. Ministro continua a achar que isto é possível. Como prevê que funcionará a agência de acreditação com prazos desses e com essa quantidade de cursos a acreditar?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, creio não demonstrar qualquer agressividade na forma como me dirijo a si. Manifesto, sim, indignação.
Gostaria de voltar à questão do estádio universitário por uns segundos. Em 2009, Sr. Ministro, uma instituição que depende do seu Ministério decidiu não fazer contrato com 100 trabalhadores, que continuam a trabalhar a recibo verde. E eu gostaria de perceber, Sr. Ministro, por que é que não os contratou em 2009, se eles são necessários. Esta questão indigna-me, porque me parece indecente que estes 100 trabalhadores estejam lá — alguns há 10 anos — e que em 2009 não tenham sido contratados e tenham sito «chutados» para uma empresa para continuarem nas mesmas funções. Ora, penso que isto é da sua responsabilidade, Sr.
Ministro, porque em 2009 decidiu não os contratar, e eu gostaria de perceber porquê. É que a precariedade tem sido promovida pelo Estado e eu penso que isso é inaceitável, até porque isto vai contra as próprias declarações do Governo.
Em segundo lugar, muito me surpreende, Sr. Ministro, que um Governo tão aflito com as suas próprias conversas telefónicas ou com conversas telefónicas dos seus membros faça dos telefonemas do Bloco de Esquerda tema de conversa nas reuniões que tem com responsáveis de instituições públicas. É interessante e surpreende-me, mas devo dizer-lhe que até fico agradado. Na verdade, agrada-me que as conversas telefónicas que o Bloco de Esquerda mantém com os responsáveis dos serviços de acção social sejam tornadas públicas nas reuniões do Governo, como aqui referiu, até porque isso prova que temos preocupações nesta matéria. Na verdade, temos falado com todas as pessoas que querem responder a este problema que para nós é da maior importância e, por isso, ficamos contentes que a nossa preocupação chegue ao Governo pela voz que aqui temos na Assembleia da República, mas que chegue também ao Governo pela voz dos próprios responsáveis dos serviços de acção social.

Página 118

118 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Ficamos sempre contentes quando as nossas preocupações são tema de conversa e são consideradas e, sobretudo, quando as nossas propostas são acolhidas. Já propusemos aqui desburocratizar os processos das bolsas, já propusemos mexer nos escalões e esperamos que isso avance. Ficamos contentes que o Governo responda às preocupações que já colocámos e ficaríamos ainda mais contentes se o Governo mudasse o conceito de agregado familiar que existe no regulamento das bolsas, avançasse para um modelo mais próximo do modelo linear para o cálculo das bolsas e alterasse o conceito de «estudante economicamente carenciado» para mais gente poder beneficiar da acção social em Portugal.
Sobre a acção social, gostava também de lhe dizer, Sr. Ministro, que o seu Governo negociou com o CDS e com o PSD um Orçamento do Estado que tem menos investimento público. As verbas do PIDDAC, a nível nacional, descem cerca de 30%. Em alguns distritos, como é o caso do Porto, descem mais de 80% e em Bragança mais de 90%. Isso significa que não vai haver dinheiro para a manutenção ou construção de cantinas e residências. Por exemplo, na Universidade do Porto, no Pólo II — Desporto, Psicologia e Ciências da Educação, Economia, Engenharia, Medicina, Nutrição —, estão muitos milhares de estudantes. Há 300 camas para esse Pólo. Era preciso uma nova residência, mas não vai haver dinheiro para tal.
No Complexo Alimentar do Pólo II da Universidade de Coimbra o estado das canalizações coloca em perigo a saúde dos estudantes. Eram precisos cerca de 100 milhões de euros para substituir os tubos existentes por tubos de inox e para reparar as deficiências. Mas não vai haver dinheiro para isto no seu orçamento, Sr. Ministro. Há uma residência em Coimbra que tem oito andares, que não tem elevador, mas não vai haver dinheiro para isso no seu orçamento, Sr. Ministro.
Em Guimarães, há residências que estão deterioradas, que têm quartos fechados porque chove lá dentro (o mesmo acontecendo em Coimbra) e não vai haver dinheiro para fazer as obras. Não vai haver dinheiro, por exemplo, para alargar os horários de funcionamento destes serviços, nomeadamente das cantinas. Os serviços de acção social da Universidade do Minho dizem-nos que, para responder ao alargamento dos horários e aos novos públicos, nomeadamente para alterar os horários das cantinas, dos serviços de apoio a estudantes e docentes, precisavam de 70 000 €. Mas não vai haver dinheiro para isto no seu orçamento e no PIDDAC, Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Já só dispõe de 1 minuto, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Obrigado, Sr. Presidente.
Termino, colocando duas questões sobre a investigação e a qualificação.
O Sr. Ministro presume que não está disponível neste orçamento para actualizar as bolsas de investigação, que não são actualizadas desde 2002, ou seja, há sete anos que não sofrem actualização alguma. Essa actualização seria uma medida de justiça para com os investigadores. Gostaria de saber a sua opinião sobre isso.
Por outro lado, gostaria de saber que verbas e que apoios vão existir, nomeadamente do tipo que houve com o PROTEC, para a qualificação dos professores do politécnico que vão ter de fazer agora doutoramentos para se qualificarem, devendo ter condições de os fazer com dispensa de serviço, beneficiando de uma ajuda ou de um apoio em termos de dispensa de serviço para poderem fazer a sua formação e os seus doutoramentos.
Sr. Ministro, gostaria de o ouvir sobre estas matérias.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior falounos aqui, com alguma consternação, da preocupação do PCP (exagerada, na opinião do Sr. Ministro) relativamente ao Orçamento do Estado que hoje aqui nos apresenta. Só que, de facto, não se trata de uma preocupação desajustada. É a realidade que nos leva a não ter vontade de sorrir perante este Orçamento do Estado quando se percebe que não vai ser possível resolver o problema do Pólo dos Leões, na Universidade de Évora, nem os problemas das condições materiais da Faculdade de Ciências de Lisboa, nem os problemas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, nem a falta de condições materiais e humanas da faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, nem os problemas do Pólo II da

Página 119

119 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Escola Superior de Educação de Coimbra, nem os problemas do Instituto Politécnico de Tomar nem do Instituto Politécnico de Setúbal, nem vai ser possível garantir as condições adequadas à Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.
Portanto, perante esta nova realidade, não podemos estar contentes e a pular de felicidade relativamente ao que aí vem, porque ouvimos a preocupação dos estudantes, ouvimos a preocupação dos professores, ouvimos a preocupação dos funcionários, que dizem que com este orçamento não é possível sobreviver em condições de dignidade para o ensino superior público em Portugal.
De facto, o Sr. Ministro tem feito, creio eu, a proeza de, com números tão baixos e tão abaixo das necessidades reais das escolas, poder dizer que tem sido feito muito com muito pouco. Isso acaba por revelar que, com um orçamento e com um financiamento digno, seria possível certamente fazer muito mais. Na verdade, se houvesse essa vontade política de encarar a educação e o ensino superior como uma prioridade, seriam certamente muito melhores os resultados que temos no nosso país.
Na anterior audição, quando questionado sobre a questão dos empréstimos bancários e sobre se haveria já por parte do seu Ministério alguma avaliação relativamente a este impacto, o Sr. Ministro direccionou-nos para o site da Direcção-Geral do Ensino Superior, que contém o estudo relativamente a esta matéria. Mas o estudo não nos podia deixar menos preocupados.
A verdade é que a situação de 11 000 empréstimos no valor de 130 milhões de euros significa que estes estudantes não puderam aceder ao ensino superior sem recorrer ao endividamento. Estes estudantes vão ter de pagar o empréstimo um ano depois de terminarem a sua formação. E o que lhe pergunto, Sr. Ministro, é se, face aos números do desemprego, nomeadamente entre os recém-licenciados, como é que encara esta possibilidade de pagamento de um endividamento, logo à partida, para a sua formação.
Esse estudo acaba por concluir as origens sociais destes estudantes e diz, nas páginas 13 e 14, que existe um duplo padrão de recrutamento social: a presença simultânea de estudantes oriundos de famílias com inserções profissionais mais remuneradas e de pais e mães com menos recursos escolares e económicos.
Sr. Ministro, perante a evidência de 11 000 empréstimos bancários (130 milhões de euros), o Sr. Ministro não considera que um financiamento adequado para o ensino superior público que não asfixiasse as instituições e conduzisse a um aumento no valor da propina era fundamental. É que estes 11 000 empréstimos foram fundamentais para o não abandono destes estudantes do ensino superior. Portanto, o artigo 74.º da Constituição, que diz que cabe ao Estado contribuir para a gratuitidade tendencial em todos os graus de ensino, acaba por ser comprometido.
Ainda sobre a questão dos bolseiros de investigação científica, o Sr. Ministro, em anterior audição, falounos em falta de fiscalização e disse que o problema desses bolseiros existia. E se existiam, de facto, situações em que bolseiros de investigação científica desempenhavam funções de investigadores, de apoio à docência, de apoio à investigação, de assistentes administrativos, era porque havia falta de fiscalização nas instituições.
Havendo ou não falta de fiscalização, o que acontece é que estes investigadores estão lá e são eles que garantem o dia a dia dessas instituições.
Sr. Ministro, passo a apresentar-lhe um exemplo muito concreto: no ITN, de Lisboa, aqueles trabalhadores, tendo o estatuto de bolseiros de investigação científica, quando se deslocam à cantina não têm direito ao almoço ao mesmo preço que os outros trabalhadores, tendo de pagar o preço de visitante. O Sr. Ministro não encara isto como uma injustiça social? Este é um simples exemplo, mas que revela e exige o reconhecimento desta situação e, no entender do PCP, a resolução desta matéria.
No Programa do Governo está inscrita uma premissa que fala do alargamento da rede de residências universitárias cuja gestão seria feita em parceria com as associações de estudantes. O PCP entende que as associações de estudantes não têm, de facto, condições financeiras para gerir uma residência universitária.
Tenho mesmo muitas dúvidas de que o consigam fazer, desde logo porque o seu objectivo primeiro não é o de gerir o património e os serviços de acção social indirectos. Mas a questão que lhe coloco é a de saber qual o reflexo orçamental que esta medida tem no orçamento do seu Ministério, porque, de facto, não conseguimos encontrar este princípio inscrito e, portanto, gostaríamos de perceber se o Sr. Ministro nos pode elucidar relativamente a esta matéria.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente da Comissão de Educação e Ciência, Luiz Fagundes Duarte.

Página 120

120 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr.ª Deputada.
Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, se me dá licença, nesta segunda ronda há um conjunto de questões de 2 minutos e pelo menos o nosso grupo parlamentar deu indicação à Mesa de quem seriam os Deputados que as iriam formular. Depois, o Sr. Ministro responderá em bloco e, a seguir, haverá uma terceira ronda de perguntas. Pelo menos foi assim que, há pouco, ficou estabelecido.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Estou à vossa disposição, como é evidente.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Muito bem, Sr. Ministro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, quer que repita os nomes de que demos indicação à Mesa?

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Não, Sr. Deputado.
Em face desse tempo, devo lembrar que, depois, o Sr. Ministro, além dos 25 minutos de que dispõe para responder, terá mais 16 minutos para, se assim o entender, completar a sua intervenção.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa, posso só perguntar-lhe se também dispõe de indicação dos Deputados que, da parte do nosso grupo parlamentar, se inscreveram?

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Inscreveram-se oito Deputados.
Não tenho inscrições do Bloco de Esquerda, mas deduzo que o Sr. Deputado José Soeiro não prescinde de usar os seus preciosos 2 minutos.

Pausa.

Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Sofia Cabral.

A Sr.ª Sofia Cabral (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, no final do debate, já longo, do dia de hoje, há uma necessária conclusão que devemos tirar: o papel do ensino superior e o papel que as instituições têm hoje, na sociedade e no desenvolvimento do nosso País, é absolutamente indiscutível e consensual entre todos.
Mas, para além dos números e das questões ligadas ao seu financiamento, o desenvolvimento e o progresso ocorrido nas instituições de ensino superior traduziu-se numa dimensão social que não pode nem deve ser esquecida e que gostaria de destacar aqui, neste debate.
Com a aposta no ensino superior, foi possível garantir mais formação para mais alunos, reforçar a abertura social do ensino superior a novas camadas de estudantes jovens e à população activa, proporcionando os apoios sociais necessários, reforçando a qualidade, a relevância das formações, a empregabilidade, a ligação cada vez mais próxima entre o ensino superior e a vida económica, social e cultural do nosso País.
No fundo, há hoje toda uma nova realidade social só possível devido à aposta e ao desenvolvimento ocorrido nos últimos anos no ensino superior.
Esta dimensão, que hoje aqui destaquei — a qualificação superior dos portugueses —, é, sem dúvida, uma das maiores conquistas sociais ocorridas em Portugal.
Para garantirmos um ensino superior verdadeiramente participado e democrático, devemos ter uma preocupação central: o apoio aos estudantes e às suas famílias, isto é, a acção social escolar, já hoje tão debatida nesta reunião.
O Orçamento do Estado que agora analisamos reflecte e reforça as medidas tomadas na anterior Legislatura e consagra o Contrato de Confiança, assinado já em 2010 entre este Governo e as instituições de ensino superior.

Página 121

121 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Assim sendo, e tendo por base os pressupostos já enunciados por mim anteriormente, gostaria de colocar a V. Ex.ª, Sr. Ministro, três questões.
Em primeiro lugar, pergunto: que medidas está neste momento o Governo a desenvolver e que estão, por sua vez, consagradas neste Orçamento do Estado tendo em vista o fomento e a melhoria dos serviços de acção social no sentido de aumentar os apoios directos e indirectos aos estudantes do ensino superior, tendo em vista a necessária justiça e equidade social? O Sr. Ministro referiu, no seu discurso, que estão previstas medidas para simplificar»

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Sr.ª Deputada, ultrapassou o tempo de que dispunha.

A Sr.ª Sofia Cabral (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, o Sr. Ministro referiu, no seu discurso, que estão previstas medidas para simplificar a atribuição de bolsas, desburocratizando, de alguma forma, os procedimentos actuais e diminuindo os tempos de espera na atribuição das mesmas por parte das universidades.
Assim sendo, gostaria que o Sr. Ministro nos enunciasse e explicitasse mais em concreto de que forma e para quando essa necessária implementação.
A terceira e última pergunta que quero colocar ao Sr. Ministro é no sentido de saber se está previsto, neste Orçamento do Estado, o reforço do número de bolsas Erasmus, tendo em vista o aumento da mobilidade dos estudantes portugueses na Europa.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Jesus.

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em primeiro lugar, enquanto madeirense, gostava de agradecer as suas palavras de solidariedade neste momento difícil para a Madeira e os madeirenses. Todos têm sabido superar as diferenças, e não poderia ser de outra forma, unindo-se neste objectivo de auxiliar a Região e, sobretudo, as pessoas que tiveram perdas materiais e humanas.
Relativamente à discussão de hoje, quando falamos, de ano para ano, nas dificuldades das instituições de ensino superior, é notória a crescente preocupação por mais financiamento — isso já aqui foi hoje discutido.
Muitas delas «vendem» a manutenção desse financiamento, ou mesmo reforço de verbas através do tal aumento de vagas, que não corresponde, na verdade, à capacidade real de admissão das universidades mas resulta, sim, da asfixia financeira em que as universidades hoje vivem. É a esta visão economicista sobre o estudante — de quanto mais vagas mais cabeças; logo, mais dinheiro para a instituição — que continuamos a assistir, em detrimento da qualidade dos cursos ministrados.
Este aumento de vagas tem sido notório e preocupante no acesso ao ensino superior e para o seu Ministério, Sr. Ministro, é um indicador de sucesso. Mas entendo que não é, porque o número de alunos que entra não é indicador de sucesso. Indicador de sucesso é, sim, como terminam a sua formação e quais as suas perspectivas de futuro, nomeadamente a sua integração no mercado de trabalho. Hoje, o que sentimos, Sr. Ministro, é que há saturação do mercado da oferta formativa universitária, o que é notório pelo constante aumento de desemprego jovem qualificado.
Neste cenário, continuamos a não compreender que, até à data, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior não tenha uma estratégia de formação adequada às reais necessidades do mercado de trabalho.
Por isso, Sr. Ministro, sabendo que existem inúmeros cursos ministrados em Portugal, aliás, num cenário de que já hoje aqui falámos, centenas de cursos de tronco comum mas com designações diferentes — não diria, como o Deputado Miguel Tiago, que são as tais sanduíches, mas que são consequência de um cozido à portuguesa ou, melhor, de um cozido à bolonhesa, derivado do Processo de Bolonha, que, na verdade, deixa o reconhecimento de certas licenciaturas duvidoso —, nesta linha de pensamento,»

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Faça o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — Termino, Sr. Presidente.

Página 122

122 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Como estava a dizer, nesta linha de pensamento, gostaria de saber o que é feito do Observatório do Emprego, de que tantas vezes o Sr. Ministro falou e prometeu e, até hoje, nada mais soubemos, designadamente se está ou não em funcionamento e que medidas pretende tomar para avaliar as taxas de empregabilidade e sucesso do ensino.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, uma notícia recente deu conta de que uma aluna da Universidade do Minho perdeu a sua bolsa de estudo e que, por isso mesmo, pode até deixar de continuar a estudar. O que é estranho é que, simultaneamente, esta aluna tem duas irmãs na Universidade do Porto que continuam a ter bolsas de estudo. Pensava que os critérios eram idênticos, mas a Universidade do Minho veio justificar e garantir que é possível que isto aconteça, porque, aparentemente, os critérios não são idênticos para todo o ensino superior. Gostaria que o Sr. Ministro esclarecesse esta questão.
Sr. Ministro, quero colocar-lhe duas questões ligadas ao desenvolvimento de infra-estruturas de dois estabelecimentos de ensino superior do distrito de Braga.
Quanto ao Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, pergunto-lhe qual é a perspectiva temporal — é uma questão de que falamos há muito — para a residência de estudantes do Instituto, para a sua biblioteca e para a escola superior de tecnologia, cuja localização, aliás, veio a ser reivindicada recentemente pelo Sr.
Governador Civil de Braga, no sentido de se situar em Vila Nova de Famalicão. Gostaria de saber se há alguma perspectiva. Admito que sim, porque, se não, o Sr. Governador Civil não avançaria com tal coisa.
Relativamente à Universidade do Minho, Sr. Ministro, pergunto-lhe também qual é a perspectiva temporal para a concretização de velhos projectos de infra-estruturas desta Universidade, inscritos, durante muitos Orçamentos do Estado, em PIDDAC e, agora, que se saiba, nem em PIDDAC nem em QREN. Refiro-me, por exemplo, à biblioteca de Azurém, em Guimarães, à escola superior de enfermagem e à sede da associação académica daquela Universidade.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Nuno Miguel Araújo.

O Sr. Nuno Miguel Araújo (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, todos conhecemos a profunda reforma promovida pelo PS, ao longo dos últimos anos, no ensino secundário, sendo de destacar, desde logo, a valorização dos cursos técnico-profissionais, há muito abandonados pelos governos de direita. Esta aposta captou jovens para a prossecução dos estudos e, consequentemente, o aumento do número de alunos no ensino secundário.
Paralelamente, o programa Novas Oportunidades irá também permitir que milhares de jovens portugueses e milhares de portugueses concluam e obtenham o 12.º ano de escolaridade.
Este reforço da oferta e da qualidade do ensino pré-universitário deve ser acompanhado, como tem sido, de uma forte aposta no ensino superior.
Por isso, Sr. Ministro, de que forma é que este Orçamento irá dar resposta e continuidade às políticas seguidas pelo Ministério da Educação, por exemplo no que tem a ver com os cursos de especialização tecnológica referidos no Contrato de Confiança? Por último, Sr. Ministro, já foi aqui abordada várias vezes a questão da acção social escolar e o PS congratula-se pelo aumento anunciado, que está previsto no Orçamento do Estado, mas gostaria de saber de que forma é que o Ministério está a pensar em duas situações muito particulares: a dos trabalhadoresestudantes mais necessitados e a das famílias monoparentais.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, quero colocar duas questões muito concretas, uma das quais tem a ver com a dita sociedade da informação, nomeadamente com a Web, a World Wide Web e a gestão e políticas comerciais que são permitidas no

Página 123

123 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

quadro europeu e internacional, no tráfego de comunicações, e outra, mais concreta, tem a ver com o distrito pelo qual sou eleito, concretamente com o distrito de Setúbal.
Muito recentemente, Sr. Ministro, tem havido novos desenvolvimentos sobre aquilo que é chamado a «neutralidade da rede», isto é, há uma política muito antiga, que está na própria génese da Internet, no próprio código genético, digamos assim, da World Wide Web, no sentido de que as comunicações não dependem dos conteúdos, no que diz respeito à sua cobrança, ao investimento na rede, etc. Muito recentemente, tem havido movimentações muito significativas e preocupantes, ao nível das grandes operadoras nacionais e transnacionais neste sector e da parte das autoridades, nomeadamente da Grã-Bretanha, com alguma influência que se está a desenhar no quadro da União Europeia, e esta questão começa a ter algum caminho aberto, o que é muito preocupante, no sentido da discriminação do conteúdo, para efeitos de cobrança, e já não vamos mais longe, no que diz respeito à proibição do acesso, a questões da dita propriedade intelectual, dos DRM (Digital Rights Management), etc. Gostava de perguntar, muito concretamente, qual é a posição do Governo português em relação a esta matéria, até porque terão de ser tomadas decisões em concreto, penso eu, ao nível do Conselho da União Europeia.
Para terminar, Sr. Presidente, e chego agora ao fim, gostava de saber qual é, da parte do Sr. Ministro, da parte deste Governo, a perspectiva em relação a duas instituições e a dois investimentos muito importantes ao nível no ensino superior no distrito de Setúbal. Estou a pensar na transferência da Universidade Aberta para o concelho do Seixal, cujo investimento tem sido, durante muito tempo, acompanhado e tratado com a participação da própria instituição e com antecessores seus no governo, para a qual já foram encontrados e cedidos terrenos e encontradas soluções, mas estas ficaram na gaveta ao longo dos anos.
Pergunto o mesmo relativamente a um outro aspecto, que também tem tido alguma abertura e algum trabalho em conjunto com as instituições, designadamente com o próprio hospital, no que diz respeito ao concelho de Almada, que é, digamos assim, a instalação de um pólo do ensino da medicina, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, no campus da Universidade Nova de Lisboa, na margem Sul do Tejo, Caparica, concelho de Almada, em articulação com o hospital que ali bem perto funciona.
Gostaria de conhecer, da parte do Sr. Ministro, a resposta e a posição do Governo sobre estas duas perspectiva muito concretas para o distrito de Setúbal.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Agora, tem a palavra o Sr. Deputado José Ferreira Gomes.

O Sr. José Ferreira Gomes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, a tarde vai longa,»

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Já é a noite!

O Sr. José Ferreira Gomes (PSD): — » ou a noite, e não quero deixar de celebrar — estou há relativamente pouco tempo nesta Assembleia, mas uma das primeiras coisas que percebi foi que o Sr. Ministro Mariano Gago nunca respondeu a qualquer pergunta que lhe tenha sido posta, e esta visão não é só da minha bancada, é, aparentemente, partilhada por outras bancadas — o facto de hoje ter respondido, das cinco questões que coloquei, pelas minha contas, a uma questão e meia, pelo que me sinto particularmente honrado.
Dito isto, e em tom mais sério, quero dizer-lhe que partilho consigo a preocupação com o reforço da educação ao longo da vida, da aprendizagem ao longo da vida, particularmente ao nível universitário.
Portanto, os meus comentários iniciais não pretendem denotar nada de negativo em relação a este aspecto, onde, reconheço, Portugal tem um défice muito grande.
O que já me parece mais difícil, pelo que tem vindo a público, é esperar que haja sucesso com as estratégias que estão a ser seguidas. Isto é, não acredito que duplicando, para as 8 horas da noite, algumas dezenas de cursos desenhados para jovens de 18 anos e para as 9 horas da manhã tenhamos algum sucesso na atracção de públicos de outra faixa etária, porque a procura é diferente, é preciso outro tipo de cursos para este outro público. Creio que isto também falta nos estímulos.
Gostaria ainda de repor as questões que coloquei inicialmente.

Página 124

124 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Em relação às universidades-fundação, acho que seria muito importante para o nosso sistema que o Sr.
Ministro se arriscasse a dizer qual é a sua estratégia: é simplesmente de desorçamentação? É de diferenciação do sistema? Ou é outra, eventualmente? Quanto à situação da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), pergunto se, com o seu optimismo, poderemos ter esperança nos financiamentos — e aqui, seguramente, partilho consigo a opinião de que temos de manter um esforço nacional, uma prioridade nacional, nesta janela de oportunidade, que, eventualmente, teremos de desenvolver no País, através de mais ciência, com tudo o que isto acarreta, pois não é só publicar papers naturalmente —, se poderemos ter a expectativa de que a Fundação funcionará de uma maneira mais previsível, aliás, de acordo com os desejos do seu Presidente.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Passo, agora, a palavra, para terminar, porque uma das pessoas inscrita não se encontra na sala, à Sr.ª Deputada Carla Rodrigues.

A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, a aposta na inovação e na sociedade da informação e do conhecimento como meios para a inovação na economia e para a inovação social são prioridades do PSD. Por isso, vimos com alguma preocupação o orçamento do seu Ministério nesta área em particular.
Analisado o orçamento do Ministério de V. Ex.ª, verifica-se uma dramática redução da verba destinada à UMIC (Agência para a Sociedade do Conhecimento), de 71,1 milhões, em 2009, para 29,5 milhões, este ano.
O presidente da UMIC já admitiu que este não é um orçamento de expansão mas, sim, de manutenção. Sei que o Sr. Ministro vai dizer que esta quebra orçamental se deve ao fim do QCA III. Porém, o objectivo de transformar Portugal numa moderna sociedade do conhecimento não foi ainda alcançado e já entrámos em velocidade cruzeiro.
Pergunto: quais são as prioridades concretas do Sr. Ministro na área da sociedade do conhecimento? O Sr.
Ministro entende que essas prioridades têm a correspondente previsão orçamental?

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Para responder globalmente às questões, tem a palavra o Sr.
Ministro, dispondo, para o efeito, de um total de 39 minutos, 25 minutos do tempo inicial e 14 minutos de agora, mas não é obrigado a usar todo o tempo, como é óbvio.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, a última parte da intervenção de V. Ex.ª foi a mais interessante, a de que «não é obrigado a usar».

Risos.

Parece-me que ainda haverá mais uma outra ronda» Não ç possível juntá-las já?

Vozes do PSD: — Não!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Prometo que reduziria ainda mais a minha resposta, pois já são 21 horas e 30 minutos»

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, vou tentar satisfazer a sua sugestão, a de não usar todo o tempo de que disponho, e, para ser breve, tomarei simplesmente como base as notas que pude tomar das intervenções.
Logo no princípio houve algumas questões, que, julgo, foram abordadas pelo PSD, relativas a dados da OCDE sobre despesa por estudante.
Os dados da OCDE sobre despesa por estudante dizem respeito à totalidade da despesa, não dizem respeito às transferências do Orçamento do Estado, etc. Dizem respeito apenas à totalidade da despesa. Em Portugal, os números mostram que a despesa por estudante tem estado, no sector público, de uma forma

Página 125

125 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

aproximadamente constante, a 1,2% do PIB — basta dividir a totalidade da receita arrecadada pelas instituições, nas contas fechadas das instituições, pelo produto interno bruto do ano — e cerca de 1,4% quando se considera o ensino privado, com as informações de que se dispõe neste momento.
No que diz respeito ao contrato de confiança e à ironia que foi feita, julguei que os Srs. Deputados tinham entendido que se tratava de um contrato de confiança do País para com o ensino superior e não de um contrato de confiança do Governo para com as instituições do ensino superior, e vice-versa. Trata-se da confiança que o País deve ter para ir estudar, para estudar mais, e da confiança que as instituições devem ter na vontade de ensino superior e de formação superior. E esta é uma grande mudança na sociedade portuguesa, que deixou de encarar o seu sistema de ensino superior como um sistema para poucos e passou a encarar o sistema de ensino superior como, idealmente, um sistema de formação básica para as futuras gerações.
Por outro lado, foram levantadas algumas questões técnicas sobre a execução. A execução foi, de facto, maior. A execução que está indicada no Relatório do Orçamento, mas não entrarei aqui em detalhes, é aquela que foi prevista em Novembro. Aliás, no nosso próprio documento, que enviámos, já temos a execução do ano passado, que é superior a essa, como não poderia deixar de ser.
Agora, há uma diferença na inscrição de fundos comunitários, que é diversa em 2010 e em 2011. Posso dar-lhe vários exemplos: tínhamos inscrito fundos comunitários, no orçamento do Ministério, em 2009, para o INL (Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia) e retirámo-los por ser completa e tecnicamente incorrecto; os fundos comunitários vão directamente do PO Norte (Programa Operacional Regional do Norte) para o INL e não entram no orçamento do Ministério. E isto multiplica-se em todos os sectores.
Por outro lado, relativamente ao ensino superior, os dados de utilização de fundos que o Sr. Deputado apresentou não contemplam os saldos das instituições de ensino superior, nem o uso desses saldos por parte das instituições na despesa. Mas tenho todo o gosto em discutir tecnicamente esta questão com o Sr. Deputado.
Contudo, a principal diferença é a da inscrição dos fundos comunitários. Se olhar para os fundos nacionais do Orçamento do Estado e outras receitas, fará a comparação mais correcta.
Depois, foram-me feitas — e estou a tentar seguir a ordem das questões —, por Deputados do Partido Socialista, algumas perguntas sobre a ampliação das bolsas Erasmus. Neste momento, a limitação na ampliação de bolsas Erasmus deixou de estar no financiamento das bolsas. Temos dois mecanismos que criámos: um, o aumento da dotação disponível e, um outro, o aumento em 50% das bolsas para os estudantes que sejam beneficiários de bolsa de acção social. Não só é garantida a portabilidade da bolsa de acção social como eles têm, enquanto forem estudantes Erasmus, uma bolsa Erasmus, que é acrescentada em 50%, porque sabíamos que os estudantes mais carenciados tinham mais dificuldades em ter mobilidade Erasmus.
O que detectámos como principal dificuldade nesta matéria para um aumento foi a ampliação dos acordos internacionais entre as instituições portuguesas e as dos outros países, acordos de reciprocidade para aumentar as bolsas. E estamos a fazer apelo às próprias instituições para que aumentem. Não existe neste momento, insisto, e esperamos consegui-lo muito rapidamente, a duplicação das bolsas Erasmus, como consta no Programa do Governo. O nosso objectivo não é atrasar isto até ao final da Legislatura, é, logo que seja possível, atingir este patamar.
Foi levantada uma questão particularmente interessante e que tem a ver com, no que toca à atracção de estudantes de pós-graduação na Ásia, a comparação entre Portugal e outros países europeus no que respeita à actividade extremamente agressiva de muitas instituições de ensino superior na Ásia. Hoje, as instituições de ensino superior portuguesas começam, ao cabo desta reforma, a ter condições para enfrentar este desafio, e algumas já estão a fazê-lo. É, de facto, nosso objectivo generalizar este movimento.
Chamo a vossa atenção — e não tive tempo de o fazer na minha intervenção inicial — para uma das medidas mais importantes que está a ser desenvolvida no Ministério, no que diz respeito à formação avançada com países da CPLP. Este foi um assunto longamente debatido e foi, na reunião dos ministros da CPLP, que se realizou em Agosto passado, objecto de uma proposta formal do Governo português à UNESCO, para a criação de um centro de categoria dois para formação avançada que visasse responder a um dos principais problemas internacionais que está por resolver: o apoio à formação avançada não ser uma contribuição líquida para a fuga de cérebros e de capacidades dos países beneficiários. Este é um problema que está internacionalmente por resolver, tive ocasião de o discutir na Conferência Mundial sobre Ensino Superior e a

Página 126

126 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

nossa proposta — que está, neste momento, em cima da mesa, que já foi aprovada pelo comité das ciências da UNESCO e que irá certamente ainda este ano ao comité executivo para aprovação — é no sentido de criação de um centro distribuído, no qual o Brasil também afirmou querer participar, que altere o mecanismo e o regime da formação doutoral, fazendo, essencialmente, com que na formação doutoral intervenha obrigatoriamente não apenas a formação de natureza científica e técnica mas a formação para a responsabilidade social, a formação para a comunicação da ciência, a formação para as condições de exercício da actividade científica em ambiente internacional e que esta formação doutoral seja feita obrigatoriamente em programas internacionais onde participe o país de origem e exista a expectativa de continuidade para lá do termo da bolsa ou do financiamento ao doutorando.
Não esperámos pelo lançamento deste centro e lançámos, com anúncios em todos os países africanos de expressão portuguesa, um programa preliminar com os mesmos princípios e que foi discutido com as instituições nacionais. Este programa chamou-se Ciência Global e teve uma adesão extraordinária, pois houve cerca de 450 candidaturas nesta fase e que estão neste momento em apreciação.
Garantimos acompanhamento dos estudantes nas suas candidaturas, que são, no fundo, pré-candidaturas, logo os estudantes precisam de ajuda; trata-se de candidaturas a doutoramento, mas também de pessoas já doutoradas que se candidatam a pós-doutoramentos.
Tenho mantido uma actividade de contacto regular com o Director-Geral da UNESCO, quer com o anterior quer com o novo, e com os serviços competentes de ciências da UNESCO e estamos convencidos de que o acompanhamento sistemático de um programa desta natureza e a criação de um centro, para o qual oferecemos a sede e o secretariado, em Portugal podem ser contribuições decisivas para a formação sistemática de recursos qualificados, designadamente nos países em vias de desenvolvimento de expressão portuguesa em África.
Também foram feitas perguntas — julgo que pelo CDS — sobre a actualização de bolsas de investigação de Institutos Politécnicos e Universitários, no sentido de se saber como é que a Agência vai acreditar os cursos, etc. Muito brevemente, devo dizer que a Agência já tornou público o seu plano de desenvolvimento (aliás, todas as instituições conhecem as informações que tiveram de fornecer) e definiu um critério que nos parece, e pareceu a todas as instituições a que apresentaram esse critério, perfeitamente realista, que é o de proceder à acreditação em diferentes níveis nos casos em que os indicadores objectivos existentes sobre o funcionamento das instituições permitem uma acreditação em bloco para certos tipos de cursos e certos níveis de ciclos de estudo das instituições, aqueles em que há indicadores suficientes para a não acreditação imediata de cursos e aqueles para os quais é preciso uma análise em profundidade que, naturalmente, demorará mais tempo.
Esperamos com este procedimento, que nos parece perfeitamente adequado, como, aliás, pareceu perfeitamente adequado às instituições de ensino superior a quem foi submetido, que o plano de actividades seja cumprido, e não temos nenhuma razão para não crer que não seja.
No que diz respeito às bolsas de investigação, o Sr. Deputado sabe, certamente, que uma das estratégias que adoptámos foi a de converter, progressivamente, bolsas de pós-doutoramento em contratos de doutoramento, que são mais caros para o Estado e para as instituições, e a de dar prioridade a esta conversão, porque é aquela que é mais decisiva na competitividade internacional da nossa investigação.
Portanto, o investimento principal que fizemos foi aqui e não na actualização dos valores nominais das bolsas de pós-doutoramento, que, aliás, no final desta Legislatura, deixarão de existir e serão, no essencial, contratos de pós-doutoramento.
Pareceu-nos que esta era a medida mais eficiente de uso dos dinheiros públicos neste momento, sem prejuízo da discussão que mantemos com as várias associações para eventuais acertos pontuais nas outras bolsas.
No que diz respeito à especialização de politécnicos e de universidades, não gostaria que ficasse essa ideia. Aos politécnicos compete, naturalmente, um leque diversificado de oferta formativa; os cursos de especialização tecnológica são, aliás, uma pequena parte, neste momento, da oferta formativa dos institutos politécnicos. Se olharmos para as entradas (primeira vez e primeiro ano) em universidades públicas e em politécnicos públicos (a situação no ensino privado é diversa), verificamos que no ano lectivo de 2009-2010 ficámos quase a par, pois o número de entradas no 1.º ano pela primeira vez em instituições universitárias públicas ficou ligeiramente acima do verificado em instituições politécnicas, é quase ela por ela, a diferença é,

Página 127

127 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

creio, de cerca de 1000 unidades, mas tem aumentado ao longo dos anos. A subida nos politécnicos é superior à subida verificada nas universidades e, provavelmente, no próximo ano lectivo, 2010-2011, a entrada no 1.º ano pela primeira vez nos politécnicos igualará ou superará a verificada nas universidades, o que é, de facto, um objectivo de política e que corresponde a uma democratização do ensino superior em Portugal.
Muitos estudantes terminam licenciaturas nos institutos politécnicos e candidatam-se a mestrados nas universidades, o que é bom. Muitos estudantes transitam de um instituto politécnico para outro, para o 2.º ciclo do mestrado profissional num instituto politécnico, o que também é bom haver mobilidade nesta matéria. Como sabe, nesta matéria, mantivemos uma posição extremamente firme de reservar às universidades a formação doutoral, como acontece, e deve acontecer, nos sistemas binários, como é o nosso.
Foram levantadas questões de dotação, em PIDDAC, para residências e cantinas. Eu estava aqui a ver o mapa detalhado do PIDDAC, apenas da parte nacional, porque ainda estamos em execução de grande parte do concurso QREN, que investiu, aproximadamente, mais de 100 milhões de euros em obras do ensino superior (cerca de 75%, porque a outra parte é dinheiro nacional), e há investimentos uns em curso e outros que serão executados com base em fundos também comunitários.
Seguindo as minhas notas, e para sossegar o Bloco de Esquerda no que diz respeito ao PROTEC (programa especial de apoio à formação avançada de docentes do ensino superior politécnico), devo dizer que o PROTEC está incorporado nos orçamentos das instituições de ensino superior, designadamente do ensino superior politécnico. No ano passado, não era dividido à partida, fazia-se um concurso e estava concentrado na Fundação para a Ciência e Tecnologia, mas foi transferido para os orçamentos das próprias instituições por desejo das instituições e de acordo com um algoritmo de previsibilidade, que será corrigido, ano a ano, em função do número real de estudantes de doutoramento e, portanto, de docentes que sejam abrangidos. Esta é uma prioridade do Governo nesta matéria; o que, naturalmente, não era e continuará a não ser uma prioridade do Governo é fazer entrar docentes sem concurso nas carreiras das instituições, como, de acordo com o que fui informado, teria sido aprovado na Comissão de Educação e Ciência, o que nos parece ser uma tentação populista e facilitista, que não deveria merecer acolhimento desta Assembleia.
Relativamente a algumas questões colocadas pelo PCP, e, provavelmente, ainda haverá outras a seguir — peço desculpa, mas estou a seguir a ordem das intervenções —, devo dizer que, no estudo que foi feito sobre os empréstimos, nada indica que os empréstimos foram feitos para evitar abandono escolar; nada nestes estudos dizem isto, indicam outras razões. O reembolso dos empréstimos pode ser feito até 12 anos e é preciso não esquecer que os emprçstimos estão limitados ao máximo de 5000 €/ano, e o valor mçdio ç bastante inferior a este.
Portanto, não vale a pena acenar com o papão dos cento e tal milhões de euros, estamos a falar do máximo de 5000 €/estudante/ano e do valor mçdio, que ç cerca de metade deste.
Não conheço o caso que o Sr. Deputado indicou, o de que haveria um bolseiro de investigação científica que era diferenciado em pagamentos na cantina de uma instituição do Estado, mas deve haver uma razão para isto e fico tão perplexo quanto o Sr. Deputado, por isso agradeço que me dê a informação para eu poder averiguar. A sua perplexidade é, com certeza, igual à minha nesta matéria.
Faça-me justiça: com certeza que todos os bolseiros, todos os investigadores, todas as pessoas que trabalham numa instituição devem ser tratados da mesma maneira no acesso aos diferentes serviços. Parece que todos nós estaremos de acordo quanto a isto, mas, como não conheço o caso, não posso pronunciar-me sobre ele, como deve imaginar.
Sobre o reforço das bolsas Erasmus, questão colocada por Deputados do Partido Socialista, já falei.
Também me foi colocada a questão sobre o fomento da acção social e as medidas de simplificação e de desburocratização. Estas medidas terão duas origens, e relato apenas aquilo que foi discutido com os próprios responsáveis das instituições. A primeira medida é a de simplificar, aplicar os princípios da simplificação administrativa ao processamento das candidaturas; ou seja, se existem informações que estão disponíveis em serviços públicos, elas devem ser acessíveis pelo serviço que avalia e analisa as candidaturas e não devem ser objecto de um dossier em papel apresentado pelo próprio candidato.
Sobre esta matéria, havia muitos problemas de natureza legal, foi preciso criar interoperabilidades, foi preciso que a Comissão Nacional de Protecção de Dados desse o seu parecer favorável. Estes passos, hoje, estão cumpridos e, portanto, o funcionamento da interoperabilidade entre serviços é uma das primeiras respostas a esta matéria. Há, no entanto, outras respostas a esta matéria, que foram sugeridas e que estão a

Página 128

128 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

ser neste momento trabalhadas pelos próprios serviços e pelas próprias instituições, as quais consistem, em particular para o 1.º ano pela primeira vez, em haver, no acto de candidatura, uma intenção declarada e informação dada pelo próprio estudante. Isto implica uma centralização, que é indesejável, mas, provavelmente, é a única forma, na primeira vez, de resolver. Porquê? Porque o estudante ainda não é estudante de nenhuma instituição, concorreu a várias.
Isto para vos dizer que este assunto está a ser tratado pelas instituições, e esperamos tê-lo pronto, com base nos elementos que hoje já dispomos. Temos confiança em que ele esteja pronto no final deste ano lectivo ou no princípio do próximo, mas, insisto, com os instrumentos que hoje estão a funcionar, com a imposição que existe hoje na lei para que os serviços possam e devam responder, em qualquer altura do ano, com auxílios de emergência a alteração de situações. O sistema e as instituições estão em condições de responder a todas as urgências que possam surgir.
À Sr.ª Deputada do PSD da Madeira agradeço as palavras e reforço as minhas afirmações iniciais.
Relativamente às outras questões que me colocou, tenho pena de não seguir a sua opinião: não acho que haja uma saturação do mercado de trabalho de licenciados em Portugal. O que os números mostram é que — embora, infelizmente, em Portugal tenhamos o desemprego que temos, como em toda a Europa —, de facto, os menos desempregados são os licenciados, aqueles que estão menos tempo no desemprego são os licenciados. Não acho que haja qualquer evidência para saturação no mercado de trabalho e isto poderá dar a ideia aos jovens candidatos ao ensino superior de que não vale a pena ir para o ensino superior. Certamente, não era isto o que a Sr.ª Deputada queria dizer»

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — Era o contrário!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não acreditava que fosse isto que quisesse dizer, mas, como esta ideia poderia ficar no espírito, quis fazer esta precisão.
Também devo dizer, Sr.ª Deputada, que os dados de observação já estão disponíveis há bastante tempo, designadamente os dados de observação trabalhados pelo nosso Ministério, colocados regularmente de seis em seis meses online, os dados do desemprego, que são aqueles com que nos comprometemos na Legislatura anterior.
Quero contestar uma afirmação, que julguei entender, mas certamente não estará no espírito da Sr.ª Deputada, a de que mais vagas representam menos qualidade. Não é razoável imaginar isto. Os indicadores de qualidade indirectos de que dispomos do ensino superior em Portugal, medidos pela qualidade do corpo docente, medidos pela produção científica e pela relevância económica das instituições de ensino superior, que, certamente, se repercutem nos estudantes e na qualidade da formação dos estudantes, mostram uma melhoria da qualidade do ensino superior em Portugal e não uma menor qualidade. Mostram, aliás, uma diversificação da oferta do ensino superior em Portugal, para diferentes públicos, como não podia deixar de ser.
O Sr. Deputado Agostinho Lopes cita um caso conhecido na imprensa entre a Universidade do Porto e a Universidade do Minho e uma família com duas irmãs» Devo dizer que a lei que estava, e está, em vigor (e que, aliás, não é da nossa responsabilidade) apontava precisamente para uma diversidade das chamadas regras técnicas, que eram entendidas como devendo ser mesmo diferenciadas de região para região e de instituição para instituição. Ora, o acordo que estabelecemos, neste momento, com todas as instituições é, precisamente, o de acabar com isto, é fazer com que as regras técnicas sejam exactamente iguais em todo o território nacional. Isto é uma inversão política, relativamente ao esquema que estava em vigor em Portugal, desde há muitos anos nesta matéria, e não vemos qualquer vantagem neste caso.
Sobre os investimentos no IPCA (Instituto Politécnico do Cávado e Ave), devo dizer que está a acabar a construção da cantina, que foi adjudicada, há projectos para outras residências e bibliotecas que vão candidatar-se a financiamentos comunitários, com participação nacional. É também uma preocupação nossa reforçar esse pólo do ensino superior politécnico.
O Sr. Deputado Nuno Araújo levantou a questão sobre a continuidade das medidas no Ministério da Educação. Julgo ser claro que, além daquelas medidas que dizem respeito à redução progressiva, que todos desejamos, do abandono e insucesso escolares no ensino básico e secundário e que limitavam, até agora, aqueles que se diplomavam com o ensino secundário, esperamos, com estas medidas para o ensino superior,

Página 129

129 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

ter condições de acolher mais estudantes no ensino superior. Isto também se aplica aos muitos estudantes que terminaram a formação com o programa Novas Oportunidades. Estamos convencidos, pelas informações que dispomos hoje, de que há o acesso de alguns desses estudantes ao ensino superior, designadamente a cursos de especialização tecnológica. Esperamos que isto acrescente à formação e às capacidades de formação superior no nosso país.
Sobre a revisão, que está em curso, dos regulamentos da acção social, também se questionou se estavam previstas mudanças relativamente a trabalhadores-estudantes mais carenciados e a famílias monoparentais, a resposta é «sim». Esta questão foi levantada e proposta pelas próprias instituições de ensino superior, como já tinha sido feito pelos serviços do Ministério, e, portanto, a situação será contemplada nas alterações regulamentares.
O Sr. Deputado Bruno Dias levantou uma questão extremamente importante, a do debate, que já tem dois ou três anos, pelos menos, sobre a neutralidade da rede, em matéria de Web. O Sr. Deputado saberá, porventura, a minha posição sobre esta matéria, porque ela é pública, encontra-se em vários sítios da Internet, aquela que defendi durante a Presidência portuguesa, em nome da União Europeia, no Fórum Mundial da Internet, e que é a de garantir a estrita neutralidade da rede.
O Governo português sempre se bateu por esta política, bateu-se dentro da União Europeia para que esta fosse a posição oficial do Conselho Europeu e bate-se, hoje, junto das Nações Unidas. Como sabe, esta é uma matéria completamente dinâmica, tão dinâmica como a evolução tecnológica, e os conflitos de interesse são de enorme importância. Entendemos que é absolutamente indispensável manter o regime democrático sobre o qual a Internet foi constituída e criada no mundo, para bem do próprio desenvolvimento económico e social e da liberdade de expressão em todo o mundo.
Portanto, para sossegá-lo nesta matéria, esta é a posição, não apenas minha mas a que tem vindo a ser defendida, sistematicamente, em termos internacionais.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Até aqui estamos todos de acordo!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — No que diz respeito à questão seguinte que levantou, devo dizer que, hoje em dia, o ensino superior à distância está a sofrer uma forte expansão, e não se trata apenas da Universidade Aberta, trata-se, aliás, de conciliar a oferta disponível em todo o País com as necessidades da Universidade Aberta. Não está, neste momento, em cima da mesa a criação de novas infraestruturas da Universidade Aberta fora das suas actuais instalações, que estão a ser recuperadas. Este é um projecto que está em suspenso para verificação, no novo quadro do ensino à distância, da sua eventual necessidade.
Também não está nos planos conhecidos da Universidade Nova de Lisboa (não são planos do Governo mas da Universidade Nova de Lisboa) a criação de qualquer novo pólo físico da Faculdade de Medicina, da Faculdade de Ciências Médicas, portanto. O que está, neste momento, em obra é a construção, no Campo Santana e no antigo Instituto Câmara Pestana, das novas instalações para a ampliação da Faculdade de Ciências Médicas, um projecto de há vários anos e que, neste momento, está em obra e a ser financiado.
O Sr. Deputado José Ferreira Gomes fez uma contabilidade que não sigo, a de responder a uma questão e meia em cinco questões, o que dá 30%. Agora, faz-me duas perguntas, que foi as que referi; o que pode acontecer é que tenha feito outras que eu não tenha registado.
Em primeiro lugar, disse que não acredita que, replicando iguais cursos para jovens e para adultos, eles funcionem. Não foi uma pergunta mas uma afirmação, e tenho todo o gosto em dizer que eu também não acredito. Espero que qualquer responsável de uma instituição do ensino superior também não acredite! Portanto, os cursos têm de ser naturalmente diferentes.
Já respondi a uma pergunta, lá vão 50%! A segunda questão tem a ver com as universidades-fundações e a desorçamentação. Não há nenhuma desorçamentação das universidades-fundações, que fique claro! As dotações do Estado para as universidades-fundações estão orçamentadas, como é natural. Tecnicamente, as despesas e as receitas das outras instituições não são nem receitas nem despesas do Orçamento do Estado, contudo são públicas; estas instituições são públicas e as receitas e despesas têm de ser aprovadas nos conselhos gerais dessas instituições e são, de todos, conhecidas. Não há, pois, qualquer desorçamentação.

Página 130

130 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Se o regime de universidade-fundação será um elemento para o futuro de alguma especialização das universidades portuguesas, designadamente através da formação de consórcios mais vastos, onde elas sejam incluídas ao nível das pós-graduações ou a todos os níveis, é uma questão que o futuro dirá. Que o regime de universidade-fundação permite, pela primeira vez, uma maior capacidade de autonomia dessas instituições na gestão do seu património e na gestão das suas relações com a sociedade e a economia é um facto. Se esta capacidade acrescida que o País está a dar pudesse constituir um elemento de diferenciação, seria extremamente positivo. Pode acontecer que não seja apenas nas universidades-fundações, mas será, certamente, em minha opinião, nas universidades-fundações.
Contudo, há outros modelos de consórcio que, neste momento, estão a ser criados, designadamente na área da medicina, entre hospitais e faculdades de medicina e que também podem constituir pólos e embriões extremamente interessantes do desenvolvimento e da especialização de novas figuras de instituições de ensino superior no nosso País, para lhe dar um outro exemplo.
Ainda disponho de tempo, Sr. Presidente? E ainda o não esgotei, pois não, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Por enquanto não,»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Por enquanto não!

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — » mas não sabemos o que vem a seguir!

Risos.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — É fácil! Passo à última questão, a uma pergunta formulada pela Sr.ª Deputada Carla Rodrigues sobre a aposta na sociedade da informação, a UMIC, para a qual há duas respostas.
A primeira resposta a Sr.ª Deputada conhece-a perfeitamente: com o fim do Quadro Comunitário de Apoio, a inscrição das verbas comunitárias, que era feita na UMIC, as verbas QREN para a sociedade da informação não são, nem podem ser, inscritas no Ministério, uma vez que estão inscritas nos respectivos programas operacionais.
Segunda resposta, e esta é uma boa notícia que gostaria de dar à Sr.ª Deputada: pela primeira vez, o Ministério, através da UMIC, procedeu a um primeiro exercício de orçamento global do Estado para a sociedade da informação, através de inquérito detalhado junto de todos os Ministérios, de que resultou um primeiro apuramento — este apuramento ainda está em fase de validação, mas, quando estiver terminado, tenho todo o gosto em o comunicar à Assembleia da República. Gostaríamos que este instrumento passasse a ser sistemático de observação.
Numa primeira observação, com os dados obtidos até hoje, ou, melhor, até ontem, as grandes linhas são a modernização administrativa e a simplificação, que correspondem a cerca de metade do Orçamento do Estado para a sociedade da informação. Depois, temos o equipamento, as questões que dizem respeito ao parque escolar e ao Ministério da Educação, o desenvolvimento do sistema científico, que diz respeito ao nosso Ministério, a utilização de tecnologias de informação e comunicação na saúde, do Ministério da Saúde, a instalação de redes de nova geração e a cobertura de banda larga de alta capacidade, do Ministério de Obras Públicas, Transportes e Comunicações (numa pequena dimensão, aliás, porque a maioria do investimento é privado, e coloquei aqui apenas os investimentos públicos), e a disponibilização de conteúdos digitais de interesse cultural e a afirmação da língua portuguesa, do Ministério da Cultura.
Tudo isto soma, segundo as nossas contas, 541 milhões de euros. De acordo com o apuramento provisório, esta é a verba do Orçamento do Estado atribuída à sociedade da informação e inscrita nesta proposta de Orçamento do Estado para 2010.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Vamos, agora, entrar na 3.ª ronda de perguntas, na qual cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos e o Sr. Ministro disporá de 10 minutos para, no final, dar uma resposta global.
Tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

Página 131

131 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, a questão da confiança é, de facto, uma matéria essencial, mas, para que os contratos de confiança sejam entre todos com alguém, é preciso, no mínimo, que as partes falem a mesma linguagem. E a verdade é que não temos falado a mesma linguagem, porque o Sr. Ministro não quer fazê-lo, o que torna difícil considerarmos que o contrato que fez seja o contrato de todos.
Como vimos, do que se tratou foi termos, para 2010, uma dotação orçamental para o ensino superior que mais não é do que cerca de 90% daquela que era a dotação em 2004.
Ainda no que diz respeito às questões da confiança, se alguém quer essa confiança, também é importante que diga que não são 100 milhões mas, sim, 88 milhões, porque é disto que se trata. Como eu dizia, é importante manter a mesma linguagem e falar-se de realidades comparáveis entre si. Por isso, vou ter de repetir a pergunta que o meu colega Pedro Saraiva já fez em comissão e hoje aqui, mas o Sr. Ministro teima em não responder. E porquê? Porque não usa a mesma linguagem! Quando falamos em financiamento por aluno, o Sr. Ministro invoca o quê? A percentagem do PIB! Ora, o que gostaríamos de perceber é qual é a meta deste Governo, qual é a ambição para o financiamento por aluno em paridade de poder de compra em euros, porque é neste indicador que, de facto, estamos longe, mas muito longe, da média europeia, havendo só um ou dois países da União Europeia, se não me falha a memória, abaixo de nós.
Portanto, não basta responder novamente com uma percentagem do PIB. Não! Queremos uma meta, que seria de facto a ambição para o País atingir neste indicador preciso. Ou seja — volto a referir para que o Sr.
Ministro não tenha dúvidas sobre o que gostávamos de ouvir —, queremos saber que é o financiamento por aluno em euros, em paridade de poder de compra. Este, sim, seria um dado objectivo que gostaríamos de obter.
Também para termos confiança, precisamos de perceber como vai funcionar a questão do financiamento das fundações. Ou seja, temos o mapa geral das instituições com dotações orçamentais, onde estão todas as instituições, as que são fundações e as que não são fundações, e, depois, num outro mapa da Direcção-Geral do Ensino Superior, temos uma rubrica de 9,7 milhões de euros destinada a este sector. Ora, como não conhecemos os contratos-programa feitos com as fundações, gostaríamos de saber se este é o «bolo» total ou se teremos de andar a pesquisar noutros mapas para conseguirmos fechar a questão das fundações.
Para terminar, Sr. Ministro, facilitismo é o facto de a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES) equiparar, provisoriamente, para efeitos de acreditação de cursos, docentes a especialistas — docentes que não o são —, criando desta forma confusão junto do sector.
Por último, devo dizer que rejeitamos por completo a acusação que nos fez, porque as alterações introduzidas por esta Assembleia, face ao novo figurino resultante das eleições, nos estatutos de carreira, quer do politécnico quer do ensino superior, foram, sobretudo, benéficas, já que corrigiram muitas injustiças, injustiças estas que estavam no decreto-lei que o Sr. Ministro fez publicar em Agosto, a pouco mais de um mês das eleições.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Melo.

A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, não vou fazer mais perguntas, estamos no encerramento do debate, mas gostaria de afirmar, sobretudo, que, para nós, o orçamento do Ministério para 2010 representa, antes de mais, a consolidação de uma mudança de paradigma do ensino superior em Portugal.
Basta olhar para as opiniões publicadas na última década para perceber que era generalizada a ideia de que o ensino superior era constituído por instituições demasiado voltadas para dentro, com dificuldades em funcionar em rede, a nível nacional e internacional, para aumentar a massa crítica necessária, com uma exígua ligação às necessidades concretas da sociedade geral, do mundo empresarial em particular, com baixa transferência de investigação e desenvolvimento como base da sustentação das alterações no tecido empresarial e, finalmente, com poucas respostas para a necessária qualificação superior dos activos.
Este diagnóstico também foi feito, durante muitos anos e muitas vezes, nesta Câmara.

Página 132

132 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Ora, a legislação elaborada pelo anterior governo pretendia, antes de tudo, retirar do seu gueto as instituições do ensino superior, tal como, aliás, há 10 anos um outro governo socialista tinha feito com a ciência.
Como qualquer alteração, também as que foram processadas tiveram, obviamente, muitas dificuldades.
Todavia, é curioso verificar que, logo no início de funções do actual Governo, foi possível fazer um Contrato de Confiança com o Ensino Superior — e, realmente, as palavras não nos fazem muita mossa e confiança é uma boa palavra! — onde todas as instituições se comprometeram a continuar a reestruturação interna decorrente das alterações legislativas, a qualificar o ensino ministrado, bem como a avançar com a reestruturação da rede existente, tendo todas estas alterações um objectivo comum: encontrar as melhores soluções para um problema nacional, que é o da qualificação dos activos.
O que é um contrato de confiança? Antes de mais, confiança das instituições do ensino superior nas suas próprias capacidades e, em norma, ao contrário do que aqui se diz, responsabilidade assumida pelo Estado. É que em tempos de crise, como são estes que vivemos, aqui e nos nossos mercados mais importantes, o Governo não propõe apenas, como aqui foi dito, mais 100 milhões de euros para o próximo ano. O que o Governo se compromete é a manter, pelo menos, esse acréscimo durante três anos consecutivos. Isto é confiança! Sr. Ministro, tenho para mim que a principal e a mais gravosa sequela que o Estado Novo nos deixou foi a generalização paralisante do «pobrezinhos, mas honestos» que quase durante cinco décadas tornou a ambição saudável um estigma e o medo do novo e do diferente uma regra de vida. Ora, é este peso que ainda hoje sentimos e que precisamos urgentemente de alterar.
O Contrato de Confiança diz-nos que as instituições de ensino superior estarão na primeira linha para que Portugal possa mudar para um mundo que não tem fronteiras nem protecções para além daquela que é a nossa capacidade e a nossa qualidade.
Portanto, que o Governo tenha assumido, pela primeira vez, esta garantia de três anos seguidos de financiamento é algo de novo.
Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, não acabo esta intervenção sem antes dizer que, para nós, este Orçamento do Estado não se pode avaliar apenas em si próprio; ele vai ao encontro dos compromissos assumidos por este Governo.
Espero que, ao analisar uma série longa da actuação de sucessivos Ministérios da Ciência e Tecnologia, talvez daqui a 10 anos, tal como hoje analisamos aquilo que se passou na ciência, possamos dizer que, efectivamente, o que está a processar-se é uma sempre difícil, mas necessária, mudança de paradigma no ensino superior.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, para mudar de paradigma este orçamento» Já vai, pelo menos, no sexto orçamento seguido do Sr. Ministro e outros para trás estão, já para não falar nos rectificativos e afins»! Eu diria que é pena que não se defina melhor o que vai acontecer neste ano no ensino superior, nomeadamente na relação universidades/politécnicos. Creio que esta é uma matéria que preocupa os agentes e vamos ver como vai ser acompanhada pelo Sr. Ministro quando virmos os contratos, como nos disse, de baixo para cima, com as metas e os valores das unidades orgânicas, com os «vistos» do Sr. Ministro. Vamos ver como, depois, irá ser elaborado o financiamento das instituições.
Não sei se o Sr. Ministro ainda quer falar disto, se vai ou não fazer contratos plurianuais, se vai ou não manter esta fórmula de financiamento das instituições, se vai ou não mexer na malfadada fórmula, se vai ou não simplificá-la, se vai ou não torná-la mais inteligível.
Vamos ver se conseguimos na Assembleia, neste ano, mexer nas bolsas de estudo — e aqui houve alguma abertura por parte do Sr. Ministro — para tornar o sistema mais linear. Aliás, creio que a Matemática dá-nos várias formas de o fazer com uma ou outra aproximação, com um qualquer método de mínimos quadrados (e é possível que consigamos, nesta Assembleia, ter uma maioria que o faça) para aproximarmos os escalões a uma recta — a uma recta ou uma curva, seja o que for — para tornar o sistema de bolsas mais justo, mais equilibrado e mais linear.

Página 133

133 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Creio, pois, que o Sr. Ministro mostrou alguma abertura para isso e pode ser que seja uma parte importante nesse processo, como espero.
Por fim, em relação a uma matéria eternamente adiada e que nos parece que continuará a sê-lo, a não ser que o Sr. Ministro queira dizer mais alguma coisa sobre isso, que é a reorganização da rede, disse o Sr.
Ministro que, no final das acreditações, portanto, no final de 2011, teremos uma matriz para olhar como é que poderemos começar a reorganização da rede. Temo que, nessa altura, já estejamos, de novo, perto de eleições — e estou a ser muito optimista — e que este assunto seja novamente adiado» Aliás, podemos atç já ter tido eleições nessa altura»!

Risos do CDS-PP.

Mas logo veremos em que processo estaremos quando a Agência de Avaliação e Acreditação terminar e se haverá ou não abertura política para a abertura de um processo de reorganização da rede, que para o CDS é fundamental, por forma a que Portugal tenha os seus cursos mais bem organizados, que se consiga concentrar nalguns pólos a criação de conhecimento nalgumas áreas e com isso ajudar à massa crítica e a que os nossos estudantes e os nossos cientistas encontrem melhores condições para exercer os seus cargos.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, há pouco coloquei quatro ou cinco perguntas, mas o Sr. Ministro nas respostas que deu só falou do PROTEC, pelo que me vejo obrigado a recolocar algumas dessas perguntas.
O Sr. Ministro prevê um aumento do número de pessoas que, com os actuais critérios, vão beneficiar de bolsas de acção social. Gostava que me explicasse por que é que os serviços de acção social, por exemplo, da Universidade de Coimbra, têm menos 200 000 € para funcionar. Qual ç a justificação para isso? Havendo mais bolseiros, havendo maiores necessidades dos serviços de acção social, por que é que neste orçamento, apesar de se prever um aumento do número de bolsas, os serviços de acção social têm menos verbas num contexto em que eles vão ser mais necessários? O Sr. Ministro ainda não explicou esta questão.
Em segundo lugar, o Sr. Ministro manifestou sensibilidade e preocupação em relação à situação do Estádio Universitário de Lisboa ou, pelo menos, em relação à ilegalidade que aí se vive. Porém, não me respondeu, se tem essa sensibilidade, ao seguinte: se o Estádio Universitário de Lisboa precisa dessas 100 pessoas, por que é que a instituição que está na tutela do seu Ministério, em 2009, não contratou essas pessoas? Estando essas pessoas a trabalhar lá há não sei quantos anos e, em 2009, verificada a necessidade de essas pessoas lá continuarem, tanto que continuam, por que é que o Sr. Ministro não as contratou? Por que é que permitiu que uma instituição do seu Ministério mantivesse essas pessoas a recibo verde, transferindo-as para uma empresa que tem escritórios no próprio Estádio Universitário? O Sr. Ministro diz que vai fazer uma queixa ao Ministério do Trabalho, mas a verdade é que não tomou essa decisão na altura, pelo que gostava de lhe perguntar, muito concretamente, o seguinte: está disposto a contratar estas 100 pessoas? Está disposto a contratar estas 100 pessoas, verificada que está, pelos documentos que lhe dei, com o acesso à informação de que dispõe, a sua condição de trabalhadores subordinados? Uma questão a que o Sr. Ministro não se referiu, penso, com detalhe foi à do PIDDAC. Sabemos que há uma redução muito acentuada dos investimentos previstos em sede de PIDDAC. Gostava de saber, uma vez que há essa redução acentuada e que não estão previstos, por via do PIDDAC, investimentos em novas residências, em cantinas em locais onde elas são necessárias — e falei-lhe do exemplo de Coimbra, do Pólo 2 do Porto, da Universidade do Minho, da Escola Superior de Educação de Coimbra, em que o Pólo 2 funciona em pré-fabricados —, se vai ou não haver investimentos nestas infra-estruturas ou na construção de novas infra-estruturas que são indispensáveis para a acção social indirecta.
Basicamente, são estas as questões que gostaria de lhe colocar, dizendo-lhe, Sr. Ministro, que o Bloco de Esquerda já entregou um projecto de lei — certamente que o conhece — sobre a acção social escolar directa e esperamos que esta Assembleia, dadas as preocupações que aqui ficaram manifestadas, possa ver esse diploma aprovado.

Página 134

134 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, hoje, vamos daqui mais contentes pelo facto de o Sr. Ministro reconhecer que havia uma injustiça relativamente aos bolseiros de investigação científica no ITN e que, se bem compreendi as suas palavras de compromisso, esses bolseiros vão passar a pagar a senha de almoço na cantina ao preço da dos restantes trabalhadores. Portanto, entendemos que desta audição, pelo menos, esse é um elemento importante.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Dá-me licença, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — No final, o Sr. Ministro terá oportunidade de tecer»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª Deputada, sobre esse ponto, quero dizer que apenas ouvi a Sr.ª Deputada, não ouvi mais ninguém e, portanto, vou ouvir outras entidades.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para começar não está mal!»

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Ministro, a ouvir a bancada parlamentar do PCP e a reconhecer a necessidade de alterar uma injustiça, eu, à boleia disso, apresento-lhe já uma série de outras situações para que também o Sr. Ministro ouça quem bem entender, nomeadamente, a questão que diz respeito à importância e ao imperativo de rever o valor das bolsas que estão por actualizar desde 2002. Entendemos que é um conceito de justiça elementar.
Também à boleia da sua boa vontade e das suas audições legítimas, colocamos a necessidade de abertura da contratação para as carreiras de investigador, docente ou técnico superior e o reconhecimento dos direitos destes trabalhadores de investigação científica do ponto de vista dos seus mais elementares direitos.
Um bolseiro de investigação científica que desempenhe funções permanentes não tem direito, por exemplo, ao subsídio de maternidade, não tem direito ao subsídio de desemprego, não tem direito ao subsídio de férias, não tem direito ao subsídio de Natal. Entendemos que, assim como a senha de almoço é um direito elementar, também todos estes direitos são elementares e, provavelmente, por parte do Sr. Ministro e do seu Ministério, irá certamente haver uma atenção especial relativamente a esta matéria.
O Sr. Ministro falou-nos aqui, várias vezes, do Sistema Tecnológico e Científico Nacional valorizando o seu aspecto mais técnico. No entanto, não podemos sair daqui sem uma palavra de apreço e de reconhecimento pelos direitos destes trabalhadores, porque valorizar em abstracto sem, na prática, reconhecer os direitos destes trabalhadores tem um fim pouco consequente. Portanto, entender que o Sistema Tecnológico e Científico Nacional tem dado bons resultados e, em paralelo, não reconhecer os direitos elementares destes trabalhadores não é de todo o melhor caminho a percorrer, pelo que esperamos que, da parte do Governo, haja abertura e reconhecimento desta necessidade.
Relativamente ao orçamento do seu Ministério, entendemos que ele vai acabar por reflectir uma política de desinvestimento, de desresponsabilização do Governo e de consequente responsabilização das famílias, pelo que entendemos que, nesse aspecto, é muito negativo.
O PCP apresentou já, nesta Legislatura, um projecto de lei sobre o financiamento do ensino superior que podia, se analisado e aplicado, dar uma resposta efectiva aos problemas, que foram identificados, sobre condições materiais e humanas.
Entendemos que também não há, por parte do seu Ministério, uma resposta efectiva para o financiamento público que corresponda às necessidades efectivas das instituições e, do ponto de vista do investimento directo e de apoios à acção social indirecta, nomeadamente as residências e a frequência dos estágios curriculares, não tivemos resposta por parte do Sr. Ministro, e era importante que a tivéssemos para o esclarecimento do País.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Para responder, tem a palavra, por 10 minutos, o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

Página 135

135 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, há ainda mais uma outra ronda de perguntas?

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Creio que a ronda seguinte não será de certeza nesta sessão, Ministro.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Ministro, esta agora teve piada!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Como?

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Estava só a brincar!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — O Sr. Deputado — como é que eu costumava chamá-lo?» Ah, era Manuel Tiago! —, de facto, surpreende-me sempre.
Começando do fim para o princípio, fico satisfeitíssimo por a Sr.ª Deputada Rita Rato sair mais contente desta audição. Fico bastante confortado com a ideia de que, quando o orçamento sobe, há um desinvestimento — deve ser uma Matemática que não aprendi» Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado José Moura Soeiro, do Bloco de Esquerda, devo dizer que os Serviços de Acção Social de Coimbra, como talvez saiba, são aqueles que, em Portugal, têm uma dotação por aluno muitíssimo superior à de todos os outros serviços de acção social. Portanto, foi logo dar um exemplo extraordinário!» Quanto ao Estádio Universitário de Lisboa, acho extraordinária a sua afirmação. O Sr. Deputado tem uma visão de tal modo interventora nas instituições» Julga que é o Ministro que contrata?! Julga que é o Ministro que manda contratar?! Gostava que pensasse um pouco que as instituições, quando têm conselhos directivos, dirigentes, etc., têm responsabilidade própria.
Sr. Deputado, naturalmente tenho a obrigação de acreditar na boa-fé de tudo o que me diz, mas não tenho obrigação de acreditar, sem prova, no que diz. Portanto, há entidades que irão prová-lo. Eu fiz a transmissão daquilo que, no seu entender, é uma denúncia, mas não tenho de aceitar como força de lei aquilo que o Sr. Deputado afirma nesta Assembleia. O Sr. Deputado afirma que se passou uma ilegalidade. E a minha obrigação é comunicar a quem de direito esta informação. Não quero que haja ilegalidades neste Ministério, nem noutro ministério. Já lho disse.
Relativamente ao PIDDAC do ensino superior, também fiquei bastante surpreendido: ele é de 27 milhões de euros, num ano, e de 27 milhões de euros, no outro, ficando, portanto, constante — e estou a falar do Orçamento do Estado, não da inscrição de verbas comunitárias no Ministério que, agora, passam a ser, na maioria dos casos, inscrições próprias das instituições. Estou, pois, a falar da verba do Orçamento do Estado, em PIDDAC — Obras — Ensino Superior —, que é constante de 2009 para 2010. Aliás, foi isso que foi discutido, no âmbito do Contrato de Confiança, com as instituições do ensino superior, face à dotação.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Michael Seufert, percebo que tem uma preocupação com as relações futuras universidade/politécnico. Tentei esclarecer qual era a nossa visão sobre esta matéria e não creio que possa dizer-lhe aqui mais do que disse.
Relativamente às bolsas de acção social, trata-se de matéria estritamente regulamentar, mas posso dizerlhe que o que está a ser feito é neste momento em perfeita consonância com todos os serviços de acção social. Espero, pois, chegarmos a um entendimento que seja consensual relativamente a esta matéria, que, julgo, é o que todos desejamos, em consulta também com as associações de estudantes que temos vindo a auscultar sobre esta matéria.
Sobre a questão da reorganização da rede, gostaria de, numa próxima vinda aqui (já não em sede destas duas comissões, mas na Comissão de Educação e Ciência), um dia, devolver-lhe a questão e perguntar-lhe: afinal de contas, para si, o que é uma reorganização da rede? Tivemos uma análise sistemática feita pela OCDE sobre esta matçria, temos»

Protestos do Deputado do CDS-PP Michael Seufert.

Página 136

136 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

Peço desculpa, mas já lhe disse o que achava! O que gostava de saber é o que o Sr. Deputado acha, para saber se estamos a falar da mesma coisa.

Risos do Deputado do PSD Emídio Guerreiro.

O Sr. Deputado Emídio Guerreiro, do PSD, disse que havia um problema de linguagem, mas deve ser porque já são 22 horas e 25 minutos, em Lisboa.
Portanto, quanto à reorganização da rede, não sei se o Sr. Deputado viu que ela tem vindo a ser feita. Ora, um dos critérios que definimos para a reorganização da rede foi o da criação de consórcios. Isto corresponde ao seu objectivo de reorganização da rede? Esta não é, no entanto, uma discussão para ser feita, aqui, às 22 horas e 25 minutos, pelo que o Sr. Deputado permitirá que eu não avance. Eu disse-lhe que era indispensável começar pela acreditação ou não acreditação de cursos, era necessário reconhecer, neste momento, o esforço que as próprias instituições estão a fazer, designadamente a tentativa de organização da sua própria oferta formativa a nível nacional e regional, esforço esse que é notório, neste momento, e verificar se é preciso algum instrumento político em cima desse esforço para acelerar uma reorganização que desejamos — não tenho a certeza é se desejamos exactamente o mesmo objectivo.
A Sr. Deputada Manuela Melo afirmou o valor deste Orçamento do Estado e referiu um ponto central que ainda não tinha ouvido ser referido nesta Assembleia. É que esta proposta de lei de Orçamento define essencialmente valores e o ensino superior é, cada vez mais, valores. Na verdade, aquilo que é essencial no ensino superior, no seu sistema e na formação dos estudantes no ensino superior, é a definição de valores do ensino superior, a saber, valores de qualidade, de exigência, de trabalho e de cooperação, que são crescentemente aqueles que devem ser os valores de um sistema diversificado de ensino superior.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — São esses valores, e o valor das propinas!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — O Sr. Deputado Emídio Guerreiro falou de várias questões. Falou de uma linguagem diferente, que certamente é só sua, Sr. Deputado, e não certamente das instituições de ensino superior, pois estas não tiveram o mais pequeno problema de linguagem. Mas, enfim, devo ter a maior simpatia pelas suas dificuldades de linguagem em matéria de ensino superior.
Também devo ter a maior simpatia, compreensão humana e generosidade face às dificuldades de leitura. É porque, no Contrato de Confiança, que é público — e isto tem a ver com a diferença entre os 100 milhões de euros e os 12 milhões de euros —, diz-se expressamente: «As instituições de ensino superior públicas terão à sua disposição, para funcionamento, em 2010, mais 100 milhões de euros face à dotação de 2009, com vista à concretização dos objectivos enunciados. Esse montante inclui 12 milhões de euros de despesa estimada com a ADSE (valores de 2009) que passa a ser directamente suportada por dotações inscritas no Ministério das Finanças».
O Sr. Deputado é que tem alguma dificuldade em ler. Nenhum dos reitores ou presidentes de politécnicos teve dificuldade em ler esta matéria. E, de facto, isto representava mais 100 milhões de euros para despesas de funcionamento para as instituições. Só o Sr. Deputado é que tem alguma dificuldade em ler esta matéria.

Protestos do PSD.

Por outro lado, o Sr. Deputado disse-me que andava a perder imenso tempo a procurar nos orçamentos onde estava a transferência para as fundações. Eu poupava-lhe esse trabalho, pois bastava ter perguntado e eu dizia-lhe que eram cerca de 200 milhões de euros — e, se quiser perguntar por escrito, dou-lhe esse número exacto por escrito, que, aliás, está inscrito orçamento, na Direcção-Geral do Ensino Superior, por transferência de funcionamento para as próprias instituições, segundo as regras normais de funcionamento de todas as outras. Aliás, isto é público.
Por outro lado, reparei que o problema de linguagem também tinha a ver com a palavra «facilidade». Mas começo com uma outra palavra, a palavra «especialista», porque a lei manda que, durante 18 meses após a publicação do decreto-lei que define as provas para especialistas, não deva ser aplicado o critério do número

Página 137

137 | II Série GOPOE - Número: 007 | 23 de Fevereiro de 2010

de especialistas, etc. Portanto, à Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior compete-lhe naturalmente cumprir a lei durante esses 18 meses — não pode mesmo inventar outro critério, a não ser cumprir a lei nessa matéria.
Gostaria de terminar com a palavra «facilitismo». O Sr. Deputado ficou um pouco incomodado com a denúncia do facilitismo — o que, confesso, não esperava da bancada do PSD, que certamente já se esqueceu que foi governo — relativamente a um sistema que, no ensino superior politécnico, defende, segundo a lei em vigor, todos os legítimos interesses do pessoal ao serviço, mas não cede ao populismo de uns poucos que querem, de facto, por um regime de facilidade, evitar aquilo com que todos os responsáveis das instituições concordaram, e concordaram com o Governo.

Protestos do PSD e do PCP.

Vejo que o ruído aumenta à medida que a hora passa. Mas tenhamos compreensão pelo andar do relógio: são 22 horas e 30 minutos, Sr.as e Srs. Deputados! Todos estamos certamente esclarecidos. Eu estou com certeza»

Risos do PSD.

» e espero que as Sr.as e os Srs. Deputados estejam esclarecidos sobre a proposta de orçamento para 2010. Assim como espero que, em breve, ela seja aprovada neste Orçamento do Estado para 2010.

O Sr. Presidente (Luiz Fagundes Duarte): — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Está terminada a audição do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, no âmbito da discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2010.
Está encerrada a reunião.

Eram 22 horas e 30 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Páginas Relacionadas

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×