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Quarta-feira, 10 de Novembro de 2010 II Série-OE — Número 4

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS

Reunião de 9 de Novembro de 2010

SUMÁRIO O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto) declarou aberta a reunião às 10 horas e 13 minutos.
Prosseguiu o debate, na especialidade, da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011, tendo o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago) apresentado o orçamento relativo ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. O Sr.
Ministro respondeu, depois, às questões colocadas pelos Srs. Deputados Pedro Saraiva (PSD), Manuel Mota (PS), Michael Seufert (CDS-PP), José Moura Soeiro (BE), Rita Rato e Miguel Tiago (PCP), José Ferreira Gomes (PSD), Manuela Melo (PS), Pedro Rodrigues (PSD), Catarina Martins (BE), Bruno Dias, João Oliveira e Agostinho Lopes (PCP), Emídio Guerreiro (PSD) e Bravo Nico (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento pronunciaram-se, além do Sr. Ministro (Vieira da Silva) e dos Srs. Secretários de Estado da Energia e da Inovação (Carlos Zorrinho), do

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Turismo (Bernardo Trindade), do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor (Fernando Serrasqueiro) e Adjunto, da Indústria e do Desenvolvimento (Fernando Medina), os Srs. Deputados Nuno Reis e Pedro Saraiva (PSD), João Galamba (PS), Telmo Correia (CDS-PP), Pedro Filipe Soares (BE), Agostinho Lopes (PCP), Nuno Encarnação e Celeste Amaro (PSD), Odete João (PS), Hélder Amaral (CDS-PP), Jorge Seguro Sanches (PS), João Oliveira (PCP), Carlos São Martinho (PSD), Hortense Martins (PS, João Ramos (PCP) e Almeida Henriques (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 19 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro reaberta a reunião.

Eram 10 horas e 13 minutos.

Antes de mais, quero dar as boas-vindas e cumprimentar o Sr. Presidente e os Srs. Deputados da Comissão de Educação e Ciência, da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e os Srs. Secretários de Estado.
Estamos aqui para proceder à audição do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior sobre a proposta de lei do Orçamento do Estado para 2011, na especialidade, que está prevista no Regimento. Esta audição será feita de acordo com a grelha de tempos que temos seguido nas outras audições, que é, aliás, coincidente com a que foi utilizada no Orçamento do Estado para 2010, que prevê uma intervenção inicial do Sr. Ministro para apresentação do orçamento do seu Ministério, de cerca de 15 minutos. Seguidamente, haverá uma primeira ronda de perguntas em que cada Grupo Parlamentar disporá de 8 minutos.
Portanto, sem mais, e informando que esta audição está a ser transmitida pelo Canal Parlamento, passo a palavra ao Sr. Ministro, a quem cumprimento.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago): — Srs. Presidentes das Comissões, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta primeira intervenção, para me conter no tempo, vou ler uma exposição escrita, o que, embora não seja costume se torna mais rápido, além de que, deste modo, tenho a certeza de me conter dentro do tempo regulamentar.
Estamos na apresentação e debate da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2011. Poderemos perguntar-nos se valerá a pena, neste momento, voltar a reafirmar que o investimento em ciência, em investigação científica e tecnológica, assim como o investimento em formação superior, aumentam a produtividade e promovem o crescimento económico e o desenvolvimento social e cultural, ou que a cultura científica é fonte de liberdade e de cidadania.
Mas talvez seja útil recordar que o actual crescimento das exportações portuguesas tem, entre os seus factores decisivos, a maior qualificação dos quadros das organizações e o enraizamento de processos científicos na cadeia da inovação e de qualidade, já que, em quase todas as empresas exportadoras mais relevantes, a incorporação dos resultados e processos da investigação é, hoje, essencial para a criação de novos produtos ou serviços.
Importa, pois, agora mais do que nunca, sublinhar o crescimento acentuado do esforço em I&D (Investigação e Desenvolvimento) nos últimos anos, e começar, antes do mais, por reafirmar a nossa vontade em assegurar a continuidade do esforço nacional na formação avançada, no conhecimento científico, no desenvolvimento tecnológico e no seu enraizamento na vida social e económica.
Os resultados estão à vista. Em primeiro lugar, na vida económica, na capacidade demonstrada pelas empresas que mais investem em I&D e nos seus resultados, no dinamismo das novas empresas de base tecnológica, a maioria das quais gerada a partir de laboratórios universitários. Em segundo lugar, na evolução extremamente positiva da produção e produtividade científicas, da qualificação dos recursos humanos, da propriedade industrial, da balança tecnológica.
Em período de dificuldades económicas e de ajustamento orçamental, são essenciais políticas que dêem continuidade e solidez a este esforço nacional pelas qualificações superiores e pelo desenvolvimento científico e tecnológico. São estes os nossos objectivos, que esperamos que sejam partilhados, unanimemente, por todos.
Esses objectivos estão firmemente inscritos na proposta de Orçamento que o Governo traz a esta Assembleia.
As metas da estratégia europeia Europa 2020 nestas duas áreas — no ensino superior, por um lado, e Investigação e Desenvolvimento, por outro — constituem referenciais da estratégia nacional que adopta, para Portugal (e esse é o pressuposto quer do Programa de Governo quer, agora, deste orçamento), níveis de despesa em I&D (pública e privada) entre 2,7% e 3,1% do PIB, em 2020, e aponta para 40% de diplomados do ensino superior na coorte de idades entre 30 e 34 anos, valor e indicador que é utilizado na Estratégia EU 2020.

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Estas metas nacionais para o final da década situam Portugal, no que respeita aos indicadores europeus escolhidos, pelo menos ao nível das metas globais europeias para 2020 e decorrem da análise realista da evolução recente, assim como da análise do impacto dos programas em curso. A proposta de Orçamento de Estado para 2011 consagra estas prioridades políticas.
Como é sabido, o Governo firmou com o sistema de ensino superior um Contrato de Confiança, instrumento que garante o desenvolvimento do sistema binário do ensino superior em Portugal e o reforço das suas instituições, num quadro de avaliação exigente e de crescente internacionalização, também no espaço da lusofonia.
Este desenvolvimento quer assegurar a diversidade das áreas de formação, a qualificação crescente do corpo docente, o sucesso escolar, e a rápida expansão dos níveis de qualificação superiores da população.
Em particular, como sabem, visa-se a formação de mais 100 000 activos nos próximos quatro anos, alargando-se a base social do ensino superior, expandindo-se as formações ao longo da vida, diversificandose as vias de entrada, como as formações curtas de índole profissional em institutos politécnicos, através de um processo exigente de definição de indicadores e objectivos por cada instituição e da avaliação anual dos resultados atingidos.
A avaliação e acompanhamento dos programas de desenvolvimento entretanto elaborados por cada uma das instituições de ensino superior serão, assim, prioridades para 2011.
Em 2011, serão promovidos programas de requalificação de licenciados em estabelecimentos de ensino superior, visando novas exigências do mercado de trabalho, complementando e diversificando formações anteriores. Ainda em 2011 e na sequência da finalização do primeiro processo de avaliação e acreditação de ciclos de estudo, levado a cabo à escala nacional, será estabelecido o primeiro roteiro para a reorganização da rede de oferta formativa do ensino superior. Também é renovado o nosso Compromisso com a Ciência.
Em Portugal, a despesa pública e privada em I&D atingiu o nível de 1,55% do produto interno bruto, em 2008 (daqui a poucas semanas teremos os números de 2009), e o número de investigadores — 7,2 por cada 1000 activos — situa-se já acima da média europeia, embora em níveis inferiores aos dos países mais desenvolvidos e de dimensão equivalente.
Todos os elementos de informação disponíveis indicam, aliás, a continuidade do progresso dos últimos anos também em 2009 e 2010, incluindo o progressivo crescimento da despesa de Investigação e Desenvolvimento nas empresas. Esta dinâmica de crescimento das capacidades científicas, assim como da produção científica, do desenvolvimento tecnológico e do entrosamento entre universidades e empresas e da sua relevância e reconhecimento nacional e internacional, é hoje, na nossa opinião, um dos principais activos para o futuro do País.
A proposta de lei do Orçamento de Estado para 2011 relança, por mais 5 anos, o sistema de apoio fiscal à Investigação e Desenvolvimento nas empresas (Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial — SIFIDE), com especial relevo para as despesas com a contratação de doutorados. Como sabem, o sistema em vigor terminaria no final deste ano.
São, ainda, intensificados os esforços de cooperação internacional entre empresas e universidades, quer no âmbito da renovação e aprofundamento das parcerias internacionais em curso quer na abertura de novas parcerias, a orientar por linhas temáticas em estreita colaboração com as empresas.
Estará efectivo em Portugal, em 2011 (porque está pronto para assinatura), um programa conjunto com a Comissão Europeia de captação para Portugal de cientistas provenientes de fora da União Europeia, qualquer que seja a sua nacionalidade.
Em 2011, concretiza-se o Programa Ciência Global, destinado aos países da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), cujos concursos e avaliação decorreram já em 2010, e prevê-se aprovação final na Conferência Geral do UNESCO de 2011 e a entrada em funcionamento, em Portugal, do Centro UNESCO para a formação avançada em Ciências no espaço da CPLP, modelo inovador de formação avançada de investigadores de países em desenvolvimento da CPLP, com vista ao fortalecimento das suas próprias capacidades, Centro esse que já foi aprovado, por unanimidade, há poucas semanas, no Conselho Executivo da UNESCO.
No ano de 2011, promover-se-á o recrutamento, à escala global, de investigadores para o Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia, que alargará em 2011 a sua escala, assegurando a sua relevância

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nacional e internacional e o seu impacto na economia de Portugal e Espanha e no desenvolvimento da própria região onde se insere.
Já começou a ser preparado, há vários meses, um novo Programa Dinamizador para as Ciências e Tecnologias do Mar, focado nas áreas de maior oportunidade científica e também de maior impacto económico — biotecnologia, recursos vivos, a orla costeira, a geologia, a energia, o clima e, numa primeira fase, em 2011, concentrando-se na actividade científica em mar profundo.
A promoção da cultura científica e tecnológica será, igualmente, visada ao longo de 2011, através da acção da Agência Ciência Viva, do funcionamento e expansão da rede de Centros Ciência Viva e, muito especialmente, da divulgação da actividade de investigação científica em Portugal e dos seus resultados.
A proposta de orçamento para 2011 do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior — e estou prestes a terminar esta intervenção — aqui apresentada segue estas orientações políticas.
Assim, em primeiro lugar, respeita integralmente os termos do Contrato de Confiança firmado entre o Governo e todas as instituições públicas de ensino superior no início de 2010, reafirmando a nossa prioridade quanto à rápida qualificação da sociedade portuguesa.
Neste sentido, mantêm-se estáveis, entre 2010 e 2011, as dotações globais para o funcionamento das instituições de ensino superior, nos termos do Contrato de Confiança. A diferença entre as dotações iniciais do Orçamento do Estado de 2010 e para 2011, nesta matéria, é apenas a que resulta da redução de despesa a pagar com remunerações e outras prestações, por força das correspondentes normas desta proposta de lei e de outra legislação.
Em segundo lugar, procede à inscrição orçamental, em 2011, de um montante igual ao inicial de 2010 no que respeita aos valores disponíveis para bolsas de estudo para estudantes carenciados, no âmbito da Acção Social Escolar. A manutenção, em 2011, do envelope financeiro para bolsas de estudo de acção social (montante esse, aliás, consideravelmente alargado nos anos imediatamente anteriores) e ainda para a comparticipação do Orçamento do Estado para o funcionamento dos Serviços de Acção Social no ensino superior manifestam a prioridade que o Governo atribui ao desenvolvimento do ensino superior e ao alargamento da sua base social.
Em terceiro lugar, orçamenta para 2011 valores idênticos — aliás, cerca de 2% superiores — aos de 2010 em matéria de investimento em Ciência e Tecnologia, mantendo e reafirmando a absoluta prioridade do Governo quanto ao desenvolvimento científico e tecnológico do País. Tal foi tornado compatível com a necessária redução de recursos nacionais, em 2011, através do estabelecimento pelo Governo de orientações prioritárias nesta matéria, quanto à afectação de montantes superiores de fundos estruturais de origem comunitária em programas co-financiados.
Em quarto lugar, mantém integralmente a contribuição do Orçamento do Estado para o funcionamento da RCTS — Rede Ciência, Tecnologia e Sociedade, rede académica que interliga, nacional e internacionalmente as instituições científicas e de ensino superior e da b-on (Biblioteca Científica On-line), inscrevendo-a na Direcção-Geral do Ensino Superior, com vista à continuidade do seu papel de infra-estrutura académica básica e à sua eventual candidatura à comparticipação por fundos comunitários.
Por fim e em quinto lugar, contempla uma inscrição orçamental, naturalmente mais reduzida face a 2010, em matéria de funcionamento dos serviços do Ministério, com vista a poder concentrar os recursos disponíveis no investimento em Ciência e Tecnologia e nas condições de funcionamento e de alargamento da base social e na qualidade do ensino superior.
Em conclusão: a proposta de orçamento para 2011 do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior segue, estritamente, as orientações estratégicas traçadas no Programa de Governo, de prioridade ao desenvolvimento científico e tecnológico do País e de reforço das qualificações superiores na sociedade portuguesa, factores esses dos mais decisivos para o futuro do nosso País.
Muito obrigado, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pela vossa atenção.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos, agora, à fase de perguntas.
O primeiro grupo parlamentar a colocar as suas questões é o PSD. Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

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O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, começo por saudar os Srs. Presidentes, o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado.
Sr. Ministro, ouvimos com atenção a exposição que acabou de nos fazer. Estamos, porventura, unidos, sem que haja qualquer dúvida sobre essa matéria, em relação aos objectivos que inicialmente enunciou, mas temos algumas dúvidas e divergências, que também são salutares, em relação a algumas das medidas aqui apontadas.
É dentro deste espírito que espero que o Sr. Ministro compreenda, na natural humildade democrática, que eu, saudando a sua presença, tenho a esperança de que desta vez esteja com vontade de discutir o Orçamento do Estado para 2011, que é o que nos traz aqui, para mais face a um panorama — vou centrar a minha intervenção no ensino superior deixando para o meu colega José Ferreira Gomes a componente da ciência — que está longe de ser tão brilhante como o Sr. Ministro acabou de enunciar.
O próprio Orçamento demonstra alguns indicadores preocupantes: o número de diplomados no ano lectivo de 2008-2009 é inferior ao de 2007-2008, incluindo terceiros ciclos; o número de doutoramentos terminados diminuiu em vez de aumentar. Portanto, isto não pode deixar de ser visto como um factor de preocupação, assim como é também factor de preocupação que o saldo da balança tecnológica tenha deixado de ser positiva em 2010 e tenha voltado a ser negativo, depois de ter feito um triénio em que todos nos orgulhámos de ver esse saldo do lado positivo, pela primeira vez. O Sr. Ministro também omitiu essa realidade, que consta do Orçamento do Estado, ou seja, o facto de haver alguma reversão.
Assim, dentro do tempo que tenho disponível, gostava de me concentrar, no que respeita ao ensino superior, sobretudo em torno de três eixos ou perspectivas de discussão.
O primeiro eixo prende-se com a existência, ou não, de erros — e o Sr. Ministro terá mais informação do que aquela de que disponho sobre esta matéria; o segundo eixo é sobre se o que é apresentado em sede de orçamento corresponde verdadeiramente ao Contrato de Confiança ou se há aqui razões para ter desconfiança face aos números concretos apresentados; o terceiro eixo prende-se o espírito de verdadeiro entendimento, ou não, do que é a autonomia universitária à luz do processo de preparação do Orçamento do Estado para o ensino superior em 2011.
Começamos, então, peço primeiro aspecto, que eu diria ser sobre erros e omissões.
Este é um Orçamento do Estado que nos habituou a algumas trapalhadas — uma boa parte do Orçamento foi entregue fora de prazo, depois apareceu uma errata de 830 milhões de euros — , mas numa matéria tão sensível como é o ensino superior e as transferências para as instituições de ensino superior trago à colação algumas afirmações proferidas em público e que não deixam margem de engano relativamente a ter havido também cortes que ninguém suspeitava que iriam acontecer.
Os reitores foram surpreendidos porque os valores lançados não eram aqueles que tinham sido previamente acordados com o Ministério e com o Governo e não foi dada uma explicação sobre o sucedido ao Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), que o refere em afirmações públicas. Aparentemente, o próprio Ministério admite que houve um erro, aliás, foi isso que veio a público também, citando, uma vez mais, o Presidente do CRUP, e é dito que, para resolver o problema, o PS irá apresentar no Parlamento uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado.
A primeira questão que lhe deixo aqui, Sr. Ministro, sendo esta a sede própria para o fazer, pois está na entidade a quem compete fiscalizar a actividade do Governo, é no sentido de explicar-nos se houve erro ou não e, se sim, qual foi a origem do erro. Admito que parte dos problemas não tenham a ver com o seu Ministério, por isso peço que retransmita ao Ministério das Finanças as nossas preocupações sobre esta matéria.
Finalmente, qual é o valor total corrigido que se estima vir a ser disponibilizado às instituições de ensino superior? É aquele que consta dos mapas que nos fez chegar em 5 de Novembro ou ainda vai haver correcções a esses mapas? O Grupo Parlamentar do PS vai ou não apresentar uma proposta no sentido de haver alterações, face ao erro cometido e que nos parece grave? Em matéria de confiança/desconfiança, estamos todos recordados de o Sr. Ministro, há um ano, com grande pompa e circunstância, ter proclamado o tal Contrato de Confiança, sempre numa base plurianual, com o reforço efectivo de 88 milhões de euros no Orçamento do Estado para 2010 — foi muito habilmente anunciado como sendo 100 milhões de euros, mas tanto eu como o Sr. Ministro sabemos que correspondia efectivamente a 88 milhões de euros — , patamar que devia ser mantido nos anos subsequentes.

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De resto, o Sr. Ministro anunciou aqui que este princípio é para respeitar e para cumprir e disse que os cortes são apenas decorrentes das reduções salariais de encargos complementares. Ora, é aqui que os nossos números não batem certo, porque só os próprios mapas remetidos pelo Ministério — e, uma vez mais, questiono se são os mapas finais ou não — apontam para um corte de 121 milhões de euros, portanto, muito mais do que os tais 88 milhões de euros adicionados no ano passado, ou de 126 milhões de euros se olhar para a totalidade das fontes de financiamento do corte, o que é um corte acima de 10%.
Portanto, torna-se muito difícil perceber, sabendo que as universidades têm encargos que não são meramente salariais e que os cortes nos encargos salariais serão, no máximo, de 10%, como é que o Sr.
Ministro compagina a ideia de fazer um corte de 121 milhões de euros dizendo que isto corresponde só a reduções de encargos salariais. Pelas minhas estimativas, eu diria que estamos a falar do dobro do que deveria corresponder a esses valores, mas o Sr. Ministro terá hipótese de me corrigir se não for este o caso.
Presumo que os cortes salariais traduzirão uma diminuição de despesa na casa dos 60 milhões de euros e o que está previsto em sede Orçamento do Estado é cortar o dobro deste valor. Sendo assim, manifestamente, não estaríamos a respeitar, de todo, o Contrato de Confiança. Gostava, Sr. Ministro, que clarificasse se efectivamente, na sua leitura, as reduções de encargos salariais correspondem a 120 milhões de euros.
Quero ainda dizer que em matéria de Contrato de Confiança é o próprio Presidente do CRUP que diz que não sabe muito bem. As contas estão a ser feitas pelas universidades e só no fim de Novembro é que cada uma delas vai saber, face ao clima final que vier a ser enunciado em termos de orçamento, se está ou não em condições de cumprir o Contrato de Confiança.
Isto é tanto mais surpreendente quando, ainda por cima, estamos a falar de um ano em que o Ministério anuncia que vamos ter mais 20 000 alunos no ensino superior. Fazendo aqui umas contas rápidas — o Sr.
Ministro saberá isto tão bem quanto eu — e tendo em conta que o nosso rácio docente/aluno andará na casa de 1/15, o que não é famoso, pois as melhores instituições do mundo andam na casa de um rácio de 1/10 ou abaixo, para manter este rácio, se quer ter mais 20 000 alunos, precisava de mais 1300 novos docentes. Esta parte da equação parece ser totalmente ignorada, uma vez que não só não admitimos novos docentes como, ainda por cima, pressupomos que há este corte de 120 milhões de euros, que, além de impedir novas contratações, vai para além da redução dos encargos salariais relativamente aos docentes que já temos.
A prazo, um verdadeiro indicador de investimento no ensino superior que me preocupa é o de número de euros por aluno que os vários países alocam aos seus sistemas. Trago aqui dados actualizados, do relatório Education at a Glance 2010, onde se vê que estamos na cauda do Plutão; pior do que nós, no mundo ocidental, só a Itália.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, dispõe de 1 minuto.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Ora, este Orçamento para 2011, ao diminuir o numerador em 10%, por um lado, e ao aumentar o denominador em 7%, por outro lado, significa que, num único ano, vamos baixar ainda mais 15% neste indicador — e é disto que estamos aqui a falar — , o que é difícil, uma vez mais, de conciliar com a ideia de que o ensino superior é uma prioridade e que vamos duplicar a qualificação da população portuguesa até 2020.
Finalmente, um último aspecto, que se prende com autocracia ou autonomia universitária.
Sr. Ministro, para concluir, pergunto-lhe se acha razoável que um despacho do Secretário de Estado venha decidir em que termos o dinheiro de uma boa parte das propinas pode ou não ser utilizado pelas instituições de ensino superior, correndo-se o risco de mudar a perspectiva que o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças tem sobre esta matéria e, de repente, estar a pagar propinas, indo 20% das mesmas ser aplicadas noutro tipo de investimento público que não tem nada a ver nem com ensino superior nem com a instituição de ensino superior que determinado agregado familiar escolheu para os seus descendentes frequentarem.
Pelo segundo ano consecutivo, ao arrepio da lei de financiamento e das recomendações da OCDE, há aqui, uma vez mais, uma base de financiamento que não tem nada a ver com fórmulas, que não tem nada a ver com a contratualização de objectivos e que simplesmente se baseia no orçamento do ano anterior, o que, a meu ver, é mais machadada no verdadeiro entendimento — e pergunto qual é seu, Sr. Ministro — da autonomia universitária.

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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, termino dizendo que com menos recursos e menor respeito pela autonomia, por muito que o Governo tenha boas intenções, tenho sérias dúvidas de que o ensino superior esteja a caminhar no sentido certo, à luz dos objectivos que o Sr. Ministro anunciou.
Sr. Presidente, peço desculpa pela demora.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, quero apenas informar que, sendo esta uma reunião de Comissão, embora a decorrer na Sala do Plenário, não se aplica a norma regimental que obriga os oradores a falar de pé.
Tem sido prática, por vezes, na intervenção inicial, o orador falar de pé, mas nas perguntas isso não tem sido prática. No entanto, evidentemente, deixo esta questão à consideração de cada Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para responder.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, com franqueza, dá-me mais jeito falar de pé; estas cadeiras são tão baixas que é mais simples falar de pé. No entanto, que isto não seja uma regra e que o facto de eu falar sentado não seja considerado uma falta de respeito por ninguém.
Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Saraiva, registei com muita atenção as suas palavras iniciais, a sua vontade de afirmar com veemência o total acordo com os objectivos e as intenções e, portanto, é nesse espírito que vou responder. Tudo o resto vou passar em claro. Vou ater-me estritamente às questões de esclarecimento que estavam incluídas na sua intervenção, não vou responder a nenhuma das expressões um pouco mais coloridas do seu discurso.
Registo que, ao menos, o Sr. Deputado reconhece as nossas boas intenções, o que já não é mau. Se temos boas intenções e os mesmos objectivos, as coisas caminham no bom sentido. Aliás, não percebo como é que, em Portugal, as coisas podem caminhar se não for desta maneira.
O objectivo que Portugal tem pela frente nesta matéria — e far-me-á a justiça de ter em conta que trabalho com este objectivo há mais de 20 anos — , de recuperar o seu atraso científico de séculos, de recuperar o seu atraso de qualificações, não pode ser cumprido nunca se este espírito de consenso não se verificar. Nos períodos em que ele se verificou na nossa história recente houve progresso; nos períodos em que ele não se verificou não houve progressos.
Há questões de facto com as quais nos interroga, algumas das quais, confesso, não percebi.
A balança tecnológica portuguesa relativa a 2010 não é conhecida, nem nunca é conhecida a não ser no ano seguinte, como é evidente.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Do primeiro semestre!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado, não se faz análise por semestres. Se analisar retrospectivamente os semestres dos anos anteriores verá que isso não é técnica de análise. Portanto, é sempre no ano seguinte e depois de estarem consolidados os dados que pode analisar-se a balança tecnológica.
Os últimos dados da balança tecnológica, como é normal, visto que o ano de 2010 não terminou e nem sequer está registado, são, naturalmente, os de 2009. Portanto, Sr. Deputado, não compreendo a questão.
Relativamente aos números de doutoramentos também fiquei um pouco confuso. Para benefício dos Srs. Deputados, recordo que a dúvida incidia sobre a forma como está isto a correr todos os anos.
O número de doutoramentos registados, em 2008, foi de 1496 e, em 2009, de 1545, sendo que o ano de 2010 ainda está a correr; era de 1199 em 2005, era de 859 em 2000 e era de 337 em 1990. Há 20 anos atrás, havia 337 doutoramentos em Portugal por ano e no ano passado houve 1545 doutoramentos — isto no que diz respeito aos números.
Penso que não vale a pena termos nenhuma ansiedade nesta matéria. Os números, neste momento, são crescentes nos vários indicadores, como, aliás, seria de esperar dado o acumular, ao longo dos anos, das pessoas que estavam a preparar doutoramento ou que estavam inscritas em doutoramento. É natural que seja

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assim. Aliás, pode prever-se para os anos seguintes, com uma margem de erro razoável, quantos doutoramentos haverá em Portugal a partir apenas das indicações dos dois ou três anos anteriores.
No que diz respeito ao contrato de confiança no ensino superior, Sr. Deputado, quer com certeza acreditar que não venho aqui dizer que este proposta de Orçamento verifica escrupulosamente o Contrato de Confiança no ensino superior sem que essa afirmação esteja suportada no acordo explícito da sua interpretação com o Presidente do Conselho de Reitores de Universidades Portuguesas e com o Presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos e sem que ela corresponda à verdade! Tive o cuidado de apresentar — junto com um documento que enviei para a Assembleia da República na sexta-feira passada — uma leitura que permite uma análise mais coerente e mais fácil dos dados que, por vezes, são de difícil interpretação, porque envolvem fontes consolidadas e porque, por razões técnicas, não incluem certas parcelas, etc.
Para sermos claros, como é que este orçamento se estrutura, do ponto de vista global? E falo de todo o orçamento de ciência e ensino superior.
Este orçamento estrutura-se da seguinte forma: existe, em duas grandes parcelas, uma contribuição do Ministério para o esforço de consolidação orçamental, através da redução de verbas nacionais do Orçamento do Estado, que atinge, no essencial, dois sectores, o sector da ciência e o sector da acção social do ensino superior.
São dois sectores que, em determinados programas que estão em curso, já eram co-financiados por fundos comunitários, designadamente pelo Fundo Social Europeu e pelo FEDER. Essa redução foi integralmente compensada com a alteração de regras internas, nacionais, nessa matéria, relativamente a taxas de co-financiamento e relativamente ao alargamento, nesses programas, de acções que podiam ser cofinanciadas mas que não estavam a ser submetidas a financiamento por indisponibilidade de fundos.
A reprogramação interna fez com que isso fosse feito mantendo-se o volume financeiro disponível na acção social, no ensino superior, parte co-financiada. Mas isso envolve também o PROTEC (Programa especial de apoio à formação avançada de docentes do ensino superior politécnico), nos institutos politécnicos, envolve os cursos de especialização tecnológica e envolve alguns programas na área da ciência, designadamente a formação avançada de projectos, etc. Esta é a primeira componente.
A segunda componente consiste na redução em todo o Ministério, que tem mais expressão, naturalmente, pelo volume de massa salarial, no sistema de ensino superior, traduzindo-se no estrito resultado da aplicação das normas da proposta de lei do Orçamento em matéria salarial e prestações complementares: ajudas de custo, horas extraordinárias, tudo o que tem a ver com remunerações.
Estes valores são certos e o que está a ser feito com as instituições de ensino superior — e, naturalmente, não podia ter sido feito na altura da apresentação do orçamento em detalhe — é a análise de instituição a instituição, por cada uma delas, não dos valores médios ou globais, que esses estão correctos, mas dos valores detalhados para cada uma dessas instituições.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, falta 1 minuto.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, estou a terminar nesta fase.
Se ficar alguma questão por responder, certamente que o farei na segunda ronda. Peço antecipadamente desculpa.
A questão a que me estava a referir é uma questão que está a ser analisada com total transparência e consensualidade com as próprias instituições de ensino.
Não estão em causa os números globais que aqui estão indicados, não há nenhuma trapalhada. O que está a ser e tem de ser analisado é o ajuste fino para cada uma das instituições do ensino superior, a partir do trabalho feito pelas próprias instituições e respectivas administrações. Em muitos casos, esse trabalho está terminado; noutros casos há dúvidas por parte de algumas instituições, dúvidas essas que estão a ser dirimidas.
Este trabalho, repito, é um trabalho que tem estado a ser acompanhado permanentemente pelo Ministério, a Direcção do Conselho de Reitores e a Direcção dos Institutos Politécnicos e todos confirmam este entendimento.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Srs. Presidentes das Comissões, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, a minha primeira nota é para vos dizer que o facto de estar sentado significa apenas que é muito mais confortável fazer a intervenção com os dados à frente do que estar levantado. Tal não significa menor consideração pela Câmara.
A segunda nota, como não podia deixar de ser, é para aquilo que aconteceu em Julho deste ano, quando apresentei quatro quadros exactamente sobre este estudo da OCDE e o Sr. Deputado Pedro Saraiva considerou que não sabia de onde vinham aqueles dados. Pois ainda bem que já sabe de onde vêm aqueles dados e utiliza-os da forma que melhor lhe convém.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Está enganado! A fonte é diferente!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Mas vamos ao que é essencial neste debate do Orçamento do Estado. Vamos fazer a reflexão central neste debate, nomeadamente em relação ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Portugal, não só para 2011 — esse ano de uma forma mais acentuada, mas nos últimos anos — , tem tido a necessidade de fazer um esforço significativo de consolidação orçamental para conseguir ir além das suas responsabilidades no contexto do processo de integração europeia e no processo de globalização.
Foi capaz — eu disse-o ao longo destes cinco anos e volto a reiterá-lo para o Orçamento de 2011 — de, mesmo com essa necessidade de contenção orçamental, estabelecer prioridades significativas nos sectores que podem, de facto, mudar a nossa realidade económica e, de certa forma, garantir um desenvolvimento económico que até então não temos sido capazes de conseguir.
Para 2011 consubstancia-se exactamente a mesma prioridade. Em relação ao ensino superior — que será matéria da qual falarei nestes sete minutos que me restam e a Sr.ª Deputada Manuela Melo falará sobre ciência na segunda ronda — não há nenhuma dúvida que se levante, até porque pelas informações que recebemos do terreno, quer o CRUP, quer o CCISP, no seio das negociações para o Orçamento do Estado, reconheceram que a base da discussão era a mesma do Orçamento que estava estabelecido em 2010. Ou seja, as verbas que eram retiradas eram as verbas inerentes à diminuição das remunerações lato sensu, em toda a Administração Pública. Isso é para nós, Partido Socialista, um valor intrínseco em si mesmo, ou seja, o reconhecimento de que continuamos a apostar significativamente nas qualificações, e todos os dados que temos o provam.
Ao longo destes cinco anos, fomos capazes de aumentar o número de alunos no ensino superior de forma sistemática, enquanto anteriormente víamos uma diminuição muito significativa. E fazemo-lo de forma marcada — este Orçamento volta a estabelecer essas prioridades — nas zonas ou nas franjas mais frágeis, que eram aqueles que estavam fora do sistema há vários anos.
Temos uma prioridade estabelecida, nomeadamente com o Contrato de Confiança, para a formação de activos, temos uma aposta muito significativa no ensino pós-laboral, que permite aos nossos concidadãos que estão já no mercado de trabalho aproveitarem essas mesmas formações, para além de uma inovação significativa neste último ano lectivo e para continuar — segundo indicações deste Orçamento do Estado — , a do ensino à distância, que permite também, de certa forma, que muitos daqueles que trabalham ou estão distantes dos centros específicos das formações que pretendem obter possam aproveitar estas formações, garantindo-nos que a prioridade estabelecida pela Europa para 2020 seja conseguida, nomeadamente no coorte dos 30 aos 34 anos, ou seja, termos 40% dos nossos concidadãos formados.
Depois, quero salientar que mesmo em tempo de contenção orçamental, nós, Partido Socialista — e isto orgulha-nos — , somos capazes de sustentar a necessidade de igualdade de oportunidades no acesso e manutenção no ensino superior, nomeadamente com o investimento que é feito nas bolsas de acção social, que se mantém nos 147 milhões de euros, relativos ao ano anterior, mesmo sabendo-se que foi um esforço significativo de maior rigor na atribuição de bolsas, com a avaliação e retirada do sistema de acção social daqueles alunos que tinham, em termos patrimoniais, valores acima dos 100 000 €, e tambçm com a capacidade que tivemos, ao longo destes anos, de aumentar significativamente o investimento em acção social.

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Significativa também é uma nota que vem no Orçamento do Estado sobre a da reorganização dos serviços de acção social. Gostaríamos de saber em que consiste esta reorganização, sendo esta a primeira questão que lhe coloco.
Depois, quero frisar também a importância da vertente da qualidade, assumida novamente em sede de Orçamento do Estado.
O esforço significativo iniciado pelo novo regime jurídico das instituições do ensino superior, que reforça as formações e a qualidade dos corpos docentes, obriga, no início de carreira, ao doutoramento. Esses valores são muito claros e não sei onde é que o Sr. Deputado Pedro Saraiva foi encontrar aqueles que referiu, pois o número significativo de aumento dos doutorados em Portugal demonstra também — o que seria natural — uma necessidade do próprio corpo docente em qualificar-se ao nível do que é exigido pelo próprio regime jurídico, pelo acesso à carreira consubstanciado nesse mesmo regime jurídico.
Por outro lado, assinalamos um esforço significativo do Estado português, designadamente do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em matéria de parcerias internacionais.
Portugal foi capaz de estabelecer parcerias internacionais com as melhores instituições do mundo, com as que estão em primeiro lugar em todos os rankings internacionais, garantindo, por um lado, um cruzamento da qualificação dos que participam nessas formações e, por outro, a absorção do que se faz de melhor em termos de ciência, tecnologia e também de ensino superior por parte das nossas empresas, muitas delas parceiras nestes acordos internacionais, absorvendo mais-valias competitivas muito significativas e que consubstanciam também o indicador balança tecnologia.
Esperamos pelo final do ano de 2010 para saber exactamente qual é o saldo da balança tecnológica, mas há uma coisa que sabemos: foi com o Governo do Partido Socialista que esta balança tecnológica mudou, e mudou, felizmente para Portugal, para um saldo positivo, o que demonstra a aposta significativa nesta área, nos últimos anos — os dados globais da ciência, muito objectivos em relação a esta matéria — , consubstanciada também em toda a reforma do ensino superior.
Também devido à reforma do ensino superior, subsume-se neste Orçamento do Estado um novo indicador relevantíssimo para nós, que tem a ver com o facto de ter sido feita a avaliação e a acreditação dos cursos de todas as instituições do ensino superior por parte da Agência Internacional de Avaliação e terem sido criadas já condições para que, no próximo ano lectivo, seja feita uma reorganização da rede formativa do ponto de vista macro, até agora realizada de uma forma mais circunstancial, que nos possa dar indicadores muito mais significativos de uma adequação das formações às realidades da procura e, essencialmente, às realidades da necessidade do País.
Isso, para nós, é muito significativo e poderá reforçar ainda mais os indicadores de algumas parcerias entre as próprias instituições em termos de formações, nomeadamente as formações avançadas, dos 2.º e 3.º ciclos, mestrados e doutoramentos, com resultados muito positivos em termos da qualidade de formação e do aproveitamento do que é realizado por parte desses mesmos alunos.
Deixo também uma nota à reflexão do Sr. Ministro em relação à necessidade da reorganização da rede do ensino superior em Portugal e que as instituições já foram capazes de absorver ao longo destes mesmos anos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Mota, procurando manter-me no registo do esclarecimento das questões objectivas, julgo que, no essencial, interpretei três questões que nos foram dirigidas.
Uma primeira diz respeito, em última análise, directamente à actividade da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior; outra diz respeito ao processo de reorganização da rede formativa, o que está anunciado nesta minha intervenção e no Relatório da lei do Orçamento como roteiro da reorganização da oferta formativa e uma terceira é relativa à questão da reorganização de serviços de acção social. Começo por este último ponto.
Com a publicação dos novos regulamentos de acção social e de normas técnicas comuns a todo o País, consagra-se a total igualdade de circunstâncias dos estudantes relativamente ao sistema de apoios sociais.
Deixa de haver regras técnicas diversas de uma instituição para outra.

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Nesse sentido, pela primeira vez, é possível abordar o problema — já abordado por quase todos os países europeus nas suas realidades nacionais — de saber quais as acções ou as áreas em que faz sentido os serviços de acção social serem separados, do ponto de vista operacional, sobretudo nas mesmas cidades, e quais são as áreas em que faz sentido haver economias de escala, com uma gestão conjunta. Pois se as cantinas e as residências praticam os mesmos preços e se o regime de bolsas é igual, qual é o sentido de multiplicar direcções de serviços e organismos? Esta não é uma reflexão apenas do Ministério, é uma reflexão que está neste momento em curso no interior do Conselho de Reitores, no interior do Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos e, em algumas cidades do País, já entre as próprias instituições. Pode ser concebida dentro de uma mesma cidade — aliás, temos cidades onde existem serviços de acção social e onde os estudantes, naturalmente, poderiam beneficiar de um serviço único, mas sem se querer criar qualquer mastodonte, isto é, com as autonomias de gestão necessárias, mas havendo a possibilidade de infra-estruturas comuns, concursos para aprovisionamento comuns, etc.
Portanto, a forma de reorganização dos serviços de acção social está na ordem do dia para que, durante o ano de 2011, seja realizada — e será sempre realizada com as instituições e pelas próprias instituições.
A segunda questão diz respeito à reorganização da rede formativa, mas antecedida pela questão da avaliação e acreditação dos cursos.
Gostaria de chamar a atenção para o seguinte: no ano de 2009/2010, foram propostos para acreditação 327 novos ciclos de estudo, dos quais cerca de 40% teve decisão favorável de acreditação e cerca de 60% teve decisão desfavorável. Este processo foi concluído.
No que diz respeito à acreditação dos ciclos de estudo pré-existentes à Agência de Avaliação e Acreditação, é extremamente interessante verificar que o próprio processo de estabelecimento da Agência, de estabelecimento de metodologias de reporte por parte das instituições e de estímulo à criação de mecanismos internos de avaliação de qualidade no interior de cada instituição, conduziu autonomamente, pelas próprias instituições, a uma redução significativa de cerca de 900 dos ciclos de estudos antes registados, que as instituições decidiram cancelar e não pedir a sua acreditação.
Este é talvez um dos processos mais interessantes e que obrigou a um intenso trabalho dentro das instituições para chegarem a estas conclusões.
Neste momento, o que falta neste processo é a avaliação e acreditação do restante, daquilo que as instituições validaram, que queriam mesmo que fosse avaliado e acreditado. Nos próximos meses, este processo estará terminado.
E é precisamente neste momento que é possível começar a pensar, de uma forma objectiva, na reorganização da oferta formativa, porque a oferta formativa fica clara a partir do momento em que os cursos sejam, ou não, acreditados, e não antes (naturalmente, não fazia qualquer sentido fazer uma reorganização da oferta formativa sem se saber quais os cursos que deveriam e não deveriam ficar).
Um primeiro trabalho tinha a ver não com a rede mas com a própria qualidade intrínseca da oferta formativa — e foi este o trabalho que foi feito, que está a ser feito e que estará terminado nos próximos meses.
O ano de 2011 é, pois, o ano da criação do roteiro da reorganização da oferta formativa.
Que fique claro: ninguém pretende — nem nas instituições, nem no Ministério — qualquer decisão de natureza burocrática sobre esta matéria. Este assunto foi longamente discutido com a equipa internacional de avaliação da OCDE, em Portugal, há quatro anos, e a recomendação internacional que nos é feita é precisamente não a de distinguir instituições mas a de manter, nesta fase, a rede existente, promovendo consórcios e sinergias entre as instituições e uma reorganização da oferta no interior desses consórcios.
Porquê? Precisamente porque estamos numa fase de expansão e com uma falha gigantesca, reconhecida há quatro anos, na atracção para o ensino superior de activos.

O Sr. Presidente: — Resta-lhe 1 minuto, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Muito obrigado, Sr. Presidente, pelo seu aviso.
Ora, foi em resposta a esta evidência que o Contrato de Confiança veio estabelecer uma prioridade na promoção do acesso dos activos ao ensino superior — e, portanto, na formação ao longo da vida, em

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Portugal, quer ao nível pós-graduado, quer ao nível das entradas de ciclos curtos e de licenciaturas — , sobre o qual se vai fundar esta reorganização da oferta formativa. Consórcios estarão, portanto, na ordem do dia, no ano de 2011.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Presidente da Comissão de Educação e Ciência, os Srs. Membros do Governo e os Srs. Deputados.
Antes de mais, quero dizer-lhe, Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, que esta grelha me parece pouco flexível e serve pouco esta Comissão, coisa que, aliás, o CDS já disse no passado.
De facto, este tempo inicial de 8 minutos leva, em primeiro lugar, a que os Deputados, como já se viu até agora e continuará a ver-se, tenham de fazer um grande esforço de alargamento, quase que os obrigando a preencher o tempo, e, depois, a que as perguntas se «afundem» nos 8 minutos da resposta por parte do Governo, implicando, por vezes, uma falta de resposta.
Aliás, o facto de ter gasto 1 minuto a dizer isto quer dizer que me sobra tempo»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, quero só informar que, embora tivesse havido tentativas de alteração, esta grelha foi acordada em reunião da Comissão de Orçamento e Finanças, e é a mesma do ano passado.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Com certeza, Sr. Presidente. Aliás, no ano passado, referi exactamente a mesma coisa. Daí ter sentido a necessidade de voltar a dizê-lo, como, aliás, já o disse a Deputada Assunção Cristas, em sede da Comissão de Orçamento e Finanças.
Quero começar por agradecer à equipa do Ministério o trabalho feito na apresentação, ontem, da proposta de orçamento, porque, se tivesse sido hoje, teria sido muito pior — aliás, o facto de terem trabalhado durante o fim-de-semana demonstra o espírito de dedicação que têm»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Foi enviado na sexta-feira!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Se foi na sexta-feira, então, foram os serviços que se atrasaram no seu envio para a Comissão.
Ainda assim, tenho pena que o Sr. Ministro não tenha aproveitado algum do seu tempo inicial para corrigir alguns dos erros contidos neste documento, que são normais, mesmo num orçamento. Por exemplo, no Quadro II, diz-se que a dotação orçamental para o funcionamento do ensino superior (item 2) resulta da soma das parcelas 3, 5 e 6, quando a parcela 5 nem sequer existe. Isto apenas para referir um caso.
Já agora, Sr. Ministro, aproveito para assinalar o seguinte: nesse mesmo Quadro II, a parcela 4 (que imagino seja aquela que se refere no somatório acima como 5), relativa ao PROTEC, no valor de 6 milhões de euros, não aparece em sítio algum no Quadro I. Esta é uma dúvida que tenho e que gostaria de ver esclarecida: onde estão «escondidos» estes 6 milhões de euros no Quadro I? Voltando aos problemas destes quadros, quero referir o seguinte: quando o Sr. Ministro diz (afirma-o no texto e afirmou-o aqui oralmente) que, nas transferências para as instituições do ensino superior, a única coisa que corta tem a ver com a baixa nos salários, dificilmente percebemos como isso é possível. Desde logo, porque o próprio CRUP veio dizer que haveria supostamente erros nos valores a transferir para o ensino superior, tendo inclusivamente o Sr. Presidente do CRUP dito que já tinham transmitido essas informações para o Ministério e que agora teriam de fazer a correcção do ponto de vista formal — disse, aliás, que o fez em tempo recorde e que esperava que o Ministério respondesse também em tempo recorde — , o que tecnicamente seria muito difícil, pois o Ministério já entregou o respectivo orçamento. Por isso, apesar de já se ter sugerido aqui uma correcção destes valores por parte do Partido Socialista, uma vez que foi o próprio Partido Social Democrata a dizê-lo e teria de ser o Partido Social Democrata a aprová-lo no âmbito do acordo que fez com o Partido Socialista — e, pelos vistos, não sabe isso! — , julgamos que as instituições não vão receber nada.
Portanto, é difícil olhar para os valores transferidos para as universidades, ver cortes de 21%, no caso do Politécnico de Santarém, de 11% na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, de 14% na

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Universidade de Évora, ou de 29% na Universidade dos Açores, e acreditar que isto se deve apenas a despesas com o pessoal, pois isso quereria dizer que os professores seriam todos catedráticos e os funcionários todos do topo da carreira, pelo menos — e, pelo menos, no caso dos 11%, pois, no caso dos 29%, já não se consegue explicar.
Aliás, a este propósito, percebe-se a intervenção aqui feita pelo Deputado Manuel Mota, pois uma das únicas instituições cujas verbas aumentam é o Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, que o Sr. Deputado conhece muito bem, e daí a sua grande euforia relativamente a esses valores.
Assim sendo, se o Sr. Ministro quiser explicar como se atingem estas percentagens e como é que isso se deve apenas aos cortes nos vencimentos dos funcionários, seria bom.
Já agora, sugeria-lhe, Sr. Ministro, que, no final desta reunião, fizesse uma chamada do seu telemóvel e explicasse ao Sr. Presidente do CRUP que aquilo que ele diz não corresponde à verdade, que o Ministério não solicitou, nem lhe foram enviados quaisquer erros, e que o próprio Ministério não poderia corrigi-los depois de já ter sido entregue o orçamento.
Voltando à questão dos erros contidos nos quadros, quero dizer que, no Quadro I, quando se comparam os valores das dotações iniciais de 2010 com os de 2011, está também a incorrer-se numa inverdade, porque estes já são valores ajustados á execução orçamental de 2010, creio»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Então, Sr. Ministro, há aqui algum problema.
É que, relativamente ao Quadro I do orçamento do ano passado, para o valor inscrito para a «Ciência e Tecnologia», por exemplo, obtenho um total de 583 000 milhões de euros, enquanto que, neste Quadro I, na parte relativa a 2010, estão apenas orçamentados 528 000 milhões de euros. Aliás, usa-se isso, depois, para dizer que o valor inscrito em «Ciência e Tecnologia» subiu, porque estão inscritos 532 000 milhões de euros, quando, se olharmos para os valores inscritos no ano passado, afinal há uma redução na execução de cerca de 50 milhões de euros na parte dos fundos comunitários, a qual, curiosamente, também não é acompanhada por uma baixa na execução na parte do Orçamento do Estado, coisa que não se compreende. É que, como estes fundos comunitários são muitas vezes co-financiados com verba nacional, se se executou quase menos um terço da parte comunitária, não se percebe como é que, na parte nacional, não há uma redução dos gastos em «Ciência e Tecnologia», nomeadamente no investimento em «Ciência e Tecnologia». E como é que o Sr.
Ministro, quando no ano passado inscrevia 538 000 milhões de euros e este ano inscreve 532 000 milhões de euros, diz que há um ligeiro crescimento (2%, disse-o há pouco) em «Ciência e Tecnologia»? Creio que vale a pena falar disto.
Para já, são estas as minhas questões, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, procurarei manter-me no registo anunciado e acordado desde o princípio.
Em primeiro lugar, quero agradecer-lhe ter-me feito anotar a gralha na numeração das diferentes linhas no Quadro II. Tem toda a razão: a numeração que consta do Quadro ç 1,2,3,4» e, depois, passa para 6. Porçm, isso não altera, como deve imaginar, nem o valor de cada uma das linhas, nem o conteúdo do quadro. Mas agradeço essa sua observação.
Relativamente às questões que colocou, as mesmas são fáceis de explicar, mas compreendo que não sejam óbvias numa primeira leitura destes documentos.
Primeiro, quanto àquilo que não é destes documentos mas da informação que o Sr. Deputado dispõe relativamente às dotações, tive o cuidado de referir, há pouco (na resposta ao PSD, julgo), que o que estava a ser feito não dizia respeito à dotação global para as instituições de ensino superior. Essa dotação global é a que consta destes quadros, isto é, da proposta de orçamento.
O trabalho técnico que esteve a ser feito nestas últimas semanas, como é do conhecimento de todas as instituições de ensino superior, é o da distribuição das dotações por cada uma das instituições de ensino superior. O Sr. Deputado referiu números — numa instituição haveria reduções altíssimas e noutras, que

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provavelmente não referiu, não havia redução alguma — que têm de ser trabalhados, pois cada uma das instituições deve calcular qual é a redução efectiva dos salários e das outras remunerações para essa redução ser feita. Esse trabalho está, neste momento, concluído e tem sido acompanhado, pari passu, pelas próprias instituições, pela direcção do CRUP e pela direcção do CCISP.
A dotação global do ensino superior está aqui indicada. Não é essa que está em causa, é apenas a distribuição dessas dotações que, como se sabe, é e sempre foi feita, mesmo antes desses cortes, de acordo com uma grelha acordada com o próprio Conselho de Reitores e com o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos.
Em estilo irónico, referiu o caso do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, mas esta questão era» Mas bem, mas bem! Quero dizer-lhe, porque gostaria de partilhar esta questão convosco, que é interessante. O Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, separadamente, decidiram, nos trabalhos preparatórios do Orçamento do Estado, comunicar ao Governo que a sua proposta era a de manutenção, para 2011, da grelha de distribuição. Ou seja, decidiram manter a grelha de distribuição de 2010 e não alterá-la. Poderia haver a discussão se ela não deveria ser alterada por ter havido alteração do número de alunos, mas cada uma das instituições propôs ao Governo a manutenção.
Estas decisões foram unânimes nos dois conselhos e, nesse sentido, foi acordado que sim, que era isso que seria feito, com uma excepção, no que diz respeito ao Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos. Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos de uma forma, que eu diria excepcional, face à prática de anos anteriores, reconheceu que o Instituto Politécnico do Cávado e do Ave — uma pequena instituição em rápido crescimento nos últimos anos e que responde a uma procura essencialmente de ensino pós-laboral, local, de extrema importância — deveria ser compensado no seu orçamento.
Esta decisão é uma decisão interna do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, que decidiu propor uma cativação de cerca de 0,5% dos orçamentos de cada um dos institutos politécnicos e afectar essa verba ao Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, o que foi, naturalmente, feito pelo Governo, porque se tratava de uma proposta do próprio Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos.
Por último, gostava de explicar a questão de 2010-2011 nos quadros dos fundos comunitários. O Sr. Deputado viu muito bem que a questão estava na inscrição em fundos comunitários e gostaria de lhe chamar a atenção para o critério de registo dos fundos comunitários, em 2011, que procurámos seguir estritamente. Em 2011, procurámos inscrever não as dotações máximas disponíveis em fundos comunitários nos programas para estas acções mas apenas os programas que, neste momento, estão acordados.
Por exemplo, se temos um programa acordado em que a taxa de comparticipação aumenta ou em que o universo aumenta, foi apenas isso que foi inscrito em fundos comunitários. Esse trabalho teve de ser feito muito cuidadosamente e as verbas que estão inscritas, agora, no quadro que foi apresentado, como verbas revistas de fundos comunitários para 2010 são apenas as verbas que correspondem aos programas cujos pagamentos estão contratualizados, neste momento.
Portanto, poderá haver ainda uma ultrapassagem, um aumento ligeiro dessas verbas no último mês deste ano, mas procurámos pôr apenas tudo aquilo que tinha sido contratualizado e pago, quer em bolsas de estudo de acção social, quer em bolsas de estudo de formação avançada, quer em programas e projectos da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, e não pôr mais nada.
Relativamente a 2011, seguimos exactamente o mesmo critério: apenas os programas que estavam contratualizados. Evidentemente, a disponibilidade de verbas de fundos comunitários é superior em 2011 àquela que está inscrita — houvesse capacidade de antecipação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, queria começar por cumprimentá-lo e dizer-lhe que há uma coisa que ainda não está clara e que não é claramente assumida pelo Sr. Ministro. É que este orçamento significa menos dinheiro para as universidades, menos investimento por aluno, e isso não é apenas, como vai ficando cada vez mais claro ao longo deste debate, a redução dos salários e os cortes nos salários. São menos 138 milhões de euros para as

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universidades e, na verdade, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior fez um contrato de confiança com as instituições do ensino superior e anunciou mais 100 milhões. Sabemos que, com os salários, poupa quase esses 100 milhões e que, além do mais, reduz o dinheiro para as instituições funcionarem. Tudo isto num contexto em que exige às universidades, às instituições do ensino superior, a formação de mais 100 000 activos. Portanto, há aqui uma contradição: é que diminuem os funcionários e os professores, mas aumentam as exigências que se fazem às instituições para formar estudantes.
Ora, gostava que o Sr. Ministro pudesse dar a este Parlamento a informação sobre esta questão do orçamento e que é a seguinte: as verbas que o Orçamento do Estado transfere para as instituições não têm permitido, sequer, pagar os salários a todos os funcionários, docentes e não docentes das instituições, ao longo destes anos. E é comum haver, à última da hora, transferências para salvar as instituições de fecharem as portas. Ora, este orçamento parece manter uma situação no limiar dessa dificuldade.
A Universidade de Lisboa, no ano passado, como sabe, tinha, só em salários, cerca de 110 milhões de euros de despesa. O Orçamento do Estado transferiu, no ano passado, cerca de 100 milhões de euros para a Universidade de Lisboa, o que significa que, com um orçamento de 140 milhões de euros, a Universidade de Lisboa não tinha — do dinheiro que era transferido do Orçamento do Estado — capacidade sequer para pagar todos os salários, durante todos os meses.
Este ano, a transferência para essa mesma universidade é de cerca de 90 milhões de euros. Gostava que o Sr. Ministro esclarecesse este ponto: na Universidade de Lisboa, como nas outras universidades, o Sr.
Ministro garante que as transferências do Orçamento do Estado chegam, ao menos, para pagar os salários para essas instituições se manterem em funcionamento? O Sr. Ministro, com o orçamento que aqui foi apresentado, pode gabar-se de as universidades terem aumentado as receitas próprias em 26%, com as reformas que este Ministério promoveu. Mas nós sabemos o que significa aumentar em 26% as receitas próprias: significa que são as famílias que pagam mais pelo ensino superior. Aliás, as famílias portuguesas são as que mais pagam pelo ensino superior, de acordo com o último relatório da OCDE.
Gostava que o Sr. Ministro comentasse o facto extraordinário, a proeza absoluta e o recorde que consegue, neste ano, de ter propinas em instituições públicas, em escolas públicas do ensino superior, que atingem os 37 000 €! Estou a falar de uma pós-graduação do ICSTE. Ou seja, estamos a falar de vários cursos de mestrado, que correspondem a formação que, antes, fazia parte da licenciatura, que têm propinas de mais de 10 000 €.
Repito: 10 000 €, Sr. Ministro! Nessa mesma instituição, há cursos do 2.º ciclo, que correspondem, como se sabe, a anos de formação que dantes faziam parte das antigas licenciaturas, que têm propinas de 20 000 €, o que significa que há um descontrolo absoluto das propinas no 2.º ciclo — muitas dessas propinas do 2.º ciclo correspondem a anos de formação ou a uma parte da qualificação que é necessária para o exercício das profissões.
Portanto, gostava que o Sr. Ministro comentasse esse «orgulho do aumento das receitas próprias», que é, em grande medida, uma penalização das famílias e um aumento de propinas que torna incomportável para muitas famílias a frequência dos 2.os ciclos e a qualificação das pessoas.
Hoje, o Estado gasta menos, investe menos, por aluno, do que em 2005. O próprio contrato de confiança confirma que o investimento por aluno do Estado é menos 16% do que a média dos países que compõem a zona euro. E, portanto, se o Estado investe menos, por aluno, no ensino superior, apesar de haver hoje mais alunos a frequentarem a universidade, de duas, uma: ou teremos menos qualificação ou, de facto, as instituições vão ter que cobrar mais dinheiro aos alunos pela mesma qualificação que antes tinham.
Gostava que o Sr. Ministro também se pronunciasse sobre uma outra realidade que está em crescimento nas universidades portuguesas e que é a realidade dos professores voluntários. Este orçamento tem um problema de fundo, que é o seguinte: as verbas para as universidades diminuem e requer-se às universidades que formem mais estudantes havendo menos professores e menos funcionários. Isso significa que, de duas, uma: ou que há uma intensificação muito significativa do ritmo de trabalho dos professores ou que há professores que não pagos. E vai haver, cada vez mais, pessoas que dão aulas nas instituições de ensino superior e não recebem salário.
Na Universidade do Porto, na Universidade de Lisboa, na Universidade Nova de Lisboa, na Universidade de Aveiro, foram aprovados regulamentos de professores voluntários, o que significa que se pede — enfim, pedir é talvez um eufemismo — , que se sugere, de forma muitas vezes enfática, que investigadores, bolseiros

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de investigação assumam as aulas de determinadas cadeiras. O artigo 13.º de um desses regulamentos diz até, claramente, e vou citar: «Os direitos e deveres dos docentes voluntários são os previstos na carreira docente, com as adaptações decorrentes do facto de os voluntários exercerem as suas funções sem remuneração.» Portanto, sabemos que há, em Portugal, cerca de 10 000 bolseiros e são muitos deles que, trabalhando à borla, estão a assegurar necessidades permanentes das instituições, num contexto em que as instituições têm menos dinheiro para funcionar, têm menos professores para mais alunos e em que se prevê que se possa multiplicar esta forma de abuso laboral — »

O Sr. Presidente: — Falta um minuto, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — » acho que é assim que deve ser chamada esta forma laboral — sobre os investigadores, muitas vezes, sobre jovens investigadores ou sobre pessoas a quem se sugere que, voluntariamente, dêem aulas sem receber um tostão.
Portanto, gostava de saber o que é que o Sr. Ministro pensa desta realidade e se esta é a solução escondida de um orçamento que está cheio de contradições e de assuntos por esclarecer.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Moura Soeiro, muito obrigado pelas suas questões.
Gostaria de responder, uma a uma, às várias questões que foram colocadas, apesar de algumas delas não serem propriamente questões, serem afirmações, mas que suponho que têm por objectivo solicitar-me a confirmação ou negação dessas afirmações. Portanto, é nesse espírito também que vou responder.
Em primeiro lugar, já tive ocasião, aqui, de explicar e de enunciar em detalhe — e passo, portanto, rapidamente sobre esta questão — , na resposta que dei ao CDS e ao PSD, que a redução da dotação específica para o ensino superior (é assim tecnicamente que se chama) proveniente do Orçamento do Estado é apenas a que resulta ou a que resultar, para cada uma das instituições, da aplicação das reduções salariais e prestações correspondentes. Estamos a falar de um número de cerca de 100 milhões de euros de redução, segundo o cálculo feito pelas próprias instituições de ensino superior. Repito: cálculo feito pelas próprias instituições de ensino superior. Portanto a este ponto, pode o Sr. Deputado ficar tranquilo.
A questão que levanta a seguir é diversa e diz respeito às verbas do Orçamento do Estado para salários.
Peço desculpa de chamar a atenção do Sr. Deputado, mas certamente conhece mal a realidade orçamental das melhores instituições de ensino superior portuguesas.
Quando aumentam as receitas próprias das instituições de ensino superior, por exemplo, quando uma grande instituição de ensino superior universitário recebe 50 ou 100 milhões de euros de contratos de investigação, isso implica necessariamente a contratação de pessoas e, portanto, o aumento da massa salarial que é paga nessa vertente por esses 50 ou 100 milhões de euros de contratos de investigação.
Ao analisar uma grande instituição universitária em Portugal, já não encontrará o panorama dos chamados «professores do quadro« e mais ninguçm, que encontrava há 10 anos» Encontrará muitas pessoas — professores convidados, investigadores convidados, investigadores a tempo inteiro, etc. — , que são, em grande parte, possíveis porque existem financiamentos para investigação nessas instituições.
A diferença entre a dotação do Orçamento do Estado e a dotação global de uma universidade pode ser enorme.
Existem instituições em Portugal em que as receitas próprias são superiores à dotação do Orçamento do Estado, ou seja, têm uma capacidade de captação de receitas muito superior às dotações do Orçamento do Estado.
Diz o Sr. Deputado, de acordo com uma lógica antiga: «Ah, isso são as propinas«» Falso, Sr. Deputado! As propinas representam entre 12% a 13% do orçamento dessas instituições. na generalidade das grandes instituições universitárias, não são as propinas, é o financiamento exterior às propinas. Mas as propinas também contribuem, com certeza, sobretudo as propinas de pós-graduação, sobre as quais vamos falar.

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O Sr. Deputado afirma — certamente estamos em desacordo sobre essa matéria e é bom que estejamos em desacordo claramente sobre alguma coisa» — que é mau que uma instituição de ensino superior pública forneça no mercado um MBA por um preço elevado. Se o fornece por um preço elevado é porque existem empresas que o pagam ou pessoas individuais que entendem que é preferível ter esse MBA do que outro a preços muito elevados. Pois, não considero mal. Isso mostra que essas instituições, públicas ou privadas, em Portugal como noutros países, entenderam que não deviam deixar os MBA apenas às instituições privadas e que tinham condições para intervir nessa formação avançada de quadros empresariais.
Não considero que isso seja negativo porque é disso que estamos a falar quando estamos a falar dos valores para que chamou a atenção.
Há uma segunda vertente — e gostaria de me colocar na perspectiva do Sr. Deputado — que já lhe concedi inúmeras vezes em comissão especializada e volto a concedê-la aqui» Existirão? É uma pergunta, não é uma afirmação, diz o Sr. Deputado. Pode haver casos em que há 2.os ciclos que são obrigatórios para o exercício de uma profissão e estão a ser exigidas propinas que não são as que estão limitadas na lei de 1.º ciclo.
Simplesmente digo o que sempre disse aos estudantes e às instituições: agradeço que denunciem esses casos para serem analisados um a um. Não é possível fazer afirmações em geral; é necessário analisar cada um desses casos. Mas não sou eu que vou analisá-los — pedirei aos organismos especializados de inspecção que os analisem, suportando-se nos pareceres técnicos necessários para compreender se a lei está ou não a ser aplicada.
Posso garantir-lhe, Sr. Deputado, que, se a lei não estiver a ser aplicada, passará a sê-lo. É tão simples como isso! Que fique claro que não nos parece razoável pactuar com uma visão de miserabilismo. Se uma instituição de ensino superior, repito, pública entende que está em condições de oferecer a estudantes, nacionais e estrangeiros, um MBA para formação de executivos de topo — que é caro porque é cara a contratação de professores para essa formação, em competição com instituições nacionais e estrangeiras, públicas ou privadas — deve fazê-lo. Se tem condições para atrair estudantes e, portanto, empresas para pagar esse MBA, não vejo qualquer razão para que possamos estar contra; antes pelo contrário, devemos saudar a capacidade dessa instituição.
Há um último ponto que eu não gostaria de deixar sem resposta, pedindo perdão ao Sr. Presidente. Já tive ocasião de responder ao Sr. Deputado José Moura Soeiro em comissão especializada, mas, repito. Trata-se da realidade para a qual nos chamou a atenção — e bem! — relativa aos chamados professores voluntários.
Tive ocasião de esclarecer que o Estatuto da Carreira Docente é extremamente claro nesta matéria. É possível que haja professores com o estatuto de professores convidados e recrutados de acordo com as normas e os critérios dos professores convidados que possam prescindir de remuneração quando dispõem de outra remuneração e apenas nesses casos. O Estatuto da Carreira Docente Universitária é para cumprir e esses casos serão corrigidos.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado.
Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, cumprimento-o em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português.
Começo por chamar a atenção de que a política orçamental em matéria de ensino superior e de ciência, hoje apresentada e discutida na Assembleia da República, vem ao arrepio do artigo 74.º da Constituição, bem como as políticas de anteriores governos, quer do PSD quer do CDS, cuja alínea e) define que cabe ao Estado garantir a gratuitidade em todos os graus de ensino.
Em matéria de ensino superior, temos assistido não a uma progressiva gratuitidade, mas, pelo contrário, a um aumento dos custos para os estudantes e para as suas famílias no que diz respeito ao acesso ao ensino superior.
Com este Orçamento do Estado, há um corte substancial de 12,7% para as universidades e de 7,1% para os politécnicos em matéria de cortes com despesas de funcionamento, quando sabemos à partida que, para

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além dos cortes com os salários dos professores e dos funcionários, existe um conjunto de despesas que vão aumentar nessas universidades.
Portanto, tudo o que são despesas de luz, de água, de gás vão encarecer os custos de funcionamento das instituições e certamente sofrem um rombo com os cortes no financiamento.
No que diz respeito ao aprofundamento de uma política de privatização do acesso ao ensino superior e de frequência do ensino superior, por via do aumento do valor das propinas, o Sr. Ministro falou-nos da questão dos 1.º e 2.º ciclos, quando é hoje bem mais claro para todos que esta estratégia de divisão em 2.os ciclos mais não foi do que uma estratégia de aumento dos custos com as propinas, definindo o tecto máximo para propinas de 1.º ciclo até 1000 euros, mas impedindo o tecto de propina de 2.º ciclo.
O Sr. Ministro falou agora dos casos concretos em que se impede o exercício da profissão e dou-lhe os casos de sociologia e de psicologia, em que a não frequência do 2.º ciclo, na prática, é o não reconhecimento da profissionalização daquela formação.
Portanto, um aluno sabe à partida que se não fizer o 2.º ciclo — onde tem de pagar 5 000 euros nalguns casos e nalguns casos mais» — não vai encontrar emprego. Portanto, pouco mais lhes resta do que pagar esse 2.º ciclo, o que até então estava enquadrado numa licenciatura de 5 anos, nalguns casos de 4 anos, e tem, por esta via, um aumento brutal do custo de acesso e de frequência ao ensino superior.
O Sr. Ministro já nos disse que o valor global com o pagamento das propinas representa, para algumas instituições, 13% e, noutros casos, 12%.
Gostaria de saber se o Ministério da Ciência e do Ensino Superior fez as contas e se nos consegue dizer qual o valor global de todas as instituições de ensino superior com a cobrança das propinas.
O PCP é contra a existência de propinas, pois entendemos que são uma barreira profundamente injusta de acesso ao ensino superior.
Portanto, entendemos que quem paga com o desinvestimento do Estado no ensino superior são os estudantes e as suas famílias, e o aumento com os custos das propinas, nalguns casos, um aumento brutal nos últimos cinco anos, é muito negativo para o acesso ao ensino superior no que diz respeito à igualdade de oportunidades para todos os estudantes.
Ainda quanto ao acesso ao ensino superior, no que diz respeito à acção social escolar directa relativa às bolsas de estudo, o Relatório do Orçamento do Estado para 2011 determina o aumento do desemprego e o agravamento da pobreza. Portanto, há um cenário propício a que exista mais procura do ponto de vista das necessidades de estudantes para frequência do ensino superior, mas o Governo não prevê um aumento desta verba, desde logo porque sabe — e creio que isto também é claro para o Sr. Ministro — que, quando o Governo preparou em Julho a aplicação do Decreto-Lei n.º 70/2010, sabia à partida que tinha já o terreno preparado para a limitação do acesso às bolsas de estudo e que a aplicação do novo conceito de agregado familiar e de utilização de rendimento fictícios, que não o são na prática, permitia que muitos estudantes ficassem afastados do acesso à acção social escolar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — O conceito de estudante carenciado para o Ministério do Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e para este Governo é um conceito que o PCP contraria, porque entende que, neste momento, só tem acesso á bolsa máxima de 419 € um estudante que viva abaixo do limiar da pobreza — e nós, PCP, não podemos estar de acordo com esta situação.
Na última oportunidade que tivemos para discutir estas questões com o Sr. Ministro demos-lhe o exemplo de uma estudante deslocada que recebe uma bolsa no valor de 160 €, que recebe uma pensão por morte do pai de 60 €, que recebe um abono de família de 30 € e cuja mãe tem um rendimento líquido mensal de cerca de 600 €. Esta estudante não tem acesso ao valor máximo da bolsa, que são 419 € — não é nenhum luxo, nem nenhum valor exorbitante.
O Sr. Ministro disse-nos: «Confronte esse caso com os meus serviços e os meus assessores porque deve existir algum problema». Ora, tivemos oportunidade de esclarecer esta situação, tendo-nos sido dito que esta estudante só teria direito a uma bolsa de 160 € porque esta bolsa conta como rendimento, porque a pensão que recebe conta como rendimento, tal como o abono de família.

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É compreensível que uma estudante que receba uma bolsa de 160 € quando a mãe recebe uma remuneração mensal de 600 € tenha dificuldades de acesso ao ensino superior.
O PCP entende ser fundamental, neste momento, haver um reforço das verbas para a acção social escolar e a revogação do Decreto-Lei n.º 70/2010, que permita ao Governo impedir que muitos estudantes que têm necessidades objectivas de acesso ao ensino superior possam ter esse direito.
Ainda no que diz respeito à reforma dos serviços de acção social, pergunto ao Sr. Ministro se nos pode garantir que o que está em cima da mesa não é uma estratégia de privatização dos serviços de acção social.
Estamos todos de acordo que os estudantes do Instituto Politécnico de Lisboa devem ter direito a ir à cantina da Cidade Universitária, porque também são estudantes da cidade de Lisboa — nesta matéria estamos de acordo! O que queremos ouvir da parte do Sr. Ministro é que a reforma dos serviços da acção social não passa por privatização e, logo, por degradação da qualidade da qualidade e aumento do preço, mas, pelo contrário, por abranger mais alunos.
Porque, se se trata de uma reforma do serviço de acção social para abranger mais alunos, o PCP está, de facto, de acordo! Não podemos é estar de acordo com a degradação do serviço, com o aumento dos preços e com a privatização destas cantinas e de outros serviços de acção social indirecta.
Uma última palavra, Sr. Ministro, para lhe dizer que, na Universidade de Aveiro, um regulamento interno já prevê a situação de bolseiros de investigação científica a leccionar, a dar aulas. Portanto, a questão que lhe coloco, Sr. Ministro, é a de saber se nos pode dizer que este regulamento que existe é ilegal, e se está disponível para dar orientações à Universidade de Aveiro para que impeça esta situação ilegal de continuar a acontecer.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, muito obrigado pelas suas questões — e, para não me esquecer, começo pela sua última, que também já foi levantada há pouco pelo Sr. Deputado José Soeiro.
Quando numa instituição de ensino superior um bolseiro pós-doutoramento, por exemplo, é convidado para dar aulas, o regime é extremamente claro à luz do Estatuto da Carreira Docente do Ensino Superior; ele pode, com certeza, dar aulas e pode, inclusivamente, aceitar dar essas aulas sem remuneração, desde que seja contratado como professor, de acordo com os critérios de recrutamento dos professores convidados. E os critérios de recrutamento dos professores convidados envolvem a participação dos conselhos científicos e vários mecanismos que visam assegurar as condições de escolha dos candidatos e as suas condições laborais.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas o bolseiro pode dizer que não?!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Com certeza, como é óbvio! Mais do que isso! Não é dizer que não, tem de se candidatar, que é uma coisa diferente!

O Sr. Manuel Tiago (PCP): — Mas não é isso que lá está!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Portanto, que fique claro este esclarecimento.
Também do fim para o princípio, a Sr.ª Deputada exprime o seu acordo — que registei e gostaria de saudar — com a vontade que temos de as instituições de ensino superior e o Ministério, em conjunto, lutarem por uma melhor organização dos serviços de acção social, agora que as regras são todas iguais, quer em matéria de prestações directas quer em matéria de prestações indirectas, portanto não se justificando economias de escala nestas matérias e sobretudo não se justificando fronteiras entre estudantes de diferentes instituições no acesso aos serviços.

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Quanto à outra pergunta, é, certamente, uma pergunta retórica, como se costuma dizer. A Sr.ª Deputada e o seu grupo parlamentar, nos últimos anos, em várias ocasiões, fizeram, face a esta equipa do Ministério, a afirmação de que estávamos apostados na privatização do ensino superior. Todos esses receios e todas essas afirmações se demonstraram ser falsas, estritamente falsas! A Sr.ª Deputada sabe perfeitamente que o Governo e este Ministério nunca, por nunca ser, tiveram qualquer intenção, aberta ou disfarçada, que é totalmente contrária às nossas ideias nesta matéria, de privatização dos estabelecimentos públicos.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Mas foi o Sr. Ministro que disse!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Portanto, trata-se, certamente, de uma pergunta retórica.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Aqui é mais dialéctica!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — É uma dialéctica mal compreendida.
Acho que quem nos está a ouvir não consegue ouvir o Sr. Deputado e, portanto, tenho de repetir: é uma dialéctica mal compreendida! Foi mal lida! A Sr.ª Deputada, depois, fez uma pequena afirmação sobre a bolsa máxima que, actualmente, está prevista pelos serviços de acção social. A bolsa máxima ç de 6000 € por ano neste momento — isto para corrigir, se é que estava incorrecta, a sua afirmação e para deixar claro.
Sobre a acção social escolar directa, a Sr.ª Deputada afirma que, agora que se prevêem muitas dificuldades na sociedade portuguesa, o volume financeiro devia aumentar. Ó Sr.ª Deputada, acho essa afirmação, do ponto de vista da generosidade social, justa. Certamente, todos gostaríamos de poder ter muito mais prestações sociais no nosso país, todos gostaríamos que o País produzisse mais e tivesse essas capacidades, e todos estamos conscientes das dificuldades sociais de muitas pessoas na sociedade portuguesa; mas todos estamos também conscientes de que o esforço em matéria de políticas sociais feito na sociedade portuguesa nas últimas décadas tem permitido uma mobilidade social ascendente, sem paralelo, e o acesso à educação, permitindo ainda crescentemente, ano após ano, um alargamento da base social do ensino superior. O que não compreendo é como é que um grupo parlamentar como o do PCP não se regozija com o alargamento da base social do ensino superior, que todos os anos é evidente. Isso é que eu não compreendo!!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Porque é que diz isso?!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — É uma tentação terrorista a tentação de achar que «quanto pior, melhor! Essa tentação na vida política é, de facto, fatal.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Seja sério, Sr. Ministro!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — A Sr.ª Deputada pergunta-me qual é o valor global das propinas. Posso dizer-lhe que o valor global das propinas — e falo de cor, porque não tenho aqui os números — arrecadado nos estabelecimentos de ensino superior público em Portugal, nos últimos anos em que a conta está consolidada, tem variado entre 12,5% e 13% das receitas arrecadadas pelas instituições de ensino superior. Aliás, a totalidade das receitas arrecadadas pelas instituições de ensino superior representam no sistema público cerca de 1,2% do PIB. E, se somarmos o sistema privado, chegamos a 1,4% do PIB, que é muito semelhante ao da média dos países da OCDE.
Por último — julgo que estou a terminar — , a Sr.ª Deputada chama a atenção para o facto de, naturalmente, com o aumento do número de alunos, virem aí mais despesas com energia, com comunicações e outras. Pois, Sr.ª Deputada, não é isso que pensam as instituições de ensino superior, que apresentaram planos extremamente ambiciosos de redução das despesas com energia, com comunicações, a partir de investimentos que prepararam ao longo dos anos em substituição de energias, em economia de energia e, designadamente, na passagem de todas as comunicações para VoIP (Voice over Internet Protocol) em

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Portugal, que permitiram uma redução significativa dessas despesas, o que neste momento é muito importante.

O Sr. Presidente: — Resta-lhe um minuto, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, encerrámos a segunda ronda de perguntas.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para defesa da honra da bancada, Sr. Presidente, porque o Sr. Ministro, com a sua tentação habitual de agressividade latente que traz sempre para o debate, acabou por acusar o PCP de manifestar uma tendência terrorista de achar que «quanto pior, melhor». Se não estou em erro, foram estas as palavras usadas, que merecem da nossa parte um comentário em defesa da honra da bancada.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o Regimento diz que quem dirige os trabalhos, verificado o agravo, concede de imediato a palavra. Eu confesso que não verifiquei qualquer agravo à bancada do PCP.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Se o Sr. Presidente entende que ser apelidado de terrorista e de «quanto pior, melhor« não revela, pelo menos»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem a palavra por dois minutos.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, julgo que a gravidade das palavras do Sr. Ministro branqueiam a realidade, porque o PCP nunca acusou o Governo de não alargar a base social do ensino superior, no entanto não mascara é a forma como o faz! O PCP não mascara como isso é feito, como o Governo tenta fazer isso, dizendo, sistematicamente, que é cada vez mais fácil o ingresso no ensino superior, quando isso não é verdade; não mascara com discursos de especialização tecnológica, que ainda nem sequer são considerados como estando no ensino superior, mas o Governo já os contabiliza; não mascara que houve uma alteração fundamental na base de recrutamento, que tem a ver com os alunos de mais de 23 anos em substituição dos alunos ad-hoc — e, portanto, as comparações não são lineares.
Mas, não iludindo o alargamento da base, não podemos deixar de colocar as questões que entendemos que são as estritamente correspondentes àquilo que o Governo tem vindo a praticar, que é o encarecimento do acesso e da frequência do ensino superior.
Se o Sr. Ministro entende que um partido que acusa o Governo de praticar uma política que é contra a própria Constituição da República Portuguesa é terrorista, mais lhe dizemos que quem espalha o terror é quem diz aos estudantes e aos jovens portugueses que só têm acesso aos seus direitos constitucionais se pagarem por eles. Isso é que é ameaça! Isso é que é terrorismo!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quanto pior, pior!

O Sr. Presidente: — Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, fico-lhe grato por me ter chamado a atenção e por me ter permitido clarificar essa questão.
O Sr. Deputado incomodou-se com uma questão e com uma afirmação de natureza estritamente intelectual, pois nunca esteve no meu espírito interpretar a palavra no sentido vulgar»

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — O que o senhor disse foi: «Quanto pior, melhor»!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — No sentido intelectual, faço-lhe justiça! E chamei a atenção de que o Sr. Deputado ou a sua bancada tendem» O Sr. Deputado pode não estar de acordo, mas tende a desvalorizar aquilo que é uma conquista da sociedade portuguesa — não é dos governos — , desde o 25 de Abril até hoje, de alargamento constante da base social do ensino superior. E cada vez que se fala de que, ano após ano, o número de estudantes no ensino superior aumenta por todas as vias, o Sr. Deputado diz: «Ah, mas entram pelos maiores de 23 anos! Ah, mas entram pelos CET!». Então, por onde é que queria que entrassem?!..
Ó Sr. Deputado, depois de se fazer quase o pleno dos estudantes que terminam o 12.º ano, por onde é que queriam que entrassem?! Era, precisamente, necessário alterar as vias de acesso, como aconteceu em todos os países, aqueles que alargaram a base social de ingresso no ensino superior. Por onde é que queria que entrassem?! Portanto, o Sr. Deputado tende a desvalorizar isso»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não é verdade!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — » e tende a dizer, ano após ano, que a base social do ensino superior não aumenta, não se alarga, está a reduzir-se.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não é verdade!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Pois, Sr. Deputado, de facto, os números mostram — e ainda bem, devemos todos regozijar-nos com isso!» E faço-lhe a justiça de, no seu íntimo, admitir que está contente que isso tenha acontecido, que não estejamos na situação de há 10, de há 15 ou de há 20 anos atrás e muito menos na situação de há 30 ou 40 anos atrás, quando éramos 5% da coorte etária no ensino superior. Hoje 36% dos jovens com 20 anos são estudantes no ensino superior. Podiam ser mais? Podiam! Simplesmente esta já é a média dos países mais desenvolvidos. Serão mais? Serão, com certeza! Por isso é que nos comprometemos com metas europeias, que são muito mais exigentes nessa matéria.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos à segunda ronda de perguntas, em que cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Ferreira Gomes.

O Sr. José Ferreira Gomes (PSD): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr.
Presidente da Comissão de Educação e Ciência, Sr. Presidente da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Devo começar por registar, com muito apreço, o entusiasmo com que o Sr. Ministro aqui nos traz a ciência e o optimismo que mostrou nos números que oralmente nos apresentou.
Contudo, sinto-me obrigado a comentar os números que estão nos documentos escritos e a percepção que a comunidade tem da nossa realidade.
Em relação a isso, os nossos cientistas vivem, nesta altura, um momento de angústia.
A Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) acumula atrasos nos processos de concursos e nos pagamentos. O ano de 2010 ficará para a história da FCT pelo recorde nos atrasos nos pagamentos às unidades de investigação e aos laboratórios associados.
Os investigadores com contratos temporários feitos no quadro dos chamados Ciência 2007 e Ciência 2008 sabem que os seus vencimentos para todo o ano corrente não foram transferidos para as instituições a que estão vinculados e que os seus contratos terminarão se a situação não for corrigida.
Os 1500 jovens que terminam os seus doutoramentos em 2010 sabem que o País não lhes oferece qualquer esperança, que o Ministro da Ciência não lhes oferece qualquer esperança!! Os compromissos assumidos pela FCT que vão ser empurrados para o ano seguinte atingem um recorde nunca visto e já não há esperança.

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Os compromissos assumidos pela FCT, que vão ser empurrados para o ano seguinte, atingem um recorde nunca visto e já não há esperança de que venham a ser satisfeitos de forma ordeira. Pior são as decisões que os nossos melhores jovens cientistas tomam discretamente, caso a caso, face à falta de uma orientação que lhes dê esperança.
A máquina de propaganda governamental nega a realidade e, por isso, dispensa-se de dar essa orientação e de construir uma estratégia de futuro.
Nada disto se pode ler na breve apresentação da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2011 que o Sr. Ministro remeteu a esta Assembleia, na passada sexta-feira. Aí, continuamos «a viver no melhor dos mundos», continuando a área da ciência e tecnologia a melhorar a sua posição com um orçamento que passa de 528 milhões de euros, em 2010, para 532 milhões de euros, em 2011» Estes são os números que o Sr.
Ministro entendeu serem os mais interessantes para comunicar à comunidade científica e aos portugueses em geral, mas infelizmente nem esta parece ser a realidade formal dos números que o Ministério das Finanças nos apresenta nem a realidade conhecida na vida do dia-a-dia dos nossos cientistas.
Recolhendo a informação dos relatórios do Orçamento do Estado e da Fundação para a Ciência e Tecnologia, podemos formar a imagem que apresento na transparência que podem ver agora projectada, onde podemos ver um decréscimo na execução orçamental na área da ciência, desde 2008. Se juntarmos a estes dados aqueles que a breve apresentação do Ministério nos quis mostrar, as discrepâncias parecem aumentar.
Qual destas realidades devemos tomar como certa? A que o Sr. Ministro nos quer fazer ver ou a que é fornecida pelas fontes autênticas e que todos sentem nos seus laboratórios? Que esperança podem ter os jovens portugueses que acabam agora os seus doutoramentos e aqueles que acreditaram nos contratos temporários Ciência 2007/2008? Que futuro para a ciência portuguesa? Todos sabemos que o Governo de Sócrates levou o País a uma situação insustentável. Todos sabemos que os portugueses serão obrigados a enfrentar anos difíceis e imerecidos. Acredito que ninguém nesta Sala queira «matar» a «galinha» de que esperamos os «ovos de ouro» no nosso desenvolvimento a médio prazo.
Todos sabemos que o investimento em ciência que foi feito nos últimos decénios colocou Portugal numa posição de que pode esperar um retorno a breve prazo e que essa é uma das poucas linhas de espaço para o nosso futuro. Mas precisamos de falar verdade, de falar numa linguagem em que os nossos cientistas possam confiar.
Ao contrário de Portugal, outros países europeus estão a fazer uma consolidação orçamental em que os credores acreditam. Ali, a ciência tem sido protegida dos cortes orçamentais, porque, nesses países, os governos acreditam mesmo que esse é o caminho de desenvolvimento futuro. Lembro-lhe a Espanha, a França, a Inglaterra. O Governo de Sócrates ganha na retórica, mas a ciência portuguesa não vive só de retórica, precisa de mais apoio e de melhor gestão para que os melhores sejam premiados e possam cumprir o seu futuro.
Nos últimos cinco anos, a ciência portuguesa tem vivido de medidas avulsas, por vezes, caras. Esgotou-se a vontade de construir um sistema competitivo aberto e eficaz.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. José Ferreira Gomes (PSD): — O Sr. Ministro lembra regularmente que o seu Ministério conseguiu estatísticas que sugerem que temos já 7,2 investigadores por cada 1000 activos, ultrapassando mesmo a União Europeia. O que os nossos jovens investigadores querem ver não são estatísticas de auto-bonificação do Ministério. O que eles querem ver são os anúncios de vagas de investigador nessas empresas. Querem ver as empresas que aparecem nas estatísticas como grandes investigadores, a abrirem essas vagas. Quantos doutores estão a fazer investigação no BCP, na PT, na Galp?

O Sr. Presidente: — Lamento, mas tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Ferreira Gomes (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente, com esta questão: para que serve a renovação dos mecanismos de incentivos fiscais se os nossos jovens investigadores não puderem ter uma oportunidade para mostrar aquilo de que são capazes, em Portugal? Obter boas estatísticas não chega!» Muito obrigado, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: — Relembro que a resposta do Governo será conjunta, nesta ronda de perguntas, pelo que passamos, agora, ao Partido Socialista.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Melo.

A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Srs. Presidentes das Comissões, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Fico espantada quando se diz que, ao contrário da França e da Espanha, em Portugal não se nota, neste Orçamento para 2011, que a ciência está protegida dos cortes orçamentais. Realmente, não sei quais são os dados em que se baseia essa ideia de que, lá fora, tomam em consideração e no nosso país não. E isto porque, olhando para o orçamento, se fosse só preciso analisar o orçamento, verificamos que há crescimento. Ora, isto não é milagre nenhum! Tal como não é fácil, simplesmente, estar com um chapéu protector para todo o programa da ciência, renovar o compromisso com a ciência e o desenvolvimento tecnológico! E não é fácil porque não se trata de manter o status quo; trata-se de tomar decisões políticas que, em muitos casos, vão ao contrário daquilo que o Orçamento para 2011 globalmente defende e aprova para todos os outros Ministérios.
Falo, por exemplo, de contenção.
O Sr. Ministro já aqui referiu qual é a contenção que se faz ao nível das verbas do Orçamento do Estado, no Ministério. Tenho de dar-lhe os parabéns, Sr. Ministro, porque, apesar de todos os problemas do Ministério estarem a crescer, conseguiram cortar as despesas de funcionamento, o que é um bom exemplo, nestes tempos de contenção. Ora, cortaram nas despesas de funcionamento dos serviços do Ministério exactamente para que todas as verbas disponíveis, e aquelas que ainda vão buscar, fossem reafectadas ao que é essencial, neste caso, à ciência e investigação científica.
Mas, tendo de cortar no Orçamento do Estado, o que foi feito? Foi tomada uma decisão política importante e que mostra a prioridade que a ciência tem, que foi reafectar alguns fundos estruturais da União Europeia, para que pudessem vir reforçar os orçamentos da investigação científica da ciência e da tecnologia. E esta foi uma decisão política tomada contra a corrente daquilo que se passa nos outros Ministérios.
Segunda decisão política: no momento em que se fala muito de cortes nos benefícios fiscais, ninguém aqui referiu um elemento essencial. É que o Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE), que dá um apoio às empresas que fazem investigação e desenvolvimento, foi renovado.
Ou seja, ao contrário daquilo que se passa globalmente, o SIFIDE, que terminava no final deste ano, não viu, simplesmente, o ponto final da sua vida, antes foi renovado por mais quatro anos, o que significa que as empresas que investem em I&D mantêm os benefícios fiscais. Ora, chamo a atenção para a questão que alguém colocou: mas que futuro para os doutorados? Pois um dos investimentos, um dos incentivos fiscais é exactamente para as empresas que empreguem doutorados. Há, por exemplo, incentivos para as pequenas e microempresas, de maneira a eles poderem fazer, por exemplo, registo de patentes.
Outra decisão política importante é a de que, mesmo em tempos de contenção, Portugal não esquece o seu papel na CPLP e também em Timor. Assim, aparece aqui algo que também ninguém referiu — o Programa Ciência Global e o Centro Unesco para a formação avançada de cientistas. Não se trata apenas de dar alguma coisa aos cientistas dos países de CPLP e de Timor, mas de lhes dar oportunidades de formação avançada. Ora, eu gostaria de saber, neste momento e nestes programas, quantas candidaturas já existem de cientistas desses países que vão ser apoiados pelo Governo português.
Quase a terminar, em termos das parcerias internacionais, gostaria de dizer que é muito difícil, num País que esteve fechado durante 50 anos, que as parcerias internacionais, o funcionamento em rede e a abertura internacional tenham de ser uma constante na vida toda, sobretudo na investigação científica. Não quero que me faça aqui o balanço do que tem sido, porque imediatamente iria gerar-se aqui outra discussão, mas gostaria de saber se, em 2011, os meios que estão inscritos no Orçamento do Estado são suficientes para aprofundar este envolvimento crescente das universidades e sobretudo de empresas portuguesas.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, dispõe de 1 minuto.

A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Qual é o balanço, em função das empresas portuguesas que estão envolvidas nesse projectos?

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Finalmente, gostaria de saber de que forma estas parcerias internacionais podem ajudar alguns dos projectos que estão inscritos no Programa Dinamizador para as Ciências e Tecnologias do Mar.
Tem-se falado muito do mar como desígnio nacional, mas é preciso concretizar isso, quer em termos da investigação feita nas nossas universidades quer em termos das empresas envolvidas nestes projectos. E a minha questão é a de saber o que é que as parcerias internacionais nos podem dar para colmatar eventuais deficiências que tenhamos no nosso sistema científico.

O Sr. Presidente: — Passamos ao CDS-PP. Sr. Deputado Michael Seufert, tem a palavra.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Srs. Presidentes das Comissões, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, gostaria de tentar perceber se entendi bem o que o Sr. Ministro há pouco disse, quando tentou explicar o facto de, nas instituições do ensino superior e nos respectivos mapas das transferências, aparecerem as reduções que neles estão inscritas. O que o Sr. Ministro está a dizer é que a dotação global corresponde à verdade, mas que, depois, aquela dotação individual que está nos mapas — creio que no Mapa VII do anexo ao Orçamento do Estado — onde em cada linha existe uma instituição e depois um valor, esse valor não corresponde à verdade. Ou seja, só o somatório corresponde à verdade e esse valor vai ter de ser reatribuído conforme a necessidade. Foi isso que nos disse aqui? É porque, se foi isso o que nos disse aqui, considero que é pena que esses mapas já estejam feitos dessa maneira. Mas, mesmo assim, será preciso explicar alguma coisa à Câmara.
Verificámos que, em 2010, o total das transferências era de 1543 milhões de euros, grosso modo. Este ano estão inscritos para as mesmas instituições 1377 milhões de euros, o que corresponde a uma redução de 11%. Ora, mesmo que todos os funcionários e todos os docentes das instituições auferissem os 10 000 €, máximo, ou mais, e levassem um corte de 10%, não se conseguiria chegar, globalmente, a uma redução de 11%. Portanto, creio que vale a pena o Sr. Ministro explicar isto.
Outra questão que lhe tinha colocado — e a, infelizmente, o Sr. Ministro se esquivou de responder — refere-se ao quadro n.º 1 do documento que ontem nos foi entregue.
O Sr. Ministro inscreve, em cima, «dotações iniciais».
Ora, para 2010, no entanto, já está a falar de provisões, até ao fim do ano e não das dotações iniciais. É porque então tem de explicar, Sr. Ministro (e volto a perguntar-lhe isto) como é que no ano passado, na dotação inicial do mesmo documento, o Sr. Ministro inscrevia, por exemplo (e volto a repetir os números), 155 milhões de euros de fundos comunitários para a ciência, e agora inscreve 107 milhões de euros!» Eu pensava que estava a falar daquilo que previa executar até ao fim do ano.
Já agora, na mesma rubrica relativa à ciência e ensino, o Sr. Ministro tinha previsto de dotação inicial, 364 milhões de euros e agora, neste documento que referi, diz que, afinal, só são 362 milhões de euros. E como ao longo de toda esta tabela há estas discrepâncias, isso leva-me a dizer que, ao contrário do que aqui foi dito, há momentos, pela Deputada Manuela Melo, não há um aumento no investimento em ciência, mas uma redução no investimento em ciência, porque apesar de neste quadro, deste ano, dizer que no ano passado investiu 528 milhões de euros e que este ano vai investir 532 milhões de euros, no ano passado tinha inscrito 583 milhões de euros, e agora há uma redução para 532 milhões de euros! Não há mal algum nisso, mas tem de ser transparente! Não pode dizer, numa frase e num quadro, que vai aumentar, quando, na realidade, se compararmos os valores deste ano com os do ano passado, verificamos que vai diminuir.
Sr. Presidente, o CDS não vai intervir na 3.ª ronda de perguntas. Por isso, gostaria de deixar uma pergunta muito curta ao Sr. Ministro, dado que o Sr. Deputado José Manuel Rodrigues não pôde comparecer, embora esteja presente em espírito e com o contributo no seu trabalho, para esta audição»

Risos gerais.

Eu queria, pois, questioná-lo, Sr. Ministro, nesta opacidade toda, onde, por exemplo, eu acrescentaria que não estão presentes nem são transparentes a dotação orçamental para as fundações de direito privado, nem as transferências públicas para as universidades que optaram por ser fundações» Fazendo-se umas subtracções, consegue-se chegar a uma ideia de quanto será essa valor, mas isso não está aqui escrito e

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considero que valeria a pena estar, porque, apesar de essas instituições terem os seus meios de financiamento, esta Càmara deve tambçm fiscalizar» Bom, mas a pergunta específica que lhe deixo (porque isso também não aparece aqui) é se, de facto, o Governo vai ou não cumprir a resolução da instalação do radar meteorológico na ilha da Madeira, e se está previsto algum valor para essa obra, que, aliás, foi alvo de uma resolução aprovada nesta Câmara.

O Sr. Presidente: — Passamos ao Sr. Deputado José Moura Soeiro, do Bloco de Esquerda, a quem dou a palavra.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, o Sr. Ministro disse que as grandes instituições têm receitas próprias, ou seja, que não têm as propinas como uma parte importante ou como uma parte principal das suas receitas próprias.
Ora, eu gostaria de saber se o que o Sr. Ministro quis dizer foi que a Universidade de Lisboa não é uma grande instituição e que a generalidade das universidades do País não são grandes instituições, porque, por exemplo, na Universidade de Lisboa mais de metade das receitas próprias são advindas das propinas.
E eu gostava ainda de voltar à questão das propinas, porque o Sr. Ministro veio aqui defender que o ensino superior e as escolas públicas de ensino superior devem disputar o mercado neste âmbito da formação, ou seja, veio dizer que há determinados cursos do ensino superior público que não devem estar acessíveis a todos.
O Sr. Ministro defende que o ensino superior põblico tenha cursos com propinas de 37 000 €, de 20 000 €, de 10 000 €, que são cursos que não são para a generalidade das pessoas poder frequentar, ou seja, o Sr.
Ministro defende que o ensino superior público deve ter cursos que não são acessíveis a uma família normal.
Se extrapolarmos essa lógica de que, se há um nicho de mercado, o Estado deve correr atrás dele, então, eu gostava de lhe perguntar se não acha que o Serviço Nacional de Saúde devia explorar o nicho de mercado das operações plásticas, onde também há um nicho de mercado. Porque é que então a segurança social pública não explora o nicho de mercado dos planos de poupança reforma?» Sr. Ministro, nós temos visões diferentes sobre o papel do Estado e sobre a justiça no acesso ao ensino superior. O BE considera que o ensino superior e a formação devem estar acessíveis a todos, independentemente do dinheiro que as pessoas ou as famílias têm — e nisso divergimos, claramente, do Sr.
Ministro!! Sobre a questão das propinas descontroladas do 2.ª ciclo, de montantes de 5000 €, 10 000 €, 20 000 €, disse o Sr. Ministro que gostaria de conhecer os casos em que elas são ilegais, se forem necessários os 2.os ciclos para o exercício da profissão.
Vou dar-lhe um exemplo: no ISCTE, os 2.os ciclos de Psicologia têm propinas de 5000 €. Eu gostava de saber se o Sr. Ministro acha que é possível exercer Psicologia apenas com o 1.ª ciclo» É porque, como sabe, Sr. Ministro, não é! No entanto, estas propinas estão legais, apesar de terem um valor ilegítimo, o que significa que são a lei e a escolha do seu Ministério que permitem este descontrolo e esta desigualdade! Gostava também de voltar à questão dos professores voluntários, porque o Sr. Ministro disse que o Estatuto da Carreira Docente Universitária e o Estatuto da Carreira de Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico são muito claros deste ponto de vista, mas nós sabemos que há investigadores que têm outra fonte de vencimento, uma vez que têm bolsas de investigação da FCT, e que são coagidos a assumir a responsabilidade de docência, sobretudo nos 1.º e 2.º ciclos das pós-graduações, o que significa que, de facto, se vão generalizando nas instituições regulamentos que prevêem essa situação e práticas que a incentivam no sentido de, fazendo face à ausência de recursos humanos e às dificuldades orçamentais criadas pelo próprio Ministério, explorar o trabalho gratuito de investigadores.
Ora, eu gostava de saber se o Sr. Ministro está disponível para impedir, de facto, que isso aconteça e que estas pessoas sejam remuneradas. É porque nós olhamos para o orçamento e percebemos que ele significa para a generalidade das pessoas (e também no ensino superior) menos salário, menos investimento, menos bolsas, menos capacidade de as instituições responderem aos desafios que seriam necessários num contexto de crise em que as qualificações e a sua democratização seriam, sem dúvida, um caminho imprescindível para mudarmos a situação em que vivemos.

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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo — a quem aproveito para cumprimentar — , Sr. Ministro: Este é um orçamento que, no essencial, vem limitar a capacidade do sistema científico e tecnológico nacional. E vem limitar de forma ainda mais significativa do que os anteriores. Aliás, sobre os anteriores, acho que é muito importante podermos aqui fazer uma nota: pelo menos desde 2007 que o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior tenta impingir a este Parlamento e aos portugueses que a despesa pública em Investigação e Desenvolvimento havia atingido 1% do PIB e disse-o vezes sem conta mesmo quando confrontado com a falsidade óbvia dessa constatação.
Eis que são os seus próprios inquéritos ao potencial do sistema científico e tecnológico nacional que vêm provar que no ano em que o Sr. Ministro anunciava 1% do PIB havia — pasme-se! — 0,57% do PIB de investimento público em I&D e que, em 2008 (são os últimos dados que temos), 0,61%, se não estou em erro, de investimento público em I&D — excluindo, obviamente, o investimento privado.
Portanto, essa tentativa, essa propaganda de branqueamento está também a ter os seus efeitos, pois, na verdade, nunca existiu 1% do PIB atribuído à Investigação e Desenvolvimento nem mesmo, como o PCP aqui denunciou, contabilizando a construção dos tectos das cantinas como investimento em Investigação e Desenvolvimento»! Sr. Ministro, queria colocar-lhe algumas questões sobre os Laboratórios do Estado.
O PCP, há bem pouco tempo e também através de diversas perguntas que dirigiu ao Governo, tem insistentemente colocado perguntas sobre a situação que se vive nos Laboratórios do Estado, situação essa que, em muitos casos, é dramática do ponto de vista da capacidade de funcionamento, é dramática do ponto de vista da gestão de pessoal e do respeito pelos direitos laborais dos investigadores, dos técnicos superiores e de um conjunto vastíssimo de homens e mulheres altamente qualificados que prestam serviço ao Estado português nos Laboratórios do Estado e que vêem os seus direitos ser, sistematicamente, atropelados e cilindrados por esta norma da precariedade que o Governo tem imposto no sistema científico e tecnológico, nomeadamente através do recurso a bolsas, mas não só.
Já agora, abro um parêntesis para lhe perguntar se já decidiu resolver com o Sr. Ministro das Finanças a questão dos técnicos superiores com doutoramento que prestam serviço de investigadores e que não são reclassificados na carreira em que deveriam estar, tendo em conta que são investigadores — e de certeza que o Sr. Ministro os contabiliza como tal neste inquérito ao potencial!» Portanto para isso são, de facto, investigadores, mas para a progressão na carreira e para a garantia dos seus direitos o Sr. Ministro ignora-os! Voltando aos Laboratórios do Estado, queria perguntar-lhe como julga que será possível que os Laboratórios do Estado, nomeadamente o que está sob a sua tutela, o ITN» Aliás, lembro que o ITN (Instituto Tecnológico e Nuclear) já esteve durante este ano com cortes de água, com cortes nas comunicações, com incapacidade para pagar dívidas a funcionários» Claro que o Sr. Ministro nos dirá que tem um fundo de maneio muito grande que não ç usado, quando sabe que impede os Laboratórios de o utilizarem» Quero, então, perguntar-lhe como é que com um corte de mais de 300 000 euros vai conseguir garantir o regular funcionamento dos Laboratórios do Estado que já assim se encontram na situação em que se encontram.
Uma nota ainda sobre o Estatuto da Carreira de Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico.
Como sabe — coisa que, aliás, o deixou bastante furioso na altura — , esta Assembleia alterou o regime transitório de ingresso nas carreiras destes professores»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Muito mal!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O Sr. Ministro diz muito mal e a sua bancada faz eco das suas considerações, mas o que é certo é que a Democracia assim o ditou e a maioria deste Parlamento construiu um novo regime transitório ao qual o Governo está vinculado.
E a questão que gostava de colocar-lhe é a seguinte: com este Orçamento do Estado o Sr. Ministro está em condições de garantir que aquele regime transitório vai ser cumprido? É porque, olhando para o artigo 42.º deste Orçamento do Estado, ficamos com a clara sensação de que não haverá nenhuma contratação, nenhum ingresso na carreira, independentemente daquilo que esta Assembleia da República construiu através da

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apreciação parlamentar do Estatuto, que prevê o ingresso na carreira de cerca de dois a três mil professores do ensino superior politécnico que há anos, há décadas, alguns deles, prestam serviço sem ingresso na carreira das nossas instituições.
Permita-me uma última nota, Sr. Ministro, sobre os protocolos com as instituições privadas estrangeiras ou outras instituições de qualquer natureza. Pela parte do Grupo Parlamentar do PCP gostávamos de conhecer, efectivamente, os resultados em número, por nacionalidade e por custo médio de doutoramento.
Julgamos que é da mais elementar justeza que os grupos parlamentares da Assembleia da República conheçam quanto foi gasto para doutorar alguém no MIT, quantos foram os portugueses doutorados e qual a mais-valia objectivamente trazida para o sistema científico e tecnológico nacional dos milhões que o Governo, ao invés de colocar no nosso sistema, injectou em entidades privadas no exterior do País.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a nossa grelha prevê nesta ronda a possibilidade de perguntas de dois minutos por Deputado e a Mesa regista a inscrição de sete Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Rodrigues.

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Presidentes das Comissões de Educação e Ciência e de Ética, Sociedade e Cultura, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Caros Deputados: O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e também o Sr. Primeiro-Ministro têm afirmado, com muita veemência, e reafirmado, para que ninguém se esqueça dessa mesma celebração, um contrato de confiança. De resto, hoje mesmo o Sr. Ministro veio aqui à Assembleia falar, novamente, do contrato de confiança com as instituições de ensino superior, reafirmando-o e afirmando também, com base nesse mesmo contrato de confiança no ensino superior, que não há desinvestimento no ensino superior, coisa de que, aliás, duvidamos, tal como já foi afirmado por esta bancada.
Em todo o caso, como é do conhecimento desta Câmara e desta Comissão, o Decreto-Lei n.º 72-A/2010 determinou a cativação de um conjunto de receitas próprias dos Serviços e Fundos Autónomos, o que, aplicado às universidades, significa uma cativação de 20% de um conjunto de receitas entre as quais as propinas.
Devo dizer, aliás, que o Sr. Ministro sempre reafirmou a não aplicação da cativação, prevista no decreto-lei de execução orçamental, às universidades, coisa, desde logo, do meu ponto de vista, bizarra, porque, se há uma disposição que consta de um decreto-lei de execução orçamental, com certeza que se aplica a todos os Serviços e Fundos Autónomos.
Todavia, o despacho exarado por S. Ex.ª o Ministro da Ciência, reconhece essa mesma cativação, prevendo, apenas, a possibilidade de aplicação dessas mesmas receitas em condições excepcionais, mas a verdade é que, analisado o Orçamento do Estado, verifica-se que, no seu relatório, o Sr. Ministro afirma que entre a estimativa do Orçamento do Estado de 2010 e o executado há uma diferença da ordem dos 5,2%, afirmando que essa mesma diferença, de 5,2% entre o executado e o orçamentado, respeita, por um lado, à diminuição das despesas com pessoal, mas também às cativações — como, de resto, não podia deixar de ser e é afirmado no relatório do Orçamento do Estado.
Portanto, o Sr. Ministro veio reconhecer a existência dessas cativações — e devo relembrar ao Sr. Ministro que várias vezes não só afirmou que essas cativações não se aplicariam às instituições de ensino superior como afirmou também que se elas se aplicassem se demitiria do cargo de Ministro da Ciência, da Tecnologia e do Ensino Superior. É sempre bom relembrar essa sua afirmação»! E a minha preocupação, Sr. Ministro, tem a ver não só com o facto de as cativações se terem aplicado, o que não me surpreende, mas também com o seguinte: é que a previsão para as dotações orçamentais para 2011 em matéria de ensino superior são feitas com base no executado em 2010, como afirmou o Sr. Ministro na sua intervenção inicial,»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não é verdade!

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — » e a verdade ç que esse executado, em 2010, ç-o com as cativações, o que significa que estas têm uma aplicação em 2010 e têm uma repercussão em 2011. E era isto que eu gostava que o Sr. Ministro me esclarecesse.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, começo por, de uma vez por todas, deixar bem claro ao Sr.
Ministro da Ciência que o PCP entende como muito importante a democratização do acesso ao ensino superior, sobretudo porque foi uma conquista de Abril, que trouxe a hipótese de muitos alunos acederem ao ensino superior e nós entendemos que isso é fundamental, até porque foi um direito conquistado pela luta de muitas gerações.
Todavia, nós ficamos, sobretudo, preocupados com aqueles que hoje não conseguem ter acesso ao ensino superior porque não têm condições financeiras para fazê-lo. E posso dar-lhe o meu exemplo: estudei numa escola no interior do País, numa turma de 15 alunos de que apenas três frequentaram o ensino superior, não porque os outros não tivessem notas de acesso mas, sim, porque não tinham condições financeiras para fazer face a despesas com alimentação, com material escolar, com deslocações! Portanto, eles nem sequer tentaram entrar no ensino superior, porque sabiam, à partida, que a sua família não tinha condições de assegurar esse direito e é, sobretudo, com estes alunos que nós estamos preocupados e entendemos que o Estado tem uma responsabilidade fundamental em garantir o acesso ao ensino superior.
Uma questão que queria colocar-lhe prende-se com o que consta do relatório do Orçamento do Estado e respeita à externalização do Estádio Universitário de Lisboa. Nós tivemos algumas dúvidas em perceber, de facto, o que é que isto significa e gostaríamos de saber que consequências é que tem, isto é, se estamos a falar da privatização de serviços tão importantes do Estádio Universitário de Lisboa ou se estamos a falar de outra coisa diferente. E é sobre esta matéria que gostaríamos de ouvir a sua opinião.
Uma última nota no que respeita à acção social escolar do ensino superior: a lei em vigor é muito injusta, pois é muito difícil ter acesso à acção social escolar e a bolsas de estudos. Existem situações, nomeadamente em residências da Universidade de Lisboa, em que os alunos, na iminência de perder a bolsa — porque agora para efeitos de rendimento contam outros rendimentos que antes não contavam — , podem correr o risco de ter de sair da residência. Gostaria, pois, que, se for possível, o Sr. Ministro nos garanta que isto não vai acontecer e que, de facto, vai existir resposta para estes alunos, porque são alunos que, não tendo garantido o acesso a uma residência, vão ter de voltar para as suas terras de origem, sendo por isso impedidos de continuar os seus estudos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, gostaria de lhe colocar as seguintes questões: a primeira relacionada com biblioteca online, a b-on que é essencial para o acesso dos estudantes e dos investigadores aos artigos científicos, como sabe. O orçamento da Sociedade da Informação, que era onde estava incluída a verba para a b-on, passou de 29 milhões de euros para 3 milhões de euros. Diz-se no Orçamento do Estado que a verba da b-on está agora inscrita em outros apoios ao ensino superior, mas esta verba mantém-se exactamente na mesma. Portanto, gostaria de saber onde está a verba para a b-on e se ela está ou não em risco.
A segunda questão tem a ver com o software. Este Orçamento do Estado prevê gastar 58 milhões de euros em software, 102 milhões em equipamento informático, o Estado e as universidades insistem na utilização de software proprietário e em esquecer o software livre, o que é ilógico, desde logo por motivos orçamentais, o software livre não custaria, naturalmente, estes 58 milhões de euros, seria uma redução de 100%, mas também em equipamento, porque está provado que o equipamento que usa software livre dura mais anos, portanto há menos necessidade de substituição.
Esta é também uma aposta que nos parece errada do ponto de vista do futuro, porque é errada do ponto de vista da qualificação, pois estamos a formar as pessoas para uma só solução, com menos competências, com menos capacidade crítica no que respeita ao uso do software, portanto, também com menos pensamento crítico e com menos inovação. Mas também por motivos económicos, porque as empresas contratam quadros que só sabem usar software proprietário e sempre o mesmo — sabemo-lo bem, a Microsoft — , pelo que não têm capacidade de inovar. Por outro lado, ficam presas sempre ao mesmo software proprietário. Assim, é

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muito mais difícil mudar de fornecedor, a sua competitividade é diminuída, as suas opções são diminuídas e mesmo do ponto de vista das aquisições, porque há empresas nacionais a investir em software, é muito mais complicado que consigam vender os seus produtos quando tanto o Estado como as universidades, como as empresas estão todas «presas» à Microsoft. Por isso que lhe pergunto para quando uma mudança.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, gostaria de suscitar aqui duas questões concretas em matéria de tecnologia de informação e da política para esta área.
Em primeiro lugar, sobre um assunto que ultimamente tem motivado mais debate e atenção que é o da neutralidade da Internet.
No debate do anterior Orçamento do Estado — o Sr. Ministro estará recordado — , coloquei-lhe esta questão por considerarmos inaceitável a intenção de alguns «gigantes» das telecomunicações de discriminar as condições de acesso a conteúdos, consoante o website de origem, ou a empresa, ou a entidade que os divulga ou disponibiliza.
O Sr. Ministro, nessa ocasião, pronunciou-se — e ainda bem! — em defesa da neutralidade da rede, mas a verdade é que este processo tem vindo a prosseguir na União Europeia. O PCP apresentou já um projecto de lei sobre a matéria e importa clarificar qual é, concretamente, a posição do Governo sobre esta questão no processo que se desenvolve no quadro da Comissão Europeia e da auscultação aos Estados-membros.
Assim, eu gostava de saber qual é formalmente a posição do Governo português sobre esta matéria e o que tenciona fazer em Portugal, se está ou não disponível para trabalhar em função ou a partir das propostas legislativas concretas que temos.
Em segundo lugar, sobre as movimentações que têm acontecido relativamente à dita contrafacção e à perigosa tentativa de colocar tudo no mesmo saco, o Sr. Ministro conhece, certamente, uma coisa chamada ACTA, que em português se traduz por Acordo Comercial Anticontrafacção. É um processo que, no quadro comunitário, tem levado a perigosos desenvolvimentos, que, inclusivamente, ameaçam o progresso tecnológico, a inovação, o software livre, as redes peer-to-peer, matérias que teoricamente, ou em palavra, têm justificado algum suposto consenso da parte de várias forças políticas e sociais, a verdade é que é preciso ser-se coerente e passar das palavras aos actos.
Qual é a perspectiva em relação a travar esta ameaça que está lançada contra o conhecimento e o desenvolvimento humanos? Qual é a perspectiva de, finalmente, libertarmos os interesses nacionais dos povos, aos níveis nacional e ao nível europeu, relativamente a estas agendas e aos interesses poderosíssimos que se movimentam entre os grupos económicos e o capital transnacional nas tecnologias de informação?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, chegando a este momento do debate e tentando manter o registo factual, eu diria que o Sr. Ministro esclareceu algumas coisas, mas ainda maior confusão lançou noutras. Isto porque veio dizer-nos — e isso eu saúdo — , peremptoriamente, que a redução de encargos salariais se quantifica em 100 milhões de euros.
Tenho as minhas dúvidas sobre esta estimativa, mas foi o valor que aqui referiu e disse-nos, também, que as restrições orçamentais para 2011 correspondiam estritamente a esta vertente.
Ora, os mapas que nos fez chegar apontam para uma diferença de 121 milhões de euros, portanto, há, no mínimo 21 milhões de euros que eu gostava que o Sr. Ministro nos pudesse aqui explicar, tentando permanecer no registo factual. E isto já para não comentar aqui o processo, porque me parece altamente questionável que, à margem das instituições de ensino superior, alguém possa de livre arbítrio, durante um determinado dia, ou uma determinada noite, rubrica a rubrica, fazer cortes no que estava previamente estabelecido e no que tinha sido lançado pelas próprias instituições de ensino superior. Limito-me, pois, a deixar aqui esta nota sobre o processo que foi seguido e que, a meu ver, nos levaria a uma longa discussão sobre o que verdadeiramente é ou não a autonomia universitária.
Dois esclarecimentos adicionais, até para dar provas aqui de quem lê ou não os Orçamentos do Estado — e já agora alargo este desafio à bancada do Partido Socialista. Sobre balança tecnológica chamo a atenção

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para a página 22 do relatório do Orçamento que compara períodos homólogos entre 2009 e 2010 e até justifica porque é que está a haver uma reversão preocupante em matéria do saldo da balança tecnológica para 2010. Portanto, basta ler o documento que aqui estamos a apreciar.
Assim como sobre o número de alunos diplomados também é o próprio relatório do Orçamento do Estado, na sua página 34 — e citando uma fonte que é o próprio Ministério da Ciência e Tecnologia e Ensino Superior — , que admite que, em 2008/2009, há menos diplomados em Portugal do que em 2007/2008.
Portanto, não sou eu que crio estes factos; é o Sr. Ministro com as suas fontes que alimenta esta informação — e eu esperaria que não desdissesse isto — ou, então, há aqui mecanismos de articulação entre os vários ministérios que eu gostaria que explicasse o que querem dizer.
Agradeço-lhe, também, um comentário sobre esta realidade factual e objectiva.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, a situação financeira do ensino superior, como é de todos conhecida, é dificílima em resultado do crónico subfinanciamento a que os governos vão submetendo as instituições de ensino superior.
Porém, gostaria de lhe colocar uma questão concreta que tem a ver com as declarações feitas recentemente pelo Sr. Reitor da Universidade de Évora, que, nas comemorações do «Dia da Universidade», dia 1 de Novembro, sublinhou uma preocupação que tinha — uma vez que paira, ainda, a ameaça de cortes mais gravosos para lá daqueles1,6% que já foram cortados na dotação de 2010 e que se deveria manter para 2011 — , dizendo que, a sucederem estes cortes, estaria seriamente comprometida não só a execução do contrato de confiança»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado, peço-lhe que repita um bocadinho da sua frase que não ouvi e que dissesse quais cortes»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Então, repito: no passado dia 1 de Novembro — o Sr. Presidente, certamente terá a gentileza de proceder ao desconto desta repetição no tempo que possuo — o Sr. Reitor da Universidade de Évora, nas comemorações do «Dia da Universidade», referiu a sua preocupação com uma ameaça que paira ainda de novos cortes sobre o Orçamento para 2011, para lá da redução de 1,6% que já foi efectuada na dotação de 2010; cortes esses que a acontecerem não só comprometeriam a execução do tal contrato de confiança — que, afinal, é um contrato de muito pouca confiança — , por parte do Governo, mas comprometeriam o próprio funcionamento normal da Universidade.
O Sr. Reitor da Universidade de Évora referiu ainda uma situação que tinha que ver com a falta de execução — digamos assim — dos compromissos assumidos em relação à obra, por exemplo, do Pólo dos Leões.
Como o Sr. Ministro deve saber, a obra de expansão do Pólo dos Leões da Universidade de Évora deveria ter sido concluída em 2010, mas não foi concluída porque não foram transferidas as verbas que eram necessárias, o que motivou, repito, o adiamento da conclusão da obra.
Portanto, Sr. Ministro, a questão que lhe quero colocar é a de saber se, de facto, as instituições de ensino superior e, particularmente, a Universidade de Évora podem contar com confiança, neste Orçamento que está a ser discutido, ou se também vai suceder no Ministério da Ciência e do Ensino Superior aquilo que no Ministério da Cultura vai suceder. Isto porque a sua colega do Ministério da Cultura nos deixou numa situação preocupante, na sexta-feira passada, ao dizer-nos que a meio do ano de 2011 irá haver orientações para novos cortes, na ordem dos 10%.
Portanto, a questão que lhe quero colocar é a de saber se as instituições de ensino superior podem ou não contar com este Orçamento, apesar de já estar cortado em relação ao tal contrato de confiança, particularmente e em relação à Universidade de Évora, se os projectos que esta tem em andamento vão ou não ser concluídos e se o Ministério vai ou não cumprir os compromissos a que está obrigado por força do Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, eu gostaria de lhe colocar um conjunto de situações sobre o seu Ministério no distrito de Braga.
Começo por referir dois projectos que se arrastam há muitos anos, relativamente à Universidade do Minho concretamente novas instalações para uma escola de enfermagem e para a associação de estudantes da universidade.
Gostaria de saber se no âmbito daquilo que tem sido assinado está ou não projectado o avanço destes dois importantes projectos.
Relativamente ao Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, de que já hoje aqui se falou, gostaria de perceber se uma residência de estudantes chamada Gil Vicente que está inscrita no PIDDAC do Ministério com uma verba de 35 000 € para o próximo ano, ç a residência de estudantes para o IPCA. Se for, eu gostaria de saber por que razão este projecto não está inscrito no PIDDAC regionalizado do distrito de Braga.
Gostaria também de saber se vão ou não avançar com os novos investimentos há muito prometidos relativamente ao Instituto Politécnico para a biblioteca e a nova escola de tecnologia, e ainda se o Sr. Ministro confirma ou desmente uma afirmação recente do Sr. Governador Civil de Braga, representante do Governo no distrito, sobre a criação de um pólo do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, no concelho de Vila Nova de Famalicão, isto é, se o Ministério tem, de facto, esta perspectiva de criação conforme o Sr. Governador Civil referiu.
Finalmente, Sr. Ministro, relativamente ao novo Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia, que é, sem dúvida alguma, um importante investimento no distrito, o Sr. Ministro tinha anunciado em 2006 que este laboratório estaria em pleno funcionamento em 2009, mas passado este tempo ainda não está em funcionamento.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que termine.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Termino, Sr. Presidente, perguntando ainda ao Sr. Ministro o seguinte: recentemente o responsável pelo Laboratório veio dar conta das muitas dificuldades no recrutamento de investigadores — pelos vistos estão apenas contratados 40 investigadores.
Gostaria que o Sr. Ministro me desse alguma informação sobre as dificuldades no recrutamento de investigadores para o INL (Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia).

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Foram-me colocadas muitas questões, por isso, dentro do tempo disponível, tentarei responder àquelas que anotei.
Para não me esquecer, começarei por responder a uma questão concreta e, depois, tentarei concentrar-me sobretudo naquelas que têm mais relevância para a questão do debate do Orçamento do Estado.
Há uma pergunta concreta que me foi feita, que diz indirectamente respeito ao Orçamento do Estado, ao PIDDAC, que tem a ver com a Universidade de Évora — Pólo dos Leões. A informação que tenho aqui da Universidade de Évora é que esta obra está terminada, que a Universidade de Évora já pagou 3,7 milhões de euros, que deve ainda cerca de 2 milhões de euros e que aguarda transferência do Programa Operacional de Valorização do Território para saldar esta dívida. O PIDDAC de 2010 tinha inscritos, em orçamento nacional, cerca de 500 000 €, que, segundo a informação que tambçm aqui tenho, já foram totalmente executados.
Regressemos, agora, à ordem das questões que me foram colocadas.
O Sr. Deputado José Ferreira Gomes deixou-me um pouco perplexo, mas insisto que, no discurso e nas respostas, manterei exactamente o mesmo tom que assumi desde o início desta minha vinda ao Parlamento.
E vou dizer por que razão me deixou perplexo, na medida em que reputo o Deputado José Ferreira Gomes, como um universitário, hoje investido nas funções de representante do País na qualidade de Deputado, que defende, naturalmente, o interesse do desenvolvimento científico do nosso País.

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O Sr. Deputado entende que é útil declarar aqui, e por isso o faz, que os nossos cientistas vivem uma grande angústia — e, ao dizê-lo, é criar essa angústia — , denunciar aquilo que acha que é optimismo do Ministro, portanto optimismo meu, quando apenas enumero aquilo que nos devia encher de satisfação a todos, designadamente à sua própria bancada, porque é um activo do País, e dizer que o País (e, depois, teve o cuidado de enunciar o Ministério e o Ministro) não oferece qualquer esperança aos cientistas. Estas afirmações deixam-me perplexo e, por isso, convido o Sr. Deputado a pensar nelas.
Nós estamos perante um desafio nacional desde há vários anos, um desafio nacional difícil, muito difícil.
Portugal chegou à ciência moderna em condições deploráveis, porque esteve afastado, durante muitos anos, da cena internacional, devido ao afastamento da universidade das correntes do pensamento, aos níveis educacionais baixíssimos e à enorme dificuldade em fazer frente às necessidades do quotidiano do País e, ao mesmo tempo, em investir naquilo que parecia a muitos ser supérfluo, isto é, na investigação científica.
O Sr. Deputado conhece bem esta história, que é a nossa história e a história de muitas das nossas gerações, que nos permitiu — e bem — superar esta situação. Nunca me acusará de ter feito qualquer discurso triunfalista sobre esta matéria. Portugal, em ciência, está infinitamente melhor do que estava há 30 anos, há 20 anos e há 10 anos, mas tem ainda muito que percorrer. Muito que percorrer! E tem muito que percorrer em duas perspectivas: na perspectiva da necessidade e na perspectiva da capacidade. Hoje, em Portugal, existem oportunidades científicas, tecnológicas e empresariais, que não existiam há uns anos, e, portanto, existe a oportunidade, existem pessoas, existe capacidade de formação, existem laboratórios, existe rede internacional, mas também existe uma imperiosa necessidade do ponto de vista económico, mas também do ponto de vista social e cultural.
O facto de, hoje, já termos atingido níveis elevados nesta matéria, quando comparados com o passado, nunca nos deve deixar esquecer o caminho que todos ainda temos para percorrer.
Não creio que seja justo — e julgo que é apenas uma força de expressão — o Sr. Deputado dizer que, nesta área da política científica, este Ministério se caracteriza por medidas avulsas, pois é precisamente o contrário do que toda a gente de fora de Portugal que nos analisou diz, que se esgotou a vontade de contribuir para um sistema científico eficaz e que as estatísticas — repito o que aqui anotei — servem para a glorificação do Ministério. Lamento muito, Sr. Deputado, mas isto não é uma boa contribuição para o desenvolvimento científico do nosso País.
Contudo, parto do princípio de que se trata apenas de uma força de expressão infeliz e que o Sr. Deputado está, de alma e coração — não tenho a mais pequena dúvida em relação a isto — , connosco na vontade e até em todas as medidas que têm sido tomadas nesta matéria.
A Sr.ª Deputada Manuela Melo pergunta-me, no que diz respeito ao Programa Ciência Global, qual o número de candidaturas. São cerca de 450 candidaturas, provenientes dos países africanos de expressão portuguesa e de Timor-Leste, países a que o concurso estava aberto. Essas 450 candidaturas, em fases muito diversas de preparação, como deve imaginar, pois umas eram meras declarações de intenção e outras eram projectos de trabalho acabados, foram tratadas individualmente, houve o contacto individual com todos os candidatos, depois de pré-seleccionadas, foram avaliadas como qualquer candidatura a bolsas de doutoramento ou de pós-doutoramento no nosso País e, neste momento, existe uma pré-selecção final de cerca de 100 candidatos.
A fase final é o contacto directo com todas as instituições de acolhimento para verificar se essas instituições têm ou não condições para cumprir os objectivos do Programa, designadamente o compromisso a longo prazo com os candidatos depois de estes regressarem aos seus países.
A segunda questão diz respeito às parcerias internacionais. Sim, os meios para as parcerias, quer nacionais quer internacionais, estão previstos no Orçamento do Estado para 2011. Eles representam uma ínfima percentagem do total do Orçamento do Estado, mas representam uma componente extremamente importante do ponto de vista estratégico.
Relativamente à avaliação das parcerias internacionais — julgo que houve um Deputado do PCP que me fez esta pergunta — , ela tem sido feita por equipas de avaliação independentes da administração portuguesa e dos organismos internacionais com os quais temos essas parcerias, e os relatórios dessas avaliações são públicos. Podemos transmiti-los aos Deputados interessados, mas, de qualquer maneira, são públicos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Já agora!

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O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Relativamente ao Programa Dinamizador das Ciências e Tecnologias do Mar e às razões da sua concentração no mar profundo, devo dizer que elas dizem respeito, em primeiro lugar, à capacidade desenvolvida, ao longo das últimas décadas, no arquipélago dos Açores, designadamente na área da vulcanologia e da geofísica submarina, na Universidade dos Açores, no Pólo de Ponta Delgada, e, no que diz respeito à biologia marinha, no Departamento de Oceanografia e Pescas, conhecido por DOP, instalado na cidade da Horta.
Trata-se de um acontecimento invulgar, o desenvolvimento na ilha do Faial de um centro de investigação, neste momento de qualidade internacional, de dimensão média, mas que começou por ser um pequeníssimo centro de investigação. Temos aí, portanto, um centro de investigação cada vez mais importante do ponto de vista do seu potencial económico para a exploração biotecnológica.
Portanto, a nossa aposta não é apenas a demonstração de que existe uma oportunidade neste momento e de que existe uma imperiosa necessidade de investimento numa área em que não se passa um ou dois meses sem que haja navios oceanográficos de outras nacionalidades que cruzam as nossas águas e que recolhem material biológico nas fontes hidrotermais dos Açores, é também pelo potencial que o subsolo da nossa zona económica exclusiva representa, que só pode ser verdadeiramente averiguado através de um fortíssimo investimento em investigação científica.
O Sr. Deputado Michael Seufert, que não está aqui presente, pede-me para esclarecer números. Eu julgo que já os esclareci, mas, certamente, esclareci-os mal. Eu tive o cuidado de esclarecer, à cabeça, que os fundos comunitários inscritos no Mapa I que vos enviei, no que diz respeito ao orçamento de 2010, dizem respeito aos fundos comunitários efectivamente transferidos e apenas a esses e, no que diz respeito a 2011, apenas aos fundos contratados nos programas que foram agora objecto de reformulação.
As transferências para as fundações são reguladas por lei, Sr. Deputado. A lei, através das formas de financiamento, trata todas as universidades e instituições públicas da mesma maneira. Os quadros de distribuição dos plafonds pelas instituições de ensino superior são públicos. As instituições, todas elas, são tratadas da mesma maneira. Mas, apesar de esses quadros serem públicos, terei todo o gosto em fornecer esses quadros ao Sr. Deputado.
Relativamente ao Radar Meteorológico da Madeira, já tive ocasião de dizer que sim e de o repetir. Está previsto que ele possa ser co-financiado e está em curso, neste momento, a avaliação técnica da compatibilidade quer com o local, onde há uma instalação militar que, neste momento, está a ser desenvolvida, quer com a escolha de outro local.
Pergunto à Sr.ª Presidente de quanto tempo ainda disponho.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente da Comissão, Teresa Venda.

A Sr.ª Presidente: — Ainda dispõe de 13 minutos, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — O Sr. Deputado José Moura Soeiro levanta muitas questões, mas eu vou começar pelas pontuais para, depois, ir à questão de fundo.
O Sr. Deputado fala de investigadores «coagidos a dar aulas sem remuneração». Já tive ocasião de dizer, Sr. Deputado, que estamos, natural e completamente, de acordo sobre essa matéria, pois ninguém pode ser coagido a nada, muito menos um investigador coagido a dar aulas e muito menos um bolseiro da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT)! Já tive ocasião de o dizer e de o repetir! As condições para que um docente convidado possa dar aulas sem remuneração estão expressas e limitadas no Estatuto da Carreira Docente Universitária, e este Estatuto é para cumprir à letra.
Em segundo lugar, temos a questão de fundo que eu gostaria de discutir em detalhe. O Sr. Deputado entende que em Portugal, ao contrário da generalidade dos países, as instituições públicas — e vou falar exactamente do único caso concreto que falou, porque é a isso que se referem essas propinas muito elevadas — , não devem fornecer cursos superiores de gestão a executivos de topo. Esta é a sua posição.
Ora, entendo que esta posição é lesiva do interesse público. A necessidade gera a oferta, a procura gera a oferta, e há uma de duas possibilidades: ou os docentes do ensino superior público procurados pelas

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empresas que querem formar os seus gestores de topo leccionam nas suas universidades ou leccionam no País ou no estrangeiro noutras instituições, designadamente em instituições privadas.
Esta fronteira entre o que é público e o que é privado deve ser extremamente clara nesta matéria. E restringir a oferta formativa — não é o mercado, é a oferta formativa — apenas em instituições privadas nesta matéria, desculpe, Sr. Deputado, parece-me que não encontro nenhuma justificação para dizer que isso não seria lesivo para o interesse público. Seria lesivo para o interesse público e para essas instituições.
Essas instituições têm não só capacidade e credibilidade, porque têm docentes qualificados que a procura pretende, mas também capacidade para atrair docentes de topo de outras universidades, públicas ou privadas, do resto do mundo para leccionar esses cursos de formação. Parece-me extraordinário vir aqui procurar estar contra a autonomia dessas instituições nesta matéria.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Ó, Sr. Ministro!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Em Portugal, a lei é tão clara nesta matéria, embora o Sr. Deputado não goste dela, que permite às instituições, quando se trate de formações que não se sucedem ao 1.º ciclo como obrigatórias para o mercado de trabalho, designadamente formações de 2.º ciclo, não estamos a falar de 3.ª ciclo»

Protestos do Deputado do BE José Moura Soeiro.

Quem está a ouvir-nos normalmente não ouve o Sr. Deputado e eu terei sempre de repetir como se fosse o seu «ponto», o que não me parece bem.
Portanto, relativamente aos cursos de MBA, o Sr. Deputado entende que as instituições públicas devem ser proibidas de leccionar esses cursos nas condições económicas em que todos os MBA leccionam, isto é, cobrindo os custos, ou, então, entende, ao invés, que os custos elevadíssimos de organização dos MBA deveriam ser suportados pelos contribuintes e não pelas empresas que mandam para lá os seus gestores.
Acho qualquer das hipóteses absolutamente extraordinária como ideia de defesa do interesse público.
O Sr. Deputado Miguel Tiago disse que o Orçamento do Estado veio limitar a capacidade do Sistema Científico e Tecnológico Nacional (SCTN). Trata-se de uma das afirmações mais extraordinárias e anticientíficas, porque corresponde objectivamente ao contrário da verdade.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mostre, então!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Mas, depois, fez uma observação interessante, que teria todo o gosto em discutir de uma forma detalhada, comparando os instrumentos do EUROSTAT — julgo que foi a isto que se referiu — de análise dos orçamentos em ciência e tecnologia dos diferentes países com a execução no sector público, medida através do Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional (IPCTN).
O Sr. Deputado ficaria estupefacto se descobrisse aquilo que normalmente ensinamos logo no princípio de análise de estatísticas aos estudantes nesta área, que é o de que existe em todos os países uma diferença de vários pontos entre estas duas medidas,»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A verdade e a mentira são muito diferentes!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — » porque são medidas diversas e os critérios são diversos numa análise e na outra.
Quando falo de execução do sistema público, falo de execução do sistema público e falo apenas da comparação ao longo dos anos dessa execução.
O Sr. Deputado arroga-se em vigilante e fiscal do EUROSTAT e em vigilante e fiscal da OCDE. Tenho todo o gosto em sugerir a essas organizações a sua contratação como consultor e crítico dos seus mecanismos!

O S. Bruno Dias (PCP): — Um pouco mais de respeito!

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O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Tenho imenso respeito. É por respeito que estou a responder, Sr. Deputado. É por respeito!

Protestos do PCP.

Por vezes, não se gosta de ouvir, mas esse é um problema de audição, é um problema de ondas sonoras nesta Sala.
O Sr. Deputado, referindo aos laboratórios de Estado, fez uma pergunta concreta sobre os técnicos superiores que têm doutoramento. Sr. Deputado, não há só técnicos superiores com doutoramento em laboratórios de Estado, há técnicos superiores com doutoramento»

Protestos do PCP.

Agradecia à Sr.ª Presidente que providenciasse no sentido de que não houvesse tanto ruído. Também não interrompi o Sr. Deputado quando ele estava a falar.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Ministro, há o hábito de se dizer alguns apartes.
Em todo o caso, recomendava aos Srs. Deputados que fizessem um pouco de silêncio.
Faça favor de continuar, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Existem técnicos superiores na Administração Pública com doutoramento; existem técnicos e quadros superiores em empresas com doutoramento; existem professores de outros graus de ensino, que não o ensino superior, com doutoramento; e existem carreiras para as quais é exigido o doutoramento, como a carreira docente universitária, como a carreira de investigação científica ou outras carreiras de natureza empresarial, para as quais se concorre, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Se houver abertura de concurso!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Com certeza, mas se a abertura de concursos não é naquela instituição, é noutra, se não é naquela carreira, é na carreira docente universitária. É a isso que se chama «mobilidade», em função das necessidades das instituições. Durante os últimos anos, em Portugal, foram contratados muitíssimos, milhares de doutorados para as diferentes carreiras.
O Sr. Deputado pediu-me os números sobre o Instituto Tecnológico e Nuclear (ITN) — se quiser, na última ronda, para não estar agora a abusar, poderei dizer-lhos — comparando os orçamentos do ano de 2010 e do ano de 2011.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Tenho aqui!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Se estiver interessado, tenho que procurar o quadro que possuo sobre esta matéria.
Sr. Deputado, fiquei verdadeiramente impressionado com o facto de V. Ex.ª ter uma posição tão conservadora relativamente às parcerias internacionais do nosso País, pretendendo substituir o que é estrangeiro (portanto, para si mau) pelo que é português (portanto, para si bom).

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isso é ridículo!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Pois é! É ridículo. Exactamente, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quanto custou cada doutoramento?

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O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Tudo isso é público, Sr. Deputado.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado Miguel Tiago, se quiser, inscrevo-o na outra ronda para fazer o resto das perguntas. Nós fazemos as perguntas e o Sr. Ministro responde.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Mas é que o Sr. Deputado sabe perfeitamente a resposta. Há perguntas que se fazem quando se conhece a resposta e há perguntas que se fazem quando se quer a resposta. É diferente. Quando a resposta é pública e já foi dada 300 vezes, deve imaginar que não se quer propriamente a resposta, quer apenas fazer-se a pergunta.
O Sr. Deputado Pedro Rodrigues falou das cativações. Pois é claro que não se aplicaram. Os Srs. Deputados que, durante muito tempo, diziam que aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro tinha afirmado com a totalidade dos reitores e a totalidade dos presidentes dos politécnicos não era verdade ficaram certamente convencidos de que era realmente verdade, portanto nunca mais desconfiarão.
A Sr.ª Deputada Rita Rato fez-me uma pergunta sobre o que queria dizer a «externalização» do Estado Universitário de Lisboa e manifestou preocupação — e sou extremamente sensível a essa sua preocupação — com alunos de menores recursos. Creia que é essa preocupação com alunos de menores recursos que nos motiva em tudo o que diz respeito à acção social escolar neste Ministério.
A externalização do Estádio Universitário de Lisboa que é pensada é apenas esta: o Estádio Universitário de Lisboa tem uma estrutura administrativa antiga, aliás completamente anómala em Portugal — é formalmente uma direcção-geral. Faz algum sentido o Estádio Universitário de Lisboa — aliás, é o único estádio universitário que tem esta estrutura — ser uma direcção-geral? O terreno é público e o que faz sentido é que todos os investimentos que ali estão estejam à guarda das universidades e dos estabelecimentos de ensino superior públicos de Lisboa para fruição não só do pessoal académico mas também da cidade. E é preciso não esquecer que o Estádio Universitário de Lisboa é, hoje, um equipamento social de extrema importância para a cidade de Lisboa, não apenas para os estudantes.
O que tem vindo a ser falado com as instituições de ensino superior da área de Lisboa e com a Câmara Municipal de Lisboa é a criação de uma estrutura adequada de gestão, mas manifestamente já não uma estrutura de direcção-geral.
Devo dizer-lhe, aliás, que ao longo dos anos, por acordo com o Estádio, foram progressivamente reduzidas as verbas de funcionamento, as quais deixaram de ser necessárias para o Estádio Universitário de Lisboa que neste momento vive inteiramente, ou quase inteiramente, das suas receitas próprias, mas, ao longo destes anos, foram feitos investimentos importantes que permitem precisamente essas receitas. O Estádio Universitário de Lisboa, hoje, é uma entidade que está pronta para ser inteiramente autónoma e, sobretudo, para não ter um estatuto de direcção-geral, que não faz qualquer sentido do ponto de vista formal.
Deve imaginar que esta cadeia hierárquica Ministro/direcção-geral no que se aplica ao Estádio Universitário de Lisboa é completamente absurda, não faz sentido.
A Sr.ª Deputada Catarina Martins fez duas perguntas, às quais tenho todo o gosto em responder.
Em primeiro lugar, tenho a dizer-lhe que não é só a b-on (Biblioteca do Conhecimento On-line); é a b-on e a RCTS (Rede Ciência, Tecnologia a Sociedade). Elas são suportadas por contratos, a maioria dos quais contratos internacionais da Fundação de Cálculo Científico Nacional (FCCN) e posso garantir que esses contratos serão, naturalmente, honrados pelo Orçamento do Estado e, que fique claro, não serão facturados às instituições nem aos utilizadores.
Portanto, a b-on e a RCTS não mudam de estrutura. Houve uma mudança de inscrição orçamental na Direcção-Geral do Ensino Superior na medida em que consideramos que é possível e desejável, por força da expansão que se prevê para a RCTS, procurar estudar as possibilidades de co-financiamento dessa expansão, portanto de alguns de custos de funcionamento da rede, não da b-on mas da RCTS.
Peço desculpa, Sr.ª Presidente, pois provavelmente o tempo de que disponho já está a esgotar-se.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Não, Sr. Ministro, ainda pode usar mais 10 minutos.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Muito obrigado, Sr.ª Presidente.

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A Sr.ª Deputada Catarina Martins colocou ainda uma pergunta sobre o software.
Esta discussão levar-nos-ia muito longe, mas, para evitar qualquer ambiguidade nesta matéria, começo por lhe dizer que por convicção, mas também por experiência profissional da minha vida, o software livre não proprietário, sobretudo de sistemas operativos não proprietários (haverá aplicações proprietárias, mas refirome ao software não proprietário), é aquele que mais favorece não apenas a redução de custos nessa matéria mas também a inovação e a própria possibilidade de desenvolver software proprietário no domínio aplicacional, portanto de actividades empresariais a partir de software livre.
É por isso que a universidade e os sistemas de investigação, sobretudo os de natureza mais ligada à engenharia ou às ciências exactas, usam sistematicamente software não proprietário, para poderem sobre ele criar as suas aplicações.
Portanto, no domínio do nosso Ministério, não estamos a falar das aplicações de escritório, as quais sabe perfeitamente que são de muito difícil ultrapassagem pela compatibilidade com os ficheiros que é preciso abrir que vêm do mundo inteiro. Mas, no domínio universitário e científico, essa é uma franja mínima, é um custo mínimo. O que verdadeiramente custa são os sistemas dos servidores e os sistemas aplicacionais dos laboratórios e das universidades.
A Fundação de Cálculo Científico Nacional tem feito um enorme trabalho nesse sentido com as instituições de ensino superior e procuraremos realizar e cumprir todas as ideias e propostas que nos queiram apresentar nessa matéria para reforçar a eficácia deste trabalho, designadamente no meio científico universitário.
O Sr. Deputado Bruno Dias levantou duas questões que reputo de extrema importância para a discussão, apesar de não terem directamente a ver com o Orçamento do Estado.
A primeira diz respeito à neutralidade da Internet. Sim, Sr. Deputado, a posição formal que o Governo português tem assumido na preparação de posições sobre esta matéria na União Europeia tem sido a da defesa intransigente da neutralidade da Internet, e espero, aliás, que toda a Câmara acompanhe o Governo.
As decisões finais, a serem tomadas sobre esta matéria, serão decisões à escala da União Europeia, do Conselho e do Parlamento da União Europeia. A posição do Governo português tem sido a da defesa da neutralidade da Internet.
No que diz respeito à contrafacção, o Sr. Deputado levantou uma questão sobre a qual conhece perfeitamente a minha posição, que é tão pública que até já fui acusado, à escala internacional — aliás, em toda a Internet, deve estar no YouTube o vídeo da minha intervenção sobre esta matéria — , por todos os puristas nesta matéria, de defender a pirataria apenas porque um dia levantei a voz para referir o abuso que poderia ser o facto de a defesa contra a contrafacção (evidentemente, todos estamos contra a contrafacção) poder servir para eliminar ou criar abusivamente restrições à circulação individual de conteúdos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E qual é a posição do Governo?!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado, não posso entrar em todos os detalhes de todas as questões, mas creio que estamos de acordo nesta matéria. Digo-lhe, mais uma vez, que tenho todo o gosto — aliás, há uma comissão especializada sobre esta matéria — em discutir esta questão com o Sr. Deputado e creio que toda a Câmara partilhará destes objectivos de equilíbrio entre a necessidade de proteger os direitos dos autores e a necessidade de promover a circulação dos conteúdos. É um equilíbrio difícil, sabemo-lo, e é sempre posto em causa cada vez que há uma inovação de suportes materiais.
O Sr. Deputado Pedro Saraiva já tinha colocado a questão dos quadros, mas eu não neguei nunca os quadros que são do próprio Ministério, como deve imaginar, simplesmente, expliquei como entendi que os devia explicar. Podemos produzir um quadro da balança tecnológica, mês a mês, mas eu simplesmente disse, Sr. Deputado, e não me leve a mal, que a balança tecnológica anual não se mede mês a mês; mede-se ao fim do ano, como deve imaginar. Basta olhar para os anos anteriores! Sr. Deputado João Oliveira, já respondi à questão de Évora e à sua preocupação relativamente à obra do edifício dos Leões.
O Sr. Deputado também colocou um conjunto de questões detalhadas relativas ao distrito de Braga. Peço desculpa de não as ter anotado, mas certamente não estarei em condições de poder responder

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detalhadamente a algumas dessas questões pontuais. No entanto, peço que as transmita para eu, depois, obter respostas a todas elas junto dos serviços e, posteriormente, lhas comunique.
No imediato, posso responder relativamente ao Instituto Ibérico de Nanotecnologia de Braga. O Sr. Deputado fez o favor de acentuar a importância que tem este Instituto, e eu registo esse facto. Também considero que tem importância, não apenas para o País mas para a própria região, a instalação deste grande Instituto, que é, aliás, a primeira instituição internacional de investigação científica no nosso País, em Braga.
Em relação à contratação de investigadores, tive ocasião de sublinhar, no meu próprio discurso, que esta contratação se alargaria à escala global, com uma campanha à escala mundial durante o ano de 2011. Esta contratação de investigadores faz-se ao nível de topo, não se trata de contratar jovens Post-doc — poderíamos ter o Instituto com 500 jovens Post-doc, amanhã — , trata-se, sim, da contratação de investigadores principais para os diferentes grupos, à escala mundial.
Ora, este é um trabalho longo, difícil, de competição internacional, de parcerias internacionais com outras instituições que tenham, neste momento, uma história neste sector para minimizar os riscos de alguém com uma carreira estabelecida que entra numa instituição completamente nova e sem tradição. Este trabalho de preparação está feito e poderei entrar nos detalhes, se assim for entendido, e estamos convencidos de que, durante o ano de 2011, além do recrutamento de jovens investigadores, naturalmente, se concluirá o recrutamento de investigadores principais.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Passamos à terceira ronda de perguntas. Lembro que os Srs. Deputados dispõem de 3 minutos para cada intervenção.
Tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr.ª Presidente, em primeiro lugar, quero cumprimentar os Srs.
Presidentes das Comissões aqui presentes, o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e os Srs.
Secretários de Estado, as Sr.as e os Srs. Deputados e todos os presentes, iniciando com uma nota prévia a dar conta que me parece importante recordar que estamos discutir a proposta de lei de Orçamento do Estado para 2011 relativa ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e não qualquer outra coisa diferente.
Assim, quero dizer-lhe, Sr. Ministro, relativamente a esta matéria, que qualquer tipo de informação a este nível deve cumprir as regras básicas e características qualitativas que devem constar de qualquer informação deste género. Estou a referir-me ao que, provavelmente, todos conhecemos, quero mesmo recordar, neste momento, que as informações devem ter as características da relevância, da fiabilidade e da comparabilidade, mas a verdade é que a proposta de orçamento do seu Ministério não tem estas três características qualitativas que definem as boas regras de um bom orçamento. O tratamento da informação não nos garante aquilo que deveria garantir, ou seja, o espelho real do que é o orçamento do seu Ministério para 2011. Não garante a comparabilidade porque, relativamente às informações que refere no seu discurso, elas são diferentes do que o que está nos mapas e as alterações sistemáticas dos mapas não nos garantem fiabilidade. De facto, o Sr.
Ministro esteve na comissão especializada há poucos dias e disse que havia um engano da ordem de umas dezenas de milhões de euros»

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Eu não disse nada disso!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Foi publicado em todo o lado, e eu ouvi essa afirmação com os meus ouvidos.
O Sr. Ministro disse o corte de umas dezenas de milhões de euros nas transferências para as instituições de ensino superior era um engano das Finanças e que agora, na discussão do Orçamento, esse engano iria ser reposto. Ora, estamos a terminar o debate e chegamos à conclusão de que o engano perdura, ou seja, não há fiabilidade nas contas, o que quer dizer que, relativamente à sua proposta, em termos de fiabilidade, não podemos comparar nada, temos é, de facto, uma grande opacidade e uma grande falta de transparência.
Em nossa opinião, isto resulta de uma grande incompetência que grassa, ultimamente, no Governo e também no seu Ministério.
Ora, o Sr. Ministro, confrontado com as questões e com os mapas, que resultam da análise da sua proposta orçamental, que são diferentes dos números que, depois, o Sr. Ministro esgrime no debate político, o

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que constatamos é que o Sr. Ministro da Ciência refugia-se, não em respostas concretas e objectivas, mas em lugares comuns, chegando a invocar aqui a alma e o coração, com o objectivo de — temos de concluir — passar o debate, ir passando o tempo e, objectivamente, não responder às questões que os Deputados de diversas bancadas foram, objectivamente, colocando, sobretudo com o intuito de esclarecer as discrepâncias entre os vários números, aqueles que estão num mapa, aqueles que estão nos segundos mapas e aqueles que estão na «boca» do Sr. Ministro.
Como nota final, o que o PSD tem a dizer é que lamenta profundamente que o caminho que o Sr. Ministro escolheu para a discussão deste Orçamento do Estado tenha sido este.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Bravo Nico, informo a Câmara que o CDS prescindiu de usar da palavra nesta ronda de perguntas, pelo que, após a próxima intervenção, se seguirá a do BE.
Faça favor, Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Presidentes das Comissões, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, na fase final deste debate em torno da proposta de Orçamento do Estado para 2011, relativo ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, penso que podemos ter uma perspectiva que nos dá um caminho, utilizando a palavra do Sr. Deputado Emídio Guerreiro, que, há cinco anos e meio, tem vindo a ser percorrido por este Governo, particularmente por este Ministério, no que diz respeito às políticas de ciência e de ensino superior.
Esta é a questão que se coloca porque quem apresenta aqui um orçamento é alguém que apresenta não só a sua proposta e a sua previsão para o futuro mas também o seu trabalho feito no passado recente, um trabalho de cinco anos de gestão científica e de gestão de ensino superior que nos dá a garantia de que o caminho que estamos a percorrer é correcto. Esta é que é a verdadeira questão.
Se perguntássemos ao Sr. Ministro da Ciência, da Tecnologia e Ensino Superior se estamos no ponto onde todos gostaríamos de estar, penso que todos concordaríamos que não estamos ainda nos patamares em que todos gostaríamos de estar — talvez não fosse possível, no tempo que percorremos, estar aí. Mas se perguntarmos se estamos a percorrer o caminho correcto para nos aproximar desse patamar que ambicionamos, penso que deveríamos todos concordar que estamos no caminho com o sentido correcto.
Com todos os indicadores a evidenciarem que estamos num caminho de sentido correcto, porque temos mais produção científica, mais formação de investigadores, mais integração em redes científicas internacionais, mais transferência de conhecimento de tecnologia e inovação para o sistema económico, cultural e social, mais alunos no ensino superior, mais jovens, mais adultos, mais qualidade no ensino superior, mais certificação da oferta formativa do ensino superior, universidades e politécnicos com um novo regime jurídico, professores com um novo estatuto da carreira docente, mais qualificação, mais ciência e temos mais ensino superior — não estamos onde queremos, mas estamos no caminho correcto — , tenho muita pena de ver uma oposição, particularmente a oposição que aspira a ser poder, ter um discurso que, penso, derrotaria qualquer espírito e qualquer impulso de modernização que qualquer cientista ou qualquer professor pudesse ter em qualquer instituição. Não é assim que conseguiremos chegar à ambição! Não é com esse discurso nem é com essa postura! Convido a oposição a associar-se a um caminho positivo, particularmente tendo um discurso positivo.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, no final deste debate, persiste uma dúvida que o Sr. Ministro é incapaz de esclarecer, porque os números não batem certo.
No orçamento para o ensino superior há, neste ano, menos 138 milhões de euros e o Sr. Ministro diz que são menos 100 milhões de euros em salários por causa do corte em salários, o que em si mesmo é um dado interessante, porque significa que o valor do Contrato de Confiança, do investimento, que o Governo fez no ensino superior, que eram 100 milhões de euros, afinal vai ser pago pelos salários dos professores, dos trabalhadores das instituições de ensino superior.

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Mas, além disso, há mais 38 milhões de euros que o Sr. Ministro não explicou por que é que desaparecem, nomeadamente cerca de 20 milhões de euros para as instituições de ensino superior. Onde é que foi cortado? Como é que se pode dizer que as instituições mantêm as mesmas verbas do ano passado, se o Sr. Ministro diz que, destes 138 milhões, há 100 milhões que são devidos aos cortes nos salários? Então, onde é que são cortados os outros milhões e porquê?! Por outro lado, ficou por esclarecer a pergunta muito concreta que fiz no sentido de saber como é que se vão formar mais 100 000 novos alunos com os mesmos ou com menos professores. Gostava que me explicasse como é que isso vai acontecer.
Há uma terceira questão a que gostava de voltar nesta última intervenção. O Sr. Ministro disse que não queria ser o «ponto» das perguntas do Bloco de Esquerda. O «ponto» não é aquele que repete, Sr. Ministro, é aquele que lembra o texto, e depois o actor diz o texto. Gostava, de facto, de servir de ponto, na medida em que gostava de lhe lembrar a pergunta que fiz e à qual o Sr. Ministro fugiu.
Não respondeu à seguinte pergunta muito concreta, Sr. Ministro: considera que se pode exercer psicologia apenas com o 1.º ciclo? Se considera que sim, então, está um bocadinho desfasado da maior parte das pessoas que requerem psicólogos para trabalhar, nomeadamente instituições públicas. Se o Sr. Ministro considera que não, ou seja, que para exercer psicologia é preciso o 2.º ciclo da licenciatura, como consideram as escolas, as instituições ou as empresas que contratam, então, gostava de saber o que acha de uma instituição de ensino superior põblico em que o 2.ª ciclo de psicologia custa 5000 € — estou a falar do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), mas há outros exemplos.
O Sr. Ministro pode fazer o elogio dos cursos para os gestores de topo das empresas, mas a minha questão ç muito simples: considera que 5000 € para o 2.º ciclo de psicologia é legítimo? Considera que isto é uma política de democratização do acesso às qualificações, quando sabemos que, antes, as licenciaturas em psicologia tinham precisamente a componente de formação que agora é assegurada pelo 2.º ciclo? O Sr. Ministro disse que aquilo que estivesse fora da lei, os 2.os ciclos que fossem necessários deveria ter propina igual à do 1.º ciclo. O que vai fazer então, Sr. Ministro, em relação ao descontrolo das propinas do 2.º ciclo em qualificações de que as pessoas precisam? Por último, gostava de voltar à questão da biblioteca online e à RCTS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, dispõe de 10 segundos.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — O Sr. Ministro disse que a biblioteca online, a b-on, está orçamentada.
Onde, Sr. Ministro? É porque, se está, há qualquer coisa que perdeu dinheiro, porque na rubrica em que o Sr.
Ministro diz que está a RCTS e a b-on não há um aumento de verba; no entanto, há uma nova competência, uma nova atribuição nessa rubrica, que é precisamente a b-on e a RCTS.
Uma pergunta concreta: quanto dinheiro há para a b-on e para a RCTS neste Orçamento do Estado? Já agora, quero saudar o Sr. Ministro quando disse que o software livre não proprietário é uma boa ideia, porque o Bloco de Esquerda tem projectos de lei nesse sentido. Já os apresentámos neste Parlamento e foram chumbados pelo Partido Socialista, mas esperamos contar com o apoio do Governo da próxima vez que os apresentarmos.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, esquece-se que, quando falamos de 1% do PIB, não falamos dos dados da OCDE, falamos, sim, daquilo que o Sr. Ministro vinha aqui anunciar quando nos apresentava os Orçamentos do Estado antes de sair, nomeadamente o Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional e os dados provisórios de 2007 e, depois, de 2008. São contas diferentes. O Sr. Ministro usa as da propaganda, nós usamos as da avaliação das suas tarefas e, portanto, obviamente, que os resultados serão diferentes, tão-só porque umas são o resultado da apreciação do que realmente se verificou, ou seja, da execução dos orçamentos que o Sr. Ministro afirmava chegarem a 1% do PIB, e outras são as do texto que o Sr. Ministro faz acompanhar os orçamentos, com as considerações que entende, muito embora também tenha a perfeita consciência de que não executará nada próximo do que afirma executar. O mais preocupante é que isso vai verificar-se também este ano.

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Portanto, estamos perante um orçamento que já de si carrega um corte muito forte e sabemos, à partida, que enquanto o discutimos ele ainda não reflecte o que realmente será executado. Mas esse é um mal de que padece esta discussão orçamental desde há muito, obviamente não é da responsabilidade exclusiva do Sr.
Ministro nem tão-pouco deste Governo. De facto, todos têm lutado um pouco pelo pior lugar.
Sr. Ministro, deixe-me voltar a algumas questões já colocadas, algumas das quais não foram respondidas e outras, julgo, o senhor não entendeu ou fez por não entender.
Sr. Ministro, quanto ao estatuto da carreira docente dos professores do politécnico, o artigo 42.º do Orçamento do Estado limita, ou não, o cumprimento cabal do estabelecido na Lei n.º 7/2010, por via de apreciação parlamentar feita nesta Assembleia pelos diversos partidos, com oposição exclusivamente do PS? Vai ou não cumprir? Ou encontrou no Orçamento do Estado uma forma de contrariar as deliberações que esta Assembleia tomou por via da sua legitimidade democrática? Os professores que leccionam no ensino politécnico e que cumpram os requisitos descritos na Lei n.º 7/2010, na apreciação parlamentar feita ao estatuto da carreira, vão ou não ter a possibilidade de ingressar na carreira de professor do ensino superior politécnico? Sr. Ministro, não teci qualquer consideração sobre os programas com instituições estrangeiras, apenas o confrontei com a opção do investimento nas instituições portuguesas e com o facto de, para uns, a bolsa abrir tanto e, para outros, fechar sempre. Todos os anos, continuamente, vemos a bolsa fechar para as instituições portuguesas, como, aliás, podemos novamente testemunhar. Perguntei-lhe apenas o seguinte: quanto custou, em média, um doutorado ao Estado português através destes protocolos? Não estou a tecer considerações de valor, aliás, precisamos desses dados.
Os dados que o Sr. Ministro refere estão pulverizados por instituição e nem todas têm os valores. Por exemplo, a Universidade Carnegie Mellon não tem os valores nem o número de doutorados, tão-pouco sobre os que são portugueses ou não.
Sr.ª Presidente, deixe-me colocar duas questões brevíssimas.
Quanto aos técnicos superiores com doutoramento, Sr. Ministro, refiro-me, obviamente, àqueles que desempenham funções de investigador e que, inclusivamente, dirigem projectos de investigação. É a estes exclusivamente que me refiro. Está ou não o Ministro comprometido com as palavras que chegou a proferir na Comissão de Educação e Ciência de que tudo faria para que estas dezenas de pessoas fossem reclassificadas na carreira que deviam integrar? Sr. Ministro, passo à questão da transferência e inovação.
O Sr. Ministro não gostava, e tinha as suas insuficiências, como é óbvio, mas o Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação (INETI) tinha, ainda assim, uma vertente de transferência e de plataforma de rotação entre o que se fazia no sector público de investigação e desenvolvimento e o sector privado.
Poderia funcionar de uma forma deficiente, não é isso que agora interessa, o que importa é sabermos o que é que vai substituir essa plataforma e o que tem pensado o Governo para garantir a ponte entre a indústria e o desenvolvimento.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, dispõe de 10 segundos.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Termino, Sr. Ministro, com a constatação de um facto que, para o PCP, não deixa de ser lamentável: independentemente do debate que aqui hoje tivemos, a conclusão que se retira é a de que o ensino superior, a acção social e o financiamento das instituições continuam a não ser uma prioridade para este Governo. O Governo continua a entender que as instituições devem fazer mais com cada vez menos recursos, degradando a qualidade.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, tem mesmo de terminar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Termino já, Sr.ª Presidente.
Quando o PCP lhe fala da privatização da acção social escolar, o Sr. Ministro faz uma cara de estranheza.
Basta lembrar os empréstimos, que mais não são do que a cobertura por privados das necessidades públicas das famílias mais carenciadas, que precisam de ir à banca buscar empréstimos para cumprir um direito que é seu, de acordo com a Constituição da República Portuguesa.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Vou dar a palavra ao Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para responder. Estava convencionado que o Sr. Ministro disporia de 10 minutos, mas como alguns grupos parlamentares excederam um pouco o tempo de que dispunham, conceder-lhe-ei depois uma tolerância, se for necessário.
Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, como esta é a minha última intervenção, quero começar por agradecer a oportunidade de estar aqui, de discutir convosco e de procurar esclarecer algumas matérias.
Sr. Deputado Emídio Guerreiro, tenho pena das afirmações que proferiu. Quanto às afirmações relativas a regras básicas de informação, a fiabilidade e a opacidade, com essas posso bem, mas acusar de incompetência as pessoas que trabalham no Ministério e que preparam este trabalho para os Srs. Deputados confesso que não merece mais do que esquecer!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Não era para eles mas para si!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Já está esquecido! No que respeita a esclarecer discrepâncias, Sr. Deputado, tenho todo gosto em esclarecer qualquer discrepância.
Sr. Deputado, se tivesse, por exemplo, perguntado com que critério se diz, no relatório do Orçamento do Estado, a certa altura, que existe um crescimento de vinte e tal por cento na Fundação para a Ciência e a Tecnologia, eu diria que não existe um crescimento de vinte e tal por cento na Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Qual foi o critério que deu vinte e tal por cento? Esse critério não inclui transferências extraorçamentais para efeitos de consolidação dos orçamentos, não inclui transferências para outros serviços e fundos autónomos. Eu teria, e tenho, todo o gosto em explicar-lhe, para um lado ou para outro, para cima ou para baixo, quais são as discrepâncias relativas aos critérios técnicos utilizados nos mapas — e que são utilizados nos mapas que reputo de mais simples leitura — que tivemos o cuidado e o esforço de preparar este ano, como, aliás, em todos os anos anteriores.
O Sr. Deputado Bravo Nico convida a oposição a ir por um caminho positivo. Pois eu não faço outra coisa desde há muitas décadas. Considero que sem um caminho positivo e de entendimento, explícito ou implícito — que fique claro — , em matéria de qualificações superiores e em matéria de desenvolvimento científico em Portugal dificilmente um pequeno País periférico como o nosso pode ultrapassar, como conseguiu ultrapassar durante estas décadas, atrasos estruturais ou, como hoje se diz, atrasos de desenvolvimento e de competência, que limitaram muito o desenvolvimento económico e social em Portugal. Para lá das afirmações, e da cor das mesmas, estou convencido de que estamos todos basicamente de acordo.
Sr. Deputado José Moura Soeiro, questionou-me sobre as diferenças de salário para o ensino superior e outros. Essas diferenças têm a ver com o seguinte, Sr. Deputado: o co-financiamento dos cursos de especialização tecnológica, o co-financiamento do Programa de Apoio à Formação Avançada de Docentes do Ensino Superior Politécnico (PROTEC) e a redução de verbas nacionais, do orçamento nacional, nas bolsas de acção social — uma parte é paga por fundos comunitários e outra parte é paga por fundos nacionais — , em que há uma diferença porque se aumenta de 70% para 85% a taxa de comparticipação dessas bolsas.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado perguntou como é que se formam mais alunos com menos professores.
Bem, nuns sítios serão menos, noutros sítios serão mais.
Sr. Deputado, se analisar aquilo que se verificou ao longo dos últimos anos no ensino superior no seu conjunto — estou a falar quase de uma década — , verá que, apesar de o número de alunos em todas as vertentes ter aumentado, não aumentou globalmente o número de professores. O que aumentou foi a qualificação dos professores — tinha professores com baixas qualificações e hoje tem professores com muito altas qualificações, o que altera significativamente as relações entre uma coisa e outra.
Também devo dizer-lhe, Sr. Deputado, mesmo contra o populismo ambiente nesta matéria, que se há uma diferença entre muitas instituições de ensino superior portuguesas e instituições congéneres noutros países é no sentido oposto: o número de horas de contacto em Portugal é consideravelmente superior ao número de

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horas de contacto, para os mesmos cursos, nas melhores instituições do resto do mundo. Ou seja, os estudantes têm mais aulas por semana do que nas melhores instituições congéneres de outros países.
Depois, Sr. Deputado, fugiu dos MBA, a 37 000 €, creio, segundo disse.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — O Sr. Ministro é que já fugiu da psicologia!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — O número é seu! Portanto, quanto aos MBA estamos conversados: «de 37 000 € passou a 0«!» Saindo dos MBA e da gestão de empresas, passou rapidamente para a psicologia.
Sr. Deputado, não sou juiz popular!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Isso é arrogante!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — A arrogância fica com quem profere as afirmações! O Sr. Deputado entende afirmar aqui o seguinte, e penso que posso traduzir a sua afirmação desta maneira: queira o Ministério mandar analisar se os cursos de 2.º ciclo de psicologia, nos termos da lei, deviam ser tratados como cursos de 1.º ciclo em termos de propinas. Ora aí está uma proposta coerente, que o Sr. Deputado não fez mas que poderia fazer. Porque, até agora, não tive nenhum requerimento no Ministério sobre essa matéria! Poderia haver estudantes ou associações que o fizessem, mas não tive nenhum requerimento.
Porém, a partir do momento em que o Sr. Deputado o requeira tenho o maior gosto em mandar analisar.
Não sou eu quem vai analisar, vou mandar analisar a quem de direito, pedir que analise se é verdade ou não.
Se estiver errado, corrige-se; se não estiver errado, continua como está. É assim que é, e deve ser, a vida democrática.
O Sr. Deputado pergunta-me quanto paga o País com os contratos da RCTS e da b-on. É cerca de 19 ou 20 milhões de euros a soma dos dois contratos inscritos na Direcção-Geral do Ensino Superior, como já disse e repeti.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Onde estão?!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Aliás, o Sr. Presidente da FCCN já teve ocasião de desmentir as atoardas que têm sido lançadas nesta matéria.
Sr.ª Presidente, de quantos minutos ainda disponho?

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Dispõe de 5 minutos, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Srs. Deputados, não quero maçar-vos mais nem atrasar o vosso almoço.
Nos 5 minutos de que disponho, e apenas — peço desculpa — na área da ciência, gostava de vos lembrar os números que temos pela frente em termos da narrativa nacional, aquilo que cada um de nós herda nesta matéria, aquilo que todos aqueles que têm responsabilidades na política nacional, a qualquer título — no Governo, na Oposição, no Parlamento, na Administração — , herdam, aquilo que cada investigador herda, aquilo que cada jovem tem necessidade de saber quando entra numa profissão de ciência e tecnologia.
Pouco depois do 25 de Abril, em 1982, Portugal gastava 0,28% do seu produto interno bruto em investigação. Esse número passa para 0,48% em 1990, para 0,81% em 2005, para 1,55% em 2008. Chega? Não chega! Mas este progresso é o que herdámos. Em 1990, apenas 27%, menos de um terço, do total da despesa é realizada por empresas. Hoje, é metade, 50%. Chega? Não chega, mas é, contudo, muito mais.
O número de investigadores, equivalente a tempo integral, registado em 1976, dois anos depois do 25 de Abril, era de 1750. Em 2008, era de 40 000. Chega? São 7,2 investigadores por 1000 activos. É menos do que a OCDE, é mais do que a média europeia, mas é, contudo — não é por médias que nos devemos gerir — , muito menos do que aquilo que tem a maioria dos países nórdicos com uma dimensão territorial semelhante à

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nossa. É muito menos do que na Suíça, é muito menos do que muitos estados dos Estados Unidos da América, que têm dimensões semelhantes ao nosso País.
O número de doutoramentos por ano era, em 1980, em Portugal, de 100, repito, 100 por ano. Por mês, 10, não contando o Verão. Hoje, é de 1545.
A qualificação dos docentes do ensino superior — e estou a falar de todo o ensino superior, incluindo o privado, o público, o universitário e o politécnico — , media-se da seguinte maneira: no ano 2000, havia 9500 doutorados para 35 700 docentes; em 2008, havia 14 200 doutorados para 35 400 docentes, um pouco menos do que aqueles que existiam no ano 2000. Contudo, o número de estudantes ampliou-se.
A produção científica referenciada internacionalmente, se olharmos apenas para o Science Citation Index (SCI), passou de 2600, no ano 2000, para 7000, em 2009. Se considerarmos o Web of Science, passou de 308 publicações, em 1980, para 10 000, em 2009. Não chega? Pois não, não chega! Estamos a cerca de três quartos da média europeia nesta matéria. Mas estávamos a 10 ou 15% dessa média.
Se há área do desenvolvimento social e cultural em Portugal em que é absolutamente clara a superação do atraso é esta. Esta é a herança que cada um de nós deixa àqueles que têm de lhe suceder sempre, ou nas próprias instituições, ou a fazer investigação.
O número de patentes submetidas, em termos europeus, no European Patent Office (EPO), era de 3, em 1982; em 2009, é o número ridículo de 165. É, por um lado, a medida da dificuldade, mas também do progresso realizado.
Querer transformar as dificuldades em dramas e em tragçdias ç a melhor maneira de não fazer nada»

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Deixe-se dessa ladainha!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — » e de estar do lado daqueles que se opõem ao progresso. Nós não estamos desse lado! É por isso, Sr.as e Srs. Deputados, que viemos aqui apresentar este orçamento, o qual defende, num período extraordinariamente difícil, o investimento no ensino superior e na ciência e tecnologia, em Portugal.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para deixar claro, através de um protesto, que o Sr. Ministro utilizou os seus últimos 5 minutos de intervenção para fazer uma interessantíssima narrativa comparativa»

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, essa figura regimental não ç agora aplicável»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, permita-me que fique registado que, do conjunto das perguntas que o PCP colocou, o Sr. Ministro respondeu «zero», «zero»!

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — O Sr. Ministro responde ás perguntas,»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não, não responde às perguntas. Essa é que é a questão!

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — » de acordo com o que considera que deve ser a sua explicação.
Mas toda a gente sabe as regras.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Peço a palavra para, em interpelação à mesa, me dirigir a si, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, é só para deixar bem claro que o Regimento da Assembleia — e peço aos Srs. Presidentes das Comissões ajuda para me corrigirem se eu estiver enganado — prevê especificamente a figura regimental do protesto relativamente a uma situação em que se considere que não existiu resposta à pergunta colocada, e foi o que aconteceu.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Conforme o Sr. Presidente da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura me chamou a atenção, o protesto tem de ser descontado no tempo do partido e o PCP ultrapassou em 2 minutos o tempo de que dispunha, com a benevolência da mesa.
Portanto, dispensávamos, nesta hora, esta intervenção.
Quero agradecer ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado os esclarecimentos que nos deram para aprofundar o orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Quero também agradecer aos Srs. Presidentes das Comissões de Educação e Ética, Sociedade e Cultura, aqui presentes, e aos Srs. Deputados pelas perguntas que puseram e que ajudaram a Comissão de Orçamento e Finanças a aprofundar este orçamento.
Vamos interromper agora os trabalhos, que recomeçarão às 15 horas e 30 minutos com a audição da equipa do Ministério da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento.
Está interrompida a reunião.

Eram 13 horas e 52 minutos.

Após a interrupção, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Paulo Mota Pinto.

O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Antes de mais, quero dar as boas-vindas e cumprimentar o Sr. Presidente e os Srs. Deputados da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia, o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento e os Srs. Secretários de Estado.
Estamos aqui para proceder à audição do Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento sobre a proposta de lei do Orçamento do Estado para 2011, na especialidade, que está prevista no Regimento. Esta audição será feita de acordo com a grelha de tempos que temos seguido nas outras audições, que é, aliás, coincidente com a que foi utilizada no Orçamento do Estado para 2010, que prevê uma intervenção inicial do Sr. Ministro.
Portanto, sem mais, porque penso que esta audição será transmitida pelo Canal Parlamento, passo a palavra ao Sr. Ministro, a quem cumprimento.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento (Vieira da Silva): — Srs. Presidentes das Comissões de Orçamento e Finanças e de Assuntos Económicos, Inovação e Energia, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de utilizar a minha intervenção inicial para fazer uma apresentação, necessariamente sintética, em função da extensão das áreas da responsabilidade do Ministério da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, que procurarei que seja abrangente relativamente às diferentes áreas e às diferentes medidas de política, que encontram nas opções orçamentais e em toda a política governamental o seu enquadramento.
As preocupações centrais que estão na base das políticas e das opções pelas quais o Ministério da Economia é responsável têm a ver com dois factores fundamentais.
O primeiro prende-se, naturalmente, com o apoio à recuperação económica dos diferentes sectores económicos, na sequência da grave crise que fragilizou a nossa economia, tal como muitas outras, em particular as pequenas e médias empresas. Naturalmente que, dentro desta primeira grande preocupação, o Ministério procurará garantir três dimensões: o acesso ao financiamento por parte das empresas, em particular das pequenas e médias empresas (PME); estimular o investimento modernizador na economia; e promover o direccionamento da nossa economia, no sentido da sua internacionalização e do crescimento da sua orientação exportadora. E, dentro desta prioridade, gostaria, desde já, de identificar ou valorizar, pela importância que tem no enquadramento orçamental, a questão do financiamento das PME.
Mas, se esta primeira linha é importante, obviamente que o Ministério da Economia, conforme é fácil de verificar, não está fora, não está ausente, do esforço que toda a Administração Pública, o Estado em geral,

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tem inscrito, no sentido de contribuir para o equilíbrio das contas públicas, tendo em atenção que esse equilíbrio é para nós um dos factores fundamentais para garantir a capacidade de recuperação económica.
Entrando um pouco mais nas diferentes dimensões da intervenção do Ministério no apoio às empresas e no estímulo ao investimento, gostaria de salientar que o Ministério irá prosseguir, com as adaptações necessárias, o Programa de Estímulo ao Investimento e à Modernização, nomeadamente com o lançamento de uma nova linha de crédito PME Investe, que será dotada de 3000 milhões de euros, que contamos que seja lançada em meados do próximo mês de Dezembro e que vai continuar o esforço de apoio ao financiamento das pequenas e médias empresas. Entre Janeiro e Outubro de 2010, foram aprovadas mais de 28 000 operações neste domínio e, portanto, obviamente que esta continuará a ser uma prioridade, e foi encontrada a solução técnica e orçamental para continuar este Programa.
Também no âmbito do estímulo ao investimento — e aqui valorizando a importância do Programa Compete — , continuaremos o esforço de reforço dos fundos de capital de risco, bem como a aceleração da execução do Quadro de Referência Estratégico Nacional. Teremos, decerto, ocasião para debater este ponto com mais detalhe, mas gostaria de vos dizer que estou em condições de afirmar que os resultados que projectámos há uns meses para o final de 2010 serão ultrapassados, isto é, a taxa de execução de 20% do QREN será ultrapassada, sendo que isso significará que, no conjunto, os fundos que o QREN injectará na economia durante o ano de 2010 se aproximarão dos 3000 milhões de euros. Para 2011, essa continuará a ser, obviamente, uma prioridade — já falarei de algumas dimensões dessas opções.
O esforço de apoio às pequenas e médias empresas na sua reestruturação, em particular no reforço da sua capitalização, será prosseguido em 2011 com o reforço dos fundos, em particular, como, há pouco disse, dos fundos associados ao capital de risco, que se destinam a estimular esta área, que é uma prioridade maior da economia portuguesa.
E, conforme puderam verificar — passando agora à dimensão da proposta de lei orçamental — , foram introduzidas algumas inovações do ponto de vista da política fiscal, para que não houvesse uma discriminação negativa do financiamento próprio das PME, em detrimento do recurso ao capital alheio, traduzindo-se isto no tratamento fiscal mais favorável, nomeadamente aos suprimentos realizados pelos sócios.
No domínio da melhoria dos factores de competitividade, o objectivo da actuação do Ministério da Economia tem a ver com o apoio ao investimento na investigação e na inovação, no desenvolvimento tecnológico, na qualificação dos recursos humanos, no aumento da eficácia e eficiência na relação entre as empresas e o Estado e no reforço de uma orientação de proximidade.
Continuaremos a privilegiar os pólos de competitividade e os clusters que se têm vindo a desenvolver — será dado um estímulo adicional e uma atenção prioritária a estes pólos — , tendo em atenção que a vocação exportadora é uma característica muito associada a estes pólos de competitividade e a estes clusters.
Gostaria de salientar também uma mudança que é introduzida pela lei do Orçamento, que se traduz na renovação do sistema de incentivos à investigação e desenvolvimento, que vai vigorar entre 2011 e 2015, o qual não só vem renovar uma experiência bem sucedida no domínio do estímulo fiscal ao investimento modernizador como alarga esse campo, de forma a que as start-up, as empresas de forte conteúdo tecnológico em início de desenvolvimento, possam ter uma majoração, coisa que, no passado, não acontecia.
Do ponto de vista da internacionalização da economia, obviamente que há aqui uma dupla preocupação de promover as exportações e de diminuir o impacto das importações no nosso País. Os últimos dados conhecidos mostram, ainda hoje, que existe uma dinâmica muito positiva na economia portuguesa a este respeito, com um forte crescimento do sector exportador e um crescimento bem menor das importações. A nossa estratégia passa, obviamente, pelo objectivo de exportar mais, com mais destinos de exportação, mais empresas a exportar, maior valor acrescentado e mais investimento modernizador.
Este objectivo de internacionalização tem vários instrumentos. Não tenho tempo para os estar a detalhar todos, mas existem desde os programas de incorporação de jovens quadros nas empresas exportadores, até ao reforço das iniciativas promocionais e da diplomacia económica, passando pelos estímulos às empresas, nomeadamente do ponto de vista financeiro, que, quer através do PME Investe, que já, há pouco, referi, quer através da manutenção dos estímulos garantidos pelos seguros de crédito à exportação, quer através de outras iniciativas que já foram desenvolvidas ou que estão em fase de desenvolvimento, procurarão atingir este objectivo.

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Aqui gostaria de chamar a atenção para o facto de ter sido assinado, na semana passada, entre os responsáveis do QREN e um conjunto muito alargado de algumas dezenas de associações empresariais e algumas centenas de empresas, um programa de apoio à internacionalização, que vai envolver, durante o ano de 2011, alguns milhares de empresas, que se destina, precisamente, a financiar, em parte, o esforço de presença das empresas nos mercados internacionais, em particular nos novos mercados, com um significativo crescimento de apoios públicos a este tipo de acções.
Uma das dimensões particulares sectoriais que se inscreve na actuação do Ministério da Economia tem a ver com a modernização do sector do comércio. E aqui posso anunciar que será lançada uma nova fase — a 6.ª fase — com mais 10 milhões de euros de apoio à modernização do pequeno comércio, que são apoios a fundo perdido e que se seguem àquelas fases que foram já iniciadas e que já totalizaram mais de 130 milhões de euros.
Continuaremos, naturalmente, a reforçar o sistema nacional de defesa do consumidor e a aumentar a vigilância do mercado, com os apoios às associações de consumidores e a acções de informação.
E temos na área do turismo uma das prioridades, como também é facilmente compreensível, dada a importância que este sector tem na economia portuguesa. Também aqui gostava de salientar os dados conhecidos hoje do crescimento dos fluxos turísticos quer do mercado externo quer do mercado interno, para Portugal que foram conhecidos relativamente ao mês de Setembro. A recuperação da actividade turística tem vindo a ultrapassar aquelas que eram as expectativas no início do ano, porque os dados que foram hoje conhecidos parecem-me largamente positivos, a par dos dados que já referi relativamente às exportações.
Na área do turismo há três grandes eixos de intervenção, que iremos detalhar de seguida: o apoio ao investimento e à qualificação da oferta — a intervenção do lado da oferta turística, em particular na sua vertente hoteleira; a qualificação dos recursos humanos, uma área de enorme importância que tem vindo a ter desenvolvimentos significativos na rede do Turismo de Portugal; e o estímulo à procura turística, sendo que aqui iremos desenvolver, quer, principalmente, no mercado externo, quer também no mercado interno, um conjunto de novas áreas e um novo modelo de promoção do turismo, visando reforçar as vantagens competitivas que Portugal tem neste sector e que deverá continuar a estimular e a sustentar.
Uma outra área da responsabilidade do Ministério é a área das energias. São conhecidas, porque já tive algumas vezes a oportunidade de as debater, em particular com a Comissão de Assuntos Económicos, as opções estratégicas do ponto de vista do sector energético. Em 2011, continuarão a ser reforçadas as apostas na promoção das energias renováveis e na eficiência e rentabilidade da utilização de todo o sistema energético, quer o sistema electroprodutor, quer o sistema de consumo, quer o recurso à importação e à transformação de combustíveis fósseis.
Uma das prioridades mais significativas será, para além das opções que existem para as renováveis, ou seja, no eólico, no hídrico e no solar, e das novas opções, nomeadamente, na energia das ondas ou nos biocombustíveis, que não vou estar aqui a apresentar em detalhe, o reforço da preocupação do investimento com a eficiência energética, que terá, durante o ano de 2011, um programa especial orientado para o sector público. Aqui também se inscreve a continuação do esforço — e o Orçamento contempla os instrumentos para tal — de valorização da posição de Portugal no domínio da mobilidade eléctrica, já que consideramos que é uma área em que Portugal tem vantagens claras.
O Governo lançou — e o Orçamento do Estado enquadra — , de uma forma muito significativa, na sequência do Plano Tecnológico, uma nova iniciativa com o horizonte de 2015, a que chamámos a Agenda Digital. Esta é, para nós, uma área decisiva do ponto de vista da modernização da economia e da sociedade portuguesa. Ela tem várias linhas de intervenção, no sector da educação, da saúde, das redes de nova geração, que é a infra-estrutura básica de desenvolvimento da Agenda Digital, mas tem uma preocupação muito forte no sentido do reforço do cluster industrial e de serviços que está a desenvolver-se em torno desta dimensão da economia digital. São já muito significativas as empresas portuguesas que trabalham nesta área no mercado interno e são muitas as que têm uma orientação exportadora já significativa. Esta será uma dimensão-chave da inovação na actuação do Governo para o ano de 2015.
Terminarei com uma referência um pouco mais detalhada ao Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN). Como disse há pouco, iremos ultrapassar a meta de execução que foi fixada de 20% do conjunto do QREN, no final de 2010, e temos vindo a lançar um conjunto de iniciativas para reforçar a sua capacidade de execução. Gostaria de realçar — e terminarei num minuto — a continuação do trabalho em parceria com os

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municípios, que se revelou muito importante para o crescimento das verbas que estão afectas a essa área do QREN, como também aquilo que tem a ver com o sistema de incentivos à inovação, o sistema de incentivos às empresas.
Foi aprovado um conjunto de medidas de simplificação, de renovação do QREN nesta área, nomeadamente foi aberta a possibilidade de as empresas que tinham já projectos aprovados poderem, até meados de Outubro (até ao mês que passou), reformular esses projectos e também terem acesso a uma linha de crédito específica para o co-financiamento da parte privada destes investimentos.
Esse processo terminou, e posso dizer aqui que terminou com uma adesão muito significativa, já que mais de 1000 empresas, representando mais de 40% do investimento contratado, recorreram a essa oportunidade de renovação dos seus projectos, de recalendarização dos seus projectos e cerca de 300 fizeram-no em simultaneidade com o recurso à linha de crédito específica.
Para além desta renovação e desta atenção particular à dotação do QREN às empresas que está já contratualizada, e que necessitava, por razões que todos conhecemos, de ser estimulada, continuará a gestão do QREN, no domínio do apoio às empresas, a lançar novos programas e novos concursos. Já na próxima semana será lançado um novo programa de apoio às empresas, muito orientado para a exportação e para a modernização das mesmas, com um valor de mais de 250 milhões de euros. Quer isto dizer que, para além do estímulo, como eu disse, à contratualização já efectuada, continuaremos a lançar novos programas, no sentido de fazer com que o QREN seja, neste momento tão difícil da economia portuguesa, um instrumento de modernização e de promoção da capacidade competitiva da nossa economia.
Srs. Presidentes, estive a olhar para o relógio atentamente e a ver os minutos a passarem. Eles passam muito depressa. Peço desculpa por ter ultrapassado um pouco o meu tempo, mas, mesmo assim, fi-lo sintetizando o conjunto de pontos que trazia para abordar neste debate.
Muito obrigado pela atenção.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Passamos, agora, à primeira ronda de questões a formular ao Sr. Ministro, dispondo cada grupo parlamentar de 8 minutos.
Tenho a indicação de que o PSD irá dividir a sua intervenção entre dois dos seus Deputados. O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Nuno Reis, a quem dou a palavra.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Srs. Presidentes das Comissões de Orçamento e Finanças e de Assuntos Económicos, Inovação e Energia, Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, começo por lançar uma questão prévia.
O Sr. Ministro das Finanças, relativamente a uma eventual intervenção externa do FMI em Portugal, em declarações ao jornal Expresso, dizia, há um mês, que com taxas de juro que se aproximem dos 7% entramos num terreno onde essa alternativa se começa a colocar.
Como se sabe, hoje ultrapassou-se a barreira dos 7%, mesmo depois das garantias dadas em comunicado pelo Ministro das Finanças de que Portugal vai reduzir o défice em 2% este ano. A minha primeira pergunta é a seguinte: como é que o Sr. Ministro e o seu Governo encaram esta situação? Passo, naturalmente, abordar o Orçamento. Desde logo, o grande pecado que encontramos nesta proposta de lei é o de não se vislumbrar quaisquer medidas adicionais, quaisquer incentivos destinados às empresas que já exportam ou que pensam vir a exportar.
Nenhum sinal, portanto, ao crescimento da economia na proposta de lei de Orçamento do Estado. O actual Governo não percebeu ainda que se deveria concentrar em criar condições para as empresas venderem mais e melhor os seus bens e serviços em vez de concorrer directamente com elas em determinados sectores.
E, porque vem a «talho de foice», quero dizer-lhe que tem de atentar nesta suprema contradição: por um lado, VV. Ex.as anunciam a saída de sectores considerados não estratégicos e, por via de privatizações, passam a assumir o papel de Estado regulador; por outro lado, em completa dissonância com essa política, compram um hotel e passam a ser operadores turísticos.
A confusão de papéis, a ausência de estratégia e a política de anúncios continuam a ser visíveis a outros níveis. Há quatro meses atrás, nesta mesma sala, tivemos a oportunidade de anunciar que o Governo, no espaço de oito meses, tinha lançado qualquer coisa como seis fundos de apoio à internacionalização. Hoje,

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lançou mais um. Desses seis mais um que, entretanto, foram anunciados, só um foi publicado em Diário da República. Só que, até hoje, nenhuma empresa deste País viu qualquer euro desse fundo de apoio à internacionalização.
De resto, esta proposta de Orçamento podia até ter dado um sinal de corrigir uma suprema injustiça, que é a de não permitir até ao momento que as pequenas e médias empresas possam concorrer em igualdade de circunstâncias com as grandes empresas. Nada disso acontece. A Agência Nacional de Compras Públicas, EPE vai continuar a funcionar da mesma forma e podemos hoje informá-lo, se é que ainda não sabe, que o Estado português vai ser processado por uma pequena e média empresa que se considera descriminada pela forma como os senhores orientam os critérios da Agência Nacional de Compras Públicas.
De resto, num outro nível, VV. Ex.as continuam a menosprezar olimpicamente a questão da eficiência energética.
Em Junho passado, anunciavam o aumento dos incentivos à eficiência energética. Fizeram, naturalmente, os anúncios habituais. Esta proposta de Orçamento vem agora retirar todos os incentivos a essa medida. Sem falar que VV. Ex.as continuam sem cumprir qualquer meta, seja ela qual for, a nível de medidas de eficiência energética na Administração Pública. Corrijam-me se estiver errado.
Segundo cálculos de vários especialistas nesta área, poderia até obter-se um potencial de poupança de cerca de 400 milhões de euros. Com essa poupança de cerca de 400 milhões de euros, se VV. Ex.as dessem o exemplo ao nível da administração central e também ao nível da administração local, poder-se-ia conseguir um estímulo à economia que poderia ser canalizado para o incentivo às pequenas e médias empresas.
O que ambicionávamos, pois, neste Orçamento era que se conseguisse ter, ao nível da área económica, o engenho de minorar o efeito recessivo das necessárias medidas de consolidação orçamental.
Nada disso acontece e, portanto, por nada disso acontecer, a grande pergunta que lhe colocamos no final desta primeira intervenção, e antes de passar a palavra ao meu colega para abordar uma outra área que tem vindo a ser muito desaproveitada, é a de saber se VV. Ex.as acreditam sinceramente que a política de austeridade vai servir de desculpa para compensar a ausência de uma estratégia a nível económico.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Também pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Saraiva.

O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, penso que, legitimamente, sempre nos habituámos a ver no Ministro da Economia e na sua equipa o guardião e o promotor da actividade económica e, portanto, vou colocar, enquanto ponto prévio, uma questão muito objectiva, complementando aquilo que o Deputado Nuno Reis já disse.
Desse ponto de vista, diria, de uma forma algo singular, que este é um Orçamento do Estado bipolar. Isto é, nas páginas pares prevê um crescimento económico de 0,2% e nas páginas ímpares prevê, de resto de uma forma mais alinhada com as previsões de todos os economistas das organizações internacionais, que em 2011 o País entre numa recessão, com um decréscimo do PIB situado em — 0,7%. Pergunto-lhe, portanto, qual é a sua versão, aquela em que acredita, aquela em que o seu Ministério, afinal de contas, acredita, porque temos esta dúvida legítima de interpretação face à bipolaridade que nos é apresentada.
As restantes questões são também muito objectivas e prendem-se com o QREN, que o Sr. Ministro aqui referiu, e bem, como grande instrumento para podermos, de alguma forma, dar corpo a uma eventual estratégia de política económica que não temos encontrado.
Desse ponto de vista, diz e bem o Orçamento do Estado que vai haver uma reprogramação do QREN e que esta vai privilegiar o fortalecimento da competitividade. Ora, o que perguntamos é em que sentido vai apontar esta reprogramação.
Perguntamos-lhe também, numa altura em que o sistema de incentivos de alguma forma já está em overbooking em algumas das suas medidas, e sabendo que, até ao final de Setembro de 2010, só apoiou efectivamente 3527 empresas, qual é o universo global de empresas que o Sr. Ministro ambiciona poder ver apoiado pelo QREN daqui até 2013, dentro dos sistemas de incentivos.
Ainda em matéria de execução do QREN, na passada sexta-feira, saiu mais um boletim, o n.º 9, que aponta para um sinal de desaceleração de execução ao longo do terceiro trimestre de 2010 — porventura, pode ser que o último trimestre venha a apontar em sentido inverso. É verdade, e eu congratulo-me com isso.

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Segundo as minhas previsões, vamos fechar o ano com 22% de taxa de execução, acima dos 20% — meta fixada pelo Governo, mas uma meta, a meu ver, pouco ambiciosa — , mas o drama que temos pela frente é este: ao fim de quatro anos, executámos 20%. Só temos mais cinco anos para executar os restantes 80%, e já estou a dar de barato que vamos derrapar até 2015, não fechando a execução em 2013, o que depois criará, porventura, um arrasto no arranque do próximo período de recuperação financeira, como aconteceu em relação a este.
Porque não encontrámos nenhuma resposta sobre essa matéria; acresce que o Orçamento, inclusivamente, aponta para novos meios reforçados nas CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional), no Instituto de Turismo de Portugal e no FDR, na presunção de que iremos ter mais execução ao longo de 2011. O que lhe pergunto é: qual é a ambição para 2011? E como já antecipo que o Sr. Ministro não vai responder, que vai dizer que ainda é cedo para o fixar, lançolhe um desafio: pela minha análise da execução, menos de 40% de taxa de execução, no final de 2011, é de alguma forma «deitar a toalha abaixo» e acreditar que as coisas vão correr mal do ponto de vista de encerramento. Pergunto-lhe, portanto, se aceita ou não este desafio em matéria de execução.
Uma outra questão que gostava também de lhe colocar prende-se com os fundos comunitários que estão pré-destinados para apoiar a Alta Velocidade. Uma vez que vai ser designada uma comissão independente e admitindo que não há decisões tomadas à partida sobre esta matéria, que um cenário possível pode apontar para a suspensão imediata da construção do naco de TGV entre Poceirão e Caia, qual é a estratégia que o Ministério pensa seguir, na perspectiva de iniciar já um processo de negociação com a Comissão Europeia para reafectação dos 955 milhões de euros que esta Comissão já clarificou que podem ser reafectados a outros projectos?

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Sr. Ministro, tem a palavra para responder.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Reis, começou com a pergunta dos 7% e vou responder-lhe. Se o Sr. Deputado acompanha o debate e a evolução desta questão, que é muito séria do ponto de vista da economia portuguesa e da economia europeia, tem facilmente compreendido que aquilo que se passou nos últimos dias — aliás, muitos observadores insuspeitos o têm vindo a dizer — tem pouco a ver com o facto de termos aprovado, na generalidade, o Orçamento para 2011 e tem muito mais a ver com razões que se prendem com a economia europeia e a União Europeia no seu todo. Isso é reconhecido, identificado e eu podia ficar aqui o resto da tarde a citar observadores e analistas, daqueles que os senhores gostam muito de citar, que têm dito exactamente o mesmo.
Em todo o caso, não sei o que é que o Sr. Deputado pretendia dizer com o que disse. Pretenderia dizer que se não houvesse aprovação do Orçamento as taxas de juro baixavam? Bom, Sr. Deputado» A situação é muito complexa. Não há, nesta área, nenhum número mágico que signifique que a partir deste momento ou daquele se tem de recorrer a outro tipo de instrumentos de financiamento da nossa dívida. O que lhe posso dizer, e que o Sr. Deputado sabe muito bem, é que Portugal tem colocado a sua dívida. Não teve até agora, nem terá, certamente, num futuro próximo, nenhuma dificuldade para o fazer. Fá-lo-á, infelizmente, com taxas de juro mais elevadas, mas essa é uma realidade que, por um lado, temos de combater com os instrumentos que temos em nosso poder, e que, por outro, nos ultrapassa nalgumas das suas mais importantes determinantes.
Portanto, Sr. Deputado, julgo ser absolutamente fundamental sabermos dar os sinais necessários a quem avalia a economia portuguesa e a credibilidade das nossas finanças. Eles são o cumprimento dos nossos compromissos europeus e internacionais em matéria de consolidação das contas públicas. Tenho a certeza de que isso terá um efeito muito positivo nos mercados.
O Sr. Deputado falou da ausência de política. O Governo não esconde — nunca afirmei o contrário — que as questões-chave da economia portuguesa, que continuam a ser as que estão associadas aos nossos défices estruturais, são hoje, em grande medida, condicionadas pelos compromissos que temos de assumir no domínio da correcção dos desequilíbrios orçamentais. Ainda assim, é extremamente importante que continuemos a apoiar a economia portuguesa na sua estratégia de modernização.

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O Governo tem criado os estímulos possíveis, quer no quadro institucional, quer no quadro financeiro, ao reforço das exportações e tem-no feito num quadro que, felizmente, é de uma boa resposta da economia. A economia tem respondido. É pena o Sr. Deputado não ter utilizado 20 segundos da sua intervenção para reconhecer (julgo que o PSD reconhece) que, graças ao esforço das nossas empresas, dos nossos empresários e também de políticas de apoio a essas empresas, as exportações portuguesas têm crescido muito mais do que os senhores supunham.
Se revisitarmos o debate do orçamento anterior vamos encontrar as vossas afirmações acerca do crescimento de 3,5% que estava previsto para as exportações. Ora, iremos triplicar, ou quase, esse valor e não se ouve uma palavra da sua bancada acerca desse resultado.
Sr. Deputado, não sei do que é que está a falar quando se refere ao hotel comprado. Decerto, o Sr. Deputado irá explicá-lo.
O Governo acredita numa economia de competição, de concorrência. A hotelaria é, por natureza, uma intervenção privada e assim continuará a ser.
Se o Estado tiver de fazer algumas intervenções úteis do ponto de vista da economia não deixará de fazêlo, sempre com o critério da racionalidade e da viabilidade estratégica dessas intervenções.
Relativamente à eficiência energética, o Governo não procedeu a qualquer redução dos apoios ficais à eficiência energética. Eles mantêm-se com a mesma natureza que tinham no orçamento para 2010. Embora estejam num outro ponto do Orçamento, o sistema de incentivos à eficiência energética mantém-se no ponto referente aos benefícios fiscais. O Governo tem vindo a cumprir a agenda da eficiência energética e já anunciou que irá lançar, no início de 2011, um novo programa de apoio ao reforço da eficiência energética no sector público.
Sr. Deputado Pedro Saraiva, a questão do quadro macroeconómico já foi muito debatida e continuará a ser, com toda a legitimidade. Todos sabemos que existe um risco sério para a economia portuguesa. Existem consequências inevitáveis da estratégia de consolidação orçamental. Porém, o Governo não desistirá de apoiar e de favorecer os desenvolvimentos da nossa economia que podem contrariar as consequências, ao nível do mercado interno e da procura interna, da política de austeridade.
É isso que se está a fazer e que continuará a ser feito, trabalhando-se no sentido da diversificação das nossas exportações, do seu crescimento, na linha do que tem vindo a acontecer na nossa economia.
Entre 2005 e 2008, a economia portuguesa foi a segunda onde as exportações mais cresceram em toda a União Europeia É um facto que normalmente é esquecido, mas é verdade.
Em 2009, no pico da crise, Portugal foi dos países da União Europeia que teve a evolução mais favorável das exportações. E está a recuperar. Aliás, de acordo com os dados de crescimento das exportações para o terceiro trimestre de 2010, que foram hoje conhecidos, esse valor é de 14%. Isto inclui a recuperação de mercados europeus, por exemplo o espanhol, e inclui o reforço da nossa presença em mercados terceiros, que têm sido decisivos para reequilibrar a dinâmica exportadora que foi atingida pela crise económica.
Sr. Deputado, acredito no Orçamento que o Governo apresentou e o Sr. Deputado não pode criticar o Orçamento por prever um crescimento exagerado. Se compararmos as previsões de crescimento económico de outros programas de estabilidade e crescimento, quer em Portugal noutros momentos da nossa história recente, quer noutros países, também nestes foram fixadas metas de crescimento que para muitos foram consideradas irrealistas — uns alcançaram-nas, outros não. Mas o Governo assume uma desaceleração muito forte do crescimento económico.
Não faz sentido falar em derrapagem para 2015, porque o próprio QREN prevê a utilização das verbas até 2015.
As metas para 2011 serão apresentadas pelo Governo quando tiver condições para fazer o balanço mais adequado da execução de 2010. Mas serão metas condizentes com a questão fulcral, que já afirmei várias vezes, da garantia de não haver qualquer corte nas verbas que constam do Quadro de Referência Estratégico Nacional.
Sobre a Alta Velocidade, o Sr. Deputado já está a antecipar conclusões de uma comissão que, tanto quanto sei, nem sequer começou ainda a funcionar. Não é essa a minha perspectiva. O Sr. Deputado até já sabe as conclusões a que ela vai chegar. Não tenho essa presciência, Sr. Deputado. Se isso viesse a acontecer, sem pôr em causa a execução do QREN, o Governo saberia reagir em conformidade.

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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro. Haverá tempo para voltar a estes temas ou a outros em respostas posteriores.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Para interpelar a mesa sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, peço para fazer distribuir ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado a proposta de lei do Orçamento, recomendando a leitura do seu artigo 93.º, o qual revoga as deduções ambientais como medidas de eficiência energética.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, Sr. Presidente da Comissão da Economia, Sr. Ministro, Srs.
Secretários de Estado, todos sabemos que este Orçamento surge numa altura de terríveis constrangimentos para a economia europeia e mundial, um dos quais, que tragicamente nunca é referido em Portugal, é o das declarações irresponsáveis de líderes europeus, que, por a dinâmica do debate político em Portugal estar demasiado centrada na realidade portuguesa, escapam à maioria dos partidos.
Um artigo publicado ontem no jornal alemão Der Spigel diz — ao contrário do que dizem alguns partidos portugueses — que a causa da dinâmica dos juros da última semana é o crash da Sr.ª Merkl.
É extraordinário como é que, em Portugal, nos mantemos sistematicamente virados para dentro e desvalorizamos estas dinâmicas exteriores, tendo de ser um jornal alemão a dizer ao seu próprio governo que o que aconteceu na última semana é da responsabilidade deles.
Penso, pois, que devíamos interiorizar ensinamentos importantes para modificarmos certos comportamentos daqui para a frente.
A oposição insiste em dizer que este Orçamento não tem política económica. Ora, a política é, como todos sabemos, a arte do possível, e o Governo faz a política económica possível. Mas é errado dizer-se que não há política económica. Se é verdade que existem cortes em quase todos os ministérios — e o Ministério da Economia também não escapa — , a grande maioria dos estímulos económicos mantêm-se e são até reforçados.
Dizem que o enquadramento macroeconómico é demasiado optimista. Mas o optimismo é um pressuposto de toda a acção política e qualquer partido tem, necessariamente, que ser optimista se não em relação às propostas do Governo pelo menos em relação às suas próprias, porque um pessimismo paralisante pode ser interessante como força de bloqueio, mas, de facto, é muito pouco, ou nada, construtivo.
Este Governo é optimista mas não é irrealista, porque a realidade que tem vindo a ser conhecida nos últimos meses desautoriza grande parte do pessimismo que tem sido invocado pelos partidos da oposição.
O Sr. Ministro já referiu os dados das exportações. É preciso não esquecer que há 17 meses consecutivos que as exportações crescem mais do que as importações e os dados do INE hoje conhecidos mostram que houve uma aceleração das exportações face ao mês anterior e uma queda brutal, ainda com crescimento, face aos valores anteriores das importações. Isto é um sinal de que a economia portuguesa, apesar de todas as dificuldades — ninguém nega que elas existem — , mantém uma dinâmica muito positiva de resposta à situação em que nos encontramos.
Penso que isso é de enaltecer, sendo importante que o Governo e a oposição dêem um sinal de confiança aos empresários, às empresas e aos trabalhadores portugueses, que têm feito este esforço sem o qual dificilmente a nossa economia poderá crescer.
Há um ponto importante na política do Governo que o distingue de certos entendimentos, sobretudo dos partidos mais à direita, sobre o que é uma política industrial.

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Este Governo procura não só criar contextos favoráveis para o desenvolvimento de actividades económicas, mas também ter um papel activo na reestruturação e na requalificação do tecido económico português.
É uma fantasia pensar-se que a nossa economia é atrasada por qualquer constrangimento constitucional ou porque os custos unitários do trabalho são demasiado elevados, o que pressupõe uma espécie de lamento por uma produtividade passada perdida, que, na óptica de alguns partidos presentes neste Parlamento, parece evidenciar estarmos fadados para uma economia com baixa tecnologia, centrada em baixos salários e, portanto, remetidos à nossa condição histórica.
O PS mostra resultados positivos através das políticas que tem vindo a pôr em prática desde 2005. Não é de um dia para o outro que se elimina o défice externo, embora, ouvindo declarações de alguns políticos portugueses, isso pareça possível. O desenvolvimento e a transformação da economia do País é um processo gradual, que se vai fazendo, que não se faz de um dia para o outro. Não há um botão onde se carrega e que, de repente, elimina um défice externo crónico que se tem verificado ao longo de toda a história portuguesa.
Ninguém acredita nisso. É uma fantasia, é uma falsa esperança pensar-se que, criticando as políticas económicas deste Governo, podemos de um dia para o outro anular um défice externo de 10% que tem raízes históricas e económicas profundas que não se eliminam por decreto.
Este Orçamento, sem nunca desvalorizar o contexto em que estamos situados, reafirma a opção do Partido Socialista e deste Governo por uma modernização e requalificação da economia portuguesa e tem instrumentos muito importantes.
Destaco a linha PME Investe, que já foi referida pelo Sr. Ministro, com 3000 milhões de euros. Não sei se a oposição critica por ser pouco, se critica por criticar, se pensava que devia ser 6 ou 10». Mas, dados os constrangimentos financeiros do País, parece-me um reforço importante de uma medida que já tem tido enorme sucesso desde a primeira linha de apoio, desde o início da crise financeira. É uma medida salutar que vai ser útil com certeza a muitas empresas para fazerem face às dificuldades de liquidez que neste momento lhes são impostas pelo mercado.
Destaco também uma medida que tem a ver com a questão da capitalização das empresas. Mais do que uma medida de melhoria da liquidez das empresas, é uma reforma estrutural, porque há muitas pessoas que falam de reformas estruturais como uma espécie de pensamento mágico, mas reformas estruturais implicam que se identifiquem problemas e um dos problemas em Portugal é o excessivo recurso a capitais alheios.
Esta medida não é milagrosa, não é de um dia para outro que eliminamos a dependência face a capitais alheios, mas é uma medida que reestrutura o conjunto de incentivos enfrentados pelas empresas, pelos seus sócios e que aumenta, por exemplo, a remuneração por suprimentos dos sócios e que, portanto, na margem, cria incentivos adicionais a uma diminuição do recurso ao crédito bancário, aumentando o recurso a capitais próprios.
Quanto á questão da energia, o PSD criticou aqui a área da eficiência energçtica,»

O Sr. Presidente: — Falta 1 minuto para terminar o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — » esquecendo-se que o Sr. Secretário de Estado Carlos Zorrinho, há pouco tempo, apresentou, se bem que em traços gerais, o ECO-AP.
Portanto, a primeira pergunta que faço ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado é no sentido de saber se podem desenvolver um pouco aquilo que, neste momento, está a ser pensado e que vai ser implementado na área da eficiência energética na Administração Pública.
A segunda pergunta — e vou terminar, Sr. Presidente — tem a ver com as exportações. Muita gente tem criticado o risco enorme dos valores que constam desta proposta de lei na área das exportações. Ora, um dos exemplos de que a macroeconomia, embora seja, obviamente, importante, não é suficiente para fazermos uma avaliação sobre comportamentos variáveis como o das exportações é, como já aqui referiu o Sr. Ministro, o caso de Espanha, para onde, apesar de estar em estagnação e quase em recessão, as nossas exportações aumentaram de forma muito significativa.
Portanto, gostava de perguntar ao Sr. Ministro, apesar de o contexto macroeconómico externo não ser o mais favorável, em que medida é que as empresas portuguesas têm demonstrado capacidade para a

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conquista de quota de mercado e para a diversificação de mercados, de forma a sustentar os valores presentes nesta proposta de lei.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Galamba, começo por me referir à questão dos objectivos da política económica, de quais são hoje os obstáculos principais, os desafios principais que se colocam à nossa economia, sem considerar, apenas por razões sistemáticas, aquilo que é um objectivo decisivo, que é reduzir o risco de financiamento da nossa economia no seu todo.
Aquilo que temos de assumir como objectivo fundamental da nossa economia e da nossa sociedade é, tão rapidamente quanto possível, vencermos aquele que é o travão mais significativo ao crescimento do potencial da nossa economia ou à elevação do crescimento potencial da nossa economia, que é o desequilíbrio externo.
E como é que se combate esse desequilíbrio externo de forma sustentada? Combate-se, de forma sustentada, de forma estratégica, com o fomento das exportações, com a substituição das importações, nomeadamente em zonas em que somos excessivamente dependentes, e quer uma quer outra área só se podem atingir — na minha perspectiva, pelo menos, fazendo nós parte da União Europeia e da moeda única — através da elevação do conteúdo, da qualidade e da capacidade competitiva dos produtos colocados no mercado internacional, quer seja o mercado externo, quer seja o mercado interno.
Se tentarmos perceber o que é que explica o crescimento das nossas exportações acima da média europeia nos últimos anos antes da crise, vamos identificar com relativa facilidade o que é que se passou: foram ganhos de mercado em domínios onde ganhámos capacidade competitiva, nomeadamente do ponto de vista da valorização da nossa oferta, seja ao nível dos produtos, seja ao nível dos serviços. Foi isso que aconteceu! Foi essa mudança que está a verificar-se na nossa economia que é a responsável! Senão, olhemos para o quadro comparativo do que era a estrutura sectorial das nossas exportações há 10 ou há 20 anos e do que ela é hoje, não desvalorizando a importância da diversificação de mercados, nomeadamente, a nossa presença em mercados com elevadas taxas de crescimento da procura.
Na minha perspectiva, esse tem de ser o objectivo central da política económica.
Obviamente que a ele estão associadas muitas questões, como a promoção do ambiente de negócios, como a questão das qualificações, que é central, como a questão de um melhor desempenho da Administração Pública no seu relacionamento com as empresas. O objectivo central é esse e é esse que é assumido no Orçamento e pela política económica do Governo.
Obviamente, depois, podemos entrar em questões que são seguramente importantes, mas que, normalmente, trazem associadas a si visões um pouco redutoras do que são os instrumentos de política. Por exemplo, quando dizemos que o QREN tem disponível no sistema de incentivos às exportações mais de 4000 milhões de euros e que o número de projectos que foram já contratualizados atinge esse valor, não quer dizer, como se trata principalmente não de apoios a fundo perdido mas, sim, de apoios que retornam ao sistema, que esse valor não possa crescer.
De facto, o número de empresas que corresponde a este valor é de 3572. Quer isto dizer que o QREN só apoia as 3572 empresas? É completamente falso! Não é nada disso! Apoia estas empresas com este tipo de sistema de incentivos directos ao investimento. Posso dizer-lhe, por exemplo, que apenas numa linha que foi contratualizada com as associações empresarias e com empresas muito recentemente, que é a linha de apoio às promoções para a internacionalização, 1700 empresas — algumas podem ser as mesmas — terão apoio público para a realização de feiras, de estudos de mercado, para acções de promoção, questões fulcrais para se atingirem estes resultados.
Portanto, respondendo à pergunta que me foi feita, julgo que, em grande medida, é para esta capacidade que a economia portuguesa tem tido de ganhar novos mercados e de trabalhar em ambientes extremamente duros e exigentes que se dirigem este tipo de opções.
O apoio aos seguros de crédito já atingiram mais de 1800 empresas ou operações desde que foram lançados, com valores muito significativos, não falando, obviamente, da linha de apoio às pequenas e médias

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empresas — o PME Investe — que, desde que foi lançada, já ultrapassou, seguramente, mais de 60 000 operações e de 50 000 empresas que foram apoiadas.
Portanto, temos de ter uma visão mais ampla do que são os instrumentos de apoio às empresas, sendo que, obviamente — volto a dizer — , neste momento, a questão fundamental tem a ver com a recuperação da capacidade de financiamento da nossa economia, que também atinge — e de que maneira! — o sector produtivo.
Reinvestir na indústria, reinvestir na economia competitiva, explorar todas as hipóteses no plano dos serviços, explorar todos os mercados, em particular aqueles com os quais temos algumas vantagens competitivas que ainda não estão completamente exploradas, é o caminho de qualquer política económica que tenha a ambição de quebrar esse ciclo vicioso de desequilíbrio externo, que, sistematicamente, tem travado a capacidade de crescimento da nossa economia. É esse o caminho que promove o desenvolvimento das exportações, é esse o caminho que as empresas têm seguido e é esse o caminho que o Estado deve continuar a prosseguir.
Portanto, desse ponto de vista, o Estado não tem muito que inventar, tem de criar boas condições para o funcionamento das empresas e, depois, tem de apoiar o sentido das empresas que vão tendo sucesso na sua estratégia de internacionalização. Não julgo que compita ao Estado ou que o Estado tenha capacidade de estar a identificar, ele próprio, quais são esses mercados; o Estado tem de trabalhar em parceria com as empresas nesse objectivo.
Finalmente, gostaria apenas de esclarecer que o sistema de incentivos à energia — para responder ao Sr. Deputado — está previsto no Orçamento. Foi aditado o artigo 73.º ao Estatuto dos Benefícios Fiscais, que substitui o antigo artigo 85.º-A, que mantém os benefícios — volto a dizer — para aquisição de equipamentos novos que utilizem energias renováveis, aquisição de equipamentos de produção de energia eléctrica por microturbinas até 100 kW e que consumam gás natural, aquisição de veículos e equipamentos que contribuam para a melhoria do comportamento térmico dos edifícios. Estes são, na essência, os incentivos que existiam e que não foram, obviamente, retirados do Orçamento.

O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Ministro.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, diria, em primeiro lugar, que já sabíamos, de há algum tempo a esta parte, que, para o Governo, os problemas são ora do passado, ora do mundo, ora das realidades mais diversas e não propriamente deste Governo ou nunca deste Governo.
A primeira questão que gostaria de lhe fazer tem a ver com os números mágicos — esta questão, de facto, tem de ser posta nestes termos. Nós tivemos uma declaração do Sr. Ministro das Finanças, que, de facto, tem sido o ministro relevante nesta área — não fui eu, não foi o presidente do meu partido, não foi a Deputada Assunção Cristas que a descobriu — , a dizer que, se os juros da dívida pública chegassem aos 7% a intervenção do FMI era possível, provável e, em alguma medida, até inevitável. Esta foi a declaração do Ministro das Finanças.
Ora, V. Ex.ª, antes de chegar aqui a esta reunião e já aqui no decurso dela, vem dizer exactamente o contrário: que não há qualquer número mágico, que esse número não existe, que esse número não é relevante e que a intervenção do FMI não vai acontecer.
Portanto, esta é uma questão que, em alguma medida, tem de ser esclarecida, Sr. Ministro. O que nos é permitido perguntar neste momento é: quem é que tem razão? Quem é que está certo nesta matéria? É o Sr.
Ministro ou é o Sr. Ministro das Finanças? São do mesmo Governo?! O Governo tem uma opinião nesta matéria? Qual é a opinião do Governo nesta matéria? É a sua ou é a do Dr. Teixeira dos Santos? Algum dos senhores está combinado com o Sr. Primeiro-Ministro? Qual dos dois é que está próximo da opinião do Primeiro-Ministro nisto? É que isto é um assunto da maior gravidade! É um assunto muito sério, como o Sr.
Ministro disse, e bem! Mas não fomos nós que andámos a fazer graças sobre este mesmo assunto, a dizer que tínhamos mandado vir o FMI, que estávamos à espera no aeroporto. Isto é demasiado grave para que se digam graças sobre esta matéria!

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Sr. Ministro, também não fomos nós que dissemos que o Orçamento era decisivo sobre esta matéria — esta é a segunda pergunta que lhe quero colocar. Quem veio dizer que, se não houvesse Orçamento, se o Orçamento não fosse aprovado, era o drama, era o caos, era a dependência do exterior, era a entrada do FMI, não foi o CDS-PP, foi o Governo. O Governo é que veio dizer que «ou há Orçamento ou, então, é o caos».
O que é que V. Ex.ª disse agora aqui nesta Comissão? Disse que isto nada tem a ver com o Orçamento, que tem muito mais a ver com outras coisas e com a realidade europeia. Pois, mas quem andou a dramatizar o Orçamento à volta desta matéria não fomos nós, foi o Governo.
Sr. Ministro, a propósito da dramatização do Orçamento à volta desta matéria, considerando que estes assuntos são, de facto, sérios e, na minha opinião, pouco divertidos, peço-lhe que, se possível, me dê uma resposta, uma explicação ou, pelo menos, a sua opinião, que já percebemos que pode não ser opinião única no Governo, o que é grave, sobre como é que, aprovado o Orçamento — pelo menos na generalidade, porque o estamos a discutir agora na especialidade — , o sinal é exactamente o contrário daquele que seria esperado e daquele que nos tinham dito que seria o sinal da aprovação do Orçamento.
Ou seja, acabámos por ter a aprovação na generalidade e um sinal de aprovação final global deste Orçamento e o grande argumento era tranquilizar os mercados, mas o sinal que os mercados nos estão a dar é exactamente o contrário: o nervosismo continua e até é maior, os juros da dívida pública portuguesa estão a bater todos os recordes, estão a atingir novamente máximos e a chegar a um número mágico, que não fomos nós que inventámos, que para o Sr. Ministro não existe mas que o seu colega das Finanças disse que existia.
Portanto, esta é uma questão que para nós é importante.
Segunda questão, dentro do mesmo tema Sr. Ministro: pergunto-lhe, obviamente, uma vez que V. Ex.ª parece pouco atreito a reconhecer as responsabilidades do Governo nesta matéria, o que tem a dizer da opinião do ex-governante socialista e seu colega e companheiro de partido António Vitorino, que dizia ontem — mais claro não pode ser e, lendo a entrevista, fica mais claro ainda — , «preto no branco», que o Governo acordou tarde para o problema da dívida soberana. Que comentário lhe merece esta afirmação? Está de acordo? Não está de acordo? Tem o Dr. António Vitorino razão? Está ou não V. Ex.ª disposto a reconhecê-lo? Sr. Ministro, isto levanta-nos também todo um outro vastíssimo conjunto de reflexões sobre este Orçamento. E continuo a achar, Sr. Ministro — enfim, não tenho outra forma de o dizer — , que há, de facto, uma divergência. V. Ex.ª vem aqui com dois dados de números relativamente optimistas, procurando referi-los sempre e reportá-los sempre. Ainda bem! Fico satisfeito que haja um ou outro aspecto que tenha números optimistas — ainda que lhe diga que o peso global das exportações no PIB é um dado preocupante. Mas continuo a pensar que há uma certa discrepância entre um discurso que se mantém em alguma medida optimista, que é para outro país, para outra realidade, para outro tipo de preocupações, que é o seu, e a realidade deste Orçamento.
O que é importante para nós — e continuando a fazer perguntas sobre isto, porque é essa a função útil da oposição e deste debate — é saber quais serão os efeitos deste Orçamento recessivo na economia portuguesa. Ou seja, o que vai acontecer em termos de emprego e não só. Como é que é possível, com um corte de rendimento superior a 2% do PIB, continuar a dizer que a retracção do consumo privado será só de 0,5%?! Aparentemente, o número não bate certo.
Pergunto-lhe também, Sr. Ministro, se V. Ex.ª mantém ou não uma meta positiva de 0.2 de crescimento ou se, pelo contrário, alinhando pela opinião de inúmeros relatórios e pela opinião consubstanciada de inúmeros analistas, vamos ter uma situação recessiva e, em vez do aumento de 0.2, vamos ter um valor negativo de 0.7.
Que efeito terá, na economia e nas empresas, a entrada em vigor do Código Contributivo e de tudo o que ele representa, designadamente do ponto de vista fiscal? Também já lhe perguntei há pouco, mas volto a perguntar-lhe o seguinte: como se explica esta contínua subida dos juros da dívida pública portuguesa, quando temos um Orçamento que deveria estar feito, pensado e a dirigir-se a acalmar os mercados? Apesar do dado positivo que refere, o número de crescimento das exportações de 8.6 não é um número optimista para a realidade económica portuguesa e para o efeito recessivo deste mesmo Orçamento. Poderia até perguntar-lhe: porquê um Orçamento tão recessivo, se está tudo a correr tão bem? Se as linhas de crédito são tão boas e se as exportações estão a aumentar tanto, para quê impor estas medidas e estes sacrifícios às empresas e às famílias? Há outras perguntas que sei não serem exclusivamente da sua área. De qualquer forma, pergunto: qual é o montante comprometido com o sector empresarial do Estado? Saber isto seria, para nós, da maior

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importância, e é evidente que seria muito relevante conhecermos. Pergunto-lhe ainda se não acha que vamos continuar a ter um aumento de importações, ao contrário da previsão deste Orçamento.
Sem prejuízo de outras perguntas que serão feitas numa segunda ronda pelo Deputado Hélder Amaral, vou só deixar-lhe, a terminar, duas questões que nos parecem particularmente relevantes.
A primeira refere-se a uma matéria sobre a qual já o questionei várias vezes. Em sede de comissão parlamentar, fizemos a pergunta relacionada com a questão da abertura do mercado da União Europeia aos têxteis do Paquistão e o Sr. Secretário de Estado Fernando Serrasqueiro teve a bondade de nos esclarecer que o Governo está a fazer uma série de diligências. Voltei a colocar essa questão em Plenário e hoje, Sr.
Ministro, pergunto-lhe se já temos resposta, isto é, se já nos pode dizer se vão ou não ser salvaguardados produtos, se o estudo já está feito, se o impacto já está avaliado e se já há (porque este debate já teve lugar há algum tempo) alguma resposta concreta.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir, por favor.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou terminar mesmo, Sr. Presidente.
Ainda sobre a questão dos têxteis, Sr. Ministro, quero apenas chamar a atenção para o facto de um conjunto de empresas exportadoras portuguesas terem dito hoje que, por causa do próprio acesso do financiamento à economia real, poderão não ter condições para a aquisição de matéria-prima para poderem chegar a essa exportação. Peço-lhe que faça a avaliação do PME da linha actualmente em vigor, de algum entrave a essa linha e da futura linha.
Sr. Presidente, muito obrigado pela tolerância.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, muito obrigado pelas questões que me colocou.
O Sr. Deputado deu aqui um extraordinário exemplo do que ç um debate na especialidade» Repetiu as perguntas e as apreciações que costuma fazer sempre que se fala de Orçamento ou de outra coisa qualquer.
Mas, enfim, vou tentar responder.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — No dia em que me responder deixarei de lhe perguntar!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Ó Sr. Deputado»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço que não interrompa.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Deputado, não sei onde é que viu nas minhas intervenções qualquer espécie de fuga às responsabilidades. Não tenho esse hábito. Conto já com alguns anos de exercício de funções públicas e ministeriais, fiz já muitas propostas e defendi-as sempre com frontalidade e clareza. Portanto, não tenho receio algum de assumir as responsabilidades. E o Governo não tem também receio nenhum de assumir as responsabilidades que tem na governação, nas opções, nas medidas que propõe e nas que concretiza. Fugir às responsabilidades é não tomar medidas, nomeadamente quando elas são complexas, difíceis e, muitas vezes, impopulares. Isso é que é fugir às responsabilidades! Portanto, Sr. Deputado, não me venha falar de fugir às responsabilidades, porque não reconheço que tenha aí qualquer superioridade que lhe dê esse direito.
Sr. Deputado, eu identifiquei problemas. Isso é que é assumir a responsabilidade! Identifiquei problemas dos pontos de vista económico, macroeconómico, orçamental e disse quais eram as nossas propostas e soluções. Se isso não é assumir as responsabilidades, Sr. Deputado, não sei o que é! Enfim, cada um assume as responsabilidades que deve assumir, no plano em que as deve assumir. Suponho que esse é ainda o plano do debate político e do debate democrático.

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Sr. Deputado, este é, obviamente, um Orçamento decisivo, e a sua aprovação é um factor decisivo do ponto de vista do financiamento da economia.
O Sr. Deputado diz que não é?! Apenas ou só porque, de facto, estamos a viver uma situação mais difícil ainda, do ponto de vista dos mercados internacionais? O Sr. Deputado pode, sequer, insinuar que a não aprovação do Orçamento nos teria colocado numa situação mais favorável do que aquela que hoje vivemos? Isso é absolutamente delirante, Sr. Deputado! Desconhecer que são factores europeus internacionais que estão a pressionar o conjunto das taxas de juro no mercado secundário, na Europa, é não reconhecer a realidade. Que essa realidade é mais dura para Portugal, porque temos fragilidades especiais, não tenho dúvidas nenhumas sobre isso! Mas é apenas uma pequena demagogia — que nem sequer chega a ser uma demagogia sólida — qualquer insinuação de que a aprovação do Orçamento não tinha efeito algum do ponto de vista daquilo que seria hoje a leitura que os mercados, as instituições financeiras, as agências de rating fariam do nosso país! É absolutamente gratuito! Quanto à questão do «número mágico», obviamente que se o Sr. Deputado ler com atenção a entrevista que o Sr. Ministro das Finanças deu e se ouvir com atenção aquilo que disse verificará que não há assim tanta contradição, se é que há alguma. O Sr. Ministro das Finanças disse que, num contexto — e o contexto muda muito rapidamente (o Sr. Deputado não gosta disso, mas muda) — diferente daquele que estamos a viver hoje, esse valor colocava riscos que podiam levar à necessidade de outro tipo de intervenções.
Mas, Sr. Deputado, há muitos aspectos que têm de ser considerados. A questão fundamental é, de facto, a capacidade de o Estado português, neste caso, de ter acesso ao financiamento da sua dívida. Não é tanto aquilo que está a acontecer no mercado, neste momento, com as oscilações de curto prazo. Já muitos, com responsabilidades maiores do que eu no plano nacional e internacional, o têm dito.
Portanto, não estou a desvalorizar o número de 7%, que obviamente é um número que nos causa a todos apreensão e preocupação, porque traduz o facto de se continuar a evoluir negativamente nas taxas de juro, nos mercados secundários. Mas estou a dizer-lhe que não é isso! Se o Sr. Deputado queria que eu dissesse aqui: «Bom, chegámos a esses 7%, por isso vamos mudar de política, vamos ver outras opções»«. Não, não ç isso. Isso não ç racional, não tem solidez, ç apenas uma forma de ocupar com pouca seriedade o debate político que aqui estamos a travar.
O Sr. Deputado disse que fomos optimistas. Sr. Deputado, eu apenas referi o comportamento das nossas exportações. Se o Sr. Deputado considera que valorizar um aspecto positivo do comportamento da economia é ser optimista e, por isso mesmo, significa estar a incorrer num qualquer «pecado» que merece uma punição elevada, essa não é a minha opinião. Houve, de facto, um bom comportamento ao longo destes três trimestres e, em particular, no último. Isso é indiscutível, está expresso nos números, e foram as empresas e os sectores exportadores que o fizeram. Portanto, não vejo qual é a dificuldade em reconhecer isso. Se nós, portugueses, não reconhecermos os factos positivos da nossa economia, quem é que está à espera que os reconheça?! Este é um facto positivo para todas as dimensões de avaliação da nossa economia, até para a avaliação da natureza e da intensidade do risco do financiamento, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado referiu mais uma vez uma questão sobre a qual não tenho grandes novidades. O Sr. Deputado já foi esclarecido sobre a posição portuguesa e sobre a batalha que temos vindo a travar, como sempre em conjunto com as associações empresariais respectivas, relativamente ao comércio internacional dos sectores que são mais sensíveis a essa mesma abertura. Obviamente que, quando houver novidades, não deixaremos de as comunicar, e o Sr. Secretário de Estado estará aqui em condições de as detalhar.
O Sr. Deputado falou também da questão do crédito à nossa economia e aos níveis de endividamento. Sr. Deputado, aquilo que estamos a fazer é a utilizar todos os instrumentos possíveis para, quer do ponto de vista macroeconómico quer do ponto de vista microeconómico, favorecer o acesso da nossa economia e das nossas empresas ao financiamento, que é o factor crítico e decisivo que se coloca à nossa economia.
Gostaria também de insistir em relação ao seguinte: ninguém tenha dúvidas — julgo que pouca gente as terá, apesar de nem todos reconhecerem isso — de que estamos num momento em que a existência de compromissos sérios e indiscutíveis no domínio da consolidação orçamental é um factor decisivo para o futuro da nossa economia. E não são os bons resultados que aqui ou acolá vamos registando que diminuem a necessidade dessa consolidação; pelo contrário, são instrumentos que facilitam a credibilidade dessa consolidação.

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Quando alguns dizem que «um problema da economia portuguesa é que até podem talvez consolidar as contas púbicas, mas têm o problema do crescimento económico», isto quando temos o sector exportador a crescer» Sr. Deputado, quando queremos ter este debate, há coisas que não podemos dizer, tal como que o peso das exportações na economia portuguesa tem vindo a diminuir. É falso! Tem vindo a aumentar! Se exceptuar, como em todos os países, o ano de 2009! Sr. Deputado, o peso do crescimento das exportações no PIB foi de 28% para 32% em poucos anos. Porque é que o Sr. Deputado diz que diminuiu o peso do PIB, quando foi exactamente o contrário que aconteceu?! Portanto, essa não é uma forma de avançarmos no debate e na compreensão das dificuldades.
É certo que está longe daquilo que temos de ambicionar. Quanto a isso estou completamente de acordo consigo. Temos de caminhar para termos um peso próximo dos 40% do PIB das nossas exportações. É um valor que é adequado a uma economia da nossa dimensão, provavelmente. Mas é melhor ter 32% do que 28%, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Passamos, agora, ao Bloco de Esquerda. Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. João Galamba (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Galamba (PS): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, queria pedir à Mesa que faça distribuir um documento aos Deputados, em especial ao Sr. Deputado Telmo Correia, que já perguntou várias vezes ao Sr. Ministro qual era a explicação para a subida da taxa de juros nas duas últimas semanas. O documento consiste de um artigo da Businessweek com declarações do presidente do BCE, que satisfaz claramente as dúvidas dos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o documento será recolhido para ser distribuído.

Protestos do CDS-PP.

Srs. Deputados, tratou-se de um pedido de distribuição de um documento. De facto, a palavra não foi utilizada para interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos»

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado? Não vamos entrar em discussão.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, é só para dizer que conheço perfeitamente a opinião do Sr. Presidente do BCE.
No entanto, há pouco o Sr. Ministro usou uma expressão menos agradável, que foi «pequena demagogia», e eu queria dizer só que quem disse isto (que não tem a ver com o Orçamento) não fui eu, foi o Sr. Ministro.
Foi o Sr. Ministro quem disse aqui hoje que isto não tem a ver com o Orçamento. Mas quando era para aprovar o Orçamento tinha tudo a ver! Portanto, quem mudou de opinião não fui eu!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o documento será distribuído. Penso que, depois, o Sr. Deputado terá ocasião de usar da palavra.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, não deixando de notar o rápido auxílio do Sr. Deputado João Galamba ao Governo, não fosse o Governo não referir estes números, inicio a minha intervenção pegando naquela que é a realidade concreta dos dias de hoje.
Não concordando com a visão que a direita tem sobre as motivações para o crescimento dos juros da dívida, devo dizer que, na prática, o comportamento que estamos a ver nos últimos dias representa a inevitabilidade de este Orçamento do Estado ser uma falácia, porque não responde aos mercados, e há alternativas que poderiam levar a fins menos lesivos para o País.
Devo dizer que é necessário colocar no debate desta discussão na especialidade aquilo que a direita e também o Partido Socialista nos dizem repetidamente: é a economia que cria postos de trabalho. E devo realçar que, até agora, nesta discussão, ainda não se referiu o flagelo que é este Orçamento do Estado para 2011, que falha em responder a um dos propósitos que o próprio Ministério da Economia considerou como necessário.
Ora, o Orçamento do Estado, no que respeita ao Ministério da Economia, diz que estas políticas visam promover uma economia competitiva, dinâmica, sustentável e geradora de emprego, mas é no próprio Orçamento do Estado, na parte da geração de emprego, que existe um engano rotundo, porque teremos, com este Orçamento, mais desemprego no próximo ano do que neste ano, e estas são as previsões do Governo plasmadas no Orçamento do Estado.
Também devo citar um artigo do The Economist, de há cerca de duas semanas, onde se referia, de forma até algo acintosa para o Governo, que apenas José Sócrates não via que o País ia entrar em recessão. Por isso, também cai por terra a parte da promoção de uma economia competitiva, dinâmica e sustentável, e é sobre este orçamento que traz recessão e desemprego que devemos centrar o debate.
Devo dizer que neste orçamento temos também uma das falhas do que foi a palavra dada pelo PS aos eleitores. Dizia José Sócrates, nos debates que antecipavam as eleições legislativas de 2009, que o que diferenciava PS de PSD era a visão do investimento público.
Por isso, a primeira pergunta que faço, Sr. Ministro, é: onde está esse investimento público? Nós, Bloco de Esquerda, temos a visão que, num cenário de crise, é essencial que exista investimento público para que se dinamize a economia; para tal, fizemos propostas que estão nas medidas que apresentamos como alternativas a este Orçamento do Estado. Mas vemos, por parte do Governo, o investimento metido na gaveta e com isto um discurso que é, em si, o soçobrar perante as dificuldades. Apesar de o acordo entre o PS e o PSD se revelar ainda mais nefasto para os portugueses, na prática, a ausência de investimento público já era uma realidade.
Sobre o acordo entre o PS e o PSD, também fiquei com dúvidas sobre a política energética que o Governo tem levado a cabo, pois quase dava a entender que, se o PSD necessitasse de mais alguma despesa ou de menos receita, mais uma ou outra mini-hídrica seria lançada, mais um ou outro projecto na área da energia seria dado aos privados. Ora, isto revela que se navega à vista, no que respeita ao programa energético para o País; revela que, no fundo, a prática é: utilizar agora a concessão de mini-hídricas, das barragens ou de outros investimentos para um rápido encaixe económico, como já aconteceu no passado, mas, depois, no futuro, teremos uma asfixia financeira. E foi exactamente isto, na parte da energia, que o Governo deixou entender e que, no restante Orçamento do Estado, leva a cabo: as privatizações para não termos mais e mais défice no futuro, e são muitas as privatizações. Já agora, gostava que o Sr. Ministro esclarecesse, porque, em todos os debates que tivemos, nunca o fez, como é que o Governo vai seguir as palavras do Ministro dos Assuntos Parlamentares, segundo o qual o Governo irá abdicar de parte da REN, mas que, mesmo assim, continuará a ter a maioria. Ora, se o Governo detém 51% da REN, pergunto: no plano de privatização, quanto é que o Governo vai privatizar? O que é que está previsto para a REN? Mas pergunto-lhe também algo que não ficou claro em todos os debates do Orçamento do Estado: a REN será, ou não, privatizada no próximo ano? Tem o Sr. Ministro esta intenção, ou não? Isto é algo que necessitamos que fique esclarecido, porque a REN ou é estratégica ou não é. Se é estratégica para o Estado, tem de ficar nas mãos do Estado; se não é estratégica, o Governo privatiza, mas o Governo já disse que privatizava apesar de o Sr. Primeiro-Ministro dizer que era estratégica. Gostava que me explicasse em que ponto é que ficamos. E isto porque as privatizações, particularmente no sector da energia, têm levado ao que conhecemos: mais e mais custos quer na electricidade, quer no gás natural, quer nos combustíveis. Aliás,

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tenho curiosidade em saber se daqui a duas ou três semanas, quando, na prática, tivermos a visibilidade do aumento internacional que o petróleo está a ter — e o petróleo está hoje em valores de Maio — , o Sr. Ministro da Economia vem dizer a público que, tal como disse no passado mês de Maio, alguma coisa de mal se passa no sector dos combustíveis em Portugal, porque pagamos mais do que deveríamos pagar. Pergunto: teremos agora as mesmas perguntas? Teremos a mesma resignação do Sr. Ministro? Ou, afinal, nada muda, tudo fica na mesma e os portugueses continuam a pagar a electricidade mais cara da Europa, os combustíveis mais caros da Europa e o gás natural mais caro da Europa? Também é necessário que fique esclarecido neste debate, em sede de especialidade, se o Governo já englobou, ou não, no Orçamento do Estado, nas suas previsões, o aumento da electricidade em 3,8%. O Governo aceitará este aumento, que é muito acima da inflação e que incorpora taxas, que são abusivas, e algumas delas criadas recentemente, e que visam um mecanismo de garantia de potência às mesmas empresas que já garantem a potência actualmente ao sector público? Pergunto, Sr. Ministro, se o Governo vai ou não aceitar estes 3,8% e se este aumento da electricidade já está incorporado no Orçamento do Estado ou se, mais uma vez, a economia portuguesa, para além de um orçamento de recessivo, ficará ainda mais na mão desta renda, que é o pagamento abusivo no sector da energia.
Ainda nesta ronda, pergunto: qual é o modelo que o Sr. Ministro tem para a economia portuguesa? Pergunto porque nos diz, desde o início do mandato, que não aceitaria um modelo baseado em baixos salários. No entanto, faz parte de um Governo que tem os baixos salários como um dos pilares deste Orçamento do Estado — aliás, o Ministro das Finanças já veio dizer que, possivelmente, esta diminuição dos salários se deveria estender ao sector privado — e que assiste calmamente a uma empresa, como a Peugeot/Citröen, em Mangualde, que despediu 500 trabalhadores no ano passado, a contratar 300 desses trabalhadores e a pagar-lhes menos 200 € do que ganhavam no ano passado para os mesmos postos de trabalho, o mesmo horário e o mesmo trabalho.
Por isso, gostaria de perceber se a política do Governo é a de crescer com competitividade através da diminuição dos salários, criando um garrote na economia e que os portugueses já não podem sustentar, ou se é, mais uma vez, a resignação que este Orçamento do Estado representa. O Sr. Ministro tem alguma coisa para nos dizer de novo?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, o ecletismo das situações do Bloco de Esquerda não pára de me surpreender, é, aliás, a única coisa que me surpreende no Bloco de Esquerda. Hoje foi o The Economist. Está bem»! O Sr. Deputado reproduziu aqui, quase sem qualquer distinção, a mesma argumentação do CDS-PP relativamente ao Orçamento. Afinal de contas, não havia uma inevitabilidade de aprovar o Orçamento do Estado, porque ele não tem qualquer impacto nos mercados financeiros, como se vê pela subida das taxas de juro.
Ó Sr. Deputado, há muitos anos, quando estudei aquelas questões das correlações, etc., contaram-me a história do galo que pensava que era por ele cantar que o Sol se levantava todos os dias! O raciocínio do Sr. Deputado não anda muito longe do raciocínio que esse galo fazia acerca das correlações entre um acto e outro. Bom, falo na figura do galo sem nenhuma ofensa para o Sr. Deputado, até porque é uma imagem muito conhecida»! Sr. Deputado, retorquindo-lhe, poderia perguntar-lhe se conseguiria garantir a alguém, em Portugal e fora de Portugal, que um resultado diferente do que tivemos aqui, relativamente à aprovação na generalidade do Orçamento do Estado para 2011, teria um efeito nulo ou até, eventualmente, positivo na forma como os mercados vêem a economia portuguesa. Estou mesmo a ver os mercados a dizerem: «Olha, eles estão muito bem, nem aprovaram o Orçamento!» É uma economia que se recomenda!» É um Estado que tem muita capacidade de cumprir os seus compromissos, de tal maneira que nem conseguem aprovar o Orçamento!»« Isso não teria nenhum efeito nos mercados! Foi, provavelmente, até o facto de o termos aprovado que alguém disse: olhem, aprovaram o Orçamento, vamos lá subir a taxa de juro! Sr. Deputado, um bocadinho de razoabilidade na colocação das questões talvez não fosse de todo dispensável.

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O Sr. Deputado veio falar da criação de emprego e, sempre nesta linha de raciocínio, de enorme profundidade, diz que o Governo, que defende que o seu modelo económico de desenvolvimento da competitividade da economia é para criar emprego, está completamente errado, porque, logo em 2011, prevê um aumento do desemprego.
Sr. Deputado, há tempos nas coisas, há tempos na economia! O Sr. Deputado sabe-o muito bem, porque é economista! Sabe que, muitas vezes, para atingirmos objectivos, que são favoráveis ao lançamento da economia e da competitividade, geram-se efeitos desfavoráveis, efeitos que são negativos — aliás, a História não anda muito longe disto. Agora, com uma grande dose de imaginação, podemos pensar que haveria aqui uma política que conseguiria fazer tudo ao mesmo tempo, o financiamento da economia, a credibilidade da nossa dívida, face aos mercados internacionais, e, ainda assim, com um crescimento a 3 pontos percentuais e a criação líquida de emprego. Podemos imaginar que isto existia, mas é pura imaginação! Não há nenhuma proposta política, repito, no curto ou no médio prazos, não foi apresentada na Assembleia nenhuma proposta política que garanta esse tipo de resposta, ao contrário, Sr. Deputado»!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Nós apresentámos!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — O Sr. Deputado vem dizer que estas políticas, nomeadamente as de defesa da concorrência sã, conduzem inevitavelmente ao desemprego e ao empobrecimento na generalidade dos sectores da economia.
Sr. Deputado, se eu olhar à volta, onde vejo mais capacidade de criar riqueza, de criar emprego e de manter níveis elevados de bem-estar e de desenvolvimento é em economias que defendem os factores de competitividade como um dos pilares do seu desenvolvimento. É nisto que eu acredito e acredito que este Orçamento persegue este objectivo, passando, obviamente, por uma dimensão táctica, se quiser usar expressões que lhe são caras, que é a de corrigir um desequilíbrio que é acentuado e que, em grande parte, foi provocado por um ambiente extremamente desfavorável, do ponto de vista económico.
O Sr. Deputado falou nas privatizações e no investimento público. Sr. Deputado, o investimento público continua presente no Orçamento e continuamos a considerar que ele é um factor extremamente importante.
Também eu gostaria bem que assim não fosse, mas, infelizmente, não é possível que fique completamente ausente deste esforço de consolidação das contas públicas.
Um investimento mais selectivo? A tentativa de recorrer a mecanismos de investimento que promovam o crescimento sem penalizarem o Orçamento, como o Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN), ou os investimentos de concessões que o Estado atribui e que têm uma capacidade elevada para criar condições de curto e médio prazos para o crescimento e para a diminuição do nosso desequilíbrio externo, como as barragens? Sim! Sim! Agora, obviamente, com a necessidade de compaginar esses objectivos com uma redução do défice, face à qual estamos comprometidos.
Sr. Deputado, o Governo vai continuar a política de privatizações que foi anunciada. Não vou dizer-lhe quando é que a REN será privatizada e em que dimensão é que isto será feito, porque a decisão ainda não está tomada, mas, assim que for tomada, será, obviamente, do conhecimento público. No entanto, gostaria de dizer que as funções da REN são desempenhadas através de uma concessão pública, que é extremamente rigorosa nos objectivos e nas condições em que é executada. Creio, sinceramente, que é possível que, num quadro accionista diferente do actual — e será, necessariamente, num quadro em que o Estado não tem a maioria — , as condições de atribuição dessa concessão sejam suficientemente rigorosas e exigentes para garantir a defesa do interesse público. É nisto que eu acredito e acho que isto é perfeitamente possível em Portugal, como noutros países.
Estamos integrados na União Europeia e, também no domínio da energia, algumas das decisões que tomámos são tomadas no quadro das regras que funcionam na União Europeia e no quadro competitivo da União Europeia. É aqui que se insere, por exemplo, o mecanismo de garantia de potência que foi definido e que vigora, por exemplo, na nossa vizinha Espanha e que, numa fase de transição do nosso sistema electroprodutor, é uma condição necessária para assegurarmos a sustentabilidade da oferta de energia eléctrica e evoluirmos para um modelo de produção de energia distinto daquele que tivemos até há uns anos.
Sr. Deputado, como sabe, existe um sistema de fixação de tarifas, que funciona através de uma entidade reguladora, e aquilo que o Estado já fez foi criar uma tarifa social eléctrica para que a energia eléctrica possa

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chegar a todas as famílias, nomeadamente às que têm maior fragilidade económica e social, em condições mais favoráveis.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro referiu aqui que acredita neste Orçamento para 2011, como resposta aos problemas do País, mas também não tem dúvidas — pelas expressões ditas nesta Assembleia, a começar pelo Sr. Primeiro-Ministro — de que este Orçamento significa cortes ou reduções drásticas em matéria de apoios sociais, corte brutal no investimento público, portanto o aumento de mais uns milhares de desempregados, como, aliás, o próprio cenário do Orçamento do Estado coloca, e que tal vai significar um brutal agravamento da situação social do País. Segundo um especialista bem conhecido dos portugueses, Bruto da Costa, esta situação vai produzir mais 400 000 novos pobres, 2,2 milhões de portugueses a viverem com menos de 414 €/mês, e mais cerca de 0,5 milhão a recorrer aos bancos alimentares para não passar fome.
Sr. Ministro, estando de acordo com este sacrifício dos portugueses mais desprotegidos e mais fracos, perguntar se não se sente incomodado pelo facto de, com a cumplicidade do Governo, o Conselho de Administração da PT ter subtraído aos cofres do próximo Orçamento do Estado cerca de 200 milhões de euros pelo pagamento antecipado de dividendos. Gostaria de saber até que ponto é que vai o incómodo do Ministro relativamente a este «roubo» feito à frente dos olhos dos portugueses com a cumplicidade do Governo, que não tomou as medidas necessárias no que toca a esta situação.
Sr. Ministro, passo a referir as políticas do Ministério inscritas no Relatório e nos documentos do Ministério da Economia sobre o Orçamento do Estado. É feita uma abordagem da produtividade e da competitividade, onde se regressa à tese da competitividade pelos salários, e nem sequer é no documento da especialidade do próprio Ministério da Economia, é no texto geral, a partir da pág. 19, que se aborda esta questão e se diz que «A subida verificada nos custos unitários do trabalho tem-se reflectido na deterioração da competitividade de Portugal»«. E, depois, há mesmo um bater da «mão no peito«, a começar pelo Ministro Vieira da Silva, considerando que este aumento dos custos unitários do trabalho, entre 1990 e 2005, foi particularmente grave para o País e para as exportações portuguesas. Este é um período em que o senhor foi, inclusive, Ministro dos governos do Eng.º António Guterres e tem, portanto, responsabilidade por estas políticas e pela situação a que o País chegou, em matéria de défice externo, da dívida externa, e da própria crise que acabou por cair sobre nós, mas, pelo que parece, a responsabilidade afinal é, inevitavelmente, dos salários dos trabalhadores portugueses e da sua evolução ao longo dos anos. Esfuma-se a tese dos novos factores de competitividade e, sobretudo, foge-se a qualquer abordagem séria de verdadeiros factores responsáveis pela perda de competitividade da economia portuguesa ao longo destes anos.
Começo por referir os custos de bens e serviços não transaccionáveis (tema abordado, recentemente, por um economista português insuspeito de proximidade ideológica ao PCP, Vítor Bento), os problemas do euro (para os senhores não existe qualquer problema com o euro e com as exportações portuguesas), os problemas das políticas comerciais da União Europeia (também aqui não há qualquer problema, pois estas políticas comerciais da União Europeia são as adequadas aos interesses nacionais, veja-se o que está a acontecer com o Paquistão) e a ausência, inclusive, de políticas que tenham respondido, ao longo destes anos, às baixíssimas produtividades da economia portuguesa, que não são, inevitavelmente, os salários dos trabalhadores, mesmo quando tivemos milhões de euros de fundos comunitários disponíveis.
Gostaria, ainda, de falar da predação do sector dos bens não transaccionáveis sobre os transaccionáveis, que o Dr. Vítor Bento, nesse seu estudo, avalia, dizendo que, durante 20 anos, representou uma predação do sector transaccionável, portanto dos sectores exportadores, de cerca de 15% do valor do PIB, e daquilo a que estamos a assistir nas contas das empresas destes sectores não transaccionáveis ao fim dos primeiros nove meses de 2010, que registam subidas. A EDP anuncia que irá ter lucros recorde, a BRISA teve um aumento de 282% dos lucros, 10 empresas do PSI onde estão muitas destas tiveram um aumento de cerca de 24%, em média, e a banca regista as subidas que também são conhecidas. E estamos a falar de bens essenciais para a competitividade das empresas portuguesas, como a energia, o crédito, os transportes, aos quais, para muitas e muitas empresas de sectores exportadores, os senhores vão acrescentar, com o apoio do CDS e do PSD, os custos decorrentes da imposição de portagens nas SCUT.

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As privatizações que estão anunciadas pelos senhores, e ainda agora acabou de as referir, vão agudizar este problema, porque vão reforçar as posições monopolistas destas empresas nos mercados nacionais, e, portanto, elas vão ficar em melhores condições para abusar das suas posições dominantes e da dependência económica dos sectores não transaccionáveis, na imposição de preços de bens e serviços essenciais com as consequências que são conhecidas.
No crédito, estamos perante a agiotagem clara da banca. Os senhores podem inventar as linhas de crédito que quiserem, mas não há linhas de créditos que respondam a um problema de uma banca, que, desde Janeiro, aumentou as comissões bancárias em 12,2%. Quem é que pagou este aumento de comissões bancárias, Sr. Ministro? Fundamentalmente, as pequenas e médias empresas deste sector, a par dos cidadãos portugueses.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já só dispõe de 1 minuto.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Quanto à situação ao nível da energia, gostaria de esclarecer o Sr.
Ministro de que não há regra alguma na União Europeia que imponha as privatizações das empresas energéticas, nem nenhuma regra da União europeia impõe, por exemplo, a segmentação da cadeia de valor que foi feita em Portugal; bem pelo contrário, a França e a Alemanha continuam a manter empresas públicas verticais no sector da energia.
Sr. Ministro, ainda sobre esta matéria, pergunto se vai travar, e quando é que isto vai acontecer, a subida dos preços do gás natural entre 10% e 20%, graças a decisões que tomaram, a perspectiva de uma subida de 25% no próximo ano para sectores industriais, sobretudo para as pequenas empresas, a par da subida de 3,8% para os consumidores e do escândalo que continuamos a verificar nos combustíveis, pois somos dos países que continua a ter os mais altos preços de gasóleo, gasolina, fuel, nafta, antes da incidência dos impostos — não são os impostos que aumentam os preços — , e até em matéria das SCUT, como já referi.
Sobre as energias renováveis, porque os senhores falam muito deste problema e, infelizmente, quanto mais energias renováveis mais são os custos que sobram para os sectores transaccionáveis e para a generalidade dos cidadãos portugueses, gostava de referir o problema da microgeração.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que termine.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Secretário de Estado, em Junho, em audições realizadas no Parlamento, anunciou que iria sair legislação para este sector no prazo de 15 dias, em Julho, o que permitiria que algumas empresas, que estavam dependentes deste processo, ainda avançassem este ano.
Os senhores avançaram com uma manobra dilatória»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — » numa reunião do Conselho de Ministros, que deu um prazo de 60 dias para a publicação da legislação. Ora, os senhores não conseguiram cumprir este prazo e só passados quatro meses, em início de Novembro, é que foi feita a publicação do diploma. Sr. Ministro, gostava que fosse dada uma explicação para esta demora na publicação da legislação.

O Sr. Presidente. — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, constato que o ecletismo nas citações continua a dominar este debate, agora é o Sr. Deputado Agostinho Lopes que cita abundantemente o Sr. Prof. Vítor Bento»

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Ele só fez os cálculos! As questões há muito que as coloco!

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O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Mas, Sr. Deputado, o Sr. Deputado levantou questões que não fazem parte da agenda deste debate, nomeadamente as da operação da PT, que não são da minha competência, além de o meu estado de espírito acerca destas questões ser reservado, não é alvo de debate nesta Comissão. Peço-lhe desculpa, Sr. Deputado.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Mas aprovou em Conselho de Ministros, certamente!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — O Sr. Deputado veio defender uma política distinta da que o Governo tem seguido e da que o País tem escolhido ao longo de muitos anos. Está no seu direito, o Sr. Deputado defende uma política de recusa da política comercial da União Europeia. Sr. Deputado, eu não posso dizer que estou 100% de acordo com a política comercial da União Europeia. Agora, e sei que, por vossa vontade, não estaríamos na União Europeia, o que não podemos é estar na União Europeia e escolher, um pouco em jeito de geometria variável, o que nos interessa e o que não nos interessa, que esta parte queremos e que aquela não queremos, que esta parte queremos, mas só se for assim, que aquela não queremos, a não ser que seja «assado». Sr. Deputado, não é assim que funciona a União Europeia, nem creio que noutros espaços de integração económica, que já existiram noutras paragens, alguma vez se tenha funcionado desta forma. Bem, alguns funcionaram, porque havia sempre algum que dizia como é que era. Mas enfim, aqui, batemo-nos pelas políticas comerciais que achamos que são mais vantajosas para Portugal.
Agora, Sr. Deputado, estamos numa evolução económica, que é no sentido de uma concorrência mais aberta, de uma concorrência com menos barreiras, aquelas barreiras que tantas vezes «protegeram» a nossa economia e que hoje, em muitos casos, não existem. Mas também lhe digo, Sr. Deputado, que essa protecção que tivemos foi, tantas vezes, mais do que uma vantagem, a causa de muitas das dificuldades que hoje vivemos, foi essa protecção excessiva e excessivamente prolongada a algumas das nossas actividades económicas no passado, é bem de ver.
Portanto, continuaremos a defender na União Europeia os interesses da indústria portuguesa, os interesses da economia portuguesa, sem esconder e sem negar que há uma transformação a fazer e que ela está a ser feita pelas empresas portuguesas. As empresas portuguesas estão a fazer esta mudança.
Sr. Deputado, se vir com atenção o Relatório que acompanha o Orçamento, não creio que possa atribuir essa mudança de orientação — acusação que deixou, concretamente, a mim próprio — aos factores de competitividade. Continuo a acreditar, Sr. Deputado, e está escrito no Relatório do Orçamento do Estado, que a competitividade da economia portuguesa depende da sua capacidade de modernização, da sua capacidade de inovação, de diferenciação, de incorporação de tecnologia, conhecimento e mão-de-obra mais qualificada e que este é, estrategicamente, o único conjunto de instrumentos capaz de fazer acrescer a competitividade da nossa economia.
Agora, também é verdade que as políticas salariais têm de ser desenvolvidas em função das circunstâncias concretas que as economias vão atravessando. Não defendo um regresso à política de baixos salários, porque não me parece que esta seja alternativa a coisa nenhuma, mas defendo, como, aliás, já disse, muitas vezes,»

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — E está escrito!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — » e está escrito em muitos sítios, que a economia tem de saber utilizar diferentes soluções, através de diferentes quadros de negociação, para que as normas salariais sejam adequadas à sustentabilidade do crescimento e do desenvolvimento. Uma coisa lhe digo: não acredito que seja o crescimento salarial que provoque o crescimento,»

Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.

» como tambçm não acredito que seja uma descida salarial a alternativa para esse crescimento. O crescimento tem de andar a par com o desenvolvimento e a capacidade competitiva de uma economia e, se e quando esse crescimento é excessivo, face à capacidade de resposta da economia, há problemas do ponto de vista competitivo e do ponto de vista do emprego, e temos muitos exemplos para o demonstrar.

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Sobre as questões relativas à energia, Sr. Deputado, eu não disse, obviamente, que a União Europeia nos obrigava a privatizar ou a não privatizar, foi uma opção do Estado português, a de privatizar alguns sectores, entre os quais os sectores energéticos. Não tenho nenhuma convicção, embora o Sr. Deputado a tenha, de que a permanência desses sectores nas mãos do Estado acrescentaria competitividade, equidade e capacidade à nossa economia. Não tenho esta visão! Não o fez no passado, duvido que o fizesse no futuro.
Se me perguntar se não é necessário corrigir distorções, se não é preciso ter uma cada vez mais intensa capacidade de regulação e de acompanhamento desses sectores, naturalmente, digo-lhe que sim, porque se trata de bens que são estratégicos e muitos deles estão muito próximos daquilo que podemos considerar bens públicos. É verdade que sim, e creio que o Estado tem de ter as condições para exercer esse papel, na defesa do interesse geral. Se isto pode ser feito num quadro que não exclui a capacidade concorrencial e a economia de mercado, acho que sim. O Sr. Deputado entende que não, temos esta divergência.
Relativamente a uma questão concreta que o Sr. Deputado colocou, gostaria de dizer que, de facto, no âmbito das estruturas responsáveis, já existiram propostas para rever a política de preços no sector do gás, e estou convicto de que, muito brevemente, poderão existir sinais muito positivos, no sentido de o crescimento do preço do gás natural ser aliviado, por forma a garantir a capacidade competitiva e o desenvolvimento das empresas com uma elevada dependência deste produto.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos agora passar à segunda ronda de perguntas, para o que cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos.
Tenho a indicação de que o PSD vai, novamente, dividir o tempo, pelo que tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Nuno Encarnação.

O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, ainda bem que acontece esta apresentação do Orçamento e a sua discussão, para constatarmos que ainda existe um Ministro da Economia. A sua actuação tem sido tão discreta, tão discreta, que se não vê.
Pode, apesar da crise, o Ministro da Economia fazer alguma coisa? Pode contribuir para melhorar o estado do País, promover o crescimento das oportunidades e o crescimento do emprego? Pode e deve! Não propriamente com o crescimento do sector público, mas, fundamentalmente, com as políticas necessárias ao desenvolvimento do sector privado. E é imperioso que perceba que opções gastas produzem resultados inexistentes.
Notam-se novidades na política orçamental que sejam capazes de alterar a situação? Não! O objectivo a atingir parece simples e consensual e é mesmo repetitivo, e o Sr. Presidente da República não tem cessado de o dizer: sem mudança na orientação económica do nosso País, sem aumentar a produção de bens susceptíveis de serem exportados ou de substituírem importações por nós feitas, não há riqueza criada, nem empregos. Como poderemos conseguir este objectivo? Com os números apontados por V. Ex.ª parece-nos difícil.
Não me parece que os instrumentos usados para apoiar empresas tenham tido o sucesso que o País exige. A grande questão é a de saber o que as motiva a investir, a tentar procurar novos mercados, a crescer em solidez.
Na vida económica, sendo certo que os bancos representam um papel principal, a pergunta é: o que deve, neste momento, ser apoiado com mais força, os bancos ou as empresas? Percebe-se a ajuda à banca: reduzem-se os riscos das operações a 50% ou a 25% e, mesmo assim, o Estado paga para que a banca conceda empréstimos. Tem sido esta a lógica das linhas PME Investe: o Estado financia os spreads e incentiva as sociedades de garantia mútua. A questão que se coloca é a de que a comparação entre um e outro incentivo leva a que o vício resultante para a banca seja o de emprestar em condições excepcionais de ganho, de lucro e de risco reduzido — o melhor dos mundos. Ora, alguns bancos já só se tentam a dar crédito nestes termos — pode isto continuar, Sr. Ministro?! E, fora destes casos, como é que as empresas podem recorrer a empréstimos, a médio e longo prazo, com resposta efectiva da banca? Está instituída a dificuldade em função do normal funcionamento dos bancos, está bloqueada a possibilidade do financiamento de empresas e projectos relevantes, e este é, ou deveria ser, o seu campo de acção privilegiado, Sr. Ministro.

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Há alguns anos, os socialistas eram particularmente exigentes no respeito pelos direitos humanos, pela repulsa da diplomacia económica com esquecimento dos valores; hoje, já tudo isto pertence ao passado, e a verdade é que parece não haver remédio.
A China é um grande mercado, a Venezuela é um mercado várias vezes visitado. Mas o Brasil e a Índia não são, igualmente, potências emergentes em relação às quais se deve continuar a fazer um esforço?! Há ainda alternativas para crescer, Sr. Ministro. O que a qualquer Estado não pode permitir-se é este conjunto de anos seguidos sem o sucesso exigido, no que diz respeito ao investimento internacional nas exportações. Tardiamente acordou para esta realidade, como diria António Vitorino; os números alcançados, apesar de positivos, são ainda poucos para aquilo de que o País necessita, Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Amaro.

A Sr.ª Celeste Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, no Orçamento do Estado para 2011, na área da promoção, verifica-se um aumento de 14 milhões de euros. Na caracterização da acção, entre outras coisas, dizem o seguinte, e cito: «(») efectuar o balanço do modelo de contratualização da promoção de Portugal no estrangeiro com as agências regionais de turismo, e definir um novo modelo». Sr.
Ministro, isto quer dizer que o modelo anterior falhou? Mas, face aos dados do INE, pelos vistos, tivemos aumento de turistas. Por que razão se vai alterar o modelo? Seguidamente, falam no reforço da marca «Destino Portugal», que, como sabemos, foi lançada a 27 de Junho. O PSD, na altura, teve oportunidade de alertar para o facto de ser demasiado tardia uma campanha que pretendia cativar os portugueses a passar férias no seu País. Ainda bem, Sr. Ministro, e, desta vez, a bancada do PSD vai dar-lhe razão e, continuando com esta campanha, dá razão ao Sr. Presidente da República, que já em 10 de Junho tinha apelado aos portugueses para fazerem férias no seu País.
Em seguida referem o lançamento do novo portal visitPortugal. Sr. Ministro, esta deve ser mais uma gralha deste Orçamento, pois este portal já existe.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Pois já!

A Sr.ª Celeste Amaro (PSD): — Por último, Sr. Ministro, no final, falam na revisão do PENT (Plano Estratégico Nacional do Turismo). Sabemos, entretanto, por fontes jornalísticas, que encomendaram um estudo à Roland Berger sobre a revisão do PENT. Sr. Ministro, será que é preciso encomendar um estudo a uma empresa destas? Não é esta a função do Turismo de Portugal, mais as regiões de turismo, mais as câmaras municipais, com os seus pareceres? E, se entenderam que tinham, de facto, de pedir este estudo, quando é que os Deputados o podem consultar? É que só sabemos alguma coisa deste estudo, face de notícias que nos aparecem nos jornais.

O Sr. Presidente: — Uma vez que o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento responderá, conjuntamente, a todas as perguntas desta segunda ronda, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Odete João.

A Sr.ª Odete João (PS): — Sr. Presidente, antes de mais, aproveito para cumprimentar o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento e os Srs. Secretários de Estado.
Numa altura de austeridade do Orçamento público, de concorrência a nível mundial, a perda de milhares de postos de trabalho tem de ser compensada, se quisermos manter os nossos padrões de vida, e isto depende, fundamentalmente, da nossa capacidade de inovação em produtos, serviços e empresas.
Portugal tem um enorme potencial na área da inovação, desde logo investigadores de craveira internacional, cujo número tem vindo a aumentar, não fosse o forte incentivo que tem sido dado para novos doutoramentos e os empresários com enorme capacidade de empreendedorismo.
Existem também evidências a que não podemos ser alheios, desde logo o investimento em investigação e desenvolvimento, que ultrapassou 1% do PIB — meta que todos desejávamos há muito tempo — , o número de investigadores, que aumentou exponencialmente, e também o investimento em infra-estruturas essenciais ao desenvolvimento.

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Existem, neste momento, nichos de mercado na nossa economia, os quais alavancam outros sectores da indústria que são essenciais para o nosso desenvolvimento.
É evidente que o Orçamento do Estado não fica alheio a esta matéria e continua a incrementar o apoio à inovação, através do apoio a empresários que pretendem levar as suas ideias ao mercado e do financiamento, como o Sr. Ministro da Economia já anunciou, de apoio às PME, as quais são essenciais no nosso tecido económico. Mas também temos de desenvolver mais e melhor o registo da propriedade intelectual, procurando alinhar este registo com os requisitos europeus, e temos ainda de reduzir custos de contexto, aumentando a celeridade das respostas e desburocratizando procedimentos ao nível dos serviços públicos.
A criação de pólos e clusters tem sido essencial para uma estratégia de eficiência colectiva e tem-se conseguido aquilo que era difícil na nossa economia, que era um trabalho em equipa, uma forte ligação das empresas ao mundo da investigação. A pergunta que faço, neste momento, vai no sentido de saber se, de facto, o Governo pretende, com estes apoios, concentrar o conhecimento da inovação em sectores estratégicos da nossa economia, no sentido de não haver desperdício naquilo que é o investimento. Não estou preocupada com a execução do QREN, pois, como nos afirmaram muitos representantes dos pólos e clusters que tivemos oportunidade de ouvir na semana passada, há um tempo para pensar, planear, organizar e, depois, executar. De facto, estamos agora no ponto de partida para uma execução mais célere.
Uma outra preocupação que se prende com os processos de inovação tem a ver com as questões da normalização, que é essencial, se queremos que as nossas empresas se internacionalizem e sejam mais competitivas, assim como com a certificação de produtos e as normas de qualidade. Peço, sobre estas duas matérias, um comentário do Governo. O mesmo se diga sobre o apoio às actividades pré-competitivas, ao qual, neste momento, é necessário dar um impulso muito significativo.
O Plano Tecnológico tem sido um instrumento de referência a nível internacional e os resultados começaram a aparecer, desde logo o saldo da balança tecnológica, que foi positivo, consecutivamente, em 2007, 2008 e 2009. É nesta matéria que o sector público constitui um motor de inovação por si próprio e em que importa continuar a investir. E não ficamos mal nos scores internacionais, nomeadamente no European Innovation Scoreboard (EIS), de 2009, que coloca Portugal como o 4.º País com maior crescimento nos efeitos económicos da inovação e como o 1.º País no progresso em termos de despesas em investigação e desenvolvimento, e para isto é referência o normativo que regula os sistemas de incentivos fiscais em I&D empresarial, que já é uma referência europeia. A pergunta que faço, sobre estas matérias, é a seguinte: quais são os resultados que o Governo tem para 2010? É de facto essencial, nomeadamente no que são as referências ao nível da contratação pública de soluções inovadoras, continuar a investir?

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que abrevie.

A Sr.ª Odete João (PS): — Com certeza, Sr. Presidente.
Também gostaria de saber se o sector público prevê a concessão de incentivos para estimular a inovação no âmbito das suas organizações e na prestação de serviços públicos, como tem vindo a fazer nestes últimos anos, e se esta é uma linha de continuidade para 2011.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Ministro e os Srs.
Secretários de Estado e por dizer que li no Relatório do Orçamento do Estado referências à recuperação do crescimento económico, ao apoio ao emprego e à promoção da coesão social, com as quais estou completamente de acordo. Mas o que eu gostaria de saber era se, no concreto, vamos consegui-lo e de que forma.
Tive oportunidade de fazer uma pergunta ao Governo sobre o Programa MODCOM. E porquê? Porque, se há coesão social, se há apoio ao emprego e crescimento económico, ele terá esse efeito numa parte significativa das micro, pequenas e médias empresas, que são o comércio tradicional, o pequeno comércio, que, ainda por cima, está espalhado um pouco por todo o País. E, portanto tem esse efeito multiplicador.
Olhando para o Programa MODCOM, há um dado que salta à vista. Para além de, no total dos vários programas, continuarmos a ver um total de 2636 candidaturas sem apoio e de 1469 candidaturas elegíveis,

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mas não apoiadas por falta de dotação orçamental, e, nos vários programas, esta média anda nos 30%, gostaria de saber se o reforço previsto no Orçamento é para se ir recuperar esta parte que fica de fora — elegível, mas sem dotação orçamental — ou se é para se criar mais um «MODCOM» muito ao estilo de mais uma PME Investe. Na prática, a consequência disto é haver uma parte significativa dos empresários das pequenas e médias empresas a acreditar nestes remédios do Governo mas, depois, a ficarem sistematicamente de fora. Como é que isto é compatibilizado com a iniciativa MERCA. É uma substituição ou também é, ao mesmo tempo, um complemento mais focalizado do apoio ao comércio? Porque na resposta não fica evidente — e há regiões do País que têm bastante comércio, nomeadamente o Minho, e que ficam sistematicamente com execuções muito abaixo das de outras regiões do País — que vá haver aqui um equilíbrio. E isto importante porque o Governo, não cumprindo com aquilo que seria o seu compromisso, que era fazer um estudo para autorizar a abertura das grandes superfícies ao domingo, acabou por permitir que, apenas com um dia de aviso, as grandes superfícies pudessem abrir. Está claro que, depois disto, nenhum município, conseguirá alguma vez mais fechar uma grande superfície ao domingo.
Passo às exportações. Os dados são o que são, são positivos e, quanto a esta matéria, acho bem, e espero que se mantenha este ritmo de crescimento. Mas lembro-me de o Governo ter falado e de ter querido nacionalizar a COSEC, com o sentido de dar à exportação os seguros de crédito necessários e suficientes para que se pudesse incentivar esse mesmo aumento de exportação.
Mas, olhando para o Relatório do Orçamento do Estado, vejo «Seguros de crédito COSEC», 40 milhões de euros. Pergunto: porquê? Porquê referir aqui seguros de créditos da COSEC, no valor de 40 milhões de euros, e não deixar aberto a outros operadores?! Há mais operadores no mercado. É uma preferência pela COSEC?! Na pág. 202 do Relatório do Orçamento do Estado para 2011 consta: «No âmbito da cooperação: Seguros de crédito COSEC», 40 milhões de euros». É o que está no Relatório e eu gostaria de saber como é que se explica isto.
Já se falou aqui de energia, mas quero lembrar que há a Resolução do Conselho de Ministros n.º 169/2005 para todo o sector energético e três decretos-lei para cada um dos três subsectores, electricidade, gás natural e petróleo.
Todavia, tanto para a electricidade como para o gás natural há decretos-lei, regulamentos e regimes jurídicos desde 2006, para que o comércio possa funcionar, mas, estranhamente, não consigo encontrar nenhum para o petróleo. E isto é mais grave, ou não, porque andamos há muito tempo a discutir o monopólio da Galp, os preços mais caros da Europa antes de impostos, o efeito dos preços dos combustíveis e dos seus derivados na economia e nas empresas, mas o certo é que a refinação não tem legislação complementar, o transporte não tem legislação, o licenciamento de instalações não tem legislação e também não há aquilo que seria, obviamente, uma necessidade, seguindo, aliás, as recomendações da própria Autoridade da Concorrência: mais concorrência no mercado, para vivermos num mercado mais concorrencial. Aliás, com a concorrência, ganhariam não só as empresas como o próprio mercado e não daria, como acontece às vezes, palco a alguma demagogia de esquerda, que aparece sempre sobre estas matérias.
Portanto, gostava de saber por que é que isto aconteceu.
Por último, no Orçamento do Estado também aparece uma verba de 36 milhões de euros para estudos e planeamentos estratégicos no sector do turismo, para o Turismo de Portugal, quando aparecem verbas de reforço para a promoção. O que é isto?! Isto também está ligado a um cluster, mas não fica claro, porque, depois, engloba uma série de entidades. Gostava que nos esclarecesse, que nos dissesse mais qualquer coisa sobre esta verba complementar para estudos e planeamentos estratégicos no sector do turismo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro, na sua intervenção de há pouco, colocou-se como o bom aluno da União Europeia.
O Sr. Ministro dizia: «nós temos de ter na energia exactamente as boas práticas que são feitas lá fora», e dizia isto acerca do mecanismo de garantia de potência, o que significará, nada mais, nada menos, que 60 milhões de euros, por absolutamente serviço nenhum, serão dados a grupos económicos que já apresentam lucros previstos para 2010 superiores a 1000 milhões de euros, no caso da EDP, e a 500 milhões de euros, no caso da Galp. É isto que significa a política do Governo e o facto de ser o bom aluno da União Europeia!

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Mas, curiosamente, este bom aluno tem tirado muito más notas, pois é exactamente isto que nos diz os juros da dívida, e a própria União Europeia não reconhece» Aliás, a própria Alemanha representa aqui um ataque interessante, que devemos perceber, à construção da zona euro, não reconhecendo nenhumas competências aos países que estão, neste momento, em dificuldades, entre eles Portugal, e isto reflecte-se, de facto, no aumento dos juros da dívida. Por isso, este bom aluno tira muito más notas face aos restantes parceiros europeus. É um aluno subserviente, mas é um aluno que não aprende muito, e dou vários exemplos: é um aluno que quer ser único e, quando o é, é pelas piores razões.
Vamos, por exemplo, ao sector do comércio e para o enorme ataque a este sector, que é a abertura das grandes superfícies ao domingo. Diz-nos o Governo: «seguimo-nos pelo resto da Europa», mas aqui nada se vê»! Em nenhum outro país da Europa, com uma õnica excepção, existe um regime semelhante de liberalização completa da abertura das grandes superfícies ao domingo. É este o plano que o Governo tem para a economia portuguesa? Mas deixe-me fazer-lhe uma outra pergunta, porque também é interessante perceber a perspectiva do Governo de valorização da economia portuguesa.
Percebemos que o investimento público ficou na gaveta, por isso o Governo apenas investe indirectamente, através do QREN, na medida em que a sua exígua execução vai acontecendo, mas a valorização de um dos nossos patrimónios fundamentais, a língua, fica igualmente na gaveta. E vê-se que este bom aluno, face à União Europeia, não tem par e faz o que nenhum dos outros faz, falo do Conselho de Ministros, de 28 de Outubro, que aprovou a adesão de Portugal ao Acordo de Londres.
Devo dizer que, na prática, o Acordo de Londres significa a supressão das exigências de tradução das patentes europeias para as diferentes línguas, entre as quais a de Portugal. É uma coisa tão importante que só Portugal é que fez, nem a Itália, nem a Espanha, nem a Polónia, nem a Finlândia e outros o fizeram. Aliás, dos países de língua oficial portuguesa, Portugal foi o único que assinou este Acordo de Londres e isto representa, na prática, uma desvalorização de um património fundamental, que é a língua, a nível de postos de trabalho e isto é feito sob a forma das mais absurdas justificações. Diz-nos, a este propósito, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial que será, por exemplo, para que seja mais fácil as empresas estrangeiras virem para Portugal, quando se percebe que quem quer investir em Portugal e não quer investir na tradução de uma patente para a língua portuguesa nunca virá cá fazer nada de bom.
Mas o Sr. Ministro não comentou uma informação que era essencial para perceber qual a política do Governo para a economia. Não disse qual era, afinal, a política que o Governo tem perante os salários. Disse uma coisa vaga, que foi que os salários não podem ser um entrave ao crescimento económico e que a economia deve saber reajustar-se mediante a sua capacidade de crescimento dos salários. Porém, isto, complementado com as informações que temos no Orçamento do Estado, de diminuição dos salários da função pública, com a informação que o Ministro de Estado das Finanças deu, de que seria natural que o sector privado seguisse as indicações da função pública, faz com que tenhamos um governo que promove uma degradação dos salários. Sabendo-se que o poder de compra dos portugueses foi um dos dois pilares do crescimento, ainda que pequeno, da economia portuguesa, a par com as exportações, isto significa que, quando queríamos que a economia portuguesa «corresse», acabámos por «dar um tiro no pé» e vamos ao pécoxinho, esperando, como diz o Governo, que não cheguemos à recessão, quando toda a gente diz exactamente o contrário.
O Sr. Ministro também não disse o que pensa, por exemplo, do caso da Peugeot-Citröen, de Mangualde. É este o paradigma que quer para Portugal? Aceita o Governo este tipo de situações? É isto que veremos no futuro, uma empresa que, de um ano para o outro, reduz, para o mesmo posto de trabalho, o mesmo horário e as mesmas funções, 200 € de salário atravçs de um despedimento colectivo? É este o plano que o Governo tem para o País? Por aqui percebemos que desta degradação da economia, desta degradação do poder de compra dos portugueses, resultará, obviamente, recessão económica e desemprego, que estão previstos no Orçamento do Estado.
Assim, descodificamos: estes são os pilares escondidos, fora de demagogia deste debate do Orçamento do Estado, que, afinal de contas, o Ministério da Economia traz a este debate.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes e dispõe, para o efeito, de 5 minutos.

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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, registo que o Sr. Ministro é o responsável, aprovou-o em Conselho de Ministros e trouxe à Assembleia da República, pelo Orçamento do Estado, mas já nada tem a ver com o problema de este mesmo Orçamento do Estado ser defraudado nas suas receitas por uma manobra de uma empresa, a PT, onde o Governo tem participação e, relativamente à qual, nada fez.
Sr. Ministro, continuando nas políticas do Ministério, gostaria ainda de falar da questão da chamada «política de modernização de comércio e serviços».
Já aqui foi referido que os senhores avançaram com o processo de liberalização dos horários do comércio.
Isto é um frete aos grandes grupos de distribuição — tenho de valorizar a viragem, mais uma vez, do CDS nesta matéria, sendo que se tornou novamente num defensor do encerramento do comércio ao domingo.
Sr. Ministro, os senhores bem podem anunciar milhões e milhões para o MODCOM e para outros «modcom» de apoio às pequenas empresas de comércio. Os senhores não têm dúvida nenhuma de que o que está a acontecer é a completa liquidação do sector do comércio tradicional, do comércio de proximidade, pela apropriação do mercado retalhista pelos grandes grupos de distribuição, ano após ano, e, no fim da distribuição, de todos esses apoios que o senhor aqui referiu. Não se trata apenas do problema da decisão da liberalização, porque esta decisão junta-se a uma outra, tão grave como esta, a da liberalização dos licenciamentos.
Estando a falar de comércio e serviços, também não posso deixar de registar a decisão de liberalização e privatização das actividades funerárias, recentemente decidida pelos senhores, para entregar a um único grande grupo neste País, controlado por fundos de investimentos estrangeiros, este tipo de actividade — lateralmente, há algumas IPSS (instituições particulares de solidariedade social) — , criando uma situação de deslealdade concorrencial para centenas de pequenas e médias empresas deste sector, que também são empresas económicas.
Relativamente ao Orçamento do Estado, os senhores falam em correcção de assimetrias regionais.
Gostaria de saber se tiveram em conta o que o aumento do IVA e a manutenção da taxa de 23% do IVA na garrafa do gás butano vai continuar a significar para toda uma vasta zona fronteiriça no nosso País. Sr.
Ministro, que medidas estão de facto em curso no Ministério da Economia para responder às assimetrias regionais? Aproveitando a abordagem desta questão, pergunto: o que é que significa, em matéria de correcção do desenvolvimento regional, retirar uma associação de olivicultores de Trás-os-Montes, envolvida num projecto do INTERREG? Por que é que ela foi afastada, aparentemente, com o argumento de restrições orçamentais nacionais? Este foi o argumento utilizado para afastar esta organização, pelo que gostava que o Sr. Ministro nos explicasse o que são estas restrições orçamentais nacionais.
Sr. Ministro, gostaria de ter uma ideia sobre o que o Governo está a fazer para preservar o comando estratégico em mãos nacionais da GALP, sabendo que no fim do ano termina o acordo parassocial.
Gostaria de saber quando vão implementar a célebre transparência nos apoios às empresas, referida no Programa do Governo, mas que continua sem resposta. Esta questão foi colocada à Sr.ª Secretária de Estado, numa audição recente, e ficou sem resposta, porque no site do Ministério não obtenho nenhuma resposta para o que quero saber sobre esta matéria.
Relativamente à Autoridade da Concorrência, verifico que os senhores reduzem as verbas. Há, aliás, uma evidente diferença entre os valores deste programa por acções, que chegou um dia destes, e os que estão no relatório do Ministério da Economia e eu gostaria de ter uma explicação para esta diferença. Mas, relativamente à Autoridade da Concorrência, gostaria de saber se o Sr. Ministro tem, ou não, consciência do significado do atraso da intervenção da Autoridade da Concorrência em violações do mercado da concorrência por abuso de posições dominantes e de dependência económica de sectores com posições monopolistas de mercado. Pergunto: entende que é reduzindo o orçamento da Autoridade da Concorrência que a vai fortalecer no sentido de poder corresponder àquilo que, em teoria, deveria fazer? Já agora, uma vez que os senhores não dão qualquer informação sobre o assunto, pergunto se vão concretizar, ou se estão a concretizar, as recomendações que a Autoridade da Concorrência, recentemente, colocou no seu relatório quanto às relações entre os fornecedores e a grande distribuição.
Gostaria ainda que os senhores me informassem»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem o tempo esgotado, agradeço que conclua.

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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, gostaria que nos informasse se um projecto de 150 000 € constante do orçamento do Ministério, destinado à minimização de danos causados por intempéries e incêndios, tem alguma coisa a ver com a reparação de prejuízos causados por incêndios florestais no Parque Nacional da Peneda-Gerês, fundamentalmente, no sector da indústria hoteleira.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, como sabem, a nossa grelha de tempos ainda prevê, nesta segunda ronda, intervenções de 2 minutos por Deputado, sendo a resposta do Governo dada, no fim, em conjunto.
A mesa regista as inscrições dos Srs. Deputados Nuno Reis, João Oliveira e Carlos São Martinho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, intervenho para recuperar uma matéria que foi abordada en passant pelo Sr. Deputado do Bloco de Esquerda e que tem a ver as mini-hídricas — Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2010.
O Governo prepara-se, ou, pelo menos, preparava-se, até final do mês de Outubro último, para lançar um concurso para a atribuição de concessões para mini-hídricas, o que vai fazer com que o prazo de concessão, relativamente aos concursos até agora existentes, passe da 30 para 45 anos e que o preço do megawatt a pagar pelo Governo passe de 85 € (salvo erro, era este o valor pago atç agora) para 95 €, durante um período de tempo alargado. Tudo isto, naturalmente, para conseguir obter o máximo de receitas no prazo mais curto de tempo. Ora, a questão que se coloca é de longo prazo.
Numa altura em que as empresas foram, no último mês de Agosto, confrontadas com o aumento do preço do gás natural, entre 10% e 20%, numa altura em que o sobrecusto com as renováveis continua a fazer da electricidade um factor caro para a competitividade das nossas empresas, este Governo prepara-se, precisamente, para acentuar um sobrecusto e «empurrar com a barriga para a frente» — passo a expressão — um custo que terá de ser pago por todos, as nossas empresas e as famílias, no futuro.
Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado, pergunto: consideram razoável, ao tentarem obter receitas a todo o custo e no mais curto espaço de tempo, estarem a contribuir para uma diminuição adicional da competitividade da nossa indústria?

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, começo por os cumprimentar, nesta vinda à Comissão, e com uma nota prévia, que tem a ver com a eficiência energética e a questão que o Grupo Parlamentar do PSD referiu, a falta de indicadores de eficiência energética.
Hoje, mesmo, é notícia nacional precisamente o facto de Portugal estar a cumprir bastante bem as metas a que se propôs, em termos de Plano Nacional de Acção para a Eficiência Energética (PNAEE).

Protestos do Deputado do PSD Nuno Reis.

Quanto a esta questão, há todo um conjunto de medidas, que estão a ser executadas, que nos leva a que, em 2015, se consiga atingir todos os objectivos a que nos propusemos. Mas consideramos interessante que o PSD se junte a outros partidos, no que respeita a esta questão da eficiência energética, porque entendemos que ela é, efectivamente, uma questão que deve unir todos os partidos em matéria de política energética.
O facto de colocarmos as renováveis na agenda dos portugueses é algo que neste momento existe graças aos governos do Partido Socialista. Penso que, nos próximos anos, devemos conseguir — e é importante que todos os partidos estejam unidos com este objectivo — fazer com que a eficiência energética seja efectivamente um desígnio na questão da política energética.
Sr. Ministro, por iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD, desde Setembro que ouvimos a Autoridade da Concorrência e, por sugestão de outros grupos parlamentares, que o PS iniciou, um conjunto de outras entidades da área que têm a ver com as características técnicas dos combustíveis e chegámos à seguinte conclusão muito clara: em Portugal, existem três tipos de combustíveis, em termos de gama e de

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características técnicas, e as petrolíferas, regra geral, comercializam apenas as caras e as muito caras, porque as que são de low cost, as de gama mais baixa, apenas são comercializadas, em regra, pelas grandes superfícies. O Presidente da Galp mostrou disponibilidade, no Parlamento, para colocar na agenda da empresa a abertura de postos low cost junto à fronteira, porque a verdade, Sr. Presidente, é que há entre Portugal e Espanha um fosso fiscal em matéria de combustíveis. Entendemos que esta é a oportunidade para uma empresa como a Galp assumir, desta forma, a sua responsabilidade social, para que os postos junto à fronteira possam ser menos desequilibrados, em termos de preço, do que acontece neste momento.

O Sr. Presidente: — Agradeço que termine, Sr. Deputado, pois tem o tempo muito esgotado.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, para concluir, quero dizer que sentimos, por parte da Galp, esta disponibilidade, em relação aos postos que estão, neste momento, em dificuldades, mas gostávamos de saber a opinião do Governo nesta matéria.

O Sr. Presidente: — Agora, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, aproveito a parte final desta ronda de perguntas para clarificar, logo à partida, um aspecto que me parece importante: V. Ex.ª, há pouco, quando me respondeu, sublinhou que, várias vezes, eu o tinha acusado de fugir às responsabilidades, coisa que nunca fiz.
Não foi isso o que eu disse, Sr. Ministro! Não usei essa expressão, nem nunca o fiz! O que eu disse foi uma coisa diferente: acusei-o de disparidade com a realidade económica e a realidade do País. É uma coisa diferente.
Em segundo lugar, o que eu disse foi que este Governo tem tido, essencialmente, uma política financeira e orçamental e tem-se visto pouca política económica. Portanto, V. Ex.ª está num Governo que tem uma política recessiva, que aumenta todos os impostos, que vai lançar o código contributivo sobre os cidadãos, com a responsabilidade da pasta da economia. Portanto, está fora da sua capacidade»! Não ç que V. Ex.ª queira fugir», não foi disto que o acusei, nem fui por aí! Se somarmos as declarações de V. Ex.ª com algumas das intervenções que ouvimos do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, bom, a disparidade então é absoluta, porque: é o primeiro no rating do não sei quê, é o sucesso energético não sei aonde, é o estamos a ganhar em mais não sei o quê»! Quer dizer, não fosse o «pequeníssimo pormenor« de o País estar á beira da falência vivíamos num mundo de sonhos, e este problema é que é a discrepância com a realidade! O que é que lhe digo? O extraordinário, Sr. Ministro, é um Governo, que tem essencialmente política orçamental, não ter, por exemplo, uma política fiscal selectiva para as preocupações que aqui nos traz!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Temos linhas de crédito!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Está bem, temos linhas de crédito! Tudo bem! Mas onde é que está uma fiscalidade selectiva para as empresas exportadoras? Onde é que está uma fiscalidade selectiva para as empresas de bens transaccionáveis? Onde é que está uma fiscalidade selectiva suficiente para o relançamento da economia e o crescimento económico? Objectivamente, não existe! V. Ex.ª, por último, diz-me «faz-me sempre as mesmas perguntas» diz sempre as mesmas coisas«! Ó Sr.
Ministro, quando V. Ex.ª responder mudarei as perguntas, mas, enquanto não responder às perguntas que lhe vou fazendo, é um bocado difícil! Mas, se quer que lhe dê exemplos, dou-lhos.
Perguntei (de resto, não fui o único a fazê-lo, o Grupo Parlamentar do PSD também já lhe perguntou várias vezes): tem objectivos para o QREN para 2011? Está bem, com os municípios conseguiu subir para 8% para 18%» Muito bem, mas estamos em 20% e a meio do prazo!

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Já perguntei sobre a questão dos têxteis do Paquistão. Chamei-o cá, não veio! A Comissão aprovou, por unanimidade, não veio! Perguntei-lhe no Plenário, perguntei-lhe hoje outra vez!

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Sr. Ministro, tem três respostas possíveis: «sim», «não» ou «talvez». Agora, enquanto não me der uma destas três respostas, não vou desistir da pergunta, como é evidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, em primeiro lugar, quero solicitar-lhe um esclarecimento sobre uma matéria que já aqui foi abordada e que tem a ver com a adesão de Portugal ao Acordo de Londres.
O Grupo Parlamentar do PCP, pelo menos desde 2008, tem levantado esta questão, porque, como sabe, o Acordo de Londres já há muito tempo está em vigor, já há muito que se colocava a possibilidade de adesão de Portugal a este Acordo, e há um duplo problema em relação à adesão ao Acordo de Londres, não só por causa da extinção da língua portuguesa como recurso tecnológico mas também por este acordo dificultar a possibilidade de registo de patentes em Portugal por parte das empresas portuguesas e, obviamente, acentuar o monopólio dos países onde os recursos tecnológicos e a acessibilidade ao registo das patentes são favoráveis. Portanto, até do ponto de vista da competitividade, que o Sr. Ministro e o seu Ministério tanto dizem valorizar, a adesão a este acordo é prejudicial ao País.
Em segundo lugar, Sr. Ministro, gostava que nos pudesse dar algumas informações sobre a execução dos projectos de interesse nacional no Alentejo, a criação dos postos de trabalho que estava anunciada e já agora também sobre as falências entretanto ocorridas e os projectos que ficaram a meio. Particularmente, no distrito de Évora há dois casos preocupantes de falências que entretanto ocorreram e de projectos que ficaram a meio com todas as promessas a esboroarem-se. Gostava que nos desse alguma informação sobre estes casos.
Por último, Sr. Ministro, passo à orientação que o senhor pretende dar à política económica no País.
Há bem pouco tempo, o Sr. Ministro participou numa festarola na CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional), em Évora — uma festarola de propaganda, obviamente, enquadrada numa campanha eleitoral — ,»

Risos do PSD e do CDS-PP.

» onde foram assinados contratos com nove promotores turísticos no Alentejo, para os quais o senhor anunciou que o Estado entregaria 15 milhões de euros, para a criação de 133 postos de trabalho.
Pergunto, Sr. Ministro: onde é que estão os 15 milhões de euros, quando é preciso apoiar empresas e quando estão em causa centenas de postos de trabalho? Numa Tyco, numa Kemet, nas empresas do Parque Industrial de Vendas Novas, incluindo a Edscha, estão centenas de postos de trabalho em causa sem que haja qualquer disponibilidade por parte do Ministério para intervir. Se há 15 milhões de euros para entregar a nove projectos de investimento turísticos, onde é que está a vontade do Governo para apoiar empresas do sector produtivo quando estão em causa centenas de postos de trabalho?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos São Martinho.

O Sr. Carlos São Martinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, já ouvimos esta tarde, por parte do Governo e do Partido Socialista, profusos auto-elogios ao aumento das exportações, ouvimos falar em números, como o aumento de 14% no último trimestre, em trimestres seguidos em crescimento, em subida de 28% para 32%. O Sr. Ministro referiu que não conseguiram atingir o objectivo de 40%. No entanto, já é uma inovação ter admitido tal facto.
Dado o crescimento anémico da nossa economia na última década, em particular nos últimos anos, o que este Governo também conseguiu fazer foi não só subir as exportações mas também causar a retracção ou a contracção da nossa produção e do nosso consumo interno na mesma proporção ou numa proporção superior, e sobre isto não ouvimos coisa nenhuma.
Na apresentação inicial, o Sr. Ministro referiu a aposta forte na internacionalização das empresas, anunciou milhões para as mesmas empresas, que estas dizem não ver.
Neste sentimento bipolar, como já aqui foi apelidado este Orçamento, o que se retira do terreno, isto é da economia real, é que o que este Governo conseguiu foi internacionalizar não apenas a economia mas também

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os consumidores para Espanha, já que conseguiu encolher a nossa fronteira económica em cerca de 35%, como já aqui foi dito, colocando em causa, com este facto, todo o esforço de sobrevivência das nossas empresas. A nossa fronteira económica andará em qualquer coisa como o que está reflectido neste meu mapa.
Como não ouvimos da sua parte nenhuma referência às zonas deprimidas, e não se vê neste Orçamento nenhuma verdadeira medida específica de apoio às empresas que tentam sobreviver nessas zonas, nomeadamente uma fiscalidade selectiva, como o Sr. Deputado Telmo Correia aqui já invocou, temo que, pela inércia deste Governo, com o aumento dos custos operacionais, o fosso fiscal com a Espanha, nomeadamente em sede de IVA e de imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP), bem como pelo custo superior do cabaz de bens de primeira necessidade, a nossa fronteira económica se expanda de 75 km para 100 km, com todas as consequências que isto trará para a nossa economia, ficando a nossa fronteira económica parecida com este mapa, que terei muito prazer em, no final, oferecer ao Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, os meus cumprimentos.
Sr. Ministro, apesar da conjuntura difícil que vivemos, as empresas do sector do turismo, pelos números que ainda hoje foram revelados, têm tido um aumento de dormidas de 7,8% e de proveitos de 6,6%, o que acontece, sem dúvida, devido à capacidade das empresas de não desistirem, de não se apegarem a este ambiente de depressão que, às vezes, raia aqui e que é promovido por alguns partidos da oposição.
No terreno, as empresas não desistem, estão empenhadas em manter os postos de trabalho e em lutar, o que é bem revelador de alguma dicotomia que existe entre alguns políticos e a economia real. Isto não se passa completamente à parte daquilo que tem sido a política do Governo para um dos sectores fundamentais, o sector do turismo, o qual tem forte impacto no desenvolvimento local.
Alguns partidos, como o PCP, ainda aqui dizem que o sector do turismo nada vale, até porque dizem que alguns investimentos colocados»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Seja séria!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Ainda noutro dia, promoveram a revogação dos projectos de potencial interesse nacional (PIN), por exemplo!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é desonesto!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Não, desonesto é não assumir as suas propostas!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço que não interrompa a oradora e que não use termos injuriosos.
Faça o favor de continuar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Portanto, este é um dos sectores fortemente exportadores, cujo peso em termos de exportações tem vindo a crescer, representando hoje 14,5% do total das exportações.
Em termos de diversificação de mercados, continua a ser necessário apostar em países de mercados emergentes, como o Brasil. Aqui não deixo de referir que a própria Europa tem algo a fazer no sentido de promover como se chegar à China. É que, Sr. Deputado Nuno Encarnação, não podemos alhear-nos do facto de a China representar um forte potencial, um forte mercado, que temos de saber aproveitar. Outra coisa é pura demagogia, desculpe que lhe diga.
Por último, quero acentuar uma questão de que o Sr. Ministro falou, o novo modelo de contratualização. Se possível, Sr. Ministro, gostaria que nos dissesse algo mais sobre isso.
No que diz respeito ao QREN, temos visto que estará para abrir um novo instrumento, ao qual haverá muitas empresas ainda a querem candidatar-se. Gostaria de saber quais são as expectativas do Governo, Sr.
Ministro.

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O Sr. Presidente: — Por último, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos, dispondo de 2 minutos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, quero colocar duas questões, uma de carácter nacional e outra que, embora também seja de âmbito nacional, tem implicação regional.
Relativamente às questões de defesa do consumidor, o orçamento mais pormenorizado que nos foi agora distribuído mostra uma diminuição no observatório e nas redes de apoio ao sobreendividamento. Tendo em conta as especificidades do momento e as reconhecidas dificuldades que existem, e que continuarão a existir, não nos parece muito correcta esta diminuição.
É assumido também neste mesmo relatório que se pretende assegurar um nível elevado de protecção e consolidar o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, mas, depois, as verbas para a protecção e os direitos do consumidor desaparecem, não há qualquer verba. A somar a isto duplicam as verbas de apoio ao Centro Europeu do Consumidor. Sr. Ministro, gostava de ouvir um comentário sobre esta matéria.
Outra questão tem a ver com a mina de Aljustrel. No final de 2008, faz agora dois anos, foi anunciada uma solução para o problema de Aljustrel e foram prometidos, na altura, 900 postos de trabalho. Até agora a empresa já recebeu 137 milhões de euros mas os postos de trabalho não estão cumpridos, a mina não está a laborar. Ora, era importante, para a população de Aljustrel, para o Baixo Alentejo e para o País, perceber em que estado está este assunto e que andamento terá.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento, dispondo de um tempo igual ao dispendido para o total das perguntas, ou seja, pode usar até 39 minutos.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, prometo que não vou submetê-los a esse sacrifício!» Já não respondo pelos Secretários de Estado, pois eles saberão o tempo de que precisam.
Gostaria de começar por me referir à questão do QREN.
Há uma realidade indiscutível. Os Srs. Deputados podem dar as voltas todas que quiserem ao discurso e à intervenção, mas uma realidade é indiscutível: o QREN teve um forte impulso ao longo do último ano. Se quiserem números posso demonstrá-lo: todos os trimestres, com excepção do trimestre que inclui o mês de Agosto — e mesmo assim a quebra foi quase nula — , pois é um mês em que há menos actividade, o crescimento global foi significativo relativamente ao trimestre anterior. E foi um crescimento sempre a taxas crescentes, o que não só nos dá garantias sérias e plenas de que vamos atingir a meta que tínhamos definido como nos dá uma grande segurança de que não vamos ter nenhum problema com a regra da guilhotina e que, no quadro temporal de execução do QREN, vamos utilizar efectivamente as verbas postas ao dispor do nosso País, sendo que vamos utilizá-las com a forte participação de agentes que são decisivos para o desenvolvimento, como os autarcas ou as empresas.
Ainda amanhã abrirá uma nova linha de crédito do QREN para as empresas, no valor de 278 milhões de euros, destinada precisamente às empresas exportadoras e com maior conteúdo em inovação e diversificação.
Isto é uma realidade. Os Srs. Deputados querem que fixe aqui uma meta para 2011, e rapidamente o faremos. Consideramos que ainda não estamos em condições plenas de fixar esses objectivos mas, como o fizemos relativamente a 2010, fá-lo-emos para 2011.
Sr. Deputado Nuno Encarnação, quanto à referência que fez e que não é inédita, relativamente à existência ou não do Ministro ou do Ministério da Economia — não sei — , se pensa que esse tipo de intervenções me causa qualquer perturbação, que fico mais nervoso, mais preocupado» Ó Sr. Deputado, preocupe-se como seu lugar na História que eu preocupo-me com o meu!» Esteja descansado!» Não ç isso que me move.
Poderão dizer o que entenderem que eu faço o trabalho que acho adequado e necessário num momento extremamente difícil, num momento em que as políticas económicas têm, de facto, fortes constrangimentos.
Sr. Deputado, não é aceitável que tenha feito um exercício relativamente à questão do crédito que, em termos muito simples, pode ser sintetizado da seguinte forma: confundiu o problema com as tentativas de lhe dar resposta. Quem o ouvisse e não conhecesse o País parecia que as linhas de crédito apoiadas pelo Estado

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eram o problema do crédito à economia. Não são, Sr. Deputado! O Sr. Deputado disse aqui que agora os bancos só emprestam quando há linhas de crédito. Não, Sr. Deputado! As linhas de crédito ajudam a que haja mais crédito para as empresas e, por isso mesmo, foram utilizadas, numa perspectiva histórica, desde o seu início, em mais 80 000 operações.
Como alguém dizia, não são os amigos do Governo, são uma grande percentagem, uma parte muito significativa do nosso universo de pequenas e médias empresas que utiliza esse instrumento. Não é um instrumento eterno, não pode ser, é um instrumento que tem de acabar. Eu desejaria que ele acabasse amanhã, que já não fosse necessário lançar a PME Investe VII, porque não acredito que este seja o modelo saudável de fazer chegar o crédito à economia. O modelo saudável é o sistema financeiro assumir essa responsabilidade, porém, neste momento, ele não está em condições de o fazer.
O que o Sr. Deputado parece querer propor é que cortemos um dos poucos instrumentos que fazem chegar crédito, embora com problemas, com dificuldades, com distorções. Como seria diferente, quando falamos de 90 000 ou de 80 000 operações? Como é que seria diferente? No entanto, é um instrumento fundamental, que tem apoiado muitas micro, pequenas e médias empresas, e isso é absolutamente decisivo.
Mas o mais espantoso — do PSD nada é espantoso — é ver o Sr. Deputado fazer aqui uma espécie de elaboração filosófica sobre a bondade das relações económicas de Portugal com outras zonas do mundo em função de algumas características dos seus regimes.
Sr. Deputado, acha que Portugal não deve incentivar as empresas portuguesas a exportar para a China? Sr. Deputado, sabe o que fazem os outros países europeus para auxiliar as suas empresas a exportar para a China? Acha que devemos ficar fora porque tem uma apreciação menos positiva? Sr. Deputado, não estou a reconhecer» …s tantas, parecia-me ouvir o Bloco de Esquerda, mas depois pensei «não, o BE não, porque, apesar de tudo, a China ainda não está suficientemente longe dos seus paradigmas».
Depois, o Sr. Deputado cita o Brasil, em alternativa?! O Governo pede meças a qualquer outro governo no trabalho que tem feito para reforçar os laços políticos, económicos e culturais com o Brasil! É um país em que temos reuniões regulares de promoção não apenas da relação entre Portugal e o Brasil mas da relação entre a União Europeia e o Mercosul, que é absolutamente decisiva para que aquilo que hoje é muito difícil para os nossos empresários — exportar para o Brasil — se torne mais fácil, porque é um mercado onde temos um enorme interesse.
Portanto, Sr. Deputado, não me parece que seja adequado à posição do PSD esse tipo de insinuações, que não ajudam nada à nossa economia.
Outra questão levantada mais uma vez é a dos salários. Gostava de ser absolutamente claro acerca dessa questão — e de todas as outras também, se for capaz.
Disse, e volto a dizer, que não acredito que a resposta aos problemas da nossa economia passe por uma utilização intensiva e generalizada de políticas salariais mais do que restritivas, como alguns defendem — não acredito! — , mas acredito na formação dos salários através dos processos de negociação colectiva e de diálogo social. É assim que acredito na formação dos salários, e sei que nesse modelo há espaço para diferentes realidades.
Saúdo — e quem é que não saúda, em Portugal? — o acordo celebrado entre a comissão de trabalhadores da Autoeuropa e a Autoeuropa, que teve o apoio de 90% dos trabalhadores, o qual conseguiu fixar objectivos de progressão salarial num ambiente de enorme dificuldade, mas também reforçou os instrumentos de flexibilidade laboral na empresa, como tem vindo a acontecer ao longo do tempo. É esse o caminho que defendo. Acho que é um caminho europeu, um caminho de progresso, é o caminho que Portugal deve prosseguir.
Nalgumas ocasiões, naturalmente, políticas salariais que não levem em conta as dificuldades da conjuntura transformam-se em problemas e não em soluções, porque vivemos numa economia aberta e não numa economia em que o mercado interno seja a explicação de tudo e mais alguma coisa.
Vivemos numa economia aberta e mesmo o mercado interno é fortemente internacionalizado nos nossos dias. Por isso mesmo, a prudência que as nossas empresas e os nossos sindicatos têm, em geral, demonstrado nas negociações é uma vantagem competitiva que temos de saber valorizar.
Relativamente à questão da energia, alguns Srs. Deputados — até, pasme-se, do próprio PSD, pelo menos muitos dos seus dirigentes e ex-dirigentes têm alguma tradição e apetência pelas energias renováveis — colocam a questão dos custos que estamos a lançar para o futuro.

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Sr. Deputado Nuno Encarnação, e os custos que estaríamos a lançar para o futuro se não fizéssemos a aposta que estamos a fazer nas energias renováveis? Não é «empurrar com a barriga para a frente» os problemas que virão de uma forma praticamente certa?! Em economia é muito difícil fazer previsões e ter certezas ainda mais, mas há uma quase inevitável: é aquela que tem a ver com uma evolução desfavorável nos termos de troca das economias dependentes do petróleo ou de outros combustíveis fósseis. Essa é uma quase inevitabilidade.
Melhores estarão no futuro os países e as novas gerações que se prepararem para essa alteração dos preços relativos às matérias-primas energéticas para melhor responderem à degradação dos termos de troca que os países importadores de petróleo têm tido e vão continuar a ter, se nada fizerem ao longo dos anos.
É certo que o papel da eficiência energética é decisivo, é uma fonte decisiva e que procuraremos exercer aí o nosso papel.
Acerca das empresas e do apoio às empresas, acho verdadeiramente espantosa a capacidade de elaboração «em cima do arame», em termos de consistência de raciocínio, que o PCP é capaz de fazer. Por um lado, vem perguntar onde estão os PIN; quando havia os PIN, estes eram uma ofensa aos interesses nacionais.
Agora, qualquer pessoa entende — não é necessário fazer uma pergunta, que, no entanto, registo e agradeço em comissão parlamentar — que muitos dos projectos turísticos tiveram processos de atraso significativo no seu desenvolvimento por via da crise económica, por via da quebra da procura, principalmente por via da quebra da procura imobiliária, como toda a gente sabe, mas dou essa resposta porque foi isso mesmo que aconteceu: os projectos turísticos, principalmente aqueles que tinham uma forte aposta imobiliária, tiveram dificuldades em se desenvolver; outros estão a desenvolver-se melhor. Mas essa é uma dificuldade.
Espero que, nomeadamente, as questões de financiamento sejam brevemente superadas para que esses projectos, em que acredito, no Alqueva ou no litoral alentejano, se desenvolvam tão rapidamente quanto possível.
Porém, pôr lado a lado o apoio aos investimentos turísticos — que acredito que o PCP não critica, naturalmente, e não o fez — que foram aprovados para o Alentejo com os apoios a empresas em dificuldade é não compreender nada do funcionamento da economia.
Sabe qual é o problema que se coloca relativamente aos 15 milhões de euros para algumas empresas do tipo daquelas — não quero aqui isolar empresas — que o Sr. Deputado referiu? É que atrás desses 15 milhões vêm outros 15 milhões e depois desses mais 15 milhões, e muitas vezes para empresas que não têm condições de sustentabilidade do ponto de vista estratégico e competitivo, ficando lá o dinheiro do Estado, o dinheiro dos contribuintes, não a promover aquilo que devem ser empresas sustentáveis, como acredito que são aquelas foram apoiadas no turismo no Alentejo. Não, Sr. Deputado! Não faremos uma política de colocar dinheiro em cima de problemas que não têm solução.
Se houver parceiros interessados na valorização das empresas, se houver sustentabilidade nos projectos de recuperação, muito bem, o Estado faz o seu papel. Não existindo»

O Sr. João Oliveira (PCP): — O problema não é esse! É mais fundo!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Os Srs. Deputados do Partido Comunista Português, que sabemos que tanto diaboliza o investimento privado, em particular dos grandes grupos e grandes empresas, quando há um pequeno ou médio problema numa qualquer dessas empresas privadas, são os primeiros a dizer para o Estado lá meter o dinheiro. Então, aí já não há problemas em meter o dinheiro ao serviço do capital?

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Na Aerosoles, por exemplo!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento — Sr. Deputado, um pouco mais de coerência não ficaria mal aos Srs. Deputados do Partido Comunista Português.
Finalmente — depois pedirei aos Srs. Secretários de Estado que me ajudem nas muitas perguntas que foram colocadas — , queria focar dois aspectos: no que se refere à questão da língua, embora não seja uma área tutelada directamente pelo Ministério da Economia, não temos qualquer problema em assumir, neste e

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em qualquer outro caso, as posições do Governo, que defenderemos sempre as condições, no funcionamento da União Europeia e em todas as suas instituições, que favoreçam a língua portuguesa e a defendam.
Mas defender a língua portuguesa também passa por saber defender as empresas portuguesas, no que respeita, por exemplo, ao acesso, à garantia dos seus direitos de propriedade, e isso exige, por vezes, se salvaguarde o essencial da defesa da língua e se construam mecanismos eficazes de protecção da propriedade intelectual, porque se estes não existirem só ganham aqueles que usam como língua própria as línguas mais influentes da Europa ou do planeta. É isso que temos de perceber e não uma posição meramente radical ou fundamentalista, que não nos leva nem a defender a língua nem a defender as empresas.
Para terminar, vou fazer uma referência à questão do comércio e à questão das grandes superfícies. Não gostaria de passar nesta reunião sem uma referência a esta questão.
Srs. Deputados, o que o Governo fez foi equilibrar uma situação que estava desequilibrada.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Essa é boa!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento — Não foi o Governo, com a decisão que tomou, que autorizou o funcionamento das grandes superfícies em todos os dias da semana. Já estava autorizado, já existia na generalidade das grandes superfícies. Havia concelhos, no nosso País, em que havia 50 grandes superfícies a funcionar e uma fechada, porque ultrapassava os 2000 m»

O Sr. José Gusmão (BE): — Então, não era uma grande superfície?!

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento — Era grande superfície, sim, Sr. Deputado! Isso revela apenas uma ausência de conhecimento do que é uma grande conhecimento. É apenas uma questão de falta de atenção ao problema, por parte do Sr. Deputado.
Esse desequilíbrio, a existência desses limites, nunca favoreceu o pequeno comércio, nunca foi a favor do pequeno comércio. Pode ter sido favorável a outras grandes superfícies, talvez um pouco mais pequeninas, que não tivessem 2001 m mas 1999 m. Mas isso não é algo que uma economia competitiva e equilibrada deva promover, porque é incentivar apenas um mero recurso, alguns truques, para ultrapassar dificuldades colocadas pela legislação. Mais vale assumirmos com clareza a legislação e o facto de a concorrência e a defesa do pequeno comércio terem outros instrumentos a que podem recorrer que não a essa falsa protecção, que é o referido desequilíbrio.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Energia e da Inovação.

O Sr. Secretário de Estado da Energia e da Inovação (Carlos Zorrinho): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, gostaria de fazer uma referência a um programa que está implícito em todo o Orçamento, um programa de inovação numa lógica moderna de programação política, que é muito importante.
Refiro-me à Agenda Digital, um programa que não está explícito num capítulo do Orçamento mas que é um programa de procura pública extremamente potente e que dá resposta a duas questões fundamentais: por um lado dá resposta à possibilidade de os nossos serviços públicos, tais como a saúde, a educação e a mobilidade, poderem fazer uma melhor oferta para os cidadãos com menos ou com os mesmos recursos, dando uma resposta adequada num contexto de contenção orçamental, permitindo, ao mesmo tempo, criar soluções, que são exportáveis, de inovação, para aumentar a nossa dinâmica de exportação. Penso que é o tipo de programa de inovação transversal que gostaria de sublinhar.
Em relação à energia, o que, de facto, se tem verificado é que a estratégia nacional de energia que foi apresentada neste Parlamento tem vindo a ser rigorosamente implementada e tem vindo a constituir um dos maiores factores de estabilidade e crescimento na economia portuguesa, seja no domínio hídrico, como também nas centrais mini-hídricas.
O Sr. Deputado diz que as mini-hídricas têm agora um quadro mais favorável do que tinham. Pergunto-lhe: quantas mini-hídricas foram construídas com o quadro anterior? E porque é que não foram? Não são as minihídricas importantes para o desenvolvimento regional, para o desenvolvimento de proximidade, para o

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combate de assimetrias? O quadro foi adequado para que seja possível construi-las, porque construi-las é muito importante para o desenvolvimento do País.
Também ao nível do equipamento eólico e solar, o processo legislativo da microgeração demorou demasiado tempo a sair, reconheço, mas está cá e vamos criar condições para minimizar o impacto desse atraso no processo legislativo, porque a aprovação em Conselho de Ministros foi feita 15 dias depois de eu ter vindo ao Parlamento, tal como foi referido.
A abertura do concurso das centrais fotovoltaicas estava previsto na Direcção Geral de Energia e é este o momento certo — refiro-me às fotovoltaicas de proximidade, para estarmos sempre na liderança do domínio tecnológico neste sector.
O Sr. Deputado falou em sobrecustos. Não podemos falar de sobrecustos sem falar de sobreganhos, sem falar de saldo. O saldo é, claramente, favorável, mas também não quero deixar de referir que se há uma variável que, de facto, subiu muito no último ano, foi a variável dos custos da co-geração. Isso decorreu do facto de o Parlamento, legitimamente, ter alterado a proposta do Governo, o que causou um sobrecusto de mais de 200 milhões de euros. É evidente que também teve os seus sobreganhos, mas é preciso referir isso dessa forma, porque aí é que esteve o grande desvio em relação ao que estava previsto.
Também desenvolvemos um novo quadro para a biomassa, muito similar ao das mini-hídricas, e também para a zona piloto das ondas. Temos de criar condições para que se faça, pensamos que agora se vai fazer, como também ao nível das energias tradicionais, porque Portugal está a investir fortemente quer ao nível da refinação quer ao nível do armazenamento de gás.
Ao nível da eficiência energética, foi já aqui referido o problema da eficiência energética na Administração Pública e também o Mobi.e.
Quero ainda referir — porque não pretendo tirar o tempo aos meus colegas — dois pontos muito importantes. O primeiro tem a ver com a transparência dos mercados.
Há muito tempo que se pretende criar o Operador do Mercado Ibérico de Energia, o OMIP, e o MIBEL (Mercado Ibérico de Electricidade).
A garantia de potência é uma das condições, assinadas entre o Estado português e o Estado espanhol, para que seja possível criar o mercado ibérico. Essa garantia de potência é que vai permitir que as nossas empresas possam concorrer em pé de igualdade com as empresas espanholas para que haja um mercado global, o mercado ibérico, e que esse mercado global permita reduzir os custos, paralelamente à concorrência.
Ou se acredita que a concorrência reduz os custos ou não se acredita. Mas este é o elemento racional dessa decisão.
Quero também dizer, porque não foi referido e acho que isso é muito importante, que tivemos pela primeira vez a coragem de dizer que há riscos de volatilidade nos preços. As renováveis reduzem os riscos de volatilidade nos preços, mas há sempre riscos.
Algumas famílias não podem estar sujeitas a esse risco, por causa do acesso, e, por isso, criámos a tarifa social, paga pelos electroprodutores, que vai atingir 1 milhão de portugueses, mais de 600 000 famílias, facto que acho importante referir.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.

O Sr. Secretário de Estado do Turismo (Bernardo Trindade): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou começar por responder à bancada do PSD, dizendo que concordamos com uma posição aqui expressa por uma Sr.ª Deputada do PSD. De facto, os números do turismo são bons, os números que hoje foram dados a conhecer pelo INE reflectem esta trajectória de recuperação depois de um ano objectivamente difícil como foi o ano de 2009, mau para as empresas, mau para a criação de riqueza e para a manutenção de emprego. Mas, sobretudo, este ano de 2010 tem reflectido uma trajectória importante de recuperação e os números do mês de Setembro reflectem-na. É importante sublinhar esse aspecto nesta discussão.
Em termos das regiões do País, apenas a Região Autónoma da Madeira, por força das circunstâncias de Fevereiro passado, não iniciou ainda esta trajectória de recuperação, o que espero que possa vir a acontecer, porque, como a Sr.ª Deputada sabe, o contributo do turismo para a riqueza regional é substancial.

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Em relação ao modelo de promoção turística, queria dizer que está prevista nesta proposta de Orçamento a sua revisão, vai haver um novo acordo de promoção turística para o ano de 2011 (e espero que nos anos seguintes também), tal como estava previsto anteriormente.
O actual modelo vigorou entre 2007 e 2009. Decidimos, em interacção com o sector, prolongá-lo por mais um ano, pois, como sabe, houve eleições legislativas no ano passado e não queríamos prejudicar o regular funcionamento da actividade turística em resultado de alguma instabilidade que pudesse decorrer do processo eleitoral.
O novo acordo de promoção turística, no essencial, sendo um modelo de continuidade relativamente ao existente, mas vai procurar, sobretudo, estar ainda mais virado para as empresas e responder ao anseio legítimo de algumas das regiões do País, nomeadamente a região de onde a Sr.ª Deputada é originária, no sentido de que este modelo deve, sobretudo, garantir que a utilização das verbas que estão disponibilizadas por parte do Turismo de Portugal possa, efectivamente, ser conseguida por mais empresas, olhando para a dimensão do tecido empresarial, e uma maior flexibilidade na utilização das verbas.
Penso que estes objectivos vêm, no fundo, responder àquelas que são as expectativas do sector empresarial.
A Sr.ª Deputada traz-nos novamente a discussão em relação às campanhas de turismo interno, procurando, no fundo, colher méritos para a bancada do PSD relativamente à trajectória.
Devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que, se há méritos nos números positivos relativos ao comportamento do turismo interno, isso resulta claramente de uma estratégia, que é uma estratégia consolidada há vários anos, de valorizar Portugal enquanto destino turístico. E, nesse particular, penso que os portugueses responderam afirmativamente ao desafio que lhes tem sido lançado desde há três anos, sobretudo para que visitem o seu País e tenham a capacidade de fruir as belezas do seu País, garantindo, sobretudo, que a nossa base exportadora, uma vez que essas despesas provêm não só do exterior como também de um consumo que pode ser gerado internamente, possa, de facto, acontecer.
A Sr.ª Deputada questiona-nos também em relação ao novo portal Visite Portugal. O portal Visite Portugal já existe, mas, no fundo, vai ser readaptado um pouco àquelas que são as exigências internacionais, utilizando, sobretudo, as novas tecnologias como instrumento de «venda» do nosso País. Vai seu um portal mais interactivo, mais próximo do consumidor, utilizando as redes sociais como um instrumento de comunicação do nosso País, sobretudo porque, hoje, temos de ter a noção clara de que a nossa abordagem e a importância crescente que esta actividade económica vem tendo deve-se, sobretudo, também a uma capacidade mais competente de «vender» o nosso País.
Uma palavra também relativa à revisão do Plano Estratégico Nacional do Turismo, que a Sr.ª Deputada referiu. Se este Plano teve, de facto, um mérito, foi o de ser o primeiro plano a médio e longo prazo transversal ao sector e com capacidade de definir metas claras relativas aos objectivos a atingir e, um pouco, as áreas e os produtos turísticos a desenvolver.
Mas, tal como está definido no decreto-lei que o criou, há, passados três anos da sua implementação, um momento em que este Plano Estratégico Nacional do Turismo deve ser revisto, para ser adequado às circunstâncias do momento.
Portanto, o esforço que fazemos orçamentalmente é o de criar as condições para que essa revisão aconteça, uma vez mais, como aqui referimos e como, no início, foi bem conseguido, em perfeita articulação com o sector. E, nesse particular, as regiões e as empresas vão ser chamadas a opinar e a interagir neste processo.
Finalmente, uma palavra para a Sr.ª Deputada Hortense Martins, relativamente às suas preocupações com os mercados de diversificação. O Sr. Ministro já referiu mas eu gostaria de sublinhar a importância crescente que o Brasil, como mercado estratégico, vem assumindo para o nosso País, com mais de 60% do crescimento nas receitas, resultado de uma belíssima parceria com a nossa companhia de bandeira, que permite que mais de 70 frequências semanais possam acontecer para esse país, aproveitando uma dinâmica económica que hoje é manifesta naquele país e que o nosso País, em circunstância alguma, pode desperdiçar.
Uma palavra ainda relativamente à China. Tivemos, no passado fim-de-semana, o seu presidente em Portugal, numa visita oficial, com o qual assinámos um acordo de parceria. Temos hoje, resultado de um acordo de code-share, uma ligação com este país, através da venda de códigos comuns entre a Air China e a

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TAP, e espero que a curto prazo possamos ter, de facto, uma ligação aérea directa, que cumpriria o objectivo de fazer crescer este mercado, de forma clara, para o nosso País.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor.

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor (Fernando Serrasqueiro): — Sr. Presidente, iria começar por responder à questão colocada pelo Sr. Deputado Telmo Correia sobre os têxteis do Paquistão, mas, como ele não está, aguardo que chegue para lhe responder à questão colocada, uma vez que ele disse que não tinha sido respondida.
Sr. Deputado Hélder Amaral, no que diz respeito à questão que colocou respeitante ao MODCOM, permitame, antes de lhe responder directamente à sua questão, que lhe diga o que é o MODCOM. Trata-se de um programa sem inscrição orçamental e sem apoio do QREN, que resulta do pagamento dos licenciamentos das unidades comerciais, cujo valor, depois, é transferido para apoio às pequenas unidades.
Ora, este Programa tem limites: um primeiro, o limite da cobrança, e um segundo, que foi aprovado em 2004, e não por estes governos, que diz que tem de ter uma aplicação em função da origem dos fundos, o que quer dizer que, se houver mais cobranças no norte, haverá mais aplicações no norte e que se houver menos cobranças noutra região qualquer, terá menos aplicação nessa mesma região.
Portanto, estamos a cumprir integralmente o que se encontra determinado, tendo já disponibilizado 114 milhões de euros, apoiando 4046 projectos e criando 5507 postos de trabalho.
Este programa tem sido muito utilizado, como diz o Sr. Deputado e eu confirmo, o que tem levado a que alguns projectos elegíveis não tenham sido seleccionados. O que acontece é que a nossa opção tem sido, em vez de abrir um único concurso com o total das verbas envolvidas, abri-lo em várias fases, tendo já sido lançadas cinco fases. Em cada fase podem concorrer os projectos elegíveis que não tenham sido contempladas nas fases anteriores. Isto quer dizer que pode acontecer que haja projectos que numa fase não foram elegíveis, embora aprovados, que se candidatem na fase seguinte.
Creio que a única divergência que apontou foi a de que havia projectos seleccionados que não tinham sido contemplados. Se é esta a nossa única divergência, a 6.ª fase vai suplantá-la, porque vai ser exactamente como o Sr. Deputado disse. Portanto, nesta matéria, creio que vamos evitar qualquer divergência com a bancada do CDS, porque a 6.ª fase vai ser dirigida aos projectos seleccionados que não foram contemplados.
Temos, portanto, o problema resolvido na próxima fase, que, dentro de poucos dias — esteja atento — vai ser lançada.
No que diz respeito ao Sr. Deputado Telmo Correia, que, entretanto, chegou»

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Estou aqui há horas! Só fui lá fora e voltei!

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — Sr. Deputado, eu já lhe quis responder mas não estava e tive o cuidado de esperar.
Relativamente ao Paquistão dispenso-me, Sr. Deputado, de fazer a cronologia que fizemos, há dias, na comissão e, portanto, como lá lhe disse»

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Só pedi o desenvolvimento!

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — Exactamente! Então, posso dar-lhe os últimos desenvolvimentos que decorreram, suponho — e já não me lembro do dia em que estivemos na comissão — , naquele dia ou no dia seguinte.
A presidência belga apresentou ao Comité de Política Comercial uma nova proposta, que se aproxima mais das posições de Portugal e de outros países, no sentido de colher a nossa aprovação. Essas alterações são, muito sinteticamente, as seguintes: redução dos três anos da derrogação para dois anos, portanto uma nova proposta; a introdução de mecanismos de fixação de contingentes, para 2012, para os produtos cuja importação, em 2011, aumentem mais do que 20%; a introdução de uma cláusula de salvaguarda; a introdução de um mecanismo de vigilância e a introdução de algo que era importante para Portugal, isto é, de

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uma exigência ao Paquistão de se abster de implementar restrições às matérias-primas que exporta, que, como sabe, são compradas por Portugal para os têxteis.
Continuamos a reafirmar a nossa posição anterior, dizendo que estas posições ainda são insuficientes, e neste momento já somos acompanhados pela Espanha, pela Polónia, pela França e pela Itália, que nos deu a ideia de que estará próxima de um consenso com o outro grupo dos países que já se encontram satisfeitos com as posições.
Portugal tem vindo a reafirmar as posições anteriores relativamente aos códigos pautais, que são poucos, mas sobre os quais temos vindo a pôr ainda exigências no que diz respeito à sua retirada, e temos posto o acento tónico nas contingências pautais para os produtos sensíveis, com início em 1 de Janeiro de 2011, e na introdução de um sistema de duplo controlo para os restantes produtos. Temos vindo a insistir nisso e espero que, nos próximos dias, possamos ter mais alguma evolução.
Portanto, como vê, com a insistência de Portugal e de outros países, que já citei, temos tido oportunidade de fazer aproximar algumas posições daquelas que defendemos.
Sr. Deputado Agostinho Lopes, relativamente às agências funerárias, o que lhe posso dizer, porque talvez tenha estado distraído, é que, ainda antes da saída desta última legislação, já havia, segundo suponho, seis casos de concessão — e não lhe chamo de privatização, porque o Sr. Deputado normalmente utiliza isso quando há uma concessão de exploração feita pelas autarquias — para a exploração de seis cemitérios. O que significa que não foi esta legislação, porque já existia legislação»

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Era ilegal! Existia ilegalmente!

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — Ó Sr. Deputado, se quiser ir a Elvas e a outros sítios, eu indico-lhos, onde, pelo conhecimento que tenho das autarquias, as populações estão satisfeitas.
Quanto à questão da diminuição do orçamento da Autoridade da Concorrência, Sr. Deputado, pela legislação que conhece, a Autoridade da Concorrência não é financiada pelo Orçamento do Estado, é financiada, como sabe, pela comparticipação dos diferentes reguladores e por receitas próprias. Portanto, alguma flutuação que possa existir tem a ver com as receitas próprias, que decorrem das decisões judiciais, e também, naturalmente, com o facto de ela estar enquadrada nas medidas que foram tomadas relativamente à redução dos vencimentos em 5%.
Sr. Deputado, as verbas para a política de defesa do consumidor não se resumem a isso, pese embora sejam também contempladas por todas as restrições que conhece, designadamente ao nível dos vencimentos.
Elas irão ser utilizadas, sobretudo em 2011, por um fundo que temos vindo a criar, cuja utilização tem de ter alguma cautela no que respeita às cauções dos alugueres de contadores e de outras matérias que tiveram a ver com a acumulação desses valores. Iremos utilizar, em 2011, verbas significativas para uma área que, normalmente, não tem verbas muito importantes.
Por isso, quero dizer-lhe que, fora do âmbito orçamental, com a utilização de um fundo que já foi criado, podemos vir a utilizar essas verbas.
Ouvi aqui falar na Venezuela e sobre as nossas relações com a Venezuela. Em relação a isso, quero deixar aqui um dado muito significativo: em 2005, as nossas exportações para a Venezuela eram de 17 milhões de euros, no último ano fechámos com 120 milhões e este ano esperamos chegar, porventura, muito mais além. Temos aqui um bom exemplo em como a diplomacia económica pode ter incidência sobre as nossas exportações.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e do Desenvolvimento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e do Desenvolvimento (Fernando Medina): — Sr.
Presidente, no minuto e vinte segundos que me restam, gostava de deixar aqui apenas três notas muito breves.
A primeira diz respeito aos seguros de crédito, que foi uma questão colocada pelo Sr. Deputado Hélder Amaral. A primeira notícia que o Orçamento do Estado traz relativamente aos seguros de crédito é manter este

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importante instrumento nas modalidades que existem, com ajustamentos, de forma a torná-lo mais prático e efectivo.
Este instrumento funciona sem discriminação relativamente às companhias seguradoras, com excepção de uma, que resulta da própria natureza de uma das intervenções do seguro de crédito, que tem a ver com o facto de só existir uma companhia de seguros a prestar este tipo de operações para fora da OCDE, que é a COSEC. Relativamente às áreas em que funcionam as várias companhias de seguros, não há qualquer discriminação, tendo o Estado protocolos com todas elas.
Quero dizer-lhe que, até agora, o volume global das coberturas apoiadas por este instrumento foi superior a 1600 milhões de euros. Isto é: houve 1600 milhões de euros de exportações portuguesas que aconteceram e que poderiam não ter acontecido se este instrumento não existisse.
A segunda nota é relativamente ao PSD e tem a ver com as linhas de crédito. O Sr. Ministro já disse o fundamental, mas eu quero dizer que a importância deste instrumento é hoje totalmente reconhecida e que, até este momento, foram aprovadas de 80 000 operações,»

O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Foram 60 000, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e do Desenvolvimento: — » num valor superior a 7200 milhões de euros de crédito disponível e, como o Sr. Ministro também referiu, a abertura da nova linha de crédito, que será feita ainda durante este ano.
O último ponto que eu também queria referir é relativo ao QREN e apenas peço 30 segundos para me pronunciar sobre ele. A evolução do QREN tem sido, no geral, positiva, com o seu crescimento sucessivo ao longo dos vários trimestres. É um crescimento feito a taxas crescentes, isto é, a um ritmo que tem aumentado ao longo do tempo, o que nos vai permitir, seguramente, fazer com que o ano de 2010 seja um dos anos com maior absorção de fundos comunitários, dos últimos anos conhecidos. Será difícil dizer se será o maior mas, seguramente, será um dos maiores. Neste momento, está assegurado que isso vai acontecer.
Relativamente às empresas, é necessário reforçar não só a importância da estratégia para a aceleração do investimento do QREN. Quando, em Julho, apresentámos aqui, na Assembleia, o pacote das 12 medidas de aceleração do investimento empresarial no QREN, cerca de 30% das empresas que tinham projectos aprovados aderiram à oportunidade da reestruturação de projectos e possibilidade de acesso à linha QREN Investe, cerca de um terço das empresas aceitou o repto da reformulação e recalendarização dos projectos e, por isso, dispomos hoje de uma base muito mais segura e capaz de acelerar a execução do QREN.
Como o Sr. Ministro já referiu, amanhã mesmo irão abrir quatro novos concursos de acesso ao QREN, num investimento total de 278 milhões de euros de apoio, disponibilizados amanhã, concentrados essencialmente nas empresas exportadoras, seja na dimensão de apoio ao investimento produtivo, seja na dimensão de investigação ao desenvolvimento, seja na dimensão de promoção. Por isso, há quatro novos concursos, com o QREN, continuando a apoiar a economia.

O Sr. Presidente: — Passamos à terceira ronda de perguntas, que serve de conclusão, em que também cada Grupo Parlamentar dispõe de 3 minutos. O primeiro orador será o Sr. Deputado Almeida Henriques, a quem dou a palavra.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Sr. Presidente, cumprimento-o, bem como o Sr. Ministro e os Srs.
Secretários de Estado.
Nestes 3 minutos de encerramento, Sr. Ministro, quero dizer-lhe que, de facto, já não nos espanta a falta de criatividade do Governo para dar a volta à situação. A verdade é que se olharmos para as três bandeiras que o Sr. Ministro, hoje, nos trouxe aqui, no âmbito do orçamento para a economia, encontramos, desde logo, o fundo de 250 milhões que já era a «bandeira» do Governo há um ano e que não chegou a ser concretizado. É, portanto, uma medida perfeitamente requentada, que não tem estado ao serviço da economia.

Vozes do PSD: — Exactamente!

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O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Depois, encontramos aqui um erro persistente, Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor. Lamento que Portugal já tenha gasto 114 milhões de euros do fundo do comércio para efeitos do MODCOM — Sistema de Incentivos a Projectos de Modernização do Comércio.
É grave que o Governo não avalie, em cada momento, o efeito das suas políticas. Sr. Secretário de Estado, anda há seis anos a persistir no mesmo «remédio» e o resultado está à vista. Vejam como está o comércio tradicional, como estão os centros históricos, vejam o resultado que teve a aplicação deste dinheiro no comércio, Sr. Secretário de Estado.
Portanto, foi mais uma medida que não surtiu efeito do ponto de vista do mercado.
A terceira medida que o Sr. Ministro aqui veio anunciar: PME Investe VII. Independentemente dos méritos que possa ter este programa — e nós nunca deixámos de reconhecer alguns méritos, porque, efectivamente, nesta fase ajuda às empresas a poderem aceder ao mercado e não pagarem juros tão altos, designadamente ao nível dos spreads — , a verdade é que estamos a falar de 52 000 empresas apoiadas num universo de 360 000 empresas, mais os microempresários, os agricultores, os comerciantes que ficam fora desta medida.
Portanto, do ponto de vista do acesso ao crédito, Sr. Ministro, o resultado é que, de facto, há algumas empresas beneficiadas, mas a esmagadora maioria dos microempresários, comerciantes e agricultores ficou claramente de fora.
Por outro lado, o Governo não demonstra criatividade, Sr. Ministro. As empresas vão continuar, com este orçamento. Repare: num momento «de vacas magras» o que esperávamos era focalização e concentração dos recursos escassos. Ora, não é isso que encontramos. O que verificamos aqui é que as soluções dos financiamentos às importações, por exemplo, das empresas que trabalham para as exportações, ou seja, as empresas que importam as suas matérias-primas continuam a não estar contempladas e têm dificuldades imensas. Ainda no sector têxtil, por estes dias dizia-se que há potencial maior para exportar e que as empresas não conseguem o financiamento às matérias-primas, o que de imediato lhes dificulta a sua vida.
O Fundo para a Internacionalização das Empresas Portuguesas vai no sétimo ou oitavo anúncio sem concretização. Os benefícios fiscais à internacionalização ainda não têm formulário — há mais de um ano que esperamos por esse formulário. No domínio do financiamento às empresas, é verdade que temos o PME Investe, mas, mais uma vez, o Governo não demonstra criatividade. Ainda o meu colega, Deputado Nuno Reis, há pouco, falava na questão da central de compras do Estado. Há medidas, Sr. Ministro, que não precisam de dinheiro; precisam, isso sim, que se esteja atento a que as coisas estão a correr mal. Porque, repare, a Agência Nacional de Compras Públicas, EPE — temos vindo a denunciar isto há muito tempo — , está a ir no sentido errado, pois está a pôr de fora tudo o que são micro e pequenas e médias empresas. Era uma forma de poder ajudar estas micro e pequenas empresas.
Por isso, Sr. Ministro, à laia de conclusão deste debate na especialidade, a verdade é que o Governo demonstra completamente a sua falta de criatividade para dar a volta à situação neste período de crise. Não focaliza as suas políticas, não tem soluções, não tem estratégia para a economia portuguesa. É essa, efectivamente, a conclusão a que podemos chegar aqui. Por mais que o Sr. Secretário de Estado e o Sr.
Ministro venham aqui esgrimir resultados estatísticos, a verdade é que está aí e as empresas continuam a não ter as soluções. No caso concreto do comércio, depois de 114 milhões de euros investidos, está no estado em que sabemos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, queria começar por uma nota prévia em relação à intervenção do Sr. Deputado Almeida Henriques, dando conta que, na minha percepção, o que os portugueses esperam, quando assistem aos debates na Assembleia da República é que, mais do que apontarmos aquilo que possa, eventualmente, ter corrido mal é dizer, claramente, às pessoas quais são as soluções.
Penso que, hoje, nesta reunião, o Governo apresentou aqui propostas que quer concretizar e que vão precisamente no caminho certo. Já falou — falou o Sr. Deputado Almeida Henriques — na linha de apoio às PME, falou na linha de apoio às exportações, mas considero importante referirmos a indicação de que o

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QREN está em bom ritmo de execução e que chegará aos 20% do QREN. Isto foi anunciado pelo Sr. Ministro, hoje, nesta reunião.
Também a questão da agenda digital, que foi aqui muito bem referida — e que não tinha sido referida anteriormente, em nenhuma das intervenções dos grupos parlamentares — pelo Sr. Secretário de Estado da Energia e Inovação, é um ponto essencial em que devemos centrar a nossa acção política na área económica.
Voltando àquilo que o PSD disse, há pouco, numa das intervenções, e quando falava na dúvida que tinha, que é uma dúvida que tem desde que a actual liderança do PSD tomou conta do partido, tem a ver precisamente, com a questão da dúvida quanto às renováveis. Gostava de lembrar ao Grupo Parlamentar do PSD que, hoje mesmo, a Agência Internacional de Energia anunciou que os combustíveis fósseis recebem cinco vezes mais subsídios do que as renováveis. Ora, Srs. Deputados, quero dizer-lhes o seguinte: Portugal não tem combustíveis fósseis. Portanto, se Portugal aposta nas renováveis faz o que tem de fazer e fá-lo em nome do futuro e dos nossos filhos.
Penso que isso é algo que faz falta no discurso político, é algo que faz falta que seja discutido a sério na Assembleia da República.
O PSD, aparentemente, já deixou de lado a questão do nuclear, mas ainda há pouco tempo falava sobre isso. Ora, não consigo perceber as dúvidas do Partido Social Democrata em relação às renováveis. Julgo que deverá haver alguma discussão interna relativamente a essa questão. Se há algo que deve unir todos os partidos políticos tem precisamente a ver com duas áreas: a área da energia — Portugal, não tendo combustíveis fósseis, deve apostar claramente nas renováveis — mas também a área das exportações, na qual os Srs. Deputados reconhecerão que, se esquecermos o ano de 2008, ano em que houve o pico da crise internacional, tivemos sempre um crescimento bastante grande. E o dado de hoje é o de que as exportações em Portugal, no último trimestre, cresceram 15%. E é um dado relevante, com o qual a Assembleia da República se deve congratular.
O Sr. Ministro referiu também um ponto positivo, no qual também devemos reflectir, e o Grupo Parlamentar do PS queria associar-se a esse ponto»

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que abrevie, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que o que se passou na AutoEuropa é um sinal de que os portugueses podem, desde que organizados e desde que façam todo o «trabalho de casa» — e os partidos políticos também devem fazer esse trabalho — , atingir a excelência.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos agora ao CDS. Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero registar também que — não era obrigatório, mas fazendo minhas as palavras da bancada do Partido Socialista — quem ouve e lê este orçamento verifica que não tem política económica e que é um orçamento recessivo. Ora, era fundamental aproveitar o dia de hoje para dar uma esperança ao clima económico, ao clima de confiança. Fica aqui a versão germânica do Partido Socialista, em que tudo corre bem, e uma versão muito lusitana, em que nem tudo corre bem. Também não quero ter aqui um discurso pessimista e, portanto, gostaria que o Sr. Ministro pudesse responder às questões políticas que o meu colega Telmo Correio formulou,»

O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Catastrofistas!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Acredito que não queira contribuir para a confusão e para a trapalhada que refere o seu colega de partido António Vitorino ou aquilo que diz o próprio Ministro das Finanças e que sejam matérias incómodas, difíceis de clarificar.
Também fiz uma pergunta, que não tem directamente a ver com orçamento, mas com um aspecto positivo que realçamos e que é o aspecto das energias renováveis, ligado ao sector do petróleo. Perguntei porque é que no gás (e não estou a falar em défice nem energético nem do gás, nem electricidade) há instrumentos que dão corpo à estratégia do Governo para o sector e, quando chegamos ao subsector petróleo, desde 2006, os

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regimes jurídicos e os instrumentos regulamentares que permitem que, com esse mercado, também possam funcionar, não há, ainda, até hoje, nenhum instrumento legislativo capaz de potenciar também a criação de riqueza, de emprego e, porventura, até de maior concorrência, tornando com isso, eventualmente, os preços de combustíveis e seus derivados mais baixos, o que seria uma ajuda fundamental às empresas nos seus variadíssimos sectores.
Tenho amizade e simpatia pelo Sr. Secretário de Estado do Turismo e, portanto, julgo que foi por esquecimento que não me explicou o significado de no orçamento existir a rubrica «estudos de planeamento estratégico» com a verba atribuída de 36 milhões, ligados ao cluster do turismo de lazer, quando eu pensava que o turismo de lazer estaria junto de todos os outros pólos e englobado nas verbas previstas para formação externa e interna. Portanto, isto está separado no mapa e eu gostava de perceber exactamente o que é que é — se é uma verba para utilização, sabe-se lá onde, ou se é algo inovador neste estudo de planeamento estratégico» Quando se fala em estudo de planeamento estratégico, se o turismo até apresenta resultados positivos e objectivos de alguma forma razoáveis, cresce a curiosidade» Portanto, eu gostava que me pudesse dizer alguma coisa sobre essa matéria.
Por outro lado, sabemos como é criado o MODCOM e para que é que ele serve na ajuda ao pequeno comércio. Não fiz nenhuma referência nem quis discutir a consequência de abertura ou não das grandes superfícies ao domingo. Registei apenas que havia o compromisso de o Governo só tomar essa medida após estudos e, portanto, foi o que feito na altura em que o Partido Socialista votou contra uma proposta do Partido Social Democrata exactamente no sentido da abertura das grandes superfícies ao Domingo. Os estudos foram feitos? Onde é que eles estão? O que fez com que o Governo mudasse? Quanto ao conteúdo da matéria em causa, noutra sede discutiremos os seus méritos.
Como o Sr. Secretário de Estado também não foi tão longe como eu gostaria, pergunto-lhe»

O Sr. Presidente: — Agradeço-lhe que abrevie, Sr. Deputado.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente, perguntando ao Sr. Secretário de Estado quais eram a amplitude e os critérios da Iniciativa MERCA acoplada ao QREN. Como o Sr. Secretário de Estado não respondeu a isso, renovo-lhe a pergunta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, em jeito de conclusão destas mais de três horas e meia de debate, direi que percebemos que o anúncio de linhas de crédito, de novas formas de agir do Governo, no dia de hoje, não é mais do que uma tentativa de fazer «prova de vida» de um Ministério que muitos já consideravam defunto» E não são mais também do que meros «grãos de areia» que se atiram para os olhos dos portugueses, porque o que este orçamento diz, clara e duramente, para a realidade económica do País é que teremos recessão e mais desemprego no próximo ano.
Devo dizer que o Sr. Ministro, ao longo desta tarde, legitimou situações como, por exemplo, aquela da Peugeot-Citroen, de Mangualde, onde, através de um despedimento colectivo, a empresa conseguiu reduzir os custos unitários de trabalho pondo os seus trabalhadores, os mesmos trabalhadores, no mesmo posto de trabalho, no mesmo horário e nas mesmas tarefas, a ganharem menos 200 € em salários que já eram baixos!! Mas a mesma argumentação serve para legitimar aquele despedimento colectivo que Américo Amorim fez, em Janeiro de 2009, apesar de, nesse ano de 2009, ter apresentado milhões de euros de lucro e apesar de, em 2010, ir apresentar dezenas de milhões de euros de lucro.
Em função da crise que se avistava, Américo Amorim dizia que ia afectar a empresa, mas, na prática, tratou-se de um despedimento colectivo que permitiu ainda dar mais milhões de lucros àquele que já é o homem mais rico de Portugal.
É esta a justiça das políticas económicas do PS. É esta a visão que o PS tem da economia. É esta a visão do Governo para a distribuição do rendimento.
Neste minuto e 10 segundos que me resta, eu gostaria de cumprimentar em particular o Sr. Secretário de Estado da Energia e dizer-lhe que é com muito gosto que o vejo. Até pensei que andava desaparecido,

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porque, em Setembro, fizemos um requerimento para o ouvir na Comissão de Assuntos Económicos e foi impossível cumprir a agenda, pois só na próxima semana é que o teremos cá.
Sempre que oiço alguém falar que vivemos acima das nossas possibilidades é do Sr. Secretário de Estado que me lembro, porque só um País que vive acima das suas possibilidades pode estar a pagar 60 milhões de euros à EDP e à Galp, que já apresentam milhões e milhões de euros de lucro por algo que nada acrescenta à situação energética do País.
Só um País que vive acima das suas possibilidades é que paga o que nós pagámos Custos de Manutenção dos Equilíbrios Contratuais (CMEC) e em Contratos de Aquisição de Energia (CAE) e, quando se pede uma diminuição de salário aos portugueses, quando se aumentam os impostos sobre consumo, não se ouve falar na renegociação destes contratos.
Só um País que vive acima das suas possibilidades é que utiliza as concessões de mini-hídricas para tapar os buracos que PS e PSD criam nas suas negociações para um Orçamento do Estado que manifestamente será mau para o País.
Na próxima semana teremos oportunidade para aprofundar todas estas matérias.
Esta é a prova cabal de quer o Ministério da Economia está desfasado da realidade do País e, por isso, não posso deixar de reforçar a opinião dada há pouco de que estas são meramente provas de vida e que o Ministério nada faz para a economia portuguesa.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, sempre com a esperança de que respondam a alguma coisa, apresentarei um conjunto de questões concretas.
A primeira é a de saber se o Ministério da Economia esteve de acordo com a homologação pelo Governo de autocarros impostados, com graves prejuízos para a produção nacional.
Segunda questão — talvez o Sr. Secretário de Estado do Turismo nos possa responder: no Orçamento do Estado há dinheiro para apoiar os low cost, discriminando a TAP? Gostaria de saber quando é que haverá uma decisão para reabrir as Termas de Vizela já que se está a prejudicar gravemente todo um concelho por completa passividade e cumplicidade do Governo.
Quando é que o Governo põe fim ao incumprimento pela UNICER das suas responsabilidades nas Pedras Salgadas? Pergunto ainda se vão cumprir as recomendações presentes em quatro projectos de resolução desta Assembleia da República sobre os caulinos de Vila Seca e de Milhazes.
O Sr. Ministro, na resposta que deu, não quis abordar a questão central do Orçamento que é a do regresso da competitividade ao problema do custo do factor trabalho. Não sou eu que o digo — consta da págs. 29 e seguintes a abordagem deste problema e a defesa desta tese.
O Sr. Ministro também não respondeu a esta questão relativa ao factor da energia, pelo que eu gostaria que dissesse se vai ou não intervir e quando é que vamos ter novos preços para a indústria do gás natural.
Vão ou não travar na electricidade um processo semelhante? Isto é, vamos ter em 2011 uma subida de 25% para o tecido produtivo na energia eléctrica? Quando é que se põe fim ao escândalo no preço dos combustíveis? Relativamente ao crédito, não vale a pena haver mistificações. As linhas de crédito são muito importantes, mas, como os senhores sabem, elas não resolvem os problemas do mercado de crédito no nosso país.
Os senhores estão a falar de linhas de crédito que atingem 10% do universo empresarial português e estão a esquecer-se das 900 mil empresas que não vão ser capazes de chegar às linhas de crédito.
Como é possível que o sector bancário tenha subido as respectivas comissões em 12%, desde Janeiro, nestes primeiros nove meses do ano? Claro que eu poderia dizer como o Sr. Ministro: como seria diferente o crédito em Portugal se os senhores, em vez de obedecerem aos banqueiros, procurassem responder aos problemas da economia nacional! Eu gostaria ainda de fazer uma breve reflexão sobre este problema do comércio tradicional e do comércio das grandes superfícies: estranha noção de equilíbrio tem o Sr. Ministro da Economia quanto à forma de reequilibrar o sector!

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Os senhores licenciaram milhares e milhares de m2 de áreas comerciais. Durante anos, os senhores foram cúmplices de uma fraude, da utilização pelos grandes grupos da distribuição de áreas de 1998 m2 como forma de fugir ao encerramento.
Os senhores homologaram um parecer que abriu mais umas dezenas de grandes superfícies e, agora, pensa que é equilibrado abrir 74 unidades, 5% das unidades, que só representam 26% do volume de facturação do comércio contra dezenas de milhares de pequenas empresas do sector comercial, que representam apenas 12% da facturação.
É um bom equilíbrio o que o Sr. Ministro pretende fazer nesta como noutras matçrias»

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento.

O Sr. Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Henriques, o risco de trazermos já a conclusão feita é o de ela não responder nada à realidade. Foi o que aconteceu ao Sr. Deputado.
O Sr. Deputado diz que as opções e as políticas do Governo nesta área não são focalizadas. Nada mais errado! Nunca o Sr. Deputado caiu numa série de contradições quando falou no número de PME, que às tantas dizia que eram poucas. Se fossem muitas mais, aí é que seria focalizado. Se fossem todos era completamente focalizado, era focalização total.
Sr. Deputado, há critérios para o apoio às PME, os quais correspondem, no que toca às linhas de crédito, a uma focalização.
Sr. Deputado, no domínio do apoio à recuperação económica (e isto serve para várias intervenções), não rejeitamos nem deixamos qualquer dúvida sobre a prioridade que o Governo atribui à problemática e aos objectivos da consolidação das contas públicas. Mas não deixamos de utilizar ao limite os instrumentos que temos para promover a recuperação económica. É por isso que estamos a colocar toda a capacidade que temos, ou primeira focalização, na recuperação do QREN.
Por isso, sabendo que existem bloqueios sérios ao financiamento, ao crédito, sabendo que este não é um instrumento capaz de resolver os bloqueios do crédito, mas neste momento não há nenhum instrumento que seja capaz de o fazer, nem os senhores são capazes de sugerir, criámos condições para reforçar o apoio às linhas PME Investe.
Segunda focalização: porque sabemos que a questão da exportação é fundamental, colocamos uma grande parte dos recursos públicos que temos nesta área no apoio à promoção das exportações, na diplomacia económica, envolvendo as empresas e as associações na promoção dos seus produtos, dos seus serviços e da economia portuguesa no mundo.
Durante o ano de 2011, apenas com as linhas de apoio que foram assinadas na semana passada, todos os dias do ano haverá pelo menos três acções (fora outras acções apoiadas por outros projectos), apoiadas por fundos públicos, para a promoção das empresas, como é o caso dos exportadores. Esta é a terceira focalização.
Nenhum dos Srs. Deputados falou do apoio à capitalização das empresas, que é uma viragem do ponto de vista da nossa política fiscal.
Como o Sr. Deputado sabe, sendo dirigente associativo, trata-se de uma velha reivindicação dos sectores empresariais no sentido da valorização do tratamento fiscal do capital próprio das empresas. Esta é quarta focalização.
Se isto não é focalizar os instrumentos que temos para o apoio à economia, não sei o que é que será.
Poderia falar de outras questões, e vou aproveitar as outras perguntas para o fazer, nomeadamente a da energia, que é, de facto, uma questão estratégica não apenas pelas questões energéticas, não apenas pelas questões ambientais, mas, sobretudo, pelas questões económicas.
Volto a dizer: se temos um travão ao nosso desenvolvimento é o défice externo e se há uma dimensão maior do défice externo é a dimensão energética. Em 2008, era 50%, ou quase, do nosso défice comercial.
A factura energética raramente é menos de um terço do nosso défice comercial.
Ninguém nos perdoará se não utilizarmos a margem que ainda temos antes da subida inevitável do preço dos combustíveis fósseis, ninguém nos perdoará se não colocarmos toda a energia na promoção de alternativas energéticas sustentáveis, hoje, daqui a 10, 15 ou 30 anos.

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Estou de acordo com o que diz o Sr. Deputado Hélder Amaral. Provavelmente precisaríamos de revisitar o enquadramento de toda a área petrolífera. Se for necessário, e se verificarmos que isso é desejável, não deixaremos de o fazer, mas atenção: contrariamente ao que muitos pensam, existem algumas dimensões do mercado dos combustíveis que estão fixadas por normas internacionais às quais Portugal tem de obedecer, nomeadamente quanto aos preços dos combustíveis refinados. Não são regras da União Europeia, são regras internacionais.
Podemos fazer mais? Provavelmente podemos.
Portugal está a fazer um grande esforço. O maior investimento que neste momento está a ser feito em Portugal é na modernização das refinarias de petróleo. Para quê? Para que deixemos de ser tão excedentários em gasolina e deficitários no gasóleo e no jet fuel.
Essa é uma mudança estratégica que valerá 400 milhões de euros por ano de diminuição da pressão sobre a nossa balança comercial.
Não digam que não existem estratégias e alternativas em Portugal! Aqui está um exemplo de como estamos a fazer um investimento fortíssimo no crescimento da armazenagem de gás natural em Portugal, porque é a alternativa mais segura no domínio das energias não renováveis.
Obviamente, se, por exemplo, a sugestão do Deputado Jorge Seguro Sanches puder ser seguida, faremos um esforço para avaliá-la e tentar que seja concretizada no sentido de haver uma maior diversificação da oferta de produtos combustíveis derivados do petróleo, para que assim possamos aliviar a carga que isso constitui para a economia e para as famílias.
Relativamente à intervenção do Bloco de Esquerda, devo dizer ao Sr. Deputado que não temos qualquer necessidade de estar aqui a fazer «provas de vida». Se quer que lhe diga, vejo a maior parte das intervenções do Bloco de Esquerda como «provas de sobrevivência».
Sr. Deputado, se quiser entrar num domínio em que o debate se aproxima mais da brejeirice do que do debate sério de ideias, vamos a isso! O Sr. Deputado diz que estou aqui a representar o capital e eu digo-lhe que o Sr. Deputado está a representar uma ideia de há dois séculos!» Ficaremos por aí toda a tarde e nenhum mal virá ao mundo» Porém, o que o Sr. Deputado diz não corresponde à realidade em muitos casos, nomeadamente no que toca às críticas que fez às opções energéticas ou económicas.
O Sr. Deputado navega sempre entre uma crítica fácil à política que existe e uma afirmação vazia e oca de políticas que não sabe quais são. São sempre outras políticas, de outro mundo, de outros actores, de outra humanidade, na qual o Sr. Deputado se revê, apesar de, de vez em quando, citar o The Economist» Há um mundo que nos divide, Sr. Deputado! Aprendamos a viver com isso. Não sei é se o Sr. Deputado tem tanta capacidade como eu para aprender a viver com essa diferença.
O Sr. Deputado Agostinho Lopes veio dizer que eu nada disse sobre a questão fundamental deste debate, que é a questão salarial. No entanto, Sr. Deputado, falei disso em todas as intervenções que fiz e referi a minha posição de forma muito clara: não acredito numa competitividade da economia portuguesa baseada no regresso à política de baixos salários. Acredito numa política salarial assente na diversidade dos sectores produtivos e na prioridade à negociação colectiva e ao diálogo social. Mas, numa conjuntura extremamente difícil como a que vivemos, com ameaças muito fortes, a política salarial deve ser muito prudente.
O Sr. Deputado considera que isto é contraditório? Eu não! Penso que são três pilares de uma abordagem.
Há a questão salarial, que é ambiciosa, mas ao mesmo tempo realista. Acreditar, como alguns acreditam, que os problemas da economia se resolvem subindo os salários para subir a procura interna e a economia, isso é uma visão de quem ainda está no «orgulhosamente sós», de quem ainda está num mercado fechado, de quem ainda está num País do passado. É essa a posição do Sr. Deputado.
O Sr. Deputado não compreendeu nada daquilo que eu disse acerca da política relativamente ao comércio.
Sr. Deputado, não acredito que, com as políticas de restrição à concorrência, o sector do pequeno comércio tenha um futuro estratégico garantido. Não acredito! É só pela inovação, pela diferenciação e pelo aproveitar das oportunidades de mercado que surgem, muitas vezes até oportunidades desenvolvidas pela grandes superfícies e pelos centros comerciais, que passa a sustentação do pequeno comércio.
Quanto às questões que me colocou, mais uma vez, relativamente às energias, à questão das autoridades da concorrência e aos preços dos combustíveis, ó Sr. Deputado, nós continuaremos a trabalhar para que o mercado seja transparente e para que daí resultem vantagens para o consumidor e para a economia nacional.
Os Srs. Deputados ainda não conseguiram demonstrar — e se o demonstrarem, serei o primeiro a reconhecer — que existem práticas irregulares no mercado dos combustíveis, no entanto, permaneceremos

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atentos e utilizaremos todas as sugestões que sejam positivas para que esse mercado seja colocado ao serviço de Portugal e dos portugueses.
Finalmente, Sr. Deputado Telmo Correia, em relação à questão das divergências, não tenho qualquer receio nem qualquer dificuldade em dizer-lhe que várias vezes, ao longo dos últimos anos, todos nós chegámos tarde demais à compreensão da realidade. Nós e os senhores! Quantas vezes, naqueles anos que nos acusam de excesso de despesa, daí dessa bancada só vinham propostas de aumento da despesa! Quantas vezes! Quantas vezes! E de diminuição da receita! E de crença no choque fiscal! Os senhores aderiram muito rapidamente a essa ideia, mas nunca à sua prática, quando tiveram oportunidade de o fazer.
Agora, Sr. Deputado, esse objectivo, um pouco pueril, de estar aqui a tentar encontrar divergências e leituras diferentes dentro do Governo é um exercício que não conduz a nada.
E também lhe posso dizer, Sr. Deputado, que a repetição, vezes sem conta, de que deste lado ou daquela bancada existe uma versão optimista de que tudo está bem, não transforma isso numa verdade. Nós reconhecemos os problemas que existem. Eu reconheço-os todos os dias, convivo com eles todos os dias e não tenho qualquer visão «cor-de-rosa» — para além das minhas inclinações políticas — acerca dessa realidade.
Peço desculpa, não há aqui nenhum monopólio de quem está próximo da verdade ou próximo da realidade, há aqui um debate político, em que nós temos as nossas ideias e os senhores têm as vossas, mas acreditamos que estamos a servir o País e é isso que continuaremos a fazer.

O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao fim desta audição»

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a mesa sobre a condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, é apenas e só para distribuir três documentos. O primeiro é a resolução do Conselho de Ministros»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, esses documentos já não poderão ser discutidos.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — O primeiro é a Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2010, que peço que seja distribuído às diversas bancadas, em especial à bancada do Partido Socialista»

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que os entregue nos serviços.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — » o segundo ç o relatório de execução da Agência para a Energia, relativamente à eficiência energética, e o terceiro a entrevista do Sr. Secretário de Estado Carlos Zorrinho, reconhecendo que a execução da eficiência energética ao nível da administração Pública não é suficiente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Peço que os entregue para serem distribuídos.
Srs. Deputados, chegamos, agora sim, ao fim desta audição.
Agradeço ao Sr. Ministro e aos membros do Governo a vossa presença.
Está encerrada a reunião.

Eram 19 horas e 25 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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