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29 DE SETEMBRO DE 1988 1193

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Sr. Presidente, como em todos estes trabalhos, farei uma intervenção a título exclusivamente pessoal.

Em primeiro lugar, gostaria de observar que o Sr. Deputado Jorge Lacão, se bem interpretei, renunciou inconvenientes dificilmente ultrapassáveis em termos objectivos. E esta dificuldade de ultrapassar, em termos objectivos, os inconvenientes apresentados pelo Sr. Deputado Jorge Lacão verifica-se das intervenções dos Srs. Deputados do PSD. Não me parece que seja uma questão secundária; é uma questão essencial.

Por outro lado, todo o enquadramento jurídico do modo de aquisição ou de conservação da nacionalidade portuguesa também não é um pormenor. Para quem o consagrou, ele deve ter certamente um valor ético-jurídico superior ao que atribuem à concessão do direito de voto aos emigrantes. Ou estaria o PSD de acordo em alterar a lei da nacionalidade dos emigrantes, retirando a nacionalidade àqueles que a têm em razão de sangue, para dar o direito de voto aos restantes?

Reconheço que é um pouco absurdo fazer uma pergunta destas a um partido porque esta é uma matéria acerca da qual um partido dificilmente pode ter uma posição. Inclusivamente um partido que preza tanto a homogeneidade de posições dos seus representantes, membros ou militantes.

Além destes, há um terceiro argumento que me parece ser ponderável. A eleição presidencial é o ponto final de uma campanha altamente personalizada e dramática. Ora, nessa campanha os debates televisivos têm o máximo relevo para o esclarecimento das posições dos candidatos. Pode-se gostar ou não se gostar desta forma de democracia mediática. Mas ela é incontestavelmente um facto adquirido e estabilizado. Não se vislumbra a sua reversibilidade. Pelo contrário, é previsível o seu ilimitado agravamento.

À luz da ponderação dos interesses, e não apenas dos conceitos, será razoável que, numa eleição em que as pessoas candidatas têm uma importância tão relevante, os compromissos assumidos na fase final da campanha eleitoral não cheguem ao conhecimento dos eleitores? Ou melhor: como é que esses debates televisivos e os compromissos finais dos candidatos, ocorridas 36 horas antes da eleição, podem chegar ao conhecimento dos eleitores emigrantes? Mesmo que não tivessem votado antecipadamente... O que dificilmente se concebe possa ser estabelecido.

Assim, do ponto de vista dos interesses, e não apenas dos conceitos, é conveniente que não entremos num processo de tal maneira complexo que possa pôr em causa pilares da ordem jurídica portuguesa e criar as maiores confusões sobre quem é e não é português e sobre quem tem e não tem direito de voto.

Isto para além das dificuldades que todos nós conhecemos relativamente ao recenseamento dos emigrantes e ao voto por correspondência. Tudo isso é também um valor que importa acautelar ao máximo, e que deve ser acautelado também nas eleições legislativas. Mas, apesar de tudo, neste último tipo de eleições não há um colégio eleitoral único.

Por consequência, afigura-se-me, pessoalmente - não sei o que é que o PS pensa a este respeito -, que nem é razoável conceder o direito de voto aos emigrantes nem justo levantar tempestades em relação a direitos fundamentais destes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - O PSD seria injusto para com o PS se não reconhecesse que a nossa recusa em consentir o voto dos emigrantes relativamente às eleições para o Presidente da República se baseia em razões sérias de defesa da genuinidade democrática, e da fidedignidade do voto e do seu significado.

Em primeiro lugar, não somos um país isolado do mundo. O próprio resumo que fez o Deputado Jorge Lacão do que se passa lá fora dá ideia de até que ponto os países hesitam nesta matéria. E nenhum deles, que eu saiba, consagra de forma plena o exercício de voto em pé de igualdade com o dos residentes no próprio território. Se algum o fizer será um caso raro.

Acontece que a circunstância de termos mais emigrantes que os outros pode tornar, no plano ético, mais grave a recusa, e no plano de defesa dos valores democráticos mais justificada essa recusa. Porque quanto maior for a percentagem de votantes emigrantes relativamente à percentagem de votantes residentes no território nacional maior será o grau de influência do voto daqueles na eleição do Presidente da República.

Ora, se tivermos de concluir que esse voto não é, em regra, um voto fundado no conhecimento dos candidatos... Os partidos políticos, esses ao menos, prolongam a sua existência ao longo do tempo e, quando as eleições têm uma base partidária, as pessoas confiam no partido, nos seus candidatos, votam mais no partido do que nos próprios candidatos. Será o caso das eleições legislativas e até das autárquicas.

Mas, no caso do Presidente da República não é assim. O candidato apresenta-se com 90 dias de antecedência, e tanto pode ser uma figura pública, conhecidíssima, como pode não ser. A nossa Constituição, à semelhança do que acontece com muitas outras, consagra o princípio da igualdade de tratamento de todos os candidatos. Pergunto a todos os presentes se reconhecem ou não que o princípio da igualdade de tratamento dos candidatos é inconcretizável e está ferido de graves riscos no caso do voto dos emigrantes.

Não preciso de lembrar uma vez mais, porque várias vezes tenho referido este aspecto, as dificuldades que teria um candidato do PCP, ou mesmo do PS, em fazer propaganda na África do Sul, ou um candidato do PCP em fazer propaganda nas comunidades dos Estados Unidas da América, e outros exemplos que tais.

Devo dizer que tenho o máximo respeito pelos emigrantes e tenho feito alguma coisa, sempre que estive no Governo e fora dele, no sentido de criar condições para a sua protecção.

Admito que um emigrante que concorde com as nossas razões será o primeiro a reconhecer que a generalidade dos emigrantes não tem bastante conhecimento do que se passa no espaço nacional. Não lhes é assegurado, sequer, em muitos casos, o domínio da própria língua portuguesa sobretudo quando se trata de jovens já nascidos no estrangeiro. Como, na verdade, o princípio jus sanguinis garante a esses jovens a nacionali-