Página 1795
Sexta-feira, 29 de Novembro de 1996 II Série - RC - Número 60
VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)
IV REVISÃO CONSTITUCIONAL
COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL
Reunião de 28 de Novembro de 1996
S U M Á R I O
A reunião teve início às 10 horas e 30 minutos.
Procedeu-se à discussão dos artigos 236.º, 236.º-A, 227.º-A, 233.º, 236.º-B, 236.º-C, 233.º-A, 234.º-A, 118.º, 235.º-A, 237.º, 239.º, 240.º e 241.º constantes dos diversos projectos de revisão constitucional.
Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Presidente (Vital Moreira), os Srs. Deputados Mota Amaral (PSD), Guilherme Silva (PSD), Luís Marques Guedes (PSD), Cláudio Monteiro (PS), Jorge Strecht Ribeiro (PS), Luís Sá (PCP), Medeiros Ferreira (PS), Barbosa de Melo (PSD), Ferreira Ramos (CDS-PP), Arlindo Oliveira (PS); Miguel Macedo (PSD), Osvaldo Castro (PS), José Magalhães (PS) e Nuno Baltazar Mendes (PS).
O Sr. Presidente interrompeu os trabalhos às 20 horas e 10 minutos e declarou reaberta a reunião às 21 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 00 horas e 15 minutos do dia seguinte.
Página 1796
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 17 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, vamos analisar as propostas relativas ao artigo 236.º, que é o último do capítulo, mas não o último da nossa tarefa, porque deixei duas matérias para o fim, uma é a da questão dos círculos regionais extra-insulares e outra é a do referendo regional.
Para o artigo 236.º há a questão da dissolução das assembleias regionais como figura do sistema de governo, que já foi tratada e, por isso, resta tratar da questão da dissolução tutelar dos órgãos regionais por parte do Presidente da República.
Em relação ao artigo 236.º foram apresentadas propostas pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, pelo PSD, e pelo CDS-PP e os pontos que delas constam são os seguintes: o primeiro é a limitação da dissolução às assembleias legislativas regionais, matéria que consta das propostas do CDS-PP, do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho e do Sr. Deputado Guilherme Silva; o segundo ponto respeita à dispensa da audição da Assembleia da República, segundo a proposta do CDS-PP, ou o do acrescentamento da audição do governo da República, segundo a proposta do PSD; o terceiro ponto consiste em alterar os pressupostos da dissolução e onde se fala de "actos contrários à Constituição" passar a referir-se "em actos graves contrários à Constituição"; finalmente, o quarto ponto respeita à gestão interina em caso de dissolução, segundo uma proposta do PSD.
São estes os quatro pontos que constam das propostas que enunciei, e que ponho à vossa consideração, em primeiro lugar, obviamente, aos proponentes para, se julgarem necessário, acrescentarem algo à sistematização que eu fiz das várias propostas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral.
O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, como V. Ex.ª já assinalou, as propostas do PSD sobre o artigo 236.º abordam alguns dos aspectos particulares da forma de dissolução.
Apraz-me verificar a restrição da hipótese de dissolução dos órgãos regionais por iniciativa do Presidente da República àqueles casos de prática de actos graves contrários à Constituição. Parece impor-se essa limitação para que não fique a dúvida de que qualquer violação da Constituição põe sobre o "pescoço" das instituições regionais o cutelo da dissolução. Isso seria absurdo, pois há outras garantias na Constituição, nomeadamente a intervenção dos tribunais, que garantem o respeito da mesma sem haver lugar a medidas de tal gravidade.
Portanto, para uma medida tão importante, tão grave, tão significativa como esta da dissolução só se pode conceber que sejam praticados actos gravíssimos contrários à Constituição. Mas não só: voltando ao debate de ontem, se, porventura, uma das assembleias regionais votasse uma moção solicitando a modificação da forma do Estado e apelando para que o Estado, em vez de ser unitário, passasse a ser federal, seria este um motivo para a dissolução da Assembleia? E, no entanto, devo dizer que é um acto contrário não só à Constituição como até aos limites de revisão constitucional, nos termos de restringir uma previdência desta natureza àqueles casos absolutamente limite e com a consequência que decorre do sistema constitucional que é a da convocação de eleições para as assembleias. E é por isso que, com razão, em algumas das propostas se refere que a dissolução só pode abranger a assembleia regional - aliás, não há casos de dissolução de órgãos executivos, que são, de resto, responsáveis perante a Assembleia.
Portanto, embora isso não conste do projecto do PSD o mais razoável seria que a dissolução servisse apenas para as assembleias legislativas regionais com a consequência de dar a voz ao povo para que ele se pronunciasse. Não existe outra maneira de resolver conflitos de gravidade senão através da consulta da vontade popular.
Quanto à outra questão importante deste preceito que diz respeito ao receio da "interinidade", de saber quem assegura o poder na "interinidade", segundo a lógica das nossas outras propostas sobre a matéria, entendemos que esta "interinidade" podia caber ou ao ministro para a região autónoma ou a outro membro do governo, devendo, no entanto, limitar-se à prática de actos estritamente necessários para assegurar a gestão corrente do órgão dissolvido.
Poderíamos também prever aqui alguma hipótese de limitação desses poderes não vá acontecer que essa entidade, que é um poder legítimo, legitimado democraticamente, seja substituída por outro poder, que, para a preparação dos actos eleitorais, tem que entrar num regime similar àquele que corresponde aos perigos de dissolução do Parlamento e de convocação de eleições.
Parece-me que, apesar de tudo, esta proposta é um bocado abstrusa, porque rigorosamente o que devia acontecer, conforme propõe o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, era que o governo regional deveria manter as suas funções limitando-se à prática dos actos estritamente necessários a assegurar a gestão dos negócios públicos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, confesso que, face a outras propostas apresentadas noutra sede e relativas à fixação de um sistema similar ao que foi estabelecido pela Assembleia da República, a dissolução da assembleia legislativa regional por iniciativa do Presidente da República ou, na óptica de um dos proponentes, pelo Ministro da República, é uma solução com a qual não concordamos.
Parece-me - e a intervenção é de revisão da minha proposta - que não se justifica a subsistência cumulativa da dissolução, que seria sempre e tão-só da assembleia legislativa regional, já não do governo, por actos, ainda que agora classificados graves, contra a Constituição. Portanto, não me parece que se deva manter este artigo 236.º, ainda que parcialmente.
Deve continuar a prever-se a dissolução da assembleia legislativa regional nos termos em que se prevê a dissolução da Assembleia da República - e penso que só por aí nos devemos quedar - não havendo, do meu ponto de vista, razão para subsistir esta especificidade de dissolução, seja apenas da Assembleia, e muito menos da Assembleia e do Governo, pela prática de actos contra a Constituição.
Os actos inconstitucionais de determinada natureza, sejam legislativos sejam administrativos, têm sedes próprias de fiscalização e de coordenação e os actos puramente políticos, que possam envolver qualquer prática contrária
Página 1797
à Constituição, são submetidos ao julgamento político, através do acto eleitoral.
Portanto, não estou a ver que haja razão e dúvidas até podem surgir dúvidas sobre esta disposição - aliás, o Sr. Deputado Mota Amaral colocou uma hipótese académica, que é discutível, de excluir como sendo um acto contrário à Constituição, e parece-me que é obviamente de excluir -, porque nada impede, por exemplo (e isso já tem acontecido) que as assembleias regionais se pronunciem sobre a revisão constitucional. Pode perfeita e legitimamente haver uma resolução que aponte nesse sentido e não vejo que, sendo contrária à Constituição vigente, seja uma proposta de jure condendo que nada tem de contrário aos princípios democráticos e à discussão política própria destas matérias.
Portanto, até por se poder entrar em situações de dúvida e forçar uma dissolução menos fundamentada, adianto que, a optar-se pela solução de consagrar o princípio da dissolução da assembleia legislativa regional no quadro excepcional e com a redacção que o PSD propõe para o artigo 175.º, clarificando os casos de dissolução da Assembleia da República, de uma forma similar à dissolução desta articularei a minha proposta relativa ao artigo 236.º com a evolução que possa ter a dissolução na outra sede que já abordamos e que o PS propõe que seja por iniciativa do Ministro da República.
Como já disse, não aceito esta solução, mas não consigo dissociar estas duas situações e, como tal, deixarei pendente uma revisão deste artigo 236 º de forma a não permitir estas duas vias de dissolução dos órgãos regionais, em especial da assembleia legislativa regional.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Gostaria apenas de fazer uma precisão.
Sr. Presidente, na sequência daquilo disse o Sr. Deputado Mota Amaral, o PSD deseja alterar o n.º 3 da proposta dando o seu apoio à formulação do n.º 2 do projecto do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.
Portanto, não vale a pena discutir este n.º 3, que ficaria sem efeito.
O Sr. Presidente: - E se o governo regional for dissolvido?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O governo regional não é dissolvido; é demitido.
A questão que quero colocar é a seguinte: como o Sr. Deputado Mota Amaral referiu, esta parte final coloca algumas dificuldades até de operacionalidade e parece-nos que a solução preconizada pelo projecto do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho é a mais adequada no caso de dissolução das assembleias, como é evidente, porque o órgão do Governo é demitido e não dissolvido. No caso de dissolução deve ser o governo regional que fica demissionário, mas em gestão corrente até à marcação de novas eleições.
O Sr. Presidente: - Ficam substituídas as propostas do PSD, incluindo a do Sr. Deputado Guilherme Silva, nos termos referidos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Segundo este esclarecimento do Sr. Deputado Luís Marques Guedes o acordo já não é tão grande como era inicialmente, ou como se pensava ser inicialmente, em relação a algumas das propostas formuladas pelo PSD por esta razão: embora se possa questionar politicamente - e o Sr. Deputado Guilherme Silva fá-lo - que possam coexistir as duas formas de dissolução, uma dissolução tipicamente política do órgão legislativo, que vem proposta em vários projectos embora com formulações diferenciadas e alcances distintos e que constava do texto constitucional…
O Sr. Presidente: - Que consta do texto constitucional e que há-de continuar a constar.
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sim, que consta do texto constitucional, que já constava do texto constitucional, que é aquilo que tem sido designado por dissolução-sanção ou dissolução-tutela, a verdade é que a tutela tem que ser entendida no sentido sui generis ou restrito, porque a autonomia não é meramente administrativa; é também política e, portanto, não estamos a falar de tutela administrativa propriamente dita.
Mas, como é evidente, não deixa de haver algum paralelismo entre aquilo que a Constituição consagra hoje e o regime da tutela administrativa e o que isso implica em termos de garantia de um poder último de controlo sobre a conformidade da actuação de determinados órgãos com a Constituição e com a lei.
Indo por essa analogia, salvaguardando as diferenças, permite-se, desde logo, concordar com a proposta do PSD na parte em que pretende qualificar os actos contrários à Constituição como graves - aliás, é isso que hoje já acontece em relação às autarquias locais relativamente às quais a própria Constituição prevê a dissolução dos órgãos autárquicos por acções ou omissões ilegais graves.
Na verdade, o artigo 243. º, n.º 3, refere que "a dissolução de órgãos autárquicos resultante de eleição directa só pode ter por causa acções ou omissões ilegais graves" e, portanto, nessa perspectiva, o que está aqui em causa não é a inconstitucionalidade de actos, designadamente de actos normativos, os quais são objecto de fiscalização pelo Tribunal Constitucional com as consequências que daí advém, é mais do que isso: são actos que ponham em causa o próprio estatuto e a função constitucional desses órgãos, que subvertam a ordem constitucional e que, por via directa ou indirecta, provoquem uma rotura constitucional.
Julgo que faz sentido qualificar esses actos como graves, porventura faria sentido usar uma fórmula equivalente, embora seja mais preocupante aquilo que tem de violação por acção do que aquilo que tem de violação por omissão, mas, em qualquer caso, nessa parte, julgo que não deverá haver grande divergência.
Precisamente por isso é que não se pode pretender retirar a ideia de que a dissolução apenas pode incidir sobre o órgão legislativo ou só sobre órgão legislativo deliberativo, porque enquanto dissolução-sanção ou tutela - ainda que a expressão possa não ser a mais feliz - ela funciona como garante em relação a quaisquer órgãos e não apenas em relação a órgãos executivos, razão pela qual, embora numa perspectiva diferente, também a Constituição e a lei prevêem a dissolução de órgãos executivos, designadamente os órgãos autárquicos, precisamente quando se verifiquem acções ou omissões ilegais graves que o justifiquem.
Página 1798
Não está aqui em causa a dissolução política, a qual evidentemente só faz sentido em relação ao órgão legislativo e pode implicar ou não a demissão do governo, mas, sim, a dissolução na lógica da desintegração do órgão ou da extinção da composição do órgão e, nesse sentido, julgo que não se pode diferenciar o órgão legislativo do órgãos executivo. Na outra sim, evidentemente que a outra, a ser prevista na Constituição, só pode ter como objecto a dissolução da assembleia legislativa, a qual porventura determina a demissão do governo e a sua manutenção em gestão até novas eleições.
Mas não podem confundir-se as duas situações: uma coisa é defender o que defende o Sr. Deputado Guilherme Silva, que é não haver estas duas alternativas e, portanto, politicamente é defensável que isso possa ser uma posição - não é esta a posição que eu defendo, julgo que não é a posição que defende o Grupo Parlamentar do PS - mas, nessa matéria, não pode haver confusões. A dissolução-sanção ou tutela tem como objecto qualquer dos órgãos do governo próprios das regiões desde que verificados estes pressupostos e, nessa perspectiva, o regime de tutela, propriamente dito, isto é, o regime substitutivo do exercício das funções desses órgãos nunca pode nunca ser cometido pela Constituição a qualquer um desses órgãos, porque pode ser ele o próprio objecto dessa dissolução. Julgo, pois, que faz sentido aquilo que actualmente a Constituição prevê, isto é, que seja o Ministro da República a exercer essas funções.
Quanto ao problema da audição dos órgãos que devem ser ouvidos sobre essa dissolução, tendo a admitir que faria algum sentido o governo ser ouvido se admitisse que faz algum sentido a Assembleia da República ser ouvida.
Julgo que nesta matéria a proposta mais coerente é aquela que o CDS-PP fez como rectificação à sua proposta inicial, que foi, pura e simplesmente, prever apenas e só a audição do Conselho de Estado pela simples razão de que se trata do exercício de uma competência própria do Presidente da República, sendo que o órgão de consulta política do Presidente da República é o Conselho de Estado, pelo que não vejo por que é que a Assembleia da República deve ser ouvida - aliás, é esse o texto constitucional actual - pela mesma razão que não faz sentido que o governo seja ouvido.
Eu admitiria que o governo fosse ouvido se se entendesse como lógico que a Assembleia o fosse, defendendo-se que todos os órgãos de soberania, designadamente aqueles que têm legitimidade democrática, deveriam ser ouvidos, mas, como julgo que, apesar de tudo, o que está aqui em causa é apenas o exercício de uma competência própria do Presidente da República, o único órgão a ser ouvido deveria ser o seu órgão de consulta política, que é, repito, o Conselho de Estado. Portanto, talvez fosse mais lógico que só o Conselho de Estado fosse ouvido e, em vez de se acrescentar a audição do governo deveria eliminar-se a da Assembleia.
Todavia, admito que, a manter-se a audição da Assembleia, isso só pode justificar-se segundo uma lógica de que devem ser ouvidos os órgãos com legitimidade democrática e, nesse sentido, também o governo a tem, embora seja indirecta, e por isso talvez se pudesse acrescentar a audição do governo como solução de recurso.
Finalmente, direi que, apesar de tudo, do ponto de vista da lisura do texto constitucional, é preferível que a audição seja restrita tão-só e apenas ao Conselho de Estado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral.
O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Cláudio Monteiro, vou fazer uma pergunta concreta: o Sr. Deputado considerou no seu raciocínio a natureza parlamentar do regime político regional? É porque - aliás, isso tem sido muito visado na argumentação do PS nesses dias em que temos que discutir estas matérias, e com razão porque é assim mesmo que lá está -, tal como se diz na Constituição, o governo depende da Assembleia. Ora, se, porventura, em hipótese (que é claramente contra a Constituição), o governo regional de uma das regiões autónomas determinasse que o acesso aos lugares públicos só era permitido aos naturais da respectiva região autónoma, isso era efectivamente contrário à Constituição...
O Sr. Presidente: - Para isso basta um acórdão do Tribunal Constitucional!
O Sr. Mota Amaral: - Sim, sim, mas no entretanto, aí é que está o problema. Entretanto, o Presidente da República dissolve o governo e qual é o papel do parlamento? Ficamos, então, numa situação deste género: o Presidente da República manda dissolver o governo, mas não dissolve o parlamento. Ora, como a rigidez do relacionamento entre o governo e o parlamento é muito grande, e como o parlamento não pode ser dissolvido, então mantemos o governo entregue ao Ministro da República com o parlamento eventualmente votando moções de desconfiança ao Ministro da República sem qualquer consequência... Não considera isso absurdo? Perante um acto político grave, o que está em causa é a responsabilidade política do governo, e se, porventura, o parlamento se solidariza com o governo, então é o próprio parlamento, do qual o governo depende, que está incurso na responsabilidade de violação da Constituição e é, sempre, a ele que pode e deve reportar-se a dissolução com a consequência imediata que é a convocação de eleições.
O Sr. Presidente: *Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Na sequência da intervenção do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, gostaria de pedir alguns esclarecimentos.
O Sr. Deputado Cláudio Monteiro desenvolveu uma teoria que aparentemente - e é essa a minha dúvida - passou tipo vol d' oiseau por cima da dependência política do governo regional face à assembleia legislativa regional. No entanto, o artigo 233.º da Constituição é claro quando diz que o governo é politicamente responsável perante a assembleia legislativa regional. Portanto, é evidente para mim, e penso que para nós todos, tendo em conta modelo constitucional presente, que no caso da prática de actos graves contrários à Constituição nunca o Sr. Presidente da República pode, ignorando este mecanismo constitucional de dependência e de responsabilidade política, demitir o governo regional sem dissolver a assembleia legislativa regional. Trata-se de uma situação que só academicamente é que poderá surgir e mesmo assim é dificilmente configurável, porque havendo, nos termos do artigo 233.º, uma responsabilidade política do governo regional perante a assembleia regional é evidente que, prima facie, qualquer acto grave...
Página 1799
O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Luís Marques Guedes, dei-lhe a palavra para pedir esclarecimentos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * O pedido de esclarecimento é este: se assim é, é ou não verdade que, neste quadro, faz todo o sentido que, quando o Presidente da República possa utilizar esta competência do n.º1 da dissolução pela prática de actos graves contrários à Constituição ele deva ter que ponderar essa sua decisão com a audição "exaustiva" dos tais órgãos com legitimidade democrática que se devam pronunciar sobre esta matéria, porque o que está aqui em causa não pode ser, do meu de vista, apenas a demissão do governo regional; uma situação dessas configura necessariamente a dissolução dos dois órgãos do governo regional.
O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Respondo a si e, em certa medida, ao Sr. Deputado Mota Amaral que, no fundo, não colocou a questão muito diversa desta.
O Sr. Deputado começou por inverter o meu raciocínio para chegar a uma conclusão que, se calhar, vai mais de encontro a ele. O problema não é dissolver-se o governo sem se dissolver a assembleia; o problema é partir-se do pressuposto, como se partia em certa medida da intervenção feita anteriormente, de que se poderia dissolver a assembleia sem dissolver o governo, ou que isso seria normal tendo em conta a natureza parlamentar do regime. É só por esta razão: é que estamos a discutir uma figura que não se coloca no plano das relações entre governo e assembleia regional, trata-se de relações entre órgãos de governo próprio e Estado. Estamos a discutir não o grau de dependência do governo em relação à assembleia legislativa regional, mas, sim, o grau de dependência dos órgãos de governo próprio em relação ao Estado, porque seja ou não uma figura de tutela - não será exactamente, pelo menos de tutela administrativa, porque, como já disse, autonomia não é meramente administrativa -, repito, o que estamos a discutir, apesar de tudo, é o grau de dependência dos órgãos de governo próprio, que é enfraquecido e que tem apenas em última análise este último poder de intervenção em relação ao do Estado.
Portanto, não é a natureza parlamentar e não são as relações entre governo e a assembleia que determinam a natureza deste instituto, mas, as relações entre autonomia regional e o Estado e por essa razão é que, se calhar, muito provavelmente, o exemplo que o Sr. Deputado Mota Amaral também deu é mau, porque não se trata de um acto grave ou não se trata de um acto que possa configurar-se como um acto grave contrário à Constituição nos termos em que se pressupõe a dissolução do órgãos. Provavelmente, um acto dessa natureza geraria um problema de responsabilidade do governo perante a assembleia e que se resolveria politicamente no quadro normal da vida política regional.
Mas não se trata de um acto que ponha em causa a relação entre a autonomia e a soberania e o quadro constitucional vigente, portanto, provavelmente, não se trata de um acto que pudesse sequer requerer a intervenção do Presidente da República a este título.
É evidente que, muito provavelmente, quando essa intervenção, por alguma razão, que espero nunca venha a acontecer, tivesse que ocorrer, isso implicaria a dissolução dos dois órgãos, até porque as relações de dependência entre um e outro levariam a que se o acto grave é praticado sem que houvesse uma reacção correctiva do outro, isso significaria que a responsabilidade pelo acto ou omissão inconstitucional grave seria imputável a ambos os órgãos e isso levaria, quase seguramente, à dissolução dos órgãos no seu conjunto e não à dissolução de um com manutenção do outro seja ele qual for e vice-versa. Portanto, julgo, essa questão não se coloca.
O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, tenho um compromisso de gentlemen agreement de terminarmos a matéria das regiões autónomas antes de jantar, pelo que apelo nesse sentido.
Estão inscritos os Srs. Deputados Jorge Strecht Ribeiro, Luís Sá e Medeiros Ferreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Strecht Ribeiro.
O Sr. Jorge Strecht Ribeiro (PS): * Sr. Presidente, vamos admitir que o governo de uma região autónoma comete um acto manifesta e gravosamente inconstitucional. Do meu ponto de vista, é evidente que se esse órgão não for exonerado não há uma imediata razão para dissolver a assembleia legislativa por acção.
Vamos admitir que o governo regional da Madeira ou dos Açores - tanto faz - declara que a língua oficial da região é a inglesa e a respectiva assembleia legislativa não reage, isto é, pura e simplesmente, não põe em causa o acto. O acto é do governo e merece, do meu ponto de vista, uma clara intervenção, bem como merece intervenção a não actuação da assembleia legislativa por omissão. Donde, aqui, a exoneração do governo e a dissolução da assembleia regional ocorreriam por acto grave do governo e por omissão grave da assembleia legislativa. Talvez seja de adoptar a fórmula do artigo 243.º, respeitante ao poder local, de acção e omissão grave. Não sei!
O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, em primeiro lugar, creio que há que ver com alguma prudência a comparação entre esta figura e a da dissolução de autarquias locais por acções ou omissões ilegais graves, não apenas por causa dos poderes e das funções políticas dos órgãos de governo próprio das regiões, mas também porque num caso estão em causa ilegalidades enquanto que no outro estão em causa actos contrários à Constituição.
Não é, por exemplo, pronunciar-se sobre o sentido da revisão constitucional, que, naturalmente, é um mero direito à opinião e não um acto contrário à Constituição, nem tão-pouco é o exemplo que acaba de ser referido pelo Sr. Deputado Mota Amaral, ou qualquer outro, tal como aprovar uma lei eleitoral ou qualquer coisa desse tipo, e que se resolve, ou deveria resolver-se, no âmbito dos mecanismos de fiscalização da constitucionalidade. Penso que o que está aqui em causa, acima de tudo, é algo a que poderíamos chamar, talvez, um estado de rebelião constitucional, isto é, uma situação de rebelião contra a Constituição, que não pode ser resolvida pelos meios próprios de funcionamento do sistema político e constitucional.
Nesse sentido, há um aspecto relativamente claro, que é o seguinte: por estarmos perante uma forma de governo parlamentar e, simultaneamente, perante uma situação em
Página 1800
que o líder do governo regional é, com alta probabilidade, o líder da estrutura regional do partido que se candidatou, parece-nos razoavelmente claro que não faria sentido, por exemplo, dissolver as assembleias legislativas regionais e, simultaneamente, não dissolver o conjunto dos órgãos de governo próprio, num quadro em que, com alta probabilidade, a responsabilidade última dos actos contrários à Constituição estará no líder do Governo regional e não propriamente apenas na assembleia legislativa regional, cujos membros, na prática, sobretudo em situações deste tipo, com alta probabilidade, estarão a ser objecto de uma liderança que não se situa na própria assembleia legislativa regional.
Isto para referir a primeira proposta que está em cima da mesa, isto é, a de dissolver a assembleia legislativa regional em vez dos órgãos de governo próprio.
Quanto à questão da audição, podemos, eventualmente, questionar a da Assembleia da República. Ela está prevista, não vejo razão para a eliminar. De raiz poderia, eventualmente, pôr-se este problema, mas, a partir do momento em que está prevista, creio que o acto é tão grave e extraordinário que esta audição pode justificar-se.
Já no que respeita à audição do Governo, ela parece-me questionável, até porque, em última instância, a opinião do próprio Governo está no partido que o sustenta, e essa audição é feita ouvindo a Assembleia da República e o Conselho de Estado.
A referência a "actos graves contrários à Constituição" e não, pura e simplesmente, a "actos contrários à Constituição" pode fazer algum sentido, contudo não compreendo que haja uma dissolução-sanção deste tipo sem os actos serem graves, ou seja, isto é de tal modo evidente que pergunto a mim próprio se há algum interesse em que fique escrito.
Creio que se os actos não forem graves não haverá, com certeza, dissolução, mas também creio que é uma daquelas matérias em que um acrescento deste qualificativo não terá qualquer problema a não ser o de dizer algo que não posso deixar de compreender como óbvio. Isto é, não estou a conceber uma situação em que o Presidente da República se proponha dissolver os órgãos do governo próprio sem violações reiteradas e contínuas da Constituição, situação essa que qualifiquei, praticamente, de rebelião constitucional.
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Basta uma violação grave!
O Sr. Luís Sá (PCP): - É óbvio que basta uma violação grave, se ela for de tal modo grave! Por exemplo, o Sr. Deputado Guilherme Silva falou da declaração de independência na última reunião! É óbvio que pode bastar apenas uma! É o estado rebelião constitucional típico, portanto, obviamente que sim.
O Sr. Jorge Strecht Ribeiro (PS): * Então e a autodeterminação?
O Sr. Luís Sá (PCP): - Julgo que tudo aquilo que referi a respeito da responsabilidade última dos actos contrários à Constituição que justificam uma dissolução aponta para a não aceitação da proposta do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho - que agora é a do PSD -, exactamente com a ideia de que num Estado deste tipo há uma alta probabilidade de a responsabilidade política última dos actos contrários à Constituição estar na própria liderança do governo regional, isto é, na liderança do partido respectivo a nível regional. Creio que são questões próprias do Estado de partidos que apontam claramente neste sentido.
Julgo que seria um pouco inexplicável, por exemplo, dissolver uma assembleia legislativa regional e haver uma alta probabilidade de o responsável pelos actos contrários à Constituição continuar a praticar "os actos estritamente necessários a assegurar a gestão dos negócios públicos", tal como propõe o PSD, e sabemos bem a indefinição deste conceito e os problemas que pode gerar.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, ouvi-o com muita atenção e as suas considerações suscitaram-me esta dúvida: julgo que não é na Constituição que está o preceito que manda fazer eleições depois da dissolução, mas que isso se encontra nos dois estatutos. Trata-se de uma norma que tem uma força particular, porque é paraconstitucional, no fundo,...
O Sr. Presidente: * Se for constitucional…
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Pois, mas diz que dissolvidos os órgãos...
O Sr. Presidente: * Que eu entendo que não são!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * … o Presidente da República tem de marcar eleições num determinado prazo. Isso também está previsto em relação às autarquias locais, etc., o que é correcto do ponto de vista democrático e é um princípio estruturante da Constituição.
Portanto, o Presidente da República toma uma decisão correcta exercendo os seus poderes, mas está limitado - não é um acto definitivo - a convocar o colégio eleitoral para pronunciar-se dentro de um certo tempo. Se a assembleia não for dissolvida como é que se consulta o eleitorado? Para um governo? Uma câmara municipal, por exemplo, é eleita pelos cidadãos, mas nesta situação o governo sai directamente da Assembleia. A pergunta que lhe faço é esta: como é que se dá esse passo que é exigido pela norma interna, pelo núcleo do princípio democrático?
O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá, a quem peço que seja breve.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Barbosa de Melo, agradeço-lhe a questão, que é muito interessante.
Sem dúvida alguma que estamos perante um princípio estruturante do Estado democrático e da Constituição e sem dúvida alguma também que há vários princípios estruturantes do Estado democrático que têm que coexistir. Por exemplo, os princípios de que estamos perante um Estado unitário e de que não pode haver violações de um conjunto de regras fundamentais. Isto leva, por exemplo, falando de autarquias locais, a que nos casos de acções ou omissões ilegais graves se verifique a inelegibilidade de determinados
Página 1801
candidatos. Naturalmente, quando isto acontece, está a preterir-se um direito fundamental em função de um valor mais grave.
O problema que se coloca nesta matéria é este: não estamos perante um conjunto de princípios estruturantes do Estado democrático e perante a possibilidade de os actos dos órgãos de governo próprio contrários à Constituição serem de tal modo graves a ponto de justificarem a dissolução e também a consideração ou reconsideração de outros princípios na medida em que podem ter todos que ser devidamente conciliados?
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Portanto, V. Ex.ª diz: "Se houver uma violação grave da Constituição, adeus autonomia regional!". É isto que V. Ex.ª diz.
O Sr. Luís Sá (PCP): * Não senhor!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Perdeu, definitivamente, a autonomia regional. É o que resulta das suas considerações.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Eu não disse isso, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS não fez qualquer proposta de alteração a este artigo, por vários motivos, mas estamos prontos a aceitar a contribuição, entre outros, do PSD, para caracterizar a prática dos actos como graves, pois, penso, que ela fará sentido neste articulado.
Por outro lado, creio que deve manter-se a audição da Assembleia da República - aliás, a analogia que vejo em relação a este artigo nem sequer é a que tem vindo a ser aqui referida como sendo a do artigo sobre as autarquias locais mas, sim, sobre o artigo relativo ao estado de sítio e de emergência. Penso que essa é a analogia mais própria para chegar-se ao entendimento do que está em jogo neste artigo.
Considero que faz sentido a audição da Assembleia da República ou, na ausência de Plenário, da Comissão Permanente, mas, sinceramente, não vejo que o Governo da República deva ser ouvido - e digo isto referindo-me à proposta apresentada apelo PSD de audição do Governo.
Como aqui foi dito, e muito bem, a dissolução é um acto que cabe ao Presidente da República e admito que, quando se chegar a esse ponto, que todos nós queremos evitar - e depois gostava fazer uma declaração política sobre este assunto -, é óbvio que os dois órgãos, em princípio, são co-responsáveis, pelo que terão que ser dissolvidos simultaneamente e alguém terá que assegurar os actos administrativos subsequentes.
O que falta aqui - tenho pena que o PS não tenha feito uma proposta nesse sentido e escrevi-o nos meus apontamentos antes de o Sr. Deputado Barbosa de Melo o ter referido - é o princípio do restabelecimento dos órgãos de governo próprio. Ah, isso falta! Falta um ponto três - nisso estou de acordo - que diga, por exemplo que o Presidente da República pode decidir a dissolução dos órgãos, mas eles devem ser restabelecidos, porque isso faz parte do ordenamento constitucional, no mais curto prazo possível mediante a realização de eleições.
Desse ponto de vista, creio que, a haver uma proposta do PS, dela constaria, além da aceitação - como já foi referido - da qualificação dos actos como graves, esse ponto três que remeto para uma segunda leitura. Nem sequer vou fazer agora uma proposta de aditamento nesse sentido, ou melhor: poderei fazer a seguir, se tiver inspiração para isso.
Fico-me por aqui, tendo em conta o pedido do Sr. Presidente. Há muitas coisas que foram ditas, cuja necessidade compreendo em termos constitucionais, mas gostava de fazer uma declaração política, e é com isso que vou terminar.
Nós partimos do princípio de que isto é um caso limite e de que nós, os Açores e a Madeira - e falo agora pelos Açores -, queremos viver em conjunto com a Nação portuguesa e temos uma visão voluntária da Nação, não temos uma visão dela como algo anterior e que pré-estabelece as condições. Nós queremos viver em conjunto, é essa a melhor tradição política do que constitui um povo para aqueles que leram Rousseau, obviamente.
A soberania reside no povo e Rousseau faz aquela angustiada pergunta no fim: "Mas o que é que faz com que um povo seja um povo?". É uma pergunta a que ele não deu resposta, à qual nós, obviamente, temos de dar alguma, não é?! É a vontade de viver em conjunto! E então, em democracia política, nem vejo outra resposta! Portanto, esta vontade de viver em conjunto faz parte das decisões soberanas do Estado português, é por isso que eu falo deste ponto três. É óbvio que isto não pode ser o fim da autonomia, como o estado sítio e o de emergência não podem ser o fim do regime democrático em Portugal, não é verdade?
É quase por analogia que eu digo que falta aqui um ponto três e que aceito, de facto, que também não pode ser incluído algo logo após o primeiro acto contrário à Constituição. Aliás, é por isso que existe o Tribunal Constitucional, para ver se os actos são constitucionais, ou não, embora aqui…
Foi-me dado um exemplo, há pouco - com graça, obviamente -, que é o seguinte: vamos admitir que havia um presidente de um governo regional que metia o Ministro da República num avião à força. De facto, há aqui um caso em que há que considerar qual será a actuação a tomar.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Pode ser inconstitucional, mas grave não é!
Risos.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Portanto, é óbvio que o artigo faz sentido, mas tem que ser entendido como uma excepção que rapidamente deve ser ultrapassada.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, face à discussão, há que concluir que nenhuma das propostas apresentadas mostra viabilidade, salvo aquela que visa aditar o qualificativo de "graves" aos actos inconstitucionais.
O PS, através do Sr. Deputado Medeiros Ferreira, deixou em aberto a possibilidade de adiantar uma proposta que explicite a necessidade de restabelecimento dos órgãos regionais. Digo explicite, porque, obviamente, basta ler os comentários à Constituição para ver que se trata de uma disposição necessariamente transitória que se aplica enquanto se mantiverem as razões que motivaram a dissolução.
Página 1802
Srs. Deputados, vamos passar às matérias que não correspondem a nenhum dos artigos do Título das Regiões Autónomas, mas que foram adiantadas por vários projectos, começando pela dos Deputados do PSD, Guilherme Silva e outros, de considerar cada uma das regiões autónomas como um círculo eleitoral próprio para o Parlamento Europeu elegendo um Deputado - artigo 236.º-A.
Para apresentar a proposta, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, não é a primeira vez que propomos esta solução em sede de revisão constitucional.
Parece-nos adequado à autonomia das regiões da Madeira e dos Açores poderem constituir um círculo eleitoral próprio para o Parlamento Europeu. Isso não colide com nenhum princípio de direito eleitoral, nem com nenhum princípio que tenha que ver com a unidade nacional.
Além disso, pensamos que os mecanismos de representatividade da região no Parlamento Europeu, como parte do Estado português, seriam melhores e mais adequados, mesmo ao nível do funcionamento das candidaturas dos vários partidos no âmbito regional, sem se recorrer ao sistema que tem sido encontrado, que é o de haver algum compromisso de os partidos, a nível nacional, colocarem em lugar elegível candidatos oriundos das regiões autónomas e identificados com as questões destas.
Parece-nos que esta fórmula seria mais adequada e espero que tenha acolhimento das várias bancadas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esta proposta está à consideração.
Não havendo ninguém inscrito, inscrevo-me eu, para dizer que estou, obviamente, contra esta proposta, uma vez que ela colide com dois princípios essenciais, sendo um deles - é evidente - o princípio da proporcionalidade. Os círculos uninominais são incompatíveis com o princípio da proporcionalidade, e esse é constitucional...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Excepcionalmente a doutrina admite.
O Sr. Presidente: - Não admite! A boa doutrina não admite!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, olhe que sim! Veja o caso...
Uma voz não identificada: - Já agora, pode indicar doutrina que o admita!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * E indico-lhe. Amanhã trarei exactamente doutrina que o admite excepcionalmente, mesmo na representação proporcional, quando for excessiva… É o caso da Ilha do Corvo, do Carteiro do CDS-PP.
Risos.
O Sr. Presidente: - Aí até são dois casos, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Por isso mesmo! Excessivo! São situações em que se permite!
O Sr. Presidente: - Situações inconstitucionais só existem na Madeira!…
Em segundo lugar, e sobretudo, colide com um princípio, esse politicamente básico, da representação unitária externa da República na União Europeia. A partir do momento em que existisse um Deputado eleito pela Madeira e outro pelos Açores passaria a haver na União Europeia uma representação externa pelos Açores, pela Madeira e pelo Continente. Isso é óbvio! Isso é absolutamente inultrapassável!
Sr. Deputados, acabei a minha intervenção.
Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, posso pedir-lhe um esclarecimento?
O Sr. Presidente: - Pode, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * O Sr. Presidente pensa mesmo que se, em termos da nossa estrutura eleitoral para o Parlamento Europeu, assumíssemos a divisão de Portugal em três círculos isso envolveria uma representação das regiões desfasada da representação nacional, desfasada da do Estado português?
O Sr. Presidente: - Juridicamente não! Politicamente sim! Tenho isso como óbvio.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Ó Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, eu gostava de dialogar com o Sr. Deputado Guilherme Silva e com o Sr. Presidente um por um, mas assim vou ter que o fazer tendo em conta as diferentes posições dos dois. Ou seja, eu penso que nós até podemos vir a conceber uma situação dessas, mas penso que ela não deve figurar na Constituição, em primeiro lugar, e é por isso que não estamos de acordo.
Mas também gostava de responder ao Sr. Presidente Vital Moreira, com o maior respeito - que, aliás, é cada vez maior -, dizendo-lhe que nada tem que ver com a interpretação que ele faz da representação política externa e lamento, sinceramente, que possa haver essa interpretação.
Um dos problemas que se coloca hoje em dia nas eleições para o Parlamento Europeu é o de haver ou não uniformidade de leis eleitorais nos Estados membros para o Parlamento Europeu, isto porque, como o Sr. Presidente sabe, com certeza, há diferentes modos de eleição para o Parlamento Europeu conforme as leis eleitorais internas dos Estados membros, havendo desde os círculos uninominais ingleses, aos círculos nacionais, como é o caso de Portugal, até à divisão interna dos países por círculos eleitorais, como é o caso da França, etc. Portanto, não há qualquer uniformidade nos critérios e nas leis eleitorais para o Parlamento Europeu. Aliás, esse é um dos problemas que se coloca...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado, eu não utilizei esse argumento.
Página 1803
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Não, mas a argumentação que o Sr. Presidente fez, com a sua particular sensibilidade nesta matéria, de que se existissem três círculos eleitorais em Portugal isso poderia ser visto politicamente como uma tríplice representação do povo português, sinceramente, cai pela base se soubermos que os 80 Deputados alemães são eleitos em bases muitos diferentes de um círculo nacional...
O Sr. Presidente: - Não, um por länder.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Mas, Sr. Presidente, eu não desposei a proposta do Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: - Pois, ainda bem. Estranho seria o contrário!
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Estou a dizer-lhe que não posso concordar com a sua interpretação política de que a existência de 3, 5 ou 10 círculos eleitorais, em Portugal, para o Parlamento Europeu, significaria,…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Até poderia haver outra divisão do Continente.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - … do ponto de vista político, uma representação externa diferente esses círculos.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Mas podia haver!
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - É aí que eu não concordo! E como, no fundo, estamos a fazer uma discussão séria, profunda, e com a sua capacidade conceptual e, depois, doutrinal e interpretativa, estas coisas podem ter uma consagração excessiva e negativa, porque depois há todos esses alunos de Direito que se multiplicam, gostaria exactamente de contrariar a sua intervenção, dizendo ao Sr. Deputado Guilherme Silva, que, obviamente, não aceitamos a constitucionalização desta proposta.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Medeiros Ferreira, contrariado está o meu ponto de vista que se mantém.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, pela minha parte quero dizer o seguinte: em primeiro lugar, a boa doutrina em matéria de proporcionalidade - já agora, gostaria que o Sr. Deputado me fornecesse outra - aponta para uma ideia, que é a de que em círculos eleitorais de menos de quatro, cinco mandatos não se exprime o princípio da proporcionalidade. Isto significa, por exemplo, que o princípio não se exprime, efectivamente, naquela enorme quantidade de círculos de dois Deputados que há na Madeira - este é o primeiro aspecto.
Há um outro argumento que me parece extraordinariamente importante nesta matéria, que é o princípio da igualdade. Já que Portugal tem, como é sabido, 24 membros no Parlamento Europeu a proposta do Sr. Deputado apontaria mais ou menos para o seguinte: um Deputado dos Açores e da Madeira corresponderia a bem menos eleitores do que os Deputados do Continente. Isto é, um Deputado dos Açores e da Madeira corresponderia a cerca de 150 000 eleitores e um Deputado do Continente corresponderia a um número bem mais significativo, da ordem dos 360 000 eleitores, o que significa que seria grosseiramente violado o princípio da igualdade, o qual, a nosso ver, é fundamental.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado, deixe-me dizer-lhe que se conseguia alguma proporcionalidade numa "uninominalidade".
O Sr. Luís Sá (PCP): - Quanto ao argumento da unidade de representação externa, é evidente que ele pode não valer do ponto de vista formal. Isto é, do ponto de vista dos tratados que instituem a União Europeia até é sabido que os Deputados não representam os países pelos quais são eleitos - este princípio é conhecido.
Contudo, isto não significa, de forma alguma, que, do ponto de vista substancial, político, não se introduzisse, efectivamente, uma quebra da unidade de representação externa ao estabelecer que determinadas regiões tinham um Deputado que as representava não havendo, de resto, o estabelecimento do mesmo princípio para as regiões administrativas do Continente, que não existem, e que o Sr. Deputado, aliás, não propõe que venham a existir.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Pode vir a haver!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Portanto, creio que o argumento do Sr. Presidente pode não fazer sentido do ponto de vista estritamente jurídico-formal, mas faz inteiramente sentido do ponto de vista político, do ponto de vista substancial.
Quanto à questão que o Sr. Deputado Medeiros Ferreira referiu, a das leis eleitorais uniformes para o Parlamento Europeu, esta, como se sabe, é uma aspiração designadamente dos ultra-europeistas, inclusive com argumentos que me parecem de todo em todo descabidos, isto é, chega-se a atribuir à diversidade das leis o facto de haver altos níveis de abstenção numa séria de países da comunidade europeia e, a meu ver, uma coisa não tem nada que a ver com a outra. Há aqui uma diversidade de culturas jurídicas e, nesta matéria, a União Europeia tem de ser construída respeitando a diversidade de culturas políticas nela existentes, como julgo ser o pensamento do Sr. Deputado Medeiros Ferreira, que - tenho essa felicidade - conheço nesta matéria.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, posso dar uma resposta ao Sr. Deputado Luís Sá, muito rapidamente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Deputado, eu não propus o critério uniforme para o Parlamento Europeu,…
O Sr. Luís Sá (PCP): - Isso ficou claro!
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - … o que eu quis foi chamar a atenção para o facto de existirem vários modos de eleição para o Parlamento Europeu e que, portanto, um país como a França não se sente diminuído na sua unidade nacional por ter vários círculos eleitorais para o Parlamento Europeu. Em nada!… Pelo contrário!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Já agora, se me permite, com uma divergência Sr. Deputado: essa diferença de círculos
Página 1804
eleitorais é para o conjunto do território nacional e não para privilegiar uma parte do território nacional em relação ao restante. Mais, ...
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): -Não tenho a certeza, quanto aos deputados dos territórios d'Outremer ou da Reunião, se corresponde ao princípio proporcional…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Não corresponde de certeza!…
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - … quando esse princípio proporcional existe em França, porque nós sabemos que as leis têm...
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Deputado, nesta matéria nós sabemos que as diversidades são muitas!… Sei que a Dinamarca, por exemplo, tem o princípio maioritário nas ilhas e tem o princípio proporcional no resto do território! Cada país tem a sua própria cultura e os seus próprios hábitos e eu creio que esta cultura e estes hábitos têm de ser respeitados. É saudável que o sejam!… Mal estará quando houver uniformidade em coisa que não tem nada que haver!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados a proposta não tem viabilidade. Vamos passar ao tema relativo aos círculos eleitorais exteriores às regiões autónomas.
Sobre esta matéria há propostas apresentadas pelo Sr. Deputado António Trindade (artigo 227.º-A), pelo CDS-PP (artigo 233.º, n.º 2 quando fala em círculos eleitorais fora do território das regiões) e pelo Sr. Deputado Guilherme Silva (artigo 236.º-B, que era aquele onde estávamos).
Quanto a estas propostas existem os seguintes pontos: umas propõem um círculo, o que é o caso das propostas dos Srs. Deputados Guilherme Silva e António Trindade, e a outra propõe mais de um círculo, o que é o caso do CDS-PP, que fala expressamente em "círculos eleitorais"; quanto ao universo eleitoral, uma redu-lo aos residentes no estrangeiro - a proposta do Sr. Deputado Guilherme Silva - e outras abrangem todos os residentes fora da região autónoma respectiva, isto é, abrangem também os residentes no restante território nacional - que é o caso das propostas do CDS-PP e do Sr. Deputado António Trindade.
Srs. Deputados, estão à consideração estas três propostas quanto à admissão, obviamente e, no caso da sua admissão, quanto às modalidades concretas que elencam.
Pausa.
Têm a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.
O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, depois das suas palavras penso não ser necessário fazer qualquer apresentação da nossa proposta.
Assim, quero só dizer que, eventualmente, o Sr. Presidente terá interpretado extensivamente aquilo que o CDS-PP quis dizer. Na verdade, a nossa proposta refere círculos eleitorais mas não faz qualquer qualificação em relação ao universo eleitoral, reservando isso para outra sede.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a vossa proposta diz "podendo incluir círculos eleitorais fora do território das regiões", sem mais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, esta é uma "reivindicação" que se tem veiculado em várias ocasiões e que já se tentou consagrar por via legislativa, com algumas dificuldades que, penso que eu, esta proposta ultrapassou...
O Sr. Luís Sá (PCP): - Acto inconstitucional grave, de resto.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Não era bem um acto inconstitucional grave, mas entendia-se que havia inconstitucionalidade por se falar na naturalidade, o que me parece que tem alguma razão de ser.
Esta proposta não vai para aí, é um problema de origem da emigração relativamente às regiões autónomas. É sabido que as regiões têm colónias de emigrantes bastantes grandes, que com ela mantêm laços muito fortes, que têm acompanhado o processo autonómico, que gostam de participar e que a elas vão com frequência. Aliás, têm-se acentuado os organismos que reúnem as comunidades de emigrantes e as mantêm ligadas à região e a Portugal e parece que é tempo de se passar a actos e a não ficar apenas por palavras.
Não podemos falar muito reconhecidamente dos nossos emigrantes, daquilo que é o seu empenho na afirmação da região e do país no estrangeiro, querer acentuar esses laços e ver como boas as suas remessas e os seus investimentos e não lhes conferir direitos fundamentais, como é o caso do direito de voto para a escolha de representantes nas suas instituições.
Portanto, parece-me que tem todo o cabimento, em terras de forte emigração, que têm quiçá mais população emigrada do que a existente nas próprias regiões, encontrar uma forma, que naturalmente a lei acautelará em termos dos requisitos para o exercício do direito de voto, que se deverá aqui consagrar como princípio e como círculo da emigração, tal qual existe já hoje em relação à Assembleia da República. Assim, não se vê que haja qualquer obstáculo em que o mesmo aconteça relativamente às assembleias legislativas regionais e diria que até, por maioria de razão, tal se justifica, em particular, em relação às assembleias legislativas regionais.
Há sempre quem levante problemas sobre a regularidade ou, pelo menos, a transparência dos processos de intervenção dos emigrantes, mas é evidente que há meios legais de o garantir, há meios de pôr as nossas representações, designadamente os Consulados, a terem uma intervenção neste tipo de processos - aliás, outros países têm encontrado forma de garantir a genuinidade dos votos.
Portanto, repito, nós já o temos em relação à Assembleia da República, não há qualquer obstáculo do meu ponto de vista e seria tempo de assumirmos, em sede de revisão constitucional, a consagração do direito de voto, que também já foi posto em relação ao Presidente da República e é acrescido agora às assembleias legislativas regionais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Arlindo Oliveira, quer adiantar alguma coisa à proposta do artigo 227.º-A, apresentada pelo Sr. Deputado António Trindade?
O Sr. Arlindo Oliveira (PS): * Sr. Presidente, estamos de acordo com a criação deste círculo, discordando apenas um pouco que seja um círculo da emigração. Preferimos
Página 1805
um círculo para os não residentes, porque, segundo a proposta do Sr. Deputado Guilherme Silva, se os madeirenses estiverem a viver no Continente continuam a não poder votar na Madeira, já que os que vivem no Continente não são emigrantes.
Assim, prefiro a proposta apresentada por nós, que está muito mais coerente e muito mais abrangente.
O Sr. Presidente: - Essa diferença é vista nas duas propostas e por mim não leva a aderir a nenhuma, mas é óbvio que existe essa diferença.
Srs. Deputados, estão à discussão as propostas feitas nos termos em que foram apresentadas, com as diferenças que eu pus em relevo, quanto a um círculo ou mais de um círculo, quanto ao universo eleitoral de só residentes no estrangeiro ou também dos residentes no demais território nacional.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, parece-me que um princípio inerente a todas as chamadas pessoas colectivas de população e território é o de o território determinar a população respectiva, delimitar, portanto, as atribuições e competências, determinar o respectivo corpo eleitoral e determinar aqueles que têm direito a participar nos respectivos actos políticos administrativos.
Estas propostas vêm, todas elas, em vez do princípio da residência, da vizinhança - e do princípio da residência que é característico deste tipo de pessoas colectivas públicas territoriais -, criar um princípio de jus sanguinis, seja para os residentes no estrangeiro seja para os residentes no estrangeiro e no Continente.
É evidente que a ruptura com o princípio da residência e a opção pelo princípio da naturalidade implica a criação de uma figura aproximada da da nacionalidade. E naturalmente, como compreenderão, isto não corresponde ao conceito de estado unitário com regiões autónomas que consta actualmente da Constituição; pelo contrário, romperia com um princípio que nos parece fundamental nesta matéria, o de que quem tem direitos e quem constitui o substracto populacional da pessoa colectiva territorial respectiva é quem reside no território dessa pessoa colectiva pública.
Julgamos que é lamentável a existência de tantos emigrantes em território estrangeiro - pois tiveram de ir procurar o trabalho que não encontraram em Portugal, ou melhores condições de vida que não encontraram nas próprias regiões autónomas -, mas esta é uma situação com a qual, infelizmente, teremos que viver mais algum tempo.
Cremos, no entanto, que o problema dos direitos dos emigrantes não se resolve com medidas que, em minha opinião, constituiriam uma subversão profunda de princípios fundamentais de um Estado de direito democrático unitário e descentralizado, como aquele que defendemos e que consta actualmente da nossa Constituição.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continua à discussão.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, é apenas para um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Luís Sá.
Sr. Deputado Luís Sá, um dos aspectos que V. Ex.ª envolveu e enfatizou na sua crítica foi a questão de, eventualmente, se estar aqui à volta de um critério de naturalidade versus nacionalidade.
Se reparar, na proposta que apresento falo nos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro emigrados das regiões autónomas - dos estados regionais é uma questão ultrapassada. Portanto, o problema não é o da naturalidade, porque, é evidente, há uma fixação na lei mais rigorosa dos requisitos para o exercício de direito de voto. Não há aqui um problema da naturalidade! Consequentemente, pode perfeitamente incluir-se no exercício deste direito pessoas que não são naturais de nenhuma das regiões autónomas mas que lá residem e de lá emigram para outro sítio qualquer, que têm um vínculo de passado, de vivência, de conhecimento, de participação que não tem absolutamente nada a ver com a naturalidade.
Agora, se me perguntar: mas a maioria será? Será, mas não é esse o requisito que, legal e constitucionalmente, se pretende e deve estabelecer para conferir este direito de voto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Deputado, o que tenho a responder é que todos os sistemas jurídicos que conferem a nacionalidade e a cidadania na base dos jus sanguinis também admitem a naturalização de quem tem um mínimo de período de residência, um mínimo de condições.
Ora, aquilo que o Sr. Deputado vem dizer para responder à minha questão é que admite que este direito, para além de ser conferido aos nacionais da Madeira seja também conferido aos naturalizados, o que, naturalmente, não responde à minha objecção e ao meu problema de fundo.
E o problema de fundo é este que o Sr. Deputado não consegue contornar: as pessoas colectivas territoriais conferem direitos a quem reside nessas pessoas colectivas territoriais, seja o município, seja a freguesia, seja a região autónoma, seja qualquer outra figura. O Sr. Deputado quer conferir direitos na base da naturalidade ou na base da residência - naturalmente que a lei diria - por um período mínimo que obrigaria a um recenseamento específico e que levaria a uma equivalência com a própria naturalidade.
Creio que isso não resolve o problema que coloquei que é o de estarmos actualmente perante pessoas colectivas territoriais ou, se quiser, perante pessoas colectivas de população e território e não perante pessoas colectivas naturais ou naturalizadas de um determinado território.
Portanto, há aqui uma subversão profunda, que não pode negar de forma alguma.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, antes de continuar a minha intervenção gostava de saber se, de facto, ficou assente no artigo 229.º a caracterização das regiões autónomas como pessoas colectivas de carácter territorial.
Página 1806
O Sr. Presidente: - O que não me parece que resolva a questão em todo o caso, Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Não?!… Pensei que ajudava aqui…
O Sr. Presidente: - Não. O Estado é uma pessoa colectiva territorial e o problema é ser uma pessoa colectiva infra-estadual, infranacional. Portanto, a caracterização como pessoa colectiva territorial não…
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Não me ajuda muito aqui.
De qualquer maneira, compreendo o pensamento desta proposta - quem vive nos Açores e até quem tem família lá sabe o que isso significa - e acho, de uma maneira geral, que estes círculos de emigração, ou como se lhes queira chamar, são sempre muito delicados politicamente.
Há um País muito recente, que nem sequer tem uma grande emigração, o Canadá, que possui uma lei muito interessante desse ponto de vista: admite que os seus cidadãos…
O Sr. Presidente: - Imigração com "i"!
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Com "e".
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Tem pouca com "e"?
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sim, sim, tem pouca com "e".
O Sr. Presidente: - Ah!… Tem muita com "i".
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - É quase toda!
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Como dizia, o Canadá admite o círculo eleitoral pela emigração, com "e", mas com muitas condicionantes. Uma delas ...
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas nacional?!…
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sim, nacional.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Nacional nós admitimos, não está em causa, ninguém contesta isso!…
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Posso continuar?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Eu só gostava de saber se o Sr. Deputado Medeiros Ferreira concordava com a proposta.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Não, não, só estou a dizer as dificuldades que isso coloca. Mas mesmo o Canadá limita, ou seja, acha que alguém que saiu do Canadá, não sei se há mais de 5 ou de 10 anos, não está em condições de votar.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Deputado, esses pormenores são para a lei ordinária, que está aqui prevista!
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Mas isto depois arrasta uma série de expectativas dos próprios emigrantes. Aqui também se deve argumentar pouco, porque o que se verifica aqui é uma grande dificuldade real...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Pois há, mas temos outra, temos a ...
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - ... não só na contemplação de laços afectivos que existe mas também na contemporização com situações múltiplas - algumas, aliás, já foram aqui descritas - de facilidade e até de confusão de cidadanias.
O que é que eu quero dizer com isto? A nossa lei permite, de uma certa maneira, a dupla nacionalidade e, de certa maneira, eu vejo muito bem o nosso emigrante votar, por exemplo, Partido Democrático no estado Massachusetts...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * … e PSD em Portugal.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - E votar PSD em Portugal. Portanto, a fé é mais à direita em Portugal.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O Partido Democrático é de esquerda?
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Não, mas aquele é um contexto, como sabe, em que democrático significa liberal, o que acontece também no contexto anglo-saxónico.
Portanto, haveria aqui como que a introdução de uma certa perversidade!…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * É exactamente para pressionar esses casos de discernimento político que nós queremos consagrar esta...
Vozes sobrepostas, inaudíveis.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Srs. Deputados, gostava de terminar, até porque estou numa situação delicada a fazer esta argumentação.
A terceira questão que se põe é, obviamente, a das dificuldades de recenseamento, ou seja, que tipo de representação externa seria necessária para organizar esse recenseamento, para organizar a votação.
Portanto, há uma série de dificuldades de natureza organizacional que levam a que me pareça que esta proposta não é de reter. E é com alguma mágoa que o digo.
O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Deputado Medeiros Ferreira, eu estou cansado, mas mais cansado do que eu estão os emigrantes, de ouvir invocar problemas de intendência, problemas de organização, para lhes conferir este direito, designadamente o de votarem na eleição para Presidente da República. As dificuldades de ordem organizacional, a genuinidade do voto, a certeza do seu bom exercício, etc., tem sido o refúgio constante para protelar ou para não conceder este direito!…
Se, efectivamente, não somos capazes de na Constituição, por um lado, encontrar a redacção adequada, e, por outro, na lei que implementar e regular o exercício deste direito ter essas cautelas, se não temos uma organização
Página 1807
de representação externa, designadamente de base consular, capaz de, como outros países têm, junto das comunidades assegurar o exercício deste direito, então alguma coisa está mal na organização do Estado português e nós, até para fazer a pedagogia da correcção, temos a obrigação de criar mecanismos e direitos que os obrigue a estruturarem-se e a porem as máquinas a funcionar devidamente.
Reconheço que há dificuldades - é óbvio que há dificuldades -, mas há aqui um princípio, há aqui uma questão até de simbolismo! É evidente que não vamos transformar as assembleias legislativas regionais com o domínio da representação do círculo de emigração!…. Mas, como o Sr. Deputado sabe, as comunidades de emigrantes ressentem-se de ser marginalizadas, ressentem-se de não lhes ver conferido o direito de participar nas suas instituições nacionais e regionais e nós temos a obrigação de fortalecer os laços entre essas comunidades e o todo nacional e regional, removendo as dificuldades, designadamente estas.
É óbvio que a posição do Sr. Deputado Luís Sá sobre o problemas das pessoas colectivas de base territorial é um argumento meramente teórico e doutrinário, porque há aqui um vínculo também de natureza territorial que é a ex-residência nos territórios de onde se emigrou. Não é uma desconexão total com o problema da pessoa colectiva de base territorial, há esse elemento que à partida é, aliás, o elemento definidor de ser conferido esse direito, é o elemento base. Portanto, não há aqui uma desconexão total com esse princípio que aceitou como impeditivo e que não é, efectivamente, impeditivo de um reconhecimento em sede constitucional deste direito.
O Sr. Deputado Medeiros Ferreira acabou a sua intervenção com mágoa por ter de expressar as dificuldades e o mar de problemas que esta proposta levanta e eu vou terminar a minha lamentando que o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, que é um homem de combate, não reuna aí força bastante para removermos esse mar de dificuldades.
O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, estou inscrito.
Estas questões obviamente não respeitam, obviamente, aos Deputados insulares, respeitam também aos Deputados do resto da República e respeitam a mim.
Assim, quero dizer que a minha oposição a este tipo de proposta nada tem a ver com questões de prática ou de intendência, porque senão também não haveria Deputados na Assembleia da República por círculos exteriores e eles existem, com mais ou menos dificuldades. É um problema de princípio, pura e simplesmente de princípio. Admitir círculos de naturais ou de ex-residentes das regiões autónomas fora das regiões seria admitir uma subnacionalidade, seria admitir que a colectividade base das regiões autónomas não é apenas dos residentes onde quer que tenham nascido, tenham eles nascido na Madeira, nos Açores, no resto do território nacional ou no estrangeiro. Qualquer cidadão nacional residente nas regiões autónomas é membro da colectividade nacional, qualquer residente fora das regiões autónomas não é membro da colectividade regional. Isto é uma questão de princípio!…
A partir do momento em que admitíssemos a extraterritorialidade política de uma região autónoma, teríamos uma subnação, teríamos um subestado. É esta a questão política essencial!… É uma questão teórica e doutrinária essencial!…
Portanto, daqui não se sai, não é uma questão de problema!… Para mim, não há problema prático nenhum!… Problema prático seria exactamente o mesmo que se põe em relação aos círculos da emigração para a Assembleia da República!… O problema é de princípio, é um problema básico! De resto, não conheço sequer um só estado federal onde os estados federados tenham círculos desta natureza!… A questão é de extraterritorialidade política! Só devemos ter um Estado e por isso somos Estado e não um conjunto de subestados ou um estado com estados subsidiários, com estados agregados ou uma nacionalidade portuguesa depois com subnacionalidades madeirenses ou açoreanas, que, de resto, teríamos de definir!… Estas propostas implicariam uma lei de subnacionalidade açoreana, uma lei de subnacionalidade madeirense, de naturais, de naturalizados por residência durante 5 ou 10 anos, etc.
Isso, Srs. Deputados, não. Comigo não!… É uma questão de princípio e não de problema.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, com toda a franqueza, relativamente a estas últimas intervenções acho que estamos a desfocar um bocadinho a questão. A verdade, com toda a clareza, é que a Constituição, ao contrário do que faz para as regiões autónomas, circunscreve o universo eleitoral, os sufrágios, aos cidadãos residentes. E não o faz podendo fazê-lo!… Optou por não fazer!… E não o fazendo, do meu ponto de vista, esta posição é possível actualmente sem revisão constitucional.
Mais: sei que o Governo Regional dos Açores - e o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, provavelmente, também deve saber - esforçou-se, em tempos, pela hipótese de consolidar a existência de um círculo eleitoral de não residentes, o que não aconteceu.
É pena não estar aqui o Deputado Mota Amaral, porque ele, muito melhor do que eu e com conhecimento de causa, poderia dar nota ...
O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, essa proposta, que, aliás, consta do estatuto autónomo regional, foi chumbada por unanimidade no Tribunal Constitucional.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, já agora deixe-me só terminar.
A doutrina do Tribunal Constitucional é a interpretação da Constituição e eu não sei exactamente qual era o mal que tinha aquela proposta em concreto. O Deputado Mota Amaral poderia explicar, melhor do que eu, que o principal óbice foi sempre o de montagem operativa do sistema.
Não sei exactamente por que é que o Tribunal Constitucional assim agiu, o Sr. Presidente, provavelmente, sabê-lo-á melhor do que eu, se participou ou não na formulação dessa decisão. Eventualmente, deve ter tido razões objectivas para chumbar a proposta que estava então em causa. Agora. a verdade é que o texto constitucional não faz esta distinção, não cinge o universo eleitoral aos cidadãos residentes, como o faz no capítulo do poder local, no acto eleitoral para as regiões, para os municípios e para as freguesias.
Portanto, actualmente, do meu ponto de vista, a Constituição deixa em aberto essa probabilidade. Se é possível ou não às leis eleitorais, aos estatutos político-administrativos, configurarem uma solução para o problema, eu tenho dúvidas e a experiência do Sr. Deputado Mota Amaral… Não falo da experiência da Madeira, porque os
Página 1808
responsáveis madeirenses, pessoalmente, nunca me falaram no assunto, mas sei, por conversas que já tive com o Sr. Deputado Mota Amaral, que a experiência da autonomia regional açoriana deparou-se com dificuldades, fundamentalmente de ordem prática. Não sei se depois, relativamente à formulação em concreto nos estatutos, tinha outro tipo de dificuldades ou não, mas também não é isso o que está em causa.
Portanto, do ponto de vista do PSD a Constituição tem actualmente essa distinção e ninguém propôs, nesta revisão constitucional, nem o PS, nem o PCP, nem o PSD, nem nenhum outro projecto, que fosse alterada, no artigo 233.º da Constituição, esta matéria. Ninguém, repito, propôs alteração nesta matéria, e, do ponto de vista do PSD, bem. Pode ser que de hoje a amanhã, com a evolução das coisas, nomeadamente com a evolução dos mecanismos de recenseamento, seja possível encontrar uma qualquer forma satisfatória que não fira o mecanismo constitucional, porque o princípio da restrição do universo eleitoral aos cidadãos residentes não existe constitucionalmente para este caso. Portanto, não existindo, se de hoje a amanhã se encontrar uma solução adequada, tudo bem!
De facto, incluir obrigatoriedade constitucional da criação deste círculo, quando a verdade é que não estão ultrapassados os problemas e as dificuldades práticas para a sua montagem operativa em termos equitativos e democraticamente adequados, parece-me ser "pôr o carro à frente dos bois", com toda a franqueza.
Apenas por esta razão o PSD não fez uma proposta sobre esta matéria. Conhecemos tentativas das autonomias no sentido de encontrar uma solução para a questão e a via constitucional, do meu ponto de vista, está aberta, uma vez que continua a não haver uma restrição do universo eleitoral para este sufrágio. Portanto, do nosso ponto de vista, a justeza, de que falava o Sr. Deputado Guilherme Silva, de tentar aperfeiçoar-se a democracia também neste plano e de tentar encontrar um mecanismo que permita às pessoas que continuam a sentir-se ligadas…
O Sr. Deputado Medeiros Ferreira sabe, com certeza, que tanto no caso da Madeira como no dos Açores - talvez até mais no caso dos Açores - há muitas famílias que estão dispersas, às vezes o núcleo central da família é residente na região autónoma e existe alguém da família que está fora! Mas há uma comunicabilidade muito grande e, portanto, representará, quiçá, um aprofundamento da própria democracia se esse tipo de cidadãos, que passam necessária e religiosamente um ou dois meses por ano na sua terra natal, aliás, fazem questão nisso, possam de alguma forma ter uma participação cívica e democrática na região autónoma.
Se isso for possível, será. A Constituição, do nosso ponto de vista, não veda actualmente, e bem, essa possibilidade. Portanto, é assim que deve equacionar-se o problema.
O Sr. Presidente: - Fica esta peculiar doutrina constitucional do PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, posso, desde o início, deduzir da sua argumentação que considera desnecessária a proposta do Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Considero que é "pôr o carro à frente dos bois"!
O Sr. Jorge Strecht Ribeiro (PS): - A questão não é operativa, mas de fundo, como diz e bem o Sr. Presidente, por um motivo pragmático e simplíssimo. O que é o madeirense e o que é o açoreano? Teríamos que definir previamente o que é o açoreano e, portanto, teríamos que ter uma lei da nacionalidade açoreana e uma lei da nacionalidade madeirense para dizer "os que nasceram", "os filhos de açoreanos", "os que residem nos Açores há cinco anos"…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não seria uma lei de nacionalidade mas, sim, de regionalidade!
Risos.
O Sr. Jorge Strecht Ribeiro (PS): - Sim, seria uma lei da regionalidade, mas é evidente que seria uma lei de nacionalidade.
Portanto, parece-me evidente que esta é uma questão de fundo, uma questão de princípio, e não de operacionalidade.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, peço a palavra só para insistir com o Sr. Deputado Jorge Strecht Ribeiro, pela simples razão de voltar a insistir-se no problema da naturalidade.
O Sr. Jorge Strecht Ribeiro (PS): - Desculpe, mas não falei em naturalidade, falei dos açoreanos e dos madeirenses! Peço imensa desculpa, mas a questão é prévia: quem é o açoreano? Quem é o madeirense?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Mas ninguém confere…
O Sr. Jorge Strecht Ribeiro (PS): - É o nascido no território? É o filho de…? É o que habita há mais de certo tempo?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Mas não se quer conferir o direito de voto nem ao madeirense nem ao açoreano; quer conferir-se o direito de voto aos emigrantes oriundos das regiões autónomas, que é uma coisa diferente. O Sr. Deputado pode fixar-se na Madeira, emigrar para o Canadá e poder ter direito de voto! Portanto, não se coloca aí o problema da naturalidade! O Sr. Deputado, por residir na Madeira cinco anos e emigrar para o Canadá, não passa a ser natural da Madeira.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta não se mostra viável, pelo que vamos passar à frente.
Para finalizar a matéria da regiões autónomas há ainda que analisar a questão do referendo regional.
Srs. Deputados, o referendo regional é proposto pelo CDS-PP, pelo PS, pelo PSD, pelo Sr. Deputado António Trindade, por Os Verdes, pelo Sr. Deputado Guilherme Silva e pelo Sr. Deputado Arménio Santos. As respectivas
Página 1809
fontes são as seguintes: CDS-PP, artigo 233.º-A; Deputado António Trindade, artigo 234.º-A; PSD, artigo 118.º, n.º 11; Deputado Arménio Santos, artigo 118.º, n.os 6 e 8; Os Verdes, artigo 118.º, n.º 9; Deputado Guilherme Silva, artigo 236.º-C; e PS, artigo 235.º-A.
São estas as fontes. Vou agora sistematizá-las para facilitar-vos a discussão.
Decisão para o referendo: a decisão para convocar o referendo cabe ao Presidente da República segundo os projectos do PS, do CDS-PP, do Sr. Deputado António Trindade, do Sr. Deputado Arménio Santos e do Sr. Deputado Guilherme Silva; cabe à assembleia legislativa regional, segundo os projectos do PSD e de Os Verdes.
No primeiro caso, convocação por decisão do Presidente da República, essa decisão é tomada sob proposta da assembleia legislativa regional, segundo os projectos do PS, do CDS-PP, do Sr. Deputado António Trindade e do Sr. Deputado Guilherme Silva; é tomada sob proposta da assembleia legislativa regional e também do governo regional no caso do projecto do Sr. Deputado Arménio Santos.
A iniciativa para a proposta de referendo junto da assembleia legislativa regional cabe, segundo o PS e o Sr. Deputado António Trindade, aos Deputados, aos grupos parlamentares e também aos cidadãos; cabe só aos Deputados e aos grupos parlamentares para o CDS-PP; cabe aos Deputados, aos grupos parlamentares e ao governo regional para o Sr. Deputado Arménio Santos.
Quanto ao objecto do referendo, as propostas são as seguintes: o referendo pode incidir sobre "questões de relevante interesse específico regional", segundo PS, o Sr. Deputado Arménio Santos e Os Verdes; sobre "matérias de interesse específico regional", segundo o PSD; sobre "matérias de interesse regional", segundo o Sr. Deputado Guilherme Silva; remetem o objecto para a lei, sem especificar, o CDS-PP e o Sr. Deputado António Trindade.
Quanto ao regime, todos remetem, com as necessárias adaptações, para o artigo 118.º, que regula o actual referendo de nível nacional.
Em todo o caso, chamo a atenção para que as remissões referem apenas os n.os 4, 5, 6, 7 e 8 do artigo 118.º, ignorando o n.º 3, relativo às questões orçamentais, financeiras e constitucionais, que não se aplicam aqui mas que hão-de aplicar-se, por exemplo, à proposta de estatuto regional.
Srs. Deputados, estão sistematizadas as propostas, o que, penso, dispensa a sua apresentação mas não a justificação das opções de cada uma delas.
Para a justificação das opções quanto a estes cinco pontos que elenquei (decisão, proposta, iniciativa, objecto e regime), peço que cada um dos proponentes - e são todos os partidos, excepto o PCP - justifiquem, se entenderem necessário, as respectivas opções, fazendo-o de forma sucinta.
Começo pelo CDS-PP, perguntando ao Sr. Deputado se quer acrescentar algo mais àquilo que eu já disse?
O Sr. Ferreira de Lemos (CDS-PP): - Não, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Segue-se o projecto do Sr. Deputado António Trindade e outros. Querem acrescentar algo mais?
O Sr. Arlindo Oliveira (PS): - Não, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Passamos ao projecto do PSD para o artigo 118.º, n.º 1. Sr. Deputado Barbosa de Melo, Sr. Deputado Miguel Macedo, querem intervir?
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Oferecemos o "merecimento dos autos".
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Arménio Santos não se encontra presente, bem como Os Verdes.
Sr. Deputado Guilherme Silva, quer referir-se à sua proposta de artigo 236.º-C?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Quero, sim, Sr. Presidente.
Em primeiro lugar, quero registar com agrado que me parece que da multiplicidade de propostas, de vários Deputados e de vários grupos parlamentares, teremos aqui uma matéria relativa às regiões autónomas que, com mais ou menos acertos, virá a merecer algum consenso. Penso que isto enriquece a autonomia e a democracia, sendo um instituto de democracia participativa que já hoje tem a sua consagração e expressão nacional e local. Havia, do meu ponto de vista, uma lacuna que com esta disposição se vem preencher.
Penso que as divergências não são muito profundas, embora admita que a minha proposta, até pela última observação do Sr. Presidente, possa ter algum polémica, designadamente no que diz respeito à possibilidade de referendar aspectos estatutários. De resto, em relação à definição do campo de intervenção do referendo, consideramos ser em matérias de interesse regional; a iniciativa parece-nos dever caber à assembleia legislativa regional; a decisão quanto à sua realização deve caber também, tal qual acontece ao nível do referendo nacional, ao Presidente da República; e as disposições estabelecidas na Constituição para o referendo nacional são adaptáveis, com uma alteração ou outra, ao funcionamento dos referendos regionais.
Sr. Presidente, é tudo quanto tinha a dizer sobre a apresentação desta proposta.
O Sr. Presidente: - Dou, agora, a palavra aos Srs. Deputados do PS para justificarem a apresentação da vossa proposta sobre o artigo 235.º-A.
Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, a nossa proposta ficou muito bem sistematizada na sua intervenção, pelo que não vale a pena justificá-la. Penso que o consenso nas matérias de decisão da proposta e da iniciativa são claros e, portanto, ficava-me por aqui.
O Sr. Presidente: - Então, Srs. Deputados, proponho que analisemos ponto a ponto.
Quanto à decisão da convocação do referendo, a quem compete a decisão final? As alternativas são apenas duas (eu teria proposto uma terceira, o Ministro da República), o Presidente da República e a assembleia legislativa regional, sendo a primeira do PS, do CDS-PP, do Deputado António Trindade, do Deputado Arménio Santos e do Deputado Guilherme Silva, e a segunda do PSD e de Os Verdes. Penso que é claramente maioritária a primeira alternativa. Não sei se o PSD abdica da sua alternativa a favor da primeira ou se a mantém como melhor solução.
Página 1810
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não, não abdicamos, Sr. Presidente, até porque não queria deixar de fazer aqui um paralelismo com uma iniciativa legislativa que o PSD recentemente apresentou na Assembleia da República e que visa a alteração do regime das consultas locais dos cidadãos, a qual justamente acompanha, com as devidas adaptações em matéria, quer de iniciativa quer até da decisão, aquilo que propomos neste artigo em relação a esta matéria.
O Sr. Presidente: - O que está hoje para o referendo local na Constituição é isso, são os órgãos deliberativos locais.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Mas essa iniciativa legislativa do PSD, Sr. Presidente, alarga o carácter do referendo, ou a natureza do referendo…
O Sr. Presidente: - Mas não alarga, de certeza, o órgão decisório!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não, isso é óbvio que não!
O Sr. Presidente: - A alternativa, se calhar, era o Governo Civil!
Risos.
O Sr. Miguel Macedo (PSD):- Convenhamos que era uma alternativa, Sr. Presidente! Mas em termos constitucionais não podia ser!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a questão é simples. Partindo do princípio que todos os outros proponentes não abdicam da sua proposta de ser um órgão exterior à região a tomar a decisão, pergunto se o PSD considera isso uma questão-chave para admitir a figura do referendo regional.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, aguardamos que o produto da reflexão desta Comissão, no seu conjunto, venha a dar uma solução sufragável pela maioria constitucional requerida para se fazer alteração. Portanto, ficamos em espera relativamente ao produto dessa reflexão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou abrir um breve espaço de argumentação sobre esta questão.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Já agora, se me permitisse, Sr. Presidente, queria aqui introduzir uma matéria, aliás, pondo em questão a própria formulação que fazemos nesta proposta do PSD.
Não sei se não valerá a pena a Comissão reflectir sobre um aspecto concreto, aliás, comum a quase todas as propostas, que é dizer-se que o referendo pode incidir sobre aspectos de interesse…
O Sr. Presidente: - Já lá vamos, Sr. Deputado! Agora, vamos analisar ponto a ponto, sendo que esse, obviamente, a meu ver, vai ser o mais complicado.
Srs. Deputados, vou agora dar um pequeno espaço de argumentação quanto à autoridade para decidir o referendo regional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, como o Grupo Parlamentar do PCP foi o único que não apresentou uma proposta nesta matéria, quero fazer uma declaração de carácter geral, se me permitir.
A posição do PCP será favorável ao referendo regional, naturalmente, em função de o respectivo regime ter o equilíbrio e a prudência que nos parecem adequadas. Este é um aspecto.
Passando ao segundo aspecto, creio que são de natureza diferente as questões que se colocam a uma consulta popular local, que por definição visa matéria estritamente administrativa, matéria, inclusive, que tem que ser da exclusiva competência da autarquia local respectiva. Este mesmo facto foi de tal ordem relevante que até hoje não houve nenhuma consulta popular local viabilizada pelo Tribunal Constitucional, como é sabido. Portanto, as questões são muito particulares.
Creio que fazer uma paralelo, como fez o Sr. Deputado Miguel Macedo, entre o regime das consultas populares locais e o das consultas regionais, o dos referendos regionais ou nacionais, que não esteve em causa, é de todo em todo inadequado.
Tudo isto para dizer que, neste contexto, creio que mereceria meditação e exame a questão aqui colocada de passagem pelo Sr. Presidente, mas que retomo. Refiro-me à ideia de ser o Ministro da República a decidir do referendo, isto é, alguém que simultaneamente estivesse ligado ao sistema político regional mas que fosse representante do Estado naquelas condições e tivesse, portanto, uma capacidade de julgamento tendo em conta a opinião, a natureza da proposta, etc. Mas que tivesse também outro tipo de cautelas e que ao mesmo tempo assegurasse uma preocupação que colocámos, bem como outros partidos, no momento em que discutimos a figura do Ministro da República, que é a de garantir o distanciamento do Presidente da República em relação às questões em debate no sistema político regional. Trata-se de um argumento que na altura produzimos, fizemos nosso e que julgamos importante, pelo que podia valer também para este caso.
Tudo isto para dizer que, para além das duas propostas que estão em cima da mesa para exame e meditação, creio que esta proposta merece também reflexão.
O Ministro da República é, como se sabe, uma figura nomeada pelo Presidente da República sob proposta do Primeiro-Ministro, portanto, com uma legitimidade e uma capacidade representativa que já aqui discutimos. Ao mesmo tempo asseguraria distanciamento, presença no local, mas também o não envolvimento do Presidente da República em questões que, obviamente, podem ser delicadas.
As várias propostas aqui apresentadas colocam, embora em termos diferentes, a questão do interesse específico, sendo que este conceito já fez correr rios de tinta, como é sabido, já foi objecto de um amplo tratamento e pode vir a colocar problemas delicados. Creio que haveria todo o interesse em não envolver o Presidente da República.
É evidente que se a questão é decidida pela assembleia legislativa regional, muito frequentemente vai ser decidida estritamente pelo partido maioritário, sem qualquer outra intervenção que não seja a intervenção fiscalizadora do Tribunal Constitucional.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
Página 1811
O Sr. Guilherme Silva (PSD): Sr. Presidente, quero deixar expresso um aspecto. Da nossa parte - e falo como subscritor deste projecto -, só temos abertura para uma de duas soluções quanto à decisão do referendo: ou aquela proposta por nós, isto é, ser decisão do Presidente da República; ou ser decisão da assembleia legislativa regional, o que, obviamente, envolveria alterações de redacção no nosso próprio texto.
A propósito deste diploma há uma questão constantemente aflorada ao longo da nossa discussão sobre a matéria das regiões autónomas, que é a seguinte: quando propomos que competências situadas ao nível do Ministro da República, designadamente, ou inovamos, como é o caso, em termos de conferir determinado tipo de competência ligadas às regiões autónomas ao Presidente da República, fazemo-lo sem nenhum complexo e com a vontade de deixar claro que sentimos a soberania portuguesa e a sua representação sem interpostas pessoas. Queremos sentir, como todos os portugueses, esta realidade à volta do Presidente da República. Não temos nenhum receio nem pejo em retirar competências, do ponto de vista "geográfico", hoje locais, porque estão no Ministro da República, passarem para o Presidente da República.
Também creio que já foi aqui repetido à exaustão o argumento que me parece completamente ultrapassado e falho de sentido. Sempre se diz que não podemos conferir determinado tipo de competências relativas às regiões autónomas ao Presidente da República porque este não pode correr o risco de se envolver em conflitos. O Presidente da República, hoje, já com as suas funções, tem um papel institucional que pode envolver conflitos com outros órgãos do Estado! O Presidente da República não tem que estar numa redoma, tem que estar na assunção dos problemas nacionais!
Do meu ponto de vista, se, em sede de revisão constitucional, estabelecermos uma área de maior intervenção do Presidente da República relativamente às regiões autónomas, estamos a reforçar a ideia de unidade nacional, a ideia de que há um Presidente de todos os portugueses, de que há uma ligação directa das instituições regionais e dos cidadãos das regiões autónomas ao Presidente da República e a criar cada vez mais condições para que se acabe, de uma vez por todas, com a figura do Ministro da República, que baralha esta questão, sempre sustentada numa ideia de "almofada" do Presidente da República.
Um Presidente da República não pode precisar de "almofada" relativamente a nenhum espaço nacional, a nenhum órgão nacional, seja local, regional ou nacional. Este argumento não pode continuar a ser utilizado à exaustão, como tem sido aqui repetidamente utilizado!…
O Sr. Presidente: - Pode, pode!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): Não pode, Sr. Presidente! Peço desculpa, mas trata-se de uma de suspeição que as regiões são sempre uma fonte de conflito! Não são, nem têm de ser! Temos de criar uma normalidade e não é com este tipo de argumentação que a criamos!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continua à discussão a matéria da competência para a decisão de convocação do referendo regional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.
O Sr. Miguel Macedo (PSD):- Sr. Presidente, peço a palavra para falar sobre essa matéria e, já agora, também para responder ao Sr. Deputado Luís Sá.
O argumento de que não houve ainda nenhuma consulta local é perfeitamente reversível, porque também não houve até agora nenhum referendo nacional sobre matéria alguma. Portanto, nesse plano, o ponto de partida…
O Sr. Luís Sá (PCP): - Peço desculpa por interrompê-lo, Sr. Deputado, mas há uma diferença muito profunda. Houve muitas tentativas de autarquias locais, que se confrontaram com a declaração de inconstitucionalidade, mas, como sabe, não houve tentativas de referendos nacionais nem regionais!
O Sr. Miguel Macedo (PSD):- Tentativas, houve!
Nesse plano, estamos exactamente no mesmo ponto de partida, porventura infelizmente e, de certeza, contra a vontade do PSD. Mas, enfim, essa é outra conversa!…
O que mais me impressiona na argumentação do Sr. Deputado Luís Sá é o início da mesma, dizendo "não propusemos nada sobre esta matéria, mas estamos de acordo com o referendo". Obviamente, saudamos essa postura na parte em que diz que está de acordo com o princípio do referendo regional, mas creio que ela não esconde, bem pelo contrário,…
O Sr. Luís Sá (PCP): - Eu reservei a posição em função dos termos em que vier a ser consagrada! Foi prudência!…
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Ó Sr. Deputado, temos a certeza que o PCP vai ser prudente nesta matéria…
O Sr. Luís Sá (PCP): - Nós não temos 2/3, Sr. Deputado!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): Nenhum de nós tem!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Essa posição não esconde, bem pelo contrário, revela de uma forma particularmente expressa, a desconfiança de princípio que o PCP tem em relação a este tipo de questões.
O que nesta primeira volta importa reflectir na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, do nosso ponto de vista, é o seguinte: há ou não interesse em consagrar na Constituição a possibilidade de um referendo regional? Depois, qual o pacote, qual o formato, em concreto de que há-de revestir-se o procedimento para alcançar este objectivo é uma questão secundária. Sendo importante, é secundária, no sentido em que, obviamente, não vai ser por isso que deixamos de consagrar aquilo que é o mais importante, ou seja, a possibilidade de referendo regional.
Em relação à questão do procedimento…
O Sr. Presidente: - Ainda estamos a falar da decisão, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Em relação à decisão, Sr. Presidente, quero só dizer que a solução do PSD tem em conta aquela que tinha apresentado para o referendo nacional, já aqui discutido na comissão de revisão constitucional. É em homenagem a essa coerência que estava estabelecido o que consta da proposta do PSD.
Página 1812
O Sr. Presidente: - Penso que devemos começar a estabelecer posições.
Caso a proposta do PSD não obtenha convencimento, tem ou não abertura à proposta alternativa, que é a da convocação…
O Sr. Miguel Macedo (PSD):- Temos, nos termos que aqui referi! O importante, do nosso ponto de vista, é a consagração constitucional da possibilidade do referendo regional. A formatação e o procedimento para esse efeito é, obviamente, uma questão que está em aberto e que vamos todos ter que ponderar e discutir muito bem, sem perder de vista quer a solução que for encontrada para o referendo nacional…
O Sr. Presidente: - Isso já está decidido, Sr. Deputado!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Está bem! Está decidido aqui na Comissão, quer essa matéria quer também aquela que vai decorrer da discussão quanto à questão das consultas locais. Não se podendo estabelecer um estrito paralelismo entre as duas matérias, não creio que possamos perder de vista aquilo que queremos fazer em relação à questão das consultas locais.
O Sr. Presidente: - Ninguém propôs alteração quanto à matéria da competência para decidir os referendos locais, Sr. Deputado!
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, creio que não estamos a seguir um método muito produtivo neste ponto. V. Ex.ª indicou cinco itens para discutirmos, e está a olhar para eles como cinco segmentos sem intercomunicação.
O Sr. Presidente: - Não!…
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Por exemplo, o item da decisão quanto ao referendo está obviamente ligado à matéria sobre a qual podem incidir os referendos. Se os referendos são regionais e se incidirem só sobre matéria de interesses especifico para a região, pergunto por que é chamado aqui o Presidente da República! Há aqui alguma desconfiança em relação ao poder regional? Não, querem ouvir os seus concidadãos sobre um tema qualquer!
Por que não é normal a assembleia legislativa regional perguntar aos seus residente o que querem sobre este, aquele ou aqueloutro ponto, sendo certo que na nossa proposta os referendos regionais incidem sobre matéria de interesse específico para a região? Chamar aqui o Presidente da República constantemente é limitar a capacidade referendária do poder regional!
O Sr. Presidente: - Sem dúvida, Sr. Deputado! Parece que está adquirido que isso é limitativo!
Srs. Deputados, então, para já, ficamos no non liquet quanto a esta matéria.
Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, o meu argumento pode parecer menor a partir do que aqui foi dito, mas creio que ser o Presidente da República a convocar ou a decidir sobre o referendo também tem uma certa lógica. A seguir ao referendo tem que haver um acto eleitoral, sendo que a própria marcação desse acto eleitoral é da competência do Presidente da República. Alguém tem de convocar o processo de referendo, não é assim? Quem é que convoca o referendo?
O Sr. Presidente: - No caso dos referendos locais é o presidente da assembleia municipal!
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Atenção! Teria que haver aí uma certa...
O Sr. Miguel Macedo (PSD):- Com prazo para decisão, aliás!
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Pois, com prazo de decisão.
Vejo aqui a função do Presidente da República como uma garantia de que o recurso ao referendo regional se faz dentro do âmbito das matérias específicas da região, tendo em conta a avaliação do seu interesse e o empenhamento da República na execução desse acto referendário, com toda a limpeza de procedimentos e o empenhamento da máquina do Estado em tudo o que envolve o acto eleitoral, isto é, uma votação. É óbvio que é a máquina administrativa do Estado que, normalmente, até aqui pelo menos, assegura a lisura, a contagem da votação e, portanto, faz um certo sentido que seja o Presidente da República a decidir.
O Sr. Presidente: - Vamos passar ao segundo item, sendo que este último fica claramente non liquet para já, ainda que o segundo dependa da solução do primeiro.
Quanto ao objecto do referendo há as seguintes alternativas, que vou referir sem problemas de ordem.
Há quem remeta para a lei, sendo o caso do CDS-PP, dizendo "nos casos e nos termos previstos na lei"; o PS, o Deputado Arménio Santos e os Verdes referem-se a "questões de relevante interesse específico regional"; o PSD refere-se a "matérias de interesse específico regional", retirando a palavra relevante e o Sr. Deputado Guilherme Silva fala em "matérias só de interesse regional" sem interesse específico. Portanto referi a questão do mais estrito para o menos estrito.
Srs. Deputados, está à discussão este item relativo ao âmbito e objecto dos referendos regionais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Penso que é óbvio que a matéria de referendo é relevante, independentemente de estar expresso que é matéria de relevante interesse regional, isto porque não se fazem referendos por qualquer questão menor.
Não me parece que seja adequado trazer para aqui o conceito de interesse específico, que tem delimitado as competências legislativas da assembleia legislativa regional e que tem originado grande doutrina e jurisprudência, a qual é conhecida, porque já tem até algumas conotações de carácter restritivo, pelo que não me parece que se caminhasse bem, desde já, para a definição do referendo regional com a introdução desse conceito.
Parece-me que deverá ser feita a avaliação casuísta da delimitação da matéria de interesse regional, mas penso que seria bom que partíssemos de um conceito novo, não já construído, com vicissitudes, como é o interesse específico, para elaborar uma definição que pode vir amputar
Página 1813
aquilo que se quer que tenha alguma amplitude, embora, obviamente sempre com o carácter e a restrição própria do seu âmbito confinado à região.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à discussão.
Tirando a questão da competência para a decisão, esta é outra questão interessante e que importa ser discutida com alguma profundidade. Penso que é aqui se podem suscitar as maiores dúvidas e conflitos, como, aliás, a questão do referendo local e a dos limites do poder legislativo regional têm abundantemente provocado.
Penso que não podemos deixar grandes margens para dúvidas; o referendo regional deverá incidir sobre matérias cuja decisão seja da competência dos órgãos regionais, nem mais nem menos, salvo as excepções que a lei do referendo estabeleceu.
O que quer dizer, obviamente, que não pode haver um referendo regional sobre matérias da competência da Assembleia da República, mas que os órgãos regionais possam propor à Assembleia da República. Não teria sentido fazer um referendo na Madeira sobre uma proposta que a Assembleia da Madeira vai apresentar à Assembleia da República em matéria de sistema eleitoral nacional ou regional. Isso parece-me evidente. Fazer uma proposta de lei regional acompanhada de um referendo seria, obviamente, uma forma de pressão politicamente inadmissível sobre a Assembleia da República.
Portanto, estas questões não devem ser escamoteadas como formas tão vagas como aquelas que aqui são aduzidas.
A fórmula que referi é clara, não suscita dúvidas, deixa uma ampla margem para o referendo, podendo decidir-se por referendo aquilo que os órgãos do governo podem decidir eles mesmos. Não pode submeter-se a referendo aquilo que os órgãos não podem decidir. A questão é tão simples quanto isto e penso que tergiversar a respeito desta matéria não seria salutar para o tema que temos em vista. Se não começarmos por esta plataforma penso que estaremos a criar qui pro quos que nada acrescentam à admissão da figura do referendo regional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - A delimitação referida pelo Sr. Presidente é possível, mas não me parece que seja a única. É óbvio que as questões da competência dos órgãos regionais são matérias de interesse regional, não sei é se elas se esgotam aí e, se se for para além disso, não sei se se entrará nas competências dos órgãos de soberania. Não me parece que as questões sejam tão delimitadas quanto ao campo de intervenção do referendo, mas trata-se de uma questão que será para nós objecto de reflexão e teremos em conta a proposta que o Sr. Deputado fez.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, julgamos que a proposta é uma boa base de trabalho. É evidente que a referência exclusiva ao interesse regional, a nosso ver, não é aceitável. Citando um exemplo já referido, devo dizer que é claro que o sistema eleitoral das assembleias regionais é uma matéria de interesse regional e é claro também para nós que uma matéria da competência exclusiva da Assembleia da República não deve ser objecto de referendo.
Portanto, cremos que é saudável e que é uma boa base de trabalho a ideia de que a matéria sujeita a referendo é da competência exclusiva dos organismos regionais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Obviamente entendi o sentido da intervenção de V. Ex.ª, mas fiquei com a dúvida seguinte: nenhum dos projectos em apreciação refere que o referendo deve ser exercido sobre matérias da competência exclusiva da assembleia regional.
O Sr. Presidente: - Por isso mesmo é que eu dei esta solução alternativa.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Eu percebo isso! Mas a questão que queria colocar ao Sr. Presidente é outra. Não considera, por exemplo, que, com o conteúdo que já tem, designadamente através de decisões do tribunal, a expressão "interesse específico regional" cobre as preocupações que o Sr. Presidente manifestou em relação a esse tipo de formulação?
O Sr. Presidente: - Penso que caminhamos na definição da competência legislativa, não da competência política, porque a competência administrativa, por exemplo, não está sujeita a um requisito de interesse específico. Portanto, a formulação que proponho é mais lata do que a expressão "interesse específico". Em matéria legislativa, a competência regional não está sujeita ao requisito de interesse específico. A delimitação legal e estatutária político-administrativa não está sujeita ao requisito de interesse específico, que foi feita ad hoc. Aliás, a Constituição não estabelece qualquer regra.
Portanto não há nada inconstitucional no facto, de hoje, a maior parte dos serviços administrativos estarem regionalizados sem qualquer requisito de interesse específico. Não foi por ser de interesse específico que os serviços de educação ou de saúde foram regionalizados, foi porque se entendeu que a descentralização, a subsidiariedade e a proximidade traziam vantagens para a regionalização desses serviços.
Portanto, o requisito de interesse específico só limita constitucionalmente a autonomia legislativa regional, não a autonomia político-administrativa propriamente dita.
Em segundo lugar, no artigo 229.º caminhámos para uma solução que está neste momento em discussão segundo a qual haveria um maior ou menor conjunto de matérias, proposto pelo Dr. Jorge Miranda, consideradas de interesse regional ope constitucione, por declaração constitucional, independentemente de o serem ou não no caso concreto. Portanto, o interesse específico regional fora dessas áreas é que teria de ser então argumentado caso a caso.
Proponho que o referendo seja indexado àquilo que é da competência dos órgãos regionais, seja ou não de interesse específico. Isto é, em matéria legislativa é óbvio que há um interesse específico, seja porque há um elenco constitucional, ou porque nos termos gerais, como é hoje, isso é mesmo considerado interesse específico. Nas áreas administrativas não há requisito de interesse específico, e estas, segundo a lei, estão atribuídas aos órgãos regionais que lhes compete decidir segundo o estatuto e a lei. Daí não haver nenhum requisito de interesse específico. Por isso
Página 1814
é que essas fórmulas, além do mais, nem sequer eram correctas.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - O bom entendimento seria sempre o de que quem permite que o interesse específico regule a actividade e as competências políticas dos órgãos regionais há-de admitir também que este conceito exista na parte administrativa.
O Sr. Presidente: - Não, mas não é. A doutrina é toda ela unânime em que em matéria de autonomia administrativa não há um requisito de interesse específico. E, portanto, nenhuma das leis que procederam à regionalização de serviços está sujeita a ser sindicável por suposta ou argumentativamente alguns daqueles serviços não serem de interesse regional. Ninguém argumentou isso e esta matéria não é, de facto, sindicável - aliás, toda a doutrina e toda a jurisprudência são claras nesse sentido.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Mas não estou a defender que seja sindicável.
O Sr. Presidente: - E isso desde a Constituição anotada que foi pioneira nesse ponto. Apesar de eu ser acoimado de centralista nessa área a verdade é que, desde a primeira edição, sempre defendemos que o requisito de interesse regional só se aplicava à delimitação da autonomia legislativa e não à administrativa.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Mas essa é que é a mais importante.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda que não haja um compromisso quanto formulação final, aparentemente há abertura generalizada para considerar a fórmula que propus, que é a de, nos termos da lei, o referendo não poder incidir senão sobre matérias cuja decisão seja da competência dos órgãos regionais.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Não foi assim que formulou!
O Sr. Presidente: - Pode incidir sobre matérias cuja decisão seja da competência dos órgãos regionais, com as excepções que depois veremos, por exemplo em matéria orçamental e financeira.
Quanto ao regime, todos remetem para os n. os 4, 5, 6, 7 e 8 do artigo 118.º com as devidas adaptações, mas penso que tem que se acrescentar o n.º 3, pelo menos no que respeita às matérias orçamental, financeira e fiscal, já que as regiões autónomas têm competência financeira e têm até autonomia fiscal e orçamental.
Portanto, se todos concordarem, o regime seria o mesmo com as devidas adaptações, isto é, a fórmula que todos usam, os n. os 3, 4, 5, 6, 7 e 8 do artigo 118.º, com as devidas adaptações. Se a ordenação dos números do artigo 118.º viesse a ser alterada procederíamos à respectiva adaptação.
Posto isto, consideram que ainda não há elementos para voltarmos à questão da decisão?
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Na nossa proposta estava obviamente incluído o n.º 3, uma vez que a proposta se insere sistematicamente no artigo 118.º.
O Sr. Presidente: - Na vossa está, mas nas outras propostas não.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Daí a minha dúvida!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, voltamos à questão da decisão. Agora que sabemos sobre o que é que pode haver referendos, passamos à questão de saber quem os pode convocar. Querem adiantar mais alguma coisa ou querem sobrestar na matéria? O PS já disse que se mantém fiel ao seu projecto.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Compreendemos os argumentos da regionalidade do referendo e podemos aceitar que seja a assembleia legislativa regional a ter esta competência.
O Sr. Presidente: - Julguei que o Sr. Deputado Guilherme Silva ia aderir à minha proposta de meio caminho no sentido de o órgão competente ser o Ministro da República.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Não, não! Ou é assembleia legislativa ou o Presidente da República, o Ministro da República é que não!
O Sr. Presidente: - Quase tenderia a concordar consigo, ou seja que entre o Presidente da República e a assembleia legislativa preferia a assembleia.
Srs. Deputados, fica de remissa a questão da decisão.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas quem é que não tem posição sobre esta questão?
O Sr. Presidente: - Toda a gente tem, só que as propostas são diferentes. Como o PSD não adere à do PS e o PS não está disponível para aceitar a vossa não há consenso.
Há três alternativas: as propostas do PS, do CDS-PP, dos Deputados António Trindade, Arménio Santos e Guilherme Silva vão no sentido de que a decisão seja da competência do Presidente da República, obviamente sob proposta das assembleias legislativas regionais, ou dos governos regionais, conforme os casos; as propostas do PSD e de Os Verdes vão no sentido de que a decisão seja da competência da assembleia legislativa regional e a minha proposta é a de que ela seja da competência do Ministro da República.
Tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Segundo uma pura lógica aritmética daria a ideia que, neste caso, a competência deveria ser do Ministro da República; só que nós já sabíamos que isto iria criar enormes dificuldades ao PSD e a alguns dos argumentos que têm sido aduzidos nesta matéria. Perante esta circunstância, a única lógica política correcta, e para facilitar, porque nós não estamos aqui para dificultar estas situações, apesar de podermos admitir que possa ser em certos casos excessivo, é a de que a decisão seja do Presidente da República.
Pensamos que, eventualmente, na lógica do que foi resolvido no artigo 118.º, o PSD compreenda que esta terá que ser a posição, porque, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não me parece que tenha qualquer razão de ser o
Página 1815
facto de a competência caber às assembleias legislativas regionais.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa!...
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, isso já foi discutido, pelo que, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não vamos repetir a discussão.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): * Estas são as opiniões do Sr. Presidente, mas não sorvemos todas as opiniões.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * O mal é que aquelas que deviam sorver não sorvem e as que não devem sorvem. Esse é que é o problema!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em todo o caso, penso que para a hipótese, se não segura pelo menos provável, de ter de ser o Presidente da República a ter a competência, há que ter em conta as questões da proposta e da iniciativa. Quem propõe que seja o Presidente da República a decidir não tem a mesma solução quanto à proposta e quanto à iniciativa, embora nesse caso as alternativas não sejam muitas.
Assim, sugerem que a proposta de referendo seja feita pela assembleia legislativa regional o PS, o CDS-PP, o Deputado António Trindade e o Deputado Guilherme Silva, sendo que o Deputado Arménio Santos propõe que o governo regional possa fazê-lo.
Como o Deputado Arménio Santos não está presente quero saber se alguém adopta esta proposta para discussão.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Se a decisão for da assembleia regional e não do Presidente da República…
O Sr. Presidente: - Isso está eliminado, o problema não existe.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * … faz sentido que o governo regional possa propor.
O Sr. Presidente: - Isso é um problema de iniciativa o qual já vamos discutir.
O que eu disse foi o seguinte: cabendo a decisão ao Presidente da República, a quem é que deve competir a proposta de referendo?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Nesse caso deve ser à assembleia regional.
O Sr. Presidente: - E portanto ninguém adopta a proposta do Deputado Arménio Santos, que fica sem efeito.
Cabendo a proposta à assembleia legislativa regional, quer dizer que terá de haver uma resolução da assembleia legislativa regional a aprovar a proposta de referendo e a fazê-lo ao Presidente da República, a quem é que deve competir a iniciativa dessa resolução?
O CDS-PP refere que compete aos Deputados e aos grupos parlamentares da respectiva assembleia, o Deputado Arménio Santos diz que compete aos Deputados, aos grupos parlamentares e ao governo regional, dizem o PS o Sr. Deputado António Trindade que se trata de uma competência dos Deputados, dos grupos parlamentares e dos cidadãos e, por último, o Deputado Guilherme Silva remete para os estatutos.
Quem tem a iniciativa para elaborar a resolução da Assembleia para aprovar uma proposta de referendo são os Deputados, sem dúvida, os grupos parlamentares da respectiva assembleia, sem dúvida. E o governo regional, segundo a proposta do Deputado Arménio Santos, que ninguém mais subscreveu?
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas não me parece que esse método tipo teste americano seja o mais feliz nesta matéria. No entanto, também não quero questionar a metodologia do Sr. Presidente. Peço-lhe é que, então, se quer utilizar essa metodologia coloque primeiro uma questão básica: entendem que essa matéria é constitucional ou é de lei ordinária? Porque a proposta do PSD é a de que isso seja definido na lei do referendo à semelhança do que acontece, de resto, nos referendo locais. Não se trata de matéria constitucional.
O Sr. Presidente: - No caso do referendo nacional é!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - No caso do referendo nacional é com certeza, mas tratando-se de referendos de base territorial parece-nos que deve ser a lei a estipular sobre a matéria, é mais lógico que seja a lei.
O Sr. Presidente: - O PS propõe que seja constitucionalizado, o mesmo acontece com o CDS-PP.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): * O estatuto?
O Sr. Presidente: - O estatuto seguramente que não, isso é a lei do referendo.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Deve remeter-se para a lei! Não é matéria para ser constitucionalizada, a lei é que define quem é que toma as iniciativas.
Aparte inaudível.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Que é o único referendo que actualmente existe de base territorial, quer dizer, há o nacional e depois o de base territorial que existe é o autárquico.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): * Este não é de base territorial?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Este é o regional, mas é também de base territorial.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Não vejo nenhuma razão para não se adoptar uma solução semelhante àquela que adoptarmos em relação ao artigo 118.º quanto a esta matéria e suponho que no artigo 118.º vamos adoptar uma solução que vá precisar quem são as entidades com legitimidade para desencadear a proposta.
O Sr. Presidente: - Isso já está assente, Sr. Deputado!
Página 1816
O Sr. José Magalhães (PS): - Não vamos? É líquido que o vamos fazer. Portanto, se não o fizermos em relação a esta matéria o e estatuto do referendo regional ficará constitucionalmente diminuído em relação ao outro.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas, Sr. Deputado, um é diminuído em relação ao outro, sem dúvida, já que um é de base territorial e o outro é nacional!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, confesso que não me repugna nada remeter esta questão para a lei.
O Sr. José Magalhães (PS): - Considero que fica mais flexível quanto à iniciativa popular.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães quer levantar um problema sobre o objecto do referendo, pelo que tem a palavra.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, em matéria de objecto do referendo suscita-se uma questão decorrente da redacção da nossa proposta.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Penso que esta questão deve ter um tratamento constitucional semelhante ao que há para o referendo nacional em termos do artigo 118.º.
O Sr. José Magalhães (PS): - Isso foi o que eu disse há bocadinho mas enfim não há nada a fazer.
Em relação ao artigo que define o objecto deste referendo regional, na nossa proposta não reproduzimos exactamente a fórmula do artigo 118.º, n.º 2, porque ela é insusceptível de ser reproduzida, uma vez que nele se alude a convenções internacionais que não fazem sentido no âmbito das competências próprias dos parlamentos regionais.
Mas não se trata aqui, dadas as peculiaridades do sistema político regional, senão de permitir o referendo em torno de questões de relevante interesse nacional que devam de ser decididas pelos parlamentos regionais e sobre os quais devam recair actos legislativos. Portanto, não há referendos regionais em relação a actos governamentais. Isso ficou claro da vossa discussão?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Não, não ficou, pelo contrário!
O Sr. Presidente: - Está à discussão.
O Sr. José Magalhães (PS): - Então, se o Sr. Presidente permitir eu vou continuar. A lógica que preside ao artigo 118.º, n.º 2, é a mesma que na nossa proposta presidia ao artigo 235.º-A. Talvez isso não esteja excessivamente bem expresso, mas a verdade é que não se trata de submeter quaisquer perguntas sobre quaisquer temas; trata-se de submeter perguntas sobre as chamadas questões de relevante interesse regional, que devam ser decididas por acto legislativo dentro da esfera própria de competências das regiões, dos órgãos legislativos regionais que são, como se sabe, apenas os parlamentos.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Não necessariamente!
O Sr. José Magalhães (PS): - Ou, então, esse referendo teria uma natureza distinta dos referendos conhecidos pelo quadro constitucional até agora, ou seja, exceptuaríamos nessa matéria, criaríamos uma margem de liberdade alargada em relação aos objectos de referendo, o que, no limite, poderia conduzir à existência de referendos sobre actos de carácter não legislativo, político, administrativo, pura e simplesmente, ou outros que não proibidos pelo nosso n.º 3, uma vez que as limitações do n.º 3 excluiriam certamente uma quantidade enorme de alguns dos actos que acabei de mencionar nas outras categorias não legislativas. O que me resta saber é se não ficariam alguns que não faça sentido autorizar que sejam referendáveis quando não autorizamos que o sejam em relação aos referendos nacionais.
Portanto, creio que o sentido originário da proposta que apresentamos é este paralelismo rigoroso com as questões legislativas sujeitáveis a referendo a nível nacional, mutatis mutandis e dentro da esfera de competências do plano legislativo agora alargadas - tudo indica - dos parlamentos regionais.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à discussão esta proposta de esclarecimento do PS segundo a qual o referendo só deve incidir sobre matérias da competência legislativa regional.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - O que significa nesse caso, se me permite, Sr. Presidente, que o Sr. Deputado José Magalhães está a pôr em causa a proposta que o Sr. Presidente há pouco fez em relação à parte ...
O Sr. Presidente: - Está claramente a qualificá-la. Nós não tínhamos encarado esse problema, tínhamos limitado o âmbito material.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Mas há a proposta do Sr. Presidente que nos parece mais…
O Sr. Presidente: - A proposta do Presidente não decide esta questão, já que ela não foi colocada.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Se mantiver a proposta nos termos em que a apresentou penso que decide, porque o Sr. Deputado José Magalhães está a restringir o referendo à matéria passível de acto legislativo.
O Sr. Presidente: - Como acontece na República.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Mas a proposta do Sr. Presidente era a matéria das competências dos órgãos regionais e sabemos que é um órgão que não tem sequer poderes legislativos e, portanto, é mais amplo.
O Sr. Presidente: * É possível. Independente do que estava, ou não, a verdade é que o Sr. Deputado José Magalhães tem toda a liberdade de fazer as propostas que quiser.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é que no sistema que decorre da nossa proposta não há nenhum risco de conflito institucional. Contudo, um sistema em que se consagrasse uma solução de bitola larga ou mista mantendo-se o monopólio de propositura à assembleia legislativa regional, como bem percebem, acarretaria que as
Página 1817
assembleias legislativas regionais poderiam sujeitar a referendo actos do Governo. Por favor, não inventemos elementos de conflito institucional, nem soluções esquipáticas e susceptíveis de criarem situações que depois poderiam ser relativamente melindrosas! É essa a razão da nossa proposta, perfeitamente razoável, séria e, seguramente, digna de ponderação. Ou então, dar-se-ia ao governo competência de propositura e criar-se-ia uma situação curiosíssima.
Sr. Presidente, só queria clarificar isto, porque nós discutimos isto com algum cuidado e a razão que nos levou a propor o que propusemos foi a que deixei aqui enunciada. Não tinha a certeza de que isso tivesse sido sublinhado, mas ficaria mal com a consciência se não o fizesse.
O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, está sempre a tempo de fazer propostas, e está feita a proposta segundo a qual os referendos regionais versam sobre matérias da competência legislativa regional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, há pouco fez aquela proposta de delimitar o âmbito dos referendos regionais em vez de se fazer singelamente uma referência a que eles versam sobre matérias de interesse específico para a respectiva região, como, por exemplo, consta da proposta do PSD sobre esta matéria.
O Sr. Presidente, quando lançou a base de trabalho para a discussão da definição das competências legislativas previstas no artigo 229.º pela tentativa de enunciação de matérias de interesse específico ope constitutionis, formulou essa proposta e disse que essa seria a base de trabalho para esta matéria.
Penso que a resposta à proposta que o Sr. Deputado José Magalhães agora formulou passa pela leitura da proposta que aí está.
Digo isto porque, do meu ponto de vista, também é mais ou menos evidente que o que é lógico é que se diga que o referendo versa sobre matérias do interesse específico, nos termos que vierem a ser definidos no artigo 229.º - portanto, na delimitação objectiva constitucional daquilo que são as matérias de interesse específico -, e sobre as quais venha a ser proferido um acto legislativo regional.
Penso que isso é seguramente o denominador comum. Se para além disso poderemos ou não configurar qualquer outro tipo de matérias que possam ser objecto de um referendo regional, sinceramente, neste momento, não estou a ver nenhuma.
Julgo que a situação abstrusa de estarmos aqui a pensar que o referendo pode de hoje a amanhã vir a ser erigido como uma forma de conflito institucional entre as assembleias legislativas regionais e o governo regional não é o principal problema. Aqui, o principal risco é o de, se não houver uma delimitação clara do interesse específico sobre o qual os cidadãos residentes nas regiões autónomas podem ser chamados a pronunciarem-se em referendo, poder haver a tentativa de, digamos, uma certa tomada de posição regional sobre matérias que são de interesse nacional, relativamente às quais todo o País - esse sim, e não apenas a região a, b ou c - se deva pronunciar.
Portanto, eu tenderia claramente a restringir a opinião do PSD à delimitação que é feita pelo Sr. Deputado José Magalhães. Ou seja, parece-me fazer todo o sentido, quando, com a base de trabalho que o Sr. Presidente nos colocou, definirmos no artigo 229.º a delimitação das matérias de interesse específico sobre as quais vai incidir a competência própria legislativa das regiões, que o referendo regional se deva reportar muito às competências próprias que nós definirmos do artigo 229.º, quer sejam competências próprias por força do enunciado objectivo do n.º 1 deste artigo, quer o sejam por força - seguindo também a metodologia de trabalho que o Sr. Presidente nos colocou na esteira da proposta do Prof. Jorge Miranda - do n.º 2 ou 3 do mesmo artigo, onde, constitucionalmente, desde logo se delimitem matérias de interesse específico, mas, provavelmente, não poderemos fugir muito daí.
Quer dizer, eu tenderia, para já, da parte do PSD, a vincular-me a isso, sem embargo de, quando passarmos à formulação em concreto do artigo 229.º, ser colocada por algum Sr. Deputado uma matéria qualquer que não constando da formulação que nós fazemos do artigo 229.º, porventura faça sentido. Eu não estou a ver que seja possível, mas, obviamente, depois de enunciado o artigo 229.º poderemos ponderar isso Penso que neste momento é perda de tempo, porque estamos a pensar em coisas que ainda não sabemos exactamente como é que vão ficar. O denominador comum é seguramente esse.
O Sr. Presidente: - Não, não é de certeza! A plataforma que eu propus não discriminava o tipo de actos; delimitava o campo. A proposta do Sr. Deputado José Magalhães é claramente qualificativa, isto é, dentro desse âmbito, ele propõe que só possa haver referendo sobre matérias que possam ter a forma legislativa.
Portanto, penso que há todo o interesse em discutir esta proposta. O que não vale a pena é ficarmos numa forma que, claramente, não é aceite pelo PS.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não! Já disse que, do ponto de vista do PSD, estamos de acordo em que esse é, seguramente, o denominador comum. Sobre isso estamos de acordo. Se do texto em concreto resultarem algumas interrogações sobre se lá falta alguma coisa, na altura, ponderaremos, mas para já estamos de acordo com isso.
O Sr. Presidente: * Muito bem. Então, há abertura para considerar a nova formulação da plataforma que propus quanto à delimitação. Portanto, só pode haver referendo regional sobre matérias cuja decisão seja da competência legislativa regional, para dizer claramente que o referendo regional só pode incidir sobre matérias que hajam de ser vertidas em decreto legislativo regional.
Srs. Deputados, quanto à iniciativa do referendo, o consenso estabelecido, afinal, acabou por não ficar. O Sr. Deputado Guilherme Silva releva-se contra o consenso estabelecido de remeter a iniciativa de referendo para a lei.
Srs. Deputados, gostaria de saber quais as vossas posições. Remete-se para a lei, ou a iniciativa para a proposta de resolução de referendo fica prevista na Constituição e as alternativas são as seguintes: Deputados, grupos parlamentares, governo regional, um certo número de cidadãos?
São quatro hipóteses: as duas primeiras parecem-me indiscutíveis, aliás, são comuns a todos; as outras duas não são comuns, a do governo regional é só o Sr. Deputado Arménio Santos, a da iniciativa popular é do PS e do Sr. Deputado António Trindade.
Srs. Deputados, está à consideração.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
Página 1818
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, estando ultrapassada, aparentemente, a nossa proposta de remeter para a lei, quero deixar apenas esta reflexão: é evidente que o PSD - isso retira-se, de resto, da leitura integrada de todo o projecto do PSD - propõe a abertura da iniciativa de referendo de âmbito nacional a grupos de cidadãos eleitores. Propõe-no não na Constituição, porque a Constituição aí remete para a lei, mas numa iniciativa já entregue na Mesa da Assembleia da República, nesta sessão legislativa, do Grupo Parlamentar do PSD, em que propõe que as consultas locais, chamemos-lhe assim, os referendos locais, por comodidade, passem a também a estar abertos a iniciativas de grupos cidadãos eleitores residentes na respectiva autarquia.
Portanto, por maioria de razão, actualmente o PSD defende e propõe para ambos os referendos, o nacional e o local, a iniciativa de cidadãos eleitores. É evidente que o PSD não concebe que para o referendo regional - "ensanduichado", se me faço entender, entre o referendo nacional e o referendo local -, em termos políticos, ficasse de fora o poder de iniciativa dos cidadãos eleitores.
Faço notar, no entanto, à semelhança da discussão que já tivemos a respeito do poder de iniciativa para o referendo nacional, e também como consta da actual lei dos referendos locais, que o poder de iniciativa não quer dizer - o Sr. Presidente recorda-se bem dessa discussão de palavras que aqui tivemos...
O Sr. Presidente: - Tem que haver iniciativa junto da Assembleia, para aprovar…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Certo, porque também para os referendos locais a decisão é da assembleia municipal.
Em termos substantivos, o PSD defende que iniciativa pode ser de grupos de cidadãos, teremos é que discutir, porque não vimos preparados para isso, uma vez que queríamos remeter a iniciativa de referendo para a lei, o número de.…
O Sr. Presidente: - O número de cidadãos é que podemos, de facto, remeter para a lei, por favor!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Nós estaremos disponíveis, obviamente, para remeter para a lei a determinação do número de cidadãos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva aí já não se opõe?!
Apartes inaudíveis.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Os Deputados e o Governo, com certeza. Faço lembrar ao PS, antes de tomar posição, para que depois não seja preciso mudar de opinião, que nos referendos locais a câmara municipal, digamos, o executivo, também pode propor referendo.
Os referendos nacionais podem ser propostos pelo órgão legislativo, pelo órgão executivo e pelos cidadãos e os referendos locais podem ser propostos pelos cidadãos, pelo órgão executivo e pelo órgão legislativo. Isto faz sentido nenhum! Porque é que nas regiões é estigmatizado o órgão executivo?! Isto não faz sentido, Srs. Deputados!
Ainda não ouvi a posição de ninguém, portanto, provavelmente, todos vão estar de acordo. Contudo, apelo a que não se crie aqui uma diatribe qualquer! Temos três tipos de consultas territorialmente delimitadas, uma delas para toda a Nação, portanto, com toda a franqueza, mutatis mutandis - Sr. Presidente, o que eu peço é precisamente que não se politize ou partidarize a questão! - a iniciativa deve ser dos cidadãos, dos membros do órgão legislativo (por acaso, aqui, também é legislativo, nas câmaras não é), isto é, da Assembleia, o órgão colegial, e do executivo!
A proposta do PSD é esta! Quanto ao número de cidadãos, Sr. Presidente, fica a sobrar.
O Sr. Presidente: * O Sr. Deputado Luís Marques Guedes ainda vai ter uma estátua cujo ex-líbris será ad majorum gloriam governarum.
Risos.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): * Sr. Presidente, quanto à iniciativa do eleitor recenseado na região, parece-nos que a Constituição poderá remeter isso para a lei. Contudo, parece-nos que essa persistência e insistência na ideia do Governo… Veja que já estão previstos os grupos parlamentares! Não sei se quer que se ponha cá o grupo parlamentar do PSD?!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Porque é que também não há-de ser para os referendo locais?
O Sr. Osvaldo Castro: - Mas aí é que está! Eu penso que o Sr. Deputado tem uma consideração desvalorizadora da autonomia política regional, por isso identifica com ...
Apartes inaudíveis.
O Sr. José Magalhães (PS): - Não é em função disso, é por força da competência legislativa, o Governo Regional não tem competência legislativa.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas tem iniciativa, pode propor diplomas à assembleia legislativa regional, essa agora!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, reformule a sua crítica e diga que o PS é que deve ter uma estátua com um machado em cima dos executivos.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não, de modo nenhum!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esta questão para já não tem acolhimento, pelo que fica de remissa. O PS fica de considerar a iniciativa de referendo no que respeita ao Governo.
Há acordo quanto a que têm iniciativa de referendo os Deputados, os Parlamentares e os cidadãos, no número que lei determinar.
Srs. Deputados, vamos interromper os trabalhos. Reiniciaremos às 21 horas e 30 minutos.
Eram 20 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a reunião.
Eram 21 horas e 50 minutos.
Página 1819
Srs. Deputados, vamos passar ao Título I, Poder Local.
Quanto ao artigo 237.º, existe, para o n.º 2, uma proposta da alteração, do PSD, que visa acrescentar, na parte final, "(…) e aproximar as decisões dos cidadãos.".
Tem a palavra os Sr. Deputado Miguel Macedo, para justificar a proposta.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, o conteúdo útil da proposta de alteração que formulamos para o artigo 237.º é, evidentemente, esse. Não vale a pena estarmos com grandes considerações, julgo que todos percebem o alcance desta proposta, que é, no fundo, explicitar uma das virtualidades da existência e da consagração, em termos constitucionais, de um poder como é o poder local, tal qual vem previsto na Constituição.
O PSD julga que enriqueceria o texto constitucional explicitar esta virtualidade do poder local, que tem que ver, obviamente, com a relação de maior proximidade quer com o conjunto de questões que são tratadas pelo poder local, que são do âmbito da competência do poder local, quer com a forma de relacionamento entre os órgãos do poder local, os órgãos autárquicos, os eleitores e os cidadãos. É esse o sentido da nossa proposta de alteração, não há muito mais a dizer sobre isto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Miguel Macedo, pensa que vale a pena mexer numa das normas lapidares com uma redundância?
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não é uma redundância, Sr. Presidente, é uma explicitação do conteúdo, que, aliás, V. Ex.ª bem desenvolve na Constituição notável de que é um dos autores, e também lá vem referida esta componente.
O Sr. Presidente: - Exacto, é uma redundância por já lá estar!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, não vejo que seja uma redundância!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta está à discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, creio que a ideia de pessoas colectivas territoriais e de prossecução de interesses próprios das populações, naturalmente que através dos respectivos órgãos representativos, não pode deixar de conter a ideia de aproximar as decisões dos cidadãos.
De certa forma, se essa fórmula fosse acrescentada neste artigo, faltaria perguntar, por exemplo, porque é que não seria acrescentada no artigo 267.º, n.º 3, a propósito das associações públicas, que também têm, obviamente, uma função de aproximar as decisões dos cidadãos, não por via territorial, mas por via da pertença a uma determinada associação à qual é conferida poderes de direito público. Nesse sentido, concordando que esta é uma virtualidade importante do poder local, julgamos que a ideia já está contida na fórmula actualmente utilizada, pelo que não há nenhuma vantagem na alteração proposta pelo PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta continua à discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, também nos parece, claramente, uma redundância a expressão acrescentada pelo PSD na parte final do n.º 2, porque pensamos, efectivamente, que a aproximação das decisões dos cidadãos está incluída nas missões e atribuições dos órgãos representativos das pessoas colectivas, que são as autarquias locais.
Portanto, não nos parece o mais adequado estar caracterizar o que devem ser essas próprias decisões, nem, ao fim e ao cabo, o preceito constitucional em causa necessita dessa precisão nesta sede. Parece-nos, claramente, que tal não se justifica.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é evidente que esta não é - de resto, isso ficou claro da explanação inicial feita pelo Dr. Miguel Macedo - uma alteração que tenha qualquer cunho de dramatismo, ou o que quer que seja, em termos da revisão constitucional.
Relembro apenas - e deixo isso à consideração dos Srs. Deputados, para as seguintes fases do processo de revisão - que o que está aqui em causa, se bem que possa ser de algum modo um explicitação daquilo que a doutrina já vem densificando sobre esta matéria, não deixa de ser um sinal importante, nomeadamente numa fase em que, devido ao desenvolvimento normal do nosso modelo democrático, estão em causa, políticas, genericamente defendidas por todos os partidos democráticos, de transferência sucessiva de competências da administração central para as autarquias locais, exactamente com o princípio, a lógica, o argumento, o fundamento de se entender que há, na evolução e na consolidação do sistema democrático, no nosso modelo, vantagem em aproximar o mais possível as decisões dos cidadãos, sempre que isso possa ser feito com vantagem para as populações que são servidas.
Por conseguinte, não deixando de ser algo que está presente desde a feitura da Constituição em 1976, é, de facto, um caminho que tem sido politicamente percorrido, com evidência notória, nos últimos tempos. Não é por acaso que os programas dos últimos governos, deste Governo também, falam em transferências de competências da administração central para administração autárquica, exactamente com este fundamento.
Por isso, parece-nos - não sendo dramático, se não houver entendimento generalizado dos outros partidos para fazer este inciso na Constituição - que é, claramente, a constitucionalização de um princípio que, hoje em dia, vem sendo comummente aceite, não apenas como princípio mas como política concreta de actuação, pelo que terá a sua vantagem.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu apelo não sensibiliza os demais Deputados, pelo que a proposta não tem viabilidade.
Srs. Deputados, passamos à discussão do artigo 238.º.
Para o n.º 1 deste artigo, há duas propostas, uma do CDS-PP e outra do PSD, no sentido de eliminar a referência às regiões administrativas - questão esta que está prejudicada.
Página 1820
Para o n.º 2 do mesmo artigo, existe uma proposta de eliminação, apresentada por Deputados do PSD Guilherme Silva e outros, sendo substituído pelo actual n.º 3.
Para o n.º 3 do referido artigo, há uma proposta do PSD e também dos Deputados do PSD Guilherme Silva e outros. A actual redacção do n.º 3 é a seguinte: "Nas grandes áreas urbanas e nas ilhas, a lei poderá estabelecer, de acordo com as suas condições específicas, outras formas da organização territorial autárquica". O PSD propõe a eliminação, na parte final, do qualificativo autárquico.
Completamente distinta é a proposta do Sr. Deputado Guilherme Silva, que elimina o actual n.º 2, substituindo-o pelo actual n.º 3 com a redacção alterada, e substitui o actual n.º 3 pelo actual n.º 4, também com uma redacção diferente. Da substituição do n.º 2 resultaria que nos Açores e na Madeira deixaria de ser obrigatória a existência de municípios e freguesias.
Está à discussão a proposta do PSD e, se alguém julgar útil, também a do Sr. Deputado Guilherme Silva, se alguém a adoptar para esse efeito.
Para apresentar a proposta do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, a explicitação que fazemos vem neste sentido: do conteúdo útil do actual n.º 3 - que o PSD passa a n.º 2, como o Sr. Presidente referiu, apenas porque faz a fusão dos actuais n.os 1 e 2, uma vez que deixaria, no contexto da nossa proposta, de haver regiões nesta sede já que elas ficariam condicionadas, no artigo 255.º, à realização do referendo - é certo que o legislador ordinário deu curso e densificou esta previsão da constituição de formas de organização territorial nas grandes áreas urbanas, mas nas ilhas isso nunca chegou a acontecer, como todos sabemos. Enfim, isso tinha sido pensado fundamentalmente para os Açores, devido à eventualidade de aglomeração de alguns grupos de ilhas, atendendo à sua dispersão geográfica. No desenvolvimento normal da autonomia açoreana isso acabou por não ser, até ao momento, uma opção.
Enfim, o PSD mantém isso na Constituição, pode ser que de hoje à amanhã um outro qualquer poder na região autónoma entenda que isso tem vantagem administrativa.
Contudo, o que é certo é que o que se consolidou entretanto, que foram as áreas metropolitanas, que hoje em dia têm existência legal e real, do nosso ponto de vista, acaba por ser uma organização territorial algo atípica, sem alguns dos conteúdos - pensamos nós - fundamentais ou constitucionalmente presentes nas formas típicas de autarquia, que, como todos sabemos, no texto constitucional actual são fundamentalmente três tipos de formas.
De facto, as organizações de moradores, por exemplo, não são autarquias, embora sendo uma forma de poder local não são propriamente uma autarquia. Parece-nos também que nas áreas metropolitanas, tanto as que já têm existência concreta como a eventual organização territorial administrativa nas ilhas, o adjectivo autárquico não provou, isto é, não ganhou curso próprio.
Portanto, foi fundamentalmente por esta razão, isto é, por uma razão de leitura do percurso real deste tipo de circunstâncias nos 20 anos que levamos de poder local democrático, em Portugal, que chegámos à conclusão de que a realidade das coisas retirou um bocado razão de ser a este adjectivo.
Hoje em dia, as autarquias são de três níveis, dos quais, até ao momento, ainda só existem dois, e parece-nos, de facto, que as áreas metropolitanas, que são a consequência da primeira parte do actual preceito constitucional, não caminharam exactamente para a configuração de um poder autárquico como ele pode ser genericamente perceptível em termos jurídicos.
Portanto, a proposta do PSD é de retirar apenas a adjectivação, mantendo, obviamente, a previsão constitucional daquela que já é uma realidade e que pode vir a sê-lo também - até ao momento não foi por razões de política administrativa - fundamentalmente no arquipélago dos Açores.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à discussão a proposta do PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, nós julgamos que a fórmula criada pela Lei n.º 44/91 não é, efectivamente, uma fórmula típica, diria até que não é uma fórmula feliz.
Como é sabido, a junta metropolitana é formada pelos 18 presidentes de câmara, no caso da Área Metropolitana de Lisboa, pelos 11 presidentes de câmara, no caso da Área Metropolitana do Porto, e é constituída igualmente por uma assembleia metropolitana, criada a partir das assembleias municipais. O executivo, portanto, a junta metropolitana não emana da assembleia metropolitana. É uma fórmula em relação à qual sempre tivemos grandes dúvidas, creio que teria sido bem preferível ter avançado para uma instituição metropolitana com a assembleia eleita directamente, eventualmente com representação municipal como está previsto em relação às regiões administrativas. Preferiu-se uma fórmula de outro tipo e a este facto somou-se o elenco muito estreito de atribuições, mas, acima de tudo, o facto de não ter dotações financeiras minimamente relevantes. Isto significa que as figuras criadas pela Lei n.º 44/91 revelaram-se com um papel muito pouco relevante, diria até bastante desinteressante.
A evolução mais provável nesta matéria é, no que toca à Área Metropolitana de Lisboa, a sua transformação em região administrativa. Pelo menos é talvez nesse sentido que apontam as propostas dos partidos que defendem a regionalização.
Em relação ao Porto o esquema será naturalmente outro, a instituição será outra, e, entretanto, eu creio que não temos de moldar a nossa posição face ao n.º 2 do artigo 238.º pela Lei n.º 44/91, que, diria, é até ligeiramente desinteressante nesta matéria. De qualquer modo, poderia existir um tipo de instituição daquele género, independentemente do qualificativo de organização territorial autárquica.
De resto, tenho dúvidas que, apesar de tudo, a fórmula que consta da Lei n.º 44/91 não caiba na categoria da organização territorial autárquica. Se não cabe nesta categoria, a partir do momento em que é constituída tendo por base os municípios, então não sei em que categoria caberá.
Podemos eventualmente dizer que é uma associação de pessoas colectivas públicas, uma associação pública de municípios, neste caso obrigatória, mas mesmo sendo uma associação pública de municípios caberia, com certeza, na organização territorial autárquica. Tirar o qualificativo autárquico abriria eventualmente não para a substituição da fórmula da Lei n.º 44/91 por outra fórmula mais abrangente e operativa, e até com maior representatividade, mas
Página 1821
para outro tipo de fórmulas que não esta que está consagrada na lei.
Nesse sentido não julgamos que haja qualquer vantagem na alteração que o PSD propõe.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é só para esclarecer uma dúvida. Percebi a perspectiva em que o Sr. Deputado Luís Sá coloca a questão, mas gostava de perguntar-lhe se não é verdade que o actual texto resulta da seguinte lógica: eram criadas, à partida, três tipos de autarquias e deixava-se a porta aberta para o desenvolvimento de outras organizações que viessem dar lugar a novas autarquias.
Ora, a realidade é que passados 20 anos isso não só não aconteceu como não é minimamente sentida a necessidade que aconteça. E se é assim, está na altura de fechar uma porta que se deixou entreaberta. Na altura não se tinha a certeza se haveria ou não necessidade de desenvolver outras formas, mas se a realidade da democracia veio a demonstrá-lo e, se é assim, então retire-se a hipótese constitucional de se fazerem acrescer os três graus de autarquias!… Ou não será assim?!…
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, o que gostaria de dizer nesta matéria é que todas as áreas metropolitanas têm estruturas metropolitanas de gestão e estas estruturas são de variados tipos. Suponhamos: a região metropolitana de Madrid é uma região autónoma como as outras regiões - é uma possibilidade; outra possibilidade são as associações de municípios; outra possibilidade ainda é a criação de instituições mistas do poder central com participação municipal. Também existem formas deste tipo!… Agora, instituições metropolitanas de gestão existem por todo o lado.
Na minha opinião, a fórmula criada na Lei n.º 44/91 não é uma verdadeira estrutura metropolitana de gestão. Por um lado não tem as atribuições suficientes para isto, por outro lado nunca previu dotações financeiras. Em relação à fórmula alternativa nesta matéria, ou seja, à fórmula associação de municípios, eu excluo-a por duas razões fundamentais.
Por um lado, as fórmulas metropolitanas a partir de instituições municipais têm, em geral, as mesmas atribuições e competências dos próprios municípios. Ora, uma instituição metropolitana tem de ter atribuições próprias, incluindo a de coordenação da actividade municipal com a actividade central, além de haver problemas próprios da instituição metropolitana. Daí que se justifique a respectiva especificidade.
Por outro lado, as associações de municípios têm uma outra dificuldade, a de que os eleitos municipais têm a perspectiva e a legitimidade própria do respectivo município, o que significa que, na generalidade das situações, reúnem e procuram entender-se com uma grande dificuldade porque cada um faz o esforço possível para chamar as infra-estruturas, os equipamentos e até as soluções de ordenamento do território ao município a que pertence e perante cujo eleitorado tem de responder, pois, naturalmente, quer conquistar apoios.
Normalmente este tipo de soluções não funcionam e, portanto, resta a ideia de associação metropolitana com legitimidade própria.
A meu uma das grandes razões pelas quais está aqui esta autorização é a ideia de poder ter regiões administrativas que não correspondam às regiões metropolitanas e, portanto, a possibilidade de criar outras formas de organização territorial autárquica. Por exemplo se as regiões administrativas correspondessem às áreas das cinco comissões de coordenação regional, esta questão, naturalmente, pôr-se-ia. Daí que se justifique esse tipo de autorização. Agora que a autorização aponta para um modelo mais representativo e com maior legitimidade do que aquele que está na Lei n.º 44/91 não tenho a mínima dúvida. Mas isto é um problema de legislação ordinária não de alteração da Constituição.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, mas a proposta do PSD não suprime a autorização, apenas a alarga o leque de possibilidades.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sem dúvida, Sr. Presidente, mas isso tem a ver com a questão que eu coloquei anteriormente e que é esta: a nosso ver as soluções dos problemas metropolitanos devem continuar a apontar para uma solução autárquica e não para uma solução mista ou para uma solução centralizada. Isto, naturalmente, é uma opção política, que corresponde ao…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quis só para clarificar os termos da discordância, que me parece agora claramente clarificada.
Srs. Deputados, continua a discussão.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, os Srs. Deputados do PSD, infelizmente, não clarificaram o aspecto a que finalmente se chega. Creio que não é especialmente interessante discutir a propósito desta matéria, sem prejuízo do interesse das condições que ficaram em acta, a natureza da estrutura da entidade criada pela Lei n.º 44/91 e suponho que ninguém sustenta que da Constituição flua, neste artigo, a obrigatoriedade de uma legitimidade própria dos órgãos das áreas metropolitanas e, obrigatoriamente, eleições directas ou inconstitucionalidade. Enfim...
O Sr. Luís Sá (PCP): - Eu nunca disse isso!
O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto! Portanto, essa seria a única coisa interessante e verdadeiramente chocante a fluir da hermenêutica do artigo 238.º, n.º 3.
Sendo certo que isso não esgota o campo de aplicação deste artigo, que, além do mais, foi desenhado tendo em conta a possibilidade de, à semelhança do que acontece em alguns países do nosso espaço europeu, ter havido lugar à invenção de estruturas para uma administração eficaz dessa espinhosa coisa que são as metrópoles, matéria na qual, como sabem, há um campo de imaginação aberto. Existem experiências bastante importantes em alguns dos estados da União Europeia neste momento e, dada a crise urbana e os seus desenvolvimentos, não somos inteiramente
Página 1822
capazes de prever que fórmulas poderão vir a ser adequadas nesta matéria.
Portanto, o que está em causa é só saber se se elimina o qualificativo autárquico e qual é o valor desse qualificativo. É só isto!… E em relação a isto, creio que na parte final do debate das intervenções anteriores foi posto o dedo numa ferida, quiçá a única ferida: a este qualificativo é atribuível não qualquer poder "traumaturgico" mas um mérito apesar de tudo relevante e que, suponho, não nos dividirá também. É que estas formas de organização territorial não devem ser um modo de diminuir o poder autárquico, o poder local democrático como tal, devem, sim, ser ainda articulações, emanações e formas específicas de metamorfose dentro dos limites de poder autárquicos. Designadamente não devem traduzir-se na invasão do espaço decisional criado nesta esfera por entidades híbridas ou filhas do poder central, que venham exercer, a bem da resolução da crise urbana, atribuições e competências que seriam sempre, por essa definição - pelo menos corriam o risco de ser -, subtracção ou redução do espaço autárquico.
O Sr. Deputado Luís Marques Guedes não esclareceu se o objectivo era esse, ou seja, o de permitir estruturas híbridas, estruturas influenciadas pela administração central, estruturas de compressão do poder local nesta matéria, ou se não atribui nenhuma dessas funções a estas formas de organização territorial assim não qualificadas, caso em que a questão não será, de facto, especialmente relevante.
Agora este último aspecto é, de facto, importante, porque não se pretende criar aqui uma cláusula - a Constituição não o quis e creio que correctamente - de possível esvaziamento a propósito das questões de organização e de arquitectura daquilo que é a panóplia de atribuições e de competências de esferas de intervenção, sobretudo em áreas que são muito importantes estrategicamente nos países.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é só para responder ao que ficou um bocado no ar da intervenção do Sr. Deputado José Magalhães.
Relativamente a esta proposta, para que tudo fique claro, quero apenas dizer que a única intenção do proponente do PSD foi, face à realidade de 20 anos do poder local, acabar com a hipótese de haver um quarto género. Ponto final!… É a única motivação dessa proposta do PSD. Achamos que, como dizia o Sr. Deputado Luís Sá, as áreas metropolitanas ou são regiões ou continuam a ser o que são. Para criar um quarto género… O Sr. Deputado Luís Sá conflui connosco a dizer que, de facto, actualmente aquilo não é autárquico, ou seja, faltam-lhe condições típicas para ser uma organização autárquica.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Actualmente é quase nada!…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É só isto que queria clarificar, porque ficou um bocado no ar, quando da intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, qual era a motivação do PSD. A única motivação é essa, é chegar à conclusão que, de facto, neste momento não visualizamos a necessidade de haver um quarto género de organização autárquica. Portanto, mantemos aqui o princípio da possibilidade de organização territorial, mas ela terá sempre de ser atípica e não autárquica, pois parecer-nos que, hoje em dia, já não vale a pena deixar esta porta aberta.
A nossa motivação era só esta!…
O Sr. Presidente: - Está esclarecida a proposta. Quanto a posições, o PCP opõe-se e o PS…
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, temos algumas dúvidas quanto à utilidade desta démarche, que talvez possa suscitar, como aqui suscitou, mais dúvidas que vantagens e que, portanto, é daquelas cirurgias que alargam o espaço de ambiguidade em vez de introduzirem espaços de clarificação.
Já agora, se me permite, Sr. Presidente, o PSD, em relação ao artigo 253.º, n.º 2, curiosamente - não sei se tem alguma conexão com o que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes disse agora -, visa introduzir um número novo que permite à lei cometer novas atribuições e competências próprias às associações e federações ...
O Sr. Presidente: - Chegaremos lá, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PS): - Claro que iremos discutir isso, mas não sei se tem alguma correlação com a vossa ideia de que não devem haver estruturas da chamada quarta espécie mas devem haver associações com valor forçado e com...
O Sr. Presidente: - Era a substituição das regiões administrativas.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Vem de baixo. Em vez de vir de cima vem de baixo.
O Sr. José Magalhães (PS): - É só isto.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O n.º 2 tem que ser lido em conjunto com o n.º 1, o qual diz que só os municípios se constituem em associação. Portanto, é ao contrário, vem de baixo e o Estado é que...
O Sr. Presidente: - É um sucedâneo das regiões administrativas.
Srs. Deputados, vamos passar ao artigo 239.º, para o qual há uma proposta do PS no sentido de que onde se lê "descentralização administrativa" passe a ler-se "descentralização administrativa e financeira".
Para apresentar as vantagens da proposta, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, as vantagens desta proposta resultam da apresentação das suas próprias credenciais, ou seja, a consagração expressa, ao lado do princípio da descentralização administrativa, do princípio que agora ficaria qualificado de descentralização financeira e pode ter um importante papel na correcção de algumas das tendências nefastas que se verificaram durante vários períodos da vida do poder autárquico nestes 20 anos.
Esta proposta tem todavia, uma vez que está consagrado de maneira modesta, ao mesmo nível que a o princípio da descentralização administrativa, um alcance razoável e moderado, ou seja, daqui não flui senão o que flui, ou seja, a par rigorosamente do que flui aqui, na legislação administrativa, ou seja, é um princípio definido em sede do artigo
Página 1823
que alude às atribuições e competências das autarquias locais, remetendo-as para a lei, puramente, com o "proviso" de que nessa matéria se respeitarão esses princípios, que sempre teriam que ser respeitados.
Creio que, em certo sentido, nós também explicitamos qualquer coisa que se desgarra de outros artigos da Constituição, designadamente o artigo 240.º, ou seja, nesse sentido proclamamos no artigo 238.º, que não deixa de ter um certo carácter capitular, se quiserem, ou introdutório, proémio, não deixamos de projectar e de refractar nele aquilo que está, na narrativa constitucional, nos artigos seguintes. Ou seja, a enunciação começa no artigo 238.º com a definição das categorias de autarquias, prossegue no artigo 239.º com um menção às atribuições e competências e uma definição principológica, e no artigo seguinte alude-se ao regime das finanças locais e à descentralização financeira, que, de facto, não é mais do que aquilo que decorre do n.º 2 do artigo 240.º. Isto é, entre outras coisas, esses regimes serão estabelecidos por forma a assegurar o nobre objectivo da repartição de recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias e a necessidade de correcção de desigualdades.
Portanto, esta proposta é uma refracção, mas uma refracção no bom sítio, que queremos, porque a definição das atribuições e competências há-de ter em atenção este aspecto e também a necessidade de que haverá atribuições, competências e meios e não competências sem meios e não atribuições sem as adequadas competências e meios.
É um casamento que me parece o bom casamento constitucional e nessa matéria a inovação substantiva não é significativa.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Posso fazer uma pergunta, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Miguel Macedo.
O Sr. Miguel Macedo (PSD):- Sr. Presidente, é uma pergunta ao Sr. Deputado José Magalhães, porque, devo confessar, não percebi bem a explicação com que o PS pretende sustentar esta alteração, primeiro porque conheço o conceito de autonomia administrativa e financeira, mas não conheço o conceito de descentralização financeira! E quero dizer-lhe que não vejo que esta proposta de alteração, que, julgo, poderá ter o mesmo destino que a proposta que fizemos para o artigo 237.º, possa ser fundamentada, se a explicitação é essa, com base no disposto no n.º 2 do artigo 240.º. Isto porque no .º 2...
O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr. Deputado, porque é que eu terei citado esse artigo?!…
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, era essa justamente a minha pergunta!
O Sr. José Magalhães (PS): - Porque é que terei citado esse artigo? Terá sido por acaso?
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Deputado, era essa justamente a minha pergunta! É que o que está no n.º 2 do artigo 240.º não tem, do meu ponto de vista, nada a ver com a defesa que o Sr. Deputado José Magalhães fez para o inciso introduzido no artigo 239.º. Mas esta é a minha opinião, e a pergunta que queria fazer-lhe é a seguinte: acha que o conteúdo do n.º 2 do artigo 240.º coincide com o que poderá ser o sentido útil da alteração que fazem para o artigo 239.º? Eu acho que não!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Quando se lança uma criatura jurídica ao mundo ela fica sujeita à leitura de todas as mentes devidamente formadas e fico, neste momento, como condição de habilitação para uma resposta com uma interrogação terrível sobre que tipo de pensamentos hermenêuticos é que nós teremos suscitado com esta pergunta à mente, seguramente perspicaz, do Sr. Deputado Miguel Macedo.
O que é que vê aqui? Será que vê algum Adamastor de dentes terríveis ou vê o que nós vemos? O que nós vemos não vê claramente!…
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não vejo, aliás não vejo nada Sr. Deputado. Se quer a minha sincera opinião, não vejo nada em relação ao que entendem que deve ser o conteúdo útil desta alteração ao artigo 239.º. É justamente isso. Vejo o que quer dizer o n.º 2 do artigo 240.º, mas não vejo o que quer dizer esta coisa da "descentralização financeira".
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, temos referido muito frequentemente o facto de se ter verificado uma prática perversa de imposição às autarquias locais de novas atribuições e competências sem os correspondentes meios financeiros e dissemos também muita vezes que esta uma fórmula particularmente perversa de atingir um conjunto de objectivos, do qual eu destaco a desresponsabilização do Estado, pessoa colectiva, e dos governos, impondo encargos sem os correspondentes meios financeiros.
De algum modo, esta questão, que estou a colocar claramente, está subjacente à intervenção do Sr. Deputado José Magalhães. Agora, se está subjacente à intervenção do Sr. Deputado José Magalhães não está subjacente com a mesma clareza à proposta que o PS faz.
Deste modo, a pergunta que fica no meu espírito é a seguinte: nós estaríamos abertos e até teríamos um grande regozijo em relação à aceitação de uma proposta que prevenisse a prática prejudicial às autarquias locais que acabei de referir, mas temos algumas dificuldades em ver a utilidade prática deste acrescento, nos termos em que é proposto.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continua a discussão.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, eu reconduzia um bocado esta discussão a algumas que tivemos na primeira parte dos trabalhos desta Comissão e que têm a ver com um princípio que, penso eu, foi sendo mais ou menos amadurecido nesta Comissão, o de que não há nunca vantagem em tentar colocar na Constituição conceitos
Página 1824
jurídicos que não têm uma adequada densificação em termos da nossa ordem jurídica e que, por isso mesmo, ao serem constitucionalizados sem essa prévia densificação na ordem jurídica podem causar as mais variadas interpretações e, acima de tudo, as mais variadas confusões.
Sinceramente, percebo perfeitamente o que é a descentralização administrativa, mas confesso que tenho dificuldade - e, de resto, desde que li este projecto de lei essa era uma das passagens que me deixava curioso - em perceber exactamente o que é que se pretende, porque descentralização financeira, falando em termos de Estado, de Administração Pública, não sei exactamente o que é que pode significar, com toda a franqueza.
Como o Sr. Deputado Miguel Macedo disse, percebe-se perfeitamente, no artigo a seguir sobre as finanças e o património e as finanças locais, que haja - e há -, da parte de todos os partidos, genericamente, vantagem em densificar um pouco mais os conteúdos reais das finanças das autarquias, e por aí fora.
Agora, este princípio da descentralização financeira, para nós, não fica perceptível e é gerador de confusão, porque se por descentralização financeira se está a pensar a possibilidade… Lembro, apenas, a título de exemplo e para ilustrar as dúvidas que podem aqui colocar-se, uma discussão que tivemos aqui, a propósito das regiões autónomas, das finanças regionais, sobre a hipótese de se consolidarem princípios como o do direito a uma capitação das receitas do erário público das receitas fiscais. Portanto, há toda uma panóplia de dúvidas que podem resultar daqui!… O que é, de facto, a descentralização financeira?!…
Sinceramente não estou nada contra, mas o PSD só aceitará a alteração do texto constitucional nesta matéria se, realmente, resultar daqui algo de palpável e de perceptível, o que, aparentemente, neste momento, ainda não acontece.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Srs. Deputados, esta discussão talvez ajude um pouco a tentar situar os contornos de uma tal figura, mas, verdadeiramente, a nossa proposta em relação ao artigo 240, n.º 3, com os seus aditamentos, fala claro sobre o nosso espírito.
Também não vi, mas talvez ainda esteja a tempo, uma expressão mais límpida do nosso pensamento nobre e meritório, digno de aplauso, como sublinhou o Sr. Deputado Luís Sá. Talvez encontremos um cálamo à proporção do brilho da ideia, como tal, porque, verdadeiramente, o que se quer com a descentralização administrativa sabemos todos, ou seja, quer garantir-se o exercício a determinadas competências a um nível próximo da base, assegurando essa proximidade.
O que se quer com a descentralização administrativa, a que agora se fazia alusão, era, precisamente, um lugar paralelo de tal coisa, ou seja, a garantia aos órgãos de base, aos entes territoriais de base, dos meios financeiros necessários adequados, proporcionados ao exercício da panóplia das suas competências, com um sentido correctivo de desigualdades múltiplas, algumas históricas. Por isso mesmo nós aditamos à imperfeita enumeração do artigo 240.º, n.º 3, uma menção expressa à existência de impostos autárquicos, novo conceito, esse também e um pouco espinhoso, quiçá, de ser objecto de uma hermenêutica clarificadora, e daquilo a que chamamos participação nos impostos nacionais e transferências do Orçamento do Estado. Essas transferências devem, de resto, acompanhar ou servir para a boa realização das ditas atribuições e competências, na óptica que flui não só do artigo 240.º como de outras normas da Constituição.
Portanto, creio que nesta matéria não há nenhuma verdadeira "abóbora do Entroncamento". Não se trata do conceito de autonomia, porque essa protege o poder local contra algumas actividades de agressão activa ou passiva e garante-lhe mecanismo e formas de decisão livre, nesse sentido, em relação ao acervo de receitas que lhe caibam e à gestão das mesmas receitas. Não é esse o conceito operacional que aqui está em causa, porque o conceito operacional que aqui está em causa é este, o que eu tentei recortar, com a vossa ajuda de resto, bastante significativa, e que pode ser expressa de outra maneira. Muito bem, mas, francamente, também só faltava que fizéssemos uma edição anotada do conceito de descentralização financeira, quando não o fazemos em relação ao conceito de descentralização administrativa, cuja densificação e explicitação nenhum dos Srs. Deputados propõe.
Portanto, Sr. Presidente, estamos, naturalmente, abertos ao destino que esta proposta tenha, mas o nosso pensamento é francamente marcado pela boa fé.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, penso que o destino, obviamente, será determinado pelas posições dos partidos. Em todo o caso, penso que não vale a pena que a decisão sobre a decisão desta proposta se baseie em dizer que isso não significa nada ou em dizer que isso significa mais do que aquilo que significa.
No entanto, há uma coisa que, obviamente, não significa: cobrir o facto de as autarquias terem fontes de financiamento, porque só cobre uma parte, isto é, as fontes próprias de financiamento.
Descentralização financeira é a face dinâmica daquilo que significa a autonomia financeira, isto é, ter receitas próprias, nomeadamente receitas tributárias próprias. Era o que significaria!…
O Sr. José Magalhães (PS): - E está no nosso artigo 240.º, aliás.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não esteja a arrepiar o caminho!…
O Sr. Presidente: - Portanto, daria cobertura ao artigo seguinte, ou seja, os impostos autárquicos ou o poder tributário próprio, que é a mesma coisa visto de perspectivas diversas e, consequentemente, à ideia de que as fontes de financiamento das autarquias locais não são apenas as transferências do Orçamento do Estado mas sim fontes financeiras próprias, isto é, receitas financeiras próprias, delas. Se a descentralização administrativa é dar a órgãos, a entidades públicas autárquicas, poderes administrativos próprios, atribuições próprias, então, a descentralização financeira é dar-lhe receitas próprias que não dependem apenas de transferências do Estado.
A única pergunta que faria sobre a vantagem em aditar isto não seria no sentido de saber se isso significa alguma coisa, porque é óbvio que significa, seria no de entender se isso acrescenta muito ao conceito global de descentralização administrativa que em si mesmo há de incluir a autonomia administrativa em sentido estrito, um mínimo de
Página 1825
autonomia financeira, um mínimo de autonomia organizatória, um mínimo de autonomia regulamentar, isto é, uma série de autonomias em que se desdobra a descentralização administrativa em sentido amplo. Portanto, o financeiro pode ser um dos elementos principais da autonomia administrativa, mas como não é o único não sei se haveria grande vantagem em discriminar isto.
Em todo, o caso, mostra-se a falta de simpatia do PCP e do PSD por esta proposta.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nós ficamos abertos, também "não é por aí que o gato vai às filhoses". Se chegarmos à conclusão que há vantagem útil, pois com certeza.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Estaremos abertos a uma formulação que corresponda à preocupação que o Sr. Deputado José Magalhães referiu na primeira intervenção.
O Sr. Presidente: - Mas essa não está coberta!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Eu sei!
O Sr. Presidente: - Essa há-de resultar do artigo 240.º globalmente. Não é apenas a descentralização financeira, ou seja, o poder tributário próprio, os impostos autárquicos, são também as tais transferências do Estado que estão incluídas aí.
Vamos, então, passar ao artigo 240.º, existindo, para o n.º 2, uma proposta do PSD que tem os seguintes elementos: introduz, desde logo, o conceito de poder autárquico; acrescenta o qualificativo "eficiente" à ideia de justa repartição dos recursos público; e elimina a ideia da correcção das desigualdades entre autarquias do mesmo grau. Deste modo, o n.º 2 passaria a ter a seguinte redacção: "O regime das finanças locais, a estabelecer por lei, dotará as autarquias locais de poder tributário e visará a justa e eficiente repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias", cortando a segunda parte do actual n.º 2.
Srs. Deputados, está apenas em discussão o n.º 2. Têm a palavra os proponentes da proposta que apresentei.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto à primeira parte, já aflorámos esta discussão a propósito já não me lembro exactamente de quê…
O Sr. José Magalhães (PS): - A propósito da Constituição fiscal.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exacto, a propósito da Constituição fiscal, do poder tributário.
Como o Sr. Presidente e os Srs. Deputados se recordarão, na altura teve o PSD oportunidade de explicitar que tivemos, na elaboração deste nosso projecto de lei, alguma reflexão e alguma dificuldade em encontrar o termo adequado para colocar aqui. Portanto, o termo consta da nossa proposta, para além de toda a abertura normal, com uma abertura acrescida pelo facto de nós próprios termos sentido alguma dificuldade em encontrar o conceito exacto.
É certo, porém, que o conteúdo aqui em causa, como na altura tivemos ocasião de explicitar, nada tem que ver com a criação de impostos. Isso está fora de causa, de resto já decorre da leitura dos artigos que estão atrás, nomeadamente das competências da Assembleia, em que claramente se mantém a criação de impostos.
A criação e extinção de impostos é competência da Assembleia da República. Não propõe o PSD, nem o considera aceitável no actual estádio do nosso país e do nosso Estado de direito, permitir-se a criação de impostos autárquicos (falo em impostos autárquicos por contraposição a impostos nacionais). Assim, tivemos alguma dificuldade em encontrar a densificação disto. Trata-se das situações que já na altura o Sr. Presidente nos ajudou a explicitar, como, por exemplo, aquela que acontece na contribuição autárquica, com dúvidas sérias de constitucionalidade, em que a lei geral se limita a definir intervalos para as taxas e, depois, é deixado ao poder autárquico a competência, o poder, de lançar o imposto, de determinar o elemento essencial do imposto, como é a taxa. O imposto está criado pela Assembleia mas…
O Sr. Presidente: - O lançamento é nas derramas!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sim, o lançamento é nas derramas. Refiro-me à determinação da taxa, que é um elemento essencial do imposto e, como tal, é profundamente discutível, como todos sabemos, a constitucionalidade estrita e rigorosa da situação que existe desde há muitos anos, mas que é desejável; do nosso ponto de vista é desejável e até devia ser aprofundada.
Quando o PSD fala em dotar as autarquias locais de poder tributário a estabelecer por lei é para nós evidente que terá que ser o legislador, a Assembleia da República, a densificar este poder tributário. A nossa ideia - já o tínhamos clarificado, mas é este o primeiro aspecto que quero aqui reafirmar - é nunca ir ao ponto de pôr em causa a criação de impostos, pois, do nosso ponto de vista, esse tem que ser sempre um poder nacional, não pode haver desigualdades desse tipo.
Passo à segunda parte da nossa proposta, a retirada da parte final do actual texto, em que se fala na "necessária correcção de desigualdades entre autarquias do mesmo grau". É certo, e isso está consolidado actualmente na Lei das Finanças Locais, que existem mecanismos que tendem a tratar desigualmente municípios que têm estádios de evolução diferentes, problemas de interioridade. Portanto, não há uma distribuição cega e igualitária de determinado tipo de rubricas, como, por exemplo, o FEF, exactamente com o intuito de permitir um desenvolvimento harmónico e a recuperação de determinado tipo de assimetrias que existem entre várias regiões do País.
Propusemos a retirada desta parte final do preceito porque, estritamente, o que está escrito na Constituição é mais do que isso, ou pode ser mais do que isso. A dúvida que tivemos relaciona-se com o facto de a necessária correcção de desigualdades entre autarquias do mesmo grau poder levar a uma leitura que, independentemente de outras circunstâncias que são competências próprias, em termos de receitas e de desenvolvimento, do poder autárquico, obrigue sempre o Estado a beneficiar as autarquias que, às vezes, continuam a ter uma situação de desigualdade com outras autarquias do mesmo grau por razões de menor dinamismo, de menor capacidade de desenvolvimento, que é um mérito próprio das suas populações.
Assim, propusemos esta eliminação apenas no sentido de não cristalizar aqui uma possibilidade de encosto, no mau sentido, das autarquias menos dinâmicas, do poder
Página 1826
autárquico menos dinâmico, com menos políticas de desenvolvimento, sempre a contar com a garantia de que o legislador, de que o regime legal das finanças locais, iria sempre encontrar formas de suprir isso.
Portanto, digamos que é um bocadinho um apelo ao mérito e ao dinamismo das autarquias. Foi essa a intenção que nos moveu; não é mais do que isso.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, e quanto à ideia de "justa e eficiente repartição"? Esse qualificativo não é um tanto exótico?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, já discutimos também este conceito a propósito, penso, da parte da Organização Económica. Não sou a pessoa mais azada para o explicitar, porque não sou economista…
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - É a ideia de que o gasto das autarquias é mais bem gasto do que o do poder central!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É o princípio da eficiência económica, Sr. Presidente. A ideia da palavra "eficiente", uma vez que estamos a falar de finanças, de repartição de recursos, está no conceito de eficiência económica (é pena não estar cá um Deputado economista. Penso que nenhum de nós é economista. Se estivesse cá o Sr. Deputado Octávio Teixeira, por exemplo, poderia ajudar-nos, porque lembro-me que ele falou muito, a propósito da questão da organização económica, no conceito da eficiência económica). É esse o conceito, Sr. Presidente, a lógica é essa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, proponho que discutamos a questão do poder tributário juntamente com o número seguinte, sem prejuízo da colocação, e que discutamos agora apenas as duas outras alterações.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, ainda sobre a matéria que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes acabou de falar, gostaria de explicitar mais algumas razões em abono da proposta do PSD.
A ideia fundamental contida no n.º 2, e que nós, PSD, obviamente salvaguardamos, tem que ver com a questão da justiça da repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias locais. Penso que este é o conteúdo essencial ou nuclear da proposta do PSD, como, aliás, já consta hoje da Constituição da República Portuguesa.
A parte que efectivamente o PSD não propõe, ou seja, a última parte do n.º 2 do artigo 240.º, julgo que pode carecer aqui de alguma ponderação, porque em situações idênticas pode justificar-se - e do meu ponto de vista deve até justificar-se - alguma desigualdade nesta repartição de fundos, com vista a conseguir a tal justa repartição.
O que quero dizer com isto é que há autarquias locais que, por exemplo, por força da sua orografia, das dificuldades que têm em fazer determinado tipo de obras, devem ter uma ponderação diferente em relação a outras para esse mesmo tipo de obras. Vou dar um exemplo muito simples: em geral, é muitíssimo mais barato fazer uma estrada de 5 Km no Alentejo do que fazer uma estrada de 1 Km num concelho do meu distrito, como, por exemplo, Terras de Bouro, onde praticamente só é possível avançar à força de dinamite.
Se tivermos em conta que são ambos concelhos, no geral, com pouca densidade populacional e, portanto, nesse aspecto não beneficiados em termos de FEF, porque esse é um dos critérios para a atribuição dos fundos, e que geralmente, até em termos de território, por exemplo, os concelhos do Norte são mais pequenos em geral do que aqueles que existem noutras zonas do País, etc., há aqui um conjunto de questões que hoje a lei, do meu ponto de vista, não salvaguarda inteiramente no sentido de assegurar a tal igualdade e justiça de repartição de fundos entre o Estado e as autarquias e, dentro das autarquias, entre as autarquias - essa é outro questão -, e que era preciso ponderar bem. Do nosso ponto de vista, isso fica completamente assegurado sem precisarmos ter na Constituição esta última parte do n.º 2 do artigo 240.º.
Julgo que a proposta do PSD aponta muito para este sentido de justiça actualista que temos, ou seja, tratar de forma diferente aquilo que, de facto, é diferente para conseguir a tal justa repartição de verbas entre o Estado e as autarquias e, dentro das autarquias, entre as próprias autarquias.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, estas explicações são de grande utilidade, porque em nome da igualdade e da justiça de repartição o Sr. Deputado Miguel Macedo elimina uma cláusula de explícita, expressa e inequívoca garantia desse objectivo, o que não é seguramente a melhor forma de legislar em sede constitucional ou ordinária.
Por outro lado, em nome de uma clarificação, introduz um espaço de ambiguidade, sobretudo devido à terminologia que utiliza, porque já não bastaria a ablação, ainda se soma à ablação a introdução de um conceito. Que conceito é? É introduzido por uma copulativa que soma ao conceito de justiça, ou seja, de justa repartição, o conceito de eficiente repartição!
O que é isso? É uma redundância? É uma forma de dizer de maneira diferente o mesmo conceito ou é aquilo que a palavra eficiência inculca? Distingue-se de eficácia, projecta a sua esfera no domínio económico em relação precisamente ao valor dos tostões, dos dinheiros, dos contos, dos escudos, aplicados e, portanto, inculca, ou pode inculcar - numa interpretação que seguramente não é a do Sr. Deputado Miguel Macedo, mas que poderá ser a de um intérprete não escravo do pensamento legislador neste termos -, que o dinheiro gasto numa autarquia geograficamente favorecida é bastante mais eficiente do que o gasto no meio da serra rebentando a dinamite as fraldas da montanha. Esse sentido seria extraordinariamente perverso e poderia introduzir guerras entre partes do território que é bom que não tenham lugar com justa causa; as outras, francamente, não nos incomodam, e assim como nascem assim se evaporam, como as nuvens.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Eficiente refere-se à distribuição das verbas entre o poder central e as autarquias!
Página 1827
O Sr. José Magalhães (PS): - Não, Sr. Deputado, não é apenas o efeito do aditamento do qualificativo eficiente, é o efeito conjugado do aditamento do eficiente e da eliminação da segunda parte do n.º 2 do artigo 240.º. O efeito conjugado dessas duas operações, francamente, não me parece que conduza aos resultados que acabou de descrever, pelo contrário, poderia legitimar interpretações como aquelas que aqui tive ocasião de resumir.
Portanto, Sr. Presidente, francamente, não vemos com nenhuma simpatia esta matéria e, sobretudo, creio que o equívoco que isso poderia gerar de "guerra santa" entre autarquias ou de autarquias afectadas por disparidades, cuja correcção histórica almejam, e é justo que almejem, e que se irá fazendo de acordo com a Constituição e com as nossas caminhadas em domínios mais vastos, é perniciosa, salvo melhor demonstração, naturalmente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas acrescentar algo ao que já foi dito. Creio que a ideia de correcção de desigualdades entre autarquias do mesmo grau é um apuramento do princípio da igualdade, o qual se traduz em poder ser tratado de forma desigual o que é desigual. É perfeitamente natural, e creio que é mesmo obrigatório, que as situações de desigualdade objectiva entre autarquias em matéria de área, de população, de orografia, de mortalidade infantil, de carências nas áreas a cargo das autarquias locais, etc., constituam indicadores que levem efectivamente a corrigir essa desigualdade.
Porém, aquilo que o Sr. Deputado Miguel Macedo parece dizer é que este tratamento das autarquias com base em critérios objectivos contraria o princípio da correcção de desigualdades entre autarquias do mesmo grau.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Exacto!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Eu diria, pelo contrário, que constitui a forma de realizar o princípio de correcção de desigualdades entre autarquias do mesmo grau. Se este princípio fosse eliminado ficaria o campo para o arbítrio nesta matéria, quando actualmente o que decorre deste princípio é a imposição de critérios objectivos no sentido de, através do eventual tratamento de forma desigual do que é desigual, quando há condições diferentes, chegar à realização do princípio da igualdade.
Quanto à questão de acrescentar à distribuição justa a ideia de distribuição eficiente, é evidente que nesta matéria não gostaria de fazer leituras perversas e muito menos processos de intenção, mas é sabido que já neste momento há, por exemplo, uma fonte de financiamento das autarquias locais extraordinariamente importante, mesmo das mais importantes para muitas delas, que são os fundos comunitários. É sabido que nesta matéria funciona efectivamente o princípio da eficiência, isto é, obtém a receita quem se candidata primeiro, quem tem melhor gestão da obra, quem tem melhor gestão financeira.
Naturalmente, no futuro, em nome deste princípio, poderia passar a ser possível a distribuição casuística de fundos financeiros à margem, por exemplo, de critérios objectivos estabelecidos no âmbito de finanças locais em particular. Em relação à abertura de um tal caminho, naturalmente, não podem contar connosco. Como disse, não quero fazer processos de intenções, mas creio que era fácil haver leituras perversas deste tipo, o que de todo em todo queremos evitar. Portanto, não vemos nenhuma vantagem em acrescentar este termo, pelo contrário, vemos inconvenientes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, em relação a esta última parte do n.º 2 do artigo 240.º, que ocupou a nossa discussão até agora, o PSD não faz nenhum finca-pé na proposta. O sentido útil da proposta que fazemos tem que ver com o conteúdo que quer eu quer o Sr. Deputado Luís Marques Guedes explicitámos aqui e, portanto, não há nenhuma conclusão perversa em relação àquilo que dissemos.
O que julgo - repito - é que o sentido nuclear da norma do n.º 2 assenta no conceito de justiça na repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias. Por isso nos pareceria não gravoso a eliminação da última parte do n.º 2, mas não nos opomos a que continue, como é evidente, não há nenhum problema em relação a isso.
No que respeita à questão da eficiência, assinalo a interpretação que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes já aqui explicitou. É, obviamente, a eficiência económica, mas é também, como é evidente, uma afloração dos princípios que todos temos de salvaguardar na gestão dos dinheiros públicos. No entanto, isso já hoje é subjacente à forma como a lei está construída na repartição dos fundos entre a administração central e a administração local e, dentro da administração local, designadamente tendo em conta a ponderação dos factores que vão determinar em concreto, em relação a cada uma das autarquias, os fundos que são transferidos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que mais ninguém se quer pronunciar, penso que a proposta do PSD quanto ao n.º 2, ressalvada a questão do poder tributário que ficou de remissa, não tem a simpatia nem do PS nem do PCP.
Vamos, então, passar ao n.º 3, para o qual existem propostas do PS e do PSD. Diz o actual n.º 3 o seguinte: "As receitas próprias das autarquias locais incluem obrigatoriamente as provenientes da gestão do seu património e as cobradas pela utilização dos seus serviços", ou seja, as receitas patrimoniais e as taxas lato sensu. O PS propõe que se acrescente, quanto às taxas dos serviços utilizados, a expressão "prestados directamente ou através de terceiros", bem como as receitas "provenientes dos impostos autárquicos e da participação nos impostos nacionais e as transferidas do Orçamento do Estado". Por sua vez, o PSD acrescenta apenas "as provenientes do poder tributário".
Estão aqui duas proposta sobre o mesmo tema com alcance diverso. Têm a palavra os proponentes, começando pelo PS.
Faça favor, Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, este artigo deve ser lido em conjugação e articulação com o artigo 106.º, n.º 3 novo, que apresentámos. O debate que fizemos sobre ele foi já bastante interessante, portanto, não o reproduzo. Assim, nessa matéria dou por reproduzido o que então alcançámos. Só trarei à colação algumas conclusões disso um pouco adiante para estabelecer a diferença entre esta proposta e a apresentada pelo PSD.
Página 1828
Gostaria tão-só de sublinhar o seguinte nesta matéria: em primeiro lugar, há uma imperfeição de redacção à partida, porque como quisemos preservar a alusão à expressão "utilização" reconvertemos o segmento em que se diz actualmente as receitas "cobradas pela utilização dos seus serviços" e configurámo-lo para dizer as receitas "por serviços utilizados", o que está francamente a mais. O Sr. Presidente, curiosamente, ao ler, fez salto directo e disse as "cobradas por serviços prestados directamente ou através de terceiros". Suponho que é uma redacção mais correcta do que continuar a expressão "utilizados", que aqui consta um pouco por herança do texto actual, mas sem nenhuma função operatória verdadeiramente relevante, suponho.
Dito isto, quero referir que o preceito faz um elenco, que não é taxativo mas que é mais rico do que aquele que hoje consta do texto constitucional, por forma a aludir especificamente à participação dos impostos nacionais e às transferências do Orçamento do Estado.
O busílis aparentemente decorreu, nos termos que já conhecemos, da introdução de uma alusão àquilo que a chamávamos, e chamamos, impostos autárquicos, com a configuração que decorre do artigo 106.º, e que implicam que a Assembleia da República estabeleça os elementos essenciais dessas espécies tributárias, cuja activação ficaria na disponibilidade das autarquias locais.
Qualquer que seja a resposta que se dê à cobertura constitucional de situações actuais que sem essa cobertura se arriscam a viver numa zona de obscuridade, e qualquer que seja o nomem juris que venhamos a adoptar para qualificar essas receitas, cuja razoabilidade não existe de uma especial controvérsia e sobre cuja supressão suponho que ninguém quererá fazer um elogio fúnebre, descontado esse aspecto, aquilo que vos propomos é quase um olhar para o mapa das receitas que em boa razão, face ao quadro legal, face àquilo que é um quadro razoável, face à experiência do Direito Comparado e face a uma prospectiva quanto ao seu futuro, as autarquias têm e enriquecer um pouco a mancha de figuras de receita constantes no elenco constitucional.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, é tão-só isto o que propomos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, e quanto aos serviços prestados directamente ou através de terceiro?
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, tenho a meu lado um ilustre Deputado e vereador que tem entre mãos, com carácter sistemático, orçamentos camarários, o que não é o meu caso, mas do estudo verificamos que em matéria de serviços há várias formas de prestação, sendo a prestação directa apenas uma delas. Há outras modalidades que não deixam, todavia, de integrar receitas autárquicas, como tal podendo ser mencionadas. Em todo o caso, estamos abertos à formulação que não introduza nessa matéria senão rigor.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes para apresentar a proposta do PSD.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de comentar a proposta do PS, porque a do PSD já está apresentada.
O Sr. Presidente: - Exacto, essa proposta já está apresentada. Então, está aberta a discussão das duas propostas.
Faça favor, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, devo dizer que quanto à proposta do PS vejo dificuldades do princípio ao fim, com toda a franqueza e com toda a serenidade.
Começando pelo aspecto já focado pelo Sr. Presidente, posso perceber a intenção de se cobrir aqui a situação, por exemplo, de empresas públicas municipais ou de serviços prestados por entidades que, embora dependentes da câmara, têm personalidade jurídica distinta e, portanto, nesse sentido, são terceiros em relação à câmara.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Exacto! É o caso da recolha do lixo!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sucede que a forma como isto está aqui redigido coloca um problema, do meu ponto de vista não ultrapassável, referente às concessões. É evidente que não são, nem podem ser, receitas próprias da câmara os serviços cobrados por concessionários camarários, mas a redacção também diz isso, e não pode dizer.
Concordo convosco quanto àquela preocupação, embora deva dizer que a considero perfeitamente supérflua, pois já assim acontece no actual texto da Constituição. O preciosismo de acrescentar, do meu ponto de vista - quero confrontar o PS com isso, pelo que peço que reponderem -, coloca problemas deste tipo, que obviamente extravasam a intenção, boa, é claro, de quem redigiu a proposta. Mais vale, então, arrepiar caminho e deixar as coisas como estão, porque, de facto, entrar por este caminho coloca-nos problemas inultrapassáveis, temos que começar aqui a excepcionar uma série de situações que, obviamente, não podem constituir receitas próprias.
Não faz sentido nenhum haver um concessionário e depois dizer "Está bem, ele é um concessionário mas a receita é da câmara"! Sabemos que não é assim!
Seguindo a redacção do acrescento do PS, vou agora referir-me ao problema dos impostos autárquicos. O Sr. Deputado José Magalhães, e bem, do meu ponto de vista, aproveitou a apresentação desta norma para não voltar a entrar no problema dos impostos autárquicos, porque, de facto, a maneira como está aqui colocado… A expressão "poder tributário" pode não ser feliz, eu próprio já o disse, mas também ainda não encontrei nenhuma melhor, sendo um esforço que todos terá de mobilizar, porém a expressão "impostos autárquicos" nunca, e muito menos colocada ao lado de imposto nacional! Então é que a dicotomia imposto autárquico/municipal fica perfeitamente colocada aqui, prestando-se não já a mal entendidos mas, obviamente, a uma interpretação profundamente errada e não condizente, nem com a vontade dos proponentes nem, seguramente, com a vontade do PSD. Ou seja, nunca por nunca o que está aqui em causa pode ser a situação de impostos que tenham incidência apenas no território autárquico, na circunscrição territorial que é uma determinada autarquia; isso é perfeitamente inaceitável!
Quanto à questão da participação nos impostos nacionais, Sr. Deputado, também tenho as mais sérias dúvidas! O texto da proposta para o n.º 3 - e convém ler o preceito todo - diz que "As receitas próprias das autarquias
Página 1829
incluem obrigatoriamente (…)". Portanto, está aqui a dizer que há uma participação obrigatória das autarquias locais, sob a forma de receita própria, em todo e qualquer imposto nacional. É isso o que resulta do texto da proposta, aparentemente, porque não se trata de números autónomos, isto é, a proposta diz que "As receitas próprias das autarquias incluem obrigatoriamente" e, depois, elenca várias coisas entre vírgulas e algumas com "e".
Portanto, o que está aqui a dizer-se - já tivemos um pouco esta discussão quando falámos das finanças regionais - é, atenção, a participação das regiões nos impostos nacionais não pode ser um direito prescrito na Constituição de uma forma perfeitamente taxativa, sob pena de estarmos a perverter, por um lado, as regras das duas vias, os princípios da solidariedade, e também de estarmos a atingir resultados que não estamos a entrever!… Porque o que aqui está é que passa a haver uma obrigação, um direito inalienável das autarquias a considerar como receita própria uma participação - é certo que não se quantifica a participação - em todo e qualquer imposto de âmbito nacional, o que me parece, de facto, no mínimo, um equívoco, e não será seguramente essa a intenção dos proponentes.
Quanto às transferências do Orçamento do Estado, essa é uma questão pacífica, em que estamos completamente de acordo e que não nos suscita qualquer tipo de equívocos. A única dúvida que tenho é não saber se transferências do Orçamento são receitas próprias, mas trata-se de uma dúvida apenas técnica, não jurídica. Não sei se o conceito de transferência é subsumível ao conceito de receita própria. É só esta a dúvida que tenho, porque é evidente que, em termos de linguagem comum, estamos todos de acordo em considerar que fazem parte das finanças locais a transferência do FEF e todas as outras transferências. Até porque nas transferências temos as transferências de capital e as despesas! Portanto, quanto a este aspecto tenho só uma dúvida técnica.
Quanto ao resto, de facto, o PSD tem problemas devido às interpretações que suscitei. Quanto a esta parte final temos só uma dúvida técnica.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, as propostas continuam à discussão.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de fazer só uma pequena observação.
Em relação à primeira questão suscitada, a do regime dos serviços prestados, a verdade é que não vejo que nesta matéria se desenhe uma tendência para as autarquias deixarem de recorrer cada vez mais a formas inventivas de criação de corpos, de estruturas e de modalidades, as mais diversas, de garantir uma mais eficiente prestação de serviços,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Cada vez mais concessões, Sr. Deputado José Magalhães!
O Sr. José Magalhães (PS): - … sob o lema, em certos casos, até da privatização, mas em muitos casos basicamente em termos de criação de entes capazes de intervir na área dos serviços essenciais, sempre em articulação, na esfera jurídica, com o mundo autárquico.
Francamente, não vejo que o preceito actual cubra rigorosamente isso, ou seja, aludir a receitas cobradas pela utilização dos seus serviços tem implícita uma ideia de prestação directa.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E a gestão do património?
O Sr. José Magalhães (PS): - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes objecta que isso abrange demais, porventura abrange demais quanto às concessões, como sublinhou.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Pensa que a gestão do património não contém já essas virtualidades?
O Sr. José Magalhães (PS): - E chama a isso gestão do património?!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Na parte em que não seja utilização dos seus serviços!
O Sr. José Magalhães (PS): - Nesse cenário, dá-lhe uma interpretação extremamente extensiva!
Para concluir, a participação nos impostos nacionais, interpretada como o Sr. Deputado a interpretou, escapa um pouco ao sentido originário da nossa proposta, por isso se o problema é deixar esse aspecto inequívoco, deixemo-lo. No entanto, além daquilo que decorre do artigo 240.º, n.º 2, ou seja, a justa repartição de recursos públicos, o que seguramente não deixará de comportar uma componente ou uma dimensão no que diz respeito à atribuição, à afectação das receitas fiscais,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas não numa participação obrigatória!
O Sr. José Magalhães (PS): - … através de modalidades diversas, incluindo naturalmente essa, mas não apenas, a refracção disso numa alusão à participação em impostos nacionais, com franqueza, parece-me um retrato de família numa composição que se augura bastante duradoura.
Quanto à questão de carácter técnico-jurídico sobre a qualificação jurídica das transferências correntes e de capital e a sua compatibilidade com a classificação de recursos próprios, vamos naturalmente ter tempo ainda de ponderar se há um conflito ou se, pelo contrário, na acepção que está neste artigo da Constituição isso não é especialmente chocante.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de fazer uma pergunta, aliás, apelo aqui à participação do Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, porque devo dizer que tenho algumas dúvidas sobre esta fórmula do PS.
Percebo qual é a ideia. Por exemplo, no que se refere ao que está agora a ser feito em todo o País em relação à recolha do lixo, até por lei estão obrigadas as câmaras municipais a participar - em capital minoritário no total do capital da empresa constituída para o efeito - numa empresa de capitais públicos que vai proceder à recolha,
Página 1830
ao tratamento e à selecção dos lixos que vão ter tratamento, quer nos aterros quer nas outras estruturas que estão a ser criadas. Porém, aquilo que consta da proposta do PS é uma coisa diferente, e penso que não é irrelevante em termos administrativos - é aqui que apelo à participação do Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, que porventura pode ter mais informação do que eu.
Em termos administrativos há um procedimento próprio para que um município arrecade as receitas próprias. Vou dar um exemplo: o imposto de circulação automóvel, que é uma receita municipal, pode ser arrecadado quer pelo município quer pelas finanças, havendo uma forma de transferir esse dinheiro arrecadado pelas finanças para as autarquias, a qual, aliás, mudou nos últimos quatro ou cinco anos, teve algumas especialidades e algumas alterações. Por exemplo, quanto a um tipo de serviço desses tenho muitas dúvidas que se trate de uma receita própria da autarquia, porque a receita é da empresa na qual a autarquia participa. O que a autarquia tem é um direito a arrecadar a sua participação…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A sua quota-parte!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Exactamente! O que a autarquia tem é um direito a arrecadar a sua participação no resultado da própria empresa.
O Sr. José Magalhães (PS): - Essa participação não é uma receita própria da autarquia?
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - É! Não estou a discutir isso, o que estou a dizer é que isto pode conflitar com a forma de arrecadação hoje prevista para as receitas próprias dos municípios, que é diferente e que se processa de forma diferente de outro tipo de transferências hoje consagradas na lei! Não sei se é exactamente assim, mas, por exemplo, neste caso concreto sei que é assim!… Portanto, a dúvida está em saber se isso não conflita… Não tenho divergências sobre isso, é óbvio que deve ser uma receita própria, mas o problema é saber se isto está adequado à situação que temos, à forma do procedimento, ao proceder que temos neste momento em relação a esta matéria.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS):- Sr. Presidente, se me permite, no que se refere a esta questão, há pouco eu estava precisamente a referir isso quanto ao imposto de circulação automóvel, que tem aposto a expressão municipal.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A sisa também tem!
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Mas neste caso concreto são impostos que quando são arrecadados, pagos, às finanças estas têm um mecanismo de transferência automática para a própria autarquia.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Exacto! Mas já foi mais automática!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já foi mais, sim! E cobram dinheiro, ainda por cima!
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - O problema que se coloca aqui, em meu entender, neste momento, e onde penso que esta expressão tem muita relevância não é em relação às concessões - penso que o problema que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes estava a colocar relativamente às concessões não pode colocar-se -, mas sim em relação às empresas públicas municipais. Aí, sim, parece-me, até pela experiência que tenho tido, que é uma questão de alguma forma controvertida e delicada à luz do actual sistema.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Vai sair agora legislação do Governo sobre isso!
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Aí, sim, é que se colocam alguns problemas, porque se trata de empresas de capitais totalmente municipais, ou seja, o único accionista, o único suporte dessas empresas, que têm uma entidade jurídica autónoma, distinta…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Têm personalidade jurídica!
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Completamente! São sociedades que se constituem…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - São terceiros!
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - São terceiros, para todos os efeitos, com órgãos sociais próprios e autónomos. Temos várias destas empresas na cidade de Lisboa, desde a EPUL até à GEVALIS.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - E há mais! Por exemplo, na Câmara Municipal de Braga transformou-se serviços municipalizados em empresas públicas municipais.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Exactamente! E aí há serviços, de facto, prestados directamente pela própria autarquia através destas empresas municipais.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Exactamente!
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Aí, sim, põe-se efectivamente a questão de saber se estas receitas que são, ao fim e ao cabo, arrecadadas pelas empresas públicas municipais consubstanciam ou não receitas das próprias autarquias.
O Sr. Presidente: - Não são, seguramente! As receitas do capital das empresas é que são receitas do município!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente! Os dividendos é que são!
O Sr. Presidente: - Essas empresas estão para o município como as empresas públicas estão para o Estado; o que é rendimento do Estado são os lucros das empresas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá, mas peço que não exageremos na discussão da matéria.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, vou até ser bastante breve.
Quero apenas dizer que o fundamental no n.º 3 do artigo 240.º não é estabelecer um elenco de todos os tipos
Página 1831
de receitas municipais possíveis. Creio que o fundamental é garantir aquilo que constitui efectivamente receitas que não podem deixar de ser do município, isto é, receitas que no fim de contas estão ligadas à autonomia patrimonial e à autonomia financeira. Isto significa que não há nenhuma receita que tenha que ser legitimada através do n.º 3 ou de qualquer outra disposição constitucional.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente! Isto não é exaustivo!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Qualquer dos problemas colocados, a meu ver, não se põem! Julgo que no caso de uma pessoa colectiva pública, de uma empresa municipal, por exemplo, as receitas são da própria empresa municipal, obviamente, mas podem estas reverter para o erário municipal sem necessidade de uma norma de autorização por parte da Constituição para o efeito.
Portanto, creio que a preocupação fundamental, naturalmente louvável, subjacente a esta norma talvez não tenha grande razão de ser. O problema que, esse sim, me parece importante e está em aberto é o de encontrar a forma adequada, necessariamente em ligação com a Constituição financeira, já discutida, de resolver a questão, por um lado, da cobertura das derramas e, por outro lado, da fixação por parte do município da taxa de incidência da contribuição autárquica, ou taxas de incidência de outro tipo de impostos que a lei venha a estabelecer e que tenham a natureza de impostos que revertem para a autarquia ou de impostos municipais.
Naturalmente, este é um ponto discutido, creio até que ao longo do tempo houve uma evolução nesta matéria: houve o tempo em que estávamos perante impostos estaduais que revertiam integralmente para o município; e houve um momento a partir do qual se evoluiu para impostos municipais, não só apenas do ponto de vista do nomem juris, isto é, da designação por parte da lei ou da designação nos selos dos automóveis, houve uma série de medidas complementares desta.
Portanto, é em relação a esta questão que creio haver um problema efectivamente importante.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A receita é que é municipal, o imposto é nacional!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Creio que é uma interpretação inteiramente defensável, o que levaria a condenar - se me permite este parêntesis - a prática do Governo PSD de chamar-lhe municipal em todo o lugar que pôde! Mas isso é outra questão que não vem ao efeito!…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é para o cidadão perceber que o dinheiro que está a pagar é receita do município, não é que o imposto seja do município.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, permitam-me…
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, se me permitisse, queria completar a minha intervenção com uma última referência.
Na proposta do PS há um aspecto para o qual gostaria de chamar a atenção, que é o facto de incluir simultaneamente participação em impostos nacionais e receitas transferidas do Orçamento do Estado. Por exemplo, o Fundo de Equilíbrio Financeiro já foi calculado a partir da participação em impostos nacionais e já foi calculado a partir das próprias despesas públicas, sem que isto envolvesse a obrigatoriedade, nos termos da lei que vigorava na época, de haver também uma participação em impostos nacionais. O problema que aqui está colocado, aí sim de forma inovadora, é o de impor simultaneamente a participação nos impostos nacionais e transferências do Orçamento do Estado, o que em certo tipo de soluções para as finanças locais pode, por exemplo, obrigar ao mesmo tempo a estabelecer o FEF e a participação noutro tipo de impostos nacionais.
O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): * A norma introduz qualificações na área onde elas são importantes, ou seja, obviamente não se trata de uma norma de autorização, mas de garantia e, como o debate prova, há duas ou três coisas básicas a garantir, as quais acabaram de ser referidas. É isso que queremos, estamos abertos a todas as redacções que quiserem, mas este fim garantístico é bastante meritório, pelo passado e pelo significado em termos de futuro, qualquer que ele seja.
O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Queria só fazer uma pergunta directa, porque, penso, o debate foi útil porque clarificou as posições. Para mim, a questão mais importante foi referida agora pelo Sr. Deputado Luís Sá relembrando que o programa normativo do n.º 3, como disse o Sr. Deputado José Magalhães, não tem que ver com a lista exaustiva da panóplia de receitas das finanças, mas com um núcleo essencial que, obrigatoriamente, ...
O Sr. José Magalhães (PS): * Tem a ver com a expressão "incluem obrigatoriamente", referida claramente pela norma.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Exactamente!
A pergunta directa que queria fazer era a seguinte: podemos dar por adquirido o princípio, que penso que já tinha sido ressaltado aquando da discussão do artigo 105.º ou 106.º, de que há um consenso - não sei se o termo adequado é poder tributar - de ampliar, no mínimo, de constitucionalizar algumas situações como a da contribuição autárquica, que já existe hoje em dia, permitindo que o legislador ordinário da lei das finanças locais amplie este tipo de situações para outro tipo de impostos que são criados nacionalmente, mas cuja receita reverte para a autarquia? Por outro lado, parece-me que, quando uma câmara opta por determinar a taxa de um imposto como a contribuição autárquica numa determinada percentagem e não noutra, se ela tem competência para isso, tem de constar de forma evidente na Constituição que a receita que daí decorre tem que ser obrigatoriamente receita própria da câmara, porque a câmara tem uma competência essencial na determinação do valor daquela.
Portanto, a câmara tem de ser responsabilizada, já que é a câmara que decide quanto é que se cobra, e a receita nunca pode vir a ser receita de outrem, tem que ser da própria câmara, até por uma lógica de responsabilização nos dois sentidos.
Página 1832
Portanto, independentemente de se tratar do conceito de poder tributário ou de outro, estamos de acordo com essa lógica, da qual já falámos, de constitucionalizar a competência das autarquias locais relativamente a matéria tributária no sentido de passarem a ter, verdadeiramente e sem dúvidas quanto à sua constitucionalidade, alguns poderes, sem pôr em causa o princípio da criação de impostos, que tem que ser sempre nacional?
Por outro lado, quando assim seja, estamos de acordo quanto ao facto de isso poder ser inscrito neste núcleo essencial de receitas obrigatórias da câmara, exactamente por uma questão de responsabilização? Se a câmara é que vai decidir acerca de elementos essenciais do imposto tem que ser ela necessariamente a arrecadar a receita e não a transpô-la para outrem, eventualmente prejudicando outrem que fica sem este poder de determinar coisas essenciais.
O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, suponho que já tínhamos consenso para a constitucionalização de situações como as descritas quando discutimos o artigo 106.º e, portanto, só nos podemos congratular e reafirmá-lo.
Quanto à função da norma, creio que estamos razoavelmente entendidos.
Quanto à importância de garantir a inclusão obrigatória de participação fiscal, como a referida na parte final da nossa proposta, e a transferência do Orçamento do Estado com o sentido que resulta da discussão, aí, sim, precisaríamos de um consenso alargado e explicito da parte dos Srs. Deputados das demais bancadas, porque há, também neste caso, clarificações e acrescentos cuja mais-valia foi demonstrada.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Mas quanto à participação nos impostos?
O Sr. José Magalhães (PS): * Quanto à segunda parte estão aclaradas as suas dúvidas e está estabelecida a diferença entre isto e a questão das transferências do Orçamento do Estado nos termos em que as prevemos na parte final do n.º 3 como algo que constitui uma inclusão obrigatória.
O Sr. Presidente: * Mas o PS estabelece uma distinção entre os conceitos de participação nos impostos nacionais e transferências do Orçamento do Estado, distinção essa que não foi clarificada. O que é isso de participação em impostos nacionais?
O Sr. José Magalhães (PS): * A participação em impostos nacionais é o nosso retrato do status quo na parte em que ele cobre algumas figuras que aqui foram aludidas, mas na parte em que não cobre as derramas, por exemplo, e que em não cobre outras figuras que poderiam ser criadas por lei e activadas ou não segundo a vontade das autarquias.
O Sr. Presidente: * Sim, mas se há algo que a expressão impostos autárquicos designa são exactamente essas figuras, portanto isso já consta dos em impostos autárquicos.
O Sr. José Magalhães (PS): - Não, nessas figuras estariam outras modalidades que, em termos de concretização, exigiriam esforço de legiferação corrente ao abrigo de leis-menu que permitam, definidos os elementos essenciais ao município, primeiro, activar ou não e, em segundo, activar segundo o modelo a, b, c, ou d.
Mas esse foi o debate que tivemos sobre o artigo 106.º.
O Sr. Miguel Macedo (PS): * Então, por que é que não aderem a uma formulação do tipo da que faz o PCP para o n.º 3?
O Sr. José Magalhães (PS): * Não, isso é outra coisa totalmente diferente!
O Sr. Presidente: * Penso que aqui há alguns preconceitos e algumas imprecisões. Em primeiro lugar, a proposta feita pelo PS de distinguir entre os serviços prestados directamente ou através de terceiros não tem pés para andar, pois só introduz equívocos e nada acrescenta, salvo dificuldades de compreensão.
Quanto às receitas provenientes dos impostos autárquicos não compreendo o preconceito do PSD. Os impostos autárquicos, na designação corrente, mesmo entre os fiscalistas, são os impostos que por lei estão afectados às autarquias. A lei qualifica como imposto municipal a sisa, o imposto de circulação automóvel, os quais são, para toda a gente, impostos autárquicos, para além da própria contribuição autárquica propriamente dita e das derramas. Estes são impostos, à partida e ab initio, atribuídos às autarquias como receita própria. A meu ver, isso é distinto de atribuir às autarquias poder tributário. É óbvio que pode haver impostos autárquicos sem haver poder tributário; o imposto de circulação automóvel e a sisa não incluem poder tributário municipal. Isso acontece com as derramas e com a contribuição autárquica propriamente dita, o imposto sobre os bens imobiliários.
Portanto, penso que se deviam distinguir duas coisas: uma são os impostos autárquicos (demos-lhe este nome ou outro, desde que saibamos o que queremos dizer, evitando equívocos), que são aqueles que a lei atribui como receita própria às autarquias. Esses são receita e a Constituição garante que, entre as receitas autárquicas, tem de haver impostos à partida com receita própria atribuídos ao municípios. Outra coisa é a ideia de atribuir às autarquias poder tributário, porque esse inclui o poder de fixar um taxa ou mesmo de lançar certos impostos, isso sim é poder tributário.
Estou de acordo com as duas coisas: penso que a proposta do PS deve ser adoptada na parte em que atribui receita obrigatória às autarquias, isto é, impostos autárquicos, com esse outro nome, e devemos acolher a ideia do PSD de reconhecer, nos termos da lei, poder tributário, pelo menos para constitucionalizar aquele que já existe no que respeita à fixação da taxa da contribuição autárquica propriamente dita e à possibilidade de lançar derramas.
É óbvio que qualquer desses impostos é criado por lei da Assembleia da República, e mesmo quando se reconhece poder tributário às autarquias este é sempre limitado, não se trata de criar o imposto ab initio, é de, quando muito, lançá-lo, quando menos fixar um ou outro elemento desse mesmo imposto. Mas pode haver - e há, e penso que deve continuar a haver - impostos que não implicam nenhum poder tributário das autarquias e que são autárquicos, porque, à partida, existem como receita própria.
Portanto, penso que devíamos distinguir estas duas coisas, se calhar, até devíamos separar a ideia do poder tributário dizendo que as autarquias têm poder tributário nos
Página 1833
termos da lei, ou podem tê-lo. Quanto ao n.º 3 dever-se-ia acrescentar apenas "as provenientes dos impostos autárquicos que lhe sejam atribuídos por lei".
Portanto, repito: uma coisa são as receitas fiscais que pertencem ab initio às autarquias, outra coisa é o poder tributário que elas podem vir a ter e eu proporia que fosse feita a separação. Quanto ao n.º 3 acrescentaria - e essa seria a inovação - a expressão "as provenientes dos impostos que lhe sejam atribuídos por lei". Tinham de certeza impostos, mas os que têm seria a lei a determiná-los e autonomizaríamos a ideia de que as autarquias podem ter poder tributário nos termos da lei.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Podia ser como o PSD propõe, ficando o poder tributário apenas no n.º 2.
O Sr. Presidente: * Talvez e com isso economizávamos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * No n.º 3 não se fazia referência ao poder tributário, mas sim à realidade dos impostos autárquicos, ficando de averiguar a terminologia.
O Sr. Presidente: * Penso que essa era uma boa transacção!
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, creio que as questões colocadas são fundamentalmente de ordem técnica e não propriamente político e é neste plano que vou levantar a questão seguinte.
Quando falamos em impostos autárquicos ou em poder tributário como poderes obrigatórios das autarquias locais estamos a pensar no fundamental em municípios. E quero colocar à reflexão os problemas que isto levanta por exemplo em relação a outros órgãos locais em relação aos quais certamente não queremos atribuir nem impostos por exemplo de freguesia nem poder tributário.
Mesmo em relação às regiões, falta saber se também lhes queremos conferir impostos regionais e a criação de poder tributário.
O Sr. Presidente: * O problema está bem levantado.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, penso que o problema é muito pertinente, mas quero só fazer uma primeira chamada de atenção que simplifica o nosso trabalho. Se pusermos o poder tributário no n.º 2, este problema desaparece, porque estando no n.º 2 é o regime das finanças locais a estabelecer por lei, e, portanto, a lei depois dirá se é só o município que tem poder tributário.
Quanto ao problema das receitas próprias, dos impostos autárquicos, é que penso que a questão colocada pelo Sr. Deputado Luís Sá tem toda a pertinência, já que nesse caso não se remete para a lei.
O Sr. Presidente: * Penso que tem razão em relação aos dois.
O Sr. Luís Sá (PCP): * A forma do PSD obrigaria a dar poder tributário às freguesias.
O Sr. Presidente: * O problema põe-se em relação às duas questões.
O Sr. Luís Sá (PCP): * A fórmula do PSD aponta claramente para a obrigatoriedade de estabelecer... O regime de finanças locais, a estabelecer por lei, dotará as autarquias locais de poder tributário. Não é uma norma de autorização é uma norma que crie uma obrigação ao Estado.
O Sr. Presidente: * O problema coloca-se em relação às duas realidades, em relação ao poder tributário e aos recursos fiscais. Ou se adopta uma fórmula que admita que não sejam todas as autarquias, ou, então, temos de a colocar mais à frente a propósito dos municípios e eventualmente das regiões administrativas. Não pode é ficar tal como está, o que parece óbvio.
Então, passamos ao artigo 241.º e voltamos a esta quando tratarmos do artigo das finanças municipais.
Segundo o artigo 241.º, n.º 2, a Assembleia será eleita por sufrágio universal directo secreto dos cidadãos residentes segundo o sistema de representação proporcional. o CDS-PP propõe a eliminação da representação proporcional, mas já vimos que isto não tem viabilidade e embora pense que o próprio CDS-PP já não insiste mesmo assim esta questão fica registada.
O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, se me permite, ficaram por ver duas propostas do PCP.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Exactamente!
O Sr. Presidente: * Tem razão, Sr. Deputado, se calhar foi porque parti da hipótese de que elas eram inviáveis.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, independentemente disso, não gostaria que os outros partidos deixassem de pronunciar-se.
Se o Sr. Presidente permitir, por uma questão de celeridade, apresentarei as duas propostas.
Em relação ao n.º 3 do artigo 240.º, creio que é evidente que se trata de vedar constitucionalmente a degradação, em termos reais, das receitas das autarquias locais.
Em relação ao n.º 5 do mesmo artigo, aquilo que está no nosso espírito é a ideia de que o Estado e as pessoas colectivas públicas que têm dividas a cobrar das autarquias locais devem fazê-lo pelos meios judiciais adequados e não através de uma via, que foi muito praticada no passado recente, que é a retenção de receitas na fonte, designadamente, de percentagens do Fundo de Equilíbrio Financeiro, ou até de acções que põem em causa o património das autarquias locais, tanto mais que, por vezes, parte das dívidas que estão em causa até são contestadas pelas próprias autarquias locais.
Portanto, trata-se de matérias a resolver por acordo ou através de recursos aos tribunais e não através de actos unilaterais que nos parecem de todo em todo indevidos. Isto é, seguiu-se uma prática de recorrer à autoridade, e até ao abuso de autoridade, em vez de recorrer aos tribunais, como é próprio de um Estado de direito, e esta prática, cremos, deveria ser constitucionalmente inviabilizada.
Página 1834
O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, somos um Estado de direito, mas também um Estado de regime administrativo em que o Estado tem o privilégio da execução prévia.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, o Estado tem o privilégio de execução prévia, mas o que se passou foi que, muito frequentemente, as dívidas em causa até eram publicamente questionáveis, como, aliás, veio a demonstrar-se. Portanto, a retenção na fonte...
O Sr. Presidente: * Portanto, foram impugnadas!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Normalmente, são todas impugnadas!
O Sr. Luís Sá (PCP): * Como o Sr. Presidente sabe, nessa matéria, muito frequentemente o funcionamento dos tribunais é bastante moroso - infelizmente - e, entretanto, as populações são prejudicadas. É isso que se pretende evitar, isto é, abusos de autoridade que prejudicam as populações.
O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, estas duas propostas estão à discussão: uma é a de estabelecer um direito à participação nas receitas do Estado e à sua actualização, outra é a de proibição de compensação de créditos do Estado.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, em relação à primeira proposta, creio que o bom princípio do artigo 240.º, n.º 2, cobre aquilo que é útil, ou seja, a justa repartição de recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias é uma regra basilar e incontornável. De resto, elas não sairão debilitadas desta revisão constitucional, seguramente, pelo contrário.
Contudo, naturalmente, as receitas públicas sofrem fluxos e o Estado e as autarquias locais não são imunes a épocas de maior e de menor prosperidade, e esse ajustamento far-se-á com uma gestão prudente e tendente a não punir, mas sem que se possa, suponho eu, estatuir, em termos absolutos e absolutamente consagradores, uma espécie de irreversibilidade das aquisições financeiras da autarquias.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Descentralização financeira, Sr. Deputado!
O Sr. José Magalhães (PS): - Não, é mais do que uma descentralização financeira; é a garantia da progressão inevitável, em quaisquer circunstâncias e acima de quaisquer circunstâncias, das transferências financeiras autárquicas.
O Sr. Presidente: * Sr. Deputados, o PCP não propõe um incremento, mas apenas a manutenção.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Tivemos, aqui, um sindicado regional, agora temos um sindicato nacional.
O Sr. José Magalhães (PS): * Não, Sr. Presidente, e até o faz de uma dupla maneira - com toda a justeza o observo -, porque, por um lado, alude ao conceito de actualização e, por outro lado, fixa o parâmetro negativo, ou seja, aquilo que se quer evitar, a chamada solução com "tranca", pela positiva e pela negativa. Portanto, o alcance é perceptível, mas a dupla "tranca" tem este problema que equacionei e que, suponho, é um problema objectivo.
A segunda proposta tem o mesmo problema, de outra forma, ou seja, "absolutiza"…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, já agora, permita-me que o questione pelo seguinte: não percebo a discriminação, porque esteve disponível para acrescentar mais dois grandes pacotes à garantia das receitas regionais e, em relação aos municípios, nem sequer quer a irreversibilidade do que eles já tem!
O Sr. José Magalhães (PS): - Foi gravado?
O Sr. Presidente: - Não, não foi!
Risos.
O Sr. José Magalhães (PS): - Em relação à segunda proposta, a formulação também é inteiramente absoluta para o Estado, ou seja, o Estado, no limite, não poderia sequer exercer os seus direitos normais e as suas prerrogativas de defesa dos seus interesses patrimoniais em casos em que houvesse não dívidas dúbias, como aquelas que o Sr. Deputado referiu, mas dívidas certas, inclusivamente mecanismos normais que entre credores e devedores se permite arbitrar, em regime administrativo, ou seja, figurando um certo poder paradigma de actuação.
Obviamente, nada disto tem que ver com o sancionamento ou com a cobertura constitucional a quaisquer situações de "tripudiação" sobre direitos de autarquias ou a quaisquer excessos que não são legítimos face ao texto constitucional, e não é preciso este acrescento para que sejam ilegítimos face ao texto constitucional, suponho eu.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, muito brevemente, a proposta do PCP para o n.º 5 do artigo 240.º, parece-me ser claramente excedentária face àquilo que deve estar contido no texto constitucional, quando muito será uma matéria a inscrever na lei.
São conhecidos alguns conflitos do passado - que, aliás, tiveram algum brado público - nesta matéria, portanto, comungando das preocupações do Sr. Deputado Luís Sá, parece-me que é perfeitamente excessivo consagrar uma norma destas na Constituição.
Em relação à proposta do PCP para n.º 3, quero, em rigor, concordar com parte do que disse o Sr. Deputado José Magalhães.
Não haveria grande problema se o PCP terminasse a redacção da sua proposta na palavra "actualizadas", contudo, quando prevê "(…) actualizadas de modo a impedir a sua degradação em termos reais.", levanta uma questão como esta: se, por exemplo, de hoje para amanhã o governo ou a comunidade, num estádio superior de integração económica, entenderem baixar a taxa do IVA, isto tem, obviamente, em termos de reflexos financeiros das autarquias, um impacto que só pode ser negativo face ao actual quadro de distribuição de verbas e à importância que tem o FEF nas autarquias locais, referido, obviamente, à receita que provém do IVA. Portanto, considero a que redacção da proposta ficaria muito bem se fosse só até à
Página 1835
palavra "actualizadas", mas pode ser complicado prever que as receitas devem ser actualizadas garantindo sempre um aumento em termos reais, face a situações que hoje não podemos visualizar e que não desejamos, obviamente.
Parece-me que neste caso a tal "tranca" é excessiva, face àquilo que pode vir a acontecer, e que nós não desejamos, como é evidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a minha posição é mais radical. Penso que, em termos constitucionais, não deve garantir-se um direito de participação, julgo que, à la longue e em termos abstractos seria razoável, à partida, que houvesse uma tal distribuição das receitas próprias que as autarquias não precisassem de transferências.
Portanto, inscrever como direito abstracto um direito de participação nas receitas do Estado e garantir a sua actualização, independentemente do volume de atribuições que, em cada momento, caibam aos municípios, a cada uma das autarquias, parece-me ser de uma fixidez, de uma rigidez, verdadeiramente insensata.
Quanto à proposta para o n.º 5, nos termos em que está redigida, de facto, não tem sentido. Quer dizer: proibir, pura e simplesmente, qualquer compensação, ou seja, mesmo que o Estado tenha créditos verdadeiramente não poder reter receitas para se ressarcir das dívidas dos municípios ou das autarquias, também me parece uma solução perfeitamente excessiva. E penso que estas soluções do projecto PCP, de facto, são um tanto…
Uma voz não identificada: - Proteccionistas!
O Sr. Presidente: - São superproteccionistas!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, posso intervir?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas referir o seguinte: em relação ao n.º 3, naturalmente, ele tem um pressuposto: é que o nível de atribuições das autarquias locais não baixa globalmente de um certo nível. Aliás, corresponde, creio eu, a uma garantia decorrente do próprio princípio da descentralização administrativa…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, mas imagine que há a atribuição de receitas fiscais directas, de impostos directos. Então, as transferências não podem diminuir? Podem e devem!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Na lógica do PCP, têm que compensar as outras.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, nós estamos, naturalmente, abertos - ou estaríamos, abertos, naturalmente, porque a proposta é inviável - a alterações que clarifiquem aquilo que é a preocupação fundamental nesta matéria: é que, de acordo com o princípio de que a descentralização administrativa não deve baixar de limiares que a própria Constituição garante, também as transferências financeiras não se devem degradar em termos globais. É isto que está em causa.
E mais: em relação ao n.º 3, por exemplo, estamos abertos a uma redacção que, em vez de garantir que as próprias receitas das autarquias não se degradem em termos reais, garanta que não se degrade a relação financeira entre o Estado e as autarquias locais, isto é, a participação das autarquias locais no conjunto das receitas públicas, isto é,...
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, isso decorre do artigo 240.º, n.º 2.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é outra coisa!
O Sr. Presidente: - Mas esse é o n.º 2 de que tratámos e que a doutrina tem tentado densificar, com alguns esforços meritórios.
O Sr. José Magalhães (PS): - A doutrina tem esgotado tudo!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, sem dúvida nenhuma que esses esforços são altamente meritórios, mas isso não significa que tenham produzido resultados práticos, daí que importasse densificar, não na doutrina mas na própria Constituição.
O Sr. Presidente: - Olhe que tem tido resultados práticos. Alguns, quero crer.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, tem tido resultados bastante restritos, como sabe, designadamente, nos últimos anos, houve uma degradação significativa nesta matéria.
O Sr. Presidente: - Se calhar, isso justifica alguns resultados eleitorais! Portanto, há alguma justiça democrática nestas coisas!
Risos.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, creio que um dos méritos de uma Lei Fundamental é que nem todos os direitos tenham que esperar por resultados eleitorais para serem concretizados. Creio que isso é óbvio, o Sr. Presidente bem o sabe e bem o tem ensinado.
Quanto à nossa proposta para o n.º 5 do artigo 240.º, o que está em causa não é, obviamente, a cobrança de créditos bem firmados por parte do Estado; creio que as autarquias locais têm que pagar esses créditos, não podem deixar de o fazer, e, se não o fizerem, naturalmente, pagam juros, tanto que eles, frequentemente, não são módicos. O problema - e foi este problema que deu origem à nossa proposta - é o das dívidas questionáveis e questionadas que o Estado cobra através da retenção na fonte, no uso do privilégio de execução prévia.
O problema do privilégio de execução prévia é que ele é bastante questionado; foi-o, por exemplo, no seio da comissão que preparou o projecto do Código do Procedimento Administrativo, como é sabido, e muito.
Nesta matéria, cremos que o que propomos é de todo em todo justificado, porque são os interesses das populações que estão em causa, uma vez que esta retenção na fonte de créditos questionados prejudica as populações. É isto, efectivamente, que está em causa. Não queremos, naturalmente, que a partir daqui se premeie uma prática das autarquias que não pagam as respectivas dívidas ao Estado; não se trata obviamente disso.
Página 1836
O Sr. Presidente: - O que também tem havido!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Também tem havido e, por isso mesmo, pagam juros.
O Sr. Presidente: - Em todo o caso, as propostas não tiveram acolhimento.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, posso intervir?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, permita-me só que sublinhe que a nossa atitude nesta matéria é, obviamente, de cumprimento da Constituição e da boa hermenêutica daquilo que dela decorre, não desejaríamos vê-la diminuída, hermenêuticamente, nesta matéria.
Contudo, a bondade das densificações ou qualificações tem que ser provada. Ora, o que resulta da discussão é uma enorme dificuldade - para não dizer impossibilidade - de explicitar argumentos razoáveis que neutralizem aqueles que foram deduzidos quanto aos inconvenientes específicos das redacções formuladas. Ou seja, no primeiro caso, cria-se uma espécie de obrigação de uma curva ascendente, imune a tudo e sempre algumas décimas, ou alguma décima pelo menos, acima da taxa de inflação, qualquer que seja, e a determinar por uma forma adequada, e uma cristalização do modelo de distribuição de receitas! Cristalização! Aspecto que foi muito bem sublinhado, por último, pelo Sr. Presidente. Ora, para estes argumentos que resposta é que há? Verdadeiramente, não há resposta!
Quanto aos outros argumentos, relativos ao n.º 5, francamente, a questão ainda é mais difícil, porque o que ficou demonstrado é que aquilo que é justo proibir já está proibido e que aquilo que não se pode proibir, e isto proíbe, não se deve proibir.
O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, o "argumentário" fica feito. As propostas não tiveram acolhimento.
Agora, sim, vamos passar à discussão do artigo 241.º. Quanto ao n.º 2, há uma proposta do CDS-PP, para eliminar a garantia da representação proporcional, e há uma do PS, para acrescentar a expressão "(…) nos termos da lei".
Os Srs. Deputados do CDS-PP nada querem acrescentar, porque esta matéria já foi discutida várias vezes, sempre sem o êxito - de resto, justificado - destas propostas.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, do PSD, para justificar o acrescento da expressão "(…) nos termos da lei.".
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, em justificação da proposta do PSD, só digo que ela tem apenas o intuito de flexibilizar. Isto é, não apontamos nenhum caminho necessário, mantemos o princípio da representação proporcional e pretendemos apenas flexibilizar o texto constitucional, no sentido de permitir ao legislador uma eventual adaptação, respeitando a representação proporcional a este ou aquele tipo de situações. Não é mais do que isto, não está cá mais nada do que isto.
O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Luís Marques Guedes, para se saber que há uma lei eleitoral não é preciso alterar este artigo, porque já no artigo 168.º e noutros lados se fala em leis eleitorais. Portanto, não é para isso que propõe o acrescento "nos termos da lei".
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, é para isso, não é para…
O Sr. Presidente: - Está aberta a discussão desta proposta.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Se o Sr. Presidente pensa que já está, concorda com o texto.
O Sr. Presidente: - A proposta está à discussão, Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, nesta matéria, suponho que não há nenhuma dúvida sobre a forma de gerar este regime legal - o governo é incompetente, seguramente, não pode ser feito por portaria - e, quanto às normas de competência dos órgãos de soberania, a Constituição estatui inequivocamente.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Isto não é órgão de soberania.
O Sr. José Magalhães (PS): - Perdão.
Em relação aos órgãos eleitos por sufrágio universal, directo e secreto, a Constituição, em sede própria, estatui, e não há nenhuma dúvida sobre isso, a não ser que alguém queira articular isso com as propostas do PSD em relação aos limites materiais de revisão, mas também, francamente, aqui, alude-se ao sistema de representação proporcional. Sabe-se como essa matéria tem sido objecto de discussão entre nós.
Quer dizer: não façamos disto um monstro, nem uma utilidade dramática para a república. A lógica deste tipo de retoques é sempre um bocadinho perturbadora, porque parecem tão inúteis que as pessoas começam a "escavacar" os neurónios em busca de uma qualquer utilidade pérfida que nem sempre existe, obviamente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, apenas quero dizer que não vemos qualquer interesse, significado ou alcance prático no acrescento que é proposto.
O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, nesta sede parece-me útil considerar uma série de propostas que têm que ver com as candidaturas, nuns casos à assembleia, noutros à câmara.
Pausa.
Srs. Deputados, pelas vossa reacção, penso que preferem deixar este tema para depois.
Passamos, então, à proposta do PS quanto aos órgãos executivos.
O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, verdadeiramente, em relação a estas propostas, nós tivemos uma pré-discussão.
Página 1837
O Sr. Presidente: * Pois tivemos, a propósito das regiões administrativas.
O Sr. José Magalhães (PS): * Quando discutimos as regiões administrativas, por apenso, o Sr. Deputado Jorge Lacão teve ocasião de fundamentar extensamente esta mudança, que é, obviamente, bastante significativa e, infelizmente, não tivemos uma receptividade especialmente notória neste domínio.
Do que trata, manifestamente, é de aplicar à formação dos executivos um sistema inspirado na criação de outros executivos, designadamente, o da República, em condições bastante provadas, sem decair de alguns princípios, como aquele que diz que na formação do executivo o cidadão que encabeça a lista mais votada na eleição para a respectiva autarquia tem um papel de liderança, pelo menos no momento inicial.
Depois, naturalmente, introduz-se a lógica de moções de censura construtivas aplicadas ao nível autárquico e limita-se o regime de recomposição dos executivos, num modelo que se funda numa determinada leitura da experiência de funcionamento dos executivos nestes 20 anos de poder local democrático e que visa, no fundo, flexibilizar o regime de criação dos ditos executivos e dar àqueles que têm a responsabilidade de liderança nessa matéria, sem prejuízo dos direitos legítimos e irretratáveis das assembleias, mais flexibilidade e possibilidade, sem prejuízo dos resultados do sufrágio, de modelar esses executivos.
Infelizmente, a reacção que tivemos a este tipo de proposta pareceu-nos, na altura, bastante negativa. Já passaram alguns meses e, enfim, faço votos de que o cenho franzido se tenha descomprimido.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Agravou-se!
O Sr. José Magalhães (PS): * Ah, vejo-o mais comprimido, o que, enfim, só posso lamentar.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * V. Ex.ª deveria ter uma experiência autárquica, ainda que breve, como teve o seu companheiro, de Flash Back, Pacheco Pereira, para perceber que esta proposta não faz sentido.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, certamente, não fará aos autarcas que modelaram esta solução do PS e que a ela aderiram a injúria de serem "virgens" na experiência autárquica.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Deputado, então fale outra vez com os autarcas que modelaram esta proposta, designadamente, depois do encontro que tiveram no Algarve, onde esteve o líder do meu partido, no qual este explicou as fórmulas que nós propomos para a eleição dos órgãos autárquicos, e vai ver que se calhar não pensam o mesmo.
O Sr. Presidente: * Também "levaram sopa"!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Quem? nós? Não, Sr. Presidente, está enganado! Aliás, a comunicação social deu o relato sobre essa matéria.
Aparte inaudível do Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Não, não é nenhum referendo nacional. Faça-nos a justiça de reconhecer que, nesta matéria, estamos a defender aquilo que já defendemos há muito tempo.
O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, esta discussão já ocorreu, por isso, peço que intervenham apenas se existir alguma modificação quanto ao juízo que, na altura, os partidos fizeram sobre esta proposta do PS, porque se não houver não vale a pena.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Presidente, só quero referir dois aspectos, se me permite.
O Sr. Presidente: * Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, as propostas são conhecidas, pelo que não vamos alongar, obviamente, a discussão que já foi feita noutra altura desta revisão constitucional, mas quero dizer duas coisas.
Em rigor, nesta proposta do PS, eu só vejo uma vantagem prática, que tem que ver com o facto de eu considerar, que, hoje - talvez esse seja o pior resultado do sistema eleitoral que temos -, uma parte importante de cidadãos que se interessam pelas questões municipais ficam, por via dos resultados eleitorais, e, por isso, democraticamente, arredados de todo da participação nos órgãos institucionais das autarquias, designadamente, quando se impede quem não foi eleito para a câmara municipal de poder participar num outro qualquer órgão.
Assim sendo, a única virtualidade que a proposta do PS tem, do meu ponto de vista, é a de, fazendo a eleição indirecta, permitir que todos aqueles que forem eleitos, quaisquer que forem aqueles que ficarem no executivo, poderão participar nesses órgãos autárquicos, mas esta é a única vantagem que vejo!
E, em desabono da tese do PS, encontro muitas…
O Sr. José Magalhães (PS): * Mas é de entre os seus membros, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Eu sei que é de entre os seus membros.
O Sr. Presidente: * Por isso mesmo!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Por isso mesmo!
O Sr. Presidente: * A vantagem de que o Sr. Deputado falou é exactamente essa!
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Exactamente!
Contudo, em desabono da tese do PS, encontro muitos argumentos. Desde logo, devo dizer que não me parece adequado fazer uma inversão da história do poder local democrático da forma como o PS faz, porque, quer queiramos quer não, na realidade das populações, o poder local é a câmara municipal.
Bem sei que o PS salvaguarda - e o Sr. Deputado José Magalhães teve oportunidade de o referir, e, nesse caso, trata-se de uma especialização em relação ao paralelismo que quer fazer com o sistema de Governo da República - expressamente que o presidente da câmara deverá ser o cabeça de lista da lista mais votada, mas julgo que isso não chega. Face à tradição e à interiorização das populações
Página 1838
do que é o poder local, de que este está, de facto, focalizado nas câmaras municipais, penso que é uma inversão que não se ajusta ao país que somos, ao poder local que temos e à forma como as pessoas e as populações sentem o poder local.
Em segundo lugar, julgo que esta vontade de uniformização do PS é motivada muito por aquilo que pensa, por exemplo, em relação às regiões e não sei se também não me parecerá uma inversão injustificada submeter o regime eleitoral dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios àquilo que se pensa poder vir a fazer para as regiões.
Uma segunda nota que quero deixar é esta: com a proposta de moção de censura construtiva do PS julgo que caiem, em grande medida, por terra os argumentos e as acusações que os Deputados do PS têm feito, em relação à solução defendida e preconizada pelo PSD, de que essa solução acabaria com o sistema proporcional, designadamente no executivo municipal, porquanto, se virmos, da solução apresentada pelo PS resulta que basta um 1/3 dos membros da assembleia municipal para criar obstáculos à apresentação e à produção dos efeitos de uma moção de censura ao executivo. E, se virmos bem, isto significa que 33% dos membros de uma assembleia municipal chegam para impedir a vontade de, porventura, 65%, 70%, dos membros dessa mesma assembleia.
Portanto, isso é uma entorse muito grave em relação à regra da proporcionalidade a que os senhores tanto se "agarram". Eu não percebo como é que compaginam esta solução com as acusações que entretanto vão fazendo ao PSD.
O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Miguel Macedo, se me permite, nós ficámos de não reabrir a discussão, mas estamos a fazê-lo.
Peço aos Srs. Deputados que não reabramos a discussão se os argumentos já foram produzidos, senão, o que se passará é que o PS vai responder, o PCP vai responder, etc.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Presidente, eu só posso prometer-lhe não responder.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, nós não queremos entrar em debate, mas não podemos é, numa matéria tão importante como esta, deixar de expressar em acta a posição real, porque não se trata de uma matéria qualquer da Constituição. Obviamente, não responderemos se cada um expressar a sua opinião.
Quero só referir mais duas questões além daquelas que o Sr. Deputado Miguel Macedo referiu e com o qual estou totalmente de acordo. Contudo, Sr. Deputado Miguel Macedo, permita-me corrigi-lo só num aspecto: para além do aspecto positivo que referiu, eu encontro um outro, só que traz tantos problemas que é de rejeitar liminarmente.
A proposta do PS tem, de facto, uma outra virtualidade em abstracto, com a qual, o PSD desde já avisa…
O Sr. José Magalhães (PS): * Francamente, estamos a progredir! No mês de Maio não lhe encontravam nenhuma virtualidade.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Exactamente! É para que não haja equívocos!
Dizia eu, a proposta do PS tem uma outra virtualidade relativamente à qual deixava expressa (para que não haja dúvidas, fica em acta), em abstracto, a total sintonia do PSD.
A proposta do PS aponta para uma questão virtuosa - sem dúvida, para o PSD -, que é a da coesão dos executivos municipais. Isso está fora de causa. E esse é um ganho pelo qual o PSD irá lutar (espero, uma vez que quanto ao princípio de fundo estamos genericamente de acordo, aparentemente), pelo qual o PSD não se poupará a esforços, no sentido de tentar encontrar uma solução possível em conjunto com os outros partidos. E esse é, claramente, um objectivo muitíssimo meritório a sair desta revisão constitucional! Oxalá possa ser desta! Já deveria ter sido em 1989!
Contudo, com toda a franqueza, o PS pretende atingir esse objectivo meritório através de custos insuportáveis em termos da própria democracia.
Para além daquilo que o Sr. Deputado Miguel Macedo referiu, eu acrescento o seguinte: o Partido Socialista atinge esse objectivo meritório à custa de executivos monocolores. Ora, que me lembre, penso que nunca ninguém tinha defendido, a nível camarário, executivos monocolores e se é certo que o PSD defende claramente o mérito desse extracto da criação de condições de estabilidade e de governabilidade aos executivos camarários - esse é ponto que, há muitos anos, o PSD defende e espera que se atinja -, não será, com certeza à custa da pura e simples erradicação da representação das minorias nos executivos camarários. Esse é que, com franqueza, nos parece um preço demasiado caro a pagar para um objectivo que também queremos perseguir. Isso que fique claro e que o Partido Socialista entenda.
Por outro lado, a segunda e última consideração que queria fazer, para além do problema quanto à perversão que daqui resulta do princípio da proporcionalidade, em termos práticos do resultado final objectivamente, é a seguinte: há também um outro princípio constitucional, cuja alteração o Partido Socialista não propôs, que vem nos princípios gerais do direito eleitoral, no artigo 116.º, que consagra o princípio do sufrágio directo, secreto e periódico, como regra geral de designação dos órgãos também do poder local.
Ora, isto que o Partido Socialista aqui propõe no capítulo do Poder Local acaba por levar a que, pelo como regra geral - estamos de acordo -, que deixa de ser o sufrágio a regra geral de eleição dos órgãos, porque, a cabeça, metade deles passa a não ser eleito por sufrágio directo e universal das populações e, nesse sentido, ha também há um princípio constitucional no artigo 116.º, que é deixado cair relativamente ao poder local, obviamente. O artigo 116.º diz que é o princípio geral para os órgãos de soberania, para os órgãos das regiões autónomas e para o poder local, mas, com uma proposta como esta, para o poder local deixaria de ser!…
O Sr. Presidente: * Para os órgãos electivos. O que o PS propõe é que um deixe de ser electivo, como, aliás, os outros executivos não são.
O Sr. José Magalhães (PS): * Interpretada assim, essa norma que torna inconstitucional uma quantidade notável da lei ordinária.
Página 1839
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não é verdade. Actualmente a regra geral nos órgãos autárquicos é, de facto, o sufrágio...
O Sr. Presidente: * Então, na junta de freguesia regional não são eleitos?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Exactamente, em seis são quatro!…
O Sr. José Magalhães (PSD): - Dessa norma não resulta a necessidade que sejam todas!…
O Sr. Presidente: * Em vez de serem quatro passavam a ser três.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não, deixa de ser a regra geral no poder local!…
O Sr. Presidente: * Não, passavam a ser três!…
O Sr. José Magalhães (PS): * Não é assim que se fazem as contas, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * De qualquer maneira, eram estas as duas considerações que queria deixar, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: * Os outros argumentos são pertinentes, estes não me parece que o sejam.
Tem a palavra, Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, é para fazer uma declaração curta, apenas em relação ao seguinte aspecto: creio que, aparentemente, esta proposta tem um aspecto benéfico, aliás o que mais tem sido referido na sua defesa, que é o facto de valorizar as assembleias municipais, as quais, naturalmente, constituem uma preocupação também para nós, pois têm hoje, na forma de governo municipal, um papel bem pouco relevante.
Simplesmente eu creio que nem sequer este objectivo acaba por ser cumprido, na medida em que, em rigor, a partir do momento que se propõe que a designação do órgão executivo seja feita por um terço dos respectivos membros, isto é, por uma maioria relativa monopartidária, na medida em que são precisos dois terços dos membros da assembleia directamente eleitos e em efectividade de funções para subscrever uma moção de censura, está-se, no fim de contas, a dizer que há uma designação pelo partido com a maioria relativa, ainda que esta seja bastante relativa, e que aponta, sistematicamente, para situações de executivos monopartidários.
Naturalmente que todos os sistemas têm vantagens e defeitos. Creio, no entanto, tratando-se de um sistema que durou 20 anos e abrangeu 305 municípios, que, como é óbvio, se enraizou nas populações e no próprio sistema político, muito poucos foram os problemas e as crises que se verificaram. Naturalmente que quando se verifica alguma crise ela tem uma grande projecção mediática, mas esquece-se muito frequentemente que há um contraponto disso: a existência de mais de três centenas de situações de outro tipo em que as coisas funcionam.
De resto, o sistema actual é muito flexível. Passa por existir um executivo dentro do próprio executivo, criado designadamente pelos vereadores a tempo inteiro designados pelo presidente da Câmara, permite ou aponta quer para coligações pré-eleitorais, como aconteceu, por exemplo, em Lisboa e noutras situações com outros partidos, quer para coligações e entendimentos pós-eleitorais, e favorece claramente essa perspectiva. Aliás, houve a prática de, à margem da própria Constituição, o presidente da Câmara dispor de importantes poderes e ser, como é sabido, um verdadeiro órgão, apesar de não estar nomeado como tal, o que significa que o sistema está a funcionar numa base plural.
Assim, não vemos vantagens na sua substituição por um sistema monolítico, que substituiria este pluralismo por maiorias sistematicamente monopartidárias.
O Sr. Presidente: * Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, quero só fazer comentários às novidades, digamos assim, do debate anterior.
A primeira novidade é obviamente o constat d'accord em relação às alusões que foram feitas pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes; depois, gostaria de sublinhar o desacordo em relação a uma igualização que foi feita pelo Sr. Deputado Miguel Macedo, que exprimirei depois de fazer a consideração que se segue.
Como resulta das observações agora feitas, o sistema tem evoluído num sentido em que a preponderância significativa dos presidentes tem vindo a afirmar-se em formas mais ou menos relevantes, consoante os próprios quadros autárquicos, qualidades e momentos históricos, em que a tendência para gerar executivos dentro do executivo, como condição de operacionalidade e como selo de lealdade, de confiança política e de proporcionalidade, também se foi verificando.
Por outro lado, além das coligações geradas por bons métodos, ou por maus, com vista às maiorias significativas, houve também situações em que de maioria relativa se passou a maioria absoluta em formações várias e, portanto, estamos cientes da dimensão deste problema.
Há várias vias nesta matéria, mas há um problema identificado, o de que provavelmente há, na nossa opinião - o nosso projecto traduz isso -, alguma obra a fazer, há que pensar o sistema de governo de forma criativa. E é aí que não me parece curial nem justo - vejo o esforço argumentativo, mas isto, enfim, é uma revisão constitucional, ou seja, uma discussão aberta e não rígida -, igualizar uma proposta com a do Partido Socialista que, ao preconizar a dita cuja moção de censura construtiva aplicada a este nível imuniza uma maioria relativa contra situações extremas de noções de censura hostis, de maiorias de lógica negativa, numa proporção a estabelecer… Realmente, se os Srs. Deputados acham que 30% de bloqueio é excessivo ou estabelece-se uma proporção excessiva e desmedida, isso não é para nós um ponto fechado!… O Sr. Deputado Jorge Lacão não o disse, mas não é um ponto fechado.
Agora isto não se confunde, de maneira nenhuma - não nos vistam esse "espartilho" nem nos façam "beber desse vinho" -, com um sistema como o da prótese de votos ou desse prémio bizarro de mais-valia, que dá a uma minoria uma prótese de votos necessários para se tornar em maioria válida para o quotidiano de todas as decisões. Não é para uma situação de emergência, não é para uma coligação negativa, é para tudo, desde o acto menor ao acto
Página 1840
maior, em todos os dias e a todas as horas!…. E é essa prótese, é essa mais-valia que nos parece...
O Sr. Presidente: * Sr. Deputado José Magalhães, proponho que guarde a apreciação da proposta do PSD para quando a discutirmos.
O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, mas, na verdade, o Sr. Deputado Miguel Macedo obriga-nos a responder. Já a fez introduzir, em trajes garridos, nesta matéria, a dizer que ela é igual a esta e que devo eu fazer senão refutar tal coisa?!… Digo a V. Ex.ª, porque sou uma criatura bastante aberta.
O Sr. Presidente: * Limitar-se a defender a proposta do PS.
O Sr. José Magalhães (PS): * Limitar-me a defender defensivamente a proposta do PS?!… É isso que me é solicitado?!… Não posso, Sr. Presidente.
Direi, pois, rapidamente, que o PS preocupa-se com uma situação que é extrema - diria assim - e o PSD inverte uma minoria em maioria quotidiana, em situações correntes e despojadas de qualquer natureza critica. E há tudo o mais, dando a minha ideia que a vida das autarquias é uma batalha campal, quando em muito casos é possível gerir, gerando maiorias e unanimidades, inclusivamente aquelas que, com tanto desgosto do Sr. Deputado Pacheco Pereira, na Câmara Municipal de Lisboa vão "soldando" uma boa gestão autárquica.
O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, proponho que não antecipemos a discussão da proposta do PSD para as câmaras municipais.
Em todo o caso, se o Sr. Deputado Miguel Macedo quiser, sucintamente, responder ao Sr. Deputado…
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Presidente, vou corresponder ao seu apelo e respondo quando defendermos a nossa proposta. É muito mais positivo.
O Sr. Presidente: * Tem a palavra, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): * Sr. Presidente, quero só, rapidamente, dizer uma coisa muito simples em defesa clara desta proposta do Partido Socialista.
Estamos sinceramente convencidos que, mais cedo ou mais tarde, essa proposta acabará por ser instituída, porque é claramente a possibilidade real de se encontrar um sistema coerente, que dê outra operacionalidade ao sistema de governo, de formulação indirecta dos executivos.
Todos nós temos consciência dos problemas que algumas as autarquias estão a passar neste momento.
Por outro lado, todos nós temos também do verdadeiro desprestígio que, de alguma forma, em algumas autarquias existe em relação ao órgão Assembleia Municipal, porque, na prática dos factos, quem vive estas realidades sabe perfeitamente que muitas vezes o que acaba por acontecer é termos uma Assembleia Municipal, no executivo, a funcionar como tal e uma Assembleia Municipal que repete depois, de alguma forma, as reuniões dos próprios executivos, o que significa claramente um desprestígio e uma ineficácia clara da Assembleia Municipal.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Não é por aí, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): * Por outro lado, como o Sr. Deputado Luís Sá disse - e bem -, o verdadeiro poder está praticamente num órgão que não é considerado como tal, o presidente da Câmara, mas que é praticamente um órgão que tem todos os poderes do executivo e que pode, inclusivamente dar-se ao luxo, permitam-me que o diga assim, nos termos da lei, de não delegar um único poder e de ter todos os poderes do órgão câmara municipal.
Isto significa que, mais cedo ou mais tarde, razões de operacionalidade determinarão que esta medida, ou outra similar, venha a ser instituída e seja a grande possibilidade de se conseguir esta maior e melhor coerência do sistema de governo das autarquias.
O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, está confirmada a não aceitação da proposta do Partido Socialista no que respeita ao executivo das autarquias locais.
A próxima reunião será na terça-feira à tarde, já que na terça-feira de manhã não existe pessoal na Assembleia.
O que gostava de saber é se os Deputados não estarão disponíveis também para na quarta-feira trocar a reunião de manhã para a tarde.
Tem a palavra, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, não fecho a porta a essa sugestão, apenas peço que uma decisão dessas só seja equacionada na terça-feira, pelo seguinte: se calhar, o Sr. Presidente não está a par mas na terça e na quarta-feira iniciar-se-ão, em Comissão, as votações na especialidade do Orçamento do Estado, pois, como sabe, só a parte da receita é que tem que ir para Plenário, pelo que muitas das votações serão feitas nestes dias.
Assim, o meu grupo parlamentar gostaria de, pelo menos, esperar até terça-feira para ver como as coisas estão e programar a sua actividade. Mas, seguramente, ter a reunião quarta-feira o dia todo é completamente impossível e quanto à mudança da manhã para a tarde, veremos., mas teremos de aguardar até terça-feira.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): Sr. Presidente, dado o feriado e a tolerância de ponto, talvez houvesse possibilidade de fazermos alguma coisa na sexta-feira à noite.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Deputado, mas o problema é exactamente o que eu estou a colocar, ou seja, terça e quarta-feira da semana que vem são dias de uma densidade muito complicada...
O Sr. Presidente: Srs. Deputados, reuniremos na terça e na quarta-feira de manhã ou de tarde, de acordo com o que decidirmos na terça-feira.
Srs. Deputados está encerrada a reunião.
Eram 00 horas e 15 minutos do dia seguinte.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL
Página 1841
Página 1842