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Quinta-feira, 29 de Maio de 1997 II Série - RC - Número 98

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

IV REVISÃO CONSTITUCIONAL

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião de 28 de Maio de 1997

S U M Á R I O


O Sr. Presidente (Jorge Lacão) deu início à reunião às 21 horas e 35 minutos.
Foram debatidas as propostas de alteração relativas aos artigos 91.º a 95.º
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados José Magalhães (PS), Luís Marques Guedes e Guilherme Silva (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Teresa Patrício Gouveia, Pedro Vinha da Costa, Calvão da Silva e Barbosa de Melo (PSD), António Reis (PS) e António Filipe (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 0 horas e 40 minutos do dia seguinte.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): * Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 21 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, suponho que haverá propostas que, em segunda leitura, se reportem ao artigo 91.º e, eventualmente, aos demais artigos relativos aos planos. Se aquilo que estou a dizer é verdade, peço que apareçam em cima da mesa as referidas propostas.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sim, Sr. Presidente, estamos a assiná-las.

Pausa

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, apresentámos, em relação ao Título II da parte da Organização Económica da Constituição, com a epígrafe Planos, um conjunto muito bem limitado de propostas que exprimem as nossas conclusões da primeira leitura, as quais passaria a apresentar.
A primeira leitura e a reflexão que tem vindo a ser feita sobre a situação do planeamento em Portugal conduzem-nos a algumas conclusões. O PS apresentou algumas iniciativas tendentes a sublinhar a vertente regional do planeamento económico e social, mas essas propostas não esgotam o espaço de reflexão e não dão resposta a todas as questões que neste momento se colocam.
Há, na Constituição, como sabemos, vários aspectos que traduzem a revisão do texto anterior, que a flexibilizou em parte. Todavia, continua nela a definir-se uma tipologia especialmente cristalizada de instrumentos e, ao mesmo tempo, continuam a ser omitidas outras figuras que, hoje em dia, adquirem relevo prático na nossa vida económica e social e que têm grande importância na efectivação das directrizes política, económica e social.
Não por acaso, a reflexão sobre planeamento está viva por toda a parte - creio que em Portugal também - e vai carecer, no terreno da lei ordinária, não em sede constitucional, naturalmente, de um grande esforço de reinvenção e de reflexão.
Temos hoje uma lei das GOP. A ideia da existência de um plano anual, com o conceito e com o cariz que alguma vez teve entre nós, está hoje substituída pela proliferação de instrumentos diversos de planeamento, os quais é suposto terem a fonte ainda nessas grandes opções, que são de extracção parlamentar, tanto no plano sectorial como no plano regional da responsabilidade governamental. Há, depois, outros instrumentos importantes no quadro da utilização de dinheiros públicos nacionais ou decorrentes da nossa participação na União Europeia.
As normas que vamos apresentar têm várias preocupações. Em primeiro lugar, salvaguardam os limites materiais de revisão, que, como sabem, foram restabelecidos, em 1989, no artigo 288.º, alínea g), que exige a existência de planos económicos no âmbito de uma economia mista.
Por outro lado, mantêm-se os princípios fundamentais de planeamento democrático, designadamente decorrem do que acabámos de reescrever no artigo 80.º, mas noutras versões também; inserem-se aqui normas sobre os planos regionais, que são coerentes com o que a Constituição tem, e terá, no título respeitante às regiões administrativas; preservam-se as garantias de fundamentação de opções e de apresentação de relatórios preparatórios, que são timbre do texto constitucional e que é importante que continuem a sê-lo; remetem-se para sede própria, na nossa proposta, as normas sobre competência em matéria de planeamento (hoje a Constituição estatui as competências do Governo e da Assembleia tanto na sede das competências como aqui, neste título, o que não é uma solução necessária, embora pudesse ter sido historicamente pedagógica); e confere-se ao legislador ordinário uma margem acrescida de escolha para criar instrumentos de planeamento democrático adequados à complexidade, que toda a gente sabe que será crescente, das tarefas e das funções a exercer neste campo pelos diversos tipos de "decisores" políticos.
Vou referir as primeiras alterações do artigo 91.º No artigo 91.º propomos muito pouco: simplesmente que se adite à menção "planos de desenvolvimento económico e social" a sua tripartição, a sua tripla natureza, a sua expressão nacional, regional e local. Ou seja, há, de facto, planos de desenvolvimento económico nacionais - são aqueles que obedeceram até agora a uma configuração, mas que podem vir a obedecer a uma outra, porventura mais adequada -, mas deve haver também planos regionais e locais, os quais, obviamente, serão da competência das entidades que nessa matéria têm uma legitimidade própria.
Propomos também que o artigo 92.º seja algo simplificado. O artigo 92.º, cuja epígrafe, como todos sabem, é "Natureza dos planos", verdadeiramente não é compreensível desligado da sua origem histórica e não tem só que ver com a natureza dos planos, em bom rigor. Este artigo, na nossa óptica, devia passar a ter uma dupla dimensão: devia legiferar sobre os planos nacionais, no n.º 1, e sobre os planos regionais e locais, no n.º 2. Quanto a estes últimos, apenas para dizer que são elaborados pelas regiões autónomas e pelas autarquias locais; quanto aos primeiros, para estatuir que os planos nacionais, qualquer que seja a sua tipologia concreta - isso ficará também na disponibilidade do legislador ordinário -, são elaborados de harmonia com as respectivas leis das grandes opções, as quais devem conter, por definição, as orientações fundamentais do desenvolvimento da política económico-social, podendo integrar programas específicos de âmbito territorial ou sectorial.
Quanto ao artigo 93.º, propomos que ele seja fundido com o actual artigo 94.º para integrar um único artigo sob a epígrafe "Elaboração e execução dos planos". Trata-se de um artigo com três números: o primeiro em que se estatui - como hoje a Constituição estatui e é princípio fundamental do planeamento democrático - que a elaboração e a execução dos planos nacionais devem ser descentralizadas, tanto regional como sectorialmente; um segundo número para garantir - como hoje se garante, de resto- que as propostas de lei de grandes opções serão acompanhadas sempre de relatórios sobre as grandes opções globais e sectoriais, incluindo a sua fundamentação com base nos estudos probatórios que haja; e, finalmente, para transpor para o planeamento regional e local as boas regras de elaboração descentralizada, devendo, além do mais, esses instrumentos ser articulados com os planos nacionais.
No artigo 95.º deve fazer-se uma menção específica e explícita à participação do Conselho Económico e Social na

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elaboração das grandes opções, coisa que a lei já hoje prevê mas que seria interessante explicitar no articulado constitucional.
Com isto se tem em conta, Srs. Deputados, a importância da repartição institucional correcta de competências. O Parlamento tem importantes competências nesta matéria, as GOP são importantes, e na sua reinvenção podem vir a ser mais importantes ainda. O relatório deste ano da Comissão de Economia, Finanças e Plano trouxe interessantes contributos, pela pena do Sr. Deputado Henrique Neto, sobre o que podem vir a ser as Grandes Opções do Plano se formos capazes de tirar lições das deficiências que têm marcado a nossa própria prática em qualquer círculo político.
Por outro lado, é preciso que consigamos inserir nesse instrumento, em que a Assembleia da República exprime a sua relevante competência, directrizes capazes de abranger de forma adequada a actividade ulterior do governo, a qual, como sabemos, se desenvolve hoje segundo esquemas mais exigentes e menos cartesianos do que aqueles que foram típicos do planeamento de que a nossa Constituição é herdeira legítima.
O planeamento, segundo a experiência de democracias como a nossa, que muito bebeu na experiência francesa do pós-guerra e na experiência italiana em grande parte, é em certa medida um instrumento altamente cartesiano e articulado, em que tudo parte do topo e depois se desenvolve em planos, subplanos, programas, subprogramas, segundo uma lógica que hoje em dia tem de ser complementada com a necessidade de criação de instrumentos ágeis, que não partem da administração central, que podem partir do "casamento" entre a administração central e a administração regional e local, do "casamento" de entidades públicas com entidades de cariz vário, inclusivamente entidades de carácter misto, e que podem ter nomes.
É que a palavra "planos" é muito polissémica entre nós, sendo que os outros sistemas similares ao nosso podem ter instrumentos que, sob a designação de planos, são verdadeiros e próprios programas no sentido técnico, são conjuntos de directrizes mais ou menos articuladas, são instrumentos de intervenção pontual. E os nomes, como sabem, proliferam: pactos regionais de emprego, programas de habilitação, de reabilitação, de desenvolvimento, de estímulo, de reconversão, etc. A "nomenclatura" nessa matéria é muito diversificada, por isso importa que haja controlo democrático e legitimidade democrática para a sua própria elaboração.
A última palavra, Srs. Deputados, é para a vantagem desta operação de actualização das normas constitucionais relativas ao planeamento. Essa vantagem parece-nos manifesta na introdução desta nova componente, ou na valorização da componente regional, e na abertura que, no plano da lei ordinária, flexivelmente sejamos capazes de construir: Grandes Opções do Plano mais actuantes, mais efectivas, mais opções determinantes e, simultaneamente, instrumentos flexíveis, mas todos eles caracterizados pelo facto de serem democraticamente controlados, terem relatórios de execução, terem sindicabilidade política e terem a possibilidade de efectivação de responsabilidades políticas perante os órgãos próprios e perante o povo português.
Creio que esta releitura do planeamento, a caminho do século XXI, é uma releitura útil, necessária e que, no fundo, reinventa o planeamento democrático em 1997, altura em que ele disso precisa para ser efectivo.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado José Magalhães, chamo-lhe a atenção para o seguinte: na proposta que acabou de ser distribuída aos Srs. Deputados creio haver, porventura, lapso material no n.º 1 do artigo 92.º, quando se diz "podendo integrar programas específicos de âmbito territorial e local". Se é de âmbito territorial, será seguramente já de âmbito local, por isso suponho que o que se quererá dizer é sectorial.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * Já agora, proponho que em vez de se dizer "âmbito territorial e sectorial" se diga de "âmbito territorial e de natureza sectorial", ou vice-versa.

O Sr. José Magalhães (PS): * A segunda questão é um lapso de escrita.

O Sr. Presidente: * Sugiro, então, aos Srs. Deputados a emenda geral do n.º 1 do artigo 92.º, que deverá dizer "programas específicos de âmbito territorial e de natureza sectorial".
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, ouvi atentamente a exposição inicial do Sr. Deputado José Magalhães explicativa das propostas. A primeira questão que quero colocar, a título de pedido de esclarecimento, refere-se a nada ter sido dito pelo Sr. Deputado relativamente à aparente - o Sr. Deputado explicará - inversão total de posição do Partido Socialista da primeira para a segunda leituras.
Conforme consta, de resto, do guião desta Comissão, na primeira leitura ficou assente, relativamente a este capítulo, uma abertura por parte do Partido Socialista ao aligeiramento do sistema de planificação. O que acontece é que, actualmente, o sistema de planificação da Constituição tem de ver apenas com o plano nacional. O artigo 92.º, de resto, é perfeitamente liminar no sentido de, com epígrafe de "Natureza dos planos", explicitar de uma forma clara que os planos de desenvolvimento são elaborados pelo governo de acordo com o seu programa. Ou seja, o actual sistema de planeamento de planos de desenvolvimento económico e social que consta da Constituição apenas contempla uma lógica nacional de planeamento, uma lógica nacional de acordo com um programa sufragado eleitoralmente da responsabilidade do governo.
Houve, na primeira leitura, face ao debate que aqui mantivemos, uma abertura no sentido de ainda assim aligeirar o texto constitucional quanto a à matéria de planificação e, se bem percebi a exposição inicial do Sr. Deputado José Magalhães, somos agora "brindados" pelo Partido Socialista com uma proposta de multiplicação do sistema de planeamento existente em Portugal indo bastante para além do texto constitucional actualmente em vigor, o qual aponta exclusivamente para uma lógica de planeamento que tem a ver, de resto, com a própria dimensão do nosso país e com os desafios de desenvolvimento que ele tem como um todo.
Ora, se é certo que na primeira leitura se apontou para um "aligeiramento" do texto constitucional, somos agora surpreendidos por uma proposta que multiplica - e esse é o pedido de esclarecimento que estou a fazer, Sr. Presidente, e o Sr. Deputado terá a ocasião de explicitar se assim

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não é e de me explicar como é que assim não é - esta lógica de planeamento, indo bastante para além do plano da natureza nacional que decorre do actual texto constitucional, multiplicando isto por regiões e por autarquias.
Portanto, do meu ponto de vista, mais do que o simples percurso explicativo que o Sr. Deputado fez dos textos que, entretanto, nos foram entregues, havia uma questão prévia a explicar, que era o porquê da mudança de posição do Partido Socialista e o fundamento ou a argumentação para sustentar essa mudança de posição da primeira para a segunda leituras.

O Sr. Presidente: * Para responder, tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, gostaria de não deixar de corresponder a esta solicitação e, assim, quero dizer que os Srs. Deputados do PSD vão ter ainda ocasião de analisar estas propostas, que foram entregues agora mesmo. Portanto, a intervenção do Sr. Deputado traduz exactamente um pouco isso e é nosso dever explicitar ou ajudá-lo a ler essas propostas.
Em primeiro lugar, creio que correspondemos rigorosamente à expectativa que tínhamos criado e que era, como diz o guião, de abertura a simplificações. É isso o que se faz nesta proposta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Aligeirar?!…

O Sr. José Magalhães (PS): * Exactamente, mas aligeirar sem, naturalmente, quebrar as raízes deste preceito em relação ao planeamento democrático. E é por isso que, em primeiro lugar, se suprime a temporalização que era típica do artigo 92.º
Se o Sr. Deputado analisar com cuidado, o que era típico no artigo 92.º nessa matéria, e que já em revisão anterior tinha sido simplificado com a eliminação da referência ao plano a longo prazo, é agora aligeirado com a eliminação da menção.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Permite-me que o interrompa só 10 segundos, Sr. Deputado, para ganharmos tempo?

O Sr. José Magalhães (PS): * Faça favor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Deputado, eu prefiro dois planos, um anual e o de médio prazo, do que 307, que é para não haver dúvidas!…
Se o Sr. Deputado acha que aligeirar é deixar de falar no plano de médio prazo, que não existe, que é perfeitamente letra morta na Constituição…

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado José Magalhães, não se deixe interromper duas vezes por favor.

O Sr. José Magalhães (PS): * Por outro lado, Sr. Presidente, é vantajoso que se faça uma menção a esta dimensão que vem integrar-se no nosso planeamento - aliás, de forma razoavelmente pacífica - e que é a existência de programas específicos de âmbito territorial e de natureza sectorial, os quais devem ter, eles próprios ainda, uma inspiração e um enquadramento em opções decididas no centro de decisão política que é o Parlamento, ainda que devam ser configurados e conformados por uma actividade que é de âmbito governamental. Aí há, de facto, uma benfeitoria, há um aumento de conteúdo, há uma densificação que suponho virtuosa e também razoavelmente consensual.
Relativamente ao facto de acrescentar, o que preocupa o Sr. Deputado, de dimensões a dimensão regional, aí, francamente, insere-se neste título aquilo que está na Constituição - tem de estar na Constituição e estará na Constituição - mas que não estava neste título e, sim, no título das regiões autónomas e no do poder local.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Onde?

O Sr. José Magalhães (PS): * Na Constituição, nesta, na nossa Constituição, em dimensões que aqui se sublinham, tão-só.
Sr. Presidente, não me alongo mais nesta fase. De resto, creio que, Sr. Presidente - e falando noutra qualidade -, uma vez que teve participação especial nesta reflexão poderá dar talvez contributos adicionais susceptíveis de ajudar a iluminar as razões e, neste sentido, satisfazer as preocupações expressas pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, com efeito inscrevi-me e em parte reproduzirei nos meus argumentos o roteiro argumentativo do Sr. Deputado José Magalhães.
Gostaria de começar por sublinhar o que se segue, pedindo talvez a atenção em particular do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, para tentar superar algumas das dúvidas que há pouco foram colocadas.
Em primeiro lugar, na realidade, e não direi um constrangimento, mas uma prescrição que resulta dos limites materiais da revisão constitucional e daí a existência de planos no ordenamento constitucional. Esse é, portanto, um dado de partida.
De que planos, neste momento, fala a Constituição? A Constituição fala já, efectivamente, na existência de planos de desenvolvimento económico e social - e são seguramente planos nacionais a que a Constituição alude no artigo 91.º actual -, mas a Constituição também já alude, salvo erro no artigo 258.º, à existência de planos regionais no quadro das futuras regiões administrativas. Aliás, também nas competências das regiões autónomas se prevê a existência do plano de desenvolvimento. Portanto, quando no artigo 91.º o PS propõe agora que se faça uma expressa referência a planos de desenvolvimento que tenham natureza nacional, regional ou local, se verdadeiramente alguma coisa acrescenta é apenas quanto ao local.
E já agora - e o Sr. Deputado Marques Guedes deveria anotá-lo -, um contributo relevante do governo do PSD no passado foi o de prescrever às autarquias locais, em sede municipal, a existência de planos directores municipais, justamente um por cada concelho. Ora, como o plano municipal é hoje um instrumento consagrado na ordem jurídica, a possibilidade de prever a sua existência em sede constitucional…
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, o PDM terá o conteúdo que a lei lhe configurar. Assim, pode ter um conteúdo meramente de ordenamento do território ou pode ter um conteúdo, que já chegou a ter, de orientação estratégica

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sobre os principais aspectos no desenvolvimento económico e social.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas não há obrigação constitucional!…

O Orador: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, se me deixar continuar o raciocínio verificará que, quanto ao conteúdo dos planos locais, a proposta feita é extremamente prudente, no sentido em que se diz no artigo seguinte que os planos regionais, tal como, aliás, os locais, são elaborados pelas regiões autónomas e pelas autarquias locais, não criando qualquer conteúdo necessário a esses planos e, portanto, não criando aqui qualquer dificuldade em sede constitucional à futura natureza dos referidos planos. Tratou-se, sim, de harmonizar alguma coisa que na primeira leitura ficou aqui evidenciado, designadamente pelo então presidente da Comissão, ou seja, que não havia, nos artigos que se referiam aos planos, uma verdadeira previsão dos vários planos susceptíveis de existirem no domínio das várias entidades públicas com dimensão nacional ou com dimensão territorial de escala regional ou local. Quisemos, de alguma maneira, criar essa racionalidade e não mais do que isso.
Passando a questões do meu ponto de vista mais nucleares, quero assinalar que no actual artigo relativo à natureza dos planos se fala de planos de médio prazo e do plano anual. Estas duas figuras são actualmente, na Constituição, figuras necessárias de plano.
Se os Srs. Deputados repararem, a proposta que o Partido Socialista agora apresenta não qualifica os planos nacionais nem necessariamente como planos de médio prazo nem necessariamente como planos anuais.
Portanto, na verdade está aqui criada uma flexibilidade quanto à existência dos planos nacionais, para não os condicionar nem sequer à obrigatoriedade do plano anual com a natureza de plano unificado.
Por outro lado, haverá ou não haverá planos de médio prazo de acordo com opções em concreto de cada governo em concreto e não por prescrição constitucional obrigatória.
Noutro aspecto, que decorre do artigo 93.º, à Assembleia da República competiria aprovar grandes opções correspondentes a cada plano e tínhamos esta questão singular… Aliás, se olharmos para a prática constitucional estaríamos em verdadeira omissão constitucional, porque esta prescrição constitucional, que era a ideia de que "para cada plano a sua lei de grandes opções", não tem sido executada.
Ora bem, as coisas não se passaram assim e nós propomos justamente uma actualização constitucional para que elas, no futuro, não tenham de se passar como a Constituição prescreve mas que a prática, de facto, não concretizou. Por isso, em matéria de grandes opções, daquilo que se fala é na existência de uma lei anual de grandes opções e é na lei anual de grandes opções que entroncarão os vários planos possíveis.
Estava o Sr. Deputado Luís Marques Guedes eventualmente preocupado sobre se isto não significaria uma possível multiplicação de planos. Sr. Deputado deixemos isso ao critério de cada governo, que sem cominação constitucional aprovará, em função das grandes opções, os planos que tiver por convenientes para o exercício da sua actividade concreta.
Mas há uma outra preocupação do Sr. Deputado Luís Marques Guedes. Refere-se a Constituição, no artigo 92.º, que a prerrogativa de aprovação dos planos sob elaboração do governo era feita de acordo com o seu programa e não de acordo com as grandes opções, e este era outro ponto para o qual gostaria de chamar a atenção do o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, se me permite, evidentemente.
Sr. Deputado, uma das preocupações que tem manifestado é a circunstância de a elaboração dos planos pelo governo sob prescrição constitucional ser feita apenas de acordo com o programa do governo e há aqui alguma incongruência constitucional. Se no artigo 92.º fala na referência ao programa do governo, já no artigo 108.º, a propósito da elaboração do orçamento, se fala do plano anual reportado às grandes opções e, de forma totalmente explícita, no artigo 202.º, que estabelece as competências administrativas do governo, diz-se: "Elaborar os planos com base nas leis das respectivas grandes opções (…)". Isto significa que havia na Constituição a ausência de referência à elaboração do plano, designadamente ao plano anual na base das grandes opções.
Ora, o que o Partido Socialista propõe aqui é que os planos, quaisquer que eles sejam, ao serem elaborados o sejam "de harmonia" - e a expressão não é outra, é esta, "de harmonia" - com as respectivas leis das grandes opções. Como só há a prescrição constitucional de uma lei de grandes opções anual, todos os outros planos apenas têm de estar "em harmonia" com a lei das grandes opções.
Portanto, Sr. Deputado, andamos bem quando falamos da flexibilização do sistema de planeamento quando comparado com os graus de rigidez que actualmente estão presentes no texto constitucional.
Por isso, não nos afastámos daquele que foi o espírito da primeira leitura e, permita-me que lhe diga, estamos cientes de o ter concretizado plenamente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente consta do guião - e suponho que o registo estará certo - que as propostas da primeira leitura do Partido Socialista tendiam a aligeirar o sistema de planificação. É isso o que está escrito, embora eu aceite que se queira dizer "planejamento". Agora, relativamente ao planeamento isto está fiel ao guião, mas quanto ao "aligeiramento" não está nada fiel ao guião, porque isto é tudo menos aligeirar o planeamento, é multiplicar os planos em vários sectores.
Mas a questão que me preocupa, e sem entrar agora na filosofia económica, na economia planificada, na importância da planificação da economia e nas ultrapassagens que alguma dessa orientação hoje regista, o que queria aqui colocar é o seguinte: como estes planos são instrumentos do governo central, do governo regional e do governo local têm, naturalmente, de reflectir na sua elaboração as preocupações de cada um desses governos, que, por natureza, não podem ser subordinados a um governo só, que é o governo central. E, realmente, eu vejo reflectida nestas propostas do Partido Socialista uma filosofia totalmente contrária às ideias de regionalização e de descentralização, porque se subordinam a elaboração e a execução dos planos regionais e locais ao plano governamental, ou seja, ao plano central. Isto é, efectivamente, além do mais…

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O Sr. José Magalhães (PS): * Onde é que está isso?!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Está no artigo 94.º n.º 3: "A elaboração e a execução de planos regionais e locais deve ser descentralizada e articulada pelos planos nacionais".

O Sr. José Magalhães (PS): * Como é hoje! Lei de enquadramento, dixit.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Não vejo na Constituição qualquer disposição que diga isto e é sabido que em matérias de articulação o articulado mais fraco se subordina, por natureza, ao articulante mais forte. Ninguém tenha dúvidas a esse respeito! E é efectivamente devido a esta viciação que as propostas têm, do ponto de vista da regionalização, da autonomia e da descentralização, que (estou a falar em termos pessoais, mas penso que o PSD se identifica com esta minha preocupação) esta fórmula de multiplicar os planos subordinando-os a um plano nacional de um governo, que em determinado momento pode não ser, ou não será na grande parte das vezes, coincidente com os governos municipais e regionais, é, do meu ponto de vista, de todo inaceitável.
E não vejo forma - e é com alguma ansiedade que o digo -, por mais explicações que o Sr. Deputado José Magalhães me dê sobre isto, de esta proposta, nos termos em que está, não ocasionar necessariamente esta consequência e esta disposição. Temos já, hoje, na Constituição, referências da parte das regiões autónomas aos planos regionais como instrumentos independentes e aprovados pelos órgãos do governo próprio, como também temos essa referência em relação às regiões administrativas.
Mas parece-me de todo errado meterem-se ao "molho", nesta parte que estava nitidamente traçada e pensada em termos de planificação nacional, essas partes das autarquias locais e das regiões autónomas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, suponho que me dirigiu este pedido de esclarecimento e eu gostaria de responder-lhe o seguinte: penso que as suas palavras vão à revelia de uma preocupação, que inclusivamente constava de propostas iniciais do Sr. Deputado, sobre a subsidariedade. O que está verdadeiramente na preocupação do PS é articular o princípio da subsidariedade relativamente a funções tão relevantes como as funções do planeamento, por forma a não deixar equívocos acerca delas.
Primeiro, já demonstrámos que a existência e a previsão de planos de desenvolvimento de âmbito regional já estava expressa na Constituição, noutras sedes, portanto, fazer a identificação em sede sistemática adequada não é acrescentar um mais, é fazer a boa catalogação das funções e das realidades do planeamento.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Nestes termos é subverter!

O Sr. Presidente: * Segundo aspecto (também reportando-me um pouco a uma dúvida do Sr. Deputado Luís Marques Guedes): não há dúvidas de que a aprovação das leis das grandes opções dos planos já é uma competência parlamentar. O que a Constituição hoje tem a mais é a exigência de cada plano ter a sua lei de grandes opções e de o plano anual ser necessariamente elaborado de acordo com a lei das grandes opções. Isso é o que a Constituição...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, dá-me licença? Já reparou nos desfasamentos de tempos que isto gera?... Quer dizer: aprovam um plano nacional em Dezembro e os regionais e os locais vão aprová-los quando? Em Janeiro, Fevereiro?...

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, a essência dos planos - já tínhamos convindo nisso há pouco e não vale a pena estarmos agora a não admitir o que já admitimos - é uma limitação em termos de reserva material, portanto, a previsão da essência dos planos é uma previsão constitucional necessária.
A questão que se coloca agora é a de saber como é que os tratamos constitucionalmente. Ou mantemos a Constituição como está, e então há uma articulação obrigatória por cada plano, isto é, a necessidade de uma lei de grandes opções prévia a cada plano. Nós não consideramos isso correcto, portanto, podemos criar um sistema de maior flexibilização em que não haja uma articulação necessária entre cada plano e uma prévia lei de grandes opções, podendo haver, como terá necessariamente de haver, uma lei anual de grandes opções e, depois, os vários planos a haver, sem a Constituição cominar quais vão ser necessariamente, serão elaborados de harmonia com essa lei das grandes opções anualmente aprovada.
Segundo aspecto da questão que o Sr. Deputado Guilherme Silva colocou: há uma eventual centralização de posição que decorreria do n.º 3 do artigo 94.º Aí, quando se fala da elaboração e execução dos planos regionais e locais, ela deve ser descentralizada e articulada com os planos nacionais.
Vamos ao primeiro segmento da norma proposta: que mesmo os planos regionais e locais devam ser descentralizados quanto à sua elaboração e execução não sobram dúvidas, do meu ponto de vista! Ou os Srs. Deputados põem em dúvida que nas regiões autónomas também deve haver um princípio de participação na elaboração dos respectivos planos de desenvolvimento?! Penso que é muito negativo pôr em dúvida que este princípio de participação na elaboração dos planos também deva existir na elaboração dos planos das regiões autónomas.
E nas regiões administrativas? Deve, ou não, a região administrativa elaborar o seu plano de desenvolvimento nacional também sob a orientação de um princípio de participação, o que envolve, designadamente, uma função relevante dos municípios da respectiva área regional no processo desses planos de desenvolvimento regional?! Não há dúvidas de que isso deve acontecer, pelo menos a mim essa dúvida não me assalta, e até no plano local, a admitirmos a figura do plano local! Isso também é válido para as autarquias locais de grau inferior ao município, que são as freguesias no processo participativo na elaboração de um plano respectivo.
Portanto, configurar em sede constitucional a existência de um princípio de participação e de elaboração descentralizada, parece-me extremamente positivo.
Quanto ao segundo segmento da norma - aliás, foi esse que, em concreto, o Sr. Deputado Guilherme Silva colocou -, digo-lhe, com franqueza, que ainda não consultei

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os meus colegas. Se fosse por essa razão que poderia haver uma divergência relevante entre nós acerca do alcance da necessidade de articulação com planos nacionais, sobretudo por causa do problema das regiões autónomas, eu não resistiria a limpar o segmento que aqui está. Portanto, por esse lado, penso que não seria motivo de divergência.
Quanto aos outros pontos, em boa interpretação constitucional, julgo que os Srs. Deputados não fizeram até agora demonstração de que as propostas do PS tornam o sistema mais complexo e penso que nós estamos a fazer alguma demonstração de que, na prática, o sistema passará a ser muito mais flexível do que aquele que resulta da Constituição actual.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira, para pedir esclarecimentos, se o entender. Caso contrário, tem a palavra a Sr.a Deputada Teresa Patrício Gouveia.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para pedir esclarecimentos.
Já há pouco referi - vou utilizar novamente a expressão e espero que a considerem com toda a seriedade - que estou bastante perplexo com estas propostas, e peço que encarem o que estou a dizer com seriedade...

O Sr. Presidente: * Mas eu acredito, também sem ironia, que esteja!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Digo isto porque, se bem entendo, o que é que o Partido Socialista nos propõe? Desde logo, no artigo 91.º, para além dos planos de desenvolvimento económico e social - que, julgo, já aqui estava, pelo menos, implícito, mas não posso garantir…

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Deputado, nessa parte não há qualquer alteração.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Ó Sr. Deputado José Magalhães, há! Eu posso compreender - e vou tentar ser breve na explicitação das minhas dúvidas - que no actual artigo 91.º se leiam os planos de desenvolvimento económico e social nacionais e regionais! Posso entender que isso inclui aqui actualmente! Agora, os planos de desenvolvimento económico e social locais?! E os locais nesta perspectiva: estão aqui referidas as autarquias locais, todas elas, e não quero fazer uma afirmação peremptória. Julgo que agora o Sr. Presidente referiu o problema da freguesia. Promover constitucionalmente a obrigatoriedade de haver planos de desenvolvimento económicos e sociais a nível de freguesia?! Eu não consigo entender como é que isto se pode propor!
Se isto vier a ser aprovado, terei muito gosto em procurar colaborar, dentro das minhas limitadas possibilidades e capacidades, na elaboração do plano de desenvolvimento económico e social da Lapa, mas tenho dificuldade - com toda a sinceridade - em entender como é que podem fazer-se planos de desenvolvimento económico e social, por exemplo, a nível de freguesia e mesmo a nível municipal!!
Julgo que alguém, há pouco, terá aventado a hipótese dos Planos Directores Municipais (PDM) já existentes. Mas o PDM nada tem de ver com os planos de desenvolvimento económico e social; é um plano de ordenamento territorial, é completamente diferente, é uma coisa completamente distinta, nada tem de ver uma coisa com a outra!
Depois, a proposta tem outra coisa - que, julgo, é facilmente ultrapassável - que é prever que os planos regionais e locais serão elaborados pelas regiões autónomas e pelas autarquias locais.
Nesta perspectiva, e tendo em conta as propostas iniciais do Partido Socialista, julgo que se mantém, digamos, essa matriz básica e substancial de que os planos de desenvolvimento económico e social das regiões administrativas serão planos regionais e não planos locais. Por conseguinte, penso que o planos regionais não podem ser apenas das regiões autónomas, têm também de ser das regiões administrativas.
Há ainda a questão da flexibilidade e da simplicidade - e neste momento estou a tentar colocar apenas dúvidas que se me suscitam, que considero legítimas e estou a fazê-lo com seriedade.
Quando se fala de flexibilidade do planeamento, significa que não há a obrigatoriedade de ser anual nem de médio prazo. Não há obrigatoriedade! Isto é que será a flexibilidade, se interpretei bem as vossas palavras, ou seja, os planos deixam de ser obrigatoriamente anuais e de médio prazo, por isso, plurianuais.
O que é que isto significa? Significa que os planos - atendendo às Grandes Opções do Plano (GOP), porque julgo que elas continuam a ser anuais - que têm de estar enquadrados nas grandes opções anuais, como deixam de ter a obrigatoriedade de ser anuais ou plurianuais, poderão ser mensais, trimestrais, semestrais! Julgo que há aqui qualquer coisa que não "joga"! Nós não podemos dizer isto!
Do meu ponto de vista, nós não podemos encarar planos que tenham um nível temporal inferior a um ano. Só pode haver plano anual ou plurianual! Plurianual, pode ser dois anos, três anos, cinco anos! Isso é outro tipo de questão, mas não pode é ser abaixo disto! Por conseguinte, quando se fala na flexibilização dos planos e do planeamento, retirando a obrigatoriedade de os planos serem anuais e plurianuais, eu não consigo ver qual é esta flexibilização que pretende impor-se!
Por outro lado, a dúvida que se suscita - e que aparece também nestas propostas - é esta dificuldade que haveria, segundo foi dito, de os planos terem de corresponder qualquer deles às grandes opções.
Sinceramente, a manter-se a ideia da planificação na Constituição, penso que todos os planos têm de obedecer às grandes opções ou, então, para além do mais - agora já não estou a referir-me a questões numa perspectiva mais económica, técnica ou algo parecida -, avançamos num caminho de governamentalização. Ou seja, falando agora a nível dos planos nacionais, não há obrigatoriedade de existência de grandes opções a nível nacional, de grandes orientações aprovadas pela Assembleia da República, e o governo, qualquer que ele seja, pode fazer o que quiser. Julgo que isso é avançar num sentido negativo, a manter-se - e penso que deve manter-se - a ideia de uma certa planificação, que é o da governamentalização do regime.
Em termos de dúvidas e de algumas perplexidades que se levantam neste momento, é isto o que tenho a dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados do Partido Socialista. Gostaria, sinceramente, de conseguir perceber a lógica da vossa proposta.

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O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Octávio Teixeira, tentarei ser telegráfico.
A primeira questão que colocou é no sentido de saber se era ou não pertinente admitir a figura dos planos locais. Há pouco, quando me referi aos planos directores municipais tive, desde logo, o cuidado de sublinhar, no exemplo que dei, que hoje em dia são basicamente planos de ordenamento do território, mas que já tiveram na sua concepção inicial funções de orientação para o desenvolvimento económico e social na escala de município - depois, esse aspecto dos PDM foi revisto na legislação que actualmente os conforma.
No entanto, toda a gente sabe que nos municípios se aprova anualmente, por efeitos da respectiva lei de atribuições e competências, o plano e o orçamento, sendo que o orçamento em sede municipal é a expressão financeira do plano, que também é objecto de deliberação em assembleia municipal. Por isso, esse plano, que é objecto de deliberação em assembleia municipal, tem aspectos de desenvolvimento económico e social relevantes, tanto mais que nas atribuições dos municípios, designadamente, a função do desenvolvimento económico e social lá está patente. Basta consultar o Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, para verificar que assim é.
A questão de configurar aqui a possibilidade de planos de desenvolvimento económico e social também com previsão da sua existência no domínio das autarquias locais não é novidade alguma relativamente à ordem jurídica vigente. Portanto, não se pense que seria a Constituição a cominar uma nova obrigação de planeamento para além daquilo que hoje é uma prática estabilizada ao nível das funções autárquicas. Não há aqui, de facto, um incremento de planeamento a essas funções.
No entanto, deixe-me acrescentar que se o maior consenso estabelecido na Comissão for no sentido de se não fazer referência a planos de âmbito local… Srs. Deputados, gostaríamos de uma solução que fosse na sua sistemática mais coerente ao nível do princípio da subsidiariedade, de que há pouco falei, mas quem quer consenso quer consenso, e se o consenso for por uma delimitação negativa relativamente a estas figuras, estamos aqui para conversar e para dialogar em torno disso no rescaldo deste debate.
O segundo aspecto que o Sr. Deputado Octávio Teixeira mencionou foi o da temporalidade dos planos, dizendo que a haver planos tem de ser necessariamente com a natureza de planos anuais. Bom, o problema é que a Constituição, actualmente, comina a existência obrigatória de plano anual e, como o Sr. Deputado sabe, há muitos anos - não sei agora dizer há quantos - que os governos não aprovam os planos anuais,…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Os plurianuais!

O Sr. Presidente: * … limitam-se a propor, e a Assembleia a aprovar, as Grandes Opções do Plano. Aprovam o respectivo Orçamento do Estado, mas a figura do plano anual não é aprovada e, portanto, há uma inconstitucionalidade por omissão.
Das duas uma: ou fechamos os olhos a esta realidade e mantemos a inconstitucionalidade por omissão, porque há vários anos que não há plano anual aprovado por qualquer governo, nem no último ano do PS, nem nos governos anteriores do PSD; ou, então, abrimos a porta para que a Constituição não passe a prescrever a obrigatoriedade do plano anual. Bom, nesse caso, perguntar-se-á: se a Constituição não prescrever de forma obrigatória o plano anual, o que deverá dizer? Deverá deixar ao critério de qualquer governo a possibilidade de elaboração de planos ao abrigo de alguma coisa. Qual é essa outra coisa ? É uma lei anual de grandes opções, pois essa, nos termos constitucionais, tem de facto de existir e de dar expressão financeira ao Orçamento.
Portanto, as grandes opções, por força de vários artigos constitucionais, designadamente do artigo 164.º, alínea h), em matéria de competência política legislativa da Assembleia da República, estão referidas, não havendo, que eu saiba, intenção de alterar esta competência da Assembleia da República. Assim, direi que os planos, na sua flexibilidade, de acordo com o critério de iniciativa governamental, terão de reportar-se às grandes opções anuais do plano.
No entanto, aquilo que a Constituição actualmente diz é que por cada plano deve haver uma lei de grandes opções. Quanto a isto dizemos também que não; não faz sentido algum querer ter previamente, por cada plano, uma lei de grandes opções. Basta uma por ano, na qual entroncariam os vários planos que eventualmente existissem, de acordo com o critério governamental.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, a propósito desta sua última intervenção, penso que o bom senso e o realismo nos levam a pensar que, se não há uma prática continuada dos governos de apresentarem planos anualmente, em vez de levarmos os governos a praticarem qualquer coisa que se verifica não ser útil talvez fosse mais de acordo com a primeira leitura de simplificação nesta matéria deixar cair essa cominação.

O Sr. Presidente: * Qual?

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - A da elaboração de um plano anual.

O Sr. Presidente: * É exactamente isso que se traduz na proposta do PS.

O Sr. José Magalhães (PS): * Mas não obrigatoriamente no terreno da lei ordinária! Não misturem os dois terrenos!

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - O Sr. Presidente acabou de dizer que havia uma não prática de qualquer coisa que a Constituição prevê. Assim, o que pergunto é se não seria mais simples deixar cair aquilo que a Constituição prevê e que nunca é praticado, em vez de elevarmos a obrigação de uma multiplicação de planos.
Em segundo lugar, em relação à sua intervenção anterior e um pouco na linha do que disse o Sr. Deputado Octávio Teixeira, ainda na perspectiva da simplificação desta actividade de planeamento, penso que os planos locais, na prática actual, se traduzem em planos directores municipais, que mesmo que possam ter um conteúdo estratégico têm uma opção muito vincada do ordenamento do território. Portanto, apesar de tudo, não penso que preencham esta obrigação de constituírem planos de desenvolvimento económico e social.

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Por outro lado, os planos anuais fundamentam o Orçamento, por isso também não penso que tenham esta dimensão; são planos que fundamentam o orçamento anual, por isso não penso que preencham o desiderato de serem planos de desenvolvimento económico e social, que todos os anos são feitos e que, portanto, não correspondem, com certeza, a uma estratégia de médio prazo e de uma certa permanência, imanente no objectivo desta planificação.
Os planos directores municipais têm uma vigência - e a nova Lei de Bases do Ordenamento do Território e do Urbanismo não a altera, tanto quanto me lembro - de 5 anos, de 10 anos. Como podem estar de acordo com grandes opções anuais?! Não vejo como é que podem preencher objectivos que aqui vêm!

O Sr. Presidente: * Sr.ª Deputada, peço-lhe desculpa, mas creio que já entendi as suas dúvidas.

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Ainda tenho mais uma dúvida, Sr. Presidente. Já agora vou colocá-la e, depois, concluo muito rapidamente.
Como é que um plano local pode preencher o objectivo de promover o crescimento e o desenvolvimento harmonioso de sectores e regiões, a justa repartição individual e regional do produto nacional? Não vejo que esteja dentro da capacidade de um plano local, qualquer que ele seja, preencher estes objectivos.
Por outro lado, fala-se na descentralização da elaboração e execução dos planos. Como é um plano local de elaboração ou de execução descentralizadas? Penso que a descentralização implica um conceito geográfico. Outra coisa é a participação, mas estamos a falar de descentralização! Como é que os planos locais são feitos descentralizadamente?

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, quero apenas pedir um esclarecimento, suscitado pela última intervenção do Sr. Presidente.
O Sr. Presidente disse - e bem! - que a actual Constituição tem, de facto, um conteúdo útil que a prática dos últimos anos - e V. Ex.ª citou mesmo tanto os governos do PSD, como, actualmente, o Governo do Partido Socialista - fez cair em desuso. E os governos não o fazem por serem masoquistas, como é evidente; os governos trabalham para o bem nacional, dentro daquilo que entendem ser esse mesmo bem nacional.
Caiu precisamente em desuso a elaboração de planos anuais e de planos plurianuais. Aliás, todos os Deputados aqui presentes sabem que actualmente a própria discussão das Grandes Opções do Plano tem vindo sistematicamente a perder a dignidade que deveria ter pela pompa com que surge esta lógica das grandes opções inscrita na Constituição. A ilação que temos de tirar conscientemente daqui é a de que, de facto, hoje em dia pouco se justifica este ritmo anual de definição de uma lógica de planeamento.
Concordo com os pressupostos do Sr. Presidente, mas quero pedir-lhe o seguinte esclarecimento: a conclusão a tirar, e que pensava o PSD que tinha sido o caminho para que enveredámos na primeira leitura - daí a nota do anterior presidente, seu antecessor, dando como exemplo a menção dos planos a médio prazo -, é no sentido de aligeirar o texto constitucional, deixando de referir explicitamente os planos anuais e os planos plurianuais.
Mais à frente, como o Sr. Presidente verificará - aliás, tal como a sua intervenção de há pouco fez referência, e porque se trata de matéria que entronca com esta -, é preciso retirar do artigo 108.º a referência a que o Orçamento do Estado é elaborado com base nas grandes opções.
A simplificação mais correcta - de resto, era esta a questão que queria colocar-lhe - é deixar o texto constitucional de falar na periodicidade dos planos. Deve continuar a dizer que os planos são elaborados pelo governo, que são responsabilidade política do governo de acordo com o seu programa, que há as grandes opções a aprovar pela Assembleia da República, na tal lógica de divisão, de separação, de interdependência de poderes que decorre de todo o nosso modelo político, mas deixar de referir que o Orçamento do Estado - esse, sim, anual, necessária e imperativamente - tem de obedecer a esta ou àquela lei de grandes opções.
As grandes opções terão de ser feitas para cada plano, e cada governo, se entender fazer um plano por ano, fará grandes opções para cada um deles, de forma a que a Assembleia sancione as opções políticas que o governo quer pôr no seu plano, pois este é elaborado de acordo com o programa do governo e a Assembleia tem de ter uma palavra sobre as grandes opções desse plano. Se houver um governo que decida fazer um plano para a legislatura, um plano de quatro anos, haverá apenas uma lei de grandes opções de quatro anos. Não será esta a lógica de aligeiramento, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Luís Marques Guedes, vou responder-lhe, bem como à Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia, com todo o gosto.
Em primeiro lugar, vou referir-me à questão, que parece ter estabelecido alguma perplexidade, da existência de planos regionais e de planos locais. Se os Srs. Deputados fizerem uma releitura atenta do debate da primeira leitura - eu, que nela não participei, procurei fazê-la - verificarão que tinha justamente sido chamada a atenção para o facto de, tendo esta matéria, relativamente ao conjunto dos planos, sido pensada pelos constituintes, e nas várias revisões constitucionais entretanto ocorridas, exclusivamente para a função de planeamento no âmbito nacional, nada ter sido dito acerca de inserção de funções de planeamento em âmbito regional e local. Era altura de o poder fazer, se o quiséssemos, mas para isso teria de haver um razoável consenso.
O que, a meu ver, deste debate fica demonstrado é que funções de planeamento ao nível regional e local inequivocamente existem. É ou não de considerar que eles tenham também uma previsão no conjunto dos artigos que ao plano dizem respeito? Do meu ponto de vista, se o fizéssemos, tal era coerente com aquilo que lá atrás estipulámos quando falámos no princípio da subsidiariedade em matéria de organização do Estado quanto, designadamente, à sua forma.
No entanto, esta questão não é a mais relevante e, portanto, se, porventura, em vez de fazer convergência faz divergência, eu próprio já manifestei disponibilidade para não entrarmos em linha de conta com esse aspecto. Do meu ponto de vista, não beneficiámos uma boa leitura sistémica

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das funções do planeamento, mas nem por isso essas funções do planeamento vão deixar de existir e, como tal, o problema não passa necessariamente por aí.
A Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia perguntou como é possível falar de função descentralizada ao nível do planeamento local. É possível, designadamente se tivermos em linha de conta que o planeamento local para este efeito é aquele que ocorre nos municípios e que os municípios também integram no seu âmbito as freguesias, e que as freguesias, pela sua participação necessária nas assembleias municipais que têm competência para aprovar o plano, estão a dar um contributo, em nome do princípio da participação descentralizada, para a respectiva aprovação.
Portanto, também isso não é, do meu ponto de vista, uma objecção impeditiva da consagração do princípio da elaboração descentralizada, mesmo para a função, digamos, local do planeamento. No entanto, volto a sublinhar, se este for o ponto de divergência, supere-se.
Quanto ao outro tema, que é talvez o tema central, o da articulação de grandes opções nacionais e de planos nacionais, os Srs. Deputados, por favor, não percam de vista que em nenhum momento na proposta do PS se falou mais do que em planos nacionais. Ou seja, não se utilizou nem a figura do plano plurianual nem a figura do plano anual como constitucionalmente necessárias.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Ainda bem! Não é tudo negativo!

O Sr. Presidente: * Havendo esta superação, o que nós dizemos é que os planos nacionais são elaborados de acordo com as respectivas leis das grandes opções e a partir daqui deixamos em aberto a possibilidade de os planos serem aqueles que os governos, de acordo com o seu critério de governação, decidam que devam existir. Portanto, aqui há uma convergência efectiva.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Aí estamos de acordo!

O Sr. Presidente: * Portanto, Srs. Deputados, o Sr. Deputado José Magalhães, que já fez um esforço nesse sentido, tentou uma fórmula mais simplificada na proposta inicial que, quanto à sua essência, mantém a filosofia de planeamento que nós apresentámos aqui esta noite e a "despe" das funções de planeamento regional e local.
Portanto, em matéria de planos, deixamos outra vez tudo, eventualmente, circunscrito à função nacional de planeamentos. Do meu ponto de vista, na organização económica, poderíamos ter ido mais longe; se não formos, paciência, pelo menos esta base de patamar mínimo de entendimento talvez seja possível.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro da Vinha Costa.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD): - Sr. Presidente, se bem entendi, a proposta agora distribuída substitui tão-somente as propostas que nos tinham sido entregues relativas aos artigos 92.º, 93.º e 94.º
Portanto, isto significa que a proposta relativa ao artigo 91.º permanece tal como nos foi…

O Sr. Presidente: * Também pode ser retirada! Pode ficar o texto constitucional como está!

O Sr. José Magalhães (PS): * Fica exactamente como está!

O Sr. Pedro Vinha da Costa (PSD): - Peço desculpa, mas não entendi.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Deputado, a última versão desta proposta é não mexer no artigo 91.º e fundir os artigos 92.º, 93.º e 94.º

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD) * Há uma questão que, para mim, permanece de pé e relativamente à qual solicito um esclarecimento, não tanto em face desta última informação do Sr. Deputado José Magalhães mas mais da primeira informação que deu em off, portanto, peço-lhe desculpa por colocá-la agora em on, sob pena de não perceber exactamente o que é que estamos a tratar.
Se não se mexe no artigo 91.º, significa que para os senhores deixa de fazer sentido falar-se em planos locais nesta sede?

O Sr. José Magalhães (PS): * Nesta sede, Sr. Deputado, não se altera o que já decorre da Constituição. Ou seja, a Constituição, como sabe, no artigo 229.º, n.º 1, alínea o), trata dos planos regionais das regiões autónomas e no artigo 258.º trata dos planos regionais das regiões administrativas, que são os únicos tipificados na Constituição para as autarquias locais e também os únicos que, por nunca terem existido regiões administrativas, nunca existiram.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD) * Portanto, desaparece a ideia do plano local deste capítulo?

O Sr. José Magalhães (PS): * Desaparece nesta sede! O legislador ordinário fará, como já podia fazer agora, o que quiser em matéria de tipologias. Uns têm que ver com as questões do ordenamento do território, portanto, nada tem que ver com o desenvolvimento económico neste sentido, outros poderão vir a ter.

O Sr. Presidente: * Outros já têm que ver, porque são planos que dão execução aos respectivos orçamentos anuais das autarquias locais, particularmente dos municípios.

O Sr. Pedro da Vinha Costa (PSD) * Sr. Presidente, congratulando-me com esta evolução dos acontecimentos, quero, contudo, fazer um ligeiro reparo - e só o faço porque houve aqui referências a isso, portanto, parece-me importante que essa emenda seja feita de alguma forma, justamente porque isso ficou registado em termos de gravação das intervenções anteriores - que tem a ver com o seguinte: é que nós estivemos a confundir uma série de questões.
Falou-se dos planos directores municipais e chamo particularmente a atenção para o facto de uma boa parte deles ter começado por ser planos gerais de urbanização, tendo sido posteriormente transformados tout-court em planos directores municipais. Portanto, estamos a falar de realidades completamente diferentes.
Segunda questão: a da articulação entre os diferentes níveis de planeamento.

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Digo-o aqui, e assumo claramente aquilo que estou a dizer: nem os planos de actividades, a que o Sr. Presidente há pouco se referia, de nível municipal e de nível de freguesia são articulados entre si. Não há qualquer articulação, e como não há, o que estamos a criar, em nome de uma justificação que foi dada, que é a de a prática dos governos ter abandonado a apresentação de planos, é uma nova mistificação aos diferentes níveis, porque na realidade estaríamos a funcionar num país virtual que não o actual. Nem sequer poderiam ser articulados, como o Sr. Deputado Guilherme Silva há pouco referiu, em face dos timings que estão previstos para as suas aprovações.
DE qualquer das maneiras, fazendo este reparo, congratulo-me, obviamente, por não se ter optado por seguir um caminho de realidade virtual que, necessariamente, implicaria que daqui a uns anos outros aqui estivessem a discutir a necessidade de rever a Constituição que então vigorasse, por força de ela não estar a ser cumprida aos diferentes níveis em que a Constituição previa que existisse planeamento.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, uma coisa que já há pouco tive oportunidade de referir, quando fiz alguns pedidos de esclarecimento (e pela minha parte gostaria de deixar claro que sobre isso não haverá dúvidas entre nós), foi que os planos de actividade municipais não têm que ver com o planos de desenvolvimento económico e social.
É evidente que qualquer autarquia local deve ter essa preocupação, mas a competência para o desenvolvimento económico e social não é, neste momento, das autarquias, é do Estado, é das regiões, ou poderá ser das regiões se elas vierem a ser criadas,…

O Sr. Presidente: * São autarquias!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Certo! Então, para especificar, para que não haja dúvidas, quando falo dos planos de actividade municipais, estou a referir-me às autarquias municípios. Elas não têm essa competência.

O Sr. Presidente: * Elas têm nas suas atribuições, de acordo com a Lei n.º 100/84, a função do desenvolvimento económico e social.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Elas devem ter essa preocupação, não têm essa...

O Sr. Presidente: * Têm, na lei!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Quanto à questão da lógica dos planos e das grandes opções do plano, julgo que há uma lógica intrínseca àquilo que neste momento existe na Constituição, quando se põe o problema dos planos e das grandes opções correlativas, ou o inverso se quiserem, das grandes opções e dos planos correlativos de médio prazo e anuais.
É natural que um governo, quando assume funções, faça grandes opções - e pelo menos seria útil que o fizesse - para o quadriénio em que pensa vir a governar e que, nessa perspectiva, desenvolva um plano de desenvolvimento económico e social com essa abrangência quadrienal, o período para o qual tem perspectiva de governação.

O Sr. Presidente: * Isso é verdadeiramente o programa do governo, Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não é isso!

O Sr. José Magalhães (PS): * Tem de ser é um prodígio de previsão económica, porque prever quatro anos actualmente é uma coisa estrambólica.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Ó Sr. Deputado José Magalhães, não estamos aqui a falar de planos burocráticos!

O Sr. José Magalhães (PS): * Eu sei. Eu estou a falar em termos do limite que a competência económica e política é hoje capaz de ter, para ver além da "esquina" do próximo século ou para além das "esquinas" dos próximos quadriénios. É só isso, mais nada!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado José Magalhães, já lhe responderei a essa questão.
Julgo que a lógica é esta: os planos de médio prazo, para abranger o período de governação, digamos, a legislatura; os planos e as grandes opções anuais, na perspectiva de um ano, directamente relacionados com o Orçamento, porque é ele que fundamenta ou sustenta as grandes opções anuais e o plano anual.
Agora põe-se a seguinte questão: mas será possível vir a perspectivar aquilo que será daqui a dois, três ou quatro anos? Alto lá! Tem de ser possível ou, então, temos de admitir a hipótese de um governo estar a governar, como sói dizer-se, a "navegar à vista".
Mas mais do que isso: neste momento, por efeito de imposições comunitárias, os governos estão obrigados a fazer, com maior ou menor densidade, planos de médio prazo. Temos, desde logo, o Plano de Desenvolvimento Regional de que decorre o Quadro Comunitário de Apoio, por exemplo, para 94/99. Para haver um Quadro Comunitário da Apoio para 94/99, como para haver um Quadro Comunitário de Apoio para 89/93, os governos de então foram obrigados a apresentar um Plano de Desenvolvimento Regional, económico e social, às instâncias comunitárias.
Se é possível, se é necessário e obrigatório apresentar esses programas plurianuais à União Europeia, também é possível - e não se vê razão para que não seja obrigatório - apresentar um plano plurianual à Assembleia da República.
Para além disto, face ao actual quadro da união económica e monetária, os governos têm de apresentar, ainda há pouco o Governo do Partido Socialista teve de fazê-lo, à Comissão das Comunidades Europeias um plano de convergência plurianual, que, com um pouco mais de densidade - aqui, não posso dizer com um pouco menos de densidade -, pode e deve consubstanciar a apresentação de um plano plurianual à Assembleia da República.
Por isso, se é possível e obrigatória a sua apresentação às instâncias comunitárias, não vemos razão para que, por um lado, não seja possível, porque tem de sê-lo, e, por outro lado, não seja obrigatório. Não se entenderia que fosse obrigatória a sua apresentação às comunidades europeias

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e não fosse obrigatória a sua apresentação à Assembleia da República.
As grandes opções anuais e o plano anual são absolutamente necessários, porque senão o que é o Orçamento do Estado? O Orçamento do Estado, sendo um conjunto de números, tem de ser, em si próprio, um conjunto de opções de desenvolvimento económico e social.
Por conseguinte, o plano anual tem de consubstanciar essas opções, as grandes linhas de orientações e as grandes perspectivas que estão consubstanciadas em termos numéricos no Orçamento do Estado.
O que temos visto é que não têm havido planos anuais nem plurianuais. Tivemos um plano plurianual em 1977 que não chegou a ser aprovado, tivemos outro em 1989 quando foi para obter o QCA 1989/1993, e tivemos outro quando foi para obter o QCA 1994/1999. Por isso pode haver planos plurianuais em termos de legislatura.
Mas os planos anuais não têm sido apresentados pelos governos. Julgo que o problema não tem a ver com o facto de a Constituição estar errada mas, sim, com o facto de os governos não cumprirem. E houve um Sr. Deputado - de que não me recordo o nome - que disse até que o problema da discussão das grandes opções anuais perdeu toda a dignidade. E é um facto que na discussão anual do Orçamento do Estado já ninguém liga às grandes opções do plano.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Julgo que foi o Sr. Deputado Luís Marques Guedes que referiu isso.
Mas, mais uma vez, do nosso ponto de vista, o problema não é a Constituição, é a prática governativa, na medida em que as grandes opções do plano anual se transformaram em puras declarações genéricas que eventualmente até poderiam ser entendidas numas grandes opções de médio prazo, quadrianual. Mas não! O que os governos têm feito é transformar as grandes opções anuais em meras declarações de intenções genéricas que podem ser para o ano de 1992, 1993, 1994, 1998, 1999. São sempre as mesmas, mais vírgula, menos vírgula...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * São planos estratégicos!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É um problema de - e permita-se-me a expressão - "deturpação" daquilo que devem ser as grandes opções anuais e não um problema decorrente da obrigatoriedade de grandes opções anuais, porque, mais uma vez, repito, não devemos avançar numa maior governamentalização do sistema e do regime. A Assembleia deve ter uma palavra a dizer sobre as grandes opções e permita-me, Sr. Presidente, dirigindo-me directamente ao Sr. Deputado do Partido Socialista, que diga mais uma coisa para terminar em definitivo, pelo menos nesta fase.
Julgo que as propostas originárias do Partido Socialista, originárias no sentido do seu projecto de lei para esta matéria e para este epílogo, são uma boa base para se poderem fazer algumas alterações positivas no âmbito desta matéria, e não as que foram apresentadas hoje, porque essas, sinceramente, do nosso ponto de vista, não melhoram absolutamente nada, antes pelo contrário, tornam a situação excessivamente laxista, que não comporta qualquer obrigatoriedade e qualquer responsabilidade política para a Assembleia da República ou dos governos para com a Assembleia da República no âmbito da planificação.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): * Sr. Presidente, em primeiro lugar, penso que, tendo em conta o que já ficou aprovado na, salvo erro, alínea d) do artigo 80.º, relativo a um dos grandes princípios do planeamento do desenvolvimento económico e social, encontramo-nos agora no âmbito da concretização de um dos grandes princípios do planeamento do desenvolvimento económico e social. Nessa medida, tem sentido manter-se o artigo 91.º, mais ou menos como está, o que não tem quaisquer problemas de maior. Com qualquer emenda numa palavra ou outra, o artigo 91.º deve ser mantido, concretizando esse grande princípio.
Penso que era vantajoso fazermos uma síntese dos artigos 92.º, 93.º, 94.º e, nessa medida, encaminharmo-nos para um solução final do tipo daquela que agora é apresentada, "condensando o Partido Socialista".

O Sr. Presidente: * Condensando o Partido Socialista não, condensando a proposta do Partido Socialista.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): *O Sr. Deputado não entendeu que a expressão está entre aspas, mas os serviços que procedem à transcrição irão entender.
Quanto ao n.º 1 dessa proposta de síntese que refere que "os planos nacionais são elaborados de harmonia com", julgo que não se perderia nada se se dissesse que os planos eram elaborados pelo governo, mantendo-se, como deve ser, a referência a quem tem legitimidade para os elaborar.

O Sr. Presidente: * As regras de competência foram todas remetidas para os sítios próprios.

O Sr. José Magalhães (PS): * Isso decorre do artigo 202.º, alínea a), Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: * De acordo com a boa técnica constitucional, não tratamos aqui das regras de competência.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): * Mas, não vemos inconveniente em que aqui se diga claramente que "os planos nacionais são elaborados pelo governo de harmonia com as respectivas leis das grandes opções".

O Sr. Presidente: * Em sede de competência dos órgãos de soberania isso está tudo suficientemente explicitado.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): * Com certeza e as grandes opções também são aprovadas pela Assembleia da República, o que virá no artigo próprio.

O Sr. José Magalhães (PS): * No artigo 164.º, alínea h).

O Sr. Calvão da Silva (PSD): * O n.º 2 também diz o que consta do actual 93.º, n.º 2. O n.º 3 é que diz a mais e diz mal em relação ao que diz o artigo 94.º actual. E, nessa

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medida, para ficar bem deve dizer apenas o que diz o actual artigo 94.º da Constituição. Nesse sentido estaria tudo mais ou menos encaminhado para uma solução passível de consenso. A "elaboração" deve ser suprimida e deverá apenas ficar a "execução" do plano.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo, para, suponho, partilhar este espírito de consenso…

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, não vou falar de consenso nem de descenso. Se me permitem, começo por "descarregar o meu defunto", como diria Jorge Amado...
Estava a ouvir VV. Ex.as discretear tão longa e proficientemente sobre planificação…

O Sr. Presidente: - Sobre planeamento!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Desculpe, mas é sobre planificação e planos.
Estava a lembrar-me daquela desgraça que aconteceu aos teólogos de Constantinopla que discutiam acesamente qual era o sexo dos anjos e já estavam os turcos a entrar pela porta da cidade…
É evidente, e por isso se substituiu - e bem! -, no artigo 80.º, planificação por planeamento, que a função que se pede ao Estado ou a qualquer corporação pública é que tenha uma actividade regulativa permanente da condução da vida económica e social, que faça planeamento. Mas isso não tem de se traduzir necessariamente em livros, em cartilhas, em coisas que depois são tomadas como se fossem a realidade, quando o que importa não são as letras que se elaboram em instâncias doutas como esta; o que importa é a intervenção real, diária, diuturna na vida económica e social. Esta é que é a ideia básica do planeamento por contraposição à ideia da planificação.
Penso que a proposta que foi aqui apresentada no princípio da sessão pelo Partido Socialista era de excluir, depois evoluiu e hoje está mais expedita pelas obras que aqui foram sendo feitas.
A execução é que deve ser descentralizada. Nós somos uma unidade e por isso não percamos o sentido da unidade nacional! Uma das desgraças que esta geração pode deixar acontecer ao nosso País é a de perder o sentido da unidade que somos. O Estado, na sua unidade, faz parte da nossa história de liberdade e perder isto é mau.
Tem de haver um concerto geral, pois, se há eleições nacionais, sinto-me muito bem a ter de criticar o Sr. Eng.º Guterres pelas coisas que faz que eu considero erradas, porque ele foi eleito pelo povo português, mas eu também fui e por isso critico-o aqui. Isto faz parte da nossa liberdade. Se estou noutro sítio não tenho a mesma legitimação, não tenho esta possibilidade. Portanto, isto tem a ver com outra ideia que anda aqui por trás: a das regiões. Não sei se isto é andar bem no sentido da história, se é andar para trás.
Neste momento, é bom que fique aqui claro que é ao governo que compete elaborar o plano, e o governo deve ouvir toda a gente e mais uma, deve "fazer o diálogo" - como VV. Ex.as dizem - para fazer um bom plano.
O plano não é a essência, o planeamento não é o plano. O plano todos os anos muda. É evidente, como disse o Sr. Deputado Octávio Teixeira, que ninguém liga às grandes opções, nem ligará porque a vida não é um conjunto de teólogos a discutir o sexo dos anjos; é a vida propriamente dita. Ninguém liga porque aquilo não faz sentido tal como é elaborado; como é evidente, é um "acto litúrgico" a alimentar as nossas ambições de eventualmente controlarmos a realidade.
Mas não vamos sacrificar aqui muita cera por este "ruim defunto"; temos é de não perturbar o equilíbrio que, aliás, já foi resultando da evolução constitucional neste domínio. Se se deixar ficar como está, não se perde nada; se se fizer alguma obra ganha-se alguma coisa, se se for no sentido da simplificação, deixando aberta esta distinção clara que se fez agora no artigo 80.º entre a planificação e o planeamento e esta é que é uma tarefa fundamental do Estado.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Barbosa de Melo, queria só fazer-lhe a seguinte observação: o Sr. Deputado referiu-se, no n.º 3, com alguma crítica, à elaboração e à execução dos planos nacionais pelo facto de a expressão "elaboração" poder induzir alguma desagregação da prevalência da coesão nacional nessa fase de elaboração do plano. Mas, a verdade, Sr. Deputado Barbosa de Melo, é que a elaboração descentralizada como princípio, ainda por cima fundado regional e sectorialmente, já decorre do artigo 85.º, que estabelece as funções do Conselho Económico e Social, e que se reporta à participação do conselho económico e social na elaboração. E esta participação na elaboração em fase constitutiva já integra os aspectos da representação regional e sectorial no âmbito desse mesmo Conselho Económico e Social. Portanto, já existe uma elaboração descentralizada no plano institucional e com representação regional e sectorial.
Portanto, não se diga, como o Sr. Deputado Barbosa de Melo disse, que evocar a palavra "elaboração" significaria menos coesão ou até alguma subversão relativamente à prática institucionalizada pela própria Constituição em fase de elaboração dos planos.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * O Sr. Presidente interveio fazendo uma pergunta - e muito bem! - e penso que era mesmo esta a altura de discutirmos o artigo 95.º e de tentarmos perceber qual era a função real que esse artigo tem no nosso sistema. Não será uma forma envergonhada, fruste de consagrar uma segunda câmara no nosso País, onde estão representadas institucionalmente no nível central do Estado todas as parcelas territoriais do País? E quando se criou este órgão se calhar não se percebeu que uma das coisas que falta no nosso sistema é a segunda câmara que faça a integração no topo do Estado de todas as parcelas territoriais e é por faltar isso que estamos com estas dúvidas. Digo até que as minhas dúvidas sobre a regionalização têm a ver com isto.

O Sr. António Reis (PS): * Depois das regiões lá chegaremos!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Antes da regionalização, Sr. Deputado, porque essa é a inversão do processo.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

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O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, prescindo da palavra porque o Sr. Deputado Barbosa de Melo correspondeu às interrogações que tínhamos.

O Sr. Presidente: * Então, Srs. Deputados, se o Sr. Deputado Barbosa de Melo aponta para a substituição do actual Conselho Económico e Social por uma segunda câmara que actualmente a Constituição não prevê, isso significa que a função do Conselho Económico e Social, mesmo no plano das preocupações do Sr. Deputado Barbosa de Melo, é a de participar institucionalmente na elaboração e isso corresponde a uma forma de descentralização institucional.
Portanto, da resposta do Sr. Deputado Barbosa de Melo há uma confirmação da pertinência quanto ao conceito de elaboração. A questão está em saber se o PSD não a aceita nesta fase…

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, não vou fazer, como há tempos ouvi a um grande amigo meu - digo-o sem hesitação -, que berrou dizendo que não admitia interpretações das suas falas.

Risos.

Eu admito todas as interpretações possíveis.
Eu disse que precisávamos de ter coragem e visão de Estado para pegar no artigo 95.º e dar-lhe uma volta fundamental que anda como um "fantasma" desde 1975/1976 e que ninguém é capaz de agarrar. Não sei porquê, porventura por "fantasmas" ligados à câmara corporativa, mas esquecendo-se de que a Primeira República teve um Senado, que a Monarquia Constitucional tinha um Senado, etc., etc.

O Sr. Presidente: - E não devemos perder de vista que a sua primeira fórmula foi mesmo "Conselho Nacional do Plano".
Tem a palavra o Sr. Deputado António Reis.

O Sr. António Reis (PS): * Sr. Presidente, quero deixar bem claro, depois desta salutar troca de impressões e depois de várias achegas muito positivas que foram dadas em relação à nossa segunda proposta, que consideramos que no n.º 3 desta nossa segunda proposta a fórmula mais aceitável e mais correcta será: "a execução dos planos nacionais deve ser descentralizada, regional e sectorialmente", deixando cair, portanto, o termo "elaboração", pela razão simples de que este termo pode de facto ser interpretado de uma forma demasiado ampla e suscitar muitos equívocos e porque o objectivo que pretendemos - como o Sr. Presidente, aliás, reconheceu - da participação descentralizada está já assegurado no artigo 95.º Portanto, creio que por essa via podemos acertar todos o passo.

O Sr. Presidente: * O Sr. Deputado António Reis entende ser de prejudicar a possibilidade de participação futura das regiões administrativas no processo de elaboração dos planos regionais.

Risos.

O Sr. António Reis (PS): - Deixaremos isso para uma ulterior revisão constitucional.

O Sr. José Magalhães (PS): * Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: * O Sr. Deputado José Magalhães pede a palavra para uma intervenção?

O Sr. José Magalhães (PS): * Peço a palavra só para lembrar que não é intenção do Partido Socialista, segundo creio, revogar o artigo 258.º da Constituição, o qual dá às regiões administrativas não só o direito de elaborar planos regionais como de participar na elaboração dos planos previstos no artigo 92.º

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado José Magalhães, só dá razão à minha alegação de que é pena que não fique em sede de princípio geral sobre elaboração dos planos o acolhimento de uma função constitucional relevante à participação das regiões administrativas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, devido às circunstâncias, que não vou explicitar, apenas peço esclarecimentos ao Sr. Deputado Barbosa de Melo, face à sua intervenção.
Vou apenas referir-me a uma parte da sua intervenção, ao problema das grandes opções do plano. O Sr. Deputado aceita que o papel que, actualmente, do ponto de vista constitucional, é atribuído às grandes opções do plano passe a ser concedido pura e simplesmente ao programa do governo? Isto é, as perspectivas de desenvolvimento económico e social, desenvolvimento sectorial e regional equilibrado etc., ficam consubstanciados exclusivamente e só no programa do governo?

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Agradeço a sua pergunta e permita-me que esclareça o meu pensamento.
Penso que o programa do governo tem um papel importante nesse domínio, mas não é necessariamente um papel único quanto à função de planeamento do Estado. O programa do governo é um dos elementos do planeamento. O governo é obrigado a apresentar, anualmente, um orçamento, o que está correcto já que o orçamento é um indicador da execução que está a ser seguida pelo governo, das ideias constantes do programa e a lei das grandes opções ou as grandes opções do plano anuais também fazem parte desse processo.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): * Mantém-nas?!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Mantenho, mas só que digo o seguinte: desgraçadamente - passe-se o plebeísmo - ninguém lhes liga nenhuma. Trata-se de uma espécie de entretenimento de quem não tem mais nada que fazer; o governo faz umas projecções e os Deputados nem sequer perdem muito tempo com isso. Mas sempre ouvi dizer, ao longo dos cinco ou seis anos de continuidade nesta Casa, que as grandes opções do plano diziam em cada ano o que diziam as anteriores. Aliás, o Sr. Deputado há pouco disse isso mesmo. E acertou no bingo, é assim! Sempre ouvi dizer isso e correctamente.

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Mas o governo, ao repetir todos os anos essa lengalenga, ao menos lembra-se do que deve ir fazendo, embora naturalmente falhe.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, tendo em conta a evolução do debate, face a esta proposta reformulada por parte do Partido Socialista, e para avançarmos no debate, queria deixar aqui a posição do PSD.
O PSD vê com bons olhos esta nova formulação que já não padece dos problemas anteriores, sendo, de facto, um avanço relativamente ao aligeiramento desejável da Constituição. Há apenas dois aspectos que constam actualmente do texto constitucional e que nos parecem ser de manter. Nesse sentido, sugerimos ao Partido Socialista a sua contemplação.
Por um lado, existe um princípio, constante do actual artigo 92.º da Constituição, que nos parece muito importante e que tem de ver com a ideia de que os planos de desenvolvimento económico e social - nacionais, entenda-se! - devem conter orientações fundamentais para os planos regionais. Isto tem de ver com a lógica de coesão do próprio desenvolvimento harmonioso das regiões e do País enquanto tal. É por isso que no artigo 258.º se diz que as regiões têm capacidade para elaborar os seus planos e participar na elaboração dos planos nacionais. Dessa participação sairá o contributo para a definição das grandes orientações fundamentais, que, depois, no caso de existirem as regiões, terão de ser necessariamente observadas para que exista um desenvolvimento harmonioso e integrado do País.
Estou a falar das regiões constantes do artigo 258.º porque relativamente às regiões autónomas...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não queremos muitas "Madeiras" no País!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Já existe no artigo 229.º, alínea o), uma competência própria para a elaboração dos planos económicos das regiões autónomas que tem uma natureza diferente. A autonomia das regiões autónomas é diferente porque é uma autonomia política. Portanto, o contexto constitucional é diferente.
O segundo aspecto que nos parece também ser de reter relativamente ao actual texto constitucional, e que se prende também com esta mesma preocupação, tem a ver com o facto de a execução dos planos, não já a elaboração, dever ser descentralizada regional e sectorialmente, devendo manter-se aquilo que a Constituição diz, sem prejuízo da coordenação feita pelo governo. Senão podemos estar a criar aqui uma lógica desarmoniosa, com prejuízos evidentes para o esforço de desenvolvimento nacional. Se é certo que há que manter no texto constitucional, embora simplificando, a lógica de desenvolvimento económico e social com a separação de poderes entre a Assembleia e o governo e com uma estrutura hierarquizante de subordinação entre o plano nacional e o plano regional, não se podem perder de vista esses dois aspectos.
Nesse sentido, suscito ao Partido Socialista, proponente desta versão do novo artigo 92.º, que contemple estas duas preocupações que resultam já do actual texto constitucional. Com essa contemplação o Partido Social Democrata estará na disposição de votar favoravelmente a proposta que nos parece, agora sim, positiva e escorreita no sentido da modernização do texto constitucional.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Esta matéria, como se tem visto, é importante.
A questão que coloco é a seguinte: estando eu totalmente de acordo não com a perspectiva global mas com a última referência que fez ao facto de a execução dos planos dever ser descentralizada regional e sectorialmente, sem prejuízo da sua coordenação pelo governo, parto do princípio de que o facto de esta proposta do Partido Socialista não conter esta última parte não tem a ver com a possibilidade de esta coordenação poder vir a ser feita em termos da União Europeia na perspectiva das regiões.
A segunda questão é a seguinte: quando refere o problema das regiões autónomas, não havendo a mínima dúvida da minha parte de que a questão das regiões autónomas é diferente da das regiões administrativas do continente, os planos de desenvolvimento económico e social, mantendo todas as competências que as regiões autónomas têm, não devem estar enquadrados no plano de desenvolvimento económico e social nacional?
Apesar de o Sr. Deputado Marques Guedes ter referido que havia uma diferença entre os planos regionais das regiões administrativas e os das regiões autónomas, que têm os seus poderes próprios políticos, etc., apesar disso, que não ponho em causa, no âmbito do plano económico e social não deve haver também uma coordenação ou uma certa..., não quero utilizar a palavra hierarquia porque não é a correcta, mas uma adequação com o plano de desenvolvimento económico e social nacional?

O Sr. Presidente: * Tem a palavra para responder, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Quanto à primeira questão devo dizer que na reflexão que fiz não tinha ido tão longe na eventual implicação que o Sr. Deputado suscitou devido ao processo de integração europeia. Mas é evidente que, pelo menos no plano teórico, posso concordar consigo em que esse poderá vir a ser, em anos próximos, dependendo da evolução da política europeia, um problema político com o qual teremos de nos debater.
Mas não era aí que eu estava a deter-me, era mais directamente, Sr. Deputado, com toda a franqueza, no seguinte problema: o texto constitucional tem determinadas referências e quando as tiramos temos de ter a noção exacta se as tiramos porque, deliberadamente, queremos desconstitucionalizar essa matéria ou se o fazemos por algum esquecimento fortuito.
Sr. Deputado, como o texto constitucional, por natureza, não tem palavras a mais, se o legislador da revisão constitucional dele decidir retirar uma questão substantiva, como é o caso do poder de coordenação governamental, é evidente que irão ser disso retiradas ilações políticas. E isso é indesejável.
Se a consequência será no plano europeu ou não, confesso, Sr. Deputado, que não fui até aí...!

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Quanto à segunda questão que me colocou, Sr. Deputado, é evidente que os planos nacionais, como o próprio nome assinala, são para todo o território nacional.
Depois, Srs. Deputado, sendo as regiões autónomas instituições com autonomia de natureza política, a Constituição não obriga a que elas tenham planos de desenvolvimento económico e social, refere apenas planos económicos regionais. Portanto, não é por acaso que a Constituição as trata de maneira diferente. As regiões autónomas, nos termos da alínea o) do n.º 1 do artigo 229.º, têm planos económicos regionais e orçamentos regionais e participam na elaboração de planos nacionais.
Ora, se elas participam na elaboração de planos nacionais e se os planos nacionais tiverem orientações genéricas para todo o País, como as regiões autónomas são nacionais é evidente que se quiserem avançar para alguma forma de planeamento económico e social terão de respeitar os princípios orientadores dos planos nacionais em cuja elaboração elas próprias participam, porque isso está na alínea o) do artigo 229.º
O que acontece, Sr. Deputado, é que como não há um constrangimento constitucional obrigatório a que as regiões autónomas tenham planos de desenvolvimento económico e social e elas são entidades imbuídas de autonomia política, do meu ponto de vista, não há que fazer explicitamente aqui nenhuma referência a que os planos nacionais tenham de conter orientações para planos putativos de desenvolvimento económico e social nas regiões autónomas, já que eles não têm de existir. Constitucionalmente a sua existência não é obrigatória e, portanto, tudo funcionará no plano das autonomias políticas.
Por último, Sr. Deputado, é evidente que caso as regiões autónomas avancem para planos dessa natureza, para mim seria completamente inconcebível que esses planos não tivessem que respeitar, numa lógica de...

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - ... consideração pelas instâncias nacionais, aqueles que vierem ser os princípios orientadores do desenvolvimento económico e social no plano nacional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, este debate está esgotado, mas como o Sr. Deputado Barbosa de Melo insiste em intervir, tem a palavra, mas peço-lhe que seja sucinto.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, é para dizer que não acho que a expressão "conter as orientações fundamentais dos planos regionais" seja a mais adequada, porque os planos a que o actual artigo 92.º faz referência não têm a ver com planos organizados pelas regiões mas, sim, com os planos elaborados pelo Governo para o desenvolvimento da política regional. Porque o Governo não deve ter políticas regionais!… Então por que é que não se diz "a aprovar no desenvolvimento da política económica"? Porque isto é outra matéria!
O que eu quero dizer é que talvez as muitas considerações produzidas aqui não condigam com o que cá está. É que aquilo de que o País precisa não é de regiões é, sim, de políticas regionais.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sobre esta parte final pronuncio-me "precisa!"

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta a que foi atribuído o n.º 114.

Pausa.

Diálogos imperceptíveis, por terem ocorrido com o microfone fechado.

Srs. Deputados, os trabalhos estão suspensos por 5 minutos, para que possam apreciar devidamente esta proposta.

Eram 11 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 11 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta n.º 114, de fusão dos artigos 92.º , 93.º e 94.º, na qual foram introduzidas algumas alterações materiais depois da sua distribuição, de que passo a dar-vos conhecimento.
O Sr. Deputado Barbosa de Melo quer interpelar a mesa para que efeito?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, é para solicitar que no n.º 2 dessa proposta, onde se lê "As propostas de lei de grandes opções serão", passe a ler-se "As propostas de lei de grandes opções são" e que no n.º 3 se substitua "deve ser" por "é", já que, em princípio, é assim que se faz tanto nos textos legislativos como nos constitucionais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, então, precisar os textos da proposta n.º 114, cujo n.º 1 não tem alteração em relação à proposta inicialmente apresentada.
Quanto ao n.º 2, o texto final será o seguinte: "As propostas de lei de grandes opções são acompanhadas de relatórios que as fundamentem."
Quanto ao n.º 3, o seu texto será: "A execução dos planos nacionais é descentralizada, regional e sectorialmente."
Srs. Deputados, esta proposta, como vos referi, visa fundir numa única norma os artigos 92.º, 93.º e 94.º
Vamos, então, passar às votações, a partir do artigo 91.º
Sr. Deputado Marques Guedes, pede a palavra certamente para explicitar as posições quanto às propostas do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, relativamente ao artigo 91.º, na sequência de uma primeira leitura das várias propostas em referência foi deixada clara, por parte do Partido Socialista, uma posição favorável a que se acrescentasse a ideia de desenvolvimento harmonioso e integrado.
Relativamente à segunda questão, há um termo a que o Partido Socialista disse "não" e que eu desejaria retirar da nossa proposta. Assim, a seguir à expressão "justa repartição" deve ser retirado o termo "individual e regional". Como o PS disse que não, o PSD retira esta proposta, mantendo-se o texto constitucional, ou seja, "justa repartição individual e regional do produto nacional."

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Depois o PSD tinha sugerido retirar do texto a expressão "preservação do equilíbrio ecológico" e falar apenas, em termos genéricos, na preservação do ambiente. Ora, como o Partido Socialista também rejeitou essa ideia, o PSD aceita manter o actual texto, ou seja, "preservação do equilíbrio ecológico e a defesa do ambiente".
No entanto, insistimos na substituição do adjectivo "educacional" pelo "educativa", porque a política é educativa. Aliás, hoje está perfeitamente adquirido, na nossa ordem jurídica, que não há política educacional mas, sim, política educativa. Isso é já, hoje em dia, uma identificação própria.
Tiramos também, até pelas questões que foram suscitadas, o problema do povo. Mas, que fique bem claro, não há aqui qualquer parti pris contra o povo!...

O Sr. José Magalhães (PS): * É crucial!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * No entanto, mantenho o segmento final quanto à política de defesa nacional, relativamente ao qual, na primeira leitura, tinham ficado aberturas, com reservas no sentido de que a questão seria desenvolvida na segunda leitura.
Recapitulando, Sr. Presidente, de todas as propostas apresentadas pelo PSD ficariam apenas três pequenas alterações: acrescentar, a seguir à palavra "harmonioso", a palavra "integrado"; substituir "educacional" por "educativa"; acrescentar o segmento final "bem como a realização da política de defesa nacional" como um dos objectivos a seguir nos planos de desenvolvimento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então votar da seguinte maneira: em primeiro lugar quanto ao artigo 91.º...
Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Desculpe, Sr. Presidente, mas para não me acusarem de não ter formulado proposta alguma, quero também, na sequência da abertura manifestada na primeira leitura, dar adesão à proposta do Partido Comunista relativamente à defesa do mundo rural, porque, do nosso ponto de vista, o combate ao despovoamento e à desertificação decorre do desenvolvimento harmonioso e integrado. Esta é a proposta que fazemos.
Quanto à questão do segmento do mundo rural, se o PCP quiser manter autonomamente, ou, pelo menos, votar em separado as duas partes, o PSD está nessa disposição. Sugeríamos apenas que ela entrasse não onde o Partido Comunista propõe mas logo a seguir a "justa repartição individual e regional do produto nacional".

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há uma proposta do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho de eliminação do artigo 91.º, mas, verdadeiramente, o que o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho propõe é uma modificação, através do n.º 1 do seu artigo 94.º-A.
Srs. Deputados, vamos, então, votá-la em primeiro lugar.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PCP e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Era a seguinte:

Eliminado.

O Sr. Presidente: * Quanto à proposta do PS, gostava de saber se o Partido Socialista propõe o aditamento "e de desenvolvimento regional" na primeira linha da norma.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, Sr. Presidente, a proposta foi retirada.

O Sr. Presidente: - A proposta do PS está, toda ela, retirada?

O Sr. José Magalhães (PS): - Toda ela, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * E a proposta do PCP?

Pausa.

Tem a palavra, Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, mantemos a nossa proposta, mas solicitamos que, como se trata de dois aditamentos - a defesa do mundo rural e o combate ao despovoamento e desertificação -, possam ser votados em separado.

O Sr. Presidente: - E também o aditamento "e desenvolvimento regional", que era simétrico àquele que o PS agora retirou da sua própria proposta.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Certamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Como é que o Sr. Deputado quer que se vote "o desenvolvimento regional"? Com um voto autónomo? É também uma proposta de aditamento!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - De preferência, gostaria que o voto fosse a favor, Sr. Presidente, mas podíamos...

Risos gerais.

O Sr. Presidente: - Quer votar autonomamente este aditamento?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Talvez seja preferível.

O Sr. Presidente: - Vamos fazê-lo, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, em primeiro lugar, vamos votar a proposta de aditamento constante do projecto do PCP relativamente à expressão "e de desenvolvimento regional".

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, e votos a favor do PCP e do Deputado do PS Jorge Lacão.

Era a seguinte:

"Os planos de desenvolvimento económico e de desenvolvimento regional (…)".

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Reis acabou de declarar para acta que se ele tivesse votado a favor o PS tinha votado contra, ou vice-versa.

Risos

Srs. Deputados, vamos agora votar o segundo segmento da norma, que se reporta à inserção do aditamento

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"a defesa do mundo rural", apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, obteve a maioria de dois terços, tendo sido aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

"(…) terão por objectivo promover o crescimento económico, o desenvolvimento harmonioso de sectores e regiões, a justa repartição individual e regional do produto nacional, a coordenação da política económica com as políticas social, educacional e cultural, a defesa do mundo rural (…)".

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos proceder agora à votação da proposta de aditamento "e o combate ao despovoamento e desertificação", apresentada pelo PCP.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era a seguinte:

"(…) e o combate ao despovoamento e desertificação, a preservação do equilíbrio ecológico, a defesa do ambiente e a qualidade de vida do povo português".

O Sr. Presidente: * Para uma declaração de voto, tem a palavra, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o PSD votou favoravelmente a inclusão do segmento da defesa do mundo rural por esse ser um aspecto que, de há muito, faz parte do programa do Partido Social-Democrata. Portanto, é um conceito e um objectivo com o qual o Partido Social-Democrata desde sempre se identificou.
De facto, parece-nos que na economia que vamos fazer, em termos de texto constitucional, neste capítulo dos planos, faz sentido acrescentar aqui uma especificação de uma das partes mais importantes da política de desenvolvimento económico e social que o nosso país tem pela frente face aos desafios de modernização.
Votámos contra as propostas feitas no sentido de acrescentar uma referência específica ao desenvolvimento regional na consciência de que esse desenvolvimento regional, obviamente, se subsumirá, quando tenha que existir, ao conceito plano desenvolvimento económico e social. Será, pois, uma das modalidades dos planos de desenvolvimento económico e social.
Lembro que o plano de desenvolvimento regional existiu uma vez, para dar expressão a uma definição de objectivos estratégicos com vista a uma plurianualidade que decorria de um pacote de fundos estruturais negociados na nossa integração europeia e não tem, necessariamente, de se repetir sucessivamente ao longo dos anos. Sempre que isso acontecer e sempre que houver necessidade, ao abrigo da lógica dos planos de desenvolvimento económico e social qualquer governo poderá aprovar o plano de desenvolvimento regional, com esse ou com outro nome, se assim entender.
Foi apenas por essa razão que votámos contra a constitucionalização, que seria um constrangimento obrigatório que nos parece redutor.
Quanto ao problema do combate ao despovoamento e à desertificação, entendemos que ele já está integrado, mais acima, neste mesmo artigo, no conceito do desenvolvimento harmonioso de sectores e regiões, ao qual o PSD proporá, como veremos a seguir, o acrescento do conceito de desenvolvimento harmonioso e integrado.
Portanto, parece-nos que a referência específica ao despovoamento e à desertificação não se justificará e está já subsumida pelo conceito de desenvolvimento harmonioso e integrado.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a nossa votação em relação ao n.º 1, à parte inicial deste artigo, decorre do facto de esta discussão ter conduzido à conclusão de que não seria vantajoso ampliar o âmbito deste capítulo da Constituição, deste Título II (Organização económica), para nele incluir as dimensões que inicialmente tínhamos previsto, relacionadas com o chamado planeamento regional das regiões autónomas, planeamento regional das autarquias locais/regiões administrativas, ou seja, fazer aqui uma espécie de construção global e uma antologia, um tratamento integrado, das questões todas de planeamento na acepção que a Constituição tem.
Manter-se-á, assim, o sentido próprio, e de resto o originário, deste título da Constituição, mas diga-se, quanto a isto, que desenvolvimento económico e social para os efeitos do artigo 91.º inclui, obrigatoriamente, uma componente de desenvolvimento regional, uma vez que o desenvolvimento não se identifica, na letra e neste espírito da Constituição, com centralismo e inclui, obrigatoriamente, uma componente de desenvolvimento regional.
É isso que se quer dizer quando nesta norma constitucional se refere "o desenvolvimento harmonioso de sectores e regiões" - eis aqui, inequivocamente, mencionadas as regiões -, o que, deste ponto de vista, dá a esta dimensão aditiva alguma redundância, embora nela, obviamente, não houvesse demérito algum e por isso a tivéssemos proposto inicialmente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vamos agora votar…

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de fazer também uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o erro foi meu, porque não deixei votar todas as matérias relativas ao artigo 91.º e agora tenho de me conformar.
Tem, então, a palavra Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, numa breve declaração de voto quero dizer que, relativamente ao desenvolvimento regional, teremos de considerar como boa a interpretação que o Sr. Deputado José Magalhães agora fez, no sentido de que a formulação que está contém implicitamente uma menção ao desenvolvimento regional através da referência, mais adiante, ao "desenvolvimento harmonioso de sectores e regiões". Do nosso ponto de vista, nada se perdia, nada!, em explicitar esta vertente do desenvolvimento

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regional, mas é também para nós evidente que ela está implícita - aliás, não está só implícita, está mesmo explícita - através da referência aos sectores e regiões, no texto do artigo.
Em segundo lugar, quero congratular-me com a aprovação do inciso, proposto pelo PCP, de "defesa do mundo rural". Parece-nos, efectivamente, que esse é um valor que está posto em causa nos tempos que correm e que deve ser defendido e preservado.
Lamentamos que não tenha sido aprovada também a expressão "de combate ao despovoamento e desertificação", que, do nosso ponto de vista, surge como complemento da defesa do mundo rural, embora também se possa dizer que a defesa do mundo rural inclui, evidentemente, o combate ao despovoamento e desertificação, porque não quero admitir que os Srs. Deputados tivessem aprovado uma referência à defesa do mundo rural de preferência despovoado e desertificado. Mas como, de facto, não é esse o entendimento que temos, também consideramos que nada se perderia em acrescentar a expressão, na medida em que o despovoamento e a desertificação são dois problemas gravíssimos com que o mundo rural, e em geral o interior do país, tem vindo a ser confrontado. Mas congratulamo-nos com a aprovação desta referência à defesa do mundo rural.
Finalmente, Sr. Presidente, gostaríamos de nos congratular por até ao momento se ter mantido a referência à qualidade de vida do povo português, se ter mantido a referência ao povo português, o que poderá querer dizer que não é aprovado o despovoamento mas se mantém o povo, que é como quem diz, "vão-se os anéis, mas, pelo menos, ficam os dedos".

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda sobre o artigo 91.º, passamos à votação das propostas do PSD.
Temos, em primeiro lugar, uma proposta de aditamento, a seguir a "desenvolvimento harmonioso" da expressão "e integrado". É este aditamento que vamos votar.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços, tendo sido aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

"Os planos de desenvolvimento económico e social têm por objectivo promover o crescimento económico, o desenvolvimento harmonioso e integrado de sectores e regiões, (…)".

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, ainda no artigo 91.º, vamos proceder à votação da proposta de modificação de expressão "educacional" para "educativa", apresentada pelo PSD.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços, tendo sido aprovada por unanimidade, regista-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

"(…) a justa repartição do produto nacional, a coordenação da política económica com as políticas social, educativa e cultural, (…)".

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de aditamento do último segmento do artigo 91.º, apresentada pelo PSD.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, a favor do PSD e do CDS-PP, a abstenção do PCP, regista-se a ausência de Os Verdes.

Era a seguinte:

"(…) a preservação do ambiente e a qualidade de vida dos portugueses, bem como a realização da política de defesa nacional".

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados vamos passar à votação da proposta de alteração da palavra "terão" por "têm" do artigo 91.º, apresentada pelo PSD.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo sido aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

"Os planos de desenvolvimento económico e social têm por objectivo (…)".

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, há algo da proposta do PSD que não foi votado, ou seja, a eliminação…

O Sr. Presidente: - Foi retirado, Sr. Deputado.
Vamos agora a votar um artigo que substitui, por fusão, os actuais artigos 92.º, 93.º e 94.º
Parto do princípio de que quaisquer propostas existentes para estes artigos por parte do PS e do PSD são dadas por substituídas pela proposta entretanto apresentada. Assim sendo, Srs. Deputados, relativamente ao artigo 92.º, vamos votar uma proposta do Deputado Pedro Passos Coelho, relativamente ao artigo 94.º-A, n.º 2.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, posso fazer uma proposta?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, proponho que votemos todas as propostas de eliminação do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho respeitantes aos artigos 92.º, 93.º e 94.º, que é o que está em causa e o que temos de fundir nos termos da proposta do Partido Socialista já discutida.
Pela nossa parte, retirávamos tudo o que diz respeito aos artigos 92.º, 93.º e 94.º

O Sr. Presidente: - Depois sobram as propostas do Deputado Pedro Passos Coelho, que sempre teremos que votar, e evitávamos votações, Sr. Deputado José Magalhães.
Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação da proposta do n.º 2 do artigo 94.º-A, apresentada pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

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Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PCP e do CDS-PP, e a abstenção do PSD.

Era a seguinte:

2 - O Governo, de acordo com o seu Programa, submeterá anualmente à aprovação da Assembleia da República as grandes opções do desenvolvimento, bem como os respectivos relatórios de execução.

O Sr. Presidente: * As propostas do PS para o artigo 92.º foram retiradas e foram substituídas pela nova, igualmente, do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Devemos votar primeiro as propostas de eliminação que serão aprovadas e depois votam-se as do meu partido. Têm de se eliminar os actuais artigos 92.º, 93.º e 94.º E se há propostas do Deputado Pedro Passos Coelho, elas devem ser já votadas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Devem votar-se primeiro as eliminações propostas pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho e depois a proposta do Partido Socialista.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se deixassem o Presidente conduzir os trabalhos, ele ficava-vos grato.
O Sr. Deputado Pedro Passos Coelho classificou de eliminação aquilo que verdadeiramente era uma modificação a partir do artigo 94.º-A. Não posso deixar de votar as normas do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, ainda que na sua ausência.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta relativa ao n.º 3 do artigo 94.º-A, apresentada pelo Deputado Pedro Passos Coelho.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do CDS-PP, votos a favor do PCP, e a abstenção do PSD.

Era a seguinte:

3 - A proposta de lei, contendo as grandes opções do desenvolvimento, será acompanhada dos relatórios e dos estudos preparatórios que a fundamentam.

O Sr. Presidente: * Agora sim, Srs. Deputados, vamos votar aquilo que resulta da nova proposta de substituição, a eliminação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, antes de passar à votação da proposta n.º 114, e como foi declarado pelo Sr. Presidente que o PS retirou as suas propostas, gostaríamos de assumir (se for necessário podemos escrevê-la, mas isso leva mais uns minutos) a proposta inicial do Partido Socialista relativa ao artigo 92.º

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, para interpelar a mesa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Por uma questão metodológica propúnhamos que essa norma não fosse votada nesta sede, porque admitimos que, dado o enriquecimento eventual do conteúdo constitucional em matéria de planeamento das regiões administrativas, rejeitada que está a ideia de encorpar este artigo, esta matéria possa, todavia, encorpar o artigo 258.º, e portanto ser reinserida nessa sede.
Propúnhamos que esta matéria fosse remetida para o artigo 258.º e que ficasse lá pendente, qualquer que seja o seu destino.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes, para uma interpelação à mesa - embora eu ainda não tenha tido ocasião de responder à primeira.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só para recordar à mesa e ao Sr. Deputado José Magalhães que o artigo 258.º já foi votado em segunda leitura.

O Sr. José Magalhães (PS): * Em segunda leitura?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Todo o capítulo da regionalização foi votado em segunda leitura. Aliás, foi votado ainda antes de entrarmos no artigo 1.º Está nas actas da CERC.
Portanto, a intenção do Sr. Deputado terá de ser uma avocação para votação na especialidade no Plenário já que não vamos poder votar aqui na CERC o artigo 258.º novamente.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, peço que o artigo não seja votado e que seja reinserido para a sede própria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, está feita a observação.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não leve muito longe a sua posição porque, como verá, é um problema que a CERC terá de apreciar em momento próprio. Já agora lembro-lhe que inclusivamente poderá haver adaptações resultantes do acordo PS/PSD que impliquem alguma reflexão de actualização de alguns artigos já votados.
Portanto, no momento próprio, na CERC, poderemos debruçar-nos sobre isso.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira fez uma interpelação à mesa no sentido de chamar ao PCP esta norma. Mas o Sr. Deputado José Magalhães desejava mantê-la em suspenso para ser apreciada aquando da votação da matéria das regiões administrativas, ou em sede de CERC ou em sede de Plenário. O Sr. Deputado conformar-se-á com esta possibilidade?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas vejamos: se bem percebi, em termos de CERC já não haverá possibilidade de votá-la.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o que respondi ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes foi que ponderaríamos, nesse momento, em Comissão aquele que será o seu entendimento. Seja qual for, há sempre um momento ainda em que a matéria pode ser apreciada.
Face à posição do Sr. Deputado José Magalhães, peço ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, portanto, que decaia agora da sua pretensão, uma vez que a norma será ainda objecto de votação, ou em CERC ou em Plenário.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Presidente não está a garantir isso…

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães garantiu-o, Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O que o Sr. Presidente está a dizer é que, em sede do artigo 258.º, se verá se sim ou não, e põe uma hipótese; se não for, então vai para o Plenário.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, a garantia é a de que o PS não decai nesta norma e que a submeterá a votação, ou ainda na CERC ou, pelo menos, no Plenário. Portanto, o PS continua a chamar a si esta norma para ser apreciada em momento próprio, que será ou na CERC ainda ou no Plenário.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Isto é uma garantia de…?

O Sr. Presidente: * É uma garantia de que a norma não foi retirada de votação,…

O Sr. José Magalhães (PS): - A proposta não está órfã e, portanto, não está em condições de ser adoptada. Tem pai e mãe!

O Sr. Presidente: - … só não é submetida à votação neste momento. Não se transformou em res nuli.
Srs. Deputados, assim sendo, vamos passar à proposta, que implicitamente decorre da proposta n.º 114, de eliminação dos artigos 92.º, 93.º e 94.º, a benefício de um novo artigo.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, já agora, se me dá licença, é só para fazer notar que presumo que o que foi dito agora relativamente ao artigo 92.º é válido também para a proposta do PS para o 93.º, por isso queria obter uma confirmação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): * O PS mantém a proposta do 93.º, não a retira.

O Sr. Presidente: - Só um momento, Srs. Deputados. Vamos ver qual é a posição do PS.

O Sr. José Magalhães (PS): - É rigorosamente a mesma questão.
Excluída a hipótese de engordar o título do planeamento, há que nutrir o título das regiões.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Srs. Deputados.
Srs. Deputados, temos porventura que dar à votação uma outra metodologia. Antes de votarmos as eliminações, importa conhecer o destino da proposta n.º 114, que poderá ser votada autonomamente - é o que proponho -, e daí decorreria depois, como consequência, a eliminação.
Srs. Deputados, vou propor à votação a proposta n.º 114 em bloco, apresentada pelo PS e PSD, excepto se alguém pedir a votação número a número.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP, e a abstenção do CDS-PP.

É a seguinte:

1 - Os planos nacionais são elaborados de harmonia com as respectivas leis das grandes opções podendo integrar programas específicos de âmbito territorial e de natureza sectorial.
2 - As propostas de lei de grandes opções são acompanhadas de relatórios que as fundamentem.
3 - A execução dos planos nacionais é descentralizada, regional e sectorialmente.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de eliminação dos actuais artigos 92.º, 93.º e 94.º, apresentada pelo PS e pelo PSD.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP e a abstenção do CDS-PP.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de fazer uma sugestão para a redacção final do n.º 2.
Julgo que ficava muito melhor e mais consentâneo com a realidade política e legislativa se a parte final fosse assim: "são acompanhadas dos relatórios que as fundamentam". Estamos aqui a sugerir que o legislador não é pessoa de bem, que pode apresentar uma lei sem ter relatórios que a fundamente.

O Sr. Presidente: - A sugestão é acolhida pelos subscritores do PS?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, vamos ponderá-la com cuidado porque daqui pode resultar uma determinada interpretação da medida das obrigações governamentais nesta matéria que exceda aquilo que decorre da Constituição actual.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Reis para fazer uma declaração de voto.

O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, o Partido Socialista quer congratular-se com o resultado da votação da proposta que apresentou relativamente à fusão dos artigos 92.º, 93.º e 94.º num novo artigo sobre a epígrafe: "Elaboração e inserção dos planos", proposta esta que resultou de um debate extremamente profícuo aqui, em sede, de Comissão.
O Partido Socialista quer, porém, deixar bem claro que considera que esta sua proposta salvaguarda os limites materiais de revisão - a existência de planos económicos, no âmbito de uma economia mista -, simplifica saudavelmente o articulado do respectivo título constitucional sem perda do seu sentido útil e mantém a plena fidelidade aos princípios fundamentais do planeamento

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democrático, ao mesmo tempo que confere ao legislador ordinário margem de escolha acrescida para criar instrumentos de planeamento democrático adequados à complexidade crescente das funções a exercer neste campo pelos decisores públicos.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado António Reis.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata também se congratula com a fórmula que acabou por ser adoptada pela CERC. O registo da primeira leitura apontava para propostas do PSD no sentido do aligeiramento deste capítulo e deste conjunto de normas sobre os planos e a proposta inicial, aqui trazida pelo Partido Socialista, no nosso entendimento, não ia ao encontro desse aligeiramento. Mas foi possível, até de uma forma de sintetização muito feliz, substituir, de uma assentada, três artigos, que se ocupavam longamente nesta matéria, por um só com três números.
A ideia de planificação é substituída saudavelmente por uma ideia que regia a ideia do planeamento, essa, sim, mais consentânea com os nossos dias e com aquilo que se exige da intervenção do plano em matéria de economia.
Há uma flexibilização relativamente ao texto constitucional anterior; entendemos que estas fórmulas agora adoptadas dão uma maior margem aos governos para apresentarem os seus planos e aprovarem propostas de grandes opções consentâneas com os seus próprios programas que são submetidos ao eleitorado. Esta é uma ideia que a democracia e a nossa estrutura constitucional têm e devem necessariamente privilegiar. Saudamos também o desaparecimento da referência aos planos anuais e aos planos a médio prazo e pensamos que prestamos um bom serviço com esta evolução que o texto constitucional regista neste particular.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer que lamentamos esta alteração que se verificou, aquilo a que já alguns Srs. Deputados chamaram o "poupar dois artigos", na medida em que, aqui, não se trata da questão de poupar numericamente mas, sim, em termos do conteúdo. E, fundamentalmente, a questão que se coloca é a de que neste momento, com base nestas votações, existem planos de desenvolvimento económico e social, só que esses planos não serão obrigatoriamente anuais nem plurianuais; existirão se existirem, quando existirem.
Nessa perspectiva, julgo que há uma perda não apenas em termos do desenvolvimento económico e social equilibrado, sustentado e integrado do País, por falta de planeamento, mas também em termos da capacidade, do direito, do dever e do poder de intervenção da própria Assembleia da República nesta perspectiva do desenvolvimento económico e social.
Chamou-se a isto simplificação. Consideramos que nada tem de ver com a simplificação, e, aliás, mesmo que fosse esse o termo - e para nós não o é - foi-se muito além daquilo que teria ficado indiciado na primeira leitura em que alguns grupos parlamentares tinham proposto a simplificação no sentido da eliminação dos planos de médio e de longo prazos, nunca dos planos anuais. E esta noite eliminaram-se também os planos anuais, enquanto obrigatoriedade da sua representação por parte dos governos, e a participação da Assembleia da República na definição e na aprovação das grandes opções a que deveriam obedecer esses planos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, aproveito apenas para comunicar que apresentarei por escrito uma declaração de voto relativamente às votações que acabaram de ter lugar, que se integrará na acta no sítio próprio.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 95.º sobre o Conselho Económico e Social.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, interpela a Mesa para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estamos em sede de declarações de voto e não de debate sobre o que quer que seja.
Passamos adiante.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer, ao título que V. Ex.ª entenda mais adequado, que tínhamos a expectativa legítima de que as operações que foram feitas nesta sede o fossem com plena consciência dos compromissos que assumimos neste domínio.
Ou seja, quando dissemos, no que diz respeito às competências da Assembleia da República, que elas são intangíveis e serão proclamadas (como de resto já são hoje) no artigo 164.º, e, quanto às competências do Governo, que são intangíveis e são proclamadas no artigo 202.º, n.º 2, era isso exactamente que queríamos dizer. E suponho que isso não suscita alguma dúvida em termos de concretização.
A Constituição, nesta área,...

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado José Magalhães, está esclarecido.

O Sr. José Magalhães (PS): * … ao aludir às competências do Governo e da Assembleia, era redundante em relação àquilo que já consta nos artigos. Continuará a dizer exactamente o que diz hoje na Constituição.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, está esclarecido.
A título de uma cláusula de "salvação" pública, o Sr. Deputado José Magalhães usou da palavra, de modo extra-regimental, como se percebeu.
Srs. Deputados, há propostas novas para o artigo 95.º sobre o Conselho Económico e Social?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, só há uma proposta que já foi apresentada por mim no início, e digo-vos francamente que pela nossa parte não vemos que ela tenha qualquer razão para não ser votada de imediato. É a proposta que consiste em dizer que o Conselho intervém também na elaboração das grandes opções; é só isto, é

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aditar a expressão "grandes opções". Portanto, aqui ninguém dirá que se tirou da Constituição o que quer que seja, "meteu-se" "grandes opções", por conseguinte, o título seria "grandes opções entram na Constituição".
Essa proposta está apresentada e consiste em aditar a expressão "grandes opções" entre "elaboração" e "planos".

O Sr. Presidente: - É uma proposta clarificadora quanto à função consultiva do Conselho Económico e Social, com um alcance que dispensa, parece-me, quaisquer outros comentários, Srs. Deputados.
A proposta que o Sr. Deputado José Magalhães acabou de apresentar é inequívoca quanto ao seu alcance, concorde-se ou discorde-se dela.
Peço aos Srs. Deputados que cooperem para votarmos a matéria deste artigo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, primeiro, quero solicitar ao Sr. Presidente que terminemos os trabalhos, porque, de facto, hoje foi um dia esgotante.
Agora, vou pôr uma questão. Tenho à minha frente esta proposta de fazer menção à participação na elaboração das grandes opções por parte do Conselho Económico e Social, mas depois tenho uma nota de que é necessário fazer subsequentemente as adaptações em normas relativas às competências do Parlamento, do Governo e do Conselho Económico e Social.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas não agora, Sr. Deputado!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Eu, com toda a sinceridade, gostaria de ver todas estas alterações que daí decorrem com alguma calma e atenção.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas, desculpe, essa nota não tem de ver com o artigo 95.º Esse artigo tem de ver com os artigos que votámos atrás e que estão votados.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, permita-me dar um esclarecimento com uma ponderação de 30 segundos.
Este artigo 95.º não tem propostas que impliquem outro alcance ou face ao que já votámos e votado está ou face ao que haveremos de votar, por isso, não tem propostas que nos inibam neste momento de tomar posição deliberativa sobre a matéria em causa para este artigo. Acontece que é um artigo que fecha a nossa apreciação da matéria constitucional do planeamento.
Faço um apelo a que os Srs. Deputados tenham a compreensão mínima para permitirmos que esta matéria fique resolvida nesta nossa reunião.
Pergunto ao Sr. Deputado Barbosa de Melo se deseja usar da palavra tal como pareceu ser a sua intenção.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Agradeço-lhe imenso, Sr. Presidente, até porque a minha provecta idade, a distância da minha morada e o adiantado da hora, porventura, não me permitirão chegar até ao fim da discussão deste artigo 95.º
Quero apenas falar em nome pessoal, para dizer que faço uma reserva de posição quanto ao artigo 95.º E as razões por que a faço já as adiantei há pouco: este artigo resulta de alterações que foram sendo introduzidas na Constituição - julgo que é da revisão de 1989 - e, no fundo, prevê uma envergonhada segunda Câmara, visto que concede representação no Conselho Económico e Social não só às actividades económicas mas também às regiões autónomas e às autarquias locais, que é exactamente a função que tem uma segunda Câmara, que é a de representar integradamente todo o território do País.
Julgo que vai sendo tempo de abandonarmos os fantasmas e de percebermos que uma boa organização do Estado implica a existência de uma segunda Câmara, por exemplo, para realizar uma tarefa que hoje ocupou o Parlamento, isto é, a de anualmente intervir decisivamente na repartição de recursos entre o Estado e as comunidades territoriais.
É claro que também há outro aspecto que foi salientado na primeira leitura, e, estando as coisas como estão, se se vai "mexer" nisto (o Partido Socialista acaba de fazer uma proposta e há outra do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, julgo que não foi retirada), ao menos há que arranjar maneira de também no Conselho Económico e Social, pelo menos, estarem representadas as famílias. Parece que isto é uma exigência. Mas digo isto a título pessoal e devolvo a VV. Ex.as a palavra.
Agradeço-lhe muito, Sr. Presidente, a circunstância de me ter dado a palavra a esta hora.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Barbosa de Melo, não agradeça aquilo que é o exercício de um direito seu.
Srs. Deputados, não sei se já foi distribuída a proposta que o Sr. Deputado José Magalhães há pouco colocou oralmente. Em todo o caso, chamo a atenção dos Srs. Deputados para o facto de que numa primeira leitura temos para apreciar duas propostas, uma do Sr. Deputado Arménio Santos e outra do Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
Srs. Deputados, vamos passar desde já à votação destas propostas, deixando para o fim a proposta apresentada pelo Sr. Deputado José Magalhães.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de modificação do n.º 1 do artigo 95.º apresentada pelo Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, o que estamos a votar é o acrescento do inciso "do Governo"?

O Sr. Presidente: * Exactamente! O Conselho Económico e Social não é só órgão consultivo do Governo também é da Assembleia da República.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de modificação do n.º 1 do artigo 95.º apresentada pelo Sr. Deputado Arménio Santos.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PCP, votos a favor do PSD e a abstenção do CDS-PP.

Era a seguinte:

1 - O Conselho Económico e Social é o órgão de consulta do Governo e de concertação no domínio (...).

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O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta apresentada pelo Sr. Deputado Cláudio Monteiro, na parte respeitante ao aditamento das organizações representativas das famílias ao n.º 2 do artigo 95.º

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e abstenções do PS, do PCP e do CDS-PP.

Era a seguinte:

2 - A lei define a composição do Conselho Económico e Social, do qual farão parte, designadamente, representantes do Governo, das Regiões Autónomas, das autarquias locais e das organizações representativas das famílias, das actividades económicas e dos trabalhadores.

O Sr. Presidente: * Agora, vamos votar uma proposta apresentada pelo Sr. Deputado Arménio Santos, que vem classificada no projecto como n.º 3 do artigo 95.º

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: * Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para solicitar que antes de votar a proposta do Sr. Deputado Arménio Santos votemos a proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro no sentido de inverter a ordem dos factores do n.º 2 do artigo 95.º, pondo à frente as instituições Governo, regiões autónomas e autarquias, seguindo-se as instituições da sociedade civil.

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado Luís Marques Guedes. Agradeço-lhe o contributo.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta apresentada pelo Sr. Deputado Cláudio Monteiro para o n.º 2 do artigo 95.º, na parte referente à inversão da ordem de factores.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PCP, com votos a favor do PSD e a abstenção do CDS-PP.

Era a seguinte:

2 - A lei define a composição do Conselho Económico e Social, do qual farão parte, designadamente, representantes do Governo, das Regiões Autónomas, das autarquias locais e das organizações representativas das famílias, das actividades económicas e dos trabalhadores.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta apresentada pelo Deputado Arménio Santos, de modificação do actual n.º 2 do artigo 95.º, constante do n.º 3 da proposta.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PCP e do PSD e a abstenção do CDS-PP.
Era a seguinte:
3 - Do Conselho Económico e Social farão parte, designadamente, representantes das confederações sindicais, das confederações patronais e de outras organizações representativas dos diversos sectores das actividades económicas, das regiões autónomas e das autarquias locais, bem como das associações de defesa do ambiente, da família e dos consumidores, de acordo com a relevância dos interesses representados, e o governador do Banco de Portugal.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, continuando no projecto do Sr. Deputado Arménio Santos, vamos agora votar a proposta de alteração do n.º 3 do artigo 95.º, que no projecto do Sr. Deputado tem o n.º 2.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PCP, e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Era a seguinte:

2 - A lei define os casos em que a consulta ao Conselho Económico e Social é obrigatória e regula a sua composição, organização e funcionamento, bem como o estatuto dos seus membros.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos votar a proposta apresentada pelo Deputado Arménio Santos, de acréscimo de um n.º 4 ao artigo 95.º

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP e do PCP.
Era a seguinte:
4 - Os representantes do Governo têm assento no Conselho Económico e Social, sem direito a voto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para dizer que - e peço desculpa - a minha bancada cometeu um lapso, pois pensou que a votação feita anteriormente incidia sobre o novo n.º 4.

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, referia-se à alteração ao n.º 3.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, então queria só deixar para a acta esta rectificação: relativamente ao n.º 4 a posição do PSD é de abstenção e relativamente ao governador do Banco de Portugal, porque não me apercebi e pensei que estávamos a votar o n.º 4, a nossa posição não é de abstenção mas, sim, contra.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, lamento mas já está votado. Mas também, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, isso não é relevante, porque o destino da proposta…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas fica em acta, Sr. Presidente, que a posição do PSD é de abstenção relativamente à defesa do ambiente e do consumidor, mas é contra a inclusão do governador do Banco de Portugal no Conselho Económico e Social.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como não votámos segmento a segmento mas, sim, em bloco e isso é irreversível…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Pronto, Sr. Presidente, é uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, temos agora uma proposta apresentada pelo Sr. Deputado José Magalhães, no sentido de acrescer ao n.º 1 uma referência à participação do Conselho Económico e Social na elaboração também das grandes opções e dos planos.
Tem a palavra, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é só para lembrar que acabámos de votar para o novo artigo 92.º "elaboração das propostas de lei das grandes opções, dos planos de desenvolvimento económico e social". Portanto, era só para lembrar que no n.º 2 do novo artigo 92.º propusemos "propostas de lei das grandes opções". Foi essa a terminologia que utilizámos.

O Sr. Presidente: - Mas aqui não está uma classificação em razão da forma jurídica mas, sim, em razão da matéria, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. José Magalhães (PS): - E isso é prudente porque, como se vê...

O Sr. Presidente: - Era bom deixar estar o conteúdo da norma como está, porque se refere à matéria e não ao instrumento formal da formulação.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é que, mesmo tendo em conta a lei em vigor, a qual, obviamente, pode ser melhorada, há vários momentos no relacionamento entre o Conselho e esse instrumento, que depois, no fim, se chama proposta de lei das GOP. Há vários momentos: há um momento de avaliação prévia, depois há uma intervenção de firmar o seu conteúdo e, antes de haver uma proposta, como sabe, há uma anteproposta, e o Conselho deve poder intervir também em relação à anteproposta.
Portanto, não há razão para se utilizar essa terminologia. O melhor, salvo o devido respeito, é utilizar-se...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, esta proposta suscita-me uma questão de fundo, na medida em que o que está aqui proposto não é que o Conselho Económico e Social seja ouvido no anteprojecto das grandes opções; é, sim, que participe na elaboração das grandes opções apresentadas pelo Governo que hão-de vir a ser discutidas na Assembleia da República, e isto vai no sentido de aprofundar alguma dependência que se tem vindo a verificar, nos últimos tempos, de "corporativização" do regime.

O Sr. José Magalhães (PS): - Como?!…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - "Corporativização" do regime, no sentido de que o Conselho Económico e Social, ou parte dele, na apreciação que faz das leis que o Governo há-de apresentar à Assembleia da República, possa ter a ideia de que pode fazer a interpretação da lei - aliás, o documento que mandaram para cá tinha um determinado objectivo e uma determinada interpretação -, pois não é essa a função que lhe é atribuída pelo órgão legislativo.
Assim, propor-se a participação do Conselho na elaboração das grandes opções de plano, que o Governo - e só o Governo - é obrigado a apresentar à Assembleia da República, parece-nos extremamente negativo e, nesse sentido, o nosso voto será em consonância com esta análise.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, a elaboração é um processo eventualmente complexo, que apelará a outras interpretações constitucionais quanto à repartição orgânica de competências entre a função que, no plano da iniciativa, cabe ao Governo e a função que, no âmbito do acolhimento de uma proposta e do ter em conta da opinião do Conselho Económico e Social, caberá à Assembleia da República.
O processo de elaboração é complexo e envolve interdependência...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É muito complexo, sem dúvida!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * O problema é esse!…

O Sr. Presidente: - … de mais do que um órgão de soberania. Nessa medida, os Srs. Deputados querem criar aqui uma opção em matéria de repartição de competências, em sede de Conselho Económico e Social, quando nessa sede não se trata de dirimir repartição orgânica de competências entre órgãos de soberania, mas tão-só de estabelecer a função que ao Conselho Económico e Social compete, independentemente dos momentos dos outros órgãos no processo da elaboração das grandes opções do plano. E a questão é esta: ou os Srs. Deputados querem enriquecer este normativo, tornando inequívoco que a participação na elaboração do Conselho Económico e Social não é só nos planos, como instrumentos no âmbito da competência administrativa do Governo, é também nas grandes opções do plano, no momento da elaboração da lei em causa.
Se os Srs. Deputados querem enriquecer, acolherão a proposta do Sr. Deputado José Magalhães; se não quiserem, evidentemente não acolherão. Mas não vale a pena é estarem a querer dirimir questões de competência entre órgãos de soberania numa sede totalmente imprópria, que apenas se reporta às funções internas do Conselho Económico e Social.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, penso que a intervenção Sr. Deputado Octávio Teixeira, embora não a subscreva em nome do PSD, por não concordar com tudo aquilo que ele disse,...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não gosta da expressão?!…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): -... suscitou uma questão que me leva a pedir a atenção especial do Partido Socialista, porque é exactamente esse o problema.

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Vejamos: há dois momentos relativamente às grandes opções, o momento da elaboração da proposta de lei, que é da responsabilidade do Governo, ou não fosse uma proposta de lei, momento esse em que a participação do Conselho Económico e Social tem de existir; e há um segundo momento, porque a Assembleia não se limita a dizer sim ou não à proposta de lei, pode reformulá-la. A Assembleia pode reformular as grandes opções!…

O Sr. José Magalhães (PS): - Pode reformular a proposta?!…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, deixemos o Sr. Deputado Luís Marques Guedes concluir...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Pode reformular as opções!…
Portanto, se a Constituição disser apenas que o Conselho Económico e Social, conforme vem aqui proposto, participa - portanto, é um direito do Conselho - na elaboração das grandes opções, a Assembleia vai ter de ouvir o Conselho Económico e Social antes de votar. O mesmo acontece - faço esse paralelismo - com o princípio constitucional de participação, por exemplo, das organizações de trabalhadores na elaboração da legislação de trabalho, que leva a que seja perfeitamente adquirido na nossa doutrina constitucional que não basta a audição das organizações de trabalhadores por parte do Governo, como está na proposta de lei, a Assembleia tem de ouvir as organizações dos trabalhadores, mesmo que o Governo já as tenha ouvido.
Portanto, se introduzirmos aqui "elaboração da grandes opções", o Conselho tem de ser ouvido pela Assembleia da República novamente, o processo terá de ser todo reaberto, complicando-se, como toda a gente compreenderá, de uma forma perfeitamente abusiva - e, aí, entretanto a tal lógica que, do meu ponto de vista, é impensável -, que é a Assembleia… Que o Governo oiça, porque o Conselho Económico e Social é um órgão de consulta do Governo, tudo bem, mas então na elaboração da proposta de lei. Depois de o Governo formular a proposta, a Assembleia decide sozinha, sem a participação corporativa de ninguém. Só ouve alguma organização de interesse corporativo se entender útil e necessário fazê-lo, mas nunca obrigatoriamente, porque senão estaremos a cair - e aí já concordo um pouco com a preocupação do Sr. Deputado Octávio Teixeira -, num modelo político que aponta já para alguns laivos de "corporativização" na formulação das decisões.
Portanto, chamo a vossa atenção para o facto de não se tratar de uma questão de redacção mas, sim, de uma questão verdadeira, que tem de ver com a doutrina constitucional. E tanto o Sr. Presidente como o Sr. Deputado José Magalhães sabem-no bem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, é só para dizer que, neste momento, o Conselho Económico e Social já se pronuncia e dá parecer sobre a proposta das grandes opções antes de vir para a Assembleia. Dá parecer sobre a proposta, mas antes.
Isto é tudo muito complicado!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, são duas coisas muito complicadas.
O Sr. Deputado Marques Guedes quis chamar a atenção para o facto de podermos estar aqui a criar um direito de participação obrigatória na fase parlamentar de apreciação das grandes opções.
Quando chamei a atenção para o facto de se remeter apenas para o aspecto material das grandes opções, sem qualificar o instrumento da sua apresentação, foi justamente para fugir à dificuldade que decorre dos direitos de participação, que por homologia o Sr. Deputado Marques Guedes quis referir, dos trabalhadores. Só que esse direito é participar na elaboração da legislação. Se aqui falássemos na participação na elaboração da lei das grandes opções, como o Sr. Deputado Marques Guedes queria referir, então cairíamos naquele problema, por "vinculatividade" constitucional.
Falar na elaboração das grandes opções é deixar ao legislador ordinário a possibilidade de modelar ...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não, não!

O Sr. Presidente: * ... as condições dessa participação. Por isso, Sr. Deputado, tivemos a cautela que tivemos.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, aquilo que se satisfaria...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, assim peço a suspensão da votação, porque isto é uma forma inultrapassável do funcionamento da Assembleia.

O Sr. Presidente: - Se não se importa, agora tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
Como vê essa não é nada a nossa interpretação, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Por isso mesmo, peço a suspensão...

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Marques Guedes se as suas preocupações ficariam acauteladas, e neste sentido eliminadas, se fosse acrescentado ao texto que aí está o inciso "propostas".
Portanto, o que o Sr. Deputado queria era "participação na elaboração das propostas de grandes opções". Era isso?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - De "propostas" ou de "propostas de lei", para ficar claro que a Assembleia não tem de ouvir. Pode ouvir se quiser, mas não tem de ouvir.

O Sr. José Magalhães (PS): - Gostaria de aceitar isso em nome da bancada e de declarar depois o que se segue.
Primeiro, é evidente que, hoje, a Constituição já permite - aquilo que, de resto, o legislador já fez - a invenção de um processo de consulta múltipla do Conselho Económico e Social, consulta essa que, evidentemente, assenta no espírito constitucional, ou seja, não o espírito corporativo, para-corporativo ou pré-corporativo, mas o espírito próprio decorrente da instituição deste órgão, em 1989, nos termos em que aqui está consagrado e, seguramente, em

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ruptura com qualquer modelo histórico que beba noutras raízes e que tenha outro leito político-ideológico subjacente ou na infância.
O legislador já pode reinventar o sistema. Não por acaso, o Conselho Económico e Social, este ano, no seu parecer e o Sr. Deputado Henrique Neto, enquanto relator da Comissão de Economia, Finanças e Plano, tiveram a ocasião de fazer interessantes considerações sobre o muito que há a fazer para reinventar e melhorar o processo de emissão destes pareceres.. E não tenho dúvida alguma que, sem revisão constitucional alguma, é possível reinventar esse sistema. Repito, sem revisão constitucional alguma.
Se quiser, o legislador ordinário já pode hoje estabelecer que, entrada na Assembleia da República a proposta de lei das GOP, pode o Conselho Económico e Social ser consultado de novo sobre elas, chamado…

Aparte inaudível.

Obviamente que pode ser chamado a ser consultado sobre algum aspecto delas, ou sobre alguma coisa que não tenha sido contemplada nelas. A Assembleia é soberana e quando a Constituição disser, como diz agora e diria nesta proposta, "e participação na elaboração dos planos", quer dizer só isto. Não quer dizer co-decisão, não quer dizer conjugação de decisões, não quer dizer igualdade de estatuto constitucional; quer dizer que um órgão, um órgão soberano, se socorre de outro órgão, um órgão consultivo, e este é o espírito da nossa Constituição e, seguramente, não é o espírito de textos anteriores.
Sr. Presidente, se a dúvida dos Srs. Deputados é essa e tão-só essa, acrescentar "elaboração das propostas grandes opções" não desfigura, em nada, o nosso espírito e o alcance da nossa proposta, até porque o Governo vai ter depois, uma vez que a Constituição assegura ao Conselho o direito de participar na elaboração dos planos...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Isso é uma proposta construtiva...

O Sr. Presidente: Sr. Deputado Luís Marques Guedes, deixe o Sr. Deputado José Magalhães concluir.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Eu estou só a chamar a atenção para…

O Sr. Presidente: O Sr. Deputado José Magalhães resolve, em sede de interpretação autêntica e com a fórmula constitucional, uma dúvida que, do nosso de ponto de vista, não tinha suficiente razão de ser mas que fica clarificada.
Já agora, proponho ao Sr. Deputado José Magalhães o seguinte: na medida em que se admite o inciso das propostas de grandes opções, o que a leitura subsequente não pode permitir é "e dos planos de desenvolvimento", na ideia com que se poderia ficar de que também os planos eram reportados a propostas. Como não é esse o caso, então a adaptação semântica…

Aparte inaudível do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

O Sr. Deputado Luís Marques Guedes agora não percebeu. É por isso mesmo, é porque não faria sentido estar "propostas", exactamente porque são do Governo. Portanto, "bem como dos planos" resolve o problema no sentido que acabou de referir.
Assim, Srs. Deputados a redacção que se propõe é a seguinte: "A elaboração das propostas de grandes opções, bem como dos planos (…)".
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta do n.º 1 do artigo 95.º apresentada pelo PS.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP e a abstenção do CDS-PP.

Era a seguinte:

1 - O Conselho Económico e Social é o órgão de consulta e concertação no domínio das políticas económica e social, participa na elaboração das propostas de grandes opções e dos planos de (…)

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, peço apenas um minuto mais da vossa paciência para dizer que teremos uma próxima reunião na próxima terça-feira, às 10 horas.
Srs. Deputados, chegámos ao final dos nossos trabalhos de hoje, com algum atraso relativamente à planificação feita inicialmente para esta proposta. Assim, pergunto: os Srs. Deputados admitem a possibilidade de fazer uma reunião na segunda-feira à tarde?

Pausa.

Vejo, pela vossa expressão, que não admitem.
Nestes termos, Srs. Deputados, na terça-feira, às 10 horas da manhã, reuniremos para apreciar do artigo 96.º, inclusive, até ao artigo 107.º Veremos se será possível fazê-lo durante a parte da manhã.
Da parte da tarde ponderaremos os artigos seguintes.
Srs. Deputados, estão encerrados os nossos trabalhos.

Eram 0 horas e 40 minutos do dia seguinte.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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Sábado, 19 de Julho de 1997 I Série - Número 98

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE JULHO DE 1997

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 12 horas e 15 minutos.
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 124/VII -Estabelece o regime fiscal específico das sociedades desportivas (Lei n.º 1/90, de 13 de Janeiro, na redacção dada pela Lei n.º 19/96, de 25 de Junho), previsto no Decreto-Lei n.º 67/97, de 3 de Abril -, sobre a qual se pronunciaram, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (António Carlos dos Santos), os Srs. Deputados Castro de Almeida (PSD), Jorge Ferreira (CDS-PP), António Filipe (PCP), Pedro Baptista (PS) e João Carlos Silva (PS).
A Câmara apreciou igualmente o projecto de lei n.º 389/VII - Alteração da Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (PS e PSD) -, que foi aprovado na generalidade, na especialidade e em votação final global. Intervieram na discussão os Srs. Deputados José Magalhães (PS), Luís Queiró (CDS-PP), Luís Marques Guedes (PSD) e António Filipe (PCP).
Prosseguiu o debate da revisão constitucional (artigos 67.º a 95.º).
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Paulo Mendo (PSD), Cláudio Monteiro (PS), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), José Magalhães (PS), Odete Santos (PCP), António Rodrigues e Fernanda Mota Pinto (PSD), Isabel Castro (Os Verdes), Sérgio Vieira (PSD), Bernardino Soares (PCP), Jorge Lacão (PS), Carlos Coelho (PSD), José Calçada (PCP), Fernando Pereira Marques (PS), Jorge Ferreira (CDS-PP), João Corregedor da Fonseca (PCP), Castro de Almeida (PSD), António Filipe (PCP), Manuel Frexes e Manuela Aguiar (PSD), Vieira de Castro (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS), António Galvão Lucas (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Francisco Torres (PSD), Henrique Neto e Rui Namorado (PS) e Manuela Ferreira Leite (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a reunião.

Eram 12 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António Rui Esteves Solheiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Areias Fontes.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Soares Gomes.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.

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Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custodio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.

Sousa Moutinho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia. Isabel Maria de Almeida e Castro.

Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao primeiro ponto da ordem de trabalhos de hoje, a discussão da proposta de lei n.º 124/VII - Estabelece o regime fiscal específico das sociedades desportivas (Lei n.º I/90, de 13 de Janeiro, na redacção dada pela Lei n.º 19/96, de 25 de Junho) previsto no Decreto-Lei n.º 67/97, de 3 de Abril.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, para uma intervenção.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (António Carlos dos Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei de Bases do Sistema Desportivo dispõe que, por diploma legal adequado, serão estabelecidos os tenros em que os clubes desportivos ou as suas equipas profissionais que participem em competições desportivas de natureza profissional poderão adoptar a forma de sociedade desportiva com fins lucrativos.
Como consequência, foi publicado, em 3 de Abril de 1997, o Decreto-Lei n.º 67/97, que estabelece o regime jurídico das sociedades desportivas. A criação e desenvolvimento destas sociedades é um objectivo do XIII Governo constitucional, tal como consta no respectivo Programa. É desejável que os clubes desportivos profissionais optem por assumir o estatuto de sociedade desportiva pois, como revelam as experiências estrangeiras, é esta a forma mais adequada para a dinamização do desporto profissional.
Face à necessidade de fomentar esta opção e, simultaneamente, de ter em conta as especificidades que as distinguem das demais sociedades comerciais, havia que estabelecer um regime fiscal específico.
Este regime, quanto à consideração como custos ou perdas do exercício, para efeitos de IRC, da totalidade das importâncias concedidas ao clube originário que goze do estatuto de utilidade pública, desde que as mesmas sejam investidas em instalações ou em formação desportiva, foi

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parcialmente instituído pelo citado Decreto-Lei n.º 67/97, de 3 de Abril. E é agora complementado com a presente proposta de lei.
As preocupações subjacentes a este regime fiscal foram, por um lado, a de dar conta da especificidade da própria actividade desportiva (bem patente, por exemplo, no plano fiscal no que se refere ao período de tributação da actividade ou na figura dos designados "passes" dos jogadores, os quais não têm equivalência em qualquer outro sector de actividade económica) e, por outro, a de equiparar as sociedades desportivas, provenientes de associações, a
outras sociedades cuja reorganização resulte de sociedades, uma vez que havia dúvidas quanto à aplicação directa à transformação dos clubes do Decreto-Lei n.º 404/90.
As principais questões tratadas nesta proposta de lei dizem respeito ao regime das amortizações, ao regime da tributação das mais-valias, às regras Fiscais aplicáveis às operações de transformação de clubes em sociedades desportivas e ao regime de responsabilidade pelas dívidas fiscais e à segurança social do clube originário.
Quanto ao regime das amortizações, define-se de forma expressa o direito de contratação dos jogadores profissionais, vulgarmente designado por "passe", como elemento do activo imobilizado incorpóreo. Esta é a solução de vários outros Estados membros da Comunidade.
O método de cálculo das amortizações é o das quotas constantes, sendo as taxas determinadas em função da duração do contrato.
Para este efeito, levar-se-ão em conta as quantias pagas pela sociedade desportiva ao clube originário, ao próprio jogador e a outras entidades.
Quanto ao regime das mais-valias, consagrou-se a solução equivalente à do artigo 44.º do Código do IRC, nomeadamente quanto à questão dos "passes", o que
significa um diferimento da tributação resultante da sua transmissão onerosa, desde que haja reinvestimento dentro do prazo de três anos. A título de exemplo, se uma sociedade desportiva adquire o direito de contratação de
um jogador em determinado ano por 100 000 contos e se o vende depois por 200 000, gera-se uma mais-valia de 100 000 contos. Se não houver reinvestimento, ocorre a tributação imediata; se houver reinvestimento, há diferimento da tributação, como sucede com as outras empresas.
No entanto, como a mais-valia apurada vai ser posteriormente deduzida ao custo de aquisição de novo direito de contratação ou ao custo de aquisição de um bem
do activo corpóreo, o valor a amortizar será inferior, pelo que a tributação vai ocorrendo ao longo dos exercícios.
Quanto à reestruturação dos clubes em sociedades desportivas, este diploma consagra no essencial as mesmas soluções do Decreto-Lei n.º 404/90, isto é, a isenção de sisa, selo e emolumentos e outros encargos legais, a exemplo do que, na prática, já hoje acontece com as reestruturações de outras sectores de actividade.
Por outro lado, desde que haja certificação por revisor oficial de contas, concede-se a possibilidade de reavaliação dos bens do activo a transmitir, uma vez que os valores que os clubes têm hoje se encontram totalmente desajustados da realidade, ao mesmo tempo que se consagra a neutralidade fiscal quanto à sua transmissão.
Porém, à semelhança do que acontece com outras empresas, não se aceita como custo fiscal 40% do aumento das amortizações anuais resultantes da reavaliação.
Consagra-se, finalmente, o regime da responsabilidade pelas dívidas ao fisco e à segurança social dos clubes originários, como forma de se evitarem situações de incumprimento por parte das sociedades desportivas
Este é, pois, o regime fiscal das futuras sociedades desportivas ora proposto.
Quanto a nós, ele é essencial, não só para o apoio à competitividade, interna e externa, do desporto profissional, actividade economicamente relevante em si mesma e pelos efeitos positivos que induz noutras actividades, desde os transportes, ao turismo e à comunicação social.
Há, no entanto, que ser claro. Isto representa uma responsabilidade para o Estado, para os clubes e para as futuras sociedades desportivas.
No que toca às questões fiscais, o Governo assumi-las-á integralmente. Significa isto que o incumprimento das obrigações fiscais levadas a cabo pelas futuras sociedades desportivas, tal como o incumprimento das obrigações fiscais existente actualmente para os clubes, originará da parte do fisco as necessárias reacções. Estas não se traduzirão certamente em execuções com penhoras de estádio mas em execuções com penhoras de receitas de jogos, de receitas de publicidade, de bens com valor de mercado, nomeadamente imóveis, e em outras formas de pagamento susceptíveis de avaliação.
Tudo isto será feito com rigor, com coragem e sem discriminação em relação aos restantes contribuintes.

(O Orador reviu).

O Sr. Presidente: - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Castro de Almeida e Jorge Ferreira.

Tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar, julgo que se impõe que esclareça Assembleia quanto à razão de ser do atraso na apresentação desta proposta de lei que estabelece o regime fiscal das sociedades desportivas.

Com efeito, no dia 31 de Julho, que é já daqui a 15 dias, inicia-se um novo período fixado pelo Governo para o regime de responsabilização dos clubes desportivos ou das sociedades desportivas e, a cumprirem-se os prazos regimentais da Assembleia da República, naquela data esta proposta de lei não estará aprovada ou sequer votada. Quer isto dizer que, para se constituírem em sociedades desportivas, os clubes desportivos não sabem " com que linhas podem coser-se" em matéria fiscal. O Governo há-de ter uma boa razão para só agora, tardiamente, ter apresentado esta proposta.

Por outro lado, gostava de colocar-lhe uma outra questão.

Na Lei de Bases do Sistema Desportivo, que foi revista nesta Assembleia em 1996, foi incluída uma norma que tinha sido proposta pelo PSD, que creio ter tido a aprovação de todos os grupos parlamentares, segundo a

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qual, mediante diploma legal adequado, poderão ser isentos de IRC os lucros das sociedades desportivas que sejam investidos em instalações ou em formação desportiva no clube originário. É esta a norma que consta da lei de bases e que vai no sentido de permitir a isenção de IRC relativamente aos lucros que sejam investidos em instalações desportivas ou em formação desportiva no clube originário.
Em execução desta norma da lei de bases, o Governo aprovou, em sede do decreto-lei que define o regime das sociedades desportivas, uma outra regra que estipula que são consideradas custos ou perdas do exercício as importâncias concedidas ao clube originário que goze do estatuto de utilidade pública desde que as mesmas sejam investidas em instalações ou em formação desportiva. Isto é, Sr. Secretário de Estado, há uma redução do âmbito da norma que consta da lei de bases quando o Governo faz a sua aplicação em sede de sociedades desportivas, ou seja, a regulamentação do Governo é mais restritiva do que a lei aprovada na Assembleia.
Assim, Sr. Secretário de Estado, pergunto-lhe porquê esta redução do alcance da norma que está contida na lei de bases. Por que razão é o Governo mais restritivo do que foi a Assembleia da República no tratamento dos lucros que forem investidos em instalações desportivas ou em formação desportiva no clube originário?

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, quer responder já ou no fim?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, em primeiro lugar, gostaria de agradecer a resposta do Governo que hoje me foi entregue relativamente a um dos requerimentos que formulei oportunamente sobre a situação actual do cumprimento dos planos de regularização de dívidas fiscais e à segurança social por parte dos clubes de futebol, resposta essa em que me congratulo por ler que, no que se refere ao eventual incumprimento dos pagamentos, "na presente data não se detecta a existência de situações de incumprimento, a não ser num caso pontual". Congratulo-me com esta resposta porque significa que alei está a ser cumprida, que este grupo de contribuintes está a cumpri-la, embora estranhe que hoje mesmo volte a noticiar-se na imprensa especializada situações de incumprimento por parte de alguns clubes e todos tenhamos presente que, na semana passada - também a fazer fé nas notícias da comunicação social -, um clube coreu a pagar uma prestação que, anteriormente, disse não dever. Portanto, continua, de facto, a haver pelo menos uma história mal contada, que, até prova em contrário, acreditamos que esteja bem contada por parte do Governo. Mas, confiando na comunicação social, que parece ser mais eficaz do que as instituições na detecção destas matérias, se a história estiver de facto mal contada, brevemente ficará a saber-se por quem e como.
Passo agora à pergunta que queria fazer ao Sr. Secretário de Estado.
O meu grupo parlamentar apresentou na Mesa uma proposta de alteração à proposta de lei que estamos a discutir no sentido de incluir uma norma transitória na eventual futura lei, a fim de impedir que os clubes possam optar pelo modelo das sociedades desportivas caso não tenham a sua situação tributária regularizada, entendendo-se por "situação tributária regularizada" ou a inexistência de dívidas ou o cumprimento pontual de plano de regularização de dívidas que tenham acordado com o Estado. Assim, Sr. Secretário de Estado, a minha pergunta é a seguinte: qual é a posição do Governo sobre esta proposta que apresentamos?
Faço esta pergunta porque da posição do Governo sobre esta proposta dependerá, afinal, a posição do grupo parlamentar do meu partido sobre esta proposta de lei.
Para nós, é muito importante que a vida nova no futebol não comece com vícios velhos e que não se criem por lei sociedades desportivas com fins lucrativos que possam iniciar a respectiva actividade com capital negativo. Portanto, quer-nos parecer que uma norma do tipo da que propomos é essencial para consagrar definitivamente, neste caso concreto em matéria fiscal, uma nova era de transparência e legalidade em matéria de futebol profissional e de sociedades desportivas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Sr. Presidente, quanto à primeira questão, respondo que creio que estamos em devido tempo. Ou seja, se esta proposta de lei vier a ser aprovada hoje, como esperamos, tal significa que passa a ter existência legal e que, portanto, não vai ser alterada. Ora, tendo existência legal, a publicação é uma mera condição de eficácia mas não exime a lei de já ter existência. Portanto, as futuras sociedades desportivas poderão confiar no Parlamento e no Governo quanto à decisão tomada, pois penso que todos nós somos pessoas de bem.
Em segundo lugar, o que diz a lei de bases é que os lucros podem ser isentos de IRC e o Decreto-Lei n.º 67/97 considerou como custos tais importâncias na totalidade, o que é o mesmo. É uma outra forma técnica de dar conteúdo à isenção, até porque, como deve saber, desde a abolição da contribuição industrial, não existe no sistema fiscal português a figura da dedução dos lucros reinvestidos.
Por outro lado, os lucros só são isentos em função de um determinado objectivo. Portanto, esta é a forma técnica que se encontrou e que equivale à outra em relação a esta questão.
Quanto ao problema invocado pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira, creio que há duas cosias a esclarecer.
Começando pela questão do cumprimento ou não de obrigações fiscais relativas ao Plano Mateus, creio que se tem gerado alguma confusão em relação a estas questões e é importante esclarecer alguns aspectos. O decreto-lei que viabiliza um plano extraordinário de regularização de dívidas fiscais diz que só se aplica às dívidas que estão

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constituídas até 31 de Julho de 1996. Quer isto dizer que, posteriormente a 31 de Julho de 1996, todas as dívidas estão submetidas ao regime normal, nunca se lhes aplicando o chamado Plano Mateus.
Questão diversa desta é a de saber se os contribuintes em geral e, neste caso, também os clubes, podem ou não aderir ao Plano Mateus havendo dívidas fiscais posteriores a 31 de Julho de 1996. A resposta é: não podem! Trata-se de uma condição de acesso, um requisito necessário para que a adesão se verifique.
Agora, a adesão não se cumpre no momento da entrega do requerimento, porque este tem de ser apreciado. E o que se passa é que, de facto - lamentamos esse aspecto, mas as coisas são mesmo assim -, houve uma série de transformações legais no final do ano, designadamente a necessidade de fechar os processos abrangidos pelo anterior plano de regularização de dívidas que estava em curso. de reformular todo o esquema informático de cálculos dos juros por força das novas determinações legais e, sobretudo, de encontrar esquemas, mais ou menos expeditos, de avaliação de todas as formas de pagamento que são feitas em dação em cumprimento, e algumas são bem complexas.
Tal significa que temos de distinguir duas situações.
Por um lado, todos os clubes que pagaram a pronto as dívidas anteriores e, em todos eles, houve contribuintes que entraram em regimes prestacionais, ao abrigo do plano de regularização de dívidas. Em relação a esta situação a resposta é clara: aí, na questão dos clubes, temos apenas uma situação de atraso detectada, relativamente recente, na ordem dos 3000 contos, de um clube de divisão secundária.
Questão diversa desta é a de saber se os clubes e os contribuintes, porque esta situação não é específica dos clubes, enquanto estão à espera de uma decisão final, estão ou não em situação de incumprimento. Ora bem, isso só se afere, na prática, no momento em que o pedido de adesão seja despachado... Mas uma vez que o plano de informática já começou a funcionar, contamos apressar esta questão, que em alguns clubes está dependente da avaliação do Totobola. Já agora, informo que o concurso que foi aberto há pouco tempo ficou deserto, pelo que estamos a procurar encontrar uma solução por via do ajuste directo.

O Sr. Presidente: - Agradeço, que abrevie, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Mas, dizia, resolvida esta questão, os clubes serão notificados e, no momento e na forma da notificação, constará esse requisito, isto é, o de terem, necessariamente, todas as dívidas regularizadas até essa altura. Até essa altura, são-lhes aplicados os acréscimos legais, os juros e as coimas, o que é diferente da situação de todos aqueles que têm, normalmente, cumprido no sentido clássico do termo, ou seja, pago regularmente todo o tipo de prestações.
Quanto à proposta do PP, nada temos a opor, somos mesmo favoráveis a ela, pois entendo que é, de facto, um bom contributo e um elemento esclarecedor do futuro regime das sociedades desportivas.
(O Orador reviu).

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Lamento não poder estar tão tranquilo quanto o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais no que respeita à data da entrada em vigor da proposta de lei que agora estamos a debater. Se cumprirmos os prazos regimentais habituais, este diploma' há-de ser votado, na generalidade, na próxima semana, baixando então à comissão respectiva, para discussão e votação na especialidade, o que só poderá acontecer na próxima sessão legislativa. E só então poderá ser feita a votação final global em Plenário, isto é, algures em Outubro ou Novembro.
Ora, esta calendarização é incompatível com a data de 31 de Julho que o Governo fixou aos clubes para a clarificação do regime de responsabilização dos seus dirigentes.
Posto isto, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr. Secretário de Estado, penso que se impõe, da parte do Parlamento, um procedimento mais ágil, de forma a tudo fazermos para que esta lei esteja, pelo menos, votada até ao dia 31 de Julho. Não há-de estar publicada no Diário da República, com toda a certeza, mas, pelo menos, os clubes podem conhecer antecipadamente as regras que, do ponto de vista fiscal, vão regular as sociedades, no caso de as constituírem.
Nesse sentido, penso que se justificaria, durante a próxima semana, constituir um grupo de trabalho, constituído por Deputados dos diversos partidos, para elaborar uma versão final desta proposta de lei. Assim, na próxima semana, quando ela for votada, na generalidade, também poderá sê-lo na especialidade e em votação final global. Não ganharemos tudo em certeza jurídica. mas ganharemos uma parte importante, na medida em que os clubes podem ficar a conhecer o texto votado na Assembleia da República, em definitivo.
Tudo isto. Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque consideramos que é fundamental a existência das sociedades desportivas, assim como de um regime especial que as regule do ponto de vista fiscal. Aliás, todos conhecem o empenho que o PSD, enquanto governo, dedicou a esta matéria.
Em 1995, foi publicado um decreto-lei que determinou o regime jurídico das sociedades desportivas, decreto-lei esse que tinha uma lacuna grave, que, na altura, o próprio governo do PSD reconheceu, a de não permitir a distribuição de lucros. A tal impedia a anterior redacção da lei de bases.
Em 1997, o Governo socialista aprovou uma nova lei, prevendo já a possibilidade de distribuição de lucros, com a qual nos congratulamos, embora na nova versão da proposta do Governo, aprovada nesta Assembleia, se tenham introduzido outras graves desvantagens relativamente à lei anterior. Pensamos, por isso, que a lei actual é pior do que a lei anterior, mas é a lei que está em vigor e, apesar de tudo, é melhor do que nenhuma.
Da mesma forma que consideramos que se justifica um regime próprio para as sociedades desportivas que as distinga das sociedades comerciais em geral, também se

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justifica um regime fiscal próprio. Damos, por isso, inteiro acordo aos princípios gerais desta proposta do Governo.
Em primeiro lugar, no que respeita à procura de neutralidade fiscal da opção que os clubes façam, constituindo ou não uma sociedade desportiva, parece-nos desejável que não seja por razões fiscais que os clubes deixem de se constituir, de se transformar ou de criar sociedades desportivas e, nessa medida, estamos de acordo com a proposta do Governo.
Em segundo lugar, concordámos com a sugestão aqui apresentada pelo CDS-PP, mas parece-nos que esta lei precisará ainda de algum ajustamento, de forma a melhorar e clarificar a redacção do actual artigo 24.º do Regime Jurídico das Sociedades Desportivas, transpondo para a lei do regime fiscal das sociedades a norma de benefício fiscal que está prevista no Regime Jurídico das Sociedades Desportivas. Desde logo, por razões de sistemática e de melhor arrumação, mas também para clarificar o alcance da norma, justifica-se fazer uma melhoria do texto na especialidade. Para tanto, o PSD propõe-se participar e colaborar activamente no grupo que, há pouco, informalmente propus.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria referir que, do nosso ponto de vista, este regime fiscal novo vai ter de ser acompanhado pelo Governo com um cuidado especial, uma vez que se trata de um regime novo, sem tradição em Portugal. Sabemos como a sociedade portuguesa está atenta às questões fiscais que dizem respeito aos clubes desportivos e é importante que se credibilizem as sociedades desportivas do ponto de vista fiscal.
Vamos, por isso, recomendar ao Governo um acompanhamento, muito particular e muito cuidado, do cumprimento desta lei em que todos vamos participar. Admitindo que ela possa não ser perfeita, vamos procurar assegurar condições para que tenha eficácia, para que os clubes se credibilizem, também por este lado e para que as sociedades desportivas acabem por conseguir levar à prática os objectivos para que foram criadas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar do PS, queria informar estamos abertos a que esta proposta de lei, para além de ser votada na generalidade, como é normal, também possa ser votada na especialidade, desde que se constitua o tal grupo de trabalho, integrado por elementos dos vários partidos, para se clarificarem as posições - e não, necessariamente, chegar a um texto uno e unânime -, as convergências e as divergências, de modo a que a votação na especialidade possa ter lugar na próxima quinta-feira, em Plenário.
Se assim for feito, estamos de acordo, pelas razões expostas e outras que serão desenvolvidas, que se proceda, conjuntamente, à sua votação na generalidade, na especialidade e final global, na próxima quinta-feira.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tudo se resume a um problema de vontade política dos partidos. Se houver vontade política, tudo é possível, quer a discussão na especialidade antes da própria votação na generalidade, quer a discussão na especialidade imediatamente após a aprovação na generalidade, porque ainda há tempo para se fazer a votação na especialidade e final global deste diploma.
Agora, o que é preciso é fazê-la antes do encerramento desta sessão legislativa, porque a sua promulgação e publicação será tão rápida quanto for necessário.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação é sobre o mesmo assunto e vai no seguinte sentido: neste momento, estão pendentes para discussão, em sede de comissão, propostas de alteração ao Regime Jurídico das Sociedades Desportivas. Por isso, creio que é da mais elementar lógica que esse consenso, que visa criar um grupo de trabalho que antecipe, de alguma forma, a discussão na especialidade desta proposta de lei, seja acompanhado ou inclua, também, a apreciação dessas propostas, até porque esta proposta de lei também contém propostas de alteração ao Regime Jurídico das Sociedades Desportivas.
Naturalmente, faremos depender o consenso para a constituição do grupo de trabalho da incumbência, a esse mesmo grupo, da apreciação das propostas que estão em comissão sobre a mesma matéria. Não faria, pois, sentido que fôssemos discutir umas propostas e não outras sobre o mesmo regime jurídico.

O Sr. Presidente: - Os vários grupos parlamentares concertar-se-ão no sentido de não impedir a eficácia da urgência que se impõe.
O Sr. Deputado Castro de Almeida pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Para uma interpelação, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, penso que faz todo o sentido a clarificação que o Sr. Deputado António Filipe acaba de introduzir. De facto, era desejável que no dia 31 de Julho, já que não podem estar publicados os textos, pelo menos estivesse estabilizado tudo o que diz respeito quer ao Regime Jurídico das Sociedades Desportivas quer ao seu regime fiscal, para que os clubes possam conhecer, definitivamente, os textos da Assembleia da República.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Mais uma vez o Governo atrasou-se - e a Assembleia tem de correr!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os partidos concertarão, tal como entenderem, as suas vontades.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Castro de Almeida, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Baptista.

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Como o PSD já não dispõe de tempo, o PS concede-lhe 1 minuto para que possa responder.

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Castro de Almeida, em relação ao que disse, há um ponto que não pode passar em claro. V. Ex.ª veio aqui. reiterar uma tese que tem tentado difundir: a de que, no passado, não teve condições para criar as sociedades desportivas que ora se criam. Fez uma tentativa mas, enfim, não conseguiu!
Por razões mais ou menos teológicas e metafísicas, V. Ex.ª não teria conseguido esse objectivo, embora tivesse tido a melhor das intenções... Ora, é bom que fique aqui claro, nesta Câmara, que o PSD esteve no governo durante 10 anos com maioria absoluta e beneficiou de todas as condições para alterar a lei de bases, de forma a propiciar a criação de sociedades desportivas vivas, mas não o fez. Contudo, o PS, em seis meses, sem maioria absoluta, conseguiu fazer aquilo que VV. Ex.as, em 10 anos, não conseguiram, com maioria absoluta!
Posto isto, Sr. Deputado Castro de Almeida, as sociedades desportivas constituídas por V. Ex.ª não previam absolutamente nada e eram, exactamente, um nado-morto, ou seja, por outras palavras; V. Ex.ª não fez nada ou, melhor ainda, fez que fez mas não fez!

Vozes do PS: - Muito bem!

Risos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida. Dispõe de 1 minuto para o efeito.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, não me atrevo a agradecer a "generosidade desse minuto"!
Sr. Deputado Pedro Baptista, não sei se está a interpelar o Governo, o ex-governo ou o Grupo parlamentar do PSD! V. Ex.ª diz que o PSD, no passado, não criou as sociedades desportivas e eu espero que o PS, no presente, também não as crie, porque quem as vai criar são os clubes desportivos! Espero que o Governo não crie sociedades desportivas, porque não é o Governo nem a Assembleia da República que criam as sociedades desportivas mas, sim, os clubes.

Risos.

O Sr. Deputado disse também que o PS fez em seis meses... Fez o quê? Sociedades desportivas? Nem o decreto das sociedades desportivas se fez em seis meses, quanto mais as sociedades!...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Sr. Deputado Pedro Baptista, aquilo que os governos têm de fazer - e o Governo do PSD fê-lo - é criar o regime jurídico que permita aos clubes criarem ou transformarem-se em sociedades desportivas. E com o nosso decreto-lei. Sr. Deputado, os clubes que quisessem faziam-no, os que não quisessem não o faziam. 0 vosso decreto-lei é muito mais intromissivo na vida dos clubes porque, na prática. obriga-os a fazê-lo. Nós fomos muito mais condescendentes com o património histórico e o regime societário dos clubes desportivos,...

Protestos do PS.

... porque considerámos, Sr. Deputado, que os clubes são autónomos para decidirem se querem ou não transformar-se em sociedades.

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Não é resposta que se dê!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Sobre o regime fiscal propriamente dito, que nos é hoje proposto, não temos grande coisa a dizer. Naturalmente, é óbvio que o regime jurídico das sociedades desportivas deve ser acompanhado de um regime Fiscal específico e, portanto, não temos particulares objecções a esse regime.
De qualquer forma, importa ainda dizer algo sobre esta matéria e. em primeiro lugar, importa dizer que a solução por que o Governo optou, em matéria de sociedades desportivas, foi um modelo de imposição prática de constituição de sociedades.
O Sr. Secretário de Estado, há pouco, referiu o exemplo de outros países nesta matéria. Creio que, nesse domínio, há que pôr um pouco de "água na fervura", porque, de facto, é verdade que o modelo de imposição de criação de sociedades desportivas não é uma originalidade portuguesa, mas é um modelo que se restringe aos países da Europa do sul. É um modelo utilizado em Espanha, em França e em Itália e, mesmo assim, e sabido que, nesses países, existe ainda uma distribuição percentual relativamente equilibrada entre clubes e sociedades desportivas. Aliás, mesmo em Espanha, os clubes mais reconhecidos e mais poderosos. digamos assim, mantêm a sua natureza associativa. Tal é o caso do conhecido Barcelona e do conhecido Real Madrid, que não optaram pelo regime de constituição em sociedades desportivas.
Quanto a outros países, importa ainda dizer que há possibilidade de opção de modelos na Grã-Bretanha e na Bélgica, há um estatuto original, que é o dinamarquês, onde os clubes podem participar em sociedades que ficam encarregues da sua gestão, embora esse modelo não seja utilizado por muitos clubes, e há o modelo associativo, sem sociedades desportivas, na Alemanha, na Suíça, na Suécia, na Holanda, na Áustria e noutros países.
Portanto, não é rigoroso dizer-se que Portugal opta por uma solução porque outros países também o fizeram, dado que são poucos os países que optaram por um modelo parecido com o português.
Uma segunda questão é a de que é espantoso que o Governo pretenda apresentar este modelo de sociedades desportivas como moralizador.
Na verdade, há pouco, o Sr. Deputado Pedro Baptista fez alusão ao facto de o governo do PSD não ter criado

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sociedades desportivas. Respondeu, e bem, o Sr. Deputado Castro de Almeida referindo que não é o Governo que cria as sociedades desportivas, são as sociedades que se criam ou não. Na verdade, este Governo não as cria e só lhe falta isso, porque não cria mas manda criar!
De facto, o que este regime propicia é que o futebol profissional seja municipalizado ou regionalizado, como é o caso da Região Autónoma da Madeira, que seja viabilizado à conta dos contribuintes, à conta da participação das câmaras municipais.
Aliás, já estamos a ver por esse país fora as câmaras municipais a discutirem qual a percentagem de capital social que vão adquirir no clube de futebol da sua terra. Agora, os cidadãos, em vez de verem a câmara municipal a satisfazer necessidades de saneamento básico,...

Protestos do PS.

... de construção de infra-estruturas desportivas, de apoio ao desporto amador, vão ver os fundos municipais empenhados na participação em capital social de sociedades desportivas.
Portanto, o Governo não cria as sociedades, mas, na verdade, manda quê alguém as crie.

Protestos do PS.

Os Srs. Deputados não precisam de se exaltar, porque, naturalmente, cada câmara municipal responderá perante os seus munícipes e é evidente que confio que a maioria das câmaras municipais não se vai envolver em "loucuras" dessas e compreenderá que, de facto, o dinheiro dos contribuintes não serve para contratar jogadores de futebol.
Mas uma outra questão se coloca: o Governo tem muita pressa na entrada em vigor do regime das sociedades desportivas, diz que não transige e que no fim deste mês de Julho as sociedades desportivas têm de estar criadas. Porém, com algumas delas isso não poderá suceder, porque o clube de origem só pode participar com 40% do capital social, a câmara municipal pode não querer participar com 50%, mas, mesmo que queira, ainda é preciso arranjar mais 10% de capital social junto de outros investidores. Esta situação pode fazer com que muitas sociedades desportivas fiquem como um concurso que o Governo abriu para o Totobola, ou seja, fiquem desertas, não se podendo constituir por falta de quem esteja interessado em subscrever capital social.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - O Sr. Deputado está muito despeitado!

O Orador: - Mas o que é espantoso é que agora é que o Governo vem com um regime fiscal! Isto é, no dia 3 de Abril foi publicado o decreto-lei das sociedades desportivas, que já tinha sido aprovado uns tempos antes, e foi dito que até ao dia 31 de Julho teriam de estar todas constituídas. Hoje, dia 18 de Julho, estamos a discutir, na generalidade, o regime fiscal das sociedades desportivas. É caso para perguntar por que é que o Governo, quando aprovou o regime das sociedades desportivas, em Conselho de Ministros, não aprovou também a proposta de lei sobre o regime fiscal. Ou seja, primeiro, o Governo criou as imposições e definições e, depois, muito tardiamente, apresentou uma proposta para que fosse definido o regime fiscal a que as sociedades desportivas vão ficar sujeitas, propondo, ainda por cima, que sejam introduzidas alterações ao próprio decreto-lei que fez publicar em Abril.
Ora, isto é bem revelador, desde logo, de uma descoordenação tremenda a nível do Governo e também da maneira perfeitamente leviana e irresponsável como está a tratar estas questões.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: As intervenções precedentes causaram a necessidade de esclarecer alguns pontos, que parecem ter sido trocados pela crítica de método em detrimento da eventual crítica de fundo.
Em primeiro lugar, cumpre dizer que o decreto-lei das sociedades desportivas não cria apenas sociedades desportivas, cria também um regime especial alternativo para os clubes que não optarem pelas sociedades desportivas, o que, do nosso ponto de vista, é essencial para acabar com a pouca vergonha que existe no futebol e que o PCP, ultimamente, tanto tem gabado.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Já começou a demagogia!

O Orador: - Portanto, é bom lembrar que este não ë apenas um decreto de criação das sociedades desportivas, é um decreto que prevê um regime alternativo de responsabilização, para acabar com aquilo que o Partido Comunista sempre criticou e que, misteriosamente, de há dois meses para cá, parece adorar.
Para concluir este ponto. não se trata, pois, do regime do Dínamo de Moscovo, nem do Dínamo de Bucareste, mas de um regime completamente diferente, e graças a Deus que é um regime completamente diferente!
Em segundo lugar, parece-nos que os problemas do futebol profissional e a sensibilidade da opinião pública para esses problemas aconselham a que todos tenhamos mais preocupação com a substância do que com o método. Provavelmente, se o PCP estivesse no governo, faria tudo cronologicamente bem, mas as soluções seriam desastrosas. Sinceramente, preferimos o contrário, pelo que, independentemente das confusões de prazos e de algum atraso deste Governo - que se distraiu com o "totonegócio" e, por isso, se atrasou nas soluções correctas,' por culpa própria -,pensamos que o prazo e de menor importância do que a modificação dos regimes legais de que estamos aqui a tratar.
Evidentemente, as sociedades desportivas com fins lucrativos não foram criadas pelo governo anterior, porque o governo anterior presumiu que isso seria desagradável para os clubes e, como os dirigentes dos clubes tinham

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muitos votos, isso era incompatível com o interesse eleitoral do PSD. Há que assumir claramente que foi por isso que o regime nunca foi por diante. Este Governo foi obrigado a fazê-lo, porque meteu a "pata na poça" com o "totonegócio" e já não tinha outra saída. Bom, seja por que razões for, ainda bem que é assim!
O que estranho é que, depois de, durante tanto tempo, toda a gente ter pedido credibilidade, moralização e transparência para o futebol, quando chegamos ao momento em que vai ser possível mudar, sob todos os aspectos. o conjunto de regras, o que vai tornar possível essa nova era para o futebol, haja tantas dúvidas e tantos problemas. Sinceramente, quer-nos parecer que há partidos que, como, normalmente, na essência, concordam com o Governo, precisam destes focos secundários para tentarem "fazer de conta" que às vezes discordam e que são oposição.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É um auto-retrato!

O Orador: - Trata-se de ilusionismo político, sem dúvida, e até de inovação política, sobretudo por parte do Partido Comunista, subitamente convertido às regras do mercado no futebol.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - É verdade!

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Falou bem em tudo, excepto no "totonegócio"!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Baptista.

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, estou de acordo com a maior parte das coisas que disse,...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Ó diabo!

O Orador: - ... porém, quero clarificar um aspecto, questionando o seu acordo em relação ao que vou dizer.
Penso que não é inaceitável que os clubes invistam grandes quantidades de dinheiro em novos jogadores. Não é isto que é inaceitável, pois o futebol e o basquetebol-espectáculo, os dois desportos profissionais que hoje temos, vivem exactamente do investimento em grandes artistas. Aliás, VV. Ex.as sabem que os estádios e os pavilhões de basquete estão cheios quando têm os chamados "craques", pelo que, nesta indústria, isso é essencial. Repito, não é isso que é inaceitável, o que é inaceitável é que alguns clubes o tentem fazer sem querer cumprir as suas obrigações sociais, as suas obrigações para com o Estado e a sociedade.
Portanto, também não é inaceitável que o Estado procure apoiar a criação das novas sociedades desportivas, definindo regimes fiscais específicos que as ajudem, e é por isso que não tenho nada a opor aos acrescentos que VV. Ex.as, do PP, propõem para esta lei fiscal.
Mas quero precisar um ponto: V. Ex.ª falou do que chama o "totonegócio", a que eu chamo acordo entre o Governo, a Liga e a Federação, e é bom que fique aqui
muito claro que, se o que VV. Ex.as chamam "totonegócio" tivesse ido para a frente. não estávamos agora nesta situação, porque nesse convénio estava exactamente previsto que os clubes, eles próprios, sancionariam os prevaricadores, com sanções desportivas de grande importância, como a descida de divisão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, que fique claro que se o assunto não foi resolvido há um ano atrás foi, infelizmente, pela posição desajustada que VV. Ex.as tomaram contra a proposta do PS.

O Sr. António Filipe (PCP): - Essa já não é a opinião
do Primeiro-Ministro!

O Sr. Presidente: - Para responder, dispondo de 1 minuto concedido pela Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, muito obrigado, julgo que não vai ser necessário 1 minuto.
Na verdade, satisfez-me imenso ouvir a parte final do pedido de esclarecimentos do Sr. Deputado Pedro Baptista, pelo seguinte: se não tivesse dito o que disse no final, certamente o acusariam de ser "muleta" do PP e penso que isso seria injusto.

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Se fosse com o Lobo Xavier, a gente entendia-se!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Ah! São irmãos!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero fazer apenas algumas precisões e mencionar um ou dois detalhes que esta iniciativa legislativa contém e que, em nossa opinião, são extremamente positivos.
De facto, os clubes desportivos estavam numa situação de desvantagem em relação às empresas comerciais e industriais, que tinham ao seu dispor um conjunto de mecanismos e benefícios que lhes permitiam reestruturar-se, nomeadamente através do Decreto-Lei n.º 404/90. Os clubes não tinham ao seu dispor mecanismos de incentivos que lhes permitissem reestruturar ou reformular as suas actividades de uma forma mais rentável para desempenharem a função social que lhes está cometida. E não nos esqueçamos de que os clubes desportivos têm equipas profissionais de futebol e de basquetebol, como já foi referido, mas têm também uma actividade importantíssima na ocupação dos nossos jovens, afastando-os dos malefícios para que são tentados na idade da adolescência, e têm uma função de formação e de educação dos cidadãos que é importante relevar e merece apoio.
Muitas vezes (eu diria, quase sempre), essa actividade formativa, essa actividade social não é suficientemente apoiada pelo Estado, sendo uma actividade de interesse

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público, e muitas vezes é também a actividade profissional, comercial, dos clubes, ao proporcionar um espectáculo, que vai permitir financiar a outra actividade social. Portanto, é justo que, no plano fiscal, não havendo um ,regime de benefício, pelo menos, não haja um prejuízo para os clubes desportivos em relação às sociedades comerciais e industriais.
Hoje em dia, qualquer sociedade que queira reestruturar-se num grupo de empresas para melhor explorar o seu negócio, tem direito a isenção de sisa na transmissão dos imóveis, tem direito a isenção do imposto de selo, de emolumentos de registo e de emolumentos notariais e os clubes não tinham possibilidade de aceder a esse regime.
Por outro lado, gostava também de dizer ao Sr. Deputado Castro de Almeida que a preocupação que evidenciou relativamente ao facto de o artigo 24.º da Lei das Sociedades Desportivas não cumprir a questão da isenção de impostos em relação às verbas atribuídas à formação é precisamente a mesma coisa, porque a isenção de impostos significa que sobre essas verbas não incide IRC e isso é que é isenção de imposto. Ora, considerar essas verbas como custo significa que o imposto sobre o rendimento não se vai aplicar sobre esses montantes, pelo que, tecnicamente, é precisamente a mesma coisa. V. Ex.ª, se tem dúvidas, com certeza que pode perguntar ao Sr. Deputado António Vairinhos.
Queria também dizer que há aqui uma outra questão muito importante, que é o reinvestimento dos ganhos com os "passes" dos jogadores. Até hoje, as empresas podem afastar de tributação os ganhos que têm na venda de elementos do seu imobilizado, se os reinvestirem noutros elementos de imobilizado; ora, aqui prevê-se também que os ganhos obtidos com a venda de "passes" de jogadores possam ser reinvestidos na aquisição de novos "passes" de jogadores ou na construção de infra-estruturas para a prática desportiva. Penso que é uma medida acertada e, mais urna vez, não cria um regime de excepção, equiparando-se com um regime que já existe para as empresas comerciais e industriais normais, com a devida adaptação.
Por outro lado, queria ainda referir que é clarificado também o regime contabilístico dos clubes, nomeadamente no que respeita às amortizações. Isto vai criar uma disciplina de gestão, incentivando os clubes a estruturarem-se de acordo com critérios de racionalidade e de gestão e conduzindo os clubes, necessariamente, a que adoptem esquemas de planos de contabilidade onde estejam expressamente relevadas todas as suas obrigações e todos os seus activos. Isto permitirá que todas as obrigações e todos os direitos das sociedades desportivas estejam relevados nos seus balanços e nas suas contas de resultados, porque, até aqui, os clubes trabalhavam, a maioria deles, perfeitamente ad hoc, sem contabilização, com operações paralelas, por fora de escrita, sem se saberem os montantes envolvidos.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Deste modo, vai haver muito maior clareza na gestão e no funcionamento das equipas de futebol profissional e das equipas de basquetebol.
Relativamente à proposta apresentada pelo PP, independentemente da formulação frásica, estamos de acordo com o princípio que estabelece e, portanto, estamos ,perfeitamente disponíveis para viabilizar a introdução desse princípio na lei. Quanto ao texto, é uma questão a ver em concreto se estaremos de acordo ou não.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou a discussão desce projecto de lei, pelo que vamos iniciar a discussão do projecto de lei n.º 398/VII - Alteração da Lei-Quadro de Sistemas de Informação da República Portuguesa, apresentado pelo PS e pelo PSD.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, queria apenas fazer uma interpelação à Mesa relativamente à proposta de lei que acabámos de debater, no sentido de que creio que seria possível obter consenso, tendo em conta a compreensão que todos os grupos parlamentares manifestaram quanto à urgência do trânsito legislativo desta proposta de lei, para que, quando ele viesse para votação na generalidade, na próxima quinta-feira, se pudesse logo fazer a votação na especialidade e final global. Para que isso não fosse muito perturbador do funcionamento da Assembleia, talvez não fosse mau que a proposta de lei, entretanto - e dado que ela já veio da Comissão de Economia, Finanças e Plano -, baixasse à Subcomissão de Desporto, da 6.º Comissão, onde, aliás, já está pendente uma matéria conexa, que é um pedido de ratificação, apresentado pelo PCP, relativamente ao regime das sociedades desportivas. Talvez assim, até à próxima quinta-feira, pudéssemos esclarecer tudo. Creio que não será difícil obter consenso, caso a Mesa também esteja de acordo.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, se houver consenso, a proposta de lei baixará, antes de votação à referida Comissão, organizando-se os Srs. Deputados em termos de, até quinta-feira, se colocarem de acordo quanto às alterações necessárias.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, tratando-se de um trabalho prévio à votação na generalidade, nada obsta a que baixe amais do que uma Comissão.
Se o entendimento da Assembleia for no sentido de que se possa já começar a construir soluções na especialidade, de forma a responder à proposta do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, pareceria avisado que o diploma pudesse baixar à Comissão de Educação, pela razão que foi invocada de haver matéria conexa já em apreciação na Subcomissão de Desporto. Se ninguém objectar, não vejo nenhuma inconveniência, havendo até vantagem, em que possa baixar, nesta sede, quer à Comissão" de Economia quer à Comissão de Educação.

O Sr. Presidente: - Isso burocratiza o trabalho.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, estaríamos de acordo em que a proposta de lei baixasse à 6.ª Comissão e os Deputados da Comissão de Economia que quisessem participar nos trabalhos poderiam deslocar-se à 6.ª Comissão. Penso que, na Comissão de Economia, ninguém se ofende com isso.

O Sr. Presidente: - Assim, a proposta de lei baixará à 6.ª Comissão com a incumbência de ela, se vir vantagem nisso, contactar a Comissão de Economia para um trabalho conjunto.
Para apresentar o projecto de lei n.º 389/VII, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto visa alterar o sistema para a eleição dos membros do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República. Mas, de caminho, a reflexão feita permitiu introduzir-lhe uma alteração, razão pela qual apresentámos a segunda versão do texto do projecto n.º 389/VII, que depositámos na Mesa na altura apropriada.
A primeira versão permitia que os membros eleitos deste conselho fossem destituídos pela mesma maioria que os tinha eleito - é isso o que diz o artigo 7.º da Lei n.º 30/84, na redacção erra vigor. Considerámos, tudo ponderado, que a garantia de independência do órgão exige que quem é eleito não possa ser destituído e possa cumprir o seu mandato de forma imune, o que é uma garantia extremamente relevante de uma forma isenta de exercício de funções. É, na verdade, uma forma de inamovibilidade que faz parte do perfil de órgãos verdadeiramente independentes.
Assim, Sr. Presidente, congratulamo-nos se for possível alcançar um consenso alargado para esta solução, que visa facilitar a eleição dos membros do conselho, ensombrada no passado por incidentes lamentáveis, e, ao mesmo tempo, reforçar a sua independência.

Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente Joio Amaral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, apenas duas palavras para dizer o seguinte relativamente esta iniciativa legislativa: ela é, claramente, do meu ponto de vista, a manifestação da incapacidade da maioria PS e PSD, a maioria de dois terços necessária para eleger os membros do Conselho de Fiscalização do SIS. Então, como não o elegem a berra, porque o bloco central não funciona a bem neste caso, vai funcionar a mal, ou seja, vai funcionar por via legal. Isto é, a lista passa a ser plurinominal e, por esta via, acaba a possibilidade de divergências entre os dois maiores partidos que têm de intervir nesta eleição, impedindo a eleição dos membros do conselho de fiscalização do SIS. Não temos nada a opor e ainda bem que, por esta via, se vai resolver o problema.
No entanto, gostaria de fazer aqui dois ou três reparos, muito breves, sendo o primeiro o seguinte: é pena que isto não tenha sido feito mais cedo porque tivemos oportunidade de ouvir, em audiência prévia, o indigitado director do SIS, quando aqui veio e, de algum modo, fiscalizámos não só a sua pessoa mas também os seus propósitos embora com as consequências legais que se sabe, isto é, nenhumas -, tendo tido a oportunidade de o ouvir, previamente à sua nomeação, para conhecer os seus propósitos, aquilo que eram as suas intenções e o seu plano de trabalhos à gerente da direcção do SIS. Porém, ao mesmo tempo. demonstrámos, a Assembleia da República demonstrou incapacidade absoluta para nomear os três membros do Conselho de Fiscalização do SIS, para efeitos de proceder à fiscalização regular da actividade do serviço.
Finalmente, não queria deixar de referir ainda o seguinte: parece-me que dizer que a eleição dos membros do conselho é feita por lista nominal, se esse conselho tiver apenas um mandato para preencher, é um nadinha redundante! Isto é, a não ser que os Srs. Deputados que elaboraram este projecto de lei entendam que é possível fazer uma lista plurinominal apenas com um membro, não vejo qual é a vantagem de se dizer que esta lista é nominal, no caso de ser apenas um dos mandatos vagos a preencher. Deve haver aqui alguma razão misteriosa que os autores do projecto terão oportunidade de me explicar.
De qualquer modo, congratulo-me que seja possível a Assembleia da República encontrar uma fórmula de obrigar a um acordo, pela via do mecanismo da eleição plurinominal, não sendo prejudicada a urgentíssima eleição dos membros do Conselho de Fiscalização do SIS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, não tenho nada de especial a acrescentar àquilo que foi dito pelo Sr. Deputado José Magalhães, mas aproveito para dar resposta a dois aspectos da intervenção do Sr. Deputado Luís Queiró, que me merecem uma pequena observação.
Em primeiro lugar, uma pequena correcção: este conselho de fiscalização, que temos perante nós, neste diploma, não é do SIS, é do Serviço de Informações da República e, portanto, abarca outros serviços também. Em segundo lugar. relativamente à questão que coloca quanto à redacção, quero apenas esclarecer que esta é a redacção utilizada nas leis eleitorais. nomeadamente para as autarquias, onde se refere que a lista pode ser nominal ou plurinominal, consoante o números de mandatos a preencher. É apenas uma questão de manter aquilo que já existe na ordem jurídica portuguesa e creio que talvez não mereça a pena fazer disto um caso, se o Sr. Deputado concordar.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

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O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - S. Presidente, Sr. Deputado, ficamos então a saber que é possível, hoje, fazer listas plurinominais apenas com um candidato!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS e o PSD, como se sabe. Reservaram para si próprios a pseudo-fiscalização dos serviços de
informações e têm de ser responsabilizados pelo escândalo nacional que representa o facto de, há três anos para cá, não existir, pura e simplesmente, conselho de fiscalização dos serviços de informações - nem bom nem mau, nem
com condições nem sem elas, pura e simplesmente não existe! 
É verdadeiramente espantoso como é que um serviço com esta importância pode funcionar sem que haja qualquer possibilidade de controlo democrático sobre o seu funcionamento, sem fiscalização! Isto é verdadeiramente escandaloso e deve ser dito aqui, neste momento em que o PS e o PSD apresentam uma proposta para resolver o seu problema quanto à designação de elementos para a fiscalização do SIRP mas não resolvem o problema do País, que é o da fiscalização idónea e democrática do serviço de informações, e quanto a isso esta iniciativa não vai resolver os problemas.
Tal como dissemos em anteriores debates sobre esta matéria e a propósito de iniciativas legislativas que o PCP apresentou relativamente à fiscalização dos serviços de informações, o actual Conselho de Fiscalização não reúne condições, nem do ponto de vista das suas competências legais nem do ponto de vista da forma da sua designação, para que haja uma fiscalização dos serviços de informações compatível com o regime democrático e que queira efectivamente, que tenha a vontade política de garantir uma fiscalização democrática idónea do funcionamento dos serviços de informações.
Portanto, quanto a nós, esta iniciativa legislativa poderá resolver o problema do PS e do PSD mas não resolve o problema que o País tem, ou seja, a garantia da fiscalização democrática do Sistema de Informações.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não há mais intervenções. A votação será no dia fixado...

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, tinha sido acordado que a votação fosse de imediato e com dispensa de redacção final, porque há urgência de envio do diploma ao Sr. Presidente da República.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, há acordo e condições para votar. O consenso foi dado na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares e, se não houver objecções, creio que poderemos votar o projecto de lei n.º 389/VII na generalidade, na especialidade e votação final global, simultaneamente.

Pausa.

Sendo assim. vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos favoráveis do PS e do PSD e com as abstenções do CDS-PP e do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, solicito formalmente a dispensa de redacção final.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, nos termos regimentais, se não houver oposição, não é preciso submeter a votação.

Pausa.

Sendo assim, está dispensada a redacção final.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão. Os nossos trabalhos recomeçaram às 15 horas, com a revisão constitucional.

Eram 13 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para introduzir o debate sobre o artigo 67.º, o Sr. Deputado Paulo Mendo.

O Sr. Paulo Mendo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero congratular-me pelo facto de, por unanimidade, as bancadas terem introduzido neste artigo 67.º (Família) a regulamentação da procriação assistida como uma incumbência do Estado português. Independentemente de haver alguma modificação apenas sob uma forma de melhoria do articulado antigo, introduziu-se-lhe urna alínea e) que diz: "Incumbe ao Estado regulamentar a procriação assistida em termos que salvaguardem a dignidade da pessoa humana".
Já está consagrada na nossa Lei Fundamental a protecção à família e o direito a um planeamento familiar; simplesmente, este direito tem sido naturalmente dirigido e executado pelos nossos serviços de saúde sob uma forma muito mais de regulamentação da maternidade, levando a um espaçamento dos nascimentos e a uma situação que é, do ponto de vista sanitário, extremamente salutar, não sobrecarregando com gravidezes sucessivas as nossas mulheres. Mas este tipo de filosofia teve um pouco como contrapartida uma certa responsabilidade na diminuição da nossa taxa de natalidade e é isto que é agora um pouco corrigido, ou objecto de alerta, na Constituição da República Portuguesa.
Com efeito, como sabem, a taxa de natalidade, em Portugal, é das mais baixas da Europa e o número de crianças que nascem não é já suficiente para garantir a simples substituições de gerações. Entre os censos de 1981 e de 1991, a faixa etária dos 0 aos 14 anos diminuiu de

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500 000 indivíduos. existindo, em Portugal, 32% de casais sem filhos, o que significa que há 800 000 lares sem crianças. Por isso e como já disse numa intervenção nesta Casa, a criança, para além de um valor humano afectivo insubstituível que sempre teve na nossa história social, é cada vez mais um ser precioso que é preciso proteger, amparar, educar e preparar para garantir a nossa continuidade como comunidade. É isso que este artigo pretende garantir na protecção à família, tornando também a criança um ser desejado. Assim, é não só garantido o planeamento da maternidade, mas também a maternidade desejada também passa a ter consagração na nossa Constituição.
É evidente que isto já se sentia há anos e, por isso mesmo, em 1995, o Professor Agostinho Almeida Santos, a quem quero prestar a minha homenagem, foi encarregado pelo ministério a que eu presidia de fazer o estudo e a preparação de uma proposta de diploma legislativo que enquadrasse na realidade portuguesa a procriação medicamente assistida.
É de notar que a procriação medicamente assistida não é a utilização de meios artificiais para conseguir uma gravidez, começa muito mais cedo, no tratamento do casais inférteis. E só com o tratamento destes casais através dos métodos da medicina é possível, segundo dados do próprio Professor Agostinho Almeida Santos, o nascimento de qualquer coisa como 5000 bebés por ano. Trata-se, portanto, da integração deste conceito de maternidade desejada nos nossos programas de saúde da mulher e da criança que estavam em preparação e parecem ter continuado com este ministério sob a forma de um diploma que parece estar quase pronto, o qual é da grande responsabilidade do Professor Agostinho Almeida Santos, que volto a chamar à colação para lhe apresentar a minha homenagem, pois foi um dos homens que mais se bateu e mais tem estudado o problema da família em Portugal e deve sentir-se muito satisfeito ao ver que esta Câmara consagrou o regulamento da procriação assistida como um dever de Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A palavra ao Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero também congratular-me com o reforço da protecção que, em certo sentido, é consagrada à família, nos artigos 67.º e seguintes da Constituição da República Portuguesa, dado que a matéria não é restrita ao artigo referido, não apenas no que respeita a esta ressalva que fez e bem, o Deputado Paulo Mendo relativamente à procriação assistida mas também, obviamente, quanto à compatibilização da política de planeamento com o respeito pela liberdade individual de cada cidadão.
Aproveitando o tema - embora a matéria esteja sistematicamente tratada no artigo 68.º, julgo que não é deslocada do tema que estamos a abordar -, quero congratular-me particularmente com a extensão que é conferida no novo n.º 4 proposto pára o artigo 68.º, em relação à paternidade e maternidade, no que toca à garantia dos direitos de acompanhamento familiar em geral. dos pais e das mães.
Neste sentido, quero chamar a atenção do Plenário para o facto de a proposta, tal como veio da CERC, no que toca ao artigo 68.º, n.º 4, ao referir-se exclusivamente ao pai, seguramente ser restritiva, devendo, obviamente, referir-se aos pais, porque o direito previsto no novo n.º 4 não é, naturalmente, apenas o direito a assistência durante o período da gestação e do parto de uma criança, mas é o direito de assistência à família em geral e esse, como é óbvio, tem que ser concedido não só ao pai como à mãe. O n.º 3 não trata dessa matéria especificamente e não faria nenhum sentido consagrar-se na Constituição da República Portuguesa uma extensão de um direito e uma garantia constitucional do direito de assistência à família em geral ao pai, de forma restrita, sem o estender à mãe.
Aliás, julgo que haverá consenso suficiente nesta Câmara - ele existe da parte do PS - para que se acrescente o plural e passe a dizer-se os "pais" e não apenas o pai, porque se trata em geral da assistência à família.

O Sr. Presidente: - A palavra à Sr. Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome da minha bancada, quero também congratular-me com esta nova redacção do artigo 67.º e seguintes em dois sentidos muito concretos, sendo o primeiro aquele que diz respeito à alínea b), ou seja, a ideia de que a família integra uma realidade plurigeracional. Julgo que esta ideia é uma das mais ricas da própria realidade familiar, ou seja, a possibilidade de integração nas suas virtudes e problemas das diferentes gerações e a capacidade de cuidar delas e isso fica bem expresso com a alínea h).
Também quero fazer minhas as palavras mais eruditas do Sr. Deputado Paulo Mendo em relação à introdução do aditamento à alínea e), no sentido de que uma maternidade e paternidade conscientes são isto mesmo, são a possibilidade de recorrer tanto ao planeamento familiar como também à procriação assistida. isto é, a possibilidade de ter não os filhos contados mas os filhos que realmente se deseja ter.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Apalavra ao Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pretendo apenas saudar três benfeitorias operadas neste artigo por consenso alargado. A primeira, permitam-me esta ordem, diz respeito à alínea d).
No que diz respeito a esta alínea, ou seja, cm, matéria de planeamento familiar, há uma incorporação no texto da Constituição da República Portuguesa da melhor doutrina sobre planeamento familiar, a qual está rodeada de largo consenso. Porém, não se alterou em nada o alcance da parte final do artigo, isto é, o dever de organizar as

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estruturas jurídicas e técnicas que permitam o exercício de uma maternidade e paternidade conscientes continua a impender sobre o Estado, com todas as consequências e com todo o alcance que tem hoje na Constituição da República Portuguesa.
Nessa parte não se alterou o que quer que fosse, mas a verdade é que se incentiva e sublinha melhor a importância do direito à informação e se concretiza de maneira inequívoca um novo direito, o direito de acesso aos métodos e meios que permitam assegurar a paternidade e a maternidade consciente. Isto reforça as obrigações de Estado, por exemplo, em matéria de distribuição gratuita de anticoncepcionais e de informação que previna a ocorrência indesejada de gravidez mas em nada prejudica as normas constitucionais em matéria de interrupção voluntária da gravidez.
Em segundo lugar, é positivo que se incorpore na Constituição da República Portuguesa o conceito de procriação assistida, a qual deixa de ser objecto de qualquer dúvida quanto à sua possibilidade, ou seja, deixa de haver qualquer dúvida sobre a possibilidade de procriação assistida, que assim é recebida e consagrada. Naturalmente, remete-se para lei a sua regulamentação e aqui não é nada acrescentado.
Permitam-me, a talhe de foice, sublinhar que, no que diz respeito à protecção da paternidade e maternidade no artigo 68.º, conexo com este, se vai clarificar numa proposta, que tem o n.º 81-P, os direitos das mulheres, trabalhadoras ou não, à protecção durante a gravidez e após o parto, salvaguardando-se todo o conteúdo do preceito actual e alargando-o às mulheres independentemente da sua situação perante o mercado de trabalho. É um alargamento francamente positivo, que não distorce em nada a filosofia constitucional mas enriquece e alarga num âmbito que suponho igualmente consensual.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Congratulamo-nos muito com o facto de isto ter sido possível.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação ao artigo 67.º, gostaria de realçar uma melhoria que me parece muito importante e que tem a ver com a consagração do direito ao planeamento familiar e não apenas, como está, actualmente, na Constituição, como sendo tarefa do Estado promover o planeamento familiar.
Isto parece-me muito significativo, mas gostaria também de referir que o planeamento familiar para ser verdadeiramente um, direito e não uma imposição, por força das circunstâncias e das necessidades da vida, é necessário efectivar os direitos sociais da nossa Constituição, nomeadamente o direito ao trabalho, o direito ao salário, que permita uma vida digna, e a outros tantos direitos. Se não for assim, se esses direitos sociais não estiverem realizados, o planeamento familiar surge como um direito diminuído, porque é um direito que se usa por imposição e não porque se quer usar.
Já que estou no uso da palavra, gostaria de, em relação ao artigo 68.º, dizer que ele vai trazer aperfeiçoamentos; contudo, estou de acordo com a intervenção do Sr. Deputado Cláudio Monteiro relativamente ao n.º 4 proposto pela CERC, pois não me parece que essa redacção seja a mais feliz, na medida em que até parece que só o pai é que tem direito a dispensa de trabalho para acompanhar os filhos nas consultas e que a mãe não tem.
Na verdade, o que os senhores querem dizer - e penso que isso estava na proposta inicial do Partido Socialista...

O Sr. José Magalhães (PS): - Estava, estava!

A Oradora: - Mas já cá não está...!
Mas o que os senhores querem dizer é que também o pai podia ter direito à licença pós-parto. Porém, como não é isso que está cá, penso que esta redacção tem de ser melhorada, como o Sr. Deputado Cláudio Monteiro referiu na intervenção que fez..

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão das alterações relativas ao artigo 68.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que já iniciámos a discussão do artigo 68.º, nomeadamente com as intervenções dos Srs. Deputados Cláudio Monteiro e José Magalhães.
Quanto à proposta classificada como 81-P, de alteração do n.º 3 do artigo em referência, damos o nosso apoio por nos parecer que ela alarga o direito das mulheres e não o restringe, única e exclusivamente, às mulheres trabalhadores, pelo que parece ser de acolher.
No que toca à proposta de aditamento de um n.º 4, julgo que também é de louvar. No entanto, gostaria de chamar a atenção para aquilo que o Sr. Deputado Cláudio Monteiro referiu sobre a atribuição de direitos de dispensa de trabalho aos pais e às mães e não só ao pai, pois, atendendo ao que está disposto no n.º 1, o n.º 4 não se devia restringir aos pais mas devia também ser alargado às mães para seguirmos a lógica do artigo, pelo que o n.º 4 ficaria "A lei regula a atribuição aos pais e às mães...".
Julgo também ser de realçar um aspecto particular, que é o facto de a Constituição passar a reconhecer o papel dos pais na educação dos filhos, tendo, obviamente, os mesmos direitos e deveres que as mães já tinham em termos constitucionais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão das alterações relativas ao artigo 69.º.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Fernanda Mota Pinto.

A Sr.ª Fernanda Mota Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que as alterações introduzidas neste artigo são de grande importância, pois tornam-no muito mais abrangente e de acordo com a Convenção Internacional dos Direitos da Criança.

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Assim, o n.º 1, ao conferir a todas as crianças o "direito à protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições", atribui a todas as crianças os direitos que estavam consignados nos n.os 1 e 2 da Constituição vigente, sem referir que alguns, deles se aplicavam particularmente a crianças órfãs e abandonadas.
Optou-se, assim, por partir do geral aplicável a todas as crianças para depois nos n.os 2 e 3 referir casos especiais que hoje, infelizmente, são muito vulgares na nossa sociedade.
Todos nós temos, decerto, conhecimento de crianças abandonadas ou privadas do meio familiar normal e de crianças que, à revelia da lei vigente, trabalham tendo ainda idade escolar. Por isso. no n.º 2 se refere que "O Estado assegura especial protecção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de ambiente familiar normal".
É também de salientar que, sob proposta do Partido Social Democrata e aceite por unanimidade por todos os outros partidos, é aditado um n.º 3 a este artigo referente à infância - e já consagrado na Constituição vigente no artigo 74.º relativo ao ensino -, do seguinte teor: " É proibido, nos termos da lei, o trabalho de menores em idade escolar", referenciando de forma clara e objectiva, porque integrado no artigo referente à infância, o direito da criança de ter o seu tempo de crescer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Queria, por último, congratular-me com o texto do acordo de revisão constitucional que me permite interpretar como a expressão da consciência, e do reconhecimento da necessidade de garantir às crianças o direito de brincar e de aprender, de crescer num ambiente de afecto, harmonia e compreensão, de não ser maltratada, de ver respeitada a sua individualidade e dignidade, reconhecendo-se. assim, a todas as crianças o direito a ser criança.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome da minha bancada, também eu gostaria de congratular-me com a redacção proposta para este artigo.
Considerando que, ao contrário de tudo aquilo que seria de esperar do ponto vista da civilização, hoje em dia, infelizmente, são múltiplas as formas de violência e de abuso sobre as crianças, nomeadamente por parte dos pais, o entendimento de que a criança deve ser defendida de todas estas formas de violência mais ou menos subtis parece-me da maior importância.
Quero, pois, deixar a nossa satisfação pelo entendimento de que o poder paternal é um poder-dever, esse em função de um resultado que não é o mero exercício do poder, e ainda por outros aspectos que estão aqui consagrados.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de dizer que saudamos positivamente o texto que acaba de ser apresentado com os múltiplos contributos dos vários partidos.
Um aspecto extremamente importante e novo que é aqui considerado e que resulta de uma situação que. não é tão isolada quanto isso diz respeito à situação das crianças abandonadas ou objecto de violência familiar em relação às quais a comunidade tem um papel importante.
Um outro aspecto que não foi sublinhado e que parece positivo é o da proibição do trabalho de menores em idade escolar. A introdução deste ponto no texto constitucional tem um significado político muito claro. O compromisso, no texto constitucional, da proibição do trabalho de menores em idade escolar veras, de forma acrescida, tornar claro que, apesar de o trabalho de menores ser proibido, se trata de um problema ainda por ultrapassar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão das alterações relativas ao artigo 70.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Vieira.

O Sr. Sérgio Vieira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer uma breve intervenção acerca de duas propostas que mereceram acolhimento e aprovação em sede de Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, uma apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD e outra apresentada pelo Grupo Parlamentar do PCP sobre o artigo 70.º, que tem como epígrafe "Juventude".
Vou começar pela proposta apresentada pelo PSD. O actual n.º 1 deste artigo refere o seguinte: "Os jovens. sobretudo os jovens trabalhadores, gozam de protecção especial para efectivação dos seus direitos económicos, sociais e culturais (...). Ora, o PSD propôs que fosse suprimida a expressão "sobretudo os jovens trabalhadores", porque, para nós, Sr. Presidente, não faz sentido que haja neste artigo uma particularização para determinados subgrupos da juventude.
As incumbências que decorrem deste artigo da Constituição para o Estado são comuns a todos os jovens portugueses e não a determinados subgrupos desta realidade, pelo que para o PSD não parece que haja razões ponderosas para haver ou uma discriminação negativa ou uma discriminação positiva em sede destas regras gerais.
Quanto à proposta apresentada pelo PCP, ela contou, desde o início, com o apoio inequívoco dos Deputados do PSD, porquanto no n.º 1 deste artigo, ao referir que a juventude goza de protecção especial do Estado para efectivação de alguns direitos económicos, sociais e culturais, ou seja, no ensino, na formação profissional e na cultura, no acesso ao primeiro emprego, no trabalho e na segurança social, na educação física e no desporto, no aproveitamento dos tempos livres, falta, na verdade, uma

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alínea que refira a necessidade do apoio do Estado no acesso à habitação. De facto, faltava essa alínea e o PCP propô-la, pelo que contou, desde logo, com o apoio do PSD. Repito, faltava esse direito, faltava essa alínea e, por isso, o PSD, desde logo, aprovou esta iniciativa do Partido Comunista Português de protecção especial aos jovens no acesso à habitação. Até porque, Sr. Presidente, esta nova alínea é nada mais do que a consagração do que foi a política do PSD nesta matéria. É que o PSD foi pioneiro no apoio aos jovens no que diz respeito ao acesso à habitação, ao criar medidas como a do crédito jovem bonificado, o subsídio de arrendamento aos jovens, etc. De facto, esta proposta representa a consagração da opção política e das opções governativas do PSD no passado. Assim, faço votos para que estas duas propostas sejam aprovadas.
Contudo, permita-me que, antes de terminar, diga o seguinte: vamos votar estas duas propostas de alteração com o desejo de que, face à consagração constitucional de apoio aos jovens no acesso à habitação, o Governo se sinta mais motivado para cumprir aquilo que prometeu e ainda não teve oportunidade de cumprir. Ou seja, há dois anos atrás, o Governo prometeu aos jovens portugueses que iria reformular o sistema de subsídio de arrendamento aos jovens, adequando-o às novas realidades, volvidos cinco anos, e que iria criar um sistema de apoios especiais para incentivar os jovens a habitar zonas desertificadas.
Estas duas promessas eleitorais do Partido Socialista ainda estão por cumprir e faço votos para que, havendo agora a consagração constitucional desta matéria, o Governo do Partido Socialista, finalmente, se decida afazer algo a este respeito.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer que também este artigo não passou incólume à limpeza semântica que em vários outros artigos da Constituição se intentou fazer neste período de revisão. Como é óbvio, a referência aos jovens trabalhadores que neste artigo estava presente não significava uma desvalorização, uma menorização, do direito dos jovens que não sejam trabalhadores. De resto, entre outros, o artigo 64.º, que já discutimos, faz referência à "criação de condições económicas; sociais e culturais que garantam a protecção da infância, da juventude e da velhice (...)", o que não quer dizer que os cidadãos de meia idade estejam afastados desta protecção constitucional. Logo, não vemos como favorável esta limpeza semântica que se pretende fazer neste artigo 70.º.
No entanto, já vemos como muito positiva a aceitação da proposta apresentada pelo PCP para que se insira no artigo 70.º uma alínea prevendo urna protecção especial aos jovens, no que toca à efectivação dos seus direitos relativos ao acesso à habitação. A preocupação que nos levou a apresentar esta proposta foi, antes de mais, a de fazer com que esta protecção especial consiga ser também um esforço no sentido de dar um direito a uma habitação condigna a tantos jovens portugueses que continuam a não tê-la. Esta foi. a nossa primeira preocupação.
Mas também temos a preocupação de, na concretização do seu projecto de vida, de uma integração e de uma participação na sociedade, os jovens possam ter também um acesso à habitação condigno com as suas aspirações e que possa ser concretizável com facilidade.
Termino, dizendo que esperamos que ao reforço constitucional do direito ao acesso à habitação que aqui irá fazer-se possa corresponder um reforço na prática, com medidas que, na realidade, garantam a aplicação deste direito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Saudámos na CERC e saudamos aqui o reforço do conteúdo útil do artigo 70.º, aliás. tal como ocorreu em relação ao artigo 69.º, por proposta do PS, quanto à reinserção da norma que proscreve o trabalho infantil. Trata-se uma norma que foi consagrada em 1989, por unanimidade, mas que agora é revigorada, é inserida na sede própria e isso é extremamente positivo.
No que diz respeito ao artigo sobre a juventude, o artigo 70.º, não há alterações de fundo. Há um reforço quanto à dimensão do direito à habitação não porque haja défice de vis legislativa e de cumprimento do Programa do Governo mas porque essa é uma orientação e urna reivindicação justa e adequada por parte dos jovens, corresponde a uma necessidade, que a Constituição acolhe, e isso é adequado e positivo.
A menção contida no n.º 1 aos jovens trabalhadores é substituída por urna referência universal. Não há, aqui, uma limpeza semântica, num sentido jugoslavo, mais, sim, uma universalização, que é um acto positivo. Não há uma barbárie, há uma universalização, que se traduz numa globalização aplicada 'a uma pluralidade. De resto, nunca foi construída uma espécie de privilégio constitucional de jovens trabalhadores em detrimento de jovens não trabalhadores ou de jovens à procura de emprego, que não deixam, por isso. de ser merecedores de protecção, aliás, até especial, nos termos da alínea b) do n.º 1, tanto na versão actual como na que vai estar em vigor.
Trata-se, portanto, de um salto muito positivo, com o qual nos congratulamos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à discussão das alterações relativas ao artigo 71.º. No momento em que vamos começar a discutir o artigo relativo aos deficientes e aos seus direitos, é justo lembrar que temos a acompanhar os nossos trabalhos mais um grupo de surdos-mudos. Saudêmo-los com toda a simpatia.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem, a palavra a Sr.ª Deputada Fernanda Mota Pinto.

A Sr.ª Fernanda Mota Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 71.º, referente a cidadãos

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portadores de deficiência, actualiza conceitos já expressos na Constituição vigente, sendo de salientar desde já a mudança da epígrafe deste artigo de "Deficientes" para "Cidadãos portadores de deficiência", redacção que me parece muito mais actual e correcta.
O n.º l deste artigo consagra direitos e deveres já expressos na Constituição vigente, referindo que "Cidadãos portadores de deficiência física ou mental gozam plenamente dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição, com ressalva do exercício ou do cumprimento daqueles para os quais se encontrem incapacitados". Trata-se, pois, de reconhecer que os cidadãos portadores de deficiência gozam de todos os direitos e deveres dos outros cidadãos, exceptuando os que não possam cumprir por força da sua deficiência.
No n.º 2 deste mesmo artigo, "O Estado obriga-se a realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência e de apoio às suas famílias, a desenvolver uma pedagogia que sensibilize a sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com eles e a assumir o encargo da efectiva realização dos seus direitos, sem prejuízo dos direitos e deveres dos pais ou tutores".
Se já na Constituição vigente eram atribuídos ao Estado todos estes deveres, é de salientar e de louvar a consignação em lei, neste número, pela primeira vez, sob a proposta do PSD, aceite pelos restantes partidos, do apoio às famílias dos cidadãos portadores de deficiência. Uma política nacional de prevenção, tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência necessita, acima de tudo, de ser compreendida e aceite pela família, dando-lhe para isso o apoio necessário, minorando-lhe o seu sofrimento e ajudando-a a aceitar e a compreender a necessidade de tratamento e de reabilitação, com vista à plena integração dos seus familiares.
E se, anteriormente, o Estado se obrigava a realizar e a desenvolver uma pedagogia de sensibilização da sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com os cidadãos portadores de deficiência, esta política deverá ser cada vez mais e melhor desenvolvida, pois só ela permite o aproveitamento das capacidades desses cidadãos, ajudando-os também a sentirem-se realizados e úteis à sociedade onde estão inseridos.
Foi por assim pensarmos que o PSD votou contra o aditamento de um n.º 4 a este artigo proposto por Os Verdes, pois a gradual eliminação das barreiras arquitectónicas é uma das muitas tarefas que o Estado deve regulamentar, mas não deve, no nosso entender, estar especificada nesta Lei Fundamental, uma vez que ela pode ser realizada pelo Estado, mas também o pode e deve ser pelos diferentes agentes sociais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - De acordo com o n.º 3 deste artigo, "O Estado apoia as organizações de cidadãos portadores de deficiência". Embora o PSD nada tenha a opor ao princípio que a proposta de Os Verdes defende, acrescentando no n.º 2 "a sua participação na definição de políticas que lhes respeitem", votámos contra esta proposta por pensarmos que apoiá-la é contribuir para uma discriminação negativa dos cidadãos portadores de deficiência. É que, no n.º 1 deste mesmo artigo, os cidadãos portadores de deficiência são considerados cidadãos iguais a todos os outros e está consagrado no artigo 48.º da nossa Constituição o direito de todos os cidadãos tomarem parte na vida política e na direcção dos assuntos públicos do País, directamente ou por intermédio dos seus representantes livremente eleitos. Por isso, não nos parece necessário repetir aqui uma norma já atrás consagrada e que se aplica aos cidadãos portadores de deficiência.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também nós queremos referir de forma positiva a circunstância de a actualização do artigo 71.º significar uma consciência acrescida em sede constitucional em relação à problemática da deficiência. Esta é encarada agora não na lógica de que um cidadão com deficiência é, necessariamente, um deficiente, porque, nesse plano, porventura, todos nós seríamos cidadãos deficientes, mas, sim, na de reconhecer que qualquer cidadão pode ser portador de uma qualquer deficiência. É essa realidade complexa, na dimensão de qualquer um, que deve ter adequado acolhimento em sede constitucional.
Não sabemos ainda se a utilização do conceito de "cidadãos portadores de deficiência" é a melhor solução. Creio que devemos ponderar sobre se, na redacção final. optaremos pelo conceito de "cidadão portador de deficiência" ou simplesmente "cidadão com deficiência". Creio que esta talvez seja ainda a formulação que melhor poderá ser acolhida pelas associações que representam os cidadãos com deficiência.
De qualquer modo, é inegavelmente positivo que a Assembleia tenha manifestado a sua preocupação quanto a esta problemática - que o é -, ao admitir em sede constitucional que é dever do Estado não apenas apoiar cidadãos com deficiência ou portadores de deficiência mas também as suas famílias. A problemática da deficiência não deve ser vista apenas face àquele que dela é portador, uma vez que tem, por vezes, consequências significativas ao nível da vida das respectivas famílias. E o Estado não pode deixar de ter esses aspectos em consideração. Por isso, o alargamento do direito à protecção às famílias que incorporem cidadãos com deficiência é uma aquisição constitucional, a nosso ver, digna de relevo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - O PSD - e ouvimo-lo agora mais uma vez - não parece muito sensível à consagração de um especial direito de participação nas políticas que digam respeito à problemática dos deficientes por parte das respectivas associações. Srs. Deputados, se consagrássemos esta possibilidade em sede constitucional, estaríamos, de alguma maneira, a diminuir, a enfraquecer ou a subalternizar o papel das associações de deficientes na lógica geral dos direitos de participação? Não creio que essa

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interpretação tenha qualquer sentido. Sobretudo, não a terá se verificarmos que noutros domínios de exercício de direitos de natureza económica e social tais direitos de participação já estão ou vão ser consagrados. É assim, por exemplo, quanto às possibilidades de participação na política da saúde, é sobretudo assim ao nível dos direitos dos consumidores, é assim também e vai ser assim relativamente à participação dos cidadãos nas políticas de ambiente. Então, por que não haveria de poder ser assim no que diz respeito à participação das associações de deficientes na elaboração das políticas da respectiva área? Parece-nos. por isso, que o PSD melhor iria se revisse a sua posição.
Quanto ao outro ponto que até ao momento não mereceu acolhimento de dois terços, o que visa conferir ao Estado uma especial obrigação de eliminação das barreiras, em minha opinião. onde se diz "barreiras arquitectónicas" ficaria melhor dizer-se "barreiras físicas", porque, se as barreiras arquitectónicas são expressão de uma barreira física, outras barreiras físicas existem, para além das barreiras arquitectónicas.
Também por isso faço aqui um apelo para que este sinal de verdadeira preocupação pelo direito de cidadania em sentido pleno, inclusive em relação àqueles que são portadores de deficiência, possa ter pleno acolhimento no artigo 71.º. Ou seja - e com isto concluo -, já fizemos positivamente uma parte do caminho; com um pouco mais de boa vontade, faríamos ainda a parte que resta fazer.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer que me parece que este artigo que estamos a discutir é de extrema importância.

Estamos a falar de uma matéria em relação à qual sociedade não tem dado a devida atenção. Os constrangimentos vários que existem em relação aos portadores de deficiências, que os impedem de exercer os seus direitos, são óbvios. Aliás, a Assembleia da República, onde nos encontramos, que é uma Casa a que todos os cidadãos portugueses têm acesso, ela própria cheia de barreiras arquitectónicas, é bem o exemplo da falta de atenção que tem sido dada a esta questão.
Gostaria agora de me pronunciar sobre as nossas duas propostas que estão em discussão e em relação às quais o PSD votou contra e o PP centrou a sua desatenção. Parece-me que são aspectos extremamente preocupantes e em relação aos quais gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados destes dois partidos.
Em relação à primeira questão que a Sr.ª Deputada Fernanda Mota Pinto referiu, ou seja, a participação das associações de deficientes na definição das políticas que lhes dizem respeito, devo dizer que, em coerência, esta é uma proposta que fazemos em todas as áreas. Não entendemos como é que uma sociedade faz os cidadãos, individualmente considerados ou enquanto associações, participarem na vida colectiva e na tomada de decisão se as associações não são ouvidas.
E se, para nós, este é um princípio que deve orientar toda a organização, toda a forma de entender a sociedade e a participação dos cidadãos - e é assim que entendemos uma sociedade onde a democracia participativa não é uma abstracção mas, sim, um exercício de cidadania constante -, por razões acrescidas, ao contrário daquilo que a Sr.ª Deputada disse, parece-me que tem todo o sentido
envolver as associações que visam interesses muito específicos. Não faz sentido que se definam políticas para destinatários, sem que estes sejam parceiros da tomada de decisão e sem que estes, que melhor do que ninguém vivem quotidianamente os problemas, tenham uma palavra a dizer. Julgo que esta é uma questão de bom senso e que o PSD devia rever a sua posição e o PP, que centra tanto a sua opinião sobre a pessoa humana, devia não subestimar, na prática, aquilo que está em jogo nesta proposta.
Em segundo lugar, a questão da promoção gradual da eliminação das barreiras arquitectónicas. Por que é que esta questão se coloca? Não se trata, obviamente, de falar das pessoas portadoras de deficiências como estigmatizadas,
porque todos nós poderemos ser - e, provavelmente, já o fomos ao longo da vida - circunstancialmente portadores de deficiência, e sê-lo-emos, com certeza, porque
todos vamos envelhecer e depararmo-nos com obstáculos ao exercício de um direito, que é o direito de mobilidade.
Efectivamente, o direito de circulação, o direito de mobilidade, não existe para os cidadãos! A forma como
os espaços são concebidos e como todos os equipamentos são construídos não tem em conta que todos somos diferentes, ou definitivamente ou em momentos precisos
da nossa vida. Portanto, o modo como a sociedade se organiza, como os equipamentos estão considerados e como o espaço físico, o espaço arquitectónico, o espaço das escolas, o espaço dos edifícios públicos e o espaço das construções é pensado deve ter em conta esta realidade.
Continuamos, por exemplo, a ter um regulamento de a edificações urbanas da década de 50, que nunca se alterou a este nível, e por isso vemos coisas tão absurdas como o prolongamento do Metropolitano e a criação de novas áreas sem se ter em conta regularmente zonas de acesso, para, através de elevadores, uma pessoa, por exemplo em cadeira de rodas, poder ter autonomia e movimentar-se, coisa que em qualquer outro país não acontece. Portanto, não criamos condições para autonomizar as pessoas portadoras de deficiência física, para lhes dar possibilidade de circularem como os demais cidadãos. É este o sentido da nossa
proposta.
Julgo, tanto quanto tenho acompanhado estas matérias, que o termo técnico que se utiliza é "barreiras arquitectónicas", mas poderemos discutir se há outra designação técnica mais correcta; contudo não será por aqui que nos
fecharemos à questão.
Portanto, o apelo que fazemos ao PP, que sempre se interessou sobre esta matéria, e ao PSD, uma vez que ambos se opuseram a estas propostas, é que considerem esta questão, não como uma questão menor mas, sim, como uma questão que, a ser ultrapassada, enriqueceria, do nosso ponto de vista, o texto constitucional.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero salientar a importância deste artigo e das alterações que nele se introduzem. São alterações no sentido da utilização de um conceito mais correcto, mais abrangente e que, efectivamente, dá melhor resposta às necessidades que este artigo pretende atingir.
O conceito que introduzimos nesta proposta exprime com maior clareza aquilo que se pretende que seja protegido e garantido por uma sociedade que, infelizmente, tantas vezes dificulta uma plena integração, uma plena participação e uma plena concretização dos direitos de todos os cidadãos, nomeadamente dos cidadãos corri deficiência.
Julgo que, nesta altura, é também fundamental dar os parabéns àqueles que nos têm acompanhado nestes trabalhos, demonstrando um interesse e uma vontade de participar e conhecer aquilo que tão importante aqui se discute nestes dias na Assembleia da República, que não é senão de louvar, de assinalar e que nos dá ainda uma maior responsabilidade na concretização de uma série de direitos que muitas vezes lhes são negados.

Vozes do PCP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quero ainda falar, embora não esteja inserida neste artigo, de uma nova alínea do artigo 74.º, que diz respeito ao ensino, onde se dá uma importância muito especial à linguagem gestual portuguesa. A inserção desta alínea no artigo referente ao ensino demonstra também uma inequívoca vontade de se encarar este problema do ponto de vista da integração social, não de um ponto de vista estigmatizante mas, sim, de uma plena integração na sociedade, de uma plena atenção a um problema que é de toda a sociedade, que é da comunidade ouvinte e que é da comunidade surda.
Neste momento. quero também dizer que seria lógico associarmo-nos a esta nova proposta, tanto mais que já apresentámos um projecto na Mesa da Assembleia da República no sentido de garantir uma formação .e o reconhecimento dos intérpretes de linguagem gestual.
Em relação às outras propostas relativas ao artigo 71.º, quero também dizer que é fundamental que se garanta e é um direito acrescido, um direito importante - a participação das associações dos cidadãos que aqui são visados, bem como o caminhar no sentido da eliminação das barreiras arquitectónicas, tanto mais que ainda temos o exemplo muito triste das dificuldades que muitos cidadãos encontram ao deslocarem-se a esta Casa e verem limitados os seus direitos, que não deviam de ter qualquer tipo de limitação ou de cerceamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação ao artigo 71.º, gostava de fazer algumas observações e, desde já, congratular-me com algumas alterações propostas.
Penso que a deficiência é talvez uma das áreas mais a descoberto em Portugal. O que se tem feito pelos deficientes e pela área da deficiência está muito aquém daquilo que precisa ser feito. Por conseguinte, este artigo, de alguma forma. tenta reforçar a protecção e o esforço no sentido de uma efectiva igualdade de direitos e de oportunidades em relação aos portadores de deficiência.
A primeira coisa que gostaria de acentuar, como muito satisfatória, é a ideia de que a deficiência não é estática e, por isso, existem diferentes graus e, eventualmente, diferentes tipos de adaptação e que todos eles podem e devem ser considerados. Portanto, não há uma política uniforme em relação à deficiência, há uma possibilidade, através dessa política, de que o deficiente, conforme o seu grau de deficiência, possa ter ou uma quase integração na vida normal ou, então, uma não integração, mas nem por isso uma vida que não esteja dentro dos parâmetros possíveis, uma vida feliz e uma vida digna.
A segunda questão com que me congratulo é a do apoio às famílias. Obviamente que as famílias, quando existem, são o principal amparo de um ser deficiente e é sobre elas também que recai grande parte da carga e da dureza da deficiência.. Portanto, começarmos a considerar a necessidade de políticas dirigidas às famílias é, do meu ponto de vista, um grande passo em frente.
Agora, em relação às duas propostas apresentadas, uma de substituição e outra de aditamento, quero dizer o seguinte: obviamente que é positivo e saudável que as associações de deficientes participem na definição das políticas que lhes digam respeito, mas interrogo-me se isto tem de ficar na Constituição. Penso que ainda muito recentemente tivemos um exemplo com a questão do ensino inclusivo. Ninguém quis ouvir as famílias dos deficientes! E ninguém ouviu as famílias dos deficientes porquê? Porque não havia uma proposta de substituição? Não! Porque o espírito do poder ainda é contrário a isso! Esta é a minha opinião, porque, na altura, tive oportunidade de contactar corri famílias de crianças deficientes, perfeitamente assustadas com a questão do ensino inclusivo, e o que vejo é que, realmente, não houve por parte do Governo essa preocupação.
Tenho sempre grandes dúvidas sobre se a inclusão na Constituição destas medidas é, em si mesmo, eficaz. Penso que o que seria eficaz era realmente que houvesse na cultura e, concretamente, na cultura do poder a ideia de que estas consultas são importantes.
Em relação às barreiras arquitectónicas, a mesma coisa, porque, na realidade, em relação ao ensino inclusivo não se pôs sequer a questão de saber se as escolas do ensino regular estão preparadas para receber estas crianças, e não estão, e uma das razões por que não estão são as barreiras físicas, já não falo apenas das arquitectónicas. Estamos a pensar em acessos e noutras situações de carácter físico que impedem esta integração.
Portanto, julgo que compete ao Estado, mas compete também à sociedade em geral, aos agentes económicos e aos agentes sociais, a eliminação destas barreiras. E vejo que o próprio Estado dá muito mau exemplo, quando, na realidade, numa medida concreta, como esta do ensino

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inclusivo, não tem sequer o cuidado de perceber que a maioria das suas escolas não está preparada arquitectonicamente para receber os deficientes.
Costumo chamar a estas medidas de carácter analgésico, que podem ter o efeito de nos fazer passar a dor, mas não têm, com certeza, o efeito de curar a doença.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar às alterações relativas ao artigo 72.º. que se refere ao meu nível etário. Espero que façam uma boa discussão, porque estarei particularmente atento.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, depois da sua observação, fico constrangido de intervir. Não creio que a sua liberdade e a sua autonomia pessoal estejam, de alguma forma, limitadas, pelo contrário.

O Sr. Presidente: - É uma grave responsabilidade que impende sobre si.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, julgo que é significativa esta proposta de alteração do n.º 1 do artigo 72.º, não só por aquilo que representa materialmente em termos de garantia de direitos pessoais das pessoas mais idosas - e nesta revisão constitucional tivemos oportunidade de consagrar o direito ao livre desenvolvimento da personalidade e tenho de reconhecer que o direito é extensivo ao livre desenvolvimento e à manifestação da personalidade em todos os momentos da nossa vida, incluindo nesta fase -, mas também por haver aqui uma particularidade, que deve ser salientada. É que esta proposta de alteração chama, apesar de tudo, a atenção para a circunstância de hoje, guando falamos de direitos económicos e sociais e do que são as tarefas fundamentais do Estado, isto é, quando falamos daquilo que são as prestações que o Estado tem de assegurar para satisfazer estes direitos, termos de ter cada vez mais a noção de que nem tudo são rosas. Isto é, a actuação do Estado nesta matéria não é sempre constitutiva de direito, não há aqui uma oposição, como se pensou em tempos, tão clara entre a administração constitutiva e a administração agressiva, porque frequentemente temo-nos deparado com situações em que, a propósito da garantia de direitos económicos e sociais, somos forçados a estabelecer garantias de direitos pessoais. Significa isto que também se pode sofrer prestações e nesse sentido também as prestações podem ser cerceadoras da liberdade individual dos cidadãos. Já há pouco, quando tratámos do planeamento familiar, tivemos a preocupação de, ao mesmo tempo que garantimos uma prestação do Estado e um direito económico e social, estabelecermos uma garantia e uma reserva da esfera da liberdade individual do cidadão e penso que nesta matéria também tivemos esta preocupação ao estabelecer a garantia do respeito pela autonomia pessoal dos idosos. Significa isto que temos de ter a consciência de que há, de facto, um limite difícil de estabelecer entre aquilo que é assegurar direitos económicos e sociais, sem que isto possa de alguma forma agredir a esfera jurídica e a esfera individual de cada um de nós.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por terminado o debate das alterações relativas ao artigo 72.º.
Para iniciar a discussão das alterações relativas ao artigo 73.º, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os artigos 73.º e 74.º referem-se à educação, cultura e ciência e ao ensino, respectivamente. São artigos particularmente relevantes, quer no texto constitucional, quer na vida social, e o texto que nos é proposto pela CERC traz benfeitorias significativas para o texto constitucional.
Devo confessar, no entanto, Sr. Presidente, que o PSD teria desejado que se pudesse ir mais além e para isso propôs uma arrumação diferente e a criação de artigos novos, de forma a valorizar opções e a consagrar valores que, na nossa opinião, deveriam estar plasmados no texto constitucional. Constatámos aí que a paixão de que alguns se arrogam no exercício do poder executivo nesta área foi menos sentida ao elaborar as alterações ao texto da Lei Fundamental. Mas ainda temos esperança de que maiorias que não se conseguiram obter em sede de Comissão Eventual para a Revisão Constitucional possam agora obter-se após a discussão no Plenário ela Assembleia da República.
Desde logo, no n.º 1 do artigo 73.º, onde na actual Lei Fundamental está referido que "Todos têm direito à educação e à cultura", na opinião do PSD deve integrar-se também o ensino, ou seja: "Todos têm direito à educação, ao ensino e à cultura". Porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se é verdade que a educação não se confunde com o ensino, não é menos verdade que o ensino é a materialização mais objectiva e mais relevante da educação. Não faz sentido, em termos teóricos, falar no acesso à educação .sem falar no acesso ao ensino.
Assim, faz todo o sentido que logo no primeiro artigo que fala da educação, cultura e ciência seja claro no nosso texto da Lei Fundamental que todos devem ter direito ao ensino. Daí a proposta feita pelo PSD, que não obteve a maioria de dois terços necessária na CERC, mas que gostaríamos que viesse a obter aquando da sua votação em Plenário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação ao n.º 2 do artigo 73.º, Sr. Presidente, dirão alguns que são apenas palavras. Para nós não são, são valores muito importantes. Se compreendemos que, em 1976. a tradução de educação seria mais teórica e que havia um conjunto de princípios circunscritos ao sistema de ensino que deveriam estar consagrados na Lei Fundamental, hoje esta Assembleia e o País em geral sabem bem que há dimensões do sistema educativo que não se esgotam no sistema de ensino.

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Ainda há pouco tempo, na presente legislatura, esta Assembleia da República, por expressiva unanimidade, aprovou a Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar, consagrando a ideia de que nesta primeira etapa do sistema educativo, entre os três e os seis anos, a criança obtém um conjunto de aprendizagens que são relevantes para o sucesso de aprendizagem ao longo do sistema de ensino. Um bom sistema de educação pré-escolar facilita o sucesso educativo ao nível do sistema de ensino. E, portanto, faz menos sentido que um conjunto de valores, de objectivos e de exigências que o texto da Lei Fundamental consagrava apenas para o sistema de ensino se não repercuta agora na parte da educação, porque faz todo o sentido que assim seja. Valores como o da igualdade de oportunidades, o da superação das desigualdades económicas, sociais e culturais e o do desenvolvimento do espírito de tolerância, de solidariedade e de responsabilidade não podem ser circunscritos apenas ao sistema de ensino, têm de ser encarados como linhas mestras de todo o processo educativo, com tradução na actividade educativa em geral, desde logo naquela que a Assembleia da República já regulou em sede de lei ordinária. Estas alterações, ao nível do n.º 2 do artigo 73.º, foram já consagradas, e, a nosso ver, bem consagradas.
De uma forma geral, estes princípios, que são traduzidos no artigo 73.º, Sr. Presidente e Srs. Deputados, são continuados no artigo 74.º, e permitam-me que, desde já, refira três aspectos de forma sucinta.
Em primeiro lugar. a ideia de que é uma responsabilidade do Estado desenvolver um sistema geral de educação pré-escolar. Sabendo responder às tentativas de estatização, de limitar ao sector público esta rede, a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional foi, a nosso ver, bem, na linha de que é responsabilidade do Estado desenvolver o sistema geral de educação pré-escolar, onde deve co-existir uma intervenção do Estado mas também uma intervenção do sector privado e cooperativo e das instituições de solidariedade social, a par das intervenções que possam ser apoiadas não apenas pela administração central mas também pela administração local.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, como aqui já foi referido, a propósito de outro artigo, pelo Sr. Deputado Bernardino Soares do PCP, a ideia de que os cidadãos portadores de deficiência e a relevância da educação especial, que já mereciam tradução constitucional, foram significativamente reforçados no texto da Lei Fundamental, o que é uma mais-valia que a todos nesta Assembleia deve motivar e que, para além da sua consagração no texto da Lei Fundamental, todos desejamos que possa e deva ser traduzida quer em actos de legislação ordinária quer numa maior atenção do poder executivo no reforço desejável e necessário da educação especial no nosso país.
Em terceiro lugar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, houve um conjunto de outras propostas mais sectoriais que, a despeito de terem relevância nas preocupações colectivas, em nossa opinião, podem não justificar a introdução no texto da Lei Fundamental, porque aqui também tem de haver uma preocupação de equidade, no sentido de o texto da Constituição ser um todo global e coerente e de não fazer opções desajustadas. Recordo que haveria, da parte de alguns grupos parlamentares. propostas para fazer relegar no texto da Lei Fundamental opções e preocupações no sistema de ensino que, a despeito de serem, a nosso ver, preocupações importantes em sede de lei ordinária, não fariam muito sentido serem constitucionalizadas, ou, então, teríamos de constitucionalizar tudo, não só as propostas pelo Partido Socialista mas também as que, em sede de Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, foram propostas por Deputados do Partido Social Democrata e de outros grupos parlamentares.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, à laia de conclusão, e a despeito de, na opinião do PSD, se poder ter ido mais longe na consagração de princípios quer sobre as responsabilidades do Estado relativamente ao sistema educativo, quer no que diz respeito às linhas orientadores do acesso ao ensino e à política de ensino, não deixa de ser claro, pelo confronto dos textos que temos perante nós, que aquilo que foi aprovado, em sede de CERC, com a maioria de dois terços, e alguns dos preceitos por expressiva unanimidade, traduzem benfeitorias no texto da Lei Fundamental, que a todos deve orgulhar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: - É evidente que as propostas aprovadas em sede de CERC no que se refere às melhorias relativas ao artigo 73.º da Constituição introduzem alguns saltos qualitativos, que não podem deixar de ser aqui relevados ....

Vozes do PCP e do Deputado do PS José Magalhães: - Muito bem!

O Orador: nomeadamente a necessidade de a criação e investigação científicas serem claramente apoiadas pelo Estado, salvaguardando embora - e este
"embora" é apenas enfático e não mais do que isso - a respectiva liberdade e autonomia, o reforço da produção e a articulação entre as instituições científicas e as empresas.
Devo dizer. no entanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, reconhecendo embora a mais-valia entretanto adquirida em sede da CERC. algumas nuvens continuam a toldar o horizonte concreto destas novas aquisições e chamo a atenção dos Srs. Deputados para o que se está a passar neste momento nesta Casa no que se refere às alterações da Lei de Bases do Sistema Educativo e também à nova proposta de lei de financiamento do ensino superior público, cuja discussão, em sede de especialidade, será brevemente iniciada. Isto porque, salvaguardando embora - e quero deixar isto bem claro, em nome do meu grupo parlamentar - aquilo que nos parece ser urna clara melhoria do artigo 73.º, não esquecermos, no entanto, que,

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por via das leis especiais ou mesmo da própria legislação ordinária, se corre o risco de bonitas palavras como "a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais", tendo em vista a democratização da educação e do ensino (e estaremos atentos no que aí se refere), serem, na prática, cerceadas por conceitos como "as propinas" ou "a diminuição da exigência" no que se refere à formação dos docentes e, de uma maneira ou de outra, acabarmos por não cumprir não só o que está consagrado na actual, e ainda vigente, Constituição da República como também o que está agora em gestação, no que se refere a algumas alterações, que acaba, em última análise, por verse traída em sede de lei especial ou de legislação ordinária.
Não queremos deixar de acentuar aqui esta componente, tanto. mais que - e veremos isto mais adiante, quando analisarmos o artigo 74.º - corremos o risco de "a superação das desigualdades económicas", consagrado no artigo 73.º, acabar por ser viciada se não forem aceites conceitos como o da "educação pré-escolar gratuita". Porém, voltaremos a isto quando discutirmos o artigo 74.º.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação a este artigo 73.º, quero simplesmente sublinhar as melhorias contidas no n.º 2 deste artigo ao enfatizar-se "a igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais", assim como a importância do "desenvolvimento da personalidade e do espírito de tolerância, de solidariedade e de responsabilidade", o que, de forma implícita, suscita uma questão, que, seguramente, terá de ser suscitada noutro contexto e noutra sede, que é a da necessidade cada vez mais premente de a educação para a cidadania ser devidamente valorizada e reforçada no sistema de ensino no nosso país.

Vozes do PS:'- Muito bem!

O Orador: - Mas também quero sublinhar a importância das melhorias inseridas no n.º 4 deste artigo no que se refere a uma nova concepção da política científica, na medida em que se pretende consignar não só a liberdade e autonomia das instituições onde essa investigação científica tem lugar e é criada e onde nasce a inovação tecnológica e precisa de ser fomentada como também a necessidade de articulação entre as instituições do Estado e as empresas, num processo que garanta a dinâmica no desenvolvimento tecnológico de que o nosso país tanto necessita.
Que fique consignado nesta Constituição uma perspectiva não meramente estatizante de investigação e de criação científica e desenvolvimento tecnológico é facto que merece ser devidamente realçado e sublinhado aqui, neste Plenário.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, tinha pedido a palavra mas era para pronunciar-me sobre o artigo 74.º e creio que ainda não chegámos lá. Ou o Sr. Presidente pôs os artigos 73.º e 74.º à discussão conjunta?

O Sr. Presidente: - Não, não.

O Orador: - Então, reservo a minha intervenção para a discussão do artigo 74.º.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar na discussão das alterações relativas ao artigo 74.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por fazer uma observação.
A consagração, no artigo 73.º, da finalidade da "educação, realizada através da escola ou de outros meios formativos" no sentido da superação das desigualdades sociais e culturais quer parecer-me que acaba por "engolir" a mesma expressão que existe no n.º 2 do artigo 74.º, na redacção que subsiste e que, tal como o artigo, vem da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Quer parecer-me, como já nos parecia originariamente, que o texto constitucional ganharia com a supressão desta expressão no n.º 2 do artigo 74.º. Mesmo para quem entende que esta expressão é necessária nalgum dos artigos relacionados com a educação e com o ensino, é óbvio que ela será mais ampla, mais vasta e mais profunda tal como está consagrada no texto do artigo 73.º, em que se abrange todo o mundo da educação, dá cultura e da ciência, do que tal como está, e subsiste, no artigo 74.º em que se restringe apenas ao sector do ensino.
Portanto, quer parecer-nos, em primeiro lugar, que a economia do texto constitucional ganharia com a supressão desta expressão no artigo 74.º, já que ela vem consagrada no artigo 73.º.
Em segundo lugar, parece-nos, até por esta "vaga" no texto que acabo de sublinhar, que seria útil, em termos de valor acrescentado ao texto do artigo 74.º, n.º 2, estabelecer claramente como uma das finalidades do ensino o conhecimento da cultura, da história e da língua portuguesa. Já tivemos oportunidade de exprimir esta nossa preocupação a propósito de um artigo discutido neste Plenário e a mesma radica na nossa concepção de que o ensino e a educação são sectores sociais da maior relevância e não podem apátridas, pelo que, num mundo com as características deste em que vivemos, ganha maior premência uma preocupação com a salvaguarda dos valores da identidade nacional, a promoção dos factores positivos de diferenciação do povo português relativamente aos outros povos. Ao fim e ao cabo, isso resume-se à transmissão, pelo sistema de ensino e pelo sistema educativo, da cultura, da história e da língua portuguesa.
Continuamos a defender que o texto constitucional ganharia muito com uma explicitação deste objectivo, fosse

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em sede do artigo em que já apresentámos uma proposta nesse sentido seja agora, no n.º 2 do artigo 74.º.
Por outro lado, não queremos deixar de manifestar a nossa estranheza pela recusa da supressão da actual alínea e) do artigo 74.º. Nesta alínea dispõe-se que é finalidade da política de ensino o estabelecimento progressivo da gratuitidade em todos os graus de ensino.
Para além de ser uma ilusão a existência de graus de ensino gratuitos, aliás, desmentida pela prática, não há graus de ensino gratuitos, quando muito, pode haver diferenças sobre quem e como se paga. Como dizia, descontando esta pequena precisão - vamos admitir por instantes que há graus de ensino gratuitos -, mesmo assim, não se compreende como dois partidos que, apesar de terem modelos diferentes, têm defendido propinas para o ensino superior podem consentir na subsistência desta disposição constitucional cuja dinâmica e cuja gramática indiciam que o objectivo final é mesmo o de que, um dia, nenhum cidadão venha a pagar coisíssima nenhuma em nenhum grau de ensino.
Ora, para nós, é muito estranho que esta alínea do artigo 74.º tenha sobrevivido no acordo de revisão constitucional feito entre o PS e o PSD. Em nossa opinião, sobrevive mal porque quer a prática do PSD quer a do PS são um exemplo prático do incumprimento deliberado deste objectivo constitucional e esperaríamos que esta alínea tivesse morrido nesse acordo, tanto mais que a gratuitidade do ensino básico universal e obrigatório vem garantida logo na alínea a). Portanto, manifestamente, esta alínea tem especial incidência no ensino superior, para o qual, curiosamente, quer o PS quer o PSD defendem o pagamento de propinas.
Assim, esperamos ardentemente que quer o PS quer o PSD cheguem finalmente à conclusão de que é preferível ser-se coerente, mesmo tendo de defrontar o Sr. Deputado José Calçada, do que, porventura, continuarem num estado permanente de incumprimento de uma alínea da Constituição com a qual, como todos sabemos, nenhum daqueles dois partidos concorda, defende ou pratica. Do nosso ponto de vista, ainda bem que assim é, mas o problema é que, depois, não têm a coragem de romper com este mito no texto constitucional, o que nos teria parecido muito saudável do ponto de vista de fazer da Constituição um texto cumprível e respeitado. É que o pior que pode acontecer a uma Constituição, e que, aliás, acontece bastante com a nossa porque é excessivamente programática, é precisamente a contradição com a realidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate feito na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional em matéria de política de educação e de Constituição educacional foi fecundo, profundo, está nas actas e revela que, no essencial, a Constituição tem metas, tem soluções, tem direitos, tem objectivos que são actuais, modernos e adequados. Designadamente. nada na Constituição obsta a reforrmas em curso, pelo contrário pela primeira vez, elas procuram dar um cumprimento adequado ao melhor espírito e ao melhor sentido da própria Constituição. É por isso que não vemos necessidade de alterar o que quer que seja em matéria de enquadramento constitucional, por exemplo, da. imposição de propinas. Nada na Constituição, segundo a leitura do Tribunal Constitucional, impede o nosso projecto. tudo na Constituição impedia o projecto do PSD que, felizmente, foi frustrado. Por isso, a questão não nos preocupa.
No que diz respeito ao artigo 74.º, saudamos as cinco mudanças introduzidas e permitam-me. Srs. Deputados, que saliente com especial empenhamento uma que levou a Comissão a um trabalho que me foi particularmente saboroso e estimulante. Refiro-me à consagração, pela primeira vez na história constitucional portuguesa ,e, curiosamente, na ordem jurídica interna, de uma norma que visa proteger e valorizar a língua gestual portuguesa "enquanto expressão cultural", diz a nossa proposta, que é um património cultural português e, por outro lado, enquanto ferramenta, enquanto arma, enquanto instrumento que permite a muitos cidadãos aceder à educação e, ainda, conseguirem uma efectiva igualdade de oportunidades num contexto em que há um elemento sensorial em que, por qualquer razão, em qualquer momento da vida, ocorreu uma interrupção do normal funcionamento de faculdades de que todos devemos poder fruir. Neste sentido, a linguagem gestual portuguesa é uma importante realização de uma comunidade de portugueses que faz parte de nós próprios e na qual nos reconhecemos. Foi preciosa a colaboração que tivemos, designadamente da Associação Portuguesa de Surdos, para o trabalho de concepção e redacção desta norma a que chegámos por consenso total na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
Em muitos pontos, o legislador ordinário deverá adoptar posteriormente medidas específicas de protecção e de valorização da linguagem gestual. É preciso tratar da uniformização e da padronização, é necessário tratar dos dicionários, das enciclopédias, dos elementos de divulgação, é necessário divulgar a linguagem gestual na televisão. É normal que as transmissões televisivas tenham. mais do que actualmente, um acompanhamento e uma tradução em linguagem gestual. É natural que a própria Assembleia da República, agora que vai ter um canal televisivo parlamentar, adopte medidas que, com a colaboração das entidades representativas apropriadas, permitam que a linguagem e a vida parlamentar tenham também uma tradução em linguagem gestual. Tudo isto é possível, mas tudo isto passa a ser encorajado por esta norma constitucional.
Assim, Sr. Presidente, congratulamo-nos com isto, especialmente por ter sido possível atingir o consenso, e sublinhamos que este é apenas o princípio, o momento relevante de uma longa tarefa em que a Assembleia da República, o Governo e os outros órgãos de soberania, incluindo as autarquias locais, têm um importante papel a desempenhar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

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A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero referir-me à proposta da protecção e valorização da linguagem gestual que gerou consenso em sede da CERC e que me parece uma medida extremamente positiva a incorporar na Constituição.
Outro aspecto que quero sublinhar e que Os Verdes valorizam particularmente no texto constitucional é o de uma nova alínea que surgiu que, no fundo. resulta de uma proposta apresentada pelo projecto constitucional de Os Verdes, embora com uma formulação diferente mas com idêntico objectivo político. Trata-se da alínea que visa "Assegurar aos filhos dos imigrantes apoio adequado para efectivação do direito ao ensino".
Esta é uma questão que, repito. nós próprios tínhamos proposto no nosso projecto de revisão constitucional, embora com redacção diferente, tendo sido mesmo a nossa a única proposta que visava especificamente este universo. Portanto, ventos com agrado que, embora reformulada, a nossa ideia está contida na proposta que agora sobe a Plenário e que foi aprovada em Comissão com maioria qualificada.
Julgamos que esta é uma questão extremamente importante pois, seguramente, não pode haver uma integração harmoniosa dos imigrantes na sociedade portuguesa se, ao nível do ensino, não houver a garantia de que os filhos desses imigrantes vão ter uma adequada integração. Como é óbvio, isto significa que a escola deve ter condições para valorizar as culturas destas comunidades étnicas ou de imigrantes, tendo em conta as preocupações destes jovens que, em particular na Área Metropolitana de Lisboa, tem hoje urna expressão extremamente significativa na população estudantil - é bom lembrar que no ensino básico, na Área Metropolitana de Lisboa, 1/4 das crianças são filhas de imigrantes.
Equacionar e fazer reflectir este problema, nestes termos, no texto constitucional é uma benfeitoria com que Os Verdes se congratulam. É, pois, com agrado que constatamos que os outros partidos também tomaram como sua esta preocupação.
Quero ainda dizer algumas palavras acerca da proposta de alteração de Os Verdes que não foi acolhida nem subiu a Plenário. É certo que a matéria de que ela se ocupa, a educação sexual, já aqui foi abordada, embora de modo diverso, aquando da discussão de um outro artigo da Constituição. É que, independentemente do direito ao planeamento familiar que é introduzido no texto constitucional, julgarmos que a escola tem um papel importante junto dos jovens para ajudar a cumprir alei no que diz respeito à educação sexual.
Esta é uma vertente que nos parece fundamental numa perspectiva de saúde pública e de desenvolvimento equilibrado dos cidadãos; contudo, ela tem sido ignorada, em absoluto, pela escola. Lamentamos, por isso, que a proposta de alteração de Os Verdes não tenha merecido vencimento.
De algum modo, os valores da educação para a paz, para a tolerância, que estavam contidos numa outra proposta de Os Verdes que também não mereceu acolhimento, deveriam ser uma preocupação, identificada desta forma ou, então, como valores da cidadania.
Parece-me, contudo, que a escola tem outros saberes, outros valores e outra responsabilidade de veicular uma atitude e um olhar diferente sobre o outro em relação ao que nos envolve, quer do ponto de vista cultural, quer do ponto de vista do respeito pelas outras comunidades, grupos étnicos ou religiosos e, no fundo, sobre todos aqueles que são diferentes de nós. Ora, julgamos que essa vertente do ensino que complementa os saberes tradicionais não tem sido suficientemente aprofundada e por isso ganharia o texto constitucional com a nossa formulação ou qualquer outra que reflectisse essa preocupação.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para urna intervenção. tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Reconhecemos que o texto do artigo 74.º saiu da CERC com algumas melhorias significativas, umas resultantes de propostas concretas de um ou de outro partido, outras de algumas propostas entretanto consensualizadas. Todavia, devo dizer que se ficou muito aquém do que nos parecia necessário, nomeadamente no que se refere à educação pré-escolar.
Neste domínio, o PCP apresentou uma proposta de alteração que, a seu tempo, será votada, pois entende que a proposta de alteração à alínea b) do n.º 3 do artigo 74.º, na redacção da CERC, é manifestamente insuficiente. A formulação "Criar um sistema público e desenvolver o sistema geral de educação pré-escolar" é excessivamente generalista e não corresponde a urna necessidade objectiva do nosso país, das nossas famílias, do nosso povo, no sentido de, tal como afirmamos na nossa proposta, "Criar um sistema público de educação pré-escolar universal e gratuito". Repito: universal e - enfatizo - gratuito!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, e sem me querer alongar sobre as necessidades de natureza científica que subjazem a esta nossa proposta - há vários estudos que apontam que, muito provavelmente, tanto quanto é possível dizê-lo. o sucesso escolar das nossas crianças, em níveis etários mais elevados, o seu sucesso educativo e, mais tarde, o seu sucesso social derivam, em grande medida, da existência de uma educação pré-escolar -, deixando este aspecto de parte, tendo em atenção a componente não apenas educativa mas social da educação pré-escolar, bem como que vivemos num país, é bom deixar este ponto bem claro, em que 25% da população vive abaixo dos limiares de pobreza aceites como extremamente baixos a nível da União Europeia, não faz, de todo em todo, sentido que não tenha sido aceite na CERC a criação de um sistema público de educação pré-escolar universal e gratuito. A não ser que outros partidos, nomeadamente o PS e o PSD. entendam que "de pequenino é que se torce o pepino" e. neste domínio, talvez não fosse má ideia introduzir uma propina. uma taxa, um pagamento - chamem-lhe o que quiserem -, isto é, a não gratuitidade a nível da educação pré-escolar!

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Isto é, as crianças, desde pequeninas, habituar-se-iam à ideia de que, mais tarde, acabariam por pagar uma propina, e nada melhor do que começar a pagá-la desde logo, a partir dos três anos! Embora, certamente, não com esse nome. Enfim, o problema não é o nome mas a "coisa"!
Neste quadro, entendemos que a não adopção da gratuitidade na educação pré-escolar é um péssimo princípio e não se apresenta senão como uma tentativa, em última análise. de seguir aquele velho sistema segundo o qual quem quer saúde paga, quem quer educação paga e, enfim, quem quer o que quer que seja, paga!
Permitam-me. também, fazer uma outra referência que me parece importante e que tem a ver com a necessidade - passe a imodéstia - de "puxar a brasa à nossa sardinha", isto é, puxar para o Grupo Parlamentar do PCP a necessidade de enfatizar a coerência entre palavras e actos. Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou nesta Casa um projecto de lei que define as condições de acesso à profissão de intérprete de língua gestual. Parece-me que devemos enfatizar esta componente concreta, na medida em que pela primeira vez, nesta Casa e na ordem jurídica portuguesa, é apresentado um projecto desta natureza.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto é, não nos limitámos, também aqui, a votar favoravelmente a alínea f) do n.º 3 do artigo 74.º, com a qual estamos substancialmente de acordo, preocupámos em passar para o concreto o resultado desta nossa votação, pois entendemos que é assim que as coisas fazem sentido, sob pena de a Constituição da República ser - e não queremos que o seja - um amontoado de boas intenções que depois correm o risco de não se verem concretizadas na lei ordinária e em actos concretos da lei ordinária.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção vem no sentido de justificar e apoiar a proposta de aditamento de uma nova alínea ao artigo 74.º, ele forma a ficar garantido o ensino artístico na Constituição.
Esta questão tem a ver com um problema de que padecemos no nosso país. Refiro-me ao analfabetismo cultural, que também se poderá designar de iliteracia artística.
Com efeito, o lugar que ocupa o ensino artístico no sistema ele ensino de um país determina, em nosso entender, o seu nível de desenvolvimento cultural, medindo-se este não só pelo, grau de investimento político e material na salvaguarda do que constitui a riqueza nacional no domínio das artes e do património histórico mas também, ou sobretudo, pela forma como as pessoas estão e são preparadas para, elas próprias. praticarem a arte ou, pelo menos, para a fruírem e viverem como necessidade de realização pessoal.
Poder-se-á dizer que é por esta questão do ensino artístico e do relevo que lhe é ou não dado que passa a questão elo desenvolvimento cultural das pessoas. E há ainda que distinguir a concepção de uma política cultural indissociada da componente educativa, como a que é praticada em geral, e em especial nos países nórdicos, daquela outra, e seja-me permitido chamar-lhe modelo francês de política cultural, majestática, cheia de panais, por vezes de muito can-can e de granas travaux, como a que foi praticada, em certa medida, por Jacques Lang.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Na nossa realidade nacional, evidentemente, é o chamado modelo francês que. à nossa dimensão, hábitos. originalidades e idiossincrasias, tem exercido maior influência. Explica-se, assim. o facto de, até hoje, o ensino artístico continuar a constituir uma realidade fluída, esparsa e inoperante no nosso sistema de ensino e de sucessivos governos se acomodarem a este facto por ineficácia ou ausência de visão estratégica.
Talvez se se lhe der dignidade constitucional, o ensino artístico possa vir a obter dignidade idêntica a outras componentes do. sistema de ensino, em conjunto com uma política cultural entendida em profundidade, de forma a contribuir, de facto, para o desenvolvimento cultural do País e dos portugueses.
Eis, pois, Sr. Presidente, no essencial, as razões que nos levam a propor e a defender este aditamento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, tinha pedido para usar da palavra, na sequência da intervenção do Sr. Deputado José Calçada, para responder a algumas questões que levantou, mas a intervenção do Sr. Deputado Fernando Pereira Marques oferece-me o seguinte comentário breve.
Primeiro, o PSD sempre foi defensor da vertente do ensino artístico nas preocupações gerais do sistema de ensino: Não é isso que está em causa, tal como não está em causa, seguramente, o empenho que o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques e a bancada do PS colocam na mesma questão. O problema que se põe é o de saber se faz sentido valorizar apenas essa vertente no texto da Lei Fundamental.
Na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional propusemos, entre outras soluções, também o aditamento da vertente mais profissionalizante e da dignificação constitucional das vias tecnológico-profissionais.

O Sr. Luís Marques Gudes (PSD): - Bem mais importantes!

O Orador: - O que é facto é que essa proposta não foi aprovada com o pretexto de que a Constituição não deveria descer a esse pormenor. Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se a Constituição não deve descer ao

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pormenor para uns casos, também não o pode fazer para outros casos! Não podemos verter no texto da Lei Fundamental preocupações relativamente a componentes importantes do sistema de ensino, marginalizando, esquecendo, secundarizando e desconsiderando outras vertentes, porque isso, sim, é que seria introduzir desequilíbrios na maneira como o Estado, como os cidadãos e como o nosso enquadramento jurídico entende todo o sistema de ensino e as suas diferentes vertentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, protestando o nosso apoio à valorização da componente do ensino artístico no conjunto do sistema de ensino português, entendemos que, no texto da Lei Fundamental, ou temos uma abordagem coerente e equilibrada de todas essas vertentes ou, então, o melhor é não fazermos referências de excessivo pormenor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado José Calçada referiu-se à questão da gratuitidade em termos que devem merecer uma resposta. porque o Sr. Deputado José Calçada estabeleceu deliberadamente uma confusão. E digo deliberadamente porque não foi mais do que um porta-voz de uma posição que foi sempre a do PCP, pelo que também não podermos deixar de fazer homenagem a essa coerência.
Mas o que é verdade é que há urna grande diferença entre a escolaridade obrigatória universal e gratuita e a educação pré-escolar.
Desde logo, porque, como é bom de ver, tudo aquilo que é escolaridade obrigatória não pode deixar de ser gratuito. Se o Estado, por via jurídica, compele, e bem, os cidadãos a frequentarem a escolaridade obrigatória, deve oferecer gratuitamente os meios para que os cidadãos o possam fazer. Isso é evidente e não merece nenhuma discussão, sob o ponto de vista conceptual ou doutrinário.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Agora, a educação pré-escolar não é obrigatória! Sei que há quem defenda essa solução, mas não é o nosso caso. Não entendemos que se devam obrigar as famílias a prescindir dos seus filhos, entre os 3 e os 6 anos, para entregá-los a outras entidades, sejam elas do Estado ou de fora do Estado. Não há aqui uma obrigatoriedade, não deve haver obrigatoriedade! Somos, isso sim, a favor da universalidade, somos a favor do princípio de que devem ser criadas condições para que, se o desejarem, todas as famílias possam ter as suas crianças, entre os 3 e os 6 anos, em estabelecimentos de educação pré-escolar.
Mas o Sr. Deputado José Calçada também não ignora que a educação pré-escolar contém duas componentes completamente diferentes, uma componente educativa e uma componente não educativa, que designámos, por facilidade, de "guarda das crianças". E, se relativamente à componente educativa, todos entendemos, Sr. Deputado José Calçada, e este "todos" significa todos, embora alguns com um bocadinho mais de esforço, depois de alguma pressão, mas, como dizia, se todos entendemos que a componente educativa devia ser gratuita - e tanto o entendermos que, a despeito de algumas resistências iniciais, o consagrámos na lei-quadro da Educação Pré-Escolar, que acabámos por aprovar por unanimidade -, também compreendermos que, na componente social, de "guarda das crianças", não faz sentido essa gratuitidade, porque estamos a falar de um apoio social, porque estamos a falar de famílias cujos pais e mães trabalham e que, para lá da carga educativa, precisam de ter alguém que tome conta das suas crianças. E aqui, Sr. Deputado José Calçada, sob o ponto de vista do apoio social, ternos de ser justos, e ser justos não é assegurar a gratuitidade a expensas do Estado, a expensas dos contribuintes, de igual modo para todos. As famílias que podem pagar devem pagar e as que não podem pagar devem ter apoio por parte do Estado. Aquilo que é justo é apoiar quem precisa e não apoiar todos por igual, aquilo que é justo não é sobrecarregar o contribuinte com o pagamento do apoio social de igual forma para todos. Isso não faz sentido, isso não é justiça, isso é urna gratuitidade demagógica! Compreendo que, por necessidade de discurso político, o PCP continue a agarrar-se a essa ideia, mas, em nome dos princípios, Sr. Deputado José Calçada não pode, sustentadamente, defendê-la.
Portanto, Sr. Presidente Srs. Deputados, à laia de conclusão, em nosso entendimento, aquilo que era importante salvaguardar, que é a gratuitidade da componente educativa do pré-escolar, já está expresso em lei. A gratuitidade de todo o pré-escolar não faz sentido, não é justa, não deve ser constitucionalizada.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Coelho, ouvi com atenção as suas últimas palavras e toda a sua intervenção tem pleno cabimento no que diz respeito ao problema da progressiva gratuitidade de todos os graus de ensino.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isto não é um grau de ensino!

O Orador: - Isto tem a ver com aquela alínea de que falei há pouco, cujo incumprimento, por parte dos partidos que fizeram um acordo de revisão, pelos vistos, ninguém parece notar.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O pré-escolar não é ensino!

O Orador: - Quero perguntar ao Sr. Deputado Carlos Coelho se entende que é compatível com a defesa de propinas no ensino superior o objectivo constitucional de assegurar progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino. É que, enfim, do PS, normalmente, esperamos todo o tipo de contradições. mas o PSD costuma ter algum

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cuidado a "polir" as suas e, desta vez, parece que não teve. E, sinceramente, não quero que os senhores continuem a fazer a revisão constitucional coma "chaga" das contradições exposta.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, agradeço muito a simpatia e amizade do Sr. Deputado Jorge Ferreira ao fazer-me um pedido de esclarecimentos que me deu mais unta oportunidade de esclarecer o nosso pensamento.
Sossego-o, Sr. Deputado, dizendo-lhe que não há nenhuma contradição. A educação pré-escolar não está no sistema de ensino, a educação pré-escolar não integra o sistema de ensino, o sistema de ensino inicia-se apenas como l.º ano do primeiro ciclo, ou seja, a partir dos 6 anos de idade, pelo que não há nenhuma contradição entre a gratuitidade dos graus de ensino e aquilo que não é ensino, que é educação, que faz parte do sistema educativo mas não faz parte do sistema de ensino. Isto e claro, sob o ponto de vista conceptual e doutrinário, e é claro na lei que aprovámos.
Portanto, se a tentativa do Sr. Deputado Jorge Ferreira era a de evitar que eu caísse em alguma contradição, agradeço-lhe. atas não era necessário, porque não havia nenhuma contradição, pelas razões que acabei de tornar claras.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Não foi isso que perguntei! A "chaga" da contradição é vossa!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É espantoso como se pode usar a lógica que o Sr. Deputado Carlos Coelho utilizou. Se me permite - e é a nossa opinião, como é evidente, não passa disso -, a lógica que utilizou é exactamente contrária àquilo que eu consideraria a lógica natural.
Ora, vejamos, e peço desculpa se vou ser um pouco repetitivo, mas não posso deixar de o ser: o 9.º ano de escolaridade e gratuito, isto é, devia sê-lo - está configurado como devendo sê-lo, embora saibamos que factualmente o não é, mas isso é outra questão -, o 8.º ano é gratuito, o 7.º ano é gratuito, o 6.º ano é gratuito, o 5.º ano é gratuito - peço desculpa, mas tenho de continuar assim -, o 4.º ano é gratuito, o 3.º ano e gratuito, o 2.º ano é gratuito, o l.º ano é gratuito, o antes do 1.º ano, alto lá, aí paga-se. É que o antes do primeiro, o antes do primeiro, que é antes do primeiro, e o antes do primeiro, que é antes do primeiro, que é antes do primeiro, esses, embora antecedendo os, outros, devem ser pagos. E isto sob o magnifico pretexto de que aí não estamos a falar de ensino - imagine-se!... -,estamos a falar de, cito. "educação". Nada mais verdadeiro! O Sr. Deputado Carlos Coelho não disse senão aquilo que é óbvio, porque sabemos que essa componente não é, de facto, a escola, no sentido de ensinar coisas, é, isso sim, ume parte integrante do sistema educativo, embora não do sistema de ensino.
Mas também se refere na Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar, embora a ¡posteriori e não tenha de fazer vencimento aqui - e o Sr. Deputado sabe-o perfeitamente -, que a educação pré-escolar constitui a primeira fase do ensino básico. Também se diz isso! E, embora no plano estritamente científico, a educação seja, de facto, uma coisa e o ensino seja outra, temos a consciência de que, neste nível etário, é mais do que óbvio que a componente educativa da pré-escolaridade obrigatória é decisiva para as crianças que vão integrar a escolaridade obrigatória. E tão decisiva é que não faz sentido que, de uma maneira ou de outra, se veja coarctada a sua frequência, porque é paga até a criança chegar à idade em que deixa de ser paga. Isto, como é óbvio, não faz qualquer sentido!
Quanto a dizer-me que a componente educativa é gratuita e que a componente social ou de apoio, ou de acompanhamento, ou de guarda, enfim, não interessa agora o nome, essa e que pode não ser gratuita, Sr. Deputado Carlos Coelho, o senhor sabe perfeitamente, tão bem quanto eu, que, ao não colocarmos a componente não educativa como gratuita, corremos n risco de impossibilitar a frequência da componente educativa. O senhor sabe isso perfeitamente! E porquê? Porque na educação pré-escolar a componente educativa e a componente não educativa são indissociáveis, são, em bom rigor, duas faces da mesma moeda. Ao potenciarmos o pagamento de uma, estamos, de todo em todo, a potenciar a não frequência da outra.

O Sr. António Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado Carlos Coelho, é a quadratura do círculo! Estamos a falar da realidade social deste país.. não estamos a falar de abstracções, c4ue podem ser muito bonitas no domínio do "livresco" mas não têm nenhuma adequação, em primeiro lugar, às necessidades do País c, em segundo lugar, às realidades do País.
Daí que nos pareça necessário, em sede de Constituição, a mais nobre de todas, garantir a gratuitidade da educação pré-escolar em todas as suas componentes.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Como já gastei, tranquilamente, mais de 80% do tempo que me foi atribuído, não vou poder desenvolver muito esta matéria.
No entanto, quero dizer que não concordo com o que o Sr. Deputado Carlos Coelho afirmou e, embora compreenda, não aceito, como deve calcular, a lógica das posições que assume.
No Capítulo dos "Direitos e deveres culturais", com a proposta que apresentei, pretendo ver assegurada a difusão de um sistema público de educação pré-escolar gratuito. como elemento essencial para o desenvolvimento da

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criança, melhorando-se o preceito constitucional que só considera a criação desse sistema.
Julgamos que este sistema gratuito deve ser adoptado na universalidade do nosso sistema educacional, ao contrário do que diz o Sr. Deputado Carlos Coelho. Espero, realmente, que, cora a argumentação que tem sido aduzida, o PSD altere a posição que assumiu.
(O Orador reviu.)

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vai pedir desculpa!...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, apenas alguns segundos, para desmontar a intervenção que foi feita pelo Deputado José Calçada.
O Sr. Deputado José Calçada disse que o 9.º ano é gratuito, o 8.º é gratuito, o 7.º é gratuito, o 6.º é gratuito, o 5.º é gratuito, o 4.º é gratuito, o 3.º é gratuito, o 2.º é gratuito, o 1.º é gratuito e quando chega ao "-1" tem de ser pago.

O Sr. José Calçada (PCP): - Aprendeu bem!

O Orador: - Nada de mais inverdadeiro, Sr. Deputado José Calçada! O "-1 ", nessa lógica de sistema educativo, é gratuito. E é gratuito porque a componente educativa do pré-escolar é gratuita!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Calçada (PCP): - E a outra?!

O Orador: - Isso é claro, não oferece dúvidas a ninguém! Foi esta Assembleia, na presente legislatura, que o votou e, por isso, nem sequer em nome da fraca memória, o Sr. Deputado José Calçada pode invocar o seu desconhecimento. Foi votado, e há bem pouco tempo, por esta Assembleia!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Depois, o Sr. Deputado José Calçada diz que não é possível ter o pré-escolar educativo sem o pré-escolar "guarda das crianças". E, então, diria o Sr. Deputado José Calçada, "é aqui que a porca torce o rabo"! Diria ao Sr. Deputado José Calçada que é claro que, nesta dimensão da componente social do pré-escolar, nesta componente de "guarda das crianças",...

Vozes do PCP: - A criança paga!

O Orador: - ... o Sr. Deputado só pode ter dois discursos: ou o discurso facilitista e igualitarista de dizer que o Estado deve pagar este apoio social para todos de igual modo - e compreendo esse discurso, mas não o aceito, porque isso significa. como já foi dito hoje neste debate, a propósito de outro artigo, que não há gratuitidade real, porque alguém paga, ou seja, todos os contribuintes pagam a componente social da educação pré-escolar, mesmo das famílias mais abastadas, e não compreendo. como é que um Deputado comunista pede que todos os contribuintes paguem a educação pré-escolar das famílias mais abastadas, é uma noção de justiça social assaz insólita e muito singular -,...

O Sr. José Calçada (PCP): - Essa é uma tese antiquíssima! Do Sr. Silva que aparecia na televisão!

O Orador: - ... ou, então, o discurso de verdadeira justiça social, dizendo que esta função social de "guarda das crianças", este serviço de apoio social deve ser pago, ou comparticipado pelo Estado, no caso das famílias que. economicamente, necessitem deste apoio.
Esta é a nossa posição e foi por isso que discordámos que se constitucionalizasse o absurdo de unia gratuitidade, que, a figurar no texto da Lei Fundamental. seria uma verdadeira injustiça.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E com isto, pela nossa parte, concluo a defesa deste artigo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, após 11 intervenções, que dariam a sugestão de que esta matéria nunca foi discutida entre vós, nem na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional nem antes disso, passarmos à discussão das alterações relativas ao artigo 75.º da Constituição da República.
Estão abertas as inscrições.

Pausa.

Uma vez que ninguém pretende usar da palavra sobre este artigo - compensação justíssima! -, passamos à apreciação das alterações relativas ao artigo 76.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 76.º irá, com certeza, ser aprovado com uma redacção bem melhor do que aquela que hoje tem.
Com efeito, a autonomia das universidades, que está já consagrada, vai ser reforçada com a noção de que a autonomia não é incompatível com um sistema de avaliação da qualidade do ensino que se faz nas universidades. Penso que é de salientar este valor acrescentado porque, com a redacção que vai ser aprovada, ninguém mais ousará afirmar que avaliação é incompatível com autonomia, ou vice-versa, e julgo que, hoje, a sociedade portuguesa sente que a universidade está mais precisada de avaliação do que de autonomia. A autonomia não está em causa nas

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universidades mas todos sentimos que há muito a fazer ainda em matéria de avaliação.
Por outro lado, gostava de referir-me a uma proposta do Partido Socialista, que não acolhemos, no sentido de atribuir idêntico grau de autonomia a outras instituições do ensino superior, que não as universidades. Aí, estamos em desacordo quer com a versão inicial da proposta socialista quer com a versão da proposta que agora foi distribuída e que especifica as instituições de ensino politécnico a quem o Partido Socialista quer assegurar idêntica dignidade que a Constituições atribui às universidades. Nós não temos nada a opor, antes pelo contrário - o PSD fez a lei que atribuiu autonomia aos institutos politécnicos -, mas consideramos que a Constituição não deve consagrar igual dignidade às universidades e a outras instituições do ensino superior.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - As universidades têm uma autonomia quase por direito natural - ainda não havia Constituição e já havia universidades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - As universidades portuguesas são quase tão velhas como a nacionalidade portuguesa. A Constituição não faz mais do que consagrar um princípio que é inerente ao próprio conceito de universidade. O mesmo não se passa com as outras instituições de ensino superior. Por isso, nós defendemos esta separação dos institutos, da universidade e do politécnico.
Por outro lado, o Partido Socialista propôs ainda uma norma com a qual não concordamos e que tem em vista dar autonomia já não às universidades ou aos politécnicos mas também a alguns órgãos dentro das universidades. Ou seja, quer consagrar a autonomia dentro da autonomia. Penso, Sr. Presidente, que esta proposta do Partido Socialista, por bem intencionada que possa ser, iria contribuir para a perda da autonomia das universidades, porque subgrupos de autonomia dentro de instituições que têm autonomia acabam por diluir responsabilidades e fazer perigar a autonomia. Penso mesmo que não faz qualquer sentido falar de autonomia para órgãos porque a autonomia é atribuída às instituições. Os órgãos poderão ser independentes entre si, mas não usufruir de autonomia, que deve ser reservada à universidade e não aos órgãos no interior das universidades. Qualquer das propostas do Partido Socialista, Sr. Presidente, iria tirar clareza e grandeza à norma que está inscrita na Constituição. Queremos consagrada a autonomia das universidades e não mais do que isso, queremos consagrada a autonomia da universidade e não de cada um dos órgãos que estão dentro da universidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, só para dizer que nós mantemos a proposta atinente ao ensino politécnico, assim como a proposta tendente a garantir a autonomia dos órgãos científicos e pedagógicos perante os restantes órgãos das escolas superiores, das universidades e das escolas politécnicas porque, Sr. Deputado Castro Almeida e Srs. Deputados, trata-se de valores extremamente relevantes em relação aos quais o acréscimo da garantia constitucional é significativo. Na falta de uma disposição constitucional, poderá o legislador ordinário estabelecer garantias neste sentido? Muito obviamente. E estaremos preocupados - e assumimos esse compromisso publicamente - em garantir essa autonomia científica e pedagógica contra a ditadura financeira, ou contra a pressão financista, ou contra a intervenção abusiva. Mas a Constituição ganharia com este enriquecimento, e o PSD está contra, mas mal, este enriquecimento.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD):- Não está mal, não!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas fazer um breve comentário relativamente a esta proposta que acaba de ser anunciada pelo Partido Socialista, porque creio que a formulação que vem da CERC, embora com maioria simples mas com o nosso voto, é mais adequada para a realidade que temos. Efectivamente, o subsistema de ensino superior em Portugal não integra apenas universidades e institutos politécnicos na medida em que há escolas do ensino superior não integradas, como, por exemplo, o ISCTE Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, que é uma instituição de nível universitário mas não está integrada em nenhuma universidade nem em nenhum instituto superior politécnico. Portanto, a expressão que vem da CERC, que se refere a "universidades e demais instituições de ensino superior", abrange toda a realidade, enquanto que a formulação "universidades e institutos superiores politécnicos" não integra todo o ensino superior, pelo que parece mais adequada a expressão que vem da CERC.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à discussão das alterações relativas ao artigo 77.º.

Pausa.

Dado que ninguém pede a palavra, passamos à discussão das alterações relativas ao artigo 78.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes.

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente,. Srs. Deputados: A proposta do PSD relativamente ao artigo 78.º contemplava três alterações. Começando pela primeira, da redacção que veio da CERC e não levantou grande polémica, que diz respeito à alínea a) do n.º 2, onde se dizia "Incentivar e assegurar o acesso de todos os cidadãos, em especial dos trabalhadores (...)", optou-se, por razões

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históricas, que hoje já não interessa manter, pela supressão da expressão "em especial dos trabalhadores".
O PSD acrescentava também ao n.º 1 a expressão "e as artes e ofícios tradicionais" depois da expressão "Todos têm direito à fruição e criação cultural, bem como o dever de preservar, defender e valorizar o património cultural". Pensamos que seria uma formulação mais rica e mais abrangente do princípio, mas também temos a noção de que o conceito de património cultural é vasto e rico, pelo que não faremos daí um "cavalo de batalha".
A terceira alteração diz respeito à supressão da palavra "assegurar" constante da alínea a) do n.º 2, que "Incentivar e assegurar o acesso de todos os cidadãos aos meios e instrumentos de acção cultural, bem como corrigir as assimetrias existentes no País em tal domínio.
Nesta matéria, temos de dizer que, no domínio da cultura, o papel do Estado não pode nem deve ser o de assegurar o acesso de todos os cidadãos aos meios e instrumentos da cultura. Não pode por uma razão de impossibilidade material e física, porque é impossível o Estado assegurar o acesso de todos os cidadãos aos meios e instrumentos no domínio da cultura, no domínio daquilo que é intangível. Não deve (e aqui é que é mais grave), porque o papel do Estado no domínio da cultura deve ser o de fomentar as políticas e os modos de todos os cidadãos terem acesso aos meios culturais. O Estado não pode cair na tentação, a que este termo pode induzir, do dirigismo cultural ou da estatização da cultura. Esse é um erro grave, mas é uma tentação que veio do passado e que deve ser eliminada. O papel do Estado deve ser, fundamentalmente, o do fomento das políticas, o do fomento das infra-estruturas culturais - essa, sim, é que deveria ser a expressão que deveria figurar neste artigo e não a expressão "assegurar", porque essa não faz sentido nenhum, Srs. Deputados.
Daí que apele, mais uma vez, à bancada do Partido Socialista no sentido de ser sensível a esta questão, a fim de nos libertarmos de fantasmas e de tentações que ocorrem sempre neste domínio.
Todos nós concordamos - e penso que isso tem sido unânime - que a cultura é um domínio especial onde a presença do Estado é essencial. Ninguém pode pretender que o Estado não incentive ou não fomente as políticas de cultura e, nomeadamente, o acesso dos cidadãos à cultura, a defesa dos bens cimeiros da cultura, como o património ou a língua. Agora, não se pode pretender, de forma alguma, que caiba ao Estado assegurar tudo, porque é impossível. Isso é diminuir a outra vertente, que é bem mais importante, que é a da sociedade e dos agentes privados, porque, quer queiramos quer não, nunca será o Estado o motor da cultura. O motor da cultura será sempre dos homens e das mulheres da cultura.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): - Tirando o "Passa por
mim no Rossio"!...

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada..

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Frexes, isto, é o diabo! O Sr. Deputado Manuel Frexes fala de fantasmas - lá terá as suas razões! - mas, se me permite, se alguém aqui tem fantasmas, é mesmo o Sr. Deputado Manuel Frexes! Não há dúvida! A que fantasmas é que se refere? Gostava que tivesse sido mais explícito! Em primeiro lugar, no que se refere a fantasmas, como sabe, com excepção do "Gasparzinho", daquele filme para crianças, não existem! Portanto, desde logo, está a falar da existência de algo que não existe! Isso elimina logo grande parte da discussão que aqui poderíamos ter sobre a matéria.
Mas vamos fazer um exerciciozinho que não nos faz mal nenhum. O Sr. Deputado não está a ver uma entidade privada - não sei qual, mas uma qualquer - a colocar uma orquestra sinfónica em Castelo Branco - está? Não está! O Sr. Deputado não está a ver uma entidade privada a inaugurar teatros em Castelo de Vide! O Sr. Deputado não está a ver, certamente, entidades privadas, funcionando legitimamente no seu quadro, de acordo com as leis do mercado, de oferta e procura, isto é, do lucro, mesmo dentro da base do chamado lucro legítimo, a distribuírem benesses pelo País no domínio e em termos de "incentivar e assegurar o acesso de todos os cidadãos aos meios e instrumento de acção cultural". Não está a ver isso, com certeza! Espero que não esteja, porque o Sr. Deputado sabe bem (e estou a lembrar-me desta - não quero ir mais longe, para não esticar a corda!) da desgraça, do desconforto, da tragédia (enfim, nunca mais sairíamos daqui com adjectivos, uns atrás dos outros...) das tentativas de mecenato naquela coisa que temos ali em baixo, que é o CCB! Que, aliás, é excelente!

Vozes do PSD: - Ah, bem!

O Orador: - "Ah". o quê? Alguma vez nos ouviram dizer o contrário disso? A gestão do CCB, o mecenato, o buraco que foi a sua construção, essa é outra componente! Mas não vamos agora falar nisso! Querem discutir o CCB? Não temos tempo para isso agora!

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - E Lisboa 94? E a Expo 98? E Serralves?

O Orador: - Sr. Deputado Manuel Frexes, deixe-me acabar, por favor. Depois, terá todo o tempo para colocar as suas dúvidas e expurgar-se dos seus fantasmas. Já lá iremos!

Risos do PCP.

O Sr. Deputado bem viu o exemplo que foi a célebre lei do mecenato aplicada ao CCB e à Fundação do Teatro de S. Carlos e à respectiva orquestra! Sabe das experiências disso! E isto é numa terra recôndita, em que a procura é terrível, em que não há apetência cultural nenhuma, chamada - imagine - Lisboa! Que, como sabe, fica longe! Longe de tudo! Sabe de é que fica longe, Sr. Deputado? Fica longe das realidades económicas e sociais do País! Isso é que fica! No sentido em que não é pela via dos mecenatos, não é pela via do sector privado

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que o Sr. Deputado, com alguma seriedade, entendamo-nos por aí, pelo menos aí, pode "incentivar e assegurar o acesso de todos os cidadãos aos meios e instrumentos de acção cultural". Não tenhamos ilusões! A experiência foi feita, foi demonstrada, não voltemos a insistir naquilo que de todo em todo não tem (permitam-me a expressão) nem pés nem cabeça!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Aguiar.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Frexes, felicito-o pela sua intervenção e aproveito para lhe fazer uma pergunta. Não sou dos que perfilham a ideia de que tudo deve estar na Constituição da República Portuguesa e que, pelo simples facto de aí estar, acontece e por isso não vou propor qualquer acrescento a este artigo. Aliás, só queria que ficasse claro que, quando falamos de acesso de todos os cidadãos aos meios e instrumentos de acção cultural, não estamos a esquecer os cidadãos das comunidades portuguesas no estrangeiro, porque quando se fala aqui de assimetrias existentes no País em tal domínio não podemos esquecer que a assimetria maior é entre o País e as comunidades portuguesas onde as associações culturais recebem menos apoios do que as suas congéneres no País. Digo isto com muito à-vontade porque sei que o Sr. Deputado foi justamente um dos políticos que remou contra essa tendência e que, na sua acção governativa, deu uma grande atenção às grandes instituições culturais que temos fora de Portugal.
No entanto, gostaria que ficasse bem claro, e julgo que concordará, que quando falamos de todos os cidadãos, estamos a pensar também nos portugueses no estrangeiro.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente. pretendo fazer alguns comentários à intervenção do Sr. Deputado Manuel Frexes, que, com toda a amizade e simpatia, me dá a sensação de que tem um resquício algo traumático da sua passagem pelo Governo em relação a este temor de intervenção manipuladora do Estado no domínio da cultura. Por outro lado, também se poderia deduzir das suas afirmações uma posição de desresponsabilização do Estado em relação àquilo que são as suas obrigações, o seu papel e as suas funções numa sociedade e num Estado democrático como o nosso.
Só queria realçar, sublinhar e lembrar ao Sr. Deputado Manuel Frexes que, porventura, teria alguma razão nos temores que exprimiu se esta alínea a) estivesse isolada e fosse ela, porventura, todo o artigo 78.º. Contudo, esta alínea tem um corpo, que diz: "Incumbe ao Estado, em colaboração com todos os agentes culturais:" e uma alínea b), que diz: "Apoiar as iniciativas que estimulem a criação individual e colectiva, nas suas múltiplas formas e expressões (...)".
Portanto, em nosso entender, não fazem sentido estas preocupações expressas pelo Sr. Deputado Manuel Frexes, que, seguramente, serão ultrapassadas no exercício da oposição que muito salutarmente está a desempenhar nesta Assembleia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado Manuel Frexes quer mandar algumas "frexadas", tem a palavra.

Risos.

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente. estou sempre preparado para dar e levar umas "frexadas"! Porque não?!
Sr. Presidente. além de ter que responder a uma pergunta que me foi feita, gostaria de clarificar bem esta questão porque quer a bancada do PCP, quer a do PS, fugiram à questão essencial. É que toda a gente sabe que o Estado, seja ele qual for, não pode nem deve assegurar o acesso de todos os cidadãos aos meios e instrumentos de acção cultural. É uma impossibilidade. reconheçam isso.
Mas podemos fazer um exercício ao contrário. O Sr. Deputado José Calçada referiu que não estava a ver uma entidade privada a fazer uma orquestra sinfónica em Castelo Branco, um museu nacional no Porto ou um museu de arte contemporânea seja onde for. De facto também não estou a ver fazer-se isso, se bem que o Museu de Arte Contemporânea esteja a ser construído por uma fundação através de um mecenato e foi um sucesso. Não sei se conhece? É a Fundação de Serralves.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sempre defendi que a presença do Estado na área da cultura é essencial e insubstituível naquilo que é mais importante, nomeadamente. na criação das redes nacionais de leitura pública. de museus, de arquivos, na defesa do património, da música e do espectáculo com relevância nacional. Sempre defendi isso.
Mas, fazendo o exercício ao contrário, o Sr. Deputado José Calçada também quereria, provavelmente, que o Estado instalasse, por exemplo, uma livraria em Freixo de Espada à Cinta (e aqui vai uma "frexada") ou uma loja de venda de discos em Faro ou noutro local qualquer de Portugal? Certamente que isso não faz sentido.

Protestos do Deputado do PCP José Calçada.

Há outra coisa que tem de compreender: mesmo no domínio do património e do património classificado aliás, basta conhecer a lei -, o Estado não tem que ser detentor de todo o património, nem deve sê-lo. Por que é que há-de ser?!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No essencial, penso que todos nós temos estado a dizer as mesmas coisas. Eu defendo que o papel do Estado na política da cultura deve ser o do fomento das infra-estruturas e cias condições de acesso de todos os cidadãos aos bens culturais, porque é isso que está em causa e é isso que todos nós defendemos, mas já não defendo que o Estado deva assegurar tudo, porque isso é impossível.

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Sr. Deputado José Calçada, não tente iludir a questão, porque está a iludir-se a si próprio.
À Sr.ª Deputada Manuela Aguiar, gostava de dizer que uma das nossas grandes preocupações - aliás, uma das alíneas deste artigo prevê isso - é a da cooperação com todos os povos, fundamentalmente com os povos de língua oficial portuguesa, porque é com esses que temos que comungar um património histórico e comum que é essencial à nossa alma.
Ao Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, devo dizer que ouvi atentamente a sua intervenção sobre o artigo 73.º e não compreendo a contradição que vai na sua mente. Isto porque no artigo 73.º preocupou-se nitidamente por não haver uma matriz estatizante ou sumamente estatizante e neste artigo 78.º, sobre a mesma matéria e sobre uma expressão semelhante, não tem exactamente o mesmo pensamento! Era só isto que lhe queria responder.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Prefiro não usar nenhum tipo de linguagem guerreira e da idade média. É que há palavras terríveis que prefiro não usar.
Desde já e antes de entrar na questão, gostava de dizer que o Sr. Deputado Manuel Frexes inaugurou uma nova modalidade no âmbito da discussão da revisão constitucional, que é a modalidade da discussão entre Deputados da mesma bancada. Não deixa de ser uma dado interessante!
Mas vamos à questão de substância. O Sr. Deputado, no fundo, o que quer - e já tínhamos todos percebido isso - é o que o nosso povo designa como "sol na eira e chuva no nabal". Isto é, desde que se trate de actividades culturais, sejam elas quais forem, não rendíveis, aí o Estado deve intervir, mas em relação a todas aquelas actividades em que, eventualmente, se possa obter lucro, aí entrega-se à iniciativa privada. No fundo, é rigorosamente a mesma lógica para o acesso aos bens culturais que denotamos na área da educação, da saúde e em todas as outras.
Sr. Deputado, não nos parece, como é evidente, que o Estado deva ser responsável pela implantação de uma livraria em Faro. Certamente que não! Mas, sem dúvida, o Estado deve ser responsável, por exemplo, pela implantação de uma biblioteca em Faro. Não temos dúvidas nenhumas nessa matéria.

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Exactamente.

O Orador: - E mais: entendemos que, por exemplo, no domínio do ensino, não faz qualquer sentido que uma escola possa abrir, ter o nome de "escola", se não possuir uma biblioteca!

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Aí estamos de acordo.

O Orador: - O Sr. Deputado não quer, com certeza, entregar domínios dessa natureza ao sector privado. Quer?!

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Não!

O Orador: - Então, não vejo onde estão os fantasmas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão das alterações relativas ao artigo 79.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A não inclusão de propostas oriundas da CERC de alteração a este artigo tem um aspecto positivo e um aspecto negativo.
O aspecto positivo é o de não se ter acolhido a proposta restritiva e empobrecedora do PSD cie se substituir a expressão "cultura física" por "educação física". Só por isso devemos ficar contentes.
O aspecto negativo é o de não se incluírem as propostas de alteração e de aditamento de vários números do artigo 79.º que o PCP apresentou e que agora recuperamos e apresentamos em Plenário. Desde logo, a necessidade de autonomizar a questão da violência no desporto, dada a importância que assume a perversão dos princípios desportivos e éticos que enformam esta actividade, dada a introdução de interesses externos na actividade desportiva que têm tido consequências graves e que adulteram a verdade desta actividade desportiva, dada a relevância que os fenómenos de violência no desporto e o combate aos mesmos deve assumir cada vez mais na nossa sociedade. Esta é uma vertente fundamental das propostas que apresentamos.
Outra vertente importante é o reconhecimento do papel político, prático e fundamental do associativismo na promoção do desporto, tantas vezes em substituição do Estado e suprindo carências da intervenção do Estado nesta matéria. Esse papel traduziu-se na generalização feita pelo associativismo desportivo do acesso à prática desportiva em tantas modalidades, bem como do acesso à participação desportiva para tantos cidadãos. Esta valorização do associativismo é tanto mais importante quando se repetem os ataques, até do ponto de vista legislativo, à autonomia associativa no âmbito desportivo, e tantas vezes os discutimos já nesta Casa.
Finalmente, propomos a vertente, que consideramos fundamental, de o Estado assegurar os meios necessários à preparação das selecções desportivas nacionais, tendo como certa a importância das representações nacionais, quer para a identificação dos desportistas e em especial dos jovens desportistas, quer para o fomento do fenómeno desportivo e para a dignificação da imagem do nosso país nas competições internacionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais pedidos de palavra, passamos à "Organização Económica", começando pelas alterações relativas ao artigo 80.º.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

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O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por saudar o Grupo Parlamentar do Partido Socialista e, porque tenho igual consideração por todos os Srs. Deputados. não quero fazer nenhuma discriminação. Mas ainda assim, e com o vosso consentimento, atrever-me-ia a destacar os Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista que subscreveram a proposta 79-P. porque esta proposta representa que, finalmente, os Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista chegaram à economia de mercado e por esse motivo merecem que, em nome dela, eu lhes dê as boas-vindas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Chegaram muito tarde, é certo. Foi pena que só tivessem chegado agora, mas, como diz o povo, mais vale tarde do que nunca. Mas o povo, neste caso, pelo facto de os senhores terem chegado tarde, pagou um preço muito caro!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta proposta, 79-P, tem esta primeira virtualidade e tem uma segunda: é que ela é filha directa da nossa proposta 40-P, que traduz aquilo que são, desde há muito, as nossas convicções relativamente ao modelo da nossa economia.
Mas apresentámo-la com uma segunda intenção. que foi a de pôr de bem, ou, se quiserem, a de compatibilizar o Grupo Parlamentar do PS com o Governo. Porquê? Porque já há algum tempo atrás, precisamente há 15 dias, tínhamos votado a proposta de lei n.º 88/VII que, na sua exposição de motivos, no segundo parágrafo, faz esta alusão: "a consagração constitucional da liberdade de iniciativa económica privada enquanto direito económico fundamental". Portanto, o Governo, provavelmente, leu a nossa proposta de alteração ou leu aquilo que sempre foi o pensamento do PSD...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E do país!

O Orador: - ... acerca do modelo da nossa economia, verteu essa leitura na exposição de motivos da proposta de lei e agora o PS, e bem, seguindo o Governo, traduziu na sua proposta 79-P aquilo que já dizíamos na nossa proposta 40-P.
Quero, desde já, dizer aos Deputados socialistas o seguinte: em benefício da proposta 79-P poderemos, eventualmente, deixar cair a nossa proposta 40-P.
No que concerne ao artigo 80:º, e falando também sobre o que têm sido as sucessivas revisões da parte económica da Constituição, gostava de lembrar hoje o Dr. Francisco Sá Carneiro, e faço-o a propósito das lutas que ele travou em relação à irreversibilidade das nacionalizações.
O Dr. Francisco Sá Carneiro era um homem de grande visão política, porventura o dirigente político da nossa democracia que tinha maior capacidade para antecipar os acontecimentos, e viu, seguramente, mais cedo do que todos nós, as consequências daquilo a que hoje se chama a globalização da economia.
E apesar de não ser bonito falar de nós próprios, vou arriscar falar do PPD e do PSD a propósito desta matéria, porque tenho a certeza de que o faço com justiça - aliás, há registos escritos que confirmam o que acabo de dizer.
Pena foi que houvesse alguns resistentes, algumas pessoas apegadas a conceitos ideológicos core os quais a economia nunca se compadeceu, pois nós, hoje, teríamos seguramente, se tivéssemos feito a tempo aquilo que preconizava o Dr. Francisco Sá Carneiro, uma economia mais moderna, mais sólida, mais rica e mais justa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A economia de mercado não equivale a um sistema perfeito, mas é, seguramente, o modelo mais fértil, o que cria maior riqueza e, com todos os seus defeitos. porque cria mais riqueza é ele que distribui mais riqueza.
Não defendermos a economia de mercado a qualquer preço! É evidente que o Estado deve ter aí um papel regulador e nós não subscrevemos as teses daqueles que defendem que o modelo económico tem de ser desenhado num estirador com uma régua, um esquadro, um lápis, papel e borracha...
E mais: o mercado é tanto mais rebelde quanto, porventura, mais normas imperativas pretendem condicionar o seu funcionamento. Portanto, na revisão da parte económica da Constituição a posição do PSD foi sempre a de se chegar à redacção de normas suficientemente flexíveis capazes de acompanhar as mudanças que, a um ritmo diário, ocorreras na economia de todos os países.
Constatamos, com alguma satisfação, que volvido algum tempo outros se juntam a nós e nos dão razão, só que eles soçobraram às repercussões da globalização e nós vimos as suas consequências antes de ela se ter iniciado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Volto a repetir: como seria hoje a nossa economia se, como dissemos há muitos anos, fosse possível mais cedo ter constituído grupos económicos sólidos e capazes de reforçarem a nossa competitividade sem prescindir, evidentemente, das pequenas e médias empresas!
Mas hoje creio que a maioria da Câmara, para não dizer a unanimidade - e decerto até poderia dizê-lo -, está de acordo em que para além das pequenas e médias empresas é fundamental que qualquer economia tenha uns quantos grupos económicos sólidos de dimensão verdadeiramente internacional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E para não me tornar mais extenso farei apenas mais duas alusões. 
Uma alusão tem a ver com a substituição da expressão "apropriação colectiva dos meios de produção". Convenhamos que essa era uma expressão verdadeiramente arcaica, que não faz sentido algum e que só desprestigiava o nosso texto constitucional.

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O Sr. Jorge Ferreira (PCP): - Não o deixava dormir sossegado!

O Orador: - A outra alusão tem a ver com a planificação democrática da economia. Essa referência do texto constitucional, tal como a antecedente, salvo o devido respeito, só nos colocava atrás de todas as. Constituições, e, ironia do destino, nós, que durante muitos anos andámos a dizer que tínhamos a Constituição mais progressiva da Europa - desculpem-me que lhes diga -, no que respeita à parte económica tínhamos, justamente, a Constituição menos progressista da Europa.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nem quero crer em algumas coisas que ouvi do Sr. Deputado Vieira de Castro...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Depois da votação do preâmbulo, também não!

O Orador: - Mas alguns aspectos que referiu serão abordados pelo meu colega e camarada - palavra que não é proibida nesta Assembleia - Henrique Neto.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Camarada, hem!?...

O Orador: - O amigo Lino de Carvalho tenha calma!
É perfeitamente claro no posicionamento do PS que nós não chegámos agora à economia de mercado. Aliás, nem o Sr. Deputado Vieira de Castro é dono da economia de mercado... Graças a Deus! Se assim fosse, talvez o mercado não estivesse tão bem...!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há uma evolução e uma compatibilização entre as concepções de um planeamento flexível, do qual somos defensores, e do desenvolvimento da economia de mercado no respeito por toda uma concepção de desenvolvimento sustentável que temos vindo a defender.
Por outro lado, é necessário que numa Constituição, nomeadamente nos seus aspectos económicos, estejam claramente balizadas quais as traves mestras da ideologia do projecto constitucional.
Numa dada altura, até parece que o CDS, ainda o Dr. Jorge Ferreira não andava por lá,...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Só a partir de 1978!

O Orador: - ... ou talvez estivesse na JC, ou talvez fosse socialista numa base personalista... Mas, a dada altura, no CDS havia alguma confusão no magma ideológico inicial disfarçado pelo brilho do Professor Freitas do Amaral e do meu amigo Amaro da Costa.

Porém, VV. Ex.as agora introduzem um outro brilho, ou seja, uma conjugação de alguma direita responsável com assomos de chauvinismo de extrema direita...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - É só disparates!...

O Orador: - O CDS no seu conjunto, não necessariamente V. Ex.ª individualmente.
Em relação às posições do PS, elas são, efectivamente, claras. E julgamos que é preciso que fique explícito que não queremos que a Constituição seja despida de um travejamento ideológico e normativo, queremos, sim, que haja uma adaptação da Constituição à realidade económica e social, mantendo aqui um travejamento importante.
Portanto, vamos analisar os artigos em que houve algumas alterações significativas dos princípios mas, centrando-me agora nas normas constitucionais relativas ao planeamento, queria dizer que a evolução da realidade económica e social e as alterações verificadas na prática do planeamento, em nosso entender, devem levar a que sejam tidas em conta no texto constitucional as concepções mais actualizadas nos domínios económico e do funcionamento das sociedades.
Efectivamente, está posto em causa, quase generalizadamente em todo o mundo, a mecânica dos sistemas de planeamento imperativo e centralizado, que não era o que estava na Constituição, mas havia, no entanto, algumas ambiguidades de linguagem em relação à óptica que temos hoje.
É preciso também ter em conta que ruíram fragorosamente as organizações políticas dos Estados que suportavam esse mecanismo de planeamento imperativo e centralizado. Mas, por outro lado, também falhou, e parece que alguns à direita ainda não perceberam, a tentativa de renovação do fundamentalismo liberal, tendo falhado o essencial do seu projecto quer na Europa quer nos Estados Unidos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O tatcherismo na Grã-Bretanha foi derrotado, embora já postumamente, primeiro pela realidade económica e depois por Tony Blair ...

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - O Tony Blair é o maior "tatcherista" que há!

O Orador: - A chamada "reaganomics" foi superada pelas políticas clintonianas e o tatcherismo e a política de Reagan marcaram uma década hoje ultrapassada.
Essas acusações ao Blair de tatcherista é daqueles que vêem o Blair não através da Visão ou da Valor mas de um resumo muito pequenino do Tal & Qual. Convém ver o que diz o Blair para não terem sobre ele o fascínio tão grande que tem a Dr.ª Maria José Nogueira Pinto ou alguns militantes do PSD.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Está com muita graça hoje!

O Orador: - Exactamente!

Risos.

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Neste contexto que referi. mais do que fazer retoques dos diversos artigos da Constituição que tratam a questão do planeamento, importava estruturar as normas constitucionais de forma clara e de modo que estipulassem uma metodologia aderente à filosofia e à prática dominante nesta área, daí que nos pareça correcta a introdução de um artigo novo.
Mas, entretanto, uma revisão constitucional também corresponde à necessidade de aperfeiçoamento. Por isso. é importante introduzir acrescentos e modificações terminológicas e até conceptuais no primeiro artigo que trata deste assunto.
Assim, as alterações no artigo 91.º, pelas menções introduzidas relativas à política educativa e à defesa do mundo rural, reforçam a perspectiva de um planeamento e desenvolvimento integrados, mais consentâneos com as realidades económicas e sociais actuais.
A utilização explícita da própria palavra "integrado", caracterizando complementarmente o desenvolvimento, que já era harmonioso na norma, exprime a perspectiva de integração e coerência que se pretende em todo o processo de desenvolvimento e planeamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Alguns artigos do actual texto constitucional são eliminados na proposta oriunda da CERC, nomeadamente o artigo 92.º, relativo à natureza dos planos;- o artigo 93.º, respeitante à elaboração dos planos; e o artigo 94.º, referente à execução dos planos. Como é óbvio, não para que se crie algum vazio ou um espaço de ambiguidade mas sim, para que num artigo novo se estruturem, de forma correcta e actualizada, os princípios e as normas relativos à elaboração e execução dos planos.
Deste modo, no novo artigo proposto subordinara-se os planos a elaborar às Grandes Opções. Estas têm cada vez mais de corresponder à definição das estratégias económicas, sociais e até territoriais no seu enquadramento internacional e numa óptica prospectiva. Se, hoje em dia, qualquer empresa ou grupo económico que, queria sobreviver num mundo competitivo e num contexto sócio-económico turbulento deve dispor, mais do que de um plano estratégico, de um conjunto de orientações estratégicas que lhe permita atingir os objectivos traçados, não faz sentido que um Estado, uma Administração Pública, as empresas e instituições de um país ou ás organizações sociais não conheçam explicitamente as orientações estratégicas adoptadas pelos poderes políticos democráticos, de forma a que uns as possam cumprir e outros as possam ter em conta.
Neste sentido, a própria evolução que temos defendido do sistema de elaboração e discussão das Grande Opções do Plano assume grande importância.
Há que ter em conta que a flexibilidade dos sistemas de planeamento faz-nos evoluir na prática e na teoria para metodologias mais flexíveis. que integrara instrumentos diferenciados. É a visão estratégica que se tem e as linhas estratégicas que se querem implementar que devem inspirar os processos e instrumentos de planeamento a utilizar e as formas da sua caracterização. L a concepção que defendemos do planeamento, participativo e democrático, também na sua concretização, que se verte no n.º 3 do artigo novo, no qual se especifica, aliás, a descentralização regional e sectorial na própria execução dos planos
nacionais.
Para além do planeamento, e por este enquadrado, interessou especificar e integrar na norma própria a referência a programas específicos, tanto no âmbito territorial como no sectorial. A importância e a aderência à realidade e a novas metodologias de planeamento dessa adaptação também têm a ver com uma nova forma de integração económica e política de Portugal, que obriga e aconselha a que tenhamos instrumentos muito flexíveis de planeamento territorial, sectorial e regional que nos permitam, por um lado, ter espaço de abertura para a criação das regiões e a articulação entre os mecanismos de planeamento municipal, regional e nacional e, por outro, articular esses instrumentos de planeamento e de programação com os próprios processos de apoio e de desenvolvimento co-financiados pelas estruturas respectivas da União Europeia.
Já que falei de Europa, interessa referir - e voltaremos a isso - que há uma nova mexida, uma nova pequena adaptação no artigo relativo ao Banco de Portugal, para que isso fique completamente claro, se é que não o era ainda.
De igual modo, no que toca ao Conselho Económico e Social, há uma pequena alteração que vai no sentido de continuar a considerar importante, na própria óptica e mecânica de pronunciamento sobre o planeamento, o Conselho Económico e Social, como elemento representativo, como câmara de eco de um conjunto de interesses sociais, económicos e culturais, uma câmara que represente, que traga à discussão as propostas de elaboração apresentadas por esses interesses:
Gostaríamos, aliás, que esse mecanismo fosse sucessivamente aperfeiçoado, de maneira a que o Conselho Económico e Social não seja apenas essa câmara de eco mas tenha uma função mais activa na própria participação na elaboração do Plano, de modo a que se intensifique, na preparação das próprias Grandes Opções, a participação dos agentes económico-sociais.
Para terminar, abordemos a questão do Orçamento. No texto que se propõe, o Orçamento terá de reflectir as Grandes Opções em matéria de planeamento. E, aqui, fecha-se um pouco o ciclo, não falando agora da Conta Geral do Estado, porque, se alterámos a própria concepção do planeamento sem dele prescindir, tornando-o mais flexível, mais aderente à realidade e mais consentâneo com a integração europeia e com a perspectiva de regionalização é descentralização territorial, o Orçamento tem de reflectir essa concepção estratégica da economia e tem de ser claro, primeiro, que há um conjunto de agentes económicos e sociais que participa e é ouvido na elaboração das próprias Grandes Opções, no fundo, na definição desse grande documento estratégico: depois, que o Orçamento tem de ser consentâneo com esses instrumentos que se utilizam; e, finalmente, que um conjunto de outros planos e programas, quer da responsabilidade do Estado, quer apoiados pela União Europeia, quer da responsabilidade das autarquias, quer os que venham a ser elaborados pelas regiões, tem de fazer um todo harmónico e integrado numa perspectiva dinâmica e não num planeamento rígido, permitindo, assim, que todo este mecanismo do planeamento contribua realmente para o desenvolvimento sustentável que defendemos.

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Se estas alterações que pretendemos introduzir no texto constitucional, no domínio económico, derem, como esperamos, um sólido contributo nesse sentido, ficamos satisfeitos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propósito de termos avocado para discussão em Plenário uma proposta a que foi dado o n.º 84-P e que já foi discutida na CERC, propunha-me intervir mas, após ter ouvido os Srs. Deputados Vieira de Castro e Joel Hasse Ferreira, justifico a minha intervenção, desde logo, pelo facto de ver o Sr. Deputado Vieira de Castro congratular-se por o PS estar agora a chegar à economia de mercado e por o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira eventualmente entender que já está na economia de mercado, quando acabam por viabilizar uma Constituição em que, logo no seu preâmbulo, nos propomos abrir o caminho ,para uma sociedade socialista. Como é que os senhores compatibilizam uma coisa com a outra? Sinceramente, não entendo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não vamos repetir o debate sobre o preâmbulo!

O Orador: - Tenho de reconhecer que, nesta matéria, doa a quem doer, quem tem uma posição coerente é o PCP. Os senhores não podem convencer quem quer que seja neste país de que, votando um preâmbulo em que se propõem abrir o caminho para uma sociedade socialista, querem a economia de mercado. ao mesmo tempo que se felicitam mutuamente por terem agora chegado a ela e por pretenderem ter, nesta matéria, a liderança, quando, no fundo, nem um nem outro querem um texto para a Constituição que tenha de facto, tanto do ponto de vista ideológico como técnico - e não tenho a pretensão de discutir esse aspecto, como muitos dos senhores que vejo nestas bancadas também a não podem ter -, um mínimo de perfeição, que seria exigível.
Aliás, todo este processo, não é demais lembrá-lo, foi conduzido de uma forma perfeitamente atrabiliária, e mais uma vez aqui manifestamos o nosso repúdio por esse facto.
É evidente que, ao avocarmos para discussão em Plenário uma proposta de substituição do artigo 80.º, na qual nos propúnhamos substituir o articulado que existia ou o que resulta das propostas de alteração que entretanto foram apresentadas por um texto simples e, em nossa opinião, bastante mais conducente a termos uma Constituição digna de um país que, no final do século XX, pretende integrar o espaço da União Económica e Monetária, temos de achar positivo que determinadas palavras, determinados termos, já aqui referidos. tais como a "apropriação" e a "planificação", venham a ser substituídos. Na verdade, como foi dito há pouco pelos Srs. Deputados José Calçada e Manuela Aguiar, não é pelo facto de estes termos estarem ou não na Constituição que não tem sido permitido fazer-se de tudo neste país, contra e a favor do que defendem uns e outros.
Portanto, havia toda a vantagem e toda a razão de ser, do ponto de vista técnico-constitucional, e, se quiserem, macro-económico também, em que a nossa Constituição não fosse aquilo que vai acabar por ser e se desse tini passo no sentido de a transformar num instrumento simples mas que contivesse os princípios que a nós todos devem unir e não tudo aquilo que depois pode ser subvertido por interpretações pela lei ordinária.
A nossa avocação para Plenário desta proposta sobre o artigo 80.º, que não mereceu qualquer espécie de acolhimento por parte dos outros partidos em sede de Comissão, tem esta intenção e assenta, para além do mais, na tremenda incoerência a que, hoje e aqui, mais uma vez assistimos. Como é que o Sr. Deputado pode defender que quer uma economia de mercado? Independentemente de nem eu nem o meu partido a querermos, porque não somos liberais, não queremos uma economia de mercado, sabemos que o mercado, na sua verdadeira essência. só funciona nos livros. porque não há um mercado, por mais perfeito que seja, onde funcione a economia de mercado.
Portanto, independentemente de não o querermos, não estejamos agora, aqui, a fazer um mero exercício parlamentar, tal como foi feito pelos dois Srs. Deputados que me antecederam, porque não é isso que está em causa. O que está em causa é, de facto, tentarmos finalmente construir, em conjunto, uma Constituição que seja um documento de que nos possamos honrar e que possamos legar a quem vier a seguir, para que, de unia forma bastante mais simples e menos controversa, se possam conduzir os destinos do país no caminho que depois. politicamente, for considerado o mais adequado.
Em termos económicos, temos opiniões, temos propostas, e apresentámo-las durante o debate em sede de Comissão, quando estivemos presentes - e estivemos quase sempre presentes, nesta fase -. mas obtivermos muito pouco acolhimento. Foi-nos dada oportunidade, e fizemo-lo também, de aprovar algumas propostas, nomeadamente do PSD, no sentido de, apesar de tudo - e tem sido sempre essa a nossa atitude -, atenuar alguns dos aspectos que nos parecem mais negativos.
Quero deixar aqui esta nota de que não estarmos nomeadamente, alguns dos Srs. Deputados que aqui intervieram - a ser coerentes. Eu pretendo ser coerente, mas poderei não estar a sê-lo, também, mas os senhores não estão a ser coerentes, de certeza, ao aprovarem um preâmbulo como o que aprovaram e ao pretenderem, agora, na parte económica, que a redacção seja a que vai ser. porque forçosamente votarão como já está indiciado.
Em minha opinião, não estamos a fazer algo de que nos possamos honrar muito. Trata-se de um trabalho árduo, penoso, estarmos todos muito cansados e muito mais estaremos no final da próxima semana. Não obstante, o PP apela, nesta altura ainda, para que esta Constituição possa ser algo que não uma densificação das anteriores Constituições, um arrastar de conceitos que vão deixando um resíduo que já não pretendermos, e para que, de uma vez por todas, nos assumamos com coerência e, volto a repeti-lo, sem qualquer espécie de demagogia, pelo menos comparável à coerência do PCP nesta matéria.

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Tudo o resto se passa como, aliás, temos ocasião de verificar: as pessoas não dão a menor atenção ao que está a ser dito, têm as suas ideias feitas, têm os seus acordos feitos. De qualquer maneira, fica para a acta que a nossa posição é esta e vamos insistir para que a nossa proposta 84-P seja votada na devida altura.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquilo a que se tem chamado Constituição económica é caracterizado por um conjunto de princípios que conformam no plano económico, como sabemos, uma matriz constitucional profundamente progressista - como, há pouco, e bem, o Sr. Deputado Vieira de Castro salientou, embora procurando dar-lhe uma interpretação contrária - e democrática. de participação dos trabalhadores e de defesa do interesse público, tal como uma Constituição deve expressar.
Os princípios da subordinação do poder económico ao poder político democrático, da coexistência de diversos sectores de propriedade, da apropriação colectiva de meios de produção, como garantia da intervenção do Estado em sectores da economia essenciais para a comunidade e o princípio da intervenção dos trabalhadores na própria economia são alguns dos traços essenciais desta matriz da Constituição económica da República Portuguesa que estão concretizados no artigo 80.º e de que decorrem os restantes comandos constitucionais plasmados nos artigos seguintes.
Mas, como sabemos, esta matriz constitucional tem sido, de revisão em revisão, alvo de propostas sucessivas com vista seja à redução do seu alcance, seja à inversão dos princípios constitucionais, seja à fragilização, quando não à liquidação, dos mecanismos de defesa da economia pública e de participação dos trabalhadores.
Quando ouvimos aqui alguns Srs. Deputados referir que tudo isto é em nome de uma desideologização da Constituição, diria antes que tudo isto é em nome de uma ideologização da economia privada no plano constitucional.
A questão é a substituição de matrizes e de comandos que configuram uma Constituição progressista, mas equilibrada, onde há lugar para os diversos sectores da economia, onde há lugar para urna participação dos trabalhadores e dos outros agentes económicos e sociais no quadro da direcção da economia e da direcção e gestão das próprias empresas, e o empobrecimento desses comandos por novos comandos, em que se invertem ou se procura inverter estes princípios, esta matriz e estes equilíbrios que a Constituição tem consagrado ao longo destes anos.
Nesta revisão esta linha de ataque não fugiu à regra. Ela esteve presente em várias propostas, como, aliás, esteve aqui presente nas intervenções de alguns Srs. Deputados.
Pela nossa parte, isso tem sido sempre salientado e sublinhamos que mantemos a coerência dos princípios e da prática, na defesa daquilo que, para nós, conforma uma Constituição que saiu de uma revolução democrática e que deve ser ela própria também um instrumento de conformação da sociedade, e não o inverso.
Infelizmente, o que verificamos, designadamente da parte do PS, é que também, de revisão em revisão, e em nome dessa modernização, dessa desideologização e de um certo revisionismo semântico, se vai decaindo de princípios constitucionais e, em alguns casos, de princípios defendidos na história, na cultura e nas propostas do PS.
Sublinhava, entre outros, três princípios nesta introdução ao capítulo da organização económica, que me parecem ser de sublinhar, para exemplificar aquilo que acabamos de dizer.
Por um lado, a redução do alcance do princípio que garante a intervenção democrática dos trabalhadores como princípio da organização económica e social do Estado. Poder-se-á dizer que o que está como intervenção democrática é o que está ou que vai ficar como participação, mas pensamos que são duas questões, apesar de tudo, diferentes. A intervenção implica participação, mas implica também intervenção na gestão da economia e das empresas, designadamente do sector público.
Nós estamos no artigo 80.º em sede de princípios, e aí fica bem manter-se a ideia da intervenção. A ideia da participação já está no artigo 81.º, como instrumental de concretização do princípio que está no artigo 80.º. É esta separação que nos parece que devia manter-se consagrada na Constituição.
Esta alteração da alínea f) do artigo 80.º não é uma alteração ingénua, é uma alteração que procura, de algum modo, reduzir o alcance da ideia da intervenção dos trabalhadores, no que ela tem de participação e de intervenção na gestão e na direcção da economia por uma simples ideia de audição, designadamente ao nível dos conselhos económicos e sociais.
Pensamos que não é assim, mas que se deve continuar a lutar e a interpretar a nossa Constituição, dando guarida a uma ideia ampla de intervenção dos trabalhadores nos diversos patamares em que se processa a necessidade de dar voz activa a este segmento dos agentes que intervêm na sociedade nos processos de decisão e de controlo da economia.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Um outro traço que não se pode deixar de sublinhar neste intróito é o banimento, diria eu, da palavra "povo" e da palavra "classes" na parte da Constituição económica. Numa noite de horror,...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Horror?!

O Orador: - ... o PS decidiu que a palavra "povo" devia sair da Constituição económica. A palavra "povo" foge ao léxico do PS!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Felizmente não podem banir o povo!

O Orador: - E também afastam a referência às "classes mais desfavorecidas", que dá um sentido de concretização ao artigo 9.º da Constituição, quando se fala

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na igualdade real dos cidadãos na sociedade e na economia.
Mas, como dizia aqui, num aparte, o meu colega Octávio Teixeira, os senhores podem banir o "povo" da Constituição económica. mas não vão eliminar o povo da luta, para que a Constituição, a economia e a sociedade portuguesa tenham políticas e Constituições que vão ao encontro dos interesses e da igualdade real que esta Constituição prossegue e determina em vários dos seus artigos.
Um outro aspecto que vale a pena sublinhar do que representa esta alteração sucessiva das posições do PS tem a ver com o artigo 87.º e com a eliminação da obrigatoriedade de haver um sector público na economia. Por uma lado, mantém-se a consagração - e bem! - da coexistência de diversos sectores da economia, mas, por outro, abre-se a porta, aliás na sequência da prática política do Governo do PS, para a eliminação da obrigatoriedade do sector público da economia.
E, se fosse preciso ter um exemplo de como se invertem estas posições, aí está, então, a proposta n.º 79-P, substituída agora pela proposta n.º 87-P, do PS. Enquanto se elimina a obrigatoriedade de um sector público da economia, enquanto se fragilizam os mecanismos que garantem uma economia mista, enquanto se diminui o peso da economia pública no texto constitucional, enquanto se diminui o alcance da intervenção dos trabalhadores, é o PS que apresenta uma proposta em que sublinha a liberdade de iniciativa e de organização empresarial no quadro da Constituição da República Portuguesa, aliás, proposta desnecessária, porque ela já está consagrada no artigo 87.º da Constituição, quando refere a iniciativa privada e as empresas privadas, e também no artigo 80.º, quando garante a coexistência dos diversos sectores da economia e, naturalmente, o apoio do Estado a esses diversos sectores da economia.
Mas ela é simbólica, porque consagra e expressa estas alterações e inversões que o próprio PS quer introduzir nesta matriz progressista da Constituição da República Portuguesa. Não são alterações menores, são alterações que, de revisão em revisão, procuram inverter este traço que a nossa Constituição consagra, que é um traço progressista e democrático e que é um traço que, apesar de tudo, tem servido, ao longo destes anos, para consagrar políticas públicas que, malgrado os ataques e as amputações que tem sofrido, mantém, em muitos dos aspectos ainda, mercê do texto constitucional, elementos de grande interesse nacional, de interesse público e de interesse de apoio aos trabalhadores e às classes mais desfavorecidas.
É esta alteração, esta inversão, dos comandos constitucionais que repudiarmos. É por isso mesmo que também repusemos em sede de Plenário uma proposta no sentido de chamar à razão o espírito profundo do PS para impedir que desapareça, na parte da Constituição económica, pelo menos a referência ao povo e às classes mais desfavorecidas, como destinatários de uma economia e de uma Constituição económica que os tem exactamente como destinatários, para dar corpo ao princípio da igualdade real entre os cidadãos que a Constituição consagra no artigo 9.º.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, desta vez venho falar em nome dos subscritores do projecto de revisão constitucional n.º 8/VII para apresentar uma das poucas propostas que repescámos da Comissão, para além daquelas, naturalmente, mereceram o consenso da Comissão e subiram por direito próprio como propostas da própria Comissão.
A proposta tem a ver, precisamente. com o artigo 80.º, mais em concreto com a alínea c), que julgo ser decisiva nesta revisão constitucional.
Ouvi as intervenções que me antecederam e vi alguns arrufos de cariz ideológico ou algumas tentativas de transformação desta discussão numa querela ideológica. Se não fosse sexta-feira, quase ao fim da tarde, se a Sala não estivesse como está e se o interesse da comunicação social não fosse o que é, até poderia ficar iludido e pensar que há, de facto, um problema ideológico subjacente à estrutura da organização económica do Estado, mas não há, esse problema está resolvido há muitos anos, foi resolvido, no essencial, em 1989, e tudo o mais, com excepção da divergência saudável do PCP, é uma questão de cosmética, é uma questão de estilo. Pelo menos naquilo que diz respeito ao discurso e à forma como ele tem sido apresentado.
Agora, há uma coisa que julgo que não se pode ignorar e não tenho ouvido referências a esse respeito nesta discussão. Não se pode ignorar a revisão da Constituição de 1989 e, nomeadamente, o que é que ela significou em termos de alterações da estrutura da organização económica e social em Portugal.
Lembram-se, seguramente, que, em 1989, se eliminou o princípio da irreversibilidade das nacionalizações e que, simultaneamente se atenuou também a ideia da apropriação dos principais meios de produção ou da apropriação colectiva dos principais meios de produção. E nessa altura houve uma dificuldade: é que havia um limite material de revisão constitucional que impedia que se eliminasse o princípio da apreensão colectiva dos meios de produção. Houve a preocupação de eliminar o limite, mas não de eliminar o princípio, sob pena de isso conduzir a uma violação do próprio texto constitucional e, por isso mesmo, a uma revisão inconstitucional. Houve até quem, na altura. dissesse que se esteve no limite de violar os limites de revisão constitucional, na medida em que, apesar de tudo, se atenuou o disposto na alínea c) do artigo 80.º.
Mas a verdade é que só não se foi mais longe em matéria de alínea c) do artigo 80.º em 1989 porque existia um limite de revisão constitucional, porque. obviamente, a sequência natural da revisão constitucional de 1989 é, uma vez eliminado o limite material da apropriação colectiva dos principais meios de produção, suprimir este princípio do texto constitucional. Isso já foi feito! A Comissão já chegou, apesar de tudo, a consenso, na medida em que, tendo proposto uma substituição ou tendo feito uma proposta de substituição da alínea c) do artigo 80.º, pelo menos na parte que diz respeito à eliminação do princípio da apropriação colectiva dos meios de produção, a Comissão e os partidos que votaram essa alteração foram

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consequentes com aquilo que era o percurso normal, na sequência da revisão de 1989.
Julgo é que ficaram aquém na parte que diz respeito à substituição, e por uma razão muito simples, é que a alternativa lógica à ideia de que constitui princípio fundamental da organização económica a apropriação colectiva dos meios de produção é a ideia de que os meios de produção se mantêm na propriedade privada, não obstante, obviamente, estarem adstritos à satisfação ou à prossecução do interesse colectivo, sempre que assim o exija a lei, o que significa necessariamente que, em matéria de alínea c) do artigo 80.º, se formos consequentes com aquilo que foi o sentido da revisão constitucional de 1989, devemos não apenas eliminar o princípio da apropriação colectiva dos meios de produção, mas também transformá-lo no sentido de que, mantendo-se a propriedade, no essencial, nas mãos privadas, ela deve, apesar de tudo, ser subordinada à lei na parte em que seja necessária para satisfazer o interesse colectivo ou na parte em que deva cumprir aquilo a que se designa a sua função social.
A proposta que veio da Comissão é redundante nesse aspecto na parte em que, em alguma medida, reproduz aquilo que diz a alínea b), porque, quando se vem dizer que "É princípio fundamental da organização económica (...) propriedade pública dos recursos naturais e de meios de produção, de acordo corri o interesse colectivo", isso já está garantido na alínea h) quando garante a coexistência do sector público e do sector privado, donde resulta que ficou-se aquém daquilo que seria, porventura, desejável, em consequência da revisão constitucional feita em 1989.
Foi por essa razão que repescámos a proposta de substituição da alínea c) do artigo 80.º, que preconiza, pelo contrário, que se diga nessa alínea que "A organização económico-social assenta nos seguintes princípios (...) aproveitamento dos meios de produção, dos solos e dos recursos naturais de acordo com a sua função social". Significa isto reconhecer que já não existe, como princípio fundamental da organização económica uma ideia de expansão do sector público e que, em contrapartida, se reconhece como legítima e como necessária, a propriedade privada, desde que ela, simultaneamente, exista também para satisfazer não apenas o interesse individual dos seus proprietários mas também o interesse da colectividade, sempre que assim for exigido.
Entretanto, foram apresentadas em Plenário novas propostas, designadamente do PS, que já constituem uma evolução muito interessante e louvável em relação àquilo que foi o consenso obtido em Comissão,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ..,. porque introduz a ideia de que, como princípio fundamental da organização económica, é necessário regular a função dos bens privados, nomeadamente a função que eles desempenham no quadro global da economia. E, neste sentido, gostaria de fazer um apelo aos Srs. Deputados, em particular aos Srs. Deputados do PS e do PSD, para sermos de alguma forma consequentes com aquilo que foi a revisão constitucional de 1989.
Não há querela ideológica, há, quanto muito, diferenças de política económica, o que é uma coisa diferente, que nada tem a ver com o que é o essencial do nosso texto constitucional, que é a estrutura da nossa organização económica. A nossa organização económica já é, há muito anos, de uma economia de mercado, com maior ou menor intervenção estatal, com maior ou menor pendor social, e resulta naturalmente da sucessão de políticas económicas democraticamente sufragadas em actos eleitorais. Portanto, não é nada disto que está em causa. O que está em causa é estabelecer o quadro fundamental de organização económica, e não há a este propósito dúvida alguma aliás, a realidade desmentiria. se houvesse alguma dúvida sobre esta matéria, nomeadamente a realidade tal como existe hoje e tal como é hoje desenvolvida e aplicada pelo PS, enquanto partido apoiante do Governo.
Acabou-se com a irreversibilidade das nacionalizações, as privatizações já foram feitas. Esta política foi seguida pelo anterior Governo e é seguida por este Governo. Já não existe entre nós quem defenda a ideia da expansão do sector público e de que temos de caminhar no sentido da apropriação colectiva dos meios de produção. Tudo isto está ultrapassado, pelo que tudo o resto é um problema de semântica, é um problema de cosmética, porque penso que, no essencial, o acordo já. está alcançado há muitos anos, não é agora que vamos alcançá-lo. Agora é preciso ser-se consequente com o que se fez em 1989, altura em que se fez meia revisão, por os limites materiais não permitirem que se fizesse a revisão inteira. Então, em 1997, já que não houve oportunidade de a fazer antes, que se complete a revisão, que se faça por inteiro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para urna intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já aqui foi salientado por vários Srs. Deputados, em particular pelo meu colega Vieira de Castro, nesta revisão de 1997 avançou-se muito em matéria económica. Tem o PSD insistido, ao longo dos anos, para que estes avanços já tivessem tido lugar mais cedo, e, como trocávamos aqui impressões, e tal como agora foi dito pelo Sr. Deputado Cláudio Monteiro, o que aconteceu foi que a economia foi funcionando, ignorando a letra da Constituição. As políticas foram sobrepondo-se naturalmente à Constituição, com eleições, com programas sufragados eleitoralmente, e que legitimavam as escolhas políticas dos vários governos no sentido de uma economia de mercado integrada, aliás, na economia global.
Nesse sentido, a alínea d) do artigo 80.º. onde se substitui "planificação democrática" por "planeamento democrático", embora a palavra "planeamento" mantenha a ideia de plano, atém-se à ideia de desenvolvimento económico e social e não já, digamos assim, ao plano no sentido anterior, o que me parece de salientar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Gostava ainda de salientar um outro ganho, que é o facto de se explicitar, deste ponto de vista, o que consta agora da actual alínea g) e que constava do

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artigo 81.º. Ora bem, ao trazer este ganho para os princípios fundamentais estamos, de facto, a dar aqui uma notoriedade e uma explicitação importante à participação das organizações representativas dos trabalhadores, das actividades económicas na definição das principais medidas de carácter económico e social, o que nos parece também bastante importante.
Como ainda há pouco dizia o Sr. Deputado Cláudio Monteiro, ficamos não diria a metade, mas, tal como o PSD, teria ido mais longe na revisão da Constituição económica para adaptá-la à realidade económica e social do país. Isso é um facto, o texto ainda se atém muito ao palavreado das Constituições anteriores, ficam as palavras "plano", "as grandes opções do plano". Lembro que houve até alguns Deputados do PS que, quando analisaram as grandes opções do plano, na Comissão de Assuntos Europeus, concordaram em que de facto já não estávamos em período de falar de grandes opções do plano, por quererem dizer. sobretudo, grandes opções estratégicas, porque os verdadeiros planos são os programas dos governos, e esses devem ser revistos anualmente, como é óbvio. Mas isso poderá ser um documento indicativo das estratégias macroeconómicas do governo, ou das estratégias, do governo em matéria macroeconómica.
Há, no entanto, mais artigos que, a meu ver, estão um pouco prisioneiros da letra da anterior Constituição.
Porém, muito brevemente, gostaria ainda de focar um ponto, relativamente à nova alínea sugerida para o artigo 80.º, sobre a liberdade de iniciativa e de organização empresarial no âmbito de uma economia mista. Pergunto aos subscritores desta proposta de aditamento: o que é uma economia mista?

O Sr. José Magalhães (PS): - É o que diz o actual artigo 288.º da Constituição.

O Orador: - Não sei...

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é um pilar dos limites materiais da revisão!

O Orador: - Diz que é no actual, mas o actual não vai ser modificado?

O Sr. José Magalhães (PS): - É isso exactamente!

O Orador: - Penso que economia mista poderá querer dizer aqui a coexistência dos vários sectores... Se quer dizer isso... Não posso compreender economia mista de outra maneira, seria uma aberração nesta Constituição. E penso que os Srs. Deputados estarão de acordo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Estamos todos de acordo!

O Orador: - Mas, se o dizem dessa maneira, então, a coexistência dos vários sectores, dos sectores privado, público e cooperativo, já está explicitamente dito no artigo 81.º.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente, mas não em associação com a liberdade.

O Orador: - Penso que não é necessário, que a liberdade não tem a ver com a limitação dos vários sectores. Numa economia de mercado os sectores coexistem em liberdade. É escusado salientar ao mesmo tempo liberdade e economia mista, sobretudo porque para o economista tem outras conotações, já que pode ser entendido como uma coisa, de facto, abstrusa nos dias que correm.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, não pode!

O Orador: - Mas, como não é, e aponta só para a coexistência normal dos vários sectores, essa coexistência é reconhecida automaticamente pela vida quotidiana. Eles existem!

Protestos do PS.

Associar liberdade à coexistência dos sectores não me parece fulcral, importante, mas, sim, redundante, dado estar já repetido em vários sítios.

O Sr. Jorge Lacão (PS):
redundante, não se preocupe e deixe ficar!

O Orador: - Têm medo de que não haja liberdade para a existência do sector público? É isso? Ou têm medo de que haja liberdade para a existência do sector privado?

A liberdade, em economia de mercado, pressupõe que os meios de produção possam ser controlados quer por meios privados quer por meios públicos. Portanto, a própria liberdade já assegura a existência de vários sectores, depois depende da organização, da escolha, digamos assim, da detenção das empresas por parte do Estado na provisão de bens públicos.
Logo, parece-me redundante toda esta segunda parte da alínea que agora se pretende aditar.
Por isso, o PSD sugeria - é este o pensamento do meu grupo parlamentar, e já o fez, aliás - que esta nova alínea tivesse a seguinte redacção: "liberdade de iniciativa e de organização empresarial". Relacionar isto, no âmbito de uma economia mista, em minha opinião não tem muito sentido, é, nesta versão, redundante e presta-se até a ser, de facto, bastante confuso, porque eu não sei sequer o que é uma economia mista.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer duas ou três reflexões breves.
Começaria por dizer que o Sr. Deputado Vieira de Castro, na sua intervenção, foi injusto para com a Constituição da República, diria até, profundamente injusto, porque a Constituição da República é reconhecida nacional e internacionalmente como uma Constituição progressista. Mas é mais do que isto, Sr. Deputado: é uma Constituição ambiciosa, no sentido em que ambiciona o melhor para Portugal e para os portugueses, e é uma Constituição exigente. E se aqui ou além tiver algumas pinceladas de ideal, de sonho e até, porque não, de utopia, não é grave,

 

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Sr. Deputado. Faz parte da vida das pessoas, dos homens e dos povos, e essas pinceladas de utopia, se o forem, só enobrecem quem, em 1976, elaborou a Constituição da República, que hoje continua, no essencial, a ser a mesma,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E que vai continuar a ser a partir de hoje, compreendamo-nos sobre isto.
O Sr. Deputado falou na questão dos grupos económicos. Como o Sr. Deputado sabe, os grupos económicos não se realizam por decreto nem num momento qualquer, e nós, pelo menos por isso, não chegámos tarde à economia de mercado, já estamos nela há bastante tempo. Gostaria que reflectisse que a economia de mercado e os grupos económicos criam-se na sociedade e que a Constituição deve reflectir o tempo em que é feita, o tempo em que existe. E há 20 anos, como há 10 anos, o nosso sistema financeiro não era o que é hoje, a liberdade financeira que existe hoje não existia, o que era uma condicionante real, pelo que foi preciso criar essa liberdade financeira que hoje existe. A própria área comercial, a comercialização e o sistema comercial, a distribuição pelo país, era corporativa no essencial, e a transição tem sido bem difícil, como o Sr. Deputado sabe. Até porque, como o seu próprio partido reflecte de maneiras diversas quase todos os dias, toda essa transição, a sua raiz corporativa, como, aliás, o país em geral e a sociedade, não se podia fazer por decreto de um dia para o outro. Mas, mais, não era só na Constituição que isto não se poderia realizar de um dia para o outro; apesar da pressa e da ambição que reconheço a Sá Carneiro, ele não teria possibilidade de realizar esta transição. O mesmo não se diria, todavia, do cavaquismo, que poderia ter realizado uma economia de mercado e contribuído bem melhor para a criação dos grupos empresariais, que o senhor defendeu, do que o fez. Bastaria referir a questão das privatizações.
As privatizações verdadeiramente, na fase cavaquista, foram lentas, não contribuíram para o objectivo essencial de criação de grupos económicos de raiz nacional. Enfim, foram lentas. criaram confusões e descrédito na actividade económica, que o senhor conhece bem.
Dito isto, não quero dizer que a Constituição não precise, porque precisa, de grandes ajustamentos, e referiria, por exemplo, o artigo 87.º da Constituição vigente para justificar muitas das mutações que agora se realizam, porque penso que é necessário fazê-lo. Assim, chamo a vossa atenção para a redacção ainda vigente do n.º 1 do artigo 87.º, relativamente ao qual podemos dizer que é do domínio da psicologia na medida em que o primeiro objectivo no que toca às empresas privadas era o de que o Estado fiscalizasse o respeito da Constituição e da lei e, mais ainda, o de que o Estado "(...) protege as pequenas e médias empresas economicamente viáveis" - é sintomática esta ideia de que o Estado "protege". De alguma maneira, esta ideia sugere que as pequenas e médias empresas são por tendência economicamente inviáveis. Há coisas destas na Constituição que era necessário alterar e estão a sê-lo agora, com ponderação.
No que diz respeito a este artigo 87.º, n.º 1, "O Estado incentiva a actividade empresarial, em particular das pequenas e médias empresas, e fiscaliza o cumprimento das respectivas obrigações legais, em especial por parte das empresas que prossigam actividades de interesse económico geral." Eis, Sr. Presidente, Srs. Deputados, um aggiornamento de um parágrafo da Constituição que não invalida que, adaptando-se à realidade do nosso tempo, continue a ser progressista no sentido exacto em que também antevê algo dos tempos futuros.
Uma outra breve reflexão que gostaria de fazer quanto a estas matérias tem a ver com o sistema de planeamento.
Infelizmente, do meu ponto de vista - reconheço que, nesta matéria, sou claramente minoritário, não só nesta sede mas talvez também na sociedade -, reconheço que a relação dos portugueses e do País com o planeamento não é uma relação feliz nem nunca foi ou, melhor, talvez tenha sido mas pelas razões erradas. Não é uma relação feliz por razões essencialmente culturais. Antes de mais, o planeamento dá trabalho, nós temos tendência para fazer as coisas por amor, que é como quem diz sermos amadores nas coisas, raramente por profissionalismo. Por outro lado, temos a cultura da improvisação, gostamos de improvisar, gostamos de chegar tarde aos problemas, de decidir na última hora, às vezes de não fazer o "trabalho de casa", às vezes de "desenrascar". Como tal, tudo isto não favorece esse esforço metodológico e profissional de prever o futuro.
É que, no fundo, o planeamento é, antes de mais, a tentativa sempre difícil de antecipar e prever o futuro. É um acto de, colectivamente, perscrutar as evoluções económicas, sociais, culturais, societárias e tentar ver como é que um país, uma sociedade, uma empresa pode adaptar-se mais rapidamente do que os outros a esse futuro e fazer planos. É evidente que esses planos não têm de ser autoritários, não têm de impor-se, não têm de ser quinquenais, etc.
Claro que reconheço que os planos quinquenais se descredibilizaram por razões de ordem vária, mas gostaria de fazer uma referência aos planos de fomento que existiam em Portugal antes do 25 de Abril.
Hoje em dia, em Portugal, verifica-se muito o hábito de condenar tudo o que existia antes do 25 Abril. Pela minha parte, infelizmente, só após o 25 de Abril é que descobri que nem tudo era condenável. O que estava mal era o regime mas havia algumas coisas que eram bem feitas. Ora, os planos de fomento do regime anterior, que puseram a trabalhar pessoas de grande capacidade intelectual e de grande inteligência, levaram à prática e à concretização de muitas coisas que. na época, foram muito úteis.
Portanto, não desdenharia planear um pouco mais, até porque, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a ausência de planos, a ausência de perscrutação do futuro, a ausência de ideias claras sobre o que se quer conduz à arbitrariedade, conduz a que, depois, os agentes do Estado possam decidir quase sempre de qualquer maneira. Esta incapacidade de tentar prever o futuro conduz ainda a que, como país, mas, às vezes, também no caso clãs empresas, acabemos por estar no sítio errado no momento errado, ou seja, em vez de se antecipar o futuro vai-se atrás desse futuro, é-se arrastado pelos acontecimentos muito mais do

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se adopta a evolução a nosso favor, muito mais do que se antecipa as transformações da sociedade.
Abro aqui um parêntesis para referir que parecer-me-ia da maior importância que a nossa participação na União Europeia tivesse como objectivo essencial esta antecipação da evolução das sociedades para nos colocarmos não apenas no centro das decisões por termos cumprido critérios económicos mas também por termos ideias, por termos projectos e por podermos participar na construção do futuro da própria Comunidade. Ora, não há melhor maneira de o fazer do que ter esses projectos e de, apesar da nossa pequena dimensão, poder indicar ou liderar de certa forma alguns desses projectos, na União Europeia.
Por outro lado, ainda, em Portugal, os planos, ou, pelo menos, a respectiva discussão, seriam úteis porque temos uma síndrome difícil de superar e que é notória em todas as coisas, que é a síndrome da obra pública. Um dos resultados - positivo e negativo, depende da óptica por que se olhe - do Estado Novo foi o de ter desenvolvido uma certa capacidade de obra pública e, da mesma maneira que o corporativismo sobreviveu ao Estado fascista, também a síndrome da obra pública existe entre nós. Isto é, as Grandes Opções do Plano mas; principalmente, os Orçamentos do Estado sofrem desta síndrome da obra pública - já referi isto no meu relatório sobre as Grandes Opções do Plano para 1987. Ou seja, a óptica por que se olha o desenvolvimento do país é a da construção de obra pública desintegrada, desligada de projectos concretos e integrados de desenvolvimento, o que não optimiza o nosso desenvolvimento, bem pelo contrário.
Finalmente, no n.º 3 do artigo 91.º fala-se, e bem, do planeamento de base regional e do planeamento de base sectorial. Por mim, daria particular relevo ao desenvolvimento de base regional, ou seja, aos planos integrados de desenvolvimento de base regional, que considero da maior importância, matéria na qual, aliás, a União Europeia está presentemente a testar iniciativas a que chamou Pactos Territoriais para o Emprego que são mais do que planos de base regional criadores de desenvolvimento e de emprego. Portanto, eu daria uma ênfase muito particular no concreto da nossa actividade política nesta Câmara ao desenvolvimento e ao aproveitamento de todas as potencialidades destes planos integrados de desenvolvimento de base regional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, pedi novamente a palavra para uma intervenção que é suscitada por algumas intervenções anteriores e pela referência do Sr. Deputado Cláudio Monteiro à proposta 80-P do Partido Socialista.
Começo por dizer que, ao ouvir o Sr. Deputado Francisco Torres, ficamos com a convicção de que o melhor é não haver Constituição. Para que serve a Constituição? Ela é um incómodo, uma limitação, sobretudo quando se quer que a sociedade e a economia se conformem seguramente, e só, a um único sector da economia, o privado. Aliás, quando, há pouco, o Sr. Deputado Francisco Torres afirmava que a Constituição era alterada porque o mercado a ignorou, claro que estava a jogar com as palavras porque quem ignorou a Constituição foram os governos do PSD e os do Partido Socialista, dando indicações ao tal mercado, que não é um deus ex machina, para ele próprio violar a Constituição.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - O mercado funciona assim!

O Orador: - Não é a Constituição que deve andar atrás da sociedade, é a Constituição que deve ser o elemento enformador da sociedade que queremos. Esta é que é a questão e a discussão que perpassa estes debates, Sr. Deputado, porque o resto passa-se em sede de legislação ordinária.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Devia ser assim, mas nasceu torto.

O Orador: - Não, não. Começou bem, vocês é que o têm entortado!
Depois, os Srs. Deputados referem-se cora grande horror à palavra "planificação" e à necessidade de alterá-la.
Aliás, há pouco, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira teve uma expressão curiosa. Dizia ele que a expressão da planificação na actual Constituição nada tem a ver com uma planificação estatizante, mas, depois, logo a seguir, o Partido Socialista, pelo sim pelo não. apresentou uma proposta para eliminar aquela expressão.
Srs. Deputados, a questão é esta: os senhores que têm tanto horror à expressão "planificação" ou "planeamento". à organização da economia, são capazes de me responder por que "carga de água" é que têm uma União Europeia que, neste momento, é o centro mais planificador da economia europeia que se tem conhecido nos últimos anos? Então, ternos uma União Europeia que chega a dizer qual é a dimensão e a cordas maçãs que temos de comer...

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Isso é mau!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é mau ruas corrige-se!

O Orador: - Ou será que o planeamento só serve quando é para apoiar e sustentar o domínio da economia privada e não para ter urna economia equilibrada e socialmente justa?
Srs. Deputados, esta proposta 80-P do Partido Socialista é interessantíssima e vou lê-la. Como sabem, hoje em dia, um dos princípios fundamentais da Constituição é a apropriação colectiva dos meios de produção e solos, de acordo com o interesse público. Ora, a proposta que vem da CERC altera aquela disposição num sentido mais redutor mas que pode ser uma interpretação aceitável: "Propriedade pública (...) de acordo com o interesse colectivo". Entretanto, a componente democrata-cristã do Partido. Socialista...

Risos do PS.

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... apresentou uma proposta no sentido da substituição da palavra "propriedade" pela palavra "aproveitamento". Então, para resolver esta "manta de retalhos" dentro do Partido Socialista, este partido apresentou uma nova proposta em que se fala em "propriedade pública ou aproveitamento dos recursos naturais, de acordo com o interesse colectivo ou com a função social". Portanto, faz disto...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - E você não percebe nada!

O Orador: - Nem nós nem ninguém, Sr. Deputado!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Nós explicamos-lhe!

O Orador: - Como o Sr. Deputado Jorge Lacão sabe - e tem obrigação de saber -, na parte dos princípios da organização económica, o que deve estar consagrado é a garantia do controle pelo Estado de sectores essenciais da economia pública necessários ao equilíbrio e à salvaguarda de interesses básicos do país.
A questão do aproveitamento, se querem colocá-la e ninguém tem nenhuma objecção a isso -, então, coloquem-na de forma instrumental no artigo 81.º. Aí é que se fala em aproveitamento dos recursos da energia, em aproveitamento da água, em aproveitamento dos recursos naturais. É aí que deve ser colocada, Sr. Deputado! Agora aqui, em sede do artigo 80.º? Esta é, pois, evidentemente, uma proposta para agradar "a gregos e a troianos" nessa "manta de retalhos" que é hoje o Partido Socialista, que não tem princípios, que não tem história e que, infelizmente, se esqueceu dos princípios e da história.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Está enganado!

O Sr. José Magalhães (PS): - Nós vamos explicar-te!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Tu explicas tudo, Zé Magalhães! O que explicavas há quatro anos explicas agora em sentido inverso, com a mesma convicção que tinhas há quatro anos!

O Sr. José Magalhães (PS): - Tem calma porque ainda não percebeste a proposta!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Percebi, percebi muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, se o Sr. Deputado Lino de Carvalho se acalmar um pouco terei todo o gosto em esclarecê-lo.
Começaria por esclarecê-lo num ponto. O PS tem uma identidade e tem uma história. A identidade e a história do PS têm estado presentes em muitos momentos na sociedade portuguesa e na vida política portuguesa, particularmente em momentos como os dos processos de revisão constitucional, constituindo uma condição de actualização numa lógica de evolução e sem ruptura na ordem democrática portuguesa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Se a Constituição de 1976, de que nos honramos - e à memória dos constituintes, muitas vezes, tributámos a nossa homenagem - não tivesse evoluído de forma natural, pelo processo das revisões constitucionais, contra as quais o PCP sempre esteve, teria sido inevitável urna ruptura com graves consequências na sociedade portuguesa.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem.

O Orador: - É isto que o PCP não percebeu ontem, nem hoje e, infelizmente, talvez nem amanhã! E aí está a grande diferença entre a identidade do PS e a identidade do PCP.
O PS não disse, ao contrário do PCP - o Sr. Deputado Lino de Carvalho afirmou-o, ainda há pouco, e eu pasmei ao ouvi-lo! -, que a Constituição não tem de se adaptar à evolução da sociedade. Então o processo de revisão constitucional que a própria Constituição prevê não é, justamente, a abertura da Constituição para que ela, no quadro democrático, naturalmente, se adapte à evolução da sociedade?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É este ponto elementar que o PCP não percebe!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O PCP não percebe e o PS tem sido lento a perceber!

O Orador: - Por isso, o PCP está afazer um discurso fora da história, fora do contexto e, permita-me que lhes diga, numa lógica de esquizofrenia política com a realidade.
Srs. Deputados do PCP. vamos entender-nos: estamos a falar dos princípios fundamentais da nossa organização económica e, nesse domínio, há uma coisa que não queremos que se diga, tal como há pouco, de alguma maneira, o Sr. Deputado Francisco Torres aqui sublinhou: que a vida económica evolui como evolui, quer a constituição goste ou não goste. quer a Constituição queira ou não queira!

O Sr. Francisco Torres (PSD): - É um facto, Sr. Deputado!

O Orador: - A questão - e dirijo-me agora, em particular, ao Sr. Deputado Francisco Torres - é que, para nós, a Constituição não tem um valor semântico mas, sim, um efectivo valor regulamentar: ela deve ser, efectivamente, reguladora, por isso é a Constituição. É essa a razão por que não cuidamos de criar soluções meramente emblemáticas para a Constituição, antes procuramos encontrar

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soluções normativas efectivas em matérias sobre as quais a Constituição tem de pronunciar-se.
Naturalmente, estes processos não são fáceis e exigem soluções de compromisso. Uma revisão constitucional, como a nossa própria experiência o demonstra, é uma solução de compromisso nem sempre fácil. Mas, no quadro desse compromisso, é preciso apurar se dele resultou o reforço dos princípios em que acreditamos ou se estes saíram comprometidos. Ora, em relação a este ponto, estamos inteiramente à vontade, uma vez que saem claramente reforçados os princípios em que acreditamos, designadamente ao nível das regras fundamentais da organização económica.
Vejamos então: colocamos em causa a subordinação do poder económico ao poder político democrático? De maneira nenhuma!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Aceitamos colocar em causa o princípio da existência de uma economia mista, baseada na coexistência dos sectores público, privado e cooperativo e social de propriedade?

O Sr. José Magalhães (PS): - Não!

O Orador: - De maneira nenhuma aceitamos pôr esse princípio de coexistência em causa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Então, Srs. Deputados, onde é que está a nossa disponibilidade de actualização? Naquilo que parece evidente: nem a lógica do tempo presente exige que a economia se subordine, fundamentalmente, a um processo de apropriação colectiva dos meios de produção nem, por outro lado, deve dispensar a possibilidade de existência de propriedade pública de meios de produção.
Há pouco, comentava um Deputado do PCP: "Vai o PS e admite uma proposta em que, a par da existência da propriedade pública, admite a possibilidade do aproveitamento da propriedade também de acordo com a função social que ela tem". O Sr. Deputado do PCP não percebeu que isto não é um retrocesso mas, sim, um avanço, porque, para além da possibilidade de existência da propriedade pública ao serviço do interesse colectivo, admitimos que a propriedade privada não tenha uma lógica meramente egoísta na sua existência social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Subordina-a à lei, com critérios e função social relevante. Mas o PCP está contra isto, ou seja, o PCP não percebe nada, porque julga que tinha de opor a função necessariamente egoísta da propriedade privada a uma função necessariamente altruísta da propriedade colectiva. Não é assim, Srs. Deputados. É necessário e indispensável ter uma compreensão global de interesse público em que, num clima de coexistência, os sectores de propriedade possam conviver entre si. É isto que nós queremos apurar e até temos alguma curiosidade em saber
como vai evoluir a bancada do PSD neste plano, porque a sua posição, neste ponto particular, ainda não está totalmente esclarecida.

O Sr. João Carlos da Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, Srs. Deputados do PCP, comprometemos alguma coisa ao actualizar uma lógica de planificação democrática, que subentendia uma existência omnipresente do Estado ao nível de toda a actividade económica, para uma lógica de planeamento democrático do desenvolvimento económico, permitindo que, justamente, o Estado funcione como instância reguladora do desenvolvimento mas não substitutiva dos agentes da actividade económica e social?
Srs. Deputados do PCP, se estão contra isto, digam-no abertamente, porque não se trata de um jogo de palavras ruas, sim, de um jogo de posições inequívocas para saber quem é que tem uma compreensão clara das exigências do nosso tempo.
Finalmente, ao acertarmos o valor da concertação social como um contributo relevante para a definição dos objectivos económicos e sociais, naturalmente estamos, mais uma vez, a relevar o dinamismo que a sociedade e os seus agentes devem ter em todos os domínios, designadamente na área económica e social.
Permitam-me, nesta intervenção, uma última palavra para sublinhar aquilo que os Deputados do PCP tanto gostam de referir, e que o Sr. Deputado Lino de Carvalho já invocou, a propósito do artigo 81.º: a circunstância de aí ter sido substituída a expressão "povo" pela referência às "pessoas".

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vai contar o número de vezes?!

O Orador: - Não, Sr. Deputado Lino de Carvalho, não preciso de o fazer. Queria apenas lembrar-lhe que a disposição do artigo 81.º, onde a referência ao povo é substituída pela referência às pessoas, era uma substância que estava redundante, porque idêntica à que permanece no artigo 9.º, relativamente às tarefas fundamentais do Estado.
A verdade é que, a propósito das tarefas fundamentais do Estado, se diz, e assim continuará, que são tarefas fundamentais do Estado, entre outras, "promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo (...)". Do povo, Sr. Deputado!
Mas agora, no artigo 81.º, do que se trata é de considerar que o povo não é apenas aquele que se enquadra em categorias sociais, é o povo composto por pessoas individuais e concretas, todas elas numa dimensão de cidadania, que têm direito a uma protecção efectiva para uma igualdade de oportunidades na sociedade portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, apenas harmonizamos e aprofundamos os valores constitucionais quer quanto aos objectivos do desenvolvimento para o povo português, no seu conjunto, quer quanto às garantias dos direitos de

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oportunidade social para os portugueses e para as pessoas no seu conjunto.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas o PCP continua a não querer entender esta realidade, daí que as intervenções dos Deputados do PCP nesta Câmara, desculpe que lhes diga, são deprimentes, do ponto de vista intelectual e político. E o que ficará registado na acta destes debates é a incapacidade de o PCP perceber o que se passa - e quando se chega a este estádio de não se perceber o que se passa, não se tem contributos positivos a dar.
Neste debate. quando o PS se esforça por ter uma Constituição actualizada e, neste sentido, verdadeiramente progressista, a atitude do PCP, lamentavelmente, é reaccionária.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Inscrevi-me apenas para usar da palavra em jeito de comentário à ,intervenção do Sr. Deputado Henrique Neto.
Não é por acaso que muitas vezes estamos de acordo, e bem gostaria que hoje 'pudesse concordar consigo em relação a, praticamente, tudo o que disse. Acontece, porém, Sr. Deputado Henrique Neto, que fiquei chocado - mas não entenda mal este adjectivo - quando V. Ex.ª disse que a Constituição da República Portuguesa, e presumo que estava a referir-se, em particular, à parte económica, ambicionava para os portugueses e para Portugal o melhor.
O Sr. Deputado não estava, de certeza absoluta, a referir-se à Constituição que estamos a discutir! Se dissesse que a Constituição, depois da revisão de 1989, começou a ambicionar algo melhor para os portugueses, eu estava de acordo consigo. porque o modelo originário da Constituição para a economia só condenava os portugueses a serem pobres , e desgraçados. O Sr. Deputado sabe isso muito bem, não preciso de ir buscar os exemplos!
Hoje sabemos, porque, felizmente, há outra liberdade de informação - que antes de 1989 não existia! - qual é o panorama, quais são os salários médios dessas pessoas! Há dias, disseram-me que um professor catedrático, num desses países que tinha na Constituição um modelo económico igual ao nosso, ganhava 40 contos por mês! Portanto, dizer-se que ambicionava o melhor para os portugueses e para Portugal não é verdade.
Depois de 1989, a Constituição começou a tomar um caminho, que foi o caminho de um país relativamente civilizado, e a querer aproximar-se dos países desenvolvidos. Mas foi só nessa altura! E eu tenho de prestar aqui a minha homenagem ao Sr. Dr. Victor Constâncio, mas também não foi por acaso. É que o Sr. Dr. Victor Constâncio não precisa de nenhuma referência relativamente ao seu prestígio e à sua competência.
Foi um acordo histórico, o acordo celebrado entre o PS e o PSD em 1989, porque até aí o que tínhamos era a irreversibilidade das nacionalizações. Já agora, a esse propósito, queria lembrar outro nome, o do Professor Cavaco Silva, e a primeira privatização a 49%. De facto, todas estas privatizações de hoje têm, para todos nós, seguramente, um grande significado, mas aquele foi o primeiro passo. E eu lembro-me das dificuldades que houve para, nessa altura, conseguirmos fazer uma lei que fosse relativamente consensual.
Estamos hoje aqui, digamos, num ambiente de alguma distensão a discutir esta revisão constitucional, mas eu tenho de dizer o seguinte: o Partido Socialista - a história confirma, seguramente, o que eu digo - tem andado "arrastado" pelos acontecimentos. Em boa verdade, é isso! Lembro-me muito bem do que foram as sucessivas tentativas, por exemplo, de alterar a lei de delimitação dos sectores de propriedade. Sistematicamente, o Partido Socialista opunha-se a que a iniciativa privada acedesse a sectores que, por essa Europa fora, já estavam abertos, há muitos anos, à iniciativa privada.
Até em relação à comunicação social, Sr. Deputado Henrique Neto, o Partido Socialista só se convenceu de que se deveria abrir a televisão à iniciativa privada quando, pelo país inteiro, nos quintais e em cima dos telhados, havia antenas parabólicas. Antes disso, não estava nada convencido.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Você, então, não diga nada!..

O Orador: - Exactamente!
Ó Sr. Deputado José Magalhães, estou a fazer uma certa pedagogia e, desculpar-me-á, para si ela é ainda mais útil!
Não digo isto com gosto, mas em boa verdade os acontecimentos "empurram" o Partido Socialista e, justiça seja feita, o PSD tem procurado "pegar-lhes na mão" para que os senhores sigam o bom caminho

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Muito bem!

Risos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não irei tão longe e, apesar de tudo, ficarei a alguma distância do artigo 80.º, dado que me parece que, estando nós aqui a discutir os princípios fundamentais da organização económica, seria útil trazer, de imediato, à colação o que vai ficar no novo texto da Constituição, quanto ao artigo 82.º. É que a questão já aqui tratada da coexistência dos sectores de propriedade, tem a sua expressão mais significativa, exactamente, no artigo 82.º

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, permito-me adiantar já a reflexão que estaria, eventualmente, reservada para mais tarde, aquando da discussão do artigo 82.º.

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Assim, relativamente ao artigo 82.º, que é o cerne da nossa Constituição económica e, por isso, um elemento essencial da própria identidade do horizonte que está inscrito na nossa ordem constitucional, as alterações propostas não foram significativas. Já na sua actual formulação, este é um preceito que recolheu o resultado de um longo e complexo processo de sedimentação histórica. É esse processo que nesta revisão foi possível prosseguir, introduzindo algumas benfeitorias no sector cooperativo e social.
Na realidade, como já tive oportunidade de referir, a propósito do artigo 61.º, foi possível consagrar no texto constitucional a, integração no sector cooperativo e social de um novo conjunto de entidades: as pessoas colectivas sem fins lucrativos, cujo objectivo principal seja a solidariedade social, com menção específica, justificada pelo seu relevo, das mutualidades.
Por outro lado, potenciando-se o alcance de um novo número introduzido no artigo 61.º, foi também possível, já no decurso do debate em Plenário, garantir o apoio político necessário à aprovação de um aditamento à actual alínea a) do n.º 4 do artigo 82.º, que permitirá que as cooperativas de interesse público possam ser abrangidas pelo sector cooperativo e social. Deu-se, assim, uma maior consistência à componente cooperativa deste sector, ao mesmo tempo que se passou a estendê-lo a um conjunto de organizações que, pelos seus objectivos e pela sua prática, cada vez menos estavam bem fora dele. Ficou claro que a fidelidade à matriz essencial da Constituição económica não impede a abertura ao que é novo, não é algo de contrário ao dinamismo jurídico-constitucional. A identidade plural da economia mista, assegurada pela coexistência dos três sectores de propriedade, mantém-se, não como estrutura formal rígida, que constrange a realidade, mas como multiplicidade de caminhos que garantem tanto melhor a liberdade de iniciativa e de actividade económica quanto mais se desdobram numa pluralidade que queremos enriquecer.
Na verdade, também no campo das organizações sociais e económicas o futuro não é o da unicidade e do unilateralismo, seja ele o estatismo, seja ele o fundamentalismo capitalista. O futuro é o da diversidade organizativa.
De facto, tal como empobrece a vida o desaparecimento das espécies biológicas, só pode empobrecer a sociedade a extinção de qualquer tipo de organização económico-social. Por isso, foi um acto de futuro o de impedir o apagamento da autogestão do texto constitucional, que, por estar hoje em larga medida adormecida, em hibernação, não fica impedida de amanhã ressurgir, com novas faces que, eventualmente, combinem a dignificação do trabalho com o pluralismo dos tipos de propriedade e de formas de gestão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Foi um acto de futuro respeitar a matriz constitucional que tem sido a estrutura mais funda, em termos jurídicos, da nossa vida económica. É que o futuro não pertencerá ao absolutismo de um Estado interventor que tudo absorva e esmague mas não pertencerá também, por certo, a urna "selva" económica, em que os "lobos" devoram livremente os "cordeiros".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Todos sabemos que a economia de mercado entendida com objectividade não funciona sem o adequado protagonismo do Estado, mas mercado e Estado não podem dispensar a criatividade organizativa da sociedade. O futuro das sociedades humanas depende, por isso, também, da criatividade associativa, cooperativa e mutualista, desse desabrochar de iniciativas que recordam que, para além da razão do Estado e da razão do lucro, também há humanidade.
Podemos, por isso, dizer que, com os pequenos passos conseguidos em benefício do sentido essencial do artigo 82.º, damos um contributo positivo para a melhoria do nosso futuro colectivo, já que garantimos a manutenção da base jurídico-constitucional de um desenvolvimento sustentável.
Como sempre, o PS mostrou, com abertura e sem sectarismo, que a fidelidade à sua identidade é a procura realista do que favorece o futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Jorge Lacão decidiu vir defender as suas "damas", e defender de uma forma inaceitável nos termos e no conteúdo que utilizou. Quase me apetecia dizer que este jogo de palavras do Sr. Deputado Jorge Lacão enjoa, porque é urna retórica confrangedora,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... porque é uma retórica em que se envolve não para nos convencer a nós mas para exorcizar os seus próprios "fantasmas", para convencer a sua própria bancada, pelos problemas que tem dentro dela, em virtude do vergonhoso acordo de revisão constitucional que fez com o PSD, nas costas de muitos dos seus companheiros. Esta é que é a questão! Esta é que é a razão do seu discurso, Sr. Deputado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Palavra de honra que já estava à espera de que os seus argumentos fossem esses!

O Orador: - Ainda bem!
Mas é evidente que, por mais retórica parlamentar confrangedora que o senhor use, com o "cristão-novo ideológico" que está ao seu lado, o Sr. Deputado não pode esconder uma questão essencial neste processo: é que as alterações que os senhores apadrinham ou apoiam nesta Constituição, em matéria de organização económica, confirmam, no plano constitucional, o permanente e

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progressivo desvio para a direita do Partido Socialista e da actual direcção do Partido Socialista.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta é que é a questão que o senhor não pode escamotear, por mais retórica de palavras, por mais "embriaguez" e "jogo" parlamentar que aqui traga.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Por isso é que os portugueses, cada vez mais, votam no PCP!

O Orador: - Aliás, Sr. Deputado, nós ouvimos o Sr. Deputado falar e ouvimos outros Deputados da bancada socialista, como, há pouco, o Deputado Henrique Neto, e há uma enorme diferença, apesar de tudo, entre a forma como consideram as diversas vertentes da Constituição económica.
O Sr. Deputado Jorge Lacão vem aqui dizer: não, nós continuamos a garantir a coexistência dos sectores público, privado, cooperativo e social na economia. Pergunto-lhe, Sr. Deputado: é verdade? O Sr. Deputado está, sinceramente, a dizer a verdade? Então, por que é que, no artigo 87.º, os senhores fizeram aprovar na CERC uma proposta que determina que passa a não ser obrigatória a existência de um sector público da economia em Portugal? Por que é que os senhores sublinham a necessidade do reforço da iniciativa empresarial, do reforço de todas as componentes da Constituição económica que apoiam o sector privado da economia? Tudo ao privado! Depois, quando se trata, no mínimo no mesmo plano, de garantir a existência do sector público, os senhores alteram exactamente o artigo da Constituição que obrigava e impunha ao Estado a existência desse sector no quadro dos sectores básicos da economia.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, não me venha dizer que garante essa coexistência, porque garante-a em palavras, no artigo 80.º, e esvazia-a ou cria as condições para ela poder ser esvaziada, no artigo 87.º.
Sr. Deputado Jorge Lacão, com toda a sinceridade parlamentar, não vale a pena vir com retórica, quando ó que está, de facto, em jogo - e aí estaremos de acordo - são duas concepções de sociedade, duas concepções de Constituição que queremos para o nosso país. Só que nós somos coerentes, e somos coerentes na modernidade e no progresso, numa modernidade é num progresso que respeitam o direito dos trabalhadores, uma sociedade justa, uma sociedade solidária e uma sociedade livre.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Os senhores são incoerentes, e são incoerentes sobretudo porque avançam de uma posição que tinham em relação à conformação progressista de uma sociedade equilibrada para uma sociedade cada vez mais à direita, onde tudo se dá ao privado e tudo se retira ao público, onde o privado é bom para tudo e o público é ,mau para tudo.
São estas as diferenças que nos separam, são estas as questões que nos dividem e que nos levam às discussões que aqui travamos. O resto é jogo de palavras, são promessas que os senhores fazem e não cumprem, procurando escondê-las através desse jogo de palavras, dessa retórica parlamentar vazia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota. Amaral): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, o senhor começou mal mas acabou menos mal, porque, apesar de alguma violência verbal inicial, acabou a falar da fraternidade parlamentar, e é em nome dessa fraternidade que tenho todo o gosto em dialogar consigo.

O Sr. João Amaral (PCP): - Ouviu mal. Ele não falou em fraternidade!

O Orador: - O Sr. Deputado Lino de Carvalho está muito preocupado porque no artigo 87.º há uma possibilidade de deixar de estar consagrada uma prescrição constitucional obrigatória quanto à existência de um sector básico vedado à iniciativa privada. O Sr. Deputado não consegue daí retirar a consequência de que rica vedada a existência de um sector público da economia, só consegue retirar a consequência de que, à cabeça e por razões constitucionais, não haverá sectores vedados à iniciativa privada. E são duas coisas completamente diferentes!

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas, como os Srs. Deputados do PCP entendem que não devem dizer a verdade, devem, isso sim, mistificar as coisas, para baralhar, mais numa lógica de propaganda do que de debate político, permitem-se, com alguma impunidade intelectual, continuar sempre a dizer aquilo que não é verdade, aquilo que não é correcto.
Ficava extremamente satisfeito se, por uma vez, o PCP passasse a manifestar-se contrário à circunstância de não haver na Constituição um limite à possibilidade de iniciativa privada. É que essa é que é a razão pela qual o PCP se opõe! Só que o PCP, ao nível da racionalidade económica, já não é capaz de dizer qual o sector de actividade económica em nome do qual, e de forma absoluta. entende que nunca deveria haver possibilidade de iniciativa privada.

O Sr. José Magalhães (PS): - A banca, se calhar!

O Orador: - Nunca o PCP, pelo menos nos últimos tempos, o disse!
Seria a banca, outra vez, ou os seguros. ou a área das telecomunicações, ou a área da EDP?!...

O Sr. José Magalhães (PS): - Os adubos, os cimentos!...

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O Orador: - Onde é que seria exactamente, Srs. Deputados do PCP? Digam-no aqui, assumam a vossa responsabilidade política! Digam que entendem que deveria haver uma prescrição constitucional nas áreas tais e tais da economia, expressamente vedadas à possibilidade de iniciativa privada. Sejam corajosos! Digam-no! Assumam-no, em nome da vossa coerência ideológica! Por que é que o não fazem?!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Corajosos?! É preciso coragem?!

O Orador: - Não é nada disso que têm andado a dizer nos últimos tempos e, por isso, verdadeiramente, não somos nós, são os senhores que procuram "tapar o sol com a peneira".
Depois, o Sr. Deputado Lino de Carvalho falou-me de formação progressista, mas, como já tenho alguma experiência política, não me impressiono com as palavras. Ó Sr. Deputado, o que é que, do seu ponto de vista, é uma lógica progressista? Eu digo-lhe! O vosso paradigma é o seguinte: é iniciativa pública, é progressista; é iniciativa privada, é reaccionário. É esta a posição do PCP!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não, não! Pelo contrário!

O Orador: - Digo-lhe, com franqueza, que não é essa a posição do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O PS está no misto!

O Orador: - O PS entende que, por razões de racionalidade económica e de interesse público, pode haver iniciativa pública. O Estado não pode ser limitado quanto à possibilidade de intervir na economia. Não pode! Agora, os critérios de intervenção têm de ser ditados por critérios de racionalidade económica, na lógica do interesse público demonstrado. Isto, para o PCP, não é uma linguagem que entenda ou com a qual se conforte, porque o PCP tem uma atitude de paradigma. E se eu tivesse dúvidas sobre isso, embora já não as tenha, o Sr. Deputado Lino de Carvalho esclareceu-me!
Por isso, devolvo-lhe a pergunta, um pouco em termos de retórica. O Sr. Deputado disse o seguinte: de facto, nós, face ao PS, temos duas concepções de Constituição. Foi assim que o Sr. Deputado Lino de Carvalho terminou as suas considerações! Peço-lhe para clarificar esse aspecto, porque a minha impressão é a de que o senhor tem uma concepção de Constituição em que tudo o que é público é benfazejo ou virtuoso e tudo aquilo que não é público é maléfico ou prejudicial. É essa a sua lógica de progressismo? Continua a ser essa a sua lógica de progressismo? Sr. Deputado Lino de Carvalho, se é, percebo os seus argumentos, se não é, então, todas as contradições e consequências estão na sua bancada e não na minha.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, como o Sr. Deputado disse, no final, a pergunta que fez é de retórica parlamentar...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - E já sei a resposta!

O Orador: - ... e, portanto. não é para responder. Aliás, acaba de dizer que já sabe a resposta.
Sr. Deputado Jorge Lacão, deixo-lhe apenas duas notas.
Em primeiro lugar, o que leio no artigo 87.º é muito simples: hoje lê-se que "A lei definirá os sectores básicos nos quais é vedada a actividade às empresas privadas", isto é, a Constituição impõe ao Estado que haja sectores da economia que fiquem vedados à iniciativa privada, por razões de interesse público, por razões de interesse nacional. Os senhores deixam de garantir essa imposição e tornam a situação absolutamente condicional.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Facultativa! E quem é que decide? São os representantes do povo, democraticamente eleitos e legitimados para decidir.

O Orador: - Exactamente! Facultativa! E sabe porquê, Sr. Deputado? Porque só desta forma é que podem dar cobertura constitucional à vossa política generalizada de privatizações e de liquidação de tudo o que é hoje sector público da economia. É óbvio! Têm de conformar a Constituição à política que têm vindo a desenvolver neste terreno. Esta é que é a questão!

Protestos do PS.

Não direi, como alguém dizia há alguns anos atrás, que o PS, hoje, nas políticas de nacionalizações, decai dos seus princípios.
Quanto à diferença, é óbvio, Srs. Deputados, que, nós, ao contrário do que afirmam, somos coerentes com uma Constituição de matriz progressista, de matriz democrática, com urna Constituição que consagra uma sociedade equilibrada, uma economia mista e a defesa e a promoção dos sectores sociais mais desprotegidos na sociedade portuguesa. Foi para isso, aliás, que se fez o 25 de Abril e a Revolução democrática. Os senhores têm vindo, a pouco e pouco, a descaracterizar essa Constituição e a criar uma Constituição onde a economia mista, onde os sectores mais desprotegidos e que precisam de protecção constitucional são amputados, são eliminados, são banidos sempre em favor dos sectores mais dominantes da economia, dos sectores mais dominantes do poder político. São essas as questões que nos distinguem, Srs. Deputados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, muito rapidamente, dado o adiantado da hora e as questões estarem quase esclarecidas, direi apenas o seguinte: em primeiro lugar, não se pode fazer uma confusão entre planificação democrática, planeamento imperativo e

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directivas europeias. Já falei há pouco de como nós víamos a questão da planificação democrática, das razões por que achamos que os artigos sobre o planeamento devem ser alterados neste texto constitucional, da sua aderência à nova estrutura e a novas modificações do planeamento. O que se passa é que, na União Europeia, como é normal, há regras que balizam certo tipo de actividades económicas, regras que balizam alguns aspectos de carácter social e noutros domínios, desde as telecomunicações à informação, etc., mas isso não se trata de planeamento imperativo, trata-se de regras adoptadas nas instâncias europeias, que balizam, clarificam e ajudam a funcionar o mercado único e o avanço para o processo da união económica e monetária. Portanto, não se pode fazer confusão neste domínio.
Por outro lado, é bom que fique claro que nós somos defensores do mercado, mas somos defensores de que o Estado não se demita, e que, pelo contrário, continue a desempenhar um papel de regulação da economia e que haja um controle pelo poder político democrático que continua estabelecido na Constituição. Essa articulação entre os diferentes níveis de intervenção dos poderes públicos, até municipal, regional, nacional e europeu, é uma proposta que é preciso que fique clara. A grande alteração é a de que, efectivamente, há uma introdução dos mecanismos de funcionamento da economia à escala europeia, e temos uma forte abertura para a clarificação, até neste domínio, do que será o futuro planeamento regional, que é preciso que fique claro.
Quanto aos sectores básicos da economia, há uma concepção fixista que não podemos aceitar, neste momento, por dogma ou por sectores básicos - é uma concepção do desenvolvimento de algumas economias da Europa de Leste e de outros países nos anos 40 e 50. Nós não pensamos que se defenda melhor o interesse público dizendo que os sectores A, B e C têm de ser estatizados, outros podem ser liberalizados e outros assim-assim... Não! O Estado pode ter de intervir nos mais variados sectores ou pode ter de recuar nos mais variados sectores em função do que seja o interesse público e a estratégia de desenvolvimento económico. Portanto, queremos que exista uma grande flexibilidade. Por isso, é compatível uma estratégia global de privatizações com a possibilidade que mantemos na Constituição, que cada governo definirá e cada Assembleia da República aceitará ou não, de o Estado poder intervir nos sectores económicos. Portanto, há aqui, por um lado, uma recusa do fundamentalismo neoliberal e uma recusa da planificação estatizante. O resto são lugares-comuns, são erros de paralaxe de um lado e de outro.
As economias de direcção central - é bom que isto fique claro - conduziram ou à ruína política dos sistemas que as suportavam ou à miséria social dos respectivos povos. É bom que isto fique claro e era bom que os que defendem essas concepções meditassem sobre isso e não procurassem atirar-nos areia para os olhos.
Quanto ao processo de construção europeia e ao processo de construção económica europeia à escala a que está a ser desenvolvido, é um processo de tipo novo em todo p mundo e é uma experiência fascinante quer no plano dos princípios quer no plano da realidade económica, política e social. A conjugação dos aspectos da cidadania europeia com a defesa dos interesses, nacionais e com o desenvolvimento sustentável a esta escala é algo de fundamental em que gostávamos que os partidos que são reticentes, nomeadamente o PCP, a exemplo de outros congéneres europeus, viesse a participar.
Mudemos de fogo das baterias: "alma até Almada!". O modelo originário da Constituição correspondia à necessidade de desenvolver um modelo económico coerente com a alteração que, nessa altura, era preciso fazer numa estrutura económica anquilosada que tinha constituído um funcionamento económico globalmente articulado com o funcionamento político da ditadura. A necessidade de introduzir rupturas nesse modelo económico, a necessidade de desenvolver alterações económicas tem a ver não só com as concepções políticas dominantes na altura, pelos que fizeram, participaram ou apoiaram a Revolução, mas também com a necessidade de romper com a estrutura existente. Tudo isto. evoluiu, houve uma evolução do pensamento político socialista, das diferentes correntes democráticas, e eu gostaria que fosse visto que, enquanto nós, PS, nos mantemos fiéis ao pensamento socialista, há muitos anos, há outros que bateram à porta da Internacional Socialista, ingressaram na Internacional Liberal e hoje são "sócios" do conservadores ingleses e dos democratas-cristãos de vários países, pelo que não podem acusar-nos. Foram mudando de família como quem muda de camisa!
Quanto às privatizações, se fosse do PSD não seria tão orgulhoso pelas privatizações que fizeram. Algumas pecaram por uma grande falta de ansparência, para não usar expressões mais fortes!
Para terminar: televisão pública e televisão privada.
Ó Sr. Deputado, futuro vereador de Almada, o senhor vem dizer coisas como as que disse!? O senhor não sabe que, em toda a Europa. isso evoluiu de uma forma significativa!? O senhor vem acusar o PS de ter tido posições dogmáticas nesta matéria!? Ó Sr. Deputado, convém que analise o que foi a evolução do problema da televisão na Europa nos últimos 20 anos. O que nós queremos é afeiçoar e adaptar a Constituição, não estamos de acordo nem com a concepção fixista e rígida nem com a concepção de liquidação da Constituição; o que nós queremos é que o novo normativo constitucional adaptado reflicta, do ponto de vista conceptual, uma evolução económica e política clara. É nesse sentido que pensamos que, globalmente, este texto caminha.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de fazer uma breve intervenção sobre aquilo que considero ser a importância do artigo 87.º. E, nesse caso, estou de acordo, mas por motivos inversos, com o Sr. Deputado Lino de Carvalho: considero que o artigo 87.º e a alteração que lhe foi introduzida é fundamental para a nossa Constituição.

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19 DE JULHO DE 1997 3607

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Considero que esta revisão constitucional ficará marcada por significativas e importantes alterações que transformarão a nossa Constituição numa outra, que estará mais de acordo com os sentimentos gerais dos portugueses, com a inserção de Portugal na Europa e com as necessidades de modernização e desenvolvimento da nossa economia.

O Sr. José Magalhães (PS): - Numa outra, não!

A Oradora: - E se há momentos importantes nesta longa discussão, o da aprovação do novo artigo 87.º é seguramente um deles.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É bem verdade!

A Oradora: - Com efeito, com esta nova redacção põe-se finalmente fim à limitação imposta à iniciativa privada no acesso a alguns sectores básicos da economia. Ao ver eliminado este princípio da Constituição, o PSD vê assim chegar a bom termo uma antiga luta ideológica, agora que a maioria dos Deputados desta Assembleia acabou por lhe dar razão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas não por essa razão!

A Oradora: - Regozijamo-nos pela consagração deste princípio elementar em democracia e fazêmo-lo não apenas para contabilizar uma vitória mas porque sempre estivemos convictos de que esta rigidez constitucional não era própria de uma economia moderna. Sempre considerámos que o sector privado será sempre um factor de dinamização da economia, e por isso tem de ser enaltecido e não pode ser fonte de qualquer desconfiança. O PSD sempre entendeu que se alguns sectores deviam ser vedados à iniciativa privada, essa definição deveria competir ao legislador ordinário, que a concretizaria de acordo com um programa que fosse democraticamente apoiado pelos cidadãos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Regozijamo-nos com a aprovação deste princípio porque, além do mais, consideramos que, num Estado de direito democrático, a efectivação dos direitos e liberdades fundamentais não pode ser selectiva. As liberdades fundamentais não podem deixar de fora o direito, sem limitações, à iniciativa privada na área empresarial.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - E, porque sempre defendemos este princípio, consideramos que a eliminação desta restrição consagra um princípio de liberdade que enriquece o nosso texto fundamental e o torna um instrumento mais moderno e democrático. Depois de eliminado o princípio da irreversibilidade das nacionalizações, este era um resquício da época revolucionária que necessitava de ser expurgado da
nossa Constituição. Não tendo sido viável na revisão de 1989, foi finalmente possível agora convencer o PS da pertinência deste princípio. Por nós, temos o hábito de chegar a tempo ao encontro da História e da modernidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.as Deputadas e. Srs. Deputados, não há mais oradores inscritos e há consenso das bancadas para considerarmos debatidos todos os preceitos até ao artigo 95.º, inclusive, correspondentes à parte económica da Constituição.
Retomaremos o debate na próxima terça-feira, a partir do artigo 96.º. Há, no entanto, uma questão que é preciso agora esclarecer: o Sr. Presidente Almeida Santos deixou-me uma nota dizendo que o PS e o PSD não vão exercer o direito de transferir para a próxima semana os 10% do tempo de que disporiam, mas é preciso saber se o CDS-PP e o PCP também prescindem dos 10% do seu tempo ou se, pelo contrário, querem conservá-lo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PCP transfere para a próxima semana 10% dos tempos a que tinha direito esta semana: se a memória me não trai, são 23,8 minutos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Muito bem, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Ismael Pimentel.

O Sr. Ismael Pimentel (CDS-PP): - Sr. Presidente, também transferiremos tempo para a próxima semana.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O tempo do CDS-PP corresponde a 25,8 minutos, a acrescer ao tempo da próxima semana. Se houver qualquer rectificação, os serviços fá-la-ão.
Assim sendo, os nossos trabalhos prosseguirão na próxima terça-feira, à hora regimental, com a revisão constitucional a partir do artigo 96.º.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 45 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António José Gavino Paixão.
Cláudio Ramos Monteiro.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Joaquim Moreira Raposo.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

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3608 I SÉRIE - NÚMERO 98

Partido Social Democrata (PSD):

António Fernando da Cruz Oliveira.
Arménio dos Santos.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco Antunes da Silva.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
Lucilia Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Odete dos Santos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Mário Manuel Videira Lopes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Raul d' Assunção Pimenta Rego.

Partido Social Democrata (PSD):

António de Carvalho Martins.
António Manuel Taveira da Silva.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
Carlos Alberto Pinto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Pedro Augusto Cunha Pinto.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António João Rodeia Machado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Ruben Luís Trintão de Carvalho e Silva.

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