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SEPARATA — NÚMERO 102

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A estratégia do anterior governo para as empresas públicas assentava na construção de um normativo

legislativo que desse força de lei à orientação austeritária da política económica e, daí que o novo regime jurídico

do setor público empresarial (que inclui o setor empresarial do Estado e o setor empresarial local), tenha

estabelecido um conjunto de regras completamente em linha com a aplicação de um mesmo «modelo de

negócio» privado.

Assim, a pretexto de um controlo estreito e da imposição de limites ao endividamento das empresas públicas

não financeiras, pois este seria responsável pelo desequilíbrio das contas públicas, o novo modelo de atividade

transformava, na prática, todas as empresas do setor público empresarial em algo semelhante a repartições

públicas estritamente dependentes da tutela financeira do Ministério das Finanças.

Em particular, quando essas empresas «apresentem capital próprio negativo» (artigo 29.º do Decreto-Lei n.º

133/2013, de 3 de outubro), os conselhos de administração, instruídos diretamente pelo Ministério das Finanças,

estariam obrigados à adoção de medidas extraordinárias de gestão, ou seja, redução de custos e da atividade,

congelamento de salários e de carreiras, cortes nos benefícios sociais, contratualmente estabelecidos, entre

outras perdas de direitos laborais.

Quem trabalha nas empresas públicas sabe bem que estas diretivas austeritárias só se aplicavam a quem

não fazia parte da legião de filhos e enteados do poder, havendo sempre exceções para o recrutamento de

quem estava «habilitado para cumprir ordens» e disponível para receber as devidas recompensas

remuneratórias. Enquanto para a grande maioria dos trabalhadores houve cortes brutais de salários e enorme

degradação das condições de trabalho durante mais de uma década; para esta nova aristocracia nunca faltou

nada.

Este anátema que o anterior Governo PSD/CDS justapôs sistematicamente às empresas públicas

descapitalizadas, ignora que o desequilíbrio estrutural não tem que ver apenas com a gestão operacional

deficitária dos anos mais recentes, mas sobretudo com razões históricas, ligadas a modelos errados de

financiamento da atividade e à subcapitalização dessas empresas, particularmente no setor dos transportes

públicos coletivos. Acresce que, neste capítulo, não pode, nem deve ignorar-se que as operações desastrosas

e ruinosas levadas a cabo junto da banca privada internacional para financiamento da atividade dessas

empresas, com base em operações de tipo swaps, de elevado risco financeiro, também tiveram um contributo

relevante para agravar as várias componentes do desequilíbrio estrutural dos capitais dessas empresas.

No que diz respeito ao regime laboral (artigos 14.º, 17.º, 18.º e 19.º) deste regime jurídico do setor público

empresarial, a contratação coletiva, que existe em quase todas as empresas do setor empresarial do Estado,

deu lugar ao «regime jurídico do contrato individual de trabalho» (n.º 1 do artigo 17.º). O n.º 2 do artigo 14.º

estabelece que podem ser fixadas por lei normas excecionais, de caráter temporário, relativas ao regime

retributivo e às valorizações remuneratórias dos titulares dos órgãos sociais e dos trabalhadores das entidades

públicas empresariais, das empresas públicas de capital exclusiva ou maioritariamente público e das entidades

dos sectores empresariais local e regional, independentemente do seu vínculo contratual ou da natureza da

relação jurídica de emprego.

Foi dentro da mesma lógica austeritária que, através do artigo 18.º, se estabeleceu como norma que, em

termos de subsídio de refeição, ajudas de custo, trabalho suplementar e trabalho noturno, seria aplicado aos

trabalhadores destas empresas o mesmo «regime previsto para os trabalhadores em funções públicas», tendo

uma «natureza imperativa, prevalecendo sobre quaisquer outras normas, especiais ou excecionais, em contrário

e sobre instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho» (n.º 4 do artigo 18.º).

Urge, pois, à luz de um novo enquadramento para a política económica e de um entendimento radicalmente

diferente sobre o trabalho nas empresas públicas, que a visão sobre estas matérias se paute pelo respeito pelas

condições de trabalho dignas e pelo empenho na qualidade da atividade das empresas públicas passando a

estar em consonância com o apoio da nova maioria política de esquerda na Assembleia da República.

Por isso, é urgente eliminar as normas existentes no Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, relativas à

regulamentação do trabalho, bem como todas as cláusulas de exceção que permitiram a reversão de direitos e

benefícios que não os que resultem dos processos normais de negociação coletiva.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

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