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SEPARATA — NÚMERO 102

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O decaimento do princípio da vigência da convenção até à sua substituição, bem como do princípio da não

ingerência do Estado e do poder político na autonomia coletiva e da contratação laboral assumiu uma especial

expressão com o regime transitório de sobrevigência e caducidade de convenção coletiva, contemplado no

artigo 10.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. O n.º 2 do artigo 10.º fez operar, à data da sua entrada em

vigor, ainda que de forma condicionada, isto é, verificados determinados factos, a caducidade de convenções

coletivas.

O Memorando da Tróica e o Acordo da Comissão Permanente de Concertação Social, que mereceu forte

oposição da CGTP, vieram acentuar a desigualdade própria das relações laborais, esvaziar o poder negocial

dos sindicatos e congelar a publicação de portarias de extensão, contribuindo para a individualização das

relações laborais. Posteriormente ao Memorando, e sempre no mesmo sentido, foi apresentado um conjunto de

iniciativas legislativas: a Resolução Conselho de Ministros n.º 90/2012, de 31 de outubro, e a Resolução

Conselho de Ministros n.º 43/2014, de 27 de junho, e a Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto. Aquelas duas

resoluções, cujas consequências foram graves e cuja constitucionalidade era duvidosa, foram, entretanto,

revogadas no verão de 2017.

Por seu turno, a Lei n.º 55/2014 de 25 de agosto veio estabelecer duas outras regras. Primeiro, estabeleceu

a caducidade, decorridos três anos (onde anteriormente eram cinco), da cláusula de convenção que faça

depender a cessação de vigência desta pela substituição por outro IRCT. No caso de denúncia, estabeleceu a

manutenção da convenção em regime de sobrevigência durante o período de negociação, num mínimo de 12

meses. A interrupção da negociação por um período superior a 30 dias implica a suspensão do prazo de

sobrevigência. O período de negociação, com suspensão, não pode exceder os 18 meses. Segundo, determinou

que a convenção coletiva, ou parte desta, pode ser suspensa temporariamente, por acordo escrito entre as

associações de empregadores e sindicais, na observância das seguintes situações: crise empresarial por

motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras ocorrências com impacto na atividade

normal da empresa.

O resultado da conjugação destes instrumentos foi minar uma das traves mestras das relações de trabalho:

a confiança entre as partes. Consequentemente, assistiu-se à diminuição das atualizações das convenções, à

degradação do sistema de relações de trabalho e ao ataque direto aos sindicatos, a quem a Constituição atribui

o exclusivo direito de contratação coletiva.

As alterações sucessivas ao Código do Trabalho nos últimos anos colocaram em causa a dimensão individual

e coletiva dos direitos dos trabalhadores, configurando alterações paradigmáticas de sentido muito negativo ao

regime laboral em Portugal. Com efeito, reconduzir os direitos coletivos para a esfera individual, ficcionando, de

uma forma artificial e falaciosa, a paridade entre trabalhadores e empregadores opera uma transfiguração que

fragiliza ainda mais a posição do trabalhador que ocupa o lugar de parte mais débil no seio da relação laboral.

O legislador português colocou, de facto, em crise o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador,

que se assume como um princípio essencial com vista a assegurar um maior equilíbrio no quadro das relações

laborais.

O princípio do tratamento mais favorável do trabalhador, enquanto forma de determinar a norma

concretamente aplicável, permite a escolha, de entre várias normas aptas a regular uma relação laboral, daquela

que fixe condições mais favoráveis ao trabalhador, ainda que se trate de uma norma de hierarquia inferior. Ora,

este princípio tem sido delapidado em nome de uma alegada necessidade de flexibilização das relações laborais,

o que tem contribuído para uma fragilização das garantias dos trabalhadores.

Na nossa doutrina, o designado princípio do «favorlaboratoris» tinha assento no artigo 13.º da Lei do Contrato

de Trabalho (LCT), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de novembro de 1969, conjugado com o artigo

6.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 519-C1/79. Deste princípio decorria que, a menos que se estivesse perante

normas imperativas absolutas, isto é, de que resultasse uma proibição de derrogação por fonte inferior ou, no

caso de normas supletivas ou dispositivas, em que houvesse a permissão de afastamento independentemente

de maior ou menor favorabilidade, seria possível através de instrumento de regulamentação coletiva (com

exceção da portaria de condições de trabalho) estabelecer regime diferente do legal desde que mais favorável

ao trabalhador.

Este princípio, norteador da aplicação das normas laborais, é considerado como basilar no direito do trabalho,

sendo vital no reequilíbrio das posições dos sujeitos do contrato de trabalho, desenvolvendo-se como critério de

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