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Quarta-feira, 7 de abril de 2021 Número 49

XIV LEGISLATURA

S U M Á R I O

Projetos de Lei (n.os 765 e 767/XIV/2.ª):

N.º 765/XIV/2.ª (PCP) — Regula o regime de trabalho em teletrabalho.

N.º 767/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Pelo reconhecimento do direito ao luto em caso de perda gestacional.

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ÀS COMISSÕES DE TRABALHADORES OU ÀS RESPETIVAS COMISSÕES COORDENADORAS, ASSOCIAÇÕES SINDICAIS E ASSOCIAÇÕES DE

EMPREGADORES

Nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º, n.º 5, alínea d), e 56.º, n.º 2, alínea a), da Constituição, do artigo 134.º do Regimento da Assembleia da República e dos artigos 469.º a 475.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (Aprova a revisão do Código do Trabalho), avisam-se estas entidades de que se encontram para apreciação, de 7 de abril a 7 de maio de 2021, os diploma seguintes:

Projetos de Lei n.os 765/XIV/2.ª (PCP)— Regula o regime de trabalho em teletrabalhoe767/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Cristina Fernandes)— Pelo reconhecimento do direito ao luto em caso de perda gestacional.

As sugestões e pareceres deverão ser enviados, até à data limite acima indicada, por correio eletrónico dirigido a: 10ctss@ar.parlamento.pt; ou em carta, dirigida à Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social, Assembleia da República, Palácio de São Bento, 1249-068 Lisboa.

Dentro do mesmo prazo, as comissões de trabalhadores ou as comissões coordenadoras, as associações sindicais e associações de empregadores poderão solicitar audiências à Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social, devendo fazê-lo por escrito, com indicação do assunto e fundamento do pedido.

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PROJETO DE LEI N.º 765/XIV/2.ª

REGULA O REGIME DE TRABALHO EM TELETRABALHO

Exposição de motivos

O desenvolvimento científico e tecnológico é uma realidade com incidência em todos os planos da vida e da

sociedade, e também no trabalho. Ele pode servir os trabalhadores ou, no quadro da sua apropriação pelo

capital, ser posto ao serviço do seu objetivo de agravamento da exploração e de ataque aos direitos dos

trabalhadores.

Sabemos que hoje com a crescente automação do processo produtivo que alia, nomeadamente, inteligência

artificial e computação a organização do trabalho permite, em muitas situações, a separação física em diversas

das unidades de produção de componentes, fora do mesmo espaço e até do mesmo país, dissociadas da

unidade de produção que finaliza um determinado produto.

Sabemos também que a informática e o processo de digitalização de muitas atividades desmaterializaram a

base de informação para o trabalho e abriram a possibilidade de uma separação física, presencial, do local a

partir do qual se opera essa informação.

O grau de informatização nos processos produtivos, máquinas e equipamento tornam possível também a

sua manutenção e mesmo manejo à distância.

A cada vez maior capacidade e velocidade de comunicação a partir das redes eletrónicas permite

tecnicamente que, mesmo com separação física de centenas ou milhares de quilómetros, as condições de

acesso não sejam muito diferentes das que tem quem acede, por via do mesmo tipo de redes, a escassas

dezenas de metros.

É neste contexto que é referido o teletrabalho. No entanto, no conceito de teletrabalho misturam-se realidades

muito diferentes: trabalho à distância em instalações da empresa; o trabalho à distância em espaço comum a

várias empresas e o trabalho a partir da residência dos trabalhadores que é, afinal, o que pretende ser promovido

e endeusado.

Para o PCP não está em causa o aproveitamento das novas tecnologias ao serviço do desenvolvimento e

da melhoria das condições de trabalho e de vida. O que está em causa, como várias vezes a vida tem

demonstrado, é o aproveitamento por parte do grande capital, para criar ilusões e fragilizar os trabalhadores ou

reduzir direitos.

O atual contexto epidémico favoreceu uma mais larga utilização de formas de teletrabalho a partir de casa,

facto que alguns pretendem aproveitar para uma generalização acrítica, promovendo ilusões sobre vantagens

para os trabalhadores e omitindo-se as consequências negativas, que aliás este período claramente evidenciou.

São muitos os riscos de perda, atropelo de direitos e consequências negativas para os trabalhadores em

teletrabalho designadamente:

• Pressão para alargamento de horários, ritmos de trabalho, disponibilidades permanentes, com a

dificuldade acrescida de definir, controlar e fiscalizar os tempos de trabalho;

• Transferência para os trabalhadores de custos de instalações, sua manutenção e acomodação,

comunicações, água, eletricidade, consumíveis e material de escritório, bem como a pressão para o uso de

instrumentos de trabalho do trabalhador ao serviço da empresa;

• Invasão da privacidade e intimidade da vida dos trabalhadores, confusão entre o espaço de trabalho, o

espaço familiar, o espaço pessoal e privado;

• Fazer caminho para acabar com componentes da remuneração dos trabalhadores, no imediato ou a prazo

– como o subsídio de refeição, de transportes e outros, que estejam relacionados com a deslocação para o local

de trabalho;

• Desresponsabilização das questões de segurança e saúde no trabalho e da prevenção de acidentes de

trabalho e doenças profissionais, estabelecendo a confusão entre o que é esfera privada e individual e a que é

do trabalho em condições de teletrabalho, para fugir às responsabilidades que cabem às empresas, num quadro

em que se potencia o desenvolvimento e agravamento de doenças do foro psicossocial resultantes do

isolamento e da solidão, bem como da não diferenciação do ambiente do trabalho e da residência;

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• Separação física e maior isolamento dos trabalhadores uns dos outros, em seu prejuízo, negando a

possibilidade de partilha de experiências e conhecimentos que favorecem o seu desenvolvimento profissional e

pessoal, com a promoção da fragilização (se não mesmo uma rutura) na construção de laços de sociabilização

e de afirmação de espaços de solidariedade coletiva, com impactos negativos no esclarecimento, na unidade,

na organização e na luta dos trabalhadores.

Para o PCP é claro que os trabalhadores em teletrabalho têm de ter os mesmos direitos e segurança no

trabalho que os restantes trabalhadores, conforme prevê o Código do Trabalho.

Também nos parece evidente que a entidade empregadora tem a obrigação de criar as condições de trabalho

que protejam o trabalhador das implicações do trabalho em visor, designadamente com observância a pausas,

ergonomia e características técnicas do material, atenção especial na saúde.

Mas num momento em que o teletrabalho está imposto, em que há empresas que, de forma oportunista,

pretendem tornar definitiva uma realidade transitória e temporária por força da situação sanitária, impondo aos

seus trabalhadores o teletrabalho de forma permanente (como fez a seguradora Liberty, recentemente) e

aproveitando o teletrabalho para atropelar e retirar direitos, o PCP apresenta propostas que fixam e garantem

os direitos dos trabalhadores abrangidos pelo teletrabalho:

• Propomos que seja fixado um valor de ajudas de custo para compensar o trabalhador pelos gastos

acrescidos, nomeadamente, com comunicações, eletricidade, água, entre outros, rejeitando que as

responsabilidades da entidade patronal sejam transferidas para os trabalhadores;

• Garantimos que os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação,

o economato, equipamentos de trabalho como cadeira, secretária e demais mobiliário afeto à atividade laboral,

sua instalação e acomodação, bem como todos instrumentos e equipamentos utilizados pelo trabalhador no

local de trabalho são fornecidos pela entidade patronal, cabendo a esta arranjos e manutenção dos mesmos;

• Garantimos que um trabalhador em teletrabalho tem um posto de trabalho seu na empresa, rejeitando a

ideia de que a casa do trabalhador seja um posto de trabalho ou local de trabalho – casa, habitação, espaço

familiar são da esfera privada do trabalhador, não podendo ser encaradas ou definidas como uma «extensão»

da empresa;

• Garantimos a possibilidade de, a qualquer momento, o trabalhador poder regressar ao posto de trabalho

na sua empresa, assegurando a preservação de uma lógica temporária e transitória do trabalho a partir do

domicílio;

• Garantimos que o trabalhador tem o poder de rejeitar a proposta de teletrabalho, quando considere que

não estão reunidas as condições para que preste a sua atividade com dignidade, privacidade e respeito pelas

condições de segurança e saúde no trabalho.

O PCP, rejeitando a transformação do domicílio do trabalhador num local de trabalho da empresa e a

generalização do teletrabalho como uma panaceia para todos os males, não abdica de intervir e apresentar

propostas que salvaguardem os direitos dos trabalhadores em situação de teletrabalho.

Nestes termos e ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º e da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, os

Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à décima sexta alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprovou o Código

do Trabalho, com vista à garantia dos direitos dos trabalhadores em regime de teletrabalho.

Artigo 2.º

Alteração ao anexo da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do

Trabalho

Os artigos 166.º, 167.º, 168.º, 169.º e 170.º do anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com as alterações

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introduzidas pela Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, Lei n.º 23/2012, de 25

de junho, Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, Lei n.º 27/2014, de 8 de maio, Lei

n.º 55/2014, de 25 de agosto, Lei n.º 8/2015, de 14 de abril, Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, Lei n.º 8/2016,

de 1 de abril, Lei n.º 8/2016, de 23 de agosto, Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, Lei n.º 14/2018, de 19 de março,

Lei n.º 90/2019, de 4 de setembro e Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, passam a ter a seguinte redação:

«[…]

Artigo 166.º

Regime de teletrabalho

1 – O trabalhador pode excecionalmente exercer a atividade em regime de teletrabalho mediante a

celebração de acordo com a entidade empregadora.

2 – (...).

3 – (...).

4 – (…).

5 – O acordo está, obrigatoriamente, sujeito a forma escrita e deve conter:

a) (…);

b) Indicação da atividade a prestar pelo trabalhador, com menção expressa do regime de teletrabalho, o

instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável, a retribuição, incluindo o subsídio de

refeição e demais valores a pagar nos termos da alínea f);

c) Indicação do período normal de trabalho, bem como, do horário de trabalho diário e semanal;

d) O período previsto para a prestação de trabalho em regime de teletrabalho, após o qual o trabalhador

regressa ao seu local e posto de trabalho;

e) A identificação dos instrumentos de trabalho, todos da propriedade da entidade empregadora,

conforme previsto no artigo 168.º;

f) (Novo) Valor a pagar, mensalmente, pela entidade empregadora a título de abono de ajudas de

custo por conta do acréscimo de despesas realizadas ou a realizar, nomeadamente, com os consumos

de água, eletricidade, Internet e telefone;

g) [Anterior alínea f).]

6 – Na prestação de trabalho, em regime de teletrabalho, o horário de trabalho não se pode iniciar

antes das 8 horas e terminar depois das 19 horas.

7 – (…).

8 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto nos n.os 3 e 5 e constitui contraordenação

leve a violação do disposto no n.º 4.

Artigo 167.º

Duração do teletrabalho

1 –A duração inicial do acordo para prestação de trabalho em regime de teletrabalho não pode

exceder três anos,podendo, este período, ter a duração até cinco anos quando estabelecido em

instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

2 – Qualquer das partes pode fazer cessar, a todo o tempo, o acordo referido no número anterior.

3 – Cessando o acordo para prestação de trabalho em regime de teletrabalho, o trabalhador retoma a

prestação de trabalho, no local e posto de trabalho definido no contrato de trabalho.

4 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto no número anterior.

Artigo 168.º

Instrumentos de trabalho e pagamento de despesas em regime de teletrabalho

1 – Os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação,

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economato e qualquer instrumento ou mobiliário eventualmente necessário, pertencem ao empregador

e são por este cedidos, devendo ainda assegurar a instalação e manutenção dos mesmos e o pagamento

das inerentes despesas.

2 – (Novo) A entidade empregadora assegura ainda o pagamento do acréscimo de despesas que o

trabalhador tenha pela execução do trabalho em regime de teletrabalho, nomeadamente, com os

consumos de água, eletricidade, Internet e telefone cujo valor diário não poderá ser inferior ao

correspondente a 2,5% do valor do Indexante dos Apoios Sociais, sem prejuízo da aplicação de

disposições mais favoráveis ao trabalhador em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

3 – (Anterior n.º 2.)

4 – (Anterior n.º 3.)

Artigo 169.º

Segurança e saúde no trabalho e Igualdade de tratamento

1 – (…).

2 – (…).

3 – (…).

4 – (Novo) O empregador deve promover, com a periodicidade de 3 meses, a realização de exames de

saúde adequados para avaliar a aptidão física e psíquica do trabalhador para o exercício do trabalho em

regime de teletrabalho, bem como a repercussão deste e das condições em que é prestado na sua saúde.

5 – (Novo) O empregador deve assegurar:

a) A adequação dos meios de proteção e prevenção em matéria de segurança e saúde dos

trabalhadores em regime de teletrabalho, bem como, que os mesmos se encontrem disponíveis a

qualquer momento;

b) A atualização dos seguros de acidentes de trabalho considerando o exercício da atividade laboral

em regime de teletrabalho, seja qual for o local onde este seja prestado.

6 – (Novo) Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 170.º

Privacidade de trabalhador em regime de teletrabalho

1 – (…).

2 – (Novo) Os instrumentos de trabalho eletrónicos, de imagem e som destinam-se exclusivamente

ao exercício da atividade laboral não podendo ser usados para vigilância e controlo do trabalho e do

espaço em que o trabalhador se encontra, por parte da entidade empregadora.

3 – Sempre que o teletrabalho seja realizado no domicílio do trabalhador, a visita ao local tem que ter a

concordância do trabalhador e só deve ter por objeto a instalação, reparação e manutenção dos

instrumentos de trabalho, devendo ser marcada por acordo e apenas pode ser efetuada, entre as 10 e as

17 horas, com a assistência do trabalhador ou de pessoa por ele designada.

4 – (Novo) O controlo da atividade laboral do trabalhador em regime de teletrabalho só pode ser

efetuado no local e posto de trabalho do mesmo, nas instalações da entidade empregadora.

5 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.

Artigo 171.º

Participação e representação coletivas de trabalhador em regime de teletrabalho

1 – O trabalhador em regime de teletrabalho, mantém os direitos sindicais e integra o número de

trabalhadores da empresa para todos os efeitos relativos a estruturas de representação coletiva, podendo

candidatar-se a essas estruturas.

2 – É garantido ao trabalhador, pela entidade empregadora, a utilização de tecnologias de informação e

de comunicação afetas à prestação de trabalho para participar em reunião ou plenários sindicais promovidos

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por estrutura de representação coletiva dos trabalhadores, assim como o tempo necessário à sua deslocação

até ao máximo de 1 hora e 30 minutos.

3 – Qualquer estrutura de representação coletiva dos trabalhadores pode utilizar as tecnologias referidas no

número anterior para, no exercício da sua atividade, comunicar com o trabalhador em regime de teletrabalho,

através de listagem dos contactos eletrónicos dos trabalhadores em teletrabalho, cedida pela entidade

empregadora, nomeadamente divulgando informações a que se refere o n.º 1 do artigo 465.º.

4 – (Novo) O trabalhador pode ainda, nos termos do número anterior, receber toda a informação

sindical por comunicação eletrónica ou através dos portais reservados aos trabalhadores, cuja

publicação deve ser garantida pela entidade empregadora.

5 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto no presente artigo.

(…)

Artigo 231º

Registo de trabalho suplementar

1 – (…).

2 – (…).

3 – (Novo) O trabalhador em regime de teletrabalho só pode realizar trabalho suplementar desde que

o mesmo seja solicitado por escrito pela entidade empregadora.

4 – (Anterior n.º 3.)

5 – (Anterior n.º 4.)

6 – (Anterior n.º 5.)

7 – (Anterior n.º 6.)

8 – (Anterior n.º 7.)

9 – (Anterior n.º 8.)

10 – (Anterior n.º 9.)

[…]»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 26 de março de 2021.

Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — António Filipe — João Oliveira — Paula Santos — Alma Rivera —

Duarte Alves — Jerónimo de Sousa — Ana Mesquita — João Dias — Bruno Dias.

———

PROJETO DE LEI N.º 767/XIV/2.ª

PELO RECONHECIMENTO DO DIREITO AO LUTO EM CASO DE PERDA GESTACIONAL

Exposição de motivos

Sabendo que nem todos reagem da mesma forma em relação à perda, a verdade é que a morte de alguém

em particular nas situações em que é inesperada ou violenta, tem um elevado impacto na vida das pessoas,

mudando-a de forma permanente. A morte inicia uma resposta natural de adaptação, tanto à perda como a uma

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nova realidade.

Reconhecendo esta necessidade, o artigo 251.º do Código do Trabalho, permite ao trabalhador faltar de

forma justificada, dependendo o número de dias a que tem direito do grau de parentesco, nos seguintes termos:

• Até cinco dias consecutivos, por falecimento de cônjuge não separado de pessoas e bens ou de parente

ou afim no 1.º grau na linha reta. O mesmo se aplica em caso de falecimento de pessoa que viva em união de

facto ou economia comum com o trabalhador;

• Até dois dias consecutivos, por falecimento de outro parente ou afim na linha reta ou no 2.º grau da linha

colateral.

Contudo, na nossa opinião, os dias previstos na lei não contemplam todas as situações de perda como é o

caso da interrupção espontânea da gravidez.

A verdade é que a perda gestacional pode representar uma interrupção repentina de um projeto de vida e,

como tal, traz um forte impacto para aqueles que estão envolvidos emocionalmente na vivência da conceção de

um bebé. Sofrer este tipo de perda, tal como as que já constam no Código do Trabalho, pode dar origem ao luto,

um processo natural e esperado perante a quebra de vínculos que se verifica.

Após a perda gestacional há mulheres que dizem sentir falta de empatia e aceitação social para sentir e viver

a perda, e essa falta de aceitação pode ser um fator de risco para a vivência do luto dessas mulheres.

Sabemos que o processo de luto é longo e vai muito para além dos períodos contemplados na lei. Contudo,

preocupa-nos as condições em que estes trabalhadores voltam a exercer a sua atividade após o falecimento de

alguém que lhes é próximo ou em circunstâncias de morte perinatal, morte fetal e perda espontânea. É

fundamental garantir que, dentro do possível, estes se encontram em adequadas condições de saúde mental

para enfrentar a pressão e desgaste associados ao trabalho.

Atualmente, a mãe trabalhadora tem direito a licença por interrupção da gravidez, conforme o disposto no

artigo 38.º do Código do Trabalho. Ou seja, após a interrupção da gravidez (voluntária ou não) a trabalhadora

terá de contactar o seu médico para efeitos de lhe ser atribuída licença, com duração entre 14 a 30 dias,

conforme as considerações do médico. Para além disso, o pai não tem aqui quaisquer direitos.

Ora, a licença não se confunde com o direito ao luto, que agora propomos, o qual deve ser garantido tanto à

mãe como ao pai, como aos beneficiários da gravidez de substituição. Neste último caso, parece-nos justo que

aqueles que pretendiam ser pais por meio da gestação de substituição tenham direito a falta justificada por luto

no caso de interrupção espontânea da gravidez. Há uma expectativa legítima de que virão a ser pais e de que

virão a acolher aquele bebé, e a frustração dessa expectativa traz muito sofrimento associado.

No que diz respeito aos pais, ao longo dos anos a forma como se perceciona a parentalidade tem sofrido

alterações e temos assistido a uma mudança de uma visão quase exclusivamente centrada na mulher para uma

visão mais paritária, ainda que não tanto como desejável, já que as questões da reprodução e do aborto

continuam em grande parte a ser vistas como um «problema» da mulher. Isto acontece por fatores sociais,

políticos e legais (o facto de o pai não ter qualquer direito em caso de interrupção da gravidez comprova-o). A

verdade é que a interrupção da gravidez também tem impactos para os homens.

O ato de abortar, seja ele induzido ou não, pode desencadear múltiplas consequências psicológicas nos pais,

que não estão relacionadas de forma linear com o tempo de gestação. Muitos especialistas afirmam que estas

dependem da própria motivação e desejo da gravidez, do investimento emocional que se gerou em torno da

mesma e na ligação com o bebé. No entanto, de um modo geral, as perdas com maior impacto ocorrem no

último trimestre da gravidez.

As perdas experienciadas pela mãe e pai, durante a gravidez ou puerpério, geram respostas emocionais

específicas, que se podem manifestar de diversas formas como tristeza, solidão, culpa, raiva, ansiedade, apatia,

choque, desamparo, choro, isolamento, baixa autoestima, insónia, perda de apetite, entre outros.

O período de dor e sofrimento correspondente ao luto por uma perda é normal e deve ser encarado como

saudável e necessário.

Segundo o relatório denominado Retrato da Saúde 20181, do Ministério da Saúde, o número de interrupções

da gravidez (incluindo a interrupção voluntária e a espontânea) tem vindo a diminuir desde 2011, no entanto, a

1 https://www.sns.gov.pt/wp-content/uploads/2018/04/RETRATO-DA-SAUDE_2018_compressed.pdf.

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média de interrupções entre 2011 e 2016 é de 17 886, embora a maioria diga respeito a interrupções voluntárias.

Ainda assim, esta não é uma situação ocasional, é algo que acontece todos os dias, com todo o sofrimento que

isso implica para as mães e pais.

A aprovação deste projeto de lei mostrará que, mais uma vez, Portugal está num caminho para a defesa dos

direitos das mulheres e para a construção de uma sociedade mais igualitária. Para além de acompanhar a

aprovação recente de lei idêntica que despertou o interesse internacional sobre esta temática, tendo sido a Nova

Zelândia o precursor.

A lei aprovada na Nova Zelândia2 é um exemplo de legislação que reconhece explicitamente o luto que vem

com a interrupção da gravidez.

Para além disso, este reconhecimento pode contribuir para permitir que as mulheres se sintam mais

confortáveis ao falarem sobre a interrupção da gravidez e em pedir ajuda no que é uma enorme perda física e

emocional, sem a pressão financeira, insegurança ou licença insuficiente para dedicar o tempo necessário ao

luto.

Por sua vez, os pais terão pela primeira vez direito ao sofrimento, sem perda de remuneração, assim como

terão direito a apoiar-se mutuamente.

Por este motivo, propomos que os progenitores passem a ter direito a três dias de luto em caso de interrupção

espontânea da gravidez, incluindo-se aqui também os beneficiários da gestação de substituição.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à vigésima alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de

fevereiro, na sua redação atual, por forma a reconhecer o direito ao luto no caso de perda gestacional.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova o Código do Trabalho

São alterados os artigos 249.º e 251.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de

fevereiro, alterado pela Rectificação n.º 21/2009, de 18 de março, Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, Lei n.º

53/2011, de 14 de outubro, Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, Retificação n.º 38/2012, de 23 de julho, Lei n.º

47/2012, de 29 de agosto, Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, Lei n.º 27/2014, de 8 de maio, Lei n.º 55/2014, de

25 de agosto, Lei n.º 28/2015, de 14 de abril, Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, Lei n.º 8/2016, de 1 de abril,

Lei n.º 28/2016, de 23 de agosto, Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, Retificação n.º 28/2017, de 2 de outubro, Lei

n.º 14/2018, de 19 de março, Lei n.º 90/2019, de 4 de setembro e Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, os quais

passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 249.º

(…)

1 – (...).

2 – (...):

a) (...);

b) A motivada por interrupção espontânea da gravidez, falecimento de cônjuge, parente ou afim, nos

termos do artigo 251.º;

c) (...);

d) (...);

e) (...);

f) (...);

2 https://www.legislation.govt.nz/bill/member/2019/0159/latest/whole.html#LMS220706.

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g) (...);

h) (...);

i) (...);

j) (...);

k) (...).

3 – (...).

Artigo 251.º

(...)

1 – (...):

a) (...);

b) Até três dias consecutivos, por interrupção espontânea da gravidez;

c) [anterior alínea b).]

2 – (...).

3 – Aplica-se o disposto na alínea b) do n.º 1, a ambos os progenitores, à gestante e aos beneficiários

em caso de gestação de substituição.

4 – [Anterior n.º 3.]»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 29 de Março de 2021.

A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA

Artigo 54.º Comissões de trabalhadores

5. Constituem direitos das comissões de trabalhadores:

d) Participar na elaboração da legislação do trabalho e dos planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector;

Artigo 56.º Direitos das associações sindicais e contratação colectiva

2. Constituem direitos das associações sindicais:

a) Participar na elaboração da legislação do trabalho;

REGIMENTO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

Artigo 134.º Legislação do trabalho

1 — Tratando-se de legislação do trabalho, a comissão

parlamentar promove a apreciação do projecto ou proposta de lei, para efeitos da alínea d) do n.º 5 do artigo 54.º e da alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição.

2 — As comissões de trabalhadores, as associações sindicais e as associações de empregadores podem enviar à comissão

parlamentar, no prazo por ela fixado, nos termos da lei, as sugestões que entenderem convenientes e solicitar a audição de representantes seus.

3 — Para efeitos do disposto nos números anteriores, os projectos e propostas de lei são publicados previamente em separata electrónica do Diário.

4 — A data da separata é a da sua publicação, coincidente com a do seu anúncio, entendendo-se como tal o dia em que fica disponível no portal da Assembleia da República na Internet.

Lei n.º 7/2009

de 12 de Fevereiro

APROVA A REVISÃO DO CÓDIGO DO TRABALHO

CAPÍTULO II Participação na elaboração da legislação do trabalho

Artigo 469.º Noção de legislação do trabalho

1 — Entende-se por legislação do trabalho a que regula os direitos e obrigações dos trabalhadores e empregadores, enquanto tais, e as suas organizações.

2 — São considerados legislação do trabalho os diplomas que regulam, nomeadamente, as seguintes matérias:

a) Contrato de trabalho; b) Direito colectivo de trabalho; c) Segurança e saúde no trabalho; d) Acidentes de trabalho e doenças profissionais; e) Formação profissional; f) Processo do trabalho.

3 — Considera-se igualmente matéria de legislação de trabalho o processo de aprovação para ratificação das convenções da Organização Internacional do Trabalho.

Artigo 470.º Precedência de discussão

Qualquer projecto ou proposta de lei, projecto de decreto-lei ou projecto ou proposta de decreto regional relativo a legislação do trabalho só pode ser discutido e votado pela Assembleia da República, pelo Governo da República, pelas Assembleias Legislativas das regiões autónomas e pelos Governos Regionais depois de as comissões de trabalhadores ou as respectivas comissões coordenadoras, as associações sindicais e as associações de empregadores se terem podido pronunciar sobre ele.

Artigo 471.º Participação da Comissão Permanente de Concertação Social

A Comissão Permanente de Concertação Social pode pronunciar-se sobre qualquer projecto ou proposta de legislação do trabalho, podendo ser convocada por decisão do presidente mediante requerimento de qualquer dos seus membros.

Artigo 472.º Publicação dos projectos e propostas

1 — Para efeitos do disposto no artigo 470.º, os projectos e propostas são publicados em separata das seguintes publicações oficiais:

a) Diário da Assembleia da República, tratando-se de legislação a aprovar pela Assembleia da República;

b) Boletim do Trabalho e Emprego, tratando-se de legislação a aprovar pelo Governo da República;

c) Diários das Assembleias Regionais, tratando-se de legislação a aprovar pelas Assembleias Legislativas das regiões autónomas;

d) Jornal Oficial, tratando-se de legislação a aprovar por

Governo Regional.

2 — As separatas referidas no número anterior contêm, obrigatoriamente:

a) O texto integral das propostas ou projectos, com os respectivos números;

b) A designação sintética da matéria da proposta ou projecto; c) O prazo para apreciação pública.

3 — A Assembleia da República, o Governo da República, a Assembleia Legislativa de região autónoma ou o Governo Regional faz anunciar, através dos órgãos de comunicação social, a publicação da separata e a designação das matérias que se encontram em fase de apreciação pública.

Artigo 473.º Prazo de apreciação pública

1 — O prazo de apreciação pública não pode ser inferior a 30 dias.

2 — O prazo pode ser reduzido para 20 dias, a título excepcional e por motivo de urgência devidamente justificado no acto que determina a publicação.

Artigo 474.º Pareceres e audições das organizações representativas

1 — Durante o prazo de apreciação pública, as entidades referidas no artigo 470.º podem pronunciar-se sobre o projecto ou proposta e solicitar audição oral à Assembleia da República, ao Governo da República, à Assembleia Legislativa de região autónoma ou ao Governo Regional, nos termos da regulamentação própria de cada um destes órgãos.

2 — O parecer da entidade que se pronuncia deve conter:

a) Identificação do projecto ou proposta; b) Identificação da comissão de trabalhadores, comissão

coordenadora, associação sindical ou associação de empregadores que se pronuncia;

c) Âmbito subjectivo, objectivo e geográfico ou, tratando-se de comissão de trabalhadores ou comissão coordenadora, o sector de actividade e a área geográfica da empresa ou empresas;

d) Número de trabalhadores ou de empregadores representados;

e) Data, assinatura de quem legalmente represente a entidade ou de todos os seus membros e carimbo da mesma.

Artigo 475.º Resultados da apreciação pública

1 — As posições das entidades que se pronunciam em pareceres ou audições são tidas em conta pelo legislador como elementos de trabalho.

2 — O resultado da apreciação pública consta:

a) Do preâmbulo do decreto-lei ou do decreto regional; b) De relatório anexo a parecer de comissão especializada da

Assembleia da República ou da Assembleia Legislativa de região autónoma.

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