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Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 30 de Janeiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 31 DE JANEIRO.

ABERTA a Sessão, sob a presidencia do Sr. Serpa Machado, foi lida e approvada a acta da antecedente.

Leu o Sr. Secretario Felgueiras os officios e papeis seguintes.

Um officio do ministro do Interior, acompanhando a consulta do conselho da fazenda ácerca do requerimento de Manoel da Silva Pinto da Fonseca, em que pede a verificação do titulo de Conde de Amarante, e da commenda de Santa Maria de Carregos. A's Commissões de Constituição e fazenda.

Um outro do mesmo ministro, acompanhando a consulta da directoria geral dos estudos, ácerca do requerimento dos moradores dos lugares de Lousa, e Escallos de cima, termo da cidade de Castello Branco, em que pertendem uma escola de primeiras letras. A' Commissão de instrucção publica.

Do mesmo ministro o seguinte

OFFICIO.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - Constando nesta Secretaria de Estado haver-se em 8 de Novembro de 1821 remettido ao soberano Congrego o auto da eleição da Commissão creada para apontar os estorvos do commercio na cidade do Porto, sobreste vê-se no progresso deste negocio, esperando se decisão, porem na data de hoje se expedem as ordens inclusas por copia á junta do commercio e superintendente da alfandega do Porto, sendo tudo o que a este respeito posso informar, pedindo a V. Exc. o queira fazer subir ao conhecimento das Cortes em execução da sua ordem de 25 do corrente.

Deus guarde a V. Exc. Palacio de Queluz em 30 de Janeiro de 1822. - Sr. João Baptista Felgueiras. - Filippe Ferreira de Araujo e Castro.

Remettido á Commissão do commercio.

Outro do ministro das justiças, remetendo a informação e mappas, que mandára o reitor geral da congregação dos conegos seculares de S. João Evangelista, ácerca dos quesitos que lhe forão feitos. A' Commissão ecclesiastica de reforma.

Outro dito do mesmo ministro, acompanhando as informações do provisor do bispado de Beja, ácerca das igrejas paroquiaes e capellas publicas da mesma diocese, por qualquer modo isentas da jurisdicção ordinaria. A' Commissão ecclesiastica de reforma.

Um officio do ministro da guerra, referindo-se ao officio do marechal de campo encarregado do governo das armas da provincia do Minho, em que participa a occurrencia de salteadores naquelle territorio. A' Commissão de justiça criminal.

Apresentou uma memoria do Doutor Manoel Gemes Bezerra, sobre manufacturas. A' Commissão das artes.

Um plano de Antonio da Silva Ribeiro Bomjardim, para serem avençados os barcos. A' Commissão de Pescarias.

Dois requerimentos dos habitantes dá cidade de Loanda, em que se queixão amargamente do actual governador Joaquim Ignacio de Lima, e pedem providencias contra os seus despotismos. A' Commissão de Constituição.

Um outro da mesma natureza, e contra o mesmo governador, de Francisco Alexandrino Portel. A' mesma Commissão.

O Sr. Peixoto apresentou uma memoria do cidadão José do Espirito Santo Faria, ácerca da divisão da freguezia de S. Pedro da villa da Sertam. A' Commissão ecclesiastica de reforma.

O Sr. Vasconcellos apresentou os diplomas dos Srs. Deputados da provincia da Paraiba. A' Commissão de poderes para serem examinados.

Feita a chamada, verificou-se estarem 102 Srs. Deputados, e faltarem os seguintes: os Srs. Povoas, Canavarro, Gyrão, Maria Ozorio, Barão de Molellos, Sepulveda, Bispo de Beja, Rodrigues de Macedo, Gouveia Durão, Borges de Barros, Filisberto Sequeira, Van Zeller, Calheiros, Braamcamp, Jeronimo Carneiro, Innocencio de Miranda, Queiroga, Mantua, Figueiredo, Bekman, Guerreiro, Faria, Sousa e Almeida, Castro e Abreu, Ribeiro Teixeira, Feio, Pamplona, Araujo Lima, Vicente Antonio.

Ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Ontem por falta de tempo não podei ao ser postas á votação as proposições do artigo 157, as quaes vou agora verificar. Em quanto á primeira que trata de se se deverá exigir ou não deposito para se conceder ou negar revistas das sentenças deffinitivas, proponho primeiramente se esta doutrina ha do ser expressa, ou ommissa na Constituição?

Resolveu-se que ficasse omittida.

O Sr. Presidente: - Proponho igualmente: se deve tambem omittir-se a clausula de injustiça notoria?

O Sr. Fernandes Thomaz: - Isso não pode ser omisso: não pode deixar de expressar-se na Constituição, porque essa he base fundamental da revista.

Resolveu-se que a dita clausula seja declarada na Constituição.

Igualmente se approvou sem discussão a seguinte clausula: estas revistas somente se concederão nas causas civeis que valerem a quantia que a lei determinar.

O mesmo Sr. Presidente continuou a propor: se a respeito das causas criminaes se deveria marcar tempo, approvando-se a clausula do artigo, ou se esta deveria ficar omissa: diz o artigo: as revistas se concederão nas causas criminaes em que se proferir condemnação de prizão, em mais de cinco annos, degredo para fora do respectivo continente, ou outra pena maior.

O Sr. Vazconcellos: - Requeiro se tenha agora

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em consideração a emenda que eu fiz a este respeito na sessão antecedente.

O Sr. Presidente: - Julgo que a emenda do Sr. Vasconcellos he que a revista seja somente concedida por sentença condemnatoria, e não absolvetoria.

O Sr. Vasconcellos: - Reduz-se a que o accusador nunca possa ler recurso contra o réo, se o jurado determinou que estava innocente pelo que foi accusado.

O Sr. Peixoto: - Opponho-me a esta doutrina. Ou a sentença terminou, ou não terminou a causa: em. um e outro caso deve a decisão ser commum a ambos os contendores. Tanto interessa á republica na absolvição de um innocente, como na punição do verdadeiramente criminoso; e o mesmo pode applicar-se aos particulares. Um accusado foi infamado e calumniado: se o accusador he absolvido com que justiça será o accusador privado de poder vindicar a sua boa fama por meio de um recurso, que ao seu adversario será permittido se fosse condemnado? Se a nullidade do processo, ou a injustiça da sentença he notoria, emende-se, uma vez que haja para isso meios: tudo o mais são principos de uma filantropia mal entendida, e contrarios a todas as regras de justiça.

O Sr. Bastos: - Em Inglaterra nem ao accusador, nem ao accusado he permittido appellar ou interpôr algum outro recurso do juizo dos jurados. Somente o Magistrado que preside pode pedir um segundo juizo, parecendo-lhe erroneo ou injusto o primeiro; mas isso tem lugar, quando este foi contrario ao réo, por nenhum modo quando lhe he favoravel. Uma tal differença deve-se áquella regra que os Romanos transmittirão a todas as nações civilisadas, e que consiste em que he preferivel absolver mil culpados ao condemnar um só innocente. Notasse a desigualdade com que assim vem a ser tratados o accusado, e o accusador: mas que direito tem elles a uma absoluta igualidade, sendo as suas situações essencialmente desiguaes: A do accusador he de quem intenta destruir, a do apensado he a de quem intenta conservar-se; a do primeiro he odiosa; a do segundo interessante. Por tanto não posso deixar de opprovar a indicação do Sr. Vasconcellos.

O Sr. Freire. - Eu não me posso conformar com que se sanccione tal desigualdade na lei: he preciso que nos formemos a idéa de, que tambem se commettem injustiças absolvendo, e de que a sociedade interessa muito na punição dos delictos, e não interessa na absolvição dos verdadeiramente criminosos. Deixemo-nos desta mal entendida humanidade.

O Sr. Pinto de França: - Pouco resta que dizer ao que tenho ouvido, direi porém que não ha proposição que pareça maçar mais de face a justiça do que esta: a lei he igual para todos, e deve ser igual na recompensa e no castigo. O homem de bem faz a lei para o homem malvado; pois se todos se derigissem pelo estricto caminho da virtude não serião necessarias as leis. Porque pois se hão de fazer leis para que possão escudar-se com ellas os criminosos? Se se fizesse a que se pretende, torno a dizer, que atacaria o que he justo e o que he bom.

O Sr. Vasconcellos: - Nós devemos ter tanta contemplação com a vida e a honra de nossos concidadãos, que devemos procurar não padeça nem uma nem outra o mais leve damno, sem ser tão claro o sou crime como a luz do dia. Por esta razão se instituiu entre nos o conselho dos jurados; mas neste particular temo-nos afastado o que fazem os Inglezes e os Americanos inglezes; e não ha recurso nenhum dos jurados. Em Inglaterra tem o réo direito sobre o accuzador de poder recuzar 20 jurados, e nas causas de conspiração pode recusar até 35. Além disso, quando o jurado declara a um homem criminoso, e o juiz pensa que não foi bem julgado, tem direito o mesmo juiz de suspender o jurado, e representar ao Rei, o qual quazi sempre perdoa. Se nos concedemos ao accusador ter recurso contra o réo, vamos a peorar esta benéfica instituição: e se o accusador he poderoso, sempre o accusado será perseguido. Demais disso: supponhamos que o primeiro jurado decide a favor do réo, e que o segundo o condemna á morte; por qual juizo estaremos? Eu pelo primeiro; porque mais vale que escapem 20 réos impunes, que morra um innocente. Por tanto insisto em que uma vez que o jurado julgue que o cidadão he innocente não possa ter recurso o accusador.

O Sr. Barata: - Eu sou da opinião do Sr. Vasconcellos; e o grande mal que desde logo temos padecido na discussão deste capitulo he não telo tornado a remetter á Commissão para que o redigisse de novo, segundo a base adoptada de jurados. Querer combinar a nossa legislação actual, e o nosso bom livro 5.° das ordenações; que devia ser queimado com a instituição dos jurados, não pode ser, porque não se pode fazer tal applicação. Tornando á emenda do Sr. Vasconcellos, digo que deve ser approvada; porque senão as perseguições serão eternas; e não devemos pôr isto n'uma mareia que se eternizem as demandas crimes, e se relacão os homens vingativos e crueis contra seus similhantes: não vamos fazer de tal sorte que botemos abaixo a instituição mais santa dos jurados.

O Sr. Lino: - Não obstante não ser eu do parecer do Sr. Vasconcellos, não posso com tudo ouvir dizer que sua proposição ataca de cara a cara a justiça; porque nos todos sabemos o grande e bem aceito axioma de Pastoret que a primeira protecção da lei pertence sempre ao cidadão que he accusado: avista deste e de outros muitos filosofos que assim opinão, e de tantas nações que assim o pratição, não se pode tolerar que o Sr. Pinto de frança declame contra similhante emenda; apezar de que, como disse, não me possa conformar com ella. Nunca poderei olhar de bom animo a um homem, que foi o assassino de meu pai, e meu irmão e de certo ainda que seja absolve do por um jurado não deixarei com tudo de perseguir aquelle que me tenha roubado prendas tão queridas. Demais: não pode ter lugar aquella emenda, porque já o soberano Congresso determinou que houvesse recurso de jurados. Podia agora admittir-se, me derão, a respeito da revista; mas o juiz dos jurados não tem revista, o que tem revista he a applicação da lei ao facto, e esta pode ser admittida em todos os casos crimes.

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O Sr. Caldeira: - Creio que he facil convencer-se de que a emenda não he admissivel uma vez que se considere, que a absolvição do accusado he o que produz a condemnação do accusador. Supponhamos que era um libello famoso, eu o autor fosse absolvido, não era isto contra a pessoa a quem tinha sido dirigido? Se se dá recurso ao reo, porque não se ha de dar tambem ao accusador quando este fica na situação daquelle, se o dito réo he absolvido? A compaixão com, o réo he muito justa; mas essa mesma compaixão he tambem justa a favor do accusador, que, como disse, absolvido aquelle fica tambem sendo réo: porque pois não se lhe ha de permittir recurso pelos mesmos principios?

O Sr. Pinto de França: - Ainda que eu por minhas desgraçadas circunstancias não estou nos termos de poder entrar na materia pela importancia que contem, apesar disso, e se estas circunstancias me põe fora da questão, eu lançarei mão do mesmo que se tem dito para entrar nella; principiarei pelo que disse um Preopinante, que o réo tem na Inglaterra privilegio sobre o accusador; e tem direito de excluir um certo numero de jurados: por isso mesmo que se dá tanto privilegio ao réo, não seria injusto, não conceder nenhum ao accusador? Diz-se que se se concede recurso ao accusador vai-se deitar por terra o jurado; digo que se o jurado deve servir para conservar o crime, para estorvar que o crime appareça, e para contribuir a que padeça o homem innocente, não haja jurado, e o dirá commigo toda a Assembléa, e o dirá todo o mundo justo. Tem-se dito tambem que se deve sempre attender favoravelmente ao réo: isto he uma verdade, isto he um axioma; mas porque se deve ter alguma compaixão com o réo não, se deverá ter nenhuma com o accusador, quando se torna tambem réo? Não fica este no mesmo caso quando lhe cabe a infamia, e a perda? Sr. torno a repetir, o homem de bem, o homem justo, não tem temor da lei, não receia de ser apresentado ante ella como o criminoso, e quer a lei para que o crime desappareça.

O Sr. Borges Carneiro: - Nesta discussão não falo das decisões do conselho de jurados, pois a respeito dessas á está decidido, que quando se recorrer á relação, ha de ella decidir se deva ter lugar o segundo Curado, e nesse caso se está irrevogavelmente pela decisão delle. Trato por tanto somente das sentenças dadas pelo juiz de direito, e digo que a nossa lei isto he a novissima, porque a ordenação prohibia a revista nas causas crimes, concedeu revista das sentenças condemnatorias, e não das Absolutorias, das quaes he cousa inaudita em Portugal, corceder-se revista; por quanto he uma graça especialissima que só podia tender a favorecer o réo. E pode-se ainda a legar outra razão, convém saber que para se conceder revista cumpre tratar-se de uma pena de certa gravidade, que esteja imposta na sentença; porem como se ha de saber se ha esta gravidade, quando não existe sentença condemnatoria? Salvo se neste caso se tiver em vista o crime de que o réo foi arguido, e que não se lhe provou. Apesar de tudo isto inclino-me a que possa pedir a revista assim o réo como o accusador, uma vez que temos estabelecido por base desta concessão a injustiça notoria, a qual tanto se pode ter commettido contra um, quanto contra o outro, e se he digna de favor a condição de um réo que se diz injustamente condemnado, não o he menos a de um offendido que fica injustamente havido por calumniador, nem a da republica, a quem summariamente prejudica a impunidade dos delictos; razão esta que moveu os nossos legisladores a decretar as espeliações officiosas das sentenças crimes. Uma vez porém admittida esta opinião, resulta outra questão, convém saber, se se deve conceder esta faculdade somente ao accusador particular, ou tambem ao promotor da justiça; sobre o que direi, que posto que eu opinasse até agora que só se concedesse ao accusador particular; agora vario de opinião, e voto que deve conceder-se tambem ao promotor da justiça, que representa á sociedade civil, a qual quando soffre uma injustiça notoria, tem tanto e melhor direito para ser attendida, do que qualquer cidadão individualmente, do que não duvidar quem trouxer á memoria as escandalosas absolvições que os desembargadores tem dado e estão dando a tantos assassinos e salteadores, e as revistas que contra ellas tem sido concedidas pelas Cortes.

O Sr. Pessanha: - Penso que do que se trata he do primeiro recurso.

O Sr. Vasconcellos: - Disso he do que eu trato.

O Sr. Presidente: - He da revista: sobre o outro já se votou.

O Sr. Vasconcellos: - Mas foi salva a emenda, e esta he sobre o primeiro recurso. Queira o Sr. Secrefario lêla.

O Sr. Secretario Freire leu a dita emenda.

O Sr. Presidente: - Continua a discussão.

O Sr. Lino: - Mas antes de se continuar a discussão he preciso ver se ficou salva a emenda do Sr. Vasconcellos, pois quero que se vote sobre ella.

O Sr. Presidente: - Póde continuar a discussão sobre a emenda do Sr. Vasconcellos.

O Sr. Ferreira Borges: - Mas em fim V. Exc. não prppoz esta questão: V. Exc. propoz a revista, e não sabemos sobre o que se ha de falar; pois a emenda do Sr. Vasconcellos he cousa distincta, e he necessario que V. Exc. diga sobre que temos de falar.

O Sr. Presidente: - A discussão vai progredindo sobre as proposições que eu fiz, e depois se tratará da do Sr. Vasconcellos. Continua sobre a revista.

O Sr. Pessanha: - Pois sobre a revista não póde ser, porque já se decidiu ontem que a não houvesse nas decisões dos juizes de facto.

O Sr. Presidente: - Mas he sobre os juizes de direito.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Isso não pertence aos jurados.

O Sr. Presidente: - A questão he se se deve conceder revista das sentenças, absolvetorias e das condemnatorias, ou sómente de uma dellas.

O Sr. Pessanha: - Requeiro que se leia a acta.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Eu supponho que o Sr. Vasconcellos teve em vista na sua emenda requerer que se applicasse, e fizesse isso entre nós do

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mesmo modo que se pratica em Inglaterra; a saber, que quando o primeiro jurado declara que não ha prova, ou não ha culpa, que não haja recurso destas sentenças.

O Sr. Castello Branco: - Tinha pedido a palavra para acclarar um engano em que vejo que tem estado grande parte dos illustres Preopinantes, e que se acaba de mencionar. Nós tratamos deste artigo da revista, que deve conceder ou negar o supremo conselho de justiça; he unicamente deste genero de revista que se trata no artigo: entretanto os illustres Preopinantes tem falado destas revistas, como se fossem concedidas das sentenças dos jurados. Julgo que hontem se approvou, que das decisões dos juizes de facto não haveria revistas para os juizes de direito; por consequencia, na materia de que nós tratamos nada se fala, nem de jurados, nem de suas decisões; dessas não se pode conceder revista, ou ao menos essa revista, não a pode conceber o tribunal de que tratamos, que he um tribunal de direito, por consequencia como podemos considerar as revistas que se podem conceder ou negar nas causas crimes senão sobre decisões de direito. Eis-aqui porque tudo quanto se tem dito nesta materia, a meu ver he fora do lugar, tem-se dito impropriamente. He sobre as revistas nas causas crimes dos tribunaes de direito que vou a falar. Todos veem que no criminal a decisão do jurado vem a ser a decisão principal: o crime não he outra cousa mais que um facto opposto á lei já se vê com toda a evidencia que a parte principal deste juizo he applicar o facto. o mais pertence á lei. Ora nestas classes de revistas não se suppõe o facto, trata-se só da applicação da lei. Mas que resta ao juiz de direito depois de determinado o facto nas causas crimes! Não lhe resta outra cousa que a applicação da lei, pôr consequencia só se pode dar revista quando elle applica lei, que não he correspondente ao facto, ou altera a mesma lei: he unicamente a revista do excesso que elle commetteu da applicação da lei. O crime, se está julgado pelos jurados, está julgado; o juiz de direito nenhum juizo tem que interpor na materia: trata-se pois de reclamar contra a applicação da lei da parte do accusado se esta tem sido mal applicada. Por tanto restringindo-me a isto, que he do que nos pertence falar, e não tendo nada em vista o juizo do facto, nem do direilo, senão applicando o que levo dito á indicação do Sr. Vasconcellos, digo que tanto se deve conceder a revista ao accusado, como ao accusador. Tem-se feito sobre isto uma modificação; quer-se que se conceda revista ao accusador quando he uma parte interessada, e particular; mas eu levo mais longe as muitas idéas. Eu tenho no coração os principios bemfazejos de todos os criminalistas modernos: mas diversifico por principios para mim igualmente bemfazejos. Por ventura para protegermos o homem que he infractor da lei devemos perder de vista a sociedade offendida? Este modo de pensar vem da barbaridade das leis antigas. Por ventura deve ter-se consideração com aquelle que ataca a vida, e a propriedade: de cidadãos pacificos e laboriosos, que he um malfeitor, um assassino, e não se deve ter considerarão com aquelles pacificos cidadãos? Deve-se ter consideração com um homem dessa especie, que tem por inimigos todos os membros da sociedade? Não he um malvado destes igual a um lobo, igual a uma fera que ataca a toda a gente para a exterminar; e havemos nós de querer que as leis favoreção mais a este individuo, que a sociedade? He por estes principios sem deixar de professam os sentimentos de humanidade, he pela mesma humanidade a respeito daquelles que mais consideração me merecem, que eu quererei que quando os juizes de direito não applicarem a pena devida a certos crimes dando a menor, que a que a lei determina, seja então proprio até do promotor da justiça requerer uma revista na fórma que as leis determinarem.

O Sr. Xavier Monteiro: - A questão he, se ha de haver revista nas sentenças que absolvem: a meu ver o que dá lugar a esta proposição he a consideração das injustiças que até aqui tem praticado os juizes de direito; por quanto nas causas dos crimes chamados ordinarios raras vozes se applicava a pena da lei, e resultava não poucas ser absolvido o delinquente: entretanto que nas causas intentadas por crimes politicos acontecia que o innocente por erros de opiniões fosse condemnado. Para evitar esta pratica no futuro parece conveniente estabelecer os jurados; mas depende essencialmente a solução completa da questão de que se trata, do modo porque for instituido o jurado. Não deve por tanto fazer parte da Constituição porque he dependente do que os codigos determinem a este respeito.

O Sr. Moura: - Vou falar pouco nesta materia, porque julgo que se poderá conceber com clareza. Não se trata da moção do Sr. Vasconcellos, trata-se agora só de a revista, que já está determinado que haja, da decisão do juiz de direito; porque he claro que não poder havela da decisão dos juizes de facto. Vamos pois a distinguir uma cousa da outra. O juiz de facto declara que um homem he culpado, ou a parte se sente aggravada, ou o mesmo juiz recorro ao tribunal, e diz: tem havido injustiça na qualificação do delicto, e torna-se a metter em processo: depois de acabado acha-se que o accusado he culpado: que he pois o que tem que fazer o juiz de direito? Abrir o livro da lei, e dizer. "Tal he a lei que corresponde ao delicto de que se diz este este homem he culpado." Logo a decisão do juiz de direito nunca he senão condemnatoria: logo pode haver revista quando applica a lei, porque pode ter aborto mal o livro; porque pode ter feito injustiça na aplicação da lei. Isto he em quanto á presente questão, quando se tratar da moção do Sr. Vasconcellos e não reservo-me fazer sobre ella algumas observações.

O Sr. Peixoto: - Convem advertir; que o caso da revista não he só o da injustiça; mas tambem o da nulidade, e esta pode estar no processo, e não na decisão do jurado: alem disso pode o juiz de direito impôr uma pena diminuta, e querer o accusador; arguir a injustiça della; por isso deve estabelecer-se; que o meio da revista seja commum.

O Sr. Presidente perguntou se a materia estava sufficientemente discutida e tendo-se julgado que sim, propoz a votos.

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1.º Se esta circunstancia das sentenças condemnatorias, e absolvetorias deve formar um artigo da Constituição? Resolveu-se que sim.

2.° Se posto o que se tinha resolvido, e de que não ha duvida na concessão da revista das sentenças condemnatorias, deveria tambem conceder-se das sentenças absolvetorias? Resolveu-se que sim.

O Sr. Castello Branco: - Eu desejo outra declaração sobre este artigo que se acaba de votar, pois não julgo que a votação tenha compreendido o caso principal: por tanto se o Congresso convem que se torne a votar de outra maneira, podia perguntar-se, se nas causas crimes se pedir revista se deve ser commum este recurso ao accusado e accusador.

O Sr. Peixoto: - Deve sem duvida declarar-se, que o meio da revista fica sendo commum ao accusador, e ao accusado: foi este o sentido do Congresso; aliás a decisão não compreenderá todas as hypotheses que se tem ponderado.

Houve mais alguma discussão sobre o ponto, de tornar-se, ou não a votar, e tendo-se resolvido, que sim; foi posto a votos, se o recurso da revista deveria ser commum ao accusado, e ao accusador, é se decidiu que sim.

O Sr. Borges Carneiro: - Peço agora se ponha tambem á votação se deve ser permittido igual direito ao promotor da justiça quando não ha accusador particular.

Votou-se, e foi approvado.

Continuou a discussão sobre o outro periodo do artigo - Serão julgadas no dicto tribunal por maior numero de juizes na forma que a lei determinar: e declarada a nullidade ou injustiça, elle mesmo fará effectiva a responsabilidade dos juizes inferiores, quando ella dever ter logar, conforma o artigo 164.

O Sr. Brito: - AS expressões serão julgadas no dito tribunal as revistas dá a entender que he no tribunal supremo de justiça que se hão de reformar as sentenças de que se pedir revista: o que; lhe daria um poder colossal, até impossivel de exercitar na practica; porque serião innumeraveis as revistas, que então só pedirião, convertido o supremo tribunal em tribunal de appellação. Não, Srs., isto implica com a natureza das revistas, que tende tam somente a anullar, e a remetter o processo para outra relação. Quando a parte pertende uma revista faz uma petição ao tribunal supremo, que se chama petição de revista, em que substancia os autos, expondo as razoes, que mostrão a nulidade, ou injustiça notoria da sentença, se o tribunal acha com effeito verificadas as ditas circunstancias concede a revista, e nada mais julga sobre o merecimento da causa. Mas devem-se remetter os autos a uma relação diversa da que proferio a sentença de que se queixa a parte, relação da responsabilidade se possa fazer effectiva, aonde sejão revistos os autos, e reformada a sentença, se parecer digna disso a estes novos juizes. Sobre os quaes não podem ter influencia os da primeira reacção, que residem em outra provincia. He por tanto necessario declarar isto expressamente, ou que se tem a palavia - julgadas no dito tribunal.

O Sr. Moura: - O que me parece que he essencial nesta materia he, que uns juizes decidão se se está no caso de conceder a revista, e que outros decidão da cousa principal: nisto convenho; mas que cada uma destas cousas se faça n'um tribunal differente, ou sejão ambas feitas no mesmo tribunal por juizes differentes me parece que he o mesmo. (Apoiado.)

O Sr. Freire: - Apoio o que acaba de dizer o illustre Preopinante, porque isso he da maior clareza, mas o que não julgo igualmente claro, he a redacção do artigo, e seria necessario que se fizesse nelle alguma emenda.

O Sr. Caldeira: - Nos não devemos decidir esta materia sem ter decidido primeiro a organisação desse tribunal: he necessario que primeiro se saiba qual ha de ser a sua organização, o numero de seus membros ele; porque pode muito bem acontecer que nesse suppremo tribunal não reste o mesmo sufficiente de juizes para se decidir, se se deve conceder revista? Supponhamos que seus membros são seis e que dos julgão que não deve haver revista? Restão somente quatro para decidir; ora já se disse que uma sentença proferida por quatro ministros não poderá ser reformada por menor numero. He por tanto no meu entender dependente a decisão seta clausula do artigo da organisação do suppremo tribunal de justiça.

O Sr. Freire: - He claro que os individuos hão de ser aquelles que se julguem necessarios; por tanto dadas as attribuições ao tribunal não acho necessidade de esperar saber-se o numero de individuos que ha de ter, para a resolução deste artigo.

O Sr. Camello Fortes: - Acho uma duvida a respeito da responsabilidade dos juizes inferiores. A força toda do Poder judicial he que os que dão a sentenças sejão responsaveis, e quanto mais melhor. Agora a minha duvida he que neste supremo tribunal de justiça os juizes são responsaveis a outros membros do tribunal.... Acho que mandando-se a outro tribunal para conhecer da revista fica a responsabilidade mais determinada.

O Sr. Borges Carneiro: - He impossivel que isto seja de outro modo, porque em algum ponto ha de vir a terminar a responsabilidade: algum tribunal ha de ser o ultimo, da justiça de cujas decisões ninguem mais possa julgar, he o supremo tribunal de justiça, que julga a cada um das ministros que o compõe, os Deputados de Cortes, os Ministros d'Estado, etc. Não ha outro maior, nem a quem sejão encarregadas funcções mais importantes. Não vejo por tanto a quem melhor se possa encarregar o negocio das revistas; não porque os membros delle não sejão como homens, capuzes de prevaricar, mas porque em algum anel ha de em fim parar a causa dos juizes das responsabilidades.

O Sr. Lino Coutinho: - Vejo que este Augusto Confesso vem a cair por fim naquelle mesmo embaraço que antevi, e predisse; porque não sabia o motivo e a razão de se acabar esta cadea no terceiro anel, o não no segundo; visto que em ultimo resultado sempre haverá um caso em que não se possa fazer effectiva a responsabilidade do Poder judicial.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu confio sempre, que a responsabilidade se fará mais effectiva, sendo a effe-

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ctividade della encarregada ao tribunal supremo de justiça, do que sendo-o á mesma relação de quem se interpoz a revista, pois nella todos comem, bebem, pastelão. Sempre nisso será menos, parcial o superior que o igual. Por tanto voto peio tribunal supremo de justiça. Tambem desejo que se consigne aqui como principio constitucional, que a revista será julgada por maior numero de juizes, do que houve na sentença que se revê.

O Sr. Lino Coutinho: - Aqui se tem dito que os magistrados são responsaveis: perqunto a quem hão de responder os do supremo tribunal de justiça? A si mesmos? e então haveremos tres poderes irresponsaveis.

O Sr. Peixoto: - Não posso admittir; que a revista se faça no tribunal supremo de justiça. Bons methodos para isso se propozerão: um, o de passar a mineiros differentes daquelles que a concederão, nos quaes a supponho uma pervenção, que em um corpo supremo do tarifa autoridade tenho por penosa: o outro de que se lembrou o Sr. Borges Carneiro, de juntar a concessão da revista á reforma da sentença, e este methodo, além do inconveniente ponderado, tiraria á revista a sua natureza particular; de separar os dois juizes, o da concessão, e do peito; e a tornaria em uma instancia ordinaria. Não ha inconveniente algum, em voltar a causa á mesma relação, que o proferio a sentença, para serem nella revistos os autos por juizes diversos daquelles que a julgárão, e por muito maior numero; se for possivel pelo dobro, e mais um, como até agora. Que temos nós observado nas nossas revistas? O Desembargo do Paço he quem as concede, e os autos voltão á casa da supplicação. Penso que não se tem observado nos ministros revisores esse espirito collegial, de quererem, por força sustentar a anterior sentença; antes pelo contrario houve tempo, em que era dito vulgar - revista concedida, causa vencida -. Pois se até agora não mereceu reprovação essa pratica, muito menos daqui em diante, quando a revista ha de ser concedida pelos mesmos ministros, que são juizes da responsabilidade dos revisores: estou certo que se a injustiça, ou a nullidade for notoria, os ministros das relações não se attreverão a affrontar esse voto do tribunal supremo; e só confirmarão a primeira sentença, que não tiverem rasões mui solidas para sustentala e para mostrar que a injustiça ou nullidade era apparente. Por tanto sou da voto; que nesta parte não alteremos o methodo ordinario.

O Sr. Brito: - Eu considero este negocio de maior importancia, porque delle pendem a segurança, vida, e bens dos cidadãos: se ao poder que tem o supremo tribunal de exigir a responsabilidade dos Desembargadores, e de conceder as revistas se junta mais o de as julgar sem recurso, perdido fica o equilibrio do poder judiciario, e até inutl a instituição dos jurys, deste palacio da liberdade civil. Quem ganhar 3 votos naquelle, então horrivel tribunal, pode decidir de todas as honras, propriedades, liberdades, e vidas dos Cidadãos em qualquer canto, onde elles estejão do Reino Unido, pois de toda a parte se pode enviar uma petição de revista ao tal tribunal. Lembrema-nos que os juizes são homens, tem paixões. Quando são as relações provinciaes que julgão, pode cada cidadão subtrair-se a qualquer dellas, que não merecer um conceito, mudando o seu domicilio para o destricto de alguma que logre toda a sua confiança: mas se um tribunal commum a toda a monarquia poder decidir as causas de toda ella não haverá asyllo, onde se possa escapar delle. Se o Desembargo do Paço, que apenas concedia, as revistas sem as julgar, tem parecido um tribunal despotico, que será esse que pertendemos substituir-lhe com maiores attribuições? Deus nos livre de concedermos similhante poder a uma só corporação. Se tal passa ficamos perdidos. Apoiado.

O Sr. Trigoso: - Lembra-me uma rasão a favor da opinião do Sr. Brito. O tribunal supremo de justiça julga que o caso he de revista; depois julga a revista; e depois faz effectiva a responsabilidade: parece-me que se só admitte esta doutrina do artigo fica muito favorecido o despotismo do tribunal supremo de justiça. Na sua mão está tudo; de maneira que he muito facil, que quando tiver odio contra alguns ministros que derem uma sentença, declarem que houve injustiça notoria para fazer effectiva a responsabilidade. Por tanto não devem ambas as causas ficar reunidas na mesma pessoa; devem pertencer a, duas autoridades separadas. (Apoiado).

Julgou-se esta parte do artigo sufficientemente discutido.

Foi posta a votos a materia como se achava escripta; e não foi approvada.

O Sr. Presidente propoz: se o tribunal supremo, de justiça julgaria as sentenças de revista? Resolveu-se, que não.

O mesmo Sr. poz a votos: se este tribunal fará effectiva a responsabilidade dos juizes? Resolveu-se, que sim.

O Sr. Borges Carneiro, requereu se declarasse na Constituição que nas revistas o numero dos juizes seja maior do que forão na sentença.

O Sr. Peixoto: - He desnecessario tal declaração: devemos confiar mais dos legisladores, que houverem de regular esta materia; e estou certo que elles, quanto for possivel, se cingirão á pratica actual, que exige o dobro dos juizes, e mais um.

Poz-se a votos a indicação do Sr. Borges Carneiro, e resolveu-se que por ora não se trata della.

Passou-se ao artigo 158. Quanto ao Brazil, tratar-se-ha do recurso da revista nas relações, que a lei designar, as quaes constarão de maior numero da ministros. Quando estas relações declarar em nullidade ou injustiça, farão logo executar a sua sentença, o darão conta ao supremo tribunal de justiça para este fazer effectiva a responsabilidade dos juizes, quando, ella, deva ter lugar. Em Africa e India tratar-se-ha da revista na mesma relação do paiz, pelo methodo que a lei determinar.

O Sr. Borges Carneiro: - Tratamos aqui das revistas no Brasil. Onde o artigo diz que se tratará dellas nas Relações que designar, desejo eu que se exprima" nas Relações daquelle Continente" para se ficar bem, entendendo que as, revistas hão de ser lá

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concedidas e tratadas, sem dependerem as partes de recorrer ao supremo conselho de justiça. Pois será mui duro aos cidadãos ultramarinos vir ou mandar a Lisboa para se lhes emendar a injustiça notoria, que houver em alguma sentença. Cuido que todos estão persuadidos de que não temos uma exaltada ambição do querer governar minuciosamente o Brazil como até agora se governava. Salvas que sejão as attribuições do poder legislativo, e as grandes attribuições do poder executivo, queremos ter em vista a respeito do Brasil o estabelecer boas relações commerciaes com os povos ultramarinos, relações, reciprocamente uteis, para todo o Reino-Unido. Agora que elles tenhão no seu seio bastante autoridade para castigar os máos ministros, para estabelecer escolas, fazer obras publicas, sentenciar revistas, etc., em tudo isso opino que devem ter grande liberdade e que quem a quizer restringir, cuidando que aperta os laços da união, os relaxa a meu ver, e acelera a desunião. A grande base da união he os interesses reciprocos de ambas as partes da monarquia, e a subordinação a umas só Cortes, um só Rei.

Voltando pois ao assumpto digo que entre as Relações provinciaes do Brasil haverá algumas que tenhão maior numero de mezas e de ministros: e nestas se concederão e processarão as revistas. A Constituição hespanhola determinou miudamente quantas salas havia de haver nas Relações ultramarinas: isto seria entrar em demasiadas especificações; bastará ficar aqui consignada a idéa geral que acabo de enunciar, convem saber, que as revistas se não pedirão ao tribunal supremo de justiça, nem se tratarão em Lisboa, mas nas Relações que tiverem maior numero de mezas, e de ministros como a lei designar.

O Sr. Villella: - He preciso que se entenda, que as provincias; do Brazil nem querem, nem devem considerar-se como provincias federadas. Ellas são provincias do Reino Unido; todos somos portuguezes, e por tanto não consinto que se presuma, nem se diga que só queremos, ou devemos só ter relações commerciaes.

O Sr. Ledo: - Levanto-me para dizer o mesmo. As provincias do Brazil são unidas ao Reino de Portugal; tudo quando aqui legislarmos he igualmente legislado para ellas, he commum para todo o Reino, longe de nós outras idéas.

O Sr. Lino Coutinho: - Eu não posso deixar de louvar a filantropia, a justiça, e igualdade do Sr. Borges Carneiro. No que elle acaba de dizer não quer de maneira alguma indicar que as provincias do Brazil devão ficar separadas de Portugal, mas sim que deveria haver laços de reciproca utilidade que estreitem mais esta união; e que todas as determinações relativas a Portugal não podem ser amoldadas áquellas provincias. Nós sabemos que a Inglaterra ha concedido às suas colonias da Asia e da America a maior liberdade possivel em consequencia da qual ellas formão suas leis e regulamentos peculiares, e tomão resoluções aplicaveis às suas circunstancias locaes, exigindo unicamente da Corte a approvação dos seus trabalhos; que as medidas adoptadas na Europa a tantas legoas de distancia não podem ter na America o effeito immediato que he preciso. Que ha pois de máo e digno de espanto nas expressões do honrado membro amigo da humanidade, quando elle diz que se devem estabelecer relações amigaveis bazeadas em reciproco interesse do Brazil com Portugal? Que ha de recear quando se diz que nos arranjos correspondentes às provincias ultramarinas não se deve coarctar inteiramente a sua liberdade, e se deve dar alguma amplitude em razão da sua localidade? Se por exemplo, no caso de que teatamos, sendo acusado perante a relação da provincia um juiz de fóra que ha prevaricado ella o pode pronunciar na verdade, mas não poderá depolo, e ficaria então um máo juiz dois ou tres annos praticando os mesmos abusos no entanto que chegada a resolução de Portugal. Isso não póde ser assim, deve haver a faculdade de o depor, e castigar immediatamente, uma vez, conhecido culpado porque de outro modo nada teremos feito, e estaremos annos e annos á espera das decisões europeas.

O Sr. Freire: - Peço a palavra porque a questão tem-se desvidado do seu objecto. Não se trata das relações que deve haver no Brazil, nem das faculdades que estas hão de ter, isso não vem para o cas; aqui trata-se sómente de saber se ha de praticar-se o mesmo nas revistas. Dizem os illustres membros da redacção que não, e dizem bem, mas não he por querer dar menos consideração ao Brazil, que a Portugal, se não por dar mais liberdade aos povos, em razão da sua localidade. Mas eu creio que aqui não se deve dizer em quanto ao Bazil nem Asia, senão dizer-se simplesmente - Quanto ao ultramar - e assim evitamos estas classificações.

O Sr. Castello Branco: - Jámais poderei convir em que os letigantes do Brazil fiquem dependendo de um tribunal supremo, de justiça residindo em Lisboa; isto seria um grande incommodo, e muitos ainda que conhecessem a injustiça que com elles se tinha praticado, não requererião a revista; e por outra parte não devem as habitantes do Brazil ser privados deste recurso. Segue-se que se deve conceder revista no Brazil; mas que deve haver autoridades no mesmo Brazil que concedão ou neguem essas revistas. Attendendo porém a que quando se redigiu o projecto da Constituição com a pressa que a Commissão tinha, nascida do desejo de apresentar quanto antes os seus trabalhos, não se poderão ter em vista todas estas reflexões, como tambem por não estarem presentes os Srs. do Brazil, que poderião ter coadjuvado, seria de parecer que agora que ha muitos desses Srs. no Congresso, tornasse este artigo á Commissão para propor a este respeito um projecto mais bem combinado.

O Sr. Borges Carneiro: - Está vencido o contrario.

O Sr. Lino Continha: - Apoio a opinião do Sr. Castello Branco. Um habitante de Portugal póde ter uma revista em 8 ou 10 dias; mas cada provincia do Brazil tem mais extensão que todo este Reino, e os habitantes de algumas dellas não poderião ter nas mesmas a dita revista em menos de um mez. Como hão de pedir, por exemplo, os de Minas a um tribunal que exista na Bahia? Não, póde por tanto deixar

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de conceder-se que estas revistias sejão dadas dentro de cada provincia, porque de outra maneira o cidadão brazileiro ficará em peores circunstancias que o cidadão europeo.

O Sr. Villela. - Eu convenho tambem nisto. O que eu disse quando combati os principios do Sr. Borjes Carneiro, não foi pela essencia delles, senão porque não se imaginasse que o Brazil desejava ter só comnosco relações commerciaes. Em quanto ao mais, he justo que se concedão ao Brazil todos aquellas cousas que são indispensaveis pela sua localidade, mas só por esta razão; porque a ser possivel unir-se em tudo, e serem para tudo applicaveis as mesmas medidas em todo o Reino unido, este seria o meu voto.

O Sr. Borges Carneiro: - Que tome o artigo á Commissão pela razão manifestada pelo Sr. Castello Branco não pode ser, porque já está decidido o contrario. O artigo está muito bom; a primeira parte (leu-a) contem um grande e justo principio a favor dos brazileiros: sob a segunda (leu-a) está igualmente bem determinada, e sómente se poderá acrescentar, que aquellas relações constarão do maior numero de ministros. Quanto ao mais sem duvida fui mal entendido pelo Sr. Villela, pois eu não quero senão consolidar mais e mais por medidas de commum e reciproco interesse a união que existe nas differentes partes da monarquia portugueza; pois estou persuadido de que nestas e na dependencia das attribuições do poder legislativo e das maiores prerogativas do executivo, he que consiste verdadeiramente aquella união, e não em dependencias minuciosas que só sirvão de mortificar e incommodar a quem de nós vive tão distante.

O Sr. Borges de Barros: - Sr. Presidente, a materia está summamente explicada; mas parece-me que este artigo se podia simplificar redigindo-se do modo seguinte: - Nas provincias ultramarinas tratar-se-ha das revistas pela, mesma Relação do paiz do modo que a lei determinar, ficando responsaveis os juizes ao supremo tribunal de justiça. E assim me parece que o Brazil ficava deste modo com o poder judiciario no seu mesmo continente sem alguma dependencia; porque effectivamente póde existir em cada uma das provincias um poder judiciario independente, e póde conceder-se-lhe esta faculdade com a responsabilidade dita.

O Sr. Ledo. - Eu sou de voto de um illustre preopinante, que este artigo deveria voltar á redacção para ser olhada agora debaixo de outras considerações, mas ainda quando isto se decida, eu desejo que se tenha em vista que os povos do Brazil devem gozar as mesmas vantagens que os de Portugal. Portugal tem um tribunal superior de justiça a quem recorrer, deveo-o tambem ter o Brazil.

O Sr. Barata apoiou a opinião do Sr. Ledo, e do Sr. Lino.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Eu não julgo, que seja tão grande mal, como alguns dos Preopinantes em considerado, o não estabelecer em cada uma das terras do Brasil (que he o que parece, que querião) um tribunal supremo de justiça: por seu entender talvez em cada freguezia deveria haver um. Isto pode-se admittir? He preciso não considerar quaes são neste caso as attribuições (porque nós estamos a falar da revista das sentenças) que competem ao supremo tribunal de justiça isto se concede em casos raros, não he em todos os casos, nem em todas as causas, he um recurso só para quando tem havido injustiça, ou nullidade notoria. Dizem os Preopinantes, e dizem bem, que he um incommodo ir duzentas leguas a expedir um negocio; mas esse incommodo o soffrem todas as nações. Por ventura em França, ou em Inglaterra ha em cada provincia um tribunal? Não: sei muito bem que he difficil no Brasil ir de uma provincia a outra, mas luto he das localidades como querem que as relações das provincias conheção da injustiça para a revista? Isto não póde ser. Não he possivel que entre seis ou oito ministros haja d'entre elles mesmos quem conheça della em gráo de revista? Sera um mal, mas estes são males necessarios na sociedade: a sociedade não se governa como um relogio. Um dos Preopinantes diz: o Brazil não se póde conservar assim, e se pode conservar deste outro modo. Estas idéas devem fugir daqui para fóra. o Brasil pode-se conservar como se tem conservado desde o dia 24 de Agosto de 1820 para cá com relações de união, de igualdade, de liberalismo, etc., mas em fim sujeito á lei. A suprema autoridade não póde rezidir se não no centro da monarquia, esta he a base de toda a associação. Se cada uma das provincias se quer considerar separada das outras, destacadas estão ellas. Se querem um tribunal particular, umas leis particulares, etc., então são provincias confederadas, quando muito; mas não são provincias unidas. Em fim, o meu parecer he, que não se trate deste artigo na Constituição e que quando se regular o numero das relações que ha de haver no Brasil, e quando se designarem as attribuições que hão de ter, seja então tambem regulado por uma lei organica, o que pertence às revistas. Apoiado

O Sr. Borges Carneiro: - Levanto-me para dizer que isto he contrario ao que está vencido no artigo 155 (leu-o). Por tanto este artigo me parece dever conservar-se accrescentando-se nas relações que a lei determinar, as quaes terão maior numero de mezas.

O Sr. Lino Coutinho: - O Sr. Fernando Thomaz acaba de dizer, que queremos em cada freguesa um supremo concelho de justiça. Isto não se quer e nem elle a ouviu dizer, nós queremos sómente em nossa casa aquillo que he de lei, assim como os europeos o querem na sua. Por ter-nos collocado a naturesa tão distante de Portugal não se ha de emendar politicamente este erro? Um systema politico he um systema arteficial, e deve, e póde por isso mesmo ser feito deste modo, que tirem todos os membros da sociedade que o adoptão a maior commodidade possivel. Os brasileiros o que querem he, que nas suas provincias se estabeleça o methodo melhor para a decisão das suas causas: não querem tribunaes superiores independentes de Portugal, querem que os seus negocios sejão decididos com brevidade, e chame-se embora em vez de tribunal supremo de justiça um collegio, ou outra qualquer cousa porque o nome para

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mim pouco importa, e só quero o bem que nos convem.

O Sr. Barros: - As revistas devem ser feitas dentro da mesma relação aonde a houver em cada provinda, porque a magnitude destas, e a distancia em que umas de outras se achão, fazem impraticavel, como se tem ponderado, que um habitante da Bahia recorra ao Rio de Janeiro de donde dista 300 leguas: isto he um impossivel. Por consequencia, digo eu, que sendo revistos os autos por ministros differentes dos que conhecerão da causa, podem ser feitas as revistas no mesmo tribunal; e se acaso não houver um sufficiente numero de juizes o chanceller da Relação convoca, o numero de ministros que seja necessario para conhecer se a causa foi bem sentenciada. Por outra parte os brasileiros pertendendo o ultimo recurso nas suas provincias não pedem cousa nova, nem que a respeito de Portugal isso tenha sido posta em uso, ha alguns seculos. Quando os Romanos erão senhores de Portugal as causas deste Reino ultimavão-se aqui, e não nos consta que se levassem a Roma diante dos Pretores, ou se decidissem segundo os municipios, ou segundo as leis dos Romanos; mas aqui se decidião. Ora porque rasão os brasileiros hão de ficar agora de peor condição, que estavão então os habitantes deste Reino debaixo do imperio dos Romanos? Segue-se-lhes tambem aos habitantes daquellas provincias prejuisos notaveis em terem de vir a concluir seus litigios a Portugal, ou a ir a partes tão remotas: porque ha de desamparar sua familia, seu commercio, seu escritorio, ou sua lavoura, e isto que he em prejuiso dos particulares redunda em prejuiso geral pelas conhecidas doutrinas de economia politica. Por todas estas rasões sou de parecer que convem que os negocios particulares se ultimem nas mesmas provincias aonde tem seu domicilio as partes interessadas.

O Sr. Castello Branco: - Foi em consideração de todas estas necessarias informações que eu votei que o artigo voltasse á Commissão, para que em vista dellas, e sendo ouvido os Srs. Deputados do Brazil, se propozesse um novo artigo a este respeito; e apezar de que o Soberano Congresso tem decidido o contrario, eu julgo que uma votação precipitada, e sem conhecimento de causa poderia ser contra os interesses de uma parte da monarquia tão interessante como o Brazil; consideração que requeria no meu entender, que se reformasse a decisão. Por tanto torno a instar, que o artigo volte á Commissão para que com audiencia, e de acordo com os Srs. Deputados do Ultramar, proponha um novo projecto adequado às circunstancias. (Apoiado).

O Sr. Miranda: - Julgo que não he necessario. O Brazil merece uma consideração particular pelas suas circunstancias, e seria sem duvida muito incommodo que aquelles naturaes viessem á capital a pedir as revistas; mas em fim seria mais incommodo para o Brazil que em cada provincia se estabelecessem relações aonde se julgassem as revistas. A mim me parece muito bem o artigo, porque diz = quanto ao Brazil tratar-se-ha do recurso da revista nas relações que a lei designar =: e me parece que devemos parar aqui. He verdade que ha muitas difficuldades locaes, que seria preciso aliviar; mas assento que nada se póde estabelecer de positivo de modo nenhum, nem dizer-se que em cada provincia se hão de estabelecer, ou não se hão de estabelecer relações; e julgo que o artigo está concebido nos termos mais proprios, até por estar de acordo com o determinado na ultima parte do artigo 106 aonde diz (leu-o).

O Sr. Barata: - Eu creio que a respeito do tribunal aonde se hão de decidir as causas das revistas pode reservar-se o designado para o futuro; mas, aqui do que se trata he onde se deve conceder.

O Sr. Pinto de França: - Tenho prazer em vêr que o Sr. Deputado Miranda he da mesma opinião que vou manifestar. Eu voto igualmente pelo artigo; elle diz =. quanto ao Brazil tratar-se-ha do recurso da revista nas relações que a lei designar = Eis-aqui o que me satisfaz. As provincias do Brazil, não querem representar como confederação; o que querem he, formar um Reino Unido. O poderoso Reino do Brazil unido com Portugal quer sempre compor o nosso Reino, cuja legislação ha de ser feita neste Soberano Congresso, cujo poder executivo ha de estar nas mãos do Sr. D. João VI. , e cujo poder judicial em ultima instancia ha de estar n'um tribunal superior: em fim o que quer o Brazil he o que quer Portugal; se houver alguma disparidade seria na expressão, mas não no sentimento. Diz-se que ha muitas difficuldades; mas a isto responderei, que se não póde compor tudo, remedeia-se muita parte. No Brasil, ha grandes distancias, mas tambem não ha a multiplicidade de pleitos que ha em Portugal; e torna-se assim menor o incommodo, e se tornará ainda menor, pelo mesmo que diz o artigo, estabelecendo as relações que a lei designar. Por conseguinte a questão se termina concedendo-se o que diz o artigo; restando-me unicamente a dizer, a que me não parece de uma verdadeira incompatibilidade, o pôr-se igualmente no Brazil o poder de effectivar a responsabilidade; e que será sempre da maior justiça, que para o Brazil se busque toda a possivel igualdade com este Reino.

O Sr. Barata: - Se ha de haver um tribunal supremo em Portugal, póde igualmente haver no Brazil um ou dois, ou tres. Podemos estar unidos, e muito unidos havendo 300 tribunaes supremos de justiça. Todos somos irmãos, e devemos igualmente participar dos mesmos bens da mãi patria, e he perciso considerar que no Brazil estamos muito opprimidos.

Julgou-se suficientemente discutida esta parte do artigo, e tendo-se posto a votos foi approvada, omittindo-se a segunda parte do dito periodo - as quaes constarão de maior numero de ministros.

O Sr. Trigoso requereu se pozes-e a votos a sua emenda reduzida a que em vez de dizer-se =.quanto ao Brazil = se diga = quanto ao Ultramar.

Poz-se a votos a dita emenda e foi approvada.

Suspendeu-se a discussão da Constituição por ser chegada a hora da prolongação, e passou-se á leitura de algumas indicações.

O Sr. Castello Branco apresentou o seguinte

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PROJECTO.

A nenhum dos membros deste soberano Congresso ser occultas as necessidades de uma numerosa classe de cidadãos credores do Thesouro publico, entre os quaes se contão muitos dos que mais devem contribuir a acreditar o novo systema constitucional; são tristes as circunstancias a que se achão reduzidos, uns por não receberem o estipendio do seu trabalho ou os ordenados de seus empregos, outros as pensões adquiridas com os uteis suores, e o sangue de seus avós, outros finalmente por não cobrarem os lucros devidos dos capitães, que seus maiores solicitos da futura subsistencia de suas familias para isso entregarão á Nação, provendo ao mesmo tempo às necessidades publicas. Este mal era antigo entre nós, a falta de pagamentos era uma das maiores calamidades publicas, e ella foi em todos os tempos o fala escolho em que tem naufragado muitos governos: por isso ao primeiro grito de regeneração todos correrão avidamente a alistar-se debaixo das bandeiras da liberdade, porque todos esperavão ver terminados seus males. E quereremos nós tornar vãs tão bem fundadas esperanças, desacreditar em parte o novo systema, e fazer desertores de uma causa que bem dirigida ha de fazer a felicidade publica? Haverá dificuldades que se possão dizer invenciveis,- quando estão juntos os representantes da Nação, investidos de todos os poderes e tendo á sua disposição grandes recursos ainda intactos? Não se requer mais do que uma pouca de actividade, este soberano Congresso a possue e a tem manifestado em todas as circunstancias, he tempo de a empregar em objecto de tanta utilidade, e em quanto governos despoticos forção os meios das nações que regem, para levarem a dessolação a paizes remotos, e fazerem correr as lagrimas de seus pacificos habitantes, empreguemos nós os que temos em enxugar as de nossos concidadãos. O principio do anno de 1823 já celebre por ser o primeiro anniversario do estabelecimento da nossa liberdade, seja tambem notavel por uma decisão que estabeleça o termo proximo dos soffrimentos de uma numerosa e distincta classe de cidadãos; proponho:

1.º Que se decrete o pagamento das folhas de ordenados, juros, e tenças, assim como os soldos militares tanto dos effectivos como dos reformados, do monte pio militar, e de qualquer outro genero de divida publica, a contar o seu vencimento desde o 1.° de Janeiro de 1821 até ao tempo em que se fizer o referido pagamento.

2.° Que para a execução do artigo antecedente, depois de havidas as informações para o conhecimento da importancia da mesma divida, se decrete um emprestimo por igual somma, o qual será negociado em paiz estrangeiro por intervenção do Governo, com às condições mais favoraveis que for possivel, e as precisas garantias para a satisfação de seus interesses annuaes, o progressiva extincção do capital.

3.º Que esta proposta seja submettida ao exame da Commissão de fazenda para offerecer com a maior urgencia o projecto que preencha os fins indicados, depois de haver as informações precisas.

Sala das Cortes 31 de Janeiro de 1822. - Castello Branco.

Ficou para 2.ª leitura.

O Sr. Borges Carneiro leu a seguinte addição ao art. 28 do projecto da Constituição.

O art. 28 já sancionado do projecto da Constituição diz assim. A Constituição... sómente poderá ser reformada ou alterada em algum, ou alguns de seus artigos depois de haverem passado 4 annos, contador desde a sua publicação.

Agora proponho que se lhe accrescentem estas ou semelhantes palavras - e quando tratarem de instituições novas, contados desde que estas se houverem posto em execução.

Sem esta addição não teremos feito Constituição, mas uma lei ordinaria que as seguintes legislaturas poderão facilmente inutilizar. Sirva de exemplo o estabelecimento dos jurados, que hade ter lugar o depois de publicados os codigos: já então terão passado aquelles 4 annos, ou, se não tiverem passado facil cousa será espaçar-se o dito estabelecimento até que passem, e então revogar o respectivo artigo da Constituição, o que he muito para recear se consideramos a grande influencia política que tem a magistratura, e o reforço que fará para não passar avante um estabelecimento que tanto a attenua; esforço que será tão efficaz então quando já o espirito publico não dará às Cortes, e á manutenção da liberdade um impulso tão forte como agora está dando. O mesmo digo da perpetuidade dos juizes, e de outras instituições que agora de novo vão decretadas na Constituição. A de Hespanha fixou geral e distinctamente o praso de 8 annos contados desde que ella houvesse sido posta em execução em todas as suas partes: nos restrinjamos esta medida pelos 4 annos já sanccionados às instituições novas, pois na verdade a razão não he outra senão para que a experiencia da instituição mostre se ella he proveitosa; mas como o poderá mostrar se se permitte revogalla talvez no mesmo momento em que houver sido posta em execução, ou ainda antes de chegar esse momento? - Borges Carneiro.

Ficou para 2.ª leitura.

O Sr. Moniz Tavares leu a seguinte

INDICAÇÃO.

Um dos grandes males, que soffria o Brazil, era a pessima, e escandalosa distribuição dos officios, ou empregos publicos, que fazia no Rio de Janeiro o antigo Governo; apenas vagava qualquer um mais rendoso em qualquer das provindas, era dado imediatamente á feliz gente do paço, ficando desta maneira os ditos empregos, ou privados de pessoas capazes para os exercer, ou não exercitados por aquelles a quem erão conferidos; por cujo motivo sendo muito interessantes que se não legitimem estes abusos com a sua duração; requeiro que se indique ao Governo, que faça expedir ordens a cada uma das juntas provinciaes no Brazil, para que passem logo a pôr em concurso todos os officios, ou empregos dados no Rio de Janeiro, que não se achão servidos pelos seus proprietarios, e que os confira a pessoas, que bem, e fiel-

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mente os possão exercer. - Francisco Montiz Tavares.

Para 2.ª leitura.

O Sr. Almeida e Castro leu a seguinte

INDICAÇÃO.

Não havendo entre nós um arrolamento perfeito; pelo qual se conheça qual seja a população do Reino-Unido, por serem antigos os que presentemente existem, e estes pouco exactos, já pelo methodo com que forão feitos, já pelas causas que em umas partes tem concorrido para augmentar, e em outras para diminuir a população, e devendo nesta ter fundada a representação nacional, faz-se de toda a necessidade que se proceda a um novo arrolamento: a isto cresce a nova divisão de territorio, a qual entre outras cousas deve conformar-se com o maior, ou menor numero de habitantes, que tiver qualquer districto; sendo além disto necessario que a força armada de uma Nação se proporcione ao maior, ou ao menor numero dos individuos que a compõem. Proponho que se diga ao Governo mande quanto antes proceder em todo o Reino-Unido a um novo arrolamento, o qual deve já servir para a futura eleição dos Deputados. Sala das Cortes 16 de Janeiro de - Ignacio Pinto de Almeida e Castro.

Para segunda leitura.

O Sr. Pereira do Carmo manifestou que tinha recebido uma carta do Rio de Janeiro, em que se lhe noticiava que os Diarios das Cortes não são ali espalhados, dando isto causa a que os gazeteiros transformem todas as noticias, e a que se faça um monopolio com os ditos diarios; vendendo-se pelo duplo ou triplo do seu valor, e requereu se encarregasse á Commissão competente adoptar as medidas convenientes para que cheguem Diarios áquellas provincias.

O Sr. Rodrigo Ferreira disse: que havia mais de cinco mezes que a Commissão se tinha occupado deste objecto, e que por via do administrador da venda do Diario fez remetter dose collecções para a Bahia, as quaes voltárão todas na mesma embarcação, apezar de ter sido a sua venda anunciada na Gaseta da Bahia: e que seria necessario ter correspondentes naquellas provincias, para que se encarregassem da repetição e venda dos Diarios, e da remessa do producto.

O Sr. Presidente convidou ao Sr. Pereira do Carmo a que apresentasse a sua indicação por escripto.

Então o Sr. Pereira do Carmo apresentou a seguinte

INDICAÇÃO.

Proponho que a Commissão do Diario empeça pela Secretaria das Cortes colecções dos Diarios para o Reino do Brazil e Provincas do Ultramar, dirigidas ás differentes Juntas administrativas:, que responderão por este negocio. Bem entendido que os Diarios deverão ser vendidos pelo mesmo preço por que se vendem no Reino de Portugal. - Pereira do Carmo.

Mandou-se remetter á Commissão da redacção do Diario das Cortes, para adoptar as medidas que julgar convenientes.

Fez-se a segunda leitura de uma indicação do Sr. Borges Carneiro ácerca da cultura do Alemtejo: foi admittida á discussão, e se ordenou que voltasse ao mesmo Sr. para formalisar um projecto.

O Sr. Secretãro Felgueiras apresentou ridigido o decreto sobre os oppositores, e foi approvado.

Leu tambem o seguinte

OFFICIO.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - Tenho a honra de participar a V. Exca. para o fazer presente ao soberano Congresso, que hoje entrei no exercicio de Ministro, e Secretario de Estado dos negocios da marinha.

Devendo sair desta Corte para o Rio de Janeiro no dia 6 de Fevereiro proximo o bergantim de guerra Reino Unido, deseja Sua Magestade saber se o soberano Congresso tem alguns despachos que remetter por elle, ou pelo bergamin. Trese de Maio, que ha de ir de correio para e mesmo porto no dia 19 do mencionado mez, com escalla pela Madeira, Pernambuco, e Bahia.

Deus guarde a V. Exca. Palacio de Queluz em 31 de Janeiro de 1822. - Illustrissimo e Excellentissimo Senhor João Baptista Felgueiras. - Ignacio da Costa Quintella.

Ficárão as Cortes inteiradas.

O Sr. Freire leu o seguinte

PARECER

Francisco Ricardo Zany, natural da Toscada, mostra com documentos legaes que reside ha vinte e um annos nas provincias do Pará e Rio Negro, com bons estabelecimentos em predios rusticos e urbanos; com o posto de capitão de milicias, e casado com mulher portugueza, da qual tem filhos nascidos nos dominios portuguezes.

Pede carta de naturalização; e parece á Commissão Constituição que se lhe deve conceder.

Pedro Paulo Candidi, natural de Roma, mostra residir em Portugal ha mais de trinta annos e casado com mulher portuguesa. Pede carta de naturalização; e parece á mesma Commissão que se lhe deve conceder. Paço das Cortes 16 de Janeiro de 1822. - Jose Antonio de Faria Carvalho; José Joaquim Ferreira de Moura; Manoel Borges Carneiro; Bento Pereira do Carmo; Luiz Nicoláo Fagundes Varella; Domingos Borges de Barros;

Foi approvado.

Entrou em discussão o novo projecto da Commissão de fazenda sobre o banco de Lisboa. ( Vide pag. 28.

Forão approvados sem emenda os tres primeiros artigos.

A'cerca do artigo 4.°, o Sr. Trigoso manifestou, que não sabia porque os sobscriptores havião de pagar ao banco o interesse da demora.

O Sr. Xavier Monteiro expoz qual tinha sido o objecto da Commissão na redacção do artigo, a qual teve em vista apresentar duas epocas de sobscrições

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para maior commodidade das subscriptores, e que como antes do 1.º de Julho o banco começa a ter interesse, não ha nada tão justo como que os novos subscriptores paguem ao banco o interesse da demora.

O Sr. Brito disse: que o motivo era para que podessem participar dos lucros do banco, havidos sem o concurso do capital dos novos accionistas, e que se devião accrescentar no artigo as palavras para participarem dos interesses respectivos do banco.

Foi posto a votos o artigo 4.°, e foi approvado com a dita emenda do Sr. Brito.

Entrou em discussão o artigo 5.°

O Sr. Brito lembrou que os estrangeiros devião igualmente ser considerados como os portuguezes para a nomeação de Presidente e directores, pois o contrario poderia desviar a muitos delles de entrarem com as suas acções: mas tendo manifestado o Sr. Xavier Monteiro entre outras ponderosas razões que os estrangeiros havião de concorrer a depositar seus cabedaes no banco de Lisboa, apesar dessas restricções, por conhecer que elle he superior em vantagens a qualquer outro da Europa: foi posto a votos o artigo, e approvado sem emenda.

Leu-se o seguinte

PARECER.

A Commissão de fazenda foi remettida uma relação de oitenta e um individuos vindos do Brazil, a quem se pagarão dois mezes de soldo, importando em 6:186$120 reis pala thesouraria geral das tropas em virtude da ordem das Cortes de 31 de Outubro de 1861. Observa a Commissão, que sendo a intenção do soberano Congresso occorrer por meio daquella ordem á necessidade em que se achavão alguns dos officiaes ingressados da America, aconteceu, que não sendo ella. enunciada em termos que denotassem claramente esta intenção, o Governo a interpretou de maneira, que incluiu no pagamento destinado aos indigentes quatro Marquezes, seis Condes, dois Viscondes, Cirurgiões Mores, Frades, e até Montes Pios, com a nota de que se ignora por falecimento de quem pertencem. Para que se evite a repetição de um similhante abuso, he a Commisssão de parecer que em a nova ordem que a este respeito se expedir, se declare terminantemente ao Governo não mande pagar a individio, que não seja militar propriamente dito ou que teria outra subsistencia alem do soldo. Paço das Cortes 29 de Janeiro de 1822. - José Ferreira Borges; Francisco de Paula Travassos; Manoel Alves do Rio; Rodrigo Ribeiro Telles da Silva; Francisco Barroso Pereira; Francisco Xavier Monteiro.

O Sr. Freire propoz que se faça distincção dos que tem ou não tem licença.

Foi approvado o parecer, declarando-se que os que estão de licença, visto que percebem moio soldo, não podem receber senão um mez.

Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação do projecto da Constituição, e para a prolongação o decreto da reforma da Companhia.

Levantou-se a sessão ás duas horas. - José Lino Continho, Deputado Secretario.

DECRETOS.

As Cortes Geraes, Extraordinarias, e Constituintes da Nação portugueza, attendendo á necessidade de regular a habilitação dos oppositores ás cadeiras da Universidade por um modo diverso daquelle que se prescreve no alvará do 1.° de Dezembro de 1804: decretão provisoriamente o seguinte:

1.° Os actuaes doutores da Universidade serão considerados oppositores depois de habilitados, e approvados em literatura, e costumes pelo juizo da congregação da respectiva faculdade em escrutinio secreto por dois terços de votos.

2.° Nenhum bacharel formado será admittido á martricula do anno de repetição sem ter informações de bacharel da forma, que se exigem no artigo antecedente. Depois do exame privado terá o licenciado nova habilitação antes de receber o gráo de doutor, a qual se redus á approvação em letras e costumes pelos dois terços dos votos da falculdade, e se depois disto se doutorar, ficará desde logo, considerado oppozitor ás cadeiras da sua faculdade.

Paço das Cortes em 31 do Janeiro de 1822. - Manoel de Serpa Machado, Presidente; João Baptista Felgueiras Deputado Secretario; José Lino Continho, Deputado Secretario.

As Cortes Geraes, Extraordinarias, e Constituintes da Nação portugueza, tomando em consideração o que lhes foi representado por parte de Pedro Paulo Candido, natural de Roma: e attendem o a que elle he casado com mulher portugueza, de quem tem filhos, e a que se acha residindo ha mais do trinta annos em Portugal: concedem ao supplicante carta de naturalisação, sem dependencia de outra alguma diligencia, para que possa gozar de todos os direitos e prerogativas, que competem aos naturaes deste Reino Unido em Portugal, Brazil, e Algarve. Paço das Cortes em 31 de Janeiro de 1822. - Manoel de Serpa Machado, Presidente; José Lino Coutinho, Deputado Secretario; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretario.

As Cortes Geraes, Extraordinarias, e Constituintes da Nação portugueza, tomando em consideração o que lhes foi representado por parte de Francisco Ricardo Zany, natural da Toscana; attendendo a que elle he casado com mulher portugueza, de quem tem filhos, e a que se acha estabelecido ha vinte o um annos nas provincias do Paia e Rio Negro: concedem ao supplicante carta de naturalização sem dependencia de outra alguma diligencia para que possa gozar de todos os direitos e prerogativas que competem aos naturaes e este Reino Unido de Portugal, Brazil, e Algarve. Paço das Cortes em 31 de Janeiro de 1822. - Manoel de Serpa Machado, Presidente; José Lino Coutinho, Deputado Secretario; João Baptista Felgueiras, Deputado Secretario.

Redactor - Velho.......

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