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trução e clareza, bem como formar-se sobre todas as indicações um mappa, ou relação geral, que forme o resultado. O que tudo V. Exc. levará ao conhecimento de Sua Majestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 5 de Março de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Candido José Xavier.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que lhes sejão transmittidos os seguintes documentos: 1.° a ordem do dia 9 de Novembro de 1821: 2.º a copia da resposta dada pela secretaria de Estado dos negocios da guerra ao officio do commandante da força armada de 13 de Dezembro de 1821, com o numero 21: 3.º o alvará de 22 de Dezembro de 1643, que deu fórma e regulamento ao conselho de guerra: 4.º a copia autentica da compra que o avô do actual secretario do mesmo conselho fez deste officio, seu preço e condições. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 5 de Março de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Ignacio da Costa Quintella.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo o incluso requerimento de 7 officiaes marinheiros reformados da armada, a fim de que sejão pagos e pontos em dia com os officiaes effectivos, em conformidade das respectivas ordens das Cortes sobre este objecto, em datas de 26 de Junho, e de 25 de Setembro de 1821. O que V. Exc. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 5 de Março de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

SESSÃO DE 6 DE MARÇO.

ABERTA a Sessão, sob a presidencia do Sr. Varella, leu se a acta da antecedente, que foi approvada.

Mandarão-se inserir na acta as seguintes declarações de votos:

Declaro que na sessão de ontem fui de voto contrario ao parecer da Commissão de Constituição, que tratou do requerimento de Felisberto Caldeira Brant Pontes. - J. Lino Coutinho.

Declaro que na sessão de ontem votei pelo adiamento do parecer das Commissões de agricultura e commercio sobre a tomadia do vinhos feita no Porto á casa de Harris. - Peixoto; Santos Pinheiro.

O Sr. Secretario Felgueiras mencionou os seguintes officios.

1.º Do Ministro dos negocios do Reino, remettendo os dois orçamentos a que se procedeu pela repartição das obras publicas, e pela commissão de engenheiros sobre a despeza de um salão e suas officinas, projectado para as sessões das Cortes. Passou á Commissão de fazenda.

2.º Do mesmo Ministro, remettendo a consulta da junta da directoria geral dos estudos sobre o requerimento da camara da villa de Montealegre, a respeito de escolas de primeiras letras. Passou á Commissão de instrucção publica.

3.º Do mesmo Ministro, remettendo duas consultas da mesma junta da directoria geral dos estudos, sobre creação de cadeiras de primeiras letras e latim em Alvações do Corgo e Azinheira, termo de Villa Real; e sobre outra de primeiras letras no couto de Covello, concelho de Lafões. Passou á mesma Commissão.

4.º Do Ministro da fazenda, exigindo providencias sobre a grande affluencia de dinheiro de ouro miudo que presentemente está concorrendo, não só no thesouro, mas em todas as casas de arrecadação, com menos do seu competente peso. Passou á Commissão de fazenda.

5.° e 6.° Do Ministro da marinha, transmittindo a parte dos registos tomados em 5 do corrente mez á galera portugueza Lusitania, vinda do Rio de Janeiro; e á outra chamada Conceição, vinda da Bahia, e á outra denomina-la incomparavel, vinda de Pernambuco. Ficarão as Cortes inteiradas.

7.° Do Ministro da guerra, satisfazendo á ordem das Cortes de 7 de Fevereiro ultimo, sobre as patentes por que foi reformado o major de milicias de Penafiel, Matheus João Numes. Passou á Commissão de guerra.

8.° Do governo provisorio da provincia de Minas Geraes sobre o procedimento que tivera com o ex-ouvidor da comarca do ouro, Francisco Garcia Adjunto. Foi mandado remetter ao Governo, com a devassa junta.

Mandou-se passar á Commissão de petições um requerimento do padre Francisco Manoel Junqueira, da villa de Igoapi da provincia de S. Paulo, sobre providencias, que pede, para remediar abusos; e á Commissão ecclesiastica de reforma uma representação dos moradores da freguezia de S. Sebastião da Pedreira desta cidade, pedindo a conservação do collegio de Santa Rita.

Foi presente uma felicitação da camara de villa Rica, capital da provinda de Minas Geraes, contendo ao mesmo tempo uma relação dos acontecimentos no juramento das bases da Constituição, nomeação de Deputados, e installação do governo provisorio, de que se mandou fazer menção honrosa, pela parte que pertence á felicitação; e pelo que diz respeito ao mais, que fosse remettida á Commissão da Ultramar.

Concedeu-se ao Sr. André da Ponte, Deputado pela provincia de S. Miguel, 15 dias de licença para fartar da sua saude.

Remetteu-se á Commissão de petições uma representação do padre Francisco Manoel da Junqueira, da villa de Igoapi da provincia de S. Paulo, contra o

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corregedor na mesma villa, José Carlos Pereira de Almeida Torres; e á de Constituição um officio do juiz de fora do Rio de Janeiro, servindo de ouvidor, datado de 12 de Dezembro, em que participava, que estava destinado o dia 26 de Janeiro para se proceder á eleição do governo provisorio, na forma do decreto das Cortes do 1. de Outubro, dando ao mesmo tempo informações sobre o estado e opinião politica daquella provincia.

O Sr. Guerreiro foz uma indicação verbal, dizendo que tendo constado que os illustres Deputados de S. Paulo trouxerão instrucções dadas pela junta da dita provincia, relativas á mesma provincia, pedia que elles fossem convidados para as apresentarem; e logo o Sr. Presidente os convidou para que as apresentassem na Commissão de Constituição.

Feita a chamada, acharão-se presentes 114 Deputados, faltando 24, a saber: os Srs. Falcão, Povoas, Moraes Pimentel, Canavarro, Ribeiro Costa, Sepulveda, Malaquias, Van Zeller, Almeida e Castro, Innocencio Antonio, Queiroga, Pinto de Magalhães, Faria Carvalho, Ferreira Borges, Faria, Sousa e Almeida, Vaz Velho, Isidoro José dos Santos, Rebello da Silva, Fernandes Thomaz, Miranda, Zefyrino dos Santos, Franzini, Ribeiro Telles.

Passando-se á ordem do dia entrou em discussão a indicação adiada do Sr. Borges de Barros, sobre ficar adiado o capitulo 1 do titulo 6 do projecto da Constituição, até chegarem ao maior numero possivel os Deputados do Ultramar, que possão dar as necessarias informações. A este respeito disse

O Sr. Moniz Tavares: - Apoio esta indicação a fim de que não haja motivo algum de queixa...

O Sr. Soares Franco: - Sigo aquella doutrina por outro motivo: desejava que pasmássemos ao capitulo 1.° em que se trata das camaras: 1.° porque he necessario absolutamente que ellas se estabeleção: 2.º porque realmente a doutrina das juntas administrativas he de alguma maneira prejudicada pela autoridade; que se der ás camaras.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu ainda duvido se deverá haver estas juntas administrativas pelas razões que darei quando se começar a tratar dellas. Falando agora sómente da questão direi, que a razão produzida na indicação não obsta a tratar-se já desta materia: primeiro, porque parece estar já neste Congresso a maior parte dos Deputados do Brazil; porem quando não esteja, todo o Reino Unido está sufficientemente representado, porque cada Deputado não representa singularmente a sua provincia, mas he Deputado em solido de toda a Nação. Aliás teriamos de dizer que uma provincia podia, não enviando os seus Deputados, paralisar os trabalhes da Assembléa nacional; e que he inutil quanto até agora temos feito e estamos fazendo. A presença de Deputados de todas as provincias he conveniente para informação, não necessaria para validade. A segunda razão he que os Deputados do Brazil que ainda faltão, podem a todo o tempo que chegarem fazer os additamentos ou emendas que lhe parecerem, ao que na Constituição acharem sanccionado.

O Sr. Andrada: - A questão tocada pelo illustre Preopinante não he agora pertencente aqui, o que elle porem impugna he sem razão: necessitamos de conhecimentos locaes, que devem influir na modificação de algumas decisões, aliás lançariamos a esmo decisões, de que ao depois seria mister recuar com desar, ou teimando nellas arriscar o socego do Brazil. He já muito o que se tem feito sem o preciso conhecimento local, evitemos para o futuro tantos embaraços. Enganou-se o Sr. Borges Carneiro quando disse que estavão aqui a maior parte dos Deputados, quando faltão muitos; falta a Deputação do Rio Grande do Sul, a Deputarão da Capitania do Espirito Santo, de Minas Geraes, Pará, Matogrosso, Seara, Goiazes, Piauhy, parte de Pernambuco, parte de S. Paulo, em fim os Deputados do Brazil serão 70 e apenas estamos 30: por estas razões pois parece-me que devemos esperar mais alguma cousa, porque nos podem ser subministradas luzes, a fim de que possamos com acerto decidir uma materia de tanta importancia.

O Sr. Lino: - Eu não posso aqui ouvir affirmar tão abertamente que cada Deputado he sómente Deputado da Nação inteira. He verdade que nós trazemos nas nossas procurações que olhemos para o bem geral da Nação, mas devemos advertir que tambem se diz, e para o bem particular da provinda. Se isto não he assim, porque se não nomeão todos os Deputados de uma só e unica provincia? Porque não se tirão para o Congresso todos os Deputados, por exemplo, só da provincia da Estremadura? E porque se vão buscar ás outras provincias? Logo daqui se segue que todos os Deputados deste Congresso, alem de representarem os interesses da Nação inteira, tem uma obrigação particular para com os interesses do seu paiz, e necessidades da sua provincia; bem entendido quando o bem particular dessa provincia não ataca o bem geral: por isso em negocios de summo interesse para as provincias do Brazil, he de imperiosa necessidade que os seus representantes concorrão todos. O Sr. Ribeiro de Andrada mostrou que o Sr. Borges Carneiro se enganou no calculo faltando mais de 40 Deputados do Brazil, e por isso faltão muitas luzes particulares para decidirmos este negocio, que he de tanta consideração. O negocio em questão não póde ser regulado para o Brazil pelo mesmo modo que para Portugal, cada provincia he diversa em caracter, em precisões, e necessidades, por isso eu sigo o parecer do Sr. Franco. A ordem he marchar do mais simples para o mais composto; as juntas administrativas vem a ser superiores ás camarás, e por isso ha preciso ver primeiro as cousas particulares que se devem dar ás camaras, para ao depois ver-se o que se deve dar ás juntas: por tanto sou de opinião que se trate primeiro das camaras, e depois das juntas.

O Sr. Moura: - Eu não me opponho directamente á moção do Sr. Borges de Barros, muito principalmente depois que o Sr. Ribeiro de Andrada explicou os motivos della; até aqui tinha alguma difficuldade em admitila; agora porem não he tão grande, mas he sempre debaixo da condição, que uma vez por todas fique entendido e sanccionado neste

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Congresso, que se achamos conveniente demorar-nos na discussão deste capitulo do projecto da Constituição, não he porque qualquer decisão, que se tomasse, sobre quaesquer dos seus artigos tivesse menos legalidade por faltar a deputação de uma, ou outra provincia. Este principio quizera eu se estabelecesse; porque não sendo elle admittido, vai-se derogar pela raiz o systema representativo, e por esta falta póde-se dizer vulnerada a legalidade da sancção que temos dado a todos os artigos da Constituição; por quanto os Deputados da provincia do Brazil poder-nos-hão argumentar deste modo: assim como tivesteis escrupulo de sanccionar este capitulo da Constituição, assim não he legal a sancção, que destes aos outros capitulos sem a nossa cooperação. Em negocios desta importancia he preciso falar claro, e he preciso ser escrupuloso. Por isso deve ficar entendido que as Cortes são um corpo moral, e collectivo; que este corpo moral está organisado logo que está reunida a maior parte dos individuos de que elle se deve compor; que nelle se tomão decisões legalissimas; e que a falta de uma deputação mais, ou menos numerosa, não influe na legalidade das decisões de uma corporação desta natureza; e em fim que tudo quanto temos sanccionado até aqui está legitimo e legal apezar de faltar uma parte, seja numerosa, ou não seja numerosa, dos Deputados do Brazil. Eu observei que affectadamente o Sr. Andrada se esforçou em mostrar a grande falta que havia nas Cortes de Deputados Brasileiros. Desejava eu que o illustre Deputado se fizesse entender, e enunciasse com mais clareza; se elle julga que a falta destes Deputados póde ter influencia na legalidade das decisões que aqui se tomarão; desejaria debater este principio, visto que a admittir-se tal principio viria acontecer, que tanto importava faltar uma deputação numerosa, ou menos numerosa, um individuo só que faltasse poderia annular as decisões que aqui se tomassem; absurdo incalculavelmente perigoso, de que poderia derivar a queda do systema. Por tanto he preciso que falemos muito clara e francamente nesta materia. Se acaso nós assentamos que nos são precisas ideas de localidades, quaes só nos podem transmittir os Deputados daquellas provincias que faltão. Convenho que só pela carencia de ideas particulares locaes, e localissimas das respectivas provincias esperemos por elles; mas então nau está removido ainda de todo este inconveniente com a idea do Sr. Soares Franco em querer que se trate da parte das camaras primeiramente, porque as mesmas ideas locaes, e circunstancias particulares que se exigem para tomarmos decisões no ponto das juntas provinciaes se exigem a fortiori para as tomarmos no que respeita ao regimen municipal das terras. Estou convencido que ha de haver algumas differenças, que havemos de ser forçados a adoptar num, e noutro caso a respeito do Brazil, e de bom grado convirei nellas; mas se as ideas locaes são precisas, para um objecto, igualmente, senão maiormente o são para o outro; de maneira que a questão vem só a consistir neste ponto. Senão he possivel termos actualmente ideas locaes de outro modo sem ser pela comparencia neste Congresso dos Deputados da America, convenho em sustar-se a discussão deste capitulo da Constituição, porque estou que devemos ajustar as leis aos povos para que legislamos, e como os povos são diversos, as leis devem ter diversidade. Mas por nenhuma outra razão quero que se considere que he necessaria a assistencia de todos os Deputados de todas as provincias do Imperio lusitano. Não he precisa esta totalidade para que sejão legaes as decisões deste Congresso; porque do contrario seguir-se-hia o absurdo superior a todos os absurdos, de que em faltando um Deputado de uma provincia, o que todos os outros fazião era illegal.

O Sr. Borges de Barros: - Fazendo a indicação em questão não tive na minha idéa mais do que o amor da ordem, e da justiça, e de mais a mais o dei ver que me he imposto, e trabalho a que me não devo poupar para a boa união da familia portugueza a mais espalhada pelos dois hemisferios. Foi pois debaixo destas vistas, e vendo eu que apezar de ser Brazileiro, e de ter andado com os livros como os mais homens dados á lição, e como elles meditado sobre a materia que nos vai occupar, e não me julgando capaz de dizer qual o melhor methodo de administração para as provincias do Brazil, julguei que em as mesmas circunstancias se devia achar a maior parte dos Deputados deste Congresso, mormente aquelles que nascidos em Portugal nunca tivessem ido ao Brazil: vi mais, que os amigos da liberdade e da justiça sé não propõem decidir negocios de que não estão cabalmente instruidos; e que devem muito duvidar entrar em negocio de cada um, sem que cada um ouvido seja. O nosso primeiro fim he acertar, e tratando de paizes tão variados por suas localidades, devemos encher-nos de ideas locaes. Respondendo ao que diz o Sr. Moura, digo que a minha tenção não he aquella, que não ponho veto aos trabalhos do Congresso, e que ha muita differença na falta da representação de uma provincia, ou na falta de um Deputado, é que essa falta he menos sensivel nas provincias de Portugal; mas o Brazil não deve olhar-se como um só paiz, são tantos paizes differentes quantas as provincias; faltar uma deputação he o mesmo que não poder-se tratar dos negocios daquella provincia: desejava que o Sr. Moura desse attenção aos climas, aos costumes, e distancias, em que as provincias do Brazil estão umas das outras. As provincias do Brazil podem chamar-se reinos: portanto assento que longe de haver inconveniente, cumpre não tratar desta materia, e admittir-se a minha indicação.

O Sr. Andrada: - O nobre Deputado lançou-me a luva, não recuso apanhala, e com a franqueza do meu caracter, responder-lhe-hei. São muito differentes os principios que regem um corpo homogeneo, dos que devem reger corpos compostos de partes heterogeneas; mormente quando a força repulsiva de um corpo que o impelle a formar systema differente he tão superior a força centripeta que o faz tender para o systema velho, que he preciso um quasi milagre de politica para conservar esta união. He regra geral que todas as vezes que um Congresso tem juntos os dois terços dos representantes da Nação, he sufficiente; mas quem disse ao Sr. Moura que quan-

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do se juntou este Congresso tinha dois terços dos membros que o havião do compor? Não esperar pelos Deputados do Brazil, não será impurrar aos povos, sem tom nem som, e á queima roupa, uma Constituição em que elles não tinhão votado? O artigo 21 das bases julgou necessaria a nossa adhesão; deu-nos direito a revermos aquillo que para nós se legislasse. Seguramente o Brazil tinha esse direita; chegou o ponto de se unir, uniu-se; mas não disse o como: este como merecia ser indagado com maior seriedade. Esta era a minha opinião, mas já disse que eu cedia, e os motivos em que me fundei, forão os de conveniencia, e não os de justiça: porque deixo á Europa inteira o julgar sobre isto. Nem se diga que o juramento posterior da Brazil justifica o Congresso, em legislar para o Brazil sem sua cooperação por seus representantes, e que os nossos diplomas e poderes tambem a isso, concorrem. Todos sabem a força de um juramento promissorio, que sempre depende da natureza da promessa; se o Brazil jurou uma loucura, o seu juramento o não obriga; de mais este mesmo juramento o defende, pois nada fez senão approvar o que estivesse feito ou se houvesse de fazer, debaixo da tacita condição, que para isto concorresse assistencia dos seus representantes. Os nossos poderes são para fazer a Constituição, e não para recebela, como automatos. Concluo pois que me agrada a idéa do Sr. Soares Franco, e podemos muito bem tratar primeiro das camaras, e depois das juntas administrativas.

O Sr. Moura: - Ou eu estou sonhando, ou não sei se o illustre Preopinante fala serio no que diz: para lhe responder não he preciso invocar mais nada do que a leitura da sua procuração, e do juramento que deu, e derão os povos seus constituintes. Quaes são as clausulas desta procuração? Quaes são as clausulas deste juramento? Os povos falão verdade; os illustres Deputados são orgãos destes povos, e orgãos verdadeiros e leaes? Sem duvida. Então que digão elles o que lhe disserão os povos, quando para aqui os mandarão. Disserão-lhes sem duvida: Ide para as Cortes de Portugal fazer a Constituição que nós desde já approvamos, e juramos; porem debaixo destas tres clausulas; primeira clausula geral do bem dos povos; segunda clausula do governo constitucional, da religião, e da dynastia. Por ventura esta procuração tem a clausula de dizer: Vós Deputados não consintais em nada, em quanto os Deputados todos da America não se juntarem? Não. Nem posso ouvir que o illustre Preopinante diga, que não he por principios de justiça que elle ratifica, e sustenta o que se tem sanccionado neste Congresso; quero que o illustre Deputado fique convencido que por principios de justiça, e rigorosa justiça, he que elle deve sanccionar aquillo, que nós temos sanccionado; porque os povos não lhe disserão que o não sanccionasse; pelo contrario ordenarão, e mandarão muito positivamente que elle houvesse de estar pela Constituição que as Cortes sanccionassem uma vez que fosse feita debaixo das tres clausulas, que ha pouco enunciei. Folgo bem de ter agitado esta questão para ouvir os illustres Representantes do Brazil.

O Sr. Araujo Lima: - Sr. Presidente, não sei porque fatalidade as questões, que aqui se discutem achão-se a maior parte das vezes envolvidas com outras, que lhes são bem alheias; observo que entrando em discussão um ponto, qualquer vê logo outro, que por incidente se tocou, e este toma o lugar do principal: he justamente o que agora succede. Está em discussão a indicação do Sr. Deputado Borges de Barros, que diz dever-se adiar este titulo para a ultima das materias da Constituirão, e entretanto observo que se discute com todo o calor, se sim ou não devem achar-se presentes todos os Deputados do Brazil para sua legitimidade. Como não vejo que esta seja a materia que entrou em discussão; como sobre isto nada se ha de pôr á votação, e nenhuma deliberação se ha de tomar, eu ponho de parte esta questão, e entrarei na materia propria da discussão. O que diz a indicação? que este titulo sobre os governos provinciaes eleve ser a ultima das materias que se devem tratar, para assim dar tempo a que cheguem os Deputados do Brazil, que podem muito exclarecer este ponto em consequencia das differentes localidades a que he necessario attender.

Eu sustento esta indicação, e voto que passe, por um principio já por mim em outro tempo enunciado, e he que os legisladores devem sempre ter em vista as localidades, e os habitos e costumes dos povos para que legislão. Quando neste Congresso se tratou se devia mandar-se tropa para Pernambuco, eu oppuz-me a isso, porque olhava para o modo porque seria aquella tropa recebida, para a influencia que esta determinação poderia ter nos animos daquelles povos, e para o effeito que produziria em todo o Brazil uma deliberação, que hia encontrar directamente os seus gostos, e o seu modo de pensar. He pois este mesmo principio que eu hoje invoco, he o mesmo que me soccorre para defender a indicação.

As provincias do Brazil muito separadas entre si, seus interesses ás vezes oppostos, fazem que sem um perfeito conhecimento de todos elles, que só nos póde ser transmittido pelos seus Deputados, não possamos tomer uma resolução que seja adequada a todas as localidades sem ouvirmos aquelles que sós nos podem bem informar. E só depois de; ouvidos todos, ou a maior parte dos Deputados do Brazil, he que nós poderemos ter um resultado, que seja o mais accomodado aos interesses das differentes provincias. Não se pense que isto he de tão pequena monta. Lembremo-nos, Srs., que o governo interior das provincias, assim como o poder judiciario he que tem mais influencia sobre os povos segundo forem organizados. He verdade que a divisão dos poderes, sua independencia, as garantias dos direitos, e liberdades dos povos são os pontos cardeaes de uma constituição, que deve fazer a felicidade do povo. Lembremo-nos porem que nada disto tem uma relação tão immediata com os povos, nada influe tão de perto sobre elles como o governo das provincias, e o poder judiciario. São estes os que tem uma connexão proxima, e immediata com o socego dos povos; são estes os que extinguem as rixas, rivalidades, e que cortão, sendo bem organizados, os principios das discordias entre os cidadãos: são estes os que pelo ponto de

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contacto, que tem com os povos, mais pezão sobre elles quando mal constituidos, assim coino, quando bem organizados, fizem doce todo o poder, e amavel toda a autoridade.

Como pois os interesses das diferentes provincias do Brazil não são os mesmos, como elles só nos podem ser conhecidos por meio dos seus Deputados, e como este negocio he da maior monta, porque he aquelle que mais de perto influo sobre ou povos, e com elles tem o mais extricto ponto de contacto, voto para que se espere pelos Deputados, ficando esta materia para ultimo lugar.

Ora em quanto aos 2 terços, de que fala a indicação, creio que seu illustre autor não a duvidará reformar neste ponto. He perciso que venha o maior numero possivel; e qualquer que este seja, deve dar-se principio a este trabalho.

O Sr. Lino: - O Sr. Moura exigiu o juramento que derão os povos do Brasil; foi de observarem a Constituição que fizessem as Cortes; mas quem fórma as Cortes? São os Deputados de Portugal, do Brasil e das outras provincias do Ultramar: logo como póde elle estar por uma Constituição que foi feita sem a representação dos seus Deputados? Tambem o juramento que nós havemos dado foi que viriamos ao Congresso para fazermos a Constituição e não para approvala quando estivesse feita. Pergunto eu agora se a deputação inteira de uma provincia chegar aqui quando a Constituição esteja concluida como ha de ella prestar o seu juramento? Daqui bem se vê pois, que nós vimos para fazer e não approvar a Constituição da monarquia portugueza. Confunde o honrado membro a falta de um Deputado, com a falta de uma deputação inteira, e de uma provincia: póde faltar um Deputado, e não fazer falta alguma, mas uma provincia inteira faz muita, e muita falta. As provincias do Brasil são outros tantos Reinos, que não tem ligação uns com outros, não conhecem necessidades geraes, cada um governa-se por leis particulares de municipalidade; por tanto para se tratar deste objecto das juntas administrativas, cumpre muito, e he de absoluta necessidade que se espere pelos Deputados daquellas provincias que ainda faltão.

O Sr. Guerreiro: - Convenho com o illustre Preopinante em que a questão que aqui se suscitou não he pertencente á materia da indicação, porem ha questões, que ainda que não seria conveniente se suscitassem, todavia suscitadas he bom que se declarem; e como esta he uma delias, e sobre a qual tão amplamente se tem falado, tocarei brevemente nella. Muita magoa me causou ouvir, que as forças repulsivas que tendem u separar as provincias do continente americano, do europeu, excedião a força centripeta que dirigia esta união: tendo visto a promptidão com que as provincias cio Brasil tinhão accedido á causa da regeneração politica que se havia proclamado nas provincias da Europa, tendo visto a boa vontade com que todas jurarão obediencia ás Cortes, tinha-me persuadido do contrario; e algumas vezes que tinha lançado as vistas sobre este objecto, tinha achado que os interesses reciprocos de um e outro continente exigião esta união, vindo por tanto a crer que a força centripeta que dirige a união dos dois hemisferios seria muito maior que aforra repulsiva que tenderia a separar-nos, porque esta não teria em vista outra coisa mais do que o satisfazer o amor proprio de uma independencia mal entendida. Quanto á legitimidade do tudo que tem sido legislado, mesmo relativamente ás provincias americanas, creio que esta se manifestará bem, lançando um golpe de vista sobre a maneira com que começou a nossa regeneração politica. As provincias do Continente europeu forão as primeiras que proclamárão a nova ordem de cousas, que espancárão o despotismo, e fizerão reassumir á Nação os seus direitos, direitos de que gozara no principio da monarquia; as provincias do Continente europeu regularião a marcha da sua regeneração, segundo exigião os seus interesses, porem lembrarão-se que em outro Continente vivião seus irmãos, que gemião nos mesmos males, e que por interesses reciprocos virião a gozar do beneficio da mesma regeneração politica. Vejão-se as instrucções que deu ajunta do supremo Governo do Reino, para se unirem á nossa causa; ninguem os constrangeu, não se deu medida alguma para poder accelerar a sua missão, com o receio de que não estivesse segura a causa da sua provincia; a maior delicadeza, e a maior boa vontade respirava em todas as medidas que se tomarão, parece que ninguem haverá no Continente americano que se attreva a negar a verdade destas considerações. Por consequencia as provincias do Continente europeu, quando fizerão a sua regeneração attenderão a si, attenderão ás suas circunstancias; a sua representação foi legitima desde o seu principio, porem desde o seu principio não tinha direito de legislar para as provincias do Continente americano; mas quando uma dellas declarou adherir á causa das provincias do Continente europeu, quando reconheceu as Cortes de Portugal, quando jurou obediencia á Constituição, quando affiançou com juramentos esta promessa, não reconheceu a legitimidade desta representação nacional? Não se sujeitou a obedecer a essas determinações? Não he a natureza desta representação, estabelecida em Portugal, que dá legitimidade ás suas decisões relativamente ao Brasil; foi á vontade dos povos das provincias do Brasil, foi o juramento que aquellas provincias derão, foi a sua declaração de que querião reunir-se a nós. Não póde pois haver duvida sobre a legitimidade de umas taes decisões, porque forão feitas por uma representação nacional legitimada; por isso parece que está demonstrada a legitimidade de tudo quanto lemos feito; parece ao mesmo tempo que este soberano Congresso tem dado a maior prova de sinceridade e affeição que tem ás provincias americanas, quando depois da reunião do numero consideravel de Deputados declarou sobre a moção de um delles, que na revisão da Constituição poderião elles offerecer a alguns dos seus artigos os additamentos que julgassem ser exigidos pela localidade. Que mais pois era necessario? Que maior prova de sinceridade poderia dar-se-lhe? Nenhuma. Não me opponho a que se demora para outro tempo a discussão deste capitulo 6.°; mas não acho que isto seja necessario, porque quanto aos principios geraes

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elles são applicaveis a todos os lugares, e a estabelecerem-se algumas providencias que sejão mais circunstanciadas, não só os illustres Deputados que se achão presentes, com os conhecimentos que tem, sabem as modificações que hão de offerecer, mas mesmo os Deputados que vierem chegando successivamente, tem direito de propor artigos addicionaes ás providencias que se julgarem mais necessarias; e por isso não haveria inconveniente algum em discutir este capitulo; e se se demorar a sua discussão, he necessario que se demore por pouco tempo. A qualidade de serem estas Cortes extraordinarias e constituintes, impõe a obrigação de accelerar os seus trabalhos para não despertar no povo idéas pouco vantajosas; he necessario que conheção todos que nós não pretendemos conservar este sagrado poder que nos foi constituido, senão tanto tempo quanto for necessario para segurar a felicidade dos nossos constituintes; o fim principal da nossa missão foi fazer a Constituição politica da monarquia; seria util que consolidássemos todos os meios do systema constitucional com poderes ordinarios, e por isso digo que he necessario não demorarmos a conclusão desta Constituição, quanto mais que a Constituição he o unico meio de salvação; he o unico meio que temos para reunir num só centro a vontade de todos os Portuguezes, e he o unico meio que lemos para consolidar a reunião de uma independencia bem entendida. Por tanto tudo que for para demorar a conclusão deste magnifico edificio, que nos ha de salvar dos ataques da anarquia, he necessario que seja rejeitado, e por isso voto contra a indicação.

O Sr. Vergueiro: - Como os principaes fundamentos são deduzidos das nossas procurações, e do juramento que prestámos, poderei dar uma explicação destes documentos. A junta provisional de S. Paulo quando passou as suas procurações, teve em vista o artigo 21 das bazes que diz: que o Brasil ficará sujeito á Constituição, quando as provindas pelos seus representantes, accederem a ella. A junta entendeu que ao direito de approvar, estava unido o de desapprovar o que se faz; no entanto entendeu que lhe competia o direito de representar. Quanto ao juramento, he bem conhecida a força que tem o juramento promissorio, principalmente de uma cousa que não se sabe o que ha de ser; o juramento assim, entende-se daquillo que for conforme aos principios que determinarão o juramento: as coisas mudarão de figura: no tempo em que o Brazil jurou a Constituição, era um Reino separado, existia já a sede da Monarquia; em Portugal existia uma regencia: o Brazil viu transplantada a sede da Monarquia para Portugal, mas nunca entendeu que ficaria sem ter lá um centro de Poder executivo. Eu não devo suppor agora que os illustres Representantes desprezem tanto a vontade geral dos povos do Brazil, que se aproveitem de argumentos para o subjugar; mas se deve attender-se a vontade geral do Brazil, he necessario que concorrão os seus Representantes, porque sem isto como se ha de conhecer a vontade geral? O Brazil não se sujeita com argumentos; ha de sujeitar-se por uma vontade espontanea, fundada sobre o interesse reciproco dos dois Reinos. Uma vez que não se entenda assim, seguramente deve obrar a força da desunião, estabelecida pela natureza: para a vencer são necessarios vinculos muito fortes; estes vinculos são o interesse reciproco. O Brazil quer a união, e desde o principio a proclamou; e até por não excitar desconfiança, deixou de exigir cautelas, e prestou todos os actos de adhesão á causa commum, entendendo que os illustres Representantes de Portugal não abusarião desta confiança, para lhe impor um jugo pezado. Por tanto devemos conhecer a vontade dos povos, e só elles he que a devem expressar; só por interesse delles he que devemos esperar pela pluralidade dos Deputados do Brazil, principalmente quando acontece faltaram de provincias muito diferentes umas das outras. Faltão Deputados do Rio Grande do sul, provincia dissimilhante de todas as outras daquella região, pois he o celeiro das cidades maritimas, não produz generos nenhuns dos chamados coloniaes: faltão os da provincia de Minas Geraes; que similhança tem esta provincia com as outras? Nenhuma. Se comparar-mos a provincia de Minas Geraes com a do Rio de Janeiro que he a mais proxima, acharemos uma differença extraordinaria: o Rio de Janeiro tem uma pequena extensão, em poucos dias irão as ordens á sua extremidade; em Minas Geraes não: a população do Rio de Janeiro está concentrada na cidade; a população de Minas Geraes está espalhada: a riqueza do Rio de Janeiro he devida á grandeza do seu porto, á grandeza de seu emporio; a de Minas Geraes, he devida á sua agricultura, ás suas minas, e manufacturas: a provincia do Rio de Janeiro está na costa do mar, e exposta a invasões; a provincia de Minas Geraes não póde ser atacada por nação estrangeira, nem pelas provincias limitrofes; havemos pois applicar os conhecimentos que temos do Rio de Janeiro, a Minas Geraes? Isto seria um absurdo. A provincia mais poderosa, e populosa que temos he Minas Geraes, ha de pois desprezar-se esta provincia que he a principal do Brazil. Eu concluo que sem estar a pluralidade dos Deputados do Brazil, e especialmente dos Deputados de Minas Geraes, não deve tratar-se negocio nenhum que tenha relação com o Brazil.

O Sr. Trigoso: - Notavel he a inconstancia das cousas humanas, e do juizo dos homens! Começámos a discutir o projecto de Constituição no principio do mez de Julho, achamo-nos hoje a 6 de Março do anno seguinte, e agora he que lembra suscitar-se a questão, se devemos ou não discutir a Constituição? Assentámos que não poderia haver inconveniente algum em discutir este projecto com os Deputados do Brasil, que aqui estavão, por isso mesmo que para isto he que fomos nomeados pelos povos de Portugal, e elles pelos do Brazil. Os outros povos das outras provincias do Brazil nomearão os seus Deputados, e jurarão a Constituição, que as Cortes de Portugal estabelecessem; as Cortes de Portugal, a quem elles já sabião que estavão unidos alguns Deputados do Brazil, ainda que em mui pequeno numero; as Cortes de Portugal, a quem elles sabião que se havião de ir ajuntando, não no mesmo ponto, mas succesivamente os outros Deputados do Brazil. Em consequencia

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não póde haver duvida, que sendo poucos os Deputados do Brazil, que estavão ao principio, e devendo reunir-se os oulros pouco a pouco, formando todos com os Europeos este Congresso nacional, a Constituição que surdir desta reunião de esforços communs, deverá ser a Constituição da monarquia portugueza. Nem os povos do Brazil, quando prestarão seu juramento, pozerão nisto a mais pequena duvida, nem pozerão condição alguma; nem as procurações que successivamente forno dando aos seus Deputados dizião outra cousa, que não dissessem as dos povos de Portugal. Por isso não posso perceber como hoje depois de discutida a maior porte da Constituição, se possa duvidar se nós temos poder para discutir a Constituição; nem sei como se possa duvidar se esta Constituirão he applicavel ás provincias do Brazil, quando todas ellas, apezar de saberem que se discutia a Constituição, tem nomeado os seus Deputados, sem fazer reserva alguma nas suas procurações. (Apoiado). Tal he pois o fundamento da sancção que temos dado aos artigos discutidos desta Constituição. Ha porem outra prova por absurdo, e vem a ser que se nós não poderemos fazer a Constituição sem que tivessem chegado os Deputados do Brazil, que haviamos de ter feito desde o dia 21 de Agosto até hoje? Nem nós agora mesmo a poderiamos começar, porque era necessario que estivéssemos á espera de que se enchesse a representação nacional, e então se nós até hoje não podessemos discutir, nem sanccionar a Constituição, necessariamente o reino de Portugal havia de estar entregue a desordem, e á anarquia. Por tanto não póde deixar de considerar-se como legitima a discussão que temos feito do projecto da Constituição politica da monarquia portugueza; e não póde deixar de se julgar que ella he não só comprehensiva do reino de Portugal, mas do Brazil; por isso que este sem reserva alguma, e sabendo que as Cortes estavão começadas, e que a Constituição se discutia, apezar de tudo isto mandou para ellas os seus Deputados. Mas nem tudo o que he legitimo, he racionavel, e politico. Assim ainda que fossem legitimos os actos que ternos praticado, e legitima a discussão, e sancção do titulo 6, nem por isso se segue que esta fosse justa, racionavel, e politica. Debaixo deste ponto de vista desejo considerar a indicação que fez o illustre Deputado: nem elle quer que se considere de outro modo. (Apoiado). Elle não disse que as Cortes não tinhão direito de funccionar o titulo 6, o que disse foi, que para ficar bem conforme á utilidade, e interesses não só dos povos de Portugal, mas do Brazil, era necessario o concurso dos seus Deputados: e quem duvida que sendo legitimas as leis que temos feito, algumas dellas não sejão justas, talvez por falta de conhecimentos, que só a experiencia póde subministrar? E se; isto merece ser acautelado quando se trata de leis regulamentares, quando um dia por outro se podem alterar; o que diremos quando se trata de leis constitucionaes que não são susceptiveis de refórma, senão passados quatro ou seis annos? Segue se pois que se nós não podei mós passar sem estes conhecimentos, praticos, e locaes, he de toda a justiça que esperemos pelos illustres Deputados do Brazil, a fim de sanccionarmos e discutirmos este capitulo 6. Eis-aqui a que se dirige a indicação do Sr. Deputado, e parece-me que todas as questões que se tem suscitado sobre a legitimidade das discussões, e sobre a necessidade da presença dos Srs. Deputados, todas são alheias da unica que deve interessamos; a saber: se deve adiar-se parte do titulo 6 para o fim da Constituirão, em quanto não chegarem os Deputados do Brazil. Parece-me pois conveniente que esperemos pela razão apontada pelo autor da indicação; e razão tanto mais justa, que sou de opinião que não ficará perfeita esta parte da Constituição ainda depois de citarem todos os Deputados das provincias do Brasil. Não he certamente o juizo dos illustres Deputados do Brazil, por mais transcendente que o queiramos suppôr, o que ha de determinar com certeza melhor fórma de administração das provincia; daquelle Reino: isto só a experiencia he que o póde ensinar, e esta he que nós não temos. Temos sim experiencia de governos despoticos dos capitães generaes, e governadores; mas não temos experiencia do que ha de resultar das juntas governativas. Eu receio muito que ainda mesmo depois de grandes discussões, em que todos os Deputados do Brazil mostrem todas as suas luzes, ainda não estejamos habilitados para fazermos uma boa lei, relativamente á administração das provincias do Brazil; e por tanto muito mais receio tenho em quanto não tivermos todas as luzes que elles nos hão de communicar: por isso sou de opinião que não se trate por agora das juntas administrativas. Acho muito natural que comecemos pelas camaras, que estão estabelecidas no Brazil, como em Portugal, e por isso, podem marcar-se bem as differenças que póde haver na sua formação de um paiz ao outro: é depois de tratarmos das camarás, e de todos os artigos adiados, ultimamente trataremos das juntas administrativas das provincias. Não ha para que esperemos dois terços dos Deputados; porque se se dissesse isto, então vinha-se a suppôr que elles erão necessarios para a legalidade da sancção; e isto he que eu não admitto, e rogo muito aos Srs. Deputados que não instem por um principio, que seria muito pernicioso, e que elles por factos tem mostrado ser falso. Não he necessario que estejão os dois terços dos Deputados, mas sim que estejão os precisos, não para que a lei seja mais legal; mas para que saia mais bem feita. E se depois de termos acabado os artigos adiados, e os outros artigos desta Constituição, assim mesmo elles não tiverem chegado todos, então necessariamente devemos passar ao capitulo 1 das juntas administrativas para estabelecer algum governo constitucional nestas provincias, fazendo as cousas de modo que ponhamos as regras mais geraes possiveis deste governo administrativo, e reservemos para as legislaturas seguintes applicalas melhor, quando houver mais copia de conhecimentos locaes, do que os que temos (apoiado, apoiado). De maneira que não entenda a ração que nós com este methodo pretendemos demorar os nossos trabalhos,, e não acabar a Constituição. He muito necessario, e eu me lisongeio muito de unir as minhas vozes ás do illustre De-

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putado, que falou neste mesmo sentido em uma das sessões anteriores; he muito necessario, digo, que acabemos a Constituição, e que deixemos aos nossos successores o ultimarem todas as outras leis que deviam segurar a Constituição, mas que os povos nos mo commetterão especialmente; por isso que o que especialmente nos commetterão foi unicamente a obra da Constituição. (Apoiado, apoiado).

Declarada a materia sufficientemente discutida, procedeu-se á votação, e decidiu-se que a materia do capitulo 1.ª do titulo VI ficasse transferida para o fim da Constituição.

Passando-se em consequencia ao capitulo 2.º do referido titulo VI., entrou em discussão o artigo 192.

Propondo o Sr. Trigoso que em lugar das palavras do artigo, com subordinação ajunta administrativa da provinda, se dissesse, com subordinação a uma autoridade superior; disse

O Sr. Soares Franco: - Está claro que se deve dizer isso, porque nós não sabemos ainda se haverá juntas administrativas, e por isso he necessario tirar essa palavra, e dizer-se em geral, autoridade supperior.

O Sr. Trigoso: - Eu opponho-me a este artigo, Desde o principio do reinado do Sr. D. João I tem-se creado muitas cidades, e muitas villas em Portugal, pelas necessidades que occorrerão aos povos estrangeiros que vierão aqui; aos quaes povos se derão certas terras, e outras acertos senhores donatarios; e em fim muitas outras cousas tem concorrido para a creação destas villas, das quaes, pelo decurso do tempo, muitas se tem augmentado, e outras diminuido; e não devem ser degradadas desta cathegoria; porem não me parece tambem justo que venha a estabelecer-se uma camara em cada uma destas villas, porque não só se seguirião muitos inconvenientes, senão que em muitas dellas não haveria quem fosse capaz de occupar aquelles encargos. Por tanto segue-se que não deve haver tantas camaras como villas; hoje he isto muito facil de fazer; e não como antigamente quando havia senhores donatarios de certas villas, a quem pertencia provar estes lugares, mas hoje que nós os vamos extinguindo, segue-se que não ha ninguem que tenha esse direito, Não deve haver tantas camaras como villas.

O Sr. Moura: - Eu queria reflectir ao illustre Preopinante....

O Sr. Trigoso: - He verdade que me enganei, porque como não vinha preparado não reflecti nos artigos seguintes; com tudo sempre me parece que do artigo 192 he que se deve tratar.

O Sr. Braamcamp: - Eu tamhem apoio esta mesma opinião.

O Sr. Moniz Tavares: - Nós na incerteza de qual artigo se havia detratar na discussão, não vinha-mos prontos para ella, por isso me parecia que se podia adiar esta materia, e tratarmos do parecer da Commissão de fazenda que he muito urgente.

O Sr. Moura: - Ao que acabou de reflectir o Sr. Trigoso, apoiado pelo Sr. Braamcamp, eu direi que o principio estabelecido no artigo 192 está corrigido no artigo 193. Muito de proposito os redactores assim o fizerão (leu). Não he justo que se tire as villas que já tem camaras aquella dignidade que ellas adquirirão por aquella creação; nem he justo tambem que se estabeleção aonde se não devem estabelecer: o que diz o Sr. Trigoso que ha villas tão pequenas que não merecem ler uma camara, isto remedeia-se com o que diz abaixo: e logo que uma villa tenha 600 fogos he necessario que haja quem os reja. Estabelecido este principio vamos a polo em pratica. Convem em tudo que haja uma camara aonde ha 600 fogos ou individuos, se se vir que ha uma que não tem este numero de individuos, acrescenta-se das outras que f"m mais. Parece-me que o numero de 600 fogos he um numero regular, se parece todavia que he muito diminuto, póde-se acrescentar.

O Sr. Guerreiro: - Como esta questão não tinha sido determinada para ordem do dia, eu não vinha preparado, e portanto peço aos illustres redactores que me desculpem alguma reflexão que não seja a proposito. Quando se tratou do decreto provisorio de camaras, disse qual era a minha opinião a este respeito. O artigo 193 diz (leu); os artigos 192 e 194 dizem (leu-os). Perguntarei agora se......... Eu já disse e agora repito que me parece que se devem crear camaras em todos os povos que as quizerem, com tanto que a povoação não seja menor de duzentos fogos. O governo economico a quem pertence conservar a policia da terra e outros objectos desta natureza não deve ser concedido aos governos representativos, porque esses não conhecem as necessidades de todos os differentes concelhos; porem as camaras não devem ser encarregadas senão do governo economico das terras, ficando as juntas administrativas encarregadas de todo o governo administrativo.

O Sr. Freire: - Eu tambem tinha a dizer quasi as mesmas palavras; a questão de que nós devemos tratar he se devem as camaras ter o governo administrativo, e depois disto he que se deve tratar do mais.

O Sr. Antonio Carlos apoiou o que disse o Sr. Guerreiro.

O Sr. Macedo: - A explicação que fez o Sr. Deputado Moura mais me faz capacitar de que o artigo não póde approvar-se como está, para se não sanccionar o principio de que precisamente continuará a haver camaras em todas as terras onde actualmente as ha. Estou bem certo que ha muitas terras que estão elevadas á cathegoria de villas, tendo ião pequeno numero de moradores, que se lhe tornão mui gravosos os encargos da governança. Já aqui se deferiu favoravelmente ao requerimento de uma terra que pedia a sua annexação a outro concelho: eu mesmo aqui apresentei outro requerimento da camara do couto de Ois do Bairro, composto unicamente de quarenta e dois fogos, no qual com toda a justiça se pede a annexação daquelle couto á villa immediata. Já foi reconhecido pelo soberano Congresso que estas annexações se devem permittir; por quanto no decreto provisorio para a nova organização das camaras já se estabeleceu, que não ficarião inhibidas as Cortes de crear novas camaras, e de extinguir algu-

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mas das existentes: se isto pois já foi decidido pelo augusto Congresso, não me parece que se deva agora decidir o contrario, antes deve ficar livre ás Cortes crearem as camaras que assentarem que são necessarias, e supprimirem aquellas que forem prejudiciaes aos povos. Por consequencia póde passar o artigo na fórma que está concebido.

O Sr. Borges de Barros: - Eu accrescentarei ao que disse o Sr. Guerreiro, que seiscentos fogos no Brazil he muito, e acho ser conveniente que uma vez que se tem marcado o minimo, se deve marcar tambem o maximo; e desejava que fosse o minimo quatrocentos fogos, ao menos no Brazil onde a povoação está mui semeada, havendo em grande espaço de terreno pequeno numero de individuos.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu levanto-me sómente para procurar trazer a questão ao seu lugar, pois tenho visto que alguns dos Srs. Preopinanres confundem o artigo 192 com o artigo 193, os quaes não tem nada um com o outro: pois o primeiro trata de designar onde ha de residir o governo economico e municipal, isto he, nas camaras; o segundo trata de designar em que lugares ha de haver camaras. Não confundamos pois estas duas proposições; decidamos primeiro a questão do artigo 192, isto he, qual seja a autoridade em quem deva residir o governo economico das terras, e se, como he presumivel, se vencer que esta autoridade he a camara, passaremos então a discutir se deve haver muitas ou poucas camaras. Ora a este respeito tudo fica satisfeito substituindo no artigo a palavra economico a administrativo, e a palavra autoridade superior ajunta administrativa da provinda, visto que não temos ainda sanccionadas estas juntas. Ora o dever na Constituição declarar-se onde resida o governo economico das terras, he isso cousa necessaria, e que seja esse um principio constitucional, porque como foi já separado o poder administrativo do poder judicial, e se disse que este ultimo está nos juizes, forçoso he dizer-se tambem onde aquelle esteja.

O Sr. Correa de Seabra: - Sr. Presidente, apoio a, opinião do Sr. Trigoso sobre a suppressão deste artigo 192, ainda que o Sr. Moura se fez cargo de responder aos argumentos do Sr. Trigoso, lembrando que se podião annexar outros povos a essas pequenas villas; porque ha villas mui pequenas, e em localidades taes que a umas não era possivel annexar-lhe outros povos, e a outras não se poderião annexar sem grande e grave incommodo dos mesmos: dumas e outras nestas circunstancias sei de muitas que refiriria se fosse necessario; mas o que me parece de toda a necessidade he que a discussão deste capitulo comece pelo artigo 200; porque se depois de determinadas as attribuições das camaras he que podemos tomar resolução acertada sobre o numero dos individuos de que hão de ser compostas as camaras, e a respeito das suas localidades; qualquer resolução que se tome a este respeito sem preceder o conhecimento das attribuições nos ha de pôr em grandes embaraços e dificuldades quando se tratar de marcar as mesmas attribuições.

O Sr. Andrada: - No Brazil o numero de fogos não póde ser menor do que aqui, e creio que o Sr. Borges de Barros está enganado. Em quanto ao poder administrativo deve ser mais claramente enunciado, fazendo distincção das camaras; pois que são differentes as attribuições; e seria imprudencia cumulalas em mãos, que as não podem exercer convenientemente.

O Sr. Freire: - Eu levanto-me para dizer que essa he a grande questão. Uma cousa he governo administrativo ou economico de cidades, e villas, e á outra he governo administrativo de todo o Reino; logo a primeira questão he se o governo administrativo em geral deve, ou não ser estabelecido nas cidades, ou nas villas, e isto he effectivamente do que se deve tratar, nós não conhecemos ainda o que he governo administrativo; disto trata o artigo 200: todos sabem que o governo administrativo até agora era encarregado a diversas autoridades, e ordinariamente dado a qualquer juiz para tratar dos negocios desta, ou daquella repartição; existia nas Secretarias distado em ponto grande; existia tambem nos corregedores, provedores, nas camaras etc.; e o que nós agora devemos tratar, he onde deve existir esse governo administrativo. Em quanto ao governo economico he evidente que ha de existir nas camaras, sem que por agora se possa determinar qual ha de ser a grandeza dos seus districtos, que nem são tão pequenos, nem tão grandes Como são actualmente os de algumas; pois se deve fazer que sejão proximamente iguais em população, e territorio; destas duas bases dependem essencialmente: será por tanto bom marcar os limites, abaixo, e acima dos quaes não possa passar o districto de uma camara. He pois a minha opinião que se passe ao artigo 200, e depois de se haverem nelle examinado as cousas, que ficão pertencendo ás camarás, poderemos então tratar da sua organização, e grandeza; e em quanto ao governo administrativo em geral, é das autoridades que devem ser delle encarregadas, pois me não conformo que sejão juntas, tratar-se-ha no capitulo correspondente.

O Sr. Serpa Machado: - Nós ainda não sabemos o que he governo administrativo, como havemos dar o que não sabemos o que he; como havemos dizer que ás camaras pertence uma cousa que não sabemos o que he? O que disse o Sr. Freire he muito bem dito; diz o Sr. Borges Carneiro que he necessario marcar isto para ver o que pertence ao juiz, e o que pertence ás camaras; porem nós com esta declaração não vinhamos a fazer nada; e por isso não he necessario que o digamos; por tanto a doutrina deste artigo he perfeitamente inutil, e até prejudicial por quanto dá ás camaras autoridade que nós ainda ignoramos; e sou de opinião que detemos passar ao artigo 200.

O Sr. Soares Franco: - .....

O Sr. Macedo: - Não sei de que serve estabelecer em these que o governo administrativo residirá nas camaas sem saber ainda o que he governo administrativo: e parece-me que primeiro deveramos determinar em que elle consiste, objecto que se trata no artigo 200. Por tanto sou de voto que parando por

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ora na discussão do artigo 192 se passe já ao referido artigo 200.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu insto em que se deve aqui dizer que o governo economico das cidades, villas, e concelhos (e basta dizer sómente dos concelhos) está nas camaras, pois que foi separado do poder judicial, e deste se disse que está nos ministros. Se porem quizermos tratar de todo o poder administrativo, então entraremos em um campo mais vasto; porque a administração da fazenda publica está no thesouro, e tribunaes fiscaes, a da forca armada está no exercito e marinha, a do ensino publico está nos directores delle etc. Aqui tratamos sómente do governo economico e municipal.

O Sr. Marcos de Sousa: - Confirmando em geral a opinião do Sr. Freire, e do Sr. Serpa Machado, só accrescentarei que este objecto devia ser considerado debaixo de tres pontos de vista: 1.° o lugar em que deve haver camara; 2.º quem a ha de compor; e o 3.° que attribuições hão de ter: parece-me que feita esta divisão ficaria mais clara, e intelligivel; e uma vez que se adopte esta minha opinião eu me proporei dizer alguma cousa sobre o primeiro artigo; mas agora quizera que esta questão fosse simplificada a estes tres pontos de vista, e que ficasse para ultimo lugar as attribuições. Este he o meu parecer, e uma vez que se permitta discutir eu diria alguma cousa sobre o Brazil.

O Sr. Ferreira da Silva: - Eu me conformo em tudo com o parecer do Sr. Borges Carneiro. He necessario declararmos primeiramente......... por consequencia me limito unicamente ao artigo 192, se se deve aqui declarar que o governo administrativo reside nas camaras; e me conformo com a doutrina do artigo, sem com tudo declarar cidades, villas, e aldeias.

O Sr. Caldeira: - Eu lembraria sómente uma idéa: parece-me que dizendo-se em geral, o poder administrativo, e economico dos concelhos reside nas camaras, he quanto basta, porque depois se póde dizer em que lugar se podem estabelecer, o que são, e o numero de que se compõem.

O Sr. Feio: - Eu creio que se não póde organizar uma maquina sem primeiro saber de, que ella ha de servir, por tanto o meu voto he que se estabeleça ás camaras quaes são as suas attribuições e depois como hão de ser compostas.

Propoz o Sr. Presidente á votação o artigo, e venceu-se que, ficasse adiado, e que primeiro se discutisse a materia do artigo 200.

O Sr. Borges Carneiro apresentou a seguinte

INDICAÇÃO.

Um dos meios mais proficuos para prevenir, connivencias, prevaricações, ou omissões dos empregados publicos no systema constitucional, he sujeitar as acções delles á censura da opinião publica, deste tribunal incorruptivel e formidavel, que he superior aos mesmos governos.

Proponho por tanto se diga ao Governo que mande publicar pela imprensa a lista dos bachareis que forão oppositores aos lugares de letras nos concursos passados, e as propostas que delles fez ao Rei o conselho d'Estado, e que assim se fique observando para o futuro, devendo passar um mez entre a publicação da lista e a formação da proposta.

Ficou para 2.ª leitura

O mesmo Sr. Deputado offereceu mais a seguinte

INDICAÇÃO.

Andão pedindo esmola muitos dos empregados que forão da extincta inquisição. Cousa injuriosa ao systema constitucional, quero dizer, a um Governo justo, ao passo que tantas e tantas pessoas abundão em superfluidades á custa da fazenda nacional!!!!

Proponho se diga ao Governo que se informe quaes são os ditos empregados que não tem outro meio de subsistencia se não os vencimentos que as Cortes lhes designarão, e lhos faça logo pagar.

Ficou para 2.ª leitura.

Fez-se 2.ª leitura de uma indicação do Sr. Soares Franco, em que propunha que sendo de urgencia o classificar-se e dar-se destino á grande quantidade de officiaes regressados do Ultramar, se autorize o Governo para crear uma commissão junto ao Ministro dal guerra da maneira que se explica no capitulo 15 do plano da reforma e organização do exercito. Sobre esta materia disse

O Sr. Freire: - Que se cree a Com missão hão ha duvida nenhuma; mas como he preciso saber as attribuições com que ella deve ser creada, deve haver discussão; e para isso he necessario determinar este negocio para ordem do dia.

O Sr. Feio: - A nossa obrigação, como legisladores constituintes, he organizar a maquina politica, e dar-lhe as leis que a devem dirigir: organizada esta maquina, e estabelecidas estas leis, he tambem da nossa obrigação examinar se ellas são bem executadas, sem com tudo nos intromettermos na sua execução: e tudo o que for sair daqui, he sair das nossas atttibuições; e confundir os poderes. Os ministros de Estado são as molas que põem em movimento a maquina politica: elles devem ser inteiramente livres nas suas acções, para que possão ser responsaveis pelos abusos que fizerem da sua autoridade. Crear uma commissão para dirigir o ministro da guerra na fórma que propõe a indicação, seria suppor, que a este Ministro faltavão os requisitos necessarios para desempenhar as obrigações do seu cargo, e ao mesmo tempo tirar-lhe a responsabilidade. Alem de que se esta commissão he para fazer a classificação dos officiaes que tem vindo da America, eu a julgo inteiramente inutil, porque ou estes officiaes tem corpos a que pertenção, ou não: se os tem, estão accommodados, e não ha providencia a tomar a seu respeito; se os não tem são officiaes sem emprego, e por conseguinte officiaes ociosos; e o maior favor que se lhes póde fazer he contemplalos como licenciados, e mandalos para suas casas com meio soldo. Esta he a unica medida de que nas actuaes circunstancias devemos lançar mão, por ser aquella que offerece menos inconvenientes; por tanto voto que seja rejeitada esta indicação.

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O Sr. Pamplona: - Nós não creámos esta Commissão para auxiliar o ministro, porque elle não seja capaz de servir bem, mas para o auxiliar nos seus trabalhos, porque elle não tem na sua secretaria todas as informações necessarias; e por isso he que he necessario absolutamente dar uma providencia para que haja quem o auxilie.

O Sr. Feio: - Nós estabelecemos um conselho de estado, e os inconvenientes deste estabelecimento já nós principiamos a sentir: e depois desta experiencia quereriamos ainda estabelecer outro conselho para dirigir a cada um dos ministros em particular? E a quem se pedirião contos do bem, ou mal que se fizesse? Ao ministro? Elle diria: a Commissão que vós me nomeastes assim mo aconselhou. A Commissão? Ella diria: nós aconselhamos segundo nossas consciencias; se errámos por falta de inteligencia, não he culpa nossa: he culpa de quem nos elegeu. Por certo que se o Congresso desse um passo tão errado perderia grande parte da gloria que lhe tem adquirido a sabedoria das suas decisões. Insisto por tanto no meu primeiro voto.

O Sr. Araujo Lima: - Eu vou dizer unicamente que a indicação deve ser rejeitada; quando muito peção-se informações ao ministro a respeito destes officiaes, e os soldos com que devem ficar.

O Sr. Lino Coutinho: - Isto he de certo modo crear um conselho de Estado para o ministro da guerra, e este conselho he quem o ha de dirigir; e então como, e sobre quem ha de recair a responsabilidade no caso de obrar mal? Se quizermos tomar u responsabilidade ao ministro, elle dirá, não tenho culpa porque fui assim aconselhado. Vai-se ao conselho, e este diz: eu aconselhei segundo a minha consciencia, e desta maneira não ha sobre quem recaia esta responsabilidade. As outras Commissões que se achão estabelecidas, não são assim; ellas examinão os abusos, e dão parte do que tem achado, mandando ás Cortes, ou ao Governo as suas participações, para se darem as necessarias providencias; porem o que se quer fazer ao ministro da guerra não he o mesmo; he um conselho para o dirigir e não sómente para o informar.

O Sr. Soares Franco: - Sr. Presidente, a maior parte do tempo perde-se porque não seguimos a ordem; acha-se o parecer adiado, e não se deve tratar da sua discussão senão quando V. Exc. haja de marcar dia para este objecto: por tanto reclamo a ordem.

Pondo-se a votos, se esta indicação se havia de tratar em separado do plano da organização do exercito - venceu-se que sim; e logo o Sr, Presidente a deu para a ordem do dia seguinte.

O Sr. Ferrão deu conta de uma representação do prior da Messejana, Joaquim Anastasio Mendes, sobre abusos nos rendimentos e lançamentos das sisas; e pediu que quanto antes se fizesse a segunda leitura do projecto sobre os capitulos geraes, pois que lhe constava querião fazer geral da ordem de... um homem o mais mau possivel, e o qual tem commettido toda a qualidade de furtos; e que por esta razão requeira se dissesse ao Governo houvesse de prevenir este mal.

O Sr. Sarmento: - Admiro-me muito que o honrado membro queira gastar o tempo com objectos desta natureza, quando ha tanta cousa de maior importancia, que ainda se não tem feito, nem se poderá tão cedo concluir. Esta indicação ia abrir uma porta no Congresso, para termos uma invasão de frades, que nos não deixarião tempo para cuidar em outra cousa. Como não instão os objectos desta qualidade, assento que nós devemos deixar de tratar delles presentemente, a fim de continuarmos com o que já está destinado para emprego do nosso tempo.

O Sr. Ferrão: - São dez mil cidadãos que tem tanto direito como outros quaesquer a fazer-se-lhes justiça.

O Sr. Trigoso: - Os frades que são verdadeiramente frades sujeitão-se aos capitulos geraes, e os que se não querem sujeitar, saião para fora.

O Sr. Osorio: - Os que reclamão contra os capitulos são os maus frades, e nunca as ordens todas, porque não supponho que uma ordem seja toda má; isto he contra as leis canonicas, e este Congresso não se deve intrometter agora nisso.

O Sr. Bispo de Beja pediu a resolução do Congresso sobre o requerimento que apresentou o Sr. Ferrão, e decidiu-se que passasse á Commissão de fazenda.

O Sr. Barroso offereceu a seguinte

INDICAÇÃO.

Pelo decreto de 28 de, Julho de 1816, e pelas regulações que o acompanharão, se mandou contemplar os officiaes de segunda linha com a cruz de campanha concedida aos officiaes da primeira linha, e 100 cruzes para os officiaes inferiores e soldados. Nesta conformidade se pedirão aos corpos da segunda linha as precisas relações iguaes aos modelos remetidos em officio do ajudante general primeira e segunda vez; e consta que geralmente se satisfez, e que o governador das armas do partido do Porto remettêra as que pertencião aos oito regimentos do seu districto em 3 de Abril de 1819. Não póde duvidar-se de que grande parte dos corpos de segunda linha tem um rigoroso direito á cruz de serviço de campanha, e que toda a demora alem de ser injusta he summamente impolitica, porque tende a descontentar a classe mais interessante da Nação, na qual reside a principal força fisica e moral do actual sistema, e para o qual ella concorreu tão energicamente.

Proponho por tanto que se recommende ao Governo mande immediatamente publicar a relação dos officiaes de segunda linha a quem compete aquelle honorifico distinctivo, removendo quaesquer obstaculos ou difficuldades, e não obstante a falta da relação de alguma provincia, porque ella não deve fazer demorar a publicação das que já estiverem apuradas. - Francisco Barroso Pereira.

Terminada a leitura, disse

O Sr. Pamplona: - (Não o ouviu o taquygrafo Leiria).

O Sr. Borges Carneiro: - Eu não posso deixar de dizer que se tem feito aos milicianos uma grande

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injustiça em lhes ter demorado tantos annos, per não dizer negado, o uso da insignia honorifica, que o decreto de 1816 lhes concedeu. Será isto porventura tambem por não haver dinheiro? A uma classe tão illustre, que militou á sua custa, e fez na guerra passada serviços tão assignalados, como he possivel que se esteja negando ha 6 annos uma cruz honorifica, que ella tão vivamente tem solicitado, por isso que lhe foi promettida? Tenho ouvido que o decreto he escuro. Ora seis annos a interprelado, já póde estar bem interpretado! Repito pois que isto he uma injustiça que se tem feto a estes corpos benemeritos, e que cumpre já reparala.

O Sr. Freire: - Eu estive encarregado deste ramo por muito tempo, e sei as difficuldades que tem havido. Desde 1815 tem-se feito as maiores diligencias possiveis para isto se effectuar, porem não só tem conseguido. Os generaes das provincias mandarão sempre as relações erradas, e deve haver lodo o cuidado em se não dar este distinctivo a quem o não merece, privando-se delle aquelles a quem na realidade compete. Nos corpos da primeira linha já houve muita difficuldade na execução desta lei, quanto mais a respeito dos corpos da segunda linha. Ella parece ser feita de proposito para nunca se executar; he pois necessario que não passe o principio de que se tenhão maltratado os benemeritos milicianos; a difficuldade he da lei, e quando aqui se apresentar o parecer da Commissão eu medrarei os immensos defeitos que ella tem.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu não digo que o Governo tem tido intenção de maltratar os milicianas; porem digo que na realidade selem praticado uma injustiça para com elles: pois se o decreto he escuro, seis annos he tempo bastante para ser declarado, e desembaraçado. A respeito da primeira linha não houve essa difficuldade.

O Si. Moura: - Se o Congresso he que tem feito esta injustiça, eu convido o illustre Preopinante a que haja de a explicar para irmos todos remediala, e nos ajudarmos das luzes, bom senso, e rectidão do illustre membro em perseguir injustiças. Vejamos o caso, o Governo remetteu o parecer ao Congresso, o Congresso o dirigiu á Commissão, e esta se acha trabalhando neste objecto. E o illustre Preopinante diz ter havido injustiça no caso: onde está ella? Eu requeiro que a declare; porque nós aqui estamos para a remediar. Sobre os meios de aplicar o remedio, logo falaremos: tratemos agora só de descobrir essa grande injustiça de que só fala.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu já disse em que ella está, e quem a commette.

Poz o Sr. Presidente a votos a indicação, e decidiu-se que fosse remettida com urgencia á Commissão militar.

O Sr. Ledo offereceu o seguinte

Projecto de decreto.

Sendo de grande utilidade para os progressos da agricultura, industria, e commercio de qualquer nação a existencia de bancos publicos, que pondo em giro muitos e differentes capitães animem e fecundam os diversos ramos da riqueza do Estado, não podem Governos paternaes deixar de promover a duração, vigor e prosperidade de similhantes estabelecimentos por todos os meios, que ficarem ao seu alcance: e como o banco do Brazil examido de forças vitaes pelas avultadas sommas com que occorreu ás despezas daquelle Estado, sinta ameaças de grave ruina, na qual deve necessariamente ser envolvida toda a provincia do Rio de Janeiro, ou talvez grande parte do Brazil; e nestas circunstancias seja da imprescriptivel obrigação dos que dirigem o leme do Estado occerrer ás desgraças que possão ser fataes a qualquer parte da nação.

As Cortes geraes, extraordinarias, e constituintes da Nação portugueza animadas do inalteravel desejo de contribuir, quanto poderem, para a manutenção, solidez, e actividade de todos os estabelecimentos, de que pende a riqueza, e prosperidade do Estado, decretão o seguinte:

I. Fica reconhecida como divida nacional, aquella que se liquidar ter sido contraida pelo Estado com o banco do Brazil.

II. A liquidação desta divida será feita por uma commissão composta de membros, parte nomeados pela junta da fazenda do Rio de Janeiro e parte pela junta da direcção do banco.

III. He consignada, para pagamento do capital e juros desta divida, a parte dos rendimentos das alfandegas do Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, e Maranhão que se julgar equivalente á quota annual de dez por cento sobre o total liquido da divida; a qual será distribuida pelas quatro alfandegas precedendo as necessarias informações, na proporção que melhor convier ao seu rendimento, e ás forças da respectiva provincia; com tanto que a consignação não exceda á quarta parte do rendimento de cada uma das alfandegas.

IV. A junta da fazenda do Rio de Janeiro fica autorizada para entender-se com as juntas da fazenda da Bahia, Pernambuco, Maranhão, naquillo que for relativo unicamente á promta execução do presente decreto.

V. A consignação aqui decretada a favor do banco do Brazil commeçará a verificar-se do 1.º de Julho do corrente anno.

Paço das Cortes em 6 de Março de 1822. Offerecido por Custodio Gonçalves Ledo.

Remetteu-se á Commissão de fazenda do Ultramar.

Sendo chegada a hora da prolongação, continuou a discussão do projecto para a extincção da intendencia geral da policia (v. a sessão de 27 de Fevereiro ultimo). A este respeito disse

O Sr. Sarmento: - Acabando de testemunhar a bem entendida economia, que pretendemos observar no tempo que se deve empregar nas discussões, sómente peço licença para fazer uma reflexão. Parece-me que deveremos chamar a questão a um ponto primeiramente, e he se deve existir, ou não a intendencia geral da policia. Peço a discussão deste ponto, porque eu lancei este projecto, de modo que ven-

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cendo-se que a intendencia geral da policia não seja abolida, todos os artigos, principiando do 2.º por diante, são inuteis, e eu mesmo pedirei nesse caso licença, para os retirar, porque o que eu pretendo neste projecto não he a admissão da mesma cousa com outro nome. pois antes prefiro cousas novas com nomes velhos. Responderei ás objecções que se fizerem, se eu poder.

O Sr. Vicente Antonio: - (Não o ouviu o taquygrafo.)

O Sr. Gouvca Osorio: - Eu quando vi este projecto assentei que se acabava de uma vez a policia; porem vejo que no 1.° § diz: passarão as attribuições de que a mesma se adia encarregada para outras repartições. Logo existe a intendencia só com differença de nome. Eu noto que quando aqui se tratou do ministro dos negocios do Reino se disse, que elle não podia com tanto trabalho, e agora havemos de augmentalo? Se eu visse que este projecto dava um regimento ás leis da policia, bem estava; porem não he assim: elle sómente lhe substitue o nome. Por conseguinte digo que he de muita necessidade o existir como até agora, porque o mais he só mudar as pessoas.

O Sr. Soares Franco: - Duas questões se podem tratar aqui: primeira se deve ser abolida ou não a intendencia; segunda se no caso de ser abolida deverá ser substituida ou não. A intendencia olhada pelo lado da sua instituição he contraria ao systema constitucional, e um monstro que foi creado no tempo do Marquez de Pombal para incutir aos povos um grande terror; porem este projecto acha-se inteiramente em contradicção com sigo mesmo, porque começa aqui por dizer que he necessario separar o poder contencioso do poder da policia, e vemos mais abaixo estes dois objectos involvidos porque diz (leu): por conseguinte o meu parecer he que pela seja abolida; não ha ninguem que não conheça que este estabelecimento carecia de uma reforma, nós temos um exemplo da sua relaxação nesse Sandoval que julgo que até teve passaportes para passar para a Hespanha; tem estado peior do que estava antes do novo systema. As leis que ternos de policia são muito boas, e deve cada um dos ministros dos bairros ser responsaveis pela sua execução. Não approvo que se incumba ao ministro de Estado porque então seria accumular os poderes, e em quanto os outros attribuições da policia, como são casa pia, limpeza da cidade etc. para isto não he necessario que exista intendencia; a casa pia deve ter um administrador; a limpeza ser arrematada; e da mesma fórma deverá ser divididos os mais objectos. Os ladrões, em lugar de terem um inimigo na intendencia, tinhão nella um apoio; elles sabem as ordens e cuidão logo na sua segurança: por tanto voto pela sua abolição.

O Sr. Borges Carneiro: - Não tratarei já se deva ou não extinguir-se a intendencia geral da policia; e no caso de se extinguir, para onde hão de passar as suas muitas attribuições. Limito-me sómente a falar sobre o modo como se deva nisso proceder, sobre os primeiros artigos do projecto relativos á segurança publica. A intendencia pela lei do 1763 tem debaixo da sua inspecção e jurisdicção os crimes de conventiculos, mortes, insultos, roubos, e outros que pelas anteriores leis pertencião aos corregedores e ministros dos bairros. Estes hoje sómente fazem dellas participações ao intendente, e debaixo das suas ordens formão a culpa e summarios que são remettidos ás relações. O que por disposições posteriores se ampliou a todo o Reino. Os juizes pois, tendo perdido a jurisdicção criminal, são meros mandatarios do intendente, e não podem fazer nada senão debaixo das suas ordens. Ora vê-se bem quanto isto seja monstruoso, e eu opinaria que tudo se restituisse ao pé em que se achava antes de 1760. Porem para se declarar revogada esta jurisdicção da intendencia da policia he necessario primeiramente derogar e alterar muitissimas leis que ha sobre este objecto: restituir-se aos juizes a plenitude da sua jurisdicção, sendo sómente obrigados a dar parte dos casos graves aos presidentes das relações, á secretaria da justiça, ou a outra autoridade competente; mas só depois de uma Commissão ter examinado todas as ditas leis, e formado um projecto que ponha em andamento seguido o exercicio da jurisdicção criminal, he que se poderá tratar esta materia com proveito: pois supprimir a intendencia sem se haver formado uma lei que regule tudo o sobredito, he pôr em perigo a segurança publica, e a individual, principalmente em Lisboa.

O Sr. Sarmento: - Sr. Presidente, vejo que eu sou muito infeliz, porque nem se quer o que eu escrevo se entende. Abstive-me de falar, para economizar o tempo que nos he tão preciso. Já na Sessão antecedente tu dei as explicações para intelligencia da artigo segundo do projecto, e pareceu-me que o illustre membro, o Sr. Trigoso ficara satisfeito; e vejo hoje que outro illustre Deputado torna a apresentar as mesmas duvidas, e por tanto sou obrigado a declarar que não he minha intenção que das participações feitas ao Ministro da justiça pelos ministros criminais, tanto da capital, como dos mais districtos do Reino, se sigão ordens emanadas do referido ministerio, como pela Intendencia geral da policia, ou seja para devassas de commissão, ou para summarios. Ninguem póde duvidar que o Governo, a quem esta encarregado o cuidado da segurança publica deve ser regularmente informado de todos os acontecimentos notaveis; isto não he dar ingerencia ao poder executivo, para se intrometter nas operações do poder judicial, nem he tirar aos magistrados criminaes aquella autoridade, que eu desejo, e he a monte do projecto, se lhes torne a dar, abolindo-se a Intendencia geral da policia, que a tem usurpado. Igualmente não deverá causar espanto ao Deputado Sr. Gouvêa Osorio, que o Ministro dos negocios do Reino fique incumbido da superintendencia do estabelecimento da casa pia, e o mais que se refere ao artigo do projecto: esta distribuição foi calculada, segundo a natureza dos negocios, que a lei da divisão das Secretarias de Estado marcou para cada uma dellas. Tudo o que se encarrega á camara de Lisboa he visivelmente pertencente a objectos de verdadeira economia municipal: não só a illuminação da cidade, como o concerto decalcadas, cuidado das fontes, da limpeza,

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e tudo o que até ao presente ninguem duvidou ser proprio do cuidado das camaras. Sendo ellas compostas de cididãos escolhidos veremos as das mais limpas, e não seremos infestados pelos animaes mortos pelas ruas. Em qualquer povoação conviria entregar estes objectos ao zelo dos seus moradores, porem em nenhuma isto he mais conveniente do que em uma populosa cidade, como Lisboa, aonde por mais diligente que seja um magistrado, nunca poderá fazer uma inspecção como um corpo de cidadãos autorizados para esse fim. Não foi o espirito de curiosidade, nem o amor da novidade, quem me excitou a apresentar este projecto. Eu já fui magistrado de policia porque fui seu delegado na provincia de Trás-os-Montes. Não sei o que eu sempre achei nos processos summarios; achava-os faltos de certas formalidades, que sempre eu julgarei necessarias, para assegurar á liberdade do cidadão, porque mo parecerá sempre que qualquer que for processado de um modo pelo qual evitar algum requisito legal, póde innocentemente soffrer. Por mais cautelas, que se estabeleção, e por mais probidade de que seja dotado alguem revestido com poderes tão consideraveis, eu tremo de similhante magistratura: Mr. de Malesherhes, nome tão respeitado na historia moderna, sendo Presidente da Cour des Aides, conheceu os abusos das Lettres de Cachet; porem sendo chamado, para o ministerio de Luiz XVI, reconheceu a necessidade de consertar aquelle poderoso instrumento de um governo arbitrario: os seus panegyristas dizem que as precauções, que elle tomava no uso das Lettres de Cachet, são um monumento da sua sabedoria. Eu não poderia descobrir um exemplo de um magistrado mais probo; porem nelle vemos o que he o despotismo, o qual constrange os mais virtuososos magistrados a seguirem procedimentos arbitrarios, e contrarios ao dictame do seu proprio coração. Ha mais uma razão, para extinguirmos uma instituição, que he talvez a unica hoje na Europa. Em França, aonde a mesma Charta Real não offerece uma Constituição tão liberal como a nossa aboliu-se já a policia! O Imperador da Russia, que governa um vasto imperio sem Constituição, e tem um poder absoluto extinguiu em 1819 a policia! E seremos nós incoherentes com os principios politicos, que temos adoptado, admittindo todas as formas democraticas, que são possiveis em uma monarquia, deixando ao mesmo tempo instituições dignas de um governo absoluto? Estes são os motivos, porque apresentei este projecto. Quer o Sr. Borges Carneiro que este projecto vá a uma Commissão, a fim de que elle se organize melhor: eu convenho com a opinião do illustre Deputado, porque sou o primeiro em me persuadir de que o projecto ha de estar muito imperfeito; e até me parece que não será preciso uma Commissão; bastará que elle seja corregido pelo illustre Deputado, e então apparecerá o projecto, como obra sua, e augmentará a collecção de excellentes projectos, e indicações que o illustre Deputado tem apresentado.

O Sr. Borges Carneiro. - Eu quando falo em uma commissão, he uma commissão de fora das Cortes, e o mesmo digo relativamente ao desembargo do paço, meza da consciencia, etc.; e eis-aqui o que eu quereria se applicasse para o presente caso, e quando muito se lhe desse uma base. O Congresso acha-se muito sobrecarregado de trabalho, o que todos sabem, e assim nomeando-se tres membros para cada uma destas commissões, estes poderão em breve apresentar ao Congresso o resultado de seus trabalhos.

O Sr. Vicente Antonio: - (Não o ouviu o taquygrafo Leiria).

O Sr. Vasconcellos: - Parecerá talvez atrevimento o eu falar em uma materia tão alheia da minha profissão; porem sempre quero dizer a minha opinião. A intendencia geral da policia da maneira que se acha, não póde subsistir; tambem quanto ao Ministro de Estado, acho muito perigoso que um homem só exerça similhante autoridade; porem tambem deve haver um centro commum, e a minha opinião he que este centro commum seja o supremo tribunal de justiça, e na relação da corte.

Sendo chegada a hora de levantar a sessão, decidiu-se que ficasse adiado o projecto.

Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia o projecto sobre as secretarias, e a indicação do Sr. Soares Franco supramencionada; e os pareceres adiados da Commissão de fazenda.

Levantou-se a sessão ás duas horas da tarde. - Francisco Xavier Soares de Azevedo, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para José da Silva Carvalho.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza, attendendo ao que lhes foi representado pelo marechal de campo Felisberto Caldeira Brant Pontes, ácerca de uma portaria da junta provisoria do governo da Bailia datada em 15 de Setembro de 1821, pela qual depois de avocados os autos de execução pendente, em que o supplicante litigava com Manoel Duarte da Silva, sobre um engenho de assucar, se ordenou que o ouvidor geral do civel fizesse, sem admissão de duvidas ou obstaculo algum, executar immediata e inviolavelmente a sentença proferida na casa da supplicação, que condemnou o supplicante a restituir o mencionado engenho com os respectivos rendimentos, mettendo de posse o exequente, e ficando direito salvo aos litigantes para proseguirem na liquidação das bemfeitorias, e rendimentos a que se julgassem com direito: resolvem que fique revogada a citada portaria de 15 de Setembro, sendo os litigantes restituidos ao estado em que então se achavão, quando a junta mandou avocar os autos por portaria de 17 de Junho de 1821; e que depois de feita exactamente esta restituição, fiquem entregues á autoridade judicial, para seguirem os termos do seu litigio, e os recursos que as leis lhes facultarem. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 6 de Março de 1822. - João Baptista Felgueiras.

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Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor: - As Corteis Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão remetter ao Governo o incluso officio da junta provincial do governo da provincia de Minas Geraes, em data de 18 de Novembro de 1821, dando parte do procedimento que tivera com o ex-ouvidor da comarca do Ouro Preto, Francisco Garcia Adjuto, e remettendo a devassa a que a respeito delle mandara proceder pelo ouvidor interino da comarca do Rio das Velhas José Antonio da Silva Maia.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 6 de Março de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para André da Ponte de Quental da Camara.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza concedem a licença que V. Sa. pede por tempo de quinze dias para tratar da sua saude. O que participo a V. Sa. para sua intelligencia.

Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 6 de Março de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 7 DE MARCO.

ABERTA a sessão, sob a presidencia do Sr. Varella, o Sr. Soares de Azevedo leu a acta da antecedente sessão.

O Sr. Lino: - Tenho a fazer uma reflexão sobre a acta a respeito da indicação do Sr. Borges de Barros: e he que a discussão e votação foi sobre a materia em geral; e perguntando o Sr. Presidente depois, foi então que o seu autor disse, que elle consentia naquillo mesmo.

O Sr. Freire: - O illustre Membro estava por 2 emendas que aqui se fizerão; uma era essa dos dois terços, que era conveniente se tirasse; e a segunda foi em passar ao lugar do artigo 6.° o artigo 1.°: e de boamente se conveio nisto; o que se póde fazer he que o autor emende a sua indicação, querendo.

O Sr. Pereira do Carmo: - O Sr. Borges de Barros emendou a sua indicação mesmo vocalmente.

O Sr. Lino Coutinho: - De facto a emendou; pois publicamente disse no Congresso que estava por dia.

O Sr. Soares de Azevedo: - Eu lancei na acta á mesma indicação do Sr. Borges de Barros, tal qual estava concebida: e eu como Secretario, não podia de modo algum emendar a indicação do Sr. Deputado: a acta diz dota maneira: (leu-a) a indicação dó Sr. Deputado falava do titulo 6; e por isso eu escrevi na acta na fórma que se decidiu.

O Sr. Borges de Barros: - Convenho nisto mesmo.

O Sr. Freire leu a indicação do Sr. Borges de Barros.

O Sr. Xavier Monteiro: - A indicação póde ser escrita de qualquer maneira que se pretenda, sem que disso haja inconveniente; porem o que se venceu não foi a indicação. O que se venceu foi, que se adiasse por ora esse titulo; e isto he o que se poz á votação. A indicação póde por tanto encerrar outra differente doutrina, com tanto que esteja exacto na acta o que se vencer.

O Sr. Presidente: - Essa indicação ficou para o fim da Constituição.

Approvou-se a acta da Sessão antecedente.

O Sr. Secretario Felgueiras mencionou o expediente seguinte.

Um officio do Ministro das justiças, enviando a informação, que dirigirão os frades da Ordem de S. Paulo primeiro eremita, em resposta aos quesitos, que forão feitos ao prelado maior em 17 de Outubro do anno passado. A' Comissão ecclesiastica de reforma.

Um dito do Ministro da fazenda, remettendo o resultado da averiguação, a que se procedeu, sobre os trabalhos da junta da revisão, consolidação, é liquidação estabelecida na capitania do Rio de Janeiro pela carta regia de 21 de Outubro de 1800. A' Commissão competente.

Mais do Ministro dos negocios estrangeiros o seguinte officio.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - Convencido o Governo Britanico da injustiça da maior parte das tomadias feitas pelas suas forças navaes ao commercio portuguez com o pretexto de illicito trafico de escravatura, calculou que era do seu interesse pôr á dispozição do Governo Portuguez a quantia de 300 mil libras esterlinas, em que avaliou a totalidade das perdas e damnos para indemnização das pessoas que se mostrassem lesadas.

Feitas estas legalizações perante a junta do commercio do Brazil, e pagos daquellas 300 mil libras os capitães que cada uma das pessoas lesadas justificou ter perdido, sobrava ainda uma somma consideravel, e entrou em duvida na junta do commercio se estas sobras se devião dividir, e todas pelos interessados á proporção dos capitães que a cada um se acabava de embolçar: ou se dando-se-lhes como equivalentes de juros e lucros trinta por cento a cada um se deverião reputar por indemnizados, cedendo a quantia que restasse a favor do publico Thesouro.

Sendo este ultimo o parecer do tribunal, e tendo Sua Magestade havido por bem conformar-se com elle, expediu o ministro, que então era dos negocios estrangeiros, ordens ao enviado de Sua Magestade em Londres para que das mencionadas sobras, deduzidos os trinta por cento dos capitães julgados ás pessoas lezadas, pagasse aos empregados dó corpo diplomatico e consular o que se lhes estava a dever de mais de oito mezes de seus ordenados, e despezas das respectivas Secretarias.

Tal era o estado deste negocio pelos fins do anno de 1820, mas entrando eu no ministerio em 26 de Fevereiro seguinte levei á presença de Sua Magesta-

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