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SESSÃO DE 27 DE DEZEMBRO DE 1884 57

serviços, nem aproveitados, talentos e capacidades. Estas considerações levaram o governo a propor que podesse ser nomeado um par na proporção de cada tres vacaturas que occorressem. Infelizmente a duração da vida é curta, e o tempo encarregar-se-ha de reduzir a camara ao seu estado normal, sem intervenção das leis humanas.

Todos Sabem que na camara dos lords em Inglaterra ha pares por direito proprio, pares inglezes hereditarios nomeados pelo soberano, pares escocezes eleitos pelos pares de Escocia para cada legislatura, e sujeitos á renovação quando o parlamento é dissolvido, e pares irlandezes vitalicios eleitos pelos pares que formam a nobreza de Irlanda. O soberano na Gran-Bretanba nomeia pares inglezes hereditarios sem numero fixo; não póde porém nomear pares de Escocia. Emquanto á Irlanda só podo crear pares em duas hypotheses: a primeira nomeando um por cada tres vacaturas ; a segunda quando o numero de pares irlandezes desce do numero de cem. Por aqui se vê que a disposição do artigo não é sem precedente.

Na proposta que o governo teve a honra de apresentar às cortes em 30 de janeiro do anno corrente, indicava-se como necessitando reforma o artigo 26.° da carta, não só porque, estando abolida entro nós a pena capital, era indispensavel harmonisar o preceito do artigo com a legislação do paiz, mas porque a opinião imparcial e desapaixonada se tem rebellado, por vezes, contra a impunidade resultante da interpretação que se tem dado áquelle artigo, embora estes casos tenham sido excepcionaes, e taes consequencias não estivessem de certo na mente do legislador.

No intuito de aperfeiçoar á obra do governo, e tornar effectiva e realisavel a sua idéa, entenderam as commissões parlamentares que as disposições do artigo 27.° careciam tambem de ser alteradas, e assim o determinou a lei. O pensamento que dictou a inclusão do artigo 27.° entre aquelles que devem ser revistos foi o de tornar effectiva a responsabilidade de quaesquer membros das cortes, que tenham commettido um delicto. A dificuldade de formulai-os respectivos preceitos consiste principalmente na escolha das disposições a adoptar, para que o crime possa sempre ser punido, sem que a inviolabilidade parlamentar possa ser affectada por qualquer modo. De um lado está o codigo penal, e o principio de que todos são iguaes perante a lei, combatendo o privilegio; do outro lado estão a liberdade, e o uso da palavra e do voto que não deve ser interrompido aos representantes da nação, e o receio de ciladas e ardis politicos, a que podo dar logar o estabelecimento do direito commum sem restricção alguma.

Ha duas espécies de inviolabilidade, pelo que diz respeito aos pares e deputados, a que se refere ao abuso da palavra no exercício de suas funcções parlamentares, e a que se estende aos crimes e delictos que possam ter commettido. Emquanto á primeira, todas as constituições estão de accordo em a manter, e a nossa carta a preceitua expressamente no artigo 25.°; a segunda póde dizer-se que entrou em todos os codigos politicos com a restricção apenas do flagrante delicto, sem distincção alguma.

A inviolabilidade dos deputados proposta por Mirabeau na tribuna franceza foi consignada na constituição de 1791, e d'ahi passou successivamente para outras constituições da Europa e America. Desde os paizes mais conservadores até às republicas mais democraticas, nenhuma deixa de consignar o principio da inviolabilidade dos senadores e deputados; varia, porém, a forma por que se referem aos crimes communs, e sobretudo ao flagrante delicto, que é geralmente exceptuado. Em todas as constituições que a Franca tem tido até á que rege aquella nação na actualidade inclusivamente, o flagrante delicto está fora do privilegio, dependendo sempre a continuação do processo de auctorisação da respectiva camara durante a sessão, ou mesmo durante a legislatura, se assim o julga conveniente. Na. Austria, na Prussia, na Belgica, na Baviera, e em quasi todas as nações da Europa disposições similhantes regem o assumpto.

Nos Estados Unidos os, senadores e deputados não podem ser presos durante a sessão, nem quando vão para o parlamento, ou voltam para os seus domicilios, excepto nos casos de flagrante delicto ou de traição, felonia ou perturbação da paz publica. Na Gran-Bretanha a disposição é a mesma, porém os lords têem o privilegio de não poderem ser presos por dividas, e os deputados igualmente; porém sómente durante a sessão e no praso de quarenta dias antes ou depois d'ella. Na Grecia estende-se a inviolabilidade nos mesmos termos ate quatro mezes depois da sessão. Na Bulgaria sómente se admitte a prisão dos deputados por crime a que corresponda pena muito grave. No Brazil o preceito é identico ao da nossa carta.

Servem as rasões e exemplos expostos para mostrar a necessidade de alterar os artigos 26.° e 27.° da carta, e justificar o sentido dessa alteração. Querendo harmonisar nesta parte a nossa legislação com as estranhas, salvaguardando as immunidades parlamentares, sem consentir na impunidade, seria logico fazer excepção do principio, que é um verdadeiro privilegio, embora dictado pelo interesse publico, nos casos de flagrante delicto, sem distincção alguma. Como, porém, os abusos, que podem escandalisar a opinião, não consistem tanto na falta de prisão immediata, como na falta do julgamento, propomos que no artigo 26.° se diga flagrante delicto por crime que não esteja sujeito a penas maiores; e no artigo 27.° se preceitue em todo o caso a continuação do processo pendente, conforme a resolução da respectiva camara, para o intervallo das sessões ou para o fim da legislatura.

O artigo 1.° e seu paragrapho da proposta que temos a honra do apresentar consigna dois princípios geralmente acceitos pela nossa jurisprudencia parlamentar, que se encontram expressos em varias constituições, mas que não estão na nossa carta. Diz-se ali que os pares e deputados são representantes da nação e não do Rei que os nomeia ou dos circulos que os elegem; e prohibe-se o mandato imperativo. A primeira d'estas disposições é filha da unidade politica do paiz, e imprime ao parlamento o caracter de representação nacional; a segundada aos seus membros a independencia e a liberdade do voto, e portanto a responsabilidade moral dos seus actos.

A reforma do artigo 28.° da carta e uma necessidade desde que na camara dos pares se introduz o elemento electivo. Emquanto os pares eram exclusivamente de nomeação regia, e os deputados da eleição popular, comprehendia-se a doutrina ali consignada, embora assentasse num principio do desconfiança que nada justifica. Mudando a natureza da camara alta, tem de mudar igualmente a disposição que regulava numa hypothese differente.

E pois que tem de alterar-se o artigo, o que o artigo 31.° da carta extrema as funcções essencialmente politicas do ministro d'estado e do conselheiro d'estado, das que são inherentes a todos os outros empregos publicos, determinando que aquellas não cessem emquanto durarem as funcções de pares ou deputados, parece justo que a esta excepção corresponda a outra de não perderem as suas cadeiras aquelles que forem nomeados para tão altos cargos politicos, visto que se não póde presumir que à confiança do Rei seja incompativel com a confiança da nação.

Tendo a lei declarado sujeitos á revisão o artigo 74.ºos §§ 1.°, 4.° e 7.° do mesmo artigo, foi aqui introduzido o principio da responsabilidade dos ministros pelos actos do poder moderador.

Antes de estar escripto na lei fundamental este principio, nenhum ministro constitucional recusou tomar a responsabilidade inherente á sua assignatura na referenda dos actos d'aquelle alto poder do estado. Se o espirito da carta não fosse esse, não teria sido interpretado assim constantemente pelo facto que resulta da referida assignatura.