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SESSÃO DE 25 DE JANEIRO DE 1881

Presidencia do exmo. sr. José Joaquim Fernandes Vaz

Secretarios - os srs.

Thomás Frederico Pereira Bastos
Antonio José d'Avila

SUMMARIO

A requerimento do sr. Castro Monteiro entra em discussão, e é aprovado, o parecer n.° 18, ácerca de uma alteração feita na camara dos dignos pares ao projecto de lei n.º 88 na sessão legislativa passada. - O sr. ministro da fazenda apresentou um projecto de lei, legalisando um excesso de despeza feito pelo seu ministerio. - Alguns srs. deputados dirigem perguntas ao governo; respondem os srs. ministros.

Abertura. - Ás duas horas e um quarto da tarde.

Presentes á chamada 75 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão os srs.: - Adriano Machado, Sarrea Prado, Rodrigues Ferreira Sousa e Silva, Azevedo Castello Branco, Antonio Candido, Fialho Machado, Ribeiro Ferreira, Antunes Guerreiro, A. J d'Avilla, A. J. da Rocha, Bigotte, Arrobas, Pessoa de Amorim, Xavier Torres, Filippe Simões, B X. Freire, Conde de Sabugosa, Diogo de Macedo, Emygdio Navarro, Hintze Ribeiro, Evaristo Brandão, Francisco Beirão, Cunha Souto Maior, Castro Monteiro, F. J. de Medeiros, Pereira Caldas, Gomes Barbosa, Simões Carneiro, Ressano Garcia, Gaudencio Pereira, Guilherme de Abreu, Henrique de Macedo, Ignacio do Casal Ribeiro, Pires Villar, Candido de Moraes, João Chrysostomo, Scarnichia, Burros e Cunha, Sousa Machado, J. A. Neves, Almeida e Costa, Oliveira Valle, Joaquim Tello, Paes de Abranches, Simões Ferreira, Bandeira Coelho, Barbosa Leão, Pereira e Matos, Garcia Diniz, Abreu Castello Branco, Fernandes Vá, Rodrigues de Freitas, Oliveira Baptista, Lemos e Napoles, Ferreira Freire, Nogueira, Simões Dias, Abreu e Sousa, Julio Rainha, Julio de Vilhena, Mancellos Ferraz, Bivar, L. J. Dias, Luiz Jardim, Luiz Oliva, Celestino Emygdio, Almeida Brandão, Penha Foi tuna, Aralla e Costa, Pereira Dias, Marianno de Carvalho, Miguel do Noronha (D) Dias de Freitas, Pedro Franco, Theotonio Paim, Thomás Ribeiro, Thomás Bastos, Visconde de Arneiros, Visconde das Devezas, Zophimo Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Alfredo de Oliveira, Antonio Ennes, Guimarães Pedroza, Tavares Crespo, Maziotti, Ferreira do Mesquita, Eça e Costa, Mello Gouveia Saraiva de Carvalho, Victor dos Santos, Xavier Teixeira, Barão de Combarjua, Carlos Ribeiro, Pinheiro Jorges, Eduardo J. Coelho, Elvino do Brito, Sousa e Serpa, Pinto Basto, Goes Pinto, F. J. Teixeira, Feinando Caldeira, Vanzeller, Barros Gomes, Baima de Bastos, Melicio, Izidro dos Reis, Gallas, Vieira de Castro, Alfredo Ribeno Alves Matheus, Gusmão, Sousa Lixa, Dias Ferreira, Laranjo, José Luciano, J. M. dos Santos, Lopo Vaz, Pinheiro Chagas, Pedro Robeiro, Visconde da Arriaga.

Não compareceram á sessão os srs.: - Guerra Junqueiro, Albino das Neves, Alexandre de Aragão, Alipio de Sousa Leitão, Braamcamp, Alves Carneiro, Alves da Fonseca, A. A. de Aguiar, Soares de Azevedo, Barão de Paçô Vieira, J. A. de Sepulveda, Ornellas e Matos, Jorge de Mello (D.), Homem da Cotta Brandão, José Guilherme, Rodrigues de Carvalho, Macedo Sotto Maior, Nobre de Carvalho, Pedro Monteiro, Visconde de Bousões.

Acta. - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio da fazenda, acompanhando 120 exemplares do relatorio do tribunal de contas, que diz respeito ás contas do thesouro, dos ministerios e da junta do credito publico com relação ás gerencias de 1875-1876 e 1876-1377.

Mandou-se distribuir.

Do ministerio das obras publicas, para que da secretaria da camara dos senhores deputados só remetta um exemplar impresso do todos os projectos, paraceres e mais documentos, parlamentares sobre assumptos da competencia d'aquelle ministerio, a fim do se satisfazer á proposta feita ao governo pela Jogarão do reino de Italia da troca de publicações officiaes.

Cumpra-se.

Representações

Dos escriturarios do escrivão de fazenda do concelho de Villa Nova de Foscôa, no districto da Guarda, pedindo que a proposta do lei apresentada pelo sr. ministro da fazenda em sessão de 10 do corrente seja modificada de forma que sejam classificados aspirantes de segunda classe das repartições de fazenda.

Apresentada pelo Sr. deputado Luiz Oliva e enviada á commissão de fazenda.

Dos escripturarios do escrivão de fazenda do concelho de Pinhel, no mesmo sentido da antecedente.

Apresentada pelo sr. deputado Luiz Oliva e enviada á e fazenda.

Segunda leitura Projecto de lei

Senhores. - O chefe da repartição dos medidores da praça do commercio de Lisboa foi, pelo artigo 7.° da carta de lei de 18 de março de 1875, equiparado em categoria aos terceiros officiaes das alfandegas maritimas de primeira classe.

A commissão de fazenda da camara dos senhores deputados, no seu parecer de 3 de fevereiro de 1870 (pertence ao n. ° 16) declara que é sua opinião que o direito do aposentação póde e deve (sic) ser concedido a este empregado, mas que esta doutrina deve ser consignada quando "e tratar da organisação da caixa de pensões.

O serviço da medição official é da maior conveniencia publica, por isso que regula as relações entre os donos dos navios e os carregadores, e é gratuito para o estado, que nenhum vencimento dá aos empregados desse serviço, sendo aliás pesadissimo, para estes, por isso que dura de sol a sol e obriga-os muitas vezes a fortes indemnisações do seu bolso, quando ha qualquer erro nas medições.

Por todas estas rasões e porque não é justo que o estado deixe na miseria um funccionario que prestou serviços importantes durante longos annos, quando porventura envelheça e se impossibilite, tenho a honra de submetter ao vosso esclarecido exame o seguinte:

Artigo 1.° Ao actual chefe dos medidores da praça do commercio de Lisboa é concedido o direito de aposentação nas mesmas condições, e com as mesmas clausulas, direitos e vantagens que a lei marca para os segundos officiaes da alfandega de Lisboa.

Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 21 de janeiro de 1881. = João Candido de Moraes

Foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

O sr. Pereira Caldas: - Pedi a palavra para rogar ao sr.
ministro da marinha o obsequio de me dizer se s. exa. tenciona apresentar ainda n'esta sessão uma proposta de lei tendente a regular a pesca, das armações nas costas do

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Algarve, ou fazer publicar um regulamento que sirva de guia aos que exercem esta industria, e tendente a evitar as continuadas luctas e contestações que quasi sempre se levantam entre os differentes interessados.

O que me pareço fóra de duvida é que a portaria, ou portarias, que regulam este assumpto, não estão de modo nenhum de accordo com as exigencias da pesca, segundo as informações que me têem sido fornecidas por pessoas que julgo competentes, peia longa pratica que têem desta industria.

Diz-se geralmente que as distancias estabelecidas entre as armações chamadas de direito são insufficientes para que esta importante industria se possa exercer em boas condições e de um modo conveniente, e creio ser este o motivo principal de onde se originam as discordias que frequentes vezes se levantam no Algarve.

Espero que o sr. ministro da marinha tornará, só não as tomou ainda, as providencias necessarias para que este estado de cousas termine, tendo sempre em vista a garantia dos direitos legitimamente adquiridos, em virtude das concessões feitas, visto que por causa dessas concessões os concessionarios fizeram despezas valiosas na costa do Algarve.

O sr. Ministro da Marinha (Visconde do S. Januario): - Vou ver se posso responder summariamente ás perguntas do sr. deputado Pereira Caldas, de modo a satisfazel-o.

As pescarias nas costas do Algarve são um assumpto muito importante, pelo interesse que desperta entre aquelles que emprehendem aquella industria e têem dado origem a muitas questões.

O negocio das pescarias está regulado por uma portaria com data de 1867 ou 1868; mas o facto é que nunca só poz rigorosamente em vigor o respectivo regulamento.

Procuraram fazer algum accordo os interessados n'esta industria, principalmente os do Tavira, que são os principaes.

Ha ali quatro armações, que me parece que têem os nomes de Medo de Cascas, Abobora, Barril e Livramento; estas são as principaes armações.

Ha mais em outros pontos do Algarve, mas as principaes questões têem-se dado entre os donos d'estas armações.

Pelo accordo que fizeram esses proprietarios, deixou de se pôr plenamente em vigor o regulamento a que me referi, mas, pelos interesses importantes que ha n'este negocio, desaviram-se por varias vezes os proprietarios, e desfazendo o accordo, ou parte d'elle, procurou-se applicar posteriormente o regulamento em toda a sua plenitude. Continuaram entretanto a haver desavenças ou duvidas, e estas duvidas eram resolvidas por despachos ou portarias.

Nomeou-se uma commissão chamada, commissão de pescarias, para dar o seu parecer em todos os assumptos importantes das pescarias do Algarve. O governo procurou formar esta commissão de pessoas entendidas n'esta industria. O presidente e o sr dr. Bocage e fazem parte d'ella officiaes que têem estado no Algarve servindo como chefes, de departamento maritimo, ou capitães do porto, e por consequencia com a pratica necessaria para darem pareceres conscienciosos sobre tal assumpto.

Sempre que ha duvida sobre as pescas do Algarve eu tenho consultado essa commissão, e ordinariamente o governo segue o parecer d'ella, ou a do chefe do departamento maritimo do sul e dos capitães dos portos onde têem logar as pescas, para resolver os conflictos que ali só dão.

Ultimamente, em julho do anno passado, a commissão das pescarias apresentou alguma alteralções ao regulamento, mas não foi então occasião de mandar applicar estas alterações porque a epocha, das pescas estava adiantada.

Logo que tive conhecimento das alterações propostas por esta commissão com relação ao regulamento das pescas, tentei applicar estas alterações, ouvindo o capitão do porto de Tavira, que as julgou muito apropriadas e opportunas para evitar conflictos e questões; mas, como as armações já. estavam lançadas, não se procedeu, porque era necessario levantai-as, o que seria difficil e moroso, e visto ser a epocha da pesca, haveria prejuízos consideraveis para os armadores.

Por este facto reservei a applicação destas alterações, que me parecem judiciosas, para o intervallo das pescas entre um e outro anno.

Agora é exactamente a occasião; e já se deram instrucções ao chefe do departamento maritimo do sul, a fim de que, de accordo com o capitão do porto de Tavira, dê as providencias para que sejam applicadas estas alterações.

Portanto devem collocar agora as armações em harmonia com os preceitos estabelecidos no regulamento e com as alterações propostas pela commissão de pescarias.

Estas alterações reterem-se á distancia em que devem estar as armações uma das outras, á area que devem occupar e em que têem de conservar- se, ás direcções em que devem ser lançadas, e ás condições technicas da pesca, tanto com relação ás armações chamadas de direito, como ás armações chamadas de revez, isco é, conforme as direcções em que vem o peixe.

Com relação ao outro ponto a que se referiu o illustre deputado, direi a s. exa. que a commissão de pescarias, no desempenho consciencioso dos sons deveres, está elaborando um projecto em que, supponho, se quer introduzir a innovação das arrematações.

Ainda não tenho conhecimento d'este projecto, que é da iniciativa da commissão; no entanto, quando elle chegar ao meu conhecimento, se houver este pensamento, hei de consultar as competentes estações; e quando se tomar qualquer resolução, posso affirmar ao illustre deputado que hei de ter em toda a consideração os direitos adquiridos pelos armadores actuara, do maneira que os interesses creados á sombra dos antigo usos, o os direitos constituidos por antigas concessões não sejam feridos.

O sr. pereira Caldas. - Agradeço ao illustre ministro a resposta que se serviu dar-me, e declaro que me satisfizeram completamente as suas explicações. Estimarei muito que o regulamento que s. exa. vae publicar dê bons resultados, o se assim for, que s. exa. baseie n'elle um projecto de lei que regulo, de um modo mais solido e seguro para os interessados, o exercicio da pesca das armações; pois e certo que uma industria, que exige capitães tão importantes como esta, não póde nem deve, na minha opinião, estar á mercê de simples regulamentos.

O sr. Azevedo Castello Branco: - Mando para a mesa a seguinte:

Declaração

Declaro que por motivo justificado faltei ás sessões que houve desde a abertura do parlamento, até á sessão de 11 do corrente, inclusivè. = A de Azevedo Castello Branco.

Enviada á sacretaria.

O sr. Pessoa de Amorim Navarro: - Mando para a mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, sejam enviados a esta camara os seguintes, esclarecimentos:

1.° se estão feitos os estudos e já approvado o projecto da ponto Pedrinha, sobre o rio Zezere, entre Covilhã e Fundão.

2.º Se estão feitos os estudos da ponte sobre o Tejo, em Villa Velha do Rodão, se o projecto está approvado e qual o orçamento para esta obra.

3.° Se estão concluidos os estudos do caminho de ferro da
Beira Baixa, passando pela Covilhã e Fundão. = Pessoa de Amorim.

Mandou-se expedir

O sr. Henrique de Macedo: - Mundo para a mesa a seguinte:

Declaração

Participo a v. exa. e á camara que faltei á sessão de

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hontem, 24, por incommodo de saude. = O deputado pelo circulo n.° 108, Henrique de Macedo.

Para a secretaria.

O sr. Castro Monteiro: - Por parte da commissão de fazenda requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento, a fim de que o parecer n.° 18, da commissão de fazenda, que foi hoje distribuido, e que se refere ao projecto de lei n.° 88, pelo qual foram alterados alguns artigos da pauta das alfandegas, entre desde já em discussão.

O sr. Presidente: - Consulto a camara sobre o requerimento do sr. deputado.

Decidiu-se affirmativamente.

Leu-se na mesa,

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 18

Senhores. - A vossa commissão de fazenda, no intuito de não prejudicar as industrias protegidas no projecto de lei n.° 88, datado de 17 de maio de 1880, em virtude das alterações feitas nos artigos 5.°, 154.°, 172.° e 184.° da pauta geral das alfandegas, conforma-se com a emenda proposta e approvada pela camara dos dignos pares, e que só refere ao artigo 124.º da mesma pauta.

Sala da commissão de fazenda, 19 de janeiro de 1881.= Mariano de Carvalho = A. da Fonseca = E. Navarro = Pedro Franco = F. Beirão = Antonio Candido = Castro Monteiro, relator.

N.º 9-A

Alteração feita pela camara dos pares na proposição de lei da camara dos senhores deputados, datada de 17 de maio do corrente anno, que tem por fim substituir por outros os artigos 5.°, 124.º, 154.°, 172.° e 181.° da pauta geral das alfandegas de 25 de janeiro de 1871.

Papel pintado ou estampado, proprio para forrar casas. Taxa a actualmente em vigor, segundo o decreto de 25 de janeiro de 1871.

Palacio das cortes, em 7 de junho de 1880. = Duque d'Avila e de Bolama, presidente = Visconde de Soares Franco, par do reino secretario = Eduardo Montufar Barreiros, par do reino secretario.

Projecto de lei n.º 88

Artigo 1.° Os direitos estabelecidos nos artigos 5.º, 124.°, 154.°, 172.º e 184.° da pauta geral das alfandegas, de 25 de janeiro de 1871, são substituidos pelos seguintes:

Eliminadas as palavras, meios de sola, da classe 2.ª, artigo 5.º

Productos Unidade Taxa

[ver tabela na imagem]

Art. 2.° Se os tecidos de 13 o algodão, de que trata o artigo 1.°, forem apresentados a despacho em peça, gosarão tambem do beneficio desta lei quando o importador ou despachante, á sua custa e dentro da alfandega, cortar os mesmos tecidos em pedaços que só possam ter applicação de cobrir guardas-chuva ou guardas-sol.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 17 de maio de 1880. = José Joaquim Fernandes Faz, presidente = Thomás Frederico Pereira Bastos, deputado secretario = D. Miguel de Noronha, deputado vice-secretario.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Hintze Ribeiro: - Sinto que não esteja presente o sr. ministro das obras publicas, a quem desejava dirigir-me, pedindo-lhe esclarecimentos, relativos ao objecto de um telegramma, que tenho aqui.

Foi-me communicado de Carrazeda, que antes de hontem, as malas do correio, que deviam chegar pelas dez horas da noite, não tinham sido remettidas para o seu destino, por culpa da auctoridade administrativa.

Parece-me isto um facto grupo, a ser verdadeiro, e desejava que s. exa. me prestasse, logo que lhe fosse possivel, todas as informações, que a este respeito já tivesse recebido.

Como s. exa. não está presente, peço a qualquer dos seus collegas a bondade de informar s. exa., a fim de que elle me possa esclarecer sobre este assumpto.

Desejo tambem que v. exa. tenha a bondade de informar-me, sobre se já teriam vindo os documentos que pedi relativamente á testamentaria do conde de Ferreira.

O sr. Presidente: - Ainda não vieram esses documentos pedidos pelo illustre deputado.

O Orador: - Então peço a v. exa. a bondade de instar novamente pela sua remessa a esta camara, para poder basear n'esses documentos as considerações que tenho a fazer ao sr. ministro do reino sobre o assumpto da testamentaria.

Por ultimo mando para a mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam, com urgencia, enviados a esta camara, os processos originaes relativos:

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1.° Ao provimento, ainda em aberto, do logar de ensaiador fiscal da casa da moeda, incluindo a proposta do actual director, com data de junho proximo passado, e tudo o mais que ácerca d'esse provimento se haja passado;

2.° A suspensão do empregado que foi da casa da moeda, Francisco Germano Claro, com todos os actos e documentos concernentes a esse processo. = Hintze Ribeiro.

Mandou-se expedir.

O sr. Francisco Beirão: - Mando para a mesa a seguinte:

Declaração

Participo a v. exa. que o sr. deputado barão de Paçô Vieira não tem comparecido ás sessões da camara desde o dia 14 inclusivamente, e não comparecerá a mais algumas, por motivo justificado. = Francisco Beirão.

Para a secretaria.

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Mando para a mesa uma proposta do lei, legalizando um excesso de despeza, pelo meu ministerio, effectuado no exercicio de 1878 a 1879, na importancia de 13 contos e tanto, com juros da divida flucluante.

Proposta de lei n.° 18-C

Senhores. - Tendo-se reconhecido pelo encerramento das contas de despeza do ministerio da fazenda do exercicio de 1878-1879, não ter sido sufficiente a somma auctorisada pelo capitulo 3.° da tabella junta á carta de lei de 19 do junho de 1879, e tornando-se necessario legalisar o acrescimo d'esta despeza na importancia de 13:782$170 réis, não obstante haver-se realisado as transferencias das verbas a que se refere o decreto de 20 de novembro ultimo, publicado no Diario do governo n.° 272 de 27 do mesmo mez, elaborei a proposta que tenho a honra de vos apresentar em substituição da que submetti a esta camara em sessão de 23 de março de 1880, e que não chegou a ser convertida em lei.

Artigo 1.° É legalisado até á quantia de 13:782$170 réis o excesso de despeza, effectuada no exercicio de 1878-1879, proveniente de juros e amortisações a cargo do thesouro, alem da somma auctorisada pelo capitulo 3.° da tabella n.° 3, junta á carta de lei de 19 de junho de 1879.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, 21 de janeiro de 1881. = Henrique de Barros Gomes.

O sr. Arrobas: - Por justos motivos não tenho podido comparecer na camara, ha dias; peço disso desculpa, e especialmente aos srs. ministros, porque creiam que, apesar de tudo, s. exas. estiveram sempre no meu pensamento. Não perdi tempo. (Riso.)

Agora, visto que me chegou a palavra, ainda que não está presente o sr. ministro da guerra, aproveitarei a presença dos seus collegas para fazer algumas observações ao governo.

Em primeiro logar pergunto ao sr. presidente do conselho, visto não estar presente o sr. ministro do reino, se o governo tenciona mandar quanto antes proceder ás eleições dos legares vagos pelos ora. deputados que tenham sido elevados ao pariato.

Vi com muito prazer, nesta casa, o zêlo pela representação nacional que a illustre commissão do verificação de poderes mostrou, por occasião de ter desapparecido um processo de uma eleição, creio que de Moçambique.

Os illustres deputados, não obstante estar legitimamente representada aquella provincia, entenderam que deviam convidar o governo a tomar providencias, por todos os modos, a fim de encontrar o processo, para que o logar fosse preenchido pelo ultimo cavalheiro eleito. É muito justo.

Ora nós temos um circulo em Lisboa que não está representado nesta casa; já na ultima sessão vagou. A camara não declarou a vagatura porque houve demora notavel na communicação da camara dos pares, á dos deputados, de que o sr. Pereira de Miranda havia tomado posse do seu logar na outra camara. Hoje ha outros deputados que, em consequencia da ultima fornada, têem tomado assento na outra camara, e é de esperar que o governo não demore a eleição a fim de que o paiz possa eleger outros cavalheiros, provavelmente inspirados nas medidas do governo, que já foi avaliado na eleição das commissões de recenseamento da capital do reino.

Sr. presidente, na sessão passada, quando eu me queixava n'esta casa da demora na remessa de esclarecimentos para poder pedir contas ao governo, disse-me o sr. ministro do reino que qualquer deputado, e sobretudo da opposição, e eu especialmente, que quizesse ir ás secretarias e ali examinar quaesquer documentos, lhes seriam fornecidos ou facultado o exame d'elles. Como ha ministros novos na actual administração, desejava saber se o governo ainda mantém a declaração que fez nesta casa. Porque, é cousa notavel, pedem-se os esclarecimentos e não são mandados: ea pedi documentos originaes já para que não houvesse desculpas na remessa, para que não houvesse demora, e tambem não vieram. Desejava por isso ver os esclarecimentos no mesmo ministerio, porque assim não póde haver demora; vou lá muito depressa; mas receio que, chegando ás secretarias, lá não me mostrem os documentos que desejo ver. Refiro-me às repartições do ministerio da guerra e não ao da marinha.

No ministerio da fazenda desejo examinar a quantidade de individuos que estão fora das suas alfandegas em serviço estranho a ellas, recebendo boas gratificações alem dos vencimentos; mas, como dá muito trabalho aos empregados das secretarias o estarem a colligir as informações e a preparal-as para virem para a camara, eu desejo dirigir-me á secretaria da fazenda para conhecer qual o numero de individuos que se acham fóra do serviço das suas alfandegas.

Desejava saber se o sr. ministro da fazenda mantinha ainda a declaração que fez o anno passado de que estava prompto a facilitar aos deputados na sua secretaria quaesquer esclarecimentos que elles solicitassem.

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - De accordo.

O Orador: - Muito bem; preciso ver e examinar qual o numero de individuos que estão fóra das alfandegas a que pertencem e com gratificações o vencimentos contra lei.

Desejo tratar d'este negocio com conhecimento de causa e por isso preciso obter os esclarecimentos.

Tenho pena de que não esteja presente o sr. ministro da guerra, mas qualquer dos seus collegas poderá responder por s. exa.

Desejava saber se o governo pretende manter um acto manifestamente illegal e que reputo offensivo para a dignidade dos generaes de engenheiros, que é o ser director da arma de engenheria um coronel, quando a lei determina que seja um general, e isto dá uma carta de incapacidade aos officiaes generaes de engenheiros.

Eu desejo ouvir isto da boca do sr. ministro, para saber se é simplesmente por amor da arte que se praticou mais uma illegalidade.

É um ponto muito importante, que não póde ter sido resolvido como negocio de simples expediente.

Occupava aquelle logar um general muito distincto, e a
opinião publica diz que foi d'elle demittido porque não se conformou na camara dos dignos pares com as boas idéas sobre o caminho de ferro do Torres.

Tambem desejo ouvir o sr. ministro sobre se a decomposição e a organisação de uma grande commissão de defeza geral do reino tem alguma relação com a questão de Torres Vedras.

Verdade é que na materia da defeza tambem houve uma fornada. Tendo saído d'aquella commissão o sr. general

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Manços, porque deixou a direcção da arma de engenheria, outros membros dessa commissão foram distrahidos d'aquella commissão, como o sr. Misseno, que foi mandado commandar o campo de Campos, e foram distrahidos para outros serviços, com varios pretextos. Depois constituiu-se uma grande commissão para a defeza geral do reino. De sorte que os poucos que restavam, e cuja opinião não é muito segura, perde-se no meio de tão grande cohorte. E a questão - se o caminho de forro de Torres ha de ir por um ou por outro lado - ha de sor resolvida por uma commissão.

Eu não acredito que fosse esse o motivo que deu logar á exoneração do sr. Mancos, mas o que sei é que, se tinha de ser exonerado d'aquella commissão, outro general devia occupar aquelle logar, porque era a lei, e o governo, nomeando um coronel, devia ter motivos muito ponderosos para isso, mas carece de pedir um bill de indemnidade, porque violou a lei.

Hei de gostar de ouvir os motivos que o governo teve para praticar esta legalidade.

O coronel nomeado é distincto, e tem até uma qualidade que eu não conheço nos generaes d'aquella arma, é surdo (Riso.) Só se foi esta qualidade que decidiu o sr. ministro a preferil-o aos generaes a quem a lei chama para aquelle logar.

E, visto que falíamos de fornadas, devo tambem dizer que se espera que todo o corpo diplomatico portuguez venha a Lisboa para votar a questão do caminho de ferro de Torres na camara dos pares. Não acredito isto, mas, se acreditasse, havia de perguntar a este governo economico quanto custava cada um d'aquelles votos. Não o creio, porque tenho a maior confiança no sr. presidente do conselho. Divergimos na politica, mas o respeito que tenho pela pureza do seu caracter não póde ser excedido.

Mas diz-se isto na imprensa, e é bom que o paiz esteja prevenido e saiba que taes boatos não têem fundamento.

Peço desculpa de fallar assim; mas não faltei á muita consideração que tenho por todos os membros do corpo diplomatico, assim como entendo que se deve ter toda a consideração para com a camara dos dignos pares, que tem prestado ao paiz, em differentes occasiões, serviços importantissimos, embora alguns srs. deputados tratassem aquella camara como uma cousa pouco importante, e v. exa. o tivesse permittido.

Com relação á tentativa a que me referi, repito que não creio que ella se realise, pela confiança que tenho no sr. presidente do conselho de ministros.

Tambem desejava perguntar ao governo se pretende manter uma outra illegalidade, e tenho muitas em que hei de fallar na minha interpellação; e essas violações de lei continuam a produzir os seus effeitos. Hei de convidar o governo a trazer bills de indemnidade.

Vejo na ordem do exercito n.° 15 de 10 de agosto de 1880, que por um simples decreto se alterou uma lei:

"Art. 2.° Fica revogada a disposição 10.ª das approvadas pelo decreto de 17 de dezembro de 1869, que alterou em parte o dito regulamento, e mais legislação em contrario.

"Paço, em 27 de junho de 1880. = REI. = João Chrysostomo de Abreu e Sousa."

Tratava-se da despeza com mobilia, concertos de armamento, etc. O decreto de 17 de dezembro tinha acabado com o abono fixo da massa para estas despezas.

É um decreto que revoga uma lei. Isto foi feito com toda a sem ceremonia, porque se diz claramente que fica revogado o artigo de um decreto .com força de lei e a mais legislação em contrario.

Estou certo que as intenções do governo foram boas, mas o facto constituo um abuso de auctoridade.

Os desejos do sr. ministro foram optimos; mas a legalidade existe, e é preciso dar satisfação ao poder usurpado.

O facto é o seguinte. No decreto com força do lei de 17
de dezembro de 1864 determinava-se que tivessem as praças todas um vencimento certo e determinado por dia para massas de mobilia, concertos de armamento, etc. Constava que se fazia economia n'este ponto, e que havia sempre um saldo.

O governo, que pretendeu economisar, determinou que essas economias fossem para a fazenda. Portanto, por aqui se vê que a intenção foi boa.

O governo determinou por este decreto, que revogou uma lei, que despezas desta especie se fizessem sem se dar uma quantia certa aos corpos; mas o que resultou foi que o dinheiro que se dava não chegou e o governo por consequencia viu-se obrigado, não só a dar as massas por inteiro, mas a abonar, não sei por onde, o excesso desta despeza, e maneira que o que o governo pretendia não se realisou e o que ficou de pé foi a illegalidade.

O governo ha de trazer á camara bill de indemnidade por ter violado a lei nesta parte; e ha de declarar se julga conveniente dar uma importancia certa aos corpos para massas, de concertos de armamento, etc., ou se julga conveniente fazer essas despezas até á verba que for precisa.

O que ha actualmente e que não podo ser, que é conjuactamente a existencia dos dois systemas; ha a lei e a violação da lei, tudo em vigor ao mesmo tempo.

Não está presente o sr. ministro da guerra, e por consequencia n'este ponto por aqui ficarei.

Consta-me que ha um anno o governo mandou vir para Lisboa contingentes dos corpos de cavallaria para aprenderem a nova tactica, e parece-me que aqui têem estado até hoje.

Esta situação obriga a uma grande despeza, porque os individuos que constituem estes contingentes têem um augmento de vencimento, e não podia deixar de ser assim, visto que têem novas despezas, que não teriam, se estivessem nos seus quarteis.

Eu pensava que os coroneis eram bastantes para estudarem a nova tactica e para a fazerem aprender aos seus subordinados; o governo, porém, zeloso como é, quiz antes que essa instrucção fosse dada por pessoas que julgou mais habilitadas.

Não me consta, comtudo, que estes contingentes tenham tido grandes exercicios; sei apenas que estão ahi para os lados de Belem, sem fazerem serviço, mas fazendo despeza ao estado.

Desejo, portanto, que o governo me diga se tenciona mandar estes contingentes para os seus corpos ou se quer que elles continuem a fazer esta despeza sem vantagem alguma para o estado.

Não quero tomar mais tempo á camara.

Sei que v. exa. está ancioso por passar á ordem do dia; e, não estando presente o sr. ministro da guerra, eu não continuo a fazer as perguntas que desejava fazer.

Se o governo se julgar habilitado a dar agora alguma resposta ás perguntas que já formulei, estimal-o-hei muito, e quando estiver presente o sr. ministro da guerra, estou persuadido de que s. exa. ha de esclarecer convenientemente a camara sobre estes assumptos.

Sei que o sr. ministro da fazenda já se deu por habilitado para responder á interpellação que lhe annunciei a respeito dos assucares.

Folgo muito com isso, e já não é sem tempo.

(Áparte do sr. ministro da fazenda.)

O sr. ministro queria já hoje essa interpellação, e eu tambem, mas v. exa. é que de certo me não consentia que a realisasse.

E eu ainda acho melhor do que a questão dos assucares a questão da promoção dos engenheiros.

Não direi a promoção da arma de engenheria, porque não foi tal.

As promoções costumam dar vantagem geral, vantagem a todos os officiaes de uma arma, porque os que não são

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promovidos ficam mais proximos da promoção, porém agora uns foram favorecidos e outros foram recuados na sua carreirra.

É uma cousa notavel que eu hei de mostrar á camara, quando a interpellação se realisar.

O sr ministro da guerra já se declarou habilitado para responder a esta interpellação, e, portanto, eu pedia a v. exa. que designasse dia para ella se realisar com a maior brevidade possivel; pedia-lhe mesmo que a mettesse em ordem do dia, para se realisar quando o sr. ministro viesse.

A interpellação a respeito da promoção dos engenheiros é a que julgo neste momento mais importante e urgente. Ella imprime caracter a este governo. (Apoiados.)

Não deixarei de insistir sobre as outras interppellações que annunciei, como são as dos correios, dos assucares e das taras metallicas; mas, como julgo a da promoção dos engenheiros mais importante, desejo que se realise primeiro.

Agora, mando para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo, pelo ministerio das obras publicas.

O sr. Presidente: - Antes de conceder a palavra a qualquer sr. deputado, permitta-me a camara que eu de uma explicação relativamente a uma phrase que acaba de pronunciar o sr. Arrobas. S. exa. disse que eu tinha consentido que n'esta camara se desconsiderasse a camara dos dignos pares. Devo pois dizer á camara que eu não ouvi nesta casa expressão alguma de menos consideração para com a outra casa do parlamento. (Muitos apoiados.) Vi que alguns oradores, tanto de opposição como da maioria, se referiram áquella camara, apreciando a sua constituição politica, e fazendo observações sobre o principio da hereditariedade, ou da nomeação sem ser equilibrada pelo principio electivo; mas não vi, nem que se discutissem as opiniões emittidas n'aquella camara, (Muitos apoiados.) o que é prohibido pelo regimento, nem que se dissesse qualquer palavra offensiva da camara dos dignos pares como instituição, nem dos seus membros individualmente.

Devia dar esta explicação, que de certo não daria se não tivesse dito o sr. Arrobas, que eu tinha deixado desconsiderar aqui áquella camara. Não o podia eu fazer e não o fiz. (Muitos apoiados.) Pelo menos não tenho idéa de que se proferisse aqui qualquer palavra que fosse menos respeitadora d'aquella instituição. O que ouvi foram observações sobre a organisação d'aquella camara, mas não offensas á instituição ou aos seus membros.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Anselmo Braamcamp.) - O illustre deputado foi percorrendo no sou discurso tantas e tão variadas questões, que não póde esperar que eu responda a ellas. Comtudo, o que eu desejo e o que devo, é repellir desde já as insinuações que eu muito senti que s. exa. dirigisse ao governo. Sei como o illustre deputado tem frito opposição a differentes governos, e principalmente ao actual, com a maior energia e vehemencia; mas não tenho ouvido até hoje da parte de s. exa. insinuações que tanto ma ferissem como aquellas que o illustre deputado acaba de proferir.

Nunca as votações politicas foram causa de qualquer deliberação que o governo podesse tomar a respeito dos membros das duas casas do parlamento.

O governo tão sómente sã guia pelas rasões do serviço publico e pelas necessidades do mesmo serviço, e nunca por outras considerações. Portanto permitta-me o illustre deputado que lhe diga...

O sr. Arrobas: - V. exa. dá me licença?

O Orador: - Pois não.

O sr. Arrobas: - Se o illustre presidente do conselho viu nas minhas palavras uma insinuação, eu retiro-as todas, porque não tive isso em vista. Eu disse que se dizia isso, mas que não o acreditava, porque conhecia bem o caracter de s. exa.

O Orador: - Folgo de ouvir essa declaração da parte do illustre deputado, mas eu não podia pela minha parte deixar de restabelecer a verdade dos factos e de manifestar clara e desassombradamente os principies que têem sido sempre seguidos pelo actual governo.

O sr. Arrobas: - E eu estimo ter dado occasião a v. exa. de mostrar que não se realisará o que dizem os jornaes.

O Orador: - Não póde este governo ser accusado de querer perseguir os seus adversarios politicos, desta ou da outra camara, quando bem pelo contrario s. exa. encontra em uma e outra das casas do parlamento os claros testemunhos de que o governo não quer por forma alguma faltar aos preceitos de liberdade e tolerancia que sempre tem mantido e respeitado. (Muitos apoiados.)

Não é o contrato do caminho de ferro de Torres Vedras que póde determinar o governo a tomar qualquer providencia ou a chamar qualquer auxilio para conseguir a sua approvação.

O governo já declarou muito clara e positivamente que está persuadido de que o contrato do Torres Vedras é util e vantajoso para o paiz, mas que nunca ha de fazer questão politica da votação do contrato.

O governo está convencido de que a realisação d'aquelle caminho do ferro deve abrir novas fontes de riqueza em Portugal, principalmente atravessando um paiz tão vinhateiro como aquelle, e sendo o commercio dos vinhos um dos principaes generos do exportação, mas nunca fez desta questão uma questão politica, nem ha de fazer. (Apoiados.)

Perguntou o illustre deputado se o governo tenciona mandar proceder ás eleições das vacaturas que se têem dado n'esta camara.

Responderei a s. exa. com as palavras do meu collega o sr. ministro do reino, proferidas nesta casa na ultima sessão legislativa, devendo acrescentar, visto que s. exa. tanto insiste n'este ponto, que por emquanto ainda poucos membros d'esta casa têem tomado assento na outra camara, e quando todos os illustres deputados, que foram nomeados pares do reino tiverem tomado assento, e que tenham sido declarados vagos pela commissão de poderes os respectivos circules, é que então será occasião opportuna de tratar-se d'este assumpto.

Perguntou igualmente o sr. deputado se o governo mantinha as declarações que fizera no anno passado, de facilitar o accesso nas secretarias a todos os membros da camara que quizessem examinar os documentos que precisassem ver para conhecer e apreciar os actos do actual gabinete.

A este respeito, não tenho senão a confirmar clara e terminantemente as declarações do governo, e affirmar a s. exa. que as portas do ministerio dos negocios estrangeiros estão abertas de par em par para o illustre deputado ver e examinar todos os documentos da minha gerencia ministerial, o parece-me poder fazer a mesma afirmação em nome de todos os meus collegas. (Apoiados.)

Referiu-se o illustre deputado ás asserções aqui proferidas em relação á camara dos pares, e neste ponto apresso-me a juntar as minhas declarações ás do honrado e digno presidente desta camara.

O governo quer e ha de manter, sem quebra, o respeito que é devido a uma tão alta corporação do estado. (Apoiados.)
O governo, se ouvisse qualquer apreciação que podesse offender os membros da outra casa do parlamento, seria de certo o primeiro a levantar a voz para reprimil-a, (Apoiados.) o tenho a profunda convicção de que esta camara toda se ha de associar nesse ponto ás elevadas expressões do seu presidente e saberá manter a dignidade e o respeito que a todos, deve merecer áquella corporação.

E creia s. exa., que nem o governo manda chamar os nossos agentes diplomaticos membros da camara dos parca para approvar o caminho do ferro de Torres Vedras, nem as nossas legações hão de ficar ermas de seus representantes junto das nações estrangeiras. O governo tem o firme empenho de manter nas condições mais favoraveis as nos-

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sas relações diplomaticas com as potencias estrangeiras, que felizmente temos até hoje conseguido. Posso asseverar ao illustre deputado, que pela minha parto não hei do faltar a esse devei, que mais especialmente me incumbo, tenha s. exa. a certeza de que nem foram chamados todos os nossos ministros para virem á camara em auxilio cio governo, nem o governo deixará de conservar junto das nações estrangeiras a representação devida, e de atender, como lhe cumpre, ás nossas relações diplomaticas.

Não posso entrar na apreciação de todas as arguições que o illustre deputado levantou ou pretendeu levantar contra o ministerio da guerra; declaro com franqueza que não estou habilitado para tanto, nem s. exa. podia esperar que, de momento, eu podesse tratar as questões do que se occupou e que por sua indole exigem especiaes conhecimentos, que não tenho.

O illustre ministro da guerra não faltará de certo a responder ás observações que s. exa. fez e acceitar n'esse ponto o debate na sua mais ampla largueza. Portanto, n'essa parte, permitta me s. exa. que não o acompanhe e que limite aqui as considerações que julguei dever expor á camara.

Vozes: - Muito bem, muito bom.

O sr. Ministro da Faseada (Barros Gomes): - Sr. presidente, pouco me cumpre acrescentar ás explicações tão francas e tão leaes que s. exa., o sr. presidente do conselho, acaba de das em seu nome o em nome de todo o governo. As declarações que foram aqui feitas pelo meu illustre collega, o sr. ministro do reino, e que hoje foram renovadas pelo sr. presidente do conselho, são acceites por todo? nós, E quando s. exa. queira colher quaesquer esclarecimentos ou examinar quaesquer documentos na secreta na a cargo de cada um de nós, poderá usar d'esse direito, que muito franca e lealmente lhe queremos facultar.

Sr. presidente, sem que entre em meu animo o disejo de irrogar censura ao illustre deputado, ou de criticar a maneira como julga dever tratar as questões nesta casa, observarei que s. exa. quando o ministro da fazenda está ausente, julga opportuno tratar as questões que dizem respeito ao ministerio da fazenda, e quando é o sr. ministro da guerra está ausente, julga opportuno occupar-se dos negócios dependentes d'este ministerio.

Quando ouvi o illustre deputado pedir a palavra, o tendo tantas recordações, como toda a camara, do que s. exa. disse na sessão passada e na actual, relativamente á questão dos assucares, imaginei que aproveitaria a occasião para dirigir-me perguntas a tal respeito; entretanto como s. exa. se reserva para tratal-a outro dia, quando v. exa., sr. presidente, no uso da faculdade que lhe confere o regimento, marcar o dia para se realisar a interpellação, tambem não me occuparei agora do assumpto.

Desejando, porém, fornecer ao illustre deputado todos os elementos que possam esclarecel-o e habilital-o a fazer uma apreciação mais alta dos meus actos, mando para a mesa pedindo a v. exa. que lhe mande dar a maxima publicidade, uma nota estatistica dos abatimentos effectuados nos direitos de importação do assacar a titulo de avaria na alfandega de Lisboa rios annos de 1876 a 1880.

Nota dos abatimentos effectuados nos direitos de importação de assucar, a titulo de avaria, na alfandega de lisboa durante os annos abaixo designados.

Annos Peso em kilogramas Direitos que pagaram Abatimentos que gosaram

[ver tabela na imagem]

Alfandega de Lisboa. Secção de estatistica, 6 de dezembro de 1880. = Augusto J. M. Machado.

Quando se tratar da interpellação fallarei desenvolvidamente a este respeito.

O sr. Arrobas: - V. exa. permitte que eu use da palavra?

O sr. Presidente: - Vou consultar a camara.

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Presidente: - Tem a palavra.

O sr. Arrobas: - Começo por agradecer ao sr. presidente do conselho as explicações francas que deu, e á camara a condescendencia que teve commigo parmittindo que eu usasse da palavra.

Folguei muito de ouvir declarar a s. exa. que não dera ordem aos diplomatas para virem a Lisboa por caixa da questão do caminho de ferro de Torres.

Nunca me passou pela idéa accusar s. exa. por este acto, mesmo porque não o julgava capaz de pratical-o, e referi-me unicamente a elle por tel-o visto na imprensa e causar-me uma certa surpreza. Declarei immediatamente que não acreditava, o se no meu espirito tivesse existido porventura alguma duvida, que não houve, teria desapparecido completamente depois da declaração do sr. presidente do conselho. Estou persuadido de que s. exa. não se prestaria a isso.

Mas o sr. ministro da fazenda não me satisfez do mesmo modo.

S. exa. mandou para a mesa um documento, que só prova contra o sr. ministro, e quando se realisar a interpellação dos assuctires eu o demonstrarei.

Para a camara ver que eu tinha rãs ao, basta dizer que por causa de muitas avarias pretendidas nos assucares, avarias que appareceram nos ultimos annos, adoptou o conselho geral das alfandegas, e a alfandega mesmo providenciou para impedir a continuação desse abuso.

A especulação fazia-se deste modo. Comprava-se em Inglaterra o assucar não refinado, em bruto, e contendo mais alguma agua vendia-se por isso muito mais barato, porque se comprava agua em vez de assucar, não havia avaria alguma na viagem, saía assim já de Inglaterra e chegava a Lisboa, e dizia-se na alfândega que o assucar estava avariado!

Não tinha avaria pela agua doce, porque o assucar, como todos sabem, para ser refinado, deita-se lhe agua, e perde na refinação todas as impurezas que possa ter, e a agua vaporisa; mas dizia-se isto com o fim de obter abatimento nos direitos.

De modo que não se despachava na alfandega senão assucar avariado. Eram avarias e mais avarias.

Cansados os empregados de ver praticar nos ultimos annos esta especulação, não deram mais por taes avarias, a disseram a quem se apresentava, pretendendo despachar assucar avariado, que requeresse superiormente.

Levantaram-se grandes clamores, dizendo-se que a alfandega até praticava o abuso de mandar examinar o assucar em um laboratorio chimico, onde effectivamente se examinou e se conheceu que o assucar não era avaliado; tinha sim maior ou menor quantidade de agua, mas que as impurezas que continha eram as que costuma conter o assucar que n'aquelle estado apparece no mercado O governo deferiu a favor da especulação e o resultado foi crescer de um modo espantoso, em poucos mezes, a verba de diminuição de direitos.

A imprensa tratou d'este assumpto em differentes vezes. Eu antes da ordem do dia fiz aqui algumas perguntas ao sr. ministro da fazenda, até que o governo foi obrigado a mandar uma ordem para não se admittir avaria sem protesto do capitão.

O governo fez varias concessões, porque até ali não havia despacho de ministro algum n'aquelle sentido, antes, pelo contrario, o governo regenerador havia providenciado em 1878 para evitar o abuso, e foi o actual governo que

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pouco antes da epocha das eleições, em 1879, provocou novamente pela sua resolução impensada a especulação adormecida.

O sr. ministro, pois, ordenou, que não se acceitassem mais allegações por avarias, sem que houvesse protesto por avaria, por parte do capitão do navio em que tinha vindo o assucar, e isto dava em resultado que a maior parte das avarias ou todas não tinham logar nem rasão de ser, porque não havia o protesto do capitão, e os generos tinham já sido comprados em Inglaterra n'aquelle estado.

Havia, porém, umas trezentas sacas, ao fechar da sessão passada, para que se requereu, dizendo-se que não deviam ser sujeitas áquella condição do protesto por avaria por isso que tinham sido metidas a despacho, antes de sair áquella portaria. Como se a portaria estabelecesse novos direitos!

O sr. ministro da fazenda, que consulta sempre, para ter com que se conformar, que umas vezes consulta o conselho geral das alfandegas, outras a procuradoria geral da corôa, outras a repartição; desta vez consultou a procuradoria, e foi a melhor, porque conformando se com a sua consulta deu despacho ás trezentas sacas, com avaria! Por isso apparecem os 800$000 réis ultimamente.

Pois não estava lá a portaria que exigia a prova, do protesto do capitão por avaria?

S. exa. julgou melhor consultar sobre o requerimento e conformar-se depois com a sua consulta.

Pois o sr. ministro póde acaso allegar que não sabia as particularidades desta especulação?

É fóra de duvida que sabia.

Mas o que é facto é que depois acabaram as avarias do assucar; é raro apparccer uma avaria; e se s. exa. apresenta esses 800$000 réis, naturalmente, são das taes trezentas sacas; dahi por diante não ha avarias.

Acabou por emquanto a especulação.

Quando se tratar da interpellaeão sobre esto assumpto hei de esclarecer este negocio; por agora só direi que os documentos que s. exa. apresentou, servem-me, mas é exactamente para provar o contrario do que s. exa. disse, e grandes louvores merece a imprensa, e a opposição, levantando esta questão, porque só depois dos seus clamores, p que s. exa. se dignou providenciar para desmanchar o que tinha feito, do contrario nunca teriam acabado as avarias.

Depois de a opposição levantar esta questão é que acabaram as avarias. De maneira que a opposição foi precursora do bom tempo; já não ha temporaes, já não ha avarias.

Ora, parece-me que o tempo em que s. exa. mandou fazer aquelle trabalho, seria melhor empregado se tivesse mandado fazer uma proposta de lei sobro a questão dos assucares.

Perdem-se muitos contos de réis, porque o assucar crystalisado passa na alfandega como assucar em bruto; e o sr. ministro dorme á sombra d'aquella estatistica infeliz que mandou para a mesa!

Quando vier a interpellação a camara conhecerá até que ponto chega a gravidade deste objecto.

O sr. Ministro da Faezenda (Barros Gomes): - Como a interpellação se não realisa agora, tambem não me alargarei em grandes considerações sobro a questão dos assucares.

O sr. deputado teve seis ou sete annos em que podia levantar a voz no parlamento para pedir que se pozesse termo a esse abuso, e não o fez.

E não me parecia que as suas accusações devessem recair sobre mim.

Eu provei que diligenciava zelar os interesses da fazenda publica e nas resoluções que tomo pelo ministerio da fazenda não me inspira senão a consciencia, o sentimento do dever e o desejo de acertar. Por isso me ferem as insinuações que se fazem ás rasões que determinaram o despacho do ministerio da fazenda. A minha consciencia em todo o caso está tranquilla.

Quando eu entrei para o ministerio da fazenda, encontrei levantada uma questão de direito - o que devia considerar-se avaria de mar; e se deveria conceder-se o beneficio do abatimento de direitos só áquelles generos que fossem avariados pela agua do mar, ou se todos os que tivessem soffrido damno a bordo, durante o seu trajecto.

A este respeito suscitavam-se duvidas na alfandega de Lisboa.

O director da alfandega e outras auctoridades fiscaes, no interesse da fazenda, entenderam que havia uma maneira do pôr ponto a qualquer abuso no que dizia respeito aos assucares apresentados a despacho com a declaração de avaria do mar, e reconhecer se essa avaria era, ou não, produzida pela agua salgada; era submettel-os a um exame chimico. E assim se procedia.

Este meio, porém, a que a alfândega se soccorreu, alem de custar muito dinheiro ao estado, trazia para o commercio uma desvantagem muitissimo grande, porque demorava os despachos por longo periodo; e o ministro da fazenda, que tem de zelar os interesses do fisco, tem tambem de empregar todos os esforços para que o expediente das alfandegas corra rapido, para que o commercio não soffra prejuizos e as suas reclamações sejam attendidas. Se o não faz, pobre delle! Cáe-lhe a imprensa em cima, e com rasão.

Tratando-se de uma questão de direitos, eu não podia portanto deixar do fazer o que fiz: consultei a procuradoria geral da corôa, a qual formulou uma consulta, que terminava por quatro conclusões; o dei ordem para que estas quatro conclusões se transformassem numa portaria que foi publicada no Diario do governo.

Onde está aqui o latet anguis, o desejo de defraudar os interesses da fazenda? Ouvi o procurador geral da corôa que formulou uma consulta e eu mandei que ipsis verbis essa consulta na sua conclusão se transformasse em portaria.

Em virtude dessa portaria teve logar na alfandega o despacho do uma porção de assucar que se considerou avariado e que gosou do beneficio concedido aos generos com avaria.

Mas para evitar que alguns abusos viessem a introduzir-se e que fossem defraudados os interesses da fazenda, lembrei-me de expedir outra portaria, não concedendo beneficio por avaria, sem que se apresentasse o protesto do capitão do navio por avarias. Desde que isto se fez, desde este momento deixou de ter logar na alfandega o despacho do assucares com avaria em tamanha quantidade, e que produziam para a fazenda perdas avultadas. E é por isso que até ao mez de novembro do anno de 1880 o pagamento de direitos de assucar com avaria foi de 800$000 réis, quando em igual periodo do anno anterior foi de réis 4:000$000.

Ora, já vale a pena estar todos os dias a alludir a esta questão! Pergunto a v. exa. se realmente, tenda nós tantos assumptos do interesse a tratar e de que nos podemos occupar, vale a pena estar todos os dias com estas constantes occupações!

Em relação a esse processo a que s. exa. alludiu e em que se pediu um novo jury, declaro a s. exa. que não o concedi.

O sr. Arrobas: - É mais antigo.

O Orador: - Não mo lembro; no entanto, o illustre deputado póde pedir todas as explicações de que careça e eu estou prompto a dal-as.

O sr. Miguel de Noronha (D.): - Mando para a mesa a seguinte:

Declaração

Participo que, cumprindo o regimento, fui desanojar o sr. deputado Alves Carneiro, que agradeceu esta prova de consideração. = D. Miguel de Noronha.

Enviada á secretaria.

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O sr. Joaquim Tello: - Tinha pedido a palavra para perguntar ao sr. ministro da justiça se estava resolvido a apresentar ainda nesta sessão legislativa uma reforma comarcã; e faço esta pergunta porque está dado para ordem do dia um projecto de lei para a creação de um certo numero de comarcas, e convinha saber as intenções em que o governo está ácerca d'esta questão. Se o governo tenciona apresentar uma proposta do lei alterando a circumscripção comarcã, desejo que assim o declare ao parlamento; mas se não tenciona, e se se limita a acompanhar a iniciativa parlamentar, então quero usar da meus direitos, ampliando aquelle projecto do lei com a creação da comarca de Villa Real de Santo Antonio, que tem indubitavelmente melhores condições de existencia, e corresponde a necessidades e interesses superiores a algumas das comarcas propostas, cuja creação eu sou o primeiro a reputar em absoluto muito justa.

Na hypothese, porém, de que o nobre ministro da justiça tenha preparada uma reforma geral na circumscripção comarca, parecia-me mais regular e mais simples, que a camara apreciasse o projecto, que está na ordem do dia, quando se discutisse essa proposta, que naturalmente o absorveria.

A este respeito era só o que tinha a dizer.

E visto que estou com a palavra, permitta-me v. exa. que eu me refira, tambem por incidente, á questão apresentada aqui pelo meu amigo e collega o sr. Pereira Caldas, com relação ás pescarias nas costas do Algarve.

É uma questão muitissimo importante para aquella provincia, porque é inquestionavelmente a piscicultura a sua primeira industria; e folguei immenso com as explicações a este respeito dadas pelo illustre ministro da marinha e ultramar.

Ácerca d'este assumpto tinha eu resolvido apresentar uma nota de interpellação a s. exa., mas depois das explicações dadas, e certo que o nobre ministro apresentará ainda n'esta sessão uma proposta de lei que regido de uma vez os grandes interesses que to prendem a esta industria, e suste os repetidos conflictos que se levantam todos os dias durante os trabalhos da pesca, não mando a nota de interpellação, e reservo algumas considerações nesse sentido para quando s. exa. apresentar a sua proposta de lei.

Repito: é uma questão de grando alcance e de muito interesse para o paiz. É já tempo do olhar seriamente para esta copiosa fonte de prosperidade publica. Os nossos mares são ricos em pescarias, a sua exploração é relativamente facil, pelo menos em quasi toda a costa do Algarve, que mais particularmente conheço, mas os processos são quasi rudimentares. Não se estuda, não se desenvolvo esto ramo do industria, porque desgraçadamente só desconheço o seu altissimo valor.
(Apoiados.) Parecem-me muito importantes as declarações do nobre ministro da marinha e ultramar, quando referiu á camara que a commissão encarregada de estudar este assumpto lembrava a idéa de arrematar em hasta publica os locaes para o lançamento das armações de atum. Talvez seja este o modo mais seguro de garantir direitos ás emprezas, sem lhes conceder um monopolio, sempre repugnante e offensivo.

Sem desconhecer as difficuldades que esta nova pratica deve trazer aos habitos do hoje e aos privilegios concedidos e tolerados, parece-me que a commissão pude fazer n'este sentido importantes serviços, não só á provincia, mas ás proprias emprezas, e a todos quantos queiram entrar n'essa especulação. (Apoiados.)

Voltarei opportunamente e com maior desenvolvimento a este assumpto, um dos mais interessantes para a provincia do Algarve, tão rica e tão esquecida por todos nós. (Apoiados.)

O sr. Ministro da Justiça (Adriano Machado): - Pedi a palavra para responder á pergunta que me foz o illustre deputado, o sr. Pimenta Tello a respeito da divisão comarcã.

Eu já o anno passado tencionava apresentar a reformada divisão comarca; mas essa reforma estava subordinada a outra, á. de organasição judicial; comtudo como esta proposta não tinha chegado a ser discutida, não mo pareceu opportuno apresentar a reforma de divisão territorial que dependia d'ella.

O projecto, que foi apresentado por iniciativa particular, não complica em nada com o projecto geral da divisão de territorio. E de iniciativa particular, mas está já accommodado á proposta de divisão territorial.

Alguns srs. deputados queriam propor a creação de outras comarcas, mas isso entendia eu que implicava com a proposta que eu tencionava apresentar; o por consequencia o meu voto foi contra, porque envolvia uma alteração em outras comarcas existentes; emfim era uma organisação inteiramente diversa do meu projecto.

Se quizerem discutir a creação dessas comarcas, isso pertence á camara; o governo não perde nada com essa discussão, pelo contrario a deseja, porque não prejudica em nada esse plano, que ha de vir logo que esteja approvado por esta camarão projecto da organisação dos julgados municipaes, ao qual está subordinado o da reforma das comarcas.

O sr. Evaristo Brandão. - Mando para a mesa uma declaração do motivo por que tenho faltado a algumas sessões.

Já que estou com a palavra, aproveito a occasião para chamar a attenção do sr. ministro da marinha e ultramar para um boato muito grave, que corre com insistencia, e que eu vejo reproduzido num jornal dos mais importantes d esta capital.

Este boato refere-se ao concurso aberto no ministerio da marinha e ultramar para a adjudicação da ompreza de navegação para a Africa Occidental.

Diz-se que no contrato, que já se celebrou ou vae celebrar-se com o concorrente preferido, se estabelecem clausulas que alteram o programma do concurso e podem até mais tarde auctorisar modificações favoraveis ao concessionario.

Acho isto extraordinario, acho que é uma verdadeira burla o alterarem-se por qualquer fórma as condições, do um concurso desta ordem, e por isso repugna-me crer em tal.

Mas, como estamos n'um paiz onde tudo é possivel, conforme a opinião de varios auctores, e tendo já decorrido mais do dois mezes depois que terminou o concurso sem o contrato ser publicado, parece-me que as apprehenções da imprensa e do publico em geral são justificadas, e por isso convido o sr. ministro da marinha a dar explicações terminantes a este respeito.

Se essas explicações forem satisfactorias, desde já as agradeço; mas, como é possivel que o não sejam, peço a v. exa. que mo resorvo a palavra para depois do s. exa. fallar.

Leu-se na mesa, a seguinte:

Declaração

Tenho faltado ás sessões por incommodo de saude. = Evaristo Brandão.

Para a secretaria.

O sr. Ministro da Marinhã (Visconde de S. Januario): - No contrato que está a ponto do celebrar-se para a navegação da Africa occidental, quer dizer, para a navegação entre a metropole o todas as nossas colonias da Africa occidental, não ha nenhuma estipulação que altere as condições do programma.

É evidente que um contraio, formulado segundo um programma, não póde ser a photographia fiel desse programma. Isso só as condições principaes, mas todas as condições do contrato, são as do programma; o que póde haver é esclarecimentos ou prevenções que só julguem indispensaveis, e que se estipulam, para melhor comprehensão do contrato, sem de fórma alguma alterar os fundamentos do mesmo programma.

Sessão de 25 de janeiro de 1881.

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É n'este sentido que está formulado o contrato a que se referiu o illustre deputado.

Exigir-se que um contrato se faça exactamente, palavra por palavra, por assim dizer moldado na fórma do programma, na minha opinião é isso absolutamente impossivel.

O contrato que está para ser assignado, e, se ainda o não foi, é por causas alheias á minha vontade, representa exactamente o pensamento do programma e alem disso tem em si todas as condições do mesmo programma.

Por consequencia parece-me que, quando o contrato for publico, o illustre deputado não achará rasão para condemnar o governo.

As opiniões que póde aventar a imprensa contra um contrato que ainda não está assignado, podem ser segundo as informações dos que escrevem os artigos o segundo a sua phantasia, mais ou menos exactas; portanto, parece-me que, não sendo conhecido o contrato, taes asserções não podem ter valor na opinião publica, e muito menos me parece que o illustre deputado deva servir de echo nesta casa a apreciações mais ou menos apaixonadas, que os jornaes porventura façam sobre um assumpto que ainda não está official e definitivamente resolvido.

O que eu posso affiançar ao illustre deputado é que tenho empregado o maior cuidado para que esse contrato represente fielmente as idéas do programma. E empreguei todo o esmero na organisação do programma, que foi feito, como era natural, segundo as minhas indicações, para que se obtivessem novas condições que melhor satisfizessem ás urgentes necessidades do serviço das differentes colonias que os vapores da companhia que se organisar para este fim têem de percorrer, porque as condições que existiam, seriam muito boas no tempo em que se fez o antigo contrato, mas hoje está reconhecido que eram insufficientes.

Parece-me que consegui com as innovações introduzidas no programma vantagens consideraveis; e posto que o contrato não seja ainda conhecido, eu affirma a s. exa. que elle está de accordo com o programma. Quando o contrato for publicado, a camara e o paiz poderão apreciai o, e o illustre deputado terá então ensejo do fazer sobre elle as considerações que julgar convenientes.

O sr. Evaristo Brandão: - Sr. presidente, parece que o sr. ministro da marinha me quiz arguir do eu mo fazer echo do que se diz na imprensa com relação ao contrato em questão; mas eu entendo que esta censura não tem cabimento e é puramente gratuita.

Pois o concurso findou ha mais de dois mezes, trata-se de um negocio de tanta magnitude, qual é o da empreza de navegação de Africa, o contrato definitivo não é ainda conhecido officialmente, e quer-se negar á imprensa o direito de fazer commentarios menos favoráveis ao ministro que figura n'este negocio?

São perfeitamente fundados os reparos da imprensa, e eu estranho que o sr. ministro da marinha me increpasse por eu ter levantado n'esta casa uma questão tão grave como esta.

Disse tambem o sr. ministro da marinha que o contrato não podia ser a photographia do programma. Certamente que não, nem se podia exigir isso. O que eu exijo é que nas estipulações do contrato não haja nada que possa contrariar a letra e o espirito do programma, porque de outro modo seria uma fraude sem. nome, e uma flagrante violação das condições do concurso, em prejuizo de terceiros e do paiz.

Não me parece agora opportuno o tratar da questão dos direitos de bandeira e outros que dizem respeito ao que se chama o nosso pacto colonial, questões que estou estudando e que espero levantar n'esta casa.

Limitei-me unicamente a chamar a attenção do sr. ministro da marinha sobre um boato tão grave, cuja veracidade me cumpria averiguar, pelo que estranho as censuras que s. exa. me fez declarando, quanto ao mais, que as suas explicações me satisfizeram.

O sr. Sarrea Prado: - Mando para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

Leu-se na mesa, e é o seguinte:

Requerimento

Roqueiro que, pelo ministerio das obras publicas, sejam enviados a esta camara os seguintes esclarecimentos:

1.° Os nomes dos segundos officiaes do mesmo ministerio que se apresentaram no concurso do logar de primeiro official vago pelo fallecimento de Francisco Antonio de Vasconcellos:

2.° Indicação e natureza dos, documentos que cada um dos concorrentes juntou ao seu requerimento;

3.° Numero de annos de serviço publico de cada um d'elles em geral e do serviço no ministerio das obras publicas;

4.° Qual foi a ordem em que cada um d'elles foi classificado pelo respectivo jury;

5.° Qual foi o nomeado. = A. Sarrea Prado.

Mandou-se expedir.

O sr. Abreu Castello Branco: - Mando para a mesa o diploma do sr. deputado eleito pelo circulo n.° 131, Caetano de Andrade e Albuquerque. Como esta eleição já foi approvada, peço a v. exa. que se digne enviar o diploma com urgencia á commissão de verificação de poderes.

O sr. Candido de Moraes: - Mando para a mesa um requerimento do sr. capitão reformado José Maria da Fonseca, pedindo que a sua reforma seja melhorada. Pela exposição feita por este militar, parece-me que e fundado o requerimento que elle dirige aos poderes publicos, e confio que a camara, na sua sabedoria, ha de aprecial-o com a devida justiça e deferil-o como o pretendente deseja.

Mando igualmente para a mesa outro requerimento do sr. alferes Sebastião Ignacio do Barros, pedindo que só lho mande contar a antiguidade do posto de alferes, de 24 de fevereiro de 1856. Encarregando-me do apresentar á camara este requerimento, e claro que eu não o faria, se não julgasse de toda a justiça as rasões allegadas pelo supplicante.

E já que estou com a palavra, permitta-me v. exa. que eu diga alguma cousa á camara ácerca dos factos a que se referiu o sr. Arrobas, e que dizem respeito, tanto ao actual commandante do engenheria, como á commissão nomeada para estudar a defeza do reino.

A lei organica da arma da engenheria estabelece de facto que seja commandante d'aquelle corpo um general, mas, em paragrapho do artigo respectivo, estabelece tambem que possa interinamente ser desempenhado aquelle cargo por um coronel.

Por consequencia, vê-se que o governo está dentro da stricta legalidade nomeando, para desempenhar interinamente aquelle cargo, um coronel, que é o mais antigo da arma.

Mas o sr. Arrobas não se limitou sómente a impugnar a legalidade da nomeação, parece que tambem quiz insinuar a incompetência do individuo em que ella recaiu.

Todos os que têem a honra de pertencer á arma de engenheria sabem que o sr. coronel Dias é um official muito digno a todos es respeitos. (Apoiados.) Não sei só o sr. Arrobas tem a competencia devida para poder avaliar a perfeição do orgão acustico d'aquelle distincto coronel, mas de certo as não tem para apreciar mal as suas qualidades aliás distinctas.

Eu posso anirmar, e o sr. Arrobas não póde contestar que ninguem mais do que o sr. coronel Dias seria capaz de zelar com brio e dignidade os interesses da corporação a que pertence e que tão dignamente commanda. (Apoiados.)

Emquanto á commissão de defeza, creio que o governo fez o que devia ter feito ha muito tempo.

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Ha annos julgou-se opportuno estudar a defeza do reino, e como se entendeu nessa epocha, e eu creio que muito mal, que o unico ponto a defender seria a capital, nomeou-se uma commissão de engenheiros, encarregada de estudar a defeza de Lisboa e seu porto.

Mas o governo actual considerou a questão na sua verdadeira altura, e entendeu que, em vez de se tratar unicamente das condições defensivas de Lisboa e seu porto, devia propor-se um plano geral de defeza, e nestas condições julgou conveniente e concentanco nomear uma commissão, não exclusivamente composta de engenheiros, porque o assumpto especial dessa commissão não era o das fortificações, mas composta de officiaes das differentes armas, que collaborassem todos na resolução do problema, como é pratica constante em todos os paizes fazer-se no estudo d'esta questão.

É claro que a commissão não podia ser constituida hoje, como era no tempo em que se pretendia estudar sómente as fortificações de Lisboa.

Nomearam-se portanto officiaes de reconhecida competencia, competencia que não póde ser impugnada por ninguem, sem que falte á justiça.

Por este facto não e licito censurar o governo, ao contrario, entendo que é digno de louvor, porque tomou a questão na sua verdadeira altura, encarou bem o problema e empregou os meios necessários para sua resolução cabal e satisfactoria.

Sr. presidente, o governo nunca pretendeu desconsiderar de certo o general da engenheria, como não pretendeu desconsiderar nenhum official, nem ha demonstração de que se possa inferir similhante intenção.

O sr. general, ex-commandante da engenheria, foi considerado com a maior distincção que se lhe poderia conferir, propondo o governo a sua elevação ao pariato.

Era uma pratica antiga, e creio que boa pratica, dar demonstração similhante de apreço não só aos, serviços relevantes prestados por militares altamente collocados como o sr. Mansos ao seu paiz, mas ás corporações que representam, e assim foram em outras epochas elevados ao pariato, os generaes commandantes da engenheria, os generaes commandantes da artilheria e em geral os officiaes que pelos seus serviços assignalados o longa o exemplar carreira militar, se tornaram merecedores d'esta distincção.

Praticando o governo este acto com relação ao general Mancos, fez, entendo eu, plena justiça ao caracter elevado e ás distinctas qualidades que concorrem n'aquelle militar.

Mas, sr. presidente, os commandos é uma attribuição do governo dal-os ou retiral-os, sem que dahi se possa inferir de qualquer modo que ha desaire para as pessoas em relação ás quaes se dão esses factos. (Apoiados.)

E o governo exonerando o sr. general Mancos da importantissima commissão que elle exercia, não poz de parte os seus serviços, pelo contrario aproveitou-os, e aproveitou-os numa commissão das mais importantes de quantas póde ter um militar, que têm a graduação elevada de tão distincto official; equiparou-o aos magistrados e collocou-o no tribunal superior de guerra e marinha.

Ora, sr. presidente, será isto uma desconsideração? Será isto o resultado de qualquer casualidade, que mais ou menos directamente se podesse referir á politica do governo? Creio que não ha menos justiça quando se fazem affirmações d'esta natureza. (Apoiados.)

Digo isto, e peço desculpa á camara de ter occupado por tanto tempo a sua attenção.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Rodrigues de Freitas: - Sr. presidente, se não me engano, passa de quatro horas da tarde; hoje, não sei por que motivo, v. exa. concede-me a honra do fallar antes da ordem do dia, apesar de ter, ha muito, dado a hora em que se costuma entrar nella; agradecendo a

v. exa. esta deferencia, occupar-me-hei de uma questão differente d'aquella que me levou a pedir a palavra.

Recebi hontem uma nota, enviada pelo ministerio da justiça, ácerca dos conventos do freiras que existem em Portugal, com a indicação do numero de religiosas residentes em cada um delles.

Temos 74 conventos com 221 religiosas, ou, termo medio, 3 freiras por convento!

Segundo o decreto de 1833, assignado por um dos mais notaveis ministros que tem tido este paiz, o sr. José da Silva Carvalho, logo que os conventos tivessem só 12 freiras deviam ser considerados extinctos e a fazenda publica devia tomar couta desses bons.

Vou ler á camara as palavras de Silva Carvalho, escriptas naquelle tempo em que os ministros eram verdadeiramente inspirados pelos principios liberaes:

"É prudente, é nobre, é necessario que Vossa Magestade Imperial não cerque o throno de sua augusta filha d'esses corpos que umas vezes têem feito curvar diante de si os reis, outras vezes têem feito curvar os povos diante dos interesses dos reis seus protectores, que elles enlaçam com os interesses de Deus."

A este respeito ha trabalhos officiaes apresentados ao parlamento portuguez em 1858 ou 1809 (não me recordo bem da data), sendo ministro o sr. duque d'Avila, então Antonio José d'Avila; e por esse tempo tambem o sr. Vicente Ferrer Neto de Paiva, homem verdadeiramente liberal (Apoiados.), escrevia no relatorio de um projecto.

(Leu.)

Pergunto ao governo em quanto computa os bens d'esses conventos que deviam ser desde muito bens nacionaes, e porque é que o governo não tem tomado conta d'elles. Ha porventura embaraços postos por qualquer poder ecclesiastico, o que o governo cumpra os seus deveres? Esta pergunta tanto a dirigiria ao actual governo como a todos os outros que o precederam.

É preciso que se diga o motivo por que na occasião em que Fe recorre ao imposto, em que se pedem ao paiz grandes sacrificios, esses bens, que deviam ter sido encorporados na fazenda nacional, o não têem sido.

O paiz, de que somos representantes, tem o direito de exigir que lhe digam a verdade a este respeito; que o governo exprima a sua opinião franca e sem ambages, que não adie um só momento qualquer explicação sobre assumpto tão grave, especialmente quando annuncia que ainda em 30 de junho de 1880 teremos um deficit que não poderá de modo algum ser inferior a 4.500:000$000 réis!

Desejo portanto que o governo dê explicação completa a este respeito.

Agradeço ao sr.. ministro da justiça o ter mandado com tanta promptidão os esclarecimentos que pedi, o a v. exa. rogo que me inscreva para eu responder, se o julgar necessario, ás explicações que o governo de certo se apressará a dar.

O sr. Ministro da Justiça (Adriano Machado): - É certo que a legislação citada pelo illustre deputado considera, supprimidos os conventos logo que o numero de religiosas esteja reduzido a menos de doze em cada um; mas tambem e certo que se tem entendido sempre que emquanto houvesse alguma religiosa a fazenda não tomasse conta dos bens do respectivo convento. É a jurisprudencia que se tem seguido sempre. (Apoiados.)

No tempo desses ministros liberaes, a que s. exa. se referiu, era força de valor expulsar esses elementos fortes que dominavam as instituições; mas hoje seria um valor muito covarde desalojar aquellas pobres velhas, que estão dentro d'esses mosteiros, cujas ruinas estão quasi caindo sobre as suas cabeças, e apesar dcsse estado de ruína, é para ellas de uma grande repugnancia abandonal-os.

N'estas circumstancias, parece-me que, em logar de valor, será uma tolerancia, que de certo não contraria os sentimentos do illustre deputado, o deixal-as morrer pacifica-

Sessão de 25 de janeiro de 1881.

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mente n'esses conventos, sendo certo, que nenhum obstaculo. ha da parte do governo, a não ser este sentimento do caridade e benevolencia para com as religiosas velhas, que estão n'esses conventos, nenhum obstaculo ha, repito, que empeça o governo do expulsar as freiras, e tomar couta das suas propriedades para a fazenda.

Creio que o perigo, que o illustre deputado receia, do extravio a que poderão sujeitar-se os seus bens religiosas, não existe; porque esses bens já se acham inventariados para a desamortisação, o muitos já estilo até desamortizados.

Portanto, creio que, executando-se, como se tem executado, e como continuará a executar-se, activamente a lei da desamortisação, applicada aos conventos, cessam todas as difficuldades e desapparecem esses receios de defraudação, de que a fazenda nacional effectivamente poderia ser victima.

Não posso já n'este momento dizer ao illustre deputado quanto é a somma total da propriedade dos conventos, já desamortisada e ainda por desamortisar, tanto dos conventos que ainda existem, como dos que já se acham supprimidos, em consequencia da morte das suas proprietarias; mas não me levará isso muito tempo, se o illustre deputado o desejar.

Tenho todos esses mappas feitos, e foi por isso que o illustre deputado obteve agora, tão depressa, os esclarecimentos que pediu, e que não sei se já tinha pedido na sessão passada.

Estes mappas levam tempo a organisar, mas a copiar não levam muito; e, repito, se o illustre deputado póde obtel-os tão depressa, e porque já estavam feitos; comei do mesmo modo está feito um trabalho a respeito da desamortisação dos bens dos conventos.

Está concluido apenas até 30 de junho do anuo passado, mas é facil concluil-o até á presente data.

Não posso pois dizer-lhe já ao certo a quanto monta essa somma, mas, pelos dados que já se acham colligidos, tenho idéa de que deveria andar por dois mil e tantos contos.

O que não posso é fazer a differença do que pertence aos conventos que ainda existam, e aos que já se supprimiram, mas se o illustre deputado deseja saber tudo minuciosamente, em pouco tempo tem todos ossos documentos na sua mão, porque se acham por assim dizer, feitos, é simplesmente, o trabalho de os copiar.

Como disse, tenho este trabalho já feito, porque tenciono apresentar á camara um projecto de dotação do clero baseado n'elle.

Pelo ministerio da justiça, fazem-se actualmente de despeza com o culto o clero, cento e trinta e tantos contos de réis, e parecia-me bem, passar esta despeza para um culto tambem ecclesiastico, formado com os bens dos conventos existentes, e assim viria a desapparecer com o tempo, uma verba avultada do nosso orçamento, o podia melhorar-se ao mesmo tempo a situação do clero parochial.

Era a este fim que destinava os bens dos conventos, e sobre que por agora não digo mais, nada porque não é elle o objecto da pergunta do illustre deputado.

São estas as respostas que posso dar ao illustre deputado, segundo o estudo que tenho feito do assumpto sobre que chamou a attenção do governo.

O sr. Presidente: - Devo dar uma explicação ao sr. Rodrigues de Freitas e á camara, que talvez tenham estranhado o não se ter entrado já na ordem do dia. A rasão é porque o sr. João Chrysostomo tinha pedido a palavra para antes de se passar á ordem do dia, e como s. exa. estava inscripto quasi em ultimo logar, eu procurei dar a palavra aos srs. deputados que primeiro se inscreveram, que não podia passar por cima da sua inscripção para ir dar a palavra ao sr. João Chrysostomo. (Apoiados.)

O sr. Rodrigues de feitas: - Agradeço ao sr. ministro da justiça as explicações que me deu. Considero muito os motivos que tenham tido os governos anteriores ao actual para consentirem que ainda estejam em tantos conventos freiras que ha muito deviam ter ido viver noutros; respeito a benevolencia que para com ellas tem havido, mas desejo saber se taes ministerios, lembrando-se d'estas senhoras, que estão na decrepitude, não se lembravam tambem das creanças que não tinham estabelecimentos de ensino onde recebessem o pão do espirito!

Pergunto ao sr. ministro da justiça se é licito invocar aquelle sentimento, quando se trata da execução de uma lei; pergunto ao governo se, havendo em Portugal sómente 2:400 escolas de instrucção primaria para o sexo masculino e 800 para o feminino; quer dizer, em relação ao sexo femenino uma escola para cinco freguezias, o em relação ao sexo masculino um numero tal que faltam muito mais de mil escolas para que haja ao menos uma por freguezia; pergunto ao sr. ministro da justiça se a mesma ou maior benevolencia não devia animar todo o governo em relação a um exercito de creanças que, uma vez instruidas, tanto haviam de contribuir para o bem estar do paiz; pergunto ao governo se convrm dar aos representantes do passado uma benevolencia illegal, ou se urge attender ao futuro em nome do progresso e da civilisação desta terra? E finalmente pergunto ao governo se tal benevolencia é justa, quando se lançam novos e pesados impostos? Acaso não são obrigados a pagal-os tantos individuos que não têem largos recursos para sustentar as suas proprias familias? E nos conventos, onde vagueiam decrepitas freiras, não havia espaço de mais para casa de escolas normaes, ou de instrucção primaria de primeiro e segundo grau?

Por que não cumpriram a lei este governo e os anteriores? O que me importa não é accusar este ministerio; a minha questão é a legalidade, contra a qual têem operado diversos governos.

E porque se deixaram arruinar- tantos desses convento, de modo que hoje têem um valor muito menor?

O sr. ministro do reino de certo desejaria que a camara tivesse approvado o anuo passado uma proposta de lei importante, a do levantamento de um emprestimo de réis 2.000:000$000 para casas de escola; se não se discutiu, foi por causa do encargo financeiro; este anno parece que succederá o mesmo; pois tome para a fazenda os bens dos conventos que a ella desde tanto pertencem, e terá valiosos recursos.

A camara comprehende que, quaesquer que sejam as diligencias que faça o sr. ministro da justiça (que eu respeito e venero muito pelos seus talentos, e de cujas lições mo recordo com prazer, porque a ellas devo uma parte do pouco que sei), a camara comprehende que, quaesquer que sejam as explicações dadas pelo sr. ministro, não ha coragem para luctar com algum poder que impede alo a feitura dos inventarios minuciosos dos conventos quanto mais a tomada de posse dos seus bens; creio que nem se emendaram ainda os defeitos indicados no importante relatorio que o sr. duque d'Avila apresentou n'esta casa.

Estes fachos precisavam sor postos a toda a luz da discussão parlamentar.

É para sentir que nós, que nos dizemos tão liberaes, tão amigos de todas as conquistas do progresso, não nos importemos com os monumentos da legislação liberal, nem com a fortuna publica, o deixemos esses quasi espectros vaguear pelos conventos que lhes não pertencem, emquanto o povo paga, paga e ha do pagar mais impostos.

Não leio agora á camara o relatorio do sr. Braamcamp, apresentado em 1862, no tempo em que o partido historico não teve receio de levantar a questão religiosa, a que alludiu recentemente um illustre orador d'esta casa: era no tempo em que a palavra eloquente do José Estevão animava o governo a tomar as providencias contra as congregações religiosas que invadiam o paiz; não leio esse relatorio; mas a occasião era azada para perguntar ao sr. ministro do reino se julga que as providencias que re-

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commendou na sua portaria de 12 de novembro do anno passado são sufficientes para que se extingam os conventos dos jesuitas, um dos quaes existe em Castello Branco, (Apoiados.) como s. exa. deve sabor pelo relatorio que lhe enviou o governador civil, e por outro de uma commissão especial; consta-me que ahi se narravam factos importantissimos; e não sei se s. exa. julga que com a sua portaria póde luctar de frente com o jesuitismo; se póde luctar e vencer.

O que digo ao governo é que é conveniente que a resolução dos problemas graves não se adie, que o partido liberal não durma, e que era nome de uma tolerancia, a qual seria uma imprudencia, e que o é de certo, não retrocedamos ao tempo em que foi preciso usar da forca armada para derrotar aquelles que em nome de Deus falsamente diziam ser favoraveis á liberdade. (Apoiados.)

O sr. Goes Pinto: - Mando para a mesa a seguinte:

Participação

Tenho a honra de participar a v. exa. que se acha constituida a commissão de obras publicas, que elegeu seu presidente o sr. Carlos Ribeiro, e secretario a mim participante.

Sala das sessões, 20 de janeiro de 1881. = Goes Pinto.

Para a secretaria.

O sr. Pinheiro Chagas: - Agradeço extremamente a v. exa. e á camara esta cortezia tão benevola e tão extraordinaria com que deixou hoje esgotar a inscripção antes da ordem do dia, (Apoiados.) sem se resolver entrar no debate do projecto de resposta ao discurso da corôa.

Acceito, sem de forma alguma commentar, as phrases cortezes e benevolas do v. exa., e vou usar da palavra.

Eu tinha pedido a palavra para requerer esclarecimentos ao governo e pedir uma explicação ao sr. ministro da marinha, e n'este ultimo ponto já fui precedido. Em todo o caso, como a camara está tão extraordinariamente benevola comnosco, sempre usarei da palavra, tanto mais quanto o sr. Rodrigues de Freitas acaba de levantar uma questão que tem uma certa importancia, grande mesmo, a que o sr. Adriano Machado, devemos confessar, deu a resposta mais extraordinaria.

Confesso a v. exa. que entre todas as surprezas que temos tido na sessão de hoje, a, mais extraordinaria de certo foi ver o sr. Adriano Machado empunhando a, lyra de Lamartine a cantar threnos aos conventos quasi derruidos e que estão ameaçando cair sobre as cabeças das religiosas, pedindo á camara que as deixe morrer sepultadas debaixo das ruinas dos conventos, antes do que tiral-as dali e transferil-as para outros.

Ainda percebia o sentimento de s. exa. se fossemos arrancar essas religiosas para as arrojar á rua, obrigando-as a estender a mão á caridade publica; mas tiral-as dali para as transferir para outros conventos, juntar essas religiosas que estão dispersas por um grande numero de mosteiros, em poucos conventos onde podessem subsistir decentemente, não vejo realmente que possa ferir o sentimentalismo tão inspirado, tão poetico e tão lamartineano do sr. Adriano Machado.

Como disse a v. exa., tinha pedido a palavra para pedir alguns esclarecimentos ao sr. ministro da marinha, no que fui precedido pelo nosso collega o sr. Evaristo Brandão, mas devo confessar que não me satisfizeram completamente as explicações que o sr. visconde de S. Januario deu. Em primeiro logar não posso acceitar de forma alguma a increpação que parece dirigir-se á imprensa por ter conhecimento das condições de um contrato que vae ser feito por s. exa., antes de ser assignado; não tenho obrigação alguma de saber como chegaram as noticias aos jornaes.

Não apresento essas noticias como factos authenticos, menciono-os como simples boato e peço explicações a s. exa.

Se s. exa. póde dar essas explicações, que as dê; eu é que não tenho obrigação de pedir ao jornal que deu as noticias que me diga o modo por que teve d'ellas conhecimento.
Pergunte-o s. exa. aos seus empregados. Isso é com elles e não commigo.

Disse o sr. visconde de S. Januario que o contrato não podia ser a photographia do programma.

Permitta-me s. exa. que lhe diga, usando da sua linguagem figurada, que o contrato não deve ser a amplificação photographica.

E é n'este sentido que o boato tem um caracter grave, porque accusa um facto importante.

S. exa. póde contestar as minhas informações, póde mesmo não dar explicações ou adial-as para quando lhe for mais conveniente; mas eu é que tenho o direito de o prevenir desde já, de que acharei irregular o seu procedimento se for conforme com o que noticiam os jornaes.

Apresentaram-se tres concorrentes no concurso para a empreza de navegação para a costa occidental de Africa, dois dos quaes, achando o programma irrealisavel, retiraram-se diante do terceiro, ou emfim o terceiro é que foi o preferido, por se conformar com o programma.

E agora parece que neste contrato que se vae fazer com o terceiro concorrente se fazem. modificações importantes ao programma, como s. exa. mesmo deu a entender, porque nos disse que o contrato não podia ser a photographia do programma.

Isto é que não se póde admittir de maneira alguma.

Se effectivamente o programma tivesse condições realisaveis, os outros concorrentes podiam naturalmente tel-o acceitado, e agora têem todo o direito de protestar por verem que o concorrente preferido obteve do ministro favores que lhes foram recusados.

Por consequencia, se o illustre ministro da marinha reconhece que o programma não podia ser realisado em toda a sua amplitude, parece-me que o unico caminho que tem a seguir é abrir novo concurso, e não fazer arbitrariamente concessões a um dos concorrentes com projuizo dos outros. (Apoiados.)

Não vejo o sr. ministro da fazenda no seu logar, e não sei se s. exa. já se retirou.

Elle ainda agora estava tão ancioso por entrar em todas as questões que digam respeito ao seu ministerio, que eu tenho realmente vontade de satisfazer um pouco a sua anciedade.

(O sr. ministro da fazenda occupou o seu logar.)

O sr. ministro da fazenda queixou-se de que o sr. Arrobas fallava em assumptos relativos ao seu ministerio, quando s. exa. estava ausente.

Ora, nas occasiões em que o illustre ministro tem estado presente e em que o temos interrogado a respeito de assumptos relativos ao seu ministerio, tem-nos dado respostas tão evasivas, que realmente não vale a pena fazerem-lhe perguntas para se obterem taes respostas.

Ainda ha pouco tempo o, sr. Hintze Ribeiro, estando presente o sr. ministro da fazenda, lhe perguntou os motivos por que tinha feito a nomeação de um certo escrivão de fazenda.

S. exa. levantou-se e disse que não se lembrava de quaes eram esses motivos, e a explicação que o sr. Hintze Ribeiro desejava, e que desejava a camara ainda a não ouvimos.

Ora, para isto não valia realmente a pena mostrar-se ancioso por tratar dos assumptos relativos ao seu ministerio.

Já que tenho a felicidade de ver s. exa. presente, vou tambem chamar a sua attenção para factos que se estão dando no seu ministerio e que contrariam completamente portarias suas, portarias em virtude das quaes se tem perseguido muita gente e que estão sendo completamente descumpridas no ministerio da fazenda.

Citarei, por exemplo, um facto.

Tendo s. exa. annunciado, logo que entrou no ministerio, que não se permittiam nas alfandegas as trocas de em-

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pregados que não fossem de alfandegas da mesma categoria, em virtude d'isso foram muitos empregados obrigados a mudar de residencia com grande prejuizo seu; mas, apesar d'isto, têem-se agora feito trocas de empregados de alfandega do categoria diversa em grande numero.

Se for necessario, se s. exa. contestar a verdade d'esta minha observação, eu citarei nomes.

Eu perguntaria, portanto, a s. exa. só está disposto a manter as deliberações que tomou quando subiu ao ministerio, ou se os abusos contra os quaes clamou, e contra os quaes clamaram os seus amigos, continuam a subsistir no ministerio da fazenda.

Leu-se na mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que me seja enviada, pelo ministerio das obras publicas, copia de todas as portarias expedidas por aquelle ministerio desde 20 do junho de 1879 até 31 de dezembro de 1880 ácerca do estradas reaes distristaes e municipaes do districto do Coimbra, ou sobre estudos das mesmas estradas ou sobre trabalhos de construcção, ou sobre qualquer assumpto a ellas relativo, ou fossem expedidas ao director das obras publicas ou ao governador civil ou á, junta geral do districto e respectiva commissão executiva. = Manuel Pinheiro Chahas.

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Folgo muito que o illustre deputado se dirigisse a pedir-me explicações o esclarecimentos sobre negocios do meu ministerio, e reitero a declaração que ha pouco fiz: aqui estou prompto a dar essa e quaesquer outras explicações que me forem pedidas. O que não é possivel é exigir de um ministro que responda de repente a qualquer pergunta que se lhe faz de improviso sobre qualquer dos muitos actos que esse ministro tem praticado durante, um, dois os tres annos de gerencia de uma pasta. É impossivel. Pela minha parte decifro que tenho a memoria muito fraca; mas creio bem que qualquer dos meus illustres antecessores, collocado n'esta situação, teria a mesma dificuldade que eu tenho em responder.

Outro dia levantou-se o illustre deputado o sr. Hintze Ribeiro e perguntou me qual a rasão por que eu tinha feito um determinado despacho. Eu disso a s. exa. que esse despacho tinha sido realisado em virtude das informações competentes que eu tinha attendido, mas que não me lembrava precisamente de quaes eram as disposições legaes em que se firmava o parecer da repartição competente, á vista do qual ou fizera o despacho. Creio que a explicação, para ser do momento, era cabal; e eu promptifiquei-me a dar quaesquer outras logo que me fossem exigida,. O processo da nomeação desse emprego está presente, e eu estou habilitado a dar a resposta que o illustre deputado deseja.

Em 14 do setembro do anno passado requereu o amanuense do ministerio da fazenda, João Francisco Xavier Eça Leal, ser despachado para o logar de escrivão de fazenda da Horta, logar que estava vago. Sobre este requerimento recaiu uma informação do illustrado funccionario que está á frente da direcção geral das contribuições directas1, informação que eu passo a ler á camara.

Diz ella:

(Leu.)

Sobre esta informação recaiu o meu despacho nos seguintes termos.

(Leu.)

Ora quando leio esto parecer á camara, não é por fórma alguma entenda se bem, para declinar a responsabilidade do acto sobre o illustrado funccionario que, no desempenho dos seus deveres o escutando a voz da sua consciencia, exprimindo franca e sinceramente perante o ministro a opinião que tinha, sobre o assumpto, pretendia unica e exclusivamente esclarecel-o ácerca do assumpto. A responsabilidade do acto é toda minha. As rasões que só dão n'esta informação acceitei-as, e por as ter acccitado é que fiz a nomeação daquelle empregado.

Mas nós poderemos discutir essas rasões; e eu perguntarei muito singelamente a v. exa. e á camara, em que disposição legal, clara o terminantese fundam as repetidas nomeações de amanuenses do ministerio da fazenda para delegados do thesouro? E entretanto essas nomeações têem-se sempre feito e nunca forem contentadas. Pergunto eu: se podem os amanuenses do ministerio da fazenda ser nomeados delegadas do thesouro, que é o mais, não poderão ser nomeados escrivão de fazenda, ou poderá contestar-se esta faculdade ao governo do os nomear para o menos? Têem elles possibilidade de desempenhar bem o logar de delegado do thesouro, e não terão para desempenhar o de escrivão de fazenda?

Pareceram me tão concludentes estas rasões que, acceitando-as, nomeei aquelle emprivado, o note-se, repito, que isto não é declinar a responsabilidade, que é toda minha, do acto que pratiquei, entendi que, tendo empregados daquella categoria podido ser nomeados delegados do thesouro, muito mas se podiam nomear escrivães da fazenda.

Em relação ao segundo ponto, sobre que o illustre deputado me interrogou, responderei que tenho presentes alguns esclarecimentos que pedi sobre o assumpto, os quaes logo que se achem completos serão apresentados á camara.

A portaria ácerca dos empregados das alfandegas tem sido cumprida. O que se passava antes do ou entrar para o ministerio era o seguinte:

Nomeavam-se aspirantes nos termos da lei para as alfandegas da raia, mas, por conveniencia de serviço ou por qualquer outra rasão, esses empregados oram desde logo mandados fazer serviço das alfandegas de Lisboa e Porto.

É claro que os meus antecessores, procedendo assim, faziam-o certamente em virtude de um motivo qualquer do interesse publico, e neste ponto faço-lhes a justiça que desejo me inçam igualmente.

Tinham, talvez, em monte os meus antecessores, que nas alfandegas de Lisboa e Porto o expediente era grande, e convinha ter ali o maior numero de empregados para dar andamento a esse expediente; mas o facto é que, pouco a pouco, foi-se agglomerando nas duas alfandegas uma grande quantidade de empregados das alfandegas da raia.

Nestas condições, e querendo introduzir ordem no serviço, era já difficil fazer a escolha a fim de se saber quaes os empregados que deviam voltar para as suas alfandegas, e por isso o governo entendeu dever pôr cobro ao que já não era um uso, mas sim um abuso, ordenando que esses empregados voltassem todos para os seus logares.
Estava em vesperas de uma eleição geral, e perguntarei a quem me escuta, se não lhe occorre que sobre o ministro da fazenda se exercia toda a especie, não digo do pressão, mas do pedidos o de recommendações para que sustasse na execução rigorosa d'aquella portaria, allegando-se inclusivamente o inconveniente politico que n'aquelle momento podia dirivar-se d'elle.

Pois apesar dos innumeros pedidos que se me fizeram, julguei do meu dever dar-lhe plena execução, unicamente com o fim do conseguir que o serviço se fizesse em melhores condições.

Mas depois d'isto o que succedeu? Haverá porventura alguns empregados que estejam nas alfandegas de Lisboa e Porto, em contravenção com a pintaria? Ha um velho empregado, e não digo o nome, que não vem nada para o caso, o qual tem perto de oitenta annos, e que eu obriguei a ir para o Porto, mas condoendo-me, do seu estado, não só pela sua avançada idade, mas ainda pelo seu precario estado de pando que a todos devia inspirar a maior consideração, perderei-o regressar a Lisboa.

Outro empregado na mesma condição é um primeiro official com mais do setenta annos; ácerca d'este subiu ao ministerio uma representação do director da alfandega de Lisboa, solicitando, era nome de todos os empregados, que,

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em attenção á sua idade e estado de saude o bons serviços, elle fosse conservado em Lisboa.

Ha ainda um terceiro empregado, um aspirante do Porto que tambem está em Lisboa a requisição do director da alfandega, que declarou ser aquelle empregada indispensavel para o serviço da secretaria e que fazia grave transtorno a sua saida d'ahi.

Fora d'estes tres casos não contesto que haja ainda algumas trocas, que não se explicam pelo sentimento a que o illustre deputado ha pouco alludiu mas pelo desejo de não contrariar inutilmente as conveniencias d'esses empregados; mas essas, trocas em virtude das quaes os empregados vão passar dois ou tres mezes em Vianna, em Lisboa ou em outra qualquer parte, são temporarias e têem sido permittidas. (Apoiados.)

Finalmente, como v. exa. e a camara sabem, o governo procurou satisfazer a uma necessidade, geralmente sentida, reorganisando o serviço da estatistica.

O serviço da estatistica commercial fazia-se por fórma que quasi d'elle se não podia colher nenhum dos subsidios que as publicações d'esta ordem podem prestar ao estado das questões economicas! Ainda ha poucos dias apenas que foi conhecido o movimento estatistico de 1878; publicado dois ou tres annos depois de se terem passado ou factos a que se refere, basta essa circumstancia para se reconhecer que esse serviço não satisfaz ás condições em que se realisa hoje em toda a parte e a que realmente deve amoldar-se para ter alguma utilidade. (Apoiados.)

Diligenciei, portanto, melhorar o serviço da estatistica geral das alfandegas, e, ouvido o conselho geral das alfandegas, publiquei, como a camara sabe, as instrucções reorganisando esse serviço. Com essas providencias espera o governo, não só que o serviço estatistico, que estava em atrazo, fique em dia, por isso que este anuo conto publicar as estatisticas de 1879-1880, mas conto alem d'isso, que a partir de janeiro de 1831 se publicará mensalmente no Diario do governo um mappa do movimento de todos os principaes generos de importação e exportação em todo o paiz. (Muitos apoiados.)

Desejando conseguir este resultado sem ir alem das sommas que annualmente se despendem. com este serviço, aproveitei para isso alguns empregados da alfandega da raia, que o conselho das alfandegas me indicou, e é essa a rasão da sua presença no Porto e em Lisboa, sem que por isso se possa julgar que foi derogada a portaria a que temos alludido.

Por consequencia, repito, estão em Lisboa os dois empregados velhos do Porto, tendo um perto de oitenta e o outro de setenta annos, e o aspirante que foi pedido pelo director das alfandegas por ser considerado indispensavel para exercer certas funcções na secretaria da mesma alfandega; e alem d'esses empregados, estão em Lisboa outros por troca temporaria de serviço, e finalmente os aspirantes da raia que vieram para fazer o serviço da estatistica.

Creio que tenho dado ao illustre deputado explicações que, a meu ver, são satisfactorias, demonstrando-lhe assim a minha boa vontade em satisfazer aos desejos de s. exa.

O sr. Ministro da Marinha (Visconde de S. Januario): - Voltando á questão da companhia da navegação de Africa sobre a qual julgo já ter dado as explicações, que por emquanto devia dar, direi ainda mais algumas palavras em resposta ao meu amigo, o illustre deputado o sr. Pinheiro Chagas.

Começo por declarar ao illustre deputado que não fiz a menor censura á imprensa, pelo facto d'ella ter frito algumas considerações sobre um contrato, que ainda não estava publicado.

Reconheço pleno direito á imprensa em esclarecer o publico como lhe aprouver; o que disse simplismente foi que me parecia inopportuno, trazer para a camara a discussão de boatos que corriam na imprensa, desde o momento que não ha uma base segura e definitiva, sobre que possa assentar a argumentação; e offectivamente parece-me completamente inutil toda a discussão que houver sobre boatos. Portanto as observações do illustre deputado com relação ás palavras que parecia querer attribuir-me, careciam do fundamento, porque, ou s. exa. não prestou toda a attenção ao que eu disse, ou não me fiz comprehender bem a s. exa.

Eu disse que o contrato não está ainda assignado. Está, é verdade, muito adiantado, mas ainda não se acha assignado.

Disse mais tambem, que entendia, que um contrato não póde ser a reproducção photographica de todas as condições do programma, palavra por palavra, o contrato desenvolve o programma com largueza, e n'esse desenvolvimento deve encontrar-se o seu pensamento fundamental, (Apoiados.) e as suas condições.

Foi debaixo d'este ponto de vista que entendi e julguei dever fazer o contrato que está quasi a publicar-te, e a que se referiram os srs. Evaristo Brandão e Pinheiro Chagas.

Quando o contrato apparecer, então será occasião de tratar da sua discussão, mas sobre uma base segura e assentada; o que não desejo, e o que não me parece nem util nem opportuno, é que se esteja discutindo sobre boatos, que embora reconheça, como já disse, o direito que a imprensa tem de os reproduzir, não são base segura para uma discussão.

Não sei por quem, nem como foi dada a noticia; não tenho nada com isso, nem isso me importa. Quando estou fazendo um contrato no meu gabinete, não autoriso os meus empregados a publical-o nos jornaes antes de ter sido publicado na folha official; no entretanto, como todos os meus actos são muito licitos, não tenho receio que os publiquem, e respeito a liberdade da imprensa, reproduzindo a noticia d'elles, venha ella d'onde vier.

Os illustres deputados referiram-se tambem á demora que tem havido na ultimação desse contrato; essa demora é independente da vontade do governo; comtudo, posso asseverar a s. exas. que, se effectivamente alguma demora-tem havido, não houve com, isso a menor falta no serviço, nem em prejuizo do commercio nem do estudo; porque a companhia actual prestou-se a continuar o serviço, nas mesmas condições do seu contrato até ao mez de julho do corrente anno; portanto, estou certo que os illustres deputados me farão justiça, acreditando que procuro ser cuidadoso e diligente na resolução dos negocios a cargo do meu ministerio, no que não faço mais do que cumprir com o meu dever.

Creiam, pois, os illustres deputados que o contrato ha de em breve ser trazido á camara, e então é occasião de se fazerem as observações que se julgarem opportunas; julgando n'este momento, repito, não me caberem as antepassadas censuras dos illustres deputados sobre factos hypotethicos, factos que ainda não conhecem e que não passam de boatos que correm no publico.

Tenho dito.

O sr. J. A. Neves (para um requerimento): - Requeiro a v. exa. que se passe á ordena do dia.

O sr. Presidente: - Já declarei á camara os motivos que tinha para não passar á ordem do dia. O sr. João Chrysostomo desejava que se não passasse á ordem do dia sem se lhe conceder a palavra porque queria dizer alguma cousa relativamente ao que havia, dito o sr. deputado Arrobas. O sr. João Chrysostomo é quem segue agora a fallar.

O sr. J. A. Neves: - Então retiro o meu requerimento.

O sr. João Chrysostomo: - Sr. Presidente, a hora está muito adiantada e julgo que não é agora a occasião mais propria para dar todas as explicações que desejo dar em relação a alguns pontos a que se referiu o sr. deputado Arrobas.

O illustre deputado declarou que desejava fazer algumas

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perguntas e provocar algumas explicações da parte do sr. ministro da guerra sobre negocios do ministerio da guerra referentes ao tempo em que esteve a meu cargo. Foi por isso que pedi a palavra: eu quero dar todas as explicações que estejam ao meu alcance ácerca dos differentes assumptos a que s. exa. alludiu.

Mas como o sr. deputado dirigiu as suas perguntas ao actual sr. ministro da guerra; e como s. exa. não está presente, eu peço que v. exa., quando se tratar d'esses assumptos, me dê tambem a palavra, porque preciso dizer alguma cousa em resposta às arguições que o illustre deputado aqui fez.

No entanto, peço licença para dizer desde já, que nos actos que são da minha responsabilidade eu procurarei dar todas as explicações na occasião opportuna, mostrando que essas arguições são destituidas de fundamento.

O sr. Joaquim Tello: - Mando para a mesa a seguinte:

Participação

Participo a v. exa. que se constituiu a commissão de recrutamento, nomeando presidente o sr. deputado Alves Carneiro e secretario a mira participante.

Sala das sessões, 24 de janeiro do 1881. = Joaquim Tello.

Para a secretaria.

Vozes: - Deu a hora.

O sr. Presidente: - A hora está effectivamente muito adiantada, mas não é ainda chegada a hora em que se costuma encerrar a sessão; temos ainda proximamente meia hora.

Vozes: - Já deram cinco horas.

O sr. Presidente: - O que eu posso fazer é consultar a camara.

O sr. Julio de Vilhena: - Parece-me que, em logar de se entrar agora na ordem do dia, v. exa. poderia dar a palavra aos srs. deputados que ainda estejam inscriptos para antes da ordem do dia. (Muitos apoiados.) Já deram cinco horas da tarde, e não mo parece que seja esta a hora mais propria para se passar á ordem do dia. (Apoiados.)

O sr. Presidente: - Se a camara concorda em que se não entre na ordem do dia, eu darei a palavra aos senhores que ainda estão inscriptos. (Muitos apoiados.) Não ha inconveniente nisso. (Apoiados.)

Então tem a palavra o sr. Hintze Ribeiro.

O sr. Hintze Ribeiro: - Como tudo isto é estranho, sr. presidente!

Pois interrompe-se a discussão do projecto de resposta ao discurso da corôa, a discussão politica por excellencia, para se proseguir até esta hora em pequenos incidentes, só porque v. exa. entendeu não dever passar á ordem do dia sem que o sr. João Chrysostomo tivesse ensejo de dar algumas explicações á camara; e a final, chegado o momento de as prestar, o sr. João Chrysostomo declara que a occasião não é opportuna, e que se reserva para mais tardo o fazer! Então para que esperámos nós até agora? (Apoiados.)

V. exa. sabe que eu tenho a maxima consideração pelo sr. João Chrysostomo; mas v. exa. tambem não ignora que nesta camara são iguaes os direitos de todos os deputados, e de certo se recorda de que tem muitas vezes passado por cima da inscripção de antes da ordem do dia, a fim de entrar na discussão do assumptos, aliás de muito menos importância do que aquelle que ao presente se debate. (Apoiados.)

Se o sr. João Chrysostomo precisava de dar promptas explicações á camara e ao paiz, de quaesquer actos da sua administração, bastava que s. exa. o declarasse para ninguem se recusar a permittir-lhe que para logo o fizesse, com prejuizo de todos os demais oradores inscriptos, mas, em todo o caso, sem prejuizo da ordem do dia. (Apoiados.) Toda a camara folgaria em ouvir as declarações do sr. João Chrysostomo, mas de fórma que isso não perturbasse o andamento regular dos nossos trabalhos, e não viesse estorvar o debate da resposta ao discurso da corôa. (Apoiados.) Isto não é uma censura a V exa., mas é um reparo que me cabe o direito de fazer, porque não me consta que era tempo algum se interrompesse a discussão da resposta ao discurso da corôa, prorogando indefinidamente os incidentes que são proprios da primeira parte das nossas sessões.

Chego até a duvidar de que fosso essa a verdadeira rasão do que na sessão de hoje se tem passado.

Seria antes a presença de tantos dignos pares do reino, justamente na occasião em que ia levantar-se a palavra energica do sr. Julio de Vilhena para responder ás accu-sações que á camara alta só fizeram hontem aqui?

Deixo á consciencia de cada um o ajuizar por si.

Sr. presidente, eu pedi a palavra para responder ao sr. ministro da fazenda.

Ha dias reclamei eu de s. exa. que me dissesse qual a lei era que se baseara para fazer um despacho de escrivão de fazenda de primeira classe, que recaíra num simples amanuense do ministerio da fazenda. Nessa occasião, s. exa. não descobriu a lei, s. exa. não se recordava até de simmilhante despacho; mas prometteu solemnemente que viria em breve praso á camara justificar o seu procedimento e indicar-nos a legislação em que se fundara para o despacho que fizera.

Pois decorreram varios dias e s. exa. não appareceu, esquivando-se assim ao pesado encargo dessa justificação, a que tão solemnemente se obrigara.

Foi necessario que o nosso illustrado collega e amigo, o sr. Pinheiro Chagas o interpellasse de novo, para que s. exa. reconhecesse que lhe corria o dever de uma resposta. Mas que resposta!

Eu só estou de accordo com s. exa. num ponto: - é que a responsabilidade, inteira e completa, deste despacho pertence a s. exa. e a ninguem mais. Não tenho que discutir aqui as informações dos seus directores geraes. É só a s. exa., que posso interpellar; e só a s. exa. que devo pedir contas dos seus actos; e s. exa. é quem mais propriamente tem obrigação de me responder por elles.

Assentado este ponto, em que estamos de accordo, vejamos qual a defeza que s. exa. apresentou.

S. exa., lendo á camara a informação do director geral das contribuições directas, por quem eu tenho todo o respeito e a mais subida consideração, mas consideração que não vão até ao ponto de antepor as rasões, que por sua parte, como por parte de qualquer funccionario, se possam produzir á letra clara, expressa o evidente da lei, s. exa. veiu dizer-nos que o decreto de 1874 era omisso e silencioso relativamente á nomeação de quaesquer empregados, que não estivessem comprehendidos nas categorias que o mesmo decreto especificou.

Ora o decreto não é omisso, é clarissimo; é de todo o ponto expresso; diz o seguinte:

"Os logares de escrivães de fazenda dos concelhos de primeira ordem serão providos em escrivães de fazenda de segunda ordem, ou em officiaes das repartições de fazenda dos districtos."

Estas são pois, á face da lei, as duas unicas categorias de entre as quaes se podem effectuar os despachos para escrivães do fazenda de primeira classe.

São porventura demasiadamente restrictas essas categorias? Conviria que ao lado d'ellas se estabelecessem outras não menos attendiveis? - questões são estas inteiramente alheias á que se ventila agora. Se a lei devera ou não ser mais ampla nos seus preceitos, era questão para se tratar quando a lei se fez, e não agora que a lei está feita.

O que é certo, o que é inquestionavel, em face da lei escripta, é que os unicos empregados que podem ser nomeados escrivaes da fazenda de primeira classe, são os escrivães do fazenda de segunda ordem, e os officiaes da repartição de fazenda dos differentes districtos.

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Isto é claro e expresso, e d´aqui não poderá jámais s. exa. sair.

Em que se baseou, porém, s. exa. para fazer o despacho? Num argumento de maior para menor, allegando que se os amanuenses do ministerio da fazenda podem ser nomeados delegados do thesouro, com muito maior rasão podem ser nomeados escrivães de fazenda de primeira classe; porque os delegados do thesouro teem no funccionalismo uma categoria superior á dos escrivaes de fazenda de primeira classe.

A replica é facil.

Os amanuenses do ministerio da fazenda podem ser nomeados governadores civis, que são empregados de categoria superior á dos escrivães de fazenda de primeira classe; podem até ser nomeados ministros d" qualquer pasta, porque não ha lei alguma que o prohiba; mas o que não podem é ser nomeados escrivães de fazenda de primeira classe, porque a isto obsta a letra expressa da lei.

S. exa. sabe que, mis differentes secretarias do estado, podem, ser nomeados para os cargos de directores geraes, pessoas inteiramente alheias aos quadros das competentes repartições. Mas s. exa. sabe tambem que, dentro desses quadros, logares ha para que só podem ser nomeados os empregados de classificação immediatamente inferior. Assim aquelles mesmos que podem obter um despacho de director geral, não podem muitas vezes ser despachados para os logares de, primeiros ou segundos officiaes.

Já s. exa. vê que o seu argumento de maior para menor é de uma notavel infelicidade!

Mas porque é que os amanuenses podem ser chamados a servir como delegados do thesouro e não podem ser chamados a servir como escrivães de fazenda de primeira classe? Pois, francamente, s. exa. ainda não percebeu a rasão da differença? É bem facil de perceber! E que os logares de delegados do thesouro são de commissão, e os de escrivães de fazenda são de accesso!

É por isso, que para os cargos de escrivães de fazenda de primeira classe só podem ser chamados os escrivães de fazenda de segunda classe ou os officiaes das repartições de fazenda dos diversos districtos.

Mas o sr. Eça Leal não era nem oficial de repartição de fazenda de um districto, nem escrivão de fazenda de segunda classe; logo, não estava em nenhuma das categorias em que, segundo a lei, deveria estar, a fim de poder ser nomeado escrivão de fazenda do concelho da Horta.

É a isto que s. exa. não póde responder, porque não é capaz de apontar uma lei escripta, em virtude da qual fizesse esse despacho. Cabe-me, por conseguinte, o direito de dizer a s. exa. que commetteu uma illegalidade, de que se não póde defender, o que lhe hei de exprobar sempre que s. exa. nos vier fallar na consciencia, inteiramente limpa do peccado, com que tem administrado os negocios da sua pasta.

O sr. Ministro da Fazenda (Sarros Gomes): - São uteis as censuras da opposição. Quem as apresenta no parlamento, na situação em que o illustre deputado se encontra, cumpre o seu dever. Chama a attenção da camara e do publico para os actos dos ministros, verbera-os em discursos eloquentes, e deixa-os quasi nas condições de não poderem responder, como o illustre deputado me deixou a mim, pelo menos na opinião do s. exa.

Mas permitia me s. exa. que eu acrescente que estas censuras se revestem de tanto maior auctoridade quanto, consultando-se os precedentes de quem as formula, se vê que a sua austeridade foi sempre a mesma e que o seu respeito pela lei se affirmou em occasiões diversas de modo uniforme.

(Áparte ao sr. Hintze Ribeiro.)

O illustre deputado leu á camara as disposições legaes que regulam a nomeação e o accesso dos escrivães de fazenda; s. exa. leu á camara as disposições legaes segundo as quaes só podem ser nomeados escrivães de fazenda de primeira ordem os officiaes de primeira classe das repartições de fazenda dos districtos e os escrivães de fazenda da segunda ordem.

Ora, quer s. exa. saber como é que foi nomeado o escrivão de fazenda para o concelho do Funchal?

O concelho do Funchal é de primeiro, ordem, igual em classificação ao concelho da Horta, mas bem mais importante do que elle. Quer s. exa. saber, como foi nomeado o escrivão do fazenda para o concelho do Funchal? Vou dizel-o, e perguntarei ao illustre deputado porque é que s. exa. só não levantou contra esta nomeação illegal, ou que s. exa. devia achar illegal.

Foi nomeado escrivão do fazenda do concelho do Funchal, que e de primeira ordem, o escrivão de fazenda do concelho do Seixal, que e de terceira ordem. (Vozes: - Muito bem.)

(Áparte du sr. Hintze Ribeiro.)

Aqui está a nota d'essa nomeação: Antonio Fino Alvares da Silva, nomeado escrivão de fazenda para o concelho do Seixal em 1870, despachado para o concelho do Funchal.

(Áparte do sr. Hintze Ribeiro.)

Foi promovido a escrivão de fazenda de primeira ordem e despachado para um concelho tão importante como é o Funchal, um escrivão do fazenda de terceira ordem. (Apoiados.)

(Áparte do sr. Hintze Ribeiro.)

Foi em 1876, e a lei é de 1874, (Apoiados.) peço ao illustre deputado que note, que foi nomeado escrivão do fazenda de um concelho de primeira ordem o escrivão de fazenda de um concelho de terceira ordem (Apoiados.)

Para Evora em maio de 1879, repare o illustre deputado bem nesta data, que é importante, foi promovido para Evora o escrivão du fazenda do concelho de Portel, que tambem é de terceira ordem. (Apoiados.)

Não poderei eu ser accusado do facto similhante.

Poderia talvez o ministro actual ter interpretado menos bem a lei, tendo visto que era possivel a nomeação de delegado do thesouro entre os amanuenses do ministerio da fazenda, julgou que era possivel a nomeação de escrivães do fazenda do primeira ordem nas condições em que o fez.

Mas para os factos que cito nenhuma duvida poderia estabelecer-se, e onde estava, perguntarei eu agora, o zêlo pela legalidade da parte do illustre deputado, que nunca se levantou aqui para exprobar actos similhantes? (Apoiados.)

(Áparte do sr. Hintze Ribeiro)

Eu não renego a responsabilidade que me pertença, mas v. exa. e a camara comprehendem muito bem que muito diversa seria a minha responsabilidade se tivesse procedido sem consulta das estações competentes.

As rasões que se apresentaram acceitei-as. Considerei que, se podia nomear delegado do thesouro um amanuense, podia nomeal-o escrivão de fazenda. Não posso dar outras explicações ao illustre deputado.

Não satisfarão talvez s. exa., mas creio que a camara se satisfará com ellas. (Apoiados.)

O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e meia da tarde.

Discurso proferido pelo sr. Fialho Machado na sessão de 16 dê janeiro, e que devia ler-se a pag. 117

O sr. Fialho Machado: - Agradeço ao nobre ministro da marinha a promptidão, com que se dignou responder às perguntas que ha pouco lhe fiz.

Sr. presidente, tenho a declarar a v. exa., que, talvez por ser pouco conhecedor das praticas parlamentares, não

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vejo motivo para annunciar desde já uma interpellação sobre este assumpto, não obstante affigurar-se me de uma grande importancia, pois que da sua resolução depende o saber-se, se alguem ha responsavel pela perda de um grande numero de vidas.

Desejei saber se s. exa. o sr. ministro da marinha tinha conhecimento deste processo, e bem assim se elle estava suspenso, ou se tinha tido o devido andamento, s. exa. disse que o ha de examinar, para ver o estado em que se acha; a não me surprehende que s. exa. o desconheça, porque foi instaurado em epocha muito anterior áquella, em que foi chamado a sentar-se naquellas cadeiras, esperando por isso a, occasião em que s. exa. dê conta nesta camara do exame a que vae proceder, para então fazer ou não a interpellação, conforme o julgar conveniente.

Chamando a attenção do nobre ministro para este assumpto, que vejo, e, como já disse, não me admiro, ser-lhe desconhecido, basta a resposta do s. exa., para ficar convencido que o tomará na devida consideração.

Aproveito a occasião de estar com a palavra, para pedir algumas explicações aos meus digníssimos collegas, que fazem parte das commissões de inquerito parlamentar, nomeadas num dos ultimos dias da sessão passada, e em que eu não estive presente, por ter tido logar nessa occasião a trasladação dos restos mortaes de D. Vasco da Gama, e ter de ir á Vidigueira, para na qualidade de deputado por aquelle circulo tomar parte no acompanhamento, e para o que tive a honra de ser convidado.

Lendo depois o Diario da cambra é que soube que se tinha nomeado uma commissão de inquerito geral às secretarias, e outra especial de inquerito ao ministerio das obras publicas, e como já têem decorrido muitos mezes, julgo que essas commissões terão feito trabalhos importantes, e por isso peço a v. exa. me diga se na mesa ha alguma participação dando conta do que está feito, porque estou com impaciencia de ver decididas estas questões.

Por di9erení3s vezes na sessão passada insisti, para que se publicassem os resultados das syndicancias, e estou resolvido a continuar este anno no mesmo proposito, porque entendo que corre ao partido progressista a obrigação, de, emquanto está no poder, esclarecer completamente o publico ácerca de todas as irregularidades, que denunciou terem sido commettidas, nas differentes secretarias d'estado.

E procedo assim, sr. presidente, porque, não podendo applaudir a morosidade com que estas questões têem sido tratadas, quero ficar collocado em posição do poder com justiça repellir sempre qualquer insinuação que se me possa fazer, de que eu concorri para a calumnia, se se provar que tudo correu regularmente, ou de que quiz encobrir os culpados, se se demonstrar que os houve.

Estou cansado de ver nomear commissões de syndicancia, e quasi que estou convencido que disto nenhuma utilidade resultará para o paiz; oxalá que esta minha desconfiança se não transforme em completa descrença, e que eu vejo num certo periodo demonstrado, que as commissões parlamentares só desempenharam do espinhoso encargo que sobre si tomaram, vindo aqui apontar os abusos commettidos, e indicar os meios de organisar os differentes ramos de administração publica.

Só assim, sr. presidente, me convencerei das vantagens de terem sido nomeadas estas commissões, e que o não foram unica e simplesmente para armar ao effeito.

É preciso, é indispensavel que acabe por uma vez esta incerteza; o paiz tem direito a saber como se tem administrado o que é seu.

Pela minha parte farei todo o possivel para que esta tenha um desenlace, e para que cesse este estado de cousas, que se me affigura prejudicial a todos. (Apoiados.)

Continuarei, portanto, a pedir instantemente que este assumpto se esclareça, porque, assim como entendo que deve pagar quem tem peccado, considero indispensavel se dê plena satisfação a todos os que, estando innocentes, possam, porventura, ter sido prejudicados com uma suspeita. (Apoiados.}

Sendo este o fim a que me propuz, e que considero digno e justo, acredite v. exa. que diligenciarei conseguil-o, e procurarei remover todos os obstaculos que encontre no meu caminho.

Como v. exa. sabe, tenho sido o unico membro da maioria d'esta casa que tem pedido o resultado dos inqueritos, e, por isso, com franqueza o declaro, senti não ter sido nomeado para estas commissões, e nas quaes estava disposto a trabalhar com vontade; mas, longo do censurar por isto a camara, felicito-a pela escolha que fez dos individuos para as comporem, por isso que são todos competentissimos, e, com certeza, aquelles serviços nada soffrerão com a minha falla, por isso que muito fraca seria a cooperação que lhes poderia prestar.

O que lamento, sr. presidente, é que o sr. conselheiro Arrobas tivesse tambem ficado no esquecimento, e que elle tenha o direito de manifestar, como ha dias o fez, que o governo faltou á promessa de o incluir naquellas commissões, promessa que eu ouvi tambem ser-lhe feita, creio que pelo sr. ministro do reino.

Procuro sempre ser justo, mesmo com os adversarios, e, por isso, direi que o sr. conselheiro Arrobas devia ter feito parte das commissões, onde, com os seus muitos conhecimentos, havia de prestar importantes serviços.

Espero que algum dos dignos membros das commissões se dignará responder às minhas perguntas, e passo a tratar de outro assumpto, que com este prende muito estreitamente.

Sinto não ver presente o nobre ministro das obras publicam, mas, como o estão alguns dos seus collegas, espero que s. exas. se dignem communicar lhe qual o assumpto, sobre que eu o desejo ouvir e que vou expor.

Desejo saber se o sr. ministro das obras publica? está já habilitado a informar a camara de todas as irregularidades praticadas na direcção geral dos telegraphos.

Interrogando eu o anno pulsado o nobre ministro sobre este assumpto, disse muito terminantemente s. exa. que na direcção geral dos telegraphos tinha havido um desfalque de cento e tantos contos de réis, o que para mim equivale a dizer que ali se praticou um roubo daquella importancia; mas que não sabia ainda quem era o responsavel, o que ou em linguagem mais portugueza traduzo, ignora-se quem foi o ladrão, e eu creio que mesmo no parlamento posso empregar estas palavras, que são portuguezas de lei, e não sei de outro synonymo, que melhor se empregue, para designar o amigo do alheio.

E creio que não é a primeira vez que se pronunciam aqui estas palavras, porque me parece que ouvi o anno passado dizer ao sr. Mariano de Carvalho, que na administração das matas se tinha roubado, e não sei em que outras partes.

O sr. Mariano de Carvalho: - Não tenho idéa de ter dito similhante cousa, o que me parece que disse aqui numa discussão, foi, que na administração geral das matas os processos administrativos não eram bons, e que assim as matas dariam prejuízos em vez de lucros, e isto é uma cousa muito diversa de roubo.

O Orador: - Eu disse que me parecia ter ouvido isto a s. exa., poderei estar enganado, e hei de ainda certificar-mo lendo o Diario, porque póde ter sido dito por outro illustre deputado, e a mim afigurar-se-me que foi s. exa.

(Entrou na sala o sr. ministro das obras publicas.)

Folgo de ver entrar o nobre ministro das obras publicas; é sobre assumpto dependente do ministerio de s. exa. que desejo ter alguns esclarecimentos, e estou certo que s. exa. m'os dará immediatamente, não só porque é esse o ser costume, mas tambem, e principalmente, porque, sendo de grande gravidade, s. exa. não póde deixar de lhe ter prestado toda a sua attenção. Espero que s. exa. terá a bondade de me dizer se já está concluida a syndicancia a

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que mandou proceder na direcção, geral dos telegraphos, e se já sabe quaes são os empregados responsaveis pelo desfalque de cento e tantos contos de réis, encontrado o anno passado naquella repartição.

Sr. presidente, depois de ouvir o nobre ministro, emittirei a minha opinião, fazendo as considerações que julgar convenientes, se v. exa. me permittir.

Discurso proferido pelo sr. Fialho Machado, na sessão de 15 da janeiro, e que devia ler-se a pag. 120.

O sr. Fialho Machado: - Sr. presidente, principiarei agradecendo á camara, a delicadeza e attenção que teve para commigo, permittindo que me fosse dada a palavra, nem por um momento duvidei, que outro fosse o seu procedimento, vistas as circumstancias especiaes em que me achava.

Agradeço tambem a v. exa. e ao meu illustre collega o sr. Elvino de Brito as explicações que, na qualidade de membros das commissões parlamentares se dignaram de me dar, e espero que dentro em pouco, e com certeza ainda nesta sessão, os poderei applaudir, pois estou convencido hão de vir dar conta á camara do resultado da missão de que foram encarregados.

Repondendo às considerações ultimamente apresentadas pelo nobre ministro da marinha, direi a s. exa., que por forma alguma posso estranhar que ignore o que se tem passado ácerca das desagradaveis e tristes occorrencias de Bolor, sei que se deram em epocha muito anterior á sua entrada no ministerio, e que nessa occasião estava s. exa. ausente do paiz.

É pouco tambem o que sei ácerca d'estes acontecimentos, e isso mesmo é unicamente devido a informações particulares, procurarei portanto esclarecer-me na repartição competente, e se me convencer que é necessario chamar a attenção do governo, mandarei para a mesa uma nota de interpellação, conformando-me assim com as indicações do nobre ministro.

Ouvi o nobre ministro das obras publicas, e folgo de mais uma vez lhe poder dar publico testemunho da muita consideração que tenho por s. exa.; estou certo que o não estarem ainda concluidos aquelles trabalhos, não é culpa de s. exa., conheço-o bastante para nem por um momento duvidar, que não tem empregado todos os esforços para o conseguir.

Mas, como me persuado que os empregados por s. exa. nomeados, não têem trabalhado com o zêlo e actividade que demandam serviços de tanta, importancia, espero que os tratará com severidade, a fim de que os concluam a tempo de poder dar d'elles conta á camara ainda n'esta sessão; porque é preciso, entendo-o assim, que todos os actos criminosos praticados nas repartições publicas tenham punição severa, pois só assim desapparecerá de uma vez para sempre a convicção em que o povo está, de que as leis penaes n'este paiz foram feitas só para serem applicadas aos pequenos (Apoiados.}

E sem me alongar em mais considerações, vou responder ao que disse o meu amigo e collega o sr. João Candido de Moraes.

Affirma s. exa., que ninguem aqui disse, que se praticaram roubos na administração das matas; eu tenho quasi a certeza, de ter ouvido aqui avançar aquella proposição; creio que por occasião de só discutir n'esta casa uma interpellação feita pelo sr. deputado Arrobas, por causa dos muitos ordenados e gratificações que accumulava o sr. deputado Candido de Moraes.

Como v. exa. estará lembrado, deu logar aquella interpellação a uma longa discussão, e apesar de não ter tomado nella parte, segui-a com tanto interesse, que estou persuadido ter d'ella perfeita recordação; e sem querer por fórma alguma offender o meu illustre amigo, permitta-me, que persista na minha idéa, até que leia o Diario da camara, que é o unico meio que encontro, para se reconhecer qual de nós está enganado.

É tal a minha convicção, sr. presidente, que não estou em erro, que declaro a v. exa. e á camara, que ainda mesmo que no Diario nada encontre para me justificar, ficarei na duvida se fui eu, ou os srs. tachygraphos que ouviram mal.

Se estivesse presente o sr. ministro da fazenda, algumas palavras diria sobre dois assumptos, para que hontem chamou a sua intenção o sr. deputado Hintze Ribeiro, porque entendo, que nem um nem outro ficaram completamente liquidados; e envolvendo ambos accusações graves áquelle membro do governo, considero indispensavel serem bem esclarecidos.

Refiro-me á saída da alfandega de muitos volumes de mobilia sem pagamento de direitos e á nomeação de um amanuense do ministerio da fazenda para escrivão de fazenda de primeira classe.

O primeiro foi denunciado nos jornaes desaffeiçoados ao governo e immediatamente trazido aqui á téla dos debates por um membro illustre da opposição.

Apesar de não ser este o uso estabelecido, estimei que assim succedesse, e que se siga para o futuro este exemplo, porque se me afigura que só d'esta fórma se conseguirá que sejam mais cautelosos nas accusações os que escrevem para a imprensa periodica.

Desde o momento que na imprensa se faz qualquer accusação a um ministro, bom é que venha aqui alguem exigir-lhe a responsabilidade; porque, estando innocente, e isso succede quasi sempre, fará callar os calumniadores, mas estando culpado soffrerá as consequencias dos actos criminosos ou illegaes que tiver praticado.

Desde que leio jornaes politicos, tenho visto que é regra invariavel e constante para os que estão na opposição o chamarem ladrões aos que estão no poder, e todos nós sabemos felizmente que a honradez é a qualidade mais vulgar e apreciavel de todos os nossos homens politicos mais distinctos.

É forçoso que se pense em fazer cessar este pessimo systema. (Apoiados.)

Reprimam-se os desvarios aconselhados pela paixão filha de uma politica mal comprehendida, cuidemos n'isto todos, que a todos muito interessa. (Apoiados.)

Agradeço de novo á camara a sua condescendencia, e peço-lhe desculpa de ter distrahido a sua attenção.

Vozes: - Muito bem.

Illmo. e exmo. sr. - Cumprido uma importante deliberação da junta geral d'este districto, a commissão executiva, a que presido, tem a honra de apresentar a v. exa. a inclusa representação d'aquella corporação dirigida á camara dos senhores deputados, a que v. exa. mui dignamente preside, a fim de que v. exa. se digne offerecel-a á sua esclarecida attenção; esperando ajunta geral que o elevado corpo legislativo, perante quem representa sobre a protecção de um ramo nascente e esperançoso de industria agricola, dispensará a sua illustrada consideração a um pedido que se recommenda aos poderes do estado por incontestavel justiça, e como beneficio previdente a um districto em notorio o lastimavel empobrecimento de todos os ramos da sua antiga prosperidade agricola.

Deus guarde a v. exa. Sala das sessões da commissão executiva, delegada da junta geral do districto no palacio do governo civil em Ponta Delgada, 13 de janeiro de 1881. - Illmo. e exmo. sr. presidente da camara dos senhores deputados. -Lisboa. = O presidente, Antonio Augusto Pacheco.

E N.° 11

Senhores deputados da nação portugueza. - O districto de Ponta Delgada, e em geral os districtos açorianos, lu-

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ctam ha muito com uma grave e complicada crise economica e agricola.

Differentes flagellos vieram successivamente assaltar a cultura da vinha, das batatas, da laranja, de muitos arvoredos e de varias outras especies de vegetaes, originando assim prejuizos de maior monta.

Ao mesmo tempo o progresso da civilisação, o estabelecimento das vias ferreas, e a facil communicação maritima por meio de vapores, transformou quasi repentinamente e por tal modo o commercio geral do mundo, que os nossos cereaes e a nossa laranja encontraram nos mercados que antes lhes eram patentes, inesperados competidores, que os depreciaram.

Para cumulo de desgraça veiu em fim um periodo do verdadeira perturbação atmospherica, que diminuiu notavelmente os nossos productos agricolas e nalguns dos ultimos annos foram tão grandes as inclemencias do tempo, que nos forçaram a recorrer á importação de cereaes.

Tamanhos e tão constantes males eram sufficientes para abalar a mais solida prosperidade; nem está na mão do homem conjural-os.

O mais a que póde chegar o poder humano, é attenuar os effeitos de taes calamidades, e a ninguem melhor do que aos altos poderes do estado cabe esta sagrada missão.

Os povos açorianos, senhores, não succumbem ao peso da adversidade. Incitados pelo instincto da conservação, movidos pelo seu ingenito amor do trabalho, procuram na introducção de novas culturas remedio a uma parte dos males; porém, n'esta lucta desigual carecem de protecção.

É esta protecção que a junta geral do districto de Ponta Delgada vem impetrar do poder legislativo, a favor de uma industria nascente e promettedora - a do chá.

A junta geral pede-vos que seja convertido em lei, com as modificações, que a vossa elevada sabedoria aconselhar, o seguinte projecto:

Artigo 1.° Não poderá ser elevado, durante o praso de vinte annos, a contar da data da presente lei, o rendimento cellectavel actual dos terrenos que, no reino, ilhas e colonias se consagrarem á cultura do chá.

Art. 2.° O chá manufacturado no mesmo periodo é isento de todo o imposto ou contribuição geral do estado, ou particular do districto ou municipio.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

A planta do chá, senhores, vegeta exuberantemente no meio das nossas montanhas, em verdadeiros maninhos, desprezados até agora, e de intimo valor. A sua acclimação e um facto consumado, existindo entre nós ha mais de sessenta annos, e sendo inteiramente espontanea a sua reproducção.

Não póde haver duvida sobre a genuidade da planta, nem sobre a conservação das suas essenciaes qualidades no nosso solo. Por intervenção e a expensas da benemerita sociedade promotora da agricultura michaelense, vieram no anno de 1873 á ilha de S. Miguel dois chinezes, manipuladores de chá, para experimentarem e ensinarem o seu fabrico. O resultado da experiencia excedeu toda a espectativa.

O chá aqui fabricado, submettido á analyse chimica do professor mr. Schutzenberger, no collegio de França, foi julgado excellente, e os provadores inglezes, que o examinaram, confirmaram este juizo.

Quanto às vantagens d'esta cultura são ellas evidentes. Emprega numerosos braços de creanças e de mulheres, nas quadras em que minguam outros lavores campestres. Não invade a area da cultura dos terrenos cerealiferos, porque se apraz principalmente nas quebradas das serras e noutros logares elevados. A producção é remuneradora, poucos annos depois da plantação. O fabrico não exige construcções nem machinismos despendiosos, nem capitães que excedam as posses de qualquer mediano cultor. A aprendizagem não é longa. Emfim, póde ser uma cultura popular, espalhando os seus beneficios por todas as classes da sociedade.

Para que, pois, a cultura do chá se generalise no paiz, e nos poupe o tributo das grossas sommas que pagâmos ao estrangeiro, carecerá apenas, quanto a nós, de se estabelecer, durante o seu periodo infantil, a protecção que implorâmos.

Não pedimos, senhores, beneficio nenhum exclusivo para esta ilha; pedimol-o para todos os pontos do solo portuguez ou colonial, em que a cultura do chá se possa adoptar.

O thesouro tão pouco soffrerá, porque não se póde esperar que em todos os pontos aonde esta cultura é possivel, ella se inicia do prompto; mas quando surgisse repentina, quando o thesouro soffresse notavel desfalque, seria esse um facto feliz, porque provava que existia no paiz uma nova e florescente industria; e o thesouro acharia a correlativa compensação na recrescente riqueza.

Esta junta, senhores, cumprindo o dever de advogar os interesses do districto que representa, e attentas as rasões de publica conveniencia, que expõe, espera confiadamente que dareis á cultura do chá a protecção de que carece para seu mais rapido desenvolvimento.

Sala das sessões da junta geral do districto de Ponta Delgada, 29 de novembro de 1880. - (Seguem as assignaturas.)

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