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N.º 2

SESSÃO DE 5 DE FEVEREIRO DE 1858.

PRESIDENCIA DO Sr. JOAQUIM FILIPPE DE SOURE.

Secretarios os srs.

Secretarios os srs.

Joaquim Gonçalves Mamede.

Antonio Pequito Seixas de Andrade

Chamada — presentes 59 srs. deputados.

Entraram durante a sessão — os srs. Affonso de Castro, Castro e Abreu, Thedim, Azevedo e Cunha, Mello e Carvalho, Sá Nogueira, D. Antonio da Costa, Serzedello, Fontes Pereira de Mello, Sousa e Menezes, Pinto d'Albuquerque, Castro Guedes, Barão das Lages, Carlos Bento, Conde de Valle de Reis, Cunha Pessoa, Faustino da Gama, Alves Vicente, Chamiço, Pinto Tavares, Rebello Cabral, Roboredo, Sousa Machado, Honorato Ferreira, Pinto Magalhães, José Estevão, Ferreira Pinto Basto (José), Luciano de Castro, Sá Vargas, Teixeira de Queiroz, D. Luiz da Camara, Vellez Caldeira, Brown, Trindade Sardinha, Mendes Leite, Miguel do Canto, Robocho, D. Rodrigo de Menezes, Nogueira Soares, Sena Bello e Thomás de Carvalho.

Não compareceram—os srs. Braamcamp, Abilio Costa, Geão, Correia Caldeira, Heredia, Antonio Emilio Brandão, Girão, Duarte de Campos, Barros e Sá, Cunha e Sá, Seabra, Barão d'Almeirim, Dias e Sousa, Bento de Castro, B. F. da Costa, Seixas e Vasconcellos, Possolo, Barata, Vivião Pessanha, Bivar, Barroso, Francisco Carvalho, F. C. do Amaral, Nazareth, Dias Grande, Zuzarte, Fonseca Coutinho, Alves de Sá, Almeida Pessanha, Benevides, Ferreira de Castro, Banha, J. J. de Matos, J. M. d'Abreu, Delorme Colaço, Latino Coelho, Oliveira Baptista, Ferreira Pinto Basto (Justino), Matoso, Aboim, Sousa Cabral, Rebello da Silva, Tenreiro, Passos (Manuel), Sousa Feio, Paulo Romeiro, Balthasar de Campos, Jacome Correia, Placido d'Abreu e Coelho de Carvalho.

Abertura,—á uma hora da tarde. Acta—approvada.

CORRESPONDENCIA.

Declarações.

1. ª—Do sr. Paes de Figueiredo, participando que o sr. Oliveira Baptista não comparece á sessão de hoje, e a mais algumas, por incommodo de saude.

A camara ficou inteirada.

2. ª— Do sr. Trindade Sardinha, de que o sr. Dias Grande não comparece á sessão de hoje por motivo de saude.

A camara ficou inteirada.

3. ª — Do sr. Rodrigues Leal, de quo o sr. Paulo Romeiro não póde comparecer na sessão de hoje por incommodo de saude.

A camara ficou inteirada.

Vol. III—Fevereiro—1858.

Officios.

1. ° — Do ministerio da guerra, devolvendo, com as informações que lhe foram pedidas, o requerimento de João Luiz Camillo de Miranda.

A commissão de guerra.

2. º— Do mesmo ministerio, satisfazendo a um requerimento do sr. Rebello Cabra), em que pede differentes esclarecimentos, sobre o serviço de saude do exercito.

Para a secretaria.

O sr. Pegado: — Vou ler e mandar para a mesa um projecto de lei, para se crear um jornal official. (Leu.) Ficou para segunda leitura.

O sr. Fernandes Thomás: — Mando para a mesa dois requerimentos, pedindo esclarecimentos ao governo; e igualmente mando a seguinte

Nota de Interpellação.

Requeiro a V. ex.ª tomar parte na interpellação que o sr. deputado Luciano de Castro pretende fazer ao sr. ministro do reino. Fernandes Thomás.

Mandou-se fazer a communicação.

O sr. Bettencourt: — Mando para a mesa um parecer da commissão de obras publicas, e um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. Maximiano Osorio: — Mando para a mesa o seguinte requerimento, e nota de interpellação.

Requerimento.

Requeiro que pela secretaria d'estado das obras publicas se remetta a esta camara a copia da correspondencia e portarias dirigidas ao director das obras publicas no districto de Villa Real, desde 12 de agosto até 31 de dezembro do 1857, e bem assim da correspondencia do director para o governo durante o mesmo praso.

E logo que este pedido esteja satisfeito:

Nota de Interpellação.

Pretendo interpellar o ministro das obras publicas, sobre o estado em geral das obras publicas na provincia de Traz os Montes, e com especialidade sobre a morosidade da estrada de Villa Real á Regoa. ='Maximiano Osorio = Aristides Abranches= Victorino de Barros.

O requerimento mandou se expedir; e da nota de interpellação mandou-se fazer a communicação.

O sr. Victorino de Barros: — Mando para a mesa o seguinte requerimento, e nota de interpellação.

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requerimento.

Renovo o requerimento que fiz em sessão de 12 de marro do anno passado, a fim de que o governo envie a esta camara, pelo ministerio do reino:

Uma lista dos nomes e residências de todos os facultativos, que, em desempenho das suas funcções professionaes ou officiaes, prestaram relevantes serviços á humanidade, durante as duas ultimas epidemias da cholera morbus e febre amarella.

Outra igual lista dos que infelizmente pereceram no perigoso exercicio da sua tão ardua como nobre missão.

Nota de Interpellação.

Logo que o governo satisfaça a este requerimento, desejo interpella-lo ácerca das medidas que se propõem tomar, tendentes não só a considerar e retribuir os valiosos serviços dos que mais se distinguiram n'essa epocha, senão a soccorrer e suavisar a desgraçada sorte das familias dos que morreram no desempenho dos seus deveres. — Victorino de Barros.

Mandou-se fazer a communicação.

O sr. Gouveia Osorio: — Mando para a mesa a seguinte

Nota de Interpellação.

Requeiro que seja prevenido o ex.mo sr. ministro das obras publicas, de que pretendo interpella-lo, com urgencia, relativamente ao estado em que se acham os trabalhos da estrada de Vizeu a Coimbra, e especialmente com relação ao modo como se dirigiu e está construindo a estrada no sitio da Portella de Vallongo, entre Mortagoa e o Criz. = Gouveia Osorio = Sant'Anna e Vasconcellos.

Mandou-se fazer a communicação

O sr. Conde de Samodães: — Mando para a mesa dez requerimentos da commissão de guerra.

O sr. Gaspar Pereira: — mando para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

Poz-se em discussão a seguinte

Proposta.

Havendo um numero consideravel de pareceres da sessão legislativa passada, e da presente, que versam sobre objectos de interesse individual ou de classe, cuja discussão não deve ser adiada indefinidamente; mas considerando que os projectos de interesse geral, quando são dados exclusivamente para ordem do dia, absorvem o tempo lodo, e que assim se annulla de facto o direito de petição, proponho o seguinte expediente:

Em todas as semanas, que comprehendam seis dias uteis de trabalho, haverá duas sessões, em que depois do expediente se entrará immediatamente na ordem do dia, sendo a primeira parte pareceres sobre interesses individuaes, do localidade ou de classe, discutidos por sua ordem chronologica; ás duas horas da tarde se entrará na segunda parte da ordem do dia, que será o que o ex.mo sr. presidente indicar.

Quando na semana haja menos de seis dias uteis, haverá pelo menos um em que se adopte a marcha acima apontada. — Conde de Samodães.

Foi admittida.

O sr. Sant’Anna e Vasconcellos: — Eu tambem entendo que a camara não deve annullar o direito de petição, deixando de discutir os pareceres que versam sobre objectos de interesse individual ou de classe; mas em quanto seja d'esta opinião, observo que estando a sessão legislativa ja bastante adiantada, e havendo negocios importantes do interesse geral a tratar, duas meias sessões por semana, como pede o sr. conde de Samodães, é demasiado; parece-me que conciliaríamos tudo, e obteriamos o que é nosso desejo, se porventura em logar de duas meias sessões, votarmos uma meia sessão por semana. (Apoiados) A maior parte d’esses pareceres não têem longa discussão, e conseguimos o nosso fim do modo que indico. Estou certo de que o sr. conde de Samodães não deixará de convir n'esta alteração á sua proposta; porque d'este modo nem prejudicámos a discussão e resolução de objectos importantes e de interesse geral do estado, nem deixam de ler andamento esses negocios que não podem ficar parados (Apoiados.)

O sr. Conde de Samodães: — Concordo com a idéa de que em vez de duas meias sessões por semana, seja só uma meia sessão; mas n'esse caso, peço então que em vez de se entrar na segunda parte da ordem do dia ás duas horas, se entre ás duas e meia, (Apoiados.) a fim de termos meia hora mais para se discutirem e poderem votar esses pareceres; pois com quanto estes pareceres não tenham grande discussão, comtudo as votações são demoradas, porque são feitas por escrutinio secreto, e isso leva muito tempo. Por consequencia peço então que no dia da semana que v. ex.ª entender mais conveniente, dê para a primeira parte da ordem do dia pareceres sobre interesse individual e de classe até ás duas horas e meia, principiando a discussão d'esles objectos logo depois de lida a correspondencia, sem haver palavras para antes da ordem do dia, (Apoiados.) e terminando ás duas horas o meia, hora em que se deve entrar na segunda parte da ordem do dia Com duas horas de trabalho poderemos fazer alguma cousa No sentido quo tenho exposto não tenho duvída em modificar a minha proposta.

O sr. Gaspar Pereira: — Eu não pude bem ouvir lodo o conteudo da proposta, nem todas as observações que acaba de fazer o illustre auctor d’ella, mas julgo que esta proposta pelo que pude ouvir, é de maior alcance do que parece á primeira vista. Trate se de algum modo de alterar o regimento quanto á ordem dos nossos trabalhos; e parecendo-me que isto é objecto bastante grave, para não se discutir e resolver de repente, requeiro que esta proposta vá a uma commissão

A camara resolveu este requerimento pela affirmativa.

O sr. Presidente: — Mas a que commissão?

O sr. Conde de Samodães: — Resolver-se que a minha proposta vá a uma commissão, como se acaba de votar, é o mesmo que matar a questão completamente, e eu para evitar discussões e complicações, peço licença para retirar a minha proposta, e v. ex.ª quando entender conveniente dará alguns d'esses pareceres de interesse individual e de classe, para ordem do dia. (Apoiados.)

A camara permittiu que fosse retirada.

O sr. Presidente: — Vae passar-se á ordem do dia, o tem a palavra que hontem pediu sobre a materia o sr. ministro da fazenda.

O sr. Ministro da Fazenda (Antonio José d'Avila) (sobre a ordem): — Sr. presidente v. ex.ª já me deu a palavra sobre a materia, e ainda que estou resolvido a fazer uso d'ella, comtudo não posso deixar de confessar a v. ex.ª e á camara que o faço com muita repugnancia; porque as observações que tinha a fazer ou a apresentar á camara referiam-se ao que disse hontem o nobre deputado que abriu este debate; estimaria que s. ex.ª ouvisse a minha resposta, mas s. ex.ª não está presente, e como o não está desejava que v. ex.ª me permittisse occupar-me de outro assumpto.

Sr. presidente, na ultima sessão um nobre deputado, que tambem não está presente, o sr. barão das Lages, fez me uma pergunta em relação á resolução das reclamações por sinistros pelo que toca aos districtos de Vizeu e Villa Real; eu prometti a s. ex.ª que havia de responder hoje definitivamente n sua pergunta: se v. ex.ª e a camara convém em que eu agora dê essa resposta, visto que estão presentes alguns illustres deputados que representam os districtos a que se referem essas reclamações, e teem interesse em ouvir a minha resposta, estimá-lo-ia muito, até porque talvez no intervallo chegasse o cavalheiro que encetou a discussão do projecto n.° 16.

O sr. Presidente: — Não ha inconveniente nenhum n'isso. (Apoiados.)

O Orador: — Sr. presidente, eu não ouvi bem a pergunta do nobre deputado o sr. barão das Lages, mas affigurou-se-me que o que s. ex.ª queria saber era se estavam... (Entrou o sr. Baião das Lages) Estimo muito que s. ex.ª entrasse.

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Dizia eu. que não ouvi bem a pergunta que o nobre deputado me fez, porque infelizmente na occasião em que s. ex.ª fallou, havia algum susurro na casa, mas affigura-se-me, que o que s. ex.ª quiz saber de mim foi se estavam já resolvidas as reclamações por sinistros feitos pelos collectados de alguns concelhos do districto do Douro, e o motivo por que ainda se não resolveram esses requerimentos, caso não estarem resolvidos; e entendeu s. ex.ª que estando agora abertos os cofres daquelles concelhos para o pagamento da contribuição predial era injusto que estivessem pendentes de resolução as reclamações por sinistros e que ainda agora esses requerentes não podessem fazer os respectivos encontros. Creio que foi n'este sentido que o nobre deputado fallou. (O sr. Bar o das Lages — Apoiado.) Ora eu disse n'essa occasião, que suppunha que tinha já resolvido este negocio, todavia não o quiz affiançar positivamente, e então prometti ao nobre deputado, que havia responder-lhe hoje; é o que vou fazer e espero que o satisfarei. Em cumprimento d'essa promessa e segundo a faculdade que acaba de me conceder o sr. presidente, passo a informar o nobre deputado do que ha a este respeito.

A pratica seguida até aqui tem sido, que as reclamações por sinistros são resolvidas todas juntas em relação a todo o reino, a fim de se prevenir a hypothese de que essas reclamações fossem alem da verba designada para essa despeza; mas, em attenção ás circumstancias extraordinarias por que este paiz tem passado, eu entendi que interpretava melhor, em vista d'estas circumstancias, o pensamento da lei não fazendo esperar a resolução das reclamações pertencentes a alguns concelhos pela resolução geral das reclamações por sinistros pertencentes aos differentes concelhos de todo o reino, (Apoiados) porque se acontecesse que a importancia das reclamações de lodo o nino viesse a importar em uma verba maior que a que esta votada para attender a essas reclamações por sinistros, eu viria ao parlamento pedir lhe que votasse a somma precisa para satisfazer a todas essas reclamações.

Eu entendi e entendo ainda, e já o disse no parlamento e parece me que com annuencia d'esta camara, digo, entendi e entendo, que aonde não houver materia collectavel não póde haver impostos; (Apoiados.) por consequencia assim que me foi apresentado o processo a respeito d'estas reclamações eu resolvi-o immediatamente; ordenei que se não fizessem parar os trabalhos na respectiva repartição com relação a alguns concelhos á espera dos trabalhos respectivos a lodo o reino, e d'esta maneira resolvi as reclamações que pertenciam a muitos districtos, importando estas reclamações em 11:620$465 réis; estão estas reclamações resolvidas por despacho de 8 de janeiro. Não me linha enganado quando disse, que me parecia que já linha resolvido esta questão.

Ha comtudo reclamações que não estão resolvidas ou por lerem vindo tarde ou por falla de esclarecimentos; mas a respeito d'estas tenho dado as ordens mais terminantes para que sejam resolvidas quanto antes. Posso assegurar aos nobres deputados que o meu fim é que se effectuem esses encontros e que isso se possa fazer na occasião actual. (Apoiados.) E acreditem os nobres deputados, que a demora que possa haver a respeito de alguns dos reclamantes, essa demora não será grande nem elles prejudicados quando tenham justiça no que pedem, porque eu não desejo senão fazer justiça, (Apoiados) e os nobres deputados comprehendem bem que as difficuldades do thesouro não se resolvem com injustiças, (Apoiados.) nem obrigando os collectados a pagar aquillo que não devem; as difficuldades do thesouro só se podem resolver pelo contrario quando o tributo for equitativamente distribuido, e quando todos pagarem o que devem e só o que devem. (Apoiados.)

Desejo que estas informações satisfaçam os nobres deputados. Torno a dizer, hei de empregar todos os meios á minha disposição para que estes processos acabem em relação aos concelhos a respeito dos quaes ainda não estão terminados os trabalhos. Ouvirei os illustres deputados que pediram a palavra, e direi ainda alguma cousa, se o julgar preciso.

O sr. Conde de Samodães: — Sr. presidente, eu linha annunciado uma interpellação logo nos primeiros dias da sessão ácerca d'este objecto; versando ella sobre interesses de uma parte do districto de Lamego e de outra parte do districto de Villa Real, que constitue o paiz vinhateiro do Douro, eu não podia ficar indifferente a respeito de um negocio que estou certo tocava com os seus interesses. Por consequencia juntamente com alguns meus collegas apresentei uma nota de interpellação dirigida ao nobre ministro da fazenda, por quanto constava-me que estas reclamações não se achavam resolvidas, e que não só não estavam resolvidas, mas mesmo os exactores de fazenda estavam exigindo dos contribuintes o pagamento de quotas que deviam da contribuição predial.

Effectivamente as minhas informações não eram infundadas, por quanto a nota apresentada pelo nobre ministro da fazenda prova que essas reclamações não foram resolvidas senão no dia 8 de janeiro. Por conseguinte quando mandei a nota de interpellação para a mesa ainda não podia constar no districto vinhateiro do Douro que essas reclamações se achavam resolvidas.

Eu folgo muito de ouvir ao nobre ministro da fazenda que apesar de não estarem ainda concluidos todos os processos que dizem respeito a reclamações por sinistros, comtudo entendêra que devia resolve-las quanto a uma parte que dizia respeito aos concelhos ou proprietarios cujos processos estavam concluidos. Effectivamente [seria uma injustiça que se protrahisse esta resolução á espera que de toda a parte do paiz viessem os processos concluidos para depois fazer o rateio do que era necessario satisfazer. Folguei igualmente saber que a quantia que se mandou annullar é Ião pequena que os 2 por cento que são votados todos os annos para falhas na cobrança da contribuição predial chegavam muito bem, e sobejam para preencher estas reclamações. É verdade que alguns processos ainda não estão concluidos, mas é muito de crer que a maior parte o esteja, e por consequencia os 26:000$000 réis que a este respeito votámos o anno passado e que votámos este anno cheguem para satisfazer essa indemnisação. Agora visto que esta questão esta resolvida pelo que toca a uma grande parte do paiz vinhateiro, eu pedirei ao nobre ministro da fazenda que quanto antes mande ao seu destino essas resoluções. (O sr. Ministro da Fazenda: — Já foram.) Bem, estimo muito que já fossem, assim como estimaria muito que s. ex.ª mandasse publicar um annuncio official para que todos os proprietarios que deixaram de pagar as suas contribuições a paguem immediatamente, porque é necessario que aquella parte que devem satisfazer a paguem sem demora. Peço tambem ao nobre ministro que se porventura ha algumas execuções começadas ellas cessem. (O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado.) porque eu posso dizer ao nobre ministro que existem e que lêem continuado.

Eu não vinha prevenido para esta interpellação, porque não tinha visto que v. ex.ª annunciasse que hoje se tratava de verificar as interpellações, e por isso não linha trazido alguns documentos que me têem sido mandados daquellas localidades, pelos quaes se mostra que se têem feito algumas exigencias aos contribuintes.

Effectivamente alguns proprietarios que haviam reclamado, já foram annulladas as suas quotas de contribuição que tinham deixado de papar. O nobre ministro da fazenda mesmo não se linha opposto a isso por meio de uma portaria que expediu a differentes localidades, auctorisando um praso ou alguma morotoria pira ele pagamento; mas o que é certo é que esta moratoria me foi cumprida por alguns exactores de fazenda; e eu sei de alguns contribuintes que foram avisados para pagar, e no praso improgavel de cinco dias, sob pena de serem removidos para o contencioso. Isto posso eu dizer que succedeu no Peso da Regoa, porque eu tenho na minha mão alguma d'essas informações. Ora, nada mais injusto que o proprietario que não leve rendimento algum collectavel e que reclamou em tempo competente para ser alliviado das suas contribuições ser depois executado para pagar o triplo ou quadruplo d'essas contribuições, e no fim de tres ou qua-

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tro annos de espera vir uma absolvição, não pelas custas do processo que pagou, mas unicamente pela quota da contribuição que se lhe exigiu que pagasse! Isto é uma injustiça flagrante, e eu estou convencido de que é necessario reformar a legislação que existe a este respeito, (Apoiados.) a fim de evitar no futuro estes inconvenientes, não só porque póde resultar grande prejuizo aos proprietarios, mas mesmo para o estado, porque se inhabilitam muitos proprietarios de podérem continuar a pagar as quotas que deverem pagar. O nobre ministro já disse que onde não ha materia collectavel não póde ser applicado o tributo; ora, querer obrigar a pagar os proprietarios as custas do processo em que foram condemnados, quando não podem pagar as contribuições que lhes foram lançadas, e que não podem pagar porque, como a camara sabe, ha muitos proprietarios que não só não recebem hoje o rendimento liquido das suas propriedades, mas que de facto não teem rendimento algum, ou por um castigo ou por uma d'estas leis da natureza que aniquilou o rendimento da propriedade vinhateira, não me parece justo.

Ora, o que é necessario, visto que o nobre ministro teve a complacencia... (O sr. Ministro da Fazenda: — Complacencia não.) seja o que for, leve a peito o cumprimento do seu dever para resolver estas questões, porque podia demorar a resolução d'este negocio e aggravar a situação dos proprietarios; visto que leve a bondade, ou por outra, cumpriu o seu dever em attender com brevidade estas reclamações, o que peço é que as mande annunciar para que todos os proprietarios saibam as quotas que lhes foram annulladas, para n'esse caso lhes serem encontradas no pagamento da contribuição predial essas quantias que foram pagas e que não deviam pagar, ou para pagar o que estiverem devendo, e mande suspender toda e qualquer execução que se tenha começado a este respeito. Sem isto a providencia mandada pelo nobre ministro será inutil, porque as contas que tiverem de pagar no processo serão muito maiores do que a propria quota da contribuição. E por ultimo declaro que me dou por satisfeito com as explicações do nobre ministro, e retiro, a minha parte na interpellação que mandei para a mesa.

(Algum srs. deputados pedem a palavra.)

O sr. Presidente: — Perdoem os nobres deputados que pedem a palavra, eu não posso dar-lh'a sem que a camara o resolva.

O sr. Ministro da Fazenda (Antonio José d'Avila): — Sr. presidente, eu pediria aos nobres deputados que reservassem o que queriam dizer a este respeito para a sessão seguinte, porque occorre-me agora, em relação ao discurso do nobre deputado o sr. conde de Samodães, que eu mandei immediatamente pedir informações aos delegados dos respectivos districtos sobre as execuções a que se referiu o nobre deputado, e sei que essas respostas já vieram, mas não posso dizer agora precisamente o que ellas contêem, porque não quero enganar-me.

Parecia-me que estas informações haviam de habilitar melhor os nobres deputados do que eu posso fazer n'este momento. Se v. ex.ª e a camara conviessem em que este assumpto se continuasse na sessão de ámanhã, não tenho duvida em trazer esses documentos e satisfazer aos desejos dos nobres deputados. (Apoiados.)

O sr. Victorino de Barros: — Eu pedi a v. ex.ª que me reservasse a palavra para fallar sobre esta interpellação.

O sr. Presidente: — Se se não considera que esta satisfeita a interpellação...

O sr. Victorino de Barros: — Para mim não o está.

O sr. Presidente: — Então queira mandar para a mesa a nota de que quer fallar sobre ella, e então ficará para ámanhã. Agora passa-se á

ORDEM DO DIA.

Continua a discussão do projecto n.º 16 (Vid. sessão n.º 1 d'este vol. a pag, 9.)

O sr. Fontes Pereira de Mello (sobre a ordem): — No discurso que tive a honra de pronunciar na sessão de segunda feira, commetti uma inexactidão de que me convenci hontem pelo exame do orçamento, e como prova da lealdade da minha parte e desejo de acertar no debate, pretendo manifesta-la á camara. Quando calculei o rendimento das matas do reino em relação ao orçamento antecedente, tanto de despeza como de receita, disse que não tinha encontrado na verba respectiva aos estabelecimentos pios, municipalidades e outras corporações, nenhuma que compensasse a que vinha n'esta receita do estado. Achei effectivamente no capitulo respectivo do ministerio das obras publicas uma verba de réis 6:500$000, ou 6:400$000 réis, e encontrei igualmente no orçamento propriamente dito d'este ministerio a verba de 7:800$000 réis para madeiras e diversas obras. Estas duas verbas com quanto muito pequenas em relação á verba lotai de 120:000$000 réis, alteram o resultado que apresentei á camara, e eu dou uma prova de lealdade e desejo de acertar mencionando este engano.

O sr. Ministro da Fazenda (Antonio José d'Avila): — Sr. presidente, eu ouvi ante-hontem, com toda a attenção que devia, o discurso do nobre deputado que abriu o debate e que acaba agora de rectificar uma parte das observações que linha feito em relação a um dos rendimentos do estado descriptos no orçamento, e ainda que não possa seguir o nobre deputado em todas as variadas considerações que apresentou, comtudo não posso deixar de manifestar á camara a minha satisfação vendo que o nobre deputado esta inteiramente de accordo com o projecto que o governo apresentou, e que se alguma divergencia apparece, provém ella de que o nobre deputado e o governo apreciam de diversa maneira os factos a que se refere o projecto e as disposições que elle contém, e affigura-se-me que se o nobre deputado me tivesse feito a honra de assistir á sessão da illustre commissão de fazenda a que eu assisti, por convite da mesma commissão, as suas duvidas leriam desapparecido completamente.

O nobre deputado disse=que este projecto é um supplemento á lei de meios, que pela sua parte não tem difficuldade em votar ao governo os meios de que carece, mas que quer que o governo diga quaes são esses meios =. É exactamente o que me parecia que estava no projecto. Não occultei nem occulto, nem tenho interesse em occultar, que o projecto é um supplemento á lei de meios. Parecia-me que o relatorio que eu apresentei a esta camara, precedendo esse projecto, que o explicava cabalmente; e se o nobre deputado tem repugnancia em votar ao governo auctorisações indefinidas e illimitadas, póde ter a certeza de que eu sou o primeiro que não quero taes auctorisações indefinidas e illimitadas. Por consequencia para dar ao nobre deputado uma prova da sinceridade do meu proceder a este respeito, eu pediria a s. ex.ª que redigisse o seu pensamento em substituição a este projecto, apresentando as limitações que s. ex.ª julga precisas para acabar o vago que n'elle encontra, e posso asseverar a s. ex.ª que aceitarei com muito prazer essas modificações.

Sr. presidente, eu fui victima da sinceridade com que sempre procedo quando tenho a honra de gerir os negocios publicos; mas espero que as explicações quedarei acamara mostrarão que effectivamente não ha motivo para que seja victima d'essa sinceridade.

Se em logar de descrever á camara, com a fidelidade com que o fiz, todas as operações que levei a effeito, ainda as apparentemente de menor importancia, me tivesse apresentado diante do parlamento e dissesse: «De julho de 1856 em diante, ou para melhor dizer, do fim do anno economico de 1853 em diante, quando o nobre deputado deixou de fazer parte do gabinete a que pertencia, ou quando esse gabinete foi substituido pelo gabinete presidido pelo sr. marquez de Loulé, diversas calamidades vieram pesar sobre este paiz produzindo despezas que não tinham sido votadas pelo corpo legislativo, e que por consequencia o governo linha direito de vir pedir ao corpo legislativo que provesse de remedio votando as sommas que essas calamidades tinham feito despender, assim como aquellas em que importavam

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as diminuições de receita devidas a essas mesmas calamidades», parece-me que não se poderia levantar uma só voz n'esta camara para negar ao governo o direito de pedir esses meios. O que se podia era querer verificar se effectivamente as sommas pedidas pelo governo eram aquellas que se linham despendido ou deixado de cobrar. Pois esta á rigorosamente a situação.

No anno economico de 1856 a 1857 a cholera morbus invadiu, assolou e flagellou este paiz, e o governo foi obrigado a abrir creditos supplementares para as despezas que esse flagello produziu.

N'esse mesmo anno a crise das subsistencias obrigou o governo a abrir creditos supplementares por sommas consideraveis para o pagamento da differença que houve no preço das forragens e rações para os ministerios da guerra e da marinha e para as guardas municipaes. Depois veiu a febre amarella, e a febre amarella obrigou o governo a abrir creditos extraordinarios na importancia de 60:000$000 réis, estagnou o commercio, e produziu uma diminuição consideravel no, rendimento das alfandegas. Por consequencia se eu viesse dizer ao par lamento: « Votae-me as verbas que foram despendidas ou que se não cobraram por virtude destas diversas calamidades», pergunto aos homens que geriram os negocios publicos, haveria direito para recusar.ao governo esses meios? Puis quando a cholera morbus assolava o paiz não se haviam de fazer as despezas que se julgaram precisas para debellar esse flagello? Pois quando a crise das subsistencias obrigou a governo a comprar mais caras as rações e as forragens não se haviam de votar ao governo os meios precisos para este excesso de despeza? Pois quando a febre amarella assolou este paiz não se haviam de fazer as despezas precisas para combater esse flagello? E a diminuição de receita das alfandegas seria um acontecimento previsto? Podiam os nobres deputados em junho de 1856 contar com a febre amarella, e com as calamidades que ella produziu? Pois, sr. presidente, as despezas occasionadas por esses flagellos são as seguintes, No anno economico de 1856 a 1857 as despezas provenientes da cholera morbus foram 46:000$000 réis. As que provieram do augmento do preço das ferragens e rações foram 301:000$000 réis. No anno de 1857 a 1858 em que estâmos, a diminuição no rendimento das alfandegas foi, em relação ao orçamento do anno economico antecedente, no mez de novembro, de 269:000$000 íeis; no mez de dezembro 3:000$000 réis; no mez de janeiro 36:000$000 réis, e os creditos extraordinarios foram 60:000$000 réis. Tudo isto monta a 714.000$000 réis.

Ora o governo veiu pedir á camara muito menos do que isto, porque veiu pedir á camara unicamente que lhe votasse (note-se bem, e peço para aqui toda a attenção da camara) a importancia das despezas que se lêem feito com o caminho de ferro desde o 1.° de julho do anno passado em diante, e as que se continuarem a fazer. E n'esta parte, se os nobres deputados receiam que o governo queira continuar o caminho de ferro por sua conta, lêem um meio excellente de prover a isto. que é porem n’um artigo especial uma limitação dizendo que o caminho de ferro não continuará por conta do governo alem da ponte d'Asseca, e esta acabada Ioda a obscuridade n'esta parte. Repito pois que pedi muito menos do que tinha direito a pedir, e não estou ainda arrependido de ler procedido assim.

O illustre deputado disse que eu tinha arredado do caminho de ferro e das obras publicas sommas valiosas. Não arredei um real, nem sei como esta imputação me possa ser feita em presença dos documentos que apresentei á camara Pois o governo linha obrigarão de dar o emprestimo dos 1.500:000$000 réis de uma vez ao ministerio das obras publicas, se este ministerio não lh'o pedisse? A obrigação do governo era levantar esse emprestimo na occasião em que julgasse que mais vantajosamente o podia levantar, e ir fornecendo as sommas que elle produzisse ao ministerio das obras publicas á medida que esse ministerio lh'as pedisse. É exactamente o que o governo tem feito, e o documento que apresentei á camara, e que fui aqui analysado, prova que até ao dia 18 de dezembro (foi a data em que se concluiu este relatorio) tinha o governo dado por conta d'esse emprestimo 1.335:000$000 réis ao ministerio das obras publicas; e para provar que o governo continua todos os dias a dar por conta d'esse mesmo emprestimo ao ministerio das obras publicas as sommas que elle pede, aqui tem v. ex.ª já o que posteriormente áquelle documento n.° 46 tem dado a esse ministerio por conta do mesmo emprestimo, como se vê d'esta nota que porei á disposição dos nobres deputados, se elles julgarem que precisam de taes informações.

Mostra essa nota, que de 19 de dezembro até 20 de janeiro ultimo entreguei ao ministerio das obras publicas, por conta do emprestimo dos 1.500:000$000 réis, 55:000$000 réis e de 21 de janeiro até 30 do mesmo, 44:000$000 réis, o que eleva o lotai d'essas sommas a 1.404:000$000 réis

Eu aqui apresentei a data de 20 de janeiro, porque tinha n'essa occasião pedido a Sua Magestade a minha demissão do cargo de ministro da fazenda, e amestrado pela experiencia, tenho o costume, quando sáio do ministerio, de me munir com os documentos que provam a situação em que deixo a fazenda publica, assim como faço o mesmo em relação á epocha em que entro no ministerio; e é por este motivo e não por querer censurar o meu antecessor, nem por querer separar a minha responsabilidade da d'elle, que o nobre deputado ha de ver nos documentos que acompanham o relatorio sobre o estado da fazenda publica até 30 de novembro, o estado da fazenda publica em 13 de março, vespera do dia em que entrei no ministerio. Dou esta explicação á camara, porque o nobre deputado deu á existencia d'esse documento entre os do meu relatorio uma outra interpretação, que não é exacta.

Por conta do emprestimo dos 600.000$000 réis votada para estradas dei:

Até 7 de dezembro de 1837. (Documento, n.° 55)............................. 279:801000

De 8 de dezembro a 20 de janeiro de 1858 72:476920 E de 21 a 30 de janeiro................ 34:042$605

Total...... 386:320525

Por conta do emprestimo dos 600.000$000 réis que o illustre deputado qualificou de anteciparão, e qualificou bem, não posso deixar de dizer que a opinião do illustre deputado é exactamente a que tenho sobre este assumpto, isto não altera nada a natureza das cousas; o nobre deputado desejava esta demonstrarão, porque tendo sustentado que era uma antecipação, foi-lhe combatida esta sua apreciação; mas o nobre deputado sabe perfeitamente que não fui eu que a combali; mas isto é um objecto de opinião, nem o cavalheiro que sustentou que não era antecipação fica em peior situação por esta declaração que eu faço; poderá ser que nós ambos estejamos em erro, o nobre deputado e eu, mas entendo que essa operação foi uma anteciparão. O facto é que por conta d'essa antecipação entregaram-se desde a data do ultimo documento que apresentei 18:000$000 réis.

Portanto eu tenho continuado a dar ao meu collega o sr. ministro das obras publicas por conta do emprestimo dos 1.500:000$000 réis todas as sommas que s. ex.ª me tem pedido, ao ponto de que, torno a dizer, n'esta data já por conta d'esse emprestimo estão dados 1:404:000$000 réis, numeros redondos; nem se poderia deixar de reconhecer isto, quando se vê que as obras do caminho de ferro têem progredido, e têem progredido durante esta administrarão. Mas bastava notar-se que desde o contrato provisorio com sir. Morton Pello até ao definitivo, no intervallo que decorreu entre estes dois contratos fizeraui.se no caminho de ferro despezas na importancia de 270:000$000 réis, que sir Morton Pello se obrigou a pagar, como consta de uma clausula do contrato definitivo. Por onde se deu este dinheiro? Pelo emprestimo dos 1.500:000$000 réis, porque não havia nenhuma outra verba no orçamento applicada para esta despeza. Por onde se têem continuado as despezas da continuação da

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construcção d'esse caminho de ferro? Por esse mesmo emprestimo.

Não arredei pois das obras de estradas, das obras do caminho de ferro, nem dos navios, cuja compra foi auctorisada, um só ceitil. Eu tenho entregue ao meu collega o sr. ministro das obras publicas, e ao meu collega o sr. ministro da marinha todas as sommas que ss. ex.ª me têem requisitado para a satisfação d'esses encargos, e esta é que eu entendo que é a minha rigorosa obrigação, porque, torno a dizer, quando se dá ao governo auctorisação para levantar um emprestimo, o governo ha de levantai esse emprestimo quando entender que o póde levantar de uma maneira mais vantajosa; a sua obrigação só é que o serviço para que esse emprestimo é votado não soffra, nem pela sua negligencia, nem porque elle recuse as sommas precisas para esses encargos.

Já vê a camara por consequencia em que vem a parar todos esses bills de indemnidade com que o nobre deputado me quer obsequiar, e que não recusarei, se a camara entender; mas espero que não entenda, que realmente das operações que eu fiz durante a calamidade que nos perseguiu, e de que os nobres deputados não fazem menção, mas que eu hei de recordar-lhes, que das numerosas operações que eu fiz n'essa epocha, resultou de alguma fórma sacrificio do serviço publico.

Sr. presidente, as opposições estão no seu direito quando recorrem a estes meios; mas o que não consinto é que se queiram justificar com o meu exemplo; porque a verdade é que eu nem recusei nunca meios, nem trouxe nunca as questões ao terreno em que tenho visto que se trazem a meu respeito, dissimulando factos essenciaes que são a explicação do meu procedimento. (Apoiados.) E eu posso dizer, e dizer com a mão na minha consciencia e invocando os echos d'esta casa e os Diarios das nossas discussões, que em occasiões similhantes o governo viu-me sempre a seu lado; sempre, ou sustentando com o meu voto e com a minha palavra, fraca como é, as medidas que apresentava, ou aconselhando outras que eu reputava mais efficazes que as suas; (Apoiados.) tratem-me as opposições da mesma fórma por que as tratei, não desejo mais nada.

Fallou-se aqui no emprestimo para a estrada marginal do Douro, e devo sobre isto uma explicação ao meu nobre e muito antigo amigo, apesar de muito moço, o sr. conde de Samodães. Digo a respeito d'este emprestimo o mesmo que disse a respeito de todas as outras sommas. Sinto que o meu collega o sr. ministro das obras publicas não esteja presente (s. ex.ª já chegou á capital de uma excursão a que negocios do serviço o obrigaram, mas chegou neste instante, provavelmente virá ainda a esta sessão), porque não posso dar ao meu nobre amigo explicações em relação ao emprego d'essas sommas, porque eu não posso responder senão pela entrega ao sr. ministro respectivo das sommas que estou auctorisado a levantar. O que assevero é que tenho mandado entregar ao sr. ministro das obras publicas todas as sommas que me tem pedido a respeito d'este emprestimo, e que a somma que lhe falta é tão pequena, que eu commetteria um grande erro se entendesse que podia remediar os males da fazenda publica recusando me a entregar esses H:000$000 réis que fallam só para completar o emprestimo.

Sr. presidente, este projecto não comprehende esse vago de disposições que se lhe imputou; e se se entender assim ha um meio excellente de o evitar, e vem a ser vote a camara as sommas que foram gastas com o flagello da cholera morbus, com o flagello da febre amarella, com a crise das subsistencias, e as sommas correspondentes á diminuição que leve logar na receita das alfandegas com o flagello da febre amarella; vote me a camara isto e eu retiro o projecto todo. (Apoiados.) Mesmo não hei de fazer questão dos 1:000:000$000 réis para completar o penhor do emprestimo dos 600:000$000 réis para as estradas, 1.000:000$000 réis que foram apresentados como uma cousa do outro mundo, quando se não trata senão de pedir um penhor que não traz ao thesouro o menor encargo, porque os juros d'essas inscripções hão de ser recebidos pelo governo, porque os encargos do emprestimo lá estão attendidos na lei. Se esse penhor viesse para as mãos dos prestamistas, expondo, como em alguma epocha anterior á minha administração, e que esses prestamistas fizessem transacções sobre elle, occorrendo, como então occorreu, que morreu um d'esses prestamistas, e grande difficuldade houve em obter as inscripções que lhe haviam sido empenhadas, muita rasão tinham os illustres deputados; (Apoiados.) mas desde que eu peguei n'essas inscripções e fui deposita-las no banco de Portugal, do qual não podem saír senão quando o governo faltar st) pagamento das suas obrigações, a que não tem faltado até hoje, nem espero faltar, não haja medo que possam influir no valor do mercado, porque não apparecem lá; e sobretudo quando eu mostro que esses papeis, á proporção que termina o fim para que foram creados, vão sendo inutilisados; pois os illustres deputados não viram nos autos da junta do credito publico, que vem publicado no Diario do Governo, que ainda ultimamente se queimaram no Terreiro do Paço 600:000$000 réis de inscripções, e porque se queimaram? porque acabou o motivo para que foram creados. Tenham pois os illustres deputados a certeza de que o primeiro empenhado em que as inscripções cheguem ao preço que têem lá fóra os fundos publicos de todos os paizes sou eu, e quando digo eu, fallo como ministro da fazenda, porque, na elevação do valor d'esses nossos fundos, está para mim em grande parte a salvação d'este paiz, (Apoiados.) porque havemos pagar muito mais vantajosamente Iodas as obras de interesse publico que mandarmos construir para serem pagas por esses fundos, e porque havemos ler fundos muito mais baratos para a industria, para o commercio, e para promover os melhoramentos da nossa agricultura e remover mesmo os embaraços do thesouro quando o governo precise de recorrer a alguma operação de thesouraria. (Apoiados.) Parece-me pois que alem d'este interesse que eu tenho como ministro, havia alguma cousa nos precedentes da minha vida publica, que provava que tem sido este o alvo a que sempre me tenho dirigido. (Apoiados) Por consequencia d'esses 1.000:000$000 réis que eu peço para reforçar o penhor do emprestimo para as estradas não provem inconveniente algum, nem a distracção que fiz dos 1.000:000$000 réis do emprestimo para a marinha applicando os para o emprestimo das estradas trouxe tambem inconveniente algum. (Apoiados.)

Disse o illustre deputado: «O governo foi dar ao banco o que o banco não pediu». Peço perdão para dizer ao illustre deputado que não viu bem o contrato. O banco prestou-se gerir este emprestimo, mas pediu que em logar do penhor que eu offerecia, fosse penhor elevado a 1.300:000$000 réis. As prestações d'esse emprestimo começavam a entrar no thesouro, a primeira em fins de agosto, a segunda em fins de setembro, a terceira em fins de outubro, a quarta em fins de novembro, quer dizer, quando o banco linha Ioda a probabilidade de que o governo havia ler apresentado este projecto na camara, e que havia tempo para ser approvado; por consequencia tendo chegado o dia em que se vencia a quarta prestação, eu. não havendo creado os 1.000:000$000 réis de inscripções tinha ainda outro meio de saír da difficuldade, e esse acharia o illustre deputado muito bom. Eu podia levantar sobre os 1.000:000$000 réis de inscripções que tinha em perfeita liberdade, podia levantar 400:000$ réis para a compra dos navios; mas para isso era necessario um emprestimo, e a occasião não era a mais propria para o fazer, porque era durante o flagello da febre amarella, quando os capitalistas aterrados por tamanho mal não estavam dispostos a fazer taes operações. (Apoiados.) Havia alem d'isso a crise monetaria que se apresentava medonha lá fóra, crise de que nós escapámos pela prudencia dos capitalistas e do banco de Portugal. Como havia eu pois n'essa occasião fazer tal operação? Achei melhor que estando como estava sobrescripta a operação dos 600:000$000 réis, e por consequencia os prestamistas não tinham direito nenhum, se se, recusarem a essas prestações, reforçar o penhor do empres-

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timo para as estradas, porque d'essa maneira contava logo com 300:000$000 réis, e os 100:000$000 réis que fallavam para a compra dos navios, não me fallavam porque a construcção d'esses navios foi feita por um contrato para se pagar em prestações até ao fim d'este anno economico. De passagem direi á camara, que por conta d'essas prestações já se pagaram 49:400 libras.

Eis-aqui o grande crime que o governo commetteu por pegar n'esses 1.000:000$000 réis, e reforçar o penhor de um emprestimo que já estava sobrescripto! Que mal resultou d'aqui? Nenhum; os navios estão-se fazendo, dois estão já em estado de vir para Portugal em muito pouco tempo. As prestações para as estiadas têem sido entregues ao sr. ministro das obras publicas com tal largueza, que se o sr. ministro continuar a gastar nos cinco mezes que faltam para acabar o anno economico, na mesma proporção com que tem gasto até aqui, não são os 600:000$000 réis que chegam para tal... (O sr. José Estevão: — Vae bem!) Vae bem! Pois o sr. deputado que me veiu censurar aqui, dizendo que eu era o dictador ou director do sr. ministro das obras publicas, admira se que eu diga que não respondo pelos trabalhos das estradas?! Não me pertence, e o meu dever como ministro da fazenda é entregar ao sr. ministro daquella repartição as sommas de que preci.ar dentro do credito que o parlamento abriu para esse fim; é o que tenho feito, e hei de continuar a fazer. (O sr. José Estevão: — Essa não é a questão.) Então qual é a questão? Estimava muito que o illustre deputado me dissesse qual era a questão; havia de ser engraçado. A não ser esta, não ha outra senão a vontade de embaraçar o governo. (Apoiados.)

O sr. Presidente: — É melhor nau interromper.

O Orador: — Eu louvo muito o procedimento do sr. presidente: as regras regimentaes foram estabelecidas para evitar que os debates tomassem uma certa acrimonia; mas as interrupções a mim não me incommodam, porque eu tenho a consciencia de que cumpro o meu dever, (Apoiados.) e tenho a consciencia de que todos os homens honestos e imparciaes d'este paiz me hão de fazer justiça. (Muitos apoiados.) Insisto portanto n'este ponto, que para mim é capital, fiz variadas operações pelas circumstancias lamentaveis em que me encontrei, nenhum» d'essas operações embaraçou nem o pagamento regular aos empregados, nem o pagamento dos juros da divida consolidada interna e externa, nem o progresso das obras das estradas em que andaram nunca menos de doze mil operarios, e muitas vezes mais de treze mil e perto de quatorze, não embaraçou os trabalhos do caminho de ferro, nem da telegraphia electrica, não embaraçou a compra dos navios, para que foi auctorisado o sr. ministro da marinha, apesar de que ainda não fiz o emprestimo que esta auctorisado para essa compra, porque me falta a hypotheca para ella, que se deu subsidiariamente ao banco de Portugal, e de que nenhum inconveniente veiu ao thesouro.

Viu o illustre deputado n'este projecto, creio que no artigo 2.°, que o governo por virtude d’elle, ficava auctorisado para ir comprometter os bonds creados para o pagamento do contraio Peito; parece me que foi isto que ouvi; mas se o illustre deputado disser que o não disse, não insisto. (Pausa.) Como o illustre deputado o não nega, entendo que o disse: eu não comprehendo como tal illacção se póde tirar d'este artigo; elle diz expressamente que são os bonds e inscripções já creadas; não se arredou ainda um só bond do valor mais pequeno para pagar as obrigações do contrato Pello: este artigo foi uma prova da lealdade com que eu entendo que me devo apresentar ao parlamento (Apoiados.); eu empenhei essas 212:000 libras, e d'esse emprestimo uma parte entrou nos cofres do estado, na massa geral da receita, e fez frente ás despezas publicas, e este artigo só tinha por fim regularisar essas operações. O mesmo digo das inscripções de que ahi se faz menção. Elimine-se pois este artigo que tanto medo causa ao illustre deputado, elimine-se do projecto, convenho n'isso, e provo assim ao illustre deputado quão exagerado foi quando viu n'esse artigo um bill de indemnidade para o passado e para o futuro.

O que se pede no artigo 3.°? Pede-se que o governo seja auctorisado a levantar pelos meios estabelecidos na carta de lei de 4 de junho, as sommas de que precisar para continuar o caminho de (erro. Creio mesmo que o illustre deputado foi já de opinião, que o governo não tinha necessidade de tal auctorisação, porque estava comprehendida no contrato feito com sir Morthon Pello; mas eu que não tenho essa opinião, não tive difficuldade em inserir aqui este artigo, que como acabo de demonstrar, é tão innocente que até o illustre deputado entende que se poderia dispensar.

Em relação á divida fluctuante tambem não comprehendi os receios que o nobre deputado exprimiu. O governo esta auctorisado para extinguir a divida fluctuante sobre penhores, com tanto que d'esta operação não resulte um encargo excedente a 6 por cento; o que se pede aqui? Pede-se que o encargo seja de 7 por cento: póde o ministro converter toda a divida em divida sobre penhores? Era preciso primeiramente que tudo ter os penhores; não se póde convertera divida fluctuante em divida sobre penhores sem ler os penhores, e o governo não os cria á sua vontade; (Apoiados.) mas se se cré que ha obscuridade n'esse artigo, essa obscuridade essa designando qual é a divida n'elle comprehendida. Aonde esta pois n'este projecto a aberração completa de todos os principios de que fallou o illustre deputado? S. ex.ª não se deu ao trabalho de o demonstrar; (Apoiados.) foi um rasgo da sua eloquencia, que infelizmente não sei imitar.

O illustre deputado folgou por ver que me tinha pago a sua divida mais depressa do que suppunha, em relação ao bill de indemnidade que eu lhe offereci. Eu pensava que o illustre deputado não trouxesse a terreno este assumpto; porque o illustre deputado sabe, que se eu tivesse vindo offender lhe bill de indemnidade por prazer, por desejo de o combatei, como meio de opposição, n'uma palavra, eu havia de ter a esse respeito uma horrivel tarefa a preencher: appello só para a sua consciencia: eu propuz aquelle bill de indemnidade malfadado, que vejo que tanto feriu os nervos do illustre deputado, porque não podia decentemente deixar de o fazer. O illustre deputado tinha vindo pedirás côrtes auctorisação para pagar a subvenção do caminho de ferro do Barreiro com 1.280:000$000 réis, em titulos de divida fundada, que haviam ser tirados das inscripções do fundo do amortisação, e poucos mezes depois vem pedir ás côrtes que lhe creassem esses 1 280:000$000 réis sem explicação alguma. Era pois necessario que o illustre deputado nos explicasse o uso que linha feito d'esses 1.280:000$000 réis, e essa explicação importava logo a confissão de uma infracção do acto addicional, e entendi que o parlamento não podia votar a creação d'essa somma sem o relevar d'essa irregularidade em que incorrera. Declarei pois, que lhe votava essa somma, mas depois de preenchida aquella formalidade essencial. Compare a camara este proceder com o proceder que tem havido comigo, desde que estou aqui sentado. Mas n lo sou eu agora que venho contar á camara lealmente todas as operações que fiz? Não sou eu que venho habilitar o illustre deputado para dizer em vista dos meus documentos, ainda que por apreciações inexactas, que eu não emprehendi todos os trabalhos de estradas por virtude de ler consumido na voragem das despezas correntes algumas sommas que linham applicação ás mesmas estradas? Repito.se a camara entender que o farto de eu ler applicado ás despezas publicas, renitas provenientes de contratos ou de emprestimos que estiva auctorisado a fazer, sem prejuizo da applicação que tinham essas sommas; se acamara entender que ha n'isto desvio de lei, eu sujeito-me ao seu juizo, sem considerar que a camara me desauctorou em cousa alguma, porque sustento que nas circumstancias em que me encontrei, lodo o mundo havia de fazer o mesmo. (Apoiados.) Entendo que se durante a calamidade da febre amarella tivesse suspendido os pagamentos, se fosse suspender por falta de meios o progresso e adiantamento das obras publicas, eu era réu de um grande crime e devia aqui ser accusado por isso: então sim, porque as consequencias eram a anarchia

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na capital e no reino inteiro; e um ministro que n'essas circumstancias não tem a coragem necessaria para attender só salvação de todos, á salvação publica, que e a primeira de todas as leis, esse ministro não é capaz de o ser. Eu não quero dictaduras: nunca hei de entrar n'esta casa com o chapéu cheio de leis, com centenares de leis, que não podem ser aqui discutidas com meditação, e que quando se analysam se reconhece que foi uma desgraça a sua adopção. Tão criminoso é o ministro que só vive de dictaduras como aquelle que não sahe salvar o paiz, expondo-se a entrar por aquella porta dentro com o cordel ao pescoço, dizendo: condemnae-me, mas eu fiz o meu dever.

Aceitarei pois todos os bills de indemnidade que a camara entende que por estes actos preciso, mas sem me considerar desauctorada por elles, porque entendo que cumpri o meu dever nas terriveis circumstancias em que me vi collocado.

Eu devia parar aqui, mesmo no interesse do debate e da minha saude; mas o illustre deputado para justificar as observações que fez, desceu a uma analyse minuciosa do orçamento, e v. ex." comprehende que eu não posso consentir que este documento, ao primeiro debate que tem logar n'esta casa, fique desacreditado. O illustre deputado já hoje reparou uma falla que commettêra quando fallou, em relação á receita dos pinhaes e matas, e só sinto que se não tivesse dado ao exame dos documentos officiaes, porque então não leria sido só essa que viria reparar, mas muitas outras, como eu vou mostrar.

Sr. presidente, o illustre deputado disse que eu tinha organisado o orçamento contando com um anno em que as alfandegas renderam mais do que costumavam render, e que tinham rendido mais por virtude da escacez das nossas colheitas, e da falla da producção do vinho, factos estes que fizeram com que se introduzisse no reino uma grande quantidade de cereaes, e um grandissimo numero de pipas de aguardente, e o illustre deputado concluiu que eu fazia finanças baseando-as sobre a fórma. Confesso que nunca esperei ser obrigado avir em pleno parlamento combater esta doutrina, e não se offenda o illustre deputado que eu lhe diga que me causou tanta surpresa esta proposição, quanto foi a surpresa que me causaram as proposições que em epocha não muito arredada foram professadas, e que obrigaram um dos maiores talentos da nossa epocha a escrever um livro em que pretendia provar que = a propriedade não era o roubo=-. Pois o illustre deputado sustenta que um paiz quanto menos produz mais consome! Não houve cereaes, entraram em grande escala os cereaes estrangeiros, e pagaram direitos nas alfandegas, não houve vinho entrou uma grande porção de aguardente e pagou direitos nas alfandegas; quando o paiz tornar a ter uma grande colheita de cereaes e vinhos o paiz ha de consumir menos de que consumiu n'esta quadra lamentosa e hão de render menos as nossas alfandegas. (Riso.) Os illustres deputados riem-se, pois foi o que se disse: não foi pois eu que estabeleci finanças sobre fórma, foi o illustre deputado que combate Se fosse boa esta doutrina o que nós tenhamos a fazer para organisar a nossa fazenda era pedir a Deus que condemnasse á esterilidade as nossas cearas e as nossas vinhas, e á colera celeste deviamos nós juntar a nossa, queimando as fabricas, porque então tudo vinha de fóra, eludo pagava direitos nas alfandegas. Mas o que eu desejava saber era com que haviamos de pagar o pão que comêssemos e o fato que vestíssemos. Isto é uma proposição do tal natureza que eu faria a maior offensa ao bom senso da camara se me demorasse na sua refutação. Eu acredito que o illustre deputado não queria dizer isto, mas o que mais me espanta e admira é que o illustre deputado fosse citar documentos officiaes, nos quaes elle achava a resposta ás suas proposições. Aqui esta o mappa do rendimento da alfandega municipal de 1856 para 1857 e no qual se acha a resposta á sua proposição.

Ve-se d'esse mappa, que os direitos cobrados sobre cereaes estrangeiros não só para consummo da capital, mas para todo o reino, montaram a 70:000$000 réis; mas n'este mesmo mappa referindo-se aos direitos do consummo em Lisboa do vinho, vinhos e á aguardente e azeite, diz-se = que por causa bem conhecidas (é a esterilidade das vinhas e a diminuição da producção do azeite) os direitos desceram mais do que no anno antecedente 59:000$000 réis, e do que n'um anno normal 200.000$000) réis ==

Quanto aos direitos do arroz direi da passagem porque realmente magoou-me gastar tempo a camara com estas refutações, que Portugal ainda não produz o arroz que consome, e que ha portanto ainda uma grande introducção de arroz estrangeiro em Portugal: ora o direito antigo em relação ao arroz, que entrava ordinariamente antes da carestia, não produzia uma somma muito inferior á que produziram os direitos moderados estabelecidos naquella epocha, apesar da grande massa de arroz que durante ella entrou pelos nossos portos. Por consequencia do rendimento que o nobre deputado calculou em relação á entrada do arroz no Porto, deve se deduzir o que produziu o direito sobre o arroz n'uma situação normal. Repilo, pois, que não estabeleci as minhas finanças sobre a fome, como disse o nobre deputado; porque tenho a desgraça de acreditar, que quanto mais abundante for a nossa producção, quanto maior massa de cereaes produzirem os nossos campos, quanta maior quantidade do vinho produzirem as nossas vinhas, quanto mais prosperas forem as nossas fabricas, tanto maior ha de ser a nossa riqueza, tanto mais havemos de consumir, e tanto mais ha de prosperar o nosso commercio e melhorar o rendimento das nossas alfandegas. (Apoiados.)

O nobre deputado disse tambem, que nos diversos relatorios que apresentei ao parlamento, apparecia sempre a minha idéa dominante, que era dissimular o deficit: permitta-me o nobre deputado quo eu me sirva de uma represalia, declarando que hei de vir a esse campo as menos vezes que podér, mas haverá occasiões, como esta, que o não possa deixar de fazer. Parecia-me, sr. presidente, que o nobre deputado era o menos competente para me fazer essa arguição, porque nos cinco orçamentos que o nobre deputado apresentou á camara, nos creditos supplementares e extraordinarios que abriu, e que se deviam sommar ao deficit d'esses orçamentos, foi sempre o deficit menos da a metade da cifra a que elle foi realmente elevado, isto é, o nobre deputado calculou sempre o deficit em menos de ametade do que elle realmente era, em quanto que em 1856 a 1857 o deficit foi muito menor do que a somma em que o calculava o orçamento, acrescentado com os creditos supplementares e extraordinarios que se abriram. Aqui estão os deficits dos orçamentos apresentados pelo nobre deputado.

No seu orçamento de 1852 a 1853, o deficit foi de réis 190:000$000; de 1853 a 1854 foi de 24:000$000 réis, nem valia a pena de fallar n'elle; de 1854- a 1855 foi de réis 11:000$000, menos ainda. De 1855 a 1356 de 295:000$000 réis, os creditos supplementares, que o nobre deputado abriu, e que estão publicados no Diario do Governo, e não posso acreditar que o nobre deputado, que sabia que era obrigação do ministro, quando abre creditos supplementares, mandar publicar o respectivo decreto no Diario do Governo, tivesse aberto outros creditos alem d'estes, os creditos extraordinarios e supplementares abertos em relação a esses quatro annos, dão a cifra de 528:000$000 réis, que com os 520:000$000 réis dão um deficit nos mesmos quatro annos de 1.048:000$000 réis. O augmento da divida fluctuante que apresenta os deficits accumulados n'este intervallo é de 2.232:000$000 réis; houve pois uma diminuição nos calculos apresentados pelo nobre deputado, em relação á realidade, de 1.200.000000 réis.

Em relação ao orçamento de 1856 a 1837, devendo o deficit d'esse anno montar a 767:000$000 réis, o augmento da divida fluctuante, que representa o deficit d'esse anno, mostra que esse deficit só foi de 571:000$000 réis, isto é, houve uma diminuição de 191:000$000 réis; quer dizer, que nos annos que o nobre deputado esteve á frente dos negocios da fazenda, o deficit real foi sempre o dobro daquelle que o nobre deputado calculou, addicionar]lo aos seus orçamentos os creditos supplementares e extraordina-

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rios, em quanto que o resultado contrario teve logar logo que s. ex.ª saíu do ministerio. Portanto, sr. presidente, parecia-me que antes de se apresentarem taes argumentos no parlamento, se devia primeiro examinar melhor os factos, para evitar estas correcções, que não podem ser agradaveis a quem commette taes erros. (Apoiados.)

Sr. presidente, se a minha tendencia fosse para dissimular o deficit, linha um meio excellente a que podia recorrer, e era attender a massa das sommas que estão por cobrar, e d'aqui deduzir uma somma para formar receita: linha direito para o fazer, porque essa somma de atrazos, que foi em augmento constantemente durante a gerencia do nobre deputado, começou a descair no anno de 1850 a 1857. (Vozes: — É verdade.)

Os rendimentos por cobrar em 30 de junho de 1851, eram 3.680:000$000 réis; em 1852, 3.755:000$000 réis; em 1853, 3.847;000$000 réis; em 1854-, 3.886:000$000 réis; em 1855, 3.960:000$000 réis; em 1856, 4.023:000$ réis; quer dizer de 30 de junho de 1851 a 30 de junho de 1856, o atrazo na cobrança das contribuições augmentou cerca de 330:000$000 réis; em 30 de junho de 1837 já se nota uma diminuição n'esse atrazo porque veiu a réis 3.969:000$000, isto é, houve uma diminuição em relação ao anno anterior de 53:000$000 réis. Espero que se tiver a honra de apresentar á camara o quadro da cobrança do anno em que estamos, o atrazo ainda ha de ser menor. Eu podia pois recorrer a este melhoramento nas cobranças para attenuar o deficit; mas a camara vê que não recorri a esse meio, mandei fazer o orçamento como se fizeram os que o nobre deputado apresentou ao parlamento, salvas algumas modificações, que entendi dever fazer, e que vou explicar á camara.

O nobre deputado insistiu principalmente sobre a receita dos pinhaes e matas, já corrigiu uma parte do que disse a este respeito, mas não corrigiu tudo. Disse o nobre deputado, que se tivesse estado na camara, quando se discutiu o orçamento de 1857 a 1858, se havia de oppor a que n'esse orçamento viesse transcripto o rendimento das malas em 88:000$000 réis. Ora se o nobre deputado em logar de se contentar com a cifra da receita, examinasse a cifra da despeza, lá havia de encontrar justificado esse augmento de receita, porque o facto é, que no orçamento ultimo, que o nobre deputado apresentou na camara, a receita era calculada em 22:000$000 réis e a despeza em 16:000$000 réis, differença 6:000$000; mas no orçamento de 1857 a 1858, em que o rendimento é de 88:000$000 réis, a despeza é de 65:000$000 réis, o que produziu só a differença de réis 23:000$000. Ora o nobre deputado se tivesse feito esse exame, havia de achar que a rasão d'esses 65:000$000 réis, é porque se descreve no orçamento as madeiras que se davam para os diversos ministerios, e para os diversos estabelecimentos de piedade e caridade, assim tambem como se comprehenderam grandes melhoramentos que se fizeram naquella administração, porque nós devemos tirar todo o partido das diversas fontes de receita que administrámos; (Apoiados.) e se houvesse motivo para estranhar era porque as nossas malas só se julgam dever produzir 120:000$000 réis, e só a mala de Leiria, que tem tres leguas de comprimento sobre légua e meia de largo, não devia dar uma receita superior a esta para o estado? Mas na nota do orçamento de 1857 1858, isto é, no orçamento que veiu como documento, orçamento feito pelo administrador geral o sr. Caminha ahi esta a explicação d'esta verba. (Leu.)

(*) Este fornecimento foi calculado em vista das requisições de madeiras, que tiveram logar no anno de 1855; a saber:

Para o arsenal da marinha...............13:649$690

» » do exercito................ 583$813

» as obras publicas................... 965$293

» estabelecimentos pios............... 1:310$063

18:508$859

Transporte....... 18:508$859

Para a companhia dos canaes de Azambuja.. 626$000

» dos caminhos de ferro do sul......... 8:173$2()0

» os telegraphos electricos............. 799$400

» venda a particulares................ 447$155

» donativos aos povos................. 9$200

» obras da administração.............. 196$275

28:760$089

Sendo este consummo provavel de madeira, calculado pelo dito anno, deverá no 1857-1858 augmentar o dito consummo a somma de 39:35-5$088 réis; a saber:

Para um caminho de madeira ao porto de

S. Miguel........................ 25:268$459

» para a construcção de dois hiates..... 1:300$000

Pelo augmento das vendas............... 12:776$629

39:345$088

Aqui esta explicada a origem dos 68:000$000 réis em que esta verba vae calculada n'esse orçamento.. Torno a dizer, que o motivo d'esta estranheza, é porque se estava no costume de se darem as madeiras ás repartições publicas quando as pediam, e não eram contadas em receita. Pois ha algum ministro que tenha direito, o ministro da marinha, por exemplo, de requisitar do ministerio das obras publicas madeiras de construcção sem as pagar, quando tem no orçamento uma verba para essas despezas? Se o sr. ministro das obras publicas quizesse fazer um caminho de pau, e se a camara votar a somma precisa, na qual entra a madeira que empregou n'esse caminho, não ha de apparecer em receita da mesma fórma que apparece em despeza? Pois aqui esta positivamente explicado o negocio. Se no actual orçamento vem 120:000$000 réis. é porque se conta com estes fornecimentos e com as encommendas que estão feitas, e o digno administrador das matas, que é um dos mais zelosos e intelligentes empregados que conheço, o sr. José de Mello Gouveia, que fez parte do corpo legislativo, dá garantias de que ha de empregar todos os meios ao seu alcance para melhorar aquella immensa e vasta administração.

Mas o nobre deputado diz: « Mas na conta que publicastes de 1856-1857 houve só o rendimento de 10:000$000 réis?» Parecia-me que era eu que devia pedir explicações ao nobre deputado por esse facto, e não s. ex.ª a mim. (Apoiados.) Essa contabilidade é organisada no ministerio das obras publicas, e o ministerio das obras publicas foi creado por s. ex.ª e organisado por s. ex.ª Se o ministerio das obras publicas não fornece ao ministerio da fazenda, como se devem fornecer, e como se hão de fornecer em pouco tempo, porque me tenho entendido a esse respeito com o meu collega, para que essas inexactidões se não continuem, senão vem para o ministerio da fazenda as contas das madeiras que são fornecidas aos diversos estabelecimentos de caridade e piedade que devem apparecer na receita, é s. ex.ª que me deve explicar este facto, e não eu a s. ex.ª Mas este abuso não continuará mais; tenha o nobre deputado a certeza de que não só o meu collega tem empregado todos os meios para organisar a repartição da contabilidade do seu ministerio, mas eu dirigi-me já a s. ex.ª na qualidade de ministro da fazenda, e obrigado a estabelecer por consequencia a regularidade possivel na contabilidade d'este paiz, que me munisse com os esclarecimentos precisos, em ordem de que se não tornem a repelir aquellas omissões, e ha de descrever-se n'essa conta todo o producto dos pinhaes, como as madeiras que são mandadas para as repartições publicas, que devem figurar como receita ahi, como despeza lá. O mesmo digo a respeito da fabrica de vidros da Marinha Grande. Parece-me que tenho explicado bem esta verba de 120:000$000 réis, e a rasão porque apparece na conta réis 10:000$000. Mas permitta-me a camara que faça ainda ou

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Ira observarão. Se os argumentos do nobre deputado procedessem, era s. ex.ª a primeira victima d'elles. Eu o vou provar á camara.

O nobre deputado apresentou cinco orçamentos n'esta casa, comprehendendo os cinco annos economicos de 1852-1856. Quer v. ex.ª ver como o nobre deputado attendeu pouco á tal verba, quanto á venda das madeiras do pinhal, para a feitura dos seus orçamentos. Na conta de 1850-1851 que s. ex.' apresentou á camara, apparece o rendimento liquido dos pinhaes e malas em 6:800$000 réis, cifras redondas, e no orçamento de 1852-1853 calcula s. ex.ª esse rendimento em 22 000$000 réis. Na conta de 1851-1852 é o rendimento de 6:900000 réis, no orçamento de 1853-

1854 de 22:000$000 reis. Na conta de 1852-1853 de réis 5:100$000 no orçamento de 1854-1855 de 22:000$000 réis. Na conta de 1853-1854 de 7:600$000 I réis, no orçamento de 1855-1856 de 21:700&000 réis. Na conta de 1854-

1855 de 7:100$000 réis. no orçamento de 1856-1857 de 21:700000. Porque vem puis s. ex.ª censurar-me por dar no orçamento maior receita do que a que vem na conta, quando s. ex.ª trouxe 22:000$000 réis no orçamento, quando a conta só dava 6:000$000 réis? Porque não emendou s. ex.ª este erro, sendo s ex.ª como era então ministro das obras publicas e da fazenda? Portanto, sr presidente, se houvesse erro a este respeito, não era s. ex.ª que o devia censurar; esse erro vem do ministerio de s. ex.ª: continuou no começo d'esta administração, mas não continuará...

O sr. José Estevão —Isso é outro caso.

O Orador: — Pois é assim exactamente; e se eu quizesse comparar, torno a dizer, estou a fugir d'este campo; a despeza que s. ex.ª apresentava no orçamento n’esse mesmo anno, perguntar-lhe-ia como entendia que rendendo o pinhal 6:000$000 réis se fizesse com elle a despeza de íeis 16:000$000? (Apoiados) A despeza que apresentou no orçamento é de 16:000$000 réis, e ha mesmo um anno de 22:000$000 réis; como vinha pedir s. ex." 22:000$000 réis para despezas do pinhal, quando rendia só 6:000$000 réis? Era melhor da-lo de graça.

Vamos a fabrica de vidros da Marinha Grande. Em 1850, sendo ministro da fazenda, ordenei que os vidros que eram fornecidos aos diversos ministerios, fossem considerados como dinheiro porque se os diversos ministerios tinham precisão dos vidros, não havendo este contrato com a Marinha Grande, haviam de comprar se no mercado, a differença era que os comprava ao proprio governo; mas na sua despeza havia de apparecer aquella despeza, e havia de apparecer na receita o resultado da venda. Quando saí do ministerio não se julgou conveniente que essa medida continuasse. Entretanto, em dezembro de 1856, sendo ministro da fazenda o sr. José Jorge Loureiro, julgou s. ex.ª que o meu principio era bom, e mandou por consequencia que elle continuasse a vigorar. Quer v. ex.ª saber qual a importancia dos vidros que d'esta fórma se converteram em dinheiro no actual anno economico? Eu lh'o digo. No anno economico de 1857-1838 os vidros fornecidos aos diversos ministerios importaram em dois contos quinhentos e tantos mil réis, vendidos na alfandega em leilão n'este anno 302$000 réis. Por consequencia nos sete mezes, que já decorreram n'este anno economico, a importancia dos vidros é de 2.868$000 léis. Ja v. ex.ª vê que se o orçamento calcula a venda d'estes vidros em 4:300$000 réis para doze mezes, se em sete mezes produziram 2:863$000 réis, em todo o anno podera produzir essa venda 4.900$000 réis. Aqui tem portanto o nobre deputado destruido o seu receio de que o deficit augmente, porque na mesma conta vem a venda dos vidros em 4:900$ réis. A conta dos vidros vem na despeza e vem na receita; se antes não vinha assim, era pelo mesmo motivo por que este erro vinha na conta das malas, e esse erro não sou eu que tenho obrigarão de o explicar á camara.

Minas, 10:000$000 réis. O que me admira, sr. presidente, é que este imposto não deva ser calculado em maior somma. É uma lei mesmo do nobre deputado aquella que estabeleceu o imposto das minas. Este imposto divide-se em proporcional e fixo; é proporcional o imposto que diz respeito á extensão do terreno que se concede para a lavra das minas; e é fixo o imposto até 5 por cento que se lança sobre o producto liquido d'ellas: para que este imposto produza pois 10:000$000 réis, basta que ellas produzam 200:000$ réis. E qual é a rasão por que este imposto se não tem cobrado? É porque o nobre deputado, auctor da lei, não se occupou de mandar fazer um regulamento para a executar; esse regulamento está-se fazendo; (O sr. Ministro das Obras Publicas: — Apoiado.) ha de ser posto em pratica o mais depressa possivel; e nós esperâmos que no anno economico de 1858-1859 o imposto das minas ha de produzir o que deve produzir: se não produzir 10:000$000 réis póde produzir 8:000$000 réis, mas tambem póde produzir 12:000$000 réis ou mais. Nós não podemos desprezar todos os meios de receita publica que o thesouro tem direito a cobrar.

Real de agua. Apparece o real de agua calculado em réis 136:000$000 e a conta só dá 104:000$000 réis. E se não désse nada? Se não tivesse sobrado cousa nenhuma por quaesquer circumstancias, havia de o nobre deputado eliminar esse rendimento do orçamento? Pois se está arrematado por esse preço, não ha de o ministro lançar no orçamento essa receita? Se uma calamidade deu logar a que n'um anno os arrematantes não pagassem toda a importancia da arrematação, ha de o ministro no anno seguinte eliminar esse imposto do orçamento?!.. Ora, sr. presidente, custa muito a refutar argumentos d'estes.

Fundo de amortisação. Vem calculado em mais, e lá está no orçamento a explicação. O fundo de amortisação soffreu uma modificação importante no modo de pagar dos fóros e dos bens que ainda o constituem, que resultou de uma lei feita pelo corpo legislativo já depois da organisação da administração de que tenho a honra de fazer parte, em que se determinou que aquelles pagamentos seriam feitos pelas tres quartas partes em inscripções, e um quarto em metal; ora como este meio ha de facilitar a remissão dos fóros e a venda dos bens, e como as medidas empregadas tendem todas a activar esta remissão e venda, calculei-as naquella somma. Eu não podia só pelo farto de que n'um anno que não era da minha gerencia, o fundo da amortisação não deu o resultado que se esperava, prever que não ha de produzir aquillo em que esta calculado. E não estou em contradicção, sr. presidente, como que apresentei, porque não calculei o fundo de amortisação indefinidamente; se o eu tivesse calculado para todo o sempre naquella somma tinha o nobre deputado rasão para me censurar; porém calculei-o só para 1858-1859.

Sr. presidente, vou acabar, e sinto ter tomado tanto tempo á camara na analyse do orçamento porque ainda que parece que essa questão entrará melhor depois na discussão geral do orçamento, visto que o nobre deputado a apresentou aqui como argumento, era preciso que eu lhe respondesse.

Eu tenho a consciencia de que nós lemos gerido a fazenda publica com o zêlo, não direi intelligencia, mas como o zêlo com que deviamos faze-lo, e que não temos compromettido a situação financeira d'este paiz. (Apoiados.) O nobre deputado que leu tanto este meu relatorio havia de achar n'elle um documento de alguma importancia que é a demonstração categorica de que nos cinco mezes d'este anno economico, sem as despezas extraordinarias da febre amarella e a diminuição dos rendimentos das alfandegas, a receita teria dado para a despeza e a divida fluctuante não teria crescido. E isto, sr. presidente, deve demonstrar que nós lemos empregado todos os meios para melhorar a situação financeira do paiz. As operações do credito que temos feito, parece que mostram algum melhoramento de credito; os prestamistas davam sobre as inscripções 30 por cento, e agora dão 40 por cento e não podem dispor d'ellas como faziam antes, tem subido o preço da divida fundada dentro e fóra do paiz. E n'estas circumstancias não acho fundamento nenhum para que se venha lançar terrores diante do paiz, que venha dizer-se lhe que estâmos em uma posição desgraçada. Nem uma só das medidas que lemos tomado tem com

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promettido o paiz. Tenho concluido. (Vozes: — Muito bem, muito bem.)

O sr. Casal Ribeiro: — Sr. presidente, dei toda a attenção que devia ao discurso que acaba de proferir o nobre ministro da fazenda. e desejei sinceramente poder convencer-me de que o governo linha lido boas rasões para apresentar e a commissão de fazenda para approvar o projecto em discussão, e ficar satisfeito com as explicações de s. ex.ª E digo com toda a sinceridade que não vou seguir o conselho que deu o nobre ministro da fazenda de que fizessemos opposição como elle costuma fazer, conselho que podia só proceder do esquecimento da maneira por que s. ex.ª se conduz quando esta na opposição. O sr. Avila no ministerio e o sr. Avila na opposição são duas pessoas distinctas, a ponto que é impossivel reconhecer o mesmo individuo n'estas duas personificações.

O sr. ministro da fazenda foi em geral urbano e moderado no discurso que acaba de proferir, porém deu assim mesmo uma amostra do que elle é, do que costuma ser nos tempos da sua ferrenha opposição; foi quando se referiu ás dictaduras. E fallou o nobre ministro de dictaduras! elle que querendo explicar todos os desastres da sua gerencia pela febre amarella, lira d'essa calamidade argumento para pedir ao parlamento auctorisações como nunca se pediram. O sr. ministro da fazenda não póde vir aqui fallar em dictaduras; não póde fallar em dictaduras quem pede auctorisação para reformar o poder municipal; (Apoiados.) para reformar a beneficencia publica, sem dizer ao parlamento o que quer fazer com similhantes auctorisações; (Apoiados.) sem dizer se se tem occupado e quaes são as suas idéas sobre estas graves materias. Quando foi que veiu aqui um governo pedir auctorisações tão amplas e desordenadas? Que tem o governo feito? Nada, absolutamente nada. (Apoiados.) E é um governo que ninguem sahe o que quer fazer, é em nome de idéas que ninguem conhece que elle vem pedir auctorisações indefinidas, que vem pedir que o invistam n'uma dictadura illimitada! (Apoiados) E ainda o nobre ministro da fazenda vem fallar em dictaduras!...

Sr. presidente. n'este momento o nobre ministro da fazenda esqueceu-se que linha passado dos bancos da opposição para os bancos do ministerio.

Não darei mais largas ás considerações que poderia fazer a este respeito; quero fallar sem paixão, quero tratar a questão placidamente; assim o pede hoje a disposição do meu espirito, e assim convem ao assumpto. Nós lemos tão sobeja rasão, que a paixão aqui só póde ser prejudicial; e eu desejo apenas levar os meus collegas á convicção que possuo, de que este projecto não póde nem deve ser approvado. Sr. presidente, o nobre ministro da fazenda quando deputado da opposição era generoso em propor ao ministerio bills de indemnidade por falla de execução de diversas disposições, como ministro não as quer para si, e julga-se superior ás leis. Mas o nobre ministro da fazenda, não reconheceu elle mesmo os factos que apresenta no seu relatorio, que applicações de fundos cuja approvação se pede importam falta de observancia de lei, falta da observancia da lei constitucional, violação flagrante de acto addicional, violação das leis relativas ao emprestimo dos 1.500:000$000 réis para obras do caminho de ferro, violação da lei respectiva no emprestimo dos 100:000$000 réis para obras no paiz vinhateiro do Douro, violação de lei ácerca do emprestimo dos 600:000$ réis para estradas, violação de lei que approvou o contrato do caminho de ferro do norte a respeito das sommas votadas sobre inscripções creadas para attender á divida dos empreiteiros do caminho de ferro de leste, violação da lei relativa ao emprestimo para a compra de navios de guerra? Mas que culpa tem elle n'estas violações de tantas leis? Nenhuma; o sr. ministro se desviou os fundos votados para obras publicas d'esta applicação foi porque lh'os não reclamaram; não foi por lhe faltar o dinheiro.

Seja-me permittido dizer, que queria que estivesse agora sentado ao meu lado na opposição o illustrado e espirituoso ministro das obras publicas, queria agora o sr. ministro das obras publicas na opposição: (Riso.) estou quasi desconfiado que se o nobre ministro das obras publicas tivesse entrado meia hora mais cedo. se tivesse ouvido tudo quanto acabou de dizer o seu collega da fazenda, levantava immediatamente daquelle logar (apontando para os dos ministros) e vinha para o nosso lado. (Apoiados e riso.) Pois que quer dizer o sr. ministro da fazenda desculpar-se á custa do seu collega das obras publicas? Que quer dizer: «Eu não vi lei as leis porque entreguei ao meu collega das obras publicas do emprestimo dos 1.500:000$000 réis tudo quanto me pciliu.se não entreguei mais a culpa foi do sr. ministro das obras publicas, porque não me pediu mais.» O sr. ministro da fazenda disse: «Não entreguei mais sommas para obras do caminho de ferro estradas, etc, porque o meu collega me não pediu mais, se me tivesse pedido linha satisfeito como satisfiz Iodas as requisições que me dirigiu; dei-lhe, tudo quanto me linha pedido, se mais me tivesse pedido mais teria dado, e então onde esta da minha parte a violação da lei. Fui eu que fallei ás minhas obrigações? Se houve falta foi porque o sr. ministro das obras publicas não pediu tudo que tinha sido votado pelas leis das côrtes, que ordenaram em que havia ser empregado o resultado daquellas operações de credito que se destinavam para estradas e caminhos de ferro». Pois é aceitavel esta explicação. Oh! sr presidente, eu voto o bill de indemnidade ao sr. Antonio José d’Avila, ministro da fazenda, e não o votava ao sr. Carlos Bento, ministro das obras publicas, se lai explicação devesse tomar-se em consideraçao, porque o sr. ministro da fazenda em vista de circumstancias deploraveis, algumas das quaes não podiam prever-se. mas algumas outras podia e devia ler previsto, pelas difficuldades em que se encontrou dispoz dos dinheiros destinados para obras publicas e applicou os ás despezas correntes. Mas se não fosse esta a cansa da violação das leis; se podesse dizer se, como asseverou o sr. Avila, que o ministro das obras publicas não quiz empregar estas sommas, como devia, na construcção do caminho de ferro e estradas não dava eu o bill ao sr. Carlos Bento. Dou-o ao sr. Avila; mas se no discurso viesse a culpa do sr. ministro das obras publicas, se fosse elle que não tivesse querido applicar as sommas votadas para obras publicas, se estas sommas não tivessem sido desviadas para attender ás necessidades urgentes do thesouro; mas fosse, como se conclue do que disse o sr. Avila por desleixo e incuria do sr. ministro das obras publicas, que ellas não tivessem a applicação devida, isto não podia ler desculpa nem absolvição do parlamento.

Mas eu condemno a theoria do sr. ministro da fazenda. Air (apontando para os bancos dos srs. ministra} não cia o sr. ministro da fazenda e o seu collega das obras publica; estão todos os ministros; esta um governo solidario; (Apoiados) não conheço naquellas cadeiras ministros isolados, mas ministros solidarios. (Apoiados.) Não é esta a primeira vez que dos bancos ministeriaes sáem asserções que contradizem este inconcusso principio constitucional; mas outras tantas vezes tenho levantado e hei de levantar a minha voz para reclamar contra ellas, (Apoiados) porque não conheço diversos governos n'um governo; não conheço este nem aquelle cavalheiro vindo d'este ou daquelle grupo, d'esta ou daquella parcialidade; para occupar uma pasta; só conheço um governo com solidariedade ministerial, respondendo um por todos, e todos por um. (Apoiados repetidos.)

Sr. presidente, não esperava, e vi com espanto que o sr. ministro da fazenda usasse similhante defeza. O sr. ministro da fazenda não ficou aqui; disse que na repartição das obras publicas não se sabiam fazer contas, e isto em relação ao rendimento dos pinhaes; não quero entrar n'este ponto desenvolvidamente, porque essa tarefa pertence ao meu amigo o sr. Fontes, que encetando o debate se referiu a este ponto. Mas fiz este reparo, porque é ainda outra imputação que o sr. Avila vem fazer ao sr. Carlos Bento, que dirige aquella repartição. Entenda-se o sr. ministro da fazenda com o seu collega, mas entenda se com elle no gabinete. Entendam-se os srs. ministros uns com os outros, entendam-se entre si no gabinete, e não venham para o parlamento, não venham

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diante do paiz, diante dos seus representantes desculparem-se uns com os outros; porque permitta-me a camara que o diga, taes disculpas não são nem decentes para o gabinete que as allega, nem são convenientes para o credito do systema representativo. (Apoiados.)

Sr. presidente, este projecto que está em discussão parte da divida fluctuante e deficit, e conclue pela paralysação immediata dos trabalhos nas estradas, e pela subversão dos principios que garantem os melhoramentos publicos. O primeiro resultado d'este projecto é deixar os trabalhos das estradas sem dotação alguma até 30 de junho do corrente anno. (Apoiados.) Em segundo logar estabelece o principio de desconfiança de que as sommas veladas para obras publicas, de que as operações de credito especialmente destinadas para obras publicas não hão de ler a devida applicação.

Não posso deixar de nutar a vista d'este mesmo projecto, que o governo venha pedir auctorisação ás córtes para levantar as sommas que vierem a ser precisas para continuar a construcção do caminho de feiro de Lisboa ao Porto. Quo fiança póde ler o parlamento de que as sommas que forem levantadas para este fim hão de ser applicadas unica e exclusivamente naquellas obras, se compararmos o artigo 3.° com o 1.° que diz, que é approvada a applicação dada pelo governo ás despezas geraes do estado das sommas pertencentes ao emprestimo dos 1.300:000$000 réis que era igualmente applicado para o caminho de ferro e estradas? Se o parlamento não fosse cauteloso n'este ponto, se approvar o projecto, a consequencia do seu voto é que o parlamento auctorisa que sejam desviadas da applicação legal as sommas que foram levantadas para certas e determinadas obras publicas, e que podem e devera ser gastas naquillo para que não foram votadas. (Apoiados.) Que credito ha de o paiz depositar nas leis votadas por esta casa?

Depois, ainda não param aqui as consequencias extraordinarias d'esta insolita lei. O projecto applica para penhor divida fluctuante, bonds e inscripções applicadas para obras publicas, e não se diga que estas sommas que se vão desviar da sua applicação nunca serão alienadas porque servem apenas para penhor. O projecto auctorisa tambem o governo a pagar a divida fluctuante vendendo o penhor; e d'este modo auctorisa-o a lançar sommas enormes de divida fundada em circulação sem que lhes commenda uma dotação segura, e estabelece como principio e como systema de governo que os deficits previstos ou imprevistos, os deficits provenientes de calamidades ou dos erros administrativos, os deficits passados, o presente e o futuro sejam solvidos á custa da emissão de titulos de divida fundida; e a divida publica vá em progresso espantoso, sem que se cure de organisará receita publica, sem que se cure de fazer face aos encargos da divida, sem que se cure, n'uma palavra, de pôr uni dique ao novo progresso o desenvolvimento da divida fluctuante.

Sr. presidente, o illustre ministro, da fazenda, por mais que queira não posso deixar de o dizer, vê as cousas segundo um prisma quando é ministro, e segundo outro quando e opposição. O nobre ministro não faz isto por má fé, mas o illustre ministro da fazenda é poeta com os algarismos...

O sr. José Estevão: — De algarismos póde ser; de outra cousa appello. (Riso.)

O Orador: — Pois eu digo de algarismos. Por exemplo, o sr. Avila é deputado da opposição, e trata de mostrar que a gerencia da fazenda publica, durante esse governo a quem faz guerra, é a peior possivel e que nos vae levar ao abysmo: então possue-se da musa da elegia e ahi temos o ír. Avila fazendo demonstrações tão acabadas e perfeitas, que diz qual o deficit que ha de existir no anno de 1863! Estão presentes muitos cavalheiros que ouviram esta celeberrima demonstração. (Apoiados.) Em 1856 demonstrava o sr. Avila que em 1863 haviamos de ler um deficit de 2.119:000$000 réis; porque o sr. Avila nos seus calculos é sempre de uma precisão mathematica: na apreciação dos algarismos, apesar da veia poetica, não esquece nunca o rigor mathematico: em 1803 o deficit havia de ser de 2.119:000$000 réis! Agora vem o sr, ministro da fazenda e apresenta um orçamento com um deficit de 500 e tantos contos, mas por umas supposições em que se baseia, e que lhe dizem que taes e taes rendimentos hão de augmentar, vae reduzindo o deficit a ponto de o apresentar em 112:000$000 réis, e se se descuidar dava-nos um saldo positivo. O orçamento diz: «Temos um deficit de 500 000$000 réis, mas é impossivel que as alfandegas e as sizas não produzam mais que a somma em que vem calculadas, então fica reduzido o deficit a réis 112:000$000»! Já se vê que um deficit d'estes não assusta nem quem e muito menos financeiro da polpa de s. ex.ª O sr. ministro da fazenda quando governo inspira-se de outras idéas; segue a musa do idyllio, voas cousas com côres aprasiveis, vae atraz da sua imaginarão, que elle manuseia com grande habilidade, e as cifras obedecem-lhe e vão provar conclusões que o espirito se recusa a aceitar.

Mas, sr. presidente, eu vejo desgraçadamente desmentidos pelos factos os calculos lisonjeiros do sr. ministro da fazenda, e vejo-os desmentidos nos proprios documentos e relatorios apresentados á camara por s. ex.ª E n'esta parte não posso deixar de me associar com o nobre ministro no elogio que elle foz á sua pessoa, de que não tinha deixado de habilitar a camara com todos os esclarecimentos necessarios para entrar n'esta questão.

Temos um relatorio bastante desenvolvido, mas que tem só o inconveniente de provar contra s. ex.ª não é a primeira vez que os relatorios do nobre ministro o compromettem, e o deixam em uma situação muito pouco favoravel. Lembremo-nos do que succedeu com o celebre relatorio sobre o tabaco. (Apoiados.)

Concluindo o si u discurso disse o nobre ministro: A prova de que não quero dissimular o deficit e a prova de que os meus calculos são exactos, é que, *e, não houvesse a febre amarella, nós não tinhamos lido deficit nos cinco mezes de julho até novembro, como se póde ver do meu relatório».

Examinemos esta asserção, e comparemo-la com os factos e com os fados consignados no proprio relatorio de s. ex.ª Que vejo eu aqui? Vejo que a divida fluctuante, as antecipações, os encargos do thesouro eram em 30 de novembro de 1857, segundo a declaração do illustre ministro da fazenda, e elle mesmo o mostrou p. los documentos que acompanham este relatorio, importam em 3 667:000$000 réis, feita já a deducção da parte que o illustre ministro pagou por conta do emprestimo da marinha de 10:300 libras e do emprestimo sobre a prata, deducção que eu aceito como o sr. ministro a apresenta. Por consequencia, havia réis 3.667.000000; isto é Unhamos mais de 1.000:000$000 réis a mais do que aquillo que foi legado á administração actual pela administrarão que findou em maio de 1856; tinhamos tambem o deficit duplicado, porque o deficit segundo as proprias declarações do sr. ministro da fazenda era do 500:000$000 réis, e actualmente anda, como não será muito difficil demonstrar em vista d'estes mesmos documentos, muito perto de 1.000:000$000 réis! Os factos fallam mais alto do que todas as considerações que se possam apresentar, e os factos são estes. «Não haveria deficit nos cinco mezes de junho e novembro». E como se demonstra que não haveria deficit se não fosse a febre amarella? E eu logo darei maior desenvolvimento a este ponto para se ver se effectivamente esse flagello põe inteiramente a salvo a responsabilidade do governo e se elle se não désse deixaria de haver grandes e graves embaraços financeiros. É curioso ver o modo como o sr. ministro da fazenda attenua, corta, aniquila esse deficit que calcula! Elle achou e achou bem, achou com verdade e exactidão que o deficit naquelle periodo de cinco mezes de julho a novembro de 1837 tinha sido de 526:307496 réis. E como achou este resultado? Comparando a somma dos encargos que pesavam sobre o thesouro em 30 de novembro de 1857, com a somma dos encargos com iguaes proveniências que pesavam sobre o thesouro em 30 de junho de 1857, comparou estas duas sommas, achou uma differença e disse: « Eis aqui o deficit real dos cinco mezes». Rias acrescenta logo; «d'aqui é pre-

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ciso deduzir as sommas que o ministerio da fazenda deu ao das obras publicas por conta do emprestimo de 1.500.000$ réis, por conta do emprestimo de 100.000-$000 réis para obras no paiz do Douro, e as sommas que pagou tambem por conta do emprestimo de 600:000$000 réis sobre rendimentos atrazados levantado no tempo em que era ministro da fazenda o sr. José Jorge Loureiro). Quando eu li este periodo pareceu-me... não posso achar phrase, ou não quero usar daquella que me occorre; mas emfim pareceu-me tão fóra de proposito esta consideraçao, tão improcedente similhante deducção, que não podia comprehender como se achasse consignada no relatorio á vista dos documentos em que se baseia e o acompanham. Reflecti, e quanto mais pensei e mais reflecti mais me convenci de que só a imaginação do sr. ministro da fazenda, só a força de inspiração de que se achava possuido naquelle momento e que o levava a não querer ver o deficit, a fechar os olhos para elle, é que o podia auctorisar a fazer uma deducção similhante. A demonstração é clarissima. Como se achou o deficit dos réis 529.000000? Foi comparando os encargos que existiam em 30 de junho, como já disse, com os encargos que existiam em 30 de novembro, a differença são 526:000$000 réis. Os encargos que existiam em 30 de junho estão especificados e mencionados nos documentos n.° 9 20 e 21 n’este relatorio. N'estes encargos comprehendem-se:

Differença entre o producto do emprestimo dos 1.500:000$000 réis auctorisado pela carta de lei de 15 de julho de 1856, e as sommas entregues ao ministerio das obras publicas por conta daquelle emprestimo. 444:226881

O mesmo em relação ao emprestimo dos réis 100:000$000 auctorisado pela carta de lei de 29 de julho de 1856............... 55:725$000

Antecipação sobre os rendimentos do thesouro até 30 de junho de 1855, por virtude do emprestimo de 600:000$000 réis auctorisado pelo decreto de 4 de agosto de 1856.............................. 360:472201

Ora, os encargos que pesavam sobre o thesouro por estas proveniências em 30 de novembro de 1857, encontram-se igualmente no documento n.° 37.

Differença entre o producto do emprestimo de 1.500:000$000 réis auctorisado pela carta de lei de 15 de julho de 1856, e as sommas entregues ao ministerio das obras publicas por conta d'este emprestimo.... 317:882881

O mesmo em relação ao emprestimo dos réis 100:000$000 auctorisado pela carta de lei de 29 de julho de 1856............... 44:925$000

Antecipação sobre os rendimentos do thesouro até 30 de junho de 1855, por virtude do emprestimo de 600:000$000 réis auctorisado pelo decreto de 4 de agosto de 1856............................. 259:474877

Estas verbas acham-se comprehendidas n'uma e n'outra somma, mas no segundo mappa acham-se diminuídas as sommas que durante aquelle periodo foram entregues pelo ministerio da fazenda ao das obras publicas e ao banco de Portugal por conta do emprestimo de 600:000$000 réis. Por consequencia a deducção que deve fazer-se está já feita, não póde fazer-se duas vezes. Não sei se me faço entender bem, mas para mim é isto tão evidente, que não carece de demonstração. Como quer o sr. ministro da fazenda deduzir os 243:000$000 réis que durante os cinco mezes entregou ao ministerio das obras publicas por conta do emprestimo de 1.500:000$000 réis; o que lhe deu do emprestimo de 100:000$000 réis para obras no paiz do Douro; o que pagou ao banco de Portugal por conta do emprestimo de réis 600:000$000 se essa deducção esta já feita nas parcellas que constituem as somam? se ha de deduzir nas parcellas, ou se ha de deduzir na somma total. Se não estivessem comprehendidas nos encargos do thesouro as sommas d'estas proveniências, de certo quo o sr. ministro tinha rasão, mas o resultado então seria o mesmo deficit de 529:000$000 réis. Se não estivessem comprehendidas n'um nem n'outro lado, a differença dava em resultado 243:000$000 réis a mais, o então podia o sr. ministro da fazenda fazer este raciocinio; se durante este periodo se pagaram sommas que não pertencem propriamente á gerencia d'este anno, descontae estas sommas. Mas esse desconto está já feito, por consequencia não póde duplicar-se. (Apoiados) Ora é sobre esta base errada e sobre este deficit assim reduzido, e assim reduzido por um equivoco tão saliente, que o sr. ministro da fazenda vem dizer, que não linha deficit nos cinco mezes se não houvesse febre amarella! Não linha deficit senão houvesse febre amarella! Se não fosse tão evidente como é, senão se podesse demonstrar a posteriori que é inexacta esta consideração apresentada pelo sr. ministro, não haveria motivo de desconfiar, não bastaria a simples rasão para fazer hesitar o espirito em acreditar que lai resultado se désse? Pois não é o mesmo relatorio que mos diz que o deficit do actual anno economico foi calculado em 912:000$000 réis? Se era possivel, se era acreditavel que senão houvesse febre amarella não haveria deficit algum nos cinco primeiros mezes d'este anno, muito mal tinha calculado a commissão de fazenda, muito tinha errado a camara dos deputados quando votou o anno passado a lei de receita e despeza, muito mal linha andado o governo em não illucidar a commissão e a camara sobre esse ponto e deixar passar na lei um erro tão palpavel. Mas a verdade é que não houve erro de calculo no deficit, que havia motivo para o calcular assim, e que era de suppor que elle fosse antes maior do que a somma em que foi calculado, do que fosse menor.

Havia effectivamente o deficit calculado para o actual anno economico era 912:000$000 réis; vamos a ver como o sr. ministro da fazenda attenua pelo seu systema constantemente seguido, o deficit calculado. Primeira attenuação; fundo de amortisação. Mas o deficit não seria tão grande porque como outros meios foram applicados para a construcção do caminho de ferro do norte lá ficava um saldo no fundo de amortisação para attenuar o deficit; este saldo foi calculado em 252:000$000 réis, fica á deficit reduzido a 659:000$000. O saldo do fundo de amortisação; Dê-me noticia o sr. ministro da fazenda do saldo que existe actualmente do fundo de amortisação; quero que me dê noticia d'elle. O fundo de amortisação não é eterno; mas o fundo de amortisação que o nobre ministro via ha pouco no leito da morte e quasi a expirar, esta agora nos ultimos paroxismos pelas sangrias que s. ex.ª lhe tem dado; o fundo de amortisação tinha já a seu cargo os juros das inscripções creadas para substituir as obrigações do thesouro, obrigações do thesouro que representavam as antigas acções do mesmo fundo, estes juros importam segundo o orçamento em 214:000$000 réis; o fundo da amortisação linha mais a seu cargo os juros das inscripções creadas para a subvenção da companhia do caminho de ferro do Barreiro, que importam em 38:000$000 réis; o ministerio actual poz mais a cargo do fundo de amortisação os encargos creados pela lei de 4 de junho de 1857, os encargos do caminho de ferro do norte, tanto na parte do subsidio que tem de pagar-se ao constructor daquella obra, como na parte da liquidação da companhia, e os encargos da liquidação da companhia que segundo os calculos do governo quando apresentou o projecto do caminho de ferro, calculos que approximadamente coincidem com o resultado das contas apresentadas a este respeito pelo sr. ministro da fazenda no seu relatorio, montam a 170:000$000 réis proximamente; encargos que têem de satisfazer-se já dentro do anno actual, e eu não conto aqui com o que respeita ao subsidio que ha de pagar-se ao sr. Pello quando elle vier fazer o caminho de ferro, conto só com os encargos do actual anno. Ora tudo isto dá a somma lotai de 422:000$000 réis de encargos do fundo de amortisação. Quanto rendeu o fundo de

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amortisação em dinheiro no ultimo anno? Diz esse mesmo relatorio que rendeu 300:709272 réis. Logo se o fundo de amortisação não render mais no anno actual do que rendeu no anno de 1856 a 1857 (como é de suppor que não renda mais), em logar de haver saldo no fundo de amortisação para diminuir o deficit do thesouro, ha deficit no fundo de amortisação que vae aggravar o deficit do thesouro. Logo em vez de vir o deficit diminuindo por este motivo 200 e tantos contos, como calcula o sr. ministro da fazenda, devia calcula-lo em cento e tantos contos para mais, o que o eleva acima de 1.000:000$000 réis.

E por que motivo digo eu que não é de suppor que o rendimento do fundo de amortisação seja maior no anno actual do que foi naquelle anno? Sr. presidente, quando se querem fazer estas comparações de rendimentos, é necessario não olhar só aos algarismos, é necessario ver o que os algarismos significam, é necessario ver as proveniências de cada uma das receitas: para se poder fazer o calculo com alguma probabilidade, com alguma segurança deque tal ou tal receita augmentou ou diminuiu, não basta ver o resultado, é necessario ir ás origens, é preciso ir ás causas.

O fundo de amortisação compõe-se pela maior parte de bens nacionaes e de fóros, e compõe-se das inscripções que lhe pertencem; estas inscripções constituem um rendimento permanente, rendimento que não diminue em quanto ellas forem conservadas em poder do estado, e que mesmo vae augmentando, ainda que lentamente, pelas novas inscripções que vem vindo para o fundo de amortisação das vendas de bens nacionaes; mas as outras proveniências todas diminuem, e diminuem consideravelmente de anno para anno; os bens nacionaes e os fóros que se vendem não deitam no thesouro a renda correspondente; quando se vende uma propriedade, realisa-se o capital, e na o se continua a receber a renda; o que mostram os documentos officiaes é que de anno para anno estes rendimentos têem ido em successiva diminuição; nem póde deixar de ser assim, porque se tem vendido muitos fóros e muitos bens nacionaes: as rendas provenientes d'estas origens cessaram para o thesouro, e quanto mais se vende é claro que menos fica para vender.

O fundo de amortisação não apresentava, para quem lhe contasse bem as pulsações, uma vida muito promettedora; mas o fundo de amortisação, depois dos encargos que o governo actual lhe lançou (porque foi essa a unica dotação que o governo consentiu para os encargos da lei de 4 de junho de 1857) ficou sem poder satisfazer os encargos que actualmente existem sobre elle; do fundo de amortisação não vem nem póde vir saldo para o thesouro, tal esperança é illusoria, e no proprio fundo de amortisação ha de o sr. ministro encontrar o deficit.

Mas vamos a ver quaes eram ainda os outros meios com que o sr. ministro da fazenda calculava fazer diminuir o deficit. Era essa eterna, essa constante supposição baseada sobre o rendimento das alfandegas. As alfandegas tinham rendido no anno de 1856 1857 cerca de 400:000$000 réis a mais do que vinha computado no orçamento; logo, no anno seguinte, e sem nos importarmos com as causas que tinham produzido aquelle augmento, as alfandegas haviam de render tambem mais 400:000$000 réis, ou mais não sei quanto! Esta questão foi já convenientemente tratada pelo meu nobre amigo, o sr. Fontes, e eu não acrescentaria cousa alguma ao que o meu illustre amigo disse a este respeito, se não visse que o sr. ministro da fazenda de certo não attendeu ou não ouviu o que elle disse; é o que se segue da resposta do s. ex.ª Pois o que mostrou o sr. Fontes? Que uma grande parte do augmento do rendimento das alfandegas no anno de 1856-1857 provinha da importação de cereaes e de importação de aguardente, importações que tinham sido determinadas por uma grande calamidade que se linha dado n'este paiz; esta calamidade era a falta de producção de cereaes e a falla de producção de vinhos; esta calamidade traduziu-se nos mappas das alfandegas n'um augmento de receita; ora, era de esperar que a calamidade cessasse, e não era sobre a calamidade que se havia de calcular a continuação de um similhante argumento. Mas o que disse o sr. ministro da fazenda? Disse: « Pois acreditam que o paiz, estando mais pobre, ha de consumir roais»? Oh! sr. presidente! Pois era isso que se tinha dito! O paiz ha de consumir pão em quanto cá houver quem coma, porque se não produzir pão nenhum ha de come lo a differença é que o come á conta do capital, a differença é que se empobrece; (Apoiados.) mas ou se ha de deixar morrer de fome, ou se ha de comer pão. Isto não é preciso defender-se com os principios de economia publica, basta o senso commum.

Sr. presidente, o nosso paiz não só produz cereaes para o seu consummo, mas até mesmo nos annos regulares tem havido excedente; mas vem um anno extraordinario e não ha producção; que se segue d'aqui? cessa o consummo? Onde achou o sr. ministro similhante principio?! Pois não se come pão porque o paiz não o produziu? Ha de comer-se por força, a differença é que vem de fóra. Mas não ha com que pagar? Ha de pagar-se; podemos arruinar as nossas fortunas, mas havemos de ler pão, apesar de que nem só de pão vive o homem, como diz o Evangelho, mas vive tambem de pão. Entretanto como se traduz o facto do desfalque da colheita nos rendimentos da alfandega? Traduz se em um augmento de importarão, e este augmento de importação traduz-se em um augmento de receita para o thesouro. É esta uma das faces do problema; e é a unica que s. ex.* viu; mas por outro lado a falla de producção empobrece o paiz, e com elle o thesouro pela diminuição da materia collectavel. Então como é que sem mais exame, sem mais critica, unicamente porque o resultado do rendimento das alfandegas no anno de 1857 linha sido mais favoravel, devido em grande parte á escacez da producção dos cereaes, o nobre ministro vem dizer que suppõe que no anno seguinte ha de haver um igual rendimento ou maior? Oxalá que tal se não dê por tal causa, porque é prova de que a producção continua a ser escassa; oxalá que não tenha logar tal augmento de rendimento proveniente de similhante causa. (Apoiados.) Já é muito querer justificar o estado da fazenda publica com um flagello, querer justificar o deficit com a febre amarella; mas contar para o augmento da receita das alfandegas com a fome!... Por este andar, se tivermos uma guerra, que é só o que nos falla, tinhamos a fazenda publica completamente salva com os tres flagellos fome, peste e guerra! (Riso.) Não se linha ainda descoberto este principio luminoso de nos podermos salvar com flagellos; cabem as honras de lai descoberta ao sr. ministro da fazenda actual.

Eis-aqui como eram enganosos os calculos do nobre ministro da fazenda de que as alfandegas haviam de produzir muito mais, 400:000$000 réis ou não sei quanto mais do que vinha calculado no orçamento, e de que com isso se havia de preencher o deficit.

Outra considerarão para attenuar o deficit era o fundo de amortisação; esse fundo de amortisação já eu disse o que elle é. E finalmente com que contava o governo mais? Contava com o augmento do credito, para conseguir que se fizesse não sei que operarão que tinha sido auctorisada o anno passado, não sei que consolidarão de divida fluctuante. Isto era uma completa illusão, porque supponhamos que o governo consolidava 2 000.000$000 réis, a differença que d'ahi lhe podia resultar a beneficiado thesouro era de 20:000$000 réis proximamente, e para isso seria necessario que podesse vender inscripções a 50. Era com isto que o governo queria attenuar o deficit? Mas em que se fundava o sr. ministro para dizer que as inscripções e bonds haviam de ter um augmento de valor espantoso? O nobre ministro tem muito empenho no melhoramento do credito publico, e falla muito n'isso, mas serve-se de expedientes taes, e crê em elixires de lai ordem para chegar a este grande resultado que está sempre no tormento de Tântalo; quer chegar a elle sem poder alcança-lo.

O nobre ministro está sempre a dar acepipes aos possuidores de inscripções, está sempre a excitar o appetite das inscripções, é o seu empenho financeiro; admitte o encontro

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dos coupons, das inscripções e dos bónus no pagamento das contribuições; manda pagar os juros nos districtos, permitte ás camaras municipaes, confrarias, misericordias e mais estabelecimentos de beneficencia que façam subrogações dos bens por inscripções, e muitos outros expedientes d'esta ordem; mas esquece os meios principaes de fazer acreditar estes titulos, meios que consistem em inspirar a todos a confiança de que a fazenda publica é bem gerida; (Apoiados.) em não crear divida sem crear ao mesmo tempo os meios para solver o onus que ella impõe, em levantar sommas para despezas reproductivas, e em mostrar ao paiz que se sabe governar e que se governa bem, que a gerencia dos negocios publicos é illustrada, que não se quer viver no presente á custa do futuro. (Apoiados.) Faça-se isto e o valor dos titulos de divida ha de subir por este meio natural mais do que por quantos meios mais ou menos engenhosos se podér lembrar o sr. ministro para estimular o appetite de comprar inscripções. Esse appetite ha de existir quando se acreditar que ellas estão devidamente dotadas e quando se não governar de maneira que se não possa receiar que os juros não hão de ser pagos regularmente; para se chegar a isto é preciso mostrar ao paiz que se governa com a verdade; que se não querem contrahir dividas sem se saber como se hão de pagar, e que a divida que se crear não é para applicar ás despezas correntes, mas sim para empregar em melhoramentos reproductivos; e governo que fizer isto ha de ler credito; (Apoiados.) em quanto isto se não fizer, empreguem os meios que quizerem, usem de quantos expedientes se lembrarem, as inscripções nunca hão de ler um valor consideravel, porque a segurança do pagamento é o verdadeiro estimulo para a procura das inscripções e papeis de credito. (Apoiados)

Eram illusorias, eram infundadas as supposições do sr. ministro de que o deficit havia de ser consideravelmente attenuado, e não póde explicar-se como elle pretende explicar pela febre amarella a totalidade do deficit que existe já nos primeiros mezes d'este anno economico.

Não foi a febre amarella que veiu transtornar as finanças, o que transtornou as finanças foi o desconhecimento dos principios mais elementares da boa administração publica que tem presidido a muitos actos d'esta administração; (Apoiados.) foi a creação successiva de encargos novos sem se attender aos meios de satisfazer a essas despezas; é o resultado daquillo que a opposição linha previsto e prophetisado, a opposição disse-o aqui o anno passado, fallou claro; (Apoiados.) foi governamental, porque não obstou á realisação dos projectos do governo, que julgou uteis e de vantagem para este paiz, foi mais governamental ainda porque declarou que não duvidava tomar a parte do odioso que lhe podia trazer o votar os meios que elle reputava necessarios para os melhoramentos publicos; foi isso que o governo não quiz fazer, e se o não quiz fazer por uma falsa idéa de popularidade, ou por compromissos politicos que tinha, d'isso não quero tratar agora, o caso é que de ahi é que provém o mal, e não da febre amarella. (Apoiados.) Demos graças a Deus porque nos livrou de tal flagello, e façamos tudo quanto estiver ao nosso alcance para que elle se não repita, mas não estejamos a servir-nos da peste para desculparmos os nossos desvarios. Não lancemos os erros dos ministros á conta da febre amarella. Vejâmos qual foi o rendimento das alfandegas nos tres primeiros mezes do actual anno economico, em que não houve febre amarella. As alfandegas renderam a mais do orçamento 39:000$000 réis, isto é, as alfandegas, grande, a do Porto e a municipal, e fallo na alfandega do Porto, o que é a favor dos srs. ministros, na alfandega do Porto não houve diminuição por causa da febre amarella, houve talvez augmento, póde muito bem ser, que estando o porto de Lisboa impedido, houvesse por esse motivo mais navios que procurassem o Porto para fazer o seu commercio.

N'estes tres mezes renderam mais 39:000$000 réis, este augmento em tres mezes corresponde ao augmento no anno a 156:000$000 réis, não são os 400:000$000 réis que tinham rendido a mais no anno anterior, e assim o facto não demonstra por maneira alguma que tinha sido bem fundada a opinião do sr. ministro da fazenda que havia cobrir o deficit com o augmento da receita das alfandegas; mas o sr. ministro da fazenda para pôr tudo á conta do flagello vae comparar o que renderam as alfandegas, não com o ornamento mas com os rendimentos do ultimo anno, e então encontra uma differença de 266:000$000 réis nos mezes de outubro e novembro; mas o desfalque que houve nas alfandegas n'estes dois mezes em relação ao orçamento não passou de 172:000$000 réis.

Ora, ponha o sr. ministro da fazenda estes 172:000$000 réis á conta da febre amarella; acrescente a importancia do credito supplementar que se abriu para os hospitaes, que não sei se em 30 de novembro estava todo gasto, fallo dos 30:000$000 réis; e são 200:000$000 réis que o governo póde pôr á conta da febre amarella.

Ora, sr. presidente, quando os factos são estes, quando fallam tão alto contra as demonstrações e os calculos do sr. ministro da fazenda, como se atreve elle no orçamento avir apresentar um deficit que não não excede a 112:000$000 réis? É esta a maneira com que se pretende explicar o deficit que tem existido e o gravissimo augmento que tem tido a divida fluctuante? Não posso aceitar similhante explicação; mas nem por isso quero exigir do governo a responsabilidade do que me parece provir dos seus erros. Eu voto ao governo o bill de indemnidade, mas votando o bill de indemnidade não posso todavia votar o projecto como se acha. (Apoiados) Eu disse, e passo a demonstrar, que este projecto significa a paralysação immediata dos trabalhos nas estradas.

Sr. presidente, o sr. ministro da fazenda diz que deu ao seu collega das obras publicas tudo quanto tem pedido pira trabalhos publicos; quaes eram os meios que o illustre ministro das obras publicas linha á sua disposição para os trabalhos e obras de necessidade publica? Eram o que restasse do emprestimo dos 1.500 000$000 réis, applicados não só pela disposição geral da lei para essas obras, mas distribuida essa somma por uma tabella que foi approvada n'esta casa; era o resto do emprestimo dos 100:000$000 réis para o paiz vinhateiro do Douro, e eram os 600:000$000 réis para estradas, votados no anno passado. Ora o documento n.° 41 do relatorio do sr. ministro da fazenda mostra que em 30 de junho de 1837 o sr. ministro da fazenda devia ás obras publicas, pelo emprestimo de 1.500:000$000 réis, 444:000$000 réis, é exactamente esta somma que se pretende agora applicar ás despezas geraes do estado, mas o documento n.° 46 d'este relatorio mostra que desde 30 de junho até 8 de dezembro o sr. ministro da fazenda deu ao seu collega das obras publicas 279:600000 réis. Esta somma refere-se portanto a um periodo posterior ao que vem designado no projecto; e pelas disposições do artigo 1.°, o sr. ministro das obras publicas é obrigado a repor a somma que recebeu desde julho em diante. Segundo o projecto, fica devendo ao sr. Avila 279:000$000 réis; eis aqui como elle de credor se torna em devedor.

Pelo emprestimo dos 600:000$000 réis para estradas, linha recebido o ministerio da sobras publicas até 7 de dezembro 278;801$000 réis e o nobre ministro da fazenda declarou ha pouco que desde esta data até ao fim de janeiro linha dado mais 106:000$000 réis. O ministerio das obras publicas tem já recebido 279:000$000 réis, com 106:000$000 réis, o que faz 385:000$000 réis; quanto lhe falta por receber? 216:000$000 réis; é o que leria de lhe dar para as estradas o sr. ministro da fazenda, mas como o sr. ministro das obras publicas lhe fica devendo 279:000$000 réis, não tem por isso o sr. ministro da fazenda que lhe dar nem mais um real. O sr. Carlos Bento fica devendo ao seu collega da fazenda ainda um saldo. (O sr. Ministro das Obras Publicas: — Mas eu não pago.) O nobre ministro não é capaz de aceitar esta disposição para depois deixar de cumprir a sua obrigação, elle que é um homem tão respeitador dos contratos e das leis. O illustre ministro diz que não pa-

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ga? pois ha de pagar: elle que nos venha dizer que já que Portugal não podia dar exemplos em outros pontos ás outras nações, davamos o exemplo da violação das leis. Quererá o sr. Carlos Bento augmentar o catalogo dos infractores? O nobre ministro ha de necessariamente pagar, porque se não quizer pagar, o sr. Avila ha de obriga-lo a isso; porque se s. ex.ª é um mau devedor (já se vê que fallo do ministro e não do homem particular) como ministro tambem é um impertinentissimo credor. [Como já deu a hora, eu peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para ámanhã, porque tenho ainda a fazer algumas considerações sobre o projecto.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que vinha para hoje. — Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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