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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

peito á pasta de S. Exa. e tinha já pedido ao seu collega, o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, o favor, não de lhe transmittir as minhas considerações, mas ao menos de chamar a sua attenção para o assumpto, que já não é novo nesta casa do Parlamento, pois li ha dias que S. Exa. já tem reclamações sobre assumpto identico relativamente á casa de correcção de Villa do Conde.

A reclamação dirigida ao Governo que eu hoje apresento é dos manipuladores de calçado de Coimbra, e é subscripta pela totalidade d'esses industriaes, em numero de cento e tantos.

Na minha passagem por Coimbra, uma numerosa commissão, representando aquella classe, deu-me a honra de me procurar para que eu advogasse nesta Camara a justiça das suas reclamações.

Não sei se S. Exa. sabe que, sendo a população actual da Penitenciaria de Coimbra de cêrca de 80 e tantos reclusos, 50 e tantos d'elles são officiaes de sapateiro!

Quasi todos que se dedicam á aprendizagem, escolhem de preferencia o officio de sapateiro; e d'ahi vem o facto de, numa população tão pequena, haver um numero tão grande de manipuladores de calçado.

D'este grande numero de officiaes tem resultado um abastecimento muito grande do mercado, e por um preço muito barato.

Eu não sei se o nobre Ministro da Justiça conhece a tabella que está em execução naquella Penitenciaria.

Não sei mesmo se ella é igual á da Penitenciaria de Lisboa ou ás das casas de correcção, onde se ministra o mesmo ensino; o que digo é que me parece que o estado não deve fazer concorrencia á industria particular.

A funcção do estado é naturalmente fazer com que os reclusos se entrenham no exercicio de um mister qualquer para assim amenizarem as agruras do carcere e ao mesmo tempo produzirem algum interesse, a fim de que o Estado seja compensado da despesa que faz com elles.

Debaixo d'este ponto de vista comprehende-se a protecção do Estado a essa industria. Mas o que não se comprehende e o que deve ficar fora da sua acção é u facto de transformar-se em commerciante ou em industrial, vindo fazer uma concorrencia desleal e prejudicial às industrias que se professam fora da Penitenciaria.

Devo dizer que a tabella é de tal maneira reduzida (creio que apenas fazem conta ao material empregado) que não ha forma de poder a industria particular competir.

Os industriaes, que me procuraram, expuzeram-me de viva voz, alem da representação que me entregaram, muito detalhadamente, as circumstancias em que se encontram

Affirmam elles que diminuiu muito o numero das suas encommendas e que se viram obrigados a baixar os preços dos seus productos, mas que, ainda assim, a sua freguesia tem desertado toda para a penitenciaria, tornando-se-lhes difficil o poderem viver.

Eu não sei bem que providencias tomaria o Sr. Ministro da Justiça, mas creio que algumas tomou pelo que li nos jornaes, quando igual pedido lhe foi feito com relação á Casa de Correcção de Villa do Conde.

Parecia me, porem, que se podiam harmonizar os interesses do Estado, debaixo do ponto de vista moral e economico, relativamente aos preços, com os interesses do commercio da localidade. Nós temos hoje na cidade de Coimbra um contingente militar importante de infantaria 23, cêrca de 500 praças, e um esquadrão de cavallaria. Parece-me que se o fornecimento d'estas praças fosse apenas feito da penitenciaria, se daria trabalho aos reclusos sem prejudicar a industria, particular.

É este um alvitre que lembro ao Sr. Ministro; mas se S. Exa., pelo conhecimento especial que tem do assumpto, se lembrar de outro melhor, peço-lhe que o adopte. O que eu desejo frisar bem é que o estado actual em que se encontra a cidade de Coimbra não é ainda proprio para
tranquillizar os espiritos. A cidade ainda não regressou moralmente ao seu viver normal. Se é certo que o Governo cumpriu a sua promessa mandando suspender as licenças que deram origem aos conflictos que ali houve, é certo tambem que a cidade ainda se ressente dos tumultos e desordens que durante muitos dias a agitaram e lhe deixaram mal estar. E oxalá que qualquer pretexto não seja fermento para novas perturbações da ordem publica na cidade de Coimbra!

Eu não quero alongar-me em considerações a que o assumpto se podia prestar; quero restringir-me unicamente a este ponto que estou tratando.

Quando estiver presente o Sr. Presidente do Conselho dir-lhe-hei, entretanto, que é necessaria muita cautela para que não se repitam os factos que se deram; porque a verdade, repito, é que a cidade de Coimbra, parecendo estar neste momento tranquilla e socegada, não está.

Peço, pois, ao Sr. Ministro da Justiça que tome em consideração o grande numero de assignaturas dos industriaes que contem esta representação. E possivel que S. Exa. não esteja habilitado neste momento a responder-me, e por isso não exijo que S. Exa. me diga de prompto qual a providencia que vae adoptar; o que desejo e espero da competencia e do empenho que S. Exa. devo ter em satisfazer as reclamações d'aquelles industriaes, é que, occupando-se do assumpto com o cuidado que elle lhe deve merecer, tome dentro em pouco qualquer providencia que ponha cobro á continuação d'este estado de cousas. O desejo de S. Exa., exactamente como o meu e o de todos aqui, é que não se façam quaesquer manifestações mais ruidosas do que estas, pacificas e ordeiras, que apresentam pela minha voz os operarios de Coimbra.

Eu não quero entrar neste momento em apreciações politicas, mas lembro que foi apenas porque o Governo não attendeu ás reclamações que um insignificante grupo de mulheres e rapazes fizeram pacificamente contra as licenças para vender no mercado que a cidade de Coimbra se agitou tão profundamente em desordens e alterações da ordem publica.

O Governo, em sua consciencia, ficará com o remorso de não ter attendido ás reclamações quando estas, dentro da ordem, se fizeram. Se attendesse a ellas teria evitado os tumultos.

Peço a V. Exa. que attenda, pois, ás circumstancias especiaes da classe dos reclamantes. É necessario que os poderes publicos se convençam de que é urgente attender ás circumstancias em que se acham a industria, o commercio e a agricultura, para que amanhã não tenhamos de remediar em vez de já hoje prevenirmos. (Apoiados}.

Sr. Presidente: feitas estas considerações com que acompanho a reclamação dos industriaes de Coimbra, aproveito o estar com a palavra para chamar a attenção do Governo para a questão do descanso dominical, a qual tem sido sustentada por todos os Deputados de um e de outro lado da Camara, sem distincção de côr politica. Se estamos todos de accordo na necessidade de attender ás justas reclamações dos empregados do commercio, porque não ha de o Governo trazer já uma medida que seja votada sem discussão e até por acclamação? Visto que a Camara está concorde na necessidade de attender a estas reclamações que lhe tem sido apresentadas desde que foi aberta, é necessario que a sessão não chegue ao seu termo sem que se tomem as providencias que o caso requer. (Apoiados).

É sempre por se não attender se reclamações as mais justas e rasoaveis, quando são feitas pacificamente, que muitas vezes d'esse usual procedimento resultam as revoltas justificadas assim.

Para se conseguir que os poderes publicos cumpram com o seu dever, attendendo ás reclamações que lhe são feitas, será necessario que as reclamações sejam feitas «bem alto» na praça publica?

Eis porque penso que é necessario que o Governo ve-