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SESSÃO DE 9 DE AGOSTO DE 1869

Presidencia do ex.mo sr. Antonio Augusto da Costa Simões, vice-presidente

Secretarios - os srs.

José Gabriel Holbeche
Henrique de Barros Gomes.

Chamada - 62 srs. deputados.
Presentes à abertura da sessão - os srs. Adriano Pequito, Braamcamp, Costa Simões, Ferreira de Mello, Pereira de Miranda, Sá Nogueira, Silva e Cunha, Veiga Barreira, Guerreiro Junior, A. J. de Seixas, A. J. pinto de Magalhães, Fontes, Sousa de Menezes, Magalhães Aguiar, Costa e Almeida, Falcão da Fonseca, Eça e Costa, Montenegro, Barão da Ribeira de Pena, Barão da Trovisqueira, B. F. da Costa, C. de Seixas, Ribeiro Silva, Conde de Thomar (Antonio), C, J. Freire, Diogo de Macedo, Fernando de Mello, F. J. Vieira, Francisco Beirão, Diogo de Sá, Quintino de Macedo, H. de Barros Gomes, Noronha e Menezes, H. de Macedo, Gil, Vidigal, Corvo, Santos e Silva, Aragão Mascarenhas, Alves Matheus, Nogueira Soares, J. Pinto de Magalhães, Gusmão, Correia de Barros, Bandeira Coelho, Infante Passanha, Dias Ferreira, Mello e Faro, Holbeche, Vieira de Sá Júnior, J. M. Lobo d'Avila, José do Moraes, Oliveira Baptista, Silveira e Sousa, Mendes Leal, Luiz de Campos, L. A. Pimentel, Camara Leme, Daun e Lourena, Affonseca, Espergueira, M. A. de Seixas, M. Fernandes Coelho, Penha Fortuna, M. R. Valladas, Paes Villas Boas, Mathias de Carvalho, R. V.Rodrigues, Thomás Lobo, Visconde de Carregoso, Visconde de Guedes, Visconde dos Olivaes.
Entraram durante a sessão - os srs. Agostinho de Ornellas, A. A. Carneiro, Villaça, Sá Brandão, Belchior Garcez, Abranches, Carlos Bento, F. F. de Mello, Coelho do Amaral, Francisco Costa, Pinto Bessa, Baima de Bastos, Assis Pereira de Mello, Matos Correia, J. Thomás Lobo d'Avila, Teixeira Cardoso, J. A. Maia, Ferreira Galvão, Sette, Firmo Monteiro, José Luciano, Latino Coelho, Rodrigues de Carvalho, J. M. dos Santos, Mello Gouveia, Nogueira, Levy, Calheiros, Visconde de Bruges.
Não compareceram - os srs. Falcão de Mendonça, Antonio Pequito, Palmeiro Pinto, P. L. Gomes, Mártens Ferrão, Lemos e Napoles, Queiroz.
Abertura - Aos tres quartos depois do meio dia.
Acta-Approvada.

Expediente
O que se deu destino pela massa
Nota de interpellação

Desejo interpellar o sr. ministro dos negocios ecclesiasticos e de justiça, sobre os motivos por que não se tem mandado pôr a concurso um canonicato da Sé de Evora, com ónus, de ensino no seminario, e que se acha vago ha mais de um anno.= O deputado, Conde de Thomar (Antonio).

Requerimento

De D. Gertrudes Carolina Menezes de Vasconcellos e de sua filha D. Maria Margarida Rebello de Vasconcellos, a primeira viuva e a segunda filha do major governador da torre de Outão, Carlos Magno Botelho de Vasconcellos.
O sr. Presidente:- Como não ha ninguem que peça a palavra, passa-se á

ORDEM DO DIA

Discussão do projecto de lei n.º 51

Senhores. - Á vossa commissão de fazenda foi presente a proposta de lei n.º 49-C, na qual o governo pede auctorisação para, realisado que seja na sua totalidade o emprestimo a que se refere o artigo 7.º da carta de lei de 16 de julho de 1869, pagar á companhia dos caminhos de ferro de sueste, ou a quem de direito for, a somma nominal de 1.850:000 libras esterlinas, em bonds de 3 por cento, com juro desde o 1.º de julho de 1869 em diante, comprehendendo-se n'esta somma, alem de 2.376:653$751 réis concedidos pelo decreto de 10 de março de 1869, o deposito e seus juros vencidos e não pagos, que servia de caução aos contratos celebrados entre o governo e a mesma companhia dos caminhos de ferro de sueste.
O artigo 4.º da já citada carta de lei auctorisava o governo a pagar á mesma companhia a somma de 2.376:653$751 réis, á qual devia juntar-se a importancia do deposito, e seus juros vencidos e não pagos, importancia que o governo, tendo reconhecido o dever moral de pagar á companhia a differença que houvesse entre o valor das obras feitas por ella e a somma das subvenções que ella recebêra, não poderia equitativamente confiscar á mesma companhia.
A vossa commissão tendo estudado o assumpto com a attenção que elle requer; e
Considerando que grandes prejuizos nos tem provindo, e continuarão a provir de se não ultimar para sempre a questão, ha alguns annos pendente, entre o governo e a companhia dos caminhos de ferro de sueste pelas difficuldades que os interessados na resolução d'este negocio têem opposto á realisação de uma operação de credito, que, habilitando- nos a pagar a nossa divida fluctuante externa, nos deixe entrar desafogadamente no caminho da nossa regeneração financeira;
Considerando que todas as administrações que successivamente têem gerido as cousas publicas, desde que se suscitou esta pendencia, têem entendido indispensavel transigir com a companhia de caminhos de ferro de sueste;
Considerando finalmente que de todas as transacções até hoje propostas é esta indubitavelmente a menos onerosa:
É de parecer que a proposta do governo merece a vossa approvação e deve ser convertida no seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º Realisado na sua totalidade o emprestimo a que se refere a carta de lei de 16 de julho de 1809, fica o governo auctorisado a pagar á companhia do caminho de ferro de sueste, ou a quem de direito for, a somma nominal de 1.850:000 libras esterlinas em bonds de 3 por cento, com o juro desde l de julho de 1869 em diante.
N'esta somma se comprehenderá o deposito e seus juros vencidos e não pagos, que serve de caução aos contratos celebrados entre o governo e a companhia do caminho de ferro de sueste.
Art. 2.º Fica assim alterado o artigo 4.º da carta do lei de 16 de julho de 1869, e revogada a legislação em contrario.
Sala da commissão, em 5 de agosto de 1869 =João Rodrigues da Cunha Aragão Mascarenhas = Anselmo José Braamcamp (vencido)-Antonio Augusto Ferreira de Mello (vencido) = Joaquim de Vasconcellos Gusmão == Henrique de Macedo Pereira Coutinho (vencido)-José Luciano de Castro Pereira Côrte Real (vencido) = Manuel Antonio de Seixas-Francisco Antonio da Veiga Beirão =José Dionysio de Mello e Faro = José Augusto Correia de Barros. relator.

N.º 49-C

Senhores. - Por decreto de 10 de março d'este anno resolveu o governo tomar conta do caminho de ferro de sueste, usando do direito incontroverso, que lhe assistia, em virtude dos contratos celebrados entre elle e a campanhia, e da sentença arbitral de 10 de novembro de 1866.
Julgou porém o governo que não devia deixar de arbitrar uma indemnisação á companhia, ou a quem de direito

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fosse, pelas sommas despendidas para a realisação d'esta obra de incontestavel utilidade publica.
A carta de lei de 16 de julho de 1869 auctorisou o governo a pagar a somma arbitrada pelo modo que mais conveniente fosse ao estado.
Como porém a companhia se houvesse declarado em liquidação perante os tribunaes inglezes, nomeando se um liquidatario official, e não obstante isso um dos principaes crédores da companhia viesse perante os tribunaes do paiz réquerer uni embargo por somma importante, n'aquella que foi arbitrada, julgou o governo que devia procurar os meios de conciliação para concluir esta longa e impertinente questão. .
Alem de tudo era evidente a influencia prejudicial que ao nosso credito fazia na praça de Londres a suspensão de uma questão tão grave como esta, que tomára proporções avultadas desde que a companhia deixou de cumprir as clausulas do contrato de 14 de outubro de 1865.
Para terminar esta questão o governo julgou dever aceitar a proposta que lhe foi feita de pôr um termo a todas as reclamações suscitadas, por meio de um accordo que, posto não dependesse já da approvação do corpo legislativo em toda a sua extensão, o governo julga dever submetter lhe completamente, para que este negocio fique cancellado para sempre.
Tinha a companhia em deposito como caução a somma de 90:000$000 réis ou 20:000 libras, que não foram incluidas na indemnisação decretada em 10 de março.
Parece justo que para se tornar equitativa a indemnisação, se faça tambem a restituição d'estas sommas, e para concluir a questão e fortalecer o nosso credito na praça de Londres, abrindo aquelle mercado os fundos do novo emprestimo, pareceu ao governo que convinha fazer mais o sacrificio que os interessados n'esta empreza propozeram, e que terá compensação para o paiz nas suas operações financeiras.
Não será difficil demonstrar que pelos diversos modos que o governo tem vindo a accordo com os accionistas e credores d'esta companhia, é o aceito pelo actual governo o mais conveniente e menos eneroso para o estado.
Desde o principio d'estas negociações considerou o governo que deveria conclui-las, mas cortando relações com a companhia que havia faltado ao cumprimento do seu contrato.
Assim, offerecendo-se a alternativa de se dar uma indemnisação maior ou menor, mantendo-se o principio firmado no decreto de 10 de março, ou fazer um novo contrato com os interessados na companhia, o governo não hesitou em escolher o primeiro expediente como o mais proprio para evitar complicações futuras, que tão funestas foram n'esta crise financeira que acabámos de vencer.
Pelos documentos juntos vereis quaes foram as propostas que recentemente se fizeram, e as resoluções tomadas pelo governo.
Não se achando porém o governo habilitado para cumprir a sua promessa sem uma auctorisação das côrtes, julgâmos dever submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.º Realisado na sua totalidade o emprestimo a que se refere a carta de lei de 16 de julho de 1869, fica o governo auctorisado a pagar á companhia do caminho de ferro de sueste, ou a quem de direito for, a somma nominal de 1.850:000 libras esterlinas em bonds de 3 por cento, com o juro desde l de julho de 1869 em diante.
N'esta somma se comprehenderá o deposito e seus juros vencidos e não pagos, que serve de caução aos contratos celebrados entre o governo e a companhia do caminho de ferro de sueste.
Art. 2.º Fica assim alterado o artigo 4.º da carta de lei de 16 de julho de 1869 e revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'stado dos negocios da fazenda, em 3 de agosto de 1869. = Augusto Saraiva de Carvalho = Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes.
O sr. Presidente: - Antes de dar a palavra aos senhores que a pediram para requerimentos, desejo que os srs. deputados que a pediram sobre o projecto declarem se são a favor ou contra.
O sr. Montenegro: - Mando para a mesa o seguinte requerimento.
Leu-se na mesa e é o seguinte:

Requerimento

Requeiro que v. ex.ª consulte a camara se quer que seja prorogada esta sessão até que se vote o projecto em discussão.
Foi approvado.
O sr. Dias Ferreira: - Associando me ao requerimento que foi mandado para a mesa para que estivessemos em sessão permanente até se votar este projecto, não entrou no meu animo, nem no da maioria da camara o restringir a discussão, de modo que não podessem fallar todos os oradores até se esclarecer suficientemente o debate (apoiados).
Dada esta explicação do meu voto, e desejando que a discussão, por isso mesmo que devemos estar em sessão permanente até o projecto se votar, se restrinja quanto seja possível á materia em discussão, e tenhamos base e esclarecimentos para a discutir convenientemente, e como o pensamento fundamental do mesmo projecto é acudir aos encargos da divida fluctuante, e alem d'isso assegurar o bom exito de um emprestimo importante já contratado em uma praça estrangeira, eu, para se dar verdadeira direcção á discussão, requeiro a v. ex.ª que convide o nobre ministro da fazenda a mandar para a mesa os documentos que deverá ter na sua pasta, ou a fazer uma declaração categorica a respeito dos seguintes pontos:
1.º Qual é a somma da divida fluctuante na actualidade no estrangeiro e dentro do paiz. Por vezes temos tido uma divida fluctuante de 12,000:000$000, 14.000:000$000 e 16.000:000$000 réis, somma superior á actual; e para que esta camara não vote uma questão importante sob apprehensões graves, exagerando-se as circunstancias em que estamos, pintando-se o estado da divida fluctuante tão aterrador como nunca, é absolutamente indispensavel para se poder votar conscientemente este projecto que o nobre ministro da fazenda declare francamente qual é a importancia da divida fluctuante contratada dentro e fora do paiz;
2.º É igualmente necessario, para sabermos o que votâmos, que s. ex.ª declare qual é a casa estrangeira com quem se contratou o emprestimo, porque dos immensos telegrammas que vem publicados no Diario, creio que de 3 de agosto e dos quaes vejo que o sr. ministro da fazenda estava em correspondencia sobre assumpto tão importante com varias pessoas, não sei qual é a casa com que se está contratando o emprestimo, e quaes as condições com que elle é negociado.
Se as condições do emprestimo, que está em via de negociação, forem rasoaveis, a camara poderá votar mais ente sacrificio para o thesouro, porque é compensado pelas condições vantajosas do emprestimo; se porém as condições são onerosas e gravosas para o thesouro, de modo que o paiz se hade ver em maiores difficuldades, a votação da camara não poderá ser favoravel ao projecto em discussão.
Espero portanto, que em assumpto tão grave, que affecta de um modo tão vital a situação do paiz, o nobre ministro da fazenda declare qual é a importancia da divida fluctuante e quaes as condições em que está contratado o emprestimo no estrangeiro.
D'estes esclarecimentos nem eu nem a camara podemos prescindir para entrarmos convenientemente na discussão do projecto; e tambem desejo saber o estado de relações em que se acha o governo com a casa Goschen.
O sr. Mello e Faro: - Peço a v. ex.ª que consulte a camara se quer que este projecto tenha uma só discussão.
Consultada a camara, foi approvado este requerimento.

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O sr. Presidente: - Tem a palavra o ar. Ferreira de Mello.
O sr. Ferreira de Mello: - Peço perdão a v. ex.ª Ouvi ao meu illustre amigo e collega, o sr. Dias Ferreira, fazer um requerimento, que se não poz á votação e ao qual o sr. ministro da fazenda ainda não respondeu, e v. ex.ª creio que por equivoco submetteu á votação o requerimento do sr. Mello e Faro, feito posteriormente ao do sr. Dias Ferreira.
O sr. Presidente: - Se o sr. ministro da fazenda quizer fallar está no seu direito.
O sr. Ministro da Fazenda (Saraiva de Carvalho): - Peço a palavra.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. ministro da fazenda.
O sr. Ministro da Fazenda: - Tenho a fazer algumas considerações a respeito da questão previa apresentada pelo meu nobre, amigo, o sr. Dias Ferreira.
Vozes: - É um requerimento.
O sr. Dias Ferreira: - E para v. ex.ª fazer uma declaração, e fiada mais.
O Orador: - A sessão permanente não quer dizer que a sessão seja restricta.
É claro que a cessão permanente tem sido estabelecida em todos os parlamento, e ultimamente no reino vizinho têem se prorogado as gestões por espaço de quinze horas, e é preciso que as haja quando um negocio importante o reclama. S. ex.ª mesmo, acabando de approvar o requerimento, concorda n'esta parte cora a minha opinião.
Pelo que respeita á divida fluctuante, e ao seu estado actual dentro e fora do paiz, tenho aqui um mappa de que posso precisar durante a discussão, e por isso não o posso remetter para a mesa, e se s. ex.ª o quiser examinar queira ter a bondade de vir aqui á banqueta...
O sr. Dias Ferreira:- É para toda a câmara.
Vozes: - Leia, leia.
O Orador: - Remetto para a mesa o mappa da divida fluctuante. A importância da divida no paiz é de (leu), e no estrangeiro (leu).
Este era o mappa da divida fluctuante em 22 de julho de 1869.
O sr. Dias Ferreira: - Qual é a importância dos saques?
O Orador: - É de 122:820$000 réis.
O sr. Dias Ferreira: - Proximamente 12.000:000$000 réis.
O Orador: - Pelo que respeita á casa com quem contribui o empréstimo, e ás condições com que fui contrabido, faço uso de uma auctorisação concedida por esta camará, e quando julgar opportuno, darei conta da auctorisação. Parece me que sim eu o juiz pura julgar quando é occasião opportuna de dar conta á camará do uso que fiz d'essa auctorisação (apoiados),
Disse s. ex.ª que, se as condições forem gravosas, certamente havia motivo para se repellir o additamento que apresentei ao accordo feito com a companhia do caminho de ferro de sueste, e eu digo que as condições nunca podiam ser mais gravosas do que aquellas que furam fixadas na auctorisação. São certamente muito menos gravosas, mas não posso apresentar agora essas condições, porque nem as tenho aqui presentes, nem acho que seja opportuna a ocasião para as apresentar.
O sr. Ferreira de Mello (para uma questão previa): - Cumprindo as disposições do regimento, principio, lendo a minha proposta (leu).
Desejo tomar pouco tempo á camará, e prometto restringir o mais que possa as observações que tenho a fazer.
Congratulo-me com a camará pela approvação que obteve o requerimento do meu collega e amigo o sr. Montenegro, requerimento que eu tinha tenção de fazer, e em que fui prevenido por s. ex.ª
Esta questão é importante, e as consequências que d'ella hão de resultar para o paiz podem ser graves e mesmo fataes, quer se approve, quer se rejeite o projecto em discussão, porque, se a salvação das finanças depende da realisação do empréstimo, ninguém pôde affirmar que a approvação d'este projecto dê a certeza de realisar esse empréstimo (apoiados).
Portanto, compenetrados todos da gravidade das circunstancias, da importância do assumpto que se discute e da responsabilidade que a cada um de nós cabe pelo voto que pronunciar n'esta questão, é indispensável que a discussão, enquanto possa restringir-se nas observações que cada um tenha a fazer, seja todavia a mais larga possível era relação ao numero dos oradores, que n'ella queiram tomar parte para declarar ao paiz quaes os motivos que os obrigam a tomar uma ou outra responsabilidade.
Eu, associando-me ao requerimento para que a sessão peja permanente, prometto que cora o meu voto não se abafará a discussão emquanto houver algum orador inscripto, porque se eu conheço que a decisão é urgente para o governo e que a camará não deve perder muitos dias a discutir este assumpto, conheço igualmente que devemos dar toda a margem á discussão, de forma que cada ura dos membros d'esta casa possa apresentar ao paiz os motivos e fundamentos do seu voto para poder definir a responsabilidade que em um ou outro caso lhe deve pertencer.
Sr. presidente, volta de novo á discussão este malfadado negocio do caminho de ferro de sueste, que ha pouco mais de um mez o segundo ministro da fazenda do actual ministério declarava a esta camará que ia resolver-se definitivamente para não apparecer mais! Apparecem de novo n'esta cana as reclamações de indemnização por parte dos interessados no caminho de ferro de sueste, reclamações que ha pouco mais de um mez esta câmara julgava ter decidido por uma forma que todos ficariam plenamente satisfeitos!
Quando se discutia o artigo 4.º do empréstimo, affirmavatios o nobre ministro da fazenda d'aquella epocha, que a approvação d'aquele artigo era indispensável para a realisação de uma grande operação de credito, e para livrar este paiz da pressão e guerra dos capitalistas estrangeiros! Pedia elle á câmara que fechasse os olhos e votasse este sacrificio, porque era o meio de organisar as finanças, de restabelecer o credito e de contratar os empréstimos e supprimentos em excellentes condições! Eram estas as promessas.
N'essa epocha, na sessão do 10 de julho, dizia eu n'aquella tribuna: "Eu não pretendo ser propheta, e muito menos desejo ser ave de mau agouro; mas faço d'este togar uma prophecia bem alto. Passe este artigo como está e o empréstimo não se realisa. Nós veremos quem se engana. Passe o artigo como está, e nós, não recebendo o dinheiro do empréstimo, deixámos n'uma lei votada pelas cortes o reconhecimento legal de uma divida; deixámos votado pelo parlamento portuguez o direito que a companhia, ou quem do direito for, tem sobro a quantia que o governo declarou ser excesso de valor do que confiscou sobre as subvenções que o paiz tinha pago".

O artigo 4.º votou-se como estava, o empréstimo não se realisou, e hoje os interessados reclamara, e o governo propõe uma indemnisação nova e maior! Veremos quem se engana, dizia eu. Quem se enganou, pergunto eu agora? Foi a maioria, que votou o artigo 4.º, ou fui eu que o combatia, annunciando este resultado?
Depois de ura estudo meditado, reflectido e profundo sobre esta questão, dizia eu o seguinte: a Para produzir bom resultado o systema que o governo adoptou na concessão d'esta indemnisação era indispensável que todos os interessados no caminho de ferro de sueste se contentassem e ficassem de uma vez para sempre satisfeitos. Mas não ficara, nem se contentam, e as difficuldades não se removem.
Era isto o que eu affirmava n'aquella tribuna contra a voz auctorisada do sr. ministro da fazenda, contra a opinião de todo o governo e contra a opinião da maioria d'esta

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camara. Decorreu pouco mais de um mez, e eu vejo que a minha opinião está confirmada pela triste experiencia, e que esta prophecia que eu sem ser propheta fazia d'aquelle logar está completamente confirmada pelos factos (apoiados). Quando eu, depois de ter estudado e meditado esta questão, via á luz da minha rasão que este resultado que hoje se nos apresenta era uma consequencia infallivel, quando eu declarava isto á camara e ao paiz, o governo e a maioria d'esta camara não acreditavam e votava-se o artigo 4.º tal qual tinha sido apresentado. N'um futuro breve, pouco mais de um mez depois, é o próprio governo, ainda que pela bôca de outro ministro da fazenda, que vem confirmar perante o parlamento e perante o paiz a verdade da minha prophecia, e que vem exigir de novo uma outra solução para a indemnisação dos interessados do caminho de ferro de sueste.
Se eu preferisse uma estulta vaidade pessoal aos meus deveres de cidadão e representante do paiz, poderia talvez lisonjear-me por ter tido rasão n'essa occasião contra o governo e contra a maioria d'esta casa. Porém, muito longe de me regosijar com este acontecimento, sinto e lamento profundamente este resultado. Folgaria devéras que os factos tivessem vindo desmentir completamente as apprehensões que eu tinha manifestado n'essa occasião.
Estimava que fosse de utilidade e vantagem para o paiz o accordo ou indemnisação votado n'esse artigo 4.º, e sinto muito ter tido rasão n'essa occasião e ver agora uma nova exigencia, uma nova reclamação vir impor ao paiz um sacrificio maior.
Não quero agora repetir as idéas que já expendi largamente n'esta casa, a respeito da questão dos interessados na companhia do caminho de ferro de sueste.
V. ex.ª e a camara estarão lembrados de que eu, longe de querer negar todos os direitos aos interessados, longe de sustentar que não tínhamos obrigação nem devíamos pagar quantia alguma, preferi, depois do estudo da questão, vir dizer á camara e ao paiz o que entendia ser verdade, embora arriscasse uma popularidade epbemera, e falsa com toda a certeza. Por isso, quando eu combati o artigo 4.º da proposta do emprestimo, combati-o principalmente porque ia sujeitar o paiz a sacrificios e não podia produzir o resultado que se desejara obter; obrigava o paiz ao pagamento de uma somma importante e não fazia desapparecer as difficuldades que tinham embaraçado sempre as nossas operações financeiras.
Eu disse que para produzir bom resultado o systema que o governo adoptou na concessão d'esta indemnisação, era indispensavel que todos os interessados no caminho de ferro de sueste se contentassem e ficassem de uma vez satisfeitos; e acrescentei ainda que eu não fazia questão de uma pequena differença de quantia, e só a fazia de uma resolução legal e clara que terminasse por uma vez todas as exigencias e todas as reclamações que se faziam a este respeito aos governos d'este paiz.
Que eu tinha todos os motivos para combater por estes fundamentos o artigo 4." da proposta de emprestimo, está demonstrado pela experiencia e está demonstrado pela proposta que o illustre ministro da fazenda e meu amigo vem agora apresentar a esta camara, para obter o mesmo que o seu antecessor nos declarava que ficava plena e inteiramente obtido, votando a camara o artigo 4.º que se votou (apoiados). Portanto eu estou prompto a votar uma indemnisação, um accordo, uma transacção, o nome que quizerem, em que se attenda aos interesses que se entenderem justos dos interessados no caminho de ferro de sueste, com tanto que essa transacção, accordo ou indemnisação que se votar faça cessar por uma vez todas as difficuldades, todas as exigencias e todas as reclamações.
É para mim uma transacção excellente toda a combinação que se fizer que dê este resultado; mas é ruinosa ainda que custe menos, toda aquella que não produzir o effeito pelo qual nos sacrificâmos a aceita-la, e de que não resultarem as vantagens que se promettem ao paiz em troca do sacrifício que se lhe pede.
Resta ver se, uma vez que não foram attendidas as apprehensões que eu manifestei, agora, depois que uma triste experiencia veiu confirmar quanto ellas eram justas, se apresenta uma nova solução que resolva completa e definitivamente o negocio, e que faça por um lado cessar a guerra dos capitalistas nas praças estrangeiras, e pelo outro, adquirir o paiz as vantagens financeiras que espera d'este accordo ou negociação.
Para saber isso é que mandei para a mesa a minha questão previa. É indispensavel que o governo mostre e prove perante esta camara e perante o paiz, que a transacção que propõe agora dá todos esses resultados, para que nós rasoavelmente a possamos votar. O que propõe o governo? A proposta do governo, note bem a camara, é a repetição fiel, é a copia litteral do artigo 4.º que nós aqui votámos com a única alteração da quantia a pagar, augmentando-a. O resto é a redacção do artigo 4.º que nós aqui votámos pará fazer desapparecer estas difficuldades e estas guerras, que não desappareceram, vendo nós que, pelo contrario, agora surgem novas difficuldade e nova guerra (apoiados), e é natural que ainda venham a apparecer novas exigencias de maior augmento da quantia que esses interessados exigem do governo do paiz (apoiada)
Os unicos documentos que acompanham este projecto que discutimos são os telegrammas trocados entre o nosso ministro da fazenda e alguns indivíduos de Londres, documentos que se acham publicados com a sessão de 3 do corrente mez. Eu pergunto ao actual sr. ministro da fazenda, se, alem dos telegrammas aqui publicados, ha mais algum documento, mais algum titulo que mostre accordo entre o governo e os interessados do caminho de ferro? (Apoiados.) E este o objecto da minha questão previa. Mas, antes de ouvir a resposta de s. ex.ª eu creio poder afirmar, com todo o fundamento, a v, ex.ª e á camara, que o sr. ministro da fazenda não tem mais que estes documentos, porque se os tivesse de certo que, assim como juntou os telegrammas á proposta que mandou para a mesa, havia de mandar tambem mais estes outros documentos, se elles existissem" Portanto creio que o sr. ministro da fazenda não tem mais documentos, nem mais títulos alem dos telegrammas. Mas que são estes telegrammas? O primeiro é expedido do Londres em 24 do mez passado, e vem assignado pelo sr. Julius Beer.
Este sr. Julius Beer, que eu não tenho a honra de conhecer, dirige-se ao ministro da fazenda de Portugal com uma semceremonia, como uma intimidade, que eu sinceramente deploro (apoiados).
Inculca elle ao ministro da fazenda de Portugal que falia em nome da companhia do caminho de forro sueste, dos credores e dos interessados, e faz isto por meio de um telegramma. No mesmo dia o ministro da fazenda de Portugal, respondendo a esse indivíduo, diz lhe o seguinte: "Recebi o seu telegramma. A minha opinião particular é inteiramente favoravel á sua proposta; como, porém, tem de ser consultado o governo, apenas poderei na segunda feira dar-lhe uma resposta definitiva. Samodães."
Alem da estranheza que me causa ver o ministro da fazenda d'este paiz, tratar de igual para igual com um indivíduo, que pôde ser um cavalheiro respeitável e estimavel, mas que não é com tudo ministro de outro paiz, e nunca póde ser uma individualidade igual a um ministro d'estado, alem da estranheza que isto me causa, ha um facto que me affecta muito mais, e é ver que o ministro da fazenda de Portugal acredita e recebe como representante de uma companhia, dos seus credores e interessados, o primeiro indivíduo que n'essa qualidade se lhe apresenta, quando o ministro da fazenda devia saber, pela discussão que houve n'esta casa, que esse homem não representa a companhia, nem os interessados ou credores, porque a companhia tem já outros representantes (muitos apoiados).

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Um assumpto que segundo nos dizem todos os dias, é da maxima importancia para o paiz, porque d'elle depende a salvação ou a ruina das nossas finanças, devia porventura ser tratado pelo ministro da fazenda por esta fórma (apoiados) aceitando como representante da companhia, dos interessados e credores, um certo individuo, quando todo o paiz sabe, porque eu citei no meu discurso todas as decisões dos tribunaes inglezes, decisões que ninguem contactou nem podia contestar, quando todo o paiz sabe que uma parte da companhia requereu liquidação voluntaria em Londres e que é representada pelo liquidatario official, que é o sr. John Bali e não o sr. Julius Beer?
Podia tratar-se por esta fórma, quando toda a gente sabe que os interessados estilo divididos, porque em quanto ha um requerimento feito pela companhia perante o vice-chanceller, para se proceder a uma liquidação voluntaria e á nomeação de um liquidatario official com poderes amplissimos, outros credores, Brandeis & C.ª, não só questionaram ácerca dos poderes que se queriam conferir ao líquidatario official, mas appellaram da decisão do vice-chanceller para o tribunal de lord chanceller, obtendo ali uma resolução favoravel, inutilisando os poderes concedidos rio tribunal do vice-chanceller ao liquidatario official e declarando-se que nenhuma resolução tornada por esse liquidatario official seria valida sem que com ella tivesse concordado um representante dos credores e dos accíonistas e sem se obter a approvação do tribunal?
Vozes: - Ouçam, ouçam.

Orador: - Mas não é só isto.
Além dos credores que questionaram em Londres, uns com os outros, aqui os credores Warings & Irmãos, requeriam arestos nos tribunaes de Lisboa por uma somma importante protestando em Londres contra a liquidação voluntaria que a companhia fazia, e protestando haver o seu pagamento por outros meios.
O sr. ministro da fazenda anterior ao actual julgou responder-me com duas palavras, dizendo-me que era incompetente para tratar a questão pelo lado juridico.
Tal resposta é inadmissivel. S. ex.ª não devia, mas podia ígnorar essas circunstancias antes d'ellas serem reveladas e díscutidas no parlamento; não podia, porém, allegar ignorancia depois que foi avisado d'estas circunstancias e depois que se demonstrou aqui a sua existencia, comprovada com os actos officiaes dos tribunaes inglezes, e com os requerimentos dos outros credores perante os tríbunaes portuguezes (muitos apoiados).
Como é que os srs. ministros da fazenda, tanto o anterior como o actual, podem acreditar que Julius Beer é representante da companhia, quando sabem que por parte da companhia é John Bali o representante em Londres, segundo as decisões dos tribunaes que aqui referi? (Apoiados.)
De quem póde Julius Beer ser o representante? Da companhia, não, porque é John Bali o liquídatario. Dos interessados que em Londres questionaram os poderes ao liquídatario, tambem não, porque Julius Beer não é Brandeis & C.ª Dos fornecedores e empreíteiros que requereram o aresto de Lisboa, tambem não, porque estes são Warings & Irmãos.
Se Julius Beer é procurador de todos estes interessados, apresente se a procuração legal. Se não é, como póde o ministro tratar com elle? (Apoiados.)
Afianço ao sr. ministro da fazenda, como o fiz ao seu antecessor, que se o artigo passar como está, o emprestímo não se realisa.
As reclamações, longe de cessarem, hão de continuar e hão de crescer, porque as exigencias têem augmentado constantemente desde que os interessados no caminho de ferro de sueste viram que podem impunemente negociar com a credulidade infantil ou com a admiravel innocencia do governo portuguez. O que é que elles querem ? É que esta camara dê um reconhecimento legal de uma divida que todos os dias cresce, e, logo que recebem o reconhecimento official d'essa divida apresentam novas reclamações e dizem, como essa quantia já está reconhecida, reconheçam mais outras, ou aliás o emprestímo não se realisa (muitos apoiados).
Não me opponho a accordo ou transacção, comtanto que seja feita de um modo serio, legal e terminante; porque então podemos auferir d'essa transacção ou accordo os resultados que todos nós desejamos. Opponho-me terminantemente a tudo que se nos apresentar com nome de accordo ou de transacção, mas que realmente não tenha os effeitos que correspondem a esse nome, porque por tal systema em vez de fazer desapparecer as dificuldades, cada dia se augmentam (apoiados).
Não posso allegar perante o paiz a defeza que allegou o nobre conde de Samodães, quando se discutiu o artigo 4.º da proposta do emprestimo. Não posso allegar perante a camara nem perante o paíz que sou incompetente para tratar questões juridícas. Lamento que possa servir de defeza ou de desculpa n'este paiz a um ministro da corôa a símples declaração de que ignora o que tem restricta obrigação de saber, porque se não possue por si mesmo esses conhecimentos, tem rigorosa obrigação de consultar os fiscaes da corôa, os homens mais competentes e mais illustrados para não fazer accordos ou contratos que não sejam legaes e que não possam produzir todos os seus effeitos.
Mas o anterior ministro da fazenda não se contentou com tratar de igual para igual com a indivídualidade do sr. Julius Beer, foi maís longe, e depois do ter respondido no proprio dia em que recebeu o telegramma, repetiu no dia seguinte a resposta, participando ao sr. Julius Beer o seguinte:
"O conselho de ministros resolveu aceitar o primeiro alvitre do seu telegramma, isto é, pagar 1.850:000 libras em inscripções de 3 por cento. O excesso da quantia auctorisada pela lei de 16 do corrente, e a caução, têem de ser propostas ao parlamento, o que leal é immediatamente..."
Note v. ex.ª e a camara que um ministro da fazenda d'este paiz, communicando a um símples índividuo estrangeiro a resolução de um conselho de mínistros, desce a julgar necessario affirmar que leal e immediatamente fará uma cousa (leu).
"... o que leal e immediatamente se fará tão depressa a aceítação pelas partes seja official."
Agora é o ponto mais ímportante:
"Congratulo-me por este resultado, e póde fazer d'este despacho o uso que lhe aprouver."
O ministro que se congratulava por este resultado, o ministro que mandava fazer d'este despacho o uso que o os particulares aprouvesse, não tratava com toda a certeza de que este paiz podesse ter credito lá fóra. Um governo que assim arrasta, não só o credito, mas a dígnidade do paiz, entregando-a a simples particulares nas praças estrangeiras, não póde, com toda a certeza, querer negociar em termos favoraveís e muito menos em termos vantajosos (apoíados).
Mandar publicar nas praças estrangeiras, nos primeíros mercados monetaríos da Europa, que o governo de Portugal não póde contratár um emprestimo, sem que uma companhia ou os interessados de uma companhia lhe dêem licença, é o mesmo que dizer a esses interessados que augmentem de dia para dia as suas exigencías, porque o governo e o paiz as satisfarão todas, porque reconhecem não ter outro meio de salvar as suas finanças.
Será este o meio de salvar as finanças em paiz nenhum? Será assim que se augmenta a receita, que se deduzem as despezas e que se evitam os perigos? Assim o mais que se póde conseguir é comprar á custa de um adiamento caro e pequeno a demora de uma catastrophe financeira, que em breve ha devir exacerbada n'um ponto muito maior (apoiados).
Os telegrammas que se seguem, não destroem de maneira nenhuma os anteriores.

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O telegrama que se segue é redigido nos seguintes termos:
" O liquidatario official aceita os termos no telegramma de v. ex.ª a mr. Beer em 25 do corrente, sujeitos á approvação do tribunal aqui, a qual se está agora requerendo. = John Bali."
O immediato é do sr. Julius Beer e diz o seguinte:
"Tenho dado passos ácerca dos dois telegrammas de v. ex.ª O liquidatario official telegraphará directamente. Ha agora em todos um accordo virtual."
Agora ha em todos um accordo virtual, diz o sr. Beer.
Mas que é accordo virtual? Eis o que é necessario que a camara saiba.
Ha accordo legal, accordo escripto, accordo feito com todas as solemnidades legaes de maneira que a parte com quem se contrata esteja obrigada ao contrato, como está obrigado o governo portuguez? Se ha, é preciso e indispensável, que seja presente á camara (apoiados), como eu proponho na minha questão previa. Mas se ha apenas accordo virtual, se ha apenas um accordo imaginario, se ha apenas desejos de haver accordo, é necessario que esta camara se mostre já desenganada pela triste experiencia que teve, e que não vá cair nos mesmos perígos em que uma vez. caiu, sujeitando se de novo a um sacrifício maior para obter no fim o mesmo resultado, que é nenhum emquanto a vantagens, mas que é importante quanto a sacrificios e a novas exigencias, que desde a approvação do emprestimo augmentaram já em 454:00$000 réis!!
E emquanto em Londres ente negocio é aceíte pelo sr. Julius Beer, obtendo se depois a confirmação de João Bali, que representa a parte da companhia que fez a liquidação voluntaria, mas que não representa nenhum dos interessados nem nenhum dos credores que em Londres se oppozeram a essa liquidação voluntaria e que em Lisboa vieram reclamar perante os tribunaes portuguezes, emquanto o negocio em Londres é tratado por este índivíduo que não tem competencia de qualidade alguma, eu vejo com profundo desgosto que o governo de Portugal trata pela sua parta com a maior leviandade, com a maior ínnocencia, obrigando-se pelo seu lado completamente emquanto que a pessoa para com quem se obriga, póde vir declarar ámanhã o que o governo portuguez já tinha obrigação da saber, isto é, que não tinha qualidade nenhuma legal para representar legitímamente nem a companhia, nem os interessados, nem os credores do caminho de ferro de sueste (apoiados).
Mas dizem, e com extraordinaria surpresa eu ouvi dizer particularmente, que o lord chanceller telegraphára ao governo portuguez, declarando que se responsabilisava pelo accordo.
Já declarei que não podia ser maior a minha surpreza, quando ouvi affirmar similhante írregularidade, que eu não podia de fórma alguma acreditar em relação aos magistrados judiciaes de um paiz illustrado e livre, como é a Inglaterra. Mas quando os telegrammas se publicaram, eu ví que, longe de haver a garantia dos magistrados inglezes, havia apenas o que não podia deixar de haver, havia a declaração do liquidatario oficial John Bali, que forçado como estava pelas restrições que o tribunal do lord chanceller impoz, a solicitar do vice chanceller a approvação de qualquer accordo que houvesse, pediu a esse vice-chanceller se lhe approvava a transacção de 1.850:000 libras, em vez dos 2.366:000%000 reis da primeira; e está claro e clarissimo que um tribunal que tem obrigação de zelar os interesses da companhia e seus credores, nunca póde recusar a approvação de um accordo que vae beneficiar essa companhia e esses credores, e que sem lhes impor onus de qualidade alguma, lhes augmenta a quantia que têem a receber.
Mas pergunto: a approvação do vice chanceller augmenta porventura a qualidade legal do sr. John Bali? Dá lhe por ventura a legitimidade, se elle não a tinha anteriormente?
Pelo facto da approvação transformar-se-ía John Ball em representante de todos os credores, quando por todas as decisões judiciaes em Londres se sabe que elle só representa a parte da companhia que requereu a liquidação?
Póde illudir-se alguem a este respeito? Não se póde illudir ninguem, porque isto é claríssimo (apoiados).
Pois apesar disto ser claríssimo, a penar de não poder illudir-se ninguem, ainda mesmo aquelle que olhe com a menor seriedade para as cousas d'este mundo; apesar disso o sr. conde de Samodães respondeu a John Ball immediatamente no mesmo dia "está concluido o accordo, recebi a sua aceitação official"; e logo em seguida manda outro telegramma a Stern, dizendo: ao governo já aceitou a proposta dos interessados do caminho de ferro".
Portanto, se são estes e só estes os documentos em que o governo portuguez se funda para vir dizer que fez o accordo completo com a companhia, com todos os interessados e com todos os credores, eu julgo que não ha n'esta camara um só homem que possa acreditar que isto seja accordo, nem que i"to imponha a mais pequena obrigação á companhia do caminho de ferro nem a nenhum dos interessados, pois não foram elles que de Londres telegrapharam (apoiados).
Sabe v. ex.ª o que d'aqui de certo resulta, e o que eu estou quasi a ver, porque os precedentes auctorísam e justificam a minha suspeita? E que o sr. Julius Beer, o qual não sei com que fundamento ou direito veiu entormetter-se em um negocio em que não o tinha nada que ver, ha de reclamar do governe portuguez uma commissão por ter tratado d'este negocio em que elle se ingeriu sem que lhe fossem reclamados os seus serviços (apoiados), e havemos de ter a repetição das seenas do sr. Hullel, que vendeu fundos portuguezes para se pagar por suas mãos (apoíados). Parece que o governo portuguez, apesar de uma lição triste e recente, ignora ainda que lá fóra é axioma de corretagem, que quem trata de um negocio tem direito a uma commissão, porque, dizem elles =nínguem trabalha para o rei da Pruria.=
Tivemos este exemplo, e em logar de aproveitarmos a lição, que foi cara e severa, parece que continuâmos no mesmo systema.
Basta que um homem de Inglaterra, que saíba assignar um telegramma, se dirija ao governo portuguez, de igual para igual, para o governo julgar que achou de novo as minas do Perú, e que descobriu um thesouro de bons emprestímos e vantajosas negociações nas praças estrangeíras! (Apoiados.) Depois o resultado vem sempre desmentir estas esperanças tão faceis como fallazes, e a final este paiz é que é a mina que os estrangeiros exploram com facilidade e vantagem.
Todos querem melhorar o nosso credito e restabelecer-nos as finanças. É tempo de desconfiar de tanto zêlo, e não acreditar facílmente em promessas, tantas vezes repetidas quantas desmentidas pelo resultado (apoiados).
Se o sr. ministro da fazenda tem um accordo celebrado e assignado com todos os interessados no caminho de ferro de sueste, é indispensavel que o apresente á camara (apoiados); se o não tem e quer continuar com este systema de credulidade infantíl em simples prometas e de voluntaria illusão em relação ás exigencias dos capitalistas estrangeiros, s. ex.ª não póde nem devo ter esperança de encontrar n'esta camara, que foi eleita em nome das economias e para a reorganização da fazenda publica, um voto que se associe a este projecto para o converter em lei, porque ente projecto representa, não o termo e extincção das reclamações e exigencias dos interessados, mas o reconhecimento de uma divida muito maior, alem da que estava reconhecida (apoiados). O resultado ha de ser uma nova reclamação.
Eu dizia isto mesmo ha pouco menos de dois mezes, e o governo não me acreditava então, como não me acredita agora. A experiencia veiu confirmar plenamente o que previa e affirmava.

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Agora repete-se o mesmo systema, não ha contrato anterior que obrigue reciprocamente, o governo fica obrigado, mas os interessados ficam livres, transcrevem se ipsis verbis as disposições do artigo 4.º da proposta passada, como espera o governo obter um resultado diverso d'aquelle que obteve do accordo ou indemnização primeira?
Esta camara já votou uma vez a mesma disposição que de novo agora se nos apresenta. Apenas era menor a somma concedida. Que sucedeu? Os interessados acharam pequena a somma, e o banqueiro encarregado da emissão do emprestimo recusou-se a realiza-lo. Que succederá agora, depois que o governo, cedendo a um telegramma particular de Julius Beer, conseguir do parlamento o augmento da somma, conservando os termos e a redacção da dispo Bicão? Eu não receio enganar me affirmando que Stern repetirá a recusa de Goschen, allegando igualmente a impossibilidade da cotação do emprestimo, e que veremos apparecer outro telegramma particular exigindo ainda augmento da somma votada para a indemnisação dos interessados no caminho de ferro de sueste!
É isto o que desejo evitar, e isto só se evita quando os interessados, legitima e legalmente representados, se tiverem obrigado a ficar satisfeitos com a indemnisação que se lhes concede (apoiados).
O governo tem encarado esta questão apenas pelo lado financeiro, sacrificando a segurança ás illusorias vantagens de facilitar a negociação do emprestimo, que em vez de se realisar cada dia se torna mais difícil. Para mim, a questão principal no accordo a fazer com os interessados no caminho de ferro de sueste, não é a questão financeira, é a questão jurídica.
O governo agora tem obrigação rigorosa de saber direito, e se o não sabe, póde estuda-lo e aprende-lo com o muito digno lente da universidade, que occupa a pasta da justiça, O lado principal d'esta questão é o lado jurídico, porque só por elle é que o paiz póde obter a certeza de ficar livre de mais exigencias, e novas reclamações (apoiados).
Agora me recordo, com muito pezar meu, que não posso conservar a esperança, que tão agradavel me era depositar na sciência jurídica do meu illustra amigo o sr. ministro da justiça. S. ex.ª na sessão de 19 de junho, respondendo-me tão concisa como substanciosamente, disse que a commissão de fazenda entendeu não dever cammungar nas minhas idéas, e não dever tomar sobre si a responsabilidade dos corollarios a que eu tinha chagado, partindo de princípios que a commissão entende não serem justos, nem verdadeiros, nem em direito, nem em política, nem mesmo em ,direito financial, se assim se pode dizer=.
A vista disto, forçoso me é perder toda a esperança de fazer commungar o illustre ministro da justiça, a quem um presentamento ou mystica attracção chamava ha muito tempo para collega do venerando prelado e meu amigo que occupa a pasta do reino. Essa attracção claramente se revela na preferencia que s. ex.ª dava ao uso de palavras religiosas para exprimir, com toda a uncção, que não partilhava das minhas idéas.
Pois os corollarios a que eu então cheguei, partindo de princípios que a commissão não reputava verdadeiros nem justos, nem em direito, nem em política, nem em direito financial, estão já hoje confirmados pelos fastos, e a opinião que eu aqui emitti é a mesma que a experiencia veiu confirmar, como s. ex.ª agora não póde negar.
Mas eu, que conheço a firmeza de idéas do meu illustre amigo, o sr. ministro da justiça, conservo muito pouca esperança de que s. ex.ª ceda, mesmo diante da fatal lei da necessidade, e presumo que nem os factos nem a experiencia bastam para que s. ex.ª mude de idéas, ainda que o projecto que se discute lhe esteja demonstrando que essas idéas que seguia não deram os resultados que esperava.
Eu conservo tambem as idéas que tinha. Por isso, seguindo-se exactamente o mesmo systema; adoptada a mesma disposição do artigo 4.º, que o anterior ministro da fazenda julgava sufficiente para fazer desapparecer toda a guerra, todos os obstaculos e difficuldades; alterada a disposição d'esse artigo, apenas na quantia; annunciando o respectivo ministro, e mandando publicar na praça de Londres, que o emprestimo é indispensavel para salvar as finanças, e que é impossível realisado, sem que os interessados na companhia hajam por bem conceder-nos licença; affirmo a v. ex.ª e á camara que o resultado que vamos obter, votando o projecto em discussão, é exactamente o mesmo que obtivemos votando o artigo 4.º da auctorisação precedente. As mesmas causas produzem sempre os mesmos effeitos; e contra esta lei da logica inflexivel, eu suspeito muito que não possam conseguir victoria nem tirar vantagem as intelligencias poderosas de dois homens novos, meus amigos, que eu sinceramente deploro ver começar a sua carreira politica nas cadeiras do poder, resolvendo por esta forma uma negociação d'esta ordem. Lamento-o profunda e sinceramente.
Quando n'outro dia se tratou de votar uma moção politica, declarei a v. ex.ª que não concorria nem me associava a nenhuma moção política, que tivesse por fim fazer retirar d'aquellas cadeiras estes dois cavalheiros, mas desde logo lhes annunciei também que nas questões de administração havia de ser muito severo com elles, e que quanto maior fosse a amisade que nos liga, maior havia de ser a minha insistencia para que bera administrassem as cousas publicas. A occasião chegou, e chegou depressa.
Por isso, se não existe um compromisso solemne e authentico da parte dos interessados no caminho de ferro de sueste, se não existe uma segurança que torne infalliveis as obrigações que esses indivíduos tenham de contrahir comnosco, eu voto terminantemente, sejam quaes forem as consequencias, contra o projecto em discussão.
Eu posso aceitar um sacrificio qualquer para salvar o paiz do estado em que se encontra, tendo a consciencia de que esse sacrificio é eficaz. Mas não posso votar, nem voto, nenhum sacrificio, por pequeno que seja, para ficarmos em peior estado do que estávamos, e sem esperanças de obter as vantagens que se desejam.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho, como questão previa, que o governo apresente a esta camara o original do accordo com os interessados no caminho de ferro de sueste, ou os titulos que acreditem, como legítimos e legaes representantes d'esses interessados, as pessoas com quem tratou pelo telegrapho, o que consta dos telegrammas publicados com a sessão de 3 do corrente mez.
Sala das sessões, 9 de agosto de 1869 = Antonio Augusto Ferreira de Mello.
Admitida.
O sr. Dias Ferreira: - Entro com verdadeira repugnancia n'este debate, que respeita a uma questão já gasta, a uma questão velha, bem conhecida de toda a assembléa. As minhas palavras e a minha auctoridade, que são de pouco valor, não podem esclarecer os representantes do povo; quero apenas registar a minha opinião.
Tratarei a questão financeiramente, sem perder de vista as considerações politicas, que são tudo n'esta occasião (apoiados). Deploro que o governo, segundo as conveniencias da sua conservação n'aquellas cadeiras, ora sacrifique a questão financeira ás condições politicas, ora sacrifique as condições politicas á questão financeira. Até ha pouco tempo a questão financeira não inquietava o governo, e só a questão politica prendia a sua attenção. Todos os intuitos do governo, todas as suas instancias se dirigiam a crear na espirito publico a idéa de que havíamos de resistir por todos os modos ás solicitações das companhias de caminho de ferro. Ainda não vae longe o tempo em que o Diario

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do governo era quasi exclusivamente destinado a publicar representações em que se cobriam de injurias e improperios aquelles mesmos com que o governo estava n'essa occasião, e está ainda hoje negociando supprimentos para occorrer á despeza ordinaria e extraordinaria do estado.

Então eram as considerações politicas, era a abnegação do poder, que recommendava ao governo, como condição essencial, e encaminhar a opinião publica, o prevenir o espirito publico no sentido da resistencia mais tenaz e mais obstinada a qualquer concessão aos argentarios estrangeiros. Era este o caminho que se seguia!

Mas os homens de coragem, os homens de principios, quando entram n'um certo caminho, seguem-o até ao fim (muitos apoiados). É esta a sua obrigação. Perdem a auctoridade exactamente no mesmo momento em que vem destruir e fulminar com as suas palavras e com os seus actos as mesmas doutrinas de que foram apostolos e propugnadores por muito tempo (apoiados).

Todos podem transigir com as companhias do caminho de ferro. Todos podem ceder diante das exigencias dos argentarios estrangeiros. Mas um gabinete, onde está o sr. bispo de Vizeu, não póde ceder (muitos apoiados), e não póde ceder sem descredito para o governo, e sem abatimento para o systema representativo (muitos apoiados).

Ainda ha pouco tempo nenhuma consideração merecia a manutenção do nosso credito no estrangeiro! Eu li n'esta casa o artigo de um jornal, que tem apoiado constantemente a situação, e que na occasião em que as nossas circumstancias eram mais criticas, em que o thesouro estava mais desfalcado de recursos, proclamava que o governo devia recorrer a um empréstimo forçado, a antecipação do imposto a suspensão dos pagamentos aos funccionarios publicos, mas nunca ceder diante das exigencias dos argentarios estrangeiros!

No mesmo dia em que eu proferia aquelle discurso, um ministro d'este gabinete, e que já o não é, confessava que uma casa bancaria lhe tinha mandado de Paris um jorna ministerial, que eu creio ser o mesmo, com o celebre artigo sublinhado, e com a declaração peremptoria de que não reformava uma letra do governo que se vencia n'aquella occasião.

Pois póde continuar a frente dos negocios publicos um governo que rebaixou o credito publico a ponto de que, recebendo ha um anno as inscripções a 42 as tem hoje a 33? (Muitos apoiados.) Pois isto póde continuar a ir assim! Pois nós podemos continuar n'este caminho? (Apoiados.)

É preciso que v. exas. saibam que, só até 30 de abril este governo emittiu 28.100:000$000 réis de inscripções (Vozes: - Ouçam, ouçam.) O emprestimo contratado obriga-nos a uma emissão d'entre 50:000$000 e 60:000$000 réis! Tudo isto poderá ser approvado por um parlamento benevolo e generoso. Mas eu não posso associar-me a uma politica que é a negação de todo o systema financeiro (Muitos apoiados.)

Votado este projecto e concluido o emprestimo nas condições onerosas que, apesar de não serem declaradas pelo nobre ministro da fazenda, eu prevejo, só os encargos do juros da divida publica, consolidada, e fluctuante com amortisação ou sem ella, a prazos mais ou menos largos, subirão a 9.000:000$000 réis annuaes, e isto com uma receita de 16.000:000$000 réis! Como saimos d'aqui? Como estamos nós a preparar a organisação das nossas finanças? Nós estamos a preparar uma situação insoluvel! (Muitos apoiados.)

Eu deploro que n'uma occasião em que as circumstancias são tão graves, em que o espirito publico esta inquieto, em que todos que têem que perder não podem estar socega dos, o sr. ministro da fazenda venha a esta casa e não apresente nem uma idéa sobre o seu systema financeiro! (Apoiados.)

Como havemos nós de alentar o espirito publico, como havemos nos de preparar o paiz para as medidas graves que é indispensavel tomar? É com este projecto?! Quaes são as medidas com que o governo pretende conjurar a crise?

Eu não tenho coragem, não só pelas relações pessoaes que me ligam ao nobre ministro da fazenda, mas tambem pelo amor que eu tenho aos principios do systema representativo, e a dignidade do governo, não tenho coragem de repetir á camara o que li ha pouco n'um jornal que publicava o plano do sr. ministro da fazenda, exposto por s. exa. numa reunião da maioria, sobre o modo de salvar a fazenda publica. Não quero nem devo repeti-lo, porque não quero que as minhas palavras causem o mais pequeno prejuizo ao credito publico (apoiados).

Sr. presidente, é possivel que depois das celebradas economias, depois de tantas reformas e de tantos cerceamentos, depois de tanta moralidade, moralidade excepcional de que não ha memoria, depois de alguns impostos addicionaes, impostos odiosos, a conclusão logica, o remate do edificio que o governo tinha architectado seja um empréstimo nas condições mais ominosas e humilhantes que tem havido desde o tempo até onde chega a nossa historia financeira? (Muitos apoiados.)

Qual é o argumento que apresentam todos os que pretendera por qualquer fórma associar-se a approvação desta medida? Quero dize-lo, quero expo-lo com toda a sinceridade e com toda a franqueza. O argumento que tenho ouvido aqui e lá fóra, e apresento-o, porque quero que o paiz saiba de uma maneira definitiva e clara o terreno verdadeiro em que a questão esta collocada, é que a prolongação do actual estado financeiro, não se eftectuando já o empréstimo, nos leva a bancarota. E o que dizem todos os que apoiam o governo, e os que desejam associar-se a esta medida.

Mas, sr. presidente, será possivel termos a bancarota, depois que o governo reduziu a despeza publica 200:000$000 réis por mez, como o sr. ministro do reino o declarou na outra camara, declaração a que eu tenho alludido tantas vezes, sem ouvir resposta, nem explicação?

O nobre ministro do reino declarou na camara dos dignos pares que o nosso deficit estava reduzido 200:000$000 réis por mez, e tendo eu alludido sempre nos meus discursos a este facto e pedido explicações, dos bancos do governo responde-se com o silencio e com o desalento!

Podem os srs. ministros ter maioria nas duas casas do parlamento, podem ter a benevolencia do paiz, mas, emquanto nas discussões ficarem collocados, como até hoje, em pessimo terreno, a sua posição não melhora (apoiados) e ha de ser sempre a mesma (apoiados), porque não é com o silencio e com o desanimo que se eleva o poder (apoiados).

E eu sinto que não esteja presente o sr. ministro da marinha, porque queria tambem responder ás ponderações que s. exa. fez no ultimo discurso, que o paiz ainda não teve a fortuna de ver publicado.

E a proposito: peço ao sr. ministro da fazenda que não vá seguindo os passos do seu collega da marinha, deixando de publicar os discursos, porque se perdemos tambem os discursos de s. exa. temos perdido tudo (apoiados).

Se alguma cousa ha que aproveitar deste gabinete são os discursos dos srs. ministros, e se s. exa. os não querem publicar como castigo a opposição, peço-lhes que lhe imponham outro castigo, porque, castigando a opposição, castiga tambem o paiz, que fica sem conhecer os seus planos e as suas idéas.

Mas sr. presidente, insistem os amigos do governo em que é necessario votar o emprestimo, e vota-lo n'esta sessão, se não temos amanha a bancarota. Diga-se, porém, para se fazer justiça a todos, que esta palavra bancarota só começou a pronunciar se nesta casa por parta dos conselheiros da corôa desde que as reducções, as economias e a moralidade entraram no governo da nação (apoiados). Só durante este ministerio é que os illustres ministros ameaçam

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com a bancarota, sempre que lhes convem obter da camara alguma votação.
Eu perguntei já multo de proposito e calculadamente ao governo qual era a importancia da divida fluctuante para desenganar a camara e o paiz de que não era a somma, aliás importante, (Testa divida que nos tinha em graves dificuldades. Actualmente a divida fluctuante orça por réis 12.000:000$000. Já foi muito maior
Em 1865 já a nossa divida fluctuante attingia esta cifra.
N'essa epocha o cavalheiro encarregado da pasta da fazenda, que já a tinha gerido por alguns annos, cuja illustração e competencia n'estes negocios ninguem póde sequer pôr em duvida, declarava no relatorio de que precedia uma operação financeira - que a divida fluctuante, amortisavel a prasos mais ou menos longos, era de 12.000:000$000 réis.
Pois em 1865 ninguém se aterrou com similhante declaração, ninguem se persuadiu de que Catilina estava ás portas de Roma, e de que estava chegada a epocha em que o nosso credito publico havia de soffrer o maior golpe e o mais profundo abalo.
Ha um anno estava a nossa divida fluctuante exactamente na mesma somma, e, se a divida fluctuante não augmentou de então para cá, é porque se tem posto muitas inscripções no mercado, é porque se tem vendido muitos titulos de divida fundada (apoiados}. E tem se vendido com prejuízo do credito, para se negociar depois do descredito um grande emprestimo! (Apoiados.)
Não ha memoria de uma... (não sei o nome que lhe hei de dar, mas creio que lhe dou o mais doce), não ha memoria de mais inhabil administração financeira.
Todos os homens que entendem dos negócios publicos procuram levantar primeiro quanto possível o credito, para depois fazerem uma grande operação financeira; mas o ministerio actual fez exactamente o contrario! (Apoiados.)
O governo actual fez o contrario. Desorganisou os serviços publicos, cercou as verbas, que não eram de mais, para o desenvolvimento da viação, e supprimiu os subsídios ás províncias ultramarinas na occasião em que ellas iam em via de prosperidade, O ministerio julgou que podia se generar a nossa administração financeiro, não só deixando de crear meios de vida social, mas atrophiando os que existiam, e contando unicamente com os recursos actuaes para saldar o desequilíbrio das nossas finanças (muitos apoiados).
A mim inquieta-me menos o deficit, inquieta me menos o desequilíbrio entre a receita e a despeza, do que o abatimento e a paralysação da vida social em todos os seus ramos, que ha de collocar o governo em gravissimos embaraços, sempre que appelle para o augmento de receita e vá bater á porta dos contribuintes.
Sr. presidente, em verdade, não pude deixar de possuir-me de grande tristeza, quando li a proposta do lei que estamos discutindo (apoiados).
Quem está acostumado a ler sobre assumptos tão graves, os relatorios circunstanciados de todos os ministros da fazenda que têem trazido similhantes propostas a esta casa, quem está habilitado a ver justificadas sempre estas indemnisações ou doações, como agora se consideram, e que antigamente se chamavam accordos no interesse do paiz, e examina a proposta de lei, sujeita á nessa apreciação, entristece, mas acha coherencia e logica no ministerio.
É um documento magro, mas fica compensada a magreza do documento com a gordura da concessão que se faz aos estrangeiros (apoiados - riso). Mas ao menos no relatorio, comquanto deficiente e humilde, não faltou o appêllo á triste especulação, constantemente usada por este gabinete de procurar cobrir a sua responsabilidade com os actos de administrações anteriores que elle ao mesmo tempo se tem esforçado por tornar odiosas ao paiz.
Eu desculpo os nobres ministros por não terem mais experiencia dos negocios publicos, mas não os desculpo de umas certas arteirices em que já começam por ser mestres (apoiados), e que eu hei de descubrir onde ellas appareceram, como foi por exemplo a historia da leitura na carruagem da medida sujeita á discussão, preparada pelo sr. cone de Samodães.
E a proposito do sr. conde de Samodães, permitta-me v. ex.ª que eu diga á camara, que as declarações feitas por aquelle cavalheiro na camara dos dignos pares, mo deixaram a impressão a mais desagradavel, e ainda aggravada com a leitura dos telegrammas ultimamente publicados a respeito d'esta questão.
Eu julgava que tendo o sr. conde de Samodães saído do ministerio pela guerra que lhe fazia a opposição parlamentar, pela guerra que lhe fazia a maioria, pela guerra que lhe faziam especialmente os dois novos ministros, como elle declarou na outra casa do parlamento, sem que ninguem tenha tido a coragem de o desmentir nem lá nem aqui, tinha saído provavelmente por que não era bom ministro. E se s. ex.ª saiu por esse motivo, se o novo ministro lhe sucedeu porque elle não era bom ministro, aceita s. ex.ª as propostas do seu antecessor, e quasi sem as ler? (Apoiados.)
Pois não era conveniente a gerencia financeira do sr. conde de Samodães, com quanto s. ex.ª fosse dotado de boas intenções e de illustração, largando por esse motivo o ministerio, e uma proposta gravissima e da mais alta importancia, preparada por aquelle cavalheiro, é apresentada pelo seu successor sem reflexão alguma, e apresentada ao parlamento, depois de unia leitura demasiado rapida?
Eu não percebo isto, assim como não percebo muitos outros actos d´este ministério, que parecem involvidos n'um véu impenetravel.
O sr. conde de Samodães diz a 28 de julho aos interessados que está aceito o acordo e que no dia 29 o apresentaria á camara; e em logar de o apresentar sáe do ministério! Ha aqui necessariamente um motivo occulto que é preciso que se explique por interesse publico e sobre tudo dos ministros que entraram de novo sobre os quaes peza uma gravissima responsabilidade perante a opinião publica (apoiados). s. ex.ª têem obrigação de explicar este facto de uma maneira cathegorica por honra sua (apoiados).
Tanto o sr. conde de Samodães estará persuadido no dia 28 de julho de que continuava a ser ministro, que se compremetteu a trazer a proposta à camara no dia 29; mas em logar de a trazer n'esse dia, vieu o sr. Presidente do conselho declarar que s. Ex.ª tinha dado a demissão! (Apoiados).
Mas continuando na minha ordem de idéas, dizia eu que ha um anno a nossa divida fluctuante era exactamente a mesma que é hoje.
Discutia-se então n'esta casa um emprestimo de iniciativa minha, e, como se vê da discussão parlamentar sobre esse assumpto, para o que chamo particularmente a attenção da camara, nem uma só palavra sobre a necessidade do emprestimo disse o actual sr. ministro da fazenda, nem o sr. ministro da justiça. O sr. ministro da justiça fallou sobre o nosso terço, que já morreu, e o sr. ministro da fazenda sobre varias cousas, mas sobre a necessidade do emprestimo nem uma palavra disseram.
Recordo estes factos para quebrar antecipadamente nas mãos do sr. ministro da fazenda a arma, com que ha de querer fazer pressão na assembléa, repetindo o eterno argumento da enorme somma da divida fluctuante, que nos assoberba. A situação é grave, mas igualmente grave era já no anno passado. E quer a camara saber o que dizia o sr. ministro da fazenda ha um anno n'esta casa, e é sempre agradavel a todos ouvir a repetição dos discursos do nobre ministro.
Cumpra o ministerio essas indicações (que eram as reducções), que só assim desatará os cordões da bolsa do contribuinte, só assim realisará esse programma, que foi aqui preconisado, só assim injectará sangue novo nas veias varicosas do thesouro publico, só assim obterá a vara miraculosa de Moysés, com que poderá ferir as artérias da pé-

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média, forçando-as a espadanar mananciaes vertentes de aguas vivas."
Eu não responsabiliso o sr. ministro da fazenda pelo cumprimento, do seu programma. E podia responsabilisa-lo por que s. ex.ª que nos disse aqui ha pouco que ha dez annos cogita nos negócios públicos, já no anno passado contava nove annos de cogitação. Mas só uma idéa revelou em to dos os seus discursos, idéa importante com relação á administração publica, idéa que tinha sido apresentada por um cavalheiro illustrado, que não tem hoje assento n'esta casa, e idéa que deu titulo á camará que foi dissolvida.
O sr. José de Moraes: - A camará dos 50 por cento.
O Orador: - Exactamente.
É por isso que o sr. ministro das obras publicas é o meu ministro (apoiados).
Eu tenho poupado especialmente o sr. ministro das obras publicas, porque cumpriu o seu programma, e reduziu a despeza no ministério a seu cargo pelo menos com a viação a 50 por cento. Bem ou mal, desorganisando o serviço publico, pondo os engenheiros a pedir, não entro n'essa questão, cumpriu o programma dos 50 por cento (apoiados. - Riso.) Para m i m quem personifica a situação é o sr. ministro das obras publicas; e quem devia ser o presidente do conselho de ministros era o sr. ministro das obras publicas (apoiados. - Riso.) Creio que não é indispensável para estar á frente de um gabinete ser titular? (Apoiados).
Mas a única idéa que o sr. ministro da fazenda revelou foi a das deducções nos vencimentos dos funccionarios públicos, sem exceptuar a lista civil, idéa que vinha provavelmente, como titulo de abnegação e independência.
O systema das deducções era já experimentado, não valia a pena fazer uma revolução pacifica para o por em pratica, como systema salvador.
Não o combato agora nem o defendo, nem mesmo peço ao sr. ministro da fazenda a realisação da sua idéa. Mas pergunto a s. ex.ª qual é a penedia a cujas artérias nos podemos recorrer com êxito seguro, votada que seja pela camará esta grande concessão? (Apoiados).
Faça s. ex.ª o favor á assembléa, e não digo a mim, tenha s. ex.ª a contemplação com o paiz, e não digo com a opposição, de dizer o modo como ha de satisfazer todos estes encargos. A vara de Moysés deve estar próxima da penedia, e, logo que a vara toque na penedia, fique o paiz certo de que ha de ser afogado em mananciaes de aguas vivas, que se hão de espadanar por toda a parte (riso).
Não é licito ao governo pedir ao paiz 8.325:000$000 réis para dar ao sr. Julius Beer, sem dizer o modo de obviar a esses encargos. O governo para obter o empréstimo serve-se do poderoso argumento de que sem o empréstimo não pôde sustentar-se.
Aqui e que está toda a abnegação do governo (riso). É conservar-se.
Pois não lhe reformam as letras da divida fluctuante?
Todos os ministérios transactos, que aliás não gosavam de tantas demonstrações de favor publico, e de tantos opplausos da opinião, tinham repetidos offerecimentos de catas estrangeiras para a reforma dos empréstimos (apoiados). O gabinete levou nos a esta situação deplorável.
Aqui tenho presente um documento que mostra á saciedade a maneira infeliz porque o governo tem tratado as cousas publicas, e não faço accusação alguma ao sr. conde de Samodães, mas ao ministério, porque o sr. ministro do reino declarou que tomava a responsabilidade dos actos d'aquelle cavalheiro (apoiados).
Em 24 de julho, pelas três horas e um quarto da tarde dirigiu-se de Londres um telegramma ao nosso ministro da fazenda em que se lhe fazia a proposta que consta do mesmo telegramma. O governo do nosso paiz respondeu immediatamente - aceito! E aceitou a proposta sem a menor modificação! (Apoiados.) A mim também me fizeram propostas onerosas, também me propozeram empréstimos a 10 e 12 por cento, mas eu nunca os aceitei. Propunha sempre modificações, que a final eram aceites. Mas agora não se faz assim, agora aceita-se immediata e promptamente qualquer proposta, qualquer accordo, porque dizem os srs. ministros "quem paga é o paiz, e nós o que queremos é sustentar-nos" (apoiados).
A câmara ainda poderia apreciar esto negocio á luz das condições que o acompanham, se não houvesse a questão prejudicial muito bem tratada pelo meu illustre amigo, o sr. Ferreira de Mello, a questão da legitimidade da pessoa com quem se está tratando. Nos telegrammas figuram muitas pessoas, sem que se saiba se todos, ou qual d'elles são os representantes dos interessados n'este accordo.
E no relatório vem ainda a antiga especulação de que o accordo em discussão é melhor que os anteriores.
É melhor que os anteriores? Mas pôde ser péssimo! Em primeiro logar isto não é verdade! (O sr. Pereira de Miranda: - Peço a palavra.) Mas a demonstração? Que é feito d'ella? Ninguém é capaz de demonstrar-me que este accordo seja mais vantajoso do que aquelle que eu tive a honra de fazer no anno passado com os meus collegas.
E que dirão os comícios que resuscitavam o governo em nome da interpidez com que elle resistia ás exigências dos argentados estrangeiros? (Apoiados.) Pois então nós havemos de ir cobertos de louros para casa, havemos também decretar grande gala por alguns dias por termos de fazer um empréstimo em títulos a 31 por cento, dando alem d'isso á companhia 1.850:000 libras nominaes? A que preço ficarão os fundos públicos? E o futuro do paiz, qual será? E com que se ha de fazer face a estes encargos?
Sobre este ponto é que eu desejava ouvir clara e categoricamente o sr. ministro da fazenda (muitos apoiados).
Mas o sr. ministro de fazenda não pôde contar só os encargos, que resultam d'esta operação. S. ex.ª ha de mandar concluir 119 kilometros que estão em construcção, os quaes, pelos cálculos dos engenheiros, custam 700:000$000 réis, e que poderão custar até l .000:000$000 réis, quantia que levantada a 10 por cento, dá um encargo de réis 100:000$000. Ha de indispensavelmente fazer construir o ramal do Lavradio, porque não é possível continuarmos a ter o embarcadouro no Barreiro, sendo o transito, durante 500 metros, exposto ao sol, chuva, e a todas as intempéries da estação. Ha de mandar fazer as pontes e estação na margem direita e esquerda do Tejo, obras que os engenheiros calculam em 400:000$000 réis, e que podem ir até réis, 600:000$000 que a 10 por cento importam um encargo de 60:000$000 réis. Preciso saber se com esta concessão terminam todas as difficuldades de tão malfaldado negocio, e como não ha de obviar aos encargos que ficam pesando sobre o thesouro depois de concluída a operação financeira, que o governo cita negociando.
O governo vale se ainda, para obter a approvação d'esta medida, de outro argumento que me foi presente á entrada da camará, que é o seguinte aviso:
"Convidam se todos os homens affectos ao actual governo a reunir hoje ao meio dia no largo das cortes, para obstar á ascenção ao poder dos esbanjadores da fazenda publica."
Sr. presidente, este argumento parece-me deplorável (apoiados).
Ninguém respeita mais nem se associa com mais satisfação ás manifestações populares do que eu, quer ellas tendam a dar força ao governo quer a representar contra os actos do governo, e devo declarar que nunca entrei n'essas manifestações, senão como opposição.
Folgo que o paiz ministerial não deixe o governo só entregue ás suas próprias forças...
O sr. Montenegro: - Quem assignou o aviso?
Vozes: - Ora.,. Ora...
O sr. Santos e Silva: - Havia de ser a opposição (riso).
O Orador: - Se porventura ha uma reunião popular no largo das Cortes com alguma representação contra ou a fa-

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vor do governo, receba-se com toda a cortezia devida á soberania do povo (apoiados); e se quer dirigir-se a algum outro poder do estado, socegada e pacificamente, o governo não a deve cohibir. Mas se taes reuniões têem por fim influir de um modo anti-constitucional na opinião da assembléa, condemno-as, como homem liberal no interesse do systema representativo, e da dignidade do proprio governo (apoiados).
Estou persuadido que o governo foi estranho a este aviso, como o foi ás representações que mandou publicar em janeiro passado no Diario do governo (apoiados - riso), porque faço justiça ao seu amor pelos principios e ao seu respeito pelo systema representativo.
Mas se d'este documento se tira o argumento que se me afigura, e que faz recordar os tristes successos de janeiro ultimo, eu deploro-o em nome da liberdade do voto (repetidos apoiados), porque todos sabem que n'esse dia muitos dos nossos collegas foram insultados á saída das cortes (muitos apoiados).
Embora os srs. ministros não façam caso da imprensa, embora não respondam aos discursos dos deputados, ao menos mantenhamos a liberdade do voto (repetidos apoiados). Ha uns poucos de dias que eu ouvia dizer e lia nos jornaes que se havia de fazer um meeting contra a camara dos dignos pares pela attitude que ella tomava contra o governo.
Declaro a v. ex.ª que estava á espera de ver representar esta scena. Vieram muitas representações a favor do governo por elle resistir com intrepidez nos argentados estrangeiros, queria ver agora se se faziam representações contra a camara dos dignos pares, exactamente quando ella impunha ao governo o cumprimento do seu programma (apoiados).
Espero que o bom senso popular mantenha todo o respeito pelo systema que nos rege, porque a outra casa do parlamento é, como a nossa um ramo do corpo legislativo, e tem por isso tanto direito á consideração publica como a camara electiva (muitos apoiados).
Os srs. ministros inspirem se da força dos seus actos, da força das suas faculdades que são nobres e distinctas; sigam o caminho franco, claro e seguro, e o seu programma em todas as suas partes. Lastimo, confesso a v. ex.ª a verdade, que esta representação se faça; mas eu acredito mie esto aviso não fará impressão no espirito de nenhum dos representantes do paiz (muitos apoiados).
Vozes da maioria:- Não faz.
O Orador: - Dêem 1.850:000 libras nominaes. Faça-se um emprestimo que nos obrigará a pôr no mercado entre 50.000:000$000 e 60.000:000$000 réis. Desorganisem-se mais alguns serviços publicos, para tudo isso póde haver remedio; mas haja respeito pelos principios do systema representativo (apoiados). Eu não quero uma nova edição de circulos eleitoraes publicados á ultima hora para fazer pressão no espirito do collegio eleitoral. Não quero segunda edição d'este attentado contra os princípios liberaes. Ainda posso perdoar aos nobres ministros alguns actos de prejuízo para o thesouro que se podem emendar; mas declaro a s. ex.ª muito francamente que não lhes perdoo, que hei de ser completamente inexoravel para com s. ex.ª por qualquer acto de desamor e menos respeito pelo systema representativo.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Ministro da Fazenda: - ... (S. ex.ª não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)
O sr. Andrade Corvo: -... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)
O sr. Correia de Barros: - Como o illustre orador, que acaba de fallar, começo eu, sr. presidente, pedindo á camara a bondade de me conceder alguns instantes de attenção, e com tanta mais rasão formulo eu este pedido, quanto é infelizmente certo que me faltam os dotes que a s. ex.ª sobejam para a conquistar.

É tal a importância do assumpto, e estão com elle tão intimamente ligados os mais caros interesses do paiz, que ouso esperar que a camara me dispensará mais uma vez uma prova da grande benevolencia a que me traz acostumado.
Sr. presidente, limitar-me hei, porque vejo que a camara está mais que cansada, e porque, concordando cora as idéas do sr. Dias Ferreira, considero a questão como velha, gasta e de todos conhecida, limitar-me-hei, digo, a tratar d'ella unicamente pelo lado financeiro.
Sr. presidente, o governo celebrou um accordo com a companhia do caminho de ferro de sueste, e vem pedir á camara a ratificação d'esse accordo. A seu tempo eu submetterei á approvação dos meus illustres collegas as rasões em que me fundo para suppor que é accordo, e não uma simples concessão, aquillo de que se trata.
Na proposta, que sobre o assumpto foi dirigida ao governo, apresentaram-se dois alvitres. O governo adoptou um d'elles, rejeitando o outro, e a maioria da commissão approvou as idéas do governo.
Preciso pois dar conta á camara das rasões que levaram a commissão, cujo relator sou, a approvar a proposta do governo.
Sr.presidente, de todos os modos por que poderia fazer-se um accordo entre o governo e a companhia dos caminhos de ferro, eu, partilhando das idéas do sr. Corvo, consignadas n'uma memoria sua, que ahi corre impressa, e que eu tenho presente, eu não aceitaria nenhum que não tivesse por base a cessação immediata e completa de relações, de interesses e de confiança entre o governo e a mesma companhia (muitos apoiados).
Sr. presidente, a dignidade do paiz oppõe-se á continuacão de relações de reciprocidade de interesses, e de mutua confiança com uma companhia que faltou sempre aos seus deveres, e que sempre violou as clausulas dos seus contratos, com graves prejuízos para a nação (muitos apoiados).
Sr. presidente, o artigo 1.º da carta lei de 16 de julho findo auctorisou o governo a contrahir um emprestimo sob certas condições, e dentro de certos limites, nos quaes cabia o contrato provisoriamente feito com a casa Frahling & Goschen. O artigo 4.º d'essa carta de lei auctorisava o governo a dar, por conta do capital levantado, á companhia dos caminhos de ferro de sueste, ou a quem de direito fosse, a quantia de 2.376:653$751 réis, á qual devia evidentemente juntar se o deposito feito pela companhia para garantir o cumprimento dos seus contratos, e bem assim os juros d'esse deposito, que estando vencidos, não estivessem pagos.
(Aparte que se não percebeu.)
De certo que não me furto a demonstra-lo, e creio que poderei irrefutavelmente faze-lo.
Sr. presidente, apenas o governo, interpretando os sentimentos da nação, entendeu ter obrigação moral de dar á companhia a differença que houvesse entre as sommas que ella gastara em beneficio do paiz, e as que do mesmo paiz recebera, claro é que implicitamente reconheceu o dever moral, se não jurídico de restituir-lhe o deposito; porque de outro modo se apropriava de uma parte do capital, com que dizia não querer locupletar-se (apoiados}.
Parece-me ter satisfeito os desejos do illustre deputado, demonstrando a proposição que arrisquei (apoiados).
É pois claro que a somma de dois mil tresentos e tantos contos de réis tinha que juntar-se o deposito, e os seus juros vencidos e não pagos.
Sr. presidente, se este dinheiro fosse levantado segundo as condições do contrato Goschen custava-nos elle annualmente e durante trinta annos a percentagem de 11,591 por cento, o que gravava o thesouro annualmente e durante o mesmo lapso de tempo com o encargo de 284:033$889 réis, encargo que ainda seria augmentado com a parte cor-

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respondente aos juros do deposito vencidos, e não pagos, e cuja importância tinha que sair do empréstimo.
Sr. presidente, o governo no uso libérrimo dos direitos quo o parlamento lhe conferiu, entendeu que não devia realisar o empréstimo, provisoriamente contratado com a casa Goschen, preferindo usar da auctorisação concedida pelo artigo 7.º da já citada carta de lei de 16 de julho ultimo.

A câmara sabe que este artigo auctorisava o governo a emittir fundos de 3 por cento até á somma effectiva de 18.000:000$000 réis, e isto em duas hypotheses diversas, a saber: l.ª, a de serem os fundos emittidos amortisaveis dentro de certo numero de annos; 2.ª, a de constituírem os mesmos fundos divida consolidada propriamente dita.

No primeiro caso não podia o governo passar alem dos encargos marcados no artigo 1.º da lei; no segundo não podiam os mesmos encargos exceder l por cento acima do juro correspondente ao preço dos mesmos fundos no mercado.
Sr. presidente, é de todo o ponto intuitivo, visto não termos conhecimento official das condições do novo empréstimo que se diz contratado com a casa Stern Brothers, que eu devo figurar a peior de todas as hypotheses possíveis, qual é a de ter o governo attingido o limite auctorisado; porque qualquer differença que porventura haja, ha de ser forçosamente favorável á demonstração que me proponho a fazer (apoiados}.
Segundo os últimos telegrammas de Londres estão Saquei-la praça os fundos portuguezes a 34,75 por cento, preço que corresponde ao juro real de 8,64 por cento; como porém o governo está auctorisado a elevar este juro até 9,64 por cento, segue-se que sem se sair fora da auctorisação, pôde fazer-se a emissão a 31,12 por cento.
Collocada assim a questão na peior de todas as hypotheses. vejamos qual a somma real que corresponde ao capital nominal de 1.850:000 libras esterlinas, pedida pela companhia de sueste.
Este capital corresponde á somma effectiva de 575:720 libras esterlinas, ou réis 2.500:740$000
Abatendo réis 90:000$000
importância do deposito, que sempre havia que pagar-se, reduz-se esta somma a 2.500:740$000
Sr. presidente, se quisermos comparar os encargos resultantes de se dar esta somma, com os que resultavam de se dar apenas a quantia marcada no decreto de 10 de março ultimo, é preciso fazer uma de duas cousas; ou elevar o juro de 9,64 por cento ao que necessário for para que o capital se amortise em trinta annos, ou baixar a percentagem de 11,591 por cento, correspondente ao empréstimo Goschen, ao que ella seria, se tal empréstimo não houvesse de amortisar-se no mesmo período (apoiado").
Adoptando o primeiro crestes expedientes torna-se necessário que ao juro de 9,64 por cento ao anno, juntemos 0,65 por cento, percentagem necessária para a amortisação, o que faz com que o encargo annual, e durante trinta annos, seja de réis 257:326$146
Ha pois n'esta hypothese a economia annual de réis 26:707$713 ou nos trinta annos a economia real de réis 801:231$390
E aproveito a occasião de recordar a v. ex.ª e á camará, que se o governo se não vir forçado a chegar ao limite da auctorisação, será ainda maior esta economia.
Sr. presidente, emittido que seja o empréstimo, paga a nossa divida fluctuante externa, e augmentada a nossa receita por meio de uma reforma tributaria completa, é de crer que o nosso credito se levante do estado de abatimento em que está, e que nós possamos por conseguinte obter dinheiro mais barato; supponhamos porém que assim não acontece, e que o governo se vê forçado a levantar sob as mesmas condições o dinheiro necessário para concluir as linhas de sueste.
As obras que havia que fazer, quando o governo tomou posse d'estas linhas, estavam orçadas em 650:000$000
D'esta somma já o governo gastou 150:000$00
Faltam pois 500:000$000
O que segundo as hypotheses estabelecidas produz mais o encargo annual durante trinta annos de. 51:450$000
O que junto ao já achado de 257:326$146
Dá o encargo total annual de. 308:776$ 146
Eu peço licença para abrir aqui um pequeno parenthesis, dizendo que é possível que n'estes cálculos me escapasse algum pequeno erro, apesar de que foi tal o meu desejo de acertar, que não houve operação, que eu não tivesse a precaução de submetter ás verificações e provas, que a arithmética ensina (apoiados).
Sr. presidente, acode aqui certamente uma objecção, a que á primeira vista não parece muito fácil responder-se.
Pois, dirão os meus illustres adversários, se, dando-se uma somma maior, ficamos com um encargo menor, menor seria este ainda, se não augmentasse a somma marcada no decreto de 10 de março. É verdade, mas a isso respondo eu: o augmento é condição sine qua non para que se realise o empréstimo, que todos temos como indispensável, para que possamos a final entrar no caminho da nossa regeneração económica e financeira (apoiados).
Esquecia-me fazer sentir á camará, que ao encargo, que para o thesouro resultaria da somma concedida á companhia de sueste pelo decreto de 10 de março, e artigo 4.º da carta de lei de 16 de julho, devia também juntar-se o que correspondesse às sommas necessárias para o acabamento das linhas (apoiados).
Sr. presidente, comparando os encargos resultantes d'este accordo com os que resultavam do que ao parlamento foi proposto pelo sr. Corvo, quando ministro das obras publicas, vou procurar demonstrar á camará, que em boas rasões se fundou a commissão de fazenda para affirmar que de todas as transacções, até hoje propostas, é esta a menos onerosa.
Por esta occasião peço desculpa ao meu illustre collega, o sr. Dias Ferreira, por não fazer a mesma comparação com o accordo feito pelo ministério de que s. ex.ª fez parte, dando-lhe ao mesmo tempo os motivos d'esta minha omissão!
Sr. presidenta, ainda quando se não tome em consideração o facto de produzir o convénio de s. ex.ª um encargo annual em realidade superior ao que produzia o do sr. Corvo, bastava para que eu o rejeitasse, se então tivesse a honra de ter assento n esta casa, a circunstancia d'elle manter e estreitar relações de confiança reciproca e mutuo interesse entre o governo e uma companhia, que devia considerar-se morta desde que deixou de honrar a sua firma, deixando de cumprir os seus compromissos para com o paiz (muitos apoiados).
Sr. presidente, segundo o accordo do sr. Corvo recebia a companhia de sueste a quantia de 4.954:526$373 réis, somma quasi dobrada da que o governo pode auctorisação para lhe dar (apoiados).

sta grande differença nasço de um erro grave...
(Aparte do sr. Corvo.)
Eu sou o primeiro a fazer justiça a s. ex.ª A somma que s. ex.ª se propunha dar á companhia era em verdade exagerada ; essa exageração nascia de um erro grave, mas pede a justiça que tal erro se não impute ao sr. Corvo (apoiados)
Esse erro nasceu da má avaliação que se fez (apoiados); e tal avaliação, digo-o com a franqueza com que deve f aliar um representante do povo, constitue um verdadeiro erro de officio por parte do engenheiro que foi encarregado de a fazer, engenheiro que aliás eu respeito muito (apoiados).
O sr. Corvo não o encarregou de avaliar em vista dos livros da companhia, como em verdade se fez (apoiados).

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S. ex.ª encarregou-o de dizer-lho qual o valor das obras executadas, a fim de o governo saber a importancia das sommas que a companhia effectivamente despendera (apoiados}.
Não póde pois ser accusado o sr. Corvo, porque o engenheiro não cumpriu as suas ordens (muitos apoiados).
A quantia que por aquelle accordo se dava á companhia, era paga em obrigações que produziam 7 por cento de juro, e que tinham 1/2 por cento de amortisação.
Assim no fim de quarenta annos estava inteiramente amortisado o capital, e o estado senhor das linhas.
Sr. presidente, para que eu possa comparar os encargos resultantes d'este accordo, com o que resulta actual, careço de elevar a percentagem para amortisação de 1/2 a 0,56 por cento, necessaria para que a amortisação se verificasse em trinta annos.
N'esta hypothese o encargo annual, que durante trinta annos resultaria do accordo do sr. Corvo, era de réis 399:334$826
Acresce que, para concluir as linhas, carecia n'aquella epocha o governo de levantar mais 70:000$000 reis, e que estando os fundos a 40 por cento, produzia um encargo annual e permanente de réis. 52:500$000
Se agora compararmos o onus resultante só da indemnisação que se dava á companhia e que sobe a réis. 399:334$826 com o que resulta da que actualmente se dá 257:326$146 junto com o proveniente da somma de 51:450$000 308:776$146 necessario para se acabarem as obras, teremos a economia annual de réis 90:558$680 afora o encargo permanente de 52:500$000 réis a que já me referi.
(Aparte do sr. Corvo.)
Eu calculei o encargo na hypothese de se verificar a amortisação no praso de trinta annos, e aproveitei a occasião para dirigir um pedido a s. ex.ª: eu peço a s. ex.ª que me faça a justiça de crer que estou argumentando de boa fé (muitos apoiados).
S. ex.ª sabe que a maiores engenhos que o meu é difficil sofismar com algarismos; creia porém o meu nobre collega que ainda que me fosse fácil o não faria (muitos apoiados).
Vozes: - Muito bem.
Sr. presidente, creio ter demonstrado quanto em minhas forças cabe, a immensa vantagem do actual accordo sobre o do sr. Corvo: e repito, fallo com este desassombro, por que fallo a verdade ao meu paiz (apoiados), e porque entendo em consciencia que s. ex.ª em nada concorreu para o erro em que se baseou (apoiados).
Resta-me agora expor á camara as rasões que teve a commissão para preferir o primeiro dos alvitres propostos ao governo.
Sr. presidente, no caso de não approvar o governo o primeiro alvitre, propunha-se a companhia a receber a somma decretada em 10 de março, e a acabar as linhas á sua custa, conservando a exploração d'ellas durante cincoenta annos, e dando em cada anno ao estado a renda de réis 21:600$000.
Alem das rasões moraes, que ha pouco tive a honra de adduzir, contra qualquer accordo, cuja base não fosse a cessação immediata e completa de quaesquer relações com a companhia, outras ha de ordem financeira, que eu vou rapidamente submetter á apreciação da camara:
Sr. presidente, a somma de 2.376:653$751 réis concedidos pelo decreto de 10 de março, confirmado pela carta de lei de 16 de julho, produziria um encargo annual durante trinta annos, e na hypothese já estabelecida de importarem os juros e amortisação em 10,29 por cento, na importancia de réis 244:557$670
Descontando era cada anno a renda de. 21:600$000 teriamos o encargo effectivo annual de .... 222:957$670
Advertindo porém, que as linhas já hoje rendem 51:00$0000 que deixaríamos de receber, seria o encargo verdadeiro de 273:957$670
(Aparte do sr. Mathias de Carvalho.)
Affirmo ao illustre deputado que me não engano...
(Aparte do sr. J. T. Lobo d'Avila.)
Se s. ex.ª se der ao trabalho de examinar o mappa geral do rendimento do estado, verá que effectivamente rendem estas linhas a somma liquida de 51:000$000 réis (apoiados).
Nem isso me parece estranho, se advertir que já no folheto do sr. Corvo se lhes attribue o rendimento liquido de 54:000$000 réis.
(Aparte do sr. Andrade Corvo.)
Eu sei que s. ex.ª era incapaz de fizer uso de qualquer dado a que faltasse o cunho official (apoiados); nem eu citei o nome de s. ex.ª, se não para que a sua muita auctoridade tornasse acreditada a minha voz (apoiados).
Tínhamos pois achado que o encargo que annualmente, e durante trinta annos, resultaria da approvação do segundo alvitre proposto seria de 273:9570670 o qual, comparado com o resultante do primeiro, na hypothese de se acabarem já as linhas, e que, como vimos, importava em 808:776$146 dava em favor do segundo alvitre a economia annual de 34:818$476
Ora, ainda quando queiramos admittir a mais desfavoravel de todas as hypotheses, isto é, a de não augmentar o rendimento kilometrico das linhas com a sua conclusão, teríamos que logo no primeiro anno teria o estado um prejuízo, privando se d'aquelle rendimento.
(Interrupção do sr. Mathias de Carvalho.)
O illustre deputado não deve imaginar que eu ignoro isso. Eu sei que muitas vezes succede abrir-se á exploração um novo traço de uma linha ferrea, e diminuir o rendimento kilometrico, porque o divisor, que é o numero dos kilometros, augmenta n'uma rasão maior do que o rendimento total da linha, que é o dividendo; mas não é isso o que acontece quando as linhas, que de ordinario terminam em um centro importante da população, se concluem (apoiados).
Quando isto succede mostram todas as estatísticas que o rendimento kilometrico cresce, e muito, durante alguns annos (apoiados).
Uma voz: - E o que se dizia nas representações ?
O Orador:-As representações faltavam contra as exigencias injustificaveis, mas não contra as que realmente se justificam (apoiados).
Contra essas não representavam os povos que não querem enriquecer-se á custa alheia (apoiados).
Uma voz: - E o governo não clamava contra os concussionarios estrangeiros?
O Orador: - E ainda quando assim fosse sou eu responsavel por isso ? (Muitos apoiados.)
O illustre deputado ha de convir em que me não cumpre responder por isso (muitos apoiados.- Vozes: - Muito bem, muito bem).
Resta-me agora, sr. presidente, apresentar á camara as rasões pelas quaes eu supponho que se trata de um verdadeiro accordo que ha de por uma vez fazer desapparecer da discussão este malfadado negocio dos caminhos de ferro de sueste.
Sr. presidente, alem dos documentos impressos no Dia-

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rio da camara, tenho presente um telegramma do nosso agente financial era Londres, em que se lê: a Considere como concluído o empréstimo Stern, com a condição porém de que seja approvado o arranjo com o caminho de ferro.
Ora, sr. presidente, eu creio que todos devemos dar credito ao que dizem oficialmente aos srs. ministros os seus agentes officiaes (apoiados).
(Aparte do sr. J. T. Lobo d'Avila.)
O sr. ministro da fazenda disse n'este telegramma, ao nosso agente em Londres, que esta só rama só seria entregue a quem de direito fosse...
O sr. J. T. Lobo d'Avila: - Essa não é a questão.
O Orador: - O governo disse que esta som m a só seria dada a quem de direito fosse, e quando essa pessoa ou pessoas se mostrarem devidamente auctorisadas para a receber, e..,
O sr. J. T. Lobo d'Avila: - Não é n'esse sentido que eu falo. A questão não é de dar o dinheiro a quem de direito for; a questão é se essas pessoas estão legalmente auctorisadas para fazer o accordo e para terminar por uma vez todas as relamaçoes (apoiados).
O Orador: - É justamente isso, e sinto que s. ex.ª não quizesse deixar me concluir. O sr. ministro da fazenda disse ao seu agente que a somma de que se trata só seria entregue a quem de direito fosse, e que se mostrasse legalmente auctorisado a receber, e a dar quitação plena, terminando assim esta questão, e impedindo futuras reclamações (muitos apoiados).
Sr. presidente, eu conheço que a camará está cansada, e que demais tenho já abusado da sua condescendência; termino pois aqui, agradecendo sinceramente a muita bonevolencia com que me escutou, e pedindo desculpa de lhe ter portanto tempo occupado a attenção (muitos apoiados).
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)
O sr. Fontes Pereira de Mello: - Chego tarde ao terreno do debate e não tenho pena. Certamente que mais cedo poderia ter obtido a palavra se quizesse ter obtido pela minha parte a esta questão um caracter político que não lhe desejo attribuir.
Entendi, e têem-no entendido commigo alguns dos meus illustres collegas que me precederam, entendi que este negocio, puramente do administração e tratado n'este campo, não me devia fornecer ensejo para fazer aggressões políticas aos membros do gabinete que se acham sentados n'aquellas cadeiras.
Geralmente não é essa a minha tendência, mas n'este objecto, ainda eu menos seguiria esse caminho"
Desejo que todos nós nos remíamos para empregarmos os nossos esforços, a fim de resolver de unia maneira definitiva e completo a questão de que se trata. Desejo cooperar, com o próprio governo que eu combato, com os illustres deputados que são meus adversários políticos, para que, de uma maneira honrosa para todos e honrosa sobretudo para o paiz, nós possamos resolver uma questão que ha tanto tempo nos incommoda.
Portanto não me apressei a tomar a palavra, e pouco tempo occuparei a attenção da camará, porque o meu objecto não é censurar ninguém; não tenho tal pretensão, não me levantei n'esse propósito; mas simplesmente fundamentar o meu voto para que se entenda bem, dentro e fora da camará, qual a rasão que o determina.
Eu congratulo-me com o governo e com a camará por chegarmos finalmente a tratar a questão preliminar das nossas finanças debaixo do ponto de vista de um accordo que melhore o credito do paiz nas praças estrangeiras. E estimo isso tanto mais quanto é certo que meio empregado é o mesmo que ha muito tempo eu sustento como impreterivel para resolver o nosso problema financeiro.
Se algum amor próprio, até certo ponto desculpável, pôde ter o homem publico, não será para estranhar que n'este momento eu me sinta verdadeiramente satisfeito por ver que as minhas previsões não tinham sido erradas, nem os meus argumentos eram infundados. É este um facto que não podia deixar de me lisonjear; mas não o quero pôr demasiadamente em relevo, para que não pareça, que qualquer sentimento de amor próprio, mais do que o sentimento de amor publico, me levam ás considerações, que por mais de uma vez tenho feito na camará sobre o assumpto em discussão.
Mas se eu tenho manifestado constantemente esta minha convicção de que só por um accordo com a companhia do caminho de ferro do sueste, e em geral com as companhias dos caminhos de ferro, nós podemos levantar e fortalecer o nosso credito nas praças estrangeiras, não se segue d'aqui, me parece, que eu seja obrigado a aceitar todo o accordo que se apresente, e ainda menos uma combinação, que nem accordo é (apoiados) a que faltam os caracteres mais significativos de uma operação d'esta natureza, que exprimam as condições aceitas pelo lado do governo e a acquiescencia das partes interessadas, que é exactamente o que não consta de nenhum dos documentos até agora apresentados (apoiados).

Bem sei que se diz, que do que se trata agora, é de dar uma auctorisação para se fazer esse accordo, mas não me parece isso exacto na presença do projecto que se discute. Auctorisação daria eu em termos licitados e precisos, porque com ella o governo poderia discutir com as partes interessadas e obter as vantagens possíveis; no caso presente está tudo discutido, e todavia não se prova que uma das partes contratantes tenha aceitado as condições do accordo que o governo trouxe ao parlamento (apoiados).
É incontestável que os documentos que se acham publicados não são revestidos de caracteres e circunstancias que produzam a convicção de que todos estejam perfeitamente satisfeitos as estipulações que se acham aqui exaradas.
Eu vejo aqui a proposta de um cavalheiro, que conheço demasiadamente, que é o sr. Julius Beer, e quando digo demasiadamente, não faço n'isto uma insinuação, nem costumo fazer insinuações a ninguém; roas conheço bem esse cavalheiro, porque quando contratei com a companhia do caminho de ferro de sueste a novação de 14 de outubro, foi ella discutida entre o governo de que eu fazia parte e/o cavalheiro a quem me referi; e quando, mais tarde, a J companhia não pôde cumprir as estipulações convencionadas e formuladas no contrato, foi ainda o sr. Julius Beer que tratou cate negocio, e não pode chegar de modo algum a um accordo com o governo sobre o pagamento d'aquellas letras que se pretendiam reformar. Depois disto, como já disse â câmara o meu collega e amigo, o sr. Corvo, não me consto, nas diversas transacções que se emprehenderam entre o governo e a companhia, relativamente á questão do caminho do forro de sueste, não me consta, digo, que o nome do sr. Julius Beer entrasse mais em qualquer convenção ou accordo para este negocio; pelo contrario eram outros os nomes auctorisados, eram outras as pessoas que se apresentavam munidas dos competentes poderes.
Eu ignoro se essas pessoas na actualidade estão ainda revestidas da auctoridade legal para tratar d'este negocio em nome dos interessados. Em todo o caso o que consta é que o cavalheiro que assignou o telegramma não parece que tivesse poderes sufficientes para tratar com o governo portuguez. Mas se é preciso uma prova mais real e mais completa, de que o sr. Julius Beer não está auctorisado pelos interessados da companhia do caminho de ferro de sueste para negociar com o governo em nome d'elles, permitta-se-me que eu me refira á sua própria declaração (apoiados), inserta no telegramma que elle expediu ao nobre ministro da fazenda, o sr. conde de Samodães, quando diz que = na sua capacidade particular é que se dirige ao governo, e faz a sua proposta =.
Já se vê que elle próprio quiz arredar de si toda a rés-

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ponsabilidade que podesse provir de fazer esta communicação e esta proposta, que porventura mais tarde não poderia ser aceita.
Portanto está provado que o sr. Julius Beer não se julgou auctorisado para representar perante o governo portuguez os interessados do caminho de ferro de sueste (apoiados).
Sinto que depois d'isto, e perante um documento d'esta ordem, a que faltam as condições indispensaveis para produzir os devidos effeitos, sinto, repito, que se estabelecesse uma correspondencia, que levou por fim á aceitação de um accordo que não apparece em parte alguma (apoiados). Quando no remate de toda esta serie de telegrammas eu vi um do nobre ministro da fazenda, ou para melhor dizer do governo, dizendo: "Está conclui do o accordo. Recebi a sua aceitação official. 27 de junho de 1869. - Conde de Samodães." Procurei debalde nos documentos anteriores o accordo a que se refere o governo n'este telegramma, e não encontrei nada. Encontrei, é certo, uma proposta de um cavalheiro que diz que não tem a capacidade necessaria para a fazer, porque é elle proprio que o declara. Encontrei uma declaração feita por parte do governo, dizendo que se congratula com a realisação do accordo. Encontrei tudo isto; mas não encontrei o accordo. Peço ao governo e a todos os srs. deputados, que se tal accordo aqui existe, tenham a bondade de me indicar, porque serei o primeiro a modificar n'este ponto a minha opinião.
Ainda por este documento vejo que o accordo versa sobre uma proposta que tinha a alternativa de dois alvitres, na qual o governo era convidado ou a dar 1.850:000 libras aos interessados do caminho de ferro, para elles desistirem de todas as reclamações, ou conceder por espaço de cincoenta annos a exploração do dito caminho, dando elles 4:800 libras de renda annual.
Não entro agora no exame comparativo destas duas propostas. Para chegarmos ao resultado que pretendemos obter, isto é, para chegarmos ao grande desideratum de facilitar as praças estrangeiras ao credito portuguez, creio que qualquer das duas seria aceitavel. A quentão de comparação para mim é secundaria; sem embargo de ter visto que o nobre relator da commissão fez disto o assumpto principal do seu discurso.Permitia me porém v. ex.ª que de passagem observe que vi com sentimento, sem ser repellido por parte do governo, nos diversos telegrammas que se acham aqui transcriptos, a declaração do gr. Beer, quando diz que =depois de feitos estes arranjos, as actuaes letras do caminho de ferro, e outros documentos do mesmo caminho, serão annulladas,
Eu tambem assignei um accordo com o meu amigo e collega, o sr. Andrade Corvo, acerca do caminho de ferro de sueste, mas esse accordo já eu o expliquei n'outra occasião; tinha por fim satisfazer a uma rasão de equidade da qual resultaria grande vantagem para o paiz, porque tornaria mais accessiveis os capitães estrangeiros ao governo portuguez.
Apesar de ter feito esse accordo, nunca reconheci á companhia o direito de exigir do thesouro qualquer somma, porque desde que o governo não é devedor a essa companhia do caminho de ferro, que não tem credito reconhecido sobre o mesmo governo, não ha quitação possível; e eu desejaria que o governo, quando disse que aceitava a proposta feita pelo sr. Beer, declarasse alguma cousa em relação a esta quitação de que se falla, porque não era possivel que podessemos aceitar n'estes termos o accordo para concluir definitivamente a questão.
Podemos inspirados por um principio de equidade, podemos no interesse do credito do paiz chegar a um accordo com a companhia, mas não podemos aceitar o principio de que nos será dada esta quitação por essa divida que não contrahimos!! (Muitos apoiados.)
Mas permitta-me v. ex.ª que diga que não posso explicar a mim proprio algumas phrases pronunciadas tanto pelo sr. relator da commissão, que acaba de fallar, como pelo nobre ministro da fazenda que ha pouco tomou a palavra quando respondeu ás observações que se têem feito n'esta camara, dizendo que não ha inconveniente em se aceitar um accordo d'esta forma, porquanto o governo portuguez se reserva o proposito de não entregar as sommas que se votarem senão aquelles que se mostrarem legalmente habilitados para as receberem.

Foi este um dos argumentos que foram apresentados tanto por parte do governo como do illustre relator da commissão, argumento que foi respondido pelo sr. Lobo d'Avila, e que de maneira nenhuma satisfaz as duvidas e aos escrupulos que se têem manifestado por parte da opposição (apoiados).
É claro que o governo não póde entregar qualquer somma que seja auctorisada a pagar aos interessados no caminho de ferro de sueste senão a quem de direito for.
E agora, depois que ha um tribunal liquidatario, ou um liquidatario official, é evidente que é a este que ha de ser entregue. E as preferencias entre uns e outros credores hão de ser disputadas e resolvidas em conformidade com a legislação ingleza.
Mas a nossa questão não é essa, é outra.
O que nós dizemos é que o parlamento, votando este projecto de lei como está redigido, vota um accordo com quem não mostrou que podia accordar comnosco (apoiado"), porquanto os individuos interessados não exhibiram documento algum que provasse que queriam vir a um accordo comnosco, e a um accordo n'estes termos.
Esta é a questão, este é o ponto controvertido! Salvas as duvidas que todos podem ter, e que eu tenho sobre um ou outro ponto do accordo de que se trata.
Estou seguindo as indicações traçadas, e o caminho esboçado pelos cavalheiros que me precederam no debate. Mas a despeza que este accordo traz comsigo, e que orça, segando a minha opinião, por 404:000$000 réis, não póde ser justificada sem uma grande rasão.
A grande rasão delle é a exigencia do banqueiro Stern, declarando que não póde fazer as emissões do emprestimo sem se realisar o accordo com a companhia do caminho de ferro de sueste.
Foi isto o que eu julguei ouvir dizer ao sr. ministro da fazenda.
Ora, peço licença para recordar á camara o estado d'esta questão.
Nós votamos uma auctorisação ao governo para fazer um emprestimo em diversas hypotheses, e com encargos definidos; mas essa auctorisação versava sobre um contrato feito pelo governo com a casa Fruthling & Goschen, o qual contrato, datado de 16 de abril, foi junto á auctorisação como documento.
Todos sabem que a casa Frabling á Goschen estipulou n'esse contrato que se pagaria aos portadores de obrigações do caminho de ferro de sueste, e depois n'outro contrato sem data a quem de direito fosse uma certa somma.
Essa somma era a mesma que o governo, por decreto de 10 de maio do corrente anno tinha determinado que fosse concedida aos interessados, com um acto de equidade, e interpretando os sentimentos generosos da nação portugueza.
O contrato Goschen foi combatido por mira, mas foi approvado pela maioria implicitamente, porque se declarou que as condições que estavam consignadas nas bases da auctorisação votada ao governo comprehenderam o contrato de que se tratava.
Depois d'isto desejaria eu saber, e não póde ser segredo para ninguem, qual foi o motivo pelo qual o governo, depois de feito o contrato de 16 de abril, poz de parte esse contrato (apoiados), e foi contratar com a casa Stern (apoiados).
Creio que os representantes do paiz têem direito de per

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guntar ao governo estas cousas (muitos apoiados), e n'um systema de publicidade não se póde passar por alto sobre assumptos tão importantes como este de que se trata, sem se explicar de uma maneira clara e definida qual foi a rã são por que se não levou a effeito o primeiro contrato.
Se alguem teve culpa, se d'isso tem alguem responsabilidade, é bom saber-se se é a casa Goschen, se é o governo portuguez. Se a houve, estimaria muito que fosse da casa Goschen, e não do governo a falta.
Não é possivel que o governo se lembrasse de ir contratar com outra casa bancaria sem ter motivos plausíveis para se desligar de um contrato que espontaneamente tinha feito, e que estava implicitamente approvada nas duas casas do parlamento, e auctorisado por uma lei.
V. ex.ª sabe melhor que ninguem, e sabe a camará toda, que esse contrato, desde que não se verificasse em certa hypothese, dava logar á multa, que me parece ser de 258:500$000 réis. Entretanto v. ex.ª e a camara do certo não deixarão de confirmar que se tem dito mais ou menos vagamente que não tendo a casa Goschen pela sua parte rompido o contrato que tinha feito com o governo, intentava uma acção de perdas e damnos.
Eu não me pronuncio de modo algum sobre este assumpto gravissímo, reservo a minha opinião sobre este ponto; o que eu desejo sinceramente é que se houve falta de alguem, fosse da parte do banqueiro. N'isto vae a dignidade da nação e mesmo o seu ínteresse immediato, porque nós querendo acabar com as difficuldades que existem relativamente ao caminho de ferro, será bom que não vamos crear outras iguaes, ou maiores, em consequencia da má direcção que se der a este negocio.
Sr. presidente, eu desejava que o governo se explicasse, e que não ficasse em duvida a camara sobre o alcance que isto póde ter.
Eu creio que o governo, mudando de banqueiro para contratar, teve rasões serias, e de certo rasões de interesse publico. Nunca attribui, mesmo aos meus adversários políticos, os mais decididos, um sentimento que não seja digno e proprio da posição em que se acham collocados. Não posso suppor que o governo procedesse sem rasões plausiveis, mas essas rasões é que temos direito de saber, e o paíz inteiro, e são tanto mais precisas quanto o sr. ministro da fazenda acabou de dizer ha pouco, com espanto meu, que não se julgava obrigado a dar mais explicações á camara, porque esta ha dias votou uma moção em que se dizia: "A camara, ouvidas as explicações do governo, passa á ordem do dia" (apoiados).
Esta rasão é deploravel, não póde ser apresentada por um ministro da corôa, porque os ministros constitucionaes não se podem esquívar nunca a dar explicações que lhes sejam pedidas em termos regulares pelos representantes do paiz (apoiados).
Sinto, apesar de ver representado o governo, que, tratando-se nada menos do que de uma operação exclusívamente financeira, se ausentasse d'esta casa o sr. minístro da fazenda.

Uma voz: - Está a fallar na outra casa do parlamento.
O Orador: - Era melhor que estivesse n'esta a ouvir.
Eu não tenho culpa de que as discussões se complíquem a ponto de tornar difficil ao governo a sua comparencia em ambas as casas do parlamento, mas emfim está representado o gabinete, e não tenho duvida de continuar, sentindo, sem comtudo fazer censura por isso, a ausencia do sr. ministro da fazenda; estimarei muito que o sr. ministro das obras publicas me queira honrar com a sua resposta.

Mas eu peço licença para reflectir á camara, que ainda ha outra rasão que me convence mais ainda do que já estava, de que tudo isto foi tratado com uma certa precipitação, que não é das melhores cousas para os negocios publicos. E digo que foi tratado com precipitação, porque do modo por que está escripto o artigo 1.º da proposta de lei podem-se tirar illações que não imagino que estivessem na mente dos srs. ministros.
O artigo 1.º da proposta de lei diz:
"Realisado na sua totalidade o emprestimo a que se refere a carta de lei de 16 de julho de 1869, fica o governo auctorisado a pagar á companhia do caminho de ferro de sueste, ou a quem de direito for, a somma nominal de libras 1.850:000 em bonds de 3 por cento."
E o accordo que o governo aceitou firmado pelo sr. ministro da fazenda diz o seguinte:
"O conselho de ministros resolveu aceitar o primeiro alvitre do seu telegramma, isto é, pagar 1.350:000 libras em inscripções de 3 por cento do novo emprestimo, etc."
Eu não faço aos meus collegas a injuria de acreditar que suppõem que inscripções e bonds é a mesma cousa. Não é a mesma cousa nem é o mesmo o valor que têem no mercado.
(Interrupções que não se perceberam.)
Peco-lhes que consultem o emprestimo que eu fiz em 1867, onde se estipulou que uma parte d'esse emprestimo fosse em títulos de divida interna, isto é, em inscripções de 3 por cento a 41 e outra parte em bonds a 38 1/2, Já vê a camara a importancia que tem este negocio.
(Interrupção do sr. Correia de Barros, relator da commissão que se não percebeu.)
Mas se o illustre deputado percorrer a escala da cotação do stock exchange, e a escala da cotação dos fundos internos, acha quasi sempre a não haver uma circumstancia especial, como agora, e que eu explicarei d'aqui a pouco para responder aos 34 3/4 a que se referiu o illustre relator da comissão, os fundos externos mais baixos que os internos. Por consequencia desde que não é uma e a mesma cousa, desde que os valores são diversos, desde que os interesses variam aceitando um ou outro alvitre, como é que o governo diz que o conselho de ministros resolveu aceitar o alvitre de pagar em inscripções a 3 por cento, e na proposta do lei se diz que é o governo auctorisado a pagar á companhia do caminho de ferro de sueste em bonds de 3 por cento?
Eu paço á camara e á commisão que reflictam n'isto, o que visto que querem approvar o accordo, aínda mesmo sem saber se os ínteressados estão satísfeitos, seria para, desejar que houvesse harmonia entre a declaração que o sr. ministro da fazenda fez, por parte do governo, e a proposta de lei que se discute (muitos apoiados).
Tenho outra observação a fazer em que não sei se a commisão e o governo pensaram.
O que tudo isto porém revela é a pressa com que estas cousa têem sido feitas, a qual penso que não póde ser imputada á opposição, A opposição tem muitas culpas, muitas faltas e responsabilidade por muitas cousas, mas não se lhe póde ímputar a facilidade com que esto negocio tem sido tratado, a promptídão com que tem sido aceítas as condições apresentadas, e o pouco cuídado que tem havido em fornecer os documentos de modo que uns combínem com outros o não produzam estas antinomías pouco aceitaveis.
Diz a proposta: "Realisado na sua totalidade u emprestimo a que se refere a carta de lei de 16 de julho de 1869, fica o governo auctorisado a pagar á companhia do caminho de ferro de sueste, ou a quem de direito for, a somma nomínal de 1.850:000 libras esterlinas em bonds de 3por cento, com o juro desde l de julho de 1869 em diante.
Os termos do artigo são pouco mais ou menos os do artigo 4.º do contrato Goschen, salvo a modificação da somma.
A carta de lei de 16 de julho diz que =o governo fica auctorísado a levantar um emprestimo até á somma de libras esterlinas 4.000:000=; está claro que o governo estava no seu direito de levantar 3.000:000 libras esterlinas, mas a auctorisação para os 4,000:000 libras não caducou, e quando vejo que esta proposta não diz que a somma n'elle marcada ha de sair da auctorisação concedida por carta de

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lei de 16 de julho, pergunto se alem da referida auctorisação poderá o governo emittir mais a somma de 1.850:000 libras?...
O sr. Correia de Sarros: - Queria chamar a attenção de v. ex.ª para o seguinte (leu).
Isto prova que o pensamento da commissão é este; não ha nada a addicionar.
O Orador: - A letra da proposta, que ha de ser a letra da lei é outra; a letra refere-se á auctorisação da carta de lei de 16 de julho de 1869. Diz o artigo 1.º:
" Realisado na totalidade o empréstimo a que se refere a carta de lei de 16 de julho de 1859, fica o governo auctorisado a pagar á companhia do caminho de ferro de sueste, ou a quem de direito for, a somma nominal de 1.850:000 libras esterlinas em bonds de 3 por cento."
Se esta auctorisação passar como está, ainda assim os interessados no caminho de ferro não podem receber senão depois de realisados os 4.000:000 esterlinos. Diz-se ali que só depois de realisado o emprestimo na sua totalidade. Será paga á companhia do caminho de ferro de sueste a somma de 1.850:000 libras em bonds. Está claro que depois de realisada a auctorisação não ha mais bonds nenhuns provenientes d'ella, estes bonds são outros.
Pode ser que isto pareça pequeno, mas em uma lei d'esta natureza não o é. Acredito que a idéa não é essa, por que sería uma burla, se é verdade que se fez um emprestimo por 3.000:000 esterlínos, porque o parlamento por ora desconhece tudo isto (apoíados). Estamos discutindo por hypotheses. O governo ainda não disse o modo por que usou da auctorisação. O sr. ministro da fazenda fez mais; declarou que o não dízia (apoíados).
Creio que quando se declara isto do banco dos srs. ministros posso argumentar com as supposições que a lei de 16 julho e a proposta auctorisam.
Suponhamos que o governo tinha usado por ínteiro (não sei se usou) da auctorisação que lhe foi concedida, supponbamos que eram 4.000:000 esterlinos os contratados com Stern, como se tinha contratado com Goschen. A proposta de que se trata não auctorisa a ir alem dos bonds correspondentes a 4.000:000 libras esterlinas, E necesario portanto redigir isto de outro modo, porque da maneira que está não corresponde á idéa da maioria da commissão nem do governo, porque creío que o governo não tenciona fazer nova emissão; e se me engano, então é necessario vir á camara pedir outra auctorisação para a junta do credito publico poder crear novos bonds.
Isto o que prova é que negocios d'esta importancia não se decidem em uma sessão permanente, quando temos estado quinze dias sem fazer cousa nenhuma (muitos apoiados).
Dito isto, peço licença para observar aínda ao sr. relator da commissão, cujo talento reconheço, e cuja dedicação admiro, que me não parecem fundados os argumentos com os quaes o illustre deputado pretendeu provar que em virtude das disposições anteriores, e em virtude das votações da camara, estava decidído que se devia entregar á companhia do caminho de ferro de sueste o deposito dos réis 90:000$000 ou 20:000 libras esterlinas que a companhia tínha feito.
Peço licença ao illustre deputado, cuja boa fé e illustração reconheço, mas que reúne a esta qualidade uma dedicação politica, que o leva ás vezes a certas aberrações que só se explicam pelo desejo que o anima de ser agradavel ao governo; peço licença para lhe dizer, repito, que a commissão n'este ponto é mais ministerial do que o proprio ministerio (apoiados).
O governo nunca teve essa pretensão. Pelo contrario, o sr. conde de Samodães, e quando digo o sr. conde de Samodães, digo o gabinete, sustentou sempre que a questão do deposito tinha de ser submettida á deliberação do corpo legislativo. E porque dizia elle isto? É porque queria entregar o deposito? Pelo contrario, é porque entendia, e muito bem, que não estava auctorisado para isso, nem podia ser entregue de modo algum (apoiados). Agora temos de restituir essas 20:000 libras com os juros vencídos e não pagos, os quaes hão de necessariamente juntar-se ás outras sommas que constituem o encargo da concessão que se vae fazer.
Desde que a companhia deixou de cumprir o contrato que fez com o governo, perdeu o direito ao deposito (apoiados). E quem pensou nunca em o restituir? Só agora se propõe essa restituição, quer dizer, um favor novo, que se vae fazer áquella companhia, e que vamos acrescentar a outros que se lhe tem feito (apoiados).
Se tudo isto é preciso, muito bem, mas não se diga que ha obrigação de fazer tal restituição, e ainda menos que pelas resoluções anteriores da camara o governo está auctorisado a entregar-lhe tal somma, porque não é exacto (apoiados).
Ora, se isto assim é, permitta-se me que diga que é mais uma rasão que tenho ainda para desejar saber as condições do contrato Stern, e declaro que conscienciosamente, ainda que não tivesse outras considerações que actuassem no meu animo, não podia approvar esta proposta definida como é, sem conhecer as condições d'esse novo contrato.
Pois nós temos um contrato que está feito por este governo com uma casa respeitável, contrato approvado por uma lei, e depois d'isto vamos contratar com outro banqueiro, quando aquelle não exigia de nós mais do que réis 2.376:000$000, e este exige agora que paguemos, alem da outra somma, a de 454:000$000 réis?
Não tenho eu direito, não tenho obrigação, como representante do paiz, como zelador da bolsa publica, de perguntar ao governo qual é a rasão por que se faz esta mutação de banqueiros? Qual é a rasão por que se poz de parte o contrato que não exigia esta somma? Qual é o artigo do contrato Stern que obriga o governo a fazer esta concessão ao caminho de ferro? Tudo isto é necessario, tudo isto é indispensavel, antes de approvar uma proposta nos termos em que esta foi concebida.
Pois pode-se pedir auctorisação para pagar mais réis 454:000$000, e não se quer dizer a rasão por que isto é? Isto não se faz. De mais a mais diz-se que o contrato está concluído e acabado. Querem considera-lo negociação pendente?
Para se fazer esta mudança, para se passar de um banqueiro que não exigia esta somma, para outro que a exigia, preciso habilitar-me, com as rasões, que determinam esta mudança, a fim de saber como hei de votar.
E 1.850:000 libras o que se tem de pagar, segundo a estipulação do contrato. Isto tem de ser pago depois de realizado o emprestimo, por consequencia tem de ser pago em bonds, ou em inscripções, como quer o governo, e como queria o sr. conde de Samodães, antes do sair do governo. Note-se bem, que esto pagamento não se verífica, se não depois do emprestimo se realisar, e sabe v. ex.ª o que ha de acontecer? Acontece que os fundos hão de subir, porque os fundos na vespera de uma emissão importante estão vergando debaixo da presão que o emprestimo em perspectiva está exercendo sobre elles.
Por consequencia, quando se realisar o emprestimo, ha de acontecer que os fundos hão de subir, e portanto não sei por que preço estarão cotados, quando se fizer o pagamento, porque só depois do emprestimo concluído é que este pagamento tem logar.
Eu supponho por hypothese que os fundos estejam a 34, e oxalá que subam a mais de 34 3/4, que é o preço actual, como nos annunciou o sr. deputado relator da commissão. E, de passagem, peço licença para dizer que este preço é nominal.
Quando se nota na cotação dos nossos fundos, como agora, o preço de 33 a 35, esta enorme differença, esta oscillação, longe de ser uma vantagem, significa descredi-

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to, e sobretudo significa uma operação em perspectiva, que está dependente de não exceder um encargo fixado antecipadamente. Não sei se me explico.

Quando isto é assim, faz realmente pena, ver um homem illustrado e zeloso, como é o illustre relator da com missão, (O sr. J. T. Lobo d'Avila : - E ingenuo) (riso.), vir para aqui dizer, com muita satisfação, que os nossos fundos estão a 34 3/4. Sempre queria saber, se o illustre deputado imagina que podem vender se alguns fundos por esse preço actualmente em Londres?

Mas supponharmos que os fundos, quando se fizesse o pagamento aos interessados, estavam a 34; 1.850:000 libras nomínaes valeriam 629:000 libras, ou 2.830:500$000 réis, isto é, 454:000$000 réis a mais do que primitivamente se tinham votado, lato é clarissimo; o mais são subterfugios.

E note-se bem que o illustre deputado calcula a 32, e calcula pouco bem (para não dizer que calcula muito mal, porque não é de suppor que, estando os fundos a 34 3/4, como diz, depois de feito o emprestimo venham a 32.

E a proposito peço licença para observar que não é pelo preço do emprestimo que se ha de pagar esta quantia, e parece me que não tenho podido explicar bem a importancia d'este ponto. Não é pelo preço do emprestimo, como era no contrato Goschen, é pelo preço por que, estiverem os fundos depois de realisado o emprestimo. E um X, é uma incognita, mas que ha de ser maior do que o illustre relator calcula.

Pois eu para auctorisar estes 454:000$000 réis preciso ser habilitado com os esclarecímentos necessarios, e não estou habilitado, e de mais a mais diz-se-me, por parte do governo, não lhe dou esses esclarecimentos, quando é certo que se diz; e eu não sei se é verdade, que o governo mostrou na commissão o contrato Stern.

Se isso é verdade, e eu não quero continuar a suppo lo, é provavel mesmo que não seja verdade...

Algumas vozes: - Quem cala consente.
O Orador: - Mas se isso é assim, então já comprehendo como é que no seio das commissões se levantam as críses. As commissões é que são a camara. Toda a franqueza e publicídade na presença dos amigos; na frente dos adversarios nada d'isso (muitos apoiados),

Não quero continuar nobre esta hypothese, que póde ser falsa, porque se eu soubesse que isto era verdade, então iria muito alem, porque não ha palavras sufficientes para fulminar um tal procedimento (muitos apoiado").

Eu tinha muita cousa a dizer, mas confesso a v. ex.ª que nem o adiantado da hora, nem o estado da sessão, nem a minha saude, que geralmente é boa, mas que hoje está um pouco affectada, me permittem fallar muito mais.

Tinha muito que dizer, mas vou resumir em poucas poucas palavras os principaes argumentos que determinam o meu voto.
Eu quiz simplesmente fundamentar o meu voto, e declaro que aceito plenamente a idéa de fazer um accordo. Tenho-a sustentado constantemente; e antes de passar adiante perguntarei ao governo, porque ha interesse em sabe-lo, qual é a natureza dos compromissos que o governo tem com a companhia do caminho de ferro do norte (muitos apoiados).

Desejo saber quaes são as suas intenções em relação ao caminho de ferro do norte (muitos apoiados). (O sr. Ministro das Obras Publicas: - Peço a palavra.)

Dizendo isto, o meu fim é unicamente dar ensejo ao governo para elle se explicar a este respeito, para apresentar as suas idéas sobre um ponto importantíssimo, e que se liga intimamente com o assumpto de que se trata.

Todos sabem que o governo portuguez está desgraçadamente excluido da praça de Paris. Não está excluido depois das ominosas administrações esbanjadoras; não é d'essa epocha; está excluido mais modernamente (muitos apoiados). Todos sabem isso, e todos sabem as difficuldades que deve haver na praça de Londres para fazer este emprestimo,
em vista da guerra que nos move a praça de Paris. Por consequencia saibamos qual é a opinião do governo a este respeito.

O que eu desejo é que peja uma opinião que sustente em primeiro logar a dígnidade nacional e em segundo loga r os mais caros interesses do paiz (apoiados). Aquelle expediente que for melhor para os interesses publicos é o que eu desejo que o governo adopte e a assembléa approve.

Por consequencia, repito, que se faça o accordo, mas não me julgo por isso obrigado a aceitar todos os accordos possiveis e impossíveis. Esta mesma dualidade de accordo indica me que, se em logar do governo responder por um telegramma, que não discuto, porque nos telegrammas não se discute facilmente, respondesse de outra maneira, ou fosse por intervenção do nosso agente financeiro em Londres ou fosse por intervenção de um agente da casa bancaria que estivesse aqui ou que cá viesse, talvez se tivesse podído chegar a um resultado melhor.

Por todas estas rasões, sr. presidente, não posso votar a proposta de lei e mesmo quando nenhuma d'estas rasões existisse, a proposta de lei não está redigida de fórma que corresponda aos desejos do governo e aos desejos da camara (apoiados).

Vozes: - Muito bem, muito bem.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Cacheiros e Menezes):- Pedí a palavra para responder a uma pergunta que o illustre deputado que acaba de fallar dirigiu ao governo.

Perguntou o illustre deputado quaes são os compromissos que o governo tem com o caminho de ferro do norte.

Declaro a s. ex.ª e á camara que o governo não tem compromissos alguns com o caminho de ferro do norte.

O governo deseja que a questão, ou antes as reclamações, porque não ha questão, da companhia do caminho de ferro do norte se resolvam equitativamente. Desejara poder satisfazer a algumas das reclamações de auxilio que fez a companhia do caminho de ferro do norte, mas compromissos não tem nenhuns.

Parece me que assim tenho respondido ao nobre deputado.

O sr. Secretario (Holbeche): - A commissão de redacção não fez alteração no projecto n.º 48. Vae expedir-se para a outra camara.

O sr. Presidente: - Considerando a resposta do sr. ministro das obras publícas unicamente como um incídente n'esta discussão, eu dou agora a palavra a lavor ao sr. Costa e Almeida.

O sr. Costa e Almeida: - Tendo chegado esta manhã de fora d'esta cidade, d'onde me tinha retirado por motivo muito grave de saude, e sabendo que estava dada para discussão esta maioria tão grave e importante, pedi a palavra sobra ella; mas n'esta occasião, e succedendo-me a um orador tão distíncto e illustra do como é o sr. Fontes Pereira de Mello, não é de certo minha intenção entrar profundamente na questão que se debate, quentão que considero plenamente resolvida, quer da parte da maioria, quer da parte da opposïção, pelas explicações e pelos discursos dos íllustres deputados que têem fallado por uma e outra parte, porém aproveitar unicamente o ensejo para explicar o meu voto na auctorisação que já foi concedida ao governo por uma proposta hoje convertida em lei; auctorisação que eu assignei como membro da commissão de fazenda, não me tendo sído possível na occasião em que ella se discutiu explicar a rasão do meu voto; e de passagem farei algumas considerações sobre varios pontos, que foram tocados pelo meu illustre amigo o sr. Ferreira de Mello e outros oradores que se lhe seguiram.

O meu illustre amigo, o sr. Ferreira de Mello, occupando se de combater a proposta em discussão, não fez mais do que repetir as idéas quo tinha apresentado por ocasião de se discutir a outra que foi depois convertida em lei apresentou as mesmas duvidas, e todas ellas dizem respeíto a um ponto de vista jurídico, que s. ex.ª largamente des-

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envolveu na commissão de fazenda, e depois no debate que então houve n'essa camara.
Esse ponto de vista jurídico devo dizer que nunca me fez peso, nem na discussão que houve na commissão, nem n'aquella que houve na camara.

O illustre deputado entende que a maneira como estava redigida a auctorisação já votada, e já convertida em lei, e como o está esta que se propõe agora, obriga o paiz a sacrifícios graves, sem que faça desapparecer aã difficuldades; porque, para os fazerem desapparecer, era mister que todos os interessados, e não apenas uma parte d'elles, na questão do caminho de ferro viessem a um accordo, e se declarassem satisfeitos.

A questão para mim nada tem que ver com a companhia do caminho de ferro, nem cora os interessados n'ella; a quentão para mi m, tanto na occasião em que se discutiu a auctorisação que foi convertida em lei, como com relação á proposta que faz objecto da actual discussão, é inteiramente differente, é a questão do empréstimo e nada mais.

Quando na commissão de fazenda se suscitou essa questão da indemnisação que então se queria conceder aos interessados no caminho de ferro de sueste, e que o meu illustre collega e amigo, o sr. Ferreira de Mello, levantou difficuldades, que reputava serias, relativamente á verificação d'esse accordo, por não achar bem expressos os termos em que essa concessão devia ser feita, para ser eficaz, isto é, para satisfazer ás exigências dos interessados n'aquella companhia, eu emitti uma opinião diversa, fundando-me em que se não tratava de fazer accordo nenhum com os interessados na companhia do caminho de ferro; mas que se tratava apenas de realisar um pensamento de equidade, tendo-se em vista desviar as difficuldades que obstassem á realização do empréstimo; e claro anta que, tendo eu combatido sempre esta espécie de accordos com quaesquer companhias, e especialmente com aquella, isto por diversas vezes e em diversas occasiões, não podia subscrever a uma tal condição, a uma tal clausula debaixo do ponto de vista de accordo, mas sim unicamente como elemento necessário para a realisação do empréstimo que se tratava da auctorisar, e para remover as dificuldades que se suscitavam contra o mesmo empréstimo; e é ainda hoje debaixo do mesmo ponto de vista que encaro esta quentão.

Não considero que haja aqui accordo algum, e por consequência desapparece para mim essa idéa da discussão. Este é o meu modo de ver individual, que pôde ser que não seja o modo de ver dos meus collegas da camara, nem mesmo dos meus collegas da commissão; mas que eu tinha necessidade de manifestar aqui n'esta occasião, para que ficasse bem explicita a maneira por que eu tinha comprehendido esta questão da primeira vez que se agitou.
Não considerando isto coroo um accordo para mim desapparece immediatamente a dificuldade que tanto assenta os illustres deputados que se sentam d'aquelle lado da camara (apoiados).
Os illustres deputados entenderam que não ha accordo, onde não ha representação de todos os interessados, e que faltando esta representação que não vem consignada unicamente pela declaração de um indivíduo que se diz representante até certo ponto dos interesses na companhia nem mesmo pelo liquidatário official, que representa a parte da companhia que procedeu á liquidação voluntária, não se pode conseguir o fim que se desejava obter por esta concessão. Porém., eu, collocado n'outro ponto de vista e não considerando isto accordo de qualidade alguma; mas sim uma restituição de capitães com os quaes o governo se não podia locupletar, não quero saber se os interessados da companhia aceitara ou não esta restituição.
O illustre deputado, o sr. Dias Ferreira, entende que esta questão não é puramente de administração e financeira, e que não podia ser tratada senão no campo político e que se não pôde separar a questão política da questão financeira.
Para isto citem o facto do governo ter olhado outr'ora este mesmo ponto pelo lado político, pelo motivo de ter publicado as representações que de todos os ângulos do paiz eram dirigidas contra os argentarios estrangeiros.
S. ex.ª acrescentou mais, que todos esses de desacreditarem poderiam divergir d'este ponto, menos o ministério onde se sentasse o sr. bispo de Vizeu.
Não sei o que tem que ver aqui a questão política com a questão financeira. Nunca devemos misturar estas duas cousas.
Para que se ha de olhar esta questão através de um prisma ordinariamente apaixonado, como é o prisma político?
O illustre deputado, o sr. Dias Ferreira, que sinto não ver presente, acrescentou que não sabia como havíamos de alentar o paiz para as medidas que vão ser adoptadas, alludindo ás medidas de impostos, e referiu-se ao que tinha publicado um jornal como sendo a expressão das idéas do actual sr. ministro da fazenda com relação ao seu systema financeiro, o que não repetiria para não comprometter o credito do paiz.
Não sei qual seria mais eloquente e mais efficaz para o propósito do i Ilustre deputado, se a repetição do que se tinha escripto n'aquelle jornal, ou as reticências em que o illustre deputado deixou ficar este ponto; achava mais leal e sincero que o nobre deputado fizesse uma interrogação franca ao illustre ministro sobre se eram ou não verdadeiras as idéas attribuidas ao ministro com relação ao systema financeiro, do que appellar para este campo, certamente desagradável, que s. Ex.ª escolheu (apoiados}.
O illustre deputado disse ainda:
"Desde que entrou a economia e a moralidade no governo é que se ouve fallar na bancarota."
Eu registo esta confissão, porque até aqui a bancarota existia com ameaça permanente e constante, mas disfarçada. Desde que continuámos seguindo os exemplos já de tão longe apontados, e somente quando os successos políticos foram desvendando aos olhos do paiz o estado das nossas finanças é que o espectro da bancarota appareceu com uma ameaça constante e patente.
Entendo que não é anti-financeiro fazer ver o grave risco que correm as nossas finanças e o nosso estado social, mesmo descrevendo com singeleza, mas com nudez e verdade o desgraçado estado em que elle se acha.
O illustre deputado ainda acrescentou que o que o atormentava menos era o déficit e a divida fluctuante, porque mais o affligia o estado da paralyeação geral que se encontra em todas as manifestações da vida social do paiz. Mas isto não se pode attribuir a um ministro nem ao systema financeiro d'esse ministro, e sim às circunstancias geraes quasi de todos conhecidas e que já foram notadas quando o illustre orador, a que me refiro, era ministro. Então nós desenhámos em largos traços e fizemos sentir as graves circunstancias em que o paiz se encontrava e o entorpecimento geral que havia.
O sr. Dias Ferreira fez notar que ninguém ainda tivesse desmentido as asserções que se dizia terem sido proferidas pelo sr. conde de Samodães com relação á guerra que se diz feita pela commissão de fazenda, especialmente pelos dois cavalheiros que hoje são ministros.
Uma vez que o sr. conde de Samodães não tem assento n'esta camará e eu não sou par do reino, mas sim deputado, entendo do meu dever esclarecer este facto e dar as mais amplas informações á camará sobre o que ha de verdade n'estes boatos.
Se o sr. conde de Samodães disse que lhe tinha si do movida a guerra na commissão, e que especialmente os dois membros d'ella, que hoje se sentam nos conselhos da coroa, lhe faziam uma guerra pertinaz, parece me que exagerou demasiadamente o facto. Não podia deixar de haver uma certa critica dos actos financeiros do ministro, quando esses actos eram submettidas á apreciação da commissão de fazenda.
Nunca houve propósito de procrastinar a discussão do orçamento, pelo contrario, houve sempre todos os esforços!

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ainda muitas vezes com prejuízo da nossa saúde, para aproveitar o tempo n'essa discussão, e entendemos fazer esse sacrifício para satisfazer aos desejos da camará e do paiz, e não encerrar a sessão sem se discutir o orçamento.
Se houve alguma sessão da commissão de fazenda em que não se tratou do orçamento, sendo elle o objecto d'essa sessão, não foi culpa da commissão, mas da ausência de algum dos ministros respectivos, ausência umas vezes fortuita, outras vezes legitimamente motivada.
Emquanto á guerra, devo dizer a v. ex.ª, que a maior parte das propostas do sr. ex-ministro da fazenda, não podem deixar de soffrer certas alterações na commissão, as alterações que o seu estudo. naturalmente suscitava. Se a isto se chama guerra, então confesso que a houve, mas não posso deixar de reconhecer que os grandes guerreadores do nobre ex-ministro n'esta parte não foram só os dois cavalheiros que hoje se sentam nos bancos da coroa, fui eu também e outros collegas, que propozemos alterações profundas á maior parte das propostas que s. ex.ª apresentou. O sr. Dias Ferreira alludiu ás celebres economias apontadas pelo sr. Saraiva de Carvalho, quando deputado, e disse ironicamente que s. ex.ª tinha feito descer com ellas as inscripções a 33 por cento.
Estas observações parecem-me pouco próprias do illustre deputado, que se esqueceu da sua historia, isto é, esqueceu-se que quando deputado da opposição também tinha apresentado um rol de economias de que depois se esqueceu quando ministro. S. ex.ª também em tempo declarou que nunca tomaria como ministro as mesmas contas que devia tomar quando deputado, a quem apresentasse o rol das economias. N'estes termos é para admirar que venha fazer arma d'isto contra o actual ministro da fazenda.
Tenho ainda outra observação a fazer com relação ao sr. Corvo.
S. ex.ª disse que havendo uma correspondência official do ministro com os liquidatários da companhia, nós por esse facto, por uma aceitação d'essa correspondência ficámos sujeitos ás decisões dos tribunaes inglezes. Ha aqui um equivoco completo da parte de n. ex.ª.
Nós não fizemos verdadeiramente accordo ou contrato, demos uma subvenção, como indemnisação, como uma não locupletação, aos interessados da companhia, e por consequência nada temos como os tribunaes inglezes. Estes têem tudo a ver com relação á liquidação da companhia, mas com relação a nós nada têem que ver, porque a companhia não está sujeita n'esta parte aos tribunaes inglezes, mas pelas condições do seu contrato está sujeita á jurisdicção dos tribunaes portuguezes (apoiados).
O sr. Fontes começou por congratular se de ver que esta questão entrasse já no seu verdadeiro caminho, uma vez que todos concordem na necessidade de se fazer um accordo com as companhias do caminho ferro em geral, e especialmente com a companhia do caminho de ferro de sueste. Peço licença para disser que nem todos estamos de accordo n'este ponto.
Desde o momento que expliquei a minha annuencia ao artigo 4.º da lei de 16 de julho d'este anno, e desde o momento que expliquei a minha annuencia ao projecto em discussão, de uma maneira tão clara que exclue toda a interpretação de accordo ou de contrato, já v. ex.ª vê que estas idéas de accordo não são tão geraes como ao illustre deputado lhe parecer.
Emfim ha um ponto...
(Havia na sala grande susurro tendo entrado muitos srs. deputados, e o orador viu se na necessidade de interromper o discurso.)
O sr. Presidente: - O illustre deputado pôde continuar a fallar.
O Orador: - V. ex.ª bem vê, que não posso continuar a fallar com o susurro que está na sala (apoiados). Nós temos estado discutindo com a maior placidez, e ouvimos os discursos dos oradores que impugnam o projecto com toda a attenção; tinham os portanto direito a esperar que se os fizesse a mesma cousa (apoiados). Esperarei pois que o silencio se estabeleça.
O sr. Presidente: - Peço silencio.
O Orador: - Se a camara não quer que eu falle, não fallo.
Vozes: - Falle, falle.
O Orador: - Apenas tenho que fazer alguns reparos ás observações apresentadas pelo sr. Fontes com respeito á redacção do artigo 1.º do projecto, redacção que s. ex.ª reputou péssima; segundo s. ex.ª pensa é mister, para a realisação do pagamento á companhia do caminho de ferro de sueste ou a quem de direito for, que o empréstimo se realise completamente, isto é, se realise pela totalidade d'elle. Esta é a primeira duvida de s. ex.ª A segunda duvida da redacção é se 1.850:000 libras deve entender-se alem dos réis 2.376:653$741 réis a que se refere o artigo 4.º da carta de lei de 16 de julho do corrente anno.
Parece-me que estas duvidas não procedem. Em primeiro logar quando se diz realisado na sua totalidade o empréstimo é claro que se refere aos limites prescriptos na auctorisação dada pela referida carta de lei de 16 de julho ultimo. Não vejo que seja outro o pensamento. Em segundo logar para responder a outro reparo feito pelo sr. Fontes basta ler o artigo 2.º do projecto que diz o seguinte: "Fica assim alterado o artigo 4.º da carta de lei de 16 do, julho de 1869 e revogada a legislação em contrario".
Quer dizer, fica substituído o artigo 4.º, da lei de 16 de julho de 1869 pelo artigo 1.º da lei que discutimos. Por consequência não ha duvida nenhuma de que 1.850:000 libras deve entender se alem de 2.370:653$751 reis, a que se refere o artigo 4.º da citada carta de lei de 16 de julho d'este anno (apoiados). Creio ter respondido ás duvidas suscitadas pelo sr. Fontes quanto á redacção do artigo 1.º Portanto eu, limitando-me apenas a explicar o meu voto e mostrar qual arasão porque voto agora esta auctorisação, tendo votado o artigo 4.º do projecto que depois foi convertido na lei de 26 de julho ultimo, tenho preenchido os meus desejos e dado as rasões o explicações do meu voto (apoiados).
Vozes: - Muito bem.
O sr. A. J. de Seixas (para um requerimento): - Peço a v. ex.ª tenha a bondade de me informar quantos coadores estão ainda inscriptos para fallar.
O sr. Presidente : - Ainda estão inscriptos para fallar dez srs. deputados.
O sr. A. J. de Seixas: - Então peço a v. ex.ª, que, para se não interromper a sessão, mande preparar as luzes, por que d'aqui a pouco é nonte (riso).
O sr. Falcão da Fonseca: - Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que se interrompa a sessão por uma hora, continuando depois a sessão permanente.
Vozes: - Nada, nada.
O sr. Presidente: - Vou consultar a camara sobre este requerimento.
O sr. Mendes Leal: - Não pode interromper se a sessão, porque foi declarada permanente (muitos apoiados).
O sr. Falcão da Fonseca: - Em vista da manifestação da camará, peço licença para retirar o meu requerimento (apoiados).
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Mathias de Carvalho.
O sr. Mathias de Carvalho: - Não sei se a camara deseja que em breve termine esta discussão.
Muitas vozes: - Não, não.
O Orador: - Em todo o caso não occuparei a attenção da camará por muito tempo. Quando outros motivos m'o não aconselhassem, bastava-me o de não ter ouvido, nem por parte do governo, nem por parte dos illustres deputados que defenderam este projecto, rasão alguma que contrariasse um só dos argumentos apresentados pela opposição (apoiados). Podia dispensar-me de fallar, porque a ar-

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gumentação produzida d'este lado da camara está de pé e ficou sem resposta (muitos apoiados).
Admira, sr. presidente, que o illustre deputado, o sr. Costa e Almeida, se desse ao trabalho de fazer uma longa jornada para vir declarar á camará que esta negociação que se discute não é um accordo, mas uma restituição, um bónus..

O sr. Costa e Almeida : - E um presente!(Sensação na assembléa.)
O Orador: - Está o paiz porventura em circumstancias de fazer presentes d'esta ordem? (Muitos apoiados.) Não é um accordo, é um presente áquelles a quem chamavam concessionários estrangeiros? (Muitos apoiados.) E note a camará que todas as economias que tem feito o governo não chegam para esse presente que elle agora quer fazer (muitos apoiados).
O sr. deputado Costa e Almeida não quer accordos por forma alguma. Então vota contra o governo, que é o primeiro a dizer que esta negociação é um accordo. Não sou eu que o digo, di-lo o governo no seu telegramma de 27 de julho, dirigida para Londres. "Está concluído o accordo; recebi a sua aceitação official."
Muitas vozes: - Ouçam, ouçam.
O sr. Costa e Almeida: - O illustre deputado dá-me licença?
O Orador: - Pois não.
O sr. Costa e Almeida: - Eu agradeço ao nobre deputado o favor que me concede de o interromper para me dar ensejo de ratificar as minhas expressões. Eu não disse que a quantia paga ao caminho de ferro era um presente, senão como uma ironia, desde que o illustre deputado interpretava tão estranhamente as minhas palavras. Mantenho o que disse e que é a minha opinião individual. Considero essa quantia como uma indemnisação, como uma quantia paga para que o estado se não locuplete comjactura alheia, nunca como um accordo ou concessão para a qual seja mister acquiescencia de todos os interesados. Foi só assim que dei o meu voto ao artigo 4.º da lei de 16 de julho e que o dou ao projecto em discussão.
O Orador: - Das explicações do illustre deputado deprehendo que s. ex.ª entende que por este projecto faz o governo uma restituição á companhia. Os 2.370:000$000 réis que o governo já deu á companhia, foram uma generosidade! (Apoiados.) O que lhe querem agora dar é uma restituição!
Mas em que se funda esta restituição?! (Apoiados repetidos.)
O illustre deputado a primeira cousa que devia demonstrar á camara era o direito que essa companhia tem a uma tal restituição.
O sr. Costa e Almeida:- Direito não tem.
O Orador: - Oh o sr. presidente, pois o sr. deputado confessa que a companhia não tem direito algum, e quer que se lhe faça uma restituição?! (Muitos apoiados.)
(Interrupção do sr. Conta e Almeida.)
São as palavras de v. ex.ª
Vozes: - Ordem, ordem.
O sr. Presidente: - Peço ao sr. Costa e Almeida o favor de não interromper o orador.
O sr. Costa e Almeida: - Quando vejo completamente desvirtuado, com a melhor intenção, o que disse, não tenho remédio senão explicar-me.
Vozes: - Ordem, ordem.
O sr. Santos e Silva: - A opposição ó que faz a desordem (apoiados).
O Orador: - Explique-se o nobre deputado, se assim o deseja; não serei eu que lhe ponha impedimento.
Á negociação que o governo pretende realisar, pode s. ex.ª dar-lhe o nome que quizer; mas é certo que, avaliado pelos documentos fornecidos pelo governo, ella não resolve as difficuldades pendentes.
O sr. ministro das obras publicas, interrogado pelo meu nobre amigo e collega, o sr. Fontes, acerca de compromissos do governo para com a companhia do caminho de ferro de norte e leste, declarou que elles não existiam, mas que o governo desejava satisfazer ás suas reclamações.
Mas que reclamações são estas? Em que se fundam? Se o governo deseja satisfaze-las, é porque o julga necessário e conveniente aos interesses públicos. Mas tudo isto precisa de ser explicado, e infelizmente não o foi, nem provavelmente o será, porque o governo envolve sempre as suas declarações n'um véu de mysterio (apoiados).
A camara deve estar lembrada que me foi aqui respondido em nome do governo de não existir no contrato de empréstimo condição alguma que se não achasse expressamente consignada na auctorisação que o parlamento votou. E o que vemos nós agora? Um projecto pelo qual fica profundamente alterado o artigo 4.º da referida auctorisação, e em virtude do qual o paiz vae pagar mais de 400:000$000 réis, alem dos 2.376:000$000 réis que o governo já tinha dado aos argentarios estrangeiros, dizendo interpretar os sentimentos generosos da nação.
E no fim de todos estes sacrifícios, ninguém poderá affirmar que o negocio do caminho de ferro de sueste fica inteiramente resolvido e não appareçam mais tarde novas reclamações (apoiados).
A promessa solemne que o governo tinha feito de que com 2.376:000$000 réis punha para sempre termo ás exigências da companhia de sueste, e facilitava qualquer operação financeira nas praças estrangeiras, é completamente contrariada por este projecto.
Isto mostra a pouca seriedade com que o governo procede nos negócios mais graves do estado (apoiados).
As circumstancias difficeis em que nos achámos, devidas principalmente á marcha que o governo tem seguido, não podem ser convenientemente resolvidas continuando-se n'este systema (apoiados)
Tenho dito.
O sr. Bandeira Coelho: - Estou inscripto a favor d'este projecto, mas preciso ainda de algumas explicações para saber como hei de votar. Estas explicações não é ao governo que eu as peço, é á opposição.
(Interrupção que se não percebeu.)
Cada um de nós vê as cousas pelo seu prisma, eu também tenho o meu, e vou explicar á camara como entendo esta questão.
Desde que se rescindiu o contrato do caminho de ferro de sueste, appareceram sobre este assumpto três opiniões differentes a este paiz: a primeira era que se devia dar muito á companhia, que se lhe devia dar de indemnisação perto de 5,000:000$000 réis; o segundo, que se não devia dar nada; e o terceiro, que se lhe devia dar somente o rasoavel (apoiados). Eu fui sempre d'esta ultima opinião (apoiados).
Desde o principio fui sempre de opinião que o procedimento do governo devia ter sido, encarregar uma commissão de engenheiros de fazer a avaliação rigorosa do valor das linhas e esse valor servir para se dar a indemnisação á companhia sem se alterar um real para mais ou para menos do que tivesse sido determinado por essa avaliação (apoiados).
Não foi esse o systema que se seguiu, fez-se um accordo sobre a base da concessão ampla a todas as contas da companhia, accordo que eu rejeitei, e seguiu-se-lhe outro accordo feito pelo sr. Dias Ferreira com bases ainda peiores, e que eu também rejeitei.
Veiu depois um decreto do governo actual pelo qual se promettia á companhia só e exactamente aquillo que logo no principio entendi que se lhe devia dar, e foi esse um dos actos do governo que reconheci devia merecer a minha maior approvação (apoiados).
Senti que essa proposta de indemnisação viesse envolvida n'um projecto de empréstimo, porque desejava que ella constituísse por si só um projecto especial; entretanto para

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ser coherente, entendi que não podia deixar de dar o meu apoio a essa proposta de indemnisação, onde quer que ella me fosse apresentada, e qualquer que fosse o governo que a apresentasse (apoiados).
Apparece-me porém hoje n'este projecto uma addição áquella indemnisação, uma alteração de concessão para mais do que se votou, para mais do que eu queria que se lhe desse, e para mais da avaliação que tinha sido feita pelos engenheiros; e eu, vendo-me na necessidade de approvar ou rejeitar esta commissão, não posso deixar n'este caso de encarar a questão financeira, ver o que resulta para o meu paiz da approvação ou rejeição d'esta proposta, e pedir explicações á opposição, para saber como ella pretende ou quer resolver esta questão, se eu e mais alguns deputados da maioría votarmos contra o projecto, e a opposição for chamada ao poder (apoiados).
O sr. Andrade Corvo: - Faz-se o accordo.
O Orador: - Diz s. ex.ª que se faz o accordo. Mas que accordo? S. ex.ª dísse nos ainda agora que este projecto era um accordo que apenas contentava os credores da companhia, os quaes ficavam excellentemente, mas que era preciso que contentasse a todos, que contentasse tambem os accionistas, que é o que eu não quero, porque entendo que o principio de equidade só deve applicar-se aos credores da companhia (apoiados), e não aos accionistas, tanto mais quanto isto é o que somente se requer para a emissão do emprestimo (apoiados).
A verdade é que esta proposta não satisfaz, ao que parece, os illustres deputados da opposição.
É preciso pois que a opposição nos diga o que tenciona fazer se amanhã for chamada ao poder e tomar conta da gerencia dos negocios publicos.
Comprometam se s. ex.ª a não apresentar aqui um projecto como este? Compromettem se a não dar mais nem 5 réis á companhia, ou adoptam o accordo feito pelo sr. Corvo? Pretendem realisar o accordo feito pelo sr. Dias Ferreira, ou estão dispostos a seguir a opinião do sr. Lobo d'Avila?
Cumpre que a opposição nos dê esclarecimentos a ente respeito, porque necessitâmos de saber qual é o seu programma, ou se elle se reduz apenas a uma questão política (apoiados).
O actual sr. minístro da fazenda assegurou nos que, com a approvação d'este projecto, ficavam resolvidas as duvidas com relação á companhia do caminho de ferro de suei-te, e assegurou nos mais que o emprestimo Stern estava contratado e era vantajoso para o paiz (O sr. Ministro da Fazenda: - Apoíado.)
Eu acredito na palavra do sr. mínistro (apoíado). E desejava saber quaes as idéas da opposição. É uma questão de confiança.
(Interrupção do sr. J. T. Lobo d'Avila, que se não ouviu.) O que eu desejava era que não se fizesse aquillo que muitas vezes se tem feito; recusar-se a um governo uma medida qualquer, para vir depois o governo que se lhe segue, composto dos homens que tínham recusado essa medida, propo la de novo ao parlamento (muítos apoíados).
D'aqui não resulta senão a perda do tempo, a paralyeação dos negocios publicos e o agravamento das nossas desfavoraveis circumstancias financeiras (apoiados).
Em vista disto eu entendo que faço um serviço ao paiz votando este projecto de lei, e persuado-me de que da sua não adopção resultaria um mal maior que a opposição me não diz como ha de remediar.
E os nossos deveres de lealdade para com os nossos constituintes impõe-nos a obrigação de olharmos com seriedade para os negocios publico, e não fazermos questões politicas de questões d'esta ordem, perdendo o tempo que tanto devemos aproveitar.
Tenho dito.
O sr. Santos e Silva: - Preciso apenas justificar o meu voto, e direi poucas palavras.
Acreditem os nobres deputados que é impossivel, na altura em que vae o debate, no estado em que estão todos os espirito, e em hora tão adiantada, porque é quasi noite, nenhum orador tem o desejo de alargar o debate, ou consumir mais de dois minutos no que tem a dizer.
Sr. presidente, nós não estamos occupados com a discussão de um assumpto do caminho de ferro de sueste; nós não estamos debatendo uma questão politica; estamos assistindo a uma triste solemnidade nacional!
Os srs. ministros, vestidos de saco e cilicio, de corda ao pescoço, silenciosos, em passo grave e cadenciado, com o espirito anuviado de negros pressentímentos, com a cabeça curvada ao peso das proprias vergonhas, marcham, em procissão de condenados, para o patibulo das forcas caudinas! (Muitos apoiados.}
Abre o funebre prestito o sr. bispo de Vizeu, de baculo na mão. O sr. Saraiva leva a cruz que o nobre prelado lhe poz ás costas, cruz em que aquelle tão sympathico amigo meu tem de ser dentro em pouco justiçado...
O sr. Cortez olha para o ar, cheio de si como um astrologo, e tinge ler na lua ou n'outro astro, a resolução de algum problema de mechanica celeste, applicado aos usos da vida.
O sr. Latino trepida, como sempre, e ha receios que, no meio da procissão, fuja para casa, a esconder os seus temores no regaço dos amigos, parque o sobre ministro não tem nervos apropriados para retistirem ás turbações do tempo, nem compleição que supporte as cargas de electricidade que se accumulam na atmosphera. Vozes:
Ordem. O Orador:
Ordem porque?
Pergunto a v. ex.ª ....... por que quatro ou seis srs. deputados ali ....acabam de soltar a sua voz um pouco irritada ....
Imaginaram talvez ...com aquella corajosa intimação me cortavam o fio das minhas observações?
Desejo que v. ex.ª ao diga se estou fora da ordem, sem o que não continuo (Pausa.)
Nos tamem estamos n'esta casa para nos corrIgirmos uns aos outros. Assim como ás vezes as opposições são corrigidas pelas maiorias, assim estas recebem a muido lições das minorias.
Em que estava eu fóra da ordem? Em que offendi eu os ouvidos d'aquella ala de quatro ou seis enthusiatas ministeriaes, que uns chamaram á ordem??? Estava fazendo uma aprecíação politica, não estava offendendo pessoalmente ninguem (muitos apoiados).
Sr. presidente, deixemos desfilar por diante de nós as figuras lugubres dos condenados, e não lhe amarguramos com algazarras o seu triste o infeliz itínerario. Continua a procissão.
O sr. marquez de Sá não é visto n'estes transes de família, porque s. ex.ª, apesar de ser chefe da tribu, continua a ser dispensado de filtrar á frente d'ella, pelo sr. bispo de Vizeu, que lhe traz muito tempo usurpado o logar.
(Rumor.)
O sr. Calheiros é o menos infeliz d'aquella leva. O sr. Calheiros está sempre alegre (riso). O sr. Calheiros ri a miudo, ri nos actos os mais serios, cuidando que ri bem (riso). O sr. Calheiros vae de ar prazenteiro na ar procissão, porque ha muita tempo decidiu na sua, alta não distinguir umas forcas caudínas de um arco triumphal (riso). E se ás vezes o sr. Calheiros pára de rir, é para soltar algumas loas patrioticas, que se confundem com o de profundis e o nuserere mei Deus, que vae na frente resando o sr. bispo de Vizeu.
O sr. Presidente: - Peço licença para observar ao nobre deputado, que me parecia mais conveniente que v. ex.ª entrasse na materia.
O Orador: - Como v. ex.ª acha inconveniente que eu

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continue em considerações d'esta ordem, pedia-lhe que me marcasse o assumpto em que devo foliar; fazia me n'isso um grande obséquio.
O sr. Presidente: - O que eu posso indicar ao illustre deputado é que entre na discussão da matéria.
O Orador: - Vou entrar na discussão da matéria; eu direi ,algumas palavras sobre a ordem, á vontade de v. ex.ª
E desolador o espectáculo a que temos assistido. Quaes são os defensores do governo, os enthusiastas do accordo, que se levantaram para rebater os argumentos da opposição? Nenhuns. Que disse o governo em favor da sua obra? Nem uma palavra. É isto serio, sr. presidente? É isto parlamentar? É isto constitucional?
Sr. presidente, com franqueza o digo, eu não sou opposto a accordos com os interessados de sueste para resolvermos por uma vez esta desgraçadissima pendência, e levantarmos no estrangeiro o nosso credito abatido. Já assignei, como membro de uma commissão d'esta casa, um accordo, que me parece muito melhor para nós do que este. Mas os srs. ministros eram os únicos homens n'este pá í z que não podiam apresentar similhante accordo, em virtude do seu programma, a que deram caracter official (apoiados).
Desde que um governo desenrola ao paiz a sua bandeira, e sustenta como programma guerra a todos os concussionarios dos caminhos de feiro a todos os argentarios estrangeiros, a todos os interessados na companhia de sueste, esse governo está julgado (apoiados). Os ministros actuaes, apresentando ao parlamento este desgraçado documento, rasgam o seu programma, e mostram que não podem governar com as suas idéas e com os teus princípios (muitos apoiados). O governo actual abdicou. A sua obrigação é ceder desde já aquellas cadeiras a quem possa resolver as nossas graves questões por um modo que não seja desairoso para o paiz (apoiados). Revoltaram no contra si próprios os actuaes conselheiros da coroa, zombaram das manifestações nacionais; serviram-se do povo para o escarnecer (apoiados).
É por isso que eu digo que estamos assistindo a uma triste solemnidade nacional, vendo o ministério encaminhar-se ás forcas caudinas, para passar vergonhosamente por baixo d'ellas, com as faces maceradas pela mais vergonhosa humilhação.
Sr. presidente, não sei quaes alo os verdadeiros encargos d'este infeliz contrai", porque, para saber o que pela, o que vale, o que significa este bonus este presente, esta dadiva, é necessário conhecer, na occasião opportuna, o valor real em que são dados os bonds de 3 por cento, na importância nominal de 8.325:000$000 réis. Não sei bem qual fui a qualificação que a este negocio deu um illustre deputado, que foi chamado pelo telegrapho, e veiu do Porto á pressa para votar uma dadiva um bónus, um ...
Eu não repito a phrase, desde que s. ex.ª já declarou que inconvenientemente a havia pronunciado...
O sr. Costa e Almeida: - Não disse isso.
O Orador: - Não emprego a palavra presente, visto que a retirou, mas disse que era um bonus ou uma restituição!!
Mas digo eu que para se saber quaes são os verdadeiros encargos que pesam sobre o paiz com esta generosa dadiva, é necessário que saibamos a como são tomados aquelles bonds quando se fizer a restituição.
O que podemos já saber é em quanto importam os juros correspondentes ao capital nominal de 1.850:000 libras esterlinas.
Perguntou o illustre deputado, que acabou de fallar, qual era o accordo que a opposição offerece ou aceita. A opposição aceita o accordo que julgar em harmonia com os interesses do paiz, com a sua honra, e com a sua dignidade, e que menos gravoso for para a nação (apoiados).
De mais a roais nós não temos certeza alguma de que este pacto por telegrammas venha resolver a questão do empréstimo, sphinge cruel, mysterioso, impenetrável, que já devorou dois ministros da fazenda, e abre pela terceira vez as fauces para devorar o sr. Saraiva de Carvalho, que será tragado em poucos dias, porque não é s. ex.ª de certo o Edipo financeiro, que lhe adivinhe os enigmas, e obrigue o monstro a precipitar se no mar. (Vozes: - Muito bem.)
Estes telegrammas, sr. presidente, não resolvem cousa alguma (apoiados}.
Hão de levantar-se novas difficuldades para a conclusão do empréstimo, porque os verdadeiros interessados hão de dizer depois que lhes não importa concordatas que os ministros fizeram cora homens que nada tinham com este negocio, que não representavam legalmente a companhia, os interessados, ou os credores, n'esta deplorável pendência.
Mas supponhamos que muitas d'estas considerações são exageradas? Em todo o caso, pôde esta camará votar este accordo ou dar um segundo presente, que traz um prejuízo certo de alguns centenares de contos de réis, um augmento de despeza permanente para o thesouro, igual talvez a toda a receita que o parlamento tem votado n'esta sessão?? E isto sem ao menos o governo nos vir dizer, qual é o seu systema financeiro, quaes as medidas tributarias que tenciona fazer vingar?? Sabe v. ex.ª quanto se tem votado de contribuições esta anno nas duas casas do parlamento? Anda apenas por 281:000$000 réis, que são os addicionaes extraordinários ás contribuições pessoal e industrial por um anno somente, porque as outras medidas apresentadas peto antecessor do sr. Saraiva de Carvalho ainda não se sabe se o actual ministro as aceitará, ou se a respectiva commissão se dignará dar parecer sobre ellas.
Alem disto, a prorogação das cortes está a terminar, Teremos nova prorogação? Discutir-se hão, approvar se hão novos impostos? Ficaremos apenas com 281:000$000 réis, por um anno, que mal chagam para cobrir, em doze mezes, os encargos annuaes, perpétuos, os juros dos bonds de 3 por cento, que orçaram por igual quantia????
É necessário que o governo responda triumphantemente a estas perguntas.
Em cinco dias que nos restam, não é possível fazer approvar o orçamento nas duas casas do parlamento, nem um systema tributário. O sr. Saraiva não nos disse ha pouco senão que a camará tinha ficado satisfeita com as suas explicações, que nós não ouvimos, que a opposição não ficou percebendo (apoiados). Isto não pode ser! Nós temos direito de saber quaes são as reformas com que o governo se pretende armar, para fazer face ás despezas publicas. Se o governo o disse já porventura na outra camará, ignora-o. Leio e sigo os diários das duas camaras, e em nenhuns d'elles tenho visto, que o illustre ministro desse quaesquer satisfactorias explicações.
Não posso portanto votar este accordo, sr. presidente. Não sei se estou falando a um ministério vivo, ou a um ministério morto. Sei só que estou tratando de assumptos que interessam vivamente o paiz.
Vozes: - Está vivo.
O Orador: - Pois se está vivo, governe e levante se! (Muitos apoiados.)
Mas, se não pôde governar, se não tem acção, nem vida, se está politicamente morto, como eu o considero, para nunca mais resuscitar, intimo-o em nome do paiz, a que saía, já e já, d'aquellas cadeiras que não sabe dignamente occupar.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
Vozes: - Votos, votos.
O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camará, não sei se querem que se passe á votação.
O sr. José do Moraes: - V. ex.ª não pôde pôr o projecto á votação, emquanto não houver requerimento para se julgar a matéria discutida.
O sr. Venancio Rodrigues: - Peço a v. ex.ª que consulte a camará, sobre se julga a matéria suficientemente discutida.
Julgou-se discutida.

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O sr. Eça e Costa: - Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer votação nominal (apoiados).
O sr. Fernando de Mello: - Peço a v. ex.ª que tenha a bondade de mandar ler os nomes dos oradores inscriptos, que ficaram prejudicados pela votação da materia discutida designando quaes estam inscriptos a favor, e quaes contra.
O sr. Presidente: - Estavam inscriptos a favor, os srs. Luiz de Campos e Pereira de Miranda; e contra, os srs. Braamcamp, Mendes Leal, Henrique de Macedo, Fernando de Mello e Lobo d'Avila.
Tenho a observar á camara que está na mesa uma proposta sobre uma questão previa, apresentada pelo sr. Ferreira de Mello e não sei se se quer votação nominal sobre esta proposta ou sobre o projecto.
Vozes:-Sobre o projecto.
Decidiu-se que houvesse votação nominal sobre o projecto.
O sr. Mendes Leal: - Peço a v. ex.ª que me permitta visto terem-se levantado duvídas relativamente á redacção do artigo l.º do projecto, ínterrogar, ou o sr. relator da commissão ou o governo, sobre se aceita ou não aquella redacção, ou se se reserva para lhe fazer as modificações que julgar convenientes. Basta que o governo declare que não faz da questão da redacção tal como está.
O sr. José de Moraes: - Acho que a observação feita pelo meu illustre collega e amigo o sr. Mendes Leal está prejudicada, porque a camara julgou a materia díscutida e vae votar o artigo como está redigido, não lhe podendo a commissão de redacção alterar nem uma vírgula.
O sr. Presidente: - Vae proceder-se á votação.
Feita a chamada
Disseram approvo-os srs. Pereira de Miranda, Villaça, Sá Nogueira, Sá Brandão, Silva e Cunha, Veiga Barreira, Guerreiro Junior, Sousa de Menezes, Magalhães Aguiar, Costa e Almeida, Eça e Costa, Montenegro, Barão da Trovisqueira, Belchior Garcez C., de Seíxas, Ribeiro da Silva, C. J. Freire, Francisco Beirão, Coelho do Amaral, Quintino de Macedo, Noronha e Menezes, Aragão Mascarenhas, Alves Matheus, Nogueira Soares, Gusmão, Teixeira Cardoso, Correia de Barcos, Bandeira Coelho, Sette, Mello e Faro, Vieira de Sá Junior, Latino Coelho Rodrigues de Carvalho, Mello Gouveia, Oliveira Baptista, Silveira e Sousa, L. Campos, L. A. Pimentel, Daun e Lorena, M. A. de Seixas, Penha Fortuna, Paes Villas Boas, R. V. Rodrigues, Calheiros, Thomás Lobo, Visconde de Carregoso, Visconde dos Olivaes, A. A. Carneiro, H. de Barros Gomes, Holbeche.
Disseram rejeito - os srs. Agostínho de Ornellas, Braamcamp, Ferreira de Mello, A. J. de Seixas, A. T. Pinto de Magalhães, Fontes, Falcão da Fonseca, Abranches, B. F. da Costa, Conde de Thomar (Antonio), Diogo de Macedo, Fernando de Mello, F. J. Vieira, F. F. de Mello, Diogo de Sá, Francisco Costa, H. de Macedo, Gil, Vidigal, Baima de Bastos, Corvo, Santos e Silva, Assis Pereira de Mello, Matos Correia, S. Pinto de Magalhães, J. T. Lobo d'Avila, Ferreira Galvão, Infante Passanha, Dias Ferreira, Firmo Monteiro, José Luciano, J. M. Lobo d'Avila, J. M. dos Santos, José de Moraes, Nogueira, Mendes Leal, Levy, Camara Leme, Affonseca, Espergueira, M. Fernandes Coelho, M. R. Valladas, Mathias de carvallho Vísconde de Bruges, Visconde de Guedes.
Foi portanto approvado o projecto por 50 votos contra 46.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a contínuação da que vinha para hoje.
Está levantada a sessão.
Eram sete horas da tarde.

Rectificação

Declara-se que o sr. deputado Camara Leme esteve presente á sessão de 7 do corrente, na qual veio dado como faltando à dita sessão.

[...]- IMPRENSA NACIONAL - [....]

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