O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1853

1853

Sessão de 3 de agosto de 1868

PRESIDENCIA DO SR. JOSÉ MARIA DA COSTA E SILVA

Secretarios — os srs.

José Tiberio de Roboredo Sampaio.

José Faria de Pinho Vasconcellos Soares de Albergaria.

Chamada — 70 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: Adriano de Azevedo, Fevereiro, Alvaro de Seabra, Alves Carneiro, Costa Simões, A. B. de Menezes, Sá Nogueira, Castilho Falcão, Sousa e Cunha, Antas Guerreiro, Falcão e Povoas, Faria Barbosa, Araujo Queiroz, Lopes Branco, Falcão da Fonseca, Montenegro, Barão da Trovisqueira, Cunha Vianna, B. F. da Costa, Conde de Thomar (Antonio), Pereira Brandão, Fernando de Mello, Albuquerque Couto, Gavicho, Pinto Bessa, Van-Zeller, Gaspar Pereira, G. A. Rolla, Faria Blanc, Freitas e Oliveira, Almeida Araujo, Judice, Santos e Silva, Assis Pereira de Mello, Ayres de Campos, Gaivão, Cortez, J. M. da Cunha, João M. de Magalhães, Fradesso da Silveira, Galvão, Bandeira de Mello, Klerk, Mardel, Correia de Oliveira, Dias Ferreira, Faria Pinho, Sousa Monteiro, Carvalho Falcão, Teixeira Marques, Pereira de Carvalho, Vieira de Sá, J. M. da Costa e Silva, Achioli de Barros, Frazão, Ferraz de Albergaria, José M. de Magalhães, Menezes Toste, Mesquita da Rosa, José de Moraes, Batalhoz, J. R. Coelho do Amaral, José Tiberio, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Motta Veiga, Penha Fortuna, Aralla e Costa, P. M. Gonçalves de Freitas, Sabino Galrão.

Entraram durante a sessão — os srs.: Annibal, A. Braamcamp, Rocha París, Villaça, Gomes Brandão, Ferreira Pontes, Barros e Sá, Azevedo Lima, A. J. da Rocha, A. J. Teixeira, Magalhães Aguiar, Torres e Silva, Costa e Almeida, B. Garcez, B. F. Abranches, Carvalhal Esmeraldo, Custodio J. Freire, E. Cabral, E. Tavares, Fortunato Frederico de Mello, Bicudo Correia, F. M. da Rocha Peixoto, Xavier de Moraes, Guilhermino de Barros, Silveira da Motta, I. J. de Sousa, Homem e Vasconcellos, J. A. Vianna, Matos e Camara, João de Deus, Faria Guimarães, J. T. Lobo d'Avila, Gusmão, Xavier Pinto, J. A. Maia, Costa Lemos, Sette, J. M. Rodrigues de Carvalho, M. B. da Rocha Peixoto, Pereira Dias, Lavado de Brito, Limpo de Lacerda, Mathias de Carvalho, Paulino Teixeira, P. A. Franco, R. Venancio Rodrigues, R. de Mello Gouveia, Sebastião do Canto, Theotonio de Ornellas, Deslandes, Vicente Carlos Teixeira Pinto.

Não compareceram — os srs.: A. de Ornellas, Ferreira de Mello, Antonio de Azevedo, Correia Caldeira, A. J. de Seixas, A. Pinto de Magalhães, A. L. de Seabra Junior, Arrobas, Augusto de Faria, Saraiva de Carvalho, C. Testa, Vieira da Motta, Faustino da Gama, Silva Mendes, Coelho do Amaral, Dias Lima, F. L. Gomes, Silveira Vianna, Henrique Cabral, Meirelles Guerra, Baima de Bastos, Aragão Mascarenhas, Pinto de Vasconcellos, Albuquerque Caldeira, Calça e Pina, Ribeiro da Silva, J. P. de Magalhães, Lemos e Napoles, J. Maria Lobo d'Avila, José Paulino, Silveira e Sousa, Mendes Leal, J. F. Pinto Basto, Levy, Ferreira Junior, Leite de Vasconcellos, Julio Guerra, Thomás Lobo, Scarnichia, Visconde dos Olivaes.

Abertura — Ao meio dia e meia hora.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

Representação De varios habitantes do concelho de S. João de Areias, pedindo a annexação d'esse concelho ao de Santa Comba Dão.

Á commissão de administração.

Participações

1.ª Declaro que, por incommodo de saude, não pude fazer parte da deputação que foi hontem ao paço. = Falcão da Fonseca.

2.ª Participo a v. ex.ª, que o meu illustre amigo e collega, deputado pelas ilhas de S. Jorge e Graciosa, José Pereira da Cunha, não tem comparecido ás sessões d'esta camara por causa do seu estado de saude. = Menezes Toste.

3.ª Participo a v. ex.ª, que o meu nobre amigo e collega, deputado pela Villa da Praia da Victoria, Theotonio Simão Paim de Ornellas Bruges, não comparece á sessão de hoje, e talvez a mais algumas, pelo motivo de haver fallecido sua illustre sogra. = Menezes Toste.

Inteirada.

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja remettida a esta camara, com a maior urgencia, uma relação nominal de todas as gratificações dadas pelo sr. ministro da fazenda, e as suas quantias desde janeiro de 1868 até julho. = José de Moraes Pinto de Almeida.

Foi remettido ao governo.

Notas de interpellações

1.ª Desejo interpellar o ex.mo ministro das obras publicas sobre os melhoramentos do campo de Coimbra. = F. Gavicho.

2.ª Desejo interpellar o ex.mo ministro das obras publicas sobre a conclusão da estrada de Trancoso a Lamego, sua continuação até o Douro, ponte sobre o Douro, e continuação da estrada de S. Pedro do Sul a Lamego. = F. Gavicho.

Mandaram-se fazer as devidas participações.

O sr. Secretario (Faria Pinho): — Participo á camara que, cumprindo a missão de que ella me havia encarregado, fui hontem desanojar o sr. deputado Theotonio Simão Paim Ornellas de Bruges.

Inteirada.

O sr. Torres e Silva: — Mando para a mesa um requerimento, a que v. ex.ª terá a bondade de dar o destino conveniente. Peço varios documentos para poder chamar a attenção do sr. presidente de conselho e ministro da guerra sobre o assumpto a que elles se referem.

O sr. Fradesso da Silveira: — Mando para a mesa duas propostas e abstenho-me de pedir a v. ex.ª que provoque uma resolução da camara a respeito dellas, porque pela sua natureza V. ex.ª verá que não é necessaria essa resolução (leu).

As propostas podiam fazer objecto de uma questão previa quando se discutisse o projecto de lei n.° 25; querendo eu, porém, poupar-me ao trabalho de levantar a questão previa n'essa occasião, mando para a mesa as duas propostas e espero que v. ex.ª terá a bondade de dar conhecimento dellas ao sr. ministro das obras publicas logo que s. ex.ª chegue. Por esta occasião mando para a mesa uma nota de interpellação sobre a politica commercial do governo.

Ha negociações pendentes em relação ao tratado de commercio com a Austria e a Prussia; e eu desejava que os srs. ministros das obras publicas e negocios estrangeiros tivessem a condescendencia de dizer á camara quaes são as suas intenções em relação á politica commercial, e especialmente com relação a estes dois paizes, com os quaes as negociações me parece estarem em principio.

O sr. Gonçalves de Freitas: — Mando para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro da marinha, e peço a v. ex.ª que lhe dê o competente destino.

O sr. Montenegro: — Mando para a mesa uma representação que me foi enviada do concelho de S. João de Areias, pedindo que este concelho seja annexado ao de Santa Comba Dão. São setenta e um os signatarios, que fundamentam a representação em varias circumstancias, como são: a pequena area do concelho, a sua pequena população, porque se compõe apenas de tres freguezas de 4:000 habitantes, os seus poucos recursos e pequeno pessoal para satisfazer os cargos municipaes e administrativos, e finalmente as relações de amisade e commercio que ha entre os dois concelhos.

Hoje, que esta geralmente conhecida a grande conveniencia de se alargarem as áreas dos concelhos, parece-me utilissimo aproveitar as boas disposições em que estão estes povos para serem annexados.

Peço a v. ex.ª que dê o destino conveniente a esta representação.

O sr. Santos e Silva: — Mando para a mesa o parecer da commissão diplomatica, a respeito da convenção postal entre Portugal e a Belgica.

O sr. Barão da Trovisqueira: — Ha dois mezes que eu mandei para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas, ácerca da estrada de Villa Nova de Famalicão á Povoa de Varzim, e como ainda o sr. ministro se não desse por habilitado para responder a ella, peço a v. ex.ª que mande fazer novo aviso, a fim de que possa realisar a interpellação, porquanto a estrada, a respeito da qual tratarei na interpellação, é importantissima, não só para os dois pontos, Villa Nova de Famalicão e Povoa do Varzim, como para uma grande parte da provincia do Minho.

O sr. Presidente: — Como esta presente o sr. ministro

Página 1854

1854

das obras publicas vae ler-se a proposta que apresentou o sr. Fradesso.

Suscita-se porém uma questão. Diz-se que a proposta é uma nota de interpellação, mas o seu auctor é que a póde classificar.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o ex.mo ministro das obras publicas, commercio e industria seja convidado a declarar, em relação ao projecto n.° 25:

1.° Se a rejeição do accordo exclue a negociação de outro accordo, tendente á ligação das"vias ferreas do sul e sueste com as do norte e leste; á união de suas administrações, e á construcção de uma via ferrea na Beira.

2.°' Se lhe parece opportuno agora preparar trabalhos para uma negociação sobre as referidas bases, considerando que a companhia real dos caminhos de ferro portuguezes não cumpriu o contrato de 2 de março de 1866, pelo qual foi modificado o contrato de 5 de maio de 1860. = Fradesso da Silveira.

O sr. Fradesso da Silveira: — Não sei bem como hei de classificar a minha proposta; mas melhor do que ninguem o póde fazer o sr. ministro das obras publicas.

Visto que s. ex.ª esta presente, vou em duas palavras dizer qual é a minha intenção.

Esta annunciada para hoje a discussão do projecto n.° 25, e como não desejo levantar uma questão previa no principio d'essa discussão, parecia-me essencial que a camara tivesse conhecimento da opinião do governo sobre os dois pontos que indiquei.

Por um acto de cortezia para com o nobre ministro das obras publicas, a quem muito respeito, e por muitas outras rasões entendi que convinha apresentar estas indicações antes da ordem do dia, para que s. ex.ª, opportunamente e quando julgasse conveniente, na discussão dizer a sua opinião.

Não quiz fazer uma pergunta de surpreza, nem uma nota de interpellação.

S. ex.ª escolherá a melhor occasião para me responder.

Não pretendi mais do que indicar dois pontos que me parecem dignos de consideração.

Quando se discutir o contrato do caminho de ferro de sueste póde-se dar resposta ás minhas perguntas.

Não fiz mais do que um acto de deferencia por não querer levantar uma questão previa.

O sr. Ministro da Fazenda (Carlos Bento): — A vista das explicações que foram dadas pelo illustre deputado, o sr. Fradesso da Silveira, parece-me que o negocio foi posto nos justos termos.

Tudo que fosse interrogar o governo antes de estar em discussão o objecto intimamente ligado com as interrogações que eram feitas, era collocar o governo n'uma posição difficil, não só porque isso podia prender a discussão do objecto dado para ordem do dia, mas porque a resposta ou a explicação das idéas do governo podia prejudicar a sua posição, e quando indicadas essas interrogações no logar proprio em que devem ser feitas, de certo isso não acontecerá.

Por consequencia, á vista das explicações do sr. Fradesso, parece-me que o mais acertado é não considerar isto como uma nota de interpellação, e que a resposta a estes quesitos póde ter logar conveniente quando entrar em discussão o objecto dado para ordem do dia.

ORDEM DO DIA

Projecto de lei n.º 11

Senhores. — A commissão de obras publicas examinou a proposta de lei para ser approvado o contrato celebrado em 10 de agosto de 1867 entre o governo e José Vicente Barbosa du Bocage.

Nos paizes em que a iniciativa particular é vigorosa e arrojada não deixam os governos de promover directa ou indirectamente a instituição e o desenvolvimento das industrias, porque vem d'ahi trabalho e riqueza.

Em paiz de frouxa iniciativa, como este nosso, será preciso em muitos casos que os governos officialmente façam o que de outra maneira nunca se poderia fazer.

Quando em tal caso apparece emprezario que pretende á sua custa, por sua conta e risco, intentar exploração util, introduzindo no paiz industria nova, justo é que lhe façam os governos concessões discretas, e que sejam moderadamente exigentes nas clausulas dos contratos, para que possa a empreza lucrar, lucrando com ella o paiz.

Achando-se n'estas circumstancias o contrato que a presente proposta de lei approva, entende a commissão que a dita proposta deverá ser convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E approvado, na parte que depende de sancção legislativa, o contrato celebrado entre o governo e José Vicente Barbosa du Bocage em 10 de agosto de 1867, o qual fica fazendo parte integrante d'esta lei, com as seguintes condições:

1.ª O governo fica no direito de inspeccionar, como e pelos meios que julgar convenientes, o modo por que for executado o contrato, devendo exercer especial fiscalisação para o cumprimento da condição 7.ª, de maneira que os bancos e o estabelecimento da engorda sejam restituídos em perfeito estado de exploração;

2.º As obras que o concessionario houver de fazer serão previamente sujeitas á approvação do governo;

3.ª O concessionario ou os seus cessionários, responderão por perdas e damnos, pela inexecução do contrato, alem da pena estipulada no mesmo contrato;

4.ª O concessionario não poderá ceder a sua concessão sem previa licença do governo, ficando os cessionários em tudo sujeitos ás mesmas condições.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contraria.

Sala das sessões, em 15 de junho de 1868. = Augusto Pinto de Miranda Montenegro = Belchior José Garcez = Carlos Bento da Silva = Lourenço Antonio de Carvalho = José Bandeira Coelho de Mello = Joaquim Henriques Fradesso da Silveira.

N.° 4-AE

Senhores. — A vossa commissão de marinha foi presente a proposta de lei do governo para ser approvado o contrato por elle celebrado em 10 de agosto de 1867 com José Vicente Barbosa du Bocage para a cultura e aperfeiçoamento das ostras na margem esquerda do Tejo.

O notavel desequilibrio entre a producção e o consumo das ostras na Europa tem provocado a attenção dos governos sobre esta industria.

Este facto lamentavel é resultado da exagerada aponha nas ostreiras para satisfazer a um consumo que augmenta progressivamente, e da não reproducção do mollusco durante annos consecutivos nos bancos naturaes, phenomeno singular que se manifesta principalmente nas costas de Inglaterra desde 1858, e que ainda a sciencia não explica completamente.

Tem demonstrado a pratica serem inuteis todas as providencias, emquanto as ostreiras poderem ser exploradas sem restricção, e emquanto não forem melhoradas.

Empenham-se em evitar o aniquilamento d'este ramo importante da riqueza publica a França e a Inglaterra, esta auxiliando os individuos e companhias que se occupam da formação de bancos de ostras e da sua cultura, o fazendo-lhes concessões de terrenos apropriados a essa industria, aquella concedendo terrenos em larga escala, e estabelecendo até a expensas do estado em 1860 e 1863 os parques imperiaes de Arcachon para lição e incitamento á industria particular.

Apesar dos esforços d'esta e dos governos, não tem ainda chegado a producção das ostras ao nivel do seu consumo actual.

D'ahi resultou, desde 1866, virem especuladores, sobretudo da França, buscar aos bancos naturaes do porto de Lisboa as nossas ostras, apesar da sua inferior qualidade e da singularidade de caracteres que lhes faz constituir um genero distincto em zoologia, explorando esses bancos de modo que, a não intervir alguma providencia, em breve serão aniquilados como os de Hespanha.

Para se formar idéa da exploração d'estas ostreiras, espalhadas pelas margens do Tejo, bastará notar que de dezembro de 1866 a maio do corrente anno, isto é, n'um espaço de anno e meio, só para o porto de Arcachon saíram quatorze carregamentos, representando mais de 13.000:000 de ostras.

No intuito de pôr termo a uma exportação devastadora, e de proteger a cultura e aperfeiçoamento das ostras nacionaes, celebrou o governo com José Vicente Barbosa du Bocage o contrato de 10 de agosto de 1867, concedendo-lhe durante trinta annos os bancos existentes na area comprehendida entre o pontal de Cacilhas e Alcochete, e demarcada em 16 de novembro seguinte pelo ministerio da marinha.

Obriga-se o concessionario:

a) A conservar e augmentar na area da concessão os bancos ou jazigos naturaes, que são a materia prima d'esta importante industria.

b) A estabelecer ostreiras ou parques artificiaes de creação e aclimatação nos pontos mais convenientes, á maneira dos que já existem em Arcachon, Dunkerque e Ostende.

c) A ter em actividade dentro de tres annos um estabelecimento com tanques ou reservatorios para engorda das ostras.

d) A melhorar a producção d'estas de modo que possam constituir um artigo de exportação regular.

e) Finalmente a pagar 180 réis por cada metro cubico que exportar.

Em compensação concede-lhe o governo durante os trinta annos do contrato, e na area da concessão, o exclusivo da apanha das ostras para o commercio externo.

A concessão d'este exclusivo, e a fixação do direito de exportação em 180 réis por metro cubico, são as duas condições que dependem, segundo a proposta do governo, de sancção legislativa.

Para se conseguir o fim da conservação e melhoramento das ostreiras não havia senão tres systemas a seguir: ou faze-lo o estado, ou deixa-lo á industria particular se a houvesse e desse garantias, ou encarregar d'isso um particular ou companhia, fazendo-lhe mediante certas vantagens a concessão mais ou menos limitada de bancos emprehendidos em certa e determinada area.

O primeiro systema não podia adopta-lo o governo, porque iria converter-se em industrial.

O segundo era inexequivel, porque não temos infelizmente industria particular organisada com esse fim, e dando garantias, e porque urgia prover de remedio.

Restava o terceiro systema. Foi o que o governo seguiu, celebrando o contrato sujeito á vossa approvação.

Considerando que sem o exclusivo não poderia o estado exigir do concessionario a conservação dos bancos existentes, o seu melhoramento e a creação de outros;

Considerando que esse exclusivo só tem por objecto os bancos comprehendidos na area da concessão, e não outros, e esses mesmos só com respeito á exportação, ficando livre o commercio interno;

Considerando que as restricções ao direito de pesca em aguas publicas, sendo já admittidas na legislação antiga, acham-se consagradas na moderna, e até no artigo 395.° do codigo civil;

Considerando que os sacrificios que exige o cumprimento do contrato, e o risco da tentativa, justificam a modicidade do direito de exportação n'elle fixado;

Considerando por um lado que da fiel execução do mesmo contrato devem resultar incontestaveis vantagens pela creação de uma industria nova entre nós, e attendendo por outro lado a que, ainda malogradas as esperanças do concessionario, nada perde o estado, porque em todo o caso viria a receber o objecto da concessão em melhores condições do que o entrega;

Considerando finalmente que a simples concessão dos bancos de ostras na area demarcada tambem carece de sancção legislativa;

Parece á vossa commissão que deve a proposta do governo ser approvada nos termos expostos e convertida no seguinte projecto de lei.

Artigo 1.° E approvado, na parte que carece de sancção legislativa, o contrato celebrado entre o governo e José Vicente Barbosa du Bocage, em 10 de agosto de 1867, o qual fica fazendo parte integrante d'esta lei, com as seguintes declarações:

1.ª O governo fica no direito de inspeccionar, como e pelos meios que julgar convenientes, o modo por que é executado o contrato;

2.ª As obras a fazer pelo concessionario serão previamente sujeitas á approvação do governo;

3.ª O concessionario ou seus cessionários responderão por perdas e damnos, pela inexecução do contrato alem da pena estabelecida no mesmo contrato;

4.ª O concessionario não poderá ceder a sua concessão sem previa licença do governo, ficando os cessionários em tudo sujeitos ás mesmas condições.

Art. 2.° É revogada a legislação em contrario. Lisboa, 15 de junho de 1868. = Jacinto Augusto de Freitas e Oliveira = Carlos Testa = Levy Maria Jordão = Antonio Cabral de Sá Nogueira = José Maria Lobo d'Avila = Francisco Luiz Gomes.

N.º 4-AE

Senhores. — O contrato que o governo celebrou em 10 de agosto de 1867 com José Vicente Barbosa du Bocage, para a cultura e aperfeiçoamento das ostras, n'uma area limitada na margem esquerda do Tejo, tem por objecto assegurar a conservação dos bancos naturaes de ostras, comprehendidos n'essa demarcação, melhorando as suas condições, e ao mesmo tempo promover pela maneira mais efficaz e racional a creação de uma nova industria, que poderá assumir de futuro uma grande importancia.

As ostras eram ha muito em varios paizes da Europa um alimento assás estimado; porém ha annos o consumo d'este mollusco alimento attingiu quasi de subito, em França e Inglaterra, proporções realmente extraordinarias.

D'esta exageração do consumo resultou, como era de prever, a pesca imoderada nos bancos naturaes de ostras, e por ella se chegou dentro em pouco tempo á destruição total de uma boa parte d'esses bancos.

Reconheceu-se então que uma industria importante e um producto alimentício de grande valor podiam de um dia para outro desapparecer; comprehendeu-se a gravidade d'esta situação, a ambos os paizes procuraram pelos meios mais conformes aos seus habitos de administração e á indole de seus habitantes, restabelecer e augmentar as ostreiras, e favorecer a cultura das ostras.

Em França principalmente o governo tem sido solicito em promover a multiplicação artificial das ostras, distribuindo pelos particulares os terrenos mais apropriados á fundação de ostreiras, facilitando a acquisição e transporte das ostras destinadas á propagação, fundando parques experimentaes que servissem de incitamento instructivo e de viveiros para a industria particular, tem n'uma palavra procurado por todos os meios ao seu alcance dar largo e rapido desenvolvimento á nova industria.

Em Portugal os bancos naturaes de ostras reduzem-se quasi aos que existem no Tejo, disseminados pelas duas margens, bancos que a tradição popular considera, com mui pouca verosimilhança, de data recente, attribuindo-os á fecunda iniciativa do marquez de Pombal.

Qualquer que seja porém a origem das ostreiras do Tejo, é certo que as ostras que ali se criam são muito inferiores como alimento, ás de França e de Inglaterra, e muito distinctas d'estas por caracteres physicos importantes. As ostras de França e Inglaterra, embora constituam variedades mais ou menos distinctas, embora diffiram entre si nos dotes que as fazem apreciar mais ou menos como alimento, podem referir-se ao mesmo typo especifico o alcançam hoje nos mercados um preço sempre remunerador. As nossas ostras, pelo contrario, distinguem-se tão completamente de todas as ostras que não só como de outra especie, mas até como de outro genero mui distincto têem sido consideradas pelos zoologistas, o como alimento apresentam-se geralmente tão magras e com um travo tão desagradavel, que não é possivel faze-las aceitar para o consumo immediato nos mercados estrangeiros.

Esta grande inferioridade das nossas ostras, que explica a rasão por que é limitadissimo no paiz o seu consumo, assegurar-nos-ia a duração indefinida dos nossos bancos se o desequilibrio entre a producção e o consumo das ostras em França e Inglaterra não viesse de repente pôr em risco a sua existencia.

As nossas ostras podem talvez, collocadas em condições mais vantajosas, sujeitas a certos tratamentos que a sciencia aconselha, ao cabo de mais ou menos tempo melhorar por modo que alcancem nos principaes mercados do estrangeiro um preço remunerador; podem alem d'isso ser empregadas na reproducção o formarem bancos artificiaes, cujos productos vão successivamente ganhando em qualidade e por conseguinte em valor.

Ora, foi precisamente inspirada por estas esperanças e levada por estes intuitos que, depois de ver exhauridas as ostreiras naturaes de Hespanha, cujas ostras se assimilham

Página 1855

1855

ás do sul da França, a industria franceza poz a mira nos bancos do Tejo e começou a abastecer-se d'elles. E apesar de ser uma tentativa de exito duvidoso, a exportação de ostras assumiu logo uma certa importancia, sendo facil de antever o que succederia logo que o resultado da especulação fosse feliz e se divulgasse.

Os factos que ficam resumidamente expostos explicam e justificam cabalmente o contrato de 10 de agosto. Os seus effeitos naturaes são faceis de comprehender. Subtrahir as nossas melhores ostreiras á devastação de que se achavam ameaçadas, assegurar o seu melhoramento e renovação, promover no paiz ensaios e tentativas racionaes para o aperfeiçoamento de um producto natural, em ordem a dar-lhe entrada nos mercados estrangeiros, converter um terreno baldio e improductivo n'um vasto campo de cultura, garantindo trabalho certo, regular e constante a uma das classes sociaes mais desfavorecidas da fortuna; taes são os resultados infalliveis do contrato logo desde a inauguração da nova industria.

Ha no contrato de 10 de agosto duas estipulações que carecem de sancção legislativa, e que por isso o governo vem submetter á vossa approvação.

Uma estabelece que o concessionario pagará ao estado 180 réis por cada metro cubico de ostras que exportar (condição 6.ª), outra concede-lhe o privilegio exclusivo por trinta annos de exportar ostras colhidas nos bancos comprehendidos na sua demarcação (condição 8.ª).

A modicidade do direito e a necessidade do privilegio exclusivo justificam-se facilmente pela indole mesmo da empreza, pela sua natureza precaria e arriscada, pelos sacrificios de capitaes que exige o fiel cumprimento das obrigações a que o concessionario fica sujeito, pela circumstancia importantissima de que findo o praso do privilegio reverte para o estado não sómente o que o concessionario recebeu e melhorou, mas tudo o que elle creou á custa dos seus, capitaes e da sua diligencia, toda a propriedade e toda a industria do concessionario.

Sem o privilegio exclusivo o estado não podia assegurar ao concessionario a conservação dos bancos d'onde precisa tirar a materia prima necessaria para a despendiosa industria que vae estabelecer, e menos poderia exigir d'elle o melhoramento d'esses bancos e a creação de outros.

Continua a ser permittida a apanha das ostras nas ostreiras naturaes, com tanto que sejam destinadas ao consumo interno. Este é por tal fórma limitado, que não poderá d'ahi resultar a destruição das ostreiras; alem de que, conseguindo o aperfeiçoamento das ostras pelos meios que o concessionario se propõe empregar, é evidente que o consumo das que provenham immediatamente dos bancos naturaes ainda ficará mais reduzido.

A industria ostreira, limitada como se acha entre nós á apanha das ostras para consumo do paiz, serve apenas de ganha pão a alguns, muito poucos, infelizes pescadores.

A exportação de ostras para França tem occupado periodicamente um maior numero de braços e fornecido trabalho aos pescadores de certas localidades, com intervallos mais ou menos longos; mas alem de ruinosa para o paiz, esta industria esta mui longe de offerecer a esta classe proletária as vantagens que lhe hão de vir immediatamente do contrato de 10 de agosto.

O concessionario precisa acudir promptamente ás ostreiras naturaes, limpando-as todas e renovando muitas que se acham em deploravel estado; tem de estabelecer ostreiras artificiaes, já com ostras escolhidas das nossas, já com ostras trazidas de outros pontos do paiz e do estrangeiro; tem de fundar vastos reservatorios e parques de engorda, onde as ostras encontrem melhor alimentação e condições mais favoraveis ao seu desenvolvimento e onde melhorem de qualidade. Todos estes trabalhos multiplos e incessantes demandam o emprego permanente de braços muito mais numerosos do que os que exigiria, durante um certo praso, a apanha de ostras em tão grande escala que importasse a destruição total das ostreiras.

A industria privilegiada fornecerá pois mais trabalho, e um trabalho mais constante do que a apanha livre, e se a sorte lhe correr favoravel concorrerá com um subsidio valioso para o augmento da riqueza publica.

A policia das pescarias maritimas e a concessão de terrenos nas margens dos rios publicos são attribuições do governo, não só pela legislação antiga como pelos decretos de 6 de novembro de 1830 e 6 de setembro de 1859, e pela lei de 26 de junho e portaria de 5 de agosto de 1867. Estas attribuições foram sempre exercidas pelo governo, como mostram as portarias de 8 de março de 1842, 19 de agosto do 1844, 29 de maio e 5 de junho de 1867 e 21 de fevereiro de 1868.

O codigo civil não alterou o direito estabelecido, porque o artigo 395.° e o artigo 432.° sujeitam o direito de pescar nas aguas publicas e communs, e o de fazer obra ou construcção permanente para aproveitar estas aguas, aos regulamentos administrativos e á licença previa da auctoridade administrativa.

Por conseguinte, se não fosse estipulado o direito de exportação e o exclusivo, nem haveria necessidade de contrato, nem de confirmação legislativa.

Para obter esta confirmação, para crear uma industria importante e para assegurar ao estado as* vantagens directas e indirectas que a prosperidade da mesma industria ha de forçosamente produzir, temos a honra de submetter ao vosso esclarecido exame e approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E approvado, na parte que depende de confirmação legislativa, o contrato de 10 de agosto de 1867, celebrado pelo governo com José Vicente Barbosa du Bocage para a cultura e aperfeiçoamento das ostras na margem esquerda do Tejo.

§ unico. Fica o mesmo contrato fazendo parte da presente lei.

Art. 2.° É revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 2 de maio de 1868. = Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas = José Rodrigues Coelho do Amaral.

Termo do contrato celebrado entre o governo e o dr. José Vicente Barbosa du Bocage, para o fim de aperfeiçoára cultura das ostras e estabelecer ostreiras artificiaes e reservatorios de engorda.

Aos dez de agosto de 1867 no gabinete do ex.mo sr. João de Andrade Corvo, ministro e secretario d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, estando presentes de uma parte o mesmo ex.mo sr. ministro e o ex.mo sr. visconde da Praia Grande de Macau, ministro da marinha e ultramar, e da outra parte o dr. José Vicente Barbosa du Bocage, por elles foi dito, que para o fim de aperfeiçoar a cultura das ostras, e estabelecer ostreiras artificiaes e reservatorios de engorda tinham concordado nas condições seguintes:

O concessionario, o dr. José Vicente Barbosa du Bocage, obriga-se:

1.ª A conservar e augmentar os bancos naturaes que existam em boas condições na area comprehendida entre o pontal de Cacilhas e Barja, ou Alcochete, e a estabelecer ostreiras artificiaes nos pontos que parecerem mais convenientes.

2.ª A ter no fim de tres annos em plena actividade um estabelecimento destinado á engorda das ostras.

3.ª A melhorar a producção e a qualidade das ostras, de modo que possa vir a ser um artigo de exportação regular para o estrangeiro.

4.ª A respeitar os portos de desembarque, os canaes e caneiros que dão accesso a povoações e propriedades, e a não prejudicar estas propriedades pelas construcções que houver do fazer.

5.º A permittir dentro de uma demarcação quaesquer obras ou construcções auctorisadas pelo governo, estranhas á industria das ostras, e que não prejudiquem o seu estabelecimento industrial.

6.ª A pagar ao estado 180 réis por cada metro cubico de ostras que exportar.

7.ª A restituir ao estado no fim de trinta annos os bancos naturaes e artificiaes de ostras e o estabelecimento de engorda, sem remuneração nem indemnisação alguma.

8.3 Durante o espaço de trinta annos, só ao concessionario, e a nenhuma outra pessoa, sociedade ou companhia, é permittido estabelecer ostreiras artificiaes e tanques de engorda, e colher ou dragar ostras para o commercio externo dos bancos existentes, ou que vierem a existir dentro da area fixada e demarcada em virtude da condição 1.º

9.ª A demarcação da area será feita por um agente do, governo e o concessionario ou seu legimo representante.

10.ª As condições 6.ª e 8.ª ficam dependentes da approvação das côrtes.

11.ª Dentro dos limites fixados na condição 1.º, e logo que este contrato seja assignado, alem do concessionario ninguem poderá nos bancos comprehendidos n'essa demarcação colher, dragar ou por qualquer modo extrahir ostras para o commercio externo. É o governo obriga-se a tomar as providencias necessarias para manter esta prohibição.

12.ª O concessionario perderá o exclusivo outorgado na condição 8.ª, se não cumprir as clausulas d'este termo.

13.ª O praso de tres annos fixado na condição 2.ª, começa a correr da data d'este contrato, e o praso de trinta annos fixado na condição 8.ª começa a correr da data da lei que approvar a mesma condição.

A estas condições se obrigaram os outorgantes, aos quaes perante as testemunhas, o conselheiro Diogo Nicolau Possollo, chefe de secção da repartição central; o amanuense da mesma repartição, Luiz Antonio Namorado; e o bacharel Antonio Cardoso Avelino, ajudante do procurador geral da corôa, junto do ministerio das obras publicas, commercio e industria, eu Antonio Augusto de Mello Archer, secretario d'este ministerio, li este termo, que fiz escrever, rubriquei e subscrevi, e que vão assignar commigo os mencionados outorgantes e mais pessoas já referidas. = Visconde da Praia Grande = João de Andrade Corvo = José Vicente Barbosa du Bocage. =Fui presente, Antonio Cardoso Avelino = Diogo Nicolau Possollo = Luiz Antonio Namorado =Antonio Augusto de Mello Archer.

O sr. Presidente: — Este projecto tem uma só discussão.

O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra, não para impugnar o contrato, que approvo com todas as suas condições, mas para propor mais uma condição que me parece conveniente que a camara approve.

Leu-se, e é a seguinte

Proposta

5.ª O concessionario não terá direito algum a qualquer indemnisação por obras publicas que no futuro seja necessario fazer nas margens do Tejo. = José de Moraes Pinto de Almeida, deputado pelo 1.° circulo da Figueira.

Foi admittida.

O sr. Fradesso da Silveira: — Diz o meu collega e amigo, o sr. José de Moraes, que lhe parece conveniente addicionar mais a seguinte condição (leu).

Li-a com attenção, e não digo que não a comprehendo, mas parece-me que o illustre deputado foi pouco benigno comnosco, foi excessivamente laconico, porque mandou a sua proposta, e não quiz ter a benevolencia de desenvolver um pouco os fundamentos d'ella.

Eu creio que o concessionario nunca póde pedir indemnisações por obras publicas que se façam no local a que se refere o seu contrato. Creio que o governo quando manda fazer obras n'aquella localidade, usa das faculdades que tem para isso, e não sei que o concessionario possa requerer indemnisações em virtude d'essas obras que o governo fizer. Portanto não posso descobrir o alcance que tem á proposta do illustre deputado. Todavia é possivel que ella tenha alcance, e digo mais, acredito que o deve ter, porque deposito muita confiança na intelligencia do illustre deputado, o sr. José de Moraes, que n'estes negocios é extremamente minucioso e cuidadoso, e que por certo não faria a sua proposta sem motivo.

Peço portanto a s. ex.ª que me interrompa, explicando a sua proposta, para que eu possa dizer se a aceito ou não. Se s. ex.ª não me quer interromper, e quer fallar depois, calo-me, e peço a v. ex.ª me conceda a palavra depois do illustre deputado ter fallado.

O sr. José de Moraes: — Responderei ao illustre deputado em duas palavras.

Eu quero que a condição que propuz seja incluida no contrato, não por desconfiar da pessoa com quem contratamos, mas porque devemos ser cautelosos em todos os contratos. Eu não quero que ámanhã por causa das obras do caminho de ferro, que se podem fazer, este concessionario ou outro qualquer em identicas circumstancias venha dizer que foi prejudicado, e que tenhamos de lhe pagar alguma indemnisação.

Se o illustre deputado entende que a condição que proponho não serve de nada, porque a doutrina d'ella se subentende do que já esta no contrato, é isso mais um motivo para que se approve, porque se torna assim o contrato mais claro, e se dá o caso do quod abundai non nocet.

Portanto se o illustre deputado entende que a minha condição esta na letra e no espirito do contrato, e que é escusado vota-la, vota n'esse sentido; eu não approvo o contrato sem a condição que propuz.

O sr. Fradesso da Silveira: — Agora tenho comprehendido. O illustre deputado o que deseja é que se um dia o governo for obrigado a fazer uma obra qualquer na toca lidado do que se faz concessão para ser explorada, não tenha o concessionario direito de exigir do estado indemnisação por ter de alguma fórma transtornado o seu negocio, fazendo modificações no terreno a que a concessão se refere. Isto parece-me rasoavel. As condições estão feitas como se devem fazer; mas parece-me rasoavel que se acautele tambem essa eventualidade, que não me parece muito provavel, mas que emfim se póde dar. Se porventura um dia, pelas obras que se fizerem nas margens do Tejo, for offendido algum dos bancos de ostras que foram concedidos ao concessionario, elle não tem direito a requerer indemnisação; parece-me isto justo, e não tenho duvida em o aceitar: entretanto é preciso advertir que se para aceitar modificações dos contratos são ouvidas as commissões, o primeiro que deve ser ouvido é o governo.

O governo faz um contrato com um concessionario debaixo de certas condições, e a camara estabelece mais outra condição; mas o governo é que tem de dizer se a aceita ou não. Se o governo a aceitar e o concessionario não, fica sem effeito o contrato.

Parece-me que a camara não póde exigir ao concessionario que aceite a condição imposta pelo sr. José de Moraes. O governo póde dizer se se conforma ou não com essa condição e os motivos, e auctorisado depois a fazer o contrato, celebra-o conforme essas bases, se forem aceitas.

O sr. Presidente: — A proposta do sr. José de Moraes é considerada como um additamento ao projecto, e por consequencia ha de ser votada depois de se votar o projecto.

O sr. Freitas e Oliveira: — Não me parece que se realise o que a proposta do sr. José de Moraes pretende prevenir, mas quando se realise, parecia-me conveniente que se julgasse este objecto como de direito commum.

Se o governo tiver de fazer obras que prejudiquem outras já feitas pelo concessionario, entendo que estas devem ser expropriadas por utilidade publica, e seguirem-se n'este caso as mesmas praticas que se seguem nas expropriações.

Desde o momento em que se concedem aquelles bancos ao concessionario, ficam sendo propriedade d'elle, não se podendo causar-lhe o menor prejuizo sem que se lhe dê, como indemnisação, o preço da expropriação.

Pela minha parte não voto senão n'este sentido.

O sr. Fradesso da Silveira: — Chamo a attenção da camara para a condição 5.ª do contrato, que diz o seguinte:

«A permittir dentro de uma demarcação quaesquer obras ou construcções, auctorisadas pelo governo, estranhas á industria das ostras, e que não prejudiquem o seu estabelecimento industrial.»

O sr. Rodrigues do Amaral: — É justamente por causa da condição 5.ª do contrato que me parece que a proposta do sr. José de Moraes não póde ser approvada:

Se o concessionario fica obrigado a permittir dentro da demarcação quaesquer obras ou construcções auctorisadas pelo governo, e estranhas á industria das ostras, de modo que não prejudiquem o seu estabelecimento industrial), é claro que ficará prejudicado se não lhe for dada a indemnisação precisa no caso contrario (apoiados). Parece-me, repito, que a proposta não póde ter logar, porque se vão annullar as vantagens que se têem em vista conceder a este estabelecimento industrial;

Supponha-se a hypothese de uma rectificação da margem do rio, que destroe as ostreiras ou parte dellas, fica assim prejudicada a industria que se pretende estabelecer. Dado este caso não ha outro meio senão expropriar por utilidade publica.

Não havendo mais ninguem inscripto, foi approvado o projecto, e rejeitada a proposta do sr. José de Moraes.

O sr. Secretario (José Tiberio: — Acha-se sobre a mesa o parecer da commissão administrativa da casa, sobre as contas da junta administrativa durante o intervallo das sessões.

Página 1856

1856

Se algum sr. deputado quizer examinar as contas póde faze-lo, para depois ser este parecer dado para ordem do dia.

Vae ler-se para que a camara tenha conhecimento d'elle. É o seguinte:

Parecer

Senhores. — A vossa commissão administrativa da examinando com todo o escrupulo e minuciosidade as contas da gerencia da junta administrativa da mesma casa, durante o anno civil de 1867, de 14 de janeiro a 30 de abril do corrente anno, e achando-as regulares e conformes, é de parecer que ellas sejam approvadas; entendendo outrosim, que de futuro nenhumas verbas de serviço extraordinario sejam pagas a quaesquer empregados da casa extraordinariamente admittidos, uma vez que não estejam auctorisadas no orçamento geral da receita e despeza do estado, porque é a commissão tambem de parecer, que nenhum outro pessoal póde ser admittido, maxime, depois de fechadas as camaras, alem daquelle que se acha fixado no mesmo orçamento.

Lisboa, e sala da commissão, aos 15 de julho de 1868. = Costa e Silva, presidente = Visconde dos Olivaes = Antonio Gomes Brandão = José dos Prazeres Batalhoz = José Tiberio de Roboredo Sampaio e Mello, relator secretario.

Leu-se na mesa e entrou em discussão o seguinte

Projecto de lei n.º 25

Senhores. — As vossas commissões de fazenda e de obras publicas reuniram-se e discutiram com a circumspecção devida, a proposta apresentada á camara em data de 22 de junho d'este anno pelo governo, como substituição da que fôra apresentada em 25 de maio proximo passado, concernente ao accordo celebrado entre o governo e os representantes da companhia concessionaria dos caminhos de ferro de sueste.

Vem este accordo a ser uma modificação dos contratos approvados pelas leis de 29 de maio de 1860 e de 23 de maio de 1864, que regulam a concessão, que é consequencia das difficuldades insuperaveis que encontrou a companhia concessionaria.

Por virtude do mencionado accordo se estipula:

1.°— Que fica sem effeito a concessão dos caminhos de ferro do Barreiro a Vendas Novas e a Setubal, dos quaes toma de novo posse o governo com todos os melhoramentos n'elles effectuados pela companhia concessionaria.

2.°— Que fica a cargo da companhia a construcção de estações e de pontes, caes n'uma e n'outra margem do Tejo, bem como do ramal que ligue a estação da margem esquerda com a do Lavradio, tudo segundo os projectos que forem approvados pelo governo.

3.°— Que passam a ser propriedade do governo os dois vapores da companhia, destinados á passagem do Tejo.

4.°— Que a companhia construirá no praso de dois annos 52 kilometros de caminho de ferro que ligue Evora a Extremoz, no praso de seis mezes 47 kilometros de caminho de ferro que ligue Beja a Cazevel, direcção a Faro, e finalmente no praso de dois mezes 20 kilometros de caminho de ferro que ligue Beja ao Guadiana, tudo nas condições technicas e economicas dos contratos anteriores, com a subvenção de 18:000$000 réis por kilometro, ficando por esta fórma adiada a construcção dos caminhos de ferro de Extremoz ao Crato, de Cazevel a Faro e do Guadiana á fronteira, ao todo 178 kilometros de extensão.

5.°—Que approvado o accordo, e logo que a companhia se constitua legalmente, pagará o governo:

1.°— A subvenção correspondente aos kilometros já construidos;

2.°— 276:726$000 réis pelo alargamento da via e outras obras no caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas;

3.° — 46:626$509 réis pelos dois vapores destinados á passagem do Tejo;

4.° — 5:198$997 réis pelas obras acrescidas nos caminhos de ferro de Evora a Beja;

5.° — 63:500$000 réis pelo estudo dos caminhos de ferro até Faro e Crato;

6.° — 250:000$000 réis pelos trabalhos effectuados em 25 kilometros entre Faro e Boliqueme;

7.°— 2:700$000 réis pelos trabalhos dó tunel de S. Marcos entre Cazevel e Boliqueme; sendo todas estas sommas pagas a começar no 2.° semestre de 1868 em titulos de 7 por cento de juro com amortisação de ½ por cento pagaveis em Londres.

6.° — Que o governo pagará mais á companhia:

1.° — 40:000$000 réis pela obra da estação de Lisboa, alem das expropriações necessarias;

2.° — 40:000$000 réis pela ponte caes na margem direita do Tejo;

3.° — 102:000$000 réis pela dita da margem esquerda do Tejo, estação e ramal para o Lavradio.

7.° — Que a companhia restituirá ao governo os antigos carris do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas, ou seu equivalente em peso de carril novo.

8.° — Que durante seis annos a companhia explorará o caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas, -sem que o estado soffra perda alguma na exploração, e recebendo o producto liquido correspondente a 77 kilometros, deduzido do da exploração de todas as linhas ferreas a cargo da companhia, ficando para convenio especial a mesma exploração passados os ditos seis annos, e tendo a companhia preferencia, em igualdade de condições, no caso da venda do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas.

9.° — Que o contrato definitivo, auctorisando este accordo, será feito com sujeição ás bases supra indicadas, e com as clausulas, seguranças e penalidades expressas nos contratos de 29 de maio de 1860 e de 23 de maio de 1864.

Depois de examinados todos os documentos relativos ao assumpto, de ouvidas as explicações franca e sinceramente dadas pelo governo, e de mui bem apreciados os encargos e consideradas as vantagens de alargar a rede dos caminhos de ferro do paiz com mais 119 kilometros em tres direcções, o que terá benefica influencia na economia publica, resolveram as commissões reunidas propor-vos a approvação do convenio de 22 de junho do corrente anno.

Sejamos, senhores, juizes imparciaes, e não influa em nosso animo nem a má vontade, nem nenhum preconceito quanto a pessoas e a cousas. O accordo em questão é mais um capitulo do livro de registo dos esforços empregados para dotar as nossas provincias do sul com os beneficios da viação a vapor, beneficios compartilhados por todo o reino. Mais alguns capitulos teremos que juntar a esse livro para fazermos girar a locomotiva de Villa Real a Lagos, entre o Algarve e o norte do reino, entre o Algarve e Alemtejo e as portas do Mediterraneo, sem que uma só terra importante daquellas duas ricas provincias, sem que uma unica das suas industrias deixe de ser auxiliada pela força do vapor.

Quando attentamente examinamos a historia d'estes ultimos quatorze annos, em relação aos caminhos de ferro do sul do Tejo, o que vemos, senhores?

Primeiramente esboçar com mão tremula um carril de pau entre o Tejo e Vendas Novas, que logo depois se muda em carril de ferro para ser explorado com a força animal, e em seguida pela do vapor. E tudo isto são modificações do contrato inicial, e tudo isto importou sacrificios para o thesouro. Bem depressa os carris de ferro chegam ás tres capitaes dos districtos alentejanos, e sempre com despendios grandes por parte do thesouro, e desacompanhados dos auxilios das localidades, apesar de mui solemnemente promettidos. Porquanto as subvenções do estado, em vez de diminuir, pelo contrario augmentam, e quasi duplicam em relação á subvenção paga para o caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas.

Entretanto os intuitos dó progresso não podiam parar em Beja ou Evora.

A lei de 23 de maio de 1864 arrojadamente decreta que a rede dos caminhos de ferro do sul se ligue com a do norte em Crato, e com os caminhos do ferro hespanhoes de Andaluzia e com os portos do Algarve. E a subvenção kilometrica augmenta! Ensaia-se depois o systema da garantia de um certo producto bruto kilometrico, e as difficuldades recrudescem para levantar os capitaes a tal ponto, que a empreza que tinha tentado vence-las succumbe e cáe debaixo da sancção penal do artigo 15.° do contrato de 23 de maio de 1864!

Onde encontrareis mais clara, mais expressa e terminante do que nos termos draconianos dos §§ 1.°, 2.° e 3.° d'aquelle artigo 15.°?

Quem duvida, senhores, que o estado esta no pleno direito de sequestrar á companhia concessionaria todos os capitaes empregados; 1.°, para alargar a via ferrea do Barreiro a Vendas Novas e Setubal, passando de 1m,44 a 1m,67, e para melhorar estações e outros accessorios d'esta linha e da de Evora a Beja; 2.°, para estudar os traçados dos caminhos de ferro para Crato, Guadiana e Faro, aliás difficilimos nas passagens das serras de Ossa e do Algarve; 3.°, para pôr em curso de construcção todos estes caminhos em muitos kilometros?

Ninguem, senhores, nem os proprios concessionarios. O que fizeram elles quando, aberta a praça em 7 de outubro de 1866, nos termos do contrato, não appareceram licitantes que lançassem sobre o valor de tantas leguas de caminho de ferro?

Perguntaram ao governo portuguez o que tencionava fazer em taes circumstancias!

Respondeu que tinha resolvido tomar conta de todos os caminhos de ferro da companhia de sueste, garantindo a esta companhia o juro de 7 por cento e a amortisação de ½ por cento em relação á somma de 5.944:576$373 réis gasto effectivamente pela companhia, segundo o exame feito pelo engenheiro fiscal do governo, de accordo com o engenheiro da companhia para o effeito da licitação em praça, com um abate de 20 por cento n'essa somma, isto a começar de 1 de julho do corrente anno.

Adverti, senhores, que n'esta verba se comprehendem as sommas levantadas pela companhia por meio de obrigações para o acabamento das linhas de Evora e Beja, para os trabalhos em continuação d'estas linhas e para differentes obras accessorias e pagamentos de juros, etc...

Foi mal recebido este accordo pelas commissões reunidas, que viram n'elle um pesado sacrificio para o thesouro, sem a vantagem de continuar os caminhos, e com o perigo de afastar d'esta industria importante para o paiz a acção emprezaria, tomando o governo a seu cargo a construcção e exploração dos caminhos de ferro ao sul do Tejo.

As commissões reunidas rejeitaram unanimemente o projecto, e n'ellas prepondera a idéa de vir a novo accordo sobre as seguintes bases: 1.ª, o menor encargo possivel para o thesouro na actual conjunctura; 2.ª, o proseguimento da construcção dos caminhos de ferro em direitura ao Algarve, ao Guadiana e ao entroncamento com a rede de leste e norte; 3.ª, não se incumbir por modo algum o governo do serviço da exploração.

É o accordo que o governo fez, é a proposta em discussão. O que representa ella, senhores? Um encargo para o thesouro de 2.968:751$506 réis a solver por titulos de 7 por cento e ½ por cento de amortisação pagaveis em Londres a começar no corrente semestre pelas quantias a que a companhia tiver direito segundo o desenvolvimento que der ás obras.

Por onde se mostra que o encargo é menos de metade do que era pelo primeiro accordo. O que sendo muito nas actuaes circumstancias, é nada em comparação das demais vantagens do accordo.

Consistem estas desde logo na construcção de 119 kilometros de caminho de ferro, e na de estações de um e outro lado do Tejo, ramal do Lavradio e outras obras, que demandarão o emprego de muitos braços, darão logar ao derramamento de um grande capital sobre o paiz, creando novos incrementos de actividade e riqueza.

E com effeito os 119 kilometros que vão augmentar-se aos que actualmente se exploram no reino custam a pouco mais de 25:000$000 réis cada um, suppondo que as verbas todas garantidas á companhia nem eram devidas nem representavam utilidade publica de nenhuma especie, o que não é exacto. E por outra parte a subvenção concedida ao caminho de ferro do norte e de leste, caminho de muito mais importancia, e de muito mais valiosa exploração, inda mal feita, e supportando mil abusos e desperdicios, foi proximamente igual.

Por todas estas considerações, as vossas commissões reunidas ousaram, confiadas na elevação das idéas e na pureza dos sentimentos da camara, propor-vos a approvação do accordo nos seguintes termos:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° E o governo auctorisado a contratar definitivamente com a companhia do caminho de ferro de sueste, nos termos das bases assignadas em 20 de junho de 1868, as quaes ficam fazendo parte d'esta lei.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 7 de julho de 1868. = Carlos Bento da Silva (vencido) = José Gregorio Teixeira Alargues (vencido) = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc (com declaração quanto ás bases para o contrato com a companhia do caminho de ferro de sueste) = Joaquim Henriques Fradesso da Silveira (vencido) = Antonio Joaquim Ferreira Pontes = Gilberto Antonio Rolla (vencido) = José Bandeira Coelho de Mello (vencido) = Francisco Van-Zeller = Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães = João Antonio dos Santos e Silva = Justino Ferreira Pinta Basto = Lourenço Antonio de Carvalho (approvo com declarações que exporei na camara) = José Maria Rodrigues de Carvalho (vencido) = Belchior José Garcez, relator = Augusto Pinto de Miranda Montenegro (approvo com declarações que farei na camara) = Tem voto a favor dos srs. Manuel José Julio Guerra = Antonio Maria Barreiros Arrobas = Antonio Correia Caldeira = Antonio José Teixeira =Tem voto contra do sr. Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

N.º 18-G

Senhores. — Em substituição á proposta de lei apresentada n'esta camara em 25 de maio ultimo, temos a honra de submetter á vossa deliberação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E o governo auctorisado a contratar definitivamente com a companhia do caminho de ferro de sueste, nos termos das bases assignadas em 20 de junho de 1868, as quaes ficam fazendo parte d'esta lei.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 22 de junho de 1868. = José Dias Ferreira = Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas.

CAMINHOS DE FERRO DE SUESTE

Bases

1.ª

Ficam sem effeito a concessão que o governo fez do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas com o ramal de Setubal á companhia do caminho de ferro de sueste, e a obrigação que esta companhia contrahiu de pagar ao estado 1.800:000$000 réis, nos termos dos artigos 1.° e 2.° do contrato de 23 de maio de 1864, revertendo para o estado o mesmo caminho e ramal, com todo o seu material fixo e circulante, edificios, accessorios e dependencias, alargamentos e mais obras feitas pela companhia, posteriormente ao citado contrato.

2.ª

A companhia obriga-se a construir em Lisboa uma estação de passageiros e mercadorias, com uma ponte de embarque e desembarque sobre o Tejo, e tambem se obriga a construir na margem esquerda d'este rio, no sitio do Mexilhoeiro, uma estação de passageiros, com uma ponte de embarque e desembarque, e um ramal que ligue esta ponte com a estação do Lavradio.

§ unico. Estas estações, pontes e ramal serão construidos segundo os projectos que o governo approvar, não podendo o custo da estação e ponte em Lisboa exceder o que respectivamente vae fixado na base 6.ª, e ficarão sendo parte da linha do Barreiro ás Vendas Novas.

3.ª

Ficam sendo propriedade do estado os vapores D. Carlos Fernando e D. Affonso, e serão destinados para a exploração do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas e ramal de Setubal.

4.ª

A companhia obriga-se á construcção e exploração por sua conta e risco:

1.° — Do prolongamento da linha de Evora a Extremoz, na extensão de 52 kilometros, os quaes deverão ser abertos á circulação no praso de dois annos;

2.° — Do prolongamento de Beja a Cazevel, na extensão de 47 kilometros, que deverão ser abertos á circulação no praso de seis mezes;

3.°— Do prolongamento de Beja á margem direita do Guadiana, na extensão de 20 kilometros, que deverão ser abertos á circulação no praso de dois mezes.

E dispensada a companhia de continuar os referidos prolongamentos de Extremoz ao Crato, de Cazevel a Faro e do Guadiana á fronteira de Hespanha.

§ unico. As construcções a que se refere esta base serão feitas nas condições technicas do contrato de 1864, e com a subvenção de 18:000$000 réis por kilometro.

Página 1857

1857

5.ª

Logo que seja promulgada a lei que approvar estas bases, a companhia se mostra constituida pela apresentação dos estatutos, em conformidade com a lei, e for assignado o contrato definitivo, o governo pagará á mesma companhia:

1.°— A subvenção de 18:000$000 réis por kilometro, correspondente aos kilometros já construidos nos prolongamentos de Evora a Extremoz, de Beja ao Guadiana e a Cazevel;

2.°— 276:726$000 réis, pelo alargamento da linha do Barreiro e ramal de Setubal e mais obras ahi feitas, em virtude do contrato de 1864;

3.°— 46:626$509 réis pela acquisição dos vapores, em virtude da base 3.ª;

4.° — 5:198$997 réis pelas obras feitas na linha de sueste, armazem da Cuba, e alargamento da estação de Vianna;

5.°— 63:500$000 réis pelos estudos feitos na parte dos prolongamentos que a companhia é dispensada de construir;

6.°— 250:000$000 réis por todas as obras e trabalhos feitos nos 25 kilometros da secção de Faro a Boliqueme, comprehendendo o material fixo;

7.°— 2:700$000 réis pelos trabalhos e obras feitas no tunel de S. Marcos.

§ 1.° A somma d'estas verbas será paga em titulos de 7 por cento, com ½ por cento de amortisação, pagaveis em Londres, e vencendo-se o coupon do primeiro semestre em 1 de janeiro de 1869.

§ 2.° Ficam sendo propriedade do estado os estudos, obras, trabalhos e material a que esta base se refere.

6.ª

Mais pagará o governo á companhia:

1.°— 40:000$000 réis para a construcção da estação em Lisboa, excepto as expropriações, que serão feitas e pagas pelo governo;

2.°— 40:000$000 réis para a construcção da ponte em Lisboa;

3.°— 102:000$000 réis para a construcção da ponte e estação do Mexilhoeiro e ramal do Lavradio.

§ unico. A importancia d'estas sommas, bem como a subvenção correspondente aos kilometros ainda não construidos nos prolongamentos de que trata a base 4.ª, será paga á proporção do desenvolvimento e progresso das respectivas obras e trabalhos, pelo modo que foi estipulado no contrato de 1864.

7.ª

A companhia é obrigada a collocar, convenientemente empilhados ao longo do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas, os carris e coxins que foram levantados do mesmo caminho para 75 kilometros de via, ou o peso equivalente em carris e coxins novos, quando faltem alguns dos velhos que foram removidos, e que revertem ao dominio do estado, em virtude da base 1.ª

8.ª

Se o governo resolver vender o caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas com o ramal de Setubal, terá a companhia o direito de preferencia em igualdade de condições; esta venda porém unicamente poderá ser effectuada no fim de seis annos, contados da data do contrato.

§ 1.° Durante este praso a companhia explorará o mesmo caminho e ramal, pagando ao estado o producto liquido da exploração.

§ 2.° A liquidação d'este producto será feita pelo seguinte modo: Sommando o producto bruto de todas as linhas, ramaes e prolongamentos, deduzir-se-hão d'elle os gastos de exploração e conservação e as despezas de administração, e o que ficar liquido será dividido pelo numero total de kilometros explorados, pertencendo ao governo o que corresponder a 77 kilometros, que será pago aos semestres.

§ 3.° Fica entendido e expressamente convencionado que o governo, em caso nenhum, terá parte nas perdas d'esta exploração.

§ 4.° Passado o praso de seis annos, e não se tendo effectuado a venda do caminho, será este explorado ou directamente pelo governo, ou pela companhia, precedendo convenção especial.

9.ª

Estas bases serão desenvolvidas em um contrato com todas as clausulas, seguranças e penalidades, aproveitando dos contratos de 1860 e 1864 todos os artigos que não forem contrarios ás mesmas bases.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 20 de junho de 1868. — Em additamento — Declara-se que os prasos fixados nos n.ºs 1.°, 2.° e 3.º da base 4.ª começarão a correr da data do contrato definitivo. Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 20 de junho de 1868. = (Assignados) José Dias Ferreira = Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas = J. T. Mackenzie = Philip Roze.

O sr. Mardel (para uma questão previa): — Desejava que o governo declarasse se aceita as bases d'este contrato, porque me parece que, sem esta declaração por parte do governo, a discussão póde ser perdida e de nenhum effeito. Se o governo aceita as bases do contrato, a discussão principia; se as não aceita, não ha que discutir. O governo responderá e a camara resolverá em conformidade com essa resposta.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Calheiros de Meneses): — Não sendo o governo, actual auctor do contrato que está em discussão, abstem-se de emittir a sua opinião a respeito d'elle, e aguarda a resolução da camara para proceder conforme for conveniente aos interesses do paiz.

Aproveito esta occasião para responder ao illustre deputado, o sr. Fradesso da Silveira. O mesmo que digo a respeito do contrato em geral, digo a respeito da nota apresentada por s. ex.ª O governo não emitte a sua opinião, por agora, porque não quer comprometter-se para qualquer negociação futura, e nem é opportuno emitti-la antes da discussão do contrato.

O sr. Mardel: — Peço licença para fazer uma reflexão ao illustre ministro das obras publicas. Pergunto eu: em nome de quem se apresentam á discussão estas bases? Se o governo não quer tomar a responsabilidade dellas, quem é que a ha de tomar? Parece que o governo, apresentando este contrato na camara e consentindo na sua discussão é porque o aceita; mas se ninguem o aceita, para que serve discutir? E praxe antiga n'esta casa, e nem podia deixar de o ser, que todas as vezes que o governo não aceita qualquer projecto do seu antecessor, a discussão d'esse projecto caducou; e quando a discussão continua, é porque o governo o aceitou.

Estas são as praxes estabelecidas; nunca se fez outra cousa, e eu desejava que o governo declarasse se toma ou não a responsabilidade d'este negocio. Que ha de o governo fazer senão tomar a responsabilidade ou declina-la? O governo não póde ter n'este caso senão uma posição muito definida. Se toma a responsabilidade do contrato, discute-se; se não toma, caducou.

Estas são as minhas opiniões, que me parece estarem de accordo com os precedentes e com o que é logico que seja. Não digo mais nada, e a camara interpretará como quizer a posição em que o governo se quer collocar.

O sr. Ministro da Fazenda: — Pedi a palavra unicamente para dizer ao illustre deputado, que acabou de fallar, que não se podem invocar as disposições regimentaes a proposito da discussão d'este contrato.

A discussão do contrato fórma parte de uma das clausulas d'elle, clausula que não esta nas mãos do poder executivo alterar de fórma nenhuma. E uma obrigação imposta pelo proprio contrato. O governo abstem-se de emittir a sua opinião sobre o contrato, mas a camara tem por força de manifestar a sua, porque, em virtude de um dos artigos do mesmo contrato, elle tem de ser sujeito á apreciação da camara.

O sr. Mardel: — Peço perdão ao nobre ministro da fazenda. A imposição da discussão d'este contrato esta nas bases apresentadas; se essas bases não forem aceitas pelo governo, pergunto eu, quem é que impõe a necessidade de discutir? Isto é um negocio muito simples, e parece-me que os precedentes não estão fixados no regimento; são consequencia logica e necessaria da natureza d'estas questões.

A imposição de discutir as bases d'este contrato é uma das proprias bases. Se as bases não têem validade, porque o governo as não aceita, não temos que discutir. Peço pois a attenção da camara sobre este ponto, porque póde acontecer que vamos perder muito tempo e muito trabalho para no fim se reduzir tudo a uma inutilidade.

O que é que se pede á camara? Pede ser auctorisação para o governo contratar com estas bases. É preciso pois que o governo diga se as quer ou não. Para que havemos de dar auctorisação ao governo para contratar sobre estas bases se elle disser que as não aceita? Se o governo as não quer, acaba a discussão.

Isto é o que me parece coherente. Se o governo aceita as bases, a camara vota-lhe a auctorisação; se as não aceita, não temos que discutir.

O sr. Fradesso da Silveira: — Este contrato foi apresentado na camara; está ligado a uma importante questão financeira; esta ligado com as necessidades do nosso thesouro; tem portanto uma certa gravidade, e é necessario não só que a camara se pronuncie sobre elle, mas que o governo tambem emitta a sua opinião. Não vejo n'isso tambem inconveniente. Se nós vamos votar a auctorisação de umas bases, e vamos dizer ao governo: «aqui tendes umas bases sobre as quaes podeis tratar», porque não ha de o governo, que esta á frente de nós, dizer se quer ou não aceitar essas bases? Parece-me que isto é claro; não vejo risco nenhum politico nem financeiro na franqueza com que o governo possa declarar á camara quaes são as suas opiniões.

A diplomacia do silencio, dizia o sr. ministro da fazenda, póde muitas vezes ser conveniente; mas a diplomacia da franqueza é muito mais conveniente. Eu confio na sua antiga opinião. Venha a diplomacia da franqueza. Deixemos a diplomacia do silencio; fallem todos, digam todos a sua opinião, diga o governo o que pensa a este respeito. Não nos devemos demorar muito tempo n'esta incerteza, e não me parece tambem que o governo sobretudo, que tem plena confiança na camara, queira demorar uma discussão que parece urgente.

Continuando a abster-se o sr. ministro da fazenda de dizer quaes são as suas idéas a respeito do assumpto, eu posso saír d'este estado de duvida, porque não me parece que é indiscrição dizer que o nobre ministro da fazenda, sendo membro da commissão de fazenda, quando eu concorri com s. ex.ª aos trabalhos relativos a este projecto, assignou vencido o respectivo parecer. Isto quer dizer que o membro da commissão de então, collocado hoje no logar de ministro, sustenta a opinião como ministro da fazenda que sustentava como membro da commissão.

Se s. ex.ª declara isto, em virtude do principio da solidariedade ministerial vou deduzir que todos os ministros actuaes são da mesma opinião.

Se acaso é barbaridade cortar o silencio que os nobres ministros se impozeram, vou dispensa-los d'essa difficuldade, deduzindo as consequencias que so podem tirar do principio que acabo de expor.

Assignando o nobre ministro da fazenda vencido, e sendo o ministerio solidario, os outros ministros estão na mesma opinião. Logo dispensemos o governo de fallar, mas tome a camara como sabido que o governo rejeita o contrato. Em vista pois d'isto para que nos havemos de incommodar? O governo rejeita o contrato, façamos nós o que entendemos.

Antes de largar este logar agradeço ao nobre ministro das obras publicas as palavras que dirigiu ás minhas perguntas. As minhas perguntas lá ficam, não se referem ao contrato, referem-se ao caso da rejeição d'elle. Eu tinha perguntado a s. ex.ª se acaso entendia que da rejeição do accordo resultava a rejeição do outro accordo, cujas bases eu tive a honra de apresentar á camara.

O sr. Pereira Dias: — Entendo que a camara esta no seu direito de votar a favor ou contra qualquer projecto que aqui se apresenta, sem que para isso seja necessario previamente saber a opinião do governo sobre esse assumpto.

(Interrupção.)

Não é opinião diversa. Creio que ninguem ha de contestar esta doutrina — a camara póde votar ou rejeitar qualquer assumpto que aqui se discuta (apoiados), sem que para isso seja necessario saber a opinião do governo (apoiados). Mas vou dizer agora que quando os assumptos são de tal ordem, quando os assumptos são importantes como este, é bom sempre, é quasi que indispensavel que o governo emitta a sua opinião.

No momento actual e a este respeito nada mais direi do que disse o sr. Fradesso da Silveira: «póde muito bem haver qualquer circumstancia que obrigue o governo a não saír de certa reserva»; no entretanto lendo o parecer, vendo aquelles que o assignaram, parece-me, e concluo pelo que disse o sr. Fradesso da Silveira, que a camara não póde ignorar por muito tempo qual seja a opinião do governo ácerca d'este assumpto.

O sr. Freitas e Oliveira: — Quando o governo transacto apresentou á camara o outro contrato feito pelo ministerio que caíu em janeiro, quizeram alguns srs. deputados e entre elles o meu nobre amigo o sr. Pereira Dias, que o governo se apresentasse aqui como Egas Moniz na côrte de Castella, de corda ao pescoço, não entregar a vida em troca da palavra mal cumprida, mas entregar as pastas em troca da promessa não realisada, sendo esta promessa o tão fallado telegramma. Estranho agora que s. ex.ª não tivesse as mesmas exigencias. E necessario que o governo manifeste a sua opinião; mas segundo disse o sr. Fradesso da Silveira effectivamente a opinião do governo é clara; não precisa elle dize-la agora. Esta no parecer onde vejo assignado o sr. ministro da fazenda vencido. A opinião do governo com relação ao contrato é manifesta; mas o que é necessario saber é se o governo rejeitando este contrato, rejeita qualquer outro accordo, ficando saldas as nossas contas com a companhia e com os portadores das obrigações, ou se havemos de ter outro accordo. Esta opinião do governo é que eu desejava ver manifestada. Com relação ao contrato não pergunto cousa alguma ao governo, porque sei perfeitamente que elle o rejeita, desde o momento em que o sr. ministro da fazenda esta assignado no parecer vencido; porque não entendo que o sr. Carlos Bento, como membro da commissão tivesse uma opinião, e agora como ministro tenha outra.

A minha pergunta, ou antes a minha questão previa, é saber se o governo rejeitando, como rejeita este contrato, rejeita todo e qualquer accordo com a companhia e com os portadores das obrigações. Esta é a questão em que o governo se deve pronunciar; a outra esta perfeitamente resolvida.

O sr. Presidente: — O melhor é additar a proposta do sr. Mardel com essa nova questão.

O sr. Freitas e Oliveira: — Mando o meu additamento para a mesa.

O sr. Mardel: — Limitar-me-hei a ler o artigo 1.° do projecto (leu).

Se o governo fica auctorisado para fazer o contrato sobre estas bases, é evidentemente necessario que a camara saiba se o governo pede essa auctorisação.

Nós vamos dar uma auctorisação ao governo, pedida por quem? É de iniciativa nossa? Vamos de bom grado dizer ao governo, esta auctorisado a contratar n'estes termos? Póde o governo a quem se dá esta auctorisação não se conformar com as bases, e n'esse caso quem pede a auctorisação? Pede-a a entidade governo, que esta assentada naquellas cadeiras, se aceitou a responsabilidade do ministerio transacto; ou então não a pede, rejeita-a, e não temos que discutir.

Isto é uma questão tão clara e simples, que não é preciso fazer grandes discursos e prolongar a discussão para chegar a um resultado.

O governo vae ser auctorisado pela camara. Quem é que pede a auctorisação? Se é o governo, então aceita as bases, discuta-se o contrato. Se não é o governo, não aceita as bases, não ha que discutir.

Eu desejava que os illustres deputados se restringissem a este ponto, que não é muito difficil. Parece-me que a minha deficiencia não influe na maneira de expor, porque a questão é muito simples, não é preciso grande talento para a tornar clara e intelligivel a toda a camara.

Quem pede a auctorisação? Pede-a o governo? Aceita as bases; não a pede o governo, rejeita as bases, não ha que discutir.

A minha pergunta portanto é muito simples e o governo não póde dispensar-se de responder a ella.

Não quero crear difficuldades nem definir posições para tirar depois illações politicas; quero que se discuta um negocio importante e grave com seriedade e com a economia de tempo necessaria (apoiados).

O sr. Santos e Silva: — Estou perfeitamente de accordo com as observações feitas pelos srs. Fradesso e Freitas e Oliveira, quando disseram que a camara estava no seu di-

Página 1858

1858

reito de approvar ou reprovar qualquer projecto de lei, ou qualquer contrato, embora o governo se pronuncie n'este ou n'aquelle sentido. Esta claro que a nossa missão parlamentar e a nossa independencia aconselham-nos isto. Mas o que eu não aceito é a apreciação que ss. ex.ªs fizeram a respeito de serem obrigados os deputados, que têem uma certa opinião sobre qualquer assumpto, a levarem essa opinião das suas cadeiras para os bancos dos ministros.

Todos os dias estamos vendo que succede o contrario d'isso (apoiados). Pois o nobre ministro da fazenda, quando deputado, não assignou e votou na generalidade um projecto de desamortisação, e poucos dias depois, sentando-se si ex.ª na sua cadeira de ministro, não nos apresentou uma proposta de lei, que modifica largamente, ou antes altera radicalmente em certos pontos, o projecto que assignou e votou como deputado? (Apoiaãos.)

Por consequencia parece-me que os illustres deputados foram crueis, querendo por força que os deputados que passam a ser ministros sejam logicos e consequentes. A não ser um epigramma que queiram fazer ao sr. Carlos Bento, não sei bem definir certas apreciações politicas que ss. Ex.ªs apresentaram. Se foi epigramma ou não, os nobres deputados o dirão.

Emquanto ao contrato póde o governo fazer as declarações que quizer, que eu por mim hei de votar como entender. Mas com relação á discussão, talvez se ganhe tempo que se póde applicar a outras cousas, desde que o governo diga francamente o que pensa a respeito do contrato. Se o governo o rejeita, para que se hão de inscrever vinte ou trinta oradores e discursar contra uma cousa que com certeza ha do ser rejeitada?

O governo tem maioria, creio mesmo que tem grande maioria; acontece isto no principio a todos os governos; é natural pois que ninguem queira gastar o seu tempo com um contrato que ha de forçosamente ser rejeitado.

Se o governo for franco nas suas declarações, hei de ver desistir da palavra oradores inscriptos contra e a favor, no intuito de empregarem o seu tempo em cousas mais importantes (apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda: — Pedi a palavra na occasião em que o illustre deputado que subiu áquella tribuna (indicando-a) mencionou a circumstancia incontestavel e incontestada de eu estar assignado vencido no projecto. Effectivamente as minhas opiniões sobre o assumpto são conhecidas, mas eu entendi que sendo esta discussão muito importante e do dominio completo da camara, não devia de maneira nenhuma influir com as minhas palavras sobre a resolução que a camara porventura haja de tomar, nem mesmo podia ter essa pretensão.

Mas é preciso dizer que o ter eu assignado vencido não importa a declaração formal do meu voto, porque tive occasião de dizer nas commissões reunidas, que rejeitando o contrato não tinha idéa de que a essa rejeição se deviam necessariamente seguir o confisco e as duras condições marcadas no contrato primitivo (apoiados) Foi esta a minha opinião; tambem foi a dos membros das commissões que rejeitaram este e o anterior contrato, e julgo muito conveniente dizer em publico o que a este respeito se passou em particular (apoiados).

Parece-me que relatei a verdade quando disso, repito, que os membros das commissões que eram unanimes em rejeitar o primeiro e segundo accordo, conservaram sempre a idéa do que essa rejeição não importava a idéa de que devessem ser approvadas as consequencias que se tiravam das condições rigorosas dos contratos anteriores (muitos apoiados).

Em referencia no que disse o illustre deputado que me precedeu responderei, que não esta em discussão a lei da desamortisação, e quando estiver mostrarei que não fui contradictorio, approvando na generalidade o projecto que se discutiu, e apresentando á camara, como ministro, a proposta de lei de que ella tem conhecimento. Esse assumpto parece-me mais conveniente discuti-lo na occasião propria.

Quanto ao ponto principal que actualmente se debate, direi á camara que é uma questão que póde ser completamente apreciada por uma assembléa tão illustrada como esta.

Esta claro que o governo póde pronunciar a sua opinião a respeito do contrato, mas não é esta uma condição exclusiva que faz com que esta assembléa approve ou reprove o contrato; todavia é certo que em questões tão serias como esta julgo conveniente não se dar logar a interpretações que se possam considerar como politicas (apoiados).

Associo-me ás outras rasões que podem determinar a apreciar o contrato, que não são de natureza politica, que têem um certo valor n'esta assembléa, e por parte de alguns dos seus membros estão claramente comprehendidas estas opiniões.

Pela minha parte repito, não julgo conveniente entrar em condições que possam fazer d'este contrato uma questão politica.

A camara apreciará os motivos que determinam uma certa reserva, que me parece exigem negocios d'esta natureza, reserva que possa declarar á camara e que ella de certo comprehende, não é effeito de consideração dos individuos que se sentam n'estas cadeiras, mas sim do interesse de objectos tendentes ao bem do paiz.

O sr. Freitas e Oliveira: — Tive a felicidade do ouvir responder cabalmente o illustre ministro da fazenda á minha pergunta.

O sr. ministro das obras publicas, respondendo á pergunta feita pelo sr. Fradesso da Silveira, declarou que o governo nem apresentava a sua opinião nem se podia comprometter para negociações futuras. As declarações do illustre ministro da fazenda foram mais explicitas: s. ex.ª, sendo membro da commissão de fazenda, declarou que da rejeição do contrato não devia necessariamente seguir-se o confisco nem as duras condições marcadas no contrato anterior.

A intenção do governo é fazer diligencias para vir a um outro accordo melhor do que o primitivo, e por consequencia proponho que esta discussão seja adiada como foi a outra até que o governo apresente o novo contrato. Dispenso-me de apresentar as rasões com que poderia sustentar este adiamento, porque são exactamente as mesmas que a camara teve para adiar a discussão do contrato celebrado pelo sr. Corvo até que appareceu este accordo realisado pelo sr. Canto; isto em uma occasião em que eu, como agora, rejeitava ambos os contratos, e em que muita gente achava este ultimo muito melhor do que o acha hoje.

Mando para a mesa a minha proposta de adiamento.

O sr. Pereira Dias: — Eu entendo que a regularidade dos trabalhos parlamentares pediam que a proposta de adiamento que o sr. Freitas e Oliveira vae mandar para a mesa devia discutir-se quando se tratar da questão principal, e não agora que se discute apenas uma questão previa (apoiados); adiamento contra o qual eu vou desde já declarando que voto, porque se nós estamos na perspectiva d'um novo accordo, é melhor que a camara se manifeste a respeito d'este assumpto, porquanto a manifestação da camara se for contra o projecto, como entendo que deve ser, e eu hei de votar contra elle, essa votação habilita o governo, a fazer um accordo em melhores condições (apoiados). É esta a rasão tambem por que votarei contra a proposta do sr. Freitas e Oliveira.

Leram-se na mesa as seguintes

Propostas

Questão previa.

Que se não entre na discussão, sem que o governo declare previamente, se aceita ou não as bases propostas, nos termos do artigo 1.°= Mardel.

Rejeitando o governo como rejeita o contrato de sueste, proponho que elle declare se esta rejeição importa tambem a de todo o accordo com a companhia e com os portadores de obrigações. = Freitas e Oliveira.

Proponho que o projecto em discussão fique adiado até que o governo apresente o projecto de um novo accordo com a companhia dos caminhos de ferro de sueste. = Freitas e Oliveira.

Posto a votos o adiamento proposto pelo sr. Freitas e Oliveira, não foi admittido á discussão.

Posta a votos a questão previa apresentada pelo sr. Mardel, não foi approvada.

Deu-se conta do additamento offerecido pelo sr. Freitas e Oliveira á questão previa do sr. Mardel, o qual foi considerado prejudicado pela rejeição da mesma questão previa.

O sr. Ministro da Guerra (Sá da Bandeira): — Mando para a mesa a seguinte proposta.

Leu-se a seguinte

Proposta

Senhores. — Em conformidade com o disposto no artigo 43.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara dos senhores deputados permissão para que os seus membros abaixo mencionados accumulem, querendo, o exercicio das funcções legislativas com as dos seus empregos ou commissões:

José Maria de Magalhães, general de brigada, commandante da 2.ª brigada de infanteria de instrucção e manobra;

José Paulino de Sá Carneiro, coronel do regimento de infanteria n.° 7;

Innocencio José do Sousa, coronel do estado maior de artilheria e sub-inspector do arsenal do exercito;

Bento José da Cunha Vianna, tenente coronel do regimento de infanteria n. 7;

D. Luiz da Camara Leme, major do corpo do estado maior e chefe do estado maior do mesmo corpo;

Antonio Cabral de Sá Nogueira, vogal do conselho geral de instrucção militar;

Antonio José de Barros e Sá, juiz relator do supremo conselho de justiça militar.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 3 de agosto de 1868. =$« da Bandeira.

Posta logo a votos, foi approvada.

O sr. Faria Blanc: — Sr. presidente, tendo sido rejeitada a proposta do illustre deputado, o sr. Mardel, não sendo admittida á discussão a do sr. Freitas e Oliveira, que propoz o adiamento do projecto n.° 25, e declarando o governo que deixava ao superior juizo da camara a resolução da questão de que se trata, entendo que não devo ter duvida em fazer uso da palavra que v. ex.ª acaba de me conceder (apoiados).

Apesar de acostumado ás lutas da tribuna parlamentar, porque desde 1859 que tenho a honra de occupar uma cadeira n'esta casa, declaro com franqueza a v. ex.ª; sr. presidente, que me arreceio entrar na grave e importante questão que envolve o projecto que v. ex.ª submetteu á discussão, e que a camara tem de apreciar, e a final de resolver com a sabedoria que lhe é propria, e que tanto caracterisa as suas deliberações.

São muito limitados os recursos intellectuaes de que posso dispor, mas nem por isso me assusta a difficuldade da questão. Os meus embaraços portanto têem outra causa, e provém sómente de não ser possivel coordenar as minhas idéas com tanta simplicidade e clareza, que, sem ser taxado de prolixo, possa condignamente satisfazer ao importante fim de que me fiz cargo, pedindo a palavra.

A camara porém não deixará de reconhecer que não é para engenhos medíocres tão ardua empreza quando collocados na melindrosa e difficil posição de descortinar a verdade, habil e arteiramente encoberta.

Mas se a questão de que nos occupâmos prende com os grandes interesses do paiz, que a camara constantemente tem defendido, e com inexcedivel zêlo e patriotismo, parece-me que, apesar da humildade da minha pessoa, devo ter a bem fundada esperança de que a camara se não recusará dispensar-me a sua attenção.

Tendo assignado com declarações o parecer das commissões reunidas de fazenda e obras publicas, sobre o projecto em discussão, entendi conveniente formular uma proposta, comprehendendo todas as alterações que indiquei na referencia que fiz ás bases do contrato, que pretende realisar-se com a companhia do caminho de ferro de sueste.

E, em observancia das disposições do regimento interna d'esta camara, principiarei lendo a minha moção de ordem.

«Proponho as seguintes emendas e alterações ás bases assignadas em 20 de junho de 1868, para o contrato definitivo com a companhia do caminho de ferro de sueste:

«l.ª Que para caução do novo contrato a companhia do caminho de ferro de sueste seja obrigada a fazer o deposito de 90:000$000 réis, a que o anterior contrato a sujeitava.

«2.ª Que a subvenção de 18:000$000 réis por kilometro, estabelecida no § unico da base 4.% e § 1.° da condição 5.ª, fique reduzida a 14:000$000 réis.

«3.ª Que a verba de 250:000$000 réis pelas obras feitas na secção de Faro a Boliqueme seja eliminada, e bem assim a de 2:700$000 réis pelos trabalhos feitos no tunel de S. Marcos, ficando sendo propriedade do estado essas obras, trabalhos o material fixo que n'elles houver.

«4.ª Que a verba de 63:500$000 réis, que o governo se obriga a pagar pelos estudos feitos na parte dos prolongamentos que a companhia fica dispensada de construir, nos termos do § 5.° da base 5.ª, seja reduzida á quantia de 19:482$000 réis.

«5.ª Que a verba de 5:198$997 réis pelas obras feitas na linha do sueste, armazem de Cuba e alargamento da estação de Vianna, seja eliminada.

«6.ª Que fique reduzida a 58:000$000 réis a verba de 102:000$000 réis, que pela condição 3.ª da base 6.ª é destinada para a construcção da ponte o estação do Mexilhoeiro e ramal do Lavradio.

«7.º Que a verba de 46:626509 réis para a compra dos vapores pertencentes á companhia, e dos quaes ella carece para o serviço das linhas ferreas, seja reduzida á quantia de 10:928$088 réis.

«8.º Que a verba de 276:726$000 réis, pelo alargamento da linha do Barreiro e ramal de Setubal, e mais obras ahi feitas, em virtude do contrato de 1864 seja reduzida á quantia de 124:466806 réis, em virtude de dever ser reduzido o custo do alargamento do caminho do Barreiro ás Vendas Novas a 1:236:673 réis por kilometro, que tanto foi o preço do alargamento do ramal de Setubal.»

Comprehende V. ex.ª, sr. presidente, e comprehende a camara que a minha posição n'esta questão é pouco agradavel, e que só uma impreterivel necessidade me obrigou a pedir a palavra.

Combater as disposições de um projecto de lei que assenta sobre uma proposta do governo é para um deputado, que pertencia á maioria da camara que apoiava esse gabinete, procedimento que só póde explicar-se pela convicção intima que tem de que as emendas e modificações que propõe ao projecto importam o interesse da causa publica, que prefere a todas e quaesquer outras considerações (apoiados).

Sinto que as explicações dadas pelo governo transacto no seio das commissões me não satisfizessem, e que, recusando-se aceitar as alterações que propuz a algumas das bases para o contrato com a companhia do caminho de ferro de sueste, me collocasse na desagradavel posição de assignar com declarações o parecer das commissões reunidas.

Dado porém este passo, não podia dispensar-me de pedir a palavra para justificar o meu procedimento perante a camara e o paiz (apoiados).

Reconheço que a minha proposta altera o accordo na sua essencia, mas como eu não posso aceitar um contrato que, acarretando pesados encargos para o estado, parece que não passa de um expediente financeiro, em extremo perigoso, e em meu entender de funestas consequencias, por isso só o aceitaria quando as suas clausulas e condições estabelecessem perfeita reciprocidade de direitos, obrigações e interesses (apoiados).

É necessario ter em vista que o accordo de que se trata foi feito com o especial fim de facilitar o recurso ao credito; e considerando-se este indispensavel para occorrer ao deficit, que apresenta o orçamento geral da receita e despeza do* estado, o governo não duvidou fazer largas concessões á companhia contratante, por lhe parecer ser este o unico meio de captar a benevolencia dos capitalistas portadores das obrigações da mesma companhia, que se arreceiavam perder os capitaes desembolsados.

Esta é a verdade, a qual se não apparece ostensiva no accordo, d'elle comtudo se deprehende, e entendo que ninguem a ignora (apoiados).

Segurem-se os interesses da companhia que falliu cessando os seus pagamentos, e faltando ás condições do seu contrato! e garanta-se aos portadores das obrigações. O reembolso dos seus capitaes, não porque tenham direito; para fazer exigencias ao governo portuguez, que nenhum tem, em vista das expressas disposições dos §§1.° e 2.° do contrato de 23 do maio de 18.64, mas porque é indispensável conservar o nosso credito na praça de Londres!!

Eis-aqui a traducção fiel d’este contrato que tantas amarguras causou ao governo transacto, e que foi a causa e origem de desintelligencias e desgostos que poderiam ter-se evitado se o governo antecipadamente tivesse ouvido os seus amigos (apoiados).

Era porém necessario proceder cautelosamente n'esta

Página 1859

1859

parte; e para que se não dissesse que havia demasiada liberalidade, ou que se dava á companhia um extraordinario bonus que não tinha rasão de ser, sustentou-se a subvenção de 18:000$000 réis por kilometro anteriormente estabelecida, mas debaixo de outras bases e condições, como logo farei ver. Elevou-se á exorbitante quantia de 63:500$000 réis o preço dos estudos feitos na parte dos prolongamentos que a companhia fica dispensada de construir, e cuja importancia o governo se obriga a pagar. Compram-se á companhia os vapores de que ella carece para a exploração das linhas ferreas. Liquida-se o rendimento do caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas com o ramal de Setubal por modo tal que, apesar de ser a parte da linha mais productiva e rendosa, o governo nunca ha de receber um real de rendimento do caminho que pelo contrato lhe fica pertencendo, e que lhe custa 1.008:000$000 réis, que é a importancia que a companhia fica dispensada de pagar, e pela qual lhe fôra feita a concessão d'esta parte da linha nos termos dos artigos 1.° e 2.° do contrato de 23 de maio de 1864. Dão-se 250:000$000 réis pelas obras e trabalhos feitos nos 25 kilometros da secção de Faro a Boliqueme. Finalmente, pagam-se excessivamente todas as differentes obras a que o accordo se refere!! E todas estas extraordinarias despezas feitas não para felicitar o paiz, ou porque uma companhia fallida offereça a necessaria garantia ao cumprimento das condições do contrato, mas para podermos com facilidade levantar capitaes na praça de Londres!!

Não póde ser! A opinião publica revolta-se contra este procedimento que nos conduziria ao cataclysmo.

Se este contrato fosse approvado, por que preço nos ficariam os emprestimos que de futuro contrahissemos? Pois não veem todos que aos juros, cambios, commissões, corretagens e outras despezas, tinham de accrescer a importancia das avultadíssimas quantias com que se procura gratificar uma companhia que faltando ás condições do seu contrato nos envolveu em serios embaraços? (Apoiados).

Se o recurso ao emprestimo imprudente, sem limite, e sem garantia de amortisação, que a não póde ter por falta de receita, tem levado as finanças do paiz a um estado assustador, a um estado quasi desesperado (apoiados), qual será o nosso futuro se para recorrer ao credito tivermos de antecipadamente conceder um bónus que se traduz na generosa offerta de muitos centos de contos de réis?

t Pois nós que estamos exigindo de todas as classes da sociedade pesados sacrificios não poupando os estabelecimentos de caridade e beneficencia, não attendendo aos direitos adquiridos, nem mesmo respeitando os do sangue (apoiados), como se manifesta da proposta do governo transacto sobre a contribuição de registo, podemos, com a mão na consciencia, approvar um contrato que dá em resultado serem todos estes sacrificios feitos em favor de uma companhia estrangeira?! Não é possivel (apoiados).

Estou convencido que os meus calculos não peccam por exagerados; e creio que as minhas apreciações não podem ser combatidas por inexactas. Apesar d'isto a resposta ha de apparecer, mas a minha argumentação pobre, humilde, e despida de todas as flores, ornatos e bellezas oratorias, triumphará, porque a verdade é uma só, e quando ella apparece em toda a sua luz são baldados os esforços da arte e da eloquencia empregados para a offuscar.

E a verdade esta patente no facto de se pretender rehabilitar uma companhia estrangeira á custa dos dinheiros da nação, cujos interesses ella comprometteu faltando á fé do seu contracto! (Apoiaãos.)

Estranhou-se, e estranhou-se por modo que talvez podesse qualificar de pouco regular, que eu combatesse um contrato que dá em resultado tirar ao pobre os meios de que carece para occorrer ás primeiras necessidades da vida, o augmentar com o sangue do povo, e sem motivo justificado, a fortuna dos estrangeiros, que nos promettem franquear de futuro os seus capitaes, mas com novos e pesadissimos encargos e com mordentes juros!! "Não cedi, e fiz bem, porque cumpri o meu dever, ficando a minha consciencia completamente tranquilla (apoiados).

Fallei em emprestimos com pesados encargos e mordentes juros, e disse uma verdade, porque os precedentes justificam o juizo que formo do desinteresse com que procedem os capitalistas estrangeiros quando nos acodem nas occasiões de apuros financeiros!!

E para não cansar a attenção da camara com a historia de alguns contratos infelizes e desgraçados que temos realisado nas praças estrangeiras, farei apenas menção do ultimo emprestimo effectuado na praça de Londres.

O emprestimo de 4.750:000 libras, emittido pelo sr. Fontes, por intervenção da casa Stern Brothers, e destinado para a consolidação da divida fluctuante, contrahida com penhor no estrangeiro, em virtude da auctorisação concedida ao governo pela carta de lei de 1 de julho de 1867, foi negociado a 38 ½.

Mas este preço (alem do desconto pelo adiantamento das prestações do emprestimo) ficou sujeito ás deducções seguintes:

1.º Commissão e corretagem 1 ½ por cento do nominal da emissão;

2.º Importancia do coupon de janeiro de 1868, que foi encontrado no pagamento das prestações, 1 ½.

Assim temos que deduzir 2 5/8 do preço da emissão, o que a reduz a 35 7/8. E não é este ainda o preço definitivo, porque cumpre tambem attender ao desconto de 5 por cento ao anno pelo adiantamento das prestações.

Attendendo porém só ao preço de 35 7/8 vemos que elle correspondo ao juro annual de 8 1/3 porcento!!! E considerando a importancia da commissão que recebeu Stern, observamos que esta subiu á enorme quantia de 240:000$000 réis!!

Aqui tem pois a camara: as vantagens do recurso ao credito! e veja se é possivel com tão pesados encargos continuar n'estes expedientes, que serão a causa da nossa completa ruina, se um braço forte e vigoroso lhe não pozer termo (apoiados).

As nossas finanças não se organisam recorrendo ao emprestimo, porque este importa augmento de encargos. A reorganisação das finanças do estado só póde realisar-se por meio das economias e do imposto. O que sustentar doutrina contraria, se não se illude a si, procura comtudo illudir os outros.

O governo tem indispensavelmente de recorrer ao imposto, e ao imposto recorreu já o governo transacto nas propostas de lei que apresentou ao parlamento. Mas se o contrato de que se trata fosse approvado sem alterações profundas nas suas exorbitantes clausulas e condições, ficaria o governo com a força necessaria para pedir impostos, e nós com auctoridade bastante para os votarmos? Certamente que não (apoiados).

Custa-me ter que dizer verdades, que de certo não agradam a alguns dos cavalheiros que fizeram parte da administração transacta; mas eu não occupo uma cadeira no parlamento só para lisonjear as pessoas de ss. ex.ªs, a quem aliás muito respeito: aceitei o mandato de meus constituintes e o pesado encargo de representante do povo para defender, como posso e entendo os interesses do meu paiz.

Muita consideração e respeito tributava, e tributo ainda, aos illustrados cavalheiros que dirigiam as pastas do reino e fazenda quando se apresentaram as aclarações ao contrato Salamanca, e apesar das occorrencias que então tiveram logar, e das quaes o sr. conde d'Avila tem perfeito conhecimento, votei contra aquellas aclarações.

Não entendam portanto ss. ex.ªs que lhes quiz fazer opposição, assignando o parecer das commissões com declarações, e acreditem que os teria acompanhado n'esta luta, se a minha consciencia o permittisse. Trabalhei muito para ver se podia convencer-me da bondade do contrato, mas quanto mais o estudava e meditava, tanto mais me convencia da sua ruindade. SS. ex.ªs consideram-no bom, eu considero-o mau; respeito as convicções de ss. ex.ªs, e tenho direito a exigir que as minhas sejam igualmente respeitadas (apoiados).

Mas se o contrato é mau, se da sua approvação podem resultar graves prejuizos ao estado, qual a rasão por que o não rejeitei logo e me limitei a assignar o parecer das commissões com declarações?

Antes que algum dos meus collegas me fizesse esta pergunta, formulei-a eu para desde já responder.

O contrato em meu entender é mau, ou antes pessimo, mas reduzido ás proporções de um justo contrato bilateral, estabelecida perfeita reciprocidade de direitos, obrigações e interesses; eliminadas as clausulas e condições que importam simples favor sem indemnisação correspondente; retirada toda a idéa de bónus concedido á companhia por meio do indispensavel abatimento nas quantias que o governo tem a pagar, poderia n'este caso aceitar-se, porque d'elle não resultariam então os inconvenientes que já apontei. Eis-aqui a rasão por que assignei o parecer com declarações.

O que eu desejo, o que nós todos queremos é um contrato justo e rasoavel, e não um expediente financeiro d'esta ordem e natureza, que póde causar a completa ruina do paiz (apoiados).

As commissões reunidas não aceitam as modificações que proponho, porque alteram o contrato na sua essencia? Rejeitem-nas muito embora. O meu dever é apresenta-las e sustenta-las, e depois para descargo da minha consciencia votar contra o projecto tanto na sua generalidade como na especialidade.

Sustentando-se as bases para o contrato que se projecta, e que o sr. Sebastião do Canto deseja que seja approvado, porque em sua consciencia o considera muito vantajoso para o paiz, cujos interesses entende ficam sufficientemente garantidos e seguros, parece-me que o sr. Canto faz a apologia do accordo anterior feito pelo sr. Corvo ex-ministro das obras publicas.

A este respeito recordo-me dos seguintes versos de um espirituoso poeta

O mundo está perdido! Quem julgára

Que aos cisnes do Caestro para o canto

Ousassem provocar os negros corvos!

(Riso.)

Faça-se muito embora a apologia do accordo do sr. Corvo, votei contra elle, como voto contra este (apoiados).

Mas não nos illudâmos. Se este novo contrato parece apresentar um encargo menor que o anterior, elle comtudo colloca o paiz em condições menos vantajosas, porque dá em resultado a perda do capital e da propriedade, como vou demonstrar sustentando a minha proposta.

Antes porém de entrar na apreciação das bases para o contrato definitivo com a companhia do caminho de ferro de sueste, cumpre considerar a questão pelo lado da garantia indispensavel para a fiel execução do projectado contrato. E é esta a primeira parte da minha proposta.

Nas bases que o governo transacto apresentou para este contrato não se falla em garantias, estas foram completamente descuradas, encontrando-se apenas na base 9.ª a declaração de que as bases propostas serão desenvolvidas em um contrato com todas as clausulas, seguranças e penalidades, aproveitando dos contratos de 1860 e 1864 todos os artigos que não forem contrarios ás mesmas bases. Declaro com franqueza á camara que não comprehendo esta base para o futuro contrato, porque os termos genericos em que esta concebida, e a referencia que faz ao contrato de 1864, indicam que ella não satisfaz ao fim a que parece se destina.

Falla-nos o accordo em seguranças e penalidades, e refere-se aos contratos de 1860 e 1864; e eu pergunto ao illustre relator das commissões reunidas, qual é o deposito que a companhia faz para caução do novo emprestimo? Não acredito que s. ex.ª para sustentar a existencia de um deposito que já não existe em face da lei, me responda com a disposição do artigo 17.° do contrato de 23 de maio de 1864, que diz assim: a companhia obriga-se a garantir a fiel e pontual execução d'este contrato com um deposito de 90:000$000 réis ou libras 20:000 em moeda metal, ou em titulos de divida publica portugueza de 3 por cento pelo seu valor no mercado.

E não acredito que s. ex.ª apresente o deposito anterior como garantia d'este novo contrato, por que se assim fôra a companhia não dava garantia alguma, visto que o anterior deposito pertence já ao estado e não á companhia.

Poderá o illustre relator do projecto que se discute soccorrer-se á disposição do § 2.° do citado artigo 17.º do contrato do 1864, que dava á companhia direito a levantar o deposito logo que se verificasse a ultima hypothese que figura, como parece ter-se verificado. Lembre-se porém s. ex.ª que a companhia não levantou o deposito, e que elle ficou subsistindo para garantia do posterior contrato de 14 de outubro de 1865.

N'este contrato, como se declara no artigo 12.°, a companhia sujeitou-se a todas as clausulas, condições e encargos do contrato de 23 de maio de 1864, apenas alteradas no artigo 8.° e § 3.° do artigo 15.º

Ficou portanto fazendo parte do contrato de 14 de Outubro o artigo 17.°, § 5.°, n.° 5.° do contrato de 23 de maio de 1864, 110 qual se declara expressamente que a companhia perderia o deposito dos 90:000,000 réis, sempre que o contrato fosse rescindido.

Effectivamente foi o contrato de 14 de outubro rescindido por decreto de 23 do maio de 1866; e porque submettido este negocio ao juizo arbitral, em conformidade das condições estipuladas, os arbitros por unanimidade, e por accordo de 10 de novembro do mesmo anno, entenderam que o decreto da rescisão do contrato devia ser cumprido e executado, desde logo ficaram pertencendo ao thesouro portuguez os 90:000$000 réis do deposito (apoiados).

O facto do governo não ter querido explorar o caminho de ferro de sueste, apesar de rescindido o contrato, não altera a questão. Se o governo não quiz aproveitar-se de todos os effeitos da rescisão, nem por isso ficou com o direito de retirar aos cofres do estado quantias que lhe pertenciam (apoiados). Se tal faculdade lhe competisse, o governo seria senhor e não administrador do patrimonio publico, o que não póde admittir-se.

O contraio foi rescindido, a companhia recorreu do decreto da rescisão para o juizo arbitral, e não teve provimento. Rescindido o contrato, o governo mandou proceder ao inventario da companhia e respectiva avaliação, e se posto o caminho em praça não teve logar a arrematação por falta de licitantes, esta occorrencia nem melhorou a posição da companhia, nem lhe conferiu direitos alguns novos (apoiados).

Convem attender que para a companhia perder o deposito bastava que faltasse ás condições do contrato expressadas no artigo 17.° do contrato de 1864, ainda que elle não fosse rescindido. Assim se declara no § 6.° do mesmo artigo nas palavras «quando a companhia perder o deposito, mas o contraio não for rescindido, deverá a mesma companhia, no improrogavel praso de um mez, renovar a caução com outro deposito feito nos termos d'este artigo.»

Será possivel, em vista de disposições tão claras e expressas, sustentar-se que existe ainda o deposito feito pela companhia em virtude do contrato de 23 de maio de 1864? Ninguem em boa fé o sustentará (apoiados).

Sendo esta a verdade, e não tratando as bases para o contrato com a companhia do caminho de ferro de sueste do deposito que a companhia tem a fazer para caução do novo contrato, por isso principiei a minha moção de ordem, propondo uma nova base n'este sentido. Base que considero essencial para evitar que a companhia, apoiando-se no silencio do contrato, o não pretenda sophismar.

Nem se diga que por este novo contrato só pretende fazer reviver o de 1864, porque se o deposito dos 90:000$000 réis ficou pertencendo de direito ao thesouro portuguez pela rescisão do contrato de 14 de outubro, o novo accordo não póde estender-se ao que já não existe. Revivam muito embora algumas das clausulas o condições do contrato de 1864, mas não se considere como deposito para caução do novo contrato o que hoje não representa deposito, mas receita eventual do estado, e que n'esta qualidade já devia ter dado entrada nos cofres publicos.

Poderão ainda os defensores do accordo impugnar a minha proposta, sustentando que na parte dos prolongamentos que a companhia é obrigada a construir existem já obras muito superiores em valor ao deposito dos 90:000$000 réis que proponho.

Esta argumentação porém, alem de corroborar a doutrina que deixo expendida, quanto a pertencer ao estado o deposito feito em virtude do contrato de 1864, e continuado pelo artigo 5.° do de 14 de outubro de 1865, é manifestamente improcedente, porque não se trata agora do que esta já feito, mas daquillo que a companhia fica obrigada a fazer para o exacto cumprimento do novo contrato; e para caução d'este novo contrato é que eu exijo o deposito.

Pergunto, se a companhia não começar os trabalhos nos prasos fixados, o que perde? Se não completar cada uma ou todas as linhas nas epochas prefixas, sem que d'essa omissão possa resultar a rescisão de novo contrato, que pena se lhe impõe?

É necessario considerar que nós vamos contratar sobre a base do que esta feito e que já é nosso, porque o decreto da rescisão do contrato de 14 de outubro de 1865 e dos

Página 1860

1860

que o precederam subsiste, sem que o facto do governo estar ainda empregando meios para evitar o confisco do caminho de ferro, e que a lei auctorisa, possa fazer caducar o direito que provém da rescisão dos mesmos contratos; rescisão julgada unanimemente pelo tribunal competente — o juizo arbitral, e de cujas decisões hão cabe recurso nos termos do § 1.° do artigo 14.° do contrato de 1864.

É portanto indispensavel a nova base que proponho e da qual não póde prescindir-se (apoiados).

Passando agora a tratar em especial das bases assignadas em 20 de junho de 1868 para o contrato definitivo com a companhia do caminho de ferro de sueste, limitarei quanto possivel as observações que vou submetter á judiciosa consideração da camara, porque não desejo abusar da benevolencia com que os meus collegas se dignam tratar-me, dispensando-me a sua attenção; nem quero com extensos e variados calculos tornar obscuro o que é claro, e complicado o que é simples.

Segundo as condições estipuladas nos §§ 1.° e 7.° da base 5.ª, o estado fica obrigado a pagar 18:000$000 réis por cada kilometro de Beja a Cazevel; 250:000$000 réis por todas as obras feitas na secção de Faro a Boliqueme e 2:700$000 réis pelos trabalhos feitos no tunel de S. Marcos.

Estas differentes verbas dão o seguinte resultado:

47 kilometros de Beja a Cazevel a réis 18:000$000 por kilometro … 846:000$000

Obras e trabalhos feitos na secção de Faro a Boliqueme … 250:000$000

Túnel de S. Marcos … 2:700$000

1.098:700$000

Mostrando-se do inventario de 24 de janeiro de 1867, que a despeza feita n'estes trabalhos fôra apenas de 921:786$112 réis, encontrámos já nas verbas constantes d'estas tres condições do accordo uma differença de 176:913$888 réis, que o governo paga a mais do despendido pela companhia! E isto afora a deducção de 20 por cento a que a referida quantia de 921:000$000 réis estava sujeita!

E para mais claramente se conhecer o excesso das indicadas verbas, note a camara que nos 921:000$000 réis estavam incluídas todas as despezas de trabalhos technicos, compras de terrenos, movimentos de terras, pontes e canos, passagens de nivel, assentamentos de vias, carris, estações, balastragens, e tunel de S. Marcos! É na verdade levar muito longe os actos de liberalidade! (Apoiaãos.)

Pagâmos a secção abandonada de Faro a Boliqueme por 250:000$000 réis, apesar de estar quasi perdida pelo abandono.

Damos 18:000$000 réis de subvenção por kilometros de facilima construcção, quando este subsidio foi estabelecido como preço medio das construcções faceis e difficeis, e dessas é a companhia dispensada. Desembolsamos, com relação áquelle prolongamento, 1.098:000$000 réis, quando o sr. Sebastião do Canto no referido inventario nos disse terem-se sómente despendido 921:000$000 réis, sujeitos á deducção de 20 por cento!

Finalmente embolsamos com generosidade a companhia de todas as despezas, e ficâmos por noventa e nove annos sem a propriedade das obras que pagâmos!!!

Será isto justo? Póde um contrato d'esta ordem e natureza ser approvado? Entendo que não.

Se nos trabalhos de construcção das Vendas Novas a Evora e Beja, sendo a companhia obrigada afazer todas as obras de arte para duas vias, não podendo os raios das curvas que ligassem os alinhamentos rectos ser menores de 500 metros, e sendo as rampas de 7 millimetros por metro, deu o estado 16:000$000 por kilometro, parece que nos kilometros da nova concessão, todos facilimos e onde os trabalhos são para uma só via, e o limite minimo do raio das curvas desceu a 300 metros e o maximo das inclinações foi elevado de 7 a 15 millimetros por metro, toda a subvenção que exceder a 14:000$000 réis por kilometro é excessiva e não deve ser concedida (apoiados).

Por todas estas considerações, proponho que a subvenção de 18:000$000 réis por kilometro fique reduzida a 14:000$000 réis, e que se eliminem do contrato as verbas de 250:000$000 réis pelas obras feitas na secção de Faro a Boliqueme, e de 2:700$000 réis pelos trabalhos feitos no tunel de S. Marcos.

No § 5.° da condição 5.ª obriga-se o governo a pagar 63:500$000 réis pelos estudos feitos na parte dos prolongamentos que a companhia é dispensada de construir.

Os prolongamentos na sua totalidade medem proximamente 204 kilometros, a saber:

Evora ao Crato … 114 kilometros.

Beja ao Guadiana … 20 kilometros

Beja a Faro … 189 kilometros

Total … 323 kilometros

Fica a companhia obrigada a construir … 119 kilometros

Logo fica dispensada da construcção de … 204 kilometros

Dividindo os 63:500$000 réis por 204 kilometros, dá-nos por cada um kilometro 311$274 réis.

Mas o sr. engenheiro Lourenço de Carvalho dando parecer, como deputado, sobre a construcção dos caminhos de ferro do Minho, calculou a despeza com os estudos em réis 180$000 por kilometro, e este calculo comparado com o que o governo aceita nas bases propostas, dá uma differença contra o estado de 131*274 réis por kilometro, a qual nos 204 kilometros dispensados sobe á avultada quantia de réis 20:779$896!!

E esta differença ainda se torna mais sensivel, se avaliarmos os estudos pelo preço que custaram os dos caminhos de ferro de norte e leste. Gastou a companhia nos estudos do caminho de ferro de leste 20:267$598 réis, e nos do Porto 20:533$959 réis, o que dá em resultado um total de 40:801$537 réis pelos 432 kilometros de Santarem para o Porto e para Badajoz.

Saiu portanto cada kilometro de estudos a 94$448 réis, e adoptado este calculo, que se baseia nos factos, mostra-se evidentemente que o preço dos estudos para os 204 kilometros de que trata o § 5.° da base 5.ª, não póde exceder a 19:482$000 réis, ao passo que o governo pretende pagar por elles 63:500$000 réis, isto é, mais 44:018$000 réis do que deve!!!

Eis-aqui a rasão por que proponho que o preço daquelles estudos seja reduzido á quantia de 19:482$000 réis (apoiados).

Proponho tambem a eliminação da verba de 5:198$997 réis de que trata o § 4.° da base 5.ª, e que o governo se obriga a pagar pelas obras feitas na linha de sueste, armazem de Cuba, e alargamento da estação de Vianna, porque o paiz não deve pagar melhoramentos nas linhas de Vendas Novas a Evora e Beja, que são da companhia, tendo o governo já pago todas as subvenções! Quero convencer-me que n'esta condição houve equivoco da parte do governo.

Obriga-se mais o governo a pagar pela condição 3.ª da base 6.ª 102:000$000 réis para a construcção da ponte e estação do Mexilhoeiro e ramal do Lavradio. E muito exagerada esta verba.

A estação do Pinhal Novo, completamente nova, e debaixo de todos os pontos de vista adoptada para um entroncamento, custou apenas 9:183*759 réis; e a estação do terminus em Setubal, nova e do typo de 2.ª classe, custou 16:267$632 réis.

Cada kilometro prompto de Beja ao Guadiana custou, segundo as contas da companhia, 20:063$250 réis. Do Tejo á estação do Lavradio haverá 1 kilometro de distancia. Calculando-se rasoavelmente o custo da estação do Mexilhoeiro em 18:000$000 réis, em 20:000$000 réis o kilometro a construir da linha ferrea do Tejo á estação do Lavradio, e em quantia igual á construcção da ponte, dá-nos o resultado total de 58:000$000 réis. Mas pelas bases para o contrato com a companhia de sueste o governo obriga-se ao pagamento de 102:000$000 réis pelas indicadas obras, logo brinda a companhia com um bónus de 44:000$000 réis!!! (Apoiaãos.) E observe a camara que se ignora o modo, como a ponte será construida, se de madeira, alvenaria, cantaria ou de ferro! Nada se diz a este respeito, e cada um d'estes materiaes tem preço diverso.

Portanto a verba de 102:000$000 réis para a construcção da ponte e estação do Mexilhoeiro e ramal do Lavradio, é de rigorosa justiça que seja reduzida á quantia de 58:000$000 réis como proponho (apoiados).

A compra dos vapores por 46:626$509 réis, em conformidade da base 3.ª e § 3.° da base 5.ª, não póde admittir-se; e quando muito e por simples equidade, visto que os vapores darão serventia ao movimento de 320 kilometros de via ferrea, poderá aquella quantia que se dá ser o preço por que os vapores foram comprados, dividir-se pelos indicados 320 kilometros, pagando b estado sómente a parte correspondente aos 75 kilometros que lhe pertencem do Barreiro ás Vendas Novas com o ramal de Setubal, isto é réis 10:928$088, e nada mais.

É necessario ter em vista que a companhia pela condição 10.ª do contrato de 1864, obrigou-se a fazer o transporte por barcos de vapor seus, entre a futura estação de Lisboa e a do Barreiro, dos passageiros e mercadorias que se destinassem a qualquer das linhas ferreas; e é por esta rasão que eu sustento que só por equidade se póde fazer o rateio que indico e proponho na minha moção de ordem (apoiados).

Mais se obriga o governo a pagar 276:726$000 réis pelo alargamento da linha do Barreiro e ramal de Setubal, e outras obras ahi feitas, em virtude do contrato de 1864.

Esta verba é excessiva e deve ser reduzida.

Segundo o inventario de 24 de janeiro de 1867, organisado por occasião de serem postas em praça as linhas ferreas de que se trata, aquella verba decompunha-se do seguinte modo:

Custo das estações novas de Setubal … 16:267$632

Custo das estações novas do Pinhal Novo … 9:183$759

Custo do alargamento da via do Barreiro ás Vendas Novas … 222:750$000

Custo do alargamento do ramal de Setubal … 16:076$794

Custo do alargamento das locomotivas e outras obras … 12:448$305

276:726$445

Tanto a linha como o ramal tinham de largura 1m,434, e foram alargados até 1m,678. O comprimento da linha é de 57 kilometros, e o do ramal de 13.

Ora, se o alargamento dos 13 kilometros do ramal custou 16:076$749 réis, isto é, 1:236*673 réis por kilometro, como é que o mesmo trabalho, e nas mesmas condições, custa nos 57 kilometros da linha 222:750*000 réis, ou réis 3:907$894 por kilometro? Não póde ser; este calculo que o governo apresentou está manifestamente errado.

A differença que se nota é extraordinaria, e sendo de 2:671$221 réis por kilometro, dá em resultado, nos 57 kilometros da linha, um augmento de 152:259$597 réis, que o estado pagará a mais se em presença dos documentos officiaes, a que me refiro, se não fizer a indispensavel alteração no § 2.° da base 5.ª, reduzindo-se a verba de réis 276:726$445 á quantia de 124:466$806 réis, em virtude de dever ser reduzido o custo do alargamento do caminho do Barreiro ás Vendas Novas a 1:236$673 réis por kilometro, que tanto foi o preço do alargamento do ramal de Setubal (apoiados).

Por esta fórma proponho as seguintes diminuições: Nos 119 kilometros a construir — para menos em cada kilometro 4:000$000 réis … 476:000$000

Eliminação das seguintes verbas:

Lanço de Faro a Boliqueme … 250:000$000

Túnel de S. Marcos … 2:700$000

Melhoramentos nas linhas de Vendas Novas a Beja … 5:198$797

Diminuição nas seguintes verbas:

Vapores … 35:698$421

Alargamento e outras obras no caminho do sul e ramal de Setubal … 152:259$194

Ponte e estação do Mexilhoeiro … 44:000$000

Estudos … 44:018$000

Diminuições … 1.009:874$412

Despeza do accordo … 2.968:751$506

Reduzida a … 1.958:877$094

Aos encargos provenientes do accordo de que se trata poderia acrescentar os 1:008*000 réis, que o governo deixa de receber, e de cujo pagamento é alliviada a companhia pelo facto de ficar pertencendo ao estado o caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas com o ramal de Setubal. E poderia apresentar, esta importante quantia como mais um bónus offerecido á companhia, porque se ao estado em compensação daquelles 1:008*000 réis fica pertencendo o indicado caminho, devia ou o rendimento d'esta parte da linha, que é a mais productiva, ou os juros d'aquelle capital, dar entrada nos cofres publicos. Mas nem uma, nem outra cousa se verifica.

Os juros não se estipularam, nem podiam estipular, uma vez que o governo aceitou o caminho em troca do direito que tinha á quantia por que fôra cedido á companhia pelos artigos 1.° e 2.° do contrato de 1864.

Os rendimentos do caminho não os recebe o estado, porque o governo não duvidou sujeitar-se ao § 2.° da base 8.ª a uma liquidação, que dá em resultado ficar a nação privada d'aquelle rendimento.

Sommar o producto bruto de todas as linhas, ramaes e prolongamentos, deduzir d'elle os gastos de exploração e conservação, e as despezas de administração, e dividir o que ficar pelo numero total de kilometros explorados, importa o mesmo que ceder á companhia o rendimento do caminho que fica pertencendo ao estado, porque todos comprehendem que a despeza de exploração e administração da parte da linha menos rendosa absorve o rendimento da parte mais productiva que é a comprehendida nos 75 kilometros do Barreiro ás Vendas Novas, e ramal de Setubal (apoiados).

De fórma que para em tudo ser desgraçado este novo contrato, que não chamarei leonino para não offender susceptibilidades, até n'elle se exararam condições com o expresso fim de privar o estado do insignificante interesse que podia auferir da acquisição de uma pequena parte da linha ferrea!!

Nem se diga que findos seis annos contados da data do contrato o governo póde vender o caminho de ferro do Barreiro ás Vendas Novas com o ramal de Setubal, realisando assim o reembolso de um capital importante, porque se chegada a epocha em que a venda póde effectuar-se, a companhia ainda existir, o que duvido muito, esta que fica gosando do direito de opção, e que em taes termos não receia ser affrontada na praça por grande numero de concorrentes, porque ninguem se quer dar ao incommodo de licitar sobre uma propriedade que tem a certeza de não poder adquirir, ha de ficar com o caminho pelo preço que lhe convier; ou como a venda não é obrigatoria, mas facultativa, continuará na administração como até ali, o que será talvez o mais provavel.

A todas estas observações respondia o governo transacto que se este accordo não fosse approvado, teriamos de approvar outro peior; ou explorar o caminho de ferro por conta do estado, o que daria prejuizo infallivel.

A idéa apresentada pelo sr. conde d'Avila de que = rejeitado o contrato, seria approvado outro peior = não me assustou, nem levemente me impressionou.

E como o illustre ex-presidente do conselho, fallando-nos em outro accordo peior, nos declarou assim estar convencido que este é mau, bastava esta declaração de s. ex.ª para eu o não votar.

Quando porém esta solemne manifestação contra o accordo de que se trata não tivesse sido feita perante o parlamento pelo chefe do gabinete, nem assim me assustava a idéa de outro accordo peior, porque nem eu o votava, nem a camara o aceitava (apoiados).

Mas rejeitado este ou qualquer outro identico accordo o governo tem de confiscar o caminho e de fazer a exploração por sua conta? Não é assim.

O governo, confiscado o caminho, póde proceder á sua venda em hasta publica, e se esta se não verificar na primeira praça, póde realisar-se na segunda ou terceira, porque tudo depende das condições da arrematação. Uma propriedade importante encontra sempre lançador quando as clausulas do contrato sejam rasoaveis (apoiados).

Póde finalmente o governo arrematar só a exploração, e é muito provavel que encontre arrematante.

Portanto nem a idéa de outro contrato peior, nem a do confisco e exploração das linhas ferreas por conta do estado são argumentos que impressionem, porque importam mais uma sophismação de idéas e de palavras, do que uma argumentação seria e concludente.

Se, em conformidade das bases que se offerecem para o contrato definitivo com a companhia do caminho de ferro

Página 1861

1861

de sueste, tem o estado á despender a enorme quantia de 2.968:751$506 réis;

Se a companhia fica dispensada do pagamento de réis 1.008:000$000, e o governo deixa de receber o rendimento da propriedade que compra por tão alto preço, cedendo-o á mesma companhia em vista dos termos por que se faz a liquidação do rendimento kilometrico;

Se todas as verbas de despeza, que o accordo menciona, denunciam a mais excessiva liberalidade;

Se de tantas, tão grandes e extraordinarias concessões nenhum interesse aufere o thesouro publico;

Se a perda do capital despendido e da propriedade por noventa e nove annos, é o resultado unico do accordo que se nos apresenta;

Se todos estes sacrificios são feitos para facilitar o levantamento de fundos na praça de Londres;

E finalmente se das operações de credito que se realisarem, quando approvado o novo contrato, resultam, como já demonstrei, tão pesados encargos que se torna inevitavel o cataclysmo: entendo que o accordo não póde ser approvado, ou que pelo menos deve ser alterado e modificado nos termos da proposta que vou mandar para a mesa (apoiados).

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)

Lê-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho as seguintes emendas e modificações ás bases assignadas em 20 de junho de 1868, para o contrato definitivo com a companhia do caminho de ferro de sueste:

1.ª Que para a caução do novo contrato a companhia do caminho de ferro de sueste seja obrigada a fazer o deposito de 90:000$000 réis a que o anterior contrato a sujeitava.

2.ª Que a subvenção de 18:000$000 réis por kilometro estabelecida no § unico da base 4.ª, e § 1.° da condição 5.ª fique reduzida a 14:000$000 réis.

3.ª Que a verba de 250:000$000 réis pelas obras feitas na secção de Faro a Boliqueme seja eliminada, e bem assim a de 2:700$000 réis pelos trabalhos feitos no tunel de S. Marcos, ficando sendo propriedade do estado essas obras, trabalhos e material fixo que n'elles houver.

4.ª Que a verba de 63:500$000 réis, que o governo se obriga a pagar pelos estudos feitos na parte dos prolongamentos que a companhia fica dispensada de construir nos termos do § 5.° da base 5.ª, seja reduzida á quantia de 19:482$000 réis.

5.ª Que a verba de 5:1985797 réis pelas obras feitas na linha de sueste, armazem de Cuba, e alargamento da estação de Vianna, seja eliminada.

6.ª Que fique reduzida a 58:000$000 réis a verba de 102:000$000 réis que pela condição 3.ª da base 6.ª, é destinada para a construcção da ponte e estação do Mexilhoeiro e ramal do Lavradio.

7.ª Que a verba de 46:626$509 réis, para a compra dos vapores pertencentes á companhia, e dos quaes ella carece para o serviço das linhas ferreas, seja reduzida á quantia de 10:928088 réis.

8.ª Que a verba de 276:726$000 réis pelo alargamento da linha do Barreiro e ramal de Setubal, e mais obras ahi feitas, em virtude do contrato de 1864, seja reduzida á quantia de 124:466$806 réis, em virtude de dever ser reduzido o custo do alargamento do caminho do Barreiro ás Vendas Novas a 1:236$673 réis por kilometro, que tanto foi o preço do alargamento do ramal de Setubal.

Sala das sessões, 3 de agosto de 1868. = Faria Blanc.

O sr. Teixeira Marques: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda.

Leu-se e approvou-se a ultima reducção do projecto n.° 22, assim como a dos n.ºs 11 e 12.

O sr. Montenegro: — Em cumprimento do regimento leio a minha moção, que é a seguinte (leu).

Não levarei muito tempo nas reflexões que tinha tenção de apresentar á camara, quando se tratasse de discutir este contrato; e não levarei muito tempo, porque vejo a disposição da camara em o rejeitar; entretanto tendo-o approvado com declaração, constitui-me immediatamente na obrigação restricta de explicar o meu procedimento, por isso fa-lo-hei o mais breve possivel, e não entrarei na analyse minuciosa do contrato, não só por que essa era já a minha tenção, mas porque as circumstancias variaram agora completamente. Se descesse á analyse minuciosa, effectivamente algumas verbas e differentes artigos podia achar dignos de reparo, posto que n'outros encontrasse tambem compensação; entretanto não posso eximir-me ao desejo de fazer uma pequena comparação, o mais rapido possivel, com o accordo que este contrato veiu substituir, e para isso devo procurar reduzir o accordo e as bases do contrato ás mesmas circumstancias, para poder comparar exactamente, vou, consintam-me a expressão, reduzi-los ao mesmo denominador.

N'estes contratos temos tres cousas inteiramente diversas. Obras já concluidas, obras em construcção, e obras inteiramente novas. Para as reduzir ás mesmas circumstancias, preciso portanto ao accordo de 24 de outubro de 1867 acrescentar as despezas necessarias para o acabamento de 119 kilometros, e tambem a importancia do material circulante por esses mesmos 119 kilometros. Ao contrato actual é preciso abater a quantia de 182:000$000 réis, que eram destinados a obras inteiramente novas, e que não tinham relação alguma com o accordo de 1867.

D'este modo temos que, em virtude do accordo de 24 de outubro de 1867, seria obrigado o governo a despender o seguinte:

Pelas obras já executadas, e juros pagos depois de abatido a tudo 20 por cento de penalidade, imposta á companhia … 2.816:351$373

Pela importancia das obrigações … 1.935:000$000

Pela importancia de coupons capitalisados em 1867 … 203:175$000

Pelo acabamento de 119 kilometros … 574:448$548

Pelo material circulante para os 119 kilometros … 178:500$000

Total da despeza....... 5.707:474$921

Encargo annual correspondente a 7 ½ por cento … 428:060$619

Devo notar que eu entro n'este calculo com a quantia necessaria para o acabamento dos trabalhos, em conformidade do orçamento feito pelo meu collega Boaventura José Vieira, que é o mais economico, e tambem calculo para o material circulante uma quantia de 1:500$000 réis por kilometro, que é uma quantia muito pequena.

Agora vamos a examinar as bases para o contrato que se discute.

Segundo as bases de 20 de junho de 1868 teria o governo que pagar á companhia o seguinte:

Pela subvenção de 119 kilometros, a réis 18:000$000 por kilometro … 2.142:000$000

Pelas obras já construidas … 644:751$506

Total da despeza … 2.786:751$506

Encargo annual correspondente a por

Cento … 213:606$262

Subtrahindo o encargo resultante d'este contrato do primeiro teremos:

Encargo resultante do accordo de 24 de outubro de 1867 … 428:060$019

Encargo resultante do contrato de 30 de junho de 1868 … 213:606$262

Differença … 214:454$357

As vantagens resultantes d'estes dois contratos eram as seguintes:

Pelo accordo de 24 de outubro de 1867 ficava o governo com todas as vias ferreas, e pelo actual contrato fica pertencendo ao governo unicamente a parte do caminho do Barreiro ás Vendas Novas e o ramal de Setubal.

Precisâmos agora comparar estas vantagens em relação aos encargos.

Pondo de parte esta acquisição que o governo fazia no segundo contrato, parece-me que o primeiro seria mais vantajoso e conveniente se o caminho podesse render os réis 214:454$357 de differença de encargos.

O rendimento que dizem que elle dá actualmente, e digo que dizem, porque confesso ingenuamente que não acredito similhante cousa, é de 54:000$000 réis.

Se fizermos o calculo na mesma proporção para os 313 kilometros, que ficavam depois de concluida a linha, teremos 87:123$550 réis; o que é uma verba muito longe dos 214:000$000 réis do encargo.

Dir-se-ha porém, e com rasão, que este rendimento ha de augmentar consideravelmente, e que durante o praso da concessão o rendimento medio ha de exceder a esta quantia.

É possivel, mas não nos Aludamos, porque tambem o custo da exploração ha de augmentar consideravelmente, porque explora-se uma linha acabada de pouco, onde as travessas são novas, onde são novos os carris e todo o material circulante, que terá depois de ser inteiramente substituido.

A substituição d'este material ha de fazer crescer o custo da exploração, e uma substituição completa no 313 kilometros não póde importar em nada menos de 2.000:000$000 réis.

Ainda quando nos 99 annos da concessão se façam só tres substituições, teremos 6.000:000$000 réis, encargo que ha de diminuir consideravelmente o rendimento liquido.

Entretanto tenhamos fé no futuro das provincias alentejanas e no seu futuro desenvolvimento; tenhamos esperança em que o rendimento d'estas linhas ha de augmentar consideravelmente durante os 99 annos; e já agora completemos as tres virtudes e tenhâmos tambem uma pouca de caridade com este accordo, que é do que elle mais necessita na minha opinião.

Supponhamos que o rendimento não só cobria o encargo, mas excedia-o, e que o caminho podia dar um resultado liquido, medio, de 300:000$000 réis. E claro que, em virtude do accordo de 24 de outubro, ficavam de lucro … 85:545$643

Mas, pelo contrato actual, tambem o rendimento correspondente aos 77 kilometros era de … 73:801$882

Ha uma differença de … 11:743$761

que fica sobejamente compensada com o material que a companhia é obrigada a fornecer para a primeira parte, e vem em favor do governo, e mesmo a diminuição do juro resultante do menor encargo annual.

Eu tinha feito tambem uma comparação com o contrato de 14 de outubro, que é o peior de todos os contratos.

Julgo entretanto desnecessario apresentar agora essa comparação, e fatigar a camara com uma exposição mais longa ácerca de um contrato que esta já collocado em muito más circumstancias.

Limito-me pois a compara-lo com o ultimo accordo, e parece-me que, d'esta comparação, não se póde duvidar que tem grande vantagem o ultimo sobre o primeiro.

É claro portanto que, prescindindo da analyse d'este contrato considerado isoladamente, mas considerando-o em comparação com os anteriores, e deixando-nos dominar de um certo panico de que a sua rejeição possa influir no nosso credito, não tinha eu a menor duvida em approvar este contrato; offerecem-se-me porém outras duvidas ponderosas, entre as quaes avulta a falta de garantias que nos assegurem que, no caso d'elle não ser cumprido, o paiz não soffrêra com isso prejuizo algum.

Tenho ouvido dizer que esta companhia com quem tratámos esta fallida; outros dizem que ella nunca existiu, e outros boatos tenho tambem ouvido, muito pouco tranquillisadores. Confesso que me não deixo dominar completamente por esses boatos, que podem ser filhos mais de ruins paixões que de pura e sã consciencia; mas a verdade é que já se têem feito tres ou quatro contratos com esta companhia, e ella até hoje não cumpriu nenhum; por consequencia, tratando-se agora de fazer novo contrato, é preciso que elle seja muito meditado e muito estudado; é necessario que elle se faça de modo que no caso d'elle se não cumprir, o governo e o estado não tenham novos prejuizos, porque esta falta de cumprimento dos contratos anteriormente feitos tem custado muito ao thesouro.

Vejamos pelo contrato actual o que podia succeder.

Em primeiro logar a companhia podia tratar de emittir immediatamente 3.000:000$000 ou 4.000:000$000 réis de obrigações a capitalistas que lhe forneçam dinheiro, confiados não só no bom resultado da exploração, mas na garantia real do proprio caminho, e uma tal emissão podia ser altamente prejudicial para o paiz; mas quando mesmo a companhia não fizesse isto, ella podia receber grossas quantias do estado e depois declarar-se fallida e entregar o caminho com o encargo dos 1.935:000$000 réis, que já estão emittidos em obrigações.

Eu sei que quanto á emissão de novas obrigações, podem responder-me com a lei das sociedades anonymas, que não permitte que nenhuma sociedade possa emittir maior numero de obrigações do que as quantias que têem em deposito; mas a verdade é que até hoje nunca se fez caso d'esta lei.

Podem comtudo dizer-me que de futuro o governo ha de obrigar as companhias a cumprir esta disposição da lei das sociedades anonymas; mas quem ha de verificar se a companhia tem em dinheiro nos cofres uma quantia igual á das obrigações que emitte?

De mais a mais, recebendo um capital importante a que brevemente terá direito, póde pô-lo em deposito, emittir igual valor de obrigações, e logo em seguida fallir, ficando para o governo este encargo.

Mas tambem me podem dizer que a companhia fica sujeita a todas as penalidades dos contratos anteriores, em vista das quaes o governo não garante divida alguma, e por isso não é obrigado a pagar as obrigações; mas quem nos diz que depois não hão de apparecer as mesmas considerações que apparecem hoje. Sei que os portadores de obrigações não têem principios de jurisprudencia, em que fundem as suas reclamações, mas têem os principios de equidade e mesmo um certo direito que não tem sido geralmente reconhecido, mas que tem sido geralmente respeitado por outras nações mais poderosas do que nós, e não hão do mesmo esquecer uma certa pressão que na qualidade de capitalistas podem exercer sobre o nosso credito nas praças estrangeiras.

É para evitar todas estas duvidas que eu quero contratos claros. Estas considerações influem muito no meu espirito, e por mais que pense não atino com respostas faceis e claras a este respeito.

Sei que podem haver mais algumas rasões mais ou menos fundamentadas, mais ou menos claras, mas todas são opinativas, e eu não quero que esta questão fique sujeita a interpretações futuras.

Portanto apresento a proposta que mando para a mesa e limito aqui as minhas considerações, que seriam mais largas se se não dessem as circumstancias que se dão. Além d'isso ha outros collegas que partilham as mesmas opiniões que eu tenho, e elles de certo supprirão com o seu talento algumas faltas que tenha havido na minha memoria, e aquillo que eu não poderei ter conseguido com os pequenos recursos da minha intelligencia.

E a seguinte

Proposta

Proponho:

1.° Que se acrescente as bases do contrato que a companhia não poderá emittir mais obrigações.

2.° Que a importancia das subvenções e mais obras a que a companhia brevemente tem direito a receber serão applicadas ao pagamento" das obrigações até hoje emittidas.

Camara dos senhores deputados, 3 de agosto de 1868. = Augusto Pinto de Miranda Montenegro.

Foi admittida.

O sr. Ministro do Reino (Bispo de Vizeu): — Mando para a mesa uma relação dos empregados do ministerio do reino e outra dos do ministerio da justiça, que têem assento n'esta camara, para que a camara lhes conceda licença para accumularem, querendo, as funcções de deputados com as dos seus respectivos empregos.

Mando tambem uma proposta de lei para relevar algumas camaras municipaes da responsabilidade em que incorreram por terem gasto algumas verbas, umas sem auctorisação, outras desviadas de um capitulo para outro. Estas camaras já foram condemnadas pelo tribunal de contas, mas como se reconheceu que ellas não delapidaram o dinheiro, nem o applicaram a interesse particular, mas sómente em interesse municipal, pareceu de toda a equidade que os poderes publicos lhe acudissem para que ellas não

Página 1862

1862

ficassem prejudicadas nos seus interesses, quando aliás tinham empregado as verbas a bem dos seus municipios.

Mando pois a proposta para a mesa, para ter o seu seguimento.

Leram-se na mesa as seguintes

Propostas

Senhores. — Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo de Sua Magestade pede á camara dos senhores deputados da nação portugueza a necessaria permissão para que possam accumular, querendo, as funcções legislativas com as dos empregos dependentes do ministerio do reino, que exercem em Lisboa os srs. deputados.

Anselmo José Braamcamp, vogal da secção do contencioso administrativo do conselho d'estado.

Antonio Cabral de Sá Nogueira, conselheiro d'estado extraordinario com exercicio na secção administrativa do conselho d'estado e provedor dos recolhimentos da capital.

Francisco Van-Zeller, ouvidor junto do conselho distado.

João Antonio Vianna, official ordinario, chefe da repartição da secretaria do conselho d'estado.

Joaquim Henriques Fradesso da Silveira, lente da escola polytechnica, director do observatorio do Infante D. Luiz.

Joaquim de Vasconcellos Gusmão, lente de economia politica na escola polytechnica.

Joaquim Xavier Pinto da Silva, primeiro official, chefe de repartição da secretaria d'estado dos negocios do reino.

José Baptista Cardoso Klerk, sub-delegado technico do conselho de saude publica em Lisboa.

José Carlos Rodrigues Sette, primeiro official da secretaria d'estado dos negocios do reino.

José Gregorio Teixeira Marques, lente substituto da escola medico cirurgica de Lisboa.

José da Silva Mendes Leal, bibliothecario mór da bibliotheca nacional de Lisboa.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 3 de agosto de 1868. = Antonio, Bispo de Vizeu.

Por se dar o caso de urgente necessidade do serviço publico pede o governo á camara dos senhores deputados da nação haja de permittir, na conformidade do artigo 3.° do acto addicional da monarchia, que os srs. deputados

Ignacio Francisco Silveira da Motta, sub-director geral da direcção central do ministerio dos ecclesiasticos e de justiça;

Conselheiro Antonio Roberto de Oliveira Lopes Branco, juiz da relação de Lisboa;

Conselheiro José Maria da Costa e Silva, juiz da relação de Lisboa;

Antonio José da Rocha, juiz de direito da primeira vara da comarca de Lisboa;

José de Menezes Toste, guarda mór da relação de Lisboa;

José Baptista Cardoso Klerk, cirurgião da cadeia da cidade de Lisboa possam accumular, querendo, o exercicio das funcções legislativas com o dos seus lagares na capital.

Secretaria d'estado dos negocios ecclesiasticos e de justiça, em 30 de julho de 1868. = Antonio, Bispo de Vizeu.

Foram concedidas as licenças pedidas.

O sr. Lourenço de Carvalho: — Sr. presidente, eu não tomaria parte n'esta discussão se a isso não fosse levado pela fórma por que subscrevi o parecer das duas commissões a cujo exame foi incumbido o accordo que se discute. Desde que assignei com declarações e que dellas prometti fazer uma publica exposição, eu não podia por fórma alguma eximir-me a esse encargo, e a camara vae ter conhecimento do sentido das minhas declarações pela leitura da minha moção de ordem (leu).

V. ex.ª e a camara notarão que ha grande analogia entre a minha proposta e a do meu amigo, o sr. Montenegro, o que eu já esperava da identidade das idéas que expozemos no seio das commissões. N'esta proposta se contém as condições com que eu aceitaria o presente accordo, e digo aceitaria, porque ainda não pude convencer-me de que esta discussão fosse mais do que uma formalidade e mera ficção parlamentar.

Á imitação do que succede nos combates simulados dos campos de manobras, nos quaes todos os lances são previstos, todas as peripecias premeditadas, e até mesmo antecipadamente se distribuem os papeis de vencidos e vencedores, já tambem nós aqui sabemos quem são os que tem de fallar contra e a favor e quaes hão de ser os vencidos e vencedores. Receio porém que a grande minoria dos primeiros cerceie um pouco a gloria dos segundos.

A confirmação d'esta minha idéa esta tanto na inscripção d'este debate como na fórma por que tem corrido a discussão. Primeiramente têem fallado os que assignaram o parecer com declarações, depois vão fallar os que têem de approvar o contrato, e naturalmente mais ninguem falla; o que prova que isto é um negocio resolvido e que não se trata senão de satisfazer as praxes parlamentares.

Sr. presidente, eu declaro a v. ex.ª e á camara que teria rejeitado este accordo simples e formalmente, se porventura as duvidas que elle me offerece não podessem ser removidas com facilidade. Se eu entendesse que se deviam substituir algumas das disposições d'estas bases para um contrato por outras inteiramente diversas, cuja aceitação encontrasse difficuldades por parte da companhia, e demandasse um novo accordo entre esta e o governo, eu então entendia ser mais logico rejeitar o contrato, encarregando o governo de contratar n'outras condições. Porém as condições que eu formulo na minha moção de ordem parecem-me muito simples e muito aceitaveis e creio que a companhia seria a primeira a aceita-las, e n'esse caso não haveria rasão alguma para que o governo as não adoptasse igualmente, porque ficariam assim salvaguardados os interesses dos bond holders, cujos direitos nós reconhecemos e a favor dos quaes nos sentimos naturalmente inspirar pelos principios da equidade.

Ora, eu creio que ha nas relações entaboladas entre o governo e a companhia factos que auctorisam a acreditar que a companhia aceitaria sem a menor reluctancia a condição do governo mandar reembolsar as obrigações por meio de agentes seus em Londres, retendo em seu podér para esse effeito a importancia correspondente das verbas que a companhia teria a receber, e que na sua totalidade ascenderia a perto de 3.000:000$000 réis, sendo a importancia das obrigações para mais de 3.000:000$000 réis. Comprehende-se facilmente que eu n'este assumpto guarde uma certa reserva, e me dispense de mais detalhadas explicações; mas espero que algum dos cavalheiros que fizeram parte da ultima administração, tomando a palavra n'este debate, complete, se lhe parecer conveniente, a deficiencia das minhas explicações.

Esta minha condição significa, no meu entender, uma garantia contra a hypothese, que julgo possivel e mesmo provavel, do abandono da exploração por parte da companhia; e já d'aqui se póde colligir que não julgo este contrato grandemente vantajoso para os seus interesses, bem como o não julgo de certo a expressão do melhor arranjo que se podesse obter entre a companhia e o governo. Ainda assim, creio que ha grandes rasões de preferencia em relação ao accordo de 24 de outubro do anno passado, e como este era na minha opinião consideravelmente preferivel ao contrato de novação de 14 de outubro de 1865, eu persuado-me que ha na solução d'estes negocios uma certa perfectibilidade progressiva que me faz conceber esperanças de que o accordo, que tem de succeder-se ao presente, mostrará maiores vantagens, a despeito da prophecia que n'esta casa proferiu o digno presidente do conselho da passada administração, poucos dias antes de apresentar a sua demissão a El-Rei. E por isso eu desejo que a camara se pronuncie sobre este negocio, e que, por fórma alguma adiemos esta questão, porque me parece que o governo ganharia grande energia e força moral para impor as condições que julgue sufficientes para obedecer aos preceitos da equidade sem comprometter e aggravar as circumstancias penosas do nosso thesouro.

E se a camara, o que eu não penso, entende que deve applicar-se á companhia a penalidade rigorosa expressa nos primitivos contratos, inuteis são quaesquer outras considerações, porque a letra rigorosa e stricta das suas disposições não deixa logar a duvidas ou hesitações, e o governo de nada mais carece para proceder ao immediato e completo confisco das linhas de sul e sueste e seus prolongamentos alem de Evora e Beja.

"Eu não sei se ha n'esta camara quem professe estas idéas, mas pela minha parte confesso que folguei muito com a declaração, que o sr. ministro da fazenda fez, de que a rejeição d'este contrato não importava por fórma alguma, no pensamento do actual governo, applicação rigorosa das penalidades do contrato. Mas se entendemos que se deve proceder para com a companhia, não com todo o rigor, mas com um certo favor e equidade, então é necessario que definamos claramente a latitude da palavra equidade, quando procurámos applica-la ao caso presente. Ora, para mim, a equidade n'esta questão é o reembolso dos capitaes dos bond holders, e uma justa compensação á companhia pelas despezas por ella effectuadas, devidamente comprovadas e corrigidas, se porventura se entende que n'ellas haja a menor exageração.

E sabido que por este accordo se entregarão á companhia, depois de ultimados alguns trabalhos, cerca de réis 3.000:000$000, ou mais exactamente 2.968:000$000 réis.

E como a importancia das obrigações emittidas, addicionando a verba dos coupons remidos, e que ainda não foram pagos, sobe á quantia de 2.138:000$000 réis, bem se deixa ver que dos 2.968:000$000 réis apenas ficariam á companhia 830:000$000 réis para reembolso das despezas já feitas, e para occorrer ás despezas provenientes do acabamento das secções de Evora a Extremoz, Beja a Guimarães, e Beja a Cazevel.

Sr. presidente, eu não quero alargar mais as minhas considerações pelas rasões que já expuz, e mesmo porque vejo inscriptos n'esta questão cavalheiros cuja competencia é muito superior á minha, que eu desejo muito ouvir, e sobre os quaes pésa de certa fórma o compromisso moral de defender actos que pertenceram á sua administração.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que ás bases do presente accordo se addicione uma nova base pela qual a companhia, ficando inhibida de emittir mais obrigações, seja obrigada ao reembolso das que hoje existem com as quantias a que for tendo direito pelas disposições do mesmo accordo. =Lourenço de Carvalho.

Foi admittida.

O sr. Montenegro: — -Vou mandar para a mesa um requerimento a fim de que v. ex.ª consulte a camara sobre se consente que seja publicado no Diario de Lisboa o officio do sr. Canto, acompanhando o inventario feito por s. ex.ª ao caminho de ferro de sueste, documento que ainda não foi publicado.

Leu-se na mesa o requerimento.

Foi approvado.

O sr. Ministro do Reino: — Mando para a mesa uma proposta de lei para auctorisar o governo a poder reformar, na ausencia das côrtes, todos os ramos do serviço publico, tudo nos termos das bases da mesma proposta de lei.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Mando para a mesa uma relação dos srs. deputados, que exercem empregos no ministerio das obras publicas, para que a camara lhes conceda licença para accumularem, querendo, as funcções legislativas com as dos seus empregos.

Igualmente mando uma relação identica em nome do meu collega o sr. ministro da marinha.

São as seguintes:

Senhores. — Estando o governo auctorisado pelo artigo 3.º do acto addicional para pedir ás camaras que, no caso de urgente necessidade, permittam aos seus membros que accumulem o exercicio do serviço publico com as sessões legislativas, se assim o quizerem, são n'esta conformidade requisitados á camara dos senhores deputados, por se dar effectivamente o caso indicado, os seguintes srs. deputados:

Belchior José Garcez, membro do conselho de obras publicas.

Joaquim Henriques Fradesso da Silveira, chefe da repartição de pesos e medidas.

Manuel José Julio Guerra, inspector de divisão.

Lourenço Antonio de Carvalho, engenheiro subalterno de 2.ª classe.

Augusto Pinto do Miranda Montenegro, engenheiro subalterno de 1.ª classe.

Gilberto Antonio Rolla, engenheiro chefe de 2.ª classe.

Joaquim Thomás Lobo d'Avila, engenheiro chefe de 1.ª classe.

Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas, engenheiro chefe de 1.ª classe.

João Maria de Magalhães, inspector de florestas.

Jacintho Augusto de Freitas e Oliveira, 2.° official d'este ministerio.

Augusto de Faria, 1.° official e chefe de secção d'este ministerio.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, 8 de agosto de 1868. = Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes.

Senhores. — Em conformidade do disposto no artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, o governo pede á camara dos senhores deputados permissão para que os seus membros abaixo mencionados possam accumular, querendo, o exercicio das funcções legislativas com as dos seus empregos ou commissões:

Antonio Maria Barreiros Arrobas, vogal do conselho ultramarino.

Joaquim Pinto de Magalhães, vogal do conselho ultramarino.

Levy Maria Jordão, ajudante do procurador geral da corôa junto ao ministerio da marinha e ultramar.

Antonio Julio de Castro Pinto de Magalhães, secretario do conselho ultramarino.

José Maria Lobo d'Avila, sub-chefe da 2.ª repartição da 2.ª direcção da secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar.

Carlos Testa, lente da escola naval.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 1 de agosto de 18Q8. = José Maria Latino Coelho.

Foram ambas approvadas.

O sr. Silveira da Mota: — Eu lembrava á camara a conveniencia de, na primeira parte da ordem do dia de ámanhã, ser nomeada por v. ex.ª ou eleita pela camara uma commissão especial para dar o seu parecer sobre a proposta de lei apresentada pelo sr. ministro do reino para a reforma dos serviços.

O sr. Presidente: — Deu a hora, ámanhã se resolverá. A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que está dada e mais o projecto da desamortisação, que tem, pela numeração antiga os n.°s 28 e 29, e pela nova o n.° 1.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

Em virtude de resolução da camara dos senhores deputados se publica o seguinte

Ministerio das obras publicas, commercio e industria — Repartição de obras publicas — 2.º Divisão fiscal de caminhos de ferro — Ill.mo e ex.mo sr. — Tenho a honra de passar ás mãos de v. ex.ª o inventario, descripção e avaliação do caminho de ferro de sueste e seus prolongamentos, trabalho este elaborado de accordo com o engenheiro em chefe da companhia C. F. White, em conformidade com o que me foi ordenado em officio de v. ex.ª, datado de 2 de novembro do anno proximo passado.

Para levar ao cabo a commissão de que estavamos encarregados, dois meios havia a seguir, ou proceder a um inventario rigoroso e medição dos trabalhos, ou tomar para base dos nossos calculos todas as quantias despendidas, tanto pelo estado, como pela companhia. Preferimos o segundo ao primeiro systema: não só por ser mais expedito, e menos sujeito a contestações; mas muito principalmente porque a somma dos valores que o estado despendeu, aproximadamente de réis 2.992:000*000, é assás diminuta em comparação com a somma de 5.489:717*511 réis relacionada como despeza da companhia. E assim o prejuizo que poderia resultar para o estado por considerarmos o material fixo e circulante novo, pela maior parte, por não deduzirmos o valor do carril usado da antiga linha do sul, fica sobejamente garantido com a somma dos maiores valores que foram pela companhia despendidos.

Por outro lado, se forem considerados excessivos os preços apresentados pela companhia, lá tem este excesso o seu correctivo em uma avaliação exacta, por isso que os concorrentes não vão lançar sobre o caminho pela fé que o inventario lhes póde inspirar, mas sim por terem bem visto e examinado, com a sua rasão e experiencia, o objecto que pretendem comprar.

Pelo que respeita á avaliação dos trabalhos nas linhas em construcção, para que o estado nada despendeu, tambem

Página 1863

1863

nos pareceu melhor e mais exacto juntarmos as sommas despendidas pela companhia, a proceder a medições, por extremo morosas, menos exactas e ainda todos os dias sujeitas ás alterações que o tempo ha de necessariamente fazer em obras que foram abandonadas antes de concluidas.

N'este inventario se faz menção dos materiaes empregados em as novas construcções, bem como daquelles que, estando em deposito, a ellas eram destinados.

Deixamos porém de relacionar tudo que, pertencendo aos empreiteiros, foi considerado como meio de trabalho.

Deus guarde a v. ex.ª Lisboa, 25 de janeiro de 1867. — 111.º30 e ex.mo. sr. conselheiro director geral das obras publicas. = O engenheiro chefe de 1.ª classe, Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas.

Esta conforme. — Repartição de obras publicas, em 29 de maio de 1868. = Joaquim Simões Margiochi.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×