O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1856 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. João Pinto dos Santos: - Como pedi a palavra sobre a ordem, vou ler a minha moção.

«A camara, reconhecendo quanto o tratado lesa a integridade da patria, aproveita esto ensejo para proclamar seus beneméritos os exploradores portuguezes. = O deputado, João Pinto.»

Sr. presidente, eu assignei a proposta apresentada pelo sr. Alpoim, proclamando benemerito da patria Azevedo Coutinho, porque na occasião em que só tinham dado os acontecimentos do Chire, o sr. ministro da marinha declarara n'esta casa que aquelle official transgredira as ordens que lhe tinham sido dadas, devendo por isso ser mettido em conselho de guerra, e tornava-se urgente que se rehabilitasse aquelle brioso militar no mesmo lugar em que lhe tinha sido feito o aggravo, compensando-o assim quanto possivel da injustiça que lhe fôra feita.

Se é este o fundamento da proposta, parece-me inopportuno o ensejo para consignar benemeritos da patria todos os nossos africanistas, que nós respeitâmos e acatâmos, (Muitos apoiados.) e a quem temos feito em outras oceasiões as maiores manifestações de enthusiasmo, porque felizmente n'este momento não carecem de rehabilitação como Azevedo Coutinho.

Custa-me a comprehender a lembrança do sr. Julio de Vilhena additando a proposta do sr. Alpoim com o nome do todos africanistas portugueses.

Se s. exa. tem em vista formar uma galeria de benemeritos da patria, não deve ir buscai os simplesmente aos que exploram a Africa, deve ir procural-os tambem aos que se têem distinguido nas letras, nas sciencias, nas artes, etc., etc.

A consignação de todos os africanistas e só dos africanistas neste momento representa realmente a condemnação do governo, (Muitos apoiados.) e admiro que o sr. Julio de Vilhena, tão talentoso como é, commettesse uma tal leviandade.

Pois não é claro que, se o governo aproveita este ensejo para proclamar benemeritos da patria todos os que têem combatido pela sua integridade é por conhecer que ella foi defraudada e querer dar-nos um premio de consolação?!

A proposta, partindo das bancadas da opposição, tinha rasão do ser, pois significava uma censura ao governo, visto tender a exaltar todos aquelles que se tinham sacrificado pela prosperidade das colonias, na occasião em que o governo dava um golpe profundo nos nossos dominios coloniaes; mas, vindo das bancadas do ministerio, sendo feita pelo sr. ministro da marinha, é um erro, é a condemnação do governo.

Têem tanto respeito pelos nossos africanistas que os vão declarar benemeritos, e assignam um tratado que nos rouba grande parte dos nossos domínios africanos?!

É tal a desorientação do governo, que não viu que tal proposta representa um cheque para elle. (Apoiados.)

Sr. presidente, fallando n'esta altura da sessão, não devo deixar de frisar bem a scisão que começa a manifestar-se no seio do partido regenerador em frente do tratado com a Inglaterra.

Dois dos seus membros muito distinctos, os srs. Manuel d'Assumpção e Serpa Pinto, acabam de fazer as suas declarações solemnes contra o tratado, promettendo envidar todos os seus esforços para o não deixar converter em lei do paiz.

O que representam estas declarações de partidários dedicados da regeneração? Evidentemente significam a enorme reluctancia que ha contra tal tratado, mesmo dentro das fileiras do partido regenerador.

Pois apesar d'isto, o governo, fascinado pelo poder, procura impor a sua obra à entrance, não hesitando sequer um momento em pôr em pé de guerra todas as forças de que dispõe, para fazer approvar o tratado.

N'este sentido, manda tomar as bocas das ruas pela policia, para não dar entrada ao povo no largo das Cortes, admitte sómente a entrada de pares o deputados e de pessoas que venham já munidas de bilhetes de galeria; posta detraz da estatua de José Estevão uma força da municipal a cavallo; faz invadir as galerias por policias vestidos á paizana, procurando por todas as fórmas que o povo não entro na camara, a fim de evitar qualquer manifestação de desagrado contra o celebre tratado.

Vê-se, pois, que ha um empenho enorme em fazer passar o tratado, ainda que para isso tenham de praticar-se as maiores prepotencias.

O tratado, porém, sr. presidente, seja qual for a posição em que a sua discussão nos colloque perante a Inglaterra, não póde, não deve ser approvado n'esta casa; e, se o for, deve-nos ser arrancado depois de uma lucta extraordinaria, em que mostremos bem a injustiça de que somos victimas e a coragem com que sabemos defender os nossos direitos.

Quando um paiz se levanta como um só homem para defender a bua honra e a sua dignidade; quando vae até aos ultimos recursos para conservar a integridade nacional, esse paiz tem direito á vida, tem direito ao respeito de todos, porque manifesta força e coragem para realisar o seu ideal historico; mas quando um paiz se deixa defraudar na sua propriedade e humilhar na sua dignidade e não lucta até aos ultimos extremos, é um paiz perdido e as nações devem, em nome do direito internacional, exproprial-o por utilidade publica.

Da mesma fórma que, no direito privado, se nomeiam tutores aos menores o aos incapazes, assim se deve fazer tambem no direito das nações.

Se Portugal chegou já á abjecção de se deixar espoliar a sangue frio e até de boa feição, que acudam depressa as nações a riscar-nos do mappa da Europa.

Felizmente, sr. presidente, estou convencido de que o tratado não conseguirá ser lei d'este paiz, porque confio muito, muitíssimo no brio nacional que saberá por todas as fórmas e feitios impor-se aos governantes que querem a nossa deshonra, e conquistar aã sympathias e as adhesões das nações europêas pelos actos de bravura e patriotismo com que defenderá de certo os nossos direitos sacratissimos.

O que é preciso é luctar, é mostrar que temos brio e merecemos o respeito de nação autonoma.

O que é preciso é arcar seriamente com os problemas da nossa administração interna.

O que é preciso é ter firmeza e juizo.

Mas, se ainda assim formos esmagados diante da força, acabâmos bem, pois nos conservâmos no nosso posto, defendendo a integridade da patria.

Leu-se na mesa a seguinte:

Proposta

A camara, reconhecendo quanto o tratado lesa a integridade da patria, aproveita este ensejo para proclamar seus beneméritos os exploradores portuguezes. = O deputado, João Pinto.

Foi admittida.

O sr. Franciso Machado: - Requeiro que seja consultada a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida.

O sr. Presidente: - Não é necessario consultar a camara, porque não está mais ninguem inscripto.

Vão ler-se as propostas mandadas para a mesa.

Leram-se as seguintes:

Propostas

A camara dos senhores deputados declara benemerito da patria o primeiro tenente da armada João do Azevedo Coutinho.

Sala das sessões, em 15 de setembro de 1890. = José