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1983

vi gastar sommas, como esta dos theatros que figura no orçamento, benzi-me e disse — pois é possivel que nós, tão pobres como somos, gastemos estas verbas? Mas depois disseram-me: «Estas verbas gastam-se aqui, porque representam tambem um grande augmento de instrucção publica, um grande elemento de desenvolvimento moral, um grande elemento de desenvolvimento artistico, e gasta-se aqui particularmente, porque Lisboa paga mais n'uma hora do que o seu circulo, o de Trancoso, paga num anno». E eu convenci-me destas rasões, e resignei-me; e tenho visto o producto d'estas despezas, e vejo que não seja uma destas verbas com que se atira á rua, porque esta verba de theatros e outras representam um grande influxo na civilisação, no desenvolvimento de todas as artes, no desenvolvimento de certas industrias; e uma nação deve empregar todos os meios de se engrandecer e nobilitar.

Sua magestade o rei do Congo, por exemplo, não gasta nada em exercito; não gasta tambem nada em theatro; e diante de mim está um illustre deputado que de certo conhece o potentado a que me refiro, e poderá confirmar o que digo. Não gasta em theatros cousa alguma, em museus nada absolutamente, numa palavra, não tem todas estas despezas que carregam sobre um governo civilisado, que vive no meio das nações cultas da Europa; mas não me parece que aquelle paiz, que se governa d'aquelle modo, seja o paiz mais feliz da terra.

Ora, foi tambem accusado o ministro da guerra, e não vejo presente o illustre deputado que dirigiu a accusação, a respeito d'esta desgraçada e apoucada questão do sr. conde de Bolhão. Foi accusado o ministro da guerra gravemente, e não só foi accusado o ministro da guerra, mas o tribunal da relação do Porto; e, a fallar a verdade, de todas as accusações aquelle tribunal nenhuma é mais revoltante do que ' esta a que se referiu de = que se aquelle tribunal absolve "ou condemna um criminoso, é pela influencia que n'elle exerce o estar tal preso aqui ou acolá =! A fallar a verdade não posso acreditar similhante cousa. Era preciso que eu não conhecesse a maioria dos juizes do tribunal da relação do Porto para poder presumir similhante cousa.

Foi accusado o ministro da guerra de ter requisitado e arbitrariamente posto numa prisão militar o sr. capitão, conde de Bolhão. Ora, o ministro da guerra nunca fez similhante requisição, nem a fazia em caso nenhum.

Eu contarei em poucas palavras o que se passou a este respeito.

0 sr. capitão, conde de Bolhão, foi pronunciado no negocio chamado de fabricação de moeda falsa: veio uma deprecada da auctoridade judicial do Porto á auctoridade administrativa de Lisboa para o prender, e hão obstante esta deprecada não foi preso, e foi para Inglaterra. Tambem não sei como elle fez isso (riso). Estando era Inglaterra imaginou voltar e vir livrar-se, e n'esta disposição o seu procurador aqui em Lisboa, um sr. conselheiro, veio-me pedir para elle ser recolhido numa prisão militar, e entregou-me o requerimento. Eu, que não tinha difficuldade em prender o sr. conde de Bolhão e todos os condes se fosse necessario (riso), porque não tinha difficuldade em mette-los todos em processo, comtanto que a lei justificasse esse meu procedimento, vendo que não havia no cartorio do ministerio da guerra nota contra elle; eu, que não tinha difficuldade em prender o sr. conde de Bolhão, quando estivesse auctorisado com a lei, sou um homem timorato e receioso • em mandar prender, quando o não devo fazer, quem quer que seja, e por isso indeferi o requerimento; o despacho ha de estar no livro da porta. O ministro da guerra não prende senão quem dever ser preso em prisão militar, porque isto podia ser uma especie de mania, uma especie de excentricidade o querer ser preso em uma prisão militar, e por isso indeferi, como disse, o requerimento. Passados alguns dias é que me foi enviada, pelo ministerio do reino, a requisição para que aquelle capitão fosse preso n'uma prisão militar, e posto á ordem do juiz Competente que o"tinha de julgar. Aqui está a ordem, que peço licença á camara para ler.

«Ministério do reino. — Direcção geral de administração civil. — 2.ª Repartição. — Constando que o paquete da carreira do Brazil, proximo a chegar de Inglaterra a esta capital, conduz o conde de Bolhão, capitão da 8.º companhia do 2.° batalhão nacional de caçadores do Porto, que vem apresentar-se para responder nos tribunaes. aos factos criminosos que lhe foram imputados: manda Sua Magestade El-Rei prevenir d'isto o governador civil do districto de Lisboa para que, assim que o dito paquete der entrada neste porto, seja o mencionado conde d'elle transferido para o castello de S. Jorge, para ali ficar em custodia á ordem da competente auctoridade judicial, até ser removido para a cidade do Porto, onde tem de proseguir o seu processo; na intelligencia de que pelo ministerio da guerra se expedem as ordens necessarias, a fim de ser recebido no referido castello.

«Paço, em 11 de agosto de 1860. = Marquez de Loulé.

«Está conforme. = Olympio Joaquim de Oliveira.»

Assim como o conde de Bolhão estava no castello, sujeito á auctoridade judicial, estavam lá muitos outros officiaes, e isto não é cousa nova, isto é corrente; tem-se praticado em differentes epochas, e na epocha em que elle estava preso, estavam lá presos muitos outros officiaes por imputação e por crime civil.

Eu nunca pude comprehender qual era o alcance politico d'esta questão. O nobre ministro da justiça respondeu magistralmente na parte em que havia a sustentar o direito, e eu não repetirei o que disse s. ex.ª; o que tenho em vista é pôr os factos no campo da verdade, e que elles sejam avaliados á luz da justiça, com imparcialidade pela camara, e que se não faça d'esta questão, que é uma questão pequenina e miseravel, uma questão de grande vulto; e sobretudo que se increpe nem se accuse o ministerio da guerra por aquillo por que não é increpavel, nem póde ser accusado.

Eu sobre a questão da organisação militar tinha muito que dizer, é uma questão grave; mas como me parece que hontem foram, as propostas para a commissão, não quero nem devo trata-la incidentalmente. Estou comtudo preparado, sem grande estudo, sem ser prevenido, para em qualquer occasião e em qualquer hora a tratar com os illustres deputados da opposição, no ponto de vista em que a quizerem tratar.

E convençam-se os illustres deputados de que essa questão não tem sido desacompanhada do governo (apoiados dos srs. ministros), e de que, se o governo não a encontrou descurada, pelo menos tem da sua parte empregado meios muito efficazes, muito energicos para lhe dar uma solução plausivel, conveniente e militar (apoiados dos srs. ministros).

Não digo mais nada, porque os documentos estão na secretaria, e eu não quero prevenir as deliberações do sr. ministro da guerra, nem revelar cousa alguma a este respeito; mas o que posso asseverar é que desde o dia 4 de junho, em que a administração actual tomou conta dos negocios, foi este um d'aquelles a que prestou mais desvelada attenção.

O objecto principal para que eu hontem pedi a palavra sobre a ordem, que lamento muito não me ter sido dada por V. ex.ª, era para mandar para a mesa uma proposta, que desejo que a camara permitta que vá á commissão respectiva, do mesmo modo que foram outras com respeito a um capitulo já votado. Se V. ex.ª quer consultar a camara (Vozes: — Não é preciso), e se a camara consente que eu mande a proposta para a mesa (apoiados), mando-a já.

A proposta estava hontem feita, e eu pedi a palavra muito a tempo para a apresentar; mas este lazarismo das moções de ordem, que faz, contra as leis da casa, transtornar a ordem da inscripção, lazarismo que mostra o que póde a propaganda, e que já me tirou a palavra sobre a materia na discussão da resposta ao discurso da corôa, e m'a tem tirado tambem na discussão do orçamento.

O objecto principal que tenho em vista nesta proposta é fazer bem sentir á camara uma das mais urgentes necessidades do exercito, que o meu dever e consciencia me obrigam, não digo a prover de" remedio, porque isso não depende de mim, mas a recommendar.

A medida que o sr. ministro da guerra apresentou pedindo mais 20:0000000 réis para auxilio de ranchos que augmenta a verba das despezas eventuaes, o que significa é que nós temos em Portugal uma classe de empregados publicos e numerosa, que é paga com 60 réis por dia. E digam-me em consciencia se no estado das cousas um homem póde hoje viver com 60 réis por dia!

Eu devo advogar n'este logar a causa dos meus camaradas, mas já apresentei um projecto a esse respeito, e não quero de maneira nenhuma que por occasião do orçamento se julgue que advogo a minha propria causa.

O que venho advogar é a causa das praças de pret, e pedir uma cousa que não produz augmento de despeza, porque tanto importa fazer-se este abono illegal para o rancho, como dar-se 20 réis mais a cada praça de pret.

A verba de 30:000$000 réis para despezas eventuaes, e que foi por mim elevada a 40:000$000 réis, é absorvida por subvenções dadas aos differentes corpos do exercito, porque é impossivel sustentar esse rancho que nós damos aos soldados, que é todo de vegetaes; é impossivel sustenta-lo, digo, sem uma subvenção, e essa sae daquella verba que se absorve quasi toda, porque é bastante forte.

Ora junte-se a isto a proposta feita pelo sr. ministro da guerra para o abono de 20:000$000 réis para o mesmo fim, e eu pergunto se este estado de cousas deve continuar, e se não é melhor decretar uma vez o augmento legal d'este orçamento, do que estar a fazer estes abonos ás pinguinhas, ás escondidas e illegalmente (leu).

Eis-aqui a proposta que eu queria que V. ex.ª mandasse á commissão.

O sr. Presidente: — Eu não lhe dei a palavra, porque o debate foi fechado a requerimento de um sr. deputado. Mas assim como aconteceu isto com s. ex.ª, tambem muitos outros srs. que estavam inscriptos sobre a ordem não tiveram a palavra.

O Orador: — Apesar do muito que tinha a dizer, concluo emittindo desejos de que a minha proposta seja bem considerada pela camara. Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que ás praças de pret se acrescente o vencimento diario de 20 réis. = B. J. Garcez, deputado por Trancoso =Barão do Rio Zezere = Placido de Abreu.

O sr. Mazziotti: — Requeiro a V. ex.ª que consulte a camara sobre se a materia está sufficientemente discutida. Julgou-se discutida, e pondo-se á votação o Capitulo 5.' — Foi approvado. Capitulo 6.°

O sr. Coelho de Carvalho(Joaquim): — Desejo chamar a attenção do sr. ministro da guerra sobre alguns objectos que têem relação com este capitulo. O capitulo em discussão trata dos estabelecimentos de instrucção, e nelles figura a escola do exercito e o collegio militar. Estes dois estabelecimentos de grande importancia para a instrucção militar, reclamam toda a attenção e solicitude dos poderes do estado, e eu digo com prazer que tenho visto que a escola do exercito, nestes ultimos annos, tem apresentado melhoramentos em larga escala; mas está ainda muito longe de poder satisfazer ás suas necessidades.

A escola do exercito, na minha opinião, não póde ser considerada senão como escola de applicação, destinada a instruir na pratica individuos que na maior parte têem já os cursos superiores. Eu desejaria que o sr. ministro da guerra me dissesse se tenciona trazer alguma proposta para o melhoramento desta escola, e especialmente para o estabelecimento de aulas praticas que não temos ali. Eu creio que o conselho da escola já tem alguns trabalhos feitos, e. o sr. ministro da guerra, que foi director d'aquella escola, deve ter conhecimento deste projecto. Eu entendo que, sem se estabelecerem as aulas praticas na escola do exercito, não é possivel que ella desempenhe a missão para o que é essencialmente destinada.

Emquanto ao collegio militar, tambem entendo que reclama a séria attenção do governo. O estabelecimento é pequeno e precisa de melhoramentos, precisa de ser augmentado, ou que se lance mão de uma nova casa, porque n'aquella em que actualmente este estabelecimento existe, não se póde receber o numero de alumnos que todos os. annos procuram entrar ali; e não só não póde receber o numero de alumnos que tem de ser pagos por conta do estado, senão que tambem só póde receber um numero muito limitado de pensionistas.

Eu chamo a attenção do sr. ministro da guerra sobre este ponto, e espero que s. ex.ª me diga alguma cousa ácerca d'estes estabelecimentos.

De passagem devo declarar á camara que não foi nem podia ser minha intenção, tomando parte no debate de hontem, lançar a mais leve censura ao sr. ministro da guerra por que tenho a maior deferencia. Tambem não foi minha intenção, lança-la aos antecessores de s. ex.ª

O que se disse aqui, e para o que eu pediria agora a attenção do illustre deputado que vem de me preceder, é que o sr. ministro da guerra se tornara signatario do orçamento; e se lhe não apresentei as considerações que fiz aqui, é por que as minhas relações particulares e especialmente politicas com o sr. ministro da guerra me davam mais facil accesso a s. ex.ª, e esperava que tendo-se s. ex.ª tornado signatario do orçamento estaria no caso de poder attender ás observações que eu lhe tinha a fazer.

Não posso ainda terminar estas observações sem levantar duas asserções apresentadas pelo sr. deputado que me precedeu. Uma é que um bill de indemnidade é negocio muito serio; mas eu respondo ao illustre deputado que a infracção de uma lei é negocio tambem muito grave e muito serio, para que a deixemos passar sem reparo.

O illustre deputado a quem me refiro comparou a economia que havia na verba dos officiaes supranumerarios; mas, com relação aos officiaes supranumerarios do exercito, a lei refere-se a cada um dos quadros das respectivas armas, e então este argumento não colhe.

O nobre deputado a quem me refiro diz = que tendo vagado alguns dos logares de officiaes supranumerarios do estado maior, tinha verba no orçamento, e que podia ser preenchida com aquella promoção de tenente coronel =; digo ainda mais que o argumento não colhe, porque eu não considero as verbas que vêm no orçamento, a respeito dos supranumerarios, senão como verbas que desapparecem e morrem logo que os officiaes fallecem ou passam á effectividade.

'Não quero dar mais proporções a este debate; mas não podia deixar de dar estas explicações á camara, e peço á camara que me desculpe de ter seguido o exemplo do illustre deputado que me precedeu, afastando me n'esta ultima parte da materia do capitulo.

O sr. Ministro da Guerra: — Em primeiro logar cumpre me agradecer ao illustre deputado as expressões que se serviu proferir a meu respeito. E aproveitarei a occasião para dizer que no anno de 1834, quando a auctoridade constitucional se achava no Algarve, reduzido ás tres povoações de Faro, Lagos e Olhão, Sua Magestade Imperial o Senhor D: Pedro ordenou-me que fosse tomar o commando superior daquella provincia. Obedeci como devia, mas não levei comigo um só soldado. Entretanto as cousas tomaram outra face, e em pouco tempo a provincia estava quasi toda libertada. Foi então que tive occasião de conhecer o sr. José Coelho de Carvalho, pae do illustre deputado. Elle poz generosamente á minha disposição o credito da sua casa, que eu empreguei, mandando commissarios a Sevilha comprar cavallos e equipamentos, para poder montar tresentos soldados e passar com elles ao Alemtejo. Gastaram-se mais de 23:0000000 réis, não havendo outra garantia para o sr. José Coelho senão a minha pessoa. É verdade que, terminada a guerra, foi esta quantia paga pelo governo, mas entretanto não posso deixar de tributar a homenagem merecida a tanto patriotismo, e de recordar-me, com reconhecimento, da confiança que em mim depositou o pae do illustre deputado. Por estes motivos eu tenho tido constantemente toda a consideração por seus filhos.

Devo declarar que hontem, dizendo o illustre deputado = que eu havia feito uma insinuação =, eu repliquei apenas, em um áparte, que era uma declaração. Eu não conhecia nada do negocio de que o illustre deputado tratava; entretanto hoje encontra-se em um jornal da capital um artiguinho, que mencionarei como uma curiosidade litteraria. Elle diz: «O sr. Coelho de Carvalho accusou o ministro de ter praticado uma infracção de lei.» E acrescenta: «O visconde de Sá confessou, mas carregou a culpa ao sr. Garcez.»

O illustre deputado deseja saber quaes são as minhas idéas a respeito da escola do exercito. Direi que esta escola foi organisada em 1837 por um decreto referendado por mim, assim como o foi o decreto que orgahisou a escola polytechnica.

Tenho a maior satisfação em ter referendado estes decretos, porque hoje um grande numero de homens instruídos, que ha no exercito, são filhos d'estes estabelecimentos, e fazem honra ás escolas d'onde sairam.