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N.º 12

Presidencia do exmo. sr. Marquez d'Avila e de Bolama

Secretarios - os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Montufar Barreiros

Pelas duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 22 dignos pares, declarou o exmo. sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da sessão antecedente, que foi considerada approvada por não ter havido reclamação contra ella.

O sr. Presidente: - Tenho a declarar á camara que se acha sobre a mesa a carta regia que eleva o sr. duque de Loulé á dignidade de par do reino. Na conformidade do regimento nomeio para formarem a commissão especial que tem de dar parecer sobre este diploma, os dignos pares, srs. marquez de Fronteira, Reis e Vasconcellos e Ferrer.

Convido s. exas. a reunirem-se para desempenharem esta missão.

(A commissão especial saiu da sala.)

O sr. Presidente: - Vae ler-se a

Correspondencia

Um officio do ministerio do reino, participando, para conhecimento da camara dos dignos pares do reino, que por carta regia datada de 4 de fevereiro corrente, houve por bem Sua Magestade El-Rei nomear par do reino ao sr. duque de Loulé, Pedro Agostinho de Mendoça Rolim de Moura Barreto, antigo deputado da nação portugueza.

Outro do ministerio da guerra, remettendo oitenta exemplares da estatistica geral do serviço de saude do exercito, relativa ao anno economico de 1873-1874, para ser distribuida pelos dignos pares.

Outro do mesmo ministerio, remettendo cincoenta exemplares das contas do ministerio da guerra, relativas á gerencia de 1874-1875. .

Mandou-se distribuir.

Outro do ministerio das obras publicas, remettendo dois autographos dos decretos das côrtes geraes sanccionados por Sua Magestade El-Rei e já convertidos nas cartas de lei de 16 de janeiro ultimo; o primeiro auctorisando o governo a mandar proceder á construcção dos caminhos de ferro das duas Beiras e do Algarve, e o segundo elevando a 12:000$000 réis a verba inscripta na secção 4.ª artigo 10.° capitulo 8.° do orçamento das despezas d'este ministerio.

Para o archivo.

Outro do ministerio dos negocios estrangeiros remettendo os exemplares do relatorio e documentos sobre a abolição da emigração de chinas contratados em Macau, apresentado ás côrtes em 1874, satisfazendo assim o requerimento do sr. conde de Valbom.

Teve o competente destino.

O sr. Miguel Osorio: - Pede que se lhe reserve a palavra para quando estiver presente algum dos srs. ministros por ter de fazer algumas considerações e perguntas ao governo.

O sr. Visconde de Villa Maior: - Mando para a mesa o parecer da commissão de instrucção publica juntamente com o parecer da commissão de fazenda, relativos ao projecto de lei, vindo da outra casa do parlamento, para a organisação do observatorio da Ajuda. Como, porém, no parecer da commissão de instrucção publica se fazem algumas modificações no projecto vindo da camara dos senhores deputados, pedia a v. exa. que, depois de impresso

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o parecer que mando para a mesa, fosse dado em seguida para ordem do dia, visto ter de voltar á outra camara.

(Leu-se na mesa.)

O sr. Presidente: - Se nenhum digno par pede a palavra vamos entrar na ordem do dia.

O sr. Miguel Osorio: - Não podem discutir-se os projectos dados para ordem do dia na ausencia do governo.

O sr. Marquez de Vallada: - Desejo unicamente observar que talvez fosse conveniente mandar recado á outra camara, convidando alguns dos srs. ministros a compareceram n'esta casa. Naturalmente s. exas. estão na outra camara, e não póde haver inconveniente no que indico. Quanto ao mais estou de accordo com o sr. Miguel Osorio, pois não se devem discutir as leis sem a presença do governo.

O sr. Presidente: - O que o digno par, o sr. marquez de Vallada propõe, está feito. Mandei já saber á outra camara se estavam lá alguns dos srs. ministros, a fim de serem convidados a vir a esta casa. Entretanto a camara de certo convem em que esperemos alguns instantes. Não suspendo a sessão porque póde chegar algum dos srs. ministros de um momento para outro.

O sr. Ferrer: - Mando para a mesa o parecer da commissão especial nomeada para examinar a carta regia que eleva á dignidade de par do reino o sr. duque de Loulé. (Leu.)

Leu-se na mesa o seguinte

Parecer n.° 7

Senhores. - A commissão especial nomeada para verificar a carta regia que eleva á dignidade de par do reino o exmo. sr. duque de Loulé Pedro Agostinho de Mendoça Rolim de Moura Barreto, tendo examinado este diploma, reconheceu
achar-se exarado segundo as prescripções do artigo 74.° da carta constitucional da monarchia, cumprida a disposição, do artigo 110.° da mesma carta, e bem assim que na pessoa nomeada concorrem as condições legaes necessarias.

É por isso de parecer que está nos termos de ser admittido a tomar assento na camara, prestando previamente o juramento do estylo.

Sala da commiesão, em 8 de fevereiro de 1876. = Marquez de Fronteira = Vicente Ferrer Neto Paiva = José Joaquim dos Reis e Vasconcelios.

O sr. Presidente: - Se não ha reclamação contra este parecer julga-se approvado.

Consta que o sr. duque de Loulé está nos corredores da camara, e n'este caso peço aos dignos pares marquez de Fronteira e Ferrer queiram introduzir s. exa. na sala.

Foi introduzido o novo digno par, e lida a seguinte carta regial prestou o juramento e tomou assento.

A carta regia é do teor seguinte:

Carta regia

Honrado duque de Loulé, Pedro Agostinho de Mendoça Rolim de Moura Barreto, antigo deputado da nação portugueza. Amigo. Eu El-Rei vos envio muito saudar como aquelle que muito amo e prezo. Tomando em consideração os vossos merecimentos e qualidades: hei por bem, tendo ouvido o conselho d'estado, nomear-vos par do reino.

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O que me pareceu participar-vos para vossa intelligencia e devidos effeitos.

Escripta no paço da Ajuda, em 4 de fevereiro de 1876. = EL-REI. = Antonio Rodrigues Sampaio.

Para o honrado duque de Loulé, Pedro Agostinho de Mendoça Rolim de Moura Barreto, antigo deputado da nação portugueza..

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, peço a v. exa. que consulte a camara se consente que sejam publicados no Diario do governo os documentos relativos á prisão de um cidadão, refiro me á prisão do sr. Lupi. Esses documentos são curiosos e importantes, e por isso merecem ser bem conhecidos da camara e do publico; alem d'isso, como são numerosos formam um masso muito volumoso, é difficil examina-los sem estarem impressos: é por estas rasões que peço a sua publicação na folha official.

Permitta agora v. exa. que eu continue a usar da palavra para me occupar de outro assumpto.

N'uma das sessões passadas pedi eu explicações ao sr. presidente do conselho sobre um negocio importante, a construcção do caminho de ferro da Beira Baixa.

O sr. presidente do conselho pretendeu dá-las, e eu não fiquei satisfeito com tantas contradicçôes; ficou porém a discussão interrompida, porque o sr. ministro da marinha veiu de soccorro ao seu collega por um modo novo, pedindo n'essa occasião que se dispensasse o regimento, para se discutir um projecto importante, que a camara não conhecia, e que foi approvado depois dos protestos de alguns pares.

A camara, annuindo á proposta do sr. ministro da marinha, não póde continuar o debate que eu havia encetado.

Portanto, como não se acha presente o sr. presidente do conselho, nem o sr. ministro das obras publicas, peço a v. exa. que me reserve a palavra para quando estiver presente qualquer d'esses srs. ministros, pois desejo ainda ouvir d'elles explicações ácerca do referido assumpto, que é altamente serio e grave.

Tenho tambem a pedir a v. exa. que me de a palavra quando estiver presente o sr. ministro da fazenda, pois tenho de me dirigir a s. exa. sobre negocios que dizem respeito ao seu ministerio.

Ao sr. ministro da justiça desejo igualmente pedir algumas explicações.

Tenho tambem de mandar para a mesa diversos requerimentos pedindo esclarecimentos ao governo; mas não o desejava fazer sem primeiro ouvir os srs. ministros, pois, conforme essas explicações, assim farei os meus requerimentos.

Todavia não posso prescindir de mandar agora para a mesa dois requerimentos, para que sejam especificadas as verbas que foram mandadas no mez de janeiro ultimo á agencia financial de Londres, a titulo de pagar as despezas feitas com a compra de armamentos e com a construcção de navios de guerra.

Vou escrever os requerimentos.

O sr. Presidente: - Queira o digno par mandar para a mesa os seus requerimentos para se lhes dar andamento.

(Pausa.)

O sr. Vaz Preto: - Mando para a mesa os requerimentos que annunciei, e são os seguintes. (Leu.)

Leram-se na mesa, e são os seguintes:

Requerimentos

No periodo que decorreu de 15 de dezembro passado até 27 de janeiro d'este anno foram, por ordem do ministerio da guerra, mandadas para a agencia financial de Londres 3:600 libras; peço pois que pelo ministerio da guerra se declare circumstanciadamente a applicação e os documentos juatificativos.= Vaz Preto.

Requeiro que, pelo ministerio da marinha, se declare qual a applicação que tiveram 7:600 libras que foram postas á disposição da agencia financial em Londres no periodo que decorre de 15 de dezembro de 1875 até 4 de janeiro de 1876, e bem assim peço os documentos comprovativos.= Vaz Preto.

O sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam que se expeçam os requerimentos que acabam de ser lidos tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

{Entrou o sr. presidente do conselho.)

O sr. Miguel Osorio: - Desejaria saber a opinião do sr. ministro da fazenda sobre o immoralissimo jogo das loterias, que já na sessão do anno passado fôra motivo de uma conversação parlamentar entre s. exa. e elle orador, com o modo de ver do qual concordou o mesmo sr. ministro.

Mostrou os inconvenientes que encontrava n'este jogo, que era um incentivo ao furto, e sempre uma causa de desregramento; e muito maiores os achava
lembrando-se que uma parte do que rendia este jogo era desfalcado á beneficencia publica para outras applicações, e para entrar no fisco.

Pediu informações ácerca dos trabalhos da commissão, que tinha sido nomeada pelo sr. ministro do reino para rever o regulamento para a admissão dos alienados no hospital estabelecido para esta enfermidade, pois ihe constava que alguns dos individuos nomeados não acceitaram a nomeação.

E pediu que o sr. ministro dos negocios ecclesiasticos viesse dar a resposta promettida ácerca do modo como tem procedido o nuncio da santa sé, relativamente ás vendas dos passaes.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Ouvi com toda a attenção as observações que acaba de fazer o digno par sobre varios assumptos, que dizem respeito, mais especialmente, a alguns dos meus collegas; mas nem por isso me julgo desobrigado de as attender e considerar. Como são, por assim dizer, theses geraes, sobre as quaes o digno par chamou a attenção do governo, não acho que seja improprio que eu dê algumas explicações.

Referiu-se s. exa. ás loterias e á conversação que houve o anno passado n'esta casa entre o digno par e o sr. ministro da fazenda, sobre o desejo manifestado então de que o imposto sobre as loterias fosse substituido por outro.

É certo, e o digno par sabe-o perfeitamente, porque o o orçamento já foi distribuido n'esta casa, que, comquanto o estado das nossas finanças seja extremamente lisonjeiro, ainda assim as circumstancias não permittem que se dispense a receita proveniente do imposto sobre as loterias. Todos estão de accordo, dentro d'esta casa e creio que tambem fóra d'ella, em que este imposto assenta sobre uma base inconveniente, e que as loterias deviam ser prohibidas em nome da moral publica; mas, para que isto se consiga, é preciso que o governo possa substituir o imposto por uma outra receita, porque este imposto, no fim de tudo, é receita do estado. O digno par sabe, e a camara tambem, que de certo os poderes publicos não iriam reduzir a receita que os estabelecimentos de beneficencia auferem do thesouro publico, ou por virtude do imposto das loterias ou de qualquer outro imposto, sem que primeiro cuidassem no modo de substituir este rendimento. Se os estabelecimentos de beneficencia não recebessem por este meio, receberiam por outro os recursos de que carecem, e, sem duvida, o pensamento, o desejo, do digno par não é que elles fiquem privados de receita.

Por consequencia, abundando com s. exa. nas suas idéas sobre a inconveniencia do imposto das loterias, eu, por parte do governo, declaro que não me julgo por ora habilitado a substitui-lo.

O digno par chamou tambem a attenção do governo para o facto de não ter ainda aprensentado os seus traba-

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lhos a commissão nomeada especialmente para rever o regulamento da admissão de individuos no hospital de alienados.

Sobre esse ponto não posso dar explicações categoricas a s. exa., podendo todavia assegurar que, se alguns dos dignos membros d'aquella commissão pedirem a sua exoneração do cargo para que o governo os nomeou, hão de ser substituidos por outros igualmente idóneos para o desempenho da missão que lhe foi confiada.

Desejou o digno par saber por fim qual a rasão por que o sr. ministro da justiça não tem aqui vindo responder ás observações que s. exa. lhe dirigiu na sua ausencia, e de que me pediu para lhe dar conhecimento, a proposito de uma questão que o digno par chamou religiosa.

Todos sabem que o meu collega, durante estes ultimos dias, tem estado na outra, casa do parlamento occupado com uma discussão importante que tem havido ali e na qual tomou uma larga parte.

Eis a rasão por que o meu collega não tem vindo a esta camara responder sobre esta e outras questões attinentes ao seu ministerio; entretanto posso assegurar que na primeira sessão que houver aqui estará presente o sr. ministro da justiça para dar as explicações que s. exa. deseja.

(O orador não reviu os seus discursos.}

O sr. Miguel Osorio: - Agradece ao sr. ministro a benevolencia e a clareza da resposta de s. exa. Espera a vinda do sr. ministro dos negocios ecclesiasticos; e acceita as explicações dadas sobre os outros dois pontos; mas parece lhe, relativamente ás loterias, que se o estado prescindisse do que arrecada do producto d'ellas, podiam desde já diminuir o numero d'ellas, e seria isto um encaminhamento para a sua extincção dentro de um praso mais breve.

O sr. Mártens Ferrão: - Participo a v. exa. e á camara que o sr. visconde de Algés não tem podido comparecer ás sessões por incommodo de saude, e por esse mesmo motivo terá de faltar a mais algumas.

O sr. Presidente: - Tomar-se-ha nota da declaração do digno par.

O sr. Vaz Preto: - Na penultima sessão, tendo eu pedido algumas explicações ao sr. presidente do conselho, s. exa. respondeu-me por uma fórma que não me satisfez. Eu tinha a palavra reservada, mas, a pedido do sr. ministro da marinha, entrou logo em discussão o projecto ácerca dos libertos, de que o governo se deveria ter occupado desde longo tempo, e só o fez agora sem o deixar examinar, e á pressa, por consequencia não pude replicar. Como o negocio é serio e grave, farei hoje algumas reflexões.

Sr. presidente, não posso admittir a doutrina que o sr. presidente do conselho de ministros apresentou, porque, alem de ser contra todos os principios de direito publico, envolve uma desattenção, uma desconsideração para com esta camara e para com a outra, é evidentemente uma desconsideração para com o parlamento este desprezo pela lei.

O sr. presidente do conselho disse então, fallando do projecto dos caminhos de ferro, que se tinha votado, que era uma auctorisação da qual faria o uso que quizesse; eu, porém não o entendo assim, porque esse projecto, que já foi convertido em lei, contem uma auctorisaçao prescriptiva, que determina o modo por que o governo ha de fazer uso d'ella. Portanto, o governo não póde usar ou deixar de usar da lei á sua vontade, é dever seu respeita-la, tem obrigação de a executar em conformidade com as suas prescripções.

Sr. presidente, n'aquella auctorisação, que é uma lei, que obriga o governo, e que lhe marca o que deve fazer e lhe prescreve o modo por que o governo póde e deve fazer uso d'ella, estabelece-se quaes os caminhos de ferro que o governo ha de construir, e entre elles o do Valle do Tejo em direcção a Malpartida; não obstante o sr. presidente do conselho, em contradicção com o seu collega das obras publicas, veiu, depois de votado o projecto que marca aquella directriz, declarar que não póde pôr em hasta publica aquelle caminho de ferro porque o governo hespanhol estava mandando estudar outra directriz!

Pois o sr. presidente do conselho não sabe que essa linha de Malpartida já está decretada pelo governo hespanhol? Não sabe que os estudos estão já feitos até Monfortinho, em cujas mediações ha de verificar-se o entroncamento?

Não sabe s. exa. que a variante de um caminho de ferro é uma nova directriz entre os mesmos pontos extremos? Não sabe pois s. exa., que a directriz da linha que póde sair de Malpartida atravessando a provincia de Caceres, a entroncar na linha de leste em Assumar, não é variante da linha de Valle do Tejo, mas sim uma nova linha que está no plano dos caminhos de ferro de Hespanha?

Pois s. exa. não sabe que o seu collega das obras publicas declarou terminantemente na sessão em que se discutiu o projecto que já tinha a commissão de engenheiros hespanhoes e portuguezes nomeada em virtude do convenio de 1866, combinado no ponto de entroncamento, e que se não se assignou o tratado foi porque os engenheiros hespanhoes chamados a toda a pressa para objecto de serviço do seu governo tiveram de partir?

Pois s. exa. não sabe tambem que as commissões technicas não escolheram outro ponto para o entroncamento senão o de Monfortinho como o melhor? Como é pois que s. exa. vem dizer que não póde pôr a concurso a construcção do caminho de ferro da Beira Baixa porque o governo hespnhol está estudando outra directriz, uma nova variante? Não sabe s. exa. o que são variantes? Não vê que o caminho que deve ir por Caceres á Assumar, é um caminho para Portugal do Alto Alemtejo? Por mais que s. exa. queira descobrir nos seus recursos parlamentares meio para responder á verdade d'estas asserções, não o conseguirá. O que me leva a crer, que a rasão das difficuldades, que hoje apparecem da parte do governo, é a que o digno par o sr. Miguel Osorio apresentou. Isto é a minha opposição ao actual governo.

Se tudo quanto tenho dito não é bastante concludente, ainda acrescentarei que o sr. presidente do conselho deve saber que o governo hespanhol tomou sobre si pela convenção de 1866 o compromisso com relação ao entroncamento dos caminhos de ferro que liguem as duas nações, de se por de accordo com o governo portuguez.

Ora, em virtude pois d'esta convenção o sr. ministro das obras publicas fez com que se nomeasse uma commissão por parte do governo hespanhol para que, de accordo com outra commissão nomeada pelo governo portuguez, se assentasse no ponte em que haviam de entroncar al linhas.

O sr. ministro das obras publicas declarou franca e categoricamente á camara n'uma das passadas sessões, que os pontos estavam assentados, e que o tratado estava feito e combinado, e que apenas faltava assigna-lo. Vou ler, para mais clareza, as palavras do sr. ministro das obras publicas. (Leu.)

Não é terminante e claro o que asseverou á camara o sr. ministro das obras publicas? Como vem pois agora o sr. presidente do conselho declarar que não podia obrigar o governo hespanhol a trazer o caminho de ferro ao ponto que se havia combinado?! Não existe a convenção de 1866? O governo em virtude d'ella nem tem pois o direito de reclamar do governo hespanhol a execução d'aquillo a que se obrigou?

Por fim diz o sr. presidente do conselho, que não póde fazer o contrario do que disse; é exacto. S. exa. não o póde fazer, mas então salta por cima da lei, o que me dá a entender que ha outro motivo que não é de certo o allegado por s. exa., e tanto ha, que o sr. Miguel Osorio já alludiu a elle.

Sr. presidente, declaro a v. exa. que em quanto o par-

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lamento estiver aberto e a lei se não tenha cumprido, eu não largarei mão d'este assumpto, e hei de vir aqui todos os dias clamar pela execução da lei; porque é preciso que as leis se cumpram e ai do systema representativos se ellas se não cumprirem. Creia a camara que, se continuarmos por esta fórma, se os ministros não fizerem caso dos seus precedentes, se professarem idéas oppostas, conforme as conveniencias, se não tratarem os negocios com seriedade, se derem todos os dias este triste espectaculo da contradicções comsigo mesmo, e com os seus collegas, e se não basearem os seus actos e o seu proceder na moralidade, o governo representativo não será senão um meio de corrupção e de satisfazer ambições.

Sr. presidente, eu ouvirei as explicações do sr. presidente do conselho, e se v. exa. me permittir, tomarei novamente a palavra depois de s. exa.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Eu pouco tenho que dizer ou a acrescentar ao que já tive a honra de expor n'uma das sessões passadas; as minhas explicações de então não satisfizeram ao digno par, e estou convencido que as que lhe vou dar agora o não satisfarão tambem, como ainda o não satisfarão todas as que de futuro lhe der. Eu não venho ao parlamento dizer hoje uma cousa e ámanhã outra, não posso dizer senão a verdade, e a verdade é uma só em todas as epochas.

Declaro ao digno par que o governo está disposto a proceder á construcção dos dois caminhos de ferro, nos termos da lei ultimamente votada, mas que não póde faze-lo sem que o governo de Hespanha esteja de accordo nos pontos do entroncamento na fronteira.

Ora, com relação ao caminho de ferro da Beira Alta, está isso designado; com respeito, porém, ao da Beira Baixa, não póde o governo, por emquanto, proceder á licitação, porque o gabinete hespanhol determinou estudar uma variante. É talvez n'este ponto que o digno par se persuade achar-me em contradicção com o meu collega o sr. ministro das obras publicas, mas não ha tal contradicção. O governo não deixa de cumprir a lei, mas aguarda os resultados dos estudos da variante que o governo da nação vizinha mandou fazer, porque póde haver maior conveniencia na designação de outro ponto de ligação na fronteira, que não aqueile que se projectou; e o governo não sáe d'este terreno, não fará senão o que já disse que faria. Accusa-nos o digno par de que infringimos a lei. A infracção não existe; o governo foi auctorisado a proceder á construcção de duas linhas, auctorisação esta que foi votada no parlamento e defendida por esta administração; o digno par ha de permittir-me que lhe diga, que uma auctorisação não é uma imposição. Em prova disto poderia citar ao digno par muitos exemplos em que têem sido dadas differentes auctorisações a varias administrações, que teem deixado de fazer uso d'ellas, e nem por isso têem sido accusadas de infringirem a lei por não as terem executado. Agora, se o digno par disser que o governo contrahe uma obrigação moral de fazer uso das auctorisações que solicita, dir-lhe-hei que é exacto; mas que commette uma infracção da lei não usando d'ellas, isso é que não póde s. exa. asseverar.

Muitas vezes os governos deixam de usar das auctorisações que pedem ao parlamento, porque a isso os levaram differentes rasões que mais tarde se apresentaram, e nem por isso os parlamentos têem accusado esses governos de falta, porque é claro que uma auctorisação não é uma imposição, como já disse.

O digno par tem a sua opinião, que todos respeitamos, mas por emquanto é uma opinião singular; nenhum dos corpos legislativos o acompanha n'ella; é uma opinião inteiramente pessoal, que livremente emitte, opinião que eu respeito muito, como respeito todas as opiniões, mas que não obriga a cousa nenhuma.

Repito, portanto, quanto á construcção d'este caminho de ferro, desejo-a, e tenho sustentado a sua conveniencia contra a opinião de muitos individuos, e até mesmo contra a opinião de amigos dedicados meus; e sustenta-la-hei ainda, sempre que for chamado a esse terreno, com a mesma convicção com que o tenho feito até aqui.

Quanto a occasião em que se ha de pôr em praça publica essa construcção, eu aguardo a opportunidade indicada pelos interesses do estado. Digo os interesses do estado, porque o digno par, que por muitos annos me tem honrado com a sua amisade, sabe perfeitamente que o meu espirito não cede á pressão de interesses meios legitimos, e ninguem póde de certo levar a mal que o governo só use das auctorisações que lhe são concedidas, quando entende que esse uso é conveniente. O governo acha se armado com uma auctorisação para a construcção de um caminho de ferro, mas só quer d'ella fazer uso quando este caminho de ferro possa ser uma verdade.

Por agora nada mais acrescentarei.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, muito poucas palavras direi para responder ao sr. presidente do conselho. Tudo o que s. exa. disse com relação ao caminho de ferro da Beira Baixa deve ser applicado ao da Beira Alta. Declara o sr. presidente do conselho que o caminho de ferro da Beira Alta já tem designado o ponto do entroncamento. N'esse caso tambem o da Beira Baixa; assim o declarou o sr. ministro das obras publicas. Eu, pela minha parte, não penso o contrario, porque a commissão não assignou um tratado, mas limitou-se apenas a um accordo de opiniões, e esse accordo, segundo as proprias phrases do sr. ministro das obras publicas, representa um contrato definitivo, apesar de se não achar por ora devidamente assignado.

Sr. presidente, eu desejava que se me declarasse qual das opiniões do governo é a genuina, isto é, qual das opiniões deve ser considerada como a do governo; se a que apresenta o sr. presidente do conselho, se a que foi expendida pelo sr. ministro das obras publicas, pois ambos têem fallado em nome do governo, mas em sentido opposto.

O ministro da repartição competente pronunciou as seguintes palavras, para as quaes eu chamo a attenção da camara.

"O digno par referiu-se ainda á existencia da convenção com o reino vizinho, ácerca da demarcação da ligação dos caminhos de ferro nas fronteiras dos dois reinos.

"Tenho a dizer a s. exa. que essa convenção não é nova, existe desde 1866; desde essa epocha os dois governos estão mutuamente obrigados a empregar os meios ao seu alcance para se chegar ao acccrdo da fixação dos pontos das ligações nas respectivas fronteiras, das linhas que em qualquer dos paizes se estudarem ou discutirem. A obrigação existe, como disse, desde 1866, e o digno par sabe que o governo deve conhecer as leis do seu paiz, e a nós nos fará a justiça de que não iriamos fazer um contrato da ordem do de que se trata, sem vir ao parlamento e pedir auctorisação para a execução.

" O governo portuguez solicitou do governo de Hespanha a nomeação de uma commissão de engenheiros que, conjuntamente com a commissão portugueza, deveria chegar ao accordo sobre a demarcação do ligamento das duas linhas nas fronteiras, essas commissões foram nomeadas, já se entenderam e fixaram os pontos da ligação; falta apenas assignar esse accordo para ser confirmado o contrato, e este trabalho, que vae em breve tempo terminar-se, já estaria concluido se os engenheiros hespanhoes não fossem, por exigencias de serviço da sua nação, obrigados a retirar com tanta brevidade, mas creia o digno par que este negocio está definitivamente tratado."

Tenho repetidas vezes lido esta declaração, que o sr. presidente do conselho não quer entender, e fa-lo-hei até que me diga s. exa. que valor lhe dá.

Notem v. exas. estas palavras: " Mas creia o digno par que este negocio está definitivamente tratado".

Em vista pois do sr. Avelino os pontos estão assentados.

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Se s. exa. quer que tenham significação as palavras do seu collega das obras publicas, se entende que o governo póde deliberar pelo que fez a commissão, deve mandar construir desde já os caminhos de ferro, isto é, abrir o concurso para todos; mas se pelo contrario deseja que as palavras do sr. ministro das obras publicas não tenham o valor que devem ter na camara, e se necessita de um accordo com o governo de Hespanha, as mesmas rasões que subsistem para o caminho de ferro da Beira Baixa militam para o da Beira Alta, e portanto o governo não póde pôr um dos caminhos a concurso sem pôr o outro.

Na presença das rasões claras que deixo expostas, o que eu desejo é que se não proceda á construcção de nenhum d'estes caminhos, digo, que não se abra concurso separadamente para qualquer d'estes caminhos, pois as rasões do sr. Fontes militam a favor de ambos, e sem que se tenha feito o contrato definitivo, ou que, não sendo necessario para a construcção de um dos caminhos, se não exija para a do outro. Eis o que eu desejo.

Disse mais o sr. presidente do conselho, que não se deixava levar por paixões e interesses menos dignos. Oxalá que assim fosse. Eu quizera mesmo acreditar que os motivos que o levam a proceder n'esta ocasião são sempre dictados pelos desejos de prover ao interesse publico. Mas que significam todas estas contradicções quando s. exa. reconhece que a Beira Baixa tem direito a este ultimo melhoramento, e que é da mesma opinião o parecer de todos os technicos? O caminho de ferro da Beira Baixa é a linha que, na opinião de engenheiros de reconhecido merecimento, deve ser considerada linha internacional.

S. exa. sabe, de mais a mais, que a via de Malpartida a Monfortinho está decretada; faltam apenas 80 kilometros para se concluir, os estudos estão feitos; por consequencia, já s. exa. ve que o governo hespanhol ha de trazer por força a esse ponto, digo a Monfortinho, a sua linha para entroncar com a portugueza.

Dizia, pois, muito bem o sr. ministro das obras publicas, que a commissão de engenheiros tinha assentado nos pontos de ligação das linhas ferreas, e que o tratado era definitivo, mas apenas faltava ser assignado.

O sr. presidente do conselho não devia portanto ter n'esse ponto a mais leve duvida, e tendo-a, devia ao mesmo tempo sentir iguaes escrupulos quanto ao caminho de ferro da Beira Alta. D'este dilemna não sáe o sr. presidente do conselho de ministros. Ou este accordo que o sr. ministro das obras publicas chama difficultoso, apesar de não estar assignado, tem valor ou não tem. Se tem valor, esse seu valor é tanto para a linha da Beira Alta como para a da Beira Baixa. Se o não tem, não póde, por mais que faça o sr. presidente do conselho de ministros, fazer com que o tenha para a linha da Beira Alta. N'este caso o governo faltará aos seus compromissos, illudirá a camara e o publico, prostergará uma lei se porventura pozer a concurso o caminho de ferro da Beira Alta, e pozer de parte o da Beira Baixa. Eu não levanto mão d'esta questão, que é mais seria para o governo do que elle imagina.

O sr. Visconde da Praia Grande: - Mando para a mesa um parecer da commissão de marinha.

Foi lido na mesa e mandou-se imprimir.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Direi só duas palavras, mais por attenção ao digno par, do que por necessidade de explicar o que já expliquei bastante.

O governo está auctorisado para proceder á construcção d'estas linhas ferreas, ou juntamente ou separadamente. O governo, pela lei que passou aqui, não foi obrigado a pôr simultaneamente a concurso a construcção das duas linhas, nem ha inconveniente em que uma linha seja construida primeiro e a outra depois. E esteja-o digno par seguro de que só motivos de interesse publico poderiam actuar no meu animo, ou avultar mais do que talvez no espirito de s. exa. para preferir que se construa uma linha separadamente da outra, sendo o desejo do digno par que se pozessem a concurso simultaneamente.

O governo hespanhol, a respeito da linha ferrea da Beira Baixa, mandou estudar uma variante, para vir á fronteira de Portugal, e depois de terem os engenheiros combinado sobre o ponto da fronteira que adoptam, é necessario que esta combinação se traduza n'um accordo assignado em Madrid ou em Lisboa.

Emquanto á directriz da via ferrea da Beira Alta não me consta que haja difficuldades por parte do governo de Hespanha.

Posso assegurar ao digno par que o governo tem instado com o governo de Sua Magestade Catholica para que quanto antes se resolva este poeto, relativamente á Beira Baixa, e que tem o maximo interesse era estar habilitado para proceder á construcção d'esta linha, conforme as declarações mais de uma vez feitas. Creio que o digno par póde estar tranquillo a esse respeito.

Agora emquanto á epocha em que o governo de Hespanha resolverá sobre este assumpto, sobre isso é que eu disse que não tinha acção nem influencia; era negocio independente da minha vontade.

O sr. Marquez Vallada: - Sr. presidente, eu tinha pedido a palavra na sessão passada, mas de tal modo se complicaram os negocios n'aquella sessão, que tarde me chegaria, se me conservasse na camara; mas tive de sair, e não pude, por consequencia, usar da palavra.

Julgava-me obrigado a fallar, porque o digno par e meu amigo o sr. Miguel Osorio chamou a attenção do governo para um facto que reputa importante e que s. exa. leu, segundo creio, no Diario popular, onde se dizia que o nuncio de sua santidade n'esta côrte, monsenhor Sanguini, tendo sido consultado por um parocho de uma das dioceses do reino, não sei qual, não me lembra, não pude mesmo ouvir bem; a casa é grande, e difficilmente aqui se ouve, sobretudo quando ha um tal ou qual murmurio, mas o certo é que, tendo sido consultado o nuncio de sua santidade sobre a venda dos passaes, a resposta que deu o nuncio foi aquella que todos os nuncios, desde que ha nuncios, seguramente não poderiam deixar de dar, isto é, que satisfizessem os requerentes aos preceitos da consciencia e se dirigissem á santa sé para ella sanar a venda. Creio que é pouco mais ou menos esta a idéa, que foi talvez traduzida em palavras mais ou menos explicitas.

Sr. presidente, quando ha muitos annos occupei a tribuna para tratar da gravissima questão da desamor a sacão dos bens das corporações de mão morta, respondeu-me o relator da commissão que deu parecer sobre o projecto que continha essa medida, e, usando de palavras muito benevolas mostrou não estar de accordo com as idéas sustentadas por mim n'esta camara, e na outra pelos srs. condes de Cabral, de Cavalleiros e de Montariol, que então faziam parte do corpo legislativo como deputados da nação.

Fazia n'essa occasião parte do gabinete, como ministro da fazenda, o sr. marquez d'Avila e de Bolama, nosso digno presidente, e o sr. Moraes Carvalho geria a pasta dos negocios da justiça. Ponderei a estes dois illustres cavalheiros a conveniencia de seguir o exemplo de estadistas notaveis d'este paiz e de fóra d'elle, celebrando uma concordata com a santa sé, a fim de facilitar a execução da lei de desamortisação e sanar as vendas que se fizessem em virtude d'ella.

Quaesquer que fossem as idéas politicas dos srs. ministros, entendia eu e entendo que não eram motivos para se não celebrar essa concordata, pois já passou a epocha do cre ou morre, e a missão dos governos é manter a harmonia no povo, e entre todas as classes sobre a salvaguarda da justiça.

Ora as doutrinas que sustentei então e que ainda conservo, é que me levaram a pedir a palavra quando numa das ultimas sessões se tratou da questão com relação ao

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facto que diz respeito á desamortisação, e o sr. Fontes, que é o chefe politico d'esta situação, respondendo com aquella urbanidade que lhe é propria, e á qual eu estou costumado ha tantos armes, declarou que havia de fazer cumprir as leis.

Ora é precisamente n'este ponto, que eu tenho alguma cousa a observar ao sr. presidente do conselho. S. exa., e por consequencia o governo, nunca poderão tornar de um modo absoluto esta promessa n'uma realidade; quero dizer, nunca hão de poder fazer cumprir a lei senão em parte, em metade, mas não no todo.

Não quero significar com isto que o governo não tenha os maiores desejos de que a lei se cumpra inteiramente, e que não deixará do empregar uma corta ordem de esforços para conseguir esse fim; mas simplesmente qus não tem poder para o fazer. É por isso que eu queria que o governo chegasse a um accordo com a santa sé.

Desde o momento em que uma lei civil está em opposição com as leis ecclesiasticas, o meio mais proprio para evitar conflictos desagradaveis ou perturbações nas consciencias é procurar por virtude de uma concordata pôr em harmonia o poder civil com o poder da igreja. O sr. ministro da fazenda manda vender os passaes, mas não póde mandar castigar os parcchos e os bispos, que deam respostas iguaes aquella que deu o nuncio.

Quando a lei da desamortisação se discutiu aqui, eu logo prognostiquei que se não poderia cumprir, em toda a sua plenitude, e que havia de encontrar na sua execução graves difficuldades, e o facto é, que os passass vendem se, as consciencias perturbam-se, os funccionarios ecelesiasticos desobedecem, e o governo não os póde castigar.

Se se tivesse celebrado uma concordata, como eu indiquei, e pela celebração da qual insisti muitas vezes, as cousas haviam de caminhar melhor e a lei poder-se-ia executar, não só em toda a sua plenitude, mas tambem a contento de todos, e ssm escrupulos para ninguem.

Agora, em vista do que se tem passado, resta-me perguntar ao sr. presidente do conselho se o governo está na resolução de promover uma concordata com a santa sé, para acabar com os escrupulos que se têem levantado por parte de algumas pessoas. Quaesquer que sejam as idéas de s. exa., não haveria n'isto senão conveniencia para todos.

Em França, onde não ha simplesmente catholicos, onde o chefe do conselho de instrucção publica é um calvinista, encontro exemplos que confirmam as minhas idéas. O governo tem obrigação de respeitar os escrupulos de cada um e de manter a paz na sociedade. Temos em Roma um ministro habilisaimo, que é o sr. conde de Thomar, por sua via se póde entrar em negociações para se chegar a um accordo honroso para ambas as partes e conveniente para todos.

Ninguem de certo ha de levantar a voz para me contrariar, porque desejar a paz (e o que eu quero é a paz) é um desejo honroso. E eu quero-a, tanto por este como por outro qualquer governo; e ainda mais por este que tenho tido a honra de apoiar, e no seio do qual se encontram pessoas que muito estimo e respeito, como, por exemplo, o sr. presidente do conselho, de quem tenho sempre recebido muito boas palavras e muita consideração.

Eu, que ha tanto tempo não occupo a tribuna, espero que a camara não julgará importunas e deslocadas estas minhas reflexões.

Passando a tratar do assumpto relativo á interpellaçao dirigida ha dias ao sr. ministro do reino, e a respeito do qual tomei a palavra em 1867, não posso deixar de dizer tambem alguma cousa a este respeito.

O governo depois da publicação do codigo civil, nomeou uma commissão encarregada de examinar as difficuldades que se encontrassem na sua execução, de harmonisar os diversos artigos e de colher todos os dados para se conhecerem essas difficuldades. Esta commissão ha dois que não se reune.

Quando aqui se apressntou o codigo civil, contra o qual eu voiei, apesar de apoiar o ministerio, e apoiei-o até ao fim, disse eu ao sr, Barjona de Freitas, que não o podia votar em cinco ou dez minutos que tinhamos apenao para o discutir. Propuz o adiamento e unicamente só quatro dignos pares votaram commigo, foram os srs. conde de Lavradio, que era então quem presidia aos trabalhos d'esta camara, o sr. marquez de Fronteira, o sr. marquez do Ficalho e o sr. conde da Ponte. Votei contra a opportunidade de se discutir no ultimo dia de sessão um codigo de tanta magnitude como é o codigo civil; ponderei as difficuldades que se haviam de dar, e effectivamente viu-se na pratica que os meus receios, as minhas previsões, realisaram-se completamente.

Eu não queria que se discutisse artigo por artigo, mas queria que se discutisse doutrina por doutrina. Reprovei alguns artigos, sobretudo o que estabelecia a usura. Hei de fallar, em occasião opportuna, sobre este e muitos outros artigos, como, por exemplo, o que se refere á censura theatral; e hei de tambem chamar a attanção do sr. ministro do reino sobre outro negocio não menos grave.

Eu tenciono, na proxima semana dirigir uma nota de interpellação ao sr. ministro da justiça. Não devo causar estranheza que eu annuncie desde já uma interpellação, porque em Inglaterra faz-se isso muitas vezes. Essa interpellação não tem, porém, o cunho de opposição, mas só tem por fim querer auxiliar es poderes publicos, sobretudo o judicial, no cumprimento dos seus deveres.

O sr. ministro da justiça, a quem ninguem de certo censurou a sua falta n'esta casa, porquanto s. exa. estando occupado na outra camara e na secretaria com assumptos importantes não tem podido comparecer aqui, ha de certo vir a esta camara dar as explicações que a camara deseja ouvir de s. exa.; tão benevolo como costuma ser, e tão apto para a oratoria como é, não foge a qualquer discussão. Espero portanto que s. exa. virá ainda n'esta sessão responder a um assumpto a que desejo referir-me, qual é o da confirmação do sr. bispo eleito dr. Ayres de Gouveia.

Da parte da santa sé é possivel que haja rasão, e n'esse caso o sr. ministro não deve continuar a insistir pela confirmação, porque assim mostrará a lealdade propria de quem se senta n'aquellas cadeiras.

Creio que o illustre ministro, se se der este caso, e sem ofiender o illustre cathedratico, não deixará de prover a diocese do Algarve num bispo que não encontre resistenias.

De qualquer dos lados póde haver rasão. Se está do lado do governo, deve este insistir; mas se está do lado da santa sé, deve ceder, sem que por isso se devam julgar offendidos nenhuns usos e costumes d'este reino.

Visto que se acha presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros e interino da marinha, tratarei com s. exa. sobre um assumpto que diz respeito a este ultimo ministerio.

Ha poucos dias que assegurei a alguns amigos, que me dirigiria a s. exa., pedindo-lhe a sua attenção para um negocio muito justo.

Falleceu um homem eminente do nosso paiz, o sr. visconde de Paiva Manso, com a amisade do qual me honrei, e cuja illustração e patriotismo era de todos conhecido. Adoeceu no serviço da patria e por ella morreu. A sua viuva e os seus filhos ficaram na miseria.

O nome de Paiva Manso passará despercebido para as gerações futuras, porque a sua viuva não poderá dar educação a seus filhos.

Eu peço, pois, ao sr. ministro, que me responda muito categoricamente, se o governo tenciona recompensar os serviços do sr. visconde de Paiva Manso, em nome do paiz que utilisou o prestimo d'este eminente jurisconsulto?

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Eu confio no sr. ministro, que é bom e generoso; confio no seu talento e no amor que s. exa. tem pelas cousas que interessam á sua patria.

E terminando, agradeço a resposta que me vae dar o sr. presidente do conselho, que espero será clara, como costumam ser as respostas de s. exa. Comtudo, se o julgar conveniente, pedirei de novo a palavra.

(O orador não reviu os seus discursos.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Em primeiro logar, affianço de novo á camara que o sr. ministro da justiça comparecerá na proxima sessão, para responder ás observações que forem feitas pelo sr. Miguel Osorio; e, e n'essa occasião, poderá tambem o digno par intepellar o meu collega sobre o assumpto a que acaba de referir-se.

Emquanto á necessidade de uma concordata com a côrte de Roma, por causa da execução da lei da desamortisação, perguntou-me o digno par sé o governo a julgava necessaria. Tenho a delarar que o governo effectivamente não a julga necessaria.

O sr. Miguel Osorio: - Apoiado.

O Orador: - A lei da desamortisação foi votada no parlamento portuguez sem dependencia de nenhum accordo com a côrte de Roma. Parece-me que é uma questão do dominio do poder temporal.

O sr. Miguel Osorio: -Apoiado.

O Orador: - Posso asseverar a s. exa. que a desamortisação se faz todos os dias, cada vez com maior desenvolvimento; e que tem concorrido a ella muita gente em todas as praças que se têem aberto ou em Lisboa ou nas provincias. (Apoiados.)

O sr. Marquez de Vallada: - Peço a palavra.

O sr. Presidente: - A hora está muito adiantada; entretanto a camara póde decidir se quer entrar já na ordem do dia.

Os dignos pares que são de voto que se de a palavra ao sr. marquez de Vallada para fallar sobre o assumpto a que s. exa. alludiu, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Marquez de Vallada: - Sr. presidente, eu não disse que era necessaria a concordata. Disse o que repito, o que proferi na occasião em que fallei e a que me refiro, que era altamente conveniente a concordata para pacificar as consciencias; mas se o governo entende que a lei se vae executando e não tenciona perseguir os infractores, então muito bem. Mas o que é certo é que a lei não se cumpre.

Lembra-me o que aconteceu na camara ingleza estando sentado nas cadeiras ministeriaes o duque de Wellington, que era protestante. Um membro d'aquella assembléa perguntou se elle devia executar as leis de Henrique viu e de Izabel. O duque de Wellington disse que não lhe podia responder.,(Aqui não se procede assim, aqui costuma-se responder.) Queria dizer que não podia executar essas leis.

O governo executa por metade a lei da desamortisação; manda que se vendam os passaes, mas não se vendem todos, ou vendem-se mal.

O meu nobre amigo e respeitavel membro d'esta casa, o sr. Miguel Osario, apoiou o sr. Fontes, presidente do conselho, quando s. exa. disse que não julgava necessaria a concordata, que a lei se ia executando. Portanto o sr. Miguel Osorio está perfeitamente de accordo com o governo, não póde exigir-lhe mais. Porém, se o sr. Miguel Osorio exige que o governo cumpra a lei em toda sua plenitude, então já não está de accordo, porque...

O sr. Miguel Osorio: - Eu não discuto com os meus collegas, discuto sómente com o governo.

O Orador: - Não posso deixar de discutir o que se passou.

O sr. Miguel Osorio satisfez-se com o que disse o sr. presidente do conselho e eu sustento que não se devia satisfazer. Mas desde que s. exa. se satisfaz, posso observar (porque o que nós dizemos é do dominio de todos) que o governo não está resolvido a copiar o papel do nobre marquez de Aguiar no tempo do senhor D. João VI, cumpre a lei até onde a póde cumprir; os nuncios vão declarando que não estão estes actos de accordo com as leis da consciencia, e o governo vae seguindo o seu caminho e deixa aos outros seguirem o seu.

Aqui está a questão posta nos seus verdadeiros termos. Ora, eu entendi e continuo a entender, que é de conveniencia a concordata. Eu não pude conseguir do governo de que fez parte o sr. marquez d'Avila, que essa concordata se fizesse, ainda que pedi e instei muito por ella como v. exa., que tem boa memoria, deve estar lembrado. O que então sustentei sustento agora. Se o sr. presidente do conselho entende que não é necessario este accordo, que a questão está plenamente esclarecida, não tenho mais nada a dizer.

O sr. ministro da marinha pediu a palavra naturalmente para responder ao appello que fiz ao governo com relação á má situação em que se acha a viuva do visconde de Paiva Manso, e estou certo que a resposta de s. exa. ha de ser satisfactoria.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Andrade Corvo): - Pedi a palavra para responder ao digno par o sr. marquez de Vallada.

O governo aprecia muito os serviços prestados ao paiz pelo sr. visconde de Paiva Manso na grave questão pendente entre o governo portuguez e o governo de Inglaterra; mas não foi só o sr. visconde de Paiva Manso que deixou a sua familia em má situação; outros homens que tambem fizeram notaveis serviços ao paiz igualmente deixaram no mesmo caso as suas familias.

O governo pondera todas estas questões, a fim de apresentar uma proposta conveniente com o intuito de obviar á situação d'essas familias.

(O orador não reviu esta resposta.)

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vamos entrar na ordem do dia. Vae ler-se o parecer n.° 97.

Parecer n.° 97

Senhores. - A commissão de guerra examinou attentamente o projecto de lei n.° 76-A, vindo da camara dos senhores deputados, applicando ao conde de Claranges Lucotte as disposições da carta de lei de 11 de agosto de 1856, relativa aos officiaes estrangeiros que serviram no exercito libertador, a fim de ser considerado coronel effectivo do exercito, e reformado subsequentemente.

Sendo certo que o mencionado conde serviu por algum tempo como official no exercito libertador, e n'esta qualidade se bateu valorosamente contra as forças do usurpador, mas tambem que depois foi demittido, rasão esta por que lhe não pôde ser applicada, nem a lei de 19 de outubro de 1840, nem a de 11 de agosto de 1856, entende a vossa commissão, comtudo, que o serviço prestado pelo referido conde em favor da causa da liberdade merece ser recompensado por modo que o colloque fóra das precisões ordinarias, muito mais quando o paiz tem sido generoso em remunerar os officiaes estrangeiros que serviram no exercito libertador. Por este motivo é a vossa commissão de parecer que o interessado seja restituido ao posto de tenente coronel, de que foi demittido em 1833, e em seguida reformado no posto immediato, com vencimento pela tarifa de 1814, com o que, ficando acceita a intenção da camara dos senhores deputados, modificada comtudo emquanto á fórma da sua applicação, julga conciliar e attender á equidade necessaria.

Conforme a este pensamento tem a commissão a honra de substituir ao projecto n.° 76-A o seguinte projecto de lei:

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Artigo 1.° É o governo auctorisado a reintegrar no posto de tenente coronel, de que foi demittido em 1833, o conde de Claranges Lucotte, reformado em seguida no posto immediato, como se tivesse vinte e cinco annos de serviço, percebendo os respectivos vencimentos pela tarifa de 1814, com as deducções estabelecidas por lei, sem direito a vencimento algum anterior ao decreto pelo qual for restituido ao posto de tenente coronel.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 31 de março de 1815. = Marquez de Fronteira = Barão do Rio Zezere = D. Antonio José de Mello e Saldanha, = Antonio José de Barros e Sá = Augusto Xavier Palmeirim.

Projecto de lei n.° 76 A

Artigo 1.° É o governo auctorisado a tornar extensivas ao coronel honorario conde de Claranges Lucotte as disposições da lei de 11 de agosto de 1856, relativa aos officiaes estrangeiros que estiveram ao serviço do exercito libertador em Portugal, sendo para este fim considerado coronel effectivo do exercito.

Art. 2.° O disposto no artigo antecedente não dá direito ao coronel conde de Claranges Lucotte para receber vencimento algum anterior á data do decreto pelo qual lhe for concedida,a sua reforma.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 23 de março de 1875. = Joaquim Gonçalves Mamede presidente = Ricardo de Mello Gouveia, deputado secretario = Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos, deputado secretario.

O sr. Palmeirim: - Por parte da commissão de guerra tenho de mandar para a mesa uma substituição ao parecer n.° 97, não porque a commissão deseje alterar a essencia do projecto, mas porque entende que se lhe deve dar outra redacção. O que está impresso, e agora se declara, ou esclarece melhor, foi escripto no ultimo dia da sessão passada, quasi sobre o joelho, tanto era a azafama na vespera do termo dos nossos trabalhos! Foi para a imprensa, e de lá voltou com erros, e mesmo com uma declaração ácerca de deducções do soldo, que tinha sido riscada como superflua, porquanto não existem já as deducções, que aliás vigoravam em 1856. A doutrina é a mesma, mas outra a fórma.

Foi lida na mesa.

O sr. Presidente: - Esta substituição fica em discussão conjuntamente com o projecto, se a camara a admittir á discussão.

Os dignos pares que admittem á discussão a substituição mandada para a mesa pelo sr. general Palmeirim tenham a bondade de se levantar.

Foi admittida e entrou em discussão conjuntamente com o parecer.

O sr. Miguel Osorio: - Pede que lhe seja enviada a substituição para a ler, pois que a não ouviu.

O sr. Presidente: - A substituição mandada para a mesa pelo digno par o sr. general Palmeirim diz o seguinte. (Leu.)

Parece-me;) pois, que é a mesma idéa do projecto com outra redacção.

Se o sr. general Palmeirim quizesse ter a bondade de dar algumas explicações quanto ás differenças que devem haver entre esta substituição e o parecer que se discute, a camara ficaria esclarecida, e eu mais habilitado para dirigir esta discussão.

O sr. Palmeirim: - Não ha differença nenhuma entre a idéa do projecto e a da substituição; não ha mais que uma alteração de redacção, por isso que o projecto apresentado o anno passado foi para a imprensa e veio de lá com um erro de redacção, que a comraissão pretende emendar, tornando o projecto mais claro, explicito e livre de cousas superfluas.

O sr. Miguel Osorio: - Deseja saber se este projecto é da iniciativa do governo, ou se está de accordo com a sua doutrina; porque foi demittido o interessado no mesmo, e se elle é o que figura como concessionario no projecto que passou aqui na sessão de sexta feira, ou se é outra pessoa.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Direi muito poucas palavras, sr. presidente, e serei tão laconico na resposta, quanto o foi o digno par nas suas perguntas.

O projecto não é da iniciativa do governo; veio da outra camara e foi formulado sobre um requerimento apresentado ao parlamento pelo pretendente; porém eu não me oppuz, nem na discussão da outra camara, nem tão pouco no seio da commissão d'esta casa do parlamento.

O cavalheiro de que trata este projecto é a mesma pessoa do projecto votado na sessão passada e a que se referiu o digno par.

Creio qus o digno par limitou aqui as suas perguntas, e que não deseja nenhuma outra explicação.

O sr. Miguel Osorio: - Se v. exa. me permitte que o interrompa?

O Orador: - Com muito gosto.

O sr. Miguel Osorio: - Falta saber as rasoes da demissão d'este official.

O Orador: - Não as sei, mas posso dizer ao digno par que este militar se bateu com valentia na defeza, da liberdade do paiz. (Apoiados do sr. visconde de Soares Franco.}

(Entrou o sr. ministro da fazenda.)

O sr. Miguel Osorio: - Depois de algumas reflexões, pede o adiamento d'este projecto até mais amplas informações, a não ser que a commissão podesse explicar como é que um homem que era opulento na sexta feira da semana passada, está tão pobre na terça feira d'esta semana, que precisa que se lhe dê pão.

O sr. Presidente: - Pediu a palavra um digno par. Hesito se foi o sr. Vaz Preto ou o sr. Palmeirim.

O sr. Palmeirim: - Pedi eu, sr. presidente.

O sr. Palmeirim: - Vou satisfazer tão completamente quanto possivel ás exigencias do digno par.

Tenho aqui os documentos que serviram de base ao parecer da commissão. A informação que veiu do ministerio da guerra é a seguinte. (Leu.) É assignada pelo chefe da repartição, o sr. barão de Castro Daire, e muito importante porque a ella se refere o officio e a opinião do sr. ministro da guerra.

O sr. Lucotte foi contratado em França no mcz de maio de 1833 para o nosso serviço, no posto de major. Chegou ao Porto em agosto seguinte, e sendo nomeado tenente coronel commandante do batalhão francez, que elle proprio organisara, tomou parte no movimento que o illustre marquez de Sá operou sobre Obidos, portando-se com tanta galhardia, que mereceu do imperador a crus de cavalleiro da Torre e Espada, no mez de outubro; mas em dezembro seguinte foi demittido, ignorando-se hoje o motivo. Requereu responder a um conselho de guerra, o que nunca lhe foi concedido.

Já quando demittido ainda prestou serviços apaziguando em Valle de Pereiro, no anno de 1834, uma gravissima insubordinação do batalhão, que outr'ora commandára.

Na qualidade de paisano continuou até 1837 ou 1838, em que requereu ao governo a reintegração no posto de tenente coronel, ou, na alternativa, uma commenda de Christo. O governo optou pela segunda; mas o sr. Lucotte nunca desistiu da reintegração, requerendo-a da generosidade nacional, como se vê dos seus memoriaes juntos ao processo, ou a exemplo do concedido em agosto de 1860 aos francezes Remy e Riché.

Nenhum direito assistia ao interessado, mas da consulta do supremo tribunal de justiça militar e da da secção administrativa do conselho d'estado infere-se existir uma certa equidade em o attender de algum modo.

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A camara dos senhores deputados entendeu tornar-lhe extensiva a lei de 11 de agosto de 1856 (lei que resultou de uma sentença arbitral), feita sómente a favor dos que sendo n'essa epocha officiaes tinham tomado o nosso serviço desde 1832 nas ilhas dos Açores, como se fizera no anno de 1860 aos capitães Bemy e Riché.

É n'este ponto que se afasta a commissão de guerra do projecto vindo da camara dos srs. deputados. Primeiramente porque esta considerou o sr. Lucotte coronel honorario, e o reforma em general, e a nossa commissão, tendo indagado este ponto, não só não encontrou o sr. Lucotte sob qualquer fórma ou denominação mencionado na lista dos officiaes do nosso exercito, ou entre os estrangeiros ao nosso serviço; mas não achou mesmo decreto ou diploma algum que assim o declarasse ao exercito, não se tendo como tal a menção que d'elle faz a ordem do exercito n.° 2 de 1846, que designa para servir ás ordens do duque de Saldanha o coronel honorario Lucotte.

Mas quem lhe conferiu esse posto honorario, quando elle não tinha, até então, podido readquirir o posto de tenente coronel?

É facto porém que o sr. Lucotte, com a sua não desmentida bravura obteve na batalha de Torres Vedras mais um grau na ordem da Torre e Espada, e logo voltou á sua vida civil anterior, não proseguindo na campanha.

Emquanto aos dois exemplos citados, não são elles iguaes. O capitão Riché era em 1860 capitão do nosso exercito, foi reformado em major o capitão Remy que era paisano, como o sr. Lucotte, foi reintegrado n'aquelle posto, e depois reformado em major.

A commissão de guerra entendeu, e entende ainda hoje, ser esta a hypothese do sr. Lucotte, e por isso, divergindo do projecto vindo da camara dos senhores deputados, propõe para o interessado, primeiramente a volta ao estado militar no posto de tenente coronel, e depois a sua reforma no de coronel, recompensa que é bastante por alguns mezes de serviço, e para obter a qual os officiaes portuguezes carecem de vinte e cinco annos.

Nada mais posso responder ao digno par, porquanto ignoro a vida e as circumstancias pessoaes do interessado.

O projecto significa, em termos mais rasoaveis, a gratidão nacional pelos serviços prestados á liberdade, e como um respeito pelas recommendaçoes do sr. marquez de Sá, e pelas consultas a que me tenho referido.

Quanto á substituição que mandei para a mesa, repito que ella não altera em nada a essencia do projecto, e só sim a redacção d'elle, como facilmente verá quem os comparar.

O sr. Miguel Osorio: - Como a questão é tão complexa, e agora ainda mais o está, proponho o adiamento para voltar tudo á commissão.

O sr. Presidente: - O sr. Miguel Osorio propõe o adiamento d'este projecto, a fim de que elle seja remettido á commissão de guerra juntamente com a proposta do sr. Palmeirim.

Vou consultar a camara sobre se admitte o adiamento á discussão.

Foi admittido.

Está, portanto, em discussão o adiamento com a materia principal.

O sr. Sequeira Pinto: - Pedia a palavra para mandar para a mesa um requerimento, que me parece dever ser tomado em consideração:

"Requeiro que, pelo ministerio da guerra, sejam remettidos a esta camara os pareceres fiscaes, consultas da secção administrativa do conselho d'estado, e do supremo conselho de justiça militar, relativos á pretensão do conde de Claranges Leucotte. Sala das sessões, em 8 de fevereiro de 1876. = Sequeira Pinto."

O projecto diz assim: (leu.)

Não considero que seja facil saber, pela leitura da pareceres das commissões de guerra d'esta e da outra casa do parlamento, se o projecto em discussão foi da iniciativa do governo, ou da iniciativa particular; sómente hoje ouvimos a declaração feita pelo nobre presidenta do conselho e ministro da guerra, que a proposta não foi apresentada por s. exas.

O conde de Claranges Lucotte serviu apenas alguns mezes, e em recompensa d'esse serviço, lhe é concedida a reforma no posto de coronel, vantagem bem superior á que até hoje tem sido concedida a officiaes muito distinctos e com serviço effeciivo por longo periodo e tendo feito todas as campanhas da liberdade.

O digno par o sr. Palmeirim, respondendo ao sr. Miguel Osorio, leu documentos de que a camara não tinha conhecimento algum, e que parecem importantes. Entre elles apparecem informações remettidas pelo ministerio da guerra, as quaes se referiam a consultas da secção administrativas do conselho d'estado e do supremo conselho de justiça militar.

Entendia, pois, que era de toda a conveniencia que se pedissem essas consultas para esclarecimento da camara.

Foi por este motivo que apresentei o requerimento; se porém não for approvado, peço a v. exa. que me conceda a palavra, para declarar os motivos por que não posso approvar o projecto.

Requeiro a urgencia do meu requerimento.

Foi lido na mesa.

O sr. Presidente: - Se o adiamento for approvado, porei á votação o requerimento do digno par; mas, no caso contrario, caduca o requerimento.

Creio que v. exa. concordará com esta minha opinião.

O sr. Sequeira Pinto: - Perfeitamente de accordo com v. ex.

O sr. Palmeirim: - Não posso deixar de combater, em nome da commissão, o adiamento proposto; e darei mais algumas explicações que elucidem os meus collegas, e os habilitem a poder votar o projecto.

Sr. presidente, o parecer da commissão de guerra da outra casa do parlamento assentou sobre um, requerimento do interessado, e não sobre proposta do governo. Quando o projecto veiu para esta camara, a sua commissão de guerra pediu os esclarecimentos que tinham acompanhado esta pretensão, e da camara dos senhores deputados foi enviada a consulta do conselho de justiça militar, a que alludiu o digno par, o sr. Sequeira Pinto, e tambem a do conselho de estado, emfim vieram todos os documentos que serviram de base ao projecto que discutimos agora.

Portanto, não é preciso voltar o parecer á commissão; e que volte, ella reproduz as mesmas idéas, porque não tem motivo para mudar de opinião.

Mas, visto que á ultima hora apparecem duvidas, eu propunha tambem um diverso adiamento, isto é, que os documentos estejam na mesa por tres ou quatro dias a fim de que os dignos pares os possam examinar, e que depois v. exa. se digne dar este assumpto para nova ordem do dia, podendo a camara, completamente esclarecida, resolver então o mais consentaneo.

O sr. Presidente: - Peço a attenção do digno par o sr. Palmeirim. Parece-me que s. exa. propoz outro adiamento para que fiquem sobre a mesa, não só o parecer, mas os documentos que o instruem. O requerimento do sr. Sequeira Pinto....

O sr. Sequeira Pinto: - Eu não podia saber que os documentos a que alludi estavam n'esta casa. Preciso consulta-los, vê-los, examina los. (Apoiados.} A declaração que acabo de fazer foi apresentada já pelo sr. Miguel Osorio. Alguns membros d'esta camara não teem conhecimento desses documentos, é indispensavel tempo para serem apreciados, mas desde que o digno par relator da commissão concorda em que fiquem sobre a mesa durante um certo praso, suspendendo-se, até que possam ser examinados, a discussão

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d'este projecto, não tenho duvida alguma em retirar o meu requerimento, porque está já satisfeito.

O sr. Miguel Osorio: - Fez diversas considerações em abono do adiamento.

O sr. Presidente: - Se oa dignos pares me permittem que estabeleça a questão, parece-me que se lucrará alguma cousa.

O sr. Miguel Osorio lembrou-se de propor o adiamento, em vista de uma neva redacção que o digno par relator da commissão mandou para a mesa.

O sr. Sequeira Pinto propoz ouiro adiamento para serem remetiidos a camara certos documentos qu3 julgava necessarios para esclarecer a questão. Como esses documentos estão aqui já na camara, segundo declarou o sr. relator, o digno par retirou a sua proposta.

Mas está de pé o adiamento proposto pelo digno par o sr. Miguel Osorio, adiamento que tem per fundamento o ter sido mandado para a mesa pelo sr. relator da commissão uma substituição alterando a redacção do projecto. Já se vê, por consequencia, que, se a camara resolver que fiquem sobre a mesa os referidos documentos, ha de adiar-se a discussão do projecto que se está discutindo, com a nova redacção que mandou para a mesa o sr. general Palmeirim.

O adiamento do digno par o sr. Miguel Osorio tem por fim que volte á commissão o parecer e a substituição para que a illustre commissão de guerra submetta á deliberação da camara uma unica redacção, e não duas, como apparecem, uma da commissão e outra do sr. relator...

O sr. Palmeirim: - Peço perdão. Não ha aqui nenhuma redacção minha. A substituição que apresentei é da commissão de guerra e não pessoal, e está por ella assignada.

O sr. Presidente: - Então ha duas redacções por parte da commissão de guerra. Peço á camara que dê attenção a isto; ha duas redações da commissão de guerra, uma, que é a do parecer n.° 97, que está em discassão, assignada pelos dignos pares os srs. conde de Fonte Nova, D. Antonio José de Mello, marquez de Sá da Bandeira e barão do Rio Zezere, e outra apresentada agora pelo sr. general Palmeirim por parte da mesma coiumissão. É preciso, pois, que a commissão declare qual d'estas duas redacções deseja que entre em discussão.

O sr. Palmeirim: - A ultima.

O sr. Presidente: - Então a primeira cousa que ha a fazer é consultar a camara se dispensa a impressão da substituição apresentada hoje pela commissão, e que está manuscripta. Peço desculpa d'estas observações, mas parece-me que na qualidade de presidente da camara devo expor a questão como a vejo.

O sr. Miguel Osorio: - Vendo duas redacções, ambas ellas propostas pela commissão, não sabe qual é a que vale; e n'este supposto, parece-lhe que deve approvar-se o adiamento para que a commissão proponha uma redacção definitiva.

O sr. Presidente: - Parece-me que seria mais regular que o sr. Miguel Osorio retirasse o seu adiamento.

O sr. Miguel Osorio: - Em presença das tão sensatas considerações do sr. presidente, retira o seu adiamento.

O sr. Presidente: - Deste modo a camara tem só a votar sobre a proposta do sr. relator da commissão, para que fiquem sobre a mesa todos os documentos, a fim de que os dignos pares os possam consultar; e n'este intervallo conviria que se imprimisse a substituição para ser distribuida pelos dignos pares, e na occasião da discussão a camara resolverá se permitte que a commissão retire o seu primeiro parecer para entrar em discussão a substituição. (Apoiados.)

Vou pois consultar a camara. Os dignos pares que approvam a proposta do sr. relator da commisão, para que fiquem sobre a mesa os documentos relativos ao projecto que tem estado em discussão para serem examinados, mandando-se n'este intervallo imprimir a substituição apresentada pelo sr. general Palmeirim, em nome da commissão de guerra, tenham a bondade de se levantar,

Foi approvado.

O sr. Miguel Osorio: - Raquer que se imprimam tambem os documentos que a commissão teve presentes.

O sr. Palmeirim: - Esses documentos são os que eu aqui tenho.

O sr. Presidente: - O digno par o sr. Miguel Osorio requer a impressão dos documentos pedidos pelo digno par o sr. Sequeira Pinto. Os dignos pares que approvam este requerimento tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: - Por consequencia só poderá entrar na ordem do dia este parecer depois de impressos o distribuidos pelos dignos pares a substituição da commissão e os documentos que foram pedidos.

Vae ler-se o parecer n.° 86.

Parecer n.° 86

Senhores. - Á commissão de guerra foi presente o projecto de lei n.° 80, vindo da camara dos senhores deputados, melhorando a reforma ao general de brigada José Maria de Pina, liquidando-a como se tivesse sido promovido a segundo tenente de artilheria em 6 de agosto de 1832.

A vossa commissão, considerando principalmente que, tendo o referido general de brigada assentado praça em 6 de novembro de 1820, lhe foi dada baixa do serviço, por ser affecto aos principios constitucionaes, em 5 de novembro de 1829, apesar de estar frequentando com aproveitamento o curso da arma de artilheria;

Considerando que, tendo concluido o referido curso em 6 de julho de 1830, devia ter sido promovido a segundo tenente de artilheria na primeira promoção geral que se effectuasse, a qual effectivamente teve logar em 6 de agosto de 1832, e tendo sido approvado pela commissão de fazenda:

É de parecer a vossa commissão que o referido projecto seja approvado para subir á sancção regia.

Sala das commissões, 30 de março de 1875. = Marquez de Fronteira = Barão do Rio Zezere = D. Antonio José de Mello e Saldanha = Antonio José de Barras e Sá = Augusto Xavier Palmeirim.

Projeoto de lei n.° 80

Artigo 1.° Será melhorada a reforma ao general de brigada José Maria de Pina, liquidando-a como se tivesse sido promovido a segundo tenente de artilheria em 6 de agosto de 1832.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 23 de março de 1875. = Joaquim Gonçalves Mamede, presidente = Ricardo de Mello Gouveia, deputado secretario = Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos, deputado secretario.

O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade e na especialidade porque contém um só artigo.

(Pausa.)

O sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam o projecto na generalidade e especialidade tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

Entrou em discussão na generalidade e na especialidade o parecer n.° 79.

Parecer n.° 79

Senhores. - Á vossa commissão de guerra foi presente o projecto de lei n.° 79, vindo da camara dos senhores deputados, o qual resolve favoravelmente o requerimento do secretario da 1.ª divisão, com a graduação de capitão, João Luis Muzanty, que pedia lhe fosse concedida a graduação de major, unicamente para os effeitos da reforma.

A vantagem é tão pequena, que este empregado pede em renumeração de seus bons serviços, que a vossa com-

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missão é de parecer que seja approvado o projecto n.° 79, para depois subir á sancção regia.

Sala da cornmissão de fazenda, em 19 de fevereiro de 1875. = Marquez da Fronteira = D. Antonio José de, Mello e Saldanha = Barão do Rio Zezere = Antonio José de Barros e Sá = Augusto Xavier Palmeirim, relator.

Projecto de lei n.° 79

Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder a graduação de major, unicamente para os effeitos da reforma no posto immediato, ao secretario da primeira divisão militar, com a graduação de capitão João Luiz Muzanty.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 23 de março de 1875. = Joaquim Gonçalves Mamede, presidente = Ricardo de Mello Gauveia, deputado secretario = Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos, deputado secretario.

Foi approvado sem discussão.

Passou-se á discussão na generalidade e na especialidade do parecer n.° 89.

Parecer n.° 89

Senhores. - Á commissão de guerra foi presente o projecto de lei n.° 86, vindo da camara dos senhores deputados, que auctorisa o governo a melhorar no posto de general de brigada a reforma concedida, por decreto de 23 de setembro de 1873, ao coronel José Osorio de Castro Cabral e Albuquerque, sem direito ao vencimento anterior á publicação da presente lei.

O projecto sendo pela commissão de fazenda approvado, entende a commisssão de guerra que elle deve ser approvado e subir á sancção regio.

Sala da commissão, em 30 de março de 1875. = Marquez de Fronteira = Barão do Rio Zezere = D. Antonio José de Mello e Saldanha = Antonio José de Barros eSá = Augusto Xavier Palmeirim.

Projecto de lei n.° 86

Artigo 1.° É o governo auctorisado a melhorar no posto de general de brigada a reforma concedida, por decreto de 23 de setembro de 1873, ao coronel José Osorio de Castro Cabral e Albuquerque, sem direito ao vencimento anterior á publicação da presente lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 23 de março de 1875. = Joaquim Gonçalves Mamede, presidente = Ricardo de Mello Gouveia, deputado secretario = Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos, deputado secretario.

Foi approvado sem discussão.

Entrou em discussão na generalidade e na especialidade o parecer n.° 105.

Parecer n.° 105

Senhores. - As vossas commissões de guerra e marinha examinaram o projecto n.° 82, vindo da camara dos senhores deputados, auctorisando o governo a dar passagem para o exercito, no posto de alferes, aos guardas marinhas Antonio Maria de Avellar, Antonio Francisco Sebes e Pedro de Sá e Mello, sujeitando-os ás condições que o mesmo projecto estabelece.

As commissões, acceitando as considerações que moveram a camara dos senhores deputados ao dito projecto da lei, julgam por ellas que este merece a vossa approvação e subir á sancção regia.

Sala das commissões, 31 de março de 1875. = Duque de Palmella = Visconde de Soares Franco = Visconde da Silva Carvalho = Visconde da Praia Grande = Antonio José de Barros e Sá = Augusto Xavier Palmeirim = José Ferreira Pestana = Marquez de Fronteira = D. Antonio José Mello e Saldanha = Barão do Rio Zezere.

Projecto de lei n.° 82

Artigo 1.° É o governo auctorisado a permittir passagem para o exercito, no posto de alferes, aos guardas marinhas Antonio Maria de Avellar, Antonio Francisco Sebes e Pedro de Sá e Mello, concedendo-lhes licença para concluirem qualquer dos cursos dás armas especiaes ou do corpo do estado maior, a que tenham direito pela classificação que obtiverem em virtude das suas habilitações, sómente com direito á antiguidade que lhes pertencer nos termos do § 1.º do artigo 40.° do decreto com força de ei de 24 de dezembro de 1863.

§ unico. Quando algum dos guardas marinhas, a que se refere o artigo 1.°, não chegue a concluir o curso das armas especiaes ou corpo do estado maior, e tenha que ser collocado nas armas de cavallaria ou infanteria, só contará a antiguidade do posto de alferes desde a data em que concluir o curso de infanteria, na conformidade do artigo 38.° do citado decreto com força de lei.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 23 de março de 1875. = Joaquim Gonçalves Mamede, presidente = Ricardo de Mello Gouveia, deputado secretario = Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, eu pedi a palavra para declarar que voto contra todos estes projectos que foram apresentados sem serem de iniciativa do governo, e que trazem augmento de despeza.

No anno passado um digno par, de proposito para que se não discutissem precipitadamente estes projectos, provocou uma deliberação da camara com o fim de que não se dispensasse o regimento para elles, para evitar assim que á ultima hora se votasse tanto escandalo. Passam porém agora, e eu lavo d'ahi as minhas mãos votando contra.

Sr. presidente, este systema do governo, de contemplações á custa da fazenda publica, é desgraçado.

Se os officiaes têem direito ao que pedem, se lhes assiste a justiça, é ao governo que lhe compete faze-la. Traga pois esses projectos, mas de iniciativa sua, e se são um augmento de despeza criem-lhe logo a receita correspondente, como determina a boa administração. O que se não póde tolerar é este systema contra o qual protesto energicamente, o que prova bem que da parte do actual governo não ha escrupulos quando se desbaratam os dinheiros da nação, que elle tem obrigação de poupar.

Desejo pois que o meu voto fique bem claro, e por isso protesto contra todos estes escandalos, que são verdadeiras calamidades.

O sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam este projecto na sua generalidade e na sua especialidade tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

Entrou em discussão na generalidade e na especialidade o parecer n.° 87.

Parecer n.° 87

Senhores. - Á vossa commissão de legislação foi presente o projecto de lei apresentado em sessão de 16 do corrente pelo digno par Barros e Sá, para que á sociedade geral agricola e financeira de Portugal sejam extensivas e appliveis as disposições da lei de 16 de abril de 1874, a fim de que os emprestimos com hypotheca, por ella feitos, quer sobre o casco da propriedade, quer sobre consignação de rendimentos, possam ser constituidos, independentemente de escriptura publica, pelo modo e com as solemnidades que forem prescriptas pelo governo em harmonia com as disposições dos artigos 906.° n.° 6.° e 928.° n.° 3.° do codigo civil. Igualmente foi presente á commissão a representação que para similhante fim foi dirigida a esta camara pela sociedade agricola e financeira.

E attendendo a que as rasões que determinaram aquella lei são applicaveis em tudo ao que agora se propõe e pede; mas considerando que em logar de uma disposição especial é mais conveniente e consentaneo á natureza do assumpto estabelecer regra geral, applicavel a todos os casos da

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mesma natureza, tem a honra de vos propor, de accordo com o governo, o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A auctorisação concedida ao governo pela lei de 16 de abril de 1874 é extensiva e em tudo applicavel ás sociedades anonymas, que pelos seus estatutos tiverem a faculdade de fazer emprestimos com hypotheca, quer sobre o casco da propriedade, quer sobre consignação de rendimentos.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 30 de março de 1875. = Conde de Fornos de Algodres = Visconde de Alves de Sá = José Marcellino de Sá Vargas = João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Martens = Diogo Antonio Correia de Sequeira Pinto = Antonio José de Barros e Sá.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: - Está extincta a ordem do dia. Os projectos que foram approvados têem de ser submettidos á real saucção; por consequencia vou nomear a deputação que com a mesa ha de apresentar a Sua Magestade varios decretos das côrtes geraes. A deputação compoe-se, alem da mesa, dos dignos pares os srs.:

Marquez de Ficalho.

Conde do Casal Ribeiro.

Conde de Linhares.

Bispo de Vizeu.

Vaz Preto.

Mártens Ferrão.

Antonio José de Barros e Sá.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Estou auctorisado para declarar a v. exa. que Sua Magestade recebe a deputação d'esta camara na quinta feira á uma hora da tarde no palacio da Ajuda.

O sr. Presidente: - Ficam prevenidos pois os dignos pares que compõem a deputação, de que Sua Magestade a recebe na quinta feira á uma hora da tarde no palacio da Ajuda.

Vae ler-se um officio que acaba de chegar á mesa.

(Leu-se.)

O sr. Presidente: - Todos os projectos vindos da outra casa do parlamento e que tinham pareceres favoraveis das commissões, estão approvados; por consequencia a ordem do dia para sexta feira são trabalhos de expediente.

Está levantada a sessão.

Eram quasi cinco horas da tarde.

Dignos pares presentes a sessão

Exmos. srs.: Marquez d'Avila e de Bolama; duque de Loulé; marquezes, de Ficalho, de Fronteira, de Sabugosa, de Vallada; condes, de Bomfim, de Cabral, de Casal Ribeiro, do Fonte Nova, de Farrobo, da Louzã, da Ribeira Grande, de Rio Maior, de Valbom; bispos, de Lamego, do Porto, de Vizeu; viscondes, de S. Jeronymo, dos Olivaes, de Portocarrero, de Porto Covo da Bandeira, da Praia Grande, de Soares Franco, de Villa Maior; Ornellas de Vasconcellos, Mello e Carvalho, Barros e Sá, Mello e Saldanha, Fontes Pereira de Mello, Paiva Pereira, Costa Lobo, Xavier Palmeirim, Carlos Bento, Carlos Eugenio, Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, Montufar Barreiros, Andrade Corvo, Mártens Ferrão, Pinto Bastos, Reis e Vasconcellos, Lourenço da Luz, Sá Vargas, Vaz Preto, Franzini, Miguel Osorio, Menezes Pita, Neto de Paiva.

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