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150 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Esse edificio é constituido por varios materiaes, por varias peças, e, de entre ellas, destaca-se o recenseamento eleitoral, feito pela forma que já indicou, isto é, prevalecendo, em absoluto, na sua elaboração, a falsidade e a burla.

Poz depois em relevo, com documentos que tem patentes, e a que, porventura, terá que recorrer na sua replica, o que poderá derivar de recenseamentos assim organisados, para que não possa gerar-se a minima duvida sobre as asserções que apresenta.

Applica aos actos a classificação que elles merecem, e se alguem não deseja vel-os assim classificados, que os não pratique. Classifica-os com a aspereza propria e até grammatical, sem todavia, excluir a correcção que se preza de manter n'esta casa; mas estes attentados contra o regimen constitucional são de ordem escandalosa.

D'esse recenseamento feito pela forma que já indicou resultaram eleições que todos nós conhecemos, e resultou mais que dois partidos com largas ramificações no paiz, o partido regenerador liberal e partido republicano, não teem representação no Parlamento.

Tanto em Lisboa, como demonstrou com documentos, como em outros pontos, esse recenseamento e as manobras correspondentes aos actos eleitoraes produziram os resultados que apontou e entendeu dever citar.

Apreciou os factos que reputa de maior vulto, e depois d'isso patenteou á Camara como se encontram os outros materiaes componentes do edificio representativo.

Em primeiro logar referiu-se ao Juizo de Instrucção Criminal, notando a insistencia com que ali se recusam documentos comprovativos da vida d'aquella mysteriosa casa, mais mysteriosa ainda que o conselho dos dez, da Republica de Veneza, mais mysteriosa ainda do que o proprio Ministerio.

A par da mingua de documentos, requisitados a esse Juizo, e por elle tenazmente recusados, e que poderiam provar exuberantemente a vida irregular d'aquelle estabelecimento, nota-se a falta de iniciativa para perseguir os traficantes de empregos publicos, como demonstrou com documentos, e foi baseando-se n'elles que expoz e enumerou circumstancias que hoje tem que passar em revista.

Disse que era para sentir que o Sr. Presidente do Conselho não seguisse as lições da historia e não se retirasse do poder, deixando de prejudicar o paiz como está prejudicando por forma tão accentuada, e, amoldando-se ainda a estes principios, elle, orador, affirmou que o velho partido regenerador, de tradições liberaes, onde militaram homens de larga envergadura, como Aguiar, Fontes, Corvo, Sampaio e tantos outros, estava hoje voltado do avesso, não só pelo que respeita ás figuras marcantes, como ás outras, e sustentou que esse partido está hoje transformado n'uma oligarcbia insufficiente.

Não é só nos homens que se nota esta carencia; evidencia-se até no culto dos principios, das regalias e das liberdades que foram apanagio d'esse partido, e era precisamente quando elle, orador, dizia ou affirmava que e partido regenerador se encontrava totalmente diverso do que foi, que ouviu dois apoiados, um do Digno Par o Sr. Eduardo José Coelho, e outro do Digno Par o Sr. Frederico Laranjo.

Pelo relato da sessão passada, em varios jornaes, teve conhecimento de que o Digno Par o Sr. Pereira e Cunha dissera n'essa occasião:: Não apoiado.

Procurou nas notas tachygraphicas se constava lá esta affirmação da parte de S. Exa., que é perfeitamente parlamentar e a que nada tinha que dizer, comquanto não costume usar d'ella. Das notas tachygraphicas não consta; mas como os jornaes deram publicidade a esse facto, e a um não apoiado nunca deixou de responder immediatamente, vae dizer o que diria se tivesse ouvido essas palavras. E vae dizer por que assim procede.

Comprehende-se que o apoiado é a confirmação do que diz o orador em todos os pontos das observações que faz; emquanto que o não apoiado é a excommunhão ex cathedra; e elle, orador, não acceita contestações ou ex-communhões d'esta natureza. Quando quer contestar, inscreve-se e contesta. Na sua humildade é este o seu proceder; mas, apesar da sua humildade, repete, não acceita excommunhões ex cathedra.

Portanto, se tivesse ouvido o áparte, que se não deu, porque não consta das notas tachygraphicas, perguntaria á Camara onde para a lei de imprensa de 1860, a lei mais liberal que sobre o assumpto tem havido, e que já soffreu não sabe quantas transformações.

Perguntaria onde estavam as notas diplomaticas trocadas com as nações estrangeiras, quando o nosso paiz foi convidado a acceitar uma legislação de excepção contra os internacionalistas, notas que devem ter a data de 1874 ou 1875 - cita de memoria, porque não teve occasião de verificar a data precisa - mas que existiram e fazem honra ao antigo partido regenerador.

Veja-se quanto estamos afastados d'essas notas, que abriam hospitalidade larga e ampla, comparadas com a situação restricta e amesquinhante que nos criou o decreto de 19 de setembro de 1902 e que elevou a quinto poder do Estado o Juizo de Instrucção Criminal.

Perguntaria onde é que está o Codigo Administrativo de 1878, que consignava todas aquellas liberdades que nós conhecemos, todos aquelles principios de descentralização applicaveis aos povos, hoje sujeitos a tutela deprimente que os opprime.

Os povos gozavam então de regalias que não mais usufruiram.

Pôde ter alguma comparação, qualquer que seja o ponto por que se encare esse codigo, com o que hoje existe, cheio de disposições bastardas, para se poderem empregar com a imprensa todas as mordaças?

Teria tambem patenteado a differença que existe entre o direito de reunião de hoje e o que se exercia nos bons tempos em que dirigia o partido regenerador Fontes Pereira de Mello, que nunca em toda a sua vida, apesar da procedencia que tinha, procedencia de militar, nunca, por via de regra, imprimiu sobre esse direito a mais leve sombra de auctoritarismo, não consentindo que nenhuma liberdade publica fosse amesquinhada ou diminuida.

Que diria elle, orador, em referencia ao decreto de 19 de abril de 1901, que diz respeito ás ordens religiosas em Portugal, se o quizesse pôr em confronto com as medidas de Joaquim Antonio de Aguiar?

Crê ter demonstrado em poucas palavras a grande differença que existe entre o nobre e velho partido regenerador e aquelle que tem actualmente por chefe o Sr. Conselheiro Hintze Ribeiro; e crê mais que não deixa a menor duvida sobre quão resistente e solida é a base em que assentaram as suas affirmações. Se tivesse ouvido o tal não apoiado que existiu para a imprensa, que d'isso deu noticia, teria logo mostrado que infelizmente a differença é manifesta e que o partido regenerador está hoje perfeitamente ao invés do que foi outr'ora, esse partido que tomou a iniciativa do Segundo Acto Addicional, que publicou uma lei eleitoral, liberrima entre as mais liberrimas, esse partido que viveu gloriosamente a começar de 1852 até ao passamento de Fontes, e vida que era digna de ter imitadores.

Quer ainda apontar outros materiaes, não de construcção, mas de derrocada do edificio do systema que nos rege, e assim, tendo-se já referido ao Juizo de Instrucção Criminal, vae apontar, ainda que perfunctoriamente, quanto esta instituição bastarda se oppõe a que as justiças ordinarias gozem das regalias e da amplidão que necessitam para o exercicio das suas funcções, e que sempre' sé tiveram, regalias que Fontes nunca diminuiu, como já teve occasião de dizer á Camara.

Admitte o Juizo de Instrucção Criminal, mas não juizo de excepção, porquê não quer excepções.