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N. 17

SESSÃO DE 4 DE MARÇO DE 1901

Presidencia do Exmo. Sr. Luiz Frederico de Bivar Comes da Costa

Secretarios - os Dignos Pares

Visconde de Athouguia
Luiz Antonio Rebello da Silva

Leitura e approvação da acta. - Não houve expediente. - O Digno Par Conde do Casal Ribeiro participa a constituição da com-missão de incompatibilidades, e propõe que alguns Dignos Pares sejam aggregados ás commissões de legislação e incompatibilidades. Estas propostas são approvadas. - O Digno Par Ferreira de Almeida faz algumas rectificações ao Summario da sessão antecedente, e advoga de novo a conveniencia do alargamento da Rua do Arsenal. - O Digno Par Conde de Mártens Ferrão indica a fórma que, segundo o seu modo de ver, melhor se presta á vulgarização dos folhetos do Sr. Trindade Coelho, intitulados Remedio Contra a Usura.

Ordem do dia: continuação da discussão do parecer n.º l, que releva o Governo da responsabilidade em que incorreu, promulgando providencias de caracter legislativo. - Usa da palavra o digno Par José Luciano de Castro, ao qual responde o Sr. Presidente do Conselho.

(Assistiram á sessão o Sr. Presidente ao Conselho, e os Srs. Ministros dós Negocios Estrangeiros e da Justiça).

Pelas duas horas e tres quartos da tarde, verificando-se a presença de 28 Dignos Pares, o Sr. Presidente declarou aberta a sessão.

Foi lida, e seguidamente approvada, a acta5 da sessão antecedente.

Não houve expediente.

O Sr. Conde do Casal Ribeiro: - Sr. Presidente: mando para a mesa a seguinte proposta:

"Proponho que seja aggregado á commissão de legislação o Digno Par Francisco Mattoso Corte Real.

Sala das sessões, 4 de fevereiro de 1901. = Conde do Casal Ribeiro".

Participo á Camara que está constituida a:; commissão de incompatibilidades, tendo escolhido para Presidente o Sr. Frederico Arouca e a mim para Secretario.

Por parte da mesma commissão mando para a mesa a seguinte propostas:

"Proponho, quê sejam aggregados á commissão de incompatibilidades os Dignos Pares Santos Viegas, Julio de Vilhena, Baima de Bastos e Visconde de Athouguia.

Sala das sessões, 4 de fevereiro de 1901. = Conde do Casal Ribeiro".

Estas duas propostas foram approvadas.

O Sr. Ferreira de Almeida: - Sr. Presidente: Bem quizera não fazer uso da palavra a miudo, mas em caso de força maior obriga-me a tratar de um assumpto que, a todos os respeitos considero gravissimo.

Quando na sessão passada fiz umas referencias á quês tão dos credores externos, apresentei umas declarações que o summario- official não reproduz com a precisa fidelidade, pelo que se tornam indispensaveis umas rectificações.

Diz esse summario:

"Causou-lhe impressão ver que de um lado,"e asseverava ter o país encargos para satisfazer um certo numero lê compromissos, e que do outro lado se afirmava precisamente o contrario".

Não disse encargos, mas sim recursos; e quando por lapso tivesse' empregado aquella palavra, que não empreguei a redacção tem o dever de fazer as correcções dispensaveis.

A seguir, no mesmo summario, encontra-se o seguinte:

"Pela sua parte entende que nós não devemos dar mais Io que está estabelecido na lei de 1893".

Disse muito clara e terminantemente que nós não podemos dar mais do que aquillo que está estabelecido na lei de 1893.

È o caso de dizer: Aliquando bónus dormitai Homerus.

Podem dormir os Srs. tachygraphos e os Srs. redactores ; mas não se admitte que adormeçam quando no Paramento se tratam e se discutem questões de alta importancia, e não se admitte que se attribuam aos oradores palavras que não pronunciaram, porque, como no caso presente, podem occasionar apreciações injustas e prejudiciaes para o país.

É muito a meu pesar que apresento estas observações que tratei de evitar, prevendo o que succederia, pedindo á Imprensa Nacional as provas do extracto, para rever, mas não consegui fazer a revisão, porque as notas tachygraphicas chegaram ali muito tarde.

Vou ainda fazer uma outra referencia, porque ninguem gosta de ser tido na conta de menos exacto.

Se o assumpto fosse de outra ordem, calar-me-hia; mas trata-se de um assumpto importante, qual é o do convenio com os credores externos.

Vou pois, fazer essa referencia, usando da maxima descrição.

Quando na sessão passada disse que o Digno Par José Luciano de Castro tinha feito uma certa affirmação que se me afigurou inconveniente, S. Exa. contestou e no summario, na parte em que o Digno Par figura responder ao Sr. Julio de Vilhena, vem o seguinte:

"Por ultimo tambem não disse que o país podia satisfazer os encargos a que o Sr. Julio de Vilhena se referiu, mas que se abstinha de discutir os calculos e as considerações de S. Exa., por julgar inopportuna essa tarefa".

Esta contestação não é tão completa e tão conveniente como devia ser, pois que uma cousa é dizer que não se avançou uma certa proposição, e outra é, para não dar margem a discussões, affirmar ciara, positiva e terminantemente, não a favor de um Governo, mas a favor do país e dos interesses de nós todos, que se não podem satisfazer outros compromissos, alem dos consignados na lei de 189$.

Dizer que não disse que pode, não é o mesmo que dizer, que não pode.

Se alguem quizer demonstrar que eu tinha ouvido mal, leia o extracto do Diario de Noticias do Popular e do Dia onde se encontra o que me pareceu ter ouvido. Não me surprehende este caso, nem mesmo o engano

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do summario, porque um jornal, fazendo o extracto do que disse acêrca do projecto do bill, alterou uma phrase que pertence ao Enrico, substituindo a palavra "Sallia" por "Golgotha", naturalmente porque o Digno Par o Sr. Julio de Vilhena se apresentou como redemptor, chamando para o seu lado, para os punir, num calvario politico, como auctores de um convenio inadmissivel, os Srs. Luciano de Castro e Espregueira.

Quanto ao lado que devem occupar cada um d'estes illustres inventores da salvação publica, por meio de emprestimos e maior encargo de juros, o Sr. Viihena lhes dirá, desde que elle, como novo salvador, os chama á responsabilidade dó que pretendiam fazer.

Estes desvarios de querer amparar uma situação financeira que nos arruina, por meio de emprestimos para pagar juros, que foi o processo que nos arruinou, faz-me lembrar aquella famosa sentença latina, Quos Deus vult perdere prius dementai, ora parece que estamos debaixo d'essa sentença, pois que todos estamos obedecendo a esta impulsão para o abysmo; e no fim de contas obedecemos positiva e claramente á evolução historica.

Hão houve povo que muito se dilatasse, que muito se desenvolvesse, que não caisse tanto mais profundamente quanto mais dilatada foi a sua acção.

Temos o imperio de Alexandre da Macedonia dilatando-se até ao Indus e desappareeendo para nunca mais surgir como Estado até nossos dias; o de Carlos Magno dividido ficando a menor parte na primitiva origem; a Grecia desapparecendo até nossos dias do mappa das nações, o imperio Romano substituido no seu Berço a Italia por pequenos Estados e só de nossos dias constituindo uma nação.

Dizem os homens da politica moderna que ha nações mortas e moribundas.

Eu estou convencido que nós vamos pelo caminho das moribundas, obedecendo á pressão historica, que havemos de desapparecer por não termos sabido conservar alguma parte das virtudes e energia dos nossos antepassados"

Isto é um facto tanto mais exacto, quanto temos exemplo frisante na nossa historia.

Nós fomos o país que mais se dilatou na conquista e na descoberta, e caimos nos braços da Hespanha, por nos enfraquecermos com tanta expansão!

Por seu turno a Hespanha, que reuniu o mais extenso dominio, por tal forma se enfraqueceu que não pode conservar-nos sob a sua auctoridade; e o seu esfacellamento chega até nossas dias, sem ficar com as antigas colonias como mercados, e voltando a contar quasi que apenas com o seu berço na Peninsula, com agitações e sobresaltos que parecem os de ultima agonia.

Devemos invocar a historia dos nossos maiores, e, inspirando-nos nella tratarmos de discutir e resolver as questões de alto interesse nacional com imparcialidade e bom senso.

Sr. Presidente: resta-me tratar um pequeno assumpto, visto que tenho o gosto de ver presente hoje entre nós o Digno Par, o Sr Conde de Restello, que, como sabemos, é Presidente da camara Municipal d'esta cidade.

S. Exa. disse ha dias que não havia dinheiro para os melhoramentos que propus. Louvo-me nas palavras de S. Exa., mas não posso deixar de dizer que, havendo dinheiro para a Avenida das Picoas, de Ressano Garcia, etc., onde ha muitas expropriações a fazer, parece-me que bem pode haver dinheiro para a obra do Arsenal, em que o Estado dá tudo, os edificios a demolir, e os terrenos.

Entretanto, emquanto se não resolve fazer uma obra que por tantos; titulos e urgencias se recommenda, bem podia a Camara Municipal de Lisboa aproveitar o ensejo de se ir montar k tracção electrica e exigir dal Companhia que entre o Polourinho e o Corpo Santo, ou apenas até á Travessa do Cotovello, houvesse uma só via como ha entre outras passagens estranguladas da cidade, como entre o Conde de Barão e o Gaz.

Assim a linha que vae do Arco Grande da Rua do Alecrim desemboca no Largo do Corpo Santo, podia seguir pela Travessa do Cotovello e desembocar na Rua do Arsenal e nesta rua haver uma só via encostada ao lado do Sul desde o Polourinho ao Corpo Santo, de fórma que todo o serviço vindo de Oeste entrasse na Rua do Arsenal pela Travessa do Cotovello por uma só via e todo o do Leste vindo do Polorinho se dividisse então no Largo do Corpo Santo.

Com uma só via americana na Rua do Arsenal passaria o restante leito da rua a servir para uma linha de carros em transito Leste Oeste e outra em sentido contrario.

Como o Governo tem actualmente a Camara Municipal sob a sua tutela, por isso lhe indico a conveniencia d'este melhoramento immediato, sem preterição da obra radical e principal da grande avenida dentro do Arsenal.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Far-se-ha a rectificação a que se referiu o Digno Par o Sr. Ferreira de Almeida; mas devo dizer que o empregado encarregado do extracto, é um funcionario muito zeloso, muito digno e cumpridor dos seus deveres, não sendo para estranhar que uma ou outra vez se dê qualquer lapso ou equivoco.

O Sr. Conde de Martens Ferrão: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, para me associar ao pedido que na sessão anterior fez ao Sr. Presidente do Conselho, o Digno Par o Sr. Visconde de Chancelleiros.

Indicou S. Exa. a conveniencia de serem lidos pelos regedores os folhetos de um digno magistrado, o Sr. Trindade Coelho, e que se intitulam, Remedio Contra a Usara.

Devo dizer que deposito muito pouca confiança na leitura feita pelos regedores, e por isso pedia ao Sr. Presidente do Conselho, se nisso não ha inconveniente, e de accordo com os respectivos prelados, que fossem encarregos os parochos de divulgarem, á hora da missa conventual, as idéas contidas nesse folheto.

Creio que esta leitura e a que pode ser feita ainda nas escolas, não trará inconvenientes, e antes vantagens apreciaveis.

Limito-me, portanto, a ampliar o pedido do Digno Par o Sr. Visconde de Chancelleiros.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do parecer n.° l, que releva o Groverno da responsabilidade em que incorreu, promulgando providencias de caracter legislativo

O Sr. José Luciano de Castro: - Chega-lhe a palavra tarde, embora a tivesse pedido no segundo dia da discussão d'este projecto. Não a pediu sobre a ordem, porque lhe repugna fazê-lo, com a certeza de ter de retirar, qualquer moção que apresente.

E, pois, com uma certa repugnancia, que entra no debate, já porque a Camara está fatigada, já porque sabe que não vae dar-lhe nenhuma novidade; mas, tendo tido a honra de presidir á situação transacta, mal visto seria, sem duvida, o seu silencio, tratando á dictadura de actos que pertencem á sua responsabilidade.

Poderia começar por se referir ao discurso do Digno .Par Ferreira de Almeida; mas parte principal d'esse discurso foi destinada a accusar o Governo actual por ter feito uma dictadura incompleta, isto é, por não ter ido essa, dictadura tão longe quanto S. Exa. entendia que devia ir.

E uma questão entre S. Exa. e o Sr. Presidente do Conselho.

Quanto a algumas das arguições do Digno Par Conde do Casal Ribeiro, dirá que raro é o Governo que não tenha feito dictadura em materia de cereaes.

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Tambem o Digno Par accusou o Governo passado pó: ter pedido ao Parlamento auctorizações para reformar alguns serviços publicos; mas observa que isso não é, come S. Exa. disse, uma dictadura disfarçada.

Continua, pois, a manter a sua reprovação absoluta sem reservas ás dictaduras, e só as admitte guando impostas por casos de salvação publica.

Afigura-se-lhe que S. Exa. foi injusto na apreciação da gerencia financeira do partido progressista, e entendo que não foram igualmente justos os calculos que o levaram a ter essa gerencia na conta de ruinosa, em relação do partido que; está actualmente representado no poder, Recorda o que se passou quando foi chamado a presidir á situação transacta.

Muitos dos seus amigos, e individuos de grande auctoridade, o aconselharam então a revogar em dictadura os actos illegaes quê os seus antecessores haviam praticado o par do Digno Par Conde do Casal Ribeiro, esse grand homem, esse indigne politico, esse convicto liberal, num livro em que assignalou as ultimas manifestações do seu enormissimo talento, Carta e Pariato, aconselhava-o a que apagasse, das paginas da legislação patria essas tres nodoas: reforma constitucional, reforma eleitoral e reforma administrativa.

Não acceitou os alvitres que lhe eram apresentados porque vinha no intuito de restabelecer o imperio da legalidade.

Quis que legalmente e parlamentarmente fossem substituidas essas leis, e assim apresentou no anno passado a reforma de alguns artigos da Carta, reforma que por uma votação de ambas as Camaras tinha sido considerada urgente, util e necessaria.

Sabe a Camara as scenas que então se passaram, e que bem triste e dolorosa impressão deixaram no seu espirito. Escravo das suas obrigações, levantou-se um dia do leito, onde o prendia a enfermidade, contra a qual luctou durante meses, e veiu á Camara defrontar-se com os seus adversarios e assumir perante ella a responsabilidade que lhe competia.

Não quer lembrar-se do que se passou nesse dia, que nunca deixará de considerar memoravel.

Veiu enfraquecido pela doença, e mal alliviado da febre que o flagellava, pedir aos seus adversarios que collaborassem com o Governo na reforma constitucional, e que apresentassem quaesquer emendas ou modificações que tendessem a melhorar uma lei tão importante.

Como disse, não quer lembrar-se das torturas moraes que lhe infligiram, mas nunca as esquecerá, como as não esquecerão os seus amigos politicos.

Então o partido regenerador declarou que tudo estava irrito e nullo, e protestou não reconhecer a obra das Camaras eleitas com poderes constituintes.

Caindo o Governo progressista, e assumindo o actual as rédeas da governação publica, todos suppuseram que S. Exas. vinham melosos de Governo constitucional; mas a breve trecho veiu a dictadura, não para acudir a imperiosas necessidas publicas, não para prover de remedio a qualquer mal que affligisse a nação, das unicamente para dar satisfação aos seus antigos correligionarios.

Accusam o orador de só ter publicado o Codigo Administrativo dias antes do Governo pedir a demissão.

Tem a observar que esse codigo não era mais do que a execução de umas bases a que o Parlamento havia assentido.

Não foi publicado antes porque o seu estado de saude o impedira de o elaborar com brevidade.

Pelo que respeita á convenção da Haya, porque é que o Governo não aproveitou os dias uteis que a prorogação das Cortes lhe proporcionava?

Quanto á base 17.ª não a discutirá; mas deplora a maneira por que o Sr. Ministro da Guerra se dirigiu ao Sr. Sebastião Telles.

Lamenta que o Sr. Ministro, em vez de discutir serenamente, recorresse a insinuações que, embora com ume certa correcção, não podiam deixar de maguar, senão o Sr. Sebastião Telles, pelo menos os amigos d'este Digno Par.

Entende que a reforma do Sr. Conselheiro Sebastião Telles, apesar da guerra intransigente que lhe moveram, ha de ficar como monumento do que podem a intelligencia, o trabalho e a firmeza de convicções.

Esperava ver demolida toda essa obra; mas o Ministerio actual, representante do partido que contra ella tão vivas baterias assestara, limitou-se a revogar unicamente a base 17.ª

Tambem não vem discutir a questão do notariado, e apenas aponta que o Governo deixou os notarios no exercicio das suas funcções até dezembro, o que demonstra que não tinha quaesquer duvidas acêrca da sua competencia e da sua seriedade.

Depois d'estas considerações chega a uma conclusão profundamente triste. Continuamos nesta vida de dictaduras, nesta vida extra-constitucional, continuamos a obedecer, não a imperiosas conveniencias publicas, mas á satisfação das necessidades politicas dos partidos; e o Parlamento só funcciona nas horas vagas d'essas dictaduras.

Seria talvez melhor resolver dictatorialmente todas as questões pendentes, visto que o país, embora desilludido, e num estado tranquillo de alma, se contenta em ir recebendo alguns melhoramentos de vez em quando.

Diligenciou sinceramente restaurar o systema parlamentar, as boas praxes constituoionaes; mas não o conseguiu.

Não sabe se terá forças para continuar nesse empenho vehementissimo, quando de mais a mais vê que o Governo não lida na resolução dos problemas que mais interessam ao país.

Recorda os áureos tempos do parlamentarismo, aquelle em que entrou na Camara com o Digno Par Visconde de Chancelleiros, e fazendo o confronto d'essa época com a actual, da-lhe vontade de chorar, ou de morrer, como dizia Alexandre Herculano.

Allude á ultima nomeação de Pares, e diz que nenhum outro Governo poderá viver com a actual Camara.

Pede ao Sr. Presidente do Conselho que governe, visto que em oito mezes nada fez em favor de questões importantissimas e de grande interesse publico, como são a questão vinicola, a financeira, a economica e a colonial, legando alem d'isso aos seus successores a questão religiosa, que era toda a parte é um perigo gravissimo, e no nosso país um forte elemento de perturbação de ordem, não só porque se agita nas das e nas praças publicas, mas tambem porque actua no dominio das consciencias.

Não quer crear difficuldades ao Governo, e só lhe pede que se compenetre da sua missão, e que a cumpra. (S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Hintze Ribeiro): - Duas impressões bem oppostas lhe produziram o discurso do illustre chefe do partido progressista.

Uma resulta da satisfação intima de ver o Digno Par restituido ás lides parlamentares.

Acompanhou-o sempre, com interesse de amigo, no longo periodo em que S. Exa. mal podia desempenhar-se dos seus deveres officiaes, e hoje, ao vê-lo de novo, na plenitude das suas faculdades de polemista, não occulta a sincera alegria que isso lhe causa.

A par d'isto, uma outra e bem opposta impressão de verdadeira magua, pelo desalento que S. Exa. expressou ao terminar o seu discurso, magua pelo país que conta no Digno Par um servidor antigo, o que o suppõe devotado aos interesses publicos, tanto no passado como no futuro.

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As palavras de desalento e de morbidez de espirito com que S. Exa. se apresenta, vem precisamente na occasião em que o Digno Par, chefe de um partido, mais precisava de alento, de vigor e de appellar, não parado passado, mas para o futuro, não para os que foram, não para os que morreram, más para os que podem prestar á causa nacional o seu esforço, o seu trabalho e a sua dedicação. Não fez o Digno Par, um bom serviço ao país, porque apresentando-se como se apresentou, mais parece uma tradição, do que uma garantia.

Mais quisera que o Digno Par tivesse proferido um discurso energico, cheio de calor; um discurso que provasse a nenhuma valia dos decretos dictatoriaes, a vi-lo desanimado, abatido, porque são prejudiciaes ao país essas manifestações de desalento, tanto mais provindo ellas de um homem que tem as responsabilidades de chefe de partido. Quem ouvisse o Digno Par, diria que S. Exa. tinha sido sempre um campeão intemerato e indefectivel da pureza do systema constitucional; havia de suppor que era um homem que pugnara constantemente pelo imperio das leis, que seguira sempre uma norma de procedimento correcto ; e, todavia, esse supposto paladino das regalias constitucionaes é o maior responsavel em materia de dictadura, pois que, num documento publico, veiu Declarar que promulgara um Codigo para servir interesses partidarios.

Já disse e repete que mais desejaria que S, Exa. em phrases vehementes, rasgasse os decretos que Constam do projecto em ordem do dia, do quê vê-lo cheio do desalento e de defecção, no momento em que é necessaria grande energia e vitalidade.

Lamenta que o Digno Par, em relação a responsabilidades politicas, fizesse um confronto que é de todo o ponto apaixonado e injusto.

S. Exa. veiu hoje recordar os actos do Ministerio de 1893, para apontar o momento em que ascendeu os Conselhos da Coroa; mas não disse que o Ministerio de 1893 caiu, depois de ter cumprido a sua missão, é depois de ter atravessado horas perigosas, horas difficeis, horas de amargura.

O Digno Par censurou a obra do Ministerio de 1893, appellidou de nódoas os actos que esse Governo praticou; mas, subindo ao poder, viveu com a reforma constitucional, com a reforma eleitoral e com a reforma administrativa decretadas em dictadura, sem nenhumas difficuldades.

Não sabe porque S. Exa. estranhou a revogação da reforma administrativa publicada dias antes de ter pedido a demissão ou no proprio dia em que a pedia, quando é certo que o partido d'elle? orador, nas declarações feitas no Parlamento affirmara não se conformar com o que nessa lei se preceituava.

É certo que as declarações dos partidos não teem força de lei, mas tem a força do dever, e valem muito perante a convicção e á obrigação moral de quem as apresenta.

Fez o Digno Par o elogio caloroso do seu antigo collega e amigo é Digno Par Sebastião Telles.

Não vae contrariar essa expansão de sentimento intimo nem desmerecer o conceito em que é tido o ex-Ministro da Guerra da situação transacta, a quem, aliás, sempre deu provas de muita deferencia e consideração; mas o Digno Par, que tanto estranhou a maneira por que o sr. Pimenta Pinto se defendeu das accusações que lhe foram dirigidas esqueceu-se do que se passou na commissão de quem d'esta Camara, e esqueceu-se tambem de que o partido regenerador declarou aqui que não discutia a reforma do exercito do Sr. Sebastião Telles, e que nem sequer assistia á discussão.

Depois d'esta declaração, e coherente com ella, suspendeu este Governo a base 17.ª

Era o que então immediatamente se impunha, mas queira Digno Par esperar pelas propostas do Sr. Ministro da Guerra, e então S. Exa. verá o que fica da obra do Digno sr. Sebastião Telles.

Quanto á reforma do notariado, diz que ella foi uma catadupa de empregos por cima de todos os apaniguados politicos, sem se conhecer da sua competencia, sem se indagar da sua seriedade.

Tratando-se de um assumpto que contendia com a sorte, com a riqueza e com o futuro de muitas familias, entendeu-se conveniente sujeitar os nomeados a um exame que lhes era feito por pessoa completamente insuspeita, e absolutamente arredada das paixões politicas, isto é, tratou de se investigar da sua capacidade.

Accusou o Digno Par o Governo por este não ter revivido ainda a questão vinicola; mas lembra-lhe que S. Exa., durante quatro annos, a deixou aggravar sucessivamente sem dar-lhe qualquer especie de solução.

Diz ainda o Digno Par que p Governo lega aos seus successores a questão religiosa.

Quaes foram os actos praticados por este Governo que deram logar á questão religiosa? Seja-lhe permittido dizer que é este um assumpto grave, e que bem merece a ponderação de todos os homens publicos, e sobretudo d'aquelles que, como o Digno Par, occupam na politica uma alta posição.

Parece-lhe que é uma questão bastante grave, cheia de perigos e de difficuldades, e á qual S. Exa. se não devia referir ao de leve.

Conclue, dizendo que as considerações do Digno Par não se harmonizam com o proposito que indicou de não crear difficuldades ao Governo.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - Ámanhã ha sessão, com a mesma ordem do dia.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e cinco minutos da tarde.

Dignos Pares presentes na sessão de 4 de março de 1901

Exmos. Srs.: Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa; Frederico de Gusmão Correia Arouca; Marquezes: de Penafiel, de Pombal, da Praia e de Monforte (Duarte); Condes: de Bertiandos, do Bomfim, de Cabral, do Casal Ribeiro, de Castello de Paiva, de Figueirô, de Lagoaça, de Margaride, de Martens Ferrão, de Monsaraz, do Restello, de Tarouca, de Valenças; Viscondes: de Asseca, de Athouguia, de Chancelleiros; Moraes Carvalho, Antonio de Azevedo, Antonio Candido, Oliveira Monteiro, Santos Viegas, Telles de Vasconcellos, Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Cau da Costa, Cypriano Jardim, Eduardo José Coelho, Elvino de Brito, Ernesto Hintze Ribeiro, Fernando Larcher, Francisco de Castro Mattoso, Ferreira do Amaral, Margiochi, Jacinto Candido, Baima de Bastos, D. João de Alarcão, Ferreira de Almeida, Moraes Sarmento, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano de Castro, Silveira Vianna, Abreu e Sousa, Julio de Vilhena, Rebello da Silva, Pessoa de Amorim, Bandeira Coelho, Miguel Dantas, Pedro Victor, Polycarpo Anjos, Sebastião Telles e Dantas Baracho.

O redactor = José Saraiva.

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