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N.º 31

SESSÃO DE 14 DE ABRIL DE 1896

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios — os dignos pares

Jeronymo da Cunha Pimentel
Visconde de Athouguia

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. — Não houve correspondencia. — O sr. presidente dá conta de que fora procurado por alguns redactores do Correio da manhã, que vieram agradecer aos dignos pares que representaram a camara no acto commemorativo do primeiro anniversario da morte de Pinheiro Chagas. — O digno par conde de Thomar insta pela remessa de uns documentos que pediu, e refere-se á expedição que se está organisando para ir á India. Responde ao digno par o sr. ministro da marinha. — O digno par Jeronymo Pimentel, por parte da commissão de fazenda, manda para a mesa dois pareceres, e em seguida requer que um d’elles entre em discussão. Approvado este requerimento, entra em discussão, e é approvado, o parecer que se refere ao projecto que augmenta os direitos dos óleos concretos e das vélas. — Continua a discussão, na generalidade, do parecer n.° 31. Usa da palavra o digno par Jeronymo Pimentel. É approvada a generalidade, os treze primeiros artigos e uma proposta de emenda apresentada pelo digno par Jeronymo Pimentel. É posto em discussão o artigo 14.° Usam da palavra o digno par Thomás Ribeiro, o sr. ministro da justiça e, pela segunda vez, o digno par Thomás Ribeiro. — O digno par conde de Lagoaça falla sobre o não preenchimento de uma vaga de lente cathedratico na faculdade de direito da universidade de Coimbra e sobre as questões da Lunda e da India. Respondem ao digno par os srs. ministros do reino e da marinha. — É lida uma mensagem vinda da outra camara. — Sobre o assumpto a que o digno par conde de Lagoaça se referiu, trocam-se ainda explicações entre o mesmo digno par e os srs. ministros da marinha e do reino. — Entra em discussão o parecer n.° 34. O digno par conde de Lagoaça requer que seja adiada a discussão d’este parecer. É rejeitado o requerimento e, continuando a discussão, usam da palavra o digno par conde de Thomar e o sr. ministro do reino. — É nomeada a deputação que tem de apresentar a Sua Magestade os autographos das leis ultimamente votadas. — Encerra-se a sessão e designa-se a immediata, bem como a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão ás tres horas e dez minutos da tarde, achando-se presentes 19 dignos pares.

Foi lida e approvada sem discussão a acta da sessão anterior.

Não houve correspondencia.

(Assistiram á sessão os srs. ministros do reino, da marinha e da justiça.)

O sr. Presidente: — Cumpre-me participar que alguns illustres membros da redacção do jornal Correio da manhã aqui estiveram hoje, encarregando-me de agradecer a assistencia dos dignos pares que representaram a camara no acto commemorativo do primeiro anniversario da morte de Pinheiro Chagas.

Tenho igualmente a participar que a commissão de redacção não fez alteração alguma ao projecto n.° 32, que hontem foi approvado.

Não houve correspondencia.

O sr. Conde de Thomar: — Sr. presidente, aproveito a presença do nobre ministro da marinha para perguntar a s. exa. se já foi remettida a esta camara copia dos telegrammas trocados entre o sr. visconde de Villa Nova de Ourem e o sr. ministro da marinha, e os telegrammas do sr. ministro da marinha ao governador geral da India, o sr. Raphael de Andrade.

Desejava saber se ha algum inconveniente em que essa copia seja mandada a esta camara; mas parece-me que é indispensavel esse documento para se apreciar devidamente o movimento que tem havido n’aquella colonia, e que dá logar a uma segunda expedição, a qual, segundo vejo nos jornaes, está tratando de se organisar para partir em breve.

Sobre este ponto permitta-me o nobre ministro da marinha que faça algumas considerações que me parecem importantes.

Effectivamente, o nosso exercito, até hoje, não se tem recusado, nas conjuncturas as mais criticas, a cumprir o seu dever, honrando assim a bandeira nacional nas suas longinquas possessões; mas não posso deixar de ponderar que não se póde estabelecer como principio, parece-me, que á primeira necessidade de serviço se destaque para as colonias parte do nosso exercito.

Alem de não pertencer aos nossos soldados esse serviço, parece-me que nas circumstancias actuaes, tendo a junta consultiva de saude declarado inficionado de cholera morbus o porto de Diu e suspeitos todos os portos da India, não é conveniente, nem prudente, mandar n’estas circumstancias uma segunda expedição á India.

Comprehende-se que desejem repatriar-se os soldados que fizeram parte da primeira expedição, por estarem mais ou menos extenuados em resultado do clima em que teem habitado, mas esses soldados estão, por assim dizer, já acclimados, e mais facilmente poderão resistir á invasão do cholera, do que aquelles que devem lá chegar exactamente quando o cholera estiver no seu auge.

São estas as perguntas que faço ao nobre ministro da marinha.

O sr. Ministro da Marinha (Jacinto Candido): — Pedi a palavra para responder ás perguntas do digno par, o sr. conde de Thomar.

Perguntou s. exa. se effectivamente se tratava de organisar uma segunda expedição á India, e se o governo podia adiar a ida d’essa expedição até que melhorassem as condições hygienicas n’aquella colonia.

Em primeiro logar dirá ao digno par que o governo não manda uma nova expedição á India, o que manda é uma força que julga necessaria e indispensavel para manter o nosso prestigio e a consolidação dos nossos dominios n’aquellas possessões.

O digno par sabe que um bando dó salteadores põe em risco a segurança de algumas povoações, e póde comprometter a tranquillidade publica. É exactamente para occorrer a essa situação que novas forças terão de partir para a India a substituir aquellas que lá estão.

Não é uma expedição militar para proseguimento de uma campanha, mas unicamente para serviço de segurança, indispensavel em seguida a uma situação violenta, como aquella que ali terminou agora.

Com relação ao estado sanitario, as informações officiaes que tem dizem que effectivamente no porto de Diu e de Damão se haviam manifestado alguns casos de cholera, como aliás é costume todos os annos n’esta estação e n’esta epocha. As precauções e medidas para o isolamento

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dos individuos atacados, haviam sido tomadas paio sr. infante D. Affonso, vice-rei da India, e não havia noticia nenhuma alarmante que podesse preoccupar o governo.

Deve ainda declarar que os receios que affligem o digno par, o sr. conde de Thomar, sobre o encargo ou onus pesado que se impunha ao soldado portuguez, para servir no ultramar, tão briosa e dignamente desmentidos pelo procedimento d’esses militares que, de toda a parte, quer ao ministerio da marinha, quer ao ministerio da guerra, affluem voluntariamente, para irem prestar serviço n’aquellas regiões.

Apraz-lhe consignar mais uma vez, por parte do governo, este testemunho de alto apreço pelo procedimento d’esses militares nas conjuncturas difficeis que o paiz tem atravessado, e que ainda reclamam urgentemente o valor dos seus serviços nas nossas possessões ultramarinas.

Portanto, da parte do governo, não ha proposito de impor ao soldado portuguez sacrificios de que elle não se desempenhe digna e briosamente; e por sua parte são elles que vem ao encontro do pensamento do governo, offerecendo-se espontaneamente para irem servir n’aquellas regiões.

Com relação aos telegrammas trocados entre o governo e os governadores da India, procurará satisfazer, com toda a urgencia, a requisição do digno par; e se o não tem feito ha mais tempo, não é por qualquer proposito, mas sim em consequencia da affluencia extraordinaria de serviço que ha na sua secretaria, e que o digno par poderá averiguar desde que esse assumpto preoccupe a sua attenção.

Se, porém, s. exa., ou qualquer outro digno par, não desejar aguardar a remessa d’esses documentos, que representam certo trabalho de secretaria, que muitas vezes não é compativel com a urgencia do serviço que ali ha, s. exa. querendo ir ao ministerio da marinha, de prompto terá á sua disposição todos os documentos que deseje examinar.

Isto não é querer privar s. exa. do direito de exigir esses documentos, é apenas acudir á urgencia com que s. exa. deseja vel-os.

Julga ter assim respondido ás considerações apresentadas pelo digno par, sr. conde de Thomar.

(O discurso será publicado quando s. exa. o devolver.)

O sr. Jeronymo Pimentel: — Mando para a mesa, por parte da commissão de fazenda, dois pareceres sobre projectos vindos da outra casa do parlamento.

O primeiro refere-se á concessão do edificio onde já de ha muito está installado o asylo de Barcellos: e o segundo a uma proposta do governo, apresentada e approvada hontem na outra camara.

Com relação a este assumpto, tenho que fazer um requerimento, e por isso peço licença para ler o parecer.

(Leu.)

Attendendo, pois, á urgencia do assumpto, requeiro a v. exa. sr. presidente, que consulte a camara sobre se o regimento, a fim de que este projecto entre já em discussão.

(O orador não reviu.)

Consultada a camara, resolveu afirmativamente.

É lido e entra em discussão parecer, que é do teor seguinte:

PARECER N.º 36

Senhores. — A proposta de lei n.° 5, uma das medidas financeiras que o governo apresentou na camara dos senhores deputados, e de que a vossa commissão tem conhecimento pelo relatorio e propostas de lei do sr. ministro da fazenda, que lhe foi distribuido, tem por objectivo impostos de fabricação e consumo.

Um dos productos que ella attingia era o sabão. Entendeu a commissão de fazenda d’aquella camara que, em logar de se tributar aquelle producto, devia antes o imposto incidir sobre os oleos vegetaes concretos que entram na sua fabricação, e sobre as velas de qualquer qualidade e forma para illuminação, de procedencia estrangeira.

Não discute a vossa commissão n’este momento a vantagem daquella alteração, nem tão pouco se manifesta sobre os outros impostos de fabricação e consumo, que fazem o assumpto d’aquella proposta de lei. Reserva-se para a apreciar devidamente, e para emittir o seu voto consciencioso e reflectido sobre a creação de novos impostos, ou augmento dos já existentes, quando vierem a esta camara as diversas propostas que constituem o plano financeiro do governo.

Mas como esta proposta de lei, de effeito transitorio, tem unicamente por fim acautelar os interesses da fazenda, evitando especulações que a podiam prejudicar, a vossa commissão não duvida emittir o seu parecer a ella favoravel.

Qualquer que seja o pensar desta camara sobre este e os outros impostos, não fica o seu voto compromettido com a approvação d’este projecto de lei.

A urgencia que se impunha ao governo para apresentar aquella proposta, é a mesma que se impõe a esta commissão para, á similhança do que ainda ha pouco se deu com relação ao assucar, aconselhar-vos que approveis este projecto de lei, para sem demora poder subir á sancção real.

Sala das sessões da commissão de fazenda, 14 de abril de 1896. = A. A. de Moraes Carvalho = Frederico Arouca = Gomes Lages = Jeronymo da Cunha, Pimentel, relator = Tem o voto do digno par: A. de Serpa Pimentel.

Projecto de lei

Artigo 1.° Pelas mercadorias abaixo designadas serão cobradas, no acto do despacho, a partir do dia da publicação d’esta lei no Diario do governo, as seguintes. taxas equivalentes ao imposto de fabricação estabelecido no projecto de lei respectivo.

Oleos concretos vegetaes, com excepção do oleo de palma, peso liquido — 8 réis por kilogramma.

Vélas, de qualquer qualidade e fórma, para illuminação, stearina em massa e productos analogos, podendo ser immediatamente empregados na formação de velas para illuminação — 30 róis por kilogramma.

Art. 2.° A cobrança d’estes impostos far-se-ha por deposito, até que as côrtes resolvam definitivamente sobre o referido projecto.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 13 de abril de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Motta Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

Ninguem pedindo a palavra, foi. approvado.

O sr. Presidente: — Se o digno par sr. conde de Lagoaça não se oppõe, continúa agora em debate o projecto de lei n.° 31 que hontem se discutiu na generalidade, em seguida ao que darei a palavra a s. exa. para realisar as suas interpellações ao governo.

Com o discurso do digno par sr. Telles de Vasconcellos ficou esgotada a inscripção.

O sr. Jeronymo Pimentel (relator): — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o digno par sr. Jeronymo Pimentel.

O sr. Jeronymo Pimentel (relator}: — Sr. presidente, como ao digno par sr. Telles de Vasconcellos respondeu hontem o sr. ministro da justiça, e s. exa. não adduziu, sobre a generalidade do projecto, novos argumentos, reservo-me para, na discussão da especialidade, se s. exa. tomar parte no debate, responder então a s. exa., fazendo as considerações que o discurso de s. exa. me suggerir.

(O orador não reviu.)

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Ninguem mais pedindo a palavra, é approvado, na generalidade o projecto de lei n.° 31, e entra em discussão na especialidade.

Não usando ninguem da palavra, são approvados os treze primeiros artigos do projecto, e a emenda apresentada pelo digno par Jeronymo Pimentel.

É posto em discussão o artigo 14.°

O sr. Thomás Ribeiro — Esperei que a votação chegasse ao fim, porque o que eu tenho a dizer não se refere propriamente ao projecto; refere-se, porém, a cousas de justiça; e como eu tenho pelo ministro da respectiva pasta uma grande consideração e amisade, e como elle faz favor de ouvir sempre com interesse ou com paciencia as minhas palavras, sabendo que nunca são ditas debalde, nem com ruins intenções, formularei sobre justiça um pedido a s. exa.; e vem a ser que, pois tem um coração excellente, uma alma justa e uma consciencia limpida, trate de averiguar o que se passa em varios tribunaes do reino, e nomeadamente em Lisboa, principalmente no que respeita á demora de sentenças, e até de meros despachos, aliás simplicissimos, durante mezes, durante annos, ás vezes muitos annos. Conheço muitos magistrados dignissimos aqui, e aprecio-os e respeito-os; quero mesmo crer que nem sempre é delles a culpa, mas dá-se o facto, e com assustadora frequencia. Justiça que não vem a tempo não é justiça.

Pertenço a uma comarca sertaneja, onde, posso asseverar, a justiça é perfeitamente feita e distribuida a tempo, conforme é preciso e justo.

Em geral é mais prompta e regular a justiça nos tribunaes das provincias. Talvez, tambem, não o desconheço, por haver lá menos trabalho, menos processos e menos incidentes.

Peço ao illustre ministro que proceda pelos meios ao seu alcance á averiguação d’estes factos; e não só pelo que se passa no civel onde muitas causas se eternisam. Ha muitos réus que continuam nas cadeias sem poderem sair de lá por falta, não d’elles, nem dos que advogam a sua justiça, se têem quem a advogue.

Eu bem sei que entre as leis sabias e boas que s. exa. tem,, ha uma, que prohibe aos juizes que eternisem as questões. Pois assevero ao sr. ministro que muitas questões se estão eternisando por falta de cumprimento dessa lei nos tribunaes de Lisboa e Porto, e sabe Deus mais de onde.

Faço estas observações sem animo de offensa a ninguem, e certo de que o sr. ministro da justiça gosta de que se faça justiça, e continuará n’esta parte a querer que a lei se execute, como é proprio da sua consciencia.

O sr. Ministro da Justiça (Azevedo Castello Branco): — Tomo sempre em toda a consideração as palavras do digno par, e em mais especial consideração tomarei aquellas que s. exa. acaba de proferir por se referirem a um assumpto tão. importante.

Não tenho conhecimento dos factos a que s. exa. alludiu; procurarei esclarecer-me, pedirei todas as informações que forem precisas, e adoptarei as providencias que couberem na minha competencia.

(O orador não reviu.}

O sr. Thomás Ribeiro: — Para eu dar a s. exa. informações cabaes, era preciso que assumisse o papel, que nunca esteve nem ha de estar no meu caracter, de denunciante.

Noticio os factos em geral. Podia apresentar alguns em especial. Não me atrevo a fazel-o, nem isso era proprio de mim. Indague s. exa., e juro-lhe que encontrará a verdade do que deixo affirmado.

É approvado o artigo 14.° do projecto.

O sr. Presidente: —Agora dou a palavra ao sr. conde de Lagoaça, e depois, se houver tempo, continuar-se-ha na ordem do dia.

O sr. Conde de Lagoaça: — Agradece, em primeiro logar, a presença dos nobres ministros que accederam ao seu convite.

Desejava fazer algumas considerações a s. exa. o sr. ministro do reino, a proposito do facto de não ser promovido a lente cathedratico da faculdade de direito o actual primeiro lente substituto d’essa faculdade, sr. dr. Guilherme Alves Moreira, que occupa esse logar, julga que ha seis ou sete mezes.

É costume, é de lei, e a lei até hoje nunca tinha sido contrariada, promover immediatamente ao logar de cathedratico o primeiro lente substituto, quando n’aquella primeira categoria se dava alguma vaga.

O sr. ministro do reino entende que não deve promover o sr. Alves Moreira a lente cathedratico, contrariando assim a lei e os usos.

Começará por ver se effectivamente s. exa. tem alguma rasão seria em que se funde para desprezar a lei e as praxes.

Dizem, e suppõe que é verdade, que o sr. Alves Moreira está filiado no partido republicano, tendo na sua direcção uma parte activa e importante, e tambem que é redactor de um jornal republicano que ali se publica.

Corre que é em consequencia disto que o nobre ministro do reino entende não dever promover o sr. Alves Moreira á categoria de lente cathedratico, conforme é de lei.

Não póde acreditar em similhante cousa.

Não lhe parece que este modo de proceder esteja no feitio e no caracter do nobre ministro do reino.

É o primeiro a concordar em que a obrigação do governo é defender as instituições, mantendo e levantando o seu prestigio; o primeiro a concordar nisto, e é assim que se procede em todos os paizes.

Costuma dizer o que sente, ser franco nas suas opiniões, e nunca tem receio de as expor.

Quaesquer medidas, pois, embora violentas, que o nobre ministro do reino empregue nesse sentido, para defender as instituições, têem o seu apoio.

Não pôde, porem, concordar n’este caso com o procedimento de s. exa., procedimento que não tem nenhum resultado pratico, que é absurdo e inutil, não realisa nenhum fim, e não deixa de ser uma illegalidade e violencia escusada.

O sr. Alves Moreira é primeiro lente substituto, e como tal está ha muito tempo regendo a sua cadeira.

A respectiva faculdade não póde saltar por cima d’elle nomeando para a cadeira que está regendo um substituto mais moderno.

Ora o facto de um lente da universidade estar filiado no partido republicano, fazendo propaganda a favor das idéas desse partido, quer pelos jornaes, quer como membro do directorio, e até mesmo pelos livros, esse facto com o qual não póde concordar, é que o sr. ministro podia evitar, applicando a lei, se a tem, e se a não tem apresentando ao parlamento uma proposta n’esse sentido! Estava plenamente no direito de o fazer e tinha o seu apoio.

Consentir, porém, que aquelle lente substituto continue na regencia effectiva da sua cadeira, não o promovendo a lente cathedratico, como a lei determina, simplesmente para que elle receba menos 20$000 ou 30$000 réis por mez, não lhe parece acto de justiça.

S. exa. é homem bastante energico, e julga-o capaz de demittir aquelle. professor se entendesse que elle era prejudicial aos seus alumnos como lente da universidade.

Deixar, porém, de promover aquelle lente, tirando-lhe, assim 30$000 réis por mez, a fim de ver se o reduz pela fome e se o converte ás suas idéas, parece-lhe uma grande violencia de s. exa., contra a qual não póde deixar de protestar.

Mas ha mais.

O sr. ministro do reino já, nomeou dois professores, re-

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publicanos convictos, e mais exaltados do que o dr. Alves Moreira: nomeou lente da faculdade de direito da universidade o doutor... Se s. exa. lhe dissesse o nome...

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Dr. Affonso Costa; sei o nome que v. exa. me pergunta, porque o li no Correio da noite.

O Orador: — E nomeou o professor do lyceu Gonçalves. Portanto, de duas uma: ou o dr. Alves Moreira já devia estar nomeado; ou, se .é inconveniente a sua permanencia na universidade e merece castigo por fazer no ensino propaganda republicana, nem como substituto lá deve estar.

E sobre este assumpto mais nada dirá por agora, aguardando a resposta do sr. ministro do reino.

Dirije-se agora ao sr. ministro da marinha e do ultramar. Deseja chamar a attenção de s. exa. para assumptos importantissimos, como são todos os que dizem respeito ás nossas colonias.

Na provincia de Angola, a nossa mais florescente possessão ultramarina actualmente, estão-se passando factos graves, segundo lhe consta. .. Custa-lhe a dizel-o, mas é preciso dizer tudo: ha quem attribua esses factos á inépcia, e á corrupção até, de meia duzia de empregados. Citam-se factos que podem comprometter o futuro dos nossos interesses na Africa, occidental, e esses factos ligam-se com a occupação da Lunda.

Não faz politica, e por isso dirá que o actual ministro da marinha não tem responsabilidade pessoal na organisação da expedição nem na nomeação do respectivo pessoal, embora s. exa. ao entrar para o ministerio acceitasse a responsabilidade dos seus collegas que, como ministros, eram solidarios n’essa occasião.

Todos sabem que ha solidariedade e solidariedade, e, digam o que disserem, o facto é que o nobre ministro da marinha não organisou a expedição nem nomeou o pessoal, de modo que está desembaraçado para proceder com toda a energia.

A expedição da Lunda está custando rios de dinheiro. Sabe de fonte auctorisada que já está em 200 contos de réis, havendo requisições do commandante da expedição, não só para o governo de Angola como para o governo da metropole que, se forem satisfeitas, excederão 200 contos de réis.

Pergunta ao sr. ministro da marinha:

São precisos tantos sacrificios para a occupação da Lunda?

É este o ponto capital.

Não será a expedição actualmente organisada, debaixo do commando que tem, uma expedição de especulação espectaculosa para servir interesses particulares com os quaes se arruina o thesouro e abate o prestigio da nação?

Julga que não erra se affirmar que sim, e é para este ponto que chama principalmente a attenção do sr. ministro da marinha.

Antes dos jornaes se referirem a esta questão, elle já tinha, como disse, apontamentos de fonte auctorisada como o póde provar.

A maneira como foi organisada a expedição é phantastica; o preço de varies objectos é extraordinario. A historia dos pantometros, a que se refere o Correio da noite, é verdadeira. Vendera-se ha casa Ferin a 3 e 4 libras, e foram adquiridos a sessenta e setenta e tantos mil réis.

Os carros para 03 transportes a mesma cousa, por grandes preços.

Despezas com carregadores 75 contos de réis, fugindo a maior parte d’elles com as mercadorias.

Diz-se que ha uma especie de circulo vicioso. Os carregadores fogem com as mercadorias e vão, segundo se diz, vendel-as ás feitorias proximas ao itinerario da expedição; mas como é preciso fazer novos fornecimentos, essas mesmas mercadorias tornam a ser compradas e, portanto, são pagas pelo estado duas vezes, pelo menos.

De maneira que ha uma certa combinação entre alguem do pessoal da expedição e os donos das feitorias; porque os carregadores nunca são apanhados, e na expedição ha parentes até dos donos de algumas feitorias.

Isto é gravissimo, e pede ao, sr. ministro da marinha que indague sobre a veracidade d’estes boatos e ponha termo a todos os abusos que existem, pois não se póde consentir que os interesses da nação estejam á mercê de quaesquer especuladores.

E para que é que a expedição foi tão longe, a pontos tão afastados do nucleo do novo districto?

Para que se gastou tanto com o caminho de ferro e com transportes por meio de carregadores?

Muitas cousas mais poderia mencionar,, mas parecer-lhe que estas são bastante para merecerem a attenção e zêlo do sr. ministro.

Não gosta de fazer mal a ninguem, mas no desempenho da sua missão de membro do parlamento, tem o dever de pugnar pelos interesses do estado e da nação, não podendo, portanto, deixar de ser, por vezes, desagradavel a alguem.

Cumpre um dever, portanto, aconselhando o sr. ministro a investigar aonde está o busilis.

Duzentos e tantos contos que se gastaram já com a occupação da Lunda, esses não podem voltar, mas póde-se evitar o desperdicio de mais 200 ou 300.

O actual chefe do districto, que já tinha estado na Lunda, publicou cinco ou seis volumes, quando voltou á Europa, todos encarecendo os seus serviços. Dizia que tinha lá tudo preparado para o bom exito, e fazia valer a sua influencia ali mais do que a do sr. João Franco em Guimarães.

Tinha removido todos os obstaculos para que ali nos instalássemos. Foi para lá á frente d’esta expedição, e está-se vendo o contrario.

Tudo isto está reclamando seriamente a solicitude do sr. ministro da marinha. Espero da sua energia e do seu caracter que alguma cousa faça em bem do paiz. S. exa. é um homem novo, tem futuro, não deve querer passar por essas cadeiras, como tantos outros, sem nada ter feito de util, nem de bom.

Seja s. exa. recto e energico e terá prestado um serviço ao seu paiz.

Visto que está com a palavra, permitta-lhe s. exa. que lhe peça que mande a esta camara, com a maxima urgencia, os documentos que pediu pelo ministerio da marinha, ha já bastante tempo, o relatorio do sr. visconde de Villa Nova de Ourem, quando governador geral da India, e ainda outros documentos que requereu ha cinco ou seis dias, relativos á compra do Thermopylas e de outros navios.

Não ha aqui senão dois ou tres benemeritos da opposição, portanto não é justo que não satisfaçam esses requerimentos.

Quer ser amigo do governo, não se quer zangar, mas hão de fazer-lhe as vontades e mandar-lhe os documentos.

Com respeito á nomeação do sr. Neves Ferreira deseja perguntar a s. exa. se effectivamente o sr. Neves Ferreira foi para a Índia unicamente para fazer um tratado de extradição e delimitação de fronteiras com o governo da India ingleza, e n’este caso nada tem a dizer, porque isso corre pelo ministerio dos negocios estrangeiros, ou se é verdade o que por ahi se diz que o sr. Neves Ferreira foi com o fim de substituir o Serenissimo Senhor Infante D. Affonso no governo da India.

É isto o que desejava saber, reservando o direito de fazer quaesquer outras considerações na occasião que julgar mais opportuna.

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(O discurso será publicado na integra quando o orador devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Pede a palavra para responder ao digno par, o sr. conde de Lagoaça, o mais breve possivel, não só pelo adiantado da hora, como por lhe não parecer necessario o alongar-se em largas considerações.

O digno par classificou de illegalidade o facto de não ter sido preenchida uma vacatura de lente cathedratico da universidade de Coimbra.

Quando o digno par lhe mostrar a lei que o obriga a preencher essa vacatura, dentro de um determinado praso, ou ainda qualquer outra, terá então rasão para dizer que esse direito foi desacatado Até lá ha de sustentar que ao governo cabe o direito de preencher as vacaturas na occasião que julgar mais conveniente.

O governo só é responsavel pela fórma como faz esse preenchimento e nada mais.

Nenhum motivo pessoal tem contra o cavalheiro a que s. exa. se referiu, que não conhece. Procedeu agora da mesma fórma por que tem sempre procedido, como por. exemplo, no supremo tribunal administrativo, onde existe uma vacatura ha perto de dois annos, e que até hoje ainda não foi preenchida.

(O discurso será publicado quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Marinha (Jacinto Candido): — O digno par começou o seu discurso por chamar a attenção do governo para a provincia de Angola, uma das que mais beneficios .tem trazido á metropole durante a difficil crise que temos atravessado, sendo licito esperar ainda de futuro. maior auxilio, acudindo-se-lhe com medidas de administração necessarias ao seu desenvolvimento.

Deve dizer ao digno par que tem dispensado toda a sua attenção para a administração, das nossas possessões ultramarinas, e com relação á provincia de Angola têem-se tomado diversas providencias, que bem attestam a solicitude do governo para o seu desenvolvimento.

Em resposta a este ponto do discurso do digno, par, para não fatigar a attenção da camara, dirá resumidamente que todas as questões que dizem respeito a administração ultramarina, quer em relação ás pautas aduaneiras da provincia de Angola, quer em relação ao regimen monetario, pessoal aduaneiro e fiscal, pessoal das contribuições directas, systema tributario, foram commettidos ao exame e ao estudo de uma commissão especial, de cuja competencia é demonstração evidente o nome dos individuos que a compõem.

Não se póde lembrar de todos os nomes, mas o digno par terá occasião de os ver, querendo, no Diario do governo.

Todos estes assumptos teem merecido a particular attenção do governo.

Ainda ultimamente se deram alguns factos, chama para isso a attenção do digno par, reveladores da maneira como se procede na administração da provincia de Angola.

Esta provincia foi pacificada e a colonia militar estendeu-se até ao meridiano 23°, desdobrando-se em postos, militares.

Estes feitos são de grande alcance e é com o maior prazer que os communica á camara.

A propaganda feita pela missão .do Espirito Santo n’aquella provincia, internando-se no sertão, tem sido poderoso auxilio para n’um praso relativamente curto attingirmos os limites da nossa fronteira.

Com relação ao assumpto especial para que o digno par chamou a attenção do governo, a occupação da Lunda, a accusação do digno par é tudo que ha de mais vago. Ora, elle não póde proceder em virtude de accusações vagas e indeterminadas. O que póde é dar conta a s. exa. das instrucções dirigidas ha mais de um mez pelo governador geral de Angola ao commandante da expedição, sobre o procedimento a seguir na occupação da Lunda, instrucções dadas de accordo com as que foram por elle mandadas ao sr.. conselheiro Álvaro Ferreira, e que se podem resumir assim: Occupação gradual. Que não prosiga na occupação de novos postos. Que, no caso de ser preciso retire os postos actuaes. Que formule um plano. Que não effectue despeza que não seja auctorisada pelo governador geral. Que proceda com economia e prudencia.

De accordo com estas instrucções, o sr. conselheiro Alvaro Ferreira, funccionario digno da maior consideração, pelo seu elevado caracter, inconcussa probidade, intelligencia e zêlo pelo serviço publico, officiou ao commandante da expedição, dizendo-lhe a que elle vae passar a ler a camara.

(Leu.}

Este officio tem a data de 7 de março, já vê o digno par que ha mais de um mez que o governador geral de Angola o expediu ao governador da Lunda.

Do que o digno par póde estar certo e descansado é que nem elle nem nenhum membro do gabinete deixará de cumprir com os principios que até agora tem orientado o governo para a boa administração publica.

Ha de ser inflexivel e justo na applicação da lei, mas para isso terá de proceder moderada e correctamente.

Não se deixará levar por asserções vagas e infundadas, das desde que haja factos demonstrados e provados, póde s. exa. estar certo que não lhe faltará energia para zelai-os interesses do paiz.

Parece-lhe ter respondido ao digno par sobre as considerações genericas feitas, sobre a fórma como foi organisada a expedição á Lunda. Agora responderá com respeito ás rasões que houve para se fazer a occupação neste momento.

As instrucções dadas, ao governador de Angola são de molde a fazer recair sobre este funccionario, que nos merece toda a consideração pela sua honrada administração, a responsabilidade perante o governo, pela fórma como foi realisada a occupação, e isto é a mais segura garantia de que se ha de fazer tudo sem prejuizo para o thesouro e em harmonia com os interesses do paiz.

Não quer concluir sem dizer ao digno par que a occupação da Lunda, embora tenha causado sacrificios ao thesouro, não se podia adiar, impunha-se não só por causa dos interesses da provincia de Angola, como o demonstra um parecer da junta consultiva do ultramar, mas ainda por causa da ambição dos povos vizinhos. Assume a inteira e completa responsabilidade d’esta occupação, embora não fosse ministro quando ella foi determinada.

Parece-lhe que estas considerações devem satisfazer o digno par quanto á provincia de Angola. Quanto aos velhos navios a que s. exa. se referiu, dirá que os documentos requeridos por s. exa. não tem vindo, não por falta de consideração por s.. exa., nem por descuido ou porque tenha prestado menos attenção a este assumpto, mas pela rasão $e que o expediente naquella secretaria tende a augmentar de dia para dia. S. exa. tem á sua disposição o seu gabinete onde lhe mostrará todos os documentos sobre a acquisição d’esses navios, que, digam o que disserem as criticas, representam, n’um caso, a satisfação de uma imperiosa exigencia da educação naval, n’outro, um acto de administração que se ufana de considerar na sua pequenez e no seu caracter caseiro de um altissimo alcance.

(Q discurso do sr. ministro publicar-se-ha na integra, revistas por s. exa. as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: — Vae dar-se conta de uma mensagem que veiu da outra camara.

Foi lida a mensagem que acompanha a proposição de lei que tem por fim auctorisar a camara municipal de Guimarães a contrahir um emprestimo de 31 contos de réis com applicação a melhoramentos concelhios.

O sr. Conde d§ Lagoaça: — Não o satisfez absolu-

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tamente a resposta do nobre ministro do reino relativa ao incidente da universidade.

Naturalmente s. exa. tem rasão no que diz, comtudo parece-lhe que o governo não tem direito de conservar em aberto as vagas que se dão nos differentes cargos de serviço publico.

Esses logares são precisos para o bom desempenho dos serviços ou não o são?

No primeiro caso, preencham-se as vagas, se não são precisos acabem com elles.

Deixar as vagas indefinidamente em aberto é que não póde ser.

Bem sabe que tem sido este o processo usado por s. exa. e por todo o governo, e igualmente o sabem todos os seus amigos e adversarios. Um digno par, que infelizmente não vê presente, porque a doença o traz afastado desta casa, até já chrismou a ordem d’esses pretendentes em ordem dos enfreiados.

Quer dizer, andam como os ursos, com o freio no beiço... e pelo beiço os vae levando... o domador.

Ora, isto seria muito bom para se dar como rasão entre amigos, mas á camara dos pares parece-lhe forte.

Ou os logares são precisos e se preenchem, ou não são precisos e se acaba com elles, fazendo-se uma economia.

Sabe que s. exa. tem uma vaga no supremo tribunal administrativo aberta ha dois annos, mas não a devia ter, porque o serviço accumula-se e vae pesar sobre os outros empregados daquelle tribunal, quando podia ser dividido por outro que não está lá.

Ora, realmente, se o serviço se faz muito bem só com os actuaes empregados, então supprima s. exa. aquelle logar e não tenha a vaga dois annos em aberto.

Acabe com ella, não nomeando ninguem para a preencher.

O facto de s. exa. ter uma vaga em aberto no supremo tribunal administrativo não auctorisa a continuação do seu procedimento.

S. exa. no seu ministerio póde ter as que quizer, e nos serviços dependentes d’elle, mas nas escolas superiores, sobretudo como a universidade não póde ser.

Esteve lá dez annos, mas nunca viu um facto d’esta ordem.

O sr. ministro do reino adduziu como rasão ao seu procedimento, que o governo é que sabe quando convem preencher qualquer vaga, e que o faz quando quer, porque não ha lei que o obrigue a fazel o logo que ella se dá.

Que quer dizer isto?

Pois então a lei é feita para se promover qualquer individuo passados seis ou dez mezes?

Porque se não promove logo?

Talvez a lei não o diga claramente, porque nunca se suppoz que viria um ministro que quizesse as cousas d’esta maneira, mas o intuito da lei é obrigar o ministro do reino a promover logo, a não ser que haja uma rasão extraordinaria de ordem publica, que n’este caso não existe.

Sabe que s. exa. não procura com isso satisfazer qualquer capricho pessoal.

Tem pelo sr. ministro do reino muita consideração, muito respeito, muita amisade até, mas permitta-lhe que lhe diga que tem obrigação de dar ao parlamento satisfação dos seus actos, de não se esconder atrás da sua vontade omnipotente, de dar, emfim, rasões sérias; essa não é seria.

S. exa. não terá por elle muita consideração, porque elle é nove, não tem pratica dos negocios publicos e não occupa uma alta posição politica; mas tenha consideração pela camara que tambem ouve essas rasões.

O governo não tem que dar satisfações? Tem tal.

Se ás vezes, num pequeno serviço dependente de uma repartição de qualquer ministerio, se dá uma vaga que se póde deixar de preencher durante algum tempo, na universidade de Coimbra não se póde dar o caso com um lente. Aquelles logares nunca foram considerados assim; os individuos que os exercem teem uma certa categoria e mereceram sempre da parte dos poderes publicos muita consideração. Quando não ha qualquer motivo que justifique demora na promoção, na primeira occasiao promovem-se.

Agora que se dá um intervallo de seis, sete ou oito mezes, occorre perguntar a rasão d’isso, que nunca se fez.

S. exa. póde justificar o facto como entender, mas, francamente, quando não quizesse dizer a verdade, o seu muito engenho devia inventar argumento que estivesse á altura de s. exa.

Pois bem, a camara fica sciente, e elle varre a sua testada.

A respeito das considerações feitas pelo nobre ministro da marinha vê com prazer que effectivamente s. exa., como era de esperar, já se tinha occupado do assumpto.

Acho boas as instrucções que s. exa. acaba de ler, mas, se é verdade tudo quanto se deprehende das affirmações que fez, o governador geral de Angola ou o commandante da expedição não cumpriu as instrucções que tinham sido dadas pelo sr. ministro.

Isso é um caso grave, e, por consequencia, depois do aviso que fica feito, s. exa. deve informar-se immediatamente.

O facto de não trazer elle para aqui um depoimento completo ácerca desse assumpto, não é rasão para que o sr. ministro fique n’um dulce far niente á espera dos acontecimentos.

Mande s. exa. perguntar muito terminantemente o que ha a esse respeito e proceda.

Elle se fosse commandante d’essa expedição não ficava já muito satisfeito; é por isso que não serve para empregos publicos.

O que parece certo é que os saques sobre a provincia de Angola já não tinham conto.

Consta-lhe que têem havido saques para Lisboa, mas que não foram acceites.

Pede, pois, ao nobre ministro da marinha que attenda a estes factos.

A obrigação de s. exa. é telegraphar para lá e informar-se para proceder com energia. Se não fizer assim, s. exa. chamará sobre a sua cabeça uma grande responsabilidade.

A respeito dos elogios que s. exa. fez ao sr. governador geral de Angola nada tem a oppor. Mal conhece esse funccionario e apenas lhe fallou uma vez em S. Thomé, quando passava para ir occupar o seu posto em Loanda. Pareceu-lhe um homem intelligente e sympathico, e, segundo ouviu dizer, é um empregado honesto e muito zeloso.

É a proposito contará um facto, que foi muito commentado, e para o qual chama a attenção do sr. ministro do reino, porque se relaciona com a politica do seu ministerio. . ...

A camara municipal de Loanda é toda composta de republicanos.

É uma cousa curiosa, sobretudo para quem conhece as nossas cousas no ultramar.

Quer que as eleições se façam com inteira liberdade, mas deve dizer ao nobre ministro da marinha que o governador geral de Angola, apesar da sua muita honestidade e da sua muita intelligencia e zêlo pelo serviço, é um pouco falto de energia.

A ultima eleição que se fez em Loanda deu em resultado uma camara composta de vereadores republicanos.

Este caso é grave e chamo para elle a attenção do governo.

O sr. ministro da marinha nada lhe respondeu com relação ao sr. Neves Ferreira.

A respeito de concessões no ultramar, s. exa. apresentou ao parlamento uma proposta de lei que ha de ser discutida a seu tempo.

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Desejava saber se a sua proposta terá ou não effeito retroactivo e se applica ou não ás concessões já feitas.

A respeito de concessões o governo não tem trabalhado muito certo. Dá concessões, depois veiu o decreto da dictadura, e todos sabem o que aconteceu.

(O discurso será publicado quando o digno par o devolver.}

O sr. Ministro da Marinha (Jacinto Candido): — V. exa. dá-me licença?

A proposta que foi presente ao parlamento é absolutamente independente de outra qualquer sobre o assumpto, é uma proposta de lei que tende a regular as concessões a fazer, proposta que ha de passar por esta camara e que os dignos pares terão de apreciar.

O Orador: — Perfeitamente. É o que eu desejava saber.

A proposta é para as concessões que se fizerem.

Tenho dito.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Pediu a palavra, simplesmente porque não quer que o digno par sr. conde de Lagoaça, que já poz em duvida a muita consideração que elle tem por s. exa., não só como membro d’esta camara, como tambem pelas suas qualidades pessoaes, visse na falta de resposta uma qualquer cousa que accentuasse essa duvida.

S. exa. accusou de illegal a demora que tem havido em preencher a vacatura na faculdade de direito da universidade de Coimbra; e elle disse a s. exa. que a sua accusação era verdadeira, desde que s. exa. indicasse qual a lei que marca praso para o preenchimento de vacaturas.

Como sabe que essa lei não existe, sustentou então que ao poder executivo cabia o direito de escolher a opportunidade para preencher os logares que vão vagando nos differentes serviços publicos, tendo em attenção não só os interesses do mesmo serviço publico, mas tambem as circumstancias que por acaso aconselhem o preenchimento immediato de qualquer vacatura.

Acrescentou mais, que d’esse direito teem feito uso todos os governos; e para mostrar que não tinha interesse nenhum pessoal com a demora no preenchimento da vaga na faculdade de direito da universidade, referiu-se a factos occorridos, mesmo no meu ministerio, em relação a outros logares.

Disse o digno par sr. conde de Lagoaça, que esses logares ou são ou não precisos. Se são precisos, devem ser preenchidos; se o não são, devem ser supprimidos.

Sómente o digno par esqueceu-se de que, quer em relação ao tribunal administrativo, quer em relação á universidade, ha substitutos que são encarregados, emquanto as vacaturas não são preenchidas, de exercerem esses logares. Tanto em um como em outro caso, lá estão os substitutos, e, portanto, nenhum prejuizo ha para o serviço na demora que tem havido no preenchimento d’aquellas vacaturas, em logares que não podem ser supprimidos, e que são tão necessarios, que os substitutos estão exercendo-os.

Posto isto, o sr. conde de Lagoaça ou outro qualquer digno par, que imparcialmente queira ver esta questão, não póde deixar de reconhecer que não póde ser accusado de illegalidade o facto do não preenchimento da vacatura, e que a responsabilidade do governo só começa desde o momento em que se preenche o logar vago. Se a decisão do governo for conforme com o direito e a justiça, o digno par fica silencioso; se pelo contrario, a solução do governo, na consciencia e intelligencia do digno par, for uma illegalidade ou denegação da justiça, o governo merece então censura, cousa que até agora não tem havido.

(O discurso será publicado quando o orador devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Conde de Lagoaça: — Será talvez demais tornar a insistir sobre este assumpto, mas, francamente, o sr. ministro do reino está n’uma posição falsa.

Tenha s. exa. paciencia, se acaso não corre tudo á medida dos seus desejos; mas se o illustre ministro tem direito de dizer o que quizer, os pares tambem têem o direito de contrariar as suas affirmações.

Não ha paridade onde s. exa. a quiz ver. Uma cousa é a vaga no supremo tribunal administrativo, outra cousa é a vaga na faculdade de direito da universidade de Coimbra.

Se ha uma vaga no supremo tribunal administrativo, illustre ministro nomeia quem quizer para essa vaga; não póde fazer o mesmo para a universidade, porque ali ha preterição de direitos.

É certo que na lei não está a obrigação restricta de o governo preencher immediatamente uma vacatura, no mesmo dia em que morrer um lente; mas, evidentemente, só quem é cego — e appella para s. exa., sr. presidente, que é um magistrado distinctissimo — que de certo vê que ha, de facto, uma preterição de direitos no não preenchimento da vaga.

Então, quando morre o lente cathedratico, o primeiro lente substituto não tem direito a ser promovido?

O caso apresentado por s. exa. não se parece absolutamente nada. O primeiro lente substituto em questão, desde que se deu uma vaga na categoria de lente cathedratico, adquiriu ipso facto direito a ser nomeado para preencher essa vaga. Por consequencia, o sr. ministro do reino, demorando a nomeação sem dar a rasão d’isso, não promovendo o dr. Alves Moreira, pretere o direito que elle adquiriu pela morte do lente cathedratico.

É este, portanto, um facto extraordinario, que só se justifica por uma rasão extraordinaria: o sr. ministro não quer.

(O discurso será publicado quando o digno par o devolver.)

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Isto é um dize tu, direi eu; mas, emfim, desde que o digno par insiste nas suas afirmativas, não póde deixar de contestar.

S. exa. diz que se dá uma preterição de direito, porque um primeiro lente substituto não foi nomeado para um logar de lente cathedratico, que continua vago. S. exa. até invocou a opinião do presidente d’esta camara como illustrado jurisconsulto.

Appello tambem para s. exa., para que diga se quando se dá uma vaga de juiz de direito de l.ª classe não se tem estado muitissimas vezes seis e nove mezes sem que seja feita a promoção.

Estes são os habitos da nossa administração. Desde que isto é assim, desde que não ha lei que obrigue o governo, fazer a nomeação em praso fixo, desde que não se dá prejuizo do serviço publico, o digno par não tem nada a dizer; só lhe cabe o direito de criticar os actos do governo, quando não forem praticados em conformidade com a lei.

(O discurso será publicado quando s. exa. o devolver.)

O sr. Presidente: — Continua a ordem do dia. Vae entrar em discussão o parecer n.° 34, approvando o co-digo administrativo.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

PARECER N.° 34

Senhores.—A reforma administrativa, decretada em 2 de março de 1895, e de que a vossa commissão se vae occupar, foi uma das mais importantes providencias promulgadas durante o periodo em que o governo assumiu funcções legislativas.

A sua importancia dimana não só da natureza do assumpto, porque diz respeito a importantes interesses sociaes que entram no ambito das instituições administrati-

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vás, mas ainda das alterações que se operaram com aquella reforma no modo de ser d’essas instituições.

Sendo a administração um dos dois braços que constituem a vida e acção do poder executivo, e por meio do qual se congregam os interesses privados para os conjugar e harmonisar com os publicos, todas as reformas que modifiquem os principios por que se regem as instituições administrativas, o mechanismo e exercicio dos serviços publicos, a sua hierarchia e organisação interna, são sempre de um grande alcance, e exercem uma poderosa influencia nas condições do paiz a que se applicam.

A administração aperfeiçoa e completa as instituições politicas, porque, como diz Bonin, é um poder que ordena, corrige e melhora o que existe; é o governo em acção, define-a ainda Vivien; o estado personificado para o regimen de seus proprios interesses; o poder vigilante que suppre todos os outros, que lhes imprime o movimento, que dirige os negocios geraes e interfere, como tutor, na gerencia dos negocios locaes; a providencia humana collocada no ponto culminante da ordem social, para de ali abranger o complexo das necessidades publicas e procurar os meios de as satisfazer.

É ainda o estimulo e o incentivo para a vida local, deixando a esta a gerencia dos negocios que lhe são proprios e que se referem aos seus peculiares interesses, mas estabelecendo as regras a que se devem subordinar esses interesses, de modo a que não se prejudique a unidade, e se assegure a ordem publica e a harmonia nas reciprocas relações entre os cidadãos e o estado, que a este cumpre manter.

N’esta dualidade de fins, n’este empenho em conciliar o interesse individual com o interesse geral, e na complexidade dos meios para e conseguir está a alta importancia do poder administrativo. É por isso que todas as reformas nas suas instituições têem sempre um elevado alcance.

Em todos os tempos e em todos os povos, ainda quando a confusão dos poderes baralhava e amalgamava em instituições informes e indefinidas, direitos, interesses, legislação e costumes, mereceu sempre especial attenção tudo o que se referia ao que mais ou menos se podia chamar a administração politica e civil.

Da amplitude das suas attribuições confundidas, que muitas vezes um só poder abraçava na sua omnipotencia, destacavam-se aquellas que mais directamente se ligavam com os interesses locaes, com as garantias dos cidadãos, com a salvaguarda das liberdades que os povos gosavam consoante as idéas de então.

Para o conseguir, para arrancar ao poder, que centralisava toda a acção, alguma parcella de administração propria; para a subtrahir um pouco á pesada tutella que as mais das vezes se confundia com um atroz despotismo, quantas luctas se não travaram com energia e pertinacia!

D’essas luctas, e por vezes tambem de mutuas concessões, foram nascendo as instituições administrativas, rudimentares, imperfeitas, confusas na variedade e diversidade das suas faculdades, mas em todo o caso affirmando uma individualidade, que, embora mal definida, já representava algumas garantias.

Desde o municipalismo romano, que, invadindo a peninsula iberica, não pôde ser completamente esmagado pelo dominio arabico, até aos concelhos perfeitos ou imperfeitos dos primeiros tempos da nossa nacionalidade, nós encontrámos aqui a affirmação d’essas instituições constituindo uma derivação do poder administrativo.

Não se coadunam com a indole d’este parecer as investigações historicas sobre a origem e desenvolvimento da administração no nosso paiz.

Partamos, por isso, de um ponto mais approximado de nós no tempo e na affinidade de circumstancias politicas, para filiarmos a reforma que hoje occupa a nossa attenção.

Antes do regimen constitucional a jurisdicção administrativa achava-se confundida com a ordinaria, ou entregue a tribunaes extraordinarios. A nova constituição politica dividindo os diversos poderes do estado consagrou a sua mutua e inteira independencia. D’ahi a necessidade de definir e descriminar o poder administrativo decretando o modo da sua organisação.

Assim já o tinha reconhecido a camara dos deputados na sua proposição de lei de 26 de março de 1827, que se limitara apenas a desenvolver as bases com relação á administração municipal, lançadas nos artigos 133.° a 135.° da carta constitucional de 1826.

A camara dos pares achou-o, tão diminuto que não preenchia os seus fins, resolvendo não o adoptar.

Das circumstancias difficeis em que se encontrou o paiz, envolvido em accesa guerra civil, resultou que as primeiras tentativas para a nossa organisação administrativa, sairam deficientes, precipitadas e destoantes das verdadeiras necessidades da administração.

Como prova d’isto temos o decreto de 16 de maio de 1832, o primeiro diploma legal destinado a organisar em novas bases a administração publica. A necessidade de o reformar veiu reconhecel-a a lei de 18 de julho de 1835, que modificou muitas das suas disposições.

O codigo de 31 de dezembro de 1836, que já representa um melhoramento na organisação administrativa, resente-se do prurido de legislar e reformar que se apoderou da situação politica d’aquella epocha.

Depois, varias providencias legislativas se decretaram no intuito de reformar o que mais carecia de alteração, e de attender a deficiencias e lacunas na nossa legislação administrativa. Entre outras, como mais completa, podemos indicar a lei de 29 de outubro de 1840.

Mas a reforma mais larga e mais methodica veiu trazel-a o codigo de 1842. Podem accusal-o de nimiamente centralisadòr, como reflexo das idéas conservadoras em politica e em administração que então vigoravam, mas não se lhe póde negar um grande valor, em que se revela o alto merito de quem nelle cooperou. Unidade de pensamento, harmonia de disposições, methodo na organisação, conhecimento das condições do paiz e das necessidades da administração n’aquella epocha, constituiam o seu legitimo titulo, e davam-lhe verdadeiramente o caracter de um codigo.

A prova do seu merecimento está no facto significativo de que, tendo-se operado uma grande transformação em todos os ramos da legislação patria, civil, penal, fiscal, economica e de processo, aquelle codigo vigorou por trinta e seis annos.

Muitas e importantes tentativas se fizeram para o substituir; umas ficaram sepultadas nos ar chi vos parlamentares, e duas chegaram a ser decretadas; a de 1867, approvada pelo poder legislativo, e a de 1870, promulgada em dictadura.

Succedeu-lhe o codigo de 1878, revelação do espirito profundamente liberal do estadista que o referendou. O seu elevado pensamento era crear a vida local; estabelecer o governo do povo pelo povo; entregar aos corpos electivos a gestão dos seus interesses; educar e preparar os cidadãos para a administração geral do estado; alliviar o governo central de tutelar interesses, cuja defeza lhe parecia melhor confiada a corporações locaes, nascidas do suffragio popular.

A experiencia de oito annos veiu mostrar que a nação não estava ainda em condições de uma emancipação tão completa, e que a liberdade tão ampla que se deu á administração local trouxera abusos, que era mister corrigir.

Os que applaudiram com enthusiasmo aquelle passo tão avantajado no caminho da descentralisação, tiveram de reconhecer o seu erro, e de lamentar excessos que ella produziu na vida local.

A liberdade illimitada concedida aos corpos adminis-

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trativos para lançar impostos, tanto directos, addicionaes ás contribuições do estado, como indirectos sobre os generos de consumo, produziu a desordem na administração financeira dos municipios e das parochias, e até graves inconvenientes para a fazenda publica, que tinha de procurar na mesma fonte os recursos para as urgencias do estado.

Á vossa commissão pertence quem, tendo dupla responsabilidade pelo seu concurso para a approvação d’aquelle codigo, mais uma vez hoje publicamente se penitenceia dos applausos sinceros com que o acolheu.

Louvaveis eram os intuitos do ministro que tomou a iniciativa d’aquella reforma, e dos que o auxiliaram na sua realisação, que julgaram util e opportuna.

«O bem commum, dizia o auctor do decreto de 16 de maio de 1832, exige que os cidadãos regulem por si os cães. interesses locaes, porque são domésticos e de familia; e o legislador não póde, como elles, estar tanto ao alcance do que lhes convem. Se o governo não vigia esse direito, estabelece a divisão e a escravidão pessoal; se o usurpa, adopta como principio o despotismo.»

Estas palavras do insigne Mousinho da Silveira, exprimem resumidamente, a idéa do poder administrativo. O codigo de 1878, baseando-se n’ellas, deu larga acção á vida local; declinou nas juntas geraes, e nas suas commissões executivas uma grande parte das funcções tutelares, que d’antes a lei reservava ao poder central.

O principio era incontestavel no campo das theorias do direito administrativo; mas a experiencia veio mostrar que ainda era cedo de mais para tão larga descentralisação.

O codigo de 1886, que o veio substituir, cortou em parte as demasias a que dava logar a ampla liberdade tributaria, que o anterior concedia aos corpos administrativos, e que era o principal objectivo das reclamações que contra elle se levantaram.

Fixou o maximo dos impostos addicionaes aos do estado, quer directos, quer indirectos, e preceituou a coordenação de uma pauta da tabella de generos de consumo que podiam ser tributados, e do maximo da imposição que comportavam.

A fórma por que organisou os tribunaes do contencioso administrativo da l.ª instancia, levantara desde logo reclamações da opinião, que lhes attribuiam um vicio de origem. Era o recrutamento dos juizes nos candidatos á magistratura judicial, e a sua passagem para esta magistratura depois de transitarem pelos tribunaes administrativos.

Dava-se assim ingresso numa magistratura especial a candidatos que, por muito que fosse o seu merecimento, não tinham adquirido para ella habilitações especiaes.

Se lhes tinha faltado o tirocinio proprio para a judicatura administrativa, não alcançavam no exercicio desta nem habilitações mais solidas, nem a pratica mais conveniente e mais adequada á magistratura judicial, para onde depois passavam.

Broglie insurgia-se contra a idéa de se ir recrutar aquelles juizes á magistratura judicial, dizendo que ella era uma idéa desgraçada e até grosseira, que levava ou á destruição do governo representativo, ou á degradação da justiça, conforme o lado para onde se fizesse pender a balança.

Conservando algumas instituições que a opinião não favoneava, e que na verdade nem tinham largas tradições a recommendal-as, nem serviços que garantissem a sua conservação, o codigo de 1886 estava pedindo muitas modificações.

O decreto de 6 de agosto de 1892 algumas operou, mas com essa vantagem para a administração, trouxe o inconveniente de ser radical em alguns pontos, como com relação ás juntas de parochia.

As justificadas reclamações que, principalmente nesta parte, provocou em todo o paiz; e a necessidade de completar algumas das alterações que elle trouxe ao regimen da administração local, eram só por si motivo sufficiente para se proceder a uma revisão da nossa legislação administrativa.

Mas não era só isso. Ha muito que a urgencia de se reconstituir a circumscripção municipal, sobre bases mais largas, se impunha á consideração dos poderes publicos. A grande desigualdade na area e na população de muitos concelhos, a pequenez de muitos a que escaceavam recursos para satisfazer as mais imperiosas necessidades da administração, e a falta de pessoal habilitado e bastante para o desempenho dos diversos cargos, estavam reclamando uma remodelação na circumscripção municipal.

Todos o reconheciam, mas nem todos tinham a necessaria coragem para arcar com as difficuldades e superar as resistencias que naturalmente haviam de levantar interesses feridos, preconceitos creados, e até vaidades locaes.

Estava na convicção de todos que a suppressão de alguns concelhos, que pela sua limitada area, diminuta população e deficiencia de recursos de toda a ordem, não podiam subsistir, era o primeiro passo a dar no caminho de uma reforma sensata nas nossas instituições administrativas.

Alguns o tentaram fazer, mas ou passaram pela decepção de ver a sua obra destruida, ainda antes de executada, como aconteceu á reforma de 1867, ou tiveram de ceder diante das resistencias que previram, como se deu com o projecto do codigo de 1878, que propunha que a circumscripção dos concelhos fosse igual á das comarcas judiciaes.

Á iniciativa illustrada e fecunda do actual ministro da pasta do reino não faltava, para levar a cabo aquelle commettimento, a coragem bastante que dão as grandes convicções, que levam, sem comprometter os interesses da ordem publica, a não sacrificar as suas idéas á velleidade de governar sem attritos.

Conheceu que era chegado o momento historico de realisar o pensamento de muitos, favorecido pela opinião imparcial, imposto pelas necessidades da administração, mas frustrado diante da falta de energia para o pôr em execução.

Bem sabemos que é empreza difficil destruir com um rasgo de penna a autonomia de muitos concelhos, que teem no seu brazão, aureolado pelas tradições de seculos, o symbolo das suas franquias, conquistadas muitas vezes á custa de luctas e resistencias.

Mas a historia, por muito larga que seja, e por muito gloriosa que se apresente, não é só por si titulo bastante para garantir uma existencia cortada de dificuldades, atrophiada no desenvolvimento do seu organismo, definhando-se á mingoa de elementos vivificadores.

Vive quem tem condições de vida; quem tem os recursos que exigem as circumstancias do meio em que se vive.

Póde e deve desapparecer do mappa topographico, ou da divisão administrativa um concelho, que não tenha elementos para acompanhar o progresso moral e material na sua constante evolução.

Acaba uma individualidade politica ou uma collectividade administrativa; mas as tradições que a glorificavam não morrem. Lá ficam os homens, herdeiros dos que ganharam os trophéus que nobilitavam o seu brazão municipal, para se ufanarem das glorias dos seus avós, ou dos feitos da sua terra. A suppressão de um concelho não importa a suppressão da sua historia.

O sr. ministro do reino não foi tão longe como Passos Manuel, que em 1836 decretou a hecatombe de 466 concelhos dos 817 que existiam.

No dizer d’aquelle estadista as furias da centralisação e do despotismo eram as pequenas localidades sem elementos de vida e desenvolvimento.

Mas a fórma como procedeu o sr. ministro do reino, a prudencia com que andou, a justiça com que supprimiu os concelhos que não podiam existir, manifesta-se na insigni-

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ficante resistencia que nos povos encontrou aquella medida, sempre precursora de perturbações e luctas.

Não podia o codigo decretar desde logo a suppressão de qualquer concelho, ou fazer qualquer alteração nas circumscripções administrativas. Era trabalho que demandava informações e exigia toda a circumspecção e vagar.

Nas diversas reformas que se tem operado na divisão territorial, quer administrativa, quer judicial, nunca se fizeram no mesmo diploma que as decretou, as alterações a que deram logar.

Foi sempre o poder executivo auctorisado a fazel-as em diploma diverso. No codigo administrativo de 1836, decretado em dictadura por iniciativa de Passos Manuel, lá vem no artigo 3.° essa auctorisação.

O mesmo se dá em outras leis, entre as quaes podemos citar a lei de 29 de maio de 1843, que deu ao governo faculdade para poder reduzir os districtos e alterar ou mudar as cabeças dos concelhos, quando o interesse dos povos assim o pedisse,; o decreto de 31 de dezembro de 1853, a lei de 26 de julho de 1850, o codigo administrativo de 1867, etc.

Acceitou o projecto, que discutimos, a disposição do decreto de 6 de agosto de 1892, que extinguiu as juntas geraes. Ninguem lamentou essa extincção; tão desnecessaria era aquella instituição administrativa que a legislação constitucional havia creado.

Depois do que pouco a pouco havia sido subtraindo á sua acção; depois que o governo lhes tirou a viação districtal e os serviços agricolas; e entregou ás camaras municipaes a administração dos expostos e creanças desvalidas; depois de outras perdas nas suas attribuições, a conservação das juntas geraes não se justificava. A sua suppressão, sem em cousa alguma prejudicar o funccionamento regular da vida administrativa, trazia para os povos o allivio de pesados encargos que d’ellas dimanavam.

Uma parte das suas attribuições, que convinha conservar passaram para as commissões districtaes.

Esta entidade, pela nova reforma, não tem exactamente a mesma organisação e as mesmas attribuições, que lhe conferia o codigo de 1878, onde pela primeira vez appareceram, nem o codigo de 1886, nem mesmo o decreto de 6 de agosto de 1892.

Com relação a este, as alterações mais importantes consistem na presidencia dada ao governador civil, em fazer parte d’ella o auditor administrativo, e em reduzir a tres o numero dos vogaes eleitos.

A presidencia conferida ao delegado do poder central, talvez pareça uma interferencia muito directa daquelle poder no exercicio da tutela que é confiada a este corpo administrativo.

O illustrado auctor do codigo de 1886. que teve por base a proposta de lei apresentada por elle ao parlamento em 1880 não pôde occultar os seus louvaveis desejos de entregar a presidencia daquellas commissões ao representante do governo.

Citava no relatorio que a precedeu os exemplos da Belgica da Italia e da Hespanha, onde os agentes do poder executivo são dellas presidentes. Reconhecia a difficuldade de evitar conflictos entre os representantes do poder central e os do districto, e apontava até como prudente o proceder dos legisladores francezes, que dispozeram que áquellas commissões presidissem os mais velhos, embora não fossem os mais insignes em meritos, ou os mais assimalados por serviços. E a rasão, dava-a aquelle relatorio, a que nos estamos referindo, era para que o presidente não escurecesse, ou assombrasse o prestigio e competencia dos representantes do poder central.

Apesar disso, não teve coragem para o decretar, talvez com o receio de apodarem a sua reforma d@ menos liberal.

A presidencia do governador civil serve de garantia para que as corporações tuteladas não abusem das faculdades, que a lei lhes confere no exerci cio da sua administração, com prejuizo dos interesses publicos, e dos proprios interesses locaes. Equilibra quaesquer complacencias dos representantes do districto em acceder a deliberações menos convenientes das estações tuteladas.

A interferencia do auditor administrativo nas resoluções da commissão districtal, dá a estas uma abonação de mais acerto, quando se ventilarem questões de jurisprudencia, que elle, pela sua competencia profissional, tem obrigação de elucidar.

Mas nenhum d’estes magistrados, nem o governador civil, nem o auditor, exercem só por si acto algum de tutela.

N’esta parte a nova reforma representa um progresso com relação ao codigo de 1886, não só tornando isentas de tutela muitas deliberações da camara, que aquelle lhe sujeitava, mas ainda subtrahindo á tutela do governador civil muitos actos, que anteriormente estavam a ella exclusivamente subordinados. Os emprestimos em determinadas circumstancias, a suspensão de deliberações dos corpos administrativos, os assumptos relativos a cemiterios, os regulamentos para a cobrança de impostos e outros actos, eram dependentes da exclusiva tutela do governador civil.

Emquanto o codigo de 1886 sujeitava á tutela todas as deliberações camararias designadas como provisorias, a presente reforma reduz de vinte e cinco a dez as deliberações que ficam d’ella dependentes.

As commissões districtaes não exercem sómente funccões tutelares; pertence-lhes tambem uma parte do contencioso administrativo.

A fórma por que elle fica organisado, não satisfaz completamente a vossa commissão, como de certo não satisfez o sr. ministro do reino, que se viu forçado a sacrificar o seu pensamento á questão da economia. Em todo o caso, fica; sendo uma instituição harmonica, logica e racional.

É a primeira vez que no codigo administrativo se mencionam as attribuições da instancia superior do contencioso administrativo, e a fórma do processo a seguir ali.

Na verdade, nenhuma rasão havia que justificasse aquella mutilação. Tratar do contencioso na primeira instancia, e nada dizer a respeito da instancia superior, era uma lacuna incomprehensivel.

Até agora, nenhum accordão do supremo tribunal administrativo era executorio sem a homologação do governo, salvo o caso determinado na lei de 6 de maio de 1878, pelo que respeitava ás decisões sobre a eleição da commissão do recenseamento.

Boas rasões justificavam esta doutrina, que exigia a intervenção do poder executivo para tornar executorias KS decisões dos tribunaes administrativos. Diz Chaveau Adolphe que «a competencia e a jurisdicção administrativa não devera ser consideradas senão como derivações necessarias do poder executivo, que eleve sempre ser chamado a invalidar ou a confirmar o que em seu nome foi julgado, a menos que uma lei disponha o contrario».

O projecto, que relatâmos, tambem neste ponto deu mais garantias e isenções ás resoluções do tribunal superior, tornando a sua execução independente da confirmação do governo.

Depois das commissões districtaes, segue-se naturalmente fallar das camaras municipaes, que são os corpos administrativos dos concelhos.

São estes pelo projecto de l.ª e de 2.ª ordem, visto que a commissão da camara dos senhores deputados acabou com os concelhos de 3.ª ordem, que o decreto de 2 de março tinha organisado,

Achâmos boa aquella modificação. Aquelles concelhos não tinham realmente muita rasão de ser. Tinham ficado de certo na primitiva reforma como uma contemporisação, transigencia desculpavel com os povos aferrados á idéa da sua autonomia. Os municipios classificados n’aquella

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ordem, se teem alguns elementos de vida mais desafogada,, com os recursos para satisfazer as exigencias da administração, devem ficar na 2.ª ordem, de contrario a sua extincção é uma consequencia lógica das suas condições.

Na organisação das camaras municipaes a mais importante alteração foi acabar com o principio da representação das minorias.

Podia ella ainda admittir-se nos corpos politicos, onde tem cabimento a representação de todas as idéas que constituem o lemma dos partidos organisados. Nos corpos administrativos, cuja indole é diversa, não tem rasão de ser a sua adopção, mormente num paiz onde não ha escolas com principios definidos em administração, que estejam identificadas com os partidos politicos.

A experiencia de quasi dez annos tem mostrado que nenhum resultado proficuo se tirou para a administração local da representação das minorias. Em geral não tem sido ellas um elemento de fiscalisação para os actos menos convenientes das corporações, administrativas, corrigindo as suas demasias e os seus erros de administração.

Ou tem sido um estorvo ao regular andamento dos negocios da administração local, quando inspiradas pelo espirito de facciosismo politico, ou um elemento de má administração pelas transacções na partilha dos favores com que reciprocamente se contemplavam.

Entendeu o projecto que, nos municipios que o governo subsidia mais largamente, devia este interferir na escolha do presidente, tirado de entre os vereadores eleitos. Nada mais acertado. E não foi uma idéa nova entre nós, e que não esteja adoptada n’outros paizes mais genericamente.

O sr. Braamcamp, na sua proposta de 4 de fevereiro de 1863, ainda estendia mais aquella disposição, e o mesmo propunha Almeida Garrett na seu projecto de reforma administrativa de 1854.

As juntas de parochia, segundo o decreto de 6 de agosto, ficaram collocadas n’uma situação difficil. Comprehendia-se a sua extincção; era ao menos uma medida radical. Mas determinar-lhes encargos, e não lhes deixar nenhuns recursos para os satisfazer, era uma cousa incomprehensivel. Tornar o parocho membro nato da junta, e negar-lhe a presidencia, nem era lógico, nem era digno.

A nova reforma obstou áquelles contrasensos, não só chamando á presidencia o parocho, como dando áquelles corpos administrativos attribuições e recursos, pondo, porem, um limite ás suas faculdades tributarias.

Pelo que respeita á parte eleitoral, de pequena importancia foram as alterações que este codigo fez no que estava anteriormente prescripto.

Na parte que se refere ás attribuições dos magistrados e empregados administrativos ficaram mais methodicamente classificadas, transportando-se para aqui algumas disposições que andavam dispersas por outros diplomas, embora algumas tivessem mais cabimento n’um codigo de processo administrativo, se porventura o tivessemos.

No que respeita á tutela das irmandades, confrarias e instituições de piedade e beneficencia, introduziram-se tambem ali providencias, que estavam disseminadas, e que completam assim aquella parte do codigo.

Com relação ás auctoridades, magistrados ou funccionarios administrativos, restabeleceu no artigo 431.° a doutrina que, por muito tempo, vigorou na nossa legislação, com assentimento de espiritos muito liberaes, á similhança do que se estatuia na legislação de outros paizes.

Referímo-nos á garantia dada áquellas auctoridades ou funccionarios de não poderem ser demandados criminalmente por faltas relativas ás suas funcções, sem previa auctorisação do governo.

Logo na primeiro codigo administrativo que tivemos, o de 1836, devido á iniciativa do espirito liberal de [...]Manuel, apparece aquella garantia[...] latitude, porque o seu artigo 216.° não permittia sequer que fossem demandados civilmente, sem aquella previa auctorisação. Do codigo de 1836 passou para o de 1842, e a reforma de 1867 manteve aquella garantia para os processos criminaes.

O proprio sr. Dias Ferreira, que foi o primeiro que acabou, com ella no seu decreto de 1870, dizia num jornal de jurisprudencia da sua responsabilidade, que o espirito da lei estabelecendo-a, foi livrar a administração da intervenção do poder judicial na apreciação dos seus actos, e obstar a que este muitas vezes processasse os empregados subalternos do governo por actos que elles tivessem praticado por ordem do mesmo governo.

Acrescentava ainda aquelle jornal, da redacção deste distincto jurisconsulto e homem de estado, que aquella excepção não foi estabelecida no interesse dos individuos, mas a favor da sociedade e do governo representativo, que tem como um dos seus principaes dogmas a divisão e a independencia dos diversos poderes politicos.

É por isso que sustentava que aquella garantia se devia estender a todos os funccionarios que estivessem nas mesmas condições d’aquelles, desde o escrivão da administração do concelho até aos reitores dos lyceus.

Aquella garantia estava tambem estabelecida em diversas leis a favor de outros empregados, como, por exemplo, para os empregados da alfandega municipal de Lisboa pelo artigo 13.° do decreto de 20 de setembro de 1861.

As auctoridades e os funccionarios administrativos não podem estar sujeitos aos caprichos da politica e ás malquerenças dos prejudicados pelas exigencias da administração, que por qualquer futilidade lhes instaurem um processo crime, que embora não tenha as consequencias de um procedimento penal, tem pelo menos o inconveniente, e não pequeno, de os encommodar, vexar e desprestigiar diante da opinião do povo, que ás vezes se deixa impressionar mais pelas apparencias, que pela realidade das cousas.

Demais, haverá por acaso um ministro que em face de um processo, onde os factos estejam certificados pelo corpo de delicto, se recuse a dar a auctorisação pedida pelo poder judicial para o processo seguir!

Rodrigues Sampaio, durante muitos annos que foi ministro, durante a vigencia do codigo de 1842 nunca recusou aquella auctorisação.

D. Manuel Colmero, distincto jurisconsulto hespanhol, diz: «Se se concedesse ao poder judicial, sem nenhuma restricção, a faculdade de julgar os agentes administrativos, teria indirectamente conhecido dos actos da administração, e desta maneira lançar-se-ia a perturbação na harmonia constitucional, e destruir-se-ia a independencia reciproca dos poderes».

A opinião do sabio jurisconsulto estava traduzida na legislação daquelle paiz, onde pela lei de 2 de abril de 1845 e decreto de 27 de março de 1850 se exigia a auctorisação do governador da provincia para demandar os empregados que lhe eram dependentes, e auctorisação previa do ministro da governação para poderem ser demandados os governadores.

Na França já existia aquella garantia para os empregados administrativos na constituição politica no seu artigo 75 ° e ali se conservou através a evolução por que passou aquelle paiz em tão largo numero de annos.

A reforma que estamos apreciando, fixa os casos em que póde haver recurso dos actos do governo para o supremo tribunal administrativo.

A jurisprudencia estabelecida por aquelle tribunal depois da sua reforma de 1886, alargando os casos em esses recursos podiam ser recebidos, não se podia deduzir do decreto de 29 de julho, que reorganisou o tribunal, nem do regulamento de 25 de novembro do mesmo anno, que determinou o processo a seguir.

Mas como se justificava essa latitude? Com as disposições dos §§ 2.° e 3.° do artigo 5.°, que dizem competir

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áquelle tribunal conhecer das reclamações contra actos e decisões das auctoridades administrativas, que offenderem direitos adquiridos, etc., e das reclamações por excesso de poder e competencia, contra as decisões ou actos de quaesquer auctoridades administrativas.

Pretende-se, pois. incluir os actos do governo no termo generico dos actos das auctoridades administrativas. Não se podia racionalmente entender que a expressão «auctoridades administrativas» abrangesse o governo.

Quando vigorava o regulamento d’aquelle tribunal de 9 de janeiro de 1850, apesar de ser mais generico o seu modo de dizer no artigo 44.°, nunca se lhe deu aquella interpretação.

José Silvestre Ribeiro, cuja competencia em assumptos administrativos era reconhecida por todos, emittiu uma vez a opinião de que, eo vista dos termos genericos daquelle artigo 44.° do regulamento de 1850, se poderiam admittir recursos de todos os actos do governo em materia contenciosa, mas declarou logo que aquella opinião a emittia como escriptor independente, sem comprometter o seu modo de julgar como membro do supremo tribunal administrativo.

D. Fernando Mellado, illustrado publicista hespanhol, diz que «não póde existir o contencioso administrativo para os actos do governo; este significa o cumprimento da vida social, e debaixo d’este aspecto ha de ter poder discricionario para cumprir o seu fim, sendo essa limitação a responsabilidade ministerial e administrativa».

Em Hespanha é a lei de 13 de setembro de 1888, que regula os assumptos do contencioso administrativo, mas o artigo 48.° d’essa lei abre a porta, em nome das rasões do interesse publico, para se escaparem á jurisdição do tribunal muitos negocios governamentaes, impondo apenas ao governo a obrigação de dar conta ás côrtes das rasões do seu proceder.

Não se coadunam com a indole de um simples parecer d’esta commissão mais largas explanações sobre assumptos tão vastos e complexos como os que entram na esphera da administração.

O conhecimento que tendes d’esta reforma, já em execução ha mais de um anno, dispensa-nos de por mais tempo nos occuparmos das suas disposições.

Cumpre-nos apenas dar-vos conhecimento das modificações por que ella passou na outra camara, já na commissão que o relatou, já durante a discussão que ali soffreu, e das alterações que a vossa commissão julga dever submetter á vossa apreciação.

A não ser o desapparecimento da classificação de concelhos de 3.ª ordem, a que já n’outra parte alludimos, todas as outras alterações que teve na outra camara não são de superior importancia.

Ainda assim, alem d’essa, as mais importantes vêem-se no artigo 339.° em que se impõe ao auditor a obrigação de relatar os processos contenciosos da competencia da commissão districtal, excepto perante as commissões districtaes de Lisboa, Porto e Braga, e no artigo 357.º em que se alargou a competencia do supremo tribunal administrativo para conhecer dos recursos ácerca das resoluções da tutela.

O resultado d’esta alteração vê-se melhor comparando o artigo 357.° do projecto com o artigo 373.° do decreto de 2 de março de 1892.

Das propostas que ao projecto foram offerecidas durante a discussão na outra casa do parlamento, podeis ter conhecimento pelo parecer addicional, que vae junto.

A vossa commissão julga que deve s ar modificado o n.° 4.° do artigo 202.°, ficando este assim redigido:

«Ordenar a estes corporações que organisem novos estatutos, em harmonia com os regulamentos e instrucções geraes do governo, e quando desobedeçam, extinguil-as, applicando os seus bens na conformidade do n.° 6.°, ou determinar as disposições estatuarias por que devem reger-se, precedendo, n’um e n’outro caso, auctorisação do governo.»

Tambem lhe parece que no § 2.° do artigo 460.° se devem supprimir as palavras com excepção do presidente, e substituir as palavras «e o empregado ou contadores» por estas «e nos processos de contas o empregado ou contador que intervier no processo».

Pareceu á vossa commissão que circurnstancias se podiam dar em que por áquelle motivo não fosse conveniente a extincção de uma irmandade ou confraria, substituindo-se então a reforma das disposições estatuarias feita pela auctoridade á que a corporação se recusou caprichosamente a fazer.

Em quanto á eliminação proposta é justificada por parecer que nenhuma rasão havia para aquella excepção.

Terminando aqui o nosso parecer, julgamos que este projecto assim modificado deve merecer a vossa approvação.

Sala das sessões da commissão de administração publica, 10 de abril de 1896. = Conde de Restello = Frederico Arouca = Augusto Ferreira Novaes = A. A. de Moraes Carvalho = Conde de Carnide = Jeronymo da Cunha Pimentel, relator.

Parecer n.° 34-A

A vossa commissão de fazenda nada tem que oppor á approvação da proposta sobre a reforma administrativa na parte que lhe diz respeito.

Sala das sessões da commissão de fazenda, 10 de abril de 1896.= A. de Serpa Pimentel = Frederico Arouca = José Antonio Gomes Lages = A. A. de Moraes Carvalho =a Conde de Azarujinha = Jeronymo da Cunha Pimentel.

Projecto de lei n.° 36

Artigo 1.° É approvado o codigo administrativo que faz parte d’esta lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 7 de abril de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Mota Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

Codigo administrativo

TITULO I

Divisão de territorio

Artigo 1.° O continente do reino de Portugal e Algarves e as ilhas adjacentes dividem-se, para os effeitos administrativos, em districtos, estes em concelhos e os concelhos em parochias.

§ unico. Os concelhos de Lisboa e Porto subdividem-se em bairros e estes em parochias.

Art. 2.° Os concelhos são classificados em l.ª e 2.ª ordem.

.§1.° São concelhos de l.ª ordem os das capitães de districto e outros que sejam assim classificados, em virtude da importancia da sua população agglomerada e do seu incremento industrial ou commercial.

§ 2.° São concelhos de 2.ª ordem todos os restantes.

Art. 3.° As circumscripções administrativas e a classificação dos concelhos, depois de fixadas nos termos d’este codigo, só por lei podem ser alteradas.

§ 1.° É, porém, da competencia do governo annexar, para os effeitos administrativos, ouvindo as juntas de parochia interessadas, o governador civil e o supremo tribunal administrativo, as freguezias que não tenham recursos sufficientes para custear as suas despezas obrigatorias, a outras freguezias do mesmo concelho que lhes sejam contiguas, e com as quaes tenham mais afinidades, não podendo n’este caso ser desannexadas senão por lei; e ao governador civil compete ordenar as annexações de freguezias nos casos do artigo 160.°

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§ 2.° Os edificios e mais bens proprios das freguezias annexadas ficam pertencendo á nova circumscripção, mas os bens de logradouro commum continuam na posse exclusiva dos moradores das povoações que os usufruiam anteriormente.

§ 3.° A annexação de freguezias importa a dissolução das respectivas juntas de parochia, procedendo-se a nova eleição dentro de quarenta dias desde a publicação do decreto da annexação.

§.4.° Compete igualmente ao governo, ouvidas as corporações interessadas, o governador civil e o supremo tribunal administrativo:

1.° Mudar as sedes dos concelhos e parochias, alterar os seus nomes e os das povoações;

2.° Resolver as duvidas ácerca dos limites das circumscripções administrativas, fixando-os quando sejam incertos;

3.° Alterar, de accordo com a auctoridade ecclesiastica, a circumscripção das parochias.

TITULO II

Disposições communs á organisação e modo de funccionar dos corpos administrativos

CAPITULO I

Organisação

Art. 4.° Os corpos administrativos são: no districto a commissão districtal, no concelho a camara municipal, na freguezia a junta de parochia.

Art. 5.° Os vogaes dos corpos administrativos, salvo o disposto ácerca da commissão districtal, são eleitos directamente pelos eleitores das respectivas circumscripções e servem por tres annos civis, a contar do dia 2 de janeiro immediato á eleição ordinaria.

Art. 6.° Para cada corpo administrativo serão eleitos tantos substitutos quantos forem os vogaes effectivos a eleger.

§ 1.° Para preenchimento do quadro dos vogaes effectivos de eleição, por não ter sido votado e apurado o sufficiente numero de vogaes para completar o referido quadro, ou por terem occorrido vacaturas depois de legalmente eleitos, serão chamados a servir os substitutos.

§ 2.° Os substitutos serão chamados a servir segundo a ordem de maior votação, preferindo os mais velhos no caso de igualdade de votos.

§ 3.° Quando os substitutos não bastem para completar o quadro da corporação, serão chamados a servir como supplentes, em numero igual ao dos logares vagos, os vogaes effectivos ou substitutos dos annos anteriores, sendo preferidos os do anno mais proximo aos do mais remoto, os effectivos aos substitutos, os mais votados aos menos votados, e os mais velhos no caso de igual votação.

§ 4.° Os vereadores substitutos ou supplentes com residencia na sede do municipio serão sempre chamados de preferencia aos que ali não residam, segundo a ordem esbelecida nos §§ 2.° e 3.°

§ 5.° Nos municipios de Lisboa e Porto serão chamados, na falta ou impedimento dos vogaes effectivos e segundo as regras procedentes, os substitutos ou supplentes eleitos pelo mesmo circulo eleitoral; e quando os supplentes hajam sido eleitos na vigencia de differente circumscripção eleitoral, serão chamados segundo a ordem da votação no quadro geral da vereação.

§ 6.° No caso de falta ou impedimento dos vogaes effectivos, compete aos presidentes dos corpos administrativos chamar a servir os respectivos substitutos ou supplentes, podendo, porém, os mesmos corpos emendar o chamamento indevidamente feito.

Art. 7.° As funcções dos corpos administrativos são obrigatorias e gratuitas.

Art. 8.° Podem ser eleitos para os corpos administrativos os eleitores das respectivas circumscripções que saibam ler, escrever e contar, sendo esta habilitação provada nos termos do § 1.° do artigo 15.°

§ 1.° Não podem ser vogaes dos mesmos corpos os individuos que, ao tempo da eleição, estiverem comprehendidos em algumas das seguintes categorias:

1.° Os ministros e secretarios d’estado effectivos;

2.° Os empregados das secretarias d’estado;

3.° Os militares em serviço activo no exercito ou na armada, salvo sendo professores ou exercendo empregos civis, que não inhibam das funcções administrativas;

4.° Os juizes e officiaes de justiça;

5.° Os magistrados e agentes do ministerio publico;

6.° Os conservadores do registo predial;

7.° Os membros do supremo tribunal administrativo e dos tribunaes fiscaes remunerados;

8.° Os magistrados e auditores administrativos e os funccionarios que lhes são subordinados;

9.° Os empregados dependentes dos corpos administrativos de cuja eleição se tratar, e os que recebam vencimentos dos seus cofres;

10.° Os funccionarios e agentes policiaes;

11.° Os funccionarios remunerados do serviço de lançamento, arrecadação e fiscalisação das contribuições do estado;

12.° Os directores das obras publicas e empregados da sua dependencia;

13.° Os pharmaceuticos, nos concelhos em que haja um só, e não tenha ajudante legalmente habilitado;

14.° Os membros dos conselhos administrativos ou fiscaes das sociedades ou companhias que tenham contrato com a corporação de cuja eleição se tratar, os que directamente sejam interessados em contratos celebrados com a mesma corporação, e os respectivos fiadores;

l5.° Os cidadãos que por sentença ou despacho de pronuncia com transito em julgado não estejam no goso dos seus direitos civis ou politicos, e os fallido? não rehabilitados;

16.° Os que estiverem exercendo funcções publicas, que obriguem a residir fora da area da respectiva circumscripção, com excepção dos membros das camaras legislativas;

17.° Outros quaesquer excluidos das funcções por leis especiaes.

§ 2.° A incapacidade eleitoral dos funccionarios publicos mencionados no § 1.° abrange os substitutos ou interinos em exercicio ao tempo da eleição.

§ 3.° A incapacidade eleitoral a que se refere o n.° 14.° não comprehende os accionistas de qualquer sociedade ou companhia que tenha contrato com a corporação, ou os portadores de obrigações.

Art. 9.° As funcções nos corpos administrativos são incompativeis com as dos seguintes cargos:

1.° Dos empregados do corpo diplomatico ou consular portuguez em effectivo serviço;

2.° Dos empregados do correio e aos telegraphos;

3.° Dos funccionarios de sanidade maritima;

4.° Dos delegados e sub-delegados de saude nos municipios de Lisboa e Porto;

5.° Dos professores de instruccão primaria, excepto para as juntas de parochia.

§ unico. Podem, todavia, pertencer aos corpos administrativos os funccionarios e empregados referidos n’este artigo que, no praso de oito dias, a contar da data da participação da sua eleição, declararem perante o governador civil do districto que optam pelo exercicio do cargo para que tiverem sido eleitos; devendo considerar-se por essa declaração terem renunciado ao cargo que exerciam.

Art. 10.° Não podem pertencer simultaneamente ao mesmo corpo administrativo, como vogaes effectivos, os paes e os filhos, os irmãos e os aflins nos mesmos graus.

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376 DIARIO CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

§ 1.° Se forem eleitos para o mesmo corpo administrativo, como vogaes effectivos, dois ou mais cidadãos, entre os quaes haja o parentesco declarado n’este artigo, consideram-se eleitos os mais votados, e os mais velhos no caso de igual votação.

§ 2.° Quando a incompatibilidade, de que trata este artigo, se verificar entre vogaes effectivos e substitutos, uns e outros de eleição, não podem estes ser chamados a servir, emquanto os effectivos, com quem tenham parentesco, estiverem em exercicio; mas serão chamados os substitutos immediatos em votos, e, na sua falta, os supplentes, nos termos dos §§ 2.°, o.° e 4.° do artigo 6.°, preferindo sempre os effectivos aos substitutos, e uns e outros aos supplentes.

§ 3.° Quando a mesma incompatibilidade occorrer entre vogaes electivos e vogaes que o não sejam, servirão estes de preferencia.

§ 4.° Não podem pertencer á camara municipal os cidadãos que tiverem com o respectivo secretario o parentesco designado n’este artigo.

Art. 11.° O cidadão que for eleito para mais de um corpo administrativo, tem direito de optar por qualquer dos cargos, devendo para este effeito communicar a preferencia ao governador civil do districto no praso de oito dias, contados da data da participação da sua eleição. Não optando, preferirá a eleição do cargo para que primeiro tiver sido eleito, mas se as eleições forem simultaneas preferirá a eleição para a corporação superior na ordem hierarchica.

§ unico. Os parochos não podem ser eleitos para a commissão districtal.

Art. 12.° Podem escusar-se dos cargos de vogaes dos corpos administrativos:

1.° Os que no ultimo triennio tiverem servido nos mesmos corpos administrativos, exercendo as funcções como effectivos, ou por terem sido chamados a servir como substitutos ou supplentes, por mais de dois annos;

2.° Os que completarem sessenta e cinco annos de idade antes da data legal da posse do cargo;

3.° Os que padecerem moléstia de que resulte grave difficuldade para o exercicio das funcções;

4.° Os professores officiaes de instrucção superior, secundaria e especial;

5.° Os professores de instrucção primaria, quanto aos cargos parochiaes para que forem eleitos;

6.° Outros quaesquer a quem sejam permittidas escusas por leis especiaes.

Art. 13.° Os quadros dos corpos administrativos., que não ficarem inteiramente constituidos, em consequencia da falta de eleição de alguns vogaes, da annullação dos votos obtidos por qualquer dos individuos enumerados no artigo 8.° ou pelas causas previstas nos artigos 9.°, 10.°, 11.° e 12.°, completam-se chamando ao exercicio das funcções os substitutos, e na sua falta os supplentes.

Art. 14.° Perde o logar no corpo administrativo a que pertencer, o vogal que acceitar algum dos cargos mencionados nos artigos 8.° e 9.°, o que estiver collocado nas circumstancias ali previstas, o vogal menos votado, e em igualdade de votos o mais novo dos vogaes, que depois da sua eleição tiver contraindo o parentesco por affinidade mencionado no artigo 10.°, e o vereador que tiver contraindo o mesmo parentesco com o secretario da camara municipal.

§ unico. Os substitutos dos logares, cujas funcções excluem dos corpos administrativos, conforme os artigos 8.° e 9.°, deixam de servir n’esses corpos enquanto exercerem os mesmos logares.

Art. 15.° A resolução ácerca das exclusões previstas nos artigos 8.°, 9.°, 10.° e 11.°, a concessão das escusas enumeradas no artigo 12.°, e a decisão a respeito da perda de logares pelas causas designadas no artigo 14.° são da competencia dos tribunaes.

§ l.° A elegibilidade absoluta dos cidadãos votados verifica-se pelo recenseamento eleitoral ou ainda pela exhibição de documento authentico comprovativo de curso ou exame de instrucção official, se os votados estiverem recenseados como eleitores na circumscripção administrativa a que se refere a eleição.

§ 2.° Não ha nenhuma incompatibilidade ou inegibilidade para o serviço dos corpos administrativos alem das expressamente designadas na lei.

Art. 16.° Antes de entrarem em exercicio os vogaes dos corpos administrativos prestam, nas mãos de quem estiver servindo de presidente, juramento de fidelidade ao Rei e de obediencia á carta constitucional, aos actos addicionaes e ás leis do reino.

§ 1 ° Se não comparecer o presidente, ou quem o deva substituir, ou algum d’elles se recusar a deferir o juramento, será este deferido pela auctoridade administrativa da respectiva circumscripção.

§ 2.° Os substitutos e supplentes prestam juramento nas mãos do presidente, quando forem chamados a servir.

Art. 17.° Os corpos administrativos, salvo o disposto para a commissão districtal, podem ser dissolvidos pelo governo, sendo previamente ouvidos e precedendo consulta do procurador geral da corôa:

1.° Quando por culpa sua não submettam á approvação superior os seus orçamentos nos prasos e termos legaes;

2.° Quando, sem motivo justificado, não prestem contas das suas gerencias, em conformidade com a lei;

3.° Quando, depois de advertidos, deixem de tomar as deliberações indispensaveis ao desempenho dos deveres que as leis lhes incumbem, ou quando faltem á obediencia legalmente devida ás auctoridades publicas;

4.° Quando, por via de inquerito ou syndicancia, se mostre que a sua gerencia é nociva aos interesses dos seus administrados e ás conveniencias da administração publica.

§ 1.° A dissolução não prejudica nem o emprego dos meios administrativos, para corrigir os abusos que a motivaram, nem o procedimento judicial contra os actos que envolvam criminalidade ou responsabilidade civil.

§ 2.° No decreto de dissolução declarar-se-hão os factos ou omissões que lhe deram causa, fazendo-se menção de parecar favoravel ou desfavoravel do procurador geral da corôa, e se mandará proceder a nova eleição dentro de um praso não excedente a quarenta dias.

§ 3.° Os vogaes da corporação dissolvida são inelegiveis para a mesma corporação na primeira eleição a que se proceder; ficam, todavia, exceptuados deste preceito os vogaes que assignaram vencidos as deliberações que motivaram a dissolução, ou que em sessão publica e em tempo competente tiverem prestado contra a falta de cumprimento da lei.

§ 4.° Emquanto não entrarem em exercicio os vogaes eleitos depois da dissolução, servirão commissões compostas do mesmo numero de vogaes das corporações dissolvidas, e nomeadas, de entre os elegiveis das respectivas circumscripções pelo governo, para exercerem as funcções das camaras municipaes e pelo governador civil para exercerem as funcções das juntas de parochia, não sendo todavia permittido ás commissões nomear ou demittir empregados.

Art. 18.° Os corpos administrativos eleitos na epocha ordinaria constituem-se no dia 2 do mez de janeiro immediato ao da eleição, e funccionam, alem do tempo para que foram eleitos, emquanto não estiverem legalmente substituidos.

§ 1.° A commissão districtal installa-se no dia 1 de fevereiro, immediato á epocha da eleição.

§ 2.° As camaras municipaes de Lisboa e Porto-eleitas na epocha ordinaria constituem-se no dia 2 de janeiro immediato ao da eleição se estiver validamente eleita a maioria dos seus vogaes, completando-se interinamente o quadro da vereação com os vereadores cessantes eleitos pelo

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circulo em que a eleição haja de repetir-se; porém, se a nova eleição se realisar por diversa circumscripção eleitoral, serão chamados os vereadores cessantes pela ordem da votação no quadro geral da vereação.

Art. 19.° Os corpos administrativos eleitos fora da epocha ordinaria constituem-se no primeiro dia util depois do terceiro domingo immediato ao do apuramento, mas só funccionam pelo tempo necessario para completar o triennio, e, alem d’este tempo, emquanto não forem legalmente substituidos.

CAPITULO II

Reuniões e deliberações

Art. 20.° Os corpos administrativos reunem-se e funccionam nos edificios especialmente destinados para as suas sessões, salvo havendo justo ^impedimento, e annunciando-se previamente por editaes o novo local das reuniões, com antecipação de tres dias, pelo menos.

Art. 21.° Os corpos administrativos não podem funccionar nem deliberar validamente sem que esteja reunida a maioria dos vogaes que constituem o quadro.

Art. 22.° É da competencia dos corpos administrativos conceder licenças aos seus vogaes e conhecer da legitimidade das suas faltas e impedimentos, comprehendendo-se nestes os que motivam a perda do logar, emquanto não é declarada, pelo tribunal competente.

Art. 23.° Nas faltas ou impedimentos dos vogaes em exercicio, chamar-se-hão os substitutos e supplentes, nos termos dos §§ 2.°, 3.°, 4.° 5.°, e 6.° do artigo 6.°, em numero igual ao dos vogaes impedidos, e pelo tempo por que durar o impedimento.

Art. 24.° As sessões são publicas, mas a nenhum cidadão é permittido, sob qualquer pretexto, intrometter-se na discussão dos negocios que ali se tratarem, nem fazer manifestações favoraveis ou contrarias, quer ás opiniões emittidas pelos vogaes das corporações ou pela auctoridade administrativa, quer ás votações e deliberações tomadas, sendo o delinquente preso, autuado e entregue immediatamente ao poder judicial.

Art. 25.° As deliberações são tornadas á pluralidade absoluta de votos dos vogaes presentes e por votação nominal.

§ 1.º Nos casos de empate o presidente tem voto de qualidade.

§ 2.° Serão sempre feitas por escrutinio secreto as votações sobre nomeações e demissões, e em geral todas as que envolverem apreciação do merito ou demerito de qualquer pessoa.

§ 3.° Salvo os casos especialmente previstos, quando haja empate nas votações por escrutinio secreto, em sessão a que não assistam todos os vogaes em exercicio, ficará o negocio adiado para a sessão immediata, sendo logo para ella chamados tres substitutos, e na falta de algum d’elles o respectivo supplente; e se n’essa sessão, estando presente a maioria dos vogaes em exercicio, se repetir o empate, proceder-se-ha com os substitutos ou supplentes a nova votação geral.

§ 4.° Quando faltar maioria absoluta de votos para o vencimento das deliberações, seguir-se-ha o disposto no paragrapho precedente, e se ainda assim não houver maioria absoluta de votos, prevalecerá a maioria relativa.

Art. 26.° Os vogaes dos corpos administrativos não podem assistir ás sessões ou a parte d’ellas em que se tratar de negocios que directamente lhes digam respeito, ou a pessoas a quem representem por preceito legal, ou com quem tenham relações de parentesco, por consanguinidade ou afinidade dentro do terceiro grau da linha recta ou transversal, contado segundo o direito civil.

§ unico. Os parochos que forem membros da camara municipal não podem tomar parte nas deliberações d’este corpo administrativo relativas a actos das juntas de parochia a que presidem.

Art. 27.° Nenhum corpo administrativo póde deixar de tomar deliberação sobre os assumptos da sua competencia, dentro do praso de trinta dias depois de lhe ser requerida pelos interessados ou requisitada pela competente auctoridade publica, e, não a tomando, poderão os interessados ou a mesma auctoridade reclamar perante a respectiva estação tutelar, que, avocando-o conhecimento do negocio, supprirá a omissão.

§ unico. Nenhum vogal póde escusar-se de votar em qualquer negocio que se tratar em sessão a que concorra, não estando inhibido de votar pela disposição do artigo antecedente.

Art. 28.° Podem os corpos administrativos alterar as suas deliberações quando não haja offensa de direitos adquiridos, excepto as estacões tutelares, cuja intervenção termina definitivamente com a approvação ou rejeição das deliberações submettidas á sua apreciação.

§ unico. As mesmas estacões são incompetentes para approvar ou rejeitar os actos emergentes das deliberações por ellas approvadas, quando esses actos não sejam, por disposição da lei, dependentes da confirmação tutelar.

Art. 29.° Aos presidentes compete dirigir as discussões, regular a ordem dos trabalhos e tomar as providencias necessarias para que as corporações não sejam perturbadas no exercicio das suas funcções, podendo requisitar da auctoridade administrativa o auxilio da força publica que para esse fim for necessario.

Art. 30.° Os corpos administrativos teem sessões ordinarias e extraordinarias: nas primeiras podem tratar de todos os assumptos da sua competencia; nas outras só podem occupar-se dos assumptos para que forem expressamente convocados ou auctorisados.

Art. 31.° São nullas as deliberações tomadas pelos corpos administrativos:

1.° Sobre objectos estranhos á sua competencia e attribuições;

2.° Em sessões ordinarias fora dos dias para ellas designados;

3.° Em sessões extraordinarias sobre assumptos não declarados na convocação, ou sem previo aviso á auctoridade administrativa, nos termos d’este codigo;

4.° Antes da abertura ou depois do encerramento da sessão, ou fóra do local para ella destinado;

5.° Finalmente, com violação das leis ou regulamentos de administração publica.

Art. 32.° De tudo que occorrer nas sessões se lavrará acta em livro especial, com termo de abertura e encerramento, numerado e rubricado pelo presidente.

Art. 33.° As actas serão escriptas e subscriptas, ou sómente subscriptas, pelos secretarios, e assignadas pelos vogaes que forem presentes á respectiva sessão.

§ 1.° Se algum vogal deixar de assignar, declarar-se-ha a falta e o motivo d’ella.

§ 2.° O vogal, que não se conformar com alguma deliberação, póde assignar vencido, e explicar resumidamente o seu voto na acta da sessão, e bem assim reclamar contra a mesma debberação.

Art. 34.° As deliberações dos corpos e corporações administrativas só podem provar-se pelas respectivas actas, cujas certidões devem ser passadas, independentemente de despacho, pelo respectivo secretario, dentro em oito dias, depois de requeridas pelos interessados ou requisitadas pela auctoridade publica.

TITULO III

Commissões districtaes

Art. 35.° A commissão districtal é composta do governador civil, presidente, do auditor administrativo, nomeado nos termos do artigo 309.°, e de tres vogaes eleitos pela forma designada nos artigos 234.° a 242.°

Art. 36.° Somente podem ser eleitos para a commissão

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districtal os cidadãos residentes no concelho da capital do districto, elegiveis para corpos administrativos, sendo-lhes applicavel a disposição do artigo 11.° quando tenham sido eleitos para mais de um corpo.

Art. 37.° A commissão districtal funcciona no edificio do governo civil, tem uma sessão ordinaria por semana no dia e hora que ella escolher na primeira sessão de cada anno, e as extraordinarias que o serviço publico exigir.

§ unico. O dia e hora das sessões ordinarias poderão ser alterados, precedendo annuncios por editaes affixados no logar do estylo com antecipação, pelo menos, de tres dias.

Art. 38.° Ao secretario geral do governo civil, como agente do ministerio publico junto da commissão districtal, incumbe interpor para os tribunaes superiores as reclamações e recursos que competirem das deliberações e decisões della.

Art. 39.° A commissão districtal tem um secretario que o governador civil nomeia de entre os empregados da secretaria, com excepção do secretario geral, e a quem incumbe:

1.° Lavrar, ler e subscrever as actas das sessões;

2.° Lavrar e subscrever os termos dos processos, exarar os accordãos conforme as minutas que lhe forem dadas pelos relatores dos processos, depois de approvadas pela commissão;

3.° Assignar e expedir as communicações das ordens e de quaesquer actos da commissão;

4.° Passar certidões das actas e dos processos affectos á commissão e satisfazer em geral qualquer expediente das attribuições deste corpo administrativo, com a coadjuvação dos outros empregados da secretaria.

Art. 40.° Pertence á commissão districtal:

1.° O desempenho das attribuições que na execução dos serviços de interesse geral do estado lhe forem commettidas pelas leis ou eram da competencia das extinctas juntas geraes;

2.° A emissão de parecer em todos os assumptos sobre que for consultada pelo governador civil, ou nos quaes o seu voto é exigido por este codigo e leis especiaes ou era da competencia dos extinctos tribunaes administrativos, juntas geraes e commissões suas delegadas;

3.° A superintendencia na administração municipal nos termos d’este codigo;

4.° O regulamento da fruição dos bens, pastos, aguas e fructos do logradouro commum dos povos pertencentes a mais de um concelho, ouvidas as camaras municipaes interessadas, e a faculdade de estabelecer penas para as respectivas transgressões dentro dos limites do artigo 486.° do codigo penal;

5.° Os regulamentos de policia proprios de posturas municipaes, que devam ser uniformes em todo o districto, ouvidas as camaras municipaes, e sem prejuizo dos regulamentos districtaes propostos pelos governadores civis e approvados pelo governo:

6.° A inspecção da viação municipal a cargo das camaras dos concelhos de 2.ª ordem, approvando, ouvida a direcção das obras publicas, os planos e projectos das estradas, designando as obras que têem de ser feiras annualmente nas de l.ª classe e fixando as quotas com que as mesmas camaras devem concorrer para as de interesse commum, tudo na conformidade das leis e regulamentos especiaes;

7.° Quaesquer outras attribuições commettidas por este codigo ou por leis especiaes.

Art. 41.° A commissão districtal póde ser dissolvida por decreto fundamentado, sendo previamente ouvida e precedendo consulta do procurador geral da corôa, nos casos em que o aconselharem motivos ponderosos de conveniencia publica, e para substituir os vogaes electivos cessantes serão nomeados pelo governo igual numero de vogaes effectivos e outros tantos substitutos, em quem concorram as circumstancias exigidas no artigo 36.°, e que sevirão até á posse dos novos eleitos.

§ unico. Á dissolução e eleição extraordinaria da commissão districtal são applicaveis as disposições dos §§ 1.°. 2.° e 3.° do artigo 17.°

TITULO IV

Camaras municipaes

CAPITULO I

Disposições sobre organisação, reunião e attribuições

SECÇÃO I

Organisação e competencia

Art. 42.° Cada concelho é regido por uma camara municipal que tem a seu cargo administrar os peculiares interesses dos povos da respectiva circumscripção, segundo as faculdades que por este codigo, pelas leis e regulamentos lhe são reconhecidas.

Art. 43.° A camara municipal compõe-se de nove vereadores nos concelhos de l.ª ordem, de sete vereadores nos concelhos de 2.ª ordem, que pelo ultimo recenseamento geral da população tenham mais de 15:000 habitantes, e de cinco vereadores nos restantes concelhos.

§ unico. A camara municipal de Lisboa compõe-se de quinze vereadores, e a do Porto é composta de onze.

Art. 44.° Cada concelho constituo um só circulo eleitoral para eleger a totalidade dos vereadores da camara municipal.

§ unico. Exceptuam-se os concelhos de Lisboa e Porto, que são divididos em circulos eleitoraes, conforme está determinado em decreto especial, elegendo cada circulo o numero de vereadores que lhe foi distribuido.

Art. 45.° As camaras municipaes teem presidentes e vice-presidentes, nomeados pelos vogaes, em escrutinio secreto, na primeira sessão de cada anno, constituindo-se para este effeito sob a presidencia do vogal mais velho, e preferindo, quando haja empate na votação, o mais velho aos votados.

§ 1.° Nas faltas e impedimentos permanentes e simultaneos dos presidentes e vice-presidentes procede-se sempre a novas nomeações.

§ 2.° Nos impedimentos temporarios e simultaneos dos presidentes e vice-presidentes presidirão os mais velhos dos vogaes presentes.

§ 3.° Emquanto funccionarem vogaes effectivos não porão presidir os .substitutos nem os supplentes.

Art. 46.° A camara municipal funcciona nos paços do concelho, tem uma sessão ordinaria por semana, no dia e hora que designar na primeira sessão de cada anno, e as extraordinarias que as necessidades do serviço publico exigirem.

§ 1.° A camara, se o julgar conveniente, poderá alterar o dia e hora das sessões ordinarias, mas deverá annunciar previamente ao publico a alteração que fizer, por editaes affixados nos logares do estylo com antecipação, pelo menos, de tres dias.

§ 2.° Para as sessões ordinarias não se carece de convocação; para as extraordinarias a convocação é feita pelo presidente, de sua iniciativa, ou quando lhe seja requerido por dois vereadores ou requisitado pela auctoridade administrativa.

§ 3.° Da convocação para sessões extraordinarias se dará simultaneamente conhecimento á auctoridade administrativa, com declaração do dia, hora e dos assumptos das sessões.

Art. 47.° O administrador do concelho, ou o do bairro em que funccionar a camara, assistirá sempre ás sessões da camara municipal, será ouvido quando o pedir, e toma assento ao lado esquerdo do presidente.

Art. 48.° A camara municipal corresponde-se directamente, por via do seu presidente, com todas as auctoridades e repartições publicas dos districtos; com o governo.

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porém, e com as repartições superiores corresponde-se sobre os assumptos da sua competencia, dirigindo-lhes representações, assignadas pelo presidente, e entregues ao governador civil que no praso de cinco dias as enviará ao seu destino com informação.

Art. 49.° O presidente da camara municipal entregará semanalmente ao administrador do concelho ou bairro em que a camara funccionar, para ser enviado ao governador civil, um resumo das deliberações que houver tomado na semana anterior, acompanhado de copia authentica das deliberações sujeitas á approvação tutelar; e, quando aquelle magistrado o exigir, lhe dará copia authentica de quaesquer deliberações e do teor dos autos, contratos e documentos a que ellas se referirem.

§ 1.° Da entrega dos documentos mencionados n’este artigo deverá o administrador do concelho ou bairro passar recibo para os effeitos legaes.

§ 2.° Estes documentos serão remettidos, dentro de tres dias, pelo mesmo administrador ao governador civil, com informação relativa ás deliberações que tiver por illegaes ou contrarias ao interesse publico.

§ 3.° O governador civil, no praso de cinco dias, a contar do recebimento, enviará ao ministerio do reino, com informação, o resumo das deliberações das camaras municipaes dos concelhos de l.ª ordem, e as copias de todas as que dependam da approvação do governo, e apresentará á commissão districtal os resumos das deliberações das outras camaras municipaes na primeira sessão depois de recebidos, fazendo-os acompanhar de copias das deliberações dependentes da approvação d’aquelle corpo administrativo.

§ 4.° Os resumos das deliberações devem mencionar, alem da data das sessões, da natureza destas e dos nomes dos vogaes presentes, todas as resoluções tomadas, com individuação clara e precisa do seu objecto, indicando concisamente os motivos de ordem legal e de conveniencia publica que as determinarem; e o administrador do concelho ou bairro, quando lhe forem entregues os resumos, verificará se estão redigidos n’esta conformidade, deixando de passar recibo no caso negativo, até que lhe seja remettida copia authentica, que sem demora requisitará, das deliberações extractadas.

§ 5.° A camara, no mesmo dia em que remetter ao administrador do concelho ou bairro o resumo das suas deliberações, fará affixar uma copia na porta do edificio municipal, onde permanecerá durante oito dias.

Art. 50.° Compete á camara, como administradora e promotora dos interesses do municipio, deliberar:

3.° Sobre a administração, fruição e exploração dos bens, pastos, aguas e fructos do logradouro commum dos povos do municipio, ou pertencentes a moradores de mais de uma freguezia d’elle;

2.° Sobre arroteamento e sementeira de terrenos municipaes incultos, e esgoto de pantanos existentes em terrenos do municipio;

3.° Sobre plantação e côrte de matas e arvoredos municipaes e sobre a concessão de qualquer auxilio á arborisação de terrenos particulares;

4.° Sobre posturas e regulamentos de policia urbana e rural;

5.° Sobre denominação das ruas e logares publicos e numeração dos predios, sendo esta obrigatoria para os respectivos proprietarios;

6.° Sobre construcção e administração das cadeias comarcas, segundo os planos competentemente approvados e as regras estabelecidas nas leis especiaes;

7.° Sobre demolição de edificios arruinados ou reparação d’elles, nos termos da legislação respectiva, podendo usar do mesmo processo especial para os predios em construcção e para tudo o que ameace a segurança publica ou particular;

§.° Sobre organisação de serviços para extincção de incendios, e para prevenir ou attenuar os males resultantes de calamidades publicas;

9.° Sobre tudo o que interessa á segurança e commodidade do transito nas ruas, praças, cães e mais logares publicos, comprehendendo a limpeza e illuminação publica, remoção de quaesquer pejamentos e do que possa prejudicar os transeuntes ou causar exhalacões insalubres;

10.° Sobre licenças para edificações e reedificações junto das das e logares publicos, fixando o alinhamento, dando as cotas de nivel e podendo ceder ou adquirir os terrenos que para este effeito sejam necessarios, com previa louvação de peritos por ella nomeados;

11.° Sobre construcção, reparação e conservação das estradas municipaes, observadas as formalidades prescriptas neste codigo e as disposições das leis especiaes;

12.° Sobre construcção e reparação de pontes e viaductos;

13.° Sobre concessão de licenças para estabelecimento de caminhos de ferro americanos, ou de outro melhoramento de viação publica nas ruas, estradas ou terrenos do municipio;

14.° Sobre construcção e conservação de fontes, poços, reservatorios e aqueductos para abastecimento das povoações do concelho;

15.° Sobre venda de carnes verdes, podendo declarar livre a venda ou dar de arrematação o sou fornecimento e estabelecer açougues por conta propria, quando os conluios dos arrematantes justifiquem esta providencia extraordinaria;

16.° Sobre estabelecimento de padarias municipaes, quando o exijam imperiosas conveniencias da alimentação publica, sobre o peso e policia da venda do pão;

17.° Sobre estabelecimento, duração, mudança e suppressão de feiras e mercados, e sobre construcção de casas para mercados publicos;

18.° Sobre creação de partidos para veterinarios e agrónomos, e sua extincção;

19.° Sobre administração de celleiros communs do municipio;

20.° Sobre creação de partidos para facultativos, boticarios e parteiras, e sua extincção;

21.° Sobre estabelecimento de cemiterios municipaes na capital do concelho, sua ampliação e suppressão, na conformidade das leis e regulamentos sanitarios, ficando todavia resalvados os direitos da camara com respeito aos cemiterios que haja construido fóra da capital do concelho;

22.° Sobre construcção e conservação de canos de esgoto, saneamento das povoações e demolição ou beneficiação de habitações insalubres, segundo o parecer de peritos, com as formalidades prescriptas na legislação relativa á demolição ou reparação dos edificios que apresentem ruinas, de que possam resultar perigos para a segurança publica ou particular;

23.° Sobre construcção e administração de lavadouros, estabelecimentos de banhos publicos e de aguas medicinaes, observando-se a respeito d’estas a legislação especial;

24.° Sobre construcção e administração de matadouros;

25.° Sobre administração dos expostos e creanças desvalidas ou abandonadas até á idade de dezoito annos, podendo subsidiar os de maior idade quando impossibilitados de trabalhar e completamente desamparados;

26.° Sobre concessão de pensões aos bombeiros que se impossibilitarem de trabalhar por desastre soffrido no serviço de incendios, e a outros individuos que se inutilisarem por desastres soffridos no serviço municipal, devendo cessar a pensão quando cesse a impossibilidade;

27.° Sobre subsidios a estabelecimentos de beneficencia, instrucção e educação, de que não seja administradora, mas que sejam de utilidade para o municipio ou para uma parte importante d’elle;

28.° Sobre creação de estabelecimentos e institutos de utilidade para o concelho, sua dotação e extincção;

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29.° Sobre todos os assumptos que forem da sua competencia segundo as leis e regulamentos.

Art. 5l.° Para o desempenho dos serviços de utilidade municipal commettidos á camara pelo artigo anterior compete-lhe deliberar:

1.° Sobre administração dos bens e estabelecimentos municipaes, sua applicação aos usos a que são destinados ou a outros que sejam de utilidade municipal;

2.° Sobre feitura do tombo com descripção exacta de todos os bens immobiliarios municipaes, quer sejam proprios do municipio, quer do logradouro commum de vizinhos delle;

3.° Sobre obras de construcção, reparação e conservação de propriedades municipaes;

4,° Sobre concessão de servidões em bens municipaes, as quaes conservarão sempre a natureza de precarias;

5.° Sobre arrendamentos e suas condições;

6.° Sobre contratos para execução de obras, serviços e fornecimentos de interesse municipal;

7.° Sobre acceitação de heranças, legados e doações, feitas ao municipio ou a estabelecimentos municipaes;

8.° Sobre acquisição de bens mobiliarios e immobiliarios para serviços do municipio e alienação dos que forem dispensaveis desses serviços;

9.° Sobre a conveniencia de ser decretada a utilidade publica ou a urgencia das expropriações, assim como sobre a realisação das que estiverem declaradas por lei ou decretadas pelo governo;

10.° Sobre accordos com outras corporações ou com particulares para realisação de melhoramentos de interesse commum;

11.° Sobre instauração e defeza de pleitos, e sobre desistencias, confissões e transacções ácerca do mesmo objecto;

12.° Sobre taxas pela occupação temporaria de logares e terrenos do uso e logradouro publico, e pelo uso dos bens, aguas, pastos e fructos do logradouro commum, de que é administradora;

13.° Sobre lançamento de impostos municipaes e regulamentos para a sua cobrança;

14.° Sobre emprestimos, sua dotação e encargos;

15.° Sobre dotação dos serviços e fixação das despezas municipaes;

16.° Sobre orçamentos municipaes;

17.° Sobre creação de empregos, sua dotação e extincção, ouvindo previamente, neste ultimo caso, os que n’elles estejam providos;

18.° Sobre nomeação, suspensão e demissão dos empregados da administração municipal, incluindo os guardas campestres, e dos que forem pagos, no todo ou em parte, pelo cofre do concelho, quando por lei não esteja determinada fórma especial de nomeação, suspensão ou demissão;

19.° Sobre aposentação de empregados e deducções nos seus vencimentos com destino a essa aposentação;

20.° Sobre regulamentos para o regimen dos estabelecimentos e serviços municipaes.

Art. 52.° No exercicio da attribuição conferida pelo artigo 50.° n.° 4.° compete á camara fazer posturas e regulamentos:

1.° Para policia dos cães, docas e praias, e para a das estradas municipaes, caminhos parochiaes e atravessadouros ou serventias publicas;

2.° Para policia dos campos e da caça nos terrenos municipaes, nos de logradouro publico e nos particulares onde é permittido o direito de caça;

3.° Para policia da pesca nas aguas communs e nas particulares, cujo peixe tenha entrada e saída livre;

4.° Para policia dos vendilhões e adellos, ou sejam ambulantes ou tenham logares fixos;

5.° Para limpeza das chaminés e fornos, para o serviço de extincção de incendios e contra inundações;

6.° Para impedir a divagação pelas das de animaes nocivos;

7.° Pará impedir que nas janellas, telhados e varandas se colloquem objectos que ponham em risco a segurança dos cidadãos;

8.° Para regular, nos termos da legislação respectiva, o prospecto e alinhamento dos edificios dentro das povoações ou junto das estradas municipaes, e para regular a limpeza exterior dos mesmos edificios;

9.° Para prover á conservação e limpeza das fontes publicas, ruas, estradas municipaes, caminhos parochiaes, atravessadouros ou serventias publicas, praças, cães, boqueirões, canos e despejos publicos;

10.° Para regular a policia das feiras e mercados;

11.° Para regular dentro das povoações as condições dos recipientes de immundicies e a sua remoção, quer esta se aça por meio de canos para o encanamento geral, quer Dor outro systema de limpeza;

12.° Para regular a policia dos carros e vehiculos, podendo estabelecer tabellas por cada corrida, tempo de serviço ou transporte de cada pessoa;

13.° Em geral sobre todos os objectos de policia tanto urbana como rural.

§ unico. Não é, porém, permittido ás camaras fazer posturas ou regulamentos de policia sobre assumptos da competencia de alguma outra auctoridade ou repartição publica, ou ácerca dos quaes providenceiem as leis e regulamentos de administração geral ou districtal.

Art. 53.° Á camara municipal pertencem tambem atribuições deliberativas e consultivas na execução de serviços de interesse geral ou local em todos os casos declarados nas leis, e bem assim attribuições consultivas em todos os assumptos sobre que for ouvida pelo governo, pelo governador civil e pelo administrador do concelho ou bairro.

SECÇÃO II

Approvação das deliberações municipaes

Art. 54.° São definitivas, e desde logo executorias, independentemente da approvação de qualquer corpo administrativo ou auctoridade, as deliberações das camaras municipaes, com excepção das mencionadas nos dois seguintes artigos.

Art. 55.° Não são executorias sem approvação do governo, por meio de decreto integralmente publicado na folha official, as deliberações municipaes:

1.° Sobre emprestimos;

2.° Sobre creação de empregos e augmento de dotação dos legalmente creados;

3.° Sobre percentagens addicionaes ás contribuições directas do estado ou relativas a rendimentos em que estas não incidam, quando excedam 50 por cento das mesmas contribuições;

4.° Sobre contratos, concedendo, com previa hasta publica, o exclusivo de illuminação ou de abastecimento de aguas, para beneficio de qualquer povoação do municipio, quando não importem restricção ou limitação do direito de propriedade particular ou do estado, sendo ouvida a procuradoira geral da corôa, e publicando-se na folha official o teor dos mesmos contratos.

5.° Sobre concessão de exclusivos de systema de viação ou outros a companhias ou particulares.

§ unico. Os contratos de que trata o n.° 4.°, quando importem restricção ou limitação do direito de propriedade, dependem de lei especial que os auctorise.

Art. 56.° Não são igualmente executorias sem approvação do governo, em relação aos municipios de l.ª ordem, ou da commissão districtal, em relação aos municipios de 2.ª ordem, as deliberações municipaes:

1.° Sobre organisação ou dotação de serviços e fixação de despezas;

2.° Sobre orçamentos;

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3.° Sobre percentagens, taxas au quaesquer impostos, salvo o disposto no n.° 3.° do artigo antecedente;

4.° Sobre acquisição ou alienação de bens immobiliarios, titulos, acções, inscripções, e em geral de quaesquer papeis de credito e sobre transacções, confissão ou desistencia de pleitos;

5.° Sobre regulamentos e posturas de execução permanente;

6.° Sobre contratos de execução de obras ou serviços, de fornecimentos e de arrendamentos, que devam durar por mais de dois annos.

§ 1.° Dentro do praso de quarenta dias, desde que sejam entregues nas administrações de concelho ou bairro as copias das deliberações enumeradas n’este artigo será, pelas competentes estações tutelares, concedida ou denegada approvação ás mesmas deliberações, no todo ou em parte, e tambem sob condição suspensiva ou resolutiva.

§ 2.° Findo o praso fixado n’este artigo tornam-se executorias todas as deliberações n’elle enumeradas, sobre as quaes não haja resolução tutelar.

Art. 57.° As estações tutelares não poderão approvar as deliberações municipaes sobre emprestimos, creação e augmento de dotação de empregos e aggravamento de percentagens de impostos directos ou indirectos sem parecer da maioria dos quarenta eleitores maiores contribuintes, domiciliados no concelho, sendo vinte da contribuição predial e vinte da contribuição industrial nos concelhos de l.ª ordem, e todos da contribuição predial nos concelhos de 2.ª ordem.

§ 1.° A convocação dos maiores contribuintes é feita, com antecipação não inferior a tres dias, pelo presidente da camara municipal, servindo de base para a convocação os esclarecimentos pedidos á repartição de fazenda, e o recenseamento eleitoral vigente; repete-se as vezes necessarias para se constituir a assembléa, que será presidida pelo presidente da camara, e o parecer emittido, lavrado pelo secretario d’esta corporação, acompanhará sempre a copia da deliberação municipal respectiva.

§ 2.° A estação tutelar conhecerá de qualquer reclamação sobre a constituição da assembléa dos maiores contribuintes, que poderá mandar convocar de novo quando julgar conveniente.

Art. 58.° Contra a approvação ou rejeição das deliberações municipaes, por parte da commissão districtal, podem as corporações interessadas reclamar no praso de trinta dias para o governo, contando-se o praso sobre a data do acto reclamado.

Art. 59.° A reclamação será interposta por meio de petição, assignada pelo presidente da corporação reclamante e apresentada no governo civil do districto, contendo a exposição dos motivos de ordem legal ou de conveniencia administrativa que a fundamentem e a conclusão clara e precisa, do pedido. Será acompanhada de copia authentica da deliberação tutelar reclamada e de todos os documentos convenientes para elucidação do assumpto controvertido.

Art. 60.° Recebida a petição, o governador civil verificará se está formulada e instruida nos termos do artigo antecedente, fazendo supprir immediatamente pela reclamante as faltas que houver, e em seguida apresentará o processo á commissão districtal para que responda dentro do praso de dez dias, findo os quaes o remetterá com informação, e dentro de cinco dias, ao ministerio do reino.

Art. 61.° As deliberações municipaes, tanto definitivas como as provisorias, depois de confirmadas pela tutela, podem ser revogadas pelos meios contenciosos, nos casos de nullidade enumerados no artigo 31.°, e nos de offensa de direitos fundados nas leis ou regulamentos de administração publica.

§ unico. São competentes para usar d’estes meios o ministerio publico o ás pessoas cujos direitos forem offendidos pelas deliberações.

SECÇÃO III

Presidente da camara municipal

Art. 62.° Ao presidente da camara municipal pertence executar e fazer executar as deliberações d’esta corporação.

§ 1.° O presidente da camara é especialmente encarregado;

1.° Da publicação de posturas, resoluções e avisos;

2.° Da proposta dos orçamentos;

3.° Do ordenamento das despezas, em conformidade dos orçamentos e resoluções da camara;

4.º De representar a camara em juizo ou fóra d’elle, precedendo no primeiro caso deliberação municipal sobre o pleito, e de escolher os advogados e procuradores que forem necessarios;

5.° De assignar a correspondencia com todas as auctoridades e repartições com que a camara se corresponde directamente;

6.° Da inspecção superior de todos os estabelecimentos e serviços municipaes.

§ 2.° É permittido á camara divdir as funcções de inspecção pelos vereadores, tendo em vista as especialidades para que tenha cada um d’elles mais aptidão, excepto no que diz respeito ao serviço da secretaria, cuja inspecção ficará sempre reservada ao presidente.

Art. 63.° Os presidentes das camarás, a favor das quaes esteja descripto e consignado no orçamento geral do estado subsidio especial superior a 1:000$000 réis, serão por decreto nomeados annualmente pelo governo de entre os os vereadores, e funccionam, emquanto não forem pela mosma fórma substituidos ou reconduzidos, mas nunca alem da posse da camara novamente eleita.

§ unico. Os vice-presidentes serão sempre nomeados pelas camaras, segundo o disposto no artigo 44.°

Art. 64.° Os presidentes- das camaras municipaes, nomeados pelo governo, podem ser destituidos por decreto fundamentado:

1.° Por violação manifesta da lei em seus actos ou resoluções;

2.° Por falta de cumprimento das decisões das competentes auctoridades ou tribunaes;

3.° Por actos repetidos de culpa ou desleixo, que importem prejuizo dos interesses municipaes.

§ 1.° A destituição não será dada sem previa consulta do procurador geral da corôa, nos casos dos n.ºs l.° e 2.°, e do supremo tribunal administrativo, nos casos do n.° 3.° d’este artigo.

§ 2.° No caso de destituição, será nomeado novo presidente de entre os vereadores.

Art. 60.° Todos os actos e resoluções dos presidentes das camaras municipaes podem ser revogados pelo governo, sempre que importem invasão das attribuições privativas das mesmas camarás, excesso ou violação do que por ellas houver sido legalmente deliberado.

CAPITULO II

Fazenda e contabilidade municipal

SECÇÃO I

Receita e despeza

Art. 66.° A receita dos municipios é ordinaria, extraordinaria e especial.

§ 1.° Constituem receita ordinaria:

1.° Os rendimentos dos bens proprios;

2.° Os juros de papeis de credito e de fundos consolidados;

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3.° Os dividendos de acções de bancos e companhias;

4.° Os rendimentos de clubs e casas de recreio, estabelecidos pelas camaras municipaes, com auctorisação do governo;

5.° O rendimento de outros estabelecimentos municipaes;

6.° As multas por transgressão de posturas ou regulamentos policiaes, quer privativos do municipio, quer ordenados pela commissão districtal para todos os concelhos do districto;

7.° As taxas pela occupação de terrenos e logares publicos, e pelo uso dos bens de logradouro commum;

8.° Os impostos;

9.° As dividas activas;

10.° O producto das multas impostas, durante o tempo em que é vedado o exercicio da caça, aos que a matarem, venderem, comprarem ou transportarem;

1l.° Os subsidios especiaes consignados no orçamento geral do estado;

12.° Os subsidios provenientes de quaesquer companhias ou sociedades, ou de concessões a companhias eu particulares;

13.° Quaesquer outros rendimentos permanentes destinados por lei a constituir receita municipal.

§ 2.° Constituem receita extraordinaria:

1.° As heranças, donativos, legados e doações;

2.° O producto de emprestimos;

3.° O producto da alienação de bens;

4.° Os subsidios eventuaes do estado, de outro municipio ou de quaesquer corporações;

5.° Os rendimentos de bazares auctorisados pelo governador civil;

6.° Outros quaesquer rendimentos incertos e eventuaes.

§ 3.° Constituem receitas especiaes as que por lei ou decreto são exclusivamente destinadas á dotação do fundo da instrucçao primaria, da viação municipal ou a outro fim prefixo.

§ 4.° As multas, a que se referem os n.ºs 6.° e 10.° do § 1.°, podem ser pagas voluntariamente, e neste caso serão cobradas pelo maximo estabelecido nas posturas ou regulamentos de policia municipal. No caso de reincidencia serão sempre pagas em dobro.

§ 5.° A caça, durante o tempo a que se refere o n.° 10.° do § 1.°, será apprehendida nas ruas, estradas, cães, estações, mercados, lojas de viveres, casas de comida, hospedarias ou outros logares publicos onde for encontrada, exposta á venda ou destinada a consumo, e será entregue aos asylos e casas de beneficencia, havendo-os no concelho, e, não os havendo, será vendida, constituindo o seu producto receita municipal.

Art. 67.° Os impostos municipaes são directos e indirectos.

Art. 68.° Os impostos directos são:

1.° As percentagens addicionaes ás contribuições directas do estado, predial, industrial, de renda de casas e sumptuaria, ou áquellas que as substituirem:

2.° Uma percentagem sobre os rendimentos em que não incidirem as contribuições mencionadas em o n.° 1.°, com as unicas excepções dos juros dos titulos de divida publica, dos rendimentos dos jornaleiros provenientes dos seus jornaes, dos vencimentos dos militares, dos vencimentos dos individuos que por lei gosem as mesmas vantagens dos militares e de outros vencimentos isentos por leis especiaes;

3.° A prestação de trabalho ou o valor correspondente em dinheiro;

4.° As taxas sobre os vehiculos;

5.° As taxas pelas licenças para caçar nos terrenos municipaes, nos de logradouro publico e nos particulares onde é permittido o direito de caça;

6.° As taxas pelas licenças para pescar nas aguas communs;

7.° As taxas pela aferição de pesos e medidas;

8.° As taxas pelos enterramentos e concessões de terrenos nos cemiterios municipaes;

9.° As taxas sobre os cães e sobre os animaes de carga que não estejam collectados em prestação de trabalho;

10.° As taxas sobre os bilhares, sociedades e casas de recreio.

Art. 69.° O maximo das percentagens mencionadas nos n.ºs 1.° e 2.° do artigo anterior é de 75 por cento, incluindo em todas o addicional para encargos da instrucçao primaria.

§ 1.° As percentagens serão iguaes para a contribuição de renda de casas e para a contribuição sumptuaria, podendo ser differentes para as outras contribuições.

§ 2.° As percentagens serão iguaes para toda a circumscripção municipal.

§ 3.° As percentagens addicionaes serão votadas até o dia 30 de abril para constituir receita do anno immediato e, logo depois de approvadas, serão communicadas á repartição de fazenda do districto para os effeitos 1egaes.

§ 4.° As mesmas percentagens cobram-se cumulativamente com as contribuições do estado, que se arrecadarem na primeira epocha posterior áquella em que forem executorias as deliberações que as tiverem votado.

§ 5.° As percentagens excedentes a 70 por cento só por lei podem ser auctorisadas, salvo o disposto no artigo 456.°

Art. 70.° Quando as collectas totaes dos impostos accumulados forem por qualquer motivo incobraveis, no todo ou em parte, as falhas de cobrança pesarão proporcionalmente nas collectas do estado e nas municipaes.

Art. 71.° A percentagem a que se refere o n.° 2.° do artigo 68.° será igual para toda a circumscripção municipal, mas poderá ser differente segundo os rendimentos em que incidir.

§ 1.° Para o lançamento da percentagem consideram-se os mesmos rendimentos equiparados aos emolumentos individualmente percebidos pelos funccionarios publicos e como se fossem sujeitos a igual taxa de contribuição industrial.

§ 2.° Os vencimentos dos empregados publicos serão considerados pela sua importancia liquida de deducções para aposentação e de impostos para o estado

Art. 72.° O imposto de prestação de trabalho comprehende o serviço de pessoas e cousas em um dia de cada anno.

§ 1.° São obrigados a este imposto todos os chefes de familia residentes ou proprietarios na circumscripção municipal:

1.° Por si e por cada um dos membros da sua familia ou domesticos, de dezoito a sessenta annos de idade completos, que residirem na circumscripção municipal e forem varões validos;

2.° Por todos os carros, carretas, animaes de carga, de tiro e de sella, que empregarem habitualmente na circumscripção municipal, no serviço de sua familia ou industria.

§ 2.° O individuo que for trabalhar com carro, carreta ou animaes não é obrigado a outro serviço pessoal.

§ 3.° Os indigentes não são obrigados a este imposto.

§ 4.° A prestação de trabalho não é devida a distancia superior a 6 kilometros da residencia do contribuinte.

§ 5.° A prestação de trabalho póde ser satisfeita pelo proprio contribuinte, por outrem em seu logar, ou remida a dinheiro pelo preço das tarifas, que a camara deve estabelecer annualmente.

§ 6.° O imposto lançado e exigido dentro do anno respectivo, mas não satisfeito no praso fixado para a sua prestação, é remido a dinheiro pelo preço da tarifa, e será cobrado executivamente pelo processo estabelecido para a cobrança dos impostos directos do estado; porém em caso nenhum póde ser exigido fóra do anno para que foi auctorisado.

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SESSÃO N.° 31 DE 14 DE ABRIL DE 1896 383

§ 7.° Se a camara municipal não tiver, dentro da area designada no § 4.°, obras a que possa applicar este imposto, será cobrado, se não for remido a dinheiro, pela junta de parochia em beneficio dos caminhos parochiaes. §

8.° Das decisões da camara sobre reclamações contra o lançamento d’este imposto cabe recurso para a commissão districtal.

Art. 73.° O rol da contribuição municipal de repartição, que não for cobrada cumulativamente com as contribuições geraes do estado, será, depois de approvado pela camara, publicado por editaes e estará patente por quinze dias na casa da camara a todos os contribuintes do concelho.

§ 1.° Nos oito dias immediatos a camara julga as reclamações apresentadas contra o rol, salvo recurso para o tribunal competente.

§ 2.° Os contribuintes que, pela forma estabelecida neste artigo, forem collectados sem fundamento algum, podem a todo o tempo reclamar extraordinariamente perante a camara, e recorrer para os tribunaes contra a collecta lançada, e, se forem attendidos, será annullado o respectivo conhecimento ou restituida a quantia já paga.

Art. 74.° Os impostos indirectos consistem em uns tantos réis lançados sobre os generos vendidos na circumscripção municipal para consumo.

§ 1.° Sobre os generos sujeitos ao real de agua, ou ao imposto que o substituir, o imposto municipal limita-se a uma percentagem addicional á pauta geral do estado, até 100 por cento.

§ 2.° Dos generos, que não estão sujeitos ao real de agua, poderão ser tributados sómente aquelles que forem designados em pauta decretada pelo governo.

§ 3.° A pauta, a que se refere o paragrapho antecedente, não poderá comprehender os generos isentos expressamente por lei de imposto para o estado.

§ 4.° A quota lançada sobre os generos não sujeitos ao real de agua não poderá exceder a 20 por cento do preço corrente de cada genero no mercado do concelho.

§ 5.° O governo póde escolher por decreto, de entre os generos sujeitos ao imposto indirecto municipal, os que só para o serviço do estado devem ser tributados, podendo esta designação ser geral ou restricta a determinados concelhos.

Art. 75.° O imposto indirecto municipal não é exigivel:

1.° Dos generos em transito;

2.° Dos generos exportados do concelho;

3.° Dos generos vendidos para revenda;

4.° Dos generos destinados ao fornecimento de forças militares temporariamente destacadas nos concelhos.

Art. 76.° Os addicionaes ao real de agua podem ser cobrados cumulativamente com o imposto do estado, nos termos do respectivo regulamento; para a cobrança do imposto sobre os demais generos farão as camaras os regulamentos convenientes, devendo apropriar-lhes as disposições dos regulamentos do real de agua, e podendo encarregar da cobrança, mediante previo accordo com o governo, o pessoal empregado na fiscalisação e arrecadação d’aquelle imposto, ou cobral-os por administração propria.

Art. 77.° Os rendimentos e contribuições municipaes, á excepção daquelles para os quaes as leis e regulamentos tiverem prescripto um modo especial de arrecadação, serão arrecadados da mesma fórma e com as mesmas formalidades prescriptas para a cobrança dos rendimentos e contribuições do estado, e sujeitos á mesma competencia contenciosa.

Art. 78.° As camaras municipaes gosam dos privilegios que, pelos artigos 885.° e 877.° do codigo civil, pertencem á fazenda publica, mas sem prejuizo d’esta.

Art. 79.° As camaras podem pôr em arrematação os rendimentos a que se referem os n.ºs 4.°, 5.° e 7.° do § 1.° do artigo 66.° e os impostos indirectos, comprehendidos os addicionaes ao real de agua.

Art. 80.° Nas ilhas adjacentes os impostos indirectos votados nos orçamentos municipaes serão cobrados, quanto aos generos importados, no acto do despacho pelas alfandegas por onde se fizer a importação, qualquer que seja a declaração do importador ácerca do destino d’elles.

§ 1.° As camaras municipaes dos concelhos, a cujo consumo forem destinados os generos importados, farão accordo sobre a quota do imposto que deve recair em cada genero, a qual deve ser a mesma para esses concelhos, competindo á commissão districtal fixar a quota, se faltar o accordo das camaras interessadas.

§ 2.° O producto dos impostos cobrados na conformidade deste artigo será pelas alfandegas entregue mensalmente ás camaras dos concelhos interessados, na proporção do que entre ellas for accordado, ou do que determinar a commissão districtal, na falta d’esse accordo.

3.° Sómente serão restituidos aos importadores os impostos cobrados por generos que se reexportarem.

Art. 81.° As despezas do municipio são obrigatorias ou facultativas.

§ 1.° São obrigatorias:

1.° As da construcção, reparação e conservação dos paços do concelho, dos tribunaes de justiça de l.ª instancia que tenham a sua séde na circumscripção municipal, e, para as camaras municipaes das sédes de districto, as de reparação e conservação dos governos civis 8 repartições dependentes ou annexas do governo civil, e da mobilia que lhes for necessaria;

2.° As da casa e mobilia para administração do concelho ou bairros e para as repartições de fazenda, quando nos paços municipaes não houver conveniente accommodação;

3.° As da construcção, conservação e mobilia das cadeias, em conformidade das leis respectivas;

4.° As da renda da casa e mobilia da conservatoria, quando nos paços do concelho não haja accommodação conveniente;

5.° As da reparação e conservação das propriedades do municipio;

6.° As dos impostos, pensões e encargos a que estiverem sujeitas as propriedades ou rendimentos municipaes

7.° As do pagamento das dividas exigiveis;

8.° As resultantes da execução de contratos legalmente celebrados;

9.° As dos litigios da camara;

10.° As dos vencimentos e empregados pagos pelo cofre do municipio;

11.° As dos vencimentos de aposentação dos empregados pagos pelo cofre municipal;

12.° As do alinhamento e letreiros das ruas e praças;

13.° As da policia e segurança do concelho;

14.° As do serviço de extincção de incendios;

l5.° As da illuminação das povoações da circumscripção municipal, quando a despeza tiver sido incluida nos orçamentos dos ultimos tres annos;

16.° As da construcção, reparação e conservação das pontes, das e estradas municipaes, em conformidade das leis respectivas;

17.° As da construcção, conservação e reparação de reservatorios de agua, poços, fontes e aqueductos municipaes;

]8.° As dos serviços de vaccinação e revaccinação as de inspecção sanitaria das meretrizes e seu tratamento, quando não tenham cabimento em hospital da localidade as do saneamento das povoações e esgoto de quaesquer pantanos ou focos de insalubridade;

19.° As de prevenção e combate de epidemias;

20.° As de construcção, reparação e conservação dos cemiterios municipaes;

21.° As do tratamento de doentes pobres no hospital real de S. José e seus annexos, conforme as disposições

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do decreto de 6 de agosto de 1892 e a tabella de quotas que o governo fixar;

22.° As dos expostos e creanças desvalidas ou abandonadas;

23.° As da instrucção primaria, em conformidade das leis respectivas;

24.° As da manutenção dos estabelecimentos de utilidade do municipio creados pela camara;

25.° As da dotação de todos os serviços municipaes regularmente estabelecidos;

26.° As do custeamento e expediente da administração do concelho ou bairro, quando os emolumentos desta forem insufficientes, e as do expediente da camara;

27.° As da assignatura da folha official do governo;

28.° As do recenseamento da população;

29.° As do recenseamento eleitoral e do expediente das eleições para os cargos politicos e administrativos;

30.° As dos livros e expediente do registo civil;

31.° As dos registos a cargo da camara;

32.° Outras quaesquer despezas que por lei forem postas a cargo do cofre municipal.

§ 2.° São facultativas todas as despezas não enumeradas no § 1.°, que forem de utilidade para o municipio e consequentes do exercicio de attribuições legaes da camara municipal.

SECÇÃO II

Orçamento municipal

Art. 82.° O orçamento do municipio comprehende o calculo da receita que se presume arrecadar, e a descripção das despezas que devem fazer-se para occorrer aos encargos e necessidades da administração municipal, não podendo nunca legalisar as despezas feitas sem previa auctorisação.

Art. 83.° O orçamento municipal é ordinario ou supplementar.

§ 1.° O orçamento ordinario é destinado a auctorisar a cobrança e applicação, durante um anno civil, de toda a receita municipal.

§ 2.° O orçamento supplementar é destinado:

l.ª A crear receita, quando a votada no orçamento ordinario for insufficiente para occorrer ás despezas auctorisadas;

2.° A prover ao pagamento de despezas urgentes, que não tenham sido contempladas no orçamento ordinario;

3.° A dar applicação a saldos de contas e á receita excedente á calculada no orçamento ordinario;

4.° A alterar a applicação da receita votada no orçamento ordinario.

Art. 84.° Os orçamentos municipaes são propostos pelo presidente, discutidos e approvados pela camara, o ordinario no mez de novembro, e os supplementares quando as necessidades do serviço o exigirem.

§ unico. A omissão da camara ácerca da votação do orçamento ordinario póde ser por ella supprida em data posterior, sem prejuizo, porém, de igual competencia das estações tutelares.

Art. 85.° A avaliação da receita para o orçamento ordinario será feita pela importancia da receita effectiva do ultimo anno civil, e pelo calculo do termo medio do producto liquido dos tres annos anteriores, em relação aos .rendimentos que, por sua natureza muito variavel, não possam ser computados approximadamente pela receita, effectiva, de um só anno.

Art. 86.° As receitas que por lei, decreto ou contrato tenham applicação a certas e determinadas despezas não podem ser desviadas para dotação de outras despezas.

Art. 87.° As camaras municipaes só poderão destinar para despezas facultativas as sobras das receitas ordinarias depois de convertidas em saldo effectivo, e as receitas extraordinarias que pela sua natureza ou procedencia sómente sejam applicaveis a determinadas despezas d’aquella categoria.

Art. 88.° As deliberações municipaes que possam influir na receita ou despeza, com excepção das que versarem sobre taxas ou impostos, para cuja votação não esteja designada epocha, sómente podem ser tomadas em consideração nos orçamentos que se organisarem depois de serem executorias.

Art. 89.° Os orçamentos, tanto ordinarios como supplementares, serão sempre organisados de fórma que a despeza votada não seja excedente á receita regularmente calculada.

Art. 90.° O orçamento deverá conter: na parte da receita tres titulos correspondentes á receita ordinaria, extraordinaria e especial, cada um delles subdividido em tantos artigos quantas forem as diversas fontes de receita enumeradas no artigo 66.°; e, na parte da despeza, dois titulos, um que comprehenda a obrigatoria e outro a facultativa, subdivididos, quanto á obrigatoria, em tantos capitulos quantas forem as diversas classes de despeza enumerados no artigo 81.c, e, quanto ás facultativas, em tantos capitulos quantas forem as verbas destinadas aos diversos ramos de administração que forem contemplados no orçamento; devendo alem d’isso cada capitulo conter, em artigos separados, quanto seja praticavel, a parte destinada ao pessoal e a destinada ao material, com a individuação necessaria para se apreciarem os differentes elementos em que seja susceptivel de decompor-se a verba total.

§ 1.° As verbas dos orçamentos supplementares devem ser descriptas sob a mesma numeração de titulos, capitulos e artigos com que no orçamento ordinario estiverem descriptas as verbas da mesma natureza.

§ 2.° No orçamento descrever-se-hão em artigos especiaes os saldos provaveis de origens diversas.

§ 3.° Os legados, donativos e quaesquer subsidios eventuaes sómente depois de recebidos serão inscriptos no orçamento.

Art. 91.° Os orçamentos, antes de definitivamente approvados pela camara, estarão expostos ao publico pelo tempo de oito dias, o que será annunciado por editaes affixados nos Jogares do estylo. E podem os eleitores e contribuintes do municipio, singular ou collectivamente, e quaesquer outros interessados reclamar ácerca dos orçamentos, quer perante a camara antes de os approvar, quer perante a competente estação tutelar depois de approvados, quer perante os tribunaes nos casos de que trata o artigo 31.°

Art. 92.° Os orçamentos municipaes serão remettidos por copia á estação de cuja approvação dependem, acompanhadas das reclamações apresentadas e dos indispensaveis documentos e esclarecimentos para se conhecer da sua regular organisação.

Art. 93.° A rejeição de qualquer verba orçamental por parte da estação tutelar invalida as deliberações respectivas, ainda que executorias.

Art. 94.° Ás estações tutelares compete supprir a falta de orçamentos ordinarios ou supplementares das camaras municipaes e a omissão ou insufficiencia de dotação dos encargos obrigatorios, e tambem supprimir ou reduzir qualquer despeza.

Art. 95.° Quando, por qualquer motivo, o orçamento ordinario não estiver votado e em termos de ser executado antes de começar o anno, em que tem de reger, continuará em vigor o orçamento do anno anterior, mas sómente quanto á receita ordinaria e quanto ás despezas obrigatorias de execução annual e permanente.

SECÇÃO III

Contabilidade municipal

Art. 96.° As camaras municipaes tem thesoureiros pri-

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vativos de sua nomeação, que poderá recair no recebedor da camara, e lhes arbitrarão, como unico vencimento, uma percentagem não excedente a 2 por cento da receita effectivamente cobrada por elles, excluindo a proveniencia de subsidies, emprestimos e rendimentos cobrados pelos exactores da fazenda publica.

§ unico. No fim de cada semestre, o recebedor da comarca, que for thesoureiro municipal, apresentará á camara a conta da receita arrecadada e dos pagamentos effectua-os durante o semestre, com os documentos que lhes digam respeito: e a camara, achando a conta exacta, lhe dará uma declaração de conformidade, para lhe servir de documento nas contas que, na qualidade de recebedor, houver de prestar ao tribunal de contas.

Art. 97.° Ao thesoureiro municipal incumbe:

1.° Arrecadar toda a receita municipal e receber dos exactores da fazenda publica a que for cobrada por elles, prestando a caução arbitrada pela camara, e que será reforçada quando esta corporação reconheça a insufficiencia d’ella;

2.° Satisfazer todos os pagamentos legalmente ordenados;

3.° Remetter ao presidente da camara semanalmente um balanço do cofre.

§ unico. O thesoureiro .municipal que satisfizer ordens de pagamento, não processadas nos termos do artigo 103.°, será responsavel pela quantia indevidamente paga, e, no caso de reincidencia, será demittido, ou, se for recebedor de comarca, será pelo governo destituido das funcções de thesoureiro municipal.

Art. 98.° Aos exactores da fazenda publica nenhuma remuneração é devida pela cobrança de rendimentos municipaes por mero addicionamento ás contribuições do estado.

§ unico. Aos empregados das repartições de fazenda concelhias será abonada, pelo serviço extraordinario a que o addicionamento der causa, uma gratificação proposta pela camara municipal e fixada pelo ministerio do reino, ouvido o da fazenda.

Art. 99.° O thesoureiro municipal ou o exactor que exercer as funcções d’elle é obrigado, sob pena de demissão imposta pelo governo, e de procedimento nos termos do § 2.° do artigo 188.° do codigo penal, a transferir para a caixa geral de depositos, independentemente de deliberação camararia, no, praso maximo de quinze dias depois de arrecadadas e á proporção que o forem, as receitas especiaes do fundo de viação municipal, as do fundo da instrucção primaria e as que tenham por lei, decreto ou contrato applicação especial.

§ unico. Das quantias do fundo de viação, arrecadadas na caixa geral de depositos, será deduzida a quota annual, com que a respectiva camara deva contribuir para o hospital real de S. José e annexos, a cuja administração será directamente entregue pela mesma caixa.

Art. 100.° Nenhuma despeza poderá ser ordenada e paga sem que esteja auctorisada em orçamento que tenha vigor nos termos d’este codigo.

Art. 101.° O serviço financeiro dos municipios executa-se em periodos de gerencia, cada um dos quaes comprehende um anno civil, que terá principio no 1.° de janeiro e terminará no dia 31 de dezembro.

§ unico. Findo o anno civil caducam todas as auctorisações orçamentaes, e ficam sem effeito todas as ordens de pagamento não realisadas.

Art. 102.° Todos os pagamentos são ordenados pelo presidente da camara, precedendo deliberação da mesma corporação.

§ unico. Recusando o presidente da camara ordenar o pagamento de despezas regularmente auctorisadas e liquidadas, poderão os interessados reclamar perante a camara o seu pagamento, e, se esta mantiver a recusa, poderão reclamar perante o governador civil, se o municipio for de l.ª ordem, ou perante a commissão districtal, se o municipio for de 2.ª ordem, e quando se defira a reclamação, com previa audiencia do presidente da camara, será ordenado o pagamento. Esta ordem terá os mesmos effeitos, que teria a do presidente, e poderá servir de base á execução, ficando o thesoureiro obrigado a satisfazel-a pela caução, por todos os seus bens e pelos do seu fiador.

Art. Í03.° As ordens de pagamento são assignadas pelo presidente e subscriptas pelo secretario da camara; devem levar a indicação do titulo, capitulo e artigo do orçamento ou orçamentos a que se refiram as despezas, não podendo comprehender despezas referentes a mais de um artigo; devem indicar a totalidade da verba orçada e da verba já despendida por conta do artigo a que se referem, e mencionar a data da deliberação municipal auctorisando o pagamento.

§ 1.° O secretario que subscrever ordens processadas em contravenção d’este artigo será responsavel pela restituição das quantias indevidamente pagas e, no caso de reincidencia, será demittido.

§ 2.° Nos municipios de Lisboa e Porto o chefe dos serviços de fazenda subscreverá, em vez do secretario, as ordens de pagamento, sendo-lhe applicavel a disposição do paragrapho antecedente.

Art. 104.° Dentro de sessenta dias depois de findo o anno civil, o presidente apresentará á camara a conta geral da gerencia; e a camara, deliberando sobre ella, a adoptará, com modificações ou sem ellas, e a enviará, por intermedio do administrador do concelho ou bairro, ao governador civil dentro de igual praso, a contar da apresentação da conta do presidente.

§ unico. O presidente não preside ás sessões em que a camara discutir a conta por elle apresentada, nem estará presente ás deliberações que a camara tomar a respeito da mesma conta.

Art. 105.° As contas da gerencia municipal, antes de serem enviadas ao administrador do concelho ou bairro, estarão patentes ao publico, durante oito dias, o que se fará constar por editaes affixados nos logares do estylo e publicados em jornal da sede do municipio, havendo-o.

§ 1.° Todos os eleitores e contribuintes da circumscripção municipal têem direito a fazer observações por escripto ácerca das contas, e, as que fizerem, irão juntas ao processo.

§ 2.° Se as contas comprehenderem periodos de gerencias pertencentes a vereação anterior, e nellas se notarem irregularidades, serão os responsaveis convidados pelo presidente da camara municipal a examinar as contas dos periodos que lhes digam respeito e a allegarem, querendo, no praso de oito dias, o que se lhes offereça ácerca das irregularidades notadas, e as explicações que derem se juntarão ao processo.

Art. 106.° A conta geral da gerencia comprehenderá a receita cobrada e a despeza effectuada durante o anno civil, com todos os documentos que a comprovem, descrevendo-se cada verba em separado, pela ordem e sob a numeração com que estiverem descriptas nos orçamentos as verbas correspondentes, regulando-se em tudo o mais pelos preceitos applicaveis dos regulamentos de contabilidade publica e do regimento do tribunal de contas.

§ 1.° Nas observações referentes a cada artigo da receita deverá especificar-se:

1.° A natureza dos rendimentos;

2.° A importancia em que forem computados no orçamento;

3.° A importancia proveniente da liquidação;

4.º A somma cobrada durante a gerencia;

5.º A somma não cobrada, que passa em divida activa para a gerencia seguinte;

§ 2.° Nas observações referentes a cada artigo da despeza deverá especificar-se:

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1.° A natureza das despezas;

2.° A importancia das verbas votadas;

3.° A importancia dos pagamentos effectuados durante a gerencia;

4.° As sommas auctorisadas e em divida, que transitam para a gerencia seguinte.

§ 3.° A conta começará pelos saldos, em cofre, de origens, diversas com que se tiver encerrado a conta da gerencia precedente; descreverá todas as operações de receita e despeza, realisadas durante o anno, na ordem por que tiverem sido auctorisadas nos respectivos orçamentos, e terminará pelos saldos que transitarem para a seguinte gerencia, cuja existencia em cofre se verificará por meio de contagem.

§ 4.° A conta será acompanhada:

1.° Dos documentos originaes de todas as despezas pagas, classificadas por capitulos e artigos dos orçamentos, correspondendo a cada artigo uma relação do numero e importancia dos documentos, se houver mais de um;

2.° De uma copia dos contratos de emprestimos e de outros realisados durante o anno da gerencia;

3.° De uma relação de todas as dividas activas e passivas do municipio, com menção dos artigos orçamentaes a que respeitam;

4.° Dos orçamentos ordinario e supplementares que se refiram á gerencia;

5.° De um mappa comprovativo das differentes verbas de despeza auctorisadas, e do que em relação a cada uma dellas se houver pago no decurso do anno, indicando as differenças para mais ou menos;

6.° Da certidão de relaxe das dividas activas cobraveis por execução administrativa, e nota das acções propostas em juizo para a arrecadação de quaesquer outras;

7.° De quaesquer outros documentos que sirvam para esclarecer e legalisar a administração financeira da corporação.

Art. 107.° Serão julgadas pelo tribunal de contas as contas das camaras municipaes dos concelhos de l.ª ordem e as das demais camaras cuja receita ordinaria exceda 15:000$000 réis, segundo o calculo do respectivo orçamento ordinario. As das restantes camaras serão julgadas pela commissão districtal.

Art. 108.° As sentenças do poder judicial, que condemnarem as camaras ao pagamento de quaesquer quantias, não poderão ser executadas contra as mesmas camaras na fórma commum do codigo do processo civil, mas sim pela forma prescripta nos paragraphos seguintes:

§ 1.° Se as quantias forem liquidas e nos orçamentos estiverem votadas e ainda não despendidas, no todo ou em parte, as verbas para o pagamento das dividas exigiveis os interessados promoverão o seu embolso, até o total da: mesmas verbas, pelos meios auctorisados no § unico do artigo 102.°

§ 2.° Se a camara não estiver habilitada ao pagamento pelas auctorisações orçamentaes, os interessados, depois de liquidadas as dividas pela fórma commum, requererão á camara que as inclua em orçamento; e, se a camara a não incluir no praso de dois mezes, poderão os interessados reclamar perante a estação tutelar que use da faculdade que lhe é conferida pelo artigo 94.°

§ 3.° Se as dividas forem avultadas, em relação ás pôs sés do municipio e aos encargos que tenha de satisfazer terá a estacão tutelar a faculdade, quando delibere pela camara, ou esta o solicite e com audiencia dos credores de auctorisar o pagamento em dois annos civis, vencendo n’este caso as dividas o juro de 5 por cento, a contar da data da resolução da mesma estação.

§ 4.° Se o estado for credor, sómente ao governo pertence auctorisar o pagamento em prestações, podendo permittil-o em mais de das annos, e sem vencimento de juro de móra.

CAPITULO III

Empregados municipaes

SECÇÃO I

Secretario e mais empregados da secretaria

Art. 109.° A camara municipal tem um secretario, ao qual incumbe:

1.° Assistir ás sessões da camara, tomando nota de tudo que se tratar e deliberar, e redigindo as actas, que na sessão immediata submetterá em minuta á approvação e assignatura dos vereadores presentes á sessão anterior, e depois lançará ou fará lançar no livro respectivo;

2.° Certificar e authenticar todos os documentos e actos officiaes da camara;

3.° Preparar o expediente e as informações necessarias para as resoluções da camara;

4.° Exercer as funcções de tabellião em todos os actos contratos em que a camara for outorgante, não podendo porem exigir d’ella emolumentos por este serviço;

5.° Conservar, sob sua guarda e responsabilidade, nos paços do concelho, o archivo municipal;

6.° Dirigir os trabalhos da secretaria, em conformidade com as resoluções da camara e ordens do seu presidente;

7.° Exercer as funcções que lhe forem attribuidas pela legislação eleitoral;

3.° Desempenhar todos os serviços que lhe são commettidos pelas leis de recrutamento, por outras leis especiaes pelos regulamentos de administração publica.

Art. 110.° O secretario da camara é por esta nomeado em concurso, aberto pelo praso de trinta dias pelo menos, e annunciado na folha official e em algum dos periodicos do concelho e da capital do districto, havendo-os, declarando-se nos annuncios os vencimentos do logar.

Art. 111.° São rasões de preferencia para o provimento do cargo de secretario, tanto o bom serviço prestado nas secretarias das camaras municipaes e em repartições administrativas, como a superioridade de habilitações scientificas e litterarias, especialmente as da formatura em direito e as dos cursos de direito administrativo e do commercio.

Art. 112.° Não podem ser nomeados secretarios das camaras:

1.° Os vereadores da mesma camara e as pessoas que tenham com algum d’elles o parentesco designado no artigo 10.° d’este codigo;

2.° Os que tenham com a camara litigio judicial ou administrativo instaurado antes da abertura do concurso;

3.° Os que directa ou indirectamente forem interessados em contratos de fornecimentos para serviços da camara;

4.° Os devedores á camara, e seus fiadores. § unico. O logar de secretario da camara é incompativel com qualquer outro emprego publico.

Art. 113.° O secretario da camara tem o ordenado de 360$000 réis nos concelhos de l.ª ordem, de 240$000 réis nos de 2.ª ordem e de população superior a 10:000 habitantes, e de 180$000 réis nos restantes, alem dos emolumentos que lhe competirem pelas respectivas tabellas.

Art. 114.° O secretario da camara é substituido nos seus impedimentos temporarios pelo empregado que a camara nomear, ou por pessoa estranha, que a camara nomeará, não havendo empregado da secretaria habilitado para as funcções.

Art. 115.° A camara terá nos concelhos de l.ª ordem até quatro amanuenses, cujo ordenado não excederá réis 160$000; nos concelhos de 2.ª ordem e de população superior a 10:000 habitantes, até tres amanuenses, e nos restantes até dois amanuenses, cujo ordenado não excederá 120$000 réis.

§ unico. Nos concelhos, onde haja actualmente maior numero de amanuenses, será este reduzido ao limite correspondente, e, onde o numero for menor, não poderá este,

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sem auctorisação do governo, ser elevado nem ainda até o numero acima fixado.

Art. 116.° Nas secretarias das camaras municipaes dos concelhos de l.ª e de 2.ª ordena poderá haver um continuo, cujo ordenado não excederá 100$000 réis nos primeiros e 80$000 réis nos segundos.

Art. 117.° O quadro dos empregados das secretarias das camaras municipaes de Lisboa e Porto é o que se acha fixado em diploma especial.

SECÇÃO II

Facultativos de partido

Art. 118.° As camaras municipaes, excepto a de Lisboa, terão pelo menos um facultativo de partido e, alem deste, os mais que exigirem as necessidades dos povos e as do serviço municipal.

Art. 119.° Quando se crearem partidos, alem de um, para cada concelho, a cada partido será designada a area da parte do concelho em que o facultativo tem de prestar o serviço clinico, e dentro da qual é obrigado a residir.

Art. 120.° Não poderão crear-se partidos exclusivamente de medicina ou exclusivamente de cirurgia.

Art. 121.° A camara poderá fixar os honorarios dos facultativos pelos seus serviços clinicos, incluindo a respectiva tabella nas condições de provimento dos partidos.

Art. 122.° Os facultativos serão providos em concurso aberto nos termos do artigo 110.°

§ unico. O concurso não se abrirá para os facultativos de certas e determinadas escolas exclusivamente, mas sim para todos os que estão legalmente habilitados a exercer a clinica no reino.

Art. 123.° O augmento dos vencimentos, ou o melhoramento das vantagens dos partidos em beneficio dos providos, só póde fazer-se, observadas as mais disposições deste codigo, sujeitando-se elles a novo concurso.

Art. 124.° Os facultativos de partido, que não quizerem sujeitar-se a novo concurso, continuarão a servir com os mesmos vencimentos e vantagens dos seus provimentos.

Art. 125.° Incumbe obrigatoria e gratuitamente aos facultativos municipaes:

1.° Curar os pobres, os expostos, as creanças desvalidas e abandonadas e os presos;

2.° Vaccinar e revaccinar, sem distincção de classes, e extrahir, recolher e conservar a lympha vaccinica;

3.° Inspeccionar as meretrizes nos dispensarios e na forma do respectivo regulamento, pertencendo esta obrigação em Lisboa e Porto aos sub-delegados de saude;

4.° Desempenhar, fóra de Lisboa e Porto, as attribuições, que pelas leis e regulamentos pertencem aos subdelegados de saude, prestando conselho e coadjuvação profissional á auctoridade administrativa ou policial, quando lhe for necessario para o desempenho das suas attribuições, fazendo os exames e inspecções das praças dos corpos de policia civil e as visitas, exames e diligencias sanitarias, em que o seu concurso for exigido pelas mesmas auctoridades, sob pena de procedimento, nos termos do § 2.° do artigo 188.° do codigo penal;

5.° Desempenhar nas capitães de districto, excepto em Lisboa e Porto, as funcções de delegados de saude, quando forem para esse fim designados pelo governador civil, podendo este suspendel-os de seus vencimentos, depois de ouvidos, até trinta dias em cada anno, se faltarem ao cumprimento das obrigações que por este numero lhes são impostas;

6.° Auxiliarem-se e substituirem-se reciprocamente os do mesmo concelho.

§ 1.° Os facultativos municipaes não podem saír para fóra do concelho por mais de tres dias, sem licença e, havendo um só facultativo, deverá substituir-se por outro, approvado pela camara, e por ella retribuido no caso da licença ser concedida por motivo de doença.

§ 2.° Por occasião de epidemia não podem os facultativos municipaes, sob pena de demissão, ausentar-se do concelho por tempo algum, excepto com licença da camara, que sómente poderá concedel-a por comprovado motivo de doença grave.

§ 3.° Havendo no concelho um só facultativo, não póde despedir-se, sem aviso por escripto, com dois mezes, pelo menos, de antecedencia, salvo fazendo-se substituir, durante esse periodo, por facultativo idóneo, approvado pela camara e o que transgredir estes preceitos incorrerá na pena de abandono do emprego.

Art. 126.° A demissão dos facultativos de partido, as alterações dos vencimentos e das vantagens com que forem providos, e a extincção dos partidos, não podem ser resolvidas sem que elles sejam previamente ouvidos.

§ unico. É applicavel, na parte respectiva, aos facultativos dos hospitaes e misericordias, o que n’esta secção se dispõe a respeito dos facultativos municipaes.

SECÇÃO III

Agentes de policia municipal

Art. 127.° As camaras municipaes terão os zeladores e poderão ter os guardas campestres que forem necessarios para as necessidades policiaes do concelho.

§ 1.° O numero de zeladores e guardas campestres será fixado pelo governo, e os seus ordenados não excederão 100$000 réis nos concelhos de l.ª ordem, ou 80$000 réis nos de 2.ª ordem, alem da metade que lhes pertencer na arrecadação das multas impostas por sua diligencia.

§ 2.° Alem do numero de zeladores fixado pelo governo, poderão as camaras municipaes, quando as conveniencias do serviço assim o exijam, nomear temporariamente para cada freguezia rural até dois zeladores, que sómente serão remunerados com a metade que lhes pertencer na arrecadação das multas impostas por sua diligencia.

Art. 128.° Para estes logares serão nomeados os individuos que tenham sido militares, ainda que licenciados para a reserva, que sejam validos, saibam ler e escrever e mo tenham idade superior a quarenta annos.

§ unico. Só nas faltas destes poderão ser nomeados os que não reunam as condições exigidas n’este artigo.

Art. 129.° Os zeladores e guardas campestres teem a seu cargo fiscalisar o cumprimento das posturas e regulamentos de policia municipal e districtal, tanto urbana como rural, e os serviços municipaes de que forem encarregados pela camara.

§ 1.° Os zeladores e guardas campestres, no julgamento das coimas, que requererem e de que decaírem, não podem, nem por si, nem como representantes da camara, ser condemnados em custas.

§ 2.° Aos zeladores e guardas campestres é permittido o uso e porte de armas no exercicio das suas funcções.

Art. 130.° As camaras municipaes dos concelhos de l.ª ordem podem, com auctorisação do governo, crear um corpo policial, devidamente dotado, a que sejam commettidas, conjunctamente com as funcções policiaes do artigo anterior, as de policia geral, tanto civil, como judiciaria, e cujas praças terão as attribuições das praças dos corpos de policia civil e serão nomeadas pelo administrador do concelho, ficando-lhe immediatamente subordinadas para todos os effeitos disciplinares.

§ 1.° A disposição d’este artigo não é applicavel aos concelhos em que haja corpos de policia pagos pelo thesouro publico.

§ 2.° Uma vez estabelecido o corpo de policia municipal, ficará a sua manutenção constituindo despeza obrigatoria do municipio.

SECÇÃO IV

Outros empregados da camara

Art. 131.° As camaras terão os demais empregados que forem necessarios ao desempenho dos serviços municipaes,

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e cuja creação e dotação for regularmente auctorisada, nos termos d’este codigo ou das leis e regulamentos especiaes.

§ unico. Os carcereiros das cadeias a cargo das camaras serão por ellas remunerados, competindo, porém, ao juiz respectivo nomeal-os, suspendel-os e demittil-os.

CAPITULO IV

Disposições especiaes para a camara municipal de Lisboa

Art. 132.° A camara municipal de Lisboa serve por periodos quadriennaes, rege-se pelas disposições deste codigo ácerca das camaras municipaes dos concelhos de 1.ª ordem, e delibera em todos os assumptos de administração comprehendidos nos artigos 50.°, 51.°, 52.° e 53.°, excepto no que respeita a expostos, ou a outros assumptos por disposição legal excluidos da sua competencia.

Art. 133.° Accrescem á receita ordinaria da camara municipal de Lisboa:

1.° O imposto addicional de 5 por cento sobre direitos de mercê e imposto do sello de todas as mercês honorificas, honras e titulos concedidos pelo ministerio do reino:

2.° As taxas pelas licenças que conceder;

3.° A contribuição especial e respectivos addicionaes a .que se refere o § 3.° do artigo 1.° da lei de 23 de junho de 1888;

4.° A parte do imposto de consumo cobrado pelo estado, nos termos do § 13.° do artigo 1.° da lei de 19 de junho de 1889, deduzida a verba de 96:000$000 réis para o fundo da instrucção primaria, em conformidade com a legislação especial;

5.° O producto liquido do imposto de consumo em Lisboa sobre aguardente, alcools, licores e cremes, nos termos do § 2.° do artigo 5.° da lei de 13 de julho de 1888;

6.° A verba de 12:000$000 réis, com que contribuirão para as despezas do serviço geral de incendios todas as companhias e agencias seguradoras de moveis ou immoveis no municipio de Lisboa;

7.° Os subsidios provenientes de exclusivos de systema de viação ou outros concedidos a companhias ou particures, quando sejam auctorisados pelo governo;

8.° As consignações do thesouro publico auctorisadas por lei;

9.° Os emolumentos cobrados na secretaria da camara municipal.

Art. 134.° Acrescem ás receitas extraordinarias da camara, para serem exclusivamente applicadas á beneficencia municipal:

1.° Os bens e rendimentos das irmandades e confrarias extinctas em Lisboa, nos termos dos n.ºs 4.°, 6.c e 7.° do artigo 253.°

2.° As offertas, esmolas, donativos ou legados, producto de subscripções ou festas de caridade, que constituiam receita do extincto congresso de beneficencia.

Art. 135.° As receitas a que se referem os n.ºs 1.°, 3.° 4.°, 5.° e 8.° do artigo 133.° poderão ser substituidas por uma verba unica, calculada pela media das arrecadações, nos ultimos tres annos, que pelo ministerio da fazenda será entregue á camara em duodecimos mensaes.

Art. 136.° As percentagens addicionaes ás contribuições directas do estado, predial, industrial, de renda de casas e sumptuaria, ou áquellas que as substituirem, não excederão a 50 por cento das referidas contribuições; serão sempre iguaes para a contribuição sumptuaria e para a de renda de casas, e poderão ser differentes para as outras contribuições.

§ unico. Sobre os rendimentos isentos das mencionadas contribuições não poderá ser lançado imposto municipal.

Art. 137.° Do imposto, a que se refere o n.° 6.° do artigo 133.° serão excluidas as companhias que tiverem menos de cinco annos de existencia, se durante elles não derem dividendos superiores a 7 por cento do desembolso effectivo das acções.

Art. 138.° Para a fiscalisação das multas, que constituem receita municipal, e sem prejuizo da competencia das outras praças do corpo da policia civil, será d’elle destacada e posta á disposição da camara a força necessaria, que receberá d’ella instrucções na execução deste serviço, continuando, porém, sujeita ao commandante do corpo no que respeita á disciplina, instrucção e administração, e ficando a camara obrigada a pagar a despeza respectiva ou o augmento do corpo da policia civil, que for para aquelle effeito auctorisado pelo governo, a fim de que não haja prejuizo de outros serviços policiaes.

Art. 139.° O estado satisfará os encargos dos emprestimos do municipio de Lisboa, auctorisados por decreto de 7 de abril de 1886, do capital nominal de 3.401:370$000 e 7.747:830$000 réis, sem prejuizo das garantias estipuladas nos contratos respectivos.

§ unico. Ficam saldadas as contas do estado com o municipio de Lisboa, tanto no que respeita a antigos emprestimos, como no que se refira a outras dividas e a quaesquer indemnisações de bens, terrenos ou valores municipaes apropriados ou adquiridos pelo estado.

Art. 140.° As aposentações dos empregados da camara municipal continuam sujeitas a todos os preceitos do decreto n.° 1 de 17 de julho de 1886, e nenhuma aposentação poderá conceder-se sem que os empregados hajam previamente contribuido para a caixa geral de aposentações, nos termos determinados no regulamento de 8 de outubro de 1891.

§ unico. Do mesmo modo as reformas do pessoal operario ao serviço da camara municipal deverão passar para a caixa de reformas creada pelo decreto n.° 2 de 17 de julho de 1886, fixando-se por acto do governo a subvenção com que o cofre municipal ha de contribuir para a mesma caixa.

Art. 141.° Será fixada por decreto, ouvido o inspector da fazenda municipal, a importancia maxima da despeza annual em cada uma das seguintes categorias de serviços municipaes:

1.° Fazenda municipal;

2.° Beneficencia publica;

3.° Obras publicas;

4.° Salubridade municipal;

5.° Limpeza e regas;

6.° Policia e segurança publica.

§ unico. A dotação de cada uma destas categorias de serviços, depois de fixada nos termos deste artigo, só por lei poderá ser alterada.

Art. 142.° A escripturação central da thesouraria municipal será feita por partidas dobradas, segundo as regras e os principios geraes applicaveis da contabilidade publica.

Art. 143.° Nenhuma ordem de pagamento poderá ser satisfeita, sem que a despeza esteja auctorisada em orçamento executorio, e sem que seja visada previamente pelo chefe da repartição de contabilidade junto do ministerio do reino, que poderá avocar todos os documentos que serviram de base ao processo da ordem, e expedir as instrucções convenientes para a regularidade d’este serviço. O empregado, que satisfizer qualquer ordem de pagamento que não esteja visada, nos termos d’este artigo, será responsavel pela restituição e incorrerá na pena de demissão imposta pelo governo.

§ 1.° Nenhuma ordem de pagamento será visada sem que esteja devidamente formulada, nos termos do artigo 103.° do presente codigo e das disposições de contabilidade publica, na parte applicavel.

§ 2.° O chefe da sobredita repartição de contabilidade, se assim for indispensavel para execução do que lhe incumbe este artigo, poderá requisitar da camara municipal leis empregados do serviço de fazenda, officiaes, amanuenes ou aspirantes, por elle escolhidos, os quaes serão con-

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siderados empregados do estado para os effeitos disciplinares.

§ 3.° O chefe da mesma repartição corresponde-se directamente com o presidente da camara municipal e com o chefe dos serviços de fazenda da mesma camara.

Art. 144.° No caso previsto no § unico do artigo 102.° ao governo incumbe, ouvido o inspector da fazenda municipal, a attribuição ali conferida ao governador civil.

Art. 145.° Continuará havendo um inspector geral da fazenda municipal, escolhido pelo tribunal de contas.

§ 1.° O inspector geral funcciona durante quatro annos, podendo ser destituido antes deste praso ou reconduzido.

§ 2.° O inspector vence uma gratificação mensal de réis 50$000, pagos pelo cofre municipal.

Art. 146.° São attribuições do inspector:

1.° Fiscalisar directamente a escripturação das receitas e das despezas, verificando se ella se realisa com regularidade e nos termos dos regulamentos;

2.° Evitar qualquer dissimulação na receita, ou falsa declaração na despeza;

3.° Reconhecer se na elaboração dos orçamentos, das contas municipaes, e em geral das operações financeiras, são seguidos os preceitos da lei e dos regulamentos em vigor;

4.° Communicar ao presidente da camara municipal as observações que julgar convenientes para aperfeiçoar os differentes serviços financeiros ou evitar quaesquer irregularidades ou abusos;

5.° Reclamar perante a camara municipal contra os actos que manifestamente prejudicarem a administração e os interesses municipaes;

6.° Communicar ao governo todos os actos da camara que sejam dignos de attenção, e em geral quaesquer difficuldades de administração ou deficiencias de leis e regulamentos relativos á gerencia municipal.

Art. 146.° Para os effeitos do artigo anterior todos os livros de escripturação, documentos e elementos, que directa ou indirectamente interessarem á fazenda do municipio, serão sempre, e sem prejuizo do serviço, facultados ao inspector geral.

Art. 147.° O inspector da fazenda municipal dirigirá annualmente ao governo um relatorio circumstanciado sobre a administração financeira do municipio.

§ 1.° O relatorio será apresentado até o fim de junho de cada anno, e abrangerá a gerencia finda em 31 de dezembro anterior.

§~2.° Se o inspector não cumprir o preceito do paragrapho anterior, o governo communicará o facto ao tribunal de contas, a fim de que este escolha novo inspector.

Art. 148.° Fica extincta a commissão municipal de obras publicas.

Art. 149.° Nenhuma obra de abertura de ruas, praças, avenidas, ou de qualquer via de communicação, poderá ser levada a effeito, sem que precedentemente se realisem as seguintes condições:

l.ª A proposta da obra será apresentada e devidamente justificada em sessão da camara por algum dos seus membros ou pelo presidente;

2.ª Approvada a proposta pela camara, o presidente mandará proceder á elaboração dos respectivos projecto e orçamento, e, depois de organisados, abrirá sobre a obra um inquerito por espaço de trinta dias, expondo ao publico em logar conveniente os projectos e mais documentos correlativos;

4.ª Fechado o inquerito e recebidas todas as indicações, pareceres ou informações, que ácerca do assumpto qualquer cidadão fornecer, o presidente sujeitará novamente o negocio assim esclarecido e informado á camara municipal, juntamente com a exposição dos meios financeiros necessarios para a conclusão da obra;

4.ª A camara remetterá ao governo, pelo ministerio do reino, o projecto e orçamento da obra, acompanhados de uma exposição succinta da sua utilidade e dos meios necessarios para o respectivo custeio;

5.ª O governo, ouvido o conselho superior de obras publicas e minas, concederá ou denegará approvação á obra projectada.

Art. 150.° Nenhuma outra obra de construcção, grande reparação ou conservação de valor excedente a 200$000 réis poderá ser effectuada sem que os respectivos projecto e orçamento, devidamente elaborados, tenham sido approvados pelo ministerio do reino, ouvido o conselho superior de obras publicas e minas, sempre que seja conveniente; e a nenhuma obra, qualquer que seja o seu valor, se poderá dar execução, sem que esteja dotada com verba sufficiente em orçamento municipal, ordinario ou supplementar, e que seja executorio, nos termos d’este codigo.

Art. 151.° A camara municipal mandará formular, nos termos do decreto de 31 de dezembro de 1864, pelo seu pessoal technico, um plano geral de viação publica no municipio, e, depois de o approvar, o submetterá á approvação do governo, ouvindo este o conselho superior de obras publicas e minas.

Art. 102.° As despezas correspondentes a cada obra de construcção, conservação ou reparação serão separadamente descriptas e escripturadas, para que na sua final liquidação se possa comparar a despeza total e definitiva com os respectivos orçamentos approvados.

Art. 153.° Os contratos para obras, fornecimentos, transportes e empreitadas municipaes não se poderão realisar sem previa hasta publica, precedendo editos, pelo menos, de vinte dias.

§ unico. Exceptuam-se, alem dos casos previstos no artigo 427.°:

1.° Os contratos que tiverem de executar-se em um só anno, não obrigando a despeza total superior a 200$000 réis;

2.° Os contratos que tiverem de durar até dez annos, não obrigando a despeza total annual superior a 100$000 réis.

Art. 154.° As adjudicações publicas relativas a fornecimentos, que não convenha sujeitar a concorrencia illimitada, poderão ser restrictas a pessoas que, anteriormente e por modo prefixado nas condições geraes da empreitada, demonstrem a sua capacidade.

Art. 105.° As obras de construcção nova, de grande reparação, e ainda as de conservação ordinaria serão, em regra, feitas de empreitada, ou pela totalidade, ou por unidades de trabalho, tendo-se em vista nos contratos a celebrar para esse fim, que os empreiteiros assegurem trabalho ao pessoal operario em serviço do municipio.

Art. 156.° As condições geraes de cada empreitada deverão expressamente indicar:

1.° A base da licitação, isto é, a importancia maxima que podem attingir as propostas dos recorrentes;

2.° A quantia que deve caucionar por parte do adjudicatario o cumprimento do seu contrato e a perfeição dos objectos fornecidos ou obras realisadas;

3.° A qualidade dos documentos que devem ser produzidos, se a empreitada se referir a fornecimentos especificados no artigo precedente;

4.° A responsabilidade dos empreiteiros e fornecedores no caso de não cumprirem os seus contratos.

Art. 157.° Quando a uma licitação não haja concorrentes, nem propostas particulares, nos termos do n.° 4.° do § 1.° do artigo 427.°, poder-se-ha novamente abrir licitação sobre o mesmo fornecimento, obra, transporte ou empreitada com o augmento de 5 por cento sobre a base da licitação primitiva.

Art. 158.° Se os augmentos successivos attingirem 30 por cento, a obra, transporte ou empreitada, sendo possivel, será levada a effeito por directa administração da camara municipal.

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390 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

TITULO V

Juntas de parochia

CAPITULO I

Sua organisação, reuniões e empregados

Art. 159.° A junta de parochia compõe-se de tres vogaes nas freguezias de população não excedente a 1:000 habitantes e de cinco vogaes nas de população superior.

§ 1.° O parocho é vogal nato e presidente da junta de parochia; é substituido pelo ecclesiastico que fizer as vezes delle no desempenho das funcções parochiaes e na falta ou impedimento deste pelo vogal mais velho da junta, preferindo sempre o effectivo ao substituto em exercicio, e este ao supplente.

§ 2.° Quando uma freguezia seja annexada a outra, ao parocho desta pertence a presidencia da junta de parochia.

Art. 160.° A parochia em que não houver pelo menos vinte cidadãos elegiveis para os cargos administrativos, ou em que não concorrerem á eleição da junta eleitores em numero legal, depois de duas convocações successivas, será annexada administrativamente áquella das mais proximas que o governador civil designar, ouvindo a commissão districtal e as respectivas juntas em exercicio.

§ 1.° Quando a annexação de uma parochia se tiver realisado em virtude da primeira hypothese deste artigo, e se provar posteriormente que ella tem já o numero legal de elegiveis, se a desannexação for requerida pela maioria d’elles, poderá o governador civil determinal-a, ouvindo a commissão districtal.

§ 2.° Se a annexação tiver sido motivada por falta de concorrencia de eleitores, deverá o governador civil determinar a desannexação se a maioria dos eleitores lh’a requerer.

§ 3.° As annexações e desannexações importam a dissolução das juntas de parochia das respectivas freguezias, devendo proceder-se a novas eleições dentro de quarenta dias, desde a publicação dos alvarás que a determinaram, a qual será sempre feita na folha official.

§ 4.° É applicavel aos casos de annexação, previstos neste artigo, o disposto no § 1.° do artigo 3.°

§ 5.° No caso de desannexação, todos os edificios e bens proprios, que não tenham sido alienados, voltam para a posse da freguezia a que pertenciam antes da annexação.

Art. 161.° Ajunta de parochia, na primeira sessão depois da posse, verificará a exactidão do inventario das alfaias, vasos sagrados, ornamentos, roupas e utensilios do culto religioso, que todos serão entregues á guarda do parocho, e se está conforme o dos mais haveres da junta, dando parte ao administrador do concelho de qualquer falta que encontrar.

Ar. 162.° Nas parochias onde houver thesoureiro ecclesiastico deverá este, se o parocho nisso convier, ter a seu cargo a guarda das alfaias, vasos sagrados, ornamentos e quaesquer objectos pertencentes á fabrica da igreja, o que tudo lhe será entregue por inventario e sob sua immediata responsabilidade.

Art. 163.° Se não houver inventarios de todos os bens e valores pertencentes á parochia e fabrica da igreja parochial e suas dependentes, ajunta, immediatamente á posse, procederá á sua organisação, e enviará copia ao administrador do concelho

§ unico. N’esses inventarios se fará menção de titulos ou quaesquer documentos que digam respeito aos objectos inventariados.

Art. 164.° A junta de parochia tem uma sessão ordinaria de quinze em quinze dias, no dia e hora que designar na sua primeira sessão de cada armo, e as extraordinarias, que a conveniencia da parochia exigir, podendo ser uma e outras ao domingo.

§ l.° Para as sessões ordinarias não se carece de convocação; para as extraordinarias será feita a convocação pelo presidente, de sua iniciativa, ou quando lhe seja requisitado pelo regedor ou exigido pelo administrador do concelho.

§ 2.°. Quando o presidente se recuse a convocar extraordinariaments a junta, em cumprimento de exigencia % do administrador do concelho, poderá este mandal-a reunir por ordem escripta transmittida ao regedor.

Art. 165.° A junta de parochia, se o julgar conveniente, póde alterar o dia e hora das sessões ordinarias, annunciando previamente ao publico a alteração, por editaes affixados no logar do estylo, com antecipação, pelo menos, de tres dias.

Art. 166.° Quando a junta não tenha casa propria para as suas sessões, poderá reunir se na sacristia, ou em qualquer outra casa de despacho que designar, mas nunca na igreja.

§ unico. As duvidas que a este respeito se levantarem serão resolvidas pelo administrador do concelho.

Art. 167.° O regedor deve assistir ás sessões da junta; toma assento ao lado esquerdo do presidente, e póde emittir o seu parecer sobre os assumptos que se discutirem.

§ unico. Para as sessões extraordinarias será sempre convidado pelo presidente, designando-se lhe dia, hora e objecto da reunião.

Art. 168.° A junta corresponde-se directamente por via do seu presidente, sobre assumptos da sua competencia, com as auctoridades e repartições publicas do concelho e do districto; ao governador civil, porém, e ás auctoridades e repartições superiores dirigir-se-ha por meio de representações entregues ao administrador do concelho, que pelas vias competentes, as fará seguir ao seu destino devidamente informadas.

Art. 169.° A junta tem um secretario e um thesoureiro, que livremente nomeará e da mesma fórma substituirá quando convenha aos interesses da parochia, podendo a escolha recaír em vogaes da mesma corporação.

Art. 170.° Incumbe ao secretario da junta de parochia:

J.° Redigir e lavrar as actas das sessões no livro respectivo, e certificar e authenticar todos os documentos dimanados da junta;

2.° Conservar sob sua guarda e responsabilidade, e na casa das sessões, quando para isso tenha as condições proprias, todos os livros e documentos que constituam o archivo da corporação;

3.° Fazer a correspondencia sob a direcção do presidente e desempenhar os trabalhos de escripturação e contabilidade inherentes ás attribuições da junta.

Art. 171.° Ao secretario, que não seja vogal da junta, será arbitrada por esta uma gratificação nunca excedente a 24$000 réis annuaes.

Art. 172.° O thesoureiro da junta é obrigado:

1.° A arrecadar toda a receita parochial, e a guardar sob sua responsabilidade os capitães que constituirem fundo da junta, emquanto não tiverem applicação definitiva, e quaesquer titulos ou papeis de credito a ella pertencente;

2.° A satisfazer todas as ordens de pagamento que forem assignadas pelo presidente;

3.° A escripturar todas as guias de receita e ordens de pagamento;

4.° A apresentar á junta um balancete da receita e des-peza effectuada, sempre que ella o exija.

Art. 173.° Ao thesoureiro, que não seja vogal da junta, será arbitrada por esta uma percentagem não excedente a 2 por cento sobre a receita cobrada por elle, excluindo a proveniente de emprestimos ou subsidios.

Art. 174.° A junta poderá ter os demais empregados, que forem indispensaveis para o desempenho dos serviços parochiaes, e cujo numero e dotação for fixada nos termos deste codigo.

Art. 175.° A nomeação e exoneração do servo ou sacristão da igreja serão da exclusiva competencia do paro-

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Cho, de quem só ficará dependente, e o seu ordenado será despeza obrigatoria da junta, nas parochias onde por outra fórma não seja remunerado.

§ unico. Nas parochias onde por costume antigo a nomeação d’este empregado depende do prelado diocesano, será mantido esse costume.

CAPITULO II

Attribuições

Art. 176.° As attribuições da junta de parochia são deliberativas ou consultivas; e no desempenho das primeiras compete-lhe resolver:

1.° Sobre administração dos bens e rendimento da fabrica da igreja parochial, das capellas ou ermidas della dependentes, e das capellas ou ermidas da parochia que não forem exceptuadas da sua administração por expressa disposição legal;

2.° Sobre administração dos bens e rendimentos de institutos de piedade, beneficencia ou instrucção por ella fundados ou por particulares em beneficio da parochia, observando-se as clausulas da instituição e a legislação especial que regular este assumpto;

3.° Sobre administração dos bens, rendimentos, legados ou donativos com applicação especial ao culto, á beneficencia ou á instrucção;

4.° Sobre administração dos bens e rendimentos da parochia;

5.° Sobre administração de celleiros communs ou de outros estabelecimentos parochiaes e applicação dos seus rendimentos aos fins a que forem destinados;

6.° Sobre applicação dos bens e edificios parochiaes a fins diversos d’aquelles a que eram destinados, mas de utilidade parochial;

7.° Sobre concessão de servidões em bens parochiaes, as quaes conservarão sempre a natureza de precarias;

8.° Sobre acceitação de heranças, legados ou doações feitos á parochia ou a estabelecimentos parochiaes;

9.° Sobre acquisição de bens mobiliarios e immobiliarios para os serviços da parochia ou dos estabelecimentos que ella administra e sobre alienação dos que forem dispensaveis d’esses serviços;

10.° Sobre a conveniencia de ser decretada a utilidade publica das expropriações ou a sua urgencia para obras de interesse da parochia, e bem assim sobre a realisação de expropriações, cuja utilidade estiver declarada por lei ou decretada pelo governo;

11.° Sobre arrendamentos e suas condições;

12.° Sobre contratos para execução de obras, serviços e fornecimentos de interesse da parochia;

13.° Sobre pleitos a intentar e defender, e sobre a desistencia, confissão e transacção ácerca de pleitos pendentes;

14.° Sobre accordos com particulares ou com outra corporação para a realisação de melhoramentos de interesse parochial;

15.° Sobre nomeação, suspensão e demissão dos empregados parochiaes, com excepção do servo ou sacristão da igreja;

16.° Sobre creação de empregos para os serviços parochiaes, sua dotação e extincção, ouvindo n’este caso os empregados n’elles providos;

17.° Sobre lançamento de derrammas;

18.° Sobre orçamentos, dotação dos serviços e fixação das despezas parochiaes;

19.° Sobre emprestimos, sua dotação e encargos;

20.° Sobre o modo de fruição dos bens, pastos, aguas e quaesquer fructos do logradouro commum e exclusivo da parochia ou dos moradores de parte d’ella e sobre lançamento de taxas pelo seu uso;

21.° Sobre plantação de matas e arvoredos e côrte de lenhas nos terrenos parochiaes;

22.° Sobre arroteamento e sementeira de terrenos parochiaes incultos e esgoto de pantanos;

23.° Sobre posturas ácerca dos assumptos previstos nos n.ºs 20.°, 21.° e 22.°, podendo estabelecer multas dentro dos limites do artigo 486.° do codigo penal;

24.° Sobre obras de construcçao, reparação e conservação das propriedades parochiaes, e dos caminhos vicinaes do uso da parochia, que não estejam classificados como estradas municipaes;

25.° Sobre applicação do imposto de prestação de trabalho á construcçao e reparação de caminhos parochiaes e de fontes para abastecimento dos moradores de algum logar da parochia;

26.° Sobre estabelecimento, ampliação, suppressão e administração de cemiterios fora da capital do concelho, e fixação de taxas pelos enterramentos e concessão de terrenos nos mesmos cemiterios, ficando todavia resalvados os direitos da junta com respeito a algum cemiterio que haja construido na capital do concelho;

27.° Sobre a fundação de estabelecimentos de utilidade para a parochia, sua dotação e extincção;

28.° Sobre todos os assumptos da sua competencia, nos termos deste codigo ou de leis especiaes.

Art. 177.° As deliberações sobre emprestimos não poderão ser approvadas pela estação tutelar sem que sobre o assumpto haja emittido parecer a maioria dos vinte eleitores da parochia maiores contribuintes da contribuição predial, para esse effeito convocados pelo presidente da junta, tendo em vista o recenseamento eleitoral vigente e os esclarecimentos requisitados da repartição de fazenda.

§ 1.° A convocação dos maiores contribuintes repete-se as vezes necessarias para a constituição da assembléa, sendo sempre feita com antecipação de tres dias, pelo menos, e o parecer, lavrado pelo secretario da junta, acompanhará a copia da acta respectiva da mesma corporação.

§ 2.° É applicavel a disposição do § 2.° do artigo 57.° á reunião dos maiores contribuintes da parochia.

Art. 178.° No desempenho das funccões consultivas cumpre á junta dar o seu parecer sobre todos os assumptos em que for ouvida pelos magistrados administrativos ou qualquer auctoridade publica, pela camara municipal ou sobre aquelles que as leis determinarem.

Art. 179.° Não são executorias sem approvação do governo, por decreto publicado na folha official, as deliberações parochiaes:

1.° Sobre creação de empregos e augmento de dotação dos legalmente creados;

2.° Sobre emprestimos, que sómente poderão rer auctorisados para exclusiva applicação a obras de construcçao e reparação da igreja e cemiterio parochial, ou ainda para outro fim de utilidade da parochia, mas neste caso sómente quando os respectivos encargos sejam custeaveis pelas receitas ordinarias da junta, depois de satisfeitas todas as despezas obrigatorias;

Art. 180.° Não são executorias, sem approvação do governador civil, as deliberações parochiaes:

1.° Sobre orçamentos, dotação de serviços e fixação de despezas parochiaes;

2.° Sobre derramas ou quaesquer taxas;

3.° Sobre acquisição ou alienação de bens immobiliarios, titulos, acções, inscripções e em geral de quaesquer papeis de credito, sobre pleitos a intentar, transacções, confissão ou desistencia dos mesmos;

4.° Sobre regulamentos e posturas de execução permanente;

5.° Sobre contratos de execução de obras ou serviços, de fornecimentos e de arrendamentos, quando o seu valor exceda 100$000 réis ou devam durar por mais de um anno;

6.° Sobre estabelecimento, ampliação ou suppressão de cemiterios

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7.° Sobre acceitação de doações em beneficio da parochia ou de estabelecimentos parochiaes;

8.° Sobre applicação de bens e edificios parochiaes a fins diversos d’aquelles a que eram destinados.

§ unico. Todas as deliberações parochiaes não enumeradas neste artigo e no antecedente são definitivas, e como taes são desde logo executorias, independentemente da approvação de qualquer auctoridade ou corpo administrativo.

Art. 181.° A junta, no praso de quinze dias, a contar de cada sessão, enviará ao administrador do concelho, para ser remettida ao governador civil, copia em duplicado da respectiva acta, bem como dos orçamentos, autos e contratos a que se refira, cobrando recibo da entrega.

§ 1.° O administrador lançará n’aquella copia a declaração da data em que passou recibo, e a enviará no praso de oito dias ao governador civil, acompanhada da sua informação sobre a legalidade e interesse publico das respectivas deliberações.

§ 2.° O governador civil, quando naquella copia encontre deliberações dependentes da approvação do governo, a remetterá ao ministerio do reino, devidamente instruida e informada, dentro do praso de oito dias depois da sua recepção.

§ 3.° Ás deliberações dependentes da jurisdicção tutelar do governador civil, este concederá ou denegará approvação, no todo ou em parte, e tambem sob condição suspensiva ou resolutiva, dentro de quarenta dias, a contar da entrega da copia na administração do concelho, e, findo este praso, serão executorias as deliberações sobre aã quaes o mesmo magistrado não haja tomado resolução.

§ 4.° Póde a junta de parochia reclamar para o governo no praso de trinta dias contra a resolução do governador civil que denegar approvação ás suas deliberações, observando-se na parte applicavel os, artigos 59.° e 60.°

Art. 182.° Não são sujeitos á administração da junta de parochia:

1.° Os bens e rendimentos das irmandades e confrarias legalmente erectas; dos hospitaes e albergarias; e das capellas ou ermidas pertencentes a particulares, ou a cuja conservação e decencia regularmente provejam os moradores de algum logar da parochia;

2.° Os passaes e casas de residencia dos parochos ou de qualquer empregado no serviço do culto;

3.° Os rendimentos, benesses e quaesquer emolumentos applicados á sustentação dos parochos;

4.° A fabrica das cathedraes;

5.° A fabrica dos templos em que as collegiadas ou irmandades forem, ou se prestem a ser fabriqueiras;

6.° A fabrica dos templos que, por serem monumentos de arte ou de gloria nacional, ou por outro motivo, estão a cargo do governo ou que, servindo de parochiaes, são tambem destinados a outros usos religiosos.

Art. 183.° É permittido á junta de parochia ceder a administração da fabrica da igreja parochial ou das suas dependentes a qualquer irmandade ou confraria, erecta nas mesmas igrejas, que, precedendo deliberação da respectiva assembléa geral, para isso for auctorisada pelo governador civil, quando a cedencia importe diminuição de encargos para os parochianos.

§ unico. A auctorisação do governador civil só póde ser revogada quando á corporação fabriqueira faltarem recursos com quer custeie os encargos da fabrica.

Art. 184.° Ás irmandades ou confrarias fabriqueiras pertencerão os encargos inherentes á fabrica, e bem assim a administração de todos os seus bens e rendimentos, com as mesmas attribuições e restricções com que essa administração pertence ás juntas de parochia, competindo ao parocho tomar parte nas deliberações das mesas, sobre assumptos relativos aos interesses ecclesiasticos da parochia e á administração da fabrica.

§ 1.° As duvidas que a este respeito se suscitarem entre os parochos e as juntas ou irmandades e confrarias, serão resolvidas pelo governador civil com recurso para o governo.

§ 2.e Aos parochos pertence sempre a guarda das chaves das igrejas parochiaes e suas dependentes e a guarda e a policia dos mesmos templos.

Art. 185.° Compete ainda á junta de parochia, como commissão de beneficencia:

1.° Fazer o arrolamento de todas as pessoas necessitadas que careçam de soccorros publicos;

2.° Promover, solicitar e distribuir esses soccorros, conforme as necessidades de cada um, especialmente por occasião de epidemias e de outras calamidades publicas;

3.° Promover a creação de commissões que a auxiliem nos serviços de beneficencia;

4.° Solicitar das auctoridades providencias para o caso de calamidades publicas, para a remoção de alienados e conducção de enfermos aos hospitaes, quando não tenham recursos para serem tratados em suas casas;

5.° Fiscalisar o tratamento dos expostos, desvalidos e abandonados entregues a amas da sua freguezia, participando ás corporações ou auctoridades, de quem haja recebido instrucções, as faltas que notar;

6.° Praticar os demais serviços de beneficencia que lhe forem incumbidos por lei ou pelas auctoridades superiores.

Art. 186.° As deliberações da junta, tanto definitivas, como provisorias, depois de confirmadas pela tutela, podem ser revogadas pelos meios contenciosos, nos casos de nullidade previstos no artigo 31.° e nos de offensa de direitos fundados nas leis ou regulamentos de administração publica.

§ unico. São competentes para usar destes meios o ministerio publico e as pessoas cujos direitos forem offendidos pelas deliberações.

Art. 187.° Ao presidente da junta pertence executar e fazer executar as deliberações della, e sobre os serviços parochiaes lhe incumbem attribuições identicas ás enumeradas no § 1.° do artigo 62.°

CAPITULO III

Fazenda e contabilidade parochial

Art. 188.° A receita da parochia é ordinaria ou extraordinaria.

§ 1.° Constituem receita ordinaria:

1.° Os rendimentos dos bens proprios e dos estabelecimentos da parochia;

2.° As taxas pelo uso dos bens do logradouro parochial, as quaes não são sujeitas a deducção alguma para o municipio;

3.° Os rendimentos dos cemiterios parochiaes, dos bens applicados á fabrica da igreja parochial ou capellas administradas pela junta e dos direitos que a fabrica, por lei ou estylo, estiver auctorisada a receber nos baptismos, casamentos e obitos;

4.° A taxa não excedente a 200 réis por cada casamento, que se realisar na parochia, de pessoas não reputadas pobres, quando por lei ou estylo não esteja estabelecida outra taxa;

5.° As taxas pelo aluguer de cadeiras ou bancos na igreja parochial ou nas capellas d’ella dependentes;

6.° As taxas pela permissão de ter bancos ou cadeira» na igreja parochial e suas dependentes;

7.° As esmolas e offertas encontradas nos altares ou nas caixas, para esse fim collocadas na igreja, capellas ou ermidas administradas pela junta de parochia, ou junto de quaesquer imagens ou retábulos, quando não pertençam a irmandade ou confraria;

8.° O producto das collectas lançadas ás irmandades e confrarias;

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9.° As multas impostas por lei, posturas ou regulamento a beneficio da parochia;

10.° As dividas activas;

11.° O imposto de prestação de trabalho ou o valor correspondente em dinheiro;

12.° Quaesquer outros rendimentos permanentes destinados por lei a constituir receita parochial.

§ 2.° Constituem receita extraordinaria:

1.° As derramas sobre os parochianos;

2.° As heranças, donativos, legados e doações;

3.° O producto de emprestimos;

4.° O producto de alienação de bens;

5.° O producto de bazares, auctorisados pelo administrador do concelho ou bairro, e o producto de subscripções destinadas a beneficio da parochia;

6.° Os subsidies do estado ou do municipio para melhoramentos ou encargos parochiaes;

7.° Outros quaesquer rendimentos incertos e eventuaes.

Art. 189.° As derramas sobre os parochianos sómente poderão ser lançadas, na falta ou insufficiencia de outras receitas para custear as despezas do culto, as de construcção e de reparação da igreja porochial ou suas dependentes e do cemiterio parochial, as de reparação da residencia do parocho ou os encargos de emprestimos auctorisados.

Art. 190.° O producto da derrama não poderá exceder quantia igual a 15 por cento sobre as contribuições directas do estado, predial, industrial, de renda de casa e sumptuaria, ou sobre aquellas que as substituirem, relativas a contribuintes, predios ou estabelecimentos da parochia.

Art. 191.° A derrama será lançada, na proporção dos presumidos rendimentos, sobre os individuos domiciliados na parochia, com excepção dos rendimentos isentos do imposto municipal designado no n.° 2.° do artigo 68.°, e sobre os individuos de fóra da parochia, que ali tenham predios ou estabelecimentos sujeitos a alguma das contribuições directas do estado, mencionadas no artigo anterior.

§ unico. O contribuinte sujeito ás contribuições directas designadas no artigo 190.°, não poderá ser collectado para as despezas parochiaes em quantia superior á que lhe pertenceria, se a percentagem $a derrama fosse cobrada cumulativamente com as mesmas contribuições.

Art. 192.° O rol da derrama será organisado no mez de setembro, para a gerencia do anno immediato, ouvindo a junta dois informadores, nomeados pela camara municipal de entre os contribuintes da parochia, ou nomeados pela junta, quando a camara não faça esta nomeação.

Art. 193.° O rol será publicado por editaes, lidos á missa conventual, e affixados na porta da igreja e outros logares publicos, e estará patente por quinze dias na casa das sessões da junta ou noutra casa, que for annunciada, para ser examinado por todos os contribuintes da parochia.

§ 1.° Nos oito dias immediatos ajunta julga as reclamações apresentadas contra o rol, cabendo da decisão recurso para a camara municipal, dentro de quinze dias, desde a sua data.

§ 2.° A camara municipal julga, dentro de oito dias, com recurso para a commissão districtal, interposto nos dez dias immediatos, os recursos que lhe forem apresentados directamente, podendo requisitar da junta de parochia ou de qualquer repartição publica os esclarecimentos convenientes e fazendo intimar os informadores parochiaes para comparecerem perante ella, a fim de lhe prestarem as informações necessarias.

§ 3.° A decisão da camara será fundamentada, e, quando de provimento ao recurso, será intimada á junta de parochia, que no praso designado no paragrapho anterior poderá recorrer para a commissão districtal.

§ 4.° As reclamações e recursos, que neto forem decidido dentro dos prasos designados n’este artigo, consideram-se indeferidos, e do indeferimento poderá recorrer-se para a estação superior, que avocará o processo affecto á estação recorrida, quando não seja entregue ao reclamante ou recorrente.

§ õ.° As reclamações ou recursos desattendidos no todo ou em parte pela junta ou pela camara serão entregues aos interessados, mediante recibo.

§ 6.° Os contribuintes, que forem collectados sem fundamento algum, podem a todo o tempo reclamar e recorrer nos termos d’este artigo, e, se forem attendidos, será annullado o respectivo conhecimento ou restituida a quantia já paga.

Art. 194.° A repartição de fazenda do concelho facultará gratuitamente á junta de parochia todos os esclarecimentos de que esta careça para o serviço do lançamento da derrama.

Art. 195.° A cobrança da derrama será feita pelo thesoureiro da junta de parochia no mez de janeiro do anno a cuja gerencia é destinada.

Art. 196.° Á junta de parochia é tambem permittido exigir dos parochianos, para melhoramento das fontes e caminhos parochiaes, ou para outras obras a cargo d’ella, até dois dias de trabalho em cada anno, em conformidade com o disposto no artigo 172.°

§ 1.° O rol de lançamento d’este imposto será organisado depois de approvado o orçamento parochial, no qual serão fixadas as tarifas da correspondente remissão, em conformidade com as da camara municipal, e, com indicação das mesmas tarifas, estará patente á reclamação, com a publicidade e durante o tempo prescripto no artigo 193.°, podendo interpor-se as reclamações e recursos ali facultados, observados os mesmos prasos e formalidades.

§ 2.° A epocha de cobrança d’este imposto Bera fixada por accordo entre a camara municipal e a junta de parochia, e, na falta de accordo, pelo governador civil, ouvida a commissão districtal.

Art. 197.° Poderá a junta de parochia collectar para as despezas da fabrica da igreja parochial ou suas dependentes as irmandades e confrarias n’ellas respectivamente erectas, na proporção dos seus rendimentos, e sem prejuizo das suas despezas obrigatorias, precedendo audiencia d’aquellas corporações e auctorisação do governador civil.

Art. 198.° Ás derramas e rendimentos parochiaes é applicavel a disposição do artigo 77.°

Art. 199.° As despezas da parochia são obrigatorias ou facultativas.

§ 1.° São obrigatorias:

1.° As do culto, paramentos, vasos sagrados, alfaias e guisamentos;

2.° As da construcção, reparação e conservação da igreja parochial, suas dependentes e edificios parochiaes;

3.° As da reparação da residencia parochial, a que o parocho não for obrigado como usufructuario;

4.° As dos impostos, pensões e encargos a que estiverem sujeitas as propriedades e rendimentos parochiaes;

5.° As da compra de livros necessarios para o registo parochial e da remessa dos respectivos exemplares para o escrivão da camara ecclesiastica da diocese, não sendo obrigadas a emolumentos pelos termos de abertura e encerramento nem pelas rubricas dos mesmos livros;

6.° As do vencimento do seu pessoal;

7.° As do expediente da junta e da regedoria da parochia;

8.° As dos litigios da parochia

9.° As do pagamento das dividas exigiveis;

10.° As da construcção, reparação e conservação dos cemiterios parochiaes;

11.° As da conducção para os cemiterios dos cadaveres encontrados em quaesquer logares, bem como dos cadaveres das pessoas pobres cujos parentes não possam satis-

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fazer taes despezas, não havendo misericordia ou corporação de beneficencia com obrigação de as satisfazer;

12.° As resultantes de contratos regularmente celebrados;

13.° As da dotação de todos os serviços parochiaes regularmente estabelecidos;

14.° As de construcção e reparação das fontes e caminhos parochiaes;

l5.° Outras quaesquer que por lei forem postas a cargo das juntas de parochia.

§ 2.° São facultativas todas as despezas não enumera das no paragrapho antecedente, que forem de utilidade para a parochia e consequentes do exercicio de attribuições legaes da junta.

Art. 200.° O orçamento parochial é proposto e approvado no mez de outubro e á sua organisação se applicam as regras estabelecidas para a organisação do orçamento municipal, devendo ser levada perante o governador civil do districto qualquer reclamação feita depois de approvado pela junta, e competindo ao mesmo magistrado as faculdades que sobre identico assumpto assistem ás estações tutelares das camaras municipaes.

Art. 201.° Em tudo o que diz respeito á contabilidade parochial se observará na parte applicavel o disposto para a contabilidade municipal.

CAPITULO VI

Eleições dos corpos administrativos

CAPITULO I

Disposições geraes e actos preparatorios

Art. 202.° As camaras municipaes e juntas de parochia são eleitas directamente pelos cidadãos, cuja capacidade eleitoral esteja para esse effeito verificada no respectivo recenseamento politico, feito segundo a legislação eleitoral.

Art. 203.° As eleições ordinarias das camaras municipaes e juntas de parochia são feitas no mez de novembro do ultimo triennio do exercicio ou do quadriennio quanto á camara municipal de Lisboa, sendo as municipaes no primeiro domingo e as parochiaes no ultimo.

Art. 204.° Quando tenha de proceder-se á eleição de algum dos mesmos corpos administrativos, por motivo de dissolução, annullação ou falta de eleição, e quando no primeiro caso o dia para ella se effectuar não tenha sido designado no decreto de dissolução, será pelo governedor civil fixado um domingo para a nova eleição se realisar dentro dos prasos designados n’este codigo, competindo ao mesmo magistrado, nos outros dois casos, fixar um domingo dentro de trinta dias, a contar da data da resolução da annullação ou da que mandou repetir o acto eleitoral.

Art. 205.° As eleições fazem-se por assembléas de eleitores, havendo uma só assembléa nas eleições parochiaes ainda no caso de freguezias annexadas, e as precisas assembléas nas eleições municipaes, conforme o determinado na legislação eleitoral.

Art. 206.° As assembléas eleitoraes são convocadas por alvará do governador civil dirigido aos administradores dos concelhos ou bairros, e por elles annunciado em edital, affixado nas portas das igrejas, e lido pelos parodiou por occasião das missas conventuaes, que se celebrarem até o dia da eleição.

§ unico. O edital convocatorio será affixado e publicado oito dias, pelo menos, antes do designado para a eleição, e n’elle deverá declarar-se:

1.° O dia e hora da eleição;

2.° As assembléas que são convocadas, freguezias de que se compõem, e logares das reuniões;

3.° Os cargos para que se faz a eleição numero de vogaes a eleger, e duração das suas funcções.

Art. 207.° Os actos preparatorios das eleições e os actos eleitoraes serão regulados pela forma determinada na legislação eleitoral, salvas as modificações prescriptas n’este codigo.

§ unico. Para as actas das eleições parochiaes e para as das eleições municipaes, nos concelhos onde haja uma é assembléa, serão authenticados apenas dois cadernos.

CAPITULO II

Votação das assembléas primarias

Art. 208.° Nas eleições parochiaes, cujas assembléas sejam constituidas por menos de quinhentos eleitores, a mesa será composta, alem do presidente, de um escrutinador, um secretario e seus revesadores, fazendo o secretario a descarga dos eleitores, que forem, votando n’um dos cadernos para isso destinados.

§ unico. Nas eleições parochiaes a auctoridade administrativa é representada pelo regedor de parochia.

Art. 209.° Se em alguma assembléa eleitoral, até duas horas depois da fixada para a eleição, não comparecer numero sufficiente de eleitores para constituir a mesa, o presidente lavrará ou mandará lavrar auto em que se declare esta falta, e que será assignado por elle, pelo parocho e pela auctoridade administrativa.

§ unico. Esse auto será logo enviado ao presidente da assembléa de apuramento do circulo, ou ao governador civil, se a assembléa a que se refere for a unica do circulo.

Art. 210.° A votação faz-se por escrutinio secreto, devendo as, listas conter em separado, e com a competente designação, os nomes dos cidadãos escolhidos para vogaes effectivos e os dos escolhidos para vogaes substitutos.

§ 1.° As listas, a que faltar este requisito, serão annulladas.

§ 2.° Não são nullas as listas que contiverem nomes de mais ou de menos; mas não serão contados os nomes a mais dos que houver a eleger.

Art. 211.° A nenhum nome escripto nas listas em devida fórma deixarão de contar-se os votos, sem attenção á elegibilidade ou inelegibilidade dos votados, nem ás causas de exclusão que a respeito d’elles possam constar.

Art. 212.° Nas eleições parochiaes e nas dos concelhos de uma só assembléa, as actas originaes e mais papeis do processo eleitoral serão enviados dentro de vinte e quatro horas, a contar da conclusão do acto eleitoral, ao administrador do concelho, para este os remetter ao governador civil, dentro de igual praso, coutado da recepção d’elles; a copia da acta e um dos cadernos dos eleitores serão enviados á camara municipal para ficarem ali archivados, salvo sendo precisos para a apreciação da validade do processo eleitoral, quando o tribunal que tiver de conhecer d’ella, de sua iniciativa ou a requerimento dos interessados, ordenar a sua juncção ao mesmo processo.

CAPITULO III

Apuramento

Art. 213.° O apuramento dos votos nas eleições dos corpos administrativos faz-se pela fórma determinada na legislação eleitoral.

Art. 214.° Nas eleições parochiaes, e nas dos circulos de uma só assembléa, a mesa da assembléa primaria faz o apuramento definitivo, e proclama como eleitos os individuos que tiverem sido legalmente votados até o numero que a assembléa foi chamada a eleger, resolvendo as duvidas suscitadas ácerca da identidade dos votados, e a cada um dos eleitos participa logo a sua eleição.

§ unico. No caso de igualdade de votos apurar-se-ha o mais velho, segundo a idade que constar dos cadernos do recenseamento, na falta de outro documento authentico.

Art. 215.° Nas eleições para que houver mais de uma assembléa; o apuramento effectuar-se-ha em conformidade

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das disposições da legislação eleitoral, sendo proclamados j por tres dos eleitores que o pedirem, dando-se recibo aos os eleitos, conforme o disposto no artigo antecedente.

Art. 216.° Nos municipios de Lisboa e Porto as assembléas de apuramento dos circulos em que se dividem para as eleições municipaes, serão presididas opor cidadãos designados pela commissão de recenseamemnto eleitoral do bairro da situação dos paços do concelho, onde devem reunir-se, na conformidade das disposições vigentes sobre a nomeação dos presidentes das mesas das assembléas primarias.

§ unico. Ao administrador do mesmo bairro compete exercer perante a assembléa de apuramento do circulo em que estão situados os paços municipaes, as funcções que nesse acto incumbem á auctoridade administrativa, fazendo-se representar nas assembléas de apuramento dos outros circulos por delegados da sua escolha, um dos quaes será o seu substituto, e para este effeito lhe serão remettidos, de todas as assembléas primarias, os respectivos cadernos de eleitores e copias das actas, devendo entregar aos seus delegados nas assembléas de apuramento os papeis concernentes ás operações d’estas assembléas.

Art. 217.° A acta do apuramento será enviada dentro de vinte e quatro horas ao governador civil com as actas originaes, cadernos e mais papeis que tiverem servido á eleição nas assembléas primarias.

§ unico. As copias das actas serão archivadas na camara municipal e na administração do concelho, salvo sendo precisas para a apreciação da validade do processo eleitoral, quando o tribunal que a julgar, de sua iniciativa ou a requerimento dos interessados, ordenar a sua juncção ao processo.

Art. 218.° O administrador do concelho dará immediatamente conta ao governador civil do resultado das eleições, declarando:

1.° Os nomes dos eleitos e o numero de votos obtidos por cada um;

2.° Se os eleitores estão ou não recenseados como elegiveis, ou comprehendidos em alguma das causas de exclusão previstas nos artigos 8.°, 9.°, 10.° e 11.°, podendo juntar documento authentico que, na fórma do § 1.° do artigo 15.°, suppra a falta de nota de elegibilidade no recenseamento eleitoral.

Art. 219.° Não se proclamarão os apurados, nem se considerará feita a eleição, quando se verifique no apuramento que o numero de votantes em todo o circulo eleitoral foi inferior ao dobro do numero dos vogaes de que devem ser compostas as mesas de todas as assembléas primarias.

§ 1.° Do resultado d’esta verificação se lavrará acta, que se enviará dentro de vinte e quatro horas ao governador civil, tendo os demais papeis o destino designado no artigo 217.°

§ 2.° Se o numero dos vogaes effectivos, votados e apurados, não constituir a maioria dos que o circulo deve eleger, proceder-se-ha a nova eleição de todos os vogaes effectivos e substitutos.

CAPITULO IV

Reclamações e julgamento das eleições

Art. 220.° Qualquer eleitor póde reclamar contra a illegalidade das operações eleitoraes e illegitimidade dos eleitos para a corporação, em cuja eleição tiver direito de votar.

Art. 221.° Estas reclamações podem ser feitas verbalmente ou por escripto, no proprio acto da eleição, no do apuramento, ou depois d’elle até o sabbado seguinte.

§ 1.° Quando as reclamações forem verbaes serão inseridas nas actas como forem ditadas pelos reclamantes; quando forem feitas por escripto se fará d’ellas simples menção nas actas, e as reclamações originaes com todos os documentos que lhes digam respeito serão juntas ao processo, depois de tudo rubricado pela mesa e por tres dos eleitores que o pedirem, dando-se recibo aos interessados que o exijam.

§ 2.º As meses das assembléas, perante quem se reclamar, informarão nas actas o que se lhes offerecer ácerca do objecto as reclamações.

§ 3.° Se não informarem, serão julgadas as reclamações independentemente de informação.

Art. 222.° As reclamações posteriores ao apuramento serão feitas por escripto, assignadas pelos reclamantes com as assignaturas reconhecidas, e entregues até p sabbado seguinte ao do apuramento ao governador civil, que as enviará ao administrador do concelho, para que este, noa dois dias seguintes áquelle em que as receber, convoque os vogaes da respectiva mesa a virem examinadas na administração do concelho e apresentarem até o dia seguinte as informações que tiverem por convenientes.

§ unico. Dentro em vinte e quatro horas, depois de expirar áquelle praso, remetterá o administrador do concelho ao governador civil as reclamações, com os informes que tiver recebido ou sem elles, para serem immediatamente apresentadas ao auditor administrativo com o processo eleitoral.

Art. 223.° O governador civil, á medida que for recebendo os processos eleitoraes, mandará examinar as actas e as respectivas informações dos administradores dos concelhos, e enviará ao auditor administrativo logo que finde o praso das reclamações nos termos dos artigos 221.° e 222.°:

1.° Os processos a respeito dos quaes houver reclamação; 2.° Os processos relativos a eleições não realisadas em consequencia das faltas previstas nos artigos 209.° e 219.° ou nas quaes não se tenha constituido a assembléa de apuramento;

3.° Os processos pelos quaes, segundo as informações dos administradores dos concelhos ou outras officialmente recebidas, tiverem sido eleitos individuos absolutamente inelegiveis, ou comprehendidos em alguma das causas de exclusão de que tratam os artigos 8.°, 9.°, 10.° e 11.°

§ 1.° Todos os outros processos eleitoraes serão vistos pelo secretario geral, que reclamará perante o auditor, quando n’elles encontre offensa de lei, que possa influir no resultado geral da votação.

2.° O governador civil participará aos corpos administrativos em exercicio os nomes dos vogaes definitivamente eleitos.

Art. 224.° Ao auditor compete julgar, precedendo resposta do ministerio publico, no praso de vinte e quatro horas, não sendo este o reclamante, as questões relativas a todos os actos eleitoraes e constituição das camaras municipaes e juntas de parochia.

Art. 225.° As actas eleitoraes, processadas com as formalidades exigidas por lei, fazem prova ácerca dos factos que directamente se referem ao acto eleitoral, sendo sómente admissivel a prova documental em contrario ou alem do conteudo d’ellas.

§ unico. Podem juntar-se documentos até a abertura de conclusão para julgamento.

Art. 226.° Serão julgadas nullas as eleições em que se hajam preterido formalidades ou preceitos legaes, que possam influir no resultado geral da votação.

Art. 227.° Annullada a eleição, o acto eleitoral repete-se em todas as assembléas que constituem a circumscripção eleitoral de que se tratar.

Art. 228.° Não se tendo constituido a assembléa de apuramento, o auditor declarará eleitos os cidadãos que deviam ser proclamados, excepto havendo irregularidade que annulle a eleição.

Art. 229.° Nos casos de falta da eleição o auditor a mandará repetir, se a falta foi motivada por inobservancia de algum preceito legal; ou declarará que deve proceder-se á nomeação de vereadores em supprimento da eleição municipal, ou que deve proceder-se á annexação da fregue-

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zia, tratando-se de eleição parochial, quando, nos dois ultimos casos, as eleições não se hajam realisado por falta de comparecimento dos eleitores.

§ 1.° Na falta de eleição municipal compete ao governador civil a nomeação para os cargos da camara.

§ 2.° Não haverá nomeação por supprimento nem annexação de freguezias sem que se tenha feito segunda convocação dos eleitores.

Art. 230.° As reclamações relativas aos actos eleitoraes serão resolvidas, sem mais termos que os prescriptos n’este codigo, dentro do praso de vinte dias, a contar da recepção dos processos na auditoria.

§ unico. A falta de resolução sobre as reclamações, dentos d’este praso, é considerada sómente para os effeitos do recurso, como indeferimento.

Art. 231.° O recurso contra a resolução proferida ou contra a falta d’ella, depois de interposto no praso e com as formalidades ordenadas n’este codigo, será immediatamente enviado ao supremo tribunal administrativo, cujo presidente ordenará a distribuição no dia em que der entrada na secretaria, onde as partes poderão examinai-o dentro de quarenta e oito horas, e juntar documentos. Findo este praso, irá logo o processo com vista ao ministerio publico para responder dentro de cinco dias.

§ 1.° Voltando o processo com a resposta do ministerio publico, o relator o examinará até á segunda sessão seguinte, em que fará o relatorio do processo, sendo na mesma sessão julgado em conferencia por todos os membros presentes do tribunal.

§ 2.° A decisão do supremo tribunal administrativo será tomada em accordão devidamente enunciado e fundamentado, que terá força executiva independentemente de homologação, e dentro de oito dias será communicada por copia authentica ao respectivo governador civil, e publicada na folha official.

CAPITULO V

Escusas

Art. 232.° O cidadão eleito para qualquer cargo administrativo, e que tenha motivo legal de escusa, de que queira aproveitar-se, deverá reclamal-a perante o auditor dentro de oito dias, a contar da data da participação official da sua eleição.

§ unico. A escusa será pedida em requerimento datado e assignado, e com a assignatura reconhecida, e entregue com a participação da eleição, dando-se recibo da entrega, se o reclamante o pedir.

Art. 233.°

Do indeferimento do auditor cabe recurso para o supremo tribunal administrativo.

CAPITULO VI

Disposições especiaes para a eleição da commissão districtal

Art. 234.° Na primeira sessão ordinaria ou extraordinaria de cada triennio as camaras municipaes escolherão, de entre os cidadãos do districto elegiveis para cargos administrativos, tres delegados nos concelhos de l.ª ordem, e dois nos de 2.ª, com igual numero de substitutos, participando logo a escolha ao governador civil, e os delegados deverão reunir-se, sem dependencia de convocação, nos paços do concelho da capital do districto no terceiro domingo do mez de janeiro do primeiro anno de cada triennio, pelas dez horas da manhã, sob a presidencia do auditor administrativo, servindo de secretario o da camara municipal do mesmo concelho, procedendo por escrutinio secreto, logo que estejam reunidos em maioria absoluta, á eleição do presidente da assembléa, e em seguida á dos vogaes electivos da commissão.

§ 1.° Nas ilhas adjacentes poderão reunir-se os delegados em outro dia designado pelo governador civil, quando n’aquelle não seja possivel a reunião por falta de communicações de alguns concelhos com a capital do districto.

§ 2.° Se ao meio dia ainda não se houver reunido a maioria absoluta dos delegados, o auditor administrativo fará lavrar auto da occorrencia, que será assignado por elle e pelos delegados presentes, subscripto pelo secretario da assembléa e logo entregue ao governador civil.

Art. 235.° A eleição para escolha dos vogaes effectivos e substitutos da commissão districtal será feita por escrutinio secreto em sessão publica, procedendo-se á chamada dos delegados por ordem alphabetica dos concelhos.

Art. 236.° As listas da votação devem ser formuladas em conformidade com o disposto no artigo 210.°, sob a pena ali comminada, e serão apurados como vogaes effectivos e substitutos os cidadãos que, respectivamente a cada uma d’estas categorias, tiverem sido os mais votados até o numero legal.

Art. 237.° O processo da eleição da commissão districtal será enviado, no praso de quarenta e oito horas, pelo presidente da assembléa eleitoral ao governador civil, que do mesmo processo e das informações officiaes sobre legitimidade dos eleitos dará vista em igual praso ao secretario geral, para que este tudo examine, e dentro de tres dias reclame para o supremo tribunal administrativo, quando encontre na eleição dos delegados municipaes ou da commissão districtal offensa de lei, que possa influir no resultado geral da votação para este corpo administrativo ou fundamento para annullar os votos de algum dos vogaes votados.

Art. 238.° Ao supremo tribunal administrativo compete julgar no mesmo processo as questões relativas á legitimidade dos eleitos para a commissão districtal, á validade dos actos eleitoraes e á escolha dos delegados municipaes.

§ 1.° Annullada a eleição, o governador civil designará para a nova eleição um domingo dentro do praso de trinta dias, a contar da data do accordão.

§ 2.° Se a eleição for annullada em consequencia de irregularidades na escolha dos delegados, competirá tambem ao governador civil designar o dia em que devem proceder a nova nomeação de delegados as camaras municipaes que as houverem praticado.

Art. 239.° Annullados os votos obtidos por qualquer cidadão para vogal da commissão districtal, o supremo tribunal administrativo designará, segundo a ordem de maior votação, o substituto que o deva substituir.

Art. 240.° No caso de falta de eleição será deferido o conhecimento do processo ao supremo tribunal administra-trativo, o qual, ouvido o ministerio publico, resolverá, no praso de quinze dias e por accordão publicado na folha official, que se proceda a nova eleição, se reconhecer que a falta foi motivada por inobservancia de preceito legal, ou declarará que deve em supprimento da eleição proceder-se á nomeação dos vogaes da commissão, a qual será feita pelo governo sobre proposta do governador civil.

Art. 241.° As reclamações ácerca da eleição dos delegados municipaes ou da commissão districtal, interpostas pelos cidadãos que forem eleitores recenseados no districto, serão entregues dentro do praso de cinco dias, a contar da eleição, ao governador civil, que immediatamente as enviará com o processo eleitoral, ou para serem juntas a este, ao supremo tribunal administrativo.

Art. 242.° As reclamações, a que se referem os artigos 237.° e 241.°, serão resolvidas nos termos do artigo 231,°

TITULO VII

Magistrados e empregados administrativos

CAPITULO I

Governador civil e empregados da secretaria do governo civil

SECÇÃO I

Governador civil

Art. 243,° O governador civil é o superior magistrado

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administrativo do districto e immediato representante do governo, competindo-lhe p direito de regular todo o serviço administrativo na area da sua circumscripção territorial e prover ás necessidades do mesmo serviço em todos os assumptos de administração publica, que por lei ou regulamento não forem exceptuados das suas attribuições.

§ unico. O ordenado dos governadores civis é de réis 1:600$000 nos districtos de Lisboa, Porto e Funchal; réis 1:400$000 nos districtos de Coimbra, Braga e Vizeu, e 1:200$000 réis em todos os outros districtos.

Art. 244.° O governador civil é nomeado por decreto e immediatamente subordinado ao ministro do reino, mas, como representante do governo, póde ser encarregado de inspecconar e fiscalisar qualquer serviço publico dependente do poder executivo, seja qual for o ministerio de que esse serviço dependa, correspondendo-se, portanto, directamente com todos os ministros, e cumprindo as ordens e instruções que d’elles receber.

Art. 245.° O governador civil terá um substituto nomeado por decreto expedido pelo ministerio do reino, e, na falta ou impedimento simultaneo delles, será substituido pelo secretario geral do governo civil do districto.

§ unico. No caso do governador civil estar ausente da sede do districto, onde é a sua residencia official, mas dentro do mesmo districto, poderá delegar as suas attribuições, ou parte dellas, no secretario geral, ainda que tenha substituto.

Art. 246.° O governador civil e seu substituto devem prestar juramento, por si ou por procuração, antes da posse do cargo, no ministerio do reino.

Art. 247.° O governador civil e seu substituto podem ser suspensos pelo ministro do reino e exonerados por decreto.

Art. 248.° A acção directa do governador civil, como magistrado e chefe da administração activa do districto e representante d’ella como entidade moral, exerce-se:

1.° Por meio de informação com respeito a quaesquer assumptos de interesse publico;

2.° Por gestão de serviços publicos e de interesses economicos do estado e do districto;

3.° Por auctoridade, principalmente nos serviços policiaes;

4.° Por tutela administrativa sobre os corpos administrativos, as corporações e institutos de piedade ou beneficencia e outros estabelecimentos publicos.

Art. 249.° No desempenho das attribuições que lhe confere o n.° 1.° do artigo 248.° compete ao governador civil informar minuciosa e diligentemente o ministro respectivo sobre quaesquer assumptos de interesse publico ou de interesse particular que tenham com elle correlação, propondo as providencias que julgar mais adequadas.

Art. 250.° Para cumprimento das attribuições conferidas pelo n.° 2.° do artigo 248.° compete ao governador civil:

1.° Transmittir as leis, regulamentos e ordens superiores ás auctoridades subalternas, dando-lhes as instrucções convenientes para a sua execução;

2.° Exercer inspecção geral e superior sobre a execução de todas as leis e regulamentos de administração publica;

3.° Dar ordens aos magistrados e empregados seus subordinados, ácerca dos serviços que cabem nas suas attribuições;

4.° Superintender em todos os serviços administrativos dependentes do ministerio do reino;

5.° Superintender nos serviços e estabelecimentos de instrucção publica, nos termos das leis respectivas;

6.° Vigiar o exercicio das auctoridades ecclesiasticas, dando conta ao governo dos abusos que notar;

7.° Exercer, a respeito dos bens e rendimentos da fazenda publica, as funcções que lhe incumbem as leis e regulamentos fiscaes;

8,° Superintender em todos os magistrados administrativos, corpos e empregados administrativos do districto e em todos os serviços da sua competencia, podendo proceder ou mandar proceder a inqueritos e syndicancias aos mesmos serviços, dar balanço aos respectivos cofres, verificar a sua escripturação e providenciar no que for das suas attribuições;

9.° Mandar proceder ás eleições dos corpos administrativos ou de quaesquer corporações administrativas nos dias e prasos legaes;

10.° Nomear para todos os empregos administrativos, para que a lei lhe de competencia, ou que não tenham por lei modo especial de nomeação;

11.° Suspender do exercicio e vencimentos e demittir os empregados de sua nomeação e, salvo disposição especial, suspender de exercicio e vencimentos, dando conta em seguida ao governo, os magistrados e funccionarios administrativos de nomeação d’este, com excepção do auditor administrativo;

12.° Dar ou mandar dar posse a todos os magistrados e funccionarios administrativos que estão debaixo da sua administração;

13.° Tomar, ou mandar tomar pelos seus delegados, juramento aos funccionarios publicos, quando a lei não defira esta competencia a outra auctoridade;

14.° Conceder licenças aos empregados seus subordinados;

l5.° Mandar processar as folhas dos vencimentos do auditor e dos empregados da sua dependencia, nos termos dos respectivos regulamentos;

16.° Verificar que o numero e vencimentos dos empregados do governo civil, das camaras municipaes, das administrações dos concelhos e bairros, das juntas de parochia e regedorias não excedam os designados nos quadros legaes, e promover pelos meios competentes a exoneração dos que excedam os mesmos quadros;

17.° Remetter ao tribunal de contas ou apresentar á commissão districtal, segundo as suas competencias, as contas de gerencia dos corpos administrativos e das corporações ou institutos de piedade ou beneficencia, dentro do praso de trinta dias desde que as tiver recebido, acompanhando-as das observações que julgar convenientes;

18.° Repartir, ouvida a commissão districtal, pelos concelhos do districto as contribuições directas do estado, e os contingentes do recrutamento;

19.° Levantar conflictos de jurisdicção e competencia entre as auctoridades administrativas e judiciaes, nos termos das leis e regulamentos respectivos;

20.° Presidir á commissão districtal, ouvil-a nos negocios consultivos e fazer cumprir as suas decisões;

21.° Representar o districto e a commissão districtal, excepto em juizo, o que compete ao respectivo agente do ministerio publico;

22.° Exercer quaesquer outras attribuições que por leis especiaes lhe forem ou estejam commettidas.

Art. 251.° No exercicio das attribuições que lhe confere o n.° 3.° do artigo 248.°, compete ao governador civil:

1.° Dar, executar e fazer executar todas as providencias necessarias para manter a ordem e tranquillidade publica, proteger as pessoas e a propriedade em todo o districto, e fazer reprimir os actos contrarios á moral e á decencia publica, auxiliando-se para este fim da força que tiver á sua disposição, e podendo requisitar o auxilio da força militar, que lhe não poderá ser recusado pelos respectivos commandantes;

2.° Tomar providencias sobre pregões, cartazes e annuncios em logares publicos, sobre exposição ou affixação de cartazes, annuncios, letreiros, disticos, figuras, quadros, estampas, imagens ou sobre quaesquer publicações que possam provocar manifestações contrarias á ordem publica ou sejam offensivas da moral, do decoro e honra

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dos funccionarios e dos particulares ou de quaesquer corporações;

3.° Tomar providencias e prohibir quaesquer espectaculos publicos em que haja offensas ás instituições do estado ou seus representantes e agentes, e ao systema monarchico representativo, ás nações estrangeiras, seus chefes e representantes: provocação ao crime; caricaturas ou imitações pessoaes; referencias pessoaes a quaesquer funccionarios publicos ou a particulares; offensas á moral publica; espectaculos de suggestão ou hypnotismo, e bem assim quando não estejam pagos os respectivos direitos ao auctor ou traductor da obra que se represente;

4.° Exercer a respeito das reuniões publicas as attribuições que lhe são conferidas pela lei;

5.° Exercer a fiscalisação necessaria sobre os estrangeiros residentes no seu districto e conceder passaportes a nacionaes ou estrangeiros, nos termos dos respectivos regulamentos;

6.° Conceder licenças para theatros e espectaculos publicos, na capital do districto, impondo todas as condições necessarias para segurança dos espectadores e artistas;

7.° Tomar providencias sobre loterias e rifas auctorisadas, casas publicas de jogo, hospedarias, estalagens, botequins e similhantes;

8.° Tomar providencias sobre musicos ambulantes e philarmonicas, fogueiras, fogos de artificio e toques de sino, ouvindo sobre este ultimo objecto o prelado diocesano;

9.° Tomar providencias ácerca dos estabelecimentos ou agencias onde se inculcam quaesquer serviços;

10.° Tomar providencias ácerca de leilões em logares publicos, corretores de hoteis, hospedarias ou estabelecimentos similhantes, creados de servir e mocos de fretes;

11.° Tomar providencias policiaes para obstar á emigração clandestina;

12.° Tomar providencias policiaes sobre mendigos, vadios e vagabundos;

13.° Tomar providencias sobre a policia, das mulheres prostitutas;

14.° Conceder licenças para casas de emprestimos sobre penhores, comprehendendo as estabelecidas por sociedades anonymas ou que d’estas sejam succursaes, ficando umas e outras sujeitas á fiscalisação policial, excepto, porém, as estabelecidas por bancos, monte pios, montes de piedade, sociedades de soccorros mutuos e outros estabelecimentos cujos estatutos são approvados pelo governo;

l5.° Conceder licenças para estabelecimentos insalubres, incommodos e perigosos, e determinar a sua cessação, nos casos prescriptos nos regulamentos;

16.° Dirigir os diversos serviços de hygiene e salubridade publica de conformidade com as leis, regulamentos e ordens do governo; adoptar, em caso necessario, as providencias adequadas para precaver o districto, ou alguma das suas povoações, de epidemias, enfermidades contagiosas e quaesquer focos de infecção, dando immediatamente conta ao governo; e, com recurso para o governo, ordenar ademolição ou beneficiação de habitações ou construcções que technicamente se tenha reconhecido importarem por qualquer fórma perigo para a saude publica;

17.° Fiscalisar as casas de saude, hospitaes, asylos e hospicios;

18.° Promover a sustentação dos presos e melhoramento das cadeias;

19.° Dirigir superiormente, nos termos das leis e regulamentos, os corpos de policia civil, exercendo a seu respeito as attribuições que lhe são commettidas pelos mesmos diplomas, e dispondo do seu auxilio para manter a ordem e tranquillidade publica ou para qualquer serviço policial da sua competencia;

20.° Superintender o serviço de sanidade maritima e terrestre nos termos das leis e regulamentos;

21.° Executar e fazer executar todas as leis e regulamentos de policia e estabelecer as providencias que tiver por acertadas para o livre exercicio das funcções das auctoridades e repartições publicas;

22.° Fazer regulamentos obrigatorios em todo o districto, com approvação do governo, sobre os assumptos de que trata este artigo, não havendo regulamentos geraes de administração publica;

23.° Exercer quaesquer outras attribuições policiaes que as leis, regulamentos ou instrucções do governo lhe incumbam.

Art. 252.° No uso das attribuições que lhe são conferidas pelo n.° 4.° do artigo 248.°, compete ao governador civil:

1.° Ordenar, precedendo reclamação dos interessados, o pagamento de despezas regularmente auctorisadas e liquidadas, quando os presidentes das camaras municipaes dos concelhos de l.ª ordem, excepto Lisboa, das juntas de parochia e das corporações ou institutos de piedade ou beneficencia o recusem, e as camarás, juntas de parochia e as mesas ou administrações gerentes não tenham reparado a recusa. A ordem do governador civil, que será sempre precedida de audiencia dos referidos presidentes, terá os mesmos effeitos que teria a destes, e poderá servir de base á execução, ficando o thesoureiro obrigado a satisfazel-a pela sua caução, por todos os seus bens e pelos do seu fiador;

2.° Approvar, ouvindo a direcção das obras publicas, com respeito aos concelhos de l.ª ordem, excepto Lisboa, os planos e projectos das estradas municipaes, designando as obras que devem fazer-se annualmente nas de l.ª classe, e fixando as quotas com que os concelhos têem de concorrer para as de interesse commum, tudo de conformidade com as leis e regulamentos especiaes;

3.° Resolver, com recurso para o governo, as duvidas que, sobre administração da fabrica da igreja e suas dependentes, se suscitarem entre os parochos e as juntas de parochia ou irmandades e confrarias fabriqueiras;

4.° Ordenar ao administrador do concelho, quando as camaras ou juntas de parochia se recusem a escolher terrenos para cemiterios ou os escolham contra o parecer dos facultativos e sub-delegado de saude, que elle proceda, segundo o voto dos mesmos peritos, á designação de terrenos que tenham as condições legaes; e, se as tiverem, approvar a escolha feita e determinar á corporação respectiva que faça levantar a competente planta e proceda ao projecto e orçamento das obras, submettendo-as em seguida, por intermedio do administrador do concelho, á approvação competente;

5.° Remetter com informação ao ministerio do reino, nos prasos respectivamente estabelecidos, as copias das deliberações dos corpos administrativos que dependam da approvação do governo, e apresentar á commissão districtal, na primeira sessão depois de recebidas, as copias das deliberações cuja approvação a esta pertença;

6.° Consultar a commissão districtal em todos os assumptos de interesse publico em que julgar conveniente ouvir o seu parecer, nos que este codigo expressamente designar, e naquelles era que quaesquer leis ou regulamentos especiaes exigiam o voto dos extinctos conselhos de districto ou tribunaes administrativos;

7.° Approvar, modificar ou rejeitar quaesquer deliberações que, segundo este codigo ou as leis e regulamentos especiaes, careçam da sua approvação para se tornarem executarias, e dar ao ministerio publico as convenientes instrucções para promover a revogação de todas as deliberações dos corpos administrativos, que, sendo executorias, estejam incursas em algumas das nullidades previstas no artigo 31.°;

8.° Approvar os estatutos das associações e institutos de recreio, instrucção publica, educação, protecção ás pessoas ou animaes, piedade ou beneficencia, hospitaes, asylos ou hospicios, bem como os seus regulamentos orga-

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nicos e dos estabelecimentos que administrem, enviando copia authentica ao ministerio do reino;

9.° Regular, com approvação do governo, a fundação e administração de estabelecimentos de instrucção, beneficencia ou outros de utilidade publica, quando sobre o assumpto não hajam providenciado os seus instituidores.

§ unico. Os estatutos de que trata o n.° 8.° não podem ser approvados pelo governador civil da séde da corporação na parte em que se refiram ao funccionamento de filiaes n’outros districtos, o que compete aos respectivos governadores civis.

Art. 253.° Usando das attribuições que lhe confere o n.° 4.° do artigo 248.°, compete tambem ao governador civil a inspecção superior das irmandades, confrarias, corporações ou institutos de piedade ou beneficencia, que por lei não estejam immediatamente subordinados ao governo, e, no exercicio d’estas funcções, pertence-lhe:

1.° Regular, por meio de instrucções, a sua escripturação e contabilidade;

2.° Approvar os seus orçamentos e auctorisar os actos da sua administração que possam influir nos mesmos orçamentos, com excepção do levantamento de emprestimos, acquisição de bens immobiliarios, alienação d’esses bens e de quaesquer capitães, applicação ás despezas correntes de capitães distratados ou que constituam o seu fundo, e de heranças, doações ou legados, se não forem deixados expressamente para as referidas depezas, o que tudo depende da auctorisação do governo, precedendo deliberação das respectivas assembléas geraes; e bem assim com excepção da acceitação de heranças e legados, o que não depende de licença ou approvação tutelar;

3.° Dissolver, precedendo auctorisação do governo, as mesas ou administrações destas associações ou institutos, nomeando livremente commissões que os administrem só até á epocha da eleição ordinaria, quando não julgue conveniente antecipal-a, e ás quaes ficam competindo as mesmas attribuições que ás mesas dissolvidas, excepto quanto á admissão de irmãos, a qual sómente lies é permittida quando indispensavel para evitar que seja extincta a associação. Para a dissolução será sempre instaurado processo, em que será ouvida a mesa ou administração, e só se effectuará quando se prove que está incursa em algum dos seguintes casos:

a) Que se desviou do fim para que foi instituida;

6) Que não se habilitou com os seus orçamentos nos prasos e termos legaes, por culpa sua;

c) Que deixou de prestar contas das suas gerencias, em conformidade da lei, sem motivo justificado;

d) Que deixou, depois de advertida, de tomar as deliberações indispensaveis ao desempenho dos seus deveres ou que faltou á obediencia legalmente devida ás auctoridades publicas;

e) Que a sua gerencia é nociva aos interesses da corporação, em vista de inquerito ou syndicancia a que se tenha precedido;

4.° Ordenar a estas corporações que organisem novos estatutos, em harmonia com os regulamentos e instrucções geraes do governo, e quando desobedeçam extinguil-as, applicando os seus bens na conformidade do n.° 6.°, ou determinar as disposições estatuarias por que devem reger-se, procedendo, n’um e noutro caso, auctorisação do governo;

5.° Obrigar as instituições de piedade, tanto as que já existirem, como as que de novo se fundarem, a applicar, pelo menos, a decima parte da sua receita ordinaria a actos de beneficencia no concelho ou a estabelecimentos de beneficencia do districto, ou a auxiliar o ensino primario da respectiva freguezia, sem prejuizo, porém, das despezas obrigatorias da corporação;

6.° Extinguir as que, comquanto legalmente erectas, não tenham pelo menos o dobro do numero dos irmãos ou associados necessarios para constituirem mesa, ou estejam por elles abandonadas, presumindo-se como taes aquellas em que houver repetida falta de eleição das suas mesas, intimando-as previamente para se constituirem de conformidade com os seus estatutos, e applicando, no caso de recusa, os seus bens e valores em beneficio de algum estabelecimento de beneficencia do concelho ou da respectiva junta de parochia, mediante approvação do governo, bens e valores que não podem ser entregues a outra corporação, ainda que se institua com a mesma denominação da extincta;

7.° Extinguir as illegalmente erectas, ou sem estatutos devidamente approvados, encorporando, com approvação do governo, os seus bens e valores na respectiva junta de parochia ou estabelecimentos de beneficencia do concelho, quando, depois de intimados os gerentes, se não constituam legalmente, bens e valores que não podem ser entregues a outra corporação, ainda que se institua com a mesma denominação da extincta;

8.° Enviar ao ministerio publico as copias authenticas das deliberações que envolvam offensa de lei ou de regulamento de administração publica ou dos seus compromissos e estatutos, a fim de reclamar a sua annullação, quando versarem sobre assumptos que não dependam de approvação tutelar;

9.° Deferir ao conhecimento do auditor administrativo os processos, que avocará, de eleições de corporações de piedade ou beneficencia, quando, no praso de trinta dias desde as eleições, lhe seja apresentada reclamação por parte de algum irmão ou associado, ou lhe seja dada communicação de irregularidade, que fundamente reclamação do ministerio publico, ouvindo previamente a mesa eleitoral, e observando-se no julgamento d’estes processos e recursos os prasos e termos do julgamento das eleições dos corpos administrativos;

10.° Dar ao respectivo agente do ministerio publico as convenientes instrucções para este promover, pelos meios judiciaes competentes, que se torne effectiva a responsabilidade solidaria das mesas ou administrações, por mutuarem quaesquer quantias sem as necessarias garantias, e sem que as respectivas escripturas sejam levadas ao registo das hypothecas, precedendo sempre o registo provisorio, e bem assim por concederem moratoria, ou perdo de capitães ou seus juros;

11.° Participar ao respectivo agente do ministerio publico quaesquer faltas ou omissões, por que sejam responsaveis os gerentes d’estas corporações, e que dêem motivo á imposição de penas, segundo o disposto na parte penal d’este codigo, para que elle promova os devidos procedimentos;

12.° Verificar que na organisação dos orçamentos, sem os quaes nenhuma despeza póde effectuar-se, e que regulam a gerencia das corporações durante o respectivo anno economico, se observe rigorosamente o seguinte:

a) No orçamento se descreverá a receita que se presume arrecadar e as despezas que devem fazer-se para occorrer aos encargos da corporação;

6) O orçamento é ordinario ou supplementar: ordinario quando é destinado a auctorisar a cobrança e applicação dos rendimentos durante um anno economico, que se contará do 1.° de julho a 30 de junho seguinte; e supplementar, podendo haver mais de um, quando é destinado: 1.°, a prover ao pagamento de despezas urgentes, que não tenham sido contempladas no orçamento ordinario do respectivo anno economico; 2.°, dar applicação a saldos de contas e á receita excedente á calculada no orçamento ordinario; 3.°, a alterar a applicação da receita votada no orçamento ordinario;

c) A designação da receita do orçamento ordinario começará pelos saldos provaveis de origens diversas, presumiveis em 30 de junho, e os rendimentos serão avaliados pela receita effectiva do ultimo anno economico, e pelo calculo do termo medio do producto liquido dos tres annos

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anteriores, em relação aos rendimentos que, por sua natureza muito variavel, não possam ser computados approximadamente pela receita effectiva de um só anno;

d) Os orçamentos, tanto ordinario como supplementares, serão sempre organisados de fórma que a despeza votada não exceda a receita regularmente calculada;

e) A receita será dividida em duas classes, comprehendendo-se na l.ª classe a receita ordinaria ou que provenha de rendimentos permanentes ou periodicos: na 2.ª, a extraordinaria ou eventual, dependente de factos incertos, incluindo-se n’uma ou n’outra, conforme a sua procedencia, as dividas activas que se presume cobrar durante o anno economico;

f) Não se inscreverá a receita em globo, mas em tantos artigos, nas referidas classes, quantas forem as suas origens diversas, explicando-se em notas a sua proveniencia, e declarando-se, quanto ás verbas de emprestimos, a sua totalidade, data da respectiva auctorisação, quantias levantadas e as já amortisadas;

g) Os rendimentos em generos serão mencionados no orçamento, calculando-se na columna da receita a sua importancia a dinheiro pelos preços da tarifa camararia ou, na sua falta, pelos preços presumiveis;

h) Nos orçamentos não podem auctorisar-se receitas dos annos futuros, e os donativos, legados e quaesquer subsidios eventuaes só se inscreverão depois de recebidos;

i) A despeza será tambem dividida em duas classes, comprehendendo-se na l.ª classe a despeza obrigatoria, determinada pelos estatutos ou por lei; na 2.a, a facultativa, que, conquanto util, não seja indispensavel para satisfazer aos fins da instituição, incluindo-se na primeira as dividas passivas a pagar durante o anno economico;

f) Não se inscreverá a despeza em globo, mas em tantos artigos, nas referidas classes, quantas forem as diversas applicações, separando-se, quanto possivel, a parte destinada ao pessoal da destinada ao material, e por fórma que se possam apreciar os differentes elementos componentes da verba principal, dando-se em notas as necessarias explicações

k) As despezas com festividades não serão mencionadas em globo, mas devidamente desenvolvidas;

l) Quaesquer receitas com applicação especial não serão desviadas para outro fim;

m) As despezas para obras de construcçao e reparação, no que se não comprehendem os pequenos concertos ou despezas de conservação, serão justificadas com os respectivos projectos e orçamentos de peritos, desenvolvendo-se por artigos a despeza com material e mão de obra;

n) Será applicada, pelo menos, a decima parte da receita ordinaria das instituições de piedade aos fins designados no n.° 5.° d’este artigo;

o) Não se proporá nenhuma despeza facultativa sem que sejam attendidas todas as despezas obrigatorias;

p) Serão numeradas por ordem todas as verbas do orçamento ordinario, tanto na parte relativa á receita como á despeza, e as verbas dos orçamentos supplementares serão descriptas sob a mesma numeração de titulos, capitulos e artigos com que no orçamento ordinario estiverem inscriptas as verbas da mesma natureza;

q) Não se inscreverá nos orçamentos supplementares nenhum augmento provavel dos rendimentos calculados no orçamento ordinario sem que a receita, já cobrada ao tempo em que elles se organisarem, exceda a calculada, o que será devidamente comprovado;

r) Por caducarem no fim do respectivo anno economico todas as auctorisações concedidas nos orçamentos do mesmo anno, se reproduzirão, em novo orçamento, as despezas não effectuadas e que ainda seja necessario effectuar, para que se auctorisem;

s) O orçamento ordinario será proposto, no principio do mez de abril, pelo presidente da mesa ou administração, e remettido, depois de discutido e approvado pela mesa, ao administrador do concelho ou bairro, até o fim do referido mez, para este o enviar ao governador civil, a quem compete approval-o, modifical-o ou ordenar que seja reformado; e, quanto aos orçamentos supplementares, serão votados, quando necessarios, para serem approvados dentro do respectivo anno economico e antes de effectuadas as despezas;

t) Os orçamentos, antes de serem remettidos ao administrador do concelho ou bairro, estarão patentes aos irmãos durante oito dias, o que será annunciado por avisos affixados á porta do edificio onde funccionar a corporação, tendo direito todos os irmãos ou associados a fazer observações por escripto, que serão juntas ao orçamento e apresentadas ao governador civil;

u) Os orçamentos, depois de findo o praso em que devem estar patentes, serão remettidos em duplicado, no praso de tres dias, ao administrador do concelho ou bairro, acompanhados dos seguintes documentos:

1.° Acta da sessão da mesa em que tenham sido discutidos e approvados;

2.° Relação das dividas activas e passivas, com declaração da sua origem, natureza e annos economicos a que respeitam;

3.° Mappa do producto liquido de cada um dos rendimentos nos tres annos anteriores;

4.° Projectos e orçamentos especiaes das obras, feitos por peritos;

5.° Certidão, passada pelo secretario, de terem estado patentes durante oito dias;

6.° Observações que tenham sido apresentadas pelos irmãos ou associados;

7.° Quaesquer outros documentos que sirvam para elucidar o orçamento;

v) O administrador do concelho ou bairro, depois de receber o orçamento ordinario, e, passando recibo, o remetterá, até o dia 15 de maio, ao governador civil, com informação ácerca da conveniencia de serem auctorisadas as despezas propostas e sobre o calculo da receita;

x) Aos orçamentos supplementares são extensivas, na parte applicavel, as disposições anteriores;.

y) Na reforma de qualquer orçamento se observarão formalidades identicas ás exigidas para a sua organisação;

z) Emquanto não for approvado o orçamento ordinario, continuam as corporações a reger-se pelo ultimo orçamento approvado, excepto com respeito a despezas facultativas, as quaes só podem ser auctorisadas em orçamento do proprio anno, depois de approvado.

13.° Verificar e promover que, quanto á contabilidade d’estas corporações, se cumpra rigorosamente o seguinte:

a) O serviço financeiro executar-se-ha em periodos de gerencia, que serão desde 1 de julho a 30 de junho do anno seguinte, caducando então todas as auctorisações orçamentaes e ficando sem effeito todos os mandados de pagamento não effectuados;

ò) A receita será cobrada por meio de guias, numeradas em ordem seguida com respeito a cada anno economico, sendo entregues, depois de datadas pelo secretario e assignadas por este e pelo presidente da mesa, ao thesoureiro, a quem compete arrecadar a receita e satisfazer todos os pagamentos devidamente ordenados;

c) As despezas serão pagas por meio de mandados passados e subscriptos pelo secretario e assignados pelo presidente, que é o unico competente para as ordenar, em harmonia com os orçamentos e as deliberações da mesa;

d) Não se ordenarão em um só mandado despezas relativas a differentes verbas do orçamento, devendo inscrever-se em cada um o titulo, capitulo e artigo do orçamento que as auctorisa;

e) O pagamento das despezas obrigatorias terá preferencia ao das facultativas, quando a receita realisada seja insufficiente para occorrer a todas as despezas;

f) As mesas tomarão contas em curtos prasos aos the-

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soureiros, consignando o resultado na acta da respectiva sessão, não lhes abonando despezas effectuadas sem mandado e que não estejam, comprovadas com recibos;

g) Serão vendidos por meio de arrematação, e pelo maior lanço, os generos de que a corporação não carecer para os seus estabelecimentos, e que o thesoureiro tenha recebido como rendimento da mesma corporação;

h) As mesas ou direcções prestarão annualmente as suas contas de gerencia, comprehendendo toda a receita cobrada e a despeza effectuada durante o anno economico;

i) A conta começará pelos saldos com que tiver sido encerrada a conta do anno anterior, e, descrevendo toda a receita e despeza da gerencia, seguindo a ordem e numeração que tiverem nos orçamentos, terminará pelos saldos que transitarem para a seguinte gerencia, sendo a sua existencia verificada por meio de contagem;

j) Explicar-se-hão em notas as differentes verbas de receita e despeza, fazendo-se tambem, em cada verba de despeza, referencia, por numeros, aos documentos que as justifiquem;

k) O presidente apresentará á mesa, até o fim do mez de agosto, a conta da gerencia do anno economico anterior, e a mesa, adoptando-a, com ou sem modificações, a mandará patentear aos irmãos ou associados durante oito dias, o que será annunciado por aviso affixado á porta do edificio onde funccionar a corporação;

l) Quaesquer observações apresentadas pelos irmãos ou associados serão juntas ao processo, podendo tambem apresental-as ao governo civil do districto;

m) As contas serão enviadas em duplicado até o fim do mez de outubro, ao administrador do concelho ou bairro, e irão acompanhadas dos seguintes documentos:

1.° Orçamentos ordinarios e supplementares, devidamente approvados, que se refiram á gerencia;

2.° Mandados de pagamento e documentos que justifiquem as despezas effectuadas, numeradas por ordem, mas emmaçados em separado os que se refiram á mesma verba do orçamento;

3.° Uma copia de todos os contratos, inclusive os de emprestimos, realisados durante o anno da gerencia, ou certidão de não os haver;

4.° Um mappa comparativo das differentes verbas de despeza auctorisadas e do que se houver pago, no decurso do anno, com respeito a cada uma d’ellas, indicando as differenças para mais ou para menos;

5.° Uma relação de todas as dividas activas e passivas, mencionando os artigos orçamentaes a que respeitam, ou certidão de não as haver;

6.° Certidão do accordão que tiver julgado a conta do anno anterior;

7.° Certidão do saldo da conta do anno anterior, havendo-o, com declaração das especies e valores de que se compunha;

8.° Certidão do saldo existente em 30 de junho, ultimo da gerencia a que se refere a conta, com certidão de se ter conferido a sua exactidão;

9.° Certidão de terem estado patentes as contas aos associados durante oito dias;

10.° Certidão de terem entrado no cofre as quantias em que tiverem sido condemnados os gerentes do anno anterior, havendo condemnação;

11.° Quaesquer observações ou reclamações apresentadas sobre as coutas;

12.° Quaesquer outros documentos que sirvam para esclarecer as contas;

n) As contas, logo que sejam recebidas pelo administrador do concelho ou bairro, do que passará recibo, serão por elle examinadas e remettidas com informação ao governo civil para serem apresentadas á commissão districtal ou enviadas ao tribunal de contas no caso de exceder a 15:000$000 réis a receita ordinaria approvada no respectivo orçamento ordinario;

o) As contas serão prestadas pelos administradores ou mesarios em exercicio, ainda que se refiram a gerencias anteriores;

p) Respeitando as contas a periodos de gerencia em que tenham servido outros gerentes, e havendo quaesquer irregularidades, serão convidados os responsaveis a examinal-as e allegar, querendo, no praso de oito dias, o que tiverem por conveniente, sendo em seguida remettidas, com as explicações que derem, ao administrador do concelho ou bairro.

§ unico. São consideradas corporações administrativas, nos termos e para os effeitos d’este codigo, todas as corporações, associações e institutos de piedade e beneficencias, sujeitas á inspecção do governador civil, conforme o disposto n’este artigo.

Art. 254.º Nas disposições do artigo 253.° não se comprehendem os monte pios ou outras associações exclusivamente de soccorros mutuos, nem as caixas economicas, as quaes todavia ficam sujeitas á vigilancia e inspecção do governador civil, que poderá mandar proceder a balanço nos seus cofres, verificará a sua escripturação e contabilidade, e dará conta ao governo, pelo ministerio competente, dos abusos que notar, cumprindo-lhe tambem fiscalisar que as esmolas, donativos e subscripções, promovidos por quaesquer particulares ou commissões para fins de piedade, beneficencia ou utilidade publica, tenham a devida applicação, participando ao ministerio publico quaesquer abusos que notar.

Art. 255.° O governador civil visitará, quando for necessario, o districto ou parte d’elle, dará conta ao governo, pelos respectivos ministerios, dos melhoramentos de que precise, proverá ás necessidades publicas quanto couber nas suas attribuições, e promoverá a fundação de instituições de beneficencia e instrucção e quaesquer obras de reconhecido interesse publico.

Art. 256.° Na execução das leis, dos decretos e das providencias de segurança geral póde o governador civil proceder directa e pessoalmente ou por intermedio dos seus delegados e agentes.

Art. 257.° Nas materias meramente administrativas póde o governador civil reformar em qualquer tempo as suas decisões, mas nas materias contenciosas ou declaratorias de direitos só podem ser revogadas as suas resoluções por meio dos competentes recursos.

§ 1.° Todas as resoluções do governador civil podem ser, em qualquer tempo, emendadas ou revogadas pelo governo, salvo havendo prejuizo de direitos adquiridos.

§ 2.° Das resoluções tomadas pelo governador civil cabe recurso, nos termos e prasos legaes, para o supremo tribunal administrativo nos casos de incompetencia, excesso de poder, violação da lei ou offensa de direitos.

SECÇÃO II

Secretario geral e mais empregados do governo civil

Art. 258.° Em cada governo civil ha um secretario geral, nomeado por decreto, precedendo concurso documental e provas escriptas, nos termos dos respectivos regulamentos.

§ unico. Para o logar de secretario geral dos governos civis dos districtos de Lisboa e Porto será nomeado o secretario geral de outro governo civil, que no cargo tenha quatro annos de exercicio, pelo menos.

Art. 259.° São candidatos aos togares de secretario geral os bachareis formados em direito, sendo motivos de preferencia os serviços prestados em cargos administrativos e a superioridade de habilitações litterarias e scientificas.

Art. 260.° Compete ao secretario geral:

1.° Dirigir, sob as ordens do governador civil, e se-

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gundo as instrucções que este estabelecer para o serviço da secretaria do governo civil, o expediente e trabalhos da mesma secretaria, e preparar os processos para serem submettidos á resolução do referido magistrado e da commissão districtal;

2.° Authenticar todos os documentos e assignar todas as certidões expedidas pela secretaria do governo civil, e bem assim subscrever quaesquer termos officiaes;

3.° Conservar, sob sua responsabilidade, o archivo do governo civil;

4.° Corresponder-se, em nome e de ordem do governador civil, com quaesquer magistrados, funccionarios ou corporações administrativas do districto;

5.° Exercer as funcções de ministerio publico junto da commissão districtal e do auditor administrativo;

6.° Substituir o governador civil, nos termos do artigo 245.° e seu § unico.

7.° Exercer quaesquer attribuições ou commissões que lhe sejam impostas por lei, regulamentos de administração publica ou ordens do governo.

Art. 261.° As secretarias dos governos civis teem os demais empregados que constem do quadro fixado pelo governo.

Art. 262.° Os empregados das secretarias dos governos civis, salvo o disposto no artigo seguinte, são nomeados pelo governo, em concurso documental, nos termos do respectivo regulamento.

Art. 263.° O governador civil, sem prejuizo do disposto na lei a favor dos officiaes inferiores do exercito e outros, nomeia, precedendo concurso documental, segundo o regulamento respectivo, e com recurso para o governo, os amanuenses da secretaria, e, independentemente de concurso, o porteiro, continues e correios onde os houver.

Art. 264.° O secretario geral e demais empregados do governo civil prestam juramento perante o governador civil do districto.

Art. 265.° O secretario geral póde ser transferido pelo governo de um para outro districto, e bem assim os outros empregados da secretaria, mas estes para logares identicos ou com iguaes ordenados.

Art. 266.° Nas altas ou impedimentos do secretario geral, se o governo não providenciar de outra fórma, fará as suas vezes o chefe de repartição ou official que o governador civil designar.

Art. 267.° Nas faltas ou impedimentos dos chefes de repartição ou officiaes, farão as suas vezes os empregados da classe immediatamente inferior que o governador civil designar, mas não haverá nomeações interinas para serem substituidos quaesquer outros empregados nas suas faltas ou impedimentos.

Art. 268.° Os porteiros serão substituidos, nas suas faltas ou impedimentos, pelo continuo que o governador civil designar, e os continuos por officiaes de diligencias das administrações dos concelhos ou bairros ou praças do corpo de policia civil tambem designadas pelo mesmo magistrado.

CAPITULO II

Administrador do concelho ou bairro e empregados da administração

SECÇÃO I

Administrador do concelho ou bairro

Art. 269.° Em cada concelho haverá um administrador de concelho, e em. cada bairro de Lisboa e Porto um administrador de bairro, delegado e representante do governo e do governador civil na sua respectiva circumscripção administrativa, e immediatamente subordinado a este magistrado, competindo-lhe prover ás necessidades do serviço administrativo em todos os assumptos da sua competencia, que não estejam especialmente commettidos a outras auctoridades ou funccionarios, desempenhar as attribuições que lhes são conferidas por este codigo e por quaesquer leis ou regulamentos de administração publica, e cumprir as ordens e instrucções emanadas do governador civil.

Art. 270.° Os administradores de concelho ou bairro são nomeados por decreto do governo sobre proposta do governador civil.

Art. 271.° Os administradores dos concelhos de 1.ª ordem devem ser bachareis formados em direito ou individuos habilitados com algum curso de instrucção superior, especial ou secundaria.

Art. 272.° Os administradores de concelho ou bairro perceberão os ordenados que lhes forem votados nos orçamentos municipaes, e os emolumentos que lhes competirem segundo a respectiva tabella, não podendo, porem, os ordenados ser inferiores a 400$000 réis nos concelhos de l.ª ordem e a 300$000 réis nos de 2.ª ordem.

Art. 273.° Os administradores de concelho ou bairro teem substitutos nomeados pela mesma fórma que os effectivos.

§ 1.° Nas faltas e impedimentos simultaneos do administrador de concelho ou bairro e do seu substituto, e emquanto o governador civil não nomear quem sirva interinamente, fará as suas vezes o presidente da camara municipal.

§ 2.° O presidente da camara, emquanto substitue o administrador do concelho ou bairro, não exerce as funcções de vereador.

Art. 274.° Os administradores de concelho ou bairro e os seus substitutos prestam juramento, por si ou por procuração, nas mãos do governador civil.

Art. 275.° Os administradores de concelho ou bairro e os seus substitutos podem ser suspensos pelo governador civil até trinta dias em cada anno, mas sómente o governo póde suspendel-os por maior praso, transferil-os e demittil-os, segundo as conveniencias do serviço publico.

Art. 276.° A acção directa do administrador do concelho, como magistrado administrativo e chefe da administração activa do concelho, exerce-se:

1.° Por informação, inspecção e execução de diversos serviços de interesse publico;

2.u Como auctoridade policial do concelho.

Art. 277.° No desempenho das attribuições, que lhe confere o n.° 1.° do artigo 277.°, compete ao administrador do concelho:

1.° Informar com inteira diligencia e minuciosidade o governador civil sobre todos os assumptos de interesse publico e de interesse particular a este correlativos, propondo as providencias que julgar convenientes;

2.° Executar e fazer executar na sua circumscripção administrativa as leis e regulamentos administrativos;

3.° Executar e fazer executar as ordens e resoluções superiores, e bem assim as deliberações da camara municipal, legalmente tomadas, na parte que d’ella dependa;

4.° Vigiar pela execução de todos os serviços administrativos, de conformidade com as leis e regulamentos respectivos;

5.° Providenciar, nos limites das suas attribuições, com respeito aos serviços confiados pelas leis e regulamentos á sua vigilancia e auctoridade, representando ao governador civil quando seja necessario tomar providencias que excedam a sua competencia;

0.° Delegar, sob sua responsabilidade, nos seus subalternos, algumas das suas attribuições, quando as necessidades do serviço o exigirem;

7.° Superintender em todos os funccionarios administrativos, corpos administrativos e corporações ou institutos de piedade ou beneficencia, inspeccionando como executam as leis e regulamentos administrativos, examinando o estado dos seus archivos, da escripturação e dos respectivos cofres, vigiando a sua administração, e verificando se

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os livros e documentos estão devidamente sellados, do que informará o governador civil, propondo as provindencias que forem necessarias;

8.° Assistir sempre ás sessões da camara muncipal, promover os melhoramentos que dependam d’ella e o cumprimento de todas as suas obrigações, dar conta da sua recusa ou negligencia ao governador civil, e bem assim enviar-lhe uma copia das deliberações que envolvam nullidade ou forem contrarias aos interesses publicos;

9.° Promover que as juntas de parochia realisem os melhoramentos que dependam d’ellas, e participar ao governador civil os seus actos que sejam offensivos das leis ou regulamentos administrativos ou dos interesses publicos, enviando-lhe uma copia das respectivas deliberações;

10.° Promover que as corporações ou institutos de piedade ou beneficencia effectuem os melhoramentos dos estabelecimentos que administram, e dar conta ao governador civil dos actos por ellas praticados que offendam as leis, os regulamentos admninistrativos, os seus estatutos, compromissos ou interesses, enviando-lhe uma copia das respectivas deliberações;

11.° Remetter ao governador civil, com informação circumstanciada, copias das deliberações dos corpos administrativos e das corporações e institutos de piedade ou beneficencia que, para serem executorias, careçam de approvação superior, e bem assim, nos prasos legaes, os orçamentos e contas de todas estas corporações e dos corpos administrativos;

12.° Dar conta ao governador civil, para os effeitos de serem annulladas, das nomeações de empregados dos corpos administrativos e dos estabelecimentos, institutos e corporações de piedade ou beneficencia, que não tenham sido feitas em conformidade do respectivo regulamento;

13.° Superintender, nos termos das leis .especiaes, as escolas e estabelecimentos publicos ou particulares, de instrucção e educação;

14.° Fiscalisar o modo como são cumpridos os regulamentos ácerca dos expostos e creanças desvalidas e abandonadas, executando tambem diligentemente as obrigações que lhe são impostas:

10.° Prestar aos corpos administrativos ou seus presidentes, e a todas as auctoridades e corporações publicas o auxilio de que precisem para o desempenho de suas funcções;

16.° Exercer, com respeito á fazenda publica, as attribuições que lhe commettem as leis e regulamentos especiaes;

17.° Abrir e registar os testamentos em conformidade do codigo civil;

18.° Receber as escusas dos testamenteiros, nos termos do codigo civil;

19.° Tomar conta do cumprimento dos legados pios ou destinados a applicações pias ou de utilidade publica, nos termos da legislação especial, competindo esta attribuição em Lisboa ao administrador do primeiro bairro, e no Porto ao do bairro a que pertencer a santa, casa da misericordia da mesma cidade;

20.° Participar ás corporações administrativas no praso de quinze dias, contados do registo dos testamentos, os legados com que tenham sido contemplados;

21.° Nomear, com excepção do secretario, os empregados da administração do concelho;

22.° Nomear para todos os outros empregos do concelho ou parochia, para cujo provimento as leis lhe dêem competencia, e, nos termos d’este codigo, suspender e demittir os respectivos empregados;

23.° Tomar juramento aos empregados publicos do concelho, quando a lei não designe auctoridade competente para o deferir e fazer-lhe dar posse dos respectivos empregos:

24.° Conceder licença até trinta dias em cada anno aos empregados seus subordinados, não havendo prejuizo para o serviço:

25.° Exercer quaesquer outros actos ou attribuições que as leis ou regulamentos lhe incumbam.

Art. 278.° No exercicio das attribuições que lhe confere o n.° 2.° do artigo 276.°, compete ao administrador do concelho:

1.° Dirigir a policia do concelho, dando todas as providencias necessarias para que se cumpram as leis e regulamentos de policia geral, districtal e municipal, e para a manutenção da ordem e tranquillidade publica, podendo para esse fim requisitar o auxilio da força publica, quando seja necessaria;

2.° A policia sobre os estrangeiros que residam ou transitem no concelho;

3.° A policia sobre mendigos, vadios, vagabundos e musicos ambulantes;

4.° A policia relativa ás casas publicas de jogo, hospedarias, estalagens, botequins e similhantes;

5.° A policia relativa ao uso e porte de armas brancas ou de fogo;

6.° A policia sobre pregões, cartazes e annuncios em logares publicos, e sobre os demais factos prohibidos pelo n.° 2.°do artigo 251.°;

7.° A policia dos theatros e espectaculos publicos, cohibindo os factos prohibidos pelo n.° 3.° do artigo 201.°;

8.° A policia sobre as reuniões publicas, nos termos das leis e regulamentos especiaes;

9.° A policia sanitaria em conformidade dos respectivos regulamentos;

10.° A policia para manter a boa ordem nos templos e solemnidades religiosas;

11.° A policia das festas e divertimentos publicos;

12.° A policia para impedir a divagação de pessoas alienadas, fazendo-as recolher em algum estabelecimento apropriado, ou entregar ás pessoas que devam tomar conta dellas;

13.° A policia para impedir- a divagação de animaes malfazejos, providenciando para que sejam extinctos;

14.° A policia relativa ás mulheres prostitutas;

l5.° A policia para impedir e reprimir quaesquer actos contrarios á ordem e á moral e decencia publica;

16.° Tomar as providencias necessarias para proteger a liberdade, propriedade e segurança dos habitantes do concelho;

17.° Providenciar para protecção e segurança das pessoas e cousas nos casos de incendio, inundação, naufragio, calamidade publica e similhantes, promovendo a prestação e distribuição de soccorros;

18.° A vigilancia pela segurança das cadeias e sustentação dos presos;

19.° A fiscalisação dos pesos e medidas;

20.° A concessão de bilhetes de residencia a estrangeiros, nos termos dos respectivos regulamentos;

21.° A concessão de licenças para theatros e espectaculos publicos, fora da capital do districto, impondo todas as condições necessarias para segurança dos espectadores e artistas;

22.° A concessão de licenças, fóra da capital do districto, para fabricar, vender, importar ou usar armas brancas ou de fogo, licenças que, sendo para uso e porte de armas, são validas em todo o reino durante o tempo da concessão;

23.° A concessão de licenças aos estabelecimentos insalubres, incommodos e perigosos, e determinar a sua cessação, nos termos dos respectivos regulamentos;

24.° A concessão de licenças policiaes que não competir, por disposição legal, a outra auctoridade ou corporação;

25.° Auxiliar os empregados fiscaes, de justiça e municipaes, e bem assim os arrematantes de impostos do estado ou do municipio, quando requisitarem o seu auxilio;

26.° Levantar autos de investigação de todos os crimes

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publicos, inquirindo testemunhas e colligindo quaesquer documentos ou provas que possam esclarecer os tribunaes, e remettendo os autos com informação ao ministerio publico;

27.° Participar ao ministerio publico as contravenções de regulamentos e postaras para que promova a applicação das penas devidas;

28.° Proceder á captura de criminosos quando possam ser presos sem culpa formada, e nos outros casos quando o ministerio publico lhe entregar os competentes mandados, pondo os presos desde logo á disposição do respectivo juiz;

29.° Dar buscas e proceder a apprehensões e mais diligencias necessarias para investigação dos factos criminosos, guardando formalidades iguaes ás prescriptas para as auctoridades judiciaes;

30.° Exercer quaesquer outras attribuições policiaes que as leis e regulamentos lhe incumbam.

Art. 279.° Nos concelhos das capitães de districto a concessão de bilhetes de residencia, de licenças para theatros e espectaculos publicos, para fabrico, importação, venda ou uso de armas brancas ou de fogo, para casas de jogo, hospedarias, estalagens, botequins e similhantes, pertence ao governador civil.

Art. 280.° Nos concelhos onde haja corpos de policia civil, os administradores dos bairros e os dos concelhos, quando não forem tambem commissarios de policia, exercem cumulativamente com estes ou com os chefes das repartições policiaes as attribuições de policia mencionadas neste codigo, preferindo, porem, os chefes das repartições policiaes ou os commissarios, quando concorram simultaneamente.

Art. 281.° Tudo o que fica disposto a respeito dos administradores de concelho é applicavel aos administradores dos bairros de Lisboa e Porto, salvo quaesquer disposições especiaes.

SECÇÃO II

Empregados da administração do concelho

Art. 282.° O administrador do concelho tem um secretario por elle proposto e nomeado pelo governador civil, precedendo concurso documental.

Art. 283.° O secretario da administração do concelho só póde ser demittido, com previa audiencia suar por desleixo, erro de officio ou mau procedimento, é é competente para o demittir o governador civil.

§ 1.° Da demissão cabe recurso para o governo, interposto de conformidade com o respectivo regulamento.

§ 2.° O secretario da administração póde ser transferido para outro concelho do mesmo districto.

Art. 284.° O secretario da administração é substituido nas suas faltas ou impedimentos temporarios pelo empregado da mesma administração que o administrador do concelho nomear.

Art. 280.° São attribuições do secretario da administração do concelho:

1.° Dirigir, sob as ordens e instrucções do administrador, o expediente e trabalhos da secretaria;

2.° Authenticar todos os documentos, e assignar todas as certidões expedidas pela secretaria;

3.° Conservar sob sua responsabilidade, na casa da administração, o archivo da secretaria:

4.° Preparar o expediente e as informações necessarias para as resoluções do administrador;

5.° Lavrar e subscrever todos os autos e termos officiaes da administração do concelho;

6.° Exercer quaesquer commissões que lhe sejam impostas por lei, regulamento ou ordens superiores.

Art. 286.° Os ordenados dos secretarios das administrações dos bairros de Lisboa e Porto são fixados nos actuaes, e os das administrações dos restantes concelhos em réis 360$000 nos de l.ª ordem, em 240$000 réis nos de 2. ordem e de população superior a 15:000 habitantes, e em 180$000 réis nos outros concelhos.

Art. 287.° Nas administrações dos concelhos haverá amanuenses para a execução e prompto expediente do serviço, e o seu numero não excederá a quatro nos concelhos de l.ª ordem, a tres nos de 2.ª ordem, que tenham mais de 15:000 habitantes, e a dois nos restantes, e os seus ordenados não serão respectivamente superiores a 160$000 e 120$000 réis.

§ unico. Nos concelhos, onde haja actualmente maior numero de amanuenses, será este reduzido ao limite correspondente, e, onde o numero for menor, não poderá este, sem auctorisação do governo, ser elevado nem ainda até o numero acima fixado.

Art. 288.° Nas administrações dos concelhos haverá igualmente officiaes de diligencias para o serviço da administração, e o seu numero não poderá exceder, sem auctorisação do governo, a tres nos concelhos de l.ª ordem, a dois nos concelhos de 2.ª ordem, que tenham mais de 15:000 habitantes, e a um nos restantes, e os respectivos ordenados não serão superiores a 100$000 e 80$000 réis.

Art. 289.° Os ordenados dos empregados, de que trata esta secção, serão pagos pela respectiva camara municipal, como despeza obrigatoria.

Art. 290.° Os amanuenses e officiaes de diligencia são nomeados pelo administrador do concelho, e tanto elles como o secretario prestam juramento perante aquelle magistrado.

Art. 291.° O secretario, amanuenses e officiaes de diligencias podem ser suspensos, até trinta dias em cada anno, pelo administrador do concelho, e, por praso superior, com auctorisação do governador civil, a qual, para a demissão dos mesmos empregados, é sempre indispensavel.

Art. 292.° Os officiaes de diligencias são competentes para accusar as trangressões das posturas e regulamentos policiaes, mas não podem ser condemnados em custas, ainda que a queixa seja julgada improcedente.

Art. 293.° Tudo o que fica disposto a respeito dos empregados das administrações dos concelhos é applicavel aos das administrações dos bairros de Lisboa e Porto, salvo disposições especiaes.

CAPITULO III

Regedor de parochia e seus empregados

Art. 294.° Em cada parochia, ou parochias annexadas administrativamente, ha um regedor nomeado pelo governador civil, sob proposta do administrador do concelho, de quem é immediato representante em todos os assumptos das suas attribuições, e nos que não estiverem especialmente commettidos a outras auctoridades ou funccionarios.

Art. 295.° Só póde ser regedor de parochia o individuo que tiver nella residencia e souber ler, escrever e contar.

Art. 296.° O cargo de regedor de parochia é obrigatorio, porém, o nomeado não póde ser compellido a servir por mais de um anno; sómente depois de um anno de intervallo poderá ser obrigado a acceitar nova nomeação.

Art. 297.° O regedor de parochia não vence ordenado mas tem os emolumentos que pelas leis lhe competirem, e, emquanto exercer o seu emprego, é isento do serviço do jury, de aboletamentos em tempo de paz e do imposto de trabalho estabelecido n’este codigo.

Art. 298.° As funcções de regedor de parochia são incompativeis com quaesquer outras funcções publicas, excepto com as de juiz de paz.

Art. 299.° O regedor de parochia tem substituto nomeado pelo governador civil nos mesmos termos do effectivo.

Art. 300.° O regedor de parochia e seu substituto podem ser suspensos pelo administrador do concelho, mas só pelo governador civil podem ser demittidos.

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Art. 301.° O regedor de parochia e seu substituto prestam juramento, por si ou por procuração, nas mãos do administrador do concelho.

Art. 302.° Incumbe ao regedor de parochia:

1.° Dar parte ao administrador do concelho das faltas e irregularidades que a j unta de parochia commetter;

2.° Dar parte ao administrador do concelho das faltas ou irregularidades que lhe conste haver na administração das irmandades, confrarias e estabelecimentos de beneficencia ou piedade;

3.° Dar parte circunstanciada ao administrador do concelho dos factos criminosos de que tiver noticia, e das provas que possam obter-se para descobrir os criminosos;

4.° Vigiar a execução das providencias policiaes relativas aos cemiterios da parochia, e exercer as funcções de policia sanitaria que lhe forem commettidas nas leis e regulamentos;

5.° Prover á desobstrucção das ruas e caminhos parochiaes;

6.° Abrir os testamentos na conformidade das disposições do codigo civil;

7.° Exercer as funcções de que for encarregado pelo administrador do concelho, nos termos d’este codigo;

8.° Finalmente, exercer quaesquer outras attribuições que as leis e regulamentos lhe incumbam.

Art. 303.° As funcções de secretario do regedor são exercidas pelo secretario da junta de parochia; porém, se este for vogal da mesma corporação, serão exercidas por pessoa nomeada pelo administrador do concelho sobre proposta do regedor, á qual ajunta arbitrará gratificação não excedente a 12$000 réis annuaes.

Art. 304.° O secretario privativo do regedor póde ser suspenso por este, mas só pelo administrador do concelho póde ser demittido. O secretario da regedoria, que accumule as funcções de secretario da junta, só póde ser suspenso pelo regedor, até trinta dias em cada anno, das funcções que perante este exerce, e em tal caso a suspensão importará a perda de metade da gratificação em favor do secretario interinamente nomeado pelo regedor.

Art. 300.° O regedor de parochia é coadjuvado no exercicio das suas funcções por cabos de policia.

§ 1.° A nomeação dos cabos de policia é feita pelo administrador do concelho, sobre proposta do regedor de parochia.

§ 2.° Os cabos de policia só podem ser nomeados:

1.° De entre os soldados licenciados para a reserva, que residam na freguezia, mas sem prejuizo do serviço militar a que sejam eventualmente chamados;

2.° De entre os mancebos residentes na freguezia, recenseados e sorteados para o serviço militar, que não tenham sido necessarios para o preenchimento dos contingentes, ou que, podendo ser necessarios, ainda não foram chamados;

3.° Na falta de individuos das duas classes precedentes, de entre quaesquer outros da parochia, que sejam varões validos, de idade não excedente a cincoenta annos.

§ 3.° O serviço de cabo de policia é obrigatorio para os individuos da l.ª classe de que trata o paragrapho antecedente, durante o tempo por que permanecerem na mesma classe; para os da 2.ª classe, durante o praso de cinco annos; e para os de 3.ª classe durante um anno.

§ 4.° O serviço de cabo de policia póde ser prestado por substituto offerecido pelo proprio, ainda que tambem seja cabo, e que tenha as condições exigidas a qualquer das classes designadas no n.° 2.°

§ 5.° Os cabos de policia não podem ser obrigados a prestar serviço fóra da freguezia, excepto para captura de criminosos ou conducção de presos. No primeiro caso só podem ser obrigados a ir até os limites do respectivo concelho; e no segundo até á sede da freguezia mais proxima do concelho confinante.

§ 6.° O numero de cabos de policia para cada parochia, e para cada secção d’ella, segundo as conveniencias do serviço, será fixado pelo governador civil, sobre propostas do administrador do concelho.

§ 7.° As nomeações dos cabos de policia só podem ser feitas no mez de janeiro de cada anno, excepto para preenchimento de quaesquer vacaturas que occorrerem, não sendo por suspensão ou demissão.

§ 8.° Os cabos de policia são immediatamente subordinados ao regedor de parochia, e d’elle recebem instrucções para a execução dos serviços que lhes forem incumbidos.

§ 9.° Os cabos de policia podem ser suspensos pelo regedor de parochia, mas só pelo administrador podem ser demittidos.

Art. 306.° O secretario privativo do regedor e os cabos de policia prestam juramento perante o mesmo regedor.

TITULO VIII

Contencioso administrativo

CAPITULO I

Tribunaes de primeira instancia

Art. 307.° As questões contenciosas de administração publica, com excep[...], aquellas que por lei estão sujeitas á jurisdicção de ou[..] tribunaes ou auctoridades, são julgadas em primeira instancia, nos termos deste codigo, pelas commissões districtaes, pelos auditores administrativos junto das mesmas commissões ou pelos juizes de direito das diversas comarcas a que competirem, segundo as regras geraes da competencia judicial.

Art. 308.° As funcções de ministerio publico nas questões a que se refere o artigo anterior são desempenhadas pelo secretario geral do governo civil nos processos da competencia da commissão districtal ou do auditor, e pelos delegados do procurador regio nos competentes juizes de direito; e consideram-se estes magistrados como agentes do governo nos diversos assumptos do contencioso administrativo, cumprindo-lhes n’esta qualidade solicitar, receber e executar as instrucções superiores, e promover com todo o zêlo e escrupulo, na parte que lhes competir, a inteira observancia das leis e mais diplomas administrativos.

Art. 309.° O auditor, junto da commissão districtal, é nomeado por decreto, expedido pelo ministerio do reino, precedendo concurso documental perante um jury composto do director geral da administração politica e civil e de dois vogaes effectivos ou extraordinarios do supremo tribunal administrativo, nomeados pelo respectivo ministro para cada concurso.

Art. 310.° Sómente poderão concorrer aos logares de auditores:

1.° Os secretarios geraes dos governos civis com dois annos de exercicio pelo menos;

2.° Os officiaes das secretarias dos governos civis, que sejam bachareis formados em direito e tenham, pelo menos, quatro annos do exercicio;

3.° Os bachareis formados em direito com dois annos, pelo menos, de exercicio do cargo de governador civil ou com quatro annos, pelo menos, de exercicio do cargo de administrador de concelho ou bairro.

§ unico. Sómente será attendido para o concurso o serviço effectivo e com boas informações.

Art. 311.° Os auditores são de tres classes segundo a ordem dos districtos, e serão promovidos, por antiguidade, da 3.ª para a 2.ª classe e d’esta para a l.ª

§ unico. Para os effeitos do disposto n’este artigo são de l.ª classe os districtos de Lisboa e Porto, de 2.ª os de Braga, Coimbra e Vizeu, e de 3.ª os restantes.

Art. 312.° As vagas que se derem no supremo tribunal

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administrativo serão por metade, e fazendo-se alternadamente a nomeação, providas em auditores de l.ª classe com doze annos, pelo menos, de serviço n’esta magistratura.

Art. 313.° Os auditores servem em cada districto seis annos, findos os quaes, se não forem reconduzidos, serão transferidos para outro, não o podendo ser antes senão a requerimento seu, salvo o disposto no artigo seguinte.

Art. 314.° Os auditores podem ser transferidos, suspensos ou demittidos pelo governo por assim o exigir a conveniencia do serviço, precedendo audiencia d’elles, e consulta affirmativa do supremo tribunal administrativo, funccionando como corpo consultivo.

Art. 3l5.° Os auditores têem de ordenado 600$000 réis nos districtos de 3.ª classe; 700$000 réis nos de 2.ª; e 800$000 réis nos de l.ª, alem dos emolumentos que na respectiva tabella lhes são fixados.

Art. 316.° Os auditores gosam do direito de aposentação, nos termos e nas condições estabelecidas na lei geral sobre o assumpto.

Art. 317.° Os auditores são obrigados a residir na sede do districto, não podendo ausentar-se d’ella sem licença, expedida pelo ministerio do reino, com o qual se correspondem por intermedio do governador civil.

Art. 318.° O cargo de auditor é incompativel com o de outro cargo publico.

§ unico. É permittido ao auditor o exercicio da advocacia, excepto em causas criminaes e em outras em que forem interessados o estado, os corpos e corporações administrativas ou pessoas a que o estado deva especial protecção.

Art. 319.° Em cada districto haverá um substituto do auditor, annualmente proposto por este, e nomeado pelo ministerio do reino, o qual servirá nas faltas e impedimentos d’elle, não sendo obrigado a servir por mais de um anno, mas podendo ser reconduzido.

§ unico. Os substitutos não têem ordenado, mas vencem, quando servirem, a parte que lhes competir no do auditor, segundo as regras geraes d’este codigo, e os emolumentos respectivos.

Art. 320.° Os auditores e os substitutos prestam juramento, por si ou por procurador, no ministerio do reino, e é-lhes conferida a posse dos seus cargos pelo governador civil.

Art. 321.° O auditor terá um secretario, proposto pelo governador civil de entre os empregados da respectiva secretaria, e nomeado pelo ministerio. do reino, com a gratificação annual de 60$000 réis.

§ 1.° O secretario exerce tambem as funcções de contador, sendo substituido nos seus impedimentos pelo empregado da secretaria, que o governador civil designar e que perceberá a parte da gratificação proporcionada ao tempo de serviço.

§ 2.° Os restantes empregados da secretaria do governo civil são obrigados a desempenhar o serviço, que for necessario para o expediente dos negocios a cargo do auditor.

§ 3.° O secretario e mais auxiliares podem ser suspensos pelo auditor das funcções, que perante elle exercem, até tres mezes em cada anno.

Art. 322.° Compete ao secretario:

1.° Lavrar, ler e subscrever as actas das audiencias;

2.° Lavrar e subscrever todos os autos e termos do processo com excepção dos despachos e sentenças, que serão exarados pelo auditor;

3.° Assignar e expedir as communicações das ordens e quaesquer actos da competencia do auditor;

4.° Satisfazer ao expediente dos negocios a cargo do auditor, guardar o respectivo archivo no edificio do governo civil, e passar as certidões que forem requeridas.

§ unico. Os actos praticados pelo secretario são equiparados, para todos os effeitos, aos que praticam os escrivães dos juizes de direito.

Art. 323.° Compete á commissão districtal, conjunctamente com o auditor, julgar:

1.° As contas de gerencia dos corpos administrativos, irmandades, .confrarias, associações, institutos e estabelecimentos de piedade ou beneficencia, cujo julgamento não pertença ao tribunal de contas:

2.° As questões sobre servidões, distribuição de aguas e uso dos bens, pastos e fructos do logradouro commum dos habitantes dos concelhos ou das parochias;

3.° Quaesquer outras questões de natureza contenciosa que lhe são commettidas por este codigo.

Art. 324.° Compete ao juiz de direito julgar:

1.° As reclamações sobre recrutamento do exercito ou armada;

2.° As reclamações ou recursos, em materia de contribuições do estado e serviço de derrama das congruas parochiaes, conforme as leis especiaes;

3.° As reclamações ou recursos sobre lançamento, repartição e cobrança dos impostos municipaes.

Art. 325.° Compete ao auditor julgar:

1.° As reclamações contra as deliberações das camaras municipaes e juntas de parochia, por algum dos motivos de nullidade enumerados no artigo 31.°, ou por offensa de direitos fundados nas leis ou regulamentos de administração publica;

2.° As reclamações contra os actos dos administradores de concelho por incompetencia, excesso de poder, violação de lei ou offensa de direitos, sem prejuizo da competencia do governador civil para a emenda dos actos arguidos, quando elles não sejam declaratorios de direitos ou não tenham servido de base a alguma decisão dos tribunaes;

3.° As reclamações relativas ás eleições das camaras municipaes e juntas de parochia;

4.° Os processos sobre inelegibilidade absoluta dos eleitos para as camaras municipaes e juntas de parochia; sobre exclusão das funcções dos mesmos corpos, perda dos logares dos seus vogaes pelas causas de incompatibilidade designadas n’este codigo, e reclamações sobre a legitimidade das faltas e impedimentos dos seus vogaes;

5.° A verificação das faltas de eleição das camaras municipaes e juntas de parochia, e procedimento dellas consequente nos termos d’este codigo;

6.° As escusas dos eleitos para os corpos administrativos;

7.° As reclamações relativas ás eleições das irmandades, confrarias e outras associações de piedade ou beneficencia, á admissão ou exclusão dos irmãos ou associados, e aos actos das respectivas mesas, direcções ou assembléas geraes, que envolvam violação de lei ou regulamento de administração publica, dos seus compromissos ou estatutos, ou offensa de direitos;

8.° As reclamações dos socios dos monte pios e associações de soccorros mutuos contra os actos das respectivas direcções, mesas ou assembléas geraes, por denegação de soccorros, subsidios ou pensões, auctorisados pelos estatutos, por offensa de direitos, violação de lei, regulamento ou disposição dos mesmos estatutos; as reclamações relativas á eleição das mesas, direcções ou conselhos fiscaes, á admissão ou exclusão de socios; as contas finaes de liquidação e a dissolução por falta de numero legal de socios, na conformidade da legislação especial;

9.° As questões que sobre o sentido das clausulas dos contratos se suscitarem entre a administração do municipio ou parochia e os emprehendedores ou arrematantes de rendas, obras ou fornecimentos;

10.° Finalmente, outras quaesquer questões ou negocios de natureza contenciosa, que as leis especiaes lhe commetterem ou commettiam aos extinctos tribunaes administrativos ou conselhos de districto.

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Art. 326.° Não é permittido aos tribunaes, nos processos do contencioso administrativo, julgar, principal on incidentemente, questões sobre titulos de propriedade ou de posse, validade de contratos ou direitos civis d’elles emergentes, sobre a conveniencia ou inconveniencia das deliberações dos corpos e corporações administrativas, nem sobre resoluções tutelares, salvo quando proferidas por estacões incompetentes ou em assumptos que não estejam sujeitos á jurisdicção tutelar ou com violação das leis e regulamentos administrativos.

Art. 327.° Os termos e diligencias dos processos da competencia dos juizes de direito são cumpridos pelos officiaes de justiça e as notificações de decisões ou despachos da commissão districtal ou do auditor serão feitas pelos empregados das administrações dos concelhos ou bairros.

Art. 328.° As ordens expedidas ás auctoridades e repartições subordinadas ao governador civil carecem do visto d’este magistrado, o qual poderá recusal-o, quando para a recusa achar motivos de conveniencia publica, que exporá ao competente tribunal.

§ 1.° Não carecem do visto as ordens para diligencias que a lei incumbe a determinados funccionarios, mas sim as que se referem a diligencias incumbidas pelo tribunal a funccionarios por elle escolhidos com auctorisação legal.

§ 2.° Se, recusado o visto, o tribunal insistir na expedição da ordem, subirá sem mais termos o processo, pela secretaria d’estado dos negocios do reino, ao governo, que resolverá por despacho exarado no mesmo processo.

Art. 329.° Incumbe ao secretario geral, como agente do ministerio publico:

1.° Assistir ás audiencias e sessões, podendo tomar parte na discussão de todos os assumptos nos processos do contencioso administrativo;

2.° Reclamar perante o auditor ou perante a commissão districtal, segundo competir, contra os actos e deliberações das camaras municipaes e juntas de parochia, que envolvam nullidade;

3.° Reclamar perante o auditor contra os actos e deliberações das irmandades, associações ou institutos de piedade ou beneficencia, que envolvam offensa de lei ou regulamento de administração publica, ou dos seus compromissos e estatutos;

4.° Reclamar perante o auditor contra as nullidades por inobservancia dos preceitos legaes nas eleições das camaras municipaes, juntas de parochia e corporações administrativas;

5.° Reclamar perante o auditor as exclusões das funcções das camaras municipaes e juntas de parochia e a declaração das vacaturas resultantes da perda dos logares dos mesmos corpos;

6.° Responder, sob pena de nullidade, em todos os processos do contencioso administrativo da competencia da commissão districtal ou do auditor, ainda que não seja parte, e n’elles promover o que for a bem do cumprimento das leis, podendo exigir, por intermedio do governador civil, quaesquer documentos de que precise;

7.° Recorrer para os tribunaes superiores dos julgamentos que lhe pareçam contrarios ás leis;

8.° Recorrer para o auditor dos actos de quaesquer corporações administrativas, com excepção da commissão districtal, cuja jurisdicção se exerça na area do districto;

9.° Exercer junto do governador civil as funcções de ministerio publico em todos os actos em que por lei se exige o comparecimento do delegado do procurador regio;

10.° Participar ao respectivo delegado do procurador régio todas as infracções ou delictos, de que tiver noticia pelos processos contenciosos pendentes;

11.° Dar conta ao governador civil de todos os abusos e irregularidades praticados pelas auctoridades e repartições administrativas; de que tiver noticia pelos processos pendentes;

12.° Promover o andamento dos processos pendentes, e exercer as demais attribuições que por lei lhe competirem.

Art. 330.° Os delegados do procurador regio observarão, na parte applicavel, o disposto no artigo anterior, nos processos do contencioso administrativo da competencia dos juizes de direito; e especialmente lhes compete exercer perante estes as funcções que, em materia de contribuições directas do estado, eram desempenhadas junto dos tribunaes administrativos pelo delegado do thesouro, sem prejuizo dos recusos, que tambem a este compete interpor no interesse da fazenda publica.

Art. 331.° Os agentes do ministerio publico são obrigados a recorrer sempre das sentenças ou despachos com força de sentença, proferidos contra a fazenda nacional, contra o voto do auditor nos processos da competencia da commissão districtal, ou contra o pedido pelos mesmos agentes nos processos instaurados a requerimento delles em cumprimento de instrucções superiores.

CAPITULO II

Processo e julgamento na primeira instancia

Art. 332.° Ácerca das suspeições e impedimentos dos julgadores nos processos do contencioso administrativo observar-se-ha o disposto na lei geral do processo civil.

Art. 333.° A auditoria funcciona no edificio do governo civil e tem duas audiencias por semana nos dias que o auditor fixar annualmente e que não sejam os designados para sessões ordinarias da commissão districtal, alem das audiencias extraordinarias que o serviço exigir, devendo umas e outras começar ás dez horas da manhã.

§ 1.° Quando algum dos dias das audiencias ordinarias for santificado ou feriado, a audiencia realisar-se-ha no primeiro dia que o não for.

§ 2.° São feriados sómente os domingos e dias santificados, os de entrudo, quarta feira de cinza, quinta feira e sexta feira santa, os dias de grande gala e os que forem declarados feriados por decreto especial.

Art.° 334. As audiencias são publicas e o auditor tem as mesmas attribuições que competem aos juizes de direito, para manter a ordem durante as audiencias.

Art. 335.° Nenhum julgador póde recusar-se a julgar com fundamento na falta de lei, na obscuridade ou omissão d’ella.

Art. 336.° Aos julgamentos deve sempre preceder audiencia contradictoria das partes interessadas, salvo quando n’este codigo, em lei especial ou nos regulamentos de administração publica estiver determinada outra fórma de processo.

Art. 337.° As reclamações contenciosas não impedem a execução dos actos ou deliberações contra que são feitas; mas o tribunal pôde, por despacho interlocutorio, suspender essa execução, quando as partes o requeiram e a execução possa trazer damno irreparavel ou de difficil reparação.

.§1.° As reclamações para revogação ou reforma de actos de administração prescrevem decorridos dois annos, contados desde que o acto se executou, salvo nos casos em que a lei estabelecer outro praso.

§ 2.° O ministerio publico, porém, é competente para promover a todo o tempo a revogação de posturas ou regulamentos approvados pelos corpos administrativos, na parte em que sejam offensivos das leis ou regulamentos geraes de administração publica.

§ 3.° A prescripção interrompe-se por meio de requerimento assignado pela parte offendida ou por seu procurador, pedindo a revogação ou reforma do acto offensivo dos seus direitos ou da lei, e entregue á auctoridade ou corporação que o praticou.

§ 4.° Indeferido o requerimento, continuará a correr a

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prescripção desde que o indeferimento for notificado ao requerente.

Art. 333.° Os processos do contencioso administrativo da competencia dos juizes de direito são sujeitos a distribuição especial, constituindo uma classe á parte, e para elles não haverá ferias senão em honra divina.

Art. 339.° O auditor será o relator dos processos contenciosos da competencia da commissão districtal, excepto perante as commissões districtaes de Lisboa, Porto e Braga, cujos processos serão distribuidos a todos os vogaes, não comprehendendo o presidente.

Art. 340.° As reclamações, que houverem de ser resolvidas pelos tribunaes do contencioso administrativo, serão submettidas ao seu julgamento, quando outro processo não esteja estabelecido, por meio de petição assignada cor advogado ou procurador bastante, ou simplesmente pelo interessado, com reconhecimento por tabellião, e por meio de officio, quando o reclamante for auctoridade publica.

§ 1.° As reclamações do ministerio publico serão deduzidas por meio de promoção.

§ 2.° As petições, officios e promoções devem expor desenvolvidamente o pedido e seus fundamentos, mas os tribunaes são obrigados a conhecer do fundo da questão, sempre que do allegado se possa deprehender a intenção do reclamante.

§ 3.° Os documentos, em que os interessados se fundarem, devem acompanhar a petição, bem como o rol de: testemunhas, o qual póde, aliás, ser additado e alterado aos termos da lei do processo civil.

§ 4.° Nas mesmas petições serão requeridos os exames e vistorias que os interessados tiverem por indispensaveis, mas não serão expedidas precatorias para inquirição de testemunhas, nem para exames ou vistorias fora do continente ou da ilha onde pender a causa.

Art. 341.° Produzida a prova, terão os interessados e o ministerio publico, independentemente de despacho, vista do processo por cinco dias cada um, para dizerem por escripto.

§ unico. Findo este praso, e conforme a competencia, será concluso o processo ao juiz de direito, o qual publicará a sentença até á segunda audiencia seguinte, ao respectivo auditor que a proferirá no praso de dez dias, ou ao relator para seguir os tramites do julgamento collectivo.

Art. 342.° As sentenças e accordãos, que julgarem definitivamente, devem conter o objecto do litigio, os nomes e qualidades das partes, o extracto das suas allegações e as rasões de decidir, não podendo, porém, nunca julgar alem ou em cousa diversa do pedido.

Art. 343.° As sentenças e accordãos com transito em julgado nos processos do contencioso administrativo têem força executiva.

Art. 344.° Da decisão final cabe recurso para o supremo tribunal administrativo, o qual será interposto dentro de dez dias, a contar da intimação, e seguirá sempre nos proprios autos.

§ 1.° Assignado o termo de recurso, e satisfeita a importancia dos sellos do correio, será enviado no praso de quarenta e oito horas o processo ao supremo tribunal administrativo.

§ 2.° Decorridos oito dias da assignatura do termo, sem o recorrente apresentar a importancia dos referidos sellos, ou autos serão desde logo conclusos, e o recurso será julgado deserto.

Art. 34õ.° Requerendo-se a suspensão do acto ou deliberação reclamada, se conhecerá deste incidente, logo que seja concluso o processo, ou dentro de tres dias a contar da resposta da parte e do ministerio publico, se for necessaria a sua audiencia, para a qual se assignará o praso de quarenta e oito horas.

§ unico. Da decisão d’este incidente póde interpor-se recurso, dentro de quarenta e oito horas, que subirá com os proprios autos ao supremo tribunal administrativo, onde será resolvido na primeira sessão, depois de distribuido, baixando logo o processo, para seguir seus termos, ao tribunal inferior, sem dependencia de homologação nem de intimação.

Art. 346.° Os processos de contas, cujo julgamento compete á commissão districtal, serão examinados na secretaria do governo civil, solicitando-se das corporações interessadas todos os esclarecimentos convenientes, e do resultado do exame se redigirá parecer com menção de todos os elementos que devem servir de base á decisão.

§ 1.° Este exame é feito pelo empregado da secretaria, que o governador civil designar; porém, nos districtos de Lisboa e Porto será o exame commettido aos contadores dos extinctos tribunaes administrativos, e só na falta ou impedimento d’estes empregados poderá fazer-se outra designação.

§ 2.° Dos accordãos definitivos podem recorrer para o tribunal de contas os responsaveis, a corporação interessada e o ministerio publico, observando sempre este o disposto na artigo 331.°

Art. 347.° As reclamações ou recursos sobre contribuições directas do estado, predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria, decima de juros e contribuição de registo só podem provar-se com os documentos, que as devem acompanhar, sendo, porém, licito a quaesquer representantes da fazenda publica apresentar os que forem a bem d’esta até o praso de cinco dias depois da distribuição, findo o qual o escrivão fará concluso o processo ao juiz, que, ouvido o ministerio publico, quando este não seja o reclamante, proferirá sentença no praso do § unico do artigo 341.°, com recurso para o supremo tribunal administrativo no praso e nos termos do artigo 344.°

Art. 348.° Se as sentenças não forem proferidas no praso para este fim assignado, o ministerio publico promoverá immediatamente nos termos do § 3.° do artigo 100.° do codigo do processo civil, sendo tambem applicavel neste caso o disposto no § 2.° do mesmo artigo.

§ unico. O escrivão, na mesma data em que fizer os autos conclusos para sentença final, intimará sempre a conclusão ao ministerio publico.

Art. 349.° Os recursos interpostos das sentenças proferidas nos processos do contencioso administrativo não têem effeito suspensivo, salvo nos casos em que o tribunal superior ordenar a suspensão, ou esta seja determinada por disposição especial de lei ou regulamento de administração publica.

Art. 350.° Nos processos do contencioso administrativo da .competencia da commissão districtal ou do auditor, é, em regra, sómente admissivel a prova documental; pôde, porem, o tribunal ex officio, ou a requerimento das partes ou do ministerio publico, ordenar inquirição de testemunhas, vistorias, exames ou outras quaesquer diligencias, as quaes poderão ser incumbidas aos administradores dos concelhos, que o mesmo tribunal designar, conforme as circumstancias.

Art. 351.° O disposto nos artigos anteriores não prejudica as disposições especiaes ácerca dos casos expressamente designados nas leis ou regulamentos de administração publica, em que, dos julgamentos definitivos ou interlocutorios com força de definitivos, se deva interpor recurso para outra instancia que não seja o supremo tribunal administrativo.

CAPITULO III

Instancia superior do contencioso

Art. 352.° Compete ao supremo tribunal administrativo conhecer contenciosamente:

1.° Dos recursos interpostos das decisões das commis-

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soes districtaes, dos auditores e dos juizes de direito no processos do contencioso administrativo;

2.° Dos conflictos de jurisdicção e competencia entre as auctoridades administrativas ou entre estas e as judiciaes;

3.° Dos recursos que dos actos e decisões das auctoridades administrativas se interpozerem por incompetencia excesso de poder, violação de lei ou regulamentos, ou offensa de direitos adquiridos, excepto em questões de propriedade, posse, validade de contratos ou direitos d’elles emergentes, ou em assumptos sujeitos á competencia de outros tribunaes;

4.° Das reclamações contra as deliberações da commissão districtal, por incompetencia, violação da lei ou regulamento, ou offensa de direitos, excepto nos casos em que por este codigo ou por lei especial haja reclamação ou recurso para outro tribunal ou para o governo;

5.° Dos recursos do tribunal de contas nos casos de incompetencia, transgressão de formulas ou violação de lei;

6.° Dos actos e despachos do governo, mas exclusivamente nos recursos dos officiaes do exercito, da armada e do ultramar ou empregados civis com graduação militar, que se julgarem illegalmente preteridos em posto ou antiguidade; nos interpostos contra a concessão de patentes de introducção de novas industrias, e nos expressamente estabelecidos em leis especiaes;

7.° Dos recursos ácerca do recenseamento para constituição dos collegios que teem de eleger os vogaes dos tribunaes de arbitros-avindores, ou ácerca da eleição dos mesmos collegios;

8.° De quaesquer outros assumptos que por este codigo ou por lei especial lhe sejam expressamente commettidos

Art. 353.° Nos processos a que se refere o n.° 1.° do artigo antecedente, o supremo tribunal administrativo conhece do recurso, desde que do respectivo termo se mostre que o recorrente não se conforma com a sentença, ainda que n’elle não deduza os fundamentos da sua opposição, nem offereça petição, em que exponha os fundamentos da sua justiça.

Art. 304.° Não carecem de confirmação do governo os julgamentos:

1.° Sobre eleições dos corpos e corporações administrativas;

2.° Sobre contribuições geraes do estado, salvo sendo recorrido algum dos conselhos das direcções geraes do ministerio da fazenda;

3.° Sobre impostos municipaes, congruas e derramas parochiaes;

4.° Sobre o recenseamento e eleição a que se refere o n.° 7.° do artigo 3õ2.°

5.° Sobre concessão de patentes de introducção de novas industrias;

6.° Sobre os mais casos expressamente declarados na lei.

Art. 350.° As decisões não mencionadas no artigo anterior subirão, em forma de decreto sob consulta do supremo tribunal administrativo, á homologação do governo; porem, quando este não se conforme com a consulta, resolverá o assumpto por meio de decreto enviado ao tribunal em que se exponham claramente os motivos da divergencia e as rasões de decidir.

§ unico. No julgamento dos conflictos entre auctoridades administrativas e judiciaes. não sendo expedido o decreto dentro de sessenta dias a contar da remessa da consulta á competente secretaria d’estado, considera-se como não existente o despacho que levantou o conflicto.

Art. 356.° Podem ser interpostos, até um anno depois de intimada ás partes a decisão, os recursos a bem da observancia da lei ou do interesse geral e publico do estado, quando dirigidos pelos ministros d’estado ao presidente do supremo tribunal administrativo por meio de relatorio devidamente instruido.

Art. 357.° Ao supremo tribunal administrativo não é permittido conhecer de recursos ácerca de resoluções da tutela administrativa, excepto quando proferidas por estações ou auctoridades incompetentes ou em assumptos que não estejam sujeitos a jurisdicção tutelar ou com violação das leis e regulamentos de administração publica.

Art. 358.° Aos ajudantes do procurador geral da corôa e fazenda, que servirem junto do supremo tribunal administrativo, compete:

1.° Exercer as funccões de ministerio publico e promover quanto for conveniente aos interesses do estado;

2.° Assistir ás conferencias para sustentar as suas promoções;

3.° Intervir em todos os processos contenciosos da competencia do tribunal;

4.° Corresponder-se com o governo pelo ministerio competente, solicitando as instrucções de que carecerem para o exacto desempenho do seu cargo, e dando parte de qualquer falta commettida ou inobservancia de lei praticada pelos agentes da administração.

Art. 359.° Ao ministerio publico incumbe pugnar pelos justos e bem entendidos direitos e interesses da administração e da fazenda publica, declarando sempre nas suas respostas e promoções o direito e a lei em que se firma.

§ unico. Se nos processos, em que responderem os ajudantes do procurador geral da corôa e fazenda, houver parecer d’este ou da conferencia fiscal, deverão mencionai-o, e, não se conformando com elle, darão os motivos, do seu voto.

Art. 360.° O procurador geral da corôa e fazenda, sempre que o julgue conveniente, poderá exercer, elle proprio, as funcções de ministerio publico em quaesquer processos distribuidos aos seus ajudantes.

Art. 361.° Compete ao tribunal de contas julgar em 2.ª instancia os recursos interpostos das decisões das commissões districtaes sobre contas dos corpos administrativos e das corporações, estabelecimentos ou institutos de piedade ou beneficencia, nos termos do respectivo regimento.

TILULO IX

Serviço dos magistrados e mais funccionarios administrativos e sua aposentação

Art. 362.° Os magistrados e mais funccionarios administrativos são obrigados a apresentar-se pessoalmente a. servir os empregos, para que forem nomeados, promovidos ou transferidos, no praso de trinta dias, a contar da communicação dos despachos, se mais curto praso lhes não for designado na mesma communicação.

§ 1.° As nomeações, promoções ou transferencias para as ilhas adjacentes de individuos residentes no continente, do reino, ou vice-versa, sómente obrigam á posse no praso de sessenta dias a contar da communicação dos despachos.

§ 2.° A auctoridade que fizer a nomeação, promoção ou transferencia, havendo motivo justificado, póde prorogar o praso para a posse por mais trinta dias, ou pelo tempo que for necessario, se houver impedimento por motivo de molestia.

§ 3.° A prorogação de praso por tempo superior a noventa dias só poderá ser concedida, pelo governo.

§ 4.° As nomeações, promoções e transferencias feitas pelo governo consideram-se communicadas pela publicação dos despachos na folha official.

§ 5.° No caso de reintegração de algum funccionario por decisão dos tribunaes ou do governo o praso para a nova posse conta-se desde a intimação ou publicação da decisão.

§ 6.° As prorogações de praso para a posse são equiparadas ás licenças para os effeitos fiscaes.

Art. 363.° O serviço dos funccionarios administrativos § sempre pessoal e só começa a contar-se desde a posse.

Art. 364.° Nenhum funccionario administrativo póde

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ausentar-se do seu emprego sem licença do seu superior immediato, que em cada anno não poderá conceder-lhe mais de trinta dias, sejam ou não seguidos.

§ 1.° As licenças por tempo excedente a trinta dias em cada anno só podem ser concedidas pelo superior immediato ao que é competente para concedel-as por menor tempo, e não excederão, em cada anno, a dois mezes, sejam ou não seguidos.

§ 2.° As licenças aos empregados subordinados aos corpos administrativos são da competencia dos respectivos presidentes, quando não excedam a oito dias em cada mez, e da competencia dos mesmos corpos, quando excedam este praso, não podendo porém exceder a tres mezes em cada anno, sejam ou não seguidos.

§ 3.° As licenças para saír do reino são sempre da competencia do governo.

§ 4.° Nenhuma licença póde ser concedida com vencimento senão por motivo de doença devidamente comprovada.

Art. 365.° Os funccionarios administrativos têem direito aos seus ordenados, sempre que exercerem as suas funcções, estiverem impossibilitados por moléstia, ou desempenharem commissões de serviço publico que não tenham remuneração.

§ unico. Quando o impedimento por moléstia exceder a trinta dias e o logar do impedido for exercido por substituto ou interino, o funccionario impedido vencerá sómente dois terços do ordenado.

Art. 366.° Os substitutos ou interinos, que já tiverem algum vencimento, teem direito a receber, pelos ordenados ou parte delles, que deixarem de receber os proprietarios dos Jogares, o que faltar para perfazer uma quantia igual aos ordenados d’estes; os substitutos ou interinos, que não tiverem vencimento algum, teem direito aos ordenados por inteiro ou á parte d’elles, que por qualquer motivo os proprietarios dos logares não tiverem direito a receber.

Art. 367.° Em todos os casos de impedimento ou de licença, não especificados nos artigos precedentes, não ha direito aos ordenados.

Art. 368.° Os funccionarios administrativos teem direito aos seus vencimentos desde a data da posse.

§ unico. Nos casos de accesso, promoção ou transferencia, os vencimentos dos novos empregos contam-se desde a data dos despachos, uma vez que a posse dos novos logares seja tomada nos prasos legaes; aliás, contam-se sómente até o fim dos ditos prasos, e, alem d’elles, só depois da posse dos novos logares.

Art. 369.° Consideram-se, para todos os effeitos, como serviço effectivo em qualquer emprego as commissões extraordinarias de serviço publico, para que o empregado seja nomeado, ou que lhe incumba desempenhar.

Art. 370.° Os emolumentos pertencem a quem serve effectivamente o emprego, ainda que o serviço seja interino, e seja qual for o impedimento do proprietario.

§ unico. Os substitutos ou interinos, que já tenham emolumentos dos logares que exerçam, sómente têem direito aos emolumentos dos logares em que funccionarem interinamente até á quantia que perfaça o total que pertence ao logar do substituido.

Art. 371.° Só ha direito aos emolumentos taxativamente fixados nas tabellas respectivas; na applicação d’estas não é admissivel interpretação extensiva, nem ainda por identidade de rasão.

§ unico. Os emolumentos que hão de receber-se nas secretarias das camaras municipaes, juntas de parochia, governos civis, administrações dos concelhos ou bairros, regedorias e nos tribunaes do contencioso administrativo são os que constarem, das respectivas tabellas.

Art. 372.° Nas diligencias feitas para instrucção do processos administrativos, quer por ordem dos tribunaes buer das auctoridades, os emolumentos devidos aos funccionarios, peritos e testemunhas que n’ellas intervenham, ao os que estiverem fixados nas tabellas judiciaes para identicas diligencias praticadas nos juizos de direito.

Art. 373.° Não podem continuar a occupar os seus logares, nos quadros a que pertencerem, os empregados administrativos que tiverem impossibilidade physica ou moral, devidamente verificada, para exercer as funcções.

Art. 374.° Verificada a impossibilidade de que trata o artigo antecedente, podem ser aposentados:

1.° Os empregados das secretarias dos governos civis os empregados das secretarias das extinctas juntas geraes de districto;

2.° Os empregados das secretarias das administrações dos concelhos ou bairros;

3.° Os empregados das secretarias "das camaras municipaes;

4.° Os empregados das bibliothecas municipaes, os facultativos de partidos, e outros empregados superiores municipaes, que tenham encarte.

§ unico. Para os effeitos d’esta aposentação sómente ao considerados os empregados, que tiverem nomeações vitalicias ou por tempo illimitado e vencimentos annuaes permanentes, fixados nos respectivos orçamentos.

Art. 375.° A aposentação dos empregados administrados, cujos vencimentos são pagos pelo estado, é regulada elas leis geraes de aposentação dos funccionarios publicos; aposentação dos empregados, cujos vencimentos são pagos pelos corpos administrativos, é regulada pelas disposições d’este codigo.

Art. 376.° Os empregados, cujos vencimentos forem pagos pelos corpos administrativos, só poderão ser aposentados com as vantagens correspondentes aos logares que exerçam, quando n’elles tenham cinco annos ou mais de serviço effectivo, aliás só o poderão ser com as vantagens correspondentes ao ultimo logar que anteriormente houverem servido.

Art. 377.° Os vencimentos das aposentações são encargo do cofre, por onde se pagavam os vencimentos de actividade ao tempo da aposentação; e para este effeito conta-se cumulativamente o tempo de serviço em cargos ou empregos que dêem direito á aposentação.

Art. 378.° A aposentação dos empregados, cujos vencimentos forem pagos pelos corpos administrativos, é ordinaria ou extraordinaria.

Art. 379.° São condições indispensaveis para a aposentação ordinaria.

1.° Ter sessenta annos de idade e trinta de serviço effectivo;

2.° Absoluta impossibilidade physica ou moral para continuação do serviço activo.

Art. 380.° A aposentação extraordinaria é concedida: 1.° Ao empregado que, contando quarenta annos de idade e quinze de serviço, se impossibilite de continuar na actividade por motivo de doença, não contrahida ou accidente não occorrido no exercicio das suas funcções;

2.° Ao empregado de qualquer idade que, tendo dez annos de serviço, se impossibilite de continuar em actividade em rasão de molestia provadamente contrahida no exercicio das suas funcções e por causa d’elle;

3.° Ao empregado que, independentemente de qualquer outra condição, se torne inhabil para o serviço por desastre, que resulte directamente do exercicio das suas funcções, por ferimento ou mutilação em combate ou lucta no desempenho do cargo, por molestia adquirida na pratica de algum acto humanitario ou de dedicação á causa publica.

Art. 381.° Perde o direito á aposentação o empregado que for demittido ou exonerado, mas, sendo readmittido, contar-se-ha o tempo de serviço anterior.

Art. 382.° No caso de aposentação ordinaria a pensão do aposentado é a estabelecida no artigo 376.°; nas aposentações extraordinarias será, nos casos dos n.ºs 1.° e 2.° do

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artigo 380.°, igual á metade do vencimento do ultimo cargo exercido durante, ao menos, cinco annos, com o augmento de 3 ½ por cento no primeiro caso e de 2 ½ por cento no segundo por cada anno de serviço a mais do minimo ali designado, e no caso do n.° 3.° a pensão será igual ao vencimento do ultimo cargo exercido durante cinco annos.

Art. 383.° Para os effeitos da aposentação sómente se attende ao ordenado ou vencimento principal com exclusão de gratificações ou outras remunerações accessorias.

§ unico. Quando o vencimento se decomponha em ordenado de exercicio e ordenado de categoria, sómente se attenderá a este.

Art. 384.° O empregado aposentado perde a respectiva pensão quando seja condemnado em alguma das penas maiores estabelecidas na lei penal; e, quando o seja nas penas de prisão correcional, suspensão de direitos politicos ou de desterro, perderá a pensão sómente emquanto não se extinguirem.

Art. 385.° A aposentação é concedida ou a requerimento do interessado, ou por determinação da auctoridade ou corporação respectiva.

Art. 386.° Os requerimentos para aposentação dos empregados, a que se referem os artigos anteriores, serão dirigidos aos governadores civis ou ás camaras municipaes, segundo dependerem das auctoridades administrativas ou d’estas corporações.

Art. 387.° Aos requerimentos serão juntos os diplomas de encarte, em devida fórma, dos empregos que os requerentes estiverem servindo e certidões de effectividade de serviço n’esses empregos e em quaesquer outros, cujo serviço deva, nos termos d’este codigo, ser contado para a aposentação requerida.

Art. 388.° As certidões de effectividade de serviço serão passadas pelas repartições em que forem processadas as folhas dos vencimentos, descontando-se no tempo de serviço os dias de suspensão, de faltas não justificadas por doença devidamente comprovada ou por impedimento legal, e de licença por mais de trinta dias em cada anno.

Art. 389.° Apresentados os requerimentos e documentos exigidos nos artigos antecedentes, as auctoridades e corporações competentes mandarão proceder a exame de sanidade nos requerentes por tres facultativos, entrando neste numero os do partido municipal, e, não bastando estes, com outros residentes no concelho, preferindo os que exerçam funcções publicas.

§ unico. Nos concelhos, em que não houver o numero de facultativos exigido n’este artigo, serão pelo governador civil nomeados os que forem necessarios, de outros concelhos.

Art. 390.° Os exames dos empregados das administrações de concelho ou bairro e das camaras municipaes serão respectivamente presididos pelos administradores, ou pelos presidentes das municipalidades.

Art. 391.° Nos autos de exame deve declarar-se, sob pena de nullidade, se o empregado tem ou não absoluta impossibilidade physica ou moral de continuar a servir o seu emprego, fazendo-se, em caso affirmativo, explicita menção das lesões ou molestias, que motivarem a impossibilidade.

Art. 392.° Quando as aposentações forem determinadas superiormente, serão os respectivos processos instruidos com os mesmos documentos, e observar-se-hão os mesmos tramites exigidos para as aposentações requeridas pelos interessados.

Art. 393.° No caso a que se refere o artigo anterior, é permittido ao empregado recorrer do parecer, que o declarou impossibilitado de servir, para o governo, o qual mandará proceder a respeito do reclamante pela forma estabelecida n’este assumpto para as reclamações dos empregados do estado.

Art. 394.° Das aposentações se darão aos interessados os competentes diplomas com pagamento dos impostos correspondentes, segundo as leis em vigor ao tempo em que se verificarem as mesmas aposentações.

Art. 395.° Podem ser admittidos a concorrer para a caixa de aposentações, os empregados das camaras municipaes, nos termos auctorisados na lei geral para os empregados publicos.

TITULO X

Disposições penaes

Art. 396.° Aquelle que se recusar a exercer o cargo de vogal de qualquer corpo administrativo, para que tenha sido eleito, e de que não seja competentemente escusado, incorrerá na multa de I0$000 a l00$000 réis, e suspensão dos direitos politicos por dois annos.

Art. 397.° Aquelle que se recusar a exercer as funcções de qualquer emprego administrativo obrigatorio, para que seja competentemente nomeado, incorre na mesma pena comminada no artigo antecedente.

Art. 398.° Os vogaes da commissão districtal, que deixarem de concorrer ás respectivas sessões, incorrerão na multa de 2$000 réis por cada sessão a que faltarem.

§ unico. Se as faltas forem mais de dez, incorrerão tambem na pena de suspensão dos direitos politicos por dois annos.

Art. 399.° Os vereadores que, sem motivo justificado, deixarem de comparecer ás sessões da camara, incorrerão por cada dia de falta na multa de 2$000 réis.

§ 1.° Na multa de 20$000 réis incorrem os maiores contribuintes que deixarem de comparecer, quando convocados, nos termos do artigo 57.°, se não justificarem a sua falta perante a camara municipal, até á segunda sessão immediata.

§ 3.° Se as faltas forem mais de dez, incorrerão tambem os vereadores na pena comminada no § unico do artigo antecedente.

Art. 400.° Os vogaes da junta de parochia que, sem motivo justificado, deixarem de comparecer ás respectivas sessões, incorrerão na multa de 1$000 réis por cada dia em que faltarem.

§ 1.° Na multa de 10$000 réis incorrem os maiores contribuintes que deixarem de comparecer, quando convocados para os fins designados no artigo 177.°, se não justificarem a sua falta perante a junta, até á segunda sessão immediata.

§ 2.° Se as faltas forem mais de dez, incorrerão tambem os vogaes da junta na pena comminada no § unico do artigo 398.°

Art. 401.° Os vogaes dos corpos administrativos que se recusarem a deliberar e a votar nos negocios tratados nas sessões a que assistirem, e em que não estiverem inhib-dos de tomar parte pelas disposições d’este artigo, ou a assignar as respectivas actas, ainda que assignem ás minutas d’estas, consideram-se ter faltado ás mesmas sessões sem causa justificada.

§ unico. O mesmo procedimento haverá a respeito dos maiores contribuintes que se recusarem a deliberar, quando convocados, nos termos d’este codigo, para emittir parecer ácerca de deliberações municipaes ou parochiaes.

Art. 402.° Nos casos em que deva applicar se alguma das multas mencionadas nos artigos precedentes, os magistrados administrativos ou os presidentes dos corpos administrativos, segundo competir, mandarão lavrar auto, em que se refiram todas as circumstancias do caso, e os remetterão ao delegado do procurador regio.

§ 1.° Dos autos, que pela sobredita fórma se lavraram, se remetterá copia ao governador civil.

§ 2.° Se o presidente de qualquer corpo administrativo não cumprir o disposto n’este artigo, ou não podér mandar lavrar o auto por não se haver reunido o corpo, pertence

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ao respectivo magistrado administrativo mandal-o lavrar e remetter ao referido agente do ministerio publico.

Art. 403.° O magistrado ou empregado administrativo, que se ausentar do exercicio das suas funcções sem licença da auctoridade competente, incorre na pena de suspensão ou demissão, segundo a gravidade dos casos.

Art. 404.° A suspensão de funcções, a qual não póde impor-se por tempo illimitado, importa a perda dos vencimentos por todo o tempo que durar a suspensão.

Art. 405.° O empregado suspenso ou demittido, quando a suspensão ou demissão venham a ser julgadas illegalmente impostas, tem direito ao ordenado que deixou de receber emquanto esteve inhibido de exercer o seu emprego.

Art. 406.° Os corpos e corporações administrativas, e quaesquer administrações obrigadas por este codigo a dar contas das suas gerencias, que não as prestarem nas epochas e pelo modo que exigem as leis e regulamentos, incorrerão na multa, graduada segundo as circumstancias, de 10$000 réis até 400$000 róis, alem das mais penas em que possam incorrer por qualquer outro abuso, embora as contas digam respeito a gerencias findas.

§ unico. Aos gerentes, que incorrerem na multa comminada n’este artigo, será fixado novo praso para a apresentação das contas; e, se novamente faltarem, incorrerão no dobro da multa, e as contas serão tomadas em vista dos elementos que existirem nas respectivas repartições.

Art. 407.° Os gerentes, que despenderem sem auctorisação, ou com excesso d’ella, serão condemnados, ou a restituir a importancia das quantias assim despendidas, ou em multa de 10$000 a 400$000 réis, segundo a gravidade das faltas.

§ 1.° A multa, a que se refere este artigo, nunca poderá exceder a quantia illegalmente despendida.

§ 2.° A disposição d’este artigo não impede a applicação de outras penas, quando haja acção criminal.

Art. 408.° Os secretarios dos corpos e corporações administrativas que deixarem de passar no praso designado no artigo 34.° as certidões requeridas, incorrem na multa de 50$000 a 100$000 réis.

Art. 409.° Os corpos e corporações administrativas e todos os magistrados e funccionarios administrativos incorrem na multa de 50$000 a 200$000 réis:

1.° Por violação manifesta da lei em seus actos ou deliberações;

2.° Por falta de cumprimento das ordens e decisões das auctoridades, corporações e tribunaes superiores;

3.° Por qualquer extravio ou dissipação dos dinheiros, titulos e valores da corporação ou por negligencia de que resulte prejuizo aos interesses e serviços que lhes estão commettidos.

§ 1.° Não serão impostas estas multas quando tenha de se applicar pena mais grave.

§ 2.° As multas serão pagas pelos vogaes que tiverem incorrido nas omissões, ou tomado parte nos actos ou deliberações illegaes, não se declarando vencidos ou não protestando em acto continuo contra as mesmas omissões, actos ou deliberações.

§ 3.° As multas comminadas n’este artigo são applicaveis aos presidentes das corporações que deixarem de cumprir as obrigações especiaes que este codigo lhes impõe.

Art. 410.° As pessoas que deixarem de cumprir as obrigações, que por este codigo lhes são impostas, incorrerão na pena do crime de desobediencia, se outra não estiver estabelecida.

§ unico. Os vogaes dos corpos administrativos, que deixarem de cumprir o disposto no artigo 27.°, incorrerão na multa de 10$000 a 100$000 réis.

Art. 411.° São competentes para a imposição das penas comminadas neste titulo:

1,° As estações a que competir o julgamento das contas, com relação ás multas impostas aos gerentes que não as prestem em devida fórma e tempo, ou despendam sem auctorisação;

2.° Os tribunaes de justiça criminal com respeito ás multas não comprehendidas no precedente numero, á pena de suspensão dos direitos politicos ou a quaesquer outras comminadas na lei geral;

3.° O governo, os magistrados administrativos e os corpos administrativos, com relação ás penas disciplinares de suspensão ou demissão, em que por ausencia illegal de funcções ou outros abusos incorrerem os funccionarios de sua nomeação.

Art. 412.° As multas mencionadas n’este titulo podem ser pagas voluntariamente, e neste caso serão cobradas pelo maximo estabelecido. Havendo reincidencia serão pagas em dobro.

Art. 413.° O producto das multas comminadas neste titulo aos vogaes das camaras municipaes e juntas de parochia ou a outros gerentes, e o das multas comminadas no artigo 408.° constitue receita dos cofres respectivos.

§ unico. As multas impostas aos maiores contribuintes nos termos deste titulo constituem receita da camara municipal ou da junta de parochia, segundo tenham sido convocados por uma ou outra corporação.

Art. 414.° O governador civil e o administrador do concelho participarão aos competentes agentes do ministerio publico as faltas ou irregularidades, que nos termos deste codigo derem motivo á imposição de penas da competencia dos tribunaes, a fim de que promovam os devidos procedimentos.

§ unico. Esta participação não é essencial para que o ministerio publico promova, logo que haja motivo de procedimento.

Art. 415.° As disposições penaes estabelecidas na legislação eleitoral são applicaveis ás eleições dos corpos administrativos.

§ unico. Qualquer infracção dos preceitos deste codigo, relativos a eleições, a que não for applicavel pena especial, será punida com a multa de 40$000 réis a 100$000 réis.

TITULO XI

Disposições geraes

CAPITULO I

Corpos e corporações administrativas

Art. 416.° O districto, o concelho e a parochia são havidos por pessoas moraes para todos os effeitos declarados nas leis.

Art. 417.° Todos os corpos e corporações administrativas podem emittir votos consultivos de sua iniciativa e leval-os á presença das auctoridades e poderes superiores do estado, mas sómente nos assumptos das attribuições, que expressamente lhes estejam reconhecidas n’este codigo, ou em outras leis, e nos seus estatutos ou regulamentos devidamente approvados, não devendo ter seguimento em nenhuma repartição publica as petições ou representações formuladas em contrario d’esta disposição.

Art. 418.° O ministerio publico junto dos tribunaes de justiça é competente para requerer e seguir o processo de execução judicial, quando este seja devido, para cobrança de impostos municipaes, de derramas das juntas de parochia e de quaesquer rendimentos municipaes e parochiaes, a cuja arrecadação seja applicavel o processo de cobrança coerciva das contribuições do estado.

Art. 419.° O ministerio publico junto dos tribunaes de justiça é tambem competente para propor, como parte principal, as acções necessarias para fazer valer quaesquer direitos do districto, municipio, parochia ou de outras corporações administrativas, nos casos, em que todos, ou a maior parte

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dos vogaes em exercicio, devam ser demandados; para fazer entrar nos cofres das respectivas corporações as quantias em que os gerentes forem condemnados, ou por que forem responsaveis; bem como para serem impostas as multas a que se referem os artigos 408.°, 409.° e § unico do artigo 413.°

Art. 420.° Na cobrança de quantias, em que for condemnada alguma das pessoas moraes, a que se referem os artigos 815.° n.° 1.° e 837.° do codigo do processo civil, com excepção do estado, proceder-se-ha nos termos do artigo 108.° deste codigo.

Art. 421.° A qualquer cidadão, no goso dos seus direitos politicos e civis, é licito reclamar contra as deliberações dos corpos administrativos que tenha por contrarias ao interesse publico, ou por offensivas de preceitos legaes, desde que se ache recenseado na area das funcções do respectivo corpo administrativo. No primeiro caso, a reclamação deve ser deduzida perante a competente estação tutelar, se as deliberações arguidas estiverem ainda dependentes da sua confirmação, e no segundo, perante os tribunaes do contencioso administrativo.

§ unico. As deliberações definitivas e as provisorias depois de confirmadas pela tutela, só podem ser arguidas de illegaes.

Art. 422.° É permittido a qualquer cidadão intentar, em nome e no interesse do corpo administrativo, em cuja circumscripção for eleitor, as acções judiciaes competentes para manter, reivindicar ou rehaver bens ou direitos, que ás respectivas administrações tenham sido usurpados, ou de qualquer modo tenham sido lesados.

§ 1.° As acções permittidas por este artigo não podem ser intentadas senão quando a respectiva corporação não as propozer no praso de tres mezes, depois de lhe ter sido apresentada uma exposição circumstanciada ácerca do direito que se pretenda fazer valer, e dos meios probatorios de que se dispõe para o tornar effectivo.

§ 2.° Os individuos que obtiverem vencimento, no todo ou em parte, nas acções de que se trata, teem direito a ser indemnisados, pela corporação interessada, das despezas que fizerem com os pleitos, comtanto que ellas não excedam o valor real dos bens ou direitos mantidos ou readquiridos.

Art. 423.° Os vogaes dos corpos e corporações administrativas assumem, pelo facto do juramento e posse, responsabilidade solidaria pela gerencia dos bens, titulos, valores e rendimentos que lhes estão confiados, ficando obrigados a indemnisação por qualquer extravio ou discipação dos mesmos haveres, e pela falta de arrecadação de todas as receitas regularmente auctorisadas, quando estes factos provenham de negligencia ou falta de zêlo na administração a seu cargo.

§ 1.° Os vogaes que não tomarem parte nos actos ou deliberações de que resulte aquella responsabilidade, ou que, tomando parte, assignarem vencidos, ou protestarem em acto continuo, contra as mesmas deliberações, serão relevados da responsabilidade solidaria.

§ 2.° Os membros dos corpos e corporações administrativos são solidariamente responsaveis pela falta ou insufficiencia da caução dos seus thesoureiros privativos.

§ 3.° As estações a que pertencer o julgamento das contas serão competentes para fixar a responsabilidade prevista n’este artigo, precedendo as informações e diligencias, que houverem por convenientes, sem prejuizo dos meios judiciaes quando por outra fórma não possa ser verificada.

Art. 424.° Os funccionarios administrativos, os vogaes dos corpos administrativos e os gerentes de qualquer corporação, estabelecimento ou instituto sujeito á inspecção administrativa, não podem de fórma alguma tomar parte ou interesse nos contratos estipulados sob a administração ou inspecção a seu cargo. A infracção d’este artigo importa a nullidade do contrato, e responsabilidade por perdas e damnos para os transgressores.

Art. 425.° Em nenhum caso póde ser auctorisado qualquer corpo ou corporação administrativa, estabelecimento ou instituto sujeito á fiscalisação do estado, salvo o disposto para as juntas de parochia, a contrahir emprestimo, cujos encargos, por si ou juntos aos de emprestimo anterior, igualem ou excedam a quinta parte da sua receita ordinaria, calculada pela media da cobrada no trienmo immediatamente anterior; e nenhuma auctorisação póde ser concedida para este effeito senão por meio de decreto publicado na integra na folha official.

§ unico. O praso da amortisação não excederá nunca trinta annos.

Art. 426.° Não podem os corpos nem as corporações administrativas effectuar obras de construcção ou reparação, sem que previamente tenham sido approvados o projecto e orçamento respectivos pela estação tutelar, ouvindo, quando o julgar conveniente, o director das obras publicas do districto.

§ unico. Exceptuam-se as obras de reparação ou conservação de valor não excedente a 100$000 réis.

Art. 427.° Serão feitos em hasta publica, precedendo annuncios, com intervallo de vinte dias, pelo menos, os contratos de alienação, arrematação de rendimentos, arrendamentos, empreitadas e fornecimentos, em que forem interessados os corpos e corporações administrativas, sob pena do procedimento previsto no n.° 1.° do artigo 409.°

§ 1.° São dispensados de hasta publica:

1.° As obras de reparação e fornecimentos, não excedendo o valor d’estes ou d’aquellas a 50$000 réis e os fornecimentos de objectos de expediente ordinario dos estabelecimentos e repartições;

2.° Os fornecimentos de objectos cujos fornecedores sejam unicos ou munidos de privilegios;

3.° Os contratos para obras de arte, objectos ou instrumentos que só possam ser fornecidos por artifices ou productores experimentados e de confiança;

4.° Os contratos para obras, fornecimentos, transportes e empreitadas que não tiverem offerta em praça, não devendo n’este caso a importancia dos contratos exceder a base da licitação;

5.° Os casos de força maior ou de reconhecida conveniencia publica, que assim o exigirem, precedendo auctorisação da competente estação tutelar.

§ 2.° Não tendo havido licitantes abrir-se-ha novamente licitação sobre a mesma obra, fornecimento, transporte ou empreitada com o augmento de 5 por cento sobre a base da licitação primitiva; e, se ainda os não houver, poderão realisar-se estes serviços por contrato ou ajuste particular ou por administração directa da corporação.

§ 3.° Não havendo licitantes, ou sendo o preço offerecido em praça inferior ao da base da licitação, poderão ser dispensados de hasta publica os contratos sobre arrendamentos e rendimentos, comtanto que se façam por preço superior ao da referida base.

Art. 428.° As propriedades concelhias ou parochiaes, emquanto não forem desamortisadas, só podem ser applicadas ao uso do municipio ou da parochia, ainda que diverso d’aquelle a que primeiro foram destinadas. Similhantemente se procederá com os bens das corporações administrativas.

Art. 429.° As disposições d’este codigo relativas ás alienações dos bens pertencentes aos corpos e corporações administrativas não prejudicam o que estiver preceituado a respeito dos mesmos bens nas leis de desamortisação, salvas as determinações seguintes:

§ 1.° O governo mandará proceder a inventario de todos os baldios ou á revisão dos inventarios já organisados, e á proporção que este serviço se conclua por parochias ou concelhos designará logo, com informação da camara municipal ou da junta de parochia interessados, os que forem indispensaveis ao logradouro commum, devendo os restantes dividir-se por aforamento e em partes de igual valor

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entre todos os chefes de familia, que ha mais de um anno sejam compartes na fruição d’elles, segundo os usos e costumes estabelecidos.

§ 2.° Para esta divisão o governo assignará, em seguida, um praso não inferior a seis mezes nem superior a um anno, dentro do qual a camara municipal ou ajunta de parochia, segundo competir, procederá á divisão, facultando ás mesmas corporações o auxilio do pessoal technico que para este serviço lhe requisitarem, e que só pelo estado será retribuido; e se, findo aquelle praso, a partilha não estiver feita no todo ou em parte, mandará fazel-a ou completal-a por uma commissão composta do administrador do concelho, do escrivão de fazenda e do presidente da corporação que esteja superintendendo na administração dos baldios.

§ 3.° A corporação ou commissão encarregada da divisão dos baldios organisará uma relação de todos os chefes de familia, que nos termos d’este artigo devam ser contemplados, expondo-a em reclamação por espaço de quinze dias, findos os quaes, resolverá, com recurso para a commissão districtal, ás reclamações apresentadas, publicando as suas decisões.

§ 4.° O recurso para a commissão districtal será interposto dentro de quinze dias desde a publicação das decisões, terá effeito suspensivo, será sempre seu relator o auditor administrativo e será resolvido no praso improrogavel de trinta dias, admittindo-se sem prejuizo d’este praso a inquirição de testemunhas offerecidas.

§ 5.° Decididos os recursos, ou não os havendo, se procederá immediatamente, por peritos, á designação de tantas glebas de igual valor, quantos os chefes de familia por que hão de ser distribuidas, fixando-se por louvados o fôro annual, nunca inferior a 50 réis nem superior a l$000 réis para cada gleba.

§ 6.° Em sessão publica, annunciada com antecipação de oito dias, se procederá ao sorteio das glebas, sendo admittidas trocas, até se passarem os alvarás de aforamento, e competindo recurso, sem effeito suspensivo, para a commissão districtal com fundamento na desigualdade das glebas ou em irregularidade do sorteio, dentro de quinze dias a contar da sua data.

§ 7.° O foreiro é obrigado a aproveitar na cultura conveniente, dentro de cinco annos, o terreno aforado, não lhe sendo permittido, durante esse praso, alienal-o, arrendal-o ou oneral-o com bypotheca, sob pena de caducar o aforamento, revertendo o terreno ao logradouro commum para ser sorteado entre os novos chefes de familia da povoação respectiva; é isento de contribuição predial durante dez annos quanto ao mesmo terreno e, depois de o aproveitar na cultura, tem a faculdade de remir o fôro.

§ 8.° A corporação ou commissão, que proceder ao aforamento, expedirá os respectivos alvarás, que para todos os effeitos serão havidos como titulos de propriedade.

§ 9.° Nenhum emolumento, imposto de sêllo, de contribuição de registo ou qualquer outro é devido pelo processo e actos de que trata este artigo.

§ 10.° Os fóros serão receita da camara municipal ou junta de parochia que tiver feito a divisão dos baldios mas se estas corporações deixarem de fazel-a no praso devido, perderão metade d’elles e da correspondente remissão ou desamortisação em beneficio da misericordia da localidade ou, na falta d’ella, de qualquer estabelecimento de beneficencia do districto, que o governo determinar, sobre proposta do governador civil.

§ 11.° O baldio que, sendo dispensavel do logradouro commum não for susceptivel de divisão entre todos os compartes na fruição d’elle por causa da sua pequena area será dividido em glebas de superficie não excedente a tres ares, as quaes serão aforadas precedendo hasta publica

§ 12.° Os terrenos actualmente arborisados, cuja arborisação for necessaria para a fixação das dunas, ficam exceptuados da divisão preceituada pelo presente artigo e não serão desamortisados por outra qualquer fórma.

CAPITULO II

Garantias das auctoridades administrativas

Art. 430.° Nenhum, magistrado ou outro funccionario administrativo póde ser perturbado no exercicio das suas funcções pela auctoridade judicial, nem por qualquer outra.

Art. 431.° Nenhuma auctoridade, magistrado ou funccionario administrativo, ou agente da auctoridade administrativa, poderá ser demandado criminalmente, sem previa auctorisação do governo, por factos relativos ás suas funcções, ainda que estas hajam cessado.

§ 1.° A auctorisação deve ser pedida ao ministerio do reino pelo da justiça, depois de constituido o corpo de delicto, do qual será enviada uma certidão áquelle ministerio.

§ 2.° A auctorisação só poderá ser denegada em portaria fundamentada e publicada na folha official, dentro de trinta dias, a contar d’aquelle em que o respectivo pedido tiver dado entrada na secretaria do ministerio do reino. Não sendo denegada dentro deste praso, entende-se concedida para todos os effeitos.

§ 3.° Concedida a auctorisação exigida n’este artigo, a auctoridade, magistrado, funccionario ou agente a que ella se referir, fica por este facto suspenso do exercicio das suas funcções.

Art. 432.° Os magistrados administrativos ou seus delegados que, no exercicio de suas funcções, forem ameaçados ou insultados, devem immediatamente fazer prender o culpado, formando auto, que remetterão, no termo de vinte e quatro horas, ao agente do ministerio publico.

Art. 433.° Os magistrados administrativos têem o primeiro logar em todos os actos e solemnidades publicas, segundo a sua jerarchia, e na conformidade das leis e regulamentos do governo.

CAPITULO III

Obrigações communs aos funccionarios e corporações administrativas

Art. 434.° Todas as corporações, magistrados e quaesquer outros funccionarios que deixarem de cumprir, nos prasos e termos legaes, as obrigações que por este codigo lhes são impostas, ficarão solidariamente responsaveis por qualquer prejuizo que possa resultar da sua negligencia ou omissão.

Art. 435.° Os corpos administrativos, e todas as corporações administrativas, magistrados e funccionarios, encarregados de serviços administrativos, são obrigados a cumprir, sob pena de desobediencia, e salvo o direito de respeitosa representação, todas as decisões e ordens legaes dos seus superiores, os quaes, depois de primeira e, segunda advertencia, poderão mandal-as cumprir, por delegados especiaes.

§ unico. Da mesma fórma poderá proceder o governador civil, quando, depois de advertidas nos termos deste artigo, as sobreditas entidades deixem de cumprir as suas obrigações legaes.

Art. 436.° Cumpre ás repartições administrativas facultar nos seus registos e documentos, que não sejam confidenciaes ou reservados, os exames que os magistrados judiciaes, com previo, aviso do dia e hora para elles designados, lhes requisitarem no exercicio das suas funcções em materia eivei ou criminal.

§ unico. As competentes auctoridades e funccionarios prevenirão os magistrados judiciaes quando o assumpto seja confidencial ou reservado, de que não podem entregal-o a exame, e, em caso de duvida, a proporão ás estações superiores.

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Art. 437.° As mesmas repartições devem passar as certidões que lhes forem requeridas sempre que o assumpto a que se refiram não seja confidencial ou reservado, e da respectiva expedição não resulte prejuizo ao serviço publico.

§ unico. Consideram-se sempre de natureza reservada ou confidencial a correspondencia official, as informações dos funccionarios publicos e as investigações policiaes.

CAPITULO IV

Empregados administrativos

Art. 438.° Os quadros dos empregados dos governos civis, das administrações de concelho, dos corpos, corporações, estabelecimentos ou institutos administrativos, são os fixados pelo governo, e só por decreto publicado na folha official poderão ser alterados, quer quanto ao numero ou categoria, quer quanto ao vencimento dos empregados.

§ 1.° Vagando algum emprego dependente de corpo ou corporação administrativa, incluindo o de facultativo municipal, de estabelecimentos ou institutos a que se refere este artigo, e que não esteja incluido em quadro já fixado pelo governo, sobreéstar-se-ha no provimento até que este resolva ácerca da extincção d’elle ou da respectiva conservação e dotação. Em caso algum é licito ás sobreditas entidades augmentar a dotação dos empregos, esteja ou não já fixada.

§ 2.° Os empregados, a que se referem este artigo e o § 1.°, só por concurso podem ser nomeados. Podem comtudo ser promovidos sem concurso os empregados das secretarias dos governos civis, que tivessem dois annos ou mais de bom e effectivo serviço na data da publicação do codigo administrativo de 17 de julho de 1886. Da mesma forma e salvo o disposto no artigo 110.°, podem os empregados das camaras municipaes de Lisboa e Porto ser promovidos á classe immediata, segundo a antiguidade no serviço da repartição a que pertencerem.

Art. 439.° E expressamente prohibido a todas as auctoridades, corpos e corporações administrativas, e aos vogaes d’estas collectividades:

1.° Fazer nomeações de empregados não tendo competencia para este effeito;

2.° Nomear alem dos quadros quaesquer empregados provisorios ou temporarios, sob qualquer pretexto ou denominação que seja;

3.° Preencher qualquer vacatura com outro individuo, que não seja aquelle que por lei ou regulamento n’ella deva ser provido;

4.° Conceder gratificações, ajudas de custo ou quaesquer remunerações extraordinarias não auctorisadas superiormente e de s criptas em orçamento devida e competentemente approvado.

§ unico. A infracção do disposto n’este artigo, alem de produzir nullidade, importa a responsabilidade dos infractores por violação de lei expressa, e obriga-os a repor as quantias recebidas pelos illegalmente nomeados ou remunerados.

Art. 440.° As nomeações para empregos, sujeitos ao pagamento de direitos de mercê, da competencia das auctoridades, corpos administrativos e estabelecimentos dependentes do ministerio do reino, serão feitas por despachos exarados nos respectivos processos ou requerimentos, os da competencia das auctoridades singulares, e por accordãos exarados nas respectivas actas, os da competencia das administrações collectivas.

Art. 441.° Os despachos ou accordãos de nomeação serão communicados aos nomeados com aviso para se habilitarem ao pagamento dos direitos de mercê nos prasos legaes, e concluirem o seu encarte no de quatro mezes.

Art. 442.° Os governadores civis, logo que recebam communicação official de terem os nomeados pago os direitos de mercê, ou de lhes ter sido permittido pelo ministerio da fazenda o pagamento em prestações, assim o participarão ás auctoridades ou corporações respectivas, para que possam expedir os diplomas de encarte aos nomeados.

Art. 443.° O titulo de nomeação dos empregados dos corpos e corporações administrativas é um alvará fundado na deliberação que os tiver nomeado, e expedido pelos respectivos presidentes. E, com respeito aos empregados nomeados pelos magistrados administrativos, é o seu titulo de nomeação um alvará passado pelo respectivo magistrado.

§ 1.° Estes alvarás terão o sello da respectiva repartição, não sendo expedidos, quanto aos nomeados pelos corpos ou magistrados administrativos, sem previo pagamento do imposto do sêllo e sem se mostrar que o interessado satisfez, ou foi auctorisado a satisfazer em prestações, os direitos de mercê que devidos forem.

§ 2.° Os presidentes das camaras e das juntas de parochia e os administradores de concelho darão parte ao governador civil das nomeações dos seus empregados, com declaração dos vencimentos e lotação dos empregos, sendo feitas por intermedio do administrador do concelho as participações das juntas de parochia, e o governador civil dará conhecimento de todas ao ministerio da fazenda.

Art. 444.° Quando os nomeados não se encartarem no praso de quatro mezes, ser-lhes-hão suspensos os vencimentos até que o encarte se realise, ficando os chefes das repartições, que o contrario consentirem, responsaveis pelos direitos devidos pelos empregados remissos.

Art. 445.° Nenhum dos empregados a que se refere o artigo 440.° poderá exercer as suas funcções sem haver prestado o devido juramento.

Art. 446.° Aos empregados dos corpos administrativos, que não tenham aposentação, das corporações administrativas ou de estabelecimentos subsidiados ou fiscalisados pelo estado, de nomeação posterior á publicação do decreto de 6 de agosto de 1892, não será abonado vencimento sem que mostrem em cada mez que estão contribuindo, como socios, para alguma caixa de pensões ou soccorros a inválidos ou inhabilitados.

§ unico. A infracção do disposto n’este artigo importa a mesma responsabilidade que o ordenamento e satisfação de despezas não auctorisadas.

Art. 447.° Os empregados dos corpos administrativos e os das secretarias dos governos civis e administrações dos concelhos ou bairros, que tiverem nomeações vitalicias ou por tempo illimitado e vencimentos annuaes permanentes, só podem ser suspensos ou demettidos, com previa audiencia sua, por desleixo, erro de officio ou mau procedimento.

§ unico. A disposição d’este artigo não prejudica o exercicio das attribuições dos corpos administrativos sobre a extincção de empregos desnecessarios ao seu serviço, ainda que estejam providos em empregados, contra os quaes não haja motivo de procedimento, mas, se o emprego for restabelecido, embora com differente denominação ou vencimento, sómente será n’elle collocado o anterior serventuario, salvo renuncia ao seu direito.

Art. 448.° Aos officiaes de diligencias da administração do concelho, aos zeladores e guardas campestres pertencerá metade do producto das multas por transgressões de posturas e regulamentos policiaes, quando tenham sido impostas por sua diligencia. A outra parte pertencerá á camara municipal, ou terá o destino indicado nos regulamentos especiaes que forem estabelecidos pelo governo ou pelo governador civil.

§ 1.° As posturas e regulamentos policiaes dos corpos e auctoridades administrativas começam a obrigar tres dias depois de publicados por meio de editaes affixados

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nos logares do estylo, se outro praso não for designado nas mesmas posturas ou regulamentos.

§ 2.° Continuam sendo receita das camaras municipaes dos concelhos, em que forem impostas, as multas, ou a parte d’ellas, que pertenciam ás extinctas juntas geraes de districto pelas transgressões dos respectivos regulamentos.

CAPITULO V

Congruas parochiaes

Art. 449.° O processso executivo para a cobrança de derramas das congruas parochiaes é applicavel á cobrança coerciva dos bolos, premios, primicias ou quaesquer prestações similhantes, estabelecidas por contrato ou costume legitimo, e computadas nas mesmas congruas, precedendo rol, com indicação da correspondente remissão a dinheiro, exposto á reclamação pela junta de arbitramento e extra-indo-se conhecimento da prestação devida.

Art. 450.° O ministerio publico junto dos tribunaes de justiça é competente para requerer e seguir o processo judicial, que competir, para cobrança das derramas e quaesquer rendimentos computados nas congruas parochiaes.

TITULO XII

Disposições transitorias

Art. 451.° É o governo auctorisado a supprimir os concelhos, que, tendo sido classificados na 3.ª ordem conforme, as disposições do codigo administrativo approvado por decreto de 2 de março de 1890, não tiverem as precisas condições e recursos de autonomia municipal, devendo ser classificados conforme as disposições do presente codigo aquelles dos mesmos concelhos que ficarem subsistindo.

§ l.° O governo mandará proceder a novas eleições municipaes nos concelhos que forem classificados nos termos deste artigo, e n’aquelles a que forem annexadas freguezias dos concelhos supprimidos, excepto quando estes ficarem integralmente encorporados nos concelhos a que estavam agrupados.

§ 2.° O quadro da vereação dos concelhos a que estiverem agrupados os de 3.ª ordem completar-se-ha, quando estes lhes não forem annexados integral ou parcialmente, pelo chamamento dos respectivos substitutos e supplentes.

§ 3.° Continuarão funccionando até o fim do triennio corrente, como actualmente se acharem constituidas, as camaras municipaes, cujo numero de vereadores haja sido reduzido pelo presente codigo.

Art. 452.° Os logares de auditores, emquanto houver juizes de direito addidos á magistratura judicial, serão providos n’estes magistrados, com os seus actuaes ordenados, mas sómente pelo tempo que decorrer até lhes caber collocação n’aquella magistratura, não podendo em nenhum outro caso ser conservados nos logares de auditores..

Art. 453.° Emquanto houver empregados addidos ás secretarias dos governos civis, sómente de entre elles serão nomeados os secretarios das commissões districtaes e os dos auditores, não lhes competindo gratificação alguma por este serviço, mas conservando a totalidade dos seus ordenados; e de entre os mesmos empregados poderá o governador civil nomear os que necessarios forem para o exame dos processos de contas, salvo o que no artigo 346.° fica disposto para os districtos de Lisboa e Porto.

Art. 454.° As disposições d’este codigo ácerca da competencia e tramites do contencioso administrativo em todas as instancias são applicaveis aos processos pendentes na data em que for publicado, sem prejuizo da validade dos termos já processados.

Art. 455.° Á commissão districtal de Coimbra continua pertencendo a administração do hospicio de expostos, desvalidos e abandonados, e á commissão districtal do Porto a administração das casas-hospicios installadas nas cidades do Porto e Penafiel, com as receitas que por lei constituem dotação dos mesmos estabelecimentos, nos termos do § 4.° do artigo 13.° do decreto de 6 de agosto de 1892.

Art. 456.° As camaras municipaes, que á data da publicação d’este codigo estiverem legalmente cobrando percentagens superiores ás fixadas nos artigos 69.° e 74.°, poderão ser auctorisadas pelo governo a continuar a cobrança das mesmas taxas, sómente emquanto forem indispensaveis para a dotação de emprestimos n’aquella data legalmente contrahidos.

§ unico. Continuam subsistindo as barreiras para cobrança de impostos nos concelhos onde estão estabelecidas, não podendo ser alteradas sem auctorisação do governo.

Art. 457.° A disposição do artigo 96.° não será executoria nos concelhos, onde esteja entregue a recebedor a thesouraria da respectiva camara municipal, emquanto o mesmo recebedor ahi permanecer.

§ unico. A disposição do artigo 98.° não é applicavel aos actuaes recebedores, emquanto permanecerem nos concelhos ou bairros onde estão collocados.

Art. 458.° No caso de suppressão de algum concelho, annexando a outros as respectivas freguezias, nos emprestimos, já realisados, separar-se-ha a quota que deva pertencer aos concelhos, a que acrescerem as mesmas freguezias, na proporção do rendimento collectavel das contribuições predial, industrial, sumptuaria e de renda de casas da parte do concelho annexado, que passar para elles, ficando cada um exclusivamente responsavel pela quota que lhes for distribuida pelo governo sobre proposta do governador civil, ouvidas as corporações interessadas. Similhantemente se procederá no caso de meras annexações de freguezias pertencentes a concelhos não supprimidos.

§ unico. A proposta será feita dentro de trinta dias, a contar da annexação, e o governo resolverá em igual praso.

Art. 459.° Voltarão ao serviço parochial, de que estavam incumbidos e que possa competir-lhes pelas disposições deste codigo, os empregados das juntas de parochia que pelo decreto de 6 de agosto ficaram addidos ás camaras municipaes, quando estejam ainda em serviço effectivo á data da promulgação do mesmo codigo.

§ 1.° Ás juntas de parochia serão restituidos todos os estabelecimentos, bens, valores e rendimentos que das mesmas juntas transitaram para as camaras municipaes em execução do decreto de 6 de agosto de 1892, e que não tenham sido alienados ou despendidos, com excepção dos valores que constituem actualmente dotação de encargos das camaras municipaes segundo as leis especiaes de instrucção primaria.

§ 2.° Os encargos de emprestimos parochiaes, que têem sido custeados na fórma do n.° 7.° do artigo 22.° do mesmo decreto, passam novamente á responsabilidade das juntas de parochia que os contrahiram, e que para dotação d’elles poderão lançar, com auctorisação do governo, uma percentagem superior ao maximo fixado no artigo 190.°, se de outros recursos não dispozerern.

§ 3.° Os actuaes secretarios privativos dos regedores de parochia poderão continuar no serviço dos seus cargos, percebendo a respectiva gratificação, que será paga pela camara municipal.

§ 4.° As juntas de parochia poderão lançar e cobrar no corrente anno a derrama que, no limite fixado pelo artigo 190.°, for indispensavel para occorrer ás despezas obrigatorias designadas no artigo 189.°

Art. 460.° Continúa em vigor, excepto na parte relativa ás juntas geraes, a tabella de emolumentos approvada pela carta de lei de 23 de agosto de 1887, sendo cobrados os emolumentos fixados no capitulo VII nos pro-

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cessos da competencia da auditoria e da commissão districtal.

§ 1.° Os emolumentos da auditoria, pelos quaes se custeará o expediente, serão contados ao auditor, ao secretario geral e ao secretario respectivo, nos mesmos casos e pela forma por que o eram a favor dos vogaes dos extinctos tribunaes administrativos, dos agentes do ministerio publico e dos secretarios dos mesmos tribunaes.

§ 2.° Os emolumentos da commissão districtal, depois de deduzidas as despezas de expediente, serão distribuidos mensalmente e por igual entre os seus vogaes e o secretario geral, devendo contemplar-se tambem com a mesma igualdade o secretario da commissão e o empregado ou contador que intervier no processo.

§3.° Aos contadores dos extinctos tribunaes administrativos não é abonado outro vencimento alem do fixado no paragrapho antecedente.

§ 4.° Os emolumentos das certidões passadas pelo se cretario da commissão districtal serão contados pela tabella das secretarias dos governos civis e distribuidos como os emolumentos das mesmas secretarias.

§ 5.° E applicavel á contadoria do hospital real de S. José e annexos o disposto no capitulo I da referida tabeliã, constituindo receita do mesmo hospital os emolumentos n’ella fixados.

§ 6.° Os continuos da secretaria do supremo tribunal administrativo serão tambem contemplados, em proporção dos seus ordenados, na distribuição dos emolumentos pertencentes aos empregados da mesma secretaria.

Art. 461.° Os empregados providos em empregos, cuja dotação seja augmentada ou diminuida por este codigo, continuarão a vencer os ordenados que actualmente percebem.

Art. 462.° Emquanto não forem decretados novos regulamentos, continuarão a reger, com as modificações estabelecidas neste codigo, os que estão em vigor.

§ unico. É o governo auctorisado a reorganisar o serviço de repartição e cobrança das derramas computadas nas congruas parochiaes, sem prejuizo dos arbitramentos actualmente fixados.

Palacio das côrtes, em 7 de abril de 1896 = Antonio José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Moita Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião deputado secretario.

O sr. Presidente: — A discussão na especialidade ha de ser por titulos, que é o que me parece mais regular, se a camara não tomar outra resolução. Agora abro a discussão na generalidade.

O sr. Conde de Lagoaça: — Eu não proponho adiamento d’esse projecto, mas que fique para ser discutido na primeira sessão.

O sr. Presidente: — Ainda não deu a hora.

O sr. Conde de Lagoaça: — Por isso mesmo é que eu faço o meu requerimento.

O sr. Presidente: — O digno par sr. conde de Lagoaça requer que se feche a sessão antes da hora.

Os dignos pares que approvam este requerimento tenham a bondade de se levantar.

Foi rejeitado.

O sr. Conde de Thomar: — Nós estamos aqui de empreitada a fallar sobre os projectos em discussão. Faz-me isto lembrar a historia de João e José. Fallou José, agora falla João.

Sr. presidente, visto que a camara não quer tomar parte n’este debate, declaro a v. exa. que tambem não discutirei a generalidade do projecto, e que a unica rasão que me leva a usar da palavra é dirigir ao nobre ministro do reino uma pergunta sobre a categoria de um concelho que, pela proposta do governo, estava na 2.ª classe e que ficou prejudicado em virtude de uma emenda feita na camara dos senhores deputados,

Sabe v. exa. que a minha familia é oriunda da Beira, concelho de Fornos de Algodres. Pela reforma do nobre ministro do reino, este concelho era, como já disse, classificado na 2.ª classe. Foi-lhe supprimida a camara, não obstante aquelles povos terem contribuido com quantias avultadas para se construirem os paços do concelho, os tribunaes, cadeia, aposentos para a administração, recebedoria, conservatoria, etc.

Eu desejo saber se o nobre ministro do reino tenciona ou não manter na 2.ª classe o concelho de Fornos de Algodres que, no seu primitivo projecto, estava na 3.ª classe.

Tenho quasi a certeza, attendendo ás idéas de justiça do nobre ministro do reino, de que não poderá este concelho ficar na 3.ª classe.

Pelos documentos que me foram remettidos e que vou ler á camara, se prova que realmente aquelle concelho não é tão insignificante como á primeira vista póde parecer.

Quando eu tenho conhecimento de que ha concelhos que têem uma só freguezia, e que esses concelhos foram mantidos, como por exemplo, o concelho da Gollegã, é justo que o concelho de Fornos de Algodres fique na 2.ª classe.

Ora, eu vou dizer o que sei com relação ao concelho de Fornos de Algodres.

N’um documento, que tenho presente, lê-se o seguinte:

(Leu.)

Alem d’isso a estatistica dos correios e telegraphos d’este concelho no anno de 1894 mostra-nos o seguinte:

(Leu.)

Vê-se tambem pelos orçamentos da camara que o rendimento daquelle concelho foi, em 1892, 13:000$000 réis em 1893, 15:000$000 réis; em 1894, 15:000$000 réis é em 1895, 14:000$000 réis.

Ora um concelho que apresenta dados estatisticos desta importancia não póde deixar de ser classificado na 2.º classe, porque de outro modo algumas das freguezias deste concelho tinham de ser annexadas aos concelhos visinhos.

Sr. presidente, no relatorio da commissão, tratando-se, da reducção dos concelhos, diz-se o seguinte:

(Leu.)

Ora, realmente, quando um concelho lança contribuições de modo a poder empregar na construcção dos paços do concelho 14:000$000 réis, quando os tribunaes em Fornos de Algodres são hoje superiores aos da propria capital do districto, parece-me que esse concelho não póde deixar de ficar pertencendo á 2.ª classe.

Eu sei que o nobre ministro do reino me póde dizer que o concelho de Fornos de Algodres tem uma população inferior a alguns concelhos de 2.ª classe, mas eu direi a s. exa. que aquelle concelho é mais rico, e tem mais elementos de prosperidade do que outros que são tambem de 2.ª classe.

Sr. presidente, eu poderia alongar as minas considerações sobre este assumpto, mas não o faço, porque creio ter dito o bastante para mostrar que o concelho de Fornos de Algodres deve ser classificado concelho de 2.ª classe.

De certo que o nobre ministro do reino me vae dar uma resposta. Se ella não me satisfizer, eu terei de pedir novamente a palavra para fazer quaesquer outras considerações.

Fico esperando, pois, a resposta do nobre ministro do reino.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): - Em virtude da alteração introduzida pelas commissões foi concedido ao governo uma auctorisação para poderem ser extinctos os concelhos que não tivessem condições para existir. Como o digno par comprehende, o governo só póde fazer uso da auctorisação que lhe foi concedida depois de approvado o projecto, e por isso não póde dar uma resposta precisa a s. exa. visto que ainda se não fez o exame dos documentos relativos a este assumpto.

Página 418

418 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Nó emtanto, como conhece as circumstancias e condições que se dão no concelho de Fornos de Algodres desde o tempo em que teve de as estudar para fazer a classificação dos concelhos, parece-lhe que póde dizer ao digno par que, com justiça, poderá ser elevado a 2.ª classe esse concelho, pedindo a s. exa. que não tome isto como uma resolução, que só póde ser tomada depois do exame dos documentos e depois de approvada esta lei. Por agora nada mais póde dizer em resposta ás considerações do digno par.

(O discurso será publicado quando s. exa. o devolver.}

O sr. Presidente: — A hora está a dar.

A deputação encarregada de levar á sanação real alguns autographos das leis já votadas, será composta dos dignos pares os srs.:

Marquez de Fronteira.
Marquez das Minas.
Conde de Thomar.
Visconde da Silva Carvalho.
Arthur Hintze Ribeiro.
Conde de Mártens Ferrão.
Jeronymo Pimentel.

Os dignos pares serão avisados do dia e hora a que Sua Magestade recebe a deputação.

A proxima sessão será amanha, 15 do corrente, e a ordem do dia a continuação da que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Dignos pares presentes á sessão de 14 de abril de 1806

Ex.m08 srs.: Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa; Marquez das Minas; Condes, do Bomfim, de Carnide, de Lagoaça, de Martens Ferrão, do Restello, de Thomar; Viscondes, de Athouguia, de Chancelleiros, da Silva Carvalho; Moraes Carvalho, Telles de Vasconcellos, Arthur Hintze Ribeiro, Ferreira Novaes, Palmeirim, Cypriano Jardim, Fernando Larcher, Costa e Silva, Margiochi, Frederico Arouca, Jeronymo Pimentel, Baptista de Andrade, Pessoa de Amorim, Thomás Ribeiro.

O redactor = Urbano de Castro.

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