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N.º 68

SESSÃO DE 10 DE MAIO DE 1884

Presidencia do exmo. sr. João de Andrade Corvo

Secretarios - os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Henrique de Macedo Pereira Coutinho

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - Ordem do dia: Discussão do parecer n.° 301. - Usam da palavra na generalidade os dignos pares os srs. Pereira de Miranda e Henrique de Macedo, relator, e na especialidade os dignos pares os srs. Costa Lobo, Henrique de Macedo e o sr. ministro do reino. - O digno par o sr. Pereira de Miranda pede, sem prejuizo da discussão do parecer n.º 282, a discussão do parecer n.° 280. - O digno par o sr. Henrique de Macedo faz igual pedido com relação aos pareceres n.ºs 270, 275 e 278. - São approvados sem discussão os pareceres n.° 282, sobre o projecto de lei n.° 302; n.° 280, sobre o projecto de lei n.° 284; e n.° 270, sobre o projecto de lei n.° 286. - O digno par o sr. Henrique de Macedo pede ao sr. ministro da marinha explicações ácerca da prorogação do praso para a construcção do caminho de ferro de Lourenço Marques. - Responde o sr. ministro. - O digno par o sr. Henrique de Macedo agradece a resposta. - O digno par o sr. Telles de Vasconcellos manda para a mesa o parecer da commissão especial sobre o projecto da reforma eleitoral. Foi a imprimir: - Foram ainda approvados os pareceres: n.° 275, sobre o projecto de lei n.° 295; n.° 278, sobre o projecto de lei n.º 264; e n.° 251, sobre o projecto de lei n.º 266.

Ás duas horas e meia da tarde, estando presentes 20 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Mencionou-se a seguinte

Correspondencia

Nove officios da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo as seguintes proposições de lei:

1.ª Concedendo á misericordia da villa de Moura, districto de Beja, o extincto convento de Nossa Senhora do Carmo e respectiva cerca para n'elle se estabelecer um hospital para doentes pobres.

Á commissão de fazenda.

2.ª Adjudicando ao seminario de Coimbra os bens e rendimentos do seminario de Leiria, que, por decreto de 16 de setembro de 1882, foram adjudicados ao seminario da diocese de Lisboa.

Á commissão dos negocios eclesiasticos.

3.ª Fixando a força naval para o anno economico de 1884-1885.

Á commissão de marinha.

4.ª Auctorisando o governo a proceder á cobrança dos impostos e demais rendimentos publicos relativos ao exercicio de 1884-1885.

Á commissão de fazenda.

5.ª Approvando, para ser ratificada pelo poder executivo, a convenção internacional para a protecção dos cabos submarinos.

Á commissão de negocios externos.

6.ª Modificando á divisão eleitoral do circulo n.° 134.

Á commissão de administração publica.

7.ª Fixando a força do exercito no anno corrente.

Á commissão de guerra.

8.ª Determinando que o cargo de pharmaceutico do hospital das Caldas da Rainha seja vitalicio e de nomeação regia, fazendo-se extensiva esta disposição ao actual pharmaceutico do dito hospital, José Augusto da Costa.

Ás commissões de administração e de fazenda.

9.ª Fixando o contingente de recrutas para o exercito e armada no anno corrente.

Ás commissões de guerra e de marinha.

(Estava presente o sr. ministro do reino.)

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Como nenhum digno par pede a palavra vamos entrar na ordem do dia.

Vae ler se o parecer n.° 281.

Leu-se na mesa o parecer n.° 281, sobre o projecto de lei n.° 301, os quaes são do teor seguinte:

PARECEU N.° 281

Senhores. - A vossa commissão de instrucção examinou como lhe cumpria o projecto de lei n.° 301, vindo da outra casa do parlamento, o qual tem por objecto e preceito principal crear junto do ministerio do reino um conselho superior de instrucção publica, em substituição da actual junta consultiva de instrucção publica que outra provisão do mesmo projecto extingue; e como resultado d'esse consciencioso e meditado estudo, vem hoje submetter á vossa esclarecida apreciação o seguinte parecer:

O modo de ver da vossa commissão é inteiramente favoravel á approvação do referido projecto de lei, e aquelle dos membros d'ella, honrado com o pesado encargo de justificar e desenvolver essa opinião, mal saberia desempenhar-se melhor de tão ardua como importante tarefa, do que reproduzindo agora aqui sem alteração, a parte essencial de outro relatorio que formulou em 24 de março de 1880, quando encarregado tambem pela illustre commissão de instrucção superior e especial da camara dos senhores deputados, a que tinha então a honra de pertencer, de expor, justificar e desenvolver o parecer favoravel d'essa illustre commissão sobre uma proposta de lei analoga ao projecto n.° 301 e da iniciativa do então ministro do reino e illustre estadista o sr. José Luciano de Castro.

Analoga ao projecto de lei n.° 301, dissemos ser essa proposta á que nos vamos referindo; mais que analoga, podiamos dizer, porque com elle se identifica não sómente nos fins e intuitos, senão nos principios essenciaes d'onde dimanam as respectivas provisões e com elles e por elles nas bases geraes em que uma e outro assentam.

Se alguma diversidade existe entre alguns dos preceitos da proposta de lei de 1880 e os correspondentes do projecto de lei n.° 301, é mero accidente de fórma ou simples variante de organisação, e de pouco momento.

Acresce que o relatorio a que nos imos referindo e abaixo vae transcripto, por uma singular previsão ou coincidencia parece como que antecipadamente destinado, senão a justificar, ao meios a indicar a conveniencia da adopção d'essas alterações.

Esse relatorio era concebido nos seguintes termos:

"Senhores. - Á commissão de instrucção superior e especial foi submettida a proposta de lei, n.° 81-G, que tem por objecto a creação e organisação de um conselho superior de instrucção publica, e examinada tal proposta com a especial attenção que demandava a importancia do as-

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sumpto, vem hoje a vossa commissão sujeitar á vossa esclarecida apreciação o seguinte parecer.

"De quanto é necessaria a existencia de uma corporação technica e independente que junto do ministro, em geral alheio á especialidade, possa auxilial-o, esclarecel-o e fortalecel-o (na phrase do excellente relatorio que precede a proposta) na resolução dos multiplos e complicados problemas da instrucção publica nos seus diversos ramos, ninguem por certo duvida. Escusado é, pois, que a vossa commissao insista em demonstrarmos o que em presença dos factos hodiernos, como das tradições do serviço, dos exemplos de casa, como da experiencia de estranhos, póde reputar-se evidenciado.

"A organisação dada pela proposta ao novo conselho teve em mira especialmente tres idéas: dar-lhe o numero de vogaes necessario para que elle podesse razoavelmente desempenhar-se de quantas attribuições lhe commettia, de quantas obrigações lhe impunha; compol-o, no tocante ao numero e qualidade das pessoas, por fórma que n'elle se encontrassem equilibradas e proporcionalmente representadas as differentes classes de instrucção e os principaes estabelecimentos de ensino publico ou privado; garantir pela fórma de eleição de grande numero dos seus membros a independencia com que haveriam de pronunciar-se ácerca dos negocios importantes, dos altos interesses que a lei collocava na essencial dependencia da sua apreciação e resolução.

" Pelo que respeita ao numero de vogaes que devem compor o Conselho, está a vossa commissão de perfeito accordo com ás idéas que dictaram a proposta que ora analysâmos.

" De feito, ainda depois de cerceadas e transferidas para funccionarios especiaes quantas attribuições da actual junta consultiva de instrucção publica são de natureza meramente fiscal, e que á pratica tem demonstrado representarem uma superfetação inutil por inexequivel, e assim melhor delimitado e reduzido, como na proposta, o rol das attribuições do novo conselho destinado a substituir aquella corporação á parte meramente consultiva, o numero, a variedade, complicação e a gravidade dos negocios e interesses submettidos ao conselho justifica ainda o numero de vogaes indicado na proposta.

"Demonstrado cabalmente a pratica d'este ramo de administração; deixa-o desde logo entrever a simples enumeração de encargos contida nos artigos 4.°, 6.° e 7.°

"É justo, e conveniente que o governo tenha uma larga parte de intervenção directa na escolha dos funccionarios sob cuja informação, conselho ou consulta terá de proceder com responsabilidade propria, em assumptos e negocios de tão singular especialidade, de tamanho melindre e importancia. E tão, sincero respeito mereceu á vossa commissão este incontestavel principio de boa administração, que lhe pareceu dever, propor-vos, no systema de organisação do conselho, preceituado no artigo 1.° da proposta, algumas modificações que terão como resultado essencial o alargamento d'essa intervenção.

"Assim, a vossa commissão, entendendo que aos quatro institutos agricolas e industriaes de Lisboa e Porto, não só por serem escolas de instrucção especial inteiramente independentes da administração geral de instrucção publica subordinada ao ministerio do reino, mas porque proporcionam aos seus alumnos, sob fórma e segundo programmas tambem especiaes, a maior parte do ensino preparatorio para os cursos technicos que professam, mal caberia a representação em um conselho superior, em cujas secções demais senão encontrava a do ensino especial, propõe-vos que, sem alterar o numero total dos vogaes do conselho, eleveis de tres a quatro o numero d'elles, directamente escolhidos pelo governo.

"Na fórma por que devem ser escolhidos os outros vogaes do conselho pareceu. tambem á vossa commissão que podiam introduzir-se com vantagem algumas alterações que, satisfazendo por uma parte ao justificado intuito de ampliar a intervenção do governo na composição do conselho, tendessem por outra a desfazer os provaveis attritos de uma eleição realisada em commum por corporações docentes em que a provavel communidade das aspirações scientificas não exclue o natural antagonismo dos interesses, as rivalidades de idéas, de systemas ou de pessoas.

"A fórma da eleição que a vossa commissão entende dever propor-vos, modificando assim o preceituado no artigo 1.° da proposta, tem ainda outra vantagem manifesta, a de manter o eleito em verdadeira e rasoavel independencia, que resulta da sua posição intermediaria entre os inconvenientes extremos da dependencia absoluta do governo, e da absoluta dependencia dos seus committentes, que em muitos casos, e especialmente no ultimo do artigo 1.°, poderia fazer d'elle um representante exclusivo, não dos interesses do ensino e da instrucção, mas dos do pessoal dos estabelecimentos em que esta se proporciona e aquella se ministra.

"Pensa tambem a vossa commissão que a parte do artigo 1.° que se refere aos vogaes do conselho directamente nomeados pelo governo, deve ser alterada, senão no pensamento, ao menos na fórma, e de modo que d'elle não possa deduzir se a exclusão do elemento que com mais manifesta utilidade publica póde entrar por esta ou outra fórma na composição do conselho, o professorado.

"Todas as outras disposições da proposta, salvas ligeiras modificações de redacção, parecem á vossa commissão de instrucção superior e especial dignas da vossa approvação, e por isso é ella de parecer, de accordo com o governo, que a proposta n.° 81-G seja approvada com as alterações que resultam da sua conversão no referido projecto de lei."

N'estes termos e por taes fundamentos é a vossa commissão de instrucção publica de parecer que o projecto de lei n.° 301 seja approvado, para que, convertido em decreto das côrtes geraes, suba á regia sancção.

Sala da commissão, em 6 de maio de 1884. = Visconde de Villa Maior = João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens = Couto Monteiro de Carvalho = Ayres = H. de Macedo, relator.

Projecto de lei n.° 301

Artigo 1.° É creado junto ao ministerio do reino um conselho superior de instrucção publica. O conselho divide-se em duas secções, uma de nomeação regia, outra de eleição.

§ 1.° A secção de nomeação regia ou secção permanente compõe-se de doze vogaes habilitados para entenderem nos negocios geraes de ensino, e escolhidos d'entre professores, effectivos ou jubilados, ou d'entre individuos que hajam exercido com distincção funcções de administração de instrucção publica no ministerio do reino ou sejam notaveis por merito relevante scientifico ou litterario.

Alem da habilitação já declarada devem ter competencia: dois vogaes para os negocios dos estudos das faculdades de mathematica e philosophia e dos institutos polytechnicos; dois vogaes para os negocios dos estudos medicos, medico-cirurgicos e de pharmacia; dois vogaes para os negocios dos estudos juridicos, administrativos e theologicos da universidade; um vogal para os negocios da estudos superiores de historia, philosophia e letras; um vogal para os negocios de instrucção especial e das bibliothecas, archivos e museus; dois vogaes para os negocios da instrucção secundaria official; um vogal para os negocios da instrucção primaria publica; um vogal para os negocios que disserem respeito á instrucção secundaria e primaria livre.

& 2.º A secção de eleição compõe-se do modo seguinte:

Cinco delegados da universidade, cada um eleito pelo conselho de cada faculdade d'entre os respectivos professores;

Dois delegados das escolas medico-cirurgicas de Lisboa

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e Porto, cada um eleito d'entre os professores de cada escola pelo conselho escolar;

Um delegado da escola polytechnica, eleito d'entre os professores da escola pelo conselho d'este estabelecimento;

Um delegado da academia polytechnica e eleito d'entre os professores da academia pelo conselho academico;

Um delegado do curso superior de letras, eleito d'entre os professores do curso pelo conselho d'este instituto;

Um delegado do real observatorio astronomico eleito d'entre os astronomos de primeira classe pelo conselho do observatorio;

Um delegado do archivo e aula de diplomatica da Torre do Tombo eleito d'entre os officiaes diplomaticos do archivo pelo guarda mór, official maior e seu ajudante e os mesmos officiaes;

Dois delegados das academias de bellas artes e cada um eleito d'entre os professores de cada academia pelo conselho academico;

Um delegado do conservatorio real de Lisboa, eleito d'entre os professores do conservatorio pelo respectivo conselho;

Tres delegados dos lyceus, cada um eleito pelo conselho do lyceu central de cada circumscripção d'entre os professores dos lyceus existentes na mesma circumscripção;

Dois professores de instrucção primaria, um eleito pelos inspectores das seis primeiras circumscripções, outro eleito pelos inspectores das restantes;

Dois delegados dos collegios e escolas de ensino livre eleitos pelos directores de collegios e respectivos professores particulares de Lisboa e Porto.

Os vogaes de eleição, exercem as suas funcções por dois annos, mas podem ser reeleitos uma ou mais vezes.

Art. 2.º O ministro e secretario de estado dos negocios do reino é presidente nato do conselho. Para servir no impedimento do ministro ha um vice-presidente que é nomeado por decreto real d'entre os vogaes da secção permanente.

§ 1.° O conselho superior de instrucção publica tem cada anno uma sessão que dura desde 1 até 15 de outubro, mas póde ser prorogada, se houver urgente necessidade, até ao fim do mez, e poderá ser convocado fóra d'esta epocha, quando por acto proprio, ou indicação da secção permanente, ao ministro pareça conveniente.

A secção permanente funcciona em sessão ordinaria uma vez por semana, e extraordinariamente todas as vezes que o presidente ou vice-presidente a convoca.

§ 2.° Os trabalhos de secretaria do conselho incumbem á repartição da direcção geral de instrucção publica, que for designada pelo ministro. O primeiro official que dirige esta repartição é secretario do conselho com a gratificação annual de 200$000 réis.

Artigo 3.°:

1.° A secção permanente compete:

Propor ao governo os melhoramentos, providencias e reformas de natureza legislativa ou executiva que julgar conveniente ao progresso dos estudos, e á administração litteraria, economica e disciplinar em todos os ramos de ensino subordinados ao ministerio do reino.

A secção permanente deve ser necessariamente ouvida:

Sobre fundação de estabelecimentos de ensino, creação, transformação ou desdobramento de cadeiras;

Sobre propinas de matriculas, exames, diplomas ou cartas;

Sobre livros de texto e leitura que devam ser prohibidos nas aulas publicas ou nas particulares por falta de conformidade com as leis do reino e a moral;

Sobre premios que devam ser conferidos aos auctores de livros adoptados nas aulas de qualquer dos graus de instrucção publica.

Sobre concursos para o magisterio, se occorrer duvida ou existir protesto contra a legalidade dos respectivos processos:

obre quaesquer recursos interpostos, pelos estudantes interessados, das sentenças ou decisões dos conselhos escolares, que os condemnarem na Pena de prohibição de exame ou expulsão;

Sobre processos de jubilação e aposentação de lentes ou professores;

Sobre conflictos de jurisdicção e competencia entre quaesquer empregados de instrucção publica;

Sobre todos os mais negocios submettidos ao seu exame por disposições legislativas ou regulamentares.

A secção permanente póde ser ouvida:

Sobre quaesquer propostas de lei que o governo haja de apresentar ao corpo legislativo e mala ou menos immediatamente se refiram á instrucção, e tambem sobre quaesquer regulamentos relativos á mesma instrucção, que o governo entenda decretar;

Sobre interpretação ou execução de leis ou regulamentos de instrucção publica;

Sobre a inspecção de todos os estabelecimentos de ensino publico e livre;

Sobre quaesquer questões do ensino, administração litteraria ou scientifica e disciplina escolar.

2.º A cada um dos vogaes da secção de eleição incumbe:

Apresentar no primeiro dia da sessão um relatorio com referencia ao anno electivo findo sobre o ensino na faculdade, instituto ou circumscripção de instrucção primaria ou secundaria de que é delegado;

Propor as providencias, que julgar necessarias ao melhomento e progresso do referido ensino na mesma faculdade, instituto ou circumscripção;

Prestar os esclarecimentos precisos para a discussão das providencias mencionadas ou dar quaesquer outras informações que lhe sejam pedidas e digam respeito ao instituto a que pertence;

Submetter á approvação do conselho os livros para texto das lições nas aulas da faculdade ou instituto de ensino, de que é representante.

3.° Ao conselho compete:

Discutir e approvar ou reprovar as providencias que forem propostas pelos vogaes da secção de eleição;

Declarar quaes das propostas approvadas sejam a seu ver de mais immediata necessidade;

Redigir os programmas de instrucção primaria e secundaria e rever os programmas para as aulas de instrucção superior dependentes do ministerio do reino;

Approvar os livros de texto e leitura para as aulas, quanto ao seu merito litterario e scientifico;

Dar parecer ácerca de todos os negocios relativos ao ensino sobre que for consultado pelo governo;

Organisar, em vista dos trabalhos da sessão, o relatorio geral e documentado que deve ser presente ao ministro do reino, e que será publicado na folha official.

Art. 4.° A cada um dos vogaes da secção permanente pertence a gratificação mensal de 30$000 réis, accumulada com os vencimentos que o referido vogal perceba por qualquer emprego do estado dentro ou fóra de Lisboa. As faltas não justificadas sujeitam a desconto proporcional á gratificação.

Os vogaes da secção de eleição vencem na sessão annual ou extraordinaria o subsidio de 2$000 réis diarios que accumulam com quaesquer vencimentos. Os vogaes que residirem fóra de Lisboa são indemnisados das despezas de jornada. As faltas não justificadas fazem perder o direito ao subsidio relativo aos dias em que occorrerem.

Art. 5.° É extincta a junta consultiva de instrucção publica. Os vogaes da junta são nomeados para a secção permanente.

Art. 6.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 5 de maio de 1884. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa, presidente = Francisco

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Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.

O sr. Pereira de Miranda: - Sr. presidente, sei que a actual junta consultiva de instrucção publica não corresponde, completamente aos fins a que é destinada, não por serem incompetentes os cavalheiros que fazem parte d'ella, ao contrario são muito competentes, mas pela organisação d'aquella corporação que não satisfaz ás necessidades do serviço.

Não me parece todavia, que seja urgente tratar d'este projecto, principalmente porque importa um augmento de despeza, e porque as condições da fazenda publica são melindrosas, voto contra o projecto.

O sr. Henrique de Macedo: - Affirmou estar animado, como o digno par a quem respondia, do desejo de não votar novas despezas sem creação de receitas correspondentes, e que, se o seu voto e modo de apreciar o projecto em discussão differia do do sr. Pereira de Miranda ao ponto de ter acceitado o encargo de o relatar era: primo, porque este projecto, era a reproducção de outro com os mesmo fins, e baseado sobre identicos principios, apresentados ás côrtes em 1880 pelo seu particular amigo e illustre estadista, o sr. José Luciano de Castro, projecto de que elle, orador, fôra relator na camara dos senhores deputados; secundo, porque esse projecto de 1880 fazia parte de um conjuncto de cinco propostas importantes, relativas á instrucção publica, das quaes tinham sido então unicamente approvadas duas que envolviam creação de receita sobeja para todos.

Que, portanto, tinha por demonstrado, não só que o projecto era technicamente bom, (o que o digno par, sr. Pereira de Miranda aliás não contestára), mas tambem que o parlamento votara em 1880, sobeja receita especialmente proposta e creada para occorrer á organisação de um conselho de instrucção publica, receita a que aliás por sua origem especial (o augmento das propinas da instrucção secundaria) não era justo dar outro destino que não fosse o de melhorar o organismo do nosso ensino publico.

Não ignorava que essa receita, por diversas circumstancias me não realisára na sua totalidade, porque, sendo calculada então pelo sr. José Luciano em 116:000$000 réis, estava hoje inscripta no orçamento na somma de réis 89:000$000, mas que tambem a despeza então votada para a instrucção secundaria se não realisára toda, d'onde resultava, feitos os calculos com toda a minucia e cuidado, que o superabit então computado pelo sr. José Luciano de Castro em 6:00$000 réis; estavam hoje em 21:000$000 réis, quantia mais que bastante para occorrer á despeza, não de um, mas de cinco conselhos de instrucção publica.

Que só movido por esta ordem de rasões, como o seu particular amigo o sr. Pereira de Miranda devia suppor, porque o conhecia bem particular e politicamente, se resolvêra a votar e relatar o projecto, e que esperava tel o satisfeito com as explicações que lhe dera.

sr. Pereira de Miranda: - Não pretendo embaraçar o andamento do projecto, mas se quizesse embaraçar, bastavam-me as palavras que acaba de pronunciar o meu amigo e collega, o sr. Henrique de Macedo, para me dar ensejo para o fazer.

Não contesto a vantagem da reforma que se propõe, acho que ella deve dar bons resultados, pois que está moldada pela reforma analoga, que não ha muito tempo teve logar na Italia; mas as condições financeiras, segundo o meu modo de ver são muito peiores do que eram, quando se apresentou o projecto do sr. José Luciano.

As considerações de que o digno par se serviu tambem me não fazem peso, porque eu vejo no ministerio do reino receitas, creadas e destinadas a serviços muito mais importantes do que este, e não serem applicadas para esse fim.

A proposito, quando se discutir a lei de meios, não quero propor nenhum augmento de despeza, mas uma deslocação de receita em relação ao orçamento extraordinario. E terei de proceder assim por ver o sr. ministro do reino conservar-se impassivel perante ás condições em que se encontra o lazareto de Lisboa. Creio que até se pensou ha pouco tempo em se reduzir as quarentenas com o fim de obter logar para novos quarentenarios, o que bem demonstra a necesssidade de algumas obras e melhoramentos n'aquelle importante estabelecimento.

Por consequencia, eu não quero alongar o debate e mesmo nas palavras que proferi apenas procurei justificar o meu voto.

O sr. Presidente: - Como nenhum digno par mais pede a palavra, vae votar-se o projecto na generalidade.

Posto á votação o projecto, na generalidade, foi approvado.

O sr. Presidente: - Agora vae ler-se o artigo l.°

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Costa Lobo: - Fez largas considerações sobre o projecto em discussão.

(O discurso do digno par será publicado quando s. exa. o devolva.)

O sr. Henrique de Macedo: - Respondendo ao digno par, o sr. Costa Lobo, affirmou que era menos justo classificar o projecto de dispendiosa inutilidade, como lhe chamára aquelle digno par, porque nem elle podia reputar inutil a organisação, junto do ministero do reino, de um corpo consultivo, e composta de homens technicos, destinado a aconselhal-o na resolução dos numerosos, difficeis e especialissimos problemas relativos á instrucção publica, nem lhe parecia licito argumentar contra tão util e importante melhoramento da ordem moral com um despendio inferior a 4:000$000 réis, para occorrer ao qual havia aliás receita de sobra, que, pela sua origem, como pela fórma e occasião em que fôra creada, não podia moralmente ter outro destino.

Pareceu-lhe excessivamente dura e severa a linguagem empregada pelo sr. Costa Lobo na discussão de um projecto que, apesar de importante, era por sua natureza inteiramente alheio á politica, e commentou menos favoravelmente algumas phrases proferidas n'este sentido pelo digno par a que se referia, respondendo tambem a algumas objecções levantadas pelo mesmo digno par no tocante á organisação e attribuições da parte electiva do proposto conselho de instrucção publica.

O sr. Costa Lobo: - Usou da palavra sobre a especialidade do projecto em discussão.

(O discurso do digno par será publicado quando s. exa. o devolver.)

O sr. Ministro do Reino (Barjona de Freitas) (O orador não reviu o seu discurso na presente sessão.): - Sr. presidente, é unicamente para dizer duas palavras em resposta ao digno par o sr. Costa Lobo.

S. exa. insurgiu-se principalmente contra a secção electiva do conselho superior de instrucção publica, de que trata o projecto em discussão.

Ora, sr. presidente, eu poderia esperar que se fizesse opposição á secção permanente, não á secção electiva, que em paiz nenhum, onde ha d'estes conselhos, tem sido atacada.

O digno par, que é muito versado em todos os assumptos, sabe perfeitamente que não ha muito tempo em França se votou uma reforma sobre instrucção publica, na qual se estabeleceu que houvesse uma secção electiva no conselho de instrucção, e que a favor d'esta idéa se pronunciaram os homens mais notaveis como Henri Martin e Bartelemi de Saint-Hilaire.

Na Italia fez-se a mesma cousa, e se algumas duvidas se apresentaram foram unicamente quanto á secção perma-

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nente, e nenhuma opposição houve contra a parte electiva do referido conselho.

Isto não quer dizer que o digno par não possa encarar este assumpto debaixo de um outro ponto de vista, mas unicamente que eu não fiz senão seguir o exemplo de algumas das principaes nações.

Com referencia ao relatorio que precede a proposta do governo, eu não digo que seja meu, que deixe de o ser; direi só que é meu para todas as responsabilidades.

Agora quanto á distincção que o digno par fez entre a representação da instrucção primaria e o numero de representantes dos estabelecimentos de instrucção superior, o que me parece é que s. exa. não notaria desproporção se attentasse em que a instrucção primaria é toda uma, e em que a escola polytechnica, por exemplo, onde professam tantas sciencias distinctas, como mathematica, as sciencias naturaes, a economia politica, etc., tem apenas um re-presentante ou delegado no conselho que se pretende crear.

Alem d'isso não admira que um professor de instrucção primaria não entenda de todos os ramos de ensino; mas o que não é natural é que um professor de ensino superior, não entenda nada de instrucção primaria.

Ora é de suppor que sejam muitas mais, entre as questões submettidas a este conselho, as que se refiram á instrucção secundaria e superior do que as relativas á instrucção primaria; por consequencia não acho limitado de mais o numero de delegados de instrucção primaria.

Parece-me, em vista d'isto, que o digno par escolheu mal o assumpto para fazer opposição, ou escolheu mal o ponto por onde atacou o projecto; e só direi que, como na lei ha relatorio, projecto e discussão ficará para esta o tratar-se do sal e de tudo mais que o digno par quizer.

O sr. Henrique de Macedo: - Sr. presidente, peço a v. exa. que me conceda a palavra antes de se encerrar a sessão, porque desejava aproveitar a presença do sr. ministro da marinha para lhe dirigir algumas perguntas a que me referi, annunciando-lh'as em uma das sessões anteriores.

O sr. Presidente: - Fica v. exa. inscripto n'essa conformidade.

Está extincta a inscripção, e vae votar-se o artigo 1.°

Foi approvado, e foram successivamente lidos e approvados todos os outros artigos do projecto, sem discussão.

O sr. Pereira de Miranda: - Sr. presidente, eu peço que, sem prejuizo do outro projecto, relativo a assumpto igualmente do ministerio do reino, que estava dado para ordem do dia, seja posto em discussão o parecer n.° 280.

O sr. Henrique de Macedo: - Sr. presidente, eu tambem requeiro que, sem prejuizo do parecer n.° 282, entrem em discussão os pareceres n.ºs 270, 275 e 278.

Foram approvados os requerimentos dos dignos pares Pereira de Miranda e Henrique de Macedo.

Leu-se o parecer n.° 282, sobre o projecto de lei n.° 302, que foi posto em discussão, e é do teor seguinte:

PARECER N.° 282

Senhores. - A vossa commissão de instrucção publica foi presente o projecto de lei n.° 302, vindo da camara dos senhores deputados.

Na sessão de 15 de maio de 1883, e depois de demorado é consciencioso exame de um projecto originado em proposta do governo, que tinha por fim reorganisar profundamente todo o serviço e regimen da nossa instrucção secundaria, entendeu a vossa commissão de instrucção publica propor-vos, formulando para esse effeito o respectivo projecto de lei, que auctorisasseis simples e unicamente o governo a providenciar para aquelle anno escolar ácerca de propinas, e da fórma, valor e constituição dos jurys e aos exames de instrucção secundaria, em determinadas bases, e com a expressa condição de dar opportunamente conta ás côrtes do uso que fizesse de tal auctorisação.

Usou o governo da auctorisação referida, publicando o decreto de 23 de maio de 1883, e, não só por dar cumprimento á ultima condição d'ella, como tambem para que o disposto no referido decreto possa ter applicação legal no corrente anno escolar, submetteu á approvação do parlamento a proposta de lei que a camara dos senhores deputados converteu no projecto de lei n.° 302.

E, como as rasões com que a vossa commissão justificava, em l5 de maio de 1883, o seu modo de proceder, rasões que reputastes acceitaveis e producentes, approvando o projecto de lei que ella então submetteu ao vosso esclarecido juizo, subsistam com a mesma força e valor hoje do que então, é a vossa commissão de parecer que approveis o projecto de lei n.° 302, para que, convertido em decreto das côrtes, suba á regia sancção. O parecer n.° 190 da sessão ordinaria de 1883, a que o presente se refere, e que a vossa commissão reputa util transcrever aqui, é concebido nos seguintes termos:

"Senhores. - A vossa commissão de instrucção publica, a quem foi presente o projecto de lei n.° 168, vindo da camara dos senhores deputados, entende que resolução do difficil problema de governação publica a que este projecto se refere o da organisação da instrucção secundaria carece de mais demorado e attento exame e estudo do que aquelle que permitte a proximidade do praso que a lei estabelece para os alumnos requererem admissão a exames.

"D'esta consideração resulta para a vossa commissão a conveniencia de propor-vos, de accordo com o governo, que adieis para mais tarde qualquer resolução definitiva, ácerca do mencionado projecto, limitando-vos por agora a auctorisar o governo no corrente anno escolar a satisfazer a algumas reclamações instantes da opinião, e a occorrer ás necessidades provadas do serviço da instrucção secundaria pelo que respeita a propinas, exames e matriculas subsequentes, nos termos do seguinte projecto de lei":

Artigo 1.° No anno escolar de 1883-1884 será observado o disposto no decreto de 23 de maio de 1883, com respeito a propinas, jurys e exames de instrucção secundaria.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 5 de maio de 1884. = Visconde de Villa Maior = João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens = Ayres de Gouveia Couto Monteiro = Thomás de Carvalho = H. de Macedo, relator.

Projecto de lei n.° 302

Artigo 1.° No anno escolar de 1883-1884 será observado o disposto no decreto de 23 de maio de 1883, com respeito a propinas, jurys e exames de instrucção secundaria.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 6 de maio de 1884. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa, presidente = Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

Não havendo quem pedisse a palavra, foi o projecto submettido á votação na generalidade e especialidade, por ter um só artigo, e approvado.

Em seguida foram approvados, sem discussão, os pareceres n.os 280 e 270, sobre os projectos de lei n.os 284 e 286, que são do teor seguinte

PARECER N.° 280

Senhores. - As taxas de imposto exagerado têem, entre outros, o grave inconveniente de produzir muitas vezes o effeito contrario ao pensamento da lei que os estabeleceu,

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o de diminuir, em vez de augmentar, a receita do estado.

No caso das taxas desproporcionadas aos actos que se pretendem tributar, ou se tratam de illudir a lei, ou diminue sensivelmente a frequencia d'esses actos. Em ambos os casos é prejudicada em maior ou menor grau, a receita do estado.

Em virtude d'estas obvias considerações, a vossa commissão de fazenda, tendo examinado o projecto de lei n.º 284, vindo da camara dos senhores deputados, que equipara para o pagamento do imposto do sêllo, os recibos de qualquer seguro, aos recibos entre particulares; é de parecer que o mencionado projecto de lei seja approvado, para subir á real sancção.

Sala da commissão, em 5 de maio de 1884. = Conde do Casal Ribeiro = A. Palmeirim = Gomes Lages = A. Barros e Sá = Telles de Vasconcellos = A. de Serpa.

Projecto de lei n.° 284

Artigo 1.° Os recibos de premios de qualquer seguro são equiparados, para o pagamento do imposto do sêllo, aos recibos entre particulares.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 4 de abril de 1884. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa, presidente = Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

PARECER N.° 270

Senhores. - A commissão de marinha e ultramar examinou o projecto de lei n.° 286, approvado pela camara dos senhores deputados, auctorisando o governo a melhorar a reforma ao secretario geral aposentado do governo geral de Cabo Verde, Antonio Maria de Castilho Barreto, contando-lhe para esse fim o tempo de serviço militar que prestou na provincia de Angola.

Considerando que se acha estabelecida no continente do reino a praxe de contar para as aposentações dos serviços civis o tempo de serviço militar;

Considerando que o mesmo serviço prestado no ultramar é muito mais penoso e arriscado do que o do continente:

E a commissão de parecer, de accordo com o governo, que o mencionado projecto de lei deve ser approvado para subir á real sancção.

Sala da commissão, 14 de abril de 1884. = Visconde de Soares Franco = Visconde de S. Januario Antonio de Sousa Silva Costa Lobo = Conde de Linhares = Marino João Franzini.

Parecer n.° 270-A

Senhores. - A vossa commissão de fazenda, a quem a dignissima commissão de marinha enviou o parecer, por esta elaborado, sobre o projecto n.° 286, remettido a esta camara pela camara dos senhores deputados, nada tem que oppor ao referido parecer.

Sala das sessões, em 19 de abril de 1884. = Conde do Casal Ribeiro = Augusto Xavier Palmeirim = Gomes Lages = A. de Serpa = Conde de Gouveia = Telles de Vasconcellos.

Projecto de lei n. ° 286

Artigo 1.° É o governo auctorisado a melhorar a reforma ao secretario geral aposentado do governo da provincia de Cabo Verde, Antonio Maria de Castilho Barreto, levando-lhe em conta todo o tempo de serviço militar prestado na provincia de Angola.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 4 de abril de 1884. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa, presidente = Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

sr. Henrique de Macedo: - Sr. presidente, os factos ácerca dos quaes desejaria ouvir algumas explicações do sr. ministro da marinha; em relação aos quaes formularei algumas perguntas e submetterei ao juizo da camara e do publico as considerações que me occorressem, são os seguintes:

No contrato celebrado em data de 14 de dezembro do anno proximo passado, para a construcção e exploração do caminho de ferro de Lourenço Marques, estão incluidas, como ha dias tive a honra de dizer á camara, e sob os n.ºs 38.° e 39.°, as seguintes clausulas:

"Artigo 38.° Dentro do praso de quarenta dias da data da assignatura d'este contrato, a empreza deverá mandar a Lourenço Marques um engenheiro proceder ao exame do traçado já estudado por ordem do governo portugues, e cujos projectos lhe deverão ser fornecidos, bem como todos os dados e esclarecimentos que o governo tiver reunido sobre este assumpto, para que o dito engenheiro possa formar o seu juizo sobre o terreno e propor as variantes que ficarão dependentes da approvação do governo.

"Este trabalho deverá ser apresentado pela empreza dentro do praso de cem dias, a contar do termo dos quarentas dias acima mencionados.

"Artigo 39.° Em acto continuo ao da approvação dos planos pelo governo portuguez, a empreza reforçará o deposito com mais 45:000$000 réis, e esta quantia, bem como a de que trata o artigo 37.°, só poderão ser levantadas, quando a empreza tiver despendido o dobro de tal importancia na construcção do caminho de ferro."

D'estas clausulas deduz-se sem contestação possivel que o concessionario acceitou expressamente as duas seguintes obrigações:

Primeira, apresentar dentro do praso de cento e quarenta dias, o seu projecto completo e definitivo no ministerio da marinha; segunda, logo depois que esse projecto fosse approvado, reforçar o deposito provisorio de 5:000 libras, a que se refere a condição 37.º, com outro maior deposito definitivo de 40:000$000 réis.

Proseguindo no exame do contrato, encontra-se pouco adiante outra condição, a 43.º, que diz assim:

"Artigo 43.° Exceptuam-se das disposições dos artigos precedentes os casos de força maior devidamente comprovados."

O que eu perguntei ha dias ao sr. ministro da marinha e ultramar, por intermedio do seu collega da fazenda, que se dignou communicar-lhe as minhas perguntas, foi se o concessionario tinha requerido ou s. exa. concedera qualquer prorogação do referido praso dos cento e quarenta dias.

S. exa., não podendo acudir a estas perguntas com immediata resposta, porque não estava presente, dignou-se on entanto communicar-me em curtissimo praso alguns documentos que, se não satisfazem completamente ao fim com que foram feitas as minhas perguntas, constituem no entretanto resposta cabal e affirmativa a essas perguntas, taes como foram formuladas.

Vou lel-os:

"Determinando o artigo 38.° do contrato assignado em 14 de dezembro de 1883 entre o governo e Eduard Mac Murdo para a construcção do caminho de ferro de Lourenço Marques á fronteira do Transwaal que, dentro do praso de quarenta dias da data da assignatura do dito contrato, a empreza deveria mandar a Lourenço Marques um engenheiro proceder ao exame do traçado já estudado por ordem do governo portuguez, sendo pelo mesmo governo fornecidos ao dito engenheiro todos os dados e esclarecimentos para que elle podesse formar sobre o terreno o seu juizo ácerca do traçado e propor as variantes que julgasse convenientes, e dispondo-se igualmente no mencionado artigo que este trabalho deveria ser apresentado pela empreza dentro do praso de cem dias a contar do termo dos quarenta já fixados; tendo a empreza comprido em devido tempo a primeira parte do disposto n'aquelle artigo,

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enviando dentro de quarenta dias da assignatura do contrato um engenheiro a Lourenço Marques para estudar o traçado; não tendo, porém, podido apresentar os planos do caminho de ferro no praso de cento e quarenta dias, allegando caso de força maior, e pedindo por isso que, em vista do disposto no artigo 43.° do contrato, se lhe prorogue o praso para a apresentação dos mesmos planos; atten-dendo a que as rasões allegadas, como tendo impedido o engenheiro da empreza de concluir em devido tempo os seus estudos, são perfeitamente justificadas, por isso que de communicações officiaes consta que effectivamente, em consequencia de muito copiosas chuvas, se tornou nos ultimos mezes muito difficil o transito entre Lourenço Marques e a fronteira do Transwaal, e de certo quasi impossivel seria portanto proceder aos reconhecimentos necessarios para o exame do traçado; na Sua Magestade El-Rei por bem, pela secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar prorogar por mais sessenta dias, que terminarão em 2 de junho futuro, o praso marcado no artigo 38.° do contrato de 14 de dezembro de 1883 para a apresentação dos planos para a construcção do caminho de ferro de Lourenço Marques á fronteira.

"Paço, em 2 de maio de 1884. = Manuel Pinheiro Chagas.

Está conforme. Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 6 de maio de 1884. = O director geral, Francisco Joaquim da Costa e Silva.

"Senhor. - Eduard Mac Murdo, concessionario do caminho de ferro de Lourenço Marques á fronteira do Transwaal, tendo, em virtude do artigo 38.º do seu contrato de 14 de dezembro de 1883, ordenado que o engenheiro Alpovridge partisse para Lourenço Marques munido dos projectos que o governo, em harmonia com as disposições do mesmo artigo, lhe devia fornecer, vê-se, por motivo de caso de força maior, impossibilitado de apresentar á approvação superior, dentro do segundo praso de cem dias tambem marcado no mesmo artigo, as modificações que o exame do terreno lhe suggerissem.

"As chuvas torrenciaes e grandes inundações inteiramente anormaes e poucas vezes presenceadas n'aquellas regiões que até á data das ultimas noticias não tinham deixado ainda de tornar completamente impossivel a conclusão dos estudos sobre o terreno, facto este que ao concessionario é participado pelo seu engenheiro e que certamente deve ter sido confirmado officialmente pelo engenheiro do governo, leva-o a solicitar de Vossa Magestade, em harmonia com o disposto no artigo 43.° do contrato da concessão, uma prorogação de sessenta dias sobre o praso marcado na segunda parte do artigo 38.° para a apresentação das modificações ali indicadas e por isso - Pede a Vossa Magestade haja por bem deferir-lhe como requer. E. R. M.

"Lisboa, 28 He abril de 1884. = Eduard Mac Murdo.

"Está conforme. - Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 7 de maio de 1884. = O director geral, Francisco Joaquim da Costa e Silva."

"IIImo. e exmo. sr. - Tenho a honra de communicar a v. exa. que cheguei a Lourenço Marques, hontem 13, pelas seis horas da tarde, tendo partido de Pretoria no dia 13 de fevereiro.

"Esta viagem foi difficil e demorada, devido ás grandes chuvas que caíram, as quaes tornaram intransitaveis algumas partes dos caminhos e encheram extraordinariamente os rios Sand, Crocodillo e Incomati. No entanto se alguem emprehendesse esta travessia no anno proximo passado e na epocha das chuvas torrenciaes, não a concluiria em menos de tres ou quatro mezes.

"Alguns pequenos melhoramentos que foram effectuados modernamente tornaram já praticavel um caminho que d'antes era quasi impossivel seguir.

"Assim ha hoje uma loja bem fornecida de generos alimenticios em Spitz-kop, uma casa na margem do rio Sand, uma povoação de indigenas em Pretorius kop, pequenas embarcações em que se atravessa o Crocodillo e o Incomati, e na margem direita d'este rio o novo posto fiscal, uma aldeia indigena e duas lojas pertencentes a negociantes estabelecidos em Lourenço Marques.

"Tudo isto é ainda muito pouco e insufficiente em relação ás necessidades do viajante e á extensão do caminho, mas é já alguma cousa que d'antes não existia.

"Espero que a experiencia que adquiri n'esta ultima viagem e os incommodos que n'ella passei, terão um resultado benefico, porque me permittirão indicar ao governo do Transvaal quaes são as medidas a adoptar para tornar este caminho mais praticavel.

"Durante o tempo que estive em Pretoria recebi dos membros do governo do Transvaal, e principalmente de s. exa. o vice-presidente da republica, que então funccionava de presidente, muitas provas de sympathia e consideração tendentes a demonstrarem os sentimentos amigaveis d'aquelle governo pela nação portugueza.

"Nas repetidas vezes em que conversei com o presidente sempre s. exa. se referia a Portugal nos termos mais lisongeiros, e n'um jantar semi-official s. exa. levantou uma saude a El-Rei, pronunciando por essa occasião um discurso em que enumerou os differentes e valiosos favores que o seu paiz tem recebido de Portugal.

"Quando fui despedir-me de s. exa. entreguei-lhe as insignias da gran-cruz da Conceição, que s. exa. o ministro me tinha encarregado de apresentar ao sr. Paulo Kruger, e pedi-lhe o favor de as depor nas mãos do presidente effectivo logo que este regressasse do estrangeiro.

"Por essa occasião o sr. P. Joubert encarregou-me de transmittir a s. exa. o ministro os seus agradecimentos em nome do povo do Transvaal, não só pelas honras conferidas ao presidente da republica, mas tambem pelos assignalados favores dispensados pelo governo portuguez nos estudos do caminho de ferro.

"No dia da minha partida de Pretoria, s. exa. na sua qualidade de commandante geral, veiu com o seu ajudante de campo, um membro do executivo e uma força de trinta boers a cavallo, acompanhar-me até á distancia de 10 milhas.

"Remetto inclusa a v. exa. copia de um pequeno relatorio que apresentei ao secretario, d'estado, em 11 de fevereiro, antes de sair do Transvaal. Da parte final d'este relatorio concluirá v. exa. que eu antecedi o que me é determinado no officio d'essa secretaria d'estado, de 21 de janeiro ultimo, officio que só hontem recebi.

"Tenho a satisfação de communicar a v. exa. que o sr. P. Joubert me affirmou, de um modo positivo, que o seu governo se occuparia da abertura da nova estrada e que envidaria todos os seus esforços para a realisação do caminho de ferro, o que s. exa. e o seu governo consideram absolutamente indispensavel á prosperidade e desenvolvimento do Transvaal.

"Deus guarde a v. exa. - Lourenço Marques, 14 de março de 1884. - IIImo. e exmo. sr. conselheiro director geral do ministerio da marinha e ultramar. = J. Machado, major de engenheria.

"Está conforme. Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 7 de maio de 1884. = O director geral, Francisco J. da Costa e Silva."

O que d'estes documentos se deduz sem maior exame é que o concessionario requereu, e o ministro concedeu uma prorogação de sessenta dias ao praso de cento e quarenta estipulado na clausula 38.º para a entrega dos projectos definitivos.

Antes de entrar em mais miudo exame do facto e dos documentos que li, de formular as novas perguntas, de expender algumas considerações que o conteúdo d'estes documentos me suggere, permitta-me o sr. ministro da marinha, consinta-me a camara que lhe affirme da maneira mais positiva e categorica, que não tenho o menor desejo

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de levantar n'este momento, e ácerca d'este assumpto uma questão politica. Nem pretendo tambem realisar agora a interpelação que em tempos annunciei ácerca da legalidade e conveniencia com que o sr. ministro da marinha firmou o contrato a que me venho referindo. Não prescindo de realisar essa interpellação, mas em occasião que se me afigure mais asada e opportuna. N'este momento, o meu unico intuito é provocar, da parte do sr. ministro, pelas perguntas e considerações que vou fazer, rigorosamente restrictas aos documentos que li e ás clausulas a que elles se referem, a dar algumas explicações que, esclarecendo officialmente alguns pontos que se me afiguram obscuros n'este contrato, permittam que elle seja ao menos n'esses pontos interpretado por fórma que fiquem devidamente salvaguar, dados os interesses publicos.

A prorogação do praso (sessenta dias) concedida pelo sr. ministro a requerimento do concessionario, elevou o praso de cento e quarenta dias, concedido na clausula 38.º para a entrega dos projectos definitivos, a duzentos dias.

De passagem, e, só de passagem, porque já disse, e repito, nem quero que se imagine que pretendo fazer d'esta questão uma questão politica, direi que o caso de força maior allegado pelo concessionario no seu requerimento, e que é o unico em que segundo a já mencionada clausula 43.º do contrato, podia ser fundada a concessão da prorogação alludida, que o caso de força maior, repito, me parece menos que mediocremente provado pelos documentos que me foram enviados. De feito, o concessionario allega unicamente, que foram no presente anno tão violentas as tempestades, tão copiosas as chuvas torrenciaes n'aquellas paragens, e na epocha propria comprehendida dentro do praso dos cento e quarenta dias, que de memoria de homem não houvera quadra invernosa assim.

Por outra parte, o officio do distinctissimo e zeloso engenheiro Machado, que de mais a mais não constitue uma informação ad hoc, e em que se funda o despacho ministerial a que me venho referindo, diz assim:

"IIImo. e exmo. sr. - Tenho a honra de communicar a v. exa. que cheguei a Lourenço Marques, hontem 13 pelas seis horas da tarde, tendo partido de Pretoria no dia 13 de fevereiro.

"Esta viagem foi difficil e demorada devido ás grandes chuvas que caíram, as quaes tornaram intransitaveis algumas partes dos caminhos, e encheram extraordinariamente os rios Saude, Crocodillo e Incomati. No emtanto se alguem emprehendesse esta travessia no anno proximo passado e na epocha das chuvas torrenciaes, não a concluiria em menos de tres ou quatro mezes"

Afigura-se-me, portanto, que o sr. ministro da marinha, dando como provado o caso de força maior, em presença de informações officiaes e dignas de toda a confiança que contradizem abertamente as allegações do requerente, pelo menos interpretou essas informações com grande excesso de benevolencia! (Apoiados.)

Não insistirei, porém, n'este ponto, sr. presidente, porque não quero dar pretexto para que se possa affirmar, ou pensar, que pretendo levantar uma questão politica, e porque estou na realidade convencido que o sr. ministro, usando de tal benevolencia, teve apenas em mira conceder um insignificante e inoffensivo favor a uma empreza que reputa de certo seria e capaz de satisfazer aos seus compromissos capitaes, sem que medisse bem o possivel alcance indirecto da concessão que fazia, na hypothese perfeitamente admissivel e digna de consideração de não estar a empreza nas circumstancias em que s. exa. a reputou. Para estas hypotheses, que nada têem com a respeitabilidade pessoal dos concessionarios, é que se estipulam os contratos os prasos, os depositos e outras garantias.

Estas hypotheses, que nada têem, repito, com a respeitabilidade das pessoas dos concessionarios, devem de estar sempre bem presentes na mente d'aquelles que exercem poderes publicos, porque quando contratam fazem-no em nome de interesses de terceiro que lhes não é licito prejudicar por mera rasão de benevolencia.

O alcance indirecto e possivel da prorogação concedida pelo sr. ministro eu vou explical-o. Proseguindo na leitura do celebre contrato de 14 de dezembro de 1883, encontra-se pouco adiante a condição 51.º, que diz assim:

"Art. 51.° Os concessionarios ficam obrigados a constituir, no praso de seis mezes, a contar da data da assignatura d'este contrato, uma sociedade anonyma com a séde em Lisboa, para a execução dos fins a que se refere o mesmo contrato, devendo os estatutos ser approvados pelo governo, sem embargo da lei de 22 de junho de 1867. A empreza será portugueza para todos os effeitos.

"§ unico. Se os concessionarios não organisarem a sociedade anonyma na conformidade d'este artigo, perderão para o estado o deposito definitivo a que se refere o artigo 39.°, e o contrato considerar-se-ha ipso facto rescindido."

D'aqui resulta que, tendo o sr. ministro prorogado, elevando o até duzentos dias a contar da data da assignatura do contrato, o praso para a entrega dos projectos definitivos; não sendo o concessionario obrigado a entrar com o deposito definitivo de 10:000 libras a que se refere á clausula 39.ª senão depois d'esse praso; devendo por outra parte a empreza estar constituida segundo a clausula 51.º, dentro de cento e oitenta dias a partir da mesma data, e perder ó deposito a que se refere a clausular 39.º, e só esse, se n'essa data não estiver constituida, vem o deposito definitivo a ter de realisar-se só em data posterior áquella em que o estado podia ter já adquirido o direito de lançar mão d'elle!

Isto na hypothese, que é a que naturalmente resulta da interpretação litteral, grammatical e restricta das condições 37.ª, 38.ª, 39.ª e 51.ª do contrato, de que a empreza em caso algum perde o primeiro deposito provisorio de 5:000 libras. Mas ainda na hypothese contraria, fica evidente, pelo que deixo dito, que em virtude da prorogação concedida pelo sr. ministro póde dar-se o caso do concessionario perder apenas 5:000 libras, em casos para os quaes pela letra como pelo espirito do contrato estipulara perder 15:000.

Succederia isto, por exemplo se a concessionario depois de seis mezes de reflexões sobre o contrato, e talvez de tentativas e trabalhos para o passar ou arranjar socios, houvesse por melhor desistir da concessão. E quem sabe se em tal caso, nos viria ainda pedir indemnisação das despezas feitas com alguns estudos e trabalhos que tivesse começado!

O que em todo o caso me parece inadmissivel, e bem póde aliás ser o triste resultado da prorogação concedida, é que ao concessionario seja licito fazer jogo na nossa praça, ou nas praças estrangeiras, ou ainda com o governo da repu-biica do Transwaal, que tem o maximo interesse e urgencia na construcção da linha concedida, por ser testa de linha da via ferrea projectada entre a capital d'aquelle paiz e Lourenço Marques; que possa fazer esse jogo, repito, e durante seis mezes o mais, podendo ao cabo d'elles, e quando d'esse jogo não tenha obtido os desejados fructos, encampar a concessão sem mais prejuizo que o do seu credito moral.

O que o sr. ministro devia ter feito, a meu ver, era não conceder a prorogação do praso, sem que a empreza estivesse convenientemente constituida, ou, pelo menos sem que o deposito provisorio de 5:000 libras, tivesse sido reforçado com as 10:000 libras a que se refere a clausula 39.º Assim, o seu despacho, que aliás reputo firmado com a melhor sinceridade e boa intenção, em nenhuma hypothese podia envolver maior prejuizo publico, do que o que resulta do proprio contracto. E podia proceder assim, porque francamente o caso de força maior allegado estava, repito, muito menos que mediocremente demonstrado.

O mal, porém, está feito, e o que hoje unicamente me

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cumpre pedir e peço ao sr. ministro, para que esse mal não possa vir a ser tão grande como se me affigurou, é que nos declare, elle que firmou o contrato alludido, e que é o unico que o póde fazer officialmente, se interpreta as condições 37.ª, 38.ª, 39.ª e 51.ª do contrato no sentido de que o concessionario perca tambem o deposito provisorio de 5:000 libras no caso de deixar de cumprir alguma d'aquellas condições que, segundo o contrato, envolvem perda de deposito.

A titulo de reflexão, indicação ou como o sr. ministro melhor entender, e quizer tomar, acrescentarei sem intenção de censura, que se encontra tambem no contrato a que me venho referindo um defeito que, sendo grave, é comtudo possivel e até facil de remediar.

Em nenhuma das condições do contrato se encontra fixado o minimo de capital realisado e a emittir com que a empreza póde organisar-se, nem a proporção de uma para outra parte do capital se encontra na nossa legislação previa e genericamente prefixada, como, por exemplo, na legislação hespanhola.

Comprehende-se que em taes circumstancias é facil formar dentro de qualquer praso uma empreza ficticia e meramente destinada a evitar ou adiar a perda dos depositos. O sr. ministro porém tem na sua mão, e proveniente da condição 51.º uma boa arma para se defender d'este possivel artificio, que é o direito indefinido que essa mesma clausula lhe dá de approvar ou não a constituição definitiva da empreza, segundo as condições em que ella lhe for proposta. Use pois s. exa. d'esse direito em ordem a que a empreza se não constitua sem todas as condições necessarias para garantir a realisação immediata do emprehendimento a que se refere o seu contrato, e terá feito um bom serviço ao seu paiz e ao credito ministerial. (Apoiados.)

O sr. Ministro da Marinha (Pinheiro Chagas) (o orarador não reviu este discurso): - Talvez uma simples resposta minha seja bastaste para satisfazer o sr. Henrique de Macedo, e me possa dispensar de entrar nas largas considerações em que s. exa. se espraiou.

É que hoje se deve ter lavrado n'um tabellião a escriptura da organisação da companhia com o capital de 500:000 libras sterlinas, capital em acções.

Os estatutos foram apresentados ao governo, que os leu e acceitou, auctorisando a organisação da sociedade n'aquelles termos.

Não deixarei de dizer a s. exa. que todos os depositos que são feitos, para garantias de contractos, sejam ou não provisorios, servem de garantia á execução das condições a que as emprezas se obrigam; findo o praso da prorogação que eu fiz, se a empreza não realisasse as condições do contrato, perdia o deposito provisorio, desde que não ha outro é como deposito definitivo.

Em todos os contratos feitos com relação a caminhos de ferro, se determinam certos depositos, que devem servir de garantia para o cumprimento das condições a que as emprezas se obrigam.

Com relação ao caso de força maior a que se referiu o o sr. Henrique de Macedo, permitta-me s. exa. que lhe diga que ha um pequeno engano na sua informação.

O engenheiro Machado o que disse foi que, tendo de ir de Pretoria a Lourenço Marques para conferenciar com o engenheiro inglez, houve uma cheia que demorou por mais um mez a viagem.

É claro que essa demora carregou sobre os estudos do caminho de ferro, porque entretanto o engenheiro inglez não podia adiantar nada; e já vê s. exa. que, chegando este de Londres a Lourenço Marques sem ter conhecimento de nada, esta demora fazia com que elle não podesse cumprir.

Quanto á nova prorogação, como s. exa. viu foi uma prorogação tambem limitadissima, e causada pela necessidade.

Aqui está, sr. presidente, a resposta que eu tinha agora a dar ao sr. Henrique de Macedo.

Entretanto se s. exa. se não satisfaz com ella, desde já me ponho á sua disposição para em outro qualquer dia lhe dar explicações mais desenvolvidas.

O sr. Henrique de Macedo: - Sr. presidente, o sr. ministro da marinha acaba de responder ás minhas perguntas e considerações, por fórma que me deixou em grande parte satisfeito.

O que eu desejava era que, para realisar e usufruir a concessão a que se refere o contrato de 14 de dezembro de 1883, se organisasse uma empreza que désse garantias, que inspirasse confiança.

S. exa. acaba de affirmar que se lavrou ou está lavrando a escriptura de constituição d'essa empreza. Bem está.

Desculpe-me, porém, s. exa. a insistencia, que não significa duvida sobre a seriedade do seu caracter, e sinceridade dos seus intuitos, e apenas entranhado interesse pelas conveniencias publicas.

Diz-se que o capital constitutivo d'essa empreza é de 500:000 libras. Não é pouco, se for capital realisavel e como seria garantia já em boa parte realisado.

Quando s. exa. tiver de examinar e approvar a constituição da empreza e dos seus estatutos, não olhe só para esta cifra nominal e importante de 500:000 libras e para as assignaturas, provavelmente muito respeitaveis, que hão de adornar essa escriptura. Inquira tambem, se atraz d'essas 500:000 libras nominaes está alguma cousa de real, alguma fracção importante de capital realisado.

Acrescentarei, que me dou por plenamente satisfeito com as declarações feitas pelo sr. ministro no tocante á legitima interpretação dos artigos que se referem ao deposito provisorio, e aos casos em que o governo tem o direito de lançar mão d'elle conjunctamente com o definitivo de 10:000 libras.

Não insistirei sobre o sentido e valor que deva attribuir-se á informação do engenheiro Machado, no sentido de provar o supposto caso de força maior.

Bem que as reflexões do sr. ministro me não convencessem, já antecipadamente tinha declarado que reputava este ponto de somenos importancia.

O fim principal das minhas perguntas e considerações, está realisado; portanto, e n'estes termos dou-me por satisfeito, e agradeço ao sr. ministro da marinha a franqueza e promptidão das suas explicações.

Tenho dito.

O sr. Telles de Vasconcellos: - Mando para a mesa o parecer da commissão especial sobre o projecto da reforma eleitoral.

O sr. Presidente: - Este parecer vae a imprimir e será distribuido pelas casas dos dignos pares.

Segundo a annuencia que a camara deu ao pedido do sr. Henrique de Macedo, vão entrar em discussão os pareceres n.os 275 e 278, e o n.° 253, que já estão dados ha muito tempo para a ordem do dia.

Lidos na mesa, foram successivamente approvados sem discussão, na generalidade e especialidade, os pareceres n.ºs 275, 278 e 253, que são do teor seguinte:

PARECER N.° 270

Senhores. - Á vossa commissão de marinha e do ultrajar foi presente o projecto de lei n.° 295, já approvado na camara dos senhores deputados, pelo qual os vencimentos actuaes do secretario geral e do secretario da junta de fazenda da provincia de Macau e Timor são modificados, dando-se-lhes uma nova distribuição dentro da verba já votada pelo decreto de 28 de dezembro de 1882 para remuneração dos mesmos funccionarios.

A vossa commissão, attendendo a que, sem augmento de despeza, se obtem, pela modificação proposta, uma proporção mais rasoavel entre o ordenado e gratificação para

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452 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

aquelles cargos e mais em harmonia com a relação que já se acha estabelecida em logares similares das outras provincias ultramarinas, é de parecer que o dito projecto de lei merece a vossa approvação.

Sala da commissão, 30 de abril de 1884. = Visconde de Soares Franco = Antonio de Sousa Silva Costa Lobo = Francisco Joaquim da Costa e Silva = Marino João Fran-zini = José Baptista de Andrade = V. de S. Januario.

PARECER N.° 273-A

Senhores. - A vossa commissão de fazenda, attendendo a que não ha augmento de despeza, não tem por que oppor-se ao parecer da commissão de marinha e ultramar.

Sala da commissão, l de maio de 1884. = Conde do Casal Ribeiro = Francisco Joaquim da Costa e Silva = Visconde de Bivar = A. X. Palmeirim = Gomes Lages.

Projecto de lei n.º 295

Artigo l.° Os vencimentos estabelecidos pelo decreto de 28 de dezembro de 1882, ao secretario geral e ao secretario da junta de fazenda da provincia de Macau e Timor, ficam modificados para cada um dos referidos logares na fórma seguinte:

Ordenado............................. 1:000$000
Gratificação......................... 400$000

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 24 de abril de 1884. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa, presidente = Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Luiz Antonio Gonçalves de Freitas, deputado vice-secretario.

PARECER N.° 278

Senhores. - A vossa commissão de marinha e ultramar examinou com toda a attenção o projecto de lei n.° 287, vindo da camara dos senhores deputados, e está de accordo em que é justo que aos officiaes das guarnições das provincias ultramarinas, naturaes da India, seja contado, para os effeitos da reforma, o tempo que servirem na Africa e em Timor, em harmonia com o disposto no artigo 3.° § unico da lei de 8 de junho de 1863; mas, como depois da publicação do decreto com força de lei de 2 de dezembro de 1869, por uma interpretação a que dá logar a equivoca fórma em que é concebido, se têem suscitado duvidas em applicar tambem aquelle beneficio aos officiaes europeus que fazem parte da guarnição das provincias ultramarinas, e que ali se alistaram directamente; e por outro lado, poderá deprehender-se do projecto que os officiaes naturaes da Africa ou de Timor aproveitariam d'elle, servindo nas provincias da sua naturalidade; é a vossa commissão de parecer, de accordo com o governo, que deve ser approvado, com a seguinte redacção, o referido projecto de lei:

Artigo 1.° Aos europeus, que forem officiaes de primeira linha das provincias ultramarinas, e aos officiaes naturaes da India ou de Macau, que servirem em Africa ou em Timor, continuará a ser applicavel, para os effeitos da reforma, o disposto no artigo 3.° § unico da lei de 8 de junho de 1863.

Art. 2.° Ficam assim interpretados os artigos 36.° e 69.° do decreto com força de lei de 2 de dezembro de 1869, e revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 21 de abril de 1884 = Visconde de Soares Franco = Antonio de Sousa Silva Costa Lobo = Visconde de S. Januario = Marino João Franzini = Visconde de Arriaga = Francisco Maria da Cunha.

Projecto de lei n.° 287

Artigo 1.° Aos officiaes dos exercitos de Africa e da guarnição de Timor, que forem naturaes das provincias ultramarinas, continua a ser applicavel para os effeitos da reforma, o disposto no artigo 3.° § unico da lei de 8 de junho de 1863.

Art. 2.° Ficam assim interpretados os artigos 34.° e 69.° do decreto com força de lei de 2 de dezembro de 1869, e revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em l5 de abril de 1884. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa, presidente = Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos, deputado secretario = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

PARECER N.° 253

Senhores. - A vossa commissão de negocios externos examinou o projecto de lei n.º 264, vindo da camara da senhores deputados, que acompanha o tratado e a convenção consular, feito com a Republica Dominicana em 1 de maio de 1883, e, conformando-se com a doutrina do projecto e as rasões expostas no relatorio do governo, tem a honra de propor-vos a sua approvação, para subir á sancção real.

Sala das sessões, 1 de abril de 1884. = Conde do Casal Ribeiro = Conde de Rio Maior = A. de Serpa = Marquez de Fronteira = Conde de Ficalho.

Projecto de lei n.º 264

Artigo 1.º É approvado, para ser ratificado pelo poder executivo, o tratado de amisade, commercio e navegação, concluido e assignado entre Portugal e a Republica Dominicana em 1 de maio de 1883, e bem assim a convenção consular assignada na mesma data pelos dois estados.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 19 de março de 1884. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa, presidente = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, deputado secretario = Francisco de Paula Gomes Barbosa, deputado secretario.

O sr. Presidente: - A proxima sessão será na segunda feira, e a ordem do dia a interpellação annunciada sobre os acontecimentos de Caminha.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas e meia da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 10 de maio de 1884

Exmos. srs. João de Andrade Corvo; Marquezes, de Penafiel, de Vallada; Condes, de Alte, do Bomfim, do Casal Ribeiro, de Rio Maior, de Valbom; Viscondes, de Arriaga, de Bivar, de S. Januario, de Moreira de Rey, de Soares Franco, de Villa Maior, de Almeidinha; Barão de Santos; Pereira de Miranda, Barros e Sá, Couto Monteiro, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Telles de Vasconcellos, Barjona de Freitas, Palmeirim, Bernardo de Serpa, Montufar Barreiros, Francisco Cunha, Henrique de Macedo, Jayme Larcher, Mártens Ferrão, Gomes Lages, Braamcamp, Baptista de Andrade, Pinto Basto, Castro, Ponte Horta, Mello Gouveia, Mexia Salema, Silvestre Ribeiro, Bocage, Vaz Preto, Placido de Abreu, Thomás de Carva-lho.

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