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1030 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOSA PARES DO REINO

em relação á empreza que se propõe todas as condições de garantia e segurança para que a obra possa realisar-se.

Com os individuos não temos nada; com os lucros ou com os prejuizos da empreza nada temos tambem.

Inspira a alguem grande cuidado que os capitães sejam compromettidos e soffram qualquer prejuizo?

A mim não. E a este respeito os membros das opposições unidas, que sentem taes receios, são muito mais syndicatistas do que eu.

Não me dá cuidado nenHum, absolutamente nenhum, que a associação lucre ou perca.

Desde que eu não entro em tal associação, desde que não está a meu cargo tutelar ou proteger, nem arriscar ou prejudicar taes interesses, a empreza segue o seu caminho, e eu, como representante do paiz, tenho obrigação de seguir o meu.

O caminho da empreza é construir, explorar e administrar as linhas. O meu é simplesmente examinar se a obra convem pela garantia que se pede ou pelo encargo que representa, e ver se a empreza offerece sufficientes condições de segurança para que a obra se realise. Nada mais, nada menos.

E eu vou, sr. presidente, em argumentação seguida, tratar a questão, abraçando-a inteira e libertando-a ao mesmo tempo dos incidentes e evasivas para onde tentam desvial-a e confundil-a, pois a verdade é que tendo eu a este respeito idéa tão simples e tão clara, que não suspeitava realmente da possibilidade de ma confundirem, se eu, em vez de tratar a questão, me deixasse prender pelos incidentes em que a discussão se tem extraviado, precisaria de um esforço sobre humano para não perder a idéa clarissima que formava e não a encontrar substituida por incidentes diversos, alguns inuteis, outros, inteiramente estranhos.

Todavia a questão é bem simples. Ha muitos annos, em 1867, governo e parlamento neste paiz entenderam que o caminho de ferro do Douro era de primeira ordem e da maxima importancia nacional.

Se entenderam bem ou mal, não me pertenceu discutil-o n’essa epocha, em que ainda não tinha entrado na vida publica; e não o discuto hoje, porque toda a discussão depois do facto consummado é inutil, e significaria simplesmente perder tempo.

Direi apenas, sem conhecimentos especiaes sobre o assumpto, que a simples inspecção do mappa da peninsula indica a todos aquelles que não são cegos, e naturalmente faz saltar ao espirito de quem teve as primeiras noções geographicas, que as nossas principaes communicações com a Hespanha e com a Europa central têem de ser pelos valles do Douro e do Tejo, não só porque são estes os pontos que correspondem ás partes mais importantes do paiz, mas principalmente porque o Tejo e o Douro são os unicos rios de Portugal que constituem os nossos portos importantes sobre o Atlantico.

O resultado tem hoje demonstrado que a linha do Douro, ainda incompleta, corresponde ou antes excede em importancia tudo o que se calculava na epocha em que se votou a construcção.

A construcção principiou e continuou fazendo-se o caminho de via larga por se julgar do primeira ordem.

Ninguem ignorava, desde que se não tinha preferido a via reduzida, que o caminho do Douro não podia ter outro destino senão ligar-se em Hespanha na rede dos caminhos de ferro d’aquelle paiz.

Alem d’isto todos os partidos faziam, renovavam e repetiam ao Porto e ao norte do reino as mais solemnes promessas a este respeito.

Assim se convenceram todos, assim se comprometteram os homens publicos d’este paiz, a ponto de parecer impossivel que ainda hoje surgisse duvida sobre se o caminho de ferro do Douro é um dos nossos caminhos de ferro de primeira ordem e dos mais importantes, que tem forçosamente de ir ligar-se em Salamanca á rede de Hespanha.

Não venho agora discutir, mas não posso dispensar-me de narrar o que aconteceu, no ultimo governo progressista, perante as repetidas instancias da cidade do Porto, que ha muitos annos julga, como eu julgo tambem, a sua prosperidade dependente da conclusão d’esta linha.

O ultimo governo progressista, em vez de desenvolver a construcção até á fronteira, como a tinha desenvolvido o governo a que succedeu, só a custo adjudicou a construcção do lanço do Pinhão ao Tua e em condições a que logo terei de referir-me. Tratou de illudir e adormecer as exigencias do Porto e do norte do reino, ora com a declaração de que a financiar e exercia influencia extraordinaria no governo hespanhol, ora que o governo hespanhol, receiando talvez a invasão de Portugal, queria fazer passar o caminho de ferro debaixo das suas praças de guerra, ora, finalmente, tentando adormecer o Porto, como se fosse uma creança, com a narração de factos incriveis que de modo nenhum podiam ser acreditados.

Como estes cantares não bastavam para adormecer as exigencias do Porto e do norte do paiz, mudou-se de tactica, principiaram as negociações perante o governo hespanhol, a principio com promessas mysteriosas e logo depois com a affirmação clara e precisa da ligação em Barca de Alva e do prolongamento até Salamanca.

Podem, porventura, os dignos pares da opposição progressista negar estes factos ou pretendem agora declinar a responsabilidade dos actos proprios e da iniciativa do governo que apoiaram?

(Áparte.)

Eu appello para os documentos, leiam as datas. Vejam quem levou o nosso representante em Madrid, cujos dotes elevadissimos eu sou o primeiro a reconhecer e a respeitar, a pedir ao governo hespanhol, e a conseguir d’elle, que as linhas do Douro e da Beira Alta não fossem já unidas passar em Hespanha sob Ciudad Rodrigo.

Depois de todos os esforços notaveis, que foram largamente apregoados, feitos pelo sr. presidente do conselho daquella epocha o sr. Anselmo Braamcamp, depois d’isso conseguiu-se o quê?

Simplesmente que a linha de Salamanca se bifurcasse em Boadilla para a fronteira portugueza, vindo ligar a linha do Douro em Barca de Alva e a linha da Beira Alta em Villar Formoso. Aqui tem, sr. presidente, a conquista notavel, cujo valor eu não quero depreciar, feita pelos dignos pares da opposição progressista e pelo ministerio do seu partido. Se a obra e má, a obra é sua.

Para que a fizeram?

Mas, boa ou má, reconheçam-na, não a neguem, não a declinem inutilmente. Vejam que a carta de lei de 23 de julho de 1880 é referendada pelos srs. Barros Gomes o Saraiva de Carvalho; foi publicada pelos ministros da ultima situação progressista, e basta ler o artigo 1.° para se ver qual é a obra do partido progressista e até onde chegou a sua iniciativa n’esta questão.

Diz a lei: «Faz parte da rede de caminhos de ferro portuguezes de primeira ordem o prolongamento da linha ferrea do Douro, do Pinhão á Barca de Alva, desde que, por accordo com o governo de Hespanha, se fixe de modo conveniente o traçado d’esta linha á fronteira portugueza e o ponto do seu respectivo entroncamento».

Aqui está tudo legislado pelo partido progressista, por aquelles que agora impugnam o que legislaram. Aqui está o prolongamento á Barca de Alva declarado de primeira ordem. Aqui está o entroncamento na linha de Salamanca. Aqui está o accordo que se negociava em Hespanha para a bifurcação em Boadilla. Vejam se falta alguma cousa áquelles que agora encontraram e grande desnivel, e que proclamam que se abandone Salamanca desviando a linha do Douro para o norte e para o sul.