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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

70.ª SESSÃO

EM 11 DE MARÇO DE 1912

SUMÁRIO: - Lida e aprovada a acta, dá-se conta do expediente. - São admitidas em "segundas leitoras" uma proposta de lei da iniciativa do Sr. Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos), sôbre a transferencia da verba destinada à instalação eléctrica dos Institutos Superiores Técnico e do Comércio, bem como os seguintes projectos de lei: passando para os tribunais ordinários os crimes previstos e punidos pelo artigo 179.°, do Código Penal; empréstimo para a compra dum cruzador; autorizando a Câmara de Beuavente a adquirir terrenos para um bairro destinado aos pobres; fixando as horas de abertura e encerramento dos estabelecimentos comerciais; destinando 4 contos de réis anuais para a publicação doa boletins do Ministério do Fomento; concedendo à Câmara do Barreiro terrenos na praia desde a ponte da Passadeira; concedendo a pensão anual de 1:200$000 íeis a dois oficiais, por serviços relevantes, e finalmente a proposta para uma comissão elaborar o projecto de lei regulador das eleições distritais, municipais e paroquiais, todos da iniciativa respectivamente dos Srs. Deputados Moura Pinto, Nunes Ribeiro, José Montez, Manuel José da Silva, Ezequiel José de Campos, Gastão Rodrigues, António Granjo e Santos Moita. Sôbre a última proposta, o Sr. Presidente consulta a Câmara acêrca da nomeação da comissão, assentando-se em que seja constituída pela mesa com elementos de todos os grupos políticos.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Presidente comunica o falecimento de duas pessoas das famílias dos Srs. Deputados Stockler e Pala propondo um voto de sentimento, o que foi aprovado. - Aberta a inscrição usa da palavra o Sr. Silva Gouveia, que faz largas considerações acêrca duma circular remetida ao comércio de Lisboa por um comerciante de Hamburgo. O Sr Manuel Bravo disserta sôbre as especulações de carácter político que rodearam a greve de Lisboa, a que responde o Sr Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos). - Mandam para a mesa: uma proposta de lei o Sr. Ministro do Inferior (Silvestre Falcão), abrindo um crédito de 50 contos de réis, para combater a epidemia da febre tifóide; e requerimentos, vários Srs. Deputados O Sr. Costa Basto anuncia uma nota de interpelação ao Sr. Ministro do Interior. - Justificam faltas diferentes Srs. Deputados.

Na ordem do dia: -(Discussão do parecer n.° 102) usam da palavra os Srs. Alexandre Braga, que manda uma moção para a mesa, que é admitida e Aresta Branco, que apresenta uma proposta e moção, que são admitidas - Prorrogada a sessão a requerimento do Sr Lopes da Silva, o debate continua, falando os Srs. Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcellos), Mesquita de Carvalho, Barbosa de Magalhães e Álvaro Pope.- O Sr. Lopes da Silva requere que se julgue a matéria suficientemente discutida verificando-se pela contagem, pedida pelo Sr Mendes de Vasconcelos, não haver na sala número suficiente para poder ser votado o requerimento daquele Sr. Deputado. - Seguidamente encerra-se a sessão. - Eram 20 horas e 30 minutos.

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Presidência do Exmo. Sr. António Aresta Branco

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
António Joaquim Ferreira da Fonseca

Abertura da sessão às 14 e 45 minutos.

Presentes à chamada 107 Srs. Deputados.

São os seguintes: - Adriano Gomes Ferreira Pimenta Afonso Ferreira, Alberto de Moura Pinto, Alberto Souto Albino Pimenta de Aguiar, Alexandre Braga, Alfredo Balduíno de Seabra Júnior, Alfredo Djalme Martins de Aze vedo, Alfredo Guilherme Howell, Alfredo Maria Ladeira Alfredo Rodrigues Gaspar, Álvaro Nunes Ribeiro, Álvaro Poppe, Álvaro Xavier de Castro, Américo Olavo de Aze vedo, Amílcar da Silva Ramada Curto, António Albert Charula Pessanha, António Albino Carvalho Mourão António Aresta Branco, António Augusto Pereira Cabral António Barroso Pereira Vitorino, António Brandão de Vasconcelos, António França Borges, António Joaquim Ferreira da Fonseca, António José Lourinho, António de Paiva Gomes, António Pires Pereira Júnior, António dos Santos Pousada, António Silva Gouveia, António Valente de Almeida, Aquiles Gonçalves Fernandes, Augusto José Vieira, Aureliano de Mira Fernandes, Baltasar de Almeida Teixeira, Caetano Francisco Cláudio Eugénio Gonçalves, Carlos Amaro de Miranda e Silva, Carlos António Calixto, Carlos Henrique da Silva Maia Pinto, Carlos Maria Pereira, Carlos Olavo Correia de Azevedo, Casimiro Rodrigues de Sá, Domingos Leite Pereira, Eduardo de Almeida, Ernesto Carneiro Franco, Ezequiel de Campos Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, Francisco Cruz Francisco Luís Tavares, Francisco de Sales Ramos da Costa, Gastão Rafael Rodrigues, Gaudêncio Pires de Campos, Germano Lopes Martins, Guilherme Nunes Godinho Helder Armando dos Santos Ribeiro, Henrique José Caldeira Queroz, Henrique José dos Santos Cardoso, Inocêncio Camacho Rodrigues, João Barreira, João Camilo Rodrigues, João Carlos Nunes da Palma, João Duarte de Menezes, João Luís Ricardo, João Machado Ferreira Brandão, Joaquim António de Melo Castro Ribeiro, Joaquim José Cerqueira da Rocha, Joaquim José de Oliveira, Joaquim Ribeiro de Carvalho, Joaquim Teófilo Braga, Jorge Frederico Velez Caroço, Jorge de Vasconcelos Nunes, José Afonso Pala, José António Simões Raposo Júnior, José Augusto Simas Machado, José Barbosa, José de Barros Mendes de Abreu, José Bernardo Lopes da Silva, José Botelho de Carvalho Araújo, José Dias da Silva, José Francisco Coelho, José de Freitas Ribeiro, José Jacinto Nunes, José Luís dos Santos Moita, José Mendes Cabeçadas Júnior, José Miguel Lamartine Prazeres da Costa, José Perdigão, José Pereira da Costa Basto, José Tomás da Fonseca, José Tristão Paes de Figueiredo, José do Vale Matos Cid, Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Luís Inocêncio Ramos Pereira, Manuel Alegre, Manuel de Brito Camacho, Manuel Pires Vaz Bravo Júnior, Miguel de Abreu, Pedro Alfredo de Morais Rosa, Pedro Januário do Vale Sá Pereira, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Porfírio Coelho da Fonseca Magalhães, Rodrigo Fernandes Fontinha, Tomé José de Barros Queiroz, Tiago Moreira Sales, Tito Augusto de Morais, Vítor Hugo de Azevedo Coutinho, Vítor José de Deus Macedo Pinto, Vitorino Henriques Godinho, Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Srs.: Adriano Mendes de Vasconcelos, Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá, António Afonso Garcia da Costa, António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, António Maria Malva do Vale, António Maria da Silva, António Pádua Correia, Artur Augusto Duarte da Luz Almeida, Emídio Guilherme Garcia Mendes, João Gonçalves, João Pereira Bastos, Joaquim Brandão, José Bessa de Carvalho, José Cordeiro Júnior, José Maria Cardoso, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, José da Silva Ramos, Manuel José da Silva, Sidónio Bernardino Cardoso da Silva Paes.

Não compareceram à sessão os Srs.: Afonso Augusto da Costa, Alexandre Augusto de Barros, Angelo Rodrigues da Fonseca, Angelo Vaz, António Amorim de Carvalho, António Caetano Celorico Gil, António Cândido de Almeida Leitão, António Flórido da Cunha Toscano, António Joaquim Granjo, António José de Almeida, António Maria de Azevedo Machado Santos, António Maria da Cunha Marques da Costa, Fernando da Cunha Macedo, Fernão Bôto Machado, Francisco José Pereira, Francisco Xavier Esteves, Henrique de Sousa Monteiro, João Carlos Rodrigues de Azevedo, João Fiel Stockler, João José Luís Damas, José Carlos da Maia, José Montez, Jovino Francisco de Gouveia Pinto, Júlio do Patrocínio Martins, Luís Maria Rosette, Miguel Augusto Alves Ferreira, Severiano José da Silva.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se á chamada. Faz-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 52 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.

Procede-se à leitura.

O Govêrno estava representado pelo Sr. Ministro do Interior (Silvestre Falcão).

O Sr. Presidente: - Estão já presentes 80 Srs. Deputados.

Está em discussão a acta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado pede a palavra considera-se aprovada. Vai fazer-se a leitura do

EXPEDIENTE

Ofícios

Do Ministério das Colónias, declarando, em satisfação

o requerimento do Sr. Deputado Casimiro Rodrigues de Sá, que foi nomeada uma comissão de inquérito á extinta inspecção Geral de Fazenda das Colónias, não tendo ainda sido publicado o seu relatório.

Relativamente a sindicâncias efectuadas nas colónias;

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foram pedidos os necessários esclarecimentos, que oportunamente serão transmitidos ao mesmo Sr. Deputado.

Para a Secretaria.

Do mesmo Ministério, enviando, com destino ao Sr. Deputado Manuel Pires Vaz Bravo Júnior, cópia do ofício acêrca dos abonos feitos ao antigo sub-inspector geral de Fazenda das Colónias, Domingos Eusébio da Fonseca.

Para a Secretaria.

No Ministério dos Negócios da Marinha, remetendo os documentos relativos ao maquinista-condutor, António Baptista, satisfazendo ao requerimento do Sr. Deputado José Botelho de Carvalho Araújo.

Para a Secretaria.

Do Ministério do Interior, remetendo cópia autêntica da acta da reunião de 7 de Julho de 1911, relativa às águas mínero-medicinais, realizada naquele Ministério, requerida pelo Sr. Deputado João de Barros Mendes de Abreu.

Para a Secretaria.

Do Ministério da Justiça, comunicando à comissão de finanças estarem, todos os documentos que interessem para o estudo do Orçamento Geral do Estado, à disposição da mesma comissão, indicando, porem, que sendo as cópias extensas, é difícil fornecê-las com prontidão.

Para a comissão de finanças.

Do mesmo Ministério, informando a comissão administrativa do Congresso que o mobiliário que existe no Paço da Ajuda não está sob a dependência daquele Ministério, mas sim do Ministério das Finanças.

Para a Secretaria.

Do Ministério das Colónias, comunicando, em satisfação do requerimento do Sr. Deputado José Tristão Paes de Figueiredo, não poder ser enviada cópia do relatório do tenente-coronel Garcia Rosado, visto aquele documento ser reservado.

Para a Secretaria.

Do mesmo Ministério, comunicando que na Direcção Geral de Fazenda das Colónias não existem os documentos acêrca do primeiro oficial de fazenda Carlos Alfredo Pinto de Lemos, pedidos pela comissão parlamentar de inquérito aos actos do actual director geral de Fazenda das Colónias.

Para a Secretaria.

Do governo civil de Aveiro, informando que o processo de sindicância contra o administrador do concelho de Espinho foi entregue directamente pelo sindicante ao Exmo. Sr. Ministro do Interior e deve existir na Administração Política e Civil, e que a reintegração daquele funcionário foi comunicada pelo telegrama do secretário do mesmo Ministro.

Para a Secretaria.

Telegrama

Tazem. - Presidente Câmara Deputados. - Lisboa. Demora aprovação projecto n.° 66, limitação região desde que firmam fazendo parte concelhos Gouveia e Ceia vem agravar situação económica desta região, pedimos maior urgência sua discussão e aprovação.

Vila Nova Tazem. - Sindicato Agrícola.

Para a Secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Artigo 1.° Os crimes previstos e punidos pelo artigo 170.° do Código Penal, ficam afectos aos tribunais ordinários e ao foro comum nos termos da lei geral.

Art. 2.° Os processos que dizem respeito a tais crimes passarão para os respectivos juizes, nos termos e altura em que estiverem.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrária e designadamente o artigo 5.° do decreto de 28 de Dezembro de 1910, na parte que diz respeito a êstes crimes.

Lisboa, 7 de Março de 1912.= Alberto de Moura Pinto.

Foi admitida e enviada à comissão de legislação criminal.

Artigo 1.° Fica o Govêrno autorizado a contrair um empréstimo de 750:000$000 réis para compra dum cruzador de cêrca de 2:000 toneladas e duma canhoneira (tipo Beira), de 400 toneladas, para fiscalização de pescas.

Art. 2.° O empréstimo será amortizado em dez anos, introduzindo se na rubrica "encargos da defesa móvel e aquisição directa de navios" a cota parte proporcional do empréstimo e juro relativo a cada ano, a partir do actual ano económico.

Art. 3.° O cruzador será construído no estrangeiro, mediante concurso aberto pelo Govêrno, entre casas estrangeiras, e deverá ser entregue dezoito meses depois da adjudicação.

Art. 4.° A canhoneira será construída no Arsenal da Marinha e no prazo de dois anos, sendo as máquinas fornecidas por casa estrangeira.

Art. 5.° O Ministro da Marinha nomeará uma comissão, perante a qual será aberto o concurso, de cinco membros, e o Parlamento elegerá dois oficiais Deputados.

Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrário. = O Deputado, Álvaro Nunes Ribeiro.

Foi admitido e enviado à comissão de marinha.

Artigo 1.° É autorizada a comissão municipal de socorros às vítimas do terramoto de 23 de Abril de 1909, de Benavente, a adquirir, com isenção d° pagamento de contribuição de registo por título oneroso, os terrenos de que carecer para construção dum bairro para pobres, amortizável por êstes em vinte anuidades, e bem assim para construção de quaisquer anexos ao mesmo bairro, tais. como lavadouro público, escola infantil, etc.

Art. 2.° Serão tambêm isentos de pagamento de contribuição de registo os contractos de compra e venda a prestações (ou como êsse direito melhor nome tenham), as aquisições feitas pelos pobres por que forem sorteadas as casas depois de construídas pela referida comissão municipal de socorros.

Art. 3.° É autorizada a Câmara Municipal de Benavente a aceitar a doação do direito às anuidades da amortização do bairro de que trata o artigo 1.°, com a cláusula de proceder anualmente à sua capitalização, só podendo aplicar o juro do capital, sucessivamente capitalizado à beneficência.

Art. 4.° A doação à Câmara Municipal de Benavente, de que trata o artigo 3.°, será isenta de pagamento de contribuição de registo por título gratuito.

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4 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrário. = O Deputado, José Montez.

Foi admitido e enviado à comissão de administração pública.

Artigo 1.° É estabelecido o princípio de que, em todas as cidades do país, os estabelecimentos comerciais não abrirão antes das oito horas nem encerrarão depois das vinte horas, de cada dia de trabalho.

Art. 2.° Os estabelecimentos de géneros alimentícios que vendam a retalho, ficam exceptuados dêste regime, salvo nos casos em que dois terços ou mais dos negociantes do mesmo ramo, é dirigindo-se à mesma clientela, assim o requeiram à municipalidade, ficando os restantes obrigados, mediante edital, a cumprir o horário estabelecido.

Art. 3.° O pessoal do estabelecimento não será obrigado a trabalhar mais de doze horas por dia, nos quais está incluído o tempo para a refeição; podendo no emtanto trabalhar depois de encerrados os estabelecimentos trinta dias em cada ano por ocasião do balanço, das festas ou princípios de estação, com prévio conhecimento da municipalidade.

Art. 4.° Os estabelecimentos comerciais estarão encerrados nos dias feriados decretados pela República.

Art. 5.° Não poderá ser permitida a venda fora dos estabelecimentos dos artigos similares aos dos estabelecimentos encerrados.

Art. 6.° Nos casos de infracção dêste regime, será observado o que dispõe a lei do descanso semanal, no que respeita a fiscalização e penalidades.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala da Câmara dos Deputados, em 8 de Março de 1912.= O Deputado, Manuel José da Silva.

Foi admitido e enviado à comissão de legislação civil'e comercial.

Artigo 1.° O Ministério do Fomento publicará anualmente, pelo menos, vinte boletins, ilustrados ou não, acêrca de assuntos agrícolas, florestais, geológicos, me teorológicos, coloniais e outros de interesse para a economia nacional. Êstes boletins serão até 64 páginas, habitualmente; serão escritos em linguagem concisa e ao alcance de todos; serão destinados principalmente à educação popular, e versarão um assunto o mais completamente possível, de acôrdo com os conhecimentos scienti-ficos e práticos actuais. Terão um formato uniforme e tomarão como modelos os publicados pelo Govêrno dos Estados Unidos da América do Norte, em boa adaptação ás nossas condições. Cada boletim será vendido, ao público, pelo preço de 40 réis.

Art. 2.° Para estas publicações serão destinados réis 4:000$000 anualmente. Todos os boletins que não forem necessários para as repartições, serão postos à venda com a melhor propaganda, especialmente nos concelhos, depois de se ter distribuído gratuitamente vinte exemplares por cada escola primária, secundária, superior e especial. De tempos a tempos far-se-há a reedição correcta dos boletins esgotados.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Câmara dos Deputados, 8 de Março de 1912. = Ezequiel de Campos.

Foi admitido e enviado à comissão de instrução primária e secundária e de instrução superior técnica e especial conjuntamente.

Artigo 1.° São concedidas à Câmara Municipal do Barreiro a propriedade e posse legítima de todos os terrenos a descoberto na baixa-mar de águas vivas, desde a Ponte da Passadeira até o Rio Coina, limite Este e Oeste do referido concelho.

§ único. Dentro de dois meses, a contar da data da promulgação desta lei, serão demarcados e entregues à câmara todos os terrenos a que o artigo se refere.

Art. 2.° A Câmara Municipal do Barreiro é obrigada a fazer concessões parciais dêsses terrenos quando êles se destinem ao estabelecimento de indústrias e armazéns de comércio, e todos os concessionários, de qualquer espécie de concessão, obrigam-se, dentro dos limites das concessões obtidas, â construção da muralha de defesa do rio, dos aterros e obras, em harmonia com uma planta geral que será elaborada pela Câmara, e os projectos por ela mencionados e depois aprovados nas estações técnicas competentes.

§ 1.° Os concessionários obrigam-se à construção mínima anual de 2:500 metros quadrados de terrenos concedidos, e ao emprego dos materiais indicados nos cadernos de encargos.

§ 2.° A Câmara Municipal do Barreiro pode, segundo os locais e épocas, cobrar qualquer quantia pelas concessões feitas nos termos desta lei.

Art. 3.° Por cada metro linear de muralha construída é o concessionário obrigado a aterrar 240 metros quadrados de terrenos, no sentido perpendicular â muralha construída, dos quais 200 metros quadrados lhe ficam pertencendo.

§ 1.° Dos 40 metros quadrados restantes, reduzidos a faixa linear, são os primeiros 20 metros quadrados destinados à construção duma avenida marginal, e os outros 20 metros quadrados a uma avenida paralela a esta, ao fim dos 200 metros quadrados da concessão, ambas da largura mínima de 20 metros.

§ 2.° Constitui obrigação do município a construção das avenidas referidas no parágrafo anterior, bem como de 25 ruas longitudinais, na largura mínima de 10 metros, que serão logradouro público.

Art. 4.° As concessões parciais dêstes terrenos não podem exceder uma quantidade superior a 10:000 metros quadrados, salvo no caso excepcional do estabelecimento duma grande indústria.

Art. 5.° Todos os terrenos concedidos somente são considerados propriedade dos concessionários depois do cumprimento de todas as obrigações consignadas nesta lei e daquelas que, anteriormente à concessão, sejam impostas pelo município, importando o seu não cumprimento na perda total de todos os direitos e bemfeitorias realizadas nos mesmos.

Art. 6.° Os concessionários não podem negociar por nenhuma forma a concessão obtida, sem o cumprimento integral de todas as obrigações desta lei.

§ único. Em caso de morte ou falência, são todos os sucessores considerados com as mesmas obrigações dos primeiros concessionários e como tal sujeitos a todas as disposições desta lei.

Art. 7.° Todas as concessões devem principiar no sentido Oeste-Este, e ligadas sempre do seu início, salvo nas concessões em que se construa uma extensão de muralha de 20 a 50 metros lineares.

Art. 8.° A Câmara Municipal do Barreiro não pode conceder nem alienar, conservando-os perpetuamente como municipais, os terrenos a Oeste da praia do Barreiro, a partir do Rio Coina, numa faixa da extensão de 200 metros, ficando somente autorizada a dispor da quarta parte desta superfície para arrendamentos ou cessões parciais gratuitas, sem inalienabilidade, quando estas se destinem a cooperativas de produção, exclusivamente formadas por operários, e à edificação de escolas e estabelecimentos de assistência e beneficência, embora de exploração industrial.

Art. 9.° Três quartas partes dos terrenos inalienáveis tem de ser destinados à construção das muralhas, cais,

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docas e uma ponte, de exploração municipal, que permita a atracação de vapores de longo curso, e à construção de hangares e armazéns de retêm e exportação ou ainda à exploração de qualquer indústria por conta do município.

Art. 10.° A Câmara Municipal do Barreiro pode, por contractos especiais, entregar, por prazos determinados, nunca superiores a noventa anos, a exploração total ou parcial dos terrenos referidos no artigo anterior, quer por arrendamento ou quer por melhoramentos a realizar nos mesmos, constituindo condição irrevogável de qualquer contracto de arrendamento total ou parcial a construção das muralhas, cais, docas e ponte para navios de longo curso.

§ único. Todas as propriedades existentes, bemfeitorias, obras e melhoramentos realizados nesses terrenos, findo o prazo máximo de qualquer contracto da sua exploração, ficam pertencendo ao município do Barreiro.

Art. 11.° A Câmara Municipal do Barreiro fica obrigada, no prazo máximo dum ano, a elaborar uma planta geral de todas as obras que, juntamente ás respectivas memórias descritivas e cálculos justificativos, tem de ser submetida à aprovação das estações técnicas competentes e, findo o prazo de cento e vinte dias, a contar da data da sua apresentação, conservar-se há para todos os efeitos aprovada, não obtendo, dentro dêste prazo, a sanção dessas estações.

§ único. Todas as alterações dessa planta e todos os outros projectos complementares ficam sujeitos ás disposições dó artigo anterior.

Art. 12.° Os concessionários, seus concessionários e sucessores, reconhecem para todos os efeitos a jurisdição portuguesa.

Lisboa e Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 8 de Março de 1912. - Gastão Rafael Rodrigues.

Foi admitido e enviado à comissão de obras públicas.

Artigo 1.° É concedida ao tenente de infantaria, António Pires Pereira Júnior, e igualmente ao tenente de artilharia, Alberto Camacho Brandão, a pensão anual e vitalícia de 1:200$000 réis, livre de todos os descontos, pelos serviços relevantes prestados á República nos dias 4 e 5 de Outubro de 1910.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das sessões, em 5 de Março de 1912. = O Deputado, António Gr anjo.

Foi admitida e enviada à comissão de guerra.

Proposta de lei

Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a transferir por meio de decreto publicado no Diário do Govêrno, do artigo 55.° para o artigo 68.° do capítulo 4.° do Orçamento de despesa do Ministério do Fomento para o corrente ano económico de 1911-1912 a importância de 8:178$000 réis, a fim de ser destinada à instalação eléctrica do edifício onde funcionam os Institutos Superiores Técnico e do Comércio, e à aquisição do material para o ensino de mecânica e electrotecnia aplicadas.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Ministério do Fomento, em 8 de Março de José Estêvão de Vasconcelos.

Foi admitida e enviada à comissão de finanças. Tem tambêm segunda leitura a seguinte

Proposta

Proponho que seja nomeada uma comissão para elaborar o projecto de lei reguladora das eleições distritais, municipais e paroquiais. Sala das sessões da Câmara, em 7 de Março de 1912.= Santos Moita.

Lê-se na mesa a proposta do Sr. Santos Moita.

Foi aprovada.

Não tendo que ir à comissão, é posta em discussão, sendo aprovada sem debate.

O Sr. Presidente: - Consulto a Câmara sôbre se a comissão a eleger, em virtude da proposta que acaba de ser aprovada deve ser eleita pela Câmara ou nomeada pela mesa.

Vozes: - A mesa.

O Sr Brito Camacho: - V. Exa. dá licença? Lembro-me que se assentou em que essa comissão fôsse nomeada pela mesa, mas com representação de cada um dos grupos políticos da Câmara.

O Sr. Presidente: - A mesa procede sempre assim. Quando se trata da nomeação destas comissões, todos os grupos políticos tem representação. Chamo a atenção da Câmara.

Acaba de ser comunicada à mesa a morte do pai do nosso colega, o Sr. João Fiel Stockler, e dum irmão do Sr. Deputado José Afonso Pala; proponho, por isso, que na acta da sessão de hoje, se lance um voto de sentimento pela mágoa que, com certeza, assiste a êstes dois nossos colegas.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai abrir-se a inscrição para antes da ordem do dia.

Vários Srs. Deputados pedem a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Silva Gouveia.

O Sr. Silva Gouveia: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: há onze dias que pedi a palavra para interpelar o Sr. Ministro das Colónias acêrca duma circular vinda de Hamburgo, que é muito importante, e deve merecer toda a atenção da Câmara. Recebeu geralmente todo o comércio de Lisboa uma circular dum negociante, juntamente com uma carta, para os Srs. Deputados verem, que está na mesa, dizendo nesta circular que não mandava mais os seus navios á Guiné em consequência do estado deplorável em que estão as pontes daquela província. Realmente aã pontes não existem; levou-as um tufão.

Tenho de fazer sciente à Câmara como foi que o Govêrno adquiriu essas pontes. O que é para lastimar, é que ainda não estejam feitas e que um dos primeiros negociantes e Senador em Hamburgo, diga que nós não podemos ter Colónias em virtude do estado de atraso era que nos encontramos.

Ora eu tenho de fazer sciente aos Srs. Deputados, que eu há dez anos fiz uma proposta ao Govêrno para fazer as pontes acostáveis em Bissau e Bolama. Foi-me dada essa concessão pela Junta Consultiva do Ultramar; fiz o depósito na Caixa Geral de Depósitos; mas qual não foi a minha surpresa, quando recebi um ofício em minha casa em que se me dizia: apareça você no Ministério para assinar a escritura. Fui ao Ministério das Colónias, e apresentam-me um cartapácio para assinar. Disse então que sendo um homem que não tinha exame de instrução primária, não iria assinar uma escritura, sem ter um prazo de dias para a ler. Preciso de 15 dias para a

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estudar. "Ora essa", disseram-me, "então o Sr. duvida de nós" ? Em virtude desta resposta passei os olhos pela escritura, e vi tantas dificuldades que fiz um requerimento ao Sr. Ministro das Colónias pedindo o levantamento do depósito. Eram de tal maneira as peias, que levantei o dinheiro. Pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as pontes nunca se fizeram. Dizia o Govêrno, naquela época monárquico, já se vê, vamos fazer as pontes, mas nunca se fizeram.

Ora as pontes. As pontes pertenciam às Câmaras Municipais de Bissau e Bolama; o Govêrno por Decreto do Sr. Ferreira do Amaral, chamou a si as casas e as pontes recebeu a receita, reduziu o mais que pôde as comissões municipais, e nós ficámos sem pontes e não temos onde embarcar.

Desembarcou outro dia um desgraçado ás costas dum preto, caiu o preto e partiu uma perna.

Aqui tem V. Exa. o estado decadente em que se encontra a província da Guiné. Eu chamo a atenção do Sr. Ministro das Colónias e da Câmara, porque não podemos viver no estado decadente em que temos vivido. S. Exa. já teve a amabilidade de me dizer que se estava estudando o assunto. Eu posso informar a Câmara que os estudos estão feitos, e, se o Sr. Ministro das Colónias quiser examiná-los, apresentá-los hei em 48 horas. Posso garantir à Câmara que as sondagens estão feitas, tanto em Bissau como em Bolama.

Não há iniciativa? Há, Sr. Presidente, é a iniciativa particular, e se mais não avança, é porque não querem.

Como sei que o Sr. Ministro das Colónias tem muita vontade em desenvolver as províncias ultramarinas, peço a S. Exa. que tome em consideração a província da Guiné visto que se está regulando o respectivo Orçamento da Província. Quando êle for apresentado, eu aqui estarei para dizer a verdade. Estou aqui com a autoridade com que muitos não estão, e, por isso, tenho o direito de exigir do Govêrno que olhe com atenção para aquela Província. Tenho a certeza que o Sr. Ministro das Colónias se não faz mais é porque mais não pode fazer.

Vou agora referir-me a S. Tomé.

Foram repatriados de S. Tomé para Angola no mês de Janeiro 280 serviçais, e no mês de Fevereiro 310.

É preciso que não vivamos de lendas, e muito menos que essas lendas se escrevam. Eu não sei exprimir-me, por linhas tortas.

Êstes desgraçados são repatriados, e sabe V. Exa. onde os colocam? No litoral; comem-lhes os vintenzinhos e se êles querem voltar para S. Tomé não lhes consentem.

O Sr. Presidente: - S. Exa. tem mais um minuto, para concluir as suas considerações.

Vozes: - Fale; fale.

O Orador: - Isso é muito pouco.

Depois de lhes comerem o dinheiro, obrigam-nos a trabalhar no Caminho de Ferro do Lobito e não os deixam ir para as suas terras.

Isto que eu acabo de dizer é unicamente para que os Srs. Deputados, e o Sr. Ministro das Colónias vejam bem o estado em que se encontram aqueles desgraçados.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Colónias.

O Sr. Ministro das Colónias (Cerveira de Albuquerque): - Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as considerações feitas pelo Sr. Deputado Silva Gouveia, considerações que eu acho muito sensatas.

Sei que essas pontes da Guino se acham completamente destruídas, e que, já no tempo do meu antecessor, se havia dado ordem para se fazerem os estudos dessas pontes.

Ainda há poucos dias, quando o Sr. Silva Gouveia me falou, sôbre o assunto, eu tratei de indagar, se êsses estudos estavam feitos, e tive conhecimento de que o não estavam, mas em via de conclusão.

Julgo, pois, que, nesse ponto, S. Exa. deveria ficar satisfeito com a minha resposta.

É certo estar S. Exa. com a palavra reservada desde alguns dias, mas se aqui não tenho comparecido, não foi por falta de consideração para com S. Exa.

Uma interpelação no Senado, e os muitos afazeres no meu Ministério tem sido a causa da minha ausência.

Entretanto, o que nós podemos fazer, é modificar a lei, tornando-a mais prática, eficaz e perfeita. Alterar, porêm, as disposições actuais, por maneira violenta, não se pode fazer. Eu bem sei que a questão da repatriação dos serviçais tem prejudicado algumas roças. Todavia, tenho procurado remediar todos os inconvenientes, e, assim, tenho mandado vários telegramas para o Governador e para o curador recomendando-lhes que empreguem todos os meios legais para evitar a crise de trabalho nas roças. Ainda há pouco tempo, há dois dias, alguém me foi procurar muito aflito, porque lhe constara que uma roça que tinha 470 serviçais ia repatriar 450 e tantos, ficando só com menos de 20 serviçais. Era realmente uma questão grave; mandei imediatamente um telegrama dizendo ao Governador que empregasse todos os meios para que êsse facto se não dêsse que incontestavelmente representava uma alta inconveniência. Tive resposta de que os serviços da roça estavam completamente assegurados, porquanto se tinha demorado a repatriação até Maio.

Era isto o que eu tinha a dizer ao Sr. Deputado Silva Gouveia, e acrescentarei que se S. Exa. se interessa, como verdadeiro patriota e colonial, pelo desenvolvimento e progresso das nossas colónias eu não me interesso menos. S. Exa. afirmou que eu podia desconhecer certas cousas que se passam nas províncias ultramarinas. É possível que eu não esteja bem ao facto de tudo quanto se passa pelo Ministério das Colónias, mas hei-de estudar todas as questões, para tomar as providências necessárias. (Apoiados).

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Manuel Bravo.

O Sr. Manuel Bravo: - Sr. Presidente: chamo a atenção do Sr. Presidente de Ministros para o assunto que vou tratar.

Li em dois jornais de Lisboa, uma notícia que se me afigura grave, a qual dizia respeito à última greve havida em Lisboa.

Preciso ouvir da parte do Govêrno explicações a fim de que acabem - se porventura as há - as especulações de carácter político em volta dessa greve.

Isto não pode ser indiferente para a marcha do Govêrno e da política geral do pais, porque revela um estado bem grave duma parte da sociedade portuguesa.

Diz-se que a última greve de Lisboa havia sido, dalguma forma, estimulada, senão auxiliada por elementos reaccionários.

Contra êsse facto protestam os operários e, a meu ver, em bem fundada razão.

Não quere isto dizer que o elemento reaccionário, cle-

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rical, não aproveitasse o estado de perturbação em que a greve vinha lanhar o país, para que tirasse dele proveito, mas, é necessário que sejamos justos, ainda mesmo com os nossos mais irredutíveis inimigos, e eu não poderia consentir que os meus correlegionários, meus antigos companheiros de luta, pudessem hoje afirmar que os nossos inimigos de hoje, os sindicalistas e os nossos inimigos de sempre, os anarquistas, procuravam dar-se as mãos com os elementos reaccionários a fim de derrubarem a República Portuguesa.

Essa acusação considera-a o operariado caluniosa e infamante. (Apoiados). Essa acusação não pode ficar nem mais um instante de pé.

Mas, Sr. Presidente, os operários grevistas, que não podem de maneira alguma assumir a responsabilidade de todos as elementos que se tivessem confundido com a greve, (Apoiados) os operários grevistas de Lisboa e de todas as localidades onde a greve se manifestou, não são solidários, nem querem solidariedade, com aqueles elementos que, nas horas torvas e agitadas, iam procurar a sua sinceridade para dela fazerem instrumento de ruins paixões.

Êles não repelem com palavras essa acusação infamante e caluniosa, êles vem com factos materiais, com a responsabilidade moral daqueles que contra isso depõem, dizer que houve elementos políticos, maus políticos e piores cidadãos (Apoiados) que se aproveitaram da sua sinceridade, do seu estado de espírito, da sua revolta, não sei se justa, se injusta, se legítima, se ilegítimo, mas aproveitaram-se da sua sinceridade, do seu movimento, para especular contra a República e contra alguns homens públicos da República.

Assim é que, Sr. Presidente, segundo êsses depoimentos, houve agremiações políticas que se dirigiam á casa sindical, pedindo-lhe o seu compromisso, a fim de que, simulando um movimento grevista, viessem para a rua assaltando e matando.

É assim que, segundo êsses depoimentos, um político em evidência, da República, estava ameaçado de morte. O próprio Presidente da República corria o risco de ser morto, e eu não posso tomar de ânimo leve, e com indiferença, estas afirmações, porque quem as faz merece o conceito de alguém que, nesta Câmara, tem autoridade moral para falar.

Sr. Presidente: num jornal que se diz órgão das classes trabalhadores, defensor dos intereses dessas classes, diz-se que alguém em nome duma agreamiação política, se dirigiu ao comité executivo da casa sindical, propondo lhe uma entente para que fôsse dalguma forma dado um golpe de Estado, com o sacrifício da vida dalguns republicanos.

E essa agremiação política, Sr. Presidente, oferecia armas e planos.

Êsse facto foi afirmado por um operário, com a sua autoridade moral de antigo revolucionário, que o diz bem alto e sem receio de ser desmentido.

Êsse operário afirma que com os outros companheiros, foi até levado a reunir com êsses elementos políticos em que entravam militares de galão, afim de que o movimento grevista pudesse prolongar-se por mais vinte e quatro horas, porque durante êsse tempo se esperava que os maus desígnios dos aventureiros pudessem produzir efeito.

Não sei? Sr. Presidente, se o Govêrno tem elementos seguros, para poder afirmar que conhece os factos e delimitar a importância que êles podem e devem ter.

Com certeza que o Govêrno, pela mesma origem, pelo menos, que eu os conheci, os deve conhecer tambêm.

Não sei o que o Govêrno fez, mas espero saber o que tenciona fazer.

O Sr. Presidente: - Previno o Sr. Deputado de que faltam dois minutos para terminar as suas considerações

O Orador: - Espero, Sr. Presidente, que o Govêrno, sabendo defender Os interesses da República e do poder, há-de diligenciar e oferecer todas as garantias, a fim de que um inquérito rigoroso se faca para que as responsabilidades, de possuem quer que seja, imediatamente se tomem e se possa desta forma saber com quem se pode contar, em defesa da República e da ordem.

Há muito tempo que, contra a República e contra alguns republicanos se tem feito uma especulação ignobil e torpe que é necessário acabar. (Apoiados).

Tenho a hombridade e a lialdade de confessar que me sinto nesta ocasião, adversário irredutível dos partidos constituídos dentro da República, mas não posso, Sr. Presidente, porque nunca o fiz, ser deslial com pessoa alguma, e essa deslialdade, Sr. Presidente, que seria infamante e humilhante para mim, seria ao mesmo tempo perigosa para todos aqueles que, só pela simpatia ou antipatia política, pudessem deixar as instituições à mercê dos primeiros aventureiros.

E por isso, Sr. Presidente, que eu, para salvação da República, não hesito em unir-me com todos os republicanos, sejam êles quais forem, tenham êles a política que tiverem.

Se, para a administração do país eu divirjo e adopto processos diversos, para a defesa da República, confundo-me com êles, porque tenho a mesma lialdade e os mesmos deveres.

Mas, Sr. Presidente, o caso da greve tem sido torpemente explorado e é necessário que acabe.

Sr. Presidente: julgo do meu dever, de republicano e de português, defender os interesses do meu país e os da República, não permitindo que, em volta dum movimento da importância do que foi o de 29 e 30 de Janeiro, alguém venha com má fé, ou com ruins paixões, explorar a sinceridade e a dedicação dos republicanos. (Apoiados).

Espero, pois, que o Govêrno dará à Câmara as mais precisas e claras explicações, sôbre o assunto, e que adoptará todas as providências, afim de que toda a gravidade e responsabilidade dêstes factos, fique apurada, de maneira que elas só venham a pertencer a quem devam pertencer. (Apoiados).

Peço a V. Exa., Sr. Presidente, que me reserve a palavra, para responder ao Sr Presidente do Ministério, caso, as explicações de S. Exa., não me satisfaçam.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos):- Assim que os factos apontados pelo Sr. Deputado Manuel Bravo chegaram ao conhecimento do Govêrno, imediatamente êste tomou providências. Há tempo já que corriam, efectivamente boatos; mas somente sôbre boatos o Govêrno não podia proceder.

O Sr. Ministro do Interior encarregou as autoridades respectivas de fazer um inquérito administrativo e o Sr. Ministro da Justiça deu as suas instruções aos Delegados do Ministério Público para que interviessem na averiguação de todas as responsabilidades.

Assim mostrou o Govêrno o empenho que tem em que se apurem todas as responsabilidades, que houve tanto nesses acontecimentos passados, como em outros, que há muito tempo, em águas revoltas da República, vinham agitando-se.

O que se faz é uma especulação política. Assim atribui-se ao Govêrno, e continuam a atribuir-se ao chefe do Govêrno, intenções e palavras que êle não pronunciou.

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Ora a verdade é o Govêrno [...]a disse que os operários conspiravam.

O Sr. Casimiro de Sá: - Disse, [...]

O Orador (com energia): [...] procuraram [...] que querem explorar [...] acontecimentos é que afirmam o [...].

Muito serenamente o orador afirma à Câmara que tudo se há-de apurar devidamente. Deve, porem, notar que, sempre que em Lisboa ou em outra qualquer cidade se provoca um movimento qualquer, imediatamente os reaccionários pretendem explorá-lo. O Govêrno tem disso provas. Assim, na Galiza imediatamente se produziu um movimento, que procurou proceder de combinação com os elementos de Lisboa. Esta é uma verdade indiscutível e o Govêrno sempre o afirmou.

Nunca pela mente do Govêrno passou que as classes operárias, que prestaram relevantes serviços à República, estavam ao serviço dos reaccionários. O que disse foi que ON elementos reaccionários queriam explorá-las.

O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Presidente: - Vai passar se à ordem do dia. Os Srs. Deputados que tenham papéis a mandar para a Mesa, podem fazê-lo.

Requerimentos

Requeiro que a sessão seja prorrogada até a votação da matéria que constitui a primeira parte da ordem do dia. = Lopes da Silva.

Foi aprovado.

Requeiro que me seja fornecido pelo Ministério do Fomento, o inquérito industrial de 1890 e o de 1881.

Igualmente peço me sejam fornecidos pelo Ministério dos Estrangeiros, os volumes publicados com a rubrica Negócios de África, correspondência, negociações e tratados com a Inglaterra, de J889 a 1891, e igualmente Memória apresentada pelo Govêrno Português sôbre a questão entre Portugal e a Gran-Bretanha, sujeita à arbitragem do Presidente da República Francesa a respeito da baía de Lourenço Marques. = Lisboa, 1873. = Henrique Cardoso.

Para a Secretaria.

Mandou-se expedir.

Requeiro que, pelo Ministério do Fomento, me seja enviado o 3.° volume do Censo da População do Reino em 1890. = Porfirio da Fonseca Magalhães.

Para a Secretaria.

Mandou-se expedir.

Requeiro a V. Exa., Sr. Presidente, se digne solicitar do Ministério das Colónias autorização para eu consultar o relatório e proposta do governador de Timor sôbre o aumento do imposto de capitação naquela nossa colónia. E assim, tambêm eu desejava consultar todos os mapas estatísticos relativos à arrecadação das receitas durante os últimos cinco anos na colónia de Timor.

Saúde e Fraternidade.

Sala das Sessões, em 11 de Março de 1912. = António Paiva Gomes.

Mandou-se expedir.

Requeiro que pelo Ministério do Interior, Direcção Geral dos Serviços da Instrução Primária, me seja enviada, com a brevidade possível, uma nota com a designação de todas as escolas primárias que se acham fechadas, descriminando as que estão providas das que estão vagas. = O Deputado, J. Jacinto Nunes.

Mandou-se expedir.

Requeiro que, com toda a urgência, pelo Ministério das Colónias, Direcção Geral da Fazenda das Colónias, me seja enviada nota especificada das verbas gastas pelo ex-alto comissário da província de Moçambique, Dr. Azevedo e Silva, e devidamente autorizadas, e bem assim nota detalhada das verbas que foram gastas pelo mesmo ex-alto comissário, e para cuja despesa não havia nem houve autorização.

Requeiro ainda que me seja enviada nota do pessoal nomeado pelo mesmo ex-alto comissário, e conseqúentemente nota da despesa acarretada por essas nomeações. = José de Abreu.

Mandou se expedir.

Requeiro que, pelo Ministério do Fomento, me seja fornecido um exemplar dos relatórios, sôbre o ensino elementar industrial e comercial do inspector António José Arroio.

Lisboa, 11 de Março de 1912. = Eduardo de Almeida.

Mandou-se expedir.

Requeiro com urgência, pelo Ministério do Interior, Direcção Geral da Assistência Pública, me seja enviada nota de onde conste a situação em que se acha o antigo capelão do Hospital da Rainha D. Leonor, das Caldas da Rainha, o padre Constantino Sangreman Henriques. = O Deputado, Afonso Ferreira.

Mandou-se expedir.

Requeiro que, pelo Ministério dos Estrangeiros, me seja concedida autorização para consultar todos os processos de delimitação de fronteiras, entre Portugal e Holanda, relativos à colónia de Timor. = Paiva Gomes.

Mandou-se expedir.

Nota de interpelação

Renovo, junto de Exmo. Sr. Ministro do Interior, o meu desejo de interpelação sôbre a dissolução da Comissão Administrativa da Câmara de Gaia. = Costa Basto.

Mandou-se expedir.

Proposta de lei

Do Sr. Ministro do Interior. É o Govêrno autorizado a abrir um crédito de 50.000^000 réis para ocorrer ás despesas extraordinárias a efectuar com o combate e tratamento da epidemia da febre tifóides em Lisboa e bem assim socorrer as famílias dos doentes pobres.

A publicar no "Diário do Govêrno", para ser submetido à admissão.

Justificação de faltas

Mando para a mesa justificações de faltas a várias sessões os seguintes Srs. Deputados:

Porfírio Coelho da Fonseca Magalhães.
António Augusto Pereira Cabral.

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Henrique de Sousa Monteiro.
João Carlos Nunes da Palma.

Para a comissão de infração e faltas.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do parecer n.° 102

O Sr. Presidente: - Tem a palavra sôbre a ordem, o Sr. Deputado Alexandre Braga.

O Sr. Alexandre Braga (sobre a ordem): - Sr. Presidente: em observância das prescrições regimentais, começo por mandar para a mesa a seguinte moção, que é, quási textualmente, a reprodução da moção apresentada pelo Sr. Deputado Brito Camacho, acrescentando-se-lhe apenas umas palavras que a completam, que a esclarecem e a tornam, creio eu, aceitável por todos os grupos da Câmara.

É a seguinte

Moção

A Câmara, reconhecendo que a nomeação do Sr. Fernão Bôto Machado para Ministro Plenipotenciário da República Argentina se fez com preterição dalgumas formalidades legais, preterição, que com idêntica natureza se deu em muitos diplomas, emanados de vários dos Ministérios do Govêrno Provisório; mas considerando que a Procuradoria Geral da República não encontrou nessas formalidades preteridas nenhuma que implicasse nulidade intrínseca, e tendo em- vista, finalmente, que o Conselho Financeiro do Estado já reconheceu valor de decretos e declarações publicadas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, nos termos do artigo 12.° do decreto de 11 de Abril de 1911, aceita a renúncia de Deputado que faz o Sr. Bôto Machado e emite parecer de que as formalidades preteridas não são de natureza a invalidar a promoção do mesmo funcionário para chefe de Legação. = O Deputado, Alexandre Braga.

Sr. Presidente: eu tenho por costume falar claro, chamando às cousas pelos seus nomes, expressando-as pelas palavras que, própriamente, as definem, e pondo, como se usa dizer, os precisos pontos nos ii.

É política ou impolítica a minha oratória? Não sei, nem me importa sabê-lo. Esforço-me por ser sincera e verdadeira, e é ÍSBO o que unicamente me interessa e me preocupa.

Julgá-la-hão impolítica e inábil aqueles que consideram a política como uma arte de sábias manhas e artificiosos disfarces; mas aqueles que não aproveitem a política como instrumento de ambicioso engrandecimento próprio, e só a encarem como processo e como meio de engrandecimento pátrio, hão-de compreender e amar bem mais a transparência das ideias, pobres ou ricas, obscuras ou brilhantes, mas sinceras e corajosas, que as minhas claras palavras não disfarçam, do que a enrodilhada e astuciosa algaravia com que se notabilizaram, dentro da monarquia, algumas famosas raposas, por cujas artes maléficas e diabólicas se preparou a pior e máxima parte da nossa desonra e da nossa ruína.

Quere isto dizer, Sr. Presidente, que neste debate eu usarei do meu habitual processo, indo direito ao fundo mesmo da questão, encarando-a em toda a sua nudez, com rudeza e com desassombro, sem me preocupar com rodeios hábeis que, as mais, das vezes, só servem a encobrir as peores malfeitorias morais, colorindo-as com aquela aparência de simulada honestidade de intuitos, que é a máscara habitual de todos os tartufos, de todos os invejosos e de todos os mesquinhos. (Apoiados).

E esfôrçar-me hei tambêm - é claro, e bem que pese aos que me acusam de fazer discursos estudados - por me expressar com pureza de forma e respeito artístico pela suprema beleza da nossa língua, ao mesmo tempo que me não pejarei de mostrar que, sempre que possa fazê-lo, me preparo com reflexão, cuidado e estudo, para dispor, com método, a ordem das minhas poucas e pobres ideias, de maneira que do meu discurso resulte qualquer cousa de compreensível, e não uma indigesta barafunda de palavras sem tem nem som, gritadas numa mímica clownesca.

Não sofrerei assim o castigo de ter de envergonhar-me de mim próprio, alterando amanhã, impudicamente, ao ter de escrevê-lo para público, tudo quanto disse e a forma por que o disse, processo de descaro e de charlatanismo, que, infelizmente, eu tenho visto empregar com um audacioso despejo, que causa repulsão e provoca engulhos.

É apagado, é intelectualmente medíocre e mesmo inferior o que vou dizer ? Paciência: mas medíocre e inferior como o produzirei, será, inalterávelmente, o que me hei-de atribuir no papel impresso, com toda a possível justeza e fidelidade.

Não farei acrobatismos de imagens espectaculosas, não agitarei falsas lantejoulas e vistosos européis duma oratória sem escrúpulos, de dentista, atropelando as palavras, a gramática e a significação própria dos termos; não serei vistoso, nem brilhante, nem teatral, embora oco e banalíssimo, mas o pobre esqueleto do meu pobre discurso apresentá-lo hei sempre inteiro, com todos os seus números e com todos os seus fémures, sem que haja de condenar-lhe à macabra engulidela dalguma das suas partes, de que, espectaculosamente, me tenha servido, para com ela rufar no espaventoso tambor das imagens desenfreadas.

É triste, Sr. Presidente, é profundamente triste e profundamente lamentável, que, num momento em que tantos, tam importantes e tam graves assuntos demandam a atenção e o estudo da Câmara, estérilmente se percam dias e dias num debate frívolo, em sua essência e em seu significado, antipático pelos mesquinhos intuitos de intriga política que o caracterizam, intuitos mal disfarçados numa postiça aparência de fingida moralidade, que a ninguêm engana, que a ninguêm pode iludir (Apoiados). Quando toda a opinião sensata e verdadeiramente patriótica da nação deseja o apaziguamento das paixões políticas, para que, num período de calma, de reflexão e de estudo, se busque encontrar solução aos instantes problemas da nossa economia, remediando, na medida do humanamente possível, a difícil situação que a monarquia nos legou, num momento de excepcional gravidade e, de pesadas responsabilidades, como é o actual (Apoiados) - é que vem reincidir-se nos velhos e desacreditados processos de política de soalheiro e conventínculo, agarrando os pretextos pelos cabelos, para procurar atingir individualidades prestantes, cujo prestígio e cujos serviços estão, felizmente, muito acima de todas as envenenadas e invejosas campanhas com que pretendem demoli-las (Apoiados).

Porque, Sr. Presidente, a que é que vem todo êste ruidoso e agitado debate sôbre a legalidade da forma porque foi nomeado o Sr. Fernão Bôto Machado? O que tem de discutir-se é o parecer da comissão parlamentar sôbre o pedido de renúncia do seu lugar de Deputado, que êsse senhor apresentou. Aceita ou não a Câmara essa renúncia? (Apoiados). E isto e só isto o que tem de decidir-se; tudo o mais é impertinente, artificioso, forçado. Mas isto pode dizer-se que é o que menos tem importado, porque, para os verdadeiros intuitos dalgumas pequeninas almas de medíocres invejosos, êste debate é apenas uma oportunidade que se aproveita para mais uma vez jogar golpes traiçoeiros à individualidade do nobre português que se chama Bernardino Machado, a quem todos nós e a República devemos uma alta gratidão pelos seus serviços, pela sua dedicação nunca desmentida, e um alto respeito pela sue envergadura moral, pela sua cultura e pela sua intelectualidade invulgares (Apoiados).

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Ninguém ousa dizer que êle haja praticado jamais qualquer acto ditado por um propósito menos correcto, ou menos moral (Apoiados). Todos reconhecem, e o afirmam, que as pretendidas preterições de formalidades de que o acusam, ainda quando demonstradas, são de natureza idêntica às que em muitos outros diplomas do Govêrno Provisório, se praticaram, emanando de outros ministérios e doutros Ministros. Todos confessam que tais preterições foram exclusivamente devidas às excepcionais circunstâncias do período em que teve de produzir-se a obra do Govêrno Provisório - obra de apressada febre, que requeria presteza, decisão, energia; obra de afirmação, demolidora e construtiva; obra de paz e obra de guerra, que não comporta a minúcia e a paciência burocrática das fórmulas, muitas vezes impeditivas, e sempre morosas, embaraçantes, dilatórias. E se todos isto reconhecem, se a própria moção apresentada pelo Sr. José Barbosa confessa que não pode atribuir-se-lhe a mínima intenção culposa, como é que essa mesma moção conclui pretendendo relevar de imaginosas responsabilidades o Ministro, que ela reconhece que em nenhuma responsabilidade incorreu? (Apoiados). Sim; porque é axiomático e bem acessível à compreensão de todos os espirites, que, reconhecendo alguém na prática dum acto uma perfeita ausência de intenção de incorrer em irregularidade, êsse alguém não tem, logicamente, o direito de supor responsabilidade punível no agente dêsse mesmo acto. Isto, que é evidente, intuitivo, indiscutível para o mais boçal dos fiéis defeitos, parece desconhecê-lo a moção do Sr. José Barbosa, que, começando por justificar a prática do facto, quere concluir, no entretanto, pela absolvição da responsabilidade daquele cujo acto justificou.

Interrupção do Sr. José Barbosa que se não ouviu.

Ah! perdoe-me o meu ilustre colega que lho diga, mas um tal processo de raciocínio assemelha-se muito aos desvairados e habituais processos da perfídia vesga, dissimulada, ardilosa, traiçoeira. O Sr. Dr. Bernardino Machado não necessita que ninguêm o defenda.

Uma voz: - Muito bem.

Melhor do que todas as defesas o escuda a inalterável correcção do seu proceder, sempre inspirado num alto e desinteressado amor pela República e pela Pátria. Mas é sempre bom afirmar-se que, se os actos do Govêrno Provisório foram geralmente ditados por um grande espírito de isenção pessoal e de devotado amor pela causa republicana, os actos do Ministro dos Estrangeiros dêsse Govêrno, foram invariavelmente inspirados no nobre desejo de concorrer para a obra de Justiça e pacificação política, que a consolidação da República imperiosamente demandava. Sabem-no, dentro desta Câmara e fora dela, muitas individualidades pertencentes a todos os partidos, porque todas elas tiveram ocasião de ver que, naquele Ministério, muitas vezes o desejo, a escolha e a vontade pessoal do Ministro cederam o seu lugar e foram preteridas pelas indicações do interesse republicano, que lhe eram apresentadas pelos representantes do todos os grupos partidários. (Apoiados).

Entremos, porêm, própriamente no assunto do debate que vem travado.

Todo êle, originariamente, se filia num acto abusivo, ilegal e impertinente do Supremo Conselho de Administração Financeira do Estado.

De facto, eu perguntei aqui ao Sr. José Barbosa qual era a disposição legal em que o referido Conselho havia encontrado fundamento, para ousar arrogar-se uma atribuição que o seu estatuto orgânico lhe não confere.

Todos viram que o Sr. José Barbosa não pôde indicar-me disposição alguma que a tanto autorizasse o Conselho de Administrarão Financeira.

Como é então que um tal organismo se nos apresenta com mexediços assomos de puritanismo legalista, êle que nos oferece o espectáculo de haver praticado um acto ilegal, arbitrário, abusivo, impertinente, e mais, insolentemente invasor de poderes, cujo exercício não tinha outra limitação alem daquela que pudesse impor-lhe a Assembleia Constituinte?

Com que direito e em nome de que lei, é que o Conselho se julgou no direito de trovejar no ,dia 15 de Julho de 1911, aquilo que lei alguma lhe concedia em dia nenhum, o que o mesmo concelho se esquecera de fazer desde 19 de Junho, data da abertura das Constituintes até aquele aziago dia 15 de Julho?

Havia por parte do Govêrno Provisório, actos queira portavam invasão dos poderes da Constituinte que estava reunida?

Se os havia, eu pergunto ao Sr. José Barbosa: - a quem competia providenciar para pôr cobro a essa pretendida invasão?

A Constituinte, ou ao Conselho? Tinha êle procuração da Constituinte para defender as suas atribuições e prerrogativas? Tinha a Constituinte delegado os seus poderes no Sr. José Barbosa ou ao Conselho? Não estava ela a funcionar?

E não podia ela, pela voz de qualquer dos seus numerosos Deputados, protestar contra essa pretendida invasão dos seus poderes?

Com que direito se lhe substituiu o Supremo Conselho?

Bem que pese ao Sr. José Barbosa êle foi nomeado para êsse Conselho pelo Sr. Bernardino Machado, por um decreto em que lhe conferem atribuições, mas lhe impõem deveres e obrigações tambêm.

Vozes: - Muito bem.

Mas dir-se há que esta resolução do Supremo Conselho de Administração Financeira, embora ilegal e abusiva, foi, no entretanto, inspirada por um louvável desejo de evitar invasão de atribuições que importavam una perigo e um prejuízo para a República. A Constituinte tinha-se deixado dormir, emquanto invadiam a esfera das suas altas e sagradas atribuições? Parece que, a ser assim, o remédio indicado seria o de acordá-la, vindo o sr. José Barbosa trazer a essa assembleia, como porta-voz potente de uma justa reclamação, um despertador que a tirasse do sono! Parece, mas não foi isso. O Sr. José Barbosa preferiu acordar por ela, falar por ela, substituir-se-lhe nas atribuições de legislar, que só a ela cabiam. Boa intenção, santa intenção dir-se há. Dir-se há, sim; mas não com o meu voto, não com o meu aplauso e sem o meu protesto. A Constituinte dormia desde 19 de Junho. A obrigação dos que velavam, como na Judia de Tomás Ribeiro, (Risos} o sono da sedutora imagem seria o de se lhe substituírem desde logo, trovejando desde logo tambêm que ela era a soberania, embora adormecida e mergulhada nos enervantes sonos do ópio. Mas não, o Sr. José Barbosa, por sua vez, deixou-se dormir tambêm, e só resolveu acordar quási um mês depois, no dia 15 de Julho, como podia ter resolvido acordar mais cedo, ou mate tarde, ou nunca, o que teria sido melhor para nós todos, sobretudo e mais legal (Apoiados).

Mas dando de barato que o Supremo Conselho de Administração Financeira tinha poderes, milagrosamente conferidos, para se substituir à Assembleia Constituinte, para que é, ainda assim, que a mais calamitosa abdicação de poderes que a meus maravilhado" olhos tem sido dado assistir, lhe poderia servir? Disse o Sr. José Barbosa:

"A resolução do Supremo Conselho de Administração Financeira foi tomada no intuito de evitar que o Govêrno Provisório continuasse a publicar decretos que importaram

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matéria legislativa, cuja atribuição e competência exclusivamente cabia à Assembleia Constituinte".

então, se assim era, porque é que o Supremo Conselho de Administração Financeira resolveu negar o visto não só aos decretos que envolvessem matéria legislativa, mas a todos os decretos, embora êle soubesse, e muito bem, que muitos havia não envolvendo tal matéria? E os decretos de que tratamos são um frisantíssimo exemplo do que venho de dizer. Em que é que êles brigam com as atribuições legislativas do constituinte ou no que é que êles as invadem? Não, o Conselho Superior de Administração Financeira não queria defender as atribuições duma assembleia, que estava desperta e vigilante, e não precisava, portanto, de que ninguêm a substituísse: - o Conselho Superior de Administração Financeira, tendo dado o seu visto, segundo a expressa confissão dum dos seus membros, o Sr. José Barbosa, a dezenas de decretos ante-datados, quis assumir, depois dessas condescendência", o ar furibundo das mulheres que, tendo praticado faltas, buscam, num arrependimento serôdio e numa contrição tardia, refazer- se numa nova e exibicionista virtude. Riso (Apoiados).

Dos argumentos trazidos á discussão fixei, pelo ar de espavento com que foram produzidos, principalmente alguns a que respondo.

Quando mesmo o Conselho de Administração Financeira não houvesse trovejado a sua famosa circular nascida tambêm da sua famosa deliberação de 15 de Julho, a nomeação do Sr. Bôto Machado seria, ainda assim, nula de pleno direito, e sê-lo hia porque, tendo essa nomeação a data de 24 de Maio, êsse mesmo senhor foi nomeado em. 27 do mesmo mês e pelo Ministério do Interior para outro lugar - provedor da Assistência de Lisboa. Alem disto, a declaração ministerial publicada em 4 de Setembro não é válida, porque tal declaração, mantendo as nomeações a que havia sido recusado o visto, só podia ser feita pelo Ministro que houvesse lavrado os decretos discutidos, e êsse Ministro - o Sr. Bernardino Machado - já não exercia funções executivas, porque o Govêrno Provisório a que êle pertencia cessara as suas suas funções dois dias antes, isto é, em 2 de Setembro. Vamos examinar com paciência a bondade destas razões. O decreto de
26 de Maio nomeando o Sr. Bôto Machado para Ministro da Argentina não pode considerar-se válido, porque em 27 do mesmo mês êle foi nomeado provedor da Assistência. Vejam todos a obstrusa lógica e a singular lialdade dêstes peregrinos documentos. A mim parece-me, talvez muito ingenuamente, que se alguma das nomeações tinha de considerar-se isenta de toda a suspeição essa seria a primeira, pela simples razão de que - se o Sr. António José de Almeida, que o nomeou para a Assistência, poderia, talvez, saber que êle estava nomeado, desde a véspera para Ministro da Argentina, - o Sr. Bernardino Machado não podia adivinhar na véspera que o Sr. António José de Almeida o iria nomear no dia seguinte para provedor da Assistência. (Apoiados).

O Sr. Presidente: - Estando esgotado o tempo destinado a tratar do assunto em discussão, pois foram marcadas três horas para três questões, dadas para ordem do dia, consulto a Câmara sôbre se deseja que se continui tratando do parecer em discussão.

Vozes: - Fale, fale.

O Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Câmara pode S. Exa. continuar v o seu discurso.

O Orador: - O assunto está esgotado. Desejo apenas acentuar que com êste debate se está desperdiçando um tempo que devia ser preciosamente aproveitado na discussão doutros assuntos da máxima importância para os interesses do país.

O Sr. Aresta Branco, tendo feito entrega da presidência ao Sr. Sarros Queiroz, pede a palavra sôbre a ordem.

Mas, Sr. Presidente, isto é o que eu penso, e o que continuarei a pensar, emquanto algum feiticeiro me não fizer a demonstração de que a República teve o prestígio mágico de conferir aos seus homens públicos o dom de adivinharem cabalísticamente o que se há-de passar no futuro. Encaremos agora a outra pretendida razão. Só o Ministro que havia lavrado os decretos de nomeação podia mante-los, pela declaração a que se refere o artigo 12.° do decreto orgânico do Conselho Superior de Administração Finenceira, e o Sr. Bernardino Machado já não era, em 4 de Outubro, data da publicação no Diário do Govêrno, da declaração referida, Ministro da República. Valha-nos Deus! Todos sabem, e os membros do Supremo Conselho da Administração Financeira não podem ignorá-lo, que o dia 2 de Outubro foi um sábado, que o dia seguinte, como conseqúentemente o concluiria o próprio Sr. de La Palisse, foi domingo, e que, portanto, só na segunda feira 4 é que se publicava o Diário do Govêrno. Ora, não podendo ter saído a declaração, mandada para a Imprensa Nacional em 2, no dia antecedente, e não se publicando o Diário do Govêrno no domingo, 3, que dia era o primeiro em que a referida publicação podia vir á luz? Todos dirão - não é assim? - que êsse dia era o de 4; mas o Supremo Conselho de Administração Financeira quere por fôrça que a declaração feita em 2, viesse a luz antes de ser geral.

Sr. Presidente: V. Exa. acaba de observar-me que passou a primeira hora regimental. Eu vou terminar, porque cuido haver já tratado o assunto no que êle tem de essencial, e porque não quero roubar á Câmara um tempo, que melhor ela pode aproveitar, como já disse, na discussão e resolução de assuntos, que mais interessam à vida da República. (Apoiados).

Vozes: - Muito bem.

O Orador: - O que me propunha demonstrar, está a meu ver bem comprovado: - êste debate não visa o aparente fim de moralidade que querem atribuir-lhe; êste debate é caracterizadamente político, na mais mesquinha e torturosa acepção do termo. Para terminar, Sr. Presidente, devo lembrar à Câmara que, se as muitas preterições de formalidades, que se deram em variados diplomas do Govêrno Provisório, são explicáveis e justificadas pela pressa febril, que tinha de presidir à factura da sua obra, mas muito mais explicáveis e compreensíveis essas preterições se tornariam quando elas se observassem em diplomas emanados do Ministério dos Negócios Estrangeiros. A preocupação principal do Govêrno Provisório não tinha de ser a beneditina observância de fórmulas emaranhadas e burocráticas. O seu mais alto dever consistia na defesa e na salvaguarda da República. Todos, ou quási todos, os nossos representantes lá fora, eram nossos inimigos figadais e irredutíveis. O interesse político da República, que só o respectivo Ministro dos Estrangeiros podia bem conhecer em toda a sua extensão, era o de substituí-los, com observância das formalidades legais, se elas pudessem cumprir-se, mas saltando tambêm sôbre essa observância, se os embaraços, que ela lhe levantasse, tivessem como consequência conservar nos seus lugares aqueles, que o interesse e defesa da República exigiam que fossem dêles removidos. Foi isto o que quis o Sr. Dr. Bernardino Machado: parece que o contrário desejava o Conselho Superior da Administração Financeira. Entre os dois, o pais que julgue.

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Eu, Sr. Presidente, concluirei as minhas considerações expressando a opinião de que dêste debate alguma cousa de útil resultou, ao menos para mim: - a convicção de que é urgente impor ao Conselho Superior da Administração Financeira o respeito das funções que a lei lhe atribuiu, fazendo lhe sentir que só lhe é permitido o que a lei lhe consente, e que nós não estamos dispostos a deixar que ela se transforme numa insidiosa tribuneca politíca. (Muitos e repetidos apoiados).

Vozes: - Muito bem.

S. Exa., que foi muito cumprimento, não reviu o seu discurso.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Aresta Branco.

O Sr. Aresta Branco:-Pedindo a palavra sôbre a ordem, tenho de ler a minha moção. Faço-o com sentimento, e se não tivesse necessidade de falar agora, não pediria a palavra sôbre a ordem para não ter de a apresentar. Mas como a minha moção há-de ser a expressão sentida de toda a verdade, eu não posso deixar de pôr aqui a verdade de tudo quanto se tem passado. (Apoiados).

É assim vou ler a seguinte:

Moção

Quando em 15 de Fevereiro pus à consideração Câmara uma carta ou ofício do Sr. Fernão Bôto Machado, observei tal vivacidade DOS Srs. Deputados que sôbre o ofício usaram da palavra que, apesar do Sr. Henrique Cardoso pedir que se prorrogasse a sessão até se concluir o debate, entendi por essa vivacidade e excitação que melhor fora retirá-lo e guardá-lo para ocasião oportuna.

Terminados os trabalhos parlamentares dêsse dia, acordei com o Sr. 1.° Secretário, depois de ouvidas as considerações da Câmara, que melhor seria, para tirar a responsabilidade á mesa, enviar essa carta ou ofício à comissão de legislação civil para que ela dêsse o seu parecer, e discutir-se depois com a serenidade que devia haver.

Depois disso, quando às minhas mãos chegou o parecer da comissão de legislação civil, tendo chegado aos meus ouvidos rumores de que a discussão não seria se pena, escrevi uma carta aos Srs. Deputados Brito Camacho, António José de Almeida e Germano Martins, a fim de que acordassem na discussão a fazer sôbre o assunto, de modo a não desviarem para uma questão política e porventura pessoal o que, com cuidado e ponderação poderia evitar-se.

Parecia-me a situação grave, e era necessário que a discussão corresse serena e a República não ficasse ferida.

O Sr. Brito Camacho leu a minha carta e comunicou as minhas apreensões ao Sr. Ministro da Justiça. Eu, por um incidente que agora não me recordo, saí da Presidência e falando ao Sr. Matos Cid dei-lhe conta das minhas apreensões. O Sr. António José de Almeida, nesse dia não veio à Câmara, e tendo conhecimento do assunto o Sr. Ministro da Justiça calculei que dele tomasse conhecimento o Sr. Germano Martins.

O que fiz? Guardei o parecer a fim de fugir a qualquer discussão irritante para num dia em que julgasse poderia haver toda a serenidade, êle ser então discutido.

Explicado o meu pensar como Presidente da Câmara, vou falar, não só como Deputado, mas, sobretudo, como Deputado eleito pela Câmara ao Conselho Superior da Administração Financeira do Estado, para onde a discussão derivou com mais calor ou com mais ódio, criticando-se com mais paixão política do que com motivo justificado.

Na discussão do último dia o Sr. Deputado Alexandre Braga dirigindo-se ao Sr. José Barbosa perguntou-lhe, com insistência, em que lei se fundava para o Conselho Superior de Administração Financeira do Estado, negar o visto a um determinado decreto ; qual o código em que se fundara para proceder dessa maneira, e como o Sr. José Barbosa respondesse que não havia lei, S. Exa. disse que era um abuso do poder. Se o Sr. José Barbosa respondesse a S. Exa. que essa lei é a que obriga, a nós, por exemplo, como país, a educar os filhos, a respeitar as mulheres, as crianças e os velhos, se o Sr. José Barbosa lhe dissesse que esta lei é uma lei parecida com essas, uma lei natural, uma lei de consciência, que temos de inscrever num código de moral, o Sr. José Barbosa tinha-lhe dito uma verdade. Eu me explico mais claramente, Sr. Alexandre Braga.

Eu estou dentro desta Câmara numa situação especialíssima. Tenho, felizmente, pelo meu procedimento, reconheço o, a estima de toda a Camará (Apoiados), tenho obrigação, por isso mesmo, de não ferir ninguêm quer pertença ao lado direito, quer pertença ao lado esquerdo, quer pertença ao centro, mas tenho obrigação de defender a, própria Câmara visto que a represento no Conselho Superior de Administração Financeira do Estado. Vou explicar:

Em 19 de Junho abriu o Parlamento e, felizmente, foi S. Exa. quem veiu, daqui, dizer ao povo português...

O Sr. Alexandre Braga: - Peço a palavra sôbre a ordem.

O Orador: - que acima de tudo estava o Poder Legislativo. E foi S. Exa. que, em nome dêsse mesmo Poder, confirmou a proclamação da República, feita na Câmara Municipal de Lisboa.

Sr. Presidente : nestas condições, e reconhecendo S. Exa. a supremacia do Poder Legislativo, eu entendo que S. Exa. não teve, hoje, o mesmo modo de ver as cousas.

E, assim, por datas - e peço à Câmara toda a atenção para as datas, que vou citar - eu vou mostrar toda a verdade nesta questão.

A 19 de Junho, abriu o Parlamento e nos últimos dias dêsse mês, na primeira semana de Julho, até o dia 15, em que o Conselho de Administração Financeira do Estado enviou, a todos os Ministérios, essa malfadada circular, choveram no Conselho decretos de nomeações, de transferências, de colocações e alguns diplomas do Poder Legislativo.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: disse o Sr. Alexandre Braga que era necessário dizer toda a verdade. Pois diga-se toda a verdade! Choveram diplomas ante-datados! (Apoiados). É perante êste abuso do Poder Executivo é que nasceu a lei de consciência, do Código de Moral, que nós temos obrigação de manter.

O Sr. Germano Martins: - Por parte da Direcção Geral do Ministério dos Negócios da Justiça, protesto contra essas palavras

O Orador: - Eu não me referi ao Ministério da Justiça, nem, em especial, a êste ou àquele Ministério.

O Sr. Germano Martins: - Mas é preciso dizer, para se apurarem as responsabilidades.

O Orador: - Sr. Germano Martins, ouça-me V. Exa. com atenção! A tempo conveniente eu darei a resposta a V. Exa. (Apoiados).

Eu terminarei o meu discurso, desafrontando-me, como tem obrigação de se desafrontar um homem de bem (Apoiados).

Vou provar ao Sr. Alexandre Braga como os diplomas,

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que estão em discussão, são ilegais e como êles são ante datados (Apoiados). Tenho pena que, seja o Presidente da Câmara dos Deputados, quem venha dizer isto, mas era sua obrigação dizê-lo, quando êsse Presidente açu mula essas funções com as de membro do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado.

S. Exa. verá, quando quis, afincadamente, dizer que se faz política com o Sr. Bernardino Machado, que labora num êrro, porque, sendo essa circular enviada a todos o Ministérios, em 15 de Julho, o Conselho não adivinhava que, um mês depois, o Sr. Bernardino Machado lhe mandaria dois diplomas dessa natureza.

O Sr. Alexandre Braga: - As nomeações já estavam feitas? V. Exa. afirma um facto de tal gravidade que eu estou convencido de que V. Exa. não deixará d o demonstrar.

O Orador: - Eu afirmo que saindo do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado uma circular em 15 de Julho, para todos os Ministérios, prevenindo os de que não poria o visto em diplomas data dos de antes da abertura das Constituintes, nenhum Ministério protestou, nenhum Ministério fez observações.

E afirmo mais que em 26 de Agosto, quarenta e tantos dias depois da circular, e depois da abertura da Constituinte, apareceram no Conselho, para serem visados três diplomas do Ministério dos Estrangeiros, com data de 26 de Maio, diplomas cujas nomeações se faziam por conveniência urgente de serviço público.

Ora, Sr. Presidente, aproximando datas vê-se que, para motivo urgente de serviço público, é demais uma nomeação, feita em 26 de Maio para ser vista em fins de Agosto.

É que essas nomeações seriam ilegais e nulas se tivessem data posterior a 26 de Maio.

O Sr. Alexandre Braga: - Essas acusações são se para o Sr. Bernardino Machado.

Trocam-se ápartes. Sussurro.

O Orador: - Estas acusações não tem sobrescrito, mas são dirigidas a todos os poderes e a todos os funcionários que procederam por igual modo.

Sussurro.

O Sr. Presidente: - Peço ordem.

O Orador: - O Conselho cumprindo um dever fiscalizava alêm dos dinheiros públicos, a moral administrativa.

A 22 de Agosto o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, e eu peço a S. Exa. que quando eu proferir êste termo não veja o Sr. Bernardino Machado, mas sim o Ministro dos Negócios Estrangeiros, a 22 de Agosto, repito, o Sr. Ministro dos Estrangeiros enviou três diplomas ao visto com a data de 26 de Maio, e a 23 ou 20 o Conselho Superior respondeu que não lhe podia pôr o visto por motivo da circular que já tinha sido levada ao conhecimento de S. Exa. e fazia outras considerações. Se a Câmara me permite leio êsse ofício.

Leu.

Quere dizer. O Sr. Bôto Machado foi nomeado a 27 de Maio provedor da Assistência Pública. No Conselho Superior pôs-se o visto no seu diploma de nomeação dois dias depois, e a 22 de Agosto aparece um novo diploma de nomeação dêste Sr. Deputado antes de ser provedor da Assistência, quere dizer, o Sr. Bôto Machado depois de ser Ministro na Argentina foi nomeado provedor da Assistência Pública. Êstes são os documentos, êstes são os factos, esta é a verdade, êstes são os números.

O Sr. Alexandre Braga: - Só é Ministro quando seja publicada a sua nomeação.

O Orador: - Estava ou não estava visado o primeiro diploma?

Tinha ou não efeito legal?

Como é que êste homem depois de ser nomeado Ministro na Argentina aceita o lugar de provedor da Assistência Pública?

O Sr. Alexandre Braga: - Não aceitou.

O Orador: - Tomou ou não tomou posse? Tomou, e portanto, para todos os efeitos, o Sr. Bôto Machado foi provedor da Assistência Pública nomeado em diploma de 27 de Maio, depois de ter sido nomeado Ministro da Argentina em 26 do mesmo mês.

Vozes da esquerda: - Demitiu-se depois.

O Orador: - Mas tomou posse e demitiu-se por motivos de ordem que não vem agora para aqui.

O Sr. Alexandre Braga: - O Sr. Bernardino Machado, é que nomeando o Sr. Fernão Bôto Machado em 26 de Maio, não podia adivinhar que o mesmo indivíduo ia ser nomeado em 27!

O Orador: - Mas essa primeira nomeação só se tinha conhecido em 22 de Agosto, e a que se conheceu imediatamente foi a de 27, em que se declara, como tem obrigação de se fazer e é de lei que o funcionário nomeado não exerce outras funções.

O Sr. Alexandre Braga: - E só entra em execução desde que se publica o decreto no Diário do Governo...

O Sr. José Barbosa: - A questão não pode ser discutida como o Sr. Deputado Alexandre Braga quere. Ora...

O Sr. Alexandre Braga: - Se o Sr. António José de Almeida fez uma declaração que não é verdadeira, a responsabilidade não é do Sr. Bernardino Machado, é dele! (Apoiados).

O Orador: - Estamos simplesmente a trocar datas, e o Sr. Alexandre Braga a desviar a questão.

O Sr. Alexandre Braga: - O que eu quero são provas; mas não vem!

O Orador: - Eu estou a citar os factos tais como se passaram; e para maior lialdade como êles se encontram scritos; se isto não são provas eu não sei então a que é que possam chamar provas de factos sucedidos.

A êste ofício, respondeu S. Exa. o Sr. Ministro dos Estrangeiros do seguinte modo:

Leu.

Nestes termos, desaparece já um decreto, o do Sr. Forjes Bessa, e enviam-se ainda para o Conselho os decretos do Sr. Abel Botelho e Bôto Machado, e não sei para onde vi, nem tenho a pretensão de saber, para onde foi um terceiro decreto.

O Sr. Ministro dos Estrangeiros, mandou os decretos só

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depois da aprovação da Constituição, com uma resolução do Directório do Partido Republicano, que o Conselho Superior não admitiu como fundamento, visto como o Conselho Superior da Administração Financeira do Estado tem sempre afastado toda a ingerência de qualquer organização política desde a mais singela até a mais elevada (Apoiados).

O Sr. Germano Martins: - Se a situação era moral...

O Orador: - Eu estou a responder à insinuação de que no Conselho da Administração Financeira do Estado se faz política.

Continuando. A êste ofício seguiu se uma reunião extraordinária do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado - repare bem a Câmara - para resolver sôbre ela, e a Câmara já vai ver que o Conselho não achando fundamento na alegação de que esta resolução tinha sido tomada pelo Directório, negou-lhe ainda o xisto. Passou-se isto em 2 de Setembro, a um sábado.

Peço aos Srs. Deputados o favor de atentar nas datas. Num sábado, dia 2, acabou o Conselho às 5 horas da tarde a sua reunião. Estava fechado o Ministério dos Estrangeiros. Não foi portanto, entregue nesse dia o ofício que continha a resolução do Conselho ; não o foi no dia seguinte, porque era domingo, e no dia 4, não tendo ainda o Ministério dos Estrangeiros conhecimento da resolução do Conselho, saía no Diário do Govêrno a declaração que mantinha, sem fundamento, as nomeações feitas.

O Sr. Alexandre Braga: - Mas é que o Sr. Bernardino Machado já sabia que o Conselho recusava o visto...

O Orador: - Essa é boa! Eu sei onde se quere chegar. E que essa declaração, do dia 4 se refere ao ofício de 22. Mas se se refere ao ofício de 22, porque é então que o Sr. Ministro dos Estrangeiros envia ainda ao visto, com alegações novas, os mesmos diplomas em data posterior?

O Sr. Alexandre Braga: - Quere dizer, a resolução do Conselho é que é posterior à resolução do Sr. Bernardino Machado.

O Orador: - Mas essa declaração não podia deixar de ir, no dia 2, para o Diário do Govêrno, porque o dia 3 era domingo e na segunda-feira, que era 4, só se imprime o Diário do Govêrno muito antes do Ministério dos Estrangeiros ter conhecimento do ofício e resolução do Conselho.

O Sr. Alexandre Braga: - Se o Ministro teve conhecimento da resolução do Conselho, publicando a declaração, praticou um acto legítimo.

O Orador: - Não, é a actos desta natureza que se deve a nossa vergonha, a nossa desonra, a nossa decadência.

O Sr. Alexandre Braga: - Eu falo para ser entendido.

Disse que havia certas habilidades de certas raposas da monarquia que nos tinham conduzido à ruína.

O Orador: - E êstes são os factos para serem entendidos, para serem julgados, e para que ninguêm diga que eu invento números, ou que invento datas ou que estou aqui propositadamente para manchar a resolução de qualquer Ministro, seja quem for. Se a Câmara me dá licença eu leio para se ver se no ofício com que o Conselho responde às alegações feitas, se fere a mais singela, a mais 1 insignificante nota política ou de malquerença para tal ou tal resolução, para tal ou tal Ministro.

Peço a atenção da Câmara.

No Diário do Govêrno de 4 de Setembro, saiu, sem data, uma declaração do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros mantendo, nos termos da lei de 11 de Abril de 1891, os decretos com data de 26 de Maio de 1911 nomeando os Srs. Bôto Machado e Abel Botelho, respectivamente Ministros na Argentina e Japão e China.

Essa declaração foi motivada pela recusa do Conselho Superior.

Diz o seguinte:

Leu.

Veja V. Exa. como o Conselho fugiu de toda a política.

E agora, para justificar a última parte da minha moção direi que considero sem valor jurídico ou legal a declaração do Sr. Ministro dós Negócios Estrangeiros.

Note a Câmara que a declaração do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não foi feita para manter as nomeações de 22 e 25, mas para manter os diplomas que mandara ao Conselho Superior da Administração Financeira do Estado.

Se na minha argumentação, referindo datas e factos, eu fui um pouco apaixonado, perdoe me a Câmara que o fôsse, mas tinha obrigação de o ser pois pugnava pela justiça.

As poucas vezes que tenho falado nesta Câmara tenho tido sempre a infelicidade de me seguir ao Sr. Deputado Alexandre Braga, e comparando-me com os dotes oratórios de S. Exa. fico sempre numa situação que não é agradável e que não é das melhores.

O Sr. Alexandre Braga (Interrompendo): - V. Exa. e é que me quere honrar, respondendo às minhas palavras.

O Orador: - Mas se eu visse que estas questões parlamentares se derimiam com palavras de fluente oratória, com períodos cheios da mais bela arte de dizer, eu, com franqueza, receava confrontar-me com S. Exa.; mas felizmente a verdade e a justiça estão ainda do lado daqueles que afirmam que êsses diplomas são ilegais.

Sim, Sr. Presidente, se a justiça, a razão e a virtude se-hão de pôr de joelhos diante de habilidades, não valia então nada a justiça, a razão e a virtude.

O Conselho Superior da Administração Financeira do Estado, vigiando toda a administração pública, sem tutela deprimente, como disse o Sr. Alexandre Braga, fá-lo em nome da lei.

O Conselho Superior da Administração Financeira do Estado é um tribunal tutelar, porque vigia para que se cumpra a lei, com suprema verdade e suprema justiça.

E assim, para que se faça a justiça merecida e de que é digno o Conselho Superior onde estão três representantes desta Câmara, e ainda para que a nossa desafronta seja mais completa, termino por enviar para a Mesa a seguinte proposta que é ao mesmo tempo um requerimento.

Proposta

Os abaixo assinados, representantes, por eleição, da Câmara dos Deputados ao Conselho Superior da Administração Financeira do Estado, cônscios de haverem cumprido escrupulosamente e honestamente a sua missão nas funções para que a Câmara os destacou;

Considerando que na discussão a propósito do caso Bôto Machado se alevanta, a dentro do Parlamento, a suspeição de que o Conselho, e portanto êles, não só exorbitaram das suas funções, senão tambêm se orientaram no seu procedimento sob a influência apaixonada da política partidária;

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Considerando que não podem, pelo mais elementar princípio de decoro, sujeitar-se à mais ligeira suspeição, que deixa sempre sinal, mesmo quando absolutamente infundada: requerem que a Câmara nomeie ou eleja uma comissão de inquérito aos seus actos e aos actos de todos os membros do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado, com quem estão solidarizados em tudo, absolutamente, que diga respeito a matéria do visto. = António Aresta Branco. = José Tristão Paes de Figueiredo = Álvaro de Castro.

Se alguém vir neste documento uma habilidade eu digo então a V. Exa., Sr. Dr. Álvaro de Castro, que lhe valeu bem ser o homem independente, o homem digno que tem sido, para ser assim tratado, eu direi a V. Exa. Sr. Dr. Tristão Paes de Figueiredo que lhe valeu bem ter sido eleito para esta Câmara para sofrer assim. Se alguém, repito, vir que isto é uma habilidade, juro que deixo o lugar de Presidente da Câmara, emquanto essa comissão que proponho não for nomeada. De mais, Sr. Presidente, peço que para essa comissão sejam nomeados os Srs. Alexandre Braga, para assim ver até onde chega o procedimento do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado, o Sr. Brito Camacho, para ver até onde chega a tutela deprimente e o Sr. Germano Martins, para ver onde chega o desleixo do Conselho onde, diz S. Exa., até nem registam os documentos que lá entram. (Muitos apoiados).

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O orador, que foi muito cumprimentado e abraçado, não reviu o seu discurso.

A moção e proposta do Sr. Aresta Branco foram admitidas.

O Sr. Presidente: - A proposta do Sr. Aresta Branco fica conjuntamente em discussão.

O Sr. Lopes da Silva: - Requeiro que a sessão seja prorrogada até se votar a matéria que constitui a primeira parte da ordem do dia.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente do Ministério (Augusto de Vasconcelos): - Sr. Presidente: não tencionava tomar a palavra neste debate por que a Câmara discutia um parecer em que o Govêrno não era chamado a intervir, mas desde que os Srs. José Barbosa e Aresta Branco formularam moções em que se frisava a necessidade de relevar o Govêrno da responsabilidade por pretendidas faltas de formalidades legais, tenho de fazer uma simples pergunta à Câmara para definir a situação dos Ministros que tem dúvidas sôbre a legalidade de qualquer documento, visto que não se sabe qual é a sua situação.

Até aqui, o Ministro que tinha dúvidas sôbre a legalidade de qualquer diploma dirigia se à Procuradoria Geral da República, e, segundo os ditames do seu parecer, assim cumpria com o seu dever, procedendo legalmente. Hoje não.

O Ministro dirige-se â Procuradoria Geral da República e, embora cumpra o seu parecer, vem perante a Câmara, que tem de o relevar da responsabilidade em que incorreu pelo acto que cometeu.

O Sr. Egas Moniz: - V. Exa. dá-me licença?

Eu entendo que os Ministros aqui respondem pelos seus actos. A Procuradoria Geral da República é uma instância consultiva. O Govêrno procede conforme entende, tornando a responsabilidade dos seus actos, não se acobertando com a consulta da Procuradoria Geral da República.

O parecer da Procuradoria pode ser uma sanção, mas ao Govêrno pertence assumir a responsabilidade do acto que pratica.

O Orador: - O que eu tenho a dizer a V. Exa. é que o Govêrno não enjeita responsabilidades, nem se oculta por detrás de estação alguma.

Pergunto a V. Exa. se os Ministros tem todos obrigação de ser jurisconsultos, e de estarem habilitados a conhecer dos pormenores de interpretação das leis para intervirem em assuntos em que não tenham competência especial?

Confesso, não a tenho em interpretação de leis, e tinha por isso de recorrer às estações que por lei se estabeleceram para me elucidar; conformando-me com o parecer dessa estacão, entendo que cumpri o meu dever...

O Sr. Aresta Branco: - Hoje o Sr. Presidente do Ministério, e já o outro dia o Sr. Brito Camacho, invocaram o parecer da Procuradoria Geral da República: muito bem. Mas era necessário que nós soubéssemos como foi feita a consulta.

Se a consulta foi, como suponho, enviando os diplomas autênticos das nomeações e perguntando se eram legais, é como se eu perguntasse à Câmara que me dêsse um parecer sôbre se o Sr. Presidente do Ministério estava no seu lugar, porque ela respondia-me imediatamente que, estava efectivamente no seu lugar.

A Procuradoria Geral da República foi consultada sôbre a autenticidade dos diplomas, com os diplomas autênticos, e como os viu feitos em papel branco, assinados pelo Ministro, com a data de 26 de maio, antes da reorganização dos serviços do Ministério dos Negócios Estrangeiros, porque depois não podiam ser legais, a Procuradoria Geral da República disse: sim senhor, está legal.

O Orador: - V. Exa. não leu os diplomas. Não é nada disso. Eu estou pronto a ler e provar a V. Exa. que está em êrro. Julgava o Govêrno, e julgo eu, que cumpri com o meu dever de Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Encontrei dois diplomas no meu Ministério que nomeavam dois funcionários. Sôbre êsses diplomas tinham-se levantado dúvidas no Conselho Superior da Administração Financeira do Estado. Perguntei então à Procuradoria Geral da República, por que não me senti com fôrça de jurisconsulto para derimir a questão, se êsses diplomas eram legais. Essa estação disse-me que os diplomas eram legais, que os nomeados estavam perfeitamente nomeados, cumpri, pois, com o meu dever.

Visto que nesta questão, apaixonadamente, se falou em diplomas ante-datados e outras irregularidades, como homem de bem, que tambêm sou, posso afirmar à Câmara o meu testemunho.

Por acaso, estava no gabinete do Sr. Bernardino Machado, quando S. Exa. mandou vir os decretos para a sua publicação no Diário do Govêrno, visto que resolvera nomear os Srs. Bôto Machado, Abel Botelho e Forbes Bessa.

S. Exa. mandou vir êsses decretos diante de mim e vi que êsses diplomas tinham a data de 26 de Maio. Nada mais tenho a dizer.

O Sr. Alexandre Braga: - Afinal o Sr. Aresta Branco não fez a demonstração de que êsses documentos tinham sido ante-datados.

O Sr. Aresta Branco: - Disse o Sr. Presidente do Ministério, que os viu em fins de Agosto ou Setembro, que estavam datados de 26 de Maio, Aquando foi posta a lata?

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O Sr. Alexandre Braga: - Incumbe-lhe a prova. A afirmação de V. Exa. acaba de ser desmentida pelo testemunho dum homem de bem.

O Sr. Aresta Branco: - Não invoque êsse testemunho porque não pode servir de nada.

O Sr. Alexandre Braga: - Foi uma afirmação gratuita.

Incumbe-lhe a obrigação de provar.

O Sr. Presidente: - De modo algum posso permitir êste diálogo. Quem quiser usar da palavra peça para ser inscrito.

Tem a palavra o Sr. Germano Martins.

O Sr. Germano Martins: - Vou responder a algumas referências feitas pelos Srs. Aresta Branco e José Barbosa, relatando um facto de que tive conhecimento.

Tendo visto no Diário do Govêrno de 30 de Junho a publicação dum despacho, que nomeava um Sr. Deputado inspector da fiscalização das sociedades anónimas, quis saber quando êsse decreto havia entrado no Conselho Superior da Administração Financeira do Estado.

O decreto é de 12 de Junho e tem o visto do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado, de 14 de Junho.

Portanto, dirigi-me ao Conselho Superior da Administração Financeira do Estado e perguntei ao secretário se eu, como Deputado, tinha o direito de examinar o livro de entrada. S. Exa., depois de consultar pelo telefone o Sr. José Barbosa, que não foi encontrado, permitiu-me que examinasse o livro de entrada. Se o decreto era de 12 de Junho e o visto de 14, eu procurei se em qualquer dêsses dias tinha entrado o decreto.

O Sr. Secretário explicou-me que, quando não vinha acompanhado de ofício, não se registavam as entradas.

Satisfeito com essa explicação, mas desconfiado que o decreto não havia dado entrada nem em 12, nem em 13 de Junho, fui examinar o próprio decreto ao Ministério das Finanças, e, com grande surpresa minha, verifiquei que êsse decreto tinha o visto antes dg entrar, pois que só entrou em 24 de Junho e tem o visto de 14 de Junho.

O Sr. José Barbosa: - Que diploma é?

O Orador: - É um diploma que nomeia um Sr. Deputado inspector da fiscalização das sociedades anónimas.

O Sr. José Barbosa: - S. Exa. está vendo que isso, é um absurdo.

O Sr. José de Abreu: - Não há preterição de formalidades.

Trocam-se ápartes.

O Sr. Presidente: - O Sr. Germano Martins é que está no uso da palavra. S. Exa. deu licença ao Sr. José Barbosa para o interromper?

O Orador: - Dei, sim senhor.

O Sr. José Barbosa: - O diploma é do dia 12. O Conselho de Administração Financeira do Estado, quando visou êsse diploma, não sabia ainda quem era deputado quem o não era; estava-se ainda na verificação de pode rés. Os diplomas que foram, nessa ocasião, para o Conselho, eram aos montões.

O Sr. Alexandre Baga: - Foi visado antes dei entrar.

O Sr. José de Abreu: - Como não é o Sr. Bernardino Machado que está metido nesta questão, para amigos mãos rotas.

O Orador: - O Sr. José Barbosa não tem responsabilidade alguma por êste visto, nem nenhum dos outros membros do Conselho, que aqui estão.

O Sr. José de Abreu: - É um outro, que já aqui gritou muito.

O Sr. José Barbosa: - Seria absurdo pôr a data antes e depois a assinatura.

O Orador: - Pois é exactamente por causa dêsse absurdo, de se ter posto o visto antes de entrar na Repartição, que eu estou a falar.

Disse o Sr. José Barbosa que "nos dias 12 a 14 tinha havido muita aglomeração de serviço". Pois eu posso dizer a S. Exa. que, nesses dias, só lá entraram 3 ou 4 papéis.

Contra o que eu me revolto é que para uns tudo sejam legalidades e para outros tudo seja legal, não tendo havido fraude.

O Sr. José Coelho: - O que é preciso é que haja moralidade, ou então estamos no caso do sapateiro de Braga.

Uma voz: - Aqui não há botas.

O Sr. José Botelho: - Não há botas, mas há moralidade.

O Orador: - E neste ponto, Sr. Presidente, eu devo dizer que não tenho o mínimo conhecimento dêste pedido. Eu fui chamado, um dia, nesta Câmara, pelo Sr. Deputado Mesquita de Carvalho para a reunião da comissão que tinha de dar parecer sôbre essa questão.

O Sr. Mesquita de Carvalho levava êsse parecer completo, para o sujeitar à apreciação dos restantes membros da comissão, e eu devo declarar que não tinha dele o menor conhecimento. Eu, como membro dessa comissão, disse imediatamente que não concordava com as três primeiras conclusões dêsse parecer, que terminava por julgar ilegal a nomeação do Sr. Bôto Machado para chefe de missão de segunda classe.

Todos os restantes membros da comissão, e, posterior mente, o Sr. Deputado Tomé de Barros Queiroz, concordaram em que a comissão tinha sido nomeada só para conceder ou negar a licença pedida pelo Sr. Bôto Machado.

Foi exactamente isto que se passou.

Havia mais duas conclusões, e devo dizer que a maioria da comissão não foi da minha opinião, divergindo sôbre o seguinte: eu entendia que, se o Sr. Bôto Machado aceitasse o lugar de cônsul, perderia apenas o cargo de Deputado; e os restantes membros entendiam que perdia o lugar de Deputado e o de cônsul.

Eu argumentei não artificiosamente, mas com sinceridade.

E, nesta altura, tenho que levantar a minha voz para protestar contra a afirmação feita pelo Sr. Mesquita de Carvalho, quando S. Exa. disse que o parecer da Procuradoria Geral da República era pouco escrupuloso, chamando lhe uma monstruosidade, porque não era a favor da sua opinião.

Isto faz lembrar-me uma peça que eu vi ontem no teatro da República, em que um sujeito dizia que um outro era uma excelente pessoa, mas que era um maroto tambêm. Excelente, porque era bom homem; maroto, porque não concordava com as suas opiniões!

Risos.

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SESSÃO N.° 70 DE 11 DE MARÇO DE 1912 17

O Orador: - S. Exa. certamente não viu a lei; ou se a viu não a quis compreender. O artigo 12.° tantas vezes citados diz que basta a simples declaração publicada no Diário do Govêrno, em que o Ministro mantenha e sustente a sua responsabilidade.

É o que diz a lei muito claramente:

Leu.

É o artigo 15.°:

Leu.

Foi o que o Sr. Bernardino Machado fez.

Pode haver interpretações diferentes, mas o que não se pode é chamar a êsse parecer pouco escrupuloso.

Todos os membros da comissão sustentaram que essa comissão não tinha competência para julgar da legalidade dos decretos que tinham nomeado o Sr. Bôto Machado.

Todos eram de opinião contrária ao Sr. Mesquita de Carvalho.

S. Exa. até mesmo me chamou habilidoso na minha argumentação.

O Sr. Mesquita Carvalho (interrompendo): - Eu não chamei tal a S. Exa.

O Orador: - S. Exa. disse que o parecer da comissão era pouco escrupuloso.

Ápartes. Sussurro.

O Sr. Presidente: - Quem tem a palavra é o Sr. Deputado Germano Martins. Peço aos Srs. Deputados que não interrompam o orador.

O Sr. Mesquita Carvalho: - Eu pedi licença para interromper o Sr. Germano Martins. Tinha que protestar contra as palavras de S. Exa. porque julgava que S. Exa. me queria magoar.

Não podia ficar silencioso ante uma tal acusação.

Apartes.

A sessão torna-se agitada.

O Sr. Presidente: - Assim não pode continuar a discussão. Peço a atenção da Câmara para que o Sr. Germano Martins possa seguir nas suas considerações.

O Orador: - Eu tive que responder às palavras do Sr. Mesquita Carvalho para ficar bem assente a significação das suas palavras.

Ao outro dia reúniu-se de novo a comissão, e o Sr. Mesquita de Carvalho apresentou-me o seu parecer com os votos de vencidos: o primeiro, o meu, e depois o do Sr. Matos Cid, o do Sr. Emídio Mendes, e o do Sr. Tomé de Barros sôbre as três primeiras conclusões.

S. Exa. ainda entendia que o parecer podia vir â Câmara com aqueles votos vencidos; pareceu-me que isso não era da praxe, e todos fomos de acôrdo que era preciso fazer outro parecer que consubstanciasse a maioria da opinião da comissão.

O Sr. Mesquita de Carvalho declarou que não sendo aquela a sua opinião não faria outro parecer, que tinha de ser nomeado outro relator. Foi nomeado o Sr. Matos Cid, e fez-se o parecer que está na mesa.

E a cousa mais simples, mais natural e mais lógica, e por isso me parecia devia ter sido votado sem discussão. (Apoiados).

Êsse parecer era de que não sendo o lugar de cônsul missão diplomática, a Câmara não tinha que dar nem recusar a licença. Era neste ponto que estávamos de acordo.

O Sr. Bôto Machado ficava com a responsabilidade se aceitasse o lugar, de se sujeitar às consequências. As consequências seriam depois debatidas.

Seria simplesmente a perda do lugar de Deputado? Seria a de cônsul?

Seria êsse o momento oportuno para se discutir êsse facto.

E, Sr. Presidente, aí nesse facto é que foi a maior divergência com os restantes membros da comissão. Eu entendia que só perdia o lugar de Deputado e não o de cônsul, pela doutrina que tem sido sempre aceite pela Câmara.

Foi assim que o Sr. José Coelho aceitou o lugar de governador civil; perdeu o seu lugar de Deputado, e não o de governador civil; foi assim que o Sr. Teixeira de Queiroz perdeu o seu lugar de Deputado, e não o da Companhia das Aguas; foi assim que o Sr. Forbes Bessa, nomeado Secretário Geral da Presidência, renunciou ao lugar de Deputado para aceitar êsse lugar.

Tem sido sempre a minha opinião, e parece-me que deve ser a da Câmara, porque não tenho ouvido aqui levantar-se uma voz contra êsse modo de ver; foi essa a opinião que sustentei na Sala dos Passos Perdidos, e todos concordaram com o meu modo de ver, mesmo Deputados que pertencem a outros grupos.

Os membros da comissão que sustentavam opinião contra a minha fundavam-se no § único do artigo 21.°, que diz:

Leu.

Entenderam os membros da comissão que a anulação dos actos é a anulação do próprio acto da nomeação.

Não entendo assim, porque me parece que para haver anulação do acto se havia de fazer referência a êste parágrafo.

Sustentei isto, na melhor das intenções, por me parecer que era a doutrina mais coerente, o que não quer dizer que os meus colegas que sustentavam opinião contrária não estivessem no melhor ponto, porque eu nunca fiz cavalo de batalha da minha opinião.

Como tenho direito a ter uma opinião, acho que os meus colegas tem direito a ter opinião contrária.

Nestas condições o parecer da comissão, se fôsse votado nesta Câmara, não daria lugar aos debates irritantes que tem dado.

Parecia-me, pois, Sr. Presidente, que o caminho mais seguro em benefício dos interesses da República, porque nenhum dos Srs. Deputados que tomaram a palavra sôbre o assunto afirmou que em qualquer dêstes actos houvesse a mínima intenção de prejudicar alguém ou o Estado, parecia me, repito, que o Sr. Bôto Machado aceitando o lugar de cônsul, perde o de Deputado, e nada mais.

Esta é a boa doutrina que deve ser aceita pela Câmara.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Mesquita de Carvalho.

O Sr. Mesquita de Carvalho: - Sr. Presidente: começarei, como me cumpre, por agradecer as palavras amáveis que outro dia me dirigiu o Sr. Deputado Brito Camacho.

E, cumprido êste dever de cortezia, direi à Câmara

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18 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

que se não fôsse o incidente desagradável que acabou de levantar o Sr. Germano Martins, só teria a felicitar-me, porque ao cabo dum tão irritante debate, eu, que o iniciei, chegasse a esta altura com o legítimo orgulho de não ver rebatido nenhum dos argumentos que apresentei e, pelo contrário, ouvir a confissão geral da Câmara de que aquilo que eu disse era a verdade, porque todas as moções mais ou menos sustentam que as nomeações feitas são ilegais. (Apoiados).

Eu estou mais do que vingado, se vingança precisa me fôsse para a intenção absolutamente honesta e honrada com que levantei no Parlamento o incidente. (Apoiados). O Sr. Germano Martins, na qualidade de membro da comissão de legislação civil, a que tenho a honra de presidir, referiu-se a dois pontos que tratarei muito ligeiramente.

O primeiro é quási uma questão pessoal. Protestei e protesto energicamente contra ela.

Todos sabem que quando se fala, e sobretudo a quem não tem a presunção de ser um orador consumado, e a quem pela primeira vez fala no Parlamento, bem possível era que proferisse uma frase imperfeita ou uma expressão incorrecta; mas tenho a certeza que tal não foi.

Ao tratar de semelhante questão - e insisto em fazer esta afirmativa - sejam quais forem os desmentidos que me queiram opor, abstive-me de trazer a ela qualquer sentimento pessoal; apenas me ocupei da questão no campo dos princípios.

Se trouxe aqui a questão fundamental da nomeação do Sr. Bôto Machado para Ministro Plenipotenciário da Argentina, é que S. Exa. baseava o seu pedido de licença precisamente nessa qualidade; e eu, ao relatar o parecer, a primeira cousa que tinha a verificar era se realmente se lhe podia dar licença para ir desempenhar, na qualidade que se arrogava, o cargo de cônsul em comissão.

Desta ideia ninguêm me afastou, nem me podia afastar porque importava conhecer se realmente a nomeação do Sr. Bôto Machado era definitiva, ou se era uma comissão de serviço. S. Exa. alegava que era comissão de serviço. Eu, portanto, entendi, e a Câmara veio dar-me inteira razão, que era indispensável começar pelo princípio, isto é, por investigar se o comissionado tinha legalmente a categoria diplomática que se atribuia, para depois averiguar se, tendo-a, podia, à face da Constituição e da lei, aceitar a comissão para que fora nomeado, e, por sua vez, se a Câmara podia assim conceder-lhe a solicitada licença.

Sr. Presidente, quando da primeira vez falei nesta casa defini nítida, clara e honestamente a minha atitude e delimitei em termos precisos e terminantes o campo em que ia tratar a questão.

Pouco me importa que das minhas considerações outros se aproveitassem, como de tudo se aproveitam, para fazer aquilo que se não chama política, mas para fazer aquilo que desgraçadamente sempre se fez e por desaire da República continua a fazer-se - a politiquice.

Entendâmo-nos. Façamos uns aos outros a devida justiça, lialmente, sem paixão, sem deturparmos a pureza dos intuitos de cada um. Não vejamos em tudo o ataque das pessoas, a insídia política e a malsinação dos homens, dos seus propósitos, dos seus serviços, esquecendo-nos de que êsse dissolvente corrosivo só serve afinal para agravar a desmoralização e a indisciplina sociais, e para promover o descrédito dos princípios, das instituições, da República e do país.

Eu não discuto aqui pessoas; creio mesmo, salvo êrro, que nunca proferi nomes, a não ser o do Sr. Bôto Machado, o que era indispensável, e os que constavam dos documentos, quando os há.

Que culpas tenho eu que êsses documentos sejam tam eloquentes que dispensassem qualquer comentário da minha parte? Se êles assim são, a responsabilidade é de quem os firmou.

A minha argumentação foi posta no campo jurídico e nele, repito, não vi, até êste momento, nada destruído, e, pelo contrário, tudo absolutamente confirmado.

Há apenas um diploma, se assim se lhe pode chamar, a que sou forçado a fazer referência especial neste momento, porque foi aqui muito discutido e muito diversamente interpretado.

Refiro-mo à já célebre declaração de 4 de Setembro.

Essa declaração, aqui o afirmei, havia sido publicada sem data; precisamente porque a não tinha, e porque não fazia referência a qualquer outra em que o despacho fôsse lançado, e como aparecia publicada em 4 de Setembro, não se podia julgar com data diversa da dêsse dia. E, sendo assim, lógica, legal e juridicamente, tinha sido publicada, quando o Ministro, que a firmara, já não era Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Respondeu-se a isto que bem podia ser essa nota datada de 2 de Setembro, porque não era provável que ela fôsse enviada para a Imprensa Nacional no mesmo dia em que aparecia publicada no Diário do Govêrno.

Ora, em matéria de suposições, tudo é admissível; no entanto, devo retorquir com a declaração formal do Conselho Superior de Administração Financeira do Estado, de que a sua resolução foi tomada no dia 2 e que, nesse dia, não pudera ser entregue o respectivo ofício, porque o Ministério dos Negócios Estrangeiros já se achava fechado.

Sendo assim, a resolução só podia ter ali entrado no dia 3; mas, como o dia 3 foi domingo, segue se que só no dia 4.

O Sr. Germano Martins: - Mas S. Exa. entende, ou não, que o Conselho fez essa declaração no dia 2?

O Orador: - Eu não sei nem preciso saber em que dia êle a fez.

O Sr. Germano Martins: - Eu já disse a S. Exa. como se fez a impressão na Imprensa Nacional.

O Orador: - Eu não preciso de conhecer nada disso.

O Sr. Germano Martins: - Mas é que é preciso conhecer. Não podia deixar de ser no dia 2.

O Orador: - Em primeiro lugar devo dizer que não interrompo ninguêm, senão para uma justificação pessoal.

V. Exa. fala quantas vezes quiser; agora porem, não consinto que me interrompa.

O Sr. Germano Martins: - Trata-se duma justificação de facto.

O Orador: - Agora não consinto que me interrompa.

O Sr. Germano Martins: - Quem não tem argumentos é que não consente que o interrompam.

O Orador: - Não podia ser datado do dia 2 ou do dia 3. No dia 2 não podia ser, por que o ofício foi mandado e não foi recebido. No dia 3 tambêm não, porque era domingo.

Eis-me chegado a falar de novo, embora com sacrifício, no parecer da Procuradoria Geral da República. Não há, dúvida que essa elevada e importante instituição, é única e exclusivamente uma repartição de consulta, isto é, de informação; e não tem a menor função deliberativa.

Pode ela dizer nos seus pereceres as cousas mais substancialmente belas e superiormente jurídicas, ou fazer as mais estravagantes afirmações contra a lei e o direito: nada disso tem importância em efeito executivo, visto os seus pareceres serem meramente opinativos.

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Para lhes dar fôrça deliberativa carecem da sanção do Poder Executivo, por despacho ministerial; e o Ministro que as firma, é quem assume a responsabilidade.

Sem ir mais longe lembro, por paridade, o que sucede frequentemente, com o Supremo Tribunal Administrativo. Posto que êste tribunal tenha, em alguns casos, jurisdição própria e as decisões sejam executivas, êle é, acima de tudo, tribunal consultivo e precisa da sanção do Govêrno.

Ora, relativamente ao caso que se discute, eu disse já e repito, que o parecer da Procuradoria Geral da República é uma verdadeira monstruosidade jurídica, contendo duas afirmações que não podem passar sem o maior protesto.

Êsse parecer foi simplesmente leviano, para o não classificar com termo mais enérgico e expressivo.

O que o Ministério dos Estrangeiros perguntou á Procuradoria da República, em ofício, era se os decretos de 26 de Maio, que haviam nomeado os Srs. Abel Botelho e Bôto Machado, Ministros Plenipotenciários, subsistiam, e se a êsses funcionários podiam ser abonados os respectivos vencimentos.

A estas duas perguntas, precisas e concretas, a Procuradoria respondeu á primeira, divagando sôbre a constitucionabilidade dos decretos, cousa que se lhe não perguntava, para aproveitar o curioso argumento de que, se decretos tais e tais do Govêrno Provisório, de maior importância e de carácter legislativo, podiam vigorar e ter sido publicados com a assinatura dum só Ministro, do mesmo modo se deviam julgar nos decretos de simples nomeação, embora com fôrça de lei.

A Procuradoria da República, fazendo tal afirmação, esqueceu-se, porêm, de que se estava a condenar a si própria, porque o argumento baseava-se precisamente na publicação dos decretos tomados para termo de comparação; e os decretos de 26 de Maio, relativos às nomeações, nunca tinham sido publicados.

Por mais indulgente que se queira ser, não se pode admitir e perdoar que uma instituição de tal categoria se abonasse em falsidade tam grosseira e precipitada. Mas vamos ao segundo argumento. Eu revoltei-me contra o parecer da Procuradoria da República por dizer que os decretos subsistiam, porque a declaração de 4 de Setembro de 1911 as substituirá e se devia julgar válidas pelas mesmas razões alegadas.

A Câmara deve recordar-se ainda dos fundamentos com que impugnei tam injurídica como dissolvente doutrina; sendo certo que hoje tenho a aduzir um outro vindo em meu auxilio e derivado do Poder Executivo, que é a condenação moral, pelo menos, do discutido parecer.

Refiro-me à nova declaração publicada no Diário do Govêrno e firmada pelo Sr. Dr. Augusto de Vasconcelos, que é a reprodução, a reedição, da declaração de 4 de Setembro; a qual seria inútil e até inexplicável, se não fora a prova plena de que o Ministério dos Estrangeiros julgou nula e sem efeito a primeira declaração, a de 4 de Setembro, a que aliás a Procuradoria da República atribuía fôrça de decreto.

Devo repetir que o Sr. Presidente do Ministério, a quem já outro dia fiz neste lugar a devida justiça, conformando se com o parecer, não teve, nem pode ter senão a responsabilidade secundária, material para assim me exprimir, que a lei lhe impõe, visto não ser um profissional e, ainda quando o fôsse, ter justamente confiado na autoridade e competência da estação oficial, que consultara. Sem que isso sirva, portanto, a, derimir a sua responsabilidade legal, constitui em todo o caso uma atenuante de tal ordem que, completamente, justifica a sua responsabilidade moral; mas, por isso mesmo que assim é, ela tem de cair inteira sôbre a Procuradoria Geral da República, a quem eu, o Parlamento e o Govêrno temos o direito de exigir estritas contas do seu êrro, e de procurar impedir que volte a praticá-los semelhantes.

Sr. Presidente: A discussão dêste incidente tem sido completamente desviada, absolutamente distraída daquilo que devia ser.

Tratava-se dum pedido, ou, melhor, de dois pedidos do Sr. Bôto Machado. E agora vem a propósito fazer uma pequena rectificação ao que a tal respeito disse o Sr. Deputado Alexandre Braga.

Própriamente, aquilo que se está discutindo, não é o pedido do Sr. Bôto Machado a respeito da sua renúncia, é o da licença; mas seja um ou outro, que nos efeitos se equivalem, é a mesma a conclusão a que tem de chegar-se e são as mesmas as premissas em que assenta. Ora se, a pretexto desta limitada questão, vieram incidentemente o Sr. Abel Botelho, o Conselho Superior de Administração Financeira do Estado e tudo mais que se foi buscar para efeitos políticos, não tenho eu culpa disso. Pretendi na minha primitiva exposição convencer a Câmara; a prova feita até agora ninguêm a rebateu, de que qualquer dos dois pedidos era não só ilegal, mas anti-constitucional, o que é pior; e acabei por salientar, que mal iria à República no dia em que se esfrangalhasse, não já a lei ordinária, o que é um pequeno delito, mas a lei fundamental, a Constituição, o que seria um perigoso precedente de gravíssimas consequências. (Apoiados).

Eu disse tambêm então que não tinha a menor animosidade contra o sr. Bôto Machado, a quem nem sequer conheço, a quem nunca falei; nem a tenho tam pouco contra nenhuma das pessoas que neste lamentável incidente se encontrem envolvidas; mas era dever meu vir justificar á Câmara a razão do meu procedimento, do meu voto, quer na comissão, quer aqui, procurando ao mesmo tempo evitar que a Câmara, por precipitação e ignorância do assunto, tomasse uma deliberação injusta.

Ora, Srs. Deputados, o Sr. Bôto Machado não só não é Ministro em parte alguma, não só não é chefe de missão de segunda classe, mas não pode ser, em caso algum, nomeado cônsul, como o Govêrno o nomeou, nem desempenhar tais funções, como pretende com o seu pedido de licença ou de renúncia.

O § único do artigo 21.° da Constituição não pode ter a interpretação engenhosa, que lhe quiz dar o ilustre Deputado Sr. Germano Martins.

S. Exa. pode ter uma opinião pessoal, muito respeitável, fundada na sua elevada competência e superiores talentos; mas o que S. Exa. não pode, por impossível, é alterar e transformar o que está escrito na Constituição, e tam claro, expresso e terminante, que não há contra a sua letra sofismas imagináveis.

Diz o seu parágrafo:

Leu.

A leitura do texto dispensa qualquer comentário; a disposição é positiva e insofismável.

A questão da nomeação do Sr. Bôto Machado oferece um tríplice aspecto, porque pode considerar-se: o jurídico, o moral e o político. Foi apenas no primeiro campo, o jurídico, que o estudei e desenvolvi; mas nem por isso deixei de atender implicitamente os outros dois, chegando á conclusão - que mantenho, seja qual for o aspecto por que se encare - de que é preferível salvar os princípios, procurando uma tangente de legalidade, a sacrificar a Câmara em resolução ilegal.

Não quis abordar a questão no campo político, porque, se o quisesse fazer, seria ir mais longe do que desejava. Mas ha uma nota que posso ferir.

Pergunto: o que é melhor para a República, o que é melhor para o poder executivo, o que é melhor para o parlamento e o que é melhor para o país, se ter na embaixada da Argentina um funcionário que todos nós somos forçados a reconhecer em situação ilegal, ou se é mais

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político, se é melhor para a República sanar essa ilegalidade, que não representa uma imoralidade, mas que representa um êrro e que é preciso remediar? Pergunto: o que é mais justo, mais honesto e mais político?

Quisera eu, se tiver de exercer funcções que me acarretem responsabilidades graves no desempenho delas, poder vir ao parlamento dizer abertamente:

Srs. tive um lapso com a irreflexão, duma das repartições informaram-me mal e eu, iludido, precipitado, mas de boa fé; por êrro firmei tal documento. Era bem melhor isto do que persistir na ilegalidade, do que querer manter a ferro e a fogo o que não se pode manter. A Câmara julgará bem ou mal da minha sinceridade; isso quási me é indiferente, porque acima de tudo, ponho a própria consciência: no emtanto, como Deputado e como jurisconsulto, que se viu forçado a entrar neste debate, animo-me a pedir-lhe com instância um momento de reflecção e de ponderação a fim de que se faça o que se deve fazer: salvar o que é possível salvarmos.

A situação do Sr. Abel Botelho como chefe de missão de segunda classe imposta apenas pequenas beliscadura numa lei vulgar; e pertence ao poder legislativo fazer leis, revogá-las ou suspendê-las. Nada impede, portanto, que, usando dessa faculdade, acudamos agora, embora tardiamente, à sua situação ilegal.

Por equidade e idêntica razão, visto as condições serem rigorosamente idênticas, precisa e deve legalizar-se a nomeação do Sr. Bôto Machado para o cargo de Ministro Plenipotenciário de 2.ª classe, reconhecendo como legítima a sua colocação da disponibilidade. Não pode, porem, ir-se mais longe, permitindo a sua nomeação, em comissão, para desenpenhar as funções de cônsul geral no Rio de Janeiro; não só porque lei alguma autoriza os chefes de missão de 2.ª classe a exercerem o cargo de cônsules, mas sobretudo porque a nomeação, sendo o nomeado membro do Congresso, ofende insanávelmente a disposição proibitiva exarada na Constituição.

Portanto, Sr. Presidente, as minhas afirmações, feitas na sessão anterior, estão absolutamente de pé.

Ha, porem, necessidade de nos congraçámos para tudo se resolver condignamente. É isto é possível com um pequeno esforço Basta uma simples lei para solidar as nomeações diplomáticas. É um remendo, bem sei; mas é um remendo digno e honesto. O parlamento assume as responsabilidade e a situação fica legalizada, segura e defenida.

E fico-me por aqui.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Barbosa de Magalhães.

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Não desejo, Sr. Presidente, cansar a atenção da Câmara, mas, tendo assinado o parecer com declarações, entendo do meu dever dizer em breves palavras â Câmara, quais os motivos porque assim procedi.

Começo por lastimar, e bem sinceramente, que continuemos no sistema de prejudicar os assuntos importantíssimos que tem de ser discutidos nesta Casa do Parlamento, preterindo os por questões desta natureza, de cuja discussão não resulta, em regra, nenhum resultado prático ou vantajoso para a República. (Apoiados).

Eu assinei o parecer da comissão com declaração por que entendi que a comissão de legislação civil e comercial, não tem competência absolutamente nenhuma legal, nos termos do nosso Regimento, para dar parecer sôbre um assunto que é de ordem meramente administrativa e constitucional, e se quiserem, eleitoral, mas nunca de legislação civil e comercial.

E, portanto, desvirtuar as funções da comissão, mandar para lá assuntos que dizem respeito a interpretação de leis.

Se a Câmara quiser, pode eleger uma comissão de hermenêutica jurídica, mas emquanto não o fizer, essas funções não competem à comissão de legislação civil e comercial.

Assinei o parecer com declarações, porque entendia que a questão estava muito simplesmente restrita ao seguinte:

O Sr. Bôto Machado vinha pedir licença para exercer a comissão de cônsul geral do Brasil, não vinha pedir mais nada, e a Câmara para se pronunciar sôbre êste pedido, não tinha mais do que ir ver a Constituição, onde se estabelecem os casos em que se tem de dar licença aos Deputados para exercer funções. Quem lesse o artigo 53.° da Constituição, em dois minutos dizia, não é caso para dar licença, visto que não se trata de missão diplomática, nem de comissão de comando.

Foi com espanto meu, que o Sr. Mesquita de Carvalho me apresentou o seu parecer em que se discutia a questão desde o seu início, com grandes argumentos de ordem jurídica, indo buscar todos os elementos que do processo relativo á nomeação nasceram, para vir desviar a questão do ponto restrito em que estava, para a trazer à Câmara, em uma discussão como esta.

A questão liquida-se em poucas palavras; o Sr. Bôto Machado pediu licença para uma comissão de serviço; a Constituição é clara dizendo que a Câmara tem de a conceder quando se tratar de missões diplomáticas ou de comissão de comando militar.

Ora de nada disso se tratava. A Câmara, portanto, em duas palavras, sem necessidade de parecer de comissão alguma, respondia, não é caso para dar licença; e, desde que o Sr. Bôto Machado ainda não aceitou o lugar de cônsul geral do Brasil, e tanto não aceitou que vem pedir à Câmara licença para o aceitar. Pela minha parte não conheço facto algum que o prove, não havendo conhecimento de que o Sr. Bôto Machado tenha aceitado o cargo, eu e a Câmara não temos que pronunciarmos sôbre as consequências que advirão dum acto que não sabemos se se pratica.

O Sr. Bôto Machado não precisa de licença desta Câmara; aceita ou não o lugar para que foi nomeado, e depois discutiremos então se perde ou não o lugar que aceitou.

Esta é a doutrina. Estar aqui a discutir uma questão tam simples como esta, não será por efeitos políticos, mas para o público a aparência é essa, e a Câmara tem estado a perder tempo.

Foi por isso que, quando o Sr. Mesquita de Carvalho me apresentou o seu parecer, eu lhe disse que não concordava com êle, e disse mais que, vindo êsse parecer assinado por S. Exa., mas a seguir com os nomes de todos os outros vogais, tendo a nota de vencidos, êsse parecer não podia subsistir. A comissão concordou com a minha opinião nas três primeiras conclusões e êsse parecer foi, portanto, substituído por êsse outro bem simples, bera concreto, que a comissão apresentou por unanimidade, e em que, me parece, deve recair unicamente a votação da Câmara, nem mais nada é preciso, a não ser que se queira continuar a complicar esta questão.

Aceitei êste parecer com a declaração de não entrar na questão da legalidade ou ilegalidade, porque não é êsse o assunto em discussão, e se é certo que o Sr. Mesquita Carvalho tinha o direito, como Deputado, de levantar esta questão, não o e menos que o não devia fazer nesta ocasião, pois que S. Exa. diz que as nomeações se devem manter como agora declara.

Veja V. Exa., Sr. Presidente, e veja a Câmara, o tempo que se tem perdido, pois que no fim de toda esta discussão dalguns dias, se chega á conclusão, apresentada pelo próprio Sr. Mesquita de Carvalho, que as nomeações são ilegais mas que a Câmara as deve manter. Para que foi, pois, toda esta discussão? Absolutamente para nada.

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Eu compreendo que se levantasse esta discussão com um fim concreto, mas não assim.

Eu compreendia que se levantasse a questão com um fim, e assim a pôs o Sr. Álvaro Poppe, dizendo que o Sr. Bôto Machado não devia ir para o Brasil.

Mas estas ilegalidades que se deram agora, já não se tem dado em outros casos?

Seria bom pôr a questão no campo em que a pôs o Sr. Álvaro Poppe, e a questão tem estado, quanto a mim, perfeitamente deslocada; a Câmara quando tem tantos assuntos económicos e importantes a discutir, não deve estar a perder tanto tempo com questões destas, para, de mais a mais, chegar a semelhantes conclusões.

Vejo com grande mágoa que depois de se conseguir que o parecer se reduzisse ao que se devia reduzir, â verdadeira doutrina, se derivasse para uma tal questão.

A Câmara foi arrastada para um fim diverso do que era a questão, fim que nem é útil nem prático.

O parecer da comissão representa a verdade, e a única doutrina que a Câmara pode aceitar, e é êsse o parecer que eu voto, porque tudo o mais vem tirar o aspecto concreto e restrito que a questão deve ter.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Álvaro Poppe.

O Sr. Álvaro Poppe : - Sr. Presidente: devo começar por agradecer ao Sr. Deputado Barbosa de Magalhães as palavras amáveis que me dirigiu, e aproveito-as para dizer que efectivamente tinha um fim quando levantei a questão.

O fim era evitar que o Sr. Bôto Machado fôsse representar o nosso país junto de qualquer nação estrangeira, ou ainda que fôsse dirigir o primeiro consulado de Portugal, que é o do Rio de Janeiro, impedindo assim o desrespeito que se pretende fazer às disposiçõos legais.

É, precisamente porque tinha um fim, ainda mais uma vez vou demonstrar qual a razão que assiste a todas as minhas considerações acêrca da não nomeação do Sr. Bôto Machado para chefe da missão de 2.ª classe, e por consequência a não validade da sua nomeação de agora, para cônsul no Rio de Janeiro.

Quando na sessão de 15 de Fevereiro apareceu o pedido de licença do Sr. Bôto Machado, eu, que estava ao lado do Sr. Presidente, disse: a Câmara não pode conceder essa licença, porquanto o Sr. Bôto Machado não está ao abrigo do n.° 1.° do § 1.° do artigo 20.° da Constituição ; e não está, porque não é missão diplomática a que se pretende que êle vá desempenhar no Brasil, nem que a fôsse, êle podia estar ao abrigo dessa disposição.

Baseado no direito internacional eu poderei responder ao Sr. Brito Camacho, que uma função consular não é uma função diplomática.

São funções absolutamente distintas, como vou mostrar á câmara.

O Sr. Brito Camacho: - Não disse que era a mesma cousa.

O Orador: - Não é uma questão de memória, tenho-o aqui escrito, nos apontamentos que tomei durante o seu discurso, para lhe poder responder.

Leu.

O Sr. Brito Camacho: - Perdão. Não disse isso. Disse que o Sr. Bôto Machado ia interinamente desempenhar funções consulares.

O Orador: - Se V. Exa. dissesse só isso, não teria eu dito, em áparte, como disse: isso é que é uma argumentação verdadeiramente extraordinária! V. Exa. sustentou que era equivalente.

Prometendo não me demorar em largas divagações sôbre direito internacional e história consular, vou no entanto fazer um apanhado dum e doutra para mostrar bem a diferença entre função diplomática e função consular.

E vou fazê-lo não com á pretensão de quem da sua cátedra faz uma preleção a alunos, mas ao contrário, como discípulo que pede a benevolência do mestre, que neste caso será o Sr. Ministro dos Estrangeiros, ilustre professor de medicina, mas tambêm muito estudioso em assuntos desta natureza.

Sr. Presidente: a instituição consular nasceu nas feitorias christãs do Levante ou colónias comerciais, que os europeus estabeleceram nas cidades da Costa Orientai do Mar Mediterrâneo.

O aparecimento destas funções consulares foi devido a três causas:

A primeira: á formação das feitorias no Oriente. A segunda: à prática de nas cidades comerciais, os comerciantes elegerem, magistrados especiais, que se denominaram cônsules, e eram encarregados da polícia dos mercados e do julgamento dos litígios.

É a terceira: ao sistema da personalidade das leis. V. Exa. sabem bem, que durante muitos anos um indivíduo que ia para uma terra estranha, ia por assim dizer, envolto nas leis do seu país e só por elas podia ser julgado.

É isto mesmo ainda hoje se dá nalguns países que estão fora, da chamada comunidade internacional.

A função consular atravessa três fases, cujos períodos e características são:

A primeira fase que vai do século XI a XVI, tinha por principais características a jurisdição e a eleição. Esta era feita escolhendo os indivíduos duma determinada nação residentes noutra, de entre si aquele a quem devia competir o exercício da função consular. É a fase designada pela dos cônsules electa.

Na segunda fase que abrange todo o século XVI, com a Renascença desenvolve-se, por assim dizer, o poder de absorção dos Estados, e os cônsules que até aí eram eleitos como se disse, passam a ser escolhidos pelo poder central, mas ainda assim dentre os indivíduos que no momento da nomeação residiam nessas terras. E a fase designada pela dos cônsules missa. Na terceira fase que vem do século XVII até aos nossos dias, desaparecem nos Estados Europeus quási todas as funções jurisdiciocionais, que os cônsules anteriormente tinham; e a sua escolha faz-se, como sabem, por modo absolutamente diferente.

Até à queda do império romano não se constituía direito internacional. Os povos não se podiam ver uns aos outros. Cada nação considerava as outras como inimigas a vencer.

E com a paz de Vestfália - 1648 - que se assentam e definem as relações internacionais que de há muito se vinham esboçando.

Já em 1625 o celebre advogado Hugo Grotins escrevera o afamado tratado que até á revolução francesa foi considerado o código do direito internacional.

Depois da queda de Napoleão, com o insucesso de Waterloo, foi necessário fazer a reconstituição da comunidade europeia, e foi assim que se reuniu o Congresso de Viena no fim do ano de 1814, tendo o regulamento de 19 de Março de 1810, depois completado pelo protocolo de 21 de Novembro de 1819 em Aix-la-Chapelle, feito a

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classificação dos agentes diplomáticos, determinando não só as suas prerrogativas como as dos cônsules, e estabelecendo a forma de investidura duns e doutros.

É assim que o corpo diplomático, ou agente diplomático, que representa o Estado junto dos governos estrangeiros, ou para exercício duma missão temporária ou permanente, foi dividido em quatro classes: 1.ª Embaixadores - legados ou núncios - denominados legati a latem quando são escolhidos dentre os do "Sacro Colégio", e legati missi quando a nomeação recai em qualquer cardeal - 2.ª Enviados extraordinários ou Ministros plenipotenciários - 3.ª Ministros residentes - 4.ª Encarregados de Negócios - Os agentes diplomáticos tem as seguintes prerrogativas : Inviolabilidade da sua pessoa, de todo o pessoal da legação, oficial e não oficial, da sua família, de todas as cousas que lhe digam respeito, como os seus papéis, o seu domicílio, as suas equipagens etc. - A inviolabilidade é o privilégio fundamental dos agentes diplomáticos- Extraterritorialidade - Princípio que estabelece a legação e pessoal estar sujeito a lei nacional do agente diplomático. Direito do asilo. Imunidade local. Imunidade de jurisdição : -policial criminal, civil e fiscal, Direito do culto domestico.

Os agentes diplomáticos representam as nações dum modo geral e no conjunto dos seus interesses, como pés soas soberanas e independentes,

Ao passo que aos cônsules foi atribuída a missão de representarem as mesmas nações no que especialmente respeita aos interesses económicos e sociais, e a protecção dos seus nacionais. As suas prerrogativas são diminuitíssimas; só tem a inviolabilidade pessoal, e essa mesma é relativa; são dispensados, por grande número de convenções consulares, de comparecerem como testemunhas nos tribunais e tem o privilégio de poder ter sôbre a porta exterior da sua habitação o escudo com as armas do seu país.

Vimos até aqui que não há equivalência alguma entre cargos diplomáticos e consulares, não só no que diz respeito ás fincões que uns e outros tem a desempenhar, mas ainda nas prerrogativas inerentes aos respectivos cargos.

Vamos agora ver como se faz a investidura do agente diplomático e do funcionário consular, para bem se demonstrar não existir entre uma e outra forma, equivalência alguma.

Para uma nação aceitar o representante doutra, é uso, ter previamente dado o seu agrément. É certo que os Estados Unidos da América do Norte mandam os seus representantes sem para êles pedirem o agrément. E a única nação, das que pertencem à comunidade internacional, se não estou em êrro que assim procede. A investidura do agente diplomático faz-se por meio de carta credencial que, em audiência, entrega ao chefe do Estado junto do qual vai representar o seu país.

A investidura do funcionário consular, que não precisa de agrément, faz-se por meio de carta patente que, o agente diplomático da nação a que o cônsul pertence, apresenta no Ministério dos Negócios Estrangeiros do Estado onde .esse cônsul vai exercer as suas funções. O Ministro dos Negócios Estrangeiros, como na Áustria, escreve nessa carta patente a palavra exequatur, que é, como se sabe, a autorização para o cônsul poder exercer o seu lugar. Na Inglaterra e na Bélgica dá-se o exequatur por decreto; entre nós por outra carta patente; e países há onde o Ministro dos Negócios Estrangeiros só põe, na carta patente apresentada, a sua assinatura.

Mas a diferença, entre o agente diplomático e o cônsul, é tam grande tam manifesta, que o agente diplomático, logo que mudam as instituições do seu país, perde imediatamente as suas credenciais, ou mesmo se morre o Chefe do Estado a que êle pertence.

Quando sobe ao trono o novo Chefe do Estado, precisa novas credenciais.

É o cônsul, quer num, quer noutro caso, continua exercendo as suas funções.

Por consequência, desde que os tratadistas de direito internacional estabelecem todas estas diferenças que os Estados pertencentes à comunidade internacional aceitaram, não é nenhum de nós que, a seu belo prazer, pode alterar o que, sendo mais do que praxe, é quási lei internacional.

Sr. Presidente: acabo de mostrar a não equivalência da função diplomática e consular e, nestas condições, eu sustento que se não pode conceder licença ao Sr. Bôto Machado para ir ser cônsul de Portugal no Rio de Janeiro.

Mas mais: se a missão de S. Exa. fôsse uma missão diplomática, e não consular, como é, tambêm lhe não podia ser concedida a licença, a não ser que fôsse nomeado chefe de missão de 1.ª classe.

E é fácil demonstrar esta asserção; diz o artigo 4.° da organização do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de 26 de Maio:

Leu.

Quando se votou a Constituição, já estava em vigor o decreto de 26 de Maio.

Esta excepção do n.° 1.° do § 1.° do artigo 20.°, não pode dizer respeito ao caso do Sr. Bôto Machado; ela só serve para aplicar àqueles que estejam no caso do artigo 4.° do decreto de 26 de Maio

Eu sei que o decreto com fôrça de lei de 26 de Maio, diz:

Leu.

Mas o n.° 1.° não pode ser aplicado senão às pessoas a que se refere o artigo 4.°, e não pode, porque, é claro, todos os outros funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que forem membros do Congresso, e lhes compita promoção, estão, como todos os outros funcionários do Estado, ao abrigo do n.° 3.° do § 1.° do mesmo artigo, que diz claramente:

O n ° 1.° do § 1.° do artigo 20.°, é excepção para os que aceitem missões diplomáticas durante a legislatura, e não se pode referir a outros que não estejam ao abrigo do artigo 4.° do decreto de 26 de Maio. Aos funcionários de carreira aplica-se-lhes o n.° 3.°

Mas demonstrado que o cargo diplomático nada tem que ver com o cargo consular, eu aceito a teoria do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, de que dentro do seu Ministério coloca o seu pessoal da maneira que melhor convier ao serviço da nação.

Perfeitamente de acordo. Mas não se quererá dizer que um ministro de 2.ª classe, quando vá desempenhar funções de cônsul, tenha as atribuições inerentes ao primeiro cargo.

É preciso não confundir.

Eu vou mais uma vez repetir que esta questão está absolutamente deslocada. Não houve atropelo de lei, não houve irregularidades, o que houve foi uma cousa muito singela: ; foi não se fazer a nomeação do Sr. Fernão Bôto Machado!

Está a discutir-se, portanto, uma cousa que se não fez!

O Sr. Bôto Machado não está nomeado! Para o ser, era preciso ter-se cumprido uma disposição do decreto de 8 de Outubro de 1910, que é a seguinte:

Léu.

Atropelo de lei e irregularidade praticar-se-hiam agora, se se teimar em fazer a nomeação.

O parecer da Procuradoria de nada vale, porque estabelece o princípio de que o decreto foi publicado, e êle não o foi.

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SESSÃO N.° 70 DE 11 DE MARÇO DE 1912 23

É um êrro do facto.

O que se discutiu, pois, era se um decreto na gaveta do Ministro, podia valer como lei!?

Ninguém aqui no Parlamento pode manter semelhante doutrina.

A questão está, pois, julgadíssima.

Licença não podia o Sr. Bôto Machado ter, por não se tratar do n.° 1.° do § 1.° do artigo 20.° da Constituição e cônsul para o Brasil não podia ir, porque jamais for nomeado agente diplomático ou funcionário consular.

Sr. Presidente: a minha moção tem V. Exa. e a Câmara de reconhecer que é justa, pois não é mais do que a afirmação de factos absolutamente verdadeiros, e a citação das disposições legais que devendo ter sido observadas, para o caso de se ter querido fazer a nomeação, o não foram.

A minha moção diz:

Leu.

Não podem, por consequência, V. Exas. deixar de dar o seu voto.

Vou agora mostrar que a moção do Sr. Brito Camacho é inconstitucional.

A Constituição diz:

Leu.

Portanto, a moção do Sr. Brito Camacho não pode ser aprovada; se o for, a Câmara vota contra a Constituição.

A moção do Sr. Brito Camacho diz:

"... mas considerando que a Procuradoria Geral da República não encontrou nessas formalidades preteridas, nenhuma que implicasse nulidade intrínseca... "

Ora isto não é verdade.

Ninguém perguntou à Procuradoria da República se teria valor um decreto que não tinha sido publicado; e, nessas circunstancias, a Procuradoria da República não podia ter tido outra opinião, que a que teve. Ela supunha o decreto publicado. E do seu parecer tambêm isso se conclui.

Mas diz ainda a moção do Sr. Brito Camacho:

"... e tendo em vista, finalmente, que o Conselho Superior da Administração Financeira do Estado já reconheceu valor de decretos as declarações publicadas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, nos termos do artigo 12.° do decreto de 11 de Abril de 1911..."

Aqui há outro êrro.

O Conselho Superior da Administração Financeira do Estado não tem de reconhecer o valor do decreto.

Êsse Conselho não tinha senão de ver se sim ou não a contabilidade devia pagar, e quando a êsse Conselho se perguntou se se podia fazer a nomeação, êle disse que não, por o indivíduo que se pertendia nomear, exercer outro lugar, para que tinha sido nomeado depois de 26 de Maio.

Isto é que é importante (!) pois o Conselho não podia pôr o visto num decreto datado de 26 Maio, nomeando um indivíduo para um determinado lugar, quando sabia muito bem que dias antes havia já posto o visto noutro decreto datado de 27 de Maio, nomeando o mesmo indivíduo para outro lugar!!

O Sr. Brito Camacho (interrompendo): - Mas o visto em quê?

O Orador: - V. Exa. não me confunde. Eu não saio da linha das minhas considerações.

Quando o Conselho p5e o visto num decreto não incorre em responsabilidade alguma desde que o lugar está vago e pode ser ocupado.

Êle o que tinha a dizer é se se podia pagar ao Sr. Bôto Machado.

Mas a moção do Sr. Brito Camacho acaba nos seguintes termos: "a Câmara emite parecer de que as formalidades preteridas não são de natureza a invalidar a nomeação do mesmo funccionário para chefe de Legação s.

Esta parte é inconstitucional, porque estabelece a peregrina doutrina de se poderem dispensar formalidades legais preceituadas em decretos do Govêrno Provisório, e que o artigo da Constituição diz serem lei, enquanto não forem revistos pelo Congresso.

Para que serve então o artigo 80.° da Constituição?

Já é letra morta o código administrativo da República?

Diga a Câmara se esta moção pode ser aprovada.

Tenho a esperança de que o não será.

Se o Sr. Ministro dos Estrangeiros quere nomear cônsul o Sr. Bôto Machado, só tem uma maneira legal de o fazer:

Pede à Câmara reveja o decreto de 26 de Maio de 1911, que reorganizou os serviços do seu Ministério, e lhe introduza qualquer cláusula de modo a poder nomear o mesmo senhor.

O processo talvez não seja agradável, por representar uma medida de excepção; mas o que se pretende fazer é pior, porque vai contra as disposições legais.

Eu declaro desde já que não voto semelhante cláusula, mas para aqueles que porventura votarem a moção do Sr. Brito Camacho, será preferível votá-la; ao menos não votaram contra disposições constitucionais.

Êsse é que é o caminho. Se V. Exas. querem manter a nomeação, não tem, repito, senão um caminho legal a seguir, é vir á Câmara o decreto de 26 de Maio, revê-lo em condição de êsse senhor poder ser nomeado porque até aqui nunca o foi e desde que não o foi, o artigo da Constituição opõe-se a que o seja agora.

Isto pelo que diz respeito à moção do Sr. Brito Camacho.

A do Sr. José Barbosa tambêm não pode ser votada, tambêm é inconstitucional, mas eu tenho a certeza de que S. Exa., que é um espírito justo, há de ser o primeiro a retirá-la.

Eu digo porque é inconstitucional; no fim diz "É relevado da responsabilidade..."

Sr. Presidente: Se efectivamente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros estivesse incurso na penalidade correspondente àquilo que prevê o decreto com fôrça de lei de 11 de Abril de 1911, não era a Câmara que lhe podia passar uma esponja sôbre essa responsabilidade, porque a constituição a isso se opunha; o poder judicial é que tem com isso. A Câmara não podia vir dizer: fica ilibada a responsabilidade do Sr. fulano, quando êsse Sr. fulano está recurso num determinado artigo de jurisdição criminal. Não confundamos.

Efectivamente, o Sr. Augusto de Vasconcelos não tem responsabilidade alguma, porquanto a responsabilidade que êsse mesmo decreto de 11 de Abril lhe podia impor, era a do pagamento se resultasse dano para o Estado, mas não há dano, porquanto o lugar está vago.

Não pode ter senão a responsabilidade política, se teimar em manter uma cousa que não pode ou não deve manter.

Sr. Presidente: o Sr. Augusto de Vasconcelos imaginou, e toda e qualquer pessoa que não tivesse saído dos bastidores desta scena imaginaira, que o Sr. Bôto Machado tinha sido nomeado, mas dizendo-lhe alguém que havia

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dúvidas sôbre essa nomeação, consultou S. Exa. a Procuradoria Geral da República. Eu bem sei que a responsabilidade é sempre do Ministro e não da Procuradoria Geral da República; mas S. Exa. consultou a entidade que podia e devia consultar; por consequência, ainda debaixo dêste aspecto, não tem responsabilidade alguma, por isso era melhor que o Sr. José Barbosa retirasse a sua moção. V. Exa. compreende, não é de forma alguma um favor que lhe peço; o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros está acima de toda a suspeição; é por espírito de justiça, e para não ter de incidir votação sôbre matéria inconstitucional.

Sr. Presidente: os intuitos com que eu levantei esta questão tem sido apreciados por maneira que bem faz lembrar os antigos tempos do velho regime; aqui dentro desta casa do Parlamento parece que ainda existe um pouco da atmosfera de então, a qual era a de todo e qualquer Deputado não poder levantar uma questão, por simplesmente estar convencido da sua legalidade ou não legalidade, da sua razão ou não razão. Era preciso entender-se com o grupo político a que pertencia. E se o não fizesse, logo se dizia: A que fim visará fulano?

Sr. Presidente: não me entendi com pessoa alguma. Levantei a questão, porque julguei prestar um serviço à República, qual é o de, a dezassete meses da sua existência, pretender evitar que se desrespeite, como se deseja, um artigo da Constituição. Êste é o intuito com que a levantei. É o fim a que viso.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, a hora vai bastante adiantada e eu já há muito que estou usando da palavra e abusando da atenção da Camara (Vozes: Não apoiado), mas entendi que tinha obrigação de ir até o fim.

Tenho dito.

O Sr. Lopes da Silva: - Requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se julga a matéria suficientemente discutida, sem prejuízo dos oradores inscritos.

O Sr. Mendes de Vasconcelos: - Requeiro a contagem.

O Sr. Presidente - Vai proceder-se á chamada. Faz-se a chamada.

Srs. Deputados presentes: Adriano Gomes Ferreira Pimenta, Adriano Mendes de Vasconcelos, Alberto de Moura Pinto, Albino Pimenta de Aguiar, Alexandre Braga, Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá, Alfredo Djalme Martins de Azevedo, Alfredo Guilherme Howell, Álvaro Poppe, Álvaro Xavier de Castro, Américo Olavo de Azevedo, António Alberto Charula Pessanha, António Albino Carvalho Mourão, António Aresta Branco, António Augusto Pereira Cabral, António França Borges, António Joaquim Ferreira da Fonseca, António Maria Malva do Vale, António Maria da Silva, António Pádua Correia, António Pires Pereira Júnior, António Silva Gouveia, Aquiles Gonçalves Fernandes, Augusto José Vieira, Baltasar de Almeida Teixeira, Caetano Francisco Cláudio Eugénio Gonçalves, Carlos António Calixto, Carlos Henrique da Silva Maia Pinto. Carlos Olavo Correia de Azevedo, Casimiro Rodrigues de Sá, Eduardo de Almeida, Fernando Baeta Bíssaia Barreto Rosa, Fernando da Cunha Macedo, Francisco de Sales Ramos da Costa, Gastão Rafael Rodrigues, Gaudêncio Pires de Campos, Germano Lopes Martins, Guilherme Nunes Godinho, Helder Armando dos Santos Ribeiro, Henrique José Caldeira Queiroz, Henrique José dos Santos Cardoso, Inocêncio Camacho Rodrigues, João Carlos Nunes da Palma, João Duarte de Menezes, João Luís Ricardo, João Pereira Bastos, Joaquim Brandão, Jorge de Vasconcelos Nunes, José António Simões Raposo Júnior, José Barbosa, José Bernardo Lopes da Silva, José Bessa de Carvalho, José Botelho de Carvalho Araújo, José Francisco Coelho, José de Freitas Ribeiro, José Luís dos Santos Moita, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, José Mendes Cabeçadas Júnior, José Miguel Lamartine Prazeres da Costa, José Perdigão, José da Silva Ramos, José Tristão Paes de Figueiredo, José do Vale Matos Cid, Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Luís Inocêncio Ramos Pereira, Manuel Alegre, Manuel de Brito Camacho, Manuel Pires Vaz Bravo Júnior, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Tomé José de Barros Queiroz, Vitor José de Deus Macedo Pinto, Vitorino Henriques Godinho e Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 73 Senhores Deputados; não pode, portanto, ssr votado o requerimento do Sr. Lopes da Silva.

A próxima sessão é amanhã, 12, à hora regimental, sendo a ordem do dia a mesma que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram 20 horas e 10 minutos.

Representações

Da Câmara Municipal de Moncorvo, pedindo que do legado deixado por Manuel António de Seixas, capitalista, oriundo de Lisboa e conhecido pelo "Seixas do Rocio", para ser criada naquela vila uma escola, legado que rende anualmente 630$000 réis, e, como há uns poucos de anos não funciona a escola, devendo para isso haver, a favor desta, uma verba superior a 3:000$000 réis, no Ministério do Interior (que tem a administração legal do legado) tal produto seja, desde já, destinado a edificar o estabelecimento com que mais tarde há de funcionar a escola de instrução primária superior.

Para a Secretaria.

Para a comissão de instrução primária.

Da comissão republicana administrativa do Município de Cintra, pedindo a regulamentação do jôgo.

Para a comissão de legislação civil e criminal.

De João Carlos de Oliveira Leone, pedindo que não seja tomada resolução sôbre um segundo projecto, visto ter requerido que lhe fôsse concedido aturar e explorar por noventa anos os terrenos entre a Ponta dos Corvos no Seixal e o Rio das Enguias, tendo sido nesse sentido apresentado um projecto em 22 de Fevereiro do corrente ano.

Para a comissão de obras públicas.

O REDACTOR = Albano da Cunha.

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