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REPÚBLICA

PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂM4RA DOS DE

SIE3SSA.O 3ST.°

EM 2 DE MAIO DE 1922

Presidência do Ex.mo Sr, Domingos Leite Pereira Baltasar de Almeida Teixeira

Secretários os Ex.mos Srs.

João de Orneias da Silva

Sumário. — Abwtura da sessão. Leitura da acta. Correspondência.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Cancela de Abreu reclama a presença do Sr. Ministro doa Estrangeiros.

O Sr. Torres Garcia reclama a presença do Sr. Ministro da Guerra oií qualquer membro do Governo.

O Sr. Rego Chaves insta pela remessa de documentos.

O Sr. Torres Garcia, achando-se presente o Sr. Presidente do Ministério, chama a atenção do • Governo para a forma como está sendo executada a lei do recrutamento militar.

Responde-lhe o Sr. Presidente do Ministério (António Maria da Silva).

O Sr. Cunha Leal manda para a Mesa um projecto de lei) para o qual pede urgência e dispensa do Regimento.

Ê aprovado este requerimento. Lido na Mesa o projecto de lei do Sr. Cunha Leal e, entrando em discussão, usa da palavra o Sr. Carvalho da Silva, sendo em seguida aprovado na generalidade e na especialidade e dispensada a sua última redacção, a reqiierimenio do Sr. Cunha Leal.

O Sr. Ministro do Comércio (Lima Basto) manda para a Mesa uma proposta de lei sobre estradas.

O Sr. António Correia reclama contra a extinção de várias estações telegráficas e telefónicas. Responde-lhe o Sr. Ministro do Comércio. O Sr. António Correia usa novamente da palavra para explicações.

O Sr. Canc.ela de Abreu ocupa-se da representação de Portugal na Conferência de Génova e chama a atenção do Sr. Ministro dos Estrangeiros' para a inteira execução do donvénio de Madrid relativo a garantia das marcas de vinho.

O Sr. Agatào Lança requere que na próxima sessão S'já di cutkio o projecto de lei, já aprovado no Senado, sobre as pensões às famílias das vítimas do 19 de Outubro.

E aprovado este requerimento.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Barbosa de Magalhães) responde ao Sr. Cancela de Abreu, e termina propondo um vo'o de saudação à Nação Brasileira por motivo do aniversário da descoberta do Brasil.

Usam da palavra os Srs.r Afonso de Melo, Nuno Simões, Carlos Pereira, Álvaro de Castro, Morais Carvalho e Lino Meto, sendo em seguida apro-vano o voto de saiidacão proposto pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Entra em discussão, a requerimento do mesmo Sr. Ministro, uma proposta de lei autorizando a aquisição dum palácio para a embaixada portuguesa no Rio de Janeiro.

Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva e Nuno Simões, que envia para a Mesa uma moção.

Lida na Mesa é admitida.

Seguem-se no usn da palavra os Srs. Bartolo-me.u Severino, Cat valho da Silva, Nuno Simões e Ministro dos ^tgócios Estrangeiros.

O Sr. Bartolomeii Severino requere a prorrogação da^sesuão até ser votada a pi oposta em discussão. Ê aprovado.

Seyuem-se no uso da palavra os Srs. Cunha Leal, Joaquim Ribeiro e Lino Neto.

O Sr. Carvalho da Silva u*a novamente da palavra, dirigindo algumas preyitnías ao Sr. Ministro da Guerra (Correia Barreto), n que este rc*-ponde.

O Sr. Carvalho da Silva volta a usar da palavra.

O Sr. Ministro da Gueri a dá ainda algumas explicações, e em seguida usam da palavra os Srs. João Camoesas e Carvalho da Silva.

Encerrado o debate, é aprovada a moção do Sr Nuno Simões.

E aprovada em seguida a proposta de lei do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, na generalidade e na especialidade, sendo dispensada a sua ultima redacção, a requerimento do &r. João Camoesas:

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Diário da Câmara dos Deputados

Abertura da sessão às 15 horas. Presentes à chamada 68 Srs. Deputados.

São o» seguintes :

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho. Alberto Ferreira Vidal. Alberto de Moura Pinto. Alberto da Rocha Saraiva. Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa. Amaro Garcia Loureiro. Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

Aníbal Lúcio de Azevedo. António Alberto Torres Garcia. António Augusto Tavares Ferreira. António Correia. António Dias.

António Joaquim Ferreira da Fonseca. António Pais da Silva Marques. António de Paiva Gomes. António de Sousa Maia. Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Artur Brandão. Artur de Morais de Carvalho. Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Artur Virgínio do Brito Carvalho da Silva.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira. Bartolomeu dos Mártires Sousa Seve-rino.

Carlos Cândido Pereira.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Constâncio de Oliveira.

Custódio Martins de Paiva.

Domingos Leite Pereira.

Eugênio Rodrigues Aresta.

Francisco da Cunha Rego Chaves.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

João Carlos Moniz Bacelar.

João Estêvão Águas.

Jo8o Luís Ricardo.

João de Orneias da Silva.

João Pedro de Almeida Pessanha.

João Pina de Morais Júnior.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.

Joaquim Serafim de Barros.

José António de Magalhães.

José Carvalho dos Santos.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Mendes Nunes Loureiro. José de Oliveira da Costa Gonçalves. José Pedro Ferreira. Júlio Henriques de Abreu. Lourenço Correia Gomes. Lúcio Alborto Pinheiro dos Santos. Lúcio de Campos Martins. Luís António da Silva Taví.res de Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Manuel de Sousa Coutinho.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mariano Mcirtins.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mário de Magalhães Infante.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Nuno Simões.

Paulo Cancela de Abreu.

Pedro Gois Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Tomé José de Barros Queiroz.

Vergílio Saque.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Afonso de Melo Pinto VeloBO.

Albano Augusto Portugal Durão.

Alberto Xavier.

Álvaro Xavier de Castro.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

António Lino Neto.

António Maria da Silva.

António Viconte Ferreira.

Armando Pereira de Castro Agatao Lança.

Augusto Pereira Nobre.

Delfim Costa.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Francisco Cru/.

João José da Conceição Camoesas.

João Pereira Bastos.

José Marques Loureiro.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

Manuel Duarte.

Paulo da Costa Menano.

Vasco Borges.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

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Sessão de 2 de Maio de 1922

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso Augusto da Costa.

Aires de Orneias e Vasconcelos.

Alberto Carneiro Alves Cruz>,

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto Leio Portela.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Américo da Silva Castro.

António Abranches Ferrão.

António Albino Marques de Azevedo.

António Ginestal Machado.

António de Mendonça.

António Eesende.

Augusto Joaquim Alves dos Santos.

Bernardo Ferreira de Matos.

Custódio Maldonado de Freitas.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Germano José de Amorim.

Hermano José de Medeiros.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

Jaime Daniel Leote do Rego.

Jaime Duarte Silva.

Jaime Júlio de Sousa.

Jaime Pires Cansado.

João Baptista da Silva.

João José Luís Damas.

João Satema.

João de Sousa Uva.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Brandão.

Joaquim Dinis da Fonseca.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Jorge Barro s Capinha.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Cortês dos Santos.

José Domingues dos Santos.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros. . x

José de Oliveira Salvador.

Júlio Gonçalves.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Manuel Alegre.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso. Manuel Ferreira do Matos Rosa. Manuel Ferreira da Rocha. Manuel de Sousa da Câmara. Manuel de Sousa Dias Júnior. Maximino de Matos. Paulo Limpo de Lacercla. Pedro Augusto Pereira de Castro. Rodrigo José Rodrigues. Sebastião -Herédia. Teófilo Maciel Pais Carneiro. Tomás de Sousa Rosa. Valentim Guerra. Ventura Malheiro Reimão". Vergílio da Conceição Costa. Vitorino Henriques Godinho. Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Pelas 15 horas, com a presença de 60 Srs. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta.

foi aprovada.

Leu-se o seguinte

Ofícios

Do Ministério do Comércio, satisfazendo ao requerido pelo Sr. Jaime Duarte Silva e pedido no ofício n.° 127.

Para a Secretaria.

Do Ministério da Guerra, pedindo a comparência do Sr. Cunha Leal no Tribunal de Marinha, no dia 5 do corrente pelas 12 horas.

Comunique-se ao Sr. Cunha Leal.

Telegramas

Dos núcleos escolares de Serpa, Cada-val e Figueira de Castelo Rodrigo, do professorado de Cuba, Castro Verde, Beja, Braga e Carrazeda de Anciães, pedindo a aprovação da proposta do Sr. Ministro de Instrução Pública sobre ensino primário geral.

Para a Secretaria.

Requerimentos

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Diário da Câmara dos Deputados

Admissões

Foram admitidas à discussão as seguintes proposições de lei:

Proposta

Do Sr. Ministro da Justiça autorizando o Governo a arrendar o prédio da Rua de S. Pedro de Alcântara, onde se acha instalado o Tribunal do Comércio de Lisboa.

Para a comissão de finanças.

Do Sr. Ministro do Comércio, aprovando o contrato relativo à comissão de amarração e exploração, no Faial, dum cabo telegráfico submarino que ligue a América do Norte, Terra Nova ou ilhas francesas da costa da Terra Nova com o continente europeu.

Para a comissão de correios e telégrafos.

Dos Srs. Ministros das Finanças e Negócios Estrangeiros considerando nula a pena de demissão infligida ao cônsul em Coritiba, José Augusto Ribeiro de Melo.

Para a comissão dos negócios estrangeiros.

Projectos de lei

Do Sr. Baltasar Teixeira, desanexando da comarca de Portalegre, e anexando-a à de Nisa, a freguesia de Gáfete, concelho de Crato.

Para a comissão de legislação civil e comercial.

Dos Srs. Pires Monteiro, Crispiniano da~Fonseca Silva Matos, criando a Junta Autónoma do Porto e Barra de Vila do Conde.

Para a comissão de administração pública.

Do Sr. Lúcio dos Santos, autorizando o Governo a reformar, sob designadas bases, o ensino técnico profissional e médio.

Para a comissão de instrução especial e técnica.

Antes da ordem do dia

O Sr. Cancela de Abreu: — Há três sessões que desejo tratar de um assunto na presença do Sr. Ministro dos Estrangeiros

Como, ainda hoje, S. Ex.a não está, peço a V. Ex.a para me inscrever para quaiido S. Ex.a estiver presente.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro dos Estrangeiros comunicou-me qu.e não pode estar aqui antes da ordem do dia, mas que ia fazer todo o possível para vir ainda nesta sessão.

O Sr. Rego Chaves: — Presunto a V. Ex.a seja está sobre a Mesa a cópia dum documento que requeri pelo Ministério das Finanças, e que me interessa sobremaneira para em negócio urgente tratar desse assunto amanhã nesta Câmara.

O Sr. Presidente: — O requerimento a que se refere o Sr. Rego Chaves ainda não veio.

Pausa.

O Sr. Cunha Leal: — <_:A p='p' está='está' interrompida='interrompida' sessão='sessão' _='_'>

O Sr. Presidente: — Como uma parte do Governo está no edifício do Congresso, eu vou pedir a alguns dos Srs. Ministros para comparecerem aqui.

O Sr. Torres Garcia:—Eu chamo a atenção do Governo para um assunto que reputo do máximo interesse e que no momento presente assume proporção de gravidade.

Refiro-me à lei do recrutamento militar, que. pelo que se está fazendo, é prejudicial para a moral social, bons costumes e prestígio das instituições. Prejudicial também para o prestígio da institui1 cão militar, entendo eu que o Ministério da Guerra se deve impor.

O artigo 79.° da lei do recrutamento diz que os mancebos que faltarem à inspecção concelhia serão apurados condicional-mente para a arma de infantaria.

Como em Portugal se faz política de tudo, os políticos fazem uso dessa arma; e como nos concelhos não é fácil iludir a população rural, pois o caso trata-se muito à vista, vão depois à junta militar, e daí resulta o seguinte:

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Isto é, andou a junta de inspecção do distrito de recrutamento e reserva n.° 23 gastando ao Estado ajudas de custo e ajudas de transporte, percorrendo todos os concelhos, para conseguir apurar 125 mancebos, caindo-lhe no regimento para serem inspeccionados em três dias 559 mancebos.

Em infantaria n.° 28 apareceram, nas condições do artigo 79.°, 1:300 mancebos para serem inspeccionados no prazo máximo de quatro dias.

De maneira que, se isto ó prejudicial pelo lado moral da questão, embora se trate de disposições legais, tem ainda outro aspecto grave: —que é estabelecer a confusão nos. primeiros dias de oncorpo-ração que devem ser todos consagrados ao bom recebimento dos recrutas, ao sou bom acondicionamento e à sua instrução que é mester que se realize nos dias designados por lei.

Em infantaria n.° 35 da mesma divisão não chegaram a 70 os apurados pela j unta de inspecção, não se apresentando ao abrigo do artigo 79.°, 849 mancebos.

Isto que é irtegular, tem de acabar ; e acabar como?

Evidentemente modificando-se a redacção deste artigo 79.°, em que se diga de uma maneira formal que os mancebos que se não apresentarem às inspecções, no prazo normal, serão considerados apurados definitivamente, para servirem na arma de infantaria, não sendo submetidos a mais alguma junta.

Poder-se há argumentar que desta forma serão encorporados indivíduos inaptos para o serviço, ou que sirvam para outras armas. Mas essas criaturas que podem, ser inábeis para o serviço militar, podem por meio de partes de doente, baixar aos hospitais. O qúé não pode continuar, p/ira prestígio da Kepública e da instituição militar, é o tremedal de imoralidades e de infâmias que se cometem neste País em volta do recenseamento militar, o que compromete a moral social, ludibriando-a e pondo de lado os princípios fundamentais que hoje dominam a organização militar das nações,

dãos, nascidos em Portugal, deixando ir só para as fileiras os mancebos que não têm conseguido o favor de uma carta de apresentação, ou a protecção dos trusts e companhias que se tom fundado neste País?

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Pois esses princípios fundamentais de uma democracia e dê uma Pátria, estão sendo comprometidos pelos actos praticados à volta do recenseamento militar.

São tremendas imoralidades que des-troem o moral das populações rurais.

Assim se fará com que o povo deixe de respeitar as leis e de ter confiança nos instrumentos legais da Kepública, desacreditando-se esta; e eu só defendo a República quando ela manifesta, pelos seus actos e pelas suas leis, os puros princípios de idealismo que eu sempre lhe quis ver, e aquele respeito pelas normas fundamentais da democracia, que acato acima de tudo, pouco me importando com o prestígio do» homens, nem com aquilo que poderão tirar de proveitoso pela prática dos actos que estou condenando.

Não tomo a iniciava de apresentar um projecto de lei, modificando a redacção do artigo 79.° porque entendo que isso pertence aos especialista*», aos militares; mas recomendo ao Sr. Presidente do Ministério e aos membros da comissão de guerra desta Câmara que dispensem a sua atenção para o caso que é de transcendental importância para a vid.a moral do regime.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva):— Pedi a palavra para afirmar ao ilustre Deputado que acaba de falar, que levarei ao conhecimento do Sr. Ministro da Guerra, as interessantes considerações que fez.

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Diário da Câmara dos Deputados

rido em campanha, a morte do capitão de infantaria Humberto de Ataíde Kamos e Oliveira.

Trata-se de unia das criaturas mais inteligentes da minha geração, de um dos militares mais briosos que eni todos os tempos Portugal tem tido.

Humberto de Oliveira, para todos que o conheceram, foi alguém; foi um homem que teve ideais, que ao serviço da Repú-blica expôs a sua vida, que ao serviço da sua Pátria nas campanhas de África, expôs a vida também.

Esteve na Eotunda combatendo pela República, porque sendo republicano, era dos que sentiam que para ser extré-nuo defensor dela deveria na sua defesa arriscar a prójiria vida.

Esteve em África, porque militar como era, e brioso, não quis eximir-se ao dever de na defesa da Pátria arriscar igualmente a sua própria vida.

Foi ferido três vezes em campanha e teve a medalha de Valor Militar.

Pois este rapaz, valente entre os que o mais eram, acabou por suicidar-se em África.

Quero contar à Câmara os motivos que o levaram a tal.

Humberto de Oliveira comandava um posto que era constituído por seis soldados.

Junto desse posto estacionava um pelotão de infantaria inglesa.

Um dia o comandante desse pelotão disse a Humberto de Oliveira, que sabia de sciência certa que o posto ia ser atacado e que nessas condições se retirava porque não tinha força para se manter, aconselhando Humberto de Oliveira a fazer o mesmo.

De facto, o oficial inglês, retirou o pelotão.

Passadas horas foram ouvidos no posto alguns tiros.

Humberto de Oliveira, dado o informe que tivera, supôs logo que o posto ia ser atacado e encontrando-se em situação de não poder opor resistência, resolveu retirar, fazendo transportar pelos seus soldados todo o material que podiam levar, deitando fogo ao que ficava para não poder ser utilizado pelo inimigo.

Sucede, porém, que se tratava de um engano.

Os tiros que haviam sido ouvidos eram dos exercícios que andavam fazendo as

metralhadoras inglesas que antes haviam abandonado o posto.

Então Humberto de Oliveira, sob a impressão de que o seu gesto beliscaria o nosso prestígio, pediu um conselho de guerra.

Consequência das avarias dos telégrafos em África, a notícia da morte de Humberto de Oliveira chegou ao conhecimento do Sr. Governador de Moçambique, primeiro do que o telegrama que ele lhe tinha enviado.

Humberto de Oliveira convenceu-se de que o consideravam um cobarde e nessas condições suicidou-se.

Nós que queremos comemorar as glórias da nossa terra, não podemos esquecer o nome deste bravo rapais que se bateu pela República, e que se suicidou, dando um exemplo de que o brio e a honra militares devem estar acima de tudo.

O projecto de lei que tenho a honra de enviar para a Mesa, e para o qual peço urgência e dispensa do Regimento, tem a assinatura de trinta Srs. Deputados; e se mais não tem, é porque não tive tempo para me avistar com todos os meus colegas.

Não é muito vulgar um pedido desta natureza feito por mim.

Se o faço, é porque não podemos continuar a ver a mãe desse soldado a passar privações.

O orador não reviu.

Consultada a Câmara, fci concedida a dispensa do Regimento e urgência para o projecto de lei.

É o seguinte:

Projecto de lei

Considerando que o capitão de infantaria, Humberto de Ataíde Ramos e Oliveira, falecido em Aírica, prestou durante toda a sua carreira militar os mais altos serviços à Pátria e à República;

Considerando que, na revolução de õ de Outubro de 1910, foi dos sargentos cadetes da Escola do Exército, um dos que mais se esforçaram pelo triunfo da revolução, batendo-se bravamente na rotunda;

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Sesosã de 2 de Maio de 1922

dalha de ouro de valor militar, a mais alta recompensa que pode ser concedida a um oticial (Ordem do Exército n.° 15, de 20 de Agosto do 1919);

Considerando que as circunstâncias que o levaram a procurar a morte no posto de Muatua, na zona de operações contra os alemães, em 4 de Agosto de 1918, mais demonstram ainda a alta compreensão que tinha da honra e do brio militares :

Temos a honra de submeter à aprovação da Câmara.dos Deputados o seguinte projecto de lei:^

Artigo 1.° É considerada como tendo ocorrido em campanha, conforme o n.° 1.° do artigo 2." do decreto n.° 3:632, de 29 de Novembro de 1917, a morte do capitão de infantaria, Humberto de Ataíde Eamos e Oliveira.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

/Sala das Sessões, 2 de Maio de 1922.— Álvaro de Castro—Lopes Cardoso — João Bacelar — Lúcio de Campos Martins— Garcia Loureiro—Fausto de Figueiredo — Plínio Silva— Tomás de Sousa Rosa — João Pereira Bastos — Henrique Pires Monteiro — Jusé Carvalho dos Santos— António Maia — Cunha Leal—Armando Agatão Lança—Torres Garcia — .Joaquim Ribeiro—Mário Infante — Mário Ramos — António Fonseca — f. do Rego Chaves — Eugênio Aresta — A. Pires do Vale—Angelo Sampaio Maia-— João Pina de Morais Júnior — Nuno Simões — Carlos Olavo—Pedro Pita — Alberto de Moura Pinto —António Correia— Lúcio dos Santos — José de Magalhães.

Foi aprovada e dispensada a leitura da última redacção a requerimento do Sr. Cunha Leal.

O Sr. Carvalho da Silva:—Não é norma da minoria monárquica aprovar a urgência e dispensa do Regimento, para projectos de lei.

Trata-se porém de um oficial brioso; e, porque o era, suicidou-se com a mais nobre noção do que sejam os devores de um soldado para com a sua Pátria. (Apoiados}.

Humberto de Ataíde era nosso adversário.

Foi uma das pessoas que se levantaram em 5 de Outubro de 1910 contra a mo-

narquia; mas isso não nos impede de lhe prestar, como a todos que sinceramente seguem um determinado caminho, as homenagens da nossa consideração.

A minoria monárquica dá assim a demonstração de que, quando se trata da defesa, da Pátria, todos se devem sobrepor a quaisquer credos políticos para, unidos, a glorificar e a defender. (Muitos apoiados).

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Lima Basto): — Pedi a palavra para mandar para a Mesa uma proposta de lei acerca das estradas em Portugal.

Não peço urgência e dispensa do Regimento, porque confio na actividade das comissões que em breve lhe darão o seu parecer.

E lastimável o estado das estradas em Portugal e a sua reparação é uma questão primordial para a economia nacional, pois a continuar como está, daqui a algum tempo, não temos um palmo de estrada transitável.

E necessário ultimar as obras iniciadas e fazer novas comunicações, porque há províncias que não têm comunicação.

Para isto é preciso pedir sacrifícios ao país; mas estou certo de que o país os fará gostosamente, desde que saiba que o dinheiro que lhe pedem será aplicado ao fim a que se destina.

As estradas precisam de unia dotação de 10:000 contos, e no Orçamento estão apenas 3:000, o que é irrisório.

Estas são as características principais da minha proposta para a qual chamo a atenção da Câniara.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Correia:—Chamo a atenção do Sr. Ministro do Comércio e Comunicações para os factos de que me vou ocupar, e que são da mais alta importância.

Parece-me que quando o Sr. António Maria cia Silva foi Ministro do Fomento, se publicou um decreto extinguindo determinadas estações telegráficas e telefónicas, muito especialmente nas terras que não dessem rendimentos, para elas se manterem.

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a justificar erauí absolutamente infantis, como se o serviço dos correios o telégrafos não fosse de interesse nacional e fosse necessário exigir das diferentes povoações que contribuíssem para a sua manutenção.

O que é facto ó que essa lei teni estado em vigor.

Muitas e variadas reclamações têm chegado a esta Câmara a este respeito, e que não têm sido atendidas com aquela celeridade que seria para desejar, polo Sr. Ministro do Comércio.

A extinção de várias estações telegráficas e telefónicas, tem sido feita especialmente depois de realizadas as eleições em 29 de Janeiro.

Tenho recebido dezenas de cartas, informando que têm sido extintas estações telegráficas e telefónicas cm freguesias importantes que assim ficam sem meios de comunicação, a enorme distancia da» sedes dos concelhos e dos distritos, impossibilitadas de se lhes acudir de um mo-m^nto para -o outro nas suas necessidade» imprevistas e inadiáveis.

Neste momento em que todos dizem que as estradas estão absolutamente intransitáveis, quando o Sr. Ministro do Comércio acaba de apresentar à Câmara uma proposta sobre estradas de tanta importância, pela qual o país estava anciosa-niente esperando, não se admite que 0:3 agentes do Grovêrno estejam extinguindo estações telegráficas e telefónicas de povoações importantes, situadas a enormes distâncias das sedes dos concelhos, deixando-as isoladas, numa situação precária, sem esperança do poderem recebe;: socorros na quadra invernosa, quando necessitem de os pedir.

Mais ainda: Toin-se aproveitado as extinção das estações telegráficas para entregar as caixas de correio a criaturas sobre cuja competência e honestidade não se têm pedido informações. Sem qualquer forma de processo, dando a esta questão um carácter político, têm-se tirado as faixas do correio a indivíduos que as têm administrado com honestidade, zelo e competência, e a respeito de cuja conduta não existe a mais pequena queixa uá Administração Geral dos Correios e Telégrafos.

Já estou ouvindo o Sr. Ministro do Comércio dizer que o serviço dos correios

e telégrafos é autónomo e que por isso pouca intervenção pode ter i.esteassunto.

Se, a pretexto dessa autouomia, o Sr. Ministro do Comércio declarar —o que não creio, uma vez que S. Ex.a já afirmou nesta Câmara não concordar com ela— que não pode ter uma interferência directa nos casos que apor.to, eu apresentarei nesta casa do Parlamento um projecto acabando com tal autonomia.

É tempo do pôr de parte a política mesquinha das facções e dos partidos para nos lançarmos definitivamente na obra de reconstrução nacional que se impõe, pondo termo à dispersão das forças republicanas a que tal política incita.

Nesse sentido eu estou coligindo elemen-los para apresentar ao Parlamento um projecto modificando esse decreto que manda extinguir as1 estações, telegráficas nas terras cujos recursos não chegam para a sua manutenção. Efectivamente não se compreende que se tirem ao País certas regalias é melhoramentos, no mo mento em que se lhe exigem os maiores e mais duros sacrifícios, tanto mais quanto é certo que, no maior número dos casos, esse cerceamento de regalias obedece apenas à satisfação de inconfessáveis interesses políticos.

Eu sei que o Sr. Ministro do Comércio me vai dizer que toma em arenção as mi-' nhãs considerações. Isto, porém, não basta; é preciso que S. Ex.a junto da direcção dos Correios e Telégrafos providencie para que essa lei só não cumpra mais, visto que, estando as estradas do País verdadeiramente intransitáveis, só por meio de telegramas se conseguem estabelecer as relações entro as suas diferentes freguesias.

O Sr. Ministro do Comércio, que ó um espírito culto, declarou já que era seu propósito não fazer 'política na gerência da sua pasta; deve, por isso mesmo, interpretar as minhas palavras como um brado daqueles que nada devendo à República tudo lhe têm dado.

Se, porém, os factos que acabo de apontar à Câmara não forem tcmados na devida consideração, eu prometo não largar de mão o assunto.

Eu muito espero, pois, do patriotismo e das qualidades de inteligência do fcr. Ministro do Comércio. Tenho dito.

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O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Lima Basto);—Sr. Presidente: pedi a palavra para responder às considerações que acaba de fazer o Sr. António torreia, se bem que S. Ex.a antecipadamente já tivesse previsto a resposta que naturalmente eu tenho de lhe dar, isto é, que os serviços dos Correios e Telégrafos são autónomos, mas que vou tomar na devida consideração as suas reclamações.

O meu desejo, Sr. Presidente, é que S. Ex.a me forneça uma nota das estacões que se encontram no estado em que S. Ex.a se referiu, a fim de que eu possa verificar o que se está passando a esse respeito.

O que eu posso dizer desde já, dum modo geral, a V. Ex.a, é que se algumas estações telegráficas têm sido transformadas em estações telógrafo-postais, o motivo é de haver falta de pessoal.

Eu vou no emtanto estudar o assunto devidamente, esperando por isso que S. Ex.a me envie a no-ta a que já me referi, podendo, no emtanto, dizer-lhe que não faço deste lagar uma arma política, estando também absolutamente convencido de que os serviços dos Correios e Telégrafos se não prestam também a instrumentos de questões políticas.

Termino, pois, esperando que S. j£x.a ^me envie a reíerida nota, no sentido de eu poder estudar convenientemente o assunto e tomar as providências que o caso requere.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: agradecendo, em primeiro lugar, à Câmara a sua atenção, permitindo que eu use novamente da palavra, começo por agradecer ao Sr. Ministro do Comércio a sua resposta, que me satisfez em parte.

Prometo a S. Ex.a trazer-lhe muito brevemente uma relação das diferentes freguesias que se encontram nas condições a que já me referi, pedindo ao Sr. Ministro do Comércio, no emtanto, o obséquio de dar as suas ordens para que se faça justiça, atendendo as reclamações que ou fiz sobre o assunto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Antes de entrar no assunto para que pedi a palavra, desejo fazer uns reparos a algumas considerações do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, em uma das últimas sessões.

S. Ex.a, um tanto agastado, estranhou que os Deputados se fizessem eco de notícias e boatos propalados pela imprensa, e isto a propósito de eu, interrompendo-o, ter declarado que um jornal dissera que o número dos nossos delegados à Conferência de. Góuova era superior aos delegados do Inglaterra.

Não foi o Sr. Ministro justo no seu reparo, não só porque, em geral, a imprensa nos merece consideração e crédito, mas também porque os seus correligionários desta Câmara fundamentam muitas vezes os seus juízos e interpelações em notícias dos jornais.

De resto, o que eu, sem afirmar a sua autenticidade, incidentalmente referira veio escrito num insuspeito jornal republicano.

Nós, monárquicos, não queremos fazer acusações ao regime, baseando-nos em informações anónimas e «cartas roubadas», e usando outros processos irregulares e dissolventes de que infelizmente aqui tanto se u»ou e abusou contra o regime monárquico, processos cuja falsidade e cujas funestas consequências estão agora bom patentes. Queremos, sim, documentar as nossas afirmações, e, porque assim ó, vimos reclamando energicamente contra a injustificável e significativa demora na remessa de documentos que re-qneremos, para a cópia urgente dos quais reputamos suficientes os 23:500 novos funcionários, que, no dizer da Confederação Patronal, foram nomeados a partir de 1914, e cuja eliminaqão, no seu maior número, vai por certo ser ob j no qual as minorias republicanas não podem transigir, sob pena de abdicarem dos seus direitos e compromissos.

Quanto à Conferência de Génova, faço votos por que sejam profícuos para nós os esforços dos nossos delegados.

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ferôncia para providenciar sobre a questão cambial, não desrespeite estas conclusões. Há o direito de pôr em dúvida as suas intenções a este respeito, pois que também na Conferência Parlamentar Internacional de Comércio, realizada no passado ano, se votou a resolução, relatada por Mr. George Lev}', de que os Governos e os Parlamentos se absteriam de novos aninentos da circulação fiduciária que nSo fossem consignados às necessidades comerciais, e, apesar disto, ainda há pouco .se votou aqui um aumento de 240:000 contos, dos quais, pelo menos, 200:000 se vão sumir na voragem. t-. Entrando propriamente no assunto para que pedi a palavra, para ôle chamo a atenção do Governo e da Câmara, pois que se me afigura do maior e do mais sugestivo interesse para o país e demanda estudo e resolução imediata, cuidada e escrupulosa.

Em 14 de Abril de 1891 foi assinada em Madrid, entre o Brasil, Cuba, Espa^ nhã, França, Suíça, Tunísia, Inglaterra e Portugal, um convénio, no qual se estabeleceu que «todo e qualquer produto que apresente uma falsa indicação de proveniência, no qual fosse directa ou indirectamente indicado um dos Estados Contratantes ou um local situado em algum deles como país ou como local de origem, seria apreendido 110 acto da importação em cada um dos ditos Estados».

Determinou, porém, o artigo 4.° que aos tribunais de cada país cumpriria, não obstante, resolver sobre quais eram as denominações que, em razão do sou carácter genérico, ficavam excluídas de tal providência.

Esta imprecisa disposição proveio de facto de não ser possível determinar con-cretamente e distinguir as verdadeiras marcas regionais daquelas que, embora tenham uma designação geográfica — como coiro da Rússia, água de Colónia e outras —• devida ao descuido dos interessados, passaram pelo uso a constituir uma denominação genérica, aplicada a produtos da mesma natureza, mas de proveniência diversa.

Que as nossas marcas de vinhos do Porto e da Madeira e outras devia-n ser reconhecidas e respeitadas como regio-siais, não podia haver dúvida.

Assim o reconheceu, por exemplo, quanto ao vinho da Madeira, uma decisão do Tribunal do Eouen, de 26 de Junho de 1900, baseada precisamente no convénio de Madrid.

Como, porém, a Alemanha não assinou este convénio, celebrámos com ela o tratado de 30 de Novembro de 1908, que foi aprovado por carta de lei de 15 de Outubro de 1909, e no qusl este país proibiu a exposição e venda, no seu território, sob a designação de P3rto e Madeira, de vinhos que não fôssom originários das respectivas regiões cio Douro e Ilha da Madeira, embarcados no Porto e no Funchal, com certificíido de origem e de pureza passado pelas autoridades competentes.

E como os termos do convénio de Madrid, eram pouco precisos e a Inglaterra o assinou, na parte indicada, com a declaração de vencida, e porvent .ira por outros motivos, celebrámos com a nossa secular aliada o Tratado de Comércio e Navegação de 12 de Agosto de 1914, que entrou em vigor em 23 de Setembro de 1916, o no qual além doutras condições de aparente reciprocidade e:n matéria aduaneira e de instalação e funcionamento de sucursais ou agencias de sociedades comerciais, se convencionou no artigo 6.°, quê :

«O Governo de S. M. Britânica só obrigava a recomendar ao Parlamento a proibição de importação e venda para consumo, no Reino Unido, da qualquer vinho ou o.utro licor, ao qual a designação de Porto ou Madeira, seja aplicada, não sendo vinho produzido, respectivamente, em Portugal e na Ilha da Madeira».

Se é certo que outras cláusulas de relativa vantagem para Portugal o tratado contém a verdade é, porém, qi:e esta é a que mais directa e essencialmente nos interessa e foi a que por certo constituiu a origem das démarches para o acordo por parte do nosso país.

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D Sr. Nuiio Simões : —Aumentou.

. O 'Orador: — O inaís, e especialmente o tratamento 'de nação mais favorecida, aproveitou, essencialmente à Inglaterra, de onde nós fazemos uma larguíssima importação de carvão-, máquinas, matérias primas, e outros artigos e pára onde exportamos vinhos, conservas, cacau e pou-. co mais.

Que assim é, a própria Inglaterra implicitamente o reconheceu no protocolo final dó tratado, declarando que a mencionada condição do artigo 6.° era estabelecida unicamente em troca da melhoria de tratamento aduaneiro concedido às mercadorias inglesas pelo Governo Português.

Afigura-se-me, pois, que por estes e por outros motivos o tratado, ao passo que tem para nós vantagens especialmente restritas ao respeito pelas marcas regionais dos nossos vinhos, "tem para a Inglaterra conveniências gerais muito amplas, alcançadas com grave sacrifício das nossas receitas aduaneiras.

E este sacrifício não pode ser compensado com as miiito problemáticas vantagens que advenham para a economia nacional, tanto mais que, em regra> podemos adquirir actualmente em outros países muitos dos produtos que importamos de Inglaterra, como o carvão da América e maquihismos e matérias primas da Alemanha.

Posta assim a questão, vejamos agora se, em presença da actual situação jurídica internacional, o tratado de comércio e navegação com a Inglaterra se pode considerar em vigor, ou, mais propriamente, se se torna indispensável que Portugal o mantenha e respeite para que a Grã-Bretanha reconheça e resolva as nossas marcas regionais dos vinhos do Porto e da Madeira. .

O Tratado de Paz de 28 de Junho de 1919, no capitulo 3.°, lelativo à «Concorrência desleal», e artigo 274.°, obrigou a Alemanha a adoptar todas as providências legislativas ou administrativas, necessárias para garantir os produtos naturais ou fabricados originários de qualquer das potências aliadas ou associadas contra qualquer forma da concorrência desleal nas transacções comerciais.

lhes obriga apenas a Alemanha para com as vinte e sete nações aliadas que o assinaram, ou também os aliados entre si? Se obriga os aliados entre si, obriga, conseqúentemente, a Inglaterra a respeitar as nossas marcas regionais de vinhos do Porto e Madeira e outras, independentemente do Tratado de 1'914, e, portanto, sem que este Tratado se mantenha e nós sejamos obrigados a respeitar o que nele, com sacrifício nosso, se convencionou a fazer da Inglaterra.

Parece-me que temos o direito de sustentar e fazer vingar a opinião do artigo 274.° do Tratado de Paz, que obriga também os aliados entre si.

Com efeito, em casos 'desta natureza,' não temos o direito de impor aos outros condições que não queremos respeitar, especialmente tratando-se, como se trata, da concorrência desleal, 'de falsificação e fraudes .que às leis penais "e de registo da propriedade industrial dos países signatários evidentemente devem pu~nir.

Assim o admite, embora em termos imprecisos, Mr. Leroy, chefe do contencio-se no Ministério da Agricultura de França, em um artigo publicado na Revue de Droit International, e assim o sustentou entre nós, coin toda a sua autoridade, o ilustre académico, notabilíssimo jurisconsulto, verdadeira honra da jurisprudência nacional, Sr. Visconde de Carnaxide, em um artigo publicado no Comércio 'do Pôr-to, de 24 dê Agosto de 1921, que prodn-ziu justificada impressão. Diz o notável homem de sciêhcia:

«Seria o maior ultraje à razão e justiça humana conceber possível um regime internacional, no qual ó que fosse atentado dúiiià nação contra outra se tornasse acto lícito quando praticado por uma destas contra qualquer das demais entre si, e até contra aquele (no nosso caso, a vencida Alemanha), que no tocante a certo e grande malefício só poderia «er ofensora e nunca ofendida».

Conclui o Sr. Visconde de Carnaxide sustentando que o tratado de fcómércio com a Inglaterra,caducou.

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de toda a oportunidade que o Parlamento e o Governo tomassem em consideração o problema.

Expondo-o à Câmara, a minoria monárquica mostra o desejo que tem de cooperar em tudo o que seja de interesse para o país e revela o mais alevantado espírito patriótico na sua intenção.

Tenho dito.

O Sr. Agatão Lança: — Peço a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se consente que na ordem do dia da próxima sessão se discutam as emendas, vindas do Senado, ao projecto das pensões às vítimas do 19 de Outubro.

Foi aprovado.

O Sr. Estêvão Águas: — Sr. Presidente: devo informar o Sr. Carvalho da Silva de que, em 22 de Março do corrente ano, foi entregue na Mesa o parecer da respectiva comissão sobre o seu projecto de lei relativo aos automóveis do Estado.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Barbosa de Magalhães):— Disse o Sr. Carvalho da Silva que a minoria monárquica não queria tratar das questões sem ter os documentos oficiais, pois não se queria basear em meras informações jornalísticas. Por isso insistia para que fosse satisfeito o seu requerimento em que pedia documentos. Logo a seguir S. Ex.a veio basear-se numa informação dum jornal para dizer que os delegados à Conferência de Génova eram em maior número do que os representantes da Inglaterra.

Essa informação não ô exacta.

A Inglaterra tem em Génova cento e dez representantes e nós apenas seis. Esta ó que é a verdade; e, embora eu tenha muito respeito pela imprensa do meu país, peco-lhe que tenha o cuidado em evitar notícias inexactas, que, além de injustas, vão avolumar campanhas que em breve serão desfeitas. Por isso mesmo anseio que seja dada para ordem do dia a interpelação do Sr. Alberto Xavier sobre o assuuto para o qual já me declarei habilitado.

Então eu mostrarei ,a sem razfio das campanhas que se têm levantado.

Quero mostrar à Câmara que essas campanhas só sorvem para prejudicar os interesses do país,

Eelativamente ao assunto para que S. Ex.a seguidamente chamou a minha atenção, e que diz respeito ao artigo 6.° do nosso contrato com a Inglaterra, que defende as nossas marcas regionais, ouvi com toda a atenção as considerações de S. Ex.a, e devo dizer-lhe que os pontos de vista que apresentou não sito novos e já têm sido sustentados na imprensa por distintos escritores.

Um desses pontos de vista já foi sustentado por esta própria Câmara e vai ser dentro em breves dias apresentado na Conferência de Bordéus, por isso que aí a delegação portuguesa da Conferência Interparlamentar de Comércio vai pugnar pela inteira aplicação entre os aliados das disposições do Tratado da Paz.

Efectivamente, desde que í.e impõem essas obrigações á Alemanha, não é jurídico nem justo que os aliados sntre si as não cumpram também.

Ainda devo dizer que esse ponto de vista tem estado a ser sustentado pela nossa delegação à Conferência de Génova.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros continuará empregando todos os seus esforços para que a defesa das marcas regionais seja feita, eficaz e proiicua-mente.

O artigo 6.°, a que se referiu o Sr. Deputado, resulta dum aditamento que foi aqui introduzido por proposta do Sr. Melo Barreto, e tem causado grandes benefícios ao país.

O Sr. Cancela de Abreu: —

O artigo 274.° do Tratado de Paz foi consignado por intervenção da França.

O Orador :—A França também tem interesses idênticos aos nossos; o que é preciso é que a mesma doutrina seja aplicada de boa fé em relação a todos.

Mas se é certo que podemos invocar para com a Inglaterra, como para os outros países, as disposições do Tratado de Versalhes, que dizem respeito à defesa das nossas marcas regionais, o que é certo também é que essas disposições foram incluídas quando ainda rião existia qualquer outro artigo a fazer essa defesa.

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de que se torne inútil para nós o artigo 6.° do tratado de comércio com a Inglaterra; o tratado resulta nulo. Isso não è bem assim, porque o tratado inclui outras vantagens. A sua vigência acaba em Agosto de 1924. Temos, portanto, um ano para o denunciar. O que devemos fazer é estudar a questão no momento da denúncia.

'Tomo, pois, boa nota das considera-çOes dê S. Ex.a, e elas serão estudadas de forma a proteger os interesses económicos do nosso país.

Sr. Presidente: dada esta resposta ao Sr. Cancela de Abreu, eu quero aproveitar o ensejo para fazer uma proposta a esta Câmara. /

Passa amanhã o aniversário da descoberta do Brasil, data gloriosa, como o Parlamento reconheceu, deliberando considera Ia como feriado nacional. Não reúne, portanto, amanhã o Parlamento, e entendo, por isso, que devemos aproveitar esta ocasião hoje para enviarmos uma calorosa saudação à nação brasileira. Em-qnanto não chegam os heróicos aviadores que estão demandando as terras do Brasil, em quanto eles não chegam ao termo feliz da sua gloriosa e arriscada travessia, váo daqui as nossas saudações à nação irmã, com os nossos melhores desejos pelas suas prosperidades e venturas.

Estou certo de que a Câmara dará com o melhor agrado o seu voto unânime a esta minha proposta; e, se a Câmara mo permite, também eu pedirei dispensa do Regimento para que seja imediatamente posta em discussão e à votação a proposta de lei que eu tive a honra de apresentar, e que já tem os pareceres das comissões dos negócios estrangeiros e das finanças, tendente a habilitar o Gro-vôrno à compra do palácio da Embaixada no Rio de Janeiro.

• E efectivamente urgente a votação dessa proposta.

Por isso peço a V. Ex.a que consulte a Câmara sobre se permite que com dispensa do Regimento, ela entre já em discussão. -

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente :—O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros propôs que fosse

enviada uma calorosa saudação ao Brasil pelo aniversário do seu descobrimento.

Consultada a Câmara, foi aprovada a proposta,

O Sr. Afonso de Melo:—Sr. Presidenr te: todos os parlamentares do Partido Liberal se associam sem excepção à proposta do° Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Não carece a Câmara de manifestar por outras palavras os seus sentimentos para com aquela- nação, porque ela é mais que nossa irmã: é uma filha espiritual da raça portuguesa.

Certo estou do que V. Ex.a, Sr. Presidente, transmitirá ao Congresso da República do Brasil, em nome de todos os Deputados portugueses, todos os sentimentos de admiração e amor pelos nossos irmãos do Brasil.

Pedi a palavra para também assegurar ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros a inteira concoí dância ao projecto por S. Ex.a apresentado; e eu, como vogal da comissão, já tive ocasião de assinar o parecer permitindo a compra de um prédio para a nossa embaixada no Brasil.

Devo pois dizer, em nome deste lado da Câmara, que damos todo o apoio à propostas, porque ela não é só necessária, mas oportuna.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Nuno Simões:—Sr. Presidente: em todos os momentos a proposta do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros devia ser bem recebida por esta Câmara; mas, neste momento, essa proposta ó profundamente grata ao coração de todos os portugueses.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros interpretou de facto o sentimento da alma portuguesa, e toda a simpatia e admiração que ela dedica ao Brasil, cumprindo apenas um dever sempre grato ao coração de todos os portugueses.

Vendo a admiração que o Brasil está dedicando aos nossos aviadores, nós manifestamos o nosso orgulho e satisfação por ver o Brasil tam intimamente ligado a nós.

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Ministro dos Negócios Estrangeiros; e, mais: que será grato à colónia portuguesa no Brasil, o votar-se a proposta relativa à compra de um edifício para a nossa embaixada, proposta que decerto toda a Câmara votará.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carlos Pereira:—Em noine dos Parlamentares Democráticos, associo me gostosamente à proposta do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, proposta essa que está no ânimo de toda a Câmara e até de toda a nação.

E faço esta afirmação sem receio de que me acusem de falta de mandato para tanto.

É que a data que se soleniza, se é grata ao coração do Brasil, o não é menos a Portugal, porque ela representa a coroação dos esforços dos nossos maiores que se deram à descoberta de novos mundos,.

É pois com dupla emoção que ine associo à proposta do Sr. Miniitro dos Negócios Estrangeiros, e assim mais uma vez eu sinto o quanto são irmãs estas duas Pátrias : Portugal e Brasil.

Tam irmãs e tam gémeas elas são que as alegrias e as dores duma são as alegrias e as dores da outra, e, para que nada falte a este sentir fraterno, até as datas gloriosas duma são as datas gloriosas da outra.

Ainda agora, neste momento grandioso em que a Pátria se ergue em toda a sua heróica e legendária atitude de mando, de olhos no alto, a rasgar as vias novas por onde só o pensamento se tinha ainda arriscado, as duas Pátrias numa mesma enternecida comoção acompanharam esse voo de glória.

A Terra, Sr. Presidente, que era o Terror e o Infinito, cujos limites fantasmas de toda a espécie ciosamente guardavam, e que na ignorância de então demoravam em impérios de sombra donde nnnca mais se voltava, a Terra, para que fosse a luz e o conhecido, teve a nossa raça de a descobrir e esquadrinhar em em todos os sentidos.

E os monstros e os fantasmas, corridos e apavorados, apenas tinham tempo de à pressa e a medo colherem os seus véus mais densos, e assim se virem abrigar

para sempre nos inofensivos domínios da lenda.

Dominadores do espaço e do tempo, nós somos, que temos vindo a estreitar a Terra, esta Terra que é cada vez mais pequena, tam pequena, tam pequena já que cabe quási num só voo dos nossos aviadores.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, com verdadeiro sentido da oportunidade, trouxe à Câmara uma proposta para a aquisição do palácio em que se acha instalada a nossa embaixada LO Brasil, e sem querer por agora discutir as razões de tal proposta, mas salientando que essa é uma das formas de homenagearmos a nossa colónia ali, muito me apraz afirmar que este lado da Câmara lhe dá o seu voto, embora essa aquisição não fosse necessária para que os portugueses pudessem pisar terra de Portugal, porque em toda a parte as nossas duas Pátrias são o prolongamento uma da outra.

Tenho dito.

O Sr. Álvaro de Castro:—Em nome do Partido de Reconstituíção Nacional associo-me com todo o entusiasmo à proposta de saudação ao Brasil, apresentada pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Morais de Carvalho : — Sr. Presidente : em nome da minoria monárquica associo-me com o maior entusiasmo à saudação ao Brasil proposta pelo ilustre Ministro dos Estrangeiros.

As nações e as raças afirmam a sua vitalidade e a sua razão de ser pela força da expansão de que dão provas.

A maior glória dos portugueses com que se fechou a história dos descobrimentos foi o descobrimento do Brasil cujo aniversário passa amanhã. E uma data que todos nós portugueses devemos festejar com o maior entusiasmo, porque essa homenagem respeita a um povo a quem Portugal está ligado por estreitos laços de sangue e de linguagem.

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caminho aéreo que iigará os dois continentes, ela tem uma significativa opor-tunjidade.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Vozes: — Muito bem.

O Br. Lino Neto: —Á minoria católica associa:se com o maior entusiasmo à proposta do Br. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Ainda ontem tivemos ocasião de saudar a Espanha e hoje temos o prazer de saíidar o ^Brasil, nação irmã que fala a mesma língua. Glorificando-a, glorifi-camo-nos a nós próprios.

A minoria católica não esquece a razão principal" que nos liga a essa grande nação : é à fé.

O dia de amanhã é o dia da Santa Cruz, por isso ainda hoje se chama ao Brasil Terras de Santa Cruz.

A minoria católica aprova com todo o entusiasmo a proposta em discussão.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente:—Em face da inani-fé's'taçâo da Câtaára considero aprovada à saudação ao Brasil proposta pelo Sr; Ministro dos Negócios Estrangeiros.

(Apoiados).

Foi dispensado o Regimento para entrar em discussão á proposta do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros para â abertura de um créãito para a compra de um edifício para se instalar a Embaixada Poii-tuguesa do Rio de Jàneirb.

É a seguinte:

A crise geral de alojamentos, extremamente intensa em todos as capitais europeias, é igualmente sensível no continente americano. Avolumou-se ali também a corrente emigratória para os grandes centros de população, provocando idênticos embaraços quanto â possibilidade de obter, tanto para a habitação, como para fins oficiais e comerciais, instalações adequadas. A extraordinária elevação das rendas, como consequência do limitado número de casas disponíveis e da carestia geral da vida, tornou mais urgente a solução do problema dos alojamentos para os agentes diplomáticos, na sua maioria impossibilitados dê pagar,

pela relativa exiguidade dós seus vencimentos, os altos preços reclamados pelos proprietários. Nestas circunstâncias, grande número de Governos resolveu, como medida de economia e para manutenção do prestígo indispensável á representação do Estado, adquirir edifícios pára instalação das suas respectivas missões, cujos arquivos necessitam, para súà boa conservação, dê local adequado qiie os garantam de possíveis estragos e onde fiquem com carácter dê permanência, ó qne é sempre bastante aleatório em casas alugadas por contratos, geralmente de pouca duração. Bão estes motivos que levaram o Governo da Eepública a ponde-ror as vantagens quê nos adviriam de ter as Embaixadas e Legações funcionando em edifícios próprios. Tal projecto, a adoptar-se, implicaria, no èmtanto, quando realizado de uma sò^vêz ou em curto espaço'de tempo, ein impo ri ante quantia,, que viria subitamente aumentar de forma considerável os encargos do Estado. Im-põe-se, portanto, a adopção de .método diverso, procedendo com vagar è aproveitando as oportunidades favoráveis. A Embaixada no Rio de Janeiro, sendo, em verdade, a missão de mais elevada classe que mantemos, deve merecer-nos a maior solicitude. Justo seria quê ela não destoasse das missões estrangeiras dê igiiàl categoria, equiparando-se-lhes, hão já quanto à sumptuosidade do edifício e seu mobiliário, mas pela decência ê perfeita disposição'das suas instalações. Reconhecendo-se, pois, quê muito conviria ao prestígio da representação diplomática portuguesa no Brasil que â embaixada da República estivesse instalada em edifício próprio e sendo possível, nesta ocasião, adquirir com facilidade, em condições van-tajosas, uma propriedade adequada para nela terem aposentadoria os representantes diplomáticos de Portugal, e tendo em vista que o protelamento dessa resolução tornaria impossível a aquisição do prédio nas boas condições em que ela neste momento é feita, temos a honra de apresentar a seguinte proposta de lei:

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Art. 2.° Inscrever-se hão no orçamento do Ministério das Finanças, a partir do ano económico de 1922-1923, as verbas necessárias para fazer face aos encargos das anuidades de juro e amortização do empréstimo por um número de anos que nunca seja inferior a dez.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das SessOes da Câmara dos Deputados, 13 de Março de 1922. - O Ministro das Finanças, Albano Augusto de Portugal Durão — O Ministro da Mari-aha e, interino, dos Negócios Estrangeiros, Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente : estamos habituados a ver que são discutidas com urgência e dispensa de Regimento propostas e projectos que acarretam aumento de despesa; mas não tínhamos chegado ainda ao apefeiçoamen-to de se votar uma proposta antes de ela entrar em discussão, pois de todos os lados da Câmara os representantes dos partidos republicanos declararam dar o seu voto à referida proposta.

Sabemos, portanto, que a Câmara vai dar o seu voto a essa proposta; não o fará, porém, sem que a minoria monárquica ao mesmo tempo que manifesta a aua admiração pelo Brasil, exprima a sua estranheza por que se vá gastar l:0l)0 contos num momento em que o País atravessa uma grave crise financeira.

Quando a nossa situação era melhor, não foi necessário comprar um palácio para a nossa representação diplomática no Brasil. Agora é que fomos atacados pelo delírio das grandezas.

Aonde vamos parar ? !

Ainda ontem mandei para a Mesa um pedido de documentos acerca do comissariado da exposição do Eio de Janeiro que constitui em matéria moral de administração um verdadeiro escândalo.

Mais um escândalo a juntar a tantos outros.

Há pouco disse o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros que não devia a mi-aoria monárquica fazer afirmaçõos pelo que se publica nos jornais, por isso mandei pedir documentos e oxalá a demora no seu fornecimento não seja como tem sido para outros assuntos.

A minoria monárquica não quere.le-

vantar questões escandalosas sem ter documentos; mas desde já posso afirmar que a minoria monárquica há-de trazer a esta Câmara um escândalo monumental que consiste em se arquivarem sindicâncias, em que se revelam roubos dos mais autênticos, por um simples despacho ministerial.

A minoria monárquica há-de mostrar ao País como são administrado» os seus dinheiro». Ela está aqui para exercer uma acção fiscalizadora; e quando se vem propor despesas verdadeiramente inúteis, num delírio de grandezas inexplicável, nós não podemos dar-lhes o nosso voto, como não podemos deixar de lavrar o nosso mais veemente protesto contra o caminho que se segue e que não sabemos onde pode levar o País.

(Apoiados da extrema direita}.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Nuno Simões: — Sr. Presidente: começo por mandar para a Mesa a seguinte moção:

A Câmara dos Deputados reconhecendo a necessidade de se iniciar uma franca e efectiva política de protecção e enaltoci-mento de-todos os valores da nossa emigração como essencial para a nossa expansão cultural e económica, e vantajosa para o estreitamento de relações com os diversos países preferidos pelas nossas correntes emigratórias, espera que o Governo não demore a sua anunciada acção nesse sentido e passa à ordem do dia.

Sala das Sessões, 2 de Maio de 1922.— Nuno Simões.

Sr. Presidente: não supunha eu que partisse da bancada monárquica o protesto contra um acto como aquele que vai praticar-se e que representa apenas o pagamento duma dívida em «bertc para com a colónia portuguesa do Brasil.

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É que os aumentos de despesa em que correntemente se fala nesta casa, e que estamos habituados a ver contrariar, nem sempre, aliás, com um fundamentado espírito de justiça, não têm nenhuma razão de ser invocados neste momento ; ó que o delírio de grandezas de que falou o Sr. Carvalho da Silva e que pode ter sido invocado noutras ocasiões com razão, não pode ser invocado neste momento para justificar as palavras de oposição que S. Ex.a acaba de pronunciar, mais por obrigação, estou certo, do lugar que ocupa, do que por um sentimento de justiça. (Apoiados).

Delírio de grandezas!

& Então a minoria monárquica tem o direito de acusar o Governo da República de fazer a única política consentânea com os interesses do Brasil e da nossa economia?

Pregunto ao Sr. Carvalho da Silva se há realmente o direito de lançar sobre um acto que é de verdadeira justiça, e representa o pagamento duma dívida, as insinuações que estão lançando.

Pregunto ao Sr. Carvalho da Silva, que tam documentado é sempre e que sempre procura tomar informações sobre os assuntos de que trata, se se informou de quanto se paga de renda pela embaixada.

Pregunto se sabe a razão por que se é obrigado a deixar essa casa, e adquirir outra que não .é um palácio afinal, que sabe que não se compra com mil e tantos contos.

(? Sabe se realmente haveria outra casa à altura da dignidade nacional? (Apoiados).

Não posso deixar de discordar das palavras do Sr. Carvalho da Silva.

Então nós acabamos neste momento de afirmar o nosso respeito pelo Brasil, a nossa simpatia e carinho pela nação irmã,

e esquecemo-nos de que o nosso interesse é não só de ordem morarmas económica?

,1 Então o Sr. Carvalho da Silva acha bem que nós não instalemos devidamente a nossa embaixada no Brasil?

O Sr. Carvalho da Silva foi infeliz.

O Sr. Cancela de Abreu (aparte):—-O povo é que é muito infeliz com a administração que se faz.

O Orador: — O Sr. Carvalho da Silva foi infeliz na oposição ao projecto. De resto se o ilustre Deputado quiser criticar com fundamento não lhe faltava motivo para o fazer, e porventura não será o Sr. Carvalho da Silva quem possa atirar a primeira pedra.

Não é intenção minha justificar a moção que mandei para a Mesa.

Fui o relator da comissão de finanças, e na imprensa que deu parecer favorável à proposta, e procurei fazê-lo com inteligência.

^ Qual o encargo do empréstimo ?

Seja ele qual for, o Sr. Carvalho da Silva não poderá com verdade afirmar que o Governo Português pratica um acto de desperdício.

Procurem obviar a todos os inconvenientes, que resultem de não termos numa capital como o Rio de Janeiro uma instalação condigna, no Rio de Janeiro, que, segundo a frase dum preto, é a segunda cidade de Portugal, e que tem uma população portuguesa ainda maior que a nossa cidade do Porto.

Não há, pois, motivo para incriminar o Governo pelo seu procedimento.

.Os encargos que desse procedimento advirão para o país tenho a certeza de que ele os suportará de bom grado.

Se o Sr. Carvalho da Silva quiser atentar no volume de ouro que todos os anos a colónia do Brasil manda para Portugal, S. Ex.a h á-de certamente reconhecer que ela compensa largamente os encargos que derivam da aprovação da proposta do Sr. Ministro dos Estrangeiros.

^Depois não devemos nós à colónia portuguesa do Brasil todas as homenagens, inclusive esta que o Governo Português, numa hora de feliz inspiração, lhe pretende prestar?

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como íim milhão de pessoas e que encerra algumas das afirmações mais brilhantes da cultura, do comércio e da indústria de Portugal no estrangeiro, não merece a homenagem que a Câmara certamente lhe irá prestar aprovando a proposta em discussão?

Oxalá, Sr. Presidente, qne esta proposta seja o início duma eficaz política de protecção aos nossos valores emigrató-rios, que essa política vá até ao fim, e que o ano que decorre seja, no que diz respeito a essa tam indispensável protecção, um ano de realizações, como o íaz prever, não só a iniciativa governamental, mas ainda o famoso raid aéreo Lis-boa-Brasil, qne tam perto se encontra neste momento, do seu glorioso objectivo.

Quanto aos reparos levantados pelo Sr. Carvalho da Silva à forma por que têm sido encaminhados os trabalhos da Exposição do Eio de Janeiro, o Sr. Ministro do Comércio muito melhor do que u os ptíderá discutir; todavia eu não posso deixar de afirmar ao ilustre Deputado que não é S. Ex.a quem pode atirar a primeira pedra...

O Governo procura de facto realizar no que respeita à navegação para o Brasil a ligação radiotelegráfica com a América, e no que respeita à exposição no Rio de Janeiro e ao raid, realizar todos os actos que possam suficientemente concorrer para que a colónia portuguesa no Brasil sinta que o Governo Português está com ela, interpretando o sentir da Nação, iniciando o que vem sendo há muito uma aspiração justa e sincera da colónia portuguesa no Brasil.

Há muito tempo que aqui e na imprensa tenho tratado dum plano da política emigratória, procurando afirmar e demonstrar essa necessidade.

O Govõrno na declaração ministerial procurou tambéfn dar satisfação àquilo que é também uma aspiração do país.

Simplesmente é necessário que o Governo não fique em factos isolados.

O Governo precisa, de facto, de pugnar mais eficientemente pelas relações com o Brasil, e sobretudo fazer com que a própria colónia portuguesa no Brasil não conheça apenas a política da emigração até hoje seguida.

Deve estabelecer-se no Brasil um tra-

tado de emigração fundamentado em tratados de comércio.

Não basta confiar no patriotismo da colónia portuguesa.

É necessário saber-se que por detrás de nós há uma nação que tem interesses. É isso que até agora se não tem feito, e é necessário fazer-se.

Anunciei ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros uma interpelação gôbre a acção do Governo, sobre os nossos valores emigratórios no estrangeire».

Hei-de realizá-la; e então terei ocasião de demonstrar que qualquer outro país com os nossos elementos económicos tê-los-ia aproveitado no sentido de fazer uma razão eficiente de influência no futuro.

Nada fazemos pela nossa colónia. É preciso iniciarmos outra política, que considere a nossa Nação não só um aglomerado material mas o aglomerado moral que do facto ela constitui.

E necessário que digamcs à colónia portuguesa e», .sã pelo mundo que ela merece a nossa simpatia porque se lhe não falta com a nossa assistência.

Sem isso inútil seria pensar em qualquer política de aproximação com o Brasil. A Itália acabou de realizar com o Brasil um contrato de emigraçiio e com a França uma convenção de trabalho. Com qualquer destes países não temos tratado algum nesse sentido, e o que ó necessário é que o Governo cuide a sério deste problema, e que o empréstimo que vai contrair para a aquisição do edifício para a Embaixada no Éio de Janeiro não fique como uma expressão isolada da boa vontade do Governo, no que toca a esta política, a qual preconizo na milha moção.

E necessário ir mais longe, e que se faça a sério a política que até hojo se não tem feito, realizando com o Brasil uma convenção literária, que o interesse da nossa cultura demanda, o a Câmara não ignora que o Sr. Matos Cid fez um trabalho importante sobre esse assunto.

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Este ano, Sr. Presidente, está fadado para a realização dessa política, que os nossos interesses impõom.

Desejaria lazer mais largas considerações, mas não desejo fatigar a atenção da Câmara, e reservarei para outra ocasião os vários pontos de vista que tenciono apresentar, especialmente quando o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros se der por habilitado a responder à minha anunciada interpelação sobre política emi-gratória. Não desejo, no emtaato, terminar sem dizer que o Parlamento português se apercebeu hoje da importância enorme dos interesses portugueses no Brasil, porquanto a colónia portuguesa é ali bem maior do que a população da segunda cidade do país, que é o Porto.

Tenho dito.

O orador não reviu.

foi lida na Mesa e admitida a moção do Sr. Nuno Simões.

'-*«-

O Sr. Bartolomeu •- r^erino: — Sr. Presidente : sendo esta a primeira vez que uso da palavra nesta sessão legislativa, cumpro o dever de cortesia, muito bem seguido nesta Câmara, de saudar V. Ex.a pelas suas altas virtudes de republicano e pelas suas qualidades de homem. Posto isto, e como relator que fui, pela comissão dos negócios estrangeiros, da proposta apresentada pelo Ministro respectivo, cumpre-me defender essa proposta dos ataques que o Sr. Carvalho da Silva inoportunamente lhe dirigiu, porquanto S. Ex.a teve duas ocasiões de ser infeliz. A primeira quando negou o seu voto à proposta de crédito, e a segunda quando, a propósito do Comissariado da Exposição no Kio de Janeiro, lançou suspei-ções.

S. Ex.a não conhece ainda quais os gastos, qual a orientação, qual o modo de ser económico do Comissariado, mas, no emtanto, já o aponta como um novo escândalo da Éepública. S. Ex.a julga demasiado depressa, o que, de rosto, é pecha do campo em que S. Ex.a milita. (Apoiados).

Relator, como fui, da proposta do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, eu tive pena de não poder alargar o crédito para a aquisição doutros edifícios em outros países para as nossas legações, o que viria, certamente, deminuir a verba

avultada que todos os anos pesa no Orçamento para rendas a particulares.

3r. Presidente: trata-se neste momento, como muito bem disse o Sr. Nuno Simões, da nossa Embaixada no Brasil, da nossa missão diplomática de mais elevado grau, da nossa representação num país onde a colónia portuguesa em muito contribui para a drenagem de ouro para Portugal. Acho, pois, bastante estranho que o Sr. Carvalho da Silva, Deputado monárquico, se lembrasse de regatear o seu voto e apodasse a proposta duma grandeza injustificável.

Sr. Presidente : eu permito-me lembrar a opinião dum grande estadista português, que classificou de crime o facto de, por qualquer modo, pretendermos estancar o sangue que anualmente corre para as terras do Brasil. Crime de lesa-pátria, como muito bem disse o Sr. Afonso Costa, era evitar por qualquer modo essa corrente emigratória.

O Embaixador do Brasil lamentou, em telegrama, a situação em que ficava, e eu pregunto à Câmara em que situação fica o Sr. Duarte Leite.

Todos os países têm procurado adquirir um edifício, mas o proprietário, que é português, tem feito todo o possível para só vender a casa a portugueses. Mas esse espírito patriótico pode desaparecer, e a nossa Embaixada ficar seiu casa.

Eu dou o meu apoio à proposta porque entendo que é necessária e urgente, e dou-lhe o meu voto com todo o aplauso.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: ouvi com a máxima atenção as considerações dos ilustres Deputados Sr . Nuno Simões e Bartolomeu Severino, mas não logrou nenhum convencer-me nos pontos de vista que defendi.

Começo por registar a opinião bem insuspeita, que muita honra o Sr. Nuno Simões, nas referências por S. Ex.a feitas à política internacional desse grande rei D. Carlos I. (Apoiados da minoria monárquica).

O ilustre Deputado Sr. Nnno Simões referiu-se à importante política desse rei, política que jamais poderá ser esquecida e a que prestamos todas as homenagens devidas.

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Diário âa Câmara dói

aludindo ã esse facto, veio dar a impressão de .que não 'devemps esquecer essa política donde nos veio tanto ouro.

Si1. Presidente: para a colónia portuguesa no Brasil vão as inais entusiásticas saudações da minoria monárquica.

A melhor forma que temos de honrar á colónia portuguesa no Brasil é mostrar àquele grande país que nós sabemos administrar-no s por maneira a não merecermos, porventura, quaisquer censuras que se justificariam se no país que vive numa angustiosa situação financeira, mantivéssemos, por delírio de grandeza, uma aparência não correspondente à realidade.

Encher de orgulho á nossa colónia no Brasil, é dar-lhe ensejo para mostrar a essa grande nação que ela pertence a uni país que sabe governar-se e, por isso, impor-sé à consideração de todo o mundo civilizado.

Também eu não esqueço um instante a circunstância, que o Sr. Nuno Simões salientou, dó vir da colónia portuguesa no Brasil um grande montante de ouro para Portugal. E, precisamente porque a não esqueço, é que eu desejo que ôsse montante seja cada vez de maior valor, o que, porém, não se conseguirá em quanto o país for governado como tem sido até agora.

Era preciso que a nossa administração financeira passasse a ser feita sob os verdadeiros princípios da boa moral administrativa, para levar a confiança à nossa colónia no Brasil no tocante à aplicação dos dinheiros que dela venham para Portugal.

Só então se poderia ver avolumado aquele montante de ouro a que se referiu o Sr. Nuno Simões.

Mais do que nunca teria actualmente a colónia portuguesa nó Brasil ensejo de mandar para aqui o seu dinheiro, visto as condições cambiais cm que estamos vegetando.

Pois, Sr. Presidente, a verdade é que nem essas favoráveis circunstâncias para a transferência do dinheiro do Brasil para Portugal animam os nossos compatriotas na sua remessa de fundos para a mãe pátria. Porquê? Porque eles bem sabem a forma como são geridos os dinheiros públicos.

'& necessário incutir-lhes confiança, dar-

mos provas de quê somos económicos, começando por não gastar dinheiro corn a aquisição de um palácio próprio para se instalar a nossa Embaixada no Brasil.

O Brasil, que é rico também, não se dá ao luxo de ter aqui um palácio próprio para a sua Embaixada, pois ela está instalada num edifício alugado.

O Sr. Bartolonieu Severino referiu-se, como aliás o já havia feito o Sr. Nuno Simões, às minhas considerações acerca do Comissariado Geral da Exposição no Rio de Janeiro.

O Sr. Nuno Simões disse cue não seria eu quem teria autoridade para vir aqui condenar essa administração dos dinheiros públicos feita pelo aluc.ido Comissariado.

Ao ouvir isto, senti-me Comissário Geral da Exposição no Bio de Janeiro, pois só assim poderia ter a responsabilidade do que se faz nesse Comissariado.

Mas não: eu não sou o Comissário Geral da Exposição no Rio de Janeiro, riem tenho a responsabilidade da sua escolha.

Tenho pois toda a autoridade como Deputado de vir aqui criticar os seus actos.

O Sr. Bartolomeu Severino disse, corno tinha dito também o Sr. Nuno Simões, dirigindo-se a mim, o seguinte, "touco mais ou menos: «... terá então o Sr. Carvalho da Silva ocasião de ver que não é tare. grande o escândalo...»

Quero dizer: j já não se nega que haja escândalo! O que se diz é que não será tam grande.

Já se não nega que seja um escândalo o que se tem feito na Comissariado Geral da Exposição do Rio de Janeiro.

O Sr. Bartolomeu Severino:—Perdão, eu não disse que havia um escândalo; eu disse que V. Ex.a não conhecia escândalo algum.

O Orador: — Mas V. Ex.a disse, como também disse o ilustre Deputado Sr. Nuno Simõps, que eu «talvez não tivesse tanta razão».

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O Orador i—V. Ex.a, contudo, disse que «não havia una escândalo tam grande» ....

O Sr. Nuno Simões:—O que eu disse, seni falar em escândalos, foi que V. Ex.a não teria tanta razão como a que supõe ter.

O Orador: — Emfim, V. Ex.» já admite essa hipótese. Mas eu devo esclarecer Q Sr. Bartolomeu Severino que quando afirmei que dentro de poucos dias a minoria monárquica irá revelar mais um escândalo monumental da administração republicana, escândalo que vem demo.nstrar que se mandam arquivar processos de sindicância em que se descobrem roubos, eu não queria referir-me neste momento ao Comissariado Geral da Ivxpqsição do Rio de Janeiro. Espere S. Ex.a três ou quatro dias, e ver-me há levantar aqui essa questão, pedindo ao Ministro respectivo para que abra as portas do sou Ministério a fim de que a minoria monárquica veja tudo Q que ó preciso que o País saiba, e que há simples despachos ministeriais que mandam arquivar processos de sindicâncias que revelam roubos enormes.

O Sr. Nunq Simões; — Y. 3£x.a podia,, pelo menos, fazer o favor de dizer qual era esse Ministro.

O Orador:—O Ministro a que me refiro não. está presente.-

O Sr. Ministro dos Necpciqs Estrangeiros (Barbosa de Magalhães):—Era melhor V. Ex.a dizer tudo, já quo começou a falar.

Trocam-sè vários apartes,

O Orador:—Eu vou dizer a Y. Ex.as! O assunto a que me refiro diz respeito à pasta da Guerra, e V. Ex.as terão ocasião de me ouvir dentro de três ou quatro dias, .com documentos, mostrar íi verdade do que afirmei,

Sr. Presidente: postas estas considerações., eu creio ter exposto 4e maneira mais que suficiente as razões por que não mudo de opinião depois de ouvir os discursos dos ilustres Deputados Bartolomeu Severino e Nuno Simões, a quem

me apresso a prestar as homenagens da. minha maior consideração,,

Tenho dito.

O orador não reviu*

O Sr. Nuno Simões; — Sr. Presidente: começo por lastimar que num deha,te sobre um assunto de tamanha importância e que devia merecer o respeito d,e toda a Câmara, se tenha enxertado um incidente como aquele que o Sr. Carvalho da Silva sem querer —quero crê-lo,— trouxe à tela da discussão,. De facto eu. não acredito que o, Sr. Carvalho da Silva integrasse neste debate afirmações, comq aquelas que fez, de escânda.los que conhece e quç é da sua obrigação claramente oxp.or ao Parlamento, para que se faça justiça % quem a tem, a fim de que num assunto como este pudesse ficar a impressão à colónia portuguesa do Brasil qqe há qualquer ligação, ainda a mais longínqua, com escândalos óje qualquer natureza.

Lastimo profundamente. Sr. Presidente, este incidente, tanto mais quanto é certo que não julgo o momento oportuno para que o ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva, quQ procura sempre ser correcto nas afirmações que faz, vir fazer afirmações tam vagas, como. aquelas que fez, afirmações e,ssas que poderio traduzir-se em insinuações para o actual Governo, mais ainda, em insinuações para pessoas que de nenhum modo a devem merecer por parte do Sr. Carvalho da Silva.

Sr. Presidente: ]astim$nílQ prqfunda-mente este incidente, como já tive qca-sião de dizer à Câmara, eu não quero deixar de salientar que as afirmações apresentadas pejo ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva, são de defesa a mais completa à proposta de le| em discussão.

O Sr- Carvalho 4a Silva quere absolutamente dignificar a nqs.sa colónia portuguesa no Brasil; e se assim é, não me parece que, S. Ex.a deseje que $ nossa Embaixada do Brasil esteja instalada em qualquer edifício, iste ó, em qualquer casa que não esteja à altura da. nossa representação no Brasil, ponto este, Sr. Presidente, que o ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva não rebateu, por isso que q não pqdia rebater.

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Diário da Câmara do» Deputado»

que representa para o Estado a renda que se paga com essa casa.

Pois se quisesse ter-se dado a esse trabalho, veria as vantagens que redundam desta proposta de lei. E se bem que o Sr. Bartolomeu Severino lhe tivesse respondido condignamente sobre o assunto, S. Ex.a ainda assim não se quis dar por satisfeito, se bem que eu tenha a certeza absoluta de que o Sr. Carvalho da Silva dará a sua aprovação à proposta que se discute.

Kelativamente, Sr. Presidente, ao Comissariado da Exposição, poderei eu dar explicações; e estou absolutamente certo de que o Sr. Carvalho da Silva será o primeiro a ver que não há escândalos, mas apenas erros.

O Sr. Carvalho da Silva:— Tem havido esbanjamentos.

O Sr. Cancela de Abreu:— Se há erros parece-me que se está na altura de os remediar.

Não é depois da despesa feita.

O Orador:— Lastimo que o assunto não mereça a devida atenção da Câmara.

O comissário da Exposição garantiu-me no meu gabinete que a publicidade não custaria ao Estado um centavo; e, como o comissário é uma pessoa honesta, não tenho razões para duvidar.

O Sr. Carvalho da Silva:—Não contesto.

O Orador:—Vou terminar as minhas considerações, lastimando que a Câmara não vote a proposta por unanimidade, prestando assim uma homenagem, quando estão em jogo altos interesses.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Barbosa de Magalhães):—Sr. Presidente : começo por agradecer à Câmara a gentileza de ter acedido ao meu pedido de urgência e dispensa do Regimento para a proposta que tive a honra de submeter à sua apreciação.

Lastimo, no emtanto, que à sombra dessa proposta se tivessem produzido afirmações e insinuações relativamente a assuntos absolutamente estranhos à matéria

em discussão, e que só serviram para roubar à Câmara o tempo de que ela necessita para se ocupar doutras questões do muito maior utilidade par$ o país.

Sr. Presidente: se os republicanos perfilhassem a doutrina dos monárquicos que se concretiza na frase «quanto pior, melhor», eu não tinha neste momento, senão que me regozijar com a atitude da minoria monárquica nesta casa do Parlamento ...

Interrupção do Sr. Cancela de Abreu.

O Orador:—Eu não permito que me interrompam.

A minoria monárquica marcou claramente a sua atitude neste caso.

Se há que lastimar é o facto de essa minoria ter aproveitado o ensejo em que se tratava dum assunto de ordem internacional e duma homenagem justa e oportuna à nossa importante colónia no Brasil, para pôr em prática a sua nefasta, política de oposição, fazendo insinuações unicamente baseadas no consta <_3 que='que' com='com' ruas='ruas' olhos='olhos' abertos...='abertos...' país='país' os='os' e='e' políticos='políticos' do='do' o='o' p='p' jornais='jornais' se='se' diz='diz' objectivo='objectivo' já='já' efeitos='efeitos' das='das' tirar='tirar' contraproducentes='contraproducentes' tem='tem' porque='porque' são='são'>

O Sr. Carvalho da Silva:—Apoiado! Não tenha V. Ex.a dúvidas.

O Orador:— ... e sabe quanto são diferentes os processos da República.

A proposta que tive a honra de enviar para a Mesa e que foi objecto duma discussão que eu não esperava, pois sempre julguei que ela viria a ser aprovada por unanimidade, já foi suficientemente justificada pelos ilustres relatores da comissão de negócios estrangeiros e da comissão de finanças.

Dadas as circunstâncias especiais, a aprovação desta proposta é de toda a conveniência, pois por outra forma poderia perder-se o prédio e dum momento para o outro ficarmos sem casa.

O Sr. Carvalho da Silva:—

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£ Estando anunciada a viagem do Sr. Presidente da República, em que situação ficaríamos sem ter onde alojar a embaixada devidamente?

No Brasil, como aqui já foi dito, outros países querem adquirir prédios para as suas embaixadas.

O que vamos fazer nesta ocasião adquirindo um prédio, é uma mera medida de ordem económica; e por isso a proposta merece a aprovação da Câmara.

É uma homenagem prestada à. grande colónia, à importantíssima colónia portuguesa no Brasil.

Devo dizer ao Sr. Nuno Simões que o Governo, em cumprimento da sua declaração ministerial, aceita a sua moção.

Não quero, pois, cansar mais a atenção da Câmara, reservando-mo para em ocasião oportuna responder à interpelação já anunciada polo ilustre Deputado, o Sr. Nuno Simões, o que então farei com o maior prazer, desenvolvendo nessa oca-, sião esse ponto do vista, que aliás se acha bem expresso na declaração ministerial.

O que eu posso, no enitanto, dizer desde já a V. Ex.;i e à Câmara é que o Governo está estudando o assunto com o máximo cuidado, estando pronto a adoptar as medidas que julgar necessárias, o tanto quanto possível imediatas, no sentido de que sejam mantidas sempre no Brasil as melhores relações connosco.

E isto, Sr. Presidente, o que por agora tenho a dizo.r sobre a assunto, e isto para não tomar mais tempo à Câmara, pois longe estava ou do imaginar que ao apresentar esta proposta do lei tam largo debato se estabelecesse sobre ela.

Termino, pois, as minhas considerações, Sr. Presidente, e>perando que a Câmara dê o seu voto à proposta que está em discussão. Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Bartolomeu Severino: — Sr. Presidente : pedi a palavra para pedir a V. Ex.a o obséquio de consultar a Câmara sobre se permite que a sessão seja prorrogada até se votar a proposta eiu discussão.

Foi aprovado.

O Sr. Cunha Leal: — O orador começa afirmando que não nega aos monárquicos

o direito de oposição, mas é necessário que o exerçam por forma a não ofenderem os direitos da inteligência. O Sr. Carvalho da Silva, no ataque à proposta em discussão, não tratou de indagar se havia conveniência na aquisição do prédio, nem se ela representava economia, Atacou, por espírito de atacar; apenas. O Sr. Carvalho da Silva encheu a boca com a palavra escândalo, mas não demonstrou as suas afirmações.

O orador prossegue na defesa da proposta.

Aparte do Sr. Carvalho da Silva,

O Orador:—Não ó exacta a afirmação. O que ele, orador, afirmara, na hora amarga em que se deram os crimes da trágica noite de 19 de Outubro, foi apenas isto : que elo, orador, jamais poderia ser monárquico, mas não sabia se poderia continuar a ser republicano. (Apoiados}.

Concluindo as suas considerações, intima o Sr. Carvalho da Silva a provar as suas acusações.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Joaquim Ribeiro: — Sr. Presidente : agradeço a S. Ex.a, o Sr. Ministro da Guerra, a fineza de ter prontamente comparecido nesta casa do Parlamento; mas creio qne S. Ex.a ainda me agradecerá muito mais de eu ter pedido a sua comparência urgentemente.

É que o Sr. Carvalho da Silva, fazendo afirmações que, afrontosas Dará o regime e para o Sr. Ministro da Guerra, tem do as provar.

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Diário da Câmara aos Deputados

O Sr. Carvalho da Silva (interrompendo):— Perdão! V. Ex.a não interpretou bem as minhas palavras. Eu disse apenas que havia graves erros no Ministério da Guerra.

O Orador: — O Sr. Carvalho da Silva faz agora uma versão diversa do que disse ou do que eu entendi que S. Ex.a disse há pouco.

Pareceu-me que S. Ex.a tinha feito alusões ao Sr. Ministro da Guerra, que é um grande homem de bem, que ó daqueles que, na República, tem estado preso por ser republicano. (Apoiados).

Eu não sei como é que o Sr. Carvalho da Silva vai explicar o que disso, para que eu e toda a Câmara nos dêinos por satisfeitos com as suas palavras. Acho difícil, mas aguardo essas explicações, lamentando ter incomodado o Sr. Ministro da Guerra, que prontamente veio à defesa do seu bom nome e da moralidade da República.

O orador não reviu.

O Sr. Lino Neto: — Sr. Presidente: por parte da minoria católica, careço de justificar a nossa atitude sobre a proposta ern discussão.

Não a quero discutir, nem quero escândalos na administração pública do meu país.

Se na proposta em discussão eu visse escândalo ou desperdício, certamente não deixaria de a repelir imediatamente.

O Sr. Nuno Simões (interrompendo): — Nem V. Ex.a nem ninguém nesta Câmara.

O Orador: — Não passa pela cabeça de ninguém a idea de eliminar a Embaixada do Brasil; ela é indispensável para a nossa situação internacional, e como condição das nossas relações com o Brasil.

O que a Embaixada não pode ó estar sem casa. (Apoiados).

A questão resume se apenas em sabei-se a casa deve ser própria ou arrendada.

As informações que acompanham a proposta são de que a casa em que está a Embaixada actualmente vai sor vondi-da; que o proprietário tem em consid^ra-ção o Governo Português, o qual terá preferência, e que se o Governo Portu-

guês não a adquirir para a Embaixada do Brasil, de um momento para o outro ficará esta sem ter casa.

A situação é esta, e ela salta imediatamente aos olhos de toda a gente razoável.

E assim a proposta não pode ser coj-siderada nem anti-económica nem política.

Para mais é agora neste momento, em que se comemora a descoberta do Brasil, uma homenagem sincera ao nosso querido país, à colónia portuguesa .no Brasil, como ao Governo Brasileiro.

Julgo assim ter justificado a minha atitude e a da minoria católica nesta Câmara.

Não se trata de uni escândalo, que os houve na administração pública portuguesa de todos os tempos. (Apoiados).

Mas não é agora o momento de tratarmos dêssu assunto.

A compra duma casa para &, embaixada portuguesa no Rio de Janeiro parece-me justificada moral, económica e politicamente.

Por esse motivo a minoria católica aprova a proposta do Sr. Miaistro dos Negócios Estrangeiros.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

(Apoiados).

O orador não r evite.

O Sr. Ministro da Guerra (Correia Barreto):— Convido o Sr. Carvalho da Silva a fazer as suas revelações.

O Sr. Carvalho da Silva : — Não precisava V. Ex.a convidar-me a falar, porque não preciso ser convidado para usar do meu direito de Deputado da Nação, e dizer o que julgu necessário no desempenho do meu mandato.

Não é V. Ex.a que me convida, portanto': é o Sr. Presidente da Camará.

Vou, portanto, duas preguntas fazer.

Vozes : —Provas, provas...

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Vozes: —Tem de provar. Provas, provas.

O Orador: — Não desejo vir fazer acusações de nenhuma espécie senão com dados concretos.

Vozes:—Não os tem.

O Orador; — Tenho alguns.

Desejo, porém, preguntar ao Sr. Ministro da Guerra o seguinte:

Primeiro: eu pedia a V. Ex.a o favor de me dizer se (não digo na gerência de V. Ex.a mas na de outros Ministros) tem sido dada a aplicação determinada por lei aos saldos das verbas destinadas às diferentes unidades do exército.

Segundo: ,;Q.ual a aplicação que tem sido dada a esses saldos, que, como V. Ex." muito bom sabe, pão quantias relativamente importantes?

Terceiro: Desejava saber se V. Ex.a manda franquear à minoria monárquica todos os documentos de que necessitarmos, na Direcção dos Serviços Administrativos do Exército.

O orador não reviu.

Trocam-se apartes.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Barbosa de Magalhães): — V. Ex.a não tem o direito de preguutar, tem obrigação de responder.

V. Ex.a há-de ficar amarrado ao pelourinho.

O Sr. Ministro da Guerra (Correia Barreto):— Sr. Presidente: respondo unicamente à terceira progunta, porque se o Sr. Carvalho da Silva quere saber a resposta das duas primeiras, faça uma interpelação. (Apoiados).

O Sr. Carvalho da Silva: — Ora essa!...

O Orador:— É isto e nada mais.

Não ó só à minoria monárquica, mas à maioria republicana também, que o meu Ministério está patente, para que todos' possam ver qual é a gerência republicana.

Além disso há uma Comissão de Inquérito Parlamentar, que a todos nós deve merecer a máxima confiança, e da qual faz parte um Deputado da minoria mo-

nárquica, que está examinando todos os documentos, e dará depois o seu parecer.,

Aparte do Sr. Carvalho da Silva.

Trocam-se apartes.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Barbosa de Magalhães): — V. Ex.a fez uma afirmação categórica, tem de a provar.

O Orador:—E isto que tenho de responder.

V. Ex.a fez acusações a Ministros da República, e eu intimo o a que as prove.

V. Ex.a fez uma acusação a Ministros da República. Intimo-o, pois, a que declino os nomes desses Ministros e a que concretize claramente a sua acusação.

(Muitos apoiados).

O Sr. Carvalho da Silva:—Sr. Presidente : visto que me forçam a fazer referência a um facto concreto, eu vou fazê-la; mas lamento que, precisando eu, para tratar mais largamente desse assunto, de uma resposta clara e categórica do Sr. Ministro da Guerra, S. Ex.a não a desse.

Não digo que o caso em questão se tenha provado na gerência do actual Ministro da Guerra.

Uma voz: —

O Orador: — Sei que por um oficial do exército de nome Sousa Azevedo foi apresentado ao Ministério da Guerra um requerimento era que se fazia a acusação de ser dada uma aplicação ilegal aos saldos de determinadas verbas e em que esse oficial pedia para continuar a ser ouvido sobre esse assunto; e eu pregunto ao Sr. Ministro da Guerra se é ou não verdade que foram mandadas arquivar as declarações desse oficial, sem se querer prosseguir nas respectivas investigações.

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Diário da Câmara dos Deputados

Eis, portanto, uma acusação concreta e, para a completar, desejo ir ao Ministério da Guerra procurar mais elementos que me habilitem a julgar só é ou não ilegal a aplicação dada às verbas em referência.

O que, porém, desde já afirmo é que há declarações formuladas sobre o assunto pelo tenente Sousa Azevedo e que a sindicância por 6ste oficial pedida não teve seguimento o foi mandada arquivar.

Vozes:—Mas que sindicância?

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Barbosa de Magalhães): — V. Ex.a está a . desdizor-sc do tudo quanto afirmou.

O Orador: — Há uma maneira de o Sr. Ministro da Guerra colocar bem a questão: é declarar, terminante e categoricamente, que não é verdadeiro o facto apontado, que aos saldos das verbas a que me referi o que atingem somas importantes não foi dada aplicação menos regular.

Eu preguuto se haverá alguém que possa defender o facto que apontei, do se mandar arquivar o que porventura haja sido apurado acerca de um acto grave.

Ao carácter do todos os meus ilustres colegas sei fazer a devida justiça; e, assim, estou certo de que não deixarão de reconhecer que este facto é imoral.

Se ele não existe, só o Sr. Ministro da Guerra podo dar-lhe um a-terminante negativa.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Barbosa de Magalhães): —

O Orador: —

Nunca fiz acusações ^ do carácter pessoal ; tenho-me referido apenas a actos de administração do Estado.

Prezo bastante a minha honra para saber respeitar a alhoia.

Eegisto a declaração do Sr. Ministro da Guerra, que muito o honra, de que facilitou sempre o exame de quaisquer documentos que desejem ser compulsados pelos Srs. Deputados, no seu Ministério.

Lá iremos verificar se são ou não verdadeiros os factos a que aludi, e que, de resto, já foram publicados na imprensa.

Tenho di;o..

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Correia Barreto): — Ao entrar hoje nesta sala, fui informado de que o Sr. Carvalho da Silva acusara um Ministro da República de ter abafado uma sindicância sobre um caso de desvios de dinheiros do Estado.

Já pedi a S. Ex.a que indicasse quem era o Ministro e quem tinha feito a sindicância. Mas S. Ex.a nada me rospon-deu. Não faz senão «ritar. Não há maneira de conseguir que concretize a sua acusação.

Do resto, é já sistema antigo usado no campo cm que S. Ex.a milha, acusar e não provar a acusação.

Eu fui até vítima desse sistema, no período sid6nico-monárquico, em que houve uma verdadeira caça à honr?, alheia, inclusivamente à honra da República. (Apoiados).

Uma voz: — E da Pátria.

O Orador: — E da Pátria, não há dúvida.

Levantaram uma sindicância aos meus actos, mas a breve trecho ela desaparecia porque viram que indo as cousas até o fim teriam de me elogiar.

Acusavam-me do crime de tor mandado fazer material de guerra, sem ter sequer as minutas dos respectivos contratos, aprovadas.

Ora a verdade é que essas minutas levavam sempre muito tempo e sendo urgente mandar material para a França, evidente é que muito para lá foi sem estarem aprovadas as minutas.

Se nós nos tivéssemos prendido nas malhas exigentes da burocracia, o que teria sucedido ao nosso Corpo Expedicionário?

Eu tenho, pois, a certeza de que nenhum Ministro da República prevaricou...

O Sr. António Maia :—Da República? O 19 de Outubro não é Republica. Apoiados.

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viam dar entrada "no Banco de Portugal aí não entraram, foi porque elas tiveram aplicação legal em diversos serviços da Kepublica.

Eis, Sr. Presidente, o que tenho a responder ao Sr. Carvalho da Silva.

O Sr. João Camoesas: — O Sr. Carvalho da Silva concretizou a sua acusação de há pouco nestes termos quási textuais: «dentro em pouco trarei a esta Câmara um escândalo monumental da administração republicana».

Instado por todos os lados da Câmara a apresentar concretamente os motivos da sua afirmação, S. Ex.a limitou-se a dizer que tinha havido um Ministro da Republica que mandara, por simples despacho seu, arquivar determinadas sindicâncias através das quais se provara a existência de verdadeiros roubos.

Instado mais uma vez pela Câmara a dizer em que consistiam esses roubos, S. Ex.a nada mais disse do quo aquilo que todos nós ouvimos.

í Onde estão, pois, os roubos, por S. Ex.a tam estrondosamente anunciados?

(íOnde estão os escândalos monumentais da administração republicana a encobrir esses roubos?

Não o conseguiu S. Ex.a demonstrar à Câmara e ao País; o que S. Ex.a conseguiu demonstrar, com as suas palavras sem fundamento, foi que nenhum respeito tem pela dignidade alheia (Muitos apoiados), evidenciando mais uma vez o seu já conhecido propósito de fazer afirmações caluniosas, com o fim de procurar provar perante o País que a República é um pouco semelhante à monarquia que eles vergonhcsamonte deixaram cair em 5 de Outubro de 1910.

Sr. Presidente: se nós, nesta Câmara, tivéssemos por adversários homens de saber, homens de inteligência, homens na verdadeira acepção do termo, em vez de coscovilheiros e intriguistas, maiores seriam ainda os louros da administração republicana.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: disse o Sr. Ministro da Guerra que eu devia formular uma interpelação sobre

o assunto acerca do qual interroguei S. Ex.a, mas eu quero registar desde já que, tendo interrogado o Sr. Ministro da Guerra sobre se os saldos das despesas das várias unidades do exército tinham tido a aplicação que^deviam ter, S. Ex.a me respondeu que, se eles não entraram no Banco de Portugal, como a lei manda, é porque foram gastos com outros serviços do exército. Apartes.

O Sr. Ministro da Guerra (Correia Barreto) (interrompendo) : — Foram gastos legalmente.

Apoiados.

Apartes.

O Orador:—Visto a declaração do Sr. Ministro da Guerra, S. Ex.a admite a hipótese de os saldos não terem dado entrada no Banco de Portugal.

O resto fica para daqui a alguns dias, quando eu receba informações do Ministério da Guerra que me habilitem a tratar do assunto.

Apartes.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Está encerrado o debate.

Vai ler-se para ser votada a moção do Sr. Nuno Simões.

Leu-se.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente : —Vai proceder-se à votação do projecto.

Foram lidos e seguidamente aprovados a substituição ao artigo J.° e os artigos 2.° e 3.° do projecto.

A substituição é a seguinte:

Artigo 1.° É autorizado o Governo a contrair um empréstimo de seiscentos e oitenta contos (moeda brasileira) a fim de se adquirir o prédio para a Embaixada da República Portuguesa e se realizarem as necessárias obras de reparações e instalação.

O Sr. João Camoesas:—Requeiro a dispensa da última redacção.

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Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Presidente:—Á próxima sessão é no dia 4, à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:

A de hoje e emendas do Senado ao projecto do lei que concede pensões às viúvas e filhos das vítimas do 19 de Outubro.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 16 minutos.

Da mesma, sobre o n.° 46—M, que autoriza o Governo a conceder o bronze para o monumento a António Maria Baptista e mandá-lo fundir na fábrica de Braço de Prata.

Para a comissão de finanças.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Requerimento

De Alfredo de Sousa Azevedo, tenente miliciano da administração militar, pedindo que seja feita uma sindicância à Direcção Geral dos Serviços Administrativos do Exército.

Para a comissão de guerra.

Propostas de lei

Dos Srs. Ministros das Finanças e Comércio, aprovando o plano geral das estradas de l.a e 2.a ordem.

Para o «.Diário do Governo».

Do Sr. Ministro da Instrução Publica, reorganizando o ensino primário superior. Para o «Diário do Governou».

Pareceres

Da comissão de guerra, sobre o requerimento do alferes miliciano Mário Páscoa da Costa, pedindo promoção.

Para a comissão de finanças.

Da mesma, sobre o requerimento do tenente Inácio Palma da Silva, pedindo contagem de antiguidade.

Para o «Diário da Câmara», nos termos do artigo 38.° do Regimento.

Da mesma, sobre o n.° 36-F, que regula a concessão de licença ilimitada aos oficiais do exército.

Para a comissão de finanças.

Da mesma, sobre o n.° 46-1, que promove ao posto imediato, por distinção, os oficiais mortos na Grande Guerra, em combate, e condecorados com a Cruz de Guerra.

Para a comissão de finanças.

Documentos publicados nos termos do artigo 38.° do Regimento

Parecer n.° 64

Senhores Deputados.—Á vossa comissão de guerra foi presente o requerimento em que o tenente do regimento de infantaria n.° 35, Enácio Palma da Silva, pede a contagem de antiguidade do seu actual posto desde 29 de Setembro de 1917.

Junta certidão do que consta da sua folha de matrícula e diz não poder recorrer para o Conselho Superior de Promoções, por a tal se opor o § 3.° do artigo õ.° do regulamento do mesmo Conselho.

A vossa comissão de guerra, por um dos seus vogais, informou-se do que consta do processo individual do requerente e existente na Secretaria da Guerra, e dele tirou as notas seguintes para vos dar o seu parecer.

É alferes desde 15 de Novembro de 1914. Depois de ter prestado uerviço em África, embarcou para França, fazendo parte do Corpo Expedicionário Português, em 22 de Fevereiro de 1917, donde regressou em 15 de Abril do mesmo ano, por haver sido julgado incapaz de todo o serviço. Foi reformado por decreto de 21. Por haver sido julgado pronto para todo o serviço pela juntajios.pitalar de inspecção, regressou ao activo por decreto de 19 de Novembro de 1920.

A repartição competente consultou, como era do seu dever, sobre a sua promoção a tenente, informando que oficiais haviam sido promovidos a tenentes em 1917, mais modernos do que o requerente, aos quais fora dispensado o curso de tiro.

Que o requerente estava nessas condições também, e que solicitava o parecer sobre a antiguidade, caso devesse ser promovido.

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reintegração, visto que, sendo uma das condições essenciais para a promoção a aptidão física, o requerente se enconirava na situação de reforma, por incapacidade física, na data em que foram promovidos os oficiais mais modernos.

O requerente chegou a reclamar e foi--Ihe indeferida. Não requereu para o Conselho Superior de Promoções porque se convenceu de que não teria provimento, visto a promoção e sua antiguidade haver sido feita nos termos da consulta do mesmo Conselho.

A vossa comissão de guerra, atendendo à forma como a repartição procedeu logo que o requerente voltou ao activo; atendendo a que prestou na consulta todos os informes necessários; atendendo ao justo

motivo alegado polo Conselho Snperior de Promoções r»ara lhe atribuir a antiguidade desde que foi julgado pronto para o serviço e a ele regressou, e atendendo ainda a que é expresso no artigo 80.° da lei de 12 de Junho de 1901 que a ninguém é devida indemnização por na-, ver sido preterido por falta do qualquer das condições essenciais de promoção, julga e resolve não dar deferimento à pretensão por falta de pagamento justo e legal.

Sala das sessões da comissão, 2 de Maio de 1922.—João Estevão Águas, presidente e relator — Leio Portela — F. C. Rego Chaves — António Maia—Eugênio Aresta.

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