O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

49.ª SESSÃO ORDINÁRIA DO 3.° PERÍODO DA 1.ª LEGISLATURA

1912-1913

EM 24 DE FEVEREIRO DE 1913

Presidência do Exmo. Sr. Anselmo Braamcamp Freire

Secretários os Exmos. Srs.

Artur Rovisco Garcia
Pedro Bôto Machado

Sumário. — Chamada e abertura, da sessão.

Leitura e aprovação da acta.

Expediente.

O Sr. João de Freitas faz considerações sôbre um seu, requerimento.

Aproveitando a presença dos Srs. Ministros, do Interior (Rodrigo José Rodrigues) e do Fomento (António Maria da Silva), que respondem a todos os oradores, ocupam-se:

De assuntos que interessam a Ponte do Lima, o Sr. Manuel José de Oliveira.

De fornecimentos de azeite para os caminhos de ferro do sul e sueste, pedindo uma sindicância, o Sr. Fortunato da Fonseca.

Da contribuição para o liceu de Bragança, por parte dos municípios do distrito, o Sr. Bernardino Roque.

Dum projecto de lei relativo a partidos médicos, o Sr. Brandão de Vasconcelos.

Do descanso semanal das pastelarias e do caminho de ferro do Entroncamento à Certa, o Sr. Tasso de Figueiredo.

Lê-se um ofício do Sr. Santos Moita, que participa ter perdido o seu lugar de Senador, resolvendo-se enviar o referido documento à comissão de infracções.

Ordem do dia. — Antes de se votar a proposta de lei n.º 74, o Sr. Bôto Machado requere que o Senado permita que seja apresentado um projecto de substituição.

O Sr. Miranda do Vale requere que o projecto vá à comissão de administração, o que é aprovado.

Continuação da discussão do parecer n.º 123, sôbre o qual falam os Srs. Sousa da Câmara, apresentando uma proposta, Silva Barreto, Ministro do Interior, João José de Freitas, Goulart de Medeiros, Ladislau Piçarra e Artur Costa.

Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Vera Cruz pede que seja publicado no «Sumário» uma exposição relativa a emigração para o Brasil, tomando a palavra sôbre o assunto o Sr. Presidente do Ministério (Afonso Costa), que tambêm, dá explicações ao Sr. João José de Freitas, que as pedira acêrca da remessa de documentos.

O Sr. Presidente encerra a sessão, depois de designar a ordem do dia.

Estiveram presentes os Srs. Presidente do Ministério e Ministros do Interior e do Fomento.

Srs, Senadores presentes à abertura da sessão:

Abílio Baeta das Neves Barreto.
Alfredo José Durão.
Anselmo Augusto da Costa Xavier.
Anselmo Braamcamp Freire.
António Augusto Cerqueira Coimbra.
António Bernardino Roque.
António Brandão de Vasconcelos.
António Ladislau Piçarra.
António Maria da Silva Barreto.
António Pires de Carvalho.
Augusto de Vera Cruz.
Carlos Richter.
Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro.
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Faustino da Fonseca.
Inácio Magalhães Basto.
João José de Freitas.
Joaquim José de Sousa Fernandes.
José Afonso Pala.
José de Castra.
José Miranda do Vale.
José Nunes da Mata.
Manuel Goulart de Medeiros.
Manuel José de Oliveira.

Página 2

2 Diário das Sessões do Senado

Manuel Martins Cardoso.
Manuel Rodrigues da Silva.
Pedro Amaral Bôto Machado.
Ramiro Guedes.
Ricardo Pais Gomes.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Adriano Augusto Pimenta.
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
Alberto Carlos da Silveira.
Alfredo Djalme Martins de Azevedo.
António Caetano Macieira Júnior.
António Ladislau Parreira.
António Ribeiro Seixas.
Artur Augusto da Costa.
Cristóvão Moniz.
Domingos Tasso de Figueiredo.

José António Arantes Pedroso Júnior.
José de Cupertino Ribeiro Júnior.
José Estêvão de Vasconcelos.
José Machado de Serpa.
José Maria de Moura Barata Feio Terenas.
José Maria de Pádua.
José Maria Pereira.
Leito Magno Azedo.
Luís Fortunato da Fonseca.
Manuel de Sousa da Câmara.
Tomás António da Guarda Cabreira.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

Alfredo Botelho de Sousa.
Amaro de Azevedo Gomes.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Joaquim de Sousa Júnior.
António Xavier Correia Barreto.
Artur Rovisco Garcia.
Bernardo Pais de Almeida.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Correia de Lemos.
Joaquim Pedro Martins.
José Luís dos Santos Moita.
Luís Maria Rosette.
Manuel José Fernandes Costa.
Sebastião de Magalhães Lima.
Tito Augusto de Morais.

Pelas 14 horas e 30 minutos o Sr. Presidente mandou proceder à chamada.

Tendo-se verificado a presença de 29 Srs. Senadores, S. Exa. declarou aberta, a sessão.

Lida a acta da sessão anterior, foi aprovada sem, reclamação. Mencionou-se o seguinte

EXPEDIENTE

Oficio

Da Presidência da Câmara dos Deputados, remetendo uma proposta de lei que tem por fim revogar e tornar de nenhum efeito a segunda e última parte do artigo 10.° do decreto de 25 de Maio de 1911, que instituiu a junta dos partidos municipais.

Para a comissão de administração.

Telegrama

De Viseu, em 24. — Exmo. Sr. Presidente do Senado, Lisboa. — Senadores, Deputados, grande número de pessoas todas classes Viseu, reunidas com comissões administrativas e Associação Comercial e Industrial, reconhecendo inconveniência criação novo distrito Lamego, ou em qualquer outro ponto país, deliberaram representar Govêrno e Parlamento pedindo integridade distrito Viseu e construção urgente linhas férreas Viseu a Castro Daire, Paiva, Gaia a Viseu, Moimenta a Foz Tua, e tambêm troço linha Régua a Vila Franca das Naves entre Régua e Moimenta, passando Lamego, dando assim satisfação antigas, instantes e justas reclamações sôbre falta meios comunicação êste importante distrito. = Presidente da assemblea, Augusto Simões?

O Sr. João de Freitas: — Pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministério da Justiça, me seja fornecida, com urgência, cópia dos ofícios enviados em Novembro e Dezembro últimos, pelo então governador civil substituto do distrito de Bragança, engenheiro Agostinho Lopes Coelho, ao referido Ministério e ao Secretário do Conselho Disciplinar da Magistratura Judicial, sendo os dois últimos ofícios datados de 6 e 21 de Dezembro, respectivamente, e todos relativos a factos irregulares e de grave responsabilidade, imputados ao juiz de direito da mesma comarca de Bragança, e cuja veracidade se pe-

Página 3

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 3

dia para averiguar por meio duma sindicância.

Requeiro, outrossim, que pelo mesmo Ministério e juntamente com a cópia dos aludidos ofícios, me seja tambêm fornecida, com igual urgência, cópia da queixa apresentada contra o referido juiz de direito, por António José da Mota, a qual acompanhou o primeiro ofício. João de Freitas.

Sr. Presidente: os dois ofícios que cito no requerimento que acabo de ler, foram enviados, um em 6 e outro em 21 de Dezembro; mas, anteriormente a êstes, haviam sido enviados outros ofícios, com a data de Novembro, ao Sr. Ministro da Justiça, os quais acompanhavam a queixa do cidadão referido.

Sôbre o último ofício incidiu outro do Sr. Ministro da Justiça, dizendo que o assunto era da competência do Conselho Disciplinar da Magistratura Judicial, e seguiram-se mais outros ofícios ao secretário do referido Conselho Disciplinar.

Nestes ofícios apontavam-se factos irregulares e de certa gravidade imputados ao juiz de direito da comarca de Bragança, tornando-se, conseguintemente, necessário averiguar a veracidade de tais factos, e por isso mando para a mesa o requerimento que li, a fim de me poder ocupar de tam importante assunto e tomar sôbre êle a atitude que for conveniente.

Aproveitando o uso da palavra, insto pela remessa de documentos que, no mês passado, e nomeadamente nas sessões de 23 e 27, pedi pelos Ministérios das Finanças e Justiça, sôbre aspirantes, tesoureiros e secretários de finanças, e sôbre a incorporação definitiva, na Fazenda Nacional, dos bens mobiliários ou imobiliários, arrolados, das casas congreganistas extintas e, bem assim, no caso afirmativo, do valor dos bens incorporados ou do que produziram.

Pelo Ministério da Justiça, insto pela nota especificada, por distritos e concelhos, do número e designação das irmandades, misericórdias e confrarias, legalmente erectas em 20 de Abril de 1911 e, bem assim, das que harmonizaram os seus estatutos com a lei da Separação,até 31 de Outubro de 1912, prazo fixado na lei de 10 de Julho último, indicando-se tambêm o número e designação, por concelhos, das que até àquela data não cumpriram essa obrigação legal.

O orador não reviu.

Os ofícios foram expedidos.

O Sr. Manuel José de Oliveira: — Sr. Presidente: pedindo a palavra, tive em vista chamar a atenção do Sr. Ministro do Fomento para inadiáveis melhoramentos de Ponte do Lima, alguns dos quais constituem velhas e justíssimas reclamações daquela formosíssima povoação minhota. Êsses melhoramentos, que eu julgo absolutamente indispensáveis, são: a restauração da ponte, a demolição dum quiosque que existe na parte mais central da povoação, a dragagem do rio e a conclusão da estrada de circunvalação, já há muitos anos principiada.

Sr. Presidente: a ponte, que é muito antiga, foi construída no tempo dos romanos, restaurada por D. Pedro I e por D. Manuel, e, desde então até hoje, não sofreu outras modificações que não fossem a do seu calcetamento e a criminosa demolição das suas velhas torres medievais.

As pedras das suas ameias e das suas torres foram aproveitadas há muitos anos no calcetamento das ruas, mutilando-se assim um dos nossos mais formosos monumentos de arquitectura antiga.

A cheia de há quatro anos, avançando por cima das suas guardas, arremessou parte delas ao rio, e deteriorou muito esta velha relíquia de granito que tanto tem resistido ao sucessivo embate dos séculos. As obras a que então se procedeu limitaram-se, Sr. Presidente, a um gradeamento de madeira que até há bem pouco tempo lá esteve a atestar a incúria com que em Portugal se tem olhado para as cousas públicas.

Foi necessário que a cheia de Setembro passado viesse de novo continuar a acção demolidora do tempo inexorável, abrindo um boqueirão sôbre um dos arcos romanos da ponte, para que as obras públicas de Viana para ela lançassem um olhar misericordioso.

Foi necessário, para que ligeiros remen dos se fizessem, que o trânsito aí estivesse interrompido durante muitos dias, derivando-se por uma outra estrada marginal, a que seria completamente impossível se em lugar dum arco já fora do leito do rio se

Página 4

4 Diário das Sessões do Senado

tivesse dado o desmoronamento dum dos arcos centrais.

Os prejuízos incalculáveis que isso ocasionaria são fáceis de imaginar.

Os remendos que se fizeram na ponte não são suficientes para assegurar a sua resistência à acção devastadora das águas caudalosas do rio nas estações das cheias: as suas condições de fraca resistência são as mesmas, e essas agravadas pelo progressivo assoreamento do Lima e pela acção violenta das cheias cada vez mais frequentes.

O Sr. Estêvão de Vasconcelos tinha-me prometido incluir no orçamento a verba destinada à restauração da ponte, mas era necessário que o projecto que tinha ido para Viana, a fim de se ultimarem umas formalidades, voltasse ao Ministério antes do Orçamento ser apresentado ao Congresso.

Prometeu o Sr. Director que em breves dias êle voltaria; não sei, porêm, que estranha influência se interpôs, o que é certo é que a boa vontade do Ministro foi iludida e até hoje, já vai passado perto dum ano, êsse projecto lá dorme em Viana o eterno sono do esquecimento.

É para lastimar, Sr. Presidente, que dentro da República as repartições públicas continuem com a mesma morosidade imoral, com os mesmos condenáveis processos que no tempo da monarquia.

Compreende-se, mudaram-se as instituições, mas o funcionalismo continua com as velhas manhas doutrora.

A bem da Pátria e da República urge coagi-lo a cumprir os seus deveres.

Ao referir-me à ponte não posso, Sr. Presidente, deixar de pedir ao Sr. Ministro que mande imediatamente proceder aos necessários passos para a demolição dum imundo e desgracioso casebre que numa das extremidades da ponte tanto desfeia o mais importante e o mais formoso largo de Ponte do Lima, dependendo isso exclusivamente das obras públicas do distrito, cuja indolência bem ásperas censuras merece.

Noutro tempo foi uma pequena casa de guarda pertencente ao Ministério da Guerra. Foi posta depois em praça, vai já há bastantes anos. A carta de arrematação foi registada e nela ficou declarado que quando fôsse necessário demoli-la o seu proprietário não receberia mais de 160 ou 165 escudos, se bem me recordo. Mais tarde o arrematante pediu licença para aumentar o casebre.

A licença foi-lhe concedida, mas com a declaração de que ficava subsistindo a condição estabelecida na carta de arrematação. Em vista disto as obras não se fizeram e o proprietário vendeu-a, não querendo o actual sujeitar-se a essa condição. Os documentos referentes a êste caso, isto é, a carta de arrematação e a licença existem na repartição das obras públicas de Viana do Castelo. Resta apenas requerer a expropriação judicial e espero que o ilustre Ministro do Fomento não hesitará em dar ordens imediatas nesse sentido.

Sr. Presidente: outro assunto de suma importância para que eu quero chamar tambêm a atenção do Sr. Ministro do Fomento é o da assustadora rapidez com que nos últimos anos se tem feito o assoreamento do Rio Lima.

São enormes os prejuízos causados ao comércio, à agricultura e à saúde pública pelas freqùentes cheias do Rio Lima, que nessas ocasiões avança sôbre a vila, inundando as praças públicas, as casas, os campos marginais e as extensíssimas veigas daquela região, destruindo fazendas e haveres, e arrasando, ora as sementeiras, ora as colheitas que muitas vezes são feitas nas veigas, transformadas em lagos imensos, dentro de barcos.

Na impossibilidade do Estado, por falta de recursos financeiros, poder realizar actualmente essa maravilhosa obra de fomento que seria a da canalização do Rio Lima, obra colossal que traria para a cultura nacional para cima de 250:000 metros quadrados de terreno fertilíssimo actualmente inculto, lembro e peco ao Sr. Ministro do Fomento a dragagem do rio. Isso seria o bastante para evitar os enormíssimos prejuízos derivados do assoreamento cada vez maior do rio e conseqúentemente das suas cheias.

Finalmente, Sr. Presidente, eu peço que se dê andamento à, estrada de circunvalação de Ponte do Lima, cujo projecto, após a proclamação da República, foi parar ás repartições do Estado, depois de se estudar uma variante, ficando por lá esquecido bem mais de dois anos!

Da boa vontade com que o ilustre Ministro do Fomento sempre atende as justas reclamações que lhe são feitas, eu espero tambêm, Sr. Presidente, que êle atenderá

Página 5

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 5

estas que lhe apresento em nome duma região profundamente patriótica e essencialmente trabalhadora.

O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: o ilustre Senador Sr. Manuel José de Oliveira chamou a minha atenção para assuntos que na verdade correm pela minha pasta.

Quanto à ponte a que S. Exa. se referiu, sôbre o Lima, devo dizer que, efectivamente, já no tempo do Sr. Estêvão de Vasconcelos se tratou dêste assunto, mas até o dia de hoje não deu entrada no Ministério do Fomento o projecto das respectivas modificações, que tinha ido para Viana do Castelo.

Já pedi, telegráficamente, êsse projecto, e fiz saber ao engenheiro director das obras públicas de Viana que não estava disposto a esperar muito tempo pela devolução daquele trabalho. Êste assunto será, portanto, tratado em breve, com o cuidado que êle merece.

Relativamente à dragagem, vou mandar estudar o que convêm fazer, mas, infelizmente, não poderei mandar executar êsses trabalhos no corrente ano económico, porque já está gasta a verba consignada no orçamento para êstes serviços. Todavia, mesmo que essa verba existisse, as obras não poderiam ser feitas, porque demandam ou necessitam de aparelhos especiais que, no actual momento, o Estado não possui. Porém, a Junta Autónoma dos Melhoramentos do Pôrto encomendou uma draga de bastante potência, draga que ela está disposta a ceder depois para trabalhos em portos do norte.

No tocante à estrada de circunvalação, já está aprovado, com parecer favorável da estação competente, o respectivo projecto, restando simplesmente obter os fundos necessários para encetar os trabalhos.

No próximo ano económico, se eu ainda estiver dirigindo a pasta do Fomento, terei muito prazer em mandar executar essa obra, que é absolutamente justa e indispensável.

Pelo que diz respeito ao quiosque, espero informações precisas, pois se diz que há quem tenha direitos, cuja existência desejo averiguar.

O Sr. Manuel José de Oliveira: — O indivíduo, a que S. Exa. se refere, não tem direitos alguns em face da lei.

O Orador: — Desde que isso se averigue, mandarei proceder à destruição do quiosque.

O Sr. Manuel José de Oliveira: — Agradeço a resposta do Sr. Ministro do Fomento.

O Sr. Fortunato da Fonseca: — Sr. Presidente: pedi a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Fomento, a fim de chamar a sua atenção para um assunto referente ao modo como foram feitos os fornecimentos, ao caminho de ferro de Sul e Sueste desde 1902 até a proclamação da República, dos azeites para iluminação dos comboios do mesmo caminho de ferro.

Êste facto já levantou celeuma entre os empregados do caminho de ferro durante a monarquia, e tanto que foi tratado na imprensa, e eu estou convencido de que as pessoas que tomaram parte na sindicância, que foi feita sôbre êsse assunto, não tiveram conhecimento de que havia irregularidades no fornecimento do azeite.

Eu pedi alguns documentos, pelos quais vejo que o Estado foi defraudado numa quantia relativamente importante.

Até 1902 o azeite era fornecido por meio de concurso em hasta pública. Nesse ano, porêm, o conselho de administração determinou nomear um agente, dando-lhe uma percentagem por litro comprado e um bilhete de livre trânsito; isto durou até a implantação da República. As vantagens que daí provieram são eloquentemente demonstradas pelos documentos que, demoradamente, me foram fornecidos e sôbre os quais baseio a minha argumentação.

Os mapas de fornecimento de azeites fornecem-nos dados curiosos que esclarecem completamente o assunto.

Salta logo à vista, ao examinar a acidez, que o exame desta era feito por mera curiosidade, pois que se verifica que, mesmo com seis graus, era aceito o produto.

Tomando para exame o ano de 1906, o primeiro para que possuo elementos de comparação, vemos que nos preços, comparados com os do Mercado Central de Produtos Agrícolas e, em Janeiro, com os dos mercados de Abrantes e Elvas, há uma diferença que, em média, se pode calcular em 230 réis o decalitro; mas o ponto em que a eloquência dos números fala

Página 6

6 Diário das Sessões do Senado

mais alto é aquele que resulta da comparação entre as quantidades de azeite indicadas pelas facturas e aquelas que figuram como entradas nos armazéns gerais. Assim vemos, reduzindo os litros a quilos e comparando com as entradas:
[ver]
Entraram.....

Deviam entrar...

Diferença....

que, ao preço médio de 220 réis, representam 1:694$000 réis, valor do azeite que o Estado pagou e não recebeu.

Pagando o Estado mais 230 réis, em média, por quilo do que o preço do Mercado Central, temos, multiplicado por 93:503 quilos, 2:15O$569 réis.

Temos ainda a acrescentar a percentagem de 2õO$000 réis ao comprador, o que, tudo somado, dá 4:094$569 réis.

Resumindo:

Veja o Sr. Ministro do Fomento o resultado que deu o não se fornecer por meio de concurso o azeite ao caminho de ferro. Aumentou êste ano, com 300$000 réis que se deu ao agente, 1:579$000 réis de azeite que o Estado pagou e não recebeu.

Vamos agora aos preços.

Cotejando os preços nos diversos meses de 1906 com os preços fornecidos pelo Mercado Central dos Produtos Agrícolas, preços que eu cotejo ainda para o mês de Janeiro com os preços do mercado em Elvas e Abrantes, que me foram fornecidos por um ilustre colega nesta Câmara., vemos o seguinte:

Em Janeiro o preço é 2$200 réis por decalitro, isto dando ao azeite o valor de azeite de segunda qualidade, porque todos nós sabemos que o azeite até l,5 graus é azeite de primeira qualidade, de 1,5 até 2,5 graus é de segunda qualidade e daí para baixo de terceira e quarta qualidades.

Temos pois que o preço aqui, em 1906, é de 2$200 réis o decalitro e é, no Mercado Central de Produtos Agrícolas, deduzido o direito de entrada, de 1$970 réis.

Se cotejarmos todos os meses, vemos que há sempre uma diferença que anda, e média, a 230 réis o decalitro. Êstes 230 réis o decalitro, multiplicados pelo número de litros, 94:000, números redondos, dão 1:694$000 réis.

No ano de 1906, pelo facto de não ser feito o fornecimento por concurso e o agente comprar como muito bem lhe parecia, o Estado perdeu 4:179$000 réis.

O exame que eu fiz nestes anos de 1907 e 1908 leva-me a crer que não é excepcional êste ano.

Ora, Sr. Presidente, comquanto seja um pouco difícil apurar qual o verdadeiro preço por que o agente comprou o azeite, em todo o caso, o que é facto é que o Estado tem a certeza de ter pago a importância de azeite que comprou e não entrou nos seus armazéns.

Chamo para êste facto a atenção do Sr. Ministro do Fomento porque, desde que o Estado foi lesado e pode receber a importância, o Sr. Ministro, se assim o entender, mandará proceder a uma sindicância.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva): — E para agradecer ao Sr. Fortunato da Fonseca as informações que acaba de fornecer-me e dizer-lhe que, na presença dos factos apontados, vou tomar providências eficazes para que o Estado não fique defraudado nas importâncias a que tenha direito.

O Sr. Bernardino Roque: — Sr. Presidente: pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Ministro do Interior para as considerações que vou fazer relativamente ao liceu central de Bragança.

O liceu nacional de Bragança foi elevado a central por decreto de 26 de Maio de 1911, decreto que, no seu artigo 3. °, diz o seguinte, referindo se aos ordenados do reitor e professores:

«Os vencimentos dos reitores, professores e empregados menores dos liceus de Bragança e Santarém, continuarão a ser iguais aos dos idênticos funcionários dos liceus nacionais, emquanto se não der cumprimento ao disposto no § único do artigo 1.° da carta de lei de 22 de Junho de 1898, por forma que da execução do presente decreto não resulte aumento de despesa para o Estado».

Êsse parágrafo único, a que se refere o artigo 3.°, dizia o seguinte:

§ único..Qualquer aumento de despesa que desta medida possa advir, depois de

Página 7

Sessão de 24de Fevereiro de 1918 7

deduzido o aumento de receita avaliado pela média dos três últimos anos, ficará exclusivamente a cargo dos respectivos municípios, sem direito a subsídio algum do Estado».

Quer dizer, a elevação a central do liceu de Bragança trazia um aumento de encargos que não podia ficar à conta do Estado e sairia dos cofres dos respectivos municípios.

Estas palavras «respectivos municípios» podem interpretar-se de duas maneiras: ou do município de Bragança ou dos municípios do distrito de Bragança.

Recebi um ofício, como Deputado pelo círculo de Moncorvo, protestando contra a derrama ou rateio dessas despesas, que a câmara de Bragança fez recair sôbre diferentes câmaras do distrito.

Vou ler ao Senado êsse oficio e peço para êle a atenção do Sr. Ministro do Interior.

Leu.

Evidentemente, Sr. Presidente, a câmara de Mogadouro, enviando êste ofício, supõe o seguinte: que a palavra «respectivos» não se refere aos municípios dos distritos, mas ao município de Bragança.

Seja uma cousa ou outra, chamo a atenção do Sr. Ministro do Interior para isto. O que se não pode admitir, em boa justiça, é que, querendo a câmara de Bragança elevar a central o seu liceu, queira distribuir pelas diferentes câmaras do distrito o aumento de despesa que essa elevação acarreta e o fôsse fazer sem consultar as próprias câmaras.

O Sr. José de Castro: — Isso não pode ser.

O Orador: — Evidentemente. Mas mais ainda. Sendo a palavra «respectiva» referente a todas as câmaras do distrito, como é que uma câmara só vai representar para ser elevado a central o liceu, sem a consulta prévia das próprias câmaras que hão-de custear as despesas?

É ir dispor da bôlsa alheia.

O Sr. Ladislau Piçarra: — Mas foi elevado a central sem autorização parlamentar...

O Sr. João de Freitas: —... pelo Govêrno Provisório.

0 Orador: — Não só a câmara do Mogadouro não tem verba para ocorrer à despesa do concelho, mas ainda há outras câmaras, que estão em iguais circunstâncias. Muitas delas não tem rendimentos suficientes para entrar em despesas urgentes, tais como a limpeza das fontes que estão quási todas inquinadas de produtos tóxicos causadores de várias doenças. Nelas bebem não só os habitantes, mas os porcos, os bois, cavalos, etc., o que dá origem a epidemias de tifos e outras febres de mau carácter.

Não tendo rendimentos para ocorrer a estas necessidades urgentes, como podem elas ter rendimentos para custear esta despesa?

Espero que o Sr. Ministro do Interior diga alguma cousa a respeito das considerações que acabo de fazer.

O Sr. João de Freitas: — Requeiro a generalização do debate.

O Sr. Presidente: — Emquanto não há número para votar o requerimento de V. Exa., dou a palavra ao Sr. Ministro do Interior.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): — O assunto é, realmente, importante, e tanto que outras câmaras tem reclamado com os mesmos motivos e fundamentos.

Reconheço que são justas as reclamações que se fazem e, portanto, vou tomar providências no sentido de serem atendidas.

O Sr. Bernardino Roque: — Sr. Presidente: agradeço a resposta do Sr. Ministro que satisfaz cabalmente o desejo das câmaras, assim como o meu modo de pensar.

Consultado o Senado sôbre o requerimento para a generalização da discussão foi resolvido negativamente.

Procede-se à contraprova a pedido do Sr. Senador João de Preitos, sendo confirmada a primeira votação.

O Sr. Brandão de Vasconcelos: — Sr. Presidente: aproveito a ocasião de estar presente o Sr. Ministro do Interior para fazer umas considerações acêrca dum projecto de lei, que está para ser votado.

Na Câmara dos Deputados foi aprovada

Página 8

8 Diário das Sessões do Senado

no dia 10 de Julho uma proposta do Sr. Alexandre Braga, que tem por fim estabelecer que nenhum diploma seja discutido, sem que obtenha parecer das comissões respectivas com a antecedência de quinze dias antes do termo da sessão legislativa actual. Discuta-se aqui essa proposta, cuja latitude necessita com certeza de ser ampliada, não vá aconteceu o mesmo com êste projecto o que tambêm sucedeu com o projecto dos ratos, que pelo artigo 32.° da Constituição é lei, sem ser apreciado pela Câmara dos Deputados.

Concordando com o espírito da proposta, que eu desejaria ver aprovada pelo Senado e na mesma ordem de ideas eu peço ao Senado que não discuta de afogadilho êste projecto de lei, relativo a partidos médicos.

Êste projecto envolve doutrina que carece de estudo e que eu considero perigosa.

Sr. Presidente: na Câmara dos Deputados já passou no Código Administrativo o artigo 308.°, que diz:

«A extinção dos lugares dos corpos administrativos que estejam sendo exercidos por empregados de nomeação vitalícia e com direitos de mercê já pagos ou em pagamento, não implica a supressão dos respectivos vencimentos, nem prejudica o direito à aposentação, nos casos em que ela é devida)».

O Sr. Ministro do Interior conhece muito bem êste assunto, que dará em resultado as câmaras municipais poderem perseguir os médicos, pois que não se limitarão ao que especialmente visa o projecto, aumentar a dotação dum partido em Fozcoa, aproveitarão a autorização implícita para diminuir as dotações e suprimir partidos, para perseguir os seus titulares.

Deseje, pois, ouvir a opinião do Sr. Ministro do Interior, mesmo para o Senado saber o que há-de votar.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): — Sr. Presidente: como o ilustre Senador sabe, o projecto não é da minha responsabilidade. Este projecto, que foi apresentado na outra Câmara, destina-se a acudir a necessidades instantes da sanidade pública.

De resto é fora de dúvida que o projecto pode trazer inconvenientes, mas à Câmara assiste o direito de aprovar ou deixar de aprovar.

O orador não reviu.

O Sr. Tasso de Figueiredo: — Sr. Presidente: visto estarem presentes os Srs. Ministros do Interior e do Fomento, vou dirigir-me a S. Exas. acêrca de dois assuntos.

O primeiro refere-se ao Sr. Ministro do Interior, e apesar de ser uma questão simples, está contudo prejudicando não só uma indústria, como tambêm o público.

Êsse assunto diz respeito ao descanso semanal para as pastelarias aos domingos.

Compreende-se que o domingo, para as pastelarias da Baixa, seja conveniente, mas para as da Avenida êsse dia é exactamente aquele em que elas são mais necessárias para as pessoas que vão passear com suas famílias e levam crianças, não encontrando estabelecimento aberto onde possam comprar um bôlo.

Isto é não só prejudicial para os industriais estabelecidos na Avenida, como tambêm um grande incómodo para o público.

Por isso pedia a S. Exa. que adoptasse providências, a fim de remediar êste mal.

Com respeito ao Sr. Ministro do Fomento, pedia a S. Exa. que, com a maior urgência, se tratasse da construção do caminho de ferro do Entroncamento à Certa, a fim de valorizar aquelas regiões que o não tem sido como merecem, por falta de meios de transporte.

Êste caminho de ferro não prejudica em nada o estudo da rede geral de que S. Exa. está tratando, e é de todo o interesse para o país, porque deve dar grande rendimento.

Eu não vejo necessidade de deixar de atender esta questão, que não traz encargos para o Estado, porquanto o Govêrno, se abrir concurso para a construção dessa linha, encontrará de certo quem a faça.

Peço ao Sr. Ministro que trate quanto antes de fazer com que seja aprovado êsse projecto, que está pendente do exame da outra Casa do Parlamento.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): — Sr. Presidente: todas as reclamações sôbre a lei do descanso semanal têm do ser resolvidas pela câmara municipal.

Página 9

Sessão de 24 de Fevereiro de 1918 9

É a câmara municipal a entidade à qual se devem dirigir os interessados.

Se a câmara municipal os não atender, então é que o Govêrno poderá intervir.

O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: vou responder às considerações feitas pelo Sr. Tasso de Figueiredo.

S. Exa. parece que me quis atribuir má vontade a respeito do caminho de ferro a que se referiu, quando S. Exa. vê muito bem as diligências que eu tenho empregado e os cuidados que me tem merecido a questão da tracção ferro-viária, que necessáriamente deve valorizar muito os recursos do país.

Eu não quero dizer que S. Exa. tivesse o intuito de me contrariar, pelo contrário penso que as suas observações tiveram por fim ouvir da minha parte, mais uma vez, a afirmação de que eu me interesso pelo assunto e que trato de o resolver o mais depressa que se possa.

Se foi essa a intenção de S. Exa., declaro-lhe peremptoriamente que continuo empregando os meus esforços e diligências no sentido de se conseguir êsse melhoramento de incontestável vantagem para o país.

V. Exa. conhece todos os passos que tenho dado no sentido de conseguir êsse melhoramento e sabe que o projecto das estradas tem de ser conjugado com a questão da viação acelerada.

Mas, Sr. Presidente, estando no uso da palavra peço licença para responder às considerações que o Sr. José de Castro fez em uma das anteriores sessões do Senado, com relação à agricultura.

Infelizmente eu não estive presente a essa sessão; mas vou consultar o Sumário e se êle não corresponder inteiramente ao que V. Exa. disse, far-me há a fineza de me fornecer as necessárias elucidações.

Leu.

O que eu vejo é que o Sr. José de Castro trata com muito amor e com muito coração certos assuntos.

S. Exa. deseja a vulgarização do ensino, porque o ensino das escolas é só para rapazes.

O que posso dizer a V. Exa. é que em todos os países o ensino é muito especial em relação a certos ramos de trabalho.

Há lá por fora cursos de padeiro e doutros mesteres e fazem-se os respectivos exames.

Em cada uma das regiões se ministra o ensino segundo as conveniências dessa mesma região e do seu desenvolvimento industrial.

O Sr. Ladislau Piçarra: — Seria conveniente que os agrónomos do distrito fossem fazer palestras sôbre agricultura nas associações.

O Orador: — Isso seria muito bom, mas por emquanto não pode ser.

O Sr. Presidente: — Já são horas de se entrar na ordem do dia.

O Orador: — Se V. Exa. e a Câmara estão de acôrdo, seria melhor ficar com a palavra reservada, pois dificilmente poderei responder com brevidade.

O orador não reviu.

Foi permitido ficar com a palavra reservada.

O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia, mas antes chamo a atenção do Senado para o seguinte ofício:

Leu-se. E o seguinte:

Ofício

Ao Exmo. Sr. Presidente do Senado da República Portuguesa.

Exmo. Sr.— Cumpre-me comunicar a V. Exa. que, em virtude das disposições da lei eleitoral e em conformidade com a Constituição por nós votada em Congresso, então reunido em Assemblea Constituinte, perdi o direito ao lugar que ocupava na Câmara de que V. Exa. é muito digno Presidente porque me ausentei sem licença nem motivo justificado por prazo superior a quinze dias, ou sejam mais de dez faltas.

Não desejo, porêm, que a minha ausência seja mal interpretada e que o meu procedimento fôsse julgado menos correcto para todos os dignos membros dessa casa do Parlamento que tam gentilmente me acolheram sempre.

A todos, sem excepção, tributo o meu mais profundo respeito e com saudade e grande pezar me afasto de com êles colaborar.

A minha assiduidade não podia ser para

Página 10

10 Diário das Sessões do Senado

o futuro como eu desejaria e me cumpria moralmente e, por isso só, julgo preferível a atitude por mina adoptada a simular uma colaboração que eu não prestava.

Saúde e Fraternidade.

Bemfica, Muge, em 23 de Fevereiro de 1913. — De V. Exa. At.° V.or Obg.ro = José Luís dos Santos Moita.

O Sr. Presidente: — Parece-me que, apesar do que se diz nesta carta, o Sr. Santos Moita não está incurso na disposição em, virtude da qual deva ter perdido o mandato

Pregunto, portanto, ao Senado se me autoriza a insistir com o Sr. Santos Moita para que desista do seu propósito, e proponho tambêm que esta carta a enviada â comissão de infracções.

Foi autorizado.

O Sr. Silva Barreto: — Mando para a mesa um parecer da comissão de infracção e faltas às sessões dos Srs. Francisco Correia de Lemos, Magalhães Lima, Ribeiro Seixas, Sousa Júnior e João de Freitas.

Foi a imprimir.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Da sessão passada ficou para votar a proposta n.° 47.

O Sr. Bôto Machado: — Sr. Presidente: eu pedi urgência para a discussão dêste projecto, mas reconheci agora, pelas declarações do Sr. Brandão de Vasconcelos e do Sr. Ministro do Interior, que efectivamente êle precisa ser substituído por outro, que foi redigido pelo Sr. Brandão de Vasconcelos.

Peço a V. Exa. que seja consultado o Senado sôbre se permite que o Sr. Brandão de Vasconcelos apresente o sem projecto de substituição.

O Sr. Presidente: — Eu chamo a atenção do Senado, pois trata-se de retirar um projecto para se substituir por outro, isto depois de ter concluído a discussão do primeiro. É um assunto grave (Apoiados).

Isto mostra que é indispensável introduzir no Regimento alguma disposição que dificulte o reconhecimento da urgência para a discussão imediata de qualquer projecto (Apoiados).

Lembraria ao Senado que as deliberações desta natureza só se deviam tomar em, votação nominal.

À comissão do Regimento compete tomar conhecimento dêste ponto especial e por isso chamo a sua atenção para o assunto.

O Sr. Miranda do Vale (para um requerimento): — O meu requerimento tem cabimento em qualquer altura da discussão; peço que o projecto de lei referido vá à comissão de administração pública.

É mais regimental que a forma como o Sr. Bôto Machado quere resolver o incidente.

O Sr. Presidente: — O requerimento do Sr. Miranda do Vale não me parece que, satisfaça melhor que a proposta do Sr. Bôto Machado. Estava bem, depois de votada a _ proposta do Sr. Bôto Machado, reconhecer que era necessário modificar aquele projecto e enviá-lo à comissão; mas, reconhecer primeiro e antes de mais nada, a, conveniência daquele projecto ser modificado é que não me parece regular.

O Sr. Miranda do Vale: — A aprovação do meu: requerimento implica o reconhecimento das razões aduzidas pelo Sr. Bôto Machado; e, como a proposta de adiamento em qualquer altura se pode propor, eu insisto em que o meu pedido tem cabimento agora, sem ofensa regimental, emquanto que a proposta do Sr. Bôto Machado, como V. Exa. verá, não tem razão de ser.

Consultado o Senado, foi aprovado o requerimento.

O Sr. Presidente: — Insisto com a comissão do Regimento para estudar êste ponto importante. Estavam marcados para ordem do dia de hoje, o projecto dos adidos e o relativo ao regulamento do trabalho indígena nas colónias.

O Sr. Presidente do Ministério pediu que não entrasse desde já em discussão o projecto dos adidos por estar S. Exa. preso na Câmara dos Deputados. O projecto de regulamento do trabalho indígena nas colónias não deve entrar em discussão por tambêm, não estar presente o Sr. Ministro das Colónias; lembro, portanto, a conveniência de, continuar em discussão o pro-

Página 11

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 11

jecto n.° 123, que estava dado para antes da ordem do dia.

Foi aprovado.

O Sr. Sousa da Câmara: — No momento em que fiquei com a palavra reservada, estava-me ocupando, ao que parece, do artigo 105.°, que se refere ao número de escolas normais e tratava de mandar para a mesa uma proposta, criando três escolas.

Efectivamente, sou eu o primeiro a reconhecer que é pouquíssima a criação destas três escolas mas, atendendo aos recursos financeiros de que dispomos e a que vale mais ter pouco e bom do que muito e ruim, parece-me de vantagem reduzir as escolas de ensino normal dum tam grande número a êste limitado número de três, porque realmente isso representa uma certa economia e, ainda que tenhamos de criar as classes paralelas equivalentes ao que, nos liceus, se chama desdobramento de turmas e, portanto, ainda que tenhamos aumento de professores, isso ainda assim representa ainda grande economia sôbre o número indispensável de professores das escolas normais.

Disse-se que cada escola normal, desde que ficassem estas três, teria uma grande frequência e, portanto, haveria uma grande acumulação d« alunos nessas escolas.

Eu disse já, acêrca do assunto, que, nos nossos liceus, tínhamos freqùência superior a 80O alunos. Ora com as escolas normais, mesmo as três que se criem, nunca êsse número irá, a meu ver, alêm de 500; de forma que fica muito aquém da frequência dos liceus.

Sôbre êste assunto ainda se pode levantar uma outra questão; desde que, por exemplo, se criem três escolas, uma no norte, como proponho, para o Pôrto, outra no centro do país em Coimbra, e a terceira em Lisboa, os alunos que frequentarem essas escolas terão de ser subsidiados, e, realmente, encontram se alguns em circunstâncias muito precárias.

O Govêrno poderia, de preferência a criar mais escolas, subsidiar êsses alunos.

Creio que, conquanto êsse subsídio represente, até certo ponto, uma quantia avultada, esta todavia é menor do que a que resultaria da criação de mais escolas.

Seria necessário arranjar professores para essas escolas e creio que dificilmente se obteriam professores para mais de três escolas.

Parece-me que criando mais que três escolas normais, adviriam não só dificuldades financeiras, mas ainda dificuldades para conseguir pessoal e material.

A meu ver, a questão do material é tam importante como a questão do professorado; sem bom material não poderá o professor, por melhor que seja, administrar um bom ensino.

Desde o momento em que se criem mais de três escolas, vem dificuldades grandes para o Tesouro.

Claro está que se, porventura, a questão financeira não estivesse no estado em que está, não teria dúvidas em aprovar não só as seis escolas, mas oito ou mais.

Assim não.

O Sr. Goulart de Medeiros: — Seria produzir professores que não tinham aplicação. Sucede isso com os médicos, por exemplo.

O Orador: — Quanto mais melhor; mas, alêm dum certo limite, não se poderá ir.

Tem que se atender à questão da população, o que é importante.

O orador não reviu.

Foi lida e admitida a seguinte

Proposta

Artigo 105.° Criar-se hão três escolas normais: uma no norte, com a sede no Pôrto; outra no centro, com a sede em Coimbra; e a última no sul, com a sede em Lisboa. = Augusto Vera Cruz = -José Miranda do Vale = Tomás Cabreira = José de Cupertino Ribeiro Júnior = António Cerquei rã Coimbra = Abílio J3arreto= Brandão de Vasconcelos = Ladislau Piçarra = Manuel de /Sousa da Câmara = M. Martins Cardoso.

O Sr. Silva Barreto: — Sr. Presidente: às observações feitas pelo Sr. Sousa da Câmara responde a comissão com o seu relatório, e permita S. Exa. que lhe responda, por mais duma vez, com passagens do mesmo relatório.

Há três factores que temos de considerar no ensino normal:

Primeiro, pessoal habilitado; segundo, falta de dinheiro; terceiro, a transformação das escolas normais pelo novo modêlo.

Página 12

12 Diário das Sessões do Senado

Êste projecto não é outra cousa senão a modificação do projecto do Govêrno Provisório.

A comissão de instrução tratou de alterá-lo o menos possível.

Se a comissão de instrução fôsse incumbida de organizar nova reforma, certamente que o seu trabalho seria mais completo.

O Sr. Ministro das Finanças está na disposição de não dar dinheiro.

Portanto o que temos a fazer? E ver se com o dinheiro que actualmente o orçamento acusa se poderá fazer alguma cousa.

Eu entendo que sim.

Peço à Câmara um pouco de atenção porque não levarei muito tempo.

É indispensável que a Câmara forme juízo acêrca desta questão.

O ensino normal como está não pode continuar.

Sou insuspeito, porque sou professor de ensino normal.

Gastam-se com todo o ensino normal: réis 70:716$000 segundo o orçamento de 1912-1913.

Além desta verba encontram-se mais as verbas seguintes:

36:000$000 réis para as três escolas normais, com 70:000$000 réis soma réis 106:000$000.

Quer dizer as actuais escolas normais com as três que vão criar-se fazem uma despesa de 106:000$000 réis.

Admitindo que o Estado não de nem mais um centavo para o ensino normal, temos 106.OCO escudos para esta ramo de serviço público.

Pregunto à Câmara se com 106.000 escudos não podemos fazer alguma cousa de geito e manter o ensino normal à altura devida.

O Sr. Sousa da Câmara diz que por cousa de questão financeira é que entendo que não deve haver mais que três escolas normais (Apoiados}.

O Sr. José de Castro: — Antes três boas que oito más.

O Orador: — Mas não há nada que impeça a criação de oito escolas boas.

Disse-se que apenas deve haver cinco ou seis escolas, a comissão de instrução insta pela criação de oito.

Escuso de fundamentar a necessidade da existência dessas escolas, porque o relatório da comissão de instrução largamente o fundamenta.

Mas dêsde que se trata de dinheiro vamos a vêr de quanto dispomos.

Temos 70:716$000 réis para o actual ensino normal e pela dotação do Govêrno temos mais 36 contos de réis ou sejam 106 contos de réis.

Eu proporia, como já propôs tambêm no projecto inicial a comissão de instrução, a extinção do ensino normal existente, porque com a dotação orçamental podemos estabelecer a número de, escolas que a comissão indica.

O que quero frisar é que com os elementos financeiros de que o Govêrnos dispõe para o ensino normal, que são 106 contos de réis podemos fundar as escolas normais suficientes para acudir às exigências do ensino, ou sejam oito escolas para o continente e uma para as ilhas.

Eu tenciono apresentar modificações à verba de 12 contos de réis para cada escola, porque é excessiva.

Hei-de propor o sua redução a dois terços, mas agora vou argumentar com a máxima importância.

Cada escola normal importa em 12:850 escudos, logo seis importam em 77:100 escudos.

O Sr. João José de Freitas: — A comissão de finanças propõe a criação de seis escolas no continente e uma nos Açôres?

O Orador: — A verba do Orçamento é de 106 contos de réis, logo sobeja dinheiro se montarmos seis escolas.

Vamos à hipótese da comissão de instrução, ou sejam nove escolas a 12:800$000 réis; importam elas em 115:650$000 réis; há um excesso de 9 contos de réis, aproximadamente. Quer dizer, podem-se criar no continente oito escolas e uma nas ilhas, satisfazendo-se assim às necessidades do ensino, sem que o Orçamento seja sensivelmente agravado.

Perguntar me hão: E o pessoal das escolas, que regula por uns cento e trinta professores?

Uma parte dêsses cento e trinta professores pode e deve ser aproveitada no ensino das novas escolas normais, com excepção dos professores de pedagogia, dos

Página 13

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 13

professores de ensino prático, e ainda outros que eu quero sejam indiscutíveis competências.

Carecemos de professores para exercícios manuais, que não temos.

Com respeito a edifícios apenas há um de construção próprio; é o da Escola Normal do Pôrto, deve-3e ao princípio da descentralização.

Talvez hoje já seja acanhado, mas lá fora, guardadas as respectivas proporções, não há melhor. Único no país, aquele edifício é da iniciativa da Junta Geral do distrito do Pôrto, E às vezes, a respeito do ensino, diz-se tam mal da descentralização!

Agora, Sr. Presidente, o pessoal. É de cento e vinte a cento e trinta professores. Segundo o que tenciono propor, será agregado aos liceus e escolas industriais.

Sabe-se muito bem que os liceus estão cheios de interinos e sabe-se como o serviço é feito em alguns dêstes estabelecimentos com as interinidades.

E V. Exas. querem resolver o problema do ensino normal, em Portugal, criando três escolas, que tantas são aquelas a que se refere o decreto.

Pois eu julgo-me habilitado a garantir a V. Exa. que, três escolas normais para quinhentos professores, que tantos são aqueles de que nós precisamos para o ensino, sem subsídio e a distância dos principais centros do país, que dão a frequência, como são as Beiras e Trás-os-Montes, não resolvem o problema.

V. Exa. verá que três escolas normais, embora bem montadas, não tem frequência, e como é que elas podem ter frequência, se são afastadas dos principais centros, que lhes poderiam dar concorrência, como sejam as Beiras, Trás-os-Montes, o sul do Alentejo e o Algarve?

A maior parte das pessoas que desejem frequentar as escolas normais, não poderão realizar os seus desejos por falta de recursos.

O Sr. Abílio Barreto: — Cá estão às bôlsas de estudo.

O Orador: — Então, o Sr. Abílio Barreto melhor dirá que se aplique a importância das bôlsas de estudo à difusão do ensino.

O Sr. Abílio Barreto: — Saem mais baratas.

O Orador: — Não ficam mais baratas.

As leis de 1878 e 1880 estabeleciam pensões, as quais se conquistavam por meio de concurso.

Pois, apesar disso, a frequência foi sempre diminuta.

O Sr. Brandão de Vasconcelos: — Talvez isso se devesse às muitas exigências.

O Orador: — É-se hoje muito mais exigente.

V. Exa. deve saber que quem hoje se quiser dedicar à carreira do ensino primário, tem de desembolsar uma quantia importante.

Ora eu posso garantir a V. Exa. que as pessoas, ou a maior parte das pessoas que pretendiam dedicar-se ao magistério, não dispõem de recursos.

Eu conheço suficiêntemente a organização do ensino normal, modéstia àparte, e conheço bem a frequência.

As pessoas que frequentam as escolas normais, são pobres, por não o fazem sem grandes sacrifícios.

O Sr. Ladislau Piçarra: — Não apoiado.

O Orador: — Aqueles que pretendem advogar a existência de três escolas normais, únicamente, partem da hipótese de que, no país, não há pessoal para dirigir seis ou oito escolas.

Não é assim.

As escolas normais tem, não há dúvida, provado incompetência pelo que diz respeito ao ensino da pedagogia, trabalhos manuais, etc., porque para professores de pedagogia, por exemplo, foram nomeados engenheiros, médicos, bacharéis em direito.

Aqui está a razão porque o ensino normal em Portugal, é mal feito, por quem se dedicou a outras especialidades.

O Sr. Ministro do Interior (Rodrigo Rodrigues): — Agradeço ao Sr. Silva Barreto ter despertado a minha atenção, porque assim, provocou da parte do Govêrno uma declaração sôbre o seu modo de ver, acêrca do número de escolas normais que devem existir no país.

Evidentemente esta questão parece pe-

Página 14

14 Diário das Sessões do Senado

quena em relação à magna questão do ensino, mas não o é e para bem se discernir, há que atender às necessidades que essas escolas vem satisfazer e aos recursos com que o nosso país pode contar, para que o país fique dotado com escolas normais dignas dêle.

Ora o Govêrno, não sendo constituído por pessoas com aquela competência pedagógica, a que o Sr. Silva Barreto há pouco se referiu, mas sendo constituído por pessoas que querem timbrar tambêm em sentimentos patrióticos, nem por isso deixa de acentuar que, depois dum estudo demorado do assunto, se reconheceu que o pais realmente não está em condições de poder ter mais que três boas escolas normais, que façam professores à altura que êle os merece, independentemente de, quando houver recursos para isso se fazer, o que o país reconhece como necessário neste ramo de serviço, ser aumentado o seu número em um futuro mais ou menos próximo.

Neste sentido o Govêrno mantêm o modo de ver inscrito na lei do Govêrno Provisório de 29 de Março.

Com respeito às escolas actuais, o Govêrno suprime-as e substitui-as. Exactamente porque o Govêrno quere que haja professores à altura que o nosso país deve ter, é que entende que o Estado não pode ter mais de três escolas.

Poucas e boas é o elemento principal.

Os argumentos principais desta questão são uns da ordem económica, outros de ordem pedagógica.

Os, de ordem pedagógica são: primeiro a necessidade que há de se dotar êsses estabelecimentos com material e professores em condições de se poder efectuar um ensino efectivo e útil.

Todos nós conhecemos a verdadeira miséria com que está instalado o serviço normal em Portugal e todos sabem que se não instala um ensino desta espécie convenientemente, com quantias pequenas.

Ora, se estabelecer três escolas, que forneçam educação complementar aos professores, constitui já para nós uma grande dificuldade, muito maior esta será, se nós tivermos que proceder à instalação de seis escolas em condições convenientes.

Isto pelo que diz respeito à parte material, se bem que o Sr. Silva Barreto referiu que algum material existe em condições de poder ser aproveitado.

O Govêrno reconhece que não tem condições para poder fazer senão três escolas no país. Alêm disso tem de escolher o pessoal.

É fora de dúvida que a escolha tem de ser feita com todo o cuidado. O professorado tem de ser digno da altíssima missão que lhe é confiada, e os recursos não são suficientes para que possamos prover á preparação dum largo professorado.

O ensino, por muito cuidado que seja sob o ponto de vista teórico e prático, se não for acompanhado pela permanente lição das cousas, redunda em imperfeito e até incongruente

E necessário que o aluno o receba desde que entra para as escolas normais permanentes.

Entre nós há todas as condições para que o ai ano possa vir a receber a educação moderna; e por estas razões entendo que as escolas normais devem estar nos pontos das regiões mais importantes do país. E ali que os alunos, no contacto permanente dessas regiões, recebem uma educação que em outros pontos não poderiam receber.

Um aluno, que vai praticar numa região afastada não pode ficar com a impressão perfeita do que é o progresso: é necessário que venha às cidades mais importantes receber a lição.

Disse o Sr. Silva Barreto que desejar três escolas normais rio país é fazer com que a sua freqùência seja pequena.

Não só porque essas escolas se encontram nos centros mais populosos, mas porque, sendo difíceis as condições de vida da maior parte dos indivíduos que as frequentam, essas condições tornam ainda mais dificultoso o transportarem-se para um grande centro, é que em tais regiões as escolas devem ser perto.

Não pode deixar de se atender às condições físicas dos alunos; não se pode continuar com o sistema seguido, que consiste em os alunos irem apenas decorar as lições dos professores.

O ensino por muito bem feito que seja, quando não venha acompanhado da permanente lição que se recebe desde que se entra na escola, torna-se improfícuo.

O Govêrno deseja que essas escolas sejam um permanente ensino aos alunos, e para isso pensa estabelecer escolas nor-

Página 15

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 15

mais modelares com todas as condições indispensáveis.

O decreto do Govêrno Provisório prevê a necessidade de se atender a êste assunto, criando o internato, a exemplo do que se faz em Inglaterra, onde dá óptimos resultados.

Nós poderemos fazer poucos professores mas bons, e por aquela forma se remedeia o inconveniente dos alunos terem de trazer os recursos de suas casas.

Com respeito às bolsas de ensino, se elas são inconvenientes, se as pensões são insuficientes e se o facto de melhorarem as condições dos professores não traz a necessária concorrência, então as razões por que as escolas não são freqùentadas, serão outras

O Sr. Silva Barreto: — Em todos os países as escolas normais começaram por pouco número. Hoje a opinião de todos os países é tornar as escolas regionais, porque adquirindo o curso nos grandes centros, já não querem ir para as aldeias.

O Orador: - Nós podemos afirmar, com a certeza de que o fazemos com conhecimento da nossa época, que a moral de agora é superior à moral passada.

Podemos dizer isto quando estudamos a lição dos factos históricos à luz da verda deira moral.

Ora, sob êste ponto de vista, os defeitos da educação regional são evidentes.

V. Exa. cria, por exemplo, uma escola nas ilhas. V. Exa. sabe que há vícios regionais que devemos fazer que desapareçam, por exemplo, quanto à linguagem...

O Sr. Goulart de Medeiros: — Na Ilha Terceira, depois de Coimbra, é até onde se fala melhor português.

O Orador: — Defeitos regionais, existem em toda a parte.

O Sr. Goulart de Medeiros: — V. Exa. vai aprender nos Açores o que não encontra nas outras cidades do continente, que são requintes de civilização.

O povo da Terceira é respeitador, civilizado, não pratica os vandalismos que V. Exa. encontra noutras partes.

O Orador: — O Sr. Goulart de Medeiros não tem de se magoar porque, sendo quási todos os que ali estão, de regiões estranhas a Lisboa, se houvesse censura nas suas palavras a êle próprio, orador, se censurava; podia falar dos Açôres, como doutra região, sem que ninguêm o possa supor com a inconveniência de ir ali lançar sôbre os Açôres algum labeu.

Julga ter definido a S. Exa. e à Câmara quais as razões que pesaram no seu espírito e no do Govêrno para defender a constituição de três escolas normais no país; é porque o Govêrno deseja ver que temos três escolas normais de utilidade efectiva, deixando para mais tarde o cuidado de criar outras, mas só depois de se reconhecer que há essa necessidade.

De resto, a fixação do número de escolas deve estar ligada à freqùência escolar e não se pode argumentar com aquilo que sucede numa época anormal para o ensino.

Há necessidade de prover muitas escolas de professores, divergindo os pedagogistas nacionais quanto ao número de professores a criar; uns dizem que são necessários oitocentos, outros que menos, supondo se, entretanto, que três escolas normais em condições são suficientes para dar êsse número de professores anualmente.

O Sr. Silva Barreto: — Segundo os cálculos pelos quais a comissão baseou o seu parecer, precisa-se de quinhentos professores, em média; portanto, sendo o curso de quatro anos, precisamos duma população escolar de dois mil alunos.

O Orador: — E por isso que êste assunto, que parece frívolo, da fixação do número de escolas normais, não é.

São estas as razões que pesaram no espírito do Govêrno para entender que, presentemente, se não podem constituir em Portugal mais que três escolas normais bem organizadas.

O orador não reviu.

O Sr. João de Freitas: — Está junto ao parecer, que se discute, da comissão de instrução, sôbre a reforma de instrução, o parecer da comissão de finanças.

É êle, orador, o relator dêsse parecer e, nas considerações que vai fazer, limitar-se há ao ponto restrito que está em discussão, isto é, ao número de escolas normais que deve ficar existindo no país.

Página 16

16 Diário das Sessões do Senado

O decreto do Govêrno Provisório reduziu êsse número a três, uma em Lisboa, uma na Pôrto e outra em Coimbra, e o actual Govêrno, representado pelo Sr. Ministro do Interior, aceita êsse número de escolas, determinado no decreto, com fôrça de lei, em vigor não na sua totalidade, mas parcialmente.

A comissão de instrução defende a necessidade da existência de oito escolas, seis no continente e duas nas ilhas, e a comissão de finanças quere, Sr. Presidente, entre estas duas opiniões, estabelecer um meio termo, isto é, que êsse número seja constituído por seis escolas normais, cinco no continente e uma nas ilhas.

Não acompanhará nem o Sr. Silva Barreto, nem o Sr. Ministro do Interior em todas as considerações que produziram para justificarem o seu modo de ver, mas referir-se há às razões fundamentais que no seu espírito e no da comissão de finanças actuaram para adoptar uma solução intermédia.

Considera insuficientes para ocorrer às necessidades da habilitação dos professores primários apenas as três escolas.

Sendo necessário, para que dentro de dez anos haja todos os professores precisos para as diversas escolas do país, preparar e habilitar anualmente uma média de 480 a 500 professores, resulta igualmente necessário que cada uma dessas três escolas habilite, em média anual, 160 a 170 candidatos. Ora, com o quadro actual de professores de cada escola, seria isso impraticável e pedagógicamente inconveniente, pois não pode cada turma de alunos exceder o número de 50 a 60 e, portanto, para atingir aquele limite de 160 a 170, teria de haver três desdobramentos paralelos e conseqúentemente duplicações ou, pelo menos, considerável aumento do quadro dos professores.

Desde que êste quadro haja de ser aumentado, ficando apenas as três escolas, convêm mais, para auxiliar as exigências da preparação de professores com as possibilidades ou os modestíssimos recursos dos candidatos ao magistério, facultar-lhes meio de poderem fazer o respectivo curso em mais três centros escolares no continente e um nas ilhas adjacentes, cuja localização lhes fique mais próxima das suas terras e onde a vida seja menos cara, sendo ao mesmo tempo menor a despesa de deslocação para êles. Êsses quatro centros escolares a mais não deverão, porem, ser escolhidos arbitrariamente, propondo êle, orador, no relatório da comissão de finanças, que sejam em Braga, Viseu, Évora e Ponta Delgada, cidades populosas, as três primeiras capitais de província e a última capital do arquipélago dos Açores, e que todas eram já, há quinze anos, sedes de liceus centrais.

Para estas quatro, há pessoal docente capaz, sendo tambêm fácil e não muito dispendioso dotá-las com instalações convenientes e o preciso material de ensino. É ainda mester conservar mais estas quatro, pela poderosa razão de ordem pedagógica de que será êsse o único meio de conseguir o número suficiente de professores do sexo masculino — exactamente aquele de que está havendo grande escassês, em proporção com o avultado número de escolas dêste sexo cujos concursos ficam desertos, não aparecendo candidatos, — número que fatalmente diminuirá se todos forem obrigados a irem cursar sómente em Lisboa, Pôrto ou Coimbra, onde a vida é mais cara e as despesas de deslocação maiores, sendo por isso superiores aos seus precários recursos.

Oito escolas no continente, como propõe a comissão de instrução, é tambêm excessivo, tendo ainda o grave inconveniente de originar uma luta embaraçosa de emulações e rivalidades locais, ao tratar-se de determinar quais as duas capitais do distrito, alêm das três já indicadas, Braga, Viseu e Évora, que, como capitais de províncias e centros urbanos relativamente populosos, não poderão ser privadas delas. Teríamos assim Faro em conflito de interêsses locais ou regionais com Beja ou Portalegre, Leiria com Santarém e Bragança ou Vila Bial com Guarda ou Castelo Branco.

Deve, pois, adoptar-se, segundo o parecer da comissão de finanças, entre as duas soluções extremas em debate, uma solução intermédia, que é a que deixa exposta.

O Sr. Silva Barreto: — Peço a V. Exa. que me inscreva após todos os oradores, visto que algumas considerações mais tenho a fazer e fá-las-hei quando os outros oradores falarem.

O Sr. Goulart de Medeiros: — Eu não me tinha inscrito, mas visto que V. Exa.

Página 17

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 17

me concede a palavra, aproveito-a para justificar o meu voto.

Segundo o pensamento da comissão, ficam pertencendo ao Estado o ensino normal, o primário superior e as inspecções, e é confiado aos municípios o restante ensino primário.

O Estado propõe-se, portanto, fornecer às câmaras do país o pessoal apto para êsse serviço.

O Estado toma uma grande responsabilidade, porque tem de fornecer aos municípios pessoal habilitado e em quantidade suficiente.

Eu desde já informo V. Exa. que em alguns pontos do país estão fechadas escolas por falta de professores, como acontece nos Açôres, na Ilha Terceira, onde está uma escola fechada e sei que não pode ser provida por não haver professor que queira ir para lá.

Há-os com certeza no continente, mas não os há nos Açores.

O Estado, encarregando-se do ensino do professorado, fechando-o, não permitindo o ensino livre, toma perante as câmaras municipais do país uma grande responsabilidade, que é a de fornecer pessoal habilitado e em quantidade precisa para o ensino.

Posta a questão nestes termos, eu não posso dizer quantas escolas serão precisas para atender aos interesses nacionais, mas o que posso informar é que há escolas que estão actualmente fechadas por falta de professores.

Em diversas localidades estão há bastante tempo fechadas algumas escolas por falta de concorrentes.

A maior parte dos alunos que frequentam as actuais escolas normais são em geral de famílias pobres.

Preferem essas escolas por assim poderem tirar um curso mais economicamente, como muitos outros antigamente frequentavam os seminários, não por vocação religiosa, mas para conquistarem uma posição sem grande despesa.

Mas o curso deve ser diferente, para que dele saia um professorado muito mais competente do que o actual.

Ora, eu pregunto: quem vai frequentar com o 5.° ano dos liceus uma escola normal para depois de terminar o respectivo curso ir receber o que actualmente se dá a um professor de instrução primária?

Aqui é que está o ponto grave da questão; nós temos de estabelecer para os alunos que saírem das novas escolas normais um vencimento superior ao dos actuais professores primários.

Temos de estabelecer diferentes classes de professores; isto é que é lógico.

O que se dá com o professorado primário tem-se dado com muitas outras classes de funcionários, como por exemplo, a dos empregados de alfândega.

V. Exa. sabe que o pessoal das alfândegas era em geral pouco ilustrado; criou-se um curso especial, exigiram-se mais habilitações aos concorrentes, e hoje aos concursos que se abrem, apresenta-se sempre um número de candidatos muito superior às necessidades do serviço.

Tem-se dificultado as exigências para entrada em diversos lugares públicos; mas, apesar disso, a concorrência é grande, aparece sempre mais do que o pessoal preciso porque êsses lugares são bem remunerados.

Estou certo de que depois da aplicação desta lei só teremos professores para prover ás necessidades de ensino, se consignarmos nela que os novos professores terão uma remuneração muito superior à que tem hoje.

Nesse caso habilitaremos pessoal próprio para êste serviço e em suficiente quantidade, tanto nos Açôres como no continente.

Interrupção do Sr. Brandão de Vasconcelos, que não se ouviu.

Eu concordo com a idea de V. Exa. e até já a tenho aqui várias vezes defendido.

Em todos os empregos pertencentes ao Govêrno e cujo desempenho se realize em diferentes pontos do país, devia fazer-se a classificação dos empregados públicos em três categorias: uma para as terras de pequena importância, outra para as capitais de distrito e outra para Lisboa e Pôrto. Isto evitava os constantes pedidos feitos aos Ministros para realizarem transferências ou colocações, porque os empregados públicos sabiam de antemão os lugares que lhes competiam pela sua categoria.

Se se estabelecessem estas três classes, nós veríamos êsses empregados mudarem de orientação e com isso muito ganhariam o serviço e a moralidade da administração pública.

Página 18

18 Diário das Sessões do Senado

O Sr. Silva Barreto: — Na lei estão classificadas as terras do país, segundo as populações, com relação à colocação dos professores.

O Sr. Ladislau Piçarra: — Sr. Presidente: nas considerações, que fiz outro dia a propósito da generalidade dêste projecto, expus as razões que me levaram a concordar cora a existência de três escolas. É verdade que apresentei depois uma proposta que está em contradição com isso, mas eu vou explicar a razão dêsse facto.

Pareceu-me ver, a respeito dês número de escolas a estabelecer, uma corrente a favor das oito escolas no continente e uma nas ilhas.

Eu queria que se reduzisse o número delas e propus que fôsse de seis, mas vi depois que a minha idea ganhou terreno e o Sr. Sousa da Câmara tomou a iniciativa de apresentar uma proposta, fixando agora o número em três.

Subscrevi essa proposta, por conseqùência peço a V. Exa. que seja consultado o Senado sôbre se permite que eu retire a minha proposta.

Continuando no uso da palavra, vou explicar a razão por que subscrevi a proposta do Sr. Sousa da Câmara.

Vou referir-me aos argumentos que já apresentei.

Sr. Presidente, o problema do ensino primário em Portugal não se resolve únicamente pretendendo ensinar o povo a ler, escrever e contar.

Nós precisamos de muitos professores primários, muitas escolas; mas precisamos sobretudo de escolas convenientemente organizadas, que possam servir para educar, e não para mal instruir.

Quais são os principais argumentos em que se baseiam os defensores de maior número de escolas?

Primeiro, a necessidade de preparar muitos professores para o pais; segundo, necessidade de haver professores habilitados para reger essas escolas normais.

Com respeito ao número de professores que são precisos anualmente e que o Sr. Silva Barreto avalia em 600, devo dizer a V. Exa. que três escolas convenientemente organizadas podem preparar êsses 600 professores.

Mas eu quero partir da hipótese que as três escolas não fornecem êste número de professores, conforme reputa necessário o Sr. Silva Barreto; partindo ainda dêste princípio, entendo que não deve ser criado um maior número de escolas que teriam de ser preenchidas por professores que certamente não estariam à altura da sua nobre missão.

Eu compreendo que sejam precisas mais escolas normais mas, por ora, não as devemos fundar.

Estou de acôrdo com a opinião exposta pelo Sr. relator, que é muito louvável.

Ora, Sr. Presidente, essas três escolas exigem um grande número de professores habilitados, se porventura se criarem os cursos paralelos...

O Sr. Silva Barreto: — Eu não sou profeta, nem tenho aspirações a tal, mas afirmo à Câmara que, estabelecidas três escolas, as outras continuam a existir.

O Orador: — Trata-se apenas da responsabilidade pessoal.

Eu não creio que essas escolas continuem a funcionar.

O Sr. Silva Barreto: — Com o meu voto não continuam.

O Orador: — Por conseqùência, entendo que seria de boa política educativa fixar-se agora o número de três escolas, convenientemente organizadas, e à medida que as exigências do ensino, de acôrdo com os recursos financeiros, forem reclamando mais pessoal habilitado, então se vão criando outras escolas.

Sôbre a organização das novas escolas, tinha muito que dizer, mas limito-me a levantar a idea, que é preconizada por muito boa gente, de que sejam substituídos os preparatórios dessas escolas pelas disciplinas que devem constituir o ensino normal, e assim nós devemos excluir do quadro das disciplinas dessas escolas as que constituem própriamente os respectivos preparatórios.

Sr. Presidente: desde o momento em que separemos as disciplinas que servem de preparatórios às escolas normais, das disciplinas pedagógicas, que devem constituir o quadro do ensino normal, não centralizamos o ensino dessas escolas, e os alunos não precisam de deslocar-se das suas regiões para ir às escolas normais estudar os preparatórios que se ensinam nos liceus e outros estabelecimentos de ensino secundário.

Página 19

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 19

O Sr. Silva Barreto: — V. Exa. está a fazer considerações que dizem respeito aos artigos 67.° e 68.°, e parece-me que, quando se discutirem êsses artigos são muito mais azadas essas considerações que V. Exa. tem feito e continua a fazer, do que nesta altura.

O Orador: — Estas considerações são para explicar a V. Exa. que nós, criando agora as três escolas nos pontos indicados, não vamos deslocar os candidatos a essas escolas, se separarmos os preparatórios do ensino normal das disciplinas própriamente pedagógicas.

Desde o momento que nós aceitamos como preparatórios muitas das disciplinas que figuram como pertencentes ao quadro das disciplinas do ensino normal, para ensinar êsses preparatórios aproveitamos os estabelecimentos que há espalhados pelo país e os alunos não tem necessidade de vir às escolas, senão depois de terem feito êsses preparatórios.

O Sr. Silva Barreto: — Isso é muito bom na aparência, mas na essência V. Exa. vai já concordar comigo.

Eu quando estudei, cursei o quinto ano de português e literatura.

Pregunto a V. Exa. se o curso do magistério deve contentar-se hoje com o curso de literatura e do quinto ano de português?

O Orador: — V. Exa. pretende-me acusar por eu ter antecipado êste assunto, que viria mais a propósito noutro artigo, pois V. Exa. já se encontra no mesmo êrro.

Eu tenho aqui uma nota das disciplinas que se devem ensinar nas escolas normais, e o que posso afirmar a V. Exa. é que se o aluno fôr para lá com o 5.° ano do liceu e passar por todas estas disciplinas, V. Exas. podem crer que teremos professores que hão-de honrar a República Portuguesa.

Sr. Presidente: considerando que nos liceus e escolas secundárias se podem ensinar os preparatórios para a escola normal, entendo que o curso da escola normal se pode reduzir um pouco.

Eu quero frisar êste ponto; não vejo necessidade de se criarem muitas escolas normais ; o que me parece indispensável é que os professores sejam de reconhecida competência; não basta que êles apresentem documentos, quero que essa competência seja demonstrada por concursos de provas práticas.

O Sr. Silva Barreto num rasgo de oratória disse: Desgraçado país se não temos oito homens capazes de ensinar pedagogia!»

Ora, eu, apreciando o quadro das doutrinas que figuram neste projecto, desejaria que o Sr. Silva Barreto me apresentasse êsse número de professores habilitados para as escolas normais organizadas por esta lei.

Traçam se explicações entre o orador e o Sr. Silva Barreto.

O Orador: — Estou de acôrdo com a opinião do ilustre relator, é muito louvável aquela doutrina; mas nós podemos fundar desde já três escolas normais, e as outras podem-se criar a pouco e pouco em harmonia com as condições financeiras e durante êsse tempo os professores vão-se habilitando.

O Sr. Silva Barreto: — Se V. Exa. quere continuar a ensinar pedagogia como se tem ensinado até hoje, então é melhor não pensarmos em reforma de ensino normal.

E já disse que, se não houver no país professores competentes para êsse ensino, há a faculdade, de ir ao estrangeiro buscá-los.

O Orador: — Estas cousas não as quero resolver a priori.

Há dentro do país professores habilitados, mestres no ofício, para ministrar êsse ensino e estou convencido de que o pessoal que se habilitar nas futuras escolas há-de ser muito competente.

Criando três escolas podem ser providos nelas professores suficientemente habilitados, depois ir-se hão criando novas escolas, e teremos a certeza de que iremos recrutando bom pessoal.

Entretanto, os professores que desejem conquistar lugares das novas escolas, poderão ir-se preparando para isso, de forma que, sem sairmos das nossas fronteiras, mesmo dentro do país, podemos recrutar bons professores para as nossas escolas, e não precisamos de ir mendigá-los ao estrangeiro.

O Sr. Silva Barreto: — Os outros países têm feito isso.

Página 20

20 Diário das Sessões do Senado

O Orador: — Pois ou desejaria que nós, como patriotas, fizéssemos preparar êsses funcionários.

O Sr. Silva Barreto: — Mas como nós não sabemos nada de pedagogia, vamos estudar com quem saiba.

O Orador: — De pedagogia não sabemos nada, e queremos oito escolas?!

Então é melhor não pensarmos em ensino normal, porque não temos um único professor que o possa ensinar, como disse o Sr. Silva Barreto.

O Sr. Artur Costa: — Sr. Presidente: não tencionava tomar parte na discussão do artigo 105.° do projecto, porque não era necessária a minha intervenção, atendendo a que ela tem sido feita pelo relator do projecto, o Sr. Silva Barreto, e por outros Srs. Senadores que se tem ocupado do assunto, mas vi-me na necessidade de pedir a palavra, quando o Sr. Silva Barreto falou no número das escolas normais que se devem criar em Portugal.

Então eu manifestei a opinião de que êsse número fôsse só de três e S. Exa. objectou-me que êsse número não chegava para as necessidades do ensino.

Depois ouvi as razões do Sr. Ministro do Interior e outras do próprio Sr. Silva Barreto, que me levaram a modificar a minha maneira de ver e hoje tenho a opinião de que as três escolas não são suficientes para preparar os professores necessários ao ensino primário em Portugal.

Mas nos poderíamos conciliar tudo, desde que mantivéssemos a existência das escolas que estão abertas pelo menos até que os seus actuais alunos concluam os cursos.

Interrupção do Sr. Ladislau Piçarra que não se ouviu.

O Orador: — Se é permitido a um leigo emitir a sua opinião, direi a V. Exa. que fechar já exabrupto, depois desta lei estar votada, as escolas distritais, é lançar a maior das perturbações no ensino normal.

Por consequência, se se encontrar uma fórmula que possa harmonizar todas as opiniões, parece-me que deve ser aceita pelo Senado.

Sr. Presidente: se por um lado eu reconheço que o ensino normal não tem estado em harmonia com o que vem consignado neste projecto, por outro lado não posso deixar de reconhecer que fechar estas escolas desde já, quando algumas tem uma freqùência grande, será um mau serviço para a instrução.

Sr. Presidente: eu tenho aqui uma nota dos alunos que se matricularam na primeira classe nas diversas escolas normais em 1910-1911.

Com relação às escolas normais a criar alêm das de Lisboa, Pôrto e Coimbra, ouvi dizer a um Sr. Senador que elas deveriam ser criadas nos distritos de Braga, Viseu e Évora por lá existirem liceus centrais.

Eu sou exactamente contrário a essa opinião, e vou dizer porquê.

0 que é que exige o projecto como preparação para a matrícula das escolas normais?

Exige o quinto ano do liceu.

Ora, se nós colocamos as escolas normais junto dos liceus centrais, isto é, que tem o 7.° ano, há-de suceder que muitos dêsses indivíduos que tem de frequentar os liceus até o quinto ano, hão-de continuar a freqùentá-lo de preferência a escola normal, visto poderem faze-lo sem maior dispêndio. E isso mesmo se observa examinando a nota da matrícula nas diversas escolas distritais.

Quere V. Exa. ver qual foi o número de estudantes matriculados nas três classes da escola de Braga em 1910-1911?

Foi de 43.

Emquanto que noutras escolas de distritos menos importantes o número foi incomparávelmente superior.

Assim, só na 1.ª classe tem a escola da Guarda 70 alunos matriculados; Aveiro nas três classes teve 112 alunos; Castelo Branco tem na 1.ª classe 38 alunos, etc.

Isto parece-me a demonstração mais eloqúente de que estas escolas não devem ser criadas exclusivamente nas terras onde existam liceus centrais.

Eu estou convencido de que as escolas normais hão-de ser concorridas desde que o Govêrno garanta um ordenado bom aos professores por elas diplomados.

Mas eu vou ainda apresentar um ou dois exemplos. Temos Viseu e Évora que tem, respectivamente, na 1.ª classe a matricula de 30 e de 18 alunos e todavia estas cidades tem liceus centrais.

Página 21

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 21

Em Braga a população do distrito é de 303:169 almas, e a escola deveria ser muito frequentada, dada a facilidade de comunicações e densidade da população.

Pois não ó, e, a meu ver, por lá existir um liceu central.

Vejamos outro liceu central, o de Évora, por exemplo. Teve matriculados no 1.° ano 18 alunos! O de Guarda tinha 70 tambêm no 1.° ano.

Vamos encontrar ainda outras escolas, como a de Castelo Branco, que, tendo de população distrital apenas 216:688 almas, teve matriculados no 1.° ano 38 alunos, isto é mais 20 do que Évora, e quási tantos como Braga nas três classes.

Se estas e outras capitais de distrito em iguais condições, amanhã vierem reclamar alegando que querem lá uma escola normal, porque não são menos que as outras, tem maiores freqùências e não tem liceus centrais, pregunto:

O que havemos de fazer?

Eu concordo realmente em que não podemos, por ora, criar escolas normais em todas as capitais de distrito.

Reconheço que não se podem montar escolas em todas as localidades que as deviam ter, não só porque teriam algumas uma frequência dum limitado número de alunos, mas tambêm porque as finanças do país o não consentem; mas então criem-se já as escolas de Lisboa, Pôrto e Coimbra em bases seguras e depois de verificado que a freqùência é tam grande que permite a criação doutras, criem-se as mais que se julguem necessárias, escolhendo-se os distritos onde haja mais freqùência.

Antes disso julgo que é intempestivo tudo quanto se faça.

Todavia eu não concordo de forma alguma em que se fechem desde já as escolas que estão em exercício, pelo menos aquelas que tem a freqùência dum certo número de alunos emquanto os mesmos alunos não concluírem os seus cursos e fiquem habilitados ao exercício do professorado.

Preguntar-se há: E os professores de ensino primário que daí saem em que situação ficam em relação aos diplomados nas novas escolas normais?

Ser-lhe há assegurada a sua situação, ficando com as mesmas garantias que têm os actuais professores primários.

Seria violento que os alunos dessas escolas, que se matricularam nelas para fazerem os seus cursos, e alguns terão até a sua casinha montada, fôssem obrigados a marchar para outra localidade, que seria Lisboa, Pôrto ou Coimbra onde a vida é caríssima. 90 por cento dêles desistiriam da carreira, porque não se desloca um cidadão que já está instalado numa determinada terra, vivendo com meia dúzia de vinténs, como eu conheço alguns, que tem feito os cursos com uma despesa que não excede a 300$000 réis, nos três anos, porque as suas famílias os ajudam e êles instalam-se numas casas a que chamam repúblicas, ou numas casas de hóspedes, que recebem estudantes em comum, ou ainda em casas particulares onde os estudantes pagam um tanto por quarto e a dona da casa lhes faz a comida, para o que os estudantes fornecem os géneros necessários, pois os próprios pais, que em geral são modestos lavradores, enviam aos filhos carne de porco e até o pão. Por isso a despesa é insignificante.

Interrupção do Sr. Ladislau Piçarra, que não se ouviu.

O Orador: — Se V. Exa. vir fechar as escolas existentes, depois não tem alunos.

O Sr. Presidente: — A hora está muito adiantada e há um Sr. Senador que pediu a palavra para antes de se encerrar a sessão.

V. Exa. quere ficar com a palavra reservada?

O Orador: — Se V. Exa. me dá licença, eu concluo as minhas considerações em dois minutos.

Se tomei a palavra foi únicamente para justificar o meu voto, que é não me parecer suficiente que três escolas satisfaçam às necessidades a que temos de ocorrer e estou certo de que se se fixar êste número hão-de criar-se mais no futuro.

Não me parece, repito, que três escolas normais sejam suficientes para preparar os professores necessários para o ensino primário em Portugal; por isso insisto na minha opinião de que as escolas se vão fechando pouco a pouco, sucessivamente, à medida que os alunos forem terminando o seu curso, e, durante êsse tempo, tenho fundadas esperanças de que uma parte do professorado normal dessas escolas se há-de aperfeiçoar de forma a poder ocupar di-

Página 22

22 Diário das Sessões do Senado

gnamente as vagas que se forem dando nas escolas normais de Lisboa Pôrto e Coimbra.

E era o meu desejo, Sr. Presidente, porque isso seria económico e vejo que o Govêrno teria a maior dificuldade em dar que fazer a essa centena de indivíduos que ficariam presos ao orçamento, recebendo o seu ordenado sem que pudessem fazer nada que aproveitasse ao Estado, sobretudo em quanto se não criassem as escolas primárias superiores, pois certamente êles não iriam de boa vontade ser simples professores primários.

O Sr. Estêvão de Vasconcelos: — Mando para a mesa um parecer da comissão de agricultura.

Transitou para a comissão de finanças.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. Vera Cruz: — Tendo alguns jornais feito alusões à nossa emigração para o Brasil, julgo conveniente mandar para a mesa uma exposição a êsse respeito, que peço a V. Exa. a fineza de, a mandar publicar no Sumário das nossas sessões.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): — Não conheço os termos da exposição que o Sr. Vera Cruz acaba de mandar para a mesa.

O problema da emigração tem sido um assunto de que o Govêrno se tem já ocupado com o cuidado que êle merece, estudando as suas causas e consequências debaixo do ponto de vista das nossas relações com o Brasil, relações que desejamos manter.

O Govêrno português recebeu do Brasil comunicação de que havia vantagem em realizar um acôrdo acêrca dos termos em que a emigração para ali se faz; nesse sentido se autorizou o Sr. Bernardino Machado, nosso representante, a tratar dêsse acôrdo, porque o desejo do Govêrno é não ao manter, mas estreitar as boas relações de amizade com aquela República.

Por agora mantêm-se o statu quo, emquanto se estuda a questão.

Convêm pois esperar o que o nosso Ministro nos possa dizer, em face do compromisso tomado pelo Govêrno brasileiro de recolher os conspiradores.

As dúvidas, que se levantaram, tiveram por origem o facto dalguns emigrantes, a pretexto de serem conspiradores, irem embarcar em portos de Espanha, para aproveitar a viagem paga, fugindo assim a todas as responsabilidades de ordem militar.

Estamos estudando êsse assunto para pedir ao Govêrno brasileiro que faça exercer a vigilância necessária a fim que a sua atitude e admirável iniciativa, que foi evidentemente promovida pelo nosso Ministro ali, o Sr. Bernardino Machado, que tantos serviços tem prestado à República e que mostrou mais uma vez o seu empenho em ser-lhe útil, não sirva de capa a quêm, querendo fingir-se cidadão português, quisesse usar de meios que não servem senão para enganar o Govêrno brasileiro ou, a propósito dessa protecção, fizesse com que a emigração patológica aumentasse.

Pois são as informações que desde já posso dar ao ilustre Senador e a certeza de que nós estamos com o assunto entre mãos.

Não nos alarmemos com o facto de que a nossa emigração tenha tido um acréscimo, porque ela já se dava quando a nossa fronteira terrestre estava abandonada de qualquer fiscalização, o que não acontece desde que a tentativa de invasão dos conspiradores se realizou.

Desde então nós estabelecemos ali um serviço de fiscalização que não permite a emigração clandestina.

O facto de haver actualmente uma muito maior percentagem de emigração é devido a outra ordem de causas, que se traduzem tambêm em prejuízos para essa emigração.

O grande remédio para a emigração é prepararmo-nos para administrar o país como democratas puros, para democratizar o país, para pedir ao povo pobre o menor número de sacrifícios possível, à parte média da população do país um pouco mais e ao rico mais uma parte do que tem dado a menos até aqui para as despesas públicas: mas em nenhum dêstes casos os sacrifícios a fazer serão incomportáveis.

Tais são os termos em que o problema pode ser posto desde hoje e, se S. Exa. precisar doutras informações, pode pedi-las ao Govêrno.

O Sr. Vera Cruz: — Agradeço as explicações de V. Exa. e estimei que V. Exa. aqui estivesse para mas dar.

Página 23

Sessão de 24 de Fevereiro de 1913 23

O Orador: — O Brasil toma a nuvem por Juno. Supôs que nós queríamos impedir a emigração para lá, estando à frente do Govêrno quem havia dito que a emigração era um benefício para o país e um sintoma de grande desenvolvimento.

Por isso aproveitei esta ocasião para fazer minhas as palavras de S. Exa., de que o nosso empenho é que as nossas relações com o Brasil sejam cada vez mais estreitas.

O orador não reviu.

O Sr. João de Freitas: — Antes da ordem do dia pedi a palavra, instando pela remessa de documentos, visto que não estava presente o Sr. Ministro das Finanças, e, como agora se encontra presente, aproveito a ocasião para insistir com S. Exa. para que seja, com brevidade, satisfeito o pedido que fiz numa sessão do mês passado, não posso precisar a data, entre 13 e 18 do mês e entre 27 do mesmo mês.

O primeiro requerimento que fiz, foi para pedir uma nota dos funcionários de finanças, secretários, aspirantes e tesoureiros que porventura estivessem afastados, ou fora do exercício dos seus cargos e exercendo serviços nas direcções ou repartições centrais dos diferentes Ministérios.

O outro foi na sessão de 27.

Decorreu já mais dum mês, sem que esta minha requisição fôsse satisfeita, por isso, aproveitando a presença do Sr. Presidente do Ministério, pedia-lhe toda a urgência na remessa dêsses documentos.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): — Tenho a dizer a V. Exa. que, no meu Ministério, dei as ordens mais terminantes para que não se demorem as requisições de documentos pedidos pelos Srs. Deputados ou Senadores.

Êste serviço de cópia de documentos embaraça muito o serviço normal dos Ministérios.

Caso o Sr. João de Freitas quisesse, podia examinar os documentos que deseja no meu Ministério, onde os terá à sua disposição.

Devo, todavia, ainda acrescentar que, há poucos dias, assinei um ofício de remessa de documentos para o Sr. João de Freitas.

O que digo em relação a S. Exa., digo em relação a todos os Srs. Senadores.

O orador não reviu.

O Sr. João de Freitas: — Eu desejo apenas umas informações do Ministério das Finanças, que creio ter o direito de pedir.

O Sr. Presidente: — A seguinte sessão é amanhã, à hora regimental. A ordem do dia será a mesma e mais a eleição dum vogal para a comissão de petições.

Está levantada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

O REDACTOR=F. Alves Pereira.

Página 24

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×