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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

SUPLEMENTO AO N.º 86

ANO DE 1936 26 DE FEVEREIRO

Nos termos da alínea b) do artigo 19.º do Regimento da Assemblea Nacional inserem-se as palavras que o Presidente da mesma Assemblea proferiu no almoço de confraternização dos Deputados e Procuradores, realizado no Estoril em 20 de Fevereiro, e também, as que proferiu em resposta ao discurso que o Sr. Presidente do Conselho fez no Palácio da Assemblea Nacional, em 21 de Fevereiro, perante os Deputados reunidos na Sala Império, ao congratular-se em nome do Governo pela forma como decorrera a segunda sessão legislativa.
Para se tornarem,, porém,, compreensíveis as palavras do Presidente da Assemblea Nacional, insere-se também o discurso do Sr. Presidente do Conselho, dando-se assim satisfação ao voto formulado por alguns Deputados e apoiado pela Assemblea, na sessão de 22 de Fevereiro, para que do Diário das Sessões ficassem constando as notáveis declarações do Sr. Presidente do Conselho, que definem a política do Governo em face de alguns dos mais graves problemas do momento actual.
Palavras do Sr. Presidente da Assemblea Nacional no almoço de confraternização dos Deputados e Procuradores à Câmara Corporativa, realizado no Estoril em 20 de Fevereiro.
Foi com o maior prazer que me associei à idea gentil de reunir num almoço os Procuradores e os Deputados; foi com a mais viva satisfação que tomei parte nesta festa de confraternização dos membros da Câmara Corporativa e da Assemblea Nacional.
A iniciativa da reunião pertence aos secretários da Câmara Corporativa. Felicito os Srs. Dr. Carlos Mendes e Guilherme Otero Salgado pela feliz lembrança que tiveram.
¿ O que se pretendeu com este almoço?
Se não estou em erro, suponho que se pretendeu assinalar este facto: que a Câmara Corporativa e a Assemblea Nacional têm vivido em estreita harmonia, e têm trabalhado na mais perfeita inteligência e lealdade.
O facto é realmente impressionante e digno de ser posto em relevo.
Que cento e oitenta pessoas das mais diversas condições e temperamentos, vindas dos mais distantes lugares do País, vivendo em meios os mais diferentes e exercendo profissões as mais variadas tenham podido, durante duas sessões legislativas, desempenhar a sua delicada função sem um atrito, sem uma agressão, sem um conflito que pusesse em risco a actividade regular dos dois organismos constitucionais, é alguma cousa que enternece e consola, é acontecimento que merece registo especial.
¿Como foi possível semelhante maravilha?
A explicação do facto tem de ir buscar-se ao poder de penetração e fie conduta das doutrinas do Estado Novo!
Diz-se que são os sentimentos, e não os princípios, os factores determinantes dos actos humanos. A tese é exacta emquanto exprime a idea de que numa colisão violenta entre disposições fortemente arreigadas na alma humana e concepções meramente abstractas ou racionais, entre sentimentos que formam a essência fundamental da constituição psicológica e regras que vêm de fora, ditadas pela educação, pela convivência, pelas múltiplas necessidades da vida social, são as disposições que prevalecem, são os sentimentos que dominam.
Mas estes casos de crise aguda não são de todos os dias, não são felizmente a matéria ordinária e corrente da vida humana.
Fora desses momentos de conflito e de convulsão, os princípios, as regras de conduta, os conceitos racionais podem exercer no espírito humano uma poderosa influência e ser, portanto, um motivo forte de determinação da vontade.
E se esses princípios se ajustam às necessidades imperiosas do meio e são postos em movimento por um animador devotado e valoroso, cercado do alto prestígio da autoridade intelectual e moral, então adquirem um tal poder de irradiação e de convicção que se transformam nas ideas-fôrças de que falam os filósofos.
Estamos assistindo em Portugal a um fenómeno desta natureza.

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seus desvarios e de que o Estado Novo, desencantado do ensaio constitucional que imaginara, ver-se-ia forrado a suprimir esses dois órgãos como nocivos, como factores de grave perturbação e desordem.
Os factos estão à vista de todos e mostram claramente que a previsão falhou. Estamos no final da segunda sessão legislativa; e podemos afoitamente afirmar perante o País que a Assemblea Nacional e a Câmara Corporativa, profundamente compenetradas da gravidade da hora que passa e das responsabilidades que lhes incumbem neste agitado momento histórico, neste passo inquieto da vida nacional, têm sabido cumprir honradamente o seu dever cívico.
O sucesso é tanto mais de registar quanto é certo que a tarefa não era fácil, sobretudo para os membros da Assemblea Nacional. A Câmara Corporativa trabalha em silêncio e em sossego; está menos exposta aos perigos e tentações da discussão pública; e tem realmente produzido peças do maior valor. Para não falar senão das mais recentes, é de justiça reconhecer que os três pareceres da Câmara Corporativa sobre dissolução de coligações económicas, acidentes de trabalho e bases do Código Administrativo fazem a honra e o crédito de uma corporação, por mais exigente que se queira ser.
A Assemblea Nacional, depois das naturais hesitações de quem ensaia os primeiros passos, vencidas as dificuldades e embaraços de quem não conhece ainda o terreno que pisa, encontrou definitivamente o seu rumo, porque fixou o sentido da sua actividade e caminha nesse sentido com uma disciplina admirável.
Quem, como eu, tem seguido atentamente todos os movimentos da Assemblea pode testemunhar este facto consolador: o interesse nacional, o bem da Nação, é o alto objectivo que inspira e decide todos os Deputados, do primeiro ao último. Claro que, em relação a cada caso concreto ou a cada problema determinado, nem todos compreendem e sentem o interesse nacional da mesma maneira; daí as divergências legítimas de opinião, daí o debate.
Mas o que todos igualmente sentem é que o interesse da Nação deve prevalecer sobre os interesses locais ou .particulares; o que todos resolutamente querem é que, de facto, se adopte aquela solução que melhor corresponda ao bem comum.
Nas discussões travadas perante a Assemblea tenho visto sempre os Deputados dominados pelo cuidado, pelo desejo, pela ânsia de chegar ao resultado que exprima e traduza mais perfeitamente a realização do interesse nacional.
Quererá isto dizer que o trabalho das duas Câmaras não poderia ser mais produtivo, que o seu rendimento não poderia ser melhor?
De maneira nenhuma. Temos estado a trabalhar em condições extremamente desfavoráveis, força é reconhecê-lo. A culpa, já tive ocasião de o dizer, não é nossa; suponho que não é de ninguém: é das circunstâncias.
Veja-se o que sucedeu este ano. Durante mais de metade do período legislativo, com dificuldade arranjámos matéria para ordem do dia das sessões; a cada passo tive de recorrer à boa vontade e amabilidade do ilustre Presidente da Câmara Corporativa, suplicando-lhe que me obtivesse algum parecer com que pudesse fazer funcionar a Assemblea.
Depois, na última fase, caem sobre nós, de repente, duas propostas da maior importância e responsabilidade: acidentes de trabalho e bases do Código Administrativo.
Qualquer destas propostas, ilustradas com um largo s exaustivo parecer, carecia de estudo atento, demorado e reflectido. Pois tivemos de as apreciar e discutir atropeladamente e a pressa. O caso tornou-se particularmente angustioso no tocante à proposta de acidentes de trabalho. Esta proposta põe questões e problemas do maior interesse e delicadeza, em que não é possível tomar posição segura senão depois de exame amadurecido.
Vi os melhores espíritos da Assemblea preocupados, e ao mesmo tempo entristecidos, por lhes não ser possível dedicar ao estudo dessa proposta a atenção e o cuidado que ela merecia. A situação tornou-se tam aflitiva que tive de suspender o debate.
Isto vem para concluir que o rendimento da Assemblea podia ser muito mais elevado se entre a apresentação dos pareceres da Câmara Corporativa e o começo do debate mediasse sempre o lapso de tempo necessário para um estudo demorado, consciencioso e reflectido de cada proposta ou projecto.
Acho que vale a pena olhar para estas irregularidades e imperfeições e prover de remédio ao vício que elas acusam.
Mas basta de discorrer.
Saúdo efusivamente todos os ilustres Procuradores da Câmara Corporativa; e suado-os na pessoa do seu digno Presidente, o Sr. general Eduardo Marques. Tudo o que eu poderia dizer a respeito do distinto Presidente da Câmara Corporativa condenso-o nestas singelas palavras: é um perfeito homem de bem, com quem faz gosto conviver e trabalhar.
Tenho encontrado nele a mais decidida boa vontade e cooperação; o contacto em que o exercício da função nos tem colocado, fez aumentar, dia a dia, a minha consideração e estima pelo Sr. general Eduardo Marques, a quem folgo de poder prestar, neste momento, a homenagem do meu maior respeito e apreço.
Saúdo agora todos os meus queridos camaradas da Assemblea Nacional. E, ao saudá-los, quero exprimir-lhes o meu mais enternecido e profundo reconhecimento por todas as atenções e gentilezas que me têm dispensado.
Já o disse o ano passado e volto a repeti-lo: não foi sem apreensões e receios que subi os degraus da presidência da Assemblea Nacional. Sabia que ia exercer uma magistratura extremamente difícil e sabia ao mesmo tempo que não estava preparado para ela.
Mas todos os Deputados, do primeiro ao último, têm diligenciado, com um carinho tocante, afastar-me do caminhos os tropeços e os obstáculos; todos têm porfiado em me tornar fácil a vida e grata a tarefa. Nunca surpreendi em quem quer que fosse o secreto e malicioso desígnio de me criar embaraços.
Pelo contrário, todos têm mostrado um zelo admirável em que se mantenha alto e intacto o prestígio do seu Presidente.
Aceitem, a afirmação do meu mais comovido agradecimento.
Não quero terminar sem aludir a uma circunstância especialmente feliz. Essa circunstância é a comparência dos Srs. Ministros do Interior, da Guerra, da Marinha, dos Estrangeiros, das Obras Públicas, das Colónias, da Instrução e do Comércio e do Sr. Sub-Secretário das Corporações, membros da Assemblea Nacional e da Câmara Corporativa. Quiseram confraternizar connosco nesta festa de boa e franca camaradagem; quiseram dar-nos um testemunho eloquente do seu apreço e da sua solidariedade. Honra lhes seja.

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II

Discurso de S. Ex.ª o Presidente do Conselho perante os Deputados reunidos na- Sala Império do Palácio da Assemblea Nacional, em 21 de Fevereiro:

Sr. Presidente, minhas senhoras e meus senhores:

Estão quási a terminar, segundo creio, os trabalhos da actual sessão legislativa, e seria para mim motivo de grande pesar não ter antes disso qualquer oportunidade de em meu nome e em nome do Governo agradecer a colaboração prestada e congratular-me com V. Ex.ªs pela serenidade, pela inteligência e pela elevação com que a Assemblea Nacional exerceu as suas funções.
Ninguém poderá dizer que a sessão legislativa, como aliás a precedente, tenha sido estéril ou inútil, pois, além das discussões suscitadas à volta de importantes problemas de administração pública, ficarão destes trabalhos alguns grandes documentos da nossa história legislativa.
Agradeço, repito, a vossa amiga, sincera e lealíssima colaboração: agradeço-a aos que entenderam dever concordar com as propostas do Governo; agradeço-a igualmente aos que uma vez ou outra manifestaram a sua discordância. O Governo não pretende ser infalível, mas apenas servir o interesse nacional, e por isso estima que sobre os maiores e mais difíceis problemas incida sempre a luz de uma larga discussão e as melhores soluções se encontrem pela convergência dos nossos esforços.
O Sr. Presidente referiu-se ontem, no almoço de confraternização dos Deputados e Procuradores à Câmara Corporativa, a uma tal ou qual irregularidade verificada na marcha dos trabalhos da Assemblea Nacional. Não me admira que assim tenha acontecido. Sentimo-nos ainda presos a um. princípio de absoluto sincronismo das duas Câmaras; e emquanto nos não desprendermos dele é fatal ser mais aliviada a primeira parte da sessão legislativa e mais sobrecarregada e difícil a segunda. Quere dizer que não atingimos ainda neste ponto a perfeição; e isso me leva a encarar o problema da competência da Assemblea nas suas relações com o princípio constitucional que fixa a duração improrrogável de cada sessão legislativa.
Compreende-se que, encarada a Assemblea Nacional como órgão de representação e fiscalização popular, como intérprete das queixas, reclamações e deficiências do público e dos serviços, se lhe possa fixar um período certo, e sempre o mesmo, para a sua actividade. Mas seria desconhecer as exigências da função legislativa supor que esta poderia ser rigorosamente circunscrita ao mesmo período de tempo. Se há problemas estudados com grande antecedência, e cuja solução pode aguardar a abertura dos trabalhos da Assemblea, há também muitas questões que circunstâncias de momento fazem inesperadamente surgir e reclamam a actividade de um órgão legislativo. Poderia dizer-se que o problema está já resolvido pela competência praticamente ilimitada do Governo para fazer decretos-leis (e este a tem exercido, mesmo durante o funcionamento da Assemblea, sobretudo em questões de pormenor e que não interessam fundamentalmente à grande orientação ideológica do Estado Novo). É todavia certo que, não podendo o Governo dominar inteiramente as exigências de ordem legislativa, nem surgindo estas forçosamente durante o período das sessões, pode preguntar-se se não seria de preferir à actual doutrina constitucional preceito mais elástico, que permitisse ao Governo convocar a Assemblea para apreciação dos maiores problemas, com prejuízo de um período fixo de trabalho.
Mesmo sem esta modificação, creio que a faculdade já hoje existente de sujeitar ao estudo da Câmara Corporativa propostas ou projectos de lei no interregno das sessões parlamentares nos permitirá afinar suficientemente as instituições de modo que seja de futuro mais bem distribuído por toda a sessão legislativa o trabalho da Assemblea Nacional.
Vão pois V. Ex.ªs acabar dentro de pouco os seus trabalhos, mas nem por isso vão, segundo creio, desprender-se inteiramente da sua qualidade de Deputados e deixar de prestar ao Governo a colaboração de que ele necessita e de que não poderia prescindir da parte do escol político que se está cuidadosamente formando. Todos, embora não no mesmo lugar, estamos combatendo o bom combate, e quanto maiores forem as dificuldades, e são grandes as deste momento, maior deve ser a nossa coesão e mais intensos os nossos esforços.
Lembro-me de que no meu único dia de Deputado se debruçou em certa altura sobre a minha carteira um dos homens que neste País ascenderam às mais altas situações e pertencia então à maioria conservadora da Câmara. Esse chefe político, que daí a poucos meses veio a ter morte horrorosamente trágica, disse-me, com ar de desânimo: «Nada se poderá fazer. Em França as eleições acabam de desfavorecer os conservadores. A hora é das esquerdas». Nunca mais se me varreu do espírito essa tristíssima impressão - de um governante com maioria na Câmara se sentir moralmente abatido só porque fora de certa tendência o resultado eleitoral num país estrangeiro.
Há alguns anos já que a nossa política deixou felizmente de ser o simples reflexo da de duas ou três outras nações. E a experiência feita tem demonstrado que a hora não é das direitas nem é das esquerdas: a hora é de quem sabe o que quere e quero na verdade realizar o seu ideal político.
Emquanto fomos abrindo o nosso caminho houve por esse mundo muitas eleições com vitórias das direitas e das esquerdas, houve muitos triunfos conservadores e radicais, houve muitos movimentos revolucionários mais ou menos profundos e mais ou menos extensos, e nada disso pôde desviar-nos das nossas concepções e da firme e serena realização dos nossos princípios.
Não digo que não tenha de haver cuidados especiais e que os factos desenrolados à nossa volta nos não causem preocupações, sobretudo se algum país se esquecer do que deve à correcção internacional. Nada disso porém pode ter qualquer influência, porque o futuro de Portugal não depende senão de nós, quero dizer, da visão que tivermos dos problemas nacionais e da nossa força de vontade para servirmos o interesse da Nação. Numa palavra: a hora é ainda e sempre nossa.
Não são doces nem tranquilos os momentos que vivemos: é fácil descortinar no horizonte internacional duas ou três grandes questões - e uma só delas seria bastante para nos preocupar: a questão da paz, o conflito ítalo-etíope e a questão colonial.
Entregou-se com optimismo e confiança a manutenção da paz à S. D. N. Não quero de modo algum deminuir os serviços deste organismo internacional, mas a verdade é que tem havido guerras fora da Sociedade e guerras dentro da S. D. N.º Os seus esforços não são por consequência totalmente eficientes, porque se vê não poder evitar a guerra, nem pôr-lhe rapidamente termo depois de começada. E não sei mesmo se os mil acordos que se estão fazendo « no quadro da S. D. N.º, segundo a expressão consagrada, significam no fundo reforço ou desconfiança da sua acção.
Genebra, como organismo de defesa colectiva, não pode considerar-se em condições de dispensar todos os

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outros meios de assegurar a paz. Se nos fosse lícito fazer uma comparação com a manutenção da ordem interna dos Estados, haveríamos de notar esta incongruência: aqui a autoridade arma-se e procura desarmar os particulares; ali os Estados armam-se e a Sociedade é desarmada. A mobilização por esta de forças suficientes que pertencem aos vários Estados é problema que consideramos ainda muito longe de uma solução razoável, pela posição divergente que poderiam tomar no momento decisivo os interesses em jogo da sociedade internacional.
E assim vemos crescer sobre os pacifismos, por vezes suspeitos, da hora presente a febre dos maiores poderios militares e navais. Foi impelido pelas mesmas necessidades que o Governo estudou com largueza e o cuidado que lhe foi possível, ainda há poucos dias, as questões relativas ao rearmamento do exército e à reorganização da armada.
Temos estado em Genebra e no Conselho da S. D. N.º A nossa atitude, de certo relevo, devida ao crédito da obra realizada e ao prestígio dos nossos representantes, tem-nos importado a acusação de pouco conciliadores e intransigentes sancionistas contra um país amigo. A história pode demonstrar o contrário, pois, se por um lado cumprimos com seriedade as resoluções tomadas em harmonia com o pacto da S. D. N., temos a consciência de ter sido sempre elementos ponderados de concórdia, empregando todos os nossos esforços por uma solução conciliatória. Nem de outra forma podíamos proceder estando em causa um país com o qual temos mantido ininterruptas relações de boa amizade e para o qual vão, por tantas afinidades políticas e mentais, a nossa admiração e simpatia.
A questão colonial está na ordem do dia: os homens que lhe dedicam os seus estudos ou se sentem dominados pelas grandes preocupações ligadas aos domínios coloniais estão lanhando com as suas ideas e propostas a intranquilidade no seio de várias nações.
Temos visto circular a idea de atribuir todas as colónias à S. D. N., para serem directamente administradas por ela ou serem-no sob a forma de mandatos pelos mesmos países que as administram agora ou por outros que as pretendem obter. Temos visto circular a idea da restituição das colónias aos países desapossados delas por terem perdido a guerra ou uma nova distribuição de mandatos coloniais.
Vemos agora, envolta ainda em indecisas brumas, a última modalidade ou a nova teoria da livre distribuição de matérias primas coloniais. ,;Sabe porventura alguém precisamente o que isso seja?
Diz-se que há poucos dias numa capital europeia, em chá oferecido a jornalistas por uma alta personalidade política, alguém lhe preguntará o que significava aquela fórmula, e consta que o interpelado, espirituosamente, respondeu: «Vous savez: je suis três peu intélligent et c'est pourquoi je ne la comprends pas».
Temos verificado nos últimos anos deixar-se a Europa sugestionar e correr pressurosa atrás de fantasias de que primeiro se espera tudo e de que depois não resulta nada. Locarno, Streza, Estados Unidos da Europa, Conferência Económica de Londres, não são já esperanças, são cemitérios. E ninguém nos diz que muitos não corram agora também atrás de simples ilusões.
Nós afligimo-nos por vezes demasiadamente sem razão. E nenhuma atitude seria mais estranha que supormo-nos sistematicamente atingidos pelas fantasias alheias. Nas muitas questões que os mandatos possam suscitar não estamos mesmo directamente em causa: não temos quaisquer mandatos e depois do tratado de Versailles só recebemos Quionga a título de restituição de territórios nossos, de que abusivamente havíamos sido desapossados. No meio do desassossego geral é bem provável que, explorando-o e agravando-o, continuem ainda campanhas de imprensa, discursos ameaçadores, longos artigos de revistas, e depois disto é também provável que não haja mais nada. Se houver, ou se trata de fórmulas jurídicas e é preciso ter razão, ou se trata de outras de diferente natureza e é preciso ter força. Creio bem que uma e outra nos não faltarão no momento preciso.
Mas, Sr. Presidente, reconheço que estou absolutamente fora da ordem e receio ser chamado a ela. Termino portanto reiterando os meus melhores agradecimentos e congratulando-me em nome do Governo com a vossa valiosíssima colaboração.

III

Agradecimento do Sr. Presidente da Assemblea Nacional:

Julgo interpretar os sentimentos de todos os Deputados exprimindo a V. Ex.ª os nossos melhores agradecimentos pela gentileza que quis ter, vindo até nós congratular-se pela boa marcha dos trabalhos da Assemblea.
Asseguro a V. Ex.ª que nos foi sumamente grata a presença de V. Ex.ª
E eu, que conheço bem o espírito que anima todos os Deputados, posso afirmar a V. Ex.ª, com segurança, que dentro e fora da Assemblea podem V. Ex.ª e o Governo contar sempre com o apoio, a dedicação e a leal colaboração de todos os membros da Assemblea Nacional.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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